Crianças, Museus E Formação De Público Em São Paulo
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CRIANÇAS, MUSEUS E FORMAÇÃO DE PÚBLICO EM SÃO PAULO PAULA HILST SELLI CRIANÇAS, MUSEUS E FORMAÇÃO DE PÚBLICO EM SÃO PAULO CONSELHO EDITORIAL ACADÊMICO Responsável pela publicação desta obra Rita Luciana B. Bredariolli Agnaldo Valente G. da Silva Omar Khouri PAULA HILST SELLI CRIANÇAS, MUSEUS E FORMAÇÃO DE PÚBLICO EM SÃO PAULO © 2013 Editora Unesp Cultura Acadêmica Praça da Sé, 108 01001-900 – São Paulo – SP Tel.: (0xx11) 3242-7171 Fax: (0xx11) 3242-7172 www.culturaacademica.com.br [email protected] CIP – BRASIL. Catalogação na Fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ __________________________________________________________________________ S468c Selli, Paula Hilst Crianças, museus e formação de público em São Paulo [recurso eletrônico]/Paula Hilst Selli. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013. recurso digital Formato: ePDF Requisitos do sistema: Adobe Acrobat Reader Modo de acesso: World Wide Web Inclui bibliografia ISBN 978-85-7983-483-7 (recurso eletrônico) 1. Museus - Aspectos sociais. – 2. Museus - Aspectos educacionais. 3. Museologia. 4. Livros eletrônicos. I. Título. 14-08268 CDD: 069 CDU: 069 __________________________________________________________________________ Este livro é publicado pelo Programa de Publicações Digitais da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) Editora afiliada: Às crianças, que todos os dias trazem aos museus novas formas de olhar. SUMÁRIO Introdução 9 1 Uma história sobre o acesso: contextualização 21 2 O que as crianças dizem 51 3 Acesso e formação de público: outras reflexões 153 Considerações finais 235 Referências 241 Anexos 257 Figura 1 – Desenho de S06. INTRODUÇÃO Este livro nasce de uma pesquisa de mestrado que desenvolvi no Instituto de Artes da Unesp, sob orientação da profa. dra. Rejane Galvão Coutinho. Seu ponto de partida foi a confluência de ques- tões até então dispersas, presentes na minha infância, formação e realidade profissional. Desde quando consigo me lembrar, sempre gostei de museus. Fossem eles de Arte, História, Ciência ou qual- quer outro, sempre me senti à vontade dentro deles, atraída pelos objetos, movida por uma curiosidade inata pelas coisas. Isso me fa- zia perguntar por que muitas pessoas não se sentiam à vontade para frequentar esses locais. Tive uma infância criativa; em casa sempre fomos estimulados à descoberta, às atividades artísticas e imaginativas. Minha relação com os museus durante a infância esteve ligada principalmente às viagens que fazíamos em família, quando visitávamos os museus e casas de memória locais. Da cidade de São Paulo, não trago muitas lembranças de museus visitados durante a infância, mas me lembro de contatos com exposições de arte menores em instituições parti- culares, da ida à Bienal e dos museus da aeronáutica e do folclore no Parque do Ibirapuera, os quais eu adorava. 10 PAULA HILST SELLI Minha escolha para o vestibular refletiu essa ligação com a arte e, em 1996, ingressei no curso de Artes Plásticas da Uinversidade de São Paulo (USP). Durante o curso, além das disciplinas sobre Arte e Comunicação, travei contato pela primeira vez com o universo da educação por meio das disciplinas da licenciatura, e me encantei. Meu novo interesse também estava ligado ao trabalho voluntário com crianças, que eu iniciara na mesma época em uma instituição não formal de educação, trabalho que desempenhei por mais de dez anos. Começavam então os primeiros questionamentos sobre a na- tureza, o papel e as relações da educação formal e não formal. No campo profissional, após ter trabalhado com restauro dentro de museu e como professora de Artes nas redes estadual e munici- pal, além de outras atividades, comecei a atuar no final de 2005 em uma instituição cultural que contém museu e exposições variadas, onde realizei trabalhos na área educativa e administrativa. Nesse novo contexto, a questão inicial de por que essas instituições não compõem, geralmente, opção de lazer (e prazer) para a maioria da população retornou com renovada força. Como profissional apaixonada pela educação, reflito sobre essas questões e sou levada a supor (talvez orientada por minhas experiên- cias) que essa formação de público de museus está intimamente liga- da à infância e à experiência construída nessa fase. Será que as crianças hoje frequentam museus? Como? Com quem? O que será que elas pensam ou imaginam acerca desses espaços? Será que nesses ambientes são estimuladas à construção do conhecimento? As crianças são protagonistas ou figurantes das ações educativas? A partir desses questionamentos, ao pensar nas crianças e nos museus, e em como são formados os públicos para museus e insti- tuições culturais na cidade de São Paulo, decidi investigar. Como as crianças veem o museu? Será que é possível refletir a respeito da formação de público desses espaços a partir das falas de crianças so- bre os museus? Como as crianças e os museus se relacionam? Eis a origem e proposta desta pesquisa. O objetivo foi, portanto, investigar o que as crianças pensam a respeito dos museus e como se relacionam com eles, para refletir so- CRIANÇAS, MUSEUS E FORMAÇÃO DE PÚBLICO EM SÃO PAULO 11 bre o acesso e a formação de público de museus e instituições cultu- rais na cidade de São Paulo. Para ajudar a responder esse objetivo geral, desmembrei-o em quatro questões específicas: • Investigar se a criança tem acesso aos museus. Como esse acesso se dá e por meio de quem. • Investigar qual é o papel que o museu assume hoje na vida e no imaginário infantil. • Levantar quem são os principais responsáveis por interme- diar hoje esse contato entre as crianças e o museu. • Relacionar as respostas encontradas para as questões an- teriores com documentos oficiais e estudos históricos, problemati- zando as diferentes responsabilidades no acesso a bens culturais e a realidade atual. Em nosso dia a dia nas instituições culturais, percebemos como o nosso público, em sua maioria, é escolar ou escolarizado. Quando digo escolar me refiro aos estudantes do ensino fundamental, mé- dio ou superior que frequentam as exposições quase sempre junto às escolas/faculdades ou por demanda delas, para realização de um trabalho ou para contabilizar horas de atividades complementares. Ao usar o termo escolarizado refiro-me ao grau de escolaridade dos visitantes espontâneos, em sua maioria, portadores de diplomas de cursos superiores. Para fundamentar o que observo na prática e justificar o início dos trabalhos, examinei duas pesquisas de público que, por suas características, se complementam: a que foi coordenada por Pierre Bourdieu e Alain Darbel nos museus europeus na década de 1960 e a de entorno realizada pela Pinacoteca do Estado no ano de 2007 em São Paulo (Pinacoteca, 2007). Digo que essas pesquisas se complementam, pois a primeira tra- ta de um trabalho de largo reconhecimento, que buscou identificar o perfil do público dos museus na Europa e, embora tenha sido rea- lizada há mais de quarenta anos e em um contexto diverso, traz-nos 12 PAULA HILST SELLI considerações profundamente relevantes. Já a segunda pesquisa nos coloca em contato direto com a nossa realidade pela data (2007) e local (São Paulo). Discute uma das grandes questões dos dias atuais buscando o perfil dos que estão ao redor do museu sem, contudo, estar dentro dele, e os motivos do não acesso. Segundo Bourdieu e Darbel (2007, p.37) “a frequência dos museus – que aumenta consideravelmente à medida que o nível de instrução é mais elevado – corresponde a um modo de ser, quase exclusivo, das classes cultas”. Na pesquisa realizada nos museus franceses em 1964 e 1965, Bourdieu e Darbel (2007) constataram que 55% dos visitantes eram, no mínimo, titulares do vestibular. Em outra pesquisa feita na Pi- nacoteca (2002 apud Pinacoteca, 2007, p.13), constatou-se que 56% dos visitantes desse museu haviam concluído o ensino superior. Por outro lado, a pesquisa realizada nos arredores do museu em 2007 pôde avaliar que, das pessoas entrevistadas, apenas 11% afirmaram ter superior completo, enquanto que, mesmo passando pela região uma ou mais vezes por semana (em 97% dos casos), apenas 19% já haviam entrado nesse museu (Pinacoteca, 2007). Esses números nos indicam o quão antigo, atual e concreto é o problema do acesso à cultura em nossa sociedade. Hoje, quarenta anos depois, as palavras de Bourdieu e Darbel não poderiam ser mais atuais: [...] nossa sociedade oferece a todos a possibilidade pura de tirar provei- to das obras expostas nos museus, ocorre que somente alguns têm a pos- sibilidade real de concretizá-la. Considerando que a aspiração à prática cultural varia como a prática cultural e que a “necessidade cultural” re- duplica à medida que esta é satisfeita, a falta de prática é acompanhada pela ausência do sentimento dessa privação [...] (idem, p.69). A partir das considerações de Fusari e Ferraz (1992) pude con- cluir que a capacidade de apreciação artística é construída aos pou- cos ao longo do tempo, do contexto histórico-social e da educação do espectador. Deve ser desenvolvida, não é de maneira nenhuma uma CRIANÇAS, MUSEUS E FORMAÇÃO DE PÚBLICO EM SÃO PAULO 13 característica inata ou espontânea. Além dos já conhecidos fatores sociais de exclusão, é possível que a falta de práticas educativas ade- quadas durante sua formação também seja responsável por respos- tas que indicam o distanciamento e o desconforto da população em relação aos museus, como vemos abaixo: “Esse palácio não foi feito para o povo e isso não mudou” – reflexão ou- vida no palácio de Versalhes na década de 1960 (Bourdieu; Darbel, op. cit., p.84). “Só vejo gravatinha lá dentro, nunca vi ninguém do povão entrar, é meio restrito” – resposta à questão “Por que não pode entrar?” da pes- quisa realizada pela Pinacoteca nos arredores do museu (Pinacoteaca, 2007, p.69). De onde vêm esses conceitos sobre museus? Quem os reforça e quem os repassa? Até que ponto os próprios museus colaboram (ou lutam contra) a manutenção dessas definições? Todos os dias, em meu trabalho, convivia com a dificuldade que temos, como profissionais de museus e instituições culturais, de trazer uma maior parcela da população para dentro.