RESENHA DE NOTÍCIAS CULTURAIS

Edição Nº 53 [ 1º/9/2011 a 7/9/2011 ] Sumário

CINEMA E TV...... 3 O Estado de S. Paulo - A tradução de um artista...... 3 Jornal de Brasília - No alegre reino da animação ...... 3 O Estado de S. Paulo - Tropicália, a arte do País em mostra americana...... 4 O Globo - ‘Histórias do Brasil’ da colonização ao século XX...... 5 Folha de S. Paulo - Sertão mineiro invade circuito europeu...... 6 Carta Capital - Um artista de família...... 7 TEATRO E DANÇA...... 9 O Globo - Uma jornada musical pela tradição carioca do botequim...... 9 Folha de S. Paulo - Beatriz Segall vive conflito de geração em novo espetáculo...... 10 O Estado de S. Paulo - À beira-mar...... 11 Correio Braziliense - É de todo mundo ...... 12 ARTES PLÁSTICAS...... 13 Folha de S. Paulo - Artista reduz ideia de luz a pedra sólida...... 13 O Estado de S. Paulo - O homem que pintou o mundo...... 14 Estado de Minas - Ver para crer ...... 16 Isto é – Romântico, com peso ...... 17 FOTOGRAFIA...... 18 O Globo - O Brasil em paisagens panorâmicas...... 18 MÚSICA...... 19 O Estado de S. Paulo - Desde que o samba é samba...... 19 O Globo - Voz entre a tradição e os ‘Novos tempos’ ...... 20 Correio Braziliense - Revelação brasiliense ...... 21 O Estado de S. Paulo - Roberto em Jerusalém...... 22 Correio Braziliense - Quando o samba é mais samba...... 24 Correio Braziliense - Mistura de xote com pop ...... 26 O Globo - O ritmo aos 70 anos ...... 27 Folha de S. Paulo - Passado a limpo...... 29 Correio Braziliense - Aos mestres, com carinho...... 30 LIVROS E LITERATURA...... 31 O Globo - A Bienal e o acesso ao livro...... 31 O Estado de S. Paulo - Programa para tradutores...... 32 ARQUITETURA E DESIGN...... 33 Folha de S. Paulo - Lygia Pape e Tunga ganharão galerias próprias em Inhotim...... 33 OUTROS...... 34 La Nación (Argentina) - Mirando al Sur...... 34 Ultima hora (Paraguai) - Arte popular del Brasil se instala en Asunción...... 35 O Globo - Vitrine de arte ...... 36 O Globo - Gagosian quer promover arte brasileira...... 38 O Estado de S. Paulo - Setembro de Bienais...... 39

2 CINEMA E TV

O ESTADO DE S. PAULO - A tradução de um artista

Luiz Carlos Merten

(1º/9/2011) Depois de O Aborto dos Outros, com o qual ganhou menção honrosa no É Tudo Verdade, a diretora Carla Gallo muda o tom e aborda um tema aparentemente mais leve. Aparentemente. Como ela própria explicou, em Assim É, Se lhe Parece seu objetivo é "traduzir" Nelson Leirner, um dos mais importantes artistas visuais contemporâneos do País. Como se traduz um artista identificado com a vanguarda, que trabalha em múltiplos suportes e extrapola seus limites? Certamente não por meio de um documentário "tradicional".

Pintor, desenhista, cenógrafo, professor, autor de happenings e instalações. Como dar conta de tanta complexidade? Não se trata apenas de "passar" Nelson Leirner pela câmera, entrevistando-o, mostrando seu trabalho ou colhendo depoimentos de colegas e críticos sobre ele. Assim É, Se lhe Parece, até pelo objeto - o "sujeito" -, é um projeto mais arriscado da diretora. Em Aborto dos Outros, a força estava no tema e a forma andava, por assim dizer, a reboque, mas é verdade - tudo! - que Carla buscava a eficiência da linguagem para tornar mais contundentes as experiências de suas mulheres. Buscava, e conseguia. Em Assim É, a forma torna-se essência. Pois se trata, aqui, de traduzir um artista que não se pauta pelos cânones, ou que os (re)cria numa nova dimensão.

Contramão. A proposta de retratar Nelson Leirner partiu do Itaú Cultural, na sua série Iconoclássicos, na qual o artista se insere, perfeitamente. Como a diretora gosta de dizer, ela andou na contramão de O Aborto dos Outros. Não adotou uma sistematização. Fez o filme em aberto. Descobriu-o durante o processo - a realização e, principalmente, a montagem. Nelson Leirner é corintiano fanático, o que muita gerente não devia saber. Carla Gallo penetra - um pouco - na intimidade do artista. Descobre e expõe movimento de suas obras, fornece pistas, mas o objetivo está longe de ser didático. O cinema direto de O Aborto dos Outros é substituído por uma pesquisa formal mais intensa, um exercício de som, imagem - e arquivo. Justamente o som, ou melhor, a música. Nelson Leirner entra no próprio filme por meio de suas preferências.

Cantos da torcida corintiana, sinfonias de Beethoven, a trilha de Irving Berlin para o velho Puttin" On the Ritz, o balé A Criação do Mundo, de Darius Milhaud. Tudo isso vai se articulando e iluminando em Assim É, Se lhe Parece. Por meio dessa articulação revela-se o espírito do artista, e de sua obra. Esse jogo sonoro é uma contribuição de Lina Chamie, a talentosa diretora de Tônica Dominante e A Via Láctea. Lina é muito ligada à música. Sua proposta para Carla não é no sentido de a música "levar" o filme. Puttin" On the Ritz entra mais como a ironia de uma citação. Mais de um crítico já informou que a obra de Leirner é toda ela um comentário sobre o sistema em que se inscreve (ou que a produz). Assim É termina dando conta também disso.

JORNAL DE BRASÍLIA - No alegre reino da animação

Prêmios maiores e novas categorias marcam evento que busca sua reinvenção

(3/9/2011) A organização da 44ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro divulgou a programação do evento que tem novidades, como a inscrição de filmes não inéditos, criação de categorias e prêmios mais atraentes. Um dos destaques é a presença de filmes de animação, que ganharam agora uma mostra competitiva e também uma sessão chamada Festivalzinho Animado, que percorrerá 13 locais. Serão, no total, cinco mostras paralelas, cinco seminários, cinco oficinas e a Mostra Brasília (com produções do DF, em curta, média e longa-metragem). As exibições das mostras competitivas serão entre os dias 27 de setembro e 2 de outubro, no Cine Brasília e, pela primeira vez na história do festival, também em outras três cidades – Sobradinho, Taguatinga e Ceilândia – que terão o mesmo cerimonial do Cine Brasília. A ideia, segundo o secretário de Cultura, Hamilton Pereira, é “Aproximar a imagem que o País produz de si mesmo e oferecê-la aos olhos dos espectadores”.

3 Para a abertura, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional, para convidados, no dia 26, foi escolhido o longa Rock Brasília – Era de Ouro, documentário de Vladimir Carvalho, premiado no Festival de Paulínia. A cerimônia terá a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, executando Brasília Episódio Sinfônico, do trompista Fernando Morais, e Eduardo e Mônica (Legião Urbana).

NÚMEROS

O tradicional evento exibirá, nas mostras competitivas, seis longas metragens, 12 curtas e 12 curtas- metragens de animação, que disputam R$ 425 mil em prêmios. A Câmara Legislativa distribuirá prêmios a produçõesç do Distrito Federal, num total de R$ 150 mil.

O Festival também terá projeções da mostra Diretoras Premiadas, em cinco cidades do DF. “A programação de filmes, debates e seminários e a ampliação das projeções para as cidades do DF farão a diferença nesta edição”, diz o coordenador- geral do evento, Nilson Rodrigues.

A 44ª edição recebeu recorde de inscrições: 624 filmes, sendo 110 de longa-metragem (56 inéditos), 415 curtas e 99 filmes de animação.

NA TELONA

CURTAS EM COMPETIÇÃO

Céu, Inferno e Outras Partes do Corpo – de Rodrigo John./ Bomtempo – de Alexandre Dubiela./ Moby Dick – de Alessandro Corrêa./ 2004 – de Edgard Paiva. /Quindins – de David Mussel e Giuliana Danza./ A Mala – de Fabiannie Bergh./Media Training – de Eloar Guazzelli e Rodrigo Silveira./Cafeka – de Natália Cristine./Sambatown – de Cadu Macedo./ Menina da Chuva – de Rosaria./ Ciclo – de Lucas Marques Sampaio./ Rái Sossaith – de Rái sossaith.

FESTIVALZINHO ANIMADO

Leonel Pé-de-vento – de Jair Giacomini./ O Pato – de Andres Lieben./ Tem Um Dragão no Meu Baú – de Rosaria. /Lúmen – de Wilian Salvador./ Aquarela – de Andres Lieben./ Kone e Dorfe no Mundo das Alcachofras – de Paulo Pappera./ Seu Dente e Meu Bico – de Marão./ Juro Que Vi: Matinta Pereira – de Humberto Avelar./ Laurinha – de Thomas Larson./ A Casa – de Andres Lieben./ Tainá – Kan, A Grande Estrela – de Adriana Figueiredo./ A Lenda do Brilho da Lua – de Gabriela Dreher. Venc

O ESTADO DE S. PAULO - Tropicália, a arte do País em mostra americana

Flavia Guerra

(4/9/2011) O primeiro cabeludo que o diretor Marcelo Machado admirou na vida não foi nenhum Rolling Stone, não foi um Beatle, não foi Jimi Hendrix. Nascido em Araraquara, no interior paulista, Machado viu na cabeleira de a rebeldia que revolucionaria a música brasileira e ecoaria até hoje em território nacional e internacional.

Os ecos de uma certa Tropicália, movimento difícil de explicar enquanto acontecia e ainda hoje impossível de ser definido em poucas palavras, chegaram até o interior paulista, viajaram o mundo e hoje desembarcam no Colorado nos Estados Unidos, mais precisamente no Telluride Film Festival.

Tropicália é o nome do documentário que Marcelo Machado dirigiu e que integra a mostra que vai até amanhã. Outro integrante é Transeunte, de Eryk Rocha. Filmes sobre música já são tradição no cinema nacional. Festivais de cinema são milhares no mundo. O que faz de Tropicália e Telluride dois eventos únicos é o fato de que são manifestações afetivas às duas artes.

4 É um documentário que não prima pelo didatismo, pela "coerência" cronológica nem mesmo pela linearidade em sua narrativa. Assim com o movimento cultural que homenageia, é uma geleia geral de imagens, referências, depoimentos e, claro, música. O Telluride tampouco prima pela regra que move muitos festivais do mundo: o culto às celebridades, a legitimação pela presença maciça da imprensa, as sessões anunciadas com antecedência. O evento mantém em segredo até o último momento (ou seja, até o dia em que começa) quais são os filmes concorrentes. "Nós estamos indo para lá hoje. E não sabemos quem vamos encontrar por lá. Podem tanto ser filmes do naipe de O Discurso do Rei, que fez sua première mundial lá no ano passado, quanto cineastas "desconhecidos" como nós", explicava Machado ao Estado antes de embarcar para o Colorado na quarta-feira.

Podem ser também filmes do estilo Cidade de Deus, o último filme brasileiro a integrar a programação do festival. A julgar pela opinião de , produtor executivo de Tropicália, Telluride é um dos festivais mais interessantes do mundo: "É o melhor em que já fui. E já estive em muitos deles".

Ali, a imprensa quase não é permitida. Não há badalação também. É sobre filmes. Os diretores têm a obrigação de ficar lá pelos quatro dias do festival, pois a ideia é encontrar os colegas, assistir a filmes e conversar. É a mostra de maior prestígio nos EUA. Bombom fino para poucos e bons.

Para Machado e as produtoras Denise Gomes e Paula Consenza, que representam Tropicália, será também a prova dos nove. "Fiquei muito feliz que Tropicália tenha conseguido um espaço lá, mesmo ainda não estando acabado completamente", comenta Machado. "O filme contagia ao contar a história daquela turma que estava realmente mudando a forma de se fazer e entender a arte. Mexendo com as massas e com os pensadores. Chacoalhando a cristaleira. Ao ver o jovem Caetano ou o jovem Gil prontos para mudar o mundo é impossível não nos sentirmos tocados pela energia transformadora."

O GLOBO - ‘Histórias do Brasil’ da colonização ao século XX

Combinando informação e entretenimento, série sobre o país começa a passar hoje na TV Brasil

João Paulo Gondim

(5/9/2011) Conciliar informação com entretenimento. Este é o objetivo da série “Histórias do Brasil”, que estreia hoje, às 22h, na TV Brasil. Com dez episódios de 25 minutos cada, a série será exibida de segunda a sexta-feira, até 16 de setembro, narrando vários momentos do passado do país, de 1530, nos primórdios da colonização, a 1958, com a construção de Brasília. Realizada através de uma parceria das produtoras Film Works e Conspiração Filmes com a “Revista de História da Biblioteca Nacional”, a obra é dirigida por Arthur Fontes.

— Dentro da Conspiração, eu era quem tinha o perfil ideal para a série. Sempre gostei de programas que falam de história, sou fã dos documentários da BBC (emissora pública britânica). É um nicho ainda pouco explorado no audiovisual brasileiro. E a nossa preocupação no projeto era não fazer uma coisa chata, nós queríamos contar os fatos de uma maneira atraente para o público — afirma Fontes.

Formato de docudrama

Para concretizar o seu intento, o cineasta empregou o formato do docudrama na atração. Cada acontecimento é ilustrado por uma encenação ficcional povoada de personagens comuns: escravos, soldados, mordomos, empregadas, cirurgião, funcionários públicos e comerciantes, entre outras ocupações. Nada de vultos ilustres, ressalta o diretor.

— Optamos por contar o que consideramos a história da vida privada do país para contextualizar melhor a sociedade da época — diz Fontes, que revela curiosidades da produção, gravada ano passado no Rio e em Paraty. O quintal de uma casa no Alto da Boa Vista serviu como a mata desbravada por bandeirantes. No capítulo dedicado às sociedades literárias secretas, desafiadoras do controle de na circulação de livros na Colônia, a locação foi iluminada apenas por velas.

5 Na busca pela fidelidade histórica do programa, a equipe do diretor recebeu a colaboração de historiadores da “Revista de História da Biblioteca Nacional”, capitaneados por Luciano Figueiredo, editor do periódico.

— O trabalho foi de um rigor extraordinário em todos os detalhes do figurino e da direção de arte. Saí da série com um conhecimento de história muito maior do que quando entrei nela — conta o cineasta.

Cada episódio ainda apresenta depoimentos de professores e pesquisadores de renome. Evaldo Cabral de Mello, , José Murilo de Car valho, Eduardo Viveiros de Castro, Mary Del Priore e Lilia Moritz Schwarcz são alguns dos acadêmicos que desvendam os bastidores do Brasil de antigamente.

Pelo menos duas teses vão ser ditas em primeira mão através de “Histórias do Brasil”. No entendimento de Cabral de Mello, o português Domingos Fernandes Calabar — aliado dos holandeses que O EPISÓDIO "Entradas e Bandeiras": projeto tem parceria da invadiram o Nordeste no século XVII — “Revista de História da Biblioteca Nacional” era contrabandista. Costa e Silva sustenta que os escravos tinham certeza de que estavam sendo levados para a morte nos navios negreiros. Em sua fala, ele acrescenta que os negros acreditavam ser sangue de africanos o vinho tinto consumido pelos portugueses nas embarcações.

— Nunca tantos historiadores de prestígio se reuniram para falar em um mesmo veículo. Conseguimos a nata deles — afirma Figueiredo.

Por ser professor de História do Brasil Colônia da Universidade Federal Fluminense (UFF), ele também foi entrevistado para o programa. Figueiredo declara ter vontade de realizar uma segunda fase de “Histórias do Brasil”, que trataria de episódios contemporâneos.

FOLHA DE S. PAULO - Sertão mineiro invade circuito europeu

Após passagem pelo Festival de Veneza, ontem, filme "Girimunho" seguirá para Espanha, Alemanha e França

Trabalho de Helvécio Martins Jr. e Clarissa Campolina recria a vida de duas mulheres de 80 anos de São Romão

(6/9/2011) - O sertão mineiro bateu asas e voou. Filmado em São Romão (MG), cidade de 8.000 habitantes, o longa-metragem "Girimunho" emplacou nos festivais internacionais.

O filme foi exibido ontem na mostra "Orizzonti" do Festival de Veneza. Depois segue para Toronto e para o festival de San Sebastián, na Espanha. Já tem distribuição acertada em circuitos de arte da Espanha, da Alemanha, da França e dos Países Baixos.

A Folha assistiu ao longa dos mineiros Helvécio Martins Jr. e Clarissa Campolina numa projeção de pré-lançamento. Encontrou na tela um filme cheio de silêncios, claros e escuros, concentrado no universo das tradições populares: batuques cantados, rio São Francisco, relações com o tempo, com a morte e com a natureza.

As personagens principais são duas senhoras de mais de 80 anos: Bastu e Maria do Boi. Elas interpretam a si mesmas. Recriam situações pelas quais realmente passaram ou que foram "provocadas" pelos diretores.

6 Das festas populares e da morte do marido de uma delas vai se desenhando a trama em fragmentos que deixa entrever a chegada da modernidade ao cenário, com as bandas de brega e o Orkut. Helvécio e Clarissa fazem parte da Teia, coletivo de cineastas de Belo Horizonte criado em 2003, cujo trabalho foca no gênero documental e experimental.

Juntos, fizeram o curta "Trecho" (2006), premiado no Festival de Brasília; sozinhos na direção, ele fez "Nascente" (2005), e ela, "Notas Flanantes" (2009).

"Girimunho" é o primeiro longa da dupla, permeado de ecos do escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967), a começar pelo cenário e pelo título -girimunho é uma outra palavra para redemoinho.

Em outubro, o filme desce o São Francisco, em que foi filmado, e será exibido na mostra itinerante Cinema no Rio. "Fico muito mais nervoso com a exibição em São Romão do que com a de Veneza", diz o diretor. Para um sertão tão vasto, o Lido ficou pequeno.

CARTA CAPITAL - Um artista de família

Orlando Margarido

De novo diretor, Reginaldo Faria reencontra as referências que o levaram a ser um intérprete vigoroso do cinema e da televisão

O açougue dos Faria não fez só alimentar a pequena comunidade de Nova Friburgo nos anos 40 e 50. Ao cinema brasileiro legou uma noção de disciplina, trabalho e esforço conjunto que se revelaria em um dos clãs mais influentes do meio. “A colaboração começou ali, no comércio do nosso pai, quando nós, os filhos, saíamos para fazer as entregas de bicicleta”, lembra Reginaldo Faria, a face mais exposta da família por ter se tornado o galã das telenovelas e protagonista preferido do irmão cineasta e produtor . Foi em boa parte por essa afinidade, lograda em parcerias prestigiadas como Assalto ao Trem Pagador, que ele se tornou também diretor de sucesso. Um ofício em que não se exercitava havia quase três décadas e ao qual retorna agora, aos 74 anos, com O Carteiro. Se não se pode dizer que a comédia romântica e de humor ingênuo resgata a boa mão do realizador no gênero um dia avalizada por picos de público, como aconteceu em 1971 com Os Paqueras, ao menos autoriza a uma revisão de momentos significativos de sua trajetória artística.

A história escrita por Reginaldo sobre o jovem carteiro apaixonado que viola as correspondências da amada estreou no recente 39º Festival de Gramado, evento que o premiou algumas vezes e traz evidências de sua memória pessoal e de seu gosto cinematográfico. O cenário do filme é uma vila encravada no Vale do Vêneto gaúcho, onde o mundo virtual ainda não deu as caras aos missivistas. O tom anacrônico, que o diretor prefere assinalar como atemporal, é reforçado pelas bicicletas do carteiro e seu -melhor -amigo, -referência ao Vittorio De Sica, que lhe é tão caro. Mas se Ladrões de Bicicleta ocupa- o seu imaginário desde as matinês no Cine Teatro Leal, juntamente com Flash Gordon e John Ford, também aí está uma característica marcante desde o início da carreira. “Para mim, cinema, de início, foi trabalho físico, carregar cenários, tripés, chassis”, diz. “Foi assim que comecei, depois de acordar às 4 da manhã para destrinchar boi, entregar carne, e antes de me tornar ator por acaso.” Talvez seja essa a motivação da crítica ao filme. A partir do pensamento do diretor, convocam-se o exagero de gestual, o excesso de corre-corre e a repetição de atos, recursos típicos de uma tradição chanchadeira que, aliás, igualmente se encontra na biografia do ator e diretor.

Quando denota o esforço braçal, Reginaldo está se referindo aos primeiros tempos no , momento em que foi encontrar o irmão Roberto nos estúdios da Atlântida. Ele foi o terceiro Faria a descer a serra fluminense para ganhar a vida, logo depois de Rivanildes, o Riva, e antes de Rogério. Para ambos, sempre envolvidos na produção de filmes, como para Reginaldo, o cinema era destino natural. Ainda que a sobrevivência o obrigasse a uma escala como bancário, o jovem chegava com uma bagagem teórica fornecida por um ocupante inesperado da sobreloja do açougue. Era Adacto Filho, ou Artur Pereira de Melo, cantor lírico, diretor e dramaturgo então aposentado que fundara a companhia Os Comediantes. Ele iniciou o entregador na arte da interpretação e nas obras do teatro, de Shakespeare- a , que adaptou com frequência. “Ao mesmo tempo, eu já tinha lá minhas brincadeiras de atuar, de imitar, eu buscava algo sem saber o quê. Tanto que o Watson

7 Macedo me convidou ainda muito garoto para atuar num projeto que não deu certo”, aponta, referindo-se a um dos principais nomes da Atlântida.

Mas a experiência das aulas informais não foi válida de imediato, pois Roberto o convocou para assistente de câmera em sua estreia como diretor com Rico Ri à Toa, em 1957. A chance do acaso apareceu no filme seguinte de Farias, No Mundo da Lua, quando o cantor Aldair Soares, que seria galã na comédia, sumiu e Reginaldo foi preparado a contragosto como substituto. “Fui tremendo para as filmagens.” Tanto assim que seu personagem, um imigrante nordestino, não falseia quando parece fraquejar ao descer do pau de arara recém-chegado ao Rio de Janeiro. As pernas, no entanto, não bambeariam mais de medo a partir dos trabalhos seguintes, de preferência naqueles com o apoio do irmão. “Roberto foi meu mestre, conselheiro, mesmo antes de existir Stanislavski na minha vida.”

O entregador de carnes ligou o meio cinematográfico, de início, ao trabalho físico de carregar cenários e chassis

Um capricho talvez para redimir uma antiga frustração levaria Reginaldo a trabalhar com Watson Macedo em Aguenta o Rojão antes de inaugurar, em 1959, a bem-sucedida série de filmes com o irmão, começando por Cidade Ameaçada. No limite do declínio da chanchada, Farias surgiu com esse policial de fonte verídica-, que em parte preconizava suas- intenções quanto a um ideal de cinema, autoral e mais artesanal, sem perder de vista o público, isso em tempos de Cinema Novo. A história do bandido Promessinha e seu bando levaria os Faria ao primeiro reconhecimento internacional, com uma indicação para o Festival de Cannes. “Foi o filme que me elevou ao status verdadeiramente de ator.”

Esse acerto entre noção de corpo e espaço, atrelado ao entendimento teórico das aulas de Adacto Filho e o intuitivo que começava a surgir, tornou-se mais evidente na composição de Grilo Peru de Assalto ao Trem Pagador, de 1962. Na segunda empreitada de Farias sobre um caso real, o roubo de grande repercussão à época de um trem pagador da Central do Brasil ocorrido dois anos antes, o personagem de Reginaldo incumbe-se como mentor- de convencer um grupo a executar- o crime. Entre miseráveis, homens negros da favela, ele é o diverso e se vê como tal no direito de trair os colegas ao gastar a sua parte de dinheiro roubado. Com um elenco excepcional, despontando Eliezer Gomes, Helena Ignez e , entre outros, o filme passou à memória referencial do cinema brasileiro, ainda perceptível como influência, por exemplo, -no recente- Assalto ao Banco Central.

Reginaldo não vê nas parcerias desse ciclo inicial com o irmão, que se fecharia com Selva Trágica, em 1964, algo além de disciplina e esforço de dedicação, traço de toda a família. Não foi com outra expectativa, a de exercer seu trabalho de modo profissional, que chegou ao set de Porto das Caixas, de Paulo César Saraceni. Seria sua única, e desconfortável, incursão no terreno do Cinema Novo. “Ali se privilegiava a estética, buscava-se a fotografia. Saraceni não dirigia os atores, ele os deixava propositadamente inseguros, e isso se via na tela.” Também não se sentia politizado para tratar com figuras e o universo daquele novo meio. “Eu era um rapaz alienado, e isso não pegava bem naquele período.” Talvez por isso seu feitio de jovem galã tenha servido na medida para personagens como o funcionário que procura tirar proveito de uma garota ingênua e, ao mesmo tempo, de outra rica, em Lance Maior, a estreia de Sylvio Back, em 1968.

Mas nada justificava, para ele, o patrulhamento de que diz ter sido vítima quando foi para trás da câmera inaugurar as comédias urbanas descompromissadas sobre playboys de Copacabana. Seu Os Paqueras, afirma, fez 4 milhões de espectadores e só perdeu na bilheteria para o primeiro filme da série James Bond, numa coincidência que não deixa de ser engraçada. Rendeu-lhe também uma incômoda pecha de “pai da pornochanchada”, quando projetos de outros diretores começaram a surgir na esteira do sucesso, mas apostando- no apelo do sexo que o primeiro não tem. “Desvirtua- ram meu filme, que tem erotismo, para fazer pornografia”, sustenta.

A essa altura, Reginaldo já contava com a fama das telenovelas, que lhe deu tipos de empatia com o público, a exemplo do irmão rebelde de Água Viva ou o arrivista de Vale Tudo. É o período dos anos 60, em que mantém uma parceria com Roberto Farias em ritmo de comédia e aventura, nos dois filmes da série com Roberto Carlos, nos quais ironiza seu tipo boa-pinta. Na década seguinte, teria conseguido mobilizar o respeito artístico cobrado por certa vertente, quando, ao mesmo tempo, adapta Plínio Marcos (Querô) em Barra Pesada, sua sexta direção, e interpreta o ladrão de banco

8 real em Lúcio Flávio – O passageiro da agonia, outra caracterização emblemática na história do cinema nacional.

Sobre esse último, Roberto Farias faz questão de lembrar que se tratava de uma produção conjunta entre Hector Babenco e a R.F. Farias, a empresa da família por ele fundada, mas que, por incompatibilidade com o diretor, passou a ser um filme só dele. “O Reginaldo costuma dizer que, se soubesse, teria cobrado cachê maior, pois fez um preço camarada por se tratar de produção nossa”, brinca. E pontua o único dos Faria a ter um “s” no sobrenome, por erro de cartório: “A vocação dele, sem dúvida, sempre foi a interpretação. É um profissional disciplinado, denso e suave quando dele se exigem essas qualidades”.

Estaria entre algum grau dessas características a sua boa condução do desafiador Brás Cubas de Memórias Póstumas (2001), aposta do diretor André Klotzel, que, em um primeiro momento, considerou arriscada e recusou. Mas quem sabe pelo dever de mergulhar na obra completa machadiana agora pode ser um professor mais seguro a influenciar seus alunos numa ponta de O Carteiro. A produção faz jus ao amor dos Faria pelo cinema, transferido aos filhos da primeira geração entre técnicos, diretores e fotógrafos. Conta no elenco com os herdeiros de Reginaldo, Candé, protagonista em estreia, e Marcelo Faria. Com este já contracenou no teatro, uma das passagens da carreira contadas no depoimento à Coleção Aplauso, O Solo de um Inquieto. Mas Reginaldo se prepara para escrever de próprio punho seu trajeto, tarefa que os olhos azuis postos na neta recém-nascida indicam. Considera um dever de avô preocupar-se com a memória de sua família, artística de tradição. • TEATRO E DANÇA

O GLOBO - Uma jornada musical pela tradição carioca do botequim

Espetáculo estreia amanhã com ode aos bares e à incorreção política do Rio

João Máximo

(1º/9/2011) Na noite de terça-feira, 6 de abril de 1976, o centenário Lamas fecha suas portas para dar lugar às obras do metrô e se mudar para a Rua Marquês de Abrantes. Desolado, Chico, velho boêmio com quilômetros rodados em mesas noturnas, põe-se a lembrar à amiga Lola os muitos bares que frequentou desde menino e as histórias que ele, espécie de Zelig carioca, viveu em 71 anos de vida. Esta é a primeira cena de “Na rotina dos bares”, musical que estreia amanhã no Sesc Ginástico.

— Os bares do Rio, como tantas coisas boas da cidade, estão acabando — diz Antônio Pedro Borges, para quem o papel de Chico é feito sob medida, velho boêmio que é. O Chico de Antônio Pedro tem 71 anos como ele e é, naturalmente, um saudosista. Mas os episódios narrados a Lola são vividos por um Chico mais jovem: Marcos França, autor da ideia e do texto.

— Quando fizemos os musicais sobre Antônio Maria, e Mário Lago, convivi demais com o Rio daqueles tempos — conta. — E me apaixonei. E logo me vi pesquisando fatos e músicas que acabaram servindo de matéria-prima para o musical. O roteiro está pronto há tempos, mas o texto final já foi construído com Antônio Pedro em mente.

Noel, Paulinho e o Zicartola

Chico é um onipresente, que apresentou NO MUSICAL “Na rotina dos bares”, que chega ao Sesc Ginástico, a Ceci no cabaré Apolo, que Antônio Pedro Borges (à direita) é o boêmio Chico, personagem com aura autobiográfica: o diretor, Marcos França, escreveu diálogos pensando nele 9 levou o mesmo Noel para a farra em seu último carnaval (apressando sua morte), que iniciou a vaia a no Cassino da Urca, que provocou o acidente que incendiou o Vogue, que fez de Tom e Vinicius parceiros no Villarino, que apontou a garota de Ipanema para os dois no Veloso, que deu o apelido a no Zicartola, que viu o último show de Dolores Duran no Beco das Garrafas e muito mais. Como diz o personagem:

“O homem que bebe não é propriamente um mentiroso, mas um contador de histórias em tom de exagero”. Essas histórias, perfeito roteiro musical por bares tradicionais do Rio (25 canções, partindo de uma lista inicial feita pelo pesquisador Lauro Gomes), realmente conferem um clima saudosista ao espetáculo, mas a mensagem que se pretende passar vai mais além.

— Ela vai resumida numa frase — antecipa Marcos — É a que Chico, velho, diz antes de cantarmos “Cidade mulher”: “Cidade maravilhosa, por mais que tentem, que se esforcem, não conseguem destruí-la”. Antônio Pedro explica o sobrenome Borges dizendo que há Antônios Pedros demais por aí (”Uma vez, fui convidado para um almoço e, chegando lá, vi que era um evento político para outro, o Índio do Brasil“). Mas o Antônio Pedro certo fala sério e até se inflama quando o assunto é a vida, o espírito da cidade, boemia sadia, que mentes politicamente corretas estão mudando.

Qualquer dia, crê, vão implantar a lei seca nos bares. — Querem mandar na sua vida, proibir tudo — protesta. — Talvez chegue um dia em que se entre num bar apenas para pedir jornal, copo d’água e palito.

Marcos admite que muito do musical é sobre isso: o fim dos bares como ponto de encontro, de conversa entre amigos, seria o mesmo que atingiu o Rio em vários aspecto, de seus monumentos até seus costumes. Ele conta que, por cinco anos, tentou patrocínio para produzir “Na rotina dos bares”. Sem êxito.

— Achavam a ideia interessante, mas se recusavam a colaborar com um espetáculo centrado em bares, falando de chope, uísque, coisas politicamente incorretas. Estou convencido de que foi por isso que custamos tanto a estrear.

No elenco, Sheila Matos é a Lola mais velha, e Letícia Medella, sua versão mais jovem. Os arranjos são de Fábio Nin, que rege os três músicos da banda: Dudu Viana (piano), Tássio Ramos (contrabaixo) e Felipe Cotta (bateria e percussão). O musical fica em cartaz, de quinta a domingo, até 2 de outubro.

FOLHA DE S. PAULO - Beatriz Segall vive conflito de geração em novo espetáculo

Em "Conversando com Mamãe", atriz interpreta viúva desbocada que tenta resolver os problemas do filho

Peça estreia amanhã no Teatro Folha; texto do argentino Santiago Carlos Oves inspirou filme lançado em 2004

GABRIELA MELLÃO DE SÃO PAULO

(1º/9/2011) Em "Conversando com Mamãe", peça que estreia amanhã sob direção de Susana Garcia, Beatriz Segall, 85, encarna a viúva de 82 anos que dá aula de modernidade ao filho Jaime, de 50 anos, interpretado por Herson Capri, 58.

Em cena, está o conflito entre gerações. No primeiro minuto de espetáculo, ela diz um palavrão com a espontaneidade dos jovens mais desbocados, como a avisar o público de que seu visual senhoril não passa de aparência.

"Meu papel é o de uma senhora que foi simplória no começo da sua vida e aprendeu com o tempo, tornando-se uma mulher moderna, de grande sensatez e energia", conta a atriz.

10 A "mamãe" do título surpreende o filho -e o público- não apenas pelo linguajar pouco usual para alguém que, como ela própria diz em cena, "já está mais pra lá do que pra cá" mas também por sua mentalidade aberta, à frente de seu tempo.

Jaime está em crise no casamento e acaba de perder o emprego. Resolve tirar a mãe de seu apartamento para vendê-lo e sanar as dívidas. Aparece para uma visita que nada tem de caridosa: pretende lhe comunicar a decisão.

A mãe limita-se a aconselhá-lo para que se preocupe menos e ame mais: "Se você e a sua mulher fizessem sexo, pensariam menos no apartamento", diz.

A visita se prolonga e gera um resgate tardio do relacionamento entre os dois.

A peça foi escrita pelo argentino Santiago Carlos Oves. Em 2004, ele lançou um filme homônimo, inspirado no texto, com China Zorrilla no papel da mãe e Eduardo Blanco interpretando o filho.

Para Capri, a obra critica com leveza os valores do mundo atual. "O tempo todo a mãe coloca para o filho que o mais importante não é ter o carro do ano ou colocação social, mas cuidar dos afetos, do relacionamento humano."

Segall conta que se surpreendeu com o potencial cômico da história. "Durante os ensaios, nem me passou pela cabeça que a peça pudesse ser engraçada", fala.

Ela e Capri descobriram o humor contido no espetáculo somente no primeiro ensaio corrido. "Técnicos de luz, som e convidados davam gargalhadas. Achamos aquilo incrível", lembra.

O ESTADO DE S. PAULO - À beira-mar

Em Santos, Bienal Sesc de Dança reúne cias. Nacionais e estrangeiras

Maria Eugênia de Menezes

(2/9/2011) Santos converteu-se em um palco imenso. De hoje até a próxima quinta, 33 companhias de dança desembarcam na cidade. É a sétima edição da Bienal Sesc de Dança, que desceu a serra e prevê apresentações em teatros, praças e ruas.

Mesmo diante de oferta tão vasta, não é difícil pinçar os espetáculos que merecem o esforço de pegar a estrada às vésperas do feriado. A encabeçar a lista está Primero - Erscht, uma criação da cia. Les Ballets C de La B. Ainda que não carregue a assinatura do incensado Alain Platel, a obra tem as marcas que fizeram a fama do grupo belga fundado em 1984.

Na coreografia de Lisi Estaras, a crítica estrangeira encontrou o mesmo traço inovador, a mesma maneira de usar a emoção como disparador de movimentos.

A peça, que abre a programação e volta à cena amanhã, mira a potência das primeiras sensações: a primeira vez em que andamos, contamos uma mentira ou trocamos um beijo.

Inevitavelmente, também é de memória - e de infância - que fala esse trabalho. Em um idílico gramado verde, cinco intérpretes tematizam a lembrança que guardam dessas descobertas. A forma como elas nos marcam e como as reinventamos ao longo do tempo.

Outra montagem que merece um olhar cuidadoso é Pudique Acide/Extasis. Concebido pela francesa Mathilde Monnier, o trabalho é uma recriação de dois de seus espetáculos antigos. O primeiro estreou

11 em Nova York, em 1984. O segundo veio a público no ano seguinte, em Lyon. Em ambos, a diretora do centro coreográfico de Montpellier atua ao lado de Jean-François Durore. Em evidência, surgem suas reflexões acerca da sexualidade.

A completar a grade internacional, despontam Luis Garay & Co. Buenos Aires - grupo argentino conduzido pelo colombiano Luis Garay - e a bailarina Germaine Acogny, do Senegal, Os uruguaios do grupo La Casa também aparecem com a intervenção Siredia.

Em casa. Na seleção brasileira, há trabalhos de destaque, mesmo entre aqueles que excedem o eixo criativo do Sudeste. Dividido entre a Holanda e o Piauí, o coreógrafo Marcelo Evelin está escalado com Matadouro. Serão oito os Estados representados na mostra.

Algumas estreias estão previstas. Dedicada às plateias infantis, a paulistana Cia. Druw mostra seu novo espetáculo: Girassóis. As telas de Vincent Van Gogh são fonte de inspiração para a diretora Miriam Druwe.

Outra opção para o público é reencontrar obras que já estiveram em cartaz em São Paulo. Caso de Vestígios, de Marta Soares. Ou do diálogo entre dança e música proposto pela bailarina Morena Nascimento e pelo pianista Benjamin Taubkin.

Novo formato. Uma das principais diferenças desta edição em relação às anteriores é a ausência de um recorte temático, explica Juliano de Azevedo, da Gerência de Ação Cultural do Sesc. "Essa opção deu um pouco mais de liberdade ao curadores, que conseguiram abarcar vários aspectos próprios da dança contemporânea." É assim que traços como permanência e territorialidade poderão ser vistos em várias das coreografias selecionadas.

Outra novidade neste ano é o uso de diversos espaços. Com uma grade mais encorpada, além do teatro do Sesc, três salas de espetáculo também passaram a integrar o circuito.

Tal expansão inspira-se, conta Azevedo, no Mirada - o Festival de Teatro Iberoamericano que a cidade portuária acolheu em 2010. Serão repetidas, inclusive, algumas experiências da mostra teatral. Entre elas, uma rede de intercâmbio entre os criadores e transporte gratuito partindo da capital paulista.

Espaços públicos de Santos, tais como a rodoviária e um posto do Poupatempo, também serão contemplados. "Queremos nos apropriar mais do espaço urbano", comenta Azevedo.

Lugares centrais e periféricos, recebem intervenções e instalações, como 100 Lugares para Dançar. Criada especialmente para esta edição da Bienal, a obra da cia. Quintos é uma videoinstalação composta por uma centena de minifilmes. Em cada um deles, exploram-se as possibilidades de a dança ocupar locais diversos da cidade. Há improvisos dos bailarinos participantes, mas também uma abertura para o imprevisto. Cenas nas quais anônimos foram registrados em manifestações espontâneas.

Estão prevista ainda uma série de atividades de formação, como palestras e workshops.

CORREIO BRAZILIENSE - É de todo mundo

A edição de 2011 do Cena Contemporânea atinge a maior visibilidade e amplia o caráter internacional com o intercâmbio de gestores estrangeiros

Mariana Moreira

(6/9/2011) - Nos últimos dias, a pergunta “vai rolar alguma coisa no museu?” tem sido postada recorrentemente no perfil de Guilherme Reis do Facebook. Para o organizador do Cena Contemporânea, essa foi a edição de maior visibilidade do festival, impulsionada pelo rebuliço das redes sociais. “A cada ano, sinto que a cidade acolhe o Cena de forma crescente. Menos gente me pergunta o que é o festival. Meu termômetro: quando não é mais nosso, é de todo mundo”, avalia.

12 Além de oferecer 75 apresentações de 33 espetáculos ao longo de 13 dias, o Cena Contemporânea ganhou a faceta mais internacional. Foi intenso o intercâmbio entre gestores de teatro e organizadores de festival de vários lugares do mundo. Pela primeira vez, houve um espaço para que os artistas locais pudessem divulgar o trabalho para realizadores estrangeiros. Segundo Reis, alguns já acertam a participação em mostras internacionais. “Recebemos pela primeira vez uma residência estrangeira. Um fotógrafo inglês faz uma viagem pela América do Sul, fotografando bailarinos, e a parada brasileira foi no Cena. Reunimos nomes importantes da dança para esse trabalho”, conta Mariana Soares, coordenadora de relações internacionais do festival.

A empolgação com o Cena não é exclusividade da equipe que o organiza. Há quem acompanhe o calendário à espera do intensivão de teatro que todo ano toma conta de Brasília. “O Cena tinha que durar o ano todo ou, pelo menos, todo o período de seca. Esse festival desperta a participação popular e dissemina a cultura”, destaca a consultora Denise Mafra, 53 anos, que viu dois espetáculos da programação. A atriz Alana Ferrigno, 27 anos, foi a sete peças, conferiu as noitadas de música no museu e participou de diversos debates e oficinas. “As pessoas poderiam aproveitar mais essas oportunidades. Houve debates legais, porém vazios”, lamenta.

Faltaram ingressos

Durante os 13 dias de teatro na veia, muita gente teve dificuldade para comprar ingressos. As longas filas e as sessões lotadas irritaram quem queria usufruir da programação. “Essa é uma área difícil de gerir. Não basta a nossa organização, é preciso se relacionar com cada bilheteria”, afirma o organizador. A alternativa é se precaver e comprar com antecedência para evitar disputas de última hora. Guilherme Reis garante que a cota destinada aos patrocinadores não interfere nessa oferta. “O maior patrocinador recebeu menos de 4% do total de ingressos”, esclarece.

Antes mesmo de repor as energias após uma festança cênica de dimensões tão grandiosas, Reis pensa na programação do ano que vem, totalmente dedicada ao cenário teatral na América Latina e na África. Em outubro, ele fará uma viagem para o México, a Argentina e o Uruguai em busca de novidades.

As negociações com embaixadas e redes de realizadores culturais estão a todo vapor. “Quero trazer, por exemplo, a África francesa, além de grupos jovens da América Latina, que fazem uma mistura de salsa, cúmbia e hip-hop”, cita.

A fase é de pesquisa, mas as atrações só serão confirmadas entre janeiro e fevereiro do ano que vem. A ideia é antecipar um pouco a próxima edição, que deverá se realizar entre 17 e 29 de julho. ARTES PLÁSTICAS

FOLHA DE S. PAULO - Artista reduz ideia de luz a pedra sólida

Em mostra aberta ontem, Iran do Espírito Santo cria luminárias em mármore polido e constrói jogo de espelhos

Ele também cria um grande degradê de 55 tons de cinza numa das paredes do subsolo da galeria Fortes Vilaça

DE SÃO PAULO

(1º/9/2011) Iran do Espírito Santo quer uma luz densa como mármore. No lugar de um raio veloz ou qualquer experiência diáfana, o artista concentra a ideia de luminosidade em objetos carregados de peso, polidos e lustrados para iludir.

Escultura do artista plástico Iran do Espírito Santo, 13 em mostra na galeria Fortes Vilaça Na mostra que abriu ontem na galeria Fortes Vilaça, Espírito Santo recria em mármore sólido as tradicionais formas dos globos de luz encontrados em casas antigas.

Estão dispostos, todos brancos, numa mesa também branca no fundo de uma sala vazia. É como se jogasse o teto para baixo e tornasse o foco de luz em objeto de escrutínio, na altura do olhar.

"Faço uma apropriação direta dos globos, mas ao mesmo tempo existe uma correção das imperfeições", diz Espírito Santo. "Estou lidando com uma ratificação da luz."

No caso, ele reproduz à perfeição as formas desses globos em esculturas, mas camufla a dinâmica artesanal sob a casca de um objeto feito em massa pela indústria.

É nesse ponto que o artista subverte a herança minimalista que parece moldar sua obra, tomando distância das fórmulas prontas e privilegiando o acaso do artesão.

No andar debaixo, Espírito Santo usa 55 tons de cinza que desenvolveu no ateliê para criar na parede um degradê milimétrico, simulando a incidência de uma luz clínica e calculada no espaço.

Três anos atrás, ele criou na mesma galeria listras nos mesmos tons de cinza, mergulhando o espaço numa reverberação artificial de luz.

Ele acentua agora esse impacto com um jogo de espelhos espalhados pelo subsolo da galeria, que quebram e ao mesmo tempo multiplicam o efeito desse degradê.

"Tem um pouco mais de ruído", diz o artista. "Há uma decomposição da luz criada pelos espelhos e também uma ruptura com essa sombra pintada."

Espírito Santo, que se diz um "control freak", no fim calculou tudo para ser só isso: uma espécie de luz materializada.

O ESTADO DE S. PAULO - O homem que pintou o mundo

As memórias do pernambucano Cícero Dias vão da casa-grande aos bares de

Antonio Gonçalves Filho

(2/9/2011) Ao morrer, em 2003, dois meses antes de completar 96 anos, o pintor pernambucano Cícero Dias deixou inacabado um despretensioso caderno de anotações. Essa autobiografia nada precoce, escrita no inverno de sua existência, é um documento vigoroso sobre um período barulhento da história mundial, que vai da explosão do modernismo, na década de 1920, ao crepúsculo da ocupação nazista nos anos 1940. Dias foi testemunha privilegiada dos dois, ocupando o centro desse palco, Paris, onde conviveu com os maiores nomes da cultura europeia, entre eles Picasso. Era seu projeto antigo o de produzir esse relato autobiográfico, mas Dias estava tão ocupado em pintar e viver que escrever ficou para trás. Pena. O livro agora lançado, Eu Vi o Mundo, comprova que o pintor poderia ter sido também grande poeta. Seu amigo Picasso achava o mesmo, garante o autor do posfácio, o jornalista Mario Helio Gomes, que convenceu a mulher de Cícero Dias, a francesa Raymonde, de 94 anos, a concluir essas memórias e assinar sua parte final.

O título do livro corresponde à metade do histórico painel do pintor, Eu Vi o Mundo... Ele Começava no Recife (1928), afresco monumental que traduz, de maneira sintética, o sentimento desse artista cosmopolita ligado umbilicalmente ao Brasil. Fragmentado como a ordem composicional de suas telas cubistas e atemporal como convém a um surrealista de primeira hora, Dias abre o livro traduzindo em palavras esse amor pela terra natal. Nele, passado e presente se confundem, tornando eterno o gosto do caju da infância no engenho Jundiá, em Escada, Pernambuco, onde o menino Cícero corria atrás de cana e cajá, tonto como uma palmeira ao vento. Dito assim, parece que tudo era felicidade no engenho pernambucano. Mas não. A tragédia o perseguia.

O pintor conta como sofria com o cheiro de santidade da casa-grande, massacrado pelo peso do manto violeta do ensanguentado Senhor dos Passos. Não é de estranhar que ele buscasse na pintura

14 uma contrapartida cromática para os dramas de Jundiá, onde a mística dona Chiquinha, parente do pai, enforcou-se com os cordões de um frade, na mesma casa onde o avô barão foi cercado por cangaceiros. As histórias de Cícero são tantas que poderiam facilmente ter rendido uma nova versão de Menino de Engenho segundo a aristocracia da Zona da Mata, se ele não fosse amigo de José Lins do Rego. Uma, em particular, teria valido a pena ler com mais detalhes, a da passagem da Coluna Prestes pelos engenhos da família, enquanto Maria Bernarda, bisneta de escravos que criou Cícero, rezava para o "cavaleiro da Esperança" abandonar o comunismo.

Se há um memorialista que vem de imediato à lembrança quando se lê Cícero Dias, esse é o mineiro Pedro Nava. É possível sentir o cheiro de incenso e ouvir a agonia das vozes votivas grudadas aos móveis da casa-grande como os objetos de culto que assustavam o garoto. A pintura de Cícero é toda ela um esforço para escapar da fraca luz das lamparinas de Jundiá e viajar nas cores sensuais da Escola de Paris. O pai se conformou com a escolha do filho. Mandou o garoto para o Rio, mas a Escola de Belas-Artes foi rejeitada pelo rebelde - que insistia, além de tudo, em manter seus livros de anatomia artística no colégio dos padres beneditinos onde estudava.

Para alguns familiares, ele virou um renegado, até que Mário de Andrade, aconselhado por Manuel Bandeira, aparecesse em Pernambuco e visitasse sua primeira exposição, após errar com o pintor pelas várzeas canavieiras - o escritor foi levado num arcaico Ford que resolveu enguiçar. Não há muito espaço para discutir o papel do modernismo paulistano no primeiro capítulo dessa longa história que se confunde com a própria modernidade no mundo. No Rio, Cícero Dias seria adotado por Di Cavalcanti. Em Paris, por ninguém menos que seu compadre Picasso. Ainda no Rio, Villa- Lobos mandou que ele aprendesse cenografia para assinar o telão de um balé de Serge Lifar.

As condições materiais do Brasil modernista, mergulhado no arcaísmo técnico, porém, pesavam. Quando estava às voltas com o painel Eu Vi o Mundo..., o pintor enfrentou sérias dificuldades para executar o afresco. Com um repertório boschiano na cabeça, que ia da escada de Jacó a 11 mil virgens impacientes, Cícero não encontrava tintas nem pincéis certos para seu resumo do mundo nos anos 1920, sendo obrigado a se conformar com uma precária bobina de papel kraft. Não importava tanto, afinal. O pintor não faria uma obra de escândalo. Queria apenas "trazer para a pintura o sentimento popular do Nordeste", como Chagall ao transplantar a alma das aldeias russas para as telas - eles, aliás, se tornariam amigos e, curioso, foi mesmo o pintor russo que convenceu Picasso a conservar Guernica em preto e branco (Cícero estava presente no ateliê da Rue des Grands- Augustins na histórica cena).

15 A França seria a segunda pátria de Cícero Dias. Um dos motivos de sua partida para Paris foi a polícia de Getúlio Vargas, que periodicamente invadia seu ateliê no Rio em busca de panfletos da Liga Sindical, frequentada por ele e os amigos Gilberto Freyre e Di Cavalcanti. Casa-Grande & Senzala (ilustrado por Cícero em 1933), conta o pintor, estava ameaçada de terminar na fogueira pela ditadura do Estado Novo - ele não cansa de comparar Vargas aos nazistas.

A parte conclusiva dessas memórias chega até o episódio da convocação para o pintor comparecer à polícia parisiense, em abril de 1941, por conviver com insurgentes espanhóis e membros da Resistência. Seu amigo, o embaixador Souza Dantas transformou-o, então, em funcionário do governo brasileiro para garantir certa imunidade ao pintor. Um ano depois, ele se encontraria com a amada Raymonde em Portugal. Mesmo sem falar uma palavra de português, ela e Cícero resolveram casar lá mesmo. O resto da história é Raymonde quem conta. E é bom não perder. Só um aperitivo: ela revela como Calder, que tinha quase 2 metros, dançou com o pequenino Miró num jantar em sua casa.

ESTADO DE MINAS - Ver para crer

Quinta edição do Festival de Arte Digital, em cartaz no Museu Inimá de Paula, inspira-se na cinética. Onze instalações em diversas linguagens exploram possibilidades do movimento

Carolina Braga

A instalação audiovisual Timelandscape woolrhytms, da artista paulista Juliana Mori, pode ser conferida até 2 de outubro

(2/9/2011) O nome é complicado: ciclorritmoscópio. Mas o inventor garante: a máquina é muito mais simples do que pode parecer. “Trata-se de um carrinho ambulante para fazer intervenções audiovisuais na rua”, explica Aruan Mattos. Quem ficou curioso para ver isso funcionar pode conferir hoje, às 20h, no Museu Inimá de Paula. Criado em parceria com Flavia Regaldo, o ciclorritmoscópio é uma das performances que integram a programação desta noite do Festival de Arte Digital (FAD).

Até 2 de outubro, o evento promete explorar as interfaces da cinética e do digital. Vinte e uma produções transitam entre quatro programas específicos. Serão oito performances, quatro debates e cinco oficinas, além de 11 instalações audiovisuais interativas. “Sempre escolhemos coisas que tenham participação do público”, diz Aruan.

16 O movimento é a base das obras que ocupam o terceiro andar do Museu Inimá de Paula. Uma das novidades deste ano é que o festival terá um tema predominante. Seguindo exemplo de eventos de outras áreas, como cinema e artes plásticas, Henrique Roscoe, um dos idealizadores, percebeu que o FAD, ao completar cinco anos, precisava propor recortes em sua programação. Assim surgiu o tema cinética. “Escolhemos a cinética pela pluralidade de formas. Arte digital sempre traz novas visões para temas que já foram trabalhados”, explica.

Apesar de se tratar de área bastante experimental, Henrique Roscoe identifica padrões entre as produções escolhidas. “Muita gente trabalha com música visual, que é a sincronia entre música e imagem. Outro padrão que identifiquei foi a construção de objetos”, comenta.

As performances de hoje são exemplo disso. O carrinho do ciclorritmoscópio é formado por várias engrenagens que produzem ações. “Parado, ele não tem sentido. Deve ser visto enquanto movimento”, explica Aruan. Dínamos de biclicleta em movimento, por exemplo, colocam projeto de slides em funcionamento. Ao mesmo tempo, o som gerado a partir de um tambor de caminhão ligado a um vibrafone complementa a performance. É como se fosse uma caixa de música. Além dele, integram a programação Jardim das gambiarras chinesas, do Duo N-1, e a italiana Do you sync, dedicada a ruídos minimalistas.

ISTO É – Romântico, com peso

O pintor Rodrigo Andrade resgata o elemento soturno do romantismo, em imagens noturnas e muita densidade de tintas

Nina Gazire

(7/9/2011) Recuperar a tradição figurativa da pintura romântica em pleno século XXI. Esse foi, em parte, o objetivo do pintor Rodrigo Andrade na sua série de paisagens noturnas denominada “Velha Ponte de Pedra e Outras Pinturas”. O artista apresenta oito obras inéditas, dando continuidade à temática iniciada com a série “Matéria Noturna”, apresentada na 29ª Bienal de São Paulo. “São cenas ou, talvez, situações atemporais por serem imagens de pontes velhas. As pontes são muito pitorescas e propícias para a pintura. São temas supertradicionais e ao mesmo tempo muito vulgares. Você encontra em diferentes períodos da pintura, BUCÓLICO Rodrigo Andrade foi buscar na Escócia inspiração para suas paisagens principalmente no romantismo”, explica.

Para pintar as pontes de pedra, fotografadas durante uma viagem à Escócia, Andrade resolveu fazer também sua própria ponte entre duas tradições distintas da figuração ao unir fotografia e pintura na produção das imagens. Depois de projetar fotografias das pontes sobre as telas de grandes dimensões – algumas com até quatro metros de comprimento –, o artista criava uma máscara com a imagem da foto, onde posteriormente aplicava a tinta a óleo. Essa técnica dá ao trabalho uma consistência material significativa, que transparece nas paisagens. Cada tela possui imponentes 50 quilos de tinta. “Nessas pinturas acontece esse movimento duplo: a perspectiva e a ilusão do figurativo te levam para dentro, enquanto a materialidade te expulsa do espaço da pintura”, comenta Rodrigo Andrade, que também compara as cenas noturnas às mise-en-scènes dos filmes de David Lynch. “Resgato essa ilusão do cinema dando uma espacialidade interna ao trabalho. Elas parecem

17 um filme do David Lynch por causa do aspecto soturno e escuro das imagens”, diz o artista, que começou a trajetória nos anos 80 com uma linguagem expressionista, e passou boa parte dos anos 2000 envolvido em uma pesquisa com o peso e a presença matérica das tintas no espaço.

FOTOGRAFIA

O GLOBO - O Brasil em paisagens panorâmicas

Exposição reúne a partir de hoje 312 obras que detalham o país de 1820 a 1920

(3/9/2011) Com abertura hoje, às 16h, a mostra “Panoramas: a paisagem brasileira no acervo do Instituto Moreira Salles” esmiúça a representação visual do país entre 1820 e 1920 e traz ao tempo presente um entretenimento criado no fim do século XVIII. O objetivo é levar o público a reviver a experiência das rotundas com panorâmicas, edifícios de forma cilíndrica que atraíam multidões na Europa para ver detalhes de gravuras e pinturas em 360 graus.

— A primeira panorâmica em rotundas foi em Londres em 1798. Depois, várias cidades fizeram as suas. Elas eram uma atração com força semelhante ao cinema hoje em dia — explica Carlos Martins, consultor de iconografia brasileira do IMS, que divide a curadoria da mostra com Sergio Burgi, coordenador de fotografia do instituto.

Rotunda cenográfica

Não à toa, um dos grandes momentos da mostra é a reconstituição cenográfica de uma rotunda. A imagem estampada nela , do pintor francês Félix Émile Taunay, é considerada a primeira representação do Brasil na Europa numa dessas estruturas. Foi em Paris, em 1824, dois anos após a proclamação da independência, que a obra de Taunay foi exposta em Montmartre. O arquiteto e historiador Nireu Cavalcanti explica a técnica usada pelo artista:

— A imagem foi feita no Morro do Castelo e, a Botafogo, em foto feita por Marc Ferrez em 1875 partir de diferentes posições, Taunay foi retratando ângulos que resultaram num quadro com logradouros do próprio Morro do Castelo, a Baía de Guanabara e vários outros detalhes do Centro. A panorâmica dele é basicamente da região urbana do Rio, diferentemente das de outros que mostraram mais a paisagem. O espírito panorâmico também baixa em outra sala do Moreira Salles, na qual uma tela de três metros de altura por 15 metros de comprimento, em formato semicircular, recebe projeções sequenciais de 15 panoramas do Rio, entre fotos e gravuras.

Ao todo, a mostra conta com 312 obras, entre fotografias, desenhos e gravuras, pontuadas basicamente por três acontecimentos históricos: a invenção da litografia, no fim do século XVIII; o surgimento da fotografia, em 1839; e a vinda de artistas para o país a partir da chegada da Corte portuguesa, em 1808. No material destacam-se obras dos alemães Rugendas e Von Martius e do inglês Charles Landseer, entre outros. Sergio Burgi explica que o Rio teve grande relevância nesse contexto.

— Por ser a capital do Império, a cidade atraiu muitos artistas. De todo o acervo de Marc Ferrez, por exemplo, metade das fotos é do Rio — ele diz, lembrando que, ainda assim, outras cidades brasileiras também têm espaço na mostra, como Salvador, Recife, Olinda e São Paulo, Santos, Mariana e Ouro Preto. Uma sala foi reservada para exibir as técnicas de registro iconográfico e litográfico do século XIX. Equipamentos de Marc Ferrez são uma atração à parte.

18 MÚSICA

O ESTADO DE S. PAULO - Desde que o samba é samba

Enquanto Teresa Cristina faz incursões por outros ritmos, novas vozes se lançam em CD

Roberta Pennafort / RIO

(1º/9/2011) Residente nas casas de samba há 13 anos, desde que a Lapa ainda não era a Lapa - ou não tinha voltado a ser -, Teresa Cristina vem frequentando outros ritmos. Desde o início de 2011, junta-se à banda de rock Os Outros para recriar clássicos de Roberto Carlos. Em agosto, a garota da Vila da Penha foi vista num banquinho cantando bossa nova com Roberto Menescal em Ipanema.

"Falaram um monte de bobagem, que eu não queria saber mais do samba, que só queria ganhar dinheiro. Mas minha mãe ficou numa euforia... E para quem luta contra a timidez é bom demais fazer rock", conta Teresa, que tem 43 anos e sempre foi a companheira de Dona Hilda nas audições dos antigos LPs do Rei. "Gosto de muita coisa, não sou um ET. Bossa nova, para mim, é samba lento, de apartamento. Adorei o Menescal, que é incrível, humilde,sem pose nenhuma."

As noites à Nara Leão, em que interpretou pela primeira vez a dupla Menescal & Bôscoli, de Tom, Vinicius e Baden, foram pelo projeto A Bossa do Parentesco. Teresa com Menescal: bossa nova, diz, é Samba, do Oi Futuro Ipanema. Com as guitarras, “samba lento, de apartamento”, não está distante do baixo e bateria d"Os Outros, sua voz tem novo que ela já cantava encontro no dia 24 de setembro, no Rival + Tarde.

E a cantora ainda repisa seu terreno conhecido, no show com sambas de compositores da ao qual também se dedica. É a Candeia - o sambista que a ex-manicure, de gosto musical eclético, ainda hoje fã de Iron Maiden e Van Halen, canta desde as noites primordiais -, que deve dedicar o próximo CD. Será o sétimo da carreira, e deve sair de forma independente Depois de Melhor Assim, o elogiado CD gravado pela EMI ano passado, com o qual ganhou prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Artes, ela decidiu deixar a gravadora, por se sentir desprestigiada, "invisível". A carreira de Melhor Assim, a propósito, continua: os próximos meses serão de viagens pela América do Sul, Angola e Europa.

Novas vozes. Para a geração que chega agora aos estúdios, o momento é outro. É o caso de Roberta Nistra, de 33 anos, e de Joyce Candido, de 28, dois lançamento da Biscoito Fino. Autodidata, Roberta tocou muito cavaquinho e violão com Teresa e o pessoal da Lapa. Está lá desde a adolescência e a revitalização das primeiras casas. Até Zé Keti e Moreira da Silva, que morreram há mais de dez anos, ela acompanhou, além de Jamelão.

Na hora de gravar, chamou os amigos daquelas noites e escolheu sambas e ijexás de composição própria, e de Roque Ferreira, Paulo César Pinheiro, João do Vale. Os cabelos loiros e os olhos verdes confundem os fixados em estereótipos. "Pensam que sou da zona sul, mas venho de Vila Isabel e sempre cantei ijexás. O CD não tem coco, jongo, mas também adoro. Já nasci na religião (candomblé) e sempre quis gravar isso. Caetano e Gil fizeram muito, mas a minha geração vai mais para o samba."

Joyce também andou por palcos da Lapa, mas tem trajetória e repertório diferentes. É do interior paulista, cantou sucessos de Clara Nunes e em barzinhos e morou três anos em Nova York, onde estudou nas escolas da Broadway e participou de rodas de samba. O dinheiro ganho custeou o primeiro CD.

19 Produzido por Alceu Maia, O Bom e o Velho Samba Novo, tem regravações - Deixa a Menina (), Feitio de Oração (Noel Rosa) -, e inéditas, tanto de medalhões quanto de jovens sambistas. Foi Chico, depois de aprovar o CD, quem o recomendou à gravadora. "Foi emocionante e incentivador", diz Joyce. "Sei que é tudo muito difícil, mas tinha que vir cantar no Rio."

O GLOBO - Voz entre a tradição e os ‘Novos tempos’

Luiz Fernando Vianna

(1º/9/2011) Estabelecida há cinco anos como uma das principais vozes da Lapa , Elisa Addor pensou, inicialmente, num primeiro CD solo cheio de sambas já existentes. Assumiria, então, a imagem que mais se conhece da música do bairro, em cujas casas noturnas é incomum ouvir inéditas. — Sempre quis fazer um disco de regravações de músicas que achasse importantes — recorda ela. — Mas, com o tempo, fui conhecendo outras pessoas, comecei a compor, percebi como é caro, sem o apoio de um selo maior, gravar apenas autores conhecidos, e tudo isso pesou para a mudança.

Batizado significativamente de “Novos tempos” (“Mas esta música é um samba de gafieira, relativamente tradicional”, ressalva ela), o CD que Elisa lança hoje, às 19h30m, em show no Rival, tem seis regravações e sete faixas originais. A cantora ainda optou por não se restringir ao samba.

Rock, forró, bossa nova

“Sorrir e cantar como Bahia”, que Moraes Moreira e Galvão fizeram nos Novos Baianos, Elisa interpreta desde os tempos de colégio, quando tinha uma Elisa Addor une regravações e inéditas em CD que lança hoje no Rival banda de rock, a La Carabina — Moraes autorizou a regravação e ainda lhe deu a inédita “Tia Ciata”.

“Roendo a unha” (/ Luiz Ramalho) é do repertório do grupo Forrozeando, que ela integrou. “Bala de rima”, de sua professora de canto e música Beth Albano (em parceria com Suely Mesquita), é em compasso de samba, mas na seara da bossa nova.

— Quero ter liberdade. Se quiser fazer um CD de fado, vou fazer — afirma Elisa, ressaltando que “o repertório acabou ficando totalmente afetivo”.

Ela também se refere a canções que já estão ligadas à sua vida há bastante tempo, como “Nasci para sonhar e cantar” (/Delcio Carvalho), o ijexá “De amor é bom” (João Nogueira/ Edil Pacheco) e “Mar de Copacabana”, samba de que cantava à frente da Orquestra Guanabara. Como se vê, Elisa tem vários conjuntos na sua trajetória, casos do Cana de Litro e do Escangalha a Maçaneta, com os quais continua se apresentando. Desta turma mais nova pinçou “Por isso Mangueira” (Rafael dos Santos) e duas do produtor do CD, Edu Krieger: “Alguém que chora” e a faixa-título (parceria com Marcelo Caldi). E inseriu criações próprias: “Janaína” e “Deixa falar” (feita com seu professor de violão, Valmyr de Oliveira).

— Componho de forma esporádica, tenho umas 15 músicas. Quando vem alguma inspiração, tento fazer. Mas não é o meu ofício. Logo, corro um certo risco — diz ela, afinada com uma tendência das novas intérpretes.

A carioca Elisa tem 29 anos e músicos amadores na árvore genealógica, como a avó pianista que conheceu Pixinguinha. Chegou ao 7o- período do bacharelado em MPB na Uni-Rio, mas concluiu apenas a faculdade de Musicoterapia, tendo estagiado no Instituto Nacional do Câncer. Hoje, dedica-

20 se somente à carreira de cantora, que ela planeja ver para além da Lapa: — Estou com esse repertório novo para mostrar e sonho ir a lugares diferentes. Vou continuar no Semente (casa noturna do bairro), mas quero conciliar com meu momento de transformação.

CORREIO BRAZILIENSE - Revelação brasiliense

Mariana Moreira Fernanda Cabral lança o primeiro disco, Praianos, hoje, no Museu da República

(1º/9/2011) A cantora Fernanda Cabral nasceu em Brasília, foi criada entre o Planalto Central e a Paraíba, mas fincou raízes em Madri, há 14 anos. Ela chegou à capital espanhola para fazer uma pós-graduação em artes cênicas, depois de uma graduação realizada na Universidade de Brasília (UnB), mas, durante o processo, as portas de seu sonho se abriram: os convites para cantar se multiplicaram e ela passou a frequentar as principais salas de show da cidade. Desde então, já girou continentes para se apresentar e estreitou seus laços com artistas brasileiros. Seu primeiro disco, Praianos, que será lançado hoje, às 22h30, na Praça do Museu Nacional da República, dentro da programação do Festival Cena Contemporânea, é um resultado dessas múltiplas facetas.

Todo cantado em português, que a artista considera seu “idioma emocional”, Praianos mistura baiões, parcerias com Chico César, (que divide com Fernanda a faixa título do disco), e a textura eletrônica do pianista Cope Gutiérrez, expert em sintetizadores. “Compus essa música em Portugal, foi uma conexão com o Brasil. O disco fala sobre o Oceano Atlântico como elemento que une e separa”, afirma. Além das canções compostas com o cantor paraibano, Fernanda incluiu no trabalho parcerias com a mãe, Elisa Cabral, com Laurita Caldas e com Leo Minax, brasileiro também radicado na Espanha, que já compôs com o uruguaio Jorge Drexler. No repertório, uma homenagem à cidade: Horizontes foi composta para ser um tributo ao que Tom Jobim chamou de “mar”de Brasília. “Em Brasília, a gente está sempre buscando o mar. O céu é tão infinito que existe essa sensação de conexão, de se aproximar do mar”, reflete.

O show ganhou a direção da russa Irina Kouberskaya, do Teatro Tribueñe, onde a cantora exercita sua outra faceta, a de atriz. “Cada canção está trabalhada num estado de ânimo diferente, os gestos trabalham os sentimentos e o resultado é que se escuta a música entrando em contato com a interpretação”, afirma.

Experiência visual Apesar de ser graduada em teatro, Fernanda só participou de uma montagem na cidade: Frida, dirigida por Hugo Rodas. “Foi meu trabalho de diplomação e fez bastante sucesso. Acho que foi por ele que consegui a minha bolsa de pós-graduação na Espanha”, destaca a cantora/atriz, que surgiu nos palcos madrilenhos pelas mãos da companhia de teatro para bebês La casa incierta, com a também brasiliense Clarice Cardell.

A carreira deslanchou depois de compor a música Mar, em parceria com a banda espanhola Wagon Cookin’. A faixa virou hit, ganhou videoclipe na MTV, ganhou releituras de DJs renomados, rendeu direitos autorais suficientes para que ela se sustentasse, além de garantir apresentações em festivais mundo afora, e até mesmo no Blue Note de Tóquio.

Nos últimos anos, a cantora dividiu o palco com nomes como Pedro Guerra, Rainer Trüby e Zezo Ribeiro. Está na reta final de uma turnê, que já dura dois anos, ao lado do músico galego Carlos Núñez: “Minha intenção é estar mais aqui do que lá no próximo ano”, avisa.

21 Três perguntas - Fernanda Cabral

Como começou sua parceria com Chico César?

Minha mãe é cineasta, fez concurso para ser professora universitária na Paraíba e Chico César foi aluno dela. Desde pequena, ele tinha essa relação de ir em casa. Minha mãe também toca sax, então sempre tinha músicos em casa e ele estava por lá. Depois, ficamos mais de 10 anos sem ter contato. Fui reencontrá-lo na Espanha. Quando me identifiquei como filha da Elisa, ele se deu conta de que não me via desde que eu tinha 14 anos. A partir daí, me convidou para um show que faria no Teatro São Luiz, em Lisboa, e compusemos nossa primeira parceria, Hora H dia D.

Você também foi a única brasiliense a ter sido selecionada para o Rumos Itaú Coletivo. Como tem sido a experiência?

É um projeto interessante, muito aberto a criações. Faço parte de um quarteto, ao lado do Angelo Primon (viola e violão), Denni Pontes (percussão) e do Rafael Piccolotto (sax). Propus e eles aceitaram de fazermos um show cênico e totalmente autoral, sem composições conhecidas. Estamos compondo e criando. No ano que vem, haverá um evento em Brasília, que será uma espécie de ensaio aberto para essa apresentação, que deverá ser realizada até o fim de 2012. Ainda não há uma data.

E a oportunidade de tocar no Cena Contemporânea, como surgiu?

Foi um convite do Guilherme Reis. Há muito tempo eu tinha intenção de participar. Agora, com o disco, foi a oportunidade ideal para fazer o lançamento. O Cena é um festival que não é só de teatro, mas de música e dança, é cênico, como o meu trabalho. Estarei acompanhada do Alfredo Bello, que é baixista e DJ, do Chico Corrêa, que me convidou para uma participação em seu disco e acabou me acompanhando na guitarra e nas programações, do Lucas Vargas, no piano, sintetizador e na sanfona, além do Gustavo Souza, na bateria. Eu faço voz e violão.

O ESTADO DE S. PAULO - Roberto em Jerusalém

O Rei fala de sua volta à Cidade Sagrada pela segunda vez e do concerto na terça

Jotabê Medeiros / JERUSALÉM

(2/9/2011) O vôo 42 da El Al ainda deslizava pela pista do Aeroporto Internacional de São Paulo quando a aeromoça anunciou: "Viaja conosco Roberto Carlos, o Rei da Musica Latina". Na primeira classe, vestindo colete e calça jeans, camisa azul, boné e óculos escuros, Roberto se acomodava ao lado de Dody Sirena, seu empresário, e esperava seu prato de salmão com arroz, iniciando uma viagem que o levaria à famosa Terra Santa - desembocadura até natural para um homem cuja religiosidade e misticismo confundem-se com a bem-sucedida carreira.

"Ele ajudou a formar toda uma geração. Amo todas as músicas dele", derretia-se, já quando o avião passava sobre o Mediterrâneo, a argentina Diana Soae, de máquina fotográfica em punho, pedindo para o comissário de bordo da primeira classe uma foto do passageiro famoso. Diana, que viajava na classe econômica, conseguiu, e sua foto passou a ser disputada por alguns dos 20 jornalistas que viajavam a Jerusalém no mesmo avião - um souvenir raro, porque Roberto não circulou nas 14 horas a bordo. "Se você quiser, mando uma foto ampliada para você", prometia a orgulhosa Diana para a moça da revista que viajava ao seu lado. Com Shimon Peres. Roberto Carlos foi recebido pelo presidente de honra de Israel e Prêmio Nobel da Paz, em sua residência no bairro de Talbia

22 Roberto estava em todo lugar. No teaser publicitário da TV de bordo, nos bottoms dos viajantes, que integravam o grupo É Papo Firme (haja música para batizar todos os 1,5 mil brasileiros que irão para lá até segunda-feira). Mas o que chamou a atenção foi o murmúrio, de madrugada, das dezenas e dezenas de viajantes a bordo rezando durante duas horas consecutivas. Depois da reza, um judeu ortodoxo foi até a poltrona onde Roberto estava para tirar uma foto com ele, outro souvenir que virou ouro a bordo.

"Estou indo a Jerusalém para turismo religioso, mas assim que soube que ele vai estar lá, fiquei doida para ir ao show", contou Liliana Nascimento, paulistana do Bom Retiro. "O problema é que me disseram que, no câmbio negro, o ingresso para o show já está custando US$ 1 mil. Desse jeito não vou chegar nem perto", lamentou Liliana. "Acho que vai ser um momento mágico. O que eu espero de tudo isso é magia", afirmou o diretor de TV Jaime Monjardim, também presente no voo. Monjardim vai filmar o especial do Rei na Cidade Sagrada.

No aeroporto Ben Gurion, em Tel-Aviv, o agente da alfândega também demonstrou curiosidade com aquele monte de gente chegando para ver um cantor. "Ele é muito famoso na América Latina?", perguntou. "O mais famoso", respondeu alguém. Colunistas como Joyce Pascowitch e Joaquim Ferreira dos Santos, de O Globo, estavam na comitiva. A caminho, estão Regina Casé, Bia Aydar, os filhos de Roberto (Luciana e Dudu), a ex-sogra do Rei (mãe de Maria Rita), a jornalista Glória Maria e até a namorada de Roberto. O quê? Namorada? Bom, esse é só um rumor, um "bafo" que acompanha o cantor desde que a mulher morreu, mas ninguém confirma, ninguém revela nada, como de hábito.

Já em terra, o guia do ônibus, Iuval, argentino de Bariloche, mostrava-se paramentado e preparado para o show. "Quero ouvi-lo cantando especialmente uma música: Jesus Cristo. Aqui, em Jerusalém, vai ser de arrepiar", afirmou. Iuval terá suas preces atendidas: o cantor garantiu, no repertório, ao menos três de seus clássicos religiosos: Ave-Maria, A Montanha e Jesus Cristo. Não sabe, entretanto, se cantará algo em hebraico - além do problema de não poder ferir suscetibilidades de parte a parte, entre palestinos e judeus, ele disse que precisava decorar a letra para não ficar lendo o teleprompter o tempo todo.

O show de Roberto no anfiteatro Sultan"s Pool será num palco maior do que o que ele montou no show de fim de ano em Copacabana (400 m², ante cerca de 300 m² daquele), com 60 mil watts de som. O cenário mostra os pontos principais de Jerusalém, e deverá ser assistido por 6,5 mil pessoas. Roberto filmará externas para o show da Rede Globo pelas ruas de Jerusalém, a exemplo do que já fizera em sua única vinda à cidade, nos anos 1970, para filmar Roberto Carlos e o Diamante Cor de Rosa. O Especial da Globo será transmitido para 115 países pela Globo Internacional. Desta vez, a profusão de cartazes com o rosto de Roberto e a recepção surpreendeu até mesmo a realeza. "Eu tinha 9 anos quando comecei a cantar, lá em Cachoeiro, e nunca poderia imaginar que chegaria tão longe. Fiquei emocionado quando passei pelos cartazes nas ruas", disse o cantor.

Lá pelas 23 h, no restaurante do hotel King David Citadel, onde Roberto se hospedou, o pianista com quipá tocava sorridente Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, esperando que o hóspede mais célebre descesse para ouvi-lo. Mas Roberto estava surdo naquele momento. "Cheguei e fui dormir. Tava cansado, esse fuso horário...", disse o cantor. "Mas acordei cedo para o encontro com o presidente Shimon Peres".

De fato. Às 11 h, Roberto foi recebido pelo presidente de honra de Israel, o Prêmio Nobel da Paz Peres, de 88 anos, em sua residência no bairro de Talbia. Durante 30 minutos, trocaram cumprimentos mútuos. "Sua voz chegou a Jerusalém antes de seu corpo", disse Peres ao Rei. Roberto (confessadamente com a ajuda de assessores) decorou algumas palavras em hebraico para dizer ao líder. "Shalom aleinu veal koi haglam" (Paz para nós e para todo mundo). E cantou, a capela, Emoções para os presentes, uma canja das mais privilegiadas. Agora, ouvir mais, só na terça-feira.

'Dilma tem lutado para resolver problemas'

Jotabê Medeiros

ENTREVISTA

23 Roberto Carlos, cantor

Vocês estão trazendo 1,5 mil pessoas do Brasil até aqui. Você não ficou preocupado com a segurança do seu público, ao ouvir as notícias sobre conflitos entre Israel e o Hamas?

Com certeza a gente se preocupa. Mas ouvimos as notícias, e os conflitos estão longe de Jerusalém. E a nossa mensagem é, acima de tudo, uma mensagem de paz e de amor. Claro que tive essa preocupação, como todo mundo. Mas o Dody (empresário) me disse: fica tranquilo, tá tudo muito bem, especialmente em Jerusalém. Não fiz nenhum pedido especial (de segurança). Só minha turma mesmo, até os músicos (risos).

Enquanto você prepara o seu disco de inéditas, já lançou três discos. Você ouviu esses discos? O que achou?

Claro, ouvi todos. São todos ótimos. Mesmo compondo com outros compositores, Erasmo é muito bom (risos). A gente tem várias composições junto no meu disco de inéditas, mas tem outras pessoas também, assim como ele tem nos discos dele. Se esse último disco dele, Sexo, é assanhadinho? É MUITO assanhadinho. Muito bom. Erasmo é craquérrimo.

O que você tem achado do governo da presidente Dilma Rousseff?

Ela tá lutando muito para resolver algumas questões. É uma luta grande, a gente tem de colaborar em tudo que puder, para que ela possa fazer o melhor.

CORREIO BRAZILIENSE - Quando o samba é mais samba

Irlam Rocha Lima

Wilson Moreira e comemoram uma parceria de 37 anos com muita música e reverência dos artistas brasileiros

Do encontro entre um agente penitenciário e um advogado, em 1974, no centro do Rio de Janeiro, seria possível esperar várias coisas; menos que dali surgisse uma das mais profícuas e afinadas parcerias da música brasileira. Ao ser apresentado por Délcio Carvalho a Nei Lopes, Wilson Moreira já sabia que acabara de conhecer um exímio letrista.

Nei sorriu quando Délcio (parceiro mais frequente de Dona Ivone Lara) disse que Wilson “colocava melodia até em bula de remédio”. Apresentação feita, imediatamente os dois começaram a compor juntos, e não demorou nada para terem as primeiras músicas gravadas: Leonel, Leonor, por Roberto Ribeiro; e Te segura, na voz de Beth Carvalho.

À época agente lotado no Complexo de Bangu — aposentou-se no começo da década de 1990 —, Wilson compunha com outro nome legendário do samba carioca, o portelense Candeia. Já Nei, além do ofício na área jurídica, atuava como publicitário e fazia música com Reginaldo Bessa. “Embora Leonel, Leonor tenha tocado bastante no rádio, o primeiro grande sucesso da minha parceria com o Nei foi Gostoso veneno, para o qual contribuiu a interpretação de Alcione”, lembra Wilson.

24 Por pertencerem a sociedades autorais diferentes, inicialmente houve uma complicação para que assinassem juntos as composições, como explica Nei, que se valeu de artifício: “As primeiras músicas que compomos juntos, eu assinei como Neizinho, em respeito a ele, que era mais antigo no meio”. Logo depois, isso foi resolvido e os dois entraram para a história da MPB com os nomes com os quais foram batizados.

De tão famosa, a parceria desses dois mestres chegou mesmo a bagunçar a cabeça de Neizinho, filho de Nei e que atualmente integra o grupo DNA do Samba. Certa vez, na escola, ao ser perguntado por uma professora quem eram seus pais, o garoto, de pronto, respondeu: “Sou filho de Wilson Moreira e Nei Lopes”, levando a mestra e os colegas às gargalhadas.

Nem mesmo os dois têm uma noção exata de quantos sambas fizeram. Wilson acredita que ultrapassa fácil a marca de 100; enquanto Nei afirma que “gravadas” são 57, embora haja um grande número de inéditas, registradas em fita cassete e CD demo. Poderia ter bem mais, se a parceria não tivesse sido interrompida, por causa do problema de saúde — um AVC — pelo qual o melodista foi acometido em 1997.

“Há muito tempo a gente não escreve nada juntos, mas a amizade, a consideração e o respeito mútuo permanecem inabalados. Wilson me emociona muito, e acho que a recíproca é verdadeira”, afirma Nei. “Quando compúnhamos, todos os métodos eram possíveis. Eu colocava letra nas melodias dele; ele colocava melodia em minhas letras; Wilson iniciava e eu concluía”, acrescenta.

Senhora liberdade

Cantores de diferentes gerações têm gravado Wilson Moreira e Nei Lopes. Além dos citados Roberto Ribeiro, Beth Carvalho e Alcione, fazem parte da lista Clara Nunes, Zezé Mota, , , Dudu Nobre, Moiséis Marques e até o francês Paul Mauriat. “Um dos maiores sucessos da dupla, Senhora liberdade, gravada por Zezé Mota, tem uma história.

“Originalmente essa música chamava-se Violenta emoção. Ao mostrá-la numa roda de samba na casa do jornalista Sérgio Cabral (pai), o samba foi ouvido por Zezé Mota, que estava escolhendo repertório para um disco. Ela gostou muito e acabou gravando. Mas aí pediu para mudar o título e colocou Senhora liberdade. Resultado, a música se transformou no hino das Diretas Já, cantado nas ruas e nas praças do Brasil”, recorda-se Wilson, orgulhoso.

Reverenciados pelos sambistas da nova geração, que contribuíram para a revitalização do bairro da Lapa, os dois têm recebido várias homenagens nos últimos tempos. A EMI Music relançou o álbum — versão CD — A arte negra de Wilson Moreira e Nei Lopes, gravado em 1980. Para comemorar o evento, em 19 de outubro do ano passado, o Instituto Moreira Salles (IMS) promoveu o reencontro dos parceiros, em show na sede da instituição, no Rio de Janeiro, numa noite memorável. O outro disco lançado pela dupla é O partido muito alto de Moreira e Nei Lopes (1985).

Wilson recentemente teve sua arte celebrada na Academia Brasileira de Letras (ABL), durante show do grupo Samba de Fato. Outra homenagem ele recebeu no Clube Democráticos (Lapa), em meio a uma festa, comandada pelo cantor e compositor Pedro Miranda. O sambista de 74 anos comemora também o lançamento do CD com músicas que gravou com o grupo Baticum, há 20 anos, produzido por Beto e Henrique Cazes.

No último sábado houve a inauguração do Centro Cultural Solar Wilson Moreira, na Praça da Bandeira, criado pela mulher, a pesquisadora Ângela Nenzy. “Estou preparando um outro disco com sambas de terreiro e de enredo, que fiz na Mocidade Independente de Padre Miguel, na Portela e na Quilombo, escolas pelas quais passei”, anuncia Wilson, com entusiasmo.

Como escritor, Nei Lopes, de 69 anos, tem 26 títulos publicados, entre dicionários, romances e livro de contos. “Estou preparando mais um dicionário de história da África, outro romance, escrevendo artigos, dando palestras, fazendo shows, cuidando dos meus orixás e dos meus irmãos mais velhos, paparicando o filho, os netos e minha mulher, tocando a vida, enfim”, celebra o intelectual do samba.

25 CORREIO BRAZILIENSE - Mistura de xote com pop

O cantor Ferrugem, que há 40 anos entoa cocos nas praias de Olinda, lança o segundo CD, no qual interpreta compositores da nova geração e ritmos como o samba de gafieira

Rosualdo Rodrigues

(5/9/2011) - Se alguém chegar ao bairro de Amaro Branco, em Olinda, procurando por Wilson Bispo do Santos, ninguém vai saber quem é. Mas pergunte por Mestre Ferrugem que, com certeza, lhe darão informação. Há 40 anos o mestre entoa cocos na cidade e arredores — talento herdado da família. Além de cantar, Ferrugem não para quieto, anda para tudo quanto é lado do Amaro Branco, mesmo tendo certa dificuldade de locomoção. “Tem hora que chego em um lugar e o povo diz: ‘Mas você não estava em tal canto agora mesmo, e já está aqui?”, diz, aos risos, o magro e carismático senhor de 58 anos, que mora no bairro desde que nasceu.

A inquietação também está nas ideias. De uns tempos para cá, por exemplo, vieram-lhe à cabeça uns pensamentos que o fizeram questionar o caminho que tomou com sua música. “Eu acho, no meu ser, que não sou um cantador, eu sou um cantor. Então tenho que cantar tanto as minhas músicas quanto a dos meus companheiros. Porque uma pessoa, quando é cantor, precisa cantar de tudo”, afirma.

Esse pensamento ajudou o artista a dar cara ao segundo disco. Diferentemente do primeiro — Mestre quando canta, discípulo tem que respeitar, de 2007 —, o álbum que leva apenas o nome do mestre, Ferrugem, inclui músicas de outros compositores e junta ao coco ritmos como samba de gafieira, canção e xote. A ousadia pode até render críticas de ouvintes mais conservadores, mas Ferrugem não se abala: “Essas pessoas dizem que estou querendo sair da minha raiz, mas eu não acho. Acho que fiz a coisa certa, na hora certa. Eu sempre quis ser pop, mas não conseguia”.

Para materializar essa vontade, o mestre contou com ajuda dos amigos Paloma Granjeiro e Pedro Rampazzo, da Sambada Produções, que buscaram nas leis de incentivo à cultura apoio para a realização do CD, e Sergio Caetano (ex-integrante do Mestre Ambrósio), que produziu o disco e trouxe para o repertório compositores de sua geração — a exemplo de Cláudio Rabeca (Sábio pescador), Geraldo Maia (Viés de uma paixão) e Juliano Holanda (Vão). “Eu quis cantar músicas desses meninos para eles saberem que sou intérprete não só de minhas músicas, mas das de qualquer outra pessoa”, afirma Ferrugem — que também não deixou de lançar um olhar ao passado, gravando Forró na gafieira, de Rosil Cavalcanti.

Aliás, se tem uma coisa de que o mestre se gaba é de se dar muito bem com esse pessoal mais novo. “Não tem um dia em que eu saia que não seja abraçado por menino, menina…”, conta ele. Com os músicos todos que estão no CD, Ferrugem tem proximidade. “Menos com o Cláudio Rabeca, que eu não conheço muito”, ressalva.

Batuque

Mestre Ferrugem também considera acintosos esses que mal começaram no batuque e já se intitulam mestres. “Acho chato isso: hoje, menino faz um estagiozinho, bota um ganzá na mão, pega umas baquetas e já toma uma camisa e escreve: ‘Mestre’. Mestre de quê? Eu canto desde os 7 anos de idade. Até os 17, eu só cantava quando meus mestres mandavam. Eu carregava os instrumentos deles. Foi assim que aconteceu e foi uma coisa muito bonita”. Ele lembra que, por essa época, quando completava 17 anos, houve uma festa em que se reuniram nove mestres. “Eu nem sabia que a festa era pra mim. Aí todos cantaram e depois disseram: ‘Cante você agora’. Quando eu cantei, olharam um para o outro e falaram: ‘Esse menino está pronto. Você pode cantar em qualquer canto”’, lembra com orgulho.

“Minha música teve o impulso desses mestres. Mané Farinha, Roxinho… Escrevi um coco muito bonito em que falo de dois deles, Calu Calado e Boquinha de Torreão. Quer que eu cante?”, pergunta ele, durante a entrevista por telefone. “Então grave aí”. Em seguida, canta a música inteirinha, fazendo percussão na mesa, e encerra com uma gargalhada. “Quem escreve uma frase daquela na

26 capa do primeiro CD tem que se garantir”, diz, referindo-se ao título que deu ao disco lançado quatro anos atrás — Mestre quando canta, discípulo tem que respeitar.

Esse, assim como Ferrugem, foi precedido por inquietações. Há tanto tempo cantando, Ferrugem não tinha nenhum disco gravado, mas aí veio um problema de saúde que o fez refletir. “Eu era uma pessoa sadia, apanhei uma enfermidade e parei de andar, perdi o movimento. Mas disse: ‘Peraí, não morri’. Porque eu já cantava. Na beira-mar de Olinda, não tinha quem ganhasse mais dinheiro do que eu. Sempre fui considerado cantor, mas nunca liguei. Chegava numa festa, era convidado pra cantar e passava na frente do cantor. O cara depois vinha me pagar pensando que era eu o artista”, conta.

Apelido de infância Se tivesse oportunidade de gravar mais, material não faltaria para Mestre Ferrugem: “Tenho 219 músicas. Nem todas estão registradas. Mas é muito bonito a pessoa lidar com a verdade e eu não vou deixar ninguém cantar minhas coisas sem minha autorização. Porque esse negócio do coco é uma linha perigosa. Cantor nenhum quer perder sua música pra outro”, diz o mestre, que ganhou o apelido Ferrugem ainda na infância, entre os colegas de escola. “Me botaram apelido de tudo quanto é qualidade, mas só esse pegou. Era porque eu tinha o olho cheio de sarda. Hoje ninguém sabe meu nome, mas pergunte por Mestre Ferrugem que todo mundo sabe quem é”, diz, com admirável bom humor.

O GLOBO - O ritmo aos 70 anos

O baterista e percussionista Robertinho Silva festeja sete décadas com documentário, biografia e três novos discos

Leonardo Lichote

(7/9/2011) Começava baixinho. O garoto empinava as orelhas, atento: tepec-tepec-tepectepec- tepec... Ele aguardava e, instantes depois, vinha: talac-talac- talac-talac-talac...

— O trem mudava o som quando passava em cima do rio, e eu ficava ligado nisso — lembra o baterista e percussionista Robertinho Silva, o garoto que, desde aquele trem, cruzou diferentes fases da história da música brasileira e acompanhou meio mundo da MPB, além de nomes como Wayne Shorter, e que agora, aos 70 anos recém-completados, é tema de documentário, prepara sua biografia, toca com jovens artistas e lança três discos.

Robertinho toca atualmente em palcos que vão de festivais de jazz europeus ao projeto Multiplicidade, ao lado de Donatinho. O documentário da diretora Beth Formaggini registra seu caminho.

— Ela filmou minha mãe com 100 anos, foi à primeira escola em que estudei, lá em Realengo — adianta Robertinho.

Com o jornalista Miguel Sá (filho de Luiz Carlos Sá, do Sá, Rodrix & Guarabyra) ele escreve a biografia “E se minha bateria falasse, hein?”, ainda sem editora:

— Gosto do título, parece que vai contar fofocas. Mas não é isso. Quero dedicar um capítulo inteiro a bateristas que me formaram, fala-se muito pouco deles.

Nos intervalos, Robertinho segue gravando. Lançou recentemente um CD com o Laskamão (grupo que tem

27 ainda Carlos Negreiros, Analimar, Pedro Lima, Guto Goffi, Mario Brother, Robertinho Silva, Orlando Costa e Marcos Esguleba). No forno, estão outros dois, parcerias com o baixista Eduardo Machado e com o violonista Gabriel Improta (com quem tem o duo Cara e Coroa).

O entusiasmo com que fala de cada um dos novos projetos parece ser o mesmo da infância povoada de sons em Realengo (“Naquela época, era zona rural”, conta). Havia o som dos bichos de madrugada, o batuque dos terreiros de umbanda, a pedreira do bairro vizinho, os forrós da hegemônica comunidade nordestina local e o rádio (“‘Cai a tarde/ Tristonha e serena’, era triste ouvir isso na roça”, diz, lembrando a “Ave Maria”, antes de citar a Orquestra Tabajara, Jacob do Bandolim e o programa de ).

— Eu captava aquilo tudo, inocentemente, O único som que detestava era o de porco entrando na faca — conta, com expressão de repulsa. — Até hoje me arrepia.

Cedo, ele descobriu que podia, ele mesmo, produzir sons. Aos 5 anos, pôs um punhado de milho numa lata de fermento Royal e percebeu que tinha ritmo. Foi apoiado nessa batida que, adolescente, conseguiu sua estreia profissional. Sabendo que Jair — um soldado que se destacava na banda militar tocando prato e que era baterista — estava hospedado na pensão da mãe de um amigo, foi lá espiar o rapaz tocando. Jair perguntou: “Você também toca?” Ele mentiu e disse que sim. Sentou na bateria e soltou um baião. O soldado convidou-o a tocar bongô e maraca com uma banda que precisava de um percussionista. Ganhou cem cruzeiros.

— Depois, como a chave dos quartos ficava do lado de fora, eu passei a treinar na bateria do Jair quando ele não estava.

Nos bailes nos quais tocava, Robertinho usava uma bateria do Exército. Até que, movido pelo desejo de comprar uma calça Lee, foi ao Méier (“Lá era o lugar chique, e também o da juventude transviada, da lambreta”) e se deparou com aquela que viria a ser sua primeira bateria.

— Fiquei tristão quando vi o preço da calça. Mas andando pela Dias da Cruz, vi na vitrine da Sears uma bateria e esqueci a calça na mesma hora. Falei com minha mãe, fomos lá, mas ela não tinha o dinheiro todo. Chorei tanto na loja que o vendedor disse: “Vou perder minha comissão mas o garoto vai levar a bateria.”

Dos bailes das zonas Oeste e Norte, Robertinho traçou uma trajetória que espelha a história da música brasileira. Tocou nos dancings do Centro e, em seguida, partiu para Copacabana, o Eldorado dos músicos então.

— Mandei fazer um paletó e fui à boate. O maestro perguntou: “Sabe tocar ‘O homem do braço de ouro’ (tema clássico de striptease)?”. Disse que sim e comecei a tocar para uma mulher tirar a roupa. Pensei: “Copacabana é isso?”

Era mais. Em 1964, ele foi convidado para tocar com Cauby Peixoto na prestigiada Boate Drink. Com o início dos festivais, que via pela TV de vizinhos, Robertinho teve a confirmação do que pensava sobre seu ofício:

— Nunca quis ser ritmista. Queria ser músico. E estudei porque não queria ser humilhado em estúdio pelos caras que diziam que baterista não é músico, é batedor de couro. Quando vi Airto Moreira (na época, no Quarteto Novo) revolucionando a percussão, decidi que meu negócio era a arte de tocar bateria.

Quando o Canecão foi inaugurado, ele fazia parte da banda da casa. Dali ganhou visibilidade, o que gerou convites de músicos como , Marcos Valle, Chico Buarque, e , com quem trabalha há quase 30 anos.

Em 1969, com Miles Davis na cabeça (“Ele ensinou todo mundo a arriscar no escuro”) e contaminado pela atmosfera contracultural do Solar da Fossa (onde morou, em Botafogo), Robertinho abandonou o Canecão sem nada em vista. Passado um tempo, Milton fez o convite que marcaria sua carreira. Estava montando o Som Imaginário, que estreou no Teatro Opinião ao lado do cantor em abril de 1970, Sextafeira da Paixão, e se tornou a maior sensação da música brasileira naquela temporada.

28 — Era moderno pra caramba, todo mundo queria ver aquele show — lembra, comentando a banda que tinha ainda Wagner Tiso, Tavito, Luiz Alves, Frederyko e Zé Rodrix. — Foi minha primeira vez fora da bateria careta. Tinha tímpano, gongo.

Com Milton, ele chegou a Wayne Shorter e Sarah Vaughan. A viagem do trem de Realengo seguia para fora do Brasil, mas também para dentro. Dedicou-se a estudar o folclore nacional e a ensinar percussão e bateria em oficinas e projetos como o bem-sucedido Batucadas Brasileiras. Hoje reflete, tranquilo.

— Aos 70, tem coisas que você deixa de fazer. Estou na terrível luta contra o cigarro — conta. — Já fui o rei da cervejota, 24 horas no ar. Hoje sou carro antigo, rodo só sábado e domingo para mostrar para os amigos. Mas sou vaidoso, não deixo o bicho me pegar. Minha ambição por crescer na música me conserva, a percussão é um remédio.

FOLHA DE S. PAULO - Passado a limpo

Artistas que eram crianças na década de 90 já usam referências daquela geração -como Lenine, Chico César, Zélia Duncan e Cássia Eller- para compor a MPB de 2011

MARCUS PRETO

(7/9/2011) - "Eu me reconheço aqui!" Ao mesmo tempo em que dizia a frase, Lenine lançava o polegar na direção dos cinco novatos no palco. "Eu faço parte desse negócio!"

Aconteceu em junho, no Auditório Ibirapuera (SP). Lotação esgotada para as gravações do DVD do grupo 5 a Seco -projeto que reúne Pedro Viáfora, Pedro Altério, Tó Brandileone, Vinicius Calderoni e Leo Bianchini.

Lenine está certo: faz parte do negócio. Tanto quanto seus colegas de geração: Chico César, Zélia Duncan, Zeca Baleiro, , Paulinho Moska e Cássia Eller.

Com carreiras individuais correndo em paralelo ao grupo, os cinco do 5 a Seco fazem parte de uma novíssima cena na música brasileira. São artistas que, fechado o ciclo de duas décadas que nos separam dos anos 1990, bebem diretamente na música deste passado recente. O mesmo vale para Dani Black, filho da cantora Tetê Espíndola e do músico Arnaldo Black (de "Escrito nas Estrelas"), que já integrou o 5 a Seco e lança CD de estreia no mês que vem (leia ao lado). Vale para o cuiabano Paulo Monarco. E para os paulistas Leo Cavalcanti e Maria Gadú.

Mais famosa da geração até agora, Gadú é a porta-bandeira da turma. Faz a ponte entre os meninos e a indústria, contracenando com eles em discos ou em shows.

Frequentemente comparada a Marisa Monte (pelo timbre e maneira de cantar) e a Cássia Eller (pelo visual e postura cênica), ela afirma que a proximidade entre os meninos dos 2010 e os veteranos dos 1990 se dá pela bagagem afetiva da infância. "[A geração 90] foi a primeira que a gente viu acontecer", diz. "Éramos crianças e ouvíamos aquilo em casa, acompanhávamos os primeiros shows. Víamos esses artistas enquanto crescíamos."

Black concorda. Sua relação com a música dos 1990 tem a ver com a infância.

"O que você quer ser quando crescer? Eu queria ser o Chico César e o Romário", diz. "Tinha sete anos, era a Copa de 94, do Romário, e o lançamento do CD 'Aos Vivos', do Chico. Aquela 'aula prática' de voz e violão foi direto no meu coração de criança." "Dani parece se sentir muito confortável com as sonoridades misturadas dos anos 90", reconhece-se nele Zélia Duncan, com quem o rapaz já tem canções em parceria.

VIOLÃO

29 Se Gadú se aproxima de suas matrizes dos 1990 por semelhanças vocais, o que liga as duas pontas, no caso dos meninos, é, sobretudo, a maneira de lidar com o violão, tocado de maneira mais percussiva. Lenine é o modelo.

"Não é um desprezo pelas melodias -todo mundo ama o McCartney, o Steve Wonder e o Chico Buarque", diz Calderoni. "Mas é uma música que fez do violão seu trampolim. Um violão elaborado harmonicamente. Mas é a coisa rítmica que salta logo na primeira audição." Para Kassin, 36, principal produtor da geração 2000 -uma antes da de Black e companhia, portanto-, trata-se de um revezamento natural.

"Tudo acontece em ciclos. São ondas de afirmação e negação, em que uma geração contraria a anterior", diz. "Se uma década é mais melódica, a seguinte tende a ser mais rítmica." Música é matemática.

CORREIO BRAZILIENSE - Aos mestres, com carinho

Marcel Powell se apresenta no Clube do Choro com repertório cheio de clássicos, como Último desejo, de Noel Rosa, e Round midnight, de Thelonius Monk

Irlam Rocha Lima

(7/9/2011) Baden Powell, com quem aprendeu a tocar violão, é a maior referência de Marcel Powell. Mas, além do pai, outros instrumentistas de cordas, nacionais e internacionais, o influenciaram, entre os quais, os brasileiros Dino 7 Cordas, Raphael Rabello, Sebastião Tapajós e Romero Lubambo; o norte-americano Pat Metheny e o espanhol Paco de Lucia. “Com cada um deles aprendi um pouco mais”, afirma.

Atração desta semana no Clube do Choro, Marcel faz show solo de hoje a sexta-feira, às 21h, e mostra repertório variado, com temas extraídos, basicamente, dos seus CDs mais recentes: Corda com bala (2009) e Aperto de mão (2006). Da lista fazem parte clássicos da música brasileira Serra da Boa Esperança (Lamaretine Babo), Último desejo (Noel Rosa), Essa mulher (Joyce), Chora violão, que Badem compôs em homenagem a Raphael Rabello; e os standards de jazz Cry me a river (Justin Timberlake) e ‘Round midnight (Thelonius Monk).

“Criei um arranjo para Feitiço da Vila, do grande Noel (Rosa), pensando no meu próximo CD, e vou fazê-lo, também, no show; assim como Violão vadio (Baden Powell e Paulo César Pinheiro), que gravei com meu amigo Diogo Nogueira, no Sou eu, o DVD dele”, anuncia. “É provável que toque, ainda, Acender as velas, de Zé Keti, um das faixas do disco que gravei só com músicas do compositor portelense.O trabalho está pronto, mas ainda não sei quando vou lança-lo.”

Emoção O violonista, que ainda não quis se lançar como compositor, tem critério para gravar algum tema: “Toda música tem que ter alguma coisa. Tem que me deixar excitado ou triste. Quando ouvi meu pai tocando ‘Round midnight num programa na França, comecei a chorar. Ela me emocinou muito”. Para ele, a maior gratificação de um autor é escutar sua melodia ser cantada ou assoviada na rua. “Só vou me considerar um compositor de verdade quando isso acontecer. Quando disserem ao ouvir uma música, isso é do Marcel Powell.”

Da mesma forma que reverencia os mestres, esse violonista virtuoso fala com entusiasmo dos músicos de sua geração — ele está com 29 anos —, e cita os brasilienses Hamilton de Holanda, Rogério Caetano e Daniel Santiago; o gaúcho Yamandu Costa e os paulistas Diogo Figueiredo, Alessandro Penesi e Daniel Migliavaca. “Daniel é um bandolinista fantástico, com que estou gravando um disco”, elogia.

30 LIVROS E LITERATURA

O GLOBO - A Bienal e o acesso ao livro

André Miranda

(1º/9/2011) De hoje até 11 de setembro, o Rio será tomado por milhares de expositores, autores, estudantes e visitantes, que vão circular pelos 55 mil metros quadrados do Riocentro durante a 15a- Bienal do Livro. Mas será tomado, sobretudo, por um desejo de democracia na leitura. Em meio às ações de divulgação e promoção de livros que sempre são realizadas na bienal, nesta edição duas vão chamar a atenção pelas possibilidades concretas que apresentam para aumentar o acesso ao livro no Brasil.

A primeira é um programa batizado de Livro Popular, que será anunciado hoje, às 15h30m, na cerimônia de abertura, pela presidente Dilma Rousseff. Trata-se de um projeto de incentivo à cadeia de distribuição dos livros, cuja meta é levar ao mercado de 2 a 3 mil obras com o preço máximo de R$ 10 até o fim de 2012.

Já na terça-feira da semana que vem, a Bienal será palco do seminário E-books e a Democratização do Acesso, que, organizado pela Biblioteca Nacional, servirá como mesa de debates para um projeto de empréstimo de livros digitais pelas bibliotecas brasileiras. O programa Livro Popular foi elaborado para se tentar solucionar o problema da baixa procura por publicações no Brasil. Há dez anos, a média de venda de livros era de 1,1 obra por habitante por ano. Hoje, mesmo com o recente aumento no consumo da classe C, a taxa ainda é exatamente a mesma. Com isso, o projeto será dividido em três editais, um para bibliotecas, outro para editoras e um último para os pontos de venda.

O das bibliotecas, que já será publicado na próxima semana, vai disponibilizar um total de R$ 35 milhões para as instituições rurais, municipais e comunitárias que se inscreverem. O das editoras virá logo em seguida, para que as empresas apresentem suas obras populares aptas a integrar o programa. Serão apenas duas exigências do governo: qualidade na edição e um preço de capa nunca maior do que R$ 10. Ao mesmo tempo, será lançado um terceiro edital voltado para livrarias, papelarias, bancas de jornal ou outros estabelecimentos que comercializem livros.

A ideia é que as editoras vendam suas publicações populares para as livrarias e afins, que por sua vez venderão tanto para as bibliotecas, com incentivo do governo, quanto para qualquer leitor interessado. — A gente quer ativar os vários elos da cadeia. O programa aumenta o número de pontos de venda e as tiragens e permite que se baixe de forma definitiva o preço — acredita Galeno Amorim, presidente da Fundação Biblioteca Nacional, órgão responsável pela elaboração do Livro Popular. — E também vamos mudar uma lógica vigente no setor. Hoje, é o governo que escolhe e compra os livros.

Agora, nós vamos envolver os pontos de venda na distribuição e também possibilitar que as bibliotecas escolham. As bibliotecas passarão a ser protagonistas.

O valor dedicado a cada biblioteca inscrita será calculado conforme a população de sua localidade e o número de usuários. Porém, todas que se interessarem serão apoiadas de alguma forma. No caso de as instituições apresentarem demandas grandes por uma mesma obra popular, o próprio governo poderá ir até o mercado e fazer a mediação da compra.

A lógica do projeto é que se estabeleça no Brasil uma prática bastante comum nos EUA e na Europa, onde os livros são primeiro lançados em edições de capa dura, mais robustas e caras, depois chegam em volumes um pouco mais simples e baratos e, após alguns meses, são publicados em versões de bolso e com preços mais acessíveis. — O cinema faz isso bem. O filme vai para as telas, aí segue para a locadora, para o DVD, para a TV e daí em diante. Ele percorre um caminho e chega ao espectador com vários preços diferentes — explica Amorim.

31 Paralelamente ao lançamento do Livro Popular, Amorim diz que tem conversado com representantes das editoras e dos pontos de venda para explicar a possibilidade de se aumentar a circulação dos livros. Haverá investimento, ainda, na formação dos bibliotecários — o que, na prática, pode evitar que a demanda do programa seja limitada a poucas publicações, geralmente best-sellers e clássicos, estes já bastante presentes nos acervos.

Outra discussão que a Biblioteca Nacional começa a ter com o mercado é sobre como implementar o empréstimo de livros digitais. A palestra E-books e a Democratização do Acesso, marcada para terça- feira, às 9h30m, no Auditório Dinah Silveira de Queiroz do Riocentro, terá essa finalidade e trará ao Rio Aquiles Alencar- Brayner, cearense que ocupa o posto de curador digital da British Library, uma biblioteca nacional inglesa com 150 milhões de títulos, entre livros e periódicos.

A British Library tem 3% de seu acervo digitalizado e oferece os livros para consulta através de um aplicativo de iPad. — A grande discussão é mais a da democracia da informação do que simplesmente da democracia dos livros digitais — diz Aquiles. — Na Europa, o grande problema é o acesso ao livro. A questão dos direitos autorais é complexa. As editoras têm medo de que as bibliotecas comecem a oferecer e-books e os leitores parem de comprar livros. Aquiles lembra do embate ocorrido nos EUA no início deste ano, quando a editora Harper Collins, uma das principais do país, impôs um limite de 26 empréstimos para os livros digitais. Depois disso, seria necessário comprar uma nova licença. O motivo, segundo a companhia, é que um livro físico só suportaria até 26 empréstimos. O ponto é que, mesmo que seja verdade, assumir uma lógica analógica para uma realidade virtual parece ser um retrocesso.

— As bibliotecas americanas ficaram indignadas — diz Aquiles. — O problema é que as editoras querem vender uma licença e não querem que o e-book seja armazenado no acervo digital da biblioteca.

Ele fica armazenado apenas na empresa. Isso é ruim, inclusive, para a preservação da informação. No caso das obras impressas, os livros eram mantidos acorrentados nas bibliotecas. No caso das digitais, as correntes são o direito autoral.

O ESTADO DE S. PAULO - Programa para tradutores

Roberta Pennafort

(2/9/2011) O português é uma língua periférica no mundo das traduções, e à exceção de , Paulo Coelho, Machado de Assis, e outros poucos, é tímida a penetração dos autores brasileiros nos mercados editoriais estrangeiros. Com o objetivo de internacionalizar nossa literatura, um pacote estratégico para a década que se inicia está sendo lançado pela Biblioteca Nacional. A ideia é atrair o olhar de fora tanto para os clássicos quanto para a produção contemporânea.

Hoje, durante a Bienal do Livro, aberta ontem pela presidente Dilma Rousseff, o presidente da Biblioteca Nacional, Galeno Amorim, vai anunciar as medidas; entre elas, um programa de residência de tradutores estrangeiros no Brasil. Dez profissionais serão selecionados para vir passar de dois a seis meses, já em meados de 2012.

"Serão convidados a morar em diferentes cidades, conhecer mais a língua, a cultura, encontrar escritores, ter contato com o meio acadêmico", explica Galeno. "Não é que não exista qualidade nas traduções, mas é importante que vejam os cenários, os personagens."

Em julho, foram anunciados investimentos de R$ 12 milhões, até 2020, em bolsas de tradução. Emissários estão fazendo visitas pela América do Sul e Europa para espalhar informações sobre o programa, que vale para primeiras publicações e reedições de títulos fora de catálogo.

Outra novidade são os editais a serem lançados para a permanência de autores brasileiros no exterior, para que eles sejam os próprios garotos-propaganda de suas obras, deem palestras e entrevistas. O apoio à publicação e à divulgação em países lusófonos é mais uma frente. "Temos bem menos traduções do que poderíamos", diz Galeno, que vem trabalhando em parceria com o

32 Itamaraty e com as editoras. "O Brasil desfruta hoje de uma imagem muito positiva, é tido como a bola da vez, precisamos aproveitar esse momento."

"Não basta o livro ser maravilhoso, tem que ter apelo internacional", pondera a editora Sonia Jardim, da Record, que está trabalhando no exterior Se Eu Fechar os Olhos Agora, estreia do jornalista Edney Silvestre, que chega chancelado pelo Prêmio Jabuti do ano passado. A Record também negocia o próximo do autor, Felicidade Fácil, que só sai mês que vem.

A imagem do Brasil como a terra exótica de Jorge Amado persiste, acredita o escritor João Paulo Cuenca. Certa vez, ele conta, ouviu de uma editora em Paris que não publicaria O Dia Mastroianni, seu segundo livro (hoje na Itália e em Portugal), porque ele "poderia ter sido escrito em qualquer país".

"A gente tem que mostrar que tem uma palavra sobre o mundo, e não só sobre o Brasil. O papel do governo é fundamental. Os livros espanhóis e franceses que lemos aqui tiveram esse apoio lá", defende Cuenca. Seu terceiro título, O Único Final Feliz para Uma História de Amor É Um Acidente, vai sair na Espanha e na Alemanha.

Tradicionalmente, autores que escrevem em inglês, francês e alemão são os que geram maior número de traduções no mundo. "A língua é a dificuldade central, mas é preciso também que haja um foco dos agentes e das editoras nisso. Não adianta achar que só porque o livro foi bem aqui tudo vai cair do céu", pontua Lucia Riff, a principal agente literária em atividade. Entre seus autores mais traduzidos estão Luis Fernando Verissimo, Lya Luft, Marcelo Ferroni e Leticia Wierzchowski.

Nesse esforço, a homenagem ao Brasil na Bienal - curiosamente, é a primeira vez em 15 edições - dá a partida a uma série que se pretende estender até 2020. Em 2012, o Brasil é o foco da feira de Bogotá; em 2013, o mesmo acontece em Frankfurt, na maior do mundo; em 2014, em Bolonha, a mais importante para o setor infanto-juvenil.

ARQUITETURA E DESIGN

FOLHA DE S. PAULO - Lygia Pape e Tunga ganharão galerias próprias em Inhotim

Projetos, publicados na revista "Monolito", são para 2012

ROBERTO KAZ

Os artistas Lygia Pape (1927-2004) e Tunga terão galerias exclusivas no Instituto Inhotim, centro particular de arte contemporânea em Brumadinho (MG).

As galerias, que devem ficar prontas no próximo ano, vão se somar às já existentes, que são dedicadas aos artistas plásticos Hélio Oiticica (1937-1980), e Adriana Varejão.

Os projeto, aos quais a Folha teve acesso, estão na nova edição da revista de arquitetura "Monolito", que chega às livrarias e bancas hoje.

São da dupla Thomaz Regatos e Maria Paz, do escritório Rizoma, que ainda desenha uma terceira galeria, para o artista Nuno Ramos.

Regatos, 30, diz que os edifícios foram projetados de forma a não entrar em conflito com as obras: "Quem tem que aparecer é o artista".

Ele conta que por isso fez uma galeria fechada e escura para abrigar a peça "TTeia", de Lygia Pape, que consiste em fios que imitam feixes de luz .

Já a galeria dedicada à obra de Tunga teve processo oposto: "Nós nos encontramos quatro vezes. Ele queria uma galeria aberta, com paredes de vidro, para que pudesse m ser vistas as obras pelo lado de fora".

33 O Instituto Inhotim também está erguendo um edifício -a Grande Galeria- dedicado a exposições temporárias. O projeto é do escritório Arquitetos Associados.

OUTROS

LA NACIÓN (ARGENTINA) - Mirando al Sur

La nueva tendencia son las ferias regionales, auténticas plataformas de legitimación del arte latinoamericano; se consolida la peruana Lima Photo y nace con ArtRio una estrella carioca

Por Alberto Armendariz

(2/9/2011) Nuevos aires soplan en Río de Janeiro. Con la violencia en las favelas más apaciguada, y ante la perspectiva de una transformación urbana radical para el Mundial de Fútbol de 2014 y los Juegos Olímpicos de 2016, la Cidade Maravilhosa se prepara para inaugurar la semana próxima su primera feria de arte contemporáneo, con la cual espera incorporarse al circuito internacional de las artes.

ArtRio se realizará del 8 al 11 de septiembre en los antiguos depósitos portuarios, reconvertidos en un moderno espacio de exposiciones con vista a la Bahía de Guanabara como parte del ambicioso proyecto Porto Maravilha, para la remodelación de la zona portuaria. Participarán 80 galerías de todo el mundo, entre ellas las neoyorquinas Leon Tovar y Magnan Metz; la parisina Hussenot; las brasileñas Estúdio Buck, A Gentil Carioca, Jean Boghici y Baró; así como otras de Alemania, España, Portugal, Dinamarca, Australia, México, Chile, Colombia y Perú.

En esta primera edición, la presencia argentina se limita a la galería porteña Ignacio Liprandi, que sólo mostrará obra del artista venezolano Mauricio Lupini. "Nos pareció muy extraño no tener más galerías y artistas argentinos. Pero para el próximo año ya tenemos a una persona contratada, la argentina María Luz Bridger, que trabajará intensamente en revertir la situación", comentó a adn la artista plástica Brenda Valansi Osorio, una de las organizadoras junto a su socia, la periodista Elisangela Valadares.

Aprovecharán que ahora Río es la "ciudad del momento" para reunir a galeristas, inversores y público en general; según estiman, atraerán a 20.000 visitantes. ArtRio coincidirá con la exposición en el Museo de Arte Moderno (MAM) de Louise Bourgeois -la misma que recientemente pasó por Buenos Aires-, y con otra de pinturas de Fernando Botero en la Caixa Cultural.

"No queremos que nuestra feria sea vista como una competencia con otras ferias latinoamericanas, como Zona Maco (Ciudad de México), arteBA (Buenos Aires), ArtBo (Bogotá) o SP-Arte (San Pablo) - advirtió Valadares-. Queremos sumar fuerzas, tejer alianzas, intercambios con todas ellas para fortalecer el peso de los artistas y las galerías latinoamericanas en el mundo."

En los grandes almacenes del puerto, el espacio estará dividido entre galerías nuevas y establecidas. Se podrá ver desde cerámicas de Pablo Picasso y grandes esculturas de Wesley Duke Lee hasta pinturas de Norbert Bisky y fotografías de John Baldessari, pasando por obras de importantes figuras brasileñas como , Hélio Oiticica, Tunga, Adriana Varejão y Cícero Dias. Un sector especial, Solo Projects, estará dedicado a trabajos inéditos creados especialmente para la feria por varios artistas, entre los cuales figura Ernesto Neto. La selección estuvo a cargo de la venezolana Julieta González, encargada de adquisiciones de arte latinoamericano de la Tate Modern en Londres, y del mexicano Pablo León de la Guerra, arquitecto, editor y curador radicado en la capital británica.

Más allá del puerto, ArtRio se extenderá al Museo Carmen Miranda, en el barrio de Botafogo, donde se realizará una exposición colectiva denominada The South American way ("A la manera sudamericana"), que explorará estereotipos latinoamericanos a través de instalaciones e intervenciones con piezas de la colección de la legendaria actriz brasileña.

34 Asimismo, en dos estaciones de metro -Carioca y General Osório- se montarán obras públicas de Guga Ferraz y Maria Nepomuceno. Y en el cine Joia, de Copacabana, se exhibirán films y documentales vinculados con el arte.

"A pesar de que en los últimos años quedó un poco relegada, Río siempre fue una ciudad muy rica culturalmente, y es esa tradición la que buscamos profundizar con la feria y todos los eventos que se harán bajo la marca ArtRio", apuntó Valansi Osorio, que tomó como modelo la feria Art Basel Miami, donde también se combina el mercado de arte con un estilo de vida playero y relajado.

Aunque el sueño de estas dos emprendedoras mujeres viene de larga data, en el camino se topó con problemas administrativos y financieros. Se fueron resolviendo cuando se sumaron al proyecto los empresarios Luiz Calainho y Alexandre Accioly, así como la Alcaldía de Río y la Gobernación del Estado de Río de Janeiro, entidades públicas que aportaron dos millones de reales (1,2 millones de dólares). Después de todo, la feria servirá para apuntalar el propósito de que Río vuelva a renacer como la capital cultural de Brasil y se afiance como polo artístico en América del Sur.

A ArtRio se le suman grandes iniciativas vinculadas con el arte y el diseño, como la Muestra de Arte Público que está organizando para el año próximo el consagrado junto con una decena de artistas internacionales (entre ellos Ai Weiwei, William Kentridge y Olafur Eliasson). También para 2012 estará terminada la construcción de la Casa Daros, en Botafogo, que albergará una de las colecciones de arte latinoamericano contemporáneo más importante de Europa.

ULTIMA HORA (PARAGUAI) - Arte popular del Brasil se instala en Asunción

(5/9/2011) En conmemoración del Bicentenario de la Independencia del Paraguay, 200 piezas de la artesanía brasileña se pueden apreciar desde mañana en la exposición que se abre a las 19.00 en el Museo del Barro.

Por Roberto Gómez Palacios

Es la primera vez que el acervo del Museo Casa do Puntal, el más prestigioso del Brasil por contemplar en su colección piezas de diversas regiones de ese país, se presenta en la capital paraguaya. "El Museo do Puntal es en Río de Janeiro lo que en Asunción es el Museo del Barro, por la similitud existente. Por eso la colección se instala en ese lugar", menciona la curadora y directora del museo brasileño, Ángela Mascelani.

Las 200 piezas se pueden ver gratuitamente los días miércoles y jueves de 15.30 a 20.00; viernes y sábado de 9.00 a 12.00 y 15.30 a 20.00, en el Museo del Barro (Calle Grabadores del Cabichu'i entre Canadá y Emeterio Miranda). Permanecen en exposición hasta el 15 de octubre.

"A pesar de que no conozco mucho de la artesanía paraguaya, no he encontrado en otros países de la región tanto parecido entre las artesanías de Brasil y Paraguay. Puede que eso se deba a la cercanía de nuestros pueblos. Al entrar al Museo del Barro uno podrá caminar por un sendero y ver ese parecido, hasta llegar a la instalación que contempla la diversidad brasileña", señala Mascelani.

SEMINARIO. La colección recorrió diversos países de América y Europa con la denominación Caminos del Arte Popular Brasileño. Al margen de esta presentación en Asunción, los representantes del Museo do Puntal realizarán un seminario para artistas, artesanos y estudiantes, en el que se discutirá sobre las distintas formas de creación artística.

"Estas artesanías salieron por primera vez de Pernambuco de la mano de unos intelectuales que decidieron mostrarlas en Río de Janeiro, donde causaron tal impresión que fueron más valoradas que antes, a pesar de que sus creadores no eran considerados artistas de élite", agrega Mascelani.

Las piezas llegan al Paraguay, gracias a un convenio firmado entre el Museo del país vecino y la Secretaría Nacional de Cultura de Paraguay, con el apoyo de diversas entidades de ambos países.

HERMANDAD. "Esta exposición ayuda a unir más a nuestros países. 15 profesionales brasileños que acompañan esta exposición realizan la adaptación de los espacios del Museo del Barro, que tiene una rica tradición de artesanías populares e indígenas, está hecho en casi un mes", dice la directora.

35 Las obras muestran piezas contemporáneas hechas en madera, hierro, plumas y otros materiales. Representan las actividades cotidianas diarias, el imaginario popular festivo y religioso y otros temas que entremezclan la realidad y los sueños. Entre los artistas sobresalen trabajos del maestro Vitalino con su obra Lavadoura; de Zé Caboclo: con dos piezas, Fotógrafo y Buen día; de Manuel Eudócio y Luiz Antönio, entre otros, que hablan de la fascinación por las máquinas, de historia y recortes temáticos capaces de transmitir al público la fuerza de estas producciones.

El Museo do Pontal nació de la pasión de coleccionistas privados que se dejaron seducir por la riqueza, belleza y fuerza de la producción plástica popular del Brasil. Su creador fue el pintor francés Jacques Van de Beuque; contiene más de 8.000 colecciones históricas y como el Museo del Barro en Asunción, tiene un estatus de museo público, aún sin ser una institución gubernamental.

O GLOBO - Vitrine de arte

Reunindo 83 galerias do Brasil e do mundo, a feira ArtRio começa amanhã no Píer Mauá disposta a atrair 20 mil pessoas e vender R$ 100 milhões Catharina Wrede e Cristina Tardáguila

“FORTALEZA DE ARKADIN”, de Wesley Duke Lee: a peça mais cara da ArtRio, que ocupa os armazéns 2 e 3 do Píer Mauá até domingo, com 700 obras, foi avaliada em R$ 1,5 milhão

(6/9/2011) A ambição é grande: reunir 700 obras de arte e 83 galerias do Brasil e do mundo às margens da Baía de Guanabara para tentar inserir o Rio, de uma vez por todas, no mapa do concorrido mercado mundial de arte. Assim nasce a ArtRio, a primeira feira internacional de arte contemporânea da cidade, nos armazéns 2 e 3 do Píer Mauá. Com abertura amanhã às 14h, para convidados, e quinta, para o público, a feira vai funcionar de 12h às 20h, até domingo, com entrada a R$ 30 (inteira).

— Esta é a edição número um. Não temos um modelo anterior para ajustar, mas visito feiras há 15 anos e, nelas, sempre mantive o olhar crítico de quem toda a vida sonhou montar uma feira própria, no Rio — diz a curadora e responsável pelo evento Elisangela Valadares.

Há dois anos, Elisangela uniu-se à amiga e também curadora de arte Brenda Valansi Osorio para pôr de pé a primeira edição da ArtRio, que desde o início se pretendia grande. Há três meses, as duas

36 receberam o reforço de uma dupla carioca especializada em entretenimento: os empresários Luiz Calainho e Alexandre Accioly.

— A arte é entretenimento — defende Calainho. — Em cinco anos, a ArtRio estará entre as três maiores do planeta — aposta. Em cinco dias, os organizadores esperam ver circulando pelo Píer Mauá 20 mil pessoas e não escondem: pretendem vender cerca de R$ 100 milhões.

— Teremos obras que custam entre R$ 1 mil e R$ 1 milhão. É uma boa oportunidade pra quem quer começar uma coleção — diz Brenda. — Na ArtRio, tudo o que estiver exposto já passou por um crivo cuidadoso de profissionais. Lá, o visitante poderá ter a certeza de que está diante de obras de qualidade.

A ArtRio conta com a participação das principais galerias da cidade. A Pinakotheke Cultural, por exemplo, terá uma cerâmica de Picasso; a Anita Schwartz, obras de Nuno Ramos e Gustavo Speridião, entre outros; a Silvia Cintra + Box 4, de ; e a Lurixs, de José Bechara. Já a Mul.ti.plo levará alguns dos trabalhos mais acessíveis do evento, como “Zero dollar”, de Cildo Meirelles, no valor de R$ 5 mil.

Importantes endereços de São Paulo também marcam presença. A Galeria Vermelho trará obras de Rosangela Rennó, entre outros; a Nara Roesler, de Carlito Carvalhosa, Hélio Oiticica e O Grivo; e a Ricardo Camargo, a obra mais cara da ArtRio: “Fortaleza de Arkadin”, de Wesley Duke Lee, avaliada em R$ 1,5 milhão. De fora do país, vêm galerias de Lisboa (Filomena Soares), Nova York (Magnan Metz), Berlim (Crone) e Paris (Hussenot Gallery), além de Argentina, México, Peru, Espanha e Austrália.

Além dos estandes de cada galeria, o evento terá um espaço (Solo Projects) destinado a dez artistas, nacionais e estrangeiros, especialmente selecionados por Julieta Gonzalez, da Tate Modern, e Pablo Leon de La Barra, que atua hoje em Londres. A programação conta ainda com palestras e mostras de vídeos e cinema, no próprio Cais e no Cine Joia, em Copacabana. Ao mesmo tempo em que as expectativas são altas, a ArtRio precisa vencer uma prova de fogo para se consolidar como um evento que merece atenção. Exemplo disso são os olhares, curiosos mas ainda reticentes, com que representantes de algumas grandes galerias pretendem circular pela feira.

Nesse grupo de “olheiros” estará o inglês Paul Jenkins, há dez meses na cidade representando o americano Lawrence “Larry” Gagosian, dono da maior rede de galerias do mundo. — Não estou autorizado a comprar nada nesta edição da ArtRio — diz. — Meu objetivo é apenas ver como a feira funciona, como foi organizada e se as pessoas estão mesmo comprando. Isso não quer dizer, no entanto, que não participaremos do evento mais para a frente. A Gagosian Gallery tem por filosofia não fazer parte do primeiro ano de nenhuma feira. Primeiro apreciamos o evento e, só depois, entramos nele. Em Hong Kong, por exemplo, foram quatro ou cinco anos de observação.

Jenkins está otimista em relação ao futuro da ArtRio. Pelo que viu até agora, acha que o evento está bem estruturado e que tem potencial para se firmar como uma espécie de Miami Basel, feira de arte que acontece em Miami há 41 anos. Mas já notou peculiaridades: — A ArtRio faz propaganda no rádio — observa o “olheiro”. — Isso a diferencia de outras feiras que conheço mundo afora, mas tudo bem. Os organizadores querem mesmo que ela pegue, que seja popular.

Alexandre Gabriel, um dos diretores da galeria paulistana Fortes Vilaça, que representa as duas artistas mais caras do Brasil, Adriana Varejão e , também estará pelos corredores da ArtRio só de olho.

— Vou como visitante — conta. — A Fortes Vilaça considerou a possibilidade de participar da feira, mas ficamos de fora porque seria uma esforço sobre-humano em termos de pessoal já que só neste mês vamos a Londres, Lyon, Istambul e Paris; e, segundo, porque preferimos ver o que acontece, saber se a feira pega de verdade.

Na opinião de Gabriel, a escolha da data de realização da ArtRio não foi muito boa, pois setembro é o início da temporada de arte na Europa, nos Estados Unidos, e é quando os museus e grandes galerias fazem as primeiras e mais importantes exposições do ano.

37 Por outro lado, a ArtRio conseguiu vencer um obstáculo pelo qual o Brasil é conhecido internacionalmente: sua elevada taxação. Quando uma obra de arte estrangeira é vendida no Rio de Janeiro, 43% de seu valor são constituídos de impostos. Cerca de 19% dessa taxação correspondem ao Imposto Sobre Circulação de Mercadoria (ICMS). Cientes disso os organizadores da ArtRio procuraram a Prefeitura e o governo do estado e conseguiram isenção de ICMS.

— Queremos mudar a história da arte na cidade e precisamos da ajuda do governo para isso — diz Elisangela.

— Vivemos um momento importante — corrobora Calainho. — Há um crescimento econômico no Brasil, um aumento de colecionadores e de galerias interessados em nossa arte, e o Rio vai ser muito visto por causa da Copa das Confederações, da Copa do Mundo e das Olimpíadas. A ArtRio é uma aposta certeira, um investimento de médio e longo prazo. Se depender da animação dos organizadores, a feira deve triplicar de tamanho nos próximos três anos. O objetivo do grupo é saltar das atuais 83 galerias para cerca de 260, número suficiente para ocupar os quatro armazéns do Píer Mauá.

Na agenda de Brenda, Elisangela, Accioly e Calainho, pelo menos, a próxima edição da ArtRio já tem data para começar: dia 12 de setembro do ano que vem.

O GLOBO - Gagosian quer promover arte brasileira

Para Paul Jenkins, da maior rede de galerias do mundo, mercado nacional é ‘insular’

Cristina Tardáguila

(6/9/2011) Paul Jenkins é um inglês de 49 anos que há dez meses trocou Nova York pelo Rio de Janeiro. Trouxe consigo a incumbência de agir como “olheiro” do americano Lawrence “Larry” Gagosian, o galerista mais importante do mundo. Discreto, passou despercebido todo esse tempo, atendendo a 12 coleções privadas que crescem no Rio, em São Paulo, Minas Gerais e no Nordeste. Está animado.

Formado em Relações Internacionais, Jenkins conta ao GLOBO que Gagosian ainda não planeja abrir um escritório por aqui, mas que o enviou ao Brasil porque não tem dúvidas sobre o potencial e a qualidade da arte brasileira. — Em toda a América Latina só a Cidade do México e o Rio têm “olheiros” de Larry, e, entre as duas, ouso dizer que o Rio está na frente em potencial. Desde que chegou, Jenkins mantém-se ocupado, conhecendo artistas, galeristas e colecionadores.

Recusa-se a revelar os nomes de seus interlocutores e, alegando confidencialidade, não especifica tampouco quantas obras já negociou. — A economia brasileira está crescendo, novas riquezas estão se formando, e mais pessoas têm vontade de iniciar uma coleção. Há dinheiro para arte por aqui.

Mas, enquanto comemora o aquecimento do mercado, enxerga riscos. Diz que a produção de arte no Brasil não acompanha o ritmo da demanda, o que leva à alta dos preços. — A arte brasileira está cara, muito cara — enfatiza. Mas Jenkins também culpa a “excessiva” taxação imposta pelo governo ao setor.

— As taxas daqui estão entre as mais altas que conheço — ressalta. — Se o governo brasileiro reduzisse essas barreiras, veria que o fluxo comercial aumentaria e que todos sairiam ganhando. Apesar de ver um bom momento para a arte nacional, Jenkins foge da palavra “boom”.

— O mundo simplesmente não vê a arte brasileira. Esse tão aclamado “boom” é exagerado, considerando o tamanho do país, a quantidade de artistas e a qualidade de obras.

Jenkins classifica o mercado nacional de arte como “insular”, diz que, apesar de ter crescido, ainda permanece “trancado em si mesmo”, mas avisa que parte de seu trabalho consistirá justamente em colaborar para que a arte brasileira circule mais lá fora.

38 — Quero montar coleções que misturem peças daqui com peças de fora. Tenho curiosidade para ver como dialogam — ele diz. — O Brasil expandiu o consumo de bens importados, lida bem com a globalização. Precisa, agora, dar o mesmo passo na internacionalização de sua arte. Os estrangeiros simplesmente não veem o suficiente para se interessar de verdade por ela.

Sobre a possibilidade de o Rio de Janeiro ganhar uma galeria Gagosian, Jenkins fala com objetividade: — O caminho trilhado pela empresa, observado em Hong Kong, Roma, Paris e Genebra, começa com o envio de um “olheiro”. Depois, passa pela instalação de um escritório oficial. Se concluirmos que vale a pena, abrimos uma galeria. Então pode-se dizer, sim, que o Rio está na primeira fase, mas ainda é cedo para fazer alarde sobre o assunto.

O ESTADO DE S. PAULO - Setembro de Bienais

A abertura este mês de quatro exposições de peso destaca a importância das artes brasileira e latino- americana

Camila Molina

(6/9/2011) Por mais que se questione o modelo das Bienais de Arte, são essas mostras exatamente que marcam o calendário cultural para os interessados na produção artística contemporânea. Os eventos se espalham pelo mundo, são centenas - alguns com mais alcance, outros com menos -, mas setembro torna-se agora um mês privilegiado em se tratando desse tipo de mostra.

Quatro exposições de peso serão inauguradas, em sequência, em apenas duas semanas. Mais do que isso, há a oportunidade de colocarem em grande destaque a arte brasileira e a latino-americana, não apenas no Brasil, como no exterior.

A rodada começa na sexta-feira, quando ocorre a cerimônia oficial de abertura da 8.ª Bienal do Mercosul, em Porto Alegre. Logo em seguida, no dia 15, é inaugurada a 11.ª Biennale de Lyon, na França, que tem entre seus participantes a presença de obras de criadores brasileiros como Arthur Bispo do Rosário, Lucia Koch, Jarbas Lopes e Lenora de Barros. Depois, no dia 17, abrem-se para o público a 12.ª Bienal de Istambul, na Turquia, desta vez, com curadoria-geral do brasileiro Adriano Pedrosa; e a 6.ª VentoSul - Bienal Internacional de Arte Contemporânea de Curitiba, no Paraná. Cada uma das mostras tem perfil, projeto e tema específicos e o Estado detalha, nesta página, um pouco dessas exposições.

Se a Bienal de Veneza, a mais tradicional de todas, chegou ao impasse de se tornar "conservadora" e "eurocêntrica", como dizem muitos de seus críticos, as grandes mostras têm enfrentado o desafio de firmarem sua relevância com projetos curatoriais mais ousados ou autorais. A mesma Bienal de Veneza, neste ano, em sua 54.ª edição, não teve nenhum artista brasileiro em sua mostra principal - o que foi uma surpresa para muitos -, mas as Bienais que se iniciam agora cobrem essa lacuna.

Território e poética na Mercosul

"Sempre achei esquisito que uma Bienal tivesse no nome um tratado econômico que nunca deu certo", diz o colombiano José Roca, que assina a curadoria-geral da 8.ª Bienal do Mercosul, sob o título Ensaios de Geopoética. Nada mais natural que uma temática estratégica sobre a questão de território e nacionalidade fosse tomada como mote para reunir obras de 105 artistas de 31 países na mostra que vai ser aberta na sexta-feira, em Porto Alegre, para convidados - o público terá acesso no sábado e a mostra fica em cartaz até 15 de novembro.

A Bienal, que homenageia o chileno Eugenio Dittborn (foto), cupará os armazéns do Cais do Porto, o Santander Cultural, o Museu de Artes do Rio Grande do Sul e locais que receberam obras específicas. Mais ainda, a edição, que tem como curadores Alexia Tala, Cauê Alves, Paola Santoscoy, Aracy Amaral, Fernanda Albuquerque e Pablo Helguera, firma-se como mostra de processo. Os segmentos Cadernos de Viagem e Além Fronteiras reúnem obras criadas a partir de viagens pelo RS. Além disso, mostras dos participantes ocorreram em outras cidades gaúchas.

Política e arte em Istambul

39 "A relação entre arte e política tem sido um foco da Bienal de Istambul pelo menos desde a 9.ª edição, curada por Dan Cameron, em 2003, sob o título de Poetic Justice", diz Adriano Pedrosa, que, ao lado do costa-riquenho Jens Hoffmann, assina a curadoria de Sem Título (12.ª Bienal de Istambul). A mostra, em cartaz na cidade turca entre 17 de setembro e 13 de novembro, tem como "inspiração" a obra do cubano-americano Félix González-Torres (1957- 1996). Ele não está presente com trabalhos, mas como "exemplo notável de artista que articula de forma profunda e complexa conteúdos políticos, pessoais e corporais com preocupações formais, estéticas e visuais", afirma Pedrosa. "A Bienal está ancorada em cinco exposições coletivas, todas tomando trabalhos específicos de Félix como ponto de partida: Untitled (Abstraction), Untitled (Passport), Untitled (History), Untitled (Death by Gun) e Untitled (Ross)." Não foi anunciada a lista de participantes, mas as artes latino-americana - do Brasil, sabe-se de exibição da série Marcados, de (foto) e de sala especial de Leonilson - e do Oriente Médio são forte presença.

Em Lyon, a ''beleza terrível''

A argentina Victoria Noorthoorn assinou, em 2009, a curadoria da 7.ª Bienal do Mercosul, mas a edição não foi muito bem aceita pela crítica. "Foi uma mostra importante, não compreendida no momento", diz José Roca, à frente da atual 8.ª edição. Agora, Victoria vai apresentar seu mais novo projeto, a curadoria da 11.ª Biennale de Lyon, na França, sob o título A Terrible Beauty Is Born.

"Nasce uma beleza terrível", diz o verso do poema Easter, do irlandês Yeats, escrito em 1916 como "gesto de emancipação" nas lutas entre Irlanda e Inglaterra. Victoria afirma que a partir desse mote fez uma proposta curiosa aos 78 artistas que participam da Bienal de Lyon (entre 15 de setembro e 31 de dezembro): que "fossem radicais" no questionamento "do presente e da realidade". Por sua proximidade com o Brasil, ela selecionou time de peso de criadores brasileiros, como Arthur Bispo do Rosário (foto), Cildo Meireles, Lenora de Barros, , Lucia Koch, Jarbas Lopes, Laura Lima e Erika Verzutti.

Ventosul e os sentidos da crise

"Os eixos tradicionais deixaram de ser hegemônicos na medida em que outras cidades com ambição cultural, entre elas, Curitiba e Porto Alegre, decidiram investir em arte. O mesmo fenômeno de descentralização se observa na Ásia e nos Emirados Árabe", afirma o alemão Alfons Hug, curador, com o paraguaio Ticio Escobar, da 6.ª VentoSul. A mostra em Curitiba, com abertura no dia 17 e até 20 de novembro, traz obras de 70 artistas nacionais e estrangeiros. O conceito da edição se faz sob o tema Além da Crise.

Não se trata, diz Hug - que já foi curador de duas Bienais de São Paulo -, de "uma crise da arte, nem dos suportes", mas o conceito se refere à reflexão sobre um "momento crucial que, diante de uma mudança brusca de paradigma, exige decisões, posições e imagens novas". A fotografia, como do ucraniano Boris Mikhailov e da alemã Ricarda Roggan, e a pintura, como de Marina Rheingantz e Eduardo Berliner (foto), são destaques. Vale dizer que a participação de criadores do Paraná foi realizada com a ajuda de Artur Freitas, Eliane Prolik e Simone Landal.

40