O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA EMPRESA

BRASILEIRA: O CASO DA REDE GLOBO

Felipe Portes Rizzo Assunção

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Instituto COPPEAD de Administração

Mestrado em Administração

ORIENTADORA: ANGELA DA ROCHA

Rio de Janeiro

2006 ii

O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA EMPRESA BRASILEIRA: O CASO DA REDE GLOBO

Felipe Portes Rizzo Assunção

Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração – COPPEAD, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre.

Aprovada por:

______- Orientadora Profa. Angela da Rocha, Ph.D. (COPPEAD/UFRJ)

______Profa. Letícia Casotti, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)

______Profa. Marie Agnes Chauvel, D. Sc. (IAG/PUC-Rio)

Rio de Janeiro

2006

iii

FICHA CATALOGRÁFICA

Rizzo Assunção, Felipe Portes.

O processo de internacionalização de uma empresa brasileira: o caso da Rede Globo / Felipe Portes Rizzo Assunção. Rio de Janeiro, 2006.

xi, 147f.: il.

Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto COPPEAD de Administração, 2006.

Orientadora: Angela Maria Cavalcanti da Rocha

1. Processo de Internacionalização. 2. Setor de Comunicações. 3. – Teses. I. Rocha, A. M. C. (Orientadora). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de Administração. III. Título.

iv

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pelo privilégio de poder dedicar dois anos da minha vida ao meu crescimento profissional e por me cercar de pessoas e condições que tornaram essa jornada ainda mais engrandecedora.

Primeiramente, gostaria de agradecer à Angela da Rocha, pela orientação, dedicação e seriedade ao longo de todo este trabalho. Aos membros da banca por suas contribuições. À CAPES, por ter concedido a bolsa de estudos que me apoiou durante o segundo ano do curso de mestrado.

Agradecimentos especiais à Rede Globo pelo incentivo à pesquisa e aos entrevistados Francisco Balsemão, Jorge Adib, Pedro Carvalho, Cristina Pessoa, Helena Bernarde, Flávio Rocha, Marcos Milanez e Patrícia Hockensmith pela paciência e tempo dedicado a este trabalho.

Aos profissionais do Coppead: professores, funcionários da biblioteca, secretaria acadêmica, segurança, reprografia e do restaurante por criarem um ambiente propício para que pudéssemos tirar o máximo proveito desta experiência.

À Turma 2004 do Coppead, que em pouco tempo transformou meros colegas em amigos para qualquer hora, e que fizeram com que o “retorno sobre o investimento” neste mestrado viesse antes mesmo da minha volta ao mercado de trabalho.

Aos meus pais pelo exemplo de vida, amor, valores e caráter. Por estarem ao meu lado incondicionalmente. Aos meus irmãos, familiares e amigos pela compreensão ao longo do tempo em que estive em um “retiro forçado”, por todo o apoio nos momentos difíceis e por me fazerem sentir que estavam sempre por perto.

Em especial agradeço à Isabella Amui, companheira para todos os momentos, grande incentivadora do meu crescimento pessoal e profissional, que me faz acreditar que não existem pedras intransponíveis ou sonhos inalcançáveis.

v

RIZZO ASSUNÇÃO, Felipe Portes. O Processo de Internacionalização de Uma Empresa

Brasileira: O Caso da Rede Globo. Orientadora: Angela Maria Cavalcanti da Rocha. Rio de

Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2006. Dissertação (Mestrado em Administração).

O objetivo deste trabalho foi investigar o processo de internacionalização de uma grande empresa brasileira do setor de comunicações, a TV Globo, com o propósito de entender sua forma, suas etapas e os fatores influenciadores desta expansão mundial sob o enfoque das teorias propostas na literatura. Optou-se por realizar uma pesquisa qualitativa sobre o assunto, desenvolvendo um estudo longitudinal que acompanhasse a evolução da empresa, identificando processos, estruturas e eventos que marcaram a sua internacionalização. Devido

à complexidade e ao caráter temporal deste estudo, o método escolhido foi o estudo de caso, sendo realizadas entrevistas com executivos da empresa e levantamento de dados secundários. A análise contemplou (1) como se iniciou o processo de internacionalização da

TV Globo, (2) como se deu a evolução do comprometimento com os mercados externos, (3) o papel das parcerias como alternativa aos investimentos diretos, (4) o processo de escolha dos países nos quais iria atuar e (5) o grau de importância do produto telenovelas nesse processo. Além disso, foram apresentados insights e questões relacionadas ao processo de internacionalização de empresas para que trabalhos futuros possam se debruçar sobre estes aspectos.

vi

RIZZO ASSUNÇÃO, Felipe Portes. The Internationalization Process of a Brazilian

Company: A Case Study of Rede Globo. Advisor: Angela Maria Cavalcanti da Rocha. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2006. Dissertation (Master in Business Administration).

The objective of this work was to study the internationalization process of a large Brazilian company from the communications sector, TV Globo, with the purpose of understanding, using theories reported in the literature review, the process, stages, and factors that influenced its international expansion. A qualitative study was designed in order to develop a longitudinal investigation with the aim of tracking the company's evolution, and identifying processes, structures and events associated to its internationalization. Due to the complexity and temporal nature of this investigation, the "case study" method was chosen, using interviews with company executives and analysis of secondary data. The following questions were addressed: (1) how the internationalization process of TV Globo started, (2) how the evolution of commitment with external markets happened, (3) the role of partnerships as an alternative to direct investments, (4) the selection process of the countries in which the firm would operate, and (5) the importance of the company’s main product - "soap-operas" - in this process. Insights and questions related to the internationalization process of firms were presented in order to foster future research on this subject.

vii

Lista de Figuras:

Fig. 1 – O Mecanismo Básico de Internacionalização –

Variáveis Fixas e de Mudança ______p.32

Fig. 2 – O Aspecto Multilateral do Processo de Internacionalização ______p.38

viii

Lista de Tabelas:

TAB 01 - Paradigma Eclético x Modelo de Uppsala ______p.41

TAB 02 - Comparação de Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais ______p.55

TAB 03 - Coleta de dados ______p.59

TAB 04 – Países onde a TVGI é transmitida ______p.105

TAB 05 – Parcerias por região de distribuição ______p.106

ix

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ______01

1.1. Objetivos do Estudo 01

1.2. Relevância do Estudo 02

1.3. Delimitação do Estudo 03

1.4. Organização do Estudo 05

2. REVISÃO DE LITERATURA ______08

2.1 Início do processo de internacionalização da firma 09 2.1.1 O conceito de “internacionalização de empresas” 09 2.1.2. Motivações para a internacionalização 11

2.2 O Processo de internacionalização de uma empresa 16 2.2.1 A abordagem econômica 16 - A Teoria de Custos de Transação: fonte de inspiração 16 - A Teoria da Internalização 18 - O Paradigma Eclético da Produção Internacional 20 2.2.2 A abordagem comportamental 24 As fontes de inspiração 25 - Penrose 25 - Cyert e March 26 - Aharoni 26 Escola de Uppsala 27 Um Processo Gradual 27 O Conceito da Distância Psíquica 28 A Cadeia de Estabelecimento 29 O Modelo de Uppsala 30 O Conceito de Networks 36

2.2.3 A comparação das abordagens econômicas e comportamentais 40

2.3 Evolução de comprometimento com mercados externos 42 - Evolução de comprometimento: um processo gradual? 42 - Um processo irreversível seguindo etapas predefinidas? 43 - Como mensurar e determinar o grau de internacionalização de uma empresa? 46

2.4 Importância das Networks 48

2.5 Seqüência de escolha de ampliação do raio de atuação internacional 50

x

3. METODOLOGIA ______52

3.1. O Problema da Pesquisa 52

3.2. Definição das perguntas da pesquisa 53

3.3. Método da pesquisa 53

3.4. Métodos de coleta e análise de dados 56

3.5. Limitações do estudo 61

4. ESTUDO DE CASO: O Caso da Rede Globo ______64

4.1. A EMPRESA 64 4.1.1. Uma breve descrição da Empresa em 2005 64 4.1.2. Organizações Globo 65 4.1.3. A Importância da Tv Globo 66

4.2. OS PRIMEIROS PASSOS DA GLOBO 67 4.2.1. Os empreendedores: Irineu e Roberto Marinho 67 4.2.2. A Formação da Rede Globo de Televisão 69 4.2.3. As Primeiras Mudanças e o Crescimento da Globo 72 4.2.4. As Telenovelas na Globo 74

4.3. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA GLOBO 77 4.3.1. Os Primeiros Passos 77 4.3.2 Investimentos Diretos no Exterior 80 Compra da Telemontecarlo – 1985 81 Compra de participação na Sociedade Independente de Comunicação (SIC) 84 A importância da Globo 88 As Telenovelas na SIC 89 Venda da Telemontecarlo – 1994 91 Foco no conteúdo 93 Investimentos em capacidade de produção: Projeto Jacarepaguá (PROJAC) 94

4.4. UMA NOVA ETAPA NO PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO 94 4.4.1. Período de Mudanças Estruturais 94 4.4.2. A Reestruturação da Área Internacional - 2000 96 Diretoria de Negócios Internacionais (DNI) 97 A Forma de Operação das Áreas 101 Diretoria Artística 102 Diretoria de Distribuição Internacional (DDI) 103 Distribuição do conteúdo através de Parcerias 105 Programa feito para brasileiros que estão no exterior 107 Venda da SIC – 2003 108 Situação da Empresa em 2005 109 De exportadora de novelas para exportadora de conteúdo 110 A Ampliação de horizontes 110

xi

5. ANÁLISE E CONCLUSÕES DO CASO TV GLOBO ______112

5.1. Como se iniciou o processo de internacionalização da TV Globo? 112

5.2. Como se deu a evolução do comprometimento com os mercados externos? 114

5.3. Qual foi a importância da utilização de parcerias como alternativa aos investimentos diretos? 121

5.4. Como se deu o processo de escolha dos países nos quais iria atuar e de que forma a seqüência de escolha encontra-se relacionada com o conceito de distância psíquica? 123

5.5. Qual o grau de importância do produto nesse processo? 126

Considerações Finais 128

Sugestões para Pesquisas Futuras 130

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 132

ANEXO 1 – 1ª Rodada de Entrevistas com a DNI 139 ANEXO 2 - 2ª Rodada de Entrevistas com a DNI 141 ANEXO 3 – Lista das Novelas Veiculadas na Globo 143

1

1. INTRODUÇÃO

1.1. Objetivos do Estudo

O objetivo deste trabalho é investigar o processo de internacionalização de uma grande empresa brasileira do setor de comunicações, a TV Globo, com o propósito de entender sua forma, suas etapas e os fatores influenciadores desta expansão mundial sob o enfoque das teorias propostas na literatura. O estudo encontra-se inserido na linha de pesquisa sobre o processo de internacionalização de empresas do NuPIn – Núcleo de Pesquisa em

Internacionalização de Empresas do Coppead/UFRJ.

As seguintes perguntas orientaram o estudo:

(1) Como se iniciou o processo de internacionalização da TV Globo?

(2) Como se deu a evolução do comprometimento com os mercados externos?

(3) Qual foi a importância da utilização de parcerias como alternativa aos investimentos diretos?

(4) Como se deu o processo de escolha dos países nos quais iria atuar e de que forma a sequência de escolha encontra-se relacionada com o conceito de distância psíquica? e

(5) Qual o grau de importância do produto telenovelas nesse processo?

2

1.2. Relevância do Estudo

As empresas brasileiras iniciaram tardiamente seu processo de internacionalização. Apesar do aumento da atividade de exportação provocada pelos incentivos governamentais nas décadas de 1960 e 1970, o movimento em direção a mercados internacionais perdeu seu impulso, sendo poucas as empresas a abrirem subsidiárias no exterior até o final da década de 1980

(Barretto e Rocha, 2003). Nos dias de hoje, são ainda poucas as empresas brasileiras que partiram para a atuação internacional, tanto no que se refere à atuação exportadora significativa, quanto ao licenciamento de tecnologia para o exterior e ao investimento direto através de abertura de subsidiárias em outros países. (Veiga e Rocha, 2003)

A TV Globo foi uma das primeiras empresas privadas de capital nacional a fazer investimentos diretos de grande porte no exterior, com a compra da Telemontecarlo em 1985 e, desde então, tem mostrado que a atuação internacional é parte de sua estratégia. Além disso, o grau de aceitação alcançado pelo produto “telenovela” no mercado externo, conseqüência do alto padrão de qualidade do conteúdo e do know-how em adaptar as novelas para o mercado de destino, serve como exemplo de sucesso para empresas que buscam se expandir para o mercado internacional e chamam a atenção para a necessidade de se possuir vantagens competitivas sustentáveis para conseguir sobreviver em um cenário competitivo global.

É válido ressaltar que ainda há poucos estudos sobre o processo de internacionalização de empresas brasileiras e muito a se explorar sobre o tema, principalmente se forem consideradas as empresas que realizaram investimentos diretos no exterior.

3

Desta forma, pode-se afirmar que o estudo de caso da TV Globo não só se reveste de importância acadêmica para esta linha de pesquisa no Brasil, como também pode auxiliar empresas que buscam a internacionalização a identificar fatores de sucesso e a minimizar as chances de fracasso em suas investidas.

1.3. Delimitação do Estudo

Inicialmente, este trabalho pretendia focar no período compreendido entre 1985 a 2005, com o intuito de dar prosseguimento ao estudo contido em uma dissertação de mestrado defendida em 1987, no Instituto Coppead (Graell, 1987) em que foi investigado, pelo método do estudo de caso, o processo de internacionalização da Globo desde a sua fundação, em 1965, até

1985. Naquela dissertação destacou-se, dentre as suas conclusões, o fato de que a exportação tornou-se um imperativo na estratégia da empresa, estivessem os dirigentes da empresa conscientes deste fato ou não.

A análise do caso realizada por Graell (1987) constatou que, na década de 1970, a Rede

Globo consolidara uma posição de indiscutível liderança e havia praticamente concluído a conquista do mercado brasileiro. No cenário internacional, a emissora era classificada entre as cinco maiores redes privadas do mundo (atrás da ABC, NBC, CBS e NHK) e começava a exportar telenovelas para outros mercados. Com o sucesso dessas vendas, a Globo expandiu gradativamente as suas exportações, e um departmento para atender este mercado internacional foi criado e posteriormente ampliado. Em 1985, a empresa exportava para cerca de 140 países, incluindo a China, e obteve um faturamento total no exterior estimado em 15 milhões de dólares. Naquele mesmo ano, a Globo adquiriu 90% das ações da Telemontecarlo,

4

uma emissora de TV sediada em Montecarlo, com o intuito de passar a atuar como emissora de TV na Itália.

Segundo Graell (1987), este estudo poderia ser apontado como um clássico exemplo de como uma empresa, tendo obtido domínio de um vasto mercado interno, dá continuidade ao seu crescimento ingressando no mercado internacional através das exportações e, posteriormente, através de investimentos diretos.

Além disso, segundo Graell (1987), o caso TV Globo seria consistente com teorias ou modelos existentes na literatura, dentre eles cabe destacar os modelos relacionados a um envolvimento sequencial com as exportações1.

A presente dissertação pretendia, então, partir do ponto em que o estudo anterior havia se encerrado e focar a atenção no período de 1985 a 2005, tentando desenvolver um estudo complementar, vendo os desdobramentos dos passos dados pela emissora nos últimos 20 anos.

No decorrer do processo de pesquisa, porém, uma série de contratempos e descobertas modificaram o rumo deste trabalho. Algumas divergências na descrição de fatos ocorridos antes de 1985 fizeram com que fosse necessário revisitar o período analisado no estudo de

Graell. Por outro lado, a mudança do quadro de funcionários e a falta de dados confiáveis da

área de atuação internacional da Globo para períodos anteriores a 2000 dificultaram muito a descrição dos passos dados pela empresa entre 1985 e 1999. Além disso, os resultados alcançados pela Telemontecarlo somados à redefinição estratégica traçada pela empresa

1 Para maiores informações do estudo realizado por Graell, ver capítulo 2

5

durante a década de noventa modificaram o modo de atuação da empresa em mercados internacionais, fazendo com que a Globo se posicionasse no exterior como uma empresa produtora de conteúdo para televisão, ao invés de uma emissora de TV.

Sendo assim, uma vez que o estudo de caso da Rede Globo se mostrou rico e capaz de agregar informações relevantes para o entendimento de vários aspectos relacionados ao processo de internacionalização de firmas brasileiras, o escopo deste estudo foi modificado.

Os primeiros passos dados pela Globo foram, então, revisitados, e foi dada maior atenção ao período após a reestruturação da área internacional, ocorrida em 2000. Acredita-se que esta flexibilização dos limites deste trabalho foi importante para tornar a análise mais profunda, permitindo obter insights interessantes sobre o quanto o processo de internacionalização da

TV Globo foi influenciado pela mudança estratégica da companhia, em que se redefiniu o seu core business como “produção de conteúdo”.

Além disso, por ser uma pesquisa de caráter exploratório, o trabalho tem o intuito de levantar insights e questões relacionadas ao processo de internacionalização de empresas para que trabalhos futuros possam se debruçar sobre estes aspectos de forma mais minuciosa.

1.4. Organização do Estudo

Este estudo está dividido em cinco capítulos, como descrito a seguir:

O primeiro capítulo apresenta a introdução ao estudo, descrevendo os objetivos, as questões abordadas, a relevância acadêmica deste trabalho, a delimitação do estudo e a forma como se encontra organizado.

6

No segundo capítulo, é feita a revisão de literatura, sendo definido o conceito de

“internacionalização de empresas” e são apresentadas teorias propostas por duas diferentes correntes que estudam aspectos relacionados a este fenômeno: as teorias baseadas em aspectos econômicos e as baseadas em aspectos comportamentais.

Da primeira corrente de estudo são apresentadas as duas principais teorias provenientes da abordagem dos custos de transação: a teoria da internalização e o Paradigma Eclético da

Produção Internacional.

Da segunda corrente são destacados os trabalhos realizados por pesquisadores da

Universidade de Uppsala, que desenvolveram teorias a partir da análise do processo de internacionalização de empresas suecas. Essa linha de pensamento levou os estudos de

Negócios Internacionais a cruzar os limites da Teoria Econômica para abranger também a

Teoria do Comportamento Organizacional, e tem trazido importante contribuição para temas como a participação do empresário no processo de internacionalização da firma.

São apresentados, ainda, alguns estudos que aplicam os modelos propostos por estas correntes no contexto brasileiro e que foram importantes fontes de inspiração e informação para a confecção do presente trabalho.

O terceiro capítulo descreve a escolha do caso, os métodos de coleta e análise dos dados, as vantagens e desvantagens do método escolhido (o estudo de caso) e as dificuldades enfrentadas ao longo da coleta de dados secundários e das entrevistas com funcionários da empresa.

7

O quarto capítulo detalha o estudo de caso da TV Globo. Em sua primeira parte, apresenta os dados da empresa, a relevância da TV dentro das Organizações Globo, o histórico de sua formação, seu crescimento no mercado nacional, o papel das telenovelas neste processo. Na segunda parte, é descrita a internacionalização da Rede Globo, começando pelas exportações de novelas na década de 1970, passando pela aquisição de participação acionária nas emissoras internacionais Telemontecarlo e SIC e pelo período de mudanças estruturais das

Organizações Globo, onde a empresa passou a focar na produção de conteúdo ao invés da preocupação em possuir a rede de distribuição deste material. A terceira parte do capítulo aborda a reestruturação da área internacional, a criação da Diretoria de Negócios

Internacionais, as atribuições desta nova área e os próximos passos planejados para a ampliação da atuação internacional.

No quinto capítulo é feita a análise do caso, buscando responder as perguntas propostas na pesquisa e correlacionando os dados coletados com as teorias apresentadas no segundo capítulo. Por fim, são feitas algumas recomendações para futuras pesquisas a respeito do processo de internacionalização de empresas brasileiras.

8

2. REVISÃO DE LITERATURA

Na literatura, diferentes abordagens têm sido utilizadas no estudo sobre o processo de internacionalização de empresas. Dentro do âmbito da administração, existem duas grandes correntes de pensamento, as quais divergem, principalmente, quanto aos fundamentos que explicam o fenômeno de internacionalização.

De um lado, há uma abordagem econômica, que acredita que os processos decisórios de internacionalização são predominantemente racionais e objetivos. Desta abordagem, surgiram teorias que buscavam entender as decisões de abertura de subsidiarias no exterior por empresas multinacionais e dentre elas destacam-se: a teoria da internalização (Buckley e

Casson, 1979, 1998; Rugman, 1981; Kogut, 1983) e o Paradigma Eclético da Produção

Internacional (Dunning, 1980, 1988, 1997).

Do outro lado, há a abordagem comportamental, que afirma que este processo se baseia em razões subjetivas e de natureza “não racional”. Sendo assim, acredita que as percepções, atitudes e expectativas dos executivos influenciam fortemente as decisões de entrada em mercados externos. Esta linha de estudos ganhou força através dos estudos desenvolvidos a partir da segunda metade dos anos 70 pela Escola de Uppsala, na Suécia, sobre o processo de internacionalização das firmas (Carlson, 1975; Johanson e Wiedersheim-Paul, 1975;

Johanson e Vahlne, 1977, 1990; Wiedersheim-Paul, Olson, Welch, 1978). Posteriormente, os conceitos desenvolvidos pelos teóricos de Uppsala foram testados e ampliados por outros autores (Bilkey, 1978; Cavusgil, 1980; Welch e Luostarinen, 1988), e o conceito das networks foi incorporado a esta teoria (Johanson e Vahlne, 1990; Chetty e Holm, 2000).

9

É válido ressaltar que as teorias do comércio internacional, provenientes do campo da economia, e o conceito das empresas nascidas globais (Knight e Cavusgil, 1995; Madsen e

Servais, 1996) não fazem parte do escopo deste trabalho.

Este capítulo procurou se estruturar de acordo com os temas das perguntas propostas nesta pesquisa, que gravitam ao redor dos seguintes temas:

(2.1) Início do processo de internacionalização da firma

(2.2) O processo de internacionalização de uma empresa

(2.3) Evolução de comprometimento com mercados externos

(2.4) Importância das networks

(2.5) Seqüência de escolha de ampliação do raio de atuação internacional.

Sendo assim, foram sumarizadas as contribuições a respeito desses temas presentes na literatura e consideradas relevantes para a análise do caso .

2.1 - Início do processo de internacionalização da firma

2.1.1 - O conceito de “internacionalização de empresas”

Segundo Morgan e Katsikeas (1997), apesar do termo “internacionalização” ser amplamente utilizado, poucas foram as tentativas no sentido de elaborar uma “definição operacional” do seu significado.

De acordo com Piercy (1981, apud Morgan e Katsikeas, 1997) e Turnbull (1985, apud

Morgan e Katsikeas, 1997) a internacionalização é o movimento de expansão das atividades operacionais da firma para fora do país. Welch e Luostarinen (1988, p.37) argumentam, porém, que seria “o processo de envolvimento crescente em operações internacionais”,

10

levando em consideração tanto a internacionalização “para dentro” (inward) quanto “para fora” (outward). A internacionalização para dentro se daria quando a empresa tivesse contato com empresas estrangeiras através de, por exemplo, importações, obtenção de licenças de fabricação ou compra de tecnologia. A internacionalização para fora, por outro lado, ocorreria quando a empresa expandisse o seu raio de atuação para além das fronteiras de seu país, seja por meio de exportações, concessão de licenças, franquias ou investimento direto no exterior.

(Barretto e Rocha, 2003)

A partir do desenvolvimento do conceito de networks (que será discutido neste capítulo), o processo de internacionalização tem sido visto, cada vez mais, no contexto de redes de relacionamento e não isoladamente. Jarillo e Martinez (1991) argumentaram que, ao desprezarmos uma atividade não “internalizada” por uma empresa multinacional (EMN), não se conseguiria capturar a real estratégia competitiva desta empresa. Portanto, muitas firmas que externalizam (algumas) atividades internacionais são, no entanto, empresas internacionais em intenção e escopo e, como tal, deveriam ser consideradas. Hemais e Hilal

(2002) complementaram esta visão, afirmando que “o grau de internacionalização de uma firma reflete não somente os recursos alocados no exterior, como também o grau de internacionalização da network que ela está inserida”. (Hemais e Hilal, 2002, p.31)

Sendo assim, para se entender o processo de internacionalização de empresas seria necessário não somente analisar as atividades realizadas por uma empresa, mas entender, ainda, as relações que esta mantém com outras empresas em um âmbito mundial.

11

2.1.2 - Motivações para a internacionalização

Após definir o conceito de internacionalização de empresas, faz-se necessário investigar, na literatura, as motivações para a internacionalização de uma firma e as visões distintas sobre os principais fatores que desencadeiam esse processo.

Um fator seria o imperativo do crescimento proposto por Edith Penrose, em que a autora estabelece que uma firma estaria sempre buscando o seu crescimento. Sendo assim, quando o mercado doméstico estivesse saturado e, conseqüentemente, o número de oportunidades lucrativas diminuísse até o ponto de impedir a ampliação da firma, dever-se-ia buscar novos locais para se expandir. Caso a expansão vertical fosse descartada devido aos seus riscos ou

às baixas previsões de lucratividade, o caminho a seguir seria o da expansão geográfica. Em outras palavras, a internacionalização da firma seria apenas uma das formas da empresa viabilizar o seu crescimento. (Penrose, 1966; Hemais e Hilal, 2002) Este conceito do imperativo do crescimento acabou influenciando tanto as teorias econômicas quanto as comportamentais.

Um ponto de vista distinto é apresentado por Hymer (1960/76), ao afirmar que os motivos pelos quais empresas investiriam em produção internacional estariam baseados em três objetivos: (1) neutralizar as ações da concorrência; (2) desfrutar de vantagens competitivas diferenciais e; (3) explorar imperfeições de mercado.

De acordo com as correntes econômicas, a principal motivação para uma empresa se internacionalizar seriam as falhas de mercado e a possibilidade de a empresa conseguir explorar estas imperfeições a seu favor.

12

Em artigo sobre a Teoria da Internalização, Buckley e Casson (1979) propuseram que a internacionalização seria uma das formas que uma firma disporia para minimizar os custos gerais de produção e que as empresas buscariam uma localização otimizada de suas subsidiarias para se aproveitar de imperfeições de mercado e definiram este efeito como

“Efeito Localização”.

Kogut (1983), por sua vez, argumentou que os benefícios inerentes a empresas multinacionais

(EMNs) levariam as empresas a investirem no exterior e que a principal vantagem estaria na flexibilidade de transferir recursos entre países através de uma rede global que maximizaria benefícios. O autor estabeleceu que empresas multinacionais desfrutariam dos seguintes benefícios:

(1) a possibilidade de arbitrar restrições institucionais: o fato de ser uma empresa multinacional aumentaria as oportunidades de investimento da firma, viabilizando o acesso a mercados financeiros internacionais mais diversificados, investimentos em projetos não disponíveis para firmas locais e um menor risco de capital. Outra vantagem das multinacionais seria a flexibilidade para alterar a estrutura e o nível de suas obrigações (como a escolha de onde declarar lucros e a transferência de produtos de um país onde a moeda está valorizada para outro).

(2) as possíveis economias de custo e vantagens de agir antes de seus concorrentes (ser o first mover), ambas advindas da curva de aprendizado em atividades internacionais; e

(3) as economias decorrentes dos ganhos de escala, tanto em marketing quanto em sua produção.

13

Dunning (1988) também propôs que as imperfeições de mercado seriam os grandes motivadores da expansão internacional e destacou como os principais fatores influenciadores deste processo:

(a) busca de novos mercados consumidores;

(b) busca de recursos e fontes de suprimentos para sua produção;

(c) busca da eficiência, através da racionalização dos investimentos.

Uma segunda corrente de estudos, porém, que se baseia em teorias de fundo comportamental, propõe uma outra abordagem para compreender este fenômeno.

De acordo com estudo realizado por Aharoni, em 1966, em que o autor estudou os investimentos que empresas norte-americanas faziam no exterior, constatou-se que, empíricamente, esses investimentos raramente se baseavam em processos decisórios sofisticados e bem estruturados. Na verdade, muito pelo contrário, o comportamento oportunista, a coincidência e a existência de um momento propício, geralmente, eram os responsáveis por desencadear o processo de internacionalização. (Hemais e Hilal, 2002)

Este estudo acabou por influenciar o desenvolvimento do Modelo de Uppsala, que propôs que a internacionalização não seria “o resultado de uma estratégia para alocação ótima de recursos entre diferentes países”, mas, ao contrário, “conseqüência de um processo incremental de ajustes a fatores da firma e de seu ambiente em mudança”. (Johanson e

Vahlne, 1977, p.26) Os processos tenderiam a ser menos planejados e fruto de estratégias emergentes que tomariam os resultados das operações no exterior como input para as novas decisões gerenciais.

14

Em outras palavras, o processo de internacionalização não era visto como uma seqüência de passos planejados e deliberados, baseados em uma análise racional, como proposto pelas teorias econômicas, mas um processo gradual, visando se beneficiar da aprendizagem sucessiva através de etapas de comprometimento crescente com os mercados estrangeiros.

(Hemais e Hilal, 2002)

Desta forma, seria comum que os primeiros passos do processo de internacionalização fossem influenciados tanto por variáveis externas, como pedidos inesperado de produtos vindo do exterior, ou um momento de mercado favorável à exportação, quanto por variáveis internas da companhia, como o perfil do tomador de decisão ou as características da sua rede de contatos pessoais.

De acordo com Jarillo e Martinez (1991), além do imperativo do crescimento proposto por

Penrose, outros fatores poderiam ser citados como motivadores do início do processo de internacionalização: utilizar capacidade ociosa, obter prestígio no mercado doméstico, ganhar competitividade, diversificar risco, ou compensar uma crise no mercado doméstico.

É interessante somar a toda esta discussão, sobre as motivações para a expansão internacional, o estudo desenvolvido por Barretto (1998), que traz esta análise para dentro do contexto empresarial brasileiro.

Neste trabalho, Barretto desenvolveu um estudo de caso sobre dez empresas brasileiras em que, dentre uma série de outras análises, procurou identificar as motivações para a internacionalização destas firmas. Dentre estes motivos listou: a ocorrência de pedidos do

15

exterior, proximidade geográfica, canalização de excedentes de produção, saturação do mercado doméstico e expansão do negócio. O autor concluiu que seria possível agrupa-las conforme cinco "padrões dominantes de motivação":

1) Internacionalização para crescimento – este padrão se relaciona a empresas que

possuem participação predominante no mercado doméstico e cujo custo para

aumentar esta participação torna a expansão para o exterior uma opção mais atrativa.

2) Internacionalização para consolidação - geralmente associada a empresas que

buscam ampliar sua presença no mercado externo para consolidar sua participação,

imagem ou oferecer melhor estrutura de atendimento aos clientes.

3) Internacionalização para sobrevivência – se dá quando, em função da estrutura da

indústria, a internacionalização é a única opção para continuar fornecendo produtos

para sua network.

4) Internacionalização por oportunidade – ocorre quando cada oportunidade de

expansão internacional é avaliada pela empresa, segundo algum critério estabelecido

internamente, de modo a maximizar os benefícios dessas oportunidades.

5) Internacionalização por visão estratégica - se dá quando a empresa tem uma atitude

mais pró-ativa e avalia a entrada no mercado internacional de acordo com uma

estratégia formulada pela alta gerência, preocupando-se com fatores como

vulnerabilidade da empresa, interferência governamental e intenção estratégica.

De acordo com este estudo de Barretto, de um modo geral, os resultados apoiariam a proposição da internacionalização como um processo gradual e progressivo, conforme proposto pelos teóricos de Uppsala. Por outro lado, a escolha de mercados com base em vantagens de propriedade, internalização e de localização do Paradigma Eclético não teria sido comprovada.

16

2.2 – O processo de internacionalização de uma empresa

2.2.1 – A abordagem econômica

Uma das principais correntes de estudo na área de internacionalização, a corrente econômica, se baseia na Teoria de Custos de Transação, proposta inicialmente por Ronald Coase em

1937, em seu estudo The Nature of the Firm, e posteriormente desenvolvida por Williamson em 1975. (Hemais e Hilal, 2002)

- A Teoria de Custos de Transação: fonte de inspiração

De acordo com a Teoria dos Custos de Transação as empresas organizariam as suas atividades através da contratação externa de algumas atividades (Mercados) e a utilização de sua própria estrutura para conduzir outras (Hierarquias). A lógica desta teoria estaria ancorada na questão da eficiência: a firma deveria realizar as atividades que ela pudesse executar a custos mais baixos e confiar ao mercado as atividades que outros fornecedores pudessem realizar de forma mais competitiva. Sendo assim, o fator que determinaria quando a empresa escolheria Mercados ou Hierarquias seria o custo total de cada uma das opções.

Era importante notar, porém, que sempre que a firma sub-contratasse parte da sua operação a outras firmas incorreria em custos, tais como:

(1) monitoramento, controle e inspeção do desempenho e qualidade dos produtos;

(2) estabelecimento de redes de fornecedores, gerenciamento de relações industriais e gastos relativos aos tramites legais e contratuais; e

(3) gerenciamento, aquisição e uso da informação obtida no desempenho da atividade.

Desta forma, a teoria propôs que estes “Custos de Transação” seriam determinantes na tomada de decisão.

17

Segundo Coase, a firma tenderia a se expandir até o limite em que o custo de estruturar mais uma transação internamente fosse igual ao custo de realizar a mesma transação no mercado ou organiza-la em uma outra firma (Coase, 1937, apud Almeida, 2005)

É interessante ressaltar que, apesar desta corrente acreditar na natureza racional do processo decisório, seus teóricos reconheciam que variáveis do comportamento humano como a racionalidade limitada e o oportunismo influenciariam este processo.

O conceito de racionalidade limitada estaria relacionado às limitações cognitivas na capacidade de comunicação e processamento de informações dos decisores, mesmo quando esses pretendessem agir de forma puramente racional. Desta forma, nem todas as alternativas possíveis seriam efetivamente consideradas no processo decisório, mas apenas um determinado subconjunto. (Barretto e Rocha, 2003)

Por outro lado o oportunismo estaria ligado à tentativa de uma das partes servir a seus próprios interesses, estando disposto a utilizar recursos como omissão ou distorção de informações para atingir este objetivo. O receio de que uma das partes pudesse ter este padrão de comportamento poderia levar uma empresa a utilizar a organização interna (Hierarquia), ao invés de um agente externo (Mercado), como forma de reduzir seu risco em uma transação.

Estas idéias tiveram forte impacto na aplicação da teoria de custo de transação ao processo de internacionalização das empresas, e acabaram por influenciar as duas linhas teóricas principais dentro da abordagem econômica: a teoria da internalização e o paradigma eclético

18

da produção internacional, ambas desenvolvidas ao final da década de 70 na Universidade de

Reading. (Weisfelder, 2001)

- A Teoria da Internalização

A teoria da internalização foi originalmente apresentada por Peter Buckley e Mark Casson em 1974 na Universidade de Reading e publicada em 1976, na obra The Future of the

Multinational Enterprise, sendo estendida e testada por Rugman no contexto das multinacionais nas décadas de 80 e 90. Esta teoria é considerada por alguns como sendo a teoria de custos de transação aplicada aos negócios internacionais e busca analisar as características de uma transação de forma a definir qual o “modo de entrada” que minimiza os custos de transação para uma empresa. (Weisfelder, 2001)

De acordo com esta teoria, as falhas de mercado, tais como custos de informação, oportunismo e especificidade de ativos seriam condições que afetariam as decisões de investimento da firma e, principalmente, o modo de entrada da firma no novo mercado.

Buckley e Casson propuseram que, para entender como os mercados nacionais são divididos entre as empresas locais e as multinacionais, seria necessário considerar o que chamaram de efeitos de localização e propriedade2.

2 Segundo os autores, seria possível entender e indicar a divisão de mercados entre: (1) produtores domésticos, (2) subsidiarias locais de uma EMN, (3) exportação vinda de fabricas estrangeiras e (4) exportação de EMN nacional com produção no exterior a partir de informações sobre fatores específicos da industria (natureza do produto, estrutura do mercado externo, relação entre escalas ótimas das atividades ligadas pelo mercado); fatores específicos da região (custos dos fatores em regiões diferentes, disponibilidade de material intermediário e matéria prima, distancia geográfica e social entre as regiões envolvidas); fatores específicos da nação (estruturas fiscal e política de cada nação envolvida); e fatores específicos da firma (em particular a habilidade de gerentes de comunicar através de fronteiras nacionais e de lidar com as complexidades de uma propriedade internacional).

19

Efeito Localização - Segundo a teoria de localização, as firmas avaliariam os custos envolvidos em cada estágio de produção e escolheriam a série de localizações em que o custo médio total de produção fosse minimizado. Dentro desta análise, seria necessário considerar fatores complicadores como: (1) a existência de economias de escala em mais de uma atividade, (2) a integração de atividades, tais como produção, marketing e pesquisa e desenvolvimento, (3) a existência de mercados imperfeitos e (4) as intervenções governamentais.

Efeito Propriedade - Em relação ao efeito de propriedade, os autores argumentaram que as empresas fariam uma análise comparativa entre benefícios da internalização de uma atividade e seus custos, de modo que sempre que os benefícios fossem maiores, haveria a intemalização de fronteiras nacionais e criação de EMNs. Dentre os benefícios da internalização podem-se citar a diminuição do tempo de produção, a possibilidade de diferenciação de preços, a diminuição de situações de incerteza, o acesso a fontes externas de matérias-primas vitais ou a um fluxo ótimo de informação técnica e conhecimento de marketing.

De uma forma geral, o efeito de localização explicaria onde seriam realizadas as operações de produção, enquanto que o efeito de propriedade indicaria quem seria detentor da propriedade

/ controle dessas atividades.

Partindo desta linha, Rugman (1981) propõe a seguinte seqüência de modos de entrada em mercados estrangeiros:

- exportação

- investimento direto no exterior

- licenciamento

20

De acordo com esse autor, a exportação seria vista simplesmente como ponto de partida para o investimento direto no exterior. Já o investimento direto seria o modo de entrada escolhido sempre que a empresa dispusesse de vantagens diferenciais em relação a outras firmas e desejasse proteger tais vantagens utilizando-se de sua própria estrutura (Hierarquia). Por

último, o licenciamento seria utilizado em situações de “entrada tardia” em um mercado, em estágios avançados do ciclo de vida do produto e quando a proteção das vantagens competitivas da empresa deixasse de ser relevante. Este ponto de vista se baseava na crença de que o licenciamento seria potencialmente perigoso, uma vez que colocaria em risco o know-how de marketing ou de tecnologia da empresa e, portanto, deveria ser evitado.

Sendo assim, as firmas tenderiam a optar, primeiramente, por exportações, em um segundo momento fariam investimentos diretos no mercado estrangeiro e só depois que o produto estivesse em um estagio avançado de seu ciclo de vida, utilizar-se-ia o licenciamento.

- O Paradigma Eclético da Produção Internacional

A partir de princípios da economia industrial, da teoria dos custos de transação e de internalização, John Dunning formulou uma teoria para explicar a extensão, forma e padrão da produção internacional, identificando e avaliando os fatores que influenciariam a decisão de produção no exterior por empresas, e o crescimento desta produção. Esta proposta de interpretação da internacionalização da empresa, apresentada originalmente em seus trabalhos de meados da década de 70, ficou conhecida como o “Paradigma Eclético da Produção

Internacional”.

21

Segundo Weisfelder (2001), Dunning recolheu “de Coase e Williamson os princípios da teoria de custos de transação; de McManus, a análise de custos relativos e benefícios dos mecanismos internos; de Buckley e Casson, os conceitos de internalização de mercados; de

Hirsch, os fundamentos da relação entre modos de entrada e custos relativos; e de Magee, a discussão relativa à capacidade de a empresa multinacional obter o retorno esperado representado pelo valor de sua tecnologia e know-how para a sociedade.” (Weisfelder, 2001, p.22-24)

Segundo a visão de Dunning, a razão de ser da produção internacional seriam as imperfeições dos mercados internacionais, que fariam com que o comércio e a produção fossem influenciados pela disponibilidade de fatores internacionalmente e pelos custos de transações internacionais.

De acordo com a teoria eclética, a firma nacional atenderia, em um primeiro momento, o seu mercado doméstico. Posteriormente, essa firma teria diversas opções de crescimento horizontal e vertical, podendo adquirir outras firmas nacionais, ou expandir-se para explorar mercados estrangeiros. Caso optasse pela expansão internacional, transformar-se-ia em uma empresa internacional. Segundo o autor, os três principais motivos para esta produção internacional seriam: (Dunning, 1988, p.13)

(a) busca de novos mercados consumidores;

(b) busca de recursos e fontes de suprimentos para sua produção;

(c) busca da eficiência, através da racionalização dos investimentos.

Segundo Dunning, para as firmas poderem competir fora de seus países seria necessário ter algum tipo de vantagem em relação aos produtores locais, suficiente para compensar o custo

22

de montar e manter uma operação estrangeira. Sendo assim, do ponto de vista das empresas, a extensão, a forma e o padrão da produção internacional seriam determinados pela configuração de três tipos de vantagens (PIL)3:

Vantagens de Propriedade (P) – reuniria as vantagens específicas da propriedade, que poderiam ser de natureza estrutural (Ativos) ou transacional (Transação) e determinariam o mercado específico onde empresas estariam propensas a operar.

Ativos (Oa - ownership asset advantages) - seriam vantagens decorrentes de ativos

específicos que outras empresas não deteriam: uma distorção estrutural como é o caso

de monopólios, patentes, ou uma intervenção governamental.

Transação (Ta - transaction advantages) - caso a vantagem derivasse da capacidade

de a hierarquia de uma empresa multinacional tirar proveito das imperfeições de

mercados, pela administração de um conjunto de ativos localizados em diferentes

países.

Vantagens de Internalização (I) – definem se a empresa estaria disposta a internalizar atividades internacionais ao invés de confiá-las ao mercado. O motivo para a internalização residiria, basicamente, nas imperfeições de mercados associadas: (i) à percepção de risco e incerteza; (ii) a obtenção de economias de escala; (iii) ao fato de uma transação de bens ou serviços poder produzir custos e benefícios externos àquela transação, que não se refletiram nos termos negociados pelas partes envolvidas.4

3 No original, o autor refere-se aos parâmetros OLI, pelas iniciais de ownership, location e internalization 4 Alguns exemplos destas vantagens seriam o desejo de integrar diferentes estágios da cadeia de valor ou diversificar a linha de produto e a captura de economias de escala em produtos complementares.

23

Apesar das imperfeições do mercado explicarem grande parte destas vantagens, o autor sinaliza que a necessidade de garantir o fornecimento de inputs essenciais e a de garantir a qualidade dos produtos poderiam ser um outro motivo para a internalização.

O autor salientou ainda a necessidade de distinguir entre a capacidade de as EMNs internalizarem mercados e seu desejo de fazê-lo. A capacidade de internalizar mercados explicaria porque as vantagens seriam exploradas por um grupo de EMNs e não por outro, ou por uma EMN e não por uma empresa local; enquanto que a vontade de explorá-las explicaria porque Hierarquias, ao invés de Mercados externos, seriam usadas para transferir as vantagens transacionais de propriedade além das fronteiras.

Vantagens de Localização (L) – poderiam determinar porque a firma decidiria explorar diretamente um mercado estrangeiro ao invés de vender ou alugar suas vantagens a uma firma já localizada no mercado estrangeiro, através de um licenciamento ou outros tipos de arranjos contratuais. Além disso, as vantagens de localização, como custos de transporte, custos de produção, barreiras tarifárias e incentivos de investimento, definiriam onde se daria a produção.

Sendo assim, o paradigma eclético deriva da combinação desses três parâmetros:

(P) as vantagens específicas da propriedade das firmas relativas à produção no exterior; (I) a propensão a internalizar mercados e

(L) a atratividade da localização da produção no exterior.

Estes elementos seriam fundamentais em cada decisão de produção de uma EMN atuando nos mercados internacionais através de produção no exterior.

24

Em trabalhos posteriores, Dunning identificou que raramente as empresas ofereciam produtos idênticos nos mesmos mercados, ou possuiriam as mesmas capacitações. Desta forma, as empresas se defrontariam com diferentes conjuntos de opções estratégicas que deveriam ser avaliadas, também, sob critérios diferentes. A partir disso, propõe que as configurações de propriedade, internalização e localização (PIL) das EMNs seriam afetadas por variáveis estruturais e conjunturais, e conclui que as características específicas da firma poderiam ser

“um determinante crucial da resposta das empresas multinacionais a uma dada configuração

PIL” (Dunning, 1988, p.6)

O autor considerou ainda a possibilidade de integração das teorias econômica e comportamental da firma para um melhor entendimento da firma multinacional. No entanto, julgou ser necessário tomar cuidado ao se adicionar mais variáveis explicativas ao modelo para que este não perdesse o seu caráter generalista. Desta forma, apesar de considerar que a influência dos tomadores de decisão e de características específicas da firma afetariam a resposta de EMNs a configurações de OLI, o autor indicou que nenhuma variável comportamental teria sido identificada como capaz de afetar o grau e padrão da produção internacional e, portanto, seria errado incorporá-las à teoria. Por último, o autor afirmou que, uma vez identificadas variáveis comportamentais influenciando a resposta de grupos de empresas a uma configuração PIL, esta variável deveria ser incorporada ao Paradigma

Eclético.

2.2.2 – A abordagem comportamental

Segundo Weisfelder (2001), enquanto os modelos econômicos, em particular o paradigma eclético de Dunning, procuram definir os motivos que levam as empresas a investir no

25

exterior, o modelo de Uppsala pretende entender o processo de internacionalização da firma e as forças que atuam no decorrer deste processo. Desta forma, o entendimento deste arcabouço teórico torna-se indispensável para a realização do presente trabalho.

As fontes de inspiração

Segundo Hemais e Hilal (2002), foi a partir dos trabalhos pioneiros de Penrose, Cyert e

March e Aharoni que a teoria da firma deixou de ser examinada puramente do ponto de vista econômico para se tornar um campo independente de pesquisa. A seguir são destacadas as contribuições, destes autores, que influenciaram a Escola de Uppsala:

- Penrose

De acordo com Penrose, o conhecimento coletivo de uma firma seria responsável por limitar a sua taxa de crescimento. Em outras palavras, o crescimento da firma estaria intimamente ligado a sua aquisição de conhecimento, que seria um processo evolutivo, baseado na acumulação da experiência coletiva da firma. A partir desta afirmação a autora se afastou do pressuposto clássico de que o limite do crescimento da firma seria determinado pela demanda existente no mercado.5 (Penrose, 1966; Hemais e Hilal, 2002)

Além disso, a autora sugeriu que existiriam dois tipos de conhecimento, que se diferenciariam pela forma como são adquiridos: o conhecimento teórico, que pode ser ensinado, transferido e registrado; e o conhecimento tácito, que só pode ser adquirido através da experiência dos recursos humanos da empresa com o mercado. (Penrose, 1966)

5 Desse posicionamento, derivou a sua teoria de diversificação da firma, que pregava que mudanças deveriam ocorrer quando os mercados existentes se tornassem menos lucrativos ou surgissem novos e atraentes mercados a serem servidos e que a firma buscaria sempre o seu crescimento.

26

Segundo Penrose (1966) a experiência em si nunca pode ser transmitida, pois ela produz uma mudança – freqüentemente uma mudança súbita – nos indivíduos e não pode ser separada deles. E complementa dizendo que, como grande parte da experiência de um homem de negócios estaria fortemente associada a circunstâncias específicas, “grande parte dos serviços mais valiosos que este homem de negócios pode prestar só será ofertada sob estas circunstâncias”. (Penrose, 1966, p.53)

Essa discussão de Penrose serviu como base para a hipótese defendida pela Escola de

Uppsala de que o conhecimento dos negócios internacionais somente pode ser adquirido através da experiência direta.

- Cyert e March

Cyert e March se baseiam no conceito de aprendizagem organizacional, considerando que a informação não é dada à firma e, pelo contrário, deve ser adquirida. Neste estudo, os autores propõem que a firma seria um grupo de coalizões de interesses múltiplos e conflitantes, que utilizava regras e procedimentos em condições de racionalidade limitada. Adicionalmente, sugeriram que as firmas deveriam ser vistas menos como hierarquias e mais como rede de relacionamentos, nas quais a habilidade de aprender experiencialmente seria uma das suas ferramentas mais relevantes. (Hemais e Hilal, 2002)

- Aharoni

O trabalho de Aharoni colocou a teoria de Cyert e March no plano da internacionalização da firma e mostrou que o processo decisório de investimento no exterior ocorria através de decisões isoladas que se baseavam no fato de dada alternativa ser considerada satisfatória ou

27

não. Além disso, a pesquisa de Aharoni evidenciou que fatores externos à própria decisão de investimento podiam impactar fortemente sobre a mesma. (Hemais e Hilal, 2002)

Em linhas gerais, esses conceitos acabaram por influenciar a Escola de Uppsala da seguinte forma (Hemais e Hilal, 2002):

(1) as firmas seriam percebidas como unidades heterogêneas, onde cada uma de suas subsidiárias possuiria interesses próprios;

(2) os gerentes seriam vistos mais como elementos que evitavam riscos do que como tomadores voluntários de riscos e;

(3) a internacionalização seria um processo gradual

A Escola de Uppsala

A Escola de Uppsala foi a grande responsável pelo desenvolvimento de teorias que buscassem compreender o processo de internacionalização de uma firma. Preocupada em descrever este fenômeno e as forças que influenciam este processo, desenvolveu o modelo da

Cadeia de Estabelecimento, o conceito da Distância Psíquica, o Modelo de

Internacionalização (que ficou conhecido como o Modelo de Uppsala) e incorporou, posteriormente, o conceito de Networks.

Um Processo Gradual

De acordo com Carlson (1974), o processo de internacionalização se assemelharia a andar cautelosamente em terreno desconhecido. O ato de realizar operações no exterior implicaria em atravessar o limite das fronteiras nacionais, o que geraria incertezas adicionais à empresa.

Dentre estas incertezas, podem-se citar: a falta de conhecimento sobre as condições de negócios locais, clientes, burocracia, risco cambial, barreiras tarifárias e dificuldades para

28

obtenção de informação. Os pesquisadores de Uppsala pressupunham que esta incerteza estava relacionada com a distância psicológica, ou psíquica. (Carlson, 1974; Hemais e Hilal,

2002)

O Conceito da Distância Psíquica

A Escola de Uppsala é geralmente reconhecida como a proponente do conceito de distância psíquica, que é definido como:

“... a soma de fatores que dificultam o fluxo de informação de e para o mercado. Pode-se citar como

exemplos as diferenças de idioma, educação, práticas de negócios, cultura e desenvolvimento

industrial” (Johanson e Vahlne, 1977, pág. 33)

“...[os] fatores que impedem ou atrapalham as empresas em seu processo de aprendizagem e

compreensão sobre um ambiente externo” (Nordstrom e Vahlne, 1992, p.3)

Em 1973, Hörnell, Vahlne e Wiedersheim-Paul (1973) constataram que as firmas pareciam ter grande propensão a fazer investimentos iniciais em países com baixa distância psíquica da Suécia (como, por exemplo, Dinamarca, Noruega, Finlândia e Alemanha Ocidental) e, somente de forma gradual, tendiam a penetrar em mercados mais distantes.

Desta forma, o nível de semelhança entre o exportador e o importador influiria na internacionalização da firma: quanto maior a diferença, pior seria o fluxo e a análise das informações.

“As firmas começam sua internacionalização pelos mercados que melhor consegue compreender.

Nele vislumbrará oportunidades e nele os riscos de mercado percebidos são menores.” (Johanson e

Vahlne, 1990, pg.13)

Segundo Hallén e Wiedersheim-Paul a distância psíquica (ou psicológica) seria “uma

29

medida da dificuldade que o vendedor tem em perceber ou estimar as necessidades do comprador, ou a dificuldade correspondente que o comprador experimenta para perceber a oferta do vendedor”. Os autores fizeram, ainda, uma distinção entre três tipos de distância psíquica que poderiam afetar a atuação internacional das empresas:

- a distância psicológica entre países – relativa às diferenças de percepção de uma empresa típica de um país em relação às percepções do comprador médio em outro país.

- a distância psicológica entre empresas – refere-se às diferenças entre as percepções da empresa compradora e da vendedora quanto às necessidades da primeira ou às ofertas da segunda.

- a distância psicológica intra empresas – relativa às diferenças de percepção entre as pessoas que interagem, cada qual em sua organização, a respeito das necessidades do comprador ou das ofertas do vendedor. (Freire e Rocha, 2003)

A Cadeia de Estabelecimento

Segundo Johanson e Wiedersheim-Paul (1975), seria possível identificar empresas em quatro estágios distintos de internacionalização. Uma vez identificada em que etapa a firma se encontra, seria possível ter uma melhor noção sobre o seu nível de comprometimento com o mercado externo. Estes estágios estão descritos a seguir:

(1) No primeiro estágio não haveria atividade regular de exportação nem compromisso de

recursos no exterior.

(2) No segundo estágio, a firma teria um canal com o mercado importador (MI) através

de um representante de vendas, do qual receberia informações a respeito dos fatores

influenciadores de vendas, havendo certo comprometimento com o MI.

30

(3) O terceiro estágio seria caracterizado pelo estabelecimento de uma subsidiária de

vendas, um canal de informação controlado pela firma, permitindo à firma acumular

experiência direta sobre os consumidores de seu produto.

(4) O quarto e último estágio se daria com a produção ou prestação do serviço no

mercado estrangeiro, o que exigiria ainda maior comprometimento de recursos.

Apesar de segmentarem desta forma, os autores lembram que este modelo é apenas uma simplificação da realidade. Sendo assim, nem sempre seria possível precisar em que estágio a empresa se encontraria ou se a empresa passaria por todas estas etapas.

O Modelo de Uppsala

O estudo publicado por Johanson e Vahlne, em 1977, apresentou um modelo descritivo para a internacionalização de uma firma, baseado em um processo de retroalimentação (feedback), onde há uma gradual de comprometimento de recursos no exterior.

“Este modelo se baseia em observações empíricas de estudos em negócios internacionais feitos na

Universidade de Uppsala que mostram que firmas suecas geralmente desenvolvem suas operações

internacionais em pequenos passos ao invés de fazer um grande investimento em um ponto específico

no tempo” (Johanson e Vahlne, 1977, pg 33)

Os autores acreditam que a internacionalização é o resultado de decisões incrementais, em que o aumento do conhecimento tácito permite à empresa enxergar novas oportunidades de negócios. O processo de internacionalização seria uma mistura de pensamento estratégico, ação estratégica, “desenvolvimentos emergentes”, oportunidades e necessidades (Johanson e

Vahlne, 1990). Seu caráter incremental seria o resultado de ajustes a fatores da firma e de seu ambiente em mudança (Johanson e Vahlne, 1977).

31

Sendo assim, os autores procuraram identificar elementos comuns em sucessivas situações de tomada de decisão para desenvolver um modelo que tivesse valor explicativo.

O artigo ainda se baseou nas seguintes premissas:

(1) A falta de conhecimento sobre o mercado é um grande obstáculo para o

desenvolvimento de atividades internacionais.

(2) O conhecimento necessário pode ser adquirido, principalmente através de operações.

(3) As firmas buscam aumentar o lucro de longo prazo.

(4) As firmas buscam manter a exposição ao risco em níveis baixos.

(5) O “Grau de Internacionalização” afeta as oportunidades e riscos percebidos pela

empresa que, por sua vez, influenciam as decisões de comprometimento de capital e

as atividades correntes.

O Modelo de Internacionalização

Este modelo se divide em duas dimensões:

- de um lado, os parâmetros que medem o atual grau de internacionalização (Variáveis

Fixas):

(1) nível de conhecimento que a empresa tem do mercado para o qual está se expandindo

(2) a quantidade de recursos investidos/ comprometidos no mercado estrangeiro.

- do outro lado estão os parâmetros que vão modificar o atual grau de internacionalização

(Variáveis de Mudança):

(1) decisões de comprometimento de recursos em operações internacionais

(2) o desempenho das atividades correntes.

32

Sua representação gráfica está expressa na figura 1:

Fig. 1. O Mecanismo Básico de Internacionalização – Variáveis Fixas e de Mudança

Variáveis Fixas Variáveis de Mudança

Decisões de Conhecimento Comprometimento do Mercado de Recursos

Comprometimento Atividades com o Mercado Correntes

Fonte: Johanson e Vahlne (1977)

Sendo assim, em um processo de retroalimentação, as decisões dos gestores e as atividades correntes da empresa modificam o nível atual de comprometimento com os mercados internacionais. Este novo nível de comprometimento, por sua vez, gera uma mudança no fluxo de informação e na quantidade de conhecimento acumulado pela empresa, o que influencia as próximas decisões da companhia.

Variáveis Fixas

- Comprometimento com o Mercado

Dois fatores que compõem o comprometimento de mercado:

(1) Montante de recursos alocados para atender ao mercado (montante de investimentos em

marketing, pessoal, homem/hora, etc. Estes valores são mais fáceis de estimar)

(2) Dificuldade de achar um uso alternativo para estes recursos ou transferi-los. Sendo assim,

quanto mais especializado para atender ao mercado específico, maior o grau de

comprometimento do recurso.

33

- Conhecimento do Mercado

De acordo com os autores, o conhecimento é um aspecto importante neste modelo, pois as

“Decisões de Comprometimento de Recursos” se baseiam em diversos tipos de conhecimentos. O conhecimento das oportunidades e problemas é responsável por iniciar o processo de tomada de decisão. Em segundo lugar, a avaliação das alternativas é baseada em algum conhecimento sobre partes relevantes do ambiente de mercado e sobre o desempenho de várias atividades. De forma geral, o conhecimento se relaciona à demanda e oferta presente e futura, à competição e aos canais de distribuição, às condições de pagamento e à mobilidade do dinheiro entre outros aspectos que variam dependendo do país e da época.

Sendo assim, o conhecimento tácito passa a ser muito importante. (Carlson, 1974; Johanson e

Vahlne, 1977)

Esta é uma premissa muito importante para o modelo, pois sem esta distinção entre as formas de se adquirir conhecimento, não haveria uma explicação para a necessidade de se investir no mercado antes mesmo de entendê-lo completamente.

Variáveis de Mudança

- Atividades Correntes

Existe um tempo entre as ações e suas conseqüências. Quanto maior esta defasagem, maior a necessidade de comprometimento de recursos em marketing para que se possa ver os resultados. Os autores assumem ainda que, quanto mais complexos e diferenciados os produtos, maior será o comprometimento total causado pelas atividades correntes.

34

Existe um tempo necessário para expandir as atividades correntes. Apesar de ser possível adquirir experiência através da contratação de consultores ou profissionais com experiência no mercado, as atividades correntes são a fonte primária de conhecimento tácito de uma firma. Há ainda uma distinção entre experiência de mercado e experiência de firma. Mesmo que se possa adquirir recursos humanos no mercado, eles ainda precisam de um tempo para adquirir conhecimento sobre a firma. Este fator é uma das razões para o processo de internacionalização geralmente acontecer devagar.

- Decisões de Comprometimento de Recursos

Decisões são tomadas em resposta a problemas ou oportunidades percebidas no mercado

(isso é influenciado pela experiência da firma e de mercado). O modelo assume que tais decisões serão influenciadas:

- pelas alternativas levantadas

- pelo processo de tomada de decisão (forma como serão escolhidas).

Além disso, os autores ainda destacam que cada decisão gerará:

- um efeito econômico: alteração na escala das operações

- um efeito de incerteza: alteração na capacidade dos tomadores de decisão de estimar o

presente e o futuro do mercado e dos fatores que os influenciam.

A partir disso, os autores apresentam um conjunto de equações para explicar a dinâmica das variáveis de exposição ao mercado, o nível de comprometimento de recursos e o nível de incerteza tolerado:

R = C x U

R*R – desequilíbrio, empresa toma medidas para diminuir os riscos da operação

35

Onde: R = risco de mercado existente na situação atual C = nível atual de comprometimento no mercado U = Incerteza existente no mercado R*= máximo de risco tolerável (fronteira de risco tolerável)

Em outras palavras, a empresa sempre gerenciaria a sua exposição a riscos, estando disposta a aumentar sua presença no mercado quando a percepção de risco de mercado fosse inferior ao máximo tolerado e tentando reduzir os riscos da operação quando estivessem acima deste nível máximo.

Por fim, os autores observaram que os comprometimentos de recursos adicionais serão feitos em pequenas etapas, a não ser em casos onde:

(1) a firma disponha de muitos recursos e os recursos para internacionalização

representem pouco para a firma

(2) as condições de mercado sejam estáveis e homogêneas (de forma que o conhecimento

de mercado possa ser aprendido sem ser através de experiência)

(3) a firma tenha muita experiência de outros mercados com condições semelhantes,

sendo possível generalizar a experiência para o mercado específico.

Excetuando-se esses casos, o acúmulo de experiência de mercado levará a um aumento gradual na escala das operações e de integração com o ambiente de mercado, onde serão tomadas medidas para corrigir os desequilíbrios da exposição ao risco no mercado. O crescimento deste mercado tende a agilizar o processo de internacionalização.

36

O Conceito de Networks

De acordo com Hemais e Hilal (2002), a incorporação da questão das networks ao modelo de internacionalização seria uma evolução natural do pensamento da Escola de Uppsala 6.

Segundo a teoria de network, toda firma seria parte de uma rede de relacionamento composta por competidores, fornecedores, c1ientes, distribuidores e agentes públicos. Estas redes variariam de acordo com o país no qual estivessem inseridas (Johanson e Mattson, 1988). O conceito de network, então, focaria nas relações de intercâmbio entre empresas interdependentes, que poderiam englobar relações além dos limites do mercado nacional ou indústria onde a firma opera. As ligações entre estas firmas seriam desenvolvidas e mantidas através de relações de negócios construídas com base em contratos, confiança mutua e conhecimento e poderia haver dois tipos de networks: as comerciais (elos técnicos, econômicos e legais) e as pessoais (elos sociais e cognitivos) (Johanson e Hallén, 1989). Para

Björkman e Forsgren (1997), esta teoria explicaria a internacionalização da firma concentrando-se nos laços cognitivos e sociais que se formam entre os atores que mantêm relacionamentos de negócios. É importante ressaltar que uma network é uma estrutura complexa e fluida, que não pode ser facilmente compreendida por um novo entrante. Ao contrário, deve ser compreendida aos poucos, através da experiência e aprendizagem resultante da interação da firma com esta network. Sendo assim, para entrar numa dessas redes é necessário que haja agentes dentro da rede interessados em interagir com o novo entrante e dispostos a fazer adaptações em suas práticas operacionais correntes. (Johanson e

Vahlne, 1990)

6 Os defensores deste modelo revisto passaram a ser conhecidos como membros da “Escola Nórdica de Negócios Internacionais ” e têm desempenhado um papel central no desenvolvimento da perspectiva das networks industriais, focalizando os relacionamentos existentes entre firmas e mercados industriais .

37

O conceito de network nos ajuda a compreender, então, as relações de intercâmbio entre empresas interdependentes e como que o fato de fazerem parte desta rede influencia suas operações, decisões estratégicas e processo de aprendizagem. Freire (2001) enfatiza, ainda, que em alguns casos, a exploração de vantagens advindas de redes (como transferência de tecnologia e conhecimento) poderia acelerar a internacionalização.

Segundo Johanson e Mattson (1988), as atividades em uma network permitem que uma firma construa relacionamentos capazes de estabelecer acesso a recursos e mercados antes não alcançáveis. De acordo com esses autores, o modelo de network parte do pressuposto que uma firma necessita de recursos controlados por outras firmas, que poderiam ser obtidos através de uma posição específica dentro de uma network. Segundo este conceito, uma firma estaria inicialmente engajada em uma network basicamente doméstica e começaria seu processo de internacionalização ao desenvolver relacionamentos de negócios com networks de outros paises. Este desenvolvimento poderia se dar de três formas: (1) através do estabelecimento de relações novas para a firma (extensão internacional); via desenvolvimento das relações dentro da rede (penetração); ou através da conexão de redes de diferentes países

(integração internacional).

Hakansson, Havila e Pedersen (1999) acrescentam que as networks modificam o processo de acúmulo de conhecimento de uma empresa, pois viabilizam a aprendizagem através da experiência de outras empresas. Este pressuposto também é considerado por Johanson e

Vahlne (1990), quando propõem a expansão do modelo de Uppsala para uma rede de relacionamento, desta forma o modelo de retroalimentação e o processo de aprendizagem seriam ampliados, considerando também a aprendizagem via network. Em vista disso, os conceitos de “comprometimento com o mercado”, “conhecimento do mercado”, “atividades

38

correntes” e “decisões de comprometimento de recursos” deveriam ser entendidos como multilaterais ao invés de unilaterais, e a internacionalização deveria ser vista não apenas como um processo inter-organizacional, mas ainda intra-organizacional, como se pode ver na figura a seguir:

Fig. 2 – O Aspecto Multilateral do Processo de Internacionalização

Conhecimento e Conhecimento e Atividades comprometimento comprometimento Correntes de outros players da firma nos mercados estrangeiros

Fonte: Johanson e Vahlne (1990, p.19)

Desta forma, o processo envolveria comprometimento e conhecimento tanto da firma que quer entrar no mercado (ou network), quanto dos outros players da network, e ambos afetariam as atividades atuais.

Chetty e Holm (2000) desenvolveram um estudo de caso longitudinal de quatro “firmas manufatureiras” em uma pequena economia aberta buscando entender como firmas usam redes de relacionamento comercial quando se internacionalizam. Os achados deste estudo ilustraram a dinâmica de como uma firma interage com sua rede para estender, penetrar e integrar mercados internacionais. As autoras acabaram por concluir que “uma network pode ajudar firmas a se exporem a novas oportunidades, a adquirirem conhecimento, aprender com experiências e se beneficiar dos efeitos de sinergia de seus recursos compartilhados” (Chetty e Holm, 2000, p.77)

39

Madhok (1996) afirma que as capacidades de uma firma e as forças competitivas do mercado seriam os principais fatores que forçariam as firmas a colaborarem entre si. Em outras palavras, argumenta que, para uma empresa sobreviver em um mercado cada vez mais especializado e competitivo, seria necessário, cada vez mais, estabelecer relações de cooperação e parceria. Partindo-se desta premissa de que as firmas estariam cada vez mais especializadas e interligadas com empresas parceiras, é fácil perceber que ações no sentido de acompanhar variações no mercado exigiriam mudanças não apenas dentro de uma empresa, mas em uma série de peças dentro de uma mesma network. Como relações não são rapidamente feitas e desfeitas, haveria alguma inércia dentro das redes, fazendo com que as mudanças se dessem de forma gradual. Sendo assim, da mesma forma como é necessário algum tempo para que mudanças ocorram dentro de uma empresa, será necessário tempo para que ocorram mudanças dentro de uma network. (Easton e Araújo, 1989)

Assim sendo, estas redes de relacionamento deveriam ser vistas como um organismo vivo, dinâmico, que se modifica ao longo do tempo, devendo cada firma ser compreendida, não apenas pelas atividades que desempenha, mas ainda pelo papel que cumpre dentro da rede e através das relações de interdependência que mantém com as demais firmas.

40

2.2.3 – A comparação das abordagens econômicas e comportamentais

Em 1990, Johanson e Vahlne (1990) desenvolveram uma análise comparativa entre o modelo de internacionalização de Uppsala e o Paradigma Eclético da Produção Internacional, avaliando a capacidade explicativa de cada um deles. A tabela 01 busca ressaltar os principais achados deste trabalho.

De todos os pontos destacados pelos autores, um dos mais interessantes foi o reconhecimento de que, conforme sustentado pela pesquisa empírica, o poder explanatório do modelo de

Uppsala era mais elevado nos estágios iniciais do processo de internacionalização. Por ser um modelo de fundo comportamental, aplicar-se-ia melhor a firmas inexperientes. Por outro lado, o paradigma eclético teria maior poder explanatório quando aplicado a firmas com atuação em diversas regiões do mundo, e, por pressupor perfeito acesso às informações dos tomadores de decisão, seria mais consistente com firmas experientes.

Por último, para que o Paradigma Eclético fosse aperfeiçoado e capaz de considerar diferenças comportamentais específicas da firma, os autores sugerem que seria necessário incorporar ao modelo as variáveis: (1) comprometimento da empresa com o mercado e (2) o volume e a qualidade de experiência acumulada - os conceitos fundamentais do modelo de internacionalização de Uppsala.

41

TAB 01 - Paradigma Eclético x Modelo de Uppsala

Paradigma Eclético Modelo de Internacionalização

Modelo Determinístico (como deveria Modelo Descritivo (como é), behaviorista. ser). Empresas tenderiam a tomar decisões Prevê limitações cognitivas, de tempo e racionais, otimizando os resultados a serem informação no processo de internaciona- obtidos lização. O modelo não prevê otimização.

Visa explicar a extensão, forma e padrão da Explica e prevê o modo e padrão do produção internacional processo de internacionalização e o estabelecimento de operações voltadas para o mercado (Nacional Þ Multinacional)

Orientado para a produção: empresas Orientado para o mercado: as empresas estabeleceriam produção onde tivessem só entrariam em mercados onde houvesse algum tipo de vantagem, independente- demanda para seus produtos. mente do mercado.

Produzir onde houver maiores vantagens Produzir primeiro em mercados de custo semelhantes e, com sucesso, expandir para outros

Modelo de natureza estática: tomadores Modelo de natureza dinâmica: as de decisão são racionais e totalmente variáveis explicativas vão se alterando ao informados desde o início do processo de longo do processo. internacionalização. Custos transacionais mudam ao longo do O modelo não faz menção alguma a tempo. Incluí o conhecimento do mercado mudanças em variáveis, como o aumento externo e as relações estabelecidas com os do conhecimento sobre um mercado, e a diversos parceiros – especialmente clientes variações de percepções sobre custos e – entre as características explanatórias do benefícios de atividades ao longo do comportamento empresarial. tempo. Desta forma, o paradigma eclético não seria capaz de explicar as mudanças de Com a aprendizagem, níveis de incerteza modo de entrada. diminuem, modificando o ponto ótimo de investimento. Empresas passam a se interessar em investir mais

Modelo tem maior validade para firmas Modelo tem maior validade para firmas globais com maior experiência em sem experiência, em estágios menos processos de internacionalização, uma vez avançados de internacionalização que assumiria que os tomadores de decisão têm perfeito acesso a informação. Baseado em Johanson e Vahlne, 1990

42

2.3 - Evolução de comprometimento com mercados externos

- Evolução de comprometimento: um processo gradual?

Na literatura, além dos modelos apresentados, há outros modelos que buscam descrever a evolução do comprometimento com mercados externos que tem princípios semelhantes ao da

Cadeia do Estabelecimento e ao Modelo de Uppsala. Entre estes, destacam-se os de Bilkey e

Tesar (1977), Cavusgil (1980), Reid (1981) e Czinkota (1982). De acordo com estes modelos, as firmas evoluiriam ao longo de diferentes estágios de internacionalização de forma gradual.

Para cada nível de internacionalização as empresas apresentariam características específicas, o que permitiria que fossem classificadas nestes diferentes estágios.

Cavusgil (1980) acreditava que o processo de internacionalização seria gradual devido às características dos gerentes e ao processo de aquisição de conhecimento sobre o mercado estrangeiro. Desta forma, no início, as firmas estariam preocupadas em procurar, localizar e avaliar mercados potenciais, adquirindo experiência em como iniciar atividades de exportação. Esta argumentação estaria baseada na suposição de que gerentes têm uma atitude cautelosa em relação ao comércio internacional, o que levaria a uma busca por informação e conhecimento tácito. Com o aumento do nível de conhecimento sobre o mercado estrangeiro, os gerentes ficariam mais predispostos a arriscar em novas oportunidades, aumentando o compromisso com as atividades internacionais. Assim como Johanson e Vahlne, o autor defende a natureza comportamental do processo e estabelece que a presença e o grau de envolvimento na atividade variariam com avaliações pessoais de tomadores de decisão, suas expectativas e aspirações, e com as características das firmas. Posteriormente, em seu estágio final de internacionalização, as dificuldades da firma estariam relacionadas à manutenção e à expansão das exportações7. A capacidade de superar estes impedimentos e de alcançar as

7 Exemplos de problemas encontrados seriam restrições de importação/exportação, custo e disponibilidade de

43

metas de lucro e crescimento influenciariam a permanência ou retirada da empresa das atividades internacionais.

Outra explicação para este processo gradual é apresentada por Buckley (1989). Segundo o autor, pequenas e médias empresas enfrentariam problemas diferentes das grandes ao escolherem seu caminho para a expansão internacional. Empresas de pequeno e médio porte teriam menos recursos à sua disposição: tanto financeiros, quanto humanos. Esta disponibilidade limitada de recursos financeiros e a escassez de recursos humanos habilitados ou de tempo da gerência para lidar com os problemas da internacionalização fariam com que as firmas tendessem a adotar a seguinte estratégia:

(1) concentrar investimentos em um mercado, (2) reinvestindo os lucros nesse mercado, em um (3) processo gradual de comprometimento de recursos para que se pudesse voltar atrás em caso de insucesso.

- Um processo irreversível seguindo etapas predefinidas?

É válido ressaltar que tanto Cavusgil quanto Buckley encontraram evidências de que uma firma poderia optar por retroceder a uma fase anterior ou retirar-se do mercado internacional, se mal sucedida, ou aumentar seu envolvimento além de exportação através de licenças, estabelecimento de subsidiarias de vendas e de produção, se bem sucedida. Welch e

Luostarinen (1988) também compartilhavam desta visão.8

Apesar de esta afirmação ser consistente com o princípio da retroalimentação do modelo clássico de Uppsala, em que se diz que o nível de comprometimento de recursos se adequaria transporte e flutuações no cambio.

8 “após definir “internacionalização”, deve-se ressaltar que, uma vez que a firma tenha embarcado nesse processo, não há como garantir a sua continuidade. De fato, evidências indicam que o contrário, a “des- internacionalização” pode ocorrer em qualquer estágio …” (Welch e Luostarinen (1988, p.37)

44

à percepção de risco de mercado e o seu retorno esperado, ela vai contra um outro pressuposto sustentado por Johanson e Vahlne (1990). Johanson e Vahlne afirmavam que, uma vez iniciado o processo de internacionalização, a própria estrutura da empresa iria trabalhar para a sua ampliação, e que os funcionários engajados em um mercado ao se defrontarem com oportunidades e problemas tenderiam a buscar soluções automaticamente, de modo que o processo procederia independentemente de haver ou não direção estratégica neste sentido.

Além disso, os autores de Uppsala consideravam que a internalização das atividades de agentes de venda no exterior seriam sempre interessantes a partir do momento em que houvesse escala para se estabelecer no exterior. O modelo de Uppsala supunha, ainda, que o nível de risco e incertezas percebido nas operações em um mercado estrangeiro seria inversamente proporcional ao nível de conhecimento que a empresa detivesse sobre este mercado. Ou seja, quanto mais se conhecesse a respeito de um mercado, mais se estaria disposto a investir nele.

Em 1986, Strandskov desenvolveu um estudo criticando a visão determinística dos modelos de estágios e divergindo da idéia de que empresas passariam necessariamente por todas as etapas pré-definidas por estes modelos, sem possibilidade de saltos ou reversões na direção do movimento. Segundo o autor, as empresas apresentariam comportamentos diversos entre si, fruto de decisões tomadas por seres humanos imprevisíveis, e em respostas a condições ambientais diversas, que não repetiriam as condições onde decisões passadas foram tomadas.

45

Jarillo e Martinez (1991)9, após analisar o processo de expansão internacional de 35 empresas espanholas, concluíram que o modelo tradicional de estágios não representava uma parcela importante da realidade observada, considerando necessário o desenvolvimento de um modelo mais abrangente. De fato, na análise dos autores, foram identificados saltos em etapas, movimentações de etapas consideradas mais avançadas para etapas iniciais do processo de internacionalização, e estagnação em um determinado modo de atuação. Segundo os autores, estas variações indicariam que o comprometimento gradual poderia ser modificado por decisões estratégicas ou econômicas das empresas, como por exemplo o aproveitamento de ganhos de escala com a produção em um único local.

Outros estudos, como os de Jones (1999) e Chetty (1999), também acharam resultados que sustentavam a hipótese que empresas não seguiam consistentemente os estágios de internacionalização da forma prevista no modelo. Estes estudos empíricos mostravam que poderia haver reversão nos estágios de internacionalização, para posições vistas pelo modelo como de menor comprometimento. Estudos como estes corroboraram a proposição de que nem sempre as empresas seguem um único comportamento internacional, podendo variar sua estratégia conforme a percepção de vantagens e oportunidades em um ou outro modo de atuação em um determinado momento no tempo.

Petersen e Pedersen (1997), por sua vez, afirmaram que o modelo de Uppsala permanecia empiricamente válido e que "a idéia fundamental de internacionalização incremental parece bastante sólida" (Petersen e Pedersen, 1997, p.131). Os autores consideraram, no entanto, que a relação linear entre conhecimento de mercado e comprometimento com o mercado era

9 Os autores realizaram um estudo com 35 médias e grandes empresas espanholas, utilizando-se de entrevistas em profundidade. Todas as empresas pesquisadas tinham mais de 20% de suas vendas provenientes do exterior, encontrando-se entre as firmas espanholas mais bem-sucedidas nos mercados internacionais.

46

questionável, e sugeriram, ainda, que as premissas restritivas relativas à cadeia de estabelecimento deveriam ser relaxadas.

Segundo Morgan e Katsikeas (1997), apesar das controvérsias envolvendo a tese do processo de internacionalização ser incremental, parece razoável sugerir que o conceito de um processo de internacionalização seqüencial não implica que esta transição seja consistente ou uniforme. Os autores acreditam que, provavelmente, haja um padrão evolutivo geral

(genérico) no envolvimento com mercados externos que poderia ser irregular e ad hoc.

Como ilustração, os autores citam Mintzberg e McHugh (1985), que afirmavam que as estratégias de crescimento, em sua maioria, seriam caracterizadas por picos e vales de comprometimento, que estariam relacionados a oportunidades emergentes descontínuas e ameaças presentes no ambiente da firma. Sendo assim, concluíam que o resultado do envolvimento internacional seria a combinação de estratégias deliberadas e emergentes ao longo do tempo.

- Como mensurar e determinar o grau de internacionalização de uma empresa?

Segundo a Escola de Uppsala, alguns fatores seriam importantes para medir o grau de internacionalização de uma empresa: (1) o montante de recursos investidos em mercados estrangeiros; (2) os usos alternativos para os recursos ou ativos dedicados ao exterior, em outras palavras, o quão oneroso e difícil seria se desfazer de seus investimentos internacionais e reaproveitar para outros fins. Sendo assim, não importa apenas o montante investido, mas também a sua forma.

47

Um estudo interessante foi realizado por Cavusgil (1984), onde o autor procurava relacionar diversas características mensuráveis das empresas com os diferentes graus de envolvimento com mercados internacionais (de acordo com um modelo de estágios proposto por ele em

1980). A pesquisa mostrou que:

(1) nas empresas pesquisadas, o tamanho da firma (medido em volume de faturamento ou número de empregados) não apresentava relação forte com o grau de internacionalização.

(2) Diferentemente do esperado, o fato de uma empresa ter anos de experiência internacional não levava necessariamente a outro estágio.

(3) A intensidade de exportação, que seria a razão entre volume de exportação e as vendas totais também não apresentava correlação perfeita com o grau de internacionalização.

(4) Apenas o percentual do lucro obtido em exportações teve boa correlação com o grau de internacionalização.

(5) Por último, identificou que o interesse da alta gerência, o acesso a mercado potencial interno e a estratégia do negócio poderiam influenciar a postura internacional adotada. De acordo com o autor, estes resultados indicariam que talvez fosse o conjunto de dimensões, e não apenas uma variável, que caracterizaria a internacionalização.

De acordo com Morgan e Katsikeas (1997) um dos problemas-chave que dificulta o progresso dos estudos na área de internacionalização é a falta de um método preciso de mensuração que determine o grau de internacionalização de uma empresa. Para ilustrar esta visão os autores citam Sullivan (apud Morgan e Katsikeas, 1997), que considera que a confiabilidade dos indicadores utilizados para medir o grau de internacionalização seria baixa, sendo quase especulações e podendo, conseqüentemente, atrapalhar a construção e comparação de teorias.

48

Por fim, é importante somar a contribuição proveniente do conceito de networks, que sugere que se deve pesquisar a abrangência da network na qual a empresa está inserida como uma das fontes de informação para mensurar o grau de internacionalização de uma firma.

2.4 - Importância das networks

Trazendo esta discussão de networks para a realidade brasileira, é valido ressaltar o estudo desenvolvido por Veiga e Rocha (2003) que analisou o processo de internacionalização de três empresas brasileiras de grande porte e alto grau de envolvimento com o exterior (Romi,

Duratex e Eucatex). O trabalho buscou entender como estas empresas estabeleciam relacionamentos (networks) no mercado internacional. Dentre os resultados mais interessantes desta pesquisa, pode-se ressaltar o caso da Eucatex, que iniciou suas atividades através de escritórios de venda próprios e, posteriormente, começou a atuar através de agentes. Em outras palavras, o padrão seqüencial proposto pelas teorias comportamentais de internacionalização não foi respeitado, mostrando que a empresa teria começado por um estágio considerado mais avançado (escritórios próprios), substituindo-os por agentes após a empresa ter adquirido uma boa experiência naqueles mercados e estabelecido sua network de relacionamentos pessoais. Desta forma, os autores sugerem que a interpretação do grau de internacionalização de uma empresa pode variar muito dependendo das variáveis nas quais se baseia a análise:

“Efetivamente, no caso da Eucatex, fica evidente um aprofundamento da atividade internacional, assim

como uma inserção da visão internacional na cultura da empresa. Tal aprofundamento parece significar

aumento de comprometimento, se se considera o número de países em que a empresa operava. No

entanto, se se leva em conta o fechamento de escritórios e a redução de estrutura internacional da

empresa como indicadores, conclui-se, pelo contrário, que a empresa reduziu seu comprometimento.”

(p.205)

49

É interessante somar a esta análise o estudo empírico realizado por Jarillo e Martinez (1991).

Neste estudo os pesquisadores compararam as características do processo de expansão internacional de 35 empresas espanholas às previstas na literatura de negócios internacionais.

Os autores concluíram que o modelo de internacionalização de Uppsala era capaz de explicar apenas uma parte da realidade revelada pela pesquisa, o que sugeriria, portanto, que a análise da internacionalização da firma estivesse a exigir um esquema conceitual mais abrangente.

O framework proposto por Jarillo e Martinez (1991) parte da observação de que a análise da estratégia seguida por empresas internacionais geralmente levava em conta apenas duas dimensões (integração e localização) e sugere a introdução de uma terceira: a

“externalização”. Com esta dimensão, seria possível distinguir as empresas que utilizam formas externas de operações internacionais, como, por exemplo, alianças estratégicas, joint ventures, franquias e licenciamentos, das que não utilizam, diferenciando empresas que externalizassem atividades de sua cadeia de valor das que não o fizessem.

“os trabalhos sobre networks (Johanson e Mattsson, 1987; Thorelli, 1986; Jarillo, 1988) mostra m que

organizações de ‘mercado’ e de ‘hierarquia’ não são escolhas dicotômicas; existem muitos ‘modos

intermediários’ que proporcionam ao menos alguma coerência estratégica para entidades legalmente

diferentes. Assim, o comportamento competitivo (...) é complementado pelo igualmente importante

comportamento cooperativo, traduzido pela nova dimensão” (p. 297-8)

Os autores afirmaram que esta terceira dimensão seria particularmente importante no estudo da expansão internacional das pequenas e médias empresas, pois estas não dispõem dos

“recursos necessários para competir ao longo de todo o espectro de atividades da cadeia de valor, ao buscar economias de escala de forma a se manterem competitivas”. (p. 298)

50

2.5 - Seqüência de escolha de ampliação do raio de atuação internacional

Segundo Freire e Rocha (2003), existiriam três formas principais das empresas selecionarem os mercados por onde começariam o seu processo de internacionalização:

- através de uma oportunidade inesperada em um mercado específico;

- pela escolha de mercados com os quais seus executivos tenham maior afinidade; ou

- adotando-se um processo racional de seleção de mercados.

Quanto à expansão, a corrente econômica seguiria o conceito de custos de transação. Para a teoria de Uppsala, por sua vez, a escolha dos países se daria de forma gradual, e começando primeiro por países próximos psiquicamente para depois se alcançar países menos semelhantes (respeitando o conceito da distância psíquica).

O’Grady e Lane (1996) sugeriram expandir o conceito de distância psíquica, incorporando fatores tais como a estrutura da indústria e o ambiente competitivo. Nesta definição mais ampla, a distância psíquica seria o grau de incerteza de uma empresa sobre um mercado estrangeiro, resultante tanto de diferenças culturais quanto de outras dificuldades para realizar negócios que representassem barreiras para o aprendizado sobre um mercado e a operação neste mercado.

Até 2006, poucos estudos foram realizados na tentativa de mapear a percepção de distância psíquica ou cultural entre o Brasil e mercados externos. Um desses estudos, desenvolvido por

Leite, Rocha e Figueiredo (1988), apontou para um resultado interessante. Segundo os executivos de exportação entrevistados, nenhum país seria muito semelhante, mas Portugal,

Uruguai e seriam vistos como os países mais próximos psiquicamente do Brasil.

51

De acordo com Hedlund e Kverneland (1984) e Nordstrom (1990), porém, o mundo se teria tornado muito mais homogêneo, consequentemente, as distâncias psicológicas teriam diminuído, facilitando-se o acesso direto de novos entrantes aos mercados internacionais. O conceito de distância psicológica teria reduzido, portanto, o seu poder de explicar a realidade pois as mudanças no ambiente tinham levado as firmas a adotarem formas de entrada mais rápidas e mais diretas.

52

3. METODOLOGIA

Neste capítulo é apresentada a metodologia de estudo da dissertação. Após uma breve introdução, é descrita a escolha do caso, são definidas as perguntas da pesquisa, o método de pesquisa, os métodos de coleta e análise dos dados, as vantagens e desvantagens do método escolhido (o estudo de caso) e as dificuldades enfrentadas ao longo da coleta de dados secundários e das entrevistas pessoais com funcionários ou ex-funcionários da empresa. Por fim são elencadas as limitações deste estudo.

3.1. O Problema da Pesquisa

Este estudo procurou investigar o processo de expansão internacional de uma grande empresa brasileira, com o propósito de entender sua forma, suas etapas e os fatores influenciadores deste processo. A empresa escolhida foi a TV Globo, a principal empresa do setor de mídia, comunicação e entretenimento no Brasil.

A escolha do caso da TV Globo teve o intuito de dar prosseguimento ao estudo feito anteriormente por Graell (1987), em que eram apontados indícios de que a empresa seguia os passos propostos na teoria do marketing internacional, tais como os modelos de envolvimento seqüencial de exportação. Ao investigar os desdobramentos do processo de internacionalização da companhia, seria possível constatar se os passos posteriores propostos por tais teorias continuaram sendo verificados na prática e o quanto o estudo de caso se relacionava com as diferentes correntes de pesquisa após uma série de refinamentos teóricos acumulados nas últimas duas décadas.

53

3.2. Definição das perguntas da pesquisa

A pergunta geral que motivou o presente estudo foi:

- De que forma decorreu o processo de internacionalização da TV Globo de 1965 a 2005?

A partir desta pergunta geral, sugiram as perguntas específicas que nortearam esta pesquisa:

(1) Como se iniciou o processo de internacionalização da TV Globo?

(2) Como se deu a evolução do comprometimento com os mercados externos?

(3) Qual foi a importância da utilização de parcerias como alternativa aos investimentos diretos?

(4) Como se deu o processo de escolha dos países nos quais iria atuar e de que forma a sequência de escolha encontra-se relacionada com o conceito de distância psíquica? e

(5) Qual o grau de importância do produto telenovelas nesse processo?

3.3. Método da pesquisa

Neste estudo optou-se por realizar uma pesquisa qualitativa sobre o assunto, desenvolvendo um estudo longitudinal que acompanhasse a evolução da empresa, identificando processos, estruturas e eventos que marcaram a sua internacionalização.

Devido à complexidade e o caráter temporal deste estudo, o método escolhido foi o estudo de caso. Desta forma, seria possível a identificação de variáveis ambientais e situacionais que poderiam ser analisadas em estudos quantitativos futuros.

54

Segundo Schramm (1971, p.12) “a essência de um estudo de caso (...) é que ele tenta iluminar uma decisão ou um conjunto de decisões: por que elas foram tomadas, como elas foram implementadas e com que resultado”.

Yin (2003), por sua vez, apresenta uma visão mais abrangente do estudo de caso, definindo-o como “um questionamento empírico que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto real, principalmente quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidas.” (Yin, 2003; p. 13)

A favor desta abordagem qualitativa podem-se citar os seguintes argumentos:

- A utilização da mesma metodologia adotada na dissertação de Isa Graell, que estudou a internacionalização da Rede Globo de 1965 a 1985.

- A manutenção da tradição empírica na pesquisa sobre internacionalização de empresas, em particular a linha seguida pela Escola de Uppsala, a qual tem indicado os estudos qualitativos como os mais adequados ao entendimento dessas questões. (Barretto, 1998)

- A afirmação de Porter (1991) de que embora os estudos qualitativos (em particular o estudo de casos) tenham aceitação acadêmica ainda pouco limitada, seriam os mais adequados para pesquisas sobre estratégia. O autor atesta que, em suas pesquisas, à medida que aumentava a complexidade das questões examinadas foi forçado a abdicar dos estudos quantitativos e optar por estudos de casos. Deste modo, poderia identificar as variáveis significativas, explorar as relações entre elas e considerar adequadamente a especificidade das escolhas estratégicas.

55

- A visão de Kirk e Miller (1986) de que a pesquisa qualitativa de caráter exploratório, facilitaria a descoberta do novo e do inesperado, sem, no entanto, perder-se objetividade.

“Se a pesquisa confirmatória segue os trâmites normais, tudo sai exatamente da forma como se

esperava. A teoria existente é reforçada por um ou mais exemplos de sua utilidade e não necessita de

mudança. Como na vida social diária, a confirmação é exatamente a ausência de insight. Na ciência,

como na vida, novas descobertas radicais precisam, quase que por definição, ser acidentais.”(p.15-16)

- A argumentação de Yin (2003) de que o método deve ser utilizado quando há a necessidade de entender fenômenos sociais complexos, por permitir ao pesquisador uma visão holística de eventos dentro de um contexto de vida real.

De acordo com Yin (2003) há três dimensões que devem ser consideradas na definição do método de pesquisa a ser utilizado: (1) o tipo de pergunta da pesquisa; (2) o grau de controle que o pesquisador tem sobre eventos comportamentais e; (3) se o foco da pesquisa será em eventos contemporâneos ou históricos. A partir destas dimensões o autor faz uma comparação entre cinco métodos importantes em Ciências Sociais e sua aplicabilidade de acordo com a tabela 02.

TAB 02 - Comparação de Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais

Necessita controlar Foca em Método Tipo de pergunta da pesquisa eventos eventos comportamentais? recentes? Experimento Como, por que Sim Sim Survey Quem, o que, onde, quanto Não Sim Análise de Quem, o que, onde quanto Não Sim/não arquivo História Como, por que Não Não

Estudo de caso Como, por que Não Sim Fonte: Yin (2003, p.5)

56

Yin (2003) sustenta que o método do estudo de caso apresenta uma vantagem comparativa sobre os demais métodos quando se pergunta “como?” e “por quê?” a respeito de uma série de eventos contemporâneos sobre os quais o pesquisador tem pouco ou nenhum controle.

3.4. Métodos de coleta e análise de dados

De acordo com Yin (2003) os processos de coleta de dados para estudos de caso são mais complexos do que os utilizados em outros métodos de pesquisa. Sendo assim, o pesquisador precisa ter uma “versatilidade metodológica” e seguir certos procedimentos formais para assegurar o controle de qualidade durante o processo de coleta de dados. Segundo o autor, os dados para estudos de caso podem ser recolhidos através de diversas formas, e para utilizar cada uma dessas fontes, são necessários procedimentos metodológicos distintos. Dentre elas, o autor cita como as mais utilizadas:

(1) Documentos e publicações, (2) estatísticas em arquivo, (3) entrevistas, (4) observação direta, (5) observação participativa e (6) objetos / artefatos.

O método de coleta de dados proposto na presente dissertação combina as três primeiras fontes citadas. Sendo assim, cabe destacar estas fontes de dados, bem como as suas peculiaridades.

(1) Documentos e publicações: São ótimas fontes de informação, por permitir cobrir um amplo intervalo de tempo, eventos e situações. É um material estável, que pode ser revisto repetidamente, contém nomes exatos, referências e detalhes de um evento. Apesar de algumas críticas a respeito de sua imparcialidade ou de sua precisão, são bastante úteis. Deve-

57

se, porém, utilizar estes documentos de forma cuidadosa, não os aceitando como registros literais de eventos passados10. Em estudos de caso, estes documentos são importantes para corroborar ou aumentar as evidências de outras fontes. Yin (2003) destaca ainda que estes são documentos elaborados para algum propósito ou público específico, que provavelmente não serão iguais ao do estudo de caso e que podem conter um conteúdo enviesado. Sendo assim, faz-se necessária uma busca contínua da identificação desses objetivos, para que o entrevistador esteja menos suscetível a estes vieses e para que interprete o conteúdo de tais documentos de forma mais crítica e correta. Por último, alguns destes documentos podem ser de difícil acesso, ou simplesmente bloqueados pela empresa, o que pode dificultar a obtenção da gama de dados necessários para a pesquisa. (Yin, 2003)

(2) Estatísticas em arquivo: Tendem a ser precisos e quantitativos e são interessantes para utilizar em conjunto com outras fontes de informação. Sua importância, no entanto, variará de acordo com o estudo em questão. Possuem vantagens e problemas semelhantes aos documentos e publicações, uma vez que foram feitas para um outro propósito e também podem apresentar problemas de acesso devido a políticas de confidencialidade da empresa.

(Yin, 2003)

(3) Entrevistas: De acordo com Snow & Thomas (1994) a utilização de entrevistas tem como principal função o conhecimento de eventos que o pesquisador não pôde observar diretamente ou mesmo obter em fontes secundárias. Segundo Mann (1979, p. 104) esta interação entre entrevistador e informante “(...) possibilita ao entrevistador aprofundar-se muito mais nas complexidades de algumas situações e pode muito bem introduzi-lo em

10 Documentos e publicações, assim como estatísticas em arquivo são dados secundários. Uma vez que tais dados foram coletados por outros, não é possível, na maior parte dos casos, verificar sua fidedignidade, ou avaliar os procedimentos de coleta utilizados.

58

fatores relevantes dos quais nem sequer tivera notícia”. Na visão de Yin (2003), as entrevistas, além de serem uma fonte de informações essencial para estudos de caso, constituem ainda uma forma de corroborar informações colhidas através de dados secundários. O autor complementa afirmando que as entrevistas devem ser sempre consideradas como apenas um registro verbal. Desta forma, serão influenciadas por vieses, pela lembrança ou articulação verbal dos entrevistados. Sendo assim, o autor sugere que haja uma triangulação das informações de forma a corroborar a entrevista com informações de outras fontes. (Yin, 2003)

O método de coleta de dados deste estudo combina (1) a utilização de dados secundários sobre a empresa, dentre eles: a dissertação de Graell (1987), artigos acadêmicos, entrevistas e reportagens veiculadas em mídias impressas e online, livros, tais como a biografia de Roberto

Marinho e “40 anos de hegemonia e poder” e outras informações divulgadas ao grande público, (2) dados financeiros da TV Globo S.A. divulgados ao mercado, documentos internos da companhia, informações contidas no website da instituição, (3) a realização de quatro entrevistas com executivos de cargos gerenciais da DNI, pautadas em roteiros semi- estruturado (de acordo com os anexos 1 e 2), a entrevista com Francisco Balsemão, fundador e presidente da emissora de TV portuguesa Sociedade Independente de Comunicação (SIC), e as entrevistas com ex-funcionários do alto escalão da TV Globo.

A primeira etapa deste estudo consistiu em reunir as informações relevantes disponíveis por meio de dados secundários, traçar o histórico da companhia e identificar os fatos que necessitavam de maiores esclarecimentos, desenvolvendo uma espécie de estudo preliminar.

Baseado nesse volume de informação inicial foram montados os roteiros para as entrevistas com gerentes e membros de cargos executivos da companhia, de forma a percorrer todas as

59

questões pendentes e apurar fatos conflitantes na literatura. Este modo de coleta de dados levava em conta o perfil dos entrevistados que, com fortes limitações de tempo para conceder as entrevistas, precisavam de entrevistas focadas justamente na obtenção do conteúdo que não seria possível conseguir através da leitura de documentos escritos sobre a empresa.

TAB 03 – Coleta de dados

Dados Secundários Entrevistas em profundidade 1 + 2 3

- A dissertação de Graell Cristina Pessoa, Gerente de Negócios Internacionais; - documentos internos da companhia, Helena Bernarde, Diretoria de Vendas; - informações contidas no website Flávio Rocha, Diretoria Artística, da instituição, Marcos Milanez, Analista da TVGI - dados financeiros da TV Globo Patrícia Hockensmith, Gerente de Marketing S.A. divulgados ao mercado, Francisco Balsemão, Presidente da SIC - reportagens veiculadas em mídias impressas e online, Pedro de Carvalho, ex-Vice-presidente do Conselho de Administração da SIC - o livro com a biografia de Roberto Marinho e outras informações Jorge Adib, ex-Diretor Internacional da TV Globo divulgadas ao grande público

Encontra-se a seguir a lista dos entrevistados na primeira etapa da pesquisa de campo:

- Cristina Pessoa, Gerente de Negócios Internacionais;

- Helena Bernarde, Diretor da Diretoria de Vendas;

- Flávio Rocha, Diretor da Diretoria Artística,

- Marcos Milanez, Analista da TV Globo Internacional (TVGI) e

- Patrícia Hockensmith, Gerente de Marketing

Devido a uma questão de agenda dos entrevistados, que teriam de enfrentar um período com viagens para feiras internacionais de venda de conteúdo, as entrevistas tiveram de ser

60

marcadas antes do recebimento de dados secundários e informações solicitadas à Rede

Globo, fazendo com que o processo de entrevistas fosse realizado antes da finalização do processo de coleta de dados secundários.

Posteriormente, em Portugal, foi realizada a entrevista com Francisco Balsemão, presidente da SIC, que agregou ao trabalho um ponto de vista sob a ótica do parceiro comercial da

Globo em Portugal. Esta entrevista foi gravada, transcrita e posteriormente analisada.

Por último, foram conduzidas as entrevistas com Pedro Carvalho, ex-Vice Presidente do

Conselho de Administração da SIC e Jorge Adib, ex-Diretor Internacional da TV Globo, que ajudaram a resgatar eventos anteriores ao ano 2000.

Como proposto por Yin (2003), este trabalho procurou manter os três princípios necessários para coleta de dados em estudos de caso:

1) O uso de múltiplas fontes de informação, para que fosse possível cruzar informações de

diferentes fontes11.

2) A criação de uma base de dados do estudo de caso, mais ampla do que a documentada no

capítulo de apresentação de caso, mantendo neste capítulo apenas a informação relevante.

3) A manutenção de um encadeamento das evidências, mantendo links entre as perguntas

propostas, o material coletado e as conclusões traçadas.

A estruturação do caso procurou manter sua narrativa de acordo com a ordem cronológica dos fatos, apresentando apenas as informações coletadas mais relevantes. Procurou-se extrair

11 Segundo Yin (2003), deve-se notar que as fontes de informação são altamente complementares e que um bom estudo de caso deveria utilizar o máximo de fontes possíveis

61

da massa de informações coletadas os elementos fundamentais que permitiriam responder às perguntas formuladas inicialmente e que orientaram o estudo.

Após esta etapa, foi realizada a análise do caso à luz do conteúdo apresentado na revisão bibliográfica e guiada pelas questões formuladas no presente estudo. Nesta etapa da análise, os resultados obtidos com o estudo de caso foram confrontados com a teoria sobre o processo de internacionalização das empresas. É importante frisar que a análise do contexto foi limitada às fontes de informação disponíveis ao pesquisador e a realidade retratada ao longo do estudo. A análise dos dados do presente estudo buscou, então, estabelecer comparações a outros casos já escritos, a teorias e modelos existentes, e a normas e procedimentos ditos tradicionais sempre que possível.

Cabe ressaltar que este estudo de caso procurou mostrar somente evidências e fatos, evitando- se juízos de valor por parte do autor durante a descrição do processo de internacionalização da empresa.

3.5. Limitações do estudo

Estudos de casos como método de pesquisa já vem sendo usados no campo da Administração de empresas há décadas. No entanto, sua valorização como método é bastante recente, acompanhando a tendência observada em outras Ciências Sociais (Yin, 2003). Dentre as principais críticas a este método as mais comuns são relacionadas (Yin, 2003; Blalock e

Blalock, 1975; Goode e Hatt, 1975; Simon, 1969):

62

1) a falta de rigor científico

A subjetividade do pesquisador interfere inevitavelmente, na coleta de dados, no registro e análise de informações, particularmente aquelas obtidas através de entrevista pessoal, bem como na própria seleção do material a ser incluído na descrição do caso. Há dificuldade do autor e entrevistados manterem objetividade e isenção de julgamento de valor na descrição e análise dos dados, assim como a percepção seletiva dos fatos.

2) ao fato de o método não permitir generalizações para o universo:

Estudos de caso, assim como experimentos, podem ser generalizados para proposições teóricas e não para populações ou universos. Sendo assim, apesar da impossibilidade de generalizar resultados, as conclusões obtidas no presente trabalho podem desenvolver proposições teóricas para serem testadas futuramente.

3) ao tamanho do estudo, que resulta em documentos muito extensos:

A dificuldade em traçar os limites do objeto social, identificando onde delimitar o estudo e parar de obter dados realmente é um problema.

Além destas críticas à utilização do método de estudo de caso, há de se ressaltar as limitações deste estudo. Uma delas é o fato salientado por Barretto (2003) de que o estudo de decisões e motivações passadas pode ser dificultado, particularmente algum tempo após a decisão ter sido tomada. As motivações humanas podem ser suprimidas, reprimidas, racionalizadas ou simplesmente esquecidas. Björkman e Forsgren (1997) acrescentam que a interpretação da história é feita por indivíduos e por grupos com diferentes objetivos e graus de comprometimento, o que conduz a vieses sistemáticos na interpretação.

63

Além disso, um resultado positivo ou negativo pode também influenciar a forma pela qual as decisões são percebidas pós-facto (percepção seletiva dos fatos). De acordo com o viés da autoconveniência, descrito pela teoria da atribuição (Kelley, 2002), as pessoas tendem a atribuir a si mesmas os resultados positivos obtidos com suas próprias ações e a atribuir a fatores externos os resultados negativos. Por último, há de se ressaltar que a maioria dos entrevistados não trabalhava na área internacional da organização antes do ano de 2000.

Com relação, especificamente, aos problemas das entrevistas conduzidas com os gerentes e diretores da DNI, pode-se destacar:

- Por uma questão de agenda dos entrevistados, as entrevistas foram conduzidas antes do recebimento de outras informações solicitadas à Rede Globo. Acredita-se que se as informações fossem fornecidas em uma ordem diferente as entrevistas renderiam mais.

- Os entrevistados da Rede Globo solicitaram que as entrevistas não fossem gravadas. Como alternativa, o autor tentou recriar o que foi dito na entrevista baseado em sua memória e nas notas que foram tomadas ao longo da reunião.

- Por se tratarem de executivos com tempo escasso, as entrevistas tiveram de ser muito objetivas, sendo perguntado aos entrevistados apenas o indispensável. Mesmo assim, algumas das entrevistas tiveram de ser abreviadas. O roteiro, porém, acabou não sendo seguido na maioria das entrevistas e como alternativa os executivos foram incentivados a falar livremente sobre suas respectivas áreas.

- A pequena duração das entrevistas dificultou a quebra da barreira do “discurso pronto”, não sendo possível aprofundar muito alguns pontos.

- Por uma solicitação da empresa, três das quatro entrevistas foram conduzidas no mesmo dia.

Isso gerou uma dificuldade, por não se poder utilizar o que foi falado em uma entrevista como “pontapé inicial” para as outras.

64

4. ESTUDO DE CASO: O Caso da Rede Globo

4.1. A EMPRESA

4.1.1. Uma breve descrição da Empresa em 2005

Em 2005 a TV Globo Ltda. era a maior emissora de televisão brasileira e, junto com suas estações afiliadas constituía a “Rede Globo de Televisão”. Ao todo eram cinco emissoras próprias (situadas no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Brasília) e 114 afiliadas, totalizando 119 geradoras (Sobral, 2005). A estrutura da rede de afiliadas contava com uma equipe de mais de 8.700 funcionários, distribuídos em todas estas áreas. Além disso, a empresa contabilizava cerca de 3.100 retransmissoras. O resultado disso foi a presença nos 26 estados do país e no Distrito Federal, cobrindo cerca de 5.400 municípios brasileiros (Sobral, 2005). Segundo dados da empresa essa cobertura equivalia a 99% dos 46 milhões de lares equipados com televisores no Brasil em 2004.

O raio de atuação da empresa, porém, não se restringia às fronteiras do território nacional.

Em 2004, além de estar presente através de seu canal “TV Globo Internacional” em 46 países, a emissora exportou dramaturgia para 65 países. Só a comercialização de espaço publicitário no exterior gerou receitas de R$ 9,7 milhões, segundo o balanço financeiro da empresa12.

12 Notes to the Unaudited Interim Financial Statements – TV Globo Ltda. - March 31, 2005 and 2004

65

No total, foram mais de R$ 3,7 bilhões de receitas publicitárias, o que permitiu à TV Globo registrar um lucro contábil de cerca de R$ 113 milhões.13

4.1.2 - ORGANIZAÇÕES GLOBO

A TV Globo pertence às Organizações Globo, o maior conglomerado de Mídia,

Comunicações e Entretenimento (MCE) da América Latina, com um faturamento de US$2,9 bilhões em 2001 (Pessoa e Lopes, 2003). Até dezembro de 2004, o grupo contava com 24 mil empregados e US$5,8 bilhões em ativos.

As diversas empresas das Organizações Globo até 2004 eram agrupadas em três grandes unidades de negócio, cada qual com ênfase em um determinado segmento de atuação ou conjunto de mídias. São elas a Unidade de Televisão e Entretenimento (UNITEEN), a

Unidade de Mídia Impressa e Rádio (MIRA) e a Unidade de Distribuição e

Telecomunicações (DISTEL). Todas são apoiadas pela Globopar, o braço financeiro do conglomerado (Pessoa e Lopes, 2003).

13 “Notes to the Unaudited Interim Financial Statements – TV Globo Ltda. - March 31, 2005 and 2004”

66

PRESIDÊNCIA Roberto Marinho Roberto Irineu Marinho João Roberto Marinho José Roberto Marinho FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO Joaquim Falcão

NÚCLEO DE CONSELHO DIR. DE RELAÇÕES DIR. DE COORD. DIR. DE RELAÇÕES ANÁLISE EDITORIAL INSTITUCIONAIS ESTRATÉGICA COMUNITÁRIAS ESTRATÉGICA Evandro Guimarães Jorge Nóbrega Margarida Ramos

TELEVISÃO E MÍDIA IMPRESSA TELECOMUNICAÇÕES GLOBOPAR ENTRETENIMENTO E RÁDIOS E DISTRIBUIÇÃO Mauro Molchansky (UNITEEN) (MIRA) (DISTEL) Pedro Carvalho Marluce Dias da Silva Luiz Eduardo Vasconcelos Moysés Pluciennik Relacionamento com o Rede Globo InfoGlobo Globocabo (Net Brasil, mercado de capitais de Televisão (O Globo , Extra) Operadoras Net, Net Sat, Sky LA, Unicabo, NetSul) Gestão de Caixa/ Funding GloboSat Sistema Globo de Rádio Assessoria Jurídico- Vicom Som Livre Editora Globo Fiscal

SIC Globo Cochrane Teletrim Participações (NEC, S. Globo Cochrane Marcos e outras)

4.1.3 – A Importância da TV Globo

Segundo Pessoa e Lopes (2003), a trajetória de sucesso da TV Globo foi determinante para que o grupo “Organizações Globo” pudesse se converter no grande conglomerado que é hoje.

“Amparada pela força crescente da TV Globo, as Organizações Globo puderam seguir uma trajetória

de expansão e diversificação continuada, capaz de acompanhar o surgimento de novas mídias. É

ilustrativo deste movimento a criação das empresas NET Brasil e Sky para atuarem em TV paga e,

mais recentemente, da Globo.com para operar em Internet. Cabe ainda ressaltar que a maior parte dos

recursos do faturamento são provenientes da televisão aberta, representando ma is de 40% do

faturamento do grupo.” (Pessoa e Lopes (2003) p.59)

Com emissoras afiliadas que cobrem praticamente 100% do país, a eficiência desta emissora conquistou o público brasileiro, consolidou um mercado publicitário e através da exportação de suas telenovelas, inverteu a direção dos circuitos internacionais da mídia e alcançou, em

1998, a posição de 12º grupo mundial da mídia, segundo a revista norte americana Variety

(Fadul, 1998).

67

4.2. OS PRIMEIROS PASSOS DA GLOBO

4.2.1 Os empreendedores: Irineu e Roberto Marinho

Filho de imigrantes portugueses, Irineu teve uma infância humilde, mas conseguiu prosperar através de seu trabalho em jornais da região até que, em 1911, resolveu abrir o seu próprio negócio e lançou o primeiro jornal vespertino do Rio de Janeiro, intitulado A Noite. O jornal fez bastante sucesso entre as camadas populares e o seu empreendimento floresceu, o que permitiu a construção de uma rede de relacionamentos no setor de jornalismo e a ascensão social de sua família. Como indício deste enriquecimento, pode-se citar a compra de uma mansão na Haddock Lobo, no bairro da Tijuca (RJ) e de transatlântico para Europa na primeira classe, que Irineu custeou para onze amigos e membros de sua família, entre eles, o filho Roberto. (Bial, 2004)

A viagem para Europa, de 1924 a 1925, tinha como principal objetivo permitir que Irineu recebesse tratamento para sua tuberculose e se recuperasse de uma operação realizada pouco antes de sua partida. Neste período, Roberto Marinho teve a oportunidade de conhecer pela primeira vez a Itália, terra de sua mãe, a França, e Portugal, o país de onde viera o seu avô e onde ficou por cinco meses.

Para fazer esta longa viagem na companhia de tantas pessoas, Irineu precisava de liquidez financeira. Desta forma, fez um acordo verbal com seu sócio, Geraldo Rocha, em que Irineu venderia a sua participação acionária no jornal A Noite, mas teria a garantia de recompra assim que voltasse de sua viagem.

68

Ainda na Europa, porém, Irineu foi informado que o jornal estava passando por mudanças ao longo de sua ausência e que toda a diretoria havia sido modificada. A partir deste momento, considerando-se traído, Irineu decidiu que, ao retornar ao país, começaria um novo jornal e que o nome deste jornal seria escolhido pelo próprio povo. O resultado foi a criação do jornal

O Globo, em 29 de julho de 1925.

Logo após a criação do jornal, Irineu veio a falecer, acometido por um infarto, deixando o jornal para o seu filho mais velho, Roberto Marinho, que na época tinha apenas vinte anos.

Roberto, que não chegara a completar o curso secundário e que era conhecido por ser uma pessoa bastante festeira, aparentava não ter o perfil necessário para liderar o jornal. Sua decisão, naquele momento, foi não pleitear o comando da empresa, deixando que fosse gerida por um homem de confiança de seu pai, Eurycles de Mattos. Passou, então, anos acompanhando as atividades do jornal e desempenhando a função de repórter até que em

1931, com a morte de Eurycles, assumiu o cargo de “diretor-redator-chefe”.

Roberto Marinho não teve um caminho simples no cargo de liderança do jornal. Segundo

Bial (2004), nesta época O Globo enfrentava, além de um quadro de endividamento, forte concorrência: parte vinda dos diários matutinos, e parte vinda de seu rival A Noite, o jornal que a própria família Marinho havia criado e estabelecido no mercado. É interessante ressaltar que só em finais da década de 40, O Globo ultrapassou A Noite e se tornou líder dos vespertinos cariocas.

69

Segundo Bial (2004), a história do jornal A Noite teria ensinado a Roberto Marinho desde cedo “que existe abandono, traição e que todo cuidado não é suficiente” e isto poderia ainda explicar uma suposta aversão do empreendedor a entrar em sociedades.

4.2.2 A Formação da Rede Globo de Televisão

A empresa foi fundada em 1964, a partir da concessão da operação do canal 4, que possuía

área de alcance limitada ao Estado do Rio de Janeiro. Nesta época, pertenciam ao Roberto

Marinho: um jornal de circulação nacional, fundado em 1925, uma rádio AM fundada em

1944, uma editora fundada em 1950 e outros investimentos de menor peso, fora do ramo da comunicação. Com a emissora de TV, pretendia-se obter “um sistema empresarial integrado a ser visto como um exemplo” (Graell, 1987). A transmissão inaugural da TV Globo ocorreu no dia 26 de abril de 1965.

De acordo com dirigentes desta empresa em sua fase inicial de formação, a emissora de TV contou com a colaboração do grupo norte-americano Time-Life que, do ponto de vista técnico e econômico, foi muito importante para construir os alicerces necessários para o crescimento da Globo. Segundo Bial (2004) a relação da Globo com o capital e a tecnologia norte-americana não só tornou a empresa rentável, como permitiu que a primeira se estruturasse segundo um modelo empresarial multinacional. Sendo assim, a interferência do grupo Time-Life na Globo teria sido “responsável pela mentalidade empresarial da direção da emissora, mentalidade inexistente na época (...) entre as empresas de comunicação”. Segundo

Sousa (s/d), o acordo com a Time-Life foi fundamental por dois motivos: em primeiro lugar e acima de tudo porque significou um fluxo de capital indispensável para a implantação de uma televisão altamente competitiva e, em segundo lugar, o acordo de orientação técnica permitiu

70

à Globo implantar um modelo de televisão comercial semelhante ao modelo americano mais avançado.

Um ponto de vista distinto é apresentado por Borgerth (2003)14:

"a contribuição do Time-Life não passou de um financiamento - sem juros e sem prazo - da escolha de

equipamentos insuficientes e de um totalmente novo, bonito e inadequado projeto arquitetônico que em

nada contribuiu para a TV Globo; (...) Time-Life não sabia nada do Brasil; (...) fracassaram em todos

os lugares onde se meteram em televisão aberta".

Segundo Jorge Adib e Pedro Carvalho, o grupo Time-Life, ao contrário do que muitos pensam, nunca foi bom em TV e não possuía know-how técnico para transferir para a TV

Globo, uma vez que não atuavam no mercado de televisão norte-americano. A importância do grupo Time-Life estaria na disponibilidade de capital, que possibilitou os investimentos em infra-estrutura e na vinda de Joe Wallach, funcionário do grupo Time-Life que implementou na TV Globo, através de sua visão de administração e finanças, uma disciplina financeira pouco comum para os padrões da época.

Em 1965, existiam no Brasil, contando com a TV Globo, 22 estações geradoras e 200 vídeo- difusoras ou retransmissoras, havendo cerca de 300 municípios atingidos pelo sinal de televisão. A audiência nacional era representada por 350 mil domicílios com aparelhos de

TV, sendo que 60% destes permaneciam desligados. Em seus primeiros anos de atuação, a

TV Globo era a última colocada nas pesquisas de audiência na cidade do Rio de Janeiro.

Atrás da TV Tupi (Canal 6), TV Rio (Canal 13) e a TV Excelsior (Canal 2) (Graell, 1987).

14 Luis Eduardo Borgerth foi funcionário da Globo por mais de 30 anos, sendo um dos responsáveis pela criação da área internacional da Globo.

71

A programação da Globo se baseava em telejornais, filmes estrangeiros e “programas de auditório”. Esta estrutura era similar a das outras emissoras e a diferença ficava por conta das telenovelas exibidas pelas concorrentes, que eram produzidas em São Paulo ou compradas de produtoras latino-americanas.

Inicialmente a produção interna da Globo limitava-se a (1) programas de auditório de variedades que contavam com a participação do público, (2) telejornais e (3) programas matinais infantis, à semelhança dos programas de auditório direcionados a adultos. Os demais produtos como filmes, seriados, desenhos animados e variedades eram comprados de produtoras americanas, um modelo que até os dias de hoje ainda é utilizado.

72

4.2.3. As Primeiras Mudanças e o Crescimento da Globo

Como é comum em qualquer empresa de seu setor, o nível do faturamento da Globo estava altamente correlacionado com o desempenho dos seus índices de audiência. Em seu primeiro ano de operação suas receitas eram provenientes de patrocínios, que representavam 50% deste montante e de anúncios veiculados, que respondiam pela outra metade. Sendo assim, aumentar o faturamento implicava necessariamente conquistar maior parcela de telespectadores. Somado a isso, a empresa necessitava gerar divisas para remunerar o grupo americano Time-Life (Bial, 2004; Souza, s/d).

Para atingir estas necessidades, ao final do primeiro ano de operação da emissora, contratou- se uma equipe de profissionais com experiência no setor, seguindo a estratégia de desenvolver a empresa através de investimentos em equipamentos, instalações e pessoal. Na opinião de Jorge Adib, esta visão de longo prazo do empreendedor Roberto Marinho, que durante anos não retirou recursos da emissora e reinvestiu todos os lucros no desenvolvimento da empresa, seria um dos principais fatores que viabilizaram o crescimento deste canal de televisão.

Analistas do setor de telecomunicações consideraram que o incremento nos níveis de audiência da emissora, a partir de 1967, deram-se em conseqüência da atuação de sua nova diretoria (Graell, 1987). Dentre os novos nomes desta diretoria, destacava-se Walter Clark e

Boni, vindos da TV Rio, que atraíram, por meio de salários mais altos que os pagos pela concorrência, técnicos e artistas que consideravam necessários à expansão das atividades da empresa, e incrementaram gradativamente o volume de produção interna.

73

A primeira medida tomada pela nova diretoria foi a eliminação da programação nacional comprada de outras emissoras. A seguir, foi estabelecida uma seqüência de programação no horário nobre (de 20:00h às 22:00h) para competir com o Repórter Esso, jornal televisivo da

TV Tupi. A seqüência utilizada foi: telenovela – telejornal – show – telenovela, todos produzidos pela emissora. Com isso, adotou-se uma estratégia diferente da utilizada pelas emissoras americanas, como a CBS, NBC e ABC, que disputavam a audiência dia a dia e tendiam a apresentar uma programação vertical. Segundo Pedro Carvalho, a nova política da

TV Globo pretendia “horizontalizar a programação” Desta forma, seria possível fidelizar clientes a semana inteira, facilitaria a busca por anunciantes, ao mesmo tempo em que dificultava as ações da concorrência 15. De acordo com Graell (1987), esta estratégia criou um hábito nos telespectadores, que depois se transformou em um trunfo poderosíssimo para a TV

Globo.

Desde o início de suas atividades, a empresa buscara, sucessivamente, ampliar seu raio de atuação, de local para regional, para nacional e finalmente para internacional. Assim, em

1967 a empresa passa a atuar em São Paulo, em 1968 em Belo Horizonte, em 1969 inicia suas transmissões de um telejornal a nível nacional e, em 1976, após sucessivas ampliações de seu raio de ação, transforma-se em uma rede de televisão com cobertura nacional.(Rocha e

Graell, 1987) 16

Pode-se afirmar, então, que o processo de expansão da cobertura do sinal da emissora se deu devido a investimentos diretos e aquisição de novas emissoras, mas, principalmente, através

15 Segundo Jorge Adib esta idéia de utilizar uma grade horizontal não foi uma invenção da Globo. Ela já era utilizada na Argentina e foi utilizada por Edson Leite na extinta TV Excelsior. Sendo assim, parte do mérito está na idéia, mas outra parte importante está na forma como foi executada. 16 Estes dados diferem parcialmente dos apresentados por Lopes (2002), p.29: “Paralelamente, tratou de ampliar sua cobertura mediante a compra do Canal 5 (antiga TV Paulista) em São Paulo em 1966, do Canal 12 de Belo Horizonte em 1967, do Canal 10 de Brasília em 1971 e do Canal 13 de Recife no ano seguinte.”

74

do aumento do número de emissoras afiliadas. Através destas parcerias a Rede Globo conseguiu ampliar o seu raio de ação de regional para nacional em pouco mais de dez anos de existência.

4.2.4 – As Telenovelas na Globo

Desde a experiência bem sucedida alcançada pela TV Tupi, em 1964, a apresentação de telenovelas passou a fazer parte da estratégia competitiva das emissoras de televisão, tendo sua produção concentrada em São Paulo. No Rio de Janeiro, apenas a TV Globo apresentava produção própria regular, tendo produzido sua primeira telenovela em 1966 (Graell, 1987).

A telenovela compõe-se, basicamente, de uma história desenvolvida em capítulos, apresentada de segunda-feira a sábado, em horário específico. Normalmente, apela para o suspense ao final de cada capítulo, de modo a atrair o telespectador para o capítulo seguinte, criando assim um vínculo com a audiência. Historicamente as telenovelas são os programas que geram os maiores índices de audiência para a emissora, sendo ainda maiores na medida em que o final da trama se aproxima (Graell, 1987).

Outra característica da telenovela é que funciona com a interferência do público no desenrolar da história, da mesma forma como acontecia com os folhetins de jornais e rádio. Além disso, a telenovela é divida em vários núcleos, que vão sendo ativados à medida que o autor percebe o potencial de cada um e a resposta da audiência, permitindo o desenvolvimento de uma história de acordo com os anseios do público, ou pelo menos, da sua maior parte.

75

De acordo com estudo de Oguri (2004) sobre a influência do consumidor na produção de telenovelas, as empresas de televisão utilizam pesquisas diárias para auxiliar o desenvolvimento deste produto. Através destas informações fornecidas sobre os hábitos do consumidor, de forma contínua, a empresa gerenciaria estes dados permitindo que o consumidor influenciasse periodicamente o andamento da novela. Segundo o autor, essa dinâmica forneceria um exemplo raro de uso das informações sobre o consumidor,

“possibilitando o gerenciamento e aperfeiçoamento contínuo do produto e a manutenção constante da satisfação do cliente; prática que vem ao encontro do conceito de marketing ou orientação para o cliente.” (Oguri, 2004, p. 4))17

Sendo assim, a decisão de produzir o seu próprio conteúdo, tomada pela diretoria da Rede

Globo em 1966, somada às características do produto telenovelas, incentivaram a Globo a basear sua estratégia de aumento de market share na utilização deste produto. Os resultados obtidos em poucos anos com essa estratégia ressaltam a importância deste produto na conquista e liderança absoluta no mercado interno (Graell, 1987).

Esta contribuição, porém, não se restringiu a levar a emissora ao posto de líder de audiência, mas foi também determinante em sua internacionalização. Segundo entrevistas com executivos da empresa, conduzidas por Graell (1987), o grande motivador das exportações foi o domínio de um gênero próprio, a telenovela, que possuía boa aceitação interna, mercado potencial no exterior e que tinha como vantagem a formação de hábito no telespectador: “A rede admitia não ter lucros expressivos na fase inicial da internacionalização, dando prioridade à consolidação da presença de seus produtos no mercado externo.” (Graell, 1987, p.91)

17 Segundo Pedro Carvalho, “o ideal é que a tela de TV seja como um espelho”, uma amostra da cultura e dos cidadãos brasileiros.

76

Segundo estes executivos, a estratégia utilizada baseou-se na formação do hábito da audiência, a partir da venda do produto no mercado a preços muito baixos. Após o sucesso comprovado, era possível negociar melhores preços.

“Para entrar e ganhar este mercado tivemos de enfrentar a Televisa [televisão mexicana], que produz 26

horas diárias de programas em espanhol de nível bem menos elaborado que os nossos. Ainda assim,

conseguimos vender nossos programas, mesmo novelas, sobretudo – adicionando os custos de

dublagem – 50% abaixo dos preços da Televisa. Como? Usando o que chamei de “estratégia da droga”:

você praticamente dá, espera o sucesso e depois vende pelo melhor preço”.18

De acordo com Oguri (2004) a história das telenovelas se confunde com o próprio crescimento da Rede Globo de Televisão. Ao longo do tempo os programas de teledramaturgias foram, cada vez mais, administrados como um produto industrial e seus aspectos comerciais como: segmentação do público, temáticas, duração, gêneros e horários começaram a ser tratados com maior rigor. A autora complementa dizendo que com uma organização específica do gênero e com a evolução crescente no seu planejamento, a telenovela passou a ser “o programa principal dentro da grade de programação da empresa”

(p.120).

Segundo os executivos da TV Globo, a utilização de diferentes horários para apresentar gêneros de novelas distintos permitia desenvolver um produto ainda mais segmentado, que além de ampliar o poder de alcance do produto, permitia que a emissora estivesse melhor posicionada em momentos de mudança do gosto do público. Segundo Jorge Adib, as emissoras norte-americanas também costumam manter diferentes gêneros na grade de programação, pois nunca se sabe “quando um desses gêneros vai explodir”.

18 Entrevista com a responsável pela divisão internacional da TV Globo – Arquivos da empresa, doc. n.o 13934, em Grael e Rocha (1987) p. 143

77

Um aspecto interessante ressaltado por Grael (1987) é que apesar das novelas serem reaproveitadas da programação local, ou seja, não produzidas especialmente para um determinado público alvo no exterior, como ocorre com a produção feita para o mercado interno, a telenovela conseguiria bons índices de audiência por representar “uma amostra da cultura brasileira, atual ou histórica, que despertaria interesse no telespectador de outros países” (p.92).

4.3. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA GLOBO

4.3.1. Os Primeiros Passos

Na literatura, existe uma discordância quanto aos primeiros passos de internacionalização da

Globo e às suas reais motivações. Segundo Graell (1987), a venda da novela “Gabriela”, em

1976 para a Radio Televisão Portuguesa (RTP)19 teria marcado a primeira exportação de conteúdo feita pela emissora. Este primeiro passo teria sido motivado por uma oportunidade de venda para Portugal, onde a Globo não necessitaria fazer qualquer adaptação no produto ou criar na empresa uma estrutura específica para a exportação. Esta exportação não teria fins comerciais (devido ao seu baixo faturamento), mas divulgaria a cultura brasileira no exterior e, principalmente, geraria status para a emissora. Com o sucesso alcançado logo no primeiro ano, a diretoria da Globo teria criado, em 1977, o departamento internacional de forma a iniciar suas exportações para a América Latina com a novela “O Bem Amado”, de Dias

Gomes, como indicado pela autora:

19 De acordo com Cunha (s/d) o lançamento do primeiro capítulo da telenovela Gabriela, Cravo e Canela se dá no dia 16 de Maio de 1977.

78

“Sem qualquer adaptação no produto e sem ter sido criada na empresa uma estrutura específica para a

exportação, foi vendida, em 1976, primeira novela da Globo para a Rádio e Televisão Portuguesa

[RTP]” (Graell, 1987, p. 97)

“O sucesso das telenovelas em Portugal teve ampla repercursão em outros países europeus, abrindo

espaço para a ampliação das atividades da empresa no mercado internacional. Serviu, também, como

estímulo para a diretoria da Globo considerar com maior atenção suas exportações, transformando-as

“de um negócio quase que semi-amador para uma atividade realmente profissional”. O propósito das

exportações não seria comercial, segundo declarações do vice-presidente da empresa, Roberto Irineu

Marinho, “pois o faturamento é ridículo”. Serviria, no entanto, para divulgar no exterior a cultura

brasileira. (Veja, 26.12.79 apud Graell, 1987, p. 98-99)

De acordo com fontes recentes da própria Globo20, porém, a primeira venda de conteúdo da emissora já teria ocorrido em 1973, quando foi exportada para o Uruguai a novela “O Bem

Amado” (a primeira novela a cores da TV brasileira). Segundo Pessoa e Lopes (2003), o processo de internacionalização partira da percepção de que as telenovelas possuíam um razoável potencial de venda, especialmente na América Latina e em Portugal e, portanto, fora criada uma área especialmente para cuidar dessa tarefa, em 1973, denominada Divisão de

Vendas Internacionais (DVI). Nesta versão, o processo teria sido mais planejado e menos oportunista, mostrando um maior nível de comprometimento com o processo de internacionalização da empresa desde o seu princípio.

Uma terceira versão é apresentada por Brittos e Bolaño (2005):

“Na Globo, o processo de internacionalização começou em 1970, com a exportação dos direitos de

exibição da telenovela Véu de Noiva. (...) Já em 1972, Irmãos Coragem foi vendida à emissora de Nova

York voltada para o público porto-riquenho, bem como para países da América Latina. No ano em que

20 Dentre elas, pode-se citar o documento: “This is our Mission”; Pessoa e Lopes (2003); GLOBO - INFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS

79

a Globo criou uma estrutura própria para a comercialização internacional – 1976 – a telenovela O bem-

amado foi exportada para 17 países latino-americanos. Esse programa constituiu-se no primeiro [...] da

Rede Globo a obter expressiva receptividade no exterior. Em 1977, a novela Gabriela foi adquirida

pela RTP (Radiotelevisão Portuguesa), e, a partir daí, pelos países africanos de língua portuguesa. Logo

depois de Portugal, as exportações se orientaram para os países de língua espanhola da América

Latina.” (p.135-136)

Não há discordância, porém, de que, nesta primeira fase, a atuação era marcadamente passiva e pouco agressiva, refletindo o fato de que os negócios internacionais da TV Globo ocupavam um lugar secundário na estratégia empresarial mais ampla da empresa (Pessoa e

Lopes, 2003; Graell, 1987).

O sucesso e o reconhecimento alcançado por suas telenovelas no exterior, particularmente em

Portugal, incentivaram a Globo a preparar-se para a expansão no mercado europeu. Segundo

Graell (1987), em junho de 1980 foi criada no Rio de Janeiro a Divisão Internacional, que seria responsável pelo processo de dublagem e distribuição das novelas para o mercado externo. Apresentando-se como “Globo TV Network of Brasil”, tinha como endereços para contatos:

- Rio de Janeiro (Divisão Internacional): responsável pelas vendas para Portugal e América

Latina;

- Nova Iorque: responsável pelas vendas para EUA e Canadá e;

- Roma: responsável pelas vendas para Europa, Ásia, África e Oceania. (Graell, 1987)

Após a emissora percorrer um processo de expansão geográfica dentro do país, Graell e

Rocha (1987) afirmaram que:

80

“na década de 1970, a Rede Globo havia concluído a conquista do mercado brasileiro, onde gozava da

mais indiscutível liderança. No plano internacional, as pesquisas a classificavam entre as cinco maiores

redes do mundo, após as três líderes americanas (ABC, NBC e CBS) e a Japonesa NHK. Naquele

momento, a empresa iniciou suas atividades internacionais, exportando suas telenovelas para outros

mercados. A direção via na atividade internacional uma fonte de prestígio e de receita. A telenovela,

como desenvolvida pela Globo, era um produto diferenciado daqueles existentes em outros mercados,

um produto em que a empresa atingira um grau de excelência incomum para os padrões

internacionais.”

Esta afirmativa ressalta a importância das telenovelas no processo inicial de internacionalização da empresa, tanto por ser o primeiro produto a ser exportado pela empresa, abrindo o caminho para as próximas medidas de expansão de seu mercado, quanto pelo padrão de qualidade deste produto, que permitia a concorrência com players internacionais.

4.3.2 – Investimentos Diretos no Exterior

Em 1985 a emissora possuía índices de participação no mercado nacional em torno de 75% e já estava subdividindo as áreas de influência de suas filiadas, através do recurso técnico de corte de sinal. Com isso, era possível alcançar as camadas de anunciantes locais, que antes não estariam dispostos a pagar por uma cobertura que extrapolasse sua área de atuação empresarial. Sendo assim, pode-se notar que as últimas alternativas de expansão já estavam sendo exploradas (Graell, 1987).

81

Por outro lado, os ótimos resultados de audiência alcançados por suas novelas no mercado estrangeiro, principalmente em Portugal e Itália, mostravam que este mercado, além de ótima aceitação, apresentava ainda bastante espaço para crescimento.

Além disso, nesta época, os efeitos da globalização e do possível desaparecimento das fronteiras nacionais começavam a dar sinais de que a internacionalização era um caminho sem volta. Para sobreviver no longo prazo, a empresa seria obrigada a se colocar na primeira linha entre as redes de televisão internacionais até mesmo para manter sua competitividade no mercado interno.

Justamente nessa época, analistas do setor identificavam, no mercado europeu, um movimento em direção à privatização dos Sistemas Televisivos. Percebendo essa nova oportunidade, a Globo se preparou para estar presente no mercado externo quando as privatizações ocorressem, tendo como objetivo se tornar sócia de empresas locais.

Compra da Telemontecarlo - 1985

Em setembro de 1985, a Globo recebeu, do Conselho de Administração da RAI (Rádio e

Televisão Italiana), permissão para comprar 90% das ações da TV Internacional –

Telemontecarlo, sediada em Montecarlo, com filial italiana em Milão, e sinal abrangendo, além do Principado, parte da França e da Itália. Para que a emissora se transformasse em uma cadeia nacional, foram necessários investimentos adicionais, fazendo com que o investimento total nessa empreitada alcançasse valor superior a US$17 milhões. A compra da

Telemontecarlo representou, então, a consolidação da estratégia de penetração da empresa no mercado europeu, mas sabia-se que seria difícil manter um investimento desta ordem sem a

82

participação de um investidor local (Graell, 1987). Segundo entrevista concedida por Roberto

Irineu a Bial (2004), esta compra seria a realização do sonho de montar uma emissora na terra de seus antepassados, iniciando o processo de internacionalização da TV Globo.

De acordo com Pedro Carvalho e Jorge Adib, no momento da compra da Telemontecarlo, uma série de fatores indicavam que a entrada no mercado italiano era uma ótima oportunidade para a TV Globo:

- A Rette Quatro era a mais expressiva compradora internacional das novelas da Globo (em termos de receitas), e o sucesso alcançado na Itália sugeria que o público italiano havia aderido ao hábito de consumo deste produto.

- A RAI, o player estatal que possuía know-how na área de televisão italiana, seria sócia da emissora e entraria com 10% do capital.

- A legislação Italiana impedia que se formasse uma emissora de televisão em rede, atingindo a todos os pontos da Itália ao mesmo tempo. Como a Telemontecarlo ficava no principado de

Montecarlo, não estava sujeita a esta legislação, podendo ser a única emissora presente em todo o território italiano.

Segundo Pedro Carvalho e Jorge Adib, porém, dois grandes problemas, atrapalharam os resultados alcançados pelo Projeto Telemontecarlo. O primeiro deles residia em um fator interno, que foi o fato de se acreditar que, para agradar o público italiano, seria necessário apenas copiar o que se fazia Brasil. Segundo Pedro Carvalho e Jorge Adib, faltou adaptação para se adequar o conteúdo da emissora ao mercado italiano.

O segundo problema estava associado a um fator externo: a concorrência. Antes do início das atividades da Globo a frente das operações da Telemontecarlo, Sílvio Berlusconni comprou a

83

emissora Rette Quatro, a maior compradoras de telenovelas da Globo no mundo. Ao perceber a força que a TV Globo teria ao transformar-se em uma concorrente e aos problemas que seriam enfrentados quando a TV Globo deixasse de ser uma fornecedora de conteúdo para a

Rette Quatro e se transformasse em uma concorrente, Sílvio Berlusconni optou por adotar uma postura ofensiva para proteger o market share de sua emissora. Sendo assim, ao assumir a emissora (antes da entrada da Globo no mercado italiano), Berlusconni banalizou as telenovelas, comprando de várias outras produtoras como Televisa. Desta forma, além de garantir novos fornecedores de conteúdo, enfraquecia a força das novelas da Globo. Ao colocar novelas em muitos horários, além de fazer com que o público perdesse parte do interesse pelo gênero, passou a ter a opção de colocar as novelas da Globo em horários piores. De acordo com os executivos, houve vezes em que chegou-se a repetir ou pular capítulos, o que tirava um dos maiores trunfos das telenovelas: a criação do hábito. Desta forma, Berlusconni conseguiu enfraquecer o maior produto da Globo antes mesmo do Projeto

Montecarlo entrar em operação. Além disso, Berlusconni aproveitou todo seu poder político e a legislação Italiana para tentar, por todos os meios complicar e conter os avanços da

Telemontecarlo.

Apesar desta primeira experiência não ter sido bem sucedida, não impediu que a empresa continuasse o seu movimento de expansão para o mercado europeu. De acordo com Pessoa e

Lopes (2002) este episódio serviu para consolidar internamente o entendimento de que estratégias com maiores chances de sucesso no exterior seriam aquelas que promovessem associações com empresas locais. Já Sousa (s/d), afirmou que o resultado obtido neste primeiro investimento na Europa motivou Roberto Irineu a buscar outra forma de provar que a Globo poderia investir em território europeu com sucesso.

84

Compra de participação na Sociedade Independente de Comunicação (SIC) - 1992

De acordo com Sousa (s/d), a abertura do mercado português de televisão deu à Globo a oportunidade de conseguir uma posição de força num novo espaço. Sendo assim, após a aprovação da Lei de Televisão nº58/90, a Globo se associou a um dos candidatos aos dois canais de televisão disponibilizados pelo Governo: a Sociedade Independente de

Comunicação (SIC), liderada por Francisco Pinto Balsemão.

A partir desta lei, o governo português organizou um concurso público, de modo que os concorrentes entregassem suas propostas em 1991, mais especificamente na segunda-feira imediatamente após a Páscoa de 1991. Antes disso, então, era necessário organizar o consórcio, estabelecendo as participações acionárias de cada uma das partes, e elaborar a proposta propriamente dita, cumprindo com as exigências técnicas e legais.

Francisco Balsemão já atuava no mercado de “videocassetes”, ou seja, comprando direitos de filmes para vender fitas de videocassetes em Portugal. Através dessas operações passou a freqüentar feiras de conteúdo e estabeleceu relacionamentos com fornecedores de produtos de

ótima qualidade como a Fox, Paramount e Warner. Mas, apesar deste negócio ter alguma afinidade com o da gestão de uma emissora de TV, Balsemão afirmou que “de televisão ninguém tinha experiência em Portugal, a não ser a RTP.” Sendo assim, acreditava que uma parceria com uma empresa do Brasil, onde a televisão privada estava muito mais desenvolvida, seria um componente muito importante para o sucesso do consórcio: “Quer em matéria de programação, quer em matéria de organização da empresa toda: a parte de publicidade e vendas, toda a parte de departamento comercial, marketing, qualidade técnica

(...) o know-how de uma forma geral.”

85

Francisco Balsemão explicou que os entendimentos desta parceria com a Globo vinham desde 199021 e que, antes de falar em termos de proposta de negócio com a Globo, chegou a conversar com outras empresas brasileiras de televisão.

Segundo Souza (s/d), investir em um mercado de reduzida dimensão, como o mercado televisivo português, era inevitavelmente arriscado para a Globo. A taxa de televisão tinha sido abolida e quatro canais preparavam-se para dividir entre si um pequeno bolo publicitário.

Por outro lado, o sucesso das telenovelas em Portugal garantia que o conteúdo da Globo seria altamente desejado pelos novos operadores, independentemente dos grupos que assumissem os canais.

De acordo com o Diretor de Marketing da SIC, Hugo Correia Pires22, a relação pessoal entre

Francisco Balsemão e Roberto Marinho teria sido um fator determinante na decisão de a

Globo investir na SIC. As afinidades (como suas carreiras de jornalistas que trabalharam em jornais, envolvidos em estratégias multimídia e que, por coincidência, fizeram a sua primeira experiência em televisão quando atingiram a meia idade) seriam fatores que facilitaram o trabalho de Balsemão.

Segundo Francisco Balsemão, presidente da SIC23, apesar desta suposição das afinidades fazer algum sentido, a posição de Roberto Irineu Marinho seria o fator essencial para incluir a

Globo entre os sócios da SIC e formar um dos três consórcios que disputariam a concessão de duas emissoras de TV portuguesas.

21 Francisco Balsemão conheceu Roberto Marinho, em 1986, quando o Dr. Roberto ganhou o prêmio príncipe das Astúrias da Comunicação. 22 Entrevista: 26 de Maio de 1997, citada em Sousa (s/d) 23 Entrevista conduzida em 23/12/2005.

86

“O Dr. Roberto Marinho pai tinha alguma relutância porque as coisas na Itália correram mal, mas o Dr.

Roberto Irineu era grande defensor deste investimento aqui. Eu nunca me esqueço do papel que ele

teve neste processo”.

Pode-se somar aos fatos acima mencionados os argumentos exposto por Pedro Carvalho para justificar a sociedade com a SIC: (1) a Globo tinha a decisão estratégica de se internacionalizar; (2) Portugal foi um dos últimos países europeus a abrir o seu mercado, sendo assim, era também uma das últimas oportunidades de privatização no mercado europeu; (3) as novelas que iam para Portugal não precisavam ser dubladas ou adaptadas, devido a proximidade cultural dos países e (4) o sucesso consolidado das telenovelas da

Globo no mercado português indicavam que o produto ainda teria bastante aceitação.

Sendo assim, apesar da relutância do Roberto Marinho, Roberto Irineu se comprometeu a entrar no consórcio para disputar a concessão. Foi baseado em uma carta de intenções de

Roberto Irineu Marinho que Francisco Balsemão organizou a participação estrangeira no consórcio, que no caso da Globo, por não ser européia, estava por lei limitada a 15% do total do capital. Esta mesma legislação, limitava a participação de empresas européias (e portuguesas também) a 25% do capital, sendo assim, Francisco Balsemão possuía apenas

25% das ações, estando os outros 60% divididos entre outros sócios.

Juntos, Francisco Balsemão e Globo, possuíam apenas 40% das ações da SIC, mas foi assinado um acordo para-social entre todos os acionistas delegando poderes a Francisco

Balsemão, líder do consórcio, e à Globo, devido ao seu know-how no assunto, para definirem os rumos que a empresa tomaria. Neste documento os outros investidores concediam bastante poder a Balsemão, caso o consórcio ganhasse e concediam à Globo , poder de veto sobre alguns aspectos.

87

Havia três concorrentes disputando por duas licenças e o projeto SIC foi um dos escolhidos.

O anúncio oficial da licença foi divulgado no dia 6 de fevereiro de 1992 e a SIC foi ao ar no dia 6 de outubro de 1992. Desde este momento a Globo manteve sempre um membro no conselho de administração da SIC 24.

Segundo Souza (s/d) a Globo, então, adquiriu 15% das ações da SIC, que possuíam valor de cerca de US$34 milhões. De acordo com Pedro Carvalho, esta aquisição da SIC não foi apenas através de um investimento direto de recursos financeiros, mas também através do fornecimento de programação (telenovelas principalmente) e serviços em um acordo de longo prazo.

Ao longo dos anos seguintes a parceria manteve-se firme e a compra de produtos Globo aumentou. Além disso, foi feito um acordo com a gravadora Som Livre (que também pertencia às Organizações Globo), em que era dada participação nos lucros à SIC em troca da promoção de seus discos em Portugal. Segundo Balsemão, tratava-se um acordo estabelecido praticamente desde que a SIC existia.

Segundo Pessoa e Lopes (2002), o acordo firmado entre as emissoras transformou Portugal no principal mercado de destino dos produtos da emissora, posição que se manteve razoavelmente inalterada até o início dos anos 2000. Francisco Balsemão corroborou este fato, afirmando que a SIC era, de longe, o maior cliente internacional da Globo e que os contratos de compra de conteúdo tinham prazo até 2009.

24 Inicialmente Pedro de Carvalho, de 1992 a 2000, e posteriormente Ricardo Scalamandré, de 2000 até 2003.

88

A Importância da Globo

De acordo com Francisco Balsemão, a ajuda da Globo foi muito relevante, mesmo na fase anterior ao leilão, quando profissionais dos quadros da Globo foram a Portugal analisar aspectos técnicos e acabaram por avalizar o projeto, o que gerava conforto para os membros do consórcio. A Globo prestou suporte na parte técnica, na elaboração da grade de programação, na organização do departamento comercial, enfim, as práticas da emissora brasileira serviram de exemplo a ser seguido, tornando-se necessário adaptar certas práticas ao contexto português.

“Nós tivemos realmente ai uma boa ajuda (...) o próprio logotipo foi o Hans Donner quem concebeu,

mesmo a confusão inicial da grade de programação, sobre a qual havia várias teses (...). Em uma ida ao

Brasil, eu tive uma conversa grande com o Boni, na altura a pessoa que mandava nessa parte da

programação na Globo, foi realmente essencial.”25

Segundo Pedro Carvalho, apesar de a Globo ter direito a veto em alguns aspectos, a relação com o resto do Conselho sempre fluiu bem e nunca foi necessário exercer esse direito. Após a lição da Telemontecarlo, a TV Globo procurou se utilizar de seu know-how para ajudar a adaptar a SIC ao público português, mas sem impor a sua opinião.

“A relação entre Globo e SIC foi a de um processo de aprendizagem. Nada era imposto. Foi uma

passagem de know-how não-compulsória. Sendo assim, a programação ficava por conta dos

portugueses. Mas eles respeitavam bastante nossa posição, por termos o know-how. A Globo não

impunha as suas crenças. Na verdade, houve vezes onde a SIC tomou atitudes contra o que a Globo

acreditava ser o certo. Mas algumas vezes é necessário que as pessoas aprendam com seus próprios

erros. Por exemplo, apesar de falarmos várias vezes para uma criança não colocar o dedo na tomada,

muitas vezes ela só aprende depois de tomar um choque. (...) Não queríamos repetir o erro da

Telemontecarlo, onde se tentou fazer a TV Globo na Itália. No caso da SIC procurou-se somar o

25 Entrevista com Balsemão

89

conhecimento da SIC sobre o público português com o know-how de TV da Globo para adequar o canal

ao gosto do público português.”

As Telenovelas na SIC

Curiosamente, no início da existência da SIC, o fator “telenovelas” não foi tão decisivo para o sucesso da emissora. Segundo Balsemão, no início a Globo continuava a “jogar em dois carrinhos”, pois vendia suas novelas para a SIC, mas não deixou de vender também para a

RTP, que era uma concorrente direta no mercado português.

“Houve uma ajuda, é claro, da programação da Globo, mas o exclusivo, não tínhamos. Só passamos a

ter a exclusividade em 1995, quando já estávamos à frente nas audiências.”

Sendo assim, o papel das telenovelas foi relevante, pois era um produto com bastante aceitação no mercado português, mas não tão importante quanto passou a ser, após o acordo de exclusividade do produto. Em 2005, a SIC possuia, além do seu canal em rede aberta, uma série de canais temáticos em TV Paga, entre os quais SIC Internacional, SIC Notícias, SIC

Radical e a SIC Mulher. Na SIC Internacional, por exemplo, que era exibida para outros países, não se podia utilizar o conteúdo Globo, pois a compra dos direitos se restringia a

Portugal. Quando questionado sobre a utilização de novelas de outras origens que não as produzidas pela Globo, Balsemão respondeu que isso já havia ocorrido (como no caso da

“Chica da Silva” há alguns anos), mas que era uma exceção. Sendo assim, a utilização de telenovelas da Globo durante muitos anos foi uma forma segura de manter o sucesso de audiência no horário nobre português.

Nos últimos anos, porém, a indiscutível liderança da SIC foi abalada com o lançamento dos reality shows e das novelas portuguesas produzidas pela TVI, uma emissora concorrente que

90

atuava no mercado televisivo português. Segundo Balsemão em 2000/2001, com o Big

Brother 1, a TVI conseguiu superar a SIC em audiência, mas mal este boom passou, perderam esta colocação. Este tipo de programa, porém, continuou a ser utilizado pela concorrência, conseguindo manter níveis de audiência representativos, o que acirrou a competição entre as emissoras e passou a ser um trunfo da TVI.

O segundo trunfo da TVI foi o desenvolvimento da teledramaturgia portuguesa. Há alguns anos a emissora procurava acertar o formato para competir com as novelas da Globo, mas havia acumulado uma série de fracassos. Com o aparecimento de “Morangos com Açúcar”, um seriado para adolescentes portugueses, pela primeira vez uma novela da TVI superou a audiência do conteúdo da Globo. Como resultado, a SIC teve de mudar o programa que competia com esta novela. Trocou o programa “Malhação” por uma outra novela da Globo

(“Alma Gêmea”). Este programa “Morangos com Açúcar”, porém, se transformou em um sucesso entre adolescentes, e possuía a vantagem de ser um seriado sem previsão para terminar, diferentemente de uma novela.

Apesar disso, até abril de 2005 a SIC liderava a audiência do horário nobre com as novelas

” e a “”, ganhando das novelas portuguesas da TVI.

Mas, com o surgimento da novela “Ninguém como Tu” a TVI conseguiu modificar este quadro. De acordo com Balsemão:

“Realmente a TVI conseguiu construir novelas portuguesas que rivalizara m muito com as novelas

brasileiras neste ano... mas também depende daquilo que a Globo faz... por exemplo, em 2005 até abril

nós liderávamos porque as novelas da Globo eram a “Senhora do Destino” e havia a “Como uma

Onda”, que ganhavam as novelas portuguesas da TVI. Depois a TVI fez uma novela muito boa, que

acabou agora, que é a “Ninguém como Tu” e essa passou pra frente na audiência. E quando uma novela

é boa, arrasta a segunda, e foi isso que aconteceu. A TVI passou a frente nas audiências em Portugal

91

por causa das novelas. (...) Neste ano de 2005 a TVI vai ganhar porque a partir de abril teve esta novela

“Ninguém como Tu”, mas esta novela acabou agora.”

“É claro que quando uma novela mostra situações mais portuguesas, a história, as paisagens, os

monumentos e cidades que as pessoas conhecem, há uma relação de proximidade que tem vantagens.

(...) Não acho que seja uma tendência, que o país esteja demandando uma novela feita para ele. Poderia

até ser, mas em todo caso, estatisticamente neste ano, nos primeiros três primeiros meses isso não

aconteceu. E portanto é uma estatística recente. (...) Como digo, neste ano mesmo, nos três primeiros

meses a novela brasileira, apesar das vantagens aparentes da novela portuguesa, levou vantagem. Eu

acho que as novelas da Globo têm enorme qualidade, mas não podem ser todas fantásticas, não é?

Quem me dera que fossem, mas há umas piores e outras melhores.(...) Enfim, nós continuamos a

apostar claramente no produto Globo.”

Apesar desta aposta no produto Globo, a idéia de investir em produções locais era uma realidade para SIC, fosse por meio de parcerias com a Globo, como no caso da mini-série “Os

Maias” ou por meio de produções próprias da SIC. Segundo Balsemão, as poucas tentativas de lançar produções próprias não tiveram um bom desempenho. No ano de 2006, porém, a

SIC havia decidido apostar na produção de uma ficção portuguesa, como uma das armas para se opor às produções locais de sua concorrente.

Venda da Telemontecarlo - 1994

Em 1994, pouco após a compra de participação acionária na SIC, a Globo vendeu a

Telemontecarlo, realizando um prejuízo de centenas de milhões de dólares (Bial, 2004).

Segundo Brittos e Bolaño (2005), desde 1987 a Globo começou a articular parceiros, no entanto, “a venda integral só foi concretizada em 1994, quando, após acumular um prejuízo de cerca de 50 milhões de dólares, a rede foi vendida ao grupo Ferruzzi, que já integrava o empreendimento.” (p.142)

92

De acordo com os pontos destacados por Jorge Adib, Pedro Carvalho e outras pesquisas anteriores disponíveis na literatura, este resultado pôde ser atribuído a uma série de razões:

- Tratava-se de uma operação extremamente mais complexa do que a venda strictu

sensu de produtos para terceiros, com a qual a TV Globo estava habituada.

- O mercado no qual passou a atuar apresentava forte concorrência de emissoras locais,

capazes de operar com inúmeras vantagens devido à experiência e conhecimento

acumulados sobre gostos, hábitos e costumes do público telespectador do seu

território de atuação. Para poder competir nesse ambiente a Globo não poderia

simplesmente replicar o que fazia no Brasil, mas teria de se adaptar ao novo ambiente

e customizar o seu conteúdo para este público.

- A concorrência agressiva de Sílvio Berlusconi, empresário de forte influência política

na Itália26 que enfraqueceu o produto “carro-chefe” da Globo após assumir o controle

da Rette Quatro.

- A recessão econômica na Europa e a queda da lira em relação ao dólar, o que teria

ampliado os prejuízos acumulados. (Souza, s/d)

Além disso, Roberto Irineu teria dado como justificativa para o insucesso atitudes antiéticas enfrentadas no mercado italiano:

“O papai tinha um faro excepcional. Eu acho que a pessoa de maior faro que eu já vi na minha vida.

Quando nós fomos fazer a Telemontecarlo, ele foi conversar com um camarada do Partido Democrata-

Cristão. ...Após a reunião ele disse: ‘Vamos embora. Isso aqui não é confiável, isso aqui não tem jogo

aberto.’ Ele tinha toda razão. ...A primeira sensação dele foi absolutamente perfeita. Na primeira

oportunidade fomos traídos.” (Bial, 2004, p.324)

26 Berlusconni se transformaria no primeiro ministro da Itália, em 1994.

93

No caso da Telemontecarlo, porém, mesmo após estas percepções iniciais, Roberto Marinho acabou cedendo à argumentação do filho Roberto Irineu, que mostrou os aspectos positivos e oportunidades do negócio e tocou, junto com outros colaboradores, o projeto Montecarlo.

(Bial, 2004)

Após esta experiência e com a venda da Telemontecarlo, a estratégia internacional da TV

Globo voltou a se concentrar na comercialização de produtos.

Foco no Conteúdo

De acordo com executivos da empresa, continuar apostando nas telenovelas parecia ser a estratégia mais acertada para obter retorno com baixos investimentos adicionais. A teledramaturgia despertava o interesse de parceiros internacionais, como SIC, Telemundo e

Rettequatro, que buscavam exclusividade na programação e co-produção de tramas brasileiras. Apenas para citar como exemplo, em 2004, 52 novelas seguiram para 70 países.

Ao todo foram mais de 23 mil horas de programação comercializadas.27

Em 2005 a TV Globo era uma das maiores produtoras de conteúdo mundial, produzindo mais de 5000 horas/ano de conteúdo como novelas, mini-séries, noticiários, esportes e programas infantis. Aproximadamente, 76% da programação exibida era de produção própria, incluindo praticamente 100% da programação exibida no horário-nobre (18:00h a 00:00h). A maior parte da produção deste material foi feita nos estúdios do Projac ou em São Paulo.

27 GLOBO - INFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS (http://redeglobo3.globo.com/institucional/) – consultada dia 9/05/2005

94

Investimentos em capacidade de produção: Projeto Jacarepaguá (PROJAC) - 1995

O Projac foi idealizado em 1989, para centralizar e baratear a produção de conteúdo da

Globo, reduzindo custos com aluguel de outros estúdios da cidade e representou um investimento de US$200 milhões. Esta estrutura foi projetada para atender sob medida as demandas da emissora. Sua inauguração se deu em 2 de outubro de 1995 e, em pouco mais de

5 anos, o Projac passou a ser considerado o maior complexo de TV da América Latina

(Lopes, 2002). Além do Projac, a empresa possuía outras instalações e estúdios em São

Paulo.

Este investimento mostra a importância dada à produção de conteúdo, especialmente às telenovelas, e a filosofia de manter investimentos contínuos em dramaturgia de elevada qualidade para assegurar a posição de liderança no mercado de televisão.

4.4. UMA NOVA ETAPA NO PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO

4.4.1 – Período de Mudanças Estruturais

Em 1996, as Organizações Globo passaram por um processo de reestruturação. Segundo o alto escalão da companhia, a firma havia se diversificado sem foco nos anos anteriores, e a nova estratégia traçada deveria centrar as atividades no chamado “core business” da

Organização: o setor de Mídia, Comunicações e Entretenimento (MCE). Os negócios não contidos nesse grupo, tais como hotéis e shoppings centers seriam vendidos. Por outro lado, novos investimentos que demandassem muitos recursos e fossem de longa maturação, seriam adiados. (Bethlem, s/d)

95

O diferencial competitivo das Organizações Globo estaria exatamente na qualidade do conteúdo que produzia, fosse na TV, no jornal, em revistas ou na rádio. A distribuição deste conteúdo era um negócio que interessava, por isso a empresa operava na área de TV a cabo e resolveu investir em telecomunicações, embora não fosse o foco central de sua estratégia.

Vários estudos mostraram que empresas geradoras de conteúdo estariam muito bem caso continuassem apenas nesse negócio. Sendo assim, a produção de novelas, séries e programas de televisão continuaria sendo o carro-chefe da TV Globo e, ao contrário do que o mercado vinha especulando, a Rede Globo não pensava em terceirizar a sua produção. (Bethlem, s/d)

Esta reestruturação não foi apenas estratégica. Contou ainda com o enxugamento do número de funcionários, redução de custos e mudanças no corpo executivo. Três diretores-gerais se tornaram responsáveis pela área executiva, promovendo uma profissionalização da gestão da empresa, que antes era fortemente marcada pela presença de membros da família Marinho.

Estes diretores passaram a ter assento, junto com a família Marinho, no novo Núcleo de

Análise Estratégica (NAE) do grupo, uma espécie de comitê montado para definir o futuro das empresas. Sob o comando de Marluce Dias da Silva, ficava o núcleo de televisão e entretenimento. As mudanças, todavia, não alteraram o controle da família e a estrutura societária das Organizações Globo.

Segundo Pessoa e Lopes (2002), essas mudanças mostravam que as Organizações Globo estavam atentas às profundas transformações no seu ambiente competitivo. Os avanços tecnológicos estavam gerando a chamada “convergência de mídias” no setor de MCE. Neste novo ambiente, as fronteiras que existiam entre nichos de mercado passaram a ficar cada vez mais tênues e empresas de diferentes setores passaram a concorrer entre si. Isso gerou no

96

mercado um movimento de fusões e aquisições no setor de mídia, comunicação e entretenimento.

Para lançar novos produtos, entrar na área de telecomunicações e fazer frente aos “players” de MCE cada vez mais fortes, as Organizações Globo começaram, a partir de 1996, a lançar papéis no exterior, eurobônus e commercial papers. Tal atitude fez com que a Organização acumulasse dívidas de alguns bilhões de dólares, atingindo uma situação financeira delicada.

Neste momento, de acordo com Pessoa e Lopes (2002), a necessidade de diminuir o seu custo de capital e gerar receitas em moeda forte assume uma importância sem precedentes na história do grupo e, para tanto, torna-se imperioso aumentar as receitas das empresas do grupo no mercado internacional.

4.4.2 - A Reestruturação da Área Internacional – 2000

Em 2000, com o objetivo de intensificar e ampliar a inserção internacional da empresa, aumentando as receitas provenientes do exterior, foi efetuada uma modificação na Divisão de

Vendas Internacionais (DVI). O objetivo seria transformar a Globo no parceiro preferencial para fazer negócio em TV e entretenimento. Não vender apenas fitas com os programas, mas vender ainda outros serviços, identificar oportunidades de mercado, assumir uma postura pró- ativa 28. Em suma, ser uma área de negócios. Sendo assim, a DVI foi unificada à Diretoria de

Parcerias Estratégicas (criada em 1999), formando a Diretoria de Negócios Internacionais

(DNI). Esta fusão deu à área internacional maior responsabilidade, status e força dentro da companhia. Para reforçar esta iniciativa, Ricardo Scalamandré, um funcionário conceituado,

28 Na DNI é comum ouvir o termo “lata”. É assim que costumam chamar programas adaptados para a venda no mercado internacional.

97

com postura comercial e com status de “Diretor de Central”29 foi chamado para assumir o comando desta área. De acordo com gerentes da DNI, ao mesmo tempo em que houve aumento do comprometimento de recursos na área, a pressão por resultados e lucratividade também cresceu, transformando a área em uma “linha de negócios”.

DIRETORIA DE NEGÓCIOS INTERNACIONAIS (DNI)

A DNI é responsável pela prospecção, desenvolvimento e execução de estratégias de acesso a mercados externos e se divide em cinco principais linhas de atuação: (1) venda de programas;

(2) distribuição de canais ou programação; (3) desenvolvimento de co-produções internacionais; (4) estabelecimento de parcerias e acordos estratégicos com “players” internacionais; e (5) criação de programas, canais e formatos especialmente para o exterior.

De acordo com os entrevistados, a forma mais forte de acesso aos mercados novos e o real momento das vendas de programas se dá nas feiras internacionais. É a oportunidade de encontrar pessoas, conhecer melhor as demandas, fechar negócios, receber feedback, e comunicar os lançamentos. Segundo Brittos e Bolaño (2005), a primeira participação da

Globo em eventos internacionais, oferecendo sua programação exportável foi em 1977, e desde então a empresa se utiliza destas feiras para expor seus produtos. Existe um cronograma fixo destas feiras e a Globo participa das principais, optando por participar de alguma outra não relacionada abaixo se acharem interessante:

29 Ex: Central Globo de Engenharia, Central Globo de Produção, etc.

98

o NATPE, em janeiro (National Association of Television Program

Executives)30

o MIPTV, em abril – o festival de televisão de Cannes, França, e serve como

grande feira de exposição de produtos para emissoras européias e algumas da

Ásia (Marché International de Programmes de Télevision) 31

o LA Screenings (Los Angeles) – Voltada para a América Latina, em maio32

o DISCOPE, em junho – Voltada para o Leste Europeu

o MIPCOM, em outubro, também em Cannes – Emissoras da Europa e Ásia.33

Nesta mesma época e local acontece o “Telenovelas Screenings”

o ATF (Asia Television Forum), em dezembro – Emissoras da Ásia 34

Por fim, a estratégia é complementada por outras ações, como visitas programadas de executivos de estações estrangeiras à sede da emissora, no Rio de Janeiro.

Apesar de a Globo possuir escritórios no exterior, foi frisado que isto se dava mais por motivos econômicos que estratégicos. Segundo a entrevistada Cristina Pessoa, seria mais barato deixar uma pessoa sediada no exterior do que pagar os gastos de deslocamento e estadia toda vez que fosse necessário, mas os escritórios não seriam essenciais no processo de vendas.

A DNI está orientada para a fidelização de clientes. A meta é aumentar a quantidade de contratos por volume de horas e aumentar os prazos de duração destes contratos. Segundo

30 www.natpe.org/conference/ 31 www.miptv.com 32 www.videoageinternational.com/screenings.html 33 www.mipcom.com 34 www.asiatvforum.com

99

Helena Bernarde, esta mudança na forma de negociar as vendas aumentaria a segurança de receitas e melhoraria o planejamento interno.

Além disso, a Rede Globo possuía no exterior uma carteira de clientes espalhados por diferentes territórios em estágios distintos de evolução. Segundo Helena Bernarde, a penetração estaria relacionada ao nível de desenvolvimento local da TV. Quanto maior a produção local, menor a demanda por produtos Globo. A curva de crescimento de licenciamento de conteúdo se dá de forma assintótica. Somado a isso, algumas emissoras locais que antes compravam conteúdo da Globo, passaram a produzir os seus próprios programas. Sendo assim, a atuação internacional pautada principalmente em venda de telenovelas, começou a apresentar sinais de que este modelo não teria muito mais espaço para crescer. Segundo Octavio Florisbal, superintendente da Rede Globo de Televisão seria necessário intensificar a venda de outros gêneros, como documentários, produções jornalísticas e musicais. (Sobral, 2005)

Segundo Cristina Pessoa, a lista dos países compradores do conteúdo Globo oscila muito, havendo muita rotatividade. Algumas emissoras têm como estratégia a utilização de diferentes fornecedores de conteúdo para não ficar muito dependente destes fornecedores.

Um exemplo citado foi o de emissoras que dispõem, em sua grade de programação, de um horário selecionado para a exibição de dramaturgia. Nesse horário ela exibiria uma novela da

Globo durante seis meses, ao final desta novela exibiria uma da Televisa e, no outro ano, uma de outra fornecedora. Sendo assim, há muitos compradores regulares que não necessariamente compram anualmente, mas algumas vezes de dois em dois anos, por exemplo. Foi frisado ainda que, geralmente, o primeiro produto a ser vendido pela TV Globo para uma emissora estrangeira é uma novela.

100

Dentro da DNI, Helena Bernarde e Flávio Rocha eram os responsáveis por identificar as oportunidades de negócios e a sua viabilidade. De acordo com os entrevistados da empresa, na geração de novos negócios são adotadas diferentes estratégias para os diversos mercados.

Por exemplo, para um mercado onde nunca foi feito negócio antes, pode-se chegar a fazer uma análise SWOT (por Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats).

De acordo com os entrevistados um novo caminho a ser trilhado era o da produção internacional. A idéia seria identificar parceiros para co-produções (aprendizado de negócios/ mercado). Já existiam iniciativas nesse sentido e alguns casos foram citados como exemplos.

Essas parcerias geralmente eram feitas através de investimento de mão-de-obra e know-how.

Segundo Octavio Florisbal (Sobral, 2005), isto estaria alinhado a uma tendência das emissoras locais, que demandariam produções mais próximas, mais parecidas com seus mercados. O principal foco de atuação nesta área era o mercado de língua hispânica nos

Estados Unidos, países do Leste Europeu e alguns países da América Latina.

Uma das grandes modificações ocorrida na área internacional da Globo foi a postura pró- ativa assumida pela diretoria para cumprir a missão de multiplicar o seu faturamento. A palavra de ordem era maximizar receitas: não vender apenas o direito de exibição das telenovelas, mas lucrar também com outros negócios paralelos ou produtos relacionados. Um exemplo citado foi o licenciamento de produtos; outro seria fazer co-produções.

Antes, a Globo não se ocupava da divulgação do produto no exterior, nem assumia a direção da estratégia de marketing para a colocação do produto. Nesse aspecto, de forma similar ao

101

que ocorre com a maioria dos fabricantes nacionais a empresa não assumia o controle do marketing mix de exportação, deixando-o totalmente em mãos do comprador. Nos últimos anos, porém, a Globo dava ao seu cliente uma série de outros serviços para ajudá-lo na obtenção de maior retorno, utilizando o conhecimento de comercialização de produtos adquirido ao longo de quarenta anos de história.

A Forma de Operação das Áreas

A DNI foi estruturada em duas áreas voltadas para o mercado internacional: a Diretoria de

Vendas Internacionais (DVI) e a Diretoria de Distribuição Internacional (DDI).

Em 2005, a DVI era responsável, principalmente, pela prospecção, negociação e gestão de diversos negócios em matéria de produtos (programas e notícias) para televisão, o que abrangia desde o licenciamento tradicional até projetos de co-produção, passando por produtos conexos. Por esta natureza abrangente, possuía fortes interfaces com diversas áreas da TV Globo, a exemplo de Central Globo de Produção (CGP), Central Globo de Jornalismo

(CGJ), Central Globo de Comunicação (CGCOM), Globo Filmes e Globo.com.

A área de Marketing prestava uma ampla gama de serviços tanto pré como pós-venda para a

DVI e a DDI, tais como a realização de campanhas de mídias, promoções, organização de eventos e feiras, acompanhamento da performance de produtos, etc.

A parte de Operações Comerciais (OPEC) cuidava da operacionalização de todos os trâmites necessários à conclusão de uma venda, o que compreendia, entre outras funções, a elaboração e o acompanhamento geral dos contratos, além do envio de material para exibição. Por suas

102

atribuições, trabalhava não apenas muito próxima à DVI e à DDI, como também com o

Jurídico, a Diretoria de Operações Financeiras (DOF) e a Diretoria de Orçamento e

Controladoria (DOC).

Por fim, a área de planejamento e desenvolvimento de projetos apoiava a direção geral e as demais áreas no desenvolvimento de projetos e tarefas diversas.

Diretoria Artística

A Diretoria Artística, por sua vez, era responsável pela preparação dos produtos Globo para o mercado internacional, pelo desenvolvimento de novos produtos para o exterior e por apoiar o desenvolvimento dos projetos de co-produção que envolvessem parceiros estrangeiros.

Nesse sentido, tanto tinha atribuições de área-fim, como de área-meio. Por sua natureza, no plano interno à DNI, trabalhava principalmente em parceria com Vendas. Em termos de outras áreas da TV Globo, possuía fortes vínculos com a CGP e a Direção Geral Artística.

Para apoiar as ações comerciais da DNI, a área internacional dispunha de uma Diretoria

Artística. Uma das atividades da área era acompanhar e conhecer profundamente a produção dramatúrgica da TV Globo, com objetivo de assessorar a área de vendas na definição da estratégia de promoção e comercialização dos produtos nos diferentes mercados. A Diretoria

Artística era responsável também pela operação do Centro de Pós-Produção da Divisão de

Negócios Internacionais, que apoiava as atividades da DVI e da TV Globo Internacional

(TVGI). A Central de Pós-Produção da área era responsável por pequenas adequações necessárias para a afinação da grade do canal internacional. Também cabia à equipe da

103

Central de Pós-Produção a edição de partes de programas para os quais a TV Globo não dispunha de direitos de veiculação no exterior.

Outra atribuição da equipe do Centro de Pós-Produção era a reedição das novelas da emissora, que originalmente eram produzidas com um número maior de capítulos do que o mercado internacional costuma absorver, bem como a padronização do tempo de duração de cada capítulo (exigência do mercado internacional).

Além da venda de versões dubladas das produções, a DNI distribuía conteúdos da Globo e da

Globosat via TV por assinatura (pelo canal TV Globo Internacional), estabelecendo parcerias estratégicas e desenvolvendo produtos específicos para o mercado externo.

Diretoria de Distribuição Internacional (DDI)

A DDI cuidava basicamente da distribuição da TV Globo Internacional (TVGI), mas o seu escopo de trabalho mais amplo era o de distribuir conteúdos Globo na forma de canais de TV.

Mais recentemente, porém, esta diretoria incorporou também a função de negociação dos direitos do futebol brasileiro para o exterior.

A TVGI é uma rede de TV paga, transmitida via satélite e a cabo, para a população de fala portuguesa que vive fora do país. Em 2005 a TV tinha cerca de 1,8 milhões de assinantes, sendo 1,4 milhões adeptos do pacote básico (todos na América Latina) e cerca de 400 mil adeptos do pacote Premium espalhados por 63 países. Lançado em agosto de 1999, em 2005 o canal disponibilizava a programação da Rede Globo para os cinco continentes no mundo.

Em 2000, o canal passou a fazer parte de Diretoria de Distribuição Internacional (DDI), sob

104

os cuidados de Marcelo Spínola. A missão da DDI era consolidar a presença da TVGI no exterior e prospectar novas oportunidades/ opções de canais.

Em 2005, a TV Globo Internacional, um canal 24 horas sediado no Rio de Janeiro transmitia, com qualidade digital, mais de quatro mil horas/ano de programas de entretenimento tais como novelas, minisséries, musicais, programas humorísticos, documentários, noticiários e futebol ao vivo. Seu público-alvo era de aproximadamente 5,5 milhões de pessoas, incluindo brasileiros e portugueses que viviam fora de seus respectivos países.

A meta da TVGI era conseguir que seus clientes estivessem dentro do programa premium, onde cada assinante pagava pelo conteúdo. Na América Latina, porém, não conseguiam alcançar este feito devido às dificuldades técnicas e ao tamanho dos operadores locais, que eram relativamente pequenos.

Dentre os assinantes Premium, a TVGI separava seus clientes em duas subcategorias: A la carte e Package. Em 2005, o canal era transmitido, através de seus diferentes distribuidores em 45 países:

105

TAB 04 – Países onde a TVGI é transmitida

América do Norte: (2) África: (17) América do Sul: (7) Europa: (13) EUA África do Sul Argentina Alemanha México Angola Bolívia Andorra Botswana Áustria América Central: (5) Burundi Colômbia Bélgica Guatemala Congo Paraguai Dinamarca Honduras Etiópia Espanha Panamá Gabon Uruguai França Antilhas Holandesas (Curacao) Ivory Coast Grécia Haiti Malawi Holanda Moçambique Itália Namíbia Luxemburgo Swaziland Reino Unido Tanzânia Suíça Quênia Uganda Ásia: (1) Zâmbia Japão Zimbábue Fonte: DNI (2005)

Distribuição do conteúdo através de Parcerias

A distribuição do sinal era feita através de parcerias com operadores locais. De acordo com

Marcelo Spínola, em entrevista cedida a Liskauskas (2004), em cinco anos de atuação, estabeleceram-se parcerias de distribuição com as maiores operadoras de TV por assinatura e registrou-se um crescimento médio anual de 35% em receita de assinaturas.

Apesar de o canal já estar presente, via satélite, em todas as regiões dos EUA, em outubro de

2004, foi fechado um acordo de distribuição com a maior operadora de TV a cabo do mundo, a americana Comcast Cable, que atingia cerca de 22 milhões de assinantes. Por este acordo, a

TVGI faria suas primeiras experiências de video on demand. A princípio, a empresa distribuiria o canal para as duas cidades de maior concentração de brasileiros nos EUA:

Miami, na Flórida, e Boston, em Massachusetts. (Liskauskas, 2004)

106

Outra novidade foi o lançamento, em 20 de setembro de 2004, de um canal específico para exibir sua programação em horários adequados aos fusos horários da Europa e da África, com possibilidades de inserções publicitárias nessas regiões.

Estabeleceram-se, ainda, parcerias e acordos no México com as operadoras Sky de DHT e com a Cablevisión, de TV a cabo, para aumentar a penetração. Na tabela a seguir, é possível ter um maior detalhamento destas parcerias para cada região de atuação:

TAB 05 – Parcerias por região de distribuição

PAÍS DISTRIBUIDOR PACOTE ASSINANTES

Echostar, RCN e EUA Atlantic Broadband, Premium 63.000 Comcast Europa (exceto TV Cabo e Premium 5.000 Portugal) Telegeneve Japão IPC-TV Premium 15.000

Chile SKY Premium 8.500

Colômbia SKY Premium 33.500

México SKY e Cablevisión Premium 187.000

Panamá Cableonda Premium 500

Angola Multichoice Premium 60.000 África do Sul, Moçambique, Multichoice Premium 16.000 Namíbia, Zâmbia e outros TOTAL PREMIUM 388.500 Fonte: DNI (2005)

A TVGI fornecia, ainda, acesso gratuito para consulados e embaixadas brasileiras, e para militares das Forças Armadas brasileiras no exterior como, por exemplo, os alocados no

Haiti.

107

Um fato curioso ocorreu em Angola, onde o número de assinantes superou todas as expectativas. De acordo com um analista da DDI: “O nosso projeto começou para atingir brasileiros, mas acertou também os angolanos. Em 2005 havia cerca de 60 mil assinantes em

Angola e este mercado se tornara muito importante para a TVGI.

Segundo entrevista de Marcelo Duarte, diretor da Central Globo de Desenvolvimento

Comercial, realizada por Liskauskas (2004), o crescimento da TV Globo Internacional, desde seu lançamento até 2004, era fantástico e apresentava um grande potencial de anunciantes. A demanda publicitária, que havia dobrado no final do ano de 2004, começava a chegar de todas as regiões em que a Globo estava presente.

Programa feito para brasileiros que estão no exterior

Para se aproximar mais do seu público no exterior, a TVGI passou a produzir, especialmente para os assinantes do canal, um programa que abordava as experiências de brasileiros que deixaram o país para morar no exterior. Com o nome de Planeta Brasil o programa fez sucesso e passou a fazer parte da grade de programação. Os destaques eram as experiências dos brasileiros que viviam fora do país e tinham que vencer desafios diariamente, como barreiras lingüísticas, poupar recursos financeiros e assumir novos papéis. O programa também apresentava um perfil de serviços, com noções sobre imigração, direitos civis no exterior e funcionamento de embaixadas e consulados. Nos EUA, a TVGI também participava, desde 2003, do Brazilian Day in New York, com a cobertura dos shows e do evento, realizado na 46ª Avenida e que costuma reunir um milhão de pessoas.(Liskauskas,

2004)

108

É interessante ressaltar o trecho a seguir, de Brittos e Bolaño (2005), em que os autores destacam como esta estrutura de internacionalização acarretava poucos riscos financeiros:

“a TV Globo Internacional aproveita-se do largo estoque de produtos audiovisuais que a Globo reúne,

fruto de seus 40 anos de atuação no mercado nacional. Assim, é montada praticamente sem novos

custos de produção, já que só um programa é realizado especialmente para o canal, sendo a grade

montada em cima da redifusão de produtos já existentes (alguns sofrendo pequenas adaptações),

estejam eles em exibição atualmente no Brasil ou já tenham sido apresentados. Dessa forma, a Globo

utiliza -se da mesma estratégia exitosa das organizações de mídia norte-americanas, que transmitem

internacionalmente bens televisuais já pagos no mercado interno, otimizando seus recursos e

aumentando sua rentabilidade. Num negócio de difícil penetração, por seus custos e pelo domínio do

saber fazer, a Globo consegue formatar um produto de custo baixo, calcado em cima de aluguel de

satélite, divulgação e venda, com uma estrutura básica de funcionários, quase todos estabelecidos no

Brasil, sob a responsabilidade da DNI.” (Brittos e Bolaño, 2005, p.151)

Venda da SIC – 2003

Alinhada à estratégia de foco em venda de programação, em 17 de novembro de 2003 foi anunciada a venda dos 15% de participação na emissora SIC para o Banco Português do

Investimento (BPI), que passou a deter 41% das ações do canal. No entanto, a parceria das telenovelas foi mantida.35 Pedro Carvalho frisou, porém, que a venda da SIC foi decorrente de um processo de reestruturação, muito mais por ser uma atitude necessária do que estratégica.

Segundo Cristina Pessoa, gerente de negócios internacionais da TV Globo, certamente a situação financeira pela qual o grupo passava contribuiu para esta decisão. Era necessário concentrar as forças em questões mais centrais da empresa e havia, naquele momento,

35 (www.telehistoria.com.br/especiais/portugalsic.htm)

109

melhores formas de se utilizar tais recursos. Somado a isso, havia o fato de a Globo não precisar manter estes investimentos para ter assegurada a compra de longo prazo por parte da

SIC. Sendo assim, antes mesmo da Globo se desfazer de sua parte do capital, os contratos de fornecimento de conteúdo tiveram seus prazos alongados. Esta medida era interessante tanto para a Globo, que poderia utilizar estes contratos como garantias perante seus credores, quanto para a SIC, que garantia a exclusividade das novelas, protegendo-se de possíveis ações de seus concorrentes. Segundo Francisco Balsemão, mesmo após a venda da participação, o relacionamento no plano pessoal das duas famílias continuou excelente e os laços entre elas bastante vivos.

Apesar de a Globo ter se desfeito de grande parte de suas participações no exterior

(Telemontecarlo e SIC) e diminuído parte de seu comprometimento de recursos, é importante ressaltar que o seu nível de cobertura mundial continuou se expandindo, segundo declarações dos executivos entrevistados.

SITUAÇÃO DA EMPRESA EM 2005

Em 2004 a emissora exportou dramaturgia para 65 países. Estas vendas responderam por

95% da receita obtida com venda de conteúdo. A comercialização de espaço publicitário no exterior gerou, em 2004, R$ 9,7 milhões, segundo o balanço financeiro da empresa.36

Octavio Florisbal observou, em entrevista concedida ao jornal Valor Econômico, que no mercado interno a perspectiva de crescimento da receita estaria atrelada ao crescimento econômico do país e à evolução da distribuição de renda. Ele citou dados comparativos da

36 “Notes to the Unaudited Interim Financial Statements – TV Globo Ltda. - March 31, 2005 and 2004”

110

relação entre investimento publicitário e renda per capita em países desenvolvidos para mostrar a distância que separa o Brasil de países mais ricos. (Sobral, 2005)

De exportadora de novelas para exportadora de conteúdo

Nos últimos 30 anos, as produções da Globo – sobretudo novelas – foram vendidas para 130 países, chegando a conquistar um público fiel em certas regiões como, por exemplo, a Europa

Oriental. No total foram, até 2005, 60 milhões de telespectadores em todo o mundo.

Este desempenho comercial estimulou a DVI a diversificar o portfólio, com a oferta de minisséries, programas infantis e juvenis, especiais e co-produções. Com uma estratégia que visava estabelecer parcerias de longo prazo, a DVI passou a incentivar a compra de horas de programação, ao invés de novelas específicas. A consolidação desta tendência seria uma reestruturação no modelo de negócios da área, atraindo compradores internacionais para outras produções da emissora fora do universo das novelas.

A AMPLIAÇÃO DOS HORIZONTES

Em 2005, a área da Distribuição Internacional da TV Globo dispunha de metas muito bem delineadas. Em entrevista concedida a Liskauskas (2004), Marcelo Spínola comentou que, ao longo do ano, seria desenvolvido um trabalho intenso para ampliar as negociações com operadores de cabo em toda a Europa. Um segundo foco estaria em iniciar prospecções em países onde ainda não houvesse contratos de distribuição, como Canadá e Israel. Em 2006 a

área objetivava promover mais ações de marketing com operadores de cabo e satélite que já distribuissem o conteúdo da TGVI, a fim de ampliar a base atual de assinantes. Além disso,

111

um dos alvos da TVGI em 2005 seria o Japão, onde a comunidade brasileira era grande e o canal acabava de renovar um contrato por mais dez anos. Outra ação voltada exclusivamente para o mercado japonês seria a busca de clientes e oportunidades de inserção de publicidade local. (Liskauskas, 2004)

Segundo o superintendente comercial da Globo, Octávio Florisbal, o próximo passo da companhia na área internacional seria ampliar as parcerias nos mercados europeu e africano para transmissão em tempo real. Em 2005, a programação da TV Globo era exibida em 50 países, nos cinco continentes e assistida por 300 mil assinantes. A meta, diz Florisbal, seria; chegar a 500 mil assinantes, nos próximos três anos. (Sobral, 2005)

112

5. ANÁLISE E CONCLUSÕES DO CASO TV GLOBO

Este capítulo tem como objetivo responder às perguntas propostas através da análise do caso da TV Globo, à luz das correntes teóricas identificadas na literatura e apresentadas no segundo capítulo deste trabalho.

5.1. COMO SE INICIOU O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA TV

GLOBO?

- A TV Globo nasce em um cenário de internacionalização inward (parceria com o grupo Time-Life).

Utilizando o conceito mais amplo de internacionalização apresentado por Welch e

Luostarinem (1988) pode-se dizer que a emissora já mostrava, desde sua inauguração em

1965, estar inserida dentro de um cenário de internacionalização “para dentro” (inward). A parceria com o grupo Time-Life permitiu à empresa adquirir conhecimento de forma mais rápida e viabilizou o contato com práticas gerenciais utilizadas no mercado televisivo norte- americano, em que o setor estava muito mais desenvolvido. Acredita-se que este seria um dos fatores responsáveis por colocar a Rede Globo em posição de vantagem em relação às suas concorrentes nacionais.

- A empresa desde o seu início se expandiu territorialmente com o intuito de se transformar em uma emissora nacional.

Aparentemente, pode-se supor que as Organizações Globo seguiam o imperativo de crescimento da firma proposto por Penrose. A criação da emissora seria o resultado de uma expansão horizontal e o empreendedor Roberto Marinho, dono das Organizações Globo, enxergava que suas empresas estavam inseridas em um setor mais amplo: o de mídia e

113

comunicações. Esta busca pelo crescimento contínuo é ainda mais evidente ao notar-se que, desde o início de suas atividades, a empresa se destacou por sua expansão geográfica pelo território brasileiro, passando de uma emissora local, em 1965, para uma rede de televisão com cobertura nacional, em 1976.

- Exportações começam de forma emergente (Oportunismo x intenção estratégica)

Em um primeiro momento, a exportação é uma resposta da firma às demandas externas, em uma postura passiva e consistente com o modelo de Uppsala. A decisão de exportar não gerava qualquer risco financeiro para a TV Globo, uma vez que estas telenovelas já estavam amortizadas e que haveria basicamente o custo de editar as fitas dentro de um formato-padrão para os mercados internacionais e os custos relacionados à dublagem, que no caso específico de Portugal, nem eram necessários37. Desta forma, mesmo cobrando preços muito baixos nos primeiro contratos, as receitas superavam todos os seus custos. Pode-se afirmar, então, que as atividades de exportação da TV Globo começaram com um caráter experimental, sem que houvesse a necessidade de grande comprometimento de recursos ou investimentos. Além disso, fica evidente que quando confrontados com esta oportunidade no mercado externo, não consideraram, alternativamente, outras oportunidades existentes em outros mercados. Por outro lado, a partir da análise desses primeiros passos da exportação, pode-se notar que não são precedidos por uma intenção estratégica ou planejamento e que os princípios propostos pelas teorias econômicas não recebem validação empírica neste caso.

- Motivos para se internacionalizar: oportunidade, prestígio, crescimento.

A TV Globo começou seu processo de internacionalização motivada por um pedido inesperado vindo do exterior. Esse pedido é visto como uma possibilidade de obter prestígio e

37 Há ainda os custos relativos a direitos autorais e direitos correlatos.

114

aumentar as suas receitas, utilizando capacidade ociosa (novelas, já amortizadas, que ficariam em prateleiras sem outra utilidade).

A decisão de fazer um investimento direto de grande porte no exterior, em 1985, coincide com um momento em que a emissora possuía índices de participação no mercado nacional em torno de 75% e demonstrava sinais de saturação, o que seria consistente com o imperativo do crescimento proposto por Penrose. Por outro lado, os ótimos resultados de audiência alcançados por suas novelas no mercado estrangeiro, principalmente em Portugal e Itália, poderiam ser considerados como o feedback necessário para que a TV Globo se dispusesse a fazer maior comprometimento de recursos no exterior e para que tivesse uma menor percepção de risco nesses países. Sendo assim, investir num desses mercados estaria alinhado com o princípio de retroalimentação sugerido por Uppsala.

Um outro motivo para a internacionalização, citado ao longo do caso como justificativa para os investimentos diretos, seria o fato de a empresa enxergar isso como uma ação para garantir a sua sobrevivência no longo prazo, colocando-se na primeira linha entre as redes de televisão internacionais e até mesmo para manter sua competitividade no mercado interno.

Esta motivação seria consistente com o proposto por Hymer, onde uma das motivações para a internacionalização seria neutralizar as ações da concorrência.

5.2. COMO SE DEU A EVOLUÇÃO DO COMPROMETIMENTO COM OS

MERCADOS EXTERNOS?

A Globo passou por estágios de internacionalização conforme proposto em particular pelos modelos de envolvimento seqüencial com a exportação.

115

- A Cadeia de Estabelecimento

No período de 1965 a 1985, a Rede Globo parecia seguir, mesmo que involuntariamente as etapas da cadeia de estabelecimento. Seu modo de operação se iniciou com um envolvimento leve, via exportação de telenovelas, fase na qual teve a oportunidade de adquirir conhecimentos sobre o novo mercado. O envolvimento se aprofundou a partir do aumento desses conhecimentos e da melhoria dos canais de informação, ampliando o envolvimento da firma, culminando na aquisição da Telemontecarlo. A seqüência na seleção de mercados sugeria a entrada sucessiva em mercados cada vez mais distantes psiquicamente, à medida que a firma ganhava experiência em operações estrangeiras.

Com a aquisição da Telemontecarlo, a Rede Globo cumpriu o proposto nas principais teorias sobre o processo de internacionalização das empresas, em particular os modelos de envolvimento seqüencial com a exportação. Mas, ao vender as suas participações em ambos os investimentos diretos no exterior e posicionar-se como uma produtora de conteúdo, a empresa mostrou-se capaz de montar uma estratégia para aumentar seu raio de atuação ao mesmo tempo em que diminuía seu comprometimento de recursos e sua exposição ao risco, não seguindo neste período o modelo proposto pela Escola de Uppsala.

Dada a reestruturação ocorrida em meados da década de 1990, a internacionalização da TV

Globo sofre uma modificação. Dever-se-ia encarar a Globo como prestadora de um serviço de telecomunicação ou como produtora de conteúdo para TV?

Analisando a segunda hipótese, mais alinhada com a atual estratégia da firma, a Globo estaria atualmente no segundo estágio de internacionalização, mas partindo para o quarto estágio, uma vez que já começa a fazer co-produções em outros países. Estas co-produções, pelo

116

menos por enquanto, não exigem maior comprometimento de recursos financeiros por parte da Globo, cedendo apenas o seu know-how ou alugando as suas instalações. Desta forma, o caso da Globo não cumpriria todas as etapas da cadeia de estabelecimento, pulando o terceiro estágio, e tendo um quarto estágio não tão consistente com a teoria. Este resultado seria possível uma vez que a empresa conseguiu estabelecer um fluxo de informação de forma a poder continuar aprendendo sobre o mercado importador e terceirizar os investimentos diretos que não correspondem ao seu “core business”.

- O poder explanatório do Modelo de Uppsala

Considerando o histórico da TV Globo, é interessante notar que seus primeiros passos em direção à internacionalização são bastante consistentes com a teoria proposta por Uppsala, mas que em seus passos subseqüentes sua forma de expansão internacional parece se distanciar um pouco do previsto pelo modelo.

Após a venda da Telemontecarlo, em 1994, a firma entra em um período de redefinição estratégica e, em 1999, começa a modificar a estrutura de sua área internacional. Como resultado disso, há o lançamento do canal internacional, em 1999, e a criação da DNI, em

2000 e a sua reestruturação em 2002. Em 2003, a emissora vende a sua participação acionária na SIC, diminuindo o montante de recursos comprometidos no mercado estrangeiro. Segundo a análise do caso, esta definição está baseada em uma necessidade de gerar receitas em moeda estrangeira, sugerindo que esta busca por expansão da venda de conteúdo e serviços agregados estivesse mais pautada em uma estratégia deliberada da companhia do que em mudanças incrementais baseadas no aprendizado adquirido com as atividades correntes.

117

Da mesma forma, a venda da participação acionária da SIC poderia de alguma forma estar ligada a um desempenho abaixo do esperado por parte da emissora portuguesa, mas ao que tudo indica, de acordo com as entrevistas, a motivação para esta mudança estaria baseada em aspectos econômicos e estratégicos. Desta forma, seria possível supor que as motivações que influenciam a internacionalização estariam subordinadas às demais decisões estratégicas da empresa, o que não é previsto pelo modelo de Uppsala.

De qualquer modo, não é possível assegurar o motivo pelo qual a empresa aparenta perder parte de sua aderência às teorias comportamentais e se alinhar ao descrito pelas correntes de estudo baseadas em fatores econômicos. A partir disso, são propostas duas perguntas:

(1) Poderia o processo de internacionalização da Rede Globo ser explicado mais

facilmente através de teorias comportamentais enquanto Roberto Marinho estava à

frente dos negócios e depois através da lógica econômica a partir do momento em

que houve uma “profissionalização” da gestão?

(2) Seria possível supor que, enquanto o tomador de decisões da empresa não precisava

prestar contas sobre os seus atos, ele era guiado por fatores mais emocionais e que

quando outros stakeholders passaram a fazer parte da estrutura de capital da empresa,

a lógica do processo decisório (ou pelo menos as suas justificativas) teve que ser

muito mais baseada em aspectos racionais e econômicos?

118

Estas perguntas são úteis para chamar atenção sobre a influência do tomador de decisão sobre os rumos da internacionalização, mas é necessário ressaltar que não é possível dissociar os desdobramentos desta expansão internacional das mudanças no ambiente e da evolução do contexto no qual a empresa está inserida ao longo do tempo.

- Desinternacionalização?

- Desinvestimento x ampliação da atuação internacional

No caso da Globo, algo curioso ocorreu. No decorrer dos últimos 10 anos, a Globo se desfez de grande parte de seus investimentos diretos no exterior (Telemontecarlo e SIC), diminuindo seu comprometimento de recursos no mercado externo. Seria esse, então, um caso de “des- internacionalização”, conforme proposto por Welch e Luostarinen?

Aparentemente, tomando como base a venda da Telemontecarlo parece evidente que o fato da

TV Globo acumular conhecimento tácito no mercado italiano, não acarretou em aumento do comprometimento de capital. Isto seria consistente com a afirmação de Petersen e Pedersen

(1997), de que a relação linear entre conhecimento de mercado e comprometimento com o mercado é questionável. Uma possível explicação seria o fato de o processo de internacionalização não ser irreversível, sendo assim, a relação poderia não ser linear. Em alguns momentos, mais informação poderia gerar diminuição do nível de comprometimento de recursos.

Apesar de acreditar que o processo de internacionalização é reversível, é possível que outra hipótese explique melhor a venda da SIC e a redefinição estratégica da TV Globo. De acordo com a própria definição proposta por Welch e Luostarinen (1988), a internacionalização seria

119

o processo de envolvimento crescente com operações internacionais. Partindo-se desta definição, seria possível afirmar que a TV Globo continuava a se envolver, cada vez mais, com os mercados internacionais, ampliando gradativamente o seu nível de cobertura mundial.

Apesar de curioso, este não seria o primeiro caso encontrado na literatura de desinvestimento com aumento da abrangência de atuação da empresa. De acordo com Veiga e Rocha (2003), em seu estudo de caso sobre a Eucatex, a empresa mostrou ser capaz de substituir investimentos diretos no exterior por parcerias com agentes locais.

À primeira vista, tanto a Globo quanto a Eucatex apresentaram uma estrutura menos complexa na fase mais avançada de internacionalização do que em uma etapa anterior. No entanto, essa maior simplicidade da estrutura internacional poderia ser justificada pelo fato de ambas as empresas optarem por se concentrar em suas “core competencies”, permitindo estruturas mais enxutas. O avanço das tecnologias de comunicação, que possibilitam encurtar as distâncias entre o mercado consumidor e produtor, poderia ser outro fator a permitir que este fenômeno de simplificação de estrutura ocorresse.

Aparentemente, a hipótese de que, por detrás da simplificação das atividades poderia haver, efetivamente, um aprimoramento da estrutura internacional, é válida tanto para o caso da

Eucatex quanto para o caso da TV Globo.

Acredita-se que o caso da TV Globo poderia ser enquadrado entre as empresas que precisam se concentrar em uma atividade específica da cadeia de valor para poder ter a competitividade suficiente para atuar no mercado internacional, o que seria consistente com a idéia de considerar uma terceira dimensão chamada “externalização”, conforme proposto por Jarillo e

Martinez (1991).

120

Apesar de todas as críticas ao modelo de Uppsala, parece extremamente pertinente traçar um paralelo entre a trajetória da Globo e o modelo de retroalimentação, com tomadas de decisão graduais, baseadas no feedback que a empresa tem do mercado e de suas atividades, proposto em 1977 por Johanson e Vahlne. Acredita-se, porém, que a inevitabilidade do processo é bastante questionável e que este pressuposto deveria ser relaxado, considerando-se a possibilidade de haver salto de etapas e reversão do processo de internacionalização.

Há de se ressaltar que, apesar da lógica do modelo ser comprovada empiricamente, a variável

“Comprometimento com o Mercado” precisa receber atenção especial. Esta variável de comprometimento, que tem parte de sua grandeza mensurada pelo montante de recursos investidos em determinado mercado, perde o seu valor explicativo no caso de empresas que conseguem promover mudanças em sua estrutura de forma a deixá-las ao mesmo tempo mais enxutas e abrangentes. Acredita-se que o estudo de Jarillo e Martinez, bem como outros estudos relacionados a networks possam conter insights relevantes para a formulação de um esquema conceitual mais abrangente.

- Dificuldade de mensurar o nível de internacionalização da TV Globo.

Foi comprovada uma constância na comercialização de telenovelas para mercados estrangeiros, começando de forma mais esporádica na fase inicial de internacionalização e se intensificando posteriormente. De acordo com Cavusgil (1984), esta constância seria um traço relevante para medir o nível de comprometimento internacional. Outra forma de medir seria através do percentual do lucro obtido em exportações, o que poderia ter boa correlação com o grau de internacionalização da empresa. Infelizmente, não foi possível coletar dados cofiáveis sobre a proporção que as atividades internacionais representam no lucro da

121

empresa, em relação às atividades nacionais. Segundo a empresa, estes eram dados estratégicos que não poderiam ser fornecidos. Apesar de a empresa afirmar que o nível de atuação internacional aumentou, os dados históricos sobre a quantidade de países atendidos pela Globo não foram informados. Na verdade, como a área foi formada há poucos anos, muito informação parece ter se perdido ao longo do tempo. Não há um controle sobre o histórico dessas exportações e receitas. Apesar disso, acredita-se que o raio de atuação da

Rede Globo se expandiu. Em 2006, a Globo chegava a outros países via TVGI, além de manter parcerias com outros países e realizar co-produções. Além disso, a TV deixou apenas de vender o produto telenovela e passou a vender, ainda, uma série de serviços para agregar valor e entregar uma melhor oferta para seus clientes, fornecendo know-how de promoção da programação e gerenciamento do marketing mix, por exemplo.

Acredita-se que, no caso da TV Globo, uma das melhores formas de medir o nível de internacionalização da empresa seria através do nível de internacionalização da network em que a empresa está inserida e o seu grau abrangência.

5.3. QUAL FOI A IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DE PARCERIAS COMO

ALTERNATIVA AOS INVESTIMENTOS DIRETOS?

Parcerias antes da internacionalização

As parcerias foram importantes em todo o desenvolvimento da Globo. Primeiramente a parceria com o grupo Time-Life acelerou o processo de aquisição de conhecimento tácito, através de transferência de know-how, ajudando a emissora a conseguir uma posição de vantagem sobre suas concorrentes. Este fato é consistente com a visão de Hakansson, Havila e Pedersen (1999) e de Johanson e Vahlne (1990) de que as networks modificam o processo de acumulo de conhecimento de uma empresa, pois viabilizam a aprendizagem através da

122

experiência de outras empresas. Seria possível argumentar, ainda, que este cenário de internacionalização para dentro também teria contribuído para o outlook internacional da empresa.

Em um segundo momento, as parcerias com emissoras afiliadas e retransmissoras viabilizaram a rápida expansão da Rede Globo transformando-a, em pouco mais de dez anos de existência, em uma emissora nacional. Desta forma, este modelo de expansão do raio de atuação da emissora, que combinava aquisições de emissoras próprias (Rio de Janeiro, São

Paulo, Belo Horizonte, Recife e Brasília) e parcerias com afiliadas e retransmissoras, permitiu que a TV Globo alcançasse seus objetivos com uma menor quantidade de recursos comprometidos.

A importância da Network na definição do raio de atuação internacional.

A Globo começou seu modelo de expansão internacional através da venda de conteúdo e, posteriormente, via aquisições, quando comprou 90% da Telemontecarlo, e 15% da SIC. No primeiro investimento, feito na Itália, ficara claro que não era necessário entrar num projeto de tal porte com uma participação acionária tão alta. Na negociação com a SIC, por outro lado, a relação pessoal entre Roberto Irineu Marinho e Pinto Balsemão parece ter sido determinante no fechamento do consórcio.

A partir da reestruturação da área internacional, porém, a utilização de parcerias passou a ser a grande fonte de expansão do raio de atuação internacional. Como exemplo pode-se citar a expansão do canal internacional (TVGI), a parceria com distribuidoras de conteúdo (ex:

Comcast) e as co-produções com agentes locais em outros países (ex: “Os Maias”, com a

SIC; Carnaval em parceria com russos e o remake da novela “Vale Tudo” em espanhol)

123

Acredita-se que a redefinição estratégica e a utilização de parcerias foi de extrema relevância, uma vez que as Organizações Globo não disporiam dos recursos necessários para manter ou para ampliar o seu raio de atuação internacional. Desta forma, o foco em suas core competences e a externalização de algumas atividades da cadeia de valor seriam fatores imprescindíveis para a Globo expandir seu raio de ação.

5.4. COMO SE DEU O PROCESSO DE ESCOLHA DOS PAÍSES NOS QUAIS IRIA

ATUAR E DE QUE FORMA A SEQUÊNCIA DE ESCOLHA ENCONTRA-SE

RELACIONADA COM O CONCEITO DE DISTÂNCIA PSÍQUICA?

Distância Psíquica

A escolha dos lugares para se expandir respeitou parcialmente o princípio da distância psíquica. Segundo Leite, Rocha e Figueiredo (1988) Uruguai e Portugal são vistos como países psicologicamente próximos e foram justamente os prováveis países de destino das primeiras novelas exportadas pela TV Globo. Desta forma, em uma primeira análise, o conceito da internacionalização a partir dos países com a menor “distância psíquica” aparenta ser respeitado no período de 1965 a 1985. Posteriormente a TV Globo passou a exportar seus produtos para países tradicionalmente mais distantes psiquicamente, tais como Rússia, China e Japão.

Não é possível precisar, porém, o quanto mudanças ambientais ao longo do tempo, tais como os avanços tecnológicos e desenvolvimento de meios mais eficientes de transmissão de informação teriam reduzido o poder explicativo do conceito de distância psicológica.

124

Há de se ressaltar, porém, que o principal produto de exportação da TV Globo é a telenovela e que este produto é extremamente influenciado por valores e costumes do mercado brasileiro:

“apesar das novelas serem reaproveitadas da programação local e não produzidas especialmente para

um determinado público alvo no exterior, como ocorre com a produção feita para o mercado interno, a

telenovela representava, na visão da empresa, uma amostra da cultura brasileira, atual ou histórica, que

despertaria interesse no telespectador de outros países.” (Graell, 1987, p.92)

Parece razoável assumir que este produto feito “sob medida” para a população brasileira tenderia a encontrar maior receptividade em sociedades com valores e costumes semelhantes aos do Brasil.

Sendo assim, se o pressuposto acima fosse verdade, seria possível que o processo de internacionalização da Rede Globo tivesse começado por países culturalmente mais próximos, não devido à menor percepção de risco por parte dos tomadores de decisão, mas devido à demanda pelo produto ter se iniciado ou obtido maior sucesso nestas nações culturalmente mais próximas.

Posteriormente, a partir do momento em que a comercialização do produto Telenovela passou a ser feita via feiras internacionais de conteúdo, acredita-se que a distância psíquica tenha influenciado muito pouco as decisões da TV Globo. Partindo-se da informação de que exportar para diferentes países não modificaria muito os riscos, custos e a operacionalização da venda, parece ser muito mais razoável supor que a questão esteja mais relacionada ao lado da demanda que ao da oferta. Ou seja, a diferença cultural influenciaria muito mais o lado do comprador do conteúdo, que poderia se sentir mais ou menos atraído pela telenovela que a vendedora de conteúdo.

125

Quanto aos investimentos diretos na Itália, poder-se-ia argumentar que a ascendência italiana da família Marinho teria influenciado a decisão de investimento no exterior, fazendo com que a Itália estivesse, para a Rede Globo, provavelmente muito mais próxima psiquicamente do que para a maioria dos brasileiros. Posteriormente, o investimento direto no mercado português, terra de seu avô, continuaria consistente com este conceito da distância psíquica.

Apesar disso, a ida para estes mercados, parece estar mais ligada a uma oportunidade do que a uma menor percepção de distância psíquica. Acredita-se que o fator mais importante na determinação dos locais para os investimentos diretos da TV Globo estavam relacionados à questão da disponibilidade. Os trechos a seguir, retirados do estudo de caso, servem como ilustração para esta interpretação:

“Percebendo essa nova oportunidade, a Globo se preparou para estar presente no mercado externo

quando as privatizações ocorressem, tendo como objetivo se tornar sócia de empresas locais.”

“A compra da Telemontecarlo representou, então, a consolidação da estratégia de penetração da

empresa no mercado europeu, mas sabia-se que seria difícil manter um investimento desta ordem sem a

participação de um investidor local.”

O setor de telecomunicações, por natureza, é fortemente regulado e, por isso, comprar uma emissora de TV é algo bastante complexo. Muitas vezes, o nível de participação acionária de um grupo estrangeiro fica limitado a uma pequena percentagem do capital total da empresa.

Em alguns casos, pode haver determinações quanto à quantidade de conteúdo local na grade de programação, ou ainda encontrar barreiras para participar de consórcios e ter que concorrer sozinho em leilões. Desta forma, é bem provável que a ordem dos investimentos fosse alterada caso o processo de privatização ocorresse primeiro em Portugal, por exemplo.

126

Por esta ótica, parece mais acertado creditar a ida para o mercado italiano ao fato de ser a

única emissora européia sendo licitada no período, e que a TV Globo decidiu investir na Itália por ser a primeira opção “satisfatória” de investimento, e não a melhor possível.

A influência do tamanho do mercado

O tamanho do mercado, por sua vez, não pareceu exercer muita influência na escolha dos destinos de exportação ou investimento direto. De acordo com a DNI, as exportações são negociadas caso a caso. Por outro lado, o investimento direto no mercado italiano se dá em um cenário em que a Globo não possuía outra alternativa de aquisição na Europa. O mercado televisivo europeu estava começando a ser privatizado e a Itália fora a primeira nação a permitir que empresas estrangeiras investissem neste setor.

5.5. QUAL O GRAU DE IMPORTÂNCIA DO PRODUTO TELENOVELAS NESSE

PROCESSO?

Ao analisar o caso da TV Globo, torna-se claro que o grau de importância do produto telenovela tanto para a expansão nacional quanto para o processo de internacionalização da

Globo é bastante elevado. Esse produto foi, conjuntamente com o telejornal, o responsável por levar a TV Globo ao topo dos índices de audiência nacional em poucos anos de operação.

As primeiras exportações de conteúdo surgiram da demanda inesperada por novelas. A decisão de adquirir a Telemontecarlo também sofreu influência das novelas, uma vez que o sucesso deste produto no mercado italiano, antes da privatização da emissora, fez com que a

TV Globo construísse a percepção de que conseguiria conquistar o público da Itália com a sua programação.

127

Até os dias de hoje, as telenovelas são responsáveis pela maior parte do lucro da empresa e representam, também, a maior parte dos produtos exportados.

Na ocasião das entrevistas, porém, essa alta dependência das telenovelas no mercado externo já causava algum receio nos executivos da DNI. Acreditava-se que o produto, estava em estágio avançado do seu ciclo de vida, e que a demanda por este produto poderia tender a diminuir.

Parece correto afirmar que o produto não é customizado para os outros países, pelo contrário, na verdade é colocado em um formato internacional padronizado, para ser vendido nas feiras internacionais de conteúdo, sofrendo pequenas modificações (feitas pelo Centro de Pós-

Produção nos produtos exportados) antes de ser enviado para o país de destino. Na verdade as novelas são feitas sob medida para a população brasileira e reaproveitadas no mercado externo.

Ao longo das entrevistas os executivos da Globo mostraram sua preocupação em atender às demandas específicas dos diferentes consumidores ao redor do mundo e a compreensão de que o processo de adaptação do conteúdo para a cultura do país de destino não é tão trivial quanto possa aparentar. Por outro lado, a Globo não realizava pesquisas de mercado nos países para onde exportava seu conteúdo, deixando de acompanhar a reação do público, o que poderia ser uma rica fonte de informações.

Esta postura refletiria o fato de não ser financeiramente interessante para a Globo produzir telenovelas sob medida para o mercado internacional. Alternativamente, parcerias com

128

agentes locais foram feitas para viabilizar co-produções, utilizando-se do know-how da Globo na produção de conteúdo.

É interessante notar que as mudanças no mercado português, o principal consumidor de novelas da TV Globo, poderiam mostrar a demanda por produtos mais customizados e correspondentes ao cotidiano local. O sucesso da novela “Morangos com Açúcar” seria um sinal de que os países tenderão a exigir cada vez mais um produto customizado e desenvolvido especificamente para si?

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Apesar das divergências entre as correntes de estudo, há evidências de que tanto os modelos econômicos quanto os comportamentais apresentam suporte empírico em casos e situações específicas. De acordo com a literatura, o fator que aparenta definir melhor o grau de adesão do comportamento das empresas a estes modelos está ligado ao porte da firma. Firmas de maior porte, com elevado nível de profissionalização de seus gestores, experiência de mercado, e que apresentam maior acesso a informação ou a recursos financeiros e humanos, tendem a seguir os modelos propostos pela teoria econômica.

Por outro lado, empresas inexperientes ou em estágios iniciais de internacionalização, que muitas vezes dispõem de poucos recursos financeiros, tendem a seguir um modelo de comprometimento gradual de recursos, adequando a exposição ao risco do mercado estrangeiro de acordo com a sua percepção de risco deste mercado.

É possível que esta mudança do comportamento de empresas em estágios iniciais para as em estágios mais desenvolvidos de internacionalização se dê devido ao quanto o processo

129

decisório dessas empresas procura seguir padrões racionais. Sendo assim, fatores como o nível de profissionalização dos gestores, a cultura da empresa e a necessidade de justificar essas decisões a outros stakeholders de forma racional seriam importantes na hora de definir o quanto a empresa estará alinhada com uma dessas teorias.

Uma possível explicação para isso seria o fato de os gestores “profissionais” possuírem, em sua grande maioria, um background e formação educacional baseado em modelos racionais.

Desta forma, seriam influenciados pela exposição às práticas gerenciais de excelência vigentes no momento da tomada de decisão e pela busca da racionalização do processo decisório. Um fato que poderia dar algum suporte a esta hipótese seria a correlação entre as atitudes gerenciais praticadas em um dado momento do tempo com o que os formadores de opinião no mundo de negócios assumiam como “as melhores práticas” no mesmo período.

Considere-se uma máxima no mundo de negócios entre os anos 30 e 70 (fordismo) de que sempre seria interessante internalizar atividades quando houvesse escala para justificar esta atitude. Tal visão teria sido compartilhada pela maioria dos gestores do período. Sendo assim,

é provável que os modelos que considerassem esta atitude como “padrão” receberiam maior comprovação empírica. De fato, pode-se observar que esta premissa era adotada tanto por modelos econômicos quanto comportamentais. Por outro lado, a partir dos anos 80 e 90, com a globalização, as melhorias nos meios de comunicação, a terceirização de atividades e a consolidação do conceito de core competence, o padrão de comportamento dos tomadores de decisão, assim como suas crenças, foram alterados. Desta forma, os modelos de internacionalização perderam parte de seu poder explicativo e sofreram revisões e aperfeiçoamentos.

130

Além disso, o fato de o meio empresarial considerar processos decisórios racionais preferíveis aos emocionais faria com que atitudes baseadas em fortes componentes comportamentais tendessem a ser justificadas com argumentos racionais.

Na visão do autor, a importância de entender os modelos comportamentais é perceber que as motivações humanas não são puramente racionais mas também têm base emocional.

A partir do momento que se aceita que o ser humano tende a ser emocional e entende-se que o seu processo decisório é influenciado por vieses sistemáticos decorrentes de heurísticas desenvolvidas para facilitar a tomada de decisão, é possível aperfeiçoar o processo de tomada de decisão. Sendo assim, não é preciso entender unicamente o que deveria afetar a tomada de decisão, mas também o que de fato afeta a decisão gerencial.

Portanto, é provável que modelos híbridos, unindo considerações dos modelos comportamentais e econômicos sejam capazes de explicar, com maior grau de abrangência, este fenômeno.

SUGESTÕES PARA PESQUISAS FUTURAS:

Como recomendação para estudos futuros, o autor sugere que sejam testadas as seguintes hipóteses substantivas:

1) Quando o tomador de decisão não precisa prestar contas a stakeholders, ele tende a tomar decisões consistentes com as correntes comportamentais; quando tem menor liberdade, suas decisões são mais baseadas em aspectos racionais e econômicos.

131

2) Em alguns casos, o processo de internacionalização da empresa começaria por países culturalmente mais próximos, não devido à menor percepção de risco por parte dos tomadores de decisão, mas devido à demanda pelo produto ter se iniciado ou obtido maior sucesso em nações culturalmente mais próximas. (Em outras palavras, ampliar o conceito de distância psíquica como um fator que influenciaria não apenas o lado da oferta como também o lado da demanda.)

3) O processo de internacionalização não é irreversível, sendo assim, a relação entre conhecimento de mercado e comprometimento com o mercado não seria necessariamente linear. Em outras palavras, mais informação poderia gerar diminuição do nível de comprometimento de recursos.

4) Por detrás da simplificação das atividades de uma empresa e a concentração em suas core competences poderia haver, efetivamente, um aprimoramento de sua estrutura e uma expansão internacional mesmo que com diminuição do montante de capital comprometido.

Finalmente, sugere-se analisar alternativas para a definição e mensuração das variáveis

"Comprometimento com o Mercado" e "Nível de internacionalização" de uma empresa, de forma a abranger aspectos da network onde a empresa está inserida. Acredita-se que o estudo de Jarillo e Martinez, bem como outros estudos relacionados a networks possam conter insights relevantes para a formulação de um esquema conceitual mais abrangente.

132

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, V. Fatores antecedentes da escolha do modo de entrada em mercados extra- regionais e conseqüências no desempenho: um modelo contingencial de expansão extra- regional do varejo. 2005. Tese (Doutorado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

ANDERSEN, O. On the internationalization process of firms: a critical analysis. Journal of International Business Studies, v.24, n.2, p. 209-231, 1993

ANDERSON, E.; GATIGNON, H. Modes of foreign entry: a transaction cost analysis and propositions. Journal of International Business Studies, p.1-26, Fall 1986.

BARRETTO, A. Internacionalização de empresas: processos, pessoas e networks no investimento direto no exterior. 1998. Tese (Doutorado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

BARRETTO, A. A internacionalização da firma sob o enfoque dos custos de transação. In: Angela da Rocha [Org]. A Internacionalização das empresas brasileiras: estudos de gestão internacional. Rio de Janeiro: Mauad, 2002

BARRETTO, A.; ROCHA, A. A expansão das fronteiras: brasileiros no exterior. In: Rocha, A. [org.], As novas fronteiras: a multinacionalização das empresas brasileiras. Rio de Janeiro: Mauad, 2003, pp 29-76.

BETHLEM, Agricola. Caso Organizações Globo. Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, s/d.

BIAL, Pedro, Roberto Marinho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004

BILKEY, W. An attempted integration of the literature on the export behavior of firms. Journal of International Business Studies, v.9, n. 1, p.33-46, 1978.

BILKEY, W.; TESAR, G. The export behavior of smaller-sized Wisconsin manufacturing firms. Journal of International Business Studies, v.8, n.1, p.93-98, 1977.

BJÖRKMAN, I.; FORSGREN, M. (org) The nature of the international firm: Nordic contributions to international business research. Copenhagen: Copenhagen Business School Press, 1997, pp. 117-34.

BLALOCK, M. e BLALOCK, L. Methodology in social research. New York, McGraw-Hill, 1975.

BORGERTH, L. Quem e como fizemos a TV Globo. A Girafa, 2003, p. 30-31

BRITTOS, V. e BOLAÑO, C. (org.). Rede Globo: 40 anos de poder e hegemonia. São Paulo: Paulus, 2005.

133

BUCKLEY, P. J. Foreign direct investment by small and medium sized enterprises: the theoretical background. Small Business Economics, Vol. 1, 1989, p. 89-100

BUCKLEY, P. J. e CASSON, M. A theory of international operations. In: European Research in International Business. London, North-Holland, 1979.

BUCKLEY, P. J. e CASSON, M. Analyzing foreign market entry strategies: extending the internationalization approach. Journal of International Business Studies, 29 (3), 539-562, 1998.

CARLSON, S. How foreign is foreign trade? Acta Universitatis Upsaliensis, Studia Oeconomiae Negotiorum II. Bulletin n. 15, BN 91-554-0289-5. Uppsala, Suécia, 1975, 26 pp. In: BARRETTO, A. Internacionalização de empresas: processos, pessoas e networks no investimento direto no exterior. 1998. Tese (Doutorado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

CAVUSGIL, S. On the internationalization process of firms. European Research, 8 (6), 273- 81, 1980.

CAVUSGIL, S. Organizational characteristics associated with export activity. Journal of Management Studies, 21 (1), 3-22, 1984.

CHETTY, S. K. Dimensions of internationalization of manufacturing firms in the apparel industry. European Journal of Marketing, 33 (1/2): 121-142, 1999.

CHETTY, S. e HOLM, D. B. Internationalisation of small to medium-sized manufacturing firms: a network approach. International Business Review, 9, 2000, Elsevier Science Ltd., pp.77-95.

COASE, R. H. The nature of the firm. Economica, 4(16): 386-405, 1937, In: ALMEIDA, V. Fatores antecedentes da escolha do modo de entrada em mercados extra-regionais e conseqüências no desempenho: um modelo contingencial de expansão extra-regional do varejo. 2005. Tese (Doutorado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

CONCEIÇÃO, C.; SOBRAL, E. As Organizações Globo preparam saída de Portugal Gazeta Mercantil. Rio de Janeiro, 9 out. 2002, C-6.

CUNHA, I. F. As telenovelas brasileiras em Portugal (s/d). Disponível em: , Acesso em: 10 jul. 2006.

CYERT, R.D. e MARCH, J.G. A behavioral theory of the firm. Englewood Cliffs, N.J., 1963.

CZINKOTA, M.R. Export Development Strategies: US Promotion Policies. Praeger, New York, NY. 1982. In: MORGAN, E.R., KATSIKEAS, C.S. Theories of international trade, foreign direct investment and firm internationalization: a critique. Management Decision 35/1, 1997 p.68-78

134

DUNNING, J. H. Toward an eclectic theory of international production: some empirical tests. Journal of International Business Studies, 11 (1), 9-31, 1980.

DUNNING, J. H. The eclectic paradigm of international production: a restatement and some possible extensions. Journal of International Business Studies, 1-31, 1988.

DUNNING, J. H. Alliance capitalism and global business. London, Rutledge, 1997.

ERIKSSON, K. et al. Experiential Knowledge and Cost in the Internationalization Process. Journal of International Business Studies, second quarter, 1997, pp.337-360

FADUL, Anamaria. Internacionalização da mídia brasileira. Comunicação e Sociedade. São Bernardo do Campo, nº 30, 1998, p. 83

FINA, E., RUGMAN, A.M. A Test of Internalization Theory and Internationalization Theory: The Upjohn Company. Management International Review Vol.36, 1996/3 pp.199- 213

FREIRE, C.M. Internacionalização de empresas brasileiras: o Caso de O Boticário. 2001. Dissertação (Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

GLASBERG, R. e POSSEBON, S. Globo se defende. Tele Viva: 28 fev. 2005. Disponível em Acesso em: 15 maio 2005.

GLOBO - INFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS – Disponível em Acesso em: 9 maio 2005.

GOODE, W.J. & HATT, P.K. Métodos em pesquisa social. São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 1975.

GRAELL, Isa. O Processo de Internacionalização de uma empresa: um estudo de caso. 1987. Dissertação (Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

GRAELL, Isa e ROCHA, Angela. O Processo de Internacionalização de uma Empresa In: Gerência de Exportação no Brasil. ROCHA, A. (Org.) - São Paulo : Atlas; Rio de Janeiro : UFRJ, 1987 (Coleção COPPEAD de Administração). p. 128-155

HAKANSSON, H.; HAVILA, V.; PEDERSEN, A.C. Learning in Networks. Industrial Marketing Management 28, 443-452. Elsevier Science Inc., 1999.

HEMAIS, C. e HILAL, A. O Processo de Internacionalização da Firma Segundo a Escola Nórdica. In: ROCHA, A. (Org.) A Internacionalização das empresas brasileiras: estudos de gestão internacional – Rio de Janeiro: Mauad, 2002, pp 15-40

HEDLUND, G.; KVERNELAND, A. Investing in Japan: the experience of Swedish firms. Stockholm: Institute of International Business, Stockholm School of Economics, 1984.

135

HYMER, S.H. The international operations of national firms: a study of direct foreign investment. Cambridge, Mass., MIT Press, 1960/1976.

JARILLO, J. C.; MARTINEZ, J.I. The international expansion of Spanish firms: towards an integrative framework for international strategy. In: Mattson, L.G.; Stymme, B. (org.) Corporate and industry strategies for Europe. London: Elsevier Science, 1991.

JARILLO, J.C. (1988). On Strategic Networks. Strategic Management Journal. January- February, 31-41. apud Jarillo e Martinez (1991)

JOHANSON, J e VAHLNE, J.-E. The Internationalization Process of the Firm: A Model of Knowledge Development and increasing Foreign Market Commitment, Journal of International Business Studies, Spring/Summer. 1997.

______e VAHLNE, J.E. The Mechanism of Internationalization. International Marketing Review, 7(4): 11-24, 1990.

______e HALLÉN, L. International business relationships and industrial networks. Advances in International Marketing, 3: xiii-xxiii, 1989.

______e MATTSSON, L.G. Interorganizational Relations in Industrial Systems: A Network Approach Compared with the Transaction-Cost Approach. International Studies of Management & Organization. Spring, 3448. 1987.

______e MATTSSON, L.G. Internationalization in industrial systems: a network approach. In: P.J. Buckley; P.N. Ghauri, The internationalization of the firm: a reader. 1988. pp.303-321. London: Academic Press. In: CHETTY, S. e HOLM, D. B. Internationalisation of small to medium-sized manufacturing firms: a network approach. International Business Review, 9, 2000, Elsevier Science Ltd., pp.77-95.

______e WIEDERSHEIM-PAUL, F. The Internationalization of the Firm: Four Swedish Cases, Journal of Management Studies, Vol. 12, pp. 305-22. 1975.

KELLEY, H.H. Attribution in Social Interaction, In: JONES, E. et al. (eds.), Attribution: Perceiving the Causes of Behavior (Morristown, NJ: General Learning Press, 1972). IN: Robbins, Stephen Paul – Comportamento organizacional / Stephen P. Robbins – 9. ed. São Paulo: Pretince Hall, 2002. p.12

KIRK, J. e MILLER, M.L. Reliability and Validity in qualitative research. Newbury Park, Calif., Sage Publications, 1986.

KNIGHT, G.A. e CAVUSGIL, S.T. The born global firm: a challenge to traditional internationalization theory. Proceedings of the Third Symposium of the Consortium for International Marketing Research. Odense, Denmark, Odense University, 1995.

KOGUT, B. Foreign Direct Investment as a Sequential Process. In: Kindleberger, C.P. e Audretsch, D. (eds.). Multinational Corporations in the 1980’s. Cambridge: MIT Press, 1983.

136

LEITE, H; ROCHA, A; FIGUEIREDO, K. A percepção cultural e a decisão de exportar. In: Rocha, A. (org.). Gerência de exportação no Brasil. São Paulo, Atlas; Rio de Janeiro, Ed. da UFRJ, 1988, p.67.

LIESCH, W.P. et al. Evolving Strands of Research on Firm Internationalization: an Australian-Nordic Perspective. Int. Studies of Management & Org., vol. 32, no. 1, Spring 2002, pp. 16-35

LISKAUSKAS, Suzana. Receita Brasileira, Sucesso Internacional. Aldeão - ANO XXVII . Nov. 2004. Nº 70

LOPES, Marcela. A evolução recente da indústria de televisão e entretenimento: O caso das Organizações Globo. Rio de Janeiro, Instituto de Economia/UFRJ, 2002, Monografia de Graduação

MADSEN, T.K. e SERVAIS, P. The internationalization of “born globals”: an evolutionary process? Proceedings of the Fourth Symposium of the Consortium for International Marketing Research. San Diego, California, 1996.

MAGALHÃES, Heloísa. Organizações Globo entra na TV paga Portuguesa. Gazeta Mercantil. Rio de Janeiro, 17 fev. 1998. C-6.

MANN, P. H. Métodos de Investigação Sociológica. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 4ª Edição, 1979.

MINTZBERG, H. e MCHUGH, A. (1985). Strategy formation in an adhocracy, Administrative Science Quaterly, Vol. 30, June, pp.160-97. In: MORGAN, E.R., KATSIKEAS, C.S. Theories of international trade, foreign direct investment and firm internationalization: a critique. Management Decision 35/1, 1997 p.68-78

MORGAN, E.R., KATSIKEAS, C.S. Theories of international trade, foreign direct investment and firm internationalization: a critique. Management Decision 35/1, 1997 p.68- 78

NORDSTROM, K.A. The internationalization process of the firm in a new perspective. Estocolmo, Institute of International Business, 1990.

NORDSTROM, K.A.; VAHLNE, J.E. Is the globe shrinking? Psychic distance and establishment of Swedish sales subsidiaries during the last 100 years. International Trade and Finance Association’s Annual Conference. Laredo, Texas, 22-25 April, 1992. In: ROCHA, A. [Org.] “As novas fronteiras: a multinacionalização das empresas brasileiras – Rio de Janeiro: Mauad, 2003.

OGURI, L. M. B. A influência do consumidor na Produção de telenovelas. Rio de Janeiro: Faculdades Ibmec, 2004. Tese de mestrado.

PENROSE, E. The theory of the growth of the firm. Oxford, 1966

PESSOA, C. M. S. e LOPES, M. T. A Estratégia de Internacionalização da TV Globo - RBCE – 74, pp. 56-65.

137

PETERSEN, B. e PEDERSEN, T. Twenty years after: support and critique of the Uppsala internationalization model. In: BJÖRKMAN, I.; FORSGREN, M. (org) The nature of the international firm. Copenhagen: Copenhagen Business School Press, 1997.

PIERCY, N.F. Company internationalization: active and reactive exporting, European Journal of Marketing, Vol. 15 No. 3, pp.24-40. 1981. In: MORGAN, E.R., KATSIKEAS, C.S. Theories of international trade, foreign direct investment and firm internationalization: a critique. Management Decision 35/1, 1997 p.68-78

PORTER, M.E. Estratégia Competitiva: técnicas para análise da indústria e da concorrência. Rio de Janeiro, Campus, 1991.

REID, S.D. The decision-maker and export entry and expansion, Journal of International Business Studies. 1981. Vol. 12, Fall, pp. 101-12 In: MORGAN, E.R., KATSIKEAS, C.S. Theories of international trade, foreign direct investment and firm internationalization: a critique. Management Decision 35/1, 1997 p.68-78

ROCHA, A. [Org.] As novas fronteiras: a multinacionalização das empresas brasileiras. Rio de Janeiro: Mauad, 2003.

RUGMAN, A.M. Inside the multinationals: the economics of internal markets. New York, Columbia University Press, 1981.

SCHRAMM, W. (1971, Dezembro). Notes on case studies of instructional media projects. Working Paper for the Academy for Educational Development, Washington, DC. Apud Yin (2003, p.12)

SIMON, J.L. Basic research methods in social sciences. New York, Random House, 1969

SNOW, CC, THOMAS, JB (1994), Field research methods in strategic management: contributions to theory building and testing, Journal of Management Studies, 31, 457-480.

SOBRAL, Eliane. TV Globo vai ampliar parcerias no exterior. Valor Econômico Rio de Janeiro: 28 jun. 2005 - edicão nº 1290.

SOUSA, Helena. Time-Life/Globo/SIC: Um Caso de Reexportação do Modelo Americano de Televisão? (s/d) Disponível em < http://ubista.ubi.pt/~comum/sousa-helena-time-life- sopcom.htm> Acesso em: 15 maio 2005.

SULLIVAN, D. (1994), Measuring the degree of internationalization of a firm, Journal of International Business Studies, Vol. 25, Spring, pp. 325-42 apud Morgan e Katsikeas (1997)

THORELLI, H.B. (1986). Networks: Between Markets and Hierarquies. Strategic Management Journal. January-February. 37-51. apud Jarillo e Martinez (1991)

TV Globo Ltda. - Notes to the Unaudited Interim Financial Statements – March 31, 2005 and 2004

138

VEIGA, L. Evolução, comprometimento e escolha de mercados na internacionalização de empresas brasileiras: estudo de casos. 2001. Dissertação (Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

VEIGA, L. e ROCHA, A. Expansão internacional de grandes empresas: estabelecendo relacionamentos no mercado internacional. In: As Novas Fronteiras: Multinacionalização de empresas. ROCHA, A. (Org.) – Rio de Janeiro: Mauad, 2003, pp 163-210

WEISFELDER, C.J. (2001). Internationalization and the multinational enterprise: development of a research tradition, Reassessing the Internationalization of t he Firm, 11, 13- 46.

WELCH, L.S. e LUOSTARINEN, R., “Internationalization: Evolution of a Concept”, Journal of General Management. Vol. 14 No. 2.,Winter 1988, pp 34-55

WIEDERSHEIM-PAUL, F.; OLSON, H.; WELCH, L. Pre-export activity: the first step in internationalization. Journal of International Business Studies, 9(1): 47-58, Spring/Summer, 1978.

WILLIAMSON, O. Markets and hierarchies: analysis and antitrust implications. New York, The Free Press, 1975.

YIN, R. K., Case study research: design and methods, 3a ed., 2003

139

Anexo 1 - 1a Rodada de Entrevistas com a DNI

PERGUNTAS PLANEJADAS:

- Fale um pouco sobre a atuação da Globo no mercado internacional.

1) Como começa o processo de internacionalização da Globo? (pra onde? Por que?)

Primeira exportação foi "O Bem Amado" para o Uruguai em 1973 ou "Gabriela" para

Portugal em 1976 (como afirma Isa Graell)?

(De onde pode ter surgido essa confusão?)

2) Qual é o principal motivo para essa primeira venda de conteudo? (financeira, status, necessidade de crescer?)

3) Como evolui, dentro da organização, a área que atende ao mercado internacional?

(falar sobre a criação da DVI, DNI, TVGI, etc. Se possível falar sobre datas de criação, número de funcionários, atribuições, ampliação do escopo de atuação, etc)

4) Como (onde e quando) se dá o primeiro investimento direto no exterior?

(além da Telemontecarlo e da SIC, houve mais algum?)

5) Quais foram os motivos para estes investimentos?

6) Quais foram os motivos para a venda da participação:

140

a) na Telemontecarlo? (1994) b) na SIC? (2003)

7) Qual a importância das telenovelas nesse processo de internacionalização?

8) Em que medida as mudanças estratégicas afetaram a internacionalização?

- Fale um pouco sobre as perspectivas futuras da Rede Globo.

1) Quais são os próximos passos planejados? Para onde irá se expandir?

2) Essa expansão será para lugares pré-definidos ou onde aparecerem as melhores oportunidades?

3) No cenário internacional, você definiria (atualmente) a Globo como uma fornecedora de conteúdo ou uma prestadora de serviço de telecomunicação?

4) E no futuro, a Globo pretende ser forncedora de conteúdo, prestadora de serviço ou fazer ambos?

141

Anexo 2 - 2a Rodada de Entrevistas com a DNI

PERGUNTAS PLANEJADAS:

Como evoluiu, dentro da organização, a área que atende ao mercado internacional?

- Em que data foi criada a DVI? Com quantos funcionários começou?

- Em que data foi criada a DDI? Em que data foi criada a TVGI? Quantos funcionários

têm?

- Em que data foi criada a DNI? Quantos funcionários têm?

- Existe alguma outra estrutura organizacional responsável por exportações e operações

no exterior que não seja pertencente à DNI? Se existir, qual o número de funcionários,

nível organizacional na estrutura, há quanto tempo foi criada, etc.

- Lista dos países compradores de conteúdo (atualmente são cerca de 65), o ano de início das exportações para estes países e qual foi o primeiro produto comprado (novela, programa humorístico, etc)

- Indicação dos 10 principais países compradores e porcentagem das vendas no exterior provenientes desses países.

- A porcentagem das receitas provenientes do mercado internacional em relação às receitas da

Rede Globo (para demonstrar o quanto o mercado internacional está cada vez mais importante) para os anos 2004, 1999, 1994, 1989 e 1985.

142

- Qual a data correta da exportação da novela "O Bem Amado" para o Uruguai: 1973

ou 1977?

- Qual foi a primeira novela exportada pela Globo e qual foi o seu destino?

- Qual foi a segunda novela exportada?

- Quais foram os países nos quais foi feito algum investimento direto e o ano em que foi feito o investimento? Itália (Telemontecarlo) em 1985, Portugal (SIC) em 1993. Houve mais algum?

- Quais foram os motivos para estes investimentos?

- Quais foram os motivos para a venda da participação:

a) na Telemontecarlo? (1994)

b) na SIC? (2003)

143

Anexo 3 – Lista das Telenovelas Veiculadas na Globo

Ano de Novela exibição 1 Ilusões Perdidas 1965 2 O Progresso 1965 3 Rosinha do Sobrado 1965 4 Marina 1965 5 Pecado de Mulher 1965 6 Paixão de Outono 1965 7 A Moreninha 1965 8 O Ébrio 1965 9 Padre Tião 1965 10 Um Rosto de Mulher 1965 11 Eu Compro Esta Mulher 1966 12 O Sheik de Agadir 1966 13 1966 14 A Rainha Louca 1967 15 A Sombra de Rebeca 1967 16 Anastácia, a Mulher Sem Destino 1967 17 O Homem Proibido 1967 18 1967 19 O Santo Mestiço 1968 20 1968 21 Passo dos Ventos 1968 22 A Gata de Vison 1968 23 A Última Valsa 1969 24 1969 25 A Ponte dos Suspiros 1969 26 A Cabana do Pai Tomás 1969 27 Véu de Noiva 1969 28 Verão Vermelho 1969 29 Irmãos Coragem 1970 30 Assim na Terra Como no Céu 1970 31 A Próxima Atração 1970 32 1971 33 1971 34 1971 35 Meu Pedacinho de Chão 1971 36 Bandeira 2 1971 37 1972 38 Selva de Pedra 1972 39 Bicho do Mato 1972 40 O Bofe 1972 41 Uma Rosa com Amor 1972 42 A Patota 1972 43 Cavalo de Aço 1973 44 O Bem-Amado 1973 45 1973 46 1973 47 Supermanoela 1974 48 O Espigão 1974 49 1974 50 1974

144

Ano de Novela exibição 51 1974 52 Escalada 1975 53 Helena 1975 54 1975 55 Gabriela 1975 56 O Noviço 1975 57 Bravo! 1975 58 Senhora 1975 59 A Moreninha 1975 60 O Grito 1975 61 1975 62 Anjo Mau 1976 63 Vejo a Lua no Céu 1976 64 Saramandaia 1976 65 O Casarão 1976 66 O Feijão e o Sonho 1976 67 Estúpido Cupido 1976 68 Escrava Isaura 1976 69 1976 70 À Sombra dos Laranjais 1977 71 1977 72 Dona Xepa 1977 73 Espelho Mágico 1977 74 Nina 1977 75 Sem Lenço, Sem Documento 1977 76 Sinhazinha Flô 1977 77 O Astro 1977 78 O Pulo do Gato 1978 79 Maria, Maria 1978 80 Te Contei? 1978 81 Gina 1978 82 Dancin'Days 1978 83 Sinal de Alerta 1978 84 1978 85 A Sucessora 1978 86 Pai Herói 1979 87 Memórias de Amor 1979 88 Feijão Maravilha 1979 89 1979 90 Marron- Glacê 1979 91 1979 92 Olhai os Lírios do Campo 1980 93 Água Viva 1980 94 1980 95 Marina 1980 96 Coração Alado 1980 97 Plumas e Paetês 1980 98 As Três Marias 1980 99 1981 100 O Amor é Nosso 1981 101 Ciranda de Pedra 1981 102 Brilhante 1981

145

Ano de Novela exibição 103 Jogo da Vida 1981 104 Terras do Sem Fim 1981 105 O Homem Proibido 1982 106 Sétimo Sentido 1982 107 1982 108 Paraíso 1982 109 Sol de Verão 1982 110 Final Feliz 1982 111 Pão Pão, Beijo Beijo 1983 112 Louco Amor 1983 113 1983 114 Eu Prometo 1983 115 Voltei para Você 1983 116 Champagne 1983 117 Transas e Caretas 1984 118 1984 119 Partido Alto 1984 120 1984 121 Livre para Voar 1984 122 1984 123 Um Sonho a Mais 1985 124 A Gata Comeu 1985 125 1985 126 Ti-ti-ti 1985 127 De Quina pra Lua 1985 128 Selva de Pedra 1986 129 Cambalacho 1986 130 Sinhá Moça 1986 131 1986 132 Hipertensão 1986 133 1987 134 1987 135 Brega & Chique 1987 136 Bambolê 1987 137 Mandala 1987 138 Sassaricando 1987 139 Fera Radical 1988 140 Vale Tudo 1988 141 Bebê a Bordo 1988 142 Vida Nova 1988 143 O Salvador da Pátria 1989 144 Que Rei Sou Eu? 1989 145 Pacto de Sangue 1989 146 Tieta 1989 147 Top Model 1989 148 1989 149 Gente Fina 1990 150 1990 151 Mico Preto 1990 152 1990 153 Araponga 1990 154 Meu Bem, Meu Mal 1990

146

Ano de Novela exibição 155 Lua Cheia de Amor 1990 156 1991 157 Salomé 1991 158 Vamp 1991 159 1991 160 1992 161 Perigosas Peruas 1992 162 1992 163 De Corpo e Alma 1992 164 Deus nos Acuda 1992 165 1993 166 1993 167 O Mapa da Mina 1993 168 1993 169 1993 170 1993 171 A Viagem 1994 172 1994 173 Pátria Minha 1994 174 1994 175 Irmãos Coragem 1995 176 A Próxima Vítima 1995 177 História de Amor 1995 178 Cara e Coroa 1995 179 Explode Coração 1995 180 Quem é Você? 1996 181 Vira-Lata 1996 182 O Fim do Mundo 1996 183 1996 184 1996 185 1996 186 1997 187 O Amor Está no Ar 1997 188 Zazá 1997 189 Anjo Mau 1997 190 Por Amor 1997 191 1998 192 Era Uma Vez... 1998 193 Torre de Babel 1998 194 1998 195 Pecado Capital 1998 196 1999 197 1999 198 Força de um Desejo 1999 199 Terra Nostra 1999 200 Vila Madalena 1999 201 Esplendor 2000 202 Uga Uga 2000 203 Laços de Família 2000 204 2000 205 Um Anjo Caiu no Céu 2001 206 2001

147

Ano de Novela exibição 207 Estrela-Guia 2001 208 2001 209 As Filhas da Mãe 2001 210 2001 211 2002 212 Coração de Estudante 2002 213 Esperança 2002 214 2002 215 Sabor da Paixão 2002 216 2003 217 Agora é que São Elas 2003 218 2003 219 2003 220 2003 221 2004 222 Cabocla 2004 223 Senhora do Destino 2004 224 Começar de Novo 2004 225 Como Uma Onda 2004 226 América 2005 227 2005 228 Alma Gêmea 2005 229 Belíssima 2005 230 Sinhá Moça 2006 231 Cobras e Lagartos 2006 232 Páginas da Vida 2006