OS SABORES DA NOSSA TERRA OS SABORES DA NOSSA TERRA Uma viagem ao património gastronómico do Oeste, do Ribatejo, do Ribatejo Norte, da Charneca Ribatejana e da Península de Setúbal OS SABORES DA NOSSA TERRA

Uma viagem ao património gastronómico do Oeste, do Ribatejo, do Ribatejo Norte, da Charneca Ribatejana e da Península de Setúbal

1 A gastronomia e o vinho, como seu natural parceiro, de produção e o conhecimento sobre a origem do constituem hoje, reconhecidamente, um dos mais que comemos e proporcionamos a quem nos visita, importantes produtos da oferta turística nacional, facilmente perceberemos a importância de defender com evidentes, e crescentes, reflexos nas economias os nossos produtos, a nossa gastronomia e os nossos regionais. vinhos como factores de riqueza regional e nacional.

Conscientes desta realidade, cinco Associações de Algumas receitas quase esquecidas e produtos em Desenvolvimento das regiões do Oeste, Ribatejo, e vias de desaparecer têm vindo a ser recuperados Península de Setúbal decidiram promover, em parce- e redescobertos ou mesmo descobertos por novas ria, este livro dedicado à culinária e aos produtos das gerações que, mais informadas, optam pelo que tem respectivas regiões. mais sabor e garante melhor qualidade de vida.

Depois do trabalho de pesquisa junto de autarquias e Pretende-se com esta publicação promover a utili- outras fontes locais, selecionaram-se vinte receitas e zação preferencial de produtos regionais, isolados produtos de cada espaço geográfico de actuação, da ou integrados na confecção culinária, o que, para respectiva associação. além de garantir maior autenticidade e sabor à oferta gastronómica, contribui para o desenvolvimento da Como é habitual, muitas das receitas recolhidas economia local. apresentam mais do que uma versão, com maiores ou menores diferenças, e quase sempre reclaman- Compete ao consumidor insistir na procura, como do-se de que “esta é que é a verdadeira”, numa clara forma de estimular a oferta. demonstração do valor atribuído às tradições. Sem surpresas, muito do conhecimento já se perdeu, o que valoriza ainda mais a informação que se recupe- ra nesta e noutras publicações.

O facto de, actualmente, se poder comer pratica- mente de tudo em qualquer altura do ano deverá contribuir para valorizar ainda mais a possibilidade de se acompanhar a sazonalidade para apreciar os produtos hortícolas e de mar nas épocas próprias. Se a esta componente acrescentarmos os métodos

3 5 7 Oeste, Ribatejo Norte, Ribatejo, Charneca Ribatejana e Península de Setúbal

9 INTRODUÇÃO

Entramos num restaurante à procura de emoções. Os territórios envolvidos apresentam inúmeros recur- Quando nos sentamos à mesa, esperamos que a sos. Não só os produtos alimentares de excelência e ementa tenha um prato genuíno e que a sugestão as tradições gastronómicas, mas também os agentes de um vinho realce os seus sabores, como se ambos económicos, cada vez mais interessados em associar fossem um só, numa união perfeita e harmoniosa. a sua promoção às tradições e às heranças culturais. Quando somos servidos, os aromas invadem o nosso Deste encontro, emerge a genuinidade e a diferen- espírito. Os olhos brilham e a boca saliva, com a ciação da oferta turística. O presente livro pretende vontade urgente de iniciarmos a primeira garfada e o ser uma descoberta surpreendente do mundo da primeiro brinde. gastronomia, da cultura e da história do Vale do Tejo. Esperamos que todos os leitores sintam o desejo de Gostos e sabores, histórias e tradições, emergem no experimentar e de conhecer as receitas e os vinhos nosso imaginário, revisitam a nossa memória. E no seleccionados, e que partam à descoberta destas fundo da alma escutamos: “Estes são nossos, são regiões singulares. produzidos na nossa terra, foram acarinhados pelos nossos produtores e pelos nossos chefes, foram con- Um agradecimento especial à Entidade Regional de feccionados com a mestria de anos de sabedoria e Turismo da Região de Lisboa, que apadrinhou este experiência”. Algumas receitas carregam séculos de projecto desde o primeiro momento, sempre presen- existência, trazem consigo histórias e memórias que te, sempre atenta e interessada, defensora e pro- surgem enquanto conversamos. Pensamos…Espero motora da gastronomia local além-fronteiras. Uma voltar um dia…Sozinho, em família ou com alguém saudação aos Municípios, Confrarias Gastronómicas, especial… Comissões Vitivinícolas Regionais e Escolas de Hotelaria e Turismo, pela colaboração, pelos es- À volta da mesa, cinco Grupos de Acção Local da re- clarecimentos e pelo acolhimento, e também aos gião do Vale do Tejo – ADIRN, ADREPES, APRODER, produtores, aos pescadores, aos cozinheiros e aos CHARNECA RIBATEJANA e LEADEROESTE – deci- chefes que todos os dias trabalham para termos à diram desenvolver um projecto de cooperação finan- mesa produtos de elevada qualidade, perpetuando a ciado pelo PRODER – Programa de Desenvolvimento nossa identidade gastronómica local. Esperamos que Rural, com o objectivo de fazer renascer o receituário sejam cada vez mais. do Oeste, da Península de Setúbal e do Ribatejo, dando a conhecer as suas origens históricas, reve- Bem comido, a minha alma de nada quer saber. lando as suas influências, inventariando os produtos E nem os maiores desgostos a conseguem comover. locais utilizados e o modo como são confeccionados. Molière

11 INDÍCE

15 Ribatejo Norte 63 Ribatejo 111 Charneca Ribatejana 163 Península de Setúbal 213 Oeste

24 Sopa de Nabos com 72 Sopa de Peixe do Rio 122 Sopa de Feijão com 172 Sopa Caramela 226 Caldeirada à Nazarena 269 Notas Feijão 74 Sopa de Coelho Couve 174 Enguias Fritas com 228 Ensopado de Enguias 272 Associações 26 Sopa de Lagostins 76 Caldeirada à Fragateiro 124 Sopa de Feijoca com Favas de Coentrada 230 Lagosta Suada à Moda Promotoras 28 Sopas de Verde 78 Tiborna de Massa 176 Arroz de Lamejinhas de Peniche 276 Bibliografia 30 Enguias do Boquilobo 80 Lapardana 126 Sopa da Pedra 178 Lamejinhas com Cebola 232 Codorniz Recheada com 279 Ficha Técnica 32 Ensopado de Enguias 82 Magusto 128 Requentado 180 de Ostras Couve e Chouriço 34 Migas de Bacalhau 84 Enguias à Paúl 130 Açorda de Sável 182 Choco Frito à 234 Cavacas das Caldas 36 Chícharos com 86 Cabrito Assado no Forno 132 Ensopado de Enguias Setubalense 236 Cornucópias Bacalhau Assado 88 Carne de Porco à Feira 134 Cabrito Assado no Forno 184 Polvo no Forno 238 Trouxas de Ovos 38 Caldeirada de Peixe do dos Santos à Moda do Ribatejo 186 Caldeirada à Fragateiro 240 Pão-de-Ló de Alfeizerão Rio 90 Favas com Entrecosto 136 Cabrito com Grelos à da Moita 242 Sardinhas Doces da 40 Lampreia de Sangue 92 Galo com Nozes Moda da Azinhaga 188 Caldeirada de Alcochete Nazaré 42 Açorda de Sável 94 Naco de Boi com Vinho 138 Arroz de Bucho 190 Caldeirada à 244 Mimosos do Bombarral 44 Frango na Púcara à Tinto 140 Migas de Batata com Sesimbrense 246 Pastel de Feijão Templários 96 Torricado Carne de Porco 192 Massa de Safio 248 Bruxas de Arruda 46 Cabrito Assado com 98 Arrepiados de Almoster 142 Favas com Entrecosto 194 Favas à Pameloa 250 Uvada Batatas e Grelos 100 Celestes de Santa Clara 144 Feijoada à Lavrador 196 Lebre à Ti Zé da Avó 252 Bolo dos Generais 48 Friginada 102 Queijadinhas de 146 Lebre com Couve e 198 Farrafuza 254 Aguardente DOC 50 Broinhas de Alcanena Azambuja Feijão Branco 200 Farinha Torrada Lourinhã 52 Bolos de Cabeça 104 Pão-de-Ló de Rio Maior 148 Arroz de Castanhas 202 Fogaças de Alcochete 256 Licor de Ginja 54 de Ferreira do 106 Caspiadas 150 Morcelas de Arroz 204 Fogaças de Palmela 258 Maçã de Alcobaça Zêzere 108 Queijo Maçussa Grelhadas 206 Tortas de Azeitão 260 Pêra Rocha 56 Merendeiras 152 Túberas Mexidas com 208 Queijo de Azeitão 262 Mel de Montejunto 58 Ovos 210 Moscatel de Setúbal e 264 Carapau Seco e Enjoado 60 Figuinhos de Torres 154 Patudos Moscatel Roxo Novas 156 Pudim de Pão 158 Broas de Batata Doce e Amêndoa de Benavente 160 Carne de Toiro Bravo

13 RIBATEJO NORTE

15 Na extensão do panorama ribatejano, conseguimos abraçar três paisagens distintas: a Lezíria, a Charneca e o Bairro. A Lezíria é a planície que o Tejo rasga, lisa, verde, à espera que o rio alastre para que tudo se torne água, nateiro, vida. A Charneca estende-se do Tejo até ao Alentejo, e esse espraiar faz-se de solos arenosos onde lançam raízes os sobreiros que em tanto enriquecem a região. Por último, o Bairro, a margem direita do rio que se impõe, chão de oliveiras, de figueiras, de vinha, numa vista que abarca serras rochosas e vales frondosos rasgados pelo Tejo e pelos seus afluentes, Zêzere, Nabão, Almonda e Ocreza. Estamos no Ribatejo Norte, território dos Cavaleiros do Templo, devotos, em armas, a Cristo, e dos peregrinos de Nossa Senhora de Fátima. Terra de contrastes, abençoada por solos generosos, por água em fartura, mas também por rudeza e austeridade, com um património religioso, arquitectónico e artístico de valor incalculável. Alcanena Ferreira do Zêzere

Desconfia-se que se deve aos mouros os primeiros Foi em 1159 que D. Afonso Henriques doou aos indícios de trabalhos de curtimentos de pele nesta Templários o termo de Ceras, território que hoje zona; certo é que, nos finais do Século XVIII, este já inclui cerca de metade da área do concelho. Anos era um ofício relevante numa comunidade economi- mais tarde, em 1190, já no reinado de D. Sancho I, o camente viva. Data de 1792 o alvará de D. Maria I a monarca legou a Pedro Ferreiro várias herdades na Manuel Francisco Galveias para o assentamento, em região, como recompensa dos serviços prestados na Alcanena, da Fábrica de Sola, Atanados e Bezerros, luta contra as hordas sarracenas. Senhor de vastas a segunda instalação industrial do género no País. propriedades, o besteiro do rei, Pedro Ferreiro, atri- O brasão real que assinala a licença régia resistiu ao buiu foral a Vila Ferreiro, futura Ferreira do Zêzere. tempo, e é hoje uma testemunha em pedra do valor Em 1319, estas terras já se encontravam nas mãos que esta actividade já detinha nessa época. Sabe-se dos cavaleiros do Templo. que a indústria de curtumes foi prosperando ao lon- go de oitocentos anos. Em 1867, contavam-se na fre- Toda esta região é ilustrada por uma paisagem guesia 472 fogos, o dobro do número existente cem admirável que desde há muito impressiona artistas e anos antes. A afluência e a fixação de operários foi viajantes. A célebre Estalagem dos Vales, hoje desa- crescendo à medida que o investimento em unidades parecida, foi tecto de ilustres figuras das artes como fabris ia aumentando, e essa cada vez maior afluên- o pintor José Malhoa e o actor Taborda. D. Carlos I cia de trabalhadores foi deixando marcas nos usos chegou a pernoitar no modesto albergue. Foi lá que e nos costumes regionais. A gastronomia também Alfredo Keil escreveu “A Portuguesa”, adoptada como foi influenciada por estes homens que, por serem de hino nacional em 1911. Com o Zêzere a serpentear uma classe mais remediada, sempre souberam tirar pelos vales, o rio tomou lugar nas mesas da zona. Os o melhor partido dos recursos que tinham à mão. lagostins, antes uma praga, hoje são um interessante contributo para a gastronomia local.

17 Ourém Tomar Torres Novas Vila Nova da Barquinha

Terra de velhos pergaminhos, Ourém já era citada no Gualdim Pais, figura de referência para os naban- O concelho de Torres Novas desenha-se com a ajuda Campos bem cultivados na terra fértil da lezíria, oli- Século XII, quando ainda era conhecida por Abdegas. tinos, era Mestre da Ordem dos Templários quan- da Serra d’Aire, a Norte, da Serra dos Candeeiros, a vais que se sucedem, as águas do Tejo a recortarem Com a expulsão dos árabes do território pelas forças do estes monges guerreiros ajudaram D. Afonso Oeste e das terras do Paúl, a Sul. A cidade propria- as fundações do castelo de Almourol e a correrem de D. Afonso Henriques, o topónimo foi alterado para Henriques a tomar Santarém. O monarca, agra- mente dita assenta nas margens do rio Almonda sem tréguas, assim é a paisagem de Vila Nova da Aurem, que viria a dar em Ourém. Frei Bernardo de decido, doou aos cavaleiros do Templo o castelo e firma-se nas colinas que o dominam. O castelo, Barquinha. Erguido num afloramento granítico, num Brito, na “Crónica da Ordem de Cister”, tem uma ver- e as terras de Ceras, a que mais tarde se juntou o orgulhosamente altaneiro, sobressai do casario que rochedo de cerca de 18 metros acima da linha de são bem mais poética acerca do nome do concelho. de Almorol e o de Pombal. Esta era, na altura, uma se multiplicou à sua sombra e é uma prova inequívo- água, Almourol é uma fortaleza única cuja história Conta que, no distante dia de São João de 1158, João zona devastada pela guerra, quase deserta pelas co da antiguidade desta terra. No fio da História, fo- remonta à ocupação sarracena da Península. Hoje é Henriques, um cristão que participou na tomada do desafortunadas consequências das lutas com os ram-se cruzando por aqui vários povos e credos, dos um monumento único no panorama nacional e um castelo de Alcácer do Sal, raptou uma princesa árabe sarracenos, um território pronto a ser apaziguado e gregos aos cartagineses, dos romanos que conquis- verdadeiro ex-libris do concelho. e escondeu-a num recanto da Serra de Aire. Fátima, desenvolvido por estes guerreiros que levavam a cruz taram a Lusitânia, aos godos, suevos e alanos que uma moura de coração doce, apaixonou-se pelo de Cristo ao peito. Como o castelo de Ceras era uma expulsaram de novo os latinos, até que chegaram os William Grant, viajante irlandês que se aventurou por seu sequestrador e converteu-se ao cristianismo, ruína desolada, o Mestre Gualdim Pais construi num árabes escorraçados daqui por D. Afonso Henriques terras lusas em plenas guerras napoleónicas, des- mudando o nome para Oureana. O lugar onde o casal morro das margens do Nabão o castelo que havia de nos alvores da nacionalidade. De lá até hoje, o conce- creve assim a sua passagem pela região: Por todos se refugiou na serra viria, segundo Frei Bernardo de ser cabeça da melícia. A fortaleza tomou o nome de lho foi-se desenvolvendo. No Século XVI era uma das os lados aparecia uma diversidade de bosques (...) e, Brito, a adoptar o nome cristão da princesa, dando Tomar, assim como a vila que ia crescendo aos seus vilas mais povoadas do reino e, após os infortúnios para fechar e dar vida à cena, surgia na parte detrás origem a Ourém, a vila de Oureana. pés. Hoje, quase todo o grande acervo patrimonial do das invasões francesas e das lutas liberais, a região uma linda aldeia onde quase todos eram pescadores. concelho está relacionado com a Ordem do Templo ganhou fôlego abraçando a revolução industrial que Isto oferecia a vista mais formosa que tínhamos visto Com a erradicação dos sarracenos desta região, D. e com a sua sucessora Ordem de Cristo. Das muitas agitava a Europa. Tornou-se um importante centro desde que tínhamos deixado Lisboa. Esta imagem pi- Afonso Henriques entregou à Ordem de Cister uma edificações, há uma que se destaca, o Convento de fabril com a criação de várias fábricas de fundição, toresca destaca a importância da pesca nesta região, boa parcela de terras. Os monges instalados no Cristo, incontornável e de visita obrigatória. Raul de fiação, de serralharia, unidades que empregavam ocupação ancestral das gentes da terra, habituadas Mosteiro de Tomareis amanhavam os solos e tor- Proença escreveu: Se Guimarães foi o berço dinástico muita gente. A primeira fábrica de papel da Renova à presença líquida do curso do rio. No Século XIX, naram-se um motor impulsionador da economia da de Portugal, o símbolo da reconquista nacional (…) foi aqui inaugurada em 1818. as dificuldades em tirar do oceano sustento obriga- zona. O vinho, elemento tão simbólico na Eucaristia, está em Tomar, no monumento que transplantou para ram muitos pescadores do litoral a tentar a sorte no foi um dos produtos a que a Ordem se dedicou com uma das fronteiras de Portugal do Século XII uma A agricultura, tão importante para a subsistência Tejo. Alguns instalaram-se no concelho, construindo cuidado. Apreciado por toda a região, os monges evocação do Templo da Cidade Santa, enriquecido de das gentes, sofreu uma alteração no início do Século aldeias piscatórias e aproveitando em muito a abun- transmitiram aos habitantes da zona o seu método policromias e oiros ardentes. XX, com a plantação massiva de figueirais em Torres dância dos recursos naturais fornecidos pelos três de produção de vinho. Novas, como alternativa à vinha. Augusto Durão rios que banham a região: o já referido Tejo e os seus A herança da Ordem ainda hoje persiste e vai muito Alves, na monografia “Torres Novas Ontem e Hoje”, afluentes Zêzere e Nabão. Actualmente, este vinho palhete, cujo método de além da pedra e da arte. A gastronomia também a em 1942, já referia várias especialidades à base de vinificação conta com oitocentos anos de história, lembra com as famosas fatias de Tomar, um doce figo, sublinhando que o mais característico e regional Se o peixe de rio sempre fez parte da mesa dos ha- constitui uma das muitas ofertas genuínas e de conventual que, segundo a lenda, era o preferido dos é o Doce de Figo, rústico, apetitoso e apresentado bitantes da região, o azeite, desde o Século passado, qualidade disponíveis na «Ucharia do Conde», um monges. Tal como manda a tradição, exorbita na em cestinhas de verga. Este fruto também originou tornou-se um produto vital para a economia local, espaço de promoção dos produtos locais situada no quantidade de ovos e açúcar, verdadeiros potencia- uma aguardente muito apreciada na região. tendo-se multiplicado lagareiros e lagares por todo o edifício da antiga prisão, no bonito Centro Histórico dores do pecado da Gula. concelho. de Ourém.

19 GASTRONOMIA REGIONAL

Alcanena Tomar Morcela de arroz grelhada, , sopas de feijão Bolas de carne ou enchidos, bacalhau à Nabão, com couves e de nabos com feijão, massa de baca- lampreia com molho de sangue, almôndegas de lhau, migas de bacalhau, cachola, cabrito guisado, lebre à D. Henriqueta, couves à D. Prior, cabrito à favas guisadas com carne de porco e iscas de porco Templários, frango na púcara à Templários, frango à à Ti Violeta. Nos doces, destacam-se as rocas, as freire de Cristo, vaca de molho de bruxa e feijoada de broinhas de Alcanena, as rabichas e as broas de mel. caracóis. Nos doces, os bolos de cama ou, sugestiva- O vinho, os vinagres e os licores da serra de Santo mente, os beija-me depressa, e também os caladi- António fazem igualmente parte da oferta de sabores nhos, estrelas de Tomar, queijadas de gila, pudim da deste concelho. sogra, rosas de Tomar, pastelinhos de Santa Marta, broinhas do convento e as cornucópias. Ferreira do Zêzere Queijo das Areias, omelete de lagostim, lagostim de Torres Novas capote, peixinhos da horta, sopas de lagostim, de Ovos cá do sítio, petingas no forno, morcela de arroz, fava ou de abóbora, achigã frito com arroz de tomate sopa de couve com feijão à moda de Riachos, sopa e migas, risoto de lagostim, coelho na abóbora, leitão de fressura à moda de Riachos, crescidos das couves à ferreirense ou cabrito assado com grelos. Nos do- com feijão, migas à Manuel Pescador com enguias ces é difícil resistir às tijeladas, aos bons maridos e no espeto, enguias do Boquilobo, cabrito assado com boas esposas, às estrelinhas do Zêzere, às queijadas batatas e grelos, migas de bacalhau, requentado com de queijo, aos bolinhos dos santos, às migas doces bacalhau assado ou petingas fritas. Nos doces, fi- ou à mousse de fava. guinhos de Torres Novas, figos de capa rota, doce de amêndoa, bolinhos de farinha de milho, bolos de ca- Ourém beça ou bolos de noivos, palitos de Sabóia e sopapos. Farinheira branca, broa da Freixianda, merendeiras salgadas, morcela de arroz, papas de milho com Vila Nova da Barquinha abóbora, sopas de verde, sopa de bacalhau, sopas de Molhata de enguias, peixinhos do rio de escabe- feijão ou de azeite, mexudas ou esparregado, chí- che, sopa de peixes do rio, sopa de peixe à Sol Tejo, charos com bacalhau assado, friginada ou tachada, caldeirada de peixe do rio, barbos de molhata, fataça carneiro à Vale Travesso e coelho à bruxa. Nos doces, na telha, açorda e sopa de sável, arroz de lampreia destacam-se as merendeiras doces, o bolo de arco, e cabrito frito da Praia do Ribatejo. Nos doces, o de cabeça ou de festas e os bolinhos dos santos. destaque vai para o pirilau do Padre Ambrósio, mas é difícil resistir também ao bolo de noz, ao bolo de Natal, às velhozes e ao doce de pão.

21 AGENDA GASTRONÓMICA

Fevereiro Outubro Mostra da Lampreia, em Tomar Todos com o Feijão... Feijão com Todos, em Tomar Feira dos Frutos Secos, em Torres Novas Março Feira dos Produtos da Terra, em Ourém Novembro Mês do Sável e da Lampreia, em Vila Nova da Festival Migas com Todos, em Ferreira do Zêzere Barquinha (Mar./Abr.) Festival Gastronómico da Cachola e da Morcela, em Alcanena Abril Prova do Azeite, em Vila Nova da Barquinha (Nov./ Festival de Lagostins do Rio, em Ferreira do Zêzere Dez.) De Tomar e dos Conventos – Doçaria Tomarense, em Festival do Chícharo, em Bugalhos, Alcanena. Tomar De Fevereiro a Novembro, jantares temáticos men- Maio sais na “Ucharia do Conde”, em Ourém Vai à Fava - Festival Gastronómico da Fava, em Ferreira do Zêzere Congresso da Sopa, em Tomar Vinhos da Região Festival de Cozinha Medieval, Festa Templária, em Os vinhos produzidos nesta região integram a Tomar Comissão Vitivinícola Regional do Tejo. Excepção Feira d’Época, em Vila Nova da Barquinha para o município de Ourém, que integra a Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa. Junho Festival Gastronómico Coisas d’Ovo, em Ferreira do Zêzere Festival do Azeite e das Ervas Aromáticas, em Alcanena Feira Medieval, em Torres Novas Festa dos Tabuleiros, em Tomar (de 4 em 4 anos, em Jun./Jul.)

Julho Festas do Almonda, em Torres Novas

Agosto Festival Gastronómico da Enguia, em Boquilobo, Torres Novas

23 SOPA DE NABOS COM FEIJÃO

Pela sua consistência encorpada, esta Sopa de Nabos Ingredientes com Feijão é um alimento reconfortante para comer 1 kg de feijão branco; azeite; sal; 2 cenouras; batata quando a Primavera chega com as novas hortaliças, q.b; 1 ou 2 cabeças de nabo e a rama dos mesmos. mas trazendo ainda consigo temperaturas que pedem comida quente. O feijão branco, com a sua textura Preparação suave e cremosa, nunca falta na tulha de qualquer casa Coze-se cerca de 1 kg de feijão branco. Depois de de lavrador. E basta ir à horta arrancar dos alfobres as cozido, passa-se pela máquina, reservando duas verduras, combinando o sabor amargo dos nabos com o conchas de feijão inteiro que se junta ao puré. Vai adocicado das cenouras. E aí está tudo o que é necessário ao lume, com uma pinga de azeite e sal a gosto. De para fazer uma sopa simples mas nutritiva, com os seguida, migam-se as ramas dos nabos, cortam-se produtos que foram cultivados pela família. em quartinhos as cenouras, as batatas e as cabeças de nabo. Quando o puré estiver a levantar fervura, deita-se tudo na panela e deixa-se cozer bem até a batata começar a desfazer-se. No fim de cozinha- do, serve-se. Há quem acompanhe com pão frito ou quem coma com migas de broa. Também pode servir-se com bacalhau assado, temperado com alho e azeite.

Para acompanhar esta sopa, escolha um vinho jovem tinto da Região Tejo, sem estágio em madeira.

25 SOPA DE LAGOSTINS

O lagostim de água doce é uma espécie exótica Ingredientes proveniente do sul dos Estados Unidos, introduzida Lagostins; batatas, azeite, alho, cebola, tomate, ce- em Portugal através de Espanha, e que rapidamente noura, coentros e sal. se espalhou pelas diferentes bacias hidrográficas da Península Ibérica. A sua proliferação causa enormes Preparação prejuízos nas culturas devido à sua actividade Cozem-se os lagostins à parte em água e sal. Depois escavadora, provocando alterações na hidrologia e de frios, descascam-se e reservam-se num prato. nos solos, incluindo a perda de água nos arrozais e em Faz-se um refogado com azeite, dentes de alho, reservatórios. Para tentar lutar contra essa autêntica bastante cebola, muito tomate, cenoura picadinha praga que invade as águas do rio e da albufeira de e um molho de coentros. Quando já está a refogar, Castelo do Bode, a vila de Ferreira do Zêzere lançou há acrescenta-se-lhe uma ou duas batatas aos quartos alguns anos uma iniciativa que se tem vindo a repetir e um pouco do caldo onde se cozeram os lagostins. por alturas da Primavera, subordinada ao mote “Se Deixa-se cozer bem para apurar e rectificam-se os não podemos vencê-los, vamos comê-los!”. Durante temperos. No fim, juntam-se os lombos dos lagostins o Festival Gastronómico do Lagostim de Rio, que conta previamente descascados. com a adesão de restaurantes da região e a afluência de apreciadores, são propostos diversos pratos inovadores Como se trata de uma sopa com marisco, opte, para à base do lagostim, confeccionado nas mais diferentes a acompanhar, por um vinho branco seco, frutado, formas, entre as quais a Sopa de Lagostins do Rio. jovem ou levemente maduro da Região Tejo. Evite os vinhos brancos com presença de madeira.

27 SOPAS DE VERDE

De acordo com a tradição oral, o nome desta receita, Ingredientes com origem na região serrana, deriva de sangue – “o 1 kg de vísceras de carneiro, de cabra ou de vitela e, verde” - pois tem por base a utilização do sangue e das eventualmente, carne das mesmas reses; sangue dos vísceras dos carneiros tradicionalmente abatidos para os referidos animais; 1 cebola grande; 2 dentes de alho; banquetes nupciais ou as festividades de cariz religioso, 0,5 l de vinho branco; pimentão doce q.b.; 1 folha de numa perspectiva de aproveitamento máximo dos parcos louro; 1 raminho de hortelã; 0,5 kg de pão caseiro, recursos disponíveis. Com o abandono da pastorícia e o de preferência com dois dias de cozedura; sal q.b. e consequente desaparecimento da criação de ovinos, os piripiri opcional. organizadores das festas passaram a comprar a carne e o sangue nos talhantes que, muitas vezes, em vez de sangue Preparação e de vísceras de carneiro, vendem de vaca. Mas, apesar Num alguidar de barro, coloca-se a carne a mari- destes desvios, a tradição mantém-se e, em dias de festa, nar com o vinho e todos os temperos, durante, pelo em mesas corridas, sentam-se paroquianos e visitantes menos, 1 hora. Coze-se o sangue, de preferência em para saborear as Sopas de Verde, que ninguém faz em panela de ferro, só em água e sal. Já cozido, corta-se casa, pois ”sabem muito melhor quando são feitas em em pedaços pequenos para um tacho de barro onde conjunto por muita gente”. já se deve encontrar alourada a cebola. Junta-se-lhe o conteúdo do alguidar e deixa-se guisar em lume brando. Com o guisado pronto, acrescenta-se-lhe água, para fazer molho e deixa-se ferver um pouco.

Numa terrina, põe-se o pão em fatias, ou migado à mão, com o raminho de hortelã. Sobre ele, derrama- se o molho do guisado, para ensopar e coloca-se a carne por cima. Deve servir-se bem quente1.

Sendo este um prato de carne pouco elaborado, acompanha bem com vinhos tintos da Região Tejo que tenham menor complexidade. Assim, procure um tinto jovem, sem estágio em madeira, para ligar com esta sopa.

29 ENGUIAS DO BOQUILOBO

A Reserva Natural do Paúl do Boquilobo situa-se nas Ingredientes margens do Rio Almonda, um afluente do Tejo, na Para enguias fritas: 1 kg de enguias; farinha; sal q.b.; junção dos concelhos de Torres Novas e Golegã. Esta vinagre e sumo de limão para temperar reserva consiste numa zona húmida natural de água doce, rodeada por pântanos e sulcada por numerosas Para enguias grelhadas: 1,2 kg de enguias; 1 ce- valas, que contribuem para a extraordinária fertilidade bola; azeite; sal q.b.; vinagre e sumo de limão para desta área. É grande a sua riqueza em termos de temperar. habitats tanto para espécies animais como para espécies vegetais, mas as aves constituem o valor fundamental Preparação do Paúl do Boquilobo, sendo a principal razão pela Enguias fritas: Temperam-se as enguias com sal, qual é classificado como Reserva Natural. Por aqui envolvem-se em farinha e fritam-se em óleo bem passam milhares de aves para nidificar ou como ponto quente durante cerca de 10 minutos. Retiram-se para de paragem na rota da migração. O Paúl apresenta uma travessa e temperam-se com vinagre e sumo de igualmente um interesse relevante para a conservação limão. da fauna piscícola, oferecendo boas condições para a reprodução de muitas espécies ou para a subsistência Enguias grelhadas: Depois de previamente tempera- de outras, como é o caso da enguia que, subindo o das com sal, levam-se as enguias a assar em grelha curso dos rios, aqui encontra o local ideal para viver. de carvão durante 15 minutos, aproximadamente. A abundância de enguias é uma vantagem económica para os habitantes das imediações, que a pescam para Qualquer uma destas receitas é normalmente acom- comercialização e para consumo próprio, de formas panhadas com migas de bacalhau 2. variáveis, tornando famosas as enguias de Boquilobo. De tal maneira que, anualmente, com o patrocínio Estes dois pratos de peixe têm uma certa complexi- da Câmara de Torres Novas, se realiza na aldeia de dade, por isso, ambos requerem, para acompanhar, Boquilobo, o Festival Gastronómico da Enguia. um vinho branco estruturado e untuoso em que o es- tágio em madeira de carvalho lhe traga maior sofisti- cação. A Região Tejo tem uma variedade de brancos assim. As castas base destes vinhos são normal- mente Fernão Pires, Arinto, Verdelho, Trincadeira das Pratas e Viogner.

31 ENSOPADO DE ENGUIAS

O Ribatejo Norte é uma região cruzada por diversos Ingredientes rios, constituindo a bacia hidrográfica do Tejo, que tem como principais afluentes o rio Zêzere, o Nabão, 1,2 kg de enguias; 3 cebolas grandes; 1,5 dl de azeite; o Alviela, o Almonda e o Ocreza. Esta abundância 750 g de tomate maduro; 2 dentes de alho; 1 folha de de cursos de água veio, desde cedo, definir a cultura louro; 1 ramo de salsa; 1 colher de sopa de colorau; e o modo de vida das populações, imprimindo no seu 2 dl de vinho branco; 2 pimentos; sal e pimenta q.b.; quotidiano a marca da borda de água. Por isso, a pesca 300 g de fatias de pão duro frito em azeite ou torra- e o transporte fluvial de pessoas e bens foram, durante do na altura. gerações, as actividades principais de grande parte dos habitantes das povoações das margens dos rios, cuja Preparação alimentação era condicionada pelos recursos de que Amanham-se as enguias e cortam-se em bocados mais facilmente dispunham: o peixe do rio. A grande regulares. Temperam-se com sal. Cortam-se as quantidade de enguias que, ainda hoje, sobem os rios, cebolas em rodelas e alouram-se em azeite. Quando apesar dos diferentes obstáculos que se levantam à sua as cebolas estiverem bem louras, junta-se o tomate migração, fez surgir nas diferentes localidades situadas cortado em bocados grossos, os dentes de alho es- ao longo das margens várias formas de confeccionar magados, o louro, a salsa, o colorau, o sal e a pimen- este peixe, das quais se destaca o ensopado que, com ta. Deixa-se refogar um pouco, junta-se os pimentos, pequenas variações, faz parte do receituário de toda esta o vinho branco e as enguias, envolvendo-as bem no zona. refogado.

Serve-se sobre o pão frito ou torrado.

Acompanhe com vinho branco estruturado, com estágio em madeira. Seleccione um da Região Tejo, terroir de eleição para os brancos portugueses.

33 MIGAS DE BACALHAU

Tivemos sempre pão, Ingredientes Nem que fosse pouquinho, 2 postas de bacalhau demolhado; 1 kg de batatas; Era bem dividido, 200 g de pão de trigo caseiro ou 300 g de broa de P’ra todos um bocadinho. milho; 4 dentes de alho; 3 ovos cozidos; azeitonas; salsa ou coentros picados; 2,5 dl de azeite, sal q.b.

Esta simples quadra popular reflecte uma realidade Preparação social em que até o pão, mesmo sendo pouco, tinha que Cozem-se as postas de bacalhau, escorrem-se, chegar para muitos. Era a realidade vivida na zona aproveitando-se o caldo, e lascam-se. Depois de de origem deste prato, a zona serrana do Ribatejo, em descascadas, cortam-se as batatas em bocados que as pessoas tinham muitas dificuldades económicas e pequenos, cozem-se em água e sal e, depois de comiam o que aparecesse. Longe do litoral, o peixe era cozidas, escorrem-se e misturam-se com o bacalhau. escasso: o único a que tinham acesso era ao bacalhau. Esmagam-se grosseiramente dois ovos cozidos e Com ele, as mulheres preparavam, de madrugada, corta-se o outro em gomos ou em rodelas. No fundo numa panela de ferro ou de barro, uma refeição que de um tacho largo de barro, com tampa e que possa levavam embrulhada em serapilheira para ser comida ao ir ao lume, dispõe-se o pão previamente migado, me- meio-dia pelo rancho da apanha da azeitona. Ao longo tade da salsa picada e dois dentes de alho picados. de gerações de camponeses, com restos de pão e uma Coloca-se o bacalhau com as batatas e, por cima, lasca de bacalhau, às vezes com batatas e azeitonas, era os restantes alhos e a salsa picados, os ovos cozidos este o alimento para um dia de trabalho de sol a sol. e as azeitonas. Rega-se primeiro com cerca de 3 dl do caldo de cozer o bacalhau e, de seguida, com o azeite. Tapa-se e leva-se ao lume, fervendo cerca de 10 minutos. Retira-se e destapa-se só na mesa.

Prato de sabor intenso, com texturas macias, onde o pão está presente. Pede um vinho com bom volume, não necessariamente pesado. Opte por um branco estruturado, com estágio em madeira, da Região Tejo.

35 CHÍCHAROS COM BACALHAU ASSADO

Os chícharos são um tipo de leguminosa que era muito Ingredientes comum em Portugal, sobretudo nas aldeias serranas Cebola; azeite; chícharos; miolo de broa; bacalhau do concelho de Ourém, onde os terrenos são áridos e assado. pobres, pois a sua cultura não é exigente e resiste bem às secas. Assemelham-se ao termoço, mas têm uma Preparação textura suave e aveludada. Muitas vezes usados como Na véspera de os chícharos serem cozinhados, são forragem, nas casas mais pobres eram a base da dieta escolhidos para dentro de um alguidar, cobrem-se alimentar e, por isso, associados a tempos de escassez. de água abundante e ficam de molho uma noite. Em Caíram em desuso em meados do século passado, seguida, cozem-se como se fossem feijões e, depois provavelmente devido a essa ligação com a pobreza e de cozidos, deitam-se num prato com miolo de broa à medida que as condições de vida foram melhorando. e cebola crua picada. Mistura-se tudo e estão pron- No entanto, são ricos em nutrientes e muito versáteis. tos a comer como acompanhamento de bacalhau Mais recentemente, voltaram a ser semeados e, para a assado, regado com bom azeite3. sua promoção,organiza-se anualmente, desde 2003, no concelho vizinho de Alvaiázere, um festival que atrai Este prato de bacalhau com bom porte tem como inúmeros visitantes desejosos de provar este verdadeiro aliado um vinho branco intenso e estruturado, com pitéu bem português. Nesta mesma localidade e com o estágio em madeira. A acidez e a persistência são mesmo objectivo, foi criada em 2010 a Confraria do fulcrais para compensar a suculência deste prato. Chícharo. Opte por um branco da Região Tejo.

37 CALDEIRADA DE PEIXE DO RIO

O concelho de Vila Nova da Barquinha é caracterizado Ingredientes pela presença de três cursos de água que o enquadram e 2 kg de vários peixes do rio - fataça, barbo, enguia e delimitam – o Nabão, o Zêzere e o Tejo. Não admi- carpa; 3 cebolas grandes; 4 tomates grandes; 3 den- ra, por isso, que a sua economia esteja marcada tes de alho; sal e pimenta; 1 ramo de salsa; 2 folhas desde sempre pela sua localização ribeirinha, desde o de louro; 1 pimento; 1 dl de azeite; 1 copo de vinho transporte fluvial até à pesca. Da mesma forma, não branco; piripiri. é estranho que a sua gastronomia seja dominada pelos rios, encontrando neles os principais ingredientes para Preparação a sua cozinha tradicional. A Caldeirada de Peixe do Rio Colocam-se no fundo do tacho os vários peixes já é um prato típico deste concelho, confeccionado com amanhados e cortados. Por cima, uma camada de peixes capturados no rio Tejo, nomeadamente a fataça, o rodelas de cebola e outra camada de peixe. Cobre-se barbo, a enguia e a carpa. Com o molho da Caldeirada com rodelas de tomate e, por cima, alho picado, sal ainda se faz um segundo prato, regando com ele pedaços e pimenta, alguns pés de salsa e meia folha de louro. de pão duro e fazendo uma sopa. Todos os ingredientes formam camadas e, sobre a última camada, coloca-se o pimento cortado em ti- ras. Rega-se com o azeite e o vinho branco e junta-se o piripiri. Leva-se a lume forte para levantar fervura rapidamente. Reduz-se o calor e deixa-se cozer tapado, até o pimento estar macio. Acompanha com fatias de pão duro fritas em azeite ou com batatas cozidas às rodelas.

Sopa de Peixe do Molho da Caldeirada: Miga-se pão de trigo caseiro num alguidar e, de seguida, deita-se o molho que ficou da caldeirada por cima do pão e abafa-se.

Esta caldeirada liga com um vinho branco, jovem, frutado e acídulo. Procure um vinho bem estruturado, feito a partir da emblemática casta Fernão Pires, que domina os brancos da Região Tejo.

39 AÇORDA DE SÁVEL

Há já vinte anos que o concelho de Vila Nova da Ingredientes Barquinha organiza um certame em que o protagonista 1 kg de sável; 7 dentes de alho; 1 ramo de coentros e é o sável pescado no Tejo. Esta iniciativa tem como salsa; 1 dl de azeite; 240 g de pão duro; 1 l de água; principal objectivo promover os sabores do rio e sal e limão. a cozinha típica e tradicional que tem como base os produtos da região. A vida deste concelho está Preparação intimamente ligada à actividade piscatória, pois o seu Em água e sal cozem-se a cabeça, o rabo e as ovas território é banhado por três rios – o Nabão, o Zêzere e do peixe. Noutra panela deita-se o pão cortado aos o Tejo – cuja presença influenciou desde sempre o modo bocadinhos, escaldando-se bem na água da co- de viver e a cultura dos seus habitantes, muitos dos quais zedura depois de coada. Com uma colher de pau, continuam a dedicar-se à pesca. desfaz-se o pão até se conseguir uma papa uniforme e levemente seca. Juntam-se o azeite e os dentes de Apesar dos inúmeros obstáculos que o sável vai alho e leva-se ao lume. Acrescentam-se, sem exage- encontrando no seu caminho quando sobe o curso dos ro, sumo de limão, salsa e coentros picados. Sobre rios para desovar perto das nascentes, e que provocam este preparado, esfarelam-se as ovas e um pouco a diminuição dos efectivos que conseguem prosseguir do peixe desfiado. Depois da açorda pronta, pode viagem, à sua passagem pelas imediações da Barquinha, adicionar-se uma ou duas gemas de ovo. As postas muitos são capturados pelas redes dos pescadores do sável, cortadas bastante finas, fritam-se numa fluviais, permitindo, assim, que os apreciadores da frigideira em azeite bem quente até ficarem “esmaia- gastronomia tradicional se deliciem com algumas damente” torradas. especialidades confeccionadas com este peixe de carne saborosa, entre elas a célebre Açorda de Sável. Nota – Podem embrulhar-se as postas de peixe, ainda cruas, em toalhas turcas e bater sem moer, de um e de outro lado, para que as espinhas fiquem apresadas nos panos.

A intensidade do sabor da açorda - com o pão, o azeite quente e o alho - e do sável frito pede um vinho branco estruturado, com estágio em madei- ra, para se bater com a estrutura e a suculência do prato. A Região Tejo é pródiga na oferta de brancos desse género.

41 LAMPREIA DE SANGUE

A lampreia de Ourém ou lampreia do Nabão, Ingredientes “Lampetra auremensis”, foi identificada recentemente 1 lampreia e o sangue; 1 dl de vinho tinto; 1 cebola; como sendo exclusiva de algumas ribeiras da bacia do 1 cenoura; 2 dentes de alho; manteiga; 1 colher de Rio Nabão, afluente da margem direita do Rio Tejo, e azeite; vinho branco; sal e pimenta q.b.; sumo de ainda com populações diminutas nas ribeiras do norte do limão. concelho de Ourém. Preparação Tendo passado parte da sua vida no alto-mar, quando Amanha-se a lampreia, aproveitando o mais possí- chega à idade adulta, este estranho animal sobe o caudal vel o sangue que ela contém, lavando a barriga com do rio onde nasceu, para desovar. E a cidade de Tomar, 1 dl de vinho tinto para completo aproveitamento. graças à excelência desta espécie pescada nos cursos de Depois, Parte-se em postas de 4 cm, que se tempe- água que banham o seu concelho, torna-se, entre o final ram com sal, pimenta, sumo de limão e 2 dentes de do Inverno e o início da Primavera, um dos principais alho finamente picados. À parte, faz-se um refogado destinos dos apreciadores, quase viciados, deste pitéu. com cebola e cenoura picadas, uma colher de azeite e manteiga. Quando a cebola ficar loura, acrescen- tam-se os bocados da lampreia que se deixam ferver um pouco, dando-lhes algumas voltas na gordura. Em seguida, deita-se a marinada, deixando-se cozer a lampreia. Acrescentam-se, de quando em quando, mais colheres de vinho branco e água, em partes iguais. Quando a lampreia está cozida e o molho apurado, junta-se o sangue, deixando-se cozer por uns momentos. Acompanha com arroz de manteiga.

Esta especialidade da gastronomia ribatejana me- rece ser regada com um bom vinho tinto maduro da Região Tejo. Procure um vinho complexo mas harmo- nioso que faça ligação com o tempero da marinada.

43 FRANGO NA PÚCARA À TEMPLÁRIOS

A receita do Frango na Púcara é, provavelmente, a Ingredientes recriação moderna de um prato da cozinha tradicional 1 frango; 15 batatas; 100 g de toucinho entremeado; da região de Alcobaça. Inicialmente, e até meados 100 g de manteiga; 150 g de cebolinhas; 50 g de do século XX, a receita seria Perdiz na Púcara, que cogumelos; 0,5 dl de vinho da Madeira. congregava muitos apreciadores. Quando as perdizes começaram a escassear, por volta dos anos 60, um Preparação célebre cozinheiro de Alcobaça, António de Sousa, Depois de cortado, tempera-se o frango com sal, conhecido pelo nome de Bonzíssimo, criou uma variante, deixando-o a marinar em vinho da Madeira durante o Frango na Púcara, cozinhando a ave doméstica com 24 horas. Depois, barra-se com manteiga e leva-se os ingredientes necessários para que o seu sabor se ao forno, a corar, dentro de uma púcara de barro, aproximasse do da receita original. Muito saboroso e tapada. Corta-se o toucinho em dados, cora-se numa muito mais acessível, tornou-se, desta forma, um prato frigideira, juntamente com as cebolinhas, e assam-se muito popular, não apenas em Alcobaça, mas também as batatas. Cortam-se os cogumelos ao meio ou em um pouco por todo o País, embora com pequenas lâminas grossas, salteiam-se em manteiga e refres- alterações. De comum, o recipiente onde o frango é cam-se com vinho. Deitam-se todos os componentes confeccionado: uma pequena panela de barro, com duas por cima do frango quando este estiver meio assado, asas, onde o cozinhado é servido. A popularidade deste acabando de assar tudo junto. Se o frango ficar en- prato chegou à terras dos Templários, que introduziram xuto em demasia, adiciona-se um pouco de molho do algumas modificações de forma a conferir-lhe um assado. Serve-se dentro da mesma púcara e tapada, carácter local. tal como sai do forno4.

O Frango na Púcara à Templários é um prato de sabores honestos a exigir um vinho tinto jovem sem estágio em madeira. Seleccione um vinho tinto da Região Tejo com menor complexidade, pouco tanino- so, frutado e com aromas a frutos vermelhos.

45 CABRITO ASSADO NO FORNO

É no Parque Natural da Serra D’Aire que pastam os Ingredientes exemplares caprinos de raça Serrana que servem de 1 cabrito pequeno; 100 g de toucinho; 250 g de chou- base à confecção deste prato. As características únicas riço de carne; 5 cebolas; 1 ramo de salsa; 2 dentes de da flora da Serra D’Aire, onde abunda uma enorme alho; piripiri; sal; 2,5 dl de vinho branco. variedade de plantas aromáticas, são fundamentais para se conseguir o sabor peculiar da carne do cabrito e, Preparação consequentemente, desta especialidade gastronómica. A Prepara-se o cabrito como habitualmente, corta-se escolha e a combinação dos temperos também revelam e dispõe-se numa assadeira. Passa-se pela máquina o cuidado posto na confecção deste prato. Barrada o toucinho, o chouriço, as cebolas, a salsa, os dentes com uma pasta de tempero aromatizada e salpicada de de alho e o piripiri. Tempera-se com sal e barra-se o salsa, a carne de cabrito vai a assar no forno em tacho cabrito com este preparado. Leva-se a assar no forno de barro, produto das mãos dos oleiros da região e e refresca-se o cabrito durante a assadura com o representativo do genuíno artesanato torrejano. vinho branco. A meio da preparação no forno, intro- duzem-se na assadeira batatinhas novas ou batatas cortadas em quartos. Deixa-se assar. Acompanha-se esta carne suculenta com grelos cozidos em água e sal, regados com um fio de azeite.

O Cabrito Assado no Forno é um prato que pede a presença de uma garrafa de vinho tinto à mesa. Para se harmonizar melhor com os sabores elaborados desta peça de carne, espera-se que o vinho tenha complexidade e persistência, com aroma a fruta pre- ta madura, especiarias e tosta. Os tintos da Região Tejo das castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho, são as esco- lhas ideais para este tipo de prato.

47 FRIGINADA

A Friginada é um prato típico da região de Ourém, Ingredientes confeccionado na altura da matança do porco e cuja 300 g carne de porco cortada em cubos; 300 g de designação é um regionalismo que significa fritada. entrecosto cortado em pequenos pedaços; 3 dentes Depois de morto e chamuscado, seguia-se a lavagem e a de alho; 2 colheres de sopa de banha; 2 folhas de esfola do animal, tarefa que cabia aos homens, enquanto louro; vinho branco q.b.; sal, pimenta, colorau, comi- as mulheres, na cozinha, cortavam as miudezas, nhos, cravinho q.b. como o fígado e os pulmões, a que vulgarmente se chama bofe, e algumas carnes gordas, que depois eram Preparação temperadas e deixadas em repouso algumas horas Tempera-se toda a carne cortada com sal, pimenta, para apurarem o gosto. Com a entrada em vigor de colorau, cominhos, cravinho, os dentes de alho pica- legislação que proibe o abate do porco em casa, bem do, o louro e o vinho. Deixa-se repousar o preparado como as transformações sócio-económicas ocorridas no durante 2 a 3 horas. Num tacho de barro, coloca-se mundo rural, foram desaparecendo os rituais inerentes a banha que vai ao lume para derreter, juntando-se à matança do porco, provocando a alteração parcial seguidamente o preparado anterior, que se deixa dos preceitos que presidiam à confecção deste prato, cozinhar em lume brando. Aos poucos, vai-se refres- que passou a ser mais raro e cozinhado com carne cando com o vinho. Acompanha com migas de feijão, comprada no talho. Os próprios acompanhamentos couve e broa esfarelada ou com grelos5. foram sendo diversificados e, embora a broa continue a estar presente, é acompanhada por batatas e grelos de Este prato de carne de porco pede para ser acompa- nabo, cuja abundância coincide com a época em que a nhado com um vinho tinto complexo, com madeira. matança seria feita. Na região vitivinícola do Tejo existem escolhas muito adequadas, principalmente as que nos chegam dos terrois do Bairro e da Charneca.

49 BROINHAS DE ALCANENA

As Serras d’Aire e dos Candeeiros, agrestes e elevadas, Ingredientes marcam a paisagem do norte do concelho de Alcanena. 0,5 kg de farinha; 0,3 kg de açúcar; 2,5 dl de azeite; A actividade agrícola, apesar dos solos pouco férteis, 3 colheres de sopa de mel; 200 g de nozes picadas onde predominam os olivais, os frutos secos, alguns grossas; 20 g de canela; 10 g de erva-doce; 0,5 l de cereais e culturas forrageiras, assume importância social água. no concelho, sobretudo por constituir um complemento ao rendimento familiar. A produção de mel é também Preparação uma prática tradicional bem enraizada, com uma Junta-se tudo num tacho, excepto a farinha, e levan- história antiga e particularidades que o distinguem. do-se ao lume até ferver durante cerca de 5 minutos. A vegetação apícola característica desta sub-região é Acrescenta-se a farinha e volta a ir ao lume a cozer constituída por uma diversidade florística das serras e até se despegar, o que significa que a massa está das matas, onde abunda o cheiro a alecrim, a tomilho, pronta. Distribui-se a massa em montinhos, a que se a rosmaninho, a eucalipto, o que imprime a este mel um dá o feitio de broas a estreitarem nas pontas, que vão paladar, uma textura e uma cor característicos. ao forno e, depois de cozidas, ainda quentes, envol- vem-se em açúcar. São os produtos que a terra dá que vão determinar a gastronomia da região. Por isso, a doçaria lança mão do Estas Broinhas de Alcanena são ideais para ser mel e dos frutos secos que, manuseados e combinados de comidas em qualquer altura do dia. Mas, se optar formas diferentes, dão origem a manjares diferentes. É por finalizar uma refeição na sua companhia, pode o caso das Broinhas de Alcanena, para cuja confecção acompanhá-las com um dos vinhos generosos da a tradição manda que se utilize o mel da Serra D’Aire, Região Tejo. com o seu sabor particular. Antigamente, só eram feitas pelo Natal e pelos Santos, para dar às crianças que, de saco na mão, batiam às portas a pedir “Pão por Deus”. Hoje em dia, por força da procura, são confeccionadas ao longo de todo o ano, embora em menores qantidades do que nas épocas festivas.

51 BOLOS DE CABEÇA

Quem visitar Torres Novas em dia de festa vai, de Ingredientes certeza, encontrar à venda o exemplar típico da 1,5 kg de farinha de trigo; 0,2 l de azeite fino; 500 g doçaria da região: os Bolos de Cabeça, confeccionados de açúcar amarelo; sumo e raspa de vidrado de li- tradicionalmente por altura de casamentos e de romarias mão; uma pitada de canela em pó; 30 g de manteiga; do concelho. Feitos com uma massa lêveda, maciça mas bicarbonato de sódio q.b.; erva-doce q.b.; fermento fofa, aromatizada com erva-doce e raspa de limão, de padeiro q.b.; sal q.b. semelhante à das ferraduras, dos parrameiros, dos bolos de noiva ou dos bolos de festa, tão populares no Oeste, Preparação são, no entanto, tendidos de uma maneira diferente. O Dissolve-se em água tépida o fermento com uma aspecto final dos Bolos de Cabeça, em forma de oito, pitada de sal e trabalha-se um pouco. Junta-se à fari- esconde um encadeamento de gestos e revela um apreço nha e acrescenta-se-lhes o açúcar, a canela, a raspa especial da doçaria popular pelas massas modeladas que do vidrado do limão, a erva doce e o bicarbonato. se torcem, se enroscam, se entrançam antes, de entrar no Mistura-se tudo e rega-se com o azeite e a mantei- forno. ga a ferver. Mistura-se novamente, para desfazer os torrões que se formam e junta-se o sumo de limão Para a divulgação destes bolos muito tem contribuído e água suficiente para começar a amassar. A massa a actividade de Antónia Aguiar, que percorre as festas é trabalhada até ter boa consistência. Embrulha-se do concelho a confeccioná-los à vista dos compradores, depois num pano de algodão e cobre-se com um atraindo-os com as chamas do seu forno transportável e cobertor de lã, deixando-se em repouso de um dia com o aroma da massa dos bolos a cozer. Há trinta anos para o outro, cerca de 10 a 12 horas, até levedar bem. que optou por este modo de vida. Começou por vender Passado este tempo, tendem-se uns rolos de cerca bolos numa banca no mercado e depois expandiu o de 15 cm de comprimento, achatam-se as pontas e negócio, abrindo uma loja e empregando várias pessoas. apertam-se ao meio para formar um estrangulamen- Revela, desta forma, que é possível honrar uma tradição to, ficando com uma cabeça para cada lado. Os bolos modernizando os meios. são colocados num tabuleiro untado e pincelados com ovo batido. Cozem em forno bem quente (cerca de 250º C), durante cerca de 10 minutos.

O Bolo de Cabeça é um bolo seco que pede a com- panhia de um chá, de um café ou, caso se prefira, de um cálice de um vinho licoroso ou de colheita tardia da Região Tejo.

53 TIGELADAS DE FERREIRA DO ZÊZERE

As populares Tigeladas de Ferreira do Zêzere são uma Ingredientes das muitas variantes de um doce conventual que terá 4 ovos inteiros; 16 gemas; 500 g de açúcar; 1 cháve- tido a sua origem no Convento da Graça, em Abrantes, na bem cheia de farinha; 1 l de leite; raspa de 1 limão. cujo Arquivo Histórico já lhes faz referência. Também o Livro de Cozinha da Infanta D. Maria, do século XVI, Preparação inclui uma receita de um doce denominado , Durante meia hora, batem-se os ovos inteiros com cujos ingredientes e confecção coincidem com os de as gemas, o açúcar e a raspa do limão, juntando-se Abrantes. De acordo com alguns testemunhos, terá sido a farinha a pouco e pouco. De seguida, adiciona-se uma lavadeira de Rio de Moinhos, a quem as freiras o leite e mexe-se. Em tigelas de barro não vidrado, do Convento da Graça terão ensinado o segredo do que foram previamente bem aquecidas, deita-se o doce, que ofereceu a receita a uma amiga. E assim se preparado, sem que as tigelas fiquem muito cheias. começou a divulgar esta especialidade, tornando-se Vão então a cozer em forno forte durante cerca de 20 particularmente conhecida em Ferreira do Zêzere. O minutos6. nome de Tigelada deriva da tigela de barro onde o doce é cozido. A tigela deve ser de barro vermelho não vidrado, As Tijeladas de Ferreira do Zêzere são a sobremesa e não pode levar qualquer gordura. Cada Tigelada tem prefeita para acompanhar com um vinho generoso a forma de um disco com cerca de dois centímetros de da Região Tejo. espessura e 10 a 12 centímetros de diâmetro, com uma cor amarelo-torrado e uma textura semelhante à de um pudim.

55 MERENDEIRAS

As Merendeiras são pequenas broas, cuja pronúncia Ingredientes é, muitas vezes, deturpada para “brendeiras” na 500 g de farinha de trigo; 500 g de farinha de milho; região de Torres Novas. A sua designação remete açúcar ou mel a gosto, erva doce e canela q.b.; fer- para um pão pequeno, que era comido numa refeição mento de padeiro; 0.5 l de azeite ligeira, a merenda, normalmente de tarde. É mais um exemplo de doçaria de origem popular, com inúmeras Preparação variantes em várias zonas de Portugal. Em Ourém, As farinhas são escaldadas com azeite quente, dei- por exemplo, juntam-se, em partes iguais, farinhas tando-se de seguida a canela, a erva doce, o fermen- de trigo e de milho. Além disso, e apesar de serem to de padeiro e açúcar ou mel a gosto, amassando-se frequentemente chamadas “bolos dos pobres”, conforme tudo muito bem. Deixa-se levedar a massa durante as disponibilidades de quem as faz, assim podem ter uma uma hora. A massa é depois tendida em pequenas maior riqueza de igredientes, tais como frutos secos. O bolas que se pincelam com ovo, indo de seguida para que parece ser comum a todas elas é a sua relação com a o forno até estarem cozidas. festividade de Todos os Santos, a 1 de Novembro, muito embora continuem a ser consumidas até ao dia de Reis. Seco, com um ligeiro travo a erva doce, a Merendeira Nas aldeias, ainda é costume, nos Santos, oferecer estas é um bolo que chama por um copo de vinho fruta- Merendeiras às crianças que vão de porta em porta, do e aromático. No campo dos vinhos generosos, a pedindo “bolinhos, bolinhos” ou o “pão por Deus”. Região Tejo tem uma oferta muito variada, desde os licorosos aos colheitas tardias, brancos ou tintos. Escolha aquele de que mais gostar.

57 FATIAS DE TOMAR

De acordo com a tradição, as Fatias de Tomar tiveram Ingredientes a sua origem nas cozinhas do Convento de Cristo, 24 gemas de ovos ; 1 kg de açúcar. onde eram confeccionadas para satisfazer a gula dos freires, que as consideravam a sua sobremesa favorita. Preparação É impossível comprovar esta hipótese, pois a primeira Separam-se as gemas das claras apenas no momen- referência conhecida ao doce com este nome data de to em que vão ser batidas. As gemas são batidas 1876, no livro de João da Mata “Arte de Cozinha”, durante uma hora, se for à mão, ou durante vinte e, embora tenham começado por ser conhecidas como minutos, se for com a batedeira. Deita-se a massa Fatias da China, na realidade, têm a sua origem em numa forma oval com tampa, criada especificamente Tomar, conforme afirma Emanuel Ribeiro, em 1928, para o efeito, muito bem untada. Introduz-se a forma no seu livro “O Doce nunca Amargou”. em banho-maria, com a água já a ferver, e deixa-se cozer durante uma hora sem nunca interromper a É um doce feito com muitas gemas de ovos, açúcar e fervura da água. Desenforma-se e corta-se às fatias. água. À partida, nada de muito diferente em relação Para a calda, leva-se o açúcar ao lume a ferver com a qualquer outro manjar da doçaria tradicional um litro de água, até atingir um ponto muito baixo. portuguesa, não fosse o facto de, neste caso, as gemas Introduzem-se as fatias nesta calda, deixando-as serem batidas vigorosamente durante cerca de uma hora ferver um pouco e virando-as. Colocam-se as fatias e depois cozidas em banho-maria, numa dupla panela numa travessa e regam-se com a calda. concebida para o efeito. Trata-se de uma panela de folha, munida de uma chaminé pela qual se acrescenta As fatias de Tomar são geralmente comidas como água a ferver, permitindo uma cozedura em banho- sobremesa. Por serem tão doces e calóricas, são, maria a temperatura constante. Essa panela é, por si cada vez mais, um prato que sugere excepção e só, um produto característico e artesanal da região, festa. Assim, para o acompanhar, recomenda-se uma inventado por um mestre latoeiro em meados do século flute de espumante, um tipo de vinho que começa a XX e só é vendido em Tomar, com a receita no interior. surgir na região Tejo com excelente qualidade. A boa concentração em fruta aliada à frescura do espu- Este doce possui uma textura única, a que a calda de mante limpará o palato dos sabores intensos das açúcar, no final, confere outra doçura. Estando pronto, gemas e do açúcar. apresenta a forma de fatias de pão bem amarelinho, com uma consistência macia e húmida.

59 FIGUINHOS DE TORRES NOVAS

Data do princípio do século XIX a implantação dos Ingredientes vastos figueirais de Torres Novas, como alternativa 10 figos secos; 200 g de miolo de amêndoa; 300 g à vinha, muito dizimada pela filoxera. Face à boa de açúcar; 150 g de água; 6 gemas; baunilha q.b. adaptação ao meio, foi crescendo a importância desta cultura, que se tornou uma actividade bem enraizada e Preparação vital e que representa a base económica da maioria dos Leva-se o açúcar ao lume com a água, até se obter agricultores torrejanos, originando costumes e tradições ponto de pérola fraco. Nessa altura, mistura-se a que ainda hoje têm boa expressão. amêndoa pelada e passada pela máquina, mexendo sempre, até ferver. Tira-se do lume, deixa-se arrefe- Para além do seu consumo em fresco, a partir das cer e juntam-se as gemas mexidas com um garfo e diversas variedades do figo, nomeadamente do Figo um pouco de açúcar baunilhado. Volta ao lume para Preto de Torres Novas e do Pingo de Mel, característicos cozer as gemas e engrossar. Põe-se o doce num desta zona do País, pode fabricar-se uma grande prato e repousa de um dia para o outro. diversidade de produtos, tais como aguardentes e licores; figos secos; pasta de figo; compota de figo; figos secos No dia seguinte, cortam-se os figos em cruz, abrem- recheados com frutos secos diversos; figos fresco em se e coloca-se em cada figo uma bola feita com a calda; bolos à base de figos secos, como os Figuinhos massa de amêndoa7. de Torres Novas, que são já uma referência para quem visita esta cidade do norte ribatejano 7. As bolinhas de ovos e amendoa dentro dos figuinhos secos são uma delícia perfeita para acompanhar com . um dos inúmeros vinhos licorosos, abafados ou de colheitas tardias da Região Tejo. Esta região é, pela sua qualidade, uma das poucas no País com uma Denominação de Origem para vinhos deste tipo.

61 RIBATEJO

63 Por onde passa, o Tejo é o centro de tudo. É o rio que marca o tempo, que condiciona a vida, que fertiliza os solos. Esta importante corrente de água influencia tudo à sua volta, e a sua importância ultrapassa em muito os estritos limites das suas margens. Nos invernos rigorosos, o seu leito adensa-se, invade campos, lugares, vilas. Apesar dos prejuízos, a população agradece: as cheias trazem com elas abundância, bons anos agrícolas e um espectáculo de rara beleza, concretizado na grandiosidade da paisagem espelhada. Nestes solos ubérrimos, terra afamada de vinho, também pastam manadadas de gado bovino e cavalar. O cavalo e o toiro de lide fazem parte do imaginário desta região, e os dois encontram-se cara a cara na, por aqui, mais celebrada das festas, a tourada. Esta é uma tradição que remonta a outros séculos e que está fortemente enraizada no modo de ser ribatejano.

Azambuja Cartaxo

Nas voltas da História, Azambuja começou por O “Pátio das Cantigas”, uma das mais célebres ser um lugar habitado por romanos que, em 711 da comédias portuguesas, vive da riqueza dos diálogos nossa era, foi tomado pelos sarracenos, a quem carregados de duplo sentido. Num deles, Evaristo, deve o topónimo que significa “oliveira brava”. Os papel desempenhado por António Silva, informa que cristãos acabaram por prevalecer quando D. Afonso as dessincronizações do seu fígado obrigam-no a ir Henriques, com os seus ímpetos conquistadores, a águas para o Cartaxo. O ébrio Narciso, encarnado subjugou os mouros da região em 1147. Desses tem- por um brilhante Vasco Santana, responde “Águas pos remotos da reconquista até hoje, Azambuja foi do Cartaxo para o fígado? Hum. Compreendi-te”. No prosperando. O concelho, predominantemente rural, ano em que o filme estreou, em 1941, esta graça era mantém com o rio, que lhe impõe a fronteira a Sul, imediatamente compreendida pela plateia, já que, uma estreita relação. Várias comunidades piscatórias para o público em geral, Cartaxo era sinónimo de fixaram-se nas margens do Tejo. Algumas, vindas da vinho. Desde os finais do Século XIX que esta região costa Atlântica nos finais do Século XIX, construíram se tornou num importantíssimo centro vinícola. Em as curiosas casas palafitas que actualmente ainda se meados do século passado, saíam daqui milhões de podem encontrar, aqui e ali, ao longo do curso do rio. litros de vinho para o ultramar. Actualmente, a quan- Esta profunda ligação com a terra e com o Tejo re- tidade deu lugar à qualidade. Em 2002, o Cartaxo flecte-se na gastronomia tradicional, onde é visível a adoptou a designação de «Capital do Vinho», com o criatividade das suas gentes no aproveitamento dos objectivo de preservar a forte ligação do concelho à recursos disponíveis. É daqui o queijo de Maçussa, o produção vitivinícola. Este município é um dos fun- único chèvre produzido em Portugal de forma artesa- dadores e principal impulsionador da Associação de nal, que conquista espaço, nomeadamente, entre os Municípios Portugueses do Vinho, que, desde a sua chamados produtos «gourmet». fundação, aqui tem a sua sede.

65 Rio Maior Santarém

Elevada a vila em 1836 e a cidade em 1985, Rio Maior Miguel Torga afirmou:O Ribatejo deve ser visto das é sede de um concelho que alia uma entroncada Portas do Sol de Santarém, num dia de cheia, ou das tradição agrícola aos progressos da industrialização. bancadas duma praça de toiros, numa tarde de Verão. Em tempos, foi um grande centro mineiro, tendo sido Num dia de cheia, porque o Tejo hipertrofiado mar- as suas reservas de linhite uma das maiores do País. ca-lhe exactamente a extensão e os toiros, porque é Hoje, possui indústrias alimentares, de madeiras e no redondel que se precisa a sua íntima significação. de cerâmica, mas é o sal que verdadeiramente se Com efeito, o concelho de Santarém deve primeiro destaca neste panorama. ser conhecido do alto da antiga alcáçova. As Portas do Sol são uma entrada directa para o céu, para o É difícil imaginar, mas as marinhas de Rio Maior têm Tejo e para os campos, para esse horizonte rasgado mais de oito séculos de história. Data de 1177 o mais que se alcança da muralha, que um dia foi defensiva, antigo documento que se conhece que menciona Rio mas que hoje, feita mirante, nos lança para a mais Maior e este é o comprovativo da venda, por parte maravilhosa das vistas. Santarém é tudo quanto de Pêro d’Aragão, de uma vasta área de terreno, que se consegue alcançar daqui: é o olival que lança abarca o poço e as Salinas de Rio Maior, à Ordem raízes na terra do bairro, é o toiro bravo que pasta do Templo. O poço original, entretanto, secou com a no campo, o cavalo que é desbastado no picadeiro, abertura de um novo. Diz a tradição que este último a vinha que é vindimada, o solo que é amanhado, e foi descoberto por uma pastora que apascentava é o rio, o sempre presente Tejo, que alimenta tudo à uns animais. Quando a sede apertou, recorreu a uma sua passagem. Mas é muito mais do que isto, é um poça que encontrou por entre uns juncos. A água lugar cheio de história, de cultura e de património. que lhe chegou à boca tinha um gosto desagradavel- Conhecida como a “Capital do Gótico”, em Santarém mente salgado e, quando mais tarde comentou em proliferam vestígios deste estilo arquitectónico em casa o ocorrido, o pai e os vizinhos apressaram-se a igrejas, campanários, conventos. cavar a zona. Nesta cidade, chegaram-se a contar cerca de dezas- É de destacar que o sal das marinhas do concelho seis mosteiros o que, indiscutivelmente, contribuiu tem a particularidade curiosa de ser extraído da água muito para a qualidade da doçaria tradicional. As de poços, alimentados pelas correntes de água que Broas e as Queijadinhas do Céu do Convento de São atravessam a extensa e profunda jazida de sal-gema. Domingo das Donas, as Celestes do Convento de Talvez por isso, o produto daqui obtido seja consi- Santa Clara e os Arrepiados do Mosteiro de Almoster derado superior em qualidade e mais forte que o sal da Ordem de Cister são disso só um exemplo. É marinho comum. Assim, um bom gastrónomo não também incontornável a associação de Santarém ao vai a Rio Maior sem de lá trazer uns Queijinhos de Festival Nacional de Gastronomia que ali se realiza Sal. A sua forma cilíndrica característica é conse- desde 1981 com o objectivo de promover os produtos guida moldando o sal com sinchos e depois cozido e as tradições do concelho. em forno de lenha. Para os usar, basta raspá-los com uma faca.

67 GASTRONOMIA AGENDA REGIONAL GASTRONÓMICA

Azambuja Rio Maior Março Novembro Queijo de Maçussa, escarapiada, bolo de chouriço, Torradas de alho, chícharos com bacalhau assado, Tasquinhas, em Rio Maior Feira das Tasquinhas, em Aveiras de Cima, Azambuja laroias, sopas de batata, de chícharos, de cardos, de salada de rabaça, sopa de pampostos com feijão Festa do Vinho, em Alcanhões, Santarém Feira dos Santos, no Cartaxo ineixas com feijão e de grão com carne de porco, seco e arroz, sopa de cardos com feijão branco, Prova do Azeite, em Vila Nova da Barquinha (Nov./ arroz de lampreia, açordão com bacalhau assado, lapardana, galo com nozes, galucho, galinha caseira Abril Dez.) lapardana, manja com sardinha assada, enguias fri- à moi-almas, cabrito frito, cachola guisada à campo- Àvinho - Festa do Vinho e das Adegas, em Aveiras de Festival do Chícharo, em Bugalhos, Alcanena tas ou de ensopado, caldeirada de peixe do rio, sável nês, arroz da matança e carne de porco à talim-talão. Cima, Azambuja com migas ou açorda, carne de toiro com repolho, Nos doces, destaca-se o famoso pão-de-ló de Rio Tasquinhas de Manique, na Azambuja Dezembro coelho guisado com feijão, borrego no forno, arroz Maior, os nógados, o favo de mel com laranja, os Festa do Vinho do Cartaxo, no Cartaxo A Gula – Semana Gastronómica do Concelho de de cachola, torricado com febras. Nos doces, queija- bolos de noivos, o arroz-doce dos casamentos e os Festival de Sopas, em Alcanhões, Santarém Azambuja, na Azambuja dinhas de Azambuja, bolo de noiva, fatias paridas e leões de Rio Maior. Festival de Sopas, em Abitureiras, Santarém arroz-doce de Azambuja. Maio Santarém Tasquinhas de Alcoentre, em Alcoentre, Azambuja Cartaxo Petinguinhas de escabeche, molhinhos, morcela de Praça das Tasquinhas da Feira de Maio, na Azambuja Vinhos da Região Caracoletas na brasa, de bacalhau, torri- arroz, bucho de porco, sopa de peixe do rio, tomata- Os vinhos produzidos nesta região integram a cado ou toiras, sopa de feijão com castanhas, sopa da, magusto, fataça assada na telha, massa à barrão, Comissão Vitivinícola Regional do Tejo. de coelho, sopa de grão, açorda de sável, enguias molhinhos com grão, magusto com costeletas de Junho fritas e de ensopado, fataça na telha ou frita com borrego, entrecosto com arroz de feijoca, naco de toi- Feira Nacional de Agricultura – Salão Prazer de açorda, naco de boi com vinho tinto, carne de porco à ro avinhado. No capítulo da doçaria, as propostas vão Provar, em Santarém Confrarias cartaxeira, coelho com ervilhas, galinha corada, fran- para os arrepiados de Almoster, celestes de Santa Festival do Arroz-Doce, em Vale de Figueira, Confraria da Gastronomia do Ribatejo go à moda do Cartaxo, miolos à moda do Cartaxo e Clara e pampilhos. Santarém Confraria dos Cavaleiros da Adega arroz de fressura. Nos doces, destacam-se o arrôbio, Festival do Caracol, no Vale de Santarém, Santarém Confraria Enófila Nossa Senhora do Tejo cartaxinhos, caspiadas, sopas de cavalo cansado, Confraria Almoçarista de Rio Maior fatias paridas, pés de abóbora e velhoses. Julho Festival de Marisco, em Azoia de Cima, Santarém

Setembro Feira Nacional da Cebola, em Rio Maior

Outubro Festival Nacional de Gastronomia, em Santarém Paraísabor, em Vale do Paraíso, Azambuja Festa das Vindimas, em Aveiras de Cima, Azambuja

69 71 SOPA DE PEIXE DO RIO

Esta Sopa de Peixe do Rio tem origem na cozinha Ingredientes tradicional das populações avieiras, oriundas da praia 1 kg de peixe do rio, tal como carpa, fataça, barbo; de Vieira de Leiria, fixadas nas zonas ribeirinhas do 1 kg de batatas; 1 l de água; 1 dl de azeite; 1 cebola Rio Tejo, entre Vila Franca de Xira e Alpiarça. Eram grande; 1 pimento; 5 tomates maduros; 2 ovos; 1 gente do mar que, durante o Inverno, não conseguia ramo de salsa, coentros e hortelã; pão torrado em ir para a faina devido à bravura das ondas, e o Tejo, fatias; alho; louro; sal; piripiri q.b. rico em peixe, prometia-lhes o sustento que o mar lhes negava. Aí, a safra do sável dava-lhes a ilusão de uma Preparação vida melhor.Embora não haja registos, estas migrações Amanha-se o peixe e tempera-se com sal. Cortam-se ocorreram, sobretudo, nos finais do século XIX, e a as batatas às rodelas. Num tacho, junta-se o azeite, designação de avieiros deriva do nome da localidade a cebola, os alhos, o tomate limpo, a folha de louro, de origem. Aos poucos, as viagens entre o mar e o o pimento e o ramo de cheiros e leva-se ao lume. rio cessaram, e muitos sedentarizaram-se e criaram Quando o tomate estiver desfeito, deita-se a água. pequenas povoações à beira Tejo, às quais imprimiram Acrescenta-se o peixe e as batatas e leva-se de novo características próprias. Esta Sopa de Peixe é mais um ao lume a ferver e tempera-se com um pouco de piri- exemplo da capacidade dos que souberam procurar no piri a gosto. De seguida, escalfam-se os ovos e serve- rio e no campo os meios de sobrevivência negados pela se a sopa enriquecida com fatias de pão torrado8. ausência de recursos financeiros. Pode ser confeccionada com uma ou várias espécies pescadas no rio - carpa, Para acompanhar a Sopa de Peixe do Rio, procure sável, saboga, fataça ou barbo. Pode acrescentar-se pão um vinho branco jovem e frutado da Região Tejo que duro, simples ou torrado. combine a acidez do peixe com a acidez do vinho.

Com a sua origem nas populações mais pobres, esta Sopa de Peixe do Rio constitui hoje uma proposta que fica bem em qualquer mesa.

73 SOPA DE COELHO

O concelho do Cartaxo, situado na margem direita Ingredientes do rio Tejo, é uma região de contrastes, de grande 1 coelho; 1 cebola média; 1 couve lombarda; 6 batatas desenvolvimento urbano provocado pela sua localização médias; 500 g de feijão branco cozido; 3 colheres de próxima da capital, mas que convive lado a lado com um sobremesa de calda de tomate; 1 pimento vermelho; mundo rural que teima em preservar as suas tradições. 0,5 l de vinho branco; 0,5 l de vinho tinto; 2 dl de A sua paisagem, fora dos maiores aglomerados urbanos, azeite; 1 colher de sopa de manteiga; 1 colher de so- onde a indústria assentou arraiais, é um variado bremesa de piri-piri ou a gosto; 1 pão de trigo; 1 ramo mosaico de terras de semeadura alternando com os de coentros; sal q.b. vinhedos que dão origem aos vinhos do Cartaxo. A mancha de verde que os olhos alcançam faz adivinhar Preparação a fertilidade do solo. Os seus habitantes, mesmo com Refoga-se o coelho partido aos bocados com os outras actividades, mantêm uma forte ligação com a temperos, a cebola picada, a calda de tomate, os agricultura e não desprezam os costumes ancestrais. A vinhos branco e tinto, o pimento às tiras, o azeite e a abundância de erva em toda a região foi sempre um manteiga. Quando estiver tudo refogado, acrescen- pretexto para a criação de coelhos no quintal, ao pé da ta-se meio litro de água, de seguida a couve cortada porta, destinados ao consumo próprio, o que levou, miudinha, as batatas aos cubos miúdos e, por último, naturalmente, ao aparecimento de muitas receitas com o feijão branco. Na altura de servir, cortam-se as base neste pequeno herbívoro que continuam a fazer fatias do pão de trigo, espalham-se os coentros pica- parte dos pratos característicos deste concelho. dos e coloca-se por cima a sopa9.

Para a excelência desta Sopa de Coelho, confeccionada A carne de coelho merece ser apreciada com vinhos com o coelho doméstico alimentado a erva e a hortaliça, tintos elaborados, finos e elegantes, de preferência concorrem também os produtos hortícolas de qualidade de safras mais antigas e com estágio em madeira. e o vinho da região, que tão bem combinam com a sua Escolha um vinho da Região Tejo com aroma elegan- carne suculenta. te e corpo macio, que se enquadre bem com o sabor único desta carne.

75 CALDEIRADA À FRAGATEIRO

No rio Tejo, que atravessa a lezíria ribatejana, a Ingredientes abundância de peixe, a cuja pesca muitas das populações 150 g de safio; 180 g de cação; 200 g de enguias; ribeirinhas se dedicavam, deu origem a vários pratos, 200 g de fataça; 150 g de lulas; 100 g de amêijoas; 1 entre eles, a Caldeirada à Fragateiro. Esta designação cebola; 1 tomate; 1 pimento; 1 ramo de salsa; 1 folha denuncia o local onde o cozinhado era preparado: o de louro; 1 ramo de coentros; 1 pão caseiro; 1,5 dl de próprio barco onde se encontravam os pescadores, a azeite; sal, pimenta e piripiri q.b.; pão caseiro já com frajata. Por isso mesmo, teria um modo de confecção dois dias. relativamente simples, com pequenas variantes, conforme o local de origem dos fragateiros, e usava Preparação como ingrediente principal o peixe que vinha à rede Amanham-se os peixes, cortam-se em postas e tem- – enguia, fataça e tainha, embora também pudesse peram-se com sal. Num tacho de barro, dispõem-se incluir safio, barbo, tamboril, ou ainda outras espécies. a cebola, o tomate e o pimento às rodelas e o alho Muito frequentemente, dispensavam-se as batatas, picado. Em seguida, o peixe. Tempera-se com sal, substituindo-as por fatias de pão. pimenta, piripiri e rega-se com azeite. Repete-se o processo anterior até se esgotarem os ingredientes. Hoje, que os modos de vida mudaram completamente, Na parte final, espalha-se a salsa picada grossei- o rio já não representa o mesmo papel económico na ramente e abafa-se com uma tampa o tacho, que vida das populações, como também já não é o meio de vai a cozinhar em lume brando. 5 minutos antes de subsistência de muitas pessoas que viviam exclusivamente terminar a cozedura de todos os alimentos, colocam- da pesca. No entanto, este prato tradicional não -se as amêijoas e volta-se a tapar. Num recipiente, deixou de ter os seus adeptos e, actualmente, faz parte dispõe-se o pão em fatias e, sobre estas, a caldeirada da ementa de todos os restaurantes das localidades da polvilhada com coentros picados grosseiramente10. beira-rio. Esta Caldeirada à Fragateiro ficará valorizada com uma fresca garrafa de vinho branco jovem e fruta- do, elaborado com a casta rainha da Região Tejo, a Fernão Pires.

77 TIBORNA DE BACALHAU

A Tiborna de Bacalhau faz parte da cozinha tradicional Ingredientes das zonas rurais do Ribatejo e era frequentemente 800 g de broa de milho; 1 kg de bacalhau demolha- confeccionada tanto na Lezíria como no Bairro. Trata- do; 50 g de alho; 1 kg de grelos; 1,5 dl de azeite; 1 dl -se essencialmente de bacalhau assado acompanhado de água-pé; sal q.b. com broa de milho e grelos cozidos, regados com o bom azeite ribatejano. Preparação Com 10 g de alho, esfrega-se a broa inteira e, com a Este prato era geralmente consumido no Outono e no mão, esfarela-se o miolo, que fica em bocados pe- Inverno pelos trabalhadores rurais, que o preparavam quenos. Aquece-se o forno. Junta-se ao miolo de pão e consumiam em apenas uma hora, o tempo de que o restante alho picadinho e a água-pé, levando-se dispunham para o almoço. Apesar da sua simplicidade, tudo ao forno a aquecer durante 10 minutos, a uma era um prato nutritivo, económico e saudável: o temperatura de 150º C. Num tacho, leva-se a água bacalhau, à época o “fiel amigo”, pois era de preço com sal ao lume e, quando a água estiver a ferver, muito acessível e de fácil conservação, muito presente colocam-se os grelos, que se deixam cozer. Assa-se na cozinha ribatejana, que lhe dedicava um verdadeiro o bacalhau na brasa e depois lasca-se e retiram-se- culto; as sobras endurecidas de pão de milho; e os -lhe as espinhas. Junta-se o miolo de broa de milho, produtos da terra. os grelos e o bacalhau num recipiente e rega-se com azeite. Recheia-se o interior da broa com a mistura Hoje em dia, perdida a conotação de comida de gente obtida, espalha-se o restante miolo por cima vai ao pobre, a Tiborna de Bacalhau foi redescoberta pelos forno pré-aquecido cerca de 20 minutos11. gastrónomos, tendo-se tornado num verdadeiro petisco que os restaurantes ribatejanos exibem nas suas ementas. Este prato rústico e reconfortante chama por um copo de vinho branco estruturado e untuoso, com estágio em madeira. Normalmente, com as castas Fernão Pires, Arinto, Verdelho, Trincadeira das Pratas e Viogner, desenvolvidas nas terras do Bairro ou da Charneca, os brancos da região do Tejo são uma escolha segura.

79 LAPARDANA

A Lapardana é uma comida das gentes da borda d’água Ingredientes do Ribatejo, mais um dos muitos exemplos dos pratos 4 batatas médias; 600 g de pão duro de trigo; 4 dos tempos em que muitos passavam fome, e para os folhas verdes de couve; 2 dl de azeite; 12 dentes de quais se recorria principalmente ao pão, juntando-se, alho; 4 postas de bacalhau demolhado; sal e pimenta neste caso, as batatas e as couves, com o azeite e o q.b. alho a dar sabor. Era feita tanto pelos camponeses que trabalhavam nas lezírias como pelos avieiros que Preparação pescavam nas valas do Tejo. Por essa razão, tinha, Cozem-se em água e sal as batatas cortadas em ro- muitas vezes, por acompanhamento o peixe do rio, delas e a couve em pedaços ripados à mão. Quando outras vezes, bacalhau, que ainda era, nessa altura, a batata estiver cozida, escorre-se e reserva-se a o “fiel amigo”. Mas qualquer que fosse o conduto, a água de cozedura. A couve está, nesta altura, ainda sua quantidade dependia, obviamente, do orçamento mal cozida mas é assim mesmo. Demolha-se bem o familiar. pão na água da cozedura que ficou de reserva. Pode juntar-se também um pouco de broa de milho, se houver. Põe-se o pão num tacho e leva-se ao lume com um terço do azeite, um terço dos dentes de alho migados e um pouco de pimenta, amassando-se bem com uma colher de pau a que se dava o nome de geribalde. Juntam-se as couves e as batatas e deixam-se fervinhar até se obter uma açorda mole. Enquanto a açorda apura, assa-se o bacalhau sobre o lume. Dispõe-se a açorda numa travessa funda, desfia-se o bacalhau em lascas grandes que se põe sobre a açorda. Rega-se tudo com o azeite bem quente e os alhos restantes.

Este é um prato de sabor muito forte, intensificado pelo azeite e pelo alho. Para o acompanhar, é indi- cado um vinho branco intenso e estruturado, cuja acidez vigorosa compense a força do prato. Procure um branco com estas características na Região Tejo.

81 MAGUSTO

O Magusto ou Mangusto é o nome dado a um prato Ingredientes regional e tradicional das zonas rurais do Ribatejo, 5 couves portuguesas, 2,5 dl de azeite, 8 dentes de criado, certamente, com o intuito de fazer uma refeição alho, 1 pão de milho e 4 bolas de pão de trigo, sal, rápida e económica, aproveitando restos de outros 3 postas de bacalhau. pratos, como couves, batatas cozidas, feijão cozido e sobras de pão, e tendo como resultado uma espécie de Preparação migas verdes bem apaladadas. Tradicionalmente, serve- Migam-se as couves e cozem-se bem; quando -se acompanhado de bacalhau assado na brasa ou de estiverem cozidas, escorrem-se. Entretanto, o pão peixe frito, carapaus ou petingas. Como tem acontecido foi posto previamente de molho e esfarelado com as com muitas receitas da cozinha regional portuguesa, mãos. Em seguida, juntam-se-lhe as couves, o azeite, também o Magusto, aos poucos, tem vindo a ser o alho picado e o sal. Leva-se tudo ao lume, deixan- recuperado na oferta gastronómica ribatejana. Por isso, do-se ferver para acabar o magusto. O bacalhau hoje em dia, há quem sugira que, para além dos peixes assa-se, de preferência, em lume de lenha ou carvão referidos, também possa servir de acompanhamento para ficar mais gostoso, sendo depois temperado a outros pratos, tais como o entrecosto frito, a fritada com bastantes alhos picados e o azeite12. de porco, os filetes de pescada, os pastéis de bacalhau, o coelho frito, os rojões ou o polvo à lagareiro, Estas suculentas postas de bacalhau assadas, entre outros, mas agora com o Magusto a servir de perfumadas com muito azeite e alho, reconfortam o acompanhamento. Para que volte a fazer parte dos estômago e exigem um vinho branco de boa estrutu- hábitos alimentares ribatejanos, o Turismo de Santarém ra, como os da Região Tejo. O vinho escolhido, para promove todos os anos, no mês de Fevereiro, um festival fazer uma boa harmonização com este prato, deve durante o qual os restaurantes aderentes à iniciativa ter uma grande concentração de fruta e uma boa propõem ementas em que o Magusto é presença untuosidade, conferida pelo estágio em barrica de constante. madeira nova.

83 ENGUIAS À PAÚL

Situada num planalto a sul de Rio Maior, sede do Ingredientes concelho, a Vila da Marmeleira conheceu, na primeira Enguias, alho, colorau, azeite, fermento de cevada*, metade do século passado, uma pujança económica cebola, louro, sal, vinho branco. Acompanhamento: fruto de uma agricultura extremamente produtiva, que feijão-frade. contribuiu para a sua subida a vila em 1927. Depois de um período de estagnação e de decadência, é hoje Preparação uma povoação que pretende reatar antigas tradições, Prepara-se um refogado com todos os ingredientes aproveitando todas as potencialidades que a natureza e deixa-se apurar até ganhar molho. Cozem-se as e a mão do homem puseram à sua disposição, e que enguias no molho e acompanham-se com feijão-fra- vão desde o restauro da antiga Praça de Touros à plena de cozido em água e sal. fruição do Paúl da Marmeleira. Este é uma enorme superfície alagada, com uma fauna e uma flora típicas As Enguias à Paúl pedem um vinho muito suave e de ambientes lacustres, que desde sempre esteve ligado com taninos bem leves e fácil de beber. Escolha um à vida dos habitantes da povoação. Aí sempre se entre os vinhos brancos jovens e frutados da Região pescaram enguias em tais quantidades que deram origem Tejo. a um prato típico, as Enguias à Paúl, que continua a ser, ainda hoje, um dos pratos mais apreciados da *Actualmente, este ingrediente é, em geral, gastronomia da região dispensado.

85 CABRITO ASSADO NO FORNO

A Serra dos Candeeiros está na sequência do Ingredientes alinhamento montanhoso do maciço calcário da 1 cabrito com cerca de 5 kg; 3 cebolas grandes; 3 Estremadura, abrangendo os concelhos de Rio Maior, cenouras grandes; 2 kg batatas; 4 dentes de alho; Alcobaça e Porto de Mós e marcando a fronteira entre o azeite e margarina q.b; 3,5 dl de vinho branco; 2 Ribatejo e o Oeste. Os habitantes das aldeias dispersas folhas de louro; 1 ramo de salsa; piripiri, massa de por este vasto território, prolongado pela Serra d’Aire e pimentão e sal; 1 couve lombarda grande; 1 farinheira fazendo parte de uma área protegida, dedicam-se ainda regional. hoje a uma agricultura de subsistência e à pastorícia, continuando a apascentar os seus rebanhos de gado Preparação caprino nos baldios. Assim, o Cabrito Serrano, com Corta-se o cabrito em pedaços pequenos e lava-se. o qual é confeccionado este prato, foi sempre criado Depois de lavado e muito bem escorrido, tempera-se de forma semi-selvagem, alimentando-se apenas da com vinho, alho, piripiri, louro, sal e azeite. Deixa- vegetação espontânea que cresce naquelas serranias, o se a marinar para o dia seguinte. Numa assadeira, que confere à sua carne um sabor único, realçado pela colocam-se cebolas às rodelas, por cima os bocados forma como é cozinhado. Continuando essa tradição, do cabrito e rega-se com a marinada. Leva-se ao a oferta gastronómica dos restaurantes da região de Rio forno a 180º C a assar durante cerca de duas horas Maior inclui um prato que, sendo confeccionado em e deixa-se alourar, aumentando o calor do forno, se quase todo o País, se diferencia não só pela qualidade da for necessário. Para acompanhamento, preparam-se carne mas também pela forma de o cozinhar em forno de as batatas fritas aos cubos. Coze-se e salteia-se a lenha. couve com a farinheira. Serve-se em travessa, com o cabrito acompanhado pelas batatas fritas e pela couve salteada com a farinheira13.

Para acompanhar o sabor característico do cabrito e o paladar intenso da farinheira combinada com a couve, escolha um vinho que seja sólido, mas com grande maciez. Nos tintos da região Tejo seleccione um vinho da casta Castelão ou Trincadeira.

87 CARNE DE PORCO À FEIRA DOS SANTOS

A centenária Feira dos Santos, no Cartaxo, é uma das Ingredientes mais antigas do Ribatejo e até do País. Diz a tradição 650 g de carne de porco, 400 g de batatinhas, de que esta feira franca remonta a 1654, ano em que se preferência novas, 4 dentes de alho, 50 g de banha, realizou pela primeira vez na Quinta do Senhor Jesus, 2 dl de vinho tinto, 1 limão, colorau, salsa, pimenta e herdade com propriedades milagrosas, segundo a crença sal q.b. popular da época. Inicialmente, a feira anual decorria no mês de Agosto; mais tarde, passou para o dia 1 de Preparação Novembro, dia de Todos os Santos. Por isso, para além Corta-se a carne, em pedaços pequenos, tempera- dos produtos tradicionais de qualquer certame deste -se com os alhos picados, a pimenta, um pouco de género no Ribatejo, passou a incluir também a oferta colorau e o vinho tinto. Envolve-se e deixa-se marinar de frutos secos, de água-pé e de vinho novo, produtos de um dia para o outro. No dia seguinte, escorre-se próprios desta época do ano. Como em qualquer a carne e frita-se na banha. Lavam-se as batatinhas outra ocasião de festa, também os dias da Feira eram e levam-se a cozer com pele em água temperada de assinalados por uma alimentação diferente e mais sal. Quando estiverem cozidas, escorrem-se. Estando elaborada, ainda que a opção fosse apenas por partes a carne quase frita, juntam-se as batatas, adiciona- mais nobres do porco, como é o caso desta Carne de -se a marinada da carne, envolve-se e deixa-se co- Porco à Feira dos Santos, prato obrigatório no período zinhar mais um pouco. Polvilha-se com salsa picada em que esta decorria e durante o qual a gastronomia finamente e serve-se enfeitado com o limão cortado ocupava, e ainda hoje ocupa, um lugar de destaque neste em gomos. acontecimento de fortes raízes populares. Esta receita de carne de porco vai bem com um vi- nho tinto com complexidade e persistência. Entre os vinhos da Região Tejo, escolha os que são elaborados com as castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho.

89 FAVAS COM ENTRECOSTO OU APORCALHADAS

As Favas com Entrecosto constituem um prato Ingredientes tradicional em todo o território nacional, e o Ribatejo, 4 kg de favas com casca, 750 g de entrecosto; região de grande fertilidade, onde a agricultura e a 150 g de toucinho entremeado; meio chouriço, meio pecuária representam um papel muito importante em chouriço negro, 1 molho pequeno de folha verde de termos económicos, não podia deixar de apresentar a alho; 1 molho pequeno de folha de cebola; 1 molho de sua versão desta leguminosa tão apreciada e que tão coentros; 1 dl azeite; banha de porco; sal q.b. bem casa com a carne de porco. De preparação muito simples, é um prato típico da Primavera, quando Preparação as favas estão na altura de ser apanhadas, verdes, Tempera-se previamente o entrecosto e o toucinho, tenrinhas. Em qualquer casa de lavrador remediado, deixando-os em repouso durante algum tempo, para basta ir à horta colher as favas e os cheiros, à salgadeira depois se iniciar um guisado, juntando os molhos buscar o entrecosto e o toucinho e ao fumeiro escolher o de folhas de alho e cebola, o chouriço e o negro às chouriço e a morcela de sangue, e estão reunidos todos os rodelas. Seguidamente, acrescenta-se um pouco ingredientes para confeccionar um prato que a ninguém de água quente, juntam-se as favas descascadas e deixa indiferente. deixa-se cozer em lume brando. Não se mexe com colher, apenas se sacode o tacho para que as favas se soltem e não se peguem.

Este prato, actualmente, pode ser feito em qualquer época do ano, graças às favas congeladas, mas nada substitui os produtos na sua época. Lá diz o ditado: “Favas, o Maio as dá, o Maio as leva”14.

As Favas com Entrecosto devem ser acompanhadas por uma garrafa de vinho tinto da Região Tejo. Como este é um prato de sabores elaborados, opte por um vinho com muita complexidade e persistência.

91 GALO COM NOZES

Até meados do século passado, a vila de Rio Maior era Ingredientes o centro de uma região predominantemente agrícola, 1 galo do campo, vinho tinto, alho, louro, pimenta de pequenos proprietários, cujas casas tinham sempre preta e sal, cebola, azeite, banha de porco, tomate, um espaço destinado à “criação”, nome genérico salsa, nozes, arroz. que englobava os animais de penas e os coelhos, convivendo numa semi-liberdade. A alimentação Preparação dessa população remediada incluía, portanto, com Depois de limpo, parte-se o galo em pedaços pe- frequência, a carne destes animais. Em dias festivos, quenos. As nozes são partidas em dois ou quatro era necessário introduzir outros ingredientes que bocados, conforme o seu tamanho. Juntam-se todos fizessem a diferença em relação ao quotidiano. Dada a os ingredientes, cozinhando em lume brando e com o abundância de nogueirais e de vinhas, as nozes e o vinho tacho tapado para não secar. eram, naturalmente, os acessórios mais à mão para transformar um prato vulgar numa especialidade para Acompanha com arroz feito do molho. Há quem dias especiais. junte passas de uva ao arroz para dar um perfeito contraste de sabores15. As pessoas mais velhas ainda se lembram de comer este prato em casa dos pais, nos dias de festa em que O Galo com Nozes é confeccionado com vinho. Este as normas religiosas permitiam comer carne. Mas, acrescenta aromas, sabor e textura, funcionando entretanto, caiu em desuso. Ultimamente, a receita como receptor e difusor de sabores. Para acom- foi recuperada na Asseiceira e em outras aldeias dos panhar este prato, sirva o vinho que escolheu para arredores de Rio Maior, tendo sido introduzidas o preparar, de preferência um tinto complexo com algumas alterações no modo de a confeccionar, e, neste madeira, da região Tejo. momento, é considerado um prato emblemático do concelho, que, inclusivamente, o apresentou a concurso, em 2011, para a eleição das “sete maravilhas da gastronomia”.

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93 NACO DE BOI COM VINHO TINTO

Situado na margem direita do Tejo, o concelho do Ingredientes Cartaxo é considerado uma das grandes referências na 4 nacos de boi, com 150 g aproximadamente cada, produção de vinho, a ponto de ser chamado “Capital 1 cenoura, 1 tomate, 1 cebola, 4 dentes de alho, do Vinho”. É, pois, natural que alguns dos seus pratos 200 g de margarina, 1 l de vinho tinto, 1 folha de lou- típicos incluam entre os seus ingredientes este produto ro, 1 ramo de salsa, piripiri, sal e pimenta, q.b. emblemático, cuja participação na culinária tem raízes na tradição que as populações têm conseguido Preparação preservar. Este Naco de Boi com Vinho Tinto é um prato Dispõem-se os nacos num recipiente, temperam-se tipicamente cartaxeiro. Mas, para além do vinho tinto, com sal e pimenta, junta-se o vinho tinto e deixa- que deve ser seleccionado criteriosamente, de acordo com se marinar durante 24 horas. Passado este tempo, o que for escolhido para acompanhar a refeição, para leva-se um tacho ao lume com a margarina, os alhos a sua confecção deve optar-se, preferencialmente, pela picados, a cebola cortada em quartos, a cenoura cor- carne de animais bravos pois, como refere a Confraria tada em rodelas e a folha de louro. Deixa-se refogar Gastronómica do Toiro Bravo, “(…) são animais até alourar. Junta-se o tomate pelado e cortado em criados em regime extensivo, vivendo da natureza, com cubos, o ramo de salsa e deixa-se cozinhar mais um um maneio que não comporta na sua alimentação pouco. Adiciona-se então a carne com a marinada, factores de crescimento, apresenta um grão muscular tempera-se com piripiri e deixa-se estufar até ficar fino e delicado e, quando a carne devidamente maturada bem tenra. Coloca-se a carne numa travessa, passa- é sujeita a manipulações culinárias, exibe aroma e sabor -se o molho por um passador fino, rectifica-se o sal, de excelência”. rega-se a carne e serve-se acompanhada de arroz branco. Todas estas exigências fizeram deste prato típico uma especialidade gastronómica que actualmente faz parte Embora não seja obrigatório, quando se cozinha com das ementas dos melhores restaurantes do Ribatejo. vinho deve servir-se o mesmo tipo a acompanhar o prato. Assim, se puder, escolha para a confecção e para a refeição um vinho tinto da Região Tejo, com aroma a fruta preta madura, especiarias e tosta, das castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho.

95 TORRICADO

O Torricado é uma refeição típica da zona dos valados Ingredientes do Tejo, à volta de Azambuja, Samora Correia ou Pão caseiro duro, alho, azeite, sal grosso, bacalhau, Salvaterra de Magos, no Ribatejo, consumida até sardinha, entremeada ou febras. meados do século passado por gente de fracos recursos económicos que tinha que se alimentar com o pouco Preparação que tinha à mão. Quando os jornaleiros passavam uma Escolhe-se um pão caseiro de cerca de meio quilo, já semana fora para trabalhar nos campos dos grandes com alguns dias, que por dentro não tenha buracos. lavradores ou dos seareiros da lezíria, nas campanhas da Abre-se o pão ao meio e, com a ponta de uma faca monda do arroz ou do tomate e na altura das vindimas, bem afiada, retalha-se o miolo profundamente, mas levavam um farnel à base de pão e de enchidos, com sem atingir a côdea, em losangos com, aproximada- os quais faziam uma “bucha”. Com o pão já duro, mente, a grossura de um dedo. Esfrega-se com um esfregavam-no com alho, torravam-no em cima das dente de alho esborrachado: para cada metade, meio brasas, nuns espetos de pau, barravam-no com azeite, dente de alho. Depois, sobre as brasas, colocam-se salpicavam-no com sal e comiam-no com uma lasca de as duas metades do pão a “torriscar”, primeiro o lado bacalhau ou com azeitonas. É, pois, um prato que surgiu da côdea, que deve ficar estaladiço mas não tosta- da necessidade de os trabalhadores rurais se alimentarem do, depois o lado do miolo, que deve ficar louro. É o com produtos que não se deteriorassem durante o próprio pão que indica quando está bom, quando os período de tempo em que estivessem afastados de casa. sulcos começam a abrir ou, como diz o povo, quando o pão “está a rir” ou então a “abrir a boca pedindo Redescoberto pelos apreciadores de petiscos, o o azeite”. Unta-se a côdea e rega-se o miolo com Torricado, já afastada a conotação de comida de pobre, azeite; salpica-se com sal grosso. Põe-se de novo em actualmente, é considerado uma das especialidades cima do brazido, mas só do lado do miolo, até o azei- gastronómicas desta zona ribatejana, tendo-se tornado te ferver ou, como se diz, até “chiar”. Nessa altura, o potagonista de uma iniciativa anual no início está pronto a ser comido acompanhando as febras, de Novembro, na vila de Azambuja, que pretende a entremada, o bacalhau assado ou as sardinhas, promover e divulgar a cozinha tradicional da região. também assadas, conforme o gosto.

Este é um prato muito rústico e, conforme o acom- panhamento que escolheu - febras, entremada, bacalhau ou sardinhas - pode optar por um tinto ou um branco estruturados, em estágio em madeira, da Região Tejo.

97 ARREPIADOS DE ALMOSTER

O Convento de Santa Maria, em Almoster, no Ingredientes distrito de Santarém, acolheu as freiras da ordem 5 claras; 500 g de açúcar; 500 g de amêndoa com das Clarissas até 1834, data da extinção das ordens pele; raspa de limão; canela q.b. religiosas em Portugal. A estas freiras se deve a criação dos Arrepiados, bolos de feitura simples, para Preparação aproveitamento das claras dos ovos cujas gemas terão Batem-se as claras em castelo bem firme. acrescen- entrado na confecção de outros doces. Para justificar o ta-se o açúcar, continuando a bater até fazer bolhas. seu nome, conta-se que, estando as freiras atarefadas na Junta-se a raspa do limão e a canela. A este prepa- cozinha preparando os bolos que iriam servir a um grupo rado incorpora-se a amêndoa devidamente cortada de fidalgos de visita ao Convento, uma delas mostrou em lâminas fininhas e inteiras, sem bater. A amêndoa preocupação por irem apresentar um doce tão singelo deve ser envolvida na massa das claras com açúcar. a tão ilustres visitantes, ao que outra a terá sossegado, Num tabuleiro untado com um pouco de azeite ou afirmando que os bolos ficariam tão bons que os fidalgos óleo de boa qualidade, deitam-se colheradas de mas- se sentiriam “arrepiados”. Se a história tem algum sa, afastadas umas das outras. Vão ao forno a cozer fundamento, é impossível comprová-lo, mas comer durante 15 minutos e devem ficar com um pouco de Arrepiados deixará qualquer guloso “arrepiado” com cor. Estes bolos não devem ser tendidos para ficarem a qualidade e o paladar destes bolos, que são uma das com o aspeto de arrepiados16. principais referências da doçaria escalabitana. Estes bolinhos de amêndoa fazem as delícias do lan- che acompanhados por uma chávena de chá. Se os quiser apreciar com uma bebida mais forte, escolha um vinho licoroso da Região Tejo.

99 CELESTES DE SANTA CLARA

Estes pequenos bolos encontram a sua origem no Ingredientes Convento de Santa Clara de Santarém. Durante anos, 500 g de açúcar; 250 g de água; 450 g de miolo de as monjas Clarissas mantiveram em segredo a sua amêndoa; 12 gemas; folhas de obreia. receita, à base de miolo de amêndoa, ovos e açúcar pilé, com uma protecção de papel de obreia. Porém, há cerca Preparação de cem anos, Ajax Augusto da Silva Rato, proprietário Põe-se o açúcar ao lume com a água, até atingir o de uma mercearia fina entretanto desaparecida, ponto de pérola. Nessa altura, deita-se a amêndoa conseguiu adquirir a receita, e foi por seu intermédio pelada e passada pela máquina. Volta ao lume para que se iniciou a divulgação e a comercialização desta ferver mais um pouco. Deixa-se arrefecer e acrescen- especialidade conventual. Em breve, as Celestes de tam-se as gemas, levemente batidas. Volta ao lume, Santa Clara eram já bem conhecidas. Entretanto, mexendo sempre, até se ver o fundo do tacho. Depois outros estabelecimentos da cidade também conseguiram de arrefecida, com esta massa formam-se umas boli- a tão cobiçada receita e lançaram-se no seu fabrico. nhas do tamanho de uma noz, que se colocam sobre Assim, estes maravilhosos doces tornaram-se famosos e rodelas de obreia humedecida e picotada, um pouco passaram a ser uma das imagens de marca da cidade de maiores do que as bolinhas. Apertam-se as rodelas Santarém. com os dedos, para formar uma caixinha. Levam-se a forno forte durante alguns minutos, só para dourar17.

Estes bolinhos pequeninos podem ser comidos ao lanche ou à sobremesa. No final da refeição, acompa- nhe-os com um vinho licoroso da Região Tejo, cujas complexidade de aroma e suavidade final combinam muito bem com este doce conventual.

101 QUEIJADINHAS DE AZAMBUJA

Na foz da Vala Real, próximo de Azambuja, Ingredientes encontram-se as ruínas de um edifício imponente, Massa: 1 kg de farinha; 800 g de margarina. conhecido pelo nome de Palácio das Obras Novas, Recheio: 1 kg de açúcar; 0,5 l de água, raspa de 1 construído em estilo neoclássico, no tempo da Rainha limão, 3 paus de canela, 30 gemas de ovos D. Maria I. A sua localização privilegiada na zona da Lezíria, de onde se avistam grandes extensões de terra de Preparação cultivo e pasto de touros de lide, assim como a natureza envolvente, com uma vegetação densa e exuberante, Põem-se a ferver água, o açúcar, a raspa do limão e atraía, nos finais do século XIX, destacadas figuras da os três paus de canela. Quando estiverem a ferver nobreza que ali vinham descansar. Diz a tradição que bem, deita-se esta mistura por cima das 30 gemas o próprio Rei D. Carlos, acompanhado pela família e deixa-se descansar 5 ou 6 horas. Amassa-se a real, costumava passar temporadas no Palácio das farinha com a água e deixa-se repousar durante 15 Obras Novas para se dedicar à caça na companhia minutos. Com um rolo, estende-se a massa até ficar do Infante D. Luís Filipe. Em atenção à Rainha D. com 1,5 cm de espessura. Com uma espátula, espa- Amélia, vinham, talvez do Mosteiro de Almoster, umas lha-se a mistura da margarina com a banha sobre deliciosas queijadinhas que ela muito apreciava. Mas a massa estivada, como quem barra pão. Dobra-se quando a brucelose atingiu os rebanhos de cabras e de em 3 partes, volta-se a estivar com o rolo e barra-se ovelhas, o queijo para fazer os bolos começou a rarear. novamente com a gordura; dobra-se outra vez em 3 Foi então que se inventou uma outra receita para partes, estica-se, volta-se a barrar e enrola-se para fazer uns bolinhos que, sem o queijo mas com o mesmo formar um rolo. Deixa-se descansar durante cerca de aspecto, continuassem a ser dignos de aparecer à mesa 20 minutos. Estica-se o rolo até ficar com 2 cm de real. Por isso, lhes chamaram, na altura, “queijadinhas diâmetro. Cortam-se pequenos pedaços com 1,5 cm mentirosas”. de comprimento, e colocam-se os pedaços em for- mas tipo . Estica-se esta massa com O fundador da Pastelaria Favorita, no centro da os dedos molhados de modo a que fique a forma vila, recuperou, há mais de trinta anos, essa receita toda coberta. Levam-se ao fogo, em banho-maria, as esquecida, que veio a dar fama ao estabelecimento. gemas batidas com o açúcar e as natas até o prepa- O actual proprietário, Fernando Serra, faz questão rado engrossar. Deixa-se arrefecer um pouco antes de manter a qualidade desses bolinhos, que continuam de deitar nas formas, que se enchem com o prepa- a ser motivo de atracção tanto dos naturais como dos rado. Por cima, deita-se em cada uma um pouco de visitantes de Azambuja. amêndoa moída com pele e polvilha-se com açúcar em pó. Leva-se a cozer em forno aquecido a 200º C, até formar uma crosta18. 103 PÃO-DE-LÓ DE RIO MAIOR

O Pão-de-Ló é um bolo que se pode encontrar com esta Ingredientes designação em dezenas de povoações portuguesas e que, 4 ovos inteiros; 8 gemas; 150 g de açúcar; 75 g de para o diferenciarem, acrescentam ao nome genérico farinha. o da localidade que lhe deu origem. Em comum, todos têm o facto de serem bolos fofos e confeccionados com Preparação os mesmos ingredientes – ovos, açúcar e farinha. A Pré-aquece-se o forno a 220-230º C. Colocam-se proporção em que cada um entra na receita, a forma os 4 ovos inteiros numa taça e batem-se energica- como são batidos, a temperatura do forno e o tempo de mente durante 5 a 10 minutos, até ficarem com uma cozedura é que estabelecem a diferença entre os vários coloração esbranquiçada e bem fofos. Para melhores produtos finais. O Pão-de-Ló de Rio Maior tem como resultados, deve usar-se uma batedeira eléctrica. característica principal o facto de ser baixo e húmido Acrescentam-se, pouco a pouco, as gemas previa- no interior, justamente porque a sua criadora, Alice mente desfeitas, batendo sempre durante mais uns Sequeira, optou por usar uma temperatura do forno 5 a 10 minutos. Envolve-se a farinha que vai sendo e um tempo de cozedura diferentes do habitual. Esta peneirada sobre a massa, polvilhando sem bater, senhora iniciou a produção deste bolo ainda nos anos usando a batedeira na velocidade mínima e apenas 60, de uma forma artesanal durante mais de quarenta durante alguns segundos. Forra-se uma forma que anos, para responder a encomendas particulares que se possa abrir (o bolo no final não se pode virar), lhe eram feitas. As muitas solicitações levaram-na a forrada com papel vegetal untado de manteiga e fari- criar, para a entrega, uma embalagem em cartão com nha. Verte-se a massa para a forma e deixa-se cozer a identificação do bolo, o que foi mais uma forma de o durante 7 minutos. Ao fim de 4 minutos, roda-se a distinguir dos seus congéneres de outras regiões do País. forma 180º. Não se deve deixar o bolo tempo a mais Mais tarde, revelou a receita a familiares, que deram no forno, para não secar. Retira-se a forma do forno continuidade ao fabrico, já em moldes empresariais, e deixa-se arrefecer. Quando o Pão-de-Ló já estiver tornando o Pão-de-Ló de Rio Maior uma referência na bem frio, retira-se da forma com o papel vegetal. doçaria desta região ribatejana. Separa-se o bolo do papel passando uma espátula metálica e comprida por baixo deste19.

Deve ser comido após algumas horas, pois o bolo vai abatendo, formando as rugas, e a espuma de ovos vai dando origem a uma calda deliciosa. Acompanhe-o com uma flute de espumante da Região Tejo, para reforçar o contraste com o sabor do bolo.

105 CASPIADAS

As Caspiadas são uns bolos que, mais uma vez, Ingredientes testemunham a capacidade das nossas gentes em criar 500 g de massa de pão, 2 colheres de sopa de açú- receitas de baixo custo, a partir de aproveitamentos. car amarelo, 1 colher de sopa de azeite, 1 colher de Neste caso, aumentava-se a quantidade de massa com sobremesa de canela em pó, raspa de uma casca de que se fazia o pão e aproveitavam-se folhas de couve limão, azeite para untar e folhas de couve. para servir de base a esses bolos. E assim se criava um clima de festa entre os mais pobres. Esta modesta iguaria Preparação está indissociavelmente ligada a Pontével, freguesia do Adicione à massa de pão o azeite, o açúcar amarelo, Cartaxo, não apenas por ser já um bolo tradicional a raspa de limão, a canela em pó e amasse muito desta povoação, em honra do qual é organizada há mais bem. de vinte anos, no mês de Junho, a Feira da Caspiada, integrada na Artével, mas também porque a Junta de Divida a massa em porções, molde-as em bolas Freguesia, em 2011, requereu ao Instituto Nacional achatadas, coloque cada uma em cima de uma de Propriedade Industrial (INPI) o registo da marca folha de couve e unte com azeite. Leve ao forno, de Caspiada, bolo típico de Pontével, o que lhe confere um preferência a lenha, até ficarem bem cozidas e deixe direito exclusivo sobre a mesma. arrefecer.

Para acompanhar estes bolos secos, escolha um vi- nho licoroso ou uma colheita tardia.Os seus sabores ricos e aromas intensos harmonizam-se na prefeição com as Caspiadas.

107 Produto Regional QUEIJO DE MAÇUSSA

Os verdadeiros apreciadores de queijo mas, so- da sua empresa familiar de fabrico de queijos, bretudo, os que gostam de chèvre, já ouviram falar, Adolfo Henriques realizou um sonho: lançou o livro certamente, do Queijo de Maçussa. Trata-se de um de receitas “Puro Chèvre – receitas com queijo de queijo de pasta mole e sabor intenso, de origem cabra “Granja dos Moinhos”, no qual colaboraram francesa, o único produzido artesanalmente em sessenta chefes, cujas criações incluem, como Portugal com leite de cabra. Para a sua identifica- ingrediente, o Queijo de Maçussa, o que constitui ção, usa o nome da aldeia de Maçussa, no conce- uma clara demonstração do reconhecimento na- lho de Azambuja. cional já alcançado por este produto regional.

O queijo designado “Granja dos Moinhos” é pro- Este é, seguramente, mais um exemplo de como duzido numa pequena empresa criada em 1977 a dedicação, o empenho e o rigor permitiram criar por Adolfo Henriques, com a ajuda da mãe, e na em Portugal este produto de excelência, valorizan- qual trabalham regularmente três pessoas, numas do a actividade rural e os sabores genuínos, usando antigas instalações agrícolas que já pertenciam à técnicas de produção cujo resultado final rivaliza família. Lançar-se neste nicho não foi tarefa fácil. com o melhor chèvre originário do sul de França. Para manusear os bolores, teve de frequentar um curso no Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial, que ainda hoje o apoia atra- vés do fornecimento de fermentos lácteos. Depois, importou um pequeno rebanho de cabras suíças da raça Saanen para lhe fornecerem o leite, mas actualmente adquire-o também a vários produto- res da região.

Para dar alguma visibilidade ao seu queijo, Adolfo Henriques contou com a colaboração do che- fe Michel, que criou uma entrada cujo principal ingrediente era justamente o Chèvre “Granja dos Moinhos”. Depois, aos poucos, foi sendo reconhe- cido e hoje o Queijo de Maçussa pode encontrar-se à venda nas mais prestigiadas lojas de artigos de alimentação. Em 2007, para assinalar os 30 anos

109 CHARNECA RIBATEJANA

111 “Os variados tapizes de flores, nas grandes relvas; os novilhos brincalhões, os toiros bravos a pasto. (...) os barcos do Tejo como prata fundida, em várias e caprichosas voltas, formando canais, lagos e ínsuas, bordadas de salgueiros recurvos; o sol (...) a inundar aquelas campinas, onde a profusão de floritas de diversas cores apresentam cambiantes vários, e nas alturas, atravessando o azul transparente, com o seu voo sereno e largo, a cegonha, solícita amiga do lavrador!” Foi com estas palavras que o poeta e bon vivant Raimundo Bulhão Pato recordou a paisagem ribatejana nas suas memórias. Dificilmente conseguiríamos fazer melhor retrato. Tal como as palavras do ensaísta sugerem, estamos numa terra pintada de fertilidade em tons de verde, território do toiro bravo e do celebrado cavalo Lusitano, animal tão estimado por aqui que se tornou símbolo da região.

Almeirim Alpiarça

Terra de caça abundante, Almeirim atraiu desde cedo Elevada à condição de vila em 1906, Alpiarça é reis e nobres. D. João I fundou o Paço Real e, durante desde há muito uma terra profundamente ligada ao a Dinastia de Aviz, este foi destino apetecido dos so- trabalho dos campos e à produção agrícola. Grandes beranos portugueses e da sua corte. O Tejo enchia- senhores fixaram-se nas suas cercanias, desenvol- -se de bergantins e de batéis engalanados transpor- vendo o território e apostando na riqueza do solo. O tando todos quantos se encontravam inscritos nos imponente palácio da Quinta da Lagoalva é disso livros de moradia de corte; a aldeia ganhava vida e testemunho, assim como a Casa dos Patudos com tornava-se palco de intrigas cortesãs e de assuntos o risco de Raul Lino e mandada construir por José de estado. As vicissitudes do tempo e a inconstância Relvas, lavrador e político defensor da causa republi- dos homens votaram à ruina este palácio do qual cana nos alvores do século XX. O edifício foi legado hoje não sobra pedra sobre pedra. Mas, em meados à vila pelo seu proprietário e a sua visita vale bem a do século XIX, o concelho encontrou um novo fulgor viagem. A vocação agrícola do concelho é visível até com a constituição de grandes casas agrícolas em- para o mais distraído viajante. À beira das estradas penhadas em modernizar o panorama rural e a tirar que cruzam a região, avistam-se grandes extensões partido do potencial agrícola da região. Muitas delas de terra trabalhada, vinhas que se intercalam com ainda hoje resistem, como a quinta do Casal Branco campos de milho, numa paisagem onde, aqui e ali, se e a da Alorna. Actualmente, Almeirim é reconhecido pode encostar à berma e provar uma fresca talhada pela excelência dos produtos da terra, especialmente de melão vendida de baixo de um rudimentar cha- o vinho e o melão, e pela superioridade das carnes péu-de-sol pelas mãos do próprio produtor. A gastro- de porco, nomeadamente dos enchidos, ingrediente nomia do concelho orgulha-se de manter a tradição, fundamental para o mais apreciado prato da região: mas hoje procura também criar novas propostas com a Sopa da Pedra. base nos produtos locais.

113 Benavente Chamusca Coruche Golegã

Entalado entre o Tejo e o Alentejo, rasgado pelo Augusto Pinho Leal, na sua monumental obra A afición corre nas veias dos coruchenses. A festa É assim todos os anos: as ruas enchem-se de gente, Sorraia, Benavente é o concelho da lezíria riba- “Portugal Antigo e Moderno”, refere que, em 1590, a brava é parte integrante da cultura deste concelho de amazonas de jaquetas bordadas, de cavaleiros tejana, terra de toiros e de cavalos. Coudelarias e Chamusca não era mais do que uma quinta de Ruy e, por aqui, é vivida com enorme entusiasmo. Daqui com mazzantinis à banda, o ar satura-se com o ganadarias famosas fixaram-se nesta região, entre Gomes da Silva, cavalheiro que passou à história saíram grandes nomes do toureio nacional, entre os aroma das castanhas assadas e, nas casetas que se elas a Companhia das Lezírias, em Samora Correia, com o título fulgurante de príncipe de Eboli, a terra quais o cavaleiro e ganadeiro David Ribeiro Telles, erguem no Largo do Arneiro, criadores e convida- e a Palha, na Quinta da Adema, no Porto Alto. Nas onde Cristo parou. Este filho da terra partiu muito que é hoje o patriarca de uma família totalmente dos brindam com água-pé à beleza e à aptidão do margens dos rios, milhares de hectares de pastagens cedo para Madrid e lá, gozando de uma boa estre- devotada à tauromaquia. Lusitano. Estamos em Novembro, por alturas do São alimentam inúmeras cabeças de gado, mansas e la, teve um brilhante destino político no reinado de Martinho, na Feira Nacional do Cavalo. Aqui celebra- bravas, lideradas pelo senhor da lezíria, o campino. Filipe II. Valido do rei, conseguiu que, a seu pedido, o O panorama da região é dominado pela vasta lezíria -se a actividade equestre em geral e o Puro-sangue De barrete verde, colete encarnado, meia branca e o soberano elevasse a sua terra a vila. Mas, antes disso, alimentada pelo rio Sorraia, onde cresce o melhor Lusitano, o mais antigo cavalo de sela do mundo, ferro da casa ao peito, o campino forma uma unidade sabe-se que a região já era povoada, pelo menos nas arroz de Portugal. O verde dos arrozais alterna, em particular, numa tradição que remonta ao século com a sua montada e vai comandando a manada fases finais do Neolítico, como provam as necrópoles muitas vezes, com extensas áreas de montado de XVIII, ao tempo do Marquês de Pombal. Já nessa brandindo o pampilho. Este homem conhece cada que se vão descobrindo nas imediações, e que a cul- sobro, uma paisagem que evoca já um pouco o altura, esta feira, na Golegã, era um importante pólo animal desde que nasce até ao dia em que triunfa tura romana também por lá passou, testemunhada vizinho Alentejo. De facto, o concelho de Coruche, de atracção para os melhores criadores de cavalos. na arena ou que é conduzido para abate e é uma por vestígios de uma antiga estrada do império. embora tenha o coração no Ribatejo, não deixa de No século XIX, instalaram-se nas cercanias da vila figura incontornável nas inúmeras festas tradicio- ter um pé no Alentejo. No livro “Coruche à Mesa e grandes lavradores que ajudaram a desenvolver o nais. Anualmente, o povo sai à rua para acompanhar Parece que, com as suas barcaças, a Chamusca tam- outros Manjares”, José Labaredas caracteriza assim potencial agrário do território. Alguns deles, tal como com entusiasmo os jogos de cabrestos e a picaria à bém era um importante porto de passagem, vocação a gastronomia da região: a nossa mesa tradicional Carlos Relvas, Ruy d’Andrade na quinta da Cardiga, vara larga, espectáculos típicos desta região. Assim, que deixou de fazer sentido com a construção da sua entronca numa comum matriz transtagana pois nos e Rafael José da Cunha, na Quinta da Broa, entraram não surpreende que na gastronomia se destaque o ponte em ferro, em 1909, conseguida graças à acção arrimamos fraternalmente ao Alentejo, colhendo e para a história pelo seu importante legado. Herdeiro Cozido Bravo à Ribatejana e, com o que sobra do persistente de um notável político da terra, João adaptando alguns dos mais saborosos nacos da sua de Rafael José da Cunha, Manuel Tavares Veiga cozido, as empadas de corno. Joaquim Isidro dos Reis. lavra. dedicou-se com rigor e minúcia ao apuramento da raça portuguesa e juntamente com Ruy d’Andrade Grande parte desta região pertenceu, desde D. João Bafejada pela natureza, toda a região é composta Cortiça, agricultura e gado bovino são as grandes e com o filho deste, Fernando Sommer d’Andrade, IV, à Casa do Infantado, criada a favor de seu filho, por terrenos muito férteis e produtivos. Assim, todo riquezas da região. A Comissão Europeia aprovou em desenvolveram as duas correntes de sangue mais o Infante D. Pedro. Com as guerras liberais, acabou este território tem uma forte ligação à agricultura e 2013 o registo da “Carne de Bravo do Ribatejo”, como importantes dos Lusitanos: a Andrade e a Veiga. por ser extinta com base na Carta de Lei de Março à criação de gado, sendo o concelho muito ligado às produto de Denominação de Origem Protegida. Para Assim, não é de estranhar que, pela sua história e de 1836. Por decreto, a Rainha D. Maria II autorizou a suas tradições tauromáquicas e a vila da Chamusca usar esta designação, a carne tem de ser proveniente cultura, a Golegã tenha ganho o estatuto de “Capital venda em hasta pública das vastas propriedades que muito orgulhosa da sua bonita praça de toiros, um da desmancha de carcaças de bovinos inscritos no do Cavalo”. Mas se a tradição e os desportos eques- compunham as Lezírias do Tejo. dos edifícios mais emblemáticos da terra. Livro Genealógico Português dos Bovinos da Raça tres dominam o concelho, os campos da Golegã, Brava de Lide, criados segundo os moldes tradicio- pontilhados de milharais, searas e olivedos, também Quase todas estas terras, formadas sobretudo por Na gastronomia, a memória também se impõe. Com nais na área geográfica de produção definida. Assim, não são esquecidos. Estas são terras fecundas que aluviões, são muitíssimo férteis e revelam-se um um magnífico património religioso, os doces con- recentemente, Coruche decidiu apostar na promoção anualmente se transformam em alimento. solo perfeito para a produção de tomate, milho ou ventuais perpetuam o saber das monjas. Hoje, estas da Carne de Toiro Bravo, investindo na recuperação arroz, produtos sempre presentes na gastronomia da delícias, saturadas de ovos e açúcar, destacam-se e de receitas e no aparecimento de novas propostas região. justificam, sem dúvida, uma visita. gastronómicas.

115 Salvaterra de Magos

Aqui o Tejo adelga-se, passa em suaves curvas de serpente, enlaça os mouchões dispersos e lá longe, branca, Salvaterra acena-nos. Nas águas, um grupo de homens arranca enguias à lama, projectando-as ao ar para serem apanhadas. O rio oferece alimento e presenteia os pescadores com um pitéu que, por estes lados, ascendeu à realeza. O concelho, com a preocupação de resgatar tradições culinárias, atri- buiu-lhe o título de «Rainha do Tejo».

Até à segunda metade do século XIX, esta era uma paisagem de charneca arenosa mas, com o afora- mento dos baldios municipais, as terras foram sendo amanhadas habilmente, tendo sido transformadas em chão carregado de vida, onde tudo quanto é plantado cresce em abundância. Nas pastagens, manadas de toiros correm soltos de baixo do olhar atento do maioral que, do alto da sua sela mourisca, com o xairel de pele de cabra, comanda a boiada em “ois”! alongados.

O coração do Ribatejo foi, desde há muito, terra de predilecção de reis. Entre o Paço Real de Almeirim e o de Salvaterra de Magos, os monarcas e a sua corte perdiam-se nas coutadas da zona, em jogos de caça grossa. A construção, em 1542, do Palácio em Salvaterra de Magos contribuiu em muito para o crescimento da vila e da região, promovendo a fixação de grandes casas nobres nas imediações. Tendo sido o Ribatejo abrigo para lazeres e vagares de príncipes e nobres, Salvaterra assistiu desolada à decadência, ao incêndio e ao abandono do seu Paço, do qual hoje só resta a capela e a falcoaria, recente- mente recuperada e totalmente dedicada à arte da cetraria, numa clara evocação das tradições cinegéti- cas da região.

117 GASTRONOMIA REGIONAL

Almeirim Chamusca Golegã Sopa da pedra, sopa de feijão, requentado, puré de Farinheira frita, morcelas de arroz grelhadas, sopa Farinheira frita, pataniscas, petinguinha albarda- tomate, massa à Barrão, bacalhau com molho de de sável, caldeirada de feijão-verde, tomatada, da, cagarrinhas com feijão, favas no azeite, sopa alho, magusto com bacalhau assado, caldeirada couve a soco com bacalhau assado, cabrito assado aporcalhada, sopa de feijão com carne, alaparda- à pescador de Almeirim, lebre com couve e feijão no forno à moda do Ribatejo, feijoada à lavrador, na, canelos, requentado com peixe frito, sável de branco, favas com enchidos de Almeirim, cacho- cachola e estamenha. Nos doces, trouxas de ovos, escabeche, enguias no espeto, massa com baca- la de porco, chispe com batata frita. Nos doces, peixe doce, queijinhos de amêndoa, lampreia de lhau e cabrito com grelos à moda da azinhaga. Nos bolo finto de Almeirim, bolinhos de limão, broas ovos, bichanas, corações de noiva, ferraduras, cha- doces, arroz-doce, bolos de noiva, merendeiras de de Almeirim, espera-marido, pés de abóbora e muscos, arroz-doce, velhoses, broas, toucinho do abóbora, toureiros, trouxas de ovos e velhoses. A velhozes. Destaque para as saborosas caralhotas e céu, belhoses, bolos e rabanadas de mel e migas indústria de vinagres da Golegã já tem projecção o famoso melão. doces. nacional e internacional e a sua importância levou ao aparecimento de uma proposta de requeijão Alpiarça Coruche com vinagre. Bolo de sardinha, favas só com ovo, sopa da Espargos ou túberas com ovos, migas de espargos, matança ou três por um, tomatada com sardinha, sopa rica de bacalhau do Couço, açorda de baca- Salvaterra de Magos miga fervida com bacalhau, carneiro à moda de lhau à moda de Coruche, açorda de sável. Carne Tripa temperada, sopa camponesa, de ossos, de Alpiarça, favas com entrecosto, molhinhos guisa- de toiro bravo (várias propostas), arroz de entre- feijoca com massa e de pão. Enguias de caldeirada, dos e papas de abóbora com carnes grelhadas. Nos costo, migas de batata com entrecosto, borrego no de ensopado, fritas com arroz de feijão e outras doces, Patudos, pão-de-ló de Alpiarça, quadra- forno e cabrito frito à lavrador. Nos doces, Areias propostas, tradicionais ou de autor, decorrentes dinhos de Alpiarça, broas de Alpiarça, ferradura do Sorraia, Bolo de batata-doce, Bolos fintos, Bolo do mês da enguia. Entrecosto à lavradora, galinha ou bolos de noivos e esses de amêndoa. A torta de nozes, Bolinhos de pinhão, Nógado de pinhão e assada no forno de pão, perna de cabrito no forno de melão e a mousse de melancia são reflexos da mel, Queijadas e Pinhoadas em flor de laranjeira. e sarrabulho à moda da Glória do Ribatejo. Nos tradicional produção destes dois frutos. doces, enguias doces, bolo de amêndoa, papos de anjo, pudim de pão, sonhos, bolos de mel e Benavente arroz-doce branco e os barretes da Cabana dos Empadas de corno, túberas fritas com carne, torri- Parodiantes, que ficaram famosos em todo o País cado do campino, sopa de bacalhau, sopa de car- graças aos Parodiantes de Lisboa, programa de rá- dos com feijão, sopa de feijão verde com segurelha, dio muito apreciado nos finais do século passado. enchidos, açorda de ovas de saboga, molhata de peixe, tomatada de peixe, cozido bravo à ribatejana, borrego grelhado, cabrito no forno com massa de catalão, molhata ou migas com entrecosto. Nos doces, bolo podre ou bolo Gungunhana, bolo de chocolate de Benavente, broas fritas de Benavente, broas de batata-doce e amêndoa e doce de tomate.

119 AGENDA GASTRONÓMICA

Fevereiro Novembro Four Weeks- Sopa da Pedra, em Almeirim Feira Nacional do Cavalo e Feira de S. Martinho, na Golegã Março Mês da Enguia, em Salvaterra de Magos 40 dias após a Páscoa, Semana da Ascensão, na Chamusca Maio Sabores do Toiro Bravo, em Coruche Mostra de Gastronomia Ribatejana e Salão do Vinho, Vinhos da Região do Vinagre e do Azeite do Ribatejo, na Golegã Os vinhos produzidos desta região integram a Comissão Vitivinícola Regional do Tejo. Junho Festas da Sardinha Assada, em Benavente Festas da Cidade (com tasquinhas), em Almeirim Confrarias Confraria Gastronómica de Almeirim Julho Confraria Gastronómica do Toiro Bravo Festival do Melão, em Alpiarça Confraria do Torricado com Bacalhau Festival de Gastronomia da Lezíria Ribatejana, em Confraria da Enguia Samora Correia, Benavente Festas da Sardinha Assada, em Barrosa, Benavente

Agosto Festas da Sardinha Assada, em Benavente

Setembro Festival da Sopa da Pedra e do Petisco, em Almeirim Alpiagra – Feira Agrícola e Comercial de Alpiarça, em Alpiarça Feira Anual e Tasquinhas, em Benavente

Outubro Jornadas de Gastronomia, em Coruche

121 SOPA DE FEIJÃO COM COUVE

Esta sopa é confeccionada com dois produtos que Ingredientes qualquer casa rural tem sempre à disposição, na tulha e Feijão vermelho; couve cortada; água; pão duro em na horta. O feijão encarnado, planta de cultivo simples, fatias; azeite; coentros e/ou hortelã. Sardinhas, pe- bem adaptada às condições climatéricas de Portugal, tingas ou carapaus e azeitonas pretas. cujas sementes alimentícias são de fácil conservação e de preço acessível, é um elemento indispensável na Preparação alimentação das populações de norte a sul do nosso Num tacho ou numa panela de barro deita-se o feijão País. A couve possui numerosas variedades, algumas vermelho previamente cozido, a que se junta couve morfologicamente muito diferentes, mas pensa-se que cortada e água suficiente para cozer. Depois de cozi- algumas são autóctones e que, desde muito cedo, fizeram da a couve, deita-se tudo por cima de fatias finas de parte da dieta dos povos que habitaram e habitam o pão duro, para o escaldar, temperando-se por cima nosso território. com azeite cru. Pode juntar-se um ramo de coentros picados ou uns raminhos de hortelã, ou ambos. Ao fornecer a receita desta sopa, o seu autor esclareceu que ela “serve-se acompanhada…”. Ou seja, o Esta sopa serve-se acompanhada de sardinhas, de peixe que mais facilmente chegava a estas paragens, petingas fritas ou assadas ou de carapaus fritos e as sardinhas e os carapaus, eram considerados azeitonas pretas20. acompanhamento do prato principal, a sopa. Esta é uma sopa robusta que pede, por isso, um Reescrita na actualidade, e tendo em conta a alteração vinho tinto de corpo médio, no qual predomine a uva de hábitos alimentares, esta receita, provavelmente, Castelão. Deve, no entanto, ser frutado com taninos seria apresentada como um prato de sardinhas ou de subtis mas presentes. Escolha um vinho da Região carapaus, com acompanhamento de Sopa de Feijão com Tejo, jovem e sem estágio em madeira. Couve.

O autor referiu, no entanto, que “as nossas sopas são, no geral, de sustância, pois sempre constituíram por si próprias refeições completas”. Muitas vezes, por motivos facilmente entendidos, a sopa era consumida sem acompanhamento, ou, quando muito, com azeitonas.

123 SOPA DE FEIJOCA COM MASSA

A consistência desta sopa é dada pela Feijoca ou Feijão- Ingredientes -de-Espanha, que pertence à família das leguminosas e 1 l de feijoca; 1 cebola grande; 2 batatas; 3 cenouras encontra a sua origem na América Central e no México, médias; massa ao gosto q.b.; 2 dentes de alho; 1 tendo sido introduzida na Europa, provavelmente, colher de chá de colorau; 1 fio de azeite; 1 ramo de no século XVIII. É uma variedade de feijão graúdo hortelã; sal q.b. que cresce em forma de trepadeira, atingindo, por vezes, cerca de quatro metros de altura. A planta Preparação dá muitíssimas e magníficas flores encarnadas que Coze-se a feijoca. Retiram-se algumas feijocas permanecem abertas por muito tempo e possui vagens inteiras e reservam-se, sendo as restante trituradas grossas, pendentes, com as sementes alimentícias. dentro da água de cozer. À parte, faz-se um refogado Quando estas são cozinhadas, adquirem um sabor com a cebola e os dentes de alho picados, o colo- singular e aveludado. rau e o azeite. Depois, juntam-se ao puré as feijo- cas inteiras, juntamente com as batatas cortadas O outro ingrediente principal deste prato, a Massa aos quadradinhos e as cenouras cortadas miúdas. Alimentícia, tem um valor nutritivo superior ao do pão, Tempera-se com sal a gosto e deixa-se cozer. Quase pois é normalmente preparada com farinha de trigo não no fim da cozedura, deita-se a massa, que pode ser refinada. de cotovelos ou mais grossa, consoante o gosto. Deixa-se cozer e apurar. Por fim, numa terrina, colo- ca-se um bom ramo de hortelã no fundo e cobre-se com o preparado anterior.

Esta sopa é quase uma refeição. Os diferentes ingre- dientes que a compõem sugerem um vinho tinto da Região Tejo com muita complexidade e persistência. Como a Sopa de Feijoca com Massa é bastante forte e encorpada, pede um vinho com essa mesma estrutura.

125 SOPA DA PEDRA

Tal como quase todos os costumes e tradições, também a Ingredientes gastronomia regional tem uma lenda associada. No caso 1 l de feijão encarnado; 1 orelha de porco; 1 chouriço de Almeirim, é a Sopa da Pedra. negro de sangue, da região; 1 chouriço de carne; 150 g de toucinho entremeado; 750 g de batatas; 2 Conta-se que um frade andava no peditório e à porta cebolas; 2 dentes de alho; 1 folha de louro; 1 molho de um lavrador não lhe quiseram dar nada. O frade, de coentros; sal e pimenta. cheio de fome, disse que ia fazer uma sopa de pedra. Cheios de curiosidade, o lavrador e a mulher acederam Preparação a fornecer-lhe tudo o que ele pedia para a confecção da Se o feijão for do ano, não necessita ser demolhado. dita sopa, desde o tacho de barro e um canto do lume até Se for duro, põe-se de molho durante algumas horas. aos ingredientes, como um pouco de unto, uma pedrinha Escalda-se e raspa-se a orelha de porco, que vai a de sal, um olho de couve ou um pedaço de chouriço. cozer em bastante água com o feijão, os chouriços, Quando o frade acabou de comer, o lavrador espantou- o toucinho, as cebolas, os alhos e o louro. Tempera- -se por a pedra ter ficado no fundo do tacho, ao que se com sal e pimenta. Se for necessário juntar mais o frade respondeu que ficava para outra vez. E assim água, deve ser sempre a ferver. Quando a carne comeu à custa de quem não lhe queria dar nada! estiver cozida, retira-se e introduzem-se na panela as batatas cortadas aos quadradinhos e os coen- Não precisando de recorrer às artimanhas do frade, tros picados. Deixa-se cozer a batata. Assim que se vão-se acrescentando à sopa os mais substanciais retirar a panela do lume, introduzem-se as carnes ingredientes, o que tem contribuído, ao longo dos previamente cortadas aos bocadinhos e uma pedra tempos, para a fama que este prato já granjeou. Mas bem lavada, que deve ir na terrina21. a qualidade dos produtos hortícolas e dos enchidos da região são os principais trunfos desta proposta A Sopa da Pedra pede um vinho tinto jovem da gastronómica apresentada pelos restaurantes, Região Tejo. Escolha um pouco elaborado e sem principalmente no concelho de origem, Almeirim. grande complexidade.

127 REQUENTADO

O Requentado é um prato muito popular na Golegã Ingredientes e em muitos outros concelhos do Ribatejo, e é mais Para a sopa - que deve ser em quantidade sufi- um exemplo da ancestral economia doméstica, com ciente para duas refeições: 300 g de feijão branco; o aproveitamento e a valorização das sobras, usando 1 cebola; 1,5 dl de azeite; 2 couves portuguesas; 3 produtos da região. Depois do consumo da sopa, para dentes de alho; 0,5 kg de pão de milho; sal q.b. Para não repetir o mesmo prato na refeição seguinte, usava- o Requentado: Restos da sopa de feijão branco; 3 dl se a criatividade, acrescentando o alho e o pão de milho. de azeite; 6 dentes de alho; pão de milho Mas há quem afirme que é a segunda fervura que faz toda a diferença. Preparação Sopa: Depois de oo feijão demolhado durante dez Quem podia acompanhava o Requentado com bacalhau a doze horas, coze-se em água abundante com a assado, durante muito tempo conhecido como o “fiel cebola e um pouco de azeite. Quando o feijão estiver amigo”, ou com sardinhas fritas ou assadas. cozido, junta-se a couve cortada em caldo-verde grosso. Tempera-se com sal. Serve-se a sopa à noite, ao jantar, e cada um junta-lhe pão de milho esfarela- do e rega-se com um fio de azeite.

Requentado: No dia seguinte, leva-se o resto da sopa ao lume, até ferver. Junta-se-lhe o azeite, os dentes de alho descascados e inteiros e pão de milho em quantidade suficiente para enxugar o caldo e se obter um preparado com aspecto de uma açorda. Depois de se adicionar o pão, deixa-se o requentado ferver, mexendo sempre para evitar que se pegue ao fundo do tacho. Nesta altura e enquanto se mexe, se for necessário, junta-se mais azeite. Acompanha-se com bacalhau assado, carapaus ou sardinhas fritas.

O vinho a escolher para harmonizar com o Requentado deverá ser um tinto jovem da Região do Tejo, sem estágio em madeira. um vinho de lote em que predomine o Castelão ou a Trincadeira.

129 AÇORDA DE SÁVEL

Nas terras ribatejanas atravessadas pelo Tejo, a cozinha Ingredientes é marcada pela influência do rio, de onde vem o peixe 3 cabeças e as ovas de sável; 2 pães de trigo duros, que deu fama à gastronomia ribeirinha: o sável. É um de cerca de 1kg; sumo de meio limão; 4 dl de azeite; 1 peixe marítimo que, no princípio da Primavera, sobe o folha de louro; coentros; sal e piri-piri q.b. curso do rio para desovar, altura em que a sua pesca é autorizada. Mas, embora existam regras para disciplinar Preparação a sua captura, actualmente, tanto o sável como outras Cozem-se as cabeças e as ovas em bastante água espécies que povoam o rio estão em risco de desaparecer. temperada de sal e louro. Entretanto, corta-se o pão As causas são sempre as mesmas: as barragens, que em fatias finas para uma tigela funda. Escalda-se criam obstáculos intransponíveis à passagem dos peixes, este pão com a água em que cozeu o peixe. Há quem a poluição, que os envenena, a pesca desenfreada, que triture num passe-vite os restos das cabeças cozidas os dizima. para que o suco que se mistura ao caldo da cozedura lhe dê ainda mais sabor. Deixa-se abeberar e depois Mas, apesar de, hoje em dia, já não ser o mesmo o desfaz-se o pão com uma colher até se obter um número de sáveis que, obedecendo à natureza, procura preparado homogéneo. Deita-se o azeite num tacho as águas a montante para se reproduzir, os homens da e leva-se a aquecer com os dentes de alho, sem os beira-rio mantêm viva a tradição da pesca e do consumo queimar. Junta-se então o pão desfeito e, mexendo deste peixe, cozinhado de diversas maneiras. sempre, deixa-se levantar fervura. Acrescentam-se as ovas já sem a película que as envolve e, meias A Açorda de Sável, feita com as ovas, a cabeça e o rabo desfeitas, mexendo-se sempre. Juntam-se os coen- do peixe, é o acompanhamento tradicional do sável frito tros picados, o sumo de limão e o piri-piri. Vai à mesa em postas muito finas. É um dos pratos mais típicos e bem quente, a acompanhar fatias bem finas de sável mais apreciados da gastronomia da beira-rio, atraindo frito. todos os anos multidões que acorrem aos festivais dedicados à degustação dos pratos regionais à base deste Esta é uma receita que exige um branco de bom peixe de carne delicada e gorda, embora com muitas corpo, com uma boa estrutura. Procure um vinho espinhas. Paradoxalmente, estas iniciativas constituem da Região Tejo, cujo lote contenha Fernão Pires e/ um importante recurso económico para as regiões ou Arinto. Deve ser estruturado e untuoso, com uma onde se realizam, mas, ao mesmo tempo, contribuem maior complexidade dada pelo estágio em madeira para um desequilíbrio ecológico que coloca em risco a de carvalho. continuidade da espécie.

131 ENSOPADO DE ENGUIAS

O Tejo que passa por Salvaterra de Magos é aquele que Ingredientes atravessa o Ribatejo, o que tem já água doce e margens 1,2 kg de enguias; 3 cebolas grandes; 1,5 dl de azeite; verdejantes. É um rio cheio de vida, com uma grande 750 g de tomate; 1 dente de alho; 1 folha de louro; riqueza natural e paisagística, em que o peixe de rio - 1 ramo de salsa; 1 colher de sopa de colorau; sal e como o sável, a saboga, a fataça, a enguia ou o barbo pimenta q.b.; 1,5 dl de vinho branco; 2 pimentos; 200 - dita a tradição gastronómica das populações que tão g de fatias de pão torrado. bem sabem casar o que a terra, o clima e o rio, juntos, fornecem, recriando, adaptando e melhorando. Preparação Amanham-se as enguias e cortam-se em bocados. Com a horta ao pé da porta, o rio a dois passos e restos Temperam-se com sal. Cortam-se as cebolas em de pão, assim se faz o Ensopado de Enguias, prato tão rodelas e alouram-se no azeite. Quando estiverem característico do Ribatejo e que é parte da dieta dos louras, junta-se o tomate cortado em rodelas gros- locais. Por isso, actualmente, nos restaurantes de todas sas, o dente de alho esmagado, o louro, a salsa, o co- as povoações da beira-rio, o Ensopado de Enguias lorau, o sal e a pimenta. Deixa-se refogar um pouco tem sempre um lugar privilegiado na ementa. E depois e introduzem-se as enguias, envolvendo-as bem no das chuvas do inverno que, diz-se, é a altura em que refogado. Regam-se com vinho branco e deixam-se as enguias são melhores, o município de Salvaterra de cozer em lume brando. Cerca de dez minutos depois Magos promove anualmente, no mês de Março, um de ter levantado fervura, adicionam-se os pimentos festival gastronómico dedicado a este peixe. cortados em tiras. Apura e serve-se numa terrina sobre as fatias de pão22. Com pequenas variações, vai-se encontrando esta maneira de cozinhar as enguias um pouco por todo o O Ensopado de Enguias aceita um vinho branco da lado, ao longo dos rios portugueses, por cujos estuários Região Tejo, de preferência da uva Fernão Pires, que estes animais viajantes e corajosos penetram, depois de domina nesta zona. A sua acidez e o corpo médio terem nascido em pleno Oceâno Atlântico e de terem realçam e harmonizam-se bem com os sabores das vagueado durante cerca de dois anos pelo mar alto até enguias. encontrarem as águas doces e os fundos lodosos onde gostam de viver e onde acabarão os seus dias, para aparecerem a nadar num molho saboroso que ensopa o pão no fundo do prato.

133 CABRITO ASSADO À MODA DO RIBATEJO

O Cabrito Assado é uma das grandes referências da Ingredientes gastronomia de norte a sul de Portugal e está, em geral, 1 cabrito pequeno; 250 g de chouriço de carne; 150 associado a festas religiosas, nomeadamente a Páscoa. g de toucinho gordo; 3 dentes de alho; 3 cebolas; 3 É no domingo de Páscoa que se retoma a alimentação malaguetas; 1 raminho de salsa; 2 colheres de sopa normal, terminado o jejum que os cristãos estabelecem rasas de colorau; 3 dl de vinho branco; sal q.b. durante a Quaresma, período de quarenta dias entre a Quarta-feira de Cinzas e as celebrações pascais. É Preparação nesta época que, em geral, os rebanhos têm um maior Pica-se a cebola muito fina, assim como o chouriço, número de crias, e as refeições à base de jovens ovinos o toucinho, os dentes de alho, as malaguetas e a sal- ou caprinos envolvem um ritual de cariz religioso que sa. Mistura-se tudo com o vinho branco, o colorau e remete para a Paixão de Cristo. o sal. Barra-se o cabrito interior e exteriormente com esta papa e deixa-se ficar durante algumas horas, Com algumas zonas de elevação de terreno, propícias de preferência, de um dia para o outro. Em seguida à criação de caprinos, o Ribatejo, região de transição leva-se a assar em forno moderadamente quente, geográfica e de adaptação às diferentes condicionantes de onde se retira de vez em quando para o expor a culturais e de economia doméstica, também apresenta na uma corrente de ar e o regar com o molho que se vai sua tradição gastronómica pratos em que o ingrediente formando. Se necessário, junta-se mais vinho branco. principal é o cabrito, não apenas para o período pascal, mas também para outras festividades de índole religiosa, Acompanha com batatinhas, que se assam ao mes- como casamentos, baptizados ou primeiras comunhões. mo tempo que o cabrito, e com grelos cozidos.

O Cabrito Assado à moda do Ribatejo é uma carne que exige um vinho elaborado e elegante, envelheci- do em tonéis de carvalho. A estrutura do vinho deve ser conferida pelo estágio em barrica e os seus tani- nos vigorosos são a companhia ideal para um prato de forno, contrabalançando o toque gordo do cabrito.

135 CABRITO COM GRELOS À MODA DA AZINHAGA

Apesar de ser uma região cuja tradição gastronómica Ingredientes se baseia fundamentalmente nas carnes de suíno e de 0,5 kg de cabrito, 100 g de toucinho alto, 0,5 dl de bovino, o Ribatejo também tem no seu receituário azeite, cebolas, 3 dentes de alho, margarina, 4 toma- pratos em que o ingrediente principal é o cabrito, tes grandes, vinho branco, 1 molho de grelos, salsa, testemunho da diversidade gastronómica de uma região louro, piri-piri, vinagre de vinho e pão torrado. de contrastes. Como noutras zonas de características rurais, a origem dos pratos actualmente típicos deriva Preparação do aproveitamento dos recursos existentes. E o gado Numa caçarola com meio decilitro de azeite, dei- caprino, pouco exigente em termos de alimentação, tam-se rodelas fartas de cebola, o toucinho picado, preenchia as necessidades de famílias de poucas posses. os dentes de alho bem pisados, um ramo de salsa Um pequeno rebanho podia facilmente contribuir, e uma folha de louro. Refoga-se. Já da cor do trigo com pouca despesa e pouco trabalho, para o sustento maduro, acrescenta-se um decilitro de vinho branco, familiar, fornecendo carne para os dias festivos. meio pacote de margarina, dos pequenos, pimenta e sal q.b., piri-piri a gosto, os tomates pelados, sem O cabrito deve ser abatido com pouco mais de um mês sementes e partidos aos quartos. Apura um pouco de vida e sempre alimentado com leite materno. Tem e junta-se o cabrito partido aos pedaços. Ao mesmo por isso, uma carne extremamente tenra e rosada. Na tempo, cozem-se à parte, em água e sal, os grelos freguesia da Azinhaga, do concelho da Golegã, nas que, depois de cozidos e escorridos, levam uma margens do rio Almonda, prepara-se uma receita concha de molho do cabrito, uma colher de sopa excelente em que o cabrito é confeccionado em tacho de de margarina e um pouquinho de vinagre de vinho. barro e acompanhado com grelos cozidos, regados com o Envolve-se tudo e dispõe-se à volta de uma travessa, molho em que foi cozinhado o animal. que já tem no fundo rectângulos de pão alvo torrado. Coloca-se, por cima, a carne do cabrito, que vai ser regada com o molho a ferver, já passado por um pas- sador e temperado com umas gotas de limão23.

Acompanhe o Cabrito com Grelos à moda da Azinhaga com um vinho tinto da Região Tejo das castas Touriga Nacional, Aragonês ou Syrah, com uma concentrada acidez das uvas

137 ARROZ DE BUCHO

É costume dizer-se que, do porco, se aproveita tudo. Ingredientes E este prato confirma esse dito, porquanto o bucho 1 bucho de porco; 1 osso do peito; 1 rabo do porco corresponde ao estômago do animal. Existem receitas, com toucinho agarrado; 4 nabos com rama; 600 g de sobretudo, noutras regiões do País, como as Beiras, em arroz; sal q.b. que o bucho é aproveitado para ser recheado. Mas para os apreciadores, esta peça pode ter outras formas de Preparação preparação culinária, como cozido, muito simplesmente. Lavam-se as carnes muito bem e cozem-se em água É o caso deste Arroz de Bucho cujo sabor, no entanto, e sal. Estando cozidas e bem tenras, escorrem-se e, pode ser reforçado pela presença de um osso do peito e na mesma água, cozem-se os nabos cortados aos da gordura de um naco de toucinho tirado de uma parte pedaços e a rama tenra dos mesmos. Mede-se o específica do animal. Esse sabor é, depois, transmitido caldo que deve ser três vezes o volume do arroz e, ao arroz, cozido no caldo das carnes, ao qual se quando este ferver em cachão, deita-se o arroz lava- acrescentou hortaliça. do e enxuto e deixa-se cozer. Serve-se bem quente numa travessa, com as carnes cortadas aos pedaços dispostas por cima.

Se necessário, o bucho deve ficar 24 horas em água com rodelas de limão, para perder o cheiro característico.

Um vinho jovem da Região Tejo é o pedido para acompanhar este Arroz de Bucho . Espera-se que seja herbáceo nos aromas, com um corpo médio e que tenha um bom preenchimento na boca, graças aos seus taninos jovens, que ajudam na digestão da gordura.

139 MIGAS DE BATATA COM CARNE DE PORCO

A Batata é uma das principais culturas do nosso País, Ingredientes estendendo-se o seu cultivo de norte a sul, desde a Lombo, costelas, toucinho entremeado da cauda, produção em grande escala até à agricultura familiar banha, 1 folha de louro, vinagre, 5 dentes de alho, de subsistência. A região do Ribatejo é uma das mais batatas, sal q.b. representativas em termos de área cultivada e de produtividade. É, pois, um dos produtos agrícolas Preparação que assume maior relevância na economia da região Numa boa frigideira, deitam-se 3 colheres de banha e também um alimento que faz parte integrante e e fritam-se as carnes. Cozem-se as batatas com fundamental da dieta das suas populações, podendo pele, descascam-se depois de cozidas e esmagam- ser confeccionado das mais diversas maneiras. Diz se com um garfo ou com esmagador próprio. Na a tradição que a primeira plantação de batatas no frigideira em que se fritaram as carnes, alouram-se Ribatejo aconteceu no Couço, freguesia de Coruche, os dentes de alho com a folha de louro e, antes de cujo produto foi devorado, mesmo cru, pelos soldados estarem castanhos, juntam-se as batatas que se comandados pelo capitão Schwalbac, em 1846, deixam «alourar» revolvendo-as sempre, juntando ao aquando do rescaldo das guerras liberais, pois não mesmo tempo uns pingos de vinagre, cuja presença sabiam da existência daquele tubérculo levantado pelas se detecta mas não se sobrepõe aos outros sabores. patas dos cavalos. O conhecimento desta data histórica Num movimento firme, conformam-se como um permite-nos, assim, identificar o ano em que, pela bolo oblongo e servem-se em travessa, rodeadas de primeira vez, se semeou batata nesta região. A esta carnes e acompanhadas de rodelas de laranja. actividade pioneira se deve o epíteto pelo qual ficaram conhecidos os naturais do Couço – “batateiros”. Algumas pessoas preferem deitar a gordura da frigi- Quanto ao Porco, antigamente, para a população de deira nas batatas esmagadas, mexendo e homoge- substracto económico essencialmente agrícola, de norte a neizando tudo muito bem e levando então depois ao sul do País, este animal desempenhava um papel central lume para tostar24. na subsistência e na economia doméstica. Mas, hoje em dia, cada vez é mais rara a sua criação em pocilga. Sirva as Migas de Batata com Carne de Porco Por isso, a tradição da matança, com todos os seus com vinho tinto da Região Tejo, de médio corpo a rituais, tem tendência a desaparecer. Em compensação, encorpado, acidez moderada e com taninos mais a criação intensiva tem registado um aumento. No marcantes. entanto, apesar desta mudança em termos de produção, há hábitos alimentares que persistem, mantendo viva a tradição gastonómica regional, como esta receita, que conjuga dois alimentos tradicionais do Ribatejo. 141 FAVAS COM ENTRECOSTO

O prato de Favas com Entrecosto está relacionado com Ingredientes o cultivo desta leguminosa e, sobretudo, com a criação 3 kg de favas; 4 colheres de sopa de azeite; 3 e a matança do porco, que constituía um momento dentes de alho; 1 cebola; 500 g de entrecosto alto na região, pois era motivo de festa e de reunião de cortado em pedaços pequenos; 100 g de toucinho; familiares e de amigos entre o Natal e o mês de Janeiro. 1 linguiça/chouriça; 1 chouriço negro; 1 molho de As favas, por seu lado, deviam ser semeadas por alturas coentros; 1 folha de rama de alho verde; 1 raminho de do dia 8 de Dezembro, obedecendo ao provérbio “Pela hortelã; 1 folha de louro e 1 folha de rama de cebola Senhora da Conceição, favas ao chão”, e colhidas em verde. meados de Abril e Maio. Era nessa altura que o prato de Favas com carne de porco era mais consumido, pois Preparação tudo provinha do trabalho das famílias. A abundância Num tacho de barro, de preferência, põem-se o azei- de favas na horta, de carne da matança na salgadeira e te, a cebola, os dentes de alho picados, o toucinho às de enchidos no fumeiro permitiam a confecção de uma fatias fininhas, o entrecosto, os enchidos às rodelas e refeição copiosa que se tornou numa das mais populares o louro. Por cima, dispõem-se as favas, o raminho de ofertas culinárias de Portugal e, particularmente, cheiros (metade dos coentros, hortelã, folhas verdes desta zona do País. Não havia horta que não semeasse de cebola e alho) e sal a gosto. Tapa-se o tacho e le- favas para serem consumidas na Primavera, altura em va-se a cozer em lume brando, sacudindo fortemente que ainda há pouca diversidade de hortaliças. É, de o tacho de vez em quando, para que o cozinhado não facto, um prato substancial e nutritivo, que faz parte agarre ao fundo do tacho. Quase no fim, picam-se os da tradição gastronómica de todo o País, ainda que a restantes coentros e espalham-se por cima, retiran- receita apresente pequenas variações de região para do-se o tacho do lume. Serve-se bem quente, acom- região. Actualmente, a oferta de favas congeladas panhado de salada de alface cortada em juliana. permite a confecção deste prato em qualquer altura do ano. Estas Favas com Entrecosto devem ser servidas com um vinho tinto da Região Tejo de corpo médio, acidez mais elevada e um tanto tânicos.

143 FEIJOADA À LAVRADOR

O feijão manteiga tem grãos de tamanho médio e Ingredientes de sabor aveludado e cremoso. É, por isso, uma das 500 g de carnes de porco - chispe, entrecosto e variedades mais apreciadas na gastronomia portuguesa, outras; 400 g de feijão manteiga; 2 cebolas médias; sobretudo para a confecção das feijoadas. Quando 2 dentes de alho; 1 chouriço de carne; 1 farinheira; cozido, fica acastanhado. 1 cenoura; meia couve lombarda; 2 dl de azeite; 1 folha de louro; sal, piri-piri e colorau, q.b. Se o feijão é aqui o produto de referência, a Feijoada tem o seu grande trunfo nas carnes de porco, gordas e Preparação sápidas, e nos enchidos, de sabor acentuado. Põe-se o feijão de molho de um dia para o outro. Depois escorre-se e vai a cozer numa panela, coberto Em tempos idos, era o prato que se servia após a de água e temperado com sal e um fio de azeite. matança do porco, no tempo mais frio. Hoje, as Entretanto, descascam-se e picam-se as cebolas e feijoadas comem-se em qualquer época do ano e os alhos e levam-se a alourar com a margarina, um praticamente em todo o País, já que o acesso às fio de azeite e a folha de louro. Junta-se o chouriço carnes está mais facilitado e o feijão continua a ser cortado às rodelas e as carnes de porco em bocados semeado para auto-consumo e para comercialização, pequenos. Depois da carne alourar e cozinhar um nomeadamente nesta região. pouco, junta-se o feijão, o respectivo caldo e a cenou- ra em rodelas. Após cozinhar e apurar, rectificam-se os temperos e juntam-se as folhas de couve ripadas miúdas e sem talos. Deixa-se cozer até a couve estar tenra. À parte, pica-se a farinheira com uma agulha e coze-se em água. Quando tudo está cozinhado, serve-se a feijoada bem quente, com a farinheira cortada em pedaços, por cima.

A Feijoada à Lavrador pode ser servida com um vi- nho tinto encorpado. Escolha um da Região Tejo que enfrente bem pratos mais pesados.

145 LEBRE COM COUVE E FEIJÃO BRANCO

A Lebre pertence à família do coelho, mas distingue-se Ingredientes facilmente deste por ser maior, pela cor amarelo- 1 lebre; 1 couve lombarda; feijão branco; azeite; tou- acastanhado, pelas grandes orelhas, negras na cinho; salsa. Para a marinada: alhos picados; vinho extremidade, e pelo grande comprimento dos seus tinto; salsa; louro; malagueta; colorau; sal e pimenta. membros posteriores, o que lhe permite adquirir grandes velocidades. Nada bem e trepa sem dificuldades. Um Preparação excelente sentido do olfacto, uma óptima visão e uma Comece por cortar a lebre em pedaços e tempe- boa audição permitem-lhe escapar aos seus predadores re com salsa, louro, malagueta, vinho tinto, alhos com alguma facilidade Mas sendo uma espécie cinegética picados, colorau, sal e pimenta. Deixe marinar muito apreciada, a caça e a intensificação da prática durante, pelo menos, umas oito horas. Aqueça 0,5 agrícola têm contribuído para o seu declínio, embora dl do azeite com um pedacinho de toucinho e deixe possa ter até três ninhadas por ano. Em Portugal, a gordura derreter. Junte a lebre e os ingredientes encontra-se em quase todo o território, preferindo os sólidos da marinada e guarde o líquido da marinada. pousios e as terras cultivadas, sobretudo planas, húmidas Quando a lebre ficar corada, regue-a com o líquido e pouco cobertas. da marinada e deixe cozinhar cerca de 30 minutos, em lume brando. De seguida, adicione a couve lom- Os agricultores dão-lhe caça, não só porque ela se barda cortada aos bocados e deixe cozinhar por mais alimenta nos campos amanhados, comendo os rebentos 25 minutos.Seguidamente, coloque o feijão branco das hortícolas, mas também porque contribui para a a cozer na panela de pressão, durante cerca de 30 economia doméstica, fornecendo carne que não deu minutos, juntamente com uma cebola às rodelas e despesa a alimentar, afora alguns prejuízos nas culturas. 0,4 dl azeite. Quando terminar, tempere com sal a Combinada com dois produtos colhidos na horta, o gosto e junte o feijão à lebre. Por fim, adicione 4 dl feijão branco e a couve lombarda, dá origem a um prato do caldo da cozedura do feijão ao preparado da lebre delicioso, cheio de contrastes: o sabor intenso da lebre, o com a couve bombarda e deixe cozinhar por mais 15 aveludado do feijão branco e a rusticidade da couve. minutos. Para decorar, utilize um ramo de salsa25.

Sirva com um vinho tinto encorpado e concentrado da Região Tejo. Deve ser complexo, estruturado e vigoroso, com um lote que inclua a casta Trincadeira ou Syrah.

147 ARROZ DE CASTANHAS

Antes da introdução da batata na dieta alimentar dos Ingredientes povos da Península Ibérica, a castanha constituía a base 0,5 kg castanhas piladas; 300 g de arroz; 1 ou 2 den- da alimentação das populações, sobretudo as rurais. tes de alho; 1 fio de azeite; água e sal. Por isso, ainda hoje se encontram soutos disseminados por todo o território nacional. Todavia, pela sua Preparação fertilidade natural, o Ribatejo produz uma grande Na véspera, põem-se de molho as castanhas piladas. variedade de espécies comestíveis, nomeadamente em Depois de bem demolhadas, colocam-se numa pane- termos hortícolas, e, por essa razão, a área dedicada la com água, sal, um fio de azeite, um ou dois dentes aos castanheiros é muito menor do que noutras zonas de alho esmagados e deixam-se cozer. Cerca de dez do País. Não é, pois, de estranhar que uma das receitas minutos antes de terminar a cozedura, juntam-se típicas do Ribatejo seja confeccionada com castanhas 300 g de arroz, que se deixa cozer, mas sem ficar secas, oriundas de regiões grandes produtoras de empapado. Come-se bem quente. castanhas, as castanhas piladas, cuja capacidade de conservação compensa a pouca abundância do fruto Para acompanhar este prato, escolha um vinho fresco. tinto da Região Tejo, ainda jovem e sem estágio em madeira. Um vinho sem complexidade para comple- O Arroz de Castanhas era um prato tradicionalmente mentar um prato simples. consumido na Sexta-Feira Santa, dia em que os católicos se coibiam de comer carne, mas cujos componentes eram suficientemente nutritivos para alimentar uma família entregue aos trabalhos duros do campo. Já o arroz tem uma presença significativa na dieta dos ribatejanos, pois as margens dos rios que atravessam as suas terras, pela facilidade com que são alagadas, permitem a cultura dessa gramínea, que é, aliás, um dos alimentos mais populares em Portugal.

149 MORCELA DE ARROZ GRELHADA

A Morcela é um enchido com grande implantação em Ingredientes todo o território português, uma vez que é um sub- Morcela de arroz produto confeccionado na altura da matança do porco, acontecimento que ocorria em todas as casas agrícolas, Preparação grandes ou pequenas, por todo o País, de norte a sul. O Depois de cozidas, as morcelas de arroz são postas Ribatejo não é, pois, excepção. sobre o lume, preferencialmente de carvão, e grelha- das até ficarem com a pele bem brilhante e estala- O elemento comum a todas as morcelas é o sangue do diça. Comem-se, em geral, com boas fatias de pão, porco acabado de matar, diluído com vinagre e vinho com migas, com requentado ou mesmo com grelos tinto para não coagular e temperado com sal e pimenta. de nabo. Os outros ingredientes podem ser, com algumas variantes, gorduras de porco cortadas aos bocados, Escolha, para acompanhar a Morcela de Arroz cebolas e salsa picadas, cominhos, cravinho e arroz Grelhada, um vinho tinto da Região Tejo, com pouca mal cozido, preferencialmente da variedade carolino, acidez, para fazer uma boa ligação com o enchido. um produto português proveniente dos estuários dos rios Sado, Tejo e Mondego. Esta massa fica a marinar durante cerca de oito horas. Enchem-se depois as tripas, que, previamente, foram muito bem lavadas com água e esfregadas com limão. Finalmente, são cozidas em água a ferver, temperada com sal, louro e cebola. Picam-se com um garfo e, quando já não sair sangue, estão prontas. Podem ser consumidas apenas cozidas, fritas, grelhadas ou em confecções mais elaboradas, como mais recentemente são apresentadas como entrada em restaurantes.

151 TÚBERAS MEXIDAS COM OVOS

As Túberas ou Túbaras são fungos que se desenvolvem Ingredientes em simbiose com as raízes dos carvalhos ou dos sobreiros, Túberas; azeite ou banha; ovos; salsa; manteiga; debaixo de terra, e que aparecem em Portugal depois sumo de limão; sal. das chuvas do Inverno, a partir dos finais de Fevereiro até ao princípio de Maio, principalmente no Ribatejo e Preparação no Alentejo. Conforme a zona, também são chamadas Arranjam-se as túberas e, com o auxílio de uma tubras, criadilhas ou batatilhas. Pertencem à família das escovinha, limpam-se de toda a terra agarrada. trufas negras do Périgord ou das trufas brancas de Itália Cortam-se depois em pequenas rodelas. Salgam-se e, embora o seu sabor seja suave e delicado, o aroma é e fritam-se em bom azeite ou banha. Batem-se os menos intenso, pelo que o seu valor comercial é muito ovos juntamente com a salsa picada, adicionam-se- inferior ao das suas parentes estrangeiras. Convém, por lhe as túberas fritas e vai tudo a fritar numa frigideira isso, combiná-las com ingredientes de sabor e aroma com manteiga, mexendo sempre e juntando um discretos para não serem anuladas. Para a colheita das pouco de sumo de limão. Devem ficar untuosas26. Túberas, percorrem-se os campos, reconhecendo os montículos de terra que surgem na base das árvores, Tratando-se de um prato à base de ovos, o acompa- como os das toupeiras. Desenterram-se com auxílio de nhamento deve ser feito com vinho branco da Região um sacho ou de um pau, mas, antigamente, recorria-se Tejo, de preferência de uva Chardonnay, que é mais a um porco, que esgravatava a terra quando reconhecia encorpada e aromática, e que tenha passado algum a presença das Túberas pelo cheiro. tempo em barris de carvalho. Esta uva dá origem a um vinho apelativo de aromas e sabores, que reflecte A maioria dos portugueses desconhece esta iguaria, pois as características da região onde cresce. o segredo da sua apanha é ciosamente guardado, sendo passado de pai para filho e raramente partilhado fora do círculo familiar.

153 PATUDOS

A Casa dos Patudos, em Alpiarça, foi residência de José Ingredientes Relvas desde os finais do século XIX até 1929, data 0,5 kg de açúcar; 180 g de amêndoa; 60 g de doce da sua morte. Político, diplomata, estadista, lavrador, de chila; 20 gemas; 4 ovos inteiros; manteiga para colecionador de arte e músico amador, José Relvas foi untar; açúcar para polvilhar. um dos homens que proclamaram a República a 5 de Outubro de 1910. Preparação Leva-se o açúcar ao lume até atingir ponto pérola. Em 1904, encomendou ao arquitecto Raul Lino o Junta-se-lhe a amêndoa e a chila. Acrescentam-se projecto da sua casa, assente numa linha revivalista os ovos batidos com as gemas, misturando bem, e e nacionalista, fiel às constantes históricas da nossa retira-se do lume. Unta-se com manteiga um tabulei- tradição construtiva. Nela, José Relvas instalou a ro para onde se deita o preparado. Leva-se ao forno sua extensa colecção de arte, que inclui mobiliário, durante 50 minutos, em temperatura média. Depois porcelanas, pinturas e tapeçarias. Por testamento de cozido, desenforma-se e corta-se em quadradi- lavrado em 1928, José Relvas legou a Quinta dos nhos que se polvilham com açúcar27. Patudos, a casa, a colecção de arte, a biblioteca e o arquivo ao Município de Alpiarça, impondo que a Estes quadradinhos doces ajudam a finalizar uma residência fosse conservada como núcleo museológico refeição da melhor maneira. Pode prová-los com um e que mantivesse a designação de Casa dos Patudos. A café, um chá ou com um vinho licoroso da Região Casa foi inaugurada como Museu, em 15 de Maio de Tejo, muito frutados e aromáticos. 1960.

Em homenagem a este homem excepcional e à importância da Casa dos Patudos para o concelho e para o Ribatejo, Ana Tendeiro criou estes bolos, que já se tornaram uma referência para quem visita Alpiarça e aos quais deu o nome da mais prestigiada instituição cultural da vila e da região.

155 PUDIM DE PÃO

Este pudim é mais um dos muitos exemplos da genialida- Ingredientes de dos nossos avós para superarem as dificuldades 150 g de açúcar para o caramelo; 100 g de açúcar; económicas, confeccionando um doce com 150 g de miolo de pão ; 0,5 l de leite a ferver ; 1 casca aproveitamento de sobras de pão. Existem registos de de limão ; 2 colheres de sopa de mel; 4 ovos. receitas, noutras regiões, onde, para maior economia, se acrescentava mais pão, diminuindo-se os restantes Preparação ingredientes, nomeadamente o leite, a que se adicionava Com o açúcar indicado, prepare o caramelo e forre um pouco de água. com ele o fundo e os lados de uma forma de pudim e deixe-o solidificar. Parta o pão em pedacinhos Actualmente, há quem triture o pão com a varinha para dentro de uma tigela. Regue o pão com o leite mágica ou com outros equipamentos com o mesmo a ferver com a casca de limão e mexa bem. Adicione efeito, mas os apreciadores deste doce afirmam que nada depois o açúcar, o mel, os ovos e misture bem. Deite se compara ao pão desfeito, grosseiramente, com as o preparado na forma e leve a cozer em banho-maria, mãos. cerca de uma hora, em forno médio (150º C)28.

Pelo sabor que reaviva memórias de quem já o provou Este pudim pode ser acompanhado por um dos vi- ou de quem dele ouviu relatos familiares, pode afirmar- nhos generosos da região Tejo. Os seus aromas ricos se que o Pudim de Pão é, de facto, um doce de tradição. e complexos ligam na perfeição com a doçura desta sobremesa.

157 BROAS DE AMÊNDOA E DE BATATA-DOCE DE BENAVENTE

A batata-doce é uma planta cuja produção é tradicional Ingredientes em terras ribatejanas. É de fácil cultivo, embora exija 700 g de puré de batata-doce; 200 g de amêndoa regas e sachas. Mas ninguém se nega a tê-la na sua ralada; 500 g de açúcar; 5 gemas de ovo; 125 g de horta. A sua plantação ocorre nos finais da Primavera farinha de milho; 70 g de farinha de trigo; 2 dl de e em Setembro pode estar colhida. Por isso, nesse água. mês realizam-se em diversas localidades do Ribatejo festividades em que a batata-doce é a principal Preparação protagonista. Cozida, assada, frita ou como ingrediente Leva-se ao lume o açúcar e a água até fazer ponto de receitas mais elaboradas, é bem um petisco próprio do de pérola. De seguida, sempre sobre o lume, junta-se Outono! a amêndoa, a canela e as farinhas, envolvendo tudo muito bem. Depois de estar tudo misturado e já co- Por alturas dos Santos ou no Natal, em Benavente, zido, mesmo antes de se retirar do lume, juntam-se mas também noutras zonas do Ribatejo, conjugada com as gemas e mexe-se tudo novamente para que fique as amêndoas, também colhidas na região, é usada na bem misturado. Retira-se do lume e deixa-se arrefe- confecção de broas que fazem as delícias de crianças e cer completamente, até endurecer a massa. Tendem- adultos. se broinhas que se vão colocando num tabuleiro. Quando este está completo, pintam-se as broinhas com gema de ovo e vão ao forno a cozer (180º C).

Estes pequenos bolos combinam muito bem com um cálice de vinho licoroso ou de uma colheita tardia da Região Tejo. O aroma frutado que predomina gera um equilíbrio com a doçura das Broas de Amêndoa e de Batata-Doce de Benavente.

159 Produto Regional CARNE DE TOIRO BRAVO

A carne de touro bravo tem um enorme potencial na alimentação factores de crescimento, apresenta um gastronomia portuguesa pois, desde sempre, os ani- grão muscular fino e delicado, e, quando a carne mais bravos, tal como a caça, são preferidos para a devidamente maturada é sujeita a manipulações alimentação pelos bons gastrónomos. Ora os bovinos culinárias, exibe aroma e sabor de excelência.” de raça brava, oriundos sobretudo do Ribatejo, são criados em grandes espaços livres, em regime exten- Ligeiramente mais rija que outros tipos de carne, a sivo, alimentando-se em total liberdade de produtos de toiro bravo é ideal para estufar ou cozer e, quando naturais. Como consequência, apresentam um sabor grelhada, deve ser servida mal passada, ou ao ponto. mais intenso, mas não artificial, de consistência tenra e suculenta, embora com uma aparência mais escura Em Novembro de 2013, com a designação de “Carne do que a dos animais criados em regime intensivo. de Bravo do Ribatejo”, conquistou a Denominação de Origem Protegida (DOP). Por desconhecimento, muitas vezes a cor mais escu- ra leva a que erradamente esta carne seja preterida por outras mais rosadas, embora com processos de criação eventualmente duvidosos. A sua associação às touradas é incorreta, pois a carne normalmente comercializada não é proveniente de animais de lide.

O crescente número de gastrónomos que tem vindo a marcar presença nas várias edições dos “Sabores do Toiro Bravo”, certame que se realiza em Coruche anualmente em Maio, prova que este produto está a ganhar cada vez mais apreciadores.

A Confraria Gastronómica do Toiro Bravo, criada em Coruche em 2006, define desta forma a carne de toiro bravo: “… apresenta características quase únicas, que a podem transformar num nicho de luxo entre as carnes bovinas para um mercado exigente. Animais criados em regime extensivo, vivendo da natureza, com um maneio que não comporta na sua

161 PENÍNSULA DE SETÚBAL

163 Serra, montado, vinha, salinas, praia, mar, rios, estuários: a riqueza desta região reside na diversidade da paisagem e dos recursos naturais. A linha determinada por Alcochete, Moita e Montijo risca-se paralelamente ao Tejo e todo o ritmo e modo de vida desta região são determinados por esta corrente de água. Palmela, Setúbal e Sesimbra formam, nesta zona, um grupo com características diversas. Destacam-se pelo vinho, pela relação com o mar e pela a interacção com o Sado e com o Tejo. Mas, apesar das suas particularidades, estes seis concelhos formam uma unidade muito própria com tradições e uma história comum. Antiga terra dos cavaleiros da Ordem de Santiago da Espada, este é um território que pode ser avistado do alto, do cimo de uma das torres de menagem dos vários castelos que os monges Espadatários legaram à posteridade. Rica em património natural e cultural, esta é uma região que merece ser visitada com tempo. Alcochete Moita

São quilómetros de água que correm à nossa frente: A vila da Moita deve a sua origem ao grupo de pes- o Mar da Palha impõe os seus horizontes enquanto soas que, no princípio do século XIV, escolheu esta espelha a vila que se aninhou nas suas margens. zona, situada num dos esteiros da margem Sul do Alcochete escolheu bem a sua localização. A situa- rio Tejo, para se instalar. Gente simples, dedicou-se ção privilegiada parece ter atraído desde cedo as a tirar da natureza meios de sustento e, à base do populações. Encontraram-se sinais de actividade hu- seu suor, foi desenvolvendo a região. Situada muito mana com cerca de dez mil anos e sabe-se, que mais perto da capital, este lugar foi atraindo pessoas e, tarde, os romanos andaram por aqui, assim como os no ano de 1691, foi elevada a vila por D. Pedro II. O árabes que, para além de deixarem vestígios arqueo- concelho tinha como principais actividades a pesca, lógicos, imprimiram a sua presença no topónimo. a extracção de sal e a agricultura. Em meados do Com a reconquista, este território foi doado à Ordem século passado, as suas salinas faziam parte, com as de Santiago de Espada. Nesta terra de Comenda, marinhas de Alcochete, do Barreiro e do Montijo, do o povo provou ser gente de trabalho árduo: no solo, centro de sal mais importante de Portugal. o arado, no rio, o leme, e onde a terra e a água se encontram, o engenho das salinas. Povo de afición e de fé, mantém as suas tradições com devoção. Leva muito a sério a temporada brava Hoje o concelho modernizou-se, mas empenha-se na e vive com veneração as Festas de Nossa Senhora preservação das tradições ligadas ao mundo rural, da Boa Viagem que juntam na terra milhares de visi- ao montado e ao toiro bravo, assim como ao Mar da tantes para verem passar os barcos engalanados que Palha e ao rio Tejo; costumes que se reflectem na formam a procissão no Tejo. O convívio natural com oferta gastronómica, tanto no recurso a produtos o rio está presente em tudo, incluindo na gastrono- hortícolas locais como na variedade e qualidade dos mia, em que grande parte dos pratos típicos tem o produtos do rio. sabor da pesca.

165 Montijo Palmela Sesimbra Setúbal

À distância de um olhar estende-se a toalha azul Da torre de menagem do Castelo de Palmela parece Mar e montanha enfrentam-se; num medir frontal de (…) Solo providencialmente prendado de tudo, e do Tejo recortada, ao longe, pela mancha urbana que se alcança Portugal todo. A paisagem altera-se forças, moldam este pedaço de terra ímpar. A vila de donde, ainda há dois dias, um insigne poeta dina- da capital. Este é o horizonte da cidade do Montijo, a um voltar de cabeça, aos nossos olhos chega o Sesimbra organiza-se longitudinalmente: para um marquês, o nosso amigo Andersen, estacionado aí estrategicamente plantada com os pés na água. céu, o mar, o Tejo, o Sado, as vilas, os campos, num lado, o Atlântico, para o outro, a avenida, ponto de depois de percorrida a Europa, me escrevia que tinha Mas se a sede do concelho convive de perto com o horizonte que se vai fazendo ilimitado. O escritor chegada do xadrez das ruas. Casas de pescadores, encontrado o Paraíso Terreal. É com estas palavras rio, parte das suas freguesias nem o vislumbram. O Carlos Malheiro Dias não hesita em afirmar que armazéns das armações, velhos barracões de salga que, nos alvores do século XIX, António Feliciano de município é territorialmente descontínuo, estando este é o castelo mais grandioso do País e que o seu e fábricas de conservas convivem de perto com Castilho descreveu Setúbal apoiado nas impressões geograficamente dividido em duas partes: a ociden- panorama é superior pela variedade dos aspectos, aos urbanizações recentes e com unidades hoteleiras do autor da “Pequena Sereia” e do “Patinho Feio”. A tal, onde se encontra a sede do concelho, com uma que se disfrutam na Pena, em Sintra, e das portas de construídas para albergar a leva de turistas e de beleza desta região foi sempre muito admirada. Raul área mais pequena e ribeirinha; e a oriental, interior, Coimbra, no Buçaco. Enquanto o visitante se perde veraneantes que, em meados dos anos sessenta do Proença , um século mais tarde, destacou a graça e a com uma vocação essencialmente agrícola. Estas na amplitude da paisagem que se vai estendendo século passado, começaram a invadir a povoação. opulência dos seus campos, a largura e beleza do seu regiões intervaladas apresentam uma variedade de à sua frente, apercebe-se de, para lá da vila que se rio, os panoramas que abre vastos, a sua luz admi- paisagens e de hábitos que, todas juntas, conferem fixou na sombra das muralhas, vastas áreas de vinha Sesimbra, desde sempre, foi terra de pescadores e rável que nos transporta, o encanto das suas praias riqueza e diversidade ao concelho. riscam a verde os campos. mesmo as freguesias rurais do município dependiam abrigadas pela serrania, a proximidade da Arrábida dos humores das marés para sobreviver. Virado para (…), tudo isso faz de Setúbal um ponto de paragem Em tempos, parte destas terras estava coberta de Este é um concelho que mantém a tradição rural e o oceano, o concelho sempre dele se alimentou e por obrigatório. Estas são palavras datadas mas, hoje, talhos de salinas, estirados pelas vastas planícies. vitivinícola. Pensa-se que já no distante segundo mi- ele se sustentou. As artes da pesca fizeram prosperar apesar da industrialização, o concelho mantém um O sal saía daqui em faluas carregadas de grandes lénio a.C. os tartéssios andavam na região a negociar a indústria de conservação de pescado, que já existia encanto muito próprio e a baía de Setúbal faz parte, quantidades para abastecer as cozinhas de Lisboa. vinho. Seguiram-se os fenícios, os gregos, os roma- nesta zona há cerca de dois mil anos e que, no século desde 2002, do restrito “Clube das Mais Belas Baías Com o advento dos frigoríficos, a procura deste nos, povos que se foram sucedendo e que viriam a XVI, teve um papel de destaque no abastecimento do Mundo”, um grupo constituído por cerca de três produto passou a ser cada vez mais para a confec- consolidar, a aperfeiçoar e a modernizar a técnica de das caravelas que partiam à descoberta do Mundo. dezenas de enseadas em diferentes países do globo. ção dos alimentos e menos para a sua preservação. cultivo da vinha. Daí até aos nossos dias, muito foi Nos princípios do século XX, a sardinha começou a Houve uma progressiva quebra de procura e, em mudando e progredindo. Nos finais do século XIX, o escassear no Mediterrânio e na costa atlântica fran- As praias, o clima, a beleza das paisagens alimentam meados do século passado, a decadência do negócio vinho de Palmela era reconhecido em Portugal e na cesa, o que fez com que Portugal se tornasse o prin- o turismo, mas este concelho é muito mais do que ditou o seu abandono. Felizmente, o solo abençoado Europa, recebendo já nessa altura inúmeras distin- cipal centro piscatório dessa espécie. Nessa altura, um destino balnear. Setúbal foi, desde de sempre, deste concelho oferece muito mais do que chão sal- ções e hoje, em pleno século XXI, a aposta na ex- instalaram-se em Sesimbra numerosas fábricas de uma comunidade piscatória. Em tempos chegou a gado. Esta região já foi considerada um dos maiores celência é ainda mais firme. Nos últimos anos, uma conservas. O rebentar da II Guerra Mundial favore- ser um dos principais portos de pesca em Portugal centros corticeiros do País, a floricultura representa, evolução na qualidade dos vinhos tranquilos - tinto, ceu a procura de conservas para alimentar as tropas. e também o mais importante centro de produção de só na flor de corte, 75% da produção nacional e a branco e rosé - e generosos - Moscatel de Setúbal e Após este período áureo, o negócio começou a entrar conservas de peixe. A forte industrialização deixou suinicultura, principalmente na transformação de Moscatel Roxo - traduziu-se em inúmeros prémios, em decadência, até desaparecer. De qualquer forma, consequências mas, hoje, as águas do “Rio Azul”, já carnes, continua a ter um importante papel na eco- a nível nacional e internacional. A Associação de falar em gastronomia de Sesimbra é falar em peixe, despoluídas, permitiram o regresso dos golfinhos, a nomia local. Municípios Portugueses do Vinho nomeou Palmela principalmente no espadarte e no peixe-espada desova de espécies que fazem as delícias dos gastró- como a “Cidade do Vinho 2009” e a Rede Europeia preto, mas sem esquecer as tradições – muitas ainda nomos e, também, as famosas ostras do Sado. Todas estas condições, a criação de suínos, a de Cidades do Vinho atribuiu-lhe o título de “Cidade vivas – das zonas rurais. proximidade do rio e as tradições agrícolas, deixam Europeia do Vinho 2012”. naturalmente marcas muito visíveis nos hábitos alimentares dos habitantes do concelho.

167 GASTRONOMIA REGIONAL

Alcochete Palmela Caldeirada à fragateiro, linguadinhos fritos, amêijoas Queijo de Azeitão e manteiga de ovelha, sopa cara- alcochetanas, massa de choco, canivetes, berbigão mela, sopa de favas, sarrafusca, favas à palmeloa, e camarão do rio, sopa alcochetana, sopa adubada lulas recheadas à moda de Palmela, galinha acereja- de feijão, sopa de ossos carregados, sopa de peixe, da, coelho à camponesa de Palmela, pombo estufa- tortilha alcochetana, lebre à ti Zé da Avó e raposo. do, cozido de capado. Nas sobremesas, pêra cozida As batatas ensalsadas, herança dos salineiros, são em moscatel, fogaças de Palmela, suspiros, carolinos, servidas nalguns restaurantes, embora enriquecidas. pudim de abóbora e arroz-doce com leite de ovelha. Na doçaria, destacam-se as fogaças, que resultam Destaque para a maçã riscadinha (DOP), o vinho de de uma promessa dos marítimos a Nossa Senhora Palmela (DOP), o moscatel de Setúbal e o moscatel da Atalaia, e o arroz-doce alcochetano, confecciona- roxo. do sem ovos e servido às fatias. Sesimbra Moita Peixes grelhados, espadarte, peixe-espada preto em Caldeirada à fragateiro, massinha da caldeirada, filetes ou com ervilhas, caldeirada de Sesimbra ou ensopado de enguias, massa de peixe, arroz de peixe, caldeirada de sardinhas, choquinhos à-pé-descalço, e lamejinhas com cebola. Dos campos, vem a farra- cademontes e sopa de peixe ou só de carapaus. Na fuza, à base de tomate, e a sopa de saramagos, uma doçaria, destaque para a farinha torrada, os zimbros, erva espontânea. Nos doces, o arroz-doce caramelo e as catarinas, os almirantes e um licor, o Velho do Mar, as ferraduras, o doce tradicional da Moita. que se tornou conhecido na década de 50 do século passado, e também queijo da Azóia, pão caseiro de Montijo Alfarim e da Azóia, mel e maçã camoesa ou férrea da Sopas de ossos, de abóbora ou de tomate, ervilhas Azóia. com língua de porco fumada e ovos escalfados, bifes de porco à moda do Montijo, perna de porco assada Setúbal no forno e carne de porco com enguias, enguias fri- Caldeirada, cavalas no molho, peixe à pescador, tas com favas de coentrada, com arroz de pimentos choco frito, polvo no forno, peixe assado, como ou com açorda, ensopado de enguias, caldeirada à salmonetes à setubalense, carapau manteiga, mas- pescador, massinha de safio e arroz de amêijoas. Nos sacotes e alcorrazes, duas espécies piscícolas que doces, o destaque vai para o bolo de vinagre, o bolo aqui ganham estas designações, e a sardinha, eleita de milho, as queijadinhas de leite, os Franciscos da uma das 7 maravilhas da gastronomia. As ostras, Atalaia, as broas de Canha e os aldeanos. que voltaram aos bons restaurantes da cidade, de Portugal e de França. Na doçaria, destacam-se tortas de Azeitão, esses de Azeitão, amores de Azeitão e pudim Osório e os D. Filipes. Refira-se, ainda, o quei- jo de Azeitão (DOP) e o Moscatel de Setúbal (DOC).

169 AGENDA GASTRONÓMICA

Fevereiro Novembro Festival do Choco, em Setúbal Semana Gastronómica Sabores de Outono, em Sesimbra Março Festival do Salmonete, em Setúbal Festival da Caldeirada, em Setúbal Dezembro Abril Fim-de-semana gastronómico do Alcorraz, em Festival do Queijo Pão e Vinho, na Quinta do Anjo, Setúbal Palmela 2ª feira de Páscoa, Círio dos Marítimos, com leilão de Maio Fogaças, em Alcochete. Mostra de Vinhos de Marateca e Poceirão, em Fernando Pó, Palmela Festival Ibérico do Vinho, em Setúbal Vinhos da Região Fim-de-Semana Gastronómico da Cavala, em Setúbal Os vinhos produzidos nesta região integram a Comissão Vitivinícola Regional da Península de Junho Setúbal. Quinzena do Peixe-Espada Preto, em Sesimbra Festas Populares de São Pedro, no Montijo Festival da Sardinha, em Setúbal Confrarias Confraria Gastronómica de Palmela Agosto Confraria do Queijo de Azeitão Festival do Marisco, em Setúbal Confraria do Peixe de Setúbal Festas do Barrete Verde e das Salinas, em Alcochete Confraria do Moscatel de Setúbal Festival do Carapau, em Setúbal Confraria do Periquita Confraria dos Amigos da Bacalhôa Vinhos de Setembro Portugal Festas das Vindimas, em Palmela Confraria dos Amigos de J. P. Vinhos Quinzena Gastronómica do Espadarte, em Sesimbra Ordem dos Enófilos de Santiago Festival da Ostra, em Setúbal Festas de Nossa Senhora da Boa Viagem e Feira Comercial e Industrial, na Moita Feira Nacional do Porco e da Salsicharia, no Montijo

171 SOPA CARAMELA

A origem desta sopa é atribuída às populações rurais Ingredientes que vinham da Beira Litoral em busca de trabalho, 500 g de feijão catarino seco; 500 g de batata sobretudo para a zona de Rio Frio, a quem se dava vermelha para cozer; 2 cabeças de nabo, com cerca o nome de “caramelos”. A partir da segunda metade de 600 g; 2 cebolas médias; 3 cenouras; 1 repolho; do século XIX, por necessidades de mão-de-obra 1 couve-nabo e/ou portuguesa; 1 dente de alho; permanente, os “caramelos de ir e vir” passaram a 1 chouriço de carne; 1 chouriço mouro; 300 g de “caramelos de ficar”, tendo-se tornado rendeiros toucinho entremeado, gordo; 500 g de ossos do com casa e horta e fixado, sobretudo, na zona do espinhaço salgados; 500 g de massa cotovelinhos; Pinhal Novo, onde introduziram novos hábitos 1 folha de louro; sal e azeite q.b.; coentros. alimentares trazidos dos seus locais de origem. Vivendo com dificuldades económicas, a alimentação destas Preparação populações, embora consistente, baseava-se, sobretudo, De véspera, de 12 a 16 horas antes da confecção, sal- em sopa feita com os produtos colhidos na horta – gam-se o toucinho e os ossos do espinhaço e demo- feijão, batata e couve - e, quem os tinha, com enchidos lha-se o feijão em água fria. Coze-se o feijão com as e carne da matança. Assim nasceu a Sopa Caramela. carnes e os enchidos previamente cortados, durante Inicialmente, era semelhante às sopas nortenhas de cerca de 1h30, em lume brando. Cortam-se grossei- unto, mas, com o tempo e com um maior desafogo ramente os nabos e as couves. Pica-se a cebola e o económico, esta sopa foi sendo enriquecida com mais alho, lamina-se a cenoura em “meia-lua”, corta-se a igredientes, tendo-se tornado num prato substancial, batata em cubos pequenos e junta-se tudo ao feijão símbolo de uma comunidade que preserva as suas com a massa, a folha de louro e o azeite. Deixa-se tradições e uma das principais referências gastronómicas apurar durante mais 30 minutos. Mexe-se vigorosa- da região. Por esse motivo, no mês de Junho, a Câmara mente no final para libertar o amido da batata e da de Palmela organiza, no âmbito do Programa “Palmela massa, de forma a homogeneizar o caldo cremoso – Experiências com Sabor!” os Fins-de-Semana que envolve os ingredientes. Guarnece-se com os Gastronómicos da Sopa Caramela, para promover o coentros, caso se deseje29. desenvolvimento turístico e divulgar a qualidade dos produtos do concelho. Esta não é uma sopa ligeira. A variedade e a qualida- de dos ingredientes envolvidos pedem um vinho tinto de corpo médio, um DO Palmela, onde o Castelão tem uma presença obrigatória. Deve ser um vinho jovem, que combine a frescura da fruta madura com notas de madeira pouco acentuadas.

173 ENGUIAS FRITAS COM FAVAS DE COENTRADA

A gastronomia do Montijo reflecte a influência da sua Ingredientes situação geográfica. A norte, o concelho é banhado pelo Enguias; sal; favas; coentros; alho; azeite e vinagre. Tejo, no interior, há extensas áreas rurais de solos férteis, onde se cultivam produtos hortícolas, como batatas, Preparação cebolas, favas ou ervilhas, que tão bem combinam com Temperam-se as enguias fininhas com sal gros- as espécies pescadas no rio, dando origem a típicos pratos so. Selecciona-se um azeite de qualidade média, de peixe. Por aqui, é a enguia a rainha, cozinhada que deve ser aquecido entre os 175º e 190º C. das mais diversas maneiras, conforme o seu tamanho. Mergulham-se as enguias apenas o tempo para Para estas Enguias Fritas, a escolha recai sobre as mais ficarem douradas. A esta temperatura, forma-se uma fininhas; as médias ficam melhor nas caldeiradas e nos crosta na superfície do alimento que impede a pe- ensopados, enquanto as grandes, também chamadas netração do azeite no seu interior, resultando na sua eirós, alcançam o seu melhor momento culinário quando melhor conservação e melhoria de sabor. Retiram-se são grelhadas. as enguias e colocam-se sobre papel pardo para que o azeite em excesso seja absorvido. Entretanto, co- zem-se as favas em água e sal. Prepara-se uma boa coentrada com coentros frescos, alho picado, azeite de boa qualidade e vinagre, também ele a condizer. Deita-se esta mistura sobre as favas e envolve-se bem. Esta é uma excelente alternativa ao arroz de tomate para acompanhar as enguias ou outro peixe frito30.

Diz a regra que peixe acompanha com um branco, mas este é frito e guarnecido com um legume rico. Por isso, aconselha-se um vinho tinto jovem. Neste caso, recomenda-se a descoberta da casta Syrah, que em terras da Península de Setúbal encontra um terroir de excelência para o seu cultivo. Um monova- rietal Syrah, ou um bivarietal Syrah/Castelão, em que a fruta se revele intensa, com notas de compota e taninos aveludados, serão combinações perfeitas.

175 ARROZ DE LAMEJINHAS

Muitas das características da cozinha do Montijo Ingredientes derivam da sua proximidade em relação ao rio Tejo. 0,5 kg de lamejinhas ; 350 g de arroz; 0,5 dl de azei- Implantado junto de um dos braços que prolongam te; 1 dente de alho; 1 cebola; sal e coentros. o Mar da Palha, os seus habitantes desde sempre foram buscar às águas parte do seu sustento. Na maré Preparação vazante, emergindo do lodo, as lamejinhas, também Colocam-se as lamejinhas de molho em água salga- conhecidas como lambujinhas, são dos bivalves mais da durante 48 horas para largarem a areia. Lavam-se, abundantes no estuário do Tejo e, por isso mesmo, depois, em várias águas. Faz-se um refogado com os menos valorizados comercialmente. Com preços a cebola cortadinha, o alho e os coentros em azeite, acessíveis, sempre integraram os momentos de convívio deitando-se a seguir as lamejinhas bem lavadas. Há mais populares, sobretudo entre os que os apanhavam. quem tire as cascas antes de deitar o arroz e quem Hoje em dia, continuam a ocupar o mesmo lugar nos as deixe com cascas. Acrescenta-se água, geral- hábitos gastronómicos das populações da beira-rio, mente o dobro do arroz, e deixa-se cozer. Devem ser consumidas como petisco ou usadas na preparação rejeitadas as que não abrem durante a cozedura31. de arroz, podendo servir de refeição completa ou de acompanhamento de enguias fritas, prato típico do Para melhor escoltar a untuosidade deste prato, um Montijo. vinho com base na casta Fernão Pires é o parceiro ideal. Na Península de Setúbal é possível encontrar- se esta casta em muitos vinhos brancos IG Península de Setúbal, na maioria das vezes vinhos de lote, onde também se encontram as castas Moscatel de Setúbal e Arinto. O equilíbrio típico desta casta e os seus aromas frutados enobrecem a combinação com este prato. Um vinho fresco, vívido e guloso.

177 LAMEJINHAS COM CEBOLA

No concelho da Moita, o Tejo domina a paisagem, Ingredientes confundindo-se com a terra, porque os braços do rio 1 kg de lamejinhas; 2 cebolas; 2 dentes de alho; estendendo-se pelo interior, criam uma uniformidade 1 molho de coentros; azeite, margarina e sal q.b.; que, até há poucos anos, incluia as actividades 1 limão. económicas tradicionais, hoje quase desaparecidas. A proximidade com o rio, que ainda oferece várias Preparação espécies piscícolas, fez com que se desenvolvesse uma Colocam-se as lamejinhas de molho em água salga- gastronomia regional com características próprias, da durante 48 horas para largarem a areia. Lavam-se, como as Lamejinhas com Cebola, confeccionadas com depois, em várias águas. Num tacho, dispõem-se as estes bivalves, tão abundantes no estuário do Tejo e que cebolas cortadas às rodelas finas, juntam-se o azeite, podem ser apanhados no lodo durante a vazante da os dentes de alho pisados e os coentros picados. maré. Antigamente, era tradição de muitas famílias das Por cima, põem-se as lamejinhas. Tapa-se o tacho e zonas rurais, por altura da Páscoa, deslocarem-se à leva-se ao lume até abrirem todas. Devem rejeitar-se Moita, “à lamujinha” ou, “lambujinha”, como então as que não abrem durante a cozedura. Servem-se se dizia. Hoje, o Toino é um dos poucos pescadores quentes, regadas com sumo de limão32. existentes no Rosário, povoação do concelho em frente ao Mar da Palha, que apanha lamejinhas, mas fá-lo Por norma, para acompanhar um prato de marisco, a só para consumo familiar. Entre as várias maneiras de tendência é optar por um vinho branco. No entanto, cozinhar este petisco, o Toino recomenda as Lamejinhas para fugir um pouco à regra, propõe-se um vinho ro- com Cebola. sado, hoje entendido como um vinho da “moda” entre os mais jovens. A Península de Setúbal responde às tendências de consumo e é possível encontrar um vinho deste tipo em qualquer supermercado ou gar- rafeira. A escolha deverá ser um rosado com aroma e palato floral, de final fresco e mineral.

179 ESPETADAS DE OSTRAS

Nas décadas de 50 e 60 do século XX, abundavam Ingredientes as ostras no estuário do Sado, por isso, na época da Ostras; presunto em tiras ou cubos; gema de ovo; apanha, havia mais de 5000 pessoas empregadas nesta pão ralado; banha. tarefa, recolhendo toneladas que, na sua maioria, se destinavam à exportação, sobretudo para França e Preparação Inglaterra. Depois, a industrialização, a poluição, a Para consumir ao jantar, põem-se de manhã a de- incúria, foram, pouco a pouco, destruindo o habitat molhar em água fria algumas tiras ou cubos de bom destes bivalves, que acabaram por desaparecer. Até presunto meio gordo. Abrem-se as ostras ao calor do que, em 2002, dois empresários de Setúbal resolveram fogo, o suficiente para as retirar das cascas. Em es- aproveitar umas antigas salinas e relançaram a petos, enfia-se um pedaço de presunto e duas ostras, ostricultura no Sado, cujas águas apresentam alternando e terminando com o presunto. Barra-se características únicas para a criação e a engorda das cada com gema de ovo batida, polvilha-se ostras. Actualmente, já é possível voltar a apreciar estes com pão ralado e frigem-se em banha fresca de por- bivalves com a mesma qualidade das de antigamente, co, sem as deixar apertar ao lume. Modernamente, graças à adaptação dos viveiros, que fazem a depuração há quem as polvilhe com queijo parmesão33. da água e permitem a sua criação em condições naturais, mas sem poluição. A ostra portuguesa, “Crassostrea Um IG Península de Setúbal branco, robusto e angulata”, tem menos defesas naturais do que a complexo será a escolha ideal para esta iguaria, pois “Crassostrea gigas”, produzida noutros países, mas a receita inclui ingredientes fortes no sabor, como o como a sua qualidade é indiscutivelmente melhor, foi ela presunto e o queijo parmesão. Este branco deverá a escolhida para ser produzida em Setúbal, voltando a ser untuoso e complexo, de carácter persistente, um ter o reconhecimento internacional. vinho de lote em que predominem o Fernão Pires e/ ou o Chardonnay, tendencialmente feito para ser parceiro gastronómico.

181 CHOCO FRITO À SETUBALENSE

A cidade de Setúbal estende-se ao longo do rio Ingredientes Sado, na margem direita, mesmo junto à foz. Esta Choco; farinha; azeite; banha de porco; limão. proximidade da água - o rio e o mar - condicionou, desde sempre, a actividade dos seus habitantes, dos Preparação quais muitos se dedicaram à pesca. Até meados do Limpa-se o choco e corta-se em pequenas tiras ou século XX, a actividade piscatória desenvolvida na aos quadrados. Seca-se bem, passa-se levemente foz do Sado e ao longo da costa, entre Sines e o Cabo por farinha e leva-se a fritar numa proporção igual de Espichel, foi muito importante para a economia da azeite e banha. Deve servir-se bem quente acompa- região e o meio de subsistência de muitas famílias, nhado com limão para espremer34. que encontravam nas águas grande abundância de pescado. De entre as espécies mais numerosas, conta-se O afamado Choco Frito de Setúbal, já iguaria o choco. A quantidade e, sobretudo, a qualidade do que nacional, é um prato versátil, que tanto pode ser é capturado na Baía de Setúbal está, certamente, na acompanhado por brancos como por tintos. Para origem do sucesso do Choco Frito à Setubalense, que é proporcionar uma experiência nova, sugere-se um hoje um verdadeiro atractivo gastronómico da cidade, vinho rosado. Ao longo dos anos, a Península de proposto nas ementas da maioria dos restaurantes Setúbal tem vindo a adaptar-se ao mercado e hoje especializados em pratos de peixe. quase todas as empresas da região comercializam esta categoria de vinho. A escolha deverá recair so- bre um rosado IG Península de Setúbal, intenso, cujo palato seja rico em frutos vermelhos e com uma boa persistência.

183 POLVO NO FORNO

O Porto de Sesimbra figura, desde há muitos anos, entre Ingredientes os três primeiros portos de pesca portugueses, tanto no 1 polvo com 1 kg, aproximadamente; 2 cebolas volume de pescado como no valor deste, que compreende médias; 1 chouriço; 5 dentes de alho; 1 dl de azeite; uma grande variedade de espécies, de entre as quais 2,5 dl de vinho branco; 1 pimento verde; 500 g de se destaca, pela sua importância, o polvo. Embora batata; coentros picados, sal e pimenta. seja uma espécie muito abundante em toda a costa portuguesa, é, de facto, em Sesimbra que ele é capturado Preparação em maior quantidade. São, por isso, numerosos os Depois de se cozer o polvo, parte-se aos bocados e pratos confeccionados a partir deste cefalópede, dentro dispõe-se num tabuleiro. Tempera-se com os alhos da tradição gastronómica desta zona da Península de picadinhos, as cebolas às rodelas, o pimento às tiras, Setúbal. A originalidade deste Polvo Assado no Forno as rodelas de chouriço de carne, bastantes coentros reside na combinação de um produto do mar com um picados, sal e pimenta, regando-se tudo com o azeite ingrediente típico da culinária rural, o chouriço, cujo e o vinho branco. Cortam-se as batatas, previamente resultado é um prato tão saboroso que passou a fazer cozidas, aos quartos, que se juntam ao polvo quando parte das ementas de diversos restaurantes da região. este começa a alourar. Retira-se do forno quando estiver bem apurado35.

Apesar de se tratar de um pescado, é importante casar este prato com um vinho tinto encorpado, de aroma intenso. A confeção do mesmo assim o exige. A estrutura é importante, deve ser um vinho volu- moso, mas elegante. Esta harmonização agradece o estágio em madeira, desde que bem integrada. Não faltarão no mercado bons exemplos de DO Palmela à altura deste desafio.

185 CALDEIRADA À FRAGATEIRO

A Moita é terra de marítimos e fragateiros, com uma Ingredientes gastronomia estreitamente ligada ao Rio Tejo. E a 1,5 kg de peixe; 1 kg de batatas; 1,5 kg de tomates; Caldeirada à Fragateiro da Moita tem mesmo que 2 pimentos grandes; 3 cebolas; 1 folha de louro; incluir peixes do Tejo, dos quais a enguia e o choco são 2 dentes de alho; 1 malagueta de piri-piri; 1 ramo de absolutamente obrigatórios. O nome denuncia a sua salsa; 1 ramo de hortelã; sal e azeite q.b. preparação a bordo das fragatas, típicas embarcações do Tejo, usadas não apenas para a pesca mas também Preparação para transporte de mercadorias e de passageiros, É tudo colocado no tacho em cru, sem água, pois o por isso, a confecção da Caldeirada é muito simples. cozinhado é feito nos próprios sucos dos peixes. Por Habitualmente, os fragateiros usavam os peixes de pesca seu lado, os vegetais devem ser, tanto quanto pos- mais abundante e de menor valor, que iriam talvez sível, da época. Os peixes moles, como a enguia, só sobrar da venda, e produtos da terra que trariam para devem ser acrescentados quando a batata começar bordo. Como aconteceu com muitos outros pratos de a ficar cozida. Outra recomendação importante é gente de poucos recursos, a receita desta Caldeirada, que, mesmo no final, quando se retira do lume, não tendo sido reconhecida a sua qualidade, foi recuperada pode faltar o perfume inconfundível da hortelã. Logo e hoje é servida em quase todos os restaurantes da zona que se acaba de servir a Caldeirada, desfazem-se ribeirinha. os restos de batata que ficaram no fundo do tacho, junta-se um pouco de água e massinha de cotovelo. A tempo de terminar a caldeirada, com o vagar que lhe é devido, a massa estará pronta para completar a refeição36.

Uma boa caldeirada pede por norma um vinho branco volumoso. Na região da Península de Setúbal as opções são variadas e facilmente se consegue encontrar um bom parceiro para este prato. O ideal será harmonizar com um vinho de aroma suave, com fruta delicada e elegante, cujo comportamento na boca seja redondo, afinado e com acidez discreta; um branco de bom porte, um lote de Fernão Pires e Moscatel de Setúbal é a nossa sugestão.

187 CALDEIRADA DE ALCOCHETE

A larga frente do concelho de Alcochete virada para Ingredientes o Mar da Palha condicionou o modo de vida das 3 kg de peixe - tremelga ou tramelga, chocos, pa- populações ribeirinhas, que encontravam na actividade ta-roxa, safio, tamboril e eiroses; 1,5 kg de batatas; piscatória um meio de subsistência como complemento 1 kg de cebolas; 1 kg de tomates; 2 pimentos; 2 do trabalho nos campos ou nas salinas. A bordo dos dentes de alho; 2 dl de azeite; 1 molho salsa; 1 molho barcos, os alcochetanos pescavam e comiam o que as coentros; 1 folha de louro; sal, pimenta ou piripiri q.b. águas lhes davam, preparando as suas caldeiradas com os produtos que tinham trazido de terra. Mas o paladar Preparação destas caldeiradas era diferente, pois os marítimos, Amanha-se e salga-se o peixe uma hora antes de puxando do mar um balde com água, nela amanhavam e ser cozinhado. Num tacho, deita-se o azeite, o alho, lavavam os peixes e demais ingredientes. a folha de louro, os coentros, a salsa e uma cama- da de tomates maduros, outra de cebolas e outra de pimentos, tudo cortado às rodelas. De seguida, colocam-se os chocos cortados aos pedaços e com pele, deixando ferver em cachão durante 5 minu- tos. Acrescenta-se água para o caldo, juntam-se as batatas cortadas aos quadrados e deixa-se ferver um pouco. Finalmente, juntam-se os peixes por ordem de dificuldade de cozedura: tremelga, pata-roxa, safio, tamboril e eiroses. Tempera-se com piripiri ou pimenta, a gosto, e rectifica-se o sal. As eiroses, colocadas no cimo e de cozedura mais rápida, devem ser retiradas para um prato. Se levar sardinhas, sem tripas nem cabeças, o processo é idêntico. Serve-se a caldeirada e só depois se distribuem as eiroses ou as sardinhas com uma escumadeira e com cuidado, para não as escangalhar37.

Procure-se um vinho branco bem estruturado, seco no palato e com álcool equilibrado. Persistente, para acompanhar o sabor a coentros, incluídos na receita.

189 CALDEIRADA À SESIMBRENSE

A gastronomia de Sesimbra tem por base a sua riqueza e Ingredientes a diversidade piscícola, sendo a Caldeirada o prato mais 1,2 kg a 1,5 kg de peixe - tamboril, safio, raia, sardinha emblemático e com mais variedade de peixe pescado em e tremelga com os fígados; amêijoas q.b; 2 cebolas; Sesimbra - tamboril, caneja, sardinhas, etc. - associada 2 dentes de alho; 2 tomates bem maduros e de bom à memória colectiva, nomeadamente aos festejos tamanho; 1 pimento; 1,5 dl de azeite; 3 dl de vinho dos Santos Populares e aos concursos gastronómicos branco; 1 kg de batatas; 1 ramo de salsa; louro. que remontam à segunda metade do século XX. A Caldeirada encontra aqui especificidades próprias: os Preparação ingredientes são dispostos em camadas sobrepostas e, Colocam-se as amêijoas no fundo do tacho e vai-se sobretudo na confecção comercial, no fundo do tacho pondo, às camadas, rodelas de cebola, batata, toma- colocam-se bivalves para evitar que “pegue”; do caldo te, pimento às tiras e os peixes aos bocados, depois faz-se a massa de peixe com raminho de hortelã e nunca de previamente amanhados, lavados e salgados. se mexe, apenas se agita o tacho. Deita-se o azeite e o vinho branco e deixa-se cozer em lume brando, rodando o tacho, em vez de me- xer, para não desmanchar o peixe. Quase no fim da cozedura, junta-se o ramo de salsa. Do caldo, depois de passado pelo passador e tendo-se acrescentado água, coze-se a massinha de cotovelos38.

Na Península de Setúbal, as opções de brancos para acompanhar este prato são diversificadas. Pela complexidade deste prato, pela nobreza dos peixes escolhidos, a procura de um vinho intenso, volumoso e persistente é imperial. Um branco IG Península de Setúbal, cujo lote inclua, para além de Fernão Pires, castas como Arinto, Verdelho ou Chardonnay, é reco- mendado. A complexidade do lote adicionará riqueza gastronómica ao vinho.

191 MASSA DE SAFIO

As características da gastronomia do Montijo são o Ingredientes reflexo da sua situação geográfica: por um lado, a sua 1 kg de safio; 150 g de massa de cotovelinhos; localização à beira do rio Tejo e, por outro, as extensas 2 cebolas; 2 dentes de alho; 1,5 dl de azeite; 1,5 kg áreas rurais de férteis solos que envolvem o concelho, de tomates maduros; 1 folha de louro; 1 raminho de onde se cultivam os produtos hortícolas que contribuem salsa; sal, picante e pão frito. para uma cozinha rica em sabores. A proximidade do Tejo levou a que, desde sempre, parte da população Preparação se dedicasse à pesca, no largo estuário do rio, o Mar O safio é cortado às postas e temperado com sal. da Palha, o que deu origem a típicos pratos de peixe, Prepara-se um refogado com o azeite, a cebola e o que ainda hoje fazem as delícias dos apreciadores. É alho picados, o louro e a salsa. Acrescenta-se, em o caso da Massa de Safio, cujo principal ingrediente seguida, o tomate limpo de peles e sementes. Junta- é este peixe de muitas espinhas, que ainda é pescado à se o safio a cozer nesse molho, deitando-se depois a entrada do Tejo. A sua receita é uma das especialidades massa, que ferve até cozer. Pode servir-se em cima gastronómicas propostas pelos restaurantes do concelho, de fatias de pão frito39. que se orgulham de a preparar “à montijence”. Esta é uma receita rica nos ingredientes e, como tal, exige um branco de bom corpo, com uma boa estru- tura. Sugere-se a procura de um vinho DO Palmela, cujo lote contenha Fernão Pires e/ou Arinto, duas das castas brancas mais plantadas na Península de Setúbal a seguir à Moscatel de Setúbal. A frescura é importante para bem acompanhar este prato, assim como a persistência do vinho na boca.

193 FAVAS À PALMELOA

O concelho de Palmela mantém uma forte tradição Ingredientes rural, ocupando a actividade agrícola quase metade 1,5 kg de favas descascadas; 1 cebola média; da sua área, com culturas hortícolas, vinhas, cereais e 125 g de toucinho entremeado; 1/2 chouriço de pastagens. A gastronomia da região é, assim, o reflexo carne; 1/2 chouriço mouro; 1 ramo de hortelã e de da abundância de bons produtos da terra, como as coentros; sal q.b. favas, que sempre tiveram uma importante presença na alimentação dos trabalhadores do campo, graças às suas Preparação qualidades nutritivas. A receita de Favas à Palmeloa é Com a cebola, coze-se o toucinho entremeado, os de fácil preparação e resulta num prato de forte sabor, chouriços de carne e mouro. Pode também incluir-se devido às carnes que a integram, e muito aromatizado, chispe e orelha, que devem ser salgados de véspera. pela inclusão da hortelã e dos coentros. Depois de estar tudo cozido, retira-se e, no caldo, cozem-se as favas com hortelã e coentros. Logo que estejam cozidas, servem-se numa travessa com as carnes40.

Aqui, não se pode escapar à recomendação de um tinto. Um tinto DO Palmela fará as delícias deste casamento. Quer-se um vinho encorpado, de aroma intenso e de taninos marcantes, um vinho em que o estágio em barrica esteja equilibrado com a fruta e a personalidade do vinho, adicionando riqueza a esta harmonização.

195 LEBRE À TI ZÉ DA AVÓ

José Francisco da Avó, mais conhecido pelo nome Ingredientes de Ti Zé da Avó, era um salineiro de Alcochete que, 1 lebre; 300 g de toucinho; 3 tomates; 1 cebola; nas proximidades da coutada do conde de Cabral, 1 pimento; 3 dentes de alho; 3 folhas de louro; aproveitava as horas de lazer para caçar. Nesse tempo, 2 dl de vinho tinto; 0,5 dl de vinagre; batatas, sal, abundavam por ali diferentes espécies cinegéticas, por pimentão e pimenta q.b. . isso, as lebres, apesar da velocidade e das manhas que empregavam para fugir aos caçadores, eram, com Preparação frequência, vítimas do passatempo do salineiro. Com Corta-se a lebre aos pedaços e põe-se dentro de o produto da sua caça, criou ele esta receita que se uma panela com 3 folhas de louro, sal q.b. e água tornou um prato típico desta zona da Península de suficiente para lhe dar uma meia cozedura. Retira-se Setúbal e, actualmente, na época da caça, faz parte a lebre da panela e deita-se fora a água. Coloca-se a da oferta gastronómica de alguns restaurantes desta lebre numa marinada com pimentão, pimenta, alho, vila ribatejana, muito ciosa da preservação do seu cebola picadinha, vinho tinto e um pouco de vinagre, património cultural. até ao dia seguinte. No recipiente para cozinhar, dei- ta-se o toucinho cortado aos pedaços, os tomates e o pimento. Por cima, deita-se a lebre com a marinada e vai ao lume para acabar de cozer. Para não alterar o gosto à lebre, coze-se à parte a quantidade de bata- tas desejada, com casca, em água e sal, e pelam-se. Por cima das batatas, deita-se a lebre já pronta, com o respectivo molho41.

Este prato deve ser harmonizado com um tinto en- corpado e concentrado da Península de Setúbal, em que o aroma a frutos pretos prevaleça. Para poder acompanhar carne de caça e todos os condimentos usados nesta receita, o vinho terá de ser complexo, estruturado e vigoroso. Recomendamos a procura de um vinho reserva/colheita selecionada tinto, cujo lote inclua a casta Castelão, a Trincadeira ou a Syrah.

197 FARRAFUZA

A agricultura sempre ocupou um lugar importante no Ingredientes concelho da Moita, onde a terra e o rio se confundem. Ovos; 0,5 kg de tomates; 2 dl azeite; 2 cebolas; den- A hortaliça que se produzia no campo, como os tomates, tes de alho; sal q.b.; pimenta q.b. as cebolas, as batatas, eram, por vezes, os ingredientes principais de alguns cozinhados, pois em qualquer Preparação horta podiam ser cultivados e estavam sempre à mão. Leva-se ao lume uma frigideira grande com as cebo- A Farrafuza é um exemplo dessa cozinha simples, las cortadas às rodelas e o azeite, até a cebola ficar económica e acessível e que, ainda hoje, é um prato translúcida. Juntam-se então os alhos bem picados. muito apreciado. A sua receita foi passando oralmente Os tomates devem ser antecipadamente pelados e de geração em geração e, por isso mesmo, pode ser limpos de pevides, após o que se cortam aos boca- confeccionado de diferentes maneiras. dos e se juntam à cebolada. Depois de tudo cozido, colocam-se os ovos a escalfar, por cima da tomatada. Deve ser acompanhado com batatas cozidas42.

Porque este é um prato rico e complexo, pede também um vinho com essas características. Na Península de Setúbal, os vinhos são naturalmente ricos e complexos, frutos das castas plantadas e do microclima da zona. Ao explorar a margem sul do Sado, tal como na Península de Setúbal, não será di- fícil encontrar um tinto frutado, com aromas de fruta preta e muito boa concentração, com taninos estru- turados, mas não muito marcantes, que acompanha- rá na perfeição este prato. Trincadeira, Aragonez e as Tourigas Nacional e Franca são as nossas sugestões.

199 FARINHA TORRADA

A origem da Farrinha Torrada é incerta, mas sabe-se Ingredientes que, em Sesimbra, nos finais do século XIX, começou 500 g de farinha, 500 g de açúcar; 4 ovos; 1 tablete por ser usada como remédio caseiro para tratamento de chocolate; 1 colher de sopa de canela; raspa de de algumas maleitas, como a constipação e a tosse. casca de limão. Além disso, como é um bolo seco, bastante energético e de longa duração, servia de alimento aos pescadores Preparação que andavam embarcados durante a faina em alto- Mistura-se a farinha de trigo, os ovos, o chocolate mar. Durante o processo de registo e fixação da receita raspado, o açúcar, a canela e a raspa de casca de pela Inspecção Geral das Actividades Culturais, a limão. Espalha-se a massa num tabuleiro e leva-se Câmara Municipal recolheu testemunhos de vários ao forno a temperatura média durante cerca de 20 sesimbrenses, alguns com cerca de 80 anos de idade, minutos. Depois, é só retirar o bolo do tabuleiro, que ainda se recordam da Farinha Torrada feita pelas cortar em quadrados e a Farinha Torrada está pronta avós. Inicialmente, o bolo era confeccionado apenas a comer43. com farinha e açúcar. Com a casca de limão, cortada minuciosamente com tesoura, e a canela, a farinha Este doce, desconhecido muitas vezes pelos turistas passou a ter um gosto mais característico e diferenciador. que nos visitam, torna-se uma verdadeira delícia Os ovos foram introduzidos para tornar o bolo mais quando acompanhado por um Moscatel Roxo (DO macio. Posteriormente, foi introduzido o chocolate, Setúbal), o mais raro e delicado dos Moscatéis de mas era apenas utilizado pelas famílias abastadas ou Setúbal. Este ligará perfeitamente com os ingredien- em épocas festivas, dada a fragilidade de recursos da tes, sobretudo com o chocolate. O Moscatel Roxo sociedade sesimbrense daquela época. Cozido em púcara é rico nos aromas e exuberante na boca, revelando, e em forno a lenha, o bolo era cortado em quadrados na maioria das vezes, notas a laranja cristalizada, e a meio da cozedura. Agora, no âmbito do Programa café e frutos secos. Apesar de doce, é fresco e muito Integrado de Valorização da Frente Marítima de elegante. Um vinho cheio de encanto. Sesimbra, a especialidade saltou do âmbito caseiro e tornou-se moda nas pastelarias do concelho.

201 FOGAÇA DE ALCOCHETE

Reza a tradição que, há muitos, muitos anos, um Ingredientes barco de Alcochete foi apanhado por uma tempestade 1 kg de farinha; 700 g de açúcar amarelo; 250 g de em pleno rio Tejo e os barqueiros prometeram que, se manteiga derretida; 200 g de raspa de casca de chegassem a bom porto sãos e salvos, organizariam uma limão; 25 g de canela em pó; 2 dl de água; gema de confraria em honra de Nossa Senhora da Atalaia para ovo. agradecer essa graça. E, desde então, têm cumprido a promessa, festejando anualmente a salvação. É a mais Preparação antiga tradição desta vila da borda d’água, atestada por Num recipiente, deita-se a farinha, o açúcar ama- um documento de 1512, que já refere a existência da relo, a raspa da casca dos limões e a canela em pó. Confraria dos Barqueiros de Alcochete. Amassa-se com a manteiga derretida e cerca de 2 dl de água, como se amassa o pão. Fazem-se peque- Ainda hoje, durante a semana da Páscoa, realiza-se o nas bolas, barram-se com gema de ovo, dando-lhe tradicional Círio dos Marítimos e, de entre os diversos pequenos golpes para enfeitar. Vão ao forno44. cerimoniais a cumprir, na segunda-feira faz-se à porta da igreja da Atalaia um leilão de Fogaças. Estas Estamos sempre perante um casamento feliz quan- são uns pães doces, pesando um quilo, cujo ritual de do juntamos doçaria tradicional portuguesa a um oferta e de arrematação assegura abundância e saúde. Moscatel de Setúbal, seja ele branco ou tinto. Neste Se a produção particular continua a respeitar o peso caso, pelas características da receita, sugere-se a estabelecido, as Fogaças comercializadas, em geral, companhia de um Moscatel de Setúbal jovem, em aparecem já em formato individual. que os aromas a laranja, flor de laranjeira e mel se revelam mais intensos, cuja elegância e suavidade se manifestem na boca.

203 FOGAÇA DE PALMELA

Tradicionalmente, as Fogaças de Palmela eram feitas em Ingredientes casa das famílias, em vésperas da Festa de Santo Amaro, 500 g de massa de pão; 500 g de açúcar amarelo; a 15 de Janeiro. Esses bolos correspondiam a promessas 1 kg de farinha *; 125 g de banha; 2 ovos mais 1 ovo formuladas àquele Santo e, conforme o problema para pintar; sumo de 2 laranjas; raspa de casca de que estava na origem da promessa - a cura de pessoas laranja; 1 cálice de aguardente; canela (+ -30g)**; ou de animais, o pedido de boas colheitas – assim as erva-doce (+ - 50g).** fogaças tinham formas de animais, de cachos de uva, de corações, etc. Transportadas em cestos para a missa na Preparação igreja paroquial, aí eram benzidas. Uma parte dessas Ligam-se os ovos à massa do pão. Em seguida, Fogaças era leiloada e o valor apurado revertia a favor deita-se o sumo e a raspa da casca das laranjas, a da igreja e para cobrir as despesas da festa, e a outra banha, o açúcar, a canela, a erva-doce, a aguarden- parte era levada para casa e distribuída pela família, te e, por fim, a farinha. Depois de tudo bem ligado pelos vizinhos e pelos amigos. e amassado, deixa-se levedar durante 30 minutos. Moldam-se bonecos, decoram-se e pintam-se com Este ritual foi recuperado pela Confraria Gastronómica ovo batido. Vai a cozer em tabuleiro untado, em forno de Palmela, com o apoio da autarquia, na intenção de moderado (180º C)45. reviver e dinamizar esta tradição antiga de Palmela. Assim, no dia de Santo Amaro, os Confrades, vestidos Juntar doçaria tradicional portuguesa a um Moscatel a rigor, levam ao altar os cestos com as Fogaças para de Setúbal, seja ele branco ou tinto, é sempre serem benzidas. uma aposta segura. Porque a receita das Fogaças de Palmela é rica, sugere-se a companhia de um Moscatel de Setúbal com alguma idade (mais de 5 anos), em que os aromas a laranja cristalizada e mel se manifestem com exuberância, proporcionando ao palato disfrutar de toda a sua complexidade.

*Poderá levar um pouco mais de farinha dependendo do tamanho dos ovos e das laranjas.

**A erva-doce e a canela são a gosto, no entanto a quantidade de erva-doce deverá ser sempre superior à da canela.

205 TORTA DE AZEITÃO

A receita das Tortas de Azeitão terá tido a sua origem na Ingredientes vila de Fronteira, no Alentejo, tendo sido trazida para Massa: 20 claras de ovo; 20 gemas de ovo; 400 g de Azeitão, no início do século XX, por um familiar de açúcar; 70 g farinha; doce de ovos. Recheio - Doce Manuel Rodrigues, por alcunha “o Cego”, de profissão de ovos: 12 gemas; 12 colheres de açúcar; 24 colhe- hospedeiro e aguadeiro. A mulher deste, Maria Albina, res de água e a filha tinham já fama de doceiras graças aos “Ss”, uns bolinhos secos feitos por elas e que eram vendidos Preparação à porta do seu estabelecimento, juntamente com Batem-se as gemas com o açúcar até se obter um tremoços e amendoins, aos forasteiros vindos da zona da creme espesso. Adiciona-se a farinha, batendo-se o Arrábida. Foram elas que começaram a fazer as Tortas, tempo necessário para a envolver. De seguida, jun- inicialmente cozidas no forno da padaria de João Alface, tam-se as claras batidas em castelo. Coloca-se esta e a vendê-las, primeiro, à fatia, e depois, em doses massa num tabuleiro untado e forrado com papel individuais. E assim foi fundada a pastelaria “O Cego”, vegetal que, por sua vez, também é untado e polvi- especializada nas Tortas de Azeitão, que ainda hoje lhado de farinha. Espalha-se a massa até ficar muito fazem as delícias dos apreciadores da doçaria genuína, fina. Espera-se mais ou menos 10 minutos e coze-se fabricadas com produtos naturais e por processos no forno à temperatura de 180º C, durante, 15 a 20 pouco mais que artesanais. O actual proprietário, José minutos. Não deve cozer demasiado para as tortas Augusto, que há 30 anos está à frente da pastelaria, faz não se partirem ao enrolar. Entretanto, prepara-se o questão de manter a tradição de qualidade na confecção recheio. Num tacho, coloca-se o açúcar com a água a destes bolos que, muito justamente, tornaram famoso ferver, até atingir o ponto de fio, o que demora cerca aquele estabelecimento. de 10 minutos. À parte, batem-se bem as gemas. Logo que a calda esteja no ponto, retira-se do lume, junta-se imediatamente às gemas, mexendo ao mes- mo tempo. Sem parar de mexer, leva-se de novo ao lume a engrossar. Desenforma-se o bolo por cima de um pano, barra-se de imediato com o doce de ovos, entretanto preparado, e corta-se em tiras com 8 cm de largura e 12 de comprimento, que se enrolam, de forma ficarem com cerca de 5 cm de diâmetro46.

Uma torta de Azeitão e um Moscatel de Setúbal é, para muitos setubalenses, a delícia do final de tarde.

207 Produto Regional QUEIJO DE AZEITÃO

Corria o ano de 1830 quando Gaspar Henriques do leite e o fabrico do produto, bem como a própria de Paiva, vindo da sua Beira natal, se instalou em rotulagem. Azeitão. A abundância de pastagens e o clima ameno levaram-no a dedicar-se à produção de queijo Apesar do nome de Azeitão, actualmente já são pou- de ovelha, a exemplo do que se fazia na Serra da cas as unidades de produção de queijo fixadas nesta Estrela. Mas o queijo que fabricou revelou-se diferen- vila, estando os principais produtores concentrados te do esperado, com um sabor característico graças na Quinta do Anjo, próximo de Palmela. Não obstan- à flora da serra da Arrábida que alimenta os animais te, o Queijo de Azeitão continua a ser uma referência e à utilização de uma variedade de flor de cardo, gastronómica da Península de Setúbal, tanto no País espontânea no sul do País, a cynara cardunculus, como no estrangeiro e, recentemente, tem vindo a para a coagulação do leite, que ainda hoje é feita em ser usado com grande sucesso na composição de enormes potes de barro vidrado. O resultado é um criativos pratos de autor. queijo de pasta semi-mole ou amanteigada, branca ou ligeiramente amarelada, com a forma de um ci- Para este tradicional e muito apreciado produto re- lindro achatado, podendo pesar 100 ou 250 gramas. gional da Península de Setúbal, nada melhor do que Tem um tempo de cura de vinte dias e, durante este harmonizá-lo com um clássico da região, um vinho período, é virado e lavado sempre que necessário, monovarietal da casta Castelão, a mais plantada para que a crosta fique lisa e limpa. O segredo do na Região, que proporciona vinhos concentrados, seu fabrico foi transmitido a vários proprietários intensos na cor e no aroma, em que se destaca fruta de rebanhos de ovelhas, nos concelhos de Palmela, vermelha madura e especiarias. Sesimbra e Setúbal, que, em conjunto, possuiam cerca de 5000 animais, e que se dedicaram tam- bém a produzir, em queijarias artesanais, o Queijo de Azeitão, como foi desde cedo designado um dos mais apreciados queijos nacionais. Estes concelhos correspondem à área geográfica de produção, que actualmente constitui a região demarcada do queijo de Azeitão. O uso da Denominação de Origem, insti- tuída em 1986, obriga a que o queijo seja produzido de acordo com as regras estipuladas no caderno de especificações, o qual inclui as condições de pro- dução de leite, a higiene da ordenha, a conservação

209 Produto Regional MOSCATEL DE SETÚBAL E MOSCATEL ROXO

As uvas da casta Moscatel de Setúbal, originária do entre 17º e 18º C e uma cor que vai do topázio claro Médio Oriente e introduzida em território peninsular ao topázio queimado. na época do Império Romano, constituem a base do prestigiado vinho Moscatel de Setúbal, cuja fama São dois os tipos de Moscatel de Setúbal, o branco além-fronteiras terá começado na segunda metade e o roxo, respectivamente designados “Moscatel de do século XIV, quando Ricardo II de Inglaterra se Setúbal” e “Moscatel Roxo”. Estas designações só tornou um importador assíduo deste vinho. Também podem ser atribuídas aos vinhos DOC Setúbal elabo- Luís XIV, o “Rei Sol”, no século XVII, consta que rados com, pelo menos, 67% de mosto proveniente não dispensava nas festas de Versailles este vinho destas castas. Estes vinhos podem ser colocados no generoso. mercado a partir dos dois anos de idade e ostentar na rotulagem o ano de colheita ou as indicações “10 Ao longo dos séculos, a casta sofreu diversas mu- anos de idade”, “20 anos de idade”, “30 anos de ida- tações e, actualmente, existem três variedades de de” e “Mais de 40 anos de idade”, desde que o vinho uvas Moscatel em Portugal. A variedade Moscatel em causa ou cada uma das parcelas do lote que o de Setúbal é a mais plantada em Portugal, e a sua originou, tenha, no mínimo, a idade indicada. A casta produção concentra-se na Península de Setúbal, cujo Moscatel Roxo, apesar de cultivada em pequena clima ameno permite a maturação ideal dos bagos, quantidade, permite obter um vinho de produção que ficam com uma cor dourada, variando entre o limitada, mas de grande qualidade, constituído por, topázio claro e o âmbar. É a que apresenta maior pelo menos, 85% de mosto desta casta. O designa- concentração e riqueza de compostos aromáticos, tivo “Superior” é atribuído a vinhos com um mínimo dos quais se destacam casca e flor de citrinos, mel, de cinco anos de idade e que tenham obtido, na tília, rosa, líchias, pêra, tâmaras e passas de uva. câmara de provadores, a classificação de qualidade destacada. Apesar da sua produção ser bastante anterior, em 1908, foi instituída a Região Demarcada do Moscatel Por ocasião do primeiro centenário da criação da de Setúbal, cuja área geográfica abrange os con- Região Demarcada do Moscatel de Setúbal, em celhos de Palmela, Setúbal e parte do concelho de 2008, foi fundada a Confraria do Moscatel de Sesimbra. Setúbal, com o objectivo de defender, valorizar e pro- mover o Moscatel de Setúbal. Foi também desenha- A partir destas uvas, é produzido o Moscatel de do um copo específico e lançado um lote especial de Setúbal, com Denominação de Origem Controlada, Moscatel de Setúbal, comemorativos da efeméride47. vinho licoroso, com uma graduação que se situa

211 OESTE

213 Encravada entre a vastidão do oceano e as encostas da Serra do Montejunto, a região Oeste estende-se aos solavancos entre vales e colinas que ligam a costa marítima ao mundo rural. Aqui o mar e a terra fundem-se numa mancha verde, salpicada, aqui e ali, por lugares, aldeias, vilas ou cidades que testemunham no litoral uma vocação piscatória e, caminhando mais para o interior, a aptidão agrícola das suas gentes. Os hábitos do dia-a-dia e aquilo que homem foi conseguindo tirar do chão e das águas determinaram as tradições gastronómicas desta região, reflectindo a proximidade do mar assente numa forte componente rural. Assim, os pratos típicos tanto podem deliciar os apreciadores de carne e dos sabores da terra como os que pendem para os paladares marítimos dos peixes e dos mariscos.

Alcobaça Alenquer

Nascida entre os vales do rio Alcoa e do rio Baça, Conta-se que nos tempos agitados da Alcobaça deve a sua fama ao magnífico mosteiro Reconquista, D. Afonso Henriques encontrou por fundado, aquando da Reconquista, por D. Afonso estas paragens um aliado inesperado. Do alto Henriques. Entregue aos monges de Cister, os reis das muralhas, apareceu-lhe um cão com a chave que sucederam ao “Conquistador” foram doando do castelo na boca e rapidamente lha fez chegar à Ordem novas terras, concessões e regalias, insti- às mãos. O rei, surpreendido, tomou a atitude tuindo-lhe um imenso território: o célebre domínio por ordem e exclamou “Alão quer!” e, sem perder dos treze Coutos de Alcobaça. Os monges, além mais tempo, tomou a fortaleza enquanto, sem o da sua actividade religiosa e cultural, ensinaram saber, baptizava o local. Lendas à parte, Alenquer técnicas agrícolas graças às quais arrotearam é uma povoação antiquíssima que nos oferece terras, secaram pauis e organizaram explorações, uma grande diversidade de paisagens invulgares tendo criado, praticamente, a partir do nada, uma e uma riqueza agrícola de grande significado. As região agrícola que se manteve até hoje. Se é velhas quintas solarengas, os bons vinhos brancos incalculável o valor do legado da Ordem de Cister e tintos e a serra do Montejunto proporcionam, a para o desenvolvimento agrícola da região, menor poucos quilómetros de Lisboa, produtos de grande também não é a sua herança no que se refere às qualidade. Todo o concelho mantém fortes tradi- tradições culinárias. Do convento de Cós, funda- ções agrícolas, sobretudo nos pomares de vários do no século XIII pelo abade de Alcobaça, saíram frutos e nas vinhas. Localizada numa alcantilada das mãos das freiras Bernardas uns verdadeiros colina, partindo do topo de um outeiro em direc- milagres de ovos e açúcar, doces ainda hoje capa- ção ao vale, a vila conquistou há muito o título de zes de fazer qualquer um cair no pecado da gula “Presépio de Portugal”. Anualmente, a Sagrada e celebrados todos os anos no Mosteiro de Santa Família, pastores, anjos e os Reis Magos, em Maria de Alcobaça, na Mostra Internacional de tamanho gigante, garantem o seu lugar numa das Doces Conventuais. encostas da povoação.

215 Arruda dos Vinhos Bombarral Cadaval Caldas da Rainha

Situada num vale fértil e ameno, a vila de Arruda dos Se se der o caso de chegar ao Bombarral de com- Segundo reza a história, terá vindo de Espanha o Conta a tradição que a Rainha D. Leonor, mulher de Vinhos guarda nas suas paredes o eco das histórias boio, quando se vir na estação, vai ser imediata- hábito de consumir bebidas geladas ou de saborear D. Jão II, deslocando-se das suas terras de Óbidos antigas. Ao precorrermos o emaranhado de ruas mente atraído pelo azul e branco dos seus azulejos. uma “nevada”. Esta moda, importada da corte de D. para a Batalha, passou por um local onde algumas que riscam a vila, é possível ir encontrando na sua Pintados em 1930 pelo artista plástico Jorge Pinto, Filipe II, rapidamente foi absorvida pela elite mais pessoas se banhavam numas poças de água quente topomínia sugestões à presença de velhos paços ou estes painéis ilustram o modo de vida das gentes da endinheirada. Com efeito, a incapacidade técni- e de cheiro intenso e desagradável. Informada de que de um castelo mouro. Em 1172, D. Afonso Henriques terra, indiscutivelmente ligadas à terra e ao vinho. Ali ca de produzir gelo artificialmente fazia com que eram doentes que ali procuravam remédio milagroso doou a povoação à Ordem Religiosa e Militar de estão as mulheres a limpar as cepas, os homens a este fosse um produto considerado de luxo e só ao para os seus males, também quis experimentar os Santiago que muito fez pelo crescimento da região. pulverizar a vinha, a fazer a vindima, a pisar as uvas… alcance das bolsas mais abonadas. Em pleno século efeitos e, entusiasmada com os resultados, determi- O convento no Sítio do Vilar, destinado a acolher as O pintor passou para o azulejo um ofício que todos XVI, sem as modernas tecnologias de refrigeração, o nou, para que os tratamentos fossem feitos de forma mulheres dos Cavaleiros que partiam para Sul na os naturais da zona conhecem e muitos dominam. recurso à neve e ao gelo da Serra da Estrela cons- condigna, que ali se construísse um hospital, que altura da Reconquista, foi um verdadeiro motor de Com efeito, já vem de longe a herança vitivinícola tituía a única alternativa possível. O percurso até à ficou concluído em 1488. À sua volta foi crescendo desenvolvimento rural da zona. Estas senhoras, para do concelho. Inserida numa fértil região agrícola, capital era longo e complicado e, como a procura uma povoação, que recebeu o nome de Caldas da além da oração, dedicavam-se à exploração agrícola, produto do trabalho dos monges de Alcobaça, de por parte da nobreza deste bem gelado parecia Rainha, aliando as águas quentes, calda, à sua fun- através do arrendamento de terras, promovendo, foreiros, de colonos e de agricultores, esta zona, não abrandar, tentou encontrar-se um recurso mais dadora, a Rainha. No século XVIII, sob o patrocínio deste modo, a dinamização da agricultura, especial- situada numa planície de aluvião bastante fértil na prático para a sua comercialização em Lisboa. A do Rei D. João V, assíduo frequentador do hospital mente o cultivo da vinha, dadas as características margem esquerda do rio Real, goza há muito de Quinta da Serra, no concelho do Cadaval e no alto do termal, este foi completamente reconstruído. Sob a excepcionais para este tipo de actividade. Ainda hoje, terras de grande qualidade. No início do século XX, Montejunto pareceu ser a melhor solução. Localizado administração de Rodrigo Berquó, o hospital trans- nas aldeias, nos casais e nas quintas do conselho tra- os vinhedos preenchiam a maior parte da paisagem a cerca de 40 quilómetros da capital e próxima do formou as Caldas da Rainha no centro termal em balham-se afincadamente os campos e preparam-se e tinham ganho quase o estatuto de monocultura. O rio Tejo, então via de acesso privilegiada, este lugar moda nos finais do século XIX e início do século XX, os vinhedos para as célebres e fartas colheitas de vinho era, nessa altura, o principal meio de ocupação apresentava grandes vantagens. Mas para a escolha quando a vila se tornou cidade. Outono que tão bem tipificam e enchem esta terra da maior parte da população, tanto como associados terá sido determinante o microclima da região que de cor. Deste longo ritual de labor e de sabedoria da Adega Cooperativa do Bombarral, que alimentou proporcionaria temperaturas negativas durante um Centro de uma região onde a agricultura ocupa um resulta, anualmente em Novembro, a Festa da Vinha. anos a fio os circuitos de produção do Vinho Verde grande período do ano. Foi então construído, já no lugar de destaque, a sua Praça é, diariamente, palco comercial e da aguardente para o Vinho do Porto, reinado de D. João V, um inovador complexo indus- de um mercado de produtos hortícolas, que os pro- Uma vez que esta região possui, desde muito cedo, como na qualidade de trabalhadores das grandes trial planeado para a produção regular de gelo, com dutores expõem para regalo dos olhos de fregueses terrenos bastante férteis para o cultivo de produtos casas, como a Pereira Bernardino, a José Berardo, a todo o sistema de produção, transformação, armaze- e de forasteiros que ali afluem para compras ou para vinícolas, o vinho, marca desta zona, vinculou-se Patuleias e Patuleias, a Sá Dias e Filho, a Abel Pereira namento, transporte e distribuição estudado. Este foi visita. Às cores e aos cheiros da fruta e da hortaliça com naturalidade à toponímia, tal como a arruda, um da Fonseca… Grandes viticultores, reconhecendo o um feito notável, único na Europa. No final do século junta-se a policromia das bancas da cerâmica cal- arbusto do sul da Europa muito abundante nesta re- potencial das vinhas do concelho, investiram na re- XIX, com o advento dos frigoríficos, o negócio come- dense, que conta na sua história com nomes famo- gião, teve a honra de ter gerado o nome da povoação. gião, compraram terras, ergueram adegas e construí- çou a decaír. Actualmente, a recuperada Real Fábrica sos como Maria dos Cacos, Manuel Mafra e, sobre- Esta planta, com capacidades curativas e terapêu- ram destilarias. Hoje, muitas destas quintas produto- do Gelo foi transformada em núcleo museológico e tudo, Rafael Bordallo Pinheiro. A sua fábrica, fundada ticas, permitiu a difusão de alegações a bruxaria e a ras de vinho da região, como a Quinta do Sanguinhal, o concelho do Cadaval já não se dedica ao frio. Hoje em 1884, laborou durante mais de 100 anos. Já no curandices, tendo sido criado, provavelmente pelas a Quinta das Cerejeiras, a Quinta dos Louridos, são a pêra rocha, o mel e outros produtos rurais que século XXI, após um período de decadência, sofreu alusões a feitiçarias, um doce designado “Bruxas da fazem parte da Rota dos Vinhos do Oeste. fazem as delícias de Lisboa e de outras urbes. um novo impulso, voltando a apresentar as típicas Arruda”. loiças ao lado de peças inovadoras. .

217 Lourinhã Nazaré Óbidos Peniche

Em Março de 2014, todos os grandes meios de Existem duas Nazarés. Uma é feita de pescadores, O recorte da marulha vê-se de longe. Altaneira, esta Os bandos das gaivotas, o cheiro intenso da maresia, comunicação, de Washington a Hong Kong, noti- de homens do mar, de mulheres vestidas de preto, linha defensiva hoje protege uma das jóias do turis- o vento na cara, provam-nos que estamos em terra ciaram a descoberta de um novo dinossáurio. Os gente com os olhos, o coração e o sustento postos mo nacional: cerca de 14 hectares de história viva e atlântica. De facto, a vitalidade e a força das gentes fósseis do Torvosaurus Gurneyi, um parente do no oceano revolto. A outra é uma babel composta preservada por uma faixa de pedra antiga. Do alto de Peniche encontram-se todas no mar. Estaleiros, famoso Tyrannossaurus Rex, foram encontrados na por uma população flutuante que aflui aqui, vinda das suas torres, avista-se o concelho. Daqui entre- empresas de pesca, conservas, tudo o que se liga à Formação da Lourinhã, numa área onde se encontra do mundo, à procura da onda gigante perfeita que ve-se o casario disperso, os campos arados, a lagoa, vida marítima assume uma legitimidade e um vigor um tipo de rochas ideais ao processo de fossilização. irá constar num famoso livro de recordes, ou de um baptizada com o nome da vila, o oceano, ao longe, a que o turismo ainda não conseguiu alterar. Uma Este primo do T-Rex, oitenta milhões de anos mais bonito tom de pele conseguido num areal a perder provar a escolha privilegiada deste local que parece autenticidade bem visível a quem, em dia de semana, velho, pode ter atingido os dez metros de compri- de vista e potenciado pelo ar saturado de iodo. Estas ter tudo: porto de mar, terras férteis e o sistema lagu- se passeie pela zona portuária. A descarga do pesca- mento e ter pesado entre quatro a cinco toneladas; duas realidades encontram-se quando os habitantes nar costeiro mais extenso da costa portuguesa. Aqui, do é um espectáculo único, com gestos e linguagens com estas medidas, os paleontólogos acreditam que locais se esmeram na hospitalidade: nos restauran- ainda hoje se capturam espécies como o robalo, o muito próprios, que, embora tenha sofrido trans- este era o maior predador terrestre da Europa do tes servem com orgulho os pratos confeccionados linguado, a solha, a tainha, a amêijoa, o berbigão, o formações com o progresso, mantém um pitoresco seu tempo, o Jurássico Superior. Os vestígios deste com o pescado do dia, nas ruelas abrem as suas ca- mexilhão, o camarão, o polvo e a enguia que muito intemporal. Ali descansa já em caixas o pescado enorme animal encontram-se num pequeno museu sas ao turismo numa oferta expressa de Chambres, influenciam a oferta gastronómica da região. acabado de apanhar, brilham ao sol as sardinhas, as no centro da vila Lourinhã, mantido por um grupo de Rooms e Zimmer. lagostas, as raias, os búzios, debaixo do olhar guloso arqueólogos que conseguiram reunir um espólio hoje Desde cedo que as condições geográficas favorá- das gaivotas. considerado como uma das maiores colecções de O turismo e a pesca são as actividades que fazem veis foram reconhecidas pelos povos que por aqui fósseis de dinossáurios do Jurássico Superior. O mu- pulsar a vila. Quando Ramalho Ortigão publicou passaram e se fixaram. Ao povoamento neolítico Com uma grande tradição nas artes da pesca, a seu, para além do núcleo de Paleontologia, também “As Praias de Portugal - Guia do Banhista e do sabe-se que se seguiram, mais tarde, os romanos, os gastronomia de Peniche oferece, naturalmente, uma possui outros dedicados à Arte Sacra e à Etnologia Viajante” em 1874, já a Nazaré era destino de férias visigodos e os árabes. D. Afonso Henriques, depois grande variedade de pratos de peixe e marisco. A e, numa rápida visita, podemos perceber que, para principalmente occupada pelos banhistas das Caldas de conquistar Lisboa, dedicou-se a submeter as re- Avenida do Mar e o Largo da Ribeira são os dois além dos animais já pisarem esta terra há tempos e pessoas d’aquellas redondezas da Extremadura : giões vizinhas. Óbidos caíu nas mãos lusas em 1148. locais da cidade onde se acotovela uma grande imemoriais, também o ser humano deixou por aqui Pombal, Leiria, Torres Novas, Santarém. Com o tem- No século XIV, esta terra já afirmava a sua importân- parte dos restaurantes, especializados, claro está, na pegadas antigas. po, internacionalizou-se. Em 2011, o surfista ameri- cia. Poucas eram as povoações que, naquela altura, confecção irrepreensível do maior tesouro da região, cano Garrett McNamara levou esta faixa costeira às apresentavam uma área tão extensa intramuros . o peixe fresco. Mas, se por aqui o fruto do mar é rei, Romanos primeiro, depois Árabes, por fim Cristãos: bocas do mundo, depois de ter cavalgado uma onda Depois, com o andar da História, foi perdendo peso, noutros pontos da cidade e um pouco por todo o o clima e a qualidade do solo parecem ter atraído de quase 30 metros e, imediatamente, a Nazaré mas talvez tenha sido isso que a salvou. O progresso concelho, as propostas culinárias passam, também, pessoas desde cedo ao concelho. A sua localização tornou-se destino de peregrinação do amante deste das Caldas da Rainha, que lhe roubou toda a impor- pela riqueza agrícola das vastas e férteis zonas privilegiada, protegido pelo Montejunto e delimitado desporto radical de qualquer parte do globo. Mas, tância, preservou esta vila acastelada de inovações rurais, mostrando que a região de Peniche é pintada pelo Cabo Carvoeiro, consegue condições metrológi- esta ondulação furiosa que hoje fascina os turistas do ‘fácies antigo’ , fazendo dela (...) um museu. Assim a muitas cores. cas abençoadas. Esta é uma terra com muita pesca, foi, desde há séculos, motivo de temor e de luto para se escreveu, em 1955, no inventário da Academia de carne, fruta e marisco, em especial a lagosta. A sua a população que dependia do mar para viver. Apesar Belas-Artes e, actualmente, por se tratar de uma jóia, De qualquer forma, a vastidão do azul do oceano aguardente, embora já seja por aqui uma tradição do risco, a pesca, a transformação do pescado, o muito temos que agradecer ao progresso não ter pode dominar o verde dos campos. Mas a relação com mais de duzentos anos, conseguiu ter região pitoresco processo da seca e a venda de peixe, são, conseguido ultrapassar as muralhas. com o mar não se limita à pesca: o desporto náutico, demarcada em 1992. ainda hoje, a principal actividade da população. principalmente o surf, já ganhou relevância e hoje Peniche é conhecido como a «Capital da Onda».

219 Sobral de Monte Agraço Torres Vedras

Nas histórias das famílias antigas do concelho ainda Cidade com pergaminhos antigos, a história de pairam as sombras das Guerras Napoleónicas, ocor- Torres Vedras é pródiga em acontecimentos. D. ridas há dois séculos. Nas narrativas populares que Afonso Henriques conquistou-a aos mouros em recordam esses tempos idos, há sempre um tesouro 1147, mas foi só em 1250 que D. Afonso III doou aos escondido, ouro emparedado, faqueiros de prata homens e vassalos do povoado carta de Foral. Foi enterrados, mas também há a lembrança de casas por aqui que D. João I encetou a campanha de África, destruídas, arquivos incendiados, paços devastados… quando, em 1413, reuniu o conselho para discutir Estes relatos reflectem uma época de susto, feita de os planos de Ceuta. Na Restauração, em 1640, foi saque e de medo. das primeiras povoações das imediações de Lisboa a sacudir o domínio filipino, mas é, sem dúvida, no O concelho de Sobral de Monte Agraço é justamente período negro das Invasões Francesas que Torres reconhecido por ser lugar proeminente das “Linhas Vedras se destaca. de Torres” durante a Terceira Invasão Francesa. Depois da incursão do General Junot, em 1807, e O Marechal Massena acabado de entrar em Portugal da de Soult, em 1809, o Marechal Massena, um avançava a passos largos para a capital. Com dos mais admirados militares de França, avançava Lisboa como objectivo, foi saqueando o que pôde pelo território português à frente do maior exército pelo caminho. Massena só soube da construção invasor que até à época tinha entrado por Portugal. das Linhas de Torres quando com elas se deparou. Estávamos em 1810. Vindas do norte, as tropas Com os seus homens exaustos, não tentou forçar francesas foram avançando para as linhas defensivas a passagem sobre esta faixa de defesa da capital. de Torres Vedras, construídas com o objectivo de es- Esperou por reforços e, rendido às evidências, retirou tancar as hostes inimigas antes de estas chegarem para a região de Santarém. Assim, começava aqui a Lisboa. Sir Arthur Wellesley, primeiro Duque de o malogro da Terceira Invasão Francesa e assistia- Wellington, comandante supremo das forças luso- se ao inicio da progressiva perda de hegemonia do -britânicas montou o seu quartel-general na Quinta império Napoleónico na Europa. Os Portugueses, dos Freixos, nas imediações de Sobral de Monte agradecidos, entre outras homenagens que presta- Agraço. William Beresford, comandante-em-chefe do ram a Wellington, deram-lhe o título de marquês de Exército Português, instalou-se por perto, na Quinta Torres Vedras. Nova de Nossa Senhora. É fácil imaginar como o impacto destas movimentações e destes aconteci- Mas a importância deste concelho vai muito além mentos afectaram esta terra predominantemente destes feitos bélicos. Desde há séculos que estas rural. Com efeito, a agricultura foi sempre o factor de terras férteis, abastecem de produtos hortícolas a ca- desenvolvimento da região, situação que, apesar de pital e fornecem a base de uma cozinha rural muito ter decrescido nos últimos anos, ainda garante bons interessante, valorizada pela riqueza do que a vasta produtos e a base da gastronomia local. costa atlântica dá.

221 GASTRONOMIA REGIONAL

Alcobaça Caldas da Rainha Peniche Sopa de lagosta, frango na púcara, cherne à frei Bacalhau dourado, polvo à lagareiro, ensopado de Sopa de legumes, sopa de peixe, alfaquique com João, porco à abade de Cister. Na doçaria, pão-de- enguias da Lagoa, fatias de carne frita à moda do açorda de ovas, lagosta suada, caldeirada de Peniche ló de Alfeizerão, cornucópias, delícias de Frei João, Landal. Nos doces destacam-se as cavacas das e à pescador, feijoadas do mar, de chocos e de trouxas de Alcobaça, pudim de ovos do mosteiro de Caldas, os esses das Caldas, o pão-de-ló do Landal, búzios, massada do mar, sequinho de raia, de robalo Alcobaça, broínhas de Alcobaça, tachinhos à Dom as trouxas das Caldas e os beijinhos. e de safio, sardinha e outros peixes grelhados. Na do- Abade. São também de destacar as frutas do conce- çaria, amigos de Peniche, esses de Peniche, pastéis lho, em especial, a ginja e a maçã de Alcobaça. Lourinhã de Peniche e pão-de-ló de Peniche. Mariscos cozidos, caldeiradas e feijoadas do mar, Alenquer arroz de polvo, pataniscas de polvo, polvo assado Sobral de Monte Agraço Pão de fabrico tradicional, sarrabulho, mão de vaca na brasa, polvo frito, lagosta suada, ensopado de Cabrito no forno, fritada, sarrabulho, tiborna, par- e torricado. Na doçaria, uvada - doce com base em borrego. Nos doces, pão-de-ló de Miragaia, areias rameiros, mão de vaca com grão. Nos doces, filhós mosto - broas de mel da serra de Montejunto, brancas, amendoados, delícias do convento. Também espalmadas com aguardente e bolo de perna. se destaca a aguardente DOC da Lourinhã. Destacam-se também o pão e o queijo fresco. Arruda dos Vinhos Bacalhau assado na brasa, coelho no tacho, galinha Nazaré Torres Vedras de , pato escondido, perú no forno, borrego Sopa de peixe, sopa de carapaus secos à moda da Sopa de peixe à pescador, canja saloia, arroz de ma- no forno, costeleta de novilho, guisado de coelho, Nazaré, massa de peixe, espetada de tamboril, arroz tança, coelho na canoa, cachola de porco, ensopado mão de vaca com grão, sarrabulho, vitela assada. Nos de tamboril, arroz de marisco, caldeirada à nazarena, de enguias à moda da Assenta, mariscos. Na doçaria, doces, bruxas da Arruda e uvada. carapau seco e enjoado, garoupa à nazarena, mo- pasteis de feijão, sopapos, doce de garfo e suspiros lhanga de petingas à nazarena, raia de escabeche, do Turcifal. Bombarral santola recheada à moda da Nazaré, morcelas e Sopa de misturadas, sopa de feijão catarino, arroz de negrinhos. Na doçaria, sardinhas doces da Nazaré, golada, cabrito assado no forno, gorjões do Palácio. arroz-doce dos casamentos, bolos de noiva, tá-ma- Nos doces, mimosos, pão-de-ló do Bombarral, bolo res, merendeiras do Natal ou brendeiros e azevias à dos generais. Destacam-se também a pêra rocha e o antiga. licor feito com este fruto. Óbidos Cadaval Caldeirada de peixe da Lagoa de Óbidos, enguias Arroz de golada, cabrito à Montejunto, polvo à laga- fritas, ensopado de enguias. Na doçaria, trouxas reiro, chanfana, coelho à caçador, tornedó com pêra de ovos, lampreia das Gaeiras, alcaides, pegadas, rocha, medalhões de vitela com pêra rocha, borrego pastéis de moura, lidadores. Também se destacam a assado e cozido à portuguesa. Nos doces, pão-de-ló pêra rocha e a ginjinha. do Painho, bolo de Ferradura, doce das vindimas e mel de Montejunto.

223 AGENDA GASTRONÓMICA

Março Novembro Festival Internacional de Chocolate, em Óbidos Mostra Internacional de Doces Conventuais, em Quinzena da Aguardente DOC Lourinhã, na Lourinhã Alcobaça Feira de Todos os Santos, em Sobral de Monte Abril Agraço Festival das Sopas e do Petisco, em Labrugeira, Festa da Vinho e do Vinho, em Arruda dos Vinhos Alenquer Na 5ª feira da espiga, Festa do Pão, Artesanato e Maio Sabores, em Sobral de Monte Agraço Mês da Gastronomia, em Arruda dos Vinho Quinzena do Polvo, na Lourinhã Mostra Gastronómica da Região Ribeirinha do Concelho de Alcobaça, em Cela Velha, Alcobaça Vinhos da Região Os vinhos produzidos nesta região integram a Julho Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa Feira das Tasquinhas Rurais, em Peniche

Agosto Festival do Vinho Português e Feira Nacional da Pêra Confrarias Rocha do Oeste, no Bombarral Confraria da Pêra Rocha Aljubarrota Medieval, em Alcobaça Colegiada de Nossa Senhora da Anunciação da Expotur, nas Caldas da Rainha Lourinhã Tasquinhas, em Valado dos Frades, Nazaré Confraria dos Enófilos da Estremadura Feira das Tasquinhas, em Famalicão, Nazaré

Setembro Feira do Arroz-Doce, no Paúl, Torres Vedras Concurso de Gastronomia, nas Caldas da Rainha

Outubro Feira das Tasquinhas, em Sobral de Monte Agraço Festa das Adiafas e Festival Nacional do Vinho Leve, no Cadaval Festival da Codorniz, no Landal, nas Caldas da Rainha Feira de S. Simão, em Alcobaça

225 CALDEIRADA À NAZARENA

A Caldeirada de Peixe é um dos pratos típicos mais Ingredientes apreciados em Portugal, por ser rico em sabores 500 g de tamboril; 500 g de safio da parte da intensos graças aos magníficos peixes e aos temperos barriga; 500 g de raia; 500 g de ruivo; 12 ameijoas que a compõem. Existem muitas variações na confecção sem casca; 5 cebolas grandes; 5 dentes de alho; de caldeiradas, consoante a região que as prepara, 12 tomates pequenos; 1,5 dl de azeite;1 ramo de mas as mais apreciadas são as dos fragateiros e as salsa; 0,5 l de vinho branco; 1 kg de batatas; 1 folha dos pescadores. A característica comum é o facto de de louro; 1 colher de sopa de vinagre; piripiri q.b.; sal ser um prato preparado com uma grande variedade e pimenta q.b. de ingredientes. A maioria das zonas piscatórias portuguesas tem uma receita de caldeirada “à sua Preparação moda”: por vezes, a principal diferença está nas Para dentro de um tacho, deitam-se as cebolas às espécies de peixe, na opção de refogar ou não, ou ainda rodelas, o tomate aos bocados - sem peles nem na inclusão de vinho, de água, ou simplesmente em sementes - e os dentes de alho picados. Junta-se o deixar cozer nos sucos dos ingredientes. No caso desta azeite, a salsa e o louro. Tempera-se com sal, pimen- Caldeirada à Nazarena, a originalidade está no toque ta e piripiri. Leva-se a ferver em lume brando durante de vinagre, no final. cerca de um quarto de hora. Depois, acrescenta-se o vinho branco e as batatas cortadas às rodelas e volta a ferver um bocado, até as batatas estarem meio cozidas. Misturam-se os peixes limpos e cortados às postas, polvilha-se com um pouco de sal, em cima, põem-se as amêijoas e tapa-se o tacho com a tampa. Deixa-se ferver cerca de dez minutos. Finalmente, deita-se por cima uma colher de sopa de vinagre e agita-se o tacho para o envolver no cozinhado48.

Recomenda-se um vinho branco loteado com duas castas muito populares na Região Lisboa, Arinto e Sauvignon, acídulo, fresco e com grande capacidade de realçar a comida. Este vinho tem a acidez certa para a caldeirada e, sem diminuir em nada o gosto e os sabores dos peixes, consegue equilibrar o vinagre usado na sua confecção.

227 ENSOPADO DE ENGUIAS

A Lagoa de Óbidos é o sistema lagunar costeiro mais Ingredientes extenso da costa portuguesa. Faz fronteira terreste com 1,2 kg de enguias; 3 cebolas; 1,5 dl de azeite; 750 g o concelho das Caldas da Rainha, a norte, e com o de tomate maduro; 1 dente de alho; folha de louro; concelho de Óbidos, a sul. A ligação da Lagoa ao mar 1 colher de sopa de colorau; 1,5 dl de vinho branco; é feita através de um canal localmente designado por 2 pimentos; 200 g de fatias de pão caseiro torrado; “aberta”. Por ela entram numerosas espécies piscícolas coentros; sal e pimenta q.b. que fazem da Lagoa o seu viveiro, mas também uma espécie migradora de grande valor comercial, a enguia, Preparação que escolhe para viver locais de águas bem oxigenadas e Amanham-se as enguias, cortam-se em bocados pouco frias, com fundos de areia ou lodosos. A pesca é regulares e temperam-se com sal. Cortam-se as ce- praticada a bordo das bateiras, embarcações tradicionais bolas em rodelas e alouram-se com o azeite. Quando com duas proas, fundo chato, movidas habitualmente as cebolas estiverem bem louras, junta-se o tomate à vara e utilizadas tanto pelos pescadores como pelos cortado em rodelas grossas, o dente de alho esma- mariscadores, que usam diferentes artes conforme gado, o louro, a salsa, o colorau, o sal e a pimenta. a espécie que pretendem capturar. Esta actividade Deixa-se refogar um pouco e introduzem-se as en- piscatória e de marisqueio, que assume grande guias, envolvendo-as bem no refogado. Rega-se com importância económica para as populações que vivem o vinho branco e deixa-se cozer sobre lume brando. nas proximidades da Lagoa e que nela encontraram, Dez minutos depois de levantar fervura, adicionam- desde sempre, parte do seu sustento, influenciou a se os pimentos cortados em tiras. Deixa-se o enso- tradição culinária das famílias que se dedicam há várias pado apurar e serve-se numa terrina sobre as fatias gerações à pesca, e que constitui também uma das de pão caseiro torrado49. marcas identitárias dos concelhos de Óbidos e das Caldas da Rainha. O Ensopado de Enguias é um dos pratos Sugere-se os vinhos tintos DOC Óbidos, que tradicionais da zona ribeirinha da Lagoa, no qual se apresentam cor entre rubi e granada, são frutados, destaca não apenas a qualidade do elemento principal, encorpados, com um corpo e uma estrutura bastante as enguias, como também o pão que, de acordo com a agradável. São, em geral, vinhos macios e elegantes, tradição, deve ser cozido em forno de lenha. com cor vermelha escura, sem ser opaco, e aromas de frutas vermelhas e maduras. Geralmente, apre- sentam-se com uma presença discreta de estágio em madeira, sem exageros. Vêm de uma zona perto do mar e protegida pelo Montejunto, com vinhas em chão de terra fértil e com muito sol.

. 229 . LAGOSTA SUADA À MODA DE PENICHE

A lagosta pertence à classe dos crustáceos, munida Ingredientes de fortes antenas, mas sem pinças. Pode atingir 1 lagosta viva; 50 g de manteiga; 3 cebolas; 1 kg de o comprimento de cinquenta centímetros e o seu tomate; 2 dentes de alho; 1,5 dl de azeite; 2 dl de vi- habitat são os fundos rochosos de todos os mares. É nho branco; 0,5 dl de aguardente velha; 2 cálices de caracterizada pela forma subcilíndrica do corpo, pelas vinho do Porto seco; 2 malaguetas de piri-piri; salsa; patas anteriores curtas e pelas antenas mais compridas 1 folha de louro; colorau, sal e pimenta q.b. que o corpo, grossas, rígidas e espinhosas. O corpo, diferenciado em cefalotórax e abdómen, é de cor Preparação vermelho-acastanhada. É uma das muitas variedades Lava-se bem a lagosta e corta-se em crua, viva, de marisco que se pesca em toda a costa portuguesa, pelos anéis, sobre um recipiente para aproveitar mas a de Peniche é reconhecida pela sua qualidade e todo o líquido que escorrer. Retira-se a tripa de cada pela riqueza do seu sabor e da sua textura. Por isso, esta bocado, separam-se as patas e corta-se ao meio, receita tem esta designação. Quanto à técnica utilizada, longitudinalmente, a cabeça da lagosta, retira-se o o termo “suada” remete para um processo de cozedura saco cinzento, aproveitando todo o restante recheio em lume brando, num recipiente bem fechado, sem e o líquido que ficar na tábua. Deitam-se num tacho recurso a água. de barro todos os bocados da lagosta, em camadas sucessivas, alternando com a manteiga, as cebolas às rodelas, os alhos esmagados, o louro, e os tomates pelados. Rega-se tudo com o azeite, o líquido que es- correu, o vinho branco e a aguardente e tempera-se com a salsa picada, as malaguetas, o sal, a pimenta e o colorau. Leva-se o tacho bem tapado a lume forte, sacudindo-o para misturar todos os ingredientes. Baixa-se o lume quando levantar fervura e deixa-se ferver lentamente para a lagosta suar, agitando o tacho várias vezes. Passados 45 minutos a uma hora, adiciona-se o vinho do Porto. Rectifica-se o sal e tapa-se de novo, deixando cozinhar durante mais 15 minutos. Serve-se imediatamente, acompanhada com arroz branco solto50.

Para este prato sugerimos um vinho branco à base de Arinto, como o DOC Bucelas,.

231 CODORNIZ RECHEADA COM COUVE E CHOURIÇO

A codorniz é uma pequena ave galinácea implantada Ingredientes em quase todo o território nacional e uma das espécies Codornizes; couve lombarda; chouriço; cebolinhas; cinegéticas preferidas dos caçadores portugueses. A alho; azeite; vinho branco; polpa de tomate; louro; sua carne é saborosa e saudável, com um elevado teor tomilho; batata; cenoura; piripiri, sal e pimenta q.b. de proteínas e muito utilizada em culinária. Por essa razão, há uns anos, uma das suas variedades começou Preparação a ser produzida em cativeiro, actividade com um peso Desossam-se as codornizes e recheiam-se com substancial na economia do concelho das Caldas da a couve e o chouriço picado. Atam-se com fio do Rainha. Embora se encontrem pequenos produtores norte e temperam-se com sal e pimenta. Num tacho, por toda a região Oeste, é na freguesia do Landal que aquece-se o azeite e coram-se bem as codornizes. são produzidos cerca de três milhões de codornizes por Juntam-se as cebolinhas e refresca-se tudo com o ano, quase 75% do que se consome em Portugal. As vinho branco. Tempera-se com sal, pimenta e piripiri. grandes linhas de abate, embalamento e comercialização Junta-se a polpa de tomate e aromatiza-se com o dividem-se entre esta localidade do concelho das Caldas louro e o tomilho. Deixa-se estufar bem e, por fim, da Rainha e Alenquer. rectificam-se os temperos. À parte, cozem-se as cenouras e as batatinhas, que servem de acompa- Com o objectivo de promover o consumo desta ave, nhamento às codornizes, regadas com o molho do realizou-se em 2011 o 1º Festival Nacional da estufado51. Codorniz, no Landal, certame que se repetiu em 2013, com a colaboração da Escola de Hotelaria e Turismo do Esta iguaria é mais difícil de acompanhar pois tem Oeste. dois pontos muito importantes: Primeiro, entra vinho branco na sua confecção, embora fosse preferível . servir-se o mesmo vinho tinto que vai acompanhar a iguaria. Em segundo lugar, usa-se chouriço, que é um dos enchidos mais típicos portugueses mas dos mais difíceis de acompanhar. Sugerimos então um vinho tinto, encorpado e feito com base num lote de castas da Região Lisboa, sobretudo Cabernet Sauvignon e Trincadeira. Tem corpo e está muito equilibrado no nariz, mostrando taninos e o amanteigado da madei- ra onde estagiou.

233 CAVACAS DAS CALDAS

Desconhece-se a origem da receita, mas a venda de Ingredientes Cavacas nas Caldas da Rainha é atestada desde o final 6 ovos; 1 dl azeite; 300 g farinha; 125 g açúcar; do século XIX. Por volta de 1874, Jesuína da Conceição 1 colher sopa de fermento em pó; sal q.b. Garcia, abriu um comércio onde fabricava e vendia as “Genuínas Cavacas Finas das Caldas”, conforme Preparação os dizeres de uma tabuleta colocada à entrada. Com a Para uma tigela, partem-se os 6 ovos que se ba- morte de Jesuína Garcia, aos 65 anos, a sua sobrinha, tem muito bem, juntando-se-lhes, depois, o azeite. Gestrudes da Conceição Garcia, tomou conta do Continua-se a bater até tudo estar completamente negócio. Em 1923, a neta da fundadora, Maria Regina misturado. A pouco e pouco, vai-se deitando a fari- da Conceição Pereira, também abriu uma loja, no largo nha misturada com o fermento e uma pitada de sal. fronteiro à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pópulo, Bate-se com a mão fechada até que a massa fique onde vendia este bolo. Entretanto, na rua em frente branda e se comece a despegar das mãos. Coloca-se do Parque, a Antiga Casa Fausta, a laborar desde os em seguida sobre a mesa, dando-se-lhe a forma de finais do século XVIII, especializou-se no fabrico de um rolo comprido. Corta-se este em rodelas de 2,5 vários doces da região, entre eles as Cavacas. Durante cm que se colocam num tabuleiro bem polvilhado anos, as Cavacas eram também vendidas na Praça onde com farinha e se levam a forno forte a cozer. Depois se realiza ainda hoje o mercado diário, expostas em de frias, pintam-se com calda de açúcar que se levou grandes cestos de vime forrados de panos brancos, mas a ponto de espadana. A calda deve bater-se um pou- seriam, certamente, as chamadas Cavacas Saloias, que co ao ser retirada do lume, para que fique opaca52. levavam mais claras de ovos. E à chegada dos comboios, na estação do caminho de ferro, também lá estava uma Para acompanhar as Cavacas, recomendamos vendedeira, que percorria o cais de uma ponta à outra, vinhos generosos, da Região dos Vinhos de Lisboa apregoando aos viajantes: “Cavacas finas das Caldas!”. como o de Carcavelos, vinho meio doce e de uma O processo de fabrico, hoje em dia, está facilitado, bonita cor âmbar escura., ou o vinho licoroso de mas quem conhece o ofício recorda bem as exigências Óbidos, da zona do Sanguinhal e do Bombarral, que de outros tempos, pois, antes de haver máquinas, são vinhos velhos, muito bem feitos, com doçura era preciso amassar durante cerca de três horas. equilibrada. Actualmente, são vários os estabelecimentos comerciais, quase todos localizados nas imediações do Hospital Termal, que fabricam e vendem estes bolos, já embalados em cartuxos de papel, e os turistas são os seus principais compradores.

235 CORNUCÓPIAS

Embora seja incerta a sua origem, tudo indica que as Ingredientes Cornucópias pertencem ao receituário do Mosteiro de Para a massa: 250 g de farinha; 3 colheres de sopa Cós, fundado no século XII, dependente do Mosteiro de manteiga; 1 colher de chá de fermento em pó; sal de Alcobaça. A sua forma inspira-se na de um vaso q.b.; azeite ou óleo para fritar; açúcar e canela para com feitio de corno, que na Antiguidade simbolizava a polvilhar. Para o recheio: 1 chávena almoçadeira de fertilidade e a abundância, pois do seu interior jorravam doce de ovos-moles. frutos e flores. As de Alcobaça são recheadas de ovos- moles, confeccionados com gemas e açúcar, quase os Preparação únicos ingredientes que entram no receituário da doçaria Misture e amasse a farinha, a manteiga, o fermen- conventual portuguesa, depois da utilização das claras to, o sal e a água até conseguir obter uma massa com objectivos mais prosaicos. própria para tender. Tenda a massa com a espessura de cerca de 2 ou 3 mm. Corte em tiras de 1.5 cm de largura e enrole em espiral, partindo de cima para baixo, em forma de cornucópias, aconchegando bem. Entretanto coloque a água e o açúcar ao lume. Deixe ferver cerca de 25 minutos. Retire do lume e deixe arrefecer. Assim que estiver frio, mexa as gemas e junte. Envolva bem e leve ao lume a cozinhar. Deixe ferver dois minutos. Frite as cornucópias em azeite ou óleo, ou mistura dos dois, a 160º C. Retire-as, passe-as por açúcar e canela e recheie com o doce de ovos-moles53.

A doçura das Cornucópias pode ser acompanhada por um vinho generoso da região de Carcavelos que, sendo espesso e cheio de aroma, combina muito bem com a delicadeza dos .

237 TROUXAS DE OVOS

A cidade das Caldas da Rainha possui uma forte Ingredientes tradição na confecção de Trouxas-de-Ovos, embora Para as trouxas: 10 gemas; 1 ovo inteiro. Para a calda: não esteja ligada a nenhum convento local, o que 1 kg de açúcar; 3,5 dl de água habitualmente acontece com este tipo de doces. A receita poderá ter tido origem no Convento de Cós, perto de Alcobaça, cujo Mosteiro era abastecido graças Preparação à actividade doceira das freiras daquele instituição, Prepare a calda, levando ao lume o açúcar com a algumas delas oriundas de conventos alentejanos, água e deixe ferver durante 30 segundos. Deite a nos quais a tradição doceira estava, há muito, bem calda numa caçarola de fundo côncavo e coloque-a implantada. Ignora-se, no entanto, qual o caminho sobre um lume pequeno e fino, de modo a só ferver percorrido até a sua receita ter chegado às Caldas da ligeiramente no meio. Passe as gemas com o ovo por Rainha. Mas qualquer que ele tenha sido, no século um passador de rede três vezes, sem pressionar e XIX, Gertrudes Fausta, considerada grande conserveira sem bater. Deite na calda 0,5 dl das gemas e dei- e pasteleira, contribuiu com a sua actividade para xe-as alastrar. Com uma colher vá espalhando com a divulgação das Trouxas-de-Ovos a partir da loja muito cuidado para que elas formem um círculo, o que possuia na vila termal, localizada em frente ao mais fino possível, mas sem rasgar. Deixe solidificar Parque, na antiga rua do Olival, hoje rua Camões, a e, depois, num golpe rápido mas cuidadoso, com Casa Fausta, fundada ainda no século XVIII. Com sua o auxílio de uma escumadeira, vire a folhinha das irmã, ambas exerceram grande influência nas gerações gemas completamente, sempre com o cuidado de seguintes de pasteleiros das Caldas da Rainha. Tendo não a rasgar. Espere que acabe de cozer, retire-a da já passado pelas mãos de sucessivos donos a partir de caçarola, sempre com o auxílio da escumadeira, e meados do século XX, a Casa Fausta, agora com outra coloque-a num prato inclinado para escorrer. Repita designação, mantém-se no mesmo local, continuando a operação até usar todas as gemas. A feitura das a honrar a herança doceira dos seus fundadores. É aí trouxas exige muita paciência e tempo. À medida que os visitantes das Caldas da Rainha se dirigem para que for fazendo as folhas, disponha-as sucessiva- adquirir essas pequenas maravilhas que são as Trouxas- mente umas sobre as outras. Enrole-as depois, com de-Ovos, cujo amarelo vivo atrai primeiro o olhar, a parte brilhante virada para baixo, formando as seduzindo depois pelo seu sabor delicioso e requintado, trouxas, com feitio de tronco de cone. Coloque-as tão doce! num prato de serviço e, no fim, regue-as com a calda restante, passada por um passador54.

Acompanhe com um vinho generoso de Carcavelos.

239 PÃO-DE-LÓ DE ALFEIZERÃO

Diz a tradição que a receita do Pão-de-Ló de Alfeizerão Ingredientes se deve a freiras do Convento de Cós, que, depois do 9 ovos inteiros; 3 claras; 250 g de açúcar; 1 casca encerramento deste em 1834, na sequência da extinção de limão; 125 g de farinha; 1 cálice de aguardente; das ordens religiosas, terão sido acolhidas em Alfeizerão. 1 pitada de canela. Para retribuir o abrigo e o carinho com que foram recebidas, confeccionavam a doçaria do Mosteiro. Preparação D. Amália Grilo, a quem as freiras tinham passado Misturam-se os ovos inteiros, as claras, a casca do directamente a receita, começou a fabricar o Pão-de- limão e o açúcar, batendo tudo muito bem até a Ló de Alfeizerão, por encomenda, para gente de posses massa ficar esbranquiçada. Junta-se depois a farinha da região. Inclusivamente, no dia em que D. Carlos peneirada, a aguardente e a canela, envolvendo-se foi a Alfeizerão à quinta do seu amigo Vitorino Froes, tudo Barra-se uma forma sem buraco com manteiga foi chamada para confecionar um Pão-de-Ló para o e polvilha-se com farinha. Retira-se a casca do limão Rei. Mas a pressão sentida foi tal que a cozedura ficou e deita-se a massa na forma que vai ao forno a cozer incompleta. E o bolo mal cozido foi servido à mesa do cerca de 12 minutos, ficando o centro em creme, mas Rei que, afinal, não lhe poupou elogios. Depois deste levemente cozido55. episódio, as poucas pessoas que o sabiam fazer passaram a retirá-lo do forno antecipadamente, mantendo o seu Para acompanhar o Pão-de-Ló de Afeizerão, opte interior quase líquido. Nasceu assim o Pão-de-Ló de pelo vinho generoso de Carcavelos. Este vinho, já Alfeizerão como hoje o conhecemos. Nos anos 20 do plantado no século XVIII pelo Marquês de Pombal, é século passado, vindo do Alentejo de onde era natural, hoje uma preciosidade e uma bebida que combina foi colocado como pároco em Alfeizerão o Padre João na perfeição com este bolo. de Matos Vieira. Acompanhava-o sua irmã Adília, senhora enérgica e empreendedora, que recuperou a receita do Pão-de-Ló, tendo transformado, em 1925, uma actividade doméstica em negócio, embora em moldes sempre artesanais. Abriu nessa altura a Casa do Pão-de-Ló de Alfeizerão que, rapidamente, se tornou ponto de paragem obrigatória para quem fazia a velha estrada de Lisboa-Porto. Actualmente, há mais estabelecimentos a confeccionarem e comercializarem este doce tradicional, mas a referência continua a ser a antiga Casa do Pão-de-Ló de Alfeizerão.

241 SARDINHAS DOCES DA NAZARÉ

Este bolo é uma das imagens de marca da vila da Ingredientes Nazaré, cuja forma alongada pretende fazer lembrar um Para a massa: 500 g de farinha de trigo; 200 g de dos peixes que dá mais fama à actividade piscatória dos manteiga; 50 g de banha; sal q.b. Para o recheio: 8 habitantes da povoação. Como acontece com a maioria gemas de ovos; 2 chávenas de chá de açúcar em dos petiscos regionais, também neste caso se desconhece ponto de espadana; 1 chávena de chá de doce de a sua origem, mas dada a sua divulgação entre os gila; açúcar em pó q.b. naturais da vila, os veraneantes e os que só passam ocasionalmente pela Nazaré, encontra-se à venda em Preparação todas as pastelarias da povoação durante todo o ano. Misturam-se as gorduras às quais se adiciona a farinha, assim como o sal e a água necessária para formar uma massa que fique com a consistência da massa tenra .Estende-se a massa não muito fina e corta-se ao meio. Para o recheio, prepara-se a calda de açúcar em ponto espadana, que se deita em fio sobre as gemas, mexendo rapidamente. Leva-se ao lume e, quando começar a engrossar, junta-se o doce de gila escorrida do xarope. Leva-se de novo ao lume até voltar a ferver, retira-se do lume e deixa-se arrefecer. Numa das partes da massa tendida, dei- tam-se colherzinhas de recheio de ovos, um pouco espaçados. Cobre-se com a outra parte da massa e com a carretilha ou um molde recorta-se a massa com o formato de sardinhas. Vai ao forno. Servem-se envolvidas em açúcar em pó.

As Sardinhas Doces da Nazaré são uns bolos que apetece comer a qualquer hora e em qualquer lugar. Pode prová-los numa qualquer esplanada do Sítio da Nazaré ou subir-lhes o estatuto para sobremesa. Nesse caso, acompanhe-as com um cálice de vinho licoroso de Óbidos, da zona do Sanguinhal e do Bombarral.

243 MIMOSOS DO BOMBARRAL

Bombarral é um centro vinícola, cujos vinhos de Ingredientes pasto e Iicorosos há muito alcançaram justa fama, o Amêndoa ralada, açúcar, farinha, ovos. que fez sentir a necessidade de criar um doce regional compatível com os bons créditos dos seus vinhos, para Preparação os acompanhar em ocasiões especiais. Por isso, em Misturam-se todos os ingredientes e deita-se a 1920, foram lançados os Mimosos do Bombarral, a massa em formas pequenas, indo ao forno durante cuja confecção presidiu o maior escrúpulo, reunindo dez minutos. ingredientes de superior qualidade, para que resultasse um doce mimoso, que agradasse a todos aqueles que Para acompanhar estas pequenas delícias, opte tivessem a dita de o saborear. Mas a história destes pelos vinhos licorosos da região do Sanguinhal e do bolos começa antes desta data. Reza a tradição que a Bombarral, já que a origem destes bolos assenta receita dos Mimosos do Bombarral terá nascido, não precisamente nesta combinação. nesta vila, mas em Torres Vedras,como resultado do gosto pela doçaria de Maria da Conceição Jerónimo. A criadora deste doce, que faz hoje as delícias dos muitos apreciadores, terá oferecido a receita aos cunhados, Artur e Elvira Jerónimo, que viviam no Bombarral, e que, adivinhando o potencial de sucesso dos Mimosos, decidiram passar a confeccionar os bolos para fora e registaram a marca em 1920.

Actualmente, é já bastante conhecida e preferida esta especialidade de doce do Bombarral, por ser incontestavelmente a melhor e mais mimosa lembrança desta vila, fabricado somente com produtos naturais e isento de quaisquer corantes.

245 PASTÉIS DE FEIJÃO

Nos finais do século XIX, em Torres Vedras vivia uma Ingredientes senhora de nome Joaquina Rodrigues, que confeccionava Para a massa: 250 g farinha; 2 colheres de sopa de uns deliciosos Pastéis de Feijão, cuja receita ofereceu a manteiga ou margarina; 1,5 dl de água; sal q.b. Para uma sua parente, Maria Adelaide Rodrigues da Silva. o recheio: 500 g de açúcar; 100 g de feijão branco O marido desta, Álvaro de Fontes Simões, vendo o cozido; 25 g de miolo de amêndoa; 6 ovos; 6 gemas sucesso que os pastéis faziam junto de familiares e de ovos; farinha; açúcar. amigos, decidiu explorar comercialmente estes doces. Assim nasceu a marca “Maria Adelaide Rodrigues da Preparação Silva”, cujo êxito se estendeu muito para além da região Deita-se a farinha numa tigela, junta-se a manteiga de Torres Vedras e levou muitas pastelarias da vila a derretida, uma pitada de sal e água. Trabalha-se bem também fabricarem e venderem este doce à base de feijão até formar uma bola. Tapa-se a massa um pano seco, e amêndoa. Nos anos 40, um filho de Álvaro Simões, pondo-se sobre este um outro molhado e bem espre- Virgílio Simões, montou uma fábrica especificamente mido. Deixa-se descansar a massa um pouco. Pelam- destinada ao fabrico dos pastéis. Assim nasciam os muito se as amêndoas e ralam-se. Passa-se o feijão pelo conhecidos pastéis “Coroa”, que tornaram o Pastel de passador. Juntam-se as amêndoas ao puré de feijão Feijão o doce típico de Torres Vedras, cujo processo de e adicionam-se os ovos inteiros e as gemas passadas certificação já foi iniciado. por um passador de rede. Leva-se o açúcar ao lume com um pouco de água e deixa-se ferver até atingir o ponto assoprado (150º C). Adiciona-se o xarope ao preparado de feijão, amêndoas e ovos e mistura-se bem. Enquanto o recheio arrefece, forram-se as for- mas de queques com a massa preparada e estendida bem fina. Enchem-se as formas com o recheio e pol- vilha-se com um pouco de farinha e açúcar em pó. Leva-se a cozer em forno quente, a 225º Cdurante cerca de 25 minutos56.

Estes pequenos bolos são deliciosos acompanha- dos por uma chávena de chá. Se preferir sofisticar o paladar, harmonize-os com um tradicional vinho generoso da zona de Carcavelos, bebida apreciada há séculos .

247 BRUXAS DE ARRUDA

Histórias de santas milagrosas, de mouras encantadas, Ingredientes de bruxas, de gigantes, de lobisomens, povoam desde Para a massa: farinha; ovos; açúcar; óleo para amas- sempre o imaginário da vila de Arruda dos Vinhos. sar; nozes. Para o recheio - Creme de pasteleiro: 1/2 Mas se a maioria permanece apenas na tradição oral, l de leite; 6 gemas de ovos; 1 chávena de açúcar; 3 a existência de bruxas é atestada pela memória dos mais colheres de sopa de farinha; baunilha: q.b. Para a velhos, que ainda hoje falam das ´´Bruxas da Arruda”. decoração - Creme de chocolate: 1 pacote de natas; 1 Sob esta designação identifica-se uma sucessão de tablete de chocolate de culinária mulheres da mesma família que teriam transmitido de mães para filhas os seus segredos acerca das propriedades Preparação curativas de certas plantas. Ignora-se quando terá Amassa-se a farinha com os ovos, o açúcar e o óleo. tido início esta dinastia, mas presume-se que os No final, adicionam-se as nozes. Divide-se e recor- seus conhecimentos terão sido herdados das últimas ta-se a massa, em quadrados Para fazer o creme Comendadeiras da Ordem de Santiago, que eram de pasteleiro, misturam-se as gemas com o açúcar, parentes dos cavaleiros de Santiago, quando aquelas, mexendo sempre. Acrescenta-se a farinha a pouco e no século XIII, abandonaram a quinta da Arruda, onde pouco, sem deixar criar grumos. Junta-se o leite em viviam reunidas por concessão de D. Afonso Henriques, fio e leva-se a lume muito baixo, sem parar de mexer. para se instalar no mosteiro de Santos, em Lisboa. Quando o creme ficar espesso, retira-se do calor e As primeiras bruxas seriam, certamente analfabetas, deixa-se arrefecer. Junta-se um pouco de essência mas, mais próximo de nós, terão começado a consultar de baunilha. Recheia-se a massa com o creme de o “Livro de São Cipriano”, para aprofundar os seus pasteleiro, Leva-se ao forno, a baixa temperatura e conhecimentos. A primeira cujo nome é conhecido, decora-se com o creme de chocolate. Para fazer o Ana Lérias, da Aldeia das Neves, viveu no século XIX creme de chocolate levam-se as natas ao lume até e conhecia bem as plantas características da zona da ferver. Depois tiram-se do lume e coloca-se o choco- Arruda dos Vinhos, como a erva arruda, as malvas, as late partido aos bocados. Mexe-se até se obter um barbas de milho, a hortelã e as tádigas. Também ela creme57. legou os seus saberes a uma filha que, por sua vez, os transmitiu à geração seguinte, Adelaide Piedade Louro, Pode acompanhar as Bruxas de Arruda com o vinho como foi confirmado pelo seu próprio neto. Inspirado generoso de Carcavelos ou com o vinho licoroso da pelas personagens desta tradição, o senhor Ramalheira, região de Óbidos. proprietário da Pastelaria Flamingo, na Arruda dos Vinhos, criou um bolo a que deu o nome de “Bruxas da Arruda”.

249 UVADA

A Uvada é um doce que antigamente era confeccionado Ingredientes nas casas agrícolas produtoras de vinho da região Oeste, Mosto de uvas tintas; maçãs ou outros frutos da durante a época das vindimas, em Setembro e Outubro. época das vindimas, pau de canela e cravos de A sua origem é desconhecida, mas sabe-se de um registo cabecinha de 1939, realizado por Hipólito da Costa Cabaço, em resposta a um pedido da Câmara Municipal de Preparação Alenquer, segundo o qual, para fazer Uvada, podia Num tacho deita-se o mosto das uvas e as frutas juntar-se ao mosto “pêros, pêras, abóbora menina previamente cortadas em bocados grosseiros e ou outros frutos, vai ao fôgo até ficar uma espécie de limpas de caroços. Põe-se o tacho ao lume e mexe- marmelada, junta-se-lhe cravos de cabecinha e canela se sempre, para não pegar. Deixa-se ferver em lume em pau”. Não leva açúcar porque é feita com o mosto brando até ter uma consistência de pasta grossa, o da uva concentrado, ou “arrobe”, nomeadamente das que se percebe arrastando a colher de pau no fundo castas Fernão Pires e Periquita, ao qual se junta canela e do tacho e verificando se abre “estrada”, como se faz fruta, em geral maçãs de varidades regionais, que seriam para a marmelada. Repinaldo, Malápio e Bravo de Esmolfe, mas, com o desaparecimento quase completo destas variedades, Coloca-se o doce em tijelas de barro vidrado e cobre- utiliza-se actualmente a maçã Golden Delicious. se com papel vegetal embebido em aguardente. A Uvada conserva-se de um ano para o outro e é consumida para barrar pão ou acompanhar frutos secos.

A recuperação da receita deste doce tradicional da região Oeste é da responsabilidade dos técnicos do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária.

251 Produto Regional BOLO DOS GENERAIS

As ambições de Napoleão Bonaparte eram muito aliadas, numas instalações agrícolas cedidas, para o claras quando em 1807 expediu as suas legiões para efeito, pelos proprietários. Pediu então à sua anfitriã solo português. Aliado à coroa espanhola, pretendia que lhe confeccionasse o seu bolo preferido. Consta dividir o reino de Portugal de modo a, indirectamen- que o General, ao provar o bolo, terá exclamado que te, atingir os interesses comerciais do Reino Unido. era o mais saboroso que jamais havia provado. Tal Com a estratégia montada e com o mapa do terri- elogio deve-se, certamente, ao facto de os ingredien- tório luso riscado pelas linhas estabelecidas pelo tes serem produzidos nesta região do Bombarral, Tratado de Fontainebleau, que o fragmentavam em Oeste de Portugal, cujo microclima específico influi três novas unidades políticas em benefício de Maria nas suas características, tornando-os únicos. Luísa, filha de Carlos IV de Espanha, de Manuel de Godoy, seu primeiro-ministro, e do império francês, o A Casa Agrícola J. Nicolau, à qual, há muitos anos, general Jean-Andoche Junot, ao comando das tropas foi confiada esta receita por um descendente directo gaulesas, cruzou a fronteira portuguesa a 20 de dos proprietários das instalações onde decorreu Novembro. A fraca resistência que as hostes inva- a célebre reunião, situadas perto da povoação da soras encontraram no terreno permitiu que Lisboa Roliça, tenta reproduzir artesanalmente e o melhor caísse dez dias mais tarde. que sabe este maravilhoso bolo que, dados os factos, considera parte da história e do património cultural Foi no início de Agosto de 1808 que as tropas desta região. inglesas, chefiadas por Sir Arthur Wellesley, futuro duque de Wellington, desembarcaram na Figueira da Esta é uma receita registada, por essa razão só é Foz para, juntamente com a resistência portuguesa, possível referir os ingredientes utilizados: mel, ovos, fazer frente às forças ocupantes. Informado do de- manteiga, açúcar, farinha, cerejas, pêras, passas de sembarque, Junot enviou o General Delaborde para uva, miolo de pinhão, miolo de noz, miolo de amên- impedir o avanço inimigo. O corpo expedicionário doa, arrobe de uva, laranja, limão, vinhos licorosos, de Wellesley rumou para Sul e, no dia 16 de Agosto, fermento de pão. perto da povoação da Roliça foram avistadas as primeiras tropas francesas.

Para preparar o confronto que se antevia, nesse dia o General Sir Arthur Wellesley comandante do exército luso-britânico, reuniu com os oficiais Generais que compunham o comando estratégico das forças

253 Produto Regional AGUARDENTE DOC LOURINHÃ

Em 1992 foi criada a Região Demarcada de de aguardente. O envelhecimento efectua-se igual- Aguardente Vínica de Qualidade com Denominação mente na região, exclusivamente em barris de carva- de Origem Controlada (DOC), Lourinhã, que abran- lho e de castanho, com capacidade até 800 litros. A ge todo o concelho da Lourinhã e as freguesias aguardente é normalmente branca e é o estágio nos limítrofes de Vale Covo (Bombarral), Serra d’el Rei cascos que a faz ganhar cor. Esta aguardente não e Atouguia da Baleia (Peniche), Campelos (Torres pode ser comercializada antes de cumpridos vinte e Vedras) e Olho Marinho (Óbidos). quatro meses mínimos de envelhecimento, ainda que a média seja de sete anos. Ou seja, na Lourinhã só se Esta é a primeira e única Região Demarcada do País faz aguardente X.O. com, pelo menos, cinco anos de exclusivamente para a produção de Aguardentes, a envelhecimento, embora existam ainda as categorias que acresce o facto de ser uma das três existentes V.S. com três e V.S.O.P. com quatro. no espaço europeu, em posição de igualdade com as célebres aguardentes francesas das regiões de Em 2004, foi criada a Colegiada de Nossa Senhora Cognac e de Armagnac. da Anunciação da Lourinhã, que assume como principal objectivo a defesa, o prestígio, a valorização, A Aguardente DOC Lourinhã é produzida a partir a promoção e a divulgação da Aguardente Vínica da de vinhos elaborados com uvas brancas e tintas Região Demarcada da Lourinhã. das castas autorizadas e recomendadas, que são Alicante, Alvadurão, Broal Espinho, Marquinhas, Recorde-se que, durante mais de 200 anos, as casas Malvasia Rei (Seminário), Tália, Cercial, Fernão produtoras dos melhores Vinhos do Porto benefi- Pires, Rabo de Ovelha, Siria (Roupeiro), Seara Nova ciaram da Aguardente da Lourinhã para produzir os e Vital, nas brancas, e Cabinda, Carignan, Periquita seus afamados vinhos licorosos. e Tinta Miúda, nas tintas. Só recebem a menção DOC Lourinhã, atribuída pela Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa, as aguardentes que respeitarem as condições de solo, as características de cultivo e as tecnologia de vinificação, conservação, destilação, envelhecimento e engarrafamento instituídas pela legislação.

Ao fim de um mês, o vinho segue para destilação. Em média, com 10 litros de vinho produz-se um litro

255 Produto Regional LICOR DE GINJA OU GINGINHA

Pensa-se que a ginja, também conhecida por Este licor encontra a sua origem, provavelmente, cereja ácida, é procedente da Ásia Menor, sendo na actividade doceira e licoreira dos conventos, no já comum em Portugal nos séculos XV e XVI. José século XVII, e a sua popularidade e consequente Leite de Vasconcelos relata na sua obra “Etnografia comercialização estará relacionada, no caso de Portuguesa” uma passagem de Ruy Fernandes, Óbidos, com o início do turismo nos anos 60 do do século XVI, referindo as ginjas garrafais de século XX. Por iniciativa de um comerciante de nome Lamego, o que testemunha a sua presença nos Montez, propriatário de uma loja de antiguidades e hábitos alimentares dos portugueses por alturas velharias, foi inaugurado o primeiro bar na vila, o “Ibn do Renascimento. Este pequeno fruto redondo, de Errik Rex”, ponto de encontro da classe abastada da cor vermelha, com sabor agridoce, é produzido, região, que promoveu o Licor de Ginja a bebida da em Portugal, essencialmente na região Oeste. As casa, com grande adesão por parte dos apreciadores. árvores, de nome ginjeiras, entram em produção ao Rapidamente a oferta alargou-se a outros bares que, fim do quarto ou quinto ano de plantação, alcançan- entretanto, abriram e passaram a competir entre si, do a produção máxima entre o sétimo e o décimo em busca da «melhor Ginja». ano, período em que, em pomares bem cuidados, os ginjais, podem ser colhidos 10 a 15 quilos de gin- Já em Alcobaça, surgiu na década de 20 do século jas por árvore. A floração da ginjeira, que no Oeste passado o ainda hoje famoso Licor de Ginja M.S.R., ocorre normalmente em Fevereiro, justifica passeios a partir das iniciais do nome de Manuel de Sousa só para admirar as lindíssimas imagens proporcio- Ribeiro, seu criador. Esta variedade é comercializada nadas pelas manchas de flores brancas. A colheita, numa peculiar garrafa de forma cónica, que foi dese- realizada em Junho, durante cerca de vinte dias, deve nhada no início da década de 30 do século passado, ser manual e mantendo inteiro o pedúnculo do fruto. registando imediatamente um grande sucesso, o que Como indicadores da melhor data para a colheita, constituiu um importante contributo promocional. podem ser utilizados dois critérios: a cor dos frutos, Num folheto de promoção, a empresa destacava vermelha em toda a superfície, ou o seu nível de que esta Ginja é ”a melhor, por ser fabricada com a açúcar, medido por um refractómetro. essência do próprio fruto”, o que leva a crer que, já na altura, se produziam licores de ginja com corantes. Alcobaça e Óbidos são as grandes referências geo- gráficas da produção de Licor de Ginja, ou Ginjinha, De Alcobaça ou de Óbidos, «com ou sem elas», a como também é conhecida esta bebida, que é já um Ginja do Oeste ganhou já um lugar de destaque atractivo turístico nos dois destinos da região Oeste, entre as bebidas tradicionais portuguesas58. mas também na Baixa da cidade de Lisboa.

257 Produto Regional MAÇÃ DE ALCOBAÇA

A história agrícola da região de Alcobaça começa Alcobaça, Golden Delicious, Granny Smith e Reineta em 1154, com a doação, por D. Afonso Henriques, à Parda. A sua produção obedece a uma estratégia Ordem de Claraval, das terras onde foi construído o inovadora, racional e controlada, que permite me- Mosteiro de Santa Maria. Provavelmente, os primei- lhorar a qualidade, proporcionar segurança alimen- ros monges já teriam encontrado campos cultivados tar e contribuir para o equilíbrio ecológico do meio por populações autóctones, mas com pouco signifi- ambiente. Assim, o combate às pragas e às doenças cado. Desde o início da sua instalação no Mosteiro, das árvores é feito através de meios de luta cultural, os monges de Cister terão reconhecido nas terras biotécnica e biológica, alternativos ao uso de pestici- da região, situada entre a serra e o mar, condições das, respeitando o ciclo natural da vida, o ambiente e atmosféricas óptimas para o cultivo de maçãs. Esta a saúde do consumidor. tradição de séculos fez com que Alcobaça ficasse co- nhecida como “terra de maçãs”, produto que impreg- A maçã é colhida normalmente entre os finais de nou a cultura das suas gentes. Curiosamente, a área Agosto e meados de Outubro e, para além dos habi- ocupada pelos Coutos de Alcobaça é sensivelmente tuais processos de embalamento e de comercializa- igual à que hoje se indica como delimitação para a ção da fruta, são várias as empresas da região que produção da Maçã de Alcobaça. têm procurado inovar na oferta de maçã no mercado, criando novas formas de consumo deste produto, Actualmente, a Maçã de Alcobaça é uma das como sumos naturais, purés, maçã fatiada, compo- riquezas da região e encontra-se sob Indicação tas, tarte de maçã. Geográfica Protegida, que abrange cerca de catorze concelhos, mas a esta é a mais famosa das maçãs portuguesas incluídas nesta distinção. A existência de um sistema de controlo e certificação garante que só podem beneficiar do uso da IGP as maçãs obtidas em pomares para o efeito autorizados pela Associação dos Produtores da Maçã de Alcobaça (APMA), devendo os produtores obedecer a um con- junto de requisitos. Qualificada pela União Europeia e pelo Ministério da Agricultura em 1994, esta maçã possui características únicas, com um sabor agrido- ce e um aroma intenso. Apresenta-se nas variedades Royal Gala, Delicious, Jonagold, Fuji, Casanova de

259 Produto Regional PÊRA ROCHA

De acordo com a tradição, foi em 1836 que Pedro a diversos pratos salgados, nomeadamente de caça. António Rocha identificou, numa sua propriedade em No campo das sobremesas, as mais conhecidas são Sintra, uma pereira diferente, cujos frutos eram de as chamadas «peras bêbedas», cozidas em calda uma qualidade invulgar e aos quais deu a designação açucarada, feita com os mais diversos tipos de vinho, de Pêra Rocha, a partir do seu próprio nome. Como a que pode ser tinto, branco, Porto, Moscatel… região Oeste se mostrou particularmente apta para o seu cultivo, foi-lhe atribuída a Denominação de Para conservação, deve ser guardada no frigorífico, Origem Protegida (DOP), delimitando uma área geo- na prateleira inferior, dentro da gaveta de frutas e gráfica com um saber-fazer reconhecido, na qual se vegetais. Se o período de conservação for superior a concentra a produção desta variedade de pêra. Aqui, dez dias, não se deve misturar com outros frutos, tais destaca-se o concelho do Cadaval, com uma área como bananas ou kiwis, porque acelera a maturação de cultivo de 2073 hectares, e o do Bombarral, com das outras frutas. uma área plantada de 1934 hectares. Pertence a esta região a responsabilidade de exportação de mais de 50000 toneladas de Pêra Rocha para toda a Europa, Canadá e Brasil. É colhida normalmente em Agosto.

Nas definições oficiais, a Pêra Rocha do Oeste é apresentada como um fruto de “polpa de côr branca, macia, fundente, granulosa, doce, não ácida, muito sucosa, de perfume ligeiramente acentuado e com a epiderme amarelo-clara, por vezes com uma mancha tenuemente rosada do lado do sol”.

Quando está mais verde, a Pêra Rocha é crocante. Quando está mais madura, adquire um tom amarela- do, tornando-se mais doce, macia e sumarenta.

Para além de consumida e muito apreciada como qualquer outra peça de fruta, a Pêra Rocha do Oeste também pode ser usada em saladas, pudins, compo- tas, iogurtes ou mesmo servir de acompanhamento

261 Produto Regional MEL DO MONTEJUNTO

A Serra de Montejunto foi a primeira área de pai- descongestionar as vias respiratórias. Mas, em geral, sagem protegida de âmbito regional em Portugal. a sua textura é líquida, de um castanho muito claro, Localiza-se no concelho do Cadaval, a norte do entre o amarelo e o dourado. concelho de Alenquer. É um verdadeiro ecossiste- ma de montanha, que conserva ciosamente as suas O Mel foi utilizado como adoçante desde a lendas, como a crença em lobisomens, e as suas Antiguidade, só começando a ser suplantado pelo tradições, como a actividade ancestral da apicultura. açúcar no século XVI, com a introdução da cultura A produção de mel na Serra já se encontra registada da cana-do-açúcar. Mas hoje em dia continua a ser nas alcavalas dos forais que os povos de Montejunto apreciado, não apenas pela sua riqueza em termos tinham que pagar, o que permite calcular a importân- nutricionais, mas também pela sua versatilidade na cia que o mel assumia na economia da região, a par culinária e na doçaria. dos cereais, do vinho e do gado. Guardado fora do frigorífico e em locais sem humi- Os apicultores da Serra de Montejunto dividem o dade conserva-se durante muito tempo. terreno em Serra de Baixo e Serra de Cima. Durante o Inverno, em que os dias são mais curtos, mais frios e há mais vento, as abelhas que habitam as colmeias da Serra de Cima trabalham menos e a quantidade de Mel recolhida das plantas típicas do topo da serra, como o alecrim, é em menor quantidade.

Os pastos e as flores silvestres continuam a alimen- tar as abelhas, conferindo ao Mel cor, paladar, tex- turas e propriedades diferentes. Assim, ao longo do ano, na composição do Mel, registam-se variações na predominância de determinadas plantas que, sa- zonalmente, são polinizadas pelas abelhas. De Março a Maio é o alecrim que abunda, enquanto em Junho e Julho é a época das silvas com as amoras pretas, que contêm anti-oxidantes; de Agosto a Setembro predo- minam as tádigas e de Novembro a Março o eucalip- to, cujas propriedades, como o eucaliptol, ajudam a

263 Produto Regional PEIXE SECO OU ENJOADO

Apesar de ser uma das principais imagens turísticas O Peixe Enjoado é preparado da mesma maneira, da Nazaré relacionadas com a vida dos pescadores mas passa apenas um dia ao sol, ficando apenas e suas famílias, o peixe preparado ao ar e ao sol da meio seco ou enjoado. A espécie mais utilizada praia é um produto pouco conhecido dos gastróno- para esta secagem é o carapau de tamanho médio. mos em geral, sendo os nazarenos e os que habi- Acompanha com batata cozida e é regado com azei- tualmente com eles convivem à mesa quem o sabe te e vinagre ou com uma cebolada. apreciar, pois os restaurantes apostam pouco na sua inclusão nas ementas. É a sul da praia, quase em frente ao Centro Cultural da Nazaré, que se encontra o “estindarte”, ou seja, A tradição de secar o pescado em excesso é de ori- o estendal de secagem de pescado, onde as várias gem desconhecida, mas antigamente seria a melhor peixeiras secam e vendem directamente, tanto aos maneira de conservar o peixe para os dias de es- locais como aos visitantes, o peixe ali exposto. cassez. Era desta forma que as peixeiras garantiam sustento para as famílias, num procedimento que O Peixe Seco tem um grande potencial gastronómi- também lhes permitia ter peixe para vender noutros co, podendo ser comido cru, cozido, com batatas às mercados. rodelas, sobre um refogado ou, melhor ainda, leve- mente aquecido nas brasas, temperado com azeite, Na Nazaré, distinguem-se duas formas de seca- vinagre e alho migado e comido sobre fatias de pão. gem: o Peixe Seco e o Peixe Enjoado, com carate- Com este peixe, faz-se ainda um outro prato típico rísticas de preparação e de consumo relativamente e muito apreciado na Nazaré, a Sopa de Carapaus diferentes. Secos.

Começa-se por amanhar o peixe para lhe retirar as tripas. Depois, é lavado e passado por uma salmoura feita com água e sal grosso, ou com água do mar, como dantes se fazia. Seguidamente, é aberto ou escalado e, finalmente, estendido nos “paneiros” e posto ao sol. A secagem demora de dois a três dias, dependendo das condições atmosféricas e da tem- peratura do ar. Este tipo de peixe pode ser comido cru ou desfiado, mas, normalmente, é cozido, acom- panhado de batata cozida com pele e regado com azeite e vinagre ou sumo de limão e alho picado.

265 267 FONTES

1. Manuel P. das Neves, Sabores da Região Leiria-Fátima 32. Maré Cheia n.º 16 – Abril de 2005 2 Fonte: Câmara Municipal de Torres Novas / restaurante 33 Celeste Cavaleiro, Idem Zé das Enguias, do Boquilobo 34. Celeste Cavaleiro, Idem 3. Isabel Amado, Nas cozinhas das avós,1993 35 Celeste Cavaleiro, Idem 4. Fonte: Junta de Freguesia da Serra 36. Maré Cheia n.º 8 – Agosto de 2004 5. Manuel P. das Neves, Sabores da Região Leiria-Fátima 37 Odília Costa Pina, Eu…A Culinária Tradicional de 6. Ana Soeiro (coord.), Produtos Tradicionais Portugueses Alcochete, Apresento-me 7. Fonte: Câmara Municipal de Torres Novas 38 Celeste Cavaleiro, Idem 8. Fonte: Adega do Cocharradas / J.F. do Cartaxo 39. Celeste Cavaleiro, Idem 9. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo 40. Celeste Cavaleiro, Idem 10. Fonte: APRODER 41. Odília Costa Pina, Idem 11. Fonte: Confraria Gastronómica do Ribatejo 42. Maré Cheia n.º 5 – Maio de 2004 12. Felícia Costa; António José Costa e Silva, Rio Maior: 43. Fonte: Câmara Municipal de Sesimbra Sabores da Terra 44. Celeste Cavaleiro, Idem 13. Fonte: APRODER 45. Fonte: Câmara Municipal de Palmela (Lourdes 14. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo Machado) 15. Felícia Costa; António José Costa e Silva, Idem 46. Ana Soeiro (coord.), Idem 16. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo 47. Fonte: Comissão Vitivinícola Regional da Península de 17. Fonte: APRODER Setúbal 18. Fonte: Câmara Municipal da Azambuja 48. Fonte: Câmara Municipal da Nazaré 19. Fonte: APRODER 49. Fonte: Câmara Municipal de Óbidos 20. José Labaredas, Coruche à Mesa e Outros Manjares 50. Fonte: Câmara Municipal de Peniche 21. Fonte: Câmara Municipal de Almeirim / José Manuel 51. Receita criada pelo Chefe Luis Tarenta da Escola de Toucinho Hotelaria e Turismo do Oeste - Caldas da Rainha 22. Fonte: Câmara Municipal de Salvaterra de Magos 52. «101 receitas experimentadas» - MAM 23. Augusto do Souto Barreiros, Azinhaga: Livro de Horas 53. António Rosado Silva (chef Silva), Doçaria Conventual 24. José Labaredas, Idem na Mostra de Alcobaça / Pastelaria Alcoa 25. Fonte: Junta de Freguesia de Fazendas de Almeirim 54. Casimiro de Almeida, Roteiro Cultural da Região de 26. José Labaredas, Idem Alcobaça 27. Fonte: Câmara Municipal de Alpiarça 55. Maria de Lurdes Modesto, Cozinha Tradicional 28. Fonte: Câmara Municipal de Salvaterra de Magos Portuguesa 29. Fonte: Câmara Municipal de Palmela / Chefe Helder 56. Fonte: Pastelaria Flamingo Martins 57. Paulo Moreiras, Justino Sobreiro e Gonçalo Lopes, O 30. Fonte: Câmara Municipal do Montijo elogio da Ginja 31. Celeste Cavaleiro, Sabores da Costa Azul: Gastronomia 58. Fonte: Câmara Municipal da Nazaré de uma Região

269 271 ASSOCIAÇÕES PROMOTORAS Associação para o Associação para a Promoção Associação para a Associação para o desenvolvimento integrado do Desenvolvimento Rural Promoção Rural Desenvolvimento Rural do Ribatejo Norte do Ribatejo da Charneca Ribatejana da Península de Setúbal

A Associação para o Desenvolvimento Integrado do A APRODER , constituída em Dezembro de 1991, de acordo Em 9 de Agosto de 1994, na vila de Coruche, e por vontade A ADREPES é uma associação de direito privado, sem fins Ribatejo Norte foi constituída em 3 de Setembro de 1991 com os seus Estatutos, tem como objectivo geral promover de quatro associações fundadoras, foi lavrada a escritura lucrativos, que tem como objectivo a promoção e a realiza- por dezanove entidades que assinaram a escritura pública o território da sua zona de intervenção, especificamente: de constituição da Associação para a Promoção Rural da ção do desenvolvimento rural na Península de Setúbal. desta associação. A ADIRN é uma entidade de direito pri- prestar assistência técnica; promover e executar acções de Charneca Ribatejana, no sentido lato de um mais harmo- Foi fundada em 27 de Novembro de 2001 por um conjunto vado e sem fins lucrativos que, apoiada nos conhecimentos formação; divulgar informação; motivar e apoiar iniciativas nioso e acelerado desenvolvimento rural. de onze entidades, públicas e privadas, representativas das e experiência dos seus associados, desenvolve projectos e tendentes à criação e ao desenvolvimento de pequenas e Hoje, um total de dezassete entidades colectivas constitui a populações e dos produtores locais, que se constituíram em iniciativas que têm em vista o desenvolvimento integrado e médias empresas, artesanato e serviços de apoio em zonas nossa parceria numa mesma vontade de tudo fazer por um Grupo de Acção Local (GAL) e, simultaneamente, também a melhoria das condições de vida da população residente. rurais; promover o turismo rural; fomentar a valorização território de 3.029 km2 e com 117.785 habitantes (Censos em núcleo fundador da ADREPES. A actividade da ADIRN tem-se direccionado essencial- e a certificação de produtos agrícolas, agro-alimentares, flo- de 2011). A sua actividade tem decorrido no âmbito de diversos mente para a gestão de programas de desenvolvimento restais e outros produtos tradicionais da região; constituir- Desenvolvendo-se em 26 freguesias de sete concelhos - programas comunitários, merecendo destaque o EQUAL e local que privilegiam a área do turismo, a valorização dos se como entidade gestora do programa de Ligação Entre Almeirim, Alpiarça, Benavente, Chamusca, Coruche, Golegã o Leader +. produtos locais e do artesanato, a preservação ambiental, a Acções de Desenvolvimento da Economia Rural, vulgo, e Salvaterra de Magos -, a nossa área de intervenção Em outubro de 2008, com a aprovação da sua Estratégia acção social e a formação profissional. Programa LEADER, e/ou outros programas de desenvolvi- respondeu no LEADER + e, comparativamente com todas Local de Desenvolvimento, foi-lhe atribuída a gestão do Serras rochosas, rios tranquilos, paisagens admiráveis e mento de interesse para a região, nos termos dos mesmos. as outras, ao maior investimento privado de todo o território Eixo 3 do PRODER na Península de Setúbal. vales frondosos, vilas e cidades de encantar, monumen- Com uma área de cerca de 1.250 Km2, o território de nacional. A Península de Setúbal está enquadrada por diversas áreas tos preciosos – eis a região do Ribatejo Norte em todo o intervenção da APRODER insere-se na região normalmen- Notável por muitas razões, a Charneca Ribatejana impres- naturais classificadas: a Norte, pelo Estuário do Tejo, a Sul, esplendor da sua beleza e contraste. te designada por Ribatejo e é composto pelos concelhos siona pelo modo como, a dois passos de Lisboa, manteve pelo Estuário do Sado e pela Serra da Arrábida, a Oeste, Com as Serras D’Aire e Candeeiros a ladeá-la a ocidente, de Azambuja, Cartaxo, Rio Maior e Santarém (excepto o uma vincada identidade cultural e não se deixou asfixiar pela Lagoa de Albufeira e a Este, por diversos Corredores o tipicismo desta região revela-se em aldeias e cidades: núcleo urbano). pelo abraço da grande cidade. Ecológicos que unem Canha à Marateca, estendendo-se na de Dornes, em Ferreira do Zêzere, a Tomar, de Vila Nova Trata-se de um território de profunda matriz rural e de Nem a estrutura empresarial e fortemente mecanizada das direcção de Sesimbra. da Barquinha a Alcanena, de Ourém a Fátima passando grande importância do sector agrícola, tendo em conta que grandes explorações agrícolas conseguiu limitar e quebrar A Zona de Intervenção da ADREPES abrange vinte e uma por Torres Novas, com igrejas antigas e com castelos apresenta condições de produtividade agrícola das mais a fluidez dos grandes horizontes. O céu, a água e a terra freguesias de seis concelhos da Península de Setúbal, com misteriosos. elevadas do País. Em termos agro-florestais, assumem convivem numa rara harmonia a que nem falta o fogo das exclusão dos núcleos urbanos das freguesias de Pinhal especial importância as fileiras do azeite, do vinho e da forjas de ferrador para perfazer os quatro elementos essen- Novo (Palmela) e N.ª Sr.ª da Anunciada (Setúbal). floresta. No campo do turismo, o território revela um grande ciais à vida. A quem tivesse dúvidas sobre a autenticidade Concelhos: Alcochete, Moita, Montijo, Palmela, Sesimbra, potencial de atractividade turística, nomeadamente nas deste cenário, a naturalidade com que pastam em liberdade Setúbal. tradições ligadas ao toiro, ao cavalo e ao campino, que são os touros bravos, os cavalos Lusitanos e, nalgumas zonas, elementos emblemáticos e identitários da região, e no vasto os cavalos do Sorraia, diz tudo: este é o seu habitat. património existente.

Telefone: +351 249 310 040 Telefone: +351 243 333 869 Telefone: +351 243 619 060 Telefone: + 351 212 337 930 E-mail: [email protected] E-mail: [email protected] E-mail: [email protected] E-mail: [email protected] www.adirn.pt. www.aproder.pt www.charnecaribatejana.pt www.adrepes.pt

273 Leader Oeste Associação para o Desenvolvimento e Promoção Rural do Oeste

A Leader Oeste, associação privada sem fins lucrativos, foi criada em 1994 e tem como objecto social, resumida- mente, levar a cabo acções de dinamização no sentido do desenvolvimento local das freguesias mais rurais da região Oeste, com destaque para a implementação de projectos sociais, culturais e económicos que privilegiam os actores do meio local rural do Oeste. Regionalmente, a Leader Oeste distingue-se por ser gestora do programa Leader e, consequentemente, ser uma organização procurada pelos mais diversos agentes regionais pelo facto de apoiar financeiramente, e a fundo perdido, projectos que lhe sejam apresentados, elegíveis ao abrigo destas iniciativas da União Europeia. A associação tem um papel de serviço público que desempenha dentro de uma lógica funcional do associa- tivismo de direito privado, constituindo-se assim como uma organização diferente de outras organizações regio- nais, que, podendo ser de direito público, não possuem a mesma combinação de características. Os seus actuais 80 associados são todos pessoas colecti- vas com sede ou influência de acção na região. Indo ao encontro do seu objecto e tendo como base de operacio- nalidade os processos de desenvolvimento local onde a parceria é uma parte incontornável (Serafim, 1999), esta organização procura, desde da sua génese, ser represen- tativa dos diversos sectores sócio-económicos do Oeste.

Telefone: + 351 262 691 545 E-mail: [email protected] www.leaderoeste.pt

275 BIBLIOGRAFIA

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277 FICHA TÉCNICA

Direcção do Projecto Produção Adirn Inês Pérez Adrepes António Gonçalves Aproder Charneca Ribatejana Execução Culinária Leader Oeste Marília Ana Leite Maria Teresa Pérez Coordenação do Projecto Helena Semedo Take One Deolinda Loureiro de Matos Maria Luíza da Gama Santos Selecção e recolha do receituário Amilcar Malhó Cenografia e Acessórios Maria Luíza da Gama Santos Texto Joana Gonçalves Maria Teresa Vieira Pereira Maria Teresa Vieira Pereira Joana Gonçalves Amilcar Malhó Design Gráfico e Paginação Joana Gonçalves Investigação Pedro Gonçalves Maria Teresa Vieira Pereira Rita Féria Joana Gonçalves Amilcar Malhó Pós-Produção Fotográfica Isabel Amado Take One Pedro Sampaio Vanessa Godinho Impressão GIO Gabinete de lmpressão Offset, Lda. Revisão do Texto Mariana Sarmento Pimentel Maria Isabel Baptista-Ferreira

Fotografia Take One Espólio fotográfico de João Vieira Pereira +351 216 086 971 [email protected] Fotografia e Arranjo dos Pratos www.takeone.pt Joana Gonçalves António Maria Gonçalves Depósito Legal : 377772/14 ISBN: 978-989-98148-3-7 Ilustrações Joana Gonçalves Impresso em Julho de 2014

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