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Índice

Editorial 2 Noticiário SPQ Entrevista 25 Medalhas na XVII Olimpíada Ibero-Americana de Química 3 11.o Encontro de Química dos Alimentos 4 Entrevista ao Prof. José Empis, XXIV IUPAC Symposium on Photochemistry 6 vencedor do EuCheMS Award for International Symposium on Metal Complexes (ISMEC2012) 7 Service 2012, pela sua contribuição Simpósio de Homenagem ao Prof. Doutor Fernando Ramôa Ribeiro 9 para a EuCheMS. 3rd ITQB PhD Students’ Meeting 10 Encontros de RMN em Aveiro 11 4th EuCheMS Congress 12 4th EuCheMS Career Days 14 e Brian Kobilka são os Laureados com o Prémio Nobel da Química 2012 pelos “Estudos Sobre os Recetores Acoplados à Proteína G” 14 Ier METROCOL - Apadrinhamento do Laboratório de Química e Biomedicina do Instituto Nacional de Metrologia da Colômbia 16 Falecimento do Professor Manuel Ribeiro da Silva 16 Ano Internacional da Química Ano Internacional da Química no Brasil 17 Livros e Multimédia Life on the Edge. Peter Danckwerts GC MBE FRS brave,shy, brilliant Sebastião J. Formosinho 21 Ensino Experimental das Ciências. Um Guia para Professores do Ensino Secundário. Física e Química Maria Helena Caldeira 22 Histórias com Química Artigo 33 João Paiva 23 Entrevista Os alergénios alimentares como um José Empis ‒ Vencedor do Prémio EuCheMS Award for Service 2012 problema emergente de saúde pública: Entrevista conduzida por Aida Moreira da Silva 25 o que são, o que provocam e como Livia Sarkadi ‒ Presidente da Divisão de Química Alimentar da EuCheMS detetá-los? Entrevista conduzida por Joana Amaral 29 Artigos Alergénios Alimentares: o que São, o que Provocam e como Detetá-Los? Joana Costa, Maria Beatriz P.P. Oliveira e Isabel Mafra 33 Desenvolvimento de Metodologias para a Produção de Vinho sem Adição de Anidrido Sulfuroso Cláudia Nunes, Ângela Cunha, Élia Maricato, Mickael C. Santos, José A. Lopes da Silva, Sónia Mendo, Sílvia M. Rocha, Jorge A. Saraiva e 39 Manuel A. Coimbra Desenvolvimento de um Ingrediente Alimentar Funcional: Caracterização por Aniquilação do Positrão M.F. Ferreira Marques, C.I.C. Galhano e A. Moreira da Silva 45 Novas Formas para Velhos Fármacos Vânia André 51 As Conversas de Jane João Paulo André 57 Química e Ensino Identificação de “Pós Brancos” usando “Produtos Químicos Domésticos”: Uma Atividade para Motivar o Interesse pela Química Regina M.S. Sousa, Paulo Ribeiro Claro e Brian J. Goodfellow 65 Química e Ensino 71 Ensinar Química com Telemóveis Inteligentes: a Tabela Periódica em Código QR Vasco D.B. Bonifácio 71 A Tabela Periódica em código QR: uma Módulos Inquiry nova metodologia de ensino Módulos Inquiry: Desenvolvimento e Utilização para todos os alunos, em especial de Recursos Educativos para a Potenciação do Inquiry cegos e amblíopes. Based-Learning no Ensino da Química Carla Morais, João Paiva e Nuno Francisco 73 “Precisas de Química para Seres um Bom Cirurgião Ortopedista?” módulo inquiry para o estudo do equilíbrio químico de oxidação-redução Carla Morais, Nuno Francisco e João Paiva 78 Química para os Mais Novos 81 Marta C. Corvo Destaques 85 Agenda 88

Química 127 - out/dez 12 1 Editorial

Boletim da Sociedade Portuguesa de Química

Textos Segundo o Novo Acordo Ortográfico Helder Gomes Propriedade de [email protected] Sociedade Portuguesa de Química ISSN 0870 – 1180 www.spq.pt Registo na ERC n.º 125 525 Depósito Legal n.º 51 420/91 Publicação Trimestral N.º 127, out – dez 2012 O final de ano é tradicionalmente a altura propícia para a realização de balanços sobre o passado e de reflexões sobre o futuro. A nível social, o ano de 2012 ficará certamente Redacção e Administração Av. da República, 45 – 3.º Esq. marcado pelo aumento do desemprego, pela diminuição das disponibilidades financeiras 1050–187 Lisboa das famílias e pelo aumento de tensões em vários setores da atividade económica. Neste Tel.: 217 934 637 Fax: 217 952 349 contexto, 2013 surge ameaçador, exigindo flexibilização de políticas e sinais notórios de [email protected] inversão da situação económica do país, sob pena de rutura social. Em particular, os www.spq.pt cortes previstos no orçamento de estado do ensino superior para 2013, em discussão na Assembleia da República no momento em que escrevo estas linhas, cuja proposta inicial rondavam em média 9,4%, continuam a ameaçar o funcionamento das instituições, a sus- Editor Helder Gomes tentabilidade do sistema de ensino superior e a capacidade de inovação e de desenvol- vimento tecnológico do país. Por outro lado, em tónica positiva, a Química e a Sociedade Editores-Adjuntos Portuguesa de Química deixam na memória várias boas notícias em 2012. Pela primeira Carlos Baleizão vez na história da participação de equipas portuguesas na Olimpíada Ibero-americana de Carlos Folhadela Joana Amaral Química, os nossos representantes trouxeram para casa quatro medalhas, uma de prata João Paiva e três de bronze. Tal feito mereceu destaque na primeira página de um jornal de grande circulação nacional e referência num popular espaço de comentário político na televisão, Comissão Editorial Jorge Morgado realçando a importância do esforço dos jovens na obtenção de bons resultados e que Hugh Burrows deles depende também o sucesso do país. 2012 fica também marcado pela comemora- Joaquim L. Faria ção oficial do centenário da SPQ, que teve como seu ponto alto uma Assembleia Geral Ana Lobo M. N. Berberan e Santos, Extraordinária no Amphiteatro de Chimica da Escola Polytechnica, no dia 9 de fevereiro, A. Nunes dos Santos o mesmo local onde foi realizada a primeira reunião da SPQ. Muitas outras boas notícias marcaram o ano, como podem ser recordadas nas páginas do QUÍMICA. Esperamos que 2013 seja também um bom ano para a Química, uma ciência central para o desenvolvi- Publicidade Leonardo Mendes mento sustentável da humanidade. Sem ela não seria possível vencer os desafios globais Tel.: 217 934 637 que o mundo enfrenta, como a necessidade de garantir alimentação em quantidade e Fax: 217 952 349 [email protected] qualidade para uma população mundial em grande crescimento.

Design Gráfico e Paginação O presente fascículo foi idealizado e preparado para dar precisamente destaque à Quí- Paula Martins mica dos Alimentos. São vários os desafios identificados e incentivados pela União Eu- ropeia, entre os quais no domínio da produção de alimentos, de doenças relacionadas Impressão e Acabamento com a dieta, segurança, etc. No sentido de melhor compreendermos a importância destes Tipografia Lousanense Rua Júlio Ribeiro dos Santos - Apartado 6 desafios, tivemos o prazer de entrevistar a Dr. Livia Sarkadi, Presidente da Divisão de 3200-901 Lousã - Portugal Química Alimentar da EuCheMS, que nos falou do papel da Divisão e dos Químicos Ali- Tel.: 239 990 260 Fax: 239 990 279 mentares em geral, entre outros assuntos, no desenvolvimento desta importante área do [email protected] conhecimento. Publicamos também uma entrevista ao Prof. José Empis, recentemente galardoado com o Prémio “EuCheMS Award for Service”, como reconhecimento da sua Tiragem contribuição na EuCheMS. A aludir ao tema deste fascículo poderá ainda encontrar três 1655 exemplares artigos completos. O primeiro aborda a questão das alergias alimentares, que tem vindo a aumentar nos últimos anos, apresentando-se atualmente como um problema emergen- Preço avulso te de saúde pública. Saiba o que são alergénios alimentares, o que provocam e como € 5,00 detetá-los. Os sulfitos, presentes no vinho devido a aditivos sulfurados que tem como Assinatura anual – quatro números € 18,00 objetivo garantir ao produto propriedades antisséticas e antioxidantes, são exemplos de (Continente, Açores e Madeira) compostos alérgicos para um crescente número de consumidores. No segundo artigo Distribuição Gratuita aos sócios da SPQ são apresentadas várias metodologias, nomeadamente a utilização de filmes à base de quitosana reticulados com genipina e a tecnologia de alta pressão hidrostática, que permi- As colaborações assinadas são da exclusiva tem conferir as desejadas propriedades ao vinho sem necessidade de recorrer a aditivos responsabilidade dos seus autores, não vinculando de forma alguma a SPQ, nem a Direção sulfurados. No terceiro artigo é abordada a definição de ingrediente alimentar funcional e do QUÍMICA. a utilização de técnicas avançadas para a sua caraterização. Encontrará ainda todas as São autorizadas e estimuladas todas as citações e outras seções a que habituamos os nossos leitores. transcrições, desde que seja indicada a fonte, sem prejuízo da necessária autorização por parte do(s) autor(es) quando se trate de colaborações Em pleno período de festas, aproveito a oportunidade para vos desejar um 2013 cheio de assinadas. A Orientação Editorial e as Normas de Colaboração boas notícias! podem ser encontradas no fascículo janeiro-março de cada ano e no sítio web da SPQ. Boa leitura!

Publicação subsidiada pela Errata

No artigo Afinidade Eletiva: Antoine-Laurent e Mme Lavoisier, da autoria do Professor Apoio do Programa Operacional Ciência, Jorge Calado (QUÍMICA 126 (2012) 13-19), o endereço de correio eletrónico saiu errado. Tecnologia, Inovação do Quadro Comunitário de Aqui fica o endereço correto ([email protected]) e um pedido de desculpas ao autor. Apoio III

2 Química 127 Noticiário SPQ

Medalhas na XVII Olimpíada Ibero-Americana de Química

Desta vez a química teve honras de primeira página num jornal diário de difusão nacional. Os quatro represen- tantes de Portugal na XVII Olimpíada Ibero-Americana de Química, que decorreu, de 22 a 30 de setembro de 2012, na cidade de Santa Fé, Argen- tina, obtiveram uma medalha de prata e três de bronze. A chegada da equi- pa portuguesa, no aeroporto de Fran- cisco Sá Carneiro, Porto, foi saudada com palmas entusiásticas dos familia- res e amigos dos premiados, ramos de flores, e entrevistas e fotografias dos jornalistas.

Como os jornalistas referiram na no- tícia do Jornal de Notícias do dia 2 de outubro de 2012, “não consta que estas atividades atraiam multidões”, Os alunos portugueses participantes na XVII Olimpíada Ibero-Americana de Química após mas é importante que sejam divulga- a atribuição das medalhas: João Pereira, Catarina Martins Costa, Carolina Gonçalves das nos órgãos de comunicação so- e Ricardo Rodrigues cial e que os jornalistas e diretores de final se realizou em maio na Universi- por mostrarem que sabem pensar. jornais reconheçam, que à semelhan- dade de Aveiro, e que foi noticiado no Esta é uma mais-valia para a sua vida ça dos jogos desportivos, outras ini- número 126 deste Boletim. futura e não somente serem um rece- ciativas devem ser notícia de primeira táculo de conhecimentos que com o página para servir de incentivo aos Nunca será demais reconhecer que o tempo poderão esquecer. Este facto jovens. É cada vez mais importante mérito é dos estudantes. É óbvio que é reconhecido pelos próprios alunos mostrar que o esforço intelectual tam- todos os envolvidos na sua formação, que nos enviam cartas de agradeci- bém vale a pena. pais e professores, contribuíram para mento onde podemos ler: o seu sucesso. Os pais apoiaram-nos Foi a primeira vez que a equipa por- e incentivaram-nos a saber cada vez “Tudo o que eu aprendi nas olimpía- tuguesa trouxe quatro medalhas. Não mais e melhor, e os professores de- das tem-me sido muito útil, não tanto devemos esquecer que já no ano de ram-lhes as bases científicas de que 2011 toda a equipa portuguesa tinha pelas matérias em si, mas sim pelas sido medalhada, mas devido a vicissi- precisavam, para além de muitos ou- capacidades de conseguir resolver tudes várias foi só constituída por três tros incentivos. Contudo, se não fos- problemas que fogem da normalidade estudantes. se o esforço e dedicação individual de do que estamos habituados a resol- cada estudante, qualquer empenho ver, ou, dito de outra forma, as olimpí- Este ano os medalhados foram o Ri- dos pais e professores não teria dado adas deram-me capacidade de, quan- cardo Jorge Pereira Rodrigues, com os resultados que aqui se celebram. do empanco nalgum problema nos a medalha de prata, que estudou na exames, conseguir olhar para eles de Escola Secundária Emídio Garcia de As Olimpíadas de Química constam outra perspetiva, e, às vezes, conse- Bragança, e, com medalhas de bron- de duas provas, uma prática, com a guir resolvê-los, e por isso, estou mui- ze, o João Pimenta Pereira, que es- duração de quatro horas, e uma teóri- to grato por tudo o que as Doutoras tudou na Escola Secundária D. Inês ca, com a duração de cinco horas. Se fizeram por mim.” de Castro em Alcobaça, a Catarina as compararmos com os jogos olímpi- da Cunha e Silva Martins Costa, que cos tratam-se de duas provas de fun- Mais do que as medalhas são estes estudou na Escola Secundária Soares do onde os alunos têm que mostrar dizeres dos alunos, que têm participa- de Basto em Oliveira de Azeméis e a que dominam muito bem os conhe- do nestas provas, que nos incentivam Maria Carolina Amoedo Gonçalves, cimentos científicos para conseguir a todos a continuar. da Escola Secundária Infanta D. Ma- responder a todas as questões den- ria em Coimbra. De referir que a Maria tro do tempo previsto. É sempre com Carolina Amoedo Gonçalves ganhou muito orgulho que ouvimos os corre- Clara Magalhães e Diana Pinto a medalha de bronze na Olimpíada tores das provas do país organizador ([email protected]) de Química+ deste ano de 2012, cuja elogiarem os estudantes portugueses Mentoras da equipa portuguesa

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11.o Encontro de Química dos Alimentos

de Química dos Alimentos (11EQA) Bragança, onde se encontra a Igreja teve como temática principal “Quali- de Santa Maria e a Domus Municipa- De 16 a 19 de se- dade dos alimentos: novos desafios”, lis. Os participantes puderam disfrutar tembro, decorreu, em incluindo no seu programa científico da vista sobre a cidade e da bonita Bragança, mais um encontro sessões plenárias com oradores con- imagem que se tem à noite do cas- da série “Química dos Alimentos”. A 1.ª vidados, comunicações orais selecio- telo com as suas ameias iluminadas. edição destes encontros ocorreu em nadas e comunicações em formato Seguidamente, demos entrada na 1993 e desde aí têm sido realizados, de poster. O 11EQA foi um encontro igreja de Santa Maria onde decorreu sempre que possível, com uma fre- muito participado, com mais de 200 um apontamento musical de Guitarra quência bienal, tendo passado já por participantes, tendo sido apresen- Clássica, brilhantemente executado diversas cidades do país, nomeada- tadas 31 comunicações orais e 290 por Mário Rego Cardoso e João Nuno mente Santarém, Aveiro, Faro, Coim- comunicações em painel. Entre as co- Teixeira. bra, Porto, Lisboa, Viseu, Beja, Angra municações apresentadas, destaca- do Heroísmo e Braga (integrado no -se a elevada participação de jovens Na segunda-feira decorreu a sessão XXII Encontro Nacional da SPQ). Em investigadores, que demonstraram de abertura, destacando-se a pre- 2012 coube ao Instituto Politécnico de um elevado interesse e contribuíram sença do Exmo. Sr. Presidente do Bragança, juntamente com o CIMO indubitavelmente para o sucesso Instituto Politécnico de Bragança e (Centro de Investigação de Monta- desta reunião científica. Apesar do do Exmo. Sr. Presidente da Câma- nha) e a Sociedade Portuguesa de encontro ser nacional, estiveram pre- ra Municipal de Bragança. Neste dia Química, o prazer de organizar, com sentes participantes de outros países, decorreram as sessões “Qualidade, o apoio da EuCheMS, mais uma edi- nomeadamente de Espanha, Brasil, Nutrição e Comportamento do con- ção destes encontros que constituem Eslováquia, Japão, Bulgária, Áustria e sumidor”, cuja plenária sobre as ten- já uma referência no domínio da Quí- Irlanda. Dada a presença destes par- dência do consumo alimentar a nível mica e da Ciência de Alimentos em ticipantes, apesar da língua oficial do mundial ficou a cargo da Dra. Ondina Portugal. encontro ser o português, foi solicitado Afonso (PortugalFoods) e “Inovação aos autores das comunicações orais e Alimentos tradicionais” cuja plená- Os Encontros de Química dos Alimen- que os seus diapositivos fossem ela- ria foi proferida pelo Dr. Jorge Ruiz tos pretendem ser uma plataforma de borados em inglês, para que também Carrascal, da Universidade da Extre- discussão, divulgação e partilha de estes participantes pudessem acom- madura, Espanha. No final da tarde, o conhecimentos entre os participantes. panhar as apresentações do encontro. encontro integrou ainda um workshop Pretende-se proporcionar, aos inves- realizado com o apoio do projeto SIAC tigadores, académicos e profissionais O 11EQA teve início no domingo ao AgroAli@EU intitulado “Necessidades da área, uma oportunidade para com- final do dia. Após a viagem, os parti- e oportunidades no setor agroalimen- partilhar e discutir os desenvolvimen- cipantes puderam desde logo levantar tar: o papel do sistema científico e tos mais recentes da investigação na a documentação do congresso na re- tecnológico nacional”, o qual decorreu área da Química Alimentar e da Ciên- ceção do hotel, tendo sido de seguida no Núcleo Empresarial da Região de cia e Tecnologia de Alimentos, com convidados para uma receção que de- Bragança (NERBA). No mesmo local, ênfase em novas ideias e abordagens correu no Museu Abade de Baçal. No e com colaboração do NERBA, foi inovadoras para a saúde, qualidade e final, seguiu-se um pequeno passeio, organizada uma mostra de produtos o segurança alimentar. O 11. Encontro já noturno, a pé, até ao Castelo de regionais “Mostra Sabores de Origem Transmontana”, na qual não faltaram os produtos mais emblemáticos do Nordeste Transmontano, tais como os enchidos, com as Alheiras em desta- que, o azeite, o mel, o folar, os queijos, a castanha, entre outros produtos de- Sessão de abertura liciosos. A cooperação das empresas (da esquerda participantes na mostra permitiu que para a direita: Diretor da ESA- os participantes no encontro pudes- IPB, Presidente da sem degustar vários destes produtos, Câmara Municipal pelo que se dirige um agradecimento de Bragança, Presidente do IPB, especial a todas elas, assim como à Vice-diretor do colaboração preciosa do NERBA. CIMO e Presidente da Divisão de Química Alimentar Os trabalhos prosseguiram na ma- da SPQ) nhã do dia seguinte com a sessão

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temática, extremamente participada, dedicada aos Alimentos funcionais e Nutracêuticos. O número de comuni- cações submetidas para apresenta- ção oral nesta temática, bem como o número de apresentações em pos- ter, denotou o elevado interesse da comunidade científica neste tema. A sessão deu início com a plenária proferida pelo Dr. Jose M. Garcia Fer- nandez, da Universidade de Sevilha, Espanha, seguindo-se a apresenta- ção de 7 comunicações orais. Duran- te a tarde foram realizadas diferentes visitas técnicas, as quais procuraram também aliar uma vertente lúdica na tentativa de dar a conhecer aos parti- cipantes um pouco da região. Dado o elevado número de participantes, me- diante inscrição prévia, estes foram distribuídos em 4 visitas: um grupo visitou as instalações da salsicharia tradicional Bísaro, localizada em Gi- Vista geral do auditório, sessão plenária (Jose Garcia Fernandez) e debate com os moderadores e monde, Bragança, seguida de visita oradores (comunicações orais) no final de diferentes sessões à aldeia de Rio de Onor, atravessada pela fronteira entre Portugal e Espa- maravilhas – Praias de Portugal. Por tra intitulada International monitoring nha e que subsiste ainda como aldeia último, ao quarto grupo foi proposta and control systems for food safety, comunitária; outro grupo dirigiu-se a uma visita apenas de carácter lúdico e na qual o Dr. Roland Poms (MoniQa Vinhais, onde decorreu a visita à in- cultural, fazendo um percurso guiado Association, Viena, Áustria) expôs os dústria transformadora de carne suína por alguns museus e monumentos da diversos aspetos prementes e atuais com certificação, Vifumeiro, seguida cidade de Bragança. No final do dia, relativamente à agenda Europeia no de uma visita ao Parque Biológico e decorreu o jantar do congresso anima- que concerne a este tema. Da parte ao Centro Interpretativo de Raças Au- do pelo som de gaita-de-foles e pela da tarde decorreu a 5.ª e última ses- tóctones; um terceiro grupo, visitou a dança das Pauliteiras de Miranda. são dedicada ao tema “Tecnologias Indústria de processamento alimen- de processamento e conservação”. tar Sortegel, localizada em Sortes, No último dia decorreu, na parte da Para esta última sessão, foi convida- Bragança, seguindo depois para um manhã, a sessão dedicada à temáti- da a compartilhar o seu conhecimen- passeio livre na albufeira do Azibo, ca “Segurança, Rastreabilidade e Au- to com os participantes sobre Quality recentemente eleita como uma das 7 tenticidade”, introduzida pela pales- by Design for packaging and shelf life

Visita à Salsicharia Bísaro, Quinta das Covas e à Aldeia de Rio de Onor

Química 127 - out/dez 12 5 Noticiário SPQ of Fresh products, a Dra. Maria José dos Biossistemas, Instituto Superior zaram as atividades deste encontro. Sousa-Gallagher, portuguesa, mas de Agronomia (CEER-ISA). Os patrocínios e apoios concedidos residente na Irlanda, onde trabalha pelas mais diversas entidades e em- no University College Cork. De referir Para o sucesso do 11EQA muito con- presas, a quem a Comissão Orga- ainda que, no decorrer do encontro, tribuíram os participantes com o seu nizadora dirige um sincero agrade- teve lugar a reunião da Divisão de dinamismo, bem como com a diversi- cimento, foram igualmente determi- Química Alimentar da SPQ, onde se dade e número de trabalhos de eleva- nantes para o sucesso do encontro! decidiu que o encontro seguinte de- da qualidade científica apresentados, Não podemos deixar de dirigir uma correrá em 2014 em Lisboa e será or- que deixaram bem patente o interesse palavra especial de agradecimento ao ganizado pelo Centro de Engenharia e relevância dos temas que centrali- apoio concedido pela Câmara Munici- pal de Bragança, NERBA e Fundação Calouste Gulbenkian, bem como para todas as empresas agroalimentares que de diversas formas apoiaram a realização do encontro, todas as em- presas de equipamentos e reagentes de laboratório, com especial destaque para as que estiveram presentes com stands, e todas as demais instituições que nos deram o seu apoio.

Joana Amaral ([email protected]) Comissão Organizadora

XXIV IUPAC Symposium on Photochemistry

Realizou-se, nos dias 15 a 20 de julho tos são representativos do impacto da aproveitamento de luz na fotossínte- de 2012, na Universidade de Coimbra, comunidade portuguesa de fotoquími- se; as restantes lições plenárias fo- o XXIV IUPAC Symposium on Photo- cos e fotofísicos no desenvolvimento ram proferidas por: Vivian Yam (Hong chemistry, um evento que teve o apoio atual e futuro da Ciência em Portugal. Kong, China), sobre organometáli- da Sociedade Portuguesa de Quí- O Simpósio iniciou-se no dia 15 de ju- cos fotofuncionais; Guillermo Bazan mica. À semelhança dos Simpósios lho com uma receção de boas vindas (Santa Bárbara, Califórnia, E.U.A.), precedentes, o IUPAC Symposium no Museu da Ciência, em que todos sobre aplicações de polielectrólitos e foi um êxito consubstanciado nos 640 os participantes puderam disfrutar oligoelectrólitos conjugados em opto- participantes, provenientes de 53 pa- não apenas do espólio do Museu, electrónica e biolelectrónica; Anthony íses. As maiores delegações presen- mas também do ambiente único pro- Harriman (Newcastle, Inglaterra), so- tes no evento foram a portuguesa, a porcionado pelo edifício Pombalino. bre antenas artificiais para captação japonesa e a espanhola, com 94, 93 e A abertura oficial decorreu no dia 16 de luz; Franco Scandola (Ferrara, 72 participantes, respetivamente. Há de julho (Figura 1), tendo sido pro- Itália) abordou as estratégias supra- ainda a destacar que metade da de- cedida por uma lição proferida por moleculares para unidades funcionais legação portuguesa foi constituída por Gregory Scholes (Toronto, Canadá) em fotossíntese artificial; alunos de pós-graduação. Estes fac- sobre mecanismos quânticos para (Gröningen, Holanda) proferiu uma li- ção onde reviu como controlar a agre- gação e o movimento através da luz; a lição proferida por Sebastião Formosi- nho e Luís Arnaut tratou da relevância do estudo de reações elementares na compreensão de processos fotoquími- Figura 1 ‒ Cerimónia cos para o desenvolvimento de novas de abertura, com a presença dos Profs. moléculas para a terapia fotodinâmi- Silvia Braslavsky ca. O programa científico foi comple- (IUPAC), João Gabriel mentado com 22 lições convidadas, (Reitor da UC), Hugh Burrows (Chairman), 111 comunicações orais, organizadas Luís Neves (Diretor em 3 sessões paralelas, e cerca de da FCTUC) e Joaquim 400 comunicações em painel. Os tra- Faria (SPQ) (da esquerda para balhos apresentados focaram as mais a direita) diferentes áreas da fotoquímica, des-

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de o desenvolvimento de novos mate- riais para aplicações médicas, células solares, fotorremediação de águas re- siduais, terapia fotodinâmica, manipu- lação de nanoestruturas, mimetização de biofuncionalidades e recuperação de objetos de arte. Todas as sessões, orais e em painel, tiveram uma eleva- da participação, o que permitiu uma discussão aprofundada e participada dos temas apresentados.

Nesta edição do IUPAC Symposium on Photochemistry foram vários os prémios atribuídos, sendo de sa- lientar: a medalha Porter, a Thomas Meyer (Figura 2), da Universidade da Figura 2 ‒ Aspeto do convívio informal que precedeu o banquete do Simpósio. Profs. Hugh Carolina do Norte (E.U.A.); o prémio Burrows (UC), Thomas Meyer (Universidade da Carolina do Norte e galardoado com a medalha EPA, a Karl Borjesson, da Universi- Lord ) e Sebastião Formosinho (UC) dade de Chalmers (Suécia); o prémio Langmuir (ACS), para a melhor apre- Goossens (Bélgica) e a Giorgio Pariani Brandão, Paralab, Photochemical & sentação oral de jovens fotoquímicos, (Itália). Photobiological Sciences, PicoQuant atribuído a Danielle Wilson (Canadá); e Springer. a melhor apresentação em painel A Organização do Simpósio contou O XXV IUPAC Symposium on Photo- (prémio IUPAC), atribuída a Waheed ainda com o apoio dos seguintes chemistry será em Bordéus em 2014. Saban (África do Sul) e a Joanna patrocinadores: Bluepharma, Caixa Malicka (Bélgica); e a melhor apre- Geral de Depósitos, Edinburgh Ins- Hugh Burrows e Artur Valente sentação em painel de estudantes truments, Elsevier, FCT, Gilden Pho- ([email protected], [email protected]) de doutoramento, atribuída a Karel tonics, Hamamatsu, Langmuir, M.T. Comissão Organizadora

International Symposium on Metal Complexes (ISMEC2012)

A edição de 2012 do International A realização do ISMEC2012 em Lis- colaboração em novas áreas de pon- Symposium on Metal Complexes boa surge como a primeira edição do ta relacionadas com a termodinâmica (ISMEC2012) realizou-se em Lisboa, simpósio realizada fora de Espanha de complexos metálicos, tendo sido de 18 a 22 de junho de 2012, na Fun- ou Itália. Esta edição emerge como dada especial ênfase à ligação entre dação Calouste Gulbenkian, e teve um marco e um passo em frente na a investigação científica fundamental como objetivo principal a apresenta- internacionalização do ISMEC, tendo e a sua inovação associada à larga ção e a discussão dos mais recentes resultado num aumento de cerca de gama de aplicações, especialmente e importantes desenvolvimentos e 100% relativamente ao número usual orientadas para fins ambientais e bio- inovações nas diversas áreas relacio- de participantes. A conferência contou médicos. nadas com os complexos metálicos. com a participação ativa de mais de A presente edição deste simpósio é 200 participantes (Professores, Inves- Assim, no âmbito do ISMEC2012, também o XXIII Italian-Spanish Mee- tigadores e Estudantes) originários de foram aceites e discutidas apresen- ting Thermodynamics of Metal Com- 27 países, a maior parte deles Euro- tações que se incluíram nos vários plexes. Contudo, como ao longo dos peus (Alemanha, Áustria, Bélgica, tópicos abaixo descritos, embora es- últimos anos este formato de encon- Bulgária, França, Espanha, Hungria, pecialmente focados na química dos tro anual tem assistido a um enorme Itália, Letónia, Polónia, Portugal, Rei- complexos em solução e suas aplica- incremento no interesse e número no Unido, República Checa, Roménia, ções: de participações de cientistas a nível Rússia, Suíça e Turquia) e 10 países mundial, na edição de 2010, o Grupo não Europeus (Africa do Sul, Argélia, . Solution equilibrium and coordina- Italiano-Espanhol de termodinâmica Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, tion chemistry de complexos metálicos decidiu a sua China, Estados Unidos da América, . Metal complexes of biological and internacionalização e abertura a novas Japão e Uruguai). environmental interest áreas. Assim, foi decidido estabelecer . Supramolecular chemistry o “European Group of Thermodyna- Esta opção estratégica na evolução . Metal-complex interactions with mics of Metal complexes”, assim como do simpósio ISMEC teve por objeti- biomolecules o acrónimo ISMEC para International vo fomentar o intercâmbio de novas . Chemistry and cultural heritage Symposium on Metal Complexes. ideias e o aumento de projetos de . Nanostructured metal complexes

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. Metals in diseases: transport, ho- . “Structural and thermodynamic meostasis and toxicity aspects of thiol binding to metal . Metal-based drugs: therapy and ions in excentric proteins”, Henryk diagnosis Kozlowski, University of Wroclaw, . Metalloenzymes: metal binding Polónia and models . “Metal complexes defining . Analytical methods and sensors aluminium’s exposome”, Christo- based on metal complexes pher Exley, University of Keele, . Computational modeling Reino Unido Cerimónia de abertura . “Modelling of molecular proper- A agenda da conferência incluiu 5 ties. Fundamental principles and Lições Plenárias, 10 Lições Orais case studies with transition metal Convidadas (Keynotes), 51 Comuni- complexes”, Peter Comba, Uni- cações Orais (selecionadas pela or- versity of Heidelberg, Alemanha ganização e apresentadas em 2 ses- . “Cation, anion and ion-pair bin- sões paralelas) e 114 apresentações ding with branched polyamines”, em Painel, um Prémio Pulidori, e ain- Antonio Bianchi, University of Flo- da uma Mesa Redonda com o Grupo rence, Itália ISMEC. . “Macrobicyclic architectures for Vista parcial da audiência (A3-FCB) recognition of anions and metal O Comité Organizador do ISMEC2012 ions”, Rita Delgado, ITQB/Univer- convidou 15 reputados investigadores sidade Nova de Lisboa, Portugal e cientistas internacionais para as li- . “Metal ion and anion coordina- ções plenárias e convidadas, cujos tion chemistry of pyrazole aza- temas exibiram uma resposta perfeita macrocycles, Enrique García- ao desafio colocado pela organiza- -España, University of Valencia, ção, além de promoverem debates e Espanha discussões de elevado nível científico. . “Interaction of hydroxamic acids Descrevem-se a seguir os títulos das with metal ions: from simple com- Chris Orvig (UBC, Canadá) 5 Lições Plenárias: plexes to metallacrowns”, Fer- nando Secco, University of Pisa, . “Redox metals in neurodegene- Itália rative diseases, and therapeutic . “Mechanistic modelling of actini- perspectives”, Robert R. Crichton, des and lanthanides extraction by University Catholique de Louvain, ionic liquids: a first step towards a Bélgica general model”, Isabelle Billard, . “Metal ion selective sequestering IPHC/DRS, Strasbourg, France agents, with selective properties”, . “Chemical speciation in environ- Kenneth N. Raymond, University ment and biomedicine: examples Carlos Geraldes (UC, Portugal) of California, Berkeley, E.U.A. to technological development”, . “Medicinal inorganic chemistry”, Manuel Valiente, University Autò- Chris Orvig, University of British noma of Barcelona, Espanha Columbia, Vancover, Canadá . “Metal-based chelates and na- É de salientar que todos os resu- nosystems for multimodal mole- mos aceites para apresentação no cular imaging applications”, Carlos ISMEC2012 estão publicados online F.G.C. Geraldes, Universidade de num livro da série “Acta of ISMEC Coimbra, Portugal Symposia, Vol 2 (ISSN 2239-2459, . “Luminescent silica nanoparticles: http://mat520.unime.it/ismecacta), per- E. García España (UV, Espanha) extending the frontiers of bright- mitindo assim uma rápida divulgação ness”, Luca Prodi, University of dos mais recentes desenvolvimentos Bologna, Itália de investigação científica apresen- tados e discutidos no simpósio. Por Foram ainda apresentadas as seguin- outro lado, reconhecendo a grande tes Lições Keynote: importância da internacionalização do ISMEC, concretizada na presente edi- . “The chemistry behind the use of ção, o prestigiado jornal internacional bioassays to assess metal toxicity: Dalton Transactions (RSC) associou- pH influence, complexation equili- -se a este evento científico, tendo Entrega do Prémio Pullidori bria”, Isabel Villaescusa, Universi- oferecido a publicação de um volume (J. González García) ty of Girona, Espanha especial temático dedicado a este

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simpósio e intitulado “The chemistry do Prémio Pulidori (5th Edition), de A próxima Edição do ISMEC and applications of metal complexes”, entre 30 concorrentes, jovens investi- (ISMEC2013) realizar-se-á em Bur- o qual incluirá uma seleção dos arti- gadores participante no ISMEC2012 e gos (Espanha), em junho de 2013. O gos mais relevantes apresentados no autores de um artigo original publica- ISMEC2012 contou com o apoio ins- âmbito deste congresso. do no período 2010-2012. O premiado titucional do IST, SPQ, CQE, FCG, deste ano foi Jorge González García, a colaboração das empresas CGD, A presente edição do ISMEC (IS- da Universidade de Valencia, com BPI, HOVIONE, ILC, TAP, Labor Spi- MEC2012), foi organizada pelo Insti- um artigo intitulado “Kinetics of Zn2+ rit, Cruz-Porto, Hotel Açores e ainda tuto Superior Técnico da Universida- complexation by a ditopic phenanthro- dos departamentos de turismo das de Técnica de Lisboa, em coopera- line-azamacrocyclic scorpiand-like CM Lisboa e CM Sintra. ção com a Sociedade Portuguesa de receptor”, Chem. Commun. 2012, 48, Química, tendo como Presidente da 1994-1996. Um resumo alargado des- Maria Amélia Santos Comissão Organizadora a Prof. Maria te trabalho será também publicado na ([email protected]) Amélia Santos. O Comité Científico revista “La Chimica e L’industria”, o Presidente da Comissão Organizadora Internacional (CCI) do ISMEC2012 foi jornal oficial da Sociedade Italiana de do ISMEC2012 incumbido de selecionar o recipiente Química.

Jantar social (CCB) Visita a Sintra (grupo parcial) Comissão Organizadora

Simpósio de Homenagem ao Prof. Doutor Fernando Ramôa Ribeiro

Decorreu, nos passados dias 8 e 9 de po de investigadores que decidiu orga- são contou ainda com a presença do outubro, no Salão Nobre do Instituto nizar este Simpósio como forma de ho- Embaixador de França em Portugal, Superior Técnico, o Simpósio de Ho- menagear a memória deste Professor num reconhecimento ao trabalho de- menagem ao Prof. Fernando Ramôa e Cientista recentemente falecido. senvolvido por Ramôa Ribeiro em prol Ribeiro, subordinado ao tema “From da colaboração científica e académica the Active Site to the Process”, um A atividade científica de Fernando Ra- entre Portugal e França. evento que teve o apoio da Sociedade môa Ribeiro deu origem a uma vasta Portuguesa de Química. rede de contactos que, de certa forma, No plano científico, os trabalhos divi- se reuniu neste simpósio em sua me- diram-se entre um conjunto de comu- Fernando Ramôa Ribeiro, falecido em mória. A sessão de abertura contou nicações por destacados membros da 29 de agosto de 2011, dedicou toda a com a presença, entre outras perso- comunidade científica ligada à catálise sua vida científica à catálise, e em par- nalidades, do Ministro da Educação e a nível Europeu e de Portugal, e um ticular à catálise por zeólitos, domínio Ciência, do Presidente do Conselho conjunto de apresentações ligadas a em que criou um grupo de investiga- Geral e do Reitor da UTL, e do Presi- empresas da área da química que em ção dinâmico, com uma elevada pro- dente do IST que, para além da repre- Portugal e em França colaboraram dutividade, quer a nível de formação sentação institucional, trouxeram os com o Prof. Ramôa Ribeiro e a sua de recursos humanos, em particular ao seus testemunhos do relacionamento equipa. nível de doutoramentos, quer ao nível com o Prof. Ramôa Ribeiro ao longo de publicações e de organização de da sua carreira na área do Ensino Su- As apresentações científicas conta- encontros internacionais. Foi este gru- perior e da Ciência em Portugal. A ses- ram com personalidades como Michel

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Guisnet, orientador do doutoramento do Prof. Ramôa Ribeiro, Michel Che (Universidade Pierre et ), Johan Martens (Universidade Cató- lica de Louvain), Jean-Pierre Gilcon (Universidade de Caen) e os nossos colegas José Luís Figueiredo (FEUP), Mariette Pereira (Universidade de Coimbra) e Armando Pombeiro (IST/ UTL) e cobriram temas desde a sín- tese e caracterização de novos mate- riais até às aplicações em processos industriais, de acordo com o tema ge- ral do Simpósio. Intervenção do Ministro da Educação e Ciência na cerimónia de abertura do simpósio

Entre as empresas participantes, recentemente à criação, pela GALP investigadores que, de alguma forma, destacam-se empresas como a GALP Energia, na refinaria de Sines, de um estiveram ligados aos trabalhos de in- Energia, a CUF e o Instituto Francês polo de investigação, precisamente vestigação do homenageado. dos Petróleos e a Petrobras. Nas dedicado ao Prof. Ramôa Ribeiro. comunicações dos representantes Mais informações sobre o simpósio destas empresas ficou bem patente Os trabalhos contaram ainda com a encontram-se disponíveis em: a necessidade do desenvolvimento apresentação de cerca de meia cen- http://scrr.ist.utl.pt. da colaboração entre a academia e o tena de posters originários de grupos Francisco Lemos tecido Industrial, sempre incentivado de investigação de vários países, com ([email protected]) por Ramôa Ribeiro, e que deu origem particular incidência para os jovens Comissão Organizadora

Esquema de uma estrutura de um zeólito em primeiro plano na Jacques Védrine, um dos colaboradores de longa data de Ramôa Ribeiro, mesa do simpósio e Vicente Córtez que se prepara para moderar numa sessão de posters do simpósio uma das sessões

3rd ITQB PhD Students’ Meeting

O 3rd ITQB PhD Students’ Meeting de- apresentados 45 trabalhos (23 apre- entre estudantes, investigadores, pro- correu, de 10 a 12 de outubro de 2012, sentações orais e 22 apresentações fessores e oradores convidados. no Instituto de Tecnologia Química e em poster), abrangendo áreas como Biológica da Universidade Nova de a Química, Ciências Biológicas e Bio- Este ano tivemos o prazer de ouvir Lisboa (ITQB-UNL), um evento apoia- tecnologias. Todos os alunos viram o o Doutor Francisco Dionísio (FCUL) do pela Sociedade Portuguesa de seu trabalho ser discutido de forma e a Doutora Luísa Figueiredo (IMM- Química. Organizado pelos estudan- bastante entusiástica pelo auditório, o -FMUL) falarem sobre “Genetic con- tes de doutoramento do ITQB, este que enriquece e motiva ainda mais o flicts” e “Chromatin dynamics in Afri- encontro anual pretende ser um palco jovem cientista. can Trypanosoma”, respetivamente, onde, num ambiente descontraído, mostrando a boa investigação em mas profissional, os alunos mostram O encontro esteve aberto a toda a Ciências da Vida que se faz em Por- e discutem os seus trabalhos com comunidade científica (entrada livre), tugal. Numa vertente mais aplicada, o os seus pares. Nesta edição, foram tendo sido registadas 243 inscrições Doutor Arsénio Fialho (IST) falou-nos

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sobre “Bacterial proteins, a new class of multi-functional anti-cancer drugs”.

No último dia do encontro tivemos uma sessão interativa com Miguel Gonçalves, um criativo com uma imaginação sem limites que ao longo dos últimos anos tem vindo a trans- formar ideias em projetos “out of the box”. Miguel Gonçalves é o fundador da Spark Agency, uma agência cria- tiva especializada em desenvolver ideias e criar plataformas que têm como principal objetivo formar uma interface entre pessoas e empresas. Após 1 hora e meia de conversas interativas a um ritmo alucinante, a Sessão interativa com Miguel Gonçalves “take-home message” para a maio- ria dos participantes foi “Bater punho e nunca desistir”.

O encontro terminou com um jantar convívio, onde foram premiados os autores das melhores apresentações, e com a promessa de o próximo en- contro ser ainda melhor.

Carla Baltazar, Débora Tavares, Filipe Almeida, Joana Rolo, Lia Domingues, Liliana Ferreira, Neuza Teixeira, Pedro Silva, Sónia Mendes e Sowmiah Subbiah ([email protected]) Comissão Organizadora do 3rd ITQB PhD Students’ Meeting Auditório do ITQB durante a palestra de um dos oradores convidados

Encontros de RMN em Aveiro

ral (Espanha), Tiago Ferreira (Suécia) e Victor Munhoz (Brasil) foram os autores apresentadores galardoados com o prémio para melhor poster.

O programa social consistiu na visita às Caves Ferreira seguida de passeio O 4.º Encontro Ibero-Americano de da América do Sul (Argentina, Brasil, de barco no Rio Douro (Porto) com RMN, juntamente com o 6.º Encontro Colômbia e Uruguai), mas também de jantar a bordo. Bienal do GERMN e o 3.º Encontro França, Alemanha, Itália, Bélgica, Re- Ibérico de RMN, decorreu, de 25 a pública Checa, Holanda, Suécia, Ca- O próximo encontro Ibero-Americano 28 de setembro de 2012, na Univer- nadá, Reino Unido e Estados Unidos de RMN será o 5.º e decorrerá em sidade de Aveiro e foi organizado pelo da América. 2013 no Rio de Janeiro, conjuntamen- grupo de RMN da SPQ (Luís Mafra e te com o 18.º ISMAR (International Eurico Cabrita – Chairs do evento). O programa científico consistiu de 6 Society of Magnetic Resonance – comunicações plenárias, 4 comunica- http://www.ismar.org). Este triplo evento contou com 200 ções orais convidadas e 9 comunica- participantes especialistas em RMN ções orais keynote, 25 comunicações Paula Santos oriundos de várias regiões do planeta, orais e 124 comunicações em poster. ([email protected]) principalmente da Península Ibérica e Cinzia Guzzi (Espanha), María Mayo- Comissão organizadora

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Momentos vividos durante o 4.º Encontro Ibero-Americano de RMN

4th EuCheMS Chemistry Congress

ter uma visão compreensiva da quí- Na segunda feira os trabalhos deram mica nas suas diferentes vertentes, início com a sessão plenária proferi- tendo como tema unificador “Química da pelo Professor (Fritz para um mundo sustentável”. Decor- Haber Institute of the Max-Planck- reram ainda simpósios especiais em -Gesellschaft, Alemanha), após a qual tópicos como “Química e Ética”. o programa de trabalhos se ramificou em diversas sessões que incluíram O 4th EuCheMS Chemistry Congress O congresso teve início na tarde de áreas diversas. No final deste dia, teve lugar em Praga, na República domingo, dia 26 de agosto, com uma vários conferencistas participaram Checa, entre os dias 26 e 30 de agos- cerimónia, cuja abertura esteve a car- na receção oferecida pela Sociedade to de 2012, tendo sido um evento ani- go do Professor Pavel Drasar, presi- Americana de Química (ACS) e pela mado e muito participado, no qual fo- dente da comissão organizadora lo- Sociedade Germânica de Química ram apresentados quase 1700 traba- cal. Nesta cerimónia foram entregues (GDCh), Wiley-VCH, ACS Publica- lhos, entre comunicações orais e em o prémio “Química Europeia Susten- tions e Chemical Abstract Service. painel. Sem dúvida, este foi um dos tável”, atribuído ao Professor Marc maiores congressos de química orga- Taillefer (Institut Charles Gerhardt, Na segunda e terça feiras decorreram nizados no país nas últimas décadas! França), e a medalha de ouro “August as duas sessões de posters do encon- O congresso integrou 10 sessões Wilhelm von Hofmann”, que foi parti- tro, onde diversos jovens investigado- principais, de encontro aos tópicos lhada pelos Professores Sason Shaik res apresentaram os seus trabalhos e 1) Química Analítica e Eletroquímica, (The Hebrew University, Israel) e Mar- tiveram oportunidade de discutir resul- 2) Educação e História, 3) Química Ali- tin Quack (ETH Zurich, Suiça). tados com os seus colegas. No final mentar, 4) Ambiente e Química Verde, do dia de terça feira, os participantes 5) Química Inorgânica, 6) Ciências da Seguiu-se uma sessão plenária profe- inscritos para o jantar do congresso Vida, 7) Nanoquímica e Nanotecno- rida pelo Professor Jean-Marie Lehn disfrutaram a sua refeição no “Grand logia, 8) Química Orgânica e Polí- (University of Strasbourg, France), Monastery restaurant”. meros, 9) Química Física, Teórica e laureado com o prémio Nobel da Quí- Computacional e 10) Química do Es- mica. No final seguiu-se um concerto Na quarta feira o dia decorreu com as tado Sólido. Cada uma das sessões pelo “Czech Collegium”, que incluiu diferentes sessões de trabalho e cul- científicas principais integrou vários excertos de musicais conhecidos, minou com a peça baseada em ciên- simpósios, o que no seu todo permi- como West Side Story, My Fair Lady cia, “Insufficiency”, do Professor Carl tiu que os participantes pudessem e o Fantasma da Ópera. Djerassi (, E.U.A.).

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Na quinta feira, último dia do congres- so, os trabalhos deram início com a apresentação levada a cabo pelo Pro- fessor David Milstein (Weizmann Ins- titute of Science, Israel), a quem este ano foi atribuída a honra de proferir a “palestra EuCheMS”, juntamente com o Professor Nazario Martín (Univer- sidad Complutense de Madrid, Es- panha). O tópico escolhido para esta Visão global do auditório palestra foi “A descoberta das reações catalisadas por metais para uma quí- mica sustentável”.

A sessão de encerramento do 4th Eu- CheMS Chemistry Congress decorreu na tarde de quinta feira, com a pales- tra do Professor Robert Grubbs (Cali- fornian Institute of Technology (Calte- Ulrich Schubert, Presidente da EuCheMS, na ch), E.U.A.) sobre o desenho e aplica- sessão de abertura do congresso Sessão de posters ções de reações seletivas de olefinas. Na cerimónia de encerramento foram anunciados os vencedores do prémio “Jovem Químico Europeu” (European Young Award, EYCA), que pretende reconhecer a excelência da investigação levada a cabo por jovens investigadores na área das ciências químicas.

Os finalistas deste ano tiveram a oportunidade de apresentar o seu Entrega da medalha de ouro (European Young Chemist Award) a Elisabetta Collini, da trabalho perante um júri, tendo havi- Expositores Universidade de Pádua, Itália do a possibilidade de responderem a questões levantadas, quer pelo júri, quer pela audiência do encontro. Fo- ram atribuídas 2 medalhas de prata e uma de ouro em duas categorias: pós-graduação e graduação. As ven- cedoras das medalhas de ouro foram Sessão de Elisabetta Collini, da Universidade de encerramento: Pádua, Itália, e Shan Jiang, da Univer- vencedores do European sidade de Liverpool, Reino Unido, em Young Chemist Award com os representantes cada uma das categorias, respetiva- da Rede Europeia de mente. A lista completa dos finalistas Jovens Químicos (EYCN) pode ser consultada em http://www. e os representantes de diversas Sociedades eyca2012.org/finalists-2012, e mais de- Químicas Europeias talhes em http://onlinelibrary.wiley.com/ doi/10.1002/chem.201203310/pdf.

Por último, todos os presentes foram convidados a participar no 5th EuChe- MS Chemistry Congress, que irá de- correr em Istambul, Turquia, entre 31 de agosto e 4 de setembro de 2014. (adaptado de ChemistryViews, doi: 10.1002/chemv.201200104) Sessão de encerramento: Joana Amaral apresentação da data e local de realização do ([email protected]) 5th EuCheMS Chemistry www.spq.pt Congress

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4th EuCheMS Career Days

em qualquer área da Química: The art falou em questões tão atuais como a of writing (scientific papers and pro- ética em Ciência e a procura da ver- posals), Putting your degree to work, dade, fornecendo uma visão histórica Chemethics and eCV, EYCA (Europe- de grandes acontecimentos que mar- an Young Award), Making caram o desenvolvimento da Ciência chemistry work for you, Science Spe- tal como hoje a conhecemos. Para o ed Date e CV Clinic. Várias empresas tópico das redes sociais e da forma associaram-se a este evento, não só como um jovem cientista poderá utili- através de apoio financeiro para a des- zar estas ferramentas para promover locação de palestrantes, como tam- a sua carreira, a Dra. Marta Agostinho bém na divulgação de ofertas de em- referiu a importância de estabelecer prego e participação ativa no Science uma reputação digital na qual o jovem Speed Date: Evonik, BASF, Bayer, químico deverá demonstrar caracte- O Grupo de Químicos Jovens (GQJ) Royal Society of Chemistry, American rísticas de comunicação, trabalho de organizou duas sessões temáticas in- Chemical Society, Contact Singapo- equipa e responsabilidade, promo- seridas no evento Career Days, pro- re e German Research Foundation. vendo a interação com colegas na movido pela EYCN (European Young mesma área e possíveis perspetivas Chemists Network) no decorrer do A organização e coordenação das de carreira. Todas as atividades pro- último 4thEuCheMS Congress em Pra- sessões Chemethics e eCV-optimizing movidas pela EYCN e organizadas ga, de 26 a 30 de agosto de 2012. social media ficou a cargo do GQJ e pelos representantes das diversas so- contou com o patrocínio das empresas ciedades membro receberam o apoio Foram várias as atividades direciona- Umicore e Boston Scientific. Os ora- entusiástico de uma vasta audiência, das a jovens químicos no âmbito des- dores convidados para cada sessão permitindo o alargamento da rede de ta iniciativa, todas com o objetivo de foram o Prof. Alexandre Quintanilha contactos e a consolidação da posi- contribuir para a construção e consoli- e a Dr.ª Marta Agostinho, respetiva- ção da EYCN junto da EuCheMS. dação de uma carreira científica sólida mente. O Prof. Alexandre Quintanilha O GQJ gostaria, mais uma vez, de agradecer o apoio por parte da di- reção da SPQ a mais uma atividade dinamizada pelo GQJ e também às empresas Boston Scientific e Umicore pelo patrocínio financeiro que tornou possível a deslocação dos oradores convidados.

Vânia Calisto, Sérgio Santos e Mariana Sardo ([email protected]) Professor Alexandre Quintanilha e Dr.ª Marta Agostinho durante as sessões Grupo de Químicos Jovens “Chemethics” e “eCV”, respetivamente

Robert Lefkowitz e Brian Kobilka são os Laureados com o Prémio Nobel da Química 2012 pelos “Estudos Sobre os Recetores Acoplados à Proteína G”

No organismo humano existem mi- lhares de milhões de células, muitas das quais desempenham papéis es- pecíficos e distintos, e que interagem umas com as outras. No comunicado em que anuncia os nomes dos laurea- dos com o Prémio Nobel da Química, a Real Academia Sueca de Ciências explica que cada uma dos milhões de Robert células que compõem o corpo huma- Brian Kobilka Lefkowitz no tem pequenos recetores que lhe

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permite sentir o meio envolvente e ça a fazer progressos e, em 1970, um “verdadeiro momento eureka!”, adaptar-se a novas situações. Robert publica em dois prestigiados jornais, estariam estes dois recetores rela- Lefkowitz e Brian Kobilka foram distin- Proceedings of the National Academy cionados, apesar de terem funções guidos pelas “descobertas que reve- of Sciences (PNAS) e Science. Mais completamente diferentes? Lefkowitz lam o funcionamento interno de uma tarde, Lefkowitz aceita uma proposta sabia que ambos os recetores inte- importante família destes recetores: da , na Carolina do ragiam com a proteína G no interior os recetores acoplados à proteína G Norte, onde, com laboratórios novos, da célula, e igualmente sabia que tal (GPCRs)”. Desta família de recetores forma a sua equipa de investigação. acontecia em cerca de outros 30 re- fazem parte os recetores da adrenali- Apesar de parecer que afinal não iria cetores diferentes. Os investigadores na, dopamina, serotonina, da luz, do efetivamente ser cardiologista, Lefko- concluíram assim que haveria uma odor e do aroma. Sabe-se igualmente witz ainda quer trabalhar com doen- família de recetores, hoje designados que cerca de metade de todos os me- ças cardíacas, pelo que decide focar a de “recetores acoplados à proteína dicamentos utilizados atuam através sua investigação nos recetores adre- G”, que funcionavam de forma similar. deste tipo de recetores, pelo que o nérgicos. Utilizando substâncias mar- conhecimento sobre GPCRs e o seu cadas radioactivamente, incluindo be- Em 2011, Kobilka alcançou um novo funcionamento é de grande interesse tabloqueadores, começa a investigar progresso nesta jornada: o cientista e para benefício da Humanidade. como funcionam estes recetores, con- a sua equipa conseguiram capturar a seguindo extrair uma série de receto- imagem de um recetor da adrenalina, Durante muito tempo foi um mistério res de tecidos biológicos e obtendo no momento exato em que era ativado como é que as células conseguiam uma primeira compreensão de como por uma hormona e enviava um sinal sentir o ambiente que as rodeava. funcionam. Foi já na década de 1980 à célula. A imagem, publicada na re- Sabia-se que hormonas como a adre- que a equipa deu o próximo salto nes- vista , revela novos detalhes nalina tinham efeitos nas células e te estudo, quando o recém-recrutado sobre GPCRs, que poderão no futuro suspeitava-se que a superfície destas jovem Dr. Kobilka aceitou o desafio ser úteis para o desenvolvimento de deveria conter recetores para essas de isolar o gene que codifica aquele novos fármacos. Essa imagem, su- moléculas, mas em que consistiam e recetor. Contudo, naquela época, ten- blinha o comité Nobel, “é uma obra- como seriam esses recetores, como tar encontrar um gene no gigantesco -prima molecular e o resultado de dé- conseguiam transmitir sinais para a genoma humano seria algo similar a cadas de investigação”. célula? encontrar “uma agulha num palheiro”. Robert J. Lefkowitz nasceu em Nova A resposta a estas questões perma- No entanto, Kobilka tem uma ideia Iorque em 1943, licenciou-se em me- neceu um mistério até que, na década engenhosa que lhes permitiria isolar dicina em 1966 na Universidade de de 60, um jovem estudante de medici- o gene. Os investigadores consta- Columbia, e é hoje investigador do na que almejava ser cardiologista faz tam então que o recetor consistia em Howard Hughes Medical Institute e serviço militar no National Institutes of sete longas regiões hidrofóbicas em professor de medicina e de bioquími- Health, onde lhe é proposto um gran- α-hélice (Figura 1), o que lhes indica ca no Duke University Medical Center, de desafio: encontrar os recetores! que provavelmente o recetor atraves- nos E.U.A.. Lefkowitz começa a trabalhar com a saria a membrana celular 7 vezes, o hormona adrenocorticotrópica, que que lhes faz lembrar um recetor que já Brian K. Kobilka nasceu em 1955 em estimula a produção de adrenalina, era conhecido noutra região do corpo Little Falls, E.U.A., licenciou-se em utilizando hormonas marcadas com humano: a rodopsina, um recetor de medicina em 1981 pela Universidade iodo radioativo para detetar os rece- luz que existe na retina do olho. Sur- de Yale, e é hoje professor de medici- tores celulares. No segundo ano do ge então uma ideia, que mais tarde é na e de Fisiologia molecular e celular projeto, Lefkowitz finalmente come- descrita por Robert Lefkowitz como na Universidade de Stanford.

(Fonte: “The in Che- mistry 2012 - Press release” e “The 2012 – Popular information”, Nobelprize. Figura 1 ‒ Ilustração da estrutura org, 7 Nov 2012, Real Academia obtida por Kobilka de um recetor β-adrenérgico (azul) quando ativado Sueca de Ciências) por uma hormona (laranja). A hormona liga-se na parte exterior Joana Amaral enquanto a proteína G (vermelho) se liga ao recetor no interior da ([email protected]) célula www.spq.pt

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Ier METROCOL - Apadrinhamento do Laboratório de Química e Biomedicina do Instituto Nacional de Metrologia da Colômbia

Investigação Académica e no Desen- de trabalho conjunto estava-me reser- volvimento Industrial”. vada a agradável surpresa de ser con- vidada para Madrinha do Laboratório. Sob o mote “Prosperidade para to- Ciente das responsabilidades, assumi dos”, o evento assinalou a recente o compromisso com gosto. criação do Instituto Nacional de Me- trologia (INM), fruto de uma estrutura Além da constituição de competên- anterior de Laboratórios de Metrolo- cias centralizadas no INM, o Progra- gia, versando as vertentes de Metro- ma Nacional de Desenvolvimento da logia Científica e Metrologia Industrial. Metrologia compreende também o Além de áreas clássicas de Metrolo- estabelecimento de uma Rede Nacio- A Metrologia é Fundamental para a gia Física, há também um investimen- nal de Metrologia assente no levanta- Inovação to arrojado na área da Química e Bio- mento das capacidades nacionais de Diretora do Departamento Nacional medicina, desde já equipada com um laboratórios. Colombiano de Planeamento laboratório primário e secundário de medidas de condutibilidade elétrica e A Coordenadora e grande impulsio- A convite da Comissão Organizadora de pH para a produção e certificação nadora do Projeto é a eminente me- do Primeiro Encontro Internacional de soluções tampão de pH, de que as- trologista brasileira, Vera Ponçano, de Metrologia da Colômbia, Ier ME- sinalamos a inauguração. Com equi- com quem tenho o prazer de partilhar TROCOL, que teve lugar em Bogotá, pamento adquirido com financiamen- experiências e conhecimentos des- de 13 a 15 de agosto de 2012, e que to do Projeto DCI-ALA/2007/19-005, de a altura da minha presidência da contou com a presença do Secretário de Assistência Técnica da Comissão EURACHEM, coincidente com a sua de Estado para o Desenvolvimento Europeia na perspetiva da promoção presidência do CITAC. Industrial, do Ministério de Comér- e expansão das trocas comerciais, o cio, Indústria e Turismo do país, bem Laboratório, dirigido por Luis Alfredo Maria Filomena Camões como de representantes ao mais alto Chavarro, conta com o contributo de ([email protected]) nível das infraestruturas metrológicas dois jovens investigadores, em fase Coordenadora do Mestrado Europeu regionais e mundiais, coube-me a de formação, empenhados no suces- em Ciência da Medição em Química honra de proferir a Lição de Abertura, so da missão de que são atores. Após Presidente da Divisão de Química “Impacto da Metrologia Química na várias horas de uma produtiva sessão Analítica da IUPAC

Falecimento do Professor Manuel Ribeiro da Silva

da SPQ, onde desempenhou vários tamento de Química da Faculdade de cargos, incluindo o de Presidente, era Ciências, onde conseguiu estabelecer atualmente Professor Emérito da Fa- condições de trabalho assinaláveis culdade de Ciências da Universidade para um novo grupo de investigação, do Porto. O Professor Ribeiro da Silva numeroso e de assinalável produti- dedicou a sua vida inteiramente ao vidade. Este grupo publicou até hoje ensino e à investigação, sendo autor mais de quatro centenas de artigos de de um vasto conjunto de publicações elevada qualidade. científicas nas mais conceituadas re- vistas internacionais de Química. Recebeu várias distinções nacionais e internacionais, sendo de realçar o Licenciou-se em Engenharia Quími- Prémio Ferreira da Silva em 2002. A Foi com grande pesar que a comuni- co-Industrial (FEUP) em 1964/65 e Química nacional perdeu um dos seus dade de químicos portugueses soube doutorou-se em Química na Universi- expoentes, que se destacou, não só do faleciemnto do Professor Manuel dade de Surrey, Inglaterra, em janeiro pela investigação, mas também pela Ribeiro da Silva, no dia 29 de novem- de 1974, após ter cumprido o Servi- dedicação ao ensino e à comunidade bro de 2012. ço Militar na Marinha. De regresso à científica. Universidade do Porto, iniciou uma Manuel Ribeiro da Silva, nascido a 30 frutuosa atividade de investigação no [email protected] de setembro de 1940, distinto sócio domínio da Termoquímica, no Depar- www.spq.pt

16 Química 127 Noticiário SPQ Ano Internacional da Química

Ano Internacional da Química no Brasil

mica, um deles para os mais miúdos e uma exposição de painéis acom- panhada de experiências. Na tabela 1 podem ser vistos os projetos que tiveram maior sucesso no portal e o número de acessos diretamente rela- cionados.

O Ano Internacional da Química-2011 Em seguida são descritos alguns des- (AIQ) no Brasil foi um projeto de su- tes materiais. cesso. Foram realizadas em todo o país inúmeras ações e atividades Livros “A Química no Cotidiano” comemorativas. A Sociedade Brasi- leira de Química (SBQ) coordenou as Este livros, juntamente com o periódi- ações e, juntamente com a Associa- co Química Nova na Escola, uma pu- ção Brasileira de Química-ABIQUIM, blicação da SBQ para professores e os Conselhos Regionais de Química, alunos do ensino médio e graduação, os museus de ciência, as universida- foram reunidos num DVD e foram dis- des e escolas de ensino fundamental tribuídas 80 mil cópias no Brasil para e médio, realizaram em torno de 150 as escolas públicas. Coleção de livros “Química no Cotidiano” projetos ao longo de 2011 e em todo o território brasileiro.

O Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), órgão governa- mental responsável pela formulação e implementação da política nacional de ciência e tecnologia, patrocinou 2 grandes projetos nacionais, que per- mitiram a realização de exposições, feiras de ciências, atividades artísti- cas e publicação de material de divul- gação de ciência, entre outras ações, com a participação direta da SBQ.

A primeira ação da SBQ/AIQ, ainda em 2010, foi um concurso para gerar um selo comemorativo do AIQ em lín- gua portuguesa. O selo vencedor foi Portal www.quimica2011.org.br reunido ao selo internacional, e pas- sou a ser usado por universidades, escolas, órgãos públicos e indústrias Tabela 1 ‒ Projetos que tiveram maior sucesso no portal www.quimica2011.org.br privadas.

Número de visitas/downloads Foi criado um portal brasileiro come- Sessão (2011) morativo do AIQ, coordenado pela SBQ, www.quimica2011.org.br. Em 365 dias de química 68 524 2011 o portal teve 520 mil visitas, um marco para um portal de ciências bra- Download da coleção de livros Química no Cotidiano 23 504 sileiro. AIQ nas escolas (projetos) 20 196

Entre as várias sessões do portal, Eventos pelo Brasil 13 497 cabe destacar o projeto Química no Cotidiano, no qual foram publicados Download do livro de experiências para miúdos 13 010 oito livros de divulgação de ciência, Download da exposição de painéis 11 990 dois livros sobre experiências de quí-

Química 127 - out/dez 12 17 Ano Internacional da Química

Exposição de painéis “A Química no Cotidiano”

No primeiro semestre de 2011, esta exposição, cujo objetivo foi apresentar a química em vários contextos, como na energia, agricultura, alimentação, saúde e comunicação, foi divulga- da pelos museus de ciência em todo país, numa parceria com a SBQ. Em alguns estados houve uma intensa itinerância da exposição para as cida- des do interior, com destaque em TVs e jornais. A partir de agosto de 2011, a exposição foi disponibilizada para acesso livre na rede, especialmente para escolas cadastradas e professo- res (11 990 downloads).

Painéis “A Química no Cotidiano” Outro projeto de sucesso no portal foi o 365 Dias de Química, que contou com entrevistas de profissionais da química e moléculas contextualizadas com manipulação de imagem. Como o nome do projeto reflete, foram adi- cionados ao portal, em cada dia, uma entrevista e uma molécula, um ver- dadeiro esforço conjunto de alunos e professores universitários.

O Brasil teve a oportunidade de re- ceber vários cientistas agraciados com o prémio Nobel, como Ei-ichi Negishi (2010), (2009), Richard R. Schrock (2005) and Kurt Wüthrich (2002), que abrilhantaram as ações brasileiras. Entre as inúme- Dr. no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro (outubro de 2011) ras conferências e eventos científicos, destacou-se o ciclo de seminários da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, com transmissão ao vivo para todo país e que contou com a presença da ex- -presidente da IUPAC, Nicole Moreau.

A química também foi cantada, dan- çada e ergueu as velas das janga- das do estado de Alagoas, durante o carnaval de 2011. No Rio de Janeiro, subiu os morros cariocas, onde o pré- mio Nobel de 2008, Martin Chalfie, abriu a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia – SNCT, medindo o pH das águas cariocas com alunos do Complexo do Alemão. E em todos os estados brasileiros houve comemora- ções criativas, como teatros, oficinas, concursos e exposições. Através da profícua parceria entre a SBQ, a Se- mana Nacional de Ciência e Tecnolo- Projeto “365 Dias de Química” Carnaval de 2011 no estado de Alagoas

18 Química 127 Ano Internacional da Química Ano Internacional da Química

gia (SNCT) e os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT) de Energia e Meio Ambiente e de Mate- riais Nanoestruturados, a experiência global da água – pH do planeta, tor- nou-se a maior experiência até hoje já realizada nas escolas brasileiras. Esta ação, proposta pela Unesco e pela IU- PAC, e lançada em janeiro de 2011 na abertura do AIQ – Paris, permitiu que jovens de todo mundo avaliassem a qualidade das águas de rios, lagos, nascentes e poços. No Brasil foram distribuídos cerca de 35 000 kits, per- correndo inúmeras localidades brasi- leiras, a exemplo da aldeia Indígena Desana, no Rio Negro, Amazônia. No portal da Química Nova Interativa – QNINT, da SBQ (www.qnint.sbq.org.br), é possível acompanhar o registo das experiências e quem as realizou, des- bravando o território brasileiro com esta belíssima ação.

Foram apresentadas no país três grandes exposições sobre a química: Elementar, que abriu os trabalhos do AIQ, Cadê a Química e Química no Cotidiano. A primeira delas foi expos- ta na região sudeste e na Amazônia, e teve a sua tabela periódica interativa premiada no concurso International Awards-2012.

De realçar ainda a 34.ª Reunião da SBQ – RASBQ-2011, que contou com a presença de 4500 associados A experiência global da água - pH do planeta e com os Presidentes da IUPAC, ACS e RSC, que participaram ativamente em debates e proferiram palestras. A aproximação das sociedades coirmãs é uma meta que vem sendo trabalha- da, pela SBQ, há alguns anos e que muito avançou no último biénio.

O projeto do AIQ no Brasil permane- ceu ativo em 2012. Entre várias ações, de realçar a participação na Conferên- cia da Rio + 20, onde escolas e famí- lias discutiram e fizeram ensaios sobre a qualidade da água.

Só nos resta agradecer a todos os parceiros desta empreitada, cujos so- nhos em torno de uma química mais consciente, bela e instigante puderam ser concretizados pelo esforço comu- Tabela periódica interativa nitário, num país onde a educação está muito aquém do que seu povo merece.

Cláudia Moraes de Rezende ([email protected]) AIQ/Brasil na Vice-presidente da SBQ e coordenado- Conferência ra das atividades do AIQ/SBQ/Brasil da Rio + 20

Química 127 - out/dez 12 19

Livros e Multimédia

Life on the Edge. Peter Danckwerts GC MBE FRS brave,shy, brilliant

Sebastião J. Formosinho*

Autor: Peter Varey Editora: PVF Publications N.o páginas: 378 ISBN: 978-0-95384420-2-9

O ano de 2012 fez vir a lume uma bio- permanente. Como refere, as bombas Tavares da Silva, hoje professor ju- grafia de Peter Danckwerts: “Life on alemãs eram letais, mas desenhadas bilado da Universidade de Coimbra, the Edge. Peter Danckwerts GC MBE com uma lógica perfeita, que uma vez e de uma seleção de colaboradores. FRS brave, shy, brilliant”, da autoria de compreendida permitia lidar com elas Para a comunidade de académicos Peter Varey. Em 1940, Peter era um jo- sem perigo de maior. Já as italianas portugueses da década de 60 e 70, vem graduado em Química no Balliol tinham designs um pouco lunáticos, o que fez a sua formação doutoral ou College da Universidade de Oxford. que as tornavam mais imprevisíveis, pós-doutoral em universidades britâ- Ao tempo, a Química oxfordiana era mas não eram letais. nicas, o livro traz inúmeras memórias, demasiado descritiva e desprovida de historietas académicas, pormenores matemática e física. Dizia-se que se Aos 27 anos encontra-se desmobi- de bastidores e da ribalta da ciência. o estudante de química encontrasse lizado à procura de um emprego in- num livro de texto uma diferencial vira- dustrial, passado seis anos da sua Em apêndice, a obra traz um bónus, va a página e se encontrasse um sinal estadia numa empresa de argilas e precisamente dedicado a Tavares da de integral fechava o livro. barros. Todavia, conseguiu uma bolsa Silva, “Sadi Carnot, precocious poly- de estudos para ir estudar para o MIT math”, um desafio a historiadores e A obra inicia-se com um Danckwerts num curso de dois anos de engenha- filósofos da Termodinâmica. Quiçá o de 23 anos a oferecer-se à Royal Navy ria química. Regressado a Inglaterra, e mais relevante fruto das investigações para participar no esforço de guerra. ante a dificuldade de regressar a um de Danckwerts, em “neglected corners Foi colocado no serviço de minas e emprego industrial, entrou em contacto of science”, após aposentação. Deixou armadilhas, onde teve formação para com o Diretor do recém-criado Depar- um escrito sobre os estudos de Car- a desativação de bombas provenien- tamento de Engenharia Química da not, pois entendia não haver ele reco- tes dos bombardeamentos da aviação Universidade de Cambridge, Teren- lhido todo o crédito que merecia. Não o alemã na Grã-Bretanha. A sua ação foi ce Fox. O Departamento foi fruto do conseguiu publicar em vida, mas o au- tão meritória e corajosa que lhe valeu empenho de John Oriel, executivo da tor da presente obra dá-o a lume. Ainda ser condecorado com a George Cross Shell, e Ronald Norrish, professor de bem que os caminhos da ciência não e, posteriormente, recebeu a Order of química em Cambridge. Ao tempo, o são os de uma dogmática insuperável. the British Empire (MBE). A biografia Departamento ainda não dispunha de faz-nos percorrer o ambiente da guer- instalações. Aliás, Departamento que O jovem e ainda desconhecido Sadi ra em Inglaterra e depois vê-o mobili- era visto com apreensão pelos outros Carnot teve de assumir a linguagem zado para Gibraltar e posteriormente Departamentos mais antigos, “não fos- do calórico, se bem que nele não acre- para a Sicília, onde ficou ferido e teve se emitir fumos corrosivos”. ditasse. Mas alcançou uma formulação uma lenta recuperação da sua perda da 1.ª lei da termodinâmica, apesar de de consciência. A perspetiva de Peter Na “boémia de Cambridge” vamos cru- ao tempo ainda não ter sido formulado é que na sua atividade tinha ocasio- zar com nomes como George Porter, o conceito de energia. Alcançou uma nalmente momentos de apreensão e Francis Crick, James Watson, Kenneth estimativa para o “equivalente mecâ- medo, mas nada se comparava com Denbigh e tantos outros, dentro e fora nico do calor (calórico)” pelo menos quem estivesse nas frentes de com- de Cambridge, como Dainton, Peter uns 10 anos antes das experiências de bate, onde um tal ambiente era quase Gray, Fred Hoyle, Alexander Todd e Joule. Alfred Ubbelohde. Mas também os tra- * Departamento de Química Universidade de Coimbra balhos de alguns dos seus estudantes A obra dispõe ainda de um índice temá- E-mail: [email protected] de doutoramento, entre eles Armando tico e onomástico muito abrangente.

Química 127 - out/dez 12 21 Livros e Multimédia

Ensino Experimental das Ciências. Um Guia para Professores do Ensino Secundário. Física e Química

Maria Helena Caldeira*

Autores: Paulo Simeão Carvalho, Adriano Sampaio e Sousa, João Paiva e António José Ferreira Editora: U.Porto Editorial N.o páginas: 253 ISBN: 978-989-8265-95-1

Um livro indispensável a um profes- O presente volume (o primeiro de da conceptual: em vez de se limitarem sor de Física e Química dois) – que aborda temas específicos à enumeração de orientações técni- de Física e de Química - está orga- cas divorciadas da aprendizagem a Não tenho qualquer dúvida de que o nizado em 5 capítulos. Os dois capí- que se destinam, os autores, a propó- livro “Ensino Experimental das Ciên- tulos iniciais são dedicados às bases sito da medição de grandezas físicas, cias – Um Guia para Professores do subjacentes ao significado da Ciência, a par com instruções e recomenda- Ensino Secundário”, de Paulo Simeão da sua natureza e das implicações do ções, aproveitam para aprofundar os Carvalho, Adriano Sampaio e Sousa, seu ensino, nomeadamente à prática conceitos com elas relacionados. João Paiva e António José Ferreira, laboratorial e experimental. recentemente editado pela Univer- É ainda abordado o papel das ativi- sidade do Porto, será uma obra de No Capítulo 1 é feita uma introdução à dades experimentais virtuais, como referência no campo da Didática das natureza e processos da Ciência e, no complemento ou alternativa aos tra- Ciências Experimentais. Capítulo 2, apresenta-se uma visão balhos práticos tradicionais. geral, atualizada, das principais con- Corolário da experiência acumulada clusões da investigação em Didática Outro pormenor importante nestes pelos autores em largos anos de do- do Ensino Experimental das Ciências. capítulos é o espaço dedicado à pla- cência e de formação inicial e contí- No Capítulo 3 é tratado um assunto nificação e à execução experimental. nua de professores, tem como princi- que geralmente cria muitas dificulda- O professor é ajudado a desenhar a pal objetivo “ajudar a desenvolver um des e até controvérsias entre os do- atividade experimental e, depois, a conjunto de competências que levem centes: a análise e o tratamento de executá-la: desde as decisões preli- os professores a valorizar mais o tra- dados experimentais. Grandezas e minares à montagem experimental, balho prático e experimental e a im- unidades, erros e incertezas na me- às normas de segurança, ao registo e plementá-lo de uma forma adequada dição de grandezas, algarismos sig- análise de resultados ... à visão atual da Epistemologia e da nificativos, análise gráfica... tudo com Didática das Ciências”. Esta preocu- exemplos práticos, respeitando sem- A comunicação de resultados mere- pação indicia uma perspetiva profun- pre as normas e as recomendações ceu um destaque especial, dada a sua damente moderna da Educação em atuais. importância em Ciência. Ciência. Revela também que esta obra proporcionará aos professores Os Capítulos 4 e 5 do livro abordam Neste livro nada foi descurado, ne- sobejas oportunidades de reflexão so- temas específicos do ensino experi- nhum detalhe foi esquecido. Sempre bre como facultar aos jovens experi- mental, respetivamente em Física e que possível, procedeu-se à ilustra- ências de aprendizagem que lhes per- Química. É dedicada bastante aten- ção com exemplos concretos e exe- mitam apreciar as razões pelas quais ção à organização do laboratório, quíveis, quer do ponto de vista das é importante aprender Ciências. Por- aspeto que os autores reiteram como teorias que suportam a aprendizagem que é nesta perspetiva didática que se essencial para garantir que o traba- das ciências, quer na execução de preconiza uma Educação em Ciência, lho experimental seja realizado com atividades experimentais, quer ainda sobre a Ciência e pela Ciência. sucesso e em segurança. Porém, so- na sua exploração didática e no trata- bressai conjuntamente uma reflexão mento de resultados. sobre conceitos científicos, uma op- * Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade de Coimbra ção que me apraz registar, pois não se É de realçar a opção feita de o con- E-mail: [email protected] dissocia, assim, a prática processual teúdo do livro não se cingir aos pro-

22 Química 127 Livros e Multimédia Livros e Multimédia

gramas atuais. Estamos perante uma siste ainda uma percentagem elevada A preocupação constante que res- obra útil no presente, mas também no de professores de Ciências que dedi- salta da leitura deste livro é a de ser futuro, independentemente das alte- ca um tempo muitíssimo reduzido ao útil e de poder contribuir eficazmente rações programáticas que vierem a ensino experimental. As razões que para um ensino melhor. Contém todo ocorrer. eventualmente originam este compor- um saber adquirido e consolidado na tamento são, talvez, medos e insegu- experiência, na utilização no terreno, Como os autores referem, “mais im- rança, decorrentes de uma provável no cuidado com a formação, na atua- portante do que discutir se o trabalho formação inicial deficiente. Além dis- lização didática proveniente da inves- prático deve ou não deve ser realizado so, muitos docentes que valorizam e tigação. no ensino das ciências é discutir como não descuram o trabalho laboratorial/ utilizá-lo de modo eficaz”. De facto, experimental não o fazem de maneira Elaborado com grande rigor, profun- parece consensual que o ensino prá- profícua. É dada primazia a demons- didade e cuidado, constitui, de facto, tico e experimental desempenha um trações e verificações experimentais, não só um excelente meio de atualiza- papel fundamental na Educação em bem como a metodologias revelado- ção, como um grande apoio à resolu- Ciência. No entanto, apesar da práti- ras de fraca atualização didática no ção de dificuldades e um forte estímu- ca laboratorial ser consignada como que diz respeito ao modo como de- lo à realização adequada e eficaz da obrigatória nos programas atualmente vem ser realizadas com eficácia as prática experimental-laboratorial no em vigor, a realidade mostra que per- atividades práticas de laboratório. Ensino da Física e da Química.

Histórias com Química

João Paiva*

Autores: Carla Morais e Pedro Mota Teixeira Editora: QuidNovi N.o páginas: 96 ISBN: 978-989-554-910-8

Este livro surge do reconhecimento de uma narrativa ficcional, onde há lugar regular, bem como uma alimentação que o ensino das ciências nos primei- para coloridas naves espaciais e via- saudável e equilibrada. O jogo tradicio- ros anos de escolaridade pode contri- gens no interior das estrelas, ou ainda nal do anelzinho surge como pretexto buir de forma decisiva para a promo- para conversas com um mocho sobre para se conhecer a alquimia e o dese- ção da literacia científica, potenciando densidade e elementos químicos – jo de transmutação dos metais, bem o desenvolvimento de competências poderá contribuir-se para despertar a como o enxofre, o azoto, o fósforo e necessárias ao exercício de uma ci- curiosidade e preparar o cérebro dos o potássio na aproximação às dinâmi- dadania interveniente e informada e mais jovens para o processamento de cas da vida rural nas vinhas do Douro. à posterior inserção numa vida pro- conhecimentos mais intrincados. fissional qualificada e ligada a áreas Neste livro, onde as informações pre- científicas. Ao longo das histórias, e sempre que cisas e complexas do meio científi- oportuno, sublinha-se o carater emi- co são condensadas em linguagem Contando histórias - nas quais os va- nentemente experimental da ciência acessível e histórias que se deseja lores e o conteúdo informativo podem química. É também na aproximação sejam atraentes, bem como em pro- ser apresentados, principalmente, por entre a química e a pasta de dentes postas práticas e experiências cientí- meio de aspetos lúdicos, distribuindo rica em flúor que se desenha uma via ficas simples, o convite é desafiante: informações científicas ao longo de de sensibilização para a importância experienciar o território das histórias e da higiene oral ou ainda para a neces- do lúdico para nele aprender, com fas- * Faculdade de Ciências da Universidade do Porto E-mail: [email protected] sidade de ter uma prática desportiva cínio, o grande fascínio da química. O QUÍMICA DESEJA-LHE BOAS FESTAS

Química 127 - out/dez 12 23

Entrevista

José Empis Vencedor do Prémio EuCheMS Award for Service 2012

Entrevista conduzida por Aida Moreira da Silva*

O Professor Doutor José Empis foi recentemente galardoado com o Prémio EuCheMS Award for Service 2012, da European Association for Chemical and Molecular Sciences, na qual foi durante vários anos representante da SPQ na Food Chemistry Division. Aproveitámos a disponibilidade do Prof. José Empis para conhecermos melhor o seu percurso académico e científico.

AMS: Quando e porquê decidiu ser o Prof. Manuel Alves Marques, meu Agroindustrial, estratégia esta que Químico? professor de Física. mais tarde não logrou apoio a nível do Senado da UTL. JE: Não sei exatamente, mas acho AMS: Em 1970 licenciou-se em En- que terá sido aos 10 ou 11 anos, por genharia Químico-Industrial, no IST, AMS: Desde 1970 que é sócio da causa de um estojo de experiências tendo-se doutorado em 1982, na mes- SPQ, e desde 2002 que pertence à que me foi dado como presente. ma instituição, em Química-Física Or- Divisão de Química Alimentar. Tendo gânica. Quando e como iniciou a sua recebido muito recentemente a Men- AMS: Fazendo um balanço dos tem- carreira no IST? ção Honrosa da EuCheMS, pode-nos pos de estudante, quais foram os elucidar como começou e decorreu a professores que o marcaram na sua JE: Depois de dois anos como bolsei- ligação a esta organização? vida? ro (no segundo dos quais recebi uma bolsa da Soda Póvoa), fui assistente JE: No final de 1986 fui abordado pelo JE: Dos 12 aos 17 fui aluno do Dr. eventual, depois assistente, professor Professor Alberto Romão Dias, que Rómulo de Carvalho, que obviamente auxiliar e professor associado, entre creio seria ao tempo Presidente da preferia a Física à Química, ensinan- 1970 e 1986, enquanto prestava ser- SPQ ou Secretário de Estado. A SPQ do-me ambas com aquele seu toque viço na então secção de Química Or- tinha sido contactada pelo Prof. Pe- especial. Dos meus professores do Li- gânica do IST. ter B. Czedik-Eysenberg para nome- ceu Pedro Nunes destaco também o ar um delegado dessa Sociedade ao Dr. José Gonçalves Calado, professor AMS: Como surgiu a Química de Ali- “Working Party on Food Chemistry” da de Matemática. No IST destaco entre mentos nos planos de estudos de cur- FECS (Federation of European Che- os meus professores, evidentemente sos ministrados no IST? mical Societies), uma organização sem desprimor para os restantes, o que funcionava como uma federação Prof. Luís Aires Barros e o Eng.º Nuno JE: Em 1986 fui abordado pelo pro- europeia das sociedades de química, Grossman (Mineralogia e Geologia), fessor Júlio Novais, no sentido de nomeadamente através de divisões o então Eng.º João Furtado Coelho, passar a integrar a secção de Biotec- ou grupos de trabalho em subdomí- que foi meu assistente em Matemá- nologia nascente no IST, nomeada- nios especializados. Peter Czedik- ticas Gerais e mais tarde veio a ser mente para lecionar Química de Ali- -Eysenberg havia criado este grupo Professor Catedrático de Matemática mentos e (Bio)Tecnologia Alimentar, de trabalho, creio que em 1979-1980. na Universidade de Lisboa, e os meus e integrei a partir do ano de 1986-7 a Ele era professor universitário em professores de Química, em particular então Secção de Biotecnologia. Havia Viena, e quadro superior da Unilever. o Prof. Fraústo da Silva e o Prof. Ber- subjacente uma estratégia do DEQ do Para entender melhor a sua iniciativa, nardo Herold, e a Doutora Maria Cân- IST de desenvolvimento de uma área é útil levar em conta que na FECS dida Barrinha Lóia. Destaco também de Engenharia Alimentar, na medida se haviam criado outras entidades em que na UTL esse domínio estava especializadas, nomeadamente em meio esquecido no ISA (Instituto Su- Química Analítica; por outro lado, é * Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Coimbra perior de Agronomia), aonde funcio- preciso relembrar que naquela altura Unidade de Investigação Química-Física Molecular, Universidade de Coimbra nava apenas uma Secção Autónoma existia ainda a ‘cortina de ferro’, mas E-mail: [email protected] que englobava tópicos de Engenharia transacionavam-se muitos produtos

Química 127 - out/dez 12 25 Entrevista alimentares entre os seus dois lados. Este grupo de trabalho reunia-se anual- e das Pescas) e, portanto, necessita- A localização geográfica de Viena, mente em Viena, no Outono, durante va, para me deslocar ao estrangeiro, e alguns apoios pecuniários a que o o mandato do Prof. Czedik-Eysenberg de uma autorização do Secretário de Prof. Czedik-Eysenberg lograva ace- como seu Presidente, e mais tarde Estado, que obtinha, mas chegou a der permitiram que rapidamente este reunia-se na altura e no local do con- ser focado que, num contacto com os grupo de trabalho contasse com um gresso de Outono organizado pela Di- serviços da Secretaria de Estado, na número elevado de representantes vision of Food Chemistry. altura, a entidade referente à reunião das sociedades de química europeias. à qual eu pretendia deslocar-me pura Os representantes das sociedades de AMS: Desde quando Portugal este- e simplesmente não existia… química eram um conjunto equilibrado ve representado através da SPQ na de químicos de alimentos com ativida- FECS? AMS: Conte-nos o seu envolvimento de científica, funcionários de empre- com a área da Química de Alimentos, sas da área alimentar, e membros das JE: Não sei exatamente desde quan- no país. autoridades reguladoras. Este grupo do a SPQ esteve representada na preparou uma proposta de Currículo FECS. Sei que a Profª Maria José JE: Cumpre-me registar que graças a Europeu em química de alimentos1, Calhorda foi eleita para a Direção da uma iniciativa do Professor António Si- publicado na Zeitschrif fuer Lebens- FECS antes de eu ter passado por lá, mões Lopes, Reitor da UTL (1987/99), mittel Untersuchung und Forschung mas não sei quais os anos, e de qual- foi criado na UTL um Mestrado em (mais tarde European Food Resear- quer modo estas eleições são a título Ciência e Tecnologia de Alimentos, ch and Technology), publicação que individual. No que toca à Química de com a participação de quatro escolas, ainda hoje é o órgão oficial desta Di- Alimentos, fui delegado nacional da FMV, ISA, ISEG e IST, no qual colabo- visão. Procurava também estabelecer SPQ no Working Party on Food Che- rei desde a primeira edição. Cumpre colaborações com grupos de trabalho mistry, mais tarde Division of Food por último salientar a organização de afins, promovendo congressos ou Chemistry, entre 1987 e 2009, tendo Encontros de Química de Alimentos sessões de trabalho conjuntas, e ini- sido seu secretário durante quatro (EQA), a partir de 1993, ao tempo ciou uma série destes acontecimentos anos. Organizei um Congresso Inter- também catalisada pelo Prof. Romão científicos, tentando que os tópicos nacional sobre Acreditação e Boas Dias, que convenceu o Prof. Jorge Jus- destas reuniões não se sobrepuses- Práticas Laboratoriais em Química tino e eu próprio de que se deveriam sem, mantendo-se ainda hoje estas de Alimentos (no INETI, creio que em organizar encontros neste domínio. reuniões já com números de série ra- 1996). Contribuí também para a cria- A 12.ª edição destes encontros está zoavelmente elevados. Isto para além ção da série de Congressos sobre prevista para 2014 em Lisboa, e eles do encontro Europeu bienal de quími- Pigmentos em Alimentos, anterior- contam em geral com níveis de parti- ca de alimentos, EUROFOODCHEM, mente referida. O sucessor do Prof. cipação bastante elevados, e têm em cuja primeira edição foi em Viena em Czedik-Eysenberg como Presidente minha opinião bastante interesse, ten- 1981, continuou bienalmente, estan- da Food Chemistry Division foi o Dr. do sido fulcrais no desenvolvimento do prevista a versão XVII em Istambul Reto Battaglia, ao tempo Diretor do de colaborações entre entidades de em 2013. São alguns exemplos de Laboratório de Controlo de Qualida- diversos pontos do país, e contado congressos recentes/futuros organi- de da Migros, em Zurique. Em tem- com participações significativas de in- zados pela Food Chemistry Division, po sucedeu-lhe o Dr. Roger Fenwick vestigadores estrangeiros convidados. a série Chemical Reactions in Foods2, do IFR em Norwich, que secretariei. a série Pigments in Food3, a série In Entretanto, o Dr. Battaglia havia sido AMS: Para além da docência teve, e Vino Analytica Scientia, entre outras. eleito Presidente da FECS e iniciado tem, múltiplas atividades, incluindo a a sua transformação na organização de consultor em assuntos de proprie- com existência real (a designação dade intelectual. Pode-nos falar sobre FECS pertence a Federation of Euro- essas atividades? pean Cancer Societies), a EuCheMS – European Association of Molecular JE: Ainda enquanto assistente do Sciences4, é hoje em dia uma asso- Prof. Herold, fui por diversas vezes ciação sem fins lucrativos, constituída chamado a intervir como testemunha e registada em Bruxelas. Lembro-me em pleitos de patentes, no tribunal cí- aliás que, tendo sido eleito membro vel. Desde essa altura interessei-me da Direção da EuCheMS (em forma- por propriedade industrial, nomeada- ção) durante um triénio e em seguida mente porque o meu melhor amigo cumprido dois mandatos como Tesou- e ex-colega de Liceu, Carlos Olavo, reiro daquela Direção, se me deparou tinha entretanto obtido uma licencia- um problema curioso relativo a uma tura em Direito, era Agente Oficial da deslocação a uma reunião da Dire- Propriedade Industrial e autor de di- ção, ocorrida antes da constituição versas obras nessa área. Mais tarde, efetiva em novembro de 20055. Eu era enquanto Diretor do IBQTA do INETI ao tempo Presidente do INIAP (Insti- (em 1993, provavelmente) integrei Prof. José Empis no seu gabinete de trabalho tuto Nacional de Investigação Agrária um grupo de trabalho que, sob a dire-

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ção do Prof. Oliveira Ascensão, tinha tante prazer é ver pessoas que sob a do proteína vegetal e outros com- como missão preparar um novo Có- minha orientação ou coorientação ter- ponentes funcionais digo da Propriedade Industrial, tendo minaram os seus doutoramentos em . antioxidantes naturais e estabili- preparado e apresentado um trabalho áreas distintas, colaborarem hoje em dade oxidativa de lípidos acerca de Modelos de Utilidade. Esta dia entre si em tarefas de investigação . deteção de irradiação em produtos minha atividade liga-se sobremaneira por elas definidas e que, de alguma . processamento de pescado a aspetos de química e biotecnologia forma, mantêm e diversificam aquelas . inclusões moleculares, aspetos farmacêuticas. em que trabalharam comigo. texturais de alimentos e sistemas polidispersos; caracterização e AMS: Nas suas atividades de investi- Notas propriedades físico-químicas e gação e desenvolvimento, que secto- funcionais res privilegiou? 1 Veja-se por exemplo http://www.euchems. . processamento mínimo e qualida- eu/fileadmin/user_upload/binaries/high- de de frutos e hortícolas JE: No decurso dos anos 1986/2009, eredfoodchem_tcm23-28617.pdf e mesmo um pouco depois, tive oca- 2 http://www.chemistry-conferences. Trabalhou, entre 1985 e 1991, em re- sião do orientar e/ou coorientar onze com/2012/11/14%20-%2016%20Chemi- presentação do IST, como consultor atuais Doutores, cujas dissertações cal%20Reactions%20in%20Foods%20 para a área do desenvolvimento, num doutorais incluíam diversos temas (Prague%20-%20CZ).htm grupo empresarial ligado aos sectores alimentares, parte deles referindo-se 3 www.foodpigments2010.mke.org.hu de alimentação animal e humana, de- expressamente a química de alimen- 4 http://www.euchems.org/ tergentes e produtos de higiene e be- tos, embora temas como a biotecno- 5 http://www.euchems.eu/fileadmin/user_ leza. Atuou como perito em proprieda- logia microalgal, a física de alimentos upload/about/EuCheMS_constitution_ de industrial em assuntos de química e também a microbiologia de alimen- and_amendments_2012.pdf orgânica e de ciência e tecnologia de tos tenham sido parte integrante do alimentos. Foi Diretor do “Instituto de leque de disciplinas centrais. A todos Biotecnologia, Química Fina e Tecno- eles a devida vénia por me terem Nota Biográfica do Professor logias Alimentares” (IBQTA), do INETI, “aturado” com sucesso. José Empis entre 1993 e 1999; coordenador do Colégio de Engenharia Química-Re- AMS: Finalizando, diga-nos qual des- José Empis é casado com três filhos sas áreas acha que tem uma obra e três netos. Possui Licenciatura em gião Sul, no biénio 1999-2001; pre- mais relevante e na qual se sente Engenharia Químico-Industrial no Ins- sidente do DEQ-IST no ano letivo de mais feliz. tituto Superior Técnico (1970), Dou- 2001-2002; presidente do INIAP-Insti- toramento em Química (Q. Orgânica tuto Nacional de Investigação Agrária JE: Pois, acho que a esta pergunta Física) no Instituto Superior Técnico e das Pescas, entre julho de 2002 e não sou capaz de responder. Tive a (B.J. Herold, 1982) e Agregação no dezembro de 2006; Professor Con- sorte da minha atividade ser em ge- Instituto Superior Técnico (1996). As vidado do Instituto Superior de Agro- ral lúdica. Gostei sempre muito dos áreas em que concentrou as suas nomia desde 1997; eleito membro do diversos temas que fui investigando atividades de I&D são as das proprie- Conselho Executivo da Federação ao longo da minha carreira, desde os dades e conservação de alimentos ou Europeia de Sociedades de Química, problemas em química física orgâni- ingredientes para alimentos. Os traba- em outubro de 2002, sendo o seu te- ca, aos aspetos ligados à biotecno- lhos englobaram temas nas seguintes soureiro eleito até outubro de 2008, e logia microalgal, à descontaminação subáreas: representou a Sociedade Portuguesa microbiana, à química supramolecu- de Química na Food Chemistry Divi- lar, para mencionar apenas alguns. . produção de biomassa microalgal sion da EuCheMS. Tive a sorte de ter ajudado a definir e sua utilização na cadeia alimen- alguns problemas que colaboradores tar/cosmética Encontra-se aposentado da carreira meus tentaram experimentalmente . desenvolvimento e utilização de docente do ensino superior universi- resolver. Um aspeto que me dá bas- ingredientes alimentares utilizan- tário desde 2009.

Em 2013 torne-se sócio da SPQ e ficará também atualizado sobre as últimas novidades e avanços no mundo da Química Em 2012 foi assim ...

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Sede: Rua do Proletariado, 1 2790 – 138 Carnaxide Tel: 214 247 300 Porto: Av. Assoc. Comercial e Industrial de Gondomar, 290 4420 – 620 Gondomar Tel: 223 778 400 www.izasa.pt

Análise de Imagem “in Vivo” Raios X (Difracção e Fluorescência) Biospace Lab, SkyScan, iThera Medical, Rigaku Xray Precision Microscópia Electrónica Biologia Molecular e Análise Genética Jeol Qiagen, Beckman Coulter, Análise de Imagem Cepheid, Pyrosequencing, Corbett, Nikon Espectrometria NanoString, Advanced Analytical, Microscopica Óptica Shimadzu, Oxford Instruments Syngene Nikon Cromatografia Análise de Proteínas Imagem Científica Shimadzu, Camag Biotek, Shimadzu, Beckman Coulter, Andor Espectrometria de Massas ALuminex Shimadzu, Jeol Biologia Celular – Citometria de Fluxo Alimentação Beckman Coulter, Fluid Imaging, Amnis, Perten Seahorse, Nikon, Biospherix, Huron Análises de Cor Centrifugação / Ultra Centrifugação Hunterlab Beckman Coulter Tª: Estufas, Incubadores, CO , etc 2 Análises de Oxigénio Instrumentação para Memmert OxiSense Microplacas Análise de águas Mecânica de Fluídos Biotek Lovibond Dantec Robótica Armários de Segurança Tecnologia de Partículas Beckman Coulter Düperthal Beckman Coulter Coagulação Rotavapores e Agitadores Reactores de Fluxo Contínuo IL Heidolph Uniqsys Microdissecção Láser Congeladores -86ºC Microbiologia Rápida Arcturus Haier Celsis Fisiologia de Plantas Geradores de Gases ADC, Delta T, Conviron Peak Scientific Criopreservação Mobiliário de Laboratório Metrologia Taylor-Warton, Sy-Lab Mahr, Nikon Análise de águas Lab Materialografia Shimadzu, TFS (auto-analisadores) Struers, Clara Vision Analisadores águas on-line Ensaios de Materiais S::can, Shimadzu, Chemtrac, Hf Sci., Process Shimadzu, Espec, Dynisco Instruments Ensaios não Destructivos Toxicidade águas on-line Foerster, Tiede, Yxlon, Microlan Oxford, karl Deutsch

Entrevista

Livia Sarkadi Presidente da Divisão de Química Alimentar da EuCheMS

Entrevista conduzida por Joana Amaral

A Professora Doutora Livia Simon Sarkadi é a atual presidente da Divisão de Química Alimentar da Associação Europeia de Química e Ciências Moleculares (EuCheMS). Aproveitando a sua presença no 4.º Congresso de Química da EuCheMS, que teve lugar em Praga, entre 26 e 30 de agosto de 2012, a Profª. Drª. Livia Simon Sarkadi aceitou realizar uma entrevista exclusiva para o QUÍMICA.

BQ: A Divisão de Química Alimentar sido fundada em 1977 no âmbito da delegados de sociedades membro da é provavelmente uma das maiores, antiga FECS como Grupo de Traba- EuCheMS de 35 países. Este é um ou talvez mesmo a maior, de entre lho em Química Alimentar (Working número bastante bom, mas infeliz- as várias Divisões da Sociedade Por- Party on Food Chemistry) com Peter mente nem todos os representantes tuguesa de Química (SPQ), uma das Czedik-Eysenberg, nosso presiden- são membros ativos. É por isso que sociedades membro da EuCheMS, te austríaco de longo tempo e “pai”. decidimos durante o meu segundo o que denota o interesse de muitos Dos vários objetivos da Divisão de mandato como Presidente da FCD investigadores nesta área temática. Química Alimentar (FCD), um dos renovar os nossos membros e tentar Pode por favor informar-nos sobre a mais importantes é a organização de encontrar representantes capazes importância e os objetivos principais reuniões científicas, individualmente de contribuir para o trabalho da FCD. da Food Chemistry Division da Eu- ou em cooperação com outras orga- Posso dizer que os representantes da CheMS (FCD-EuCheMS)? nizações e Divisões da EuCheMS, Sociedade Portuguesa de Química que permitam reunir colegas mais são sempre membros muito ativos da LSS: A Associação Europeia de Quí- experientes juntamente com jovens FCD. Estou muito contente por poder mica e Ciências Moleculares (Eu- que tenham um interesse geral na anunciar aos leitores do Boletim da CheMS) é uma organização sem área da ciência e da química dos Sociedade Portuguesa de Química fins lucrativos fundada em 1970. A alimentos. Pela atuação da FCD- que o Prof. José Empis recebeu o EuCheMS incorpora o papel e as res- -EuCheMS foram estabelecidas uma Prémio EuCheMS Award for Service ponsabilidades da antiga Federação série de conferências, por exemplo 2012, em reconhecimento da sua ex- de Sociedades Europeias de Química EuroFoodChem, Chemical Reactions tensa contribuição para a EuCheMS. e Instituições Profissionais (FECS), in Food, Pigments in Food e, mais re- José Empis foi membro do Conselho que adotou o nome EuCheMS em centemente, CoCoTea. Já a série de Executivo da Federação Europeia 2004. A EuCheMS representa cerca conferências In Vino Analytica Scien- de Sociedades de Química (FECS), de 160000 químicos da academia, tia são organizadas conjuntamente desempenhando um papel ativo na da indústria e de instituições gover- pela Divisão de Química Alimentar e transformação da FECS em EuChe- namentais de mais de 30 países de Divisão de Química Analítica da Eu- MS. Foi ainda o primeiro tesoureiro da toda a Europa. A EuCheMS tem atual- CheMS. EuCheMS, tendo organizado de for- mente 40 sociedades como membros ma eficiente esta atividade. Durante e suporta 17 divisões e grupos de BQ: Quantas sociedades europeias muitos anos ele foi também delegado trabalho que abrangem as principais estão representadas na FCD-EuChe- português para o Grupo de Trabalho áreas da química. O principal objeti- MS? Acha que essas sociedades se sobre Química Alimentar (mais tar- vo da EuCheMS é promover a coo- encontram suficientemente envolvi- de Divisão de Química Alimentar), e peração na Europa entre sociedades das com a EuCheMS? Relativamente atuou como secretário por vários anos. científicas e técnicas não-lucrativas à Sociedade Portuguesa de Química, nas áreas das ciências químicas e pode dizer-nos algo? BQ: Durante o 4.º Congresso de Quí- moleculares. Dentro da EuCheMS, a mica da EuCheMS foram realizadas Divisão de Química Alimentar é uma LSS: Com base em dados recentes, cinco sessões paralelas em diferen- das Divisões mais antigas, tendo posso dizer-lhe que a FCD inclui 58 tes temas/tópicos relacionados com a

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Química Alimentar, a qual foi também “a produção de alimentos seguros e científicos para discussão. Alguns uma das áreas temáticas incluídas sustentáveis”, e “dieta e saúde”. Um exemplos são: Novos desenvolvi- nas 14 sessões de posters realizadas. dos representantes na FCD, Keith W. mentos em processamento de ali- Agora que o congresso acabou, qual Waldron, juntamente com Hutchinson mentos e novos alimentos; Micro e é a avaliação global que faz sobre a James, desenvolveu a parte rela- macronutrientes: Biodisponibilidade participação e envolvimento dos “Quí- cionada com a temática “alimentos” e estratégias de medição; Efeitos dos micos Alimentares” neste evento? deste documento. Na área da quími- constituintes alimentares na textura ca alimentar existem muitos desafios, e sabor; Substâncias tóxicas resul- LSS: No âmbito do 4.º Congresso como por exemplo proporcionar uma tantes do processamento (ex: acrila- de Química da EuCheMS, a Divisão quantidade suficiente de alimentos de mida, 3-MCPD, etc.); Nanomateriais de Química Alimentar (FCD) teve um elevada qualidade e nutritivos para em alimentos; Food “omics”; Métodos simpósio de dois dias, que considero uma população rapidamente crescen- analíticos rápidos. O congresso Eu- ter sido muito bem sucedido. Os prin- te a nível mundial; existe igualmente roFoodChem XVII será certamente cipais temas foram: Nanotecnologia, a necessidade de se promover a sus- um excelente fórum para a discussão Alimentos e Processamento; Produ- tentabilidade em toda a cadeia de pro- sobre a integração da química alimen- ção sustentável de alimentos; Quí- dução alimentar; existem problemas tar a nível europeu e mundial, inves- mica analítica como suporte/apoio à globais de doenças relacionadas com tigação em qualidade e segurança produção sustentável de alimentos; a dieta, como por exemplo a obesida- alimentar, e troca de conhecimentos Microconstituintes e análise; Água, de, que é um fator de risco significati- e boas práticas para desenvolver es- Contaminantes e Resíduos de alimen- vo para muitas condições adversas de tratégias comuns para a avaliação da tos. O programa incluiu também apre- saúde. Para resolver cada um desses qualidade e segurança alimentar. sentações com duração de 5 minutos problemas globais, é necessário levar realizadas por autores de apresenta- a cabo investigações interdisciplina- BQ: Acha que o congresso Euro- ções em painel. A sessão foi bem re- res, bem como realizar de forma efe- FoodChem XVII também irá atrair a cebida pelos nossos representantes tiva a transferência de conhecimento participação de químicos da indústria na FCD. Alguns dos representantes para os consumidores, indústrias e alimentar? na FCD desempenharam o papel de legisladores. oradores, incluindo eu própria, bem LSS: Como pode verificar a partir como de moderadores ou comodera- BQ: Em 2013, o congresso Euro- dos tópicos apresentados, o Euro- dores de sessões. FoodChem XVII será realizado na FoodChem XVII aborda questões- Turquia. O que nos pode dizer sobre -chave relevantes também para a BQ: Durante a conferência os partici- este congresso? indústria, para além da comunidade pantes tiveram acesso ao documen- académica e de órgãos reguladores/ to “QUÍMICA - Desenvolvimento de LSS: A série de conferências Euro- legisladores nacionais e internacio- soluções num mundo em mudança” FoodChem é “a bandeira” da Divisão nais, bem como organizações de con- (“CHEMISTRY – Developing solutions de Química Alimentar da EuCheMS. sumidores. in a changing world”), que foi lançado O Euro Food Chem XVII terá lugar recentemente pela EuCheMS (e tam- em Istambul, na Turquia, nos dias 7 bém está disponível para download BQ: De entre os trabalhos apresenta- no site da Associação). Este docu- a 10 de maio de 2013. Todos os in- dos durante o EuroFoodChem XVII, mento tem como objetivo destacar a teressados podem obter informações prevê-se que exista alguma seleção importância central da química na re- em www.eurofoodchemxvii.org. É a para posterior publicação em revistas solução de uma série de desafios que primeira vez que esta série de confe- internacionais? enfrentamos atualmente num mundo rências é organizada fora da Europa. em mudança. Neste documento, uma O local escolhido reflete o papel de LSS: Como habitual, os resumos das das áreas identificadas e considerada Istambul como um ponto de encontro apresentações orais e apresentações como uma prioridade no futuro foi a entre o Oriente e o Ocidente, como o em painel serão incluídos no “Livro de área dos “Alimentos”. Pode dizer-nos cruzamento de diferentes continentes Resumos da Conferência”. Para além algo a respeito da participação da e culturas. Aproveito para lembrar que disso, proceder-se-á à seleção de al- FCD-EuCheMS na redação deste do- o prazo para submissão de resumos é guns trabalhos apresentados no con- cumento, bem como a sua opinião so- janeiro de 2013. gresso para serem publicados em ver- bre os futuros desafios que se põem são de artigo completo num número aos químicos alimentares? BQ: Pode dizer-nos quais serão os especial da revista “Quality Assurance principais temas científicos focados and Safety of Crops and Foods” (SCI- LSS: O documento que refere é uma no congresso EuroFoodChem XVII -Expanded), após revisão por pares. contribuição para a consulta sobre o e quais são as suas expectativas no futuro do programa da União Europeia que concerne à discussão dos mes- BQ: Que mensagem pode transmitir para a investigação, Horizonte 2020, mos? aos jovens investigadores portugue- que vai cobrir o período de 2014- ses na área da Química Alimentar 2020. O programa Horizonte 2020 vai LSS: Nesta conferência tentar-se-á com vista a estimular a sua participa- abordar os desafios globais, incluindo oferecer uma ampla gama de temas ção no EuroFoodChem XVII?

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LSS: Estou certa de que esta con- do Prémio Nobel que foi atribuído a ferência vai proporcionar a todos os Maria Sklodowska-Curie, sem dúvida, participantes um fórum para troca de um dos mais reconhecidos investiga- ideias científicas, inspirar novas pes- dores polacos de sempre. Eu acredito quisas, renovar amizades e estabele- que os químicos de alimentos têm as cer novos contatos para uma coope- habilidades e conhecimentos para fa- ração mais estreita. Dirijo uma palavra zer uma contribuição significativa para especial a exortar todos aqueles que a resolução de muitos problemas gra- estão no início das suas carreiras na ves que o mundo enfrenta na área de ciência de alimentos para aproveitar nutrição através do desenvolvimento esta oportunidade e participarem nes- de alimentos saudáveis ​​e nutritivos. ta conferência. BQ: Sabemos que a Dra. Livia é uma BQ: Pode indicar-nos alguns outros das autoras do livro oficial da EuChe- congressos ou atividades em que a MS para o Ano Internacional da Quí- Livro oficial da EuCheMS para o Ano FCD-EuCheMS esteja atualmente en- mica “Mulheres Europeias em Quími- Internacional da Química, editado pela volvida? ca” (European Women in Chemistry). Dr.ª Livia Sarkadi Pode-nos falar um pouco a respeito teressantes que atraíssem um públi- : Gostaria de chamar a atenção dessa experiência e como se tornou LSS co amplo - incluindo químicos e não- para algumas conferências em 2013 parte integrante dela? -químicos, jovens e idosos, homens e organizadas pela FCD-EuCheMS, pe- mulheres. Espero que gostem de ler : Esta publicação foi uma das los seus membros ou com a colabora- LSS o livro! ção destes: contribuições da EuCheMS para o Ano Internacional da Química. O ob- BQ: Como mulher, acha que os cien- . Euro Food Chem XVII, 7-10 de jetivo deste livro foi celebrar o papel tistas do sexo feminino hoje em dia maio de 2013, em Istambul, Tur- das mulheres na química, refletindo ainda enfrentam dificuldades e têm de quia (www.eurofoodchemxvii.org) um dos principais temas do Ano Inter- vencer desafios relacionados com o . 7.º Congresso Internacional sobre nacional da Química. Como tal, consi- género ou, pelo contrário, existe igual- Pigmentos em Alimentos, 18-21 dero que o livro se traduz numa home- dade de oportunidades dadas aos ho- de junho de 2013, Novara, Itália nagem a todas as mulheres europeias mens e mulheres em Química? (www.pif2013.org) que foram, ou são, ativas em áreas . CoCotea 2013, 9-11 de outubro de diversas da Química. Como membro LSS: Atualmente as mulheres têm 2013, em Nápoles, Itália (www.co- da Comissão Executiva da EuCheMS certamente mais oportunidades de cotea2013.org) fiquei muito feliz por aceitar o convite estudar do que em épocas anteriores para presidir o Painel Editorial e edi- e assim o desenvolvimento das suas BQ: Mudando de assunto, 2011 foi tar o livro juntamente com Jan Apo- carreiras, com sucesso, já não é in- o Ano Internacional da Química (AIQ theker da Real Sociedade Holande- comum. Mas ainda se espera que as 2011). Qual é a sua perceção da influ- sa de Química. O Painel Editorial foi mulheres cumpram os seus deveres ência do AIQ 2011 para a noção que composto por 22 pessoas propostas no trabalho e, em seguida, cuidem a sociedade tem sobre os químicos pelo Presidente do Grupo de Traba- igualmente da casa e da educação alimentares? lho da EuCheMS sobre a História da dos seus filhos. Não é surpreendente Química. O livro incidiu numa série de que, para muitas mulheres, a sua car- LSS: Como parte do Ano Internacio- retratos de químicas europeias proe- reira acabe por “perder enfase” em de- nal da Química foram organizadas em minentes, do sexo feminino, ao longo trimento de outras necessidades para todo o mundo, com sucesso, uma sé- dos séculos, cuja seleção foi feita com o seu tempo. Embora tenha havido rie de atividades nacionais e interna- base nas sugestões dos presiden- progressos, as mulheres químicas na cionais. Uma das principais atividades tes das diversas Sociedades Mem- academia e na indústria ainda não es- da Divisão de Química de Alimentos bros da EuCheMS e dos editores. tão suficientemente bem representa- foi a organização da EuroFoodChem A nossa ideia era de que os capítu- das nos níveis superiores. Há, portan- XVI, que foi realizada na Polônia, em los deveriam ser mais do que apenas to, uma necessidade premente de se Gdansk. Alguns de vocês sabem que currículos das mulheres selecionadas continuar a promover, apoiar e incenti- a celebração do Ano Internacional da ou revisões versando as suas con- var as mulheres químicas e mulheres Química em 2011 foi o resultado de quistas científicas. Assim, procurámos cientistas e tecnólogas, especialmen- este ano ter sido o 100.º aniversário produzir uma coleção de histórias in- te aquelas no início de suas carreiras.

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Alergénios Alimentares: o que São, o que Provocam e como Detetá-Los?

Joana Costa, Maria Beatriz P.P. Oliveira e Isabel Mafra*

A prevalência das alergias alimentares tem vindo a aumentar nos últimos anos, constituindo um problema de saúde pú- blica, com expressão mais relevante nas sociedades ocidentais. Atualmente estima-se que cerca de 2 a 4% da população adulta e 6 a 8% da população jovem possa padecer de algum tipo de alergia alimentar. A inexistência de terapêuticas efetivas para este tipo de patologia tem levado a uma crescente preocupação da população alérgica quanto aos alimentos disponíveis no mercado, dado que a única forma de se protegerem contra possíveis reações alérgicas consiste na elimina- ção dos alimentos alergénicos da sua dieta. A proteção destes indivíduos é apenas assegurada pela legislação que obriga a rotulagem de todos os ingredientes considerados potencialmente alergénicos nos alimentos pré-embalados. Para a veri- ficação do cumprimento da rotulagem, é de extrema importância o desenvolvimento de metodologias analíticas adequadas para a sua monitorização. Dada a crescente necessidade de métodos analíticos com elevados níveis de sensibilidade e seletividade para a deteção e quantificação dos alergénios alimentares, têm sido propostas várias técnicas com base nas proteínas ou no ADN. No entanto, deverá ainda ser desenvolvido muito trabalho para que se possa responder à necessi- dade de estabelecer metodologias oficiais e materiais de referência adequados para a gestão de alergénios em alimentos.

Alergias alimentares: o que são? Prevalência das alergias tritas de alimentos. Estes estão reuni- alimentares dos em oito grupos e são vulgarmente Nos últimos anos, as alergias alimen- conhecidos como the big-8 (Figura 1): tares têm sido consideradas um pro- Estudos recentes estimam que a ovos, leite, soja, trigo (glúten), crus- blema emergente de saúde pública, prevalência das alergias alimentares táceos (marisco), peixe, amendoim e com especial ênfase nas sociedades tem vindo a aumentar e que possa frutos de casca rija (amêndoa, noz, ocidentais. Estas definem-se como re- afetar cerca de 2 a 4% da população avelã, noz-pecã, noz de macadâmia, ações adversas do sistema imunitário mundial, atingindo um número supe- pistácios, caju e noz do Brasil). Em- em indivíduos sensibilizados à pre- rior entre a população jovem (8% de bora qualquer um destes alimentos sença de proteínas (geralmente glico- crianças e adolescentes). Só na Eu- possa desencadear reações alérgi- proteínas) que ocorrem naturalmente ropa avalia-se que o número de pa- cas, alguns deles, nomeadamente nos alimentos. cientes alérgicos possa ascender aos os amendoins e os frutos de casca 20 milhões de indivíduos. As alergias rija, estão entre aqueles que podem As alergias alimentares podem ser di- alimentares podem ser induzidas por causar reações adversas graves ou vididas em duas categorias, de acordo uma grande variedade de alimentos, mesmo fatais. Atualmente, as aler- com o tipo de resposta imune desen- no entanto, cerca de 90% das reações gias induzidas pela ingestão de frutos cadeado. Um dos grupos correspon- alérgicas são atribuídas a classes res- de casca rija são a principal causa de às reações de hipersensibilidade imediata, quando a resposta adversa é mediada pelos anticorpos especí- ficos da imunoglobulina E (IgE) para um dado alergénio. Estas reações devem a sua designação ao facto dos sintomas aparecerem dentro de pou- cos minutos até algumas horas após a ingestão do alimento alergénico. A segunda categoria corresponde às re- ações de hipersensibilidade retardada por serem mediadas pelas células T do sistema imunitário, pelo que os sin- tomas aparecem 24 a 48 horas após o consumo do alimento alergénico [1].

* REQUIMTE, Departamento de Ciências Químicas, Faculdade de Farmácia, Universidade do Porto, Porto Figura 1 ‒ Representação dos 8 grupos de alimentos (big-8) responsáveis por desencadear cerca E-mail: [email protected] de 90% das reações alérgicas

Química 127 - out/dez 12 33 Artigos de anafilaxia, levando todos os anos consequência, os indivíduos alérgi- tos potencialmente alergénicos no um elevado número de indivíduos em cos são aconselhados a retirar da sua anexo IIIa da Diretiva 2000/13/EC. De todo o mundo a recorrer às urgências dieta todos os alimentos que possam acordo com esta, a indústria alimentar dos hospitais. A anafilaxia desencade- eventualmente conter os ingredientes era obrigada a declarar no rótulo to- ada pelo consumo de alimentos pode alergénicos. Adicionalmente, estes dos os ingredientes utilizados na pre- ocorrer em indivíduos de qualquer pacientes são ainda aconselhados a paração de alimentos pré-embalados idade e como consequência da inges- evitar alimentos suscetíveis de pro- sujeitos a comercialização dentro da tão de qualquer alimento. Contudo, as vocar eventual reatividade cruzada UE, com muito poucas exceções. Das fatalidades provocadas por choques com o ingrediente alergénico, uma alterações que têm surgido à referida anafiláticos têm maior incidência entre vez que a frequência de reações alér- diretiva, destaca-se a presente lista os adolescentes e os jovens adultos, gicas desencadeadas por alimentos contendo um total de 14 grupos de sendo frequentemente relacionadas da mesma família é muito comum. alimentos (ovos, leite, soja, trigo (glú- com consumo de amendoins e frutos No caso particular de alergia a um ten), crustáceos, peixe, amendoim, de casca rija (avelã, amêndoa e noz). fruto de casca rija, como a amêndoa, frutos de casca rija, aipo, mostarda, Pacientes com diagnóstico duplo de o paciente é fortemente aconselhado sésamo, tremoço, moluscos e sulfitos) alergias mediadas pela IgE associa- a eliminar da sua dieta o consumo de suscetíveis de induzir reações alérgi- das à asma e a alimentos revelam outros frutos de casca rija e de frutos cas em indivíduos sensibilizados, com um risco acrescido de episódios de da mesma família da amêndoa, como a obrigatoriedade da sua rotulagem, anafilaxia despoletados pela inges- as maçãs, as cerejas, os pêssegos, independentemente da sua quantida- tão destes alimentos. Nestes casos, de entre outros [3]. Sabe-se que algu- de (Diretiva 2007/68/CE). A rotulagem o atraso na administração de injeção mas reações imunológicas adversas a correta dos alimentos pré-embalados de epinefrina como medida retificativa certos alimentos podem ser minimiza- constitui uma das formas mais efeti- a uma exposição acidental ao ingre- das ao longo do tempo. Um exemplo vas para a proteção dos indivíduos diente alergénico resulta, geralmente, de alergias que podem diminuir de in- alérgicos, visando essencialmente em fatalidade [2]. tensidade com o avanço para a idade possibilitar uma escolha informada adulta é o caso da ingestão de leite. acerca dos produtos que adquirem. A quantidade exata de um alergénio No entanto, outras alergias alimenta- No entanto, de forma a obedecer à capaz de induzir uma resposta alérgi- res, como as provocadas pelos frutos diretiva vigente da UE e a proteger-se ca depende de vários fatores, ou seja, de casca rija, são normalmente per- de possíveis processos, a indústria varia de indivíduo para indivíduo, da sistentes e sem tendência a desapa- alimentar tem feito um uso excessi- altura do dia, da existência de infe- recerem. Apesar de todas as precau- vo da rotulagem de precaução com ções, da prática de exercício físico e/ ções, a total supressão destes produ- a alegação “pode conter vestígios ou de situações de stress. Os indiví- tos da alimentação é muito difícil de de…”, o que condiciona a escolha dos duos alérgicos podem ainda apresen- manter. Estima-se que cerca de 50% produtos alimentares a consumir e a tar diferentes graus de sensibilidade das crianças com histórico de alergia qualidade de vida dos indivíduos sen- a um alimento alergénico específico, alimentar mediada pela IgE possa sibilizados/alérgicos. Como exemplo, pelo que as quantidades mínimas ca- sofrer uma exposição acidental ao para um paciente alérgico à avelã, a pazes de incitar uma resposta alérgi- alergénio em questão nos primeiros 5 escolha de um simples chocolate de ca ainda estão por definir. No entanto, anos após o diagnóstico, subindo este leite pode ser tarefa impossível, dado estudos revelam que quantidades tão número para os 75% nos primeiros 10 que praticamente todos os chocolates baixas quanto 1 mg de alergénio po- anos depois do diagnóstico [1]. possuem no seu rótulo a declaração dem ser suficientes para induzir uma “pode conter vestígios de frutos de reação adversa em alguns indivíduos Enquadramento legal casca rija”. Sem limites legais esta- alérgicos [1]. No caso especifico da belecidos que restrinjam a rotulagem avelã, as doses de alergénio capa- O alerta para a existência de molécu- de precaução, os pacientes não têm zes de despoletar sintomas adversos las naturais presentes nos alimentos e outra alternativa, a não ser evitar na observáveis em indivíduos sensibili- que induziam reações alérgicas num totalidade o consumo dos referidos zados podem variar de 1 a 100 mg, número significativo de indivíduos le- alimentos. o que equivale ao consumo de 6,4 a vou, em 1985, a que a Comissão do 640 mg de avelã numa refeição. Codex Alimentarius publicasse uma O que são alergénios alimentares? lista contendo um conjunto de alimen- Os estudos populacionais baseados tos considerados responsáveis por Os alergénios são antigénios com na prevalência das alergias alimenta- induzir hipersensibilidade em indiví- capacidade de desencadear uma res- res são ainda muito escassos, eviden- duos sensibilizados e aconselhando posta imunitária adversa em indivídu- ciando a enorme falta de informação a rotulagem obrigatória destes. Desde os sensibilizados. Bioquimicamente, acerca deste tópico. Apesar de ser então, tem vindo a ser dedicada uma os alergénios são maioritariamente classificado pela Organização Mun- especial atenção ao estabelecimen- glicoproteínas, solúveis em água e dial de Saúde (OMS) como o quarto to de diretivas claras com respeito à resistentes à digestão. São reconhe- principal problema de saúde pública, rotulagem de alimentos alergénicos, cidos pelo sistema imunitário, levando ainda não existem tratamentos efeti- o que levou a União Europeia (UE), à produção de anticorpos específicos vos para este tipo de patologia. Em pela primeira vez, a incluir os alimen- do tipo IgE. Normalmente apresentam

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pesos moleculares que podem variar molécula que apresente epítopos se- No caso dos alergénios de origem ani- entre os 3-160 kDa, mas os alergénios melhantes pode ser responsável por mal, estes são essencialmente prote- mais comuns tem pesos moleculares desencadear reações adversas do ínas de transporte (albuminas, globu- entre 20 a 40 kDa. Muitas destas mo- mesmo tipo (reatividade cruzada). linas e caseínas) ou de regulação/es- léculas evidenciam atividade enzimá- A resposta alérgica inicia-se com a trutural (tropomiosinas e parvalbumi- tica, o que lhes faculta a capacidade ativação dos mastócitos, levando à nas). Os alergénios de origem vegetal de atravessar a barreira da membrana libertação de histamina, citocinas, são na sua grande maioria proteínas mucosa. Na superfície tridimensional prostaglandinas, entre outras. Este de reserva como as vicilinas, 2S al- destas proteínas existem os chama- processo desencadeia o aparecimen- buminas e leguminas, mas também dos epítopos, que permitem a ligação to dos sintomas cuja intensidade varia existem vários que desempenham destas moléculas aos centros ativos em função do grau de exposição ao funções de transporte (Lipid Transfer da IgE (Figura 2). No caso de existir alergénio em questão. Proteins - LTP), estruturais (profilinas) uma sensibilização prévia a um dado e de defesa (Pathogen-Related Pro- alergénio, o sistema imunitário desen- As proteínas que induzem respostas tein - PR-10). volve anticorpos específicos para as imunitárias adversas pertencem a di- moléculas alvo. Contudo, qualquer ferentes grupos ou famílias (Tabela 1). Moléculas alvo: proteínas ou ADN?

O desenvolvimento de metodologias analíticas que possam verificar a ve- racidade da rotulagem e, mais impor- tante, ajudar a indústria alimentar a controlar a presença de ingredientes potencialmente alergénicos, como for- ma de prevenir a ocorrência de conta- minações cruzadas, é de extrema im- portância [3]. Presentemente, apesar de existirem vários métodos analíticos disponíveis na literatura visando a de- Figura 2 ‒ Representação da resposta alérgica desencadeada pela presença de alergénio alimentar. Ligação do alergénio às IgE, que leva à desgranulação dos mastócitos e consequente teção e quantificação de alergénios libertação de histamina, citocinas e prostoglandinas alimentares, nenhum deles é ainda

Tabela 1 ‒ Representação das oito classes de alimentos potencialmente alergénicos com a respetiva classificação das proteínas, função bioquímica de cada grupo e exemplos de alergénios conhecidos

Classe de alimentos Classes de proteínas Função bioquímica Exemplo de alergénios Ovos Albuminas Transporte Gal d 2 Peixe Parvalbuminas Regulação Gad c 1 (bacalhau do atlântico, comum à maioria dos peixes) Leite Globulinas Transporte Bos d 8 Caseínas Transporte Bos d 4 Albuminas Transporte/regulação Bos d 5 Crustáceos Tropomiosinas Regulação/estrutural Pen i 1 (camarão) Cha f 1 (caranguejo) Soja Leguminas Reserva Gly m 6 Vicilinas Reserva Gly m 5 Profilinas Estrutural Gly m 3 PR-10 Defesa Gly m 4 Frutos de casca rija (amêndoa, noz, PR-10 Defesa Cor a 1 (avelã), Pru du 1 (amêndoa) avelã, caju, pistácio, noz pécan, noz de LTP Transporte Pru du 3 (amêndoa), Cor a 8 (avelã) macadâmia e noz do Brasil) Profilinas Estrutural Pru du 4 (amêndoa), Jug r 5 (noz) Vicilinas Reserva Cor a 11 (avelã), Jug r 2 (noz) Leguminas Reserva Car i 4 (noz pécan), Ana o 2 (caju) 2S albuminas Reserva Pis v 1 (pistácio), Ber e 1 (noz do Brasil) Amendoins Vicilinas Reserva Ara h 1 2S albuminas Reserva Ara h 6/Ara h 7 Leguminas Reserva Ara h 3 Profilinas Estrutural Ara h 5 Oleosinas Estrutural Ara h 10/Ara h 11 PR-10 Defesa Ara h 8 LTP Transporte Ara h 9 Trigo Profilinas Estrutural Tri a 12 LTP Transporte Tri a 14 Tiorredoxinas Transporte Tri a 25 Gliadinas Reserva Tri a 19/Tri a 21 Gluteninas Reserva Tri a 26

Química 127 - out/dez 12 35 Artigos oficial. Os requisitos necessários para disponíveis comercialmente vários nais das proteínas, surgiu nos últimos responder às exigências impostas kits de tiras de fluxo lateral e de testes anos a abordagem por espetrometria pela legislação envolvem parâmetros ELISA que permitem a deteção/quan- de massa (MS) acoplada com aná- de elevada sensibilidade e especifici- tificação dos alergénios alvo. Estes lise bioinformática. Estas técnicas dade para rastrear quantidades ves- kits indicam a possibilidade de detetar permitem efetuar, em simultâneo, a tigiais de alergénios e/ou respetivos e quantificar o ingrediente alergénico deteção, a quantificação e a identifi- marcadores em matrizes complexas, até um limite de 2,5 mg/kg, revelan- cação de péptidos alergénicos e/ou tais como os alimentos processados. do elevada sensibilidade. Este tipo de péptidos marcadores da espécie alvo. Para tal, a definição dos limites su- testes é o mais usado pela indústria A aplicação da análise por espetrome- periores permitidos para a presença alimentar, uma vez que é de fácil exe- tria de massa acoplada a técnicas de de componentes alergénicos como cução e não requer equipamento es- cromatografia liquida com ionização não-ingredientes seria um importante pecífico. Alternativamente aos testes por electrospray com a capacidade progresso para a proteção dos con- ELISA, surgiram os biossensores, que da deteção de múltiplos péptidos-alvo sumidores alérgicos. Contudo, estes são considerados métodos imunológi- numa única corrida, torna esta me- limites só têm significado se existirem cos muito atrativos por permitirem a todologia numa estratégia muito pro- metodologias disponíveis capazes de deteção múltipla de diferentes aler- missora para a análise de alergénios verificarem o cumprimento dos mes- génios em alimentos, baseando o seu alimentares. Trabalhos recentes reve- mos. Atualmente, pensa-se que os li- funcionamento na interação anticor- lam o sucesso na aplicação da aná- mites de deteção dos métodos usados po-proteína. Têm revelado uma vasta lise por MS para o rastreio de frutos na deteção de alergénios em alimen- aplicação nesta área, nomeadamente de casca rija em alimentos com limites tos deverão rondar os 1-100 mg/kg, o na identificação de avelã e amendoim, de deteção de 3 mg/kg. Porém, o ele- que constitui uma gama de concen- com limites de deteção comparáveis vado custo do equipamento e da sua trações bastante baixa para a maio- aos ensaios ELISA mais sensíveis manutenção, e a exigência de pessoal (1-10 mg/kg). No entanto, a elevada ria das técnicas disponíveis. Aliada à com elevado grau de especialização suscetibilidade dos ensaios imunoquí- problemática do desenvolvimento de para manter a plataforma MS, condi- micos à reatividade cruzada com pro- técnicas específicas e sensíveis para ciona o amplo desenvolvimento e apli- teínas não alvo, tornam a sua fiabilida- a deteção de ingredientes alergénicos cação destes métodos em análises de de limitada. Acresce ainda o facto dos em alimentos, acresce a falta de ma- rotina [3]. referidos ensaios terem como alvo a teriais de referência que permitam a deteção direta de proteínas, que são sua otimização e validação [3]. Como metodologias alternativas à moléculas com baixa resistência a va- deteção direta das moléculas alergé- riações de pH e/ou temperatura, con- As metodologias mais utilizadas nicas (proteínas), surgiram as técni- dições essas que são frequentemente baseiam-se em protocolos imunoló- cas de análise indireta baseadas no utilizadas durante o processamento gicos ou imunoquímicos, como os ADN. Durante a sua preparação, os dos alimentos. Como consequência, alimentos processados são comum- ensaios ELISA (Enzyme-Linked Im- as estruturas das proteínas podem mente sujeitos a tratamentos térmi- munosorbent Assay), Figura 3, e as sofrer alterações conformacionais cos, o que pode levar à desnaturação tiras de fluxo lateral, cujo mecanismo (desnaturação), o que pode invalidar se fundamenta na deteção direta de a sua deteção. Deste modo, embora das proteínas presentes, tornando-as proteínas alergénicas/marcadoras, os ensaios imunológicos sejam ferra- “invisíveis” para os métodos imunoló- mediante uma reação imunológica mentas valiosas na avaliação de ali- gicos utilizados na sua deteção. Ainda anticorpo-proteína. A aplicação de an- mentos crus ou pouco processados, a que muitas destas moléculas percam ticorpos poli- ou monoclonais para a sua aplicação em produtos processa- a atividade alergénica, a sua desna- deteção de ingredientes alergénicos dos deverá ser criteriosa. turação pode também levar ao apare- nos alimentos processados tem sido cimento de novos epítopos capazes amplamente explorada com suces- Ainda com base na deteção direta de desencadear respostas imunitárias so. No caso específico do amendoim das proteínas alergénicas/marcado- anormais, representando um poten- e dos frutos de casca rija (caso da ras, mas visando a eliminação da uti- cial risco para os indivíduos alérgicos. amêndoa, noz, avelã, noz de maca- lização de anticorpos e os problemas As moléculas de ADN evidenciam dâmia, pistácio e caju), encontram-se associados às alterações tridimensio- maior estabilidade do que as proteí-

Figura 3 ‒ Sistemas ELISA usados na deteção e quantificação de ingredientes alergénicos em alimentos processados

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nas, além de estarem disponíveis na nicos, existem alguns kits disponíveis ços recentes nos equipamentos de maioria dos tecidos biológicos, o que comercialmente para a amêndoa, elevada resolução e do aparecimento as transforma em alvos preferenciais a avelã, a noz, o caju, o pistácio e o de corantes mais especializados para para a diferenciação e identificação amendoim. Os referidos kits permitem intercalar as cadeias duplas dos áci- de alergénios ou ingredientes aler- atingir limites de deteção relativos e dos nucleicos (ex. EvaGreen). génicos em alimentos com elevado absolutos de 0,4 a 4 mg/kg e 5 có- grau de processamento [3, 4]. As téc- pias de ADN do respetivo ingrediente Esta abordagem tem sido largamente nicas baseadas na deteção do ADN alergénico. No entanto, nenhum de- utilizada nas áreas da saúde, nome- consistem na amplificação de uma les disponibiliza qualquer informação adamente para a genotipagem, es- região alvo que codifica a proteína sobre a performance de ensaios de tudos de despistagem de mutações alergénica ou de um gene marcador reatividade com outras espécies ve- genéticas, descodificação do ADN de espécie com recurso à reação em getais, nomeadamente com outros e edição de ARN, dado que permite cadeia da polimerase (PCR). Na PCR, frutos de casca rija. distinguir pequenas alterações (subs- as cadeias duplas do ADN são sepa- tituições/deleções/inserções nucleo- radas por desnaturação a elevada A literatura também disponibiliza um tídicas) em fragmentos de PCR com temperatura (94-96ºC), seguindo-se a conjunto de metodologias baseadas tamanho e composição semelhantes. hibridação dos primers que se ligam no ADN para a deteção de frutos de Atendendo às inúmeras potencialida- aos locais complementares de cada casca rija em alimentos. Com limites des e vantagens da análise por HRM, uma das cadeias alvo (50-65ºC) e res- de deteção ligeiramente superiores a sua aplicação foi proposta com su- petiva amplificação por ação de uma aos registados pelos métodos imuno- cesso na identificação de alergénios polimerase termorresistente a 72ºC, lógicos, as técnicas de PCR em tem- da amêndoa em alimentos processa- obtendo-se no final de 30 ciclos de po real revelam maior especificidade dos, tendo atingido um limite de de- amplificação mais de 109 fragmentos e seletividade com menores ocorrên- teção relativo de 50 mg/kg. A análise de ADN. A especificidade e seletivida- cias de reatividades cruzadas. Neste por HRM permitiu também diferenciar de do método baseiam-se na escolha contexto, e visando a obtenção de li- a amêndoa de outros frutos do géne- das sequências dos oligonucleótidos mites de deteção e quantificação mais ro Prunus (pêssego e alperce) [5], o designados por primers com comple- baixos, têm vindo a ser desenvolvidos que atesta a sua aplicabilidade para a mentaridade para a região do ADN alguns trabalhos com recurso à PCR identificação e diferenciação de espé- alvo e nas condições de hibridação em tempo real. Esta técnica permite cies. Ainda visando o aperfeiçoamen- dos mesmos. A elevada sensibilidade a monitorização da produção do ADN to de métodos moleculares de eleva- e especificidade associadas à relativa alvo ao longo da amplificação através da especificidade e sensibilidade, foi simplicidade e rapidez tornam a técni- da aquisição de sinal de fluorescência desenvolvida outra nova estratégia ca de PCR adequada para análises de por adição de corantes específicos ou combinando as vantagens de duas rotina e também como ferramenta de sondas marcadas para o efeito. Para técnicas moleculares, nomeadamente confirmação. Apesar das vantagens além da sensibilidade e especificida- a PCR nested e a PCR em tempo real, óbvias dos métodos de ADN, o facto de acrescidas, comparativamente à num novo sistema designado por sin- de ser uma abordagem indireta, isto PCR convencional, a vantagem adi- gle-tube nested real-time PCR. A nova é, não baseada na deteção de mo- cional da quantificação é uma mais- técnica foi aplicada para a deteção e léculas capazes de desencadearem -valia na análise de alimentos. quantificação relativa de alergénios as reações adversas, fazem com que da amêndoa e da avelã revelando sejam contestados por vários autores. Neste sentido, para a deteção de aler- uma elevada performance em ambos génios da amêndoa foi muito recen- os sistemas (Figura 4) [6, 7]. Permitiu No entanto, o mesmo acontece com temente desenvolvido um método de baixar o limite de deteção e quantifi- a maioria dos testes ELISA, uma vez PCR em tempo real com análise por cação relativo da avelã e da amêndoa que estes frequentemente não de- high resolution melting (HRM) [5]. A para 50 mg/kg, sendo este limite duas tetam as proteínas alergénicas, mas análise por HRM emergiu dos avan- vezes inferior ao obtido com os res- sim proteínas marcadoras da espé- cie. Não obstante a divergência de opiniões, as técnicas baseadas na PCR têm vindo a ser extensivamente utilizadas na deteção e quantificação de alergénios em alimentos proces- sados. Neste sentido, as técnicas de PCR qualitativa ou convencional e de PCR em tempo real têm sido larga- mente aplicadas na deteção de aler- génios nos alimentos, sendo a última adequada à quantificação. No caso específico da identificação e quanti- ficação de frutos de casca rija como Figura 4 ‒ Sistemas baseados na PCR em tempo real para a deteção e quantificação de alergénios ingredientes potencialmente alergé- de frutos de casca rija em alimentos processados

Química 127 - out/dez 12 37 Artigos petivos sistemas convencionais de acerca da melhor metodologia para a operação Transnacional e Tecnológica PCR em tempo real. Em termos ab- avaliação da presença/ausência de FCT/Eslováquia FCT/2489/3/6/2011/S, solutos possibilitou a amplificação até ingredientes potencialmente alergé- e da Universidade do Porto, atra- 0,5 pg de avelã, o que corresponde a nicos em alimentos processados. Até vés de “Projectos Pluridisciplinares” uma cópia de ADN, sendo este valor o à data, nenhuma das metodologias IJUP2011-176. Joana Costa agrade- mais baixo reportado na literatura [6]. apresentadas, tanto baseadas na de- ce à FCT a bolsa de doutoramento No caso da amêndoa, o novo sistema teção direta de proteínas alergénicas, (SFRH/BD/64523/2009) financiada permitiu a deteção absoluta de apro- como, de forma indireta, através do pelo POPH-QREN (subsidiado pelo ximadamente 4 cópias de ADN (1,28 ADN, satisfaz plenamente todos os FSE e MCTES). pg), sendo de igual forma o valor mais requisitos considerados adequados Referências baixo atingido [7]. para a deteção de alergénios em ali- mentos processados. [1] L.M.L. Nollet and A.J. van Hengel, Este sistema revelou elevada versa- Food allergens: analysis instrumen- tilidade, dado que apresenta perfor- A inexistência de valores máximos tation and methods, Boca Raton: mances melhoradas, independente- legislados para a presença de ingre- CRC Press (2011). dientes alérgicos em alimentos e de mente da matriz alimentar e do respe- [2] E. Shah, J. Pongracic, Pediatrics An- tivo alvo, quando comparado com os métodos oficiais para a sua deteção nals, 37 (2008) 536-541. e quantificação continuam a constituir sistemas convencionais de PCR em [3] J. Costa, I. Mafra, I. Carrapatoso, obstáculos para a melhor gestão des- tempo real. Esta metodologia de sin- M.B.P.P. Oliveira, Journal of Agricul- te problema de saúde pública. Num gle-tube nested real-time PCR provou tural and Food Chemistry, 60 (2012) ainda ser uma ferramenta alternativa futuro próximo espera-se que estes 1337-1349. com elevado potencial para a deteção requisitos de prevenção encontrem [4] I. Mafra, I.M.P.L.V.O. Ferreira, e quantificação de diversos alergénios resposta, permitindo ir ao encontro M.B.P.P. Oliveira, European Food alimentares, tanto em matrizes cruas das necessidades da indústria ali- Research and Technology, 227 como em matrizes sujeitas a elevado mentar, de forma a facilitar a gestão (2008) 649-665. grau de processamento. de ingredientes alergénicos e a obter [5] J. Costa, I. Mafra, M.B.P.P. Oliveira, rotulagem mais efetiva e segura, num Food Chemistry, 133 (2012) 1062- Considerações finais contexto de maior liberdade de esco- 1069. lha dos indivíduos alérgicos. [6] J. Costa, I. Mafra, T. Kuchta, M.B.P.P. Em suma, apesar dos inúmeros avan- Oliveira, Journal of Agricultural and ços, há ainda muito a desenvolver Agradecimentos Food Chemistry, 60 (2012) 8103-8110. relativamente à temática da deteção [7] J. Costa, M.B.P.P. Oliveira, I. Mafra, e quantificação de alergénios em ali- Este trabalho teve o apoio da FCT, Novel approach based on single-tube mentos. As opiniões continuam a di- através do financiamento PEst-C/ real-time PCR to detect almond aller- vergir e a constituírem fonte de debate EQB/LA0006/2011 e do projeto de Co- gens in foods (submitted).

Atualidade Científica

Dois elementos da tabela periódica recebem o seu nome Nos finais de maio de 2012, dois elementos químicos receberam as suas designações definitivas aprovadas pela IUPAC. A 30 de maio de 2012, o elemento de número atómico 114 adotou o nome de Fleróvio (símbolo químico Fl), enquanto que em 31 de maio de 2012, a IUPAC adotou para o elemento de número atómico 116 o nome de Livermório (símbolo químico Lv). O fleróvio é um elemento químico radioativo, e foi denominado em homenagem ao físico nuclear soviético Georgy Flyorov (também soletrado como Flerov), 1913-1990, o fundador do Joint Institute for Nuclear Research (JINR), em Dubna, Rússia, onde o elemento foi primeiramente descoberto em dezembro de 1998. Foram detetados até à data aproximadamente 80 decaimentos de átomos de fleróvio, 50 diretamente e 30 inferidos pelo decaimento dos elementos mais pesados livermório e ununóctio. Todos os decaimentos foram atribuídos a cinco isótopos vizinhos com números de massa na gama 285-289. O isótopo mais estável conhecido atualmente é o 289Fl, com tempo de meia vida de ~2,6 s. Estudos químicos realizados em 2007-2008 sugerem que o fleróvio é inesperadamente volátil para um elemento do grupo 14 e aparenta exibir propriedades do tipo gás nobre devido a efeitos relativísticos. Por outro lado, o livermório é um elemento superpesado sintético colocado na tabela periódica como o elemento mais pesado do grupo 16. No entanto, de momento não é conhecido um isótopo suficientemente estável para que se possam realizar estudos que confirmem esta posição como um homólogo pesado do polónio. Foi inicialmente detetado por investigadores do JINR, em Dubna, Rússia, em julho de 2000. O nome Livermório foi adotado como reconhecimento pelo papel que o Lawrence Livermore National Laboratory, sedeado na cidade de Livermore, Califórnia, teve na colaboração que conduziu à sua descoberta. Desde a deteção inicial foram produzidos aproximadamente 35 átomos de livermório, quer diretamente, como através do decaimento de ununóctio, com quatro isótopos vizinhos de números de massa na gama 290-293. O isótopo mais estável conhecido é o 293Lv, com um tempo de meia vida de ~60 ms. Paulo Brito ([email protected]) Instituto Politécnico de Bragança

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Desenvolvimento de Metodologias para a Produção de Vinho sem Adição de Anidrido Sulfuroso

Cláudia Nunes1,*, Ângela Cunha1, Élia Maricato1, Mickael C. Santos1, José A. Lopes da Silva1, Sónia Mendo2, Sílvia M. Rocha1, Jorge A. Saraiva1 e Manuel A. Coimbra1

O anidrido sulfuroso (SO2) é um aditivo versátil e eficiente utilizado na vinificação, devido à sua capacidade antissética, inibindo o crescimento de microrganismos nocivos ao vinho, e às suas propriedades antioxidantes, impedindo a ocorrência de reações de oxidação indesejáveis. Contudo, a presença de sulfitos é uma das grandes desvantagens associadas ao consumo de vinho, dado o crescente número de consumidores intolerantes e/ou alérgicos a estes compostos. No âmbito de um projeto de investigação, uma parceria entre a Universidade de Aveiro e a empresa Dão Sul S.A., foram testadas várias metodologias que, de uma forma mais saudável, segura, simples e eficaz, permitissem produzir vinho sem a adição

de SO2. Os filmes à base de quitosana reticulados com genipina são insolúveis em soluções ácidas, mantendo as proprie- dades de sequestração do ferro e antimicrobianas da quitosana, sendo promissora a sua aplicação na produção de vinho branco. A alta pressão hidrostática potencia a velocidade das reações de polimerização das antocianinas e promove as reações de Maillard, dando origem a vinhos tintos com características de vinhos envelhecidos. Esta é uma tecnologia que origina vinhos com características diferentes do vinho produzido tradicionalmente, o que pode ser uma vantagem se a tradição for conciliada com a inovação.

O anidrido sulfuroso na vinificação desenvolvimento de novas metodo- ção com o intuito de desenvolver uma

logias que possam substituir o SO2 metodologia que permita a produção O anidrido sulfuroso é um composto é importante para ir ao encontro das de vinhos à escala industrial. Com usado na vinificação como antissépti- necessidades do mercado e do con- este propósito, tem sido proposta a co e antioxidante, impedindo reações sumidor. No entanto, esta inovação adição de ácido ascórbico, dimetildi- que originam defeitos nas proprieda- no processo de vinificação e armaze- carbonato, lisozima, nisina ou com- des sensoriais do vinho. Este é um namento do vinho deve manter as ca- postos fenólicos e a aplicação de no- aditivo versátil e eficiente, o que o tor- racterísticas organoléticas e varietais vos métodos físico-químicos, nomea- dos vinhos. damente, campos elétricos pulsados, na indispensável na preservação da ultrassons ou radiação ultravioleta [5]. qualidade sensorial do vinho [1]. Este Alternativas à adição do anidrido No entanto, nenhum destes métodos, composto inibe o crescimento de mi- sulfuroso isoladamente, provou ainda ser tão crorganismos nocivos ao vinho, sendo eficaz e completo como o anidrido as bactérias mais sensíveis do que as Conscientes de que a presença de sulfuroso na produção e conservação leveduras. A sua capacidade antioxi- sulfitos nos vinhos pode ser prejudicial dos vinhos, já que qualquer estratégia dante deve-se à combinação com o para os consumidores, os produtores alternativa terá de atuar simultanea- oxigénio livre e à sua ação na inativa- de vinho têm procurado reduzir a utili- mente a três níveis: como conservan- ção de enzimas oxidativas como a po- zação de SO2. O processo tecnológico te, antioxidante e na manutenção das lifenoloxidase e a peroxidase. O ani- de produção de vinho pode ser orien- características sensoriais do vinho. drido sulfuroso também se combina tado de forma a usar os níveis mais com alguns compostos presentes no baixos possíveis de anidrido sulfuro- Filmes à base de quitosana vinho, como o acetaldeído, açúcares so, nomeadamente utilizando boas e antocianinas [2]. Assim, este com- práticas higienossanitárias. Os vinhos A quitosana é um polissacarídeo obti- posto contribui para a estabilização da podem ser produzidos utilizando uvas do a partir da quitina, um componen- cor e sabor do vinho, mantendo a se- sãs e mantendo os mostos e vinhos te do exosqueleto dos crustáceos ou gurança microbiológica do produto fi- abaixo de 14ºC. No entanto, este tipo dos estiletes das lulas. Este polissa- nal e favorecendo a sua preservação. de vinho é mais suscetível à degrada- carídeo é constituído por resíduos de ção e portanto pouco comercializável. d-glucosamina e N-acetil-d-glucosa- Apesar das vantagens acima des- mina (Figura 1), em que os resíduos critas, os sulfitos resultantes da adi- Têm sido testados diferentes métodos de d-glucosamina são maioritários ção de anidrido sulfuroso aos vinhos como substitutos do SO2 na vinifica- (grau de acetilação inferior a 50%). podem provocar intolerâncias e/ou alergias aos consumidores mais sen- síveis [3, 4]. Consequentemente, o

1 Departamento de Química, Universidade de Aveiro, Aveiro 2 Departamento de Biologia, Universidade de Aveiro, Aveiro * E-mail: [email protected] Figura 1 ‒ Estrutura química da quitosana

Química 127 - out/dez 12 39 Artigos

Este polímero tem sido muito estuda- como a pepsina. A quitosana tem carídeo, disponível comercialmente, do devido às suas propriedades an- ainda a capacidade de formar géis e obtido a partir da desacetilação da tioxidantes e antimicrobianas [6], que filmes. Devido às propriedades quími- quitina. A genipina (Figura 2), a aglíco- dependem principalmente do grau de cas e biológicas já referidas, os filmes na do genipósido presente no fruto de acetilação e do tamanho das molé- produzidos com base neste polímero gardénia (originária da China), foi usa- culas. Têm sido sugeridos dois me- têm sido bastante estudados com o da como agente reticulante. Este com- canismos para explicar a inibição do intuito de diversificar a sua aplicação, posto tem a vantagem de reagir rapi- crescimento das células microbianas nomeadamente na área das ciências damente com os grupos amina e ser por parte deste polissacarídeo: 1) a in- biomédicas e indústria alimentar [13]. menos citotóxico [14], cerca de 5000 teração do polímero policatiónico com As propriedades da quitosana susten- a 10000 vezes menos, do que o glu- os grupos aniónicos na superfície de tam a hipótese da sua utilização na taraldeído, o agente reticulante mais células de bactérias Gram-negativas, substituição do SO2 durante o proces- utilizado para a quitosana. A genipina o que pode obstruir o transporte de so de vinificação. No entanto, este po- liga-se à quitosana formando um com- substâncias essenciais para o seu lissacarídeo é solúvel no vinho devido posto heterocíclico e a ligação cruzada interior ou provocar a rutura celular e ao seu pH ácido, pois a solubilização ocorre através da ligação entre duas 2) a complexação de metais, oligoele- da quitosana em meios aquosos ocor- moléculas de genipina que estejam mentos ou nutrientes essenciais que re pela protonação do grupo –NH2 dos ligadas à quitosana (Figura 3) [15]. ficam indisponíveis para que o micror- resíduos de d-glucosamina, sendo ganismo cresça [7]. A capacidade an- solúvel em soluções com pH abaixo O processo de produção dos filmes tioxidante da quitosana está também de 6,0 (pKa = 6,3). Assim, a sua apli- consiste em dissolver a quitosa- relacionada com a sua capacidade de cação no tratamento do vinho requer na numa solução de ácido acético complexar com os iões metálicos [8] que esta seja modificada para a tornar (1%), sendo a esta solução adi- como o Fe2+ ou o Cu+ (participantes insolúvel de forma a não alterar as ca- cionado glicerol como plastificante na reação de Fenton). Alguns estudos racterísticas sensoriais do vinho. Uma e genipina como reticulante. Esta demonstraram que a quitosana tem das estratégias possíveis é a reticu- solução, depois de filtrada e des- também a capacidade de adsorver os lação do polímero por uma molécula gaseificada, é colocada em placas compostos fenólicos do vinho bran- (cross-linker) que ligue duas ou mais (0,2 g de solução por cm2). A genipina co, prevenindo o seu escurecimento moléculas de quitosana, originando a reage com a quitosana durante pelo [9, 10]. A quitosana tem sido descri- formação de uma rede covalente tri- menos 6 h à temperatura ambiente ta como tendo atividade hemostática dimensional. A escolha adequada do e o filme é obtido por evaporação do (coagulante), efeito analgésico, efei- agente reticulante e das condições de solvente a 35ºC (Figura 4). to imunoestimulador e propriedades reação pode permitir obter materiais anti-colesterolémicas e anti-tumorais com menor solubilidade, mantendo as Propriedades dos filmes [11, 12]. É ainda um polímero biode- propriedades biológicas e permitindo gradável e biocompatível, pois pode aumentar a sua resistência mecânica, O filme de quitosana com ligação ser degradado in vivo por várias en- a estabilidade química e a capacidade covalente à genipina apresenta uma zimas, como a lisozima e proteases de absorção de água. solubilidade, em meio ácido, cerca de 60% inferior em relação aos filmes Produção dos filmes produzidos com quitosana sem modi- ficação química e preparados segun- Com o intuito de produzir filmes está- do o mesmo procedimento (Figura 5). veis em meio ácido e com atividade A solubilidade dos filmes foi determi- antioxidante e antimicrobiana para nada por percentagem de perda de serem usados no processo de vinifi- massa dos filmes após terem estado cação, foi desenvolvido um processo 7 dias mergulhados numa solução Figura 2 ‒ Estrutura química da genipina de produção de filmes com quitosana aquosa com 10% de etanol a pH 3,5, reticulada. A quitosana é um polissa- com agitação orbital, à temperatura ambiente. Os resultados para a ativi- dade antioxidante dos filmes, determi- nada pelo método radicalar do ácido 2,2’-azino-bis(3-etilbenzotiazolina-6- -sulfónico) (ABTS) [16], mostrou que

Figura 4 ‒ Filme de quitosana reticulada com Figura 3 ‒ Proposta da estrutura química da quitosana reticulada com genipina [15] genipina

40 Química 127 Artigos Artigos

a reticulação não altera significativa- mente a atividade antioxidante dos filmes (Figura 5).

A capacidade do filme para inibir o crescimento de leveduras foi deter- minada para o filme preparado com quitosana modificada com genipina e para o filme preparado com qui- tosana não modificada, tendo sido utilizada uma cultura de leveduras Saccharomyces cerevisiae. Os filmes foram colocados nesta suspensão numa proporção de 4 cm2 de filme por 10 mL. As suspensões de células Figura 5 ‒ Solubilidade (7 dias em meio ácido com agitação) e atividade antioxidante (método contendo os filmes não apresentaram ABTS) dos filmes de quitosana e quitosana com genipina (letras diferentes representam valores nenhuma unidade formadora de coló- significativamente diferentes) nias (UFC) ao fim de 48 h de incuba- ção a 25ºC, enquanto o controlo (sus- cor mais verde (menor a*) e amarelo pensão de células inoculadas nas (maior b*). As diferenças observadas mesmas condições, mas sem adição nos vinhos que estiveram em contacto de filme) apresentou 8x107 UFC/mL. com o filme podem dever-se à adsor- Em resumo, o filme preparado com ção dos compostos fenólicos ao filme quitosana reticulada com genipina e consequente alteração na cor, o que apresenta baixa solubilidade após 7 está de acordo com a bibliografia [9, dias em meio ácido (< 20%), em com- 10]. No entanto, como o vinho que es- paração com um filme de quitosana teve em contacto com o filme à base não modificada, e mantém a sua ca- de quitosana apresentava um teor em pacidade antioxidante e de inibição ferro cerca de 50% inferior em relação do crescimento de Saccharomyces ao vinho sem tratamento ou com adi-

cerevisiae. ção de SO2, é possível que a quito- sana tenha promovido a inibição das Figura 6 ‒ Vinho branco experimental Aplicação dos filmes aos vinhos reações de oxidação que ocorrem no produzido pela Dão Sul S.A.: A) vinho sem vinho por sequestração dos iões ferro. tratamento; B) vinho com o filme à base O filme de quitosana reticulado com de quitosana genipina foi utilizado, em substituição Na prova sensorial aos vinhos, sem mas, preservando-o durante longos do anidrido sulfuroso, na produção que o painel de provadores soubesse períodos de tempo. A inativação mi- de vinho branco pela empresa Dão a sua origem, o vinho branco que es- crobiana pela APH é provavelmente Sul S.A. seguindo o processo de vi- teve em contacto com o filme à base devida a interferências nas estrutu- nificação tradicional. Após a fermen- de quitosana foi considerado um bom ras celulares e funcionais, tais como tação alcoólica, o filme foi colocado vinho em relação à cor, aroma e sa- membranas, ribossomas e enzimas, em contacto com o vinho (Figura 6). bor. De acordo com estes resultados levando à morte celular. De acordo Vinhos sem tratamento com SO2 e pode-se afirmar que os filmes de qui- com a bibliografia, a APH atua que- tratados com 40 mg/L de SO2 foram tosana reticulados com genipina são também engarrafados e armazenados promissores para aplicação na produ- brando ligações não-covalentes, nas mesmas condições para servirem ção de vinho branco em substituição aparentemente não afetando as liga- como controlos. O vinho que esteve da adição de anidrido sulfuroso. Esta ções covalentes [17]. em contacto com o filme manteve-se tecnologia permite manter a seguran- estável do ponto de vista microbioló- ça microbiológica do produto final, À temperatura ambiente e a pressões gico. As análises físico-químicas de- favorecendo a sua longevidade com de 300 a 500 MPa, as bactérias e as monstraram que o vinho com filme à uma boa qualidade organolética. leveduras presentes no vinho são base de quitosana tinha um conteúdo inativadas [18, 19] e a atividade enzi- em compostos fenólicos ligeiramente Tecnologia de alta pressão mática, incluindo a polifenoloxidase, é inferior em relação ao vinho tratado hidrostática reduzida. Alguns estudos realizados

com SO2. No entanto, a cor dos vinhos concluem que os tratamentos não era diferente em comparação com o A tecnologia de alta pressão hidrostá- alteram as propriedades sensoriais e vinho sem tratamento, tendo o vinho tica (APH) é um processamento não- nutricionais do vinho [18, 19]. No en- branco que esteve em contacto com -térmico que consiste em submeter o tanto, foi verificado recentemente que o filme uma menor intensidade da cor. produto a altas pressões, entre 100 o tratamento de vinho tinto por eleva- Segundo os parâmetros CIELAB, este e 1000 MPa, com o objetivo de des- das pressões (650 MPa) durante 1 ou vinho apresentava uma tonalidade de truir microrganismos e inativar enzi- 2 h promove a diminuição da cor, de-

Química 127 - out/dez 12 41 Artigos vido à polimerização de compostos tamento. Em relação à cor, pelos pa- reação de Maillard. Estes resultados fenólicos [20]. râmetros CIELAB, verificou-se que permitem explicar as diferenças verifi- os vinhos brancos tratados por APH, cadas na cor, pois o acastanhamento Aplicação da APH aos vinhos ao longo do armazenamento, tinham dos vinhos pode ser devido a um favo- uma luminosidade menor e uma tona- recimento de reações de Maillard pro- A APH foi testada em vinhos brancos lidade mais vermelha e amarela (a* e vocado pelo tratamento de APH. Nas e tintos em substituição da adição de b* superior) do que os vinhos tratados análises sensoriais, os vinhos pressu- anidrido sulfuroso. Os vinhos, bran- com SO2 ou sem tratamento. Os resul- rizados foram caracterizados por aro- co e tinto, sem adição de SO2, foram tados obtidos pela análise de cor indi- mas de frutos cozidos, enquanto os engarrafados em garrafas PET e cam que a APH leva ao escurecimen- vinhos não pressurizados foram des- posteriormente foram sujeitos a dois to de vinho branco, tornando o vinho critos com aromas frutados e florais. tratamentos de pressão, 425 MPa e mais acastanhado ao longo do tempo Estas diferenças de aroma podem es- 500 MPa, durante 5 min. Vinhos sem de armazenamento. Nestes vinhos, a tar relacionadas com o teor superior tratamento e vinhos com adição de concentração dos aminoácidos livres de compostos voláteis de Maillard nos

40 mg/L de SO2 foram também en- era inferior (20%) em relação ao vi- vinhos pressurizados, uma vez que garrafados e armazenados nas mes- nho branco com SO2 (Figura 7A). Por estes compostos são descritos como mas condições. Ao fim de 12 meses outro lado, os vinhos pressurizados tendo descritores de aroma a fruta “tor- de armazenamento, os vinhos trata- apresentaram um teor mais elevado rada” ou processada termicamente. dos por APH estavam estáveis a nível de compostos voláteis, como o furfu- microbiológico, enquanto o vinho sem ral e o benzaldeído (10 vezes supe- Os vinhos tintos pressurizados, tal tratamento apresentava crescimento rior), quando comparados com os vi- como os vinhos brancos, também de leveduras e bactérias. nhos não pressurizados (Figura 7B). apresentaram valores mais elevados Estes compostos são considerados dos parâmetros CIELAB, em especial Os vinhos brancos tratados por APH compostos voláteis de Maillard, uma o valor de b*, quando comparados apresentaram uma concentração infe- vez que o furfural pode ser formado com o vinho tratado com SO2. O vi- rior em compostos fenólicos e ativida- pela desidratação de açúcares atra- nho tinto com a APH adquire uma cor de antioxidante (10% inferior), quando vés da reação de Maillard e o benzal- mais acastanhada ao longo do arma- comparados com os vinhos tratados deído pode ser formado pela degra- zenamento. Nos vinhos tintos pressu- com SO2 ou com os vinhos sem tra- dação de Strecker em resultado da rizados observou-se também um de-

Figura 7 ‒ Conteúdo em aminoácidos livres (A) e compostos voláteis de Maillard (B) nos vinhos brancos sem tratamento, com SO2 e tratados por APH, a 425 MPa e 500 MPa, após o armazenamento

Figura 8 ‒ Conteúdo em antocianinas totais, livres e poliméricas nos vinhos tintos sem tratamento, com SO2 e tratados por APH, a 425 MPa e 500 MPa

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créscimo no conteúdo em compostos tos voláteis de Maillard (furfural e ben- Conclusões fenólicos totais (10%), principalmente zaldeído). devido à diminuição das antocianinas Os filmes de quitosana reticulada com livres (50%) e poliméricas (20%), em Em termos de análise sensorial, os vi- genipina são promissores para se- relação ao vinho não pressurizado (Fi- nhos tintos pressurizados apresenta- rem aplicados na produção de vinho gura 8). ram uma boa apreciação global, nome- branco em substituição do anidrido adamente em termos de cor, aroma e sulfuroso por complexação de iões de Os vinhos tintos pressurizados sabor. Contudo, os provadores referi- ferro e adsorção de compostos fenóli- apresentaram uma maior quantida- ram um aroma a compota e a especia- cos que dão cor ao vinho. Estes filmes de de depósito formado em garrafa rias e uma cor mais castanha, límpida permitem manter a segurança micro- (Figura 9). O depósito do vinho pres- e menos violeta nos vinhos que foram biológica do vinho branco com quali- surizado apresentou uma quantidade sujeitos ao tratamento de pressão. dade organolética igual ou superior à de compostos fenólicos totais superior dos vinhos produzidos pelo método (10 vezes superior para o vinho trata- Durante a maturação e envelhecimen- tradicional. do a 500 MPa) em relação ao vinho to dos vinhos, os compostos fenólicos

com SO2, sendo este aumento atribu- podem sofrer reações de oxidação- O tratamento de APH influencia a ído à presença de maior quantidade -redução, polimerização e complexa- composição química dos vinhos, pro- de proantocianinas polimerizadas (Fi- ção com compostos como proteínas, movendo reações de Maillard e de po- gura 10). polissacarídeos ou metais. Conse- limerização dos compostos fenólicos. quentemente, as antocianinas e pro- Este é um aspeto que deve ser to- Estes resultados demonstram que os antocianinas vão sendo gradualmente mado em consideração na aplicação tratamentos de pressão aceleraram transformadas em oligómeros e polí- desta tecnologia para a preservação a velocidade de polimerização dos meros mais estáveis e com caracte- dos vinhos. A aplicação de APH aos compostos fenólicos do vinho, nome- rísticas físicas e químicas diferentes vinhos tintos parece acelerar o seu adamente antocianinas e proantocia- dos seus precursores, contribuindo envelhecimento, o que pode permi- ninas, formando compostos fenólicos para uma mudança nas proprieda- tir a redução do tempo necessário à polimerizados que se tornam insolú- des organoléticas do vinho, tais como obtenção de um vinho com uma boa veis no vinho com o armazenamento. a cor e o sabor [21]. Os acetais e os qualidade organolética. Esta tecnolo- furanos são também descritos como gia torna-se promissora na utilização A análise dos compostos voláteis potenciais marcadores de envelheci- presentes nos vinhos tintos pressuri- mento, uma vez que o seu conteúdo zados revelou teores mais elevados aumenta durante o envelhecimento em furanos (5 a 10 vezes superior em do vinho [22]. Portanto, as alterações furfural), acetais (2 vezes superior em nas características do vinho tinto com 1,1-dietoxi-etano), cetonas (2,3-pen- os tratamentos de pressão, nomeada- tanodiona) e aldeídos (1,5 vezes su- mente a cor mais acastanhada, o me- perior em benzaldeído) comparativa- nor conteúdo em compostos fenólicos mente aos vinhos não pressurizados. e o maior teor em furanos e aldeídos, Nos vinhos tintos, tal como também podem dever-se à aceleração de re- se verificou para os vinhos brancos, ações que naturalmente ocorrem nos parece existir um favorecimento de vinhos ao longo do armazenamento, Figura 9 ‒ Garrafas PET com o depósito reações de Maillard provocado pelo como por exemplo as reações de poli- formado durante o armazenamento: A) sem tratamento; B) com adição de SO ; tratamento de APH, pois apresentam merização dos compostos fenólicos e 2 C) tratado por APH a 425 MPa; D) tratado também um teor superior de compos- as reações de Maillard. por APH a 500 MPa

Figura 10 ‒ Conteúdo em antocianinas totais e proantocianinas no depósito formado durante o armazenamento dos vinhos tintos sem tratamento,

com SO2 e tratados por APH, a 425 MPa e a 500 MPa

Química 127 - out/dez 12 43 Artigos

de castas muito adstringentes e que and Experimental Allergy 40 (2010) Food Chemistry 54 (2006) 3290- necessitam de elevados estágios para 1295-1302. 3296. que as suas qualidades organoléticas [4] B.L. Wedzicha, Food Additives and [15] C. Nunes, É. Maricato, Â. Cunha, se tornem aceitáveis. Contaminants 9 (1992) 449-459. A. Nunes, J.A. Lopes da Silva, M.A. [5] M.C. Santos, C. Nunes, J.A. Saraiva, Coimbra, Carbohydrate Polymers 91 Agradecimentos M.A. Coimbra, European Food Re- (2013) 236-243. search and Technology 234 (2012) [16] R. Re, N. Pellegrini, A. Proteggente, O trabalho foi financiado pelo QREN– 1-12. A. Pannala, M. Yang, C. Rice-Evans, SI I&DT (3462) e pela FCT através do [6] F. Shahidi, J.K.V. Arachchi, Y.J. Jeon, Free Radical and Medicine Trends in Food Science & Technol- projeto PTDC/AGR-ALI/101251/2008, 26 (1999) 1231-1237. ogy (1999) 37-51. Unidade de Investigação 62/94-QOP- 10 [17] F. Moerman, Meat Science 69 (2005) [7] Y.C. Chung, C.Y. Chen, Bioresource NA (PEst-C/QUI/UI0062/2011) e as 225-232. Technology 99 (2008) 2806-2814. bolsas de Cláudia Nunes (SFRH/ [18] C. Mok, K.T. Song, Y.S. Park, S. Lim, BPD/46584/2008) e Mickael Santos [8] P.J. Park, J.Y. Je, S.K. Kim, Carbohy- R. Ruan, P. Chen, Journal of Food (SFRH/BD/70066/2010). Os autores drate Polymers 55 (2004) 17-22. Science 71 (2006) M265-M269. agradecem à empresa Dão Sul S.A. [9] G. Spagna, R.N. Barbagallo, P.G. Pif- [19] A. Morata, S. Benito, M.C. Gonza- (Carregal do Sal) e Frubaça (Alcoba- feri, Journal of Agricultural and Food lez, F. Palomero, W. Tesfaye, J.A. ça). Chemistry 48 (2000) 4619-4627. Suarez-Lepe, European Food Re- [10] G. Spagna, P.G. Pifferi, C. Rangoni, search and Technology 235 (2012) Referências F. Mattivi, G. Nicolini, R. Palmonari, 147-154. Food Research International 29 [20] Y. Tao, D.-W. Sun, A. Górecki, W. [1] P. Ribéreau-Gayon, D. Dubourdieu, (1996) 241-248. Błaszczak, G. Lamparski, R. Am- B. Donèche, A. Lonvaud, Handbook [11] T.W. Liang, Y.J. Chen, Y.H. Yen, S.L. of Enology – The Microbiology of Wang, Process Biochemistry 42 arowicz, J. Fornal, T. Jeliński, Inno- Wine and Vinifications. 2nd ed. Vol. (2007) 527-534. vative Food Science and Emerging 1, West Sussex: John Wiley & Sons, [12] W.S. Xia, P. Liu, J.L. Zhang, J. Chen, Technologies (2012) DOI: 10.1016/j. Ltd, 2006. Food Hydrocolloids 25 (2011) 170- ifset.2012.09.005. [2] P. Ribéreau-Gayon, Y. Glories, A. 179. [21] M. Monagas, C. Gomez-Cordoves, Maujean, D. Dubourdieu, Handbook [13] P.K. Dutta, M.N.V. Ravikumar, J. Du- B. Bartolome, Food Chemistry 95 of Enology – The Chemistry of Wine tta, Journal of Macromolecular Sci- (2006) 405-412. Stabilization and Treatments. 2nd ence C42 (2002) 307–354. [22] R. Perestrelo, A.S. Barros, J.S. Ca- ed. Vol. 2, Chichester: John Wiley & [14] F.L. Mi, C.T. Huang, H.F. Liang, M.C. mara, S.M. Rocha, Journal of Ag- Sons, Ltd, 2006. Chen, Y.L. Chiu, C.H. Chen, H.W. ricultural and Food Chemistry 59 [3] A. Gillman, J.A. Douglass, Clinical Sung, Journal of Agricultural and (2011) 3186-3204.

Atualidade Científica

Resíduos vinícolas como potenciais matérias-primas para a produção de biocombustíveis De acordo com um estudo recente, o bagaço de uvas, o resíduo sólido obtido após o processamento das uvas para a produção de vinho ou sumo, apresenta potencial para ser usado como matéria-prima na síntese de etanol (J. Agric. Food Chem., DOI: 10.1021/ jf303509v). A atenção crescente no campo dos biocombustíveis estimulou o interesse dos investigadores no desenvolvimento de alternativas económicas e ambientalmente sustentáveis para a sua produção, nomeadamente do etanol. A engenheira biológica Jean VanderGheynst, da Universidade da Califórnia, em Davis, interessou-se pelo bagaço das uvas, devido à elevada disponibilidade do recurso, já que os produtores vitivinícolas da Califórnia produzem anualmente acima de 100000 toneladas destes resíduos, que na sua maioria não são reaproveitados. De forma a quantificar o etanol passível de ser obtido a partir de bagaço, este foi processado sob diversas condições de fermentação. VanderGheynst e a sua equipa verificaram que os maiores rendimentos em etanol foram obtidos com uvas brancas. Os produtores de vinho apenas extraem o sumo destas uvas e não fermentam o bagaço. Assim, este apresenta teores mais elevados de açúcares provenientes dos frutos. Por outro lado, o bagaço de uvas pretas é fermentado por longos períodos, restando menores quantidades de açúcares para posterior produção de etanol. No entanto, os investigadores verificaram que a adição de ácido diluído a este bagaço possibilita um aumento no rendimento de etanol produzido. Os investigadores verificaram também que a produtividade do bagaço na conversão em etanol é, em média, inferior a metade da correspondente ao milho, em base mássica seca. Para obter o máximo de etanol possível a partir dos resíduos das uvas, será ainda necessário desenvolver tecnologia de modo a converter a celulose das uvas em etanol, de acordo com Yi Zheng, químico da companhia biotecnológica Novozymes, da Dinamarca. Porém, este investigador pensa que o bagaço pode afinal ser um recurso exequível, devido à sua fácil disponibilidade. Afirma ainda que “os produtores de etanol poderiam tornar o bagaço das uvas economicamente mais viável se combinassem a produção de etanol com a obtenção de outros produtos baseados em bagaço, como fertilizantes e rações para animais”. (adaptado do artigo de 23/10/2012 de Mark Schrope: Winemaking Waste Could Become Biofuel Starter, http://cen.acs.org/articles/90/web/2012/10/Winemaking-Waste-Become-Biofuel-Starter.html) Paulo Brito ([email protected]) Instituto Politécnico de Bragança

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Desenvolvimento de um Ingrediente Alimentar Funcional: Caracterização por Aniquilação do Positrão

M.F. Ferreira Marques1,2, C.I.C. Galhano3,4 e A. Moreira da Silva3,5,*

O interesse dos consumidores numa alimentação saudável tem vindo a crescer à medida que vão sendo divulgados os potenciais benefícios para a saúde de determinados alimentos e/ou ingredientes alimentares. As evidências científi- cas apoiam a ideia de que alguns alimentos, ou ingredientes alimentares, possam ter efeitos positivos sobre a saúde e bem‑estar, para além do fornecimento dos nutrientes básicos. Alguns projetos de investigação já levaram à identificação e compreensão dos mecanismos dos componentes alimentares biologicamente ativos que podem reduzir o risco de doença. Neste contexto, é introduzido o conceito de Alimento Funcional. O principal objetivo do estudo aqui relatado consistiu na caracterização de um potencial ingrediente alimentar funcional, a timoquinona, um componente ativo, obtido a partir de um óleo essencial de sementes de Nigella sativa. De forma a aumentar a biodisponibilidade da timoquinona, foi utilizada uma estratégia que consistiu na síntese de um sistema de nanopartículas. Entre as várias moléculas existentes capazes de formar essas estruturas (supramoleculares), as ciclodextrinas têm vindo a ser utilizadas de forma a aumentar a solubilida- de de moléculas de natureza hidrófoba. A espectroscopia de tempos de vida de Aniquilação do Positrão (PALS -“Positron Annihilation Lifetime Spectroscopy”) foi usada na caraterização do composto de inclusão baseado em β-ciclodextrina e timoquinona. A apresentação deste estudo suscita a referência a outros desafios que se apresentam à comunidade cien- tífica para a investigação de alimentos funcionais, de forma a entender-se os mecanismos potenciais dos componentes ativos dos alimentos que poderão melhorar o estado de saúde e de bem‑estar e, possivelmente, reduzir o risco de doença.

Alimentos Funcionais: o óleo essen- cial que seja universalmente acei- podem ser usadas informações cien- cial de Nigella sativa e a timoqui- te. Um ponto de vista mais redutor tíficas atualizadas sobre os efeitos nona como potenciais ingredientes é que qualquer alimento é de facto na saúde para anunciar benefícios. alimentares funcionais funcional, porque tem a função de Muitos, se não a maioria, são frutas, fornecer nutrientes e possui efeitos legumes, grãos, peixes, laticínios e No projeto de investigação iniciado, fisiológicos. Nesse contexto, o termo produtos cárnicos. Estes alimentos o principal objetivo foi o desenvolvi- Alimento Funcional poderá ser consi- contêm vários componentes naturais mento de um potencial ingrediente derado um termo de marketing, para que poderão proporcionar efeitos be- alimentar funcional. Este desenvolvi- um alimento cuja atração reside nas néficos para a saúde, para além da mento foi precedido pela caracteriza- reivindicações de saúde e da forma nutrição básica. Alguns exemplos in- ção do constituinte principal do óleo como o produto é entendido pelo con- cluem o licopeno (Figura 2) do toma- essencial de Nigella sativa (Figura 1 sumidor. Há quem defenda que, qual- te processado, os ácidos gordos ω3 (a) - planta medicinal com usos an- quer alimento, quando comercializado (Figura 3) do salmão ou as saponinas cestrais), a timoquinona (Figura 1 (d)). adequadamente, acompanhado por (Figura 4) da soja. Mesmo o chá e o uma alegação de efeitos positivos so- chocolate têm sido seguidos nalguns A primeira questão que se pode co- bre a saúde, é um Alimento Funcional. estudos, sendo‑lhes atribuído proprie- locar sobre este tema é: “O que são dades funcionais, ou seja, atributos Alimentos Funcionais”? Na tentati- Alguns alimentos considerados como com efeitos positivos para a saúde e va de responder identificam-se uma Alimentos Funcionais são realmen- bem estar geral para além da nutrição série de questões com definição… te alimentos naturais integrais, onde básica (Tabela 1). “Qualquer alimento pode ser funcio- nal?”, é uma das questões que sur- ge imediatamente. “O que define um Alimento Funcional? Existem muitas definições para alimentos funcionais, (a) (b) (c) (d) mas não há nenhuma definição ofi- Figura 1 ‒ Nigella sativa (a), sementes de cominhos‑negros (b), óleo essencial (c) 1 Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, 3031-199 e molécula de timoquinona (d) Coimbra 2 CEMUC, Departamento de Física, Universidade de Coimbra, 3004-516 Coimbra 3 Escola Superior Agrária de Coimbra, Bencanta, 3040- 316 Coimbra 4 Unidade de investigação CERNAS, Bencanta, 3040- 316 Coimbra 5 Unidade de investigação Química-Física Molecular, Universidade de Coimbra, 3000-535 Coimbra * E-mail: [email protected] Figura 2 ‒ Estrutura molecular do licopeno

Química 127 - out/dez 12 45 Artigos

Figura 4 ‒ Estrutura molecular de uma saponina, heterosídeo do metabolismo secundário vegetal, Figura 3 ‒ Ácidos gordos ω3 e ω6 apresentando propriedades tensioativas

Tabela 1 ‒ Exemplos de Alimentos Funcionais e/ou Componentes Funcionais, fonte alimentar e respetivos benefícios potenciais [2]

Componentes Funcionais Fonte Benefícios potenciais Prebióticos/Probióticos Frutoligosacáridos (FOS) Helianthus tuberosus, alho, cebola em pó Efeitos positivos sobre a microflora intestinal Lactobacillus casei immunitas Leite fermentado, outros laticínios Melhoramento da saúde gastrointestinal Carotenoides Alfa-caroteno Beta-caroteno Cenouras, frutos vegetais Aniquilação de radicais livres Luteína Vegetais verdes Redução do risco de degeneração da mácula Licopeno Tomate (ketchup, molhos) Redução do risco de cancro da próstata Fibra Redução do risco de cancro da mama e do Fibra Insolúvel Farelo de trigo cólon

Beta-Glucana Aveia, cevada Redução do risco de doença cardiovascular. Fibra Solúvel Psyllium Redução do colesterol Ácidos Gordos Redução do risco de doença cardiovascular. Ácidos gordos ómega -3 (DHA/EPA) Salmão e outros óleos de peixe Melhora as funções cognitivas e visuais Melhora a composição corporal. Reduz o risco Ácido Linoleico Conjugado (CLA) Queijo, carnes de doenças Compostos Fenólicos Antocianidinas Frutos

Catequinas Chá Neutraliza os radicais livres e reduz o risco de Flavononas Citrinos cancro Flavonas Frutos/vegetais Lignanos Centeio, vegetais Prevenção de cancro e de falhas renais

Taninos (proantocianidinas) Arando, cacau, chocolate Melhora a saúde do trato urinário. Reduz o risco de doença cardiovascular Fitoesteróis Redução dos níveis de colesterol sanguíneo, Éster de Estanol Milho, soja, trigo através da redução da absorção do colesterol Fitoestrogénios de Soja Alívio dos sintomas adversos da menopausa. Isoflavonas Grãos de soja e alimentos com base de soja Redução dos níveis de colesterol sanguíneo

Há ainda quem defenda que só um a saúde, deverá ser considerado como sa dieta normal. Um alimento funcional alimento que foi intencionalmente for- funcional. A maioria das definições pode ser dirigido à totalidade da po- tificado, enriquecido ou reforçado com também sugere que um alimento fun- pulação ou a grupos específicos, que determinado componente que possui cional deve ser, ou parecer, um alimen- podem ser definidos, por exemplo, por determinado benefício acrescido para to tradicional e deve fazer parte da nos- idade ou por constituição genética [1].

46 Química 127 Artigos Artigos

Regressando ao sistema em estudo, As CDs são oligossacarídeos cícli- possam entrar e formar espécies de a timoquinona (TQ), principal cons- cos, macrociclos, com uma superfí- inclusão estáveis. Durante a inclusão tituinte de sementes de Nigella sati- cie hidrófila e uma porção interna de são quebradas ou formadas ligações va (Figura 1 (b) - sementes negras), natureza hidrófoba, que consiste em do tipo não covalente. Uma das apli- importa referir que tem sido tradicio- seis (α-CD), sete (β-CD), ou oito (γ- cações mais importantes de ciclo- nalmente empregue na medicina po- CD) anéis de D-glucopiranose unidos dextrinas nas áreas farmacêutica e pular, devido a vários efeitos farma- através de ligações glicosídicas do alimentar é a melhoria da solubilidade cológicos. Vários estudos recentes tipo α-1,4 (Figura 5 (a)), que podem aquosa das moléculas através do pro- relatam que a TQ exibe fortes efeitos ser representados como uma estru- cesso de inclusão, criando estruturas anti-oxidantes, anti-inflamatórios, anti- tura de cone truncado, ou de “donut” supramoleculares1. -neoplásicos e analgésicos, tanto in molecular (Figura 5 (b)). Os diâmetros vitro como in vivo [1]. da cavidade interior são aproximada- O método experimental e os mate- mente 0,57, 0,78 e 0,95 nm, respeti- riais usados: a técnica de aniquila- Atualmente existe um interesse cres- vamente (Figura 5 (c)). As vantagens ção do positrão, a timoquinona e a cente no potencial terapêutico da TQ fundamentais de ciclodextrinas na- β-ciclodextrina em diferentes áreas de investigação turais como veículos de fármacos e/ médica, incluindo os estudos sobre ou ingredientes funcionais, são as O eletrão, e-, e a sua antipartícula, o a diabetes, mas, particularmente, na seguintes: (i) a estrutura química é positrão, e+, são partículas fundamen- terapia de diversas formas de cancro. conhecida, com vários locais poten- tais que apresentam as seguintes ca- A TQ é um potente inibidor em célu- ciais para modificações químicas ou racterísticas: sendo partículas de spin las do cancro do cólon, de leucemia, por conjugação, (ii) a disponibilidade ½, obedecem à estatística de Fermi- do carcinoma da laringe, do cancro de diferentes tamanhos de cavidades, -Dirac e verificam o princípio de Pauli; pancreático, do adernocarcinoma do (iii) a sua baixa toxicidade e atividade das quatro interações conhecidas na ovário, do sarcoma uterino e do can- farmacológica, (iv) a solubilidade em natureza (gravítica, eletromagnética, cro da próstata, embora apresente água, (v) a proteção contra a biode- fraca e forte), só não participam dire- uma baixa toxicidade para células não gradação dos conjugados de fárma- tamente na interação forte. neoplásicas. Para além disso, a TQ e cos e/ou ingredientes alimentares in- a planta medicinal Nigella sativa são cluídos [3]. Pondo de lado os positrões presentes também promissores agentes quimio- na radiação cósmica, os positrões que preventivos [1]. A molécula da β-ciclodextrina é uma se encontram na natureza são em ge- forma muito utilizada em sistemas ral o produto de um decaimento radio- A maioria dos fármacos, especialmen- alimentares, tendo sido aprovada em ativo do tipo β+ (resultado de interação te os de natureza hidrófoba, falha nos 1998 para a utilização em géneros fraca). ensaios clínicos em humanos, devi- alimentícios, constando na lista Euro- do à eficácia reduzida, que pode ser, peia dos Aditivos Alimentares com a O positrão, que no vazio é uma par- em parte, uma consequência da sua referência E-459. Por outro lado, a lis- tícula estável, pode aniquilar-se na baixa biodisponibilidade. Embora os ta de moléculas convidadas (guests) matéria ao encontrar um eletrão. O produtos naturais tenham suscitado disponíveis para encapsulação em positrão pode também ligar-se com um grande interesse da comunidade ciclodextrinas inclui compostos tais um eletrão para formar um átomo do científica, a maioria dos fármacos de como hidrocarbonetos de cadeia li- tipo do hidrogénio, o positrónio (Ps), origem natural utilizados clinicamente near ou ramificada, aldeídos, ceto- que assume um de dois estados dife- 1 apresentam uma baixa biodisponibili- nas, álcoois, ácidos orgânicos, ácidos rentes: o estado singuleto, S0, desig- dade. Esta desvantagem tem dificulta- gordos, compostos aromáticos, gases nado por para-positrónio (p-Ps), com do a aplicação prática. Uma estratégia (por exemplo, 1-metilciclopropeno, cu- os spins do positrão e do eletrão em para a resolução da desvantagem an- -jo nome comercial é “SmartfreshTM”) orientações opostas, e o estado triple- 3 teriormente descrita tem sido a inclu- e compostos polares, tais como halo- to, S1, o orto-positrónio (o-Ps), cujos são de moléculas de natureza hidró- géneos e oxiácidos aminas. A cavida- dois spins têm a mesma orientação. foba em ciclodextrinas (CDs), com o de hidrófoba da ciclodextrina fornece objetivo de produzir preparações mais um ambiente de modo a que molécu- As probabilidades de formação des- estáveis e biodisponíveis [3]. las não polares de tamanho adequado tes dois estados são de aproximada- mente 25% para o p-Ps e 75% para o o-Ps.

Uma vez que o Ps é um átomo do tipo do hidrogénio, o seu tratamento em mecânica quântica é muito seme- lhante ao do próprio hidrogénio, mas (a) (b) (c) (d) com algumas diferenças substanciais. Figura 5 ‒ Estrutura do oligossacárido cíclico, ciclodextrina, CD (a) n igual a seis, sete ou oito anéis Contrariamente aos átomos, para os de D-glicopiranose, unidos através de ligações glicosídicas do tipo α-1,4 (b), representação de quais o modelo clássico de Bohr per- α-CD, β-CD e γ-CD (c), respetivamente. Pó branco cristalino de β-CD (d) mite imaginar um núcleo central à vol-

Química 127 - out/dez 12 47 Artigos ta do qual gravitam os eletrões, para troscopy) resulta do facto de o átomo A fonte mais comum na espectrosco- o Ps é difícil uma tal representação. de positrónio na matéria se localizar pia de tempos de vida em sólidos tem Pode-se contudo imaginá-lo como um preferencialmente em volumes livres uma estrutura de sandwich. O material sistema de duas partículas que gravi- da ordem de grandeza de dimensões radioativo é depositado numa folha de tam à volta do seu centro de massa, moleculares, ficando aí aprisionado kapton®, sobre a qual, após secagem, e cujas identidades são perdidas em e sujeito às forças repulsivas provo- é colocada uma outra folha do mesmo proveito de uma entidade neutra, pelo cados pelas nuvens eletrónicas das material, sendo o conjunto, por fim, que o seu comportamento é seme- moléculas envolventes. Este compor- devidamente selado. Tipicamente, as lhante ao de um átomo do tipo hidro- tamento resulta na capacidade da téc- amostras para este estudo são duas genóide, muito leve. nica de PALS fornecer valores confiá- pastilhas com espessura suficiente, veis para as dimensões e frações de colocadas justapostas à fonte, uma Existem três processos diferentes de volume livre. de cada lado. decaimento do positrão e/ou do posi- trónio. Num dado meio condensado As dimensões dos “buracos” e a fra- O sistema utilizado compreende dois τ corresponderão um tempo de vida, i, ção de volume livre são grandezas detetores de radiação gama (γ). Um e uma abundância relativa, Ii, caracte- importantes para a caracterização deles deteta o fotão de 1,2746 MeV, rísticos. De um modo geral, num meio micro e macroestrutural de materiais, que identifica o instante em que o posi- homogéneo condensado, revelam-se uma vez que é possível correlacio- trão é produzido (start), e o outro dete- três componentes cujas vidas médias, nar a informação (sub) microscópica ta um dos fotões de 511 keV, resultan- τ i, e respetivas abundâncias relativas com propriedades macroscópicas [4]. te da aniquilação (stop). Os detetores,

(intensidades), Ii, estão associadas às A técnica que tem por base a aniqui- constituídos por cintilador plástico lido várias espécies positrónicas, com os lação de positrões utiliza nuclídeos por fotomultiplicador, são os compo- índices i = 1-3 a corresponderem ao radioativos emissores β+, e na espec- nentes mais críticos para a otimização p-Ps (125 ps), e+ livre (300-500 ps) e troscopia de tempos de vida, a fonte da resolução e da eficiência dum es- o-Ps (alguns nanosegundos), respeti- usada é de 22Na. O esquema de de- pectrómetro de tempo. Além do divisor vamente. caimento do 22Na está representado na de tensão para o fotomultiplicador, as Figura 6 (a), onde se vê que a quase bases incluem a eletrónica que faz a Uma vez formado o positrónio, ele totalidade dos decaimentos β+ conduz seleção da janela de energia, sendo os pode interagir com um eletrão do meio ao estado excitado do 22Ne, que decai sinais de tempo tirados dum dínodo do que possua um spin de sentido oposto para o estado fundamental com emis- fotomultiplicador, Figura 7. ao do seu próprio eletrão, resultando são dum fotão γ de 1,2746 MeV. Sen- daí a aniquilação. Tanto o o‑Ps como do o tempo de vida deste estado muito A técnica da espectroscopia de tem- o p-Ps podem sofrer aniquilação por curto (3 ps), quando comparado com o pos de vida assenta na determinação pick‑off. Nestas condições, é afinal a dos positrões em líquidos ou materiais da distribuição temporal de interva- vida média do o-Ps que vai ser signi- poliméricos, o fotão de 1,2746 MeV é los de tempo entre a criação (start) ficativamente modificada por tal pro- usado como referência para o instante e aniquilação (stop) de positrões. A cesso, reduzindo-se de 140 ns (no va- de criação do positrão, Figura 6 (b). utilização da fonte radioativa de 22Na zio) a alguns ns, enquanto o efeito so- bre o p-Ps é menos importante dado a sua vida média ser muito mais curta.

Uma vez injetados num meio con- densado, os positrões provenientes do decaimento de um núcleo radio- ativo vão perdendo progressivamen- te a sua energia cinética inicial (tipi- Figura 6 (a) ‒ Esquema do decaimento Figura 6 (b) ‒ Esquema da fonte de 22Na e da 22 camente de umas centenas de keV) da fonte de Na interação da radiação emitida com o meio através de ionizações, excitações (eletrónicas, vibracionais e rotacio- nais) e múltiplos choques elásticos. Após este processo de termalização, ou o positrão se aniquila espontane- amente com um eletrão, ou forma o positrónio, Ps. A grande importância do o-Ps justifica-se por ser uma sonda das mais adequadas à determinação das propriedades físico-químicas da Figura 7 ‒ Esquema do sistema usado para o registo dos espectros de tempo. PM1 e PM2 - matéria. O sucesso da aplicação de fotomultiplicadores; D1 e D2 cintiladores; HV1 e HV2 - fontes de alimentação; Delay - atraso do sinal de stop; TAC (Time to Amplitude Converter) - conversor de tempo em amplitude, PALS (espectroscopia de tempos de que transforma o intervalo de tempo entre a chegada dos sinais de start e de stop num sinal vida da aniquilação do positrão - Po- cuja amplitude é proporcional ao valor desse intervalo de tempo; ADC (Analog to Digital sitronium Annihilation Lifetime Spec- Converter) ‑ conversor analógico-digital

48 Química 127 Artigos Artigos

torna fácil essa medida, uma vez que com a aniquilação por captação (pick- a produção do positrão é acompa- -off) do o-Ps nos volumes livres das nhada pela emissão de um fotão γ de amostras de CDs. energia suficientemente afastada dos 511 keV para que seja possível a sua Tao e Eldrup [7, 8] propuseram um mo- identificação sem ambiguidade pelo delo semi-empírico, a partir da resolu- sistema experimental. ção do problema de uma partícula, o Ps, encerrada num potencial esférico Figura 8 ‒ Espectros de tempo com as três O espectro de tempos de vida obser- de raio R0 e altura infinita, cuja função componentes temporais observadas em vado experimentalmente, N(t), é uma de onda se sobrepõe à distribuição de sistemas homogéneos. Nota-se a presença de soma de funções exponenciais (uma eletrões sobre uma calote esférica de duas componentes mais lentas; a presença da componente mais rápida só é evidente após por cada “espécie” positrónica) convo- raio R. Esse modelo permite estabele- desconvolução com a função de resposta luída com a função de resolução do cer a seguinte correlação entre o raio sistema experimental, R(t), e sobre- do buraco do volume livre, R (em Å), TQ. No entanto, a diminuição mode- posta ao fundo, F. Na Figura 8, apre- e a vida média do o-Ps por pick-off, τ 3 rada observada até 1:0,75 contrasta senta-se um espectro típico de uma (em ns): com o valor obtido para 1:1. Os vo- amostra com os três tempos de vida. −1 lumes livres calculados variam de  R 1 2πR  3 τ +−= 71,1 a 60,5 A . O parâmetro I3 apre- No estudo aqui relatado usaram-se os −Pso 15,0 sin( )  R0 2π R0  senta um decréscimo contínuo com compostos β-CD, oferta da Wacker- o aumento da fracção molar de TQ; -Chemie, e TQ que foi adquirida à (1) a densidade de buracos, com um va- Sigma. Os compostos de inclusão lor inicial de 23,35% para β‑CD pura foram preparados pelo método de co- Aqui R = R + ∆R, e ∆R = 1,656 Å re- 0 é, para a estequiometria de 1:1, de presenta a espessura de uma camada -precipitação [3]. apenas 0,41%. O comportamento de eletrónica homogénea para a aniqui- I está de acordo com a diminuição lação pick-off. 3 Cada amostra, em pó, de β-CD com do volume livre no cone truncado da inclusão de TQ, foi sujeita a uma β-CD, devido à inclusão de molécu- Sendo R o raio médio dos buracos de pressão de ~ 70 bar para formar dis- las hóspedes, o que indica que os volume livre, é possível determinar o cos de 10 mm de diâmetro e cerca buracos do cone truncado se tornam volume médio dos buracos tomando de 0,5 mm de espessura. A fonte de totalmente ocupados para a estequio- positrões 22Na (ca. 7 × 104 Bq, encer- como V = (4/3)πR3, grandeza que f metria de 1:1. rada entre folhas de Kapton®), foi co- pode ser calculada a partir da medi- locada entre dois discos de amostras da do tempo de vida do positrónio. idênticas. Todas as medições foram Embora o volume aparente livre inte- realizadas a 298 K, colocando a san- gre apenas os locais detetados pelo dwich de amostras, mais fonte, num o-Ps [9], o modelo tem sido utilizado tubo de aço inoxidável, no vazio. com sucesso em estudos por PALS de numerosas substâncias, incluindo Os espectros de tempo de vida (LT – polímeros, membranas [10, 11] e ago- lifetime) foram registrados num siste- ra as ciclodextrinas [5, 12]. Embora a ma de PALS de coincidências rápidas equação 1 tenha sido obtida para bu- (com cintiladores plásticos de “Pilot-U” racos esféricos, o que não é o caso e fotomultiplicadores XP 2020), com nas CDs, nem tão pouco na maioria uma resolução em tempo de 270 ps das outras substâncias referidas, o

[4, 5]. Cada amostra foi medida várias valor de R extraído de τ3 pode ser vezes (três a quatro espectros), con- considerado como um raio “médio” e, tendo cada espectro ca. 2,3 × 106 con- como tal, é correntemente associado tagens. Os espectros de tempo foram ao “volume livre médio” dos sistemas analisados pelo programa LT, versão estudados. 9 [6].

Além dos tempos de vida (τ3), e das in-

No processo de inclusão de tensidades (I3), observados nas amos- TQ@β-CD ficam poucos espaços tras de β‑CD/TQ, incluindo β-CD pura livres na cavidade de β-CD como referência, a Figura 9 apresenta os raios obtidos com a equação 1. É Os espectros de tempo foram sujeitos de sublinhar o bom acordo dos valo- a uma análise com apenas três com- res encontrados para β-CD pura com ponentes temporais, i.e., três vidas resultados obtidos anteriormente [5]. Figura 9 ‒ Parâmetros de PALS (tempos de médias, τi, e as respetivas abundân- Para a inclusão da timoquinona (TQ), vida do o-Ps (τ3), respetivas intensidades (I3) e cias relativas (intensidades), Ii. Nestas o valor do tempo de vida τ3 diminui valores dos raios calculados para os sítios de captura do o-Ps em CDs: β‑CD, β‑CD/TQ condições, τ3 e I3 estão associados com o aumento da concentração de

Química 127 - out/dez 12 49 Artigos

Além disso, esta última observação Estão já em andamento estudos que (2009) 129-133. está de acordo com resultados de visam avaliar o potencial de utilização [2] A. Moreira da Silva “Food Products medidas de calorimetria diferencial desses sistemas de inclusão como that Help to Promote Human Health”, (DSC – Differential Scanning Calori- novos ingredientes funcionais para Food, Diet and Health: Past, Present metry) e de infravermelho por trans- aplicações em formulações farmacêu- and Future Tendencies, Chapter 4, formadas de Fourier (FTIR – Fourier ticas e/ou em produtos alimentares. Nova Science Publishers Inc., Editor Transform Infrared Spectroscopy), e Raquel Pinho Ferreira Guiné, pp137- a aplicação do método das variações A apresentação deste trabalho sobre o 193, 2010. contínuas (representação de Job) [13, desenvolvimento de um novo potencial [3] G. Astray, C. Gonzalez-Barreiro, J.C. 14]. A técnica de DSC fornece evidên- ingrediente alimentar funcional é um Mejuto, R. Rial-Otero, J. Simal-Gan- cia para a inclusão do hóspede, reve- contributo para a identificação de no- dara, Hydrocolloids (2009) 25-49. lando a ausência do pico endotérmico vos potenciais ingredientes funcionais. atribuído a fusão da TQ para a maior [4] Y.C. Jean, P.E. Mallon, D.M Schrad- fração molar. Por sua vez, o espec- Quais são os outros desafios para er, Principles and Applications of tro de FTIR de β-CD/ThQ para 1:1 é a investigação sobre Alimentos Positron and Positronium Chemistry, muito semelhante ao de β-CD pura, o Funcionais? Word Scentific, London 2003. que implica que a TQ seria incluída na [5] M.F. Ferreira Marques, A.M.G. Morei- cavidade do cone truncado do macro- Existem vários outros desafios chave ra da Silva, P.M. Gordo, Zs. Kajcsos, ciclo cíclico, β-CD, e não interposta para a investigação na área dos ali- Material Science Forum 666 (2011) entre moléculas de β-CD [13,14]. mentos funcionais, como por exemplo 99-102. a identificação de outros potenciais [6] J. Kansy, Nucl. Instrum. Methods τ O produto de 3 e I3 é uma quantidade ingredientes funcionais que poderão Phys. Res. A 3 74 (1996) 235-244. interessante, uma vez que está rela- fornecer benefícios em termos de saú- [7] S.J. Tao, Journal of Chemical Phy- cionada com o volume livre da amos- de e do bem-estar; a identificação de sics 56 (1972) 5499-5510. tra [15, 16]. No presente caso, a in- respostas individuais biológicas aos [8] M. Eldrup, D. Lightbody, J.N. Sher- clusão da TQ mostra um decréscimo alimentos funcionais; a definição de wood, Chemical Physics 63 (1981) linear desse produto com o aumento biodisponibilidade dos ingredientes 51-58. da fração molar. O resultado mostra alimentares funcionais; o desenvolvi- [9] F.H.J. Maurer, M. Schmid, Radiation assim que a estequiometria é de 1:1, mento de biomarcadores apropriados Physics and Chemistry (2000) uma vez que não temos aí qualquer a uma ampla gama de parâmetros 58 volume livre. funcionais; o desenvolvimento da 509-512. nutrigenómica, da bioinformática, da [10] G. Roudaut, G. Duplâtre, Physi- Será que a diminuição dos volumes proteómica, metabolómica e da nano- cal Chemistry Chemical Physics 11 livres na β-CD reflete o processo tecnologia no desenvolvimento de ali- (2009) 9556-9561. de inclusão da TQ? mentos funcionais; a antecipação das [11] M.F. Ferreira Marques, P.M. Gordo, necessidades de nutrição personali- C. Lopes Gil, A.P. de Lima, D.P. Quei- O presente estudo de β-ciclodextrina zada e o papel potencial dos alimen- roz, M.N. de Pinho, Zs. Kajcsos, e seu composto de inclusão pela téc- tos funcionais. Outros desafios pas- Radiation Physics and Chemistry 76 nica de PALS fornece uma informação sam também pela realização de estu- (2007) 129-133. preciosa na determinação do volume dos de estabilidade dos ingredientes [12] M. Roussenova, M. Murith, A. Alam, livre existente para cada fração molar alimentares funcionais durante o J. Ubbink, Biomacromolecules na determinação da dimensão dos 11 processamento e na passagem des- (2010) 3237-3247. buracos livres e na sua densidade e tes através do trato gastrointestinal, [13] T. Cardoso, Development and car- na confirmação da estequiometria dos assim como estabelecer a Dose Di- actherization of a novel potencial complexos. Prova-se, uma vez mais, ária Recomendada (DDR), para uma nutraceutical, Relatório de Estágio que a técnica é adequada para a reco- ampla gama de nutrientes, de modo Profissionalizante, Mestrado em En- lha de informações micro estruturais a viabilizar a exploração comercial de em tais sistemas. ingredientes alimentares funcionais. genharia Alimentar, Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Deverá contudo dar-se especial aten- Nota Coimbra, 2011. ção à evolução com o tempo decorrido [14] T. Cardoso, C.I.C. Galhano, M.F. Fer- desde o encapsulamento, um aspe- 1 A química para além das moléculas. reira Marques, A. Moreira da Silva, to de extrema importância no estudo São estruturas formadas através de Espectroscopia: uma revista inter- da permanência do composto que se ligações do tipo não covalente: de li- nacional 27, 5-6 (2012) 329-336. usa como molécula hóspede “guest”. gação de hidrogénio, interações hidró- [15] G. Dlubek, R. Buchhold, Ch. Hüb- No entanto, a fim de conseguir uma fobas, interações de van der Waals e ner; A. Nakldal 32 Macromolecules melhor compreensão dos mecanis- interações π−π. mos de encapsulamento, a utilização (2010) 2348-2355. [16] M.F. Ferreira Marques, P.M. Gordo, de outras técnicas complementares, Referências como as espectroscopias de Raman, S.D. Santos, R.F. Marques, A. Morei- de RMN e alargamento Doppler, terá [1] M. Khader, N. Bresgen, P.M. Eckl, ra da Silva, Material Science Forum de ser considerada. Food and Chemical Toxicology 47 733 (2013) 88-91.

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Novas Formas para Velhos Fármacos

Vânia André*

O desenvolvimento de novas formas de princípios farmacologicamente ativos (PFA) é um tema que tem recebido par- ticular atenção nos últimos anos com vista a melhorar as suas propriedades físico-químicas e o seu desempenho tera- pêutico. Foram desenvolvidas várias formas cristalinas ao longo deste projeto com base nos princípios de engenharia de cristais, que racionaliza a sua formação e o seu modo de agregação supramolecular. São exemplos: polimorfos, solvatos, co-cristais, sais moleculares e sais obtidos em estudos com gabapentina, gabapentina-lactama, ácido 4-aminosalicílico, paracetamol e erbumina de perindopril. Testes de solubilidade realizados com co-cristais de gabapentina e gabapentina- -lactama revelaram que estes apresentam melhores características que o PFA inicial. Um novo hidrato de erbumina de perindopril demonstrou ser mais estável face ao produto atualmente comercializado. A coordenação de PFA a metais é uma outra forma de melhorar o seu desempenho e desenvolver materiais bio-inspirados. Exemplos deste tipo de comple- xos são os compostos de coordenação de piracetama e ácido 4-aminosalicílico a níquel e prata, respetivamente. Além destes resultados, foi ainda conseguida a síntese da metalodroga bismuto de salicilato através de moagem assistida por solvente e iões. Este método de “química verde” permitiu a síntese rápida, seletiva e eficiente de três formas de salicilato de bismuto, com diferentes rácios bismuto:ácido salicílico. Obteve-se neste estudo a primeira estrutura cristalina de salici- lato de bismuto sem ligandos auxiliares.

Introdução ção no mercado. A influência destas [4, 12]. A química supramolecular, “a novas formas nas propriedades físico- química para além da molécula”, como A procura de novas formas cristalinas -químicas e desempenho de fármacos foi definida por Jean-Marie Lehn, éa é um dos tópicos atuais mais desa- é ampla e diversificada, revelando-se química da formação de agregados fiantes da química do estado sólido, nas características do estado sólido, moleculares com base em interações com importante impacto nas caracte- tais como densidade, morfologia, cor e não-covalentes [13]. A conjugação rísticas físico-químicas, desempenho, pontos de fusão. Não menos importan- destes princípios, associada ao conhe- produção, marketing e proteção da te é a capacidade destas novas formas cimento das ligações por pontes de 1 2 propriedade intelectual de materiais de alterarem a estabilidade à tempera- hidrogénio, sintões e grafos , conduz moleculares em várias áreas científi- tura, humidade, pH e tempo, a solubili- à síntese racional de polimorfos, co- cas, com especial ênfase no desen- dade (equilíbrio de solubilidade e velo- -cristais, solvatos, sais moleculares e

volvimento de princípios farmacologi- cidade de dissolução) e a biodisponibi- outros sais, entre outras formas [1, 5]. camente ativos (PFA) [1-4]. Cada fár- lidade [6-9]. Problemas de formulação maco atualmente lançado no mercado relacionados com fluidez, miscibilida- Na indústria farmacêutica tem sido resulta de 10-15 anos de trabalho in- de, granulação, encapsulamentos ou dada uma ênfase especial aos co- tensivo e sustentado, que transforma compactação, podem igualmente ser -cristais. Vários estudos têm demons- uma simples molécula num fármaco ultrapassados com o recurso a estes trado que esta é a forma cristalina por pronto a ser consumido. Assim, é im- novos compostos [10, 11]. No entanto, excelência para otimizar as proprieda- perativo um estudo rigoroso e eficien- como já foi referido, a atividade intrín- des de solubilidade e dissolução dos te dos fármacos atualmente comercia- seca do PFA é mantida, uma vez que a PFA em função do pH, mesmo com lizados, com o objetivo de otimizar as sua identidade não foi alterada. compostos não ionizáveis [18]. suas propriedades (estabilidade, solu- bilidade e biodisponibilidade). A engenharia de cristais, o design ra- Foram utilizados métodos tradicionais cional de sólidos moleculares funcio- de síntese e recristalização, mas mais A combinação dos fundamentos de nais, consiste na combinação de três interessante foi o recurso bem suce- engenharia de cristais e química su- etapas que definem “o quê”, “como” e dido a técnicas verdes de mecano- pramolecular [1-5] permite o design e “porquê”: 1) estudo das interações in- química (moagem, moagem assistida a síntese de novas formas cristalinas termoleculares; 2) uso dessas intera- por solvente e moagem assistida por de PFA, mantendo as propriedades ções na síntese de compostos através solvente e iões) [19-21]. farmacológicas originais e reduzindo do desenvolvimento de estratégias drasticamente o tempo de introdu- para a construção de uma determina- Design e síntese de novas formas da arquitetura cristalina; 3) caracteri- cristalinas zação estrutural e sua correlação com * Centro de Química Estrutural, DEQ, Instituto Superior Técnico, UTL, Av. Rovisco Pais, 1049-001 Lisboa as propriedades dos materiais para A procura com sucesso de novas E-mail: [email protected] otimizar características específicas formas cristalinas com o objetivo de

Química 127 - out/dez 12 51 Artigos melhorar propriedades específicas é baseada numa forte componente de análise de base de dados cristalográ- ficos (Cambridge Structural Database [22]) para um design e planeamento eficazes.

Os ensaios de cristalização e co-cris- talização são efetuados através da es- colha criteriosa de métodos sintéticos e de condições de cristalização, que incluem várias técnicas de solução e mecanoquímica. A caracterização e avaliação das propriedades das no- vas formas são efetuadas com recur- so a várias técnicas, desde difração Figura 1 ‒ Fases envolvidas no desenvolvimento de novas formas cristalinas de raios-X, usada na caracterização estrutural, a cromatografia líquida de alta pressão (HPLC), usada nos estu- dos de solubilidade e dissolução. Um sumário das fases envolvidas nestes estudos é apresentado na Figura 1. Gabapenna Gabapenna-lactama Polimorfos, co-cristais e outras formas multicomponentes na me- lhoria de propriedades de PFA

O principal objetivo deste trabalho foi, Ácido 4-aminosalicílico Erbumina de perindopril não simplesmente “fazer cristais com um objetivo”, mas sim “definir novos objetivos para fazer cristais”, tendo sido escolhidos PFA que, embora co- Paracetamol Piracetama Subsalicilato de bismuto mercializados, apresentam problemas de formulação, processo ou desem- Figura 2 ‒ Princípios farmacologicamente ativos utilizados em rastreios polimórficos, ensaios de penho. formas multicomponentes e coordenação a metais

Na Figura 2 apresentam-se os prin- a cípios farmacologicamente ativos b utilizados em rastreios polimórficos, c estudos de formas multicomponentes e coordenação a metais cujos resulta- d dos são aqui discutidos. e Concentration (m) Concentration f A gabapentina, um anticonvulsivo usado no tratamento da epilepsia, e a gabapentina-lactama, um pró- (a) (b) -fármaco derivado da gabapentina Figura 3 ‒ (a) Dados de solubilidade e (b) termogramas para gabapentina-lactama (GPTL) e com potenciais efeitos neurolépticos, respectivos co-cristais com os ácidos 4-aminobenzóico (4ABA), gentísico (GEN), 4-hidroxibenzóico apresentam elevada solubilidade e, (4HBA), fumárico (FA) e benzóico (BEN) embora a necessidade de diminuir a solubilidade seja pouco frequente, é vas formas são estáveis à tempera- de modelos matemáticos de solubi- por vezes necessária para aumentar tura (Figura 3 (b)), à humidade e na lidade, que estão de acordo com os a eficácia do fármaco. Em ambos os gama de pHs com relevância biológi- dados experimentais apresentados na casos, após rastreios polimórficos e ca [23, 25, 26]. Figura 3 (a) [26]. pesquisa de formas multicomponen- tes com ácidos carboxílicos, foram Estes exemplos comprovam a vanta- O ácido 4-aminosalicílico, um antibió- sintetizados, além de polimorfos [23] gem dos co-cristais na obtenção das tico usado no tratamento da tubercu- e um éster derivado da gabapentina solubilidades desejadas, mesmo com lose, apresenta limitações de biodis- [24], co-cristais com uma solubilidade compostos não-ionizáveis, como a ponibilidade. Estudos exploratórios mais adequada. Além desta melhoria gabapentina-lactama. Estes estudos resultaram na síntese de doze novas na solubilidade (Figura 3 (a)), as no- permitiram ainda o desenvolvimento formas, entre solvatos, sais molecu-

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lares e co-cristais com heterociclos, que permitiram uma racionalização do comportamento deste PFA através da identificação das pontes de hidro- génio e sintões mais favoráveis, que estão a ser usados em estudos mais aprofundados (Figura 4). Foram esta- belecidas várias correlações entre a estrutura e a estabilidade das novas formas [27, 28]. (a) A erbumina de perindopril, fármaco usado no combate à hipertensão, é instável à temperatura, o que inviabili- za a sua comercialização em algumas zonas do planeta. O rastreio polimór- fico permitiu a determinação das pri- meiras estruturas deste PFA e condu- Solvate ziu à síntese de um novo hidrato, mais 80 ºC estável à temperatura e à humidade, 100 ºC apresentando um perfil de dissolução 120 ºC semelhante ao do composto atual- ASA mente comercializado, mesmo quan- do misturado com excipientes (Figura 5) [29, 30].

A forma polimórfica I do paracetamol, (b) um analgésico usado em larga escala, é a atualmente comercializada e é a mais estável, mas apresenta proble- Figura 4 ‒ Ácido 4-aminosalicílico (ASA): (a) empacotamentos cristalinos dos sais polimórficos mas no processo de compactação. de amónia (retirado de Vânia André et al. Cryst. Growth Des. 2012, 12, 3082-3090, com permissão. Copyright 2012 American Chemical Society); (b) a estrutura do solvato com dioxano A forma II é conhecida por ser mais permite interpretar a sua estabilidade térmica, através da saída dos “canais” de dioxano apropriada para esta fase processual, com a obtenção final do ASA, como comprovado por difração de raios-X em pós (adaptado mas é menos estável. Têm sido de- de Vânia André et al. Cryst. Growth Des. 2009, 11, 5108–5111, com permissão. Copyright 2009 American Chemical Society) senvolvidos vários esforços para ten- tar encontrar co-cristais que apresen- tem as características de compressibi- lidade da forma II e de estabilidade da forma I. Tendo em conta este objetivo, foram efetuados vários ensaios de co- -cristalização dos quais se obtiveram três novos co-cristais. Pela análise dos arranjos supramoleculares destas formas, as propriedades de compac- tação aparentam ser mais favoráveis (a) (b) do que na forma comercializada, es- tando a ser efetuados estudos no Figura 5 ‒ (a) Empacotamento cristalino do novo hidrato de erbumina de perindopril; azul: dupla sentido de confirmar esta hipótese. camada sustentada por pontes de hidrogénio; rosa: moléculas de água; (b) perfil de dissolução de nova forma hidratada com excipientes (adaptado de Vânia André et al. Cryst. Growth Des. 2011, 11, 3703–3706, com permissão. Copyright 2011 American Chemical Society) A Tabela 1 sumariza os resultados obtidos através de estudos de novas tativa de alterar as suas propriedades nosalicílico obtiveram-se igualmente formas cristalinas multicomponentes físico-químicas e idealmente conjugar redes de coordenação com prata. A para os princípios farmacologicamen- duas atividades farmacológicas com- combinação de métodos de estado te ativos discutidos. plementares. sólido e solução permitiram a caracte- Coordenação de PFA a metais na rização destes compostos, que mos- busca de simbiose de efeitos Foram explorados com sucesso mé- traram ser estáveis até temperaturas todos de mecanoquímica para obter superiores a 100ºC [31]. Este tipo de Uma outra forma de melhorar as pro- redes poliméricas 1D de coordenação complexos com PFAs pode represen- priedades de um PFA é através da de níquel a piracetama (Figura 6), um tar uma nova forma para a libertação sua coordenação a metais, numa ten- nootrópico3 [31]. Com o ácido 4-ami- controlada de fármacos ao nível bioló-

Química 127 - out/dez 12 53 Artigos gico, dada a diferença da estabilida- ado num complexo de bismuto com através de moagem assistida por sol- de, solubilidade e biodisponibilidade ácido salicílico. Atualmente, a sua sín- vente e iões [32]. Os reagentes foram do fármaco livre relativamente ao fár- tese é feita em solução e a remoção moídos com quantidades catalíticas maco coordenado. do excesso de solvente implica custos de solvente e sais de nitrato, os quais de energia e tempo, pelo que têm sido não se misturam com o produto final, Síntese verde e eficiente de meta- feito esforços de melhoria de eficiên- como provado por RMN de estado só- lofármacos e elucidação estrutu- cia do processo, sem sucesso. lido, sendo fáceis de separar. Abre-se ral para compreensão da atividade assim caminho para a produção de farmacológica Neste estudo foi conseguida a síntese fármacos de uma forma mais eficiente rápida, seletiva e eficiente de três for- a nível energético e menos poluente. O Pepto-Bismol® é um fármaco usa- mas de salicilato de bismuto, com dife- do para problemas digestivos, base- rentes rácios bismuto:ácido salicílico, Embora este composto seja usado há mais de um século, a sua estrutura era ainda desconhecida, o que limi- tava a compreensão da sua atividade farmacológica. Neste estudo foi obtida a primeira estrutura cristalina de sali- cilato de bismuto sem ligandos auxi- liares, bem como de um novo agrega- do com DMF (Figura 7) [32].

Conclusões gerais

Foram sintetizados vários polimorfos Figura 6 ‒ Arranjo supramolecular do complexo piracetama:Ni, mostrando a rede 1D e a sua e formas multicomponentes de PFA, interação com a água (azul) e os cloretos (rosa). Apenas estão representados os átomos de hidrogénio envolvidos em pontes de hidrogénio, para uma melhor clareza tendo-se conseguido estabelecer cor- relações entre estrutura e proprieda- des físico-químicas, sendo de realçar os avanços obtidos na otimização do comportamento dos PFA comerciali- zados. De salientar também que mui- tos destes novos produtos foram obti- dos por métodos de síntese altamen- te eficientes, que requerem menos energia e solvente, sem a formação de produtos secundários indesejados. Com este trabalho foi dado mais um passo para a “síntese verde” de pro- (a) (b) dutos farmacêuticos. Figura 7 ‒ (a) Fragmento da estrutura de dissalicilato de bismuto; (b) agregado de salicilato de

bismuto com DMF [Bi38O22(Hsal)26(H2O)4(DMF)18]

Tabela 1 ‒ Sumário de resultados obtidos na síntese de novas formas cristalinas multicomponentes de PFAs

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Agradecimentos Crystal Growth & Design 9 (2009) [20] D. Braga, F. Grepioni, L. Maini, R. 2252-2264. Brescello e L. Cotarca, CrystEng- A autora agradece a orientação da Pro- [7] M. B. Hickey, M. L. Peterson, L. A. Comm 10 (2008) 469-471. fessora M. Teresa Duarte e o financia- Scoppettuolo, S. L. Morrisette, A. [21] S. Karki, T. Friscic, W. Jones e W. D. mento da Fundação para a Ciência e a Vetter, H. Guzman, J. F. Remenar, Z. S. Motherwell, Molecular Pharma- Tecnologia (PPCDT/QUI/58791/2004 Zhang, M. D. Tawa, S. Haley, M. J. ceutics 4 (2007) 347-354. e SFRH/BD/40474/2007). Zaworotko e O. Almarsson, Europe- [22] F. H. Allen, Acta Crystallographica an Journal of Pharmaceutics and Bi- Section B-Structural Science 58 Notas opharmaceutics 67 (2007) 112-119. (2002) 380-388. [8] L. S. Reddy, S. J. Bethune, J. W. [23] D. Braga, F. Grepioni, L. Maini, K. 1 Sintão: unidade estrutural que se Kampf e N. Rodriguez-Hornedo, Rubini, M. Polito, R. Brescello, L. repete nas estruturas cristalinas e Crystal Growth & Design 9 (2009) Cotarca, M. T. Duarte, V. André e M. que permite o design racional de ar- 378-385. Piedade, New Journal of Chemistry quiteturas supramoleculares através [9] L. Jie, L. Zhen e J. Xiaolin, Front. 32 (2008) 1788-1795. da análise de padrões de interação Chem. Eng. China 4 (2010) 37-44. [24] V. André, M. Marques, M. da Piedade recorrentes [5, 14]. [10] S. Karki, T. Friscic, L. Fabian, P. R. e M. T. Duarte, Journal of Molecular 2 Grafos: baseiam-se na teoria de gra- Laity, G. M. Day e W. Jones, Ad- Structure 973 (2010) 173-179. fos e classificam os padrões de pontes vanced Materials 21 (2009) 3905. [25] V. André, A. Fernandes, P. P. Santos de hidrogénio em notações simples de [11] T. Beyer, G. M. Day e S. L. Price, e M. T. Duarte, Crystal Growth & De- representação geral , onde G é o Journal of the American Chemical sign 11 (2011) 2325-2334. designador do padrão (G = C para ca- Society 123 (2001) 5086-5094. [26] C. Maheshwari, V. André, S. Reddy, deias, R para anéis, D para complexos [12] G. R. Desiraju, Angewandte Chemie- L. Roy, M. T. Duarte e N. Rodriguez- finitos e S para interações intramolecu- International Edition 46 (2007) 8342- Hornedo, CrystEngComm 14 (2012) lares), r é o número de átomos simet- 8356. 4801-4811. ricamente independentes envolvidos [13] J. M. Lehn, Pure and Applied Chem- [27] V. André, D. Braga, F. Grepioni e M. no padrão, d é o número de doadores istry 59 (1978) 871-892. T. Duarte, Crystal Growth & Design 9 e a é o número de aceitadores [15-17]. [14] G. R. Desiraju, Angewandte Chemie- (2009) 5108-5116. 3 Nootrópico: composto que aumenta o International Edition 34 (1995) 2311- [28] V. André, M. T. Duarte, D. Braga e F. desempenho cognitivo no ser humano. 2327. Grepioni, Crystal Growth & Design [15] M. C. Etter, Accounts of Chemical 12 (2012) 3082-3090. Referências Research 23 (1990) 120-126. [29] V. Andre, L. Cunha-Silva, M. T. Du- [16] M. C. Etter, J. C. Macdonald e J. arte e P. P. Santos, Crystal Growth & [1] K. Biradha, C.-Y. Su e J. J. Vittal, Bernstein, Acta Crystallographica Design, 2011, 11, 3703-3706. Crystal Growth & Design 11 (2011) Section B-Structural Science 46 [30] V. André, L. Cunha-Silva, P. P. San- 875-886. (1990) 256-262. tos, J. Empis e M. T. Duarte, patente [2] M. J. Zaworotko, Nature Chemistry 3 [17] G. A. Jeffrey, An Introduction to Hy- registada (2010) PT105315. (2011) 653. drogen Bonding, Oxford University [31] D. Braga, F. Grepioni, V. André e M. [3] G. R. Desiraju, Journal of Chemical Press, Oxford, 1997. T. Duarte, CrystEngComm 11 (2009) Sciences 122 (2010) 667-675. [18] N. Schultheiss e A. Newman, Crys- 2618-2621. [4] G. R. Desiraju, Current Opinion in tal Growth & Design 9 (2009) 2950- [32] V. André, A. Hardeman, I. Halasz, R. Solid State & Materials Science 13 2967. S. Stein, G. J. Jackson, D. G. Reid, (2009) 35-35. [19] T. Friscic, D. G. Reid, I. Halasz, R. S. M. J. Duer, C. Curfs, M. T. Duarte [5] A. Nangia, Journal of Chemical Sci- Stein, R. E. Dinnebier e M. J. Duer, e T. Friscic, Angewandte Chemie- ences 122 (2010) 295-310. Angewandte Chemie-International International Edition 50 (2011) 7858- [6] D. J. Good e N. Rodriguez-Hornedo, Edition 49 (2010) 712-715. 7861.

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As Conversas de Jane

João Paulo André*

Conversations on Chemistry foi uma obra publicada em Londres em 1805, com o objetivo de divulgar a Química moder- na, então a dar os primeiros passos. A sua autora foi Jane Haldimand Marcet (1769-1858), senhora de uma personalidade comunicativa e de um espírito averiguador e objetivo. As palestras a que assistia na Royal Institution, proferidas pelo famoso Humphry Davy, e que depois lhe eram explicadas pelo marido - o médico e químico Alexander Marcet - estiveram na génese de Conversations on Chemistry, escrito na forma de diálogos ficcionais entre uma professora e duas alunas, destinado acima de tudo a levar os conhecimentos da Química a outras mulheres. Durante várias gerações o livro foi um best seller, tanto na Europa como nos Estados da América. Ainda hoje se publica.

Jane Haldimand Marcet achava merecer por um negócio tão tacada escritora e divulgadora de ci- rentável, ouviu uma forte reprimen- ência [3]. Do seu vasto círculo faziam Jane Haldimand nasceu em Londres da da velha senhora que, ao mesmo ainda parte a romancista irlandesa em 1769 (Figura 1), filha de mãe in- tempo, lhe ensinava que nem tudo o Maria Edgeworth (1768-1849) e Har- glesa e pai suíço, um banqueiro e ho- que se diz deve ser levado à letra. Ao riet Martineau (1802-1876), que serão mem de negócios de sucesso. Jane e longo da vida Jane manteria esta qua- referidas adiante. Conta-se que Jane os seus onze irmãos cresceram num se inépcia para conceber que alguém Marcet e Maria Edgeworth ficaram ambiente cultural e intelectualmente dissesse uma coisa, quando queria amigas no seguimento de uma carta estimulante; a educação escolar foi- dizer outra [2]. de gratidão por esta enviada à autora -lhes dada em casa pelos melhores de Conversations, por alegadamente precetores da época. De acordo com Desde muito nova, Jane teve a opor- o seu livro ter salvado a vida da irmã, a convicção do pai, algo liberal, ra- tunidade de privar com importantes que incidentalmente ingerira um áci- pazes e raparigas deviam receber a figuras do mundo da política, das do, pois alguém se recordara de nele mesma instrução; assim, Jane e os artes, da ciência e da literatura - tais ter lido que os ácidos podiam ser neu- irmãos aprenderam Filosofia Natural, eram os frequentadores dos janta- tralizados com magnésia [4]. História e Línguas, a par da Música, res e serões “Iluminados” da casa Arte e Dança [1]. de seus pais. Quando, aos 15 anos, Para além de Conversations on Che- subitamente perdeu a mãe, que com mistry – um dos primeiros textos didá- Jane, que desde cedo revelou uma 39 anos sucumbiu a um complicado ticos de ciência moderna – Jane teve grande avidez para o conhecimento, parto, ficou assente na família que uma vasta produção literária de ensi- era possuidora de um espírito sagaz daí em diante seria ela a responsá- no e divulgação do conhecimento que e pragmático que não se coadunava vel pela organização dos serões so- incluiu títulos como Conversations on com matizes discursivos de natureza ciais dos Haldimand. Foi num desses Polytical Economy (1816), Conversa- subjetiva, donde lhe vinha uma cer- serões que Jane conheceu o suíço tions on Natural Phylosophy (1819), ta propensão para um entendimento Alexander Marcet, com quem casaria quase literal das palavras. É frequen- em 1799 e de quem teria quatro filhos. temente narrado um episódio, algo Dessa união com Alexander, médico caricato, bem ilustrativo da sua forma e químico destacado, resultou a aber- de pensar: em criança terá um dia ou- tura da casa dos Haldimand-Marcet a vido a avó queixar-se de um relógio figuras tão notáveis como os quími- que não funcionava bem, pelo que de cos Berzelius, Wollanston e Humphry bom grado o trocaria por um guinéu. Davy, o botânico Augustin de Candol- Jane, sem meias medidas, no dia se- le, o matemático Horace Benedict de guinte apresentou-se à avó com um Saussure, o físico Auguste de La Rive orgulhoso guinéu e meio - tanto quan- e o economista político Thomas Mal- to lhe tinha rendido o velho relógio thus [1]. Jane também manteve o seu num relojeiro - mas, para sua gran- próprio salão, destinado a incentivar o de admiração, em vez do elogio que estabelecimento de redes de comu- nicação entre mulheres intelectuais. * Departamento/Centro de Química, Universidade do Correspondeu-se com a matemática Minho, Campus de Gualtar e astrónoma irlandesa Mary Somervil- 4710-057 Braga Figura 1 ‒ Jane Haldimand Marcet E-mail: [email protected] le (1780-1872), também ela uma des- (1769-1858)

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Conversations on Language (1844) e De 1804 a 1819, Alexander exerceu a O período que se seguiu à morte de vários livros para crianças [4]. profissão de médico e químico no Hos- Lavoisier foi também marcado, não pital de Guy – uma importante escola surpreendentemente, por enormes Jane Marcet morreu em Londres, aos londrina de Medicina – onde, nas au- avanços, em particular na análise 89 anos. las de Química que lecionava, introdu- quantitativa (graças, sobretudo, aos ziu uma componente de identificação contributos de Martin Heinrich Klapro- Alexander Marcet e caracterização química de cálculos th (1743-1817), na Alemanha; de Lou- urinários, a qual complementava com is Nicolas Vauquelin (1763-1829), em Alexander John Gaspard Marcet demonstrações experimentais. Ale- França, e de William Hyde Wollaston (1770-1822), Figura 2, natural de Ge- xander Marcet pode justamente ser (1766-1828), em Inglaterra, respon- nebra, bem jovem partiu para Inglater- considerado como um dos grandes sáveis pela descoberta de vários ele- ra como exilado político, no decurso impulsionadores desta, então recen- mentos metálicos). das convulsões da Revolução France- te, metodologia pedagógica, sobretu- sa. Em 1797, obteve o diploma de mé- do por via indireta. Aquando da visita De França vieram ainda os contri- dico pela Universidade de Edimburgo que fez a Londres, em 1812, Berzelius butos maiores de Claude Berthollet e dois anos depois desposou Jane ficou tão impressionado com as lições (1748-1822), através dos estudos Haldimand e licenciou-se em Medi- de Alexander, que decidiu ele próprio que conduziram à enunciação da lei cina pelo Colégio Real de Médicos; adotar a mesma metodologia ped- da ação da massa (a qual viria a ser em 1800 obteve a cidadania inglesa. agógica no Instituto Karolinska, em formulada em 1864 pelos noruegue- Em 1805 colaborou na fundação da Estocolmo. Os dois cientistas manti- ses Cato Maximilian Guldberg e Pe- Sociedade Médico-Cirúrgica de Lon- veram uma correspondência regular ter Waage) e de Joseph-Louis Proust dres, uma instituição que mantinha e voltaram a encontrar-se mais duas (1754-1826), com a lei das proporções definidas. Em Inglaterra, John Dalton estreitos contactos com médicos e vezes. (1766-1844), entrando na era moder- químicos de outras nações, de entre Alexander Marcet, que morreu aos 52 na da teoria atómica, assumiu que os os quais o grande químico sueco anos, é recordado sobretudo como elementos se combinam entre si por Jöns Jacob Berzelius (1779-1848). um dos pioneiros da aplicação da relações simples de massas (1803), Foi por essa altura que a atenção de Química à Fisiologia e à Medicina, em mas cometeu o erro de atribuir arbi- Alexander Marcet se focou na análi- particular quanto ao uso da análise trariamente valores às proporções de se de águas minerais, o que lhe con- química para obtenção de diagnósti- combinação. A lei da combinação dos feriu a experiência necessária para cos clínicos fiáveis [1, 5]. volumes dos gases, enunciada em o trabalho que o tornaria famoso: a 1808 por Louis Joseph Gay-Lussac análise química de fluidos de origem De Lavoisier às palestras da Royal (1778-1850) - sugerindo que todos os animal e de cálculos urinários, que Institution gases deveriam ter o mesmo número publicou sob o título de An Essay on de átomos num determinado volume the Chemical History and Medical As últimas três décadas do séc. XVIII – poderia ter constituído a chave con- Treatment of Calculous Disorders constituíram uma grande revolução ciliadora entre Dalton e Gay-Lussac, (Londres, 1819). A própria técnica na Química: os avanços da Química contudo, na época, não houve quem utilizada nesse trabalho, a semimi- Pneumática tinham centrado a aten- o soubesse fazer. Em Itália, em 1811, croanálise, constituía uma novidade ção sobre o oxigénio, permitindo dar Amedeo Avogadro (1776-1856), dis- para a época; Alexander, contudo, a machadada final na convicção de tinguindo pela primeira vez entre áto- nunca deixou de reconhecer o mé- que o ar e a água eram elementos. mo e molécula, oferecia a solução rito do pioneirismo de William Hyde Em 1789, o Traité Élémentaire de para a resolução do diferendo Dalton/ Wollaston no estudo da composição Chimie de Antoine Laurent Lavoisier Gay-Lussac, mas acabaria por ser de cálculos urinários [1, 5]. (1743-1794) veio definitivamente con- uma voz isolada e ignorada durante sagrar a Química como uma ciência quase cinco décadas (apesar do es- moderna. forço levado a cabo por André Marie Ampère, em 1814, para a sua aceita- No tempo que mediou entre a publi- ção). Entretanto, em Estocolmo, Ber- cação do Traité e Conversations on zelius fez progressos no isolamento Chemistry, uns escassos dezasseis de novos elementos (ao cério, desco- anos, assistiu-se progressivamente à berto em 1803, seguir-se-iam o selé- aceitação das novas teorias e atitudes nio, tório, silício, zircónio e titânio) e perante a Química, nomeadamente: a na determinação de massas atómicas utilização sistemática dos métodos (a massa do carbono passou para 12, quantitativos, a eliminação absoluta a do nitrogénio para 14 e a do oxigé- da teoria do flogisto (embora houves- nio para 16). Todavia, neste campo, o se entretanto o óbice do calórico!), a seu sucesso foi mais moderado por- lei da conservação da massa, a teoria que, não raramente, deparava-se com da combustão, a noção de elemento grandes problemas de interpretação Figura 2 ‒ Alexander Marcet (1770-1822) e um novo sistema de nomenclatura. dos resultados da sua investigação,

58 Química 127 Artigos Artigos

decorrentes de uma teoria atómica, Jane & Cia Outra figura que, no presente contex- ainda, bastante incipiente (o uso dos to, não pode ser omitida é Marie-Anne equivalentes superava em parte esta A proporção dos impactos que a obra Pierrette Paulze Lavoisier (1758- limitação). A Berzelius deve-se ainda de divulgação científica encetada por 1836). Muitos investigadores conside- a moderna notação química ao ter Jane Marcet iria atingir ao longo do ram que Claudine Picardet terá sido o sugerido, em 1811, o uso dos atuais séc. XIX era totalmente inédita para a modelo de Madame Lavoisier como símbolos dos elementos. época, todavia não era a primeira vez mulher participante nas atividades do que, de forma direta ou indireta, se mundo da ciência. Consciente do seu Em Bristol, na Instituição Pneumática, verificavam contributos “no feminino” estatuto de esposa do maior químico entre 1799 e 1802, foram estudados para a propagação do conhecimento mundial do tempo, decidiu aprender os efeitos de vários gases sobre os científico. Na França do séc. XVIII, Química e aperfeiçoar o domínio do seres humanos; dessa investigação das mais diversas formas, contribu- Inglês e do Latim. O seu conhecimen- sobressaiu o nome de Humphry Davy íram para a divulgação da ciência fi- to das línguas revelou-se valioso para (1778-1829), verdadeiro herói român- guras tão relevantes como Émilie du a tradução de vários artigos e livros, tico inglês, que à enorme habilidade Châtelet, Claudine Picardet e Marie- dos quais se destacam Essay on Phlo- para a Química juntava ainda dotes -Anne Pierrette Paulze Lavoisier. giston (1787) e Strength of Acids and para a poesia. Em plena época da the Proportions of Ingredients in Neu- descoberta da eletricidade - Alessan- Émilie du Châtelet (1706-1749) foi tral Salts (1790), do químico britânico dro Volta (1745-1827) tinha apresen- uma matemática, física e escritora do Richard Kirwan. Na tradução que fez tado em 1800 a primeira pilha elétrica Iluminismo, que se destacou sobre- desta última obra incluiu anotações e - Davy viria a evidenciar-se na eletró- tudo pela tradução para francês da comentários da sua lavra. Madame lise de sais, isolando o potássio e o genial obra de Isaac Newton Principia Lavoisier foi ainda a responsável pela sódio, em 1807, e o cálcio, estrôncio, Mathematica, onde incluiu anotações correspondência científica do marido bário e magnésio em 1808 [6-8]. e comentários da sua própria autoria. (as línguas estrangeiras não eram o Esta tradução, que só foi publicada seu forte!) com figuras como Pristley e Entretanto, em 1801, quando as pales- dez anos após a sua morte, ainda hoje Cavendish. Os seus dotes para as be- tras públicas de Humphry Davy come- é considerada a versão francesa de las artes valeram-lhe ter sido a autora çavam a fazer furor na recentemente referência. Ao longo da sua atividade das gravuras que ilustram o Traité Élé- criada Royal Institution, aquele que literária e de tradução, a Marquesa de mentaire de Chimie. Outro contributo, viria a ser o genial Michael Faraday Châtelet advogou o direito das mulhe- normalmente menos referido, mas não (1791-1867) era ainda uma criança. res à educação, por entender que, só menos importante, foi o ter sido uma assim, estas poderiam, à semelhança divulgadora ativa das ideias da nova As lições públicas de Humphry Davy, dos homens, destacar-se nas artes e Química através da correspondência que incluíam demonstrações experi- nas ciências [8, 9]. que manteve com múltiplas personali- mentais e às quais se acedia medi- dades; empenhou-se em particular no ante o pagamento de uma entrada, Claudine Picardet (1735-1820) foi derrube da teoria do flogisto – muito tornaram-se tão famosas que passou também uma personalidade de vulto arreigada na sociedade científica da a ser chique frequentá-las; a burgue- nos meandros da divulgação científi- época. Depois da morte de Lavoisier, sia elegante de Londres e a aristocra- ca dos finais do séc. XVIII. Enquanto guilhotinado em 1794, Marie-Anne cia não as perdiam – Jane e Alexan- esposa do General Picardet, mante- organizou, em 1805, a publicação de der Marcet também não! Para a maio- ve um salão famoso, procurado por Mémoires de Chimie, uma compila- ria dos espectadores, em particular as académicos e intelectuais, onde não ção de escritos do marido e dos seus senhoras, estas sessões constituíam se coibia de expor as suas opiniões. colaboradores, onde se expunham os uma espécie de entretenimento cir- Madame Picardet, que trabalhou princípios da nova Química; a esta cense; porém, para Jane, eram muito como assistente de Bernard Guyton adicionou uma introdução do seu pró- mais do que um espetáculo: achava- de Morveau – amigo e colaborador prio punho [11, 12]. as verdadeiramente fascinantes, pelo científico de Lavoisier – com quem conhecimento científico que lhe tra- viria a casar em segundas núpcias, No contexto da divulgação e populari- ziam, e o seu desejo era poder en- teve uma atividade intensa como tra- zação da ciência no séc. XIX, a esco- tendê-las integralmente. dutora: três livros e várias dezenas de cesa Mary Sommerville (1780-1872), artigos científicos. O seu trabalho de matemática e astrónoma autodidata, Assim, deu início à realização de al- tradutora não só concorreu para a dis- merece um destaque especial, pro- gumas experiências científicas na sua seminação da Química (em particular vavelmente de forma só comparável própria casa (para o que contava com a Química dos sais e dos minerais), a Jane Marcet – a despeito de terem o auxílio e as explicações do marido). como também teve impacto no mundo tido intervenções em planos diferen- Daí até ter sentido que outras pesso- editorial, tanto no que respeita ao apa- tes, atendendo a que Jane não foi as, em particular as mulheres, deviam recimento de revistas científicas espe- uma cientista. A reputação de Mary poder aceder a informação compre- cializadas, como na própria definição começou com a sua tradução de ensível sobre os factos da Química e de alguns aspetos editoriais inéditos Mécanique Céleste, de Laplace, que das suas descobertas para o bem-es- (por exemplo a inclusão da data da desde o primeiro instante, em 1831, tar da sociedade, foi um curto passo. primeira publicação dos artigos) [10]. se revelou um sucesso de vendas.

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A propósito da popularidade da sua (foi consultada a quinta edição ingle- […] Por conseguinte, decerto compreen- versão, a própria chegou a dizer que sa – Figura 3) [16]: derás que […] uma mulher pode adquirir tinha traduzido Laplace “da álgebra um conhecimento científico que a levará a para a linguagem comum”. Mary Som- “Ao aventurar-se a oferecer ao públi- interessar-se pelos fenómenos correntes merville foi também autora de várias co, mais particularmente ao feminino, da vida, contribuindo ainda para alargar o obras científicas - tão procuradas por uma Introdução à Química, a autora seu horizonte de ideias e tornar a contem- cientistas como por estudantes - das – uma mulher – entende que deverá plação da natureza uma encantadora fonte quais, por entrarem no domínio das dar uma explicação pela iniciativa, de instrução. ciências físicas e químicas, se des- tanto mais que o seu conhecimento tacam The Connexion of the Physical do assunto é recente, não podendo Ao longo de Conversations, a auto- Sciences (1834) – que na sua terceira reclamar para si o título de química.” ra vai dando a conhecer, explicando, edição refere o trabalho de Michael os principais conceitos da Química Faraday, com quem se correspondeu Conversations, que nas primeiras e os seus grandes avanços: as des- entre 1833 e 1834 – e Molecular and edições apareceu em dois volumes cobertas de Galvani, Volta, Franklin, Microscopic Science (1869). Os seus – o primeiro abordando o que autora Rumford, Priestley, Oersted, Berze- livros tiveram uma influência deter- designa por “corpos simples”, e o se- lius, Berthollet, Cavendish, Lavoisier, minante sobre figuras como James gundo os “corpos compostos” – está Davy, … Clerk Maxwell e o seu trabalho foi me- escrito na forma de diálogos informais recidamente reconhecido na época; entre uma professora, a Sra. B., e as Nos dias atuais, para além do valor Mary Sommerville foi alvo de nume- suas duas alunas: a reservada Emily, histórico intrínseco da obra, Conver- rosas honras e louvores, tendo sido de treze anos, e a sua irmã de dez, a sations on Chemistry tem ainda algo eleita membro de várias sociedades espontânea Caroline. a dizer-nos: não, obviamente, no que científicas, incluindo a Royal Society toca à Química propriamente dita (o [13, 14]. Centremo-nos no diálogo seguinte, calor é explicado em termos de “caló- bem revelador da forma e do espírito rico”; as transformações físicas e quí- Outra figura de relevo na divulgação da obra (página 2 de [16]): micas são discutidas, respetivamente, científica no séc. XIX, foi Harriet Marti- em termos de “atração de coesão” e neau (1802-1876), de resto frequenta- Caroline: Sra. B., para dizer a verdade não de “atração de composição”; o “caló- dora do círculo social e intelectual de estou muito inclinada a conceber a Quími- rico”, a luz e a eletricidade são lista- Jane Marcet. Através da sua atividade ca de forma muito favorável, nem sequer dos como corpos simples; etc.) mas, de jornalista, escritora e socióloga de acho que me possa entreter muito com ela. antes, pelo seu valor didático. Para orientação feminista – hoje conside- Prefiro as ciências que abordam a nature- este, contribuem de forma exemplar rada como uma das fundadoras da za em grande escala às que se confinam a clareza e a simplicidade do texto. sociologia – Martineau teve um pa- à minúcia dos seus detalhes. Porventura Com efeito, Conversations ainda hoje pel importante na difusão dos novos poderão os últimos estudos sobre as pro- se publica (Figura 4). conhecimentos da economia política priedades gerais da matéria, ou sobre a da primeira metade do séc. XIX (uma revolução dos corpos celestes, ser compa- Nas últimas décadas têm sido reco- das muitas áreas em que Jane Mar- rados à combinação de meros compostos? nhecidas as vantagens das metodolo- cet também interveio). Neste campo, Admito contudo que, na Química, possam gias de ensino-aprendizagem basea- Harriet Martineau destacou-se atra- existir experiências divertidas e que até das na convicção de que a aprendiza- vés de uma série de vinte e cinco no- nem desgostaria de testar algumas delas, gem se processa por ciclos, ao longo velas publicadas sob o título genérico por exemplo a destilação da lavanda ou da de Illustrations of Political Economy água de rosas. (1832-1834) [15]. Igualmente se nota- bilizou pelas suas traduções da obra Sra. B.: Minha querida Caroline, prefiro filosófica de Auguste Comte e por ter pensar que essa tua antipatia pela Química sido, desde o primeiro momento da se deve à ideia bastante limitada que tens publicação de The Origin of Species dela. Restringes o laboratório de Química (1859), uma apoiante da teoria da ao mero espaço de trabalho do farmacêuti- evolução de Charles Darwin. co e do perfumista, quando na verdade ele se presta a muitas outras funções úteis. Emily, Caroline e a Sra. B. Além do mais, minha querida, de modo al- gum a Química se confina só ao trabalho Conversations on Chemistry, a obra das profissões: a natureza também tem o que Jane Marcet publicou em dezem- seu próprio laboratório, o Universo, onde bro de 1805, sob pseudónimo (em- os processos químicos ocorrem incessan- bora revelasse que era uma mulher), temente. Estás surpreendida, Caroline! tinha como principal objetivo divulgar Contudo, asseguro-te que os fenómenos a Química, ensinando-a. O desígnio mais maravilhosos e interessantes da na- pedagógico e divulgador da obra é tureza são quase todos eles produzidos Figura 3 ‒ Frontispício da quinta edição apresentado pela autora no prefácio por forças químicas. inglesa de Conversations on Chemistry (1817)

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dos quais o estudante tem de ser con- ceito de substância elementar (pági- Emily: Sim, perfeitamente: decompomos duzido pelo professor – desde o nível nas 7 a 10 de [16]): um corpo nas suas partes constituintes e cognitivo onde se encontra até às dividimo-lo nas suas partes integrantes. novas situações – de forma a poder Sra. B.: […] tens de ter em conta que os atingir um novo patamar de conheci- vários corpos da natureza são compostos Sra. B.: Exatamente. Por conseguinte, se mento e de compreensão, idealmen- por certos princípios elementares, os quais um corpo for constituído por uma só subs- te de um nível superior de abstração. não são em grande número. tância, embora possa ser divido nas suas As demonstrações e as experiências partes integrantes, não é possível decom- laboratoriais, bem como o recurso a Caroline: Sim, eu sei que todos os corpos pô-lo. Tais corpos são então chamados de analogias e a exemplos concretos do são compostos por fogo, ar, terra e água: simples ou elementares, uma vez que são quotidiano e da indústria, contribuem aprendi isso há muito tempo! os elementos de que são compostos todos para a efetivação destes ciclos de os outros corpos. Os corpos compostos aprendizagem [17]. Em pleno início Sra. B.: Tens no entanto de fazer um esfor- são os que consistem em mais de um des- do séc. XIX, sem dispor das moder- ço para esquecer isso! Já te falei da grande ses princípios elementares. nas teorias pedagógicas, Jane Mar- mudança que ocorreu na Química desde cet, através da Sra. B., conseguiu que esta se tornou uma ciência regular … Em Conversations, as experiências que fossem alcançados muitos dos Um corpo elementar é o que não pode ser são descritas com tal realismo que o resultados que atualmente são espe- decomposto, isto é, separado noutras subs- leitor as consegue “viver”; algumas vêm acompanhadas dos respetivos rados dos professores e escritores/ tâncias. O fogo, o ar, a terra e a água são esquemas de montagem, desenha- divulgadores de ciência [18]. Se, por todos eles suscetíveis de decomposição. dos pela própria autora (Figura 5). O um lado, se pode dizer que a autora diálogo seguinte, a propósito de uma se destacou no pioneirismo do recur- Emily: Pensava que decompor um corpo experiência destinada a ilustrar o con- so às demonstrações experimentais era dividi-lo nas suas partes mais minús- ceito de “atração” entre compostos, é [13], por outro, se analisarmos os di- culas. Assim, não entendo como é que bem revelador da clareza, detalhe e álogos - que têm sempre uma exten- uma substância elementar não pode ser vivacidade das descrições (páginas são adequada ao desenvolvimento do decomposta tal como as outras. 17 a 19 de [16]): tópico em causa – verifica-se que, por hábito, a Sra. B. introduz os tópicos Sra. B.: Não entendeste bem a ideia de de- Sra. B.: […] se eu verter algum deste líqui- recorrendo a exemplos conhecidos composição; é muito diferente da simples do (chamado ácido nítrico) sobre o pedaço e a analogias, de seguida apresenta divisão, que unicamente reduz um corpo às de cobre contido no copo, a sua forte atra- novos conceitos e, finalmente, ajuda suas partes. A decomposição separa-o nos ção faz com que cada uma das partículas as alunas a estabelecer comparações vários ingredientes ou materiais de que é do cobre se combine com uma partícula e a tirar conclusões [18]; os diálogos composto. Consideremos um pão: se sepa- de ácido; formando juntas um novo corpo, costumam terminar com uma reco- rássemos os vários ingredientes de que é totalmente diferente tanto do cobre como mendação para que seja revisto um feito - a farinha, o fermento, o sal e a água - do ácido. Notas a comoção interna que já o resultado seria muito diferente do de cor- dado assunto, antes de se passar ao começa a ocorrer? seguinte. tar o pão em pedaços ou de o esmigalhar. Emily: O ácido … parece dissolver muito No diálogo que se segue, em que a Emily: Compreendo agora muito bem … rapidamente o cobre! autora recorre ao pão como analogia, é abordado pela primeira vez o con- Caroline: Mas a farinha, a água e os outros Sra. B.: Dessa forma ele vai reduzir o cobre materiais do pão, de acordo com a defini- a partes mais minúsculas do que aquelas ção, não são substâncias elementares? que possivelmente se poderiam obter por uma ação mecânica. Mas, como o ácido Sra. B.: Não minha querida. Eu referi o só consegue atuar na superfície do metal, pão, para ilustrar a ideia, mais por ser uma vai demorar algum tempo até que a união comparação familiar do que propriamente destes dois corpos se complete. um exemplo. Podes, no entanto, ver já como este com- As substâncias elementares de que um posto é totalmente diferente dos seus in- corpo é composto são as chamadas partes gredientes: não é incolor como o ácido, constituintes do corpo. Se o decompuser- nem duro, pesado e amarelo como o co- mos, iremos, por conseguinte, separar as bre. Se o provasses, já não irias notar a suas partes constituintes. Se, pelo con- acidez do ácido. De momento apresenta- trário, dividirmos um corpo cortando-o em -se como um líquido azul mas quando a pedaços, ou mesmo se o triturarmos ou união ficar completa e a água - na qual o martelarmos até ficar reduzido ao mais fino ácido estava diluído - for evaporada, assu- pó, cada uma dessas pequenas partículas mirá a forma de cristais regulares de uma será ainda uma porção […] do corpo; estas bela cor azul perfeitamente transparente. Figura 4 ‒ Capa de uma edição recente de uma seleção de diálogos de Conversations designam-se por partes integrantes. Con- Posso mostrar-te um exemplar desses, on Chemistry segues ver a diferença? porque para o efeito já preparei alguns.

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Caroline: Que bonitos que são na cor, na […] a Sra. Marcet era uma boa amiga mi- Marcet, a propósito das experiências que forma e na transparência! nha, como o deverá ter sido de todos os tinha possibilidade de realizar, e verifiquei seres humanos. Entrei para a oficina de que estas concordavam com os factos, tal Emily: Não deverá existir melhor exemplo um livreiro e encadernador aos treze anos como eu os podia entender, senti que tinha da atração química! de idade, em 1804, e permaneci lá oito encontrado, no conhecimento químico, anos, encadernando livros a maior parte uma âncora de sustentação à qual rapida- O aprendiz de encadernador do tempo. Foi nesses livros, lidos após as mente me agarrei. Daí a minha profunda e de Química horas de trabalho, que a minha filosofia se veneração pela Sra. Marcet: primeiro como iniciou; havia dois que me ajudaram espe- uma pessoa que me deu grande prazer e As sucessivas edições de Conversa- cialmente, a “Enciclopédia Britânica”, onde satisfação pessoal e, depois, como alguém tions on Chemistry foram sendo atua- obtive as minhas primeiras noções de ele- capaz de transmitir a verdade e os princí- lizadas por Jane Marcet ao sabor dos tricidade, e o Conversations on Chemistry pios daqueles infindáveis domínios do desenvolvimentos da Química, para da Sra. Marcet, que me forneceu os meus conhecimento das coisas naturais, a uma os quais estava sempre alerta. A esse alicerces naquela ciência. mente jovem, não instruída e inquisidora. respeito é interessante reparar na nota inicial que incluiu na quinta edi- Não julgue que eu fosse um profundo pen- As voltas que o parafuso dá ção inglesa [16]: sador ou, mesmo, considerado como uma pessoa precoce; era antes muito vivaço Jane Marcet, detentora de um espíri- “A autora, nesta quinta edição, esfor- e imaginativo - tanto podia acreditar nos to averiguador e de um pensamento çou-se por incluir as principais des- contos das “mil e uma noites” como na claro e muito lógico, a que se aliava cobertas levadas a cabo nos últimos “Enciclopédia”. Contudo, os factos eram uma enorme capacidade de comu- quatro anos na Ciência Química bem importantes para mim, que foi o que me nicação, foi, na primeira metade do como as várias importantes aplica- salvou; eu acreditava num facto se ele se séc. XIX, uma notável pedagoga e ções que originaram, como é o caso conseguisse sustentar em todos os seus divulgadora da ciência e das disci- da luz de gás e da lanterna de segu- detalhes. Quando consultei o livro da Sra. plinas saídas do Iluminismo, muito rança dos mineiros.”

Na oitava edição, Jane introduziu as “últimas descobertas do eletromag- netismo e a doutrina das proporções definidas” [2].

A sua permanente preocupação em atualizar Conversations está bem pa- tente na carta que, aos 71 anos, es- creveu àquele que em jovem lhe terá encadernado o seu livro (Figura 6) [2]:

Caro Sr. Faraday, li esta manhã no Athe- naeum uma notícia sobre uma descoberta Figura 5 ‒ Ilustração de Conversations on Chemistry relativa à preparação do oxigénio e às por si anunciada … respeitante à identida- combustões (página 181 da quinta edição inglesa) de dos agentes imponderáveis, calor, luz e eletricidade. Encontrando-me neste mo- mento a corrigir o meu Conversations on Chemistry, para uma nova edição, ouso tomar a liberdade de lhe pedir que me in- forme onde poderei obter uma descrição desta descoberta. Receio que seja de uma natureza demasiado complexa para poder ser adaptada às minhas jovens alunas mas não me decidi ainda a publicar a nova edição sem a mencionar. Por conseguinte, mantenho de lado as folhas das provas de Conversations referentes à eletricidade – as quais estive esta manhã a rever – até receber a sua resposta, na esperança de a conseguir incluir.

Quando Jane morreu, em 1858, Mi- chael Faraday escreveu a seguinte carta a Auguste de la Rive, amigo da Figura 6 ‒ Livraria e oficina de encadernação de George Riebau onde, em jovem, família Marcet [4]: Michael Faraday trabalhou como encadernador

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apreciada, sobretudo, pelo sexo fe- A referência a Jane Marcet destina-se [5] N. G. Coley, Medical History, 1968, minino, que não recebia educação a frisar que a pergunta da ama pertur- 12, 394-402. formal em ciência. Conversations on bou tanto Flora como a teriam pertur- [6] A. J. Ihde, The Development of Mod- Chemistry, a obra que a imortalizou – bado as comuns perguntas sobre as- ern Chemistry, Harper & Row, Nova e que inegavelmente teve o contributo suntos escolares. “Nove vezes nove” Iorque, 1964. do marido Alexander Marcet, químico apresenta um sentido duplo: se por [7] R. Gonçalves-Maia, O legado de ilustre – dominou sobremaneira a ins- um lado é uma alusão à tabuada, que Prometeu – Uma Viagem na História trução elementar em Química durante as crianças (então!) tinham de saber das Ciências, Escolar Editora, Lis- várias gerações. Conversations teve de cor; por outro, apela ao domínio do boa, 2006. dezasseis edições em Inglaterra e sobrenatural, nomeadamente ao mo- [8] J. Calado, Haja Luz! - Uma História foi traduzido para francês e alemão. mento da 3.ª cena do 1.º ato de Ma- da Química Através de Tudo, IST Nos Estados Unidos da América, o cbeth de Shakespeare, em que uma Press, Lisboa, 2011. das três bruxas lança um feitiço sobre seu impacto foi igualmente admirá- [9] J. P. Zinsser, La Dame d’Esprit: A um marinheiro1. vel: em 1853 já tinha vendido 160 000 Biography of Marquise Du Chatelet, Viking Penguin, Nova Iorque, 2006. exemplares. Thomas Jefferson (1743- A novela de Henry James tem sido ob- [10] M. Rayner-Canham, G. Rayner- 1826), terceiro presidente do país – jeto das mais variadas adaptações ao Canham, Women in Chemistry: Their ele próprio um apaixonado da Quími- longo dos tempos, tanto para o palco, Changing Roles from Alchemical ca – recomendava o livro da Sra. Mar- como para o ecrã; as mais notáveis Times to the Mid-Twentieth Century, cet (que não faltava na sua biblioteca) serão a ópera homónima, de Benjamin American Chemical Society e Chem- aos que a desejassem aprender [19]. Britten (1954), e o filmeThe Innocents, ical Heritage Foundation, 1998. de Jack Clayton (1961), Figura 7. O facto, pouco inocente, de as três [11] J. P. Poirier, La Science et l’Amour personagens do popular livro serem Agradecimentos - Madame Lavoisier, Pygmalion, Par- do sexo feminino, teve a consequên- is, 2004. cia óbvia de contribuir para o estabe- O autor agradece as valiosas suges- [12] P. Fontes da Costa, Manifesto para lecimento da Química como uma ciên- tões e/ou a leitura atenta do manuscri- uma Nova Química, Palavrão, Cal- cia não destinada exclusivamente aos to às seguintes pessoas: João Costa, das da Rainha, 2011. homens. Uma das consequências do Jorge Calado, Ana Paula Esteves e [13] S. Houlihan, J. H. Wotiz, J. Chem. interesse das mulheres pela Química, avaliador(a). Educ., 1975, 6, 362-364. e do seu progressivo envolvimento [14] M. T. Brück, Journal of the British As- nela, foi a necessidade da criação de Nota tronomical Association, 1996, 106, instituições de ensino científico desti- 201-206. 1 Weary se’n nights nine times nine nadas a raparigas. [15] A. J. Harding, Wordsworth Circle, 40, Shall he dwindle, peak and pine: 2009, 22-29. Though his bark cannot be lost, As repercussões da obra de Jane [16] J. Marcet, Conversations on Chemis- Yet it shall be tempest-tost. Marcet na sociedade ficaram teste- try, Vol. 1, 5ª edição, Longman, Lon- (Página 859 de [21]) munhadas na novela do grande es- dres, 1817. [17] J. D. Herron, J. Chem. Educ., 1983, critor anglo-americano Henry James Referências (1843-1916), The Turn of the Screw, 60, 947. [18] M. E. Derrick, J. Chem. Educ., 1985, publicada noventa e dois anos depois [1] L. Rosenfeld, Clinic. Chem., 2001, 62, 779-751. da primeira edição de Conversations 47, 784-792. [19] H. J. Abrahams, J. Chem. Educ., 37, on Chemistry. Trata-se de uma obra li- [2] E. V. Armstrong, J. Chem. Educ., 1960, 357-360. terária de terror psicológico cuja ação, 1938, 53-57. [20] H. James, Ghost Stories, Ware, repleta de tensão e de ambiguidade, [3] E. C. Patterson, British Journal for the Hertfordshire, 2001. decorre numa mansão vitoriana as- History of Science, 1969, 4, 311-339. [21] The Complete Works of William sombrada; as figuras centrais são o [4] A. de la Rive, Biliothèque Universelle - Revue Suisse et Étrangère, 1859, Shakespeare, Wordsworth Editions, rapazinho Miles, a sua irmã Flora e 64(4), 445-468. Ware, Hertfordshire, 1996. a ama destes. No capítulo X, a ater- rorizada ama – que julga ter visto um fantasma – pergunta a Flora se tam- bém vira algo estranho. A pergunta, contudo, não parece impressionar a criança, que se mostra imperturbável (página 218 de [20]):

She absolutely declined to be puzzled; she turned her eyes to the flame of the candle as if the question were as irrelevant, or at Figura 7 ‒ Cena da ópera The Turn of the Screw de Benjamin Britten, numa produção de 2007 any rate as impersonal, as Mrs. Marcet or da English National Opera (esquerda); Deborah Kerr no papel da ama no filme de 1961 de Jack nine-times-nine. Clayton The Innocents (direita)

Química 127 - out/dez 12 63 Five Years of Outstanding Publications

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PSJ-11-32962_gu 4/2006 A Journal of Cluster: Cancer Chemotherapy Review: Praziquantel and Schistosomiasis Review: protein–protein interactions (A. Dömling, K. Khoury) Original Contributions: 17β-HSD1 inhibitors, photosensitizer–peptide Full Paper: NMDA Receptor Antagonists conjugates, AMPA receptor ligands,TRPV1 channel blockers, (P. Conti) catiomers as transfection agents, and more

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Identificação de “Pós Brancos” usando “Produtos Químicos Domésticos”: Uma Atividade para Motivar o Interesse pela Química

Regina M.S. Sousa1, Paulo Ribeiro Claro2,* e Brian J. Goodfellow2

A identificação de “pós brancos” através de testes químicos simples proporciona uma excelente oportunidade para a aplicação de conceitos básicos de química. A atividade aqui apresentada, adaptada e desenvolvida a partir da proposta de Oliver-Hoyo e colaboradores (J. Chem. Educ. 2001, 78, 1475), apresenta duas versões destinadas a diferentes faixas etárias e grau de supervisão exigido.

Introdução try – são tradicionais no acolhimento forma, eliminam-se possíveis proble- dos alunos nos departamentos de quí- mas relativamente ao transporte de A capacidade da química para atrair a mica. A publicação de trabalhos nesta produtos químicos, ao seu uso fora de atenção dos jovens reside essencial- área não é vasta, mas é de referir, ambiente laboratorial e à eliminação mente no seu carácter experimental. por exemplo, a coletânea de rea- de resíduos. Naturalmente, isto não As transformações proporcionadas ções espetaculares de H.W. Roesky invalida a obrigatoriedade de respeitar pelas reações químicas são uma fon- [2], a proposta de um espetáculo de as regras de segurança para manuse- te inesgotável de fascínio, surpresa e química que junta demonstrações amento dos compostos químicos! descoberta. Infelizmente, o contacto e música como forma de criar uma dos jovens com este carácter mais linguagem audiovisual que atinja o O facto de se recorrer a produtos facil- fascinante da química – que é fre- público, de Arroio e colaboradores mente acessíveis e proporcionar a re- quentemente o prelúdio de uma car- [3], ou a construção do “Química por alização de experiências fora de am- reira dedicada à ciência – tem vindo Tabela”, um espetáculo permanente biente laboratorial permite estimular a a sofrer limitações diversas. Não só da Fábrica – Centro Ciência Viva de aprendizagem por esta ciência. Este na escola, onde o tempo dedicado Aveiro, que junta as demonstrações trabalho pode também ser adaptado às atividades laboratoriais é cada vez de química com um fundo cénico de aos vários níveis de ensino. Tendo em mais escasso, como nas suas compo- imagem, luz e som [4]. conta que esta atividade trata da iden- nentes lúdicas, de que são exemplo tificação de “pós brancos” por pro- os “estojos de química”. Estes mini- No entanto, estas atividades de de- cedimentos que envolvem conceitos laboratórios de química, que fizeram monstração não substituem a explo- básicos de química, como reações de as delícias de várias gerações de ração pelo próprio, sendo por isso ácido-base, oxidação-redução, preci- jovens (e estão, de facto, na origem de explorar a ideia de um “estojo” de pitação, entre outros, permite adaptar da descoberta da “vocação” de diver- química que utiliza essencialmente esta atividade a diferentes contextos, sos químicos portugueses), são hoje produtos de uso comum, disponíveis valorizando os aspetos mais formais, fortemente condicionados por regras comercialmente. É neste contexto ou potenciando os aspetos mais lúdi- de segurança restritivas. O exemplo que surge a atividade Identificação cos. Neste último caso sugere-se uma extremo deste condicionamento está de “pós brancos” usando “produtos abordagem no âmbito da investigação bem expresso na capa de um esto- químicos domésticos”: uma atividade criminal, num cenário em que um “pó jo de química vendido pela empresa para motivar o interesse pela química branco” surge como indício recolhido Elenco (EUA), com o título “Chemistry como forma de proporcionar expe- no local de um assalto à caixa forte 60”, que anuncia ‘60 atividades diver- riências de química que possam ser do banco. Este cenário foi já utiliza- tidas... sem químicos’ (!) [1]. efetuadas por alunos de todas as fai- do com sucesso numa atividade ex- xas etárias e público em geral, quer perimental apresentada pela Fábrica Muitas universidades (ou professores na escola, quer em casa. A proposta – Centro Ciência Viva de Aveiro, no universitários) apostam em atividades aqui apresentada, adaptada e desen- âmbito do seu “Laboratório com pare- de química capazes de fascinar os jo- volvida a partir da proposta de Maria des de vidro”, acessível ao público em vens e o público em geral. As demons- Oliver-Hoyo e colaboradores [5], des- geral [6]. trações de química – que de algum creve um esquema de análise qualita- modo seguem as famosas sessões de tiva (Figura 1) para a identificação de Metodologia Faraday na Royal Society of Chemis- catorze sólidos com aspeto de “pós brancos”, utilizando apenas materiais Este método segue os princípios clás- e produtos químicos do dia-a-dia, dis- sicos da análise qualitativa, em par- 1 Fábrica - Centro Ciência Viva de Aveiro 2 Departamento de Química/CICECO, Universidade de poníveis em supermercados, farmá- ticular, da “Marcha Geral de Análise” Aveiro cias, drogarias, entre outros. Desta utilizada na identificação de iões em * E-mail: [email protected]

Química 127 - out/dez 12 65 Química e Ensino solução aquosa: um conjunto de tes- “amostras-problema” para as identifi- to, é perfeitamente possível manter o tes sequenciais, com um efeito visual car. O esquema de análise qualitativa nível de interesse e desafio químico (ou outro) que permite classificar o apresenta-se na Figura 1. Os catorze desta atividade sem estes compostos, teste como positivo/negativo, ao lon- sólidos brancos desconhecidos encon- reduzindo a oito o número de possíveis go de um diagrama dicotómico que tram-se listados na Tabela 1, juntamen- amostras-problema. O esquema que conduz à identificação final. Tal como te com as suas fontes e propriedades permite a realização da atividade pelos referido na introdução, o esquema de físicas utilizadas para os identificar. mais jovens, com baixo nível de super- análise tem por base o trabalho de Os restantes reagentes (a negrito na visão, é apresentado na Figura 2 e in- Maria Oliver-Hoyo e colaboradores Figura 1) são apresentados na Tabe- clui os testes de solubilidade em água, [5], mas foram introduzidas novas pro- -la 2, assim como as suas fontes. o teste do iodo, o teste do vinagre e o postas de testes e de exploração da teste de pH com antocianinas. atividade, que visam enriquecer e va- A presença de reagentes como o hi- lorizar a sua aplicação prática. Natu- dróxido de sódio (soda cáustica), áci- Testes de solubilidade ralmente, houve também necessidade do clorídrico a 20% (ácido muriático) e de adaptar os produtos utilizados aos sulfato de cobre é uma condicionante Os testes de solubilidade permitem a produtos comerciais existentes em ao desenvolvimento da atividade pe- primeira separação dos “pós brancos” Portugal. los mais jovens. em dois grupos, de acordo com a sua solubilidade em água, à temperatura Nesta atividade propõe-se a reali- O manuseamento destes reagentes ambiente. Dos 14 sólidos brancos, 9 zação de testes com os “pós bran- exige cuidados em qualquer faixa etá- são solúveis em água e 5 são muito cos” conhecidos para classificar o ria, que passam por um elevado nível menos solúveis (Tabela 1). A solubili- resultado como positivo/negativo e, de supervisão ou mesmo de realiza- dade é também a base de dois outros posteriormente, efetuar testes com ção do teste por um adulto. No entan- testes que surgem posteriormente no

Figura 1 ‒ Esquema de análise qualitativa

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esquema: a identificação do bitarta- teste apenas com água) para compa- No caso particular do borato de sódio rato de potássio e do ácido acetilsa- ração. (bórax), o teste das antocianinas for- licílico. nece uma identificação positiva por Teste de pH um mecanismo diferente: o bórax re- O bitartarato de potássio é apenas age com os grupos hidroxilo em posi- ligeiramente solúvel em água, mas Os testes de pH permitem distinguir ção orto do anel aromático da antocia- é bastante solúvel em solução ácida um conjunto apreciável de sólidos nina (posições 3’ e 4’), originando um (HCl 20%). Neste caso, a alteração solúveis. O indicador de pH utilizado complexo de borato de cor amarelo- de solubilidade do sal em água passa neste teste é também de produção -acastanhado [10]. pela sua conversão em ácido tartári- doméstica: uma solução concentrada co (o que permite o seu uso como pa- de antocianinas extraídas da couve Formação de um hidróxido drão primário para soluções tampão) roxa. insolúvel [7]. Por seu lado, o ácido acetilsalicíli- co, que apresenta baixa solubilidade A estrutura da Figura 3 representa o A identificação positiva do sulfato de em água, é solúvel em alguns solven- núcleo geral da cianidina, que origina magnésio é efetuada através de um tes orgânicos como, por exemplo, o os pigmentos antocianinas por liga- teste de solubilidade, com precipitação álcool etílico. ção a hidratos de carbono. No caso de um hidróxido insolúvel (Equação 1). particular da antocianina extraída da Teste de variação de temperatura couve roxa, a sua estrutura apresen- De facto, dos 9 compostos solúveis ta duas moléculas de glucose ligadas em água, apenas o sulfato de magné- A solubilização de NaOH é um pro- pelos átomos de oxigénio nas posi- sio forma um hidróxido insolúvel -11 cesso fortemente exotérmico (entalpia ções 3 e 5, respetivamente. (Ksp Mg(OH)2 ≈ 10 ) [8]. de dissolução para solução aquosa é −44,4 kJ/mol) [8]. O aumento de tem- Esta antocianina é um indicador uni- Teste de temperatura peratura que acompanha a solubili- versal de pH e exibe as seguintes co- zação do hidróxido de sódio fornece res para os diferentes valores de pH O aquecimento à chama da lamparina um teste positivo para a identificação [9]: 1-3, vermelho; 4, rosa; 5-6, rosa- permite distinguir o cloreto de sódio dos deste sal. -violeta; 7, violeta; 8, azul; 9, azul- glúcidos sacarose e glucose (ou frutose). -verde; 10-12, verde; > 12, amarelo A partir da entalpia de dissolução do (Figura 4). Quatro das soluções exi- O ponto de fusão do cloreto de sódio é NaOH estima-se um aumento de tem- bem cores típicas por adição de ex- bastante elevado (pf. = 801ºC), como peratura acima dos 6ºC quando 0,25 g trato de couve roxa: verde-amarelado se espera de um sal inorgânico, não de NaOH são dissolvidos em 10 mL de (pH = 11,5) para a solução de carbona- sendo possível fundi-lo recorrendo à água. Este aumento de temperatura to de sódio; azul-esverdeado (pH = 8) chama de uma lamparina. da solução é facilmente detetável pelo para a solução de bicarbonato de sódio; contacto com a pele, mas sugere-se rosa (pH = 4,5) para a solução de ácido No entanto, a temperatura da chama a utilização de um “branco” (tubo de bórico. é suficiente para fundir a sacarose

Tabela 1 ‒ Propriedades físicas e fontes dos sólidos brancos

Solubilidade em água (g/100 mL) Sólido desconhecido Fórmula Molecular Uso/Fonte Onde encontrar Temp amb. Aquecimento

Ácido acetilsalicílico C9H8O4 Aspirina Supermercado/Farmácia 0,3 1 (37ºC)

a) Ácido bórico H3BO3 Ácido bórico Farmácia 6 27 (100ºC) Amido Polímero de glucose Farinha Supermercado Insol.

Bicarbonato de sódio NaHCO3 Bicarbonato de sódio Supermercado 10 16,4 (60ºC)

Bitartarato de potássio KHC4H4O6 Cremor de tártaro Farmácia ou padaria 0,5 6 (100ºC)

Borato de sódio (bórax) Na2B4O7.10H2O Bórax Farmácia 6 130 (100ºC)

Carbonato de cálcio CaCO3 Giz Supermercado 0,001 0,002 (75ºC)

Carbonato de sódio Na2CO3 Carbonato de sódio Farmácia 28 45 (100ºC) Cloreto de sódio NaCl Sal de cozinha Supermercado 36 39 (100ºC)

Frutose C6H12O6 Frutose Supermercado Muito sol.

Glucose (dextrose) C6H12O6 Glucose Farmácia Muito sol. Hidróxido de sódio NaOH Soda cáustica Drogaria/Supermercado 110 347 (100ºC)

Sacarose C12H22O11 Açúcar Supermercado 200 500 (100ºC)

Sulfato de cálcio CaSO4 Gesso Drogaria 0,2

Sulfato de magnésio MgSO4.7H2O Sulfato de magnésio Farmácia 71 91 (40ºC) a) Temperatura à qual determinada quantidade de sólido (g) se dissolve em 100 mL de água. Neste caso, é possível dissolver 27 g de ácido bórico em 100 mL, a 100ºC.

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(pf. = 185-187ºC), a glucose (pf. = 150- guir entre a glucose (ou frutose) e a ser adicionada mais mistura de redu- 152ºC) e frutose (pf. = 119-122ºC). O sacarose. O ião Cu2+ reage com açú- ção do cobre. O teste positivo origina aquecimento provoca reações de oxi- cares redutores originado uma mis- uma coloração vermelha do óxido de dação e polimerização dos açúcares tura com uma coloração na gama de cobre e um teste negativo coloração (caramelização) [11], pelo que o resul- cores que vai de laranja a vermelho azul típica do ião Cu2+ hidratado. tado do teste com açúcares é normal- ou a castanho (Equação 2) [12]. mente um resíduo negro. Formação do complexo amido-iodo Tanto a frutose como a glucose são Teste dos açúcares redutores agentes redutores. A sacarose não é A identificação do amido é efetuada um açúcar redutor e, portanto, não re- através do “teste do iodo”, utilizando Uma reação de oxidação-redução é age. Este teste pode demorar um ou uma solução de iodo com iodeto de usada para o teste que permite distin- dois minutos e, se necessário, pode potássio. A amilose, o componente do amido de cadeia não ramificada, MgSO (aq) + 2NaOH (aq) → Mg(OH) (s) + Na SO (aq) (1) 4 2 2 4 forma um complexo amido-iodo azul Glucose (aq) + 2 Cu2+ [azul] + NaOH → gluconato de sódio + Cu O [vermelho] (2) 2 escuro na presença de iões iodeto, amido + I ( I- ) [Incolor] → amido-I (I- ) [azul escuro] (3) 2 2 num processo que parece envolver as - - formas I3 e/ou I5 (Equação 3) [13].

Libertação de bolhas de dióxido de carbono

A reação de carbonatos ou bicarbo- natos com ácidos, como por exemplo o ácido acético (no vinagre), origina dióxido de carbono gasoso. Estas bo- lhas de gás são mais evidentes se for adicionado o ácido a um sólido, mas o teste também pode ser realizado usando uma solução ou mistura. É de referir que, frequentemente, o sulfato Figura 2 ‒ Esquema de análise qualitativa simplificado para 8 sólidos de cálcio contém uma pequena quan- tidade de carbonato impuro e, portan- to, podem formar-se algumas bolhas. Contudo, a evolução do gás será mui- OH to menor do que com carbonato de 3' OH cálcio. 4' Procedimentos experimentais HO 7 O

Os sólidos brancos e os produtos 5 3 OH químicos utilizados encontram-se em OH supermercado, farmácia ou drogaria, Figura 4 ‒ Cores exibidas pelo extrato de conforme indicado nas Tabelas 1 e 2. Figura 3 ‒ Núcleo geral da cianidina couve roxa a diferentes valores de pH As quantidades dos reagentes podem ser determinadas recorrendo a uma Tabela 2 ‒ Fontes dos reagentes colher de café, não sendo necessário balança. Os volumes de líquidos po- Reagente Uso/Fonte Onde encontrar dem ser medidos utilizando seringas Ácido acético 5% Vinagre Supermercado descartáveis ou copos medidores de Ácido clorídrico Ácido muriático Drogaria cozinha (no caso de volumes maio- Água Água da torneira ou engarrafada - res). Para armazenar reagentes ou Antocianina Extrato de couve roxa Supermercado soluções podem-se usar garrafas de plástico ou frascos com tampa. Como Comprimidos antiácidos Comprimidos antiácidos (ex. Rennie) Supermercado/Farmácia recipientes pode recorrer-se a copos Cu2+ (CuSO ) Sulfato de cobre Drogaria 4 de plástico ou frascos de vidro, e para Etanol Álcool etílico 96 vol. Supermercado/Farmácia agitar podem-se usar colheres. Os tu- Fermento em pó Fermento em pó Supermercado bos de ensaio podem ser substituídos Hidróxido de sódio Soda cáustica Drogaria/Supermercado por copos de plástico transparentes Iodo Tintura de iodo Supermercado/Farmácia pequenos (copos de shot). A extração da antocianina da couve roxa pode Isopropanol Álcool isopropílico Farmácia ser feita num tacho ao lume, eliminan-

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do a necessidade de placa de aqueci- Este passo permite obter uma so- de água para usar como solução mento. Filtros de café são suficientes lução mais concentrada e requer de comparação. para as filtrações. A maceração dos menor volume desta solução nos 2. À mistura do teste de solubilidade comprimidos é possível recorrendo a testes de pH. adicionar algumas gotas de extra- almofariz de cozinha. to de couve roxa. Nota: A extração da antocianina da 3. Agitar e observar a coloração ob- A identificação de todos os recipien- couve roxa com álcool isopropílico ou tida. Caso a coloração adquirida tes (copos, frascos, tubos de ensaio álcool etílico origina uma solução do não seja muito nítida, adicionar ou outros) é imprescindível para evitar indicador eficaz durante cerca de 3 um pouco mais de extrato de cou- enganos. meses. No caso da extração ser efe- ve roxa e/ou sólido conhecido. tuada com água, o extrato obtido é efi- No final das experiências, todos os caz apenas nos 2 ou 3 dias seguintes. Formação de um hidróxido insolúvel resíduos podem ser despejados pela pia com excesso de água. Testes do fluxograma 1. A uma solução semelhante à pre- parada para o teste de solubilida- Esta atividade pode demorar 2-3 ho- Antes de tentar identificar uma amos- de, adicionar cerca de 1 mL da ras caso sejam feitos os testes para tra “desconhecida”, pode efetuar um solução de NaOH. todos os compostos. No caso da iden- teste a todo o fluxograma. De notar 2. Agitar e observar se ocorre forma- tificação de uma amostra “desconhe- que algumas identificações são mais ção de um precipitado branco. cida”, a atividade não ultrapassa os fáceis do que outras. Entre as identi- trinta minutos. ficações “fáceis” estão, por exemplo, Ponto de fusão o teste do amido-iodo e o teste de Preparação de reagentes redução do cobre. Nas identificações 1. Colocar ½ colher de café (de inox) “mais difíceis”, ou seja, para as quais do sólido conhecido sobre uma Solução de hidróxido de sódio é possível que surjam situações de chama. dúvida, estão, por exemplo, o teste de 2. Observar a alteração de cor, esta- 1. Num copo, colocar 2 colheres de solubilidade em água, o teste de pH do físico e cheiro. café (cerca de 1 g) de desentupi- com antocianinas e também o teste dor de canos sólido. de redução do cobre. Redução do cobre 2. Adicionar 75 mL de água e agitar. Obtém-se uma solução com uma 1. A uma solução semelhante à pre- Certifique-se que os tubos de ensaio concentração de cerca de 0,3 M. parada para o teste de solubilida- estão limpos. Se o primeiro teste for de, adicionar cerca de 2 colheres de solubilidade, pode continuar com o Mistura para redução do cobre de café da mistura de cobre. próximo teste no mesmo tubo de en- 2. Agitar e aguardar cerca de 2 mi- saio. Colocar os resultados na tabela 1. Num copo, colocar 1 colher de café nutos. Observar se ocorre forma- de resultados dos sólidos conhecidos. (1 parte) de sulfato de cobre (II), ção de um precipitado vermelho/ 12 colheres de café (12 partes) de laranja. Solubilidade em água desentupidor de canos sólido, 4 colheres de café (4 partes) de car- Formação do complexo amido-iodo 1. Colocar ½ colher de café (cerca bonato de sódio e 15 colheres de café (15 partes) de sal de cozinha. de 0,25 g) do sólido conhecido 1. À mistura do teste de solubilidade, 2. Esta mistura deve ser armazena- num tubo de ensaio e adicionar adicionar 3 gotas de tintura de iodo. da num recipiente coberto com cerca de 10 mL de água. 2. Agitar e observar a coloração ob- papel de alumínio para a proteger 2. Agitar o tubo de ensaio, verificar tida. Apenas com o amido deverá da luz e deve ser mantida longe de se o sólido se dissolve e, no caso verificar uma tonalidade azul. Note calor. dos sólidos solúveis, se ocorre al- que a gama de cores de amarela- guma alteração de temperatura. do a roxo é a cor típica do iodo e Antocianina 3. Os sólidos pouco solúveis são não é um teste positivo. incluídos na categoria dos insolú- 1. Cortar cerca de 125 g de couve veis (Insol. < 0,6 g/100 mL). Os só- Libertação de bolhas de dióxido roxa em pedaços pequenos. lidos solúveis têm todos solubilida- de carbono 2. Adicionar cerca de 250 mL de ál- des > 6 g/100 mL. Pode existir um cool etílico, álcool isopropílico ou resíduo remanescente em alguns 1. A uma solução semelhante à pre- água. compostos solúveis (bórax, por parada para o teste de solubilida- 3. Aquecer, a cerca de 50ºC, durante exemplo), mas deve ser capaz de de ou a ½ colher de café (cerca de 1 hora. ver facilmente quais são insolúveis. 0,25 g) do sólido conhecido (neste 4. Filtrar a mistura obtida. Obtém-se caso, o resultado é mais eviden- uma solução roxa escura. Teste de pH te), adicionar cerca de 1 mL de vi- 5. Caso tenha acesso a evaporador nagre. rotativo, poderá reduzir o volume 1. Adicionar algumas gotas de extra- 2. Observar a libertação de bolhas. da mistura para cerca de 50 mL. to de couve roxa a cerca de 10 mL Esta libertação de gás ocorrerá

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na presença de CaCO3. Contudo, Cuidados de Segurança rá ser sempre efetuada num ambiente devido a uma pequena impureza que possa ser facilmente arejado. de carbonato no gesso, pode-se O facto desta atividade ser desenvol- verificar uma ligeira quantidade de vida com produtos químicos de uso Referências bolhas por adição de vinagre ao doméstico não invalida o cumprimen- [1] http://web.archive.org/web/20101122 CaSO4. to de regras de segurança básicas, 160209/http://elenco.com/edu-7075. nomeadamente as que resultam das Solubilidade com HCl 20% htm (acedido em 30-03-2012); próprias indicações dos rótulos dos http://cen.acs.org/articles/89/i9/ produtos. A leitura da informação dos Chemistry-Kit-Chemophobia-Goof- A uma solução semelhante à prepara- rótulos deve ser sempre estimulada, da para o teste de solubilidade, adicio- proof.html (Chemistry and Engineer- como norma a seguir em qualquer cir- nar algumas gotas de HCl 20%. ing News, acedido em 30-03-2012). cunstância. [2] H. W. Roesky, Spectacular chemical 1. Agitar e observar se ocorre disso- experiments, Wiley-VCH: Weinheim, Os testes apresentados ao longo des- 2007. lução de algum sólido. te trabalho podem ser efetuados em [3] A. Arroio, K. M. Honório, K. C. We- Solubilidade em álcool etílico vários níveis de ensino, mas com al- ber, P. Homem-de-Mello, M. T. P. gumas restrições. No caso do 1.º e 2.º Gambardella e A. B. F da Silva, ciclos, podem ser efetuados os testes Quim. Nova 29 (2006) 173. 1. A ½ colher de café (cerca de 0,25 g) de solubilidade em água, do iodo, do [4] P. Ribeiro-Claro, B. Goodfellow, P. do sólido conhecido, adicionar cer- vinagre e da antocianina, o que permi- Trincão, J. Oliveira, M. Valença, ca de 10 mL de álcool etílico. T. Pereira, F. Assis, I. Mendes, C. 2. Agitar e observar se ocorre disso- te a realização da versão simplificada Marques, D. Ferreira, Helena Rod- lução de algum sólido. com 8 sólidos (Figura 2). rigues e M. Cardoso, Química 110 (2008) 5. Criação de um cenário de investiga- Ao nível do 3.º ciclo e ensino secun- [5] M. Oliver-Hoyo, DeeDee Allen, S. ção criminal dário podem ser efetuados todos os testes. Contudo, é necessário ter mui- Solomon, B. Brook, J. Ciraolo, S. Daly e L. Jackson, J. Chem. Educ. Após um assalto à caixa-forte de um to cuidado na manipulação do hidróxi- 78 (2001) 1475. banco, as investigações da polícia do de sódio, ácido clorídrico e mistura [6] http://www.fabrica.ua.pt/PageImage. permitiram encontrar, como única pro- de redução do cobre. A preparação aspx?id=13469 (Fábrica - Centro va no local do crime, vestígios de um prévia por um adulto das misturas/so- Ciência Viva de Aveiro, acedido em luções que contêm estes reagentes é pó branco e indiciou quatro suspeitos 30-03-2012). recomendada e a supervisão é sem- por terem consigo pós brancos (no [7] Daniel C. Harris, Quantitative Chemi- pre indispensável. entanto, todos identificaram e justifi- cal Analysis, New York: W. H. Free- caram o respetivo pó). Cabe agora ao man, 2006. O hidróxido de sódio é corrosivo, por Laboratório de Investigação Criminal [8] CRC Handbook of Chemistry and isso, aquando da manipulação do de- identificar os pós brancos encontra- Physics, 85ª ed., CRC Press, 2004. sentupidor de canos e da mistura para dos no local do crime e nos quatro [9] M. Forster, J. Chem. Educ. 55 suspeitos e tirar conclusões. redução do cobre, ambos contendo (1978) 107. hidróxido de sódio, é obrigatório o uso [10] S. Ötleş, Methods of Analysis of Food Os alunos, divididos em cinco grupos, de luvas para evitar queimaduras na Components and Additives, CRC podem efetuar os testes necessários pele e de óculos de segurança para Press, Taylor and Francis, 2012; H. (de acordo com o fluxograma) com proteger os olhos. De igual forma, é Steinberg, Organoboron Chemistry; amostras conhecidas (pós identifica- também imprescindível o uso de luvas Interscience: New York, 1964. dos pelos suspeitos) para classificar no manuseamento do ácido muriático [11] M. A. C. Quintas, J. F. Fundo e C. L. M. o resultado como positivo/negativo e, (HCl 20%). Neste caso, é ainda ne- Silva, Food Eng. Rev. 2 (2010) 204. posteriormente, cada grupo terá uma cessário ter muito cuidado com os va- [12] A. Sandell, J. Chem. Educ. 71 (1994) amostra-problema (pós encontrados pores libertados, e adicionar sempre 346. nos quatro suspeitos e no local do cri- o ácido à água e nunca o contrário. A [13] W. Saenger, Naturwissenschaften, me) que terá de identificar. manipulação destes reagentes deve- 71 (1984) 31. Vá a www.spq.pt Torne-se Sócio da Sociedade Portuguesa de Química e beneficie de:

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Ensinar Química com Telemóveis Inteligentes: a Tabela Periódica em Código QR

Vasco D.B. Bonifácio*

O ensino moderno não pode ficar indiferente ao ambiente tecnológico atual. O recurso a conteúdos educativos online por parte de professores e alunos tem vindo a generalizar-se e constitui sem dúvida um excelente complemento da atividade letiva. Neste contexto, o ensino de Química, em especial o ensino da Tabela Periódica dos Elementos (TP), constitui um desafio, dada a sua complexidade. A TP áudio codificada em código QR é uma nova ferramenta que permite ensinar os elementos químicos de forma atrativa usando um telemóvel inteligente. O ensino de conteúdos de Química em registo áudio é por outro lado uma mais valia para alunos invisuais ou amblíopes, evitando o recurso ao braille.

A Tabela Periódica dos Elementos o processo de aprendizagem do aluno ao fabricante (ex. para iPhone/iPad (TP) é um dos ícones mais fascinan- invisual, evitando o recurso ao Braille. usa-se a aplicação i-nigma obtida na tes da Química. Foi criada por Dimitri Os telefones inteligentes (smart pho- loja online da Apple). Um código QR é Mendeleev em 1869, e desde essa nes, ex. iPhone, Android e Blackberry) gerado online de forma automática [9] data já foram publicadas mais de e os tablets (ex. iPad) são cada vez e a informação que pode armazenar 700 versões [1]. Apesar de ter sido mais uma ferramenta do dia a dia, é escolhida pelo utilizador. Pode ser elaborada há quase 150 anos, a TP cujo potencial é muitas vezes desco- um pequeno texto, um link para uma ainda não está totalmente completa, nhecido pelos próprios utilizadores. O página na internet, as coordenadas havendo ainda alguma controvérsia uso de telefones inteligentes no ensi- de um mapa do Google ou uma men- no reconhecimento da descoberta de no da química na sala de aula tem vin- sagem de voz [10]. A informação que alguns elementos. Muito recentemen- do a crescer, em especial nos Estados escolhermos irá aparecer no ecrã do te, e após um período de três anos de Unidos [6], e irá em breve alterar de telefone inteligente após a leitura do revisão científica, uma comissão da forma radical as atuais metodologias código QR (Figura 1). IUPAC (International Union of Pure de ensino. Um grupo de investigado- and Applied Chemistry) reconheceu res da Universidade de Nottingham Embora a QR-TPV seja bastante útil, oficialmente a descoberta de mais concluiu recentemente o projeto da possui muita informação visual que dois elementos (Z = 114 e Z = 116) TP em vídeo [7]. Cada elemento quí- é perdida se for usada por um aluno [2]. Atualmente, a TP pode ser encon- mico possui um vídeo associado que cego ou amblíope. Por esta razão foi trada em diversos formatos, desde o se encontra publicado no Youtube. desenvolvida uma versão áudio da clássico poster em papel, até ás ver- Usando códigos Quick-Response TP codificada em código QR - (QR sões digitais, dinâmicas e interativas (QR) foi depois construída uma TP -TPA) que é acessível a todos [11]. [3]. Contudo, a informação química vídeo (QR-TPV) [8]. Os códigos QR A QR-TPA pode ser descarregada li- acessível a estudantes invisuais ou são códigos de barras 2D que foram vremente da internet [12]. A Figura 2 amblíopes é ainda escassa, sendo de desenvolvidos no Japão em 1994 mostra a QR-TPA e sua leitura usando destacar alguns esforços que vêm pela empresa Denso Ware. Embora um telemóvel inteligente. sendo feitos em Portugal pelo ECE- estando patenteados, o seu uso é to- GAM (grupo de trabalho para o ensi- talmente livre pois a empresa decidiu Esta nova versão da TP foi constru- no de cegos e grandes amblíopes) [4], não exercer os seus direitos de paten- ída com base numa versão áudio em parceria com a ACAPO (Associa- te. Os códigos QR são lidos usando existente em língua inglesa que se ção de Cegos e Amblíopes de Portu- um telefone inteligente/tablet através encontra disponível online no website gal), que desenvolveu já um software de uma aplicação (gratuita) adequada “Chemistry in its Element”, da Royal que permite a um invisual desenhar e navegar através de estruturas quími- cas [5]. Por esta razão, o desenvolvi- mento de ferramentas, especialmente em formato áudio, que tornem a quí- mica acessível a todos, é urgente e crucial. Os materiais em formato áu- dio aceleram de forma extraordinária

* REQUIMTE, Departamento de Química, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa, Figura 1 ‒ Esquema de leitura de um código QR, contendo uma mensagem áudio, usando 2829-516 Caparica Email: [email protected] um telemóvel inteligente

Química 127 - out/dez 12 71 Química e Ensino

Society of Chemistry [13]. A versão emite um sinal sonoro e a descrição Nota portuguesa da QR-TPA encontra-se áudio inicia-se automaticamente (é ne- neste momento em desenvolvimen- cessária uma ligação Wi-Fi à internet Este artigo também está disponível em to. Em Portugal, o uso da QR-TPA no local da leitura). O uso da QR-TPA versão html no site da Sociedade Por- na sala de aula poderá ser facilmente não está condicionado ao suporte em tuguesa de Química (http://www.spq.pt/ integrado nos programas curriculares papel, podendo a leitura do código QR QUIMICA/multimedia), onde os leitores de Física e Química (10.º ano) e de ser igualmente realizada a partir de poderão aceder diretamente às referên- Química (12.º ano), incluindo ou não écrans de computador ou de projeção. cias e recursos mencionados. alunos invisuais. A QR-TPA poderá ajudar os alunos a envolver-se na Em resumo, o ensino de química Referências temática da TP de uma forma diver- usando telemóveis inteligentes/tablets tida, usando uma ferramenta muito apresenta-se como uma nova meto- atrativa, permitindo uma exploração [1] E.R. Scerri, The Periodic Table: Its dologia de ensino para todos os alu- individual (com recurso a auriculares) Story and Its Significance, Oxford nos, em especial cegos e amblíopes. ou coletiva. Esta exploração poderá University Press, New York, 2007. Num futuro próximo é esperado que o mesmo estender-se a outros locais [2] R.C Barber, P.J. Karol, H. Nakahara, mobile-learning seja adotado em Por- fora da sala de aula (ex. transportes E. Vardaci, E.W. Vogt, Pure Appl. tugal para todos os níveis de ensino. públicos), potenciando a aquisição de Chem. 83 (2011) 1485–1498. A demonstração do uso da QR-TPA conhecimentos por parte do aluno. Na [3] M. Dayah, Dynamic Periodic Table: está documentada na entrevista que o versão impressa destinada a alunos http://www.ptable.com (acedido em invisuais, os símbolos químicos dos autor do artigo deu ao programa “Com 01-01-2012). elementos deverão ser previamen- Ciência” transmitido pela RTP 2 [14]. [4] Website do ECEGAM: http://bit.ly/ te rotulados em Braille e colados na ECEGAM (acedido em 01-01-2012). gradecimentos QR-TPA. O aluno invisual deverá tam- A [5] F. Pereira, J. Aires-de-Sousa, V.D.B. bém aprender qual a distância ótima Bonifácio, P. Mata, A.M. Lobo, J. Fundação para a Ciência e a Tecno- para ler o código QR a partir da TP, de Chem. Educ. 88 (2011) 361-362. modo a poder realizar uma aprendiza- logia e FEDER (Projeto CHEM4ALL: [6] A.J. Williams, H.E. Pence, J. Chem. RIPD/APD/109547/2009). QRandGO® gem autónoma quando o ensino não Educ. 88 (2011) 683-686. estiver a ser tutorado. Após a leitura pelo suporte técnico na elaboração da [7] Tabela Periódica em Vídeos: http:// do código QR, o telemóvel inteligente QR-TPA. www.periodicvideos.com (acedido em 01-01-2012). [8] Tabela Periódica QR em Vídeo: http://bit.ly/videoPTE (acedido em 01-01-2012). [9] Exemplo de geradores online de có- digos QR: (a) http://zxing.appspot. com/generator (b) http://qrcode.kay- wa.com (acedidos em 01-01-2012). [10] Website que permite traduzir uma mensagem de texto numa men- sagem de voz através de um código QR: http://qrvoice.net (acedido em 01-01-2012). [11] V.D.B. Bonifácio, J. Chem. Educ. 89 (2012) 552-554. [12] Poster da QR-TPA: http://bit.ly/QRT- PA (acedido em 01-01-2012). [13] Website da TPE áudio da Royal Society of Chemistry: http://www. rsc.org/chemistryworld/podcast/ele- ment.asp (acedido em 01-01-2012). [14] Entrevista do autor do artigo ao pro- grama “Com Ciência” (RTP 2): http:// bit.ly/ComCienciaQR-TPA (acedido Figura 2 ‒ Leitura da QR-TPA usando um telemóvel inteligente em 01-01-2012).

Sociedade Portuguesa de Química Av. da República, 45 - 3ºEsq. - 1050-187 Lisboa * Tel.: 21 793 4637 * Fax: 21 795 2349 * e-mail: [email protected] Horário: 9:45 às 13:00 e das 14:30 às 18:00

72 Química 127 Química e Ensino Módulos Inquiry

Módulos Inquiry: Desenvolvimento e Utilização de Recursos Educativos para a Potenciação do Inquiry Based-Learning no Ensino da Química

Carla Morais1, João Paiva2,* e Nuno Francisco3

Tem-se vindo a registar uma diminuição do interesse dos alunos pela aprendizagem das ciências. É necessário, por isso, que se implementem estratégias de ensino que permitam ao aluno compreender a utilidade da aprendizagem da ciência e a relevância do conhecimento científico. É nesta filosofia que se enquadra o projeto europeu PROFILES e o seu antecessor PARSEL. Neste artigo irão apresentar-se os princípios basilares destes projetos, referindo-se também as potencialidades do método inquiry no processo de ensino-aprendizagem das ciências. Em estreita relação com o método inquiry, este artigo reportar-se-á também à elaboração e utilização de recursos educativos - módulos - que visam contribuir para a abordagem das ciências através de problemas sociais e éticos. Associado a este artigo poderá encontrar-se ainda uma proposta de um módulo inquiry para o ensino da química.

Introdução sentar simplesmente os conceitos do pelo significado do acrónimo, na envoltos no seu formalismo científico, promoção de abordagens com base A educação em ciências apresenta-se mas se esforça por contextualizá-los no Inquiry-Based Science Education como uma aposta primordial das so- em problemáticas atuais e promo- (IBSE). ciedades modernas com vista à reso- toras de tomadas de posição face a lução dos problemas que têm vindo a questões do quotidiano. Foi com este Há mais de um século que o método enfrentar. No entanto, as perspetivas objetivo de aumentar a popularidade inquiry tem tido um papel relevante tradicionais da construção do conhe- e a relevância da educação científica nos currículos escolares de ciência cimento científico e a visão sobre os que vários investigadores europeus [6, 7]. Antes de 1900 muitos educa- processos de ensino e aprendizagem se associaram no projeto PARSEL – dores viam a ciência, principalmente, associados a outros fatores, como a dos quais fez parte a Universidade de como um corpo de conhecimentos avaliação externa dos alunos, cons- Lisboa (Instituto de Educação) [4, 5] – que os alunos tinham de aprender tituem-se, frequentemente, como en- cujo desenvolvimento teve lugar entre através de uma instrução direta. Uma traves à inovação pedagógica [1]. No 2006 e 2009. Este projeto constitui-se crítica a esta perspetiva surgiu em ensino das ciências continua a dar-se ainda como um importante anteces- 1909, quando John Dewey, na quali- particular relevância à transmissão de sor do projeto PROFILES cujo desen- dade de membro da American Associ- factos, princípios e leis. Estas apren- volvimento se iniciou em 2010 e cujo ation for the Advancement of Science, dizagens, muitas vezes realizadas término está previsto para 2014. Na referiu que a ciência é mais do que um de uma forma descontextualizada do secção seguinte do presente artigo corpo de conhecimentos para apren- real, não têm contribuído muito para apresentar-se-á mais informação so- der, pois há também um processo e a melhoria dos níveis de literacia cien- bre este projeto e os seus propósitos. um método a serem aprendidos [8]. tífica dos alunos e, não raras vezes, Nas décadas de 1950 e 1960, a jus- levam a que os alunos desenvolvam O projeto PROFILES e o método tificação para a utilização do método atitudes negativas face à ciência. As- inquiry inquiry como uma abordagem para o sim, é expectável a existência de al- ensino das ciências estava a tornar- guns indicadores que revelam que os O acrónimo PROFILES significa Pro- se cada vez mais evidente: If students alunos do ensino básico e secundário fessional Reflection-Oriented Focus were to learn the methods of science, parecem gostar cada vez menos de on Inquiry Learning and Education then how better to learn than through ciências [2, 3]. Para contrariar esta through Science (http://www.profiles- active engagement in the process of tendência, muitos professores pro- project.eu) e trata-se de um projeto inquiry itself? [8]. curam implementar estratégias de europeu que compreende mais de ensino que fomentem o pensamento uma vintena de países participantes, O educador Joseph Schwab [9] foi crítico e autorreflexivo por parte dos entre os quais Portugal, que é repre- uma voz influente para estabelecer alunos. Isto poderá ser conseguido sentado pela Faculdade de Ciências esta visão da educação científica, ar- quando o professor deixa de apre- da Universidade do Porto. O projeto gumentando que a ciência deve ser surge da necessidade de investir na entendida como um conjunto de es- formação contínua de professores truturas conceituais que deverão ser 1, 2 Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e assenta nos princípios básicos de revistas como resultado da existência Departamento de Química e Bioquímica Unidade de Ensino das Ciências autoeficiência e de teacher owner- de novas evidências: The implications Centro de Investigação em Química of Schwab’s ideas were, for their time, 3 Colégio Cedros, Colégios Fomento ship. Além disso, o PROFILES coloca * E-mail: [email protected] também a sua tónica, como é indica- profound. His view suggested that tea-

Química 127 - out/dez 12 73 Módulos Inquiry chers should present science as inqui- problemas científicos e procedimen- O projeto PARSEL e os seus re- ry and that students should use inquiry tos de decisão sócio científica. Na sua cursos educativos to learn science subject matter [8]. essência, o ensino através de inquiry promove o envolvimento dos alunos O acrónimo PARSEL, que significa A obra de Schwab, Dewey e outros, em investigações para satisfazer Popularity And Relevance of Scien- incluindo Bruner e Piaget nas déca- curiosidades, sendo estas satisfeitas ce Education for Scientific Literacy das de 1950 e 1960, influenciaram a quando os alunos constroem estru- (http://www.parsel.uni-kiel.de/cms/in- natureza dos materiais curriculares turas mentais que explicam de forma dex.php?id=home), explicita a impor- desenvolvidos nas referidas décadas adequada e correta as experiências tância que este projeto europeu deu à e no início dos anos 70. vivenciadas. O inquiry é fortemente popularidade e relevância da educa- estimulado pela curiosidade. Assim, ção científica, com vista ao desenvol- Nos últimos anos temos visto um pode referir-se que não há investi- vimento de uma sólida literacia cientí- crescente apelo ao inquiry, por se gação autêntica nem aprendizagem fica e à valorização da aprendizagem considerar que este método pode de- significativa se não existir um espírito científica por parte dos alunos. Os mó- sempenhar um papel importante na interrogativo que indaga uma respos- dulos PARSEL, desenvolvidos no âm- educação científica [10–13]: This call ta, uma solução, uma explicação ou bito deste projeto, são um conjunto de for inquiry-based learning is based on uma decisão. A utilização do inquiry recursos pedagógicos que visam con- the recognition that science is essen- visa melhorar a aprendizagem base- tribuir para a abordagem das ciências tially a question-driven, open-ended ada no aumento do envolvimento dos através de problemas sociais e éticos. process and that students must have alunos nas múltiplas formas de co- De acordo com Rannikmäe e colabo- personal experience with scientific in- nhecimento e nas fases sequenciais radores [20]: The objective of the mo- quiry to understand this fundamental da cognição. Para tal deverá procurar- dules is to increase the relevance and aspect of science [14]. -se promover a realização de investi- popularity of science teaching in the gações com base na iniciativa dos eyes of students, but at the same time O IBSE é baseado na ideia de que a alunos, com a intenção de que desta guarantee solid student learning hea- aprendizagem das ciências deve ser forma o conhecimento assim constru- ded for enhancing scientific literacy. autêntica para a prática da ciência, ído seja mais relevante e significativo, uma ideia defendida por Dewey [15, não se limitando à aquisição passiva Os módulos PARSEL foram especifi- 16]. O suporte moderno para o IBSE de factos transmitidos pelo professor. camente estruturados em cinco sec- vem de pesquisas na área da cogni- A colaboração aluno-aluno, com vista ções diferentes [21]: ção que fornecem evidências sobre a reforçar a assimilação do conheci- a importância da atividade e dos con- mento, poderá também ser um ele- 1. A primeira secção – Página inicial textos autênticos de aprendizagem mento preponderante nesta dinâmica. – é um documento formal com o [17]: Authentic activities provide le- A implantação do método inquiry com- título do módulo, o resumo dos arners with the motivation to acquire preende alguns passos estruturantes, principais conceitos científicos e new knowledge, a perspective for in- tal como se indica esquematicamente o nível de escolaridade em que o corporating new knowledge into their na Figura 1. módulo deve ser aplicado. existing knowledge, and an opportuni- ty to apply their knowledge. In contrast to the passive reception of knowledge associated with conventional science learning, inquiry is active. As an au- thentic scientific practice, inquiry also provides a valuable context for scien- ce learning [14].

De acordo com Branch e Oberg [18]: Inquiry-based learning is a process where students are involved in their le- arning, formulate questions, investiga- te widely and then build new unders- tandings, meanings and knowledge.

Segundo o mesmo autor, o conheci- mento adquirido pelos alunos é novo para eles e pode ser usado para res- ponder a perguntas, para desenvolver uma solução para um problema ou sustentar uma tomada de posição. O inquiry promove uma aprendizagem Figura 1 ‒ Representação esquemática dos passos estruturantes na aplicação do método inquiry através da criatividade, resolução de (adaptado de [19])

74 Química 127 Módulos Inquiry Módulos Inquiry

2. A segunda secção de um módulo cos sólidos para aprofundar a dis- discussão e do raciocínio, tomam PARSEL é o guia do estudante – cussão da temática em estudo. A uma decisão sócio científica: In Atividades para o aluno. Este do- busca por essa solidez científica this process, the actual decision cumento fornece o cenário sócio constitui a base para a segunda made is of less importance than ético que os alunos irão conside- fase de aplicação destes módulos. the reasoning put forward, and the rar. É neste guia que as tarefas A Figura 2 representa, de forma degree to which the scientific com- são propostas aos alunos. esquemática, a primeira fase de ponent is included in a conceptu- 3. Seguidamente é apresentado o aplicação dos módulos PARSEL. ally correct manner [21]. guia do professor – Guia de ensi- no. Este documento apresenta al- FASE 2 – Descobrir a ciência sub- Esta fase envolve capacidades gumas orientações sobre a ordem jacente à situação apresentada de argumentação, capacidade das tarefas e a abordagem consi- no cenário inicial. Aquisição de de liderança, capacidade de ra- derada mais conveniente para a conceitos científicos e desenvolvi- ciocinar usando ideias científicas realização das mesmas. mento de competências de reso- sólidas e equilibrar essas ideias 4. O documento de avaliação – Es- lução de problemas. face a outras considerações, tais tratégias de avaliação – é outro como questões éticas, ambientais, documento importante que deve A abordagem pedagógica nesta sociais, políticas e, claro, finan- figurar em qualquer módulo PAR- segunda etapa deve ser familiar ceiras. A Figura 4 representa, de SEL. Este documento destina-se para os professores e o módulo forma esquemática, a terceira fase a recomendar ao professor estra- proporciona isso mesmo, por os de aplicação dos módulos PAR- tégias de avaliação das atividades orientar para uma abordagem por SEL. exploradas. método inquiry, maximizando o 5. Finalmente, pode ser adicionado envolvimento dos alunos no pro- As ideias-chave associadas ao pro- ao módulo PARSEL um arquivo cesso de ensino-aprendizagem. cesso de aplicação destes módulos e opcional – Notas do Professor. Esta segunda fase inevitavelmen- os seus intentos encontram-se siste- Este documento tem como obje- te tomará a maior parte do tempo matizadas na tabela 1. tivo fornecer ao professor mais de aplicação do módulo. Sobre informações adicionais sobre o esta segunda fase e tal como re- Módulos PARSEL e Módulos tema ou outros materiais pedagó- fere Holbrook [9]: The extent to Inquiry gicos relevantes. which scientific ideas are explored or scientific problems are solved No âmbito da implementação do pro- Estes módulos de trabalho foram will depend on the scientific le- jeto PROFILES em Portugal estão a desenvolvidos para serem utilizados arning deemed necessary for an decorrer ações de formação, na Fa- pelos professores através de uma appreciation of the socio-scientific culdade de Ciências da Universidade abordagem de ensino que contempla issues introduced in Stage 1. do Porto, para professores de ciência três fases diferentes mas interrelacio- que, para além de todo o envolvimen- nadas entre si: Esta fase é, no seu conteúdo, to e disseminação da filosofia deste puramente científica, embora a projeto europeu, intentam que os pro- FASE 1 – Promoção da relevân- aprendizagem cooperativa, a co- fessores se apropriem e modifiquem cia aos olhos dos alunos: estímulo municação científica, e o desen- os módulos PARSEL, com vista a com base em situações familiares volvimento da perseverança, da aproximá-los o mais possível ao cur- (cenário). iniciativa e da criatividade, tam- rículo nacional e ainda incrementar bém sejam prioritárias. A Figura 3 nesses módulos oportunidades ala- A relevância para o aluno pode ser representa, de forma esquemáti- vancadoras de experimentação, de alcançada ligando o título (com ca, esta segunda fase. utilização de software educativo, bem palavras cuidadosamente esco- como de exploração de exemplos in- lhidas de modo a serem familiares FASE 3 – Desenvolvimento de e interessantes para os alunos) a competências de tomada de de- teressantes e adequados da História uma situação de cariz social. Se- cisão e reforço da capacidade de da Ciência [22]. A estes novos módu- gundo Holbrook [21]: This means transferência/aplicação dos con- los chamámos módulos inquiry. that the initial teaching concerns ceitos científicos subjacentes ao the social aspect and it is put into cenário em estudo. A aplicação dos módulos inquiry junto an appropriate context by means dos alunos constitui também um obje- of a ‘scenario’ – a story, a situation, Esta última fase é talvez a mais tivo da formação PROFILES, da qual an elaboration of the title or other importante. Aqui os alunos conso- daremos conta a breve trecho, e que such triggers to initiate discussion. lidam a sua aprendizagem através se orienta de acordo com as fases da transferência dos conceitos apresentadas na secção anterior. De Com base nas considerações da formais apreendidos durante o notar que este número do Boletim da primeira fase, os alunos são con- processo de resolução da ques- SPQ apresenta um exemplo concreto duzidos a aperceberem-se de que tão sócio científica (introduzida de um módulo inquiry, em estreita li- não dispõem de conceitos científi- na primeira fase) e, através da gação com este artigo.

Química 127 - out/dez 12 75 Módulos Inquiry

Figura 2 ‒ Representação esquemática da primeira fase de aplicação dos módulos PARSEL (adaptado de [21])

Figura 3 ‒ Representação esquemática da segunda fase de aplicação dos módulos PARSEL (adaptado de [21])

Figura 4 ‒ Representação esquemática da terceira fase de aplicação dos módulos PARSEL (adaptado de [21])

Tabela 1 ‒ Aplicação dos módulos PARSEL: fases de aplicação e considerações (adaptado de [21])

O MODELO de três fases Fase 1 Fase 2 Fase 3

Título Tomada de decisões sócio Abordagem de ensino- relevante da vida real mais Aprendizagem IBSE construída e cenário interessante para motivar orientada pelo professor. científicas, centradas no aluno aprendizagem os alunos. e orientadas pelo professor.

Competências de planificação; Consolidação de ciência Comunicação oral; identificação competências de processos; conceptual; competências de Competências educacionais de aprendizagem prévia; competências de apresentação; argumentação; competências desenvolvidas motivação intrínseca. retirar conclusões; competências sociais; tomadas de decisão interpessoais. sócio científica justificadas. Aprendizagem conceptual de Aprendizagem de educação em Identificar a ciência em contexto; ciência; relacionar conceitos; Transferência de aprendizagens ciência colocar questões científicas a desenvolvimento de competências de ciência conceptual para investigar. IBSE. novas situações sociais.

Estimulação inicial dos alunos Reforço da relevância da Interesse e relevância – motivação intrínseca (querer Aumento de interesse e relevância ciência e melhoria da literacia aprender). através de atividades dos alunos. científica.

76 Química 127 Módulos Inquiry Módulos Inquiry

Considerações finais Aprender Ciências. O contributo do lenges of inquiry-based learning Projecto Internacional PARSEL para through technology and curriculum Torna-se necessário que cada “pro- tornar a Ciência relevante para os design. Journal of the Learning Sci- fessor PROFILES” contribua ativa- alunos. Ed. 1. Porto: Porto Editora ences, 8(3-4), 391-450. mente para a promoção da motivação e Instituto de Educação da Universi- [15] Dewey, J. (1964a). Progressive or- dos alunos para a aprendizagem das dade de Lisboa. ganization of subject matter. In R. ciências, incrementando sempre uma [6] Bybee, R. W., e DeBoer, G. (1993). D. Archambault (Ed.), John Dewey sólida literacia científica. É nessa linha Goals for the Science Curriculum. In on education: Selected writings (pp. de pensamento que o PROFILES tem Handbook of Research on Science 373-387). Chicago: University of Chi- cago Press. sido implementado em Portugal e te- Teaching and Learning. Washington, [16] Dewey, J. (1964b). Science as sub- mos esperança que ao longo do proje- DC: National Science Teachers As- ject matter and as method. In R. D. to possamos fornecer mais exemplos sociation. Archambault (Ed.), John Deweyon de módulos inquiry potencialmente [7] DeBoer, G. E. (1991). A History of education: Selected writings (pp. úteis para o ensino da química nos di- Ideas in Science Education: Implica- 182-195). Chicago: University of Chi- ferentes níveis de escolaridade. tions for Practice. New York: Teachers College Press, Columbia University. cago Press. [17] Greeno, J., Collins, A. e Resnick, L. Referências [8] National Research Council. (2000). Inquiry and the national science edu- B. (1996). Cognition and learning. In R. Calfee e D. Berliner (Eds.), Hand- [1] Figueiredo, O., Freire, S., Reis, P., cation standards: A guide for teach- book of educational psychology. New e Galvão, C. (2009). Indo além do ing and learning. Washington, DC: York: Macmillan. PARSEL. In F. Paixão e F. R. Jorge National Academies Press. [18] Branch, J., Oberg, D. (2004). Focus (Eds.), Educação e formação: Ciên- [9] Schwab, J. (1966). The Teaching of on inquiry: a teacher’s guide to im- cia, cultura e cidadania. Atas XIII Science. Cambridge, MA: Harvard plementing inquiry-based learning. encontro nacional de educação em University Press. (pp. 1-5) Alberta, Canada: Alberta ciências (pp. 926-34). Castelo Bran- [10] American Association for the Ad- Learning. vancement of Science. (1994). co: Escola Superior de Educação, In- [19] Franklin, W. A. Inquiry Based Ap- Benchmarks for science literacy. stituto Politécnico de Castelo Branco. proaches to Science Education: New York: Oxford University Press. [2] Sarjou, A., Soltani, A., Kalbasi, A. Theory and Practice (http://www. [11] Blumenfeld, P. C., Soloway, E., Man, e Mahmoudi, S. (2012). A Study of brynmawr.edu/biology/franklin/Inqui- R., Krajcik, J. S., Guzdial, M. e Pal- Iranian Students’ Attitude towards ryBasedScience.html). incsar, A. (1991). Motivating project- Science and Technology, School Sci- [20] Rannikmäe, M., Teppo, M. e Hol- based learning: Sustaining the doing, ence and Environment, Based on the brook, J. (2010). Popularity and ROSE Project. Journal of Studies in supporting the learning. Educational Relevance of Science Education Education, 2(1), 90-103. Psychologist, 26, 369-398. Literacy: Using a Context-based Ap- [3] European Commission (EC). (2007). [12] Linn, M. C., Disessa, A., Pea, R. D. e proach. Science Education Interna- Science education now: A renewed Songer, N. B. (1994). Can research tional, 21, 2, 116-125. pedagogy fo the future of Europe. on science learning and instruction [21] Holbrook, J. (2008). Introduction to Brussels: European Commission. inform standards for science educa- the Special Issue of Science Educa- [4] Galvão, C., Reis, P., Freire, S. e tion? Journal of Science Education tion International Devoted to PAR- Almeida, P. (2011). Enhancing the and Technology: 3(1), 7-15. SEL. Science Education Internation- popularity and the relevance of sci- [13] National Research Council. (1996). al, 19, 3, 257-266. ence teaching in Portuguese Sci- National science education stand- [22] Thier, H. D. (2000). Developing ence classes, Research in Science ards. Washington, DC: National Inquiry-Based Science Materials: Education 41(5), 651-666. Academy Press. A Guide for Educators. New York: [5] Galvão, C., Reis, P., Freire, S. e [14] Edelson, D. C., Gordin, D. N. e Pea, Teachers College Press, Columbia Faria, C. (2011). Ensinar Ciências – R. D. (1999). Addressing the chal- University.

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Química 127 - out/dez 12 77 Módulos Inquiry

“Precisas de Química para Seres um Bom Cirurgião Ortopedista?” módulo inquiry para o estudo do equilíbrio químico de oxidação-redução

Carla Morais1, Nuno Francisco2 e João Paiva3,*

O módulo inquiry que aqui se apre- complementadas com justificações çado, pelos alunos e pelo professor, senta foi por nós adaptado e otimi- bastante fundamentadas. foi o do aumento da literacia científica zado (com base no módulo PAR- e prática criativa através de materiais SEL já existente e disponível em Alguns constrangimentos que de- de ensino inovadores, com cenários http://www.parsel.uni-kiel.de/cms/index. correram do processo de utilização multidisciplinares e com uma vertente php?id=54) de forma a tentar motivar deste módulo inquiry foram: o facto sócio-científica. os alunos para o estudo do equilíbrio do currículo da disciplina de Física químico de oxidação-redução – um e Química A ser muito extenso, não Referências ramo da química que, normalmente, se compadecendo com atividades se torna difícil na compreensão e mais inovadoras e mobilizadoras em [1] Burke, K. A., Greenbowe, T. J. e conexão dos diferentes conceitos termos de tempo [4]; a integração do Windschitl, M. A. (1998). Develop- inerentes por parte dos alunos [1]. módulo na planificação anual prevista; ing and using conceptual compute Os conteúdos científicos subjacentes as dúvidas na comparação entre os animations for chemistry instruction. ao módulo aqui apresentado envol- resultados virtuais obtidos e os resul- Iowa State University of Science and vem os conceitos de reações redox, tados esperados na atividade labora- Technology, vol. 75, n.º 12, December séries eletroquímicas e atividades torial real, e as conceções alternativas 1998, Journal of Chemical Education. dos metais, e têm como intenção pri- que os alunos manifestavam relativa- [2] Branch, J. e Oberg, D. (2004). Focus mordial lançar mão das tecnologias mente ao comportamento redox. Es- on inquiry: a teacher’s guide to im- educativas emergentes para promo- tes obstáculos foram, na sua maioria, plementing inquiry-based learning. ver abordagens pedagógicas através ultrapassados com a realização de Alberta, Canada: Alberta Learning, do Inquiry-Based Science Education uma atividade experimental real, não pp. 1-5. (IBSE), que é o focus do projeto euro- simulada, proposta pelo currículo ofi- [3] PROFILES (2010). FP7 Negotia- peu PROFILES [2, 3]. cial. Os relatórios das experiências tion Guidance Notes – Coordination surgiram ainda mais completos com and Support Actions – Supporting O cenário motivador, adaptado para as respostas às questões pré e pós and coordinating actions on innova- os alunos do ensino secundário – 11.º laboratoriais. Estas foram respondi- tive methods in science education: ano de escolaridade, foi o motor fun- das, maioritariamente, com espírito teacher training on inquiry based damental na abordagem do equilíbrio crítico. Outra estratégia utilizada foi teaching methods on a large scale redox. A questão inicial, que dá título a construção interativa de mapas de in Europe – Annex I – “Description a esta comunicação, levou-nos a ou- conceitos, visando organizar os no- of Work”, 2010. tras perguntas propostas pelos alu- vos conceitos expostos para que se [4] Morais, C., Paiva, J. e Francisco, nos (algumas do foro da biologia e tornem significativos. A utilização dos N. (2012). Módulos inquiry: desen- da medicina). Antes da interação dos módulos inquiry e a abordagem IBSE volvimento e utilização de recursos alunos com uma simulação computa- tentam incrementar a motivação, do educativos para a potenciação do cional sobre a temática em apreço no professor e dos seus alunos [5]. inquiry based-learning no ensino módulo, registaram-se as perguntas da química. Boletim da Sociedade mais pertinentes, as quais serviram As expetativas futuras passam pela Portuguesa da Química, 127, pp. como referência para a execução e adaptação de novos materiais de en- 73-77. orientação da atividade. As questões sino combinados com uma interven- [5] Edelson, D. C., Gordin, D. N. e Pea, que criaram maior expetativa foram ção no curriculum e a disseminação R. (1999). Addressing the Chal- respondidas com bons resultados e deste módulo a outros colegas em lenges of Inquiry-Based Learning diferentes meios de divulgação cien- Through Technology and Curricu- tífica (fóruns interativos, revistas cien- lum Design. Institute for the Learn- 1, 3 Faculdade de Ciências da Universidade do Porto tíficas e cursos de formação contínua, ing Sciences and School of Educa- Departamento de Química e Bioquímica Unidade de Ensino das Ciências e a análise mais sistemática da moti- tion and Social Policy, Northwestern Centro de Investigação em Química 2 Colégio Cedros, Colégios Fomento vação do aluno, incluindo a sua práti- University, 8, pp. 391-450, The Jour- * E-mail: [email protected] ca reflexiva). O maior objetivo alcan- nal of the Learning Sciences.

Sociedade Portuguesa de Química Vá a www.spq.pt e participe nos eventos apoiados pela SPQ

78 Química 127  Módulos Inquiry

Módulo inquiry “Precisas de Química Para Seres um Bom Cirurgião Ortopedista?”

Atividades para o aluno

Procedimento inicial (Ler, Refletir, Questionar)

O seguinte artigo foi publicado na secção de desporto de um jornal:

“No dia 26 de julho de 2009, num jogo de futebol pelo Corinthians, Ronaldo, após uma jogada no meio campo, foi empurrado por um adversário e caiu no chão, apoiando todo o corpo sobre a mão esquerda. Devido ao facto de não ter havido um impacto muito grande na queda, a sua lesão foi minorada. Contudo, ele sofreu uma fratura no terceiro e no quarto metatarso da mão esquerda e foi obrigado a fazer uma cirurgia. Foram colocadas 2 placas de metal e 5 parafusos para corrigir a lesão. Ronaldo ficou dois meses sem jogar.” Fonte: http://colunas.gazetaweb.globo.com/platb/arivaldomaia/tag/corinthians/page/11/

Questão: Se tu tivesses acompanhado o jogador lesionado ao hospital, que perguntas colocarias ao cirurgião acerca da fixação de ossos?

Atividade Virtual

De forma a escolher o melhor metal a ser usado na cirurgia óssea, nós sugerimos que examines a reatividade de diferentes metais. Na seguinte atividade experimental virtual tu serás capaz de pesquisar a reatividade de metais. Entra no link: http://stwww.weizmann.ac.il/G-CHEM/animationsindex/Redox/home.html

Executa a atividade n.º 1

Na simulação podem ser visualizados vários gobelés, cada um contendo uma solução de iões metálicos, sendo também possível visualizar uma lista de metais sólidos.

1. Escolhe um dos metais e coloca-o dentro das diferentes soluções, esperando, até que uma mensagem te diga para remover o metal das soluções.

2. Regista as tuas observações.

3. Em qual dos gobelés a reação química ocorreu?

4. Repete os passos 1-3 para os diferentes metais (atividades 2 e 3). Resume todas as tuas observações na tabela seguinte.

Soluções Mg2+ (aq) Zn2+ (aq) Cu2+ (aq) Ag+ (aq) Metais

Mg

Cu

Zn

Ag

5. De forma a observares as reações a um nível molecular, clica em e segue as instruções.

6. Escreve a equação química para duas das reações que ocorreram.

7. Organiza a série eletroquímica de metais de acordo com o poder redutor crescente.

Química 127 - out/dez 12 79  Módulo inquiry Precisas de Química para seres um bom cirurgião ortopedista? Notas complementares para o professor Introdução O desenvolvimento e a aplicação dos módulos inquiry visa a promoção da literacia científica pela aprendizagem significativa em dois domínios principais: a) desenvolvimento cognitivo, pessoal e social e b) processo e natureza da Ciência. Com vista a contribuir para a popularidade e relevância das aulas de ciência, nestes módulos, a abordagem parte, intencionalmente, de um fenómeno real do quotidiano e orienta-se para a ciência tentando por esta via, aproximar-se das necessidades específicas de aprendizagem dos alunos.

Estrutura Os módulos inquiry: 1. Apresentam o título e o cenário (baseados num assunto social), e suportados no guia do aluno. 2. Colocam a sua ênfase centrada no aluno, na resolução de problemas científicos, interligando a aprendizagem num contexto de objetivos educacionais e científicos. 3. Incluem tomadas de decisão científico-sociais relacionando os conhecimentos científicos adquiridos com necessidades sociais incluindo a cidadania responsável.

Objetivos/Competências/Metas Conectar os conceitos inerentes ao equilíbrio de oxidação-redução; construir a série eletroquímica; executar uma experiência virtual; recolher dados; explicar os resultados; criar um grupo de discussão e um debate de turma e executar um trabalho experimental de projeto.

Procedimento proposto (disponível detalhadamente em: www.profiles.org.pt) (duração: 6 aulas) 1. Análise de um artigo desportivo. 2. Brainstorming. 3. Observar a reatividade de diferentes metais, na simulação computacional. 4. Efetuar registos de observações, organizando-os num quadro-resumo. 5. Responder às questões propostas. 6. Realizar a atividade experimental real (disponível na página 48 do programa da disciplina de Física e Química A, comprovando os resultados habituais e analisando-os criticamente num relatório escrito. Guia do professor A. Na primeira lição sugerimos trabalho de grupo. Cada aluno lê o texto curto e o pequeno grupo discute-o. O grupo deve colocar o maior número possível de questões (Brainstorming). Ao trabalho de grupo segue-se uma discussão com toda a turma (com uma base científica rigorosa, o professor guia os alunos, filtrando as questões mais pertinentes). Os objetivos da discussão são: • Estabelecer conexões entre química e medicina. • Criar nos estudantes “necessidade de saber” - qual o metal menos reativo. B. Na segunda aula, os alunos entram no site: http://stwww.weizmann.ac.il/G-CHEM/animationsindex/Redox/home.html Este site possibilita a execução de uma experiência virtual (simulação laboratorial), para inquirir a reatividade relativa de metais. A atividade 4 pode ser utilizada para verificar a série eletroquímica que foi construída pelos alunos (possibilidade de autoavaliação). Depois da experiência virtual, os alunos têm a possibilidade de construir a série eletroquímica. C. Na terceira e quarta lições analisam-se as respostas às questões formuladas anteriormente, tendo em conta que se apresentam apenas as questões mais pertinentes. Como sugestão aconselha-se ainda a organização dos conceitos fundamentais através de mapas/redes de conceitos, construídos interactivamente com os alunos. A restante matéria pode ser lecionada como é sugerido no programa da disciplina. Recomenda-se, ainda, uma aula de debate alargado a toda a turma, de acordo com as seguintes questões: Como podes explicar os resultados? Quais são as conclusões possíveis? O que é a reação química numa escala microscópica? D. Na quinta e sexta lições é aconselhável realizar a experiência laboratorial proposta (AL 2.4) do programa da disciplina. Avaliação A avaliação incidirá na participação na aula, no trabalho de grupo e, formalmente, num grupo de questões de um teste de avaliação e no relatório escrito da atividade experimental.

80 Química 127  Química para os Mais Novos

Química para os mais novos Marta C. Corvo Departamento de Química Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa [email protected]

Introdução

A química está por todo o lado, e os alimentos não são exceção. Cozinhar é uma das aplicações mais antigas e universais da química, pode‐se dizer que ao cozinhar observamos a química em ação, com uma grande vantagem ‐ a possibilidade de provarmos o resultado das nossas experiências. Com as atividades propostas iremos observar as transformações químicas que acontecem com a caramelização do açúcar que servirá para fazer um delicioso e crocante doce de amendoim. Vamos também observar as transformações físicas ao serviço da confeção de um gelado.

I- Os segredos da caramelização

Atenção: Esta experiência deverá ser efetuada sempre com um adulto. O açúcar atinge temperaturas muito elevadas e pode haver risco de queimaduras graves.

Material:

• 1 chávena de açúcar • 1/2 chávena de xarope de glucose • Espátula de silicone/colher de pau • Pincel de silicone

• 1 chávena de amendoins • 30 g de manteiga • 1 colher de chá de bicarbonato de sódio • Recipiente de pyrex • 1/8 colher de chá de sal • Luvas de forno ou pegas • Papel de alumínio • Forno micro‐ondas

Química 127 - out/dez 12 81  Procedimento:

1. Utilizando um pincel de silicone espalhar uma camada de manteiga numa folha de papel de alumínio (A). 2. Colocar o açúcar e o xarope de glucose num recipiente de pyrex, misturar com a espátula, adicionar os amendoins e o sal (B).

3. Colocar o recipiente no micro‐ondas e aquecer A na potência máxima durante 6 a 7 minutos, até que a mistura comece a borbulhar. 4. Retirar do micro‐ondas e adicionar a restante manteiga, misturar bem e voltar a colocar no micro‐ondas por mais dois minutos (C). 5. Continuar o aquecimento por períodos de um minuto, verificando o aspeto da mistura. Quando começar a ficar amarelo acastanhado retirar do micro‐ondas (D).

B C D

6. Adicionar rapidamente o bicarbonato de sódio e misturar (CUIDADO: 148‐154oC!) (E). Forma‐se uma espuma.

E F 7. Deitar a mistura na folha de papel de alumínio de modo a formar uma camada fina (F). 8. Deixar arrefecer e cortar ou quebrar e provar!

Explicação:

Nesta experiência fizemos a caramelização do açúcar ‐ esta é uma transformação química complicada em que as moléculas do açúcar atingem temperaturas muito elevadas (c.a. de 150oC). Ao aquecermos o açúcar fornecemos energia para que as suas moléculas se alterassem, dando origem a

82 Química 127  uma grande variedade de outras moléculas de tamanhos diferentes, com aromas e cores distintas. Adicionámos glucose no início para evitar que a calda do açúcar cristalizasse durante o aquecimento, como existem várias moléculas diferentes, estas já não têm tendência para se organizarem e se encaixarem formando cristais. Ao caramelizarmos devemos ter muito cuidado, pois se a temperatura atingir valores demasiado altos, passamos a ter um sabor amargo e desagradável ‐ começa a ficar carbonizado. O bicarbonato de sódio que adicionámos no final reage com as moléculas resultantes da caramelização do açúcar, neutralizando‐as e produzindo simultaneamente dióxido de carbono, um gás. Este gás liberta‐se, criando túneis na textura deste doce, tornando‐o mais leve.

II- Gelados sem congelador

Material:

• 1 chávena de natas frias • 1/2 colher de chá de baunilha • 2 colheres de sopa de açúcar • 4 chávenas de gelo picado • 1/2 chávena de sal grosso • 3 sacos de plástico zip‐top • Pedaços de bolacha ou cereais (opcional)

Procedimento:

1. Transferir as natas, a baunilha e o açúcar para um saco de plástico. Retirar todo o ar e vedar muito bem o saco.

2. Colocar este saco dentro do outro saco e selar este último.

Química 127 - out/dez 12 83  3. Colocar o duplo saco dentro do terceiro saco e encher este último com gelo, adicionar o sal e fechar o saco fazendo com que todo o ar seja removido. Agitar suavemente o saco de modo a que o gelo se espalhe uniformemente durante cerca de 15 a 20 minutos (pode‐se usar luvas para proteger as mãos).

4. Abrir os sacos e provar o gelado!

Explicação:

Ao adicionarmos o sal ao gelo fizemos com que este começasse a derreter, porque o sal provoca a diminuição da temperatura a que a água congela, chama‐se uma depressão crioscópica. A água salgada tem um ponto de congelamento inferior ao da água pura (0oC). É por esta razão que quando neva se espalha sal nas estradas, para que seja mais difícil que congelem. Na experiência efetuada, a temperatura da mistura de gelo e sal depende da proporção relativa de gelo e sal que utilizámos. Se utilizarmos uma proporção de 1:3 (sal/gelo) podemos atingir temperaturas próximo de ‐20oC. Quando fizemos o gelado, o gelo (um sólido) transformou‐se em gelo derretido (um líquido), deu‐se uma transformação física. Quando o gelo absorve energia muda de fase, de sólido para líquido. Esta energia vem dos ingredientes que utilizámos no nosso gelado, que em consequência arrefecem, passando eles ao estado sólido.

Bibliografia

[1] Adaptado de Catelli, E. Chem Matters 1991, December, 4‐7.

[2] http://scienceofeverydaylife.discoveryeducation.com/families/pdfs/activities/Kitchen‐ Chemistry.pdf, acedido em 23/10/2012.

84 Química 127 Destaques

A página do encontro encontra-se em construção, mas pode desde já ter acesso às informações importantes, sugerindo-se a consulta frequente da mesma, onde breve- mente serão colocadas mais informações. EuroFoodChem XVII E: [email protected] URL: http://pif2013.org 7–10 maio 2013 em Istambul, Turquia

Após o sucesso de edições anteriores, o XXVII Euro- FoodChem decorrerá na capital da Turquia, local de en- contro do Oriente e Ocidente, cidade que reflete o cru- zamento de diferentes continentes e culturas. A série de conferências EuroFoodChem é organizada sob os auspí- cios da Divisão de Química Alimentar da EuCheMS (As- XVIII Meeting of the Portuguese Electrochemical Society sociação Europeia de Química e Ciências Moleculares). 24-27 março 2013 no Porto O EuroFoodChem XVII incidirá sobre os seguintes tópicos principais, entre outros: Novos desenvolvimentos no pro- O 18.º Encontro da Sociedade Portuguesa de Eletroquími- cessamento de alimentos; Novos alimentos; Alimentos e ca irá decorrer no Porto, entre os dias 24 e 27 de março. O ambiente; Micro e macronutrientes: biodisponibilidade e encontro destina-se a todos os investigadores que traba- estratégias de avaliação; Análise risco/benefício e avalia- lham e se dedicam ao estudo da fascinante área que é a ção de risco; Efeitos do processamento nos constituintes eletroquímica. Uma das palestras já confirmadas será pro- dos alimentos; Contaminantes; Alergénios; Adulteração ferida pelo Professor Richard G. Compton (Universidade e autenticidade de alimentos; Ingredientes e alimentos de Oxford, Reino Unido) o qual é autor/coautor de mais de funcionais; Métodos analíticos rápidos; Nanomateriais 1100 artigos científicos na área da eletroquímica/ciências em alimentos; Alimentos tradicionais: propriedades físico- eletroquímicas. De salientar igualmente que será publica- -químicas, etc. do um número especial da revista da Sociedade Portugue- A data limite para submissão de resumos para trabalhos sa de Eletroquímica, Portugaliae Electrochimica Acta, com cujos autores pretendam apresentar no formato de comu- base nas contribuições apresentadas nesta conferência. nicação oral é dia 4 de janeiro de 2013, ao passo que tra- Mais detalhes podem ser obtidos na página web do evento. balhos cuja apresentação seja feita em formato de poster poderão ser submetidos até 31 de janeiro de 2013. E: [email protected] Para a obtenção de mais informações sobre o evento, con- URL: http://www.fc.up.pt/18spe sultar a respetiva página web. E: [email protected] URL: https://www.arber.com.tr/eurofoodchemxvii.org/ index.php/home

7th International Congress on Pigments in Food (pif 2013) 4th Moniqa International Conference 18-21 junho 2013 em Novara, Itália 26 fevereiro - 1 março 2013 em Budapeste, Hungria

Depois de seis congressos organizados A 4.ª Conferência Internacional MoniQA irá decorrer em com sucesso, desde a 1.ª edição em Sevi- Budapeste, no Hotel Novotel Budapeste Congress, entre lha, Espanha (1999), passando depois por os dias 26 de fevereiro e 1 de março de 2013. A conferên- Lisboa, Portugal (2002), Quimper, França cia é organizada pela Associação MoniQA, com sede em (2004), Stuttgart-Hohenheim, Alemanha Viena, Áustria, em cooperação com a Universidade de Tec- (2006), Helsínquia, Finlândia (2008), Buda- nologia e Economia de Budapeste (BME), Hungria. O tema peste, Hungria (2010), o sétimo evento da desta 4.ª conferência MoniQA, será “Segurança Alimentar série de congressos que visa o estudo dos sob a Pressão Global causada por Mudanças Climáticas, pigmentos existentes nos alimentos, será Segurança Alimentar e Crises Económicas”. Este tema pre- realizado em Novara, cidade localizada no tende incentivar a discussão de várias questões alimenta- norte de Itália (Piemonte). Este congresso, res emergentes e persistentes relacionadas com a segu- que terá lugar entre os dias 18 e 21 de junho de 2013, é rança alimentar, e os desafios analíticos e legais relevantes organizado sob os auspícios da EuCheMS, e este ano es- que surgem com a perspetiva da globalização, alterações tará subordinado ao tema “…tecnologia alimentar para a climáticas e possíveis crises económicas. Esta conferên- saúde, passando pelas cores…”. cia tradicionalmente atrai participantes de vários países, O principal objetivo do congresso consiste em fornecer esperando-se a presença de cerca de 200 participantes uma possibilidade de encontro e de discussão para os de cerca de 35 países diferentes, provenientes do meio cientistas que lidam e estudam diferentes aspetos rela- académico, mas também da indústria e de diferentes or- cionados com os pigmentos de alimentos, tais como quí- ganizações, incluindo representantes de consumidores e de meios de comunicação, organizações governamentais, micos e químicos alimentares, agricultores, nutricionistas, legisladores, prestadores de serviços, etc. A apresentação mas também pessoas da indústria de todo o mundo. de novas abordagens e desenvolvimentos será realizada Os tópicos principais que se pretendem ver abordados através de apresentações orais e em formato de poster. neste congresso são os seguintes: (i) Química e bioquímica Em ambos os casos será incentivada a discussão de ideias de pigmentos, (ii) Extração e isolamento, (iii) Novas (bio) e troca de conhecimentos. tecnologias verdes/brancas para a extração de pigmentos, Para mais informações, sugerimos a consulta da página (iv) Estabilização e formulação, (v) Análise e medida da cor, eletrónica da conferência. (vi) Toxicologia, (vii) Propriedades bioativas de pigmentos, (viii) Pigmentos como ingredientes funcionais e (ix) Novas E: [email protected] fontes de pigmentos (incluindo resíduos agroalimentares). URL: http://budapest2013.moniqa.org

Química 127 - out/dez 12 85 Destaques

encontro, serão disponibilizadas brevemente na página Web do encontro. E: [email protected] URL: http://www.foodprotection.org/europeansymposium EUROFOODCHEM XVII 13th Institute of Food Technologists Annual Meeting & Food Expo May 07-10, 2013 Istanbul, TURKEY 13-16 julho 2013 em Chicago, E.U.A.

A 13.ª edição do encontro anual do Institute of Food Te- chnologists (IFT), considerado uma das maiores exposi- 5th European Conference Chemistry for Life Sciences www.eurofoodchemxvii.org ções e fórum de discussão na área da ciência alimentar 10-12 junho 2013 em Barcelona, Espanha a nível mundial, decorrerá, em julho de 2013, na cidade OH de Chicago, nos Estados Unidos da América. Este evento global atrai participantes de todo o mundo, juntando os A 5.ª Conferência Europeia de Química para as Ciências da mais reputados profissionais da indústria agroalimentar, Vida realizar-se-á em Barcelona, entre os dias 10 e 12 de investigadores e académicos, membros de organizações junho. Esta conferência é uma atividade da Divisão de Quí- governamentais, entre outros participantes, todos eles mica para as Ciências da Vida da EuCheMS, sendo orga- com interesses nas mais diversas facetas da ciência e tec- nizada conjuntamente por esta associação, pelo Institute nologia alimentar. Regra geral, os participantes neste en- for Research in Biomedicine (Barcelona), Real Sociedad Es- contro pretendem adquirir novos conhecimentos e estar a pañola de Química e Societat Catalana de Química. A con- HO par das forças motrizes por trás das inovações e tendên- ferência apresentará como tópicos a serem discutidos os cias que afetam os consumidores. Os principais objetivos seguintes, entre outros possíveis: Bioconjugados – novas European Association for desta série de encontros consistem em (i) proporcionar metodologias e aplicações em biomedicina, Bionanoma- aos participantes novas descobertas e aplicações recentes teriais – nanopartículas usadas em terapia e diagnóstico, Chemical and Molecular Sciences no campo da ciência alimentar, (ii) permitir conhecer, to- Quimiogenómica, Análise conformacional de biomacro- Division of Food Chemistry car, provar novos produtos e conhecer as tecnologias que moléculas, Desenho e síntese de derivados terapêuticos estiveram na sua génese, (iii) estabelecer novos contactos de ácidos nucleicos, Desenvolvimento de fármacos para e relações empresariais, (iv) expandir o conhecimento de alvos desafiantes, Reações enzimáticas: novos mecanis- base e (v) fazer novos contactos que permitam a evolução mos, Química de glúcidos, Modulação de interações pro- da carreira de diferentes profissionais. teína-proteína, Reconhecimento molecular e biocatálise, Neuroquímica: mecanismos moleculares de neurodege- Hacettepe University Durante os quatro dias do encontro, peritos de diferen- neração, Novas tendências em Química Bioinorgânica, tes setores (industrial, I&D e órgãos governamentais), Novas tendências em Química Medicinal, Química de pro- Food Engineering Department partilham os seus conhecimentos únicos durante mais de teínas e péptidos, e Síntese de compostos biologicamente 100 sessões e de 1000 apresentações, abordando temas ativos. De referir ainda a possibilidade de atribuição de que vão desde novos benefícios para a saúde, segurança 15 bolsas para custeio de viagem a jovens investigadores Honorary Committee Organising Chair alimentar e inovações de produtos, até às mais recentes (nascidos após 1 de janeiro de 1981). tendências de consumo, bem como receios dos consumi- Dr Mehmet Mehdi EKER Para saber como se candidatar a estas bolsas (candidatu- Dr. Hamit KÖKSEL dores. Os tópicos abordados incluirão os seguintes: Segu- Minister, Ministry of Food, Agriculture and Livestock Hacettepe University, Turkey rança alimentar, Benefícios para a saúde e nutrição, Pro- ras até 15 de março de 2013) deverá consultar a página cessamento alimentar e embalagem, Desenvolvimento de do evento. Dr A. Murat TUNCER produtos & inovação de ingredientes, Sustentabilidade, E: [email protected] Rector, Hacettepe University Políticas públicas, leis alimentares e regulamentos, Micro- URL: http://www.5ecclsbarcelona.com biologia alimentar, Química alimentar, Engenharia alimen- tar, Análise sensorial, entre outros. De salientar ainda que, Organising Committee nos dias que precedem o encontro, o IFT disponibiliza 8 a Second International Congress on Cocoa, Coffee and Tea 10 cursos de curta duração diferentes. Mais informações 9-11 outubro 2013 em Nápoles, Itália Dr Arzu BAŞMAN, Hacettepe University, Turkey podem ser obtidas na página Web do evento. Dr Roger FENWICK, Institute of Food Research,UK E: [email protected] Dado o sucesso da 1.ª edição CoCoTea, (Former President, EuCheMS Food Chem. Div.) realizar-se-á entre 9 e 11 de outubro de URL: http://www.am-fe.ift.org/cms 2013, com o patrocínio da Food Chemis- Dr Michael MURKOVIC, Graz University of Technology, Austria try Division da EuCheMS e da Sociedade (Secretary, EuCheMS Food Chem. Div.) Internacional de Reações de Maillard 2013 International Association for Food Protection (IAFP) Dr Livia SIMON SARKADI, Budapest University of Technology and Economics, Hungary (IMARS), o 2.º Congresso Internacional Venue European Symposium on Food Safety (President EuCheMS, Food Chem. Div.) CoCoTea, um encontro dedicado sobre- Dr Ümran UYGUN, Hacettepe University, Turkey 15-17 maio 2013 em Marselha, França tudo à ciência do cacau, chocolate, café, Harbiye Military chá e produtos relacionados. Os tópicos Museum and Culture Site O Simpósio Europeu IAFP sobre Se- principais, envolvendo estas matrizes, gurança Alimentar, organizado pela incidirão na Química Alimentar (composição, qualidade Scientific Committee Associação Internacional para a Prote- e segurança, aspetos analíticos, processamento, etc.), Dr Susan ARNTFIELD, Canada Dr Mükerrem KAYA, Turkey ção Alimentar (IAFP), irá decorrer em Tecnologia Alimentar (novas tecnologias, micro e nano- Marselha, França, no Parque Chanot -encapsulação, embalagem, impacto de processamento Dr Nevzat ARTIK, Turkey Dr Amos NUSSINOVITCH, Israel Convention Centre, nos dias 15 a17 na segurança e qualidade) e Nutrição e Saúde (compostos Organizing Office Dr H. Tanju BESLER, Turkey Dr Semih ÖTLEŞ, Turkey de maio de 2013. Estes simpósios têm bioativos e biodisponibilidade, estudos in vitro e in vivo, Dr Dilek BOYACIOĞLU, Turkey Dr Nihat PAKDİL, Turkey efeitos fisiológicos, etc.). sido organizados anualmente desde Dr Srinivasan DAMODARAN, USA Dr Mariusz PISKULA, Poland 2005, com o objetivo de contribuir para a melhoria futu- E: [email protected] Dr Roland E POMS, Austria Dr Bert POPPING, Germany ra no campo da segurança alimentar, proporcionando um URL: http://www.cocotea2013.org fórum para a troca de ideias entre os participantes pro- Dr İrfan EROL, Turkey Dr Livia Simon SARKADI, Hungary venientes da industria, governo e academia de países Eu- Secção compilada por Joana Amaral Dr Juana FRIAS, Spain Dr Carmen SOCACIU, Romania ropeus. Mais informações sobre o programa científico e Dr Vincenzo FOGLIANO, Italy Dr Hans STEINHART, Germany as diferentes sessões temáticas que serão abordadas no ([email protected]) www.spq.pt Tel : +90 312 441 0700 Dr Fahrettin GÖĞÜŞ, Turkey Dr Berrin ŞENÖZ, Turkey Fax: +90 312 441 0701 Dr Thomas GUDE, Switzerland Dr Rimantas VENSKUTONIS, Lithuania www.arber.com.tr Dr Mehmet HAYTA, Turkey Dr Angelo VISCONTI, Italy 86 Química 127 [email protected] Dr Thomas HENLE, Germany Destaques EUROFOODCHEM XVII May 07-10, 2013 Istanbul, TURKEY www.eurofoodchemxvii.org

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European Association for Chemical and Molecular Sciences Division of Food Chemistry

Hacettepe University Food Engineering Department

Honorary Committee Organising Chair Dr Mehmet Mehdi EKER Dr. Hamit KÖKSEL Minister, Ministry of Food, Agriculture and Livestock Hacettepe University, Turkey Dr A. Murat TUNCER Rector, Hacettepe University

Organising Committee Dr Arzu BAŞMAN, Hacettepe University, Turkey Dr Roger FENWICK, Institute of Food Research,UK (Former President, EuCheMS Food Chem. Div.) Dr Michael MURKOVIC, Graz University of Technology, Austria (Secretary, EuCheMS Food Chem. Div.) Dr Livia SIMON SARKADI, Budapest University of Technology and Economics, Hungary Venue (President EuCheMS, Food Chem. Div.) Harbiye Military Dr Ümran UYGUN, Hacettepe University, Turkey Museum and Culture Site Scientific Committee Dr Susan ARNTFIELD, Canada Dr Mükerrem KAYA, Turkey Dr Nevzat ARTIK, Turkey Dr Amos NUSSINOVITCH, Israel Organizing Office Dr H. Tanju BESLER, Turkey Dr Semih ÖTLEŞ, Turkey Dr Dilek BOYACIOĞLU, Turkey Dr Nihat PAKDİL, Turkey Dr Srinivasan DAMODARAN, USA Dr Mariusz PISKULA, Poland Dr Roland E POMS, Austria Dr Bert POPPING, Germany Dr İrfan EROL, Turkey Dr Livia Simon SARKADI, Hungary Dr Juana FRIAS, Spain Dr Carmen SOCACIU, Romania Dr Vincenzo FOGLIANO, Italy Dr Hans STEINHART, Germany Tel : +90 312 441 0700 Dr Fahrettin GÖĞÜŞ, Turkey Dr Berrin ŞENÖZ, Turkey Fax: +90 312 441 0701 Dr Thomas GUDE, Switzerland Dr Rimantas VENSKUTONIS, Lithuania www.arber.com.tr Dr Mehmet HAYTA, Turkey Dr Angelo VISCONTI, Italy [email protected] Dr Thomas HENLE, Germany Agenda

16-17 janeiro 2013 em Londres, Reino Unido 3-5 julho 2013 em Limerick, Irlanda Protein-Protein Interactions: Emerging Science and Therapeutic 5th Eurovariety in Chemistry Education Conference Potential E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.eurovariety2013.ul.ie URL: http://www.maggichurchouseevents.co.uk/PPI 7-12 julho 2013 em Quioto, Japão 26 fevereiro-1 março 2013 em Budapeste, Hungria 33rd International Conference on Solution Chemistry (ICSC 2013) 4th MoniQA International Conference E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.solnchem.jp/33ICSC URL: http://budapest2013.moniqa.org 7-12 julho 2013 em Marselha, França 11-13 março 2013 em Punta del Este, Uruguai 18th European Symposium on Organic Chemistry (ESOC 2013) 12th Symposium on Metal Ions in Biology and Medicine E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.esoc2013.eu/index.html URL: http://www.metal-ions2013.com 8-11 julho 2013 em Praga, República Checa 19-22 março 2013 em Daegu, Coreia do Sul 19th European Symposium on Polymer Spectroscopy (ESOPS 19) 21st International Conference on Polymer Characterization - E: [email protected] World Forum on Advanced Materials (PolyChar-21) URL: http://www.imc.cas.cz/en/umch/konference.htm E: [email protected] 13-16 julho 2013 em Chicago, EUA 24-27 março 2013 no Porto 13th IFT Annual Meeting & Food Expo XVIII Meeting of the Portuguese Electrochemical Society E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.am-fe.ift.org/cms URL: http://www.fc.up.pt/18spe 28 julho-1 agosto 2013 em Fort Collins, Colorado, E.U.A. 7-10 maio 2013 em Istanbul, Turquia 17th IUPAC International Symposium on Organometallic EuroFoodChem XVII Chemistry Directed Towards Organic Synthesis (OMCOS17) E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.arber.com.tr/eurofoodchemxvii.org/index. URL: http://www.omcos17.com php/home 28 julho-2 agosto 2013 em Taipei, Taiwan 13-15 maio 2013 em Sitges, Espanha th rd 15 International Symposium on Novel Aromatic Compounds 3 International Conference on Bio-Sensing Technology (ISNA-15) E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.biosensingconference.com/index.html URL: http//:www.isna15.org 14-15 maio 2013 em Boston, E.U.A. rd 4-9 agosto 2013 em Sapporo, Japão 3 Flow Chemistry Congress 6th International Symposium on Relations between Homogeneous E: [email protected] and Heterogeneous Catalysis (ISHHC-16) URL: https://selectbiosciences.com/conferences/index. E: [email protected] aspx?conf=FCC2013 URL: http://www.shokubai.org/ishhc16

15-17 maio 2013 em Marselha, França 11-16 agosto 2013 em Istambul, Turquia 2013 IAFP European Symposium on Food Safety 4th IUPAC Congress - Clean Energy Through Chemistry E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.foodprotection.org/europeansymposium URL: http://iupac2013istanbul.org 19-23 maio 2013 em Milão, Itália 25-29 agosto 2013 em Varsóvia, Polónia 20th IFCC-EFLM European Congress on Clinical Chemistry & 17th Euroanalysis Laboratory Medicine e 45th Congress of the Italian Society of E: [email protected] Clinical Biochemistry & Clinical Molecular Biology URL: http://www.euroanalysis2013.pl E: [email protected] URL: http://www.milan2013.org/index.php 11-13 setembro 2013 em Leipzig, Alemanha 10-12 junho 2013 em Barcelona, Espanha Flavors & Fragrances 5th European Conference Chemistry for Life Sciences E: [email protected] E: [email protected] URL: https://www.gdch.de/index.php?id=1410 URL: http://www.5ecclsbarcelona.com 15-20 setembro 2013 no Porto th 16-21 junho 2013 em Pisa, Itália 18 International Conference on Flow Injection Analysis (ICFIA) Congress of the European Polymer Federation (EPF-2013) E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.spq.pt/eventos/ICFIA URL: http://www.epf2013.org 15-22 setembro 2013 em Istambul, Turquia 18-21 junho 2013 em Novara, Itália International TURCMOS (Turkish Congress on Molecular Spec- 7th International Congress on Pigments in Food troscopy) - 2013 E: [email protected] E: [email protected] URL: http://pif2013.org 2-3 outubro 2013 em Roma, Itália 30 junho-4 julho 2013 em St Andrews, Escócia 4th International Conference on Biodegradable and Biobased 20th EuCheMS Conference on Organometallic Chemistry Polymers (BIOPOL 2013) E: [email protected] E: [email protected] URL: http://www.eucomcxx.com URL: http://www.biopol-conf.org Secção compilada por Joana Amaral ([email protected]) www.spq.pt

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