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RESENHA DE NOTÍCIAS CULTURAIS

Edição Nº 49 [ 4/8/2011 a 10/8/2011 ] Sumário

CINEMA E TV...... 4 Agência Brasil - Ancine vai distribuir R$ 700 mil a produtoras cujos filmes tenham se destacado em festivais ...... 4 Folha de S. Paulo - "45 Minutos" é experiência radical acessível ao público ...... 4 Correio Braziliense - Riscado abre o Festival de Gramado...... 5 Folha de S. Paulo - Filmes não sonorizados são tema de livro...... 6 - Gramado em busca do prestígio abalado...... 7 O Estado de S. Paulo - Encontro de gerações...... 8 O Globo - Um éden místico...... 9 Revista Época - O senhor do seu tempo...... 10 O Globo - Mostra relembra a obra de ...... 13 Estado de Minas - Combatentes em campo ...... 14 O Globo - Entre o entusiasmo e o ódio declarado...... 15 Estado de Minas - Enfim, a estreia ...... 16 TEATRO E DANÇA...... 16 O Globo - O grande ator sai de de cena...... 16 O Globo - Talento que enriquecia a profissão...... 17 Estado de Minas - Sem começo, meio ou fim...... 18 Folha de S. Paulo - Filho de Tim Maia reclama e muda cenas de musical...... 18 Focusbrazil.com (Reino Unido) - International Press Award for promotion of Brazilian Theatre in Britain ...... 21 O Globo - De volta ao lar e cheio de planos futuros...... 21 O Estado de S. Paulo - Macumba Oswaldiana...... 22 Estado de Minas - O teatro-dança de Evandro ...... 24 Estado de Minas - O Guetto de Gladstone ...... 25 Estado de Minas - Stop! A vida parou ...... 27 Folha de S. Paulo - Cia. Barracão, de Campinas, explora o sarcasmo do bufão...... 28 O Estado de S. Paulo - Quatro jovens em busca do amor...... 28 ARTES PLÁSTICAS...... 30 Estado de Minas - Em defesa do planeta ...... 30 Estado de Minas - A força das impressões ...... 31 O Globo - No olho da rua...... 31 O Globo - Obra de Ernesto Neto abre centro portenho ...... 34 FOTOGRAFIA...... 36 Estado de Minas - Tributo à criação ...... 36 O Estado de S. Paulo - O Brasil em recortes...... 37 MÚSICA...... 38 Estado de Minas - Pop com experimentalismo ...... 38 Correio Braziliense – No circuito do rock...... 40 Correio Braziliense - Sem nostalgia...... 41 Folha de S. Paulo - Diva Inezita comemora seus 60 anos de carreira...... 41 Folha de S. Paulo - Cantora sobrevive em meio ao risco de perda da música caipira...... 43 Estado de Minas - O samba das moças ...... 44 Estado de Minas - Blues do Brasil ...... 45 Estado de Minas - Sonoridade muito especial ...... 46 Folha de S. Paulo - Criador e Criaturas...... 48 Correio Braziliense - Alternativos e independentes ...... 50 Correio Braziliense - Palco acolhedor ...... 52 Correio Braziliense - Serginho do Brasil ...... 53 Estado de Minas – Identidade assumida ...... 54 Estado de Minas - Em plena entressafra ...... 55

2 LIVROS E LITERATURA...... 56 Correio Braziliense - O silêncio como força poética...... 56 Folha de S.Paulo – Painel das Letras / Itamaraty nas letras...... 57 O Globo - Em voz alta, os excessos de ‘Pornopopéia’...... 57 Carta Capital - Estrela por acaso...... 59 Veja - Um continente com pés de barro...... 62 Correio Braziliense - Ficção: O cangaço pop...... 64 Folha de S. Paulo - Família de anuncia reedições especiais...... 65 ARQUITETURA E DESIGN...... 65 Folha de S. Paulo - Mendes da Rocha alerta para 'rota dos desastres'...... 65 Estado de Minas - Tapetes de pedra ...... 66 Estado de Minas - Padrão internacional ...... 67 Estado de Minas - Arte com tecnologia ...... 69 MODA...... 70 Folha de S. Paulo - Sob Nova Direção...... 70 OUTROS...... 71 Correio Braziliense - O índio por ele mesmo...... 71 Estado de Minas - Arte indígena em destaque ...... 73

3 CINEMA E TV

AGÊNCIA BRASIL - Ancine vai distribuir R$ 700 mil a produtoras cujos filmes tenham se destacado em festivais

Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil

(4/8/2011) - Sete produtoras cinematográficas vão receber R$ 100 mil cada uma da Agência Nacional do Cinema (Ancine). Lançado esta semana, o Programa Ancine de Incentivo à Qualidade do Cinema Brasileiro (PAQ 2011) receberá inscrições até o próximo dia 15 de setembro.

Só poderão se inscrever, entretanto, produtoras que tenham participado de festivais de cinema no Brasil e no exterior, lembrou o diretor da Ancine, Mário Diamante, em entrevista à Agência Brasil. “O grau máximo de nota, de avaliação positiva de uma obra, é se ela entra nos principais festivais internacionais, como Cannes e Berlim, se ela se qualifica para participar do Oscar e se participa também dos principais festivais no Brasil”.

Diamante lembrou ainda que o campeão do PAQ 2010 foi o filme Maré, Nossa História de Amor, da cineasta Lúcia Murat, que teve uma participação significativa nos principais festivais internacionais e nacionais, como o Festival do Rio 2007, o de Berlim, o Open Doek (Bélgica), o de Shangai, Cannes, o Barbican Centre (Londres), o de Los Angeles, o Latino Film e o Open Doors (Holanda), todos em 2008.

As produtoras premiadas têm que investir os recursos em pesquisa e roteiros de novos filmes. “A ideia é que o dinheiro do prêmio seja reinvestido na própria atividade, ligando a produção dos filmes. É o que a gente chama de capital semente, para você plantar novas obras audiovisuais, ou seja, novos filmes. De certa forma, é um ciclo virtuoso da produção cinematográfica”, definiu o diretor.

Desde o início do programa, em 2005, já foram contempladas 38 empresas, viabilizando a realização de 39 filmes, entre eles A Mulher Invisível, Heleno, Uma Noite em 67, Malu de Bicicleta, Trabalhar Cansa (este inédito, selecionado para o Festival de Veneza), e a série Nathalia, exibida na TV Brasil.

Além do PAQ, a Ancine dispõe de outra premiação para incentivar a indústria cinematográfica nacional. Trata-se do Prêmio Adicional de Renda (PAR), que segue o mesmo princípio do PAQ, mas o cálculo da premiação é feito com base no resultado comercial das obras no segmento de salas de cinema.

“Aí, quem ganha são os produtores cinematográficos que têm obras de maior bilheteria, os distribuidores que lançaram os filmes e os cinemas de rua, que são incentivados a exibir os filmes brasileiros”, disse Diamante.

A lista dos vencedores do PAQ 2011 será divulgada tão logo termine a análise técnica dos inscritos. O diretor da Ancine estimou que isso ocorrerá cerca de um mês e meio depois do encerramento das inscrições.

FOLHA DE S. PAULO - "45 Minutos" é experiência radical acessível ao público

CACO CIOCLER ASSUME DESAFIO E REALIZA UM DOS TRABALHOS MAIS INTERESSANTES DE SUA CARREIRA

LUIZ FERNANDO RAMOS CRÍTICO DA FOLHA

(4/8/2011) As tensões de um monólogo. "45 minutos", encenação de Roberto Alvim a partir de um texto de Marcelo Pedreira, é a síntese feliz de um embate produtivo entre dramaturgo e encenador.

4 Um ator se apresenta diante do público hesitante e sem motivação. Deixa claro que não tem nada para contar e que sua presença ali é uma imposição externa, um martírio que compartilhará com os assistentes nos três quartos de hora seguintes. Pelo seu discurso não há trama ser desenvolvida, mas o espetáculo em curso o contradiz, afirma uma dimensão fabular e provoca inevitável reflexão sobre a teatralidade.

A direção de Roberto Alvim dialoga com a tradição de textos dramáticos do século 20 que fizeram da relação problemática entre ator e espectador seu tema.

O mais famoso deles é "Insulto ao Público" (1966), do austríaco Peter Handke. Com o discurso cênico que estabelece, pontuando milimetricamente todas as falas do personagem, Alvim intensifica as dificuldades para o ator que o encarna e o patético da situação. Caco Ciocler assume o desafio com desassombro e realiza um dos trabalhos mais interessantes de sua carreira. Ator renomado pelas , ele trabalha na contramão das expectativas.

Constrói sua caracterização explorando as falhas, os brancos e os silêncios. O personagem quase colapsa ao servir-se do parco estoque de truques de que ainda dispõe e que, fragilizado, revela.

A cenografia quase inexistente, que consiste na palavra "teatro" escrita no fundo do palco em letras garrafais, explicita a ironia dominante do espetáculo.

Se ali já não se representa nada, havendo só um ator nauseado tentando entreter o público, não deixa de haver teatro, ou alguém fazendo cena. Pelo menos é o que vários lances precisos e cortantes de luz e som operados sugerem.

A dramaturgia de Marcelo Pedreira não apontava necessariamente para essa solução. Participante de uma nova geração de autores cariocas, seu texto poderia ter sido encenado de uma forma mais leve e ligeira.

A opção pela gravidade e pelos tons escuros reflete o projeto estético que Roberto Alvim vem obrando no seu grupo Club Noir. É da tensão entre essas duas correntes teatrais, cristalizada no trabalho de um grande intérprete, que emergem as virtudes de "45 Minutos".

Não é só mais um monólogo de ator global. É experiência de teatro radical, acessível ao grande público.

CORREIO BRAZILIENSE - Riscado abre o Festival de Gramado

Ricardo Daehn

(5/8/2011) “Nunca sei o que dá pra esperar de um festival. Independentemente de premiação, o que importa é ter a convivência com todos lá dentro: tomar parte da colônia de cineastas que vêm alimentando a nossa indústria do audiovisual, ainda em formação”, observa o ator , às vésperas da exibição do longa dirigido por ele (O carteiro) no Festival de Cinema de Gramado. A 39ª edição do evento, que será aberta hoje com a exibição de O palhaço (e uma homenagem ao ator e diretor Selton Mello), se estende até o dia 13, com a entrega de

Karine Teles em cena de Riscado, filme dirigido por Gustavo Pizzi

5 Kikitos disputados (em categorias distintas) por 14 longas-metragens, entre produções nacionais e estrangeiras.

Riscado (de Gustavo Pizzi) dá a largada, hoje, na competitiva. No filme, a protagonista é uma atriz que, limitada a imitações de ícones do cinema, tem uma grande chance ao ser selecionada por um francês para tomar parte de gravações no exterior. Do outro lado da tela, dentro do Palácio dos Festivais, Domingos Oliveira e serão homenageados, respectivamente, com os troféus Eduardo Abelin e Oscarito. Pelo tapete vermelho de Gramado estão previstas as passagens de atores como Danton Mello, Daniela Escobar, Flávia Alessandra, Leona Cavalli, Hermila Guedes, Roberto Bomtempo, e Tainá Müller.

Numa seleção com títulos de circunstâncias densas, o filme de Reginaldo Faria — que retoma a função de diretor, depois de 27 anos — aporta na serra gaúcha com missão clara: “O princípio básico é o interesse pelo entretenimento, e não necessariamente a busca por bilheteria. A primeira coisa, em termos de motivação, é a paixão pelo que venha a ser criado”. Filmado no Vale Vêneto (), O carteiro aposta no humor para contar a trajetória de um rapaz do interior que se intromete numa relação amorosa, ao violar correspondência alheia.

Também na mostra competitiva, com o documentário Uma longa viagem, a diretora Lucia Murat explica que o filme “parte de uma tragédia, mas tem elementos de bom humor” na trama que “lida com drogas, rock’n’roll e luta armada”. A diretora vê Gramado como uma porta de entrada para “a possível continuidade de repercussão” alcançada no Festival de Paulínia, de onde saiu premiada pela crítica. “Extremamente pessoal”, uma vez que o projeto foi impulsionado pela morte de um irmão, Uma longa viagem faz conexões entre Murat, outro irmão dela, Heitor, que viveu a era hippie, com direito a “duas voltas ao mundo”, e a “inesgotável” história do Brasil.

Rumo trágico

Conduzido pelo pernambucano Paulo Caldas, País do desejo é outro concorrente de peso no festival. Estrelado por Fábio Assunção e , que interpretam dois irmãos, o filme expõe o drama de uma pianista que sofre com problemas renais e vê a vida mudar depois de conhecer um padre. Também centrado na presença de uma mulher doente, o documentário pernambucano As hipermulheres — um dos selecionados para o 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, por sinal — traz um trio de diretores (Carlos Fausto, Leonardo Sette e Takumã Kuikuro) debruçado sobre a perpetuação de um ritual indígena do Alto Xingu (Mato Grosso), com a tradição ameaçada pela debilidade física de uma mentora.

Cercado por questões de vida ou morte — tal qual o curta-metragem Pérfida (de Ramon Navarro), único título do DF incluído na mostra, que, na trama, une uma espiã, um padre nazista e uma leva de ex-católicos —, o longa Ponto final marca o retorno de Marcelo Taranto (A hora marcada) para a ficção. Riscos como o de uma bala perdida, ao lado da relativização do “poder definitivo da morte”, são elementos de Ponto final, projeto que consumiu seis anos de trabalho e R$ 800 mil. “Trato da dor repentina de um executivo, por meio da violência urbana e de como, em casos extremos, só há uma saída: o encontro amigável e afetuoso com o outro”, explica o diretor.

Já Cláudia Priscilla e Kiko Goifman estão à frente de Olhe pra mim de novo. A produção paulista se apoia na figura do transexual Syllvio Luccio, espécie de cicerone para os espectadores do road movie, que apresenta um painel da diversidade diluída no sertão nordestino.

FOLHA DE S. PAULO - Filmes não sonorizados são tema de livro

"Viagem ao Cinema Silencioso do Brasil" tem lançamento na Cinemateca e reúne ensaios de 14 pesquisadores

Obra nasceu de grupo de estudos mensal e aborda figura da mulher e ancestral dos "road movies"

GABRIELA LONGMAN DE SÃO PAULO

6 (5/8/2011) Como era o cinema nacional entre o fim do século 19 e o começo dos anos 1930? Quais eram seus temas? Como as revistas o abordavam?

Organizado por Samuel Paiva e Sheila Schvarzman, o livro "Viagem ao Cinema Silencioso do Brasil" reúne 14 ensaios críticos sobre a produção cinematográfica da época, apontando novos caminhos para os estudos de cultura e sociedade brasileira no começo da República.

Os autores, quase todos ligados à universidade, integram um grupo que desde 2003 se reúne mensalmente na Cinemateca para investigar e discutir seu acervo.

"Havia um apetite pelo inédito", conta Schvarzman à Folha. "Por isso nos concentramos no período silencioso, menos estudado."

O lançamento ocorre no bojo da programação da Jornada do Cinema Silencioso, evento anual que inaugura hoje a sua quinta edição.

O grupo de pesquisa e o festival são, no fundo, duas faces do mesmo movimento de resgate. "A jornada surgiu a partir de o grupo perceber a necessidade de ampliar o acesso a esses filmes", diz Carlos Roberto de Souza, curador do evento.

Para "reler" o repertório clássico de forma contemporânea, a programação prevê sessões com música ao vivo, tal e qual acontece em festivais do gênero pelo mundo.

"Somos a 'irmã mais nova' da mostra de Pordenone [Giornate del Cinema Muto]. Mas somos mais ousados na escolha da música, o que pode gerar reações adversas no público", diverte-se Souza. Neste ano, a jornada homenageia o repertório italiano, tendo Luca Giuliani, diretor do Museo Nazionale del Cinema, entre seus convidados.

OLHARES MÚLTIPLOS

Os textos do livro explicitam como o cinema pode e deve se somar às fontes tradicionais de pesquisa histórica. Há desde uma análise da figura da mulher, em três filmes, até um artigo sobre a influência, na representação social brasileira, das fórmulas narrativas americanas centradas na figura do herói.

Schvarzman analisa "Brasil Pitoresco, Viagens de Cornélio Pires", de 1925, espécie de ancestral dos "road movies". Ali, "o cinema funciona como a captura e a exibição do desconhecido mas também como afirmação daqueles que detêm o poder de registrar imagens", escreve.

No fim do volume, um levantamento dos filmes brasileiros ano a ano, de 1897 a 1934, serve de guia para historiadores e cinéfilos.

O GLOBO - Gramado em busca do prestígio abalado

Tradicional festival gaúcho começa hoje apostando no cinema autoral do Brasil e de outros países da América Latina

Rodrigo Fonseca

(5/8/2011) De mãos dadas com o cinema autoral, num esforço para apagar de uma vez por todas a fama de “decadente” adquirida no princípio da década passada, o Festival de Gramado inaugura hoje sua 39a- edição com uma responsabilidade a mais: apresentar uma safra à altura da exibida em Paulínia, em julho, considerada uma das melhores do país nos últimos anos. Surpresas já estão asseguradas na seleção de longas- metragens nacionais, com curadoria do crítico José Carlos Avellar e do cineasta

“SUDOESTE”, de Eduardo Nunes, fecha a programação, dia 12: competição nacional reúne sete longas 7 Sérgio Sanz, uma dupla mais preocupada com invenções narrativas do que com o glamour outrora vigente no Palácio dos Festivais.

Dos sete concorrentes ao Kikito de melhor filme brasileiro, cinco são inéditos: “Ponto final” (RJ), de Marcelo Taranto; “País do desejo” (RJ), de Paulo Caldas; “As hiper mulheres” (PE), de Carlos Fausto, Leonardo Sette e Takumã Kuikuro; “Olhe pra mim de novo” (SP), de Claudia Priscilla e Kiko Goifman; e “O carteiro” (RS), que marca a volta do ator Reginaldo Farias à direção após um hiato de 27 anos em sua trajetória como realizador. Ganhador do troféu de melhor atriz (com ) no Festival do Rio 2010 e aclamado em exibições no exterior, o drama “Riscado” (RJ), de Gustavo Pizzi, abre a competição hoje à noite, após uma homenagem a Selton Mello, que apresentará hors-concours seu segundo longa como realizador, a comédia “O palhaço”. Fecha a lista de competidores o documentário “Uma longa viagem” (RJ), que deu a Lúcia Murat o prêmio da crítica em Paulínia.

— Os festivais de cinema não competem entre si, mas competem todos eles com o mercado, trabalhando para ampliar o espaço de difusão e de reflexão de cinema. No caso de Gramado, a proposta é ampliar em especial o espaço para o cinema de autor feito entre nós e nos outros países da América Latina — explica José Carlos Avellar.

Avellar e Sanz selecionaram ainda sete longas estrangeiros para a competição latino-americana de Gramado, começando por “Medianeras: Buenos Aires na era do amor virtual”, de Gustavo Taretto (Argentina), amanhã. Até o dia 12, quando o drama carioca “Sudoeste”, de Eduardo Nunes, encerra a programação, disputarão o Kikito de melhor filme da América Latina as produções “A tiro de piedra”, de Sebastián Hiriati (México); “Las malas intenciones”, de Rosário García Montero (Peru); “La lección de pintura”, de Pablo Perelman (Chile); “El casamiento”, de Aldo Garay (Uruguai); “García”, de José Luis Rugeles (Colômbia); e “Jean Gentil”, de Laura A. Guzmán e Israel Cárdenas (República Dominicana). Os vencedores internacionais e brasileiros serão conhecidos no dia 13.

Com tributos reservados à atriz Fernanda Montenegro e ao diretor Domingos Oliveira, que receberão respectivamente os troféus Oscarito e Eduardo Abelin, Gramado garante ainda espaço para uma mostra paralela, à tarde, que inclui produções premiadas como “O senhor do labirinto”, de Geraldo Motta, que traz Flávio Bauraqui como Artur Bispo do Rosário. ■

O ESTADO DE S. PAULO - Encontro de gerações

Em Gramado, Paulo José e Selton Mello emocionam com 'O Palhaço'

Luiz Carlos Merten /GRAMADO (8/8/2011) Duas gerações de grandes atores nacionais encontraram-se no palco do Palácio dos Festivais, na sexta-feira à noite, na abertura do 39ª Festival do Cinema Brasileiro e Latino de Gramado. Paulo José entregou a Selton Mello o prêmio Cidade de Gramado, que o ator recebeu por ter dado um rosto ao cinema do País desde os anos 1990, naquilo que se chamou de "retomada".

Paulo e Selton interpretam pai e filho em O Palhaço, que o segundo dirigiu e foi o filme que inaugurou, fora de concurso - como parte da homenagem - a maratona na serra gaúcha, que vai até o próximo sábado.

Selton foi emocionante. Lembrou que seu sonho sempre foi o cinema. Se pudesse, iria até a rodoviária de Gramado e pegaria um ônibus para 1992, para tranquilizar o garoto ansioso que foi, dizendo-lhe que, quase 20 anos e 30 filmes depois, estaria ali, no palco, sendo homenageado. Impossível não se emocionar também com O Palhaço.

8 O segundo longa de Selton - após Feliz Natal, bem menos satisfatório - já havia sido premiado em Paulínia (quatro Meninas de Ouro, incluindo melhor direção). É um filme muito bonito e delicado, mas que justamente por isso talvez seja um tanto difícil de vender para um público ansioso por emoções mais fortes. "Vender", no caso, não deve ser entendido pejorativamente, como vil comércio. O espectador, afinal, precisa ser motivado para comprar o ingresso.

De todos os festivais que se realizam no Brasil - e são muitos -, Gramado é o que tem a curadoria mais presente. O crítico José Carlos Avellar e o documentarista Sérgio Sanz, que fazem a seleção dos filmes das mostras competitivas brasileira e latina, privilegiam o cinema de autor e gostam de escolher e projetar os filmes de forma a que dialoguem entre si.

Isso foi particularmente sensível na primeira noite, quando, após O Palhaço, foi exibido o primeiro longa brasileiro da competição: Riscado, de Gustavo Pizzi. Paulo José e Selton Mello interpretam palhaços de um circo mambembe. O segundo duvida da sua vocação, como a atriz de Riscado também se interroga sobre as suas chances de fazer bem o que gosta (e obter reconhecimento).

Houve críticas à seleção de Riscado porque o filme foi premiado no Festival do Rio, há quase um ano. Avellar, no jornal do festival, disse que a ideia é alavancar filmes inéditos com datas próximas de lançamento. Riscado está apontado para estrear em setembro. O elo foi mais tênue entre os filmes da segunda noite - o argentino Medianeras, de Gustavo Taretto, que a Imovision vai lançar em 2 de setembro, e Ponto Final, de Marcelo Taranto.

Ambos tratam da cidade grande - Buenos Aires, no filme argentino, é onde vivem os protagonistas, ambos fóbicos. Um designer de sites e games e uma arquiteta que ganha a vida como vitrinista. Ambos discutem a cidade, cada um do seu canto, e chegam à conclusão de que as desigualdades arquitetônicas expressam a estrutura social. Medianeras é sobre o lento processo de aproximação desses solitários, interpretados por Javier Drolas e Pilar López de Ayala, a Angélica do Estranho Caso de (e também uma das atrizes de Lope, de ). O filme, exibido no Panorama, em Berlim, é encantador.

O GLOBO - Um éden místico

Brasileiro prepara filme, livro e exposição sobre Kabadio, uma pequena vila religiosa, de três mil habitantes e cercada por conflitos armados, no Senegal

André Miranda

9 NUMA CENA do trailer do documentário preparado por Daniel Leite, mulheres de Kabadio dançam numa praça: filme pretende mostrar a cultura e as tradições islâmicas do vilarejo

CENAS DA ROTINA dos moradores, que Daniel Leite fotografou — em filme, não em digital — em duas viagens a Kabadio; diretor voltará em 2012 ao Senegal para terminar o projeto

(8/8/2011) Um carioca de 33 anos dá nome ao único cinema — na verdade, uma sala com um projetor que exibe vídeos numa parede — de Kabadio, uma pequena vila de três mil habitantes no Sul do Senegal, considerada um centro místico em meio a uma região marcada por conflitos armados. Não é pouca coisa considerando-se que, há até poucos anos, os moradores de Kabadio não gostavam de receber forasteiros e tentavam se manter alheios a qualquer tipo de influência dos toubab, a designação no idioma mandingue para homem branco. Mas o fotógrafo e cineasta Daniel Leite furou o cerco espiritual.

Em duas visitas, uma em 2006 e outra em 2011, ele já passou dois meses no vilarejo para preparar um livro de fotos, uma exposição e um documentário. Seu maior objetivo, contudo, é ir além dos produtos materiais. Daniel quer mesmo ajudar Kabadio.

O Senegal tem uma geografia inusitada: o Norte e o Sul do país são separados por um outro país, a Gâmbia. O Sul é conhecido como Casamansa, região que sofre com conflitos armados há mais de 20 anos, a maioria deles promovidos pelo Movimento das Forças Democráticas de Casamansa (MFDC), uma guerrilha que reivindica sua separação do resto do Senegal.

Logo na primeira vez que foi a Kabadio, Daniel compreendeu os riscos e as dificuldades da Casamansa. Ele pegou um avião de até a capital senegalesa de Dacar, atravessou as estradas do Norte, cruzou a Gâmbia, enfrentou um engarrafamento de seis horas até conseguir pegar um ferry boat para atravessar o Rio Casamansa e só então foi parar na região militarizada. Sua primeira imagem do Sul do Senegal, ao acordar no meio de uma viagem que no total durou 16 horas, foi a de um caminhão cheio de militares armados bloqueando a estrada.

Outro encontro comum, para quem trafega por Casamansa, é com os rebeldes do MFDC cobrando um “pedágio” dos forasteiros em nome de uma ajuda ao movimento separatista. — Esse trajeto é uma passagem que foi me acostumando àquilo com que eu iria me deparar — diz o diretor. — Kabadio é um éden.

Eles são pobres materialmente, mas não há miséria. A guerra não passa por lá por causa da proteção mística e do respeito político que os rebeldes têm pelo vilarejo. Com o projeto, eu quero revelar a realidade daquele povo, que é de onde nosso povo brasileiro vem. Aqueles rostos são os nossos. Eles são nossos ancestrais.

Daniel, que hoje trabalha como diretor de fotografia da TV Globo, começou a se aproximar de Kabadio durante os três anos em que estudou cinema na França. Ele ficou em Lyon de 2004 a 2007, pagando as contas com editoriais de moda para revistas ou com pequenos trabalhos em cinema e TV. Mas ele se sentia incomodado pelas dificuldades de um estrangeiro no país e por não conseguir realizar um trabalho autoral como gostaria.

— Um dia eu recebi um e-mail de uma francesa, estudante de mestrado, que queria fazer um trabalho sobre minhas fotos. Nós nos encontramos e ela me contou que passou três meses num projeto de cooperativa de pesca em Kabadio — conta. — Depois, conheci a associação humanitária francesa IEFR, que atua em Kabadio. Daí começamos a planejar a primeira viagem.

O financiamento inicial veio de um fundo da faculdade e de uma organização que banca projetos estudantis, a Crous. Já para a segunda viagem, realizada no início deste ano, a verba — que inclui passagem área, deslocamentos, equipamentos e a contratação de guias e assistentes — foi própria.

REVISTA ÉPOCA - O senhor do seu tempo

A vida de , fundador das Organizações Globo, se confunde com a história recente do país

Martha Mendonça

10 (8/8/2011) A bela casa cor-de-rosa em estilo colonial no bairro do Cosme Velho, no Rio de Janeiro, é o ponto de partida do documentário Roberto Marinho – O senhor do seu tempo, que será lançado nesta segunda-feira, dia 8. Nela, o jornalista e empresário que criou as Organizações Globo – o grupo de mídia a que ÉPOCA pertence – morou por mais de 60 anos, viveu três casamentos, criou quatro filhos e teve reuniões e festas que mudaram a história brasileira. No fim da vida, entre tantas memórias, tomava sol numa poltrona em frente a uma janela da casa.

Primeiro filme sobre Roberto Marinho, o documentário dirigido por Rozane Braga faz parte da série Os grandes brasileiros, que já homenageou , Tancredo Neves e . Alternando imagens de arquivo – algumas inéditas – e depoimentos de quem conheceu Roberto Marinho de perto, o filme reúne as realizações do empreendedor obstinado que ergueu o maior grupo de mídia da América Latina às histórias do homem apaixonado, dotado de grande senso de humor. “Falar da vida do doutor Roberto é passear pela história do Brasil”, diz a diretora Rozane Braga.

Aos 21 anos, Roberto Marinho perdeu o pai, Irineu Marinho, fundador de O Globo. Aos 26, assumiu a direção do jornal e, em pouco tempo, transformou-o num dos mais influentes do país. Mal assumira O Globo, viveu um embate político com a ditadura Vargas que durou uma década. O jornal atacava a censura e o alinhamento ideológico de Vargas com os regimes fascistas da Europa. Depois do suicídio do presidente, a sede foi apedrejada. Segundo conta no filme o jornalista Claudio Mello e Souza, por muitos anos assessor pessoal de Roberto Marinho, o episódio trouxe uma lição importante sobre as relações entre o governo e a imprensa.

Esportista, amante dos carros e dos cavalos, Roberto Marinho aproveitou a vida boêmia do Rio de Janeiro e casou-se apenas aos 43 anos. Teve quatro filhos, todos homens: Roberto Irineu, João Roberto, José Roberto e Paulo Roberto (este último morreu aos 19 anos, num acidente de automóvel). Em 1965, aos 60 anos, idade em que a maioria evita correr riscos, a alma empreendedora de Roberto Marinho levou-o a apostar na maior inovação que desafiava a mídia de seu tempo: a televisão. Não foi a única conquista tardia na vida de Roberto Marinho. Aos 86 anos, ele se casou com dona , sua terceira mulher. Aos 90, inaugurou no Rio de Janeiro o maior centro de produções de televisão da América Latina, o Projac. Contar uma história como esta em 56 minutos foi o grande desafio do documentário.

Quando lançou a TV Globo, canal 4, Roberto Marinho foi chamado de louco. Enfrentou o concorrente , uma CPI no Congresso para apurar sua sociedade com o grupo americano Time-Life e assumiu uma enorme dívida para que a emissora pudesse entrar no ar. Cinco anos depois, em 1970, a Globo já era líder de audiência. “O segredo foi saber colocar as pessoas certas nos lugares certos”, diz o jornalista e escritor Marcel Souto Maior, roteirista do documentário. Roberto Marinho sabia tudo de jornal impresso e nada de televisão. Mas tinha o dom de escolher as pessoas e delegar. Na TV, deu carta-branca a José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, e a Walter Clark. Os “meninos”, como ele os chamava, ajudaram a equipar a emissora com a eficiência técnica e o talento criativo que a distinguiram.

Boni é responsável por alguns momentos tocantes no documentário. Presente nos primórdios da construção da Rede Globo, ele esteve ao lado de Roberto Marinho em momentos cruciais. Em 1975, as relações com os militares azedaram. Roberto Marinho se recusara a denunciar os jornalistas de esquerda que trabalhavam na redação de O Globo. “Dos meus comunistas cuido eu”, respondeu ao governo. Em represália, a novela Roque Santeiro, de , foi proibida no dia da estreia. “Doutor Roberto se reuniu comigo em sua sala para assistir aos primeiros capítulos e viu que não havia nada demais. Então ele mesmo redigiu um editorial para o , falando sobre a censura no Brasil”, diz Boni. “Pegou o governo de surpresa, como eles haviam feito conosco.” Dez anos depois, em 1985, Roque Santeiro foi ao ar. “Feliz, ele disse que gostaria de assistir ao primeiro capítulo da nova versão comigo, em sua sala. Eu o vi chorando – e chorei também”, diz Boni.

Roberto Marinho – O senhor do seu tempo pode ser visto como um registro de carinho paterno – pela devoção com que seus filhos falam dele e pelas imagens inéditas do próprio Roberto Marinho contando sobre a morte precoce de seu pai, de quem ele herdou os valores e o ofício. “Não consigo falar desses acontecimentos sem me emocionar”, diz ele, com voz embargada, num discurso. Também tomado pela emoção, o primogênito Roberto Irineu, hoje presidente das Organizações

11 Globo, lê uma carta que o pai lhe enviara quando ainda era muito jovem. “A vida é justamente essa luta pela conquista de um ideal ambicioso ou por um simples lugar ao sol”, diz um trecho. Roberto Irineu não consegue terminar de ler.

O DVD do documentário – que, além de vendido, será doado a universidades, escolas e bibliotecas – traz dois extras. Um deles com imagens belíssimas da casa do Cosme Velho. O outro contém cinco histórias que mostram o lado bem-humorado do temperamento de Roberto Marinho. Numa delas, o filho João Roberto conta um episódio em que, já no fim da vida, o pai ainda se recusava a aceitar a idade que tinha. Teimou com todos os presentes: filho, nora, mulher. Pediu sua carteira de identidade para confirmar e declarou: “As notícias são desoladoras”. “Ele sempre achou que teria todo o tempo do mundo para fazer o que quisesse. Papai achava que a vida não iria terminar”, afirma João Roberto, hoje vice-presidente editorial das Organizações Globo.

O documentário não deixa de lado as polêmicas em que Roberto Marinho foi envolvido: a relação com os governos militares, a abordagem inicial em relação ao movimento das Diretas Já (1983-1984) e a edição polêmica no Jornal Nacional do debate entre Lula e Fernando Collor, na disputa presidencial de 1989. Também está presente no filme a amizade com o político Carlos Lacerda, que mais tarde passou a adversário, assim como a aguda disputa que marcou as relações com o ex- governador do Rio, Leonel Brizola.

Politicamente conservador, defensor do capitalismo e da livre-iniciativa, Roberto Marinho tinha convicção de que o fortalecimento da esquerda não era o melhor caminho para o Brasil. “Ele temia realmente a retomada das ideias comunistas”, diz Roberto Irineu. José Roberto, o caçula dos filhos, vice-presidente das Organizações Globo e presidente da Fundação Roberto Marinho, conta como achava complicado ser filho de Roberto Marinho, visto como um “ícone da direta”. Ele diz que, muito jovem, teve grandes discussões com o pai a respeito de suas posições políticas. “Eu o questionava muito”, afirma. “Ele sempre me explicava que ‘o outro lado’ também não seria uma democracia.”

O documentário exibe tanto a força da personalidade de Roberto Marinho quanto seus momentos de maior fragilidade. Estão lá a capacidade de repensar suas posições, assim como o medo do tempo – que ele chamava de “the enemy” – e da morte, da qual preferia não falar. No documentário, é o mordomo Edgar Peixoto que narra seus últimos momentos: “Doutor Roberto começou a passar mal e deitou-se na cama. Ele olhou para dona Lily e pediu que não o deixasse só. Depois pegou minha mão e falou: ‘Edgar, me tira dessa’. Mas não resistiu”.

Entrevista: Rozane Braga

98 anos em 56 minutos

Depoimentos tocantes e imagens raras ajudam a desvendar um homem discreto, que passou a vida nos bastidores

(8/8/2011) A jornalista e publicitária Rozane Braga, de 47 anos, dona da FBL Produções, é a produtora e diretora de Roberto Marinho – O senhor do seu tempo. Ela diz que a casa do empresário e suas paixões forneceram a linha condutora do documentário, o primeiro sobre o fundador das Organizações Globo. O filme demorou dois anos para ficar pronto e envolveu uma equipe de 70 pessoas. ÉPOCA – Como apresentar 98 anos de uma vida como a de Roberto Marinho em 56 minutos?

Rozane Braga – Esse sempre foi o maior desafio. Uma personalidade de importância histórica, um empresário cheio de realizações e, ao mesmo tempo, um homem que teve uma vida pessoal intensa. Nossa solução foi definir a casa e as paixões como uma linha condutora de todo o roteiro. Isso foi nos levando a esta viagem no tempo, tempo que o doutor Roberto parecia ignorar, tamanhas suas aspirações, seus desejos de empreender. Acho que o resultado é muito bom. Fizemos uma primeira exibição para os filhos do doutor Roberto, e eles se emocionaram muito.

ÉPOCA – Não é estranho que este seja o primeiro documentário sobre a vida de um homem tão importante?

12 Rozane – Certamente. Eu soube que, vivo, ele chegou a receber alguns projetos de filme, mas não quis levar nenhum à frente. O mesmo para biografias. Ele mesmo ensaiou escrever uma autobiografia, mas sempre deixava para depois. Acreditava que sempre teria tempo. Não é à toa que escolhemos este título, O senhor do seu tempo, para o documentário.

ÉPOCA – Como foram os bastidores das filmagens e entrevistas?

Rozane – Muito emocionantes. Tivemos total apoio da família, que nos abriu a casa do Cosme Velho e nos deu entrevistas maravilhosas. Aliás, acredito que um dos pontos fortes é o conjunto de entrevistas que conseguimos. Pessoas que estiveram muito perto dele, os filhos, Boni, o assessor Claudio Mello e Souza e o mordomo Edgar. Essas entrevistas conduziram tão bem o documentário que temos pouca narrativa em “off”. Os depoimentos, além de fortes, foram importantes para apresentar o biografado, porque doutor Roberto não era um homem de aparecer demais. Ele trabalhava muito e preferia os bastidores. As raras imagens em que aparece acabam ficando bastante valorizadas, como a que conta o momento em que seu pai morreu ou seu discurso na inauguração do Projac.

ÉPOCA – Quantas vezes estiveram na casa do Cosme Velho?

Rozane – Cinco vezes, para entrevistas, imagens internas e externas. O material foi tão grande que fizemos um no DVD só para mostrar o lugar onde ele viveu a maior parte da vida, ao som de Carmen, a ópera preferida do doutor Roberto. Fiquei muito impressionada com o amor dos funcionários pelo casal. Todos contam histórias com carinho e se emocionam ao dizer como eram respeitados por doutor Roberto, no dia a dia. A casa está mantida exatamente como no tempo em que ele e dona Lily estavam vivos. Objetos de arte e decoração espetaculares, jardins bem cuidados. Tudo está muito vivo. A impressão que eu tinha lá dentro é que, a qualquer momento, ele apareceria para nos cumprimentar.

O GLOBO - Mostra relembra a obra de Grande Otelo

Filmes, exposição e debates estão, a partir de hoje, na programação do Correios

André Miranda

(9/8/2011) O pseudônimo famoso de Sebastião Bernardes de Souza Prata já era, em si, uma piada. A ideia era que, quando se anunciasse a entrada de Grande Otelo no palco, o público esperasse por um homem grande, classudo, esbelto, e não pelo negro baixinho e com cara tresloucada. Mas certamente Otelo foi imenso em suas interpretações, tornando- se o mais celebrado comediante brasileiro do século XX, o que poderá ser conferido no Festival Grande Otelo, que acontece de hoje a domingo no Centro Cultural Correios, com a exibição de filmes, “MACUNAÍMA”, em exibição amanhã: exemplo uma exposição de fotos e debates. do talento do ator A programação foi organizada pelos mesmos produtores de mostras recentes de Oscarito e Ankito, dois comediantes que, junto a Otelo, formavam a tríade sagrada da chanchada.

— Evidentemente a comédia foi o gênero que deu mais visibilidade à carreira de Grande Otelo. Mas, depois, diferentemente de outros atores das chanchadas, ele mostrou que seu lado dramático era muito forte em filmes como “Rio Zona Norte” e “Macunaíma” — afirma Leonardo Conde, curador do festival. — Para mim, ele foi o ator mais genial da comédia brasileira.

Dos mais de cem filmes realizados por Otelo, serão exibidos 12 na mostra, entre eles “Macunaíma”, de Joaquim Pedro de Andrade (amanhã, às 18h30m); “Aviso aos navegantes”, de Watson Macedo (sexta, às 12h30m); “Assalto ao trem pagador”, de (sexta, às 18h30m); “Rio Zona Norte”, de Nelson Pereira dos Santos (sábado, às 18h30m); e “Nem Sansão nem Dalila”, de Carlos

13 Manga (domingo, às 14h30m). A abertura, hoje, será com a projeção de “Os cosmonautas”, de Victor Lima, com Otelo e Ronald Golias no elenco.

— Ele sempre acabava roubando a cena de todos os filmes de que participava — afirma Conde. — Hoje, seria considerado um homem multimídia. Grande Otelo compunha músicas, escrevia poemas, fazia TV, teatro e cinema. Ele tem uma importância histórica e extremamente valiosa para a cultura brasileira.

Para a mostra, a maior parte das cópias dos filmes foi conseguida nos acervos da Cinemateca Brasileira e da Herbert Richers. Já a exposição de fotos trará um pouco da trajetória de Otelo. Além disso, também será exibido continuamente um vídeo-documentário, realizado para o festival, com entrevistas e depoimentos de diretores, atores, amigos e personalidades que conviveram com o ator. E todos os dias, após as sessões de 18h30m, haverá debates com cineastas, atores e críticos.

— Mudou muito o humor daquela época para o de hoje. Era um humor mais puro, mais ingênuo — diz Conde. — Normalmente o público vê esses filmes hoje com o olhar de resgatar um pouco o movimento histórico do cinema brasileiro.

ESTADO DE MINAS - Combatentes em campo

Média-metragem sobre a participação brasileira na batalha de Montese, na Itália, tem penúltimo episódio hoje na internet

Eduardo Tristão Girão

Guto Aeraphe interessou-se pela história dos soldados mineiros

(9/8/2011) Dirigido pelo mineiro Guto Aeraphe, o recém- lançado média-metragem Heróis engrossa a lista de produtos culturais brasileiros cuja temática é a participação do país na Segunda Guerra Mundial. Focada nos brasileiros que atuaram na Batalha de Montese, na Itália, a película de 35 minutos terá seu penúltimo episódio disponibilizado a partir de hoje no hot site especialmente desenvolvido pelo site www.em.com.br. O Jornal da Alterosa veiculará matérias sobre o filme hoje, às 13h, na emissora.

Na área audiovisual, há títulos como o documentário Senta a pua!, do diretor Erik de Castro, lançado em 1999. O foco está em pilotos da Força Aérea Brasileira que atuaram na guerra, tendo como base o livro homônimo do brigadeiro Rui Moreira Lima. Há depoimentos dele e de outros que combateram no conflito, inclusive. Em 2008, Rui lançou outro livro, O diário da guerra (Adler), no qual narra suas experiências profissionais.

Já o novo Corações sujos, que abriu mês passado o 4º Festival de Cinema de Paulínia, em São Paulo, apresenta ponto de vista diferente: o dos imigrantes japoneses no Brasil. Em 1946, quando a guerra já havia acabado, a maioria deles não aceitava a derrota do Japão. Sem acesso a informações originadas em seu país, julgavam que os fatos eram, na verdade, propaganda inimiga e isso motivou uma série de conflitos. A história é contada no livro de mesmo nome do escritor Fernando Morais.

Outro filme brasileiro baseado no mesmo episódio histórico é For all – O trampolim da vitória, de Luiz Carlos Lacerda e Buza Ferraz, centrado na convivência entre brasileiros e soldados norte-americanos na base de Parnamirim Field, em Natal (RN). Cerca de 15 mil soldados estrangeiros passaram por lá, o que alterou a rotina local.

14 O GLOBO - Entre o entusiasmo e o ódio declarado

‘País do desejo’, de Paulo Caldas, divide a crítica e leva polêmica à mostra gaúcha

Rodrigo Fonseca Enviado especial • GRAMADO

FÁBIO ASSUNÇÃO e Gabriel Braga Nunes no filme de Paulo Caldas: aborto e intolerância religiosa em foco

(10/8/2011) Polêmica prometida é polêmica cumprida no 39o- Festival de Gramado, que há dois dias se debate em discussões calorosas provocadas por “País do desejo”, o novo longa de Paulo Caldas, responsável por renovar o cinema pernambucano, há 15 anos, com “Baile perfumado”, codirigido por Lírio Ferreira. Tabus como a legalização do aborto e reflexões sobre a intolerância religiosa cruzam essa coprodução entre Brasil e Portugal, que levou Fábio Assunção e Maria Padilha à mostra gaúcha anteontem, na noite mais estrelada do festival. Entre locais imaginários, Assunção interpreta o padre José, ameaçado de expulsão por apoiar uma adolescente violentada com necessidade de abortar.

Narrativa clássica

Em meio à pressão de seu superior, o sacerdote se apaixona por uma pianista, Roberta (Maria Padilha), vítima de uma doença renal grave. Além de mexer em vespeiros temáticos, Caldas conseguiu polemizar também por suas escolhas formais.

Em vez de apostar na linguagem experimental de seu longa anterior, “Deserto feliz” (2007), o diretor investiu em um formato mais próximo do cinema clássico, sob a cartilha do folhetim melodramático. Seu longa provocou um racha entre os críticos, divididos entre o ódio declarado (expresso em frases como “É um filme pernambucano versão paraguaia”) e o entusiasmo por uma estranheza capaz de evocar mestres europeus como Marco Bellocchio (em “L’ora di religione”).

— Não temos a intenção de atacar a Igreja Católica, mas também não queremos aliviar na abordagem dos problemas gravíssimos em torno dessa empresa multinacional que ela se tornou. Não existe conflito com a religião, e sim com a instituição — explicou Caldas, dedicando a exibição do filme ao fotógrafo Paulo Jacinto dos Reis, o Feijão, morto em abril.

Desde sexta-feira, quando o festival começou, a atuação masculina de maior impacto foi a intervenção de no documentário “Uma longa viagem”, de Lúcia Murat, o recordista de aplausos até agora. Mas o desempenho de Assunção e, em especial, o de Gabriel Braga Nunes, na pele de um médico sórdido, irmão do padre José, pode render um Kikito de melhor ator a “País do desejo”.

— Sempre quis conhecer outras realidades de cinema, e a produção de Pernambuco era uma delas — disse Assunção. Embora Karine Telles desponte como favorita ao prêmio de atriz por “Riscado”, Maria Padilha pode desestabilizar a disputa, na pele de Roberta.

Antes de “País do desejo”, Gramado gargalhou frente a um José Wilker ranzinza, no papel de um aposentado solitário em “A melhor idade”, curta-metragem de Angelo Defanti, cuja disputa começou

15 anteontem. O curta mais aplaudido foi “A verdadeira história da bailarina de vermelho”, de Alessandra Colasanti e Samir Abujamra. ■

O repórter viajou a convite do festival

ESTADO DE MINAS - Enfim, a estreia

Capitães da areia deve chegar às salas em outubro

(10/8/2011) Se não houver novos adiamentos, a novela que foi a produção de Capitães da areia chega ao fim em 14 de outubro. Esta é a data anunciada pela Imagem Filmes para o lançamento da obra, que inicialmente estava programada para chegar aos cinemas em 2010.

O atraso vai acabar por dar ao filme um contexto bastante adequado: a proximidade com as comemorações do centenário de nascimento de Jorge Amado (1912-2001), em cujo romance homônimo a fita se baseia. Há, inclusive, um aspecto pessoal e familiar na homenagem: Capitães da areia é o primeiro filme em longa-metragem dirigido por Cecília Amado, neta do escritor baiano.

O romance conta a história de um grupo de garotos que vivem nas ruas de Salvador, confrontando, sempre que necessário, a sua sobrevivência, o poder, a força ou a riqueza. Quando foi lançado, em 1937, provocou bastante polêmica pelo olhar social que se aproximava do que o conservadorismo brasileiro considerava comunismo. TEATRO E DANÇA

O GLOBO - O grande ator sai de de cena

Ítalo Rossi morre consagrado como um dos maiores intérpretes do teatro brasileiro

Luiz Fernando Vianna *

16 (4/8/2011) Nem todos os que se divertiam com Ítalo Rossi no papel de Ladir Miranda, no seriado “Toma lá dá cá”, sabiam que ali estava um dos maiores nomes da história do teatro brasileiro. Para vários de seus contemporâneos, ele, que morreu na terça-feira aos 80 anos, de insuficiência respiratória, e foi sepultado ontem no Cemitério do Caju, foi o mais brilhante ator do país.

— Indiscutivelmente, Ítalo foi o maior ator do Brasil — afirma seu grande amigo Sergio Britto. — Sua morte é uma enorme tristeza, uma pancada violenta. Você olha sua carreira e vê que ele fez de tudo. Era uma pessoa muito especial, que só se considerou ator quando fez um papel de astro. Sergio se refere à montagem, em 1956, de “A Casa de Chá do Luar de Agosto”. Antes, fizera trabalhos que desconsiderava. Mas já convivia com amigos como , que o conheceu no dia em que chegou a São Paulo vindo de Porto Alegre, em 1952.

Mais tarde, atuaram na companhia de Vera Nunes e em “Encontro com Fernando Pessoa”, que rendeu a Ítalo, em 1986, um de seus quatro prêmios Molière. — Era um colega sempre bem- humorado e um ator perfeito, versátil, um bicho de teatro — diz Walmor. — Eu só não gostava dessas últimas participações na TV fazendo comédias que eram menores do que ele.

Mística

Miguel Falabella, autor de “Toma lá dá cá”, sente orgulho de “ter proporcionado um último imenso sucesso” ao ator. Caiu na boca do povo o bordão “isso é mara!”, corruptela de “maravilhoso”.

— Ele estava com a saúde um pouco debilitada, então tentávamos poupá-lo, acarinhá-lo. Mesmo assim, ele revestia o papel de grandeza — diz Falabella. — Sentávamos para conversar e ali estava a história do teatro brasileiro. Colega em “Toma lá dá cá”, Diogo Vilela diz que Ítalo carregava uma “mística” que poucos atores têm:

— Era algo tão forte que fazia desaparecer qualquer problema físico. Ele se defendia com a capa do personagem. Enobrece a nossa profissão.

— Mesmo sem trabalhar muito na TV, era um ídolo do povo, que reconhecia seu talento — observa . Marília Pêra diz se lembrar dele “com graça”, por causa do bom humor:

— Sempre foi cheio de gargalhadas. Ítalo Balbo Di Fratti Copolla Rossi consolidou sua carreira dirigido por encenadores vindos da Itália, como Alberto D’Aversa e Gianni Ratto — com este, realizou espetáculos ao lado de Fernanda Montenegro e Sergio Britto. O trio também fez História na época da TV ao vivo, com programas como o “Grande Teatro Tupi”.

Fernanda soube da notícia em Tocantins e pretendia chegar a tempo do enterro. Os dois se reencontraram no palco em 2001, na peça “Alta sociedade”, e na TV em 2005, em “Belíssima”. Nas décadas anteriores, Ítalo atuou com diretores mais jovens, como Gerald Thomas (“Quatro vezes Beckett”, em 1986) e Moacyr Góes (cinco peças a partir de “Antígona”, de 1992). Ítalo começaria ontem a dirigir a peça “Coisas da vida”, com Ester Jablonski.

Autora, com Antonio Gilberto, da fotobiografia “Ítalo Rossi: isso é tudo”, ela manteve o ensaio para homenageá-lo: — Ele morreu como viveu, sem decadência, já com um projeto engatilhado. A vida dele foi o teatro.

O GLOBO - Talento que enriquecia a profissão

Barbara Heliodora

(4/8/2011) Profissionalizamo-nos quase ao mesmo tempo, ele no palco, eu, na plateia. Foi em 1957 que Sergio Britto me apresentou ao resto do quarteto: Fernanda, Fernando e Ítalo. Eu, novata na crítica; Ítalo, novato como profissional: “Os interesses criados” era a sua segunda peça (a primeira, “A Casa de Chá do Luar de Agosto” eu só veria mais tarde no Rio). Os contatos a princípio eram poucos; depois, seriam muitos. E, nos últimos dez ou 15 anos, tudo virou um imenso telefonema, pois nos falávamos quase todo d i a ( m a s d u r a n t e o s torneios de tênis, esporte que ele amava, a frequência aumentava: eram duas a cinco ligações por dia).

17 Um ator imenso

Ítalo sabia que não voltaria ao teatro, então conversávamos sobre o teatro do tempo que lembrávamos, do final dos anos 1950, dos 60, dos 70, ou seja, até esbarrarmos nos anos 1980. Paulista de Botucatu, o talento de Ítalo é um exagero que a cidade deu ao teatro — e não tinha sequer a dimensão do que estava oferecendo. Quem viu o espetáculo “A Casa de Chá do Luar de Agosto” por certo se lembra até hoje do personagem Sakini.

Quem viu “Comunicação a uma academia” sabe que assistiu a uma das maiores atuações da história do teatro brasileiro.

Não é fácil falar de um grande amigo e imenso ator, pois nem é possível saber qual dos d o i s m e t ro u x e m a i s alegria e felicidade. Na vida real e na imaginação, infelizmente sei que desde terça- feira esta felicidade recebeu um duro golpe. Adeus, meu amigo, mas a amizade não acaba. E tudo que demos um ao outro continua conosco. Minha admiração pelo talento de Ítalo Rossi só fez aumentar cada vez que o via no palco, pois ele enriquecia tudo o que fazia. Mas nós ainda temos o telefone, e espero que ele nos mantenha unidos para sempre.

ESTADO DE MINAS - Sem começo, meio ou fim

Thaís Pacheco

Wester de Castro dirige e atua

(4/8/2011) Roleta russa – Bertolt morreu, vivo estou eu; um grito mudo e cai o pano é o novo espetáculo da Asterisco Cia. de Teatro. Inspirada em texto de Aderbal Freire-Filho, para apresentação da segunda edição do livro Estudos sobre teatro – Bertolt Brecht, a montagem ficará em cartaz somente de hoje a domingo, no Teatro Marília.

“No texto, ele caminha pela sala onde morou Brecht e vai encontrando características da vida e do teatro dele”, descreve o ator Wester de Castro, que também assina direção e dramaturgia. “De uma das janelas da sala dá para ver o túmulo onde Brecht foi enterrado. Ele era vizinho do próprio túmulo.”

Monólogo com 55 minutos de duração, Roleta russa… não tem apego à linguagem padrão cronológica. Sem começo, meio e fim, apresenta várias cenas. Além do texto de Freire-Filho traz adaptações de Alberto Cae e Álvatro de Campos (codinomes de Fernando Pessoa) e . O próprio título da peça é referência a várias cenas dela. São 10 ao todo.

Wester conta que, como na montagem anterior da trupe, o espetáculo pode ser dividido em três temas. O primeiro tange a morte; o segundo, ao politicamente engajado; e o terceiro tema é o próprio teatro.

Roleta Russa – Bertolt morreu, vivo estou eu; um grito mudo e cai o pano

FOLHA DE S. PAULO - Filho de Tim Maia reclama e muda cenas de musical

"Tim Maia - Vale Tudo, o Musical" é baseado na biografia best-seller escrito por Nelson Motta

"Como tudo que envolve Tim Maia, não poderia faltar alguma confusão às vésperas da estreia", diz autor

18 MARCO AURÉLIO CANÔNICO DO RIO

(4/8/2011) Da plateia, Carmelo Maia assistia à morte de seu pai em cima de um palco pela segunda vez. Estava comovido, mas um tanto contrariado. "Meu pai não usava calça brilhante assim", dizia o filho de Tim Maia à sua mulher, sentada ao lado. Reclamava também, ao estilo do pai, sobre a música: "Os arranjos estão uma merda".

Ele assistia pela primeira vez a um ensaio de "Tim Maia - Vale Tudo, o Musical", baseado na biografia do cantor escrita por Nelson Motta, dirigido por João Fonseca e com estreia marcada para amanhã, no Rio.

Em cena, Tiago Abravanel encarnava o problemático astro da MPB em sua última apresentação, em março de 1998, no Teatro Municipal de Niterói (RJ) -quando Tim passou mal já no começo do show e foi internado, morrendo sete dias depois.

"Eu gostaria de ter sido avisado antes sobre os ensaios", disse o herdeiro do cantor à Folha. "Isso é cláusula contratual, eu teria de participar de tudo que é pertinente a esse projeto, e não participei. Mas antes tarde do que nunca."

"Como tudo que envolve Tim Maia, não poderia faltar alguma confusão às vésperas da estreia", disse Nelson Motta por e- mail enviado pela assessoria. "Normal, no caso do Tim."

Normal, como mostra o musical: o longo histórico de confusões do cantor -atrasos e faltas a shows, brigas com a família e os amigos, consumo desenfreado de drogas- aparece no palco intercalado com os símbolos de sua genialidade: sua voz e suas canções.

Carmelo Maia não se queixou de cenas que mostravam seu pai nos piores momentos.

Sua reclamação principal, que quase descambou para uma briga jurídica com os produtores às véspera da estreia, veio da inclusão da personagem Adriana Silva, fã que virou secretária e, segundo o livro e o musical, amante e companheira de Tim.

"Com a transposição do livro para o palco, o Carmelo, que autorizou o livro e a peça, discordou de duas cenas na parte final, e então foram feitos pequenos ajustes para que não houvesse nenhum mal entendido", disse Motta.

Carmelo Maia confirmou à Folha o acordo fechado com a produção ontem, após a briga. A nova versão, com as cenas modificadas, seria ensaiada ontem à noite pela primeira vez.

A briga judicial entre Carmelo Maia e Adriana Silva durou anos, com derrotas e vitórias para ambos, e acabou com acordo em que ela recebeu o que lhe era devido por seus anos como secretária.

Outra disputa envolvendo Tim ainda está em andamento: Rafaela Campos, 31, que diz ser filha do cantor, conseguiu em março autorização para exumar o corpo dele para recolher material para um teste de DNA. A exumação ainda não foi realizada.

Neto de impressiona como Tim

Não é fácil ser Tim Maia, e Tiago Abravanel sentia isso na pele, da qual escorria a maquiagem que lhe dá o tom da pele do cantor. "Gente, estou ficando sem voz."

19 A última segunda-feira foi o sétimo dia consecutivo de ensaio de "Tim Maia - Vale Tudo, o Musical", e o ator principal estava exausto.

"Quando me falaram do Tiago Abravanel eu pensei: mas ele é parecido com o Tim Maia? Vem [à mente] a imagem do Silvio Santos, né?", diz João Fonseca.

O diretor certamente não foi o único a identificar o sobrenome do ator e a imaginar se um neto do apresentador caberia na pele de Tim.

"Quando ele entrou eu falei 'Gente, ele é parecido mesmo com o Tim Maia'. Quando ele abriu a boca, me arrepiei dos pés à cabeça." De fato, Abravanel, 23, tem um físico parecido com o do cantor (tem 115 kg) e, com ajuda de maquiagem e perucas, vira um Tim fisicamente convincente. Mas é quando interpreta o cantor falando e cantando que a semelhança realmente impressiona.

"Eu já cantava Tim Maia em festas, porque é o tipo de música de que gosto e é mais próximo da minha região vocal. Quando soube da peça, pensei: sempre cantei isso, tenho o timbre parecido, sou gordo, vou mandar para ver o que acontece", diz o ator.

Para interpretar o "síndico" dos 12 aos 55 anos, ele diz ter lido o livro de Nelson Motta e assistido "a umas 20 horas de vídeos do Tim".

Desses estudos, ficou com a imagem de um homem destemido e inconsequente. "O título do musical resume o que é a figura dele, para ele valia tudo mesmo."

O ator ficou tenso quando viu o filho de Tim na plateia no ensaio. Aproximou-se tímido, desculpando- se. "O Tiago é um cara ímpar, um doce, ele desceu do palco preocupado", conta Carmelo Maia. "Ele conseguiu absorver as expressões do meu pai em pouco tempo. Eu me emocionei de chorar na cena em que ele passou mal no último show."

Pressão por carregar o sobrenome do avô (que, segundo ele, deve ir à sessão para convidados, no dia 8/8) Abravanel diz não sentir. "Tenho muito orgulho de ser neto de quem eu sou. Já me sugeriram usar meu outro sobrenome, mas não tenho por que esconder isso."

No palco, a vida do cantor é contada através das músicas

A adaptação do bem-sucedido livro de Nelson Motta ("Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia") compacta as 392 páginas da obra em duas horas e meia de peça, com 14 trocas de cenário e 22 números musicais.

"A ideia era que as músicas estivessem a serviço da história, foi por esse processo que as escolhemos. Mas é lógico que não dava para fazer sem "Primavera", "Azul da Cor do Mar", "Não Quero Dinheiro"", diz João Fonseca, que dirige o musical e colaborou com Nelson Motta no roteiro. "A gente tem a sorte de que muito da vida do Tim está nas músicas", diz o diretor. E é seguindo essa estrutura que o musical conta as principais passagens da vida de Tim, da infância na Tijuca à morte no palco em Niterói.

Quem leu o livro vai identificar diversos trechos no palco: Tim comendo o conteúdo das marmitas que deveria entregar, quando criança; os encontros com Erasmo, Roberto e Jor pré-fama; a temporada nos EUA, o sucesso, as drogas, as mulheres, a fase "Racional". Também aparecem as célebres frases espirituosas do cantor, como o diálogo entre ele e Motta (também personagem da peça) quando este contou que a filha dera o nome de Tim ao gato. "Já sei, porque é preto, gordo e cafajeste", respondeu o cantor.

"O mais importante era mostrar o artista, é uma vida rica, venceu contra tudo e contra todos, da maneira mais espontânea e verdadeira", diz o diretor. O musical estreia amanhã no teatro Carlos Gomes, no Rio, para uma temporada de um mês. Deve estrear em São Paulo em janeiro.

20 FOCUSBRAZIL.COM (REINO UNIDO) - International Press Award for promotion of Brazilian Theatre in Britain

Dear Friends of StoneCrabs Theatre

(4/8/2011) We are pleased to announce that our Co-Artistic Director, Franko Figueiredo, has won an international media award for the promotion of Brazilian Theatre in the UK.

Franko is being recognised for his “outstanding performance and contribution” in the 14th Annual Brazilian International Press Award, a major celebration of the South American nation’s cultural presence in Europe.

The Brazilian Ambassador Roberto Jaguaribe will open the ceremony on August 6 at the Hilton Canary Wharf, where Franko Figueiredo is to be presented with his accolade. The ceremony will be televised by the Brazilian satellite channel, Globo Internacional.

On 5 August, at the Hilton Canary Wharf, Franko, who has also been nominated Olympic Torchbearer (check the video link: http://c3-culture.com/topic/2012-london- olympics/index/id/26/lang/en ), will be a special guest at the seminar, ‘Brazilian Culture, Media and Community Abroad’. On the occasion, he will give the lecture, ‘10 years of International Theatre in the UK – Making Theatre in an unpredictable world”

Franko is a co-founder of StoneCrabs Theatre Company. He started his career as an actor and writer and worked at Gamboa, Vila Velha, and CDL Theatre in (Bahia) and Gate and Royal Court in the UK.

Franko’s directing credits include Mishima’s Hanjo, Sotoba Komachi (Metro and Time Out Critic’s Choice) and The Damask Drum (Time Out Critic’s Choice) ; Lynn Greenwood’s basic, ’ After Doroteia and Waltz # 6 (Time Out Critic’s Choice), Stringberg’s Miss Julie, Goldoni’s A Servant of Two Masters, Shakespeare’s Winter’s Tale, Midsummer Night’s Dream (in Brazil), and several staged readings at Arcola Theatre, SOHO, Oval House, the Brazilian Embassy and Canning House. Franko has directed many theatre pieces for the Young Vic/TPR, regularly directs at Lewisham Youth Theatre/Catford Broadway and runs directing and producing workshops in London, , Salvador and Feira de Santana.

After obtaining an MA in Theatre Practices (Directing), Franko completed a practical research in the Theatre of Tadeusz Kantor supported by a bursary from the Local Network Foundation. Previous to StoneCrabs, Franko jointly founded and ran Gatos Noir Theatre Company in Brazil.

O GLOBO - De volta ao lar e cheio de planos futuros

Enquanto encena peça no Rio, Grupo Tapa anuncia mergulho em Tennessee Williams

Luiz Felipe Reis

(5/8/2011) Eduardo Tolentino já não tem mais a pressa e a ansiedade que marcaram o começo da carreira. Passados 32 anos desde a criação do Grupo Tapa, ele lida com o tempo, erros e acertos, críticas e elogios, de modo mais sereno — e isso não tem a ver com esfriamento no desejo de levar aos palcos todos os anos com uma série de peças itinerantes.

— Queremos fazer de tudo. Aprofundar o trabalho dos atores, lidar com diversos gêneros, mexer em questões momentâneas, mas o que permanece é um grande prazer em fazer teatro, de se colocar à disposição do erro e do acerto... — diz o diretor carioca, radicado em São Paulo há 25 anos. — As motivações não mudaram tanto neste tempo, mas estamos menos ansiosos. O sucesso e o fracasso representam menos. É claro que você sempre quer fazer dar certo, mas se a crítica e o público não falarem bem, tudo bem, é só mais uma peça.

21 É guiado por esse temperamento que Tolentino traz pela primeira vez ao Rio, dez anos depois de debutar em São Paulo, um dos grandes sucessos do grupo, “Contos de sedução”, em cartaz desde ontem no Teatro da Caixa. Nos últimos anos, o Tapa trouxe, também à Caixa, produções como “A mandrágora” (2003) e “O ensaio” (2008), peças que continuam a circular pelo país.

Acostumado a trabalhar com repertório, o grupo põe em cena uma média de oito peças ao ano. Em 2011, estreou “Credores”, de Strindberg, que será levada ao festival Porto Alegre em Cena entre os dias 19 e 21 de setembro, e também “Blues do Tennessee”, uma homenagem a Tennessee Williams que começa, também em setembro, a circular pela periferia de São Paulo. No ano que marca o centenário de Williams, a ligação com o dramaturgo americano não para por aí. Tolentino passou os últimos dois meses mergulhado na tradução da sua obra, que começa a ser publicada em outubro pela editora Resoluções.

O primeiro volume, “Mister Paradise e outras histórias” sai em outubro com 13 peças curtas do autor. Até 2012, outro volume contendo 16 peças curtas e outros dois livros reunindo, cada um, três peças longas chegam às prateleiras.

— Foi uma coincidência. Estávamos trabalhando em “Blues...” quando fomos contactados pela editora... E o Tapa não para por aí. Ainda este ano, voltam a encenar o sucesso “Doze homens e uma sentença” (2010) e planejam uma temporada carioca da peça para o começo de 2012.

— Nos anos 1980, íamos a São Paulo quando podíamos, até que em 1986 fomos para ficar um ano e acabamos nos estabelecendo por lá. Agora, fazemos o inverso, sempre que possível trazemos nossas peças.

O cronista Maupassant

Na peça “Contos de sedução”, assinada pelo dramaturgo Jonathan Amacker, os escritos do poeta francês Guy de Maupassant são interpretados por Zécarlos Machado e Brian Penido Ross — atores remanescentes da montagem original, de 2000 —, que se unem a Fernanda Viacava, Isabella Lemos, Natalia Moço e Daniel Volpi. No palco, seis contos são costurados por conversas entre um Maupassant doente, preso a uma cama, e François Tassart, seu secretário e enfermeiro.

— Maupassant é um cronista fantástico. Assim como Nelson Rodrigues descreveu como ninguém o subúrbio carioca, ele destrinchou a sociedade da sua época. Ficamos fascinados pela adaptação do Amacker — diz. Tolentino não imaginava vida tão longa ao texto, e nem tanta distância entre a estreia em São Paulo e esta vinda ao Rio.

— Isso aconteceu por uma série de fatores, mas estamos sempre trabalhando o nosso repertório e, no fim das contas, sempre damos um jeito de trazer nossas produções ao Rio.

O ESTADO DE S. PAULO - Macumba Oswaldiana

Oficina chega ao cinquentenário revendo o legado que Oswald de Andrade deixou para o grupo

Maria Eugênia de Menezes

(8/8/2011) Transformar a área ao lado do Oficina em um "teatro estádio", nos moldes das arenas gregas, é um sonho antigo de Zé Celso Martinez Corrêa. Há anos se arrastava a peleja com Silvio Santos, que pretendia erguer um shopping no local. A solução para o impasse, contudo, nunca pareceu estar tão próxima.

Agora, nas festividades de 50 anos do Oficina, o diretor só fala naquilo que chama de "troca entre terrenos". Na prática, o processo significa que o grupo Silvio Santos teria aceitado trocar o espaço

22 que circunda o teatro - avaliado em R$ 33 milhões - por outro de igual valor em qualquer ponto da cidade. "Com a crise que está passando, ele se humanizou muito", diz Zé Celso sobre o outrora arqui-inimigo. "Nós nem imaginávamos que um dia fossemos nos tornar amigos, falar no telefone."

A ideia também ganha força com a homologação do tombamento do edifício projetado por . Com a resolução, não é apenas o prédio que passa a ser considerado patrimônio histórico nacional. Todo o seu entorno também fica protegido. Só falta o Ministério da Cultura ou outra esfera pública encampar a causa de Zé Celso.

Enquanto isso não acontece, ele toca as festividades do cinquentenário com um espetáculo que já é um ensaio para a nova morada. Em Macumba Antropófaga, a encenação extravasa os limites do teatro e toma o terreno vizinho como palco para uma imensa pajelança.

Em cortejo, atores e público devem percorrer ainda as ruas do Bexiga. Irão entoar o Mandu-Çarará de Villa-Lobos. Encontrar Pagu, Carlos Gomes e Dom Pedro I. Parar diante do velho TBC - Teatro Brasileiro de Comédia. "Lá, invocaremos o espírito de Cacilda Becker, que logo depois se transforma em Tarsila do Amaral", explica o diretor. Na sequência, seguem até a Rua Ricardo Batista, endereço onde morou Oswald de Andrade.

Não por acaso o escritor aparece como foco do novo espetáculo. A montagem, que já foi vista em Inhotim, MG, e na última edição da Festa Literária Internacional de Paraty, retoma o manifesto oswaldiano e todo o seu ideário. Reafirma a influência que o polêmico modernista exerceu sobre os rumos da trupe pelo menos desde 1967, com a estreia de O Rei da Vela. "Existem para nós claramente dois momentos: pré e pós O Rei da Vela", comenta o líder da Oficina Uzyna Uzona.

De fato, não é exagero dividir a trajetória do grupo em antes e depois desse encontro com o autor de Serafim Ponte Grande. Inaugurava-se ali uma nova visão de Brasil. Um teatro anárquico descrente do racionalismo e do realismo, uma audácia cênica nunca vista entre nós.

Todos os textos europeus ou norte-americanos montados desde então surgiram travestidos por um olhar absolutamente autoral e brasileiro. Devedor da poética de Oswald e da sua antropofagia. Filiado às tradições do coro grego.

A origem. Foi no número 520 da rua Jaceguai - precisamente no mesmo local onde é hoje a sua sede - que o grupo Oficina inaugurou seu primeiro teatro. Já no começo de 1961, os meninos egressos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco anunciavam seus novos planos. A partir de sua próxima criação, deixariam a fase amadora e se tornariam profissionais.

Remodelado pelo arquiteto Joaquim Guedes, o antigo Teatro Novos Comediantes ganhou outros contornos e recebeu, em 16 de agosto, a primeira récita de A Vida Impressa em Dólar, texto de Clifford Odets que marcou a estreia de Zé Celso na direção. "Levamos oito meses para construir o teatro. Mas, no dia seguinte à abertura, a peça foi proibida e a sala fechada por não ter condições de funcionar", lembra o encenador. "O Jânio Quadros renunciou no dia 25 de agosto. Assim que ele saiu, nós voltamos. E não paramos mais."

Nessa época, encenaram textos como Um Bonde Chamado Desejo, de Tennessee Williams e Todo o Anjo é Terrível, de Ketti Frings. Mas, a companhia, que surgiu para se contrapor ao "teatro burguês" do TBC e à verve política do Arena, só começou mesmo a despertar a atenção com sua versão de Os Pequenos Burgueses, de Gorki.

O lançamento de O Rei da Vela coroava essa trajetória, mas também insinuava uma radical mudança de rumo. Seu caminho não era o do realismo de Stanislavski. Nem podia ser resumido apenas ao distanciamento preconizado por Bertolt Brecht.

"A descolonização do Oficina veio com O Rei da Vela e com Roda Viva. Desde então, nós fizemos tudo por meio da leitura da antropofagia: Shakespeare, Nelson Rodrigues", diz Zé Celso. "Todas as ideias de que falamos hoje surgem quando a gente monta Oswald. A ideia de um teatro para as multidões. A noção de que o teatro não é igual à vida. O teatro é mais vida." Vida longa do Oficina.

23 FOLHA DE S. PAULO - Depois de reforma, Municipal é palco de ópera de Villa-Lobos

"A Menina das Nuvens" venceu Carlos Gomes em 4 categorias

IRINEU FRANCO PERPETUO COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

(8/8/2011) Sucesso da temporada 2009 do Palácio das Artes, em Belo Horizonte, "A Menina das Nuvens", de Heitor Villa-Lobos (1887-1959), é a primeira ópera a subir ao palco do Theatro Municipal de São Paulo depois da reforma.

Cantada em português, e inspirada em peça com temática infantil de Lúcia Benedetti, a ópera, em três atos, foi finalizada em 1958, e estreada no Rio, em 1960.

A produção mineira venceu o Prêmio Carlos Gomes nas categorias de Melhor Espetáculo, Cenário, Iluminação e Produção. Com cerca de duas horas, e definida pelo próprio compositor como "aventura musical", a partitura está vazada na linguagem neorromântica da fase final de Villa-Lobos, com orquestração luxuriante, certa prolixidade nos dois atos iniciais e voos de lirismo no último ato.

O time envolvido na montagem é quase o mesmo de Belo Horizonte, com direção cênica de William Pereira e Gabriella Pace no papel-título. A principal mudança é a entrada de Lício Bruno, como o Tempo -o barítono ensaiou a parte na produção de 2009, mas sofreu um acidente pouco antes da estreia.

A regência é de Roberto Duarte, um especialista em Villa-Lobos que fez uma revisão do manuscrito do compositor para a montagem de dois anos atrás, que celebrava o cinquentenário de seu falecimento.

Os ajustes chegaram até a composição de uma abertura. "Considerei oportuno juntar alguns trechos de temas importantes da própria obra, mantendo exatamente o que o mestre escreveu, criando assim uma introdução de mais de quatro minutos", conta Duarte. "Meu trabalho de revisão foi o que normalmente faço em toda a partitura de Villa-Lobos, dirimindo dúvidas quanto a grafia e ajustando dinâmicas."

ESTADO DE MINAS - O teatro-dança de Evandro

Thaís Pacheco

(8/8/2011) Era 1966, na cidade de Diamantina, quando um pedreiro e uma doméstica viram nascer o sétimo dos 11 filhos, mal podiam imaginar o que o futuro reservava ao bebê Evandro. Quarenta e cinco anos depois, ele acaba de ser convocado para integrar o Comitê Internacional de Dança da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Motivo: a relevância de seu trabalho, por usar a dança como ferramenta de inclusão social.

24 "Minas me deu régua e compasso" - Evandro Passos, professor e bailarino

“Meu papel é trabalhar a dança de matriz africana e o corpo negro, fazendo interlocução com as pessoas no mundo inteiro. Ou seja, falar um pouco dessa formação na educação de jovens da periferia”, define Evandro.

Quando chegou a BH com a família, em 1982, Evandro começou a dançar. A primeira trupe profissional que integrou foi o Grupo Folclórico Aruanda, que completa cinco décadas este ano. Paralelamente, atuava em companhias teatrais amadoras. Em 1987, ele participava da primeira turma do curso de atores do Centro de Formação Artística (Cefar), que funciona no Palácio das Artes.

Evandro se tornou professor e coreógrafo. Decidiu investir seu conhecimento em projetos sociais. “Passei a ensinar dança e teatro em projetos sociais. Sempre trabalhava as coisas interligadas. Meus projetos levam o nome de dança-teatro ou teatro-dança”, explica.

À parte o trabalho coletivo, Evandro mantém carreira como ator. Acaba de gravar participação em episódio da nova temporada da série Força tarefa, exibida pela Rede Globo. “Inicialmente, é só um episódio, mas o personagem pode voltar. É muito interessante, tem a ver com o que trabalho. Interpretei um morador de favela que reivindica seus direitos”, informa.

No cinema, Evandro trabalhou nos longas-metragens Uma onda no ar e Minha . Na TV, fez pequena participação na novela Desejo proibido, da TV Globo. O projeto dele é trabalhar no Rio de Janeiro e em São Paulo, investindo na carreira de ator. Mas isso sem deixar o estado natal, pois mantém aqui a Associação Sociocultural Bataka. “Minas me deu régua e compasso”, garante ele.

ESTADO DE MINAS - O Guetto de Gladstone

25 Vencedor do 10º Festival Internacional de Hip-hop, Cultura do Guetto batalha por patrocínio nas ruas de BH

Thaís Pacheco

(8/8/2011) O grupo Cultura do Guetto começou em 2006, fundado pelo coreógrafo Gladstone Navarro e alguns amigos. “A ideia era ensinar dança a quem não tinha nenhum contato com ela. Nossa missão era social, porque onde vivo rola muita coisa, enquanto jovens não contam com as oportunidades que tive de fazer arte”, afirma Gladstone.

Ele mora na Vila Nossa Senhora do Rosário, na região do Bairro Pompeia, na Zona Leste da capital. No princípio, o grupo reunia apenas rapazes daquela área, mas o trabalho cresceu, chamou a atenção e atraiu gente de vários pontos da cidade, sobretudo da periferia. Em 2007, foi montado o segundo elenco, também com dançarinas.

A turma se vira como pode. Sem patrocínio, seus integrantes se dedicam a outras profissões. O Cultura do Guetto só tem os fins de semana para ensaiar. E o faz sem parar, aos sábados e domingos.

Resultado: só este ano, a moçada venceu três festivais. Um em BH, outro no interior de São Paulo. Recentemente, os dançarinos trouxeram outra vitória para casa: o primeiro lugar no 10º Festival Internacional de Hip-hop, em Curitiba, evento com jurados estrangeiros. Venceram na categoria avançado (para bailarinos com mais de 17 anos). Disputaram com 80 grupos do Brasil, da Argentina e do Paraguai.

Ensaiar, dançar e vencer competições não é problema para o Cultura do Guetto. Difícil é conseguir patrocínio. Além do apoio da Incomodança, escola de dança de salão que cede espaço para os ensaios, os bailarinos usam a criatividade “Fazemos pedágio e dançamos no sinal, no meio da rua. É esse pessoal que contribui e ajuda a gente a viajar”, conta Gladstone.

É dessa maneira que o Cultura paga hotel, comida e transporte para participar de eventos em que possa competir e trocar experiência com outras trupes.

Se você topar com a moçada numa das ruas de BH, pode saber: a causa é justa. Mês que vem, a moçada segue para o 7º Festival Internacional de Dança de Cabo Frio, no Rio de Janeiro.

26 ESTADO DE MINAS - Stop! A vida parou

De hoje a domingo, grupos de performance do país e do exterior invadirão a capital mineira. Artistas querem surpreender o público dentro de coletivos, em praças, ruas e até no viaduto

Carolina Braga

As atrizes do grupo mineiro Primeira Campainha vão encenar Toma cá dá lá dentro dos lotações em BH

(8/8/2011) Se você observar algum movimento diferente no Centro da capital, não se assuste. Até domingo, o cidadão poderá ser surpreendido por imagens provocativas ou mesmo cenas insólitas no meio da rua. Começa hoje a segunda edição do Festival de Performance de Belo Horizonte, que programou cerca de 70 atividades em vários espaços da cidade.

“Performance é muito plural. Pode ser tantas coisas, melhor não definir. Processos de dança podem ser performáticos, assim como processos de atuação ou de som”, diz a curadora Denise Pedron. Justamente essa variedade será apresentada. A programação inclui intervenções urbanas, mostra de estudos, shows de música performática, mesas de debates e exibição de vídeos.

O tema geral desta edição é “Performance aqui e agora”. Traduzindo: várias ações, que interferirão no cotidiano da cidade, não têm local e horário fixos. A ideia é surpreender o transeunte. “Como estamos trabalhando com intervenção urbana, obedecemos à vontade do artista. Alguns gostam de estabelecer hora e local, outros não. Acham importante evitar qualquer tipo de espetacularização, pois assim, em vez de acontecimento, a performance vira teatro”, explica a curadora.

Invisível O Festival de Performance de BH começa hoje com as chamadas ações invisíveis. Toma cá dá lá: dai a nós o que é nosso + Dai a César o que é de César foi criada pelo (Ah) Coletivo! e a Cia. Primeira Campainha. Como qualquer cidadão, os artistas vão entrar nos ônibus pedindo dinheiro para causas supérfluas e despropositadas. O passageiro será convidado, por exemplo, a financiar uma vitrola em forma de maleta para ouvir disco de vinil na praça ou a bancar uma tatuagem. Pode receber pedido de donativo para o transplante de ouvido de uma cantora lírica.

“Escolhemos lidar com o acontecimento porque é uma coisa que rompe o cotidiano da cidade de forma inesperada, sem planejamento”, comenta Denise Pedron. Ela adianta que haverá duas apresentações surpresas de Toma cá dá lá. A última vai reunir vivências registradas nas duas primeiras intervenções.

27 Além de artistas locais, participam criadores de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e de outros países, como Portugal e Suíça.

Skype

Da Europa, Luca Forcucci marcará presença por meio da internet. O artista esteve na edição do evento de 2009. “Luca fará participação pelo Skype, uma performance de experimentação sonora. As pessoas vão passar de duas a três horas tocando de forma improvisada no Bar Nelson Bordello”, adianta a curadora.

O festival se estenderá para espaços como o Parque Municipal, a sede da Funarte, Praça da Estação, a sede do grupo Espanca!, C.A.S.A (em Nova Lima) e locadora Cinecittà, onde haverá mostra audiovisual.

Uma das novidades será a ampliação do diálogo com a academia sobre o tema performance. Para isso foi criado espaço para apresentação de estudos, além de mesas dialógicas. Uma delas, com a presença de Gil Amâncio, discutirá a diferença entre som na performance e performance sonora. Tudo o que se refere a essa arte passa mais por sensações que por racionalizações, resume Denise Pedron.

FOLHA DE S. PAULO - Cia. Barracão, de Campinas, explora o sarcasmo do bufão

Peça "Diário Baldio" fala sobre seres à margem da sociedade

GABRIELA MELLÃO DE SÃO PAULO

(8/8/2011) O bufão representa uma inversão nos valores do mundo. Na Idade Média, era o filho do pecado, gerado através de relações incestuosas. Ganhou notoriedade na corte por conta de sua figura deformada e da língua ferina, capaz de extrair o cômico do grotesco e revelar verdades geralmente ocultadas.

A Cia. Barracão aproxima o bufão do mundo contemporâneo em "Diário Baldio", que está em cartaz na cidade. O ator Esio Magalhães pesquisou seres excluídos da sociedade em Campinas, cidade onde é sediado este grupo com 13 anos de estrada. Interessou-se pelos deficientes que vivem nas ruas, geralmente tendo surpreendente domínio sobre seus corpos. O ator Gabriel Bodstein estudou os travestis.

"Diário Baldio" nasce do encontro entre esses dois universos, personificados pelos protagonistas mascarados Cotoco e Lady. Magalhães foi indicado ao Prêmio Shell de melhor ator em 2009 por seu trabalho em "Encruzilhados entre a Barbárie e o Sonho" -peça que reestreia em São Paulo no dia 12. Volta a assombrar como Cotoco, homem deformado com problemas mentais e de locomoção.

Ele surge para tirar Lady do isolamento, personagem andrógino que vive num beco tentando fugir do mundo. O espetáculo apresenta a relação que se desenvolve entre esses seres desamparados, à margem da sociedade, a partir de quatro encontros.

"A intenção era abordar as relações desses bufões como ponto de vista crítico sobre o mundo de exclusão e do abandono, o mundo da imperfeição", diz a diretora Tiche Vianna.

Ela também é autora do texto, construído de forma coletiva com os atores e finalizado por Guga Cacilhas. O grupo experimenta pela primeira vez o universo da bufonaria. "Mudou a intensidade. A crítica do bufão é seca. Ele é sarcástico, cruel e ferino", afirma a diretora.

O ESTADO DE S. PAULO - Quatro jovens em busca do amor

A peça Trabalhos de Amores Quase Perdidos confirma boa fase do ator, diretor e dramaturgo Pedro Brício

28 Roberta Pennafort

Peça. Os quatro atores do elenco de Trabalhos de Amores Quase Perdidos

(10/8/2011) Cinco peças, um elogiado filme e, possivelmente, um Prêmio Shell de dramaturgo na estante de casa. Quando 2011 terminar, e Pedro Brício chegar mais perto dos 40, ele terá vivido um ano e tanto. Não muito diferente dos que vêm experimentando desde que se afirmou, além de ator, como autor e diretor de teatro dos mais interessantes do País. "Minha vida melhorou muito depois dos 30. Aos 20 e poucos, você tem muita ansiedade. Depois você tem o olhar mais crítico, à medida em que descobre que sua vida é o presente, e que não dá para ter tanto controle. A experiência de começar a escrever foi ótima para mim", conta Pedro - para quem só o vê em suas raras aparições na TV, apenas a lembrança de papéis como o dinamarquês da novela Beleza Pura, de três anos atrás.

As palavras que escolhe são para falar da última peça que estreou, Trabalhos de Amores Quase Perdidos, em cartaz desde sexta passada no Espaço Cultural Sergio Porto, no Rio. Nela, quatro personagens de menos de 30 anos, vividos pelo afinado quarteto formado por Branca Messina, João Velho, Lúcia Bronstein e Pedro Henrique Monteiro, interpretam amigos cúmplices, daqueles que passam Natal juntos e estão sempre às voltas com amores, dores, acasos, traições, idas, voltas e reviravoltas.

Entre o rapaz que não quer amadurecer, o outro que tenta ser "mais profundo" e a moça determinada, a discussão geracional se impõe. Comum a todos, o desejo de "deixar os dias menos comuns". "Foi legal ver atores mais jovens (entre 24 e 27 anos) se identificando com essa sensação de não se estar preparado, de ser amador diante da vida", conta o autor.

Você Precisa Saber de Mim, que Luiza Mariani, Gisele Fróes e levam ao Espaço Tom Jobim este sábado, ele divide com Jô Bilac, Vitor Paiva, Henrique Tavares e Rodrigo Nogueira, outros jovens que compõem este "mosaico autoral". A direção é de Jefferson Miranda.

Terror, texto inédito e impactante de João Paulo Cuenca integrado ao projeto do Sesc Nova Dramaturgia Brasileira, com direção de Pedro, teve poucas apresentações e deve voltar para uma segunda temporada. O projeto traz ao palco escritores que nunca experimentaram o texto teatral - além de Cuenca, Xico Sá, Joca Reines Terron e André de Leones. Em Terror, um casal de amantes (Nina Morena e João Velho) discute a relação em pleno 11 de Setembro de 2001, enquanto assiste pela TV ao esfacelamento das Torres Gêmeas, em Nova York, onde está o marido da personagem.

29 Já em O Menino Que Vendia Palavras, que entra em cena no mesmo Espaço Sesc dia 19, com no elenco, o trabalho de Pedro foi imprimir linguagem teatral ao livro de Ignácio de Loyola Brandão, em colaboração com a diretora, Cristina Moura e a atriz Mariana Lima.

O ano produtivo começou com a comédia Me Salve, Musical, pelo qual ele está indicado para o Prêmio Shell de melhor autor - ele já tem um desses, ganho há seis anos com A Incrível Confeitaria do Sr. Pelica, e outra Obra de Fernando Vignoli que integra a exposição Antes que indicação, também como autor, por Cine- o mundo acabe teatro Limite (2008), louvadíssima pela crítica. A peça estreou no Rio em janeiro e viajou ao Festival de Curitiba, no qual Pedro também foi representado por Comédia Russa, mais um acerto deste ruivo carioca, montado lá pel"Os F... Privilegiados.

E, desafiando a lógica das salas de cinema, abarrotadas de fãs de Harry Potter e dos Smurfs, segue em cartaz o pequeno, instigante e intenso A Falta Que Nos Move, de Christiane Jatahy, que estreou em 1.º de julho. No filme, atua com quatro colegas. O grupo, que também assina o roteiro, foi filmado por treze horas contínuas e direcionados por mensagem de texto. Talvez seja por trabalhos como este que Pedro continua preenchendo fichas de hotel com o ofício que lhe veio primeiro: "Ator".

PARCEIROS

João Velho está em dois dos recentes trabalhos de Pedro Brício, como diretor apenas e na função dupla de autor e diretor. Em Terror, ele é o homem apaixonado que não quer deixar a amante escapar de seus braços, sem se preocupar com a iminência da possível Terceira Guerra Mundial, prenunciada pelos ataques terroristas que os dois veem pela TV. Já em Trabalhos de Amores Quase Perdidos, que se inicia numa "semana em que foram felizes para sempre", vê-se entre o amigo a quem não quer trair e a amiga por quem se reapaixona. O personagem sente-se angustiado por não ter um caminho definido. O ator se reconhece nessas inseguranças. "Como ator, se sofre com isso. Você não sabe se vai continuar. Hoje, tenho certeza do que quero fazer."

ARTES PLÁSTICAS

ESTADO DE MINAS - Em defesa do planeta

(4/8/2011) Antes que o mundo acabe é o título da exposição que o artista plástico Fernando Vignoli abre amanhã, às 20h30, na Galeria de Arte do PIC. Ele vai mostrar 20 obras, realizadas entre 2010 e 2011. O artista explica que não se trata de pressentimento de que o apocalipse vem aí. “Fico apenas horrorizado com as notícias e o fato de ninguém fazer nada pelo mundo”, explica, observando que, se cada um fizer um pouquinho, o planeta continua bem vivo.

As pinturas, como explica o artista, foram criadas a partir de notícias que ele vê, lê e ouve. “Seja crônica social, catástrofes, ecologia etc. Estou trabalhando sobre o cotidiano”, explica. A tela que dá título à exposição e mostra “a origem” da situação que Fernando Vignoli detalha, articula Adão, Eva e símbolos de pecado. Japan tsunami, soma maremoto e bomba atômica. O mundo após 2001, o que sobrou das torres gêmeas, de Nova York, depois do bombardeio.

“Minha pintura tem humor, ironia, realidade, fantasia, carrega um pouco de tudo”, explica Fernando Vignoli. Ele define seu estilo como soma de expressionismo e surrealismo. De um lado, gosto por expressões psicológicas; de outro, sedução por sonhos, distorções, vida em transformação (“como na obra de Salvador Dali”). Em 2009, apresentou mostra no Museu Inimá de Paula cujo título foi

30 Expressiva mente surreal. Como o que está nas telas “pode ocorrer ou a pessoa ver”, acredita que há realismo no que faz.

ESTADO DE MINAS - A força das impressões

Mostra do projeto Serigrafias reúne obras de artistas que sempre valorizaram a técnica usando formas diferenciadas

Walter Sebastião

(4/8/2011) Desde os anos 1980, a Escola Guignard da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) desenvolve projeto dedicado a pesquisas com serigrafia, técnica que imprime imagens a partir de matrizes construídas com telas de náilon. Um panorama do realizado em 21 anos de atividade, por meio de 80 trabalhos, de 54 artistas, professores e ex-professores da instituição, além de alunos de Alberto da Veiga Guignard, está sendo apresentado na galeria de arte do BDMG Cultural. Se mostras de gravura são raras, as dedicadas à serigrafia mais ainda.

“Nosso objetivo é divulgar a técnica que, no Brasil, é a menos valorizada no contexto da gravura, algumas escolas nem a ensinam”, explica Edna Moura, atual coordenadora do projeto. “É preconceito”, afirma. E lista artistas notáveis que têm na serigrafia um dos fundamentos de sua obra. Como Andy Warhol (1928- 1987), fundador da pop art; a refinada abstração geométrica de Dionísio del Santo (1925-1999); e a paulista Regina Silveira, que, por sua vez, deu à técnica dimensão experimental. “Artista muito importante para nós é Décio Novielo. Ele foi o primeiro a trabalhar com Serigrafia de José Paulo Neves integrante da serigrafia em BH”, observa. Terezinha Soares, também mostra Projeto Gravura/Serigrafia, apresentada mineira, usou muito a técnica. na Galeria do BDMG Cultural O projeto Serigrafia foi criado por Carlos Wolney. Como a Escola Guignard, há duas décadas, funcionava no porão do Palácio das Artes, para evitar a toxicidade das tintas sintéticas, o professor e artista plástico Herculano Ferreira começou a desenvolver impressões com tintas à base de água, adaptando produtos. Diretriz mantida desde então, que implicou pesquisas sobre papéis, conservação e durabilidade de pigmentos, produção de tintas etc. “É trabalho muito original”, observa Edna Moura, contando que a equipe do projeto sonha com um livro relatando o realizado. Assim como espaço específico para o projeto e mais equipamentos para ampliar as atividades.

Edna Moura, fazendo balanço do realizado, explica que o que surgiu como desafio técnico hoje é pesquisa madura. “Aspecto positivo foi, ainda, a intensificação do diálogo entre artistas e equipe do projeto, com trocas ricas para ambas as partes, que abriu outras perspectivas para a prática da serigrafia e também da gravura”, conta. É exatamente esse aspecto, explica, que gostariam de intensificar. A exposição do projeto Serigrafia tem um convidado especial: Marcos Coelho Benjamin. “É um artista que tem relação com a Escola Guignard e com a serigrafia”, explica a professora.

O GLOBO - No olho da rua

Projeto de SP que deve se espalhar pelo país mapeia grafites, painéis, esculturas e outras obras a céu aberto e inspira discussão sobre arte pública

Carlos Albuquerque e Suzana Velasco

31 (07/08/2011) Usando de forma inovadora e criativa os recursos da internet, como o Google Maps e o Google Street View, além de vídeos e fotografias, dois jornalistas de São Paulo, Andre Deak e Felipe Lavignatti, criaram um projeto que coloca (virtualmente) no mapa cem obras de arte que estão nas ruas ou em espaços públicos da cidade, e que muitas vezes passam despercebidas pelo público. São murais, esculturas, telas, edifícios e grafites, que formam um gigantesco acervo a céu aberto, capaz de incluir desde trabalhos anônimos a obras de e Osgemeos. Intitulada Arte Fora do Museu, a iniciativa gerou um site (arteforadomuseu.com.br), que vai ser combinado com um aplicativo para celulares, em fase final de ajustes. Feito inicialmente para São Paulo, o guia deve se espalhar por outras cidades do país, o Rio inclusive, destacando obras que os criadores do projeto consideram contemporâneas, de acesso fácil a pedestres e livres para se contemplar (sem ingressos ou agendamentos). O objetivo é chamar a atenção para obras que se misturam à vida cotidiana e, até por isso, frequentemente não conseguem se sobrepor ao caminhar e ao olhar apressados — uma derrota ajudada pela falta de conservação e identificação das peças.

— Percebemos que não havia informação sobre, por exemplo, quem era o artista, o que era a obra, qual a sua importância. E muitas estavam largadas, às vezes servindo de banheiro público — diz Deak, cujo projeto foi financiado com R$ 30 mil de um edital da Funarte, em 2010.

O site não pode restaurar as obras, mas avança ao fazer um mapeamento que serve para moradores e turistas que agora têm um guia de arte pública, como em muitas cidades do mundo. Em Nova York, por exemplo, a prefeitura possui um fundo para arte pública e, em parceria com artistas e organizações de arte, leva esculturas para áreas verdes, listadas em www.nycgovparks.org.

No Rio, a prefeitura criou, no fim de 2009, uma comissão para filtrar ou estimular projetos de obras públicas, diante da profusão de estátuas de bronze em homenagem a personalidades. Segundo o subsecretário de Patrimônio, Washington Fajardo, porém, não houve nenhuma ação propositiva desde então. Para o crítico de arte Ronaldo Brito, mais do que popular, a instalação dessas estátuas é populista. Ele acredita que o poder público deveria apostar em obras de valor estético, mesmo que não agradem a todos.

— Muitas casas hoje tombadas também não eram bonitas na época. Com o tempo, a obra encontra a verdade dela. Frequentemente há um estranhamento do público por causa do isolamento da arte de boa qualidade, mas podemos chamar a atenção para ela — afirma Brito, que nos anos 1990 fez parte de uma comissão municipal que levou para as ruas cariocas esculturas de José Resende, Amilcar de Castro e Waltercio Caldas, entre outros.

Foi pensando em romper esse isolamento que Deak e Lavignatti convidaram o crítico Fábio Cypriano e o especialista em turismo voltado para a arte Diogo Oliveira como curadores, limitando o escopo do projeto paulista a cem obras de arte como a arquitetura da Galeria do Rock, no Centro; as esculturas de Lasar Segall, no Jardim da Luz; os grafites na Rua Augusta; e os murais de Maria Bonomi na estação de metrô Jardim São Paulo.

— Nada contra projetos colaborativos, mas em vez de algo inspirado na Wikipedia pensamos num trabalho com base jornalística, indo para a rua tirar fotos e ouvir especialistas, que atestam a relevância das obras — diz Deak.

Além do site, a dupla da Arte Fora do Museu planeja um aplicativo que funcione como um GPS para o pedestre. O espaço delimitado de um museu, afinal, diz para o visitante: “Aqui você verá obras de arte.” Já nas ruas, esculturas, grafite e murais estão a céu aberto , sem nada apontando para eles.

— Falta difusão — afirma a crítica de arte Beatriz Lemos. — Às vezes se investe muito dinheiro em obras públicas, mas não existe um planejamento para conservação, e elas acabam se deteriorando.

32 Não adianta espalhar obras pela cidade sem essa preocupação. Se uma escultura como a do José Resende, no Largo da Carioca, parece abandonada, as pessoas também não dão valor a ela.

Resende, que está em cartaz com uma exposição no MAM do Rio, vai instalar até o fim do mês no Centro uma escultura temporária, cuja forma se relaciona com os postes da cidade. Para Ronaldo Brito, curador da exposição, a ideia é mesmo pôr a obra em confronto com o público.

— Esse horrendo museu de cera (as estátuas de bronze) de homenagens, que não existe só no Rio, é um regresso em relação à arte moderna e à arte contemporânea, que têm uma relação com o espaço. A escultura do Drummond não incentiva a leitura da sua poesia, e sim sua folclorização. Arte pública é para a gente encontrar eventualmente no lugar onde a gente menos espera. Ela tem que enfrentar o caos, a massa urbana — diz Brito, ressaltando que detesta a ordenação dos jardins de esculturas.

Em São Paulo, Andre Deak e Felipe Lavignatti foram a campo enfrentar as obras cara a cara para criar o site. Na base do “façam vocês mesmos”, a dupla passou dias seguidos andando (muitas vezes, de bicicleta) pelas ruas, registrando as obras selecionadas.

— Isso serviu como uma espécie de teste para os roteiros que o site ia sugerir. E o aplicativo que ainda será lançado vai servir para ajudar as pessoas na rua, como uma espécie de visita guiada — diz Deak, que lançou o projeto pouco antes da exposição “De dentro e de fora”, mostra de arte urbana que será aberta no Masp, em São Paulo, no dia 17, com oito grandes nomes estrangeiros, como os franceses Invader e JR e a americana Swoon.

Site com Creative Commons

O que acabou se revelando mais trabalhoso para os dois foi fazer as entrevistas (cem, ao todo) que cada indicação traz, em janelas que pulam em cada clique nos respectivos ícones (azul, para arquitetura; vermelho, para escultura; verde, para grafite; e amarelo, para murais). Deram seu aval às obras escolhidas nomes como o grafiteiro Pato, os arquitetos Ricardo Ohtake e Valter Caldana, a educadora Rosana de Paula Prado e a mosaicista Isabel Ruas.

— Foi uma loucura, porque não tínhamos equipamento apropriado para tanto trabalho — ressalta Deak. — Compramos um tripé vagabundo e gravamos tudo numa câmera digital. Depois, editamos no meu próprio laptop.

Com todo o material em mãos, Deak e Lavignatti conferiram no Google Street View o local exato de cada uma das indicações. Tudo mapeado, o site foi colocado no ar, há pouco mais de um mês, como uma obra em progresso, dentro da licença Creative Commons, que permite a reutilização do seu material, desde que seja citada a fonte.

— Além de terminar o aplicativo, ainda temos que traduzir o site para o inglês e para o espanhol. Depois, queremos fazer o mesmo projeto para as ruas do Rio — explica Deak. — Quanto à licença, ela se justifica porque esse trabalho foi feito com dinheiro público e é sobre espaços públicos. Não faz sentido ele ser fechado. Afinal, viver de royalties é tão século XX...

No Rio, especialistas sugerem atrações

(07/08/2011) De marcos consagrados (como o Aterro do Flamengo, um projeto coletivo dos anos 1950, que incluiu Burle Marx) a trabalhos alternativos (como as pinturas dos holandeses Hass & Hahn no morro Dona Marta, feitas em 2010), passando por inúmeros grafites, murais e esculturas, o Rio de Janeiro é, naturalmente, farto em exemplos de arte em espaços públicos. A convite do GLOBO, um time de especialistas — o diretor e curador do projeto Multiplicidade, Batman Zavareze; o grafiteiro Márcio Ribeiro, o Piá; o crítico de arte Fernando Cocchiarale e a arquiteta Nanda Eskes — selecionou alguns dos seus preferidos.

33 — Acho um belo exemplo de arte pública o projeto Casulo, uma espécie de tapume que envolve a fachada da Escola Estadual Pública Nave, na Tijuca — diz Batman. — São 324 metros quadrados de imagens que mudam constantemente. Gosto da Parede Gentil, no lado externo da galeria Gentil Carioca, naquele “baixo Praça Tiradentes”. E citaria também a obra “Retângulo vazado” de , que considero um gênio, na Rua Luís de Camões, no Centro.

Para o crítico de arte Fernando Cocchiarale, um destaque que não pode ser esquecido é a escultura “O passante”, de José Resende, no Largo da Carioca.

— Consideraria incluir também o monumento a D. Pedro I, na Praça Tiradentes, o primeiro feito por subscrição popular do país, em meados do século XIX — conta ele, que critica a proliferação de estátuas de artistas e intelectuais brasileiros pelas ruas da cidade. — São frequentemente de péssima qualidade e não têm qualquer significação artística.

Na lista de Nanda Eskes, estão clássicos como o Aterro do Flamengo e o Edifício Gustavo Capanema, no Centro, um marco internacional da arquitetura no Brasil.

— Citaria também o Hangar do Zepelim, em Santa Cruz. Ele foi construído em 1932 por engenheiros alemães e é um dos últimos hangares para dirigíveis existentes no mundo — explica a arquiteta. — Gosto também das pinturas urbanas de Hass & Hahn, em particular a intervenção “O morro”, feita no Dona Marta em 2010. Eles começaram a trabalhar juntos em 2005, quando estiveram no Rio de Janeiro e em São Paulo para gravar um documentário sobre a influência do hip-hop nos jovens das favelas. Inspirados pela visita, passaram a criar intervenções urbanas, em projetos que não são somente artísticos, mas também sociais.

O grafiteiro Márcio Piá, do coletivo carioca Fleshbeck Crew, mapeia alguns dos exemplos que considera marcantes do estilo, entre eles um muro na Rua Real Grandeza, próximo à Rua Henrique Novaes, em Botafogo, e desenhos no Arpoador, em frente ao Colégio São Paulo, feitos por Leo Uzai e Matheu Velasco.

— Acho muito legal também uma improvisada galeria a céu aberto, na Avenida Chile, no Centro. Ela foi pintada de forma coletiva, por vários artistas, a convite da prefeitura, o que serviu para valorizar um pouco o lugar, que é muito maltratado. As ruas da cidade precisam de mais iniciativas assim.

O GLOBO - Obra de Ernesto Neto abre centro portenho

Instalação monumental do carioca inaugura mês que vem o Faena Art Center, empreendimento de US$ 15 milhões em Buenos Aires

Suzana Velasco

(7/08/2011) Em 2004, o argentino Alan Faena começou a mudar a cara da zona portuária de Buenos Aires, com o Faena Hotel + Universe, um projeto de Philippe Starck para um edifício de 1902, usado para armazenar grãos. Sete anos depois, os empreendimentos do empresário ocupam sete quadras do bairro de Puerto Madero, que ganhará mais um deles, agora voltado para a cultura. Com investimento de US$ 15 milhões, o Faena Art Center será inaugurado no dia 21 de setembro com uma instalação monumental do brasileiro Ernesto Neto. Desde fevereiro, ele está preparando um projeto especialmente para o espaço, no também centenário edifício Los Molinos, que foi o primeiro grande moinho da Argentina.

34 ERNESTO NETO dentro de sua passarela de cordas e bolas: escolhido para inauguarar o espaço por sua obra “telúrica” e “visceral”

— Quando começamos a recuperar essa área abandonada, tivemos a sorte de comprar as sete quadras, em 2002, e criar uma unidade, com o hotel, restaurantes, residências e agora o centro. Queremos que ele seja um espaço de cultura interdisciplinar, uma incubadora para artistas, um lugar de referência na cidade — afirma Faena. — Ernesto Neto é um artista número um no mundo, um gênio. Argentina e Brasil têm a rixa do futebol, mas somos irmãos, queremos estimular essa relação.

Reformado pelo escritório de arquitetura argentino Mc- Cormack & Associates — que ganhou uma concorrência com outros seis projetos do país —, o centro de arte terá dois ambientes, cada um com 6.780 metros quadrados, onde também serão realizados shows, peças, desfiles de moda e conferências. Ernesto Neto prepara uma instalação grandiosa para uma das salas, com nove metros de pé-direito: uma passarela suspensa, toda feita de tramas de cordas coloridas, como as que usou no ano passado na exposição “Dengo”, no MAM de São Paulo. O visitante vai tirar os sapatos e percorrer o caminho sinuoso, cujo piso é formado por bolas, daquelas de piscinas infantis.

— Tentei fazer o chão da passarela com vários tipos de madeira, mas não funcionou. Uma coisa não beijava a outra. Com as bolas ficou mais orgânico — diz Neto. — Eu sempre quero fazer uma coisa mais civilizada, geométrica, euclidiana, mas não adianta, eu acabo entrando numa floresta. É sempre uma escultura-aventura, mas quis mesmo fazer uma obra audaciosa.

E é por sua obra “telúrica”, “visceral”, “viva”, que Neto foi escolhido para inaugurar o centro, segundo sua diretora, Ximena Caminos. Há dois meses, cerca de 20 pessoas ajudam o artista a fazer os crochês com as cordas de poliuretano. Tudo feito à mão. Na semana passada, eles testavam as estruturas — que ocuparão também as paredes e o teto do espaço — na quadra do Colégio Pedro II, vizinho ao ateliê de Neto, no Centro. Diferentemente da mostra no MAM, em que as cores eram mais vivas, Neto encomendou tons todos misturados — para o artista, uma posição política a favor da mistura, “nesse nosso mundo histérico”. Os típicos “sacos” que são marca de Neto serão preenchidos por objetos, como televisões, panelas, rádios e tambores, servindo de contrapeso para a passarela:

— Estava achando tudo muito naturalista, então quis contaminar a obra com elementos da cultura, tirar a pureza da estrutura — diz ele, que foi cinco vezes a Buenos Aires desde o convite para a exposição, com curadoria de Jessica Morgan, da Tate Modern.

Exposições de Long e Barceló

35 Além do centro cultural, está em andamento na área de sete quarteirões um projeto do arquiteto britânico Norman Foster para um prédio residencial — com o sugestivo nome borgeano de Aleph. No Faena Art Center, estão programadas exposições do inglês Richard Long e do espanhol Miquel Barceló e, ainda este ano, uma mostra da argentina Gachi Hasper e um show de Marianne Faithfull e Doug Pettibone. Como Alan Faena, a diretora do centro diz que quer levar mais brasileiros para a beira do Rio da Prata, e cita os irmãos Campana como uma das possibilidades.

— A ideia é ser um espaço não convencional, um lugar de encontro de todas as disciplinas artísticas — afirma Ximena. — Somos latino-americanos, e hoje o mundo do Hemisfério Norte está cansado. Argentina e Brasil têm uma relação de amor e ódio, como um casal, e sentimos que são países muito complementares. Queremos fomentar o intercâmbio. Gostamos do fato de Ernesto Neto ser latino- americano, trabalhar em escala monumental e ser um dos grandes artistas contemporâneos do mundo. Ele é brilhante, de uma sensibilidade rara. FOTOGRAFIA

ESTADO DE MINAS - Tributo à criação

Fotogênese, exposição que inaugura a galeria CMafra, mostra trabalhos inspirados no conceito de nascimento. A proposta é reinventar a fotografia, em vez de limitá-la a mero registro da realidade

Walter Sebastião

Futebol, de Davilym Dourado: efeitos plásticos obtidos com ácido jogado sobre antigos negativos

(9/8/2011) Amanhã, BH ganhará sua primeira galeria de arte dedicada à fotografia. O espaço leva o nome do proprietário, Cícero Mafra, e já existe há um ano. Mas só agora será inaugurado oficialmente, com a exposição Fotogênese. A mostra reúne obras de Ana Casatti, Davilym Dourado, Ricardo Hantzschel e Rogério Medeiros. A seleção ficou a cargo do paulista Eder Chiodetto, que assumiu o posto de curador da galeria. O projeto é realizar seis mostras anuais – uma coletiva e cinco individuais. Até outubro, os mineiros verão os trabalhos de fotógrafos gaúchos.

Eder Chiodetto conta que a inauguração da galeria mineira lhe trouxe o desejo de realizar mostra que falasse de coisas que estão nascendo. Divagando, associou as ideias de luz, fotossíntese, surgimento de vida e formas ainda não definidas. Foi assim que chegou à palavra Fotogênese. Chiodetto partiu, então, para a seleção de fotógrafos que trabalhassem com motivos identificados com esse conceito.

Rogério Medeiros faz imagens abstratas a partir da natureza – fusão de pintura e fotografia, valorizando texturas, cor e forma, despreocupada com relatos ou documentação do real.

Ricardo Hantzschel, por sua vez, mostrará fotos vindas de câmera construída artesanalmente, chamada pin-hole. Assim, observa Chiodetto, “ele reinventa o que é fotografar, desautomatiza a foto”. Isso numa época em que o digital facilita tudo. Resultado: imagens que têm espessura, antecipa o curador.

36 Os trabalhos de Davilym Dourado surgem de “ataques” com ácido, jogado sobre negativos de fotos antigas dele, registrando a corrosão do material. “O tempo resguardado na foto é redimensionado pelo acaso”, pontua o curador, explicando que o resultado é muito pictórico.

Ana Casatti traz imagens opacas, delicadas, femininas. “Quase só indícios”, lembra Chiodetto, ressaltando que elas tanto sugerem esquecimento como lembranças. “São praticamente haikais”, afirma, ressaltando sua natureza poética e sintética.

Pegada Os trabalhos expostos não são imagens isoladas. Integram séries desenvolvidas metodicamente pelos fotógrafos. “Você sabe quem é profissional quando o autor mantém a pegada e o discurso conceitual em várias imagens”, garante Chiodetto. A diversidade de procedimentos vem do fato de, nos últimos 10 anos, o Brasil viver momento em que são ampliados os limites da prática da fotografia experimental. “O repertório do fotógrafo cresceu. Nunca houve tantas portas abertas para que cada um escolha o seu caminho. Todos os processos são ferramentas para construir poéticas pessoais, o essencial quando se faz arte”, afirma.

O arquiteto e designer Cícero Mafra conta que o projeto da galeria nasceu da paixão pela fotografia, que o levou a viagens e estudos, além de formar coleção e a fotografar. O objetivo dele é divulgar a arte fotográfica com exposições e palestras, além da venda de trabalhos. Para ele, o gênero tem posição marginal no circuito. Há apenas 10 galerias dedicadas à fotografia no país, lembra. “É pouco”, observa. “Mas a situação mudou, estamos descobrindo a fotografia”, garante.

A importância de uma galeria dedicada à fotografia, explica Éder Chiodetto, está em Paisagem do curtume, de Ricardo Hantzschel: artista formar público para essa linguagem e também reinventa a realidade, desautomatizando o olhar para as atividades culturais. A proposta é fazer do espaço belo-horizontino centro de convivência, inclusive com biblioteca, visando incentivar a reflexão e o pensamento. Organizador da mostra Geração 00: a nova fotografia brasileira, em São Paulo, o curador dá uma dica de livro aos interessados: A fotografia como arte contemporânea (Editora Martins Fontes), de Charlotte Cotton. E conclui: “Arte são visões e pontos de vista que nos mostram ser possível ver o mundo de forma desautomatizada”.

O ESTADO DE S. PAULO - O Brasil em recortes

Em 64 imagens, livro celebra os 40 anos de carreira de Pedro Martinelli

Simonetta Persichetti / ESPECIAL PARA O ESTADO

Jari. Registro de 1979

(10/8/2011) Basta um átimo, uma fração de segundo para que a foto tão esperada seja conseguida ou não. Longos minutos à espreita de uma imagem já visualizada e enfim: a satisfação. É

37 essa a sensação que o fotógrafo paulistano Pedro Martinelli, nascido em 1950, nos passa quando olhamos seu trabalho. Fotos flagrantes, mas que, muitas vezes, mereceram a calma da espera. Ele é, antes de mais nada, fotojornalista, um narrador do mundo. Há 40 anos está na estrada, sempre procurando temas para suas fabulações, que tanto podem ser os índios, como bastidores da moda, um incêndio, a pesca do pirarucu, as festas populares do Brasil. Parte de seu trabalho, 64 imagens, foi reunida em Martinelli, Pedro (Editora Terra Virgem, 96 págs., R$ 45), que será lançado no sábado com uma exposição de fotos vintage e imagens do livro que serão vendidas na ocasião. Mas não é só. Para setembro, a Terra Virgem e Martinelli organizaram o lançamento de uma edição de luxo do livro, durante a SP-Arte Foto, no Shopping Iguatemi/SP. Uma edição limitada de 100 exemplares numerados: 20 virão acompanhados de cópia fotográfica 55 x 44, também numerada e assinada e 80 livros assinados pelo autor. Isso visando ao crescente mercado de colecionadores de fotografia.

Pequenos recortes, quem sabe, melhor dizendo, um aperitivo de seu vasto acervo imagético. Como o seu famoso registro feito durante um jogo no Parque Antártica, no início dos anos 1970, quando ele começava sua carreira, que nos lembra o quadro Operários, de Tarsila do Amaral: "Eu vi a foto, como todos os fotógrafos que estavam naquela tarde no Parque Antártica viram", escreve Martinelli, nas primeiras páginas do livro. E continua: "Dali para frente, não fiz outra coisa senão planejar a fotografia". Esperou o momento exato, o início da partida, aquele momento em tudo parece ficar em suspenso esperando o apito do árbitro. Foi aí que ele disparou: "A foto era só minha".

Ou o instante da tragédia no incêndio do Edifício Joelma em São Paulo, em 1974, ou ainda o olhar cúmplice dos índios que se rendem e se deixam retratar, como em Marabá em 2000. Mas não ficam de fora suas fotos-denúncia, como as do desmatamento da Amazônia - região que lhe é muito cara e que acompanha desde a década de 1970. Aliás foi na Amazônia, acompanhando uma expedição dos irmãos Villas-Boas, em 1973, que conseguiu a primeira imagem dos índios kranhacãrore, de quem ainda pouco se sabia. Foram três anos de espera e apenas duas fotos: a primeira tremida, a segunda perfeita: "De volta ao acampamento, antes de atracar no barranco, os índios (que dirigiam a canoa) estavam em total euforia, começaram a saltar da canoa, que começou a balançar, virou comigo, as câmaras e os filmes. Desastre. Pensei que tinha perdido tudo".

Não perdeu. Os índios resgataram os filmes e a foto foi primeira página do jornal O Globo, onde Martinelli trabalhou de 1970 a 75. Na sequência, Martinelli atuou, entre 1977 e 1983, como fotógrafo e editor da área da Veja. Depois, de 1983 a 1994, foi diretor de serviços fotográficos no conjunto de revistas da Editora Abril. De seu currículo também fazem parte importantes exposições coletivas, entre elas a 1.ª Trienal de Fotografia (MAM, 1980); 100 Anos de Avenida Paulista, (Masp, 1991); 1.ª e 2.ª Bienal Internacional de Fotografia de Curitiba (1996 e 1998).

Lugares e desejos. O livro pertence à coleção Fotógrafos Viajantes, criada pelo editor Roberto Linskier, que foi lançada em 2009 com um livro sobre Pierre Verger e em 2010 com um sobre Cássio Vasconcellos: "A coleção traz grandes fotógrafos, suas imagens e viagens, editadas de forma a contar um pouco sobre a visão peculiar de cada um deles. O que me interessa é a diversidade de olhares, lugares e desejos", diz Linskier.

De pequeno formato, lembrando diários de viagem, Martinelli, Pedro acompanha a trajetória desse fotógrafo, que soube colocar e manter o fotojornalismo brasileiro em destaque, mas que, acima de tudo, é um ótimo contador de histórias, como as que estão nos seus livros Casas Paulistanas (1998), Panará a Volta dos Índios Gigantes (com exposição no Sesc Pompeia/SP-1998), Amazônia o Povo das Águas (com mostra no MIS/SP-2000), Mulheres da Amazônia (com exposição no Museu da Casa Brasileira/SP-2004) e Gente X Mato (2008).

MÚSICA

ESTADO DE MINAS - Pop com experimentalismo

38 Eduardo Tristão Girão

(4/8/2011) Depois de mergulhar no universo sonoro das enxadas, Babilak Bah agora quer tocar no rádio. Com Biografia de homens inquietos, seu recém-lançado segundo álbum, o artista paraibano se aproxima da sonoridade pop, mas sem abrir mão de certo experimentalismo, que é o traço principal de sua carreira. As novas canções serão apresentadas em show hoje à noite, no Chevrolet Hall, em Belo Horizonte.

“Trouxe muito da minha experiência radiofônica para o disco. O bom é quando a nossa música toca no rádio. Isso não empobrece em nada o meu trabalho. Além disso, o rádio faz parte da cultura brasileira. Imagine que bom esse disco tocar numa festa de aniversário?”, fantasia Babilak Bah, há 25 anos radicado na capital mineira.

O álbum tem direção e produção assinadas pelo próprio Babilak e concluí-lo levou três anos. No primeiro ano, escreveu cerca de 40 letras. Na sequência, começou a musicá-las paralelamente a aulas de canto. “Era muito dedicado à pesquisa de percussão e timbres”, justifica. Já a gravação, realizada no Estúdio Elierim, na capital mineira, consumiu o ano passado inteiro.

É ele o autor de todas as 15 faixas, sendo duas feitas em parceria: Almin, com Carlos Ernest Dias, e Zé contemplador, com Waldo Lima do Valle. As referências presentes no disco são presumíveis a partir dos títulos de algumas faixas, como Urucumnacara, Moçambique, Zumbi prometeu, Olhar eletrônico e Jesus é broder de xangô. Convidados mineiros e paraibanos marcam presença nas faixas.

Estreia Ainda que algo de inquietante tenha sido mantido nessa nova leva de canções, fica claro que Biografia de homens inquietos é um disco que chega mais fácil ao ouvido do que Enxadário, seu disco de estreia, lançado em 2006 e baseado na experimentação sonora com enxadas. “Agora, usei as harmonias não como dogma, mas ferramenta para desenvolver meu trabalho. Fugi do formalismo”, define.

A banda que o acompanha é formada por Johnny Herno (percussão), Gladson Braga (bateria), Leonardo Brasilino (trombone) e Thiago de Melo (baixo). Serão usadas no show algumas novidades

39 criadas em seu projeto Enxadigma, como o marimbau eletrônico. Ainda este mês o músico toca em Salvador (dia 11) e seguirá para sua primeira turnê no exterior (seis países europeus), incluindo workshop na Itália.

SAIBA MAIS

ENXADA COMO INSTRUMENTO

A enxada é elemento indissociável da obra de Babilak Bah, mas seu uso como instrumento musical não é ideia dele. Nos anos 1980, conheceu a técnica por meio de um músico paraibano e, nos anos 1990, entrou em contato com o grupo baiano Zambiapunga, também especialista no objeto.

CORREIO BRAZILIENSE – No circuito do rock

QNG Festival reúne amanhã nove bandas em Taguatinga. Também da cidade, o grupo Vitrine lança hoje o primeiro disco

Felipe Moraes

Andreia Aguiar/Divulgação

QNG Festival reúne amanhã nove bandas em Taguatinga. Também da cidade, o grupo Vitrine lança hoje o primeiro disco

(5/8/2011) Uma semana depois do Porão do Rock, Taguatinga dá o recado: a cidade, a partir deste sábado, lembra à vizinhança que também é cantinho do rock brasiliense. A primeira edição do QNG Festival reúne bandas locais e de outras cidades e ocorre amanhã, às 15h, na Área Especial 29 da QNG, em Taguatinga Norte. No line-up, Casa Vermelha, Dependência Pulmonar, Maverick’79 (Santo Antônio do Descoberto), Os Caras do Rock, Os Merah, Podrera (Riacho Fundo 2), Prisão Civil, Suicídio Coletivo (Jardim Ingá, em Luziânia) e Valdez.

O Dependência Pulmonar, iniciado em 2006, aproveita o evento para lançar o segundo disco, Capital do kaos (independente, 18 faixas). Em 2007, Danillo Nunes (bateria), Rafael Vilela (baixo), Santiago Oliveira (guitarra) e Lauro Humberto (vocal) divulgaram a demo Elvis não morreu, tá na carteira e, desde então, têm investido nas apresentações ao vivo. Para Nunes, que integra a produção dos shows, a iniciativa cria um espaço para a cena. “Fortalece toda a galera da região. Queremos que cresça e se torne importante, como o Porão ou o Ferrock. A gente quer tornar a QNG um ponto de encontro”, compara.

Os Merah, também presentes na organização, mesclam rock, baião e timbres nacionais e internacionais, de Tim Maia a The Strokes. O guitarrista Rafael Sapo define o evento como uma manobra de descentralização. “No DF, o rock é centralizado e não tem espaço. Faltava uma coisa assim, com esse número de bandas. Além disso, atende o público daqui”, diz o parceiro de Bruno Merah (vocal), André Nunes (guitarra), Paulo Silas (bateria) e da única garota na banda, Alenne Surer (baixo).

40 Everaldo, baixista do Valdez, trio que esteve no Porão, acredita que a movimentação dos músicos pode consagrar o festival em pouco tempo. “Taguatinga fornece espaços mínimos. É uma baita festa, que deve atrair gente de outras cidades e ser consolidado”, diz, otimista. O trio, completado por Sérgio (bateria) e Diego Valdez (guitarra e vocal), continua elétrico: está em estúdio, gravando singles, e, no ano que vem, pretende finalizar pelo menos uma música por mês. Álbum, por enquanto, fica em segundo plano.

Já bem conhecidos na cidade, Os Caras do Rock veem no QNG Festival o preenchimento de uma lacuna que sempre atazanou as bandas. “Pode melhorar a situação de todo mundo e foi criado pela falta de espaço. Aqui não tem local organizado, com boa qualidade acústica”, afirma o guitarrista e vocalista Fábio Brandão. A formação, com Luiz Henrique no baixo e German Rafael nas baquetas, segue o comportamento dos colegas do Valdez: prefere divulgar músicas avulsas a investir num disco apressado e caseiro.

CORREIO BRAZILIENSE - Sem nostalgia

Wanessa Lima/ Divulgação

O Vitrine lança o primeiro CD, Espelhos, em show no Cult 22 Rock Bar

(5/8/2011) Para a banda Vitrine, gravar Espelhos, seu primeiro disco, não foi moleza. Durante quase dois anos, o quarteto estabeleceu uma rotina de idas e vindas, saindo de Taguatinga, Águas Claras e Núcleo Bandeirante, onde moram os integrantes, até o estúdio do produtor Philippe Seabra (Plebe Rude), no Lago Norte. Ao meio-dia, tinham de estar de volta ao Bandeirante, para que o vocalista Israel Veloso pudesse trabalhar. Mas o guitarrista Davi Kaus afirma que eles fizeram isso como a coisa mais divertida da vida. “Queríamos que o disco soasse como a gente, simples, porém mais polido e profissional”, conta Davi.

A banda fez seus primeiros ensaios em 2002, em Taguatinga. Em 2006, chegou à formação atual, com Mark Santana no baixo e Anderson Gomes na bateria. “A proposta inicial era fazer um som pautado no new wave, de bandas como Clash, Echo and the Bunnymen e The Jam”, comenta Israel, autor da maioria das letras, sobre relacionamentos e observações cotidianas.

A inspiração oitentista, no entanto, não faz de Espelhos um disco de sonoridade e timbres datados. Pelo contrário. Sem nostalgia ou afetação, o repertório tem cara de agora. Nas 11 faixas, a banda encontra equilíbrio entre o rock de guitarras e potencial radiofônico. O CD tem alguns candidatos a hit. Dois deles já ganharam videoclipe, Zero hora e Egoísmo. (Pedro Brandt)

FOLHA DE S. PAULO - Diva Inezita comemora seus 60 anos de carreira

Aos 86, cantora faz hoje especial na TV Cultura, ao lado de orquestra

Apresentadora de "Viola, Minha Viola" defende música de raiz tradicional e critica o sertanejo moderno

MORRIS KACHANI DE SÃO PAULO

(7/8/2011) Toda quarta-feira, centenas de homens e mulheres de idade avançada se reúnem à tarde no 451 da avenida Tiradentes, em São Paulo, mais precisamente no auditório do teatro Franco Zampari, onde é gravado o "Viola, Minha Viola", da TV Cultura.

41 Para eles, a paulistana da Barra Funda Ignez Magdalena Aranha de Lima representa mais ou menos o mesmo que Madonna nas hostes fashionistas. Uma diva.

No caso de Ignez, ou , como é conhecida, uma diva caipira. Aos 86 anos, ela está completando 60 de carreira. Metade deles apresentando o programa musical mais antigo da TV brasileira e que proporciona a maior audiência da emissora estatal paulista (de 3 a 4 pontos no Ibope).

Para comemorar a data, a Cultura exibe hoje às 9h, com reprise no próximo sábado, às 20h, uma versão especial do programa. Como nos bons tempos da era do rádio, Inezita aparece acompanhada de 27 músicos de orquestra, cantando alguns clássicos de sua carreira, como "Flor do Cafezal", "Meu Limão, Meu Limoeiro" e "Lampião de Gás".

VODCA, NÃO

Para sempre Inezita será associada à música de raiz nascida nos rincões do Sudeste e do Centro- Oeste do país -Paraná, Mato Grosso, Goiás e principalmente Minas Gerais e São Paulo-, a que se dedica desde criança.

Isso num meio predominantemente machista, carola e pinguço. Ela nunca foi de beber, mas não dispensa a caipirinha de sábado. "Sem vodca, pois não sou russa."

Movimentando-se com um andador, em razão de um tombo recente, coberta de maquiagem e extremamente lúcida, ela diz: "A cultura caipira está dentro de cada um de nós. E é fantástica. Antigamente havia um preconceito, mas hoje todo mundo sabe que não precisa ser acadêmico para ser poeta".

"Viola" é um programa sem concessões que faz contraponto ao "sertanejo universitário" -micaretas, axé e baladas pop. Um gênero comercial que apenas de longe remete às origens rurais. A ideia do programa é apresentar a velha geração de violeiros ainda em forma e os poucos expoentes da nova geração (uma das tendências atuais enche Inezita de orgulho: as violeiras, contrariando o machismo do meio).

CAIXA DE CDS

De acordo com Aluísio Milani, roteirista do programa, "para honrar e reverenciar Inezita todos tocam só o que ela gosta -e sabem do que ela não gosta". E do que ela não gosta? "Pergunte o que ela acha do Luan Santana."

No "Viola", instrumentos eletrificados, à exceção do baixo, não entram. "Nossa base é a viola, o violão e a sanfona. A música caipira se afasta cada vez mais da raiz, e isso é muito ruim. É sempre assim: onde entra o dinheiro, sai a cultura", diz Inezita. "O tecladinho pode ser bom para dançar, mas para mim é um realejo deitado, um instrumento sem alma. Qualquer coisa que altere os ritmos da música de raiz é ruim.

Mas a pior coisa que eu já vi foi um trio elétrico invadindo uma procissão da Festa do Divino, em Mogi das Cruzes [interior de São Paulo]".

E conclui: "A boa música é feita de ritmo, história, boa poesia e comunicação com o público. O mundo mudou muito, mas a cultura caipira nunca vai morrer".

Uma biografia de Inezita ainda não foi escrita. Mas em março o jornalista Assis Angelo lançou "A Menina Inezita Barroso" (Cortez Editora), livro sobre a infância e a adolescência dela, ilustrado com xilogravuras, para o público infantojuvenil.

Completando o ciclo de comemorações, a gravadora Microservice deve lançar dentro de dois meses uma luxuosa caixa contendo seis CDs, com músicas selecionadas pelo produtor e pesquisador Rodrigo Faour.

42 Intitulada "O Brasil de Inezita Barroso", recupera pérolas da música regional, de folclore e sertaneja interpretadas por Inezita entre os anos de 55 e 61. "Ela é pioneira nesse repertório e as gravações originais são de ótima qualidade", diz Faour. "É um luxo tê-la na ativa."

FOLHA DE S. PAULO - Cantora sobrevive em meio ao risco de perda da música caipira

JOSÉ HAMILTON RIBEIRO ESPECIAL PARA A FOLHA

(7/8/2011) Como padroeira e madrinha da música caipira, Inezita navega em mar perigoso. Em todos os gêneros musicais, do coco de roda à música erudita, o número de músicas ruins é maior -muito maior- do que o de boas.

Como os criadores da música caipira são pessoas simples, quase analfabetas, quando eles erram na mão, o erro fica evidente, gritado. Surge uma repulsa. Diz-se então que espingarda de caçador tem dois canos justo para matar dupla caipira.

Mas Inezita é uma estrela. Como todo grande artista, ela tem em volta de si uma aura de carisma, magnetismo -e consciência.

Então sabe que, no universo da música caipira, além da cota inevitável de bagulho, vivem pequenas (e até grandes) joias de melodia, de ritmo e de poesia, a crônica -escrita por gente criativa e até iluminada de boa parte do Brasil, em dado momento.

A música caipira nasceu com o Brasil (a viola portuguesa foi a base) e teve seu apogeu entre os anos 1930 e 60, quando cerca de 80% da população vivia no campo.

Hoje, o povo está quase todo na cidade, cenário e contexto são outros, o mundo andou, mudou, se globalizou.

A música caipira se vê agora diante de três caminhos: 1) cultivar a tradição de uma época que não volta mais; 2) mudar para ser como os "sertanejos modernos", que se apresentam como dupla caipira, mas cujo contexto não é mais rural nem ainda é cosmopolita; 3) engrossar o movimento que, através das orquestras de violeiros (cada grande ou média cidade do centro-sul já tem uma ou mais de uma dessas orquestras) e das aulas de viola até na universidades, valorizar a viola caipira em conjuntos, bandas e mesmo orquestras sinfônicas.

Nesse mundo em mudança, e em risco permanente de perda desse grande patrimônio cultural do povo brasileiro, Inezita sobrevive, sempre em primeiro plano, como atriz, apresentadora de TV e agitadora cultural.

Usa sua voz forte e bonita na interpretação de músicas com segurança e originalidade. Sua gravação (voz e imagem) da "Moda da Pinga", em que ela sugere -com graça, discrição e muito charme- que tomou umas e outras, é inesquecível.

Com 86 anos, Inezita alcançou os patriarcas da música caipira, encabeçados por Raul Torres, de que agora só temos um, Tinoco (da dupla Tonico e Tinoco), fazendo 91 anos agora em novembro.

Inezita conheceu os "patriarcas", conviveu com quase todos eles, a todos reverenciou, de todos recebeu afago. Lida agora com a segunda geração da música caipira, possivelmente a última.

Dino Franco, 74, autor de "Cheiro de Relva" e "Ventania", entre outras mil composições, talvez seja o maior expoente dessa segunda geração. Pois Dino Franco diz que Inezita tem um defeito, o defeito de ser só uma.

JOSÉ HAMILTON RIBEIRO, ganhador de sete prêmios Esso de jornalismo, é repórter do programa "Globo Rural"

43 ESTADO DE MINAS - O samba das moças

Jovens artistas vão à luta no país das cantoras, explorando sobretudo o samba. Repertório das estreantes, crias da noite, reúne faixas autorais e canções de autores consagrados

Ailton Magioli

Ana Cristina: tributo a Dick Farney e ao jeito carioca de viver

(9/8/2011) Eu canto, tu cantas, mas elas, principalmente, cantam. Fenômeno histórico digno de estudo, o número de intérpretes femininas não para de crescer no Brasil. Além de Thais Gulin, a namorada de que já está no segundo disco (muito bom, por sinal), agora é a vez – em ordem alfabética, por favor – de Ana Cristina (Acaso, da Biscoito Fino), Joyce Cândido (O bom e velho samba novo, Biscoito Fino), Manu Santos (Nossa alegria, independente) e Thais Macedo (O dengo que a nega tem, independente).

Em comum, além do timbre de voz agudo, a maioria delas passeia pela samba. Como gosta de dizer Janaína Moreno, o gênero é amigo das cantoras. “Uma vaca de tetas gordas. Quem mama, acaba desenvolvendo sua potencialidade”, brinca ela, na fila de espera com o independente Festeira, que deverá chegar ao mercado apenas no ano que vem.

Cria de uma das famosas Oficinas dos Menestréis de Oswaldo Montenegro, a carioca Manu Santos ainda se lembra do dia em que cantou pela primeira vez para o público, na Lona , de Bangu, no subúrbio carioca. “Havia umas 300 pessoas”, conta a jovem cantora. Pouco depois, já estava na lendária Lapa, participando de concurso do Bar Carioca da Gema, ao lado de Aline Calixto e outras candidatas. Lá conheceu bambas como Moacyr Luz e Wilson das Neves, hoje personagens importantes em sua trajetória.

“Sigo a música popular brasileira. O Brasil é percussão, terra, mato, água. Gosto de misturas”, diz Manu. Seu estilo musical vai de Moacyr Luz (Domingo é dia e Eu só quero beber água) ao argentino Fito Paez (Un vestido y un amor). A musa da jovem cantora é Maria Bethânia. “Foi incrível a garra com que ela saiu da Bahia para o Rio e deu certo”, elogia. Também gosta de e Clara Nunes.

Em ritmo pop-bossa, Ana Cristina, a nova afilhada de Roberto Menescal, não consegue esconder a admiração pelo estilo carioca. “Eles são seres apaixonados à beira-mar: dia de sol, caminhada, tudo isso dá a eles um sentido despretensioso e divertido de viver”, avalia a moça, nascida e criada na Gávea. Acaso, de sua autoria, virou faixa de trabalho de seu disco de estreia, que ainda traz os clássicos Dindi, de Tom Jobim, e Dora, de . Menescal participa de Queria, também de autoria de Ana. A fonte maior de inspiração, no entanto, é Dick Farney, “pela sensibilidade nas canções e no piano”.

A paulista Joyce Cândido batizou de O bom e velho samba novo seu disco de estreia. Graduada em piano e música, a cantora de Marília fez escola na Broadway. Lá estudou canto, dança e teatro, além de participar das montagens A pequena sereia e A noviça rebelde. No Rio, foi recebida por Alceu Maia, e outros bambas, que lhe abriram caminho para o samba. De e Vadico (Feitio de oração, com participação da atriz Letícia Sabatella nos vocais) a Ana Costa, Fred Camacho e Alceu Maia (Ce pó pará), ela desfila o samba de ontem e de hoje, convocando o público a sambar.

44 A mineira Janaína Moreno, que se juntou à turma da Lapa carioca há cerca de dois anos, acaba de ganhar mais parceiros para a produção de Festeira e aprovou o projeto do disco na Lei Rouanet. Com seis faixas gravadas, ela acabou de fechar com Fernando Merlino a produção do álbum. Do samba ao maracatu, passando pelas canções, Janaína está regravando Baioque, de Chico Buarque, e Canto em qualquer canto, de Ná Ozzetti e Itamar Assumpção. “O Rio me ampliou o raio de atuação”, comemora a belo-horizontina.

Por que cantar?

MANU SANTOS carioca

"Não me vejo fazendo outra coisa. Gosto de estar junto do público, ver os sorrisos. A gente pode passar mensagens de esperança para as pessoas através do canto. Fora o fato de a família na qual me formei ser muito musical. Sem pretensão alguma, da oceanografia, que escolhi para estudar, acabei cantando uma série de canções que falam do mar".

THAIS MACEDO fluminense de Macaé, radicada no Rio

"Venho de família supermusical. Da bisavó aos tios. Na escola, fui cantar em coral e me tornei solista com o apoio de meu pai. Aos poucos, fiz apresentações amadurecendo a ideia. Ao trocar a faculdade de engenharia civil pela de produção cultural, acabei cantando na noite".

JANAINA MORENO mineira de Belo Horizonte, radicada no Rio

"Não escolhi. Acho que fui escolhida pela música. Aos 7 anos, já cantava em um grupo infantil. Depois trabalhei no teatro, sempre cantando paralelamente. De repente, quando vi, já estava fazendo o projeto Samba da madrugada em um casarão de Santa Tereza, em BH. Depois fui para o Ziriguidum".

ANA CRISTINA carioca

"Iniciei-me como pianista aos 5 anos, diante da musicalidade despertada já na infância. A composição veio aos 16. Como cantora, mesmo, comecei aos 20, depois de começar a faculdade de economia e fazer aulas de canto para me entreter. Dois meses depois, fui para o palco. Mais um mês, estava ao lado de Roberto Menescal, responsável pela formação do trio vocal feminino Pop Bossa, que integrei com Monique Kessous e Flávia Gabizo, fazendo gravações para o mercado asiático".

ESTADO DE MINAS - Blues do Brasil

Kiko Ferreira

(9/8/2011) Jataí, a espécie de abelha sem ferrão que dá título ao sétimo álbum de Edvaldo Santana, lembra a mosca de Walter Franco. A insistência em fugir da mesmice e bradar suas ideias com voz rascante e violão primo do rock e do blues remete, de alguma maneira, à mosca na sopa de .

45 O cantador Edvaldo Santana está lançando seu sétimo disco, Jataí

O paulistano, filho de nordestinos, já ostenta seu otimismo blueseiro na faixa de abertura, Quando Deus quer, até o diabo ajuda. Depois de dizer que “estava certo que eu era um sujeito que veio no mundo para dar errado”, trata do privilégio de mudar a sina pelo álibi da lua que o inocenta e “o desejo de ser protegido pelo índio rindo em câmera lenta”.

Criticando a alienação da mídia e os podres do mercado e do poder (Nada no mundo é igual, Sem cobiça), encoraja o ouvinte a sair do rebanho (Você pode fazer) e, depois de se definir como “um cara estragado pelo vício e pelo susto” (Amor é de graça), reafirma a independência em Há muitas luas: “Não levo jeito para ser um popstar/ bem que tentei mas foi difícil me enquadrar”.

A voz rouca que lidera um som sem firulas, baseado em violão, guitarra e percussão, busca em exemplos alheios a esperança de um mundo que se salva pela qualidade dos indivíduos. Do jardineiro que tira espinhos das rosas para não machucar as crianças na escola (A poda da rosa) ao amigo que fechava bares com ele, tratando de poesia (Aí Joe), ele celebra a avó e a infância (Eva Maria dos Anjos) e faz uma viagem pelos sabores musicas e pela baixa gastronomia que experimentou nas andanças pelo país (Jataí). E fala da homenagem que Sérgio Sampaio um dia fez para em Sampaio melodia e do samba de raiz de Seu Ico, que tem o violão incluído na faixa.

Com capa de Elifas Andreato, o CD inclui participações especiais do baixista argentino Mintcho Garramone, da cantora Fabiana Cozza, do sanfoneiro Antonio Bombarda e dos teclados de Adriano Magôo e Daniel Szafran. Todos colaborando para aumentar a palheta de cores e ampliar a fluência das faixas. Sem aquela música com jeito de hit de rádio, nem possível tema romântico de novela, Jataí é mais um capítulo coerente na carreira do cantador estradeiro que rima a carreira com integridade.

ESTADO DE MINAS - Sonoridade muito especial

46 O grupo Diapasão lança seu novo CD em apresentação hoje, no Conservatório UFMG

(9/8/2011) Uma das boas surpresas da cena instrumental belo-horizontina nos últimos anos, o quinteto Diapasão lança seu segundo álbum, Ao vivo, no qual está registrada performance do ano passado na Sala Juvenal Dias do Palácio das Artes, na capital mineira. Na apresentação de hoje à noite, no palco do Conservatório da Universidade Federal de Minas Gerais, os músicos tocarão todo o repertório do trabalho: não haverá convidado (o violinista Ayran Nicodemo marca presença no disco), mas há músicas e arranjos novos.

“O disco foi gravado ao vivo e num só take. Foi uma experiência muito forte. A sonoridade é muito especial. Não há aquela qualidade límpida de estúdio, mas o som fica mais verdadeiro do ponto de vista da expressão. Tem coisas que só são possíveis ser gravadas se todos os músicos estão tocando realmente juntos”, observa Leandro César (violão, bandolim e outros), que compõe o grupo com Alexandre Andrés (flautas), Rodrigo Lana (piano), Gustavo Amaral (baixo e bandolim) e Adriano Goyatá (bateria e marimba de vidro).

Atuando naquela seara difícil de rotular, a da música instrumental brasileira, o Diapasão faz música com forte influência das matrizes brasileiras, com espaço, é claro, para que seus integrantes expressem talento em solos e arranjos. “Somos cinco pessoas com histórias musicais diversas, mas parte da nossa escola musical é baseada em , Villa-Lobos, Uakti, , Tom Jobim. Enfim, por mais que cada um caminhe por outros lugares e um esteja mais ligado à música de Philip Glass ou ao Genesis, por exemplo, sempre nos encontramos na música dos brasileiros”.

Suave

À exceção do baterista, todos os integrantes assinam composições no disco, que tem nove faixas. “Alexandre, Gustavo e eu trabalhamos com outros grupos mais na área da canção e estamos sempre criando. Já o Rodrigo compõe pensando mais no Diapasão. Trabalhamos de muitas formas diferentes e isso é muito bom, pois se estamos abertos a receber intervenções, o trabalho fica mais suave, sem rigidez. O processo criativo se dá tanto na criação da música como na hora de estruturar o arranjo. Isso ocorre de forma muito espontânea também”, explica Leandro. (ETG)

Saiba mais

Instrumentos inusitados

47 Outro traço importante da música do quintetoé a colaboração de Leandro como criador de instrumentos inusitados. No disco, ele apresenta o GIG, adaptação de um instrumento criado pelo músico Marco Antônio Guimarães, mentor do Uakti. “Cada dia que passa surge um novo instrumento e minha casa já está ficando superlotada. O GIG ficou muito legal. Num dado momento ficam só ele e o piano e, com isso, criamos uma atmosfera muito diferente. Esses instrumentos abrem essa possibilidade de levar a um lugar completamente novo, mas precisam de horas e horas de estudos para atingir expressão bacana”, diz.

FOLHA DE S. PAULO - Criador e Criaturas

Principal produtor musical dos anos 2000, Kassin lança primeiro CD solo MARCUS PRETO

DE SÃO PAULO

(9/8/2011) Era 1984 -um ano antes do primeiro Rock in Rio. Kassin tinha dez anos e morava com os pais no apartamento 306, terceiro andar de um prédio da rua República do Peru, Copacabana.

Exatamente embaixo dele, no 206, vivia o casal de compositores Edson e Tita Lobo. Ele, também um baixista -dos melhores surgidos com a bossa nova, na virada dos 50 para os 60. Ela, violonista e cantora.

Recebiam em casa, quase todas as noites, outros artistas ligados àquele movimento -que, então, estava longe de fazer parte da programação regular das rádios. E os saraus, animados, rolavam noite adentro.

Aluno de Edson, Kassin começou a frequentar as festas. Levava para as noitadas seu gravadorzinho de rolo e registrava toda aquela música. Era, ainda que ele não soubesse disso, a primeira incursão no que viria a ser, menos de dez anos depois, a sua profissão.

Hoje, aos 37 anos, ele é o principal produtor musical do país. Se o conceito "melhor" soaria por demais subjetivo, Kassin pode ser chamado, sem erro, de "o mais requisitado". É também aquele com maior trânsito entre o universo independente e o mainstream.

Pilotou trabalhos de e de Mallu Magalhães, de Vanessa da Mata e de Totonho e os Cabra, de Los Hermanos e de Ana Carolina. Neste ano, entrega o novo da Nação Zumbi.

É com essa longa e eclética experiência prévia que ele coloca agora nas lojas seu primeiro álbum solo, "Sonhando Devagar".

Esse não é, no entanto, o primeiro trabalho em que se envolve como artista -e não apenas como produtor.

Antes, atuou nos dois discos de Acabou la Tequila, banda que fundou em meados dos anos 1990 e que foi considerada, por Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante, uma das influências do Los Hermanos.

Depois, em 2001, tornou-se o terceiro elemento do trio +2 (que acabou neste ano), ao lado de Domenico Lancelotti e Moreno Veloso. Na sequência, virou um dos quase 20 membros da Orquestra Imperial, em que atua até hoje.

No meio disso, criou o Artificial, projeto experimental em que usava apenas sons de jogos eletrônicos. Sob a alcunha Artificial, também lançou um CD.

"Por eu ter vontades estéticas diferentes, acho um pouco injusto convidar alguém para 'o show do Kassin' e, quando ele chega, só toco 'gameboy' no palco", diz. "Optei por chamar de Kassin só meus trabalhos que envolvem canções."

Ele afirma que não tem nenhuma vontade de seguir uma carreira de cantor. Tem muito mais prazer em conseguir realizar um álbum -dele ou de outra pessoa- do que em encarar o cotidiano dos palcos.

48 GERAÇÃO 2000

Por sua aparição cada vez mais frequente em fichas técnicas de álbuns desde a estreia como produtor, em 1996, Kassin acabou por imprimir sua marca na geração 2000.

O que há de mais importante, esteticamente, nesses novos artistas -e a sonoridade que seus trabalhos trouxeram? Em que eles de fato colaboram para a evolução da nossa tradição musical, historicamente tão rica?

Segundo Kassin, a identidade de cada época é relacionada às mudanças tecnológicas. Bateria eletrônica: anos 80. Samples: anos 90. E assim por diante.

"O surgimento de novas coisas vai dando a cara e o jeito de fazer música durante um tempo. Hoje em dia, pouca coisa tecnológica é inventada. O que temos de mais novo é a possibilidade de muitas edições, de misturar isso."

Quanto a ter de lidar com o peso do passado da música brasileira, Kassin diz que se sente "no mesmo caldeirão" de Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento e de todos os nossos medalhões. Nem mais, nem menos.

"Não me sinto inferiorizado por ninguém", diz. "Ou melhor: só me sinto inferiorizado pelo Jorge Ben, que é o grande e supremo orixá da música brasileira."

É que tudo o que produziu até hoje, ele diz, vem das memórias do apartamento de Edson e Tita. Mesmo os trabalhos mais roqueiros.

"Quando eu penso em fazer rock, quero que soe que nem aquilo", diz. "João Gilberto é o Kraftwerk do Brasil -uma estética imutável por 50 anos que se mantém fresca por todas essas décadas. Quem não quer soar assim?" RAIO-X

ALEXANDRE KASSIN

VIDA Nasceu em 1974, no Rio de Janeiro, onde vive até hoje

BANDAS EM QUE TOCOU Nos 1990: Acabou la Tequila Nos 2000: +2, com Moreno Veloso e Domenico Lancelotti

BANDA EM QUE TOCA Orquestra Imperial

EM TURNÊ É baixista da cantora Vanessa da Mata

CRÍTICA POP: Com justaposição de elementos, Kassin se inspira em estado de sonho

RONALDO EVANGELISTA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Os sentidos adormecidos, a percepção ainda livre de influências exteriores, aquela momentânea incerteza sobre o que é real e o que é imaginado: nossa sensibilidade fica aguçada de maneira muito particular quando acordamos, envolvendo o ritmo do mundo em estado de sonho.

Esse espírito difuso, leve e agradável, dos nossos primeiros momentos despertos, parece ser o registro em que existe "Sonhando Devagar", o primeiro disco solo de Kassin -ou segundo, ou terceiro, ou quarto, dependendo de onde se começa a contar.

49 "Eu sonhei" são as primeira palavras do disco, e a ideia permeia letras e inspirações, liberdade conceitual de cantar sobre calças de ginástica, bolhas de sabão, bebês no sofá, suor e sorvete, câimbras noturnas e mioclonia.

Ironia bem-humorada e psicodelia tropical, brincando com o absurdismo de literalidades, trava- línguas, oposições, inversões, malandragem, detalhismo espirituoso, excentricidade divertida -a mesma abordagem heterogênea e espontânea para conceitos e para sons.

Cruzando timbres de discos brasileiros dos anos 70 com pop japonês, bolero e samba-rock com indie e eletrônico experimental, música doce sobre sangue de foca e discopunk safada, Kassin funciona no encontro, no atrito, na confluência.

Se no mundo nada se cria e nada se perde, tudo se transforma, o mais interessante da obra do produtor e compositor é ver seu talento alquímico de transmutação de material bruto em pequenas pérolas pop de sofisticação casual. A ponta da criatividade nas recombinações, a justaposição de elementos já em si uma nova criação.

CORREIO BRAZILIENSE - Alternativos e independentes

Distante do centro de Brasília e com poucos espaços para shows, a cena do rock é marcada pela união e pela persistência.

(10/8/2011) Engana-se quem pensa que a vocação para o rock está restrita ao coração do Distrito Federal. Ao redor de Brasília, a música pode até carecer de algum incentivo, mas sobrevive com bom humor, criatividade e, é óbvio, muito barulho. É o caso dos meninos do Ramasth, banda sediada no Riacho Fundo 1. Iniciado em 2009, o grupo gira em torno dos pesados acordes do death, trash e heavy metal e concentra integrantes de várias praças. Enquanto Eduardo (bateria) e Wellerson, o Maníaco (baixo), vivem na cidade, Ângelo (guitarra) vem do Riacho Fundo 2 e Wallan (vocal), da Candangolândia. E as apresentações também seguem um itinerário de várias paradas.

“Tocamos em outros lugares, como Planaltina, Gama, Ceilândia. Temos que ir correndo atrás. Com o contato com outras bandas, fica mais fácil conseguir mais espaços”, diz Ângelo, o caçula da família Ramasth, com apenas 19 anos. A média de idade do conjunto não passa dos 22. Em busca de outro guitarrista, para deixar o som mais carregado, o quarteto ensaia a partir das letras de Wallan e dos arranjos de Ângelo, que entrou como baixista e depois passou para a guitarra. Hoje, ele contribui com ideias para os dois instrumentos. Os integrantes ainda não gravaram nenhum trabalho em estúdio, mas já têm uma demo de quatro músicas, Território sobre a guerra.

"É uma grande batalha mesmo", define Lucas Alencar, vocalista da banda Zilla. Já conhecidos em Planaltina, cidade que abriga o death metal melódico do grupo desde 2002, os membros precisam vencer longas avenidas e estradas para serem ouvidos. No fim de julho, percorreram algumas dezenas de quilômetros até Brazlândia, para participar do pequeno festival Ovo Rock. "Apesar da distância, tanto para show quanto para ensaio e gravação, a gente está bem satisfeito com o resultado", observa Lucas.

50 Ao lado dos guitarristas Roberto Bodão e Mark Nagash, do baterista Glauco e do baixista Wagner Zói, ele lançou o disco Pragmatic evolution (independente, 11 faixas), em maio do ano passado. Mais recentemente, a Zilla acabou de finalizar o videoclipe da faixa Inner vision, dedicada aos fãs. Para o frontman, o reconhecimento na cena só vem com trabalho e movimentação pelo circuito. "Sei que as coisas andavam meio estagnadas em Planaltina até pouco tempo atrás. Mas agora está retornando com força total, com eventos e oportunidades para grupos locais e de outras cidades. A seletiva do Porão do Rock, no ano passado, que levou a gente para o festival, deu uma animada no pessoal", destaca.

Prova da diversidade de Planaltina é a sonoridade da descontraída The Nóis (foto abaixo): um quarteto de punk que não despreza os ritmos brasileiros. Por isso, os fixos Marley (bateria e vocal), Luciano (baixo) e Alex (guitarra) juntaram-se ao percussionista Rogers Jonathan. "Ele entrou há pouco tempo, para tentar dar uma cara nova", detalha Marley. Fundado em 2008, o grupo também investe em shows performáticos. "O Luciano é ator e está trazendo essa referência para o palco, com máscaras e caracterizações", conta o baterista. Ele e Luciano são os "vovôs" da turma, com 21 anos.

Desde que começou a arranhar os primeiros acordes, em 2005, a banda Dias Melhores, ironicamente, não teve vida fácil. Membros voláteis iam e vinham e o grupo foi perdendo fôlego. Ainda capitaneado pelos fundadores Wesley Schneider (bateria) e Allan Barros (baixo e vocal), o conjunto do Guará reviveu no ano passado, com a chegada de Daniel Macedo (guitarra e backing vocal) e Caio Cesar (guitarra e backing vocal). Cesar garante: "A gente está percebendo mais cumplicidade entre todos".

Com versos sobre amizade e amor, os integrantes gravaram um EP demonstrativo de sete faixas, de título homônimo. E já planejam um disco de 10 canções. "A gente tem um home studio, do Wesley. Nós mesmos gravamos e mixamos. Às vezes fica inviável entrar em estúdio, é caro. E optamos por, primeiramente, fazer algo nosso, com a nossa cara e, se possível, do nosso jeito", diz o guitarrista.

O nome pode até soar como um paradoxo: Senhores do Nada. Pelo contrário. O quarteto de rock alternativo de Brazlândia coordena timbres de todos tipos e origens. Levam para o palco influências da MPB, como Belchior e Milton Nascimento, do pop, do Los Hermanos, do reggae e do rap. Anderson (bateria), Sóstenes (guitarra e vocal), Vitor (guitarra e backing vocal) e Bruno iniciaram os trabalhos do grupo, reunido em 2009. São eles que finalizam as plataformas de divulgação e as primeiras demos.

51 As apresentações só saem por conta própria. "O último Ovo Rock, em que tocamos, teve apoio da administração regional, mas normalmente não é assim. A gente mesmo tem que montar equipamento. É bem complicado. Aqui não tem espaço para a galera do rock. Só se consegue na choradeira. Se as bandas não fizerem nada, não acontece nada", explica Anderson. E elas só querem mesmo é ser ouvidas.

CORREIO BRAZILIENSE - Palco acolhedor

Com carreira iniciada ao lado do pai, Egberto, o violonista Alexandre Gismonti pisa pela primeira vez no Clube do Choro para interpretar temas autorais e de compositores nordestinos

Irlam Rocha Lima

Alexandre Gismonti tem profunda admiração pelo trabalho de formação do Clube do Choro de Brasília

(10/8/2011) Consagrados músicos brasileiros têm participado com frequência de projetos do Clube do Choro de Brasília. Eventualmente, entre os convidados da direção da casa, há jovens e talentosos instrumentistas. A atração desta semana — de hoje a sexta-feira, às 21h — é Alexandre Gismonti, violonista que, na companhia do contrabaixista acústico Mayo Pamplona e do percussionista Felipe Cotta, apresenta-se naquele espaço pela primeira vez.

Bacharelando em violão pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Alexandre conta que o grande aprendizado, em seu ofício, foi obtido nos palcos do Brasil e do exterior — levado pelo pai, Egberto Gismonti, nome representativo da vanguarda musical no país. “Tinha 15 anos quando toquei com meu pai pela primeira vez no Rio. Depois disso, eu me apresentei com ele em teatros na América do Sul, na América Central, nos Estados Unidos, na Europa e no Oriente Médio”, lembra.

“Egberto foi gestor do meu contato com a música profissionalmente. Na convivência artística com ele, o interesse pela música foi se intensificando e passou a dar sentido ao trabalho que comecei a desenvolver a partir da adolescência. Tenho profunda gratidão por meu pai, por seus ensinamentos”, afirma. Outras importantes referências para Alexandre são compositores nordestinos de diferentes gerações, entre os quais , , e Lenine.

Gilberto Gil, aliás, assina texto na contracapa de Baião de domingo, o primeiro CD solo do violonista, lançado em 2010, pelo selo carioca Fina Flor. No álbum em homenagem a Dominguinhos, ele criou versões personalíssimas para Ainda me recordo (Pixinguinha e Benedito Lacerda), Asa branca (Luiz Gonzaga), Feira de Mangaio () e Saudades da Bahia (Dorival Caymmi).

Ascendência nordestina “Quis também nesse disco, produzido por Ruy Quaresma, que gravei com meu trio, mostrar meu lado de compositor e incluí no repertório o choro-canção Saudades, Chora Antônio, Arrasta-pé, Forrozinho e o tema-título. Embora seja nascido no Rio, tenho ascendência nordestina muito forte (a mãe dele é a potiguar Rejane Medeiros) e, por isso, o meu gosto por ritmos daquela região”, explica.

52 Anteriormente, em 2009, Alexandre havia lançado pela gravadora alemã ECM, no Canadá, nos Estados Unidos e na Europa, o CD Saudações, que gravou em duo com Egberto. “Esse trabalho, que ainda não chegou ao mercado brasileiro, traz músicas inéditas do meu pai, e Chora, Antônio!, que fiz e dediquei a meu bisavô, o primeiro compositor da família”, revela.

Entre abril de 2010 e fevereiro deste ano, Alexandre fez uma série de concertos intercalados em teatros do Canadá, dos Estados Unidos e da Inglaterra pelo projeto International Guitar Night, ao lado de outros três violonistas: o norte-americano Brian Gore, o italiano Pino Forrastiere e o inglês Clive Carroll. “Esse projeto existe há 15 anos e dele já participaram, a convite do idealizador, Brian Gore, os brasileiros Guinga, Marco Pereira e Paulo Belinatti”, diz.

No roteiro do show pelo projeto Clube do Choro do Brasil, Alexandre Gismonti incluiu músicas do Baião de domingo e outros temas, todos com características de estilos brasileiros, harmonicamente bem elaborados e com afinações diferentes. “Estou na maior expectativa em relação a essa rápida temporada num lugar que conheci e passei a dar importância, assistindo pela tevê a apresentações de grandes músicos. O trabalho didático, realizado pela Escola de Choro, é digno de aplausos”, elogia.

CORREIO BRAZILIENSE - Serginho do Brasil

Serginho Meriti canta hoje no Feitiço Minieiro e amanhã na Aruc

(10/8/2011) Serginho Meriti tem mais de 200 músicas gravadas por cantores como Roberto Ribeiro, Bezerra da Silva, Martinho da Vila, Arlindo Cruz, Bebeto, Leandro Sapucahy, Elza Soares e . Mas o que o fez conhecido — e reverenciado — pelo grande público foram os sambas Quando eu cantar (Iáiá Iáiá) e, principalmente, Deixa a vida me levar — grandes sucessos na voz de .

Cantor e compositor nascido em Madureira (subúrbio do Rio de Janeiro) e criado em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, Serginho é a atração do projeto Feitiço do samba, que Makley Matos comanda no Feitiço Mineiro, às quartas-feiras. Hoje, às 22h, os dois estarão no palco do bar e restaurante da 306 Norte, acompanhado por grupo liderado pelo violonista e cavaquinista Evandro Barcelos; e amanhã, às 20h, voltam a se juntar na Aruc (Cruzeiro Velho), pelo projeto Karrapixo cultural.

Serginho herdou o DNA artístico dos pais, Seu Felibino e Dona Nair. Ainda na infância, já tirava os primeiros acordes do violão. Cresceu num ambiente musical e, em 1976, já encaminhado na carreira, lançou pela gravadora Tapecar um compacto, ao lado do parceiro Carlinhos PQD, com a música Balanço do mar. À época integrava a banda de baile Copa 7, na qual tocava samba e gafieira.

Quem o fez conhecido no meio foi o cantor Bebeto, que, no auge da carreira, gravou nada menos que 36 músicas de Serginho. Só num disco foram registradas 11. Diretor da Polygram (atual Universal Music), Roberto Menescal levou o cantor para a gravadora, pela qual lançou dois discos, um deles com a participação de Leci Brandão. Frequentador da Mangueira desde a adolescência, morou por algum tempo na comunidade, foi convidado por Ivo Meirelles para integrar a ala de compositores da escola.

Em suas andanças pelas rodas de samba no subúrbio do Rio, conheceu o compositor Beto Sem Braço — autor, com Aluísio Machado, do samba enredo clássico da Império Serrano Bumbum paticumbum prugurundum — no Cacique de Ramos. Serginho e Beto compuseram Quando eu contar que, gravada por Zeca Pagodinho, transformou-se no primeiro sucesso do cantor.

53 Mesmo totalmente envolvido com o samba, Serginho teve passagem pelo reggae — no mesmo período em que frequentava o Cacique de Ramos — e integrou a banda Diaop, que fez apresentações no Circo Voador, na Lapa e gravou o álbum Retratos da vida. Foi quando participou da gravação de um clipe de Jimmy Cliff — o primeiro feito no Brasil.

Serginho está finalizando seu quinto disco, produzido por Leandro Sapucahy. Morando em São Paulo, atualmente, comanda o projeto Conexão do samba, na comunidade da Vila Catarina (Zona Sul da capital paulista). O compositor faz questão de destacar que Deixa a vida me levar conquistou o Grammy Latino, em 2003, e o Prêmio Tim de Música, em 2004, como melhor samba.

ESTADO DE MINAS – Identidade assumida

Carolina Braga

A banda Forfun não esconde: com Alegria compartilhada, está surfando a onda do otimismo

(10/8/2011) Ao ouvir os primeiros acordes de Alegria compartilhada, novo CD do Forfun, fica até difícil acreditar que quando o grupo surgiu, há 10 anos, foi direto para as prateleiras de hardcore. O novo álbum é a prova de que a maturidade amansou e diversificou o som produzido pelo quarteto carioca, formado por Danilo Cutrim (voz e guitarra), Rodrigo Costa (baixo), Vitor Isensee (guitarra, samplers, sintetizadores, teclados, escaleta e vocal) e Nicolas Christ (bateria).

“O primeiro disco é sempre mais visceral, é a banda em seu estágio primário. O segundo já foi mais experimental, flertamos com vários estilos. Quando chegamos para este terceiro, queríamos uma identidade mais resolvida”, conta Vitor Isensee. Pelo que Alegria compartilhada sinaliza, o Forfun está muito mais para o lado do reggae do que para o rock.

Novos tempos A tarefa de delinear a identidade da banda coube ao produtor musical Daniel Ganjaman, que tem na bagagem trabalhos com , Forgotten Boys, Curumin e outros. “Fizemos uma pré-produção ao longo de um ano e meio e mostramos para ele. O Daniel foi o quinto elemento. Trouxe coesão, um novo ponto de vista e teve bom senso para ponderar sobre o que cortar e como lapidar”, completa o guitarrista.

54 As 14 faixas de Alegria compartilhada mantêm, tanto na sonoridade como nas letras – e até na capa assinada pela artista plástica Nelma Guimarães – , a onda otimista na qual a banda tem surfado. “A gente procura focar mais na parte alegre e sublime da coisa”, reconhece Vitor.

A força dos metais e o uso de sintetizadores desenham a pegada reggae predominante no disco. Ela marca presença na faixa de abertura (que batiza o CD) e vai se diversificando à medida que o disco avança com Quem vai, vai, A garça e Comic Jesus , passando à adocicada balada Descendo o rio. Somente em Tropicália digital , Quando a alma transborda e Pra sempre é que as guitarras ganham mais peso. “Ao mesmo tempo em que temos influências urbanas, também dialogamos com a natureza, com o mar. Tentamos fazer um som plural”, detalha Isensee.

Antes de chegar às lojas de disco, Alegria compartilhada foi lançado na internet e os mais de 100 mil acessos derrubaram o site da banda. A ação faz parte da estratégia de lançamento, que também inclui o formato físico, vendido a R$ 10 nos shows. “É uma adaptação aos novos tempos. Já desistimos de remar contra a maré e ganhamos muito mais com isso”, diz.

Depois da investida na internet, o que Vitor Isensee observou é que, quando o Forfun chega a uma cidade, os fãs estão com as novas letras na ponta da língua. O trabalho é assimilado de forma mais rápida e o encantamento virtual revelou a existência de um público cativo. “Essa guinada na sonoridade, na temática das letras nos aproximou ainda mais da galera. Passou a impressão de sinceridade. Agora, temos que estar atentos para não achar que este público é tudo que existe. Ainda temos muito a conquistar”, avisa o guitarrista.

NA REDE

O Forfun faz parte da geração de bandas independentes brasileiras que apostam na interatividade com os fãs. Além do disco disponível para download gratuito, o usuário pode ouvir o álbum e conferir imagens de bastidores e vários videoclipes no site www.forfun.art.br.

ESTADO DE MINAS - Em plena entressafra

Músico mineiro Flávio Venturini fará show amanhã, no Palácio das Artes. Ele aproveita a chance para antecipar o repertório do próximo CD, que deve ser lançado apenas em 2012

Ana Clara Brant

Venturini reúne os novos parceiros e também faz planos para voltar a tocar com a banda 14 Bis

(10/8/2011) O 26º disco da carreira solo será lançado apenas no ano que vem, mas o público que for amanhã à noite ao Palácio das Artes poderá conferir um pouco desse trabalho inédito do cantor e compositor mineiro Flávio Venturini. O músico de Belo Horizonte vai apresentar pela primeira vez na cidade o show que fez sucesso no Teatro Rival, no Rio de Janeiro: Fotografia de um amor, que também dá nome a uma música do próximo CD. No show de amanhã, ele será acompanhado por César Santos (guitarra, violão e voz), Adriano Campagnani (baixo), Enéias Xavier (teclados) e André Godoy (bateria).

55 “O show começa meio rock, depois entra numa fase cool, intimista e aí termina com as canções mais antigas. Estou num período de entressafra, então vou mostrar um pouco do que já fiz e o que virá também”, adianta Flávio. O repertório traz também inéditas, como Estrela submersa e Idos janeiros, da parceria com Vander Lee, que fará uma participação especial no show.

Outros convidados especiais são o irmão Cláudio Venturini e Kadu Vianna, que fazia parte da banda de Flávio e vai cantar Mantra da criação. “Sem falar em Estate, que é uma música italiana que foi imortalizada pelo João Gilberto e é belíssima. Fiz uma viagem recente à Itália e prometi que, assim que voltasse ao Brasil, iria cantá-la”, revela.

Bicho do mato Com um estúdio recém-inaugurado que funciona dentro de sua casa, no Condomínio Retiro das Pedras, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Flávio Venturini acredita que terá mais liberdade para fazer as coisas do seu jeito e investir em novos projetos. Entre eles, uma turnê com os ex-companheiros do 14 Bis, grupo do qual fez parte nos anos 1980. “Desde que deixei a banda, em 1988, nunca mais pus o pé na estrada com eles. Sempre fiz participação em disco, show, mas agora vamos gravar um DVD e rodar o país”, revela.

A intenção de Venturini é resgatar pérolas da banda, especialmente o lado B do 14 Bis. Mas ainda não há previsão de quando isso vai se concretizar, já que recentemente os músicos sofreram um acidente com o ônibus da banda, que causou a morte do assistente de produção Wilson Maciel, de 58 anos.

“Vez por outra também faço show com O Terço, que é o outro grupo do qual fiz parte”, conta Flávio Venturini. “Abrimos a Virada Cultural em São Paulo, recentemente. Acho legal essas participações, porque fazem parte da nossa história, mas isso não significa que é uma volta definitiva”, diz o músico, que é também dono do próprio selo, o Trilhos.Arte, que lançou nomes como Bárbara Mendes, Maurício Oliveira e Cláudio Faria.

Depois de ter morado em São Paulo e 26 anos só no Rio de Janeiro, há seis Flávio Venturini voltou a viver em Minas. E escolheu literalmente um retiro para se refugir. “Sempre fui meio do mato porque morei num sítio em São Paulo, tenho outro sítio em Itaipava, na Região Serrana do Rio, e agora moro num condomínio que é perto da cidade, mas não deixa de ser meio campo. Hoje em dia, com essa coisa de internet, o artista não precisa mais morar no eixo Rio-São Paulo. Vivi um bom tempo no Rio de Janeiro e foi muito importante para minha carreira, mas a cidade não está num momento muito efervescente como antes”, avalia. LIVROS E LITERATURA

CORREIO BRAZILIENSE - O silêncio como força poética

Eugênio Giovenardi: vale a pena se entregar ao silêncio

(4/8/2011 ) A ausência de som permeia situações de convívio, assim como uma conversa banal em uma padaria ou fila de banco. Foi ao pensar “em quantos silêncios existem ao redor da gente”, que o escritor gaúcho Eugênio Giovenardi decidiu usar situações vivenciadas para escrever o livro Silêncio. Este é o quinto romance e o 12º livro publicado, entre estudos sobre a natureza, crônicas e poesia.

A ideia surgiu enquanto ele assistia a uma cena do filme Amor sem escalas, estrelado por George Clooney, na qual há uma pausa no momento em que um dos personagens

56 é demitido. O tema é lançado como um desafio, pois o estado de consciência humana só poderia ser alcançado a partir de uma reflexão silenciosa. Para isso, deve haver um afastamento da balbúrdia diária encontrada nas relações pessoais e no caos urbano.

Essa busca pela quietude não é algo perseguido só pelo protagonista do livro, Pedro Montenor. Ela tem origem na própria vida de Giovenardi, que prefere se refugiar em um sítio afastado da cidade, onde pode ouvir o barulho do vento e das árvores.

Caminhadas

Morador de Brasília há quase 40 anos, ele escolheu as quadras da Asa Sul, onde costuma caminhar, como ambiente e se inspirou em amigos próximos para criar as personagens, pois acredita que o escritor só pode falar daquilo que viveu.

No entanto, o livro não chega a ser autobiográfico, é uma transferência de experiências de vida, que ocorre com naturalidade, destaca ele.

As reflexões de Montenor nos mostram a ode do livro: elucidar a presença do silêncio na vida de todos. Cada personalidade usa o “silenciar” de maneiras diferentes, com aversão como o personagem Leônidas ou com deslumbre e encantamento, caso de Montenor.

Para Eugênio Giovenardi, vale a pena se entregar ao silêncio, pois assim se alcança a autocompreensão e o “esvaziamento” de medos, de fetiches e de tabus. Ao longo do romance é possível perceber a busca pela vivência harmônica com este estado de espírito.

FOLHA DE S.PAULO – Painel das Letras / Itamaraty nas letras

JOSÉLIA AGUIAR

(6/8/2011) Depois de o Ministério da Cultura lançar o novo programa para ampliar a tradução de brasileiros, é a vez de o Itamaraty desenhar sua estratégia. O edital do MinC já começou a ser traduzido e divulgado por embaixadas e consulados de mercados importantes. Nas principais cidades dos EUA e da Europa; mas também em lugares como Atenas, Ancara, Nova Déli, Pequim. Editores e tradutores da Alemanha vêm para a Bienal do Rio a convite do Itamaraty. A vinda para cá de gente das letras será incentivada, até 2013, quando o Brasil é homenageado em Frankfurt. A ida ao exterior de autores que venceram prêmios, como o São Paulo de Literatura, será parte do programa.

O GLOBO - Em voz alta, os excessos de ‘Pornopopéia’

Reinaldo Moraes faz hoje leitura pública de trechos de seu aclamado romance, primeira parte de uma trilogia

Mauro Ventura

(8/8/2011) Experimente abrir uma página de “Pornopopéia” ao acaso. É grande a chance de você dar de cara com baixos instintos e alta literatura, palavrões e palavras bem escolhidas, obscenidades e humor refinado. Tudo em igual medida. Vai ser uma oportunidade e tanto ver esse texto ser lido em público, e na voz do próprio autor, Reinaldo Moraes, como acontecerá hoje, às 18h, no auditório , na Biblioteca Nacional, no Centro.

57 — Num programa em que fui na TV, abri e li qualquer coisa. Na leitura de hoje, as pessoas mais sensíveis podem sair da sala e depois voltar — brinca ele.

O evento, com entrada franca, faz parte do projeto Rodas de Leitura, da Estação das Letras, dirigida pela poeta e ensaísta Suzana Vargas. Dura uma hora e meia. Reinaldo começará lendo as primeiras cinco páginas de seu romance e depois escolherá mais alguns trechos. Em seguida, falará de sua obra e responderá às perguntas. A leitura de hoje tem um subtítulo: “Do gozo ao risco, do risco ao riso.” — É chique pra caramba. Não consigo nem decorar isso — diz ele, que é colunista do caderno Ela.

REINALDO MORAES: escritor, que se apresenta hoje na Biblioteca Nacional, já está escrevendo a segunda e a terceira parte da trilogia iniciada com “Pornopopéia

Deboche e provocação

No romance de quase 500 páginas, Zeca é um cineasta que precisa fazer um vídeo institucional de embutidos de frango e sofre um bloqueio criativo. Sexo, drogas e até assassinato cruzam o caminho desse personagem amoral, desregrado e de uma voracidade sem limites. Suzana explica a seleção do autor para a leitura, que faz parte do ciclo “Literatura, vanguarda e transgressão”.

— Reinaldo é um cara ousado, de uma inteligência fulgurante. O livro faz uma leitura perfeita da sociedade contemporânea. Ele não poupa ninguém, debocha da sociedade consumista o tempo inteiro. Estava faltando uma provocação na literatura brasileira. Está todo mundo sisudo, sério.

Ela explica que o evento começa sempre com o escritor lendo o início de seu livro para que o espectador se situe. — O projeto tem o propósito de levar as pessoas a lerem melhor o livro, é dar a chave de leitura para continuarem a lê-lo. No caso de “Pornopopéia”, ela diz que há outra vantagem em ler o começo: — Se não vira: “Ah, é um livro de sacanagem de Reinaldo.”

E olha que as primeiras linhas não são propriamente desprovidas de baixarias: “Vai, senta o rabo sujo nessa porra de cadeira giratória emperrada e trabalha, trabalha, fiadaputa. Taí o computinha zumbindo na sua frente. Vai, mano, põe na tua cabeça ferrada duma vez por todas: roteiro de vídeo institucional. Não é cinema, não é epopeia, não é arte.

É — repita comigo — vídeo institucional. Pra ganhar o pão, babaca. E o pó. E a breja. E a brenfa. É cine-sabujice empresarial mesmo, e tá acabado. Cê tá careca de fazer essas merdas. Então, faz, e não enche o saco.” “Pornopopéia”, lançado pela Editora Objetiva, foi um dos livros brasileiros mais elogiados pela crítica nos últimos anos. Como disse o crítico literário Roberto Schwarz: “O que me impressiona no ‘Pornopopéia’ é a combinação de registro chulo com escrita elaborada e inventiva, resultando uma peça inteiramente nova na literatura brasileira.” Reinaldo está escrevendo agora outros dois romances. Um tem o título provisório de “A travessia de Suez” e está previsto para sair no fim de 2012, também pela Objetiva. O outro está pela metade e ainda vai levar uns dois anos até ser concluído.

— “A travessia de Suez” trata de um sujeito que morre e resolve contar os episódios mais relevantes de sua vida a um médium terreno que se encarrega de psicografar o material — antecipa. — Um detalhe distingue de forma radical esse relato de vida de qualquer outro: é que o espírito tagarela descobre, ao adentrar o Paraíso, que foi uma encarnação de Deus em vida. Da mesma forma que Jesus. Só que aquele sabia que era Deus, ou filho do Homem, o que para efeitos práticos dá no

58 mesmo, e o meu novo personagem não tinha a menor ideia desse fato. Foi Deus e não sabia disso, até desencarnar. O outro livro fala de um viúvo, sessentão, fiscal de renda aposentado.

— Ele tem uma vida altamente desinteressante e burocrática, até que se mete com uma mulher que o leva para uma espiral de loucura e crime que vai acabar no México — explica Reinaldo, dizendo que a obra faz parte da coleção “Amores Expressos”, da Companhia das Letras.

Três momentos do humano

Ele se deu conta de que está escrevendo uma trilogia. — São três momentos do humano. Vou sair do malandro em acelerada decadência, que derrete as regras, de “Pornopopéia” para o sujeito imbuído de uma superioridade avassaladora de “A travessia de Suez”. E daí hei de pular para o famoso e meio esquecido homem absolutamente comum do livro em boa parte passado no México, ou seja, eu, tu, ele. Ele explica que os três são narrados em primeira pessoa.

— Além disso, tem outra coincidência: o narrador conta a história para outra pessoa. No caso da “Travessia”, ele está fazendo uma transmissão mediúnica para um psicógrafo na Terra. No do México, ensaia escrever um romance, porque participa de um curso de narração criativa. E, em “Pornopopéia”, o esquema narrativo leva as experiências de vida de Zeca a caírem no colo de um escritor que jamais dá as caras. Se o leitor é levado a se indagar o quanto as peripécias contadas pelo narrador teriam sido manipuladas pelo escritor, fica implícito que há uma realidade por trás de tudo aquilo. A questão é saber com que grau de fidelidade ela está sendo passada para o papel. ■

CARTA CAPITAL - Estrela por acaso

PROTAGONISTA Símbolo de um sonho cinematográfico naufragado, Eliane Lage diz ter exercido seu papel de maneira desconfortável, apenas por desejo do marido

POR ORLANDO MARGARIDO

Rejeição ao mito. Livro - analisa a atriz nos anos 50, quando a vida ao lado dos filhos lhe atraía mais

(8/8/2011) A MEMÓRIA do cinema brasileiro associa a companhia Vera Cruz ao sonho. E, a esse devaneio, alguns poucos rostos simbólicos. Tônia Carrero representou a empreitada sem hesitar. Mas Eliane Lage caminhou na direção oposta, reticente no papel. Poucas intérpretes do período foram tão destituídas de vaidade cênica quanto ela, por mais que o sistema ainda carente de estrelato teimasse em lhe exigir o contrário. Linda, jovem e descoberta no cerne de uma tradicional família carioca, Eliane caracteriza a trajetória da companhia cinematográfica que se pretendeu a nossa Hollywood em todo o seu encanto e desencanto. As duas estrelas surpreenderam ao surgir e espantaram o público quando subitamente deixaram a cena. A diferença é que Eliane assim o quis.

Aos 83 anos, com cinco filmes realizados na década de 1950, uma autobiografia, um documentário e um livro a seu respeito, a atriz nunca titubeou ao negar um personagem construído à sua revelia, não com algum desconforto e embaraço. "Fiz por amor a um homem, nunca quis ser estrela", reitera a CartaCapital por telefone, com a voz tranquila e firme, sem inquietude, do Rio de Janeiro, em um dos

59 poucos momentos nos quais não está em Pirenópolis, seu refúgio goiano há anos. O homem em questão é o argentino de origem inglesa Tom Payne, um dos diretores que o empreendedor paulistano Ciccillo Matarazzo e o produtor italiano Franco Zampari importaram para a Vera Cruz. Foi ele quem a descobriu na casa de Yolanda Penteado, mulher de Ciccillo, amiga de família e espécie de guardiã de Eliane, ao sugerir um teste para Caiçara, título de estreia dos estúdios de São Bernardo. A partir dessa produção em Ilhabela, a estreante deixou-se levar, ao que diz por uma paixão imediata, a uma carreira inesperada e a um casamento na tela e fora dela.

"Fiz tudo por amor a um homem" é a frase continuamente repetida por ela durante a conversa. Até durante a separação, em 1966, e nas épocas difíceis, Eliane diz que sempre amou Payne. Sua estreia e a união do casal em 1951, um ano depois de finalizado Caiçara, acirrariam a curiosidade da imprensa por uma filha de herdeiro de companhia de navegação, mãe inglesa, nascida na Paris onde residia a avó paterna e criada no Rio, entre internatos cariocas e europeus.

Quando Jorge Lage, seu pai, separou-se de Margareth Hodge, esta voltou à Europa e deixou a menina aos cuidados de uma governanta na casa de Henrique Lage, seu tio-avô. Eliane fala dessa época com resignação, sem aparentar raiva ou rancor, mesmo distante do convívio materno por decisão da própria Margareth. Descreve com naturalidade sua residência em uma ilha de propriedade da família, onde cresceu até ingressar, aos 7 anos, num tradicional colégio carioca. Nesse período também frequentava a fazenda de Yolanda Penteado, incentivadora das artes plásticas, em São Paulo. Os encontros esparsos com a mãe se efetivaram apenas quando esta, já novamente casada com um diplomata, foi obrigada a permanecer na capital fluminense por causa da Segunda Guerra. Com Margareth, Eliane voltará mais tarde à Europa para novo ciclo escolar e trabalhos voluntários com vítimas de guerra, experiência que utilizará no retorno ao Rio, sozinha e disposta a trabalhar.

Apesar do percurso incomum para uma adolescente, Eliane constituiu um refinado modelo social de sua época, diverso da origem da maioria dos atores e atrizes. Em parte isso contava na opinião de Yolanda, contrária ao casamento com Payne. Ela chegou a ordenar que trancassem a protegida em seu quarto de Ilhabela para evitar o assédio do diretor. Também influenciava a diferença de idade, ela com 20 anos e ele com 35, além de Payne ser visto como um aventureiro.

Para Eliane, apenas a paixão explicava ter o rumo de sua vida alterada. "Eu voltava da Europa ao Rio naquele momento para fazer trabalho social no Morro Santa Marta, preocupada em buscar algum ofício para mim. Não pensava em casar e muito menos em trabalhar no cinema", lembra a atriz. Devido a um divórcio de Payne, casaram-se por procuração no México, e comemoraram com os colegas no set gaúcho de Angela, o filme seguinte da companhia, assumido por ele depois que Eros Martins Gonçalves deixou a direção. Havia sido ideia de Yolanda, mais uma vez malograda, enviar Eliane às filmagens em Pelotas para assim conseguir separá-la de Payne.

Essa trajetória romanesca da atriz é rememorada no livro Yes, Nós Temos Bananas (Alameda, 376 págs., R$ 72), de Ana Carolina de Moura Delfim Maciel, assim como o início do estrelato, a colaboração em cinco produções e a desistência das câmeras. Resultado da tese de doutorado da autora, o volume contextualiza Eliane no projeto Vera Cruz, suas intérpretes, e propõe repensar as razões do declínio dos estúdios, a exemplo das dificuldades de gestão, da distribuição e exibição. Ana Carolina vê a companhia pelo viés de suas figuras femininas na tela, a exemplo de Vera Sampaio, coadjuvante em Caiçara, Tônia Carrero, Marisa Prado, e a própria Eliane, a quem a autora dedicou um curta documental em 2008. "Acredito que ainda hoje o saldo da Vera Cruz possa ser visto como positivo, com seus 18 longas", diz Ana Carolina a CartaCapital. "Um fato pouco lembrado é que os filmes, mesmo depois do fim da empresa, foram por muito tempo exibidos no exterior, o que atesto no livro com os recibos de rendas da época."

A visão sobre as demais atrizes é ressaltada como contraponto ao caso singular de Eliane, desprendida do universo da badalação. "Eu e Tom não frequentávamos o mundo artístico, a vida noturna. Preferíamos ficar em casa." Casa, em um primeiro momento, se restringia a alojamentos adaptados no antigo galinheiro do terreno da Vera Cruz, onde funcionou antes uma granja de Ciccillo. Depois, quando o casal se transferiu para um sítio próximo a Cotia, consolidou-se a imagem de uma mulher ligada ao cultivo da terra, a criar animais e a se dedicar aos filhos Tom Payne Jr., o Tommy, Vanessa e Vivien, a ponto de insistir em sua preferência a eles do que aos filmes cobrados pelo marido.

60 Estes se sucederam, seja uma ponta em Terra E Sempre Terra (1951), seja protagonista em Sinhá Moça, seu maior sucesso. Embora Eliane relativize a existência de uma imprensa dedicada a assediar os famosos do período, um dos temas preferidos de títulos como Cinelândia e A Cena Muda era a composição entre o glamour da tela e a vida bucólica da atriz. É dessa atitude detectada no livro, aliás, que veio à autora o título escolhido para o volume, frase atribuída ao jornalista e crítico de cinema Salviano Cavalcanti.

Mesmo quando o assunto era a análise dos filmes em que atuava ou sobre sua interpretação, Eliane diz não ter tido interesse em acompanhar os desdobramentos. "Como não aspirava a ser uma atriz e muito menos pensava em talento, pois isso para mim fazia mais sentido no teatro, eu apenas via tudo como uma incumbência dada pelo meu marido, que me orientava para tanto." Da mesma forma, manti-nha-se distante das crises na companhia. "Ele, sim, era mais atuante. Ia ao governo reclamar das altas taxas de importação dos negativos, dos preços do material necessário para fazer cinema. Chegou a se encontrar com Getúlio (Vargas)."

Muitas dessas reflexões estão presentes na autobiografia Ilhas, Veredas e Buritis, lançada em 2005. Nela, a atriz procura quebrar certo imaginário de reclusão que lhe passou a ser atribuído a partir da falência da Vera Cruz em 1954, e de modo mais incisivo com seu último filme, Ravina, quatro anos depois. A produção é um objeto peculiar na trajetória da intérprete. Enquanto Payne tentava se manter no cinema, dedicando-se a produções de outras companhias, a exemplo de Arara Vermelha (1957) na Maristela, o casal se transferiu para o Guarujá, onde certo dia surgiu o crítico Rubem Biáfora para convencê-la a protagonizar sua estreia na direção.

As dificuldades financeiras seriam determinantes na acolhida ao convite, mas a distância do marido, com quem se acostumara atrás das câmeras, e o estranhamento com a história de Ravina e o estilo de Biáfora a incomodaram. "Apesar de ele dizer que escreveu o filme para mim, foi uma situação de tensão constante e nunca gostei do resultado", avalia ela, que prefere Sinhá Moça. "O Biáfora não inspirava confiança como diretor e montou uma colcha de retalhos com cenas do cinema do qual gostava, como as de Morro dos Ventos Uivantes. Fez tudo, ali, menos um filme brasileiro genuíno." Também não deu provas de satisfação com o trabalho dos atores. "Nem fomos chamados a fazer a dublagem, como era comum na época." Não é difícil crer que o desapontamento com Biáfora seria mais uma razão a afastá-la das telas, lugar onde não escolheu estar. A separação de Payne, morto em 1996, a levaria em definitivo para a vida de fazendas, território de infância, e à histórica Pirenópolis, onde atende curiosos e fãs, sempre gentil: "É natural esse percurso porque condiz com a minha formação". Ela rejeita, assim, qualquer traço de negação ao convívio, o que sua presença na noite de lançamento de Yes, Nós Temos Bananas, em 26 de setembro, no Bar Balcão, em São Paulo, deverá confirmar. •

FOLHA DE S. PAULO - Livro sobre governo Lula não será chapa-branca, diz Morais

BERNARDO MELLO FRANCO DE SÃO PAULO

(9/8/2011) O biógrafo de Olga Benário, Assis Chateaubriand e agora vai assinar a história oficial do governo Lula (2003-2010).

Autor de best-sellers premiados, Fernando Morais foi convidado pelo ex-presidente para organizar um livro sobre seus dois mandatos.

Ele diz que o modelo da narrativa ainda não foi definido, mas deixa claro que a obra reproduzirá sua simpatia pelo protagonista.

"Estou muito animado. Gosto do Lula, fiz campanha para ele. É um personagem fascinante, que pôs o Brasil em outro patamar", exalta.

"Ainda é cedo para avaliar o seu governo na História, mas acho que nossos tatarenetos vão se lembrar do Getúlio Vargas e do Lula."

61 Apesar dos elogios, Morais, que pediu votos para a presidente Dilma Rousseff no ano passado, promete evitar um relato ufanista da administração do amigo.

"Não será um livro chapa-branca, como os programas do Amaral Netto sobre os feitos da ditadura militar", diz ele. "Nem acho que o Lula queira que eu faça isso."

Na semana passada, os dois conversaram sobre o projeto em almoço no Instituto Cidadania, em São Paulo. Entre pratos de feijão de corda, combinaram novos encontros a partir de setembro.

Lula sonha com um livro em que brasileiros ricos e pobres contem como a vida teria mudado -para melhor, claro- em seu governo.

Morais não conseguiu convencê-lo a dar um depoimento em primeira pessoa, e agora busca outra fórmula para contar bastidores da gestão.

Não está decidido se o livro será oferecido a uma editora ou publicado pelo futuro Instituto Lula. Por ora, o desafio do autor é encontrar brechas na nova agenda de político e palestrante internacional do ex-presidente.

"É difícil, porque o homem não para. Está hiperativo."

O projeto atropelará duas biografias inconclusas de Morais: do ex-senador Antonio Carlos Magalhães e do ex-ministro José Dirceu, que também é seu amigo.

"Esta foi interrompida pelo fim do mandato dele", comenta, numa referência sutil à cassação do petista acusado de chefiar o mensalão.

VEJA - Um continente com pés de barro

Uma dupla de jornalistas faz um exame rigoroso da trajetória de grandes símbolos da esquerda latino-americana. Todos se revelam promotores do atraso e do autoritarismo

(10/8/2011) Nem opiniões, nem expressões de proselitismo político ou construtos ideológicos, mas fatos: tal é a matéria-prima do recém-lançado Guia Politicamente Incorreto da América Latina, escrito a quatro mãos pelos jornalistas Duda Teixeira (colega de redação, mas sem nenhuma relação de parentesco com o autor desta resenha) e Leandro Narloch. Três exemplos eloqüentes: em 1959, o revolucionário argentino Che Guevara comandou fuzilamentos sumários de opositores na fortaleza de La Cabaña, em Cuba — fato. O general Simón Bolívar, chamado "o libertador" por seu papel na independência de vários países sul-americanos, tinha fortes tendências autoritárias e temia a ascensão política de negros e pardos — fato. Os principais líderes das revoltas que ensanguentaram o Haiti no fim do século XVIII eram negros, mas não mostraram interesse em extinguir a escravidão — fato. São todos dados da realidade, atestados em documentos históricos. No entanto, não será de bom-tom enunciar essas singelas verdades nos círculos ditos "progressistas". A correção política que o título do livro afronta provocativamente determina que revolucionários são agentes iluminados da justiça social e portanto não fuzilam ninguém (pelo menos, ninguém que não mereça ser fuzilado), que os libertadores libertam (a correção política é assim mesmo: tautológica) os povos do jugo colonial e estão isentos de qualquer laivo tirânico e/ou racista, e que um povo oprimido — no caso, os negros haitianos — será sempre somente vítima, jamais um promotor da opressão. O Guia de Narloch e Teixeira é o livro certo para romper essas idiotices que se tornaram consenso.

Leandro Narloch já é um bem-sucedido iconoclasta: seu Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, há oitenta semanas na lista de mais vendidos de VEJA, é um dos maiores fenômenos editoriais recentes, com 200 000 exemplares comercializados. Editor assistente de VEJA, Duda Teixeira trouxe a este novo Guia sua profunda experiência em assuntos latino- americanos. Já entrevistou cinco presidentes do continente e fez reportagens de fundo em Cuba e na Venezuela, entre outros lugares refratários à democracia. Os dois produziram uma ágil reportagem histórica. Os temas e personagens do livro são do passado, mas só foram trazidos à análise pelo que representam para a mitologia corrente da esquerda. Essa dupla inserção na história e na atualidade fica patente no

62 capítulo dedicado a Simón Bolívar: o que se está desmontando pelo exame da biografia do libertador é o mito (ou, mais propriamente, a farsa) que o ditador venezuelano Hugo Chávez montou em torno dele. O herói de Chávez é um líder anti-imperialista mestiço e socialista. O Bolívar histórico era um membro da elite branca, de ascendência espanhola, que temia a instauração de uma "pardocracia" (governo de mestiços) nos países por cuja independência lutava.

A ideia de uma identidade latino-americana é desmontada já na introdução. Os autores lembram que o conceito de América Latina só foi inventado na segunda metade do século XIX, pelos franceses: Napoleão III queria aumentar sua influência sobre o continente, e para tanto era útil enfatizar um laço cultural — as línguas latinas — que distinguia o sul da América de seus vizinhos anglofônicos do norte. Ao longo do século XX, o conceito ganhou contornos ideológicos inflamados: a tão propalada "identidade latino-americana" se construiu em oposição ao "imperialismo" dos Estados Unidos. A cultura local, observam os autores, só tinha validade na medida em que se erguia como uma forma de "resistência" ao opressor do norte. Passou a ser um "requisito moral" usar saias e ponchos coloridos, ou colares de artesanato indígena. Os grandes heróis da "latino-americanidade" no século XX, examinados em capítulos individuais no Guia, são previsíveis inimigos dos Estados Unidos. A exceção parcial é o revolucionário mexicano Pancho Villa, que admirava o presidente americano Woodrow Wilson (a admiração, aliás, era recíproca) e chegou a estrelar um filme de Hollywood — no papel dele mesmo, Pancho Villa. Quando os Estados Unidos apoiaram um desafeto seu nas renhidas disputas da guerra civil mexicana, Villa de fato atacou uma pequena cidade americana da fronteira. Mas seu antiamericanismo é sobretudo uma falsificação tardia das esquerdas.

Antiamericanos, no duro, foram o argentino Juan Domingo Perón (e sua parceira na cama e no populismo, Evita), o também argentino mas revolucionário internacional Che Guevara e o chileno Salvador Allende. Esses representantes maiores da tal "cultura de resistência" alimentaram, cada um a seu modo. a ideia paranoica de que as mazelas sociais de seus países resultavam da exploração imperialista norte-americana. Na verdade, foram eles mesmos promotores da pobreza e do atraso. Além de contumaz assassino de opositores. Che mostrou-se um dispersador da riqueza cubana no período em que ocupou cargos de mando na economia da ilha, no ínicio dos anos 60. Foi um praticante do que Teixeira e Narloch chamam de As Três Atitudes Infalíveis para a Ruína Econômica: 1) estatizar empresas; 2) confiscar propriedades, espantando investimentos nacionais e estrangeiros; e 3) na tentativa de tapar o rombo causado pelas atitudes l e 2, imprimir mais e mais moeda corrente, o que produz a mais galopante das inflações. O general Perón seguiu receita parecida para arrasar a Argentina, até então uma das economias mais pujantes da América do Sul, quando foi presidente pela primeira vez, de 1946a 1955. Voltaria a governar período curto, de 1973 a 1974. quando morreu, deixando a Presidência para a viúva, Isabel (nem de longe tão carismática quanto Eva Perón. morta em 1952). Esse legado de caos econômico seguiu vivo e barulhento na Argentina governada pelo casal peronista Néstor e Cristina Kirchner.

No Chile, Allende foi ainda mais radical no ímpeto de nacionalizar indústrias, bancos, mineradoras. O capítulo dedicado a ele no Guia promete ser um dos mais controversos. Trata-se, afinal, do único marxista do mundo que subiu ao poder pelo voto, e não pelas armas. Some-se a isso o fato de Allende ter sido derrubado, em 1973, por um golpe militar que sagrou como seu sucessor um ditador feroz, o general Augusto Pinochet, e está pronto o mito do democrata pacífico que se opunha ao nefasto capitalismo internacional e foi deposto pelas forças reacionárias amparadas pela CIA. O Guia destroça cada uma dessas falsificações. O governo de Allende intimidava a oposição e atropelava as instituições democráticas. E a maior ingerência estransgeira no Chile não era americana: militares de Cuba treinaram as forças paramilitares que cercavam e protegiam Allende.

Ao lado dessa ampla exposição das sandices dos heróis latino-americanos, Teixeira e Narloch também apresentam um inventário miúdo de taras privadas e perversões políticas dos mesmos personagens: Perón incentivou organizações políticas de estudantes apenas para seduzir garotas adolescentes, e Allende, na sua tese de conclusão da faculdade de medicina, propôs medidas eugenistas —• esterilização forçada de doentes mentais, por exemplo — muito próximas daquelas implementadas pela Alemanha nazista. Não há símbolo nativo da latino-americanidade que resista ao exame deste Guia. Todos têm pés de barro. Desabam quando confrontados com o sereno poder do fato histórico.

63 CORREIO BRAZILIENSE - Ficção: O cangaço pop

Gilmar Carvalho: no livro, o narrador e o protagonista se misturam

(10/8/2011) Os atrevimentos de Gilmar de Carvalho em Parabélum (Armazém da Cultura) parecem vir de uma novidade do mercado literário: o herói tem características de uma porção de gente — Lampião, principalmente, depois Jesus, Che Guevara, Zumbi dos Palmares e mais alguns —, e a narração, arcaica e moderna, tem a solenidade de um capítulo bíblico e os desvios de uma história em quadrinhos. Na verdade, o cearense de Sobral gosta de lembrar, o livro foi publicado em 1977 — timidamente, em baixa tiragem e edição do autor.

Em 2011, o escritor acerta as contas consigo mesmo. “Não queria cair novamente num segundo equívoco, de eu mesmo bancar ou depender de editora. Ofereceram uma boa reedição. E queria recuperar o tempo perdido, fazer com que as pessoas pudessem ter acesso ao livro. Fiquei uma temporada inteira atrás dele. Não encontrava nem em sebo”, observa Gilmar, agora satisfeito. Seu primeiro e único romance voltou à prateleira dele e das livrarias.

Morando em Fortaleza desde os 2 anos de idade, Gilmar largou a ficção uma década depois, em 1987.

Desde então, dedica-se à vida acadêmica e a trabalhos “muito cartesianos”, ele define. Mas a energia daqueles tempos, em que ele burlou o romance regional, é inesquecível. “Comecei a escrever aos 25 anos. O momento político era de ditadura, um clima opressivo.

A minha escrita tentava combatê-lo e deixa marcas visíveis. Eu recorria a metáforas, tentava fazer uma literatura mais hermética. Queria interferir, mas não queria ser preso ou que o livro fosse confiscado”, detalha.

Gilmar conta que, na época, não tinha noção da ideia de pós-modernidade. “Tem uma coisa meio paródica, de referências, citações. Uma ruptura com a linearidade. A gente diz que é um romance, talvez porque precisamos de rótulo ainda”, fixa. Para quem anda sem tempo, ele recomenda uma leitura esporádica, sem obediência à ordem dos capítulos. E, em cada um deles, o domínio é da ironia. O narrador pode ser substituído pelo próprio protagonista, que, às vezes, toma as rédeas do texto. Em outros momentos, aparece uma sátira autoconsciente, como na seção em que toda a trajetória do herói é construída de cômicas negações. “Em 1946, não foi condenado pelo tribunal de Nuremberg ao lado de 21 carrascos nazistas por crimes de guerra”, ele escreve.

Apesar da óbvia ligação com a tradição nordestina, o autor diz que estava mais preocupado com a realidade nacional. “Talvez tenha uma crítica à indústria cultural. Esse Nordeste de cangaço e cordel é tratado de forma muito estilizada. Tento criar algo mais amplo a partir daí”, destaca.

Como nota o escritor paulista João Silvério Trevisan na apresentação, o título reproduz a pistola de Lampião, uma parabelum 97. A inscrição vem de um provérbio latino: si vis pacem, para bellum (“se queres a paz, prepara a guerra”). Nas mãos de Gilmar, a arma não destrói. Apenas constrói.

Trecho

“Era uma vez e aquela seria a região onde nasceria o homem, personagem e fio condutor desta narrativa. A tessitura destes relatos pretende ser um projeto de romance. Ou um evangelho, poderão dizer. Um romance da caatinga apesar de todas as denúncias e do filão mesmo, segundo os críticos. É necessário pôr um radinho de pilha na história e reciclar a linguagem de uma literatura que se pretende enraizada na alma vertical de um povo não escolhido”

64 FOLHA DE S. PAULO - Família de Jorge Amado anuncia reedições especiais

Comemoração do centenário de nascimento do autor, em 2012, estimula produção de filmes e exposições

Mostra "Jorge, Amado e Universal" será montada no Museu da Língua Portuguesa e na capital baiana

GRACILIANO ROCHA DE SALVADOR

(10/8/2011) Nas celebrações do centenário de seu nascimento, Jorge Amado (1912-2001) terá parte da obra relançada em edições especiais e será tema de debates, exposições, filme e enredo de escola de samba.

Parte da intensa oferta cultural sobre a vida e a obra do escritor foi anunciada ontem pela família na Fundação Casa de Jorge Amado, em Salvador (BA).

Um dos destaques da "Jorgemania" será a exposição "Jorge, Amado e Universal" -primeiro, no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, entre março e julho do ano que vem, e, depois, na capital baiana.

A Companhia das Letras, editora que publica as obras do escritor desde 2008, vai relançar edições especiais e de bolso de pelo menos 12 de seus trabalhos.

Em agosto de 2012, quando o criador de Tieta e Gabriela completaria cem anos (no dia 10), a editora vai publicar um livro com a correspondência inédita entre Jorge Amado e a mulher, Zélia Gattai.

"Não é um movimento apenas de festejar ou de homenagear, mas de manter ele vivo através das suas histórias, dos seus livros", disse a cineasta Cecília Amado, neta do escritor e diretora do longa "Capitães de Areia", com estreia prevista para outubro.

A neta cineasta enxerga no centenário uma excelente oportunidade de divulgação do legado artístico do avô: "Para a família, ele é uma presença diária, mas é importante que as novas gerações de baianos e brasileiros também possam compartilhar essa presença maravilhosa de Jorge Amado".

Em fevereiro de 2012, Jorge Amado será tema do desfile da Imperatriz Leopoldinense, no Carnaval do Rio, e de um camarote do tradicional circuito que percorre a orla de Salvador.

ARQUITETURA E DESIGN

FOLHA DE S. PAULO - Mendes da Rocha alerta para 'rota dos desastres'

Arquiteto condena urbanismo atual e avanço da especulação imobiliária

Segundo brasileiro a vencer o Pritzker abre hoje exposição de suas obras e fala sobre novos projetos em andamento

SILAS MARTÍ DE SÃO PAULO

(4/8/2011) Na arquitetura do país, é um divisor de águas. Foi o último brasileiro a vencer o Pritzker, maior prêmio da área no mundo, depois de , e a linguagem que ajudou a construir na chamada escola paulista serve de base conceitual na obra dos jovens arquitetos agora em voga.

65 Mas em seu escritório no centro de São Paulo, na véspera de abrir uma mostra de seus projetos, ele diz que esse estilo é "bobagem" e que o concreto virou o material-chave em sua obra por ser "belíssimo" como estrutura. São de concreto aparente, aliás, os dois desenhos que desenvolve agora, o Cais das Artes, complexo com museu e teatro, em Vitória, e o Museu dos Coches, que está em fase de conclusão em Lisboa.

Mostrando fotografias do canteiro de obras em Portugal, ele não esconde o fascínio pela proeza das máquinas e novas possibilidades de construção. Ao mesmo tempo, parece desapontado com o urbanismo atual no Brasil.

"Estamos aceitando uma rota do desastre em questões que são evidentes", diz Mendes da Rocha, 82. "Falta projetar os desejos na forma de ensaios e perspectivas."

No caso, ele desacredita dos planos para o centro paulistano. "Não é bom imaginar que essas áreas só se revitalizam com obras extraordinárias", afirma. "Uma cidade é feita de comércio, habitação e vida do dia a dia, isso entra na frente de qualquer museu ou sala disso ou daquilo."

Ele também se assusta com o avanço da especulação imobiliária. Um projeto seu, a galeria Leme, no Butantã, é vítima desse processo. Será demolida e reconstruída em novo endereço para dar lugar a mais um grande complexo de apartamentos e escritórios. "Parece que o governo está de mãos atadas em relação à cupidez do mercado", diz o arquiteto. "Verticalizar toda a cidade na matriz das velhas casinhas é uma estupidez."

Na opinião de Mendes da Rocha, aliás, os avanços reais no mundo moderno parecem estar na cabeça das pessoas e não nas pranchetas. Ele vê uma mudança radical de pensamento na forma como o homem lida hoje com a natureza, dizendo que "ninguém precisa se convencer de que o planeta é só um calhau desamparado no espaço".

E nesse pedregulho ameaçado, ele segue construindo espaços. "Os projetos de um arquiteto são todos um só projeto", diz Mendes da Rocha. "Um arquiteto não projeta para si, mas trabalha na ilusão de satisfazer desejos."

Mostra destaca projetos e obras já construídas

Utopia e realidade contrastam na mostra de Paulo Mendes da Rocha que é aberta hoje no Centro Universitário Maria Antonia. De um lado, estão seus esboços urbanísticos para a baía de Montevidéu ou um porto no rio Tietê. Do outro, o Cais das Artes, em Vitória, ou o Instituto Tecnológico Vale, em Belém, que agora saem do papel.

Enquanto defende, no projeto uruguaio, mais atenção para o uso da água como meio de transporte, constrói uma estrutura sobre palafitas no delta do Amazonas, ressaltando a ideia de projeto sobre solo instável, de fluxos e refluxos, que marca sua obra. Também estão na mostra maquetes de seus projetos, entre eles o Museu dos Coches, obra em fase conclusão em Lisboa.

ESTADO DE MINAS - Tapetes de pedra

José Bento Teixeira de Salles

(5/8/2011) A inauguração, terça-feira, da preciosa exposição Tatuagens urbanas, no Museu de Artes e Ofícios, foi marcada pela distinta presença feminina, projetada nas palavras iniciais proferidas por Ângela Gutierrez, presidente do Instituto Cultural Flávio Gutierrez; Renata Lima, coordenadora do projeto da mostra artística; Helena Severo, curadora, e a secretária de Cultura, Eliane Parreiras. Por aí se comprova a participação da mulher na festiva abertura da mostra.

O título da exposição é expressivo, pois se assemelham a verdadeiras tatuagens ou mosaicos os desenhos feitos nos passeios.

O estupendo livro bilíngue lançado na ocasião, Tapetes de pedra, apresenta elevado padrão gráfico e fotográfico e encerra primoroso texto fixando como tema as calçadas portuguesas e suas remotas

66 origens. Renomados autores brasileiros e portugueses abordam o assunto sob ângulos diferentes, mas todos enfatizando o acentuado sentido plástico e artístico de tão nobre atividade.

O estudo histórico e a documentação fotográfica que ilustram o texto merecem toda nossa admiração e traduzem, com fidelidade, o alto nível da exposição recém-inaugurada.

Visitá-la, com interesse e vagar, nos dá a justa sensação de que estamos em plena aula, não se sabendo bem qual a mais admirável lição ministrada, se a beleza plástica das belas fotos ou a visão panorâmica da história sob ângulo pouco debatido, qual seja, a instigante construção dos caminhos urbanos, a partir do Império Romano.

É evidente que o livro e a exposição dão enfoque ao tema em terras portuguesas e brasileiras, mais especificamente aos desenhos dos passeios e praças públicas das grandes cidades desses dois países.

Há de se ressaltar, além da feliz montagem da mostra, a participação do Museu de Artes e Ofícios, cujo ambiente e instalações tão marcadamente contribuíram para o maior êxito do empreendimento.

Enfim, trata-se de exposição que merece ser visitada, pois ela vem enriquecer, certamente, o movimento cultural da cidade.

ESTADO DE MINAS - Padrão internacional

Governo promete inaugurar em 2014 complexo cultural com sala especialmente concebida para concertos sinfônicos. Rádio Inconfidência, TV Minas e Filarmônica ganham sede em BH

(5/8/2011) Está marcada para 2014 a entrega de um dos mais ousados projetos estatais para a cultura de Minas Gerais. Orçada em R$ 140 milhões e ocupando 14,4 mil metros quadrados no Barro Preto, em Belo Horizonte, a futura Estação da Cultura Presidente Itamar Franco abrigará as sedes da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, da Rádio Inconfidência e da Rede Minas de Televisão, incluindo ainda moderna sala de concerto para música erudita e espaço de convivência.

O terreno escolhido para a instalação do conjunto arquitetônico fica no quarteirão delimitado pelas ruas Gonçalves Dias, Tenente Brito Melo, Uberaba e Alvarenga Peixoto, próximo às avenidas do

67 Contorno e Amazonas, vizinho ao 12º Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro. Os trâmites de licitação para execução do projeto devem ser decididos este ano. A previsão é que as obras comecem no segundo semestre de 2012.

“A intenção é investir na infraestrutura cultural do estado e do município, entendendo esse projeto como algo estratégico. Será a primeira sala de concerto especializada em música sinfônica no país e incluirá Minas Gerais nesse circuito, que é muito rigoroso. Os demais espaços brasileiros são adaptações, ou seja, não foram construídos para abrigar uma sala como essa. Acredito que ela terá visibilidade internacional”, afirma Eliane Parreiras, secretária de Estado de Cultura de Minas Gerais.

Com capacidade para 1,4 mil pessoas, a sala de concerto terá tratamento acústico diferenciado, com sistema de ajuste sonoro para repertórios distintos feito por um grande difusor móvel acima do palco e bandeiras acústicas nas paredes laterais. O espaço contará com infraestrutura para gravações de áudio e vídeo, iluminação cênica, pontos de apoio para equipes de televisão, segurança e acessibilidade a portadores de necessidades especiais.

Sala de concerto usa tecnologia avançada

Convivência

A Rádio Inconfidência e a Rede Minas de Televisão serão instaladas em prédio de oito andares e terão estúdios e redação equipados com tecnologia de ponta. Como trabalharão de forma integrada, é dada como certa a transmissão dos concertos realizados no local por rádio e televisão. A propósito, as antenas transmitidoras serão um dos pontos de referência do conjunto arquitetônico, com formato estilizado e posicionadas sobre torre de 75 metros de altura.

A praça de entrada terá jardins, pérgula para sombreamento, bancos, lagos e café, distribuídos no centro de convivência com 8 mil metros quadrados. O imóvel hoje existente no local, tombado como patrimônio histórico do município, será restaurado para abrigar restaurante e café.

Entrevista

Fabio Mechetti

Maestro e Diretor artístico da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais

68 Que possibilidades a sede própria abrirá para a Filarmônica?

Ela vai deslanchar. Por exemplo, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, antes da inauguração da Sala São Paulo, estava longe do que é hoje. Outra questão é a agenda dos concertos. Não temos controle sobre isso e, atualmente, tocamos nos dias que negociamos. Poderemos distribuir as apresentações de maneira mais racional.

Quais serão as principais melhorias para a orquestra?

O novo espaço vai proporcionar aos músicos salas de estudo individuais e de ensaios de naipes. Daremos condições ideais de trabalho. O armazenamento de instrumentos também vai melhorar, pois hoje compartilhamos espaço com outras atividades. Além disso, 70% dos instrumentos que usamos são próprios. Na sede, serão 100% nossos. Atualmente, percussão, piano e instrumentos pesados não nos pertencem.

O que tudo isso muda para o público?

O projeto de uma sala como essa começa com a parte acústica, que é o seu coração. Não terá fosso, nem proscênio, por exemplo. A acústica do Palácio das Artes, desenhado mais para ópera, é mais seca, não é a ideal. Carpete pode ajudar, mas não em relação à música erudita. Não teremos concha acústica, pois o próprio palco será a concha. Teremos até público atrás da orquestra. Esperamos que a diferença seja sentida imediatamente pelas pessoas.

ESTADO DE MINAS - Arte com tecnologia

Um dos mais prestigiados concursos do país, Prêmio de Design do Museu da Casa Brasileira chega à 25ª edição, novamente procurando dar abertura a propostas criativas

Walter Sebastião

(9/8/2011) Vai até dia 29 o prazo de inscrição no 25º Prêmio de Design do Museu da Casa Brasileira, o mais respeitado e antigo concurso nacional do setor. São sete categorias: mobiliário, utensílios, iluminação, têxteis, equipamentos eletroeletrônicos, equipamentos de construção e equipamentos de transporte, cada qual contemplando ainda a modalidade protótipo. Uma oitava categoria, escritos publicados e não publicados, é dedicada a textos que valorizem a produção teórica ligada ao design de produto, design gráfico, arquitetura, urbanismo e paisagismo. O resultado sai em 21 de setembro.

Os interessados devem se inscrever no site www.mcb.org.br/ premiodesign, mediante pagamento da taxa de inscrição de R$ 60. Entre os critérios de avaliação da comissão julgadora estão originalidade, concepção formal, inovação tecnológica, adequação ao mercado, viabilidade industrial, segurança e proteção ambiental. O júri vai eleger os projetos finalistas e os premiados, que serão reunidos na exposição 25º Prêmio Design MCB. O valor da premiação para o primeiro lugar de cada categoria é R$ 6 mil; na modalidade protótipo, R$ 2 mil. Novidade em 2011 é o sorteio, entre finalistas e premiados, de uma bolsa de estudos em Milão, na Itália.

69 Domingos Tótora, que vive na cidade mineira de Maria da Fé, venceu a categoria mobiliário em 2010

O Prêmio de Design do Museu da Casa Brasileira se confunde com a história da evolução do design no Brasil, como lembra Miriam Lerner, diretora da instituição. Ela recorda que há 25 anos, quando foi criado o prêmio, mal se via o design como valor agregado e, por isso, o objetivo da iniciativa foi conscientizar a indústria da necessidade do bom desenho. “Hoje, o design é atividade conceituada, o Brasil tem produção respeitada inclusive internacionalmente”, conta Miriam Lerner, ressaltando que ainda há carências. “Falta divulgação do design brasileiro no exterior”, aponta.

Para Miriam Lerner, até por ser tempo de rápidas transformações, o momento abre amplos espaços para novas ideias. “Em jogo estão não só tecnologias, mas também novos valores, como a questão da sustentabilidade”, observa, destacando também que o Museu da Casa Brasileira tem em seu acervo quase 500 peças, entre mobiliário e utensílios. Além de enfatizar que o museu a enche de orgulho de ser brasileira, Miriam Lerner reconhece o desafio de desenvolver trabalhos com recursos limitados.

Premiado Para Domingos Tótora, designer de 50 anos, vencedor ano passado na categoria mobiliário, o Prêmio de Design do Museu da Casa Brasileira é importante por sua grande visibilidade e júri rigoroso. “E é aberto ao novo, como mostra o fato de darem prêmio a banco que fiz de papelão”, justifica. “O prêmio consolidou o meu trabalho. Deve-se aproveitar este momento que o design brasileiro está em alta e o mundo inteiro está de olho no que fazemos.”

MODA

FOLHA DE S. PAULO - Sob Nova Direção

VIVIAN WHITEMAN

Grifes dispensam estilistas renomados e apostam na formação de equipes de criação 'anônimas'

(5/8/2011) Grifes como Redley, Maria Bonita Extra e Rosa Chá dispensaram seus diretores de criação famosos e resolveram apostar em equipes de estilo sem nenhum nome estrelado.

70 Nesse modelo, que dispensa a assinatura de um único autor, as equipes dividem funções e a responsabilidade pelas coleções. "Estamos num momento do mercado em que não dá pra ficar refém de uma única pessoa, de um único olhar", diz Alexandre Aquino, sócio-diretor da grife Maria Bonita Extra.

A marca anunciou a saída da diretora de criação Ana Magalhães e contratou uma equipe de quatro designers. "Dois assinam as roupas, um, os sapatos, e o outro, os acessórios. Não haverá um dono da coleção", explica Aquino.

Há três meses, esse modelo foi adotado pela Redley, que dispensou o premiado estilista americano Sandy Dalal. Antes dele, era o alemão Jurgen Oeltjenbruns quem comandava o estilo da marca, que, segundo seu diretor, Léo Ferreira, se descaracterizou.

"Os estilistas não estavam entregando ao cliente o que ele procurava. Era inovação por inovação, um 'fashion' sem a funcionalidade característica dos nossos produtos", conta Ferreira.

A solução foi, além de delegar a responsabilidade pelas coleções a sete estilistas, voltar às origens do seu estilo. Agora, a marca investe num sportswear menos conceitual e atento às demandas do mercado. "A Redley não é um ateliê, precisa se expandir. Gringos, nunca mais", brinca o empresário.

O estilista , que saiu do comando criativo da Rosa Chá depois de a grife não renovar seu contrato, em junho, faz ressalvas quanto às opiniões dos empresários. "A criação nunca ficou na mão de uma pessoa, o trabalho é sempre em equipe. Os empresários devem conhecer bem quem contratam", diz.

Diretor criativo da malharia TDB e de suas marcas próprias, Alexandre diz que, na época de sua saída, foi "informado de que a Rosa Chá tomaria novo rumo". A grife, que está em crise, fechou várias lojas próprias e, atualmente, está sem um diretor criativo.

"Com a chegada de marcas internacionais no mercado, precisamos nos movimentar. Os ajustes passam pelo foco em linhas mais vendáveis à adoção de novos modelos de negócios ", diz Giuliano Donini, presidente do grupo Marisol, dono da Rosa Chá.

Para o estilista Marcelo Sommer, que já desenhou para grifes como TNG e Cavalera, os empresários podem estar fazendo um péssimo negócio. "Já fui demitido com o argumento de que eu custava mais do que manter uma equipe inteira. Porém, em grupos sem liderança, muitas vezes a unidade criativa se perde e a grife tem prejuízos com isso."

Vida privada A escritora Lisa Chaney lança em novembro a polêmica biografia "Coco Chanel: an Intimate Life". A autora diz ter provas da bissexualidade da estilista, do seu envolvimento com drogas e de seus romances com um soldado nazista e com o pintor Salvador Dalí.

Amarradona neste mês a marca scarf me inaugura duas novas lojas em sp, uma no shopping higienópolis e outra no shopping iguatemi. para comemorar, a grife lança dois lenços especiais feitos de seda premium (na foto, um dos modelos). cada peça custa R$ 298.

OUTROS

CORREIO BRAZILIENSE - O índio por ele mesmo

Multimídia

Versão final da exposição Séculos indígenas no Brasil é exibida a partir de hoje, com filmes e imagens colhidas em todo o país, além de oficinas e peças de artesanato

Nahima Maciel

71 Frank Coe (D) é um dos idealizadores da mostra multimídia, em cartaz até 10 de outubro: "Nossa proposta é educar pela arte"

(9/8/2011) Foram necessários 19 anos de pesquisa e 45 horas de filmagens para Frank Coe e Álvaro Tukano chegarem à versão final da exposição Séculos indígenas no Brasil. A partir de hoje, a mostra leva ao Memorial dos Povos Indígenas um conjunto de filmes e imagens idealizados para facilitar o acesso de professores e alunos ao universo dos povos nativos brasileiros. Coe e Tukano conceberam a exposição de maneira didática, como um exemplo para estimular a execução da Lei nº11.645, que desde 2008 tornou obrigatório o estudo das culturas afro-brasileira e indígena nas escolas de ensino médio e fundamental.

A primeira versão de Séculos indígenas no Brasil é de 2005, quando a lei ainda não estava em vigor. Desde então, o acervo do projeto cresceu. As origens indígenas do povo brasileiro passaram a ser tema obrigatório nos currículos escolares, um detalhe que fez os coordenadores da exposição incrementarem o programa educativo.

A maioria dos mediadores selecionados para guiar os visitantes são indígenas, e a versão brasiliense da mostra tem documentário inédito, montado a partir das 45 horas de imagens recolhidas durante três meses de viagem por mais de 30 mil km. No total, a equipe visitou 20 etnias escolhidas por Tukano e Aílton Krenak, também líder indígena. “Nossa proposta é educar pela arte e o público prioritário será de professores e alunos das redes pública e privada. A exposição é uma experiência multimídia com três vértices”, explica Coe.

Para aproximar o público do universo indígena, o Memorial foi preenchido com uma enorme cobra construída em bambu. No interior, chão de terra batida ajuda a ambientar o espaço expositivo, que traz o acervo do próprio museu e reproduções de obras pertencentes a instituições como o Museu de Etnologia de Genebra (Suíça), o Museu do Índio do Rio de Janeiro, o Instituto Socioambiental e o Museu Dahlem (Alemanha).

Audiovisual

A parte mais consistente e importante da mostra será exibida no auditório em formato audiovisual. Mescla de documentário e animação, o inédito Maíra, de Darcy Ribeiro: um deus mortal? é uma adaptação parcial do livro Maíra, publicado pelo antropólogo em 1976. “Na verdade, diz respeito a sete capítulos em que Darcy trata dos mitos dos povos indígenas. Ele conta a origem do mundo segundo os indígenas”, conta Coe, diretor do documentário. Intercaladas à animação estão cenas de

72 arquivo e imagens filmadas ao longo do projeto, além de uma entrevista inédita com o antropólogo gravada em 1995. “É uma entrevista na qual ele faz uma apresentação do texto A invenção do Brasil”, diz o diretor. Além do longa, os visitantes poderão conferir os curtas Reflexões e Reflexões do curumim, destinados ao público infantojuvenil.

A vertente educativa e didática da mostra é um dos aspectos mais importantes do projeto para Rosane Kaingang, presidente da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul e consultora de Coe. “Temos que trabalhar a capacitação dos professores e subsidiá-los para fazerem um trabalho nas escolas não indígenas”, explica. “Para nós é importante que a Lei nº11.645 seja executada para que os indígenas não sejam discriminados em sala de aula.” Além de oficinas programadas para o fim da visita, a exposição conta com uma ação paralela. Durante o 3º Módulo do Fórum de Atualização sobre Culturas Indígenas, professores das redes pública e privada poderão realizar curso de formação para mais tarde trabalhar o conteúdo em sala de aula.

Para Coe, a característica fundamental da mostra é o fato de ter sido concebida em parceria com os indígenas. “As diretrizes foram definidas pelas lideranças indígenas”, garante. “A ideia era fazer um trabalho de documentação diferente do que vinha sendo feito, em que os indígenas tivessem a oportunidade de definir essa informação.” Por isso, foi importante incluir o acervo do Memorial dos Povos Indígenas, uma coleção doada por Darcy Ribeiro, coletada durante mais de três décadas e hoje avaliada em R$ 850 mil. “As peças de artesanato passam uma imagem do indígena concebida pelo indígena sem a intermediação de não indígenas”, repara Coe.

ESTADO DE MINAS - Arte indígena em destaque

Trabalho de Kamalurré Mehinako

(10/8/2011) A exposição 3 escultores da Amazônia, em cartaz na Galeria de Arte Sandra & Márcio, apresenta obras dos artistas Wet Palikur, Kamalurré Mehinako e Yauapi Kamayurá. Talhadas na madeira, 24 peças foram cuidadosamente pintadas. Wet Palikur é pajé da reserva palikur, localizada na fronteira do Oiapoque com a Guiana Francesa. Como ele, Mehinako e Yauapi expressam a criatividade da arte indígena do país.

“Precisamos valorizar a nossa cultura. O brasileiro tem o hábito de dar importância ao que vem de fora e, na maioria das vezes, o que temos aqui é de grande valor estético e cultural”, comenta Luiz Márcio, diretor da galeria. Os trabalhos poderão ser conferidos até 10 de setembro. O espaço funciona de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h, e aos sábados, das 10h às 13h, na Rua Passa Tempo, 477, Sion.

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