Resenha de 29 Set 2014

Resenha Diária 29/9/12 2

MINISTÉRIO DA DEFESA 29 SET 14 EXÉRCITO BRASILEIRO Resenha GABINETE DO COMANDANTE Diária Segunda-feira CCOMSEX

Elaborado pelo Centro de Comunicação Social do Exército

DESTAQUES O GLOBO - Dilma é cobrada por no debate FOLHA DE S. PAULO - Prisão de ex-senador pode ajudar a reaver até R$ 2 bi O ESTADO DE S. PAULO - Presidente é centro de Ataques em debate tenso VALOR ECONÔMICO - Após vistoria, ameaça de bomba é descartada em voo da Avianca CORREIO BRAZILIENSE - EUA reconhecem ter subestimado jihadistas REVISTA VERDE-OLIVA - “LIBERATORI”

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Dilma é cobrada por Petrobras no debate Germano Oliveira, Renato Onofre, Sérgio Roxo e Tiago Dantas

Presidente diz que foi ela quem demitiu diretor envolvido em corrupção; Marina abordou política do etanol Com o governo sendo o principal alvo de ataques no debate entre os candidatos à Presidência na TV Record, a presidente (PT) chegou a pedir três direitos de resposta em uma hora. Dilma foi questionada sobre escândalos na Petrobras por Aécio Neves (PSDB) e rebateu perguntando se o tucano não privatizaria a empresa. Com Marina Silva (PSB), a presidente travou embate sobre CPMF e etanol. -SÃO PAULO- Ao ser o principal alvo de ataques durante o debate entre os candidatos à Presidência da República, realizado ontem pela TV Record, Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição, fez questão de tentar rebater as críticas. Confrontada com denúncias de corrupção no seu governo, especialmente envolvendo a Petrobras, Dilma chegou a pedir três direitos de resposta em uma hora. FERNANDO DONASCI Presidenciáveis. À esquerda, na bancada, Aécio Neves e Dilma Rousseff; do lado direito, Pastor Everaldo, Eduardo Jorge e Marina Silva: escândalos da Petrobras, etanol e segurança foram abordados O candidato Aécio Neves, do PSDB, disse que não vê a presidente Dilma indignada com os escândalos que envolvem a Petrobras e políticos do PT, PMDB e PP, que ele classificou como “vergonhosos”. Pastor Everaldo, do PSC, e Levy Fidelix, do PRTB também criticaram as denúncias durante suas falas.

COMBATE À CORRUPÇÃO No único direito de resposta que foi aceito, a presidente saiu em defesa do seu governo: — Uma coisa tem que ficar clara, quem demitiu o Paulo Roberto (ex- diretor de Abastecimento da Petrobras, preso na Operação Lava-Jato) fui eu. E a Polícia Federal, no meu governo, foi quem investigou todo esses ilícitos. Eu fui a única candidata que apresentou propostas para o combate da corrupção. Ela voltou a falar sobre o assunto no segundo bloco, ao ser questionada por uma jornalista sobre segurança pública: — Queria dizer ainda que eu tenho tido tolerância zero com a corrupção. Não varri nada para debaixo de tapete. Não criei nenhum engavetador geral da República. No início do debate, Dilma havia pedido dois direitos de resposta para inutilizar os ataques feitos por Aécio Neves, Marina Silva e Pastor Everaldo (PSC) quando não estava sendo questionada. Os dois pedidos foram rejeitados pela direção do debate. O terceiro pedido não tinha a ver com os casos de corrupção. Ela foi acusada pelo pastor Everaldo de ser autoritária por “tirar um minuto do programa de TV”. O ataque mais contundente às denúncias da Petrobras foi feito por Aécio Neves, ao responder uma pergunta feita pela própria Dilma. A presidente quis saber se o senador mineiro poderia se comprometer a não privatizar a Petrobras, citando um discurso feito por ele em março de 1997, quando o tucano disse que poderia discutir a privatização da estatal. — Não vamos privatizá- la. Vou tirar das mãos desse grupo político que tomou conta da Petrobras. É vergonhoso. As denúncias não cessam. E não vejo a senhora dizendo: ‘não é possível que fizeram isso’. Essa indignação está faltando. O assunto voltou à tona em uma pergunta feita pelo pastor Everaldo para Levy Fidelix: — Dilma disse que não tinha ideia do que estava acontecendo. O senhor acha que ela não tinha ideia mesmo? O candidato do PRTB respondeu que acredita que a presidente “não tem a menor ideia disso (escândalo da Petrobras), como de outras coisas” e citou problemas no orçamento e gastos públicos. Até o início do segundo bloco, Marina Silva não havia feito nenhum comentário sobre corrupção. A candidata do PSB preferiu centrar os ataques do governo na crise do etanol. A presidente aproveitou o tempo da resposta para falar de outros assuntos que haviam sido levantados por outros candidatos: citou o programa federal de remédios gratuitos, a modernização das Forças Armadas e a produção de energia por meio de hidrelétricas.

POLÊMICA DA CPMF Dilma havia partido para o ataque contra Marina logo na primeira pergunta do debate, declarando que a candidata do PSB havia sido contra a aprovação da CPMF:

— A senhora mudou de partido quatro vezes, mudou de posição de um dia para outro em temas como CLT, homofobia e pré-sal. Em sua resposta, a ex-senadora do Acre disse que votou a favor da CPMF, uma vez para a criação do fundo de combate a pobreza e lembrou que as principais lideranças do PT à época eram contrárias. A candidata falou sobre ataques que vem recebendo: — Mudei de partido para não mudar de ideias e princípios — disse Marina. — Não sou nem oposição raivosa nem situação cega. Tive prática coerente vida toda. Defendi CPMF para fundo de combate a pobreza e essa é mais uma das conversas que o PT tem colocado para deturpar. Enquanto os candidatos com mais intenção de voto trocavam farpas, presidenciáveis com índices menos expressivos também travaram embate particular. Luciana Genro (PSOL) perguntou a Eduardo Jorge (PV) por que ele havia dado “uma risadinha” ao perguntar o que ela faria “se ganhasse a eleição”. Depois, disse que os dois partidos tinham pautas semelhantes: — É difícil avançar nas pautas progressistas ao ver as alianças que tu e teu partido costumam fazer. O senhor foi secretário do (José) Serra e do (Gilberto) Kassab, (na prefeitura de São Paulo). Continuação da Resenha Diária 29/9/14 4

“LUCIANA FALTOU À AULA” A resposta de Eduardo Jorge veio na sequência: — Luciana faltou à aula de história do século XX. O PV é um partido ambientalista, diferente dos partidos que são de esquerda de base marxista. Se tivermos que ajudar governo conservador ou de esquerda vamos ajudar.

O fiel da governabilidade PMDB lidera pesquisas em oito estados e quer se manter indispensável a qualquer presidente

Mesmo sem candidato próprio à Presidência, o PMDB se encaminha para sair mais forte desta eleição, com a possibilidade de dobrar o número de governadores e aumentar o de senadores, além de manter bancada forte na Câmara. A estratégia do partido ao focar nos estados e no Congresso é permanecer grande e indispensável a qualquer presidente que venha a se eleger. -BRASÍLIA- Coadjuvante na disputa presidencial, o PMDB do vice-presidente se prepara para conseguir um sólido crescimento país afora. O partido lidera as pesquisas eleitorais para os governos de oito estados e tem boas chances em outros dois, o que poderá levá-lo a ter dez governadores a partir de 2015 — o dobro de seu desempenho em 2010, quando apenas cinco peemedebistas venceram eleições estaduais. Os peemedebistas também contam com um crescimento das bancadas no Congresso, o que reforça seu papel de fiel da governabilidade de qualquer presidente que venha a ser eleito. Sem candidato próprio à Presidência há 20 anos, a estratégia do PMDB, ao focar nos estados e no Congresso, é justamente a de permanecer grande e indispensável a qualquer presidente. O partido desempenhou esse papel nos governos do PSDB e do PT. Formalmente aliado ao atual governo e à campanha de Dilma Rousseff à reeleição, o PMDB pode aumentar sua representatividade em caso de vitória da candidata petista.

PLANALTO JÁ PREVÊ PARTICIPAÇÃO MAIOR O governo e o PT contam com um crescimento das bancadas do PMDB no Congresso para ajudar a garantir a governabilidade em eventual segundo mandato da presidente Dilma, contrabalançando a ida do PSB para a oposição. O Palácio do Planalto já prevê, inclusive, um aumento da participação dos peemedebistas no governo, em caso de vitória da petista. O espaço extra se daria basicamente sobre o vácuo deixado pelos socialistas, que ocupavam dois ministérios e cargos no segundo escalão. — É certo que o PMDB, nosso principal aliado, deve sair maior numericamente nessas eleições. Temos que ter um crescimento porque perdemos o PSB, que era um aliado importante — afirmou o senador (PT-AC). Ele reconhece, no entanto, que a relação entre PT e PMDB não é um mar de rosas: — Vamos ter que aprender com os erros, sair de uma situação de desconfiança. Nosso vice é do PMDB novamente, temos que construir uma relação de maior confiança — afirmou o senador petista. Apesar de ter cinco ministérios, o PMDB reclama de ocupar pastas com menos peso político do que no governo Lula e do fato de boa parte delas ter cargos-chave ocupados por petistas. O PT costuma contra-argumentar que o partido possui a vice-presidência da República. Os peemedebistas, por sua vez, rebatem dizendo que o cargo seria figurativo. Assessores do Planalto afirmam, no entanto, que ainda não há discussão sobre ocupação de espaço em eventual segundo governo e que o foco neste momento é ganhar a eleição presidencial. Integrantes do governo reconhecem que há “demandas reprimidas” do PMDB relativas ao primeiro mandato: — Pretendemos ampliar o diálogo com o PMDB em um segundo mandato — afirmou um assessor do Planalto.

PARTIDO TEM EXPECTATIVA DE CRESCIMENTO Um interlocutor de Dilma aponta que essa substituição do PSB pelo PMDB já ocorre nos estados, com os peemedebistas tendo um crescimento maior do que os socialistas, o inverso do que ocorreu nas últimas eleições: — Em 2010, o PT franqueou espaço para o PSB nos estados e o partido conseguiu fazer seis governos. Este ano a tendência é que perca cadeiras nos palácios estaduais para o PMDB. Dentro do governo federal, o PMDB tende naturalmente a ganhar também. O PMDB tradicionalmente foca nas eleições estaduais, mesmo que integrantes do partido venham tentando ao longo dos últimos anos entrar na disputa ao Palácio do Planalto. A última vez que o PMDB teve candidato a presidente foi em 1994, há exatos 20 anos: Orestes Quércia, que ficou em quarto lugar. Em 2010, unificado em torno da inédita aliança nacional com o PT, o PMDB teve o pior desempenho estadual desde a redemocratização, com cinco governadores eleitos, desempenho igual ao do PT. Os tucanos chegaram a oito governadores e o PSB, sob a liderança de Eduardo Campos, elegeu seis governos estaduais Agora, o PMDB lidera em estados como o Rio de Janeiro, com Luiz Fernando Pezão; o Ceará, com o senador Eunício Oliveira; o Amazonas, com o líder do governo no Senado, ; o Rio Grande do Norte, com o presidente da Câmara, Henrique Alves; e no Pará está em empate técnico com o atual governador, o tucano Simão Jatene, que segue numericamente à frente.

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Partido quer controle de presidências no Congresso Bancada no Senado tende a ser a maior, e na Câmara a queda de braço é com o PT

“É certo que o PMDB, nosso principal aliado, deve sair maior numericamente nessas eleições. Temos que ter um crescimento porque perdemos o PSB, que era um aliado importante” Jorge Viana Senador (PT-AC) “Pode ocorrer um grande entendimento entre as maiores bancadas, como em 2010” Eduardo da Fonte Deputado (PP-PE) -BRASÍLIA- Além da força que exibe nas disputas aos governos estaduais, o PMDB também lidera as pesquisas para o Senado em oito estados, ficando à frente dos tucanos, que lideram em cinco, e do PT, que lidera em três. Com um terço das vagas em disputa, a tendência é que o partido ao menos mantenha as 20 cadeiras que tem hoje na Casa. O PT tem 13 senadores e o PSDB, 12. Mantendo o maior número de senadores, o partido praticamente garante a presidência da Casa, onde, por tradição, a maior bancada tem direito de indicar o presidente. O atual presidente do Senado, (PMDB- AL), que ainda tem mais quatro anos de mandato, pode ser reeleito. Na Câmara, independentemente de ficar com a primeira ou a segunda maior bancada, que disputa com o PT, o partido também tentará garantir o comando, em ao menos dois dos quatro anos do mandato, como ocorreu nas duas últimas legislaturas. PMDB e PT vêm travando uma queda de braço na Câmara a cada eleição para ver quem será hegemônico em número de deputados. As projeções dos dois partidos são de manter a bancada em torno de 80 parlamentares. Atualmente, estão no mandato 72 peemedebistas e 88 petistas. O PMDB trabalha com a possibilidade de eleger como próximo presidente da Câmara um deputado conhecido por sua independência em relação ao Planalto: o atual líder da bancada, (RJ), candidato a novo mandato. A questão ainda não é tratada de forma aberta. Mas, nos bastidores, aliados e adversários afirmam que Cunha é candidato e se credencia a cada dia para o posto. O desafio dele será vencer as resistências de parte dos parlamentares que se incomodam com a imagem negativa que ele adquiriu por sua defesa de interesses de grupos empresariais, como no caso da disputa em torno da medida provisória que estabeleceu novas regras para o setor portuário.

OPOSIÇÃO DEFENDERIA CUNHA Segundo líderes, a imagem negativa de Cunha fora do Parlamento pesa, já que a Câmara é uma caixa de ressonância da sociedade. No entanto, eles avaliam que em uma eventual reeleição da presidente Dilma Rousseff, o nome dele se fortaleceria até mesmo porque integrantes da oposição defenderiam sua eleição para a presidência da Câmara para derrotar o PT e o governo. — Entre Cunha e qualquer outro petista, eu voto no Cunha. Ele joga o jogo do Legislativo. Um petista, por mais independência que prometa, sempre vai jogar o jogo do Executivo — argumenta um líder da oposição. Peemedebistas afirmam que o segundo turno será palco para negociações sobre espaços dos partidos e que a presidente Dilma terá que dialogar até para garantir apoios. Será também o momento de rediscutir a relação PT e PMDB. Destacando que é muito prematuro tratar da eleição da presidência da Câmara neste momento, o PT admite que existe essa movimentação de Cunha, mas o partido trabalha com a possibilidade de eleger novamente a maior bancada de deputados federais e voltar ao comando da Câmara — A permanecer a correlação de forças, com o PT sendo a maior bancada, vamos insistir muito para que o candidato a próximo presidente da Câmara seja do nosso partido — afirmou o atual líder do PT, Vicentinho (SP). Outros aliados, no entanto, afirmam que é preciso esperar e levar em conta a taxa de renovação da Câmara e a eleição presidencial. Lembram que Cunha tem força na Casa, mas que neste final de mandato ele se firmou principalmente como “o retrato do confronto com o governo Dilma”, agregando os insatisfeitos. — É prematuro tratar disso agora. No primeiro biênio, o presidente da Câmara vem de um bom entendimento do presidente eleito e que assume com a força das urnas. Pode ocorrer um grande entendimento entre as maiores bancadas, como aconteceu em 2010 — diz o líder do PP, Eduardo da Fonte (PE).

PMDB foca nos estados para se tornar indispensável PMDB lidera pesquisas em oito estados e quer se manter indispensável a qualquer presidente Simone Iglesias, Catarina Alencastro eFernanda Krakovics BRASÍLIA

Coadjuvante na disputa presidencial, o PMDB do vice-presidente Michel Temer se prepara para conseguir um sólido crescimento país afora. O partido lidera as pesquisas eleitorais para os governos de oito estados e tem boas chances em outros dois, o que poderá levá-lo a ter dez governadores a partir de 2015 - o dobro de seu desempenho em 2010, quando apenas cinco peemedebistas venceram eleições estaduais. Os peemedebistas também contam com um crescimento das bancadas no Congresso, o que reforça seu papel de fiel da governabilidade de qualquer presidente que venha a ser eleito. Sem candidato próprio à Presidência há 20 anos, a estratégia do PMDB, ao focar nos estados e no Congresso, é justamente a de permanecer grande e indispensável a qualquer presidente. O partido desempenhou esse papel nos governos do PSDB e do PT. Formalmente aliado ao atual governo e à campanha de Dilma Rousseff à reeleição, o PMDB pode aumentar sua representatividade em caso de vitória da candidata petista.

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Planalto já prevê participação maior O governo e o PT contam com um crescimento das bancadas do PMDB no Congresso para ajudar a garantir a governabilidade em eventual segundo mandato da presidente Dilma, contrabalançando a ida do PSB para a oposição. O Palácio do Planalto já prevê, inclusive, um aumento da participação dos peemedebistas no governo, em caso de vitória da petista. O espaço extra se daria basicamente sobre o vácuo deixado pelos socialistas, que ocupavam dois ministérios e cargos no segundo escalão. - É certo que o PMDB, nosso principal aliado, deve sair maior numericamente nessas eleições. Temos que ter um crescimento porque perdemos o PSB, que era um aliado importante - afirmou o senador Jorge Viana (PT-AC). Ele reconhece, no entanto, que a relação entre PT e PMDB não é um mar de rosas: - Vamos ter que aprender com os erros, sair de uma situação de desconfiança. Nosso vice é do PMDB novamente, temos que construir uma relação de maior confiança - afirmou o senador petista. Apesar de ter cinco ministérios, o PMDB reclama de ocupar pastas com menos peso político do que no governo Lula e do fato de boa parte delas ter cargos-chave ocupados por petistas. O PT costuma contra-argumentar que o partido possui a vice-presidência da República. Os peemedebistas, por sua vez, rebatem dizendo que o cargo seria figurativo. Assessores do Planalto afirmam, no entanto, que ainda não há discussão sobre ocupação de espaço em eventual segundo governo e que o foco neste momento é ganhar a eleição presidencial. Integrantes do governo reconhecem que há "demandas reprimidas" do PMDB relativas ao primeiro mandato: - Pretendemos ampliar o diálogo com o PMDB em um segundo mandato - afirmou um assessor do Planalto.

Partido tem expectativa de crescimento Um interlocutor de Dilma aponta que essa substituição do PSB pelo PMDB já ocorre nos estados, com os peemedebistas tendo um crescimento maior do que os socialistas, o inverso do que ocorreu nas últimas eleições: - Em 2010, o PT franqueou espaço para o PSB nos estados e o partido conseguiu fazer seis governos. Este ano a tendência é que perca cadeiras nos palácios estaduais para o PMDB. Dentro do governo federal, o PMDB tende naturalmente a ganhar também. O PMDB tradicionalmente foca nas eleições estaduais, mesmo que integrantes do partido venham tentando ao longo dos últimos anos entrar na disputa ao Palácio do Planalto. A última vez que o PMDB teve candidato a presidente foi em 1994, há exatos 20 anos: Orestes Quércia, que ficou em quarto lugar. Em 2010, unificado em torno da inédita aliança nacional com o PT, o PMDB teve o pior desempenho estadual desde a redemocratização, com cinco governadores eleitos, desempenho igual ao do PT. Os tucanos chegaram a oito governadores e o PSB, sob a liderança de Eduardo Campos, elegeu seis governos estaduais Agora, o PMDB lidera em estados como o Rio de Janeiro, com Luiz Fernando Pezão; o Ceará, com o senador Eunício Oliveira; o Amazonas, com o líder do governo no Senado, Eduardo Braga; o Rio Grande do Norte, com o presidente da Câmara, Henrique Alves; e no Pará está em empate técnico com o atual governador, o tucano Simão Jatene, que segue numericamente à frente.

Oposição quer ouvir tesoureiro do PT na CPI PPS pedirá explicações sobre suposta ação de Vaccari em fundos de pensão

-BRASÍLIA- O líder do PPS na Câmara, deputado Rubens Bueno (PR), afirmou ontem que pedirá novamente a convocação do tesoureiro do PT João Vaccari Neto para depor na CPI mista que investiga irregularidades na Petrobras. Ao longo das investigações da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, foi levantada a suspeita de atuação do petista como um elo entre o grupo do doleiro e fundos de pensão estatais. Ontem, o jornal “Folha de S.Paulo” publicou que e-mails encontrados pela PF sugerem que Vaccari ajudou operadores do doleiro a fazer contato com a Petros, fundação de previdência dos funcionários da Petrobras, em 2012. Na época, o grupo queria captar recursos para o Trendbank, empresa administradora de fundos de investimentos que viria a deixar um rombo de cerca de R$ 400 milhões. Segundo a reportagem da “Folha”, um operador do mercado financeiro chamado Enivaldo Quadrado, doleiro condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ter distribuído dinheiro do mensalão, seria a ligação entre Vaccari e Youssef para fazer o negócio com o Trendbank. A relação dos dois já era conhecida pela PF e também já havia vazado para a imprensa. Vaccari foi um dos mencionados pelo exdiretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa como beneficiário do esquema de corrupção na estatal, segundo revelou a revista “Veja”. O tesoureiro do PT nega qualquer participação no esquema de Costa e Youssef. “Vaccari é peça fundamental para as investigações da CPI, e a comissão não pode prescindir dele. Vamos apresentar requerimento já na segunda (hoje) e esperar que o presidente (da CPMI) Vital do Rêgo (PMDB-PB) peça uma reunião o quanto antes, porque temos muito a decidir no colegiado”, disse Bueno, em nota divulgada por sua assessoria. A Petros aplicou R$ 23 milhões no Trendbank. Outro fundo de pensão que investiu na empresa foi o Postalis, dos funcionários dos Correios. Em janeiro deste ano, antes de a PF deflagrar a Operação Lava-Jato, surgiram notícias dos prejuízos que os investidores do Trendbank estavam sofrendo. Na ocasião, o Postalis informou que realizou aplicações de R$ 50 milhões em março de 2010, antes, portanto, da suposta ação de Vaccari para aproximar Petros e Youssef.

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Serviços já são 65% do orçamento da classe C Classe média destina 65% do orçamento ao setor, mas saúde e educação consomem ganho de renda Cristiane Bonfanti Danilo Fariello BRASÍLIA

Novos gastos

O consumo da nova classe média, que cresceu fortemente nos últimos anos, mudou. Levantamento do Instituto Data Popular, realizado a pedido do GLOBO, mostra que 65% dos gastos dessa parcela da população são destinados a serviços, enquanto 35%, a produtos. Uma inversão de prioridades, na comparação com as despesas de uma década atrás. Em 2004, 63% do consumo da classe média eram direcionados a produtos e 37%, a serviços. Depois de satisfazer a sua aspiração por bens, essa população - que tem renda per capita de até R$ 1.184 por mês - passou a gastar a maior parte de sua renda com serviços. Porém, boa parte do aumento salarial conquistado nos últimos anos é gasto com serviços essenciais. Entre os serviços que passaram a abocanhar mais do orçamento da classe C nos últimos dez anos, estão educação e saúde. A primeira consome 2% dos gastos totais dessas pessoas e a segunda representa uma fatia de 3% das despesas. O dinheiro é gasto em itens que vão desde o pagamento de planos de saúde, exames de laboratório e cirurgias até mensalidades de clínicas. O presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), Marcio Coriolano, diz que, mesmo com o baixo crescimento econômico, o setor de planos de saúde continua avançando e atribuiu esse fenômeno à mudança do perfil de consumo no país. Ele reconhece que, com a maior demanda pelos serviços de saúde, o preço dos convênios pode ser subir. O diretor do Data Popular, Renato Meirelles, explicou que, em algumas ocasiões, o gasto com serviços essenciais chega a absorver todo o aumento de renda da classe C. Ele diz que muitas vezes a população considera os serviços públicos ineficientes: - Gastar mais com serviços significa maior desenvolvimento da população, porque, quanto maior a renda, mais se gasta com serviços. A corretora de seguros Maysa Pereira, 22 anos, passou a ter acesso aos serviços de saúde quando começou a trabalhar. Mensalmente, a empresa desconta R$ 88 de seu salário por causa do convênio. - Eu tenho usado mais o plano odontológico, para exames de rotina. Mas é confortável ter o plano de saúde também para o caso de necessidade - disse. INFLAÇÃO DE SERVIÇOS ENTRE 8,5% E 9% AO ANO Na avaliação de especialistas, embora o Brasil esteja se aproximando do padrão de consumo de países desenvolvidos, essa procura maior por serviços acabou levando a um efeito perverso: mais inflação nos últimos anos. Levantamento do economista Fábio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio (CNC), mostra que, desde 2004, a inflação de serviços tem ficado acima da taxa de produtos, com exceção do ano de 2008. Nos últimos três anos, a diferença foi mais significativa, com o índice dos serviços entre 8,5% e 9% ao ano e o dos produtos, entre 4,5% e 6% ao ano: - Em princípio, isso não seria um problema. A questão é que a produtividade não acompanha o aumento real do salário. Com mais dinheiro no bolso e a produtividade crescendo menos, há uma oferta menor de serviços diante da demanda crescente. Segundo Bentes, é um problema estrutural que torna a inflação mais resistente. Os instrumentos para combater a subida de preços, como juros mais altos, são insuficientes para conter os preços. Para o ministro Marcelo Neri, da Secretaria de Assuntos Extraordinários, o encarecimento dos serviços tem dois lados. Ele destaca que boa parte dessa nova classe C trabalha na área de serviços, e, portanto, sua renda acompanha essa aceleração inflacionária. Assim, ela gasta mais, mas pode também lucrar mais com a prestação de serviços. - Mas o trabalhador da indústria, de fato, está penalizado, porque não existe para ele tanto espaço para o aumento da renda. A costureira Maria Gorete Matias, de 42 anos, foi uma que escolheu o setor de serviços. Deixou o trabalho numa indústria de camisetas e uniformes, numa cidade a 40 quilômetros de Brasília, para oferecer reparos em um ateliê no Centro da capital. Deixar a indústria e migrar para o setor de serviços foi também uma maneira de proteger seu poder de compra, uma vez que o preço dos serviços vem subindo com a demanda: - Mudei de serviço porque trabalhava de dia para comprar comida à noite. Não tinha como sobreviver com aquilo. Era escravidão.

Viagens são 2% das despesas Os dados do Instituto Data Popular mostram que a classe média destina 31% de sua renda à reforma e à manutenção de serviços no domicílio. Nesse recorte, estão incluídos TV a cabo, internet e serviços para a casa em geral. Em seguida, vêm os gastos com alimentação em restaurantes, bares e lanchonetes: 5%. Outras despesas, com uma fatia de 19% da renda, incluem cabeleireiros, manicures, sapateiros, lavanderias, contratação de empregados domésticos, aluguel de aparelhos, Imposto de Renda, tarifas bancárias e seguros de vida, entre outros. Viagens e entretenimento passaram a ocupar, cada um, parcela de 2% das despesas. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 8

A cabeleireira Valéria Cristina Dias Mota, de 49 anos, retrata bem esse movimento. Depois de 15 anos pagando aluguel, ela acabou de comprar uma casa e já planeja reformar o imóvel no ano que vem. Valéria mora com duas netas, com idades entre 6 e 8 anos. - Tenho TV a cabo e internet. As meninas têm tablet, computador, internet e impressora. - disse Valéria que mantém a casa com a pensão do marido falecido e com o serviço de cabeleireira que presta em casa. O brasileiro da classe média também gasta mais com a compra de automóvel particular do que com transporte público. Uma parcela de 5% da renda da classe média é destinada ao veículo próprio, enquanto outra de 3% é usada com transporte público. Boa parte do gasto com transporte público é bancada por empregadores por meio de vale- transporte.

O imponderável nas eleições Márcio Fortes Ninguém ganha de véspera. As pesquisas, cada vez mais confiáveis, mostram uma fotografia do momento e apontam tendências, mas não definem o resultado

O fator surpresa tem sido uma constante nas eleições brasileiras. Os exemplos são inúmeros. Na disputa pela prefeitura do Rio, em 1992, foram ao segundo turno Benedita da Silva, com 38% dos votos, e Cesar Maia, com menos de 15%. Cesar superou Cidinha Campos, no primeiro turno, menos de dez dias antes das eleições. E acabou vencendo Benedita, a franca favorita anterior. A derrota de Luiz Paulo Conde para o próprio Cesar, em 2000, também disputando a prefeitura, configurou-se somente às vésperas da eleição. Também inesperada foi a vitória de Garotinho sobre Cesar, em 1998, para o governo estadual, delineada no final da campanha. As eleições de Leonel Brizola, em 1982, e de Moreira Franco, em l986, ambos para o governo do estado, consolidaram-se, de forma surpreendente, na reta final. Mas o exemplo mais importante foi a eleição para a Presidência da República, em 1989, em que Lula superou Brizola e foi ao segundo turno contra Collor, que, afinal, saiu vencedor. Em São Paulo, Fernando Henrique era considerado eleito até a véspera da eleição para a prefeitura, em 1985, e perdeu. A vitória de Luiza Erundina, em 1988, como prefeita deveu-se a um fato ocorrido fora da capital e que gerou revolta no eleitorado: a morte de um grevista em Volta Redonda, no Estado do Rio. Também emblemática a derrota de Roberto Magalhães, que chegou a ter mais de 80% de intenção de votos para a prefeitura do Recife, em 2000. Todos esses exemplos demonstram apenas que ninguém ganha eleição de véspera. As pesquisas, cada vez mais apuradas tecnicamente e mais confiáveis, mostram uma fotografia do momento e apontam tendências, mas não definem o resultado. Há características regionais que dificultam a amostragem. Há dois anos, foi marcante o erro de pesquisas em lugares importantes. Em Salvador, ACM Neto era apontado como derrotado até a véspera da eleição. Assim também ocorreu com Arthur Virgílio, em Manaus. E há outros casos de erros Brasil afora. Estamos agora na reta final da mais instigante campanha eleitoral para a Presidência, com o resultado mais imprevisível dos últimos tempos. Ela começou, efetivamente, há pouco mais de um mês, após o trágico acidente ocorrido com Eduardo Campos. A intensa cobertura de imprensa, o que é absolutamente natural, fez com que Marina Silva, já conhecida do eleitorado desde 2010, fosse alçada ao centro dos acontecimentos. Os palanques estaduais haviam sido cuidadosamente montados e coligações importantes se consolidaram há mais de um ano, quando o cenário era outro. E as discrepâncias aparecem nas pesquisas. Paulo Souto, do DEM, lidera as pesquisas na Bahia, estado em que Dilma é apontada como vencedora. Assim também acontece em São Paulo, onde Marina está à frente e Geraldo Alckmin aparece como vencedor no primeiro turno. Em outros estados encontram- se as mesmas características, refletindo as articulações políticas feitas antes. O resultado eleitoral para a Presidência da República está, portanto, ainda indefinido. Márcio Fortes foi deputado federal

Continuação da Resenha Diária 29/9/14 9

Prisão de ex-senador pode ajudar a reaver até R$ 2 bi Valor a ser cobrado de Estevão e outros acusados inclui multa e indenização Uso de recursos 'em cascata' para que réus obtivessem prescrição das penas marcou o caso do TRT-SP Frederico Vasconcelos de São Paulo

Com a prisão do ex-senador Luiz Estevão (ex-PMDB), o Ministério Público Federal em São Paulo tentará obter o ressarcimento das verbas públicas desviadas na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo entre 1992 e 1998. Segundo o MPF, incluindo multa e indenização por dano moral, o total devido ao Tesouro pelos acusados de participar do desvio pode chegar a R$ 2,25 bilhões, segundo o Tribunal Regional Federal da 3ª Região. "Os bens de Luiz Estevão e dos outros condenados estão bloqueados há 14 anos, por ordem judicial. No entanto, eles ainda continuam na posse e administração desse patrimônio, inclusive auferindo seus lucros", diz a procuradora regional da República Maria Luisa Lima Carvalho. Junto com a procuradora Isabel Groba Vieira, ela ajuizou as primeiras ações cíveis do caso TRT-SP. Segundo Maria Luisa, "Estevão foi o principal beneficiário do bilionário esquema de desvio de verbas públicas". Ela diz que "o MPF e a Advocacia-Geral da União devem dar início à execução provisória, levando a leilão os bens bloqueados pela Justiça, para que pelo menos parte do valor bilionário desviado dos cofres públicos seja devolvido". Em 2012, Estevão assinou acordo com a Advogacia-Geral da União para devolver ao erário R$ 468 milhões, em 96 prestações. Esse pacto não teve a concordância do MPF em São Paulo. Luiz Estevão foi preso neste final de semana porque usou documento falso para tentar obter a liberação de bens indisponíveis. Sua condenação a três anos e seis meses de reclusão, em regime semiaberto, não poderá ser substituída por penas alternativas. Isso porque o TRF-3 entendeu que Estevão orientou a atividade criminosa dos demais réus, o ex-presidente do TRT-SP Nicolau dos Santos Neto e os empresários Fábio Monteiro de Barros Filho e José Eduardo Correa Teixeira Ferraz, da Construtora Incal. Na última quinta-feira, o ministro , do Supremo Tribunal Federal, reconheceu "o caráter manifestamente protelatório" de um recurso de Estevão. A peça foi protocolada às vésperas da prescrição, o prazo legal que venceria no próximo dia 3 de outubro para o Judiciário encerrar definitivamente a causa.

DISTORÇÃO Segundo o MPF, a decisão de Toffoli começa a corrigir uma distorção que marcou o caso do TRT-SP nos últimos anos: a interposição de recursos "em cascata", para se obter a prescrição das penas. Em maio último, a Justiça livrou Estevão da condenação por formação de quadrilha e uso de documento falso, pois os dois crimes prescreveram. Outro expediente é a criação de obstáculos para retardar as decisões judiciais. Em julho, a ministra Regina Helena Costa, do Superior Tribunal de Justiça, mandou retirar desse processo um recurso de quase quatro mil folhas. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 10

Em junho deste ano, uma Turma do Supremo anulou a condenação de José Eduardo Ferraz. Voto de desempate do ministro Marco Aurélio acolheu a alegação do ex-ministro do STF e ex-procurador geral da República José Paulo Sepúlveda Pertence, advogado de Ferraz. Sepúlveda Pertence sustentou que o empresário teve a defesa cerceada em 2006, pois dispensara na véspera de um julgamento o advogado Domingos Mantelli Filho, "profissional que já não gozava de sua confiança". Mantelli Filho continuou representando Ferraz no caso.

Primeiro passo

Embora reticente, documento das Forças Armadas sinaliza atitude mais equilibrada diante dos abusos cometidos durante a ditadura militar Constitui relativo progresso, ainda que insuficiente --como apontaram os membros da Comissão Nacional da Verdade--, a disposição das Forças Armadas de admitir, pela primeira vez, que não têm como negar a ocorrência de violações aos direitos humanos em dependências militares durante o regime ditatorial (1964-1985). Mais de 40 anos depois do período em que a tortura sistemática de presos políticos atingiu seu auge, é difícil entender por que o tema desperta na caserna resistências tão frequentes e sólidas. Corroborada por inúmeras evidências e admitida por diversos de seus protagonistas, a sevícia dos adversários daquele governo --assim como célebres casos de desaparecimento e assassinato-- não teria por que ser negada ou ocultada por uma geração já distante, cronológica e doutrinariamente, de fatos ocorridos décadas atrás. O principal mérito da Lei da Anistia, promulgada em 1979, foi o de permitir que o processo de democratização do país se desse num clima desanuviado dos ressentimentos que pesavam sobre ambas as partes em conflito. A esmagadora maioria dos que se envolveram na luta armada, a começar da própria presidente Dilma Rousseff (PT), não tem problemas em fazer a revisão histórica de sua estratégia, fundada não só num romantismo revolucionário juvenil, mas também na exaltação da violência e num desprezo ao que então se desqualificava com o termo "democracia burguesa". Mesmo oposicionistas moderados, avessos a pegar em armas, foram entretanto torturados barbaramente pelos militares. O descontrole da repressão política chegou a ameaçar o próprio sistema de comando das Forças Armadas; na segunda metade da década de 1970, o então presidente Ernesto Geisel teve êxito em barrar um processo capaz de minar as bases de sua própria autoridade. Historiadores e cientistas políticos podem, de resto, avaliar de formas diferentes e contraditórias as justificativas de cada lado. O debate, que se projeta para o campo dos valores e das hipóteses morais, não tem como perturbar um modelo vitorioso de convivência democrática, em que os militares têm seu papel definido na Constituição. Diante de algumas reações de inconformismo explícito e de velada resistência à elucidação dos fatos por parte de setores das Forças Armadas, os três comandantes ao menos avançaram, em documento oficial, na disposição de não negar o ocorrido. O caminho para uma visão histórica mais neutra e equilibrada do passado --no qual, felizmente, a grande maioria dos brasileiros não se reconhece-- será ainda longo; mas, pelo menos, foi dado um primeiro passo.

Usina de R$ 20 bi vira disputa entre Furnas e Odebrecht Acionistas de Santo Antônio cobram um do outro o pagamento de prejuízos gerados por atrasos na obra Sócios precisam pagar dívida com o mercado de curto prazo, senão podem perder licença de operação da usina Machado da Costa De São Paulo

A briga envolvendo os dois líderes no consórcio responsável pela usina de Santo Antônio, no rio Madeira (RO), Odebrecht e Furnas, emperra a resolução dos problemas financeiros da companhia. Ambos travam um embate interno para decidir quem se responsabilizará pelo atraso na construção da obra: todos os sócios ou só a Odebrecht. A usina, de acordo com o cronograma válido na Aneel, atrasou cinco meses e, por isso, precisa arcar com um prejuízo de R$ 2 bilhões. A Odebrecht quer que o valor seja rateado entre todos os sócios. Furnas, por outro lado, exige que a Odebrecht pague a maior parte. Furnas culpa a empreiteira pelo fracasso na antecipação do cronograma da usina em um ano. A Odebrecht prometeu entregar a obra no início de 2014, quando originalmente o prazo era 2015. O objetivo era vender a energia gerada antecipadamente em contratos no mercado livre. A empreiteira, por sua vez, culpa ações sindicais, em 2013, pelo atraso. Exceto Furnas, os demais sócios querem injetar R$ 2 bilhões em Santo Antônio para pagar prejuízos no mercado de curto prazo, de abril a agosto, além de R$ 700 milhões ao consórcio construtor, formado por Odebrecht e Andrade Gutierrez. Furnas aceita pagar o mercado de curto prazo, mas não as construtoras. A resistência impediu a injeção de R$ 1,14 bilhão, que deveria ser discutida na última quinta (25). Continuação da Resenha Diária 29/9/14 11

A estatal não apareceu na assembleia porque Santo Antônio vinculou o pagamento às construtoras à injeção que precisa ser feita para pagar, até o dia 7, R$ 266 milhões, conta do mercado de curto prazo referente a agosto. Outra parte da injeção, de R$ 850 milhões, para pagar o prejuízo entre abril e julho, foi aprovada por todos os sócios em 5 de setembro. Caso não seja feito o pagamento, um processo de desligamento da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica deve ser iniciado. Se expulsa, Santo Antônio perde a licença de operação da usina, que seria devolvida à Aneel, sem indenização. O imbróglio que é a composição acionária de Santo Antônio impede uma resolução imperativa da questão por parte de algum dos sócios isoladamente. No que se refere ao capital votante, Furnas responde por 39%, Odebrecht, por 38,6%, Andrade Gutierrez, por 12,4%, e Cemig, por 10%. A relação de cada um com o capital financeiro (a fatia que cada uma deve dispor em caso de injeção financeira), porém, é mais complexa. Furnas mantém 39%, mas a Odebrecht reduz sua exposição, para 28,7%. A ajuda vem do fundo de investimento do FGTS, que detém 9,9%. A Cemig aumenta sua fatia para 20,3%, reduzindo a da Andrade Gutierrez para 2,1%. Apesar da maior participação, Furnas possui apenas um benefício: o poder de veto aos pagamentos feitos ao consórcio construtor. Foi essa vantagem que travou o repasse dos R$ 700 milhões às empreiteiras. Para forçar o pagamento, a Odebrecht ameaçou paralisar a obra e demitir trabalhadores. Mas a primeira fase já está pronta. A segunda só deve ser entregue em 2016.

Pessoas com maior risco cardíaco subestimam chance de problema Pesquisa com 6.544 pessoas comparou percepção pessoal de pacientes com avaliações médicas Mais de 90% dos participantes com alta chance de sofrer um evento acreditavam ter baixo risco Débora Mismetti editora de "ciência saúde"

Quando o executivo Gilson Campos, 54, foi até a clínica de check-ups do Einstein, numa manhã de abril, estava só cumprindo um agendamento adiado havia mais de seis meses, por causa de reuniões e outros compromissos. Saiu da esteira do teste ergométrico direto para o hospital: estava infartando. Mesmo tendo pressão alta havia muitos anos, o executivo não imaginava que poderia ter uma coronária 97% obstruída. Só tinha marcado o check-up, aliás, porque a empresa onde ele trabalha exige exames periódicos. "Não fazia acompanhamento. Tomava remédio para pressão, mas não dava bola. Só me conscientizei depois", diz Gilson. Ele conta que sentia cansaço havia dias, mas nunca imaginou que poderia estar infartando. A falta de consciência sobre o próprio risco de ter um problema cardíaco é comum, como mostra um estudo recente do cardiologista Marcelo Katz com 6.544 pacientes da unidade de check-up do Einstein, em São Paulo, publicado no "European Journal of Preventive Cardiology". Na pesquisa, as pessoas preenchiam, antes de fazer os exames, um questionário respondendo se achavam que tinham risco cardiovascular alto, médio ou baixo. Depois, todos passaram por teste ergométrico e de pressão, tiraram medidas de peso, altura e circunferência da cintura e fizeram exames laboratoriais, para medir colesterol, glicemia e outros indicadores de risco. Com base nesses resultados, os pesquisadores usaram uma escala científica que calcula a probabilidade de uma pessoa sofrer eventos cardiovasculares ao longo da vida e classificaram os participantes entre os que tinham alto, baixo e médio risco.

DESCOMPASSO Os médicos perceberam que havia um descompasso grande entre o que os números diziam e o que as pessoas percebiam. Entre os participantes com risco médio (entre 10% e 20%) de sofrer um problema cardíaco no futuro, 72% acreditavam ter baixa probabilidade de ter um evento do tipo. Entre os com alto risco (20% ou mais), 91% subestimavam sua condição. Segundo Katz, autor do estudo e coordenador de pesquisa cardiovascular do Einstein, esse tipo de trabalho busca entender por que grande parte das pessoas é tão resistente a seguir recomendações médicas para prevenção. "Fatores de comportamento são 80% do risco cardíaco. Para se cuidar, a pessoa tem de saber se está em risco." Entre os pacientes do estudo, só 6,1% se viam como de alto risco cardíaco, mas a escala de risco a longo prazo colocava 49,3% nessa condição. Katz afirma que é comum um viés otimista: "A pessoa pensa: Se nunca aconteceu comigo, por que vai acontecer? Vou aproveitar a vida agora e depois me cuido'". A maioria só desperta quando sofre um infarto ou alguém próximo e até celebridades têm um problema. O próximo passo, diz o médico, é investigar por que as pessoas não se cuidam. Um problema são as prioridades: a maioria tende a colocar tarefas imediatas de trabalho e família na frente dos cuidados que dão frutos a longo prazo, sobretudo exercícios. Depois do infarto, Campos mudou a alimentação, cortou refrigerantes e perdeu 8 kg. Mas ainda não conseguiu pôr exercícios na rotina. "Estou muito bem, mas não posso dizer que estou bem nisso", diz.

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Dialogando com o carrasco Rubens Ricupero

Misturar diplomacia com demagogia nunca dá certo. Pior é quando presidente em busca de reeleição submete a Assembleia Geral da ONU ao espetáculo da propaganda de baixo nível do nosso horário eleitoral obrigatório. Os diplomatas estrangeiros não podem fazer como o espectador no Brasil, que simplesmente desliga a TV ou passa a outro programa. Foram obrigados a aguentar impávidos os disparates que lhes impingiu o discurso brasileiro de inauguração da assembleia. Disparate, diz o dicionário, é expressão destituída de razão e senso, algo de despropositado e fora da realidade. A definição se ajusta como luva à declaração de que o Brasil condena os bombardeios americanos aos degoladores do Estado Islâmico porque favorecemos o diálogo e os meios pacíficos. Alguém deveria ter explicado à presidente que diálogo é excelente maneira de resolver conflitos desde que o outro lado concorde em ouvir e responder. Quando a resposta é a faca na carótida, não existe diálogo possível. Alguém imagina que as vítimas de Auschwitz poderiam ter dialogado com a Gestapo e os SS? Ou que os cambojanos e ruandeses massacrados deveriam ter mantido conversação polida com genocidas? Por que será diferente com fanáticos e psicopatas que trucidam prisioneiros inermes e torturam todos os que não aderem ao Califado? Duas semanas atrás, a ofensiva do EI estava às portas de Bagdá e da capital do Curdistão. Se não tivessem sido detidos pelos ataques aéreos americanos, milhares de refugiados teriam tombado nas mãos dos piores assassinos que o mundo conheceu desde o Khmer Vermelho. O que o Brasil propôs de prático e efetivo para evitar tal desenlace, além de banalidades piedosas e ineficazes como aconselhar o diálogo com degoladores? Se não sabemos ou podemos tomar iniciativa para neutralizar os terroristas, deveríamos ter ao menos a decência de ficar calados. Condenar os bombardeios, único recurso existente naquela hora para afastar a ameaça, equivale a condenar ao massacre civis desprotegidos. Há um nome para esse tipo de atitude confortável e hipócrita: irresponsabilidade. Nada mais fácil do que o principismo de invocar o diálogo em situação na qual esse método obviamente se encontra fora da realidade. É o mesmo que lavar as mãos em relação à consequência trágica mais que provável de um conselho despropositado. A diplomacia não deve buscar o aplauso fácil. Tem de responder pelos resultados previsíveis do que propõe. Isso na melhor das hipóteses, se o conselho foi dado com sinceridade e boa fé, embora desprovidas de discernimento. Se, ao contrário, a motivação é o antiamericanismo barato com o objetivo de angariar votos, é muito mais grave. Nesse caso, combina-se a irresponsabilidade com a provocação gratuita, sem contribuir em nada para minorar o sofrimento das vítimas ou fazer avançar a pacificação do conflito. Em qualquer das situações, não é a receita para tornar o Brasil candidato irrecusável a membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, posição que se alcança apenas por meio de diplomacia responsável, a serviço da moderação e do equilíbrio.

Continuação da Resenha Diária 29/9/14 13

PRESIDENTE É CENTRO DE ATAQUES EM DEBATE TENSO Dilma tenta constranger Marina, mas se torna alvo preferencial no decorrer do encontro de ontem na TV Record; corrupção na Petrobrás é usada contra petista, que rebate dizendo que foi ela quem demitiu ex-diretor sob suspeita

Em uma palavra, a definição do penúltimo debate presidencial da campanha, ontem à noite na TV Record, é nervosismo. Tanto os principais candidatos ao Planalto como os de siglas menores travaram embates duros, marcados por pedidos de direito de resposta, e demonstraram tensão na falta de controle do tempo– poucas respostas foram concluídas sem brigar com o cronômetro. Líder nas pesquisas e candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT) foi alvo preferencial de Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB), que também procurou atingir a segunda colocada a fim de reverter a desvantagem. Enquanto os rivais tentavam ligar a petista a escândalos na Petrobrás, ela própria recorreu ao tema afim de colar o rótulo de “privatista” no tucano. Os nanicos Eduardo Jorge (PV) e Luciana Genro (PSOL) travaram embate particular que repercutiu nas redes sociais, assim como as respostas constrangedoras de Levy Fidelix (PRTB) sobre homossexualidade. O cenário da disputa ajuda explicar o nervosismo, assim como as regras do debate, com duas rodadas de perguntas entre candidatos logo no primeiro bloco, como havia ocorrido com os candidatos a governador de São Paulo. A organização foi acionada quatro vezes por Dilma e uma por Marina sobre direito de resposta: a petista obteve uma só permissão. O primeiro embate envolveu as duas candidatas mais bem colocadas. Dilma pôde escolher para quem perguntar e questionou Marina sobre mudanças de partido – ela foi do PT e do PV– e de posições da candidata do PSB no plano de governo. “No debate da Band, a senhora disse que votou a favor da CPMF. Qual foi seu voto?”, perguntou a petista, auxiliada por material impresso, referindo-se ao mandato da adversária no Senado. Marina afirmou que mudou de partido “para não mudar de ideais nem de princípios” e reiterou que ela e Eduardo Suplicy (PT-SP) votaram a favor, no governo Fernando Henrique Cardoso, mesmo contra a orientação da sigla. Na réplica, Dilma disse que a ex-senadora votou quatro vezes contra a criação da CPMF, citando os “anais do Senado”. A expressão é a mesma usada por inserção do PT, exibida no segundo intervalo do debate, mas a propaganda mostra dois votos contrários de Marina. “Atitudes assim produzem insegurança. Não dá para improvisar”, disse Dilma. A candidata do PSB foi a próxima a perguntar e escolheu Aécio para falar sobre matriz energética. Marina criticou tanto o “improviso” do apagão, no governo FHC, quanto o gasto “de bilhões e bilhões” da gestão Dilma em termelétricas. O tema motivou o primeiro pedido de resposta de Dilma, que foi negado. Na tréplica, Aécio disse “concordar” com Marina em relação à necessidade de variar a matriz energética, mas disseque era preciso “fazer justiça” a FHC. “O grande desafio era domar a inflação. Lutamos por isso contra o PT, no tempo em que a senhora participava do PT.” O tucano ainda usaria o passado petista de Marina para ataca-la quando o assunto eram boatos sobreo fim de programas sociais como o Bolsa Família. “Sempre fizeram ameaça contra as candidaturas do PSDB, inclusive quando você era do PT”, afirmou Aécio. O principal ataque da candidata do PSB à presidente foi ao questioná-la sobre a crise enfrentada pelo setor sucro- alcooleiro. “Não respondeu o que era mais importante: que a política de etanol no seu governo é um fracasso, destruindo Continuação da Resenha Diária 29/9/14 14

60 mil empregos. Eu vou repetir, Dilma: 70 usinas foram fechadas”, afirmou. “Por que mudou as prioridades do presidente Lula?”

Petrobrás . A estatal foi lembrada pela primeira vez em pergunta de Aécio ao Pastor Everaldo. “Infelizmente, nossas empresas públicas foram tomadas por um grupo político que as utiliza para se manter no poder. A cada debate há uma nova denúncia sobre a Petrobrás”, disse o tucano, para novo pedido de resposta de Dilma, também negado. Os “malfeitos” no governo e as ações de combate à corrupção viriam a opor Dilma e Aécio ainda nesse bloco. A surpresa é que a própria petista citou a Petrobrás, para questionar o tucano: “ O senhor assumiria o compromisso de não colocar a privatização da Petrobrás no radar?” Aécio respondeu: “Eu sou claro. Não vamos privatizá-la, mas reestatizá- la”. Ao fim da resposta, o tucano se atrapalhou ao citar dados da inflação dos governos FHC, Lula e Dilma. Dilma rebateu o tucano ao dizer que combate a corrupção “para fortalecer a Petrobrás”. “Tem gente que usa para enfraquecer a Petrobrás. Os senhores (do PSDB) foram favoráveis à privatização, venderam parte das ações a preço de banana.” Por duas vezes, a presidente alegou que foi ela quem demitiu o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, envolvido em um esquema de desvios na estatal que teria financiado partidos e políticos. A primeira citação foi no único direito de resposta obtido por Dilma. Daqui a quatro dias, os candidatos ao Planalto participarão do último debate do 1.º turno, na TV Globo Ana Fernandes, Carla Araújo, Iuri Pitta, Isadora Peron, Pedro Venceslau, Ricardo Galhardo e Vera Rosa

5 DÉCADAS DE UM PAÍS EM MUTAÇÃO

74 A DITADURA PERDE FORÇA Foi no 10º aniversário do golpe militar, já em 1974, que a ditadura brasileira fez a passagem dos anos de chumbo para um projeto de abertura “lenta, gradual e segura”, como definido pelo então presidente Ernesto Geisel. O regime militar controlava tudo na vida do País e se manteria no poder por outros 11 anos. Aos poucos, o Brasil já começava a olhar para a frente. 84 ELEIÇÕES DIRETAS À VISTA Recessão, inflação de 239% ao ano, sinais de exaustão do regime militar. Foi nesse cenário que a campanha das Diretas Já ganhou as ruas em 1983 e 1984. Os comícios reuniram multidões e mudaram o clima político do País. A emenda não foi aprovada e o brasileiro só voltaria a escolher na urna o presidente em 1989, mas a ditadura estava com os dias contados.

94 INFLAÇÃO DEBELADA Em junho de 1994, a inflação foi de 46,5%. No ano, acumulava 763%. Desde 1967, o porcentual chegava a 1,1 quatrilhão. A chegada do Plano Real e da nova moeda – a sétima criada pelo governo em 13 anos – foi uma virada radical na vida dos brasileiros. Implementado em julho de 1994, o pacote baixou a inflação já naquele mês para 6%, e 1,5% em setembro. Valorizou os salários, reorganizou a economia. Empresas e cidadãos voltaram a fazer contas e planejar o longo prazo. O plano levou à Presidência o ministro da Fazenda responsável pela operação – o então senador tucano Fernando Henrique Cardoso.

2003 OS POBRES ENTRAM NO JOGO Nos anos 2000, já com democracia e inflação controlada, a nova urgência do País era reduzir a pobreza. Vários programas que, em 2002, beneficiavam 5 milhões de pobres foram unificados no Bolsa Família, que fez da transferência de renda aos pobres a grande prioridade nacional. Na conta oficial, em dez anos 22 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema.

2013 O BRASIL SE LIVROU DA DITADURA E DA INFLAÇÃO, REDUZIU A POBREZA E AGORA QUER VIVER MELHOR Edgar Maciel Nas últimas cinco décadas o Brasil lutou por direitos humanos, por leis trabalhistas, foi às ruas pelas Diretas Já, destituiu um presidente e superou uma inflação astronômica nos anos 90. Estabilizou-se, criou programas sociais que reduziram a pobreza e melhorou alguns índices na educação. Virou até o “queridinho” dos investidores estrangeiros por alguns anos. Esses avanços tiveram em comum a mobilização por conquistas que, a rigor, eram deum País inteiro, de diferentes classes, lugares ou idades. Nos últimos 15 meses, protestos e movimentos voltaram às ruas – e a cruzada da vez é mais complexa. É a constatação de que a democracia em si não basta. Ela tem de se livrar da corrupção e abrir caminho para a qualidade de vida. As previsões para os próximos anos, advertem pesquisadores, direcionam a sociedade brasileira para uma onda de “movimentos pós-materialistas”. “As manifestações de junho de 2013 apontaram para isso. Quando uma estabilidade ocorre, as pessoas tendem a deixar para trás reivindicações de subsistência e avançamos em temas que lutem por mais liberdade e capacidade de decisão sobre suas vidas”, afirma José Álvaro Moisés, cientista político e professor da USP. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 15

Ganham espaço, no novo cenário, as discussões sobre mobilidade urbana, habitação digna, preservação do meio ambiente, reivindicações ligadas a gênero e diversidade sexual. “As pessoas querem viver melhor, mas também querem seus direitos individuais colocados em pauta pelos governos, sendo atendidos e respeitados”, afirmou o cientista política Pedro Fassoni. Esses novos anseios se moverão por uma nova forma de participação política, uma democracia virtual. Atualmente, a internet já é palco de debates, opiniões políticas, consultas e denúncias de irregularidades no poder público. Mas ainda não se tornou um agente efetivo de decisões. “A internet está sendo mal utilizada. Há uma série de movimentos propondo que o meio virtual seja aproveitado como uma renovação da democracia. Se não para consultas diretas, mas como um meio de formação de demandas e prioridades”, disse Moisés. Partidos . A sociedade se mobiliza, mas os partidos políticos resistem à ideia de se adaptar a esse processo de transição. Para o professor de História Moderna da Universidade Federal do Rio de Janeiro Francisco Carlos Teixeira da Silva, o perigo desse descompasso é o crescimento da aversão à política. “Antigamente, as pessoas sabiam quais eram seus representantes e os partidos eram mais ativos. Agora, acontece uma constatação de que a política é suja, ruim e isso pode prejudicar a viabilização das demandas da sociedade.” Nas próximas décadas, a evolução dessas prioridades que vieram à tona nos últimos anos dependerá de como os brasileiros se servirão das ferramentas democráticas. “Nenhuma tendência é linear e podemos ver regressões dos direitos atuais. Vai depender da história que a sociedade quer construir”, ponderou Moisés.

Apagão da Autoridade Carlos Alberto Di Franco

A sociedade assiste, atônita, a uma escalada de crimes cometidos no âmbito de famílias de classe média. Transformou se o crime familiar em pauta ordinária das editorias de polícia. O inimigo já não está somente nas esquinas e vielas da cidade sem rosto, mas dentro dos lares. Mudam os personagens, mas as histórias de famílias destruídas pelo ódio e pelas drogas se repetem. A violência não se oculta sob a máscara anônima da marginalidade. Surpreendentemente, vítimas e criminosos assinam o mesmo sobrenome e estão unidos pela indissolubilidade do DNA. A multiplicação dos crimes em família tem deixado a opinião pública em estado de choque. Paira no ar a mesma pergunta que Fellini pôs na boca de um dos personagens do seu filme Ensaio de Orquestra, quando, ao contemplar o caos que tomara conta dos músicos depois da destituição do maestro, pergunta, perplexo: “Como é que chegamos a isto?”. A interrogação está subjacente nas reações de todos nós, caros leitores, que, atordoados, tentamos encontrar resposta para a escalada de maldade que tomou conta do cotidiano. A tragédia que tem fustigado algumas famílias aparece tingida por marcas típicas da atual crônica policial: uso de drogas, dissolução da família e crise da autoridade. Não sou juiz de ninguém. Mas minha experiência profissional indica a presença de um elo que dá unidade aos crimes que destruíram inúmeros lares: o esgarçamento das relações familiares. Há exceções, é claro. Desequilíbrios e patologias independem da boa vontade de pais e filhos. A regra, no entanto, indica que o crime hediondo costuma ser o dramático corolário de um silogismo que se fundamenta nas premissas do egoísmo e da ausência, sobretudo paterna. A desestruturação da família está, de fato, na raiz da tragédia. Se a crescente falange de jovens criminosos deixa algo claro, é o fato de que cada vez mais pais não conhecem os seus filhos – e filhos também não se interessam por seus pais e avós. Na falta do carinho e do diálogo, os jovens crescem sem referências morais e âncoras afetivas. Recebem boas mesadas, carros e viagens. Mas, certamente, trocariam tudo isso pela presença dos pais. Sua resposta é uma explosiva combinação de revolta e ódio. Psiquiatras, inúmeros, tentam encontrar explicações nos meandros das patologias mentais. Podem ter razão. Mas nem sempre. Independentemente dos possíveis surtos psicóticos, causa imediata de crimes brutais, a grande doença dos nossos dias tem um nome menos técnico, mas mais cruel: a desumanização das relações familiares. O crime intra e extralar medra no terreno fertilizado pela ausência. O uso das drogas, verdadeiro estopim da loucura final, é, frequentemente, o resultado da falência da família. A ausência de limites e a crise da autoridade estão na outra ponta do problema. Transformou- se o prazer em regra absoluta. O sacrifício, a renúncia e o sofrimento, realidades inerentes ao cotidiano de todos nós, foram excomungados pelo marketing do consumismo alucinado. Decretada a demissão dos limites e suprimido qualquer assomo de autoridade – dos pais, da escola e do Estado –, sobra a barbárie. A responsabilidade, consequência direta e imediata dos atos humanos, simplesmente evaporou-se. Em todos os campos. O político ladrão e aético não vai para a cadeia, renuncia ao mandato. O delinquente juvenil não responde por seus atos, é “de menor”. Certas teorias no campo da educação, cultivadas em escolas que fizeram uma opção preferencial pela permissividade, também estão apresentando um amargo resultado. Uma legião de desajustados, crescida à sombra do dogma da educação não traumatizante, está mostrando a sua face perversa. Ao traçar o perfil de alguns desvios da sociedade norte americana, o sociólogo Christopher Lach (autor do livro A Rebelião das Elites) sublinha as dramáticas consequências que estão ocultas sob a aparência da tolerância: “Gastamos a maior parte da nossa energia no combate à vergonha e à culpa, pretendendo que as pessoas se sentissem bem consigo mesmas”. O saldo é uma geração desorientada e vazia. A despersonalização da culpa e a certeza da impunidade têm gerado uma onda de superpredadores. O inchaço do ego e o emagrecimento da solidariedade estão na origem de inúmeras patologias. A forja do caráter, compatível com o clima de verdadeira liberdade, começa a ganhar contornos de solução válida. A pena é que tenhamos de pagar um preço tão alto para redescobrir o óbvio. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 16

O pragmatismo e a irresponsabilidade de alguns setores do mundo do entretenimento estão na outra ponta do problema. A valorização do sucesso sem limites éticos, a apresentação de desvios comportamentais num clima de normalidade e a consagração da impunidade têm colaborado para o aparecimento de mauricinhos do crime. Apoiados numa manipulação do conceito de liberdade artística e de expressão, alguns programas da televisão crescem à sombra da exploração das paixões humanas. As análises dos especialistas e as políticas públicas esgrimem inúmeros argumentos politicamente corretos. Fala se de tudo, menos da crise da família e da demissão da autoridade. Mas o nó está aí. Senão tivermos a coragem e a firmeza de desatá-lo, assistiremos a uma espiral de crueldade sem precedentes. É só uma questão de tempo. Já estamos ouvindo as primeiras explosões do barril de pólvora. O horror dos lares destruídos pelo ódio não está nas telas dos cinemas. Está batendo às portas das casas de um Brasil que precisa resgatar a cordialidade e a tolerância.

Terceirização obrigatória e às avessas Onofre Carlos De Arruda Sampaio

O ministro , do Supremo Tribunal Federal (STF), outorgou status de repercussão geral ao Agravo em Recurso Extraordinário n.º 713.211, em que a empresa Cenibra defende a sua pretensão de poder contratar empresas regularmente estabelecidas no País para que, em propriedades rurais próprias dela, Cenibra, ou por ela arrendadas, prestem serviços de plantio, cultivo e corte de eucaliptos a serem utilizados nas suas fábricas de papel. Essa forma de contratação, que a Cenibra considera ser seu direito, lhe foi negada pelo Judiciário Trabalhista, razão do seu recurso ao Supremo. A matéria é usualmente tratada pela Justiça do Trabalho sob a rubrica de terceirização de mão de obra e tem sido objeto de continuada peleja entre o Ministério Público do Trabalho e as empresas que desejam fazer uso dela. Sob critérios nada objetivos o Parquet trabalhista vem se opondo sistematicamente a essa forma de contratação, em que uma empresa contrata outra para a prestação de serviços, que esta executa com seus próprios empregados. A alegação do Ministério Público, acolhida pela Justiça do Trabalho, é de que disso resultaria a “precarização” da relação de trabalho. A questão, tal como se acha posta, tem extrema relevância e a decisão da Suprema Corte será de grande valia para assegurar a patrões e empregados parâmetros claros que, nos seus devidos termos, possam garantir a liberdade constitucional de contratar, ser contratado e empreender, aportando segurança jurídica a uns e outros e evitando que essa questão continue a ser mais uma a somar-se ao já tão substancioso custo Brasil, que tanto tem impedido o desenvolvimento da nossa sociedade. Na decisão de conceder efeito de repercussão geral ao objeto da discussão a Primeira Turma do STF enfatizou que a liberdade de contratar prevista no artigo 5.º, II, da Constituição federal é conciliável com a terceirização dos serviços para o atingimento do exercício-fim da empresa e justificou a importância da decisão a ser tomada diante da existência de milhares de contratos de terceirização de mão de obra em que subsistem dúvidas quanto à sua legalidade, o que poderia ensejar condenações expressivas por danos morais coletivos semelhantes às verificadas nos autos do caso Cenibra. Porém não é disso que se quer tratar neste artigo, mas sim do seu avesso, isto é da obrigação de “terceirizar” imposta aos citricultores em decisão prolatada pela Vara do Trabalho de Matão, até agora confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho de Campinas na Ação Civil Pública n.º 00121-88.2010.5.15.0081. Essa decisão determina que a indústria de suco só poderá adquirir dos citricultores laranjas que tenham sido plantadas, cultivadas e colhidas por empregados diretamente contratados pela indústria. Desse modo, se essa decisão prevalecer, o citricultor que quiser vender laranjas à indústria terá de bater às suas portas e pedir que esta contrate os empregados necessários e os envie à sua propriedade, para plantar, cultivar e colher as laranjas. Se a indústria não quiser fazer isso, tal citricultor só poderá vender suas laranjas em feiras e supermercados. Em outras palavras, tal decisão obriga todos os citricultores estabelecidos no território brasileiro a terceirizar às indústrias produtoras de suco o plantio, cultivo e colheita de laranjas e limões que queiram vender a qualquer delas, alijando esses citricultores das práticas inerentes à sua atividade fim, limitando, aqui também injustificadamente, seu direito de uso e gozo de sua propriedade agrícola e sua liberdade empresarial. Até mesmo os fatos, por si sós, independentemente do direito, mostram a inviabilidade dessa decisão. Sabe-se que uma laranjeira ou um limoeiro passam a produzir a partir do seu quarto ano de vida e produzem durante 20 anos. Se tal decisão pudesse prevalecer, nenhum dos citricultores que hoje vendem fruta às indústrias poderia continuar a fazê-lo e os que desejassem fazê-lo, no futuro, teriam de se atrelar a uma ou mais indústrias de suco que se dispusessem a plantar, cultivar e colher, dali a 4 anos e durante os 16 seguintes, as frutas produzidas em suas terras, como se fossem arrendatários compulsórios, sem possibilidade de mudança até o fim. Deixaria ele, também, de poder comercializar por um melhor preço, no mercado de frutas frescas, as de melhor aparência, deixando as demais para a indústria, à qual a aparência não interessa. Assim, o produtor rural citrícola, contrariamente ao que ocorre no caso da Cenibra, estaria, sem nenhuma razão jurídica válida, obrigado a terceirizar a sua produção, sob pena de não poder comercializar parte substancial dela para as indústrias de suco de laranja. Não é preciso muita imaginação para concluir que se isso pudesse prosperar muitos hectares dos cerca de 8mil citricultores que hoje cultivam laranja no cinturão citrícola de São Paulo, Triângulo Mineiro e Paraná, os quais empregam milhares de trabalhadores rurais, seriam destinados a outras atividades agrícolas em que a mecanização fácil viria substituir a mão de obra do trabalhador rural, aí, sim, “precarizando” a sua situação e a de sua família, a quem se deve garantir, sempre, todos os direitos que a lei lhes outorga, independentemente de que mantenha empregado, garantia Continuação da Resenha Diária 29/9/14 17 essa que é função precípua do Parquet e da Justiça do Trabalho, que devem fazer cumpri-la sem precisar recorrer a artificialismos e atalhos que não se sustentam nem no Direito nem na realidade fática subjacente. Como se vê a questão da “terceirização”, ser apenas possível ou até mesmo imposta, é matéria da maior relevância para todo o País e está de fato a exigir que a Suprema Corte ponha fim, de uma vez por todas, a tamanha confusão que grassa no seio da Justiça laboral e intranquiliza aqueles que desejam, a um só tempo, produzir e cumprir a lei, sem com isso se verem submetidos a acusações da mais variada ordem.

Velhos conhecidos

A quadrilha que ora está sendo denunciada na Operação Lava Jato, da Polícia Federal (PF), é integrada por gente que participou dos mais importantes escândalos nacionais desde pelo menos 1997, conforme relatou reportagem do Estado. A reincidência desses veteranos mostra que a predação ao erário se tornou para muitos deles um meio de vida – e que eles agiram movidos pela certeza de que a Justiça nunca os puniria para valer. O elo entre quase todos os casos é o doleiro Alberto Youssef, principal acusado na Lava Jato. Figura conhecida no mundo dos recentes episódios de corrupção e de desvio de dinheiro público, Youssef enriqueceu “sem nunca ter uma atividade lícita”, conforme afirma o Ministério Público Federal. Ele é tido como o coordenador do esquema de lavagem de dinheiro para legalizar recursos obtidos por meio de fraudes e de pagamento de propinas na Petrobrás entre 2009 e 2014. Calcula-se que sua expertise tenha sido usada para branquear algo em torno de R$ 10 bilhões. A trajetória de Youssef começou no escândalo do Banestado (Banco do Estado do Paraná), revelado em 2003. Por meio de depósitos de doleiros em contas de laranjas e nas CC5 (contas criadas para facilitar transferências legais para o exterior), o esquema naquele banco público transferia para paraísos fiscais dinheiro oriundo de narcotráfico e de corrupção. O gerente de câmbio que operou os negócios chamou a atenção na época para a “permissividade” do Banco Central, que transformou o Banestado num paraíso de doleiros – entre eles Youssef –, que teriam movimentado R$ 30 bilhões. Para não ser condenado à prisão, Youssef fez acordo de delação premiada em 2004, em que admitiu diversos crimes contra o sistema financeiro e os cofres públicos. Mesmo com o compromisso de colaborar com a Justiça e, assim, reduzir a punição, Youssef continuou a atuar. Além de montar uma rede com doleiros, políticos, servidores e empresários para operações de câmbio fraudulentas, suspeita se que ele tenha tido participação no escândalo do mensalão, por meio da corretora Bônus Banval. Segundo Marcos Valério, pivô do mensalão, o dono da corretora é Enivaldo Quadrado, sócio de Youssef e que também foi preso na Operação Lava Jato. A quadrilha que atuou na Petrobrás inclui mais nomes conhecidos de outros escândalos. Um deles é o do doleiro Raul Henrique Srour, que atuou com Youssef no Banestado. Ele é acusado agora de fraudar identidades para realizar operações de câmbio. Srour já havia sido citado pela CPI que investigou o escândalo dos precatórios, em 1997. Outra veterana envolvida no caso da Petrobrás é Nelma Kodama, doleira que também é ligada a Youssef. Ela foi investigada na CPI dos Bingos, na CPI dos Correios e na Operação Anaconda, que apurou um esquema de venda de sentenças judiciais. A lista da Lava Jato cita ainda Rafael Angulo, que foi condenado por envolvimento em esquema de remessa ilegal de cerca de US$ 700 milhões ao exterior entre 2004 e 2006, na chamada Operação Curaçau. Angulo também trabalhou para Youssef. Outros mencionados são os notórios Carlinhos Cachoeira e Pedro Paulo Leoni Ramos. O bicheiro Cachoeira, preso em operação contra o crime organizado em Goiás em 2012 e que tinha extensas ligações com o mundo político, movimentou dinheiro em uma das empresas de fachada de Youssef, conforme a investigação da Lava Jato. Já Pedro Paulo Leoni Ramos, o “PP”, foi investigado pela PF em inquérito sobre fraudes em fundos de pensão em 2013 e agora é suspeito em razão de suas relações com Youssef. Um cunhado de “PP”, Roberto Figueiredo, também está envolvido na Lava Jato – ele já havia sido preso pela PF na Operação Navalha, que desbaratou esquema de corrupção na contratação de obras do PAC, em 2007. É provável que a Lava Jato venha a incluir ainda mais nomes conhecidos do submundo das negociatas – gente que não foi punida quando deveria e que, confiante, parece ter se organizado como uma ampla rede dedicada a roubar o quanto puder dos cofres públicos.

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Após vistoria, ameaça de bomba é descartada em voo da Avianca

BRASÍLIA - Um avião da empresa Avianca que partiu de Cuiabá (MT) ontem, às 21h no horário local, rumo a Porto Velho (RO), precisou ser revistado devido a uma ameaça de bomba. Segundo a assessoria de comunicação da empresa, o avião pousou por volta das 22h50 na capital Porto Velho. Nenhum explosivo foi encontrado na aeronave, de acordo com o sargento Lúcio Heleno, da Companhia de Operações Especiais (COE) da Polícia Militar do Estado de Rondônia. O coordenador do Centro Integrado de Operações de Rondônia (Ciop), major Marques, detalhou que Polícia Militar, o Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) e o esquadrão antibombas da Companhia de Operações Especiais (COE) da Polícia Militar foram chamados para investigar a denúncia e analisar a situação da aeronave. Os trabalhos de revista duraram algumas horas, mas foram concluídos ainda na madrugada, por volta das 4h. Segundo a empresa, a ameaça foi detectada a partir de uma ligação anônima feita na noite de sábado, em relação à presença de bombas no voo O6 6187, que levava 88 passageiros e cinco tripulantes. A Avianca, então, entrou em contato com a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) e a Polícia Federal para manter a segurança dos passageiros a bordo. Logo que o avião chegou ao Aeroporto Internacional de Porto Velho, em Rondônia, os passageiros tiveram que esperar cerca de 30 minutos a autorização da torre, para então começar a desembarcar, conforme a assessoria da Avianca. (Agência Brasil)

Governo recua em plano de usinas hidrelétricas no Parque do Juruena Por Daniel Rittner | De Brasília

O governo retirou duas usinas hidrelétricas polêmicas no rio Juruena da lista de projetos que vão reforçar a oferta de energia nos próximos dez anos. A desistência - pelo menos temporária - fez com que grupos de defesa do meio ambiente respirassem aliviados: um parque nacional com quase dois milhões de hectares, o equivalente ao tamanho de Israel, seria reduzido para acomodar as hidrelétricas de São Simão Alto e Salto Augusto Baixo. Juntas, elas têm capacidade prevista de 4,9 mil megawatts. Localizados em pleno Parque Nacional do Juruena, o quarto maior do país, os dois projetos são o terror dos ambientalistas: podem afetar 42 espécies de animais ameaçados de extinção, que só existem naquela região, e colocar em risco corredeiras vitais para a migração de peixes. Estima-se que, para a construção das usinas, seria necessário alagar 40 mil hectares de áreas protegidas. Contra essas hidrelétricas, encravadas na divisa de Mato Grosso com o Amazonas, um abaixo-assinado capitaneado pela WWF Brasil conquistou a adesão de 22 mil pessoas. As assinaturas da campanha SOS Juruena, Continuação da Resenha Diária 29/9/14 19 pedindo o abandono dos empreendimentos, foram encaminhadas ao Ministério de Minas e Energia. Até o presidente do Instituto Chico Mendes (ICMBio), Roberto Vizentin, aderiu à campanha. "O parque é o coração de um mosaico de unidades de conservação e constitui uma barreira para o avanço do desmatamento na Amazônia", afirma o superintendente de conservação da WWF Brasil, Mauro Armelim. O novo plano decenal de energia, que lista os projetos do governo para o setor elétrico no horizonte 2014-2023, excluiu as duas usinas. Elas constavam das versões anteriores do planejamento elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). No relatório do ano passado, estavam previstas para entrar em operação em janeiro de 2022. São Simão Alto tem capacidade prevista para 3.509 MW. O projeto de Salto Augusto Baixo é para 1.461 MW. A potência somada equivale a cerca de dois terços do complexo hidrelétrico que está sendo construído no rio Madeira (RO). Procurada pela reportagem do Valor durante quatro dias, a EPE não deu entrevista sobre o assunto e nem quis responder uma pergunta crucial: a retirada do plano decenal caracteriza o abandono da ideia de erguer as duas usinas ou significa que é preciso ter mais tempo para estudar esses projetos? "A nossa esperança é que o governo tenha entendido que algumas hidrelétricas são mais complexas do que outras. No caso das hidrelétricas do rio Juruena, seria inviável seguir adiante", opina Armelim. A EPE já havia excluído do horizonte de planejamento três projetos localizados no rio Jamanxim, um importante afluente do rio Tapajós que corta o Pará, devido à proximidade de terras indígenas e à complexidade do processo de licenciamentio ambiental. As hidrelétricas de Jamanxim, Cachoeira do Caí e Cachoeira dos Patos - com 2,2 mil MW no total - estavam previstas para 2019, mas saíram dos planos no ano passado. Agora, o grande desafio dos ativistas é discutir o futuro das megausinas do Tapajós. A primeira delas, São Luiz do Tapajós (8 mil MW), chegou a ter leilão marcado para dezembro. O certame foi adiado, mas o pedido de licença prévia ambiental já foi feito ao Ibama. O outro projeto é Jatobá, com 2,3 mil MW, ainda sem previsão de licitação.

Seca reduz receita de cidades do interior de SP Por Vanessa Jurgenfeld, Marta Watanabe e Rodrigo Pedroso | De São Paulo

Os efeitos da prolongada seca sobre as cidades do interior de São Paulo vão desde a queda no turismo em cidades que vivem das atrações do rio Tietê, passam por diminuição da operação de empresas de transporte fluvial e de grãos até um recuo na safra de cana de açúcar e hortaliças. Os municípios estimam que não deverão atingir a previsão inicial de receita para o ano. Apontam queda no recolhimento do Imposto sobre Serviços (ISS), além de perdas no valor adicionado de alguns setores de até 50%, o que deve reduzir o repasse do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nos próximos anos. Sertãozinho, Promissão, Pederneiras, Barra Bonita e Guararapes são alguns dos locais que relatam problemas decorrentes da seca. O clima difícil, segundo secretários dos municípios e prefeitos, se soma a um ano de atividade econômica mais fraca em diferentes setores e serve de aditivo a outros problemas mais antigos. Algumas cidades, por exemplo, já vinham sofrendo retração econômica por outras razões, como os efeitos da política de combustível do governo federal, que segurou o preço da gasolina para conter a inflação, prejudicando os produtores de etanol. Outros municípios sediam empresas exportadoras, que estão com mais dificuldades para exportar com o real valorizado. "No nosso PIB, a agroindústria representa cerca de 60%, portanto a seca impacta os negócios da agroindústria e, consequentemente, as receitas do município. Com a seca prolongada, há menos cana para moer. O impacto econômico no município vai da moagem à produção industrial de fabricantes de equipamentos para o setor sucroalcooleiro, até as empresas de prestação de serviços a esse setor e ao comércio da cidade", diz o secretário de Indústria e Comércio de Sertãozinho, Carlos Roberto Liboni. A seca levou à antecipação do fim da safra de cana na maioria das usinas da região de Sertãozinho, que abriga cerca de 20. Entre elas, estão unidades de grupos como Louis Dreyfus Commodities, Balbo, São Martinho e Bunge. "Normalmente, a cana é moída até novembro, ou começo de dezembro. Agora, algumas usinas vão parar já neste mês", diz Liboni. Isso significa que funcionários que geralmente eram dispensados em novembro, serão agora dispensados em setembro, prejudicando o movimento econômico local. Em Pederneiras, a seca afetou empresas que trabalham com transporte pela hidrovia Tietê-Paraná e as que operam silos para armazenagem de grãos e outras mercadorias. Na cidade, geralmente a carga que chegava do Centro- Oeste pela hidrovia era colocada em trens para ser levada até o porto de Santos. Com a impossibilidade de navegação desde maio em um dos trechos da hidrovia, localizado entre os municípios de Andradina e Buritama, as empresas que produzem grãos deixaram de transportá-los por ali e isso reduziu o volume de cargas em Pederneiras, com efeitos sobre a sua receita. A Tietê-Paraná é a mais importante hidrovia em movimentação de cargas no país, usada principalmente no escoamento de soja e minério de ferro. Daniel Camargo, prefeito de Pederneiras, estimou que 90 pessoas tenham sido demitidas no município e que houve mil demissões, se considerados também outros municípios próximos à hidrovia. A MRS Logística foi uma das empresas que constataram redução do volume de cargas na região, mas ela informou que não houve demissões. Uma parte das cargas que antes chegava pela hidrovia passou a chegar por caminhões e continua sendo despachada pelo trem. A empresa informou que não demitiu funcionários, mas que houve um remanejamento dado o volume menor de cargas. Em Barra Bonita, o efeito foi diferente. Antonio Marcos Gava Júnior, secretário de Cultura e Turismo da cidade, conta que as notícias sobre a falta de chuva afetaram mais o município do que a seca em si. "A desinformação afetou o turismo na cidade", diz. Ele conta que embora a Tietê-Paraná possua um ponto com navegação de carga suspensa, o trecho do rio em Barra Bonita continua com nível suficiente de água para a navegação turística. O problema, diz, é que Continuação da Resenha Diária 29/9/14 20 com as notícias de seca e interrupção da hidrovia, os turistas imaginaram que os passeios também pararam, o que não ocorreu. Segundo Gava, a navegação turística chegou a cair entre 30% e 50% nos últimos meses, em relação a igual período do ao ano passado, o que afetou a economia mais dependente do turismo, como hotéis, restaurantes, lojas de artesanato e empresas que fazem os passeios. A frequência de turistas, após divulgação sobre a continuidade dos passeios, começa a voltar ao nível normal agora, diz ele. Cerca de 300 mil pessoas ao ano fazem o passeio pelo rio Tietê, de acordo com o secretário. Em Promissão, a situação se agravou porque depende de agricultura. "Como desde novembro está faltando chuva, a economia do município está muito fragilizada. As empresas não estão pagando fornecedores, porque está havendo quebra [de safra] e isso se reflete muito no comércio em geral", disse o prefeito Hamilton Foz. Entre quebras, Foz cita a cana de açúcar e efeitos da seca sobre o setor de alimentos. Ele diz que o ramo de carnes está sendo prejudicado pelo pasto mais seco. Sem a pastagem, as empresas precisam gastar mais com ração para a engorda do gado. Também houve redução da bacia leiteira, que tem empresas como a Promilat e a Promileite. De 50 mil litros/dia, hoje a bacia leiteira do município está em somente 25 mil litros/dia. Além disso, um terço de Promissão é composto por assentamentos da reforma agrária. Essas famílias produzem principalmente hortifrutis, cuja quebra foi de 70%. Um dos aspectos mais críticos é que a situação de queda de receita vem ao mesmo tempo em que esses municípios se deparam com um aumento de custos; ou por demanda dos serviços de saúde, por conta dos problemas causados pela própria seca, ou porque agora gastam mais para captar água. A diretora de finanças da prefeitura de Guararapes, Cristina Caparroz, diz que o nível da represa no município ficou tão baixo que desde julho a prefeitura precisou colocar duas bombas para puxar a água, o que resulta em gasto de cerca de R$ 30 mil mensais com diesel. As bombas consomem cerca de 400 litros do combustível ao dia. Além disso, pelo menos dois funcionários foram deslocados para o serviço. Como o trabalho se estende das seis da manhã até a meia-noite, gera também pagamento de horas extras. Nem todos os municípios já contabilizaram impactos relevantes da contração econômica em suas contas até junho, mas prefeitos e secretários dizem que isso ocorrerá mais intensamente a partir deste mês. Hamilton Foz, de Promissão, diz que deve ocorrer neste ano retração de 5% em relação à perspectiva inicial de receita, que era de R$ 80 milhões. Em Sertãozinho, a previsão de receita no ano era de R$ 370 milhões, mas esse número também será revisado, segundo Liboni. "A indústria de Sertãozinho é toda dedicada à cadeia do açúcar e álcool. Quando para a usina, para a cadeia produtiva como um todo, dos serviços até o comércio", disse ele, que estima 8% a 9% de queda nos repasses do ICMS para o ano que vem. A crise do etanol já havia levado o município a uma perda anual de ICMS de 10% nos últimos dois anos. Em Pederneiras, o prefeito estima queda de 40% a 50% no valor adicionado da cadeia de transporte e armazenagem de cargas. Este setor é um dos mais importantes para a economia do município. Ele representou um valor adicionado de R$ 200 milhões em 2013. A redução de atividades dessas empresas deve refletir-se consequentemente no repasse de ICMS nos próximos anos, segundo ele. Em Guararapes, Cristina estima que a prefeitura deixará de receber este ano cerca de R$ 800 mil com o ISS recolhido pelas usinas de açúcar e álcool, por conta de perda de produção. Trata-se de valor significativo para o município, que em 2013 obteve receita total de R$ 2,84 milhões com o imposto. Até setembro, o recolhimento de ISS somou R$ 1,5 milhão, informa a prefeitura. A queda de receita já leva ao adiamento de alguns investimentos. Cristina cita que entre os contingenciamentos de Guararapes estão recapeamento de ruas e também desembolsos, como a compra de medicamentos. Com a finalização da colheita em novembro, estima a diretora da prefeitura, haverá perda de 25% na cultura de cana, de 50% a 60% no milho não irrigável e perda total no feijão não irrigável. A quebra na colheita não deve trazer impacto direto para a prefeitura este ano, mas deve contribuir negativamente para o cálculo do valor adicionado no município e, consequentemente, no índice de participação da prefeitura na arrecadação estadual de ICMS para os próximos anos. Liboni, de Sertãozinho, afirma também que alguns investimentos ficarão prejudicados, como a duplicação do acesso ao distrito industrial do município, que era para ser realizada neste ano, mas não deve sair do papel em 2014. Na sexta-feira, iniciou-se um programa para redução de vazão nas usinas de Porto Primavera e Jupiá, com o objetivo de restabelecer o nível de água das represas de lha Solteira e Três Irmãos, usina localizada em Andradina. Entre esse município e o de Buritama fica o trecho em que a navegação de cargas foi suspensa em junho na hidrovia Tietê-Paraná. Com a redução de vazão, a expectativa da Secretaria de Transportes do Estado de São Paulo é restabelecer o nível navegável da hidrovia em 90 dias.

Demanda russa aquece mercado de carnes Por Alda do Amaral Rocha e Luiz Henrique Mendes | De São Paulo

Ainda que as estatísticas oficiais não revelem, o aumento da demanda da Rússia já sustenta os preços das carnes brasileiras, principalmente de aves e suínos. Fontes da indústria relatam incremento nos preços em dólar dos produtos destinados àquele país desde que Moscou anunciou que mais de 80 novos estabelecimentos de carnes (de frango, suína e bovina) do Brasil poderiam vender à Rússia, em 8 de agosto. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 21

A medida foi um desdobramento da decisão da Rússia de retaliar produtos, como carnes e lácteos, provenientes dos Estados Unidos, Canadá, Austrália e União Europeia, após sofrer sanções econômicas do grupo por conta do conflito na Ucrânia. Uma das empresas que tem sido favorecida pela maior demanda da Rússia é a Aurora Alimentos, de Santa Catarina. Segundo o presidente da Aurora, Mário Lanznaster, há um incremento de 30% nos volumes de carne de frango embarcados para a Rússia e os preços ao país subiram cerca de 12% na comparação com os valores negociados antes do embargo russo a americanos e europeus. Mas Lanznaster tem os pés no chão e avalia que o aumento da demanda é temporário. "Vai durar o tempo do conflito [da Rússia] com a Ucrânia". O presidente da Associação Catarinense de Avicultura (ACAV), Luiz Adalberto Stábile Benício, também é cauteloso e diz que as empresas de aves não estão elevando a produção para atender a Rússia, um cliente reconhecidamente "instável". A estratégia das indústrias, explica, é deixar de atender mercados que pagam menos para vender à Rússia. A Aurora, por exemplo, está deixando de vender alguns cortes para a China para vender ao mercado russo, confirma Lanznaster. Em mais uma demonstração de cautela, o presidente da ACAV lembra que a Rússia busca autossuficiência na produção de frango, "portanto a demanda maior não deve ser algo perene". Assim, a estimativa da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) de que seja possível ampliar em 150 mil toneladas as vendas de carne de frango à Rússia soa otimista. Para Benício, o volume deve ser "mais modesto". Para o vice-presidente de aves da ABPA, Ricardo Santin, as sanções russas já favorecem o Brasil. "O mercado já responde bem. Nos primeiros quinze dias de setembro, exportamos para a Rússia mais do que vendemos em todo o mês de agosto", afirma. Os embarques de carne de frango para ao país saltaram de um média mensal de 5 mil toneladas entre janeiro e julho para 8 mil toneladas em agosto. Já em setembro, a expectativa é a que os embarques superem 20 mil toneladas. Santin confirma que os preços da carne de frango vendida aos russos subiram. Mas pondera que o aumento não aparece, à primeira vista, nas estatísticas da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Uma das razões é que peças como coxa e sobrecoxa, que têm preço mais baixo, são contabilizadas pela Secex na mesma categoria - Nomeclatura Comum do Mercosul (NCM) - que o peito, que tem preço maior. Com o embargo, a Rússia ampliou as importações de coxa e sobrecoxa do Brasil - antes comprava dos EUA. Com isso, o preço médio das exportações brasileiras até caiu. No acumulado de setembro até o dia 14, o preço médio da carne de frango foi de US$ 2,55 o quilo, queda de 6,94% sobre a média de agosto, segundo a ABPA. Só na primeira quinzena do mês, a receita com as vendas de frango à Rússia somou US$ 20,6 milhões, acima dos US$ 15,8 milhões de todo o mês de setembro de 2013. No caso da carne bovina, também houve incremento de preços nas vendas à Rússia, mas já começa a haver pressão por parte de importadores por redução. Uma fonte de frigorífico afirma ter ocorrido um avanço entre 5% e 10% nas cotações em relação aos preços anteriores à retaliação russa aos EUA e à UE. "Não é muita coisa, mas o suficiente para aquecer o mercado", diz. Segundo a mesma fonte, a alta só não foi maior por conta da queda do real ante o dólar - com isso, as empresas recebem mais reais a cada dólar negociado. Os russos compram sobretudo cortes de dianteiro do Brasil, cotados hoje entre US$ 4,5 mil e US$ 5 mil por tonelada. Também demandam os chamados "cortes da roda", como coxão mole. Outra fonte da indústria diz que "a percepção é de que os preços de venda para o mercado russo bateram no teto". Ele lembra que a menor oferta de carne bovina no mundo já vinha sustentando os preços de venda para a Rússia mesmo antes das sanções. Agora, afirma, os importadores russos começam a pressionar para derrubar os preços, pois suas margens despencaram. A razão é que o rublo, assim como o real, está em queda em relação ao dólar. Isso significa que é preciso mais rublos para cada dólar de carne importada. Para o presidente da Associação Brasileira das Indústria Exportadoras de Carnes (Abiec), Antonio Camardelli, uma elevação mais significativa nas exportações de carne bovina para a Rússia só deve ocorrer no fim de setembro, com os primeiros embarques de miúdos - o país ficou cerca de cinco anos sem exportar. "Acredito que vamos ter variação positiva no fim do mês, com os negócios de miúdos", diz Camardelli. Até agora, porém, o fluxo de embarques de carne bovina para a Rússia segue "normal", segundo ele, e não houve grandes alterações nos preços. Mas isso pode se mudar caso a Rússia destine mesmo a cota de embarques de carne bovina dos EUA e da UE para outros países, como Brasil e Paraguai. "Se acontecer essa transferência de cotas, o Brasil está pronto para responder", afirma. Camardelli não confirma, mas o Valor apurou que algum tipo de transferência de cotas deve ocorrer. Para 2014, EUA e UE tinham uma cota somada de 120 mil toneladas de carne bovina congelada. Nem todo esse volume seria transferido, uma vez que boa parte já foi embarcada. Nas primeiras três semanas de setembro, os embarques de carne bovina ao mercado russo alcançaram US$ 100,8 milhões - foram US$ 122,5 milhões em todo o mês de setembro de 2013. Em carne suína, a avaliação é de que a Rússia já vinha ampliando as compras do Brasil e que esse movimento continua. "Desde fevereiro e março, o volume comprado pela Rússia vem subindo", afirma Rui Vargas, vice-presidente de suínos da ABPA. Nas primeiras três semanas de setembro, o país comprou 11,4 mil toneladas de carne suína do Brasil - mais de 40% do total de 24 mil toneladas vendidas, segundo dados da Secex compilados pela ABPA. Em março, essa taxa era de 22%. O valor das vendas no período alcançou US$ 58 milhões ante US$ 32,2 milhões de todo mês de setembro de 2013. Embora os preços médios na exportação de carne suína indiquem uma certa estabilidade, há relatos no mercado de cortes de pernil para a Rússia sendo negociados a US$ 6 mil por tonelada.

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Coordenadora da campanha de Marina minimiza queda em pesquisa Por Gustavo Brigatto | Valor

SÃO PAULO - A candidata a deputada federal pelo PSB e coordenadora da campanha de Marina Silva à presidência da República, Luiza Erundina, minimizou a queda nas intenções de votos. No Datafolha divulgado na sexta- feira, Marina caiu de 30% para 27%, contra uma alta, na mesma proporção, de Dilma Rousseff, que chegou a 40%. “Não adianta dizer que não é verdade. A pesquisa é verdade na hora em que ela ocorre. Mas esse processo é muito dinâmico. Há ainda uma massa de indecisão, de indefinição. A margem de expectativa de mudança ainda é muito alta”, disse ela. Erundina lembrou ainda de quando foi candidata e ganhou a prefeitura de São Paulo. Segundo ela, nas pesquisas de intenção de votos feitas em 1988, ela aparecia como a 3ª colocada. Mas acabou vencendo a disputa e governou a cidade entre 1989 e 1992. “Hoje a Marina está muito melhor”, disse. Erundina participou hoje de uma carreata e de um comício para apresentar as propostas de Marina Silva à população de São Paulo. As comitivas partiram de quatro regiões da cidade e do grande ABC, e se encontraram no Largo da Batata, na Zona Oeste da cidade. O encontro teve baixa adesão, reunindo cerca de 100 pessoas, entre membros do PSB, candidatos a deputado estadual e seus apoiadores. Marina Silva e seu vice, Beto Albuquerque, não participaram do evento. De acordo com Erundina, a mobilização de rua será a grande arma de Marina na última semana de campanha. Grandes centros, com maior contingente de eleitores, serão os principais alvos dessa estratégia. “Nós vamos nos dividir. A Marina sozinha, em poucos dias, não vai suprir a necessidade de presença dela”, disse. Segundo Erundina, essa presença maciça da militância é uma forma de contornar a baixa exposição da candidata, que tem pouco espaço na TV e poucos recursos para financiar a campanha. “Eu percorri a Zona Leste de São Paulo ontem e você não vê material da Marina. É uma candidata quase invisível. Isso é uma realidade”, disse. Erundina defendeu ainda uma reforma nos meios de comunicação de massa no Brasil. Segundo ela, essa medida é necessária para a democratização do acesso à informação no país. “É diminuir o oligopólio, a propriedade cruzada [quando um mesmo grupo é dono de rádios, TVs e publicações impressas], espalhando um pouco os meios de comunicação de massa pelas várias regiões do país”, disse, durante carreata e comício para apresentar as propostas de Marina Silva à população de São Paulo. De acordo com Erundina, a proposta não é a mesma defendida pelo PT, que prevê o chamado controle social da mídia. “Não é controle social da mídia. É dar ao atual conselho de comunicação social, que foi criado na Constituição de 88 e regulamentado no início dos anos 90, as condições para discutir e negociar as políticas de concessões”, disse. “Isso tem que ser negociado. Não vai se impor nada. É uma discussão que vai evoluir naturalmente com os concessionários atuais”, completou. A coordenadora da campanha de Marina disse que o assunto da regulação da mídia não entrou nas discussões do programa. Segundo ela, essa é uma tese defendida por ela própria e também pelo PSB. A deputada disse acreditar, no entanto, que haveria espaço para discutir o assunto caso Marina seja eleita.

Renda e consumo definem escolhas do eleitor brasileiro Por Camilla Veras Mota, Adriana Mattos, Tainara Machado e Felipe Marques | De São Paulo

A despeito da piora de indicadores macroeconômicos, como inflação e crescimento econômico, e da melhora dos sociais, como o da desigualdade, os dados que mostram maior correlação com intenções de voto são evolução da renda e capacidade de consumo. Nos Estados onde a renda cresce mais, como Piauí e Maranhão, a presidente Dilma Rousseff (PT), com mais da metade das intenções de voto, tem desempenho melhor que Marina Silva (PSB). Nos Estados onde a renda avançou menos, Aécio Neves (PSDB) e Marina estão em melhor posição na disputa eleitoral. A candidata do PSB também tem a preferência nos Estados onde o consumo caiu em relação ao ano passado, como São Paulo e Distrito Federal. Para Christopher Garman, diretor de pesquisas para mercados emergentes do Eurasia Group, o quadro "faz todo o sentido". A variação da renda, em sua avaliação, é a medida de bem-estar mais sensível entre os indicadores da economia que traduzem, para os eleitores, a percepção de ascensão ou perda. O cientista político pondera, ainda, que a renda cresceu de forma mais significativa entre as famílias mais pobres, o que explica a larga vantagem de Dilma na Região Nordeste. "A variável que mais importa para a sensação de bem-estar econômico é o delta [variação] de renda", diz Garman. Garman explica que o aumento da renda não vem necessariamente acompanhado da redução do desemprego ou da desigualdade. "Grandes segmentos da sociedade podem passar das classes D e E para a classe média e, ainda assim, haver um aumento do Gini [indicando aumento da desigualdade], caso o ganho de renda dos ricos seja maior nesse processo", observa o diretor do Eurasia. Regiões onde o consumo sofreu desaceleração mais acentuada são aquelas em que há maior intenção de voto em Marina. O aumento da inflação nos últimos anos, por sua vez, ajudou a piorar a avaliação da situação econômica das famílias, diz Aloísio Campelo, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).

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PF prende ex-senador Luiz Estevão em Brasília

BRASÍLIA - A Polícia Federal prendeu na manhã deste sábado (27) o ex-senador Luiz Estevão, acusado de superfaturamento do Fórum Trabalhista de São Paulo. Ele foi detido em casa, em Brasília, e será levado ainda nesta manhã para São Paulo. Luiz Estevão deve passar o fim de semana na Superintendência da PF em São Paulo e, na segunda (29), será encaminhado para um dos presídios da capital paulista. Os policiais cumpriram uma decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli, que determinou na quinta (25) a prisão imediata do ex-senador. A decisão de Toffoli foi enviada para a Justiça Federal de São Paulo, responsável pela execução da pena de Estevão. Entre os processos que responde, Estevão foi condenado a três anos e seis meses por falsificação de documento. De acordo com o Ministério Público, a fraude teria ocorrido em livros contábeis para alterar valores das obras do Fórum numa tentativa de ocultar o superfaturamento. Com isso, ele evitaria que seus bens fossem bloqueados pela Justiça para ressarcir danos ao erário. Apesar de a legislação permitir que penas de inferiores a quatro anos sejam cumpridas no regime aberto ou através de medidas alternativas - como a prestação de serviços comunitários- Estevão, devido ao histórico de irregularidades não obterá o benefício e deve ir para o semiaberto. Nesse tipo de regime, o preso somente passa a noite na cela, podendo ficar a maior parte do dia no pátio do presídio ou até mesmo trabalhando fora da cadeia se tiver autorização da Justiça para tal. A decisão da prisão de Estevão foi tomada após o ex-senador apresentar um recurso ao STF que foi considerado como meramente protelatório por Toffoli. Ou seja, a estratégia era somente adiar o início do cumprimento da pena. Estevão teve o mandato de senador cassado por quebra de decoro parlamentar em 2000. Ele foi acusado de participar do esquema de superfaturamento e desvio de recursos durante a construção da sede do TRT (Tribunal Regional do Trabalho) de São Paulo, na década de 90. Por causa do escândalo, o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, conhecido como Lalau, foi preso e condenado. Em valores atualizados, o desvio das obras chega a pouco mais de R$ 1 bilhão de acordo com cálculos da Justiça em São Paulo. (FolhaPress)

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EUA reconhecem ter subestimado jihadistas

Pelo menos 8 milhões de iraquianos e sírios estão sob o domínio de 31 mil jihadistas liderados por Abu Bakr Al- Baghdadi e se submetem às decisões do conselho consultivo (shura), que impôs a populações inteiras a versão mais fundamentalista da sharia (lei islâmica). Jamais passava pela cabeça do presidente americano, Barack Obama, que o Estado Islâmico (EI) ganharia tanta força e representaria uma ameaça ao Ocidente. Em entrevista à tevê CBS, Obama reconheceu, pela primeira vez, que os EUA subestimaram a capacidade do grupo extremista e exageraram a habilidade das forças iraquianas em lidar com a facção. “Sim, é verdade. Isso é absolutamente verdade”, respondeu o mandatário, ao ser indagado se James Clapper, diretor da Inteligência Nacional, estava certo ao afirmar que Washington minimizou o que estava ocorrendo na Síria. “O que aconteceu com o Estado Islâmico foi que você tinha a Al-Qaeda no Iraque, que era um grupo vicioso, mas nossos marines foram capazes de reprimi-la, com a ajuda das tribos sunitas”, explicou Obama. “Ao longo dos últimos anos, durante o caos da guerra civil síria, onde há imensas porções do país completamente desgovernadas, (os jihadistas) foram capazes de se reconstituir e tomar vantagem do caos”, acrescentou o presidente, segundo o qual o EI se tornou o “marco zero para os jihadistas ao redor do mundo”. Para Jens David Ohlin, professor de direito da Universidade de Cornell (em Ithaca, Nova York), a ascensão dos extremistas foi propiciada pelo fracasso da Casa Branca em desenvolver uma estratégia coerente para lidar com a guerra civil síria. “Foi uma situação difícil. Ninguém desejava apoiar (o ditador Bashar) Al-Assad ou a oposição jihadista que o combatia. Muitos países nada fizeram, e o Estado Islâmico floresceu nesse vácuo”, explicou ao Correio, por e- mail. “Está claro que os EUA subestimaram a capacidade militar e a determinação dos terroristas.” Ohlin entende que a única tática possível é uma solução militar para privar o EI de controle territorial, o que exigiria a presença de forças terrestres. Professor de história e de ciência política da Universidade Vanderbilt, em Nashville (Tennessee), Thomas Schwartz aposta que o mea-culpa de Obama deve ter sido complicado para o democrata. “Presidentes não gostam de confessar erros, pois sabem que os rivais utilizarão isso contra eles”, lembra. O especialista concorda com Ohlin sobre o envio de tropas e reconhece a relutância de Washington em fazê-lo. “Se Bagdá obtiver apoio da população sunita, pode haver esperança de uma derrota do EI”, afirma à reportagem.

Front Os militantes do EI intensificaram a pressão sobre a cidade de Ain Al-Arab, também chamada de Kobane (norte da Síria), na fronteira com a Turquia, apesar dos ataques da coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos. Mais de 160 mil dos 400 mil moradores fugiram para o país vizinho. Por telefone, Idris Nassan, vice-ministro das Relações Exteriores do cantão curdo de Kobane, disse ao Correio que o local está sob cerco dos jihadistas há mais de um ano. “Nas últimas duas semanas, têm havido intensos combates no entorno. Todas as passagens que levam à cidade estão bloqueadas, e faltam bens essenciais”, contou. De acordo com ele, os refugiados que chegaram ao território turco se abrigaram em praças e em parques. “Hoje (ontem), foi um dia muito ruim para eles, pois choveu bastante. A situação é péssima para as pessoas que estão na fronteira. Elas vivem em meio à lama, sem água e sem comida. Precisam de ajuda urgente da comunidade internacional.” Nassan diz que os ataques aéreos não são suficientes para deter os jihadistas e pede uma aliança entre a coalizão internacional e as Unidades de Proteção Popular (YPG), forças curdas que combatem o EI há mais de um ano. “Elas necessitam de ajuda e de armas”, afirma. Também morador de Kobane, Berwer Mohammed Ali, 28 anos, disse ao Correio que os terroristas usam armamentos pesados contra os civis e contra as YPG. “Nos vilarejos a oeste da cidade, o EI executou dois terços dos habitantes e sequestrou 28 integrantes de uma mesma família”, contou. Segundo Berwer, apesar de a população de Kobane ser muçulmana, o Estado Islâmico a considera apóstata. “Nós estamos prontos para o confronto. Eles não vão invadir”, prometeu, por telefone. Em Raqqa, bastião do EI, os caças da coalizão bombardearam um aeroporto e um campo de treinamento. Ontem, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse que o país “não pode ficar de fora” da aliança militar. A Frente Al-Nusra, braço da rede Al-Qaeda na Síria, voltou a fazer ameaças aos EUA e aliados. “Seus dirigentes não serão os únicos a pagar o preço dessa guerra. Vocês também vão pagar”, advertiu Abu Mohammad Al-Jolani, líder da organização, em mensagem de áudio divulgada pela internet e dirigida “à população dos Estados Unidos e da Europa”. “Se os ataques aéreos não cessarem, transferiremos a batalha para as casas de vocês.” Diretor do Projeto de Inteligência da Brookings Institution (em Washington) e ex-analista da Agência Central de Inteligência (CIA), Bruce Riedel fez uma previsão aterradora. “Veremos mais execuções de reféns ocidentais no Oriente Médio e no norte da África. Um grande ataque terrorista é provável na Europa”, opinou, por e-mail.

"Durante o caos da guerra civil síria, (…) os jihadistas foram capazes de se reconstituir” Barack Obama, presidente dos Estados Unidos

Confronto aberto a 144 horas das urnas

A apenas uma semana do primeiro turno das eleições, os candidatos ao Palácio do Planalto protagonizaram, na noite de ontem, um debate morno e com poucas propostas, mas que serviu de teste para o último embate antes das eleições, que acontece na quinta-feira. A presidente Dilma Rousseff, que tenta a reeleição, foi a principal vidraça. Todos Continuação da Resenha Diária 29/9/14 25 os adversários aproveitaram as perguntas, réplicas e tréplicas para fustigar a petista. Corrupção na Petrobras, o fantasma da inflação, a situação de penúria dos aposentados, crise econômica e até a política externa brasileira foram temas explorados pelos dois principais concorrentes: o senador Aécio Neves (PSDB) e a ex-ministra Marina Silva (PSB). Em alguns momentos, o tucano e a pessebista, que disputam uma vaga no segundo turno contra Dilma, polarizaram, principalmente sobre a manutenção das políticas sociais da gestão petista. A presidente Dilma utilizou a estratégia de atacar os dois. Sempre que teve oportunidade, escolheu questionar um deles. Nas respostas, abusou dos números e dados oficiais. Insistiu no pedido de direito de resposta sempre que alguém criticava o governo federal. Após três solicitações seguidas, conseguiu 30 segundos para responder sobre corrupção. O formato do debate, com confronto entre os chamados nanicos, não ajudou o embate mais direto entre os três principais candidatos.

A criação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, já revogada) foi o primeiro ponto polêmico na discussão. No primeiro bloco, a presidente Dilma questionou Marina sobre a mudança de posicionamentos. “A senhora mudou de partido quatro vezes e mudou de posição de um dia para o outro em temas importantes como a CLT, a homofobia e o pré-sal”, provocou a petista. Em seguida, Dilma questionou qual tinha sido o voto da então senadora quanto à CPMF. “Mudei de partido para não mudar de ideais e de princípios”, rebateu pessebista sobre a provocação da petista. “A CPMF começou em 1993, com várias etapas”, explicou a ambientalista.

Petrobras A presidente também protagonizou troca de acusações com o candidato tucano. Dilma acusou Aécio de pretender privatizar a Petrobras. “Num discurso seu na Câmara, em 1997, o senhor disse que pode chegar o momento de discutir a privatização da Petrobras. E recentemente você disse que a Petrobras não está no ‘radar’ de privatizações do PSDB. Quais estão?”, perguntou Dilma. Aécio aproveitou o questionamento para citar o ex-diretor da Refino e Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, envolvido num dos maiores escândalos de corrupção do país. “Ao contrário, eu vou reestatizá-la. Vou devolver para o povo brasileiro. Me estranha que não haja da parte da senhora um sentimento de indignação com essa corrupção que estava acontecendo nas suas barbas”, completou o senador mineiro. Aécio também citou uma denúncia publicada pela edição desta semana da revista Veja, segundo a qual o ex-ministro Antônio Palocci teria pedido cerca de R$ 2 milhões ao ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa para a campanha de Dilma, em 2010. Em outro momento do debate, o tucano duelou com Marina. “Quem vai decidir é a sociedade brasileira”, respondeu a pessebista, de forma vaga, quando questionada sobre “quem decide a manutenção dos programas sociais” em uma eventual eleição da ex-ministra. Aécio Neves aproveitou a brecha deixada por Marina. Escolhido por um jornalista para comentar a resposta da ambientalista, disse: “No meu governo serei eu que irei decidir", cravou, garantindo que manterá os programas sociais. Nas alegações finais, os candidatos utilizaram argumentos para pedir os votos dos eleitores.

Aécio: "Um não à corrupção"

São João del-Rei (MG) — O candidato do PSDB à Presidência da República, senador Aécio Neves, relembrou os primeiros passos na política e citou os ensinamentos de seu avô, o ex-presidente Tancredo Neves, como principais motivações para a última semana de campanha. A sete dias das eleições, o tucano visitou a terra natal de Tancredo e usou um tom emocional ao falar sobre a trajetória. Em São João del-Rei, ele apontou o avô como exemplo de homem público que não se envolveu em escândalos de corrupção e falou sobre a importância de resgatar os valores da ética na administração federal. “Uma semana nos separa das eleições e não tem lugar melhor do que a terra de meu avô Tancredo e de Tiradentes para garantir que a decência e a vida pública podem caminhar juntas no Brasil. E essa sinalização precisa partir de Minas. Temos que falar um não à corrupção e sim a um governo correto, regido pela ética.” O tucano citou também o ex-presidente Juscelino Kubitschek, ressaltando a presença histórica de mineiros no Palácio do Planalto e destacando “valores históricos de decência e honra” do povo mineiro. Em seu discurso para lideranças da cidade e de outros municípios vizinhos, da região do Campo das Vertentes, Aécio pediu a confiança dos mineiros para chegar ao segundo turno e que “redobrem os esforços na reta final” por sua candidatura. Ao lado do governador Alberto Pinto Coelho (PP), do candidato ao Senado Antonio Anastasia (PSDB) e do candidato ao governo de Minas Pimenta da Veiga (PSDB), o senador relembrou que foi em São João del-Rei, no início de junho, que ele deu início à sua campanha para a Presidência, repetindo o gesto do avô, que visitava a cidade em datas importantes. “Venho à minha casa, à minha causa, que sempre foi Minas. Como é bom você poder, depois de 30 anos, caminhar pelas mesmas calçadas de pedras e reencontrar os mesmos amigos e olhar de cabeça erguida e poder dizer: eu honrei cada dia desses 30 anos que vocês confiaram em mim. Foi aqui nesta terra que recebi os primeiros estímulos e exemplos que levei ao longo desses 30 anos. Quis o destino que fosse eu, filho dessa terra, o responsável a mostrar ao país que podemos ter um país mais decente. Há 60 anos foi Juscelino (Kubistchek), há 30 foi Tancredo, outro mineiro que nos liderou na busca pela democracia, agora nos unimos mais uma vez em uma nova disputa”, discursou.

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Cerimônia Na parte da manhã, Aécio aproveitou a agenda na cidade para batizar os filhos gêmeos, Bernardo e Julia. Os filhos de Aécio nasceram em junho e pela primeira vez foram trazidos à cidade natal de Tancredo. Durante o evento, o candidato pediu para não falar sobre eleições e temas da campanha. Ao lado de sua mulher, Letícia Weber, e com os dois filhos no colo afirmou na porta da igreja já se considerar um vitorioso. “Sou ou não vitorioso? Não preciso nem disputar as eleições. Eu já ganhei”, disse.

Campanha na ponta da língua Nada tempera tanto uma campanha eleitoral quanto as frases de quem busca o voto. Um dos casos mais recentes foi protagonizado pelo candidato do PSDB, senador Aécio Neves. Em uma das suas críticas à postura da candidata Marina Silva (PSB), ele aproveitou o embalo para atacar também a presidente Dilma Rousseff (PT). Afirmou, em um ato de campanha na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que uma fala mentiras — que seria a presidente —, e a outra, Marina, se desmente. Dilma também já cravou sua frase de impacto, que acabou virando bordão na internet. Ela aproveitou a declaração de Marina Silva, que defendeu alterações na legislação trabalhista, para retrucar e faturar. Dilma disse que “nem que a vaca tussa” faria o mesmo que a adversária.

Evangélica , Marina disse que o povo precisa de oração para ter discernimento. O comentário foi feito em relação a ataques dos adversários. “Contra o marketing selvagem, não vale argumento, só discernimento. Então peçam a Deus pelo discernimento do povo brasileiro”.

Dilma defende programas

A presidente Dilma Rousseff (PT) afirmou ontem, em São Paulo, que o programa do partido para um eventual segundo mandato são “o governo e as propostas”. A modernidade “não é um calhamaço de papel”. Dilma foi questionada sobre o motivo de o Partido dos Trabalhadores ainda não ter um programa de governo documentado. “O alicerce do meu programa é o meu governo. Se tem alguém com proposta, sou eu. O documento é o governo e as propostas. A modernidade não é um calhamaço de papel”, declarou. Ela relacionou propostas que já lançou, como a do programa Mais Médicos, a de um modelo de segurança pública integrado, como o utilizado na Copa do Mundo. Além disso, defendeu mais vagas para o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e para o Ciência sem Fronteiras, além da terceira etapa do programa Minha Casa Minha Vida. Também lembrou da proposta de combate à corrupção pela qual a prática de caixa 2 passaria a ser crime. A candidata do PSB, Marina Silva, passou o dia de ontem se preparando para o debate da TV Record, que ocorreu à noite.

Eleitor fisgado pelo bolso

O ponto mais sensível do eleitor é o bolso, argumentam muitos estrategistas eleitorais. Outros apontam para o coração. Nesta campanha presidencial, porém, parece não haver divergência. A opção dos candidatos e dos marqueteiros é pela economia emocional. Emprego, renda e estabilidade são temas inescapáveis em qualquer corrida ao Planalto. Ganharam, porém, mais espaço desta vez. As razões para o aumento de importância são várias, de acordo com especialistas. De um lado, o mensalão foi parcialmente superado com a condenação dos réus. Às vésperas da visita às urnas em 2010, pesavam também sérias acusações contra uma figura de primeira grandeza dentro da sede do Executivo, a ministra-chefe da Casa Civil Erenice Guerra. O escândalo de corrupção da vez passa, ao menos por enquanto, mais distante dali. E ainda por cima afeta a Petrobras, um dos núcleos mais relevantes na discussão sobre investimentos, energia, política industrial e até preços. A razão principal para o foco na economia, porém, de acordo com as análises de quem acompanha o processo, está na combinação de baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e carestia, mescla rara chamada estagflação. Os candidatos de oposição Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB) têm criticado duramente as políticas que levaram a isso, sobretudo a falta de autonomia do Banco Central (BC) para elevar juros quando julga necessário, e, principalmente, o crescimento dos gastos públicos. O contra-ataque da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição pelo PT, tem sido, por sua vez, virulento. Na semana passada, ela disse que a proposta de ajuste fiscal de Marina é desnecessária e pode abalar ainda mais o país (leia quadro). Aécio, embora vá na mesma linha da socialista, fala em medidas escalonadas em vários anos. Antes, a campanha petista havia alertado o eleitor, com dramatização no programa de tevê, para risco de sumir a comida da mesa caso o PSB vença e dê independência formal para o BC atuar. A campanha de Aécio, que propõe autonomia, sem tanta clareza quanto à ideia de mandatos para a diretoria a instituição, saiu em defesa de Marina. Para economistas, há dúvidas de que o debate sobre esses temas proporcione esclarecimentos ao eleitor. “O que se veem não são tanto posicionamentos, mas sim um candidato batendo no outro e ofertando sacos de bondades ao eleitor”, lamenta o professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) João Saboia. Continuação da Resenha Diária 29/9/14 27

Implicitamente, ele acha, porém, que o público entende que Dilma defende “o que está aí”, enquanto Aécio “é mais precupado com a arrumação da casa”, incluindo nível de inflação e gasto público. “Marina é um mistério. Por sua história, tem preocupação social, mas também precisa se mostrar comportada. Não terá maioria parlamentar, se eleita, e terá de procurá-la nos partidos mais à direita.”

Mercado O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, considera Aécio o candidato com maior credibilidade para o mercado financeiro. Mas, por isso mesmo, critica, pelo ruído causado, propostas que o tucano vêm fazendo, como a revisão do fator previdenciário, algo de grande apelo a sindicalistas. “Ele sabe que não vai entregar isso.” O PSDB alega que a promessa é encontrar uma alternativa ao mecanismo que adia aposentadorias. Perfeito diz que, com Marina, programas como o Pré-Sal podem retroceder tanto do ponto de vista da produção quanto de compra de fornecedores nacionais. O PSB nega que isso ocorrerá. O economista alerta ainda para o fato de que a política econômica tende a ter poucas diferenças qualquer que seja o eleito. “A dificuldade do ajuste fiscal é que os gastos discricionários são poucos. Basicamente só os investimentos”, alerta. O ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC Alexandre Schwartsman vê claras diferenças entre os postulantes da oposição e a atual presidente quanto à redução de gastos públicos e convergência da inflação para a meta de 4,5%. “Dilma também diz que quer isso, mas tem sempre um ‘se’. É como dizer que eu quero ficar rico, mas só se não tiver de trabalhar”. Ele admite que muitas propostas dos candidatos são incoerentes ou difíceis de serem realizadas. Mas acha que o eleitor está vacinado contra isso. Citando o estadista alemão Otto von Bismarck, lembra que “nunca se mente tanto quanto durante a guerra e antes das eleições”. “Marina é um mistério. Por sua história, tem preocupação social, mas também precisa se mostrar comportada. Não terá maioria parlamentar, se eleita, e terá de procurá-la nos partidos mais à direita” João Saboia, professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Expectativa de novo pacote do governo

À medida que as eleições se aproximam da reta final, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciará mais um pacote de benesses ao setor produtivo. Desta vez, será para as empresas exportadoras, que andam ressentidas com a falta de uma estratégia mais definida para o setor. Nada garante que a ação produza algum impacto. O chefe da equipe econômica da presidente Dilma Rousseff tem encontro marcado na manhã de hoje com executivos das maiores companhias do país que atuam no mercado internacional na sede da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). A expectativa é de que o ministro anuncie novas medidas, entre elas uma elevação do teto de restituição do Reintegra de 3% para 4%. “Isso (a elevação da taxa de 3% para 4%) vai ser discutido lá com eles (os exportadores). Cada medida que a gente toma, a gente espera um resultado e faz um acordo. É sempre assim. Não demite, não sei o quê e tudo mais. Então, não tem nada definido. E vamos discutir”, disse Mantega, em entrevista ao Correio publicada ontem. O programa de reembolso dos tributos pagos em cascata na produção, criado em 2011, devolvia 3% do total das vendas externas, mas havia sido cancelado no início deste ano. Em junho, o governo tornou o incentivo permanente, mas com elevação gradual da taxa, que estava em 0,3%. Em setembro, ele prometeu que, em 2015, a alíquota do Reintegra seria de 3%. Mantega informou que há vários temas que serão discutidos no encontro e ele dará continuidade ao realizado no último dia 15. “Fizemos uma reunião com 25 grandes exportadores e eles pediram para a gente fazer uma discussão mais ampla. E são vários tópicos que eles têm para debater: desburocratização, agilização, redução de custo, Reintegra, financiamento da exportação… É essa agenda que estamos discutindo”, disse.

Exportação Exportadores se queixam da falta de uma política de comércio externa menos dependente do Mercosul, que está em crise. A Argentina é o destino de mais de 80% dos produtos manufaturados brasileiros e que vem importando cada vez menos. Pelas contas de Mantega, o país vizinho importará metade dos 410 mil veículos que comprou do Brasil no ano passado. O setor também demonstra preocupação com o câmbio. O real valorizado estimula as importações e inibe a produção local, reduzindo o investimento no país. Aliada à elevada carga tributária local, a moeda cara deixa qualquer produto nacional sem capacidade de competir lá fora. Especialistas do setor apostam que o dólar deveria estar a R$ 3 para que o país voltasse a ter competitividade. “É desejo do exportador que o câmbio esteja o mais desvalorizado possível. Não podemos simplesmente desvalorizar o câmbio para beneficiar o exportador, mesmo porque, às vezes, ele esquece que importa insumo ou que contraiu uma dívida em dólar. Tem que haver um certo equilíbrio. O mercado está flutuando”, disse Mantega.

Doenças da pobreza resistem no país

Apesar de a incidência das chamadas doenças negligenciadas apresentar índices decrescentes no país, o Brasil ainda convive com número significativo de casos dessas enfermidades. Construções de baixa qualidade, esgoto a céu aberto e contato diário com ambientes sem higiene são situações que deixam a população mais vulnerável a Continuação da Resenha Diária 29/9/14 28 enfermidades como a esquistossomose, a doença de Chagas, a tuberculose e as diarreicas. Não à toa, são também chamadas doenças da pobreza, aquelas para as quais a indústria farmacêutica não volta suas atenções em razão da baixa perspectiva de lucro. As medidas preventivas e o tratamento para algumas dessas moléstias são conhecidos, mas não estão totalmente disponíveis nas áreas mais pobres. Além disso, a indústria tem menos interesse em desenvolver métodos de diagnóstico mais eficazes e novos medicamentos.Essas doenças são causadas por agentes infecciosos ou parasitas e são consideradas endêmicas em populações de baixa renda. Por isso, especialistas até comemoram a queda nos números. Doenças infecciosas e parasitárias, por exemplo, eram responsáveis por 11,6% das mortes no país em 1980. Em 2009, esse índice baixou para 4,9%. Ainda assim, os casos resistem. A malária, que atinge principalmente a região amazônica, teve uma queda de 26% entre 2012 a 2013, segundo dados do Ministério da Saúde, mas ainda chama a atenção a quantidade de 179 mil notificações no ano passado. A tuberculose apresenta um índice estável, com 70 mil registros no ano passado, quase o mesmo que os 71 mil de três anos atrás. Hoje, o Brasil está na 16ª posição na lista de países com maior número de casos da doença. As diarreicas, relacionadas a más condições de saneamento, tiveram aumento do número de casos e mataram mais de 4 mil pessoas no ano passado, principalmente crianças de até cinco anos (leia memória). Os óbitos têm a ver com o difícil acesso aos centros de saúde e ao pouco conhecimento referente a soluções caseiras. Na opinião do presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Carlos Henrique Nery da Costa, o Brasil tem trabalhado para reduzir a incidência dessas doenças, mas os números ainda preocupam. “Ainda falta muito, senão elas teriam desaparecido, uma vez que temos exemplos de nações que conseguiram controlar as doenças. A China, por exemplo, acabou com a leishmaniose visceral e praticamente liquidou a esquistossomose”, detalha. De acordo com o especialista, as taxas brasileiras se assemelham mais às dos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento que às dos desenvolvidos. “Outro ponto importante é que, muitas vezes, os programas de controle dentro do Ministério da Saúde são muito bemfeitos e organizados, mas eles têm impacto muito reduzido quando distribuídos entre estados e municípios”, avalia Nery. Sem controle Por mais que as doenças tenham o clima e a maior incidência nas classes mais pobres como denominadores comuns, cada uma tem especificidades. De acordo com Nery, dengue e leishmaniose visceral são as mais preocupantes. A primeira por ser endêmica e acontecer em qualquer ambiente. A segunda tem maior incidência e letalidade, além de ser pouco debatida. Os pesquisadores não têm sugestões sobre como controlar a enfermidade, apenas como tratá-la. “Nenhuma das duas tem controle.”

A malária ainda mata muitas pessoas, assim como a doença de Chagas, que a ciência não sabe ainda como tratar na sua forma crônica. A hanseníase provoca sofrimento no paciente, além do estigma e preconceito envolvidos. Ela precisa de diagnóstico rápido e boa estrutura das equipes de saúde. Já a esquistossomose está intimamente ligada às condições de higiene e saneamento básico das comunidades. “É um dos calcanhares de Aquiles do país”, diz Nery. A tuberculose também atinge principalmente os mais pobres. Epidemiologista, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e integrante da Rede Brasileira de Pesquisa em Tuberculose, Ethel Leonor Noia Maciel explica que a doença não se relaciona a más condições de água. “Quando moram 14 pessoas numa casa de dois cômodos, que tem uma ventilação ruim, a probabilidade de transmissão é maior do que em um lugar arejado, com várias janelas”, afirma. “As próprias questões nutricionais fazem diferença. Se a pessoa é bem nutrida, o corpo combate o bacilo.” A aglomeração de pessoas também é um fator de risco. Por isso, os presídios têm alta incidência da doença. Nos municípios, a maior concentração de casos de tuberculose no país ocorre no Rio de Janeiro. “São as favelas e as comunidades mais pobres”, explica Leonor. “Os indivíduos têm inúmeras verminoses. Há muitos lugares onde não há serviços de saúde”, diz. Segundo ela, tem crescido também a incidência em moradores de rua, porque muitos têm problemas de desnutrição, associação com drogas e contaminação por HIV. Leonor, entretanto, avalia que o governo tem investido mais no combate a essas doenças, tanto com a criação de um departamento específico para a área no Ministério da Saúde, quanto no financiamento de pesquisas. Mas, segundo ela, a melhor forma de eliminar as doenças é trabalhar para erradicar a miséria.

Memória Mortes em Alagoas Uma epidemia de diarreia deixou 165 pessoas mortas em Alagoas no ano passado. De acordo com dados da Secretaria de Saúde do estado, pelo menos 92 mil casos foram registrados. O surto durou entre maio e agosto de 2013. O secretário de Saúde de Alagoas, Jorge Villas Bôas, chegou a dizer que as mortes ocorreram porque muitas pessoas procuraram os centros de tratamento tardiamente ou não receberam o atendimento inicial adequado ao chegarem ao local. A maior parte dos óbitos foi registrada em crianças, muitas com até um ano de idade, e em idosos. O Ministério Público estadual abriu uma investigação no ano passado para apurar as causas da epidemia, relacionada à contaminação da água.

179 mil Quantidade de pessoas atingidas por malária no ano passado "Os programas de controle são muito bemfeitos, mas eles têm impacto reduzido quando distribuídos entre estados e municípios” Carlos Henrique Nery, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical Continuação da Resenha Diária 29/9/14 29

EDIÇÃO Nº 224 – JULHO 2014

“LIBERATORI” Com relatos de italianos que conviveram com os Pracinhas da Força Expedicionária Brasileira, o autor leva aos leitores como os heróis brasileiros da 2ª Guerra Mundial, em decorrência de uma convivência fraterna com os cidadãos italianos e pela capacidade de se adaptarem às difíceis condições do combate e destemor para enfrentar um inimigo forte e aguerrido, conquistaram o título de Liberatori.

Em todas as guerras, a população indefesa é quem mais sofre. Destruição, miséria em todos os sentidos, fome, humilhações e confisco de bens são algumas das provações a que é submetida. Entre 16 de julho de 1944 (chegada do 1º escalão brasileiro a Nápoles) a 19 de setembro de 1945 (embarque do último escalão para o Brasil) 25.354 brasileiros participaram da 2ª Guerra Mundial, na Itália. Entre os veteranos da Força Expedicionária Brasileira (FEB) é comum ouvir sobre o convívio fraterno com a população. Nesse contato, aprenderam e agregaram muitas palavras italianas ao seu linguajar. Uma das mais significativas é Liberatori – Libertadores, na tradução literal.

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Brasileiros Recepcionados com festa Foto: MNMSGM

A partir de 20 de setembro de 2012, no cenário dos combates, foi possível confirmar o quanto foi difícil a missão da FEB. O terreno acidentado evidencia dificuldades; se acrescentarmos a ele adversários adestrados e condições climáticas desfavoráveis, não restam dúvidas sobre as barreiras vencidas pelos pracinhas ao longo dos cerca de 400 quilômetros percorridos e centenas de vilas e cidades libertadas. Havia um adversário a combater, que exigia preparo e atenção impecáveis; havia a população a proteger, que merecia cuidado especial. Em ambos os quesitos, os brasileiros saíram-se muito bem. Vários italianos relataram comoventes histórias que evidenciam porque, transcorridas quase sete décadas, os brasileiros são reverenciados como heróis e esclarecem porque se tornaram merecedores do título de libertadores, objetivo maior deste artigo.

O SOLDADO CIDADÃO Na guerra, o medo é companhia constante dos soldados e da população. Enquanto avançavam no terreno, os brasileiros se hospedavam em casas italianas, propiciando uma relação benéfica para todos: para os italianos representava comida, segurança e solidariedade; para os brasileiros, conforto no rigor do inverno e o aconchego substituto da família distante. Para as crianças, o medo se multiplicava e se transformava em pavor, inflado pela propaganda; por isso, recebiam maior atenção. O tempo passou; contudo, não se esquecem da mão que as confortou na dificuldade. Perdas e eventuais ganhos permanecem vivos na memória e são externados em depoimentos emocionados, que comprovam que os sentimentos forjados no calor da guerra, mesmo em terras geladas, são para a vida inteira.

A neve – mais um obstáculo a ser vencido Continuação da Resenha Diária 29/9/14 31

Foto: AHEx

Giuseppina Malfatti expressa o horror da guerra, mas deixa transparecer o carinho e a atenção recebidos quando criança. “Durante a Guerra, eu era muito pequena, mas tenho recordações muito vivas, muito fortes. Nós vivemos todo o terrível período de 1943/44 ao longo daquela que se chamava Linha Gótica. Vimos queimar Sant’Anna di Stazzema (aldeia em que foram cruelmente mortas mais de 500 pessoas, entre crianças, idosos e refugiados, em agosto de 1944, pelos nazifascistas); tivemos parentes – a minha avó paterna... – mortos pelos alemães. Guardo a lembrança das nossas fugas nos bosques, perseguidos pela SS com cani lupo (pastor alemão). Por anos, eu não pude suportar os cães...”. Seu encontro com os brasileiros deu-se em um dia chuvoso de setembro de 1944, quando eles chegaram à casa de sua avó e pediram hospedagem. “Naquele momento, começou a nossa ressurreição.” [...] “Nós, crianças, éramos cinco: três irmãos e dois primos; aproximamo-nos com muita curiosidade desses soldados, que nos deram pães com geleia. Eu acredito que aquilo tenha sido para nós ‘o’ presente. Ou seja, há anos não comíamos coisas doces.” [...] “Era uma geleia de cereja escura, que nunca vou esquecer. Davam-nos algumas caixinhas; talvez carne com verduras, com ervilhas. Ocasionalmente, essas caixinhas nos eram presenteadas e nós apreciávamos muitíssimo porque a fome era tanta.” [...] “As sensações das crianças são completamente distintas das dos adultos. A libertação, a liberdade, e, finalmente, o fim do medo correspondiam ao fato que de podíamos comer doces novamente...”.

Superada a desconfiança, prevaleceram a amizade e a integração

Durante o longo convívio, o medo dos brasileiros – sobretudo dos negros, com os quais ainda não tinha convivido –, que havia sido fomentado pela propaganda fascista, transformou-se em confiança: “Porém me lembro, devo dizer... eram muito bons, mais que todos; e mais benevolentes. Uma prima, recordo que brincava (com eles), porque nós tínhamos dois tios prisioneiros – um na Rússia e outro na Alemanha –; portanto, dois primos não tinham os pais em casa.” [...] “E estes rapazes, acredito, eram jovens, mas eram muito afetuosos com nós, crianças, e em particular com os priminhos que não tinham os pais em casa”. Em parte, Giuseppina atribui a atenção e o destemor dos pracinhas à religiosidade: “Minha avó era uma pessoa muito altruísta, muito generosa, e perguntava a esses rapazes se eles não tinham medo; e eles diziam: ‘Não, porque tenho fé no coração! ’”. Giancarlo Maciantelli , que encontrou os brasileiros em Granaglione, confirma: “A propaganda fascista tinha colocado em nossa cabeça algumas teorias... e tinha as tropas de cor, que foram marcadas, definidas... Disseram que eram selvagens. Bem... essencialmente, disseram que comiam crianças, para podermos entender. E, portanto, no primeiro contato com essas tropas de cor, brasileiras, houve um pouco de desconfiança: as mulheres se trancavam em casa; nós, crianças, procurávamos permanecer longe. Depois, notamos que eram soldados de bom coração, tranquilos, cordiais, que procuravam as crianças para dar carinho, para dar chocolates...”. Maciantelli reforça a integração entre os italianos e os brasileiros que, ao invés de dormirem nas trincheiras geladas, ficavam nas casas: “Ali nos contavam um pouco de suas famílias no Brasil, da saudade, que era muita. Uma vez estabelecida a confiança, se desencadeava toda aquela alegria brasileira, que podia aparecer de uma caixa de Continuação da Resenha Diária 29/9/14 32 fósforos... tum, tum, tum, tum, tum, tum... a bater em panelas de alumínio, de lata, com bastões, para fazer um pouco de ritmo. Era uma diversão, um passatempo. Ao sentirmos esta cordialidade, a gente se ligava mais e mais a esses soldados. Não existia mais o medo... dos negros que comiam crianças, como nos diziam os jornais fascistas”. Valentino Betti tinha 10 anos na época da guerra. Morava a dois quilômetros de Gaggio Montano, numa pequena aldeia onde se localizava a cozinha dos brasileiros. Recorda que alguns se destacavam pela atenção que davam às crianças: “Tinham bom coração... Eu penso neles todos os dias... Éramos fascinados e estávamos sempre com eles”. Após muitas histórias e longo convívio, restou o sentimento de perda ao fim da guerra: “Nós ficamos esperando que chegasse alguma correspondência, mas nunca chegou nada. Nós nos tornamos verdadeiramente amigos, e eles foram embora...”. Iolanda Marata conviveu com os brasileiros em Preccaria por longo período. Sua mãe preparava a comida para os soldados e todos comiam juntos, em harmonia. Recorda que seu pai havia enterrado algumas caixas com grãos e outras com garrafas de vinho, que desenterrava e bebiam juntos. “Sempre foram bons, respeitosos; seja com a família, seja comigo, que era uma garotinha. Chocolate... quanto chocolate eu comi!” O convívio era familiar e incluía assistência médica para quem necessitasse. Com alegria e gratidão conclui: “Sempre foram bons e gentis com todos... Não devemos nunca nos lamentar”. Os irmãos Vittorio e Bianca Bernardi perderam o pai, assassinado pelos alemães em 1944. Sem contar com o apoio dos familiares, abandonaram a cidade com a mãe e outros moradores, indo buscar refúgio em Porreta Terme. No grupo havia cerca de dez crianças. Na primeira manhã, foram à praça e, para sua admiração” – relata Vittorio –, “os brasileiros deram de comer às crianças antes de servirem a eles mesmos. Os brasileiros, em suma, sempre nos consideraram, nos deram de comer, deram cobertores; sempre nos trataram bem, bem, bem... Digo bem não porque vocês são brasileiros, mas porque era assim... Davam-nos sempre formas de pão; aquele pão branco, macio...”. Bianca afirma que, além da comida que recebiam no entorno do acampamento e da que o irmão levava para casa, à noite alguns soldados levavam um pouco de pão, potes de queijo fundido, chocolates, frutas em potes, além de algumas peças de vestuário e calçados. Por esses motivos se emociona a cada vez que vê um brasileiro. Traz viva a lembrança do afeto, do acalanto: “... aqueles militares me pegavam nos braços e diziam: ‘venha aqui comigo, pois amanhã à noite te trago chocolate... Agora vem aqui cantar comigo’. Eu não esquecerei nunca... Mesmo porque, sabe, a falta do meu pai pesava... e encontrar alguém que me pegasse nos braços era uma grande coisa...”. “E foi assim. Eles nos trataram bem... como senhores. Nós podemos dizer – eu tenho setenta e três anos e espero que acreditem em mim – que fomos tratados melhor pelos brasileiros e pelos americanos do que pelos nossos parentes... com isto eu disse tudo”, conclui.

Médico brasileiro assiste à criança italiana Foto: AHEx

Desafiada pelo marido Giancarlo, Bianca pede a ajuda do irmão. Juntos, cantam: “Quem parte leva saudade de alguém, que fica chorando de dor, por isso não quero lembrar quando partiu meu grande amor... Ai, ai, ai, ai... está chegando a hora; o dia já vem raiando meu bem; eu tenho de ir embora...”. A emoção cala suas vozes. Bianca complementa: “A música nos faz lembrar deles. Eles nos ensinaram... vinham a nossa casa à noite e diziam: ‘Agora vamos cantar para ter um pouco de alegria’. E pensem! Eu tinha cinco anos, não mais do que isso”. Vittorio: “Não lembro Continuação da Resenha Diária 29/9/14 33 bem do nome; lembro daquele da cozinha, daquele negro que se chamava Quim. Certas coisas não se pode esquecer. Quando nos jogavam uma forma de pão branco, que nós comíamos como açúcar, como doces... Rapazes, Acreditem em mim! Precisariam passar por isso para saber...”. Giuliana Menichini diz que a vida na guerra é como uma medalha; tem sempre dois lados: “não é tudo negativo e nem tudo é positivo; porém, naquele período prevaleceu o medo, o sofrimento”. A primeira impressão que teve dos brasileiros foi muito boa, sobretudo de retomada da liberdade. Giuliana compara outros soldados aos brasileiros: “A diferença é que os brasileiros não davam... eles dividiam! Se tinham café, levavam café em casa... se tinham chocolate, levavam chocolate em casa... o mingau, o pão branco. Era uma divisão, o que era muito diferente. Era como confraternizar com os brasileiros; eles se integraram logo à família; acredito que a origem latina ajudou. Era uma convivência muito boa; familiar”. Fabio Gualandi nasceu em 1935, em Gaggio Montano. O seu depoimento expressa a crueza da guerra e, em contrapartida, a solidariedade. “Durante o passar da guerra aconteceram coisas muito, muito... terríveis! Matanças... a vida não valia nada... Era um número... se pensava em um número e pronto: sobraram dez, sobraram oito...”. [...] “O soldado brasileiro chegou aqui em primeiro de novembro. E chegou não como um exército de conquista. Compreendeu rapidamente a situação dos habitantes que, depois de tanto tempo, festejavam a libertação...”. Gualandi diz que a população, tendo em casa os soldados, se sentia segura, protegida. Foram cinco meses de convívio a um quilômetro da Linha Gótica. “E realmente todos, nesta região, se lembram dos soldados brasileiros com afeto e com bondade. De um dia para o outro, de viver com medo, de viver com pouca comida... quando eles chegaram, chegou a comida, chegou o chocolate, chegou tudo! E se tornaram, o soldado, a população e a comunidade verdadeiramente amigos”. “Os brasileiros nos deram um pouco do bem da vida, de viver”. “Por isso”, diz, “quando os Pracinhas chegam à Itália são acolhidos por todos; é a forma de externarem a gratidão. Os Pracinhas merecem! Foram, naquela época, verdadeiros amigos... Só com a vinda dos brasileiros é que começamos a viver e a reviver, amar a vida, ter amigos, todas aquelas belas coisas...”, conclui Gualandi.

OS GUERREIROS Ao chegarem à Itália, os soldados brasileiros tiveram de se adaptar rapidamente ao clima adverso e ao terreno acidentado. Além disso, o armamento e o fardamento eram desconhecidos. A despeito das condições desfavoráveis, mesmo sem o preparo adequado, assumiram a missão. Italianos da resistência, que participaram da guerra ao lado dos brasileiros, admiram-nos pelo denodo com que encaravam o inverno gelado e o inimigo mais bem preparado e ambientado àquele cenário. Para Giancarlo Maciantelli , os brasileiros eram admiráveis. “Esses soldados diziam: ‘nós saímos de 40 graus do Rio de Janeiro...’ Eu sei! E, quando chegaram aos Apeninos, eram -15 graus... Depois, naquele ano, veio abaixo uma avalanche de neve... nem todos tinham visto neve, tido experiência de frio... E isso trouxe o congelamento de pés, congelamento de mãos, resfriados, bronquites, todas as doenças... Quando chegavam até nós, nas nossas casas de montanha; não tinha sistema de aquecimento, tinha a lareira... Todos ‘grudados’ ao fogo para esquentarem. Faziam patrulhas e vinham se esquentar nas nossas pobres casas de camponeses da montanha”.

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Lares italianos eram refúgio acolhedor no rigor do inverno Foto: AHEx

Moreno Costa tinha 18 anos quando teve contato com os brasileiros, em Camaiore, em 18 de setembro. Para ele, os brasileiros são admirados, sobretudo pelos mais idosos, não só pelo senso humanitário na relação com a população sofrida, mas também pela seriedade que demonstravam nas ações em que tiveram participação. Mesmo que os alemães já houvessem abandonado Camaiore quando a FEB chegou, Costa ressalta a importância dos brasileiros pela segurança que proporcionaram: “Foram eles que ocuparam e protegeram as instituições, como a prefeitura e outros prédios públicos”. Acrescenta que os brasileiros estiveram em várias cidades da Alta Versiglia, para as quais a população só retornou após a chegada dos Pracinhas. Inquirido por que os brasileiros são considerados libertadores, Costa é enfático: “Bem, não é que são considerados ou os consideramos libertadores... eles são libertadores”. Franco Fini estudava Medicina e Cirurgia na Universidade de Bolonha. Durante a guerra, permaneceu junto à família em Santa Maria Villiana. Recorda que, no dia 1º de novembro de 1944, chegou a 7ª Companhia do 6º Regimento, lá permanecendo até o fim do inverno. “Na noite de 4 de fevereiro de 1945 vieram os soldados da SS para atacarem as posições (brasileiras). De fato, eu estava aqui fora com meu pai e o Capitão Portocarrero... Começou um fogo infernal... O Capitão pediu tiros de artilharia. Os primeiros tiros caíram dentro da nossa linha; depois ajustaram o tiro e chegaram ao ponto ideal... Foram horas de combate”. Os alemães queriam estourar a ponte de Marano, a fim de poderem atacar as tropas brasileiras que estavam para o lado de Castelnuovo pelas costas, mas, ao contrário, foram expulsos. A fazenda estava no meio dos fogos alemães e aliados; era conhecida como “terra de ninguém”, onde os embates de patrulhas eram constantes. “Aqui era o fim do mundo! Quando começavam a disparar, nós entrávamos em casa e, quando os tiros batiam de encontro à parede, a casa estremecia”, diz.

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Brasileiros na frente da casa de Franco Fini Foto: Franco Fini

Fini compara o soldado brasileiro ao de outros exércitos: “Havia uma diferença enorme; os soldados brasileiros eram como irmãos e uma boa companhia. Repito: como irmãos! Os outros exércitos eram completamente distantes, mesmo porque não nos entendíamos (por causa do idioma)”. Esclarece que, na Toscana e na Emilia Romagna, os brasileiros são conhecidos como libertadores, pois foram os primeiros a chegar: “Em toda esta região, não sei em outra parte, mas aqui no vale do Rio Reno, de Porretta até Vergato, os libertadores foram os brasileiros...”. Francesco Berti , nascido em 1926, era integrante da Brigada Justiça e Liberdade, lutava ao lado dos aliados. Apesar dos fracassos iniciais da FEB em Monte Castello, admira a coragem dos Pracinhas e a persistência no combate. “No começo”, diz, “os brasileiros foram alvo fácil. Ali houve muitos mortos. Eu me inclino diante desses pobres Pracinhas que não conseguiram chegar sobre a linha de fogo e foram mortos; muitos e muitos. Eu lembro que havia um pelotão de sepultamento na Estrada Provincial e todos aqueles sacos cheios...”. Ugo Castagnoli , testemunha ocular das ações brasileiras, tinha 15 anos quando a frente de guerra aproximou-se da sua cidade. Como muitos italianos, abandonou sua casa em busca de paz, na região de Gaggio Montano. “Eu vi quando atacaram o local que se chama Serretta di Maserno e, depois, aqui em Montese, no Monte Montello. Foi uma batalha muito áspera, muito forte, com mérito dos brasileiros, que se saíram melhor. Restaram muitos mortos... Mas a bravura dos brasileiros teve o seu valor; conseguiram passar pelos obstáculos... Em suma, os alemães tinham as posições fortificadas e foi uma batalha muito dura, muito severa”. A guerra passou e a vida voltou à rotina; porém, ficaram as marcas, indeléveis. Valentino Betti diz que o pior sentimento deixado pela guerra é a perda da infância, da ingenuidade, enfim, da juventude: “De rapaz, quando termina a guerra, a gente se torna quase um homem”. Betti diz que se encontrasse um veterano brasileiro, não saberia expressar exatamente o que sente. “Eu o abraçaria... porque, para mim, os brasileiros foram os que mais sofreram nesta guerra e, em suma, foram os que mais deram à Itália, pelo menos no nosso território”. “Eu creio que noventa por cento da população de Gaggio Montano teve um relacionamento verdadeiro com os brasileiros. (O Brasil) é a única nação que permaneceu impressa na história de Gaggio”, conclui.

HOMENAGENS Com tantos depoimentos, não restam dúvidas de por que os Pracinhas são os libertadores da Toscana e da Emilia Romagna. Contudo, para os italianos, é uma questão de justiça tornar visível a gratidão, de modo que as futuras gerações não se esqueçam dos “heróis que vieram do Brasil para libertar uma terra que não era deles”. Imponentes ou singelas, as homenagens expressam o reconhecimento ao guerreiro que, mais do que qualquer outro, foi amigo, solidário e, sobretudo, cidadão.

Francesco Berti , proprietário da famosa Casa Guanella, que protegeu muitos Pracinhas durante o gelado inverno, doou o terreno em que está construído o monumento em homenagem aos soldados mortos e à FEB, à frente do Monte Castelo. Justifica a doação como “um ato de necessário reconhecimento pelo valor com o qual combateram os soldados brasileiros... Os brasileiros não deixaram conversa fiada sobre o terreno: eles deixaram mortos. E eu quis agradecer, valorizar esses soldados...”. Claudio Carelli tinha quatro anos e se lembra dos detalhes pelas histórias que ouvia dos pais. Recorda que morava em Riola com os avós e os pais. “Dois brasileiros vinham sempre a nossa casa; como se tinha pouco para comer, eles traziam caixinhas de chocolates. Depois comiam com a gente; o pouco que tínhamos, dividíamos e éramos exatamente uma grande família naquele momento... Brincavam sempre comigo; portanto não posso esquecer”. Quando adquiriu um sítio em Vergato, pesquisou e descobriu que dois Pracinhas haviam morrido no local. Em homenagem, construiu “um pequeno memorial a dois soldados brasileiros que morreram aqui lutando pela liberdade; pela minha liberdade. Se hoje eu sou um homem livre, sinto-me grato a estas duas pessoas e quis recordá-las. E recordar quer dizer que também os meus filhos e os meus netos saibam da minha história, da história da Itália e também Continuação da Resenha Diária 29/9/14 36 do Brasil”. Na placa afixada ao memorial está escrito: “Para a honra e lembrança de Francisco Gomes de Souza e José Alves de Abreu, dois valentes Pracinhas da Força Expedicionária Brasileira que aqui tombaram em batalha, no alvorecer de 1945, lutando pela liberdade”. O historiador Giuliano Cappelli , custódio da Capela de Nossa Senhora de Lourdes, em Staffoli, quando soube da gruta construída pelos brasileiros, procurou até encontrá-la. Para ele, é fundamental preservar o local, “primeiro porque é que uma página dividida da História do Brasil e da Itália; depois, porque também é um ponto de agregação de dois povos em um mundo cheio de tensões, de guerras”. “Julgo que este lugar tenha uma importância também em nível espiritual, pois se trata de um monumento construído por pessoas que, neste momento, talvez não estejam mais vivas... Graças também à sua memória e honra é que me dedico com esta paixão à manutenção do monumento e isto me distingue. Em honra aos mortos e àqueles que combateram pela libertação e restauração da democracia no nosso país. É, sobretudo, um gesto de gratidão”, conclui. Nem todos puderam construir monumentos ou memoriais. Entretanto, o brilho no olhar e as palavras externadas são sempre de alegria e reconhecimento, por poderem transmitir aos brasileiros o monumento à solidariedade que os Pracinhas construíram na alma e no coração dos italianos. Giuseppina Malfatti diz: “Depois da guerra eu nunca mais ouvi falar dessa Força Expedicionária Brasileira.” “Eu me perguntava: E os brasileiros? Ah! Você deve ter sonhado com os brasileiros...” Quando soube que almejávamos o seu testemunho, cancelou a agenda para dar o seu depoimento sobre os “nobres soldados”, que “tinham chegado e sumido”, dos quais “a bondade era fabulosa”. “Quero acrescentar que estou feliz que alguém queira ouvir-me testemunhar sobre esses soldados... É uma obra de recuperação da memória.” Maria Elisabetta Tanari , prefeita de Gaggio Montano, julga fundamental rememorar a participação brasileira na guerra em todas as escolas, pois os episódios vividos entre os brasileiros e italianos estão impregnados de humanidade, de amizade, de troca e, por paradoxal que possa parecer, de alegria, pois serviram para humanizar uma experiência cruel e inumana como a da guerra. “Esta é uma experiência fundamental que precisa ser conservada e transmitida”, conclui.

A capela, em Stafolli, durante a 2ª Guerra Foto: MNMSGM

Giuliano Tessera , professor de História e Filosofia, morador de Milão, admite que, até há alguns anos, não conhecia a participação brasileira na II Guerra Mundial. Apaixonado pelo assunto e por ouvir da população como era tratada pelos brasileiros, conclui: “Não estarei contente até que veja o tema nos livros, na normalidade do estudo, não como coisa excepcional, não como folclore, mas como coisa real e efetiva”. Mario Pereira , filho do veterano Miguel Pereira e de Giuliana Menichini, tem a missão de hastear diariamente a Bandeira do Brasil no mais representativo símbolo da participação brasileira na guerra: o Monumento Votivo Militar Brasileiro, em Pistoia. Além disso, zela para que a chama perpétua, representativa da tenacidade do soldado brasileiro, permaneça acesa e ilumine o túmulo do “soldado desconhecido”, único corpo que permanece sepultado no local. Pereira destaca que as visitas têm aumentado muito nos últimos anos, o que mostra o reconhecimento da população italiana pela postura adotada pelos brasileiros durante a guerra, tanto no campo de batalha, quanto na postura humanitária. Segundo diz, sua missão é seguir os passos do pai, que “não falava em trabalho; ele falava em missão. E a minha missão é manter acesa esta chama, que não é uma mera chama: é a chama da memória”.

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Monumento construído para homenagear quem viveu os horrores da guerra se destaca na hoje serena paisagem, vista de Bombiana Foto: Vera Lucia Lopes Cordeiro