Universidade do Estado do Centro de Ciências Sociais Instituto de Filosofia e Ciências Humanas

Giselle Pereira Nicolau

Um Gavroche entre a política e a sociedade: teatro de Arthur Azevedo (1891- 1898)

Rio de Janeiro 2012

Giselle Pereira Nicolau

Um Gavroche entre a política e a sociedade: teatro de Arthur Azevedo (1891-1898)

Dissertação apresentada, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós- Graduação em História, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: História Política.

Orientadora: Profª. Dra. Lucia Maria Paschoal Guimarães Co-orientadora: Profª. Dra. Laura Moutinho Nery

Rio de Janeiro 2012

CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ/REDE SIRIUS/CCSA

A994 Nicolau, Giselle Pereira. Um Gavroche entre a política e a sociedade: teatro de Arthur Azevedo (1891-1898)/ Giselle Pereira Nicolau. – 2012. 110 f

Orientador: Lúcia Maria Paschoal Guimarães. Co-orientador: Laura Moutinho Nery. Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

1. Azevedo, Arthur, 1855-1908. 2. Brasil – História –1891- 1898 – Teses. 3. Teatro brasileiro – 1891-1898 – Teses. 4. Cultura política – Brasil – 1891-1898 – Teses. I. Guimarães, Lucia Maria Paschoal, 1946-. II. Nery, Laura Moutinho. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. IV. Título.

CDU 981”1891/1898”

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, desde que citada a fonte.

______Assinatura Data

Giselle Pereira Nicolau

Um Gavroche entre a política e a sociedade: teatro de Arthur Azevedo (1891-1898)

Dissertação apresentada como requisito parcial, para a obtenção do título de Mestre, Programa de Pós- Graduação em História, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: História Política.

Aprovada em 24 de abril de 2012. Banca examinadora:

______Profª. Dra. Lucia Maria Paschoal Guimarães (Orientadora) Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - UERJ ______Profª. Dra. Laura Moutinho Nery (Co-orientadora) Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - UERJ ______Profª. Drª. Tania Maria Tavares Bessone da Cruz Ferreira Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - UERJ ______Prof. Dr. Antonio Herculano Fundação Casa de Rui Barbosa

Rio de Janeiro 2012

DEDICATÓRIA

À Francis, minha mãe, e à Gabrielle, minha irmã, meus maiores tesouros. Aos meus avós, braços e pernas neste caminhar. A Dom Basílio Silva, OSB, por me ajudar a sonhar.

AGRADECIMENTOS

O trabalho acadêmico, frequentemente associado à solidão da pesquisa, envolve um número bastante significativo de pessoas que direta e indiretamente auxiliaram em sua realização. Lembrar de todos aqueles que caminharam ao longo desses 24 meses de mestrado, implica um exercício mnemônico que, entre a lembrança e o esquecimento, o último torna-se inevitável. Se porventura isso acontecer, espero que não diminua a importância dos que, mesmo não sendo contemplados nos agradecimentos, contribuíram para este trabalho. Os meus sinceros agradecimentos ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em especial à professora Marcia de Almeida Gonçalves, sempre amável e disposta a ajudar. Ao professor, Orlando de Barros, grande interlocutor nesse trabalho, à professora Lená Medeiros de Menezes, primeira mestra na arte da pesquisa. Ao Prof. André Sena, muito obrigada por acreditar neste projeto. Agradeço também, de um modo especial, os professores: André Azevedo, Lúcia Bastos Pereira das Neves, Antônio Edmilson Martins Rodrigues, Francisco Palomanes, Maria Letícia Correia e Felipe Charbel. Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em História e do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro sempre dispostos a ajudar os alunos, seja através de informações sobre o funcionamento da instituição, seja por meio de estímulo e palavras amigas. O meu sincero agradecimento a José Maria Ferreira, amigo desde os tempos da graduação de minha mãe, na década de 1990, a Max Rebello, Marco Antônio, Daniela e Cristiane. Das instituições de pesquisa em que percorri o meu agradecimento especial à Irene Moutinho, quem disponibilizou a consulta ao arquivo de Arthur Azevedo na Academia Brasileira de Letras, e a Luiz Antônio Souza, responsável pela biblioteca da referida instituição, pelas indicações de livros importantes para pesquisa. Aos amigos pela fé, com quem contei com orações e palavras de estímulo, agradeço a Amanda Antunes, Juliana Fernandes, Aline Barbosa, Mauricio Bortoluzzi, Iasmim Araújo, Jamille Coutinho, Sônia Coutinho, Lila Almeida, Frei Pedro, Pe. Helenes Lima, Dom José Palmeiro e Dom Cipriano Chagas, OSB, e muitos outros companheiros que estiveram ao meu lado. Na caminhada da história, partilhei, ao longo desses últimos dois anos, sonhos, angústias e longo desses últimos dois anos, sonhos, angústias e expectativas com Bruna Melo, Paulo Campos, Thiago Mourelle, Wanderson Arruda, Pedro Galdino, Bruno Sousa e Beatriz Momesso. Aos meus familiares o meu eterno agradecimento pelos valores transmitidos ao longo de minha vida. Um muito obrigada aos avós Luiz e Maria, à minha mãe, Francis, ao seu esposo, Jorge, à Gabrielle, minha querida irmã, aos padrinhos Luana Barbutti e Fabio Soares, aos tios, Maris e Itamar, e, por fim, ao primo irmão Thiago. Às minhas orientadoras Lucia Guimarães e Laura Nery, sem dúvida, as melhores companheiras nos últimos anos. Sempre presentes e atentas às minhas necessidades, iluminaram o meu caminhar na pesquisa e na dissertação. À doce vovó Aurinha, que deixou lições de amor ao próximo e bondade, o meu agradecimento, In memoriam. Ao Deus uno e trino, por seu meu maior companheiro e mestre na caminha da vida.

RESUMO

NICOLAU, Giselle Pereira. Um Gavroche entre a política e a sociedade: teatro de Arthur Azevedo (1891-1898). 2012. 112 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

Arthur Azevedo viveu uma época de mudanças. Nascido em São Luís do Maranhão, em 7 de julho de 1855, na Corte, como tantos outros jovens provincianos daquela época. No Rio de Janeiro, foi jornalista, escritor, funcionário público e destacado autor teatral. Testemunhou a passagem do Império à República, fazendo desse conjunto de acontecimentos, matéria e cenário para suas crônicas, contos e peças teatrais, em especial, em suas Revistas de Ano. Partindo do conceito de cultura política, tal como foi formulado por Serge Bernstein, pretende-se analisar a produção de Arthur nos anos subseqüentes à mudança do regime, à luz do contexto social e teatral experimentado pelo autor, articulando suas escolhas políticas e a cultura da época à obra por ele deixada.

Palavras-chave: Arthur Azevedo. Revistas de ano. Cultura política. Primeira República.

RÉSUMÉ

NICOLAU, Giselle Pereira. Un Gavroche entre la politique et la societé: thêatre de Arthur Azevedo (1891-1898). 2012. 112 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

Arthur Azevedo a vécu une époque de changements. Né à São Luís au Maranhão, le 7 juillet 1855, il a quitté son lieu d ´origine à l´âge de 18 ans, pour chercher des opportunités à la Cour, comme beaucoup d'autres jeunes provinciaux de cette époque là. À Rio de Janeiro, il a été journaliste, chroniste e fonctionnaire, mas il se distingua au théâtre. Arthur assista au passage de l`Empire à la Republique, en faisant de cet ensemble d'événements un matériel pour ses chroniques et pièces de théâtre, surtout les revues de l´ année. En partant du concept de culture politique, tel comme il a été formulé par Serge Bernstein, nous cherchons à analyser le production d´Arthur dans les années postérieures au changement du régime, face au contexte social et théâtral dans lequel était inseré l´auteur, en articulant ses choix politiques et la culture de l´époque à l'oeuvre qu'il légua.

Mots- clés: Arthur Azevedo. Thêatre. Culture politique. Première Republique.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...... 9 1 ARTHUR AZEVEDO E SUA ÉPOCA...... 14 1.1 Cenas da passagem do Império à República...... 14 1.2 Biografia em foco...... 20 1.3 Arthur Azevedo e sua época como um problema...... 23 1.4 Arthur Azevedo: biografia, teatro e cultura política ...... 26 2 AS REVISTAS DE ANO: UM LUGAR ENTRE AS ESCOLHAS POLÍTICAS DE ARTHUR E DO “PÚBLICO”...... 42 2.1 Arthur e “O tribofe”...... 42 2.2 Da indiferença à adesão: a revista de ano O major como um estudo de caso...... 58 3 ARTHUR AZEVEDO: TEATRO, SOCIABILIDADE E CULTURA POLÍTICA...... 73 3.1 Um fracasso retumbante: A Fantasia...... 73 3.2 Do jornal ao palco: um olhar sobre Gavroche...... 95 CONSIDERAÇÕES FINAIS...... 103 REFERÊNCIAS...... 106

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INTRODUÇÃO

Gavroche foi um dos pseudônimos de Arthur Azevedo. E, também, o título com que batizou a sua revista de ano, encenada em 1898. Nos dois casos, a denominação foi tomada de empréstimo de um personagem do romance Les Misérables, de Victor Hugo, publicado em 1862. A trama se passa em meio às revoluções que abalaram a monarquia francesa entre 1815 e 1832. Gavroche é um menino, abandonado pelos pais, que luta para sobreviver nas ruas de Paris, onde acaba por morrer assassinado ao participar das barricadas de 1832. O romance alcançou grande sucesso e o termo Gavroche incorporou-se ao vocabulário francês, passando a designar moleque travesso e valente, mas ao mesmo tempo generoso. Escolhido por Arthur Azevedo para assinar versos políticos nas páginas do jornal O País, o Gavroche brasileiro apareceu pela primeira vez em 14 de março de 1894. A partir daí passou a celebrar diariamente em quadrinhas a vitória do governo do marechal Floriano Peixoto sobre a Revolta da Armada, liderada pelo almirante Custódio José de Melo. Debaixo do pseudônimo, o poeta desvendava o seu posicionamento político, ao enaltecer a figura de Floriano e satirizar a de Custódio. Tal qual o personagem de Victor Hugo, Arthur envolveu-se no redemoinho revolucionário, perfilando-se nas hostes florianistas. Tomou a pena como arma e montou barricadas que não se restringiam ao campo da imprensa. A postura de Gavroche, sem dúvida, também se revela no festejado autor teatral, sobretudo nas suas Revistas de Ano. Arthur Azevedo (1855-1908) foi um dos maiores autores do Teatro de Revista no Brasil. Escreveu cerca de dezenove revistas de ano, muitas das quais em parceria com Lino d´Assunção, França Júnior, Moreira Sampaio, Aluísio de Azevedo e Gastão Bousquet. Segundo Antônio Martins de Araújo, o final da década de 1890, foi um período de grande autonomia na produção dramatúrgica azevediana, pois para este autor, este foi momento em que Azevedo escreveu sozinho, seis revistas. Dentre os diversos gêneros que compõem o teatro musicado, as Revistas de Ano alcançaram maior êxito nos palcos cariocas. Surgido no Brasil do século XIX, como fruto da expansão da indústria do entretenimento, conforme assinala Fernando Mencarelli, o Teatro de Revista apresentava à platéia, os principais acontecimentos transcorridos ao longo de um ano, na cena nacional e internacional. Estabelecia-se, assim, através de uma linguagem humorada e "ligeira",

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um diálogo com especial com os expectadores. As cenas cotidianas, os costumes da sociedade, as reviravoltas políticas, os acordos diplomáticos, as críticas sociais são assuntos que fazem parte do repertório das revistas. Por trilhar os caminhos do teatro musicado, sobretudo as operetas e revistas de ano, Arthur Azevedo foi alvo de preconceito por parte de literatos que conviveram com ele. Consideravam um verdadeiro desperdício que seus esforços estivessem voltados para a produção de gêneros ligeiros. Julgavam que deveria empregar o seu talento na redação de peças “sérias”, capazes de instruir o público. Não raras vezes Arthur dedicou espaço nos seus folhetins e colunas para responder à crítica teatral da época. Acreditava que uma comédia musicada bem feita, poderia ser elevada à categoria de arte. Além disso, imaginava que os apreciadores do teatro de revista, saberiam "separar o joio do trigo", nas palavras do próprio teatrólogo. A presente pesquisa concentra-se no período ente 1891 e 1898, época especialmente turbulenta. De fato, nas revistas de ano constituem um bom termômetro para se descortinar os primeiros anos do regime republicano, aqui revisitados a partir das próprias escolhas de Azevedo: em suas revistas, acontecimentos políticos decisivos, como a proclamação da República e o período da ditadura de Deodoro da Fonseca, o Encilhamento, o governo florianista, a Revolta Armada, articulam-se à vida cultural do Rio de Janeiro, ao cotidiano de seus habitantes e aos costumes da cidade. Partindo da hipótese de que o teatro de Azevedo reencena o passado da República nascente, e seu próprio presente, por meio do teatro ligeiro. Para verificar tal hipótese recorremos ao conceito de cultura política, conforme definido por Serge Bernstein, realçando não somente as qualidades do texto teatral, mas também o vigor do pensamento de Arthur Azevedo no âmbito político, entrecruzando vida, obra e iluminando não apenas a já reconhecida qualidade do texto teatral de Arthur Azevedo, mas sobretudo o vigor das idéias políticas defendidas por ele defendidas, entrecruzando vida, contexto e obra. De acordo com o Dicionário de Política, organizado por Norberto Bobbio, define cultura política corresponde como um conjunto de atitudes, normas, crenças e tendências partilhadas por membros de uma determinada sociedade, a partir de uma dada realidade política. Esse conjunto de representações é determinante na constituição de uma identidade política. Ampliando ainda mais esse entendimento, Serge Bernstein sustenta que a cultura política, adquirida por um sujeito histórico seria uma espécie de núcleo que assinala suas escolhas a partir de uma determinada visão de mundo. O autor argumenta que o estudo de uma cultura política deve considerar as

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experiências vividas e partilhadas, individual e coletivamente. Philippe Levillain, por sua vez, considera que a biografia é indispensável na compreensão entre “passado” e “presente”, “memória” e “projeto”, “indivíduo” e “sociedade”. A concepção de Levillain esforça, pois, a importância da relação entre biografia e história, no movimento de renovação porque passam hoje em dias as investigações no campo do político, viés que orienta a abordagem dessa dissertação. Assim, o conceito de cultura política aqui incorporado, não exclui a particularidade das escolhas individuais nem as várias formas de representação que estas podem adquirir, permitindo que possa diferenciar uma identidade política específica. Tal conceito mostra como as esferas da cultura e da política são inseparáveis, como se constatará nos capítulos que se seguem. Através do exame de quatro revistas de ano: O Tribofe (1891), O Major (1894), A Fantasia (1895) e Gavroche (1898). Aprofundando a hipótese inicialmente formulada, acreditamos que as peças selecionadas para análise são um bom termômetro para perscrutar o eixo particular de valores e interesses do autor. Possibilitam, ainda, identificar a gradação ou a variação de opiniões emitidas por Arthur, que resultam em posicionamentos políticos às vezes ambíguos. Do mesmo modo, podem revelar aspectos importantes das diversas culturas políticas que se desenvolvem e disputam o poder no alvorecer do regime republicano. Por essa linha de raciocínio, deduz-se que as revistas de ano cumpriam importante papel político. Mas, para além de encenar de modo humorístico os costumes, os valores e as práticas políticas de uma sociedade, não se pode esquecer que o gênero revista estabelece forte cumplicidade entre autor e o público. Assim, o seu estudo oferece ao historiador uma possibilidade de aproximação com a atmosfera de paixões e agitação que marcou o difícil processo de enraizamento do sistema republicano no Brasil. Em outras palavras, isto significa dizer que a aproximação detalhada da obra teatral de Azevedo possibilita desvendar aspectos importantes das culturas políticas que desenvolveram no país, no alvorecer do regime republicano. No tocante à base empírica utilizada nesta dissertação, a pesquisa concentrou-se nas quatro revistas de ano já mencionadas - O Tribofe (1891), O Major (1894), A Fantasia (1895) e Gavroche (1898), visto que as mesmas cobrem o período inicial da República. Complementando essas fontes, foram consultadas as cartas de Arthur Azevedo dirigidas a alguns homens de letras a exemplo de , de José Veríssimo e de , com quem Arthur polemizou sobre a imprensa. Também foram levantados documentos hemerográficos, no arquivo

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ainda não inventariado do teatrólogo, sob a guarda da Academia Brasileira de Letras, ao qual tivemos acesso. Além disso, foram compulsados jornais da época, em especial, O País, com o qual Arthur contribuiu desde a fundação, em 1 de outubro de 1884. Este material revelou-se para a análise das revistas de ano selecionadas. Através da sua leitura conseguimos estabelecer conexões entre alguns aspectos da biografia de Azevedo e a respectiva obra. No primeiro capítulo Arthur Azevedo: entre a sociedade e a política, apresentaremos as cenas da mudança do Império à República, através de um diálogo fecundo entre Arthur Azevedo e a historiografia republicana. Contemporâneo à instauração do novo regime, o teatrólogo nos legou um importante testemunho acerca da atmosfera política e social que envolveu a cidade do Rio de Janeiro, a partir de 15 de novembro de 1889. Ainda neste capítulo, incorporamos algumas discussões acerca da reabilitação porque passa hoje em dia o gênero biográfico no âmbito da história da historiografia, apresentando as contribuições de autores sobre os limites e possibilidades do gênero no atelier do historiador. Isto nos levará a revisitar criticamente a clássica contribuição biográfica de Raimundo Magalhães Júnior, Arthur Azevedo e sua época. Finalmente, em rápidas pinceladas, apresentamos um ligeiro estudo da história de vida do teatrólogo, privilegiando a sociabilidade literária da época, a sua trajetória política, bem como a inserção no universo teatral das últimas décadas do século XIX e início do XX. Como já se esboçou acima, Arthur Azevedo foi um grande conhecedor do público teatral à época. No segundo capítulo, intitulado As revistas de ano; um lugar entre as escolhas políticas de Arthur e do “público”, examinamos as revistas de ano O Tribofe e O Major. São duas peças fundamentais para se compreender a relação existente entre biografia e cultura política na obra artístico-literária de Arthur Azevedo. Interlocutor privilegiado do povo fluminense. o teatrólogo tornou-se um simpatizante do governo do marechal Floriano da Fonseca, posicionando – se em favor do então presidente da república tanto no teatro quanto na imprensa. Desde já podemos antecipar que a análise dessa peça, e também da revista de ano Gavroche, da qual se conhecem apenas as partes musicais, parece indicar um encaminhamento diferente daquele sugerido por biógrafos e comentadores da obra deixada por Arthur Azevedo. Ela aponta para a defesa de um projeto político mais claro do que supõe, ou seja, demonstram a proximidade de Arthur com o movimento jacobino. Ao mesmo tempo, revelam de que maneira

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as flutuações da cultura política se entrelaçam com a própria história de vida do autor, ainda que o revistógrafo se mantivesse fiel ao repertório das convenções características do gênero.

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1 ARTHUR AZEVEDO ENTRE A SOCIEDADE E A POLÍTICA

1.1 Cenas da passagem do Império à República

“A Rua Primeiro de Março estava cheia de povo”, escreve Arthur Azevedo em sua crônica sobre o 15 de novembro de 1889: “... Deodoro da Fonseca, à frente da tropa, [...] “parecia um herói que viesse não de uma vitória, mas de uma derrota”. Segundo o cronista, a população assistiu aos acontecimentos “bestificada”:

O silêncio era profundo. Só se ouvia o barulho das patas dos animais batendo na calçada, e os sons longínquos das bandas marciais, que se aproximavam. Não houve um grito na multidão. O adjetivo “bestificado”, com que Aristides Lobo, escrevendo para o Diário Popular, de São Paulo, classificou o povo nesse dia histórico, é uma propriedade cruel, mas irrefragável. Os cariocas olhavam uns para os outros, pasmados, interrogando-se com olhos sem dizer palavra.1

Contudo, na perspectiva de Arthur, o termo bestificado ganha também a conotação de “surpreendido”, demonstrando uma percepção suplementar à famosa formulação de Aristides Lobo:

Entretanto, é preciso convir que o caso não era para menos. O “bestificado” de Aristides Lobo pode ser o sinônimo... enérgico de “surpreso”. O povo não esperava que a república triunfasse da noite para o dia; não tinha o espírito preparado para a notícia do acontecimento mais grave da nossa história.

Considerando o modo como encerra a crônica, a “bestificação” fora apenas momentânea, e não definiria uma atitude de permanente alheamento do povo nem significava um caminho aberto para o retorno monarquista.

1 O texto foi reproduzido n´O País em 17/11/1902, sob o título Recordações. Apud. Antônio Martins, “Arthur Azevedo: homo politicus”, in: Teatro de , Vol. 5, Rio de Janeiro: Funarte, 2002, p. 608.

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Mas se os restauradores imaginam que num momento oportuno poderão contar com a mesma “bestificação”, enganam-se redondamente; o povo agora está prevenido, não será tomado de surpresa, não deixará passar em silêncio um cavaleiro vitorioso. 2

A memória de 1889 deixou registrada a idéia de que o povo não estava presente no momento da proclamação da República. Segundo Aristides Lobo: “O povo assistiu [à proclamação] bestializado”. A frase, fixada nos livros história, também serviu de mote para o estudo de José Murilo de Carvalho em Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. Nesta obra, entretanto o autor problematiza o termo e discorre sobre a participação política fluminense nos anos iniciais da República, apontando para uma explicação a respeito deste fenômeno. Segundo o autor, se o povo era ausente dos “mecanismos formais” do jogo político, sobretudo nas eleições; por outro lado, estava presente nas festas populares ou no carnaval.

(...) havia no Rio de Janeiro um vasto mundo de participação popular. Só que este mundo passava ao largo do mundo oficial da política. A cidade não era uma comunidade no sentido político, não havia o sentimento de pertencer a uma entidade coletiva. A participação que existia era de natureza antes religiosa e social e era fragmentada.”3

Atuando fora do âmbito das ações políticas clássicas e suas demandas (reivindicação de participação nas decisões governamentais, defesa dos direitos constitucionais ou limites à ação do Estado, por exemplo), a população mantinha uma relação pragmática com o Estado. Segundo José Murilo de Carvalho, a população fluminense possuía uma característica única, diferente do que se observava em qualquer outra cidade do país. No Rio de Janeiro vigorava o que o autor define como uma “mentalidade de irreverência, de deboche, de malícia, o tribofe” 4. Saber lidar com a lei em benefício próprio, ao ponto de “desmoralizar” a autoridade, eis aí o que o historiador define como bilontragem, em oposição à passividade contida no termo bestificação. Tanto o “Tribofe” quanto o “Bilontra” são personagens centrais de famosas revistas de Arthur Azevedo. Em ambos, encenam o ethos local: o trapaça, o espertalhão, o gozador:

2 Idem Ibidem. 3 José Murilo de Carvalho. Os bestializados. O Rio de Janeiro e a república que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p. 38. 4 Ibidem p. 159.

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Se quer saber o que é bilontra, É bom que saiba, antes do mais, Que esta palavra não se encontra No dicionário de Morais. A bilontrage é sacerdócio Que cada qual pode exercer; Entre o [...] e o capadócio O meio termo veio a ser.5

A comemoração do centenário da Proclamação da República levou muitos estudiosos, preocupados em analisar os processos políticos e sociais, a se voltarem para o momento da transição do Império à República. Em texto clássico, publicado na coletânea organizada por Sérgio Buarque de Holanda, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso analisa os primeiros anos republicanos6: Para o autor, a instauração de uma nova ordem não se deu de uma forma natural, uma vez que houve uma “mudança nas bases e nas forças sociais que articulavam o sistema de dominação no Brasil”.7 A passagem da ordem monárquica para republicana, segundo ele, teria ocorrido no interior de um processo maior de transição para uma ordem burguesa, cujo ponto de corte está na década de 1870. Ilmar Rohloff de Matos, por seu turno, afirma que o término da Guerra do Paraguai foi um divisor de águas, momento em que a população fluminense compreendeu o conjunto de mudanças em marcha. O Manifesto Republicano de 1870, “cumpriria o papel de contestação a uma ordem política, intelectual e moral, responsável pela ordem imperial: a direção saquarema.”8 Para Nicolau Sevecenko, aquele foi um momento de forte engajamento dos homens de letras, grupo que ficou conhecido como a Geração de 1870. Lutava-se por um Brasil “moderno”, e defendiam-se as transformações redentoras, como a democracia, a abolição, o liberalismo, com vistas à extinção da sociedade “empoeirada” do Império. O engajamento político era condição ética de homens que, na medida do possível e, de acordo com a condição do país, lutavam pelo ideais de progresso e civilização. Através de jornais e periódicos ilustrados, estes letrados, em

5 Arthur Azevedo. “O Bilontra”. In: Teatro de Artur Azevedo, Vol. 4, Rio de Janeiro: Funarte, 2002, p. 1317. 6 Fernando Henrique Cardoso. Dos Governos Militares a Prudente – Campos Sales. In: Boris Fausto (org.). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo III. O Brasil Republicano. Vol.1. Estrutura de Poder e Economia (1889- 1930). n.8. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989, pp. 18-57. 7 Ibidem, p.40. 8 Ilmar Mattos. Do Império à República. Revista de Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.2, n.4, 1989, pp. 163-171.

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linhas gerais, produziram dentro de um espaço intelectual e político reflexões que punham em xeque uma tradição imperial. 9 De acordo com Sevcenko, entretanto, um expressivo contingente desses escritores e intelectuais, embebidos da fonte européia, ao tomarem para si a “missão”, o fizeram em tom de arrogância, apresentando-se como “representantes dos novos ideais”, dotando a tarefa de um caráter salvífico, cujo objetivo era retirar a nação do obscurantismo, guiando-a rumo a um futuro promissor. O que movia ação destes homens era a certeza de seu papel transformador, enquanto sujeitos históricos. O engajamento político da “república letrada” era uma condição ética, e mais do que isso era o espaço de suas atuações e reflexões. Neste sentido, vemos a valorização de um viés utilitarista, considerado uma das características marcantes dessa geração escritores, a ponto de valorizarem simplesmente o que é digno de provocar mudança social. 10 O engajamento dos literatos, a que se refere Sevcenko, já pode ser percebido no período da conturbada passagem do Império para a República, fase de crescente instabilidade política, econômica e social. A aparente fluidez e falta de referências se dissemina e pulsa sem cessar no texto desses autores. Como observa José Murilo de Carvalho, a circulação de idéias, ora liberais, ora socialistas, marcou aquele momento de efervescência, em que se define uma “nova atitude dos intelectuais em relação à política:

Da invasão da Câmara Municipal a 15 de novembro de 1889, antes mesmo de proclamada a República, participaram vários intelectuais. Alguns, por certo, antigos militantes do movimento abolicionista, como José do Patrocínio, mas outros pela primeira vez movidos à ação política concreta, como , Luís Murat e . Um mês depois, os intelectuais do Rio enviaram um manifesto de entusiástico apoio ao governo provisório (...)11

A abolição da escravidão e a proclamação da República indicaram não somente a vitória do projeto desta geração, mas também seu pesadelo. A sucessiva conquista de seus ideais e a mudança de um regime para outro, deveria constituir um processo construtivo, sólido e realista. Porém, o quadro de entusiasmo republicano iria se modificar com o autoritarismo do governo Floriano Peixoto. Na seqüência dos acontecimentos, os efeitos do novo regime se fizeram sentir

9 Nicolau Sevcenko, Literatura como missão. Tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, pp. 95-137. 10 Idem Ibidem. 11 José Murilo de Carvalho, Opus cit, p. 25.

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de modo mais dramático. Basta lembrar que, durante o governo de Floriano, por exemplo, muitos intelectuais e literatos deixaram a capital para escapar da prisão. A consolidação de nova ordem e de suas instituições se deu através de um processo conturbado, cujos efeitos acabaram por macular o tão sonhado ideal. Os primeiros anos da República foram repletos de sobressaltos e contínuas crises políticas. Para Nicolau Sevcenko, a política econômica denominada de encilhamento foi um fator decisivo nesse contexto. A febre especulativa e a abundância de créditos para o desenvolvimento de novos empreendimentos propiciaram um sentimento de euforia quanto à possibilidade de enriquecimento na capital federal. 12 O historiador André Azevedo, assinala que a atmosfera de enriquecimento rápido e ascensão social que envolvia os brasileiros de diversas classes sociais.13 O encilhamento criou um clima de tensão, no qual as atenções deveriam estar voltadas para as oportunidades oferecidas pelo progresso proporcionado pela República. O Rio de Janeiro, capital do arrivismo, modernizava a sua economia pari passu ao progresso proporcionado pelo novo regime. A euforia em relação ao desenvolvimento material do país, acreditavam alguns, era a contrapartida da busca pelo progresso posta em marcha pela República, e cujo modelo seria os Estados Unidos. Em A República Consentida, Maria Tereza Chaves de Mello oferece interpretação um pouco distinta e aponta para a idéia de que mudanças se operavam “no campo do progressivo consentimento de uma nova concepção de mundo, na qual estava inscrito o regime republicano.”14 Dessa maneira, a idéia de República trazia consigo expectativas positivas e a possibilidade de um regime político baseado na igualdade social. Para a historiadora, a rua, espaço público por excelência, era também o locus privilegiado da ação daqueles que, sem ter espaço no parlamento, davam um novo significado para este local. Palco das mais variadas manifestações possíveis, como conferências nas associações civis e recreativas, em livrarias, encontros e debates acalorados nas redações dos jornais e nas rodas das confeitarias, chegando por vezes a mobilizações populares urbanas.

12 A obra que retrata esse período de febre especulativa é o romance O encilhamento, de Visconde Taunay, em 1894. O livro mostra o pensamento que orientava boa parte dos cidadãos brasileiros, a ânsia pelo “dinheiro fácil”, pelo lucro e as oportunidades de enriquecimento sem esforços, eram vistos pelos atores sociais na época como uma oportunidade única. 13 André Azevedo. Da Monarquia à República. Um estudo dos conceitos de civilização e progresso na cidade do Rio de Janeiro entre 1868 e 1906. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2003. (Tese de Doutorado). 14 Maria Tereza Chaves de Mello. A República Consentida: cultura democrática e científica no final do Império. Rio de Janeiro: FGV; Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2007, p. 14.

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Somado a isto, a intelectualidade ligada à geração de 1870, especificamente, teria desempenhado, ainda segundo a autora, um importante papel na divulgação dos valores republicanos, através das obras literárias e da imprensa. A propaganda política da época, seja na literatura, seja nos periódicos desempenhou papel primordial na politização da Corte. A vitória dessa propaganda foi estabelecer uma associação entre república e democracia, sendo o último termo ressignificado e compreendido como igualdade, ou melhor, como uma “sociedade sem privilégios”. 15 Esse brevíssimo balanço historiográfico permite que se entreveja as possíveis interpretações acerca da atmosfera de efervescência política e cultural que marca a passagem de um regime ao outro. Se, de um lado, alguns estudos consagrados reforçam uma visão dicotômica do período, operando com pares como exclusão-inclusão ou marginal-oficial, encaminhando para a percepção daquela experiência sob a chave interpretativa da “duplicidade de mundos”, como escreve José Murilo a respeito do Rio de Janeiro,16 outros autores indicam a possibilidade de um quadro mais complexo e apontam para a existência de interações sociais e políticas não tão estanques. Nesse sentido, as contribuições da história cultural têm também grande peso, dando visibilidade aos atores e às formas de representação da sociedade que faziam circular valores e ideais da época. Nessa clivagem, deseja-se abordar a trajetória e a obra de Arthur Azevedo recuperando, aqui, a noção de cultura política em suas relações com a história cultural, conforme esclarece Serge Bernstein. A noção, segundo o autor, designa um “fenômeno de múltiplos parâmetros”, estando, portanto

(...) estritamente ligada à cultura global de uma sociedade, sem, todavia se confundir totalmente como ela, porque o seu campo de aplicação incide exclusivamente sobre o político. Não poderia pois haver antinomia, uma vez que a cultura política, como a própria cultura, se inscreve no quadro das normas e dos valores que determinam a representação que uma sociedade faz de si mesma, do seu passado, do seu futuro.17

15 Ibidem, p. 213. 16 José Murilo de Carvalho, Opus Cit., p. 159. 17 Serge Bernstein. “A cultura politica”, In: Jean-Pierre Rioux e Jean François Sirinelli. Por uma história cultural. Lisboa: Editorial Estampa, 1998, pp. 352-353.

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Do ponto de vista de Bernstein, o âmbito cultural pavimenta o solo da vivência política, que, por sua vez, não é um fenômeno fixo, a ser abordado a partir de uma única via. Falar, assim, em cultura política é realçar suas dimensões representativas e simbólicas. E, ainda, falar da complexa relação entre o individual e o coletivo. Sugere-se, aqui, investigar essa possibilidade a partir do caso de Arthur Azevedo. A investigação cruzada de sua produção revisteira e de sua trajetória pessoal e intelectual é o caminho escolhido, de modo a avaliar as características especificas da ação e do legado desse autor em suas dimensões tanto individuais quanto coletivas. A opção apresenta, assim, o desafio de mergulhar, ainda que brevemente, na relação entre biografia e história.

1.2 Biografia em foco

As discussões sobre os limites entre história e biografia são antigas e remetem à época clássica. Em seu estudo sobre o desenvolvimento da biografia na Grécia, Arnaldo Momigliano nos chama a atenção para “os altos e baixos do gênero biográfico”.18 No mundo de tradição ocidental, a prática da escrita de vida era concebida como uma prática cultural, cuja forma, usos e funções políticas variaram ao longo do tempo. Uma mudança substancial na relação biografia- história ocorre a partir do século XV, quando surge uma nova maneira de conceber o homem em relação ao mundo que o cercava. Já no século XVIII, marcado pelas idéias iluministas, o processo de secularização da sociedade, e o começo da emancipação do homem em relação à ordem transcendental afetam a relação entre indivíduo e biografia, separação que vai se aprofundando nos séculos subseqüentes com historicidades próprias. O distanciamento entre biografia e história iria aumentar no século XIX. Segundo Sabina Loriga, dois fatores concorreram para essa nova configuração. O primeiro, de natureza filosófica, refere-se à busca de um sentido para a história empírica. O segundo, é o destaque de uma “concepção teleológica do devir”, como ressalta a autora do ensaio A Biografia como um problema, quando vigora a idéia de que cabe à humanidade como um todo realizar sua mais alta finalidade, em detrimento dos feitos individuais. Tal posição reflete a relação problemática entre a história e a biografia. Como escreve Loriga, o homem é “esmagado pela lei. Uma lei, dramática

18Arnaldo Momigliano. The development of Greek biography. Londres :Havard University Press, 1993.

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e implacável, isenta de toda a contingência”.19 As instituições, o meio – aí compreendidas as concepções de raça, geração ou nação – prevalecem sobre a existência humana particular. Por outro lado, como afirma François Dosse, cada momento histórico possui o que chamou de uma “idade heróica”, tendo suas próprias figuras individuais como modelos. Dosse mostra que, no século XIX, ocorre uma passagem da noção de heroísmo para a idéia de “gênio”, agora exaltado sob o influxo do romance, enquanto gênero. Tanto Loriga quanto Dosse vêem Thomas Carlyle como autor emblemático dessa sobrevida (ainda que discreta) da biografia no século XIX. No caso francês, especialmente no momento pós-revolucionário, o historiador sugere ainda uma vinculação entre a biografia e o fortalecimento do nacionalismo, sendo o gênero utilizado como uma forma de pedagogia da nação. Daniel Madelénat, téorico da literatura, tentou dar conta da relação entre história e biografia, partindo da historicidade do conceito de biografia, no interior da cultura ocidental. O autor analisa este campo, a partir da chave interpretativa dos “paradigmas”. O “paradigma clássico”, que cobre o período da Antigüidade até o século XVIII; o “paradigma romântico”, entre o fim do século XVIII e o início do século XX; e, por fim, o “paradigma moderno”, que se configura ao longo do século XX, em um diálogo com outras áreas do saber, como a sociologia e a psicanálise, por exemplo. 20 Nos anos 1980, o debate em torno das escritas de vida é reascendido na esfera acadêmica das ciências sociais e dos estudos históricos. Motivados pela guinada subjetiva, como a denominou Beatriz Sarlo, ressaltando que se verifica, então, uma

(...) tendência acadêmica e do mercado de bens simbólicos que se propõem a reconstituir a textura da vida e da verdade abrigados na rememoração da experiência, a revalorização da primeira pessoa como ponto de vista, a reivindicação de uma dimensão subjetiva, que hoje se expande sobre os estudos do passado e os estudos culturais do presente, não são surpreendentes. São passos de um programa que se torna explícito, porque há condições ideológicas que o sustentam. 21

19Sabina Loriga. “A Biografia como problema”. In: Jacques Revel (Org.), Jogos de escalas: a experiência da microanálise. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1998, p. 230. 20 Daniel Madelénat. La Biographie. Paris: PUF, 1984. 21 Beatriz Sarlo. Tempo Passado Cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: UFMG, 2007, p. 18.

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Trabalhos que contemplam o indivíduo e as suas subjetividades passam a surgir nesse momento, em um diálogo com os modelos estruturalistas e pós-estruturalistas das décadas de 1960 e 1970. No interior dessas discussões, o gênero biográfico, desvalorizado, por exemplo, pela historiografia voltada para o coletivo, identificada com a École des Annales, é redescoberto. Fala-se, mesmo, em reabilitação da biografia pela historiografia, agora ligada ao personagem anônimo, voltada para o cotidiano, a cultura popular, a história oral e a história das mulheres. O desejo de dar voz aos excluídos da história reabriu os debates acerca da biografia. A lista de autores que pensaram essa relação entre história e biografia se amplia, quando mencionamos as considerações teóricas e metodológicas de historiadores ligados à Micro – Storia, entre os quais Giovanni Levi 22, ao atribuírem um valor heurístico para a biografia, na perspectiva do “jogo de escalas”, para utilizar a expressão utilizada por Jacques Revel. Na esteira dessas discussões, Giovanni Levi, em Usos da Biografia, levanta importantes questões sobre a relação entre história e biografia. Ao partir da premissa de dar conta de uma trajetória de vida está longe de ser o maior problema do historiador que pretende trabalhar com biografia, Levi apresenta uma tipologia da qual ressaltamos a que o autor italiano denominou “biografia e contexto”, na qual se valoriza a relação entre sujeito, ambiência e o meio social numa dada época. Muito utilizada pelos historiadores, essa perspectiva não está isenta de contradições. Ao adotar essa possibilidade de análise biográfica à luz do contexto, é preciso levar em conta as considerações do autor, que alerta para o risco de que o objeto de estudo não seja apresentado de maneira estática, de modo que o contexto não prevaleça sobre as escolhas individuais nem se apresente como “causa” não problematizada das ações individuais no âmbito coletivo. Entretanto, é preciso considerar também a preocupação quanto á tensão contexto-vida apontada por Pierre Bourdieu em seu ensaio A ilusão biográfica, no qual alerta para os problemas metodológicos enfrentados pelo pesquisador que busca o “artefato socialmente irrepreensível” que é a história de vida. O risco, segundo o autor, é seguir por trilhas que podem levar o historiador, sem seu consentimento, mas com sua cumplicidade, à uma análise crítica mal

22Giovanni Levi. “Os usos da biografia”. In: Marieta de Moraes Ferreira & Janaína Amado (orgs.). Usos & abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1996, pp.183-191.

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realizada dos problemas sociais. Por isso, Bourdieu considera que o relato de vida deve se aproximar ao máximo de um documento. 23 De maior interesse para essa pesquisa, entretanto, são os trabalhos ligados à renovação do campo político, como os de René Rémond e Philippe Levillain.24, pois possibilitam um importante diálogo entre biografia e história, operacionalizado através do conceito de cultura política. Uma das tensões presentes nesse debate, de acordo com Levillain, se constitui em torno do eixo formado pela necessidade de acatar a objetividade dos fatos, que orientou grande parte da historiografia até o início do século XX, e a subjetividade do indivíduo, algo a que dificilmente se pode ter acesso. Como articular, na relação entre o individuo e a sociedade os limites entre as normas e valores introjetados e a liberdade de escolhas? Para evitar esquematismos do tipo determinista ou o excesso de interpretação, é preciso considerar a função da biografia, hoje, como algo “a meio caminho entre o particular e o coletivo”.25, adotando aqui, em conjunto, as considerações de Levillain sobre biografia e as de Bernstein, citadas anteriormente, sobre a cultura política Tendo em vista o debate teórico delineado acima, abre-se a possibilidade de utilizar a biografia para recuperar não só desvios, fissuras e contingências, como também as potencialidades do passado, as questões sobre a liberdade e ação do indivíduo. É neste âmbito que a presente análise sobre Arthur Azevedo procura se situar, explorando uma relação entre biografia, obra e história orientada para o destaque do viés político das peças aqui selecionadas.

1.3 Arthur Azevedo e sua época como um problema

A trajetória deste teatrólogo e a sua atuação no meio social se entrelaçam de modo singular a uma época de mudanças no cenário político brasileiro, na passagem do Império à República. Procurando evitar o risco de projetar uma biografia que valorize mais o contexto do que a ação do sujeito biografado pretende-se aqui ressaltar os contornos ativos de Arthur, sua luta pela valorização e reconhecimento da atividade teatral brasileira e seu engajamento nos debates políticos e literários de sua época. Ou seja, ressaltando sua ação efetiva como artista e intelectual

23 Pierre Bourdieu. “A ilusão biográfica”. In: Marieta de Moraes Ferreira & Janaina Amado (orgs.) Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1996, pp. 183-191. 24 Philippe Levillain. “Os protagonistas da história”. In René Rémond (org.). Por uma história política . Rio de Janeiro: UFRJ; FGV, 1996, pp. 141-184. 25 Ibidem, p. 165.

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e, se possível, procurando iluminar Azevedo como um agente destas mesmas mudanças culturais e políticas. Com efeito, rever a biografia de Arthur Azevedo sob o ponto de vista da história, significa romper com certo monopólio sobre esse objeto de estudo, até então pesquisado quase que exclusivamente por estudiosos da área de letras e artes cênicas. Com isto não se pretende excluir, é claro, as considerações deixadas por esses autores. A opção por ressaltar a sua ação enquanto homo politicus26 implica tentar compreender a sua visão de mundo, suas escolhas políticas, o meio intelectual em que viveu e desempenhou suas atividades como jornalista e amante das artes e das letras. Talvez o primeiro desafio seja o de confrontar e problematizar a obra de referência escrita por Raimundo Magalhães Júnior, Arthur Azevedo e sua época, de 1953, até hoje a peça fundamental para quem quer acercar-se do teatrólogo. Acentue-se, antes, que, quanto à recuperação de Arthur Azevedo, três momentos são relevantes; década de 1950, quando Raimundo Magalhães Júnior lança sua biografia. A década de 1980, quando a historiografia brasileira se alinha à já mencionada reabilitação da biografia, em estudos que repensam especialmente a República na proximidade do seu centenário, focalizando em especial o Rio de Janeiro – e aqui temos as importantes referências que são os estudos de José Murilo de Carvalho, Flora Süssekind, Nicolau Sevcenko e Monica Pimenta Velloso, apenas para citar alguns autores. Estas reflexões enfatizaram, de uma forma ou de outra, a possibilidade de uma experiência propriamente moderna entre nós e, ainda, uma interpretação dos aspectos de exclusão social do Brasil republicano. Finalmente, em 2008, com as homenagens pelo centenário da morte de Azevedo, vemos uma terceira etapa de estudos se delinear. 27 A biografia escrita por Magalhães Júnior foi reeditada mais três vezes (em 1955, 1966 e 1971). O texto original foi também ampliada em mais um capítulo, o que aponta para um projeto ambicioso do autor, marcado pelo desejo de apreender o sujeito biografado em sua totalidade. Escrita na década do centenário de nascimento e cinqüentenário da morte, a obra comprova a

26 A sugestão veio da leitura do ensaio de Antônio Martins, “Arthur Azevedo: homo politicus”, in: Teatro de Artur Azevedo, Vol. 5, Rio de Janeiro: Funarte, 2002, pp. 593- 612. 27 Cf. Larissa de Oliveira Neves. As comédias de Artur Azevedo- Em busca da História. UNICAMP, 2006 (Tese de doutorado)/ LEVIN, Orna Messer (Org.), Neves, Larissa de Oliveira (Org.). O Theatro: crônicas de Arthur Azevedo (1894-1908). Campinas, São Paulo: Editora da Universidade de Campinas, 2009./ Flávia Ferreira de Almeida. Fritzmac e o ano de 1888: a revista de ano como palco de discussões políticas no Rio de Janeiro oitocentista. UERJ, Rio de Janeiro. ( Dissertação de mestrado), 2011./Tatiana Oliveira Siciliano. "O Rio que passa" por Arthur Azevedo: Cotidiano e vida urbana na Capital Federal da alvorada do século XX. UFRJ, Rio de Janeiro, 2011 (Tese de doutorado).

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escolha apropriada feita por Magalhães Júnior, que soube valorizar uma efeméride que se encaixava bem no interesse da década de 1950 pela biografia. Segundo Marcia de Almeida Gonçalves, os decênios de 1920-1950 foram anos de “epidemia biográfica”. Intelectuais preocupados com a renovação da literatura e dos estudos históricos, na tentativa de configurar um campo de estudos brasileiros, consideram a função heurística do gênero. 28 Preservar a memória de Arthur Azevedo se encaixava nessa perspectiva dos “vultos esquecidos” pelo Brasil moderno. Arthur Azevedo e sua época é uma biografia romanceada, que pretende dar conta não só da história de vida deste escritor, mas também de sua relação com os grandes acontecimentos ocorridos em seu tempo. No prefácio à segunda edição, Magalhães Júnior adverte que esta “não é a biografia de um homem, nem a história de uma época”29, mas sim, um pouco dos dois. O “Arthur” de Magalhães Júnior adquire contornos de um gênio brasileiro. Dramaturgo, poeta, tradutor, contista, funcionário público e abolicionista, ele é tratado como o representante de uma época em que o Brasil passava por transformações políticas, sociais e culturais, que assinalaram a passagem do Império à República. Em sua obra, organizada em trinta e quatro capítulos, Raimundo Magalhães Júnior, recorre a certas liberdades estilísticas para traçar o perfil do biografado, ao dialogar com fases da vida de Azevedo, atribuindo, por vezes juízos de valor em algumas situações. Pode-se dizer que há um romancear dos fatos e passagens, embora o biógrafo procure seguir uma pauta amparada no “factual”, ou seja, na objetividade dos fatos. Assim, ele retrata o lugar do teatro na sociedade brasileira, em especial a fluminense, o abolicionismo, o movimento republicano, a febre especulativa, ocasionada pelo encilhamento; a Revolução Federalista, a Revolta da Armada, a consolidação da República, a sociabilidade intelectual e a formação dos clubes literários, que posteriormente vieram a dar lugar à Academia Brasileira de Letras. Deste modo, a valorização da ambiência e do meio social, descritos exaustivamente, caracterizam a atmosfera que legitimaria a singularidade de Azevedo. A estratégia narrativa utilizada por Magalhães Júnior ajuda a compor um discurso elogioso, que envolve a efeméride, assumindo um tom panegírico, ao destacar as virtudes e feitos exemplares de Arthur Azevedo. Lembrando Levillain, talvez o biógrafo tenha assumido excessivamente os sentimentos de seu

28 Marcia de Almeida Gonçalves. Em terreno movediço: biografia e história na obra de Octávio Tarquíno de Sousa. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009, pp. 97-152. 29 Raimundo Magalhães Júnior. Arthur Azevedo e sua época. São Paulo: Martins, 1966, p.1.

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biografado ou, ainda, projetado sobre ele questões que não eram suas nem de sua época, colaborando para uma “exaltação discutível de um indivíduo; entrave ao julgamento crítico do historiador.” 30A observação nos serve de alerta e convida a realizar uma leitura problematizada dessa biografia de referência.

1.4 Arthur Azevedo: biografia, teatro e cultura política

Arthur Azevedo viveu uma época de mudanças. Nascido em São Luís do Maranhão, em 14 de julho de 1855, este deixou a terra natal aos 18 anos, em busca de oportunidades na Corte. No Rio de Janeiro, foi jornalista, cronista e funcionário público, mas destacou-se como autor de teatro. Arthur testemunhou a passagem do Império à República, fazendo desse conjunto de acontecimentos, matéria e cenário para suas crônicas, contos e peças teatrais, em especial, em suas Revistas de Ano. Quando chegou ao Rio de Janeiro em 1873, com o objetivo de trabalhar no jornalismo e no teatro, o jovem de apenas 18 anos, iniciou suas atividades na folha A Reforma, dirigido por ,31 um dos precursores da moderna imprensa política brasileira. Periódico de cunho liberal tinha, entre os colaboradores, nomes como os de , Rodrigo Otávio e Cesário Alvim. A redação do semanário era ponto de encontro de políticos, como , Afonso Celso, que posteriormente veio a se tornar o Visconde Ouro Preto, e Tavares Bastos, além de outras figuras ligadas ao Partido Liberal. Não obstante a baixa remuneração, o trabalho jornalístico abria as portas para jovens que desejavam seguir carreira literária. Algo muito comum nessa época, o apadrinhamento ou mecenato, para usar a expressão de Machado Neto32, dava oportunidades na imprensa para jovens que desejavam ganhar a vida com as letras. Com Arthur Azevedo não ocorreu de outra maneira. Recém-chegado do Maranhão, onde havia desempenhado funções de jornalista, encontrou espaço no periodismo carioca, por intermédio de seu conterrâneo, Joaquim Serra. Sobre este assunto, Azevedo relatou:

30 Philippe Levillain, Opus. cit., p. 142. 31 Joaquim Maria Serra Sobrinho foi jornalista, professor, político e teatrólogo. Ao lado de Arthur Azevedo e Moreira Sampaio, é conhecido como um dos precursores do Teatro de Revista no Brasil. Nasceu em São Luís do Maranhão, em 20 de julho de 1838, e faleceu no Rio de Janeiro em 29 de outubro de 1888. 32 A.L. Machado Neto. Estrutura social da República das Letras: sociologia da vida intelectual brasileira (1870- 1930). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1973, p. 11.

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Atravessei, escreve ele, a rua do Ouvidor muito disposto a conquistar o futuro naquele mesmo dia. Quando cheguei ao largo de São Francisco, tinha efetivamente conquistado alguma coisa: o lugar de revisor e tradutor de folhetins d´A Reforma que se imprimia no prédio em que hoje está a Gazeta da Tarde. A minha fortuna foi encontrar Joaquim Serra á porta do edifício. A esse ilustre maranhense, que escondia um coração de ouro sob um aspecto rebarbativo, dava o pão que primeiro ganhei no Rio.33

Arthur Azevedo recebeu n` A Reforma as lições de seu mestre, Joaquim Serra. Através da folha, inseriu-se na sociabilidade intelectual e literária da época, e passou a frequentar a famosa Rua do Ouvidor,

(...) cujos jornais empregavam muitos dos literatos e tornavam possível a existência de um pequeno grupo de escritores que viviam exclusivamente para a literatura e para a reforma política. Estes boêmios, vivendo timidamente as fantasias do muito folheado Scènes de la vie Bohème, moravam juntos, trabalhavam nos jornais de grande circulação e davam um novo impulso à vida dos cafés e confeitarias.34

Esses jovens boêmios, pertencentes à mesma geração, aspiravam à glória literária. Em comum muitos desses, como o próprio Needell aponta, haviam “trocado o conforto prometido pelo direito e pela medicina”. Abraçavam a literatura como estilo de vida e profissão de fé. Muitos desses eram provincianos, oriundos de famílias abastadas, como é o caso dos irmãos Arthur e Aluísio de Azevedo. O grupo liderado por José do Patrocínio35, mulato de origem humilde, teve apoio familiar para estudar, além da ajuda financeira do sogro que patrocinava seu jornal. Entre os debates políticos despertados com o desenrolar da Guerra do Paraguai o projeto de lei de caráter emancipacionista, aprovado em 28 de setembro de 1871, a Lei Rio Branco – conhecida como Lei do Ventre Livre, potencializou as já apaixonadas discussões, demarcando ainda mais as posições liberais e conservadoras na arena pública. O movimento abolicionista,

33 Raimundo Magalhães Júnior, Arthur Azevedo e sua época. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira S.A., 1966, p. 21. 34 Jeffrey D. Needell. Belle Époque Tropical. Sociedade e cultura de elite no Rio de Janeiro na virada do século, São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 221. 35 José Carlos do Patrocínio nasceu em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, em 9 de outubro de 1853. Farmacêutico, destacou-se nas atividades que desempenhou na imprensa e na política, atuando nos movimentos abolicionista e republicano. Morreu em 29 de janeiro de 1905, no Rio de Janeiro.

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portanto, não teve como ponto de corte a decretação de 1871: o próprio abolicionismo cresceria e se fortaleceria face às divergências da aplicação da lei. Além da defesa do fim do trabalho escravo, postulava-se também a mudança do regime político, associando-se à Monarquia ao atraso nacional. Arthur Azevedo partilhou desses ideais, a saber: abolicionistas e republicanos. Revestiu- se das armas de seu intelecto, fazendo-se “escravo de sua pena” e propagandista da causa abolicionista.36 Por meio da imprensa, do teatro e de sua participação em festas populares, percebe-se que Arthur esteve presente nas diversas manifestações em favor da causa antiescravagista. Aliás, em seu ensaio, A morte da escravidão, Humberto Machado aponta para importância da imprensa e do teatro na campanha abolicionista. Além disso, Machado ressalta o valor das festas, quermesses e meetings para arrecadar fundos para compra de cartas de alforria, bem como a popularização do movimento, com vistas a angariar simpatizantes à causa da libertação dos cativos. 37 Os teatros abriam suas portas para comitês e campanhas contra a escravatura. Era comum, nessas reuniões a presença de homens como Joaquim Nabuco, José do Patrocínio e André Rebouças. A campanha nos teatros não se restringia apenas às discussões políticas, mas convertia-se na efetiva adesão de artistas e empresários. O historiador Eduardo Silva relata a adesão destes após o espetáculo da Companhia Fênix Dramática, no Teatro Lírico, em 21 de junho de 1870, em benefício de Ernesto Rossi 38, ator italiano que estava em temporada no Rio de Janeiro. 39 Ao fim da encenação, atores e atrizes da companhia levaram ao palco uma menina negra de dois anos para ser alforriada em cena, prestando homenagem a Rossi. Este, emocionado, fez um discurso em favor da libertação dos cativos para uma platéia que contava com mais de cinco mil espectadores, dentre os quais, o próprio Imperador Dom Pedro II. Dessa data em diante, observa Silva, André Rebouças veria no teatro um meio eficaz para a propaganda abolicionista.

36 Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit., pp. 129-148. 37 Humberto Machado, “A morte da escravidão”. In: Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves e Humberto Fernandes Machado, O Império do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 374. 38 Ernesto Rossi nasceu em 29 de abril de 1827, em Livorno, na Itália. Ator de grande prestígio, ficou conhecido por introduzir Shakespeare no teatro italiano. Esteve no Brasil em temporada, tendo representado no teatro Provisório. Morreu em 1896. 39 Eduardo Silva. Apud Andréa Marzano. Cidade em cena: o ator Vasques, o teatro e o Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha seca: FAPERJ, 2008, pp. 74-75.

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O teatro desempenhou papel de agente na luta em prol da abolição. Abriam suas portas para comitês e campanhas contra a escravatura. Era comum, nessas reuniões a presença de homens como Joaquim Nabuco, José do Patrocínio e André Rebouças. Contudo, a campanha nos teatros não se restringiram apenas às discussões políticas, mas estendiam à adesão de artistas e empresários. O historiador Eduardo Silva relata a adesão de artistas e empresários se deram após o espetáculo da Companhia Fênix Dramática, no Teatro Lírico, em 21 de junho de 1870, em benefício de Ernesto Rossi40, ator italiano que estava em temporada no Rio de Janeiro.41 Ao fim do espetáculo, atores e atrizes da companhia levaram ao palco uma menina negra de dois anos para ser liberta em cena, prestando homenagem a Rossi que, emocionado, fez um discurso em favor da libertação dos cativos, para uma platéia que contava com mais de cinco mil espectadores, dentre os quais, o próprio Imperador Dom Pedro II. Dessa data em diante, André Rebouças veria no teatro um meio eficaz para a propaganda abolicionista. A partir da década de 1880, as conferências viriam a dar lugar às matinées abolicionistas. Realizadas nos teatros, tinham por objetivo divulgar a campanha em favor da libertação dos escravos, incluindo as camadas mais diversificadas da sociedade, em especial as menos favorecidas, com destaque para negros e mestiços. No tocante à programação, sabe-se que “além de uma conferência em defesa da abolição, tais eventos incluíam a encenação de uma peça alegre, números musicais e recitação de poesias, entre outras atrações.” 42 Sobre a atuação desses artistas em favor da abolição, Magalhães Junior salienta os esforços empreendidos pela gente de teatro para arrecadar fundos para compra de cartas de alforria. O autor destaca os nomes de Rose Villiot, atriz francesa naturalizada brasileira, que participou de muitas peças de Arthur Azevedo, Ismênia dos Santos, Apolônia Pinto, Delmary, Suzanna Castera, Delorme, Correia Vasques, o ator mais festejado dos oitocentos, Xisto Baía, um dos maiores intérpretes do teatro de revista de Azevedo, e muitos outros que faziam sucesso nos palcos. Contudo, o maior destaque do movimento abolicionista popular, foi Luiza Regadas, cantora de igreja, que se engajou na causa antiescravista de forma ativa, participando de sociedades abolicionistas, como a Confederação Abolicionista e Sociedade Brasileira Contra

40 Ernesto Rossi nasceu em 29 de abril de 1827, em Livorno, na Itália. Ator de grande prestígio, ficou conhecido por introduzir Shakespeare no teatro italiano. Esteve no Brasil em temporada, tendo representado no teatro Provisório. Morreu em 1896. 41 Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit., p. 130. 42 Andrea Marzano, Opus cit., p. 75

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Escravidão e outras congêneres, merecendo o título de Rouxinol da Abolição.43 Igual contribuição, tiveram ainda, segundo Magalhães Junior, os maestros Carlos Gomes, Arthur Napoleão, Henrique Mesquita, Bassi e Cernichiari. Desde a década de 1830 e durante os oitocentos, o teatro foi um local de manifestação pública, onde “todas as iniciativas e decisões no campo artístico, que viessem por parte de literatos, estariam legitimados a priori e passariam a ser expressão mais pura daquilo que se queria atingir.”44 O engajamento dos homens das letras pela via do teatro era condição sine qua non da campanha abolicionista. Assim foi com Arthur Azevedo. Engajado nos debates e campanhas de seu tempo, escreveu obras teatrais voltadas para este fim. Um exemplo está na peça O Liberato, redigida a pedido de Joaquim Nabuco. Encenada no Teatro Lucinda em 1881, rendeu bons frutos, repetida em inúmeros festivais em prol da campanha emancipacionista. No ano seguinte, em 1882, Arthur Azevedo escreveu com Urbano Duarte o drama A família Salazar, censurado pelo Conservatório Dramático, teve seus originais apreendidos, os autores recuperaram o manuscrito da peça em 1884. Porém, vendo que a campanha abolicionista caminhava a largos passos, eles decidiram publicá-la sob o título, O Escravocrata. Logo no “Pródromo”, Duarte e Azevedo fariam a sua “profissão de fé”:

Tanto mais que nos achamos plenamente convencidos de que, à força de empenhos e de argumentos, alcançaríamos a felicidade de ver o nosso drama à luz da ribalta. Mas esses trâmites seriam tão demorados, e a idéia abolicionista caminha com desassombro tal, que talvez no dia da primeira representação de O escravocrata já não houvesse escravos no Brasil. A nossa peça deixaria de ser um trabalho audacioso de propaganda, para ser uma medíocre especulação literária. Não nos ficaria a glória que ambicionamos, de haver concorrido com o pequenino impulso das nossas penas para o desmoronamento da fortaleza negra da escravidão.45

Como observa Antônio Martins de Araújo, em Arthur Azevedo: Homo Politicus: “De passo em passo, de crônica em cônica, de peça em peça, Arthur foi pouco a pouco reivindicando

43 Ver Raimundo Magalhães Júnior. Arthur Azevedo e sua época. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira S.A., 1966/ Andréa Marzano. Cidade em cena: o ator Vasques, o teatro e Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha seca: FAPERJ, 2008. 44 Sílvia Cristina Martins de Souza, As noites do Ginásio: teatro e tensões culturais na corte (1832 – 1868). Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2002, p. 35. 45 Arthur Azevedo. “O escravocrata”. In: Teatro de Artur Azevedo, Vol. 4,Rio de Janeiro: Funarte, 2002, pp. 233.

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em favor dos irmãos de cor o direito de usufruírem as benesses de uma sociedade que devia ser construída por brasileiros de todas as cores.” 46 Como já foi mencionado, Arthur usou o jornal como uma espécie de tribuna em defesa de uma sociedade sem escravos. Além de colaborar em diversos periódicos, Azevedo fundou com Aníbal Falcão, A Gazetinha, em novembro de 1880. A folha media “pouco mais que um palmo e meio” 47, contendo em sua página inicial anedotas, notícias, sobretudo as ligadas ao universo teatral. De caráter literário, contribuía para a campanha abolicionista. A redação situava-se à Rua do Ouvidor, 132. Segundo Gonzaga Duque, era decorada com caricaturas de Raul Pompéia, Belmiro de Almeida, Aluísio Azevedo, França Júnior e outros.48 Reuniu em sua redação, nomes como os de Lopes Trovão, José do Patrocínio, Demerval da Fonseca, Arthur de Oliveira, Carvalho Júnior, Lúcio de Mendonça, o próprio Aluísio, Teófilo Dias, Urbano Duarte, Salustiano Sebrão, Fontoura Xavier, . Na História da Imprensa no Brasil, Werneck Sodré aponta para rivalidade entre A Gazetinha e A Gazeta de Notícias, e desta última com O País, de João José dos Reis Júnior, “resultando em duelo deste com Ferreira Araújo, duelo a que o Mequetrefe dedicou uma de suas capas”. 49 De vida efêmera, a folha fundada por Arthur Azevedo circulou até 1881. Porém, a animosidade entre Arthur e Ferreira Araújo, se estenderia durante mais uns anos, chegando mesmo a criar um personagem em uma de suas revistas de ano, Mercurio, interpretado pelo ator Xisto Baía, o Dr. Telha, caricatura viva de Araújo. A atuação de Arthur Azevedo na imprensa foi notável. Ele colaborou com cerca de quarenta e cinco jornais, chegando a publicar cerca de quatro mil crônicas.50 Tendo participação ativa nas redações de jornais e revistas como o Diário de Notícias, Correio do Povo, A Época, O Besouro, O Dia, Folha Nova, Correio da Manhã, O Mequetrefe, Kosmos, O Teatro, O País, A Notícia, Revista Brasileira, entre outros. Contudo, foi nas páginas d´ O País, onde esteve desde a sua fundação - ali assinava versos humorísticos sob o pseudônimo de Gavroche-, bem como no Diário de Notícias que Arthur estabeleceu seu lugar junto um grande número de leitores. Sua notoriedade na imprensa possibilitou-lhe o ingresso em associações e grupos literários que, posteriormente, viriam a dar lugar à Academia Brasileira de Letras.

46 Antônio Martins, Opus cit., p. 599. 47 Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit., p. 66. 48 Idem Ibidem. 49 Nelson Werneck Sodré. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, p. 231. 50 Antonio Martins de Araújo, Opus cit, p. 599.

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Como se sabe, desde o Império, a iniciativa de se formar uma Academia de Homens da Letras, nos moldes da Academia Francesa, já se fazia presente nas aspirações dos literatos brasileiros. Partidário dessa idéia, o Imperador Dom Pedro II já demonstrava, em suas reuniões literárias em São Cristóvão, o desejo de criar uma instituição voltada para essa finalidade. Com o objetivo de atender a essa demanda, o conselheiro Francisco Otaviano criou a Associação dos Homens das Letras do Brasil, inaugurada em 30 de agosto de 1883, no Liceu de Artes e Ofícios. Sob a presidência do também Conselheiro, Pereira da Silva, a sociedade contava com a presença de Dom Pedro II, Princesa Isabel, do Conde d´Eu, de representantes do exército, da política, do jornalismo e da literatura. Arthur Azevedo integrava o seleto grupo, ao lado de Franklin Távora, Visconde de Taunay, Afonso Celso, Sílvio Romero, Homem de Melo, Machado de Assis e Franklin Dória, entre outros. Segundo Afonso Celso, o reduto letrado tinha por objetivo “animar a profissão literária, reunindo e utilizando no interesse comum e das letras as atividades intelectuais, que o isolamento traz dispersos” 51. Porém, depois de criada, a associação se dissolveria. Outras formas de associação literária, surgiriam, tendo vida mais ou menos efêmera, e em certa medida, podem ser consideradas embriões daquilo que mais tarde veio a ser a Academia Brasileira de Letras. Um exemplo notável é a fundação d` A Semana, nos anos iniciais da República. Jornal de grande circulação, a folha agrupava diversos nomes da literatura, permitindo que muitos desses divulgassem seus trabalhos, possibilitando o diálogo com o público leitor. O desejo de criar uma sociedade estável que representasse a cultura brasileira orientou a segunda fase do periódico (1893-1895), dirigido então por Valentim Magalhães. Ponto de encontro dos homens das letras, a redação do semanário, situado à Rua Gonçalves Dias, nº 67, 1º andar, tinha como colaboradores: Lucio de Mendonça, João Ribeiro, Araripe Junior, Urbano Duarte, Silva Ramos e Rodrigo Otávio.52 Nessa mesma época, por iniciativa de Araripe Junior, foi criado o clube Rabelais, que reuniria mensalmente, em divertidos “banquetes”, vários dos futuros membros da Academia Brasileira de Letras.53 Estes “ágapes literários”, tinham lugar em hotéis famosos, como o Hotel

51 Apud. Fernão Neves. A Academia Brasileira de Letras: notas e documentos para a sua história (1896-1940). Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2008, p. 6. 52 Max Fleiuss. Apud. Fernão Neves, Opus Cit., p.8. 53 Arthur Azevedo, Raul Pompéia , Urbano Duarte, Rodrigo Otávio, Coelho Neto, Lúcio de Mendonça, Valentim Magalhães, Raimundo Corrêa, Said-Ali, Max Fleiuss, Capistrano de Abreu, Xavier da Silveira e outros menos assíduos.

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Globo54. Nessas ocasiões, discutiam-se diversos assuntos, em especial aquele que mais os unia: a literatura. Em suas Recordações do Clube Rabelais, Araripe Júnior registra: “A regra era esta:- na primeira sexta-feira de cada mês reuniam-se os sócios no hotel previamente escolhido e banqueteavam-se sem cerimonial, à brasileira”.55 A cada mês, o jantar ficava a cargo de um comissário diferente, que tinha a cota de dez mil réis, dinheiro suficiente para fazer um grande banquete. Sabe-se que o primeiro encarregado foi Raul Pompéia, “o mais jovial e o mais traquinas: o enfant gâté do clube”56, tal como descrevera Araripe em suas memórias. O segundo jantar, teria como idealizador o contista e jornalista Pedro Rabelo. Já o terceiro, ficou sob a responsabilidade de Rodrigo Otávio, que dirigiu a Arthur o seguinte convite:

ARTHUR: Pr´a futura sessão do Rabelais Que a 14 de outubro se efetua, Queira você mandar-me dez mil réis, Se não quiser ficar no olho da rua. Pela resposta aguarda o portador. Desculpa o “sans-façon” do admirador Rodrigo Otávio57

Dentre os membros do Clube Rabelais, Araripe Junior destaca em suas recordações os nomes de Raul Pompéia e Arthur Azevedo, os quais se sobressaíam pela jovialidade e encanto:

De ordinário, nesses ágapes literários, sobressaíam pelo espírito de dois convivas – naturezas completamente diversas, Raul Pompéia e Arthur Azevedo

54 Rodrigo Octávio. Apud Fernão Neves. A Academia Brasileira de Letras: notas e documentos para a sua história (1896-1940). Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2008, p. 8. 55 Araripe Júnior. Apud. Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit.,p. 221. 56 Idem Ibidem. 57 Documento encontrado no acervo de Arthur Azevedo na Academia Brasileira de Letras, não inventariado. À guisa de curiosidade, para além das brincadeiras com seu confrade, Arthur, sabe-se que, Rodrigo Otávio organizou um banquete à moda chinesa, surpreendendo os rabelesianos, como recorda araripe Júnior em suas Memórias: “No banquete, de que foi encarregado Rodrigo Otávio, pregou-nos uma surpresa. Como os chineses estavam em causa, ele lembrou-se de adornar a sala a caráter... Não houve à mesa ninhos de salangana; mas em compensação, leques, figuras, paliteiros, tudo era chinês, das paredes pendiam caquemonos, improvisados em telas de cetim branco e amarelo, pintados a tinta de escrever, representando dragões, guerreiros e cegonhas, reminiscências das clássicas figuras do pintor japonês Outamaro.” Cf. Araripe Júnior. Apud. Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit.,pp. 220- 221.

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se completavam, dando às nossas festas intelectuais uma frescura e juvenilidade encantadoras. Se por um lado o autor do Ateneu fustigava a nossa inércia com esfuziadas imprevistas, paradoxais, por outro o comediógrafo dos Noivos, quando de veia, pulverizando as palestras de anedotas e pequenas comédias, quase representadas ao vivo, provocava risadas incoercíveis e uma alegria molieresca inextinguível.58

A despeito de toda a excitação de seus convivas, o clube Rabelais foi dissolvido. Em tom de lamentação, o criador registrou o fim da sociedade literária. Sem, no entanto, esclarecer o motivo pelo qual o clube deixou de existir:

Infelizmente tudo isso acabou, e dos rabelesianos, o mais vivo e convicto, a alma do clube enfim, desertou para as regiões do Além, como dizem os nefelibatas, sem nos dizer adeus. A sua proposta no clube fora que se desse o banquete no próximo carnaval, no refeitório de um convento, verdadeiro ou fictício, em homenagem ao cura de Meudon, padroeiro da sociedade. Os sócios apresentar-se-iam em hábitos franciscanos e falariam em latim ou no jargão de Rabelais. A idéia não se realizou porque o clube dissolveu-se; âquele festivo pantagruelismo convertera-se nas sombrias preocupações de um novo Brutus.59

Com o término da sociedade literária, os jantares e banquetes organizados por seus confrades, cederam espaço para o chá das quatro e para as reuniões na redação da Revista Brasileira. Segundo Werneck Sodré60, a fase literária da revista foi marcada por dois momentos: a primeira, entre 1879 e 1881, quando dirigida por Nicolau Midosi, e a segunda, entre 1895 e 1898, sob a direção de José Veríssimo. Sobre a última fase, é de se notar que Veríssimo reuniria em torno desta, homens de letras como: Paulo Tavares, Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Lúcio de Mendonça, Graça Aranha, Paula Ney, Domício da Gama, , Rodrigo Octávio, o próprio Arthur Azevedo, Silva Ramos, e Filinto de Almeida. Por vezes apareciam Bilac, Guimarães Passos, , Valentim Magalhães, Pedro Rabelo e outros.61 A redação, localizada em uma modesta sala à travessa do Ouvidor, é descrita por Coelho Neto, através de um jogo retórico amparado no contraste entre à escuridão do ambiente e a clareza das idéias que circulavam no local. Sobre a atmosfera que envolvia os homens das letras, o literato escreve:

58 Araripe Júnior. Apud. Raimundo Magalhães Júnior, Opus Cit.,p. 222. 59 Idem Ibidem. 60 Nelson Werneck Sodré. Opus cit., p.89. 61 Coelho Neto. Apud . Fernão Neves. A Academia Brasileira de Letras: notas e documentos para a sua história (1896-1940). Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2008, pp.8-9.

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(...) o negrume do recinto contrastava o brilho da palestra que ali se travava. Se as idéias fulgissem e as imagens relumbrassem, certo não haveria em toda a cidade casa mais iluminada do que aquela. Infelizmente, porém, apesar dos conceitos diamantinos de Machado de Assis, do esplendor dos períodos de Nabuco, da cintilação do espírito de Lúcio e dos paradoxos relampejantes de Paula Ney, era necessário manter sempre aceso um bico, ao menos, de gás, para que tantos luzeiros não andassem aos esbarros desmantelando pilhas de brochuras, abalroando nas mesas, que eram duas, uma das quais de pinho réles e tripeta, claudicando sob o peso glorioso de obras-primas á espera de editores.62

Arthur Azevedo foi um assíduo colaborador da Revista Brasileira. Isto se evidencia pelo número de correspondências existentes no arquivo de Azevedo na Academia Brasileira de Letras, destinadas ao diretor José Veríssimo, como se segue:

Ilustre e prezado Mestre Sr. José Veríssimo. Recebi e agradeço o exemplar dos Estudos brasileiros com que me obsequiou. Em breve terei ocasião de manifestar publicamente a estima em que tenho essas magníficas páginas. – Peço-lhe uma prorrogação de treze dias ao prazo que me foi concedido para entregar na casa Laemmert o conto que prometi para o primeiro número da Revista Brasileira. Sábado lá estará. Só me falta copiá-lo. Seu admirador e amigo agradecido. – Arthur Azevedo63

Seria em torno da redação da Revista Brasileira, que ressurgiria a idéia de se formalizar uma associação dos homens de letras no Brasil. Sugerida por Lucio de Mendonça, causou alvoroço entre os literatos. Uns foram partidários do projeto, enquanto outros não. Machado de Assis, a princípio, faria algumas objeções, embora mais tarde se tornasse entusiasta da Academia da qual foi seu primeiro presidente. Por sua vez, Coelho Neto deixaria o seguinte testemunho:

Foi em tal pobreza obscura, como a do presepe ( honni soit qui mal y pense!) que nasceu a Academia, e, si, anjos não esvoaçaram no beco, anunciando o natal da instituição, cá em baixo, na terra rasa, teve a recém nascida vozes que, si não a glorificaram com hosanas, fartaram-se de a arrasar, anunciando –lhe a morte com prognósticos ridículos.64

62 Ibidem, p. 9. 63 Documento encontrado no acervo de Arthur Azevedo na Academia Brasileira de Letras, não inventariado. 64 Coelho Neto. Apud Fernão Neves. A Academia Brasileira de Letras: notas e documentos para a sua história (1896-1940). Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2008, p .9.

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Alessandra El Far afirma que a idéia de criação da Academia Brasileira de Letras não se deu de maneira isolada. Ao contrário, para a autora os projetos de fundação,

(...) não constituía novidade. No final dos anos de 1880 e início dos 1890, diversos literatos engajados na nascente profissão das letras almejavam estabelecer um novo padrão de sociabilidade literária. Os encontros casuais, as módicas remunerações, os grupos dispersos e descompromissados já não lhes bastavam: queriam reconhecimento social e uma identidade que os diferenciasse dos outros setores da sociedade intelectual.65

Como observou Jeffrey Needell o período inicial da República foi marcado por conflitos e por forte repressão, que dispersaram a boêmia literária. Muitos escritores transplantaram os antagonismos políticos para o mundo literário. Cenário que se via agora divido entre monarquistas, republicanos e florianistas. Muitos encontrariam empregos ocasionais. Outros, porém, desfrutariam de cargos públicos, alguns, ainda, perderiam suas posições, ao manifestar fidelidade à monarquia e desgosto com o novo regime. Houve também quem buscasse um modo de vida mais seguro, nos moldes burgueses, mantendo suas “identidades de criadores da cultura nacional.” Um exemplo notável dessa tendência, para Needell, seria justamente a fundação da Academia Brasileira de Letras, em julho de 1897.66 Criada segundo os moldes da Académie Française des Lettres, a congênere brasileira tinha por objetivo primeiro criar uma tradição para as letras no Brasil. Do modelo francês, os brasileiros mantiveram a idéia de imortalidade, ao eleger quarenta imortais, adaptando ritos, como por exemplo a linhagem literária das cadeiras.67 Por outro lado, para alguns historiadores da literatura brasileira, no âmbito da produção teatral teria havido uma falta de definição no final do século XIX. Do ponto de vista da dramaturgia, o fim dos oitocentos não produzira peças de grande interesse, que pudessem figurar

65 Alessandra El Far. A encenação da imortalidade: uma análise da Academia Brasileira de Letras nos primeiros anos da República (1897-1924). Rio de Janeiro: FGV, p. 42. 66 Jeffrey Needell, Belle Époque Tropical. Sociedade e Cultura de elite no Rio de Janeiro na virada do século. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 224- 229. 67 Ver: Ruth Villela Cavalieri. A Academia de Letras: Sobrevivência, Ludismo e Ritualização. PUC, Rio de Janeiro, 1990. (Tese de doutorado)/ Alessandra El Far. A encenação da imortalidade: uma análise da Academia Brasileira de Letras nos primeiros anos da República (1897-1924). Rio de Janeiro: FGV.

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no panteão das grandes obras teatrais.68 Autores como Galante de Sousa e Múcio da Paixão apontaram para uma espécie de “vazio”, no que diz respeito à sucessão das escolas estéticas. A exemplo da França, considerando o modelo artístico e literário, no Brasil, o realismo deveria ser sucedido pelo naturalismo. Todavia, não foi o que aconteceu. Tal indefinição, segundo esses estudiosos, foi preenchida pelas obras de caráter mais ligeiro, a saber: operetas, revistas de ano, mágicas e burletas. Contudo, a nova historiografia teatral tem apontado em uma direção oposta. Trabalhos e pesquisas orientadas por essa nova abordagem historiográfica, deram uma nova roupagem para esse suposto “vazio”, ao indicarem o valor e a riqueza deste tipo teatro que veio então suceder a escola realista. Ao contrário do que a tradicional historiografia teatral aponta, o período compreendido entre os anos de 1855 e 1865, considerado a época de ouro para arte não esteve isento de problemas, como se lê em As Noites no Ginásio: teatro e tensões culturais na corte (1832–1868), em que Silvia Cristina Martins de Souza expõe as dificuldades do ator e empresário, João Caetano69, na luta pela constituição de uma escola de arte dramática na Corte. Para a autora, o Teatro Ginásio constituiu um exemplo das dificuldades pelas quais a atividade teatral passava nesse momento. À frente desse mesmo Ginásio, Joaquim Heliodoro70 também enfrentou obstáculos para a encenação de textos dramáticos brasileiros. Para contornar essas dificuldades financeiras, Heliodoro não hesitou em encenar melodramas e cenas cômicas.71 Na mesma direção, Andrea Marzano sinaliza para os problemas enfrentados por Heliodoro, em sua biografia sobre o ator Vasques.72 Não se pode negar, entretanto, a presença do realismo no teatro brasileiro, ainda que durante um curto tempo, contando com obras de José de Alencar e de Machado de Assis, por exemplo. Segundo João Roberto Faria, iniciou-se na década de 1860, com o florescimento de uma dramaturgia nacional, que encontrou o seu lugar justamente no teatro Ginásio. 73

68 Ver Múcio da Paixão. O Teatro no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Moderna, 1917/ João Galante de Sousa. O teatro no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1960. 69 João Caetano nasceu em 27 de janeiro de 1808, em Itaboraí, Rio de Janeiro. Foi ator e empresário de teatro, sendo o responsável por iniciar a campanha de criação do teatro nacional. Morreu no Rio de Janeiro, em 24 de agosto de 1863. Ver Silvia Cristina Martins de Souza. As noites do Ginásio: teatro e tensões culturais na corte (1832 – 1868). Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2002. 70 Ver Silvia Cristina Martins de Souza. As noites do Ginásio: teatro e tensões culturais na corte (1832 – 1868). Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2002. 71 Ibidem, pp. 57 – 67. 72 Ver Andréa Marzano. Cidade em cena: o ator Vasques, o teatro e o Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha seca: FAPERJ, 2008. 73 João Roberto Faria. Idéias teatrais: o século XIX no Brasil. São Paulo: Editora Perspectiva, p. 110.

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Com efeito, se por um lado observamos a encenação dos grandes “dramas de casaca” e a afluência de alguns homens de letras ao Ginásio Dramático, por outro, vemos a pompa francesa, as belas atrizes e as cançonetas maliciosas representadas no Alcazar Lyrique. Inaugurado pelo empresário francês Joseph Arnaud74, em 1859, este café-concerto situado na Rua da Vala, atual Uruguaiana, ficaria imortalizado nas Memórias da Rua do Ouvidor, de :

(...)Maligna foi sob todos os pontos de vista a influência do Alcazar, venenosa planta francesa que veio medrar e propagar-se tanto na cidade do Rio de Janeiro. (...) O Alcazar, o teatro dos trocadilhos obscenos, dos cancãs e das exibições de mulheres seminuas, corrompeu os costumes e atiçou a imoralidade. (...) O Alcazar determinou a decadência da arte dramática e a depravação do gosto do público. 75

Paulatinamente, o teatro, entendido como escola de costumes, foi sendo “minado”, em favor de uma arte mais voltada para o divertimento do público. Machado de Assis, sob o pseudônimo de Dr. Semana, havia deixado suas impressões a respeito desses espetáculos, ao afirmar que: “todas as noites, por entre baforadas de fumo e de álcool, se vê e se ouve aquilo que nossos pais nunca viram nem ouviram, embora se diga que é um sinal de progresso e civilização.” 76 Não obstante, o Alcazar se popularizaria através das encenações de operetas francesas, com destaque para Orphée aux Enfers e La fille de Marie Angot. A primeira delas, de música de Offenbach77 e texto de Hector Crémieux e Ludivic Halévy, seria responsável pela alta afluência de espectadores, sinalizando, definitivamente, a ascensão dos gêneros ligeiros que, na opinião de Andrea Marzano, estaria ligados à expansão da indústria do entretenimento na corte:

74 Joseph Arnaud foi empresário do Alcazar Lyrique. Chegou ao Rio de Janeiro na década de 1850, residindo na cidade até o seu falecimento, em 22 de fevereiro de 1878. 75 Joaquim Manuel de Macedo. Memórias da Rua do Ouvidor. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1988, p. 112. 76 Machado de Assis. Crônicas. Rio de Janeiro: Jackson, Vol. 20, 1951, p. 260. 77 Jacques Offenbach nasceu em Colônia, na Alemanha, em 20 de junho de 1819. Foi violoncelista e compositor da era romântica. É considerado o maior expoente da opereta e precursor do teatro musicado. Morreu em Paris, França, em 5 de outubro de 1880.

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O Alcazar dinamizou a vida noturna na cidade, dividindo opiniões da população: se para muitos simbolizava o progresso, trazando o que de mais novo se produzia Paris, outros se indignavam com a sua abertura até mesmo durante a Quaresma, pervertendo o costume tradicional de fechar os teatros naquele período de abstinências e reflexão. Para inúmeros pais e mães zelosos e preocupados, o Alcazar incomodava toda a vizinhança com suas atividades consideradas suspeitas. 78

Para Décio de Almeida Prado, o sucesso das operetas francesas, estimularia jovens autores a escreverem paródias. Segundo este autor, essas peças nas mãos de autores brasileiros, “perderiam o sal gaulês, em favor da pimenta nacional” 79. O primeiro a se aventurar seria o ator mestiço, Francisco Correia Vasques, o Vasques, com o seu Orfeu na Roça, paródia da opereta Orphée aux Enfers, em 1868, repetindo o mesmo sucesso da versão francesa. Na interpretação de João Roberto Faria, o recurso á paródia foi largamente explorado pelos autores nacionais:

O veio aberto por Vasques foi intensamente explorado. Ao mesmo tempo em que as operetas francesas eram encenadas em sua língua original no Alcazar, as versões brasileiras se multiplicavam. La Grande Ducesse de Géroltein – texto de Henri Meilhac e Ludovic Halévy, música de Offenbach – transfomou-se na paródia A Baronesa de Caiopó, pelas mãos de Caetano Filgueiras, Manuel Joaquim Ferreira Guimarães e Antonio Maria Barroso pereira, e foi representada no Ginásio em dezembro de 1868. No ano seguinte, Barba de Milho – encenada por Vasques no Recreio Dramático – foi o título dado por Augusto de Castro à paródia de Barbe-Bleu, texto de Meilhac e Halévy e música de Offenbach. Essa mesma opereta ganhou ainda uma segunda paródia, feita por Joaquim Serra, com o título de Traga-moças. 80

Nesse panorama teatral, Arthur Azevedo encontraria inúmeras oportunidades. O jornalista, engajado com os ideais abolicionistas e republicanos, surgiria agora, no mundo teatral, fluminense em 1871, com a encenação da paródia La Fille de Marie Angot, batizada como A filha de Maria Angu.81 A paródia foi levada aos palcos mais de cem vezes no Fênix Dramática, em

78 Andrea Marzano, Cidade em Cena: o ator Vasques, o teatro e o Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha seca: FAPERJ, p.39. 79 Décio de Almeida Prado. História Concisa do Teatro Brasileiro (1570-1908). São Paulo: EDUSP, pp.87- 113. 80 João Robert Faria. Opus cit., pp.146-147. 81 A Filha de Maria Angu foi representada pela primeira vez na Fênix Dramática em 21 de março de 1871. Ao pesquisar todos os exemplares do primeiro ano da Revista Illustrada, percebe-se que esta noticiou e ovacionou Arthur Azevedo e a opereta, durante o período em que a peça esteve em cartaz. Interessante observar, o cuidado e a minúcia com que foram narrados os detalhes de cada encenação. Segundo Herman Lima, isto era uma tendência dos

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1876.82 Rebatendo às inúmeras críticas que recebeu, Arthur apresentou, então, o seguinte argumento:

Escrevi a Filha de Maria Angu por defastio, sem intenção de exibi-la em nenhum teatro. Depois de pronta, mostrei-a a Visconti Coaraci, este pediu-me que lha confiasse, e por sua alta recreação leu-a a dois empresários que disputaram ambos o manuscrito. Venceu Jacinto Heller, que a pôs em cena.83

Já na Revista Ilustrada, a repercussão não foi diferente:

Foi assim que se viu uma das mais esplêndidas e brilhantes reuniões a encher a sala e o jardim do teatro na noite da primeira representação. Erguido afinal o pano, sob o silêncio da geral ansiedade, desde o principio manifestaram-se os sinais de bom acolhimento e de aprovação para o autor, e para os artistas, participando deles a empresa pelo esmero da encenação, que para logo mostrou. Esses sinais foram crescendo e rompendo em entusiásticos aplausos, à proporção que a opereta foi passando, e uma esplendida ovação, pela espontaneidade e pela qualidade dos espectadores que aplaudiram, coroou os esforços da empresa, dos artistas e do autor. A opinião da imprensa tem sido unânime em louvar o desempenho da peça e a propriedade com que o autor transplantou o libreto francês não só para a nossa língua, como para os hábitos e costumes.84

O exercício de “transplantar essas culturas” 85 estimularia Arthur a escrever outras paródias como A Casadinha de Fresco e Abel, Helena, das originais francesas La petite mariée, texto de Leterrier e Vanloo, música de Lecocq, e La Belle Hélène, texto de Meilhac e Halévy e música de Offenbach. Além dessas, o teatrólogo se arriscou a produzir algumas operetas nacionais, como Os Noivos e A Princesa dos Cajueiros, não obstante o seu empenho em escrever peças de outros gêneros. caricaturistas da época, sempre à cata de novidades, eram frequentadores assíduos dos teatros. Ver. Hermam Lima. História da Caricatura no Brasil. Editora José Olympio, Rio de Janeiro, 1963. 82 A Fênix Dramática foi fundada em maio de 1868, pelo ator Francisco Correia Vasques. Instalado na rua da Ajuda, nos jardins do Hotel Brisson, onde também funcionava a casa de espetáculos Eldorado, dirigida por M. Chéri. Assim como o Alcazar, o teatro gozou de grande popularidade junto ao público fluminense, sobretudo por encenar operetas e cançonetas em português. Ver: Brasil Gerson. História das ruas do Rio, p. 96/ Andrea Marzano. Cidade em cena: o ator Vasques: o teatro e o Rio de Janeiro (1839-1892). Rio de Janeiro: Folha seca: FAPERJ, 2008. 83 Arthur Azevedo. Apud João Roberto Faria. Idéias teatrais: o século XIX no Brasil. São Paulo: Editora Perspectiva, p. 607. 84 Trecho extraído da Revista Ilustrada, 21 de março de 1876. 85 Décio de Almeida Prado, Opus cit.., p. 123.

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Polígrafo, Arthur se dedicou a diversos gêneros teatrais. Contudo, ganhou notoriedade com os chamados gêneros ligeiros, em especial, com as operetas e as revistas-de-ano. Essas últimas, objeto de interesse para os estudiosos na área de crítica literária e da teoria literária revelam-se também fontes desafiadoras para o historiador, especialmente enquanto material de reflexão para o campo da história política, como se verá no exame empreendido nos dois próximos capítulos.

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Fontes Manuscritas

Correspondências de Arthur Azevedo no Arquivo da Academia Brasileira de Letras (ABL).

Fontes Impressas

Revistas de Ano de Arthur Azevedo:

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Fontes Hemerográficas

Revista Ilustrada (1876) O País (1889-1898; 1908) A Gazeta de Notícias (1908) Diário de Notícias (1908) Hemeroteca de Arthur Azevedo (não inventariada) na Academia Brasileira de Letras.