Lucas Patschiki 2012 P3

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Lucas Patschiki 2012 P3 6. O MSM E O FASCISMO: “Twist the truth - then twist your arm/It's the Emperor Caligula School of Charm/ Don't take his word 'cause it's not worth having it (he's an Art-Nazi)/He's a tinpot Hitler gone berserk/ A self-made man from another man's work/More tonque in cheek than a french kiss from Judas Iscariot”. Martin Walkyier. “Art Nazi”. The Silent Whales of Lunar Sea. 1995. Neste capítulo iremos situar teórica e historicamente o MSM, buscando compreender os motivos pelos quais os movimentos políticos de cunho fascista se fazem necessários na fase atual do capitalismo. Somente através desta leitura mais ampla poderemos compreender a própria existência do MSM. A atribuição de sentido fascista para determinado movimento ou ideologia de direita não deve ser feita inconsequentemente, ou de maneira caricata, já que esta leitura antes de tudo presume uma nova força a ser considerada na relação de forças – “nova” força no sentido de uma relevância maior, que faz o conceito de fascismo “escapar” dos grupúsculos, que na contemporaneidade associam-se diretamente aos que iremos chamar de fascismos de primeira onda (os fascismos clássicos), os considerando somente uma parte do “espectro fascista” existente. Por entendermos que estas considerações não são habituais, iremos neste capítulo primeiro abrir uma linha de interrogação teórica, situando os fascismos clássicos e a conjuntura que permitiu sua ascensão – a “crise fascista”. Prosseguiremos apontando a crise de 2008, que em seus desdobramentos específicos aponta para a ascensão de movimentos e partidos fascistas. Em seguida apontaremos as transformações que estes movimentos e partidos tiveram de cumprir para continuar apresentando-se como opções políticas válidas no Pós-Guerra (os fascismos de segunda onda) e após o declínio da URSS (os fascismos de terceira onda). Por fim iremos situar alguns movimentos e partidos fascistas de terceira onda na contemporaneidade, sublinhando suas funções políticas e sociais diante das crises do capital-imperialismo. O fascismo não é um desenvolvimento “natural” ou óbvio da direita, “gênero de que o fascismo é uma espécie”1, pois cumpre papéis específicos, resguardando determinados grupos sociais na disputa do bloco no poder, o que garante a sobrevida do Estado capitalista. Assim como cumpre um papel específico na ofensiva contra as forças da classe trabalhadora em um processo de crise serve como elemento rearticulador do bloco no poder, alterando as relações entre as diferentes frações da burguesia (grande e pequena) para a superação da crise. Antes de qualquer desenvolvimento, iremos apresentar o conceito de fascismo de Leandro Konder, que irá balizar as mudanças e permanências assinaladas, para quem trata-se de: […] uma tendência que surge na fase imperialista do capitalismo, que procura se 1KONDER, L. Introdução ao fascismo. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 27. fortalecer nas condições de implantação do capitalismo monopolista de Estado, exprimindo-se através de uma política favorável à crescente concentração do capital; é um movimento político de conteúdo social conservador, que se disfarça sob uma máscara “modernizadora”, guiado pela ideologia de um pragmatismo radical, servindo-se de mitos irracionalistas e conciliando-os com procedimentos racionalistas-formais de tipo manipulatório. O fascismo é um movimento chauvinista, antiliberal, antidemocrático, antissocialista, antioperário. Seu crescimento num país pressupõe condições históricas especiais, pressupõe uma preparação reacionária que tenha sido capaz de minar as bases das forças potencialmente antifascistas (enfraquecendo-lhes a influência junto às massas); e pressupõe também as condições da chamada sociedade de massas de consumo dirigido, bem como a existência nele de um certo nível de fusão do capital bancário com o capital industrial, isto é, a existência do capital financeiro2. A situação de crise aberta é um dos pontos chave para compreender a ascensão de movimentos deste tipo, o que delimita que “nem todo movimento reacionário é fascista” e “nem toda repressão – por mais feroz que seja – exercida em nome da conservação de privilégios de classe ou casta é fascista” do mesmo modo que o conceito “não se deixa reduzir, por outro lado, aos conceitos de ditadura ou de autoritarismo”3. Mas, que fique claro, isto não significa que os movimentos e partidos fascistas cumprem suas tarefas políticas em um sentido coerente na disputa política, dados a centralidade e do irracionalismo e do pragmatismo, que possuem reflexos tanto ideológicos quanto hierárquicos. “Para uma política ser eficaz, ela precisa ser levada à prática através de iniciativas concretas, manobras, concessões, acordos, golpes de audácia, formas de arregimentação das forças disponíveis que transcendem da mera atitude doutrinária”4. O que não nos impede de sublinhar diferenças concretas entre os momentos da ascensão históricas de projetos deste cunho. Ou mais especificadamente, segundo Calil: Diversas características que marcaram a trajetória dos movimentos fascistas foram completamente abandonadas quando de sua ascensão ao poder, particularmente seu discurso anticapitalista e sua denúncia do grande capital. Todos os processos históricos concretos de ascensão do fascismo ao poder foram precedidos por um compromisso entre os movimentos fascistas e o grande capital monopolista, abandonando-se qualquer discurso ou prática de questionamento ao capitalismo. Assim, também no caso de movimentos fascistas que não ascenderam ao poder, é necessário analisar com muito cuidado suas proposições pretensamente anticapitalistas, tendo em vista que não é possível cotejá-las a uma prática efetiva de governo. A veiculação de um discurso pretensamente anticapitalista correspondia a uma necessidade concreta dos movimentos fascistas, embasando sua auto- representação como movimentos “revolucionários”, tendo em vista o atendimento das expectativas de sua base social fundamentalmente pequeno burguesa, a qual, em um contexto de crise econômica e social, responsabilizava o grande capital pelas conseqüências destas crises. É importante ressaltar que os movimentos fascistas não são constituídos a priori como “instrumentos do grande capital”, mas, ao contrário, surgem historicamente formados pela pequena burguesia e apenas posteriormente, com o acirramento da luta de classes, passam a expressar diretamente o interesse do 2KONDER, L. Introdução ao fascismo. op. cit. p. 53. 3Idem. p. 25. 4Ibidem. p. 28. 2 grande capital5. Sublinhemos esta peculiaridade combativa do movimento, que o reveste de caracteres “anticapitalistas”, ou melhor, o posiciona contra alguns elementos ou movimentos parciais do capitalismo. Sua origem social é constituída por elementos oriundos dos estratos médios da sociedade, cujo afastamento do bloco do poder os permite construir um aparato ideológico capaz de oferecer possibilidades políticas maiores para as burguesias em caso do acirramento da luta de classes, sem que com isto a ordem social seja invertida. Isto ocorre porque “o próprio sistema em cuja defesa as classes dominantes se acumpliciam – um sistema que gravita em torno da competição obsessiva pelo lucro privado” é responsável por impedir “que as forças sociais em que consiste a direita sejam profundamente solidárias: elas só se unem para os objetivos limitados da luta contra o inimigo comum”6. Este trabalho de arregimentação em nada corrobora com leituras do fascismo como sendo estritamente uma metodologia estática de organização política, pois o compreende através de suas tomadas de posição em uma determinada relação histórica de forças. Isto é retomado por Mauro Iasi na apresentação do livro de Konder: Presos à incapacidade de compreensão da distinção entre forma e conteúdo, os mais preocupados espíritos atormentados de liberais democratas, ou seus jovens aliados recém-liberais e tardiamente democratas, ficam à espera de uniformes marrons, camisas negras, suásticas e facios, e deixam escapar manifestações muito mais substanciais. O culto pós-moderno do irracionalismo combinado com a ostensiva retomada de um cientificismo neo-positivista, o elogio dos sentimentos e instintos contra a razão, o pragmatismo renovado da realpolitik, a negação da teoria pela revigorada ofensiva daqueles que Zizek batizou de “agnósticos new age”, e, principalmente o brutal anticomunismo, o cínico preconceito de classe contra os trabalhadores e sua sofisticada e sutil, mas nem por isso menos brutal, expressão acadêmica na tese do “fim do mundo do trabalho” e a suposta impropriedade do conceito de classe social como instrumento explicativo da sociedade contemporânea, nos alertam que os cadáveres enterrados na Itália e na Alemanha tiveram tempo de liberar a sua alma7. O que pode ser observado como uma das características do fascismo clássico: seu pragmatismo radical serviu somente “no sentido de superar a situação altamente insatisfatória que a contradição [...] tinha criado para as forças conservadoras mais resolutas”8, não ocorria afastado das suas posições práticas. Do mesmo modo concorreu para apropriar-se de conceitos de origem do campo do “inimigo”, o marxismo, seja para esvaziá-lo de sentindo social, na disputa pelo discurso competente em relação ao corpo social, seja para entender estrategicamente o posicionamento estratégico do proletariado, seja para compor seu próprio plano para a atuação política delimitando 5CALIL, G. G. O integralismo no processo político brasileiro – o PRP entre 1945 e 1965: cães de guarda da ordem burguesa. op. cit. p. 151-152. 6KONDER, L. Introdução ao fascismo.
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