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A Arte De Fazer Cultura

A Arte De Fazer Cultura

Publicação reconhecida pela Secretaria de Estado da Cultura como de interesse Cultural e Literário

Directora: Nassalete Miranda MAnuel antónio pina 31 Outubro de 2012 1943-2012 Nº 85 | Preço: 2 euros Quinzenalmente às quartas

memória // PÁG. 22 A arte de fazer cultura

Arnaldo de Pinho Nadir Afonfo Jubilação académica Doutor Honoris Causa e publicação de Obras Escolhidas pela UPorto homenagem // PÁGS. 18 a 20 especial // PÁG. 15

emdestaque // PÁGS. 4 a 6 literatura // PÁGS. 10 e 11 música // PÁGS. 16 e 17 lançamento // PÁG. 23 Renascença Um romance que Emmanuel Nunes: As Questões Portuguesa pode não ser romance um gigante da música que se Repetem

Colóquio «Memória e Património: «Podemos matar um sinal de trân- Ele foi sem dúvida um dos mais Não é necessário ser filósofo para o lugar do livro nos centenários sito?» é uma obra surpreendente, (mundialmente) consagrados com- entender a nova breve história da da Renascença Portuguesa e da que convida a transmigrar, interpe- positores portugueses nascidos filosofia que se encontra nas ban- Livraria Académica» de 14 a 16 de lando o entendimento profundo de no século XX... com um admirável cas, assinada por Paulo Tunhas e Novembro, no Porto, para abordar, quem vai além do texto e mergulha percurso curricular na dupla quali- Alexandra Abranches. Um manual essencialmente, o papel daquele na profundidade do contexto. dade de compositor e pedagogo. de qualidade pedagógica indiscutí- movimento cultural na edição. Por: edite estrela Por: josé atalaya vel, merecendo elogios dos pares.

pub 31 outubro 2012 abertura as artes entre as letras | 2

Nassalete Miranda directora

SingularPlural, Arte & Comunicação, Unipessoal Lda. Capital Social: 5.000 € Número de Certidão: 0232-6801-3200 Conservatória do Registo Comercial de Vila Real

AS ARTES ENTRE AS LETRAS Praceta Eng.º Adelino Amaro da Costa, 764 - 9º Esq. 4050-012 Porto Entre Sentidos Telefone e Fax.: 22 606 35 56 Telemóvel.: 91 803 56 76 E-mail.: [email protected] morte, sendo a única certeza “verdadeira- E, agora que os teus “olhos se fecharam”, tenho du- Publicidade mente certa”, como me dizia o também já as notícias para ti: Praceta Eng.º Adelino Amaro da Costa, 764 - 9º Esq. 4050-012 Porto falecido padre Jordão, chega sempre por 1.ª a tua poesia vai andar nas ruas de Santo Tirso Telefone e Fax.: 22 606 35 56 A Telemóvel.: 91 803 56 76 anunciar, não é bem-vinda e só não é definitiva em Março do próximo ano. Sim, em jeito de home- E-mail.: [email protected] quando a vencemos através da memória. nagem… e não, os que nunca estiveram continua- A morte só leva o corpo daqueles que gostamos, rão ausentes! ficha técnica não consegue arrancar-nos as horas felizes par- 2.ª o teu amigo e companheiro de letras, e não só, Directora: Nassalete Miranda tilhadas em cumplicidade de ideias, de livros, de “Chico Zé Viegas” já não é Secretário de Estado da Editora: Isabel Fernandes Fotografia: Ângela Velhote palavras e é precisamente por isto, Manuel Antó- Cultura. Alegou questões de saúde para o seu pe- Direcção Comercial: Maria José Guedes Grafismo: Pedro Cunha nio Pina, que tu não serás esquecido, apesar de um dido de demissão do cargo. Temos a esperança de Paginação: Pedro Cunha Site: Criação no âmbito do projecto desenvolvido no ISLA dia teres escrito que “somos feitos para o esqueci- que melhore e, claro, de ler o seu novo romance! por Joaquim Jorge Santana Oliveira mento”. AH! Não é novidade?! Contactos: Praceta Eng.º Adelino Amaro da Costa, 764 - 9º Esq. | 4050-012 Porto Sim, os lugares ficam mais vazios: as “Quintas” no Vamos falando Manel. O encontro é no sítio do cos- Telefone e Fax.: 22 606 35 56 Telemóvel.: 91 803 56 76 Teatro do Campo Alegre, a última página do JN, es- tume, entre as palavras dos teus livros, agora vira- Email.: [email protected] Registo na ERC ta cidade do Porto que adoptaste para abraçar em das com saudades das que não tiveste tempo de 125685 vivência de ruas e cafés, em poetas e prosadores, juntar. Impressão Selecor - Artes Gráficas,L DA entre leigos e cristãos, entre jornalistas de ontem e Permitam-me hoje que recomende a todos boas Rio Tinto - Telef.: 22 485 42 90 Distribuição de amanhã. leituras em artes feitas nos livros do Manuel Antó- VASP - MLP, Media Logistics Park, Quinta do Grajal - Venda Seca 2739 - 511 Agualva Cacém Respiras nas palavras que nos deixaste em mais nio Pina. Telef.: 21 433 70 00 de 40 livros e em milhares de crónicas – gostaria Pontos de Venda [email protected] de ver editadas em livro as que ainda não estão – e Nota - Na memória permanece também Nuno Telef.: 80820655 - Fax.: 80820613 Propriedade: nisso serás imortal. Grande, o Professor solidário, o investigador pre- Singular Plural NIF O “machado”, não só não corta “a raiz ao pensa- miado, o portuense ilustre o vizinho sorridente de 509578942 mento” como não arranca a raiz da memória dos trato gentil hoje lembrado pelo nosso muito queri- Tiragem 1250 exemplares nossos afectos. do Amigo e Homem Maior, Daniel Serrão. Interdita a reprodução, mesmo parcial, de textos, fotografias ou ilustrações sob quaisquer meios, e para quaisquer fins, inclusive comerciais Partiste, Manel. Ficaste nas palavras que não tiveste medo de jun- conselho editorial tar! Arnaldo Saraiva | Agustina Bessa-Luís E em nós vives, neste clã feito da Amizade que não António Vitorino d’Almeida | António Joaquim Oliveira cobra horas de permanência nem reivindica an- NOTA Carlos Fiolhais | Francisco Laranjo O jornal As Artes entre As Letras, que ainda não adoptou Francisco Ribeiro da Silva | Helder Pacheco tiguidade, e acredita que ficarás “acordado toda a o novo Acordo Ortográfico, publica textos de colaboradores Isabel Ponce de Leão | José Atalaya que o aplicam, respeitando, assim, o original. José Rodrigues | Levi Guerra noite/ diante de uma coisa imensa”. Lídia Jorge | Luisa Dacosta Manoel de Oliveira | Mário Cláudio Miguel Veiga | Óscar Lopes Salvato Trigo | Urbano Tavares Rodrigues Entrenós colaboradores especiais Um curso a seguir… Adelto Gonçalves | António Fournier | António José Queiroz Armando Alves | Carlos Cabral Nunes Carlos Vaz | Cristino Cortes A Associação África Solidariedade, que la Lopes-Cardoso, mais oito jovens estão Domingos Lobo | Eugénio Lisboa já proporcionou apoio na formação de incluídos no projecto de formação. A as- Francisco d’Eulália João Medina | Jorge Sanglard 11 estudantes através do plano específico sociação – cujo trabalho passa, entre ou- J. Esteves Rei | Lauro António de “apoios a africanos residentes em Por- tros pontos, pela sua “difusão e implan- Manuel Sobrinho Simões | Maria Antónia Jardim tugal, em especial, na sua formação para tação mais alargada na sociedade portu- Paulo Ferreira da Cunha | Ramiro Teixeira Rodolfo Alonso | Rudesindo Soutelo quadros para os respectivos países” e “su- guesa” – realizou a habitual matinée re- porte de bolsas a estudantes africanos creativa no passado fim-de-semana.E ste parcerias que estudam nos respectivos Países”, é um encontro anual e intercultural des- continua a sua acção perseguindo mais tinado à angariação de fundos com que a resultados. Assim, segundo a presiden- Associação faz face a projectos de desen- te da Organização Não Governamental volvimento em que colabora com países Livraria Lello Para o Desenvolvimento, Maria Manue- africanos de língua portuguesa.

apoios

Para assinar online: www.artesentreasletras.com 31 outubro 2012 3 | as artes entre as letras avidadoslivros

Guilherme d’Oliveira Martins presidente do cnc

Na visita ao complexo da Pampulha, em Belo Horizonte, compreendemos que ali se deu uma viragem na arquitetura mundial, que culminaria na construção de Brasília, graças também ao impulso decisivo do entusiasta de Belo Horizonte, o célebre prefeito J.K.. Hoje recordamos o diálogo entre a arte barroca e as suas sequelas modernas e a obra-prima de Gil- berto Freyre (1900-1987) «Casa Grande e Senzala» (1933).

sentido da estabilidade patriarcal». Fora da ten- dins de Roberto Burle Marx são uma referência DOIS PAÍSES dência de exclusão que encontramos na Amé- da arquitetura paisagística. A Igreja de S. Fran- MODERNOS rica do Norte relativamente aos mestiços, o Bra- cisco de Assis também é monumento e é um Uma relação moderna entre e o Brasil sil é um exemplo de respeito e tolerância no to- exemplo de renovação da arte religiosa, com os obriga a entender que as raízes históricas têm cante aos filhos de cruzamentos de grupos ét- painéis e azulejos de Cândido Portinari, de Pau- de ser caldeadas pelas consequências presen- nicos diferentes. Não poderemos esquecer que lo Werneck e as esculturas de Alfredo Ceschiat- tes da globalização. A historiografia crítica de o Padre António Vieira, ele mesmo, era neto de ti. Homenageámos, assim, Nuno Teotónio Perei- ambos os países está hoje em condições de en- uma mulata, e que tal não o impediu de ser fi- ra e os seus companheiros do nosso MRAR, co- tender que há diferenças e complementarida- gura de primeiríssimo plano no seu tempo. A mo o tínhamos feito relativamente a Gonçalo des que têm de ser compreendidas e aprofun- religião, a música, a literatura e arte são profun- Ribeiro Telles, quando falámos de Burle Marx, dadas – num sentido crítico e emancipador, es- damente influenciadas por essa mestiçagem, lembrando igualmente Ruben A., diretor dos truturadas através de um modo universalista de mistura enriquecedora absolutamente inédi- serviços de imprensa da Embaixada do Brasil encarar a cultura e de uma língua comum. Im- ta. Falar de uma «cultura luso-brasileira» é refe- em Lisboa, que tanto contribuiu para o conhe- põe-se, por isso, um conhecimento mais exigen- rir uma realidade profundamente original e di- cimento da obra emblemática de Belo Horizon- te de duplo sentido, uma vez que a diversidade ferente, demarcada das de onde partimos e que te. A utilização das curvas por Niemeyer prolon- cultural e histórica pressupõe movimentos cen- se cruzam no inesgotável território brasileiro. ga o barroco e afirma a identidade de Minas Ge- trípetos e centrífugos. Do ciclo do pau-brasil pas- Voltando a Freyre: «Para a formidável tarefa de rais e desse espírito artístico de contradição, de sou-se ao do açúcar, que no início do século XVII colonizar uma extensão como o Brasil, teve Por- representação, de metáfora, de sonho, de imper- correspondia a cerca de 95 por cento das expor- tugal de valer-se no século XVI do resto de ho- feição, de humanidade e universalismo. E, sobre tações brasileiras, tornando o nordeste uma das mens que lhe deixara a aventura da Índia. E não o barroco brasileiro, temos de lembrar Mário de zonas mais prósperas da América. No entanto, a seria com esse sobejo de gente, quase toda mi- Andrade (1893-1945), o primeiro a reconhecer a queda dos preços internacionais da matéria-pri- úda, em grande parte plebeia e, além do mais, continuidade entre a obra dos santeiros e dos ma mudou drasticamente o curso dos aconteci- moçárabe, isto é, com a consciência de raça ain- escultores dos século XVIII e a epopeia moder- mentos, num sentido dramático não fora a des- da mais fraca que nos portugueses fidalgos ou nista. António Francisco Lisboa foi o génio que coberta do ouro e dos diamantes no virar dos nos do norte, que se estabeleceria na América interpretou e antecipou. O barroco do Aleijadi- séculos XVII e XVIII. É, no entanto, a miscigena- um domínio português exclusivamente bran- nho não se limita a ser estilo da época (até por- ção biológica e cultural que vai constituir a cha- co ou rigorosamente europeu». Já lembrámos a que é único) – é uma atitude original, que põe a ve fundamental para a pujança criadora que justa crítica de Vitorino Nemésio sobre o desco- arte de Minas Gerais num ponto singular na his- gradualmente se foi afirmando no Brasil. nhecimento nosso sobre a cultura brasileira e a tória, como reconheceu Germain Bazin. E se dú- míngua de estudos brasileiros aqui. É um desa- vidas houvesse, aí está a literatura pujante desse CASA GRANDE & SENZALA - Uma leitura mo- fio fundamental perante que nos encontramos. barroco brasileiro especial, projetado para além derna e atualista de «Casa Grande e Senzala» Não basta a invocação comemorativa de laços de setecentos. Desde o Padre António Vieira até de Gilberto Freyre, completada pelos resulta- ou recordações. E não se pense que a economia Euclides da Cunha (com «Os Sertões – Campa- dos das recentes investigações históricas e so- avança sem o intercâmbio e o diálogo da cultu- nha de Canudos», 1902, sobre o movimento de ciológicas, permite entender melhor o que Sér- ra. A situação mundial e europeia obriga a um António Conselheiro) – onde as metáforas e as gio Buarque de Holanda designa como «Raízes estreitamento de relações de conhecimento e contradições se encontram, com a plasticidade do Brasil», bem como os desenvolvimentos que de criatividade, de saber e iniciativa. Não se trata da língua. E a verdade é que Mário de Andrade entretanto se foram produzindo. Lembremos de pensar em alternativas globais à construção não pôde prever que João Guimarães Rosa se- a importância dos bandeirantes paulistas. Fo- europeia, mas da construção de um novo rela- guiria esse filão, como, aliás, João Cabral de Me- ram eles que romperam o limite do meridiano cionamento atlântico com interesses e valores lo Neto (admirador confesso de Quevedo e Gôn- de Tordesilhas, levando o Brasil às fronteiras do comuns e diferentes. gora) e Carlos Drummond de Andrade… Por um presente. Os estudiosos são unânimes em refe- momento, nesse sonho barroco de letras e artes, rir as virtudes e os evidentes riscos dessa auto- O SONHO DE J. K. - No final do primeiro dia da quase esquecemos que Belo Horizonte nasceu colonização, que poderia ter conduzido à frag- visita do CNC, no conjunto arquitetónico da em 1897, planeada ortogonalmente por Aarão mentação territorial. O certo, porém, é que o Pampulha em Belo Horizonte, recordámos Jus- Reis, para suceder a Mariana e Vila Rica de Ou- «melting-pot» e a construção do Estado (à ima- celino Kubitschek e a visão futurista do jovem ro Preto, onde o bandeirante João Leite da Silva gem de Portugal) permitiram uma síntese ex- prefeito (1942-44), anunciando ali o que seria Ortiz, guarda-mor das minas de Goiás, fundou, traordinária e uma unidade surpreendente. E o fantástico sonho de Brasília, com Óscar Nie- a partir de uma concessão em sesmaria (1711), o diz ainda Gilberto Freyre: «Em contraste com o meyer. O Cassino funcionou fugazmente como Curral d’El-Rei. nomadismo aventureiro dos bandeirantes – em salão, pela proibição pelo Presidente Dutra dos sua maioria mestiços de brancos e índios – os jogos de fortuna e azar (em 1946), passando a ser senhores das casas grandes representaram na um centro de arte na década seguinte. A Casa de NOTA formação brasileira a tendência mais caracte- Baile acompanharia o destino do Cassino. O Ia- Texto publicado ao abrigo da parceria estabelecida entre risticamente portuguesa, isto é, o pé-de-boi, no te Ténis Clube é monumento nacional e os jar- AS ARTES ENTRE AS LETRAS e o Centro Nacional de Cultura 31 outubro 2012 emdestaque as artes entre as letras | 4

Porto revive a Programa do Colóquio Renascença e a sua obra

Dia 14 (quarta-feira) Isabel marcante e não ser apenas uma mente espon- Palacete dos Viscondes de Balsemão Fernandes tânea de visibilidade pública”. E Paulo Samuel concretizou: “Porque, por exemplo, a maior par- te das obras estão incluídas em séries ou em bi- 10h30 - Abertura oficial do Colóquio Renascença Portuguesa está a assinalar bliotecas – por exemplo, há uma biblioteca lusi- cem anos. O que foi? O que resta? Quem tana, há uma biblioteca da educação, há uma bi- 11h - “Os artistas plásticos e a imagem Asabe do que se trata? Entre seminários blioteca da Grande Guerra, que inclui obras re- estética da «Renascença Portuguesa»” e conferências, alguns tentam preservar a me- lacionadas com a guerra de 14-18, com títulos - Isabel Ponce de Leão (UFP/CLEPUL-Porto) mória e o património deste movimento literário de militares portugueses que estiveram no lo- e cultural do início do século passado, mais ou cal das operações, há uma biblioteca histórica. 11h30 - “António Carneiro e a estética menos entre 1912 e 1929/30, que surgiu no Por- O que denota que havia ali, de facto, um pen- da «Renascença Portuguesa» to e se estendeu ao país. Aquele que foi “o maior samento e uma política editorial, no sentido de - Eduardo Paz Barroso (UFP/CLEPUL-Porto) movimento cultural e literário do Porto e do pa- distinguir muito bem não só as obras, mas os pú- ís” teve, no entanto, um período de acção relati- blicos a que se destinavam com características, 12h - “Espólios literários e outros: vamente reduzido e registou “o seu período áu- algumas delas, diferenciadas”. algumas considerações” reo entre 1912 e 1924/25, que engloba a criação Paulo Samuel, recordou que houve títulos que - Luís Cabral (CMP/Divisão de Cultura) da Faculdade de Letras do Porto por Leonar- foram reeditados, que tanto quanto se sabe “não do Coimbra, enquanto ministro da Instrução”. há fundos editoriais” da Renascença Portugue- 12h30 - Debate. De todas as vertentes da Renascença Portugue- sa, significando que “essas obras eram vendi- sa, a actividade editorial é “a área que tem sido das e lidas e que tiveram, sem dúvida alguma, 13h - Pausa./Almoço. muito pouco estudada e atendida” e, na pers- um grande impacto na sociedade culta do Por- pectiva de Paulo Samuel, “muito menos anali- to e não só, pois havia uma distribuição nacio- 14h30 - “Uma editora coetânea sada quanto ao seu impacto social, educativo, li- nal e internacional, porque parte destas obras da “Renascença Portuguesa”: terário e cultural, através das várias ‘Bibliotecas’ eram distribuídas no Brasil”, lembrando mesmo a Livraria Civilização” criadas para o efeito, numa produção que atin- que parte delas eram impressas no Rio de Ja- - Nuno Cravo (UA) giu em poucos anos mais de 200 títulos publi- neiro, a partir do momento em que Álvaro Pin- cados”. E é precisamente esta vertente que se- to – “que era a grande figura deste movimento e 15h - “Os livros enquanto património: rá abordada durante três dias – de 14 a 16 de No- o homem mais directamente relacionado com conteúdos textuais vembro – no Colóquio «O lugar do livro no cen- a actividade prática e pragmática da Renascen- e representações patrimoniais” tenário da Renascença Portuguesa e da Livra- ça” – foi para o Brasil, onde fundou, para além de - Sérgio Lira (UFP/CLEPUL-Porto) ria Académica» e que se dividirá entre o Pala- uma revista de literatura, uma editora, Anuário cete Viscondes de Balsemão e a Universidade do Brasil, inicialmente chamada Lusobrasilia- 15h30m - “As revistas literárias Católica do Porto, com uma visita ao Museu do na, “o que levou a que houvesse um intercâm- do Porto no início do século XX” Papel (Paços de Brandão, Santa Maria da Feira). bio grande de obras publicadas em Portugal e - Daniel Pires Paulo Samuel, organizador e coordenador-exe- no Rio de Janeiro”. O organizador do Colóquio cutivo do encontro, quer que este seja um mo- «O lugar do livro no centenário da Renascença 16h - “A importância dos impressos mento de abertura a especialistas e público em Portuguesa e da Livraria Académica» assinalou ou como se descobre um (ignorado) geral – daí ter escolhido realizar o evento fora da ainda que aquele intercâmbio entre Portugal e combatente republicano, poeta renascen- universidade (com uma explicável excepção) – Brasil na edição “é de tal forma importante que tista: Alfredo Brochado” e um contributo para que também esta verten- alguns investigadores ou bibliófilos brasileiros - António José Queiroz (UCP/CEPP) te, cujo impacto foi “muito grande na época”, en- já referiram que um dos períodos mais impor- tre no conhecimento e na abordagem da Renas- tantes da edição no Brasil, designadamente pe- 16h30 - Pausa./Café cença Portuguesa. Este estudioso, que tem um las suas qualidades gráficas e estéticas, corres- percurso ligado ao livro e à edição, afirmou mes- ponde precisamente ao período em que o Álva- 17h - “Alguns desafios Juspolíticos da mo ao jornal As Artes entre As Letras, na conver- ro Pinto desenvolve essas edições no Rio de Ja- «Renascença Portuguesa»” sa que foi mais uma viagem à Renascença e ao neiro, sob a chancela do Anuário do Brasil”. - Paulo Ferreira da Cunha (UP-Fac. Direito) livro, que as publicações daquele período são Paulo Samuel – autor do livro «A Renascença dos primeiros projectos editoriais que conhece Portuguesa: um perfil documental» – não dei- 17h30 - “O plano editorial da no séc. XX com a amplitude que teve e “uma vi- xou ainda de realçar que este é um momento «Renascença Portuguesa»” são editorial pouco comum à época”. E explicou “muito interessante” para trazer o tema à refle- - Paulo Samuel (UNL/CHC) que “a Renascença Portuguesa não se limitou a xão e à discussão “porque estamos a atravessar publicar os autores ou os nomes mais marcan- talvez um momento limite, relacionado com o 18h - Inauguração da exposição tes do movimento”, como foi o caso de António futuro do livro”, não hesitando em afirmar que de obras publicadas pela Sérgio, de quem há várias obras publicadas” na- se tornará um objecto verdadeiramente raro. «Renascença Portuguesa» quele período. “Publicou também autores brasi- Referiu-se ao facto de o Porto praticamente não leiros”, assinalou e realçou que “esta linha edito- ter editoras, não ter livrarias tradicionais – “ex- rial estava, de facto, concebida para ser algo de ceptuando talvez o caso da Livraria Lello, mas 31 outubro 2012 5 | as artes entre as letras emdestaque

que é hoje uma livraria muito diferente, com que hoje jovens e não jovens já têm dificulda- uma vertente muito ligada ao Turismo, não tem de em distinguir os diversos tipos de encader- um fundo editorial também”, o que o faz reafir- nação, não reconhecem os tipos de papéis, os ti- Dia 15 (quinta-feira) mar: “Já não há nenhuma livraria tradicional no pos de gravação que se faz, a utilização que era UCP-Porto (Campus da Foz) Porto”. corrente em artes gráficas de famílias tipográfi- O que ainda há “são livrarias alfarrabistas”, que cas – aquilo que hoje chamamos fontes – etc. To- também não escapam ao momento actual e do esse saber das artes gráficas que ainda está 10h - Abertura da sessão. atravessam o que caracteriza como um “fenó- patente em livros que têm mais de 50 anos não meno muito curioso e interessante” e que des- é apresentado e não é dado a conhecer aos no- 10h15 - “As obras da conhece ainda o alcance futuro: “Como não há vos públicos começa também a não estar visí- «Renascença Portuguesa» na Bibl. livrarias tradicionais no Porto, e eu quando di- vel. Porque esses espaços de visibilidade estão Memorial Leonardo Coimbra” go tradicionais não é no sentido de serem anti- ocupados por outros. Tudo isto faz-nos entrar – António Costa (UCP/CEPP) gas, mas é de terem uma prática tradicional do aqui num ciclo vicioso e perverso sempre com livro, desde logo com a existência de fundos edi- a maior perda dos nossos saberes nesta área do 10h45 - Pausa./Café toriais – e eu darei como exemplo de livraria tra- livro e das artes gráficas. Porque Portugal – mais dicional a antiga Livraria Leitura –, das mais di- uma vez importa dizê-lo – tem quase cinco sé- 11h - Conferência: “O livro português versas áreas da publicação editorial e durante culos de história na impressão de livros. Não é e o Humanismo Europeu” bastante tempo levando a que as livrarias alfar- algo novo, não nos aconteceu aqui o que acon- – Artur Anselmo (UNL/CHC) rabistas, pelo menos aqui no Porto, estejam a ser teceu noutros países que receberam a tipogra- visitadas e procuradas por um público relativa- fia e o saber de produzir livros no séc. IX X. Nós 11h30- Conferência: “Bibliofilia y libros mente jovem que procura aí [nas livrarias alfar- fazemos livros desde o séc. XVI. É qualquer coi- bodonianos en la Península Ibérica” rabistas] o que não encontra no lugar próprio: li- sa! O D. Manuel [já] mandava fazer edições es- – Pedro M. Cátedra (Universidade de Salamanca) vros editados há cinco anos, há seis, há sete, há peciais… Tudo isto se está a perder”. Paulo Sa- três anos. Livros de ficção, romances, livros de muel fala fluentemente sobre o tema e não pre- 12h - Debate História e Historiografia, etc. Mas chama a aten- cisamos de muitas interrupções para que a in- ção para o facto de este não ser o papel das livra- formação útil surja ou para que as explicações 13h - Pausa./Almoço. rias alfarrabistas! Bem pelo contrário, a função sejam suficientes.E nesta sequência fluente, in- delas “é terem livros antigos e, de alguma forma, troduz a razão pela qual o colóquio interliga os 14h30 - UCP-Porto (Campus da Foz) dar resposta aos interesses dos coleccionadores centenários da Renascença e da Livraria Aca- Saída do Porto. e bibliógrafos, quer relativamente a obras anti- démica. Deslocação dos participantes gas, seculares, quer de edições especiais que se O colóquio – que coincide com o dia 16 de No- fazem desde cedo, não apenas no séc. XX – edi- vembro por ser nesse dia que se cumpre o cen- 15h - Museu do Papel (Paços de Brandão) ções amarradas, assinadas, com dedicatórias – tenário da abertura da livraria – ainda pretende Visita guiada ao Museu do Papel ou seja, dentro de uma determinada tipologia chamar a atenção para o que é ser livreiro alfar- que é o que define ser alfarrabista e o ser bibliófi- rabista, isto a propósito do Centenário da Livra- 16h - “História do papel, filigranas e marcas lo. Os livreiros alfarrabistas não existem para te- ria Académica, de Nuno Canavez, uma das mais d’água no acervo do Museu do Papel” rem os livros publicados nos últimos 10 anos, ou antigas do Porto, que se dedicou sempre ao co- – Maria José Santos (Museu do Papel) cinco anos…”, asseverou. “Nós estamos a perver- mércio alfarrabístico, de uma maneira geral, ter aquilo que é uma livraria alfarrabista, porque criada pelo livreiro Guedes da Silva e continua- 17h - Regresso dos participantes ao Porto deixa de o ser para se tornar livreiro de livros no- da pelo actual livreiro Nuno Canavez. Por tudo vos e usados, que é outro domínio e que tam- isto pareceu a Paulo Samuel, do Centro de His- 18h - “Tertúlias & Alfarrabistas: bém existia no passado”… Mas hoje tudo é dife- tória da Cultura, da Universidade Nova de Lis- estórias de livros com gente (de)dentro” rente, movido – lamenta – pela “maior rendibili- boa (UNL/CHC), “feliz e oportuno juntar dois dade económica” e, portanto, “o que conta é ape- momentos históricos que estão aliados por esse Painel de convidados: nas aquilo que pode dar dinheiro imediato e em elemento comum que é o livro e fazermos uma – Nuno Canavez (Livraria Académica) grande escala”. reflexão em torno de todas as questões relacio- – Herculano Ferreira (Livraria Manuel Ferreira) Na viagem que fizemos com Paulo Samuel pe- nadas com o universo do livro”. Os três dias de – Pedro Castro e Silva (Livraria Castro e Silva) lo livro e pela edição com o Centenário da Re- encontro, “e para ir ao fundo das questões”, vão – Adelino Pires (Livraria D’Outro Tempo) nascença Portuguesa e o colóquio que terá lu- ser usados igualmente “para saber o que é o pa- – Nuno Gonçalves (Livraria Otium Cum Dignitate) gar no Porto e que inclui uma viagem a Paços pel e como é que se produz papel manual, de al- de Brandão como pretexto houve igualmente godão e é nesta parte que se encaixa a visita ao tempo para lembrar o que se está a perder em Museu do Papel”. Saber o que é uma marca de termos de cultura e mesmo de património. O água e um filigrana, que hoje com a produção in- facto de, cada vez mais, as montras das livrarias dustrial do papel já não existe, mas contempla- alfarrabistas estarem a ser preenchidas pelos dos em livros com mais de 70 anos”. E relembra títulos mais recentes e não pelo que é suposto que Portugal teve grandes marcas de produção comportarem, obras antigas e autores do passa- de papel: “Algumas dessas marcas são célebres do e que, refere, “era importante estarem ali visí- a nível da Península Ibérica e da Europa e nós veis para os novos públicos”, salientando “a per- sabemos muito pouco sobre isso”, razão pela da de conhecimento” que tal acarreta. E as per- qual considera “importante” a comunicação da das que aponta são mais do que o desconheci- ex-directora daquele espaço (que fez recente- mento de autores e obras. “Estamos a falar de mente 11 anos), Maria José Santos, e que se tem outros conhecimentos e de outros saberes por- dedicado há muitos anos a essa investigação. 31 outubro 2012 emdestaque as artes entre as letras | 6

Exposição Dia 16 (sexta-feira) Palacete dos Viscondes de Balsemão urante os três dias do colóquio – e tal- de alguns autores, como é caso da tese de vez possa ser prolongada no tempo – Leonardo Coimbra «O Criacionismo», e das Destará patente uma exposição inédi- obras de Pascoaes, mas também capas ilus- 10h - “Ensinar as artes do livro na Universi- ta sobre a actividade editorial da Renascen- tradas por artistas da época e que são mui- dade hoje” ça Portuguesa, que deverá rondar os 100 to pouco conhecidas, de António Carnei- – Cristina Carrington (UA) títulos dos 300 que publicou o movimen- ro, Cristiano Carvalho, Correia Dias. Em De- to. Será acompanhada por um catálogo da zembro, a exposição será trasladada para a 10h30 - “Retratos da [Livraria] Académica – mostra com informação sobre o que foi a Biblioteca Albano Sardoeira, em Amaran- memórias do livro” actividade editorial da Renascença Portu- te, onde ficará exposta por duas semanas, a – Eva Gomes (UA) guesa e uma espécie de catálogo com a des- coincidir com a data da entrega do prémio crição das obras que estarão a ser expostas Teixeira de Pascoaes. Durante esse período 11h - Pausa/Café e também com a reprodução daquelas que serão proferidas duas conferências, uma podem ser consideradas mais importantes por Paulo Samuel e outra por Isabel Ponce 11h30 - “Vulgarização da leitura, entre ro- ou que marcaram o percurso bibliográfico de Leão. mances e periódicos” – João Luís Lisboa (UNL/CHC)

12h - “Quando a memória se escreve patri- monialmente…” – Annabela Rita (FLUL/CLEPUL)

12h30 - Debate.

13h - Pausa./Almoço.

15h - “O caleidoscópio de poéticas na dinâ- mica da «Renascença Portuguesa»” – José Carlos Seabra Pereira (UC)

15h45 - “Os centros de investigação e a edi- ção de livros em suporte de papel” – José Eduardo Franco (FLUL/CLEPUL)

16h30 - “Avisos e lembranças de um cole- cionador de livros que está longe de ser au- toridade na matéria” – Artur Anselmo (UNL/CHC) Sobre o futuro 17h30 - Livraria Académica Evocação do centenário da Livraria do livro em suporte papel... Académica. Contrariando o que tem lido e ouvido, valorização. Há 50 anos ninguém ligava Mostra de livros sobre o Porto Paulo Samuel não tem “dúvida nenhuma nada a um manuscrito, hoje há um cam- e Transmontanos de que tudo isto [o que expôs ao longo da po de interesse que se dedica quase exclu- Apresentação do livro Subsídios para uma conversa com As Artes entre As Letras] sivamente ao manuscrito. Nós temos ho- bibliografia sobre Trás-os-Montes e Alto- concorre para que, de facto, o livro em su- je em Portugal, pelo menos, uma livraria Douro (vol. V), de Nuno Canavez, por Ger- porte de papel venha a tornar-se pratica- alfarrabista que se dedica à área dos ma- mano Silva mente residual”. nuscritos com grande sucesso e, provavel- “Se eu vejo nisso uma vertente exclusiva- mente, ao livro acontecerá a mesma coisa. mente negativa e grave, direi que não. Pelo Ou seja, criar-se-á no futuro uma falange seguinte: talvez esse processo que nos pa- de pessoas que vai ainda saber o que é o li- rece drástico e dramático com tudo o que vro, o que é que ele encerra, que vai ainda lhe está associado, não é apenas por cau- descobrir muito sobre os livros... Tenho es- sa do suporte, mas com a perda desse do- sa esperança porque, enquanto editor, pu- mínio do livro em suporte papel nós esta- bliquei alguns livros que têm característi- mos a extinguir empresas, profissões, pes- cas que eu nunca revelei e que espero que soas que ainda estão nessas áreas, forma- venham a ser conhecidas no futuro e, por- ção que poderia ser feita nessas áreas, etc. tanto, vão ser esses que vão procurar o li- Mas noutra perspectiva e à frente pode le- vro e que o vão valorizar extraordinaria- var a que o livro venha a tornar-se algo de mente. Vai ser mesmo um objecto de cul- tão raro que depois venha a ter uma outra to, já o é, mas vai tornar-se cada vez mais”. 31 outubro 2012 7 | as artes entre as letras páginaqueirosiana

J. A. Gonçalves Guimarães amigo e confrade de ACM amigo protocolado da FEQ

Os caminhos da História recente

os meses de Verão, num dos poucos diários não é possível comparar, até por impossibilidade crono- muito para trás. portugueses que ainda subsistem, fomos len- lógica, os tempos de agora com «os tempos de Salazar». Uma mitomania recente é aquela que os serviços de Tu- Ndo uma polémica entre os historiadores Rui Compreende-se que a geração que nasceu depois de 74, rismo entre nós difundem fazendo crer que, no passado, Ramos e Manuel Loff a propósito dos capítulos sobre ou que então era criança, não tenha uma noção real dos havia multidões de peregrinos a caminho de Santiago de o Estado Novo publicados pelo primeiro na sua His- tempos estúpidos e cinzentos do «orgulhosamente sós». Compostela, como se fosse possível, até finais do século tória de Portugal, polémica essa a que se juntaram al- E então, para de tal saberem, terão de recorrer ou à me- XIX, o povo andar a passear por esses caminhos fora. A guns outros historiadores, juristas, sociólogos e não sei mória dos vivos com cinquenta e mais anos e aos seus efabulação está pois na ordem do dia e a preguiça men- mais quem. Tem sido uma bela polémica, com alguns relatos forçosamente pessoais e parcelares ou aos docu- tal encaixilha-a, aplaude-a e vende-a como ouro, quando exageros à mistura que não interessam para o caso. mentos da época. Mas todos nós sabemos, mesmo sem não passa de latão. Ainda em anos recentes um livreco Mas quero desde já sossegá-los: não sou mais um histo- sermos historiadores, que um documento pode ser ver- cheio de erros históricos crassos, que o pudor me impe- riador a querer dirimir razões entre aqueles dois histo- dadeiro e o seu conteúdo falseado, propositadamente ou de de nomear, uma coisa que pretendia “por a nu” a vida riadores e professores universitários, embora sobre ca- não. A História não é uma questão de fé, mas ciência em de rainhas e princesas de Portugal, e que se vendia nos da um deles e a sua obra tenha opinião feita obviamente busca da possível verdade. Mas a sociedade prefere-lhe hipermercados ao lado dos sabonetes, esgotou pelo me- pessoal. Para mim a questão é outra: será possível e acei- o mito, a fantasia. nos duas edições. O povinho gostou da coisa e mandou tável haver já uma História do Estado Novo a tão curta Todos nós conhecemos a história mitológica do passado, às malvas o lavor dos historiadores. distância da sua existência cronológica, escrita por histo- difundida pelas crenças. Ouvimos frequentemente al- Eça de Queirós, que o não era, escreveu que «as ciências riadores criados nas suas estruturas, ainda que em der- guém dizer que gostaria de ter vivido noutra época, com históricas são a base fecunda das ciências sociais (Prosas rocada após o golpe militar de 25 de Abril e a reorganiza- certeza na situação de privilegiado e não na de cavador Bárbaras). O que se pede aos historiadores é pois mais ci- ção social e económica consequente, que na realidade, de enxada. Há pessoas com o ar mais sério deste mundo ência e menos ideologia. Ou talvez, seguindo Voltaire. tratou de compor a outra face da “moeda única” que o tal que divulgam mitos, ou os seus relatos, como se de His- «Trabalhemos sem filosofar… porque é o único meio de Estado Novo criou? tória se tratasse. A maior parte do público não distingue tornar a vida suportável» (Cândido). Será tal possível quando ainda estão vivos e opinativos as fantasias históricas dos literatos e memorialistas da se- Mas então não será possível ir já estudando o século XX dirigentes, ministros, militares, clérigos e simples cida- rena procura da possível descrição do passado. Por ou- português? Creio bem que sim, mas com cuidado, com a dãos que viveram, suportaram ou repudiaram o Estado tro lado há situações e personagens do passado que são vontade de não esquecer os mitos e seus mitómanos que Novo e que foram pais e avós da geração que hoje terá sistematicamente retiradas do seu contexto épocal e vi- assim se pretendem perpetuar, e sem ajudar a erguer no- 30/40 anos, incluindo aqueles dois historiadores que se lipendiadas ao longo dos séculos. De Herodes o Grande vos mitos retroativos. Vamos a fatos; vamos a datas; va- acusaram mutuamente de terem uma visão ideológica saberemos que mandava matar criancinhas, mas pouco mos a números. E, mesmo esses, interroguemo-los sem- daquele período da História Contemporânea portugue- sabemos da construção do grande porto de Cesareia que pre sem acreditar nas lombadas ou encadernações com sa, europeia e mundial? Creio bem que não: as glórias e as mandou fazer e que deu pão e abrigo a milhares de nave- que se apresentam. Então, talvez, tenhamos História, chagas ainda estão vivas e a poeira do tempo ainda não gantes. E quanto a governantes responsáveis pela morte mesmo sendo a do historiador A ou a do historiador B. assentou. Basta ver a toleima, para não dizer infantilida- de criancinhas ao longo do nosso século XX, temos um E, pelo sim pelo não, a dos historiadores será sempre me- de ou inconsciência, com que alguns comparam o que extenso rol para vos apresentar que deixaria Herodes lhor daquela que é feita pelos que o não são. Esplendor da Arqueologia

Desde 27 de Outubro, decorre no Solar Condes de Re- muitas outras, até à arqueologia de sítios contempo- textos dos professores. A sua frequência implica a sende um curso livre – «Esplendor da Arqueologia: Ci- râneos. inscrição prévia. ência, Cultura, Turismo» – destinado a todos os géne- Os conferencistas são alguns dos mais conhecidos ros de público, mas em especial aos estudantes e pro- investigadores que já publicaram trabalhos sobre Email fissionais de Arqueologia, Património, Turismo, Ensi- estes locais e que são igualmente conhecidos pela [email protected] no e dirigentes e ativistas de instituições culturais e re- sua grande capacidade de comunicação, de entre os confrariaqueirosiana.blospot.com eca-e-outrasblogspot.com creativas. O curso decorre duas tardes de sábado por quais, António Lima, António Manuel Silva, Armando mês, entre as 15 e as 17 horas, num total de 12 sessões. Coelho, Fernando Coimbra, Gonçalves Guimarães, Coordenação da página [email protected] Os temas a abordar irão desde o Grand Tour e as gran- Joel Cleto, José Manuel Tedim, Laura Peixoto, Lino des descobertas arqueológicas dos séculos XVIII e Tavares Dias, Luís Manuel de Araújo e Manuel Real. Endereço Postal: Solar Condes de Resende XIX, passando pelo Egito e pela Europa celta, até às es- O programa definitivo pode ser visto em confraria- Travessa Condes de Resende, 110 tações arqueológicas emblemáticas do Entre Douro queirosiana.blogspot.com 4410-264 Canelas V.N. GAIA - PORTUGAL Tel.: 227 531 385 | Fax.: 227 625 622 e Minho e Vale do Douro, como a Citânia de Sanfins, A todos os participantes será entregue no final do Telm.: 968 193 238 Tongóbriga, Crestuma, Ervamoira, Castelo de Gaia e Curso um certificado de frequência e um CD com 31 outubro 2012 literatura as artes entre as letras | 8

Ramiro Teixeira crítico literário A Criança que ri na memória do homem…

Mãe, abre-me a porta. Deixa-me entrar. Não deixes to das ideias, recheado de elipses, esquiva-se a mo- mo dá a conhecer a génese pessoalíssima deste li- que ele entre. mentos do pensamento dialéctico (tese, antítese e vro e a forma pelo qual o apresenta. A ver: O riso da criança que ri. O medo. síntese), salvo, porventura, no facto do poeta ao rei- Mãe, abre-me a porta. Tem pena do teu filho. vindicar o estatuto de ser pensante concluir existir. O meu corpo está frenético como um corpo empala- Abre a porta, mulher. Tem pena do teu filho. Todavia, esta mesma reivindicação torna-se sem do. Depositaram-me na enfermaria com o sorriso de A injecção. sentido pelo domínio ou pelo desejo de não existir. quem arreou a alegria há duas estações atrás. O meu A porta, mulher (p.16). Em contrapartida, a espaços, sobrevive a crença na corpo empalado é digno de registo. Ciranda ao acaso possibilidade da renovação da vida: por um qualquer caminho aleatório que não torno a á a língua e o sujeito falante, dito emissor, percorrer. que explana ideias e exterioriza sentimen- A escrita há-de salvar-me. A escrita há-de levar-me a Eu, sim, sou digno de registo. A inteligência guindou- Htos, comunicando por este meio com o so- algum lado. me até altos píncaros. cial. De acordo com o contexto em que se insere, Nos teus dedos, na minha mão. Até aqui, ao Miguel Bombarda, para ser um pouco que para além dos aspectos circunstanciais tem a Envolvo-te como o raio no descampado. Hei-de abra- mais preciso. ver fundamentalmente com a formação intelec- sar-te. Ninguém dá justo crédito às minhas palavras. Temo tual, ambiente familiar e estado psíquico, o falante Fulminado. mesmo que a minha palavra se perca atrás do vento. é motivado pela necessidade de adaptar o seu dis- A escrita há-de salvar-me. Como um demónio. (p.8). Na enfermaria regista-se uma absoluta tranquilidade. curso, por concordância ou oposição, às circuns- A meio da tarde cada um foi arejar, passeando nem tâncias externas, que o mesmo é dizer ao diálogo Situando-se nos antípodas da poesia de Eugénio por aqui nem por ali. Não esqueçamos que a minha com o outro, mesmo quando aparentemente mo- de Andrade, os textos de CTF não exprimem nem cabeça só fala para quem diz presente. A boca não. A nologa como acontece na generalidade da criação sustentam qualquer espécie de música, tão pou- cabeça. A humanidade terá que aguardar paciente- poética. co a exaltação do corpo, dos horizontes, das lu- mente pela próxima oportunidade. Nesta obra o coeficiente de correlação que se es- minosas cores do seu arco-íris pessoal, dos sen- Aqui vigora a lei da bata branca. Num raro instante tabelece entre a linguagem e o pensamento, da- timentos singulares aos rés das coisas simples, de lucidez vislumbro o desgaste de quem se ocupa do que a estrutura linguística está intimamente li- quotidianas, no seu esplendor. Bem ao contrá- de gente tal e qual como eu. Com a resignação de um gada à estrutura mental, reflecte estados de afasia, rio, exprimem a angústia de existir sem remédio, comprimido cada paciente traz uma vida que aban- de atrofiamento, evidenciando, não poucas vezes, através dum esquema obsessional pautado por donou lá fora. Não há uma única biografia verídica a incapacidade de ajustar não só a escrita ao pensa- configurações de tensões psíquicas, que tanto es- que um enfermeiro possa sustentar. Cada momento mento que a comanda, como o enquadramento do tilhaçam e dispersam a unidade do pensamento, é um momento efémero que esqueço. depoente no social. Assim: como a recriam segundo uma lógica particular Mas a bata branca lembra-me o haldol guardado de raiz doentia. na prateleira do gabinete que não ouso ultrapassar. O ar é ventilado nas condutas. O ar é destilado numa (p.22); carpintaria. A sombra é a palavra. A palavra gasta, a palavra di- Há a mão que serra. Há a mão que pune. ta. A sombra é a palavra. A palavra gasta. O sonho é a Não são brancas as paredes brancas do hospício. Pas- Há o grito. Que vai acabando. É claro o grito. Só o gri- sombra. A morte. A palavra. Diz. Os dentes. Os dentes sou hoje por mim uma rapariga que eu não cheguei to. O silêncio não. do tigre. O sonho é a palavra. A palavra morta, a pala- a beijar. Beijei-a antes, no pescoço da minha mãe, na A criança brinca e é um herói. A morte já a ronda. Só vra dita. O sonho. A sombra. A palavra morta, a pala- nuvem que aureava o mar. O beijo antes de ter tenta- a criança não sabe. vra dita. O sonho. A palavra. A palavra dita. do. Só a criança ri. Os dentes são a palavra. A palavra morta, a palavra di- Deste lado do muro eu não a beijei. Toda a violência. Toda a violência que conseguir. ta. O sonho. A sombra. (p.163). O muro é a barreira que me impede de ocupar um lu- (p.9); gar no mundo. Este livro de poemas em prosa traz-me à lembran- A injecção. A tumba está sepultada por debaixo do meu ombro. ça o quadro de Munch, «O Grito», não pelo expres- Depois vou cair desamparado no chão do hospício. No meu ombro está a tumba. Eu jazo na tumba no sionismo em si mesmo, mas pelo esquema obses- Atordoado balbucio que vou morrer e assim consigo meu ombro. sional que comporta. obter a indispensável ajuda. A morte repousa no bosque. No muro. Formalmente, a obra divide-se em dois blocos: um Dois auxiliares colaboram assepticamente no levan- A serpente desliza verdejante. através de correntes de pensamentos estilhaçados, tamento de um peso morto do fundo do chão. Arras- A morte está em chamas. ao jeito de escrita automática, por demais concisos tam-no até à cama, com o mesmo zelo com que acar- A morte está a saque. (p.13). ou reduzidos; e outro caracterizado por uma es- tariam uma palete de leite … (p.19); crita corrente, com pensamentos ajustados, ainda Muita da fraseologia aqui aplicada não obedece que sempre subordinados a pulsões obsessivas, e Na porta de entrada do muro está gravada uma ins- a uma ordenação lógica, raramente consubstan- onde o depoente não só revela o domínio superior crição a letras escarlates: Quem cá entra tem que es- ciando um pensamento completo. O encadeamen- sobre as imagens e a escrita que as fundamenta, co- quecer o que é para voltar a ser o que nunca foi. 31 outubro 2012 9 | as artes entre as letras literatura

Todos aqui dão em questionar o sentido da vida à ho- Meus senhores, apresento-me, o papalvo da quin- mim, particularmente, me angustiou pela parti- ra das refeições. Ninguém presta a menor atenção ao ta-feira. O escritor elegante acometido por pensa- lha a que a expressão do poeta me obrigou. carrinho do enfermeiro, posto discretamente à entra- mentos delicados e profundos. A elegância do ho- Já agora, dei-me ao trabalho de cotejar até páginas da do refeitório. mem de letras rebuscadas. O escultor da pedra dos 81, correspondentes a metade do livro, que empiri- A origem da vida vem promulgada numa folha bran- dias indefinidos. camente podemos multiplicar, a palavra muro, que ca colocada em cima do carrinho dos comprimidos. Amanhã outro homem cantará. Poderia ser assim. aparece 91 vezes; morte, que aparece 70; e porta e Na folha branca vem estipulado o futuro de cada um. Assim houvesse modo. medo, com 27 aplicações cada. O futuro tanto poderá ser azul como branco ou rosa. Passarei a escrever numa única linha aquilo que Não são palavras vãs: muro é sinónimo do espaço Mas regra geral é redondo. desde os primórdios os homens aspiram ouvir. hospitalar em que o poeta viveu e para o qual foi re- A meio da refeição dão-nos a conhecer o futuro que A palavra. metido em busca de normalidade existencial; mor- vem prescrito na folha branca. De cada vez a folha Eu sou o memorial. O lugar do culto das palavras te, constitui a metáfora dessa existência enclausu- branca estabelece um novo receituário. morta. Talvez fosse hoje, mas não sou assim. Aca- rada e dos tratamentos a que teve de se sujeitar, O futuro mostra-se imprevisível. O futuro vencerá so foi ontem. Por desdém digo hoje. que se por um lado tendiam a fazê-lo renascer pa- após o combate desigual de um homem contra duas Eu poderia ser hoje. Mas por hoje fiquemos assim. ra uma vida normal, por outro aniquilavam o que gramas. Vamos todos dormir como bebés ao colo do (p.21). de si sobrevivia em estado obsessivo; porta e medo, enfermeiro. justapõem as causas anteriores, com a variante de É um lugar-comum que à hora das refeições se esta- Este é um poeta que se compraz a cantar a im- acumularem a lembrança de pesadelos infantis (o belecem os melhores negócios. O acordo é formali- previsibilidade dos dias, o anseio e o abando- tigre), em simultâneo com a lembrança do carinho zado com um copo de água. O refeitório está pejado no que experimenta em relação ao mundo re- maternal e o desejo de regressar às origens do ser, de homens de roupa humilde. Homens soberbos que al, com o qual apesar de tudo dialoga mental- ao líquido amniótico, e daí o seu grito, Mãe, abre-me não pretendem negociar a vida. mente, inventando e inventariando ilusórias re- a porta. Deixa-me entrar… O enfermeiro traz os comprimidos. lações de felicidade (assim o devaneio sobre a Eis, enfim, pungente e ático, A Criança que Ri, ou a Veredicto: culpado. (p.42). rapariga inominada), ora através de mergulhos tragédia do homem em busca de si, sob a lembran- suicidas, ora de fulgurações estilísticas onde a ça de ter sido naturalmente criança, entre risos e Dizeres destes traduzem vivências seguramente ironia se compraz de forma surpreendente: afagos, porque tudo o mais desde então foi um pe- vividas, se me perdoam o pleonasmo, tal é o realis- sadelo para esquecer. Ou como o autor refere no mo e a angústia com que são relatados. O incomum Isto podia ser mentira mas é a mais pura das ver- que passa por ser a sua biografia oficial: Carlos Tor- e a precariedade das coisas vividas entremuros, de dades. A primeira vez que te vi no café Dr. Medina res Figueiredo nasceu a 5 de Março de 1968, em Lis- todo não se me afiguram poses burlescas, habilida- tu estavas sentada a três metros de mim. Eu disse- boa. Curta biografia. Tudo o mais são pormenores des ou adornos poéticos discursivos. Há aqui a ex- te, recorrendo à minha mente omnipresente (uma que poderiam ter sido de outro modo. Antes fossem. pressão duma existência em percurso retalhado, especialização caseira): “Não olhes para mim ra- dentro e fora dela. Assomos de consciência e in- pariga”. consciente vividos a espaços, entre a realidade e o Uma rapariga bonita a olhar para mim, incomoda- pesadelo, e que antes de passarem por metáforas me. Fico atrapalhado, sem saber o que fazer. (p.81). poéticas são projecções lodosas, borrões ou vómi- tos que irrompem dos abismos do ser. O desassossego, chamemos-lhe assim, aparece No entretanto, a espaços, a consciência que bem sobre todas as formas possíveis e imaginárias, pode passar por ser de génio, no sentido que verda- amplificando tanto as tensões pessoais como deiramente a palavra possui, que é o de talento ou os objectos e as personagens de convívio quoti- inspiração que os espíritos, bons ou maus, segun- diano, as mais das vezes através da perplexida- do a crença dos antigos, preside ao destino dos ho- de, do absurdo ou da agudização da consciên- mens, revela-se aqui com uma clarividência de es- cia dos fenómenos, vistos e analisados aparen- tado de ser impressionante (ainda que com algu- temente sob a perspectiva do outro lado do ser, ma ressonância do génio pessoano): mas, coisa extraordinária!, com um sentido críti- co de raro fulgor, com uma ironia de bisturi que Eu talvez não fosse, mas hoje sou assim. Uma estrela nada poupa na dissecação do que trata. tem o direito a deixar-se morrer a três anos-luz de dis- Entre a poesia e a prosa, o aforismo e a antifá- tância. No contrário de mim está a palavra que rever- bula, a agudização da consciência e as corren- deja. Sou o antónimo anónimo que surpreende com tes do pensamento inconsciente, A Criança Que Ri, é uma obra deveras perturbadora, de alguma uma profusa e labiríntica dissertação que versa sobre FICHA si mesmo. A palavra anódina encerrada num baú. maneira inqualificável adentro dos percursos A Criança que Ri, Carlos Torres Figueiredo. Prémio de Poesia O fim. da poesia portuguesa contemporânea, e que a Eugénio de Andrade, 2011. Porto, Modo de Ler, 2012). 31 outubro 2012 literatura as artes entre as letras | 10

Edite Estrela presidente da Delegação dos socialistas da Delegação Portuguesa no PE Um romance que pode não ser romance

« odemos matar um sinal de trânsito?» “Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potên- quando se alteram os sinais, o hábito prevalece. é uma obra surpreendente, que convi- cia a vossa”. E porque qualquer inovação num sistema não Pda a transmigrar, interpelando o enten- O último ponto do livro, o 134, parafraseando pode pôr em causa os princípios básicos – no sis- dimento profundo de quem vai além do tex- Wittgenstein – “o que se pode dizer pode ser di- tema de trânsito, a fluidez – teve de se fazer rapi- to e mergulha na profundidade do contexto. É to claramente; e aquilo de que se não pode falar damente uma “melhoria” da sinalização, ainda um título estranho, intrigante. E só depois de tem de ficar no silêncio” – termina com uma fra- que à revelia da norma. Imaginem o que seria se, se ler o subtítulo se percebe que não se trata se assertiva: “Acerca daquilo de que se não po- no Reino Unido, as autoridades decidissem mu- de um livro policial, embora cultive o suspen- de ficar em silêncio, tem de se falar”.E o filósofo- dar as regras de trânsito e adotassem a condu- se, mas de assunto sério, ainda que apresenta- narrador fala, fala muito e fala bem, seguindo a ção pela direita. Provocaria uma rebelião. Com do como «um divertimento político-filosófico recomendação de Wittgenstein: “O fim da filoso- uma ironia inteligente (que me fez lembrar Woo- acerca da profundidade do quotidiano». Mas fia é o esclarecimento lógico dos pensamentos”. dy Allen), o autor refere as mudanças de trânsi- dizer só isso, não “seria contar bem a história”, Percorrendo a orografia do texto e tentando to nas Ilhas Samoa (p.66), – mudança de sentido como é afirmado no p. 100. chegar aos meandros do sentido, há dois tópi- – mas, como não basta tomar uma decisão para A melhor apresentação do livro é, aliás, feita pe- cos que gostaria de destacar: que tudo corra bem, os autocarros não estavam lo próprio autor: devidamente preparados e gerou-se a confusão. “Sem ser um romance, este livro é como um ro- . A estranheza da proximidade/complexida- O mesmo acontece no sistema político. Sirva de mance: no fundo, conta uma história que quere- 1de das coisas próximas que escapam ao olhar exemplo o caso recente da TSU. Como punha mos saber como acaba. Sem ter a forma de um quotidiano. Muitas vezes, quanto mais próximo em causa o princípio da equidade, foi liminar- ensaio, é um ensaio: tem uma tese, mas não a da vista, mais distante do conhecimento. Pode- mente rejeitada pela generalidade das pesso- impõe, nem arregimenta os argumentos em or- mos chamar à colação a máxima socrática, “co- as. Alterar os princípios básicos de um sistema, dem clássica, deixando ao leitor o trabalho, que nhece-te a ti mesmo”, como aspiração daque- que as pessoas consideram inalienável, é consi- aqui é um gosto, de descobrir o seu próprio ca- le que acede ao saber para ilustrar a dificulda- derado uma violência. Como o autor reconhe- minho marítimo para a Índia. É um divertimen- de de conhecer aquilo que nos é próximo. Até ce no p. 125: “Parece que o mundo institucional to, porque divertirá o leitor tanto ou mais do que na nossa vida, sem nos apercebermos, valori- pode fazer uma certa violência ao mundo natu- divertiu o autor, mas é filosofia por ser pensa- zamos e conhecemos melhor o que é distante ral”. O mesmo se aplica a conquistas civilizacio- mento estruturado para lá das fronteiras das e tendemos a desvalorizar e desconhecer o que nais como o modelo social europeu, a escola pú- disciplinas, e é política por questionar dinâmi- está próximo. Por exemplo, é normal não conhe- blica de qualidade, o acesso universal aos cuida- cas profundas da nossa vida”. cermos os vizinhos do nosso prédio e seguir- dos de saúde que os neoliberais querem alterar, Está tudo dito mas, noblesse oblige, terei de mos com interesse, e quase com familiaridade, o que provoca enorme contestação popular. Ou acrescentar mais alguma coisa. a vida de pessoas que estão a milhares de quiló- com o sistema ortográfico (de que não vou falar) O sinal de trânsito é o leitmotiv de uma narra- metros de distância. É essa estranheza do que é mas sim, da relação difícil entre uso e norma na tiva que interpela o leitor e o transporta dos próximo, a verificação do que está e do que falta, linguagem. becos e vielas da vida para a profundura da que pode conduzir à profundidade do aparen- No p. 64, escreve o autor: “Um hábito abundan- interpretação filosófica. Mas é no p. 132 que te e do imediato. Em suma, a recorrente viagem temente partilhado tornar-se-á, provavelmente, encontramos as respostas para a pergunta do para o conhecimento. uma regra – mesmo que para tanto seja neces- título e encontramos a chave de leitura desta sário revogar alguma regra ainda existente mas complexa narrativa. O autor estabelece cor- . A relação entre matéria e pensamento ou, que já tenha caído em desuso”. A mesma ideia relações lógicas entre as palavras e “a famí- 2nas palavras do autor, “entre os sinais e as par- está presente nos p. 12 e 13: “O que o tempo faz às lia dos sinais de trânsito”, mas também, na li- ticularidades do sistema de trânsito que a ele se normas”; “o tempo matou aquela regra” e “as nor- nha de John Austin, entre a linguagem e a rea- subordinam ou que só se explicam através de- mas fortalecem-se com uso... partilhado”. Como lidade – “analisar a linguagem comum resulta le”. De que decorre no p. 16 a pertinente pergun- é sabido, uma variedade ascende num determi- em analisar a realidade” – e chega à “comuni- ta: “Existe primeiro o sistema de trânsito ou exis- nado momento a norma por razões fundamen- dade política”, tomando como exemplo a “de- tem primeiro os sinais?”. Na vida prática, o que talmente de natureza socioculturais e políticas mocracia portuguesa”: “A política portuguesa nos importa é o sinal, isto é, a materialização de mais que por razões exclusivamente linguísti- tem passado demasiadas vezes pela desqua- uma ideia e não a ideia em si mesma. Sigo as in- cas. E porque o uso é ele mesmo instância legiti- lificação da própria palavra dos agentes” e, dicações de um sinal de trânsito sem me preocu- madora, a norma não permanece invariável ao prossegue, “a palavra é muito poderosa: sem a par com a coerência do sistema que lhe está na longo dos tempos. palavra, as palavras, talvez não fosse possível origem. Mas, por trás de um sinal existe um to- São, aliás, frequentes os casos de conflito entre matar o tal sinal de trânsito. As mesmas pala- do coerente, o sistema. Tomemos como exem- norma e uso. Há formas legitimadas pela norma vras que o podem resgatar”. Conclusão óbvia: plo as recentes alterações de trânsito na rotun- que o uso não privilegia, como é o caso da pro- as palavras são uma arma poderosa, como já da do Marquês de Pombal em Lisboa. Como to- núncia de acordos, o sentido de famigerado, a o havia lembrado Cecília Meireles no poema do o sistema cria hábitos muito difíceis de alterar, acentuação de pudico. Outras há de grande acei- 31 outubro 2012 11 | as artes entre as letras literatura

tabilidade social, mas que a norma não reco- Aprendi com Bernardo Soares que «tudo o que interesse: (p. 94) “Dissemos lá muito atrás neste nhece, como é o caso das pretensas formas de vemos é outra coisa» e que “tudo quanto o ho- texto...”, “atentem no que vos relato”; (p. 107) “pa- particípio passado: empregue, encarregue, pre- mem expõe ou exprime é uma nota à margem rece estranha esta visão?”. “Considere o leitor, sente. E há vocábulos que têm um aparecimen- / De um texto apagado de todo. Mais ou menos, por exemplo, a relação entre o seu telemóvel ou to fulgurante e depois caem no esquecimento. pelo sentido da / nota tiramos o sentido que ha- o seu computador e os seus processos de pen- São os modismos, palavras que estão “em mo- via de ser o do texto; mas fica / sempre uma dú- samento: como é que tudo isso se conjuga?”. da” por um certo período. E há palavras ligadas vida, e os sentidos possíveis são muitos”. Desco- Termino dando a palavra a três crianças: ao “espírito da época”, ou seja, a um ambiente brir essa “outra coisa”, trazê-la da penumbra do 1. Do blogue do Porfírio, retirei estas frases da re- sociopolítico especial: reacionário, progressista, contexto para a luz do texto, decifrar os sinais, dação sobre “as palavras”, feita pela Mariana, operário, revolucionário, burguês, proletário. Atu- descobrir os sentidos possíveis, dissipar a dú- aluna do 4.º ano: “Há palavras boas e palavras almente, ocorre-me “mandatório”. vida é o prelúdio da compreensão do Verbo, o más, há palavras bonitas e palavras feias... As pa- As incursões linguísticas do autor chegam à re- princípio de tudo. É essa a aventura que o Porfí- lavras também servem para dizer e consolar ou lação forma/função, que remete para a relação rio Silva nos propõe. sofrer”. significante/significado e a arbitrariedade do Os leitores de «Podemos matar um sinal de 2. Quando estava a ler o livro, o meu neto Diogo, signo linguístico, de palavras como garfo, clip e trânsito?» têm de ser atentos, capazes de aten- aluno do 3.º ano, perguntou-me: “Porque riscas post-it. der ao essencial, disponíveis para a aventura o livro? É trabalho?”. Nas relações sociais, o poder é mutável, mani- das palavras, dos sinais e dos símbolos, enfim, 3. E o Vicente, irmão do Diogo, do 1.º ano, ao ver a festa-se e varia de relação para relação. A lingua- para a Vida, em toda a sua complexa simplici- capa do livro, estranhou: “Estás a ler um labirin- gem em “contexto institucional” adquire novos dade. to?!”. (É de labirinto que fala o p. 101). poderes. O poder de, ao dizer, fazer. Dizer e fazer Ao longo de toda a narrativa, o leitor diverte-se Três crianças que revelam capacidade de ob- com palavras. O autor parte então para “os actos com o insólito dos casos, confronta-se com o seu servação e de interpretação do real, que não se de fala” teorizados por John Austin e John Se- significado e questiona o adquirido para embar- limitaram a olhar, souberam ver. Porque, como arle e bem documentados no p. 120, onde o au- car na aventura de descobrir o outro lado, o la- nos lembra o autor, “não basta ter os olhos aber- tor distingue o valor da palavra na celebração do mais profundo, dos pequenos nadas de que tos para ver”. de um casamento e numa cena de casamento é feito o nosso quotidiano. A relação que o narra- E, agora, façam o favor de ler «Podemos matar num filme de Manoel de Oliveira. No primeiro dor estabelece com o leitor é plurifacetada, pe- um sinal de trânsito?» de olhos e mente bem caso, as palavras proferidas “declaro-os marido lo que merece uma chamada de atenção. O “eu” abertos e… bom divertimento. e mulher” produzem efeitos no próprio momen- do narrador emerge individualizado sem más- to em que são proferidas. No segundo caso, não caras ou nomes. Por vezes desdobra-se, nega- têm qualquer valor. “A diferença é institucional”, se, oculta-se, identifica-se com o autor. O narra- explica o autor. Para Austin, os atos de fala são dor parte da sua experiência “já vivi a experiên- emissões performativas que, ao serem proferi- cia de uma crise alimentar” (p. 62). Umas vezes, das, dão a impressão de dizer apenas algo, mas apresenta-se cúmplice do leitor, usando o plural que correspondem à realização de uma ação. narrativo, “nós”: desde logo no título, «Podemos Daí as perguntas do autor: “Porque é que os au- matar um sinal de trânsito?»; e no p. 105, “aten- tores do blogue 31 da Armada, quando, a 10 de temos nas proposições de Tummolini e Castel- Agosto de 2009, subiram à varanda dos Paços franchi”. E chega mesmo ao tratamento fami- do Concelho de Lisboa e hastearam a bandeira liar do tuteamento (p. 100): “O sistema continua azul e branca, não restauraram a monarquia, co- a sua vida mesmo que eu ou tu ou o nosso vizi- mo disseram ter feito, reclamando que foi preci- nho se sinta injustiçado por esta ou aquela deci- samente com esse gesto que em 1910 foi procla- são concreta, desde que ela tenha sido tomada mada a República?”. conforme ao procedimento”. Depois, num regis- “O que explica que Obama tenha repetido o ju- to coloquial e à boa maneira de Garrett nas «Via- ramento como presidente, no dia seguinte à ce- gens na Minha terra», interroga o leitor: “Surpre- rimónia de tomada de posse assistida por mi- endidos? Não me parece” (p. 89). Às vezes, o nar- lhões de pessoas, desta feita sem anúncio pré- rador singulariza-se para falar da sua experiên- vio, num ambiente recatado e perante um res- cia pessoal e partir de um caso concreto para o trito número de testemunhas?”. geral (p. 6), numa oscilação entre o “eu” e o “nós” “Quando cai um sinal de sentido proibido, por que não é desprovida de significado. Outras ve- nota esse facto desaparece a proibição de circular zes, adota um registo pedagógico, de pergunta/ Texto de apresentação do livro de Porfírio Silva «Podemos matar um sinal de trânsito?», nesse sentido naquela rua?”. Já estamos aptos a resposta, numa bem-conseguida tentativa de editado pela Esfera do Caos, Lisboa, 2012, na Livraria Orfeu, responder. envolvimento do leitor para manter intacto o um espaço cultural português em Bruxelas. 31 outubro 2012 arte as artes entre as letras | 12

Carlos Cabral Nunes [email protected]

Palavras-actos #46

naugurada recentemente no Palácio do Egipto, em Oeiras, a exposição “Lusophonies aleria – 2012

| Lusofonias” volta a encontrar-se com o pú- G e

I v blico português, depois de ter passado pelo Sene- Per gal, onde esteve patente na Galeria Nacional de Arte em Dacar, em Novembro de 2010. Já antes esta exposição, que é fruto da coleção que as ga- lerias Perve têm vindo a constituir, desde 1999, ti- nha sido apresentada em Portugal, corria o ano de 2009. Em todas as apresentações (passadas e futuras), a exposição é sujeita a uma nova sele- ção e consequente remontagem, tendo em conta o tema específico que se quer realçar e a sua in- Vista da exposição «Lusofonia» tegração no espaço físico onde a mostra se apre- senta. Integrada na Trienal Desenha ’12 e visitável até ja, no meio de tanta crise, a oportunidade que fal- china, i.e. são obras em cuja forma se anuncia a 30 de Dezembro, a exposição tem o desenho, tava para que se dedique, finalmente, atenção ao possibilidade do traço nobre do desenho. suas possibilidades discursivas e plásticas, com reforço da nossa ancestral ligação com os PALOP. Sendo certo que a coleção que dá corpo a esta a primazia no projeto de curadoria. Para o ano Assim desejo. exposição é substancialmente mais vasta do de 2013, esta mostra que pretende ser itineran- Aqui deixo fragmento do texto introdutório à ex- que aqui se apresenta – e do que foi anterior- te, viaja até São Paulo, onde será apresentada, de posição, que seguiu no catálogo e que, espero, mente apresentado noutros locais, é igualmen- forma bastante ampliada, no Museu Afro Brasil, possa ter o condão de despertar interesse para a te justo dizer-se que em cada apresentação des- tendo a chancela do “Ano de Portugal no Brasil”. visita, se não real, pelo menos virtual, através do ta exposição itinerante, se parte do todo para Pretendi, desde que a coleção teve início, que um site: www.pervegaleria.eu mostrar um fragmento que, por si só, faça senti- dia estas obras fossem reunidas definitivamente Mostrar o que foi (e continua sendo) a arte na- do para o visitante, seja ele leigo ou especialista. em torno de um espaço cultural, com caracterís- quilo a que hoje chamamos Lusofonia, mais Assim, a organização da exposição segue dois ticas museológicas, que abordasse a questão das do que manifestação de boas vontades, é uma eixos principais: o antes e o depois da revolu- Lusofonias, num quadro onde a matriz africana obrigação ante a demanda de conhecimento ção portuguesa, a 25 de Abril de 1974, e da con- fosse central. Falou-se, no tempo do anterior go- das gerações atuais que se expressam em por- sequente independência dos PALOP. Dentro verno, na constituição de um espaço do género tuguês, seja no território nacional, seja junto destes, criam-se subtemas como a produção ar- mas não dedicado nem à Lusofonia, nem aos PA- das comunidades luso-falantes espalhadas pe- tística local e a diáspora, estabelecendo-se liga- LOP. Chamava-se Africa.Cont e tinha o apoio da lo mundo. ções entre o imaginário africano e sua influên- União Europeia, da Gulbenkian e da Câmara Mu- Com este propósito, a Perve Galeria e o Centro cia em distintos autores portugueses. nicipal de Lisboa, que cedia o imponente Palácio Cultural Palácio do Egipto apresentam a expo- Numa espécie epílogo expositivo, gera-se a Tercenas do Marquês. Estava pensado para a re- sição «Lusophonies | Lusofonias» através da perspetiva sobre o futuro da criação artística lação contemporânea que a Europa pode (e de- qual se procura abordar de forma antológica a através da inclusão de obras que, na sua fragili- ve?) ter com África, como um todo. Em meu en- produção artística nos PALOP, Brasil e Portugal, dade, sublinham narrativamente o significado tender e disse-o nestas páginas, todo o edifício es- tendo por base a necessária reflexão sobre os conceptual, vivenciado, do termo Lusofonia e, tava errado, não nos pressupostos, que me pare- fundamentos e as razões estruturais que refle- por essa via, podem servir de elemento difusor cem corretos, mas nas prioridades: tratar de Áfri- tem a matriz africana da Lusofonia. da noção que aí se pretende evidenciar – como ca como um todo sem antes tratar da nossa rela- Esta mostra reúne obras cujo suporte e técni- será o que somos, amanhã? ção particular com os países africanos que falam ca se aproximam daquilo que vulgarmente se Complementarmente, apresenta-se um nú- português é manifestamente um erro que se tra- pode designar por desenho, a par com algu- cleo expositivo, intitulado «Um passo à frente duziria no maior afastamento destes em relação mas obras escultóricas que seguem igualmen- em África», em que se pretende evocar o perío- a nós. Agora que o tempo das vacas mortas (de te esse raciocínio – são obras que na sua tridi- do Africano de Cruzeiro Seixas, autor prestes a tão magras) chegou, não mais se ouviu falar des- mensionalidade poderiam possuir um discur- completar 92 anos de idade e que, desta forma, te projeto faraónico e peregrino. Pode ser que se- so sobre papel, com auxílio de lápis ou tinta-da- se pretende homenagear.

pub 31 outubro 2012 13 | as artes entre as letras arte

Agostinho Fernandes Joana Vasconcelos intemporal e global

oda a gente sabe que coube neste ano de dr 2012 representar a arte contemporânea em TVersalhes à artista portuguesa Joana Vas- concelos em exposição que para o efeito decor- reu de Junho a de Setembro em . A artista portuguesa também nasceu em Paris em 1971. Apesar do mundo controverso em que vivemos não deixa de ser deslumbrante poder tomar o avião para Paris em fim-de-semana e aprovei- tar para revisitar o Palácio de Versalhes e deixar- nos seduzir pelo génio, magia e originalidade das obras em exposição naquele mítico lugar da artis- ta portuguesa Joana Vasconcelos depois de ou- tros nomes respeitados no mundo das artes como o americano Jeff Kaans, do japonêsT akashi e dos franceses Veilhan e Bernar Venet. É a primeira mulher e também a artista mais jo- vem a confrontar-se com a referência histórica e única de Versalhes e nem sequer valerá a pena neste contexto alongar as nossas considerações ao valor universal e excepcional de um bem cul- tural maior como o Palácio de Versalhes, uma re- alização única de Luís XIV, o rei Sol e Património lher, singular e omnipresente na sua reflexão... en- a Valquíria Enxoval (2009), a Lilicoptère (2012), a Mundial da Unesco. Para além do Palácio, os jar- quanto existe também uma estética popular e so- Blue Champagne (2012), a Pavillon de Vin (2011) dins e os parques, as estátuas e os lagos, os pas- fisticada, de um diálogo entre o passado e o pre- e a Pavillon de Thé (2012), num deslumbramen- seios a pé e de barco em paisagem verde sem fim. sente e que remetem para a própria história. A ex- to crescente entre a realidade e o sonho, o quoti- De referir finalmente que Luís XVI ofereceu o Pe- posição de Joana Vasconcelos à semelhança de diano e o mágico, a festa e a tragédia, não se perce- tit Trianon a Maria Antonieta que o moldou ao seu uma loucura do efémero pretende assim fazer bendo à luz do exposto a razão da ausência da sua gosto pessoal, aí procurando a tranquilidade e inti- história com os visitantes em Versalhes e com as obra a Noiva que, como se sabe, expôs anterior- midade que não encontrava em Paris. suas harmonias geniais e dissonâncias. E ainda mente na Bienal de Veneza e que representa tão A exposição de Joana Vasconcelos pretende inte- com a sua magia. só um lustre elaborado por tampões higiénicos grar-se no universo e inúmeros e imensos salões Apesar da originalidade dos temas não encontra- que proclamam somente a feminilidade, o “peca- do Palácio, totalmente atapetado de obras impor- mos nenhuma provocação maior da artista ape- do original” ao Mundo, em palavras do Comissá- tantíssimas da pintura francesa e europeia, e não sar do discurso à volta da sua obra seja em rela- rio da exposição Jean François Chougnet. apropriar-se de Versalhes. Impossível, de resto, da- ção à envolvente do Palácio quer em relação a cli- Andou bem o Ministro dos Estrangeiros de Portu- dos os tesouros artísticos ali existentes. É um en- chés facilmente identificados por portugueses, gal quando, surpreendentemente, passou em Ver- contro desde sempre desejado e um desafio que um misto de humor divertido, aqui e ali inquietan- salhes para visitar e reforçar a presença e o marke- a leva a tentar apropriar-se ainda que circunstan- te, em linguagem moderna e bamboleante entre o ting artístico nacional, em altura de crise da Euro- cialmente, de um local mítico. “Pensei em Versa- clássico de Versalhes e o imaginário e fantástico pa e em que todas as janelas devem ser abertas lhes desde sempre”, rodeada pela imensidão dos das suas criações, sempre em ressonância com a para criação de oportunidades aos mais jovens e espaços do Palácio, pela vastidão dos jardins e flo- dualidade que perpassa diante dos nossos olhos. mais ousados. restas, já que não se sabe que mais admirar fren- Assim é que desfilaram diante de nós, em tarde De resto e acabo com as palavras da própria Joa- te a tamanha grandiosidade, tão exuberante e re- quente e cheia de milhares de visitantes, em lugar na Vasconcelos quando disse algures que “Pensei quintada quão geométrica e megalómana pois privilegiado e habitado pela arte, 15 trabalhos ge- em Versalhes desde sempre”, rodeada pela imen- que a exposição transborda o palácio e alonga-se niais dispersos pelos salões, galerias e jardins do sidão dos espaços do Palácio, pela vastidão dos pelos jardins próximos e das superfícies de água. Palácio e que se referem desde a Mary Poppins jardins e florestas, já que não se sabe que mais ad- Mas Joana Vasconcelos vai ainda mais longe no (2010), a Coração Independente Preto (2006) e mirar frente a tamanha grandiosidade, tão exu- seu questionamento do luxo e do belo no dizer da Marilyn (2011), do Coração Independente Verme- berante e requintada quão geométrica e megaló- Presidente do Palácio, propondo novas obras, es- lho (2005) e Perruque (2012) a Le Dauphin et La mana pois que a exposição transborda o palácio pecialmente concebidas para os diversos espa- Dauphine (2012), a Gardes (2012), a Vitrail (2012), e alonga-se pelos jardins próximos e das superfí- ços. Prende-se simultaneamente à figura da Mu- a Royal Valkyrie (2012), a Golden Valkyrie (2012), cies de água. 31 outubro 2012 arte as artes entre as letras | 14

«Desassossegos»

O artista plástico Artur Santos mostra a sua pintura na sala de exposições da Câ- mara Municipal de Oliveira do Bairro. «De- sassossegos» pode ser visitada até ao dia 18 de Novembro.

Arquitectura na Árvore «Árvores» A Árvore associou-se ao mês Armando Alves apresenta 15 pinturas sobre tela de Arquitectura no Porto (Ou- na Galeria de São Mamede, no Porto, a partir das tubro) através da realização de 16 horas de 10 de Novembro. As «Árvores» de Ar- uma exposição de desenho, mando Alves “tomam o primeiro plano nos seus pintura, obra gráfica, peças ce- quadros da mais recente série, erguem os ramos râmicas e publicações de al- ao céu como se fossem braços”, como refere Ber- guns arquitectos próximos da nardo Pinto de Almeida no texto de apresentação Cooperativa cultural. Até ao dia do catálogo da mostra patente até 15 de Janeiro. 6 de Novembro poderão ser vis- Reflectir sobre arte tos originais, obra gráfica, pro- dução cerâmica exclusiva da «Dig Dig: Digging for Culture in a Crashing Eco- Árvore da autoria de: Alcino nomy» é uma proposta de Patrícia Trindade, on- Soutinho, Álvaro Siza, Abreu de participam Alexandre Farto, Ana Rito, Ânge- «Música Pessegueiro, Cecília Cavaca, lo Ferreira de Sousa, Catarina Mil-Homens, Hugo no Coração» Eduardo Souto Moura, Fernan- Barata, Louise Hervé & Chloé Maillet, Nuno Sou- do Lanhas, Fernando Távora, sa Vieira, Rodolfo Bispo, Sara & André, Tom Jar- Gustavo Fernandes inaugura a sua João Paulo Rapagão, Manuel musch. A proposta expositiva, que pretende re- próxima exposição de pintura e es- Graça Dias e Nuno Teotónio Pe- flectir acerca do passado e futuro da cultura, es- cultura na Galeria de Arte do Casino reira. Destaque para a mostra tá patente até ao dia 3, no piso 1 da Plataforma Re- Estoril, amanhã (1 de Novembro), às da maquete da Casa Cortez, da vólver. Aqui podem ser visitadas outras propos- 18 horas. A mostra, intitulada «Música autoria de Viana de Lima, tes- tas até ao mesmo dia. no Coração», dá vida artística a diver- temunho único da arquitectu- sos instrumentos musicais, e pode ser ra corbuseana no Porto, que foi visitada até 21 de Novembro destruída em 1971.

«Museum Shop», de Rodolfo Bispo

Dario Alves e Emerenciano A Galeria de Arte Contemporânea, em Santa Ma- ria da Feira, junta, numa exposição de pintura, Dario Alves e Emerenciano. Num texto intitula- do «Encontro de Afectos», Emerenciano revela como nasceu este projeto que interliga dois ar- tistas que, seguindo caminhos diferentes, têm a “imaginação simbólica” como elemento artístico comum. A mostra com obras destes dois artistas marcantes da pintura portuguesa contemporâ- Love Boat nea pode ser visitada até 24 de Novembro. 31 outubro 2012 15 | as artes entre as letras ESPECIAL

Dia 5 de Novembro foi Doutor Honoris Causa a data escolhida para a atribuição do título de Doutor Honoris Causa, pela Faculdade de Be- las Artes da Universida- de do Porto, ao grande Pintor Nadir Afonso. A cerimónia vai decor- rer a partir das 15 horas na Aula Magna da FBA da UP. O elogio está a cargo do Professor Dou- tor António Quadros Ferreira e o padrinho é o Professor Doutor Francisco Laranjo.

“ edito sobre o que fiz. Medito e tiro con- de Oficial da Ordem Militar Santiago de Espada te, Da intuição Artística ao Raciocínio Estético, clusões. O que posso dizer já o escre- (2010). Doutor Honoris Causa pela Universida- Sobre a Vida e Sobre a Obra de Van Gogh, As Ar- Mvi. Está nos meus livros. Já disse o que de Lusíada e pela Universidade do Porto. tes: Erradas Crenças e Falsas Criticas, Nadir Face tinha a dizer. (…) Os homens criaram uma rela- Jorge Campos realizou os filme Nadir e O Tem- a Face com Einstein, Manifesto – O Tempo não ção entre o espaço e o movimento, e essa rela- po não Existe. Uma grande retrospetiva foi apre- Existe. ção chama-se Tempo”, palavras do grande mes- sentada no Museu Soares dos Reis e no Museu Entre as exposições realizadas, nesta tempora- tre Nadir Afonso a olhar a vida. do Chiado (2010); uma importante exposição da, em todo o mundo e nos mais prestigiados Nasceu em Chaves em 1920. Diplomou-se em antológica é mostrada em Roma no Museu Car- espaços culturais, a mostra de Nadir Afonso em Arquitetura na Escola de Belas-Artes do Por- lo Bilotti (2012). Roma, no Museu Carlo Bilotti foi incluída, na lis- to. Em 1946, estuda pintura na École des Be- Está representado nos Museus de Lisboa, Porto, ta das mais importantes em revistas da especia- aux‑Arts de Paris, por interferência de Portina- Amarante, Rio de Janeiro, S. Paulo, Budapeste, lidade. ri obtém uma bolsa de estudo do governo fran- Paris, Wurzburg, Berlim entre outros. Neste momento está a decorrer até ao dia 10 de cês. Entre 1946 e 1948 e novamente em 1951 foi Publicou: La Sensibilité Plastique, Les Mécanis- Novembro, uma exposição de Nadir Afonso em colaborador do arquiteto Le Corbusier, e ser- mes de la Création Artistique, Aesthetic Synthe- Veneza no Instituto Veneto de Scienze, Lettere viu-se algum tempo do ateliê de Fernand Lé- sis, Universo e o Pensamento, O Sentido da Ar- ed Arti - Palazzo Loredan. ger. De 1952 a 1954, trabalha no Brasil com o ar- quiteto Óscar Niemeyer. Nesse ano regressa a Paris, retoma contacto com os artistas orienta- dos na procura da arte cinética, desenvolven- do os estudos sobre pintura que denomina Es- pacillimité. Na vanguarda da arte mundial expõe em 1958 no Salon des Réalités Nouvelles, Espacillimités animado de movimento. Em 1965, Nadir Afonso abandona definitivamente a arquitetura e acen- tua o rumo da sua vida exclusivamente dedica- da à criação da sua obra. Prémio Nacional de Pintura em 1967 e Prémio Amadeo de Sousa‑Cardoso em 1969. Conde- corado com o grau de Oficial (1984) e de Gran- 31 outubro 2012 música as artes entre as letras | 16 memória

José Atalaya maestro Um gigante da música

orrespondo gostosamente à invocada Sempre bem tratado como se lê e se sabe, no necessidade de assinalar, neste preciso outro Notícias, este o do Porto. Também no Cnúmero de As Artes entre As Letras, o im- igualmente portuense Janeiro, como de res- previsível e súbito falecimento em 2 de Setem- to se assinala na resenha de parte das minhas bro do compositor Emmanuel Nunes (1941- crónicas (numa chamei “orquestricida” a um 2012). ministro que teve o mérito de, depois, me acei- Ele foi sem dúvida um dos mais (mundial- tar colaboração). Tudo reproduzido em Labi- mente) consagrados compositores portugue- rintos da Música – livro editado pela Caixotim. ses nascidos no século XX. Exibe um admirá- Devo acrescentar, contudo, e antes de ter ou- vel percurso curricular na dupla qualidade de vido no Expresso do dia 8 a semanal e autori- compositor e de pedagogo! Deu aulas na Uni- zada voz de Luciana Leiderfard – a qual nun- versidade de Pau, em França, na Escola Supe- ca deixo escapar – que, pela minha parte, con- rior de Freiburg em Breslau, Alemanha, na Es- sidero, talvez erradamente (admito), que pelo cola Superior do Conservatório Nacional de facto de Emmanuel Nunes não ter aderido à Música e da Dança em Paris, em Harvard, tra- “computer music”, não o consigo situar como balhou desde 1989 com o parisiense IRCAM “o maior” dos nossos músicos. Os músicos que (Institut de Recherche et Coordination Acous- penetraram, como ele, no século XXI. Muito tique/Musique) como assinala objectivamen- embora, mesmo assim, o tenha designado (há te o rigoroso Ruy Vieira Nery. Foi Prémio de muito tempo, há mais de duas décadas!) como Composição da Unesco em 1999, foi Comenda- nosso digno e maior representante, no século dor da Ordem de Santiago da Espada. Foi tam- XX na saudosa Tribuna Internacional de Com- bém por nós distinguido (logo a seguir… em positores. Exercia eu, então, funções de cúpu- 2000) com o Prémio Pessoa, via círculo cultu- la na RDP. ral e jornalístico devido a Francisco Pinto Bal- Fiz questão de não perder aquela oportuni- semão – facto que, uma vez mais e bem, presti- dade maior, a de o impor naquele “congresso” giou (ainda em vida do homenageado) a aten- máximo da radiodifusão europeia. ta intervenção regular do mais influente e po- Só recentemente, confesso, me aproximei das deroso dos nossos homens dos “media”. novidades da sua linguagem. Muito peculiar e Tudo isto na sequência, é preciso dizê-lo já, que o afasta do público inculto, preguiçoso ou das sucessivas intervenções em seu favor da distraído. Fundação Gulbenkian, mais recentes as da Ca- Revelação tardia quanto a mim, repito, pelo da da Música, assinalando e concretizando no que de facto não me espantou, aquela mais país tudo o que ele foi construindo pela Euro- que lamentável recepção que o nosso (cultíssi- pa. Toda! mo?) público de São Carlos fez questão de lhe Correspondo, portanto, hoje, gostosamente, dispensar por ocasião da estreia da sua ópera como acima proclamo, e tanto quanto pos- «Das Märchen», inspirada no texto de Goethe so, pela escrita, às de músico interveniente. E (público que abandonou parte da sala a meio atrevido, não resisto a relembrá-lo, e recordo do espectáculo – um horror!). últimas) composições vertidas em papel. De- a quem não o saiba. Fui obrigado a reformar- Procuro aqui e hoje redimir-me, em minha de- pois… tudo “redigido” e sempre improvisado me prematuramente da RDP por ter ataca- fesa, dessa tardia revelação do seu génio? Tal- (como acontece hoje, cultores do jazz). Impro- do o meu então presidente, e já falecido, Bráu- vez… e porquê? visado também há séculos, antes do alvorecer lio Barbosa, indignado, eu, com a nefasta ex- Relato para quem não o saiba. Nunca até hoje da música escrita, construída em pauta. Tudo tinção, por sua lamentável iniciativa, do meu me referi às minhas andanças compositórias e hoje por mim improvisado em teclado acopla- querido Programa 2 que percorria todo o pa- caminharam sempre em sentido diverso à da do ao computador. Devo ser único (nesta ex- ís em onda média, o ÚNICO posto em Portugal obra, essa genial de Nunes. E distanciam-nos centricidade). Mas (surpresa!) as três canções que emitia os clássicos universais. Vinte e qua- apenas 13 anos, ele mais novo do que eu. sobre poemas de Eugénio de Andrade foram tro horas por dia. Essa divergência vem de muito longe, da mi- orquestradas após a sua primeiríssima leitura Hoje, e desde então, apenas em FM, em con- nha primeiríssima op.1. Verdadeira obra pri- pelo meu muito querido Mestre Luiz de Frei- traponto isolado contra dezenas de outros dis- meira porque até então estava limitado a me- tas Branco. Faleceu 14 dias depois… Metidas na persos pelo país inteiro. E em que, consequen- ros e colegiais exercícios de contraponto flo- gaveta, estreadas por iniciativa de seu, João temente, jamais se pronunciou ou pronuncia- reado. Todos muito riscados, com as famige- Maria, meio século depois, eram o último tra- rá este nome… o Emmanuel Nunes. Sem emen- radas “quintas seguidas” etc. de que eu tanto balho do avô. da, porém, continuo crítico activo, sucessiva- gostava. Minha primeira obrinha é datada de Compreensível o desgosto. Não mais compus mente, apraz-me sublinhar, no DN (o único on- Janeiro de 1951! Escrevi (então estudante) três em papel. Impossível evoluir. Regressei à cria- de fui extinto por referência a “poderosos”). discretas canções. Foram afinal as primeiras (e tividade há somente pouco mais de uma déca- 31 outubro 2012 17 | as artes entre as letras música

memória

desse gigante da nossa música. Passou apenas támos a divergir. Normal… E como se prova, via de relance pela electrónica, como afirma com Internet, ao alcance de todos, em obras de Bar- lucidez extrema Pedro Amaral. Não me con- ber (o célebre adagio) Bartok (Danças) etc. que segui aproximar dele, do seu exermplo, como ali estão inseridas com a Orquestra Raízes Ibé- poderá vir a comprovar quem por mera e so- ricas. litária curiosidade quiser visitar, possivelmen- Para concluir. E para me desculpar, em parte, te proximamente editadas pela Numérica, as da minha infeliz incapacidade de aderir (rápi- cerca de 40 peças seguintes às Variantes Rít- do) ao génio indiscutível do gigante recente- micas sobre quatro sons sinusoidais. Estas, sim, mente falecido. E que a “minha” quinzenal re- já distribuídas por aquela valente difusora da vista fiel ao seu desígnio metodicamente evi- música portuguesa do século XX, no penúlti- denciado (o de avivar a “memória” quando um mo CD do ciclo Geografia da Música. grande vulto desaparece) me vai sempre pe- Esta incapacidade de sintonia de sempre com dindo. os sempre tão admirados ideais de E. Nunes (o Que legião de tantos e respeitáveis admirado- que obviamente bastante me aflige). E aconte- res, os de Emmanuel Nunes. Entre os quais, ce, não obstante a presença de Boulez e Sto- hoje (importante!) – hoje mesmo quando es- ckhausen, na música dele Nunes. E na máxi- crevo! – José Manuel Viegas, nosso actual Se- ma força em mim quando, bastante mais tar- cretário de Estado da Cultura. Madalena Sove- de, me deslumbro com este último, após tê- ral que lhe gravou uma das obras mais difíceis lo conhecido em Lisboa por ocasião do seu e mais celebrizadas. Outros (nacionais) desde memorável concerto para o Círculo de Cultu- os remotos e formosos tempos da sua juventu- ra Musical, nos tempos históricos do Duque de. Lopes Graça, Francine Benoit, seus profes- de Lafões, Manuel Machado Macedo e Ofélia sores. No final da década de 80, Pedro Amaral, Diogo Costa. E quando me aproximo, como E. hoje notável maestro e seu colega nos tempos Nunes, de outra figura maior do nosso tempo. de estudos com Graça, e que afirma com notó- Boulez. Não foi em Lisboa. Conheci, de facto, ria lucidez: “Ele delimitou muito o seu território Pierre Boulez, mas em Basel – no decorrer dos estético”, ficando sempre “ligado à utopia da re- cursos de direcção de orquestra a que assis- volução estética dos anos 50”. Acrescentando ti (sem, contudo, me atrever a contactá-lo pes- ter sido ele “um dos compositores que levou soalmente). Não resisto talvez, a propósito de mais longe a reflexão sobre a música electróni- Boulez, contar que causou sensação (e diverti- ca” (e aqui, num aparte muito meu, e que não mento) ouvi-lo contar naquele tempo, ou me- consigo conter). Razões da sua repulsa eviden- Pintura de Hélder Carvalho lhor, explicar muito a sério (e a uma plateia re- te pelos máximos propulsores da “computer cheada de personalidades) por que razão ele, music”. O que justifica o seu incompreensível Boulez, dirigia, como hoje, sem batuta! Contra- distanciamento de autores mais extremistas da. Via “computer music” graças a Pietro Grossi riando assim um hábito enraizado na nossa que enveredaram eficazmente a golpes de gé- (um dos dois introdutores em Itália da música cultura musical desde que irrompeu, e de vez, nio como os dele por novos e mais revolucio- electro-acústica). Mais recentemente em Por- a figura carismática do chefe de orquestra, so- nários estilos. Como assim? tugal devido a Reynaldo Feio, figura extraor- brepondo-se assim à do primeiro violino, à do Farei na próxima edição um relance rápido na dinária – o homem forte, em Portugal, das ino- “concert meister”. Prefere dirigir, simplesmen- esperança de, finalmente, dispor das respecti- vações anuais e informáticas da Toshiba. Mas te, com as mãos. E Boulez lá ia sempre dizen- vas partituras. ausente, por feitio, de todo o nosso mundo da do, sorrindo e divertido: “Com as minhas mãos, Última revelação para quem eventualmente música, prefere trabalhar em silêncio. Portan- com os meus dedos não disponho de uma, mas não o saiba ainda, e se tenha apercebido que to, regressando às razões do meu distancia- de dez batutas!”. E aplicava à risca este novo foi mesmo um colosso difícil de entender. De mento de Emmanuel (que nunca me canso de conceito gestual até então, como se sabe, re- génio imparável. Contudo: lamentar) só muito e muito depois dessa mi- servado apenas aos dirigentes de coros. Mais Emmanuel Nunes nasce de uma família sem nha longínqua doce op.1, voltei a sentir fortís- tarde, tive oportunidade de esclarecer (pesso- qualquer relação com a música, inferiorizado simo o apelo criativo e então finalmente muito almente, com o próprio Boulez) muitas outras por doença neuromotora, a qual lhe afectou próximo, tanto de co- interrogações despertadas em mim através da até à hora da morte, em 2 de Setembro, os mo- mo de Pierre Boulez. Ora precisamente essas entrevista que dele obtive destinada ao meu vimentos. E a própria dicção. duas das figuras máximas, os designados “dois Programa 2 da ex-Emissora Nacional. Primeiros instrumentos em criança? Aquelas dos pilares” de Emmanuel Nunes! Nunes não o acompanhou, manteve o pauzi- colherzinhas de pau com as quais batia, com Nem sequer isso, porém, me aproximou dele, nho. Eu nunca mais peguei numa batuta. Vol- fervor, em tachos e panelas! 31 outubro 2012 homenagem as artes entre as letras | 18

sidenciais. Foi preciso o papa Paulo VI ter pedi- do aos Estados para renunciarem totalmente a esses direitos. E isto era alguma coisa que já não se via desde o século IV, desde a altura em que a Igreja passou a ser imperial, constantiniana. Esta renúncia foi muito importante. Outro eixo de re- novação conciliar foi, a meu ver, a discussão ecu- ménica. Depois do anátema lançado pelo concí- lio de Trento sobre os protestantes, a Igreja Cató- lica tardou todo este tempo para passar do aná- tema ao diálogo. Mas este é apenas um aspecto, porque eu incluiria também nesta linha de reno- vação o diálogo inter-religioso. Se a Igreja não cul- tivar uma atitude ecuménica nunca poderá dia- logar com as culturas que se situam fora da cultu- ra ocidental. Como é que vai ser o futuro da Igre- ja na China? Vai ser uma Igreja ocidental ou chi- nesa? Há ainda um terceiro eixo a meu ver muito importante: o desenvolvimento duma antropo- sandra boloto logia. O cristianismo deixou de entender e viver a graça como algo celeste, afastado do homem histórico, para viver a graça como encarnação. A Arnaldo de Pinho constituição Gaudium et Spes, por exemplo, apre- senta Cristo como modelo antropológico justa- mente porque foi um modelo de proximidade do teólogo da cultura homem.

Entrevista conduzida por Nuno Higino no momento da sua jubi- Como teólogo, que balanço faz destes 50 anos lação académica e da publicação do volume I (Teologia e Inter- que viveu intimamente ligado ao mundo aca- pretação) das suas Obras Escolhidas démico? Acha que essas ideias foram bem as- similadas? Esse é outro problema que tem a ver com a cha- No dia 11 de Outubro passado cumpriram-se 50 questões fundamentais que contribuiu para es- mada recepção. Ora o processo de recepção do anos da abertura do Concílio Vaticano II. Nessa sa reconciliação foi a da liberdade religiosa que concílio está longe de acabar. Hoje há gente que altura, em 1962, tinha 20 anos e começava a es- foi condenada permanentemente pela Igreja até fala na necessidade dum concílio Vaticano III tudar teologia no Seminário do Porto. Que re- ao pontificado de Bento XV, portanto, até pratica- ou dum concílio de Jerusalém. Eu acho que, se cordações guarda dessa altura? Que impacto mente ao início da I Guerra Mundial. Outra ques- tal necessidade existe, seria mais interessante teve a notícia sobre os jovens teólogos de en- tão importante foi a questão da antropologia. A um concílio de Jerusalém do que um concílio tão? antropologia conciliar é humanista e moderna. do Vaticano III. O problema nesta discussão é a Em Portugal, por esses anos, não tínhamos a in- E isso representou um grande avanço. Não po- seguinte: nunca se sabe muito bem onde, quan- formação necessária que nos pusesse nas pistas demos esquecer que a Igreja vinha de posicio- do e como um concílio vai frutificar. Eu dou um do que foi verdadeiramente o concílio. A infor- namentos muito radicais. O século XIX tinha si- exemplo: o concílio de Trento (sec. XVI) apelou mação que nos chegava era veiculada pelos jor- do um século de enfrentamentos permanentes à criação de seminários para a instrução do cle- nais diocesanos e reportava-se apenas aos factos da Igreja com o mundo. O pontificado de Pio IX ro. Ora, essa recomendação foi recebida em mui- mais mediáticos, mas não concretamente aos pode considerar-se o clímax desse clima de en- tos lugares da Igreja muito mais tarde. Na dioce- grandes temas doutrinais que estavam a ser dis- frentamento. se do Porto, só com o Cardeal D. Américo, que cutidos. Eu só percebi o que foi o concílio a par- morreu já no final do sec. IX X, é que foi criado o tir de 1972, 73. E percebi-o depois de estudar o que Teologicamente quais foram as grandes mu- seminário. Resumindo: onde o concílio melhor foi a revolução da modernidade na história eu- danças trazidas pelo Concílio? frutificou foi na inculturação da fé, por exemplo ropeia e na história da civilização ocidental. No A meu ver, a primeira grande linha de renova- em África. O primeiro concílio verdadeiramente meu entender, é impossível perceber o concílio ção conciliar foi a Igreja ter-se libertado das tu- ecuménico foi o Vaticano II. Houve outros concí- fora desse contexto. telas e dos poderes do mundo. A Igreja vive de si lios chamados ecuménicos, mas no concílio de mesma e por si mesma (embora não para si mes- Trento, por exemplo, havia muito poucos bispos Acha que se pode dizer que o concílio foi uma ma), basta que a deixem ser livre. Ainda no sécu- de fora da Europa. No concílio Vaticano I havia, resposta tardia da Igreja ao programa iluminis- lo XIX quem nomeava os bispos era o rei. E já no é verdade, alguns bispos africanos e americanos ta? século XX, o papa Pio X (1903-1914) foi eleito por- mas eram quase todos missionários, oriundos Não direi que foi uma resposta porque o concí- que houve um país (a Áustria, se não erro) que da Europa. Não havia bispos autóctones. O de- lio não teve isso em vista. Agora é verdade que vetou aquele que devia ser papa. Havia 4 potên- safio da inculturação, portanto, é o maior desa- o concílio fez seus alguns dos motivos determi- cias na Europa que tinha direito de veto na elei- fio da Igreja no mundo actual. Veja-se a incultu- nantes do iluminismo; sobre isso não há dúvida. ção do papa. A Igreja não vivia de si mesma, vi- ração que se fez no Brasil com a teologia da liber- De certa maneira apaziguou conflitos e reconci- via encostada ao poder político. Havia concorda- tação. A teologia da libertação foi determinante liou a igreja com o mundo. O mundo é entendido tas, incluindo a portuguesa, que previam o direi- para a conquista da democracia no Brasil. Mui- aqui como a interpretação do mundo. Uma das to de veto do Estado à nomeação dos bispos re- tos líderes, e uma grande parte dos membros do 31 outubro 2012 19 | as artes entre as letras homenagem andra boloto s Partido dos Trabalhadores, cresceram dentro da e o quadrivium. Para entrar na teologia era neces- atmosfera da teologia da libertação. Sem incultu- sário fazer as artes. Quando digo as artes, não me ração o cristianismo não sairá do ghetto do Oci- estou a referir ao tocar piano ou ao pintar, mas dente. E a inculturação é tanto mais importante sim à filosofia. O que acontece, a meu ver, é que a no momento presente quanto sabemos que, pe- teologia se perdeu muito em questões práticas, a lo triunfo da técnica, podemos estar a criar um liturgia, os ministérios, etc., que são questões ri- mundo completamente falso porque desenrai- tualísticas, ao passo que as grandes questões, zado da cultura. como a questão do sobrenatural, do misté- rio, do significado da vida humana ficaram Deixe-me voltar à ideia dum novo concílio, até esquecidas; mas também as questões do porque parece que algumas pessoas da Igre- trabalho e da técnica, que são muito abor- ja têm alguma dificuldade em lidar com esta dadas pela filosofia, têm ficado um pouco à ideia. Todos sabemos que actualmente a Histó- margem da reflexão e investigação teológica. ria avança muito depressa. Se não erro foi o Pa- Se formos ouvir as homilias ao domingo, ve- pa João Paulo II que disse que hoje um século mos que andamos perigosamente perto do são 10 anos. Se assim é, o Vaticano II foi há 500 deserto… anos… Na história normalmente são as ideias minori- A sua jubilação da Universidade é uma boa tárias que se expandem. Mesmo no concílio Va- oportunidade para fazer balanços. Quais fo- ticano II os esquemas foram todos chumbados ram as grandes linhas de investigação teo- e as ideias minoritárias é que foram ganhando lógica que procurou seguir enquanto pro- terreno. A minha intuição é que os grandes con- fessor? cílios do futuro vão ser regionais. Não sei se da A minha orientação fundamental, a minha parte de Roma haverá grande abertura para is- Kehre, como lhe chamam os alemães, foi a so mas já houve uma tentativa, no tempo de João leitura de Heidegger. Aliás, ainda tive a opor- Paulo II, com os grandes sínodos regionais. Al- tunidade de assistir a algumas das suas con- guns foram muito interessantes, por exemplo, o ferências. Outro autor importante na minha sínodo para as igrejas do Médio Oriente e o síno- formação foi Ricoeur, com quem pude par- do para a África. Já o sínodo para a Ásia pareceu- tilhar alguns seminários em Estrasburgo. La- me demasiado abstracto. Penso que as cultu- drière foi outro pensador importante. Com ele ras regionais vão estar no centro da evangeliza- aprendi uma certa poética da linguagem. Eu co- ção do futuro. É verdade que o Vaticano II lançou mecei com uma teologia que consistia em andar vistas sobre o mundo mas ainda foi um concílio à volta dumas teses formuladas a partir do muito ocidentalizado. O grande problema qual magistério da Igreja, para provar é? É que a cultura deixou de estar centralizada aquilo que o Magistério no Ocidente, como aliás a economia e outras coi- sas. Por outro lado, o que verdadeiramente está a ser renovado no Ocidente não é a teologia mas a filosofia. Veja-se, por exemplo, o caso da França: a teologia francesa está um pouco parada, ao contrário da filosofia. Na França há um gru- po de filósofos que eu estimo, o Jean-Luc Marion, o Michel Henri, etc. que têm da- do importantíssimos contributos à teo- logia. O problema é que a teologia ainda não lhes pegou…

Essa também é uma questão impor- tante, julgo eu. Não lhe parece que a teologia actual se afastou demasia- do da filosofia, perdendo assim -al guma capacidade de equilíbrio e enredando-se num discurso um pouco superficial e ramalhudo? Concordo com essa ideia e acho que o problema está na base. Em geral, os estudantes de teologia têm má preparação filosófica. Ora, eu continuo a pensar que não se pode estudar bem te- ologia sem uma boa prepa- ração filosófica. Já os me- dievais tinham o trivium 31 outubro 2012 homenagem as artes entre as letras | 20

tura. Esta revisão de temas historicamente con- troversos e odiosos na sua época é que torna a te- ologia amável. Se algum mérito teve o meu ma- andra boloto s gistério de professor de teologia foi rever estes te- mas e tratá-los dentro duma perspectiva de diá- logo e com uma linguagem moderna. Aliás, a lin- guagem é muito importante porque a linguagem é que veicula o pensamento, não há outro meio. Como é que se fala hoje do casamento ou da gra- ça, do céu e do inferno? É com os chavões tradi- cionais ou com sensibilidade para uma nova lin- guagem? Fora da linguagem não há nada. Os con- ceitos não existem fora da linguagem. Heidegger disse, e muito bem, que a linguagem é a casa do ser. Não há mensagem fora do mensageiro. Os pa- dres na sua pregação não devem esquecer isto…

A crise actual da cultura europeia não estará intimamente relacionada com a perda de es- paço da Igreja nas nossas sociedades? O Roland Barthes dizia que o grande proble- ma da nossa cultura é a desintegração do sinal. Ora este problema não é apenas da Igreja mas dizia. A grande mudança introduzida pelo concí- mã é diferente da francesa. Os alemães sempre da cultura em geral e da nossa cultura ociden- lio quanto ao modo de fazer teologia virou as coi- ligaram o seu pensamento ao idealismo, ao mis- tal em particular. O que significava um médico sas ao contrário, fazendo partir o pensamento te- tério, e sempre houve uma íntima relação entra na minha infância? Um médico era um sinal. O ológico da experiência da fé, e relacionando a fé a teologia e a filosofia. Os grandes filósofos - ale que significava o padre? O padre era um sinal. e a transcendência. Aquilo que eu ensinei e es- mães sempre estiveram muito ligados à filosofia. O mesmo se pode perguntar do professor pri- crevi está marcado por uma certa poética, ou um Em França é diferente porque a França sempre mário ou do juiz. Esses sinais desintegraram-se certo modo poético de fazer teologia. Isso vê-se, foi mais racionalista. na nossa cultura. A Igreja não escapa a esta lógi- aliás, neste primeiro volume da minha obra que ca de desintegração dos sinais. Isto não quer di- acaba de ser publicado, que é um trabalho funda- Ao longo dos seus quase 50 anos de teólogo e zer que a desintegração dos sinais seja uma fa- dor sobre as relações entre teologia e interpreta- padre sempre teve uma grande preocupação talidade. Com certeza que a Igreja é responsá- ção. em relacionar a teologia com a cultura. Como vel também por esse facto. Vivemos uma época avalia esse trabalho e como justifica essa ne- sem consensos e não vale a pena criá-los à for- Falemos agora da Teologia em Portugal. Acha cessidade? ça. A criação de sinais e consensos é laboriosa, e que se pode falar duma teologia portuguesa, É verdade que segui um pouco esse caminho. E isso é o que os teimosos não vêem. Os teimosos no sentido em que se fala, por exemplo, da teo- porquê? Porque encontrei ao longo da vida mui- pensam que impõem a cultura pela autoridade logia alemã ou francesa? ta gente interessante fora da Igreja, talvez mais ou pelo poder, que ainda é pior. O niilismo é isto, Não. Não há propriamente uma teologia portu- até do que dentro da Igreja. Isso permitiu-me es- a desintegração do sinal. guesa. O que há é um pensamento português colher temas de diálogo que nem sempre são tra- que talvez esteja muito próximo da teologia. Leo- tados dentro da Igreja. A Igreja tem de retomar te- Não lhe parece que está por fazer uma teologia nardo Coimbra, Sampaio Bruno, Teixeira de Pas- mas históricos que foram provocatórios e mal re- da cultura? coaes… têm uma certa proximidade dos temas te- solvidos, como por exemplo as relações com a Tudo o que tenho lido sobre a teologia da cultura ológicos. O seu pensamento não é propriamente Maçonaria. O papa João Paulo II fez isso em rela- é muito fraco. Quem fez, a meu ver, a melhor teo- crítico, como o pensamento de Kant, mas é um ção ao judaísmo, em relação a Galileu, em relação logia da cultura foi o Ricoeur, que era um filóso- pensamento muito ligado ao religioso. Isto não à guerra, em relação aos operários, em relação ao fo e não um teólogo, sobretudo na obra Conflito significa que não haja em Portugal gente compe- trabalho. A isto é que se chama relação com a cul- das interpretações. E o Ladrière também. Embo- tente em teologia. Mas veja-se uma coisa: a Uni- ra nem um nem outro utilizem a expressão ‘teo- versidade Católica em Portugal, que é a única logia da cultura’. Universidade onde se ensina teologia, é muito re- cente, não tem ainda uma tradição. Uma tradição Aquilo que tem feito com o seu ensino e os seus demora muito tempo a formar-se. escritos não será uma teologia da cultura? É um pouco isso que tenho feito. Tudo o que fiz, Acha que faz sentido falar em ‘teologias regio- e que a minha geração fez, foi recuperar os te- nais’? mas esquecidos pela crise modernista. As gran- Não sei, o que eu penso é que o mundo tende a des temáticas da cultura são, muitas vezes, aque- caminhar para grandes blocos civilizacionais. A las que ficam para trás, que deixam de ser nome- ideia dos nacionalismos, se voltar, será uma ideia adas e discutidas. Essa é a opinião de Y. Congar, perversa. E o nosso grande bloco é o bloco cató- que eu partilho. O que aconteceu à teologia a par- lico-protestante. Eu penso que dentro destes blo- tir de certa altura? Transformou-se numa ciência cos a teologia terá expressão própria. É claro que de regras e esqueceu o seu labor de ligação e in- dentro deles há e haverá variantes. A teologia ale- terpretação das experiências da fé.

Retrato do pintor José Maia 31 outubro 2012 21 | as artes entre as letras memória

Daniel Serrão médico

Dados NUNO GRANDE biográficos Nuno Lídio Pinto Rodrigues – um transmontano inesquecível Grande (Vila Real, 1932 – 8 de Outubro de 2012) foi um médi- dr co e professor português, fun- dador do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, on- de foi director do Departamen- to de Anatomia. Nuno Grande formou-se pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, com a apresentação de uma tese de 19 valores, tendo, na altura, sido convidado pa- ra ser assistente da cadeira de Anatomia ao lado do professor Hernâni Monteiro. Doutorou- se em 1965, com a classificação de 19 valores. Seguidamente foi mobilizado pelo Exército e colocado no Hospital Militar de Luanda. Foi 1.º Assistente da Universidade de Luanda e onheci Nuno Grande quando ele veio es- era sempre bio-psico-social e espiritual, logo os foi encarregado do Centro de tudar Medicina para o Porto. Foi-me reco- encaminhava para a instituição mais apropria- Estudos de Medicina Experi- Cmendado por amigos, transmontanos co- da para o tratamento. Fazia milagres para con- mental do Instituto de Investi- mo eu, que apelaram para esta comunidade de seguir meios auxiliares de diagnóstico, interna- gação Científica de Angola. Na origem para que eu o ajudasse a mostrar na Fa- mentos para cirurgias, consultas privadas de es- Universidade de Luanda, re- culdade as qualidades de inteligência que tinha pecialistas e outros apoios. Nunca deixava os geu as cadeiras de Anatomia revelado no Liceu de Vila Real. seus doentes sós, era ele que providenciava o Topográfica e de Histologia, Eu, que pouco mais velho era – sou de 28, ele necessário para que tudo corresse bem. orientando, também, Anato- de 32 – adotei-o como se fosse um meu irmão Com a sua permanente preocupação pelos as- mia Descritiva e Biologia. Em e acompanhei-o nos estudos, vibrando com os petos sociais, ajudava os conterrâneos mais ne- 1970, pela extensão a Ango- seus êxitos nos exames e o seu sucesso na car- cessitados, muitas vezes pagando do seu bolso la da jurisdição da Ordem dos reira docente e na investigação. Na conclusão análises para que fosse mais rápido o diagnósti- Médicos, Nuno Grande, apesar da sua tese de doutoramento dei-lhe um apoio co e o tratamento. Daqui ser adorado pelos seus de estar a viver na então coló- que foi decisivo para que o trabalho fosse aceite doentes. nia há menos de cinco anos, foi depois de uma primeira opinião desfavorável; A Câmara de Vila Real atribuiu-lhe, muito justa- eleito pelos colegas presiden- mas, a meu ver, injustificada. mente, a Medalha de Ouro para distinguir um te do Conselho Regional da Os anos em comum na Faculdade, como alu- transmontano que, vivendo embora fora de Vi- Ordem dos Médicos. Exerceu nos e como docentes, cimentaram uma amiza- la Real, era a imagem de um cidadão excecional igualmente as funções de di- de indestrutível. Em Luanda, entre 67 e 69, vol- que dava honra à terra onde nascera. Estive pre- rector da Faculdade de Medi- tei a trabalhar na sua companhia pois me convi- sente na cerimónia e recordo bem a sua emo- cina e de vice-reitor da Univer- dou para reger a disciplina de História da Medi- ção e a sua alegria. sidade de Luanda. Em 1974, re- cina no Curso de Medicina da Universidade de Como pró-Reitor da Universidade do Porto, a Luanda que criou e dirigiu. sua preocupação ia toda para os estudantes que gressou de Angola, tendo, em Nuno Grande foi um excelente Professor e In- tinham dificuldades financeiras para viverem 1975, juntamente com perso- vestigador. Mas desta faceta da sua atividade no Porto e por eles distribuía os recursos dos nalidades médicas como Cori- muitos têm escrito nestes dias que se seguiram serviços sociais da Universidade com o maior no de Andrade, fundado o ac- à sua morte. Eu quero e posso dar um testemu- rigor e isenção. tual Instituto de Ciências Bio- nho diferente. Isenção que comprovei durante os 21 anos em médicas Abel Salazar, no Por- Como médico foi um competente Clínico Geral, que coincidimos como membros do Júri dos to. Nesta escola médica, em melhor direi um médico de Família. O seu Con- Prémios de Investigação do Instituto de Gené- que foi regente da cadeira de sultório na Rua de Camões era o refúgio seguro tica. Anatomia Sistemática realizou dos vila-realenses que o procuravam para rece- Nuno Grande foi um Homem inteiro e um trabalhos inéditos de reper- berem ajuda clínica. Hábil no diagnóstico, que Transmontano inesquecível. cussão internacional. 31 outubro 2012 memória as artes entre as letras | 22

tiu no dia 19 de Outubro – faria 69 anos a 18 de Novembro –, mas deixou uma obra e aí não morrerá. Desde logo, em «A poesia está na rua», que decorre anualmente em Santo Tir- so, e que será dedicada a Manuel António Pi- na pela segunda vez. Já tinha sido a figura cen- tral da terceira edição deste evento, em Mar- ço de 2006, cuja obra e vida tinha sido apre- sentada pelo ensaísta Eduardo Prado Coelho, também já falecido. Por seu lado, o «Jornal de Notícias», onde Manuel António Pina traba- lhou cerca de 30 anos e até há poucos meses assinava, na última página, a crónica «Por ou- tras palavras», deixará o espaço em branco. A garantia foi do director do Jornal, Manuel Ta- vares, quando recordava um “grande amigo e cidadão português”. Referiu-se ainda a Ma- nuel António Pina como “a mente mais bri- lhante do «JN»”. Também a Câmara do Porto assinalou a mor- te do escritor, nascido no Sabugal em 1943 e licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, ao aprovar, por unanimidade, dois votos de pesar. O assunto foi o primeiro a ser abordado na primeira reunião de Câmara que teve lugar após o falecimento do autor de po- esia, ficção, crónica, literatura infantil e de pe- ças para teatro, com o PS a apresentar um vo- to de pesar pelo falecimento de uma “figu- ra maior do jornalismo e literatura portugue- sa”, com “uma perspectiva por vezes descon- certante”, segundo o vereador socialista Ma- nuel Correia Fernandes. O vereador do PS sublinhou ainda que Manuel António Pina “sempre escolheu o lado da liberdade, mes- mo quando isso era difícil e perigoso”. Pedro Carvalho, vereador da CDU, salientou a “cida- dania interventiva” do escritor e sugeriu que Pintura de Hélder Carvalho o nome do Prémio Pessoa de 2011 fosse “asso- ciado à toponímia da cidade”. “Manuel Antó- Manuel António Pina: 1943-2012 nio Pina foi, de facto, um ser humano brilhan- te, de talento singular. Mas era, além do mais, um grande cidadão. Inteligente, criativo, in- A poesia não vai acabar quieto, inconformado, solidário”, escreveu o comunista, no voto apresentado ao executivo. Isabel Neste momento, nenhuma palavra que dis- A sua obra mereceu diversos prémios. Pa- Fernandes sermos vale a pena. Temos apenas as tuas. Os ra além do Prémio Camões, em 2011, ganhou teus versos, a tua beleza incandescente, iróni- o Prémio Literário da Casa da Imprensa, em ca, suave, amorosa. O resto são as nossas lágri- 1978, por «Aquele Que Quer Morrer»; o Gran- “ poesia, meu querido Pina, ao contrá- mas, que folheiam os teus livros, a nossa gran- de Prémio Gulbenkian de Literatura para rio do que um dia a tua ironia deixou de necessidade dos teus livros e de tantos ver- Crianças e Jovens e a Menção do Júri do Pré- Aescrito num dos teus poemas mais sos que decorámos para que a vida tivesse mio Europeu Pier Paolo Vergerio da Univer- perfeitos, não vai acabar. Vai continuar a ser um sentido e acaba por não ter. Escreveste “es- sidade de Pádua, em 1988, por «O Inventão»; aquilo que foi a tua vida: a celebração de uma távamos a precisar de solidão,/ de silêncio, de o Prémio do Centro Português de Teatro pa- beleza rara e inóspita, inacessível a todos os geometria/ e as nossas lágrimas de uma gran- ra a Infância e Juventude, em 1988, pelo con- aborrecidos que nunca nos vencerão, que de razão”. Isto (e mais) escreveu Francisco Jo- junto da obra; o Prémio Nacional de Crónica nunca te venceram. Nunca te esqueceremos. sé Viegas, sob o título «As nossas lágrimas fo- Press Clube/Clube de Jornalistas, em 1993, pe- Plantaremos uma árvore em teu nome. Dire- lheiam os teus livros». O secretário de Estado las suas crónicas; o Prémio da Crítica da Asso- mos um poema em teu nome. Daremos estes da Cultura deu lugar ao amigo e foi na escri- ciação Portuguesa de Críticos Literários, em dias em teu nome. Celebraremos o que nun- ta que encontrou a palavra, as palavras, para 2001, por «Atropelamento e Fuga»; e o Prémio ca vamos esquecer: o teu coração dedicado à o testemunho que no dia não se tornou pos- de Poesia Luís Miguel Nava e o Grande Prémio poesia, aquilo que nunca se pode dizer, de tão sível. de Poesia da APE/CTT, ambos pela obra «Os frágil e mudo que é. ‘Farewell Happy Fields’. O jornalista e poeta Manuel António Pina par- Livros», recebidos em 2005. 31 outubro 2012 23 | as artes entre as letras lançamento

«O que está o pensador a fazer?»

Não é necessário ser filósofo para entender a nova breve história da fi- tra nas tês últimas páginas da obra”. Paulo Tu- losofia que já se encontra nas bancas, sob a chancela da D. Quixote. nhas provocou espanto ao afirmar que a filo- sofia “é uma espécie de ficção com constran- Paulo Tunhas e Alexandra Abranches assinam este livro lançado na gimentos próprios. Alguns quase delirantes. Faculdade de Letras da Universidade do Porto. “AS QUESTÕES QUE SE O pensamento é por natureza sistemático ou REPETEM” é o nome que compilou em 360 páginas um indispensável assistemático. Quando as questões são colo- manual de qualidade pedagógica indiscutível, merecendo entre mui- cadas em contexto e génios diferentes, as res- tos elogios os de nomes da filosofia como sejam os do Prof. Costa Mace- postas são imprevisíveis, embora, recordo Aristóteles que dizia que «não são as questões do, José Meirinhos (Director do Instituto de Investigação de Filosofia da que se repetem, são as soluções». O contexto é FLUP) e Fátima Marinho, Directora da Faculdade de Letras da UP. que é sempre diferente.” Durante a leitura de AS QUESTÕES QUE SE REPETEM, sentimos a ignorância à flor-da-pele, desde logo porque Maria mergulhamos em 2600 anos de pensamentos José que se cruzam, esgrimem, prolongam-se, con- Guedes trariam-se, completam-se e repetem constan- temente, e mesmo assim, sempre enigmáticos e de «cura» desconhecida. Esta aventura pelo ão seis capítulos, um da responsabilida- tempo filosófico, tal como dita a contracapa, de de Alexandra Abranches , e contas fei- começa nos Gregos. “(…) É uma trivialidade di- Stas, os outros cinco têm a assinatura reco- zê-lo, mas é uma trivialidade verdadeira. É cer- nhecida de Paulo Tunhas, que já publicou en- to que os princípios da filosofia grega prolon- tre outros livros, “Impasses”, “coisas vistas, coi- gam a sabedoria oriental, babilónica ou egíp- sas ouvidas”, em parceria com Fernando Gil cia, nomeadamente no que respeita às teorias e Daniele Cohn. “AS QUESTÕES QUE SE RE- da criação do cosmos, mas cosmogonias, e à PETEM”, tem algumas particularidades que ideia de um caos primordial a partir do qual não são «vulgares» em livros, principalmen- tudo se organiza (o caos transforma-se no cos- te em filosofia, e uma delas é que não encon- mos). Mas é com os gregos que se acrescenta à trar-mos uma única nota de rodapé. Novida- interrogação sobre a origem do cosmos aque- de que suscitou pontos de interrogação aos le que é o gesto inaugural da filosofia: uma -re quais o professor Paulo Tunhas respondeu di- flexão sobre o próprio acto de pensar e sobre zendo que a “falta de traduções em português a origem do pensamento no espanto, ou ma- de Portugal de autores que são referenciados ravilhamento, com a própria existência de um nesta obra, fizeram-me decidir por não inse- mundo ordenado, de um cosmos. Uma refle- rir notas de rodapé”. Porém, as indicações que xão que se desdobra num inquérito sobre a se encontram nas margens do corpo do texto natureza da nossa vida moral e política, e so- são fundamentais pedagógica e didaticamen- bre a essência da beleza. Estes três temas – na- te, como fez questão de sublinhar o professor tureza, moral e beleza – manter-se-ão os três Costa Macedo, que referiu ainda a excelên- objectos principais da filosofia ao longo da cia desta obra ao criar “dinamismo da filoso- cidade de resolução dos problemas, pelo con- sua história, ao ponto de quase se poder dizer fia na sua diacronia, realizada antes e depois trário, é criadora de mudança. Só na «aparên- que a filosofia consiste nas várias formas de os de Hegel. Verificamos aqui o desejo indiscu- cia» é que as questões se repetem, e como diz pensar e de os ligar entre si”. E as três últimas tível da procura que cada autor referenciado, Paulo Tunhas, quando anuncia as províncias frases de AS QUESTÕES QUE SE REPETEM, ao tem em encontrar O Sistema. Este livro moti- centrais da filosofia, que se vão modificando problema: “«O que está O pensador a fazer?». va quem Lê”. E mesmo os filósofos que se po- em função dos contextos e «génios» dos filó- Num certo sentido, é a questão essencial que dem «arquivar na pasta» dos anti-sistemáti- sofos, no sentido da capacidade de criação, a filosofia não parou de se colocar ao longo da cos, “caem no sistema”. Nesta obra” é «desem- verificamos que a repetição das questões não sua história. O que é pensar? E: qual a relação baciado» o espelho de cada teoria, suas cor- significa a estagnação da filosofia, pelo - con do pensamento com os seus objectos?”. As- respondências, por vezes atravessando sécu- trário. A cada 20 anos produz-se literariamen- sim, Paulo Tunhas, antecipa o seu próximo li- los de distância entre cada pensamento, por te mais do que tudo o que havia sido produzi- vro, já nas bancas mas ainda não lançado na outras distanciando os mesmos objectos do do na história da humanidade, e o último ca- circunstância, de seu nome “O Pensamento pensar, ainda que em autores contemporâ- pítulo deste livro tem a faculdade de auxiliar e os seus Objectos, Maneiras de Pensar e Sis- neos. José Meirinhos, que aceitou a tarefa de o exercício de destacarmos nos nossos dias os temas Filosóficos”. E para quem sentiu sauda- apresentar AS QUESTÕES QUE SE REPETEM, autores mais marcantes no campo da filoso- des de notas no AS QUESTÕES QUE SE REPE- jogou com as palavras para alertar que “a re- fia. É ainda necessário não deixar passar des- TEM, aqui no O Pensamento e os seus Objec- petição das questões não significa a incapa- percebido o índice onomástico que se encon- tos contam-se 3550. 31 outubro 2012 emnotícia as artes entre as letras | 24

VIH/SIDA e condições laborais Mandarim desde o 1.º ciclo São João da Madeira vai ensinar mandarim a possível aos jovens o contacto com a língua A infecção VIH/SIDA “não é apenas alunos do 1.º ciclo e criar uma escola bilingue para criar uma “mais-valia diferenciadora pa- uma condição de saúde, mas tam- é o próximo passo. A aposta do presidente ra as empresas da região”. “Não podemos fe- bém uma condição social, limitadora da Câmara, Castro Almeida, é uma iniciativa char os olhos à realidade. Nós somos uma de oportunidades e processos”. Esta é pioneira e arrancará já em Janeiro de 2013. O terra muito virada para a exportação. A Chi- uma das conclusões do livro «Diagnós- projecto pretende dotar a região de uma ge- na é um parceiro fundamental no comércio tico da infecção VIH/SIDA: representa- ração preparada para os novos desafios glo- internacional e temos que os considerar ca- ções e efeitos nas condições laborais», bais, nomeadamente ajudar a contornar a da vez menos como um mercado de compra de Isabel Dias, docente da Faculda- dificuldade existente em entrar no mercado de produtos baratos e mais como uma área de de Letras da Universidade do Por- chinês de luxo sem falar mandarim. Assim, de venda de produtos de alta qualidade”, afir- to (FLUP) – Departamento de Sociolo- o edil pretende ajudar a garantir o mais cedo mou Castro Almeida. gia, e investigadora do Instituto de So- ciologia. A partir de um inquérito por questionário a 1634 pessoas infecta- das, maiores de 18 anos, que recorrem aos serviços de saúde de 14 dos maio- «Agora Acontece» res hospitais portugueses, localizados «A Democracia na região de Lisboa, Porto, Coimbra e na UMinho Algarve, o livro procura dar a conhe- e o Futuro» O espólio das emissões do programa «Ago- cer o impacto e as consequências da Nos dias 3, 10, 17 e 24 de Novembro ra Acontece», da autoria de Carlos Pinto Co- infecção no contexto laboral. O estudo (sábados), às 16 horas, a Casa da Es- elho, foi doado ao Instituto de Ciências So- resultou de um protocolo entre o Alto crita, em Coimbra, acolhe o ciclo de ciais da Universidade do Minho (Campus de Comissariado da Saúde/Coordenação conferências políticas subordinado Gualtar, Braga). Em causa a entrega, em su- Nacional para a Infeção VIH/Sida e o ao tema «A Democracia e o Futuro» porte digital, da totalidade das emissões do Departamento de Sociologia da FLUP. – 300 Anos de Rousseau/250 Anos «Agora Acontece», com cerca de 600 horas da obra «O Contrato Social», fruto de de gravação áudio. Na altura, foi assinado uma parceria da Câmara Municipal um documento relativo à doação, e foi fei- de Coimbra e Fundação Bissaya Bar- ta uma evocação do percurso e da persona- reto, sob coordenação científica de lidade de Carlos Pinto Coelho, por José Ma- Alexandre Franco de Sá (Universi- nuel Mendes, docente do Departamento de dade de Coimbra). Ciências da Comunicação. Carlos Nuno de Congresso Abreu Pinto Coelho, falecido a 15 de Dezem- bro de 2010, foi jornalista, mas também se de ciberjornalismo dedicou à fotografia e literatura. Estão abertas as inscrições para o III Congres- so Internacional de Ciberjornalismo que terá lugar nos dias 6 e 7 de Dezembro na Faculda- FLUC acolhe de de Letras da Universidade do Porto. O tema principal do congresso é a Convergência nas estudos russos «Eis o Homem» diferentes dimensões do conceito associadas A Faculdade de Letras da Universidade de ao ciberjornalismo (profissional, empresarial, Coimbra (FLUC) tem o primeiro Centro de Recomeça no dia 1 de Novembro um tecnológica e cultural). A conferência de aber- Estudos Russos em Portugal, inaugurado novo ciclo de conferências «Eis o tura estará a cargo de Ramón Salaverría, da na semana passada. O director da Faculda- Homem», este ano subordinado ao Universidade de Navarra. de de Letras, Carlos André, enalteceu o fac- tema «O Sínodo da Nova Evangeli- to: “Inaugurar o primeiro Centro de Estudos zação, nos 50 anos do Concílio Vati- Russos em Portugal é um motivo de orgu- cano II». O 1.º ciclo de debates versa lho, mas também uma responsabilidade e sobre a Recepção do Concílio do Sí- um desafio. Temos de ter em conta que o nodo da Nova Evangelização, tendo Confraria russo é a língua da maior comunidade de como oradores D. Manuel Clemen- falantes da Europa e língua de um dos paí- te (1 de Novembro), D. António Cou- do Vinho de ses mais importantes do ponto de vista po- to (8 de Novembro) e Aura Miguel (15 Felgueiras lítico e económico”. A “estratégia de afirma- de Novembro). Esta é uma iniciati- ção da Faculdade de Letras passa pelo de- va conjunta da Universidade Católi- No dia 11 de Novembro tem lugar o VIII Ca- senvolvimento de estudos nas várias cul- ca Portuguesa, da Pastoral Universi- pítulo da Confraria do Vinho de Felguei- turas modernas, desde logo as mais impor- tária, da Associação Católica do Por- ras. O encontro será composto por missa tantes; e a cultura russa é uma delas. A Fa- to e do Secretariado Diocesano da de Acção de Graças e Benção do vinho no- culdade de Letras sente-se honrada pela Pastoral da Cultura, que terá lugar vo, no Mosteiro de Pombeiro (11 horas), se- escolha feita pela Fundação Russkiy Mir, às 21h30 na Associação Católica do guido de almoço, nas instalações da Coo- que apoia este Centro e sente esse apoio Porto (R. Passos Manuel, 54). perativa Agrícola de Felgueiras. A chan- como um desafio”, sustentouC arlos André. celer da confraria, Fátima Felgueiras, aler- ta para a necessidade de marcação prévia. 31 outubro 2012 25 | as artes entre as letras emnotícia

Serões Debates continuam na Casa da Bonjóia Em Novembro continua o ciclo de conferências, comissariado por Arnaldo Saraiva, promovido A primeira tertúlia à moda do Porto de Novembro, pela Casa da Música, Porto, neste ano em que França é o país-tema da sua programação. O pró- dia 1, integra-se no Ciclo das Tradições, com Jor- ximo realiza-se no dia 8 com os sociólogos Pierre Bréchon e António Barreto falarão sob o te- ge Cunha que falará «Da Santidade ao Reconheci- ma «Os Novos Comportamentos Sociais e Individuais. Domingos Andrade, da Porto Canal, se- mento». No dia 8, Graziela Meister falará sobre «Or- rá o moderador. A 13, caberá aos filósofosJ osé Gil e Lucien Sfez falar sobre «A Comunicar é Que quídeas – O Cymbidium e o seu Cultivo», no Ciclo a Gente se Entende», moderados por Miguel Gaspar, do Público. Para falar sobre «Emigrantes e das Plantas e Flores. O Ciclo Literário chega no dia Luso-Descendentes na França Contemporânea» são convidados Hermano Sanches Ruivo, ad- 15, com Ana Luísa Oliveira Ramos para abordar «A junto do Maire de Paris, e (ainda a confirmar)I nês de Medeiros, deputada e actriz, a ter lugar no Intensidade de Florbela Espanca» e segue até ao dia 22, com moderação de Júlio Magalhães, Porto Canal. O último deste mês – no dia 28 –, que dia 22, dia em que será apresentado, nos Serões será moderado por Arnaldo Saraiva, abordará a «Crise e Permanência da Literatura Francesa» da Bonjóia, no Porto, o livro «Camilo Castelo Bran- pelo editor e tradutor Michel Chandeigne e pela professora universitária e ensaísta Maria Al- co por Terras Famalicenses», de Maria de Fátima zira Seixo. Estando a última marcada para 13 de Dezembro – com o encenador Emmanuel De- Castro. No dia 29 será lançado o livro «História da marcy-Mota e o professor universitário José Manuel Esteves a falarem sobre «As relações Cul- Medicina Portuense Séc. XIX e XX - da Sangria aos turais Entre a França e Portugal: Novos Desafios» e Anabela Mota Ribeiros na moderação –, to- Transplantes», de António Coimbra, no Ciclo Porto das as sessões com entrada livre mantêm o sítio, Sala 2, e a hora, 21h30, de realização. Cidade de Ciência. As sessões realizam-se às 21h15, na Quinta de Bonjóia, Porto.

Prémio Fernando Namora Acesso à cultura No próximo dia 4 de Novembro será conhecido em Espinho o vencedor do Prémio Literário Fernando Na- O Festival de Outono de Espinho termi- mora, para o qual o júri tinha seleccionado uma na no dia 4 de Novembro, com o concerto ‘short list’ de cinco nomes. João Tordo, com «Ana- «Autumn Leaves» («Folhas de Outono») tomia dos Mártires», Ana Cristina Silva, com «Car- dos Clapersax Quartet, às 18 horas, na Bi- tas Vermelhas», Lídia Jorge, por «A Noite das Mu- blioteca Municipal José Marmelo e Silva, lheres Cantoras», Paulo Castilho, por «Domínio contando com a participação especial da Público» e Dulce Maria Cardoso, com «O Retor- cantora convidada Beatriz Preda. O even- no». O vencedor será anunciado pelo júri, presi- to, organizado pela Câmara Municipal de dido pelo escritor e ensaísta Vasco Graça Mou- Espinho, ainda prevê o 2.º Kabaret Kali- ra, e que inclui ainda Guilherme D’ Oliveira Mar- nas, com o espectáculo «Por Amor à Ar- tins, pelo CNC, José Manuel Mendes, pela APE, te», no dia 3 de Novembro, às 22 horas, no Manuel Frias Martins, pela Associação Portugue- Centro Multimeios de Espinho. Por seu la- sa dos Críticos Literários, Maria Carlos Gil Lourei- do, a exposição que abriu o Festival, «Es- ro, pela Direcção Geral do Livro e das Bibliotecas, paço Habitado», das pintoras Ana Pau- Maria Alzira Seixo e Liberto Cruz, convidados a tí- la Oliveira e Laura Bártolo, continua pa- tulo individual e Nuno Lima de Carvalho e Dinis tente no Fórum de Arte e Cultura de Espi- de Abreu, pela Estoril Sol, entidade que instituiu o nho até ao dia 18 de Novembro. De acor- galardão. Recorde-se que o Prémio vai na 15.ª edi- do com a autarquia de Espinho, o aspecto «as luvas de um ção e tem, este ano, o valor de 25 mil euros. mais relevante do projecto que envolve o Festival do Outono prende-se com a con- aprendiz (in) tinuidade no esforço e na vontade de pro- conformista» mover talentos. Manter o acesso a uma cultura diversificada é outro dos objecti- No dia 3 de Novembro, às 17 horas, a Biblioteca Mu- A casa das pedras vos do Festival. nicipal de Silves acolhe o lançamento do último li- vro da autoria de Gabriela Rocha Martins, «as lu- parideiras vas de um aprendiz (in)conformista». O livro, que Chegou ao fim o processo de infra-estru- já se encontra à venda, tem a introdução escrita turação do geossítio das Pedras Paridei- por Domingos Lobo. ras, na Serra da Freita (Arouca). O Cen- Prémio de tro de Interpretação Ambiental e núcleo museológico, bem como o percurso pe- poesia de Fânzeres donal de visita em torno do maciço prin- «Viagem através do nosso distanciamento», À Conversa Com… cipal de afloramento serão inaugurados de Joaquim Manuel Pinto Serra, ganhou a 21.ª a 3 de Novembro, às 15h30. Orçada em edição do Prémio Nacional de Poesia da Vila O psicólogo e psicanalista Eduardo Sá é o convi- cerca de 190 mil euros, a intervenção foi de Fânzeres. A obra foi votada por unanimida- dado do dia 7 de Novembro para as conversas financiada em cerca de 60 por cento pe- de. O júri atribuiu ainda menções honrosas às ao fim da tarde, que se realizam na Biblioteca lo programa Proder (Programa de De- obras «Paixão em cinco actos», de Ana Paula Municipal de Coimbra. À Conversa Com… tem senvolvimento Rural). Ramos Amaro, e «Matéria-prima ou o poema lugar às 18 horas.. inculto», de Daniela Macário Resende. 31 outubro 2012 emnotícia as artes entre as letras | 26

Caminhos do Invicta Filmes Concurso Cinema Português O Ciclo Humphrey Bogart continua em No- Entre 9 e 17 de Novembro, Coimbra é palco de de presépios vembro, na Biblioteca Almeida Garrett, no mais uma edição do festival Caminhos do Ci- A Câmara Municipal do Entronca- Porto, no âmbito da iniciativa Invicta Filmes. nema Português. No Teatro Académico de mento e a Pastoral da Cultura da Pa- A próxima sessão realiza-se no dia 13 com «O Gil Vicente vai ser analisado o que de melhor róquia da Sagrada Família promo- Tesouro de Sierra Madre» («The Treasure of aconteceu no cinema português entre 2011 e vem, pelo segundo ano consecutivo, Sierra Madre»), de John Huston, realizado no 2012. As vertentes vão desde os filmes de ani- o Concurso «Presépios na Cidade». O ano de 1948. «Vidas Nocturnas (Paixão Ce- mação, curtas e documentários até longas- concurso, aberto até 30 de Novem- ga)» («They Drive by Night»), de Raoul Walsh metragens. A atenção também vai ser dada bro, destina-se a todos os interessa- (1940) será apresentado no dia 14. A 22 é dia de aos projectos finais de escola de cinema, per- dos inseridos numa das seguintes rever «O Último Refúgio» («High Sierra»), de mitindo que jovens cineastas mostrem o seu condições: comerciantes que possu- Raoul Walsh (1941). «Paixões em Fúria» («Key talento. Desde 1988, o festival tem vindo a des- am estabelecimentos em actividade Largo»), de John Huston (1948), no dia 29 e o tacar-se por ser um evento único em Portugal no concelho; escolas e instituições ciclo termina em Dezembro, a 5, com «À Bei- que serve de “montra” ao talento da indústria do concelho. ra do Abismo» («The Big Sleep»), realizado por cinematográfica portuguesa. Howard Hawks em 1946.

Dia do Desassossego Expectativa A Fundação José Saramago comemora os João V, a que a obra de Saramago se refere, 90 anos do nascimento do escritor, a 16 de num espectáculo dirigido por Vera Barbo- na mudança Novembro, com a realização do primeiro sa. As janelas e varandas da sede da Funda- Jorge Barreto Xavier é o substituto Dia do Desassossego, fez saber Pilar del Rio. ção José Saramago vão ser decoradas pelo de Francisco José Viegas na Secre- Em conferência de imprensa na Casa dos pintor José Santa Bárbara, com figuras do taria de Estado da Cultura. Os pri- Bicos, sede da Fundação, a presidente apre- romance, como Blimunda, Baltazar ou frei meiros comentários ao nome são sentou a programação com que preten- Bartolomeu de Gusmão e, no interior, esta- de reconhecimento de competên- de “desassossegar” os leitores do escritor, rá uma exposição de retratos do escritor, cia, mas também de hesitação. É o descrevendo as celebrações – que coinci- da autoria de nove ilustradores portugue- caso do escritor Pedro Mexia que dem com os 30 anos da edição de «Memo- ses e espanhóis. Pilar del Rio – que anun- afirmou à Lusa que Jorge Barreto rial do Convento» – como uma “festa cívi- ciou o encerramento da Fundação no dia Xavier “é competente” para a Secre- ca e da cultura”. Pilar del Rio recordou a fra- 14 de Novembro, dia de greve geral no país, taria de Estado da Cultura, mas “não se de José Saramago “escrevo para desas- convocada pela CGTP-IN – aproveitou ain- há condições para fazer um traba- sossegar os meus leitores”, para justificar o da para reiterar que a Fundação José Sara- lho decente”. “[Jorge Barreto Xa- baptismo da data em que o Nobel da Lite- mago “não recebe quaisquer apoios finan- vier]Já demonstrou anteriormente ratura, nascido na Azinhaga, em 1922, faria ceiros do Estado ou municipais, vivendo que conhece o meio e os desafios 90 anos. “Vamos decretar para sempre o 16 dos direitos de autor da obra de José Sara- da Cultura, mas sou céptico quanto de Novembro como o Dia do Desassossego, mago, e das receitas da bilheteira e da lo- à possibilidade de se fazer alguma juntando o objectivo da obra de Sarama- ja” da instituição. Também a nível interna- coisa, pois não há condições orça- go com o livro de Fernando Pessoa”, disse a cional, na restante Europa e nas Américas, mentais para termos uma Secreta- presidente da Fundação. Nesse dia, a partir serão várias as celebrações dos 90 anos de ria de Estado da Cultura funcional”. do meio-dia, o grupo de teatro Éter recriará Saramago. E o editor da Caminho Zeferino Entre outros desempenhos na área passagens do romance «Memorial do Con- Coelho anunciou que na semana das cele- da Cultura, Jorge Barreto Xavier foi vento», em frente à Casa dos Bicos, e Jor- brações, todos os livros de Saramago serão escolhido em Abril de 2008 para di- ge Baptista da Silva cantará árias de Dome- colocados nas livrarias e vendidos com um rector-geral das Artes, tendo-se de- nico Scarlatti, o compositor da corte de D. desconto de 50 por cento. mitido, em Julho de 2010, quando a tutela era exercida pela então mi- nistra da Cultura, Gabriela Canavi- lhas. A propósito da saída motivada Histórias de Sérgio Godinho pelo pedido de demissão de Viegas, o Primeiro-ministro procedeu a ou- O Ciclo «Conta-me histórias» continua em Gaia, para mais uma sessão. Desta vez com Sérgio tras remodelações e substituiu três Godinho, um dos mais importantes músicos portugueses, e será no próximo dia 9 de Novem- secretários. Os outros dois são João bro, no Auditório Municipal de Gaia, às 21h30. Depois da passagem de nomes como os Clã, Ri- Henrique Grancho, para o Ensino ta Redshoes e Mafalda Veiga por alguns dos pólos culturais de Vila Nova de Gaia, é agora a vez Básico e Secundário, e Manuel Ro- de Sérgio Godinho trazer à memória “muitas histórias que certamente terá para contar”. É, ac- drigues, para as Finanças. Refira-se tualmente, um dos músicos portugueses mais activo, colaborando frequentemente com ban- que também Isabel Silva Leite dei- das e projectos de música moderna, mantendo-se como sempre na linha da frente da criativi- xa o Governo a seu pedido, alegan- dade, em Portugal. O ciclo «Conta-me Histórias» é uma sessão de conversa com os músicos so- do motivos pessoais, segundo fon- bre o processo de criação de canções e a importância que eles dão à palavra. Conversas sim- te oficial do executivo, citado pela ples sobre o quotidiano do artista, intercaladas com seis a oito temas da sua autoria. Lusa. 31 outubro 2012 27 | as artes entre as letras emnotícia

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Prémio Seiva/2012 João Machado (Artes), Nuno Santos (Ciências) e Fernando Guimarães (Letras) são os ven- cedores da X.ª edição do Prémio Seiva, que a Companhia de Teatro Seiva Trupe institui bienalmente para distinguir as individualidades que, através das suas obras ou das suas actividades, mais tenham contribuído para o progresso, dignificação e prestígio dasA rtes, das Ciências e das Letras da cidade do Porto. O Prémio é uma peça especialmente conce- bida para o efeito pelo escultor José Rodrigues. O Prémio será entregue no dia da estreia da peça «Squash» (5 de Novembro).

«Squash» no s ateu M

Campo Alegre Mostra de s arlo A partir de 5 de Novembro e até 2 de De- C zembro, o Teatro do Campo Alegre, Por- Teatro do Brasil to, será palco para a peça «Squash», de Entre amanhã (1 de Novembro) e 16 de De- Ernesto Caballero. Com tradução do es- zembro, o Teatro Nacional D. Maria II apre- critor António Rebordão Navarro e ence- senta a Mostra de Teatro do Brasil, no âmbito nação e Júlio Cardoso a peça conta a his- do Ano do Brasil em Portugal. A Sala Garrett tória de três seres patéticos e suas des- e a Sala Estúdio recebem um conjunto de venturas num único campo de batalha: espectáculos representativos da cena tea- «Tuning» uma quadra de squash. Duas mulheres tral brasileira contemporânea. Para António são chamadas por um personagem mis- Grassi, presidente da FUNARTE, “unindo di- terioso para ocupar um emprego supos- ferentes gerações e companhias, o actor é o Rentrée do TMA tamente concebido para elas. De forma foco principal desse programa”. Esta parce- Duas peças de Shakespeare («O peculiar, são submetidas a uma série de ria entre o TNDM II e a FUNARTE tem início mercador de Veneza», com ence- provas ridículas e cómicas a fim de se sa- com um concerto de Bibi Ferreira, uma das nação de Ricardo Pais; e «A tragé- ber qual das duas é a melhor candidata grandes actrizes da cena contemporânea, dia de Timão de Atenas», com en- para ocupar o cargo. O riso acontece im- que marca assim o seu regresso a Portugal. cenação de Joaquim Benite), e a parável na plateia durante toda a repre- Destaque ainda para a presença de nomes reposição de um espectáculo diri- sentação, até que há uma mudança de como Marília Pêra, Drica Moraes e Mariana gido ao público jovem («Tuning», papéis: os personagens descobrem que Lima e para textos da autoria de nomes tão de Rodrigo Francisco e encena- tudo foi uma piada...? Para um público conhecidos como Jorge Luis Borges, Clarice ção de Joaquim Benite) marcam a maior de 16 anos, o espectáculo tem ses- Lispector ou Moacyr Scliar. Com esta Mos- segunda metade da programação sões de terça-feira a sábado às 22 horas e tra de Teatro do Brasil, o TNDM II colabora de 2012 do Teatro Municipal de Al- ao domingo às 16. na abertura ao intercâmbio cultural entre os mada. Em co-produção com o Te- dois países. atro Nacional de S. João, Porto, a Companhia de Teatro de Almada repõe «O mercador de Veneza» na Sala Principal, até 11 de Novembro. Lugar à dança… «A tragédia de Timão de Atenas», que já se encontra em ensaios, tem «Trava ou Destrava Depois de vários anos apostados na cria- estreia marcada para 20 de De- Línguas» ção de um público interessado na dança zembro e reposição em Janeiro de O Pequeno Auditório do Teatro de Vila contemporânea, o Teatro Viriato (em Vi- 2013 no TMA e entre 20 e 30 de Ju- Real acolhe no dia 10 de Novembro, pe- seu) apresenta agora uma mostra que reú- nho no Teatro Nacional D. Maria II, las 16 horas, o espectáculo de teatro «Tra- ne as mais recentes criações de coreógra- teatro com o qual o espectáculo é va ou Destrava Línguas», dirigido a crian- fos nacionais. «New Age New Time» pre- co-produzido. Estreia absoluta em ças entre os seis e os dez anos, construído tende proporcionar o encontro entre co- Portugal, «A tragédia de Timão de a partir da lenga-lenga, trava-línguas e po- reógrafos e intérpretes portugueses e o Atenas» aborda o percurso que o emas de vários autores portugueses, on- público, procurando apoiar os criadores seu protagonista (uma interpreta- de se desenvolve, de forma lúdica e peda- nacionais e criar oportunida­des para a cir- ção de Luís Vicente) realiza entre gógica, um exercício sobre a dicção e lite- culação das suas peças. Cláudia Dias, Luís a filantropia desmedida e a misan- racia. No final haverá lugar para um peqe- Guerra, António Cabrita e São Castro, Tâ- tropia desencantada, tendo como no ateliê onde as crianças vão poder pra- nia Carvalho, Marlene Freitas, Sofia Dias pano de fundo o carácter alienan- ticar alguns dos exercícios de respiração, e Vítor Roriz apresentam as suas criações te do dinheiro. «Tuning» estará em concentração e de dicção mais utilizados durante três dias, de 15 a 17 de Novembro. cena na Sala de Ensaios entre 17 de pelos actores. Recorde-se que o Teatro Viriato está a pra- Novembro e 2 de Dezembro. Cen- ticar preço especial fixo para pessoas em trado no universo de dois jovens situação de desemprego. dos subúrbios que acabam por su- cumbir à marginalidade, este texto de Rodrigo Francisco foi nomeado pela SPA para o Prémio de Melhor Texto de Teatro Português estrea- do em 2010. 31 outubro 2012 28 | as artes entre as letras