Banco de Brasília apresenta Ars et Vita Brasília 2017 MOSTRA Curadoria Luiz Gustavo Carvalho e Maria Vragova Direção Executiva Maria Vragova Direção Financeira Marcos Antônio Miranda Identidade Visual e Design Gráfico Phamela Dadamo Assessoria de imprensa Bárbara Chataignier Tradução Maria Vragova Revisão Maria Vragova Em setembro de 1966 nascia o Banco de Brasília (BRB) com a missão de fomentar o Dublagem Ronaldo Junior e Luiza Cesar Inserção de Legendas e VT Studio Cerri desenvolvimento econômico e social do Distrito Federal. Ao longo destes 50 anos, o BRB Confecção de objeto e fotografia Ricardo Coelho tem interagido com a comunidade local de diversas formas, seja pela democrática oferta de

CATÁLOGO crédito e de serviços bancários, pelo cuidado na disponibilização de novos e modernos pontos Coordenação Editorial Luiz Gustavo Carvalho e Maria Vragova de atendimento aos seus clientes, pela ação de suporte aos programas econômicos, sociais Textos Luiz Gustavo Carvalho, Serguei Kapkov, Roman Katchanov, Fiodor Khitruk, Andrey Khrzhanovsky, Larissa Maliukova, e culturais da cidade, ou, ainda, pela geração de empregos – tudo isso contribuindo para o Yuri Norstein e Maria Vragova Revisão Maria Vragova desenvolvimento da qualidade de vida da Capital Federal. Design Gráfico Phamela Dadamo Hoje – devido à própria expansão econômica e social de Brasília – o BRB dispõe de 123 unidades de atendimento convencional, sendo 16 delas fora do DF: Rio de Janeiro, São Paulo, Cuiabá, Campo AGRADECIMENTOS Grande, Anápolis, 2 em Goiânia, Luziânia, Formosa, Valparaíso, Santo Antônio do Descoberto, Aurora B. Bernardini, Alessandro Cerri, Laura Vragova Carvalho, Ricardo Coelho, Valentina Dadamo Coelho, Fábio Flaks, Svetlana Filippova, Serguei Kapkov, Larissa Maliukova, Daniela Mountain, Yuri Norstein, Fabíola Notari, Irineu Franco Perpétuo, Alexander Petrov, Águas Lindas, Novo Gama, Planaltina de Goiás, Alexânia e Unaí. Possui também 163 lojas do Andrei Plakhov, Konstantin Bronzit, Valéria Cabral, Amro Saad, Estúdio “”, Cine Brasília e Sergio Moriconi. BRB Conveniência – rede de Correspondentes Bancários instalada em sistema de parceria com empresas do Distrito Federal. O BRB Conveniência conta também com 8 correspondentes móveis (vans equipadas para levar serviços bancários a localidades distantes). Além disso, o BRB possui 823 terminais de autoatendimento próprios e acesso a mais de 24 mil terminais da rede Banco24Horas, em todo o país e no mundo. Com isso, a população do DF e das regiões de influência dispõe de vasto leque de possibilidades para realizar seus serviços bancários. MOSTRA DE ANIMAÇÃO RUSSA 27 a 30 de julho de 2017 O BRB, Instituição que sempre tem apoiado iniciativas culturais da nossa cidade, sente-se honrado em apoiar a Mostra de Animação Russa em Brasília. CINE BRASÍLIA EQS 106-107 - Asa Sul Brasília (61) 3244-1660 Vasco Gonçalves Presidente do BRB Em 2017, oitenta e um anos após a criação do maior estúdio de animação da antiga União Soviética, o público brasileiro tem a oportunidade de assistir a primeira Mostra de Animação Russa, através da exibição de 37 filmes, realizados entre os anos 1950 e a atualidade por alguns dos mais importantes nomes da animação soviética e russa.

Se imaginarmos um espaço entre a razão e o sentimento, a animação russa, ao longo de toda a sua existência, sempre estará mais próxima à emoção. No espírito pioneiro de Mikhail Tsekhanovsky, nos desenhos virtuosos de Lev Atamanov, na revolução visual de Fiodor Khitruk, na filosofia de Yuri Norstein, nas parábolas subversivas de Andrey Khrzhanovsky ou na frágil poesia de Svetlana Filippova a animação se afirmou na história como uma linguagem com fortes traços autorais. Acima de tudo, ela se destaca pela liberdade de que desfrutam escritores, diretores e animadores para escolher os elementos 6 que desejam, em meio ao que lhes é oferecido pelo mundo real. 7 Desta forma, em um país marcado por uma política externa beligerante e opressiva, esses artistas conseguem criar os desenhos animados mais humanos do universo e através de uma linguagem esopiana, burlam todas as fronteiras e estéticas impostas por qualquer regime político.

Esperamos que, na companhia de Tcheburashka, do gato Matroskin e do pequeno ouriço, a animação russa propicie um novo olhar sobre uma cultura rica e praticamente desconhecida no Brasil.

Desejamos a todos uma excelente Mostra!

Maria Vragova e Luiz Gustavo Carvalho programação

sinopses

a animação na rússia Serguei Kapkov e Larissa Maliukova mikhail tsekhanovsky: um pioneiro da animação Maria Vragova

conversa sobre a profissão Fiodor Khitruk

uma enciclopédia animada para a compreensão de uma sociedade Luiz Gustavo Carvalho

biografias

a seriedade de uma risada bondosa Roman Katchanov

fidelidade ao caminho escolhido Andrey Khrzhanovsky

extratos de “a neve na grama” Yuri Norstein

ponto de partida Yuri Norstein 27 quinta-feira 28 sexta-feira 29 sábado

livre 15h livre 15h adulto 20:30h livre 11h

A luva I Roman Katchanov. 1967, 10 min Tcheburashka I Roman Katchanov. 1969, 20 min Três histórias de amor I Svetlana Filippova. Espera, você vai ver! - 6º e 7º episódios I 2007, 12 min Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, 10 min (cada) Espera, você vai ver! - 1º, 2º e 3º episódios O ursinho Puff I Fiodor Khitruk. 1969, 10 min I Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, Onde morrem os cães I Svetlana Filippova. 2011, A flor vermelha I Lev Atamanov. 1952, 42 min Umka I Vladimir Popov e Vladimir Pekar. 1969, 10min 10 min (cada) 12 min Terem teremok I Leonid Amalrik. 1971, 10 min Cuidado, macaquinhos! I Leonid Schwartzman A história de Sara I Svetlana Filippova. 2006, (URSS, 1984) 10 min 6 min livre 14:30h Brutus I Svetlana Filippova. 2014, 13 min O ursinho Puff faz uma visita I Fiodor Khitruk. livre 16h 1969, 10 min adulto 16h Espera, você vai ver! - 4º e 5º episódios I O ursinho Puff e um dia atarefado I Fiodor PROGRAMAÇAO Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, 10 min (cada) Khitruk. 1972, 19 min A história de um crime I Fiodor Khitruk. 1962, Roman Katchanov. 1967, 10 min 20 min A luva I O crocodilo Guena I Roman Katchanov. 1971, Vladimir Polkovnikov. 1963, 20 min A ilha I Fiodor Khitruk. 1973, 10 min Tarakã, o bigodudo I 16 min O ursinho Taptizhka I Fiodor Khitruk. 1964, 9 min A batalha de Kerzhenets I Yuri Norstein e Ivan Ivanov-Vano. 1971, 10 min 10 11 O ouriço no nevoeiro I Yuri Norstein. 1975, 10 min lançamento 17h livre 16h O conto dos contos I Yuri Norstein. 1979, 29 min Lançamento do livro Tarakã, o bigodudo, de K. Espera, você vai ver! - 8º e 9º episódios I Tchukovsky Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, 10 min (cada) Mukha-Tsokotukha I Boris Dezhkin. 1960, 10 min adulto 17:30h adulto 17:30h A raposa e a lebre I Yuri Norstein. 1973, 12 min Meu amor I Alexander Petrov. 2006, 26min SESSÃO COMENTADA - com os curadores Maria A vaca I Alexander Petrov. 1989, 10 min Vragova e Luiz Gustavo Carvalho O sonho de um homem ridículo I Alexander A ilha I Fiodor Khitruk. 1973, 10 min Petrov. 1992, 20 min O homem na moldura I Fiodor Khitruk. 1966, A Sereia I Alexander Petrov. 1996, 10 min 10 min O velho e o mar I Alexander Petrov. 1999, 20 min O ouriço no nevoeiro I Yuri Norstein. 1975, 10 min Lavatory-Lovestory I Konstantin Bronzit. 2007, 10 min 30 domingo

mesa redonda 17h livre 11h adulto 17h

Animação Russa I com os curadores da Espera, você vai ver! - 10º episódio I SESSÃO COMENTADA - com a animadora mostra Maria Vragova e Luiz Gustavo Carvalho e a Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, 10 min Svetlana Filippova animadora Svetlana Filippova O quebra-nozes I Boris Stepantsev. 1973, 27 min Três histórias de amor I Svetlana Filippova. 2007, 12 min adulto 20:30h Onde morrem os cães I Svetlana Filippova. 2011, 12 livre 14:30h min Três histórias de amor I Svetlana Filippova. O conto do pescador e do peixinho I Mikhail A história de Sara I Svetlana Filippova. 2006, 6 min 2007, 12 min Tsekhanovskiy. 1950, 30 min Brutus I Svetlana Filippova. 2014, 13 min Onde morrem os cães I Svetlana Filippova. 2011, Espera, você vai ver! - 11º, 12º e 13º 12 min episódios I Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, 10 min (cada) A história de Sara I Svetlana Filippova. 2006, adulto 18:30h 6 min Umka procura um amigo I Vladimir Popov e Vladimir Pekar. 1970, 10 min A garça e a cegonha I Yuri Norstein. 1974, 10 min Brutus I Svetlana Filippova. 2014, 13 min A Sereia I Alexander Petrov. 1996, 10 min 13 12 O leão e o touro I Fiodor Khitruk. 1984, 10 min livre 16h Lavatory-Lovestory I Konstantin Bronzit. 2007, Espera, você vai ver! - 14º, 15º e 16º 10 min episódios I Vicheslav Kotenotchkin. 1969-1986, Três histórias de amor I Svetlana Filippova. 2007, 10 min (cada) 12 min Os três de Prostokvashino I Vladimir Popov. 1978, 19 min 14 15 LEONID AMALRIK SVETLANA FILIPPOVA Terem teremok I Terem teremok A história de Sara I Skazka Sari

URSS, 1971, 10min Rússia, 2006, 6 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. lguns animais decidem viver juntos em um “teremok”, uma ara que uma árvore cresça, é necessário plantá-la; para Acasinha típica russa. Baseado em um conto do folclore russo, Pque a primavera comece, é antes necessário limpar a neve; “Terem teremok” é o último filme do diretor Leonid Amalrik. para achar “o novo”, é necessário despedir-se “do velho”. Assim pensa, aos 6 anos, a menina Sara.

SINOPSES Três histórias de amor I Tri istorii liubvi LEV ATAMANOV Alemanha, 2007, 12 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. A flor vermelha I Alenkiy tsvetochek sando diversas imagens históricas, o filme narra três Uhistorias de amor de um poeta, inspiradas na vida do poeta URSS, 1952, 42 min Vladimir Maiakovsky. Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. aseado em um conto do folclore russo, análogo ao clássico “A BBela e a Fera”, o filme narra a história de um bondoso pai, o Onde morrem os cães I Gde umiraut sobaki qual traz uma flor vermelha de presente para a sua filha caçula, despertando a paixão e a angústia de um estranho ser que habita França, 2011, 12 min as sombras de um reino distante. O filme foi dirigido por Lev Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Atamanov, uma das principais influências do animador japonês Hayao Miyazaki. m homem cresce e deixa a sua casa. Durante toda a sua vida, Uele quer regressar em busca do seu passado. Mas acontecem 16 coisas, as quais ele não pode mudar: a sua mãe envelhece, a casa 17 fica meio destruída e o seu cachorro morre. Acontecimentos KONSTANTIN BRONZIT inevitáveis, aos quais estamos todos destinados. Lavatory-Lovestory Brutus I Brut Rússia, 2007, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Rússia, 2014, 13 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Prêmio de Melhor Filme, no Festival Anima Mundi, 2007 Nomeado ao Oscar, na categoria “Melhor curta-metragem”, 2007 autora e animadora Svetlana Filippova aborda um dos Aepisódios mais trágicos da humanidade. A história do cão endo como cenário um banheiro público, Konstantin Bronzit, Brutus na Alemanha nazista. Tum dos principais nomes da animação contemporânea, relata uma história de amor repleta de pureza e romantismo.

BORIS DEZHKIN e VLADIMIR SUTEEV Mukha-Tsokotukha

URSS, 1960, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. ukha-Tsokotukha conta a história de uma mosca que é atacada Mpor uma aranha no dia do seu aniversário. O filme foi realizado a partir do conto homônimo de Korney Tchukovsky, um dos principais escritores infantis da antiga União Soviética. ROMAN KATCHANOV O homem na moldura I Tchelovek v ramke URSS, 1966, 10 min A luva I Varezhka Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português.

URSS, 1967, 10 min ma sátira social sobre os burocratas e a burocracia. À medida Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Uque um “homem de papel” sobe os degraus da carreira burocrática do seu país, ele vai deixando a vida e transforma-se Primeiro Prêmio no Festival Internacional de animação de Annecy. em uma mera máscara. A história de uma menina que sonhava em ter um cachorro. O ursinho Puff I Vinni Pukh O crocodilo Guena I Krokodil Guena URSS, 1969, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. URSS, 1969, 20 min rimeiro episódio das aventuras do “Ursinho Puff”, realizado a Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. Ppartir do livro homônimo do escritor Alan Miln. A versão russa ealizado a partir do livro infantil “O Crocodilo Guena e os do desenho animado foi considerada a melhor pelo escritor inglês. Rseus amigos”, o filme apresenta-nos o personagem ícone da história da animação soviética: “Tcheburashka”. O ursinho Puff faz uma visita I Vinni Pukh idet v gosti URSS, 1969, 10 min Tcheburashka Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português.

URSS, 1971, 20 min o segundo episódio da série, o ursinho Puff decide visitar o seu Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. Namigo coelho, passando por uma situação embaraçosa. o segundo episódio da trilogia, o crocodilo “Guena” comemora No seu aniversário, o qual, infelizmente, acontece somente uma vez por ano. Tcheburashka e o crocodilo Guena ainda fazem todo o O ursinho Puff e um dia atarefado I Vinni Pukh i den zabot possível para serem aceitos como “pioneiros”. O filme conta com 18 a participação do famoso animador russo Yuri Norstein. URSS, 1972, 19 min 19 Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. ltimo filme da trilogia. O episódio relata o aniversário do Úburrinho Ió e as peripécias do ursinho Puff e seus amigos para FIODOR KHITRUK agradar o aniversariante. A história de um crime I Istorya odnogo prestuplenya A Ilha I Ostrov

URSS, 1962, 20 min URSS, 1973, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Prêmio “Golden Gate” no VII Festival Internacional de San Franscico, 1962 Palma de Ouro no Festival Internacional de Cannes, 1974. Leão de Prata no Festival de Veneza, 1962 “A ilha” conta a história de um Robinson Crusoe contemporâneo. Diploma no IX Festival Internacional de Cinema e Animação de Uma reflexão poética sobre a solidão humana na sociedade Oberhausen, 1963 moderna. arulhos noturnos, causados por uma vizinhança mal educada, Blevam o simpático e pacífico contador Vassily Vassilievitch Manin a cometer um crime. O leão e o touro I Lev i byk URSS, 1984, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. O ursinho Taptizhka I Taptizhka este seu último trabalho, Fiodor Khitruk retrata, a partir de uma parábola visual, uma história de amizade e traição, URSS, 1964, 9 min N repleta de simbolismo psicológico. Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. onsiderado pelo diretor como o seu melhor filme, “Taptizhka” Crelata a história de amizade entre um ursinho que se recusava a hibernar e um coelhinho. ANDREI KHRZHANOVSKY A garça e a cegonha I Tsaplia i zhuravl URSS, 1974, 10 min A gaita de vidro I Stekliannaya garmonika Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. URSS, 1968, 20 min Prêmio Especial do Júri no Festival de Cinema de Annecy, 1975 Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Primeiro Prêmio no III Festival Internacional de Cinema de New York, 1975 ilme alegórico que retrata o destino da arte em um governo esta obra-prima, o diretor Yuri Norstein narra uma grande Fburocrático e corrupto. Um músico chega a uma cidade, Nhistória de amor entre a garça e a cegonha, fazendo o onde reinam a burocracia e a corrupção. Poderão as suas espectador esperar pelo beijo final, o qual nunca chegará. melodias, tirar as pessoas da indiferença? Realizado em 1968, “A gaita de vidro” foi o primeiro desenho animado censurado na União Soviética. A música para o filme foi composta por Alfred O ouriço no nevoeiro I Ezhik v tumane Schnitke, um dos principais compositores do século XX. URSS, 1975, 10 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. Prêmio do Festival Internacional de Cinema de Londres, 1977 Boomerang de Prata no Festival Internacional de cinema em Sidney, 1978 VICHESLAV KOTENOTCHKIN Prêmio de Melhor Curta-metragem no Festival Internacional de Cinema de Girona, 1977 Espera, você vai ver! I Nu pogodi! m ouriço fica perdido em uma floresta, durante um nevoeiro, URSS, 1969-1986, 16 episódios Uao ir ao encontro do seu amigo urso. Neste filme, que recebeu Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. mais de 35 prêmios internacionais, Yuri Norstein reflete sobre ma das séries mais emblemáticas da animação soviética, os enigmas da vida e os mistérios da existência. Ucomposta de 16 episódios realizados entre 1969 e 1986. Na série, um lobo tenta, continuamente, pegar um coelhinho que sempre consegue escapar. Muitos enxergam nesta trama Conto dos contos I Skazka skazok um paralelo com o desenho animado “Tom e Jerry”, apesar de URSS, 1979, 29 min Kotenotchkin ter conhecido a série americana somente no final Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. 20 dos anos oitenta. 21 “Grand-Prix” do Festival Internacional de Cinema de Lille, 1980 Prêmio Internacional de Crítica FIPRESSI, 1980 Prêmio da Federação Internacional dos Cineclubes em Oberhausen, 1980 “Grand-Prix” no V Festival Internacional de Cinema de Zagreb, 1980 YURI NORSTEIN e IVAN IVANOV-VANO Primeiro Prêmio no Festival Internacional de Cinema de Ottawa, 1980 A batalha de Kerzhenets I Setcha pri Kerzhentse ste filme, considerado pela Academia de Arte Cinematográfica Ecomo “o melhor filme de todas as épocas e povos”, aborda as URSS, 1971, 10 min questões primordiais da humanidade. Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. ilme baseado na lenda e no poema sinfônico do compositor Frusso Rimsky-Korsakov sobre a cidade invisível de Kitezh, a qual ficou submersa para evitar a sua ocupação pelas tribos tártaras.

YURI NORSTEIN A raposa e a lebre I Lissa i zaiats URSS, 1973, 12 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. Melhor Filme Infantil e Prêmio Especial, no II Festival Internacional de Cinema de Zagreb, 1974 filme é baseado em um conto popular russo e narra a história Ode uma lebre, cuja moradia é invadida pela raposa, e todas as suas tentativas de recuperar a sua casa de volta. ALEXANDER PETROV Meu amor I Moya lubov Rússia, 2006, 27 min A Vaca I Korova Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. URSS, 1989, 10 min Prêmio especial do júri no XI Festival Internacional de Animação de Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Hiroshima, 2006 Indicação ao Oscar na categoria “Melhor curta-metragem”, em 1990 Prêmio FIPRESCI de Melhor Animação no Festival Internacional de Primeiro Prêmio no Festival Internacional de Animação de Hiroshima, 1990 Cinema Documentário e Animação de Leipzig, 2006 Prêmio na categoria “Melhor Estreia” do Festival Internacional de Prêmio de “Melhor Animação” no Festival Internacional Anima Mundi, 2007 Animação de Ottawa, 1991 Indicação ao Oscar, em 2008 m dos primeiros filmes do diretor, “A vaca” narra as memórias eu amor” é baseado no romance “A história de amor”, Ude uma criança sobre o seu relacionamento com uma vaca, “Mdo escritor russo Ivan Shmelev. No final do século XIX, que integrava o cotidiano de uma família rural. O filme é baseado o jovem Anton passa a viver em um mundo de sonhos, após se no livro homônimo do escritor russo Andrei Platonov. entregar à dúvida entre o seu primeiro amor e o desejo por uma “femme fatale”. O diretor e animador russo Aleksander Petrov utiliza uma técnica especial para a realização do filme, pintando quadros de vidro a óleo com os dedos, para então fotografá-los. O sonho de um homem ridículo I Son smeshnogo tcheloveka

Rússia, 1992, 20 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Primeiro Prêmio e Prêmio Especial da ACIFA no Festival Internacional de VLADIMIR POLKOVNIKOV Animação de Ottawa, 1992 Primeiro Prêmio no Festival Internacional de Animação de Annecy, 1993 Tarakã, o Bigodudo I Tarakanische Primeiro Prêmio no VII Festival Internacional de Animação de URSS, 1963, 16 min Stuttgart, 1994 Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. aseado no livro homônimo do escritor russo Fiodor Dostoievsky. Um personagem desiludido com o mundo decide filme, baseado no conto homônimo do escritor russo Korney B OTchukovsky, conta a história de uma barata capaz de deixar 22 cometer suicídio. Após ignorar uma menina que em prantos 23 implora por ajuda, ele volta para casa, pega um revólver para se todas as feras do reino animal em pânico. Somente o pequeno e matar, porém acaba adormecendo. Em seguida, em um estranho corajoso pardal pode enfrentar o temível agressor. sonho, encontra a verdade projetada em uma sociedade ideal, livre da luxúria e do egoísmo humano.

A Sereia I Rusalka VLADIMIR POPOV e VLADIMIR PEKAR

Rússia, 1996, 10 min Umka Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. URSS, 1969, 10 min Indicação ao Oscar na categoria “Melhor curta-metragem”, em 1998 Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. Prêmio Hiroshima no Festival Internacional de Animação de Hiroshima, 1998 filme conta a história de um ursinho polar, chamado Umka, e Prêmio Especial do Júri no Festival Internacional de Animação de Odo seu primeiro encontro com o ser humano. Annecy, 1997 m conto envolvente sobre um monge, o seu noviço e uma Usereia. Uma história de amor, tentação e traição. Umka procura um amigo I Umka ishet druga

URSS, 1970, 10 min O velho e o mar I Starik i more Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português.

Rússia, Canadá, Japão 1999, 20 min s vésperas do réveillon, Umka procura o seu amigo no círculo Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. ÀÁrtico, envolvendo-se em grandes aventuras. Oscar de “Melhor curta-metragem”, em 2000 aseado no livro homônimo do escritor americano Ernest BHemingway, o filme conta a história de um velho pescador que decide enfrentar o alto mar em busca de um peixe gigante. VLADIMIR POPOV Os 3 de Prostokvashino I Troie iz Prostokvashino

URSS, 1978, 19 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. aseado no livro “Tio Fiodor, o cachorro e o gato”, do renomado Bescritor infantil Eduard Uspensky, o primeiro filme da trilogia “Os 3 de Prostokvashino” relata a vida do menino Fiodor, que decidi ir viver sem os pais, na companhia de um gato e um cão, no pequeno vilarejo chamado Prostokvashino.

LEONID SCHWARTZMAN Cuidado, macaquinhos! I Ostorozhno obezianki!

URSS, 1984, 9 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. filme “Cuidado, macaquinhos!” é o segundo filme da série Ode sete episódios sobre uma macaca e os seus filhos, que sempre procuram bagunça. Com um cenário escrito pelo famoso escritor infantil Gregory Oster, o filme tem ainda a trilha sonora assinada por Andrei Makarevitch, líder da banda “Mashina Vremeni”, uma das mais famosas bandas de rock dos anos 80, na União Soviética. 24 25 BORIS STEPANTSEV O Quebra Nozes I Schelkuntchik URSS, 1973, 27 min Classificação livre. Versão original em russo. Legendas em português. Primeiro Prêmio no Festival de Cinema Infantil de Girona, 1974 ilme baseado no livro de E.T.A. Hoffmann e no balé homônimo Fdo compositor russo P. I. Tchaikovsky.

MIKHAIL TSEKHANOVSKY O conto do pescador e do peixinho I Skazka o ribake i ribke URSS, 1950, 30 min Classificação livre. Versão original em russo. Dublagem em português. “Melhor filme” do VI Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary, 1951 ealizado a partir do livro homônimo do poeta russo Aleksander RPushkin, “O conto do pescador e do peixinho” conta a história de um pescador e de um peixinho dourado, capaz de realizar qualquer desejo do seu dono. 26 27 festejavam a paz, a vida e a infância. O “Soyuzmultfilm” reunia talentos excepcionais, Serguei Kapkov e que poderia causar inveja em qualquer outro estúdio do mundo. Nestas circunstâncias, A animação na Rússia Larissa Maliukova mestres conseguiram criar filmes que até hoje conservam um frescor e uma habilidade técnica surpreendente, além de aspectos psicológicos, educativos e mentais sutis: “A canção alegre” (1946), “O cavalo Gorbunok” (1947), “O conto do pescador e do peixinho” A história da animação russa começou com... besouros. Vladislav Starevitch, cineasta, (1950), “A flor vermelha” (1952), “O gatinho teimoso” (1953), “O antílope dourado” (1954), fotógrafo e excêntrico entomologista amador, decidiu realizar um filme sobre a luta “A rainha da neve” (1957). Nestes filmes, tão diferentes em estilo, humor, tempo e ritmo, desses insetos por uma fêmea. Ele colocou-os sob uma lâmpada elétrica e ligou a câmera foram exploradas a natureza da imagem desenhada à mão e o caráter do personagem de vídeo. Porém, o calor chamuscante da luz fez com que os insetos não se mexessem. (cabe ressaltar as contribuições de importância singular para o mundo da animação Starevitch decidiu então fazer um truque: arrancou as patas de alguns besouros secos realizadas pelo animador e diretor Leonid Schwartzman). Em meados dos anos 60, retirados da sua coleção e amarrou-os, com a ajuda de um fino fio e plasticina. Em até mesmo o Papa recomendou aos seus fiéis os desenhos animados soviéticos, seguida, encenou a luta dos insetos, gravando quadro por quadro na película. Desta considerando-os “os mais gentis e humanos do mundo”. Os filmes desta época irradiam forma, surgiu o primeiro desenho animado na Rússia e a primeira animação de objetos alegria. A animação desses anos tinha ainda uma capacidade colossal de contar histórias, (animação de bonecos) no mundo. transmitindo aos jovens espectadores o profundo significado dos contos de fadas, hipnotizando-os e, ao mesmo tempo, educando-os. No entanto, isso não foi compreendido imediatamente. A estreia aconteceu no dia 08 de abril de 1912 e a imprensa moscovita descreveu o “milagre” desta forma: “Starevitch Em 1953, a União Soviética vivencia o “terceiro renascimento” da animação de objetos descobriu segredos invisíveis sobre o adestramento de insetos! Nos seus filmes, os (animação de bonecos). Após a partida de Vladislav Starevitch, esse gênero só havia sido besouros atuam como verdadeiros atores!” Domadores de circo pediam e insistiam para lembrado em 1935, quando o diretor Alexander Ptushko realizou o longa-metragem “O que o cineasta vendesse os segredos sobre a técnica usada para o adestramento dos novo Gulliver”. Neste filme, apareciam na mesma cena atores e personagens animados insetos. Starevitch, no entanto, ergueu as mãos de maneira teatral e gritou: “De jeito liliputianos. Vencedor do prêmio principal no Festival de Cinema de Veneza, diversos nenhum!” Ele era um mistificador e um brincalhão nato. Starevitch foi ainda o primeiro jornais de todo o mundo escreveram sobre o diretor a utilizar nos seus filmes a combinação entre atores reais e personagens filme e até mesmo Charles Spencer Chaplin 28 animados em um único quadro. No filme “A embriaguez e as suas consequências” (1913), reagiu ao “novo Gulliver” com cumprimentos 29 o herói principal bebe “para capeta” e Starevitch filma um episódio, no qual um diabo de lisonjeiros. Diretores de arte, artistas, plasticina sai da garrafa, sob o olhar perplexo do ator russo Ivan Moszhukhin. operadores de câmera e marionetistas estiveram envolvidos no universo da Após a revolução de 1917, Vladislav Starevitch emigrou para a França, provocando animação de objetos (animação de bonecos). um hiato na história da animação no país. Em meados dos anos 20, jovens artistas Entre os melhores exemplos deste gênero de entusiastas começaram a fazer os primeiros desenhos animados na União Soviética. animação, destacam-se os filmes de Roman Eram, no entanto, desenhos pouco interessantes, com um viés político, criados a partir Katchanov “A luva” (1967), “Crocodilo Guena” da técnica de sobreposição de marionetes de papel. Em seguida, surgiram os primeiros (1969) e “Tcheburashka” (1971). desenhos animados. Na década de 1960, um sentimento que Em meados dos anos 30, os desenhos animados de Walt Disney chegaram à União ansiava por novas aberturas invadiu os Soviética. O impacto junto ao público e aos cineastas foi tão grande, que se tornou clara diversos movimentos culturais existentes. a necessidade de aprender a partir da experiência americana. Por ordem pessoal do Jovens artistas, recém-formados pelo camarada Stalin, uma delegação foi enviada aos Estados Unidos. Disney voluntariamente Instituto de Cinema, ainda sem nenhum compartilhou as suas tecnologias e, em 1936, foi criado em Moscou o principal estúdio de limite imposto pela ideologia e com sede animação do país. No futuro, todos os sucessos da animação soviética seriam associados pela liberdade, chegam aos estúdios de ao nome “Soyuzmultfilm”. animação do país. Desta forma, em 1962, É importante ressaltar que essa nova tecnologia não foi bem recebida por todos os a União Soviética vivencia relevantes diretores. Muitos imitaram a estética de Disney, mas muitos resistiram. Fascinados mudanças na história da animação. Este pelo cinema de animação autoral, procuravam uma estética própria. De maneira geral, movimento iniciou com o filme “A História a animação soviética foi confinada à “gaveta infantil”, sendo permitido filmar somente Frames de “A história de um crime” contos de fadas ou histórias com ensinamentos morais. No entanto, após a Segunda Guerra Mundial, os artistas filmavam voluntariamente desenhos animados, que de um Crime”, de Fiodor Khitruk. A revolucionária tragicomédia sobre a imoralidade da sociedade quanto os estadistas olhassem novamente com atenção para o cinema de impolidez transformou-se em um símbolo de mudanças. O artista ofereceu expressivos animação. O “Oscar”, em alguns sentidos, ajudou a animação russa a sair do gueto do “alinhamentos” no estilo do filme, permitindo ao espectador pensar o que fora insinuado, esquecimento e a sobreviver a um genocídio econômico... porém não descrito detalhadamente no espaço. Khitruk é, merecidamente, reverenciado Era uma época de paradoxos. Em parte, a indústria da animação caminhava rumo ao como professor por quase todos os diretores da animação contemporânea na Rússia. abismo financeiro. Os grandes estúdios do país, emblemas da indústria cinematográfica Trabalhando no universo da animação desde 1937 e tendo estudado e incorporando as de animação, fechavam as portas. No entanto, paralelamente, como cogumelos, tradições da animação clássica na sua obra, ele se tornou o descobridor e explorador de proliferavam novos estúdios independentes. Nascidos durante a crise, eles eram imunes a áreas até então desconhecidas do cinema de animação. Em cada novo trabalho, ele abre qualquer tipo de dificuldade. novas “portas”: “Toptizhka” (1964), “As férias de Bonifácio” (1965), “O homem na moldura” (1966), “Filme, filme, filme” (1968) e “O ursinho Puff” (1969) constituem marcos da história Era também uma época de novas esperanças. Uma escola de animação foi criada em da animação no país. São Petersburgo, inicialmente devido ao ativismo dos diretores Irina Evteeva, Konstantin Bronzit e Rinat Gazizov... Mas o grupo de São Petersburgo iniciou, praticamente do zero, A animação não só havia atingido a sua maturidade, como também adquirido um olhar alguns projetos de grande porte: séries para a televisão e filmes de longa-metragem. perspicaz sobre a sociedade. Compreendeu também a possibilidade e necessidade de Hoje, o estúdio “Melnitsa” (Moinho) ocupa um dos principais lugares no cenário comercial dialogar com o público sobre as preocupações íntimas e cotidianas de cada indivíduo e do cinema de animação. a responsabilidade de cada indivíduo na sociedade. Nos melhores filmes, os aspectos sociais, os pensamentos sobre o presente e o futuro, assim como sobre a moralidade Atualmente, a animação russa está em ascensão. São produzidos 300 filmes por ano, ganham formas filosóficas. Nos filmes de Andrei Khrzhanovsky, os acontecimentos entre filmes autorais, séries e longas-metragens. Obviamente, as dificuldades financeiras transformam-se até mesmo em parábolas filosóficas poéticas, tais como “Era uma vez novamente influenciam o desenvolvimento do universo de animação. Até hoje, a Rússia Kozyavin” (1966) e “A gaita de vidro” (1968). não conseguiu produzir nenhum blockbuster no universo de animação, o qual mereça ser assistido em todo o mundo. Para a produção de tal produto, simplesmente, não há meios Quando o animador Yuri Norstein tornou-se diretor, a animação soviética ganhou um econômicos suficientes. Mas chegaremos lá. autor que constrói os seus filmes com um universo próprio: “A raposa e a lebre” (1973), “A garça e a cegonha” (1974), “O ouriço no nevoeiro” (1975) e “O conto dos contos” (1979). 30 Cada imagem mostra ao mesmo tempo o mundo concreto, “habitável”, e o espaço 31 completamente imaterial do espírito. Independente dos protagonistas escolhidos por Norstein para as suas histórias, no centro da sua obra encontra-se sempre o espírito perdido, em busca de laços com o mundo, com as suas raízes e com os amigos. O cinema de animação autoral desta época pode ser, merecidamente, comparado com a literatura, com a poesia e com a pintura.

Em 1988, foram criados na União Soviéticos estúdios não estatais mais dinâmicos e com linhas próprias, os quais atraíam os jovens artistas. Graças à lei “da cooperação”, e Igor Kovalev criaram o estúdio “Pilot”, primeiro estúdio independente. A coluna vertebral deste estúdio era composta por graduandos da escola fundada pelo próprio Alexander Tatarsky, durante os anos em que ele trabalhava para a televisão. No estúdio “Pilot”, os diretores souberam combinar com sucesso o trabalho em filmes autorais e as encomendas do mercado. O estúdio quebrou o estereótipo relativo à duração dos filmes: somente as questões artísticas determinavam a duração de cada título. Assim, estudantes provenientes da “Escola Estúdio Pilot” imediatamente começaram a ganhar reconhecimento do mercado internacional e receberam os principais prêmios nos concursos internacionais.

Durante os anos 1990, cerca de dez novos estúdios foram criados pelo país. O famoso diretor de cinema e artista Alexander Petrov criou o estúdio de animação “Panorama”, em Yaroslavl. No entanto, a crise econômica que assolou o país foi extremamente prejudicial para o cenário cinematográfico do país. Alexander Petrov concluiu no Canadá o seu filme “O velho e o mar”, pelo qual ganhou o Oscar americano. Este fato fez com que tanto a transformação na linguagem artística de Tsekhanovsky, muitos artistas simplesmente Mikhail Tsekhanovsky: um pioneiro da não aceitaram estas mudanças e deixaram a indústria da animação para outros campos animação Maria Vragova das artes, tais como a pintura ou a ilustração literária. O filme “O conto do padre e do seu trabalhador Balda”, baseado na obra do poeta russo Alexander Pushkin deveria ser o primeiro longa-metragem do diretor, com música de Um dos pioneiros da animação na União Soviética, Mikhail Mikhailovitch Tsekhanovsky Dmitri Shostakovich. Os trabalhos começaram em 1933 e, após ter escrito parte da nasceu em 1889, na cidade de Khmelnyntsky. Começou a desenhar ainda no Liceu de partitura, Shostakovich relatou entusiasmado: “Há diversas situações hiperbólicas Pintura de Moscou, antes de continuar os seus estudos na Academia de Belas Artes de e personagens grotescos... Escrever a música é prazeroso e fácil.” No entanto, em Paris, entre 1908 e 1909. De volta à Rússia em 1911, formou-se na Academia Imperial de 1936, Shostakovich foi forçado a interromper os trabalhos, após a publicação do Artes de São Petersburgo e na Escola de Pintura, Escultura e Arquitetura de Moscou. artigo “Confusão ao invés de música”, no qual criticavam o “formalismo” nas obras do Entre 1918 e 1923, integrou o Exército Vermelho, onde realizou diversos trabalhos em arte compositor. Além disso, os movimentos mecanicamente interligados dos personagens aplicada e escultura. Trabalhou ainda como artista instrutor na Escola Técnica Estatal de em preto e branco foram considerados “incompatíveis” com o estilo pushkiniano pelos Arte e Indústria, em Petrogrado (atual São Petersburgo). críticos. Finalmente, a animação do filme ficou praticamente pronta e foi enviada aos A partir de 1926, Mikhail Tsekhanovsky trabalhou na editora “Raduga” (Arco-íris) e arquivos do estúdio “Lenfilm”. Durante a Segunda Guerra Mundial, o material foi destruído na editora infantil Lengiz, ilustrando diversos livros infanto-juvenis em colaboração durante um bombardeio. Apenas o fragmento “Bazaar”, com poemas de Alexander com Vladimir Lebedev. O jovem artista foi rapidamente seduzido pelo movimento Vvedensky, e a partitura fragmentada e inacabada de Shostakovitch² sobreviveram ao construtivista, e logo incorporou o método gráfico proposto por El Lissitzky no seu incêndio. Em seus diários, Tsekhanovsky aponta o destino do filme como “um desastre.” universo criativo. Esta influência construtivista fica evidente nos assim chamados “cine- Após sobreviver a meses sombrios durante o Cerco de Leningrado, Tsekhanovsky livros”, criados por Tsekhanovsky na década de 20: “Bola”, “Bim-Bom” e “Trem”. Nestes mudou-se para Moscou no final da Segunda Guerra Mundial e começou a trabalhar no volumes, nos quais o artista já utilizava algumas técnicas cinematográficas, criava-se, ao “Soyuzmultfilm”. Nos filmes realizados após a Guerra o diretor retrata o maravilhoso folhear o livro, uma espécie de animação das imagens. mundo dos contos de fadas russo. Com uma técnica precisa e consciente dos sentimentos de heroísmo, tragédia e poesia presentes nestas obras, Tsekhanovsky conseguiu criar Em 1928, iniciou os seus trabalhos como diretor de animação no estúdio “Sovkino”¹ em 33 32 Leningrado. Com um universo complexo e um vasto horizonte, Mikhail Tsekhanovsky imagens dotadas de uma poesia fabulosa, refutando a opinião daqueles que alegavam ser encontrou na animação uma linguagem ideal para transferir na integralidade o seu estilo a animação apenas um meio para ninharias cômicas. e a sua visão artística. Já o seu primeiro filme, “Correio” (1929), foi em muitos sentidos um grande marco na história da animação soviética. Neste primeiro curta-metragem, baseado ¹ O estúdio cinematográfico “Sovkino” passou a ser chamado de “Lenfilm” a partir de 1934. nas suas ilustrações para o livro de , o diretor trouxe para o cinema a ² A partitura foi restaurada e terminada por Vadim Bibergan, aluno do compositor, em 2005. estética construtivista, que havia aperfeiçoado nas suas ilustrações. Em 1929, ao lado de Evgueny Sholpo e Arseny Avramov, Tsekhanovsky foi um dos pioneiros do “som desenhado”, uma síntese de obras musicais através de uma imagem gráfica gravada na película, a partir de trilhas sonoras. Em 1930, a versão sonora de “Correio”, com música de Vladimir Deshevov e apresentação de Daniil Kharms, ficou conhecida como o primeiro desenho animado sonoro da União Soviética. O filme foi ainda o primeiro desenho animado a atingir um grande público na União Soviética e a sua versão em cores (desenhada à mão) constitui a primeira animação colorida do país. O filme revolucionou o universo da animação na União Soviética, utilizando ângulos diagonais inesperados, os quais nos remetem às fotografias de Boris Ignatovitch e trazendo uma organização rítmica da imagem. Essa organização rítmica Frames de “O conto do pescador e do peixinho” da imagem e a sincronização entre o som e imagem continuaram a ser desenvolvidas pelo diretor em “Pacific 231” (1931). Com música de Arthur Honegger, o filme é construído a Filmografia na mostra partir de uma complexa composição sonoro-visual. O conto do pescador e do peixinho” (Skazka o ribake i ribke) Com o estabelecimento do realismo socialista, Tsekhanovsky foi forçado a abandonar URSS, 1950, 30 min este estilo extremamente inovador para praticar a técnica genérica que viria a ser conhecida na União Soviética sob o nome de “Éclair” (no Ocidente esta técnica é chamada de rotoscopia). Se as diferenças visuais são claramente visíveis, marcando uma profunda fiodor khitruk diretor I cenarista I animador I pedagogo

Nasceu em Tver, em 1917. Após concluir os seus estudos no Instituto de Ilustradores, Fiodor Khitruk integrou o corpo de profissionais do estúdio “Soyuzmultfilm” entre 1937 e 1941 e entre 1948 e 1983. Animou cerca de 200 filmes, antes de iniciar a carreira de direção. Colaborou com S. Alimov, E. Nazarov. Foi professor na Escola Superior para Roteiristas e Diretores, na Escola de Animadores do Estúdio Soyuzmultfilm e no Instituto de Cinema de Moscou, além de ter sido diretor artístico do mesmo estúdio. Vencedor de diversos prêmios internacionais, entre os quais destacam-se o prêmio do Festival Internacional de Cinema de Cannes, o Prêmio Estatal da URSS e o Prêmio Starevitch de animação. Em 1985, foi condecorado como “Artista do Povo”, na União Soviética.

34 35 Filmografia na mostra

A luva (Varezhka) URSS, 1967, 10 min A história de um crime (Istorya odnogo prestuplenya) URSS, 1962, 20 min O ursinho Taptizhka (Taptizhka) URSS, 1964, 9min O homem na moldura (Tchelovek v ramke) URSS, 1966, 10 min O ursinho Puff (Vinni Pukh) URSS, 1969, 10 min O ursinho Puff faz uma visita (Vinni Pukh idet v gosti) URSS, 1969, 10 min O ursinho Puff e um dia atarefado (Vinni Pukh i den zabot) URSS, 1972, 19 min A Ilha (Ostrov) URSS, 1973, 10 min O leão e o touro (Lev i byk) URSS, 1984, 10 min “Pinóquio” e alguns outros. Nós estudávamos estes filmes detalhadamente, quadro por quadro, cada cena, cada episódio. Fiodor Khitruk Conversa sobre a profissão No início de 1940, eu fui convidado pelo diretor Lev Atamanov para trabalhar com ele, em Yerevan. Trabalhei com ele novamente mais tarde, em Moscou. Na verdade, eu não fui convidado diretamente. Animadores mais experientes, tais como Boris Titov e Grigory Fiquei impressionado pela animação pela primeira vez em 1934. Kozlov foram convidados, e eles me levaram. Em Yerevan, realizamos o primeiro longa- Eu tinha 17 anos quando vi os desenhos de Walt Disney, no Primeiro Festival metragem de animação armênio: “O tapete mágico”. Trabalhávamos com entusiasmo por Internacional de Cinema de Moscou. Eram os filmes “Maestro Mickey”, “Os três mais de um ano e, em maio de 1941, voltamos felizes a Moscou. porquinhos” e “Os pinguins engraçados”. Obviamente, eu já tinha visto desenhos E a guerra começou... Eu me lembro dos primeiros dias alarmantes. Lembro-me como animados nacionais e estrangeiros, mas naquela época, eu achava que tratava-se todo o estúdio era tenso, assim como todo mundo. Já tínhamos outros pensamentos somente de um truque habilidoso. Mas esses filmes me transtornaram. Eu via algo e temas: neste estado de mobilização interna, nós sentíamos a necessidade de criar incrível, inimaginável! Eu já estava bastante habituado com o fato que um desenho podia cartazes curtos, ativos e satíricos. Dezhkin e eu também começamos a criar um cine- mexer-se no écran. Mas o que mais me impressionou foi que estes filmes fizeram-me cartaz publicitário. Trabalhávamos como loucos, sem nenhum roteiro ou esboço... Durante esquecer disso. Levaram-me para um mundo de novas imagens, surreais e ao mesmo os ataques aéreos, colocávamos capacetes que nós próprios confeccionamos. Subíamos tempo incrivelmente reconhecíveis, muito divertidas. Porque só podemos rir de algo que no telhado do estúdio e atirávamos bombas incendiárias... Após o término do alarme conhecemos, sobre o qual temos uma posição. aéreo, voltávamos a trabalhar, pernoitando muitas vezes no estúdio...

Eu não vou mentir, dizendo que aquela sessão foi determinante para mim na escolha da Mas nós não terminamos a nossa história. Eu fui mobilizado como cadete do colégio de minha profissão. Naquele momento, eu não pensava na animação como a minha futura infantaria, comandante de pelotão e mais tarde como intérprete militar no 17º exército profissão. Eu já estudava em um liceu artístico e sonhava com as artes gráficas. Mas o aéreo. Junto com as unidades do 3º fronte da Ucrânia, eu lutei até o final da guerra, indo sentimento que experimentei durante a sessão, permaneceu na minha memória e, após até Viena. três anos, foi determinante na escolha da profissão. A guerra acabou. Eu regressei a Moscou e já pretendia voltar ao meu querido estúdio, 36 Em 1937, após ser aprovado no concurso artístico, eu fui aceito como estagiário-animador mas, de repente, fui enviado a Berlim, como intérprete militar, permanecendo dois 37 no estúdio “Soyuzmultfilm”. O trabalho de um animador é muito específico. Ele requer anos na Alemanha. Somente no dia 10 de novembro de 1947, precisamente dez anos uma qualidade bastante rara: a habilidade de poder imaginar um personagem em após a minha admissão no estúdio, eu voltei ao “Souyzmultfilm”, e a minha profissão de qualquer ângulo. Essa é somente a primeira premissa para essa profissão. animador, que eu mal havia começado a dominar e da qual já tinha me esquecido. Eu tive Eu estudava, praticando e observando o trabalho dos nossos melhores animadores: que, novamente, começar tudo do zero. Boris Dezhkin, Faina Epifanova, Boris Titov e muitos outros. Mas vivemos ainda anos Eu estava com sorte, pois entrei no grupo de Boris Dezhkin. Como ele se lembrava de difíceis, cheios de desespero e decepções, antes que eu pudesse chamar-me de artista- mim, logo me deu uma cena de produção do seu novo filme. Mas eu tive problemas com animador. Quanto mais eu trabalhava, mais eu entendia como a profissão de animador é esta cena, e não consegui fazê-la. O prazo era curto e pressionava-me como a espada de difícil e heterogênea. O animador não só precisa saber desenhar bem e rápido. Ele precisa Dâmocles. Quanto mais nervoso eu ficava, mais o meu trabalho piorava. Já começava a ainda ter um ouvido musical, pois trabalhamos com música e somos acompanhados pensar em procurar outro trabalho (eu já tinha exercido a profissão de intérprete), mas constantemente pela música. Ele necessita de um bom ritmo. Finalmente, ele precisa não conseguia me separar da animação. Ela já fazia parte de mim. Sou muito grato a de uma propriedade única: tem que guardar na imaginação aquele movimento decisivo, Dezhkin, pois ele entendia perfeitamente o meu estado, as minhas torturas e dúvidas e porque ele poderá vê-lo durante o processo, no écran, quando as composições estiverem guiava-me com muito tato. completas e filmadas. No filme “A patinha cinza”, de L. Amalrik e V. Polkovnikov, eu fiquei encarregado de uma O animador, trabalhando em uma cena, tem que sentir sempre a sua duração, a sua ordem cena: o personagem inteiro da raposa em uma determinada parte, pois durante o filme, e o seu ritmo. Vê-la através da sua visão interna. Ele deve ainda ser ator... Precisa ainda vários animadores trabalham em um personagem. Isto também é uma peculiaridade da de muitas outras qualidades. Dizem que a animação é uma arte sintética, mas também nossa profissão. A imagem é única, e deve existir uma única solução e maneira de atuar ao podemos dizer que a profissão de animador é uma das profissões mais sintéticas, pois longo do filme, mas é realizada por vários animadores, cada qual com o seu próprio estilo reúne várias linguagens artísticas. e propriedades... É difícil imaginar o papel de Hamlet sendo apresentando por cinco atores Nós aprendemos muito com os filmes de Disney, porque a escola de animação clássica, como é hoje em dia conhecida, é muito bem representada nos seus longas-metragens: “A Branca de neve e sete anões”, “Bambi” (em minha opinião, o ápice da arte de animação), em um espetáculo, apesar de ter ouvido falar sobre uma encenação assim na Polônia. Mas no papel de narrador. isso era uma exceção e para nós, uma regra. O pintor L. Schwartzman O mais difícil para mim, e creio que para qualquer animador, é entrar no papel de um criou um excelente personagem. Naquela época, eu já dominava os movimentos. Já imaginava como a raposa personagem típico. Junto andaria, como se comportaria em certas circunstâncias. Mas entrar no papel, sentir o com o diretor e pintor, caráter e o estado do personagem numa situação concreta era a tarefa mais difícil e, nós discutíamos em provavelmente, a mais interessante para mim. Eu acho que é a essência do trabalho de detalhes a biografia deste animador: ele metamorfoseia-se duas vezes. Primeiro, penetra o personagem que ele personagem. A apropriação cria, e depois, através deste personagem, ele encarna-se no seu caráter, a partir do do personagem começou, roteiro criado. como sempre, pela Aqui, um esclarecimento faz-se necessário. Não é o gravação do áudio. A voz animador que inventa o personagem. A imagem é criada era de Vladimir Gribkov, pelo dramaturgo e pelo roteirista. Ela é elaborada por famoso ator do teatro MKHAT. Ele elaborou um diretor de arte, que encontra uma imagem gráfica Frame de “A rainha da neve” concreta, chamada de personagem típica. A tarefa a parte vocal de maneira tão fina e precisa que o trabalho passou a trazer-me um do animador é personificar esta imagem através do verdadeiro prazer. Durante o processo apareciam novas tarefas, até então desconhecidas para mim, como a procura de finas nuances no psiquismo do protagonista. movimento emocional. Em a “Rainha da Neve”, eu interpretava mais um papel: o da Rainha da Neve. O contraste Para mim, foi muito instrutivo participar nos filmes de Mstislav Pachenko, um ótimo entre um gnomo vivo e expansivo e a imagem da fria feiticeira me ajudava bastante diretor e uma pessoa bastante otimista. Creio que o filme “Quando iluminam as árvores no trabalho. A Rainha da Neve era majestosa e imóvel. As suas emoções podiam ser de natal” foi a nossa primeira colaboração. Eu deveria animar o personagem do boneco expressas por gestos mínimos: um movimento das sobrancelhas, um movimento dos de neve. A cena era relativamente longa, cerca de 20 segundos, e o papel consistia em um olhos, os quais irradiavam uma luz glacial... 38 monólogo. Era uma tarefa complicada e ao mesmo tempo interessante: o boneco de neve 39 não tinha parceiros. Ele não tinha contato com os outros personagens e, principalmente, Eu não tenho como falar de todos os papéis que criei, pois são mais de 200. Eu participei não fazia nada. Só ficava em pé e falava. No desenho animado, o trabalho começa com da criação de 120 filmes e posso dizer que era uma belíssima escola. Todos nós a gravação das frases dos protagonistas. O ator Volodin gravou as frases do boneco de aprendíamos com os diretores, com os nossos colegas animadores. Aprendíamos fazendo neve e fez isso de uma maneira tão viva e imaginativa, que para mim tornava-se fácil as cenas e, na maioria das vezes, aprendíamos através dos nossos próprios erros... E imaginar os gestos e o comportamento do personagem. Mas, obviamemte, a minha esta experiência única como animador ajudou-me muito quando eu decidi ser diretor. Isto tarefa não se limitava ao trabalho de fazer o boneco de neve mexer os lábios e braços aconteceu no final de 1961. de maneira sincronizada com o fonograma. Era necessário encontrar os traços típicos Frequentemente, perguntam-me por que eu decidi ser diretor tão tarde. Realmente, do comportamento do personagem e aproveitar a cena. Fazendo isso, eu, pela primeira 44 anos não é uma idade apropriada para o início da carreira de diretor. Aqui, eu vez, entendi que a profissão de animador incorpora parte do trabalho de um diretor: não devo precisar: ninguém chamava-me para ser diretor, mas tampouco colocavam-me sou eu o ator. Eu faço isso através de um personagem desenhado e, por isso tenho que obstáculos. Eu simplesmente gostava muito, e continuo gostando da minha profissão de interpretar a encenação e controlar a ação dentro da cena. animador e agora, sendo um diretor experiente, tento não perder a minha habilidade neste Pachenko tinha uma qualidade excepcional: não pregava sermões e não impunha nada a ramo. Se esta profissão não fosse tão esgotante, demandando esforço, (não somente um ninguém. Neste sentido, ele era um professor ideal. Sabia precisamente o que queria de esforço moral, mas também um esforço físico, pois finalizando uma cena, você se sente um animador, mas sempre dava a oportunidade para ele revelar-se, para realizar a sua completamente devastado) eu gostaria de combiná-la com a profissão de diretor. ideia. E, se esta estivesse em harmonia com a ideia geral, respondendo à ideia principal, Chegou um momento, quando eu senti que queria e poderia ser diretor. Eu tinha algo a ele aceitava a proposta com muita vontade, dando ao animador plenos poderes de autor. dizer, algumas ideias, as quais eu não conseguia expressar como animador. O tema do Esta qualidade é bem rara entre os diretores e por isso, muito apreciada. meu primeiro filme, “A historia de um crime”, e as particularidades do meu estilo de Uma das minhas tarefas mais complicadas foi durante o filme de Lev Atamanov “A rainha direção eram o resultado da experiência profissional adquirida antes deste filme. De da neve”. Eu tive muita sorte. Normalmente, o animador não anima um personagem. Ele alguma maneira, este filme traz alguns traços autobiográficos. Era uma vez, quando, sem anima uma cena, trabalhando com todos os seus detalhes. Em “A Rainha da Neve”, eu fiquei encarregado de animar um personagem ao longo de todo o filme. Era o papel de Ole Lukøje, um gnomo de um conto de fadas, o qual o diretor introduziu no conto de Andersen querer, eu encontrava-me em uma situação muito parecida com a do protagonista do para serem descobertas, tantas coisas interessantes, que decidimos com firmeza a filme. A ideia que eu sugeri ao departamento de roteiros foi logo aceita e aprovada, mas continuar a experiência. Queríamos fazer algo completamente diferente, usando outra eu não tinha um roteiro em si. Tinha somente alguns esboços, um projeto de rascunho. temática, outro modo de expressão, e, obviamente, outro gênero. Propuseram o roteiro a Mikhail Volpin, dramaturgo experiente, que aceitou com prazer. Ainda na juventude, um dos meus pintores preferidos era Evgueny Tcharushin. Pensando Para mim, não era fácil começar. Quase todo o grupo de produção era iniciante. Serguey em um novo tema, eu, involuntariamente, lembrava-me dos seus desenhos. Eu queria Alimov, que acabava de se formar no Instituto de Cinema, era um iniciante, assim como o muito usar este estilo surpreendente em uma animação baseada em um conto de fadas. operador e os jovens animadores. Podemos dizer que todo o nosso grupo pequeno, mas Tcharushin era um incrível contador nas suas ilustrações. Ao mesmo tempo, eu entendia unido, estava prestes a começar a sua primeira viagem independente. Estávamos todos que era muito difícil reproduzir no écran o encanto incomparável da sua técnica: a técnica em condições de igualdade. de celulóide é ligada a um desenho de contornos muito rígidos e, normalmente, o contorno de linhas não é presente nas ilustrações do pintor. Eu tinha uma pequena experiência de trabalho como diretor, acumulada Tcharushin preferia trabalhar com manchas coloridas vivas e ricas. Mas como reproduzir durante o meu trabalho como animador, um desenho destes em milhares de esboços? mas logo entendi que a profissão de A tentação era grande e nós decidimos experimentar. diretor era completamente diferente e que as responsabilidades eram mais Eu tinha um roteiro, que não era tão bem escrito: a simples história sobre o ursinho amplas e mais específicas. Aqui, fazia-se Toptizhka. Este roteiro servia muito bem para uma experiência técnica. Em minha opinião, necessário ainda ser um organizador, a linha de contorno rígida destrói a poesia do conto, tornando as imagens demasiado gerente de um grupo. E isto não era fácil. concretas. Como resultado, o principal desaparece: o caráter enigmático e misterioso, que é atribuído ao conto russo. Por isso, decidimos usar a técnica de travessas plenas A dificuldade residia também no fato e bonecos de papel, a qual possibilitava a manutenção de uma rica fatura da imagem. que no nosso filme não tínhamos a Assim, nasceu o filme “O ursinho Toptizhka”. Provavelmente, é o único filme, no qual condicionalidade tradicional de um posso dizer que conseguimos realizar tudo o que pretendíamos. O nosso filme abria novos conto de fadas, que era uma base 40 caminhos no uso das artes ilustrativas na animação. 41 habitual da nossa animação e que também consistia a sua principal força Depois, eu recebi, por acaso, um roteiro baseado no conto do escritor tcheco Miloš de expressividade. Todavia, tentávamos Macourek: “Bonifácio e a sua família”. Lendo as primeiras frases, eu já estava encantado usar as vantagens de linguagem deste pela atmosfera de conto, pela imagem de um leão calmo, tímido e bondoso (Bonifácio), gênero. Eu acho que, de algum modo, que deveria pretender ser uma fera feroz no circo onde trabalhava. Este tipo de serviço obtivemos um resultado. não lhe agradava e ele tinha saudade da África, onde morava a sua avó. Atrás desta historia simples, há um pensamento profundo sobre o destino do artista, a alegria da arte, Passaram-se mais de vinte anos desde e a relação entre o artista e o público. aquela época, e agora eu posso afirmar com certeza: infelizmente, nós nunca Se entre os meus primeiros três filmes havia intervalos grandes e durante cinco anos eu mais tivemos discussões tão ardentes fiz somente três filmes, o meu próximo filme, “O homem na moldura”, foi iniciado antes de e, ao mesmo tempo, uma unidade e terminarmos os trabalhos de “Bonifácio”. A ideia deste filme já vinha sendo amadurecida unanimidade no processo de criação do durante algum tempo. Como também no “Ursinho Toptizhka”, ela surgiu a partir de uma filme, pois cada um queria contribuir técnica, de uma imagem visual. Assim acontece: primeiro você acha uma imagem visual, com algo seu, com a sua experiência a qual, em seguida, vira um roteiro... Eu creio que encontrei uma imagem bem sucedida: pessoal. enquanto se desenrolava o destino do protagonista, uma pessoa medrosa e limitada, que preservava a sua reputação com rigor e tinha receio de fazer algo fora da “normalidade”, Após o grande sucesso do filme, a sua moldura aumentava, tornando-se cada vez mais sólida. O homem não crescia. muitos me aconselharam a continuar o Simplesmente, a moldura aumentava até o ponto de cobrir completamente a sua persona, trabalho, inventando novas aventuras a sua personalidade... com o protagonista do filme, em outras palavras, fazendo uma série. Mas, nós não estávamos atraídos pela ideia. Existiam, na animação, tantas coisas “A história de um crime” Este foi o trabalho mais difícil e mais sério de todos nós encontramos o caráter que tanto procurávamos. Assim mesmo deveria ser o nosso os que eu havia realizado. Eu sentia a necessidade protagonista. Leonov encontrou a imagem deste sonhador excêntrico. Eu chamei os de fazer um filme, no qual a ideia seria expressa por animadores: olhem, desenhem! Assim deve ser o nosso protagonista. meios mínimos, somente através de uma imagem- Os meus últimos trabalhos, “A ilha”, “Eu te dou a estrela”, e “Ícaro e os sábios” foram bem símbolo muito forte. aceitos tanto pelo público russo, como pelo público estrangeiro. Creio que “A Ilha” é o meu É difícil trabalhar com os símbolos. A precisão na escolha dos meios é imprescindível. filme mais leve. O único obstáculo encontrado na realização do filme foi o ritmo, melhor Todo o sistema de imagens do filme era destinado à revelação de uma séria ideia dizer, a pulsação do filme. Enquanto eu não havia assistido ao filme inteiro, cada cena em social. Trata-se de um filme sobre o dever moral, sobre a consciência, sobre a si me contentava. No entanto, quando eu colei o filme nos testes de rascunho e o coloquei responsabilidade do homem perante a sociedade e sobre a sua capacidade de assumir na mesa de montagem, ficou óbvio que eu havia errado bastante no ritmo. O filme era esta responsabilidade. Este filme narra como, a partir da covardia e da ambição, nasce, lento demais. aos poucos, a infâmia, a qual conduz o homem à morte moral. Por acaso, eu puxei o pedal da bobina e o filme rodou mais rápido. Logo, ficou claro que Enquanto isso, na minha alma, amadurecia o meu sonho sobre “O Ursinho Puff”. Eu conhecia este era o tempo ideal para o filme. O tempo era muito importante neste filme, como este livro praticamente de cor. Ele havia sido relatado magnificamente pelo poeta Boris um sinal do tempo no mundo ocidental contemporâneo, o qual está sempre apressado, Zakholder. Sim, relatado, e não meramente traduzido. Eu flertava com este livro durante correndo e precipitado. Está sempre querendo alcançar algo, que ainda não pode ser vários anos e estava com medo de estragar tudo, pois a sua fatura era muito fina e o material alcançado. muito frágil. Levar ao cinema uma obra clássica da literatura (e Ursinho Puff é, sem dúvida, No meio desta confusão, no cruzamento das principais artérias da civilização, deveria uma obra clássica no nível de “Alice no pais das maravilhas”) é sempre perigoso. Há sempre estar este pobre Robinson. E não se sentia isso no filme. Eu tive que refazer as folhas de o risco de não alcançar o nível do original da obra. Mas o conto me atraia tanto, que eu estava exposição de todas as cenas. Quando o filme foi filmado novamente, ele ficou muito mais pronto a arriscar e, se ainda não havia feito, era porque não me sentia totalmente preparado. próximo ao conceito inicial. Quando eu encontrei o artista Vladimir Zuikov, percebi que o conto era muito próximo a ele e que ele seria capaz de propor uma ideia Eu gostaria de falar ainda sobre mais um detalhe deste filme. Este estava prestes a ser gráfica interessante. concluído, e nós estávamos sem uma ideia para o ponto final. Eu não estava satisfeito 42 com as opções para o final. Eram todas muito concretas, estreitas, simplificando o 43 Para nós, o Ursinho Puff não era pensamento. Nós estávamos sentados, extenuados, pensando em um final, cansados apenas um ursinho que gostava de mel. de tanto esforço em vão. De repente, alguém começou a assobiar, bem baixinho. Ele Víamos nele um filósofo, um sonhador. não tinha um bom ouvido e não assobiava tão bem. Assobiava baixinho, imerso em seus Todas as situações cômicas eram pensamentos... E estes sons deram-me a pista para a ideia do final. Assobiando baixinho, construídas a partir do conflito entre o um ser igual ao protagonista passa nadando. Ele o convida a agarrar um pequeno tronco mundo imaginado por Ursinho Puff e a de árvore, o qual ele mal consegue segurar. E eles partem, os dois, para uma vida em um realidade que o cerca e com a qual ele mar sem fim... entra em contato de maneira absurda e inesperada. Durante o trabalho de A geração de artistas que está chegando hoje ou que chegará amanhã no mundo criação, foram criadas três opções do de animação terá mais dificuldades do que a nossa, porque as tarefas serão mais protagonista, mas somente a última era complicadas e, consequente, as expectativas serão mais elevadas. Atualmente, já não interessante, mais próxima da nossa é suficiente saber desenhar bem ou ser um bom ator. E amanhã, a qualidade principal e ideia. decisiva será a capacidade de compreender os complicados e contraditórios processos de vida. E quanto mais complicado for o pensamento, maior deverão ser a habilidade, a arte e A ajuda chegou inesperadamente, de a maestria para poder expressá-lo de maneira clara e precisa. Isto significa que cada um Evgeniy Leonov, o narrador das histórias deve ter uma base profissional sólida e saber fazer bem o seu trabalho. do Ursinho Puff. Ele não narrou simplesmente o texto do roteiro, mas Todos nós continuamos os nossos caminhos na animação e este processo é infinito. A imediatamente e, de maneira precisa, animação é uma arte, na qual muitos aspectos ainda não são conhecidos e não foram entendeu o caráter do protagonista. Ele ainda decifrados. se posicionou em frente ao microfone, parou por um momento, assumiu uma pose, com o olhar pensativo, e “O homem na moldura” Nesta época, surgem também algumas Uma enciclopédia animada para a ecranizações dos contos de um dos mais compreensão de uma sociedade Luiz Gustavo Carvalho importantes escritores infantis da União Soviética: Kornei Tchukóvsky. Já a versão colorida, realizada por Ivan Ivanov-Vano, em A animação dos anos 1960 reflete a relativa liberdade que floresceu na União Soviética 1954, de “Moydodyr” (1954), um personagem durante um período conhecido como “O Degelo”. Nikita Khruschev, Primeiro-Secretário sob a forma de uma pia antropomórfica, do Partido Comunista e líder da União Soviética entre 1953 e 1964, denunciou os crimes marca uma nova compreensão do aspecto cometidos por seu antecessor e colocou um fim ao culto da personalidade de Josef Stalin. gráfico do desenho animado. Ivan Ivanov- Esse episódio, hoje conhecido como “Discurso Secreto”, foi de importância fundamental Vano (Moydodýr) e, posteriormente, para a produção artística da segunda metade do século XX na antiga União Soviética, Leonid Amalrik (Limpopo) e Boris Dezhkin Frame de “Mukha Tsokotukha” pois permitiu que o papel da arte na sociedade fosse reformulado. Assim, no universo da (Mukha Tsokotukha) tentam manter as animação, surgiu o desejo de realizar filmes, nos quais o público se identificasse como características gráficas dos personagens de parte da realidade, através da construção de identidades visuais e narrativas históricas Tchukóvski, procurando uma fidelidade aos personagens descritos nos seus contos. contemporâneas. Enquanto a era stalinista praticamente extinguiu a influência do Essa estética é também claramente visível no filme “Tarakã, o bigodudo”² (Tarakanishe), construtivismo e da vanguarda russa na animação, Khruschev via a imagem visual como realizado em 1963 por Vladimir Polkovnikov. Neste conto, Tchukóvsky pinta um quadro um meio importante para a revitalização da sociedade soviética. alegórico, no qual um reino animal idílico é aterrorizado por “um monstro gigante, / ... / Tarakã é seu nome! Baratona, baratão!” que A estética revolucionária de Fiodor Khitruk, com o seu filme “A História de um Crime” “rosna, gritalhão / vai mexendo o bigodão” e (1962), abre o caminho para uma geração talentosa de jovens diretores e animadores ameaça: “Fiquem calmos, não se apressem, desenvolverem os seus próprios estilos e interesses. Os desenhos animados desta época / Vou engoli-los num instante! / Vou engoli- traziam não somente um novo estilo de animação, que lembrava as linhas prosaicas do los sem perdão!”. O terrível e bestial estúdio americano U.P.A.¹, mas abordavam pela primeira vez, desde os anos de vanguarda gigante de Tchukóvsky tem a estatura de 45 44 da animação soviética, uma história então contemporânea. uma barata, um apelido dado na Rússia aos Assim, a animação dos anos 1960 nos apresenta um crocodilo, que trabalha como homens que possuem um bigode espesso. crocodilo em um jardim zoológico (Crocodilo Guena) e Tcheburashka, que apesar de ainda Escrito em 1923, quando Stalin era apenas não ter ser sido identificado pela ciência, já sonha em ser pioneiro. (Crocodilo Guena, um dos “bigodudos” que almejavam o poder Frame de “Tarakã, o bigodudo” 1969, e Tcheburashka, 1971, de Roman Katchanov). Em “Terem-teremok” (1971), alguns na União Soviética, a sátira faz alusão a animais decidem viver juntos em uma pequena casinha de madeira, pois “viver junto é qualquer ditadura, imposta por uma minoria contra o desejo da maior parte da população. mais divertido”, distribuindo ativamente as tarefas cotidianas segundo a aptidão de cada Mas, obviamente, muitas pessoas viram o ditador retratado no poema de Tchukóvsky, e morador. Desta forma, Leonid Amalrik transporta o universo do conto folclórico russo o apelido dado a Josef Stalin no início dos anos 1930, “Tarakã” (barata), foi derivado do para a realidade dos apartamentos comunais da União Soviética. Já o “tio Fiodor”, na protagonista deste conto. A animação realizada nos anos 1960, a partir do conto dos anos companhia do gato Matroskin e do cão Sharik, vivem em um oásis ecológico chamado 1920, mostra como somente na era khruscheviana permitiu a abordagem de certos temas, Prostokvashino, onde discutem planos mesmo que através de uma linguagem esopiana, na sociedade soviética. para aumentar as economias rurais, Com “Nu pogodi!” (na programação da Mostra de Animação Russa os episódios foram comprando a vaca Murka para a produção traduzidos como “Espera, você vai ver!”), nasce na União Soviética a primeira série de leite, o qual também poderá ser vendido. de animação. O roteiro original, no qual um lobo desastrado persegue uma lebre em Tcheburashka, Guena e os personagens diversas situações, foi criado pelos escritores Feliz Kandel, Arkady Khait e Alexander do desenho “Os 3 de Prostokvashino”, de Kurlyandsky. Apesar da maioria dos diretores do estúdio “Soyuzmultfilm” ter rejeitado Vladimir Popov, tornaram-se tão populares o roteiro, Vicheslav Kotenotchkin foi convencido pela ideia. Mesmo se inicialmente no país, que Tcheburashka foi escolhido não haviam planos para transformá-lo em uma série de filmes, o sucesso do primeiro como mascote da equipe olímpica da episódio provocou uma popularidade imediata do lobo e da lebre por toda a União União Soviética e a canção de aniversário do crocodilo Guena e as frases do gato Matrosskin são, até hoje, citadas na Rússia! Frame de “Terem-teremok” Klara Rumyanova, conhecida por dublar heróis pequenos e positivos. Mesmo assim, na primeira cena do filme, o lobo escala uma corda, na sua primeira tentativa de pegar a lebre, assobiando “Uma canção sobre um amigo”, de Vladimir Vissotsky, em uma bela homenagem do diretor a um dos maiores cantores e poetas da sua geração.

Obviamente, é impossível não comparar os personagens de “Nu Pogodi!” com os protagonistas de Tom e Jerry. No entanto, através de um olhar mais atento, podemos perceber um perene aspecto humanista nos desenhos de Kotenotchkin, aspecto

Frames de episódios da série “Nu podogi!” (Espera, você vai ver!) inexistente nas eternas brigas entre o gato Tom e o rato Jerry. Kotenotchkin afirmou que os desenhos americanos de Walt Disney foram, sem dúvida, uma grande influência para a sua formação. Especialmente, Bambi, o qual foi apresentado na União Soviética logo após Soviética. Centenas de cartas começaram a chegar ao “Soyuzmultfilm”, pedindo por novas a Segunda Guerra Mundial. No entanto, o diretor alegou que só teve a oportunidade de aventuras do lobo e da lebre. Os primeiros dezesseis episódios, conhecidos como os assistir as aventuras de Tom e Jerry em 1987, quando já havia realizado todos os episódios “dezesseis episódios de ouro”, foram realizados ao longo de 17 anos, refletindo também de “Nu pogodi!”. as mudanças que aconteciam na sociedade soviética desta época. Se o primeiro episódio foi criado ainda em 1969, o décimo sexto foi realizado durante a “Perestroika”, em 1986. Kotenotchkin, que nunca teve nenhuma pretensão em criar uma animação autoral, tentava criar cenários simples e concretos. Mesmo assim, muitos intelectuais reconheciam a intelligentsia na personagem da lebre, enquanto o lobo representava a classe operária.

“Nu pogodi!” pode ser, acima de tudo, visto como uma pequena enciclopédia da vida soviética: a população do país se reconhecia nos hábitos alimentares dos personagens e até mesmo nos papirosis fumados pelo lobo nos diversos episódios. Os episódios mostram os apartamentos khruschevianos, nos quais vivia a maior parte da população, 46 os balneários, que atraiam as pessoas durante o verão, e a moda da época. Enquanto 47 a lebre aparece quase sempre vestida com uma blusa verde e shorts azuis, o lobo, ao longo da série, desfila todo um guarda-roupa com as principais novidades da moda do país. Kotenotchkin soube ainda integrar de forma inteligente nos seus desenhos os maiores sucessos musicais da época e importantes acontecimentos históricos, tais como a corrida espacial e os Jogos Olímpicos de Moscou. A cultura clássica dos contos russos, que havia influenciado tantos diretores e animadores nos anos 1950 e no início dos anos 1960, é também visível nos episódios da série, mas ela é inserida com virtuosismo em situações cotidianas da sociedade soviética. Diversos nomes da cultura contemporânea do país foram citados nas aventuras do lobo e da lebre, tais como Alla Pugacheva, Vladimir Vissotsky e até mesmo o brasileiro Chico Buarque, cuja canção “A banda” integra a trilha sonora de um dos episódios.

Um detalhe, através do qual constatamos como a animação soviética fazia parte da vida cotidiana das pessoas e a seriedade com a qual eram tratados todos os componentes envolvidos na produção de um desenho animado, é o fato de grande parte das vozes dos protagonistas dos filmes pertencerem aos principais nomes do teatro e do cinema russo. Desta forma, Innokenty Smoktunovsky é o narrador do conto “A garça e a cegonha”, de Yuri Norstein, e a voz de Oleg Tabakov ficará para sempre associada ao gato Matroskin, ¹ - United Productions of America ² - Tarakã, o Bigodudo (Tarakanishe), lançado durante a Mostra de Animação Russa pela editora Kalinka. personagem do desenho animado “Os 3 de Prostokvashino”, de Vladimir Popov. Em “Nu Traduzido por Aurora Fornoni Bernardini e Maria Vragova. pogodi”, Kotenotchkin queria que o personagem do lobo fosse dublado por Vladimir ³ - Tradução de Aurora Fornoni Bernardini e Maria Vragova. Vissotsky. Como o cantor e poeta não era bem visto pelo governo e a sua obra encontrava- se então proibida no momento pelas autoridades, a ideia foi censurada e o diretor teve que optar pelo grande ator de teatro e cinema Anatoly Papanov. A lebre é dublada por biografias vicheslav m. kotenotchkin diretor I animador

Nasceu em Moscou, em 1927. Estudou na Escola de Artistas-Animadores leonid a. amalrik do “Soyuzmultfilm”. Participou da produção de mais de 60 desenhos animados , em colaboração com L. Amalrik, L. Atamatov, I. Ivanov-Vano, diretor I animador M. Pashenko e B. Dezhkin, entre outros. Foi o diretor da primeira série de animação da União Soviética: “Nu, pogodi!”. Foi condecorado como “Artista do Povo”, em 1987 e recebeu diversos prêmios internacionais. Nasceu em 1905, em Moscou. Trabalhou como decorador e diretor de Faleceu em Moscou, em novembro de 2000. arte no estúdio “ Merzhrabpom-Rus”, sob a direção de A. Rodtchenko, S. Eisenstein e V. Pudovkin. Em 1928, começou a trabalhar com animação. Como animador, contribuiu com I. Ivanov-Vano, V. Suteev, D. Babichenko, entre outros. Lutou no Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial. Vencedor do prêmio Starevitch de animação. Leonid Amalrik vladimir i. polkovnikov faleceu em Moscou, em 1997. diretor

Nascido na região de Moscou, em 1906, trabalhou como animador no 48 boris p. dezhkin estúdio cinematográfico “Soyuzkino” e “Soyuztekhfilm”. A partir de 1936, 49 começou a trabalhar no estúdio “Soyuzmultfilm”, como assistente de diretor I animador I caricaturista I roteirista L. Amalrik. Durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhou no Estúdio Cinematográfico Técnico de Guerra. Nasceu em Kursk, em 1914. Após terminar os estudos de animação, Regressou ao “Soyuzmultfilm” em 1946, colaborou com importantes trabalhou como animador experimental, com V. Smirnov, e na “Mosfilm”. A animadores, tais como A. Trusov, R. Katchanov e M. Rudatchenko, entre partir de 1936, integrou a equipe do estúdio “Soyuzmultfilm”, trabalhando outros. como animador, roteirista e diretor. Contribuiu com importantes diretores, tais como E. Migunov, V. Vasilenko e S. Rusakov, entre outros. vladimir i. popov ivan p. ivanov-vano diretor I animador diretor I roteirista I pedagogo Nasceu em 1930, em Moscou. Iniciou os seus estudos no “Soyuzmultfilm” em 1952, onde, trabalhou como animador e diretor. Colaborou com V. Nascido em 1900, em Moscou, Ivan Ivanov-Vano é um dos ícones da Pekar, L. Khachatrian e A. Sher. animação soviética. Foi o diretor do estúdio “Merzhabpomfilm” no início dos anos 1930. A partir de 1936, trabalhou no estúdio “Soyuzmultfilm”. Colaborou com L. Amalrik, M. Botov, B. Butakov e Y. Norstein, entre outros. Foi professor do Instituto de Cinema (VGIK) e da Escola de Animação do estúdio “Soyuzmultfilm”. Foi condecorado como “Artista do Povo”, em 1985. roman katchanov diretor I roteirista I animador

Roman Katchanov nasceu em Smolensk, em 1921. Em 1941, iniciou os seus estudos no Instituto de Engenharia de Moscou. Foi convocado pelo Exército Vermelho, durante a Segunda Guerra Mundial, quando lutou como paraquedista. Após a guerra, iniciou os estudos de animação, na Escola de Animação do estúdio “Soyuzmultfilm”, graduando- se em 1947. Trabalhou como animador e assistente de direção. Foi professor na Escola de Animação do estúdio “Soyuzmultfilm” e na Escola Superior de Cenaristas e Diretores de Moscou. Colaborou com os animadores N. Serebryabov, L. Schwartzman e N. Orlova, entre outros. Em 1981, foi reconhecido como “Artista do Povo”, na União Soviética.

50 “A animação começa onde termina a possibilidade de outras 51 formas artísticas”, disse uma vez o diretor búlgaro Todor Dinov. E eu concordo plenamente com ele.

Como dizer que a animação não é cinema, se os personagens falam através da voz dos melhores atores do Filmografia na mostra cinema e do teatro? Se a música para os desenhos animados é composta por renomados compositores? E como trabalha A luva (Varezhka) um animador? Ele se desespera, bate os pés, cantarola URSS, 1967, 10 min algo para si próprio, fala através de todos os seus heróis, gesticula... Em uma palavra, um teatro em um só ator. Crocodilo Guena (Krokodil Guena) URSS, 1969, 20 min A animação é uma arte de origem humana. Fina, filigrana. Algumas pessoas, após terem observado o nosso trabalho, Tcheburashka até mesmo o compararam com a iconografia. URSS, 1971, 20 min

A minha profissão passou a ser chamada artista animador, ao invés de artista multiplicador. Um artista que dá a vida a alguém, que anima. Mas eu prefiro o título anterior, porque eu nunca tive a sensação de animar nenhum dos Vicheslav Kotenotchkin heróis que desenhei. Desde o início, eles eram animados “Espera, Kotenotchkin, você vai na minha imaginação... ver!” (1999) sonorizados por N. Bogoliubov, V. Gribkov, M. Astangov e R. Simonov. O trabalho com Atamanov não era um trabalho contínuo de um grupo de diretores. Nos intervalos entre os A seriedade de uma risada bondosa Roman Katchanov filmes, eu trabalhava como animador, ganhando experiência e segurança. Assim, quando os diretores V. Polkovnikov e A. Snezhko-Blotskaya me propuseram trabalhar como diretor de arte no “Menino enfeitiçado”, eu aceitei.

Tudo começou durante a guerra. Nós estávamos assistindo um filme americano, o qual De novo tive sorte, pois conheci V. Polkovnikov. Ele já era um diretor bastante conhecido. falava sobre as vantagens do piloto automático em comparação ao piloto humano. O filme Junto com L. Amalrik, tinha feito o filme “A patinha cinza” e outros filmes importantes. O utilizava-se de técnicas de animação. encontro com V. Polkovnikov teve um grande significado para mim. Trabalhando com ele, eu apreendi a trabalhar com pintores, atores e compositores. Posteriormente, na então De repente, na cabeça do piloto que estava no comando aparecem ovos mexidos em uma recém-criada União de Filmes de Animação de Bonecos, eu conheci A. Karanovitch, que frigideira. O avião começa a balançar, mas os ovos mexidos desaparecem e a aeronave me convidou para ser o assistente de direção e animador do filme “Pedro e o lobo”. Eu endireita-se. Depois, na imaginação do piloto aparece uma imagem de uma menina aceitei a proposta. Até hoje, eu me lembro do prazer que senti quando eu vi o boneco que trocando de roupa. O avião começa a dar voltas..., e bate em uma montanha. Mas no final, eu havia animado. tudo termina bem. O piloto está deitado em um leito hospitalar, todo enfaixado, e a mesma menina está dando-lhe comida na colher, falando-lhe alguma coisa e colocando a comida O filme “Pedro e o lobo” impressionou-me menos do que aquela primeira cena que eu em algum lugar entre as faixas. Ela diz alguma coisa e ele tosse. próprio fiz. Mas eu já estava atraído pelos bonecos. Junto com escritor I. Fink, eu escrevi um roteiro baseado no antigo conto russo “O velho e a garça” e o propus a Karanovitch. O Estes desenhos animados ingênuos me fascinaram. Eu pensei como seria ótimo, se eu movimento e a plasticidade já eram bem melhores do que em “Pedro e o lobo”, mas ainda pudesse animar os meus próprios desenhos e caricaturas. estavam longe da perfeição. Eu quero falar só de uma cena deste filme. A guerra terminou e eu entrei no estúdio “Soyuzmultfilm”. Era junho de 1946. Os meus Em um lago, há um barco parado próximo às margens. Um velho senta-se no barco. Fui eu professores eram os principais animadores do país. que filmei esta cena e fiz da seguinte maneira: entrando na embarcação, o velho empurra Após terminar o curso, eu comecei a trabalhar na produção. Alexander Ivanov foi o o barco com o pé. primeiro diretor com quem eu trabalhei. Ele era uma pessoa emocional e sabia como Quando vimos a cena filmada no écran, ficamos muito impressionados, pois vimos um 53 52 entusiasmar os seus colegas. Depois, eu trabalhei com as joviais irmãs Brumberg, com personagem vivo, com o seu próprio caráter. Não era um simples boneco. Aquele traço o valente Bredis, cuja técnica era ótima, com o calmo e sensato Sazonov e com o cordial simples e os movimentos do pé ficaram muito expressivos. Era uma “bicicleta” animada Babitchenko. E, finalmente, com o misterioso Tsekhanovsky. Eu o chamo de misterioso, que eu próprio havia inventado. pois ele sempre guardava uma certa distância. Se todos os diretores ainda buscavam uma estética própria ou, em outras palavras, estavam em fase de formação e na maioria O desenho é algo bem complexo e, muitas vezes o uso da imagem torna-se muito das vezes apenas tinham diferentes personagens, Tsekhanovsky já havia criado o filme difícil. No desenho, tudo acontece de forma rápida. Por isso, uma rápida adaptação “Correio”, considerado até hoje como um clássico da animação. do espectador à imagem ilustrada é essencial. O tempo necessário para o espectador acreditar no que está acontecendo no écran e aceitar as regras do jogo. Naquela altura, Tsekhanovsky era um grande adepto da técnica conhecida como rotoscopia. Nesta técnica, as filmagens eram feitas com atores verdadeiros, os quais Em primeiro lugar, penso nas crianças. Elas são muito receptivas e entendem muito bem com algumas modificações eram copiados para o papel, entrando desta forma no filme. a ideia transformada em ações dos protagonistas. Muitas vezes elas adivinham antes dos Muitos amaldiçoam esta época, alegando que este método causou danos à arte da adultos, ou seria melhor dizer, preveem por que tudo acontece. Elas são muito sensíveis animação. Talvez isto seja verdade, mas este método também era útil. A movimentação e às ideias falsas e composições estudadas. Em primeiro lugar, elas precisam ver a verdade sonorização das filmagens contavam com a participação de grandes atores, tais como M. no cinema. Em um conto, em uma fantasia, nos cenários mais surreais, nas ações mais Astangov, M. Ianshin, G. Vitsin, A. Gribov e N. Bogoliubov. Os animadores, transcrevendo extravagantes dos protagonistas as crianças sentem muito nitidamente a verdade. as cenas interpretadas pelos autores para o papel, ficavam mais próximos aos mistérios Os seus cérebros, ainda sem muita experiência de vida, rejeitam a mentira e de arte cênica, gestos, articulações e movimentos. Isto não pode ser nunca subestimado. elas não são capazes de se entusiasmarem por cenários falsos. Em 1949, Lev Atamanov começou a trabalhar no estúdio e me convidou como seu Tudo isto diz respeito à verdade no conteúdo do filme, ao cenário. Mas ainda existe, se assim assistente. Eu aceitei o convite e nós fizemos três filmes juntos: “A cegonha amarela”, “A podemos nos expressar, a verdade dos movimentos. flor vermelha” e “O antílope dourado”. Em minha opinião, os dois últimos são os melhores filmes de Atamanov. E obviamente, não digo isso porque estive envolvido. Todo o mérito é do ótimo trabalho de direção e do bom roteiro, escrito para o filme “A Flor vermelha” por G. Grebner e por N. Abramov para “O antílope dourado”. Além disso, estes filmes foram O ator real, como qualquer pessoa real, faz muitos movimentos “excessivos”, sem pensar Para mim, é difícil entender os cineastas que vão ao departamento de roteiros, nisso. Você se senta em uma cadeira e arruma a sua roupa, em um mero instinto. Você se perguntando se havia algum novo roteiro. Eu acho que o encontro com um tema é como o levanta da cadeira e sem pensar, involuntariamente, sacode as migalhas que ficaram na encontro com a mulher amada e acontece casualmente. Assim foi o meu encontro com o roupa. Mas quando um animador dá vida a um desenho ou objeto, ele esquece isso. Ele roteiro do filme “A luva”. esquece, porque neste momento ele movimenta somente o personagem. O personagem Quem o viu primeiro foi Karanovitch. Chegou, dizendo que eu ia gostar do roteiro e que parece um robô, mexendo sem movimentos excessivos ou detalhes vivos, e o espectador, poderia fazer alguma coisa boa com ele. inconscientemente, percebe que nesta cena não há vida. Se um ator real faz estes movimentos involuntariamente, o espectador da mesma maneira, involuntariamente, Realmente, eu gostei do roteiro e comecei a trabalhar com a autora, Zhanna Vitenzon. O percebe estes movimentos. primeiro roteiro era bem diferente da versão final. No primeira versão, haviam diálogos, mas eu achava que seria também possível contar a história sem usar palavras. Uma vez, os alunos de animação tinham que observar a seguinte cena: uma menina brinca de amarelinha. Num desenho ela saltava melhor, em outro pior. Mas ela simplesmente Eu também compreendi que a música não deveria ser obrigatoriamente sincronizada no saltava. E de repente, em uma das cenas, nós vimos uma menina real. Aconteceu o filme. Segundo minha experiência, a sincronização feita durante a pós-produção é mais seguinte: levada pelo animador até o final da linha, ela virou-se para saltar de volta, e produtiva do que quando feita durante as filmagens. neste momento jogou a trança para o outro lado, para que ela não a atrapalhasse a saltar. Quando o diretor trabalhava em um filme que seria sincronizado após as filmagens, o Eu chamo estes detalhes e traços vivos de “incomodidades planejadas”. Eles devem trabalho de montagem era muito importante. Para que um compositor escrevesse a existir em cada cena. Se um filme está repleto destes detalhes, o tempo de adaptação música sincronizada para um filme, eu precisava fazer cálculos, quebrando a cabeça, será mínimo. É muito importante que o diretor e animador, a partir de um estudo preciso e determinar os momentos de destaque, com uma precisão de até dois quadros. de encenação, pensem nas “incomodidades planejadas”. O compositor, limitado neste desafio, tinha que enfiar a sua musica neste espaço, Quando Karanovitch e eu filmávamos “A nuvem apaixonada”, eu não podia aplicar a previamente calculado. A partitura voltava para mim como um bumerangue, e eu tornava- minha “descoberta”, pois o filme foi feito a partir de objetos semi-dimensionais, com os me refém desta música. Perdia a liberdade de montagem e de medir a duração do filme. movimentos limitados. Trabalhando neste filme, eu tive a oportunidade de conhecer Nazim Em algumas cenas, tornava-se impossível mudar o tempo de movimentação. Tudo isto Khikmet, grande poeta turco e uma pessoa muito simpática. Eu guardarei as conversas prejudicava a qualidade. Além disso, para o compositor é mais interessante escrever a 54 com ele para sempre na minha memória. música tendo a possibilidade de ver o filme. 55

Enquanto filmava “A nuvem apaixonada”, eu estava escrevendo o roteiro para o filme Houve uma época, quando se dava muita importância à sincronização. Um roteiro simples, “Masha e o urso”, baseado na peça de G. Landau. uma história ingênua e a falta de personagens com caráteres diferentes e de psicologia nos filmes eram compensados pela musicalidade e abundância de temas musicais. Eu precisava de um diretor de arte e pedi um conselho a Vadim Kurchevsky. Quando ele Muitas vezes, um longa-metragem é acompanhado por um tema musical, composto de soube que eu precisava de um pintor talentoso, jovem e alegre, disse-me que conhecia forma talentosa pelo compositor. Se este é o caso em um longa-metragem, o mesmo não uma pessoa assim. E me apresentou a Nikolay Serebryakov. Realmente, Serebryakov era se aplica em um curta-metragem. um jovem simpático. E o mais importante, ele era talentoso. Ele realizou os esboços dos cenários e dos bonecos. Quando os bonecos ficaram prontos, começamos as filmagens. Há ainda dois assuntos importantes a serem abordados quando um diretor começa a No filme “Masha e o urso”, eu vivenciei uma experiência importante. As bonecas eram pensar em um filme ou começa as filmagens. Trata-se da questão do conto de fadas e da pensadas e confeccionadas sem bocas e toda a importância durante a sincronização foi questão da diversão. O que me atrai em um conto de fadas, não é o lado fantástico, mas o focada na gesticulação, que resultou bem expressiva no filme. Aqui, a minha experiência comum, aquilo que reconhecemos. E o humor. Ele é obrigatório, independente do conteúdo de trabalho com o método da rotoscopia me foi útil. Os diálogos também foram bem de cada filme. E em um roteiro inspirado em uma história triste, o humor torna-se ainda gravados. O papel do urso foi dublado por Anatoly Papanov, que era muito jovem na mais necessário. Há inúmeras possibilidades de fazer o espectador rir. Eu gostaria de dar época. Após a primeira exibição, eu perguntei aos meus colegas o que eles acharam alguns exemplos dos meus filmes e explicar essas possibilidades. da articulação e todos acharam bem sincronizado. O mais interessante é que ninguém Eu me guio, quase sempre, pelo contraste ou pela associação: o constaste de ações reparou que os bonecos não tinham bocas. Graças a isso, eu compreendi que o mais da personagem com o seu caráter ou da desconformidade dos acontecimentos com as importante na frase é o gesto. normas fixas. A maestria na confecção dos objetos animados crescia a cada filme. Junto a eles, eu procurava um tema próprio. “O sapinho procura um papai”, “Como contruíram uma casa para o gatinho” - todos esses filmes e, especialmente, “A netinha perdida”, foram uma preparação para o filme “A luva”. No filme “A luva”, o coronel demitido faz nossos filmes são recebidos, sinto uma gratidão pelo calor e atenção que recebemos, fico continência ao buldogue e mostra, de orgulhoso da animação soviética e sinto uma grande responsabilidade. Tenho a sensação maneira óbvia, que é submisso ao cão... que ainda não fiz o meu filme principal, que ainda não achei o meu caminho.

É muito importante que os personagens Talvez isto seja ruim, pois, como sabemos, o mais importante é a descoberta e não a procura. façam tudo de maneira perfeita. Muitas vezes é no final da sua vida artística que um autor cria a sua obra “principal”. Qualquer exagero do próprio movimento, qualquer comicidade elimina a Não devemos ficar tristes, pensando que é pouco. Somos muitos, e se cada um de nós descoberta. Quanto mais sério for o fizer a sua obra, mesmo que seja somente uma, elas serão suficientes. movimento, quanto mais o contraste for sublinhado, mais cômica torna-se a situação. Lembrem-se do mesmo coronel, em “A luva”: solenemente ele dá o binóculo ao buldogue, o qual está em uma pose muito séria e isto nos faz rir.

Vou agora dar o exemplo de algo divertido, criado através de associações. No mesmo filme, a dona dopuddle pega o seu pupilo que ficou na linha de partida nos braços e corre, tentando alcançar os outros cães. Com o puddle nos braços, ela ultrapassa todos os obstáculos, e logo reconhecemos nesta menina as mães, Frames de “Tcheburashka” 56 as quais protegem demais os seus filhos 57 Frame de “A luva” e estão prontas a fazer tudo por eles. Eu procuro o lado divertido das coisas sérias. E por isso, quando em 1967 eu li o conto “Crocodilo Guena e os seus amigos”, de Eduard Uspensky, os personagens Tcheburashka e Crocodilo Guena não me impressionaram muito. Eu gostei da cidade, na qual seres humanos e animais vivem juntos. Nela, por exemplo, o meu vizinho poderia ser um crocodilo que trabalhava no jardim zoológico.

Nós fizemos três filmes sobre Tcheburashka e Guena: “Crocodilo Guena”, “Tcheburashka” e “Shapokliak”. Não estamos com pressa em fazer a continuação.¹ Quando se filma uma série, o próximo filme tem que ser sempre melhor do que o precedente. E isto é realmente obrigatório, quando eles não são interligados somente pelo enredo.

Recentemente, recebemos a visita dos dois principais animadores dos estúdios de Walt Disney: Ollie Johnston e Frank Thomas. Eles trabalharam mais de 40 anos nos estúdios e são autores dos melhores episódios nos filmes mais conhecidos de Disney. Conversando com eles, eu contei sobre o primeiro desenho animado que eu vi e sobre a história do piloto. “Fui eu que pensei o personagem”, exclamou, de repente, Ollie Johnston. ¹ - O texto do autor foi escrito no início dos anos 1980 e o livro de S. V. Asenin, A sabedoria da imaginação, foi Depois, ele me enviou uma carta muito simpática, dizendo que havia contado este caso publicado em 1983. Em 1983, R. Katchanov realizou ainda o último filme sobre Tcheburashka: “Tcheburashka vai à escola” para os seus colegas e que estava muito contente por me haver “trazido” para o mundo da ² - Em 1983, a população da URSS eram 271 milhões de habitantes animação.

Quando eu imagino, mesmo que por um momento, o número de espectadores² que assistem os nossos desenhos, fico com medo. Mas, quando eu vejo com quanto amor os andrey khrzhanovsky diretor I roteirista

Nasceu em 1939, em Moscou. Realizou os seus estudos de direção no Instituto de Cinema de Moscou (VGIK). A partir de 1962, trabalhou no estúdio “Soyuzmultfilm”, onde trabalhou com N. Orlova, N. Popov e G. Arkadiev, entre outros. O seu filme, “A gaita de vidro” foi o primeiro filme de animação a ser censurado na União Soviética. Premiado em diversos festivais internacionais, Andrey Khrzhanovsky foi condecorado como “Artista do Povo”, na Rússia, em 2011.

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Filmografia na mostra

A gaita de vidro (Stekliannaya garmonika) URSS, 1968, 20 min convincente, como se fosse uma testemunha. Pushkin se tornou o herói preferido dos meus desenhos infantis. Eu adorava desenhar a boca vermelha de um africano e uma Fidelidade ao caminho escolhido Andrey Khrzhanovsky farta cabeleira, cheia de caracóis que desciam até suíças. Em um dos desenhos do duelo, eu, seguido por minha intuição e querendo livrar Pushkin da morte, desenhei os adversários atirando para lados opostos. Ao encontrá-lo, trinta Um dia, eu gostaria de fazer um filme que tenha tudo o que o poeta prometeu: anos depois, eu o utilizei no meu filme “O belo dia” (um filme realizado a partir de “... terá tudo: o passado, desenhos infantis e baseados nos temas de Pushkin). e o presente, Por que eu me lembrei destas historias? Para fazer uma confissão: eu compreendia a as minhas aspirações e fundamentos, realidade como um arranjo artístico. Isto é bom ou ruim? Eu acho que é bom e ruim. e o que vi na vida...” Para mim, este conceito era frutífero, porque me ajudou a enxergar a cultura como um Neste filme, eu gostaria de falar sobre as pessoas, acontecimentos e obras de arte que processo atrelado ao desenvolvimento. Sem esta sensação, de fazer parte deste processo, me influenciaram e afinal fizeram-me escolher a minha profissão. Eu não gostaria de eu não me imagino no cinema. Assim, sem a continuidade não pode existir um espírito fazer isso porque me considero uma pessoa interessante ou a minha vida instrutiva, inovador. Esta sensação alimenta o meu interesse à cultura clássica, às construções mas porque acredito, como Fellini, que “tentando contar sobre si próprio com a maior polifônicas, à criação (para uso individual) de vários micro-sistemas. franqueza, é possível ajudar as outras pessoas a alcançar uma compreensão mútua...”. Concluindo as minhas lembranças da infância e com a predisposição de trabalhar no Isto seria a maneira mais natural de expressão. Mas, por enquanto, direi algumas cinema, eu falarei dos dois interesses que surgiram nesta época. palavras sobre mim e sobre o meu trabalho. Um deles é ligado à música. Tanto os meus estudos, quanto os meus estudos na área de Algumas recordações. desenho, não me conduziram a continuar uma formação profissional no ramo (a música agradece). Mas assim como a pintura me ajudou nas questões de compreensão do espaço, As recordações mais vivas da minha infância estão interligadas com as artes visuais. a música aumentou o meu interesse em relação à duração temporária como uma das Uma das primeiras é ligada diretamente aos trabalhos do meu pai, pintor por formação e principais substâncias da vida e da arte. 60 aluno de K. Malevitch e P. Filonov. Talvez não com as obras em si, mas com o processo de 61 trabalho, o fascinante cheiro de tinta, espremida na paleta ou guardada no estreito tubo Nesta época, o meu pai trabalhava no teatro de variedades, onde participava de comédias dentro do álbum de estudos. de um ato e fazia espetáculos baseados na arte da imitação. Daí surgiu o meu amor pelos espetáculos, que incluía o amor pela cena e pelos bastidores, pela variedade de gêneros Na infância, eu também tentei pintar. Participei de várias exposições, sendo até premiado. típica desta época (final dos anos 1940/ início dos anos 1950). Em outras palavras, por tudo Mas eu não me tornei pintor. Compreendi agora, que não tinha a bravura e a obsessão que me fazia pensar sobre a natureza carnavalesca da arte. necessárias, componentes importantes ao talento. Eu gostava mais de simplesmente observar do que de pintar. Eu acredito que a animação é a linguagem mais próxima da minha natureza artística, que eu definiria como lírico-satírico. Creio que esta definição foi, em primeiro lugar, Outra fonte de inspiração para mim era o armário de livros. Até hoje, ele está no meu influenciada pela literatura russa. quarto, o velho, “muito respeitado” armário com os livros, que seria o “protagonista” de um dos meus filmes. Gogol me impressionou muito. Espero poder leva-lo, um dia, ao écran.

No armário, além dos livros, nós guardávamos álbuns com reproduções. Em um grande O mesmo, posso dizer sobre a poesia de Maiakóvski. livro azul, que continha quase toda a obra de Van Gogh, eu fiquei impressionado pelo L. Tolstoi, uma vez, falou que o seu principal problema era ter a imaginação mais viva desenho de um velho escondendo o seu rosto entre os joelhos. Eu tinha a impressão que do que os outros. Este “problema”, também presente na minha família e nos grandes ele chorava. pintores, me cativava. Neste cativeiro, eu sentia uma liberdade maior.

O corpo do velho, a cabeça, as grandes mãos faziam-no parecer com o meu avô. Desde E, por fim, o destino me presenteou com a amizade de dois grandes satíricos: E. Garin e então, sempre que eu olhava para o meu elegante e otimista avô polonês (um traço típico N. Erdmann. O contato com eles e com as suas artes determinou, de uma vez por todas, a dos livreiros profissionais), eu me lembrava daquele velho. Era difícil de imaginar o meu direção do meu caminho, assim como o meu posicionamento. avô em uma pose triste, com as mãos escondidas entre os joelhos. Mas eles faziam parte Mesmo assim, foi o acaso que levou-me à animação. do mesmo conto e uniram-se contra a minha vontade. Era um milagre de outra existência, e esta se tornava realidade.

Outra lembrança vinda do “armário” era o livro “As anotações d`Arshiak”, de Grossman. Eu conhecia a cena do duelo entre Pushkin e Dantes de cor e a contava de maneira tão Terminando o curso de direção do Instituto de Cinema de Moscou (VGIK), eu recebi a proposta de realizar o meu trabalho de conclusão de curso no estúdio “Souyzmultfilm”.

Devo ressaltar que naquela altura cada aluno deveria realizar uma filmagem. E como o número dos diretores formados pelo Instituto chegava a trinta por ano, conseguir manter esta condição era bastante complicado. Nós, que estávamos formando da faculdade de direção, nos encontrávamos diante de um dilema: esperar anos pela sua vez em um dos estúdios de cinema ou fazer o trabalho final sem perder tempo em um estúdio alternativo.

“Era uma vez Koziavin”, o meu primeiro filme, foi o meu trabalho de conclusão de curso.

Certa originalidade deste filme, apontada pelos críticos, foi o resultado da minha inexperiência na questão da assim chamada especificidade da animação. De algum modo, eu entendia esta especificidade, pois durante alguns meses, eu assisti os cursos práticos de mestres experientes, tais como V. e Z. Brumberg e F. Khitruk. Mas as nossas tarefas eram mais abrangentes do que esta especificidade e, de alguma maneira, a ignoramos conscientemente. Neste trabalho, eu e o diretor de arte Nikolai Popov, que também estava fazendo o seu primeiro filme e por isso compartilhava comigo a liberdade virginal em relação à tirania dos clichês, recebemos uma ajuda relevante do experiente animador Anatoly Petrov. Ele também queria ultrapassar as barreiras das formas tradicionais.

Durante os trabalhos para o meu próximo filme, eu encontrei novos colegas talentosos: os pintores Yulo Sooster e Yuri Sobolev e o compositor Alfred Shnitke.

Nos famosos versos de Boris Pasternak, ele assim descreve o artista: 62 “Mas quem é ele? Em qual arena 63 ganhou a sua experiência? Com quem lutou? Com ele próprio, com ele próprio.”

Neste sentido, eu considero “A gaita de vidro” como mais um passo na luta (em primeiro lugar, comigo) pela “nova visão” (expressão de Y. Tianianov). A livre construção da composição e o uso de vários estilos tem um objetivo: uma expressão de forma livre e completa e o equilíbrio entre a estrutura emocional e lógica.

Aqui, entramos no território conhecido como “cinema de autor”. Sem entrar em pormenores nesta questão muito importante para mim, eu devo ressaltar que a animação (aqui, falo, sobretudo, dos filmes feitos com a técnica de grupo) apresenta-se como o meio de expressão mais apropriado. Pelas seguintes razões: quase não há intermediários entre o “diretor” e o “espectador” e há a possibilidade de transmitir com maior precisão a “escrita” do artista (por isso, eu prefiro a animação desenhada à animação de bonecos).

O trabalho de animação pode ser comparado, pelo seu caráter pessoal e intimista, ao trabalho de um pintor que trabalha com miniaturas ou ao de um poeta.

A animação, em uma linguagem ampla e lacônica, é o caminho mais curto para atingir tanto as emoções quanto o consciente do espectador. Eu creio que se alguém tentasse modelar o processo de pensamento no cinema, a linguagem da animação seria a mais apropriada. yuri norstein diretor I roteirista I animador I pedagogo

Um dos principais nomes da animação contemporânea, Yuri Norstein nasceu em 1941 e frequentou a Escola de Animação do estúdio “Soyuzmultfilm”, onde trabalhou entre 1961 e 1989. Com diversos filmes realizados em uma parceria com a sua esposa, Francesa Yarbussova, Yuri Norstein também colaborou Roman Katchanov e Ivan Ivanov-Vano, entre outros. Em 1993, junto com Fiodor Khitruk, Andrey Khrzhanovsky e Eduard Nazarov, criou a escola-estúdio Shar. Vencedor do Prêmio Estatal da URSS, Yuri Norstein foi condecorado “Artista do Povo”, na Rússia, em 1996.

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Filmografia na mostra

A batalha de Kerzhenets (Setcha pri Kerzhentse) URSS, 1971, 10 min Direção I Yuri Norstein e Ivan Ivanov-Vano Ivan Ivanov-Vano, um dos nossos mais antigos diretores, A raposa e a lebre (Lissa e zaiats) me convidou para ser o co-diretor do filme “A batalha de URSS, 1973, 12 min Kerzhenets”. Nós utilizamos a música de Rimski-Korsakov e a nossa ideia era unir o som e a plasticidade visual. Era A garça e a cegonha (Tsaplia i zhuravl) um trabalho colossal e não se tratava de uma ideia formal. URSS, 1974, 10 min Não queríamos simplesmente fazer conexões coloridas com a música. O objetivo era alcançar um efeito emocional O ouriço no nevoeiro (Ezhik v tumane) URSS, 1975, 10 min para as imagens. Através de uma mistura de cores, tentamos dar um desenvolvimento dramático às imagens. Conto dos contos (Skazka skazok) “A batalha de Kerzhenets” é uma tentativa de unir a cor ao URSS, 1979, 29 min ritmo e à música. Yuri Norstein e Franceska Iarbussova

Eu não creio que o meu trabalho com Francheska Iarbussova possa ser um exemplo para outros artistas. Um dia, eu estava vendo algumas gravuras japonesas. Em uma delas, eu vi uma mulher sentada com um galo, o qual tinha a cabeça ao lado do rosto dela e o seu enorme bico quase lhe tocava os olhos. Eu estava perplexo. O que é isso? Francheska me contou que quando ela tinha quatro anos, ela gostava de entrar nos galinheiros. Ela ficava de cócoras e permanecia quietinha até que as galinhas achassem que ela era uma delas. Elas começavam a rodeá-la, examinando-a. Ela me contou que o galo, com o seu bico enorme, começava a limpar os seus cílios.

Franceska me fez sentir uma comoção, mostrando como de uma crisálida nasce uma borboleta. Ela trouxe um grande molho de urtiga coberto de lagartas para casa. Elas se espalharam pelo quarto. Dentro de alguns dias, por todo lado apareceram as crisálidas. Em um belo dia, Francheska diz: “Agora, desta crisálida nascerá uma borboleta”. Eu fiquei olhando, olhando, olhando e, de repente, as batentes da crisálida se abriram e fecharam. Meu coração começou a bater forte de tanta emoção. É uma visão cósmica. Você é testemunha do surgimento de uma nova vida. As pétalas da crisálida se abriram e ficaram sem mexer. Tudo estava em silêncio. Através da abertura das conchas, apareceram as asas molhadas. Elas eram enrugadas como o corpinho de um bebê, acabado de sair do 66 ventre materno. Finalmente, a recém-nascida saiu da crisálida. O que aconteceu depois 67 foi um espetáculo. Observar como um novo ser, lentamente, se enchia de tempo. Tudo, na vida humana, acontece no espaço de dois ou três anos, aqui acontecia em horas. A borboleta encheu os vasos com resina. A resina ficou sólida, as asas se enrijeceram, como sob o vento. Elas eram incrivelmemte limpas, ainda com pólen. As asas ainda não mostravam os buracos causados pela força do vento. As asas, duras, tremiam um pouco e depois começaram a mexer. Assim o avião verifica o motor e o volante antes de chegar Frame de “O conto dos contos” à pista de decolagem. “A borboleta se prepara para o vôo. Ela está secando as asas.”, comentou Franceska. Ela previa cada movimento da borboleta, porque na infância as Às vezes ela não alcança o meu ritmo, as minhas exigências, e eu fico com a impressão cultivara por todo lado. Eu acho que ela própria, um dia, foi uma borboleta, um cardo, uma que ela está com preguiça ou não consegue chegar ao estado necessário da criação. E flor... Como a protagonista de Marquez, ao redor da qual sempre adejavam as borboletas. afinal, quando ela alcança a temperatura criativa necessária, a tensão cai e temos que Franceska sente muito bem o mundo que cresce, floresce e respira. Ela realmente o começar tudo do zero. conhece como os artistas renascentistas. Ela é um mistério para mim. Quanto mais eu a Mas eu nunca conseguiria fazer um esboço com a sua força, como ela é capaz de fazer nos conheço, menos a conheço. Em uma longa vida conjugal isto é ótimo, sem dúvida. Mas como seus melhores momentos de devaneio artístico. As suas revelações me impressionam. nós somos ligados um ao outro pelo trabalho, as relações tornam-se mais complexas. Muitas vezes, em meia hora ela passa do estado de uma pessoa incapaz de pensar, Pode parecer que a nossa união seja uma união feliz. Estamos juntos também quando ao estado da mais alta tensão de um pintor profissional. Para mim, trata-se de uma não trabalhamos. Torna-se mais fácil discutir o que estamos fazendo e alcançar algum inspiração mágica... resultado nas nossas disputas “ardentes”. Mas acabamos atrapalhando bastante um ao outro. A dependência familiar entra diretamente em conflito com o processo artístico. dos dois como roteiristas. Roman Katchanov é um ótimo diretor. Os seus filmes “A Luva”, “Crocodilo Guena” e “Tcheburashka” são obras primas da animação mundial. Eu posso Extratos de “A neve na grama” Yuri Norstein chamá-lo de professor. É um homem de uma bondade eterna, de muito tato. Sabe usar perfeitamente os detalhes do jogo. Eu não exagero em dizer que Roman Katchanov criou a sua própria escola de movimentação na animação de objetos (animação de bonecos). Eu O roteiro do filme “A Garça e a Cegonha” é bastante simples, e em minha opinião, lembra acho que sem ele, eu não me tornaria diretor. o universo poético de Tchekhov e Gogol. Não estou usando a palavra poesia por acaso. Voltando ao roteiro, podemos dizer que enquanto uma frase é consecutiva, o Trata-se de uma história simples: dois personagens que não podem fazer as pazes e ficar cinema é, simultaneamente, consecutivo e paralelo. É o seu fenômeno. felizes, porque ambos têm medo de ser humilhados e por isso, tentam mostrar a sua independência e superioridade. Uma história humana e não um mero conto animal. E aqui Por isso, o sentido de construção no cinema e na literatura é distinto. No cinema, nós começaram todos os problemas. Eu pressentia, porém não adivinha que seria tão difícil. percebemos a ação em várias camadas: som, cor, luz... Que riqueza de percepção! Neste Eu li este conto na infância e depois, o li para os meus filhos. sentido, o cinema apresenta grandes vantagens em comparação à literatura. E mesmo assim, a literatura é a forma de expressão autoral e de anotação imaginativa e metafórica Porém, eu só senti o desejo de filmá-lo quando mais potente e sólida. Aí reside a sua grande força. Pelo conjunto de sinais e sons, comecei a ficar perseguido pelo barulho de repetimos a realidade na consciência. grama, pelo barulho dos juncos dos rios. Pode- se achar estranho, pois trabalhando com artes Na consciência, a realidade inventada é visuais, foi o som que me causou um impacto, sempre mais forte do que na vida. Nela, levando à criação do filme. somos livres da dependência física. Depois, ainda antes de começar a escrever o roteiro, eu imaginei uma cena: a garça e a cegonha imitam um a outro. Uma fala: “Toma!”, e a outra responde: “Toma você!”. Eu ainda A palavra é o intermediário entre a realidade e nós. A palavra é a moeda de troca da não sabia onde colocaria esta cena no filme. Mas eu fiz a desenhei. Posteriormente, eu realidade. E o mais importante: a realidade é representada pela palavra, quer dizer, pelo 68 escrevi algo parecido com o roteiro, apesar de não poder chama-lo de roteiro. Resumia-se sinal através do qual ela se revela. 69 a algumas simples ações, nada mais do que isso. O tempo todo, eu estava preocupado em No cinema, a realidade é apresentada pela realidade. Aqui, faz se necessário um esforço não mostrar uma mera história de dois animais. Ao contrário, o foco da história deveria do autor para ultrapassá-la. A força da linguagem cinematográfica e, ao mesmo tempo, ser a natureza humana. Finalmente, o roteiro foi escrito por Roman Katchanov. E a partir a autenticidade têm um grande significado no caminho rumo à perfeição espiritual da daí, realizei os filmes com os meus esboços. Nos créditos do filme aparecem os nomes obra cinematográfica e, consequentemente, de nós próprios. A palavra é a linguagem que nós usamos. E não nos comunicamos na língua cinematográfica. É o primeiro sistema de sinais entre os animais. Talvez, sob a pressão da televisão, algo acontecerá nos nossos conscientes. Por enquanto, nós estamos somente perdendo o hábito de falar. Já não somos mais capazes de expressar o nosso pensamento de forma correta, imaginativa e rica. Estamos ficando preguiçosos. O cinema nos faz passivos. Lendo uma obra literária temos que passar um caminho esgotante de imersão no texto. O cinema, por princípio, nega este caminho. Os filmes, nos quais o trabalho de imersão na imagem, na ação e na linguagem cinematográfica se faz necessário, não passam o critério de “cinema”. Assim, muitas vezes, a percepção do espectador não corresponde aos critérios do autor. Podemos lembrar-nos das salas vazias nos filmes “A noite de Cabiria” e “A ilha nua”. Casos de convergência entre a verdade artística e o sucesso junto aos espectadores acontecem raramente. Eles acontecem quando a sociedade é abalada pelo acontecimento histórico retratado pelo artista.

Frame de “A Garça e a Cegonha” Quantos truques usa o cinema para atrair espectador! Efeitos criados pelo computador, criação de uma realidade irreal... É possível usar tudo: as fantasias virtuais (porque a realidade parece-nos simples), super-heróis, efeitos especiais, que encantam o público... 71 70 Passo a passo, o nosso consciente se habitua às situações que causam efeito. Somente as grandes ações podem ser chamadas verdadeiras, e não mais aquelas coisas prosaicas que realmente podem diminuir o medo da vida. Dependentes dos efeitos, eliminamos do nosso consciente o interesse pelo simples. Criando a indústria cinematográfica, ficamos vulneráveis a todos os efeitos colaterais. Mas o que fazer, se o baile de máscaras já começou? Já desaprendemos a nos surpreender com o dia a dia, por isso, exigimos da arte pratos mais apimentados.

“O conto dos contos” alexander petrov diretor I diretor de arte

Nasceu na região de Yaroslavl, em 1957. Estudou no Instituto de Cinema de Moscou (VGIK), na classe de Ivan Ivanov-Vano e na Escola Superior de Roteiristas e Diretores, com os professores Fiodor Khitruk, Yuri Norstein e Eduard Nazarov. Criou o estúdio independente “Panorama”, em 1992, na cidade de Yaroslavl. Entre 1996 e 1999 viveu e trabalhou no Canadá. Em 2007, criou o Ateliê Alexander Petrov. As suas animações receberam os principais prêmios internacionais, entre os quais se destacam o Prêmio Honorário do Festival Internacional de San Marino e o Oscar Americano.

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Filmografia na mostra

A Vaca (Korova) URSS, 1989, 10 min

O sonho de um homem ridículo (Son smeshnogo tcheloveka) Rússia, 1992, 20 min

A Sereia (Rusalka) Rússia, 1996, 10 min

O velho e o mar (Starik e more) Rússia, Canadá, Japão 1999, 20 min

Meu amor (Moya lubov) Rússia, 2006, 27 min discutíamos longamente, mas nada nos satisfazia. Eu voltei para casa (morávamos em Sverdlovskl¹), e lá filmei um fragmento que nos faltava. Comecei a filmar e, de repente, deu certo. Eu levei este material para o estúdio e nele Com A. Petrov havia algo especial. Ainda não tínhamos nenhum material entrevista por Elena Dolgopyat concreto, mas havia uma poesia própria. E, enquanto eu filmava, Volodya Petkevitch veio até mim, e perguntou-me o que eu fazia. Ele disse que Platonov havia escrito algo parecido. Ele conhece bem os contos infantis de Platonov e O seu primeiro trabalho individual, “A vaca”, é baseado no conto me trouxe o livro. E imagine! Era o que eu procurava. Mais de Platonov. Por que Platonov? simples e menos intelectual do que tudo o que eu havia A.P. Antes ainda de realizar o filme “A vaca”, eu fiz um criado, ele ia diretamente ao ponto. Eu desfiz-me de todas filme baseado em Platonov, em colaboração com Vladimir as minhas dúvidas e comecei a filmar. Não filmei todo o Petkevitch. De maneira geral, ele foi o responsável pelo conto de Platonov. Eu excluí um grande episódio: a parte meu entusiasmo com Platonov. Nós fizemos o filme “A cotidiana do conto, o qual me pareceu menos importante. noite”, do qual eu gosto muito. Cerramos os dentes e Concentrei-me no aspecto místico da obra. quebramos a cabeça, mas hoje, eu posso garantir que não me senti, neste filme, como um apêndice. Eu não quero Todos os seus filmes são adaptações falar mal do trabalho de direção de arte, mas neste filme, literárias, exceto “A sereia”... de repente, eu me via em cada detalhe. Eu me reconhecia neste lugar e, provavelmente, havia nascido para isso. A. P. “A sereia” também é uma adaptação. E é quase impossível adivinhar de onde Com “A vaca”, foi tudo diferente. Primeiro, eu fiz um roteiro ela foi adaptada. Tudo começou com “A baseado em um fragmento de uma obra de Vassily Belov. pobre Liza”. Também é um trabalho dos 75 74 Um fragmento sobre uma vaca, a qual deverá ser abatida no meus anos de estudos. Como você vê, os dia seguinte. Uma situação dramática, pois a proprietária anos de estudos nos trouxeram algumas faleceu e ninguém poderia sustentá-la. A vaca não sabe, ideias, que apareciam para, logo em porém pressente o seu fim próximo e recorda a sua vida. seguida, desaparecer, morrer ou serem Essas recordações tocaram-me. Eu tentei realizar um guardadas em algum “armário”. “A pobre roteiro sobre isso, ainda Liza” foi apenas uma ideia passageira. quando era estudante, Frame de “Sereia” Nasceu a partir de um exercício, feito por cada estudante. na Escola Superior de Era necessário escolher entre três ou cinco temas: Roteiristas e Diretores. “Mumu”, os contos de Tchekhov (se não me engano, “A Tínhamos a seguinte tarefa: dama e o cachorrinho”) e ainda algum outro tema. Cada criar um roteiro e então, estudante podia escolher o seu tema preferido e deveria filmar um fragmento de criar não um, mas três roteiros, com três interpretações um ou dois minutos. Assim, do conto: uma comédia, uma tragédia e um melodrama. nasceu “A vaca”. O exercício era interessante, proporcionando, a muitos, Eu a torturei por muito inúmeras descobertas. Sinceramente, era difícil realizar tempo, pois não sabia o que as três versões. Eu consegui, com muito custo, concluir fazer. Em paralelo à história somente uma versão e meia: a tragédia e a comédia. da vaca, de Belov, eu criei Elogiaram-me por este trabalho. Eu não fiz nenhuma a história do menino. Às alteração e guardei-o em uma pasta. Não me lembro como vezes, ele é pequeno e vai Frame de “A vaca” até ela para beber leite, às vezes, já é grande e vai até ela com um pedaço de pão. Criei diversas situações. Nós eu o encontrei novamente, seis anos após a conclusão dos de maneira intuitiva. Não é possível meus estudos. simplesmente decidir que o personagem Eu examinei, reli o cenário e pensei: “Pode virar um bom será de tal jeito e que o protótipo dele desenho. Era preciso enviar um projeto ao Goskino”. Eu o será tal pessoa. Isso nunca aconteceu. fiz e ele foi aceito. Eu tinha dúvidas, mas eles decidiram É sempre o resultado de uma procura, positivamente: podia-se fazer um filme a partir do roteiro onde no final espera-nos uma proposto. Ele não era mal, mas disso a um filme... Ontem, descoberta ou uma frustração. Depois, eu vivi a seguinte situação: Em frente da minha janela, de repente, vem uma ideia: e se eu havia uma macieira. Eu queria desenha-la e, ainda no tentar assim... Ou algum personagem inverno, havia realizado alguns estudos. Eu não desenhava desenhado começa a lembrar-me nada, sem ter realizado esboços prévios. No entanto, Frame de “O velho e o mar” alguém conhecido. Mas nunca aconteceu quando eu estava pronto para desenhar esta macieira, um simplesmente por minha vontade própria. Posso até dizer vento forte passou e a derrubou. E, de repente, diante dos que eu nunca percebi este momento conscientemente. meus olhos, toda essa beleza encontrava-se no chão. Eu me lembro de começar a convencer o meu operador de câmera, Serguei, a ser o meu “homem ridículo”, quando Você tem uma escrita realista. Por que a animação e não o já havíamos realizado o filme. O personagem já existia e cinema? se movimentava. Nós filmamos algumas cenas e eu sentia que havia algo errado. Eu tinha diversas fotografias. Após A. P. Já me fizeram essa pergunta e eu respondi alguma examiná-las, escolhi a fotografia de um jovem, proveniente meia verdade, para esquivar-me. Na verdade, eu de uma familha camponesa. Tinha algumas fotografias... simplesmente não sei. Provavelmente, eu não realizo filmes Mas, ou eu não podia enxergá-las, ou não tinha fotografias para falar sobre eles, mas para que eles possam levar-nos suficientes... Não sei como, mas eu abordei Serguei. ao mundo dos sonhos. Até essa esfera, na qual é impossível Foi uma grande sorte que eu pude finalmente enxergá-lo, 76 filmar com uma câmera ordinária, na qual tudo acontece na 77 apesar de ele ter estado todo o tempo ao meu lado. Não imaginação, de onde também tudo emerge. Isso é o que já teria sido necessário tanto sofrimento. Subitamente, eu podemos chamar de objeto de animação, ou seja, algo que compreendi que ele poderia me ajudar. Eu pedi-lhe para não existe na vida real. É como se todos os meus desenhos servir como modelo para a animação, pedi-lhe para filmar da vida real fossem uma mera moldura para mostrar a algumas cenas. Convidamos ainda uma menina e eles minha fantasia ou para penetrar o universo dos sonhos. atuaram juntos em algumas cenas, as quais poderiam Para mim, os sonhos têm significados. Os sonhos, a ser usadas para o filme. Por que eu fiz isso, eu próprio fantasia e todo este mundo paralelo, que existem ao lado não sei. Eu simplesmente o vi com aquela boina. Ele fazia da nossa vida cotidiana e que parecem muito com a nossa parte daquela época. O seu rosto e o seu caráter eram vida real. Eu até mesmo tento não opor estilisticamente exatamente o que eu buscava. Podemos dizer que foi uma o sonho e a realidade, desenhando somente a realidade. feliz coincidência. E, graças a Deus, ele finalmente aceitou, Eu me esforço para que as transições nos meus filmes pois no início ele tinha dúvidas e chegou até mesmo a não possam ser percebidas, a fim de levar o espectador, recusar categoricamente. inconscientemente, até essa esfera superior. Mas há também situações, nas quais eu encontro um personagem nos meus desenhos, e tenho a impressão Alguns dos seus heróis foram feitos a partir de protótipos. O que ele vive. Foi assim com o velho, no filme “A sereia”. protótipo do menino, no filme “A sereia” foi o seu filho; o velho, Eu procurei um velho, porém não o encontrei na vida real. em “O velho e o mar”, o seu sogro. Você precisa conhecer bem Também tinha diversas fotografias de diferentes velhos: a pessoa que inspirará os seus personagens ou basta apenas um monge, um pintor e algum outro. Todos barbudos um olhar? A. P. Sem dúvida, é melhor conhecê-la. Eu não sei como isso acontece. Algumas vezes, acontece completamente e diferentes. Eu tentei colocar todas essas pessoas na uso da computação. Sobretudo, não me convenceram mesma medida. Em todo caso, ao assistir o filme, é que o resultado será melhor. Obviamente, o trabalho é possível perceber que o velho é diferente nas diversas gigantesco. Passo muito tempo para criar uma ilustração cenas. Em algumas, ele é como Lev Tolstói; em outras, sintética, que pareça uma pintura. Talvez, eu gastaria como Dostoievsky; em outras como Serafim Sarovsky. Em menos tempo e energia se esta parte fosse realizada outras ainda, recorda o padre Serguei. Não encontrei uma por outro artista, com o auxílio da computação. Mas única ilustração para o personagem. eu lamentaria deixar esta parte do trabalho. Estou acostumado e sem ele, tudo me pareceria monótono. Você teve a ideia de filmar “O velho e o mar” há muito tempo, quando o Canadá ainda não estava nos seus planos. Se não Você pensa, atualmente, em fosse uma produção canadense que tivesse financiado o filme, algum novo projeto? mas alguma produção russa, qual teria sido o destino do filme? A. P. Ainda é cedo para dizer A. P. Com certeza eu não o teria realizado em Cuba, ou se ele resultará em algo, ou levado o cenário para o Mar Branco ou para o Mar de não. Trata-se de um filme Barentsevo. Eu contaria uma história sobre um velho da sobre o primeiro amor. região de Pomor. Creio que tais histórias existiram. Eu, Mas não é baseado em simplesmente, teria vestido toda a história com camisas Turgenev. É uma adaptação de cânhamo russo e toda a história teria cores prateadas de um livro de Shmelev. nórdicas, como na “Sereia”. Dramaturgicamente, eu tentaria manter o mesmo nível. Talvez o filme fosse menos Por que sempre adaptações? Frame de “O velho e o mar” espetacular, pois tive que filmar algumas cenas utilizando A. P. muitos efeitos. Algumas cenas pediam este lado espetacular. Talvez por pobreza. 78 O próprio ecrã exigia isso, ou mais corretamente, a imagem Muito pouco brota da 79 da sala de cinema, que necessita chocar o espectador. Estes minha imaginação. Por Frame de “O meu amor” cinemas mostram filmes, nos quais helicópteros mergulham isso, eu utilizo o que já existe. “A Sereia” é uma exceção, no mar ou mil antílopes correm pela África. Cenas deste apesar de ter nascido a partir da “Pobre Liza”, a qual, no gênero. E eu precisei filmá-las. Talvez elas não existissem entanto, sofreu alterações, limitando-se a um pequeno se os americanos tivessem uma tradição, ao invés de episódio. Mas toda a história... Eu a chamo até mesmo de simplesmente uma tendência. um vinagrete literário, pois nela há Pushkin, há a história sobre Lorelei e a história sobre o suicida, que não pode descansar, voltando sempre à terra, para vingar-se. Esse Isso influenciará a sua tecnologia? é o seu consolo. Eu quis desenvolver um pouco a história. A. P. Sou sempre colocado como um lutador contra as novas tecnologias. Na realidade, não é bem assim. Eu Fale-nos um pouco sobre os seus professores ou sobre as inclusive realizei alguns testes em alguns estúdios, pessoas que lhe influenciaram. que utilizam o computador nas suas animações. Eles A. P. estavam interessados em mim. Queriam desenvolver Desde a infância, diversas pessoas me infleunciaram. um programa, pois acreditavam que o trabalho manual é Mesmo que não tenham me influenciado sob o ponto de cansativo e lamentavam eu não utilizar todas as qualidades vista artístico, mas como ser humano. Na escola artística, propostas por uma máquina. Talvez eles tivessem algum em Yaroslavl, tínhamos um excelente pedagogo, uma interesse próprio, pois realizando um programa com a pessoa singular: Piotr Ivanovitch Pavlov. Ele havia estudado minha participação, o mesmo poderia ser vendido para no Liceu de Artes de Yaroslavl após a guerra, na qual ela outros artistas. Nós realizamos alguns testes. Eles foram interessantes, porém não me convenceram que o processo pode ser acelerado ou simplificado com o perdeu toda a família. Por isso, talvez, o trabalho com as honestamente, não acredito nisso. Uma pessoa assim deve crianças, com jovens artistas lhe era muito importante. tem um talento nato. E até mesmo o talento nato é, de certa As minhas conversas com ele fazem parte das minhas forma, limitado. primeiras lembranças. Uma pessoa muito importante para mim foi, sem dúvida, Você se baseia em algumas imagens artísticas durante o Boris Nemensky, mestre em pintura no Instituto de Cinema trabalho? (VGIK). Naquela época, ele trabalhava junto com Vitaly A. P. Eu tento não citar ou usar como fonte um artista só Aleksandrovitch Tokarev, mestre em desenho. Ele sempre ou realizar o meu futuro filme em estilo de um artista ou expressava a sua posição como cidadão e não posso afirmar de uma escola. Em algum momento, parei de pensar na que ele tinha muitos apoiadores. Ao contrário, ele provocava forma, no estilo, nas lembranças ou alusões que um filme sempre discussões, mas discussões podem ser produtivas. possa despertar. Se ele fala do movimento da “Idade de Sou extremamente agradecido ao mestre Ivan Ivanov- Prata” ou do Renascimento. Vano, pessoa extremamente conhecida no cinema e um Antes, isso era importante para mim. Quando eu fazia dos pilares da nossa animação soviética. Um homem filmes para outros diretores, eu tentava encontrar uma que, através da sua vida e obra, levou a animação a um forma para transmitir com precisão as ideias dos diretores, determinado nível, mudando a atitude das pessoas em ou quando o filme era baseado em uma obra literária, relação a esta linguagem artística. Ele era bastante também dos autores. Eu procurava formas estilísticas. excêntrico e muito generoso no diálogo com os jovens Depois, essa preocupação passou. artistas. Nós éramos jovens, e não podíamos apreciar a oportunidade apresentada pela vida. Se eu pudesse voltar Quando eu comecei a fazer os meus filmes, esqueci-me no tempo, gostaria de poder escutá-lo ainda mais e poder disso. Eu pintava como podia. Obviamente, eu tentava ser fazer-lhe ainda muitas perguntas. Foi uma grande fonte de fiel a mim próprio e cuidava para que a minha forma não conhecimento e experiência para mim. entrasse em conflito com a fonte literária. Mas eu não 81 80 procurava uma forma especial para expressar-me. Eu E obviamente, os nossos pedagogos em direção: Fiodor não utilizava as obras de Goya para ilustrar Dostoiévski, Savelovitch Khitruk e Yuri Norstein. Ambos, provavelmente, embora isto, provavelmente, fizesse sentido. Algumas exerceram uma influência decisiva na minha formação pessoas vêem Goya, Bosch e muita mais nos meus filmes. como diretor. Eu sempre me lembro deles com gratidão. E, sinceramente, sinto falta deste contato. Com prazer, Uma vez, eu tinha algumas ilustrações do artista francês continuaria como estudante, escutando-os transmitir Claude Lorrain penduradas no meu ateliê, como fonte de os seus pensamentos. Mas, infelizmente, a vida não inspiração. Eu as coloquei ao meu lado, não porque amava oferece segundas oportunidades. Mesmo assim, nós nos a obra dele, mas porque eu li que Dostoiévski adorava este encontramos, conversamos amigavelmente por alguns artista e achava ser o único artista a transmitir a sensação minutos quando nos encontramos nos festivais e em outras de harmonia perdida pela humanidade. Uma harmonia da ocasiões. Para mim, é sempre como um presente. qual ela tenta se aproximar ou distanciar. Sim, podemos falar de muitas pessoas que encontramos Eu achava que se Dostoiévski acreditava que a obra de ao longo da vida. Às vezes, vemos certa pessoa uma única Claude Lorrain correspondia a este ideal, eu deveria vez na vida, mas é o suficiente para, em algum momento, colocar os seus quadros ao meu redor. No entanto, no entendermos algo sobre a vida, sobre o nosso lugar nela e filme não há nenhuma referência ao estilo de Claude sobre a arte. Lorrain. Eu acho que não é necessário utilizar o estilo de um artista para transmitir pensamentos e ideias. Tento O mais importante, provavelmente, é o contato com colegas inventar imagens, sinais, símbolos, composições. É muito e o diálogo com os estudantes. É importante estar e mais interessante. Contudo, “O Sonho de um homem aprender com eles, sentir como eles crescem ao seu lado. Talvez seja possível evitar as instituições e a educação, e permanecer solitário. De alguma maneira, isto pode até ser melhor do que uma educação organizada. Mas eu, ridiculo” é um manual visual. Nele, encontram-se todos os para a linguagem cinematográfica. Eu consultei Yuri meus artistas favoritos: Rembrandt, Goya, Bruegel. Estão Norstein. Ele também falou sobre a falta da dinâmica todos presentes, mas sem que eu tenha utilizado citações da ação. Isto também parece preocupá-lo. Um filme não diretas. pode simplesmente contar fatos históricos. Ele precisa de vida, de ação. Precisa de um caleidoscópio de imagens e O que mais lhe ajuda no seu trabalho? quadros. E se não há uma faísca no momento da leitura, é melhor deixar esta ideia. A. P. Eu não leio sem parar. Já vivi assim, mas este período passou. Eu leio lentamente. Não aprendi a ler rápido. Tampouco tenho problemas com essa nova geração que não lê. Eu leio tudo o que pode ser útil para os projetos atuais e futuros. Na verdade, eu gosto de ler durante o processo de criação de um filme. Leio tudo o que encontro no meu caminho: jornais, revistas... Tudo é valido. Percebi que eles colaboram com o filme. Neste processo, você se encontra em um estado tão inquieto, que tudo o que passa por você é filtrado através desta inquietude. Às vezes, isso é útil. A criação de um filme é um processo muito demorado. Durante um ou dois anos você vive com o mesmo pensamento. Você dorme e acorda com ele. Toma chá e trabalha com ele. Vive todo o tempo sob o seu olhar fixo. Neste momento, a leitura torna-se um processo consciente e útil. 82 83 Você tem desenhos e esboços do “Grande Inquisidor” ... A. P. Eu ainda tenho esta ideia. Para dizer a verdade, eu tenho medo de realizá-la. Naquela altura, quando eu era jovem, eu achava que podia realizar qualquer ideia e que conseguiria fazer tudo. Hoje em dia, eu não arriscaria. Eu

entendi que Dostoiévski não é nada fácil. Eu sabia que ele “A sereia” é um escritor bastante complicado para a animação e para o cinema. “O Sonho de um Homem Ridículo” é um conto bastante dinâmico, com uma intriga e ações que podem ser representadas. Há várias cenas que ganham visualmente. “A Lenda do Grande Inquisidor” começa de uma forma intrigante e interessante: Espanha, século XVI. Os hereges, a Inquisição, incêndios e outros fatos. A prisão, onde se encontram o Grande Inquisidor e Jesus Cristo, que voltou à terra novamente. Depois, há um diálogo bastante complicado. Não é um diálogo, mas um monólogo. Jesus não fala uma palavra, somente o Grande Inquisidor fala. ¹ - Sverdlovsk, hoje Ekaterinburg. Na literatura, isto foi feito de maneira brilhante. Há uma intriga, o poder e a dor nos argumentos do velho. Mas é muito difícil fazer disto uma ação. É difícil traduzi-lo svetlana filippova autora I roteirista I diretora I animadora I ilustradora

Nasceu em 1968, em Alma-Ata (Cazaquistão). Formou-se na Escola Superior de Cineastas e Cenaristas (VKSR) de Moscou, na classe de Fiodor Khitruk, Yuri Norstein, Eduard Nazarov e Andrei Khrzhanovsky. Vencedora de inúmeros prêmios, vive e trabalha em Moscou como ilustradora de livros, autora, diretora e animadora. Membro da União de Artistas da Rússia.

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Filmografia na mostra

A história de Sara (Skazka Sari) Rússia, 2006, 6 min

Três histórias de amor (Tri istorii liubvi) Alemanha, 2007, 12 min

Onde morrem os cães (Gde umiraut sobaki) França, 2011, 12 min

Brutus (Brut) Rússia, 2014, 13 min Yuri Norstein Ponto de partida Revista “Nostalgia” n 1, 2007

Com S. Filippova Sveta Filippova mostrou-me um roteiro: “Um zelador morava com os seus pertences entrevista por Elena Gubaidulina para a Revista Psychologies em um cômodo apertado. No final do inverno, nevava intensamente. A neve caía durante toda a noite. Era uma vingança da neve por todo o esforço do zelador para manter as ruas limpas. O zelador estava deitado com o seu chapéu, embaixo do coberto e tinha Como surgem as ideias para os seus filmes? um olhar perplexo. A neve batia freneticamente na janela. O zelador ainda permaneceu deitado até que, de repente, jogou longe o cobertor, permanecendo deitado. Ele estava S.F. Vou contar uma história. Eu estudei na Escola Superior vestido e segurava nas mãos uma pá de madeira, que repousava sobre o seu peito”. Neste de Cineastas e Cenaristas, na faculdade de direção de momento, eu comecei a rir. É um detalhe curioso e engraçado: um zelador que dorme animação. Yuri Borisovitch Norstein nos deu a seguinte com uma pá nas mãos. O que nos resta na vida e o que nos une? O que torna a realidade tarefa: inventar o despertar de uma pessoa, e através de mais leve, transformando-a em metáfora? Somente a memória. Ela nos obriga a trabalhar detalhes, mostrar o caráter deste personagem. E deixou- a partir das nossas experiências anteriores. O zelador dormia toda a noite vestido, pois nos na sala de aula por duas horas. Eu me lembro de olhar estava sempre pronto para enfrentar a neve. pela janela e ver a neve que caía lá fora. E pensei: como é bonito para nós, espectadores, ver a neve caindo, mas Quantas vezes Sveta “despejou” inúmeras possibilidades no desenho? Quantas vezes, no como é difícil para quem tem que limpa-la. Eu desenhei seu roteiro, o zelador não saiu da sua cova confortável rumo ao espaço aberto? Cada vez algumas cenas, nas quais um zelador dormia vestido, de maneira diferente. Quanta neve (desenhada) o zelador não limpou, somente para voltar com uma pá embaixo do travesseiro. E como na guerra, ao seu leito para, em seguida, levantar-se novamente e reiniciar o trabalho, somente para estava sempre pronto para a batalha com a neve. Esse foi o que ela pudesse amadurecer o personagem e retirar novos detalhes da neve? Eu sempre primeiro desenho que eu mostrei a Norstein. O desenho me 86 repeti a mesma frase: ao achar um novo detalhe, é necessário limpar novamente todo o parecia pobre, e eu sentia vergonha de levá-lo a sua mesa. 87 cenário, para compreender como este novo detalhe influencia o tempo da imagem. Sveta Estava certa que ele me expulsaria do curso por falta de concluiu a Escola Superior de Cineastas e Cenaristas, foi premiada internacionalmente aptidão profissional. E, de repente, Yuri Borissovitch deu com o seu trabalho de conclusão de curso, deu à luz a gêmeos. E o seu zelador continuava uma gargalhada. Algo neste zelador com a pá parecia-lhe a retirar a neve, em uma briga eterna. E nunca conseguia deixar a cidade livre da neve. engraçado. A partir deste episódio nasceu o meu filme “A De volta à Rússia, Sveta realizou ilustrações maravilhosas para alguns livros de Ludmila história de Sara”. Ulitskaya, enquanto o zelador continuava a dormir segurando a pá de madeira. E a neve caía, caía, enquanto as crianças cresciam, cresciam. E tudo terminou quando a sua filha Esboços de “A história de Sara” pegou o material do cenário e escreveu um novo conto. O filme passou a chamar-se “A Neste filme surpreendente, o mundo é visto através do olhar de história de Sara”. uma criança. Observar os seus filhos ajuda-lhe no trabalho? S. F. “A história de Sara” não existiria se eu não tivesse Eu assisti o seu filme “A história de Sara”. Não se trata, obviamente, de uma campanha filhos. Os meus filhos nasceram logo após a conclusão dos com o título “Precisamos de trabalhadores para limpar o território”, mas eu ouvi o meus estudos como diretora e animadora e as filmagens sussurro do meu neto de seis anos: “Mamãe, eu também quero pegar uma pá para retirar tiveram que ser adiadas por vários anos. Eu os eduquei e os a neve”. observava. Nas horas vagas, desenhava cenas para futuros filmes. O resultado, porém, não me satisfazia. Os finais me pareciam previsíveis e planos. Os meus filhos pediam- me para ver o material desenhado e eu lhes pedia para contar uma história a partir dos desenhos. Sara, que tinha cinco anos, me contou uma história, inventando um final completamente inesperado. E eu compreendi que deveria influência de Pirosmani. Depois, a sua chegada à cidade. Já fazer o filme a partir da sua história e colocar o seu nome se trata de uma estética completamente diferente: Chagall, no título do filme. Tanto o meu filho quanto a minha filha Tchekriguin, Mansurov, Labas, Gontcharova, Larionov. ajudam-me no meu trabalho. Eu lhes peço para desenhar Vendo este trabalho no Festival Krok (Festival Internacional algo, e estes desenhos sempre mostram outro olhar na de Animação Krok), um produtor francês composição geral e nos protagonistas dos filmes. Estes pediu-me uma ideia para um próximo desenhos muitas vezes servem como ponto de partida para filme. os meus filmes. E o que você lhe sugeriu? E como surgiu “Três histórias de amor”? S.F. Eu tinha um roteiro sobre a vida S.F. De alguma forma, essas histórias dão do meu cachorro. Nos anos 1990, eu sequência ao tema iniciado pelo filme “A tive que deixar a minha cidade natal e história de Sara”. Por diferentes razões, parti, sem saber o que me aguardava. a realidade sempre nos interessa. Era Deixei o meu cachorro em casa e lá, muito interessante poder mostrar a ele envelheceu e morreu sem mim. Eu história de amor de Mayakovsky, vista Frame de “Onde morrem os cães” fiquei com um grande sentimento de culpa. Comecei a de ângulos diferentes. Como a história refletir sobre este tema e desenhei alguns esboços. O teria sido contada por Lylia Brik? Como produtor francês gostou da história, apesar dela parecer- ele próprio a teria contado? E como ela lhe demasiadamente russa. Mas tudo deu certo, e alguns teria sido vista por um observador? meses depois, eu fui para a França filmar este filme. Enquanto eu estudava o material, assisti diversos arquivos audiovisuais da época O seu filme “Brutus”, provavelmente o filme de animação mais 89 88 e o roteiro foi mudando. Eu não queria marcante que eu vi nos últimos tempos, fala também sobre mais falar sobre uma pessoa concreta, cachorros, sobre criaturas corretas, que não desejam tornar- invadir os detalhes de uma vida alheia. se traidores. Como foi filmado este filme? Assim, criei a imagem geral de um poeta, S. F. o qual deixa a sua aldeia nas montanhas Eu comprei, por acaso, o livro “Vida de Cão”, de rumo à cidade grande. A imagem de Ludwig Ashkenazy, e o li para os meus filhos. “Brutus” Mayakovsky e a sua capacidade de e alguns outros contos não saíram da minha cabeça. Eu entregar-se ao amor de tal maneira que lembrava também dos comentários das crianças sobre nenhuma mulher conseguia permanecer este livro. Em 1934, começaram as proibições para os ao seu lado por muito tempo, continuava judeus na Alemanha nazista. No início, proibiram os sendo importante. Pequenos pedaços judeus de defender as suas teses nas universidades. de crônicas, interrompidos de maneira Depois, os alemães não podiam comprar em lojas judias Frames de “Três histórias de amor” brusca, pediam uma continuação. E eu desenhava essas e os casamentos com judeus foram proibidos. Eles eram continuações. Tudo isso resultou em um filme estranho, proibidos de frequentar bibliotecas, hotéis, teatros e no qual cenas documentais são costuradas graças à óperas, pistas de patinação e piscinas. Os automóveis lhes animação. A animação determina as novas regras do jogo, foram proibidos. Aos poucos, tudo foi sendo proibido. E as mais contingentes, e a crônica ganha, desta forma, um pessoas, acostumadas, continuavam a viver, sem enxergar aspecto diferente. Foi muito importante não contar apenas como tudo terminaria. Eu percebi que queria fazer um uma história de amor abstrata, mas situa-la em uma época filme a partir do conto “Brutus”. Era um desafio pensar na concreta da História. O material gráfico e as pinturas de maneira de levar esta literatura para o cinema. De algum artistas do início do século XX ajudaram-me bastante. O filme foi construído sobre citações. Começa com a infância de Mayakovsky na Geórgia. Obviamente, há uma grande modo, o filme “Brutus” foi dos seus animais de estimação. Assim, a protagonista mais simples e ao mesmo entrega Brutus, também o traindo. Eu creio que neste tempo mais difícil do que momento, algo morre dentro dele, ou seja, a guerra nos os outros. No momento de transforma. O nosso espírito fica cansado de resistir pleitear ajuda financeira aos absurdos da guerra. A indiferença torna-se a única para a realização de um saída para sobreviver à maldade. Em algumas situações, filme, é necessário indicar para verificarmos os nossos limites, precisamos estar a duração do mesmo. em um ambiente hostil. No entanto, muitas vezes, o mal Mas como prever a duração do filme? Tudo é construído a penetra nas nossas vidas sorrateiramente não é possível partir de ilustrações, detalhes e pausas. Como contar isso? reconhecê-lo ou identificá-lo imediatamente. E ele corrói- Eu liguei um cronômetro, fechei os olhos e mentalmente nos a alma. Adptamo-nos, tentando sobreviver em um comecei a ver o filme, o qual eu ainda não havia filmado. E mundo desconhecido, com novas regras. Após ultrapassar o mais engraçado é que eu o visualizei. Depois, anotei tudo essa fronteira, tudo se torna possível. Isso é ilustrado em o que tinha visto. Demoradamente, recordava os detalhes e “Brutus”, que apesar de ser representado por um cão no as impressões gerais. Precisava ainda estudar as crônicas conto, fala da natureza humana. dos anos de guerra, pesquisar fotografias e filmes. Fazer centenas de esboços. Tudo ficava dependurado diante dos Por que a animação pode ser útil em tornar o invisível visível? meus olhos no meu ateliê, para que eu não me esquecesse S.F. de nada e para que o filme fosse preenchido por pessoas. Às vezes, penso que a animação é uma linguagem Ekaterina Baikova e Svetlana Zimina auxiliaram-me nos demasiadamente rude. É possível mostrar alguns aspectos trabalhos. Elas assumiram parte deste pesado fardo de maneira mais sutil no cinema, assim como fizeram emocional. Quando eu estava no momento mais sombrio Bergman, Fellini, Tarkovsky, Guerman e Muratova. Lá, é da história, pedi para que a minha filha desenhasse a cena. possível trabalhar diversas soluções através de grandes Esboços de “Brutus” 91 90 Sentia a necessidade de um olhar fresco sob uma cena planos ou através da expressão facial dos atores. Tente que nos foi mostrada inúmeras vezes no cinema. Como fazer isso na animação! Revendo os filmes de Caroline ficavam as pessoas nos comboios rumo aos campos de Leaf, Georges Schwitzgebel, Frédéric Back, George concentração? Como elas eram recebidas, à noite, por cães Dunning ou dos nossos mestres, eu vejo que nós próprios e pessoas em uniformes? E a partir dos seus desenhos, nos impomos restrições. Tudo é uma questão de liberdade. eu aperfeiçoei a animação destas cenas. Era muito É assustador fazer algo que ainda não foi feito por ninguém. importante preservar a leveza nas ilustrações, assim como Durante os trabalhos no meu último filme, eu me proibi a negligência e a secura intencional da apresentação. Era explicações e análises sobre o que eu estava fazendo. Eu preciso procurar detalhes engraçados. li a seguinte frase de um poeta: “Eu não me intrometo na minha criação”. É verdade. Eu sempre preciso lembrar-me disso. A poesia é a arte mais próxima da animação. Para O que motiva a traição das pessoas próximas? E de onde descrevê-la, podemos utilizar as palavras de Seamus buscamos forças para suporta-la de maneira estóica e humilde, Heaney: “Enquanto algo não chegar voando aos ouvidos do como o faz o protagonista de “Brutus”? poeta, enquanto a sua consciência não tropeçar em um solo S.F. Muitas vezes, a traição acontece aos poucos. plano, enquanto a surpresa ou a emoção não o possuírem, Primeiramente, algo acontece nos nossos pensamentos. mesmo que minimamente, o trabalho não começa.” Uma Como Brutus, que todo o tempo recordava o velho cavalo. forma que se transforma em pensamento. Esta é uma das Ele ainda era um cão inteligente e vivia na família de um mais importantes peculiaridades da animação. professor de latim. E acima de tudo, amava o seu dono. Mas o cheiro de sangue da velha égua estava sempre na sua cabeça. E, em um determinado momento, o seu dono encontra-se sem alternativas diante da situação. Frames de “Brutus” Um decreto fascista obriga os judeus a se separarem Podem existir restrições na animação, as quais limitam artistas e diretores na transmissão do seu universo? S.F. É necessário pensar em como desenhar em movimento tudo o que pensamos. E ter consciência que em cada segundo de um filme encontram-se entre 12 e 24 desenhos. Existem desenhos maravilhosos. No entanto, depois de começarmos a pensar como os personagens se movimentarão neste desenho, tudo nos parece em excesso. Cada história requer uma nova solução em relação à luz, composição, movimentação da câmera montagem, etc. Na animação, a movimentação do personagem é muito importante. Se analisarmos os filmes de Fiodor Khitruk, podemos constatar que em cada filme ele inventava um novo estilo de movimentação. Como tudo é permitido na animação, é difícil alcançarmos tamanha liberdade, tal como ela possibilita. Criar um mundo com novas regras e brincar com elas ou destruí-las? Eduard Nazarov nos mostrou, durante as suas aulas, o filme “Ali Babá” de Giulio Gianini e Emanuele Luzzati. Os personagens eram feitos a partir da superposição de papeis, os quais nem mesmo eram cortados com tesoura, mas rasgados com as mãos. O filme começa, e inicia-se um jogo de imaginação, no qual você adivinha como funcionarão as leis recém-nascidas 92 93 neste mundo modificado. Tudo é errado, porém nestes papeis que se movimentam você reconhece a verdade da vida. Neste momento, você se sente feliz.

Esboço de “Brutus” 94 95

Bibliografia

Assenin, Serguey. Mudrost Vimisla. Mastera multiplilkatsi o sebe i o svoem iskusstve. Moskva: Iskusstvo, 1983

Norstein, Yuri. Sneg na trave. Moskva: VGIK, 2005

Khitruk, Fiodor. Professia animator. Moskva: Gaiatri, 2007

Kinovedctheskie zapiski. N52, 2001 O que é uma animação e como se faz? Animação é uma sequência de desenhos ou fotos de objetos com pequenas mudanças de posição entre eles. Quando passamos esses desenhos ou fotos bem rápido nosso cérebro entende que o objeto está se mexendo. Legal, não é? E isso pode ser feito de várias maneiras: com desenhos, com fotos e inclusive com o computador.

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Folheie o livro de trás pra frente! Viu? O nome dessa “técnica de animação” é flipbook, em inglês. Mas podemos chamar também de cine-livro, assim como os Conhece?russos faziam há muito tempo, no período do construtivismo russo, um movimento artístico muito interessante e importante. VAMOS TENTAR? VEJA A SEGUIR O PASSO A PASSO E DIVIRTA-SE! Pense na história que você quer contar e no personagem (ou personagens) que ela terá 1 dica Agora que você está começando escolha formas mais simples!

Faça seu bloco de papeis ou compre um pronto. Para fazer o bloco é só cortar folhas A4 em pedaço menores e grampear dica 2 Para fazer 1 segundo de animação você vai precisar de 12 a 24 desenhos!

Vai fazendo os desenhos com 98 pequenas alterações na forma e posição para fazer o movimento que você pensou, um em cada folha dica 3 Os profissionais trabalham sobre uma mesa de luz, assim é possível ver o desenho anterior e saber onde você deve alterar a forma. Mas você pode usar o vidro de uma janela da sua casa. Ela funcionará como uma mesa de luz!

DESTAQUE A FOLHA TRANSPARENTE AO LADO E USE PARA FAZER OSSUA DESENHOS ANIMAÇÃO! DA produção apoio patrocínio