Pontifícia Universidade Católica Do Rio Grande Do Sul Faculdade De Letras Programa De Pós-Graduação Em Letras
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS MARISTELA KIRST DE LIMA GIROLA ENTRE A CASA E A RUA: O ESPAÇO FICCIONAL E A PERSONAGEM FEMININA NO ROMANCE PORTUGUÊS DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX Porto Alegre 2011 MARISTELA KIRST DE LIMA GIROLA ENTRE A CASA E A RUA: O ESPAÇO FICCIONAL E A PERSONAGEM FEMININA NO ROMANCE PORTUGUÊS DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX Tese apresentada como requisito para a obtenção do grau de Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Faculdade de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Orientadora: Dr. Maria Luíza Ritzel Remédios Coorientadora: Dr. Helena Carvalhão Buescu Porto Alegre 2011 Às mulheres. AGRADECIMENTOS À Professora Maria Luíza Ritzel Remédios, minha orientadora, exemplo de amor à vida e de perseverança, pelos conselhos plenos de sabedoria, afeto e generosidade. À Professora Helena Carvalhão Buescu, minha orientadora na Universidade de Lisboa e coorientadora desta tese, pela disponibilidade, pelo acolhimento carinhoso e pelos ensinamentos preciosos. Aos professores Maria Eunice Moreira e Pedro Brum Santos pelas valiosas sugestões na banca de qualificação. A CAPES que viabilizou, por meio de bolsa, o Doutorado e o estágio em Portugal. À coordenação, aos professores, às secretárias, aos funcionários e aos colegas do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS pelos anos de convivência fraterna. À Maria Inês da Cruz Tinoco Rebelo, funcionária do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, pelo atendimento sempre (mesmo quando à distância) expedito, gentil e eficiente. À Professora Beatriz Weigert pela atenção e afetuosa recepção em Lisboa. À minha família, ao meu marido e aos meus amigos pela compreensão, pela paciência, pelo amor e pelo apoio incondicionais. A Lisboa pela sua atmosfera inspiradora. A representação do mundo, como o próprio mundo, é operação dos homens; eles o descrevem do ponto de vista que lhes é peculiar e que confundem com a verdade absoluta. (BEAUVOIR, s/d, p. 183) A arte é, provavelmente, uma experiência inútil; como a ‘paixão inútil’ em que cristaliza o homem. Mas inútil apenas como tragédia de que a humanidade beneficie; porque a arte é a menos trágica das ocupações, porque isso não envolve uma moral objetiva. Mas se todos os artistas da terra parassem durante umas horas, deixassem de produzir uma ideia, um quadro, uma nota de música, fazia-se um deserto extraordinário. Acreditem que os teares paravam também, e as fábricas; as gares ficavam estranhamente vazias, as mulheres emudeciam. (BESSA-LUÍS, 2008, p. 20) Há que afinar um instrumento e os dedos do consciente até aos limites do possível – e artista e instrumento deverão ser aqui da mesma matéria e energia: o verbo-história português. Esta não é a liberdade, é a libertação. Nem há outra liberdade para o artista que não a de ir libertando-se, libertando. (COSTA, 1976, p. 84) RESUMO Esta tese dedica-se a estudar o espaço do feminino na sociedade patriarcal portuguesa, em romances da segunda metade do século XX, tomando como objetos de análise as seguintes obras: A Sibila (1954), de Agustina Bessa-Luís; O Anjo Ancorado (1958), de José Cardoso Pires; Casas Pardas (1977), de Maria Velho da Costa; História do Cerco de Lisboa (1989), de José Saramago e Não entres tão depressa nessa noite escura (2000), de António Lobo Antunes. A análise fundamenta-se na teoria da literatura, com o apoio dos estudos culturais, de teorias feministas e de teorias sociológicas. O estudo demonstra que a progressiva complexificação da construção da personagem feminina relaciona-se direta e necessariamente à construção do espaço ficcional. Palavras-chave: Literatura Portuguesa. Romance do século XX. Espaço. Memória. Personagem feminina. ABSTRACT This thesis investigates the space of women in the Portuguese patriarchal society in novels published in the second half of twentieth century: A Sibila (1954), by Agustina Bessa-Luís; O Anjo Ancorado (1958), by José Cardoso Pires; Casas Pardas (1977), by Maria Velho da Costa; História do Cerco de Lisboa (1989), by José Saramago and Não entres tão depressa nessa noite escura (2000), by António Lobo Antunes. The analysis is based on literary theory, cultural studies, feminist studies and sociological studies. This work demonstrates that the configuration of feminine character acquires a progressive complexity. This evolution is related directly and necessarily to the construction of fictional space. Keywords: Portuguese Literature. The Twentieth Century Novel. Space. Memory. Feminine Character. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8 2 “O SILÊNCIO COMO UM ESTREMECER PROFUNDO PERCORRIA A CASA”16 2.1 A REPRESENTAÇÃO DO ESPAÇO E DA MULHER E A AUSÊNCIA DA VOZ FEMININA ................................................................................................................. 16 2.2 “DO HOMEM A PRAÇA, DA MULHER A CASA” ................................................ 23 3 “FOI ENTÃO QUE SE OUVIU O GRITO” ............................................................ 32 3.1 ANJO OU SIBILA? NOVAS MULHERES EM FORMAÇÃO ................................ 32 3.1.1 A figura paterna e a personagem feminina ................................................ 70 3.1.2 A educação feminina .................................................................................... 93 3.2 O ESPAÇO DA MEMÓRIA E DO FEMININO ................................................... 111 3.2.1 Memória e escrita........................................................................................ 143 3.2.2 A memória de um país ................................................................................ 171 3.3 O ESPAÇO DO CORPO E O CORPO DA ESCRITA ....................................... 195 3.3.1 Sexualidade e escrita: a mulher e o espaço do amor .............................. 222 3.3.2 A escrita da casa e a casa da escrita: “A casa não é margem mas antes convergência, encontro, centro” ......................................................................... 243 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 259 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 266 8 1 INTRODUÇÃO O foco desta tese é a análise do espaço do feminino na sociedade patriarcal portuguesa, em romances da segunda metade do século XX. O estudo procurará estabelecer relações entre a representação do espaço e a construção das personagens, buscando demonstrar como os autores abordaram a condição e a identidade femininas em seus universos ficcionais. Dar-se-á atenção às relações de poder representadas, levando-se em conta os critérios de gênero, classe social e contexto histórico. Embora focada na análise de texto, levar-se-á em conta também a influência da organização social, dos mecanismos ideológicos, bem como das mudanças por que tem passado a literatura portuguesa a partir do Neorrealismo, ou seja, buscando uma interpretação textual e uma interpretação sociológica de maneira equilibrada. Procuramos analisar o espaço ficcional e a construção das personagens femininas do ponto de vista da teoria da literatura, com a colaboração dos estudos culturais, de teorias feministas e de teorias sociológicas, reconhecendo a importância de suas contribuições para a crítica literária. O corpus a ser analisado contempla romances escritos por homens e mulheres, pois não temos a intenção de distinguir autoria feminina e autoria masculina, uma vez que acreditamos ser possível encontrar um discurso antifalocêntrico quer em textos concebidos por homens quer em textos construídos por mulheres. O presente estudo compreende a análise do espaço ficcional, entendido como “mundo do texto” ou “modelo de realidade”, no sentido proposto por Paul Ricoeur (1995), isto é, uma representação textual que não imita o real, mas a ele se refere, transformando-se num “mundo de sentido”, constituído no interior do próprio ato representativo e em intersecção comunicativa com o “mundo do leitor”. A questão fulcral desta tese é verificar quando e de que forma a representação da mulher e da sociedade patriarcal portuguesas sofre uma mudança significativa de tratamento temático e estético no romance português, a partir da articulação entre espaço ficcional e personagem. Procuramos entender essa articulação entre “espaço” e “feminino” como um processo de postular interrogações sobre a representação da mulher e de um tipo de sociedade, a patriarcal portuguesa. Pretendemos confirmar a hipótese de que os romances produzidos na segunda metade do século XX, em Portugal, promovem uma quebra de paradigma em relação à configuração da personagem feminina, como “anjo” ou “demônio”, 9 imagens idealizadas e consagradas por escritores de épocas anteriores. É na segunda metade do último século que a mulher passa a ser efetiva e recorrentemente constituída no romance como um “sujeito”, de acordo com o que propõe Ricoeur (s/d), um ser que se caracteriza pela possibilidade de se colocar questões, sendo simultaneamente o questionador e a coisa questionada, ou como propõe Maurice Merleau-Ponty (1984, p. 37), “aquele que questiona é, ele próprio, posto em causa pela questão”, ou ainda, como um “sujeito perceptivo”, definido por Helena Buescu (1990), como capaz de, ao mesmo tempo, posicionar-se temporal e espacialmente dentro de um mundo, de pensar-se dentro dele e em relação a ele.