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XXII Encontro Anual da Compós, Universidade Federal da Bahia, 04 a 07 de junho de 2013

APROXIMAÇÕES COM O CONCEITO DE APROPRIAÇÃO: uma associação com as imagens de celebridades no blog ‘Te Dou Um Dado?’ 1

APPROACHES TO THE CONCEPT OF APPROPRIATION: an association with celebrities pictures on ‘Te Dou Um Dado?’ blog Camila Cornutti Barbosa 2 Susan Liesenberg 3

Resumo: O presente artigo propõe apresentar uma discussão sobre o conceito de apropriação a partir de relações com distintos campos do conhecimento, como as Artes Visuais, a Filosofia da Linguagem e a Comunicação. Blogs e sites de rede social têm sido apontados como ambientes propícios para fazer emergir novos conteúdos e imagens apropriadas de outros contextos. Assim, em um segundo momento, busca-se criar uma categorização de tipos de apropriações relacionadas às imagens de celebridades veiculadas no blog de humor “Te Dou Um Dado?”, procurando evidenciar a importância de se pensar sobre a apropriação também no contexto de artefatos digitais amplamente difundidos na rede.

Palavras-Chave: Apropriação. Imagem. „Te Dou Um Dado?‟.

Abstract: This article aims to present a discussion of the concept of appropriation from relationships with different fields of knowledge such as the Visual Arts, Philosophy of Language and Communication. Blogs and social networking sites have been identified as environments conducive to bringing out new content and images appropriated from other contexts. Thus, in a second step, we seek to create a categorization of types of appropriations related to images of celebrities that are transmitted on the humor blog "Te Dou Um Dado?", seeking to highlight the importance of thinking about the appropriation also in the context of digital artifacts widespread on the Internet.

Keywords: Appropriation. Image. „Te Dou Um Dado?‟.

1 Introdução O ponto de interesse deste artigo se dá na discussão do termo apropriação, a partir de leituras como Smolka (2000) e Bar, Pisani e Weber (2007), além da busca por outros autores

1 Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Comunicação e Cibercultura do XXII Encontro Anual da Compós, na Universidade Federal da Bahia, Salvador, de 04 a 07 de junho de 2013. 2 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação (UFRGS), bolsista CAPES. Linha de pesquisa: Informação, Redes Sociais e Tecnologias. E-mail: [email protected] 3 Mestre em Comunicação e Informação pelo PPGCOM/UFRGS. Linha de pesquisa: Informação, Redes Sociais e Tecnologias. E-mail: [email protected]

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que possam contribuir para esta reflexão, como Bakhtin (1998), Kristeva (1974) e Deleuze (1998). Ao investigar quais são os usos imbricados no conceito de apropriação, vê-se que muitas vezes temos sentidos tácitos de entendimento do mesmo, sem uma tentativa de conjugar outras áreas do conhecimento para uma compreensão mais ampla de algo caro à Comunicação e à Cibercultura. Primeiramente, faz-se esta exploração inicial de abordagens do conceito em campos como as Artes Visuais, a Filosofia da Linguagem e a Comunicação. O passo seguinte envolve questões relativas à centralidade que as imagens adquiriram na vida contemporânea a partir da apresentação do blog “Te Dou Um Dado?4”. Assim, tendo o entendimento de que as imagens são representações cumpridoras de um papel de mediação entre o espectador e a realidade (AUMONT, 2005), passa-se aqui ao questionamento e à observação de como as imagens de celebridades (tão repercutidas na web) têm sido apropriadas neste âmbito e, em particular, tangenciando a temática do humor no “TDUD?”5. Em seguida, são apresentados os procedimentos empregados para a seleção das imagens e a análise – que diz respeito a um levantamento inicial e exploratório de imagens que têm sido veiculadas neste blog. Ainda que aqui se refira a textos escritos que por vezes estão associados às imagens, o interesse deste trabalho recai sobre as imagens em si – delineando a opção de observação delas e classificando-as a partir da criação de uma categorização de distintas formas de apropriação de imagens de celebridades pelo referido blog.

2 Aproximações acerca do conceito de apropriação O conceito de apropriação aparece com frequência na redação de trabalhos acadêmicos. No entanto, percebe-se ser pouco apresentado sob um aspecto prismático, que explore as diversas nuances do que seja uma apropriação. Tais nuances emergem quando lançam-se vistas em um dicionário analógico, por exemplo, na procura pela palavra “apropriação”. Figuram aí significados como “apropriar-se de, tomar, arrebatar, fisgar, agafanhar, agadanhar, agarrar, ensacar, embolsar, meter no bolso, aquinhoar-se, receber, aceitar, empalmar, reter, represar, pagar-se com as próprias mãos, colher, apanhar, obter (...)”

4 www.tedouumdado.com.br 5 A partir daqui denominaremos o blog com o uso da expressão “TDUD?”

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(AZEVEDO, 2010, p. 370). Com estes sentidos, crê-se que o uso mais frequente do conceito na Comunicação tem sido o de se utilizar de alguma coisa, se apoderar, tomar emprestado. Pesquisando-se a origem do conceito, encontra-se a apropriação bastante discutida nas Artes Visuais – primeiramente como um caminho de questionamento de se o artista estaria se apropriando de conceitos e imagens do mundo a sua volta para constituir suas criações. Como ponto de partida, toma-se a questão que há muito tempo se apresenta nas Artes: o fato de uma obra anterior ser citada dentro de uma nova obra e a incorporação de objetos múltiplos, do cotidiano, e algumas vezes de outras obras, em um outro trabalho de arte. De toda forma, há que se considerar autores que instituem diferenças daquilo que, de forma geral, compreende- se como apropriação, mas que são definidas como o que é da ordem da releitura, da citação e da apropriação em si. Pillar (2003, p. 11) afirma que a releitura, o ato de reler, se associa a “fazer a partir de uma obra, é recriar o objeto, reconstruindo-o num outro contexto com novo sentido; é uma criação com base num referencial”. Barbosa (2005) faz distinções entre a citação, entendida como a utilização, em uma determinada produção, de elementos que possam se relacionar a artistas, movimentos e estilos específicos da história da arte, e a apropriação que seria o ato de retirar objetos ou imagens de seus locais de origem para construir uma obra. Em uma compreensão de linha do tempo, mesmo que muitos artistas já tivessem instituído práticas que são relacionadas à apropriação, ficam claros os exemplos a partir de movimentos de vanguarda do século XX, como o Cubismo Sintético – estendido de 1908 a 1914 e dividido entre as fases analítica e sintética – e o Dadaísmo. Para Pozenato e Gauer (2001, p. 94), “o Cubismo Sintético divide a figura em planos, segmentos e zonas de cor, trabalhando com escalas de tons. A figura é dividida, mas não é decomposta, e, para representá-la, usam-se signos plásticos baseados nos sólidos geométricos”. Baumgart (1999, p. 350) afirma que Picasso e Braque, neste período, “haviam utilizado em suas colagens pela primeira vez pedaços de jornais, papéis de parede, etc., como „material de pintura‟, retornando a realidade expulsa dos quadros de certa maneira pela porta dos fundos, agora como objeto real”. Baumgart (1999, p. 349-350) ainda coloca o exemplo do Dadaísta Kurt Schwitters, que pretendida mudar concepções “elevadas” de arte, “reunindo lixo recolhido de latas, da rua e de outros lugares em uma „pintura‟”, conforme se vê na figura (1) a seguir:

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FIGURA 1 – “O Alienista” (1919)6 e “A Constelação” (1920) 7 de Kurt Schwitters

Nas obras acima, têm-se a noção de apropriação pelo fato de o artista ter se utilizado de materiais externos à pintura para incorporar na concepção do todo por meio de colagem. Gombrich (1993, p. 477), ao se referir ao trabalho dos dadaístas, menciona a noção de “montagens de objetos descartados”. Em uma revisão e compilação sobre a Arte Moderna na Europa, Argan (2010, p. 475) indica que: A prova de que a colagem constitui, a partir de 1910, quase uma constante lingüística, se encontra no fato de que essa técnica e suas derivações não permanecem exclusivas do cubismo e dos movimentos que remetem a ela mais ou menos diretamente: Schwitters, cuja formação é essencialmente dadaísta, generalizou a técnica da colagem até construir composições inteiras (Merzbau) com objetos e fragmentos de objetos encontrados por acaso e justapostos. Trata-se, nesse caso, de um processo de colheita casual (bricolage) e de justaposição e acumulação (assemblage) (...) (ARGAN, 2010, p. 475).

Schwitters, em especial, qualifica esta estratégia de apropriação, como aproxima-se aqui, com o nome de Merz, um movimento em que esta palavra indica “a assemblagem artística de todos os materiais imagináveis e, por princípio, a igualdade de cada um desses materiais no plano técnico” (SCHWITTERS apud POLIDORO, 2010, p. 55). A partir daí, tem-se outros indicativos de associações com a noção de apropriação, como as técnicas de bricolagem (trabalho manual em que são reaproveitados diferentes materiais) e assemblagem

6 Imagem disponível em: http://www.epdlp.com/pintor.php?id=3217html - Acesso em 11/02/13. 7 Imagem disponível em: http://uploads6.wikipaintings.org/images/kurt-schwitters/merz-picture-25a-the-star- picture-1920.jpg - Acesso em: 11/02/13.

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(onde “todo e qualquer tipo de material pode ser incorporado à obra de arte”8). Outra visada no campo das Artes e que auxilia a problematizar o conceito de apropriação diz respeito a obras de Marcel Duchamp (1887 – 1968). Mink (2006, p. 7) considera que “visto sob a perspectiva atual, Marcel Duchamp parece ser o mais influente artista do século XX”. Tal afirmativa em muito tem a ver com a proposta dos ready-mades (ou objetos “já acabados”, “prontos”, em uma tradução livre) idealizados pelo artista. Neste período questionador sobre as relações entre Arte e sociedade (sob forte afetação dos horrores da Primeira Guerra), os ready-mades designavam um tipo de objeto inventado por Duchamp (que consistiam em um ou mais objetos ou artigos de utilização cotidiana, com processo de fabricação em grande escala, e que eram expostos como obras de arte em espaços destinados a galerias e museus). Duchamp, assim, colhia estes objetos e os nomeava com algum título, assim como se poderia nomear um quadro, por exemplo. Pode-se apreender que havia aí uma apropriação de algo corriqueiro, do dia-a-dia, ao ressignificá-lo como objeto artístico, movimentando este questionamento da Arte Moderna no século XX. Um dos casos mais emblemáticos desta apropriação é “A Fonte” (1917) (FIG. 2, a seguir), um urinol de porcelana, apresentado de forma invertida, que Duchamp assinou com o pseudônimo de “R. Mutt” (“R” alusivo a Richard, nome que, na gíria francesa, tem o sentido de pessoa rica, e “Mutt”, um trocadilho com o nome da empresa onde adquiriu o urinol, “Mott Works”) e inscreveu para ser exposto em um salão de artistas independentes de Nova Iorque (que acabou não acontecendo frente às críticas da comissão de avaliação do salão). No segundo número da The Blind Man, revista publicada por Duchamp e os amigos Beatrice Wood e Henri-Pierre Roché, o caso de “R. Mutt” foi defendido da seguinte maneira: A Fonte do Sr. R. Mutt não é imoral, é absurda, tem tanto de imoral como uma banheira. É um objecto (sic) que se vê todos os dias nas montras dos canalizadores. Se o Sr. Mutt fez A Fonte com as suas próprias mãos ou não, isso não tem importância. Ele ESCOLHEU-A. Pegou num artigo corrente da vida, colocou-o de forma que faz desaparecer o significado utilitário sob o novo título e ponto de vista – deu-lhe um novo sentido (The Blind Man, No. 2, Maio de 1971, Nova Iorque. In: MINK, 2006, p. 67).

Esta defesa reitera o tensionamento existente entre o estatuto de dar sentido novo a alguma coisa extrínseca ao material costumeiro do fazer artístico e à própria noção do que é

8 Trecho do verbete “Assemblage”, da Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3 25 - Acesso em 10/02/03.

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da ordem de entendimento sobre a apropriação (além de romper com paradigmas ao contestar quem decide o que é Arte, se o artista ou curadores e galeristas, por exemplo).

FIGURA 2 – “A Fonte” (1917)9 de Marcel Duchamp

É possível encontrar diversos casos, sobretudo nos movimentos de vanguarda do século passado, para cotejar com o conceito de apropriação. O que se pode levantar como questão é que depois de os artistas modernistas se apropriarem de objetos, materiais e coisas que eram externas ao que era convencional para a pintura, mais tarde foram se delineando outras facetas da ideia de apropriação – no entendimento de que com o passar do tempo, a Arte não só centra a produção de vanguarda na busca pelo novo (e, neste sentido, pelo questionamento da práxis da arte em si), mas dá vazão para que o novo possa ser uma atualização do próprio passado. Assim, a apropriação também se dá neste rumo de trânsito entre uma reflexão do presente e da memória. Em outra vertente, da Filosofia da Linguagem, também se pode apontar autores e/ou correntes teóricas que ratificam ou fazem emergir estas interfaces possíveis. A primeira correlação com a noção de apropriação que estabelecemos nesta seara se dá a partir de Bakhtin (1998), entendendo que a língua teria um modo de funcionamento real amparada na noção do dialogismo. Ou seja, na medida em que os discursos se conformam em diálogo com

9 Imagem disponível em: http://www.invisiblebooks.com/fountain.jpg - Acesso em 11/02/13.

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outros, talvez seja plausível dizer que ao passo que constituímos discursos por meio ou na relação com outros, estamos aí nos apropriando de elementos da linguagem para tornar a nossa linguagem, em si mesma, legítima. Sobre isso, para o autor, (...) Orientado para o seu objeto, o discurso penetra neste meio dialogicamente perturbado e tenso de discursos de outrem, de julgamentos e de entonações. Ele se entrelaça com eles em interações complexas, fundindo-se com uns, isolando-se de outros, cruzando com terceiros; e tudo isso pode formar substancialmente o discurso, penetrar em todos os seus estratos semânticos, tornar complexa a sua expressão, influenciar todo o seu aspecto estilístico (BAKHTIN, 1998, p. 86).

No encadeamento destas considerações, Bakhtin estabelece o estudo de uma tipologia universal do romance, criando duas modalidades para ele: o monológico e o polifônico. Isto é importante para se levantar na relação com o conceito de apropriação, tendo em vista que o que caracteriza a polifonia é a posição do autor como regente do grande coro de vozes que participam do processo dialógico. Mas esse regente é dotado de um ativismo especial, rege vozes que ele cria ou recria, mas deixa que se manifestem com autonomia e revelem no homem um outro “eu para si” infinito e inacabável. Trata-se de uma mudança radical da posição do autor em relação às pessoas representadas, que de pessoas coisificadas se transformam em individualidades (BEZERRA, 2005, p. 194).

Tanto no que diz respeito aos estudos da linguagem como os da literatura, a dimensão do que seriam estratégias de se apropriar de outros discursos, vozes, indicam apoderar-se de algo, capturar, incorporar e colocar isto em diálogo e, em consequência, perceber estes discursos e vozes modificados, transformados. Esta noção vai ao encontro do que Kristeva propõe como conceito de intertextualidade (com base no trabalho de Bakhtin). Para a autora, “todo texto se constrói como mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto” (KRISTEVA, 1974, p.72). Deste modo, a analogia da absorção e transformação a partir da apreensão de diversos aspectos compõem um texto. Texto é aqui entendido na compreensão tanto da escrita como no fato de que uma imagem pode ser lida como texto (OLIVEIRA, 2005). Em um trabalho sobre a apropriação das práticas sociais, Smolka (2000) dimensiona aspectos da apropriação em comparação ao conceito de internalização, dizendo que Internalização, como um construto psicológico, supõe algo “lá fora”– cultura, práticas sociais, material semiótico – a ser tomado, assumido pelo indivíduo. A realidade, a concretude, a objetividade ou a estabilidade de tais materiais e práticas lhes dão as características de produtos culturais (SMOLKA, 2000, p. 28).

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Smolka (2000, p. 28) afirma que apropriação poderia ser utilizada como um sinônimo de equivalência para internalização, mas conjectura que o termo apropriação é “permeado por outras significações importantes, que trazem outras implicações conceituais”. Com isto, para a autora, o sentido adquirido é mais relacional, conjugado a significações. Além disso, o texto abarca a indagação de que apropriação sugere tornar próprio, tornar seu e também carrega a base daquilo que é adequado, pertinente (aos valores e normas socialmente estabelecidos). Outro autor que pode contribuir para tal discussão é Chartier (1995), da História Cultural, para quem, em linhas gerais, a apropriação é o meio através do qual pode-se perceber vínculos de poder e dominação que se dão no plano cultural. Para ele, a apropriação é uma produção que gera inteligibilidade10. Em outro contexto, mas igualmente trazendo o que é da ordem de poder e também de controle, Bar, Pisani e Weber (2007), no tratamento da apropriação em relação à tecnologia, indicam que o processo de apropriação constitui uma negociação sobre poder e controle na configuração da tecnologia, sobre seus usos e seus benefícios. Por isso, para os autores, o conceito é essencialmente político, relativizando quem usa a tecnologia, sob quais condições, para qual propósito e com que consequências. Assim, a apropriação, no contexto tecnológico, é definida por eles como o processo de interação e modificação na forma como é utilizada e no quadro social em que ocorre. No âmbito da Comunicação, McLuhan (2007) aponta para a ideia do conceito de remediação, que mais tarde é efetivamente denominado por Bolter e Grusin (1999). Aqui se faz a ligação da apropriação com o conceito de remediação na medida em que este último dá a entender que as mudanças de um produto midiático se dão em função de que suas características passam a ser justamente apropriadas por outras mídias. No que se pretende articular aqui como objeto de análise (imagens veiculadas no “TDUD?”), esta lógica soa estar em conformidade, pois o blog é constituído de produções que se valem de características de outros meios para criações e recriações de conteúdos para si. A compreensão de apropriação se dá ao passo em que conteúdos visuais e/ou textuais que são veiculados e produzidos por outros meios, são cooptados para o uso humorístico na web (em imagens, gifs, montagens, animações, vídeos, tweets, postagens).

10 Roger Chartier é um autor que deverá ser aprofundado em nossos estudos futuros, assim como Michel Foucault, que também angula conceitualmente a questão da apropriação.

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Neste campo, outro conceito que se pode aproximar com a ideia de apropriação é a noção de que estes conteúdos que são continuamente modificados são fruto do que Lemos chama de “ciber-cultura-remix” (2005, p. 1), isto é, “as possibilidades de apropriação, desvios e criação livre (que começam com a música, com os DJ‟s no hip hop e os Sound Systems) a partir de outros formatos, modalidades ou tecnologias”, que são potencializadas “pelas características das ferramentas digitais e pela dinâmica da sociedade contemporânea” (p. 2). Lemos destaca que a “liberação da emissão, o princípio em rede e a reconfiguração são consequências do potencial das tecnologias digitais para recombinar” fundam estas três principais leis que estão na base da ciber-cultura-remix, embora a novidade, neste processo, não seja “a recombinação em si mas o seu alcance” (2005, p. 2). A este aspecto, soma-se aqui ainda a reflexão de Fontanella (2009) sobre os conteúdos definidos como digital trash, ou o lixo digital. Para o autor, não importa a qualidade técnica do conteúdo, mas o fato de a audiência poder participar de sua criação (ao se modificar um texto, uma imagem, e enviá-los adiante para o riso coletivo na rede), tomando parte da criação do escárnio. Esta criação hipertextual também abarca um modo de se entender o que é uma apropriação. Assim, além de ser importante que a audiência seja co- criadora da paródia, sobretudo por meio desta noção da apropriação, torna-se necessário que, para que a brincadeira tenha sentido pleno, seu código seja compreendido entre os participantes. Desta maneira, compreende-se o conceito de apropriação como articulador de novos sentidos, como foi possível investigar até aqui. Segundo Fontanella (2009, p. 6), é o “caráter de entretenimento envolvido na cultura digital trash” o seu apelo social mais potente, uma vez que o “caráter comunitário do digital trash é evidenciado pelo fato de que o prazer da brincadeira depende do compartilhamento de códigos” (p. 3), conforme citou-se acima. Deste modo, a graça, o riso em torno do conteúdo digital trash e o fato de blogs com posts com imagens celebridades (onde são publicadas apropriações engraçadas com elas) serem considerados divertidos, podem ser apontados como fatores que fazem com que blogs de humor se apropriem de imagens de outros contextos e as veiculem.

3 O blog “Te Dou Um Dado” e as apropriações de imagens de/sobre celebridades O “TDUD?” foi criado em abril de 2007 e centra suas postagens no universo das celebridades, pautando seus conteúdos pela tônica do humor. Ele foi criado por duas pessoas

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(Ana Paula Barbi, a Polly, e Alessandra Siedschlag, Lele), inicialmente para comentarem a edição do programa “ Brasil 7” (neste período, era hospedado na plataforma gratuita blogspot com o nome de “Big Bosta Brasil”). Com o passar do tempo e o encerramento da sétima temporada do programa, as blogueiras passaram a estender seu conteúdo e comentar notas, notícias e peculiaridades sobre a vida das celebridades. Dentre os blogs que temos observado neste segmento, este tem a característica de focar suas postagens mais nas celebridades nacionais, o que particulariza o seu conteúdo. Desde 2009 o blog é hospedado no portal R711 e tem uma média diária de atualizações (em períodos de exibição de reality shows no Brasil esta média tende a crescer, com mais postagens em um mesmo dia). A seleção do “TDUD?” se justifica como objeto de análise (as imagens por ele veiculadas), pois ele possui grande visibilidade na web. Vale ressaltar que os blogs seguem sendo uma referência importante na criação e disseminação de conteúdo na rede. Outro aspecto relevante é que a rapidez possibilitada nas publicações das postagens, em associação com as características basilares de fluidez e instantaneidade da web, torna blogs como o “TDUD?” muito propícios para que ali o humor ocorra de forma veloz, com agilidade na possibilidade de propagação da informação/nota/chacota. A isto se associa uma característica do que é próprio para o se fazer rir, achar graça, debochar: o timing da piada. Este tempo da piada, no caso de um blog de humor sobre celebridades, é observado também na maneira distinta com que exploram as imagens dos famosos. Tendo em vista o contexto contemporâneo, pode-se dizer que nunca estivemos tão cercados de celebridades e suas imagens. Sendo assim, pelo interesse que despertam, celebridades configuram um tema caro à Comunicação, o que motiva a observação de como o “TDUD?” tem se apropriado das imagens que fazem referências a estas figuras. As postagens, de forma geral, se caracterizam pela presença de imagem e texto escrito. Para este artigo, procura-se observar como as imagens do blog sofrem o atravessamento direto das questões que levantamos sobre noções de apropriação. Para procedimentos de construção deste texto, observaram-se 40 páginas do blog de modo a serem buscadas semelhanças e diferenças nas origens e usos destas imagens – a fim de identificar algum tipo de padrão que nos orientasse para a criação de uma categorização (para, metodologicamente, facilitar esta análise frente à articulação com o conceito de apropriação).

11 www.r7.com.br

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Nestas condições, foram eleitos três tipos de ocorrências presentes de maneira mais constante no blog:

a) Imagens do tipo 1: Imagens apropriadas a partir de outros sites, portais de notícias ou perfis de sites de redes sociais de determinada celebridade); b) Imagens do tipo 2: Imagens apropriadas a partir de outros sites, portais de notícias ou perfis de sites de redes sociais de determinada celebridade, mas com alguma interferência gráfica, visual - inserção, apagamento, manipulação digital, sobre tal imagem); c) Imagens do tipo 3: Imagens apropriadas a partir de outros sites, portais de notícias ou perfis de redes sociais de determinada celebridade (normalmente são imagens em que a celebridade figura em alguma pose que não a favorece esteticamente) e que são sugeridas ao público leitor do blog (sob o nome de “Concurso Cultural”) para serem trabalhadas com interferências gráficas, visuais, dos próprios leitores, ressignificando tal imagem e, posteriormente, sendo publicadas no blog.

Conforme a categorização criada, a seguir procuramos perceber estes diferentes níveis de apropriação verificados nas imagens veiculadas no “Te Dou Um Dado?”, conforme exercitaremos na análise abaixo: a) Imagens do Tipo 1: O primeiro grupo de imagens de/sobre celebridades que são vistas de forma recorrente no blog dizem respeito àquelas imagens que são capturadas a partir de outros sites, portais de notícia ou mesmo perfis de sites de redes sociais de determinada celebridade. Assim, o “TDUD?” se apropria de imagens que estão sendo expostas em outros ambientes da web, como os citados acima, e cria uma postagem utilizando este tipo de imagem. Não há interferência direta (gráfica/visual) sobre a imagem em si, no entanto, na medida em que as blogueiras, também vistas como usuárias da rede, fazem a definição da forma própria como vão capturar uma imagem e transpô-la para uma postagem – lembrando que este uso pode ou não estar de acordo com os interesses tanto de quem figura na imagem quanto de onde ela foi retirada. No exemplo escolhido para esta primeira categorização, vemos uma postagem do blog (de 08/01/2013), com uma foto retirada do perfil do

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Instagram12 da apresentadora Monique Evans (perfil @moniquevansreal). A imagem é uma fotografia em que figura a mãe de Monique Evans recebendo oxigênio numa ambulância. O “TDUD?” se apropria desta fotografia para criar um post, conforme visto abaixo (na FIG. 3):

FIGURA 3 - Imagem publicada no perfil @moniqueevansreal e a mesma imagem apropriada no blog “TDUD?”

Pela curiosidade de Monique ter fotografado a mãe em uma ambulância e ter postado a foto no Instagram, o blog veiculou um postagem sobre isto e a repercussão (de questionamento do público sobre a atitude de Monique) nas redes sociais confirmou que o uso da imagem da forma como foi feita, não estava de acordo com os interesses da “fornecedora” da imagem. Este é o tipo de exemplo mais comum dos usos e implicações realizados na maioria das postagens do “TDUD?”. b) Imagens do Tipo 2: Nesta segunda noção de apropriação apreendemos que esta envolve um processo em que há inclusão de camadas, algo relacionado à adição de novas formas de aplicação de um mesmo artefato. Neste sentido, as Imagens do Tipo 2 também são capturadas em outros sites, portais de notícias ou perfis de sites de redes sociais de determinada celebridade, mas neste caso, quando transpostas para o “TDUD?” elas já sofrem alguma interferência gráfica, visual, com a manipulação digital (com o uso do software Adobe Photoshop, por exemplo), de inserção ou apagamento, mas de maneira ainda pontual, mais breve, como no exemplo que veremos a seguir. No caso escolhido, o blog selecionou

12 Aplicativo para compartilhamento de fotos com efeitos de filtros e que tem seu funcionamento similar à noção de uma rede social (criação de perfil, escolha de avatar, troca de comentários entre usuários)

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uma imagem da atriz Carolina Dieckman saindo de uma churrascaria com os filhos (a postagem data de 15 de outubro de 2012). Tal imagem foi inicialmente veiculada no site Ego13 (FIG. 4). Pelo fato das blogueiras terem percebido uma personagem que está presente na fotografia quase como uma figurante, mas em uma pose que gera o riso (a mulher está com os dedos no nariz), além da imagem capturada e transposta para a postagem, ela é novamente replicada – deste vez com uma interferência gráfica sobre o símbolo do restaurante, um porco (da churrascaria “Porcão”, no ): linhas que sinalizam a direção do olhar do animal para a mulher que está no fundo da cena e corações no final desta série de traços. Assim, faz-se a clara alusão entre a figura do porco e a atitude da mulher presente na imagem. Cria-se, assim, uma outra “camada” sobre a imagem inicialmente utilizada para o post, apropriando-a de modo a desvelar e reforçar outros significados na fotografia (FIG. 4):

FIGURA 4 - Imagem capturada do site Ego (www.ego.com.br), veiculada no “Te Dou Um Dado?” e a sequência da mesma fotografia, com interferências visuais, publicada no blog

c) Imagens do Tipo 3: A terceira categoria que se desenhou a partir da observação das imagens de celebridades veiculadas no “TDUD?” diz respeito às Imagens do tipo 3. Este seria um processo mais extremo ao passo que aqui temos o usuário entrando em conflito mais direto com quem figura na imagem. Na relação deste tipo de apropriação com as imagens do blog, o que se notou é que o mesmo promove, sem periodicidade definida, um “Concurso

13 www.ego.com.br

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Cultural” para os seus leitores. Este concurso configura o nome de uma seção do blog (por meio de posts que são etiquetados com esta definição). O “Concurso Cultural” consiste em postagens em que as blogueiras propõem que os leitores façam algum tipo de interferência visual em alguma fotografia de celebridades em alguma pose ou situação inusitada (fotografia esta que é publicada em algum veículo, como site de revista ou portais de jornais ou de grandes grupos de comunicação, de onde é retirada). A imagem selecionada é publicada no blog, categorizada neste “Concurso Cultural”, e os leitores copiam esta imagem e a manipulam (provavelmente em softwares como o Adobe Photoshop), comumente inserindo a imagem em outro contexto de cenário, realizando apagamentos, colocando outros elementos, atribuindo novos sentidos e ressignificando tais fotografias. As responsáveis pelo blog escolhem aquelas que consideram as melhores imagens (normalmente em número de três ou quatro, mas não havendo regras para tal) e as publicam alguns dias depois com o título de “Resultado do Concurso Cultural”. As imagens vencedoras geralmente só têm a indicação do primeiro nome ou apelido do autor (até como forma de precaver maiores problemas entre os leitores, pois muitas destas imagens podem ser consideradas agressivas, com distorções de sentido, etc.). Outra possibilidade bastante corriqueira na proposição de cada concurso é o fato de um leitor ver alguma imagem peculiar de celebridade sendo veiculada na web, podendo enviar a foto como sugestão para um próximo concurso para o e-mail de contato do blog. Caso as blogueiras do “TDUD?”, considerem a imagem muito boa para ser alçada a um concurso, as mesmas creditam a ideia ao leitor que fez a sugestão. No exemplo abaixo temos, inicialmente, uma imagem de José Serra andando de skate, sendo auxiliado por populares e partidários, com uma expressão de susto, ou medo, ao tentar se equilibrar. Esta foto (FIG. 5) foi retirada de uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo e apropriada, capturada e transposta, para ser promovida como possibilidade de interferência mais extrema. A postagem da promoção do “Concurso Cultural ft. José Serra”14 data de 23 de julho de 2012. Nesta postagem já há um enquadramento diferente da foto que foi publicada na imprensa, conforme podemos ver a seguir:

14 Entende-se o “ft.” como “featuring”, do inglês, significando “com”, tais como nos chamamentos de filmes com grandes astros.

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FIGURA 5 - Imagem veiculada na Folha de S. Paulo15 e posteriormente enquadrada com novo recorte e veiculada no “Te Dou Um Dado?” para um “Concurso Cultural” entre os leitores

Na sequência, em 24 de Julho, o blog publicou a primeira etapa de resultados do “Concurso Cultural”. Aqui, escolheu-se três das quatro imagens vendedoras (FIG. 6) para exemplificar a relação entre Imagens do Tipo 3 e um tipo de apropriação mais extremada:

FIGURA 6 - Resultados de apropriações da imagem proposta em um “Concurso Cultural” do “TDUD?”

Nos resultados das interferências por parte do público, podemos notar que tais interferências são mais incisivas, agressivas até. Apropria-se de outros cenários para esta

15 Imagem disponível em: http://f.i.uol.com.br/folha/poder/images/12205161.jpeg - Acesso em 22/01/13.

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construção de ressignificação da imagem inicialmente capturada e transposta para o blog. Na primeira delas, vê-se que há um apagamento da figura do skate e nos pés de José Serra encaixa-se a imagem de uma privada, de modo a sugerir que o político estava sendo colocado dentro de uma. Na segunda imagem, novamente há a noção de apagamento, obliteração da parte inferior da imagem, agora ainda mais forte, pois os pés e um pedaço das pernas de Serra são suprimidos para dar lugar a um tubarão que o está engolindo. Além da figura do animal, há a presença da própria água do mar e respingos desta sobre as pessoas que ladeiam o ex- candidato à prefeitura de São Paulo. Por fim, o nível mais extremado de apropriação fica ainda mais evidente, tendo em vista que a o corpo todo de Serra é suprimido da imagem, só restando a cabeça – que agora passa a ser apropriada na fotomontagem de um cartaz do filme “Back to the Future” (“De Volta para o Futuro”). As imagens resultantes dos concursos culturais promovidos no blog baseiam-se em sobreposições, apagamentos, trabalho em camadas, em distintas conformações. Faz-se um remix, agregam-se possibilidades para uma mesma imagem, atribuindo-se, por meio de recortes, colagens, mosaicos e novas organizações, outros contextos, deslocamentos, polifonias e ressignificações. Partindo-se do princípio de gradação nos tipos de imagens verificadas no blog, entende-se que as Imagens do Tipo 1, 2 e 3 vão mantendo traços iniciais de um mesmo tipo de apropriação (todas são capturadas, pegas, roubadas de um outro contexto e inseridas no “TDUD?” para constituírem uma postagem) e, na medida em que avançam nestes tipos de identificação, podemos perceber que estas apropriações vão ficando cada vez mais passíveis de modificações, nos dirigindo a um sentido dialógico, polifônico ainda mais claro. Para estas apropriações das Imagens de Tipo 3, sobretudo, há de se considerar a crescente popularização do acesso e do manuseio de ferramentas digitais de produção de vídeos, fotos, músicas e textos, e a possibilidade de sua difusão pelos canais de publicação e compartilhamento da web 2.0, impulsionaram o conteúdo gerado pelo consumidor (Shirky, 2008). Se anteriormente ao desenvolvimento da interface cooperativa da internet os meios clássicos de comunicação de massa dominavam a filtragem das publicações midiáticas, a viabilização de criar e poder disponibilizar tais produções trouxe a criatividade amadorística à tona no cenário digital e deu passagem livre e ilimitada ao conceito de apropriação nesse contexto.

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4 Considerações Finais Discutir noções iniciais do conceito de apropriação se mostra fundamental frente ao tipo de imagens que estão sendo trabalhadas e identificadas a partir do blog “TDUD?”. Como se colocou no início deste artigo, muitas vezes tomamos o sentido de entendimento tácito do que seria da ordem da apropriação, mas não discutimos como este conceito foi (e segue) sendo construído historicamente, sob a visão de diferentes campos do conhecimento. Este texto resulta do exercício de se refletir sobre tal conceito, ainda que se tenha a compreensão de que o mesmo necessita ser aprofundado - tendo em vista as múltiplas disciplinas e a profundidade que ele envolve. Além disso, buscou-se levantar questões de reflexão sobre o termo para, depois, se ter condições de associá-lo a uma análise de um artefato tão caro ao trabalho que vem sendo desenvolvido, as imagens de celebridades que são apropriadas neste tipo de blog e que são sempre pautadas pelo viés do humor (ponto que só foi mencionado aqui diante da elaboração dos outros aspectos neste momento). O “TDUD?” consegue captar características que permeiam fazeres da web, assim como é o caso destas apropriações de imagem. Isto também passa a ser importante ao passo que antes lidávamos com a imagem das celebridades de forma distinta a estes fazeres que um ambiente como este nos proporciona. Antes, vistas à luz da perfeição e de ideais a serem seguidos, e, agora, inseridas em novos contextos, de chacota, daquilo que é risível e, assim, mais próximo do humano, do próprio leitor. Os concursos, então, carregam características próprias da web como instantaneidade e rapidez. As apropriações percebidas e indicadas nos conduzem a pensar em novas formas de expressão e comunicação que ficam mais latentes quando observadas na web, na inserção de uma cultura que é estrelada pela presença constante das imagens. Por fim, o “TDUD?”, por meio dos tipos de imagens veiculadas e que agrupamos aqui em categorias distintas, nos dá pistas para questões mais profundas acerca dos processos de apropriação e de como temos lidado com tal conceito ao longo do tempo e, agora, no contexto da web.

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