Universidade do Minho Instituto de Ciências Sociais

Sofia Isabel Dias Alves 80

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UMinho|20 outubro de 2014 Universidade do Minho Instituto de Ciências Sociais

Sofia Isabel Dias Alves

Uma nova maneira de fazer televisão: O caso do Canal180

Relatório de Estágio Mestrado em Ciências da Comunicação Área de Especialidade em Audiovisual e Multimédia

Trabalho realizado sob a orientação da Professora Doutora Sandra Marinho

outubro de 2014

Agradecimentos

Antes de mais quero agradecer a todos aqueles que me acompanharam e ajudaram durante o meu percurso académico. Quero agradecer e dedicar este trabalho aos meus pais e à minha irmã por todo o apoio que me deram.

Quero também agradecer ao Canal180 e a toda a equipa pela oportunidade que me proporcionaram para ganhar experiência na área e por toda a ajuda que me deram durantes os três meses e mesmo depois enquanto preparava este relatório.

Por fim, quero agradecer à minha orientadora Sandra Marinho pelo esforço e dedicação que demonstrou, seguindo, auxiliando e corrigindo todas as fases deste relatório.

O meu muito obrigada!

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“Uma nova maneira de fazer televisão: O caso do Canal180”

Resumo O presente Relatório de Estágio é baseado na minha experiência de estágio de três meses no Canal180. Um canal totalmente diferente dos restantes canais de televisão portugueses, um canal inteiramente dedicado às artes e à criatividade e um canal em que qualquer pessoa pode participar (open source).

Durante os três meses em que estive no Canal180, tive a oportunidade de passar pelas diferentes áreas e de fazer um pouco de tudo. As minhas tarefas passaram pela procura de novos conteúdos para televisão e para a página de facebook do canal, bem como pela produção multimédia, pela edição de peças televisivas para o programa MAG, um magazine cultural diário. Com esta experiência apercebi-me que a televisão está a mudar, principalmente depois de entrarmos na chamada “era digital”. Com esta alteração tecnológica a televisão passa a estar também nossos telemóveis, computadores e tablets. Para se conseguir atrair um maior número de pessoas nestas diferentes plataformas é preciso repensar os conteúdos e a forma como os transmitimos. Esta grande diversidade de meios de comunicação permite que haja uma maior especialização da mensagem para cada segmento da audiência, portanto “devido à diversidade dos media e à possibilidade de visar um público-alvo, podemos afirmar que no novo sistema dos media, a mensagem é o meio. Quer dizer, as características da mensagem hão-de moldar as características do meio” (Castells,2003:447).

Este relatório foca-se na forma inovadora de fazer televisão do Canal180, principalmente pelo facto de este ser um canal open source, e de funcionar através de parcerias com sites (Archdaily, Pitchfork, Cranetv, Guestalten, Fubiz entre outros) e com criadores (Boris Hoppek, David Wilson, Vincent Moon, Bret Novak, Hiro Murai, Mac de Marco entre muitos outros). Para além de que é um canal low cost que funciona com apenas duas câmaras DSLR e o software de emissão é o mais barato a nível nacional.

Todos os trabalhos desenvolvidos durante o período de estágio serão apresentados neste relatório, bem como uma pesquisa mais profunda sobre as mudanças que a “caixa mágica” tem sofrido nos últimos tempos, com o aparecimento das novas tecnologias que vão alterando a linguagem audiovisual.

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“A new way of making Television: The case of Canal180”

Abstract

The present internship report is based on my experience of three month in Canal180. A totally different channel from the others Portuguese television channels, a channel entirely devoted to the arts and creativity and a channel in which anyone can participate (open source).

During the three months that I was in Canal180, I had the opportunity to go through the different areas and to do a bit of everything. My duties were to look for new content for television and for the facebook page of the channel, as well as some multimedia production, editing television pieces for the “MAG” program, a daily cultural magazine. With this experience I realized that television is changing, especially after we entered the so-called “digital era”. In the digital era, television starts to be in our cell phones, computers and tablets. To be able to attract a greater number of people in these different platforms is necessary to rethink the content and the way we transmit it. This great diversity of media allows for greater specialization of the message for each audience segment, so “due to the diversity of the media and the possibility of targeting an audience, we can say that in the new media system, the message is the medium. Which means, the characteristics of the message will shape the characteristics of the environment” (Castells, 2003: 447).

This report focuses on the innovative way of making television of the Canal180, mainly because this is an open source channel, and because it works through partnerships with websites (Archdaily, Pitchfork, Cranetv, Guestalten, Fubiz entre outrso) and creators (Boris Hoppek, David Wilson, Vincent Moon, Bret Novak, Hiro Murai, Mac de Marco entre muitos outros). Apart from that this is a “low cost” channel that works with only two DSLR cameras and the software of emission is the cheapest nationwide.

All works developed during the internship period will be presented in this report, as well as a deeper study of the changes that the “magic box” has endured in recent times, with the appearance of new technologies that will change the audiovisual language.

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Índice

Introdução ...... 10 1. O Canal180 ...... 13 1.1 A empresa ...... 13 1.2 O Canal180 ...... 13 1.3 Missão e Público-alvo ...... 15 1.4 Operação tecnológica e modelo de negócio ...... 16 1.5 Programação e conteúdos ...... 16 1.6 Parcerias e colaborações ...... 18 1.7 Prémios obtidos ...... 19 2. A experiência de estágio ...... 21 2.1 Realização e filmagens ...... 22 2.2 Produção ...... 22 2.3 Pós-Produção ...... 23 2.4 Escolha de conteúdos ...... 24 2.5 Traduções e legendagem ...... 24 2.6 Entrevistas e voz off ...... 24 2.7 Avaliação/Reflexão da experiência de estágio ...... 25 3. A televisão generalista e a televisão segmentada ...... 27 3.1 Um breve enquadramento da história da televisão ...... 27 3.2 Interatividade e participação das audiências na televisão ...... 31 3.2.1 Problemas da televisão generalista...... 31 3.2.2 A Internet, o digital e a difusão de conteúdos televisivos ...... 35 3.2.3 A interatividade na televisão tradicional e generalista ...... 38 3.2.4 O aparecimento do Canal180 ...... 40 3.3 Interdisciplinaridade e transversalidade dos profissionais de comunicação ...... 47 3.4 Internet como difusora dos conteúdos 180 ...... 51 4. Considerações sobre as entrevistas e sobre a programação dos canais generalistas e do 180…...... 53 4.1 Metodologia ...... 53 4.2 Considerações sobre as entrevistas ...... 53 4.3 Considerações sobre a programação cultural ...... 54 5. Considerações finais ...... 57 6. Referências Bibliográficas ...... 60 7. Anexos ...... 64

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7.1 Guião das entrevistas ...... 64 7.1.1 Guião da entrevista a João Vasconcelos (Diretor executivo do Canal180) ...... 64 7.1.2 Guião da entrevista com Nuno Alves (Diretor de programação) ...... 64 7.1.3 Guião da entrevista a Rita Moreira (Coordenadora editorial) ...... 64 7.2 Links para alguns dos trabalhos produzidos durante o estágio ...... 65 7.2.1 Peças criadas para o MAG ...... 65 7.2.2 Alguns episódios traduzidos e legendados ...... 65

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Índice de Tabelas

Tabela 1 Uso da interatividade na televisão portuguesa em 2004 ...... 39 Tabela 2 Salas de espetáculo em ...... 41 Tabela 3 Espetáculos ao vivo em Portugal ...... 42

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Índice de Figuras

Figura 1 Logo empresa ...... 13 Figura 2 Logo Canal180 ...... 13 Figura 4 Página do facebook do Canal180 ...... 14 Figura 3 Página do Youtube do Canal180 ...... 14 Figura 5 Website Canal180 ...... 14 Figura 6 Oferta Nacional VS Oferta Internacional ...... 15 Figura 7 Design Tecnológico ...... 16 Figura 8 Grelha de programas ...... 18 Figura 9 Parcerias e colaborações ...... 19 Figura 10 Prémio atribuído ao canal pelo seu design inovador ...... 20 Figura 11 Prémio que permitiu a criação do canal ...... 20 Figura 12 A televisão como meio ...... 31

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Introdução

Como todos já nos apercebemos, a televisão ou como muitos ainda lhe chamam a “caixa mágica”, está a mudar. Quando apareceu, a televisão provocou uma alteração na sociedade, pois veio alterar a forma como se comunicava e veio juntar a imagem, ao som e à escrita. Esta assumiu o papel de mais importante meio de comunicação, e tinha como funções informar, entreter, publicitar e educar toda a sociedade, “todos os processos que se pretendem comunicar à sociedade em geral, da política aos negócios, do desporto à . A televisão modela a linguagem da comunicação em sociedade” (Castells,2002:442). Apesar de se ter tornado mais comercial e de o número de canais ter aumentado muito, a informação que cada canal oferece não difere muito. Para além disto os interesses da audiência são postos de lado, visto que existe muito pouca participação da mesma. Isto deixa transparecer que a televisão, mesmo tendo avançado na técnica e na quantidade de pessoas que atinge, estagnou no que respeita à criatividade, todos estão a fazer o mesmo (Jeanneney,1996:25).

Consequência deste estagnamento da televisão, ou como forma de chegar individualmente a cada pessoa, entramos na era digital: o aparecimento dos computadores e internet. Assim, como refere Jenkins (cit. por Macnamara,2010: 25) “as indústrias dos média estão a passar por outra mudança de paradigma”.

Com a introdução da era digital, a chegada do computador e da internet, entramos num período de mudança revolucionária nas tecnologias de comunicação o que provocou uma mudança na perspetiva e compreensão humana e, em consequência, nos meios de comunicação de massas. Isto porque o computador fez evoluir todos os processos de comunicação humana e tornou mais fácil a transmissão de conteúdos.

Para além do aumento de plataformas de transmissão de conteúdos (computador, smartphone e tablet) verificamos também um aumento no que respeita a atividades e oferta cultural. Todos os dias estreiam novas peças de teatro, novos filmes, novas exposições e novos concertos, mesmo a nível nacional. Isto, juntamente com o facto de haver pouca oferta televisiva no que respeita à oferta cultural, justificou o aparecimento do Canal180, o primeiro canal português deste género.

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Com o aparecimento deste projeto, surgiu no mercado português uma nova maneira de fazer televisão. Como já referi este é um canal open source, em que qualquer pessoa pode participar e em que grande parte dos programas resulta de parcerias com outras televisões ou sites. São poucos os programas originais, e os que existem têm normalmente a participação do público. Mesmo tendo poucos recursos, o facto de os conteúdos serem estritamente culturais e a existência de participação por parte da audiência, tornam este canal bastante apelativo ao público, principalmente o jovem. Todos os programas e vídeos são pensados ao pormenor e depois publicados nas redes sociais do canal (onde têm maior visibilidade).

Este relatório é, então, baseado na minha experiência de três meses no Canal180. O Canal180, é o primeiro canal português dedicado à cultura, criatividade e artes. Foi criado pela empresa OSTV (Open source television) e tem já uma rede de colaboradores nacionais e internacionais que vão desde empresas, sites e televisões (Archdaily, Pitchfork, Cranetv, Guestalten, Fubiz entre outros) e ainda criadores (Boris Hoppek, David Wilson, Vincent Moon, Bret Novak, Hiro Murai, Mac de Marco entre muitos outros). São estas colaborações, mais a participação do público, que fazem com que seja possível a existência deste canal.

A fundamentação deste relatório é feita, principalmente, através da experiência e do conhecimento adquirido durante os três meses (Janeiro a Abril de 2014). No entanto, torna-se crucial que esta experiência seja suportada por conceitos teóricos e por autores relevantes da área. É ainda importante para este trabalho perceber com funciona a empresa e como decorreu a experiência de estágio, pois só assim poderei estabelecer a relação entre as tarefas desenvolvidas e a fundamentação teórica.

Com este estágio apercebi-me que a televisão está a mudar, e que cada vez vai mudar mais. Daí surge a questão que vou aprofundar: Por que é que um canal de televisão deve apostar na internet como principal meio para a difusão dos seus conteúdos?

Este relatório começa com a apresentação da empresa e com uma breve reflexão sobre o que aconteceu durantes os três meses de estágio na mesma. Depois, achei relevante fazer um breve enquadramento teórico no que respeita a história da televisão no mundo e, particularmente, em Portugal.

Para a total compreensão do Canal180 e as diferenças em relação aos canais generalistas o capítulo teórico, baseado nas opiniões de diferentes autores da área, fala do aumento da

11 interatividade e da participação das audiências, da interdisciplinaridade e transversalidade dos profissionais de comunicação e ainda da utilização da internet como principal difusora de conteúdos 180. Temas que despertaram a minha atenção devido à experiência do estágio.

O último capítulo aborda a metodologia utilizada (entrevistas a elementos do Canal180), bem como breves considerações sobre a programação 180 e a programação cultural dos canais generalistas portugueses (RTP, SIC, TVI).

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1. O Canal180

No capítulo introdutório deste relatório vou fazer uma apresentação da empresa, o Canal180. Vou falar de todas as opções que foram tomadas para criar o primeiro canal cultural em Portugal: qual a missão e o público-alvo, qual a opção tecnológica, a programação e os conteúdos, as parcerias e os prémios que obtiveram até agora. Toda a informação apresentada neste capítulo surge da minha experiência de estágio, de informações retiradas do site da empresa, mas principalmente de entrevistas que realizei a três elementos do canal: o diretor executivo, a coordenadora editorial e o diretor de programação.

1.1 A empresa

O Canal180 é parte integrante da empresa OSTV (Open Source Television), uma sociedade criada em Janeiro de 2010, que tem como principal objetivo o exercício da atividade televisiva, a produção de conteúdos audiovisuais e multimédia e ainda a prestação de serviços de auditoria.

A empresa está dividida em três áreas: marketing e vendas, operações e conteúdos. O fundador e diretor executivo da OSTV é João Vasconcelos que é responsável pelo departamento de marketing e vendas, que trata das relações internacionais, da gestão da marca e inovação. Nuno Alves, diretor de programação, trata das operações, departamento responsável pelo planeamento, transmissão, produção executiva e desenvolvimento tecnológico. Os conteúdos ficam a cargo de Rita Moreira, que é ainda editora do programa MAG, que se encarrega de desenvolver a oferta e abordagem criativa do canal, bem como a realização e a publicação.

Figura 1 Logo empresa 1.2 O Canal180

O Canal180 é o primeiro canal português dedicado às artes e à criatividade, com uma programação inteiramente cultural. Para além disto, o Canal180 reclama também o título de ser o primeiro canal de televisão do mundo open source (qualquer pessoa pode participar na programação). O canal, que ocupa a posição 180 da NOS (daí ter surgido o nome), conta com emissões regulares desde Figura 2 Logo Canal180

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25 de Abril de 2011 e pode ainda ser acompanhado através de outras plataformas digitais:

 Website: http://canal180.pt/  Youtube: https://www.youtube.com/user/canal180  Facebook: https://www.facebook.com/canal180  Aplicação para mobile (smartphone e tablets)

Figura 3 Página do facebook do Canal180 Figura 4 Página do Youtube do Canal180

Figura 5 Website Canal180

A OSTV lançou este canal devido ao generoso aumento de produção cultural que se tem verificado nos últimos anos. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) e do Ministério da Cultura, os espetáculos de dança duplicaram, os de teatro triplicaram e as salas de espetáculo do país cresceram 300%. No entanto, os meios de comunicação tradicionais não foram capazes de acompanhar este crescimento.

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Figura 6 Oferta Nacional VS Oferta Internacional

Fonte: OSTV

Este canal tenta mudar a forma como se vê e como se faz televisão nos dias de hoje, e a principal preocupação é a de proporcionar ao espectador uma nova experiência televisiva, bem como a difusão e promoção do talento e criatividade.

1.3 Missão e Público-alvo

O Canal180 tem como missão oferecer uma alternativa televisiva a quem procura novos conteúdos audiovisuais, num contexto cultural que está cada vez mais fragmentado. O canal pretende orientar os jovens e jovens-adultos para uma vida mais ligada à cultura, promovendo gostos que não se prendam apenas com a música, mas que abranjam também o cinema, o teatro, a dança, a pintura, entre outras temáticas com menor projeção. Outro objetivo deste projeto é descobrir e incentivar uma nova geração de talentos, promovendo estas atividades mais criativas e culturais como fator de competitividade e de criação de valor não só social como económico.

Sendo um canal especializado em cultura não consegue atingir todas as faixas etárias. O público-alvo do canal180, segundo o diretor executivo, é: os jovens adultos, informados e qualificados, culturalmente ativos e audiências com consumo elevado e fragmentado de conteúdos em todos os suportes digitais.

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1.4 Operação tecnológica e modelo de negócio

A operação tecnológica do Canal está pensada como resposta ao desafio de tornar as plataformas mais permeáveis e horizontais, de uma forma organizada e relevante. O que significa criar um produto editorial com mais capacidade de inovação e originalidade e que consiga sobreviver em diversas plataformas de comunicação Figura 7 Design Tecnológico Fonte: OSTV integrada. Este é o tipo de competitividade de que os novos media precisam para arrecadar novas audiências. Por isto, os conteúdos são produzidos ou escolhidos tendo em atenção a sua capacidade de se sustentarem em televisão, mas de igual forma nas redes socias e nas aplicações para Ipad e Iphone.

Baseado num modelo de negócio low cost, o Canal180 funciona num pequeno escritório, com alguns computadores para edição e um para transmissão. Existem duas câmaras DSLR e uma de qualidade 4k (adquirida enquanto eu estava em estágio). Não há estúdios nem régies. Não há apresentadores, só voz off. A equipa é pequena, mesmo contando com os estagiários. Ainda assim conseguem fazer uma emissão de 24h.

O software de emissão foi criado exclusivamente para o Canal, pelo Nuno Alves (atual diretor de programação), e é a nível nacional a emissão televisiva mais barata.

1.5 Programação e conteúdos

Quando foi lançado, a 25 de Abril de 2011, o Canal180 apenas tinha emissão seis horas por dia, das 20h às 02h, isto porque pretendia-se atingir o público mais jovem. No entanto, passados seis meses, a emissão passou a ser das 8h00 às 02h00. Neste momento, o Canal180 já transmite 24 horas por dia.

No início, da programação destacava-se o MAG (magazine180), depois começou-se a apostar em documentários, minidocs, programas inteiramente dedicados a música e parcerias com criadores.

Os conteúdos do Canal180 privilegiam os movimentos culturais nacionais e internacionais, o que envolve vários tipos de programas e documentários sobre: música, dança, teatro, artes visuais e urbanas. Neste momento, na sua grelha televisiva apresenta programas originais como:

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 MAG (magazine180) – é um programa diário que funciona como um magazine cultural. Dá a conhecer tudo o que se passa a nível nacional e internacional relacionado com a cultura, vai da música ao cinema passando por exposições e instalações artísticas. O material utilizado nas peças de magazine vem de diversas fontes, como por exemplo dos próprios artistas;  I Like – este programa foi criado para mostrar os trabalhos que inspiram os Like Architects, um grupo de arquitetos do Porto que tem intervenções artísticas em vários países. Através de uma parceria com o ArchDaily, este programa passou no Brasil e nos Estados Unidos;  Minidoc/ID – Documentários de curta duração que dão a conhecer artistas de diferentes áreas;  180 segundos – Têm a mesma função dos minidoc, mas duram apenas 180 segundos;  No enemies de Boris Hoppek- uma série criada durante o Creative Camp 2013. Podemos seguir os passos deste artista durante a semana que passou na cidade de Abrantes e ver as reações dos munícipes às suas intervenções artísticas;  Oliva sessions - Uma série de concertos secretos que aconteceram na renovada fábrica Oliva, em Santa Maria da Feira;

Conta ainda com:

 Trip – Um programa sobre viagens criado pelo Canal180, mas cujo conteúdo provém de colaborações internacionais. Qualquer pessoa pode enviar conteúdos sobre as suas viagens;  Bodyspace – Produzido pelo 180 em parceria com o site português Bodyspace. É dedicado à música independente;  Banda do Dia – Um programa diário que apresenta uma banda. Para além dos vídeos musicais, o programa contém entrevista e concertos da banda;

A programação inclui então programas de outros criadores, nacionais e internacionais, como:

 Petites Planètes, um exclusivo do realizador francês Vincent Moon para o Canal 180. Uma série de documentários que apresentam as diferentes musicalidades que este jovem realizador vai encontrando nos quatro cantos do mundo;

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 The Avant Garde diaries – É uma série sobre o talento que existe no mundo. Jovens realizadores procuram as melhores histórias sobre arte, ciência, desporto e cozinha;  Gestalten tv – Uma parceria com o site alemão Gestalten. Pequenos episódios sobre artistas inovadores e líderes culturais que se atrevem a mudar a paisagem artística dos dias de hoje;  The wild honey pie - Uma parceria com o site com o mesmo nome. Cada episódio é um espetáculo ao vivo de uma banda.

Estes são apenas alguns dos programas que o Canal180 apresenta, principalmente devido às parcerias que conseguiu até agora.

Figura 8 Grelha de programas

Fonte: Site Canal180

1.6 Parcerias e colaborações

A produção de conteúdos não é prioritária para o Canal, mas antes a modelação e a reconstrução dos mesmos através do material em bruto enviado para a equipa, e as parcerias que vai estabelecendo com sites e com artistas.

Durante os três anos de existência, o Canal180 já criou diversas parcerias, quer a nível comercial como institucional.

A nível comercial podemos distinguir as parcerias com instituições e marcas. Das instituições distinguem-se as parcerias com Serralves, a Fundação Gulbenkian, Casa da Música, Centro Cultural Vila Flor, Bienal de Cerveira, Teatro Nacional de São João e Fundação Cidade de Guimarães (no âmbito de Guimarães Capital Europeia da Cultura 2012). Para estas instituições o

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Canal180 faz vídeos promocionais que serão utilizados pelas mesmas. A nível das marcas o Canal180 tem parcerias com a Optimus (agora NOS), o IKEA, a Redbull, o McDonalds entre outros.

As parcerias institucionais têm resultado em programas de estágio, através da Universidade do Minho, Universidade do Porto, Universidade Católica Portuguesa entre outras. Para além disto o Canal180 tem estabelecido parcerias com outros sites e empresas, o que traz novos conteúdos para a programação do Canal. Parcerias com os Like Architects, que resultou no programa I LIKE, com o site Bodyspace, com a Música Portuguesa a Gostar dela própria e mais recentemente com sites internacionais como CraneTV, GestaltenTV, Petite Planéte, Focus Forward entre muitas outros. É preciso ainda falar das parcerias criadas com os próprios artistas e criadores, que resultam, por exemplo, em programas como 180 segundos ou MiniDoc. Entre os criadores destacam-se: David Wilson, Vincent Moon, El Guincho, Boris Hoppek, Brett Novak, Hiro Murai, Mac De Marco, Ana Aragão, Sam the Kid entre muitos outros.

Figura 9 Parcerias e colaborações

Fonte: Site Canal180

Todas estas parcerias são fundamentais para a produção de conteúdos para o MAG e mesmo para o funcionamento do Canal180. Sendo um canal open source funciona muito com materiais não próprios.

1.7 Prémios obtidos

O Canal180 recebeu, em 2010, o prémio Nacional Indústrias Criativas Unicer/ Serralves 2010. Foi este prémio que tornou possível a existência do Canal. Mais recentemente, em 2012, foi distinguido com um leão de Bronze no festival de Cannes, na categoria de Design, um reconhecimento da sua identidade gráfica.

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Figura 10 Prémio atribuído ao canal pelo seu design inovador

Figura 11 Prémio que permitiu a criação do canal

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2. A experiência de estágio

Antes de falar da experiência de trabalhar numa televisão durante três meses, é importante dizer que fiquei bastante surpreendida com os escritórios do Canal180. Em nada se comparavam com os escritórios de uma televisão: não havia um único estúdio de gravação, tinham apenas 10 pessoas a trabalhar e todo o material parecia bastante simples. Apesar de eu saber que não gravavam nenhum programa televisivo, nem um estúdio para gravação de voz off tinham. No início achei que teriam uma outra sala, mas rapidamente me apercebi que não, que tudo o que eles produziam era trabalhado naquele pequeno escritório.

Logo aí percebi que havia uma nova maneira de fazer televisão. Já nem um estúdio é preciso, basta uma ideia, uma câmara, uma equipa de três elementos e um computador com um programa de edição. Claro que isto é possível apenas para canais mais especializados, ou para canais regionais. Nos canais generalistas o caso muda totalmente de figura com a existência de grandes estúdios e de material profissional.

Durante os três meses (Janeiro a Abril) que estagiei no Canal180, as tarefas desenvolvidas foram muitas e diversificadas. Apesar de a equipa fixa não ter mais que 10 elementos, no período em que lá estive chegaram bastantes estagiários da mesma área que eu, o que fez com que o trabalho fosse mais dividido, e permitiu passar pelas diferentes áreas do canal. Ainda assim, foi- me dada total independência e responsabilidade nas tarefas que realizei, apesar de contar sempre com o apoio e orientação de qualquer membro da equipa.

Outra coisa de que me apercebi durante este estágio, e que me parece fundamental, é a transversalidade dos profissionais de comunicação. Hoje em dia, um operador de câmara já não sabe fazer só isso: ele realiza, ele filma, ele edita. Um jornalista não faz apenas as perguntas, é também capaz de editar e filmar uma peça televisiva. Para além de muitas outras áreas a que nós, profissionais de comunicação, nos temos de adaptar. Foi o que me aconteceu durante este estágio.

Enquanto estagiária de audiovisual e multimédia, as minhas funções incluíam: produção, pós-produção (edição), escolha de conteúdos, traduções e legendagem. Para além disto também tive a oportunidade de fazer algumas entrevistas.

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Como já disse, durante o estágio foi-me possível trabalhar nas diferentes correntes audiovisuais (guionismo, produção, realização e pós-produção), dando especial atenção à pós- produção, ou seja, a edição de imagens para criação de um vídeo.

2.1 Realização e filmagens

A realização ficava a cargo dos membros da equipa, no entanto tive a oportunidade de fazer algumas filmagens para algumas peças de magazine. Antes disso, foi-nos dado um pequeno workshop sobre a maneira, muito específica, como o Canal180 faz as filmagens. Joana Domingues, um dos membros mais antigos da equipa, mostrou-nos como trabalhar com a câmara e como filmar uma exposição, um concerto ou uma entrevista. Este pequeno workshop foi fundamental para percebermos como filmar em situações mais específicas e em cenários diversos. Eu não tinha noção de como filmar com diferentes tipos de luz e por isso ajudou-me bastante. No entanto, poucas foram as oportunidades que tive para filmar, pois eram muitos os estagiários nessa área.

Ainda assim, participei nas filmagens da exposição “ Mira Schendel” em Serralves, que abriu a 1 de Março, na peça de rua sobre downhill, e tirei algumas imagens da cidade do porto.

2.2 Produção

Relativamente à corrente audiovisual da produção, foi-me dada a oportunidade de fazer parte da equipa de produção do vídeo de apresentação do festival Optimus Primavera Sound 2014. As filmagens foram feitas no Palacete Pinto Leite, no Porto, e demoraram duas noites, 6 e 7 de Fevereiro. Eu fiz parte da equipa dos cenários, a minha função era preparar e arranjar tudo o que era necessário antes da filmagem da cena seguinte e arrumar o que já não era preciso.

Participei também na produção da festa de aniversário de três anos do canal180, em que fiquei encarregue de uma das salas da festa: a sala das fotografias. Eu e três colegas decorámos a sala com o logotipo do Canal, para servir de photoboot, ou seja, os convidados iam lá para tirarem uma foto.

Gostei bastante desta área do audiovisual, pois tive a oportunidade de participar em dois eventos totalmente distintos. Foram muitas horas a trabalhar para que tudo corresse bem, mas foi bastante gratificante ver o trabalho final.

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2.3 Pós-Produção

A corrente audiovisual em que mais incidiu o meu estágio foi a da pós-produção, ou seja, o tratamento das imagens e vídeos. Esta é também a mais importante área de trabalho no Canal180, pois sendo um canal open source, os vídeos são enviados para a equipa e é necessário tratá-los e editá-los de modo a poderem ser colocados na emissão.

Durante o estágio curricular fiz a edição de algumas peças de magazine, bem como de algumas promos para novos programas ou filmes que iriam passar no canal. Das peças para o Magazine180 que editei destaco a peça sobre a Bienal Ilustrarte 2014 (enviaram-me os vídeos em bruto e eu editei) e Pinturas Intermitentes de Rita Melo (foi uma equipa filmar à galeria e depois eu editei). Depois fiz também a edição da promo de um novo programa, “ArchDaily”, e de uma série de filmes que ia passar no canal, a série Vende-se Filmes que era composta por três filmes: “Bué Sabi”, “Orquestra geração” e “Li Ke Terra”.

Ao editar as peças é preciso ter em atenção o volume do som, pois o Canal180 tem o som a um nível superior, em relação aos restantes canais portugueses. É importante que todas as peças estejam iguais a nível sonoro, quer na música quer na voz off. A música também é uma parte importante da edição, é fundamental escolher uma música que se enquadre com o tema e o ritmo da peça.

Senti algumas dificuldades na edição, pois o Canal180 tem também uma forma bastante específica de editar as suas peças. No entanto tive sempre a ajuda dos membros da equipa que me iam dando dicas sobre o que alterar e como tornar a peça mais apelativa. Fui para este estágio com pouca experiência em edição e saí de lá muito mais segura nesta área. Em relação ao som também tive algumas dificuldades, pois é bastante complicado conciliar o som do voz off com o das entrevistas e com a música, que é fundamental para o sucesso da peça.

Dentro da pós-produção estão também os grafismos. Depois de a peça estar editada é preciso colocar os grafismos, que tinham o nome da peça, e outras informações relevantes como: o autor, a cidade, o porquê e o interesse. Na altura do meu estágio o Canal180 estava a mudar todos os grafismos. Como estavam a ser alterados os grafismos, havia muitas peças que precisavam de ser alteradas e por isso todos os estagiários tiveram de aprender a colocá-los. Tive

23 a oportunidade de aprender a colocar esses novos grafismos, e por isso de trabalhar um pouco mais na área da multimédia.

2.4 Escolha de conteúdos

Para além da parte audiovisual o meu estágio passou também pela escolha de conteúdos para programas que iriam passar no Canal. Dentro das parcerias que o canal tinha com diferentes sites, eu tive de escolher os episódios que mais interesse tinham para o público 180. Escolhi episódios de “Música Portuguesa a gostar dela própria”, “Cranetv”, “Gestaltentv”, “The Wild Honey Pie” e “Bodyspace”. Este tipo de programas constitui a maioria da programação do canal.

Gostei bastante desta escolha de conteúdos, pois são séries com bastante interesse a nível cultural,artístico e musical. Esta escolha passava por visualizar os episódios (a maioria tinha apenas três minutos) e escolher aqueles que mais se enquadravam com a programação do canal e com o que eu achava que mais ia interessar ao público-alvo do canal.

2.5 Traduções e legendagem

Uma parte importante do canal são as traduções e legendagens dos episódios. Foi-me pedido que traduzisse e legendasse alguns episódios das séries estrangeiras (a maioria em inglês e algumas em espanhol), para poderem ser colocadas em emissão. Para a legendagem tive de aprender a trabalhar com um programa específico.

Fiquei ainda responsável por traduzir um programa produzido pelo Canal: o “I like” um programa sobre arquitetura. Os episódios tinham uma voz off em português, mas como o site internacional ArchDaily fez uma parceria com o canal, foi necessário fazer a legendagem para inglês.

Este tipo de trabalho acabou por se tornar um pouco aborrecido e demorado. Apesar de os episódios não serem grandes, foi preciso traduzir uma grande quantidade de episódios. É um trabalho pouco apelativo, mas que tem muita importância para a programação.

2.6 Entrevistas e voz off

Durante os três meses tive ainda a oportunidade de fazer algumas entrevistas para peças de magazine. Entrevistei o skater de downhill Nuno Pereira, para a peça Downhill Skate Vila Nova De Gaia. Para além disto gravei a voz off de algumas promos de programas e de alguns projetos comerciais do canal.

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O meu estágio era em audiovisual e multimédia, no entanto, também gostei de entrar na parte jornalística do canal, que não é muita.

Foi também muito interessante gravar a voz off de algumas promos e de outros projetos comerciais do canal. Tive a oportunidade de aprender a trabalhar melhor com a voz e a gravar para diferentes tipos de projetos. É diferente a maneira como se grava um anúncio comercial da maneira como se faz a promo de um programa de televisão.

Gravei o anúncio de uma empresa de desportos radicais, que passou na Sic Notícias, Sic Mulher e Sic Radical, e gravei as promos de programas como: Trips e Bodyspace. Nesta área tive sempre o acompanhamento da Rita Moreira, que é a voz do canal.

2.7 Avaliação/Reflexão da experiência de estágio

Devo dizer que considero esta experiência de estágio bastante positiva e enriquecedora quer a nível profissional quer a nível pessoal. Como a estrutura da empresa é pequena, foi-me possível dar ideias, opiniões e sugestões que foram tomadas em consideração. Tive a oportunidade, como já referi, de passar e de aprender diversas áreas da comunicação, o que me fez perceber que um profissional desta área tem de ser polivalente e versátil.

Apesar de ter sempre alguém disponível para orientar, foi-me dada total liberdade e responsabilidade em determinadas tarefas, o que tornou o trabalho mais cativante e desafiador, pois se nós não fizermos determinadas tarefas, mais ninguém as fará. Acabamos por sentir que o nosso trabalho tem valor para a empresa.

Toda a equipa da OSTV, bem como todos os estagiários que por lá foram passando, são enriquecedores por si só. São pessoas jovens de diferentes áreas e culturas, o que torna o ambiente da empresa muito acolhedor e, por isso, é bastante fácil trabalhar na empresa.

Durante os três meses foram surgindo várias dúvidas e problemas que tive que resolver rapidamente, o que me obrigou a ser criativa e a ter de pensar. No entanto todos os membros da equipa estão disponíveis para ajudar, ficamos totalmente à vontade para fazer perguntas.

Apesar de eu achar que os restantes estagiários foram fundamentais para o enriquecimento desta experiência, acho que o canal devia restringir um pouco mais o número de estagiários que tem em cada período de tempo. Quando eu lá cheguei não havia mais estagiários,

25 mas foram chegando quase todas as semanas. Nos últimos tempos em que lá estive era quase impossível encontrar uma secretária para nos sentarmos.

Como já referi, fiquei muito surpreendida ao chegar aos escritórios do 180 e ao aperceber- me da diferente forma como faziam um canal de televisão: com tão pouco do que estamos habituados. Foi daí, acompanhada de toda a experiência durante os três meses, que me surgiu o tema a aprofundar. Na parte teórica deste relatório, vou tentar perceber quais as diferenças do canal180 em relação aos canais tradicionais, as consequências de se optar pelo open source em televisão e ainda o porquê se utilizar a internet como o principal meio para a difusão de conteúdos. No último capítulo vou fazer um resumo das entrevistas que realizei a três membros do Canal180 e vou ainda fazer umas considerações acerca da programação cultural dos canais generalistas em Portugal.

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3. A televisão generalista e a televisão segmentada

Com este capítulo pretendo fazer um breve enquadramento da história da televisão. Desde as primeiras tentativas de Alexander Bain, até aos dias de hoje com a televisão digital e interativa. Vou falar também da entrada na era digital e consequente aparecimento da internet.

3.1 Um breve enquadramento da história da televisão

Apesar de a “caixa mágica” só surgir como agora a conhecemos nos anos 30, desde o século XIX que os homens sonhavam em transmitir imagens à distância. Primeiro o objetivo era enviar imagens fixas, o que conseguiu Alexander Bain, em 1842, ao executar um projeto de envio telegráfico de uma imagem.

Segundo Jean-Noel Jeanneney (1996:24) “a televisão nasce das descobertas da fotoeletricidade, isto é a capacidade que determinados corpos possuem para transformar uma radiação de eletrões de energia elétrica em energia luminosa”. No ano de 1920, John Logie Baird empregou os diversos princípios já desenvolvidos para esse tipo de tecnologia e montou um dos primeiros modelos de televisão de que se tem notícia. Apesar de outras tentativas, este foi o primeiro estudioso que conseguiu melhorar muito a nitidez da imagem e do som. A partir deste momento a televisão foi sendo aprimorada até ter maior viabilidade comercia (Jeanneney,1996).

Durante o período pré 2ª Grande Guerra, quatro países são responsáveis pelo maior número de experiências relativas à televisão: a Grã-Bretanha, os Estados Unidos, a França e a Alemanha. A Grã-Bretanha lança, a 2 de Novembro de 1936, através da BBC, as primeiras emissões públicas. Mais tarde, em1939, são realizadas as primeiras reportagens no exterior. Nos Estados-Unidos quem domina é o sector privado. A primeira firma a produzir um televisor a escala industrial é a RCA, que em 1931 instala um emissor no topo do Empire State Building. Em França, dois engenheiros são fundamentais para os avanços tecnológicos da televisão: René Barthélemy e Henri de France, este último inventor da televisão a cores, versão francesa. Em 1932, Barthélemy lança um programa experimental, o primeiro a ser emitido uma hora por semana (Jeanneney,1996). Na Alemanha, o principal acontecimento televisivo acontece em 1936, com a transmissão dos Jogos Olímpicos de Berlim para seis cidades alemãs. Segundo Jean-Noel Jeanneney (1996:57), “os jogos Olímpicos de Berlim, em 1936, constituem o momento fundador,

27 o acontecimento que vem cristalizar aos olhos do público a aparição do novo meio de comunicação social”.

Apesar de todos estes avanços, o aparecimento da 2ª Guerra mundial congela todas as experiências e é necessário esperar pelo pós guerra para que a televisão tenha um novo começo. “É um facto que a televisão tenha nascido primeiro como uma espécie de apêndice insignificante da rádio. Exatamente no momento em que, crescendo rapidamente, perturbou o equilíbrio, a influência, a glória e as paixões” (Jeanneney,1996:45).

Após 1945, com o fim da guerra, é que se dá o verdadeiro começo da televisão. Apesar de começar do zero, rapidamente a televisão “retomaria a dinâmica abandonada há sete anos atrás” (Cádima,1996:24).

Os Estados-Unidos, muito menos enfraquecidos, conseguem avanços notáveis: “Em 1948, dá-se a grande “explosão” popular da televisão: em Janeiro de 1950 existem já 97 estações de televisão em 36 cidades…” (Cádima,1996:40), para além da cor que surge em 1953, quando o número de estações atingia os 200. Foi também aqui que mais cresceu o mercado publicitário. Contrariamente, na Europa, as coisas não avançaram tão rapidamente.

No entanto, na década de 50, verificou-se o aparecimento dos canais nacionais de televisão, por toda a Europa. Os anos 60 vieram intensificar a ideia de que o mundo era uma comunidade planetária, que se veio a concretizar com a chamada “mundovisão”: uma ligação em direto entre os Estados-Unidos e a Europa. Em 69, aconteceu a a emissão televisiva do século: os primeiros passos do homem na lua, em direto (Cádima,1996).

Em Portugal tudo aconteceu muito mais lentamente. A televisão portuguesa, RTP (canal estatal) surge em 1957 com emissões regulares, 30 anos depois das emissões regulares em Inglaterra. Estando Portugal num período de ditadura, imposta pelo , a televisão portuguesa tinha regras diferentes das restantes, pois estava sob o controlo da censura: “Primeiro com Salazar, e mais tarde com Marcelo Caetano, a RTP foi sempre, designadamente através dos seus boletins noticiosos regulares, o principal porta-voz da política do Estado Novo” (Cádima,1996:68). Em 1974, após a Revolução do 25 de Abril, verificou-se a nacionalização da RTP, e a sua transformação em empresa pública. Mais tarde, em 1992 e 1993, surgem os primeiros canais de televisão privados em Portugal, a SIC e a TVI, respetivamente (Cádima,1996).

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De acordo com Cádima (1996), é na década de 70 que a televisão se afirma como um meio de comunicação de massas no mundo, “…se ainda nos anos 60 havia um pouco a ideia de que o fenómeno televisivo era, por assim dizer, um “milagre”, rapidamente esse mistério se perde: os anos 70 transformaram, em definitivo, a televisão em eletrodoméstico, em objeto de grande consumo”.

Apesar de, maioritariamente, cada país apenas ter duas ou três estações televisivas nacionais, com a proliferação dos satélites e das antenas parabólicas, era cada vez mais fácil ver canais de qualquer país do mundo (Cádima,1996).

Os anos 80 e 90 ficaram marcados pela necessidade de desenvolver a indústria europeia de programas de televisão devido à entrada, nesse mesmo mercado, dos programas americanos, que nessa altura já se encontravam bastante desenvolvidos e diversificados. Foi durante estas décadas que se verificaram maiores avanços tecnológicos no campo audiovisual e multimédia, com inúmeras tentativas de melhoramento da definição da imagem e do som. No entanto, o problema dos conteúdos dos programas televisivos continuava sem solução: “… o esforço do melhoramento incidiu exclusivamente nas questões tecnológicas de aperfeiçoamento da imagem e do som, mas o problema dos conteúdos ficou por resolver. Aliás, esta incapacidade de atacar a questão dos conteúdos demonstra o estado de falência de ideias da televisão tradicional, que esgotou a sua panóplia de seduções,…” (Correia,1998:41).

Com todos os avanços tecnológicos na televisão, e não só, verificou-se a entrada na chamada era da televisão digital terrestre. Para além de mais melhorias a nível de imagem (passagem para o HD) e som, isto veio aumentar o número de canais. Assim, os conteúdos estão cada vez mais segmentados e os canais vão sendo mais temáticos. Nesta altura, o espetador deixa de ser um espetador passivo e passa a ser um espetador ativo, visto que tem maior possibilidade de escolher o que quer ver e quando quer ver: “É a era dos self-media, dos media que se destinam aos utilizadores individuais – PC, fax, telemóvel, bip, etc.- e que interactuam através de redes celulares e de redes interactivas (RDIS, Internet, “auto-estradas da informação”, por exemplo)” (Cádima,1996:78).

Atualmente, os meios de comunicação desde a imprensa escrita, rádio, televisão, multimédia, jogos e cinema têm a migração do analógico para o digital feita quase na totalidade para plataformas tecnológicas digitais (Looms,2006). O digital tende a impulsionar todos os concorrentes de comunicação, operadores privados e públicos, à criação de novos conteúdos mais

29 atrativos, criando uma maior diversidade de serviços. Verifica-se também maior encorajamento aos produtores independentes e ao aparecimento de novos produtores na criação de novos conteúdos.

A internet veio permitir a maior difusão de conteúdos audiovisuais e também de serviços de programas televisivos, sendo esta considerada por muitos teóricos como uma rede global de comunicação: “A internet é o primeiro meio de comunicação global e interativo, à escala global, totalmente digital” (Amaral,2008:20). Ao podermos aceder a diversos tipos de conteúdos, a internet, tornou-se também numa nova plataforma de difusão de canais e formatos televisivos.

Depois deste breve enquadramento da história da televisão importa falar: sobre os problemas e desafios impostos à televisão generalista e tradicional, sobre o aparecimento dos canais especializados e regionais e ainda sobre a utilização da internet para difusão de conteúdos. No próximo ponto vou também aprofundar a ideia da interatividade e participação das audiências nos diferentes tipos de televisão, tentando perceber quais são as principais diferenças entre os canais generalistas e os canais segmentados como o Canal180.

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3.2 Interatividade e participação das audiências na televisão

Como referi no início, este relatório baseia-se na minha experiência de três meses no Canal180, e tem como objetivo dar a entender quais as diferenças na maneira de fazer televisão do 180, relativamente às televisões generalistas portuguesas. Assim, ao longo deste ponto vou falar sobre os desafios que a televisão tradicional tem vindo a sofrer e sobre as condições que favoreceram o aparecimento de um canal cultural em Portugal.

3.2.1 Problemas da televisão generalista

Quando apareceu, a televisão provocou uma alteração na sociedade, pois veio juntar a imagem, ao som e à escrita: “De uma forma impressiva todos sentimos o impacto daquela pequena janela aberta ao mundo, que rasgou horizontes, modificou hábitos alterou a organização familiar, impôs padrões de consumo e, em alguns casos, reformulou ideários políticos, religiosos e morais” (Correia,1998:33).

Depois da 2ª Grande Guerra Mundial, a televisão roubou o protagonismo à rádio e assumiu o papel de mais importante meio de comunicação no mundo. Denis McQuail (2003) carateriza este meio de comunicação de massas como:

Figura 12 A televisão como meio

Fonte: McQuail (2003)

No entanto, e como já referi, foram várias as mudanças provocadas pela televisão, mesmo no que toca à sua influência na sociedade. Apesar de ir crescendo a nível comercial e de, atualmente, a maioria das pessoas ter mais do que um aparelho televisivo em casa, este já não é um meio de comunicação capaz de fidelizar os espetadores (Correia,1998): “Nos próximos anos, a televisão generalista continuará inevitavelmente a perder público, não só para as suas mais

31 diretas concorrentes temáticas – ou mesmo para canais nicho -, no satélite, no cabo, na paytv, para o VOD (vídeo on demand), mas sobretudo para a internet…” (Cádima,2011:9).

Entravámos então na era digital da televisão e dos restantes meios de comunicação. Pinto Balsemão (2000:14) define digital como: “Do digital sabemos todos que é uma técnica ou tecnologia fantástica que permite reduzir todo o tipo de informações a um código extremamente simples, suscetível de ser transmitido por vias muito diversas e de modo mais fácil e eventualmente mais barato do que os sistemas analógicos até agora dominantes”.

Com a entrada na era digital, de uma economia industrial passamos para uma economia de informação e de cultura, uma consequência da evolução tecnológica a partir do aparecimento dos computadores, da internet, da chegada dos serviços digitais de televisão e dos novos meios de comunicação.

Para Iosifidis (2007) a televisão pública deve estar presente em todas as plataformas de distribuição, garantindo os conteúdos digitais a todos os cidadãos, cumprindo o princípio da universalidade, que só será alcançado através da oferta do serviço em sinal aberto e gratuito.

Fruto da liberalização da Lei da televisão (1990) surgiram em Portugal os primeiros canais por cabo. O nascimento da CaboTv Portugal permitiu a entrada, no nosso país, de novos canais estrangeiros, tanto generalistas como temáticos (Cádima,1995). As emissões via satélite também proporcionaram uma maior diversidade na oferta de canais e serviços, alguns dos quais sujeitos a pagamento.

Apesar de o número de canais ter aumentado de uma forma bastante expressiva, o conteúdo das programações não difere substancialmente, talvez seja devido a uma televisão “cada vez mais oligopolista a nível planetário” (Castells,2002:448). Segundo Espada (1982) este meio de comunicação tornou-se apenas num instrumento, num simples objeto onde predomina a técnica sobre a criação e onde os espetadores não são tidos em conta, já que há falta de participação dos mesmos.

A televisão não conseguiu perceber que cobrir grandes distâncias não é suficiente para uma programação com conteúdos de qualidade e que não aborreça as audiências. Mesmo tendo feito grandes avanços tecnológicos, no que toca à criatividade as coisas estagnaram, tornando este meio bastante monótono. A maioria dos canais faz o mesmo, tem o mesmo tipo de programação: “De degrau a degrau, a televisão tradicional desce os degraus do pedestal da fama

32 para se atolar na vulgaridade. Ao afrontar a dignidade humana, a televisão tradicional está a escrever, pelo seu próprio punho, a crónica do seu passamento." (Correia,1998:37).

Ainda que já existam alguns canais com programação diversificada, a televisão continua a ser um meio unidirecional, onde a única reação visível da audiência seja através do mercado e dos resultados obtidos. A audiência nota que a sua participação no processo televisivo é quase nula, os seus interesses não são tidos em conta, ou seja, existe uma desconexão quase total entre os emissores, cadeias televisivas e os recetores, as audiências (Cádima,2011).

Como já referi os meios de comunicação de massas foram criados como um meio unidirecional que tinha como objetivo fornecer informação às audiências, que a podiam utilizar ou não. No entanto, estes novos media são interativos e desagregam as audiências e integram o uso dos media na sua vida diária (Nightingale, 2011).

Depois de alcançadas as grandes audiências, parece cada vez mais necessário chegar e comunicar com o indivíduo singular. A era digital, em que nos encontramos, através da massificação do computador, do telemóvel e do tablet favorece esta proximidade: “A maioria que está em vias de abandonar a televisão tradicional, encontrou na internet uma alternativa diferente, mas válida para esquemas e modelos de programação que são alienígenas à sua mundividência e mundivivência” (Correia,1998:39).

Sobre esta nova era digital e a sua maior individualização, Cádima (2011:14) diz que:

“Se o dispositivo comunicacional da era da TV analógica tinha as especificidades próprias do modelo mass-mediático, o dispositivo digital emergente assenta numa lógica biunívoca, imersiva e participativa. Mas a pós-televisão e os conteúdos distribuídos pelas múltiplas extensões móveis remetem para uma cada vez maior individualização, para uma (híper) personalização da experiência de consumo audiovisual e multimédia…”.

Como já referi, as próprias pessoas começaram a exigir maior diversidade nos canais de televisão. Normalmente são precisos muitos anos para alterar os hábitos no que respeita o consumo dos media, mas nos jovens existe uma aceleração dos comportamentos na escuta e visualização. Por isso foram estes que se desligaram da televisão tradicional, pois para os mais idosos a programação da televisão tradicional continua a ser suficiente: “Aqueles que se afastaram dos modelos de programação da televisão tradicional são pessoas maioritariamente situadas em escalões etários jovens, com nível de instrução médio, ou acima da média e uma boa parte da

33 chamada média alta e culta, com formação universitária” (Correia,1998:39). Estes são uma minoria com exigências mais sofisticadas no que respeita aos sistemas de comunicação.

Um outro desafio que a televisão tradicional tem vindo a atravessar, e que mostra o aborrecimento dos espetadores é o zapping. O zapping é a prática de rapidamente passar por diversos canais para tentar encontrar algo interessante para se ver: “As mudanças imprevistas de canal por parte de muitos espetadores são um dos sintomas claros da incapacidade do mass media em fidelizar audiências” (Correia,1998:34).

Esta prática é mais verificada na altura dos intervalos, devido à quantidade excessiva de publicidade que o espetador tem de ver. O espetador, cansado dos anúncios publicitários, vai mudando de canal até encontrar algo que lhe interesse, ou até se cansar e desligar totalmente a televisão:

“Os intervalos publicitários, impostos à margem da legislação em vigor, são longos períodos de rutura não anunciada. A carga publicitária é tão intensa que o ruído destas mensagens se sobrepõe aos conteúdos que elas veiculam. O zapping é, em muitos casos, uma forma de fuga ao massacre do “compre!”, “veja!”, “experimente!”, “vá!” – formas invariavelmente imperativas de ações apelando ao consumo” (Correia,1998:34).

Esta quantidade excessiva de publicidade que as estações impõem às suas audiências é, no entanto, fundamental para o crescimento económico das mesmas. A publicidade é das maiores fontes de rendimento das estações televisivas.

No entanto, nos últimos tempos, temos verificado um novo fenómeno no que toca à publicidade nas estações televisivas. Os extensos intervalos só de publicidade têm tendência para diminuir pois, cada vez mais, está a ser usada a colocação do produto (product placement)e a diminuição do tempo desses anúncios (Elliot,2010). Product Placement é uma técnica de marketing que consiste em incluir ou fazer referência a um produto, ou a um serviço num programa de televisão, como por exemplo nas telenovelas. É uma estratégia muito direta e com maior eficácia do que os intervalos gigantescos. Para Cádima (2011:190) “na área da publicidade, procurava-se atingir os público-alvo de uma forma mais objetiva, tendo por exemplo, sido produzidos e testados anúncios de pequena duração, …, devidamente pensados para o novo suporte de forma a que houvesse uma maior adequação aos destinatário e, naturalmente, uma melhor visualização”.

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Para além desta nova técnica de marketing, hoje e dia, é bem mais fácil para os espetadores fugirem à imposição de publicidade nos intervalos, através de serviços que permitem gravar ou recuperar programas antigos e fazer forward no intervalos, ou seja, passa-los à frente.

3.2.2 A Internet, o digital e a difusão de conteúdos televisivos

A internet é uma rede global de comunicações que liga redes de computadores que estão espalhados pelos mundo, e que utiliza tecnologias que nos permitem aceder a qualquer tipo de conteúdos desde multimédia, documentos, e até mesmo mundos virtuais, a partir de qualquer dispositivo digital (Marques,2009). Com a generalização do uso da internet, tornou-se fácil o acesso a diversos tipos de conteúdos, e por isso esta transformou-se também numa nova plataforma de difusão de canais e formatos televisivos.

Com o significativo aumento do número de utilizadores tornou-se num meio desejado pelos para os agentes de produção e difusão televisiva. O aumento da capacidade da rede e a evolução tecnológica permitiram, que na Internet, se verificasse a difusão do sinal de televisão em direto da emissão de um canal (Carvalho,2009).

Ainda por causa desse aumento no número de utilizadores da internet, apareceu o Youtube: um site de difusão de todo o tipo de vídeos. Foi no youtube que começaram a aparecer os primeiros vídeos de produção amadora tornando o utilizador em produtor e realizador de conteúdos, como vou falar mais à frente no caso do Canal180. Este site rapidamente atingiu um grande número de utilizadores. No primeiro trimestre de 2010 acederam a esta página web quase três milhões de portugueses, 68.4% do total de internautas nacionais (Marketest,2010a).

Com esta crescente utilização da internet, os operadores televisivos ganharam novos concorrentes, quer por grandes grupos de media, como a imprensa escrita e a rádio, disponibilizarem os seus serviços na internet, quer por disponibilizarem também uma forte componente audiovisual, quer pela sua especificidade disponibilizando conteúdos a qualquer momento (Carvalho,2009). Por isto, os grandes grupos audiovisuais sentiram a necessidade de desenvolver os seus sites, oferecer novos serviços interativos, fazendo com que esta plataforma se tornasse essencial para a sua estratégia de média.

“A televisão e a internet constituem hoje as duas principais tecnologias de mediação, disputando cada uma o centro de duas redes de interatividade diferenciadas, interligadas entre si

35 através dos links oferecidos pelas diferentes tecnologias de comunicação interpessoal” (Cardoso,2006:10). A grande vantagem da internet é o facto de não existirem fronteiras em termos globais, no que toca ao consumo dos media, que é feito por todos os escalões e grupos sócio- profissionais (Cardoso,2006). Para outro autor, Carvalho (2009) a internet apresenta um conjunto de particularidades que merecem destaque:

 Exige a intervenção do utilizador através do computador ou telemóvel, implicando consumo individualizado;  Disponibiliza conteúdos a qualquer momento (o consumidor assume o controlo de “O quê?”, “Quando?” e “Onde”);  Integrada numa difusão cross media, exploração simultânea em várias plataformas;

Os media tradicionais começaram então a aperceber-se da potencialidade da internet na expressão individual e no desenvolvimento de novas linguagens, novas narrativas convergentes (multimédia), à velocidade do momento e numa escala mundial (Zamith,2008). Portanto, a lógica dos conteúdos tradicionais tem de ser adaptada às novas lógicas de produção e de consumo. Por isto mesmo, os media tradicionais começaram a aumentar as suas produções audiovisuais na internet.

Com estas alterações mediáticas surgiu um novo fenómeno, o fenómeno da convergência mediática. Esta é uma tendência que se tem verificado muito nos últimos anos, e verifica-se na utilização da internet para a difusão dos conteúdos dos diferentes meios de comunicação (rádio, televisão e jornais impressos) (Jenkis,2008). Para Jenkins (2008) esta tendência designa o atual processo da construção da informação, pois estes novos media digitais permitem um cenário em que qualquer indivíduo tem condições para produzir e partilhar vídeos, imagens e sons. Para conseguirem competir neste novo universo tecnológico os jornais, as rádios e as televisões criam sites e páginas nas redes sociais, estando assim mais próximos dos seus espetadores.

Há alguns críticos que encaram esta convergência como uma inevitável conglomeração onde as grandes corporações acabam com os pequenos jornais ou estações televisivas, com cortes no número de profissionais e de perda de qualidade nos conteúdos transmitidos (Artwick,2004). No entanto, esta ideia parece estar errada, uma vez que esta tendência não implica a homogeneização das expressões culturais, nem o domínio completo de códigos por alguns emissores centrais, “é precisamente devido à sua diversificação, multimodalidade e

36 versatilidade que o novo sistema de comunicação é capaz de abarcar e integrar todas as formas de expressão, inclusive a dos conflitos sociais, bem como a diversidade de interesses, valores e imaginações” (Castells,2003:491).

No entanto, estas alterações não significam que estamos perante uma tendência em que todos os media se tornem num só media, é normal a permanência de formas de comunicação heterogéneas e diferentes, uma vez que os meios são formas de comunicação humana profundamente codificados, com significados e valores que surgem e se alteram ao longo do tempo, não apenas porque as indústrias assim o decidiram (Dewdney et. Al,2006).

Os jornais online, em Portugal, começaram a 26 de Julho de 1995 com a inauguração da edição eletrónica do Jornal de Notícias, seguido depois pelos restantes jornais impressos (Granado,2002). As rádios também entraram na internet: a TSF a 17 de Setembro de 1996 foi a primeira; seguida de , e , Rádio Renascença e RFM em 1997 (Granado,2002).

Atualmente todos os meios de comunicação tradicionais já têm um site na internet, mais do que isso já criam os seus próprios elementos audiovisuais e multimédia. Mesmo as rádios e os jornais impressos já têm uma grande presença de vídeo nos seus sites online.

Com estes desenvolvimentos televisivos na internet, foi possível o aparecimento de canais com temas mais específicos e/ou regionais que apenas existiam na web. São as chamadas webTv, que com o passar dos anos passaram também a dar na Tvcabo. A primeira a aparecer foi a FamalicãoTV, em 2005. Nos anos seguintes foram nascendo por todo o país. Para Cádima (2011:22) a televisão regional tem uma grande importância política e cultural pelo “facto de só ela poder representar a realidade local, apresentar e interpretar a matéria informativa em função das especificidades e dos interesses locais/regionais e de realçar e dar visibilidade aos seus projetos e às relações que a região mantém com outras realidades do mesmo estado”.

A convergência entre a televisão tradicional, os serviços multimédia e a Internet é uma tendência, tendo as inovações tecnológicas e a interatividade como fator fundamental na evolução dos media.

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3.2.3 A interatividade na televisão tradicional e generalista

Com o passar dos anos verificou-se um aumento da interatividade entre a televisão tradicional e generalista com as audiências, e isso resulta numa melhor relação entre a televisão e o espetador. As novas tecnologias como a internet, os telemóveis e os tablets têm tido uma boa taxa de penetração, o que possibilita essa aproximação. A interatividade através destes diversos serviços digitais aproxima o espetador do conteúdo, envolvendo-o e fazendo-o parte ativa do programa (Cardoso,2006).

Para Cardoso (2006) a utilização da interatividade na televisão portuguesa é caraterizada essencialmente pelo seu recurso em programas do entretenimento sendo mais reduzida na dimensão informativa. A maioria das pessoas que interage com a televisão fá-lo para:

 Expressar uma opinião num assunto particular ou em votação;  Comunicar com outras pessoas, através de mensagens enviadas para programas para serem lidas por familiares, amigos - ou então para conversar através de sms ou outros interfaces comunicativos (forums e chats) oferecidos pela internet;

Como percebemos as formas mais comuns de interação no contexto digital são através do sms, e-mail, chat, telefone e telemóvel. A interatividade através destes serviços é mais verificada em programas de entretenimento e na procura de uma maior sociabilização.

As formas de interatividade têm sido aperfeiçoadas ao longo dos anos. No início era permitido a difusão, em rodapé, das mensagens recebidas pelos espetadores e depois começou a ser permitido a intervenção sobre o conteúdo apresentado, através do voto, quer no próprio estúdio onde assistem ao programa em direto quer pelo telefone (Carvalho,2009).

Na tabela que se segue podemos ver em que programas e de que maneira se verifica a interatividade entre as televisões e as audiências (Cardoso,2004). Vamos verificar que são os programas de entretenimento que mais interatividade permitem às audiências, através do envio de mensagens de telemóvel, das chamadas telefónicas e do envio de emails.

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Tabela 1 Uso da interatividade na televisão portuguesa em 2004

Tabela 1 Uso da interatividade na televisão portuguesa em 2004

Fonte: Projeto Internet e Mass Media, Cardoso et al (2004)

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Hoje em dia, são muitos os programas que contam com a participação das audiências, programas como “O Preço Certo” e o “Quem quer ser milionário” da RTP1 atingiram o sucesso, pois permitem que os espetadores tenham uma experiência muito parecida com a dos concorrentes em estúdio.

Para Cardoso (2006) a televisão assume-se como parte de uma maior rede de tecnologias de mediação, relacionando-se com outras tecnologias, não perdendo a sua caraterística de sucesso como modelo comunicacional de interatividade. Desta rede de tecnologias faz parte, claro está, a internet, que, como já referi tem tido uma crescente e próxima relação com a televisão.

De acordo com um estudo do IDATE (2010) as inovações em curso nos serviços de televisão, são parte de uma tendência a longo prazo da convergência gradual entre a televisão tradicional e a internet. São três as caraterísticas que explicam essa tendência:

 Em termos de padrões de consumo: mais tempo gasto e personalização dos conteúdos, portabilidade de conteúdos, consumo que combina transmissão broadcast, pessoal e conteúdo web;  Em termos de acesso: novas soluções de distribuição da imagem;  Em termos de financiamento: fragmentação da receita de anúncios; disponibilidade de conteúdo livre, o que dificulta gerar receitas para pagar programas:

3.2.4 O aparecimento do Canal180

Estes desafios pelos quais a televisão tem vindo a passar tornaram possível e viável o aparecimento de canais mais alternativos, participativos e interativos. Os Canais que estão também presentes nos nossos telemóveis, computadores e tablets, através da internet. No entanto, para se conseguir atrair um maior número de pessoas para estas diferentes plataformas é preciso repensar os conteúdos e a forma como estes são transmitidos.

Foram surgindo os canais temáticos de várias áreas diferentes. Estes canais “constituem um primeiro nível de especialização frente aos canais generalistas. São canais que se centram num só tema, mas abordam-no de várias perspetivas diferentes, de tal maneira que se mantêm com uma visão geral. Diferenciam-se claramente dos canais generalistas porque giram em torno de um só tema. Se se qualificam de temáticos gerais é porque abordam todas as possíveis

40 variáveis do mesmo tema, ainda que com maior insistência nuns aspetos do que noutros.” (Herreros,2004:132)

Esta grande diversidade de plataformas e dispositivos de comunicação permite que haja uma maior especialização da mensagem para cada segmento da audiência, portanto “devido à diversidade dos media e à possibilidade de visar um público-alvo, podemos afirmar que no novo sistema dos media, a mensagem é o meio. Quer dizer, as características da mensagem hão-de moldar as características do meio” (Castells,2003: 447).

Outros aspetos beneficiaram o aparecimento de canais mais especializados, principalmente no que toca à cultura (música, dança, teatro, cinema entre outras). Nos últimos anos verificou-se um aumento muito grande de atividades e de oferta cultural. Em Portugal, esse aumento também se verificou de uma forma bastante significativa. De acordo com dados do Ministério da Cultura, de 2011, existiam em Portugal cerca de 347 salas e recinto para espetáculos, sendo que a maior parte se encontra em Lisboa e no Porto como podemos ver no quadro que se segue:

Tabela 2 Salas de espetáculo em Portugal Fonte: INE 2011

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No que respeita ao número de espetáculos realizados em Portugal, no ano de 2011 eram 25 871, divididos pelas diversas áreas (teatro, música ao vivo, ópera e dança). Segundo estes dados, o teatro é a arte com mais sessões de espetáculos. Em termos do número de espetadores, em 2011, cerca de 8 484 295 portugueses assistiram a um espetáculo. A arte que mais chama é a música, com cerca de 4 090 610 espetadores.

Tabela 3 Espetáculos ao vivo em Portugal

Fonte: INE 2011

Segundo um estudo da Center for Social Media (2009) são 5 os aspetos fundamentais nos hábitos das pessoas no consumo dos media:

 Escolha – as pessoas escolhem e comparam conteúdos sem esperar pela sua transmissão tradicional, através de motores de busca, guias de programação, feeds de notícias e sites;  Conversação – comentários e fóruns de discussão são cada vez mais comuns em grande parte dos sites e plataformas, os utilizadores usam estas ferramentas para partilhar interesses e distribuir conteúdo online;

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 Curadoria – os utilizadores estão a partilhar, classificar, republicar, dando opinião e criticando, numa variedade de plataformas como blogs, sites e redes sociais;  Criação – os utilizadores criam os seus próprios conteúdos multimédia (vídeo, texto, áudio, fotografias e animações);  Colaboração – os utilizadores estão a adotar uma série de novos papéis ao longo da cadeia dos media, tanto na sua criação como na distribuição;

Como vamos ver a seguir o canal180 vai de encontro a estes novos hábitos de consumo, pois permite que os seus espetadores e utilizadores tenham uma maior liberdade de escolha e mesmo liberdade de produzir aquilo que querem ver (open source): “Estamos, portanto, a deixar o analógico e a entrar na era do digital, na era da cultura da convergência e da cultura participativa” (Cádima,2011:196).

Como referi foram vários os elementos que proporcionaram as melhores condições para o aparecimento do Canal180: o nascimento de novas tecnologias de comunicação e o aumento da oferta cultural em Portugal. Este Canal é o primeiro, em Portugal, inteiramente dedicado às artes, à cultura e à criatividade, que veio tentar preencher uma lacuna há muito verificada no nosso país: a falta de informação cultural e a pouca promoção e apresentação de artistas portugueses das diferentes áreas.

Para perceber quais as principais diferenças entre o Canal180 e os canais generalistas portugueses (SIC, RTP e TVI) e mesmo a MTV Portugal (canal apenas ligado à música) realizei entrevistas ao diretor executivo João Vasconcelos, ao diretor de programação Nuno Alves e à coordenadora editorial Rita Moreira.

Uma das maiores novidades que o 180 trouxe para Portugal foi o open source television. Este termo é normalmente utilizado para caraterizar um programa de computador, em que o código de programação está disponível a toda a gente. Podemos então dizer que open source significa o acesso universal a uma determinada coisa.

No caso específico do Canal, open source significa que os conteúdos apresentados, quer na televisão como na internet, estão disponíveis a todos os espetadores. Mais do que isso, significa que a programação do canal é livre, ou seja, qualquer espetador pode participar nos programas apresentados. Alguns programas de produção 180 apenas funcionam com a participação das audiências. Caso do programa Trips, em que os espetadores podem enviar os vídeos das suas

43 viagens; e o programa Escolho eu em que os espetadores podem enviar uma lista com as suas músicas preferidas, que depois são passadas uma hora por semana. Isto mostra que cada vez mais, as audiências são mais do que meros espetadores, chegam a ser programadores e produtores. Podemos dizer que a antiga audiência, o público comum, começou a agir e participar na produção e difusão de informação e conteúdos, que estão agora acessíveis a qualquer indivíduo.

Para Cádima (2011) esta nova interatividade remete para uma também nova lógica comunicacional, deixando de haver só um programa para passar a existir um mundo de programas e ligações, que potencia neste sistema de lógica biunívoca e não-linear, um conjunto de virtualidades de forma exponencial.

“Para além desta evidente migração de públicos, sabe-se também que qualquer telespectador é, cada vez mais, um programador. O que significa que essa é, em si mesmo, uma rutura face ao paradigma da televisão clássica. Contudo, com a possibilidade de ver/fazer o que quiser, quando quiser, onde quiser e como quiser, o novo programador torna-se também num “produtor”, e pode dizer-se que o próprio broadcasting está em evolução, por assim dizer, para o egocasting” (Cádima,2011:13).

O broadcasting é a distribuição de conteúdos de áudio e/ou vídeo para uma audiência grande e dispersa, através de um qualquer meio de comunicação. O termo egocasting é mais recente, e foi pela primeira vez usado por Christine Rosen (2004). Para ela egocasting é “a busca completamente personalizada e extremamente restrita pelo nosso gosto pessoal, onde exercemos, num grau nunca antes visto, o controlo sobre o que nós vemos e ouvimos” (Rosen,2004:4). Estamos na era do egoscasting, em que só lemos, vemos e ouvimos aquilo que reflete os nossos gostos e a nossa personalidade. Os consumidores estão a ficar mais exigentes e querem ser eles a decidir que conteúdos deviam estar disponíveis e querem interagir com eles.

Ao falar destes conceitos é também importante definir o narrowcasting, ou seja, em vez de uma única audiência consumindo a mesma informação, temos várias audiências, interesses e canais de informação. O aparecimento dos novos media (Canal180 incluído), mudou o modelo de comunicação com o aumento do número de canais através dos quais a informação atinge o público: “Na internet, os blogues, os wikis, etc., mudaram a tradicional distinção entre emissor e audiência. Em vez de se basear no “um para muitos”, as pessoas podem agora obter a informação através de “um-para-um” e “muitos-para-muitos” sistemas que elas próprias escolherem, criando

44 os seus próprios meios a partir de diversas fontes” (Cádima,2011:65). Este fenómeno verifica-se no Canal180, pois sendo este um canal cultural, apenas atinge um segmento da audiência, normalmente os jovens adultos qualificados e culturalmente ativos.

Claro que estes fenómenos estão mais presentes nas gerações mais jovens, que foram mostrando novas e diferentes necessidades em relação aos meios de comunicação e à programação: “Os sabores dos saberes das novas gerações exigem novas formas de participação que extrapolam a passividade no consumo.” (Correia,1998:46).

Como já referi, os mais jovens são o principal público-alvo do Canal180, são eles que procuram maior interatividade e participação com os meios de comunicação. Para se verificar esta aproximação entre a audiência e o meio de comunicação, neste caso o 180, é preciso mais do que uma programação diferente. É preciso estar presente em todas as diferentes plataformas e meios de comunicação, principalmente na internet. Ao combinarem os diversos media, os consumidores conseguem expressar as suas preferências e estabelecer uma relação com a indústria cultural.

A internet e o ciberespaço são mais do que um simples espaço onde ideias e opiniões são publicadas, são um espaço a transbordar de novas tendências, conteúdos e troca de influências. É na internet que o Canal180 tem maior influência, através das publicações que faz no youtube e no facebook, bem como com os conteúdos que publica para aplicações móveis.

Como já referi na apresentação do local de estágio, os conteúdos do Canal180 resultam não tanto das suas próprias produções, mas sim de parcerias que estabelecem a nível nacional e internacional. Sem esquecer a participação do público 180, fundamental para o normal funcionamento da programação. As principais parcerias, como já referi, são sites, empresas, canais televisivos e mesmo os próprios artistas. Dessas parcerias posso distinguir: a Gulbenkien, Casa da Música, Centro Cultural Vila Flor, Museu de Arte Contemporânea de Barcelona, GestaltenTV, The Avant Garde Diaries, David Wilson, Vincent Moon, entre muitas outras. Todo o material fornecido por estas e outras fontes, é editado pela equipa do canal180, para a criação de peças para o programa “Mag”, o magazine cultural diário. Este programa respeita uma série de técnicas de edição que se revelam fulcrais no reconhecimento da identidade do canal: primeiro evitar ter qualquer rosto que dê a cara ao programa ou ao canal, depois preferir planos grandes e de pormenor a planos gerais, e utilizar músicas alternativas para as peças.

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Isto torna muito mais vasto o leque de programas e temáticas culturais abordadas pelo Canal, para além de ser totalmente diferente do que se vê nas televisões generalistas portuguesas.

Para perceber o porquê da existência de um canal como o 180, é preciso saber que programas culturais existem nas televisões portuguesas e quais as diferenças em relação ao Mag e à restante programação. É preciso ainda tentar perceber as diferenças entre o 180 e a MTV Portugal, outro canal português com uma programação mais específica. No segundo capítulo vou aprofundar um pouco mais este assunto.

No próximo ponto deste capítulo vou aprofundar a ideia de que não foram só os meios de comunicação que evoluíram, também os profissionais de comunicação têm vindo a alterar a maneira de trabalhar. Cada vez mais um profissional da comunicação tem de ser polivalente e transversal, sendo capaz de trabalhar em qualquer área da comunicação.

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3.3 Interdisciplinaridade e transversalidade dos profissionais de comunicação

Ainda não existe um consenso no que toca à definição de interdisciplinaridade. Jean Luc Marion (1978:17) define-a como “a cooperação de várias disciplinas no exame de um mesmo objeto”. Outra definição é de Piaget (1972) que diz que a interdisciplinaridade aparece como intercâmbio mútuo e integração recíproca entre várias disciplinas (…tendo) como resultado um enriquecimento recíproco. Uma última definição é a de Palmade (1979:22), que vai ainda mais longe, propondo que por interdisciplinaridade se entenda “a integração interna e concetual que rompe a estrutura de cada disciplina para construir uma axiomática nova e comum a todas elas, com o fim de dar uma visão unitária de um sector do saber.” Através destas definições podemos dizer que a interdisciplinaridade é o processo de integração disciplinar de qualquer forma de ensino que estabeleça uma qualquer articulação entre duas ou mais disciplinas.

A transversalidade surge desta abordagem interdisciplinar, e é o conhecimento de diferentes disciplinas. A transversalidade diz respeito à possibilidade de se estabelecer uma relação entre conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real e da sua transformação (aprender na realidade e da realidade) (Herreros,2004).

Portanto a transversalidade permite a integração dos conhecimentos escolares e a interdisciplinaridade permite a comunicação entre eles.

Interdisciplinaridade e transversalidade são dois conceitos fundamentais que caracterizam os profissionais de comunicação e não só, nos dias de hoje. O Canal180 é um verdadeiro exemplo disso.

Como já referi, foram várias as coisas que me surpreenderam quando cheguei ao Canal180. Uma delas sendo número de membros fixos da equipa, que não passa dos 10. O que significa que a toda a equipa tem de saber um pouco de tudo. Claro que os estagiários ajudam na divisão do trabalho.

Apercebi-me com este estágio, que os profissionais de comunicação têm de saber um pouco de tudo, têm de ser versáteis e perceber de todas as vertentes da comunicação. Um jornalista, para além de escrever tem que ser capaz de filmar e editar uma reportagem. Hoje

47 em dia é fundamental sermos capazes de nos adaptar às mudanças que se têm vindo a verificar. É ainda muito importante a adaptação às novas redes sociais, que cada vez mais são cruciais para o desenvolvimento dos meios de comunicação.

O 180 parece-me o exemplo perfeito disto mesmo. Durante os três meses em que lá estive, passei por diversas áreas. Se não sabia algumas coisas, ia aprendendo à medida que me iam surgindo as dúvidas. Como já referi, tive de filmar e editar vídeos, gravar sons, fazer entrevistas, traduzir séries estrangeiras, fazer publicações nas redes sociais do canal, e ajudar na produção de vídeos.

Um termo que define bem este novo tipo de jornalistas é backpack journalism, em português jornalismo de mochila às costas. Para Hirst e Harrison (2007:251), esta é a:

“Prática de um único jornalista, que vai para o trabalho de campo equipado para reportar em todas as formas de media: radio, televisão, impresso e online. Normalmente este tipo de jornalista vai equipado com um computador portátil, uma câmara de filmar digital e um telemóvel: todos os itens que podem ser transportados numa mochila. É incomparável com a bagagem transportada por uma equipa de uma televisão tradicional, que leva luzes, tripés, lentes, quadros refletores, monitores e ainda um cesto de picnic com comida e vinho tinto”.

Jane Stevens (cit. por Hirst & Harrison, 2007:252), a primeira backpack journalist, tem uma definição bastante elucidativa para este termo: “Eu sou uma jornalista de mochila às costas. Eu uso uma câmara de vídeo como o meu caderno de apontamentos. Eu consigo criar histórias multimédia que incluem vídeo e áudio, e fotos retiradas do vídeo, e ainda texto. Consigo criar informações gráficas para os web designers. E consigo criar uma simples página web”.

É exatamente isto que acontece no 180, quando saímos para fazer uma reportagem levamos o necessário para criar uma peça completa, com vídeo, som, entrevistas e texto. Levávamos apenas uma ou duas câmaras DSLR e um gravador de voz. Para além disso, a mesma pessoa que filmava, editava a peça e a outra que entrevistava, escrevia o texto e gravava o voz off que aparecia no vídeo.

A convergência dos media, que é a união de todas as formas de comunicação mediada, acontece num lugar específico, a internet. Este novo tipo de jornalismo é um excelente exemplo desta convergência mediática, pois faz uso de todas as áreas de media – áudio, visual

48 e texto. Claro que os jornalistas que praticam este género têm de ser eficientes e bons em todas as áreas, para conseguirem comunicar a suas histórias com eficácia (Hirst & Harrison,2007).

Este tipo de jornalismo de mochila às costas já é comum em muitas redações televisivas. Primeiro porque é mais fácil chegar a determinados sítios e notícias com apenas uma câmara, mas principalmente porque é mais eficaz em termos de custos, é low cost:

“Infelizmente, esta tendência não é só alimentada por uma boa gestão de notícias ou por um desejo de colocar os jornalistas em espaços antes inacessíveis, mas também por cortes nos orçamentos. É mais barato, e portanto mais eficiente em termos de custos, para organizações como a ABC comprar câmaras de vídeo digital de boa qualidade para os seus correspondentes e enviá-los para o campo sozinhos, sem ter que recorrer a equipas completas….” (Hirst & Harrison, 2007:252).

As opiniões diferem no que respeita ao futuro deste método jornalístico, bem como à sua generalização nas redações das grandes televisões mundiais. O argumento que diz que as organizações de notícias devem adotar esta nova tecnologia e apostar no jornalismo de mochila às costas repousa sobre o facto de cada vez mais consumidores acederem a notícias e informações através da internet. Por isso é fundamental criar apresentações multimédia para atrair os consumidores. Stevens (cit. por Hirst & Harrison, 2007:254) acredita que este é o futuro do jornalismo “Em alguns anos, os jornalistas de mochila às costas – ou pelo menos aqueles que conhecem o jornalismo de mochila e o jornalismo de convergência – não serão apenas a regra, mas vão dominar.” Shister (2012:20) afirma que “o jornalismo de mochila às costas é o futuro inevitável desta indústria devido à vacilante economia mundial – aumenta os teus conhecimentos ou é game over”. Ou seja, ou os jornalistas são capazes de mudar de meio para meio (vídeo, áudio e texto) ou não vão conseguir sobreviver nesta indústria, cada vez mais tecnológica.

Pelo contrário, alguns autores não acreditam nesta forma de jornalismo e chegam mesmo a afirmar que isto compromete a veracidade e legitimidade das notícias. Vêm o jornalismo de mochila às costas como uma ameaça à responsabilidade que o jornalista tem para com os espetadores de fazer notícias justas, equilibradas e exatas. Para Martha Stone (cit. Por Hirst & Harrison,2007:255), o perigo “é que a pressa de fornecer uma história que satisfaça as exigências de todos os tipo de media (impressa, televisão e online) leve a um jornalismo

49 medíocre, porque cada aspeto – escrever, filmar a história, dar voz ao guião e editar as imagens – são tarefas para diferentes especialistas”.

Como já referi, no Canal180, apenas existem jornalistas de mochila às costas. Na minha opinião, isto é uma coisa boa, visto que dá maior abrangência de disciplinas, e aprendemos na prática a fazer um pouco de tudo. Agora, também é normal que ao ter de saber e fazer um pouco de cada área jornalística, não nos tornemos em especialistas de todas essas áreas, sendo esse o aspeto menos positivo deste novo tipo de jornalismo. Depende muito das necessidades das redações, e para o 180 (também por uma questão de custos, como já falei) o mais importante é saber trabalhar com este jornalismo de convergência.

Estamos então a verificar uma mudança significativa nas profissões relacionadas com a comunicação, mas não só. Cada vez mais os profissionais de qualquer área têm de ser capazes de se adaptar às mudanças, têm de ser transversais e interdisciplinares. Nos dias que correm temos que saber um pouco de tudo, ou então corremos o risco que não arranjar emprego.

Para tal acontecer foi necessário que o ensino acompanhasse estas evoluções, principalmente no que toca ao mundo do trabalho. Hoje em dia já é normal e até obrigatório os cursos de jornalismo terem programas que giram em torno do jornalismo de multimédia e do jornalismo de mochila às costas. Também se tem verificado, nestes últimos anos, um aumento dos estágios realizados depois da licenciatura ou do mestrado, como foi o meu caso.

No ponto que se segue vou falar da utilização da internet para difusão de conteúdos televisivos no caso concreto do Canal180. Quando falo de internet, falo essencialmente das redes sociais como o facebook, o youtube, o twitter entre outros. Vou tentar perceber até que ponto é que isto é fundamental para o sucesso de um canal de nicho, como o 180.

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3.4 Internet como difusora dos conteúdos 180

O canal180 é o único canal em Portugal exclusivamente dedicado à difusão de conteúdos relacionados com arte e criatividade e tem como objetivo dar a conhecer ao público artistas de diferentes áreas que ainda não tiveram o merecido reconhecimento, bem como tentar tornar os seus espetadores ativos culturalmente.

Apesar de o 180 chegar aos seus espetadores através da televisão, todos os seus conteúdos são também difundidos e partilhados na internet, através do site, da página do facebook e do twitter e do canal no Youtube.

Por que é que um canal, neste caso o canal180, deve apostar na internet como o principal meio para difusão dos seus conteúdos?

Com a mais rápida penetração da história dos meios de comunicação, a Internet transformou por completo os processos comunicativos e tornou a comunicação bidirecional, segmentada e onde é permita a participação e a interatividade dos consumidores. Ao contrário dos outros meios de comunicação, trouxe uma nova possibilidade aos consumidores ao permitir-lhes fazer parte do processo de criação e distribuição de conteúdos (Castells,2002).

Isto acontece no Canal180, principalmente através da internet, mas também pela televisão. Como já disse é a internet que permite a maior interatividade e participação das audiências, no entanto o 180 tem uma maneira diferente de fazer televisão. O espetador pode participar na programação 180 e até há programas que funcionam apenas com vídeos enviados.

No entanto é na internet que o Canal180 atinge um maior número de pessoas, onde está mais presente o público180. Primeiro porque este canal apenas existe na televisão por cabo e em duas operadoras (Nos e Vodafone) sendo assim mais complicado chegar a muita gente. Depois porque é principalmente na internet que está o público-alvo do 180, os jovens e jovens adultos informados e qualificados e que sejam culturalmente ativos.

O facto de estarmos na era digital deu origem a um novo tipo de audiência. Estamos perante um conjunto de indivíduos que já não vive sem tecnologia, sem o seu smartphone ou tablet. O que faz com que estejam sempre online à procura de novas coisas para ver e fazer e a partilhar aquilo que lhes interessa. Daí a importância de criar constantemente conteúdos apelativos e atrativos, bem como permitir a interação e participação desses mesmos indivíduos.

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Apercebi-me da importância da internet para o canal180 durante todo o meu estágio, pois sempre que produzia uma peça para o MAG (o programa cultural diário) ou outro trabalho qualquer tinha sempre de o publicar no youtube e no facebook. Para além de que todos os dias são publicadas fotos ou vídeos que vão ao encontro dos interesses do público 180 mesmo se não forem de produção do canal, e são também publicadas datas de concertos, outros eventos e espetáculos. Para além de publicarmos as nossas peças na página do canal pediam-nos para publicarmos também nas nossas páginas pessoais, dando assim a conhecer o canal a um maior número de pessoas, todos os nossos amigos virtuais. Isto é uma maneira de promover a marca 180. Claro que isto atrai as pessoas a gostarem da página, quanto mais não seja para estarem a par das novidades musicais e culturais que estejam a acontecer na sua cidade.

É também através das redes sociais que se verifica a maior interatividade entre o 180 e o seu público. No facebook, por exemplo, o público consegue fazer chegar diretamente as suas opiniões, críticas e sugestões aos responsáveis pelo canal e consegue obter uma resposta rápida e personalizada. Além disso, esta proximidade faz com que eles se sintam parte integrante do canal e que têm algo a dizer sobre a forma como é organizada a programação e, como já referi, podem ser mesmo produtores de conteúdos.

Por estas razões é que é fundamental para um canal de televisão apostar na difusão dos seus programas e conteúdos na internet. Foi isto que percebi ao longo dos três meses que lá estagiei, que a internet e em especial as redes sociais como o facebook, são o principal meio de difusão de conteúdos, bem como o principal meio de promoção do canal.

Pelo que já foi dito até agora é óbvio que o Canal180 em nada se compara aos restantes canais portugueses. No entanto, também já é um hábito para estes canais mais tradicionais disponibilizarem os seus conteúdos nos seus sites ou nas suas páginas das redes sociais. Isto porque se aperceberam que a internet é um meio que junta todos os outros meios comunicacionais (rádio, televisão, jornal), fenómeno a que se chama convergência mediática. E como já disse, porque junta todas as pessoas de todas as idades e classes sociais. Por isso, e com medo de perder a influência que tinham sobre as sociedades, as televisões tradicionais decidiram disponibilizar os seus conteúdos na internet.

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4. Considerações sobre as entrevistas e sobre a programação dos canais generalistas e do 180

4.1 Metodologia

Neste relatório efetuei uma análise exploratória da OSTV e do Canal180, da maneira como funcionam, da sua programação e dos conteúdos produzidos e coproduzidos. Para perceber isto e para responder ao tema principal deste relatório, realizei entrevistas ao diretor executivo João Vasconcelos, ao diretor de programação Nuno Alves e à coordenadora editorial Rita Moreira. Escolhi estes três membros da equipa pois foram eles que criaram a empresa e o canal, e são eles que tomam todas as decisões relativas ao mesmo. Achei portanto que eram as pessoas mais indicadas para responder as minhas questões. Os guiões das entrevistas estão colocados em anexo.

Para além disto, e para perceber quais as diferenças em relação aos canais generalistas portugueses, fiz algumas considerações sobre programação cultural. Tentei perceber e comparar os programas culturais que existem na SIC, TVI e RTP com o programa do Canal180 MAG. Esta comparação é bastante limitada, pois não é possível comparar os objetivos e os recursos de um canal generalista e um canal temático. Também não é possível comparar um canal generalista com um canal temático e nem mesmo um canal temático de notícias com um temático de cultura. Portanto, o objetivo desta breve comparação é apenas perceber quais as alternativas ao Canal180, no nosso país.

4.2 Considerações sobre as entrevistas

Através de entrevistas realizadas foi-me possível perceber que o Canal180 tem como principais objetivos inovar na programação de conteúdos, atraindo as gerações mais jovens para uma vida cultural ativa. Para além disto, este projeto de televisão independente visa promover e produzir conteúdos culturais de uma forma criativa através de novos formatos televisivos, e procura ainda criar uma nova forma de abordagem e uma nova forma de informar que cative novos públicos.

De acordo com o diretor executivo, João Vasconcelos, a principal diferença entre o 180 e os canais que já conhecemos é o facto de ser um canal especializado, concebido a partir de

53 princípios de colaboração e co-produção, que agrega alguns dos conteúdos mais originais e surpreendentes da música, do documentário e da arte urbana. Para além disto pretende dar a conhecer jovens artistas e criadores que têm pouca projeção nos restantes canais.

Falando mais especificamente do MAG (programa cultural diário do 180) podemos encontrar várias diferenças. Segundo Rita Moreira, o MAG distingue-se pelo cruzamento de propostas culturais em que aposta, e também por uma linha editorial que envolve aspetos criativos de filmagem e de edição dos conteúdos. Além de que, e ao contrário das televisões generalistas, os conteúdos trabalhos e apresentados no programa MAG não são só exibidos no canal de televisão, mas funcionam de forma autónoma nas diferentes plataformas como o site, a página do facebook e do twitter, o canal do youtube e ainda as aplicações gratuitas para iphone e ipad.

É preciso falar também das especificidades na edição do programa MAG. Uma edição que pretende estar mais próxima da linguagem publicitária e de cinema do que das peças informativas dos outros canais televisivos. O 180 apresenta algumas técnicas de edição bastante específicas: primeiro evitam ter qualquer rosto que dê a cara ao programa (a não ser os entrevistados), depois utilizam os grandes planos e os planos de pormenor em vez de planos gerais e utilizam músicas alternativas e de acordo com a identidade do canal para as peças. A música é fundamental para criar um ritmo na peça e a tornar mais atrativa.

Relativamente ao critério de escolha dos programas que passam no Canal, o diretor de programação Nuno Alves diz que tentam exibir conteúdos contemporâneos, com elevado grau de criatividade. Como já disse o 180 procura ser uma plataforma de divulgação de novos criadores e de novos formatos televisivos. Todas as parcerias que estabelecem, quer a nível nacional ou internacional, preenchem estes requisitos de criatividade e novidade.

Para o futuro os três entrevistados são unânimes quando dizem que o objetivo é o lançamento do Canal180 noutros países. Enquanto lá estive estavam em conversações para lançar o Canal na Polónia. Em Portugal, o objetivo é conseguir estar presente na maior parte das plataformas: operadores de televisão por cabo e TDT.

4.3 Considerações sobre a programação cultural

Os principais canais generalistas em Portugal são a RTP1 e RTP2, a SIC e a TVI. A partir destes canais foram surgindo outros como a TVI24, a SIC Notícias, a SIC Mulher, a SIC Radical. Obviamente a programação destes canais em nada se compara à programação 180. Uns são

54 canais generalistas que apresentam diversos tipos de programas (jornais noticiosos, novelas e outros programas de entretenimento) e outros são canais temáticos, mas de carácter noticioso.

Os canais generalistas em Portugal (RTP1,RTP2, SIC e TVI) não têm na sua programação nenhum programa inteiramente dedicado à divulgação cultural. No entanto, canais como a TVI24, a SIC Notícias e a RTP2 têm na sua programação programas de cariz cultural. A RTP2 apresenta todos os dias o programa “Cartaz 2” em que apresenta os destaques culturais do dia das diversas áreas e ainda sugestões para o dia seguinte. É um programa do género documental e apenas passa em revista os eventos culturais que acontecem no nosso país. Na SIC Notícias o programa “Cartaz” apresenta, diariamente, os principais destaques do cinema nacional e internacional. Este programa apenas aborda as notícias sobre cinema: mostra os trailers dos filmes que vão estrear em Portugal e normalmente têm um convidado em estúdio que fala um pouco sobre esses filmes. Na TVI24 o programa é semelhante e chama-se “Cinebox”, fala das estreias cinematográficas e dá a conhecer as notícias do mundo artístico.

No entanto, o Canal180 com o programa MAG marca uma posição totalmente diferente dos restantes canais portugueses e respetivos programas culturais, acima de tudo porque dá a conhecer novos jovens criadores portugueses e o seu trabalho, em áreas como a música, a dança, o teatro, a pintura, as instalações artísticas e o cinema. Enquanto os cartazes culturais dos outros canais, apenas falam dos mais conhecidos artistas e criadores (especialmente no mundo da sétima arte), o 180 traz a público artistas nacionais e internacionais que ainda não tiveram o reconhecimento e das mais variadas áreas. Para além disso, o 180 apresenta diariamente novas bandas de um universo um pouco mais alternativo e que não têm muita projeção.

Para além do tipo de programação cultural, existem outras diferenças entre os canais portugueses e o 180, ou melhor, características apenas visíveis no Canal180. Uma das mais marcantes é o facto de o 180 não ter, em nenhum dos programas, um apresentador, uma pessoa que dê a cara pelo canal, apenas a voz. Nas gravações de entrevistas é tido em conta isso, e apenas aparece o entrevistado. A falta de presença de um apresentador foi uma opção de edição do Canal180, é o elemento diferenciador do MAG, para além de que pretende dar mais importância e destaque ao entrevistado e ao assunto da peça. O facto de o entrevistador nunca estar visível na peça permite também que ele não esteja presente fisicamente, caso muito frequente nas peças 180, principalmente em peças internacionais. Nos programas culturais dos outros canais existem sempre um apresentador e um estúdio próprio. Outra grande diferença é a

55 publicidade, que é quase inexistente no 180. A pouca publicidade é das parcerias que vão estabelecendo com algumas instituições nacionais e internacionais. Isto é imposto pela conjuntura económica e também porque o Canal não atinge muita gente pela via televisiva, não sendo por isso sustentável ter a quantidade de publicidade que vemos nos outros canais.

Claro que não é possível comparar os recursos nem os objetivos dos canais generalistas portugueses aos do Canal180. Os canais generalistas, com o próprio nome indica, pretendem abranger todo o tipo de programas (entretenimento, noticiosos, reality shows, novelas entre outros) e chegar ao maior número de pessoas possível. Como já mencionei, o facto de não haver um estúdio, nem câmaras de filmar profissionais, e de funcionarem num pequeno escritório com 10 mesas, surpreendeu-me bastante, foi algo com o qual eu não estava mesmo a contar. Depois de começar o estágio percebi que, apesar de não parecer, ali era preparado e feito um canal televisivo cultural.

Destas considerações, posso retirar que os canais portugueses generalistas e temáticos de notícias não apostam muito na divulgação cultural do nosso país. Claro que esse não é o objetivo deles, no entanto acho que a programação cultural devia ser tida mais em conta. O Canal180 tenta preencher essas lacunas, apesar de não conseguir chegar a todo o público.

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5. Considerações finais

Obviamente a sociedade tem vindo a sofrer alterações com a evolução dos meios de comunicação de massas, pois estes tornaram possível comunicar com muitos ao mesmo tempo e transmitir a mesma mensagem. A introdução destes diferentes meios foi-se tornando cada vez mais rápida, principalmente com a internet. Isto tornou os indivíduos de hoje em dia totalmente dependentes destas novas tecnologias como o computador, o smartphone e o tablet: “uma relação de dependência, que se demonstra aquando da falha destas ferramentas, que deixam os seus utilizadores completamente desorientados” (Carvalho, 2010:56).

Para alguns autores esta tendência tecnológica ditava o fim dos meios de comunicação mais tradicionais, como os jornais, a rádio e principalmente a televisão: “Os próximos anos…convocam-nos, por isso, para aquilo a que podemos chamar o lento, mas irreversível, luto pela caixa resiliente que se diz que mudou o mundo” (Cádima, 2011:9). No entanto, não se tem verificado esse total desaparecimento, mas sim alterações profundas à forma como são transmitidos os conteúdos. Como refere McQuail (2003:484) apesar da “especulação sobre o desaparecimento eminente dos meios de massas, devido ao avanço de tecnologias alternativas, estes mostram uma enorme capacidade para se adaptarem e sobreviverem”.

Esta nova tendência, em que os meios tradicionais procuram adaptar-se a uma nova realidade ao usarem as diferentes capacidades tecnológicas e comunicativas para alcançarem novos públicos, chama-se convergência mediática. Ou seja, a maior difusão de conteúdos na internet pelos diferentes meios comunicativos (rádio, jornais e televisão) é a forma de lhes garantir maior competitividade no mercado e mais sucesso. Ainda assim, e como estamos perante um novo panorama, estes meios de comunicação ainda estão à procura das melhores soluções e as melhores formas de usufruírem dos benefícios da internet. Pois a produção audiovisual para várias plataformas exige uma dinâmica diferente. Neste novo panorama comunicacional o Canal180 conseguiu alcançar, na minha opinião, um lugar privilegiado no que respeita a divulgação cultural no nosso país.

Como já referi houve uma alteração profunda na maneira como os conteúdos são transmitidos, ou seja, foram surgindo novas maneiras de fazer televisão. Foi esse aspeto que tentei reforçar ao longo deste relatório: a nova maneira que o Canal180 arranjou para fazer televisão.

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Apercebi-me que o 180 funcionava de uma maneira totalmente diferente mal entrei no pequeno escritório em que funcionavam no Porto. Já tinha estado nos escritórios da SIC, também no Porto, e em nada se comparavam. Claro que isso não é a única, nem a principal diferença que existe entre estes canais portugueses. No entanto, foi ao longo dos três meses de estágio que me fui apercebendo de todas as diferenças: na programação, na participação e interatividade das audiências, na difusão de conteúdos nas redes sociais e no trabalho realizado pelos profissionais de comunicação. No entanto, é importante dizer que os objetivos destes canais não são os mesmos e por isso uma comparação nunca será justa.

No caso do Canal180 foi criada uma estratégia multi-plataforma, onde já estava pensada a utilização das redes sociais para criar uma relação mais direta com o público. Isto, partindo do princípio que, no panorama atual, não basta que a televisão coloque todos os elementos do público a falar do mesmo se não gera resposta (processo unidirecional). Estas redes proporcionam um tipo de comunicação aberta, mas o 180 conseguiu ir um pouco mais além desta tendência, já que os conteúdos do canal não existem sem a participação do público. Assim o público acredita que, através destas plataformas, pode ter um papel ativo na implementação, no crescimento do canal ou na alteração do que acreditem estar errado. A participação da audiência na produção dos conteúdos do 180 resulta do facto de este ser um canal open source. No entanto, esta questão da participação do público acarreta também alguns desafios. Desafios que passam pelo aumento do poder das audiências que resulta da maior interatividade e do aumento das escolhas dos espetadores. Com esse aumento das escolhas, principalmente na internet, torna-se mais difícil fidelizar as audiências.

Como referi, foi também durante o estágio que percebi que houve alterações significativas nas funções dos profissionais de comunicação. Foi a minha experiência que me fez perceber isso, pois passei pelas diversas áreas do Canal. Para além da experiência no audiovisual e multimédia, através da edição e filmagem de peças para o programa Mag, passei também pela área do jornalismo e da pré-produção. Estamos na era dos jornalistas multifuncionais, como refere Jane Stevens (2002) os jornalistas de mochila às costas (Backpack journalists). Hoje em dia um profissional de comunicação tem de ser capaz de fazer um pouco de tudo: filmar, fotografar, escrever e comunicar uma notícia, ou corre o risco de não conseguir um lugar na indústria da comunicação. Claro que este novo tipo de jornalismo não é de aceitação geral. Para vários autores é muito difícil manter a credibilidade e a qualidade de uma notícia

58 se for tudo feito por uma só pessoa. Para estes autores é necessário mais do que breves conhecimentos de todas as áreas, é necessário uma maior profundidade de estudos de cada área.

Para conseguir entender melhor as diferenças entre a programação 180 e a programação cultural dos canais generalistas portugueses, realizei entrevistas a três elementos do Canal180 e fiz algumas considerações sobre os programas culturais dos canais portugueses RTP1, RTP2, SIC e TVI.

Depois disso posso dizer que não existem grandes alternativas ao 180 nos canais generalistas. Existem poucos programas culturais nestes canais e a maioria apenas fala das novidades cinematográficas. No entanto e como já foi dito, não é possível comparar corretamente estes canais visto terem objetivos tão diferentes e alcançarem audiências também diferentes.

Quanto ao projeto 180 é preciso dizer que com estes três anos de emissões já conseguiram alcançar um generoso número de seguidores, no entanto não existem provas suficientes que comprovem o sucesso deste canal enquanto plataforma nacional de divulgação cultural.

Desta experiência ficam ainda algumas críticas ao Canal, especialmente no que respeita a quantidade de estagiários que recebem de cada vez. Na altura em que lá estive os estagiários eram tantos que mal havia lugar para todos e, por serem tantos, a orientação não era muita.

Relativamente ao futuro deste projeto penso que deviam apostar um pouco mais na produção de conteúdos próprios sobre atividades culturais no nosso país, sem descurar as parcerias internacionais. Acho igualmente fundamental conseguir colocar o Canal180 em todas as plataformas televisivas e em todos os operadores para chegar a um número maior de pessoas. Por último, é importante tentar a internacionalização do 180, sendo esse um dos principais objetivos do projeto.

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7. Anexos 7.1 Guião das entrevistas 7.1.1 Guião da entrevista a João Vasconcelos (Diretor executivo do Canal180)

. Com que objetivo foi criada a OSTV (Open Source Television)? . Como funciona o Canal180? . Qual a missão e o público-alvo do Canal180? . Em que é que a programação do 180 difere da programação cultural dos canais generalistas? . Qual a origem dos conteúdos que não são produzidos pela equipa do 180? . O Canal já completou três anos. Que evolução já sofreu e o que falta conseguir?

7.1.2 Guião da entrevista com Nuno Alves (Diretor de programação)

. Qual é o critério para a escolha dos conteúdos e programas que passam no Canal180? . Como funciona o software de emissão do canal? . Porque é que o Canal 180 é considerado um modelo low cost de fazer televisão? . O que distingue o programa MAG dos programas culturais que passam nos restantes canais televisivos? . Quais as especificidades de edição no Canal 180? . Qual a importância da escolha da música numa peça de magazine?

7.1.3 Guião da entrevista a Rita Moreira (Coordenadora editorial)

. O que é que o Canal180 traz de nova em relação aos canais generalistas? . Qual o critério na escolha de conteúdos que passam no canal? . O que distingue o MAG dos programas culturais que passam nos restantes canais televisivos? . Qual a importância das redes sociais (facebook e youtube) para o sucesso de um canal como o 180?

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7.2 Links para alguns dos trabalhos produzidos durante o estágio

7.2.1 Peças criadas para o MAG

 http://www.youtube.com/watch?v=fcuOVNDJpxs&index=43&list=PL25953F234C92E5A C  http://www.youtube.com/watch?v=1qomutbjwQk  http://www.youtube.com/watch?v=qFRdR18FRRE  http://www.youtube.com/watch?v=_ac4mxgVwXk  http://www.youtube.com/watch?v=ZCxPNASbo9A

7.2.2 Alguns episódios traduzidos e legendados

 http://vimeo.com/75879507  http://vimeo.com/75885420  http://vimeo.com/77126621  http://vimeo.com/76040523  http://vimeo.com/90045993

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