UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

DIONE MARQUES FIGUEIREDO GUEDES PEREIRA

CORPOREIDADE, PRÁTICAS DISCURSIVAS E CUIDADO DE SI: A CONSTITUIÇÃO DE SUBJETIVIDADES DE CELEBRIDADES IDOSOS(AS) NA MÍDIA

NATAL / RN

2020

DIONE MARQUES FIGUEIREDO GUEDES PEREIRA

CORPOREIDADE, PRÁTICAS DISCURSIVAS E CUIDADO DE SI: A CONSTITUIÇÃO DE SUBJETIVIDADES DE CELEBRIDADES IDOSOS(AS) NA MÍDIA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do Título de Doutora em Estudos da Linguagem.

Área de Estudo: Linguística Aplicada

Linha de Pesquisa: Estudo de Práticas Discursivas

Orientadora: Profa. Dra. Marluce Pereira da Silva

NATAL /2020

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – CCHLA

Pereira, Dione Marques Figueiredo Guedes. Corporeidade, práticas discursivas e cuidado de si: a constituição de subjetividades de celebridades idosos(as) na mídia / Dione Marques Figueiredo Guedes Pereira. - Natal, 2020. 197f.: il. color.

Tese (doutorado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020. Orientadora: Prof. Dra. Marluce Pereira da Silva.

1. Corporeidade - Tese. 2. Envelhecimento - Tese. 3. Práticas discursivas - Tese. 4. Cuidado de si - Tese. 5. Celebridades idosas - Tese. I. Silva, Marluce Pereira da. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 81'33

Elaborado por Heverton Thiago Luiz da Silva - CRB-15/710

DIONE MARQUES FIGUEIREDO GUEDES PEREIRA

CORPOREIDADE, PRÁTICAS DISCURSIVAS E CUIDADO DE SI: A CONSTITUIÇÃO DE SUBJETIVIDADES DE CELEBRIDADES IDOSOS(AS) NA MÍDIA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, para obtenção do Título de Doutora em Estudos da Linguagem.

Aprovado em ____ / ____ / ____

EXAMINADORES:

______

Profa. Dra. Marluce Pereira da Silva – UFRN Orientadora

______Profa. Dra. Laurênia Souto Sales- UFPB Examinadora Externa

______Prof. Dr. Degmar Francisca dos Anjos - IFPB Examinador Externo

______Profa. Dra. Celina Rodrigues Muniz – UFRN Examinadora Interna

______Prof. Dr. Josenildo Soares Bezerra – UFRN Examinador Interno

Aos idosos e idosas que se reiventam mundo afora.

AGRADECIMENTOS

A Deus por se fazer presente na minha vida mesmo quando as forças pareciam se esvair.

À Professora Marluce Pereira da Silva por aceitar o desafio de me conduzir nesse processo dividindo seus inúmeros saberes.

À minha família que reconheceu, em silêncio, a necessidade de renunciar a muitos momentos juntos.

Ao meu esposo Carlos S. Guedes Pereira de Lima por assumir algumas atividades quando eu não poderia estar.

Ao meu filho Carlos Germano M. Guedes Pereira pela preocupação com meus momentos de estudo.

À minha mãe Maria do Socorro Marques de Figueiredo pela garra na condução dos estudos das filhas.

Ao meu pai (in memoriam) – Edil Justino de Figueiredo - presença viva de luz a me conduzir.

Às minhas irmãs – Denise Marques de Figueiredo e Daniela Marques Figueiredo– pelo acolhimento constante diante de minhas angústias.

Aos Professores Degmar dos Anjos e Josenildo Soares pela sensibilidade e pelas importantes contribuições no momento da Qualificação da Tese, permitindo os ajustes necessários.

Aos amigos do Instituto Federal da Paraíba – Campus Avançado João Pessoa Mangabeira pelos incentivos diante de tantas demandas de trabalho.

À Professora Maria da Luz Figueiredo de Albuquerque, exemplo de amor pela educação e pelo próximo, pelas experiências compartilhadas.

À Professora Zoraida Arruda pelo exemplo de luta incessante nas questões educacionais.

Aos amigos da Escola Municipal Lions Tambaú pela partilha de diferentes saberes.

Aos idosos e idosas da ASPAN (Associação Promocional do Ancião) e da Vila Vicentina Júlia Freire por me acolherem com tanto carinho nesse universo discursivo do idoso. Aos idosos e idosas – estudantes da Escola Municipal Lions Tambaú - que me permitiram observar o universo discursivo da Educação de Jovens e Adultos a partir do parâmetro da corporeidade.

À Professora Ariane Norma de Menezes Sá pelo incentivo a ingressar na pós-graduação. Com ela aprendi lições para uma vida inteira.

À Professora Ana Cristina de Sousa Aldrigue por me conduzir nas orientações de Mestrado.

Aos estudantes do Curso Técnico em Cuidados de Idosos Subsequente ao Ensino Médio do IFPB – Campus Avançado João Pessoa Mangabeira pelas experiências diárias.

À Pró-Reitoria de Pesquisa, Inovação e Pós-Graduação – PRPIPG/IFPB pelo incentivo dado aos profissionais da instituição no sentido de avanço nos conhecimentos e construção de uma educação melhor para todos.

RESUMO

Esta tese tem como objeto de estudo a constituição de subjetividades de artistas idosos (as), considerados celebridades no meio artístico, oriundas de práticas discursivas veiculadas em sites e revistas eletrônicas e publicadas entre o período de 2011 e 2020. A questão central reside no modo como as celebridades se munem de técnicas de si (FOUCAULT, 1991), em seus enunciados, buscando construir tipos de subjetividades que não as inscrevam como indivíduos decrépitos e fadados ao ostracismo social ou à condição de ―refugo humano‖ de forma a contribuir para a manutenção de sua visibilidade após os 60 anos. Objetiva-se analisar como se constituem as subjetividades de artistas idosos e idosas com visibilidade midiática a partir de discursividades presentes em sites e revistas eletrônicas cuja produção de sentidos aponta as tecnologias do eu utilizadas por tais celebridades na construção de subjetividades. Além disso, de forma específica, objetiva-se analisar como artistas idosos/as relatam, em seus posicionamentos discursivos veiculados pela mídia, a utilização de técnicas de si voltadas à estética corporal visando à manutenção de padrões de beleza ao constituírem suas subjetividades; problematizar enunciados em matérias veiculadas nas mídias cujos autores constroem subjetividades de cunho profissional de ―celebridades‖ idosas e idosos e ainda interpretar sentidos em falas dessas/desses celebridades que apontam técnicas de si na construção de subjetividades que não as inscrevam como indivíduos decrépitos e fadados ao ostracismo social ou à condição de ―refugo humano‖. As discursividades presentes nas falas das entrevistas concedidas ou nos artigos de opinião do ambiente midiático foram categorizadas a partir de enunciados cujos efeitos de sentido apontam para a utilização de técnicas voltadas ao cuidado de si. O corpus é composto de discursos emanados por 22 celebridades. O estudo, vinculado à Linguística Aplicada, é de natureza qualitativa e interpretativista, tendo como base os postulados teóricos de Foucault (2002a) e Bauman (2015) e teóricos da linguagem, com ênfase nos modos de subjetivação, na arte do cuidado de si e corporeidade (FOUCAULT, 2002a) e na noção de refugo (BAUMAN, 2015). As análises demonstram discursividades voltadas a práticas de resistência à inclusão na condição de refugo humano. Os cuidados com o corpo tendem a refutar as questões estéticas em detrimento das condições básicas para a atividade no trabalho. Enquanto tecnologias de si, os cuidados com o corpo são ancorados na resistência a partir do autogoverno e utilizados como instrumentos de mobilidade social não mais como condição de ascensão profissional, mas como garantia de permanência das condições de empregabilidade.

Palavras-chave: Corporeidade. Envelhecimento. Práticas discursivas. Cuidado de si. Celebridades idosas.

ABSTRACT

This researchaims at studying the constitution of subjectivities concerning elderly artists who are considered celebrities in the artistic scenery, arising from discursive practices in websites and electronic magazines, published from 2011 to 2020. The central issue of the research lies on the way celebrities use techniques of the self (FOUCAULT, 1991) in their statements, so as to build types of subjectivities that do not inscribe them either as decrepit individuals, doomed to social ostracism or to the condition of ―human refuse‖, as a way of contributing to their visibility after 60 years old. We aim, therefore, at analyzing the way subjectivities of elderly and elderly artists, with visibility in the media, are constituted from discursivities which are present in websites and electronic magazines, and whose production of meanings concerning the self technologies in the subjectivity construction. In addition, and in a more specific way, it aims at analyzing the way elderly artists report themselves, in their discursive positions conveyed by the media, the use of techniques of the self, aimed both at body aesthetics and at maintaining beauty standards when constituting their subjectivities; problematizing utterances in articles published in the media whose authors build professional subjectivities of elderly and elderly ―celebrities‖ and also interpreting meanings in the speeches of these celebrities who point out techniques of themselves in the construction of subjectivities that do not inscribe them as decrepit and doomed social ostracism or the condition of ―human refuse‖. The discursivities whichpass through the speeches of the interviews or in the opinion articles of the media were, thus, categorized on statements whose effects of meaning reflect the use of techniques aimed at self-care. As to the corpus, it consisted of speeches concerning 22 celebrities. This study, which is aligned to the Applied Linguistics area, configures itself as being of qualitative and interpretative nature, based on Foucault (2002a), Bauman (2015) and language theorists, with emphasis on the subjectivation mode, the art of self-care and corporeality (FOUCAULT, 2002a) and the notion of refuse (BAUMAN, 2015). As to the analysis, itshowed us discursiveness focused on practices of resistance to inclusion, in the condition of human refuse. Body care tends to refute aesthetic issues in detriment of the basic conditions for activity at work. Just like technologies of the self, body care is anchored in resistance based on self-government and used as social mobility instruments, and no longer as a condition for professional advancement, but as a guarantee of permanence concerning employment conditions.

Keywords: Corporeality. Aging. Discursive practices. Self-care. Elderly celebrities.

RESUMEN

Esta tesis tiene como objeto de estudio la constitución de subjetividades de artistas mayores, considerados celebridades en el entorno artístico, resultantes de prácticas discursivas difundidas en sitios web, inclusive de revistas electrónicas y publicadas entre el período de 2011 y 2020. La cuestión central se establece en cómo las celebridades se dotan de técnicas propias (FOUCAULT, 1991), en sus declaraciones, buscando construir tipos de subjetividades que no las inscriban como individuos decrépitos y destinados al ostracismo social o a la condición de ―escoria humana‖ para contribuir a mantener su visibilidad después de los 60 años. El objetivo es el de analizar cómo se constituyen las subjetividades de los artistas mayores con visibilidad mediática a partir de discursividades presentes en sitios web, inclusive de revistas electrónicas y qué producción de significados apunta a las tecnologias del yo utilizadas por tales celebridades en la construcción de subjetividades. Además, de forma específica, los objetivos son: analizar cómo los artistas mayores relatan, en sus posiciones discursivas difundidas por los medios, la utilización de técnicas propias hacia la estética corporal con el propósito de mantener moldes de belleza al constituir sus subjetividades; problematizar enunciados en artículos difundidos en los medios cuyos autores construyen subjetividades de naturaleza profesional de ―celebridades‖ mayores como también interpretar significados en sus discursos que señalan técnicas propias en la construcción de subjetividades que no las inscriban como individuos decrépitos y destinados al ostracismo social o a la condición de ―escoria humana‖. Las discursividades presentes en las hablas de las entrevistas concedidas o en los artículos de opinión en el ámbito mediático fueron categorizadas a partir de enunciados cuyos efectos de significados apuntan a la utilización de técnicas hacia al autocuidado. El corpus consta de discursos emanados de 22 celebridades. El estudio, conexionado a la Linguística Aplicada, es de naturaleza cualitativa e interpretativa, se fundamenta en los postulados teóricos de Foucault (2002a), Bauman (2015) y teóricos del lenguaje, con énfasis en los modos de subjetivación, en el arte del autocuidado y corporalidad (FOUCAULT, 2002a) y en la noción de escoria (BAUMAN, 2015). Los análisis exhiben discursividades hacia prácticas de resistencia a la inclusión en la condición de escoria humana. Los cuidados con el cuerpo tienden a refutar las cuestiones estéticas en detrimento de las condiciones básicas para la actividad en el trabajo. Mientras que tecnologías propias, los cuidados con el cuerpo son anclados en la resistencia a partir del autogobierno y utilizados como instrumentos de mobilidad social no más como condición de promoción profesional, sino como garantía de permanencia de las condiciones de empleabilidad.

Palabras clave: Corporalidad. Senectud. Prácticas discursivas. Autocuidado. Celebridades mayores.

SUMÁRIO

1. POR TRÁS DAS MINHAS LENTES...... 12 2. UMA MUDANÇA NEM TÃO REPENTINA: ASPECTOS INTRODUTÓRIOS. 16 3. QUEM É O IDOSO DE HOJE?...... 22 3.1 O tempo para o idoso...... 27 3.2 Esse corpo que é meu...... 29 3.3 Subjetividades...... 32 4. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS...... 40 5. CONVERSAS ANTERIORES...... 47 5.1 Estado da Arte...... 47 5.2 Trilhas Metodológicas...... 53 6. CUIDADO DE SI E TECNOLOGIAS DE SI...... 57 7. CELEBRIDADES: UM POUCO DE SUAS TRAJETÓRIAS...... 66 8. UM OLHAR SOBRE A MÍDIA...... 91 9. FIOS QUES SE TRANÇAM: ANÁLISE DISCURSIVA DOS TEXTOS MIDIÁTICOS...... 97 9.1 Categorias de Análise...... 98 9.1.1 Percepção e concepções acerca da velhice...... 98 9.1.1.1 Rejeição, liberdade, resistência e incapacidade do idoso...... 98 9.1.2 Cenário atual traçado para o sujeito idoso...... 115 9.1.2.1 - Finitude do sujeito...... 115 9.1.2.2 - Corpo e refugo...... 120 9.1.2.3 – Solidão...... 123 9.1.3 Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso...... 125 9.1.3.1 – O corpo e autoafirmação no cuidado de si...... 125 9.1.3.2 – Sexualidade...... 131 9.1.3.3 – Mobilidade Social...... 139 CONSIDERAÇÕES FINAIS...... 143 REFERÊNCIAS...... 149 ANEXOS...... 157

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1. POR TRÁS DAS MINHAS LENTES

Casa de Repouso (...) Promoção de Natal: Deixe seu idoso bem cuidado conosco e desfrute das festas natalinas. Preços promocionais!!

Era dezembro de 2017 e uma faixa chamava atenção dos moradores de uma das cidades brasileiras com a oferta de mais um serviço para a população idosa. Tratava-se da ―solução para os problemas‖ daqueles que desejavam viajar para as festas de final de ano ou simplesmente, encontrar um lugar calmo, seguro e adaptado para uma pessoa idosa, cujos hábitos não mais se adequavam aos de uma família considerada tradicional. As materialidades linguísticas dessa faixa circularam o país por meio das redes sociais e os efeitos de sentido retratado por aqueles que se viam diante dela era de indignação em função do entendimento de que o idoso ali subjetivado comparava-se a uma mercadoria. Nos últimos anos, inquietações como essas vêm fazendo parte também da minha vida após o acompanhamento da realidade de muitos idosos, especialmente aqueles que residem em Instituições de Longa Permanência para Idosos – ILPIs. Até então, os relatos que ouvíamos eram relacionados à impossibilidade total da família em cuidar de seu ente, agora em idade mais avançada, a outras prioridades estabelecidas pela família ou a própria escolha do idoso em residir em local diferente pelas mais diversas razões. Em contrapartida, vejo também pessoas idosas frequentando reuniões de pais e assumindo por completo a responsabilidade pela educação de seus netos mesmo que as condições gerais de saúde e de finanças se apresentem aquém do ideal. São realidades, de certa forma, antagônicas, pois demonstram as diferentes visões que uma família pode ter de seus idosos a partir do que aqueles representam no seu contexto familiar. Em face de tais discussões, parece surgir uma nova estratégia para justificar ou minimizar a exclusão do idoso do convívio familiar – a existência de espaços de maior conforto e tranquilidade para aquele que não mais se sente bem em passar os festejos natalinos junto dos entes com os quais dividiram uma vida inteira, conforme parece demonstrar a faixa mencionada anteriormente. Dessa forma, o enunciado apresentado tenta construir discursivamente um caráter de positividade, de zelo pela pessoa idosa que não mais precisará passar pelo ―tormento‖ de tantas comemorações. Para tanto, faz uso da condição de ―idoso bem cuidado‖ como um diferencial de seus serviços e não como uma condição precípua exigida a todos os prestadores de serviços, em especial, àqueles que 13 atendem pessoas com tamanha vulnerabilidade. Esses elementos já devem estar inseridos na missão da empresa e não devendo ser utilizados como instrumentos de marketing, uma vez que ninguém deixa um ente querido na companhia de alguém que não zele por seus cuidados. Após ler tal enunciado, imediatamente me reportei às dezenas de idosos das instituições as quais acompanho enquanto docente de um curso técnico em cuidados de idosos e de docente de uma instituição de ensino fundamental. Tentei dimensionar o número de vezes em que aquelas pessoas, hoje institucionalizadas, pensavam em retornar aos seus lares, depois de tantos festejos ao longo do ano com pessoas que nunca tinham visto. Quantos não chegaram ali com a alegação de que seria apenas um passeio e que, no final da tarde, estariam de volta? Quantos não receberam a justificativa de que aquele era o local mais seguro e alegre? Quantos, por falta de opção, ―apagaram‖ da memória o seu passado? Quantos não esperam, até hoje, o retorno para casa? Fico pensando nos inúmeros dados estatísticos a informar que essa parcela da população só tende a crescer. E nós, o que pensamos de tudo isso? Será o idoso apenas um dado estatístico? Nesse contexto que envolve a minha atividade docente foi possível conhecer diferentes realidades relacionadas ao universo do envelhecimento. As questões relativas à corporeidade, beleza, autonomia, independência, solidão, finitude do ser assumem sentidos diferentes no processo de constituição de subjetividades dos indivíduos tomando como parâmetro os idosos institucionalizados e aqueles que frequentam as unidades escolares. Para os inseridos no primeiro grupo, suas histórias, em grande parte dos casos, estão registradas nos prontuários da instituição uma vez que o tempo e tudo que a ele está atrelado se encarregaram de apagar marcas importantes de suas vidas. As produções discursivas, em alguns casos, apontam para diferentes efeitos de sentido em função dos problemas de cognição e memória. Parecem vaga-lumes a piscar em momentos distintos emitindo flashes que tentamos captar como peças de um jogo de quebra-cabeça. Muitos estão há anos convivendo no mesmo espaço e com as mesmas pessoas. Poucos recebem visitas de familiares e são convidados para passeios na cidade. Alguns relatam não morar na instituição (mesmo estando lá há anos) e mencionam antigos endereços como se pudessem para lá retornar caso desejassem. Em contrapartida, ao observar os idosos inseridos no grupo que frequenta a escola de ensino fundamental na modalidade EJA – Educação de Jovens e Adultos, os cuidados com o corpo assumem outro sentido. A autonomia e a independência são essenciais para o seu deslocamento e a atenção ao corpo ultrapassa os limites estéticos. A manutenção no mercado de trabalho e o contato com pessoas e ambientes diferentes contribuem para que as produções 14 discursivas apontem para constituição de subjetividades bem distintas face aos idosos institucionalizados. As conversas em sala de aula, os momentos de intervalo, as apresentações em eventos, além da sensação de pertencimento à família contribuem para a constituição do sujeito de então. Paralelo a isso, percebo que há um outro grupo de idosos que não só permanece na sua casa, mantendo sua independência funcional e autonomia, como supre todas as necessidades da família, aqui incluindo o sustento de seus integrantes e a educação dos netos. Diferentemente da situação anterior, esses idosos são verdadeiros amuletos, pois representam a garantia de que, se tudo der errado nas finanças e na administração da casa, o idoso poderá sanar e por ordem em tudo. Essa questão, nem de longe demonstra respeito aos ―vovôs e vovós‖ da família. Ao contrário, demonstra que o idoso é uma simples moeda de troca no sentido de que, sua permanência na casa está atrelada a tais contribuições. É nesse contexto que ouvimos relatos de idosos que são surpreendidos pela condição de devedores em face de inúmeros empréstimos realizados à revelia daqueles. Estranha-nos ainda saber que, no país em que a legislação só permite o comprometimento de até 30% dos proventos com empréstimos, encontramos pessoas com 70% de seus recursos comprometidos, contrariando um princípio legal. Nesse percurso voltado ao acompanhamento da pessoa idosa em ILPIs, observamos situações as mais diversas para justificar a permanência ou a procura por uma instituição na condição de moradia. Há exemplos de pessoas que saíam de suas residências por falta de alimentação básica e passavam o dia e parte da noite a vagar em mercados públicos a procura de doações e do que estivesse disponível para saciar a fome e foram recolhidas pelo Ministério Público e levadas para a instituição. Há inúmeros casos de filhos que convidam seus pais para um ―passeio‖ e os deixam na instituição sob a alegação de que voltariam mais tarde para pegá-los e não mais retornaram. Há casos, ainda, de idosos transferidos de outras instituições cujas atividades foram encerradas por falta de recursos para manutenção ou porque não desempenhavam suas atribuições a contento. Há casos de idosos cuja família é desconhecida porque, no momento do cadastro, informava nomes e endereços fictícios, ficando impossível qualquer contato posterior. Há exemplos de filhos (as) que após se casarem, seus(suas) companheiros(as) não aceitam a permanência de seus genitores dividindo o mesmo ambiente que eles. O mais grave é que, nessas situações, a residência é do genitor, ou seja, o idoso é ―convidado‖ a sair de sua própria casa. Ressalta-se, contudo, que muitas dessas condições eram ainda mais comuns quando não havia uma política pública ou legislação específica voltada ao idoso. Com o surgimento do Estatuto do Idoso, Conselhos de 1515

Direitos do Idoso (nacional, estaduais e municipais), Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, houve uma significativa mudança nesse cenário com uma fiscalização mais rígida não só às ILPIs, como no tocante ao acompanhamento dos familiares através de visitas e assistências periódicas dentro e fora dessas instituições. Ao longo desse percurso, percebi o quanto o idoso é invisível à lente humana e, apesar de os conceitos gerontológicos afirmarem que começamos a apresentar falhas na memória nessa etapa da vida, constatamos analogicamente que essas falhas são instaladas bem mais cedo nos tornando indivíduos cegos diante do idoso. Todavia aos poucos essa negativa em face da pessoa idosa parece ficar mais difícil em função do número crescente dessa população que não mais se projeta para anos futuros; ela já se faz presente no nosso país com projeções ainda maiores para os próximos anos, ou seja, não há mais espaço para invisibilidade, mesmo que provocada. Nesse cenário e, por trás de minhas lentes urge saber um pouco sobre as diferentes subjetividades desse público, sobre a produção do sujeito idoso em face de sua inscrição em determinadas formações discursivas ou ainda sobre a subjetividade produzida pelo exterior em face dos discursos aos quais se submergem, em especial, as subjetividades apresentadas por artistas brasileiros na sua condição de sujeito idoso. Estamos acostumados a referenciar as celebridades apenas no contexto dos palcos, de seus hábitos, rotinas e amores que ensejam a curiosidade da população. As mídias refletem bem esse comportamento. São elas que, de algum modo, seguem o dia a dia dessas celebridades atribuindo-lhes suas próprias verdades. Contudo, pouco nos damos conta de que esses indivíduos também envelhecem. Fica- nos a impressão de que vivem sob a égide de poderes diferentes dos nossos, onde nada os atinge. Congelamos a imagem do artista na nossa memória, tal qual sua última aparição pública e lhes atribuímos um glamour eterno. De repente, como se repentino fosse, deparamo- nos com discursos e imagens que desfazem o modo como os subjetivamos e passamos a reconfigurar, também os nossos próprios discursos em face dessas novas subjetividades. Assim como os personagens de histórias em quadrinhos, os nossos heróis, vilões, mocinhos, galãs, roqueiros e até a ―namoradinha do Brasil‖ também envelhecem e constroem suas próprias verdades nesse longo percurso que é a vida. Interessa-me, aqui, acompanhá-los (as) no universo discursivo das mídias e entender quem são esses novos velhos artistas de agora sob o prisma da constituição de suas subjetividades.

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2. UMA MUDANÇA NEM TÃO REPENTINA: ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir. (Michel Foucault)

O olhar de educadora me levou a enveredar pelo processo de envelhecimento de forma a entender melhor o atual cenário. É bem verdade que envelhecer é um percurso natural no qual todos nós estamos incluídos de tal forma que, uma vez seres viventes, vamos cumprindo fases dia a dia. Entretanto, não há registros tão constantes acerca das discursividades relacionadas à pessoa idosa como nos últimos anos, motivo que nos instiga a trilhar o amplo caminho dessas formações discursivas, a começar por uma breve contextualização histórica que pode contribuir para a justificativa do crescimento populacional nessa faixa de idade. Durante muitos anos, o Brasil foi considerado um país jovem e essa jovialidade não estava atrelada apenas à condição geoespacial, mas à média de idade de seus habitantes. Nesse sentido, segundo dados do IBGE (2018), o país viveu, ao longo de sua história, diferentes contextos no que tange ao crescimento populacional sendo o intervalo relacionado entre as décadas de 50 e 60 considerado como o apogeu do indicador relacionado ao índice de natalidade. Até o início da década de 1930, conforme Mendonça (2019), o crescimento da população brasileira teve forte influência do processo imigratório. O crescimento era tão significativo que foi necessário a adoção da "Lei de Cotas" (1934) para controlar a entrada de imigrantes em nosso território. Entretanto, no período compreendido entre os anos de 1939 e 1945, a população brasileira aumentou em função de alguns avanços tais como a expansão da rede de esgoto, acesso à água encanada, campanhas de vacinação em massa, acesso a medicamentos básicos, todos considerados elementos redutores dos índices de mortalidade que tanto assustavam a população da época. A partir da década de 1960, com o impulso proveniente do processo de urbanização, começou a ocorrer redução na taxa de fecundidade e uma desaceleração demográfica. Somam-se a isso, ainda, a utilização da pílula anticoncepcional, a participação feminina no mercado de trabalho, o acesso a informações e as altas despesas dos pais na educação dos filhos no meio urbano. Mesmo em face de tais informações, o Brasil pouco se preocupou com essa desaceleração no crescimento populacional, notadamente no que tange à população jovem. Se 17 reportarmos ao início dos anos 70, quando a música que mais retratava o cenário da época era "Pra Frente Brasil", composta por Miguel Gustavo para a Copa do México, percebe-se que o nacionalismo vigente que impulsionava "noventa milhões em ação‖ serve hoje como parâmetro de análise populacional. A população dobrou de tal forma que agora somos cerca de 208,5 milhões de habitantes, segundo dados do IBGE de 2018. O que muda, contudo, é que tal quantitativo não mais traduz uma população jovem, mas uma população que cresceu e envelheceu. Em muitos casos, esse aumento da população idosa e consequente aumento da expectativa de vida se atribuem, também, aos avanços farmacológicos, a exemplo da produção de diversas vacinas e da descoberta do antibiótico que pôs fim a muitas mortes por infecções. Ainda segundo projeções do IBGE (2018), após análise dos dados relativos à população idosa no ano de 2017, a expectativa é de que a população idosa (acima de 60 anos) deve dobrar no Brasil até o ano de 2042. De acordo com o levantamento, o país tinha 28 milhões de idosos no ano de 2017, ou 13,5% do total da população. Em dez anos, chegará a 38,5 milhões (17,4% do total de habitantes) e em 2042, o cenário já aponta para uma população brasileira em torno de 232,5 milhões de habitantes, sendo 57 milhões de idosos (24,5%), conforme aponta o gráfico abaixo. (MELLIS, 2018)

Figura 1: Evolução da população de 80 anos ou mais de idade por sexo - Brasil

Gráfico 20 - Evolução da população de 80 anos ou mais de idade por sexo - Brasil: 1980 / 2050

5.175.373 2050 8.573.332

3.531.657 2040 5.888.830

2.258.072 2030 3.654.153

1.579.741 2020 2.425.788

1.082.139 2010 1.570.922

848.556 2005 1.196.231

661.009 2000 925.949 Homens Mulheres 384.646 1990 534.564

239.621 1980 351.347

9.000.000 7.000.000 5.000.000 3.000.000 1.000.000 1.000.000 3.000.000 5.000.000 7.000.000 9.000.000 População

Fonte: IBGE, 2004

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Ainda segundo Mellis (2018),

[...] em 2031, o número de idosos (43,2 milhões) vai superar pela primeira vez o número de crianças e adolescentes, de 0 a 14 anos (42,3 milhões) e antes de 2050, os idosos já serão um grupo maior do que a parcela da população com idade entre 40 e 59 anos. Atualmente, a população entre 20 e 49 anos é de 96,4 milhões (46,2%). Em 20 anos, cairá para 93,1 milhões (40,3%), chegando a 80 milhões em 2060, ou 35,4% do total. Enquanto o número de idosos aumentará, o de crianças de 0 a 9 anos deve cair nas próximas décadas. Hoje, essa faixa etária representa 14% da população (29,3 milhões). Em 2038, crianças até 9 anos serão 11,1% do total de brasileiros, ou 25,8 milhões.

Diante de todo esse levantamento estatístico e de estudos que já alertavam para essa inversão na pirâmide etária, o Brasil se vê diante de cidadãos idosos com poucas políticas públicas voltadas a eles. Durante muito tempo, investiu-se muito em ações voltadas à criança e ao jovem, mas pouco se pensou nas necessidades do público idoso que já crescia. Espaços de saúde, educação e lazer não vislumbravam essa parcela da população. Hoje, profissionais de geriatria e gerontologia não conseguem suprir as demandas existentes o que comprova a ineficiência ainda de serviços essenciais aos idosos. Há que se considerar também que esse despreparo repercute sensivelmente na visão que a sociedade tem acerca do idoso e se traduz nos diferentes discursos reverberados nos espaços sociais. Isso se mostra evidente quando comparamos a nossa realidade a outras culturas. A maneira como o idoso se percebe nos países orientais é diferente de como esse mesmo idoso é percebido nos países ocidentais, a exemplo do Brasil. O Japão é um modelo característico quando se fala em respeito à pessoa idosa de tal maneira que, quando um cidadão conclui sua jornada laborativa e se aposenta, é recebido como um herói e reverenciado pelos inúmeros ensinamentos. Segundo a Agência Brasil (2019), o país já é detentor de cerca de 30% de idosos e, desde cedo, as crianças são orientadas a respeitar às pessoas de mais idade e o mercado é incentivado a desenvolver produtos e tecnologias que melhorem a qualidade de vida daqueles. Em contrapartida, grande parte dos países ocidentais retrata o idoso como um ―objeto‖ de descarte e um peso ao serviço público uma vez que não mais produz, economicamente falando, e necessita de cuidados mais urgentes decorrentes de uma saúde fragilizada em grande parte dos casos. Fazendo-se uma analogia ao aspecto mercantilista, o ser humano seria alguém com um prazo de validade predeterminado. Diante de todo esse contexto que envolve o processo de envelhecimento nos dias atuais apreendi que esse fenômeno tão ―democrático‖ inclui também artistas famosos que sempre adentraram às nossas casas quer através da música, das artes cênicas ou do jornalismo. Percebi que muitos desses atores / atrizes com históricos de galãs, protagonistas, mocinhos 19

(as) e com padrão de beleza invejável já não ocupavam os mesmos espaços e os mesmos papéis de outrora. Passaram da condição de filhos (as) para pais/mães, avôs e avós além de desempenharem papéis mais curtos, às vezes considerados secundários como de dona de casa, secretária, dentre outros. São pessoas que, mesmo com o incremento da cosmetologia, não conseguem impedir as ações do tempo sobre si, mas investem maciçamente no cuidado de si. Além disso, é comum ouvir, nos mais diferentes espaços, expressões que produzem sentidos de espanto quanto à presença de rugas e traços de expressão em artistas famosos levando-nos à reflexão de que a essa população é negado o direito de envelhecer, contrariando, assim, os preceitos da longevidade. É como se a constituição do sujeito não perpassasse, dentre tantos outros elementos, pelo aspecto biológico e fisiológico, devendo aqueles congelar uma imagem do passado. Essa interferência do tempo me fez questionar como o ser humano, na condição de artista, se constrói como um sujeito agora idoso? Qual o seu atual lugar de fala? Como ele se reconhece no mesmo espaço profissional após um decurso de tempo? Muitas são as indagações e poucas as respostas encontradas nas leituras realizadas. Por esse motivo e diante das inquietações, a pesquisa em questão apresenta como objetivo geral analisar como se constituem as subjetividades de artistas idosos e idosas com visibilidade midiática a partir de discursividades presentes em sites e revistas eletrônicas e que produção de sentidos aponta as tecnologias do eu utilizadas por tais celebridades na construção de subjetividades. Imbuída dessas reflexões que tanto divergem do cenário vivenciado nas ILPIs e ambientes escolares frequentados pelo idoso os quais acompanho foi que se delineou o objeto de pesquisa: Constituição de subjetividades plásticas de artistas idosos a partir de práticas discursivas presentes em ambientes midiáticos, cujas questões estão assim delineadas:

1- Como as discursividades que perpassam os dizeres dos artistas idosos produzem sentidos que constroem o corpo como reflexo do cuidado de si para consequente manutenção nos espaços de visibilidade?

2- Em que medida as matérias veiculadas nas mídias constroem subjetividades profissionais de ―celebridades‖ idosas, a partir das materialidades linguísticas utilizadas por seus autores?

3- De que modo as celebridades se munem de técnicas de si em seus enunciados, buscando construir tipos de subjetividades que enalteçam o profissionalismo e minimizem as 20 questões estéticas e que não as inscrevam como indivíduos decrépitos e fadados ao ostracismo social ou à condição de ―refugo humano‖?

Esses questionamentos levaram a definição dos seguintes objetivos específicos:

1- Analisar como artistas idosos (as) relatam, em seus posicionamentos discursivos veiculados pela mídia, a utilização de técnicas de si voltadas à estética corporal visando à manutenção de padrões de beleza ao constituírem suas subjetividades;

2- Problematizar enunciados em matérias veiculadas nas mídias cujos autores constroem subjetividades de cunho profissional de ―celebridades‖ idosas e idosos;

3- Interpretar sentidos em falas dessas/desses celebridades que apontam técnicas de si na construção de subjetividades que não as inscrevam como indivíduos decrépitos e fadados ao ostracismo social ou à condição de ―refugo humano‖.

Utilizando dos estudos de Foucault acerca das subjetividades, busquei fazer uma analogia com o princípio da plasticidade neural ou plasticidade neuronal na qual o cérebro desenvolve habilidades capazes de reorganizar os neurônios e os circuitos neurais permitindo a sua adaptabilidade às mudanças (FERRARI, et al., 2001,p. 188). Em outras palavras, a capacidade que os neurônios têm de percorrer determinados caminhos levando o impulso nervoso permite que haja alteração do percurso conforme a necessidade, gerando assim, estímulos elétricos e sinapses em outras áreas. Esse processo é de extrema importância no mecanismo de reabilitação de pessoas com algum tipo de lesão física ou cerebral. Nesse aspecto, os idosos representam um grupo significativo a necessitar de tal plasticidade em função de algumas sequelas de AVC – Acidente Vascular Cerebral que podem contribuir para sua incapacidade. Conforme Paraíso (2006, p. 101):

A subjetividade, na perspectiva foucaultiana, é completamente produzida, moldada e ―fabricada‖ em diferentes práticas discursivas, em relações heterogêneas de poder-saber (cf. Foucault, 1993). Nessas relações, os indivíduos são subjetivados de diferentes modos e passam a constituir a si mesmos como sujeitos. Os modos de subjetivação, por sua vez, são todos os processos e as práticas heterogêneas por meio dos quais os seres humanos vêm a se relacionar consigo mesmos e com os outros como sujeitos de um certo tipo (cf. Foucault, 1995b). A palavra ―sujeito‖, em Foucault (1995b), possui, então, dois significados: ―Sujeito a alguém pelo controle e dependência, e preso à sua própria identidade por uma consciência ou autoconhecimento. Ambos sugerem uma forma de poder que subjuga e torna sujeito‖. 21

Dessa forma, compreendendo a subjetividade como algo que se molda e se ramifica em diferentes práticas discursivas com vistas à constituição do indivíduo assim como a plasticidade neural que busca suas interligações na constituição de um novo ser, o termo subjetividades plásticas será aqui utilizado para melhor compreensão dessas interligações discursivas. Reconheço que o trilhar de tais caminhos pode não se apresentar de forma tranquila uma vez que a história não se configura em algo contínuo e linear, mas certamente permitirá que nos coloquemos diante de alguns jogos de verdade em meio às relações de poder do cenário midiático.

22

3. QUEM É O IDOSO DE HOJE?

Não reconhecemos a velhice em nós, nem sequer paramos para observá-la, somente a vemos nos outros, mesmo que estes possuam a mesma idade que nós

(Beauvoir)

Os estudos relativos ao processo de envelhecimento têm demonstrado as diversas denominações recebidas por aqueles acima dos 60 anos. Dessa forma, convivemos com enunciados como velho, idoso, ancião, terceira idade, melhor idade, novo idoso, dentre outros. Em geral, essas diferentes denominações giravam em torno das concepções de saúde e qualidade de vida voltadas para tal parcela da população ou simplesmente por uma questão cronológica. Baseado nesse pressuposto, encontramos divergências também em normas e legislações. Tomando-se como referência o texto constitucional (BRASIL, 1988) pessoa idosa é aquela considerada a partir de 65 anos de idade. Entretanto a Lei 10.741/2003 que instituiu o Estatuto do Idoso considera como pessoa idosa, aquela a partir de 60 anos, ou seja, cronologicamente falando, os dois ordenamentos estipulam idades diferentes para a mesma condição de ser idoso. O Estatuto do Idoso é, ―no ordenamento jurídico brasileiro, a norma que realiza de modo mais amplo a discriminação afirmativa, ou ação afirmativa, com o intuito de superar as desigualdades existentes entre os idosos, como grupo vulnerável, e o conjunto da sociedade‖ (BRASIL, 2004). Abre-se, portanto, um novo discurso voltado agora para o princípio de equidade de condições para os idosos, estabelecendo estratégias de garantias de direitos. É a partir desse instrumento que ficam asseguradas as gratuidades em transportes municipais, por exemplo. Isso referenda o pensamento de Foucault (2012, p.07) quando ressalta que ―o discurso está na ordem das leis, que há muito tempo se cuida de sua aparição‖. Diante de tantas nomenclaturas ou denominações, é preciso que entendamos o que cada uma representa. Dessa forma, dependendo da vertente defendida teremos um conceito envolto em sentido jurídico, científico, médico, religioso, dentre outros. E é a partir do conhecimento acerca da genealogia dessas representações discursivas que se compreende melhor quando alguns termos aparecem deslocados de sua história e são transformados em discursos universais. Conforme enfatiza Foucault (1999, p.15): 23

A genealogia seria, pois, relativamente ao projeto de uma inserção dos saberes na hierarquia do poder próprio da ciência, uma espécie de empreendimento para dessujeitar os saberes históricos e torná-los livres, isto é, capazes de oposição e de luta contra a coerção de um discurso teórico unitário, formal e científico. A reativação dos saberes locais – ―menores‖, talvez dissesse Deleuze – contra a hierarquização científica do conhecimento e seus efeitos de poder intrínsecos, esse é o projeto dessas genealogias em desordem e picadinhas. (p. 15)

Tomando-se como parâmetro essa oposição a um discurso teórico unitário mencionado por Foucault (1999), observa-se que as questões relativas ao idoso vêm alcançando maior visibilidade pelo aumento significativo dessa população no mundo inteiro. Todavia a longevidade crescente aponta para a heterogeneidade desse público ratificando a necessidade de desconstrução de que um discurso científico único atenderia às suas perspectivas. Isso fica evidente quando o tema é analisado sob o cunho social no qual se reconhecem os diversos problemas sociais caracterizados, dentre outras coisas, pela necessidade de políticas públicas que melhor atendam a população que ora está visível nas ruas da cidade ou que tenta ser vista nos mais diversos espaços. Ou seja, aquela parcela que representava uma minoria sem muita expressividade e que se ocupava apenas em se manter em seu ambiente domiciliar, hoje circula livremente em todos os espaços que puder chegar. Isso implica, contudo, em uma visibilidade governamental que pode ser entendida como positiva ou negativa a depender das ações que para esse público são ofertadas. Deve-se, portanto, dar conta de um país que envelhece. Surge com isso um novo mecanismo de poder que toma a vida como alvo de gestão, segundo Foucault (1988, p. 100), ―não pelo direito, mas pela técnica, não pela lei, mas pela normalização, não pelo castigo, mas pelo controle‖. Nesse universo discursivo de diferentes conceitos e enunciados, começamos pelo termo envelhecimento aqui entendido por Manzaro (2014) como ―um processo natural da vida que traz consigo algumas alterações sofridas pelo organismo, consideradas normais para esta fase. Envelhecemos desde o momento em que nascemos‖. Logo, como cita o autor Messy (1999, p.18), ―se envelhece conforme se vive‖, ou seja, o processo de envelhecimento é contínuo e atinge a todos. Segundo a Organização Mundial de Saúde através do Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde (2015, p.12), um dos parâmetros apontados como norteador do envelhecimento, é o parâmetro biológico. Sobre isso, destaca que:

as mudanças que constituem e influenciam o envelhecimento são complexas. No nível biológico, o envelhecimento é associado ao acúmulo de uma grande variedade de danos moleculares e celulares. Com o tempo, esse dano leva a uma perda gradual nas reservas fisiológicas, um aumento do risco de contrair diversas doenças e um declínio geral na capacidade intrínseca do indivíduo. Em última instância, resulta no falecimento. 24

Porém, essas mudanças não se constituem apenas em alterações biológicas; elas produzem mudanças nos papéis e posições sociais abrindo espaço para diferentes subjetividades ou formas de subjetivação, a depender do cenário em que essa pessoa esteja inserida. O documento destaca, ainda, que os objetivos, as prioridades motivacionais e as preferências também parecem mudar ou por uma forma de se adaptar às perdas ou por um desenvolvimento psicológico contínuo capaz de oportunizar ao idoso, novos papéis traduzindo-se numa capacidade de resistência e de crescimento psicossocial. Essa influência de fatores que vão além de elementos biológicos é referenciada por Schneider & Irigaray (2008, p. 592) quando acrescenta outros aspectos a esse processo:

O envelhecimento é um processo complexo e multifatorial. A variabilidade de cada pessoa (genética e ambiental) acaba impedindo o estabelecimento de parâmetros. Por isso, o uso somente do tempo (idade cronológica) como medida esconde um amplo conjunto de variáveis. A idade em si não determina o envelhecimento, ela é apenas um dos elementos presentes no processo de desenvolvimento, servindo como uma referência da passagem do tempo.

Dessa forma, o processo de envelhecimento sofre interferências diretas, também, do estilo de vida e das intempéries ambientais. Não se pode referenciar, portanto, as condições biológicas como elementos únicos e determinantes. Mesmo que tenhamos a mesma idade cronológica, muitos fatores podem incidir no processo, influenciando no envelhecimento mais tranquilo para uns e mais difícil para outros. Todavia Beauvoir (1990, p. 19) chama a atenção para um outro elemento que pode categorizar o envelhecimento como algo bem sucedido – a independência funcional. Segundo a autora, ―não se falará de envelhecimento enquanto as deficiências permanecerem esporádicas e forem facilmente contornadas. Quando adquirem importância e se tornam irremediáveis, então o corpo fica frágil e mais ou menos impotente: pode-se dizer, sem equívoco que ele declina.‖ (BEAUVOIR, 1990, p. 19) Com isso, percebe-se que a falta de independência funcional e de autonomia do indivíduo contribuem diretamente para a aceleração do processo de envelhecimento. Muitos não se consideram inseridos na fase idosa, embora as concepções baseadas na cronologia se contraponham a isso, por não apresentarem limitações que os impeçam de desempenhar as atividades rotineiras. É o caso daqueles que optam por enfrentar uma fila de supermercado, mesmo podendo utilizar a fila preferencial. Quando as limitações já não podem ser contornadas, tende-se a assumir a condição de pessoa idosa abrindo espaço para novos modos de subjetivação. 25

No que concerne ao termo idoso, este é entendido como o sujeito do envelhecimento, aquele indivíduo acima de 60 anos de idade. Conforme citado anteriormente, este termo é adotado nos principais ordenamentos jurídicos, dentre eles, a Constituição Federal. Sua denominação visa, também, substituir a expressão ―velho‖ por entender que este último representa uma ideia depreciativa atribuída a um sujeito, aqui visto como decadente e limitado para grande parte de suas atividades habituais, podendo ser melhor atribuída a um objeto / coisa do que a uma pessoa. Segundo Katz (1996, apud Silva, 2008, p.157), a história da velhice ―surge como produção discursiva a partir da inserção dos sujeitos na série moderna de disciplinamento, sendo, sobretudo resultado do investimento do discurso médico sobre o corpo envelhecido‖. Ao longo do século XX, essa etapa da vida passou a entrar em evidência em função dos avanços médicos e a institucionalização das aposentadorias. Em decorrência disso, surgem posteriormente os saberes médicos e a consequente geriatria como uma necessidade de estudar esse corpo envelhecido. É a partir dela que se acentuam as descobertas relativas às principais patologias que atingem esse corpo que já não se comporta com a mesma agilidade de outrora. A velhice se relaciona, portanto, com a história do curso moderno de vida. Entretanto, mesmo diante de todas as mudanças relacionadas às expressões utilizadas para aqueles de maior idade, percebe-se que nem sempre estas são aplicadas da forma como são conceituadas. A depender da classe social a qual esteja inserido, por exemplo, o idoso pode ser identificado como sendo aquele detentor de um poder aquisitivo mais abastado mantendo-se a classificação de velho para aquele mais pobre e desprovido das condições básicas de autonomia e independência. Assim, em determinados espaços, aqueles que demonstram um padrão de jovialidade e seguem uma rotina de atividades que os mantêm longe da aposentadoria estão mais vinculados à denominação de idosos. Em contrapartida, aqueles com componentes estéticos mais desgastados ou que não mais estejam vinculados a relações de trabalho são facilmente categorizados como velho. Esse cenário pode ser encontrado, por exemplo, em supermercados e agências bancárias quando os requisitos estéticos e a boa apresentação visual se apresentam como divisor de águas entre quem pode e quem não pode fazer uso de uma fila preferencial. Contextualizando a velhice na sociedade ocidental a partir dos parâmetros acima, Barbieri (2012, p. 118) ressalta que:

A depreciação da velhice na sociedade ocidental, localizada historicamente nas mudanças sociais e econômicas ocorridas a partir do século XVIII, decorreram principalmente dos novos modos de produção, que interferiram significativamente nos espaços sociais. A inserção e a valorização do indivíduo na sociedade passaram 26

a se dar pela força de trabalho, e o velho, ao não trabalhar, passa a ser desvalorizado, por ser considerado cidadão improdutivo, sendo a aposentadoria a marca dessa passagem. Vale lembrar que o termo aposentar quer dizer: retirar-se para os aposentos, evidenciando a ideia de ociosidade. Quase sinônimos, velhice e aposentadoria passaram a ser caracterizados pela inatividade e pela pobreza. Entretanto, com a ampliação do trabalho assalariado, começa a ocorrer uma dissociação entre aposentadoria, pobreza e velhice.

A força produtiva passou a influenciar, de forma veemente, na delimitação do que é estar inserido na condição de idoso. Enquanto se estiver no mercado de trabalho, as marcas da idade parecem não se tornar evidentes ou importantes. Contudo, ao adentrar no universo dos aposentados, o estigma da velhice parece surgir de forma repentina fazendo com que muitos discursos venham a ensejar a associação com a finitude. Apesar disso, esse cenário deverá sofrer mudanças em função das condições de aplicabilidade da reforma da previdência recentemente em vigor. Não se sabe ao certo como essas pessoas acima de 60 anos desenvolverão suas atividades nas mais diferentes áreas de trabalho, tampouco como o mercado de trabalho se comportará frente a essa nova realidade. Essas indagações residem no fato de que a velhice está associada a elementos negativos, conforme relata Alves Júnior (2004, p. 60),

a velhice é apresentada como um período da vida ao qual se associam mais desvantagens do que vantagens, existindo grande controvérsia sobre qual seria o momento ideal para marcar o início dessa tal velhice. Para ele, o mais frequente é o uso da idade cronológica para se dizer quando alguém é velho, ou então se recorre a determinados comportamentos ou a um modo específico de envelhecer. A falta de consenso é presente, seja no uso de critérios cronológicos, seja na importância que se dá aos sinais externos, apresentados por meio das mudanças corpóreas ou orgânicas, que acabam refletindo na variedade de conselhos que são dados em cada época para se enfrentar a velhice.

Essa falta de consenso tem alcance nos documentos legais citados anteriormente acerca do marco inicial da fase idosa. Se verificarmos o sentido da palavra aposentadoria, veremos que esta se refere a uma fase em que o então trabalhador deverá recolher-se a seus aposentos, ou seja, sair de cena por não ser mais pertencente àquele grupo produtivo. Por outro lado, tal conceito não contempla as diferentes condições em que essas pessoas se apresentam, o estilo de vida de cada uma, as variáveis que interferiram na formação do sujeito de hoje. Os critérios de velhice ou de determinação de quando alguém é considerado idoso, na prática ultrapassam a barreira da cronologia. Todas essas denominações ou conceitos que circundam o tema velhice têm se mostrado, a nosso ver, mais perceptíveis no cenário atual, independente da conotação utilizada. Isso contribui para o processo de subjetivação da pessoa idosa que pode se encontrar representada em um ou outro discurso, grupo ou conceito. 27

3.1 O TEMPO PARA O IDOSO

Que sejas ainda mais vivo No som do meu estribilho Tempo tempo tempo tempo Ouve bem o que eu te digo Tempo tempo tempo tempo.

(Caetano Veloso)

A expressão ―tempo‖ traz conotações diversificadas a depender de quem a utiliza. John Wheeler, um dos maiores físicos do século 20 descreveu o tempo como sendo ―o jeito que a natureza deu para não deixar que tudo acontecesse de uma vez só‖. Segundo ele, ―o tempo veste um traje diferente para cada papel que desempenha em nosso pensamento.‖ No processo de envelhecimento, o fator tempo parece exercer uma influência ainda maior sobre aqueles acima de 60 anos. Isso porque, considerando a condição de que o envelhecimento acontece a cada dia a partir do nascimento, tal fator não deveria representar tamanha interferência uma vez que atinge a todos sem distinção. Todavia essa condição cronológica pode representar proximidade com a finitude da vida, exclusão, isolamento e inutilidade após os 60 anos. Apesar de fazer parte da nossa vida, de contabilizar todas as nossas ações a partir do tempo, este ―não é uma concepção homogênea e imutável. Na história da humanidade se pode afirmar que existiram diversos modos de construir uma relação com o movimento e o imóvel, com o eterno e o fugaz: distintas imagens do tempo.‖ (COSTA; FONSECA, 2007, p. 113). Essa diversidade está atrelada ao que Bauman (2001) denominou de liquidez, considerando o dinamismo existente na transição entre a modernidade e o que ele chamou de pós- modernidade. A fase de derretimento do sólido e consequente formação de elementos líquidos acabam por contribuir para o caráter modificável do comportamento adotado em sociedade e, por conseguinte, dos modos de subjetivação. Se na modernidade atual nada é feito para durar, nada se solidifica, as pessoas tentam se adaptar constantemente a tais mudanças . Daí a busca incessante pelo corpo perfeito, pelo acesso a tecnologias de ponta. Os relacionamentos, os grupos, os valores, assim como os objetos, passam a ser efêmeros. Nesse contexto, o tempo antes destinado para a autorreflexão, para o lazer (ou tempo livre), para as interações sociais hoje é considerado como tédio ou solidão. O tempo moderno implica em escolhas tecnológicas e estímulos externos; os relacionamentos são muito mais virtuais do que presenciais. A máquina do tempo parece 28 correr numa velocidade que não nos favorece e isso contribui para o aumento do consumo sem precedentes. Nesse sentido, Bauman (2009) chama a atenção, em uma de suas entrevistas, para esse novo comportamento, assim relatando:

Na sociedade contemporânea, somos treinados desde a infância a viver com pressa. O mundo, como somos induzidos a acreditar, tornou-se um contêiner sem fundo de coisas a serem consumidas e aproveitadas. A arte de viver consiste em esticar o tempo além do limite para encaixar a maior quantidade possível de sensações excitantes no nosso dia-a-dia. Essas sensações vêm e vão. E desaparecem tão rapidamente quanto emergem, seguidas sempre de novas sensações a se perseguir. ―A pressa - e o vazio - é fruto disso, das oportunidades que não podemos perder (BAUMAN, 2009).

A chamada modernidade líquida nos faz adotar comportamentos, padrões e características que não existiam em gerações anteriores. Mesmo com o advento da revolução industrial que protagonizou muitos dos cenários apresentados hoje, a liquidez se apresenta com muito mais força na atualidade. Gerações que se formavam a cada 30 anos vêm sendo renovadas a cada década, ou até em menor espaço de tempo. Esse excesso de novas informações e consequente acesso com tamanha facilidade permitem, inclusive, o desenvolvimento de novas patologias, a exemplo da Síndrome do Pensamento Acelerado, frequentemente relatado pelas ciências médicas e descrita pelo Psiquiatra Augusto Cury. O cérebro humano já não consegue processar as informações com a rapidez com as quais elas chegam e acaba por se manter em constante atividade, ocupando os espaços destinados ao sono. É como se o dia não mais tivesse 24 horas. Nessa perspectiva, Bauman (2009) reflete que ―o tempo jorra em todos os lugares. Nós envelhecemos no Tibete ou em Nova York. Mas a experiência da passagem do tempo é organizada de maneira diferente, dependendo da sociedade em que estamos inseridos.‖ Em algumas sociedades, o consumo dita as regras e as nossas necessidades são determinadas pelo que o mercado tem a oferecer e isso passa fortemente pela interferência tecnológica. Produtos, equipamentos e serviços surgem e se tornam facilmente obsoletos impulsionando-nos a constantes aquisições, mesmo que não precisemos ou não saibamos a sua real utilidade. As relações também adquirem forma líquida, ou seja, se adaptam ao momento ou às regras estipuladas na atualidade. Da mesma forma que nos conectamos e desconectamos de um equipamento, assim o fazemos com as relações e as pessoas: substituímos com a mesma rapidez com que se substitui um eletroeletrônico. Nada é mais duradouro. Em tempos líquidos, nada é para durar, como afirma Bauman (2007, p. 13). Deixamos de nos satisfazer com as pessoas da mesma forma que perdemos o interesse por objetos ou equipamentos. 29

As pessoas se subjetivam em face dos constantes discursos de que devem acompanhar o que o tempo traduz como novo, deixando o mundo ainda mais líquido conforme expressão utilizada pelo filósofo polonês. Essa liquidez atinge, de forma mais imperativa, as pessoas idosas. Se as relações, os vínculos estão cada vez mais frágeis e efêmeros, o que dizer da atenção dispensada àqueles acima de 60 anos? A liquidez da pós-modernidade parece atingi-los com um efeito ainda mais devastador, obrigando-os a constantes processos de subjetivação como garantia de pertencimento a um grupo ou sociedade. Daí nos depararmos com artistas maiores de 60 anos, por exemplo, preocupados com o processo de rejuvenescimento e utilizando discursos que enaltecem sua aparência e forma física na tentativa de se moldar ao novo formato que essa liquidez moderna impõe. Corpos são ―refeitos‖ em clínicas de cirurgias plásticas para que a ação do tempo tenha seu curso alterado. As pessoas se moldam, reconfiguram-se e se subjetivam em busca de algo que nem sempre sabem o que é. O corpo, mais uma vez, tenta usar o tempo em seu favor.

3.2 ESSE CORPO QUE É MEU

Quanto menos eu me reconheço em meu corpo, mais me sinto obrigada a me ocupar com ele. (Beavoir)

O corpo sempre foi foco de interesse, atenção e pesquisa e não se limita apenas às concepções orgânicas, mas se configuram com um espaço onde se operam diferentes dispositivos. Hoje, de forma mais incisiva, percebe-se a veiculação pelos diferentes espaços midiáticos de que a longevidade é algo que está ao alcance de todos e em igualdade de condições. Isso contribui para a falsa ideia de que os efeitos do envelhecimento acontecem nas mesmas proporções para toda a população levando-nos a crer que o que se contrapõe a isso é consequência de uma recusa pessoal. O exemplo de Jane Fonda, apresentado por Bauman (2001, p. 79), referencia bem essa relação de valoração que o corpo exerce na modernidade: ―Gosto muito de pensar que meu corpo é produto de mim mesma, é meu sangue e entranhas. É minha responsabilidade.‖ A mensagem de Fonda para toda mulher é que trate seu corpo como sua propriedade (meu sangue, minhas entranhas), seu próprio produto e, acima de tudo, sua própria responsabilidade [...] O lado inverso da mensagem também não é ambíguo, ainda que não soletrado com a mesma clareza: você deve a seu corpo cuidado, e se negligenciar esse dever, você deve sentir-se culpada e envergonhada. Imperfeições de seu corpo são sua culpa e 30

vergonha. Mas a redenção do pecado está ao alcance das mãos da pecadora, e só de suas mãos.

As materialidades linguísticas trazidas por Jane Fonda apontam efeitos de sentido que ensejam que você é totalmente responsável pelo corpo que tem e que seu sucesso ou fracasso está atrelado ao comportamento adotado ao longo da vida. Como mencionado anteriormente, muitos são os fatores que interferem na sua longevidade e nos resultados obtidos, de sucessos ou de insucessos. Nesses fatores, o corpo também está envolvido. Todavia a mídia e as estratégias de marketing tendem a delegar a você, a opção pelo corpo bem cuidado e belo. As técnicas de emagrecimento, os exercícios, as dietas e os produtos de beleza estão disponíveis, cabendo-lhe a aplicabilidade. Conforme Bauman (2001, p. 79), seguir os ensinamentos de Jane Fonda é um caminho a ser traçado por qualquer indivíduo: ―Sou famosa e amada; sou objeto de desejo e admiração. Qualquer que seja a razão, existe porque eu a fiz existir. Olhem meu corpo: é esguio, flexível, tem boa forma – perenemente jovem. Você certamente gostaria de ter - de ser um corpo como o meu. Meu corpo é meu trabalho; se você se exercitar como eu, você poderá tê-lo. Se você sonha em ―ser como Jane Fonda‖, lembre-se de que fui eu, Jane Fonda que fiz de mim a Jane Fonda desses sonhos.

Esse efeito de sentido de que o nosso corpo é produto de nossa inteira responsabilidade é destacado por Foucault quando enfatiza:

Como resposta à revolta do corpo, encontramos um novo investimento que não tem mais a forma de controle-repressão, mas de controle-estimulação: ―Fique nu... mas seja magro, bonito, bronzeado!‖ A cada movimento de um dos dois adversários corresponde o movimento do outro (FOUCAULT, 2002, p. 147).

Isso mostra o quanto somos impulsionados a reconhecer que nosso corpo é produto de nossas escolhas e que somos ―estimulados‖ a dedicar um significativo espaço de tempo para a manutenção do corpo dito ideal, uma vez que este, assim como o de Jane Fonda, ―pode ser submetido, pode ser utilizado, pode ser transformado e aperfeiçoado‖ (FOUCAULT, 2004a, p. 118) Ainda de acordo com Michel Foucault (2002, p. 146):

O domínio, a consciência de seu próprio corpo só puderam ser adquiridos pelo efeito do investimento do corpo pelo poder: a ginástica, os exercícios, o desenvolvimento muscular, a nudez, a exaltação do belo corpo... tudo isto conduz ao desejo de seu próprio corpo através de um trabalho insistente, obstinado, meticuloso, que o poder exerceu sobre o corpo das crianças, dos soldados, sobre o corpo sadio. Mas a partir do momento em que o poder produziu este efeito, como conseqüência direta de suas conquistas, emerge inevitavelmente a reivindicação de seu próprio corpo contra o poder, a saúde, contra a economia, o prazer contra as normas morais da sexualidade, do casamento, do pudor. 31

As colocações de Foucault acima apontam para as relações de poder que são exercidas sobre o corpo. A construção do indivíduo é dada pelos efeitos do poder e este se encontra presente na população às vezes de forma bastante sutil. Os procedimentos de rejuvenescimento, a aplicação de vacinas, a produção de células-tronco a partir da conservação de cordões umbilicais são exemplos desse poder. É a ação do biopoder que ultrapassa a esfera individual atingindo, também, o coletivo. Paralelo a isso, o corpo passa a representar atitude, interferindo nas formas de viver. É o que aponta o filósofo quando destaca que o corpo: também tomou a forma de uma atitude, de uma maneira de se comportar, impregnou formas de viver: desenvolveu-se em procedimentos, em práticas e em receitas que eram refletidas, desenvolvidas, aperfeiçoadas e ensinadas; ele constitui assim uma prática social, dando lugar a relações interindividuais, a trocas e comunicações e até mesmo a instituições; ele proporcionou, enfim, um certo modo de conhecimento e a elaboração de um saber (FOUCAULT, 2002, p. 50).

Dessa forma, as atitudes tomadas pelas celebridades frente aos seus corpos constituem-se, também, em novas possibilidades, novas práticas, novas referências de cuidados para quem os (as) acompanha. Utilizando-se desses corpos famosos, a mídia identifica um nicho de investimento exibindo exemplos de beleza e sucesso como estratégias de marketing e vendendo a possibilidade de uma beleza eterna e cheia de glamour. Assim, essa corporeidade enquanto fator pujante na vida de qualquer indivíduo passa a ser conduzida pela mídia como um modo único de vida, ou seja, estimulada pelo modelo apresentado por diferentes celebridades. Esse controle sobre os corpos, contudo, surge com uma nova roupagem assegurada pelos aparatos tecnológicos que interferem nas formas e contornos corporais, permitindo a construção de uma imagem o mais próximo possível do imaginário popular. Com isso, novas silhuetas são criadas, marcas de expressão são excluídas, a tonalidade da pele assume um brilho especial e as alterações típicas do processo de envelhecimento parecem burlar as teorias biológicas, contrapondo-se às diferentes ações do tempo sobre o corpo. São ações do biopoder utilizando-se de novas estratégias de controle. Ademais, inúmeras são as formas de controle sobre os diferentes corpos. A institucionalização da vacina no início do século XIX, por exemplo, é um marco representativo desse controle e, desde então, tem ocupado lugar de destaque como elemento importante nas políticas públicas de saúde mediante constante vigilância sobre os corpos. Acerca desse exercício de poder, Foucault (2010) destaca: A disciplina é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos. Não basta olhá-los às vezes ou ver se o que fizeram é conforme a regra. É preciso vigiá-los durante todo o tempo da atividade de submetê-los a uma perpétua pirâmide de olhares. É assim que no exército aparecem sistemas de graus que vão, sem interrupção, do general chefe até o ínfimo soldado, como também os 32

sistemas de inspeção, revistas, paradas, desfiles, etc., que permitem que cada indivíduo seja observado permanentemente (FOUCAULT, 2010, p. 106).

Assim, disciplinamos os corpos institucionalizados no que concerne à sua rotina diária, o que inclui alimentação, higiene, quadro clínico geral, realização de atividades lúdicas e corporais e controle de visitas. Nas unidades escolares, o poder disciplinar exerce controle sobre o vestuário, dieta alimentar, proposta curricular, critérios de aprovação, entrada e saída da escola, dentre outros. No contexto midiático, utilizam-se corpos jovens, saudáveis, magros cujo efeito de sentido aponta para a beleza e o sucesso a partir dos cuidados devidos e fazendo inferir que a manutenção desse sucesso se dá pela proatividade e pelo autocontrole. Instaura- se, portanto, um processo de vigilância constante e em todas as etapas da vida que pune aqueles que não se encaixam nas normas e padrões culpando-os pelos insucessos.

3.3 SUBJETIVIDADES

Não me pergunte quem sou e não me diga para permanecer o mesmo. (Michel Foucault)

Quando se fala de um indivíduo, atribuímos de pronto um sentido de singularidade, unidade. Todavia essa individualidade acaba sendo construída ao longo da vida mediante as influências advindas da sociedade. Assim sendo, passamos a conviver enquanto sujeitos que estão em contínuo processo de transformação em face das relações sociais. Daí a constituição do sujeito acontecer de formas distintas mediante os espaços inseridos, conforme aponta Teixeira e Camargo (2015, p. 06): Se as práticas sociais só são legitimadas no campo da representação, o texto quer seja: literatura, cinema jornalismo, publicidade são espaços perfeitos para entender os conceitos que tangem determinados grupos, pois ao produzi-lo, os sujeitos colocam-se em um palco onde é possível visibilizar a maneira como as representações agem, são absorvidas e transformam-se em discursos representativos.

Acerca das questões de constituição do sujeito, Foucault declara:

Em primeiro lugar, penso efetivamente que não há um sujeito soberano, fundador, uma forma universal de sujeito que poderíamos encontrar em todos os lugares. Eu sou muito cético e hostil em relação a essa concepção de sujeito. Penso, pelo contrário, que o sujeito se constitui através das práticas de sujeição (assujeitamento) ou, de uma maneira mais autônoma, através das práticas de liberação, de liberdade, como na Antiguidade – a partir, obviamente, de um certo número de regras, de estilos, de convenções que podemos encontrar no meio cultural (Foucault, 2004b, p. 291). 33

Analisando-se o percurso histórico acerca da temática, percebe-se que no período socrático, as maneiras de constituição do sujeito eram baseadas em um cuidado de si, porém voltado muito mais para questões políticas, para os modos de governar no contexto político. Assim destaca Foucault (2004, p. 45):

[...] a finalidade do cuidado de si, não o objeto, era outra coisa. Era a cidade. Sem dúvida, na medida em que quem governa faz parte da cidade, também ele, de certo modo, é finalidade de seu próprio cuidado de si e, nos textos do período clássico, encontra-se com frequência a ideia de que o governante deve, como convém, aplicar-se a governar, para salvar a si mesmo e a cidade - a si mesmo enquanto parte da cidade. [...] A cidade mediatizava a relação de si para consigo, fazendo com que o eu pudesse ser tanto objeto quanto finalidade, finalidade contudo unicamente porque havia a mediação da cidade.

Já nas sociedades modernas, entram em jogo relações de saber e de poder que acabam por interferir na constituição do sujeito, diferentemente do que acontecia na Grécia Antiga. Isso começou a ficar evidente no início do Cristianismo quando se depositou na figura dos padres e religiosos o poder no sentido de contribuir com o processo de formação do sujeito, ou seja, delega-se ao outro o seu assujeitamento. Inverte-se, portanto, o processo no qual o sujeito passa a ser constituído mediante autorização delegada a outrem, saindo de uma esfera particular, que outrora predominava, para a inclusão de terceiros. Importante destacar que a relação do sujeito consigo mesmo era minimizada em função de poder concedido a outro (religiosos) que passariam a nortear seus modos de subjetivação. Essa autoridade, devidamente imbuída do poder e da autoridade moral de interferir na constituição do sujeito, sob a ótica de possibilitá-lo ser uma pessoa melhor, acabava por desqualificar muito do que o sujeito trazia até então. O ato de perdoá-lo por seus atos contribuía para a ruptura com seu passado. Era uma desconstituição ou destruição de quem aquela pessoa era em detrimento do que se entendia como um sujeito melhor. Dessa forma, havia uma significativa influência da visão do outro sobre o indivíduo sendo este o fator determinante e não seu autoconhecimento. Esse processo passa a ser modificado com o advento das ciências sociais que deram um caráter científico à percepção do que o sujeito trazia acerca de si mesmo, ou seja, não era necessário buscar no outro, enquanto autoridade a condução de sua vida enquanto sujeito. O conhecimento sobre o humano dava a este um caráter de verdade científico. Nessa nova forma de constituição do sujeito, o poder permanece uma vez que à ciência é delegado o direito de descortinar sua vida ao ponto de fazer surgir um novo ser. Essa condição de assujeitamento permanece na sociedade moderna, pois, ao contrário do que se pensava, não contribui para a emancipação e sim referenda os parâmetros de verdades 34

utilizados pelo conhecimento científico a partir dos critérios de julgamento utilizados. Dessa forma, imbuído ou amparado pelo conhecimento científico, o sujeito é conduzido a assumir determinadas posturas ou padrões. Nesse cenário moderno, Foucault (1984, p.1205) enfoca que seu intuito a partir do contexto de assujeitamento por ele mencionado é construir uma nova perspectiva do presente sem desconsiderar os efeitos do passado. No contexto atual, as lutas políticas não só mudaram como interferem, mediante uso do poder, na transformação dos indivíduos em sujeitos. Segundo o filósofo:

Elas se constroem contra um tipo de poder que se exerce na vida cotidiana das pessoas, que classifica os indivíduos em categorias, designa-os por sua individualidade e lhes fixa em suas identidades, lhes impõem uma lei de verdade a qual eles devem reconhecer em si mesmos e que os outros devem reconhecer neles. Trata-se de uma forma de poder que transforma os indivíduos em sujeitos (FOUCAULT, 1984, p. 1048).

A ação política deve se dar no contexto de resistência às relações de poder-saber que pressupõe uma relação do sujeito consigo mesmo de forma que consigamos compreender quem somos e porque nos subjetivamos dessa ou daquela maneira. Essa nova forma de visão nos faz refletir que,

sem dúvida o objetivo principal hoje não é o de descobrir, mas de recusar o que nós somos. É necessário imaginarmos e construir aquilo que poderíamos ser para nos desvencilharmos dessa espécie de ‗dupla constrição‘ política que é a individualização e a totalização simultâneas das estruturas do poder moderno (FOUCAULT, 1984, p. 1051).

Ao longo de sua trajetória, Foucault foi visto por muitos como um filósofo cuja preocupação residia nas questões relativas ao poder. Entretanto, através de sua obra O Sujeito e o Poder, o autor ressalta que um de seus objetivos até então não residia nas questões relativas ao poder, mas possibilitar o entendimento das diversas formas pelas quais os homens se tornam sujeitos. Nesse sentido, em uma entrevista com Hubert Dreyfus e Paul Rabinow, acerca três modos de objetivação que transformam os seres humanos em sujeitos, o autor declara:

O primeiro é o modo da investigação, que intenta atingir o estatuto de ciência, como, por exemplo, a objetivação do sujeito do discurso na gramaire générale, na filologia e na linguística. Ou, ainda, a objetivação do sujeito produtivo, do sujeito que trabalha, na análise das riquezas e da economia. Ou, um terceiro exemplo, na objetivação do simples fato de estar vivo na história natural e na biologia. Na segunda parte de meu trabalho, estudei a objetivação do sujeito naquilo que eu chamarei de ‗práticas divisoras‘. O sujeito é dividido no seu interior e em relação aos outros. Este processo o objetiva. Exemplos: o louco e o são, o doente e o sadio, os criminosos e os ‗bons meninos‘. Finalmente, tentei estudar –meu trabalho atual- o 35

modo pelo qual um ser humano torna-se um sujeito. Por exemplo: eu escolhi o domínio da sexualidade –como os homes aprendem a se reconhecer como sujeitos de ‗sexualidade‘. Assim, não é o poder, mas o sujeito, que constitui o tema geral de minha pesquisa. (DREYFUS; RABINOW, 1995, p. 231-232).

Os estudos foucaultianos evidenciam, portanto, três fases no pensamento do filósofo em questão - arqueologia, genealogia e ética. Tais fases permitem que se compreendam os problemas existentes dentro de uma cronologia específica, delimitada para cada fase. Veiga- Neto (2003), denomina tais fases de ―domínios foucaultianos‖, em função de as obras de Foucault não apresentarem um caráter sistemático, sendo aqui compreendidas as denominações de saber (ser-saber / o que posso saber?), ação de uns sobre os outros (ser- poder / o que posso fazer?) e ação de cada um consigo próprio (ser-consigo / quem sou eu?), sendo este último domínio, o elemento norteador de minha pesquisa. Por esse motivo, encontramos referências à temática sob a titulação de ―fases de Foucault‖ ou ―os três Foucault‖, lembrando, contudo, que essas fases não representam uma divisão destacada podendo ser encontrado traços implícitos de um domínio no outro. Esses ―três Foucault‖ podem ficar melhor explicitados a partir da citação de Veiga-Neto, a saber:

Como Deleuze sugeriu, a cada fase pode-se fazer corresponder uma das perguntas fundamentais que nortearam Foucault: ―que posso saber?‖, ―que posso fazer?‖ e ―quem sou eu?‖. A cada fase corresponde um problema principal colocado pelo filósofo e uma correlata metodologia (VEIGA-NETO, 2003, p. 38).

A fase da arqueologia evidencia a preocupação de Foucault com as questões relativas às ―estruturas‖ que compõem os diferentes conhecimentos que não correspondem necessariamente aos saberes científicos. Daí a importância dada ao processo de investigação acerca da formação dos saberes e suas formulações conceituais. Ela compreende, segundo critério metodológico e cronológico mencionado por Veiga-Neto (2003), ―as obras que vão de História da Loucura (1961) até A arqueologia do saber (1969), passando por O nascimento da Clínica e As Palavras e as Coisas”. Em sua obra, Veiga-Neto (2003, p.58) relata que, em História da Loucura (1961), Foucault já se reportava à arqueologia numa condição que ele chamou de ―percepção‖ como forma de demonstrar um saber que não é considerado de base científica ou sistematizado. Por esse motivo, as percepções não estão inseridas no campo do conhecimento. A preocupação com o conhecimento só ficará mais evidente em As Palavras e as Coisas quando a cientificidade dada aos saberes faz com que estes sejam aceitos como discursos verdadeiros. O ponto áureo dessa primeira fase ou primeiro domínio foi a obra Arqueologia do Saber. A arqueologia permite com que se descortinem as camadas dos discursos já ditos como 36 forma de resgate de ideias já esquecidas o que facilita o entendimento de como e porque os saberes se formam e se transformam. Além disso, ela define o discurso não como um documento, mas como práticas que obedecem a regras. Daí a importância de se compreender que a arqueologia não pretende justificar ou interpretar o teor de um discurso, mas entender como e porque ele se constitui dessa forma e não de outra, haja vista que o discurso segundo Foucault (2014, p.122) é ―um conjunto de enunciados que se apóia em um mesmo sistema de formação‖. A fase da genealogia ou segundo domínio (ser-poder) contempla a Ordem do Discurso (1971) passando por Vigiar e Punir (1975), até culminar com o primeiro volume de História da Sexualidade – a vontade do saber (1976). Importante destacar que as periodizações aqui denominadas de fases parecem-nos acontecer bem mais para fins didáticos do que, cronológicos uma vez que é possível encontrarmos elementos de uma fase implícitos em outra. Ademais, é nessa terceira dimensão que Foucault adentra nas questões relativas ao processo de formação do sujeito a partir da ingerência de uma rede de poderes capaz, inclusive, de categorizá-lo. Dessa forma, o elemento norteador passa a ser o poder aqui entendido como ―elemento capaz de explicar como se produzem os saberes e como nos constituímos na articulação entre ambos‖ (VEIGA- NETO, 2003, p.65). O autor chama a atenção, também para o fato de entendermos ―a genealogia como um conjunto de procedimentos úteis não só para conhecer o passado, como também, e muitas vezes principalmente, para nos rebelarmos contra o presente‖. A partir daí, é possível perceber melhor as verdades históricas repassadas ao longo das gerações sem, contudo, atribuir-lhes uma nova interpretação, desmistificando aquilo que seria uma invenção e não uma descoberta. Seria o caso, por exemplo, do enunciado relativo à terceira idade aqui referenciada como a melhor fase da vida onde se concede um caráter cientifico a essa verdade que é assim multiplicada nas práticas discursivas. Por esse motivo, o presente é uma "etapa no processo bélico de confrontação entre forças opostas em busca do controle e da dominação”, estando essas forças presentes em todos os espaços sociais. O poder seria, portanto, o que Foucault descreveu como uma ação sobre ações. Os destaques dessa fase em questão são as transformações presentes em práticas institucionais, a exemplo da prisão, escolas, asilos, dentre outras que passaram de suplícios ou castigos corporais para o disciplinamento que dociliza os corpos mostrando que a disciplina mobiliza, produz, traz efeitos positivos. 37

O poder disciplinar veio substituir o poder pastoral que vigorava no cristianismo e o poder soberano. Segundo Foucault (2014), o poder pastoral rege-se mediante princípios, quais sejam: - O poder é vertical uma vez que emana do religioso/pastor, mas se retroalimenta dos fiéis; - Exige sacrifícios em nome da salvação – o pastor deve estar à disposição de seu rebanho e esse sacrifício pode representar a salvação e a vida eterna; - É individualizante e detalhista à medida que exige o conhecimento acerca de cada fiel de seu rebanho. Já o poder soberano, pela sua própria natureza, não poderia ser piedoso e não conseguia atender ao viés político. Diante de tal limitação, o poder disciplinar surge como um novo modelo que, na realidade, tentava ampliar o poder soberano à medida que utilizava práticas de vigilância capazes de observar toda uma sociedade, ou seja, o poder disciplinar foi capaz de chegar onde o poder soberano não conseguia ser visto. Daí ser interessante analisar como essas relações de poder podem se evidenciar na constituição de idosos proativos para uns e considerados refugos para outros, no tocante aos direitos e garantias fundamentais da nossa legislação. Nessa linha, percebe-se que as instituições asilares, hoje denominadas instituições de longa permanência para idosos, também contribuíram para a transformação de uma sociedade baseada no poder soberano para uma sociedade estatal a partir do momento em que individualizou a pessoa idosa e abriu espaço para novas subjetividades ou novos modos de subjetivação. Surgem, então, idosos mais maleáveis e moldáveis, tanto em nível de corpos como de saberes. Todavia conforme explicitou Machado (2006, p. 179), o poder disciplinar não extinguiu a soberania. Ao contrário, esta se aliou à disciplina e à gestão governamental, advindo daí, o seu conceito de governamentalidade - práticas de governamento ou da gestão governamental que ―têm na população seu objeto, na economia seu saber mais importante e nos dispositivos de segurança seus mecanismos básicos‖. A fase da genealogia ainda nos traz a temática do biopoder aqui considerado como uma nova forma de poder que age sobre uma multiplicidade de corpos – a população, entendendo que, mesmo diante das individualidades, algo é comum a todos: a vida. Enquanto o poder disciplinar age na individualidade do corpo, o biopoder age sobre a espécie humana surgindo em função disso, o que Foucault denominou de biopolítica. Por meio desta, os saberes são criados com vista a controlar a própria espécie. Para uma população, com inúmeros interesses, características e necessidades era necessária, também, uma 38 multiplicidade de saberes que contemplasse esse novo corpo, inclusive controlando-o e fazendo projeções para o futuro, indo além de uma mera descrição. Com isso, depreende-se que o poder disciplinar age sobre o indivíduo (corpo) mediante mecanismos disciplinares e o biopoder age sobre a população por meio de mecanismos regulamentadores. A fase da ética ou terceiro domínio contempla os volumes II e III de História da sexualidade - o uso dos prazeres e O cuidado de si, publicados pouco mais de um mês antes da morte de Foucault, em 1984. Nesse domínio, Foucault não tinha como escopo retratar condutas sexuais nem como estas são representadas pela ciência. Interessa para ele entender a sexualidade enquanto caminho para a subjetivação, como um espaço que se abre para falarmos sobre nós mesmos, nossos desejos e todas as proibições que giram em torno dessa temática. Segundo Foucault (1991, p.345), ―as proibições sexuais estão continuamente relacionadas com a obrigação de dizer a verdade sobre si mesmo‖. Sempre indagando o porquê, quando e como tal prática pode vir a se constituir como um problema na tentativa de ―definir as condições nas quais o ser humano problematiza o que ele é, e o mundo no qual ele vive‖. Essa fase é considerada, então, como marcada pela reflexão sobre o sujeito, a moral, sexualidade desejo e prazer. Diante desse cenário, o filósofo define a ética a partir da relação do indivíduo consigo mesmo e como este se constitui enquanto um sujeito moral de suas próprias ações. É através dos jogos de verdade que conseguimos perceber o que cada um entende como falso ou verdadeiro e que vão contribuir para o reconhecimento de quem somos ou como nos vemos. Isso só se torna possível porque o sujeito moderno é produto da intercessão da ética com o saber e o ser-poder. É no terceiro domínio que se configura a subjetivação do sujeito moderno aqui influenciado pelas seguintes tecnologias: tecnologias de produção, tecnologia de sistema de signos, tecnologias de poder e tecnologias do eu, sendo esta última a maior referência de Foucault para a fase em questão e que servirá como referência para a análise dos discursos dos idosos enquanto celebridades. A ética que envolve o cuidado de si possibilita que o sujeito problematize sua própria existência tornando-o capaz de criar uma ética própria para seu dia a dia o que contribuirá para o desenvolvimento de atitudes que se contraponham as estruturas de poder capazes de determinar suas subjetividades. Daí o resgate feito por Foucault à necessidade de autoconhecimento presente no período socrático. É a partir dessa perspectiva que se fundamenta a pesquisa em questão. 39

A partir do que Foucault denominou como ―Tecnologia do eu‖ (1991), o filósofo chama atenção acerca da necessidade do cuidado consigo mesmo – o cuidar de si. Sob esse prisma, ele enfoca o quanto o sujeito deve voltar seu olhar para si próprio não como uma forma de isolamento ou individualidade, mas como uma forma de reflexão acerca de si próprio e de sua relação com o mundo. Acerca disso, Danner (2008, p.77) complementa: Na perspectiva foucaultiana, a cultura de si assume a forma de um exercício que o indivíduo realiza sobre si mesmo, ou seja, um exercício onde o indivíduo procura se elaborar, se transformar e atingir um determinado modo de ser e de agir, um determinado ethos. É o que vai denominar de technè tou biou, isto é, uma arte da vida, uma estética da existência. Desta maneira, a cultura de si está diretamente vinculada à formação do caráter moral dos indivíduos.

São as práticas de si que propiciam que o indivíduo, ao se voltar para si, consiga se encontrar, encontrar momentos de liberdade e traçar suas próprias regras capazes de influenciar na sua vida e na sua subjetividade. Todavia esses momentos de liberdade correspondem a um retorno a determinados espaços de prisão que acabam por cercear muitas de nossas escolhas e instigar-nos a seguir caminhos que não foram por nós traçados ou que sequer fomos consultados. É por esse motivo que o cuidado de si não deve ser entendido como um princípio de base egoísta uma vez que o retorno a si se desdobra em retorno ao outro e ao mundo como forma de melhor compreensão do sujeito envolto às práticas sociais. Nas palavras de Foucault (2004, p. 268):

[...] e é muito difícil saber quando isso aconteceu o cuidado de si se tornou alguma coisa um tanto suspeita. Ocupar-se de si foi, a partir de um certo momento, denunciado de boa vontade como uma forma de amor a si mesmo, uma forma de egoísmo ou de interesse individual em contradição com o interesse que é necessário ter em relação aos outros ou com o necessário sacrifício de si mesmo.

Mediante as técnicas de relações consigo mesmo enquanto conhecimento acerca das subjetividades de idosos, as entrevistas publicitárias podem representar um começo para esse conhecimento. Os discursos dos artistas, reconhecidos como celebridades, podem produzir sentidos que apontem como o conhecimento de si contribui para a ruptura de estruturas de poder que tentam mudar quem ele é, direcionando suas subjetividades.

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4. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

E foste um difícil começo Afasto o que não conheço E quem vende outro sonho feliz de cidade Aprende, depressa, a chamar-te de realidade Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso. (Caetano Veloso)

Inicio aqui algumas outras considerações acerca do pensamento de Foucault (2014) que podem contribuir para abertura de caminhos para a pesquisa, utilizando um trecho da obra de Caetano Veloso e David Byrne, Sampa, lançada em 1978. Desta feita, esta referência se dá não apenas por ser este um cantor de grande visibilidade no cenário brasileiro no auge de seus 77 anos (07/08/1942), mas por ensejar como relatado na obra “Foucault, Um Diálogo” de Rosa Maria Bueno Fischer e Alfredo da Veiga-Neto (2004), a riqueza e versatilidade presentes nos estudos de Foucault que não permitem que este seja reduzido a slogans e frases classificatórias. Esse avesso, segundo Fischer (2004, p.11), justifica-se porque mesmo que retornemos a um determinado lugar, não seremos os mesmos de quando lá adentramos pela primeira vez, ou seja, o lugar já não é o mesmo. Dessa forma, acredita-se que uma nova entrevista concedida em um espaço midiático acerca de um tema já pautado e com questionamentos semelhantes não será igual àquela já dita outrora. É através da obra de Foucault, considerado indisciplinado para alguns, dada sua capacidade de desalinhar o pensamento já pré-concebido, que somos instigados a repensar as relações de poder. Conforme enfoca Fischer (2004, p.10):

Enquanto todo mundo pensava que mais saber diminuiria as relações de poder, que de certa maneira o saber nos libertaria do poder, ele (Foucault) iria mostrar que ambos são inseparáveis. Quanto mais saberes nós temos, mais nos potencializamos, mais nos empoderamos.

E é imbuído desse espírito ―indisciplinado‖ de Foucault que passo a apresentar alguns elementos teóricos que contribuirão para esse universo discursivo que permeia o também universo artístico de alguns idosos e sem os quais, dificilmente encontraremos respostas para os nossos questionamentos. 41

Para Foucault (2014, p.98), o discurso se expressa ―em unidades menores: o enunciado, que deve ser analisado em conjunto, produzido na dispersão de acontecimentos‖, sendo concebido, portanto, como unidade de análise. Ainda segundo ele,

(...)'discursos', (...) não são, como poderia se esperar, um puro e simples entrecruzamento de coisas e palavras. (...) analisando discursos, vemos se desfazerem os laços aparentemente tão fortes das palavras e das coisas e separar um conjunto de regras próprias à prática discursiva. (....). Tarefa que consiste em não mais tratar os discursos como conjuntos de signos (de elementos significantes que remetem a conteúdos ou a representações), mas como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam (FOUCAULT, 2014, p. 64)

Para além da designação dos signos, o discurso é também a formação, a possibilidade e a configuração desses signos com relações de poder, hierarquias, exclusões, inclusões e obstruções. O discurso não está nem limitado às palavras, nem às coisas. O discurso não é uma unidade monolítica. (SIQUEIRA, 2016). Sabe-se que os discursos são feitos de signos e que estes têm a sua devida importância não apenas como laços entre as palavras e as coisas; o discurso é bem ―mais que utilizar esses signos para designar coisas. É esse mais que os torna irredutíveis à língua e ao ato da fala. E é esse ―mais‖ que é preciso fazer aparecer e que é preciso descrever‖ (FOUCAULT, 2014, p.56). O discurso não é, pois entendido como produto de uma retórica, não é produzido por alguém, mas deve ser compreendido a partir de sua mobilidade que o faz se ajustar a esse ou aquele grupo ou conteúdo, importando assim ―as condições de possibilidade.‖ Seguindo esse contexto, é também entendido como:

um conjunto de enunciados, na medida em que se apoiem na mesma formação discursiva‖; este conjunto é limitado a um certo número de enunciados, além de ser ―histórico – fragmento de história, unidade e descontinuidade na própria história, que coloca o problema de seus próprios limites, de seus cortes, de suas transformações, dos modos específicos de sua temporalidade, e não de seu surgimento abrupto em meio às cumplicidades do tempo. (FOUCAULT, 2014, p. 132-133).

Essa historicidade, alicerçada também ao viés institucional contribui para impulsionar ou reprimir determinados discursos. Daí, a depender da formação discursiva em que estejamos inseridos, faremos uso de enunciados específicos para aquele momento. Isso fica evidente, por exemplo, quando o local de fala é uma clínica de psicologia e os enunciados visam determinar os fatores que desencadeiam a síndrome do pânico de uma paciente. Todavia esse mesmo psicólogo passa a utilizar enunciados diferentes quando busca saber o processo evolutivo de aprendizagem de seu filho no ambiente escolar. Isso nos leva a pensar em uma outra concepção trazida por Foucault (2014, p. 133): 42

o discurso só faz sentido nas relações, em sua aplicabilidade prática, no funcionamento pleno dos enunciados o que posteriormente veio a definir prática discursiva como um ―conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa.

Conforme ressaltam Sousa e Cutrim (2013, p.49), ―o sujeito do enunciado é historicamente determinado. Esse sujeito sofre mudanças de um enunciado a outro e a função enunciativa pode ser exercida por diferentes sujeitos‖, diferente de alguém que apenas reproduz um ato de fala. Daí que um único e mesmo indivíduo pode ocupar, em uma série de enunciados, diferentes posições e assumir o papel de distintos sujeitos – pai, médico, professor, político, consumidor, juiz etc. ―O sujeito é aqui visto, portanto, como uma categoria móvel, fluida‖. Os enunciados, por sua vez, estão ancorados em alguma modalidade enunciativa ou algum meio que o qualifique. A depender das formulações, pode estar em um site destinado a jovens, numa revista médica, em um instrumento normativo, etc. Assim, ―não há enunciado em geral, enunciado livre, neutro e independente; mas sempre um enunciado fazendo parte de uma série ou de um conjunto, desempenhando um papel no meio dos outros, neles se apoiando e deles se distinguindo‖ (FOUCAULT, 2014, p. 114).‖ Não há, portanto, enunciado neutro, ele funciona e toma efeito numa prática discursiva que é prestigiada, em geral, pelo fato de produzir verdade. As práticas discursivas têm relação com outras práticas sociais, econômicas, culturais.‖ (ARAÚJO, 2007, p. 09) Acerca do enunciado, Foucault acrescenta:

Mais que um elemento entre outros, mais que um recorte demarcável em um certo nível de análise, trata-se, antes, de uma função que se exerce verticalmente, em relação às diversas unidades, e que permite dizer, a propósito de uma série de signos, se elas estão aí presente ou não.(FOUCAULT, 2014, p.105)

Dessa forma, entendendo que o enunciado não se define como um ato de fala, Foucault acrescenta:

O enunciado não é, pois, uma estrutura (isto é, um conjunto de relações entre elementos variáveis, autorizando assim um número talvez infinito de modelos concretos); é uma função de existência que pertence, exclusivamente, aos signos, e a partir da qual se pode decidir, em seguida, pela análise ou pela intuição, se eles ―fazem sentido‖ ou não, segundo que regra se sucedem ou se justapõem, de que são signos, e que espécie de ato se encontra realizado por sua formulação (oral ou escrita); é que ele não é em si mesmo uma unidade, mas sim uma função que cruza um domínio de estruturas e de unidades possíveis e que faz com que 43

apareçam, com conteúdos concretos, no tempo e no espaço.(FOUCAULT, 2014, p.105)

O enunciado é povoado por muitos outros enunciados que, mesmo divergentes, acabam se reconfigurando. Ele ―depende de uma materialidade, que é sempre de ordem institucional, no sentido de uma estrutura de poder‖ (MACHADO, 1981, p. 151-152). Não se pode, ainda segundo o autor, confundir enunciado com enunciação uma vez que o primeiro pressupõe possibilidade de repetibilidade, diferente da enunciação (uma frase, por exemplo) que não poderá ser repetida. Diante dos conceitos ou informações trazidos por Foucault (2014) enquanto base arqueológica percebe-se que, no tocante à formação discursiva, esta não deve ser entendida a partir de um viés epistemológico e sim em termos de prática discursiva notadamente relacionada a um momento ou uma época específica. Tal prática discursiva se define como um ―conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa‖ (FOUCAULT, 2014, p.43). Esse arcabouço de informações servirá de base para que se compreendam melhor as noções de verdade, subjetividade e as relações de poder imbricadas na concepção de saber. Para tanto, Foucault (2002, p. 249) retrata, dentre outras coisas, como a constituição histórica influencia na construção dos saberes e como isso se evidencia nos discursos. Segundo ele ―a análise das formações discursivas, das positividades e do saber em suas relações com as figuras epistemológicas e as ciências, é o que chamamos, para distingui-la das outras formas possíveis de história das ciências, análise da épistémè‖ (Foucault, 2002, p.249) A obra de Foucault (2014, p. 43) retrata, ainda, a concepção do que seja formação discursiva

No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva (…).

Nesse sentido, Marques (2012) ―considera que a noção de formação discursiva não tem relações estreitas com a ideologia, mas com os saberes e poderes, tendo como objetivo descrever os mecanismos de constituição das ciências do homem‖. Tais saberes e poderes apresentam uma relação estreita com o que venha a ser considerado verdade para um sujeito, apesar de Foucault não apresentar, ao longo de seus estudos, preocupação em definir o que 44

venha a ser verdade. Isso porque, para ele, necessário seria entender porque a verdade para uma pessoa ou grupo de pessoas é diferente daquilo que é considerado verdade para outro grupo, além de refletir acerca dos critérios para a adoção dos próprios regimes de verdade. Sobre os jogos de verdade, o autor destaca:

Jogos de verdade são o conjunto de regras de produção de verdade, o conjunto de procedimentos que conduzem a um determinado resultado, que pode ser considerado – em função de seus princípios e de suas regras de procedimento - como válido ou não. Quem fala a verdade são indivíduos livres, os quais entram em consenso e estão inseridos em uma determinada rede de práticas e de instituições coercitivas (Foucault, 1999, p. 112).

Dessa forma, não há que se falar em isenção de interesses ou de liberdade na escolha de seu regime de verdade. O discurso recebe interferências ou influências de diferentes fatores, dentre os quais, políticos e econômicos e, uma vez que estamos continuamente envoltos em diferentes cenários, sejam eles familiares, de relação de trabalho, afetivos fazemos uso de tais regimes de verdade. Daí o interesse de Foucault (1984) em enveredar ―numa história que não seria aquela do que poderia haver de verdadeiro nos conhecimentos,

[...] mas uma análise dos ―jogos de verdade‖ dos jogos entre o verdadeiro e o falso, através dos quais o ser se constitui historicamente como experiência, isto é, como homem se dá seu ser próprio a pensar quando se percebe como louco, quando se olha como doente, quando reflete sobre si como ser vivo, ser falante e ser trabalhador, quando ele se julga e se pune enquanto criminoso? Através de que jogos de verdade o ser humano se reconheceu como homem de desejo? (FOUCAULT, 1984,p. 13)

O pensamento de Foucault (1984) acerca dos jogos de verdade nos permite depreender as diversas possibilidades de modos de subjetivação dos indivíduos uma vez que aqueles não se constituem em fonte de descoberta da verdade, mas do entendimento das regras que possam influenciar a posição de um sujeito em seu discurso acerca do que seja verdade sobre um determinado objeto. Daí a influência trazida pela igreja, pela ciência, universidades no sentido de nos ―orientar‖ acerca do que venha a ser verdade ou não, levando-nos a certas escolhas. É por esse motivo que Foucault (1984) não se refere a uma verdade, mas ―as verdades‖, pois a cada interesse defendido, utiliza-se um conceito ou justificativa para concebê-la como verdade, constituindo-se por vezes em espaços de lutas ideológicas. Isso fica mais forte quando é proferida no âmbito dos especialistas cujo discurso é capaz de construir verdades capazes de alterar o comportamento de uma população inteira, a exemplo do discurso médico- científico que determina como devem ser nossos hábitos alimentares, necessidades de vacinação, modelos de rejuvenescimento, dentre outros. 45

Essa linha de pensamento foucaultiano traz à tona, também, a importância com que este descreve a subjetividade referindo-se à ―maneira pelo qual o sujeito faz a experiência de si mesmo num jogo de verdade, no qual ele se relaciona consigo mesmo‖. (Foucault, 2004, p. 236). Todavia não se pode dissociar a análise relativa a tal conceito do viés arqueológico que perpassa os saberes do sujeito, o viés genealógico que retrata as estratégias de dominação que incidem sobre esse mesmo sujeito, além das técnicas que permitem com que esses sujeitos se transformem em diversos momentos da vida. A partir dessas observações, percebe-se que a subjetividade não é algo estanque, imutável. Ela necessita de uma relação com as coisas, com o mundo e, por conseguinte, com o tempo. E isso se configura também na relação com o próprio corpo uma vez que recebemos influências constantes dos diferentes saberes e poderes que tentam interferir nos processos de subjetivação, mesmo sendo estes impessoais. Conforme ainda relata Foucault (1984, p. 28), ―não existe constituição do sujeito moral sem modos de subjetivação‖, daí sua singularidade e impessoalidade mesmo diante de uma ação massiva. É importante que se destaque que as questões relativas aos modos de subjetivação têm seu cerne pautado no conceito de cuidado de si. Mais do que isso, Foucault (2004b, p. 13) indica que ―a incitação a ocupar-se consigo mesmo alcançou, durante o longo brilho do pensamento helenístico e romano, uma extensão tão grande que se tornou [...] um verdadeiro fenômeno cultural de conjunto‖. O cuidado de si não estava atrelado apenas a uma visão pessoal; ele pressupunha também uma atitude perante , implicando em uma verdadeira prática social. Designa, portanto, ―um conjunto preciso de técnicas (tecnologias do eu) que se exerce sobre si mesmo com o fim último da transformação, da modificação, da transfiguração de si‖ (FISCHER; MARCELLO, 2014, p. 161). Essas tecnologias que aparecem sempre mescladas entre si e não de forma isolada, compõem a nossa subjetividade. No tocante à importância ou atenção dada ao ―eu‖, esta importância apresentava diferentes conotações ao longo da história, principalmente quando nos referimos à filosofia antiga e ao cristianismo. Apesar de em ambos haver um interesse com as tecnologias do eu, o cuidar de si não necessariamente representava um fascínio consigo mesmo, mas na utilização de estratégias que exigem um saber prévio, um autoconhecimento. Para os greco-romanos, o cuidar de si implicava em uma perspectiva de governar os outros.

Conforme Menezes (2004, p.1413),

os gregos exerciam um trabalho sobre si (mestria de si) com a finalidade (teleologia) de poder governar os outros. Para tanto, recorriam às práticas de 46

moderação que tinham como alvo os atos ligados ao prazer e desejo (substância ética) e tal atitude de moderação se justificava como tentativa de dar à existência uma forma bela (modo de sujeição).

Para o cristianismo, o cuidar de si estava relacionado com as possibilidades de salvação determinando, para tanto, algumas estratégias que deveriam ser seguidas para alcance desses objetivos, perpassando, necessariamente por algumas renúncias. Essas características greco- romanas voltadas ao cuidado de si ficam mais evidentes a partir das colocações de Foucault (2004):

Nos gregos e romanos, pelo contrário, a partir do fato de que se cuida de si em sua própria vida e de que a reputação que se vai deixar é o único além com o qual é possível se preocupar, o cuidado de si poderá então estar inteiramente centrado em si mesmo, naquilo que se faz, no lugar que se ocupa entre os outros. (FOUCAULT, 2004, p.274).

Essa análise nos permite entender como determinadas verdades circulam na contemporaneidade influenciando algumas regras de conduta, formas de dominação e interferindo na nossa subjetividade, ou seja, a legitimidade dada a uma verdade socialmente aceita contribui para os modos de subjetivação existentes e aceitos em um espaço temporal. Daí podem emergir, portanto, os diferentes modos de subjetivação dos idosos, aqui detentores de suas próprias estratégias do cuidado de si. Destarte lembrar que, ao analisar as discursividades das celebridades não se busca descortinar possíveis verdades obscuras, mas partir do princípio de que todos trazemos as nossas verdades e essas refletem momentos distintos e respondem a questões específicas de nossas vidas. Com os idosos, isso não é diferente.

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5. CONVERSAS ANTERIORES

O novo não está no que é dito, mas no acontecimento de sua volta. (Michel Foucault)

5.1 ESTADO DA ARTE

A temática voltada ao idoso sempre teve um espaço no universo das pesquisas e, em particular, na Linguística Aplicada. Todavia devido ao aumento da expectativa de vida e consequentemente, ao aumento da população idosa nos mais deferentes países, tais pesquisas se tornaram ainda mais evidentes. São estudos que demonstram a transdisciplinaridade da Linguística Aplicada justificando a sua oposição ao que outrora se considerava como um lócus das línguas estrangeiras uma vez que ela aponta para uma relação estreita com a sociedade e deve, portanto, atender às suas necessidades enquanto espaço de interação social. Em assim sendo, passa a ser vista

[...] como articuladora de muitos domínios do saber, em diálogos constantes com vários campos do conhecimento que têm preocupação com a linguagem. Tendo em vista que a linguagem permeia todos os setores de nossa vida social, política, educacional e econômica, uma vez que é construída pelo contexto social e desempenha o papel instrumental na construção dos contextos sociais, nos quais vivemos, está implícita a importância da LA no equacionamento de problemas de origem educacional, social, política e até econômica (CELANI, 2000, p. 19-20).

De forma complementar, Moita Lopes (2006, p. 21) assevera que

a necessidade de repensar outros modos de teorizar e fazer LA surge do fato de que uma área de pesquisa aplicada, na qual a investigação é fundamentalmente centrada no contexto aplicado [...] onde as pessoas vivem e agem, deve considerar a compreensão das mudanças relacionadas à vida sociocultural, política e histórica que elas experienciam.

Dessa forma, a Linguística Aplicada interage com outras áreas do conhecimento, pois entende ser essencial ouvir as diferentes vozes que vivem as práticas sociais conforme externou Moita Lopes (2006). Daí a importância da expansão das pesquisas em ciências sociais, humanas e da saúde, por exemplo. Estudos envolvendo a constituição de subjetividades de idosos e, em especial de idosos atores ainda é algo relativamente escasso em nosso cenário. Muitas das pesquisas existentes versam sobre as condições de saúde que interferem decisivamente na qualidade de vida desses indivíduos, principalmente no tocante à ausência de patologias, quer para o idoso institucionalizado, quer para aquele mantido em seu ambiente familiar. Tais estudos são 48 essenciais para que se dispense a atenção adequada a esse público num momento em que a longevidade é um tema bastante atual e exige que a sociedade receba a atenção devida desde a mais tenra idade como forma de se evitar maiores intervenções na fase de idoso. Todavia não se pode negar a interferência do meio e das condições em que se vive para a construção das suas subjetividades. Os estudos e as pesquisas direcionadas à corporeidade, envelhecimento e o cuidado de si me conduziram ao amplo universo discursivo proporcionado pela Linguística Aplicada. As diferentes áreas do conhecimento, amparadas pela transdisciplinaridade, encontram na LA uma base profícua que contempla incontáveis objetos de pesquisa. Assim, os diferentes saberes se cruzam não em busca de uma verdade única, mas em busca de oportunizar diferentes olhares sobre uma mesma temática. Esta tese, especificamente, parte do olhar de uma profissional de Educação Física, docente que percebeu a necessidade de levantar questões que vão além do tradicionalmente delimitado como área de estudo para tal segmento. As questões relativas à corporeidade e ao envelhecimento, objetos de estudo da Educação Física, necessitam dessa imersão nos saberes originários da Linguística Aplicada enquanto alicerce para problematização de temas como subjetividades, relações de poder, jogos de verdade que, necessariamente, perpassam sobre as principais referências da Educação Física: o corpo e o movimento. Nesse caminho em busca das subjetividades de pessoas idosas, Silede Leila Oliveira Cavalcanti defendeu, em 2013, junto ao programa de Pós-graduação em História / UFPE, a tese Corpos tristes, velhices alegres: do velho instituído pelo discurso da caridade e da higiene ao idoso saudável inventado pelos saberes gerontogeriátricos. Seu estudo objetivou, a partir da Instituição de Longa Permanência São Vicente de Paulo, em Campina Grande/PB ―fazer uma história das significações culturais da velhice asilar‖ a partir das subjetivações dos diferentes sujeitos que compõem a ILPI, a exemplo dos idosos ali institucionalizados, da equipe gestora da instituição e dos profissionais das diferentes áreas da Geriatria. O estudo levantou algumas questões, entre elas, qual a diferença do regime de verdade caritativo e higienista que constrói e fabrica corpos velhos tutelados em relação à produção discursiva que inventa o corpo idoso saudável e utilizou conceitos de Foucault (2008) voltados à biopolítica, disciplina e bioascese, além de corpos refugos de Bauman (2015). Em suas considerações, Cavalcanti (2013) afirma que: talvez o corpo não seja mera sujeição, havendo saída para os impasses apresentados por Foucault na sua analítica do poder. Os corpos asilares, assim, como os sujeitos idosos do centro de convivência, de formas diferentes reinventam e exercitam práticas de subjetivação e de constituição de si e, mesmo diante do poder e saberes 49

legitimados na gestão e intervenção de seus corpos, conseguem protagonizar suas vidas.

Outro estudo foi desenvolvido junto à Universidade Estadual de Campinas, em 2010 através do Instituto de Estudos da Linguagem. Nele, Geralda Maria de Carvalho Zaidan, mediante sua pesquisa de doutorado intitulada ―Quando o relógio para = tempo, lembrança e memória no discurso do sujeito idoso asilado‖, aborda os sentidos sociais do envelhecimento e sua repercussão no Lar dos Velhinhos de Campinas. Para tanto, retoma documentos da referida ILPI desde 1889, publicações no jornal O Diário de Campinas, o Estatuto do Lar dos Velhinhos de Campinas e o folder sobre o asilo, com a finalidade de analisar os processos de legitimação, dissimulação e naturalização de sentidos para o sujeito idoso no discurso social e em instituições. A pesquisadora sugere que a relação tempo-espaço assume papel importante na configuração dos sujeitos inseridos na instituição. Na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), através do Programa de Pós- Graduação em Ciências Sociais, a pesquisadora Solange Beatriz Billig Garces desenvolveu, em 2012, a pesquisa Movimentação dos atores idosos na esfera pública e na sociedade civil: sociabilidades presentes no território dos idosos. A pesquisa teve como objetivo analisar como se constituem os espaços sociais para vivenciar a velhice e as sociabilidades que geram identidade e potência aos idosos, transformando-os em atores sociais. Os resultados afirmaram que os idosos refutam a ideia de serem vistos como doentes ou coitadinhos e que estão inseridos em diferentes dinâmicas de vida. Os tipos ideais encontrados foram: Idosas Viúvas e Solitárias; Idosos Militantes Políticos; Idosos engajados em movimentos culturais; Idosos espiritualizados e solidários e Idosos que trabalham e estudam a questão do envelhecimento. O estudo também mostrou a importância dos espaços de sociabilidades como referência para os idosos permitindo que se potencializem e adquiram identidade pela suas ações. Seguindo as pesquisas voltadas aos idosos, Almira Lins de Medeiros apresenta a tese Governamentalidade, educação e normalização: As práticas de subjetivação da Universidade Aberta à Maturidade. A tese desenvolvida junto ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais, Centro de Humanidades da Universidade Federal de Campina Grande, em 2013, focalizou a velhice e os elementos que compõem a sua condução utilizando a educação como instrumento de desenvolvimento dessa etapa da vida. Para tanto, utilizou os pressupostos teóricos de Michel Foucault através da noção de governamentalidade, partindo da ideia de que as formas de educação analisadas exercem influência no que concerne às subjetividades entendidas como saudáveis e na produção da homogeneização de idosos. Além disso, as teorias foucaultianas contribuíram para a investigação do modo de intervenção do governo 50 das pluralidades, utilizando os instrumentos encontrados na educação ―para verificar como são conduzidos os que nela transitam, averiguar os efeitos dessa condução e para dar a conhecer como nela se operam os jogos de poder através dos quais se produzem sujeitos adequados‖. Para tanto, foram analisadas a organização e o funcionamento da Universidade Aberta à Maturidade (UAMA) cujas ações estão pautadas na promoção de um envelhecimento ativo e cujos serviços são disponibilizados à população idosa de uma forma mais acessível. Os registros feitos durante as atividades realizadas e as análises de documentos e vídeos permitiram delinear as escolhas dos idosos sobre o que se considera como envelhecimento saudável delegando-lhes o poder e a capacidade de conduzir e realizar suas próprias mudanças. Utilizando-se de regras já instituídas junto às atividades selecionadas, os frequentadores da UAMA elencam as mudanças que consideram necessárias, conformam-se diante de algumas situações e resistem a outras verdades como justificativa da busca do envelhecimento saudável. Realizada no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, em 2007, a tese intitulada Velhices problematizadas: redes discursivas sobre envelhecimento em Santa Catarina, no Brasil e no contexto das décadas de 1970 a 1990, de autoria de Ana Maria Marques, fez uma análise dos discursos presentes em revistas da década de 80 e em jornais das décadas de 70 e 80 que circulavam na região de Santa Catarina, além de produções monográficas e documentos legais e fontes institucionais não governamentais, também da região acerca de questões voltadas ao envelhecimento. Durante o período compreendido entre as décadas de 70 e 90, a longevidade foi tratada como um problema diante da redução dos índices de natalidade. Diante desse cenário, Santa Catarina se apresenta como contemporâneo na construção de um processo de visibilidade e de autonomia do idoso. Assim, na tentativa de substituir o ―velho‖ pelo ―idoso‖, utilizou-se discursos do âmbito biológico, jurídico e dos próprios idosos que ―tomavam e transformavam os discursos conforme suas conveniências e contextos‖. A pesquisa demonstrou que os discursos se apresentavam confusos uma vez que, em determinados momentos negavam a própria velhice e em outros, excluíam as camadas mais pobres. O estudo intitulado Informações implícitas do texto: sentidos e contrassentidos na publicidade para idosos, desenvolvido em 2015 por Roberta Maria Garcia Blasque dentro do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Londrina é uma tese que utiliza os discursos presentes em peças publicitárias, em especial, anúncios de cosméticos destinados ao público idoso, veiculados nas Revistas Claudia e Caras nos anos de 2012 e 2013 com vistas a investigar os sentidos e os contrassentidos de tais peças 51 nessa parcela da população. O rejuvenescimento, tão almejado por muitos, gera um discurso negativo em relação à velhice e impulsiona a adoção de uma postura ideológica de ocultação da idade. Ao mesmo tempo, mostra como a Gerontologia apresenta o idoso como um indivíduo ativo e bem-sucedido e que estimula a aceitação da idade cronológica, sem desejos de retorno a fases anteriores do ciclo de vida. O estudo pretendeu demonstrar as divergências entre as duas áreas (publicidade e gerontologia) onde uma favorece a ocultação da idade e a outra estimula a sua aceitação além de analisar como os argumentos utilizados se constituem em discursos diferentes. Ainda acerca de teses voltadas à pessoa idosa, Maria Emmanuele Rodrigues Monteiro publicou em 2014, através da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Programa de Pós- Graduação em Linguística e Ensino, a pesquisa sob tema Governamentalidade, biopolítica e biopoder: a produção identitária para o corpo velho nos discursos da mídia brasileira contemporânea. Seu objetivo foi analisar o corpo considerado velho pela mídia, relacionando- o à produção de identidades que além de excluir ou incluir o idoso, produz um sujeito exposto à condição de ―superidoso ou gerontolescente‖. Nessa relação saber-poder, utilizaram-se pressupostos teóricos relacionados à Biopolítica, Biopoder e Governamentalidade. O corpus foi composto por discursos provenientes da mídia (revistas Época, Isto é e Veja) e formatado em diversos gêneros, tais como, reportagem, propaganda e capas de revista. Os resultados apontaram para um corpo gerido socialmente e que funciona como matriz produtora de sentidos. Segundo a autora, o corpo velho, a partir dessa ótica cultural, pode ser observado enquanto transformações sofridas no decorrer do tempo e expressam aspectos da velhice constituídos historicamente. O cenário acima descrito demonstra quão rico é o universo de pesquisas voltadas a compreender melhor a pessoa idosa em suas mais diferentes características, necessidades e condições. Entretanto, quando o lócus da temática envolve idosos tidos como celebridades cujo protagonismo se deu desde o período de sua juventude, e que de sua imagem depende a manutenção da visibilidade em ambientes midiáticos, os estudos são extremamente escassos. Os levantamentos feitos em plataformas de pós-graduações apontam para estudos nas áreas de Saúde e das Ciências Sociais, principalmente em função do aumento da expectativa de vida. Assim, a pesquisa que ora apresento busca ampliar os estudos acerca da temática a partir do momento em que insere o idoso visto como e que utiliza sua imagem, corpo e seu próprio discurso como estratégias para manutenção de sua visibilidade. Após a contextualização do cenário atual que aponta para esse novo nicho representado pelo índice crescente da longevidade, identifico na Linguística Aplicada uma 52 excelente linha de conexão entre o idoso longevo e os modos de subjetivação que o levam a constituir-se enquanto sujeito. Afinal, a linguagem está além dos signos, do que se pronuncia e daquilo que se escuta. Enquanto prática social, ela pressupõe uma interação capaz de oportunizar fortes mudanças sociais a partir de uma relação dialógica. No caso do idoso, pode colaborar para a elaboração de novas concepções e novas perspectivas para esse público contribuindo para sua constituição enquanto sujeito e facilitando a compreensão acerca da realidade desse grupo. Percebem-se no levantamento acima, excelentes produções que contribuem para a completude de áreas importantes do conhecimento cuja aplicabilidade extrapola, inclusive, os limites da linguística. São estudos que incluem conceitos como governamentalidade, biopolítica, biopoder, práticas de subjetivação em idosos institucionalizados, na Universidade Aberta da Maturidade e em reportagens, propagandas e capas de revista. O estudo que hoje apresento vem contribuir nesse leque de pesquisas no sentido de incluir o indivíduo idoso, reconhecido enquanto celebridade, como lócus de interesse da abrangente área da Linguística Aplicada. Nessa perspectiva, entendo serem ainda escassos os estudos em que os idosos, inseridos no campo de visibilidade midiática, têm analisadas suas subjetividades na condição de artistas. A depender do tempo de visibilidade a que estão expostos, atribuímos subjetividades às celebridades como alguém acima das interferências do tempo, verdadeiros heróis da jovialidade, exemplos de um percurso de vida sem percalços, indivíduos fora do alcance de doenças e cujos adjetivos inspiravam muitas gerações a almejar a mesma posição. Seres quase intocáveis, a quem tudo dava certo. Em muitos casos, isso era proveniente da vinculação que fazíamos do indivíduo ao personagem que ele representava, ao estilo de musica que compunha ou cantava e a forma como se dirigia ao público quando do pronunciamento de alguma notícia ou fato jornalístico. Hoje, facilmente visualizamos semblantes de espanto nas pessoas ao perceberem os reflexos do tempo no corpo dessas mesmas celebridades ou quando seus papéis, antes de protagonistas, são deslocados para outros estilos de personagens. Voltamos a subjetivá-los agora não mais da forma de outrora. Mas, e esses agora idosos, como se subjetivam frente a tudo isso? Como essa mesma mídia que os ancora, contribui para os modos como os subjetivamos? Entendendo que são indivíduos inseridos em diferentes relações de poder e cujos cuidados de si devem enveredar por caminhos que busquem desenvolver a arte de existência, considero ser essa pesquisa um bom instrumento a contribuir para a ampliação do entendimento desse universo discursivo voltado ao idoso. 53

5.2 TRILHAS METODOLÓGICAS

Falar de caminho é falar de construção, de rota. É expressar, mesmo por intermédio de projeções, o que se quer e para onde se deseja ir. Nesse sentido, meu caminho foi construído em meio a muitos círculos, idas e vindas, a sucessivas descontinuidades. Isso porque meu mundo era outro, meu universo era outro. As formações discursivas nas quais me insiro ou me inseria, na maioria das vezes se mostravam arraigadas a questões puramente pedagógicas ou envoltas em um viés biológico. Do lugar que venho pouco se fala sobre temas como discursos, práticas discursivas, relações de poder, subjetividades, verdades, com o olhar criterioso advindo da Linguística Aplicada ou nos moldes dessa, mesmo que faça parte das nossas entranhas, mesmo que não consigamos fugir deles. Não que tais assuntos sejam restritos a uma área do conhecimento, absolutamente, mas a percepção que tenho é de que as demais áreas não dedicam o espaço devido a entender a influência dos discursos na nossa vida. Daí a importância tamanha da Linguística Aplicada nesse universo discursivo porque permite que entendamos como as práticas histórico-sociais interferem em um espaço específico. Do lugar que venho, fala-se sobre patologias, qualidade de vida, escola, atividade física, lazer, esporte, normas, legislações, ensino, profissionalização, idoso, mas pouco se fala sobre efeitos de sentidos dos discursos que permeiam todo esse arcabouço. Das trilhas as quais tive acesso, optei por seguir aquelas que me conduzem à produção de sentidos de relatos de pessoas idosas veiculados em espaços midiáticos e com enunciados ancorados em um contexto relacionado às suas subjetividades. Isso porque, ao longo da minha trajetória profissional, achava intrigante o modo como as pessoas percebiam os idosos institucionalizados, os idosos que retornavam aos bancos de estudo com distorção idade-série e os idosos que todos os dias apareciam nas nossas casas, via programas televisivos, subjetivamente empoderados de algo ou de alguma coisa que faltava aos demais de igual idade. Entendi, portanto, ser essencial explorar os efeitos de sentidos de enunciados que podem traduzir o mundo das chamadas celebridades. Nessa caminhada, seguindo as orientações de uma pesquisa de natureza qualitativa e interpretativista, optei por utilizar os dispositivos teórico-metodológicos da Análise do Discurso (AD), por reconhecer neles a possibilidade de reflexão e produção de saberes a partir, no âmbito da pesquisa em questão, das informações veiculadas na mídia e que tanto atraem a atenção da sociedade, sobretudo no que tange a pessoas de visibilidade nacional. O percurso teórico está pautado nas obras e ideias de Foucault que tão bem transitam por 54 diferentes áreas, perpassando pelas contribuições de Bauman (2015) e outros. As ideias de Foucault permitem múltiplas leituras em muitos campos do saber e se configuram em importantes espaços de reflexão sobre sujeitos, discursos e cuidados de si, embora seu foco, seu objeto de estudo sempre foi o sujeito. E é a partir do sujeito idoso que começa a nossa trilha. Para o processo de delimitação do corpus, o presente estudo utilizou entrevistas com artistas considerados celebridades (atores, atrizes, cantoras) com idades acima de 60 anos. Nos discursos produzidos pelas celebridades e que são veiculados por textos midiáticos, pode-se apreender trajetos temáticos cujos efeitos de sentidos apontam para a definição de categorias tais como: 1 Percepção e concepções acerca da velhice (1.1 Rejeição, liberdade, resistência e incapacidade do idoso); 2 Cenário atual traçado para o sujeito idoso (2.1 Finitude do sujeito, 2.2 Corpo e refugo, 2.3 Solidão); 3 Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso (3.1 O corpo e autoafirmação no cuidado de si, 3.2 Sexualidade e 3.3 Mobilidade Social). São práticas discursivas cujos sentidos me instigaram a buscar aportes teóricos que subsidiassem o entendimento de tais questões, ciente de que não se buscava uma verdade absoluta ou respostas capazes de dirimir todas as dúvidas, mas encontrar dispositivos teóricos e analíticos que subsidiassem a análise dos modos de subjetivação desses diferentes idosos. Nesse viés, a Linguística Aplicada, mediante o estudo das práticas discursivas se apresenta como o melhor recurso a seguir. A linguagem, como prática social, é o elemento norteador da pesquisa uma vez que é, mediante os discursos que perpassam os textos midiáticos, que me arrisco a analisar as subjetividades dos idosos. Daí a necessidade de alguns conceitos iniciais que perpassem sobre tal área de pesquisa, a exemplo de discurso, formações discursivas, dentre outros. Conforme Foucault (2014, p.135), só podemos chamar de discurso ―um conjunto de enunciados que se apoiem na mesma formação discursiva‖ sendo tais enunciados ancorados em um processo histórico, como um fragmento ou unidade desta e não como algo que surge ao acaso, desprovido de um viés institucional e isolado frente ao tempo. O discurso é, antes de tudo, uma prática que encontra seu sentido nas relações e no funcionamento dos enunciados. Assim sendo, estamos todos envoltos em constantes discursos, mesmo que não percebamos ou não compreendamos de forma clara, o alcance e a influência que estes provocam em nossas vidas, nas instituições às quais pertencemos e na própria história. Já Orlandi (2006, p.16) destaca que "pensar o texto em seu funcionamento, é pensá-lo em relação às suas condições de produção, é ligá-lo a sua exterioridade". Em face disso, não 55 há que se falar em discurso sem a influência de aspectos extralingüísticos, sem a aplicabilidade prática das palavras que, rebuscadas de uma forte influência histórica acabam por provocar a produção de sentidos uma vez "que a própria textualidade traz nela mesma sua historicidade, isto é, o modo como os sentidos se constituem, considerando a exterioridade inscrita nela e não fora dela" Outro conceito importante nessa trilha metodológica diz respeito à noção de refugo, tão presente naquilo que Bauman denominou de ―liquidez‖. São os excluídos nessa sociedade pós-moderna. Seriam eles os ―refugos‖ definidos por Bauman (2015) já que não mais ocupam espaços na divisão de trabalho, ou se enquadrariam nas listas dos excedentes cuja exclusão não é considerada intencional ou planejada? E os que se encontram em atividade nos cenários midiáticos, também seriam exemplos de exclusão ou seriam um refugo reciclável? Nessa Modernidade Líquida tratada por Bauman a liquefação que acomete as relações tem gerado incertezas frente à velocidade com que as mudanças acontecem e com elas a solidariedade e coletividade dão lugar ao individualismo, ao consumismo. As relações interpessoais são vistas a partir de redes sociais facilitando, também, seu descarte, ou seja, estamos sendo refugos cada vez mais cedo. Por outro lado, como entender tais realidades tão diferentes uma vez que se tratava de idosos? Estariam esses refugos relacionados apenas às mudanças do corpo? Esse corpo que, segundo Foucault (2013, p.11): é um fantasma que só aparece na miragem dos espelhos e, ainda assim, de maneira fragmentária. Preciso, verdadeiramente, dos gênios e das fadas, da morte e da alma, para ser ao mesmo tempo indissociavelmente visível e invisível? Ademais, este corpo é leve, é transparente, é imponderável; nada é menos coisa que ele: ele corre, age, vive, deseja, deixa-se atravessar sem resistência por todas as minhas intenções. É verdade! Mas somente até o dia em que adoeço, em que se rompe a caverna de meu ventre, em que meu peito e minha garganta se bloqueiam, se entopem, se fecham. Até o dia em que a dor de dentes estrala no fundo da minha boca. Então, aí então, deixo de ser leve, imponderável etc.; torno-me coisa, arquitetura fantástica e arruinada.

Essas respostas não poderiam ser obtidas apenas pela esfera biológico-gerontológica ou pedagógica que permeava meu universo de trabalho. Era necessário um aprofundamento em relação a diferentes áreas do conhecimento para que se procedesse à análise do corpus pretendido reiterando, assim, a necessidade de se ancorar na Linguística Aplicada. A partir desse entendimento, a delimitação do corpus se deu mediante a utilização de entrevistas com artistas considerados celebridades (atores, atrizes, cantoras, jornalistas) com idades acima de 60 anos, publicadas nos sites: portaldoenvelhecimento.com, globo.com, uol.com, portalterceiraidade.org, brasilsenior.com, purepeople.com, clicrbs.com, virgula.com, 56 afreaka.com, vix.com, osul.com, 50emais.com, missnews.com, folhavitoria.com, metropolis.com, BBC.com, rd1.com, terra.com, 1news.com, tvprime.com, e o obuxixogospel.com. A amostra foi composta por 04 atores, 14 atrizes, 01 jornalista e 03 cantoras com idades entre 67 e 92 anos. As entrevistas foram concedidas no período de março de 2011 até junho de 2020. O critério para seleção foi, portanto, ter idade acima de 60 anos e pertencer ao quadro de artistas brasileiros com visibilidade no cenário nacional.

57 6. CUIDADO DE SI E TECNOLOGIA DE SI

Ocupar-se consigo não é pois, uma simples preparação momentânea para a vida; é uma forma de vida.

(Michel Foucault)

Com o objetivo de elaborar uma história dos diferentes modos pelos quais os seres humanos são constituídos em sujeito, Foucault (1995, p. 231) elencou o que seriam formas de objetivação. Para tanto, dividiu-as em número de três, a saber:

o primeiro são os modos de investigação, que tenta atingir o estatuto da ciência, como, por exemplo, a objetivação do sujeito do discurso na grammaire générali, na filosofia e na linguística. Ou ainda a objetivação do sujeito produtivo, do sujeito que trabalha, na análise das riquezas e na economia. Ou, um terceiro exemplo, a objetivação do simples fato de estar vivo na história natural ou na biologia. Na segunda parte do meu trabalho, estudei a objetivação do sujeito naquilo que chamarei de ―práticas divisoras‖. O sujeito é dividido no seu interior e em relação aos outros. Esse processo o objetiva. Exemplos: o louco e o são, o doente e o sadio, os criminosos e os ―bons meninos‖. Finalmente tentei estudar – meu trabalho atual- o modo pelo qual o ser humano torna-se ele próprio um sujeito. Por exemplo, escolhi o domínio da sexualidade – como os homens aprenderam a se reconhecer como sujeitos de ―sexualidade‖. Assim, não é o poder, mas o sujeito que constitui o tema geral de minha pesquisa. Dessa forma, à luz de Foucault, Benites (2006, p. 114) didaticamente assim dividiu as formas de objetivação:

na primeira, o sujeito se dá a conhecer pela ciência enquanto objeto de estudo, também como um ser que produz economias e é parte de uma história biológica e natural; no segundo processo de objetivação, Foucault observa o sujeito como prática divisória, isto é, como divisão em si mesmo e dos outros, o que resulta em seus estudos sobre a segregação social dos loucos, prisioneiros, etc da parcela dita sã da sociedade; a última forma caracteriza-se pelo modo como o homem dá a si mesmo o status de sujeito, ou seja, o conhecimento de si e as práticas de si levam o homem a constituir-se e a reconhecer-se como sujeito. Assim como ele, outros filósofos buscaram problematizar o homem de forma a entendê-lo enquanto corpo que é atravessado por forças e que, por conseguinte, influenciam na sua constituição de sujeito. O que compreende essa terceira forma de objetivação interessa-me sobremaneira dada a possibilidade de refletir acerca das técnicas e práticas que influenciam na constituição do sujeito, adentrando no que ele denominou de técnicas de si. Para tanto, cumpre informar, a partir da obra Tecnologias de Si, que os estudos iniciais de Foucault acerca da temática sexualidade não tinham como escopo apenas os elementos relacionados à proibição ou à permissão envolta na área, mas ampliar essa contextualização 58 de forma a inserir aspectos voltados aos sentimentos, pensamentos e desejos. Para o filósofo, as ―interdições sexuais estão constantemente ligadas à obrigação de dizer a verdade sobre si‖. (1991, p. 321) Nesse cenário, a confissão passa a exercer um papel de destaque principalmente nas instituições penais e religiosas. Todavia as confissões que perpassavam sobre a trilha da sexualidade se sobrepunham a todo e qualquer outro pecado aparentando ter um peso maior que os demais. Além disso, mediante infinitos temas que circundam a vida em sociedade, o comportamento sexual deveria obedecer a regras bem mais rígidas como forma de manutenção da decência. Exigia-se dizer a verdade ao passo em que era negado ao indivíduo a possibilidade de se reconhecer como se é e falar sobre o que se faz numa forte perspectiva de se renunciar à carne. Baseado nessa vertente, Foucault (1991) envereda na questão das interdições no sentido de entender como estas influenciam nos tipos de conhecimento sobre si e como esse saber sobre si é capaz de propiciar algum tipo de renúncia. Daí advém a preocupação em entender também as tecnologias de si no início do cristianismo, o que não foi uma tarefa fácil em função de estas serem pouco conhecidas e da insignificante ou tímida importância disponibilizada pelo cristianismo às práticas reais. Havia uma tendência de direcionar a hermenêutica de si às tecnologias da alma, mais uma vez circunscritas ao ambiente do pecado, das crenças. Ao longo de sua trajetória, Foucault (1991, p. 323) buscou traçar como os indivíduos desenvolvem o conhecimento sobre si mesmos de forma a não aceitar tais conhecimentos apenas pelo viés de garantia da ciência, ―mas analisar essas denominadas ciências como ―jogos de verdade‖ muito específicos, relacionados a técnicas particulares que os seres humanos utilizam para entenderem a si próprios‖. Nesse sentido, descreve o filósofo: Como contexto, devemos entender que há quatro grupos principais de ―tecnologias‖, cada um deles uma matriz de razão prática: (1) tecnologias de produção, que permitem produzir, transformar ou manipular as coisas; (2) tecnologias dos sistemas de signos, que permitem utilizar signos, sentidos, símbolos ou significação; (3) tecnologias de poder, que determinam a conduta dos indivíduos e os submetem a certos fins ou dominação, objetivando o sujeito; (4) tecnologias de si, que permitem aos indivíduos efetuar, com seus próprios meios ou com a ajuda de outros, um certo número de operações em seus próprios corpos, almas, pensamentos, conduta e modo de ser, de modo a transformá-los com o objetivo de alcançar um certo estado de , pureza, sabedoria, perfeição ou imortalidade.(FOUCAULT, 1991, p.323)

Todos esses tipos de tecnologias citados acima tendem a agir de forma conjunta quer na descoberta de habilidades, quer na tomada de atitudes, entretanto, interessa-me de forma mais premente no trabalho em questão, as tecnologias de si sem desconsiderar as tecnologias 59 de dominação sobre os outros no sentido da governamentalidade. Interessa-me, ainda o como os idosos, aqui considerados celebridades, agem sobre si mesmo, como percebem a realidade, as atitudes tomadas frente às colocações da mídia em entrevistas e publicações. Enfim, interessa-me a construção das subjetividades idosas a partir do uso das tecnologias de si, quer sejam sob forma de resistência, autogoverno, vigilância, renúncia ou outras que porventura estejam presentes nas materialidades linguísticas. O estudo das tecnologias de si, utilizado por Foucault, teve como parâmetro dois momentos históricos relacionados, a saber – ―a filosofia greco-romana nos primeiros dois séculos d.C. do início do Império Romano e a espiritualidade cristã e os princípios monásticos desenvolvidos nos quarto e quinto séculos do final do Império Romano‖ (FOUCAULT, 1991); ambos tomavam como base, práticas voltadas ao ―cuidar de si‖. Nesse viés de estudo, é importante destacar que a verdade, dentro de um ambiente discursivo, nunca foi um elemento ou um conceito de fácil trânsito. Quando nos reportamos ao mundo antigo percebemos a dualidade existente entre o ―cuidado de si‖ e o ―conhecimento e si‖. Nessa esfera, verdade e sujeito eram temas que se constituíam em instrumentos de disputa face aos modos de vida. Em assim sendo, percebe-se, através de Sócrates e Platão, por exemplo, como a predileção pelo conhecimento de si ofuscou o cuidado de si, de maneira tal que ao conhecer a si mesmo poder-se-ia fazer as melhores escolhas, trilhar os caminhos corretos, impelindo a ideia de que a forma se sobrepõe à matéria. Para Foucault (1991, p. 328), as razões para o ―conhecer a si mesmo‖ se sobrepor ao ―cuidar de si‖ reside no fato de estarmos mais inclinados a entender o cuidado de si como imoralidade, como uma forma de escapar de todas as regras possíveis. O autor ainda afirma: ―Herdamos a tradição da moralidade cristã que faz da renúncia de si condição para a salvação. Conhecer a si mesmo era paradoxalmente o caminho para a renúncia de si‖. Além disso, a base da moralidade repassada para nossa sociedade estava em algo externo, em regras e condutas aceitáveis socialmente. Enveredando cada vez mais no estudo do cuidado de si, Foucault (1991, p.329) encontra na obra Alcibíades I, de Platão, a primeira referência filosófica identificando a principal característica do cuidado de si ali presente. O referido diálogo exerceu tamanha importância na tradição clássica que os neoplatônicos o utilizavam também como matriz do conhecimento e como fonte de leitura para os jovens que quisessem praticar a virtude e se manter longe da política. ―Cuidar de si‖ era então, o primeiro princípio da filosofia platônica sendo referendado a partir do estudo de Alcibíades. Nessa perspectiva, instiga saber como o ―cuidado de si‖ é introduzido no diálogo. 60

A obra expõe um perfil de Alcibíades voltado à busca pelo poder pessoal e político sendo interpelado, nessa transformação em busca de satisfação pessoal, por Sócrates que declara seu amor por ele. Nesse instante, Alcibíades deve mudar sua condição de amado para a condição de amante, reconhecendo que precisa caminhar bem na esfera afetiva e política para execução de seus objetivos. Estrategicamente, Sócrates, sabedor dos intentos de Alcibíades no sentido de se manter na condição de dominante e ambicionista, propõe uma submissão desse no plano espiritual e não físico. A intersecção entre a ambição política e o amor filosófico é o que Foucault denomina ―cuidado de si‖. A partir de tal plano, Sócrates orienta Alcibíades no tocante a se preocupar consigo mesmo caso deseje continuar seu intento em busca do poder uma vez que seu perfil era de conhecimento limitado frente aos demais reis, o que caracterizava a necessidade premente de cuidar de si. A ênfase, então, era a ambição política. Entendendo o ―si‖ como uma questão de identidade, qual seria então o fundamento para que essa identidade seja encontrada? Utilizando-se o exemplo de Alcibíades, o cuidado de si não está atrelado ao corpo e sim, à alma enquanto prática e não substância. Para tanto, é necessário compreender que esse cuidado só será possível a partir da contemplação da alma enquanto elemento divino permitindo assim que ela descubra parâmetros para identificar o que é justo enquanto comportamento e ação política. Dessa forma, quanto mais se contemplasse a alma, mais esta seria conhecida e mais positiva seria a interferência política de Alcibíades. Esse diálogo denota que ―o cuidar de si consiste em conhecer a si mesmo. O conhecimento de si torna-se o objeto de busca do cuidado de si‖. (FOUCAULT, 1991, p.332). A partir desse estudo inicial acerca do cuidado de si, ainda tomando como exemplo a figura de Alcibíades, Foucault (1991, p.333) na busca de entender o porquê da subordinação do cuidado de si ao conhecimento de si, identifica quatro problemas: - relação entre ocupar-se de si e a prática política uma vez que as duas acontecem de forma alternada; (período helênico e imperial) - relação entre ocupar-se de si e a pedagogia onde o cuidado de si ora é visto como dever do jovem, ora é visto como atitude permanente (período socrático) - ocupar-se de si e o conhecimento de si onde há o predomínio do princípio délfico ―conhece-te a ti mesmo‖ (período platônico). Tal pensamento foi invertido nos períodos helênico e grecoromano, assumindo o cuidado de si, uma posição de destaque. - relação entre ocupar-se de si e o amor filosófico, ou a relação para com o mestre. 61

Todavia percebe-se que a temática do cuidado de si perpassava por todos os povos como prática difundida o que ―gerou competição entre os retóricos e aqueles que se voltaram contra si, particularmente sobre a questão do papel do mestre‖ (FOUCAULT, 1991). Nesse sentido, os momentos reflexivos e a escrita tiveram um papel importante já que serviam como meditação e forma de rememorar as verdades quando relidas. Por esse viés, a escrita se torna tão significativa que o cuidado de si é visto nas cartas a partir dos detalhes citados na vida cotidiana. Poder-se-ía, por exemplo, citar a carta de Marco Aurélio a Fronto onde ele expressa, com riqueza de detalhas toda a sua rotina diária, inclusive demonstrando como se comporta seu corpo e sua alma naquele dia com uma prevalência do que foi feito, não do que foi pensado e, tendo como ênfase, o exame de consciência. Ainda em sua análise sobre os textos antigos, Foucault (1991) percebe o início da mudança no processo de subordinação do cuidado de si ao conhecimento de si a partir dos helênicos, estóicos, cínicos e epicuristas. Para tanto, faz um resgate das duas questões anteriores: o cuidado de si com vistas à prática política e o cuidado de si enquanto cunho pedagógico destinado apenas aos jovens. Além disso, destaca que ―o cuidado médico permanente é uma das principais características do cuidado de si. O indivíduo deve se tornar o médico de si‖ e seu intuito não é preparar-se para a próxima etapa da vida, mas para a ―realização plena da vida. Esta realização só está completa no momento imediatamente anterior à morte. Essa noção de uma alegre aproximação da morte — da velhice como plenitude — é uma inversão dos valores tradicionais gregos de juventude‖ (FOUCAULT, 1991, p. 347). O cuidar de si passa a ser algo presente em todas as fases da vida, um gesto contínuo e não uma condição a ser observada por quem é jovem. Especificamente para os estoicos, os movimentos filosóficos demonstram o desaparecimento do diálogo em detrimento da cultura do silêncio onde o mestre fala e o discípulo apenas ouve em silêncio. A arte da escuta era indispensável para a conquista da verdade. Essa arte da escuta foi que Plutarco denominou como crucial para percepção do que é verdade ou não. Não se trata de seguir quem está mencionando o fato, mas permitir-se refletir sobre o que escutou e confrontá-la com sua razão interior. A verdade, portanto, está na razão e não dentro do indivíduo como menciona Platão. Importante destacar nesse percurso filosófico trazido por Foucault (1991) sobre o cuidado de si que, na cristandade, o caminho para se chegar a Deus era a partir da renuncia de si. Contrariamente, o estoicismo entende o cuidado de si não como uma renúncia à realidade, mas como uma busca da verdade – a arkêsi; aqui entendida como “um conjunto de práticas 62 pela qual o indivíduo pode adquirir, assimilar e transformar a verdade em um permanente princípio de ação. Aletheia torna-se ethos. Este é um processo de tornar-se mais subjetivo‖. (Foucault, 1991, p. 344) Utilizando-se dos preceitos da arkêsi o indivíduo perceberá, através de exercícios, se é possível aplicar os discursos de seu acervo em situações que são postas fazendo-o refletir sobre como se comportar frente a um acontecimento semelhante. Esse exercício pode se dar mediante meletê (―meditação‖), onde se memoriza respostas e as reativa em uma situação prática para análise de como se reagiria ao fato hipotético e gymnasia (―treinamento‖) entendida aqui como uma experiência real. A abstinência sexual seria um desses ―treinamentos‖ em busca da purificação. No estudo do cuidado de si, Foucault abre espaço para o cristianismo. Segundo ele:

O cristianismo não é apenas uma religião da salvação, é uma religião confessional. Ela impõe severas obrigações de verdade, dogma e cânone, mais do que o fazem as religiões pagãs. Obrigações de verdade em creditar nisto ou naquilo foram, e ainda são, muito numerosas. O dever de aceitar um conjunto de obrigações, de assumir certos livros como verdades absolutas, de aceitar decisões autoritárias em matéria de verdade, de não apenas acreditar em algo, mas demonstrar o credo, e de aceitar a autoridade institucional, são todas características do cristianismo. (FOUCAULT, 1991, p. 349)

Seguindo esse percurso, verdade e fé andam de forma paralela, mas recebem exigências diferentes do cristianismo. Cabe ao indivíduo reconhecer suas limitações, seus desejos, seus defeitos e até revelar seus segredos; tudo em nome da purificação da alma. Todavia só se chega a esse estado de purificação mediante o conhecimento de si. O longo caminho para descoberta das verdades enquanto cristãos passava pela exomologêsis aqui entendida como um ritual de reconhecimento de suas falhas. Uma vez ocorrendo o pecado, necessário seria o cumprimento de alguma penitência como forma de reparação, o que o afetaria durante toda sua vida. Outra opção seria o jejum e restrições no tocante ao vestuário e ao sexo. A penitência poderia também assumir uma condição de status onde o ritual era composto pela exposição dos erros perante o bispo o que justificava sua consequente condição de penitente antes de uma posterior reconciliação. O processo de penitência inclui autopunição e revelação de si e tinha como objetivo o retorno ao estado de pureza obtido no período de batismo. Contudo, a purificação era precedida de uma total exposição do pecador cuja essência era revelada mediante os pecados apresentados. A penitência era a demonstração de ruptura com o passado e consigo mesmo. Fazendo-se um paralelo entre as 63 tradições estoica e cristã, percebe-se que a primeira utiliza a memorização de regras como busca do conhecimento de si enquanto a segunda opta por uma ruptura do próprio indivíduo. Seguindo ainda os estudos de Foucault (1991, p. 355) acerca das tecnologias de si, o mesmo nos traz o exame de si a partir de dois princípios de espiritualidade cristã: a obediência e a contemplação. Para tanto faz referência às diferentes relações entre o discípulo e o mestre no tocante à condução do processo de ensinamento. Em Sêneca, por exemplo, essa relação era temporal uma vez que se encerraria quando do alcance pelo discípulo de uma vida feliz e autônoma mediante os conselhos recebidos. Em se tratando da vida monástica, a visão do mestre se apresenta com outra conotação. A obediência alcança uma amplitude que contempla todos os aspectos da vida monástica. Por esse paradigma, tudo que foge à permissão do mestre era considerado uma afronta. O sacrifício de si, da vontade do sujeito frente à obediência permanente ao mestre é o que Foucault (1991, p.355) tipifica também como uma tecnologia de si. Nesse caso, o si é constituído pela obediência até a morte. A contemplação, outra característica monástica, é considerada um bem supremo e preceitua que os pensamentos do monge devem estar continuamente voltados a Deus de forma que sua pureza o fará ver Deus. Percebe-se, com isso, que a obediência e a contemplação estão mais vinculadas ao pensamento do que a ação. O exame de si estava, portanto, relacionado ao controle do espírito, à imobilização da consciência de forma que seu pensamento não apresentasse desvios ou fraquezas no destino a Deus. Foucault complementa ainda que:

Há três tipos principais de exame de si: primeiro, o exame de si em relação a pensamentos em correspondência com a realidade (Descartes); segundo, o exame de si em relação à forma pela qual nosso pensamento relaciona-se com regras (Sêneca); terceiro, o exame de si com respeito à relação entre pensamentos ocultos e uma impureza interna. Neste momento inicia-se a hermenêutica cristã de si, com sua decodificação dos pensamentos interiores. Isto implica que há algo escondido dentro de nós e que estamos sempre em uma auto-ilusão que oculta os segredos. (FOUCAULT, 1991, p.357) Dessa forma, ele deixa claro alguns traços característicos do cuidado de si a partir do escritos mencionados em Descartes e Sêneca cujas características diferenciam-se daquelas encontradas em Cassiano que destaca o cuidado voltado às ações presentes, sem interferência da consciência, como caminho para se chegar a Deus. Isso fica evidente nas três analogias por este último citadas: analogia do moinho onde devemos separar os grãos bons dos ruins com vistas à salvação; a analogia militar que aponta que se deve agir como o oficial que identifica e separa o bom do mal soldado e a analogia do cambista que enfoca a necessidade de, assim 64 como na moeda, analisar a qualidade de nosso pensamento, levando em consideração se o nosso pensamento em direção a Deus está sendo desviado pela influência dos nossos desejos. A verbalização dos pensamentos é um traço forte em Cassiano. Não é necessário apenas obedecer, mas verbalizar o que se pensa, o que é diferente do estoicismo. Nessa posição, o monge situa-se em relação hermenêutica em relação, não apenas ao mestre, mas a ele mesmo. ―Essa verbalização é o critério ou a moeda do pensamento.‖ (FOUCAULT, 1991, p.358) Na tentativa de entender como podemos ser hermeneutas de nós mesmos a partir da confissão, Foucault (1991, p. 359) reflete que apesar dos conselhos que podem advir do mestre mediante confissão colhida, esta confissão já representa um fator discriminatório do monge diante do mestre, mesmo que o último não mencione nada. Não há confissão sem sofrimento, sem constrangimento. Todavia a ideia da verbalização permanente não se sustenta uma vez que ela nunca é completa. O filósofo conclui que havia duas formas de revelação de si nos primeiros séculos do cristianismo: a exomologêsis, que expõe a condição de pecador enquanto penitente e utiliza o martírio como modelo e a exagoreusis que defende a verbalização contínua do pensamento e a obediência total a outra pessoa, renunciando a si mesmo. Essa renúncia, contudo, está presente nos dois modelos, segundo Foucault, uma vez que ao se revelar, ao se reconhecer na condição de pecador ou penitente, autoflagelar-se ou ser obediente ao mestre, o indivíduo renunciava a si mesmo. As técnicas de verbalização passaram a ser inseridas em outro contexto a partir de sua utilização pelas ciências humanas. Seu intuito, agora, seria a constituição positiva do sujeito e não mais sua renúncia. Diante das considerações apresentadas acerca dos cuidados de si descritos por Foucault (1991), podemos sinteticamente descrevê-los enquanto três momentos específicos: - Momento socrático-platônico – baseado em ideais filosóficos e médicos. Aqui, o cuidado de si está relacionado como uma atitude prévia necessária para cuidar do outro, ou seja, só se pode cuidar bem do outro aquele que sabe cuidar de si próprio, entendendo-se esse cuidar do outro relacionado à arte de governar. Incluem-se aqui práticas filosóficas como meditação, autoavaliação perante comportamentos adotados (exame de consciência), participação em rituais de purificação, além de práticas médicas tais como, cuidados com a alimentação, realização de atividades físicas. O conhecimento de si é visto como uma reflexão sobre si mesmo. 65

-Segundo Momento – época helenística (entre os séculos I e II d.C.): O cuidado de si deixa de ter um caráter mais individualizante e passa a ser destinado a toda a população. Dessa forma, a prática de si passa a exercer papel fundamental e não mais o conhecimento de si. Aqui também imperam os saberes filosóficos e médicos. Todavia há um destaque para a escrita e para a escuta entendida como procedimento na subjetivação de um discurso verdadeiro. O cuidado de si passa a ser também o cuidado dos outros. ―Para que a prática de si alcance o eu por ele visado, o outro é indispensável‖ (FOUCAULT, 2004b, p.158). Assim como no período socrático-platônico, os princípios estratégicos visam as práticas de liberdade e não de escravidão. - Momento Cristão: A confissão, o sacrifício e a renúncia são os elementos que norteiam o cuidado de si. Os saberes filosóficos e médicos perdem espaço para os saberes religiosos. A moral enquanto ética pessoal é substituída por uma obediência aos preceitos religiosos. Apesar de algumas práticas relacionadas aos momentos anteriores ainda se fazerem presentes, estas seguem o viés religioso que as define. As práticas relacionadas ao uso dos prazeres são abolidas. Diante de todas as colocações de Foucault frente às análises dos escritos, depreende-se que o cuidado de si leva a uma formação de um novo eu, uma nova forma de se perceber, de se reconhecer como sujeito. É um processo horizontal. É um conjunto de técnicas que o coloca frente a uma verdade e esta não foi descoberta, revelada, mas uma verdade que foi construída e que permite que a conduta do sujeito seja idêntica àquele que a enuncia. Segundo Scortegagna (2019, p. 02)

o cuidado de si significa cuidar da alma, do eu. Consiste em almejar uma filosofia de vida que enalteça ―as condições e as possibilidades indefinidas de transformação do sujeito‖, capaz de descobrir um novo eu e impulsioná-lo em busca de si mesmo, moldando-o, porque é intrínseco e coextensivo à vida da pessoa conhecer e cuidar de si mesma.

Faz-se mister, portanto, analisar como essas práticas, esse cuidado de si atravessam os discursos das celebridades idosas, subjetivando-as. Para isso, também se faz necessário conhecer um pouco acerca do trajeto pessoal e profissional de tais celebridades para posterior acesso a algumas materialidades linguísticas presentes em textos midiáticos que vão nortear nossa análise. Os discursos serão categorizados e analisados a partir das tecnologias de si presentes em tais materialidades. Diante de um cenário artístico tão diversificado, é importante, inclusive, a devida identificação através do nome e da imagem da celebridade.

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7. CELEBRIDADES: UM POUCO DE SUAS TRAJETÓRIAS

Fonte: centrape.org

A utopia é um lugar fora de todos os lugares, mas um lugar onde eu teria um corpo sem corpo, um corpo que seria belo, límpido, transparente, luminoso, veloz, colossal na sua potência, infinito na sua duração, solto, invisível, protegido, sempre transfigurado; pode bem ser que a utopia primeira, a mais inextirpável no coração dos homens, consista precisamente na utopia de um corpo incorporal. (Michel Foucault)

As mudanças sociais oriundas do aumento da expectativa de vida, bem como cenários que demonstram novos papéis assumidos pelas pessoas idosas dentro de um novo conceito de família, trabalho e de ocupação de diferentes espaços tem se refletido também na vida de celebridades idosas. Apesar de todas as possibilidades envoltas na condição de ser sujeito, esses indivíduos se deparam com situações que põem à prova tais condições. O processo de envelhecimento traz consigo inúmeras concepções para o corpo agora denominado idoso. Para muitos, é entendido como um processo de declínio, finitude, inutilidade. É a face contrária da juventude cuja oposição se traduz na existência de patologias crônicas que o impedem de se manter ativo, autônomo e independente. Cria-se para tanto, um novo espaço ou uma nova forma de subjetivação para essa parcela da população que, imbuída de uma necessidade de desmistificar ou de desconstruir tais conceitos, abre caminho para uma medicina que lhe proporcione devolver a jovialidade perdida e com isso, uma reinserção nos diferentes espaços outrora ocupados. Isso se torna ainda mais premente quando o idoso em 67 pauta é uma pessoa pública cuja aparência representa tanto ou mais que o seu próprio talento. Nesse cenário, os artistas, aqui compreendidos dos mais diversos segmentos, são os que mais entram em evidência no quesito estética, superlotando clínicas e aderindo aos mais diferentes procedimentos rejuvenescedores num processo de redimensionamento das experiências subjetivas com vistas ao cuidado de si. Entretanto pouco se sabe de sua trajetória. Considera- se, sobretudo, o momento atual vivido por tal celebridade e a ele / ela é atribuído, em geral, um controle sobre os corpos que contribui para uma negação de sua representatividade enquanto sujeito. Esse poder sobre os corpos tenta descaracterizar as subjetividades dos idosos, refutando o seu passado. Entendendo que as subjetividades são constituídas continuamente, interessante se faz conhecer um pouco da trajetória dessas celebridades aqui referenciadas, reconhecendo que se trata de um pequeno resgate biográfico.

7.1 ANA MARIA BRAGA

Ana Maria Braga Maffeis, nascida em 01 de abril de 1949 em São Joaquim da Barra, é uma bióloga e jornalista que ganhou notoriedade a partir de programas de culinária e variedades. Filha única de italianos, passou grande parte da infância em internatos do interior de São Paulo. Após sua graduação em Biologia pela Universidade de São Paulo/ São José do Rio Preto, mudou-se para São Paulo com o objetivo de se especializar em sua área de formação. Com o intuito de custear seus estudos, ingressa na TV Tupi cujo ambiente lhe estimula a cursar Jornalismo e a deixar a profissão de Bióloga. Em seu currículo, a apresentadora traz uma longa experiência em grandes emissoras de televisão, a exemplo da antiga Rede Tupi, Rede Record – onde apresentou o programa Note e Anote e atualmente, a Rede Globo com o atual programa ―Mais Você‖. Segundo o site https://anamariabraga.globo.com/biografia, Ana exerce atividades bastante diversificadas, embora seu foco principal seja a área relacionada à culinária. Em função de seu foco na área da gastronomia, mesmo em ambiente televisivo, a apresentadora acumula a venda de 13 milhões de livros, além de assinar coluna no jornal Extra, criar a feminina ―Revista A‖, e de possuir produtos assinados com seu nome. Em sua trajetória a apresentadora foi destaque em 2015 sendo escolhida como a Top 1 Voice do Linkedln Brasil, rede social profissional, com um texto que demonstrou como superou uma demissão com criatividade. Além disso, seu nome compõe a lista das 250 mulheres mais poderosas do planeta (Fortune Maganize-2017) e do Guinnes Book como a apresentadora com o maior tempo de permanência ao vivo do mundo. 68

Sua vida pessoal também está relacionada às recidivas de câncer que a fizeram se submeter a diferentes tratamentos de quimioterapia e imunoterapia. A apresentadora é mãe de dois, Mariana e Pedro e avó de três, Joana, Bento e Maria. Recentemente (07/02/2020) casou-se com o francês Johnny Lucet.

Disponível em ; e Acessos em 17 de abr. de 2020.

7.2 ÂNGELA VIEIRA (03/03/1952)

Natural do Rio de Janeiro e nascida em 03 de março de 1952, Ângela Regina Vieira começou como integrante do Corpo de Baile do Municipal do Rio de Janeiro até assumir a profissão de atriz em emissoras de televisão. Sua vida profissional como atriz teve início no ano de 1978 através do Programa Planeta dos Homens onde interpretava vários personagens em um elenco fixo. Sua longa participação artística inclui mais de 40 trabalhos entre séries, minisséries e novelas o que a fez ganhar respeito dentro da teledramaturgia brasileira. Dentre seus principais trabalhos na televisão, destacam-se: ―O Planeta dos Homens – 1978‖, ―Chico Anysio Show – 1979‖, ―Viva o Gordo – 1981‖, ―Lampião e Maria Bonita – 1982‖, ―Os Trapalhões – 1983‖, ―Caso Verdade – 1984‖, ―Armação Ilimitada – 1986‖, ―Terra Nostra – 1999‖, ―Brava Gente – 2001‖, ―Sai de Baixo – 2001‖, ― – 2004‖, ―Carga Pesada – 2005‖, ―Cobras & Lagartos – 2006‖, ―Paraíso Tropical – 2007‖, ―Malhação – 2007‖, ― – 2008‖, ―Insensato Coração – 2011‖, ― – 2011‖, ― – 2013‖, ―I Love Paraisópolis – 2015‖, ― – 2017‖ e ―Brasil a Bordo – 2018‖. A atriz também apresenta um longo currículo no teatro, tendo inúmeras peças encenadas ao longo da carreira. Seu primeiro trabalho no teatro aconteceu em 1979, mesmo ano em que ingressou na televisão, com a peça A História é Uma História, de Millôr Fernandes. No cinema, os filmes ―Angel‖ e ―Viva Zapata‖ são suas referências de sucesso enquanto atriz também das grandes telas. A atriz também é escritora e lançou em 2004 o livro ―Meia Idade Inteira‖. O livro a projetou na condição de palestrante, sendo, inclusive, uma pioneira como palestrante coach. A atriz foi casada com Roberto Frota de 1983 até 1997. Atualmente é casada com Miguel Paiva. 69

Disponível em Acesso em 01 de abr. de 2020.

7.3 BETTY FARIA (08/05/1941)

Elisabeth Maria Silva de Faria, mais conhecida como Betty Faria, nasceu no Rio de Janeiro, no dia 8 de maio de 1941. Filha única do militar Marçal Faria e da dona de casa Elza, Betty é uma atriz de sucesso tanto na televisão, como no cinema e teatro. Sua história artística inclui pelo menos 23 filmes, entre eles ―Dona Flor e Seus Dois Maridos‖, e mais de 40 novelas, com destaque para suas atuações em ―Tieta‖ (1989), onde foi protagonista, ―‖ (1975) e ―‖ (1981). Além de atriz, também traz no seu currículo a experiência enquanto dançarina de shows musicais. Ela ainda foi considerada um símbolo da mulher bonita brasileira. Sua carreira teve início, praticamente, no mesmo período das e do cinema brasileiro. Com menos de 25 anos realizou sua primeira novela, em 1965, mesmo ano em que participou de seu primeiro filme, ―O Beijo‖. A carreira no cinema obteve destaque através da participação em filmes dos diretores Carlos Diegues (―Bye, bye ‖, ―Um trem para as Estrelas‖), Bruno Barreto (―A Estrela Sobe‖, ―Romance da Empregada‖) e Carlos Reichenbach (―Anjos do Arrabalde‖, ―Bens Confiscados‖). Já no teatro, o destaque é para os espetáculos ―Onde Canta o Sabiá‖ e o show ―Camaleoa‖. Sua principal referência com emissoras de televisão é a Rede Globo, lugar onde praticamente desenvolveu toda a sua carreira. Contudo, em 2009, Betty Faria assinou um curto contrato com o SBT e atuou em ―Uma Rosa com Amor‖, retornando em 2014 à Rede Globo para participar de ―Avenida Brasil‖. Betty Faria foi casada com o ator Cláudio Marzo com quem teve sua filha e também atriz, Alexandra Marzo. Fruto do relacionamento com seu segundo marido, o diretor e ator Daniel Filho, a atriz teve segundo filho, João de Faria Daniel. A atriz também teve sua vida contada na biografia ―Betty Faria: rebelde por natureza‖, de autoria de Tânia Carvalho.

Disponível em Acesso em 13 de abr. de 2020

70 9 7.4 BRUNA LOMBARDI (01/08/1952)

12 Bruna Patrícia Maria Teresa Romilda Lombardi nasceu na capital paulista, em 1º de agosto de 1952. Filha de um cineasta e de uma atriz austríaca, começou a aparecer em televisão no ano de 1977 através da novela ―Sem Lenço e Sem Documento‖, exibida pela Rede Globo. No ano seguinte, foi então convidada pela autora Ivani Ribeiro a atuar em sua nova novela na TV Tupi, Aritana. Lá, conhece o também ator, Carlos Alberto Riccelli, com quem vem a se casar pouco tempo depois. Com o marido, Bruna realizou vários projetos, incluindo trabalhos para o cinema, como os filmes O Signo da Cidade (2008) e Onde Está a Felicidade? (2011), roteirizados por ela e dirigidos por Riccelli, além de outras atividades em Los Angeles, onde o casal reside. Dentre esses projetos, destaca-se o programa Gente de Expressão, levado ao ar de 1993 a 1995, na TV Manchete. Nele, a atriz entrevistava expoentes da área artística em viagens pelo mundo. A atriz ainda estrelou Grande Sertão: Veredas (1985), adaptação de Walter George Durst da obra homônima de Guimarães Rosa, e Memórias de um Gigolô (1986), de Durst e Marcos Rey. Na primeira, interpretou Diadorim, que, para vingar a morte do pai, escondia-se sob a identidade do destemido jagunço Reinaldo e despertava o conflito do também jagunço Riobaldo (Tony Ramos), que pensava estar apaixonado por um homem. Na segunda, foi a prostituta Lu, no centro de um triângulo amoroso formado pelos personagens de Lauro Corona e Ney Latorraca. Dentre suas passagens por novelas, destacam-se: a novela Louco Amor (1983), de Gilberto Braga (sua primeira novela no horário nobre da TV Globo); (1986), de Lauro César Muniz, como par romântico de Tarcísio Meira, De Corpo e Alma (1992), de Gloria Perez. Em 2002, interpretou a viúva Branca da minissérie O Quinto dos Infernos (2002), de Carlos Lombardi. Morando em Los Angeles, seguiu escrevendo livros e participando de filmes em suas idas e voltas ao Brasil. No teatro, Bruna Lombardi tem passagens em peças como Numa Nice (1982) e Eu te Amo (1987). Entre suas publicações, estão dois livros de poesia, dois romances, um registro poético das filmagens da minissérie Grande Sertão: Veredas, um infantil e dois roteiros escritos para filmes que estrelou e produziu. A atriz é mãe de Kim Riccelli. 71

Disponível em < https://memoriaglobo.globo.com/perfil/bruna-lombardi/perfil-completo/> e Acessos em 13 de abr. de 2020.

7.5 ELBA RAMALHO (17/08/1951)

Elba Maria Nunes Ramalho nasceu em 17 de agosto de 1951em Conceição do Piancó, cidade do interior da Paraíba. Sua carreira foi revelada na década de 70, quando, assim como outros nordestinos, Elba foi em busca de oportunidades melhores de vida no sul do país. Com forte influência da cultura nordestina e criada entre os baiões de Luiz Gonzaga e os pastoris (manifestação folclórica da cultura nordestina), a artista começou na música abraçando outro estilo - o rock. Foi baterista do grupo feminino As Brasas. Mas, foi a partir de sua participação no espetáculo A Feira, ao migrar para o Rio em 1974, agregada ao Quinteto Violado, que a vida da cantora tomou outra dimensão - Elba acabaria se tornando a voz do Nordeste que ecoaria em todo o Brasil para dar continuidade ao legado de Luiz Gonzaga. Dona de um estilo musical com viés dramático, inicialmente, a cantora aproveitou esse talento para atuar no teatro carioca. Sua participação na primeira montagem da Ópera do Malandro chamou a atenção da crítica e do autor do espetáculo (Chico Buarque) em função de estilo de voz agreste e forte da cantora paraibana. A boa receptividade vivenciada pelos artistas nordestinos no mercado fonográfico no final dos anos 70 favoreceu a gravação do primeiro LP de Elba Ramalho, citado anteriormente - Ave de Prata, com direito à música inédita de Chico Buarque (Não Sonho Mais). Logo após, vieram os álbuns Capim do Vale (1980) e Elba Ramalho (1981), todos pela CBS. Após sua saída da CBS, Elba assinou com a extinta gravadora Ariola. A partir de então, a cantora adota uma imagem mais sensual e brejeira que a faz explodir nacionalmente. Os discos Alegria (1982), Coração Brasileiro (1983, LP que trouxe o sucesso "Banho de Cheiro"), Do Jeito que a Gente Gosta (1984) e Fogo na Mistura (1985 - ano do hit "De Volta pro Aconchego") são exemplos dessa fase transitória e de sucesso. Esse período de forte ascensão profissional foi marcado, também, pela produção de outros discos a exemplo de: Remexer (1986), Elba (1987), Fruto (1988), Popular Brasileira (1989), Popular Brasileira ao Vivo (1990), Felicidade Urgente (1991), Encanto (1992), 72

Devora-me (LP de 1993 em que procurou um acento caribenho para sua música) e Paisagem (disco de 1995, de sotaque mais pop). Em 1996, Elba assina contrato com a BMG e promove festejada volta às origens nordestinas com o disco Leão do Norte, produzido por Robertinho de Recife. O espetáculo homônimo foi eleito o melhor de 1996 pelos críticos. Nesse mesmo período, a cantora se une a Alceu Valença, Geraldo Azevedo e Zé Ramalho e juntos criam o que ficou denominado como O Grande Encontro. O grupo sai em turnê pelo Brasil, registrada num disco ao vivo (mais tarde, já sem Alceu, o trio lançaria mais dois álbuns de sucesso). A vasta carreira da cantora Elba Ramalho é composta de muitos trabalhos que lhe renderam milhões de discos vendidos e inúmeros prêmios. Destaca-se, nesse sentido, o Grande Prêmio da Música Popular Brasileira vencido10 vezes pela cantora. Além do Grande Prêmio da Música Popular Brasileira, outros prêmios foram conquistados como o Grammy Latino de Melhor Álbum de Música Regionalista no Brasil. A cantora é uma das artistas que mais tem músicas em trilhas sonoras de novelas. Considerada uma profissional versátil, Elba possui uma vasta experiência como atriz tendo atuado em musicais no teatro e participado de novelas, seriados e minisséries a exemplo de ―Sai de Baixo‖, ―Pra Viver um Grande Amor‖, ―Linha Direta‖ entre muitas outras. Além do filho biológico, Luã, Elba Ramalho tem três filhas adotivas. Disponível em Acesso em 13 de abr. de 2020. Disponível em Acesso em 13 de abril de 2020.

7.6 ELZA SOARES (23/06/1937)

Elza da Conceição Soares nasceu no dia 23 de junho de 1937, no subúrbio do Rio de Janeiro, em uma comunidade onde hoje está situada Vila Vintém. Filha de um operário (Avelino Gomes) com uma lavadeira (Rosária Maria da Conceição), a cantora de voz rouca é um dos maiores nomes da música popular brasileira. Foi com seu pai que, ainda menina, começou a cantar acompanhando-o ao som do violão. Elza teve uma infância dura e de um período muito curto já que essa fase foi subitamente interrompida pelo casamento. Seu pai a obrigou a casar quando ela tinha apenas 73

12 anos com Lurdes Antônio Ramalho, que além de amigo de seu genitor, era bem mais velho do que Elza. Pouco tempo depois do casamento, deu à luz ao seu primeiro filho. Obrigada pelas próprias circunstâncias de um casamento precoce, a adolescente tem essa etapa de vida encurtada assumindo uma postura de uma mulher adulta. Em seus relatos, a cantora destaca as agressões e violências sexuais que a marcaram pelo resto da vida — e que se transformaram em protestos que ela apresenta por meio de sua música. Sua primeira apresentação pública aconteceu no programa de calouros do radialista Ary Barroso sendo motivada pelas condições financeiras e necessidades diante de um filho doente. Jovem e sem ajuda dos pais ou do marido, encontrou na participação do programa a possibilidade de resolver esse problema. Essa aparição foi marcada por uma frase de grande repercussão dita pela cantora. Diante de uma estrutura corporal franzina, o apresentador a questiona de que planeta a então candidata vinha, sendo surpreendido pela resposta ―planeta fome‖. Mesmo sendo vencedora no então programa, Elza perdeu seus dois primeiros filhos, ainda pequenos vitimas de desnutrição. Na década de 60, volta a se inscrever em concurso musical de rádio sendo vencedora. A partir daí, assina um contrato para apresentação semanal e começa a viver da música. Em 1966 foi a representante do Brasil na Copa do Mundo no Chile, momento em que conhece o jogador Garrincha e com quem viera a se relacionar. A relação com o famoso jogador de futebol se manteve de forma clandestina porque Garrincha era casado. Com o fim de seu relacionamento anterior, os dois oficializam a união que se manteve durante 17 anos. Entretanto, após o término da carreira de jogador, o atleta tornou-se alcoólatra e passou a agredir fisicamente Elza. Dessa experiência de violência doméstica, muitos anos mais tarde, surgiu a canção Maria da Vila Matilde, onde a cantora afirma:"cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim" – uma referência às agressões sofridas. Elza publicou em 1969 um livro intitulado Minha vida com Mané, onde conta detalhes da história de amor que viveu com Garrincha.

Dentre os maiores sucessos de Elza Soares, destacam-se:

 Dentro de cada um  Exú nas escolas  Deus há de ser  A Carne  Mulher do Fim do Mundo  Língua 74

 O que se cala  Dindi  Maria da Vila Matilde  Banho

Em 2000, a emissora BBC, em Londres, deu-lhe o título de A Melhor Cantora do Universo. Disponível em e Acessos em 13 de abr. de 2020.

7.7 FERNANDA MONTENEGRO (16/10/1929)

Considerada a primeira-dama do teatro, Fernanda Montenegro é uma importante atriz brasileira cuja carreira, que já ultrapassa sete décadas, perpassa pelos diferentes cenários da cultura brasileira. Nascida no Rio de Janeiro no dia 16 de outubro de 1929, seu nome é, na verdade, Arlette Pinheiro Esteves da Silva. Filha de uma dona de casa e um mecânico, a menina nasceu no bairro do Campinho, na zona norte do Rio de Janeiro. O nome Fernanda foi escolhido por ela, por ter uma sonoridade que remetia aos personagens de Balzac ou Proust. Montenegro veio de um médico homeopata que era amigo da família. Sua estreia como atriz aconteceu aos oito anos de idade, quando Arlette participou de uma peça na igreja. Aos 15 anos, a jovem foi contratada como redatora, locutora e radioatriz da rádio MEC. Considerada a primeira atriz contratada da TV Tupi (no Rio de Janeiro), fato acontecido no ano de 1951, Fernanda tem contabilizado 80 peças de teatro nessa emissora. Em dezembro de 1950, ao lado do marido Fernando Torres, fez sua estreia no teatro. Em 1959 fundou a Companhia Teatro dos Sete com a ajuda também de seu marido e de alguns amigos. A atriz também participou da extinta TV Excelsior. Uma das principais referências na carreira de Fernanda Montenegro foi a sua atuação no filme Central do Brasil (1998), de Walter Salles Jr onde chegou a concorrer ao Oscar. Premiada nacional e internacionalmente, seu primeiro prêmio, Saci, foi recebido em 1955. Posteriormente foi agraciada com o prêmio da Associação Paulista de Críticos Teatrais, Prêmio Governador de Estado de São Paulo, Prêmio Padre Ventura do Círculo Independente 75 de Críticos de Arte, Prêmio Molière. Ao longo da carreira, recebeu todos os prêmios nacionais, além de cinco distinções internacionais. Na esfera política, recebeu convites para ocupar o cargo de Ministra da Cultura nos governos de José Sarney e de Itamar Franco, além embaixadora do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), porém nenhum desses convites foi aceito pela atriz. Fernanda Montenegro foi casada com o ator Fernando Torres, que conheceu quando tinha apenas 16 anos e trabalhava no rádio. Juntos eles tiveram dois filhos: a atriz Fernanda Torres e o diretor Cláudio Torres. Disponível em e https://educacao.uol.com.br/biografias/fernanda-montenegro.htm Acessos em 13 de abril de 2020.

7.8 LAURA CARDOSO (13/09/1927)

Laurinda de Jesus Cardoso Baleroni, mais conhecida como Laura Cardoso, nasceu em São Paulo no dia 13 de setembro de 1927 e é considerada pioneira na televisão brasileira. Sua carreira teve início em 1952, na antiga TV Tupi, em um programa chamado Tribunal do Coração. Sua longa trajetória como atriz registra mais de 50 novelas e inúmeras peças teatrais, além de papéis no cinema, inclusive cerca de 30 longas-metragens. Segundo relatos da atriz, seu interesse pelas artes cênicas começou a ser percebido ainda criança, por volta dos 06 ou 07 anos e ao completar 15 anos, a então candidata fez testes na Rádio Cosmos onde recebeu o nome artístico de Laura Cardoso A atriz conheceu seu futuro marido o diretor, ator, roteirista e produtor de televisão Fernando Baleroni após mudar-se para a Rádio Tupi. Com ele, teve duas lindas filhas, sendo elas Fátima e Fernanda Cardoso. Considerada uma das colecionadoras de prêmios do teatro, cinema e televisão, Laura Cardoso tem na homenagem concedida pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva que lhe conferiu a Ordem do Mérito Cultural - ordem honorífica a artistas e personalidades que contribuíram para a cultura nacional, sua premiação de maior reconhecimento. ―Caminho das Índias‖, ―‖, ―Explode Coração‖, ―‖, ―‖, ―‖ estão na lista das inúmeras novelas de sucesso das quais a atriz fez parte.

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Disponível em Acesso em 13 de abril de 2020.

7.9 MAITÊ PROENÇA (28/01/1958)

A atriz e escritora Maitê Proença Gallo, nascida em São Paulo no dia 28 de janeiro de 1958, é filha de Margot Proença e Augusto Carlos Eduardo da Rocha Monteiro Gallo. Aos 12 anos de idade, a então adolescente viveu um drama familiar com a morte de sua mãe, assassinada pelo próprio pai após a descoberta de um caso extraconjugal da mulher. Em função de haver testemunhado a favor do pai, que fora absolvido, a família de sua genitora se distancia da adolescente que passa a sofrer de depressão, refugiando-se em um pensionato luterano. A atriz então começa uma peregrinação viajando para países da Europa, África e Ásia. Com o adoecimento do pai, a jovem resolve voltar da França para se dedicar a ele. Entretanto, programava que seria um período curto e que logo retornaria para o país europeu. Nesse intervalo, resolveu fazer um curso de teatro cuja intenção, além do curso de teatro era, também, aprender sobre roteiro de filmes. O então jornalista Mario Prata, ao conhecê-la, decidiu convidá-la para um teste na extinta TV Tupi. Pouco tempo depois, Maitê Proença fazia sua estreia na televisão na TV Tupi através da novela Dinheiro Vivo. Após sua estreia na Tupi, a atriz se transfere para a Rede Globo onde participa do elenco da novela Coração Alado. Esse foi um período marcado por problemas de saúde enfrentados pela atriz. Em sua carreira, a atriz fez diversos trabalhos importantes, a exemplo de ―Jogo da Vida‖, ―‖, ―‖, ―Marquesa de Santos‖, ―Dona Beija‖, ―O Salvador da Pátria‖, ―Cara & Coroa‖, ―Torre de Babel‖, ―Estrela Guia‖, ―Passione‖, ―Caminho das Índias‖ e muitas outras. Maitê Proença é, também, escritora e lançou em 2008 o livro ―Uma Vida Inventada‖ onde narra uma experiência amorosa frustrada com um francês que a abandonou depois de grávida. A atriz viveu com Paulo Marinho por 12 anos com quem teve uma filha chamada Maria.

Disponível em Acesso em 13 de abr. de 2020. 77

7.10 NATHÁLIA TIMBERG (05/08/1929)

Nascida no Rio de Janeiro no dia 5 de agosto de 1929, Nathália Timberg é uma das mais consagradas atrizes da televisão, do teatro e do cinema brasileiro. Sua estreia aconteceu de forma precoce quando aos seis anos já atuava como atriz no filme ―O Grito da Mocidade‖. Nathália é formada pela Escola de Belas Artes da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro). Sua experiência nos palcos apresenta registros do ano de 1948 quando começou a atuar no Teatro Universitário, grupo estudantil formado na Escola Nacional de Música do Rio de Janeiro. Ainda no Teatro Universitário, atuou nas peças: ―A Dama da Madrugada‖ (1948), ―O Pai‖ (1949) e ―Quebranto‖ (1950). Graças a esses trabalhos, recebeu uma bolsa de estudos em Paris como prêmio do governo francês, onde permaneceu entre os anos de 1951 e 1954. Lá, estudou no curso de formação de atores na Education Par Les Jeux Dramatiques. Ao retornar ao Brasil ingressou na Companhia Dramática Nacional onde estreou profissionalmente em 1954 com a peça ―Senhora dos Afogados‖, de Nelson Rodrigues. Em 1956 passou a integrar o elenco do Teatro Brasileiro de Comédia, em São Paulo, onde entre outras peças atuou em ―O Pagador de Promessas‖ (1960). Ainda no ano de 1956, iniciou sua carreira na televisão no programa ―O Grande Teatro‖, da TV Tupi de São Paulo. Sua longa vida no teatro lhe rendeu muitos prêmios, dentre eles o Prêmio Molière concedido por sua atuação na peça ―Meu Querido Mentiroso‖. Seu primeiro sucesso na televisão veio com a novela ―Direito de Nascer‖ exibida pela TV Tupi. Em 1965 ingressou na TV Globo onde apresentou o primeiro telejornal da emissora intitulado ―Tele Globo‖. Lá, posteriormente, ingressa na novela ―Um Rosto de Mulher‖. Em 1967 cria com o marido Sylvan Paezzo, o ―Circo do Povo‖, em São Paulo - um teatro popular construído em uma lona de circo onde encenou ―Os Ciúmes de um Pedestre‖, além de vários textos baseados na literatura de cordel. No cinema, os destaques estão nas atuações nos filmes: ―O Homem Que Comprou o Mundo‖ (1968), ―Fruto Proibido‖ (1976), ―Contos de Lygia‖ (1998), ―Condenado à Liberdade‖ (2000), ―O Quinto dos Infernos‖ (2002), ―JK‖ (2006), ―Vendo ou Alugo‖ (2012), ―Em Três Atos‖ (20015), dentre outros. Na televisão, foram muitas atuações em novelas e minisséries dentre as quais merecem destaque: ―O Terceiro Pecado‖ (1968), ―Vida em Conflito‖ (1969), ambas exibidas na TV Excelsior, ―As Bruxas‖ (1970), ―O Tempo não Apaga‖ (1972), ―Divinas e Maravilhosas‖ (1973), ―‖ (1975), ―Caso Especial‖ (1978), ―A Sucessora‖ (1978), ―Cara a Cara‖ 78

(1979), ―Ti Ti Ti‖ (1985), ―Vale Tudo‖ (1988), onde interpretou Celina a irmã da vilã Odete Roitman, ―Pantanal‖ (1990), ―Mulheres de Areia‖ (1993), ―Éramos Seis‖ (1994), ―Celebridades‖ (2003) ―Insensato Coração‖ (2011) e ―Amor a Vida‖ (2013). Um dos papéis mais polêmicos em sua carreira, certamente aconteceu em 2015, quando atuou na novela Babilônia, formando um casal ao lado de Fernanda Montenegro. Em 2016, foi homenageada pelo diretor Wolf Maya com a inauguração do Teatro Nathália Timberg. Disponível em Acesso em 20 de abr. de 2020.

7.11 NEUZA BORGES (08/03/1941)

Neuza Maria da Silva Borges nasceu em Florianópolis no dia 8 de março de 1941. Sua carreira teve início em São Paulo, como crooner de orquestra, em casas noturnas. Na época, chegou a trabalhar com grandes maestros a exemplo de Clóvis Lima e Salgado Filho, sempre cantando e dançando. Já na televisão, sua estreia aconteceu na TV Record, na Venha ver o sol na estrada, com Márcia de Windsor. No começo de carreira ainda atuou em Beto Rockfeller, na extinta TV Tupi. Seus papéis de destaque foram nas novelas Escrava Isaura, Dancin' Days e . Contudo a atriz também tem bastante representatividade em minisséries a exemplo de Grande Sertão: Veredas, Amazônia, de Galvez a Chico Mendes, dentre outras. Ao longo de seus trinta e cinco anos de carreira, a atriz acumula dezenas de prêmios, entre eles a Ordem de Tiradentes. Em 2011 Neusa Borges sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) e ficou internada por alguns dias. Atualmente já está recuperada.

Disponível em e https://famosos.culturamix.com/atrizes/neusa-borges-vida-e-trabalhos-na-televisao Acesso em 13 de abr. de 2020.

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7.12 RITA LEE (31/12/1947)

A cantora e compositora brasileira Rita Lee Jones de Carvalho nasceu em São Paulo no dia 31 de dezembro de 1947. Filha do dentista Charles Fenley Jones, um imigrante americano e da pianista Romilda Pádua Jones, ainda adolescente, começou a tocar bateria. Considerada um dos maiores símbolos do Rock no Brasil, junto com os irmãos, Sérgio e Arnaldo Baptista, formou, em 1966, a banda Os Mutantes que começou a ter projeção nacional em 1967, quando acompanhou o cantor Gilberto Gil na apresentação da música Domingo no Parque, ficando em segundo lugar no III Festival da Música Popular Brasileira. Em 1968, a banda acompanhou o cantor Caetano Veloso na apresentação da música É Proibido Proibir, no Festival Internacional da Canção (FIC). Esse trabalho possibilitou a assinatura de um contrato com a gravadora Polidor que lançou o primeiro disco da banda ―Os Mutantes‖. Aos poucos, o grupo foi se tornando um grande nome do rock de vanguarda da música brasileira. Contudo foi através da participação no disco-manifesto Tropicália ou Panis et Circensis e nos discos de Gilberto Gil e Caetano Veloso que a banda teve maior visibilidade Em 1970, acompanhada dos Mutantes, Rita começa a se destacar gravando seu primeiro disco solo, Build Up. Em 1972 lançou Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida. Em 1974 lançou Atrás do Porto tem uma cidade, seguida de Fruto Proibido, lançada em 1975, que vendeu cerca de 700 mil cópias. Em 1976 lançou Refestança, que fez sucesso com a música Ovelha Negra. A música ocupou a primeira posição nas paradas de sucesso e ainda hoje é uma das marcas de Rita Lee. Em 1977, através ao disco Entradas e Bandeiras, a cantora recebeu o certificado com o disco de platina duplo. Ainda em 1977, conheceu o músico Roberto de Carvalho comquem veio a se relacionar. Dentre seus sucessos destacam-se: Baila Comigo, Lança Perfume, Caso Sério, Bem-me- quer, Nem Luxo Nem Lixo, Banho de Espuma, Cor de Rosa Choque, Flagra, Desculpe o Auê, Paga Rapaz, entre outras. Em 2003, o CD Balacobaco é ndicado ao Grammy Latino na categoria de Melhor Disco Pop Contemporâneo. Depois de alguns anos sem gravar, em 2012, Rita Lee lançou o álbum Reza. Além dos inúmeros sucessos que compôs para seus discos, Rita Lee teve músicas gravadas por artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, João Gilberto, Elis Regina, entre muitos outros cantores. A cantora está casada com Roberto de Carvalho desde 1996 e juntos 80 têm três filhos. Em 2014, Rita decidiu deixar de pintar os cabelos com o tom vermelho que marcou sua imagem durante toda sua carreira, assumindo os fios brancos.

Disponível em Acesso em 20 de abr. de 2020.

7. 13 RUTH DE SOUZA (12/05/1921)

A atriz Ruth Pinto de Souza nasceu na zona norte do Rio de Janeiro, no bairro de Engenho de Dentro, em 12 de maio de 1921. Também considerada pioneira no teatro, cinema e televisão, é a primeira artista negra a conquistar projeção na dramaturgia brasileira e internacional contrapondo-se aos personagens estereotipados atribuídos aos atores negros. Isso foi possível através de uma consciência política que a permitiu representar papéis que desconstruíssem o que estava posto para o negro, enquanto personagem. A história de Ruth de Souza tem início em um sítio em Porto Marinho, interior de Minas Gerais para onde a família se muda logo após o nascimento de Ruth. Em 1932, ainda pequena, encanta-se pelo teatro e o cinema quando assiste ao filme Tarzan, o Filho das Selvas. Posteriormente tem oportunidade de assistir a espetáculos no Theatro Municipal quando, ainda adolescente, desperta o interesse pela atividade artística, mas enfrenta reações de descrença à decisão precoce de ser atriz. Isso acontece em função da estrutura racista vivenciada naquela época em que era incomum para artistas negras se estabilizarem na carreira artística. Convicta de suas escolhas, no começo da década de 1940, Ruth conhece o Teatro Experimental do Negro (TEN), onde se integra em 1945 ao grupo capitaneado pelo escritor e dramaturgo Abdias Nascimento (1914-2011). Aos 24 anos, estreia nos palcos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, como ponta na peça O Imperador Jones, do dramaturgo norte- americano Eugene O‘Neill (1888-1953). Em 1947 acontece sua primeira grande atuação, em O Filho Pródigo, do escritor Lúcio Cardoso (1912-1968). Em 1948 é reconhecida como exemplo da ―nova mulher negra‖ no jornal Quilombo que a descreve como ―uma mulher de personalidade forte e interessante, estudiosa de todos os problemas de arte, inteligência alerta e sequiosa de aprender sempre mais‖. Graças à influência do Teatro Experimental do Negro, Ruth assume papel voltado à denúncia da exclusão social e da opressão cultural do negro no Brasil, reconfigurando, assim, a forma de pensar o cenário artístico brasileiro. 81

Na década de 50, a atriz se transfere para os EUA onde reside por um ano, graças a uma bolsa da Fundação Rockefeller. Lá, tem a oportunidade de estudar e pesquisar artes cênicas na American National Theater and Academy, na Karamu House e na Universidade de Harvard. Em 1953, é convidada para representar uma mulher escravizada na novela Sinhá Moça, obra que aborda a luta abolicionista nos últimos anos de escravidão no Brasil e que concorreu ao Leão de Ouro no Festival de Veneza, tendo a atriz Ruth de Souza participado da disputa pelo prêmio de melhor atriz. Ruth de Souza também se destacou na televisão através de trabalhos iniciais com teleteatros nas TVs Tupi e Record nos anos 1950. Em julho de 1969, contratada pela Rede Globo, torna-se a primeira protagonista negra de um folhetim televisivo brasileiro, A Cabana do Pai Tomás. A personagem Cloé, casada com o personagem-título [Sérgio Cardoso (1925- 1973)], é outra mulher escravizada e resistente às opressões de um grupo de fazendeiros. Apesar do protagonista, o nome de Ruth não é devidamente valorizado, a começar pelos créditos na abertura, o que, segundo ela, ratifica o preconceito sobre artistas negros. Em março de 2019, aos 97 anos, é homenageada no Carnaval carioca pela escola de samba Acadêmicos de Santa Cruz, com o samba-enredo ―Ruth de Souza – Senhora Liberdade, abre as asas sobre nós‖, que a celebra em versos como ―talento é dom pra vencer/ preconceito não pôde calar‖. É inegável a contribuição que a atriz Ruth de Souza trouxe para a ―reconfiguração do imaginário cultural brasileiro em relação à população negra. Ao estrear nos palcos menos de seis décadas após a abolição da escravatura, supera preconceitos e torna-se figura importante na cultura popular, na representação e representatividade da mulher negra na dramaturgia do país‖. A atriz faleceu em 28 de julho de 2019, aos 98 anos.

Disponível em http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa349507/ruth-de-souza>. Acesso em 20 de abr. de 2020.

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7. 14 SIMONE (25/12/1949)

Simone Bittencourt de Oliveira nasceu em Salvador no dia 25 de dezembro de 1949.

Sua história musical começou ainda na juventude, quando foi convidada por sua então professora de violão para um encontro na casa do então gerente de marketing da gravadora Odeon, Moacir Machado. Na oportunidade, Simone demonstrou seu talento musical o que a oportunizou o convite para assinar um contrato quatro LPs de uma só vez. O primeiro LP de Simone foi gravado em outubro de 1972 e lançado em 20 de março de 1973 (data que marca o início oficial da carreira), em São Paulo, mesmo dia em que Simone estreou num programa da TV Bandeirantes. Ainda no início de sua carreira e pouco conhecida do público brasileiro, participou de uma turnê internacional organizada por Hermínio Bello de Carvalho. O roteiro incluía o Olympia em Paris, e o Madison Square Garden, em Nova Iorque, além de Bélgica e Canadá. O resultado da turnê originou os discos Brasil Export 73 e Festa Brasil. Em 1977, a cantora se destaca através das canções Começar de novo, Face a face, Jura Secreta e O que será, trabalhos esses que contribuíram para a projeção da cantora em 1978. Nos anos oitenta, a cantora se consolida junto ao público e obtém expressiva venda de discos, despontando como um dos maiores ícones da indústria fonográfica nacional. A temporada na tradicional casa carioca, Scala II levou a cantora a permanecer durante oito meses seguidos registrando um público de 220 mil pessoas, maior público já registrado até então em uma única apresentação ao ar livre. A partir de então a projeção aumenta colocando-a na lista dos nomes mais importantes da MPB. Ainda jovem, aos 32 anos de idade, tornou-se a primeira cantora a lotar sozinha um estádio, o Maracanãzinho, em 1981. Foi um feito histórico na Música Popular Brasileira. Estilos musicais como o amor romântico ou idealizado, a paixão, (Começar de Novo, Jura Secreta, Corpo, Medo de Amar nº 2, Raios de luz, Lenha), o samba (O Amanhã, Disputa de Poder, Ex-amor), e a religiosidade (Cantos de Maculelê, Reis e rainhas do Maracatu, Então é Natal, Ave Maria, Jesus Cristo) são os mais recorrentes em sua obra.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

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7.15 (23/08/1942)

Sônia Maria Vieira Gonçalves, conhecida como Susana Vieira, nasceu no dia 23 de agosto de 1942 em São Paulo. A atriz é filha do militar Marius Gonçalves e de Maria da Conceição Vieira Gonçalves. Susana (nome artístico da atriz) tem uma irmã que também é atriz chamada Susana Gonçalves, além de três irmãos Sérgio Ricardo Vieira Gonçalves, Sérvulo Augusto Vieira Gonçalves e Sandra Vieira Gonçalves. A carreira de Susana Vieira teve inicio no começo da década de 60 quando se formou em artes pelo Teatro Municipal de São Paulo. Seu primeiro papel na televisão foi em ―A Noite Eterna‖ apresentado em 1962 pela extinta TV Tupi. Em seus trabalhos na televisão entre séries, minisséries e telenovelas a atriz contabiliza mais de 70 trabalhos o que a torna uma das mais atuantes atrizes no país. Seus principais trabalhos na televisão foram em ― – 1971‖, ―Elas Por Elas – 1982‖, ―O Salvador da Pátria – 1989‖, ―Anjo Mau – 1976‖, ―Top Model – 1989‖, ―Mulheres de Areia – 1993‖, ―Senhora do Destino – 2004‖. Além do cinema, televisão e do teatro, a atriz também enveredou pelos caminhos da música gravando um disco. Na sua vida pessoal, casou-se pela primeira vez em 1961 com seu primo e diretor Régis Cardoso com quem teve seu único filho Rodrigo Otávio Vieira Cardoso.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.16 VERA FISCHER (27/11/1951)

Vera Lúcia Berndt Fischer nasceu em 27 de novembro de 1951 em Blumenau – Santa Catarina. A atriz é filha de Hildegard Berndt descendente de alemães e de Emil Fischer, um alemão da cidade de Karlsruhe. Enquanto atriz, a carreira de Vera Fischer teve um início no período considerado de ouro das famosas ―pornochanchadas‖. Esse momento foi marcado por uma produção cinematográfica com alto teor de apelo sexual nos filmes brasileiros. Em 1982, em meio a esse universo de produções, Vera ganhou prêmios pelo filme ―Amor Estranho Amor‖. A partir do sucesso de então, as novelas globais apareceram para a atriz sendo a primeira ―Espelho Mágico‖ de 1977. 84

Após Espelho Mágico, a atriz se destacou em muitos outros trabalhos de sucesso tais como ―Sinal de Alerta‖, ―Mandala‖, ―‖, ―Coração Alado‖, ―Brilhante‖, ―Perigosas Peruas‖, ―Pecado Capital‖, ―Laços de Família‖, ―‖, ―Agora é Que São Elas‖, ―Senhora do Destino‖, ―‖, ―Casos e Acasos‖, ―‖ dentre outros. Ao todo a atriz fez mais de 30 trabalhos em novelas, séries e minisséries. No cinema Vera Fischer possui mais de 20 filmes, sendo o primeiro datado de 1972. ―Sinal Vermelho – As fêmeas‖, ―Superfêmea‖, ―Eu Te Amo‖, ―Navalha na carne‖, ―Dora Doralina‖ são apenas alguns exemplos de filmes dos quais a atriz participou. Vera Fischer traz também em seu currículo, várias peças de teatro, tendo se dedicado aos palcos nos últimos anos. A atriz foi casada pela primeira vez com o ator e diretor Perry Salles de quem se separou em 1988. Seu segundo casamento foi com o também ator, Felipe Camargo de quem se separou em 1995. A atriz tem dois filhos Rafaela Fischer e Gabriel Camargo.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.17 ZEZÉ MOTA (27/06/1944)

Maria José Motta de Oliveira, conhecida como Zezé Motta, nasceu em 27 de junho de 1944 em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro.

Ainda criança, aos dois anos de idade, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro vindo posteriormente a frequentar a escola do teatro Tablado. Sua carreira de atriz tem início no ano de 1967, quando foi estrela da peça Roda-viva, de Chico Buarque. Em 1969, atuou em peças como ―Fígaro, Fígaro‖, ―Arena canta Zumbi‖ e ―A vida escrachada de Joana Martini e Baby Stompanato‖. Nos anos seguintes, fez parte de Orfeu negro (1972) e de Godspell (1974). Além de atriz, Zezé Motta também seguiu a carreira de cantora cujo início aconteceu em 1971, em casas noturnas paulistas. Entre os anos de 1975 e 1979, a também cantora lançou três LPs, seguidos de mais três nos anos 80. Na área cinematográfica, participou de filmes consagrados como ―Vai trabalhar, vagabundo‖ (1973), ―Ouro Sangrento‖, ―Anjos da Noite‖ e ―Tieta do Agreste‖. No ano de 1976, é a estrela do filme ―Xica da Silva‖ (1976) que a consagrou internacionalmente, além de atuar em ―Orfeu‖ no ano de 1999. O sucesso do filme ―Xica da Silva‖ foi tão expressivo 85 que foi transformado em telenovela de mesmo nome em 1996, vinte anos depois da exibição nas telas de cinema. Na oportunidade, Zezé Motta fez a mãe de Xica, no início, e Xica na maturidade, no final.

Na televisão, além de ‖Xica da Silva‖, a atriz teve participação em novelas como ―‖, ―A próxima vítima‖, ―‖, ―‖, dentre outras e em minisséries como ―Memorial de Maria Moura‖ e ―Chiquinha Gonzaga‖, ambas na Rede Globo. Além de trabalhar nessa última emissora, Zezé Motta também atuou na novela Luz do Sol na Rede Record, sendo considerada uma das mais importantes atrizes negras do Brasil.

A atriz teve participações em outros momentos importantes da cultura, a exemplo de festivais que protagonizaram as mulheres enquanto talento e empoderamento feminino. No período compreendido entre as décadas de 60 e 80, quando surgiram os especiais do Festival de Música Popular Brasileira (TV Record), a televisão brasileira foi marcada pelo sucesso de espetáculos transmitidos que revelavam novos talentos e registravam altos índices de audiência. O especial Mulher 80, exibido pela Rede Globo, foi um destes marcantes momentos da televisão. Nele, eram exibidas uma série de entrevistas e musicais cujo tema central era a mulher e a discussão de seu papel na sociedade de então. Além disso, essa temática era retratada no contexto da música nacional com a inegável preponderância das vozes femininas, a exemplo de Elis Regina, Maria Bethânia, Fafá de Belém, Marina Lima, Simone Bittencourt de Oliveira, Rita Lee, Joanna, Zezé Motta, Gal Costa e de atrizes como e Narjara Turetta, que protagonizaram o seriado Malu Mulher.

Zezé Motta também fez parte do elenco do Telecurso 2000, programa educativo da Rede Globo, além de participar de discussões sobre o papel dos negros na teledramaturgia.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.18 ANTÔNIO FAGUNDES (03/04/1947)

Antônio José da Silva Fagundes Filho nasceu no Rio de Janeiro em 18 de abril de 1949. Aos 8 anos de idade mudou-se com os seus pais para São Paulo. Ainda criança, já demonstrava atração pelos palcos e, no Colégio Rio Branco, em São Paulo, onde estudava, participou da montagem da peça ―A Ceia dos Cardeais‖. Ao completar 17 anos, entrou para o grupo do ―Teatro de Arena‖, iniciando assim, sua carreira. O ator fez parte do elenco de ―Marta Saré‖, ―Cão Siamês‖, ―Hair‖. 86

Em 1969 participou do filme ―A Compadecida‖ dirigindo-se mais tarde para a TV TUPI onde se destacou em trabalhos como ―O Machão‖, ―Mulheres de Areia‖, ―A Revolta dos Anjos‖ e ―Bel Amy‖. Desde que foi contratado pela Rede Globo não mais saiu da emissora e seus sucessos em novelas foram constantes. O ator também se destaca no teatro brilhando em peças como ―Cirano de Bergerac‖. Já no cinema, o destaque de sua atuação pode ser comprovado em filmes como ―Gaijin: Caminhos da Liberdade‖. Antônio Fagundes foi casado com a atriz e bailarina Clarice Abujamra, tendo adotado três filhos. Mais tarde casou-se com a atriz Mara Carvalho, com quem teve um filho. Ao longo de sua trajetória, o nome Antônio Fagundes está relacionado ao sucesso quer no cinema, teatro ou televisão. Todavia o que mais o representa é o personagem ―Bino‖, que fez dentro do seriado ―Carga Pesada‖, ao lado de Stênio Garcia. O ator, considerado hoje um galã maduro, destaca-se não apenas por seu talento, mas pelo seu carisma e sua beleza.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.19 CID MOREIRA (29/09/1927)

Alcides Alves Moreira, popularmente conhecido como Cid Moreira, nasceu em 29 de setembro de 1927 em Taubaté, São Paulo. É um jornalista, locutor e apresentador brasileiro que ficou conhecido nacionalmente por sua voz grave e inconfundível que apresentou por décadas o Jornal Nacional da TV Globo. Também possui uma expressiva atuação no áudio, narrando um conjunto de obras da Bíblia. Sua carreira teve início como contador de histórias na rádio Difusora onde narrou, através do Canal 100, noticiário e jornalismo esportivo que eram apresentados nos cinemas. Mas, sua notoriedade se deu a partir de 1969 por meio do Jornal Nacional exibido pela Rede Globo. Aproveitando o alcance positivo de sua voz, o jornalista narrou trechos da Bíblia, em áudio, cujo empreendimento se transformou em sucesso absoluto junto ao público católico, com mais de 30 milhões de CDs vendidos. Dessas narrativas, as que mais se destacaram foram: ―A Bíblia Sagrada‖– ―O Novo Testamento‖ (2002), ―Coleção Novo Testamento‖ (2004), ―A Bíblia Sagrada em texto integral" (2004 a 2009). 87

Um momento de destaque que marca a influência da voz e da entonação do jornalista foi a repercussão da vinheta da Copa do Mundo de 2010, onde ele entoava o ―Jabulaani‖, termo empregado por conta dos erros dos jogadores provocados pela bola oficial daquele evento. A gravação da voz foi sucesso imediato no Youtube e na Televisão. Aos 83 anos, Cid Moreira lançou a biografia ―Boa Noite‖, cujo título é uma referência à frase diária mencionada por ele nos tempos que apresentava o telejornal diário. Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.20 (29/11/1933)

Francisco Cuoco nasceu em 29 de novembro de 1933 na cidade de São Paulo. Filho de um feirante italiano, ainda jovem ajudava seu pai durante o dia nas atividades da feira e à noite buscava estudar almejando uma profissão que lhe desse mais estabilidade. Inicialmente seus planos eram de cursar a Faculdade de Direito. Mas esse pensamento foi modificado ao entrar em contato com a Escola de Arte Dramática de Alfredo Mesquita, quando decidiu ser um profissional de dramaturgia, abandonando, assim, os estudos de leis e códigos. Sua estreia no teatro aconteceu em peças do Teatro Brasileiro de Comédia e depois deu continuidade junto à companhia Teatro dos Sete, trabalhando com diretores como Alberto D'Aversa, Gianni Ratto, Fernando Torres e atores como Ítalo Rossi, Fernanda Montenegro, Carminha Brandão, entre outros. Sua primeira atuação como protagonista no teatro foi com o personagem Werneck, de O Beijo no Asfalto, de Nelson Rodrigues, em 1961, com direção de Fernando Torres. O trabalho intenso na televisão fez com que Francisco Cuoco se afastasse um pouco dos palcos voltando com a comédia de Rodrigo Murat, "Os três homens baixos", em 2004. Após esse seu retorno, outras comédias tiveram sequência como - O último bolero (de João Machado), Circuncisão em Nova York (João Bethencourt) e Deus é química (Fernanda Torres). Como ator de novela, sua primeira experiência foi na telenovela foi Renúncia, escrita por Walter Negrão, levada ao ar em 1965 pela TV Record. Na oportunidade, o ator já estreou como protagonista, ao lado da atriz Irina Grecco. Na Rede Tupi, o ator também participou de telenovelas, mas foi na TV Excelsior, onde viveu o Dr. Fernando, protagonista de Redenção, um de seus principais destaques já que é a telenovela que até hoje mantém o recorde de permanência no ar, com 596 capítulos 88 exibidos ao longo de dois anos. O ator ainda ocupou posição de destaque no enredo de Sangue do meu sangue, exibida em 1969. Sua transferência para a Rede Globo aconteceu em 1970, quando protagonizou seu primeiro trabalho na emissora através da telenovela Assim na Terra como no Céu, de Dias Gomes. Desde então, atuou em sucessivos trabalhos principalmente os idealizados pela escritora Janete Clair, que o tinha como um de seus atores preferidos. Por intermédio de Janete, Cuoco assumiu personagens famosos como o Cristiano de Selva de pedra, o jornalista Alex de , o taxista "Carlão" - trabalho muito elogiado de Cuoco na primeira versão da novela Pecado capital -, o misto de mocinho e vilão "Herculano" de O astro, o ambicioso Tião Bento em Sétimo sentido e o político "Lucas" em Eu prometo. Considerando as participações mais recentes no cinema, podemos citar os filmes Cafundó (2008), de Paulo Betti e Clóvis Bueno, Traição (1998 - conjunto de três episódios baseados na obra de Nélson Rodrigues), e Gêmeas (1999), de Andrucha Waddington, em que o ator fez o personagem Jorge, o pai das gêmeas do título. Estrelou Anuska, manequim e mulher (1968), Os xeretas (2001), e participou em Um Anjo Trapalhão (2000), Cafundó (2005) e Didi - O caçador de tesouros (2006). O ator revelou, em 2013, seu relacionamento de mais de 4 anos com Thaís Rodrigues de 27 anos, 53 anos mais jovem que ele. O relacionamento se manteve até o final de 2017.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.21 STÊNIO GARCIA (28/04/1932)

Stênio Garcia Faro nasceu em 28 de abril de 1932 na cidade de Mimoso do Sul – Espírito Santo. É filho do casal Stella Garcia Faro e Antônio Pereira Faro. Em 1958 concluiu seu curso de artes cênicas no Conservatório Nacional de Teatro no Rio de Janeiro e em seguida já se apresentava, na condição estagiário, no Teatro Cacilda Becker. Neste mesmo período atuou no famoso Teatro Brasileiro de Comédia localizado em São Paulo no bairro de Bela Vista. Sempre muito persistente e atuante, manteve os dois espaços de trabalho e, graças ao seu caráter inovador, estava sempre sendo premiado. Na televisão, sua participação tem início a partir da década de 60 quando aparece na série O Vigilante Rodoviário na extinta TV Tupi. 89

Na televisão fez papéis em trabalhos como ―As Minas de Prata‖ (1966), depois seguiu personagens inesquecíveis em ―Saramandaia‖, ―Gabriela‖, ―Carga Pesada‖, ―Corpo a Corpo‖, ―‖, ―Meu Bem, Meu Mal‖, ―O Rei do Gado‖, ―Torre de Babel‖, ―A Muralha‖, entre muitos outros. Ao longo de sua atividade artística, Stênio Garcia já contabilizou mais de 50 trabalhos na televisão, entre novelas, séries e minisséries permanecendo como um dos mais premiados da televisão brasileira. No cinema, a trajetória do ator que estreou com ―O Vigilante contra o crime‖ possui números expressivos – são mais de 30 trabalhos entre curtas e longas-metragens. Entre os prêmios colecionados por Stênio Garcia destacam-se Troféu Imprensa de Melhor Ator, Troféu APCA de Melhor Ator de Televisão e Prêmio Contigo! Melhor ator coadjuvante. Um dos principais personagens vividos pelo ator e que permanece como referência para a população brasileira foi o personagem Bino, vivido em Carga Pesada ao lado de Antônio Fagundes. Os dois representavam uma dupla de caminhoneiros (Pedro e Bino). A vida afetiva do ator é marcada por cinco casamentos ao longo desses anos. Inicialmente foi casado com a atriz Cleyde Yáconis e sua separação aconteceu em um momento difícil da vida da atriz quando sua irmã estava em coma. Logo em seguida se casou com a atriz Clarice Piovesan com a qual teve duas filhas - Cássia Faro e Gaya Faro. Também foi casado com Gisele Sá, Márcia Barros e agora, por último, está casado com Marilene Saad. Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

7.22 TARCÍSIO MEIRA (05/10/1935) Tarcísio Magalhães Sobrinho nasceu em 05 de outubro de 1935, em São Paulo. O ator é casado com a também atriz Glória Menezes, com quem tem um filho, Tarcísio Filho, também integrante da classe artística. Sua estreia no teatro aconteceu em 1957, na peça A Hora Marcada . Antes disso, porém, Tarcísio Meira atuou em várias peças de teatro, como Chá e simpatia (1957), de Robert Anderson, e Quando as Paredes Falam (1957), de Ferencz Molnar, com a Companhia Nydia Licia-Sérgio Cardoso. Na televisão, sua estreia aconteceu no ano de 1959, em Noites Brancas, um teleteatro da TV Tupi, adaptado do romance de Dostoievski e dirigido por Geraldo Vietri. No teleteatro Um Pires Camargo (1961), também da TV Tupi, pode contracenar pela primeira vez com Glória Menezes, com quem casaria pouco tempo depois. Os dois passariam a formar um dos 90 casais de maior sucesso da televisão brasileira. Ainda na TV TUPI participou das novelas e teleteatros Cleópatra; A Intrusa; Noite Eterna; Maria Antonieta; A Única Verdade; O Choque e outros. O nome do ator é registrado como o galã da primeira telenovela diária da televisão brasileira, 25499 Ocupado (1963), de Dulce Santucci. A então telenovela era transmitida pela TV Excelsior de São Paulo e pelo canal 2 do Rio de Janeiro. Tarcísio Meira ainda protagonizou mais sete telenovelas na mesma emissora até resolver se transferir, juntamente com Glória Menezes para a Rede Globo. Lá estrearam em , escrita por Janete Clair. A partir daí, Tarcísio se tornou uma das presenças mais constantes da teledramaturgia brasileira e já contabiliza mais de 50 trabalhos entre telenovelas; minisséries e seriados de televisão.

Disponível em Acesso em 21 de abr. de 2020.

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8. UM OLHAR SOBRE A MÍDIA

O discurso nada mais é do que o reflexo de uma verdade que está sempre a nascer diante dos seus olhos. (Michel Foucault)

A mídia vem fazendo parte de nossa rotina há anos e cada vez mais nos vemos envoltos pelas ideias, notícias, entretenimentos, informações ou publicidades por ela veiculadas. Enquanto espectadores ou anunciantes, nem sempre nos damos conta da influência que ela exerce em nossas vidas apesar de nos debruçarmos horas e horas em frente de uma tela de TV, de celular ou de um computador, recursos mais utilizados na atualidade. Nesse cenário midiático, o acesso à internet tem assumido proporções significativas. Segundo dados do IBGE (2020), aproximadamente três quartos (74,7%) da população brasileira com 10 anos ou mais de idade (181,9 milhões de pessoas) acessaram a internet no período de referência da PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), uma alta de 4,9 pontos percentuais em relação a 2017 (69,8%). Afirma ainda o IBGE que cerca de 75,7% das mulheres utilizaram a Internet em 2018, percentual um pouco acima daquele verificado entre os homens: 73,6%. A faixa etária que mais utilizou a Internet em 2018 foi a de 20 a 24 anos, alcançando 91% do público com esta idade. Mas, de 2017 para 2018, houve crescimento do uso em todos os grupos etários, tendo o de 55 a 59 anos tido o mais expressivo aumento. O estudo apresentado pelo IBGE não tem por escopo demonstrar quais os sites apresentaram os maiores acessos, apenas ressaltar a crescente utilização desse recurso, considerando o último trimestre de 2017 e de 2018, conforme quadro abaixo:

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Fonte: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/ Acesso em 05 de maio de 2020

Considerando o corpus da pesquisa ser delineado a partir discursos apresentados em sites, tal informação se torna relevante e denota o alcance da mídia nos dias atuais, ampliado pelo viés da internet. Para Silverstone (2005, p.12), ―a mídia é onipresente, diária, uma dimensão essencial de nossa experiência contemporânea. É impossível escapar à presença e à representação da mídia‖. Segundo ele, ―é no mundo mundano que a mídia opera de maneira mais significativa. Ela filtra e molda realidades cotidianas, por meio de suas representações singulares e múltiplas, fornecendo critérios, referências para a condução da vida diária, para a produção e a manutenção do senso comum. E é aqui, no que passa por senso comum, que devemos fundamentar o estudo da mídia‖(SILVERSTONE, 2005, p.20). E destaca: ―Estudamos a mídia porque precisamos compreender como ela contribui para o exercício do poder na sociedade tardo-moderna; (...) porque precisamos tornar a mídia inteligível‖ (p.283). Na tentativa inicial de nortear a finalidade de estudar a mídia, o autor destaca:

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Para responder a minha pergunta teremos de investigar as maneiras como a mídia participa de nossa vida social e cultural contemporânea. Precisaremos examinar a mídia como um processo, como uma coisa em curso e uma coisa feita, e uma coisa em curso e feita em todos os níveis, onde quer que as pessoas se congreguem no espaço real ou virtual, onde se comunicam, onde procuram persuadir, informar, entreter, educar, onde procuram, de múltiplas maneiras e com graus de sucesso variáveis, se conectar umas com as outras. (Silverstone, 2005, p.16-17)

Nesse entendimento da mídia como processo social, percebe-se o quanto os recursos por ela propagados têm estimulado o acesso em massa ao longo dos anos. O século XX, por exemplo, foi caracterizado pela intensificação do uso do telefone, rádio, cinema e televisão. Hoje o apogeu se dá pela interação instantânea proveniente da internet. Esse processo social perpassa por um viés não só político como econômico, daí a diversidade de significados produzidos que chegam às nossas casas e que geram inúmeros efeitos de sentido. Sua atuação, segundo o próprio autor acima, constrange e invade culturas locais, mesmo que não as subjugue. Mas, quando se estuda a mídia considerando também o senso comum, permite-se uma reflexão acerca de que a vida é uma realização contínua e, por conseguinte, exige uma a participação também continua do indivíduo. Nesse sentido, Silverstone (2005, p. 20) reflete: A mídia nos deu palavras para dizer, as ideias para exprimir, não como uma força desencarnada operando contra nós enquanto nos ocupamos com nossos afazeres diários, mas como parte de uma realidade de que participamos, que dividimos e que sustentamos diariamente por meio de nossa fala diária, de nossas interações diárias.

Todavia apesar de a mídia fazer uso constante do senso comum, ela também o distorce, de forma a produzir os resultados por ela almejados. Isso pode gerar inúmeros conflitos e controvérsias uma vez que o produto pode não refletir o discurso de quem proferiu gerando subjetividades que não correspondem à realidade de um determinado momento. Os sites, por exemplo, a depender da página na qual estão ancorados, podem contribuir para a constituição de sujeitos consumistas, ativos, dependentes, vítimas, solitários, resilientes, em suma, produzir sentidos diversos. Em se tratando das celebridades idosas, objeto do trabalho em questão, as discursividades produzem efeitos de sentidos que atendam às formações discursivas do artefato midiático. Sob esse prisma, considera-se:

Nessa visão, o mundo é um mundo em que as realidades empíricas são progressivamente negadas, tanto para nós como por nós, no senso comum e na teoria. Nessa visão, vivemos nossas vidas em espaços simbólicos e auto-referenciais que nos oferecem nada mais que generalidades do sucedâneo e do hiper-real, que nos proporcionam apenas a reprodução e nunca o original e, ao fazê-lo, negam-nos 94

nossa subjetividade e, de fato, nossa capacidade de agir significativamente. Nessa visão, somos desafiados com nosso fracasso coletivo a distinguir a realidade da fantasia e a responder pelo empobrecimento, embora forçado, de nossas capacidades imaginativas. Nessa visão, a mídia se torna a medida de todas as coisas. (SILVERSTONE, 2005. p. 26)

Afora a análise quanto ao senso comum, importante acrescentar, também, que essas novas tecnologias nas quais estamos inseridos, mudaram os padrões de vida, reestruturaram as relações de emprego, as formas de trabalho e o lazer. Áreas foram substituídas, outras foram criadas e as pessoas passaram a ter acesso a novas formas de comunicação e informação. Todavia essas facilidades podem gerar efeitos divergentes. Se por um lado oportunizam maior diversidade de escolhas, por outro geram novas formas de vigilância e controle quer através de equipamentos que acompanham o dia a dia no trabalho, quer por técnicas sutis de controle e manipulação da informação. Os estudos de Kellner (2001, p. 27) acerca da temática relatam que [...] na maioria dos países capitalistas, a mídia veicula uma forma comercial de cultura, produzida por lucro e divulgada à maneira de mercadoria. Em primeiro lugar, a produção com vistas ao lucro significa que os executivos da indústria cultural tentam produzir coisas que sejam populares, que vendam, ou que – como ocorre com o rádio e a televisão - atraiam a audiência das massas. Em muitos casos, isso significa produzir um mínimo denominador comum que não ofenda as massas e atraia um máximo de compradores. Mais precisamente, a necessidade de vender significa que as produções da indústria cultural devem ser eco da vivência social, atrair grande público e, portanto, oferecer produtos atraentes que talvez choquem, transgridam convenções e contenham crítica social [...]. Seria o caso, por exemplo, de refletirmos sobre os inúmeros programas televisivos pautados nos quadros policiais e de registros de violência que tanto atraem a atenção dos telespectadores e os efeitos de sentido decorrentes dessas discursividades, independente de estas incluírem ou não celebridades. Quando se veiculam as informações, é preciso avaliar que além de estas representarem um viés de interesse de um determinado grupo ou segmento, elas também concorrem com outros grupos de pensamentos diferentes cada um produzindo os seus jogos de verdade. São o que Foucault (2004, p.282) define como um conjunto de regras de produção da verdade, [...] ―um conjunto de procedimentos que conduzem a um certo resultado, que pode ser considerado, em função de seus princípios e das suas regras de procedimento‖, válido ou não, ganho ou perda. Isso se torna perceptível quando, diante de um lugar de enfrentamento social ou de uma formação discursiva, cada lado defende seu ponto de vista. 95

Kellner (2001, p.27) também destaca as sensíveis mudanças em torno da mídia atual principalmente no tocante à cultura por ela veiculada impulsionada pelas novas formas visuais e verbais e destaca:

A cultura veiculada pela mídia transformou-se numa força dominante de socialização: suas imagens e celebridades substituem a família, a escola e a igreja como árbitros de gosto, valor e pensamento, produzindo novos modelos de identificação e imagens vibrantes de estilo, moda e comportamento.

Nesse sentido, não é difícil nos depararmos com uma invasão de imagens, sons, notícias e informações que, dada à velocidade com que circulam, chegam a desconstruir a noção de tempo. Associado a isso, a cultura midiática tem gerado uma nova categoria de profissionais aqui denominadas como influenciadores digitais cujas discursividades produzem efeitos de sentido os mais diversos. Vistos hoje sob o prisma de celebridades no mundo digital, tais influenciadores utilizam seus jogos de verdade como estratégias capazes de produzir novas formas de pensar, vestir, comportar-se, enfim. Acerca disso, Foucault (2014) já refletia que os meios de comunicação participam de forma significativa das práticas que ensejam uma política de verdade de maneira tal que sua influência pode produzir ações ancoradas em um regime específico e em um lugar determinado, lugar esse, ocupado de forma provisória. Esse pensamento é corroborado por Fisher (2001, p.12) quando assevera [...] a mídia, ao mesmo tempo em que é um lugar de onde várias instituições e sujeitos falam – como veículo de divulgação e circulação dos discursos considerados ―verdadeiros‖ em nossa sociedade –, também se impõe como criadora de um discurso próprio. Porém, pode-se dizer que, nela, talvez mais do que em outros campos, a marca da heterogeneidade, além de ser bastante acentuada, é quase definidora da formação discursiva em que se insere. Poderíamos dizer que hoje praticamente todos os discursos sofrem uma mediação ou um reprocessamento através dos meios de comunicação.

E acrescenta ainda que a necessidade de ser notícia está presente em todas as áreas – médico, religioso – e de forma mais incisiva naqueles que vivem da mídia que nesse caso, em especial, são os as celebridades idosas. Ainda segundo Fischer (2001), ―está em jogo, nessa pluridiscursividade do social, luta pela imposição de sentido, a luta entre vários discursos, na conquista de novos sujeitos‖. Fischer (2001, p. 214) destaca também que,

[...] se cada discurso é remetido por ele mesmo a tantos outros, os discursos incorporados pela mídia, a partir de outros campos – mormente os da medicina, da pedagogia, da psicologia, da psicanálise –, também eles, ao entrarem na cena midiática, ao tomarem forma dentro desse campo específico da comunicação social, sofrem um tratamento que os retira de seu habitat e que, ao mesmo tempo, reforça a 96

autoridade própria de cada um, pela importância que têm numa determinada formação social. Finalmente, caberia ainda dizer que o próprio recorte feito pelo pesquisador é também um "fato de discurso" e, como tal, introduz mais um dado que amplia e dinamiza o que por definição é já heterogêneo.

Isso nos impele a refletir que os discursos das aqui denominadas celebridades idosos e idosas proferidos nos mais diversos sites devem ser considerados a partir do momento ou do contexto de sua enunciação uma vez que o tratamento dado não traduz um único, pronto e acabado na vida daquele que o proferiu. Entendendo que as instituições não produzem significados, e sim os oferecem, conforme destaca Silverstone (2005, p.18), reconhece-se a partir de então que a mídia não detém a supremacia do poder. Para o autor, a mídia é feita pelos indivíduos ou grupos sociais. Todavia na mesma proporção em que são produtores, também são produtos. Nessa perspectiva, Fischer (2002, p. 159), em um de seus estudos sobre a mídia relata que:

[...]convivem, na TV, distintos tratamentos do ―outro‖: ora, por exemplo, a mulher negra é incluída, por ser reconhecida como alvo do mercado (é assim que uma mulher negra de seus 30 anos pode aparecer num comercial do desodorante ―Dove‖), ora é fixada no seu papel de subalterna nos repetidos papéis das atrizes negras em telenovelas; ora a mulher de seus 40 ou 50 anos, de classe média, aparece na sua possível e necessária juventude e autonomia profissional, cobrindo-se de cremes perfumados da ―Natura‖, ora oferece-se como plenamente submissa servindo, ao marido que chega do trabalho, o verdadeiro ―amor‖ do tempero ―Sazon‖, devidamente acompanhada da empregada doméstica.

Isso significa que, o indivíduo assume posições diferentes em um programa, anúncio publicitário ou filme a depender do público para o qual é endereçado e quais as posições de sujeito esperadas. Entretanto, ao mesmo tempo em que o sujeito está submetido às relações de controle e dependência, ele também volta o olhar para si próprio, construindo as suas verdades que em nada se relacionam com a imagem que esse ou aquele programa fez transparecer. É o caso, portanto, das celebridades idosas que carregam consigo as referências, os sucessos e os fracassos de uma personagem, música ou notícia veiculada ao longo de uma carreira. Muitos são subjetivados em função desses papéis que, a depender de sua representatividade, podem levá-los do apogeu à ruína. Como se vê, a mídia ocupa um espaço importante nos modos de subjetivação de um indivíduo, em especial, daquele que se encontra inserido nesse meio.

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9. FIOS QUE SE TRANÇAM: ANÁLISE DISCURSIVA DOS TEXTOS MIDIÁTICOS

As luzes que descobriram as liberdades inventaram também as disciplinas (Michel Foucault)

O ambiente midiático representa um solo bastante fértil para análise discursiva. Atualmente, com o aumento do acesso às redes sociais, não só a obtenção de informações sobre diferentes assuntos está na palma de uma mão, como a interação com o que se veicula no mesmo ambiente acontece de modo imediato. Essas materialidades linguísticas que compõem os enunciados produzem sentidos que apontam a constituição de subjetividades. Conforme mencionado anteriormente, o instrumento base da pesquisa foram os enunciados presentes em sites de fácil acesso à população, proferidos por sujeitos considerados celebridades e que se mantém em visibilidade no cenário nacional após os 60 anos de idade, etapa em que, cronologicamente são considerados idosos. O estudo considerou a amostra de 22 celebridades, distribuídas entre 18 atores/atrizes, 03 cantoras e 01 jornalista cujos discursos corroboravam para a constituição de suas subjetividades. As discursividades presentes nas falas das entrevistas concedidas ou nos artigos de opinião do ambiente midiático foram categorizadas a partir de enunciados cujos efeitos de sentido se originaram de práticas discursivas que perpassavam revelações de técnicas voltadas para o cuidado de si. Observou-se, para tanto, a presença de materialidades linguísticas que apontavam para determinadas temáticas o que contribuiu para a categorização que ora se apresenta. Elementos linguísticos relacionados à corporeidade (exercícios físicos, estética, beleza, cuidados com a pele, intervenções plásticas) atravessavam vários discursos, embora produzindo efeitos de sentido diferentes a depender da percepção que se tem acerca da velhice e do que esse corpo representa no cenário atual. Com isso, as questões da corporeidade podem apontar para uma constituição de subjetividades voltadas para a própria liberdade e autoafirmação do idoso ou para a finitude do ser. Além disso, em função de o corpus envolver celebridades cuja história laboral foi construída mediante exposição nos mais diferentes espaços, os elementos linguísticos relativos à visibilidade são uma constante, quer como referência de seu potencial artístico, quer como justificativa para permanência no cenário midiático. Dessa forma, diante da materialidade discursiva posta e, consciente da dificuldade que é enquadrar um determinado discurso em uma categoria, dadas as nuances que circundam 98 o processo de análise, optei, após leitura do corpus, por agrupar as discursividades em 03 categorias analíticas: 1- Percepção e concepções acerca da velhice; 2- Cenário atual traçado para o sujeito idoso; 3- Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso. Importante reiterar a dificuldade de categorização em função de que muitos discursos atravessam mais de uma categoria. Todavia para fins didáticos, mantive a divisão supracitada. Após categorização inicial, os discursos foram agrupados em subgrupos conforme as formações discursivas. Nessa linha, as categorias ficaram assim organizadas:  Categoria 01- Percepção e concepções acerca da velhice – subdivide-se em: 1.1- Rejeição, liberdade, resistência e incapacidade do idoso

 Categoria 02 - Cenário atual traçado para o sujeito idoso – subdivide-se em: 2.1-Finitude do sujeito; 2.2- Corpo e refugo; 2.3 - Solidão

 Categoria 03 - Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso – subdivide-se em: 3.1 – O corpo e autoafirmação no cuidado de si; 3.2- Sexualidade; 3.3 - Mobilidade social

9.1 CATEGORIAS DE ANÁLISE:

9.1.1 Percepção e concepções acerca da velhice

9.1.1.1– Rejeição, liberdade, resistência e incapacidade do idoso

O discurso para Foucault enquanto objeto de estudo, sempre foi algo que lhe instigou e provocou inquietações. Contudo, não se trata de estudar o discurso com um viés de descortinar algo que esteja implícito como se procurássemos algo escondido em meio ao que fora dito. Conforme menciona Fischer (2001, p. 198) em seus estudos a partir de Foucault:

[...] nada há por trás das cortinas, nem sob o chão que pisamos. Há enunciados e relações, que o próprio discurso põe em funcionamento. Analisar o discurso seria dar conta exatamente disso: de relações históricas, de práticas muito concretas, que estão "vivas" nos discursos. Por exemplo: analisar textos oficiais sobre educação infantil, nessa perspectiva, significará antes de tudo tentar escapar da fácil interpretação daquilo que estaria "por trás" dos documentos, procurando explorar ao máximo os materiais, na medida em que eles são uma produção histórica, política; 99

na medida em que as palavras são também construções; na medida em que a linguagem também é constitutiva de práticas.

Dessa forma, quando opto por analisar o discurso veiculado pela mídia e proferido por celebridades, não estou à procura da verdade intocada, mas de reconhecer a representatividade que tais discursos exercem em um determinado percurso da vida dessa mesma celebridade e que, naquele momento, representa a sua verdade. Tomando como parâmetro a categoria de análise que trata da Percepção e concepções acerca da velhice que aqui inclui a rejeição, liberdade, resistência e incapacidade do idoso, elenquei alguns enunciados que podem ensejar efeitos de sentido relacionados à categoria supracitada. Em geral, a literatura médica voltada ao idoso relata que os problemas decorrentes da falta de autonomia e de independência são atribuídos à incapacidade, principalmente funcional que acaba por interferir na realização de atividades diárias. A depender do grau de (in)capacidade, o idoso pode se constituir como alguém livre, resistente às adversidades, rejeitado ou simplesmente incapaz. Entretanto, não se pode negar as relações de poder que atravessam tais discursos. A seguir, algumas discursividades da atriz Ângela Vieira:

―Lamento por ainda termos essa postura em relação às pessoas mais velhas [de desvalorização]. Não levanto bandeira, mas sigo minha vida tentando me manter ativa, atenta e rejeitando qualquer tipo de preconceito. O Brasil ainda é um país muito preconceituoso‖. (Ângela Vieira, p. 159) Fonte: https://noticiasdatv.uol.com.br

O discurso de Ângela Vieira enfatiza sentidos que traduzem a desvalorização sofrida pelo idoso e que, provavelmente leva a atriz a se ―manter ativa, atenta e rejeitando qualquer tipo de preconceito‖ como forma de resistência a essa verdade disseminada de que o idoso é aquela pessoa cansada, incapaz e improdutiva. Dessa forma, o cuidado de si acaba assumindo um papel de resistência frente às constantes normatizações delineadas pela sociedade fazendo com que esse sujeito se reafirme a partir da posição assumida. Isso se reflete no que menciona Beauvoir (1990, p.8):

A velhice aparece como uma espécie de segredo vergonhoso, do qual é indecente falar (...). Com relação às pessoas idosas, essa sociedade, não é apenas culpada e criminosa. Abrigada por trás de mitos da expansão e da abundância trata os velhos com párias.

Em geral, os discursos proferidos por alguns sites trazem efeitos de sentido que tentam macular a imagem do sujeito idoso levando a uma subjetividade baseada nas suas limitações e fragilidades. Percebe-se na fala da atriz que o fato de se manter ativa surge como um elemento de 100 resistência a tais forças e, de certa forma, como uma rejeição ao fato de ser idoso uma vez que a mesma se refere àquele em terceira pessoa, não se incluindo no grupo. Interessante ressaltar que a própria chamada da matéria traz como enunciado ―Está com tudo - Coroa empoderada em Bom Sucesso‖, numa referência à personagem protagonizada por Ângela Vieira. Se considerarmos que ―coroa‖ é um termo comumente relacionado àquele (a) que já apresenta traços biológicos do processo de envelhecimento, mas que não se insere na fase idosa, reconhecemos então, que a matéria produz efeitos de sentido que não consideram a atriz como idosa, apesar de seus atuais 68 anos. Ao mesmo tempo, a entrevista é conduzida pela relação da personagem enquanto idosa. No caso específico do contexto de sua entrevista com a atriz, as práticas discursivas do jornalista frente à atriz apontam para a produção de sentido de que Ângela representa a terceira idade em um país considerado preconceituoso com essa população tentando construir um discurso que de certa forma não é ratificado pela atriz. Trata-se de uma possível tentativa de subjetivação nos moldes tradicionais da mídia que enquadra o sujeito após os 60 anos nas condições determinadas pelos aspectos biológicos, amparada pelo biopoder. Assim, as discursividades apresentadas na matéria apontam para uma construção de um corpo que reflete um cuidado estético. Isso fica evidenciado quando o enunciado enaltece uma fase anterior à fase idosa, apesar da produção discursiva apresentada posteriormente ensejar a desvalorização do idoso. Ângela Vieira seria, então, uma idosa cujos cuidados contribuíram para sua manutenção em uma fase que antecede à idosa. Todavia as relações de poder presentes a colocam no mesmo discurso biológico da idade, quando a referencia como coroa empoderada, mas direciona a entrevista para uma pessoa realmente acima de 60 anos. Nesse contexto, Deleuze (1991, p.112) destaca:

Se é verdade que o poder investe cada vez mais nossa vida cotidiana, nossa interioridade e individualidade, se ele se faz individualizante, se é verdade que o próprio saber é cada vez mais individualizado, formando hermenêuticas e codificações do sujeito desejante, o que sobra para a nossa subjetividade? Nunca 'sobra' nada para o sujeito, pois, a cada vez, ele está por se fazer, como um foco de resistência, segundo a orientação das dobras que subjetivam o saber e recurvam o poder (Deleuze, 1991, p. 112-113).

Referendando o pensamento de Foucault, Deleuze (1991) enfatiza a tendência que temos em querer descortinar verdades, adentrar na privacidade dos indivíduos e construir um saber capaz de dominar os sujeitos, seus corpos e suas almas, o que, no discurso midiático relacionado à atriz produz um efeito de sentido voltado ao controle dos corpos. Ao contrário de Ângela Vieira cujas discursividades norteadas pela mídia faziam uma correlação com sua personagem empoderada e criativa de sua última novela, a entrevista com Betty Faria demonstra que sua personagem tentava produzir um efeito de sentido que ensejava 101 liberdade e independência o que na verdade se contrapunha ao vivenciado pela intérprete. Seu discurso, ao contrário da personagem, aponta efeitos de sentido que em nada romantizam o processo de envelhecimento, mas denota, mesmo em tom de humor, o sofrimento enfrentado no processo de gravação devido a dores articulares. Vejamos:

Para a atriz, que no ano passado teve de operar os dois joelhos, envelhecer não é tão agradável

quanto sua personagem fará parecer. "É um saco, melhor idade é o cacete!", diz às gargalhadas.... (Betty Faria, p. 160) Betty sofreu muito com dores nos joelhos. Durante o trabalho em (2014) tomava uma injeção a cada 15 dias. "Faço fisioterapia para fortalecer as pernas, mas não posso dançar nem muito menos usar salto alto. E eu gosto desses saltos altos de ―cachorra‖, como eu gosto... – (Betty Faria, p. 160) Fonte: http://noticiasdatv.uol.com.br

Dona de um histórico relacionado à beleza e sexualidade, a atriz se utiliza de um cuidado de si voltado à própria saúde como requisito para se manter na ativa enquanto profissional. Para tanto, os cuidados voltados à estética que tanto a identificaram passam a assumir um plano secundário, fazendo sobrepor àqueles a sobrevivência e permanência no cenário midiático. Seria uma resposta ou uma defesa à possibilidade de inclusão no que Bauman (2015, p. 12) denominou de ―refugo humano‖:

A produção de ―refugo humano‖, ou mais propriamente, de seres humanos refugados (os ―excessivos‖ e ―redundantes‖, ou seja, os que não puderam ou não quiseram ser reconhecidos ou obter permissão para ficar), é um produto inevitável da modernização. E um acompanhante inseparável da modernidade.

A modernidade, em sua liquidez expressa por Bauman (2001, p.8), leva o indivíduo idoso a se subjetivar a partir do que lhe está posto. Entendendo que a celebridade idosa tem necessidade de sobrevivência como qualquer outro profissional, esta se utiliza dos mecanismos que estão ao seu alcance para que não se enquadrem na condição de refugo humano, mesmo que tentem ultrapassar o limiar da dor. Os cuidados com o corpo vão além da beleza – representam a própria manutenção da capacidade física da celebridade, não devendo, portanto, ser considerada uma prática egoísta. Os ―excessivos‖ e ―redundantes‖ que, em geral, assumem essa posição por serem substituídos pelos mais novos – considerados únicos e essenciais para determinadas posições na mídia, travam uma batalha diária para não serem fadados ao ostracismo. Quando o foco é a demonstração de sua capacidade física para o trabalho, a prioridade passa a ser, portanto, a manutenção dos padrões de saúde e não mais a possibilidade de simplesmente utilizar um salto alto. O controle sobre o corpo se configura de forma marcante exigindo da atriz os cuidados com os aspectos básicos de saúde. A beleza corporal não é mais primazia nesse momento. 102

Isso fica evidente nas pesquisas de Sampaio (2011, p.224) ao estudar a liberdade a partir de Foucault, quando afirma:

Essa atitude, ocupar-se "de si", foi aos poucos se tornando um comportamento que despertava desconfiança aos olhos de determinadas práticas morais, como se tivesse defeitos ou fosse uma postura egoísta do indivíduo. Mas o cuidado de si, ainda segundo Foucault, longe de ser uma atitude egoísta, posiciona- se como um comportamento eticamente primeiro, diante do fato que a relação consigo é ontologicamente primeira. Além disso, no mundo contemporâneo, o cuidado de si poderia constituir-se como uma forma de resistência diante das frequentes práticas subjetivantes modernas.

Dessa forma, quando as produções discursivas trazidas pela mídia tentam atribuir um sentido voltado à decreptude e construir subjetividades que insiram a atriz fora de suas capacidades laborativas, a mesma reage fazendo uso dos recursos médicos como estratégias do cuidado de si. Nesse caso, a subjetividade plástica fica evidente uma vez que a cada discursividade com efeito de sentido negativo e reducionista de sua capacidade laborativa, a atriz faz uso de técnicas que se contraponham a isso, construindo uma rede de proteção e resistência às limitações corporais. Ao mesmo tempo em que aponta suas fragilidades corporais no âmbito biológico, Betty Faria ratifica, discursivamente, sua resistência à condição de refugo humano quando contraria os discursos condenatórios que a definiram como ―ousada‖ pelo fato de ir de biquíni à praia em meio aos seus 73 anos à época. Em função disso, afirmou:

―Pude viver momentos de beleza, não tenho mais, mas não é por isso que não vou poder ir à praia de biquíni. Não sou ressentida, posei três vezes para a Playboy e tenho o direito de ficar velha. Se não gosta, não publica, não olha, deleta, vai a m… Fiquei com raiva porque me arrasaram. É como se quisessem que eu estivesse com o porte da Tieta‖, disse a atriz para a série Depoimentos para a Posteridade, do Museu da Imagem e do Som (MIS), no Rio de Janeiro e reproduzido pelo jornal O Globo. (Betty Faria, p.161) Fonte: http://www.virgula.com.br

Interessante destacar que o discurso retrata um período de reapresentação da novela Água Viva, lançada em fevereiro de 1980, oportunidade em que a atriz estava com 39 anos e cuja personagem era ambiciosa e não media esforços para ascender socialmente. Some-se a esse encontro de fases, a eterna personagem Tieta protagonizada aos 42 anos, que notabilizou a atriz como símbolo sexual e cujo enredo incluía a sedução de seu próprio sobrinho seminarista interpretado por Cássio Gabus Mendes. Nesse ínterim surge Beth Faria, aos 73 anos ―ousando‖ fazer uso de um biquíni na praia. Em meio às formações discursivas que buscam associar a imagem da atriz às personagens por ela protagonizadas, percebe-se que os efeitos de sentido são gerados em face 103 da necessidade de preservação da imagem da atriz ainda jovem, ostentando um corpo sedutor e que só dessa maneira lhe possibilitaria usar tal vestuário. ―Fiquei com raiva porque me arrasaram‖ expressa bem como a atriz se subjetiva nesse lapso temporal onde as exigências no tocante à estética corporal em relação ao artista têm um peso diferenciado para as demais categorias profissionais. Aqui, a atriz aponta para uma construção de subjetividade plástica que enaltece todo o profissionalismo traçado por ela ao longo dos anos e que devem sobrepor às questões estéticas. Atingiu o apogeu da beleza ao ponto de ser capa da Revista Playboy por três vezes, mas essa não deve ser a referência para ser lembrada e sim, sua trajetória artística. Em um rompante de resistência, o site O Globo acrescenta:

[...] apesar de todo o policiamento que fizeram, ela continua indo à praia de biquíni, quase como um ato de resistência. (Betty Faria, p.161) Fonte: http://www.virgula.com.br

Refletindo sob essa ótica, Fischer (1999, p. 40) questiona:

Estaríamos vivendo um momento semelhante àquele que Foucault investigou - da Antigüidade Clássica -, em que se tomaram tão presentes as "técnicas de si", essa reflexão sobre os modos de existir e regrar a própria conduta, segundo determinados fins que o homem fixa para si mesmo? Ou estaríamos mais próximos da apropriação, feita pelo Cristianismo, dessas mesmas técnicas de si? Ou ainda: estaríamos aperfeiçoando aquilo que o homem dos séculos XVII e XVIII tão bem conseguiu, ao produzir um farto material, tão bem analisado por Foucault, no qual se registrou à exaustão a intimidade de vidas "infames, obscuras e desafortunadas"?

Percebe-se que a mídia, em seus diversos meios de comunicação, exige uma constante preocupação da atriz consigo mesma e uma justificativa para todos os seus atos, principalmente aqueles que fujam dos padrões e rótulos impostos, que desvirtuem da verdade estabelecida. Nesse jogo de verdades, a atriz chegou a questionar ao jornalista se ela deveria ir de burca à praia num sinal de resistência à ideia de que seu corpo não poderia estar mais em evidência devendo ser ocultado em sua quase totalidade. Contrapondo-se a essas forças que tentam delimitar os espaços a serem ocupados pelo idoso em face de não mais ostentar os padrões de beleza, a atriz rompe com tais paradigmas munindo-se de um comportamento de resistência. Nesse sentido, a mídia evidencia as relações de poder que agem sobre o corpo idoso utilizando-se do ―policiamento‖ como mecanismo de controle. Todavia tal controle é enfrentado com a continuidade da atriz em ir à praia, de biquíni. Em uma outra formação discursiva, a atriz se rende aos cabelos brancos como registro de passagem do tempo quando afirma: 104

"O que é bom [na terceira idade] é só essa liberdade de não precisar virar uma velha loira, ficar assim natural, como estou. Meu cabelo está virgem, é a cor que tenho agora", diverte-se....( Betty Faria, p.161) Fonte: http://noticiasdatv.uol.com.br

As discursividades do enunciado produzem sentidos que expressam a liberdade que os cabelos grisalhos podem representar. Conforme expressa Goldenberg (2006, p.57), a brasileira não fica velha, fica loira. A possibilidade de não mais alterar a cor do cabelo, de não mais ser ―escrava‖ dos salões para manutenção de um padrão que a sua profissão exigia gera uma sensação de libertação e um caminho para uma provável necessidade de aceitação dos reflexos da idade. Todavia essa liberdade é limitada apenas à questão capilar, uma vez que a atriz se utiliza de expressões linguísticas que denotam ser apenas isso a referência positiva atribuída à terceira idade. Esse discurso é corroborado pela atriz Fernanda Montenegro quando menciona:

―Deixar o cabelo branco é repousante, muito confortável. Pintar toda semana é um horror porque uma hora a tinta deixa de pegar na raiz. Agora que estou natural, é como se eu fosse uma criança de novo. Viu como tem vantagem a velhice?‖, diverte-se. (Fernanda Montenegro, p.171) Fonte: https://www.osul.com.br

O discurso produz sentidos que apontam para uma confissão do passar dos tempos a partir das lembranças da jovialidade de outrora. Contudo o fato de assumir os cabelos grisalhos pode produzir esquivas, um jogo na produção de verdades, conforme destaca Fischer (1999, p.55).

[...] a compulsão aprendida de tudo falar, de tudo confessar, não significa univocamente que o dito libera, o falado em si produza verdade; é como se estivéssemos de fato num jogo de verdade e falsidade, e a confissão - com todas as técnicas de exposição ilimitada de si mesmo - para permanecer como prática desejável e permanente, também produzisse "desconhecimentos, subterfúgios, esquivas", como escreveu Foucault em "Scientia sexualis", de A vontade de saber. O jogo da produção da verdade, em especial a verdade sobre sexo, inclui, portanto também o não-saber.

Dessa forma, a sensação de liberdade expressa pela aceitação da cor dos cabelos pode corresponder a um jogo de verdades em que a confissão acaba sendo uma estratégia desse jogo, o que pode ser corroborado pelo fato de o discurso considerar ―só‖ essa condição como 105 algo que represente positividade na fase idosa ou como a única vantagem da velhice, acima mencionada por Fernanda Montenegro. Assim, as produções discursivas apontam para um cuidado do corpo no sentido de proteção e até de retomada de algo peculiar à fase jovem – a naturalidade dos cabelos, mesmo que na condição de grisalhos. Com isso, a visibilidade agora se dá em um padrão divergente daqueles anteriormente encontrados quando da execução de alguma personagem. Contudo, os discursos não deixam claro ser isso uma opção, uma escolha assumida ou um intervalo entre um trabalho e outro. A depender do momento em que tal entrevista aconteceu, a discursividade pode ensejar uma liberdade momentânea, um pequeno intervalo onde as atrizes podem assumir alguns sinais do processo de envelhecimento. Sob outro prisma, pode produzir sentidos que apontam para o cuidado com o corpo como manutenção de visibilidade e condição para assumir determinados papéis. É o caso, portanto, quando as características da personagem exigem determinada cor de cabelo, determinado peso e até o uso de certas variações linguísticas. Assim, as subjetividades das atrizes são construídas seguindo uma imposição do mundo televisivo que direciona acerca dos cuidados necessários a cada momento específico sob pena de exclusão do cenário midiático. Ainda sob a égide dos discursos de Beth Faria, a mesma se posicionou, discursivamente, frente à Regina Duarte, atriz contemporânea de mesmos palcos, acerca de sua saída do cargo que ocupava enquanto Secretária de Cultura do Governo Federal. Em meio às polêmicas e controvérsias que marcaram a passagem da atriz pelo cargo, Beth Faria relata:

―O ego da atriz que foi famosa e bonita é muito mais duro. É mole ficar velha se você foi a coadjuvante e a baranga a vida inteira. Primeiro porque, mais velha, você desperta menos tesão. Tem sempre alguém que gosta um pouco, mas não era como antes. Além disso, a pessoa tem que saber que o protagonismo é dos mais jovens, os papéis não terão o mesmo destaque. A atriz vai sofrer com a idade se não estiver trabalhando a cabeça. Trabalhei muito a minha.‖ (Betty Faria, p. 162) Fonte: https://extra.globo.com

Os elementos linguísticos aqui presentes apontam para as dificuldades em aceitação das mudanças corporais geradas ao longo do tempo e que se refletem no meio artístico e fora dele mesmo que a trajetória tenha sido construída sob o escopo do talento e da beleza. ―É mole ficar velha se você foi a coadjuvante e a baranga a vida inteira‖ retrata bem o peso que o processo de envelhecimento pode representar para aqueles que construíram suas vidas sob os holofotes. Para alguém que nunca teve os atributos da beleza e sempre viveu no anonimato ou em funções de pouca repercussão, torna-se mais fácil. E assim, associa a beleza às questões da 106 sexualidade e do protagonismo, sendo esse último, segundo ela, uma opção apenas para os jovens. As produções discursivas, nesse caso, apontam para a significativa importância que se dá ao corpo de uma atriz que foi referência de beleza e das dificuldades de esta se reconhecer sem a presença de tais atributos na atualidade. Todavia a atriz atribui a essa dificuldade de se reconhecer a velhice como um dos motivos do insucesso de sua colega de profissão, sem adentrar na capacidade para o cargo. As discursividades delineiam para a subjetividade de uma atriz que ainda se percebe disputada para os mais diferentes papéis e por esse motivo, não entende quando suas ações são alvo de críticas. Daí a dificuldade para sair de cena. A matéria veiculada, portanto, associa o insucesso da atriz à insistência em se manter em um cargo cujo protagonismo caberia a alguém mais jovem. Em função desse cenário, a atriz aponta para a necessidade do autoconhecimento e da reflexão como integrantes do cuidado de si ao enfatizar: ―A atriz vai sofrer com a idade se não estiver trabalhando a cabeça. Trabalhei muito a minha.‖ Isso corrobora para a constituição de subjetividades que não só as transforme como contribua para a construção de um novo modo de ser com vistas à autotransformação. O cenário da resistência é também habitado por nomes da música. A cantora Elza Soares, nos seus 90 anos de vida nos apresenta discursividades que produzem sentidos que parecem minimizar os efeitos das alterações biológicas. Em um dos enunciados relativos a esse processo, o site BBC Brasil destaca:

Elza recebe a BBC Brasil sentada com uma almofada firme nas costas, e permanece na mesma posição até irmos embora, reflexo dos problemas na coluna que a obrigam a fazer fisioterapia três vezes por semana e apresentar todos os shows também sentada. A cantora é avó e bisavó, com sete netos e quatro bisnetos. (Elza Soares, p. 168) Fonte: https://www.bbc.com/

No acontecimento discursivo acima estão presentes formulações discursivas que produzem sentidos que constituem subjetividades de um idoso desgastado, enquanto estrutura corporal ao ponto de permanecer em uma mesma posição durante toda uma entrevista. Essa ideia de incapacidade é corroborada pela periodicidade com que se submete a tratamentos fisioterápicos associada, todavia, a um movimento de resistência que a mantém nos palcos mesmo que sentada durante todo o show. Em contrapartida, o entrevistador destaca a condição da cantora enquanto bisavó numa possível alusão à sua atual condição física e de saúde, ou seja, a incapacidade biológica é inerente à condição de bisavó. Encontrar uma 107 senhora bisavó com problemas de coluna que a impedem de se movimentar adequadamente seria algo esperado para essa fase da vida. Esse discurso reverbera efeitos de sentido ainda mais redutor da capacidade laborativa da celebridade. Diferente do direcionamento discursivo dado à Beth Faria, enquanto idoso que prioriza o acompanhamento fisioterápico como estratégia de manutenção de condições básicas de saúde, no caso de Elza Soares o viés é de algo previsível para uma bisavó de quase 90 anos. Conforme Beauvoir (1990, p.17) as condições da velhice não podem ser generalizadas. Isso porque, como a própria autora nos diz, não podemos definir a velhice: ―ela assume uma multiplicidade de aspectos, irredutíveis uns aos outros‖. Esse discurso é ressaltado por Foucault (1999, p.14), quando assevera que ―é exatamente contra os efeitos de poder próprios de um discurso considerado científico que a genealogia deve travar o combate‖. Em geral, quando se está diante de formações discursivas relativas à pessoa idosa tenta-se enquadrá-las em categorias predefinidas advindas do campo científico como se cada uma delas pudesse se adequar a uma caixinha ordenada e tivesse sua legitimidade concedida pela ciência. Isso fica evidente quando alguns enunciados são validados apenas pelo viés do campo científico, desconsiderando a sua historicidade e universalizando como se fosse verdade única. Quando tais discursos se perpetuam, surgem colocações como a apresentada acerca de Elza Soares, naturalizando um elemento biológico apresentado. Para Foucault (1999, p.15):

A genealogia seria, pois, relativamente ao projeto de uma inserção dos saberes na hierarquia do poder próprio da ciência, uma espécie de empreendimento para dessujeitar os saberes históricos e torná-los livres, isto é, capazes de oposição e de luta contra a coerção de um discurso teórico unitário, formal e científico.

Ainda nesse sentido, Santos e Lago (2016, p.135) destacam que:

A problematização sobre a velhice no campo das ciências sociais e humanas imprescinde de um olhar que considera as formas pelas quais ela foi tratada durante a história e os discursos que a enunciaram como questão objetivável de controle e de gestão dos corpos e das populações. Se em determinados estratos históricos o envelhecimento foi considerado a fatalidade de um estágio biológico natural que representava o declínio das funções vitais, em outros contextos, mais contemporâneos, as fases avançadas da vida passam a ser reinvestidas de significados que positivam os corpos envelhecidos, produzindo sujeitos dotados de capacidade produtiva.

Essas linhas de subjetivação apresentadas como forma de resistência pela cantora Elza Soares enquadram-se nas técnicas de si mencionadas por Foucault (1984, p.15). Segundo o filósofo, tais técnicas compreenderiam: 108

[...] práticas refletidas e voluntárias através das quais os homens não somente fixam regras de conduta, como também procuram se transformar, modificar-se em seu ser singular e fazer de sua vida uma obra que seja portadora de certos valores estéticos e responda a certos critérios de estilo. (FOUCAULT, 1984, p. 15).

Não importa, portanto, se tais técnicas estão ligadas a elementos de saúde básica da cantora, mas a própria apresentação desta vista como padrão de fragilidade e incapacidade para a mídia pode representar uma transformação ou adaptação de estilo de vida com vistas a uma nova retomada artística. Isso se tornou evidente quando a cantora levou esse mesmo ambiente de casa (sentada) para os shows por ela apresentados. Diferente de Elza Soares que visivelmente demonstra a necessidade de cuidados com a saúde, dentro dos cuidados de si, a atriz Maitê Proença também apresenta, em seus enunciados:

―Não são as rugas e dores articulares que perturbam, mas o olhar do mundo que exige uma transformação repentina. Uma jovem bonita age com trejeitos e maneirismos que o mundo lhe impõe”, começou Maitê. (p. 176)

―Seduz sem se dar conta de que a beleza e juventude são o alicerce de seu encantamento. Nada daquilo, no entanto, vai servir na velhice. Uma senhora com cacoetes da juventude é apenas uma velha vulgar", concluiu a artista. (Maitê, p. 175) Fonte: https://rd1.com.br

Para a atriz, muito mais incômodo que as alterações biológicas que se configuram em diferentes sinais e sintomas, são os olhares de repreensão que mais geram desconforto. As relações de poder, aqui discursivamente construídas pela mídia, contribuem para a sensação de fracasso do idoso por não conseguir se manter com o mesmo perfil de outrora. O processo de subjetivação, contudo, é algo contínuo, daí a atriz apontar que alguns elementos configuradores de sua jovialidade podem, na atual condição, produzir outro efeito de sentido, passando do ideal para o vulgar. Seguindo a perspectiva foucaultiana, Castiel e Dardet (2007, p.125) expõem:

Para viver muito tempo, é imprescindível a vigilância extensiva e normalizadora que acaba impedindo a possibilidade de transcendência. Viver sob a égide biopolítica é perpetuar a vida, através do sacrifício existencial do ser vivente, reduzindo-o ao âmbito biológico. Na saúde persecutória, vive-se sob o primado paradoxal da sentença e da condenação culposa, sem delito, como estratégia de afastamento dos riscos à sobrevida, que, por ser mantida sob esta forma, passa a ser achatada aos limites somáticos ao preço da negação do mais humano que há na vida. 109

Assim, muitos discursos midiáticos produzem efeitos de sentido que transferem ao indivíduo a total responsabilidade por um processo de envelhecimento sem muitas alterações ou efeitos negativos. Aqueles que não se encaixam nessa configuração são considerados culpados uma vez que são os únicos responsáveis por esse cuidado de si ou pela falta dele. Nesse sentido, Foucault (2004a, p.143) acrescenta que o poder disciplinar, ao mesmo tempo que adestra, também se apropria. Não tem intenção de anular as forças, mas de utilizá-las de forma integral. É meticuloso – analisa todas as particularidades necessárias e entende a disciplina como uma ―fábrica‖ de indivíduos. O olhar que exige uma transformação repentina mencionado por Maitê Proença é o mesmo encontrado em muitos filhos que utilizam de suas relações de poder para subjetivar as mães dentro de um controle de seus próprios corpos. Lembro-me bem do relato de uma estudante acerca do comportamento de uma filha que exigia de sua mãe (com 90 anos) que mantivesse sua postura ereta, andasse de forma rápida e segura e se alimentasse da mesma maneira que todos da casa, com alimentos de alto valor calórico, afinal de contas, ela não era ―velha‖. São formas de controle que tentam negar a constituição do próprio sujeito. Esse poder, inicialmente individualizante quando determina que você é o protagonista de seus atos e a você cabe seus próprios resultados, configura-se posteriormente em um biopoder quando o controle incide por toda a população. Dessa forma, as produções discursivas expõem o controle ao qual o corpo da celebridade é submetido em seus diferentes estágios. Quando a beleza impera, no auge da juventude, todos os gestos são considerados como algo simbólico e positivo para a idade. Em contrapartida, quando esses mesmos gestos perduram até a fase idosa, tornam-se cacoetes e demonstram vulgaridade. O cuidado de si passa a ter como foco a resistência a esses hábitos que desqualificam a celebridade para a ocupação de um espaço de visibilidade. Aqui, as subjetividades plásticas estão ramificadas não apenas na resistência aos efeitos biológicos do envelhecimento, mas aos olhares que impelem um sentido condenatório às alterações advindas da idade. Seguindo esse percurso discursivo das celebridades, encontro a seguinte colocação da atriz Neuza Borges:

―Quero voltar a trabalhar. Você sabe que pobre e preto não pode ficar doente muito tempo. Imagine ficar desempregado dois anos? São 65 anos de carreira, 48 deles na Globo. Não dá para o povo esquecer de mim. Não tenho sequela, estou numa boa. Estou entre os 14 milhões de desempregados no Brasil.‖ (Neuza Borges, p. 177) Fonte: https://f5.folha.uol.com.br

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A discursividade expressa pela atriz é decorrente, dentre outros elementos, de um AVC – Acidente Vascular Cerebral que a acometeu em janeiro de 2012. Na ocasião, por se tratar de um AVC hemorrágico (onde há o vazamento de sangue no espaço entre o cérebro e o crânio), os casos em geral são mais graves, podendo deixar sequelas ou até serem letais. Durante a entrevista, contudo, a atriz destaca com veemência que não apresenta nenhuma sequela que a impeça de voltar a trabalhar. Além disso, é importante mencionar que a entrevista foi concedida em janeiro de 2019, sete anos após o problema de saúde, ou seja, já havia decorrido um tempo significativo para melhoria de seu quadro geral e redução de possíveis lesões. Todavia a atriz permanecia sem oportunidades de trabalho há dois anos. Sobre esse parâmetro, Foucault (1988, p.131) associa a subjetividade ao desenvolvimento de um poder sobre a vida. O biopoder surge desenvolvendo estratégias também de regulação dos corpos e revestido de um aparato de proteção à população. Segundo ele: As disciplinas do corpo e as regulações da população constituem os dois pólos em torno dos quais se desenvolveu a organização do poder sobre a vida. A instalação durante a época clássica, desta grande tecnologia de duas faces - anatômica e biológica, individualizante e, especificamente, voltada para os desempenhos do corpo e encarando os processos da vida - caracteriza um poder cuja função mais elevada já não é mais matar, mas investir sobre a vida de cima a baixo (FOUCAULT, 1988, p. 131).

As discursividades apresentadas por Neuza Borges traduzem sentidos reveladores de que a atriz envidou todos os esforços anátomo-biólogicos para o restabelecimento de sua capacidade laborativa e que seu corpo estava pronto para o retorno às atividades, fazendo questão de destacar a ausência de sequelas que é o principal fator limitante após um acidente vascular cerebral, segundo a literatura médica. Todo o controle delimitado pela medicina teria sido seguido motivo pelo qual não fazia sentido a falta de convite às novelas. No caso da atriz Neuza Borges, o cuidado de si voltado à questão básica que é a saúde não foi elemento suficiente para seu retorno ao cenário midiático. As discursividades apontam para o entendimento de que as possíveis limitações físicas eram os motivos de sua não empregabilidade. Todavia a não configuração de seu retorno pode ensejar um efeito de sentido de que seu corpo não mais atende às condições que a mídia exige, mesmo diante de subjetivações contrárias da atriz arraigadas ao seu profissionalismo ao longo de 65 anos de carreira. Essa construção de subjetividades, além de estar pautada no aspecto profissional e de saúde, traz também a questão étnico-racial como fator limitante uma vez que, historicamente, pobres e negros já são excluídos de outros cenários. 111

Nessa desconstrução de um discurso pautado na incapacidade física, a dificuldade de permanecer no cenário midiático é ainda maior quando se é pobre e preto. Essas discursividades produzem sentidos na narrativa da cantora Elza Soares, conforme expresso:

―Eu já vinha falando sobre isso há muito tempo. Eu falo de política desde que comecei a cantar. De ser mulher, de ser negra. De ser mulher negra.‖ (Elza Soares, p. 169) QuadroFonte: https://www.bbc.com 12 – Elza Soares

―A gente fala da negritude, tem que falar da cor de pele, que é uma coisa absurda, né, tem que estar toda hora gritando, "olha!", "olha!", como um pregão, sempre.‖ (Elza Soares, p. 169) Fonte: https://www.bbc.com

Os efeitos de sentido presentes nos enunciados de Neuza Borges e Elza Soares expressam tipos de subjetividades que ultrapassam os limites de incapacidades provenientes da idade. Somam-se a isso outros elementos limitadores que reduzem ainda mais a permanência ativa na profissão e que implicam numa ação de resistência. De acordo com Ventura (2012, p.239),

historicamente as várias formas de resistência articulam-se em três principais tipos de luta: i) contra as formas de dominação (étnica, social e religiosa); ii) contra as formas de exploração que separam os indivíduos daquilo que eles produzem; e iii) contra as formas de sujeição, ou seja, contra a submissão da subjetividade, sendo esta última a mais importante para ele na atualidade.Este último tipo de resistência se caracteriza como luta contra os dispositivos de poder-saber que confinam e fixam o sujeito à sua própria identidade, subjugando-o e tornando-o "sujeito a", ou seja, classificando e normalizando sua subjetividade. Não se sujeitar é resistir, é abrir-se para outros e novos modos de ser sujeito e de estar no mundo. "Talvez, o objetivo hoje em dia não seja descobrir quem somos, mas recusar o que somos (...). Temos que promover novas formas de subjetividade através da recusa deste tipo de individualidade que nos foi imposto há vários séculos".

Dessa forma, os discursos de Neuza Borges e de Elza Soares produzem efeitos de sentido de resistência, fazendo uso de jogos de verdade que tentam desconstruir o paradigma daqueles que subjugam sua capacidade por questões étnicas e sociais. Essa resistência fica evidente nas discursividades de Elza Soares quando retrata a necessidade de incluir na sua rotina de shows as questões relacionadas à negritude. Ao mesmo tempo, considera um absurdo ainda ser preciso tomar esse tipo de posicionamento nos dias atuais. Mais do que se contrapor à condição de refugo pela idade, as matérias veiculadas apontam para um efeito de sentido de que o negro, em pleno século XXI, ainda deve reafirmar suas potencialidades e a 112 importância de ser quem é. Os cenários dos shows acabam por se constituir em espaços adequados para essa resistência e autoafirmação.

Para Antônio Fagundes, ―o problema da velhice é a associação com a doença‖ Mas, até agora, tudo bem.‖ E haja bom humor.‖Acho que o problema da velhice é a associação com a doença. Mas não tenho ficado doente, não tenho tempo. Só estou com uma dor aqui nas costas, será o pulmão?‖emendou aos risos. (Antônio Fagundes, p. 188) Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

Citado como um galã pelo portal G1 aos 70 anos, o ator Antônio Fagundes também relaciona os problemas da velhice à doença, apesar de descartar a possibilidade de estar atravessando qualquer condição patológica. Contudo, destaca-se em seu enunciado a ausência de tempo para ficar doente, numa possível alusão à manutenção de sua rotina de trabalho. Para Bauman (2001,p.120), ―o cuidado com a saúde se transformou em uma guerra permanente contra a doença e a ideia de doença, antes circunscrita, se tornou confusa e nebulosa‖. Além disso, a possibilidade de se ter saúde está ligada ao fato de ―seguir normas‖. Nessa liquidez apresentada por Bauman que descreve o cenário atual como eivado de elementos fluidos e passageiros, o fato de se ter saúde representa o estar apto para enfrentar as constantes mudanças do mundo moderno. Nesse contexto, as discursividades que perpassam os dizeres do ator Antônio Fagundes demonstram uma certa vigilância às condições de funcionamento de seu corpo. Essa vigilância não deve se imprimir apenas a ele, mas a todos aqueles incluídos no ―problema da velhice‖. Conforme Foucault (2004b, p.77), o cuidado de si ―refere-se a uma forma de atividade, atividade vigilante, contínua, aplicada, regrada, etc.‖. A partir dos enunciados, ao mesmo tempo em que se mantém vigilante à saúde, o ator constrói subjetividades que, de certa forma, o excluem da velhice quando relata que não tem ficado doente. Assim, diante da ausência de doença, não há que inseri-lo na condição de idoso já que sua rotina de trabalho corrobora para comprovação de seu estado geral, somado ao profissionalismo de anos de trabalho. O voltar-se sobre si trata de um ato reflexivo sobre as próprias ações, um modo de subjetivação. Ainda à luz do cuidado de si, a atriz Laura Cardoso demonstra suas inquietações frente a alguns comportamentos adotados junto ao idoso. Vejamos:

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No programa Encontro da Fátima Bernardes, a atriz Laura Cardoso fez questão de dizer que não gosta quando as pessoas tentam tomar decisões por ela, só porque ela já envelheceu.

"Detesto. Não quero que ninguém tome decisão por mim. Se a pessoa não está bem de saúde, se precisa de alguém, é lógico que alguém vai tomar decisão por ela...", disse. "Agora, se ela está bem de cabeça, ela toma decisões." (Laura Cardoso, p. 173) Fonte:

As pessoas tratam o idoso como se ele fosse um robozinho. É um tal de ―senta aí‖, ―come isso‖, ―faz aquilo‖... Nunca fui vítima de grosserias, as pessoas se dirigem a mim com carinho e respeito. Mas não tem essa de ―melhor idade‖, não! De melhor, a essa altura do campeonato, só a experiência adquirida. Eu amo a juventude, a mocidade! Hoje, não tenho mais a força muscular e a pele bonita de anos atrás. É muito diferente! Acho que é o jeito com que você leva a vida que faz a idade ser melhor ou pior, seja na velhice ou na mocidade. (Laura Cardoso, p. 173) Fonte: https://www.brasilsenior.com.br

―Prioridade‖ tem sido um termo bastante associado ao indivíduo idoso. É comum nos depararmos com enunciados do tipo ―Atendimento Prioritário‖ em bancos, supermercados, consultas médicas, campanhas de vacinação, transportes públicos, dentre outros. A prioridade é uma condição de que algo deva ocorrer em primeiro lugar, ou seja, de que alguém é o primeiro em relação aos demais. Assim, em uma tramitação de processo em que seja parte interessada, no recebimento de um benefício, alguém deve ser atendido antes dos demais. No Estatuto do idoso, esse ―alguém‖ é o próprio idoso. Todavia apesar de ser um direito tipificado no Estatuto do Idoso, essa prioridade pode produzir efeitos de sentido que apontam para a incapacidade do idoso, atribuindo-lhe um sentido de que não consegue mais tomar suas próprias decisões. Dessa forma, o enunciado anterior apresenta discursividades que traduzem sentidos acerca da capacidade do idoso em tomar suas próprias decisões. Nesse jogo de verdades que circundam o processo de envelhecimento, o idoso é visto como alguém incapaz de cuidar de si mesmo com razão e raciocínio lógico comprometidos por um processo demencial. É essa divisão que se dá também no campo da longevidade, controlando o que representaria a linha tênue que divide a lucidez e demência que Foucault (2008, p.3) atribuiu à influência do biopoder, ou seja:

―[...] o conjunto dos mecanismos pelos quais aquilo que, na espécie humana, constitui suas características biológicas fundamentais vai poder entrar numa política, numa estratégia política, numa estratégia geral de poder‖

O discurso da atriz Laura Cardoso coaduna com esse poder disciplinador que busca controlar todos os passos da pessoa idosa determinando comportamentos tais como o local 114 para sentar, o horário de se alimentar e os nutrientes com os quais vai se alimentar. Acerca desse poder, Foucault (1999, p.293) já relatava:

Não é com a sociedade que lida essa nova tecnologia de poder; não é tampouco com o indivíduo corpo. É um novo corpo: o corpo múltiplo, corpo com inúmeras cabeças, se não infinito pelo menos necessariamente numerável. É a noção de “população‖. A biopolítica lida com a população, e a população como problema político, como problema ao mesmo tempo científico e político, como problema biológico, e como problema de poder, acho que aparece nesse momento.

A biopolítica surge como uma forma de governar não apenas o indivíduo mediante procedimentos disciplinares, mas a população. Para tanto, faz uso de técnicas de governamentalidade. De acordo com Veiga-Neto (2007, p.952), ―governamento designa todo conjunto de ações que objetivam conduzir deliberadamente a própria conduta ou a conduta dos outros‖. São procedimentos que vão além das instâncias de governo já que estão presentes em diferentes espaços. Quando se oferece ao idoso um local para sentar, independente de sua solicitação, o efeito de sentido provocado por esse gesto é de que a incapacidade funcional do idoso já é algo inerente a ele. O fato de se manter em pé em um ambiente já representaria um risco à sua saúde, dada a fragilidade osteomuscular associada à idade. Dessa forma, a vigilância é constante para que todos os passos sejam dados em função da manutenção de sua segurança. Para o Estado, esse excesso de proteção resultaria, por exemplo, em economia com internações hospitalares, deixando os leitos disponíveis para pessoas em idade produtiva. Para a família, representaria zelo e cuidado pela pessoa idosa. Em todos os casos, contudo, estaria presente o biopoder assegurando a disciplina e a regulamentação dos processos biológicos. As discursividades expostas apontam para a ideia de autogoverno. Ao relatar que ―está bem da cabeça e que pode tomar decisões sozinha‖, a atriz constrói subjetividades baseadas na autonomia e na independência necessárias à sua capacidade laborativa. Além disso, referenda sua resistência ao fato de delegar ao outro o controle de seus atos numa contraposição às produções discursivas que utilizam a fragilidade corporal com a incapacidade. O corpo, nesse caso, é percebido como instrumento de trabalho tendo como referência a lucidez e o raciocínio lógico para a devida tomada de decisão quando, por exemplo, da necessidade de decorar um texto. Dessa forma, diante do processo de envelhecimento, sua visibilidade se dá mediante o funcionamento das funções básicas do corpo e não mais por questões estéticas. Isso se configura num processo de resistência aos enunciados midiáticos que vinculam qualquer pessoa idosa à incapacidade de conduzir sua própria vida. 115

9.1.2 Cenário atual traçado para o sujeito idoso

Conforme já mencionado anteriormente, as categorias aqui traçadas não são estanques, não estatizam a vinculação de um discurso em uma única vertente, até porque a própria discursividade pode ensejar diferentes efeitos de sentido. Fazendo uso, inclusive, das ideias de Beauvoir (1990, p.109), observo o quanto é difícil construir um percurso para a velhice. Segundo a autora:

[...] é impossível escrever uma história da velhice. A história implica uma circularidade. A causa que produz um efeito é, por sua vez, modificada por este. Das mitologias, da literatura e da iconografia destaca-se uma certa imagem da velhice, variável de acordo com o tempo e os lugares. A imagem da velhice é incerta, confusa, contraditória.

Mesmo entendendo todas essas características multifacetadas do idoso, mas reconhecendo, em contrapartida, as diferentes formas de subjetivação que atravessamos ao longo da vida, considero importante analisar um pouco como o idoso se constitui no cenário atual. Dentre as inúmeras situações, elenquei, nesse item, a preocupação com a finitude, a associação de seu próprio corpo com a ideia de exclusão e refugo e a possível referência à solidão.

9.1.2.1-Finitude do sujeito

Diante das diversas incertezas que trazemos ao longo de nossa existência, uma delas foge da lista: a finitude do ser. Por mais que cuidemos do corpo e da alma, que sigamos todas as pesquisas que projetem um melhor ajuste da máquina humana, nada garantirá a manutenção desse corpo conforme nossa vontade. Somos finitos. Contudo, o efeito de sentido atribuído à finitude coaduna, em alguns casos, àqueles presentes em enunciados de Bauman (2007a, p.10) quando aponta que a liquidez humana nos faz sair de cena antes que o espetáculo acabe. Segundo o autor, A vida na sociedade líquido-moderna é uma versão perniciosa da dança das cadeiras, jogada para valer. O verdadeiro prêmio nessa competição é a garantia (temporária) de ser excluído das fileiras dos destruídos e evitar ser jogado no lixo. (BAUMAN, 2007a, p. 10). 116

Essa liquidez contribui para uma produção de sentidos de que a iminência da morte tende a afastar a celebridade idosa da possibilidade de continuar atuando, trabalhando, de receber convites para novos trabalhos. Mergulhados em um mundo em constante transformação, em que nada é duradouro, os artistas idosos (as) tendem a adotar uma postura adaptável até mesmo ao que envolve a finitude humana, Acerca das discursividades das celebridades relativas à finitude, destacam-se, por exemplo, as considerações de Elza Soares.

BBC Brasil - Você tem medo da morte, Elza? Elza Soares - Nunca conversei com ela não, entendeu? Deixo ela distante. Não tenho muita confiança com ela não. Deixa ela pra lá. (Elza Soares, p. 170) Fonte: https://www.bbc.com

Em entrevista concedida à BBC Brasil, dentre inúmeras questões suscitadas, uma delas foi em relação ao medo da morte. Prontamente a cantora se esquiva do tema produzindo um efeito de sentido de dissimulação numa possível tentativa de se proteger de algo que atormenta a todos e, em especial, os idosos. Nesse sentido, destaca Silva (2013a): Os mecanismos de defesa apresentados pela pessoa idosa possibilitam que se ignore a morte e se dificulte a percepção da finitude do ser no mundo. O idoso por sua vez, admite a morte como um fato, porém apresenta grande dificuldade em assumi-la como um modo de ser da natureza humana. Adotar uma postura de autodefesa diante da morte garante ao ser o simples ato de pensar e agir, dissimulando seu verdadeiro significado.

Esse pensamento é corroborado por Santos (2000,p.158) quando menciona a dificuldade que o indivíduo tem de se perceber em processo de envelhecimento, atribuindo essa condição ao outro: O verdadeiro velho é o outro – neste sentido, os sujeitos enfatizam o estágio final da velhice como fase de dependência total. Assim, há sempre um ―outro‖ mais velho que ele. Parece importante salientar, que ao destacar aspectos negativos da velhice que de certo modo ameaçam a identidade do sujeito, alguns mecanismos de defesa são acionados. Assim, há sempre um outro mais velho que concretizaria as características negativas da velhice.

Perguntas sobre finitude parecem naturais de serem feitas às pessoas acima de 60 anos. No caso de Elza Soares, aos 90 anos, essa proximidade com a morte denota algo mais óbvio do que a busca de uma explicação para sua longevidade. É como se no campo midiático a constituição da subjetividade do idoso perpassasse, necessariamente, pelo discurso da finitude. Em contrapartida, com a mesma naturalidade com que é tratada a pergunta, a cantora utiliza do conhecimento de si como comportamento vigilante a esse tipo de indagação. 117

Destarte, pode-se vislumbrar também uma categoria de resistência à colocação da mídia. Como analisa Foucault (1995, p.206), onde há poder, há resistência. Resistência que se traduz em lutas contra as diversas formas de subjetividade e de submissão às quais estamos expostos constantemente. Assim, para a mesma estrutura de poder que age no controle dos corpos direcionando-os, obrigatoriamente, para o reconhecimento da finitude, há uma força contrária de resistência opondo-se a essa forma de subjetivação. Essa figura é explicitada quando da negação da cantora Elza Soares a essa forma de controle e governamento. Ainda no âmbito da finitude, destacam-se, também os discursos que envolvem as celebridades Fernanda Montenegro, Tarcísio Meira e Antônio Fagundes em momentos distintos:

Poderíamos levantar inúmeras respostas para essa questão quase ―insuportável‖ de viver a velhice, mas o que parece ser o ponto crucial é a proximidade do fim, o enfrentamento da finitude quando há tanto de bom para viver (mesmo que, de fato, não haja). ―O mais difícil é saber que você está na fase definitivamente conclusiva da vida. É melhor encarar‖. Um processo entremeado, necessariamente, de muitas perdas: referência de experiências vividas, corpo e mente que já não respondem como gostaríamos e pior, amigos, amantes e amores que se vão levando parte de nós e de nossas histórias. É…a finitude bate à porta de todos, ninguém escapa, nem mesmo os ―soberbos‖.

Perdas democráticas, todos, um dia, as terão. Lembrando a morte do companheiro de 60 anos de vida, Fernando Torres, a atriz lamenta: ―A coisa mais dolorosa pela qual tenho passado é ver a minha geração morrer. Nos últimos cinco anos, morreram, além dele, Paulo Autran, Raul Cortez, Gianfrancesco Guarnieri, Renato Consorte, Sérgio Viotti, Sérgio Brito, Ítalo Rossi e Millôr Fernandes‖. (Fernanda Montenegro, p. 171) Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

Ela se emociona ao concluir: ―Você olha em volta e a sua memória está ligada a todo esse mundo que se vai. É muito forte‖. Na lista de baixas recentes, tem ainda Hebe Camargo que, como ela, nasceu em 1929. ―Vivemos o mesmo período da história. Quem substitui? Ninguém‖. (Fernanda Montenegro, p. 171)

E continuam morrendo. Hoje, por exemplo, foi a vez do poeta Décio Pignatari. Morreu aos 85 anos. (Fernanda Montenegro, p. 172) https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

―A morte me assusta. Ninguém gosta de pensar que o fim está chegando. Mas ele está chegando para mim. É triste também lidar com a perda dos amigos. Certa vez, fui receber um prêmio de cinema. Dei de cara com o diretor de teatro Antunes Filho. Foi uma alegria, porque fazia anos que não o via. Eu disse: ―Antunes, somos sobreviventes‖. Pouco tempo depois, o próprio Antunes morreu. A esta altura da vida, muitos colegas da minha idade se foram. Daqui a pouco, vou eu. Talvez eu deixe um vazio nas pessoas.‖ ( Tarcísio Meira, p. 198) Fonte: https://veja.abril.com.br

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Nessa mesma entrevista, ao ser perguntado sobre o que achava sobre a morte – na ocasião um dos assuntos abordados na sua peça ―Restos‖, em que ele interpretava o personagem Edward Carr, ele respondeu: Tem um filósofo (Lucrécio) que resume muito bem: ―Onde a morte está, eu não estou. Onde estou, a morte não está. Por que me preocupar?‖ Só que ela existe, faz parte da vida. Não me preocupo muito com a morte. Me preocupo mais com a doença. Porque a morte é isso mesmo. Acabou, morreu. Agora, ficar no sofrimento é horrível em qualquer idade. O Schopenhauer (Arthur Schopenhauer, filósofo) dizia que, se você tem 15 anos, é bonito e rico, mas não tem saúde, está perdendo para um cara de 80, feio e pobre, mas com saúde. (Antônio Fagundes, p.189) Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

“Costumo brincar que sempre tive a nostalgia da velhice. Queria ser velho quando era moço, comecei fazendo velho no teatro. Sempre tive fascínio pela velhice. Você só não vai ficar velho se morrer jovem. Então a velhice e a morte estão ligadas, você tem que encarar. Venho me preparando. Claro que a coisa muda, você não sobe mais a escada de três em três degraus, mas estou subindo de dois e dois ainda‖. (Antônio Fagundes, p. 189) Fonte: https://glamurama.uol.com.br

A constituição de subjetividades apresentada por Fernanda Montenegro, Tarcísio Meira e Antônio Fagundes, em suas produções discursivas, diferentemente daquelas apresentadas por Elza Soares, demonstra uma certa preparação para a chegada do fim da vida. Ao relacionarem os diversos amigos e companheiros de convivência que já se foram ou ao reconhecerem que a morte faz parte da vida, eles se percebem inseridos nessa mesma lista. Todavia diferente do discurso de Tarcísio Meira e de Antônio Fagundes, há que se considerar algumas discursividades midiáticas presentes na entrevista da atriz Fernanda Montenegro que merecem menção, já que alguns elementos não foram citados acima. A publicação da reportagem data de maio de 2014 e foi intitulada ―Dona do tempo‖. Nela a jornalista destaca que a entrevista foi feita após acordo silencioso e que isso só acontece porque trata-se da ―soberba‖ Fernanda Montenegro. Feito isso e contextualizando o processo de envelhecimento, conclui um de seus posicionamentos dizendo que a finitude bate à porta de todos, ninguém escapa, nem mesmo os ―soberbos‖ numa possível alusão ao fato de que a altivez ou o orgulho da atriz não a exclui da finitude do ser. Além disso, reporta-se à velhice como algo ―insuportável‖. Produz, portanto, efeitos de sentido que de imediato a inserem nesse cenário de finitude, incluindo tais informações já no momento de apresentação do que viria a ser tratado na reportagem. São efeitos de um biopoder que também faz uso de recursos midiáticos para produzir suas próprias verdades e repassá-las como verdades a serem seguidas, mesmo que isso não corresponda à subjetividade do indivíduo citado. 119

Adentrando nos discursos das três celebridades pode-se depreender que as tecnologias do eu aparecem como forma de confissão da finitude quando reconhecem que estão na fase conclusiva da vida, a qual deve ser encarada e que o fim está chegando. Trata-se, portanto, de regramentos da relação consigo. Nesse sentido, Fischer (1999, p.53) destaca que os estudos de Foucault sobre o relato de inúmeras técnicas de si, expostas nos textos clássicos, demonstram que as práticas relativas ao cuidado consigo mesmo diziam respeito à necessidade que o homem tinha de discursos verdadeiros para dirigir-lhe a vida - as palavras certas para enfrentar o real, para saber seu lugar na ordem das coisas, sua dependência ou independência em relação aos acontecimentos. Isso era alcançado através de muitas e variadas técnicas: exercícios de memorização, de escrita, de leitura e reflexão, de meditações sobre a vida e a morte, doença e sofrimento, de histórias exemplares de vida.

E completa, citando Foucault (1989):

Temos aí um conjunto de técnicas que têm por fim ligar a verdade e o sujeito. Mas é preciso compreender bem: não se trata de descobrir uma verdade no sujeito, nem de fazer da alma o lugar onde reside - por um parentesco de essência ou por um direito de origem - a verdade; não se trata mais de fazer da alma o objeto de um discurso verdadeiro. Estamos ainda muito longe daquilo que seria uma hermenêutica do sujeito. Trata-se, ao contrário, de armar o sujeito de uma verdade que ele não conhece e que não reside nele; trata-se de fazer dessa verdade - apanhada, memorizada, progressivamente colocada em aplicação - um quase-sujeito, que reina soberanamente em nós. (FISCHER, 1999, p.54)

São preceitos e regramentos estabelecidos na relação dos atores consigo mesmo que inserem seus discursos em uma relação de poder sobre si, mesmo que esse poder seja o reconhecimento da finitude. Nessa perspectiva, Silva (2013, p.354-355) destaca que: o corpo, para Foucault, era um corpo controlável, dócil, sujeito aos ditames do biopoder e da biopolítica. A ideia de vida, para ele, só poderia ser pensada a partir da ideia de morte. A morte seria um momento de desalienação total, no qual nos tornamos singular. [...] A mudança da noção de morte no ocidente, segundo Foucault, operou de modo a estabelecer um poder de morte sobre a vida, e essa fase de transição fez com que fosse inscrita nos mecanismos do biopoder.

Nesse contexto de finitude, as discursividades que perpassam os dizeres de Fernanda Montenegro e de Tarcísio Meira produzem sentidos voltados à vigilância de quantos dos seus pares já se foram, como uma contagem diária para saber quais ainda estão presentes nesse plano. Ao contabilizarem os amigos falecidos, percebem que poucos restaram e o cuidado de si antes de ser voltado à visibilidade, constitui-se, literalmente, na possibilidade de permanecer vivo. 120

As produções discursivas presentes na mídia minimizam as subjetividades profissionais em detrimento do processo de finitude. Logo de inicio, a matéria destaca o viver a velhice como algo insuportável e que o ponto crucial é a proximidade do fim. Sendo assim, o profissionalismo, enquanto parâmetro de visibilidade, já não faz mais sentido, face ao pouco tempo de vida. É um discurso imbuído de controle dos corpos e da indução à renúncia de si mesmo. Quando se mantém a vigilância constante sobre os que restam, a mídia contribui para a construção de subjetividades das celebridades não mais como profissionais, mas como alguém que deve aproveitar o pouco tempo que lhe resta. Aqui, as subjetividades plásticas parecem apontar para o fim do emaranhado de possibilidades disponíveis do cuidado de si a partir do momento em que as discursividades se resumem a uma vigilância biológica. O discurso da finitude, contudo, não produz o mesmo efeito de sentido para o ator Antônio Fagundes. Talvez isso se deva ao fato da diferença de mais de uma década de vida em relação aos citados anteriormente e da permanência em vida de muitos de seus colegas de palco. Assim, Fagundes demonstra que seus cuidados com o corpo visam a preservação da saúde biológica, referindo-se à incapacidade como algo mais negativo do que a morte. Ao referenciar sua capacidade de subir degraus com uma certa tranquilidade, o ator, mediante tais materialidades, se põe em situação confortável, excluindo aquilo que poderia gerar sua saída do cenário midiático. Assim, ao demonstrar que continua apto para as atividades diárias, o ator não apenas se exclui da relação com a finitude, como garante a sua permanência na mídia.

9.1.2.2- Corpo e refugo

O corpo representa objeto de desejo e é muitas vezes utilizado na mídia como marketing para a venda de produtos e serviços. Suas características podem emanar, para alguns, efeitos de sentido de cuidado e preocupação, ao passo que também podem se configurar em desleixo produzindo uma culpa pela forma como se apresenta. Isso faz com que muitas celebridades vivam sob o controle das dietas, dos exercícios físicos e dos tratamentos para rejuvenescimento. Quando se adentra à fase idosa, as cobranças são maiores e mais difíceis pois exigem um controle maior sobre os corpos no sentido de que a manutenção dos padrões de beleza implica na permanência nos espaços de trabalho. Todavia o poder biológico sobre os corpos impera numa velocidade acima das possíveis intervenções constituindo-se numa ação de 121 controle sobre eles. Tudo isso resulta numa tentativa de se evitar a condição de refugo humano que compara os indivíduos a objetos de descarte. Vejamos algumas discursividades que podem ser categorizadas nesse âmbito, a começar pela cantora Rita Lee:

Rita se mostra bem resolvida com a idade e tenta olhar a vida pelo lado positivo, sem crises. "Conquistei uma certa serenidade. Sempre fui muito ansiosa, compulsiva até. Agora, sinto um pouco mais de controle na minha cabeça, nas coisas que eu quero, nas minhas orações. Estou gostando mais de mim e percebendo que fiz coisas boas. É o meu processo de envelhecer com dignidade, ver os pontos bons, afastar mágoas que tinha comigo mesma. Eu me perdoei de tudo. Estou me achando legal. Roberto sempre me fala: "Pô, se ache legal. Você é legal, é bonita!‖Então, estou aqui, tem umas pelanquinhas, umas rugas, mas estou bem. (Rita Lee, p. 178) Fonte: http://www.purepeople.com.br

A cantora Rita Lee, conhecida como ―Rainha do Rock Brasileiro‖, relata conquistar serenidade e gostar mais de si própria. Incentivada pelo marido, a mesma se constitui de forma positiva apesar de enfatizar o aparecimento das rugas e da flacidez a que denominou de ―pelanquinhas‖. As discursividades enfatizam sentidos que apontam para uma cantora autorreflexiva e que busca, no processo de encontro consigo, reconstruir cenários que hoje teriam uma outra conotação. Assim, sob um possível processo de meditação, a cantora tenta identificar momentos positivos de sua trajetória que a configurem como alguém que deixa boas lembranças na memória das pessoas. É um autoconhecimento pautado nos reflexos que suas atitudes trarão à vida das pessoas. Conforme expressa Foucault (2004b,p.12): [...] com a noção de epiméleia heartoû, temos todo um corpus definindo uma maneira de ser, uma atitude, formas de reflexão, práticas que consistem uma espécie de fenômeno extremamente importante, não somente na história das representações, nem somente na história das noções ou das teorias, mas na própria história da subjetividade ou, se quisermos, na história das práticas de subjetividade.

Dessa forma, o cuidado de si transcende a individualidade e é direcionado também ao outro à medida que suas ações influenciam nos demais. O ocupar-se do corpo e da alma passa a ser uma referência no cuidado de si. Ao contrário do descrito no cristianismo, não se trata aqui de uma renúncia de si uma vez que o exame de consciência que gerou o perdão de seus próprios atos não se configura em uma obediência permanente a alguém, apenas gerou a aplicabilidade em algumas circunstâncias. 122

Com isso, depreende-se que as discursividades que atravessam os dizeres da cantora apontam para um cuidado de si voltado muito mais à reflexão dos atos que a constituíram ao longo da vida do que, necessariamente, de sua manutenção na mídia. Essas técnicas de si constroem subjetividades que minimizam as questões estéticas ao passo em que enaltecem as atitudes tomadas como garantia de um direito de envelhecer com dignidade. Esses traços ficam evidentes quando da chamada da mídia que destaca – ―Rita se mostra bem resolvida com a idade e tenta olhar a vida pelo lado positivo, sem crises‖. Diferente de Rita Lee cujas discursividades não são direcionadas ao corpo na condição de refugo, a atriz Susana Vieira destaca:

A atriz fez críticas ainda ao Brasil, que, segundo Susana, não dá valor ao artista que possui uma idade mais avançada. "A gente fica totalmente insegura em uma terra que não dá o menor valor a uma história, a uma carreira, o menor valor a uma pessoa velha... (Susana Vieira, p. 184) Fonte: https://televisao.uol.com.br

A atriz Susana Vieira, apesar de não mencionar expressamente as mudanças corporais atribuídas à idade destaca que a história e a carreira de um ator são desconsideradas quando da chegada da velhice. Dessa forma, as alterações provenientes do processo de envelhecimento podem contribuir para a redução de convites para trabalhar uma vez que, biologicamente, há uma possível redução na agilidade, não só em questões de deslocamento, como de memorização de textos, atividades essenciais em espaços televisivos. Esse biopoder atuante exerce seu controle utilizando estratégias que contribuam para a redução desses fatores, quer por meio de reeducação alimentar e exercício físicos, quer por intervenções estéticas. Nessa perspectiva, Santos e Lago (2016, p.140) salientam que ―a medicalização da velhice, disfarçada sob a categoria da terceira idade, criou a figura do bom velho e do mau velho em consonância aos outros ideais bioascéticos que produzem uma onda de corpos potencialmente abjetos‖. Para os autores, os estereótipos contra os gordos, idosos e outras figuras que fogem do padrão do corpo ideal têm o mesmo efeito estigmatizador e excludente. A obsessão pelo corpo bronzeado, malhado, sarado, lipoaspirado e siliconado faz aumentar o preconceito e dificulta o confronto com o fracasso de não atingir esse ideal, como testemunham anorexias, bulimias, distimias e depressões.

Esse pensamento é corroborado por Bauman (2001) quando enfatiza que na modernidade líquida, os objetos e produtos são de consumo rápido e facilmente substituídos por outros lançamentos. Todavia essa linha de descarte é também direcionada às pessoas que 123 não se enquadrem nesses padrões de beleza, sendo considerados descartáveis. Nesse refugo da modernidade, enquadram-se aqueles que fogem aos estereótipos estabelecidos, incluindo-se, aqui os idosos. Conforme menciona também, Baeuvoir (1990, p.8)

A velhice aparece como uma espécie de segredo vergonhoso, do qual é indecente falar (...). Com relação às pessoas idosas, essa sociedade, não é apenas culpada e criminosa. Abrigada por trás de mitos da expansão e da abundância trata os velhos com párias.

O discurso de Susana Vieira reverbera a resistência ao esquecimento e ao isolamento do idoso, não necessariamente àquele protagonizado em instituições de longa permanência para idosos, mas ligado à negação de suas potencialidades capazes de confiná-los em depósitos de refugo humano, conforme tão bem descrito por Bauman (2015, p. 109):

Em suma, as prisões como tantas outras instituições sociais, passaram da tarefa de reciclagem para de depósito de lixo. (...) Se reciclar não é mais lucrativo, e suas chances (ao menos no ambiente atual) não são mais realistas, a maneira certa e lidar com o lixo é acelerar a ―biodegradação‖ e decomposição, ao mesmo tempo isolando-o, do modo mais seguro possível, do habitat humano comum. (2015, p. 109)

Assim, o discurso da atriz produz sentidos que inserem o corpo enquanto refugo humano ao anular o histórico do profissional pautado em seu currículo e transformá-lo em algo irrelevante frente à idade. Dessa forma, ficam evidentes as construções de subjetividades da mídia numa perspectiva de desvalorização do profissional independente do que tenha produzido ao longo da vida. Por esse motivo, a atriz se mune de técnicas de si que a incluem em contexto bem sucedido de experiência demonstrando que a idade não pode apagar uma vida inteira. Representa um grito de resistência no sentido de desconstruir a relação que vincula a chegada aos 60 anos ao fim de carreira, independente das condições apresentadas pela celebridade em questão.

9.1.2.3 – Solidão

Apesar de a solidão não ser uma condição presente apenas na vida da pessoa idosa, ela se torna mais visível nessa fase em função da ausência dos filhos que se emancipam ou pela finitude que a separa dos amigos (as) ou dos companheiros (as). 124

Na vida das celebridades, apesar de todo o glamour que a envolve, a solidão também é referenciada nas discursividades. Vejamos:

Tive a crise dos 30, dos 40, dos 50 e dos 60 anos. Com 70, cansei, achei que era palhaçada. Na juventude a gente sofre mais, é muita ansiedade, dúvidas e cobranças. Na velhice, o que incomoda é a solidão. No momento, vivo sozinha, mas estou na pista".... ( Zezé Mota, p. 187) Fonte: https://tvefamosos.uol.com.br

Quando se fala em solidão, geralmente o enfoque é dado a sofrimentos e dificuldades pessoais, isolamentos ou como condição patológica associada à depressão. Para Bauman (2004, p.120) a solidão está ligada, também, à liquidez da modernidade que considera tudo muito fulgaz e efêmero. Sobre isso, ele afirma:

As relações são cada vez mais vistas através do prisma de promessas e expectativas, e como um tipo de produto para os consumidores. Eles querem satisfação. Se não ficam totalmente satisfeitos, devolvem o produto à loja ou vão trocá-lo por um novo e aprimorado. Afinal, você não se apega ao carro, ao computador, ao ipod quando versões melhores aparecem.

Para ele, esse amor da modernidade líquida é o desejo apenas do afeto, do estar junto, mas sem considerar um compromisso, algo mais duradouro. Os laços permanecem o tempo suficiente para uma nova conquista. Os tempos atuais escorrem pelas mãos. Assim como desapegamos de objetos, as relações também têm seus desapegos. Essa fugacidade fica mais evidente em indivíduos idosos onde em determinados casos, as relações afetivas são substituídas por outras emanadas de pessoas mais jovens, instalando- se aí, um processo de solidão. Em outros casos, a solidão pode surgir em decorrência do falecimento de um dos cônjuges, gerando tristeza e saudade. No caso específico de Zezé Mota, suas produções discursivas nos fazem relacionar a solidão a uma conotação afetiva, de relacionamento e não uma solidão relativa a amizades ou ausência de convivência em determinados espaços. Para tanto menciona viver sozinha, mas ―estar na pista‖, ou seja, em busca e aberta a uma nova companhia ou relacionamento. Nesse processo de uso das tecnologias do eu, de relação do indivíduo consigo, a atriz opta pela confissão de seu momento de solidão abrindo espaços para novos relacionamentos. Para Foucault (2004, p.785), ―a confissão é uma das técnicas de si, um dos modos pelos quais o indivíduo pode estabelecer uma relação consigo mesmo e produzir uma série de operações sobre seu corpo, seus pensamentos e sua conduta‖. Sob essa perspectiva, pode-se inferir que o discurso da atriz Zezé Mota se traduz no processo de reconhecimento da interferência da idade no processo de interação social, o que não era tão decisivo quando se 125 tinha 30, 40 ou 50 anos. Assim, os efeitos de sentido apontam para uma necessidade de busca de companhia e não mais de espera. Denota a necessidade de uma ação da atriz, um autogoverno para que o problema da solidão seja sanado. O que antes era delegado ao outro, agora passa a ser iniciativa da atriz. A veiculação de tal matéria contribui para a construção de subjetividades a partir de técnicas de reflexão que permitem à celebridade a ocupação consigo. O passar da idade traz estruturas sociais novas. Dessa forma, os convites e os momentos de descontração que aconteciam de forma natural, ficam escassos e exigem uma atitude proativa da atriz. É importante destacar que, dentre as inúmeras discursividades elencadas na pesquisa, essa foi a única a fazer referência à solidão, o que não necessariamente representa a inexistência desse dispositivo em outras produções discursivas das mesmas celebridades. Ademais, alguns elementos linguísticos apresentados pelas celebridades ao longo da pesquisa apontam relação com o processo de solidão, mesmo que a temática não tenha sido expressamente mencionada. As produções discursivas da atriz Neuza Borges, por exemplo, ao reiterar sua necessidade de retomada do trabalho após o AVC (Acidente Vascular Cerebral) podem ser ampliadas para além das questões de empregabilidade. Nesse caso, o retorno ao ambiente de trabalho ultrapassa os limites da visibilidade e do próprio sustento e podem ser direcionadas à possibilidade de retorno ao convívio com seus pares. Quando a atriz destaca ―não dá para o povo esquecer de mim‖, pode-se inferir que tal retorno e o desejo de não ser esquecida apontam para uma solidão já vivenciada. As discursividades trazidas por Fernanda Montenegro ao destacar ―[...] corpo e mente já não respondem como gostaríamos e pior, amigos, amantes e amores que se vão levando parte de nós e de nossas histórias‖ também apontam efeitos de sentido relacionados à solidão uma vez que a condição de finitude inerente a todos deixa uma lacuna traduzida em solidão aos que ficam. Esse efeito de sentido fica ainda mais evidente quando, segundo a atriz, a morte de alguém implica em levar consigo um pouco de quem ficou.

9.1.3 Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso

9.1.3.1 – O corpo e autoafirmação no cuidado de si;

Diferente da categorização anterior em que é visto como refugo, aqui o corpo é visto como autoafirmação da celebridade no cuidado de si, como uma estratégia para manutenção 126 da visibilidade. Nesse sentido, destacam-se os procedimentos disciplinares que agem sobre os corpos, modelando-os de forma vigilante no sentido de atender a essa necessidade de autoafirmação. Entendendo o corpo como um lugar sobre o qual se exerce o poder, Milanez (2006, p.13) menciona: [...] ele é o produto de uma subjetivação marcada por uma imagem que nos remete a uma forma temporal determinada, por isso, levo em conta os meios e as técnicas pelas quais elas se transmitem em nossa época em particular. O corpo subjetivado é a história de certa experiência do sujeito no mundo.

Como centro das atenções nas inúmeras relações que envolvem sujeito e práticas discursivas, o corpo representa um campo de atuação do poder quer seja como controle relativo a fatos passados quando se tenta interferir em influências genéticas, quer como elemento de beleza, desejo ou status. Quando as materialidades linguísticas ancoram em corpos de celebridades, as relações de poder se tornam mais fortes em função da exposição a que esses mesmos corpos são levados. Vejamos algumas dessas discursividades:

A boa forma da atriz despertou também interesse para os segredos de sua beleza. "Gosto de pensar que tenho muitas coisas para cuidar, corpo, cabeça, emoção, sentimentos, valores, e acho que tudo se conecta". (Bruna Lombardi, p. 164) A idade, ela garante, não é problema. "Para mim, idade nem mesmo é um número, porque eu normalmente não penso em números em qualquer circunstância. Sou regida por outros valores, que me interessam mais. O universo é imenso e somos todos mínimos diante da sua abrangência." (Bruna Lombardi, p. 164) Fonte https://f5.folha.uol.com.br

―A pele boa vem de uma vida vivida com inteireza‖, diz, sorridente. ―Tive grandes momentos de derrota e de vitória. Aprendi a nem me deslumbrar com um elogio, nem me amargurar com uma crítica.‖ (Bruna Lombardi, p.165) Fonte: https://veja.abril.com.br

A atriz Bruna Lombardi é vista em muitos sites como padrão de beleza. Em meio às pesquisas realizadas com vistas a elencar discursos a ela relativos, não encontrei produções discursivas que se configurassem em críticas ao seu corpo ou à sua beleza ao longo de seus 67 anos. Os poucos elementos encontrados foram em face de seu trabalho enquanto escritora, diferente de outras celebridades de igual idade. Isso acaba gerando, portanto, muitas inquietações quanto às formas de subjetivações que permeiam essa atriz. Os exemplos trazidos nas discursividades oriundas dos sites selecionados mostram a preocupação da mídia em adentrar nos segredos de beleza da atriz numa possível influência 127 que esses modos de subjetivação exercem aos leitores. Em geral, a mídia sob seus diferentes meios, utiliza-se da imagem como marketing para venda de produtos. Todavia isso produz uma busca ao padrão de beleza ideal provocando nos indivíduos que não se encaixam no perfil, a sensação de fracasso e de culpa por não conseguir o corpo almejado. Percebe-se, ainda que a atriz não relata o que seriam os seus segredos de beleza, relativiza apenas associando a algo muito subjetivo como inteireza e abrangência do universo, por exemplo. Segundo Milanez (2006, p.16), o sujeito a que Foucault se refere é uma fabricação histórica. Ele é constituído por meio de tecnologias e dispositivos elaborados pela sociedade. Para ele, o mecanismo principal dessa fabricação é a disciplinaridade. O corpo é o objeto das disciplinas, não apenas enquanto alvo das ações disciplinares, mas também enquanto sede capaz de pensar de uma maneira ordenada e representacional e, por aí, capaz de dar um sentido particular àquilo que pensa. A disciplinaridade passa a funcionar como uma matriz de fundo que, por si só, impõe ao corpo determinados códigos de permissão e de interdição e maneiras muito peculiares de pensar o mundo. (MILANEZ, 2006, p.16)

Dessa forma, quando a mídia investe em discursos que disciplinam os corpos a partir da imagem de celebridades, tenta transformar a diversidade de corpos já existentes em um padrão único, cujo resultado se efetivará em poucos devido aos inúmeros dispositivos que agem sobre esse mesmo corpo. Utiliza-se de um jogo enunciativo com vistas à produção de um senso comum, mesmo sabendo que esse padrão único de beleza não existe. Assim, a depender da forma como esses indivíduos fazem uso do cuidado de si, pode-se inferir acerca da constituição de suas subjetividades, o que no caso específico de Bruna Lombardi, constitui- se a partir de tecnologias do eu que conectem corpo, cabeça, emoção, sentimentos e valores. O cuidado de si é associado ao cuidado com a espiritualidade e à pureza da alma. É a conexão com o universo que a faz direcionar o olhar para si mesmo. Essa conexão, contudo não a impede de frequentar as mais renomadas clinicas e profissionais especializados em técnicas de rejuvenescimento. Ou seja, a imagem da artista é repassada como uma beleza natural, sem intervenções, produto do devido controle da atriz em suas mais diferentes concepções, todavia, sua presença é vista e divulgada em sites de clínicas conceituadas de estética. Essa concepção de que todos detêm o controle sobre seus corpos e só deles dependem os resultados, é assim referenciada por Foucault (2004b, p. 107) Não havendo mais diferença de status, pode-se dizer que todos os indivíduos, em geral, são ―capazes‖: capazes de ter a prática de si próprios, capazes de exercer essa prática. Não há desqualificação a priori de determinado indivíduo por motivo de nascimento ou de status. Por outro lado porém, se todos, em princípio, 128

são capazes de aceder a prática de si, também é fato que, no geral, poucos são efetivamente capazes de ocupar-se consigo. Falta de coragem, falta de força, falta de resistência – incapazes de aperceber-se da importância desta tarefa, incapazes de executá-la: este, com efeito, é o destino da maioria.

Com isso, pode-se inferir que as discursividades da atriz tentam atribuir seu padrão de beleza a um cuidado de si muito mais reflexivo e espiritual do que pela adoção de medidas estéticas. Seu autogoverno diante das intempéries da vida figuram como o principal elemento a influenciar sua estrutura corporal de forma positiva. É importante destacar que, ao contrário de matérias anteriores, as direcionadas à Bruna Lombardi não perpassam pelo lado negativo da velhice. Os efeitos de sentido aqui expostos canalizam para alguém que, com cuidados simples, ostenta uma beleza semelhante à de pessoas bem mais jovens. Com isso, sua beleza se configura numa autoafirmação do cuidado de si e se traduz como garantia de permanência dos espaços de visibilidade. Para a cantora Elba Ramalho, o cuidado espiritual se faz presente, mas os cuidados com o corpo se apresentam de forma mais enfática, os quais são corroborados pela atriz Vera Fischer. Vejamos:

Faço yoga e meditação, e acho que isso mantém minha alegria, meu equilíbrio e a beleza de dentro. Ah, sempre retiro a maquiagem com um bom demaquilante e uso hidratante, acrescido de um protetor solar. Sou vaidosa como todo artista, mas sou serena e confiante - esse é o segredo da juventude. Há trinta anos, achava que cairia em depressão ao me ver envelhecendo. Mas o tempo chega para mim, para todos. Não posso fazer nada em relação a isso. Com essa idade, a insegurança passou, e estou mais exigente. Envelhecer não é tão ruim assim. (Elba Ramalho, p. 166) Fonte: https://revistamarieclaire.globo.com

"Eu faço karatê, é um aeróbico que para minha idade é excelente. Faço tratamento para cabelos finos. A pele está sempre limpa, por causa do excesso de maquiagem que uso nos trabalhos e passo muitos cremes. Jovem, não serei mais, tenho que dormir bem, me alimentar bem e tentar não fazer extravagâncias". (Vera Fischer, p. 186) Fonte: www.missnews.com.br

As produções discursivas trazidas pela cantora Elba Ramalho e pela atriz Vera Fischer produzem diferentes efeitos de sentido a partir, inicialmente, da citação de práticas corporais. Para a cantora, a prática selecionada (Yoga / meditação) visa à manutenção da alegria, de um maior equilíbrio e de sua beleza interior. O tipo de subjetividade aponta estar mais atrelada ao lado espiritual do que propriamente aos cuidados com o corpo, apesar de mencionar ser vaidosa e referir usar bons demaquilantes para os cuidados com a pele. Já a atriz Vera Fischer diz optar pelo Karatê enquanto atividade aeróbica por ser indicada para sua idade. Assim 129 como a primeira, demonstra cuidados com a pele devido ao excesso de maquiagem no trabalho. Esses cuidados também reverberam a governamentalidade presente em seus discursos reforçando a existência das técnicas de poder que monitoram o comportamento das celebridades aqui representadas. Essas ações de biopolítica não só investem na longevidade dos que vivem expostos ao público como sinalizam que essa longevidade deve ultrapassar a fronteira da qualidade de vida, tão defendida no campo médico-biológico. A ideia é que essa vigilância deva interferir para a manutenção de corpos e que siga o padrão de jovialidade esperado pelo público. Nesse processo de regulação estão incluídos os cosméticos anteriormente citados, as dietas, prescrição de exercícios físicos, aplicações a exemplo do botox e cirurgias ou intervenções plásticas. Quanto mais próximo dos padrões ideais de beleza, maior a probabilidade de manutenção no cenário midiático. O corpo, conforme Foucault (2009, p.150) passa a ser o alvo do poder. Assim como no período helenístico em que o cuidado de si passa a ser uma maneira de viver extensiva a todos e onde elementos como dietas e exercícios físicos eram estimulados, as produções discursivas de Elba Ramalho e Vera Fischer apontam para esse mesmo propósito. Diante das alterações típicas do envelhecimento biológico, as discursividades apontam para a construção de um corpo que necessita ser cuidado para que as marcas do tempo não se tornem tão perceptíveis aos olhos do público, garantindo-lhes, assim, uma visibilidade positiva. Os cuidados relatados perpassam, também, por momentos reflexivos que contribuem para um processo de aceitação do envelhecimento sem desvinculá-los da importância estética para suas funções. Ainda nessa perspectiva do corpo como objeto de poder, encontramos as seguintes discursividades:

“Eu sou muito tranquila. Cuido muito bem do meu corpo. Três vezes por semana tenho fisioterapia.

Cuido da minha saúde, da minha alimentação, eu sei que preciso me cuidar. Por isso que eu digo, cuidem do

Brasil porque o Brasil precisa se cuidar.‖ (Elza Soares, p. 169)

“Adoro um espelho. E para adorar um espalho adoro cirurgia plástica, adoro tudo. Acho que a

mulher merece tudo, tem que ser linda, vaidosa. Mulher. Bons vestidos de seda, boas camisolas lindas,

maravilhosas. Olhar no espelho e dizer, sou feliz comigo mesma. É muito bom.‖ ( Elza Sares, p.169)

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese

"Que mulher quer ser velha e feia? Nenhuma!". A declaração foi feita pela atriz Susana Vieira, 68

anos, 51 de carreira, em entrevista que foi ao ar neste domingo (14), no Fantástico. Adepta das cirurgias

plásticas, liftings e tudo o mais que a ajude a manter a aparência sempre mais jovem, ela garantiu não ligar para a idade, afirmando viver atualmente como se fosse uma "menina de 70 anos". (Susana Vieira, p.183) Fonte: https://www.terra.com.br

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―Ninguém chega para mim e pergunta a minha idade. Não tem necessidade. O maior xingamento para mim é me chamar de velha. Eu aparentemente não tenho 72 anos

Não faço parte dos velhinhos. Não tenho medo de envelhecer. Me desculpem se eu cheguei aos 72 anos sem estar caquética e estando maravilhosa, com tudo em cima.‖ ( Susana Vieira, p. 184) Fonte: wp.clicrbs.com.br

Sim, Simone revelou que está com 70 anos e deixou artistas, telespectadores e internautas chocados, de queixo caído, com a boa forma física da artista. Mas não se trata apenas de aparência física, a voz de Simone permanece a mesma. Ela cantou ao vivo e mostrou que continua afinada e com a voz potente de sempre. Faltou perguntar a ela o segredo dessa jovialidade aos 70 anos. Claro que os mais céticos e críticos vão falar em plástica, botox, médicos caros etc....(Simone, p. 181) Fonte: https://www.sonoticiaboa.com.br

―De pertinho, o veterano ator – que estreou na teledramaturgia em 1969, na novela Nenhum Homem É Deus,

na pioneira TV Tupi – parece vaidoso. É cheiroso, o cabelo brilha e a pele está sempre bronzeada. Mas, durão,

diz que o máximo que faz é tomar banho. O cabelo só lava com sabonete. Nunca usou cremes. Nem fez

plástica. Pintar os cabelos brancos, então… Nem pensar.‖ Tenho cabelo branco desde os 30 anos. Já pintei,

mas não acredito que isso faça a pessoa parecer mais jovem. Fora que dá trabalho, ter de retocar a cada 15 dias.

E aí eu ia ter de pintar outras coisas, o peito, por exemplo. Dá trabalho, né?‖, justificou. E dei risada. Detalhe:

ele me disse que só tem cabelo branco do lado esquerdo do peito. ‖É que o coração está velho.‖ (Suspiros!) E

diz que não liga para esse papo de velhice. ‖Não me sinto velho, estou ótimo. (Antônio Fagundes, p. 188)

Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

Com saúde de ferro e ótima memória, Cid conta que às vezes exagera nos exercícios físicos e que mantém a forma praticando musculação, pilates, futebol e tênis. Além disso, ele segue uma rotina saudável de hábitos

alimentares com saladas e alimentos integrais. ―Há mais de meio século tirei a carne vermelha do meu cardápio. Minha fisioterapeuta diz que tenho a musculatura de um homem de 60 anos‖. (Cid Moreira, p. 194) Fonte: extra.globo.com/famosos

As discursividades apresentadas por Susana Vieira, Simone, Antônio Fagundes e Cid Moreira trazem o cuidado de si voltado ao corpo de forma enfática. Enunciados que perpassam pela realização de fisioterapia (aqui provavelmente relacionada à atividade física e não a algum processo de reabilitação), dietas, cirurgias plásticas, uso de cosméticos, pilates, musculação, futebol e tênis são algumas evidências desse cuidado. O corpo, aos poucos, vai se modelando e assumindo os contornos que o mercado necessita. 131

Percebe-se que esse cuidado de si tem uma repercussão direta com o ambiente externo. Quanto mais as celebridades se dedicam a ações para consigo, mais influenciam a população que as acompanha nas mídias exercendo, também, uma forma de controle para com os demais. Considerando que o corpo é submetido a poderes, Foucault (2009, p. 117) destaca:

Houve, durante a época clássica, uma descoberta do corpo como objeto e alvo de poder. Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção dedicada então ao corpo - ao corpo que se manipula, se modela, treina, que obedece, responde, torna-se hábil ou cujas forças se multiplicam. (FOUCAULT, 2009, p. 117).

Nesse caso, o corpo que treina e se modela tenta se configurar em um influenciador como forma de garantia de seu espaço profissional. Dessa forma, o cuidado de si é pautado por saberes médicos que direcionam e justificam a melhor forma de proceder. Esses saberes permaneceram contínuos desde a época clássica, mantendo-se os mesmos princípios, mas aprimorando-se ao ponto de exigir constante vigilância sobre o corpo. O fato, portanto, de se subjetivar a partir dessas práticas, não é algo novo. Tanto no momento conhecido como Socrático-platônico como no período denominado como a idade de ouro do cuidado de si, o direcionamento ao corpo enquanto enfoque já se fazia presente. Aqui, as discursividades das celebridades revelam efeitos de sentido com forte intervenção sobre os corpos mediante o auxílio de procedimentos estéticos. As matérias veiculadas constroem subjetividades cujo foco é a manutenção de uma aparência jovem que não só assegura a empregabilidade artística como mantém o corpo como instrumento de sedução. Mesmo aqueles que não fazem referência às intervenções têm as suas subjetividades construídas como se tivesse adotado procedimento semelhante, como apontam as discursividades sobre a cantora Simone. Os cuidados de si, expressos ou não, são associados às novas tendências médicas que amenizam os sinais do tempo.

9.1.3.2- Sexualidade;

Foucault (1988, p.16) em sua genealogia da sexualidade já asseverava que é necessário levar em consideração:

o fato de se falar de sexo, quem fala, os lugares e os pontos de vista de quem fala, as instituições que incitam a fazê-lo, que armazenam e difundem o que dele se diz, em suma, o ―fato discursivo‖ global, a ‗colocação do sexo em discurso‘. 132

A sexualidade, apesar de todos os estereótipos e tabus que a tentam circundar, passou a ser um objeto de interesse em vários campos do saber. No campo biológico, elementos como a alteração corporal na gestação, produção hormonal nas relações sexuais passaram a ser objeto de interesse e estudos. No campo religioso, sob influência do poder pastoral, todos os atos eram passíveis de confissão, até os que ainda estavam na esfera do pensamento e a sexualidade não fugia a essa regra. ―A sexualidade não é mais o grande segredo, mas ela é ainda um sintoma, uma manifestação do que há de mais secreto em nossa individualidade‖ (FOUCAULT, 2014a, p. 201). Segundo seus postulados, quando se debruçou sobre os discursos envoltos na sexualidade seu objetivo foi

mostrar como as relações de poder podem passar materialmente na própria espessura dos corpos sem ter que ser substituídas pela representação dos sujeitos. Se o poder atinge o corpo, não é porque ele foi inicialmente interiorizado na consciência das pessoas. Há uma rede de biopoder, de somatopoder que é, ela mesma, uma rede a partir da qual nasce a sexualidade como fenômeno histórico e cultural no interior do qual, ao mesmo tempo, nós nos reconhecemos e nos perdemos. (FOUCAULT,2014a, p. 38)

O corpo, como elemento de prazer e que produz suas verdades a partir do sexo é também o centro das relações de poder. A sexualidade, em suas diferentes manifestações, é o produto real da interferência de um tipo de poder sobre os corpos e seus prazeres. Esse poder é capaz de despertar os segredos mais reservados da intimidade do indivíduo. Nesse sentido, Foucault (1988, p.71) afirma:

Muito mais do que um mecanismo negativo de exclusão ou de rejeição, trata-se da colocação em funcionamento de uma rede sutil de discursos, saberes, prazeres e poderes; não se trata de um movimento obstinado em afastar o sexo selvagem para alguma região obscura e inacessível, mas pelo contrário, de processos que o disseminam na superfície das coisas e dos corpos, que o excitam, manifestam-no, fazem-no falar, implantam-no no real e lhe ordenam dizer a verdade: todo um cintilar visível do sexual refletido na multiplicidade dos discursos, na obstinação dos poderes e na conjugação do saber com o prazer.

Reconhecendo que a sexualidade é um elemento que repercute na constituição de subjetividades, os discursos a ela relativos decorrentes de pessoas idosas passam também a ser objeto de interesse e de estudo da construção da verdade do sujeito. Vejamos alguns enunciados das nossas celebridades acerca da questão da sexualidade:

―As borboletas estão batendo no estômago, não importa a idade que se tem. É isso que faz renovar a vida, a esperança e a felicidade‖, completou a loira. (Ana Maria Braga p. 158) Fonte: https://www.metropoles.com

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A expressão metafórica ―borboletas no estômago‖ é muito utilizada para referenciar um efeito de sentido de quando se está apaixonada (o). Essa possível relação entre corpo e mente, contudo, não é algo que determine o encontro do amor verdadeiro, mas um fenômeno ligado à atração sexual que não necessariamente implica na existência de romance. Segundo o psiquiatra e neurocientista Daniel Amen (2020), o estômago é estimulado por um nervo e se apaixonar ou se interessar por alguém desperta o sistema de prazer que causa respostas no corpo. O coração começa a bater mais forte, as mãos ficam frias e suadas e o foco no objeto, pessoa de interesse, fica ampliado. Seu sistema límbico ou emocional ativa o nervo vagus que vai do cérebro ao estômago. As borboletas no estômago significam que você está estressado e motivado a fazer algo ou ver a pessoa novamente. Como a dopamina é o primeiro neurotransmissor a se manifestar quando você vê alguém atraente, a pessoa, então, fica extremamente focada e excitada.

Essas discursividades demonstram o interesse que a sexualidade desperta no campo das ciências em suas diferentes especificidades. A necessidade do saber impulsiona a explicação para quaisquer alterações do indivíduo, assumindo uma conotação ainda maior quando o assunto é sexualidade. São ações de biopoder que tentam controlar, sob a justificativa de evidências científicas, os dizeres e atitudes de uma população, gerando suas verdades. O enunciado apresentado por Ana Maria Braga decorre de um momento em que a mesma foi pedida em casamento pelo francês Johny Lucet, de 55 anos. Por meio de sua produção discursiva há evidências de que os efeitos de sentido produzidos corroboram para manutenção da sexualidade ―não importando a idade que se tem‖, conforme citado pela apresentadora. É uma constituição do sujeito revestido de práticas de liberdade onde sua verdade expressa que o sentir prazer independe da idade. Ao utilizar-se da metáfora ―borboletas batendo no estômago‖, a apresentadora aponta que os mesmos sentimentos e reações presentes no período de juventude se mantêm em proporções semelhantes na fase idosa. Com isso, refuta-se a sua inclusão na lista daqueles estereotipados pelo viés biológico de que a sexualidade sofre grandes alterações na velhice. Sob essa perspectiva, a mídia constrói subjetividades de uma profissional que não se encaixa na condição de idoso, ratificando a sua permanência no mundo das celebridades. Somado a isso, as questões estéticas, apesar de elencadas no cuidado de si, ficam em segundo plano, passando a ser algo secundário frente às questões sexuais e permitindo uma construção de subjetividade muito mais forte enquanto artista. Esse cuidado de si ultrapassa a ideia de sexualidade atrelada apenas ao viés do companheirismo, conforme discursos proferidos por Zezé Mota e Cid Moreira: 134

Quando minha mãe se casou com quase 70 anos (hoje, ela tem 93), pensei com meus botões: “Ah, ela está casando para ter uma companhia para jantar, para ir ao cinema e ao teatro‖. Depois, percebi que não era bem por aí (risos). Sinto falta de sexo, sou uma mulher saudável. Agora, não vou transar por transar. Quero um companheiro. Mas faço as minhas caminhadas, uma vez por semana tem massagem relaxante, tomo meu vinho. Recebo cantada, mas só de rapazes muito mais jovens, e não rola mais para mim. Aqui (a velhice) não é o paraíso", escreveu (Zezé Mota, p. 187) Fonte: https://caras.uol.com.br

Casado há 14 anos com a jornalista Fátima Sampaio, Cid Moreira, de 86 anos, garante que mantém a chama do amor acesa até hoje. ―Não percebo essa questão da idade. Por enquanto, tudo continua funcionando‖, disse o ex-apresentador do Jornal Nacional, em entrevista à revista ―Caras‖ desta semana.

O segredo de tanta paixão, segundo ele, está na jovialidade da sua quarta mulher, 36 anos mais nova. ―Ela é maravilhosa, dedicada, educada, tem todas as qualidades do mundo‖, derrete-se Cid, que também recebeu elogios de Fátima. (Cid Moreira, p.193) Fonte: extra.globo.com

Os diversos saberes das ciências ao longo dos anos têm utilizado a decreptude biológica como arcabouço para justificar a relação entre pessoas idosas apenas no campo do companheirismo, da redução dos efeitos da solidão. São elementos da pastoral cristã que conduzem às populações a uma forma de governamentalidade pautada na obediência aos postulados médicos e que têm nas práticas de confissão, o controle de que tais ordenamentos estão sendo cumpridos. Sob forte vigilância, dissemina-se a ideia de que todos aqueles que fogem dessas condições estão fora dos regramentos não se enquadrando às normas impostas, na obediência incondicional ao mestre, conforme relatado por Foucault (1991, p.355). Esses reflexos podem ser vistos no discurso de Zezé Mota quando considera, inicialmente, o casamento de sua mãe, aos 70 anos, como uma necessidade de ―companhia para jantar, para ir ao cinema e ao teatro‖. Ao chegar, também aos 70 anos, percebe a forma equivocada com a qual subjetivava sua mãe. Além disso, a atriz expõe a falta de sexo e enfatiza ser uma mulher saudável o que representa uma ruptura com os padrões médicos que tornam reducionistas os desejos sexuais para aqueles (as) com idade acima de 60 anos. A atriz também demonstra um cuidado de si quando menciona que esses desejos sexuais não a fazem transar com qualquer pessoa que conhece. E completa ―faço as minhas caminhadas, uma vez por semana tem massagem relaxante, tomo meu vinho‖, referindo-se a outros tipos de prazeres. Sua resistência aos padrões sexuais dominantes denota um jogo de verdades que a subjetiva a partir de práticas de liberdade. 135

A análise das discursividades apresentadas pela atriz permite também a produção de sentidos que a liberte das amarras que subjetivam o idoso como alguém indiferente às sensações de prazer. Assim como tendem a ser rotulados como alguém sem capacidade produtiva e que a convivência com outra pessoa visa apenas o companheirismo, o enunciado da atriz não só desfaz esse estigma como aponta para uma forte ação hormonal quando cita as massagens relaxantes, as caminhadas e o uso do vinho. Essas referências hormonais, contudo, são típicas da juventude e são apresentadas pela atriz como construção de subjetividade que se contrapõe às evidências biológicas. Somado a isso, percebe-se que a atriz se mune de técnicas de resistência aos padrões médicos, contribuindo para que se mantenha no cenário midiático. Em sentido semelhante, apresenta-se o discurso de Cid Moreira. O Jornalista, hoje com 92 anos, tenta quebrar os tabus relacionados à sexualidade ao relatar o relacionamento com sua esposa, 36 anos mais nova, e com quem está há duas décadas. Segundo suas colocações, ele não apenas não se atém à questão da idade, como expressa que ―está tudo funcionando‖ e que mantém a chama do amor acesa. Esse discurso reverbera os efeitos de sentido ligados ao biopoder uma vez que, ao se relacionar com alguém mais jovem e sem apresentar alterações em seus prazeres sexuais, o jornalista rompe com os paradigmas da ciência que legitima o declínio de determinados prazeres na fase idosa. A produção discursiva acerca de sua sexualidade, portanto, demonstra que a idade só será um divisor de águas quando seu comportamento sexual for afetado, o que não foi percebido no auge de seus 92 anos. Trata-se de uma resistência às relações de poder que rotulam um mesmo padrão de comportamento às pessoas consideradas idosas. Conforme esclarece Foucault (2012a, p.277): [...] nas relações de poder, há necessariamente possibilidade de resistência, pois se não houvesse possibilidade de resistência – de resistência violenta, de fuga, de subterfúgios, de estratégias que invertam a situação –, não haveria de forma alguma relações de poder.

O discurso de Cid Moreira enfatiza sentidos que traduzem um corpo que não reconhece os efeitos do envelhecimento o que se configura quando da citação de que ―tudo continua funcionando‖. Esse modelo de resistência aponta para um cuidado de si que coaduna com a escolha de sua companheira, 36 anos mais nova, e cujo relato da mídia utiliza a temática da sexualidade como elemento de subjetivação que foge aos padrões da sua idade. As produções discursivas apresentadas também se contrapõem ao discurso científico que prega a necessidade de utilização de medicamentos capazes de intervir no desejo na potência sexual. Acerca disso, vejamos o que destacam Francisco Cuoco e Stênio Garcia:

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Aos 80 anos, o ator Francisco Cuoco afirmou que não usa remédio algum para ter relações sexuais com sua namorada Thaís Almeida, de 27 anos. A declaração, dada à revista ―Contigo!‖, despertou a curiosidade de homens que também querem alcançar a terceira idade com um desempenho sexual satisfatório e gerou a dúvida:

é possível chegar à velhice sem precisar usar remédios para ter ereção? (Francisco Cuoco, p. 195)

Fonte: https://www.bol.uol.com.br/

Em entrevista à revista "Contigo!" desta semana, Stênio admitiu que já fez uso do Viagra e relatou que não teve uma boa experiência com a pílula. "Nunca mais uso remédio para impotência sexual, porque me faz muito mal. Experimentei o tal do Viagra, e o coração veio na boca", disse ele. (Stênio Garcia, p. 197) Fonte: https://extra.globo.com

Os discursos biomédicos têm se dedicado a um sintoma que afeta o corpo biológico e o classifica como uma crise de masculinidade – a disfunção erétil. Descrita como uma desordem e referenciada como um problema de saúde, a disfunção erétil é entendida como a incapacidade de obter ou manter uma ereção peniana suficiente para uma relação sexual satisfatória. Diferentemente das mulheres, cujas tecnologias de si eram muitas vezes direcionadas à proteção do corpo em função da maternidade e cujos desejos sexuais eram desaconselhados, para os homens, o caráter viril era incentivado. Assim, as teorias médicas, ao tentar reger os corpos, envidaram esforços no sentido de contribuir com essa manutenção da virilidade masculina através de implantes penianos. Todavia em uma de suas prescrições, um medicamento utilizado para fins cardiológicos provocou, dentre as reações adversas, a ereção peniana passando então a ser utilizado com o fim de minimizar os problemas da disfunção erétil. Feito essa contextualização inicial, percebe-se como o cuidado com a sexualidade masculina no tocante ao prazer sexual é algo que desperta tamanho interesse. As estratégias biopolíticas intervêm nos diferentes aspectos e momentos da vida e o poder sobre a vida se instaura de forma incisiva. Em função de o discurso médico definir os mecanismos de funcionamento do corpo humano em suas diferentes idades, enquadrando o idoso no padrão biológico limitado, os discursos, em geral associam a sexualidade do idoso à necessidade premente de alguma intervenção medicamentosa. Dessa forma, quando o ator Francisco Cuoco verbaliza a não utilização de remédios para melhoria de sua performance sexual, tal colocação desperta dúvida e curiosidade sobre tal possibilidade. 137

Interessa-nos destacar que o cuidado de si utilizado pelo ator denota uma prática de si voltada para uma autovigilância. Não lhe interessa estar nas estatísticas médicas que enquadram o idoso na lista daqueles com alterações no desempenho sexual. Não lhe cabe a responsabilidade de exercer algum tipo de convencimento sobre seus pares acerca de sua sexualidade. Nesse sentido, ao renunciar os estereótipos que tentam arrancar uma confissão voltada ao uso de artefatos médicos, o ator se contrapõe, subjetivando-se através de práticas de liberdade. Conforme menciona Mendes e Glayse (2014, p. 515): ―Trata-se de se propor conselhos que permitam práticas de liberdade e não de escravidão.‖ Diante disso, percebe-se que as discursividades apresentadas pelo ator Francisco Cuoco produzem efeitos de sentido que o desvinculam da condição de idoso quando da não necessidade de recursos medicamentosos na prática sexual. O cuidado de si permeia uma ocupação consigo no tocante a uma vigilância constante sobre o funcionamento do seu corpo. Atrelado a isso, a idade de sua companheira surge na matéria como um elemento a mais a referenciar a subjetividade do ator fora dos moldes da decreptude e da condição de refugo. O reflexo dessas discursividades é percebido nas curiosidades que o tema levanta junto à possibilidade de adentrar a essa idade sem problemas de disfunção erétil. Ainda acerca da constituição de subjetividades, o ator Stênio Garcia aponta que já fez uso de medicamento para impotência sexual, mas que os efeitos colaterais foram danosos ao coração. Diferente do discurso de Francisco Cuoco que simplesmente informa a não utilização de medicamentos para potencializar suas relações sexuais, sem adentrar em detalhes, Stênio Garcia justifica sua interrupção no processo de uso demonstrando cuidados diferentes na ocupação de si. Tais posicionamentos reafirmam o que Foucault (1991) já descrevia em torno das tecnologias do eu – não é só o conhecer-se que interessa, mas a forma de se governar, de entender que o objetivo maior reside em nós mesmos e não no que os outros nos ditam. Dessa forma, não importa onde os princípios normativos o enquadrem – seu autogoverno o direcionará para a melhor escolha. Essas discursividades que atravessam os dizeres de Stênio Garcia apontam para um processo de vigilância constante sobre seu próprio corpo ao ponto de confessar a necessidade de utilização de estimulante sexual. Contudo, os efeitos de sentido advindos dessas discursividades apontam que os medicamentos foram nocivos ao ponto de fazê-lo recuar. Nesse caso, o processo de vigilância assume agora uma conotação de proteção corpo que se mostra mais importante do que o desempenho sexual. Isso contribui para a percepção de 138 como as matérias veiculadas pela mídia têm, na temática da sexualidade, um forte controle das reais condições da celebridade idosa, subjetivando-a de forma positiva ou não. Nesse percurso que categoriza a sexualidade, aqui entendida como algo que faz parte de nossas condutas, um dos componentes dessa série enunciativa destaca a percepção do corpo e da forma como o sujeito se constitui a partir dele como padrão de sexualidade. Vejamos:

Assim como Sonia Braga e Vera Fischer, Betty é um ícone dos anos 70. Simbolizando a mulher independente, livre, que sabe pensar por conta própria, ela não poderia deixar de fascinar os homossexuais. Ela virou até verbete do Aurélia, o dicionário de termos gays. Betty Faria é ―uma expressão usada quando se vê alguém que é bonito e gostoso e que incita o desejo sexual‖. (Betty Faria, p. 161) Fonte: http://www.virgula.com.br

Apesar de Sônia Braga e Vera Fischer representarem um ícone na década de 70, a atriz Betty Faria representa aqui não apenas um padrão de beleza, mas é subjetivada pela mídia como uma mulher livre, empoderada, requisitos que fascinam os homossexuais. Considerando que esse enunciado poderia ensejar outras formas de categorização, o que chama a atenção nesse caso, é como a mídia utiliza os padrões de beleza referendados também por atitudes do indivíduo como algo que incita o desejo sexual ao ponto de se transformar em verbete de dicionário. Aqui, não apenas o sobrenome (Faria) denota a intenção do verbete, mas a própria subjetividade da atriz que se considera ―rebelde por natureza‖, numa analogia às tecnologias de si que ensejam as práticas de liberdade em seu histórico e que sempre trazem à tona seu comportamento sexual. Esse modo de subjetivação está latente no livro de mesmo nome – ―Rebelde por natureza‖ que traduz um pouco essa resistência aos padrões impostos sobre os corpos e sobre a vida. Na citação acima, não é a atriz que se subjetiva, mas a mídia que a subjetiva enquanto referência de símbolo sexual que incita o desejo de homossexuais. Nos dizeres de Foucault (2014a, p.251): ―A sexualidade faz parte de nossas condutas. Ela faz parte da liberdade de que gozamos neste mundo. A sexualidade é algo que nós criamos nós mesmos - ela é nossa própria criação, muito mais que a descoberta de um aspecto secreto de nosso desejo.‖ Ela é constitutiva da subjetividade. A partir dessa perspectiva, a mídia encontra nas principais discursividades de Betty, sentidos que a subjetivam como alguém rebelde, à frente de seu tempo, resistente e empoderada o que contribui para sua fixação nos espaços de visibilidade. Aqui, mais do que as questões estéticas, sobrepõe-se a subjetividade profissional somada à marca de muitas de suas personagens que a configuram como fora dos padrões de exclusão.

139

9.1.3.3 - Mobilidade social

Dentro de uma estrutura social, o cenário referente às mudanças de classes para as celebridades idosas (os) tem demonstrado dificuldades semelhantes àquelas de outras categorias. Acostumados com o glamour que representa o fazer parte de uma classe artística que é vista com certa frequência em diferentes campos midiáticos, a manutenção de seus locais de trabalho nem sempre se configura em algo tranquilo durante as etapas da vida. Enquanto para alguns a saída de cena pode representar um autogoverno, uma decisão pessoal, para outros, a governamentalidade que incide sobre eles, determinando seu momento de saída de forma imperiosa, torna-se um fator excludente que os leva a uma subjetivação capaz de configurá- los como indivíduos produtivos. Nessa perspectiva, algumas discursividades são apresentadas:

"Essa palavra gratidão está na moda, mas eu a uso há anos porque chegar na minha idade e poder

conversar com alguém mais jovem e passar uma coisa boa, só me dá mesmo gratidão. Sou uma sobrevivente de

tempos, tempestades e trovoada. Estou contentinha de trabalhar, fazer novela", comenta. (Betty Faria, p. 170)

Fonte: http://noticiasdatv.uol.com.br

Para Ruth, o segredo de tamanha vitalidade é um só: não parar nunca! ―Deus tem sido muito generoso

comigo. Desde que comecei a trabalhar, nunca parei. Numa profissão instável como a minha, é uma bênção de

Deus ter podido estar sempre ativa‖, agradeceu, durante a coletiva de Se Eu Fechar os Olhos Agora. (Ruth de

Souza, p. 188)

Fonte: http://www.afreaka.com.br

Bom dia pessoal! Tudo bem? Quero agradecer a Deus esse lindo dia! Hoje acordei cedo apesar de estar escrevendo só agora para vocês. Praticamente daqui um mês farei 92 anos, se Deus quiser! Neste momento me encontro no aeroporto do Galeão à espera de um voo para São Paulo. Vou participar de um evento amanhã pela manhã com ―influencers‖ digitais. Estou comentando isso só para dizer que não é mais fácil viajar na minha idade, a movimentação do aeroporto, todos com muita pressa. Escadas rolantes, grandes distâncias entre um portão e outro, longas esperas mas a gente só nota isso depois que envelhece. Mas eu ainda não desisti de trabalhar! Isso me dá satisfação e a sensação de estar envolvido com o movimento da vida me dá ânimo. (Cid Moreira, p. 192) Fonte: https://www.1news.com.br

As produções discursivas trazidas pelas atrizes Betty Faria, Ruth de Souza e pelo jornalista Cid Moreira produzem efeitos de sentido que perpassam pela resistência em se manterem fazendo algo que gostam, ao mesmo tempo em que reconhecem que não é uma tarefa fácil e uma realidade de poucos. 140

Em um dos momentos, Betty Faria chega a relatar que o simples fato de conversar com alguém mais jovem já representa um motivo para agradecer e comenta o quanto está feliz por trabalhar. Sob essa mesma perspectiva, a atriz Ruth de Souza reconhece a dificuldade de se manter atuando numa profissão tão instável e agradece a Deus o fato de continuar trabalhando. Já o jornalista Cid Moreira chama a atenção não apenas pelo relato de dificuldade na mobilidade física dentro de um aeroporto onde as distâncias internas geram um dispêndio de energia significativo para sua idade, mas pelo motivo que o fez desconsiderar esses obstáculos – sua participação em evento com ―influencers‖ digitais – algo pouco provável para alguém de 92 anos. A mobilidade social aqui atravessa diferentes percursos em busca de um mesmo fim, constituir-se subjetivamente ativo para que isso se configure em requisito facilitador nas relações de trabalho. Analisando-se o percurso profissional das três celebridades, pode-se perceber características distintas entre eles. Betty Faria tem um histórico televisivo marcado por protagonismo em novelas e por personagens marcantes que ainda hoje a referenciam. Em sua biografia oficial intitulada ―Rebelde por natureza‖, publicada em 2006, a atriz é descrita como símbolo da mulher bonita, gostosa, faceira, interessante, de nariz arrebitado e corpo com tudo em cima. A diferença está apenas no aumento das rugas e da sabedoria. A atriz Ruth de Sousa, por sua vez, falecida em 2019, aos 98 anos, desbravou o cenário artístico sendo considerada a primeira artista negra a conquistar projeção na dramaturgia brasileira e a primeira artista negra a aparecer na capa da revista Manchete. Sua biografia traz relatos da rejeição e descrença das pessoas à sua escolha pela carreira de atriz em um período em que as questões étnico-raciais eram ainda mais graves. Já o apresentador Cid Moreira tem uma longa trajetória no jornalismo e em 2019 chegou à marca de 50 anos de contrato com a Rede Globo com renovação assinada para mais cinco anos. Quando nos reportamos a esse breve percurso histórico e fazemos uma justaposição aos discursos analisados, entendemos um pouco como se constituem as subjetividades dos artistas citados a partir da mobilidade social. Em todos encontramos sinais de resistência, mesmo em nuances diferentes. Muitos dos efeitos de sentido apontados nos discursos de Betty Faria coadunam com as referenciadas pela maioria de suas personagens – fortes, altivas, marcantes, resistentes, além de sua imagem ainda estar ligada a algumas personagens (como Tieta, por exemplo). Já as produções discursivas de Cid Moreira indicam que o mesmo está 141 recorrendo a outras possibilidades de empregabilidade que não apenas a de apresentador, inclusive enveredando em áreas que são mais facilmente utilizadas por jovens, a exemplo dos influenciadores digitais. Essas discursividades podem apontar também para uma resistência aos fatores limitantes da mobilidade física em face da mobilidade tecnológica. Dessa forma, os obstáculos parecem não existir frente a sua capacidade de adaptação ao novo. E Ruth de Souza que fez de sua própria trajetória de resistência um motivo para ser referenciada em trabalhos. A atriz se manteve em cena até o ano de 2019, meses antes de seu falecimento. Dessa forma, as tecnologias do eu utilizadas pelas celebridades a partir das produções discursivas apresentadas estão direcionadas a uma resistência oriunda de uma prática de si que reconhece sua própria história como marca de mobilidade social positiva. É bem verdade que a mobilidade social aqui defendida não é uma ascensão a postos crescentes de visibilidade, mas a manutenção da visibilidade já adquirida através de anos de trabalho. Diante desse cenário, é perceptível que as discursividades apontam para sentidos que expressam sentimento de gratidão ao fato de ainda ter espaço para trabalhar, resistência às dificuldades que insistem em considerar o idoso como facilmente substituível e de autogoverno quando impulsionam idoso ao desafio de novas descobertas. Bem mais do que o conhecer a si mesmo, está envolto aqui a prática de si através de uma ―forma de atividade vigilante, contínua, aplicada, regrada, etc‖. (FOUCAULT, 2004b, p.77). Ao longo da pesquisa, outras discursividades mereceram atenção dentro de uma perspectiva de mobilidade social das celebridades. Muitas delas, volto a destacar, podem ser analisadas em outras categorias já que atravessam mais de um contexto. Vejamos algumas produções discursivas das atrizes Laura Cardoso, Nathália Timberg e da cantora Elza Soares:

―Ah, não sou muito de férias nem de aposentadoria. Acho que, se você parar, morre alguma coisa por dentro. Trabalho é vida, faz a cabeça e o corpo funcionarem, o coração pulsar forte.‖ (Laura Cardoso, p. 173)

Fonte: https://www.brasilsenior.com.br

―Nunca que quero me aposentar e fazer tricô, já falei 500 vezes, não sou a velhinha que faz tricô, sou um demônio, quero trabalhar, interpretar, fazer mil vidas. Até sei fazer tricô, mas não, ficar quietinha, não. Não posso viver sem trabalhar, sem me imaginar fazendo teatro, TV, cinema, não consigo, aí eu morro‖. (Laura Cardoso, p.174) Fonte: https://istoe.com.br

―No dia que eu parar, é porque morri e esqueci de cair―. ―Só me sinto bem trabalhando‖ (Nathália Timberg, p. 176) Fonte: https://rd1.com.br

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BBC Brasil - Então como você se sente na fase de vida em que está hoje? Elza Soares - Completamente bem, fantástica, maravilhosa, trabalhando, viajando muito. Sucesso absoluto. Feliz. (Elza Soares, p. 168) Fonte: https://www.bbc.com

Alguns pontos nos chamam atenção nos enunciados acima. Um deles é a tentativa de controle dos corpos no sentido de direcionar as celebridades à aposentadoria como um pressuposto óbvio de escolha de quem chega a essa fase. Representativamente falando, seria a linha de chegada após um longo percurso de corrida. Nesse caso, o apogeu da mobilidade social seria alcançado e ali estagnaria sem, contudo essa estagnação ser considerada maléfica. Em outros momentos, a mobilidade social é interpretada como um deslocamento de uma área profissional para o lazer, voluntariado ou afazeres domésticos canalizando a constituição de subjetividades para modelos estereotipados. Os discursos elencados, no entanto, demonstram uma resistência a esse poder que rotula uma população acima de 60 anos a seguir, necessariamente, o caminho da aposentadoria. Essa forma de controle é mais ampla uma vez que não restringe o grupo àqueles considerados incapacitados biologicamente, ao contrário, enquadram todos os seus integrantes na mesma realidade. Independente da idade mínima legal para tal procedimento, o que não é o objeto desse estudo, ao adentrar nessa linha limítrofe, os discursos de controle já são direcionados para esse fim. A aposentadoria é vislumbrada como algo além do refugo humano, é o princípio da finitude. Nesse sentido, a partir da definição de Foucault (1995, p.55) acerca dos ―modos de subjetivação como sendo todos os processos e as práticas heterogêneas por meio dos quais os seres humanos vêm a se relacionar consigo mesmos e com os outros como sujeitos de um certo tipo‖, não se pode considerar que todas as celebridades idosos (as) se subjetivem de um mesmo modo. Há que se considerar também que as verdades produzidas pelas celebridades são permeadas por um discurso da mídia que, em geral tenta produzir efeitos com base na renúncia do idoso ou em um contraponto de resistência. Elementos como esse podem ser destacados no enunciado de Laura Cardoso quando menciona: ―[...] já falei 500 vezes, não sou a velhinha que faz tricô, sou um demônio, quero trabalhar, interpretar, fazer mil vidas‖. Ou seja, não adianta insistir em querer subjetivá-la a partir de sua idade como se o trabalho não fosse mais uma opção para ela. Com isso, deixa sua marca de autogoverno, contrapondo- se ao controle biológico das teorias médicas. 143

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procure o que é bom, forte e bonito em sua sociedade, e desenvolva-se desde lá. Empurre-se para fora. Sempre crie a partir do que você já tem. Então, irá saber o que você tem que fazer.

(Michel Foucault)

Atravessar uma parte desse universo discursivo do idoso foi uma tarefa, no mínimo, fascinante. Quando adentrei nessa experiência, o mundo no qual circulava era voltado a idosos institucionalizados e a outros que frequentavam a educação básica quer na condição de matriculados, quer na condição de responsáveis por seus netos no deslocamento para a escola ou na integralidade da educação e desenvolvimento desses. Foram eles, na verdade, o elo que me direcionou ao estudo das subjetividades a partir do olhar enquanto profissional e educadora na área de Educação Física. Independente das denominações ou das fases - velho, idoso, terceira idade, novo idoso, melhor idade, eles estão ali, presentes e em número crescente, se formos considerar os levantamentos estatísticos no Brasil e em diversos outros países. Para muitos, são invisíveis e se somam a tantos outros refugos distribuídos em categorias profissionais mundo afora. Para outros, fonte de investimento e lucro, foco de estratégias de marketing e de vendas. Acompanhei durante muitos anos o cotidiano de alguns desses idosos, em especial, os institucionalizados e percebi alguns modos de subjetivação dentro de um ambiente em que nem todos tinham mais condição de se ausentar, ou seja, toda a sua rotina se desenrolava praticamente no mesmo lugar. Em contrapartida, os idosos que frequentavam a escola regular e que tive a oportunidade de também acompanhar, tinham acesso ao universo de informações que contribuíam para modos de subjetivação distintos a contar pela própria possibilidade de deslocamento que os permitia adentrar em diferentes espaços. Nesse sentido, a corporeidade, enquanto critério de observação, exerce um papel de relevância no processo de constituição de subjetividades desses dois grupos principalmente no tocante ao controle existente sobre os corpos institucionalizados uma vez que a higiene pessoal em grande parte é realizada por outrem e a alimentação, prática de atividades físicas e deslocamentos acontecem dentro de um sistema de normas de controle. 144

Nesse intervalo, tive acesso ao vídeo intitulado ―Velho Quem?‖ da campanha ―Envelhecer Sem Vergonha‖ promovida pela Pfizer Brasil. O referido vídeo confrontava as discursividades de pessoas jovens e de idosos a partir do questionamento: o que se ganha e o que se perde quando ficamos velhos? Os protagonistas dessa campanha não eram celebridades, eram pessoas de 16 a 85 anos, desconhecidas do ambiente publicitário e que estavam ali conversando sobre livros, aventuras, esportes praticados (inclusive os radicais), expectativas sociais e processo de envelhecimento. Os resultados da exibição produziam efeitos de sentido sobre quem seriam os ―verdadeiros idosos‖ nas produções discursivas, e como as subjetivações apresentadas pelos dois grupos os constituíam enquanto sujeitos. O contato com esse vídeo e com o anúncio publicitário de oferta de serviços para idosos em pleno período natalino me trouxe algumas reflexões. Para o grupo que se encontrava acima dos 65 anos, o cuidado de si era baseado em suas próprias escolhas, no autoconhecimento quanto às suas limitações e até quanto à formulação de estratégias para ultrapassar seus limites pessoais. O público-alvo do anúncio publicitário, contudo, era os familiares daqueles com idade acima de 65 anos que, utilizando-se de suas formas de controle, definiam o destino de seu idoso durante as comemorações de Natal, ação de biopoder que se assemelha à forma como muitos nessa etapa da vida são conduzidos às ILPIs (Instituições de Longa Permanência para Idosos). Se aquelas pessoas estavam ali, subjetivando-se de diferentes modos, num espaço publicitário, desprovidos do status de celebridades, como se daria então a constituição de subjetividades de celebridades idosas? O resultado dessa viagem pela Linguística Aplicada, norteada pelos conhecimentos de Foucault, Bauman e outros importantes pesquisadores mostrou o quanto as discursividades apresentadas pelas celebridades representam a luta para a construção de suas próprias versões de verdade. A subjetividade dos artistas atravessou saberes de diferentes campos e posições diversas foram assumidas por eles, a depender da categoria analisada, o que corrobora com os estudos de Foucault (2004b) de que a subjetividade não é algo estanque, imutável. Isso não caracteriza que o discurso possa ser eivado de mentiras em um momento e verdadeiro em outros, já que ―a ―verdade‖ não existe, mas, ―regimes de verdade‖. Ou seja, ―discursos que funcionam na sociedade como verdadeiros‖ (FOUCAULT, 2002). Nesse percurso discursivo, o corpo, um dos elementos categóricos que mais ensejam estudos, contribuiu como um parâmetro de resistência mediante o uso das tecnologias de si com vistas à constituição de subjetividades. Os regimes de verdade demonstrados nas produções discursivas acerca do corpo apontaram para uma produção de sentido muito mais 145 direcionado à necessidade de manutenção dos padrões de saúde como critério mínimo de permanência no cenário midiático do que de construção de um padrão jovial de beleza. Assim, muito mais do que tentar resgatar uma beleza anterior, mediante técnicas de rejuvenescimento, a celebridade idosa resiste às intempéries da idade com cuidados que a mantenham autônoma e independente para o trabalho. Em alguns casos, entretanto, essa resistência se dá até mesmo de forma relativa quando num processo de vigilância interna, o autogoverno se apresenta sob a forma de cadeiras e almofadas como visto em Elza Soares. Essa resistência marcante do corpo representou, também, uma recusa ao processo de liquidez referenciado por Bauman (2015) que apresenta o quanto a sociedade tem tornado as coisas, os indivíduos, os amores, efêmeros. Se tudo é liquido, se a vida atravessa por entre os dedos e se dissipa com tamanha fluidez, a celebridade idosa se constitui de forma a refutar a condição de refugo que faz dela alguém normativamente substituível e facilmente excluída. A pesquisa demonstrou, ainda, a atuação da mídia enquanto agente executor do poder disciplinar junto aos corpos apresentando discursividades que apontam uma relação estreita com a necessidade de manutenção dos padrões de beleza por parte do artista. As temáticas presentes nas produções discursivas e que foram objeto de categorização nesta Tese, corroboram para a produção de efeitos de sentido em que, quanto mais atenção for dada à estética e, por conseguinte, à corporeidade por parte da celebridade, mais distantes ficam os enunciados em torno da velhice enquanto momento eivado de negatividades. As matérias relacionadas à Ângela Vieira, Bruna Lombardi e Maitê Proença são exemplos desse biopoder que impõe a necessidade de corpos sempre bem cuidados como requisito para uma exposição positiva na mídia fazendo crer que o sucesso do envelhecimento ativo é o resultado de suas próprias escolhas. Em contrapartida, quando as matérias veiculadas têm como protagonistas celebridades acima de 80 anos ou que apresentem alguma incapacidade, os enunciados perpassam pela finitude (medo da morte e perda de parentes e colegas de palco), incapacidade funcional e resgate nostálgico de períodos áureos da beleza. Para esses, o poder disciplinar incide sob forma de cobrança culpabilizando-os pelos insucessos, redução da empregabilidade e críticas recebidas, subjetivando-os negativamente, conforme discursividades relacionadas à Betty Faria, Elza Soares e Neuza Borges, por exemplo. Assim, a mídia instiga a produção de corpos saudáveis como condição precípua para uma constituição de subjetividades que favoreçam a manutenção daquela celebridade em visibilidade. Em resposta a tais discursos, as celebridades se munem de técnicas de si baseadas na resistência e no histórico de profissionalismo construído ao longo dos anos, tentando se 146 contrapor aos efeitos de sentido que tentam constituí-los enquanto indivíduos fora do padrão adequado para os dias atuais. Esse nível de profissionalismo, inclusive, referenciou a ocupação de espaços considerados estratégicos na televisão brasileira, como analisado nos enunciados de Ruth de Souza. Desde cedo, seu discurso foi pautado na resistência e em práticas de liberdade quando, ainda criança, era ridicularizada pelo desejo de se tornar atriz na condição de negra e com poucos recursos financeiros. Não só conseguiu seu intento como foi considerada a primeira negra a se projetar na dramaturgia e a ser capa de revista, algo ainda escasso na mídia em dias atuais. Essa mobilidade social, ancorada no profissionalismo, contribuiu para sua manutenção no cenário midiático até os 98 anos, quando veio a falecer. Esse deslocamento cronológico caracterizado pela luta e resistência ao longo da trajetória repercute em uma prática de si que incide no outro. Suas produções discursivas, em geral, contrapunham-se às discursividades ancoradas no estigma étnico-racial e posteriormente na idade, enaltecendo a mobilidade social por competência e profissionalismo. Dessa forma, a luta da atriz também representava uma luta daqueles que vivenciavam situações semelhantes. Seu discurso era, portanto, atravessado por muitos outros ―eu‖. Nesse percurso discursivo, retomo uma referência que fiz acerca das subjetividades plásticas. Essa plasticidade, aqui entendida como um emaranhado que se ramifica em diferentes práticas discursivas para a efetiva constituição do sujeito, nos permitiu conhecer algumas celebridades que há anos adentram às nossas casas. Com isso as produções não eram provenientes de um personagem ou de um jornalista /apresentador em meio a uma reportagem, mas do próprio sujeito que ali se constituía. Em função disso, a categorização da pesquisa trouxe reflexões acerca desses modos de subjetivação apontados pelas discursividades de tais artistas. Quanto à percepção e concepções acerca da velhice, os elementos linguísticos presentes na pesquisa apontaram para celebridades idosas que se constituíam a partir de técnicas de resistência frente a discursos midiáticos que desfavoreçam sua visibilidade. Assim, não só se opunham à desvalorização que se atribui ao sujeito idoso como rejeitavam os discursos que os referenciavam tomando como base apenas os aspectos biológicos trazidos pelo processo de envelhecimento. O cenário atual traçado pelo sujeito idoso apontou para questões relativas à finitude do ser, a importância do corpo frente a esse cenário e os possíveis traços de solidão associados à velhice. Nesse contexto, as celebridades acima de 80 anos, em geral reconheciam e identificavam a proximidade da finitude quando enumeravam os amigos de profissão que não mais se faziam presentes nesse plano. Outras se esquivavam do assunto num processo de 147 rejeição à sua inserção nessa etapa da vida e incluíam no cenário atual os planos para o futuro. As produções discursivas relacionadas ao corpo, enquanto integrante importante na constituição de subjetividades, apontavam para a condição de refugo, com enunciados midiáticos que enalteciam a decreptude do ser e reiteravam as dificuldades de mobilidade, as dores e as mudanças negativas quanto à estética. Contudo os elementos linguísticos presentes nos discursos das celebridades idosas acerca do corpo direcionavam para a liberdade, resistência e o autoconhecimento quando optavam por assumir os fios brancos e se contrapunham ao controle do vestuário estabelecido para a idade, por exemplo. A solidão compôs as produções discursivas de forma bastante sutil uma vez que a citação explícita do tema foi mencionada apenas por uma atriz. Entretanto, nas entrelinhas de outras celebridades pôde-se inferir efeitos de sentido atribuídos à solidão quando reiteravam a necessidade de retorno ao trabalho e enalteciam sua capacidade laborativa. Com isso, utilizavam o corpo sob a perspectiva da funcionalidade, autonomia e independência como autoafirmação do cuidado de si. A sexualidade, assim como a solidão, constituiu-se numa temática pouco mencionada, de uma forma explícita nos discursos. As discursividades apresentadas pela mídia apontavam para a necessidade de utilização de medicamentos para impotência o que fora refutado em alguns casos e admitido em outros pelas celebridades. Entretanto, alguns elementos linguísticos apontavam a referida temática quando das técnicas de si voltadas ao cuidado e à proteção com o outro, além do companheirismo. Assim, enveredar por um universo discursivo que agrega a corporeidade, envelhecimento, subjetividades e o cuidado de si me permitiu refletir sobre os jogos de verdade que circundam os indivíduos nos diferentes espaços por eles ocupados e como a mídia exerce influência através do biopoder, destacando a longevidade, mas associando a capacidade produtiva aos cuidados com o corpo e utilizando-se do poder disciplinar para criar corpos saudáveis e produtivos. Reconheço que a teia produzida por esse emaranhado discursivo nos fará chegar a outras subjetividades, apontando outros efeitos de sentido e conduzindo a outras verdades, inclusive em categorias diferentes. Muito há que se falar ainda sobre as subjetividades de pessoas idosas. Por reconhecer ser essa Tese apenas um recorte que se soma a outros estudos aqui apontados e percebendo as lacunas ainda presentes dada, a riqueza e amplitude da Linguística Aplicada, entendo tais lacunas como novas possibilidades de investigação e que me levarão a novas pesquisas. 148

Assim, considero ser esse o ponto de partida para o estudo de subjetividades de atletas que se encontram fora do cenário competitivo. Enquanto profissional de Educação Física, enveredar pela área do envelhecimento me trouxe inquietações quanto às subjetividades de atletas de alto nível cujo poder disciplinar é bastante incisivo no critério idade e corporeidade. Se muitas modalidades esportivas atribuem o declínio de uma carreira quando se adentra a terceira década de vida, idade considerada o apogeu para outras ocupações, como se subjetivam, então, tais atletas? Como eles reagem aos discursos de verdade que os apontam como velhos aos 35 anos de idade? Que tecnologias do eu são utilizadas para confirmar ou refutar tal verdade? Como os clubes e federações esportivas se utilizam do biopoder para formar atletas com corpos mais longevos? Há, portanto, um longo caminho a se percorrer...

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157

ANEXOS

158

ANEXO A

ANA MARIA BRAGA

Noiva! Ana Maria Braga anuncia casamento e dasabafa sobre idade A apresentadora teve a mão pedida pelo namorado francês, Johny Lucet, de 55 anos

Ana Maria Braga, de 70 anos, foi pedida em casamento pelo namorado francês, Johny Lucet, 55, com quem se relaciona há alguns meses. Em entrevista à revista Caras, a apresentadora do Mais Você desabafou sobre ser noiva com sua idade e rasgou seda para o amado.

―Por que não [se casar]? Não tem muito mais o que fazer, não tenho mais 20 anos para noivar, etc.. Adoro um casamento! Choro em todos que vou. É unir as pessoas que se amam, gostam, que se dão bem, não tem muito por que não casar‖, disse.

―Ele é um cara incrível. Johny fez tudo à moda antiga. Pediu minha mão à família, com as crianças. Nos encontramos, foi uma coincidência, encontro casual‖, emendou Ana Maria.

Ela, que deu início ao relacionamento com Lucet durante uma viagem a Portugal, acrescentou: ―Percebemos que estamos em momentos da vida que queremos olhar para o futuro com mais tranquilidade e parceria‖.

―As borboletas estão batendo no estômago, não importa a idade que se tem. É isso que faz renovar a vida, a esperança e a felicidade‖, completou a loira.

Disponível em Acesso em: 24 jan. 2020.

159

ANEXO B

ÂNGELA VIEIRA (03/03/1952)

Ângela Vieira tem vivido uma trajetória interessante com seu papel em Bom Sucesso. Ela interpreta Vera, uma senhora divorciada que chegou na novela muito confusa, querendo casar com Alberto (Antonio Fagundes), e evoluiu ao longo da trama. A personagem hoje é empoderada, criativa e conselheira, e a própria atriz se sente orgulhosa por representar a terceira idade em um país que ela define como preconceituoso com idosos.

Aos 67 anos, Ângela Vieira diz que Vera é muito bem construída e que se identifica com o humor e o otimismo da personagem. Ela também se sente bem ao levar ao público que um casal de idosos pode se encontrar e ser feliz nessa fase da vida.

"Lamento por ainda termos essa postura em relação às pessoas mais velhas [de desvalorização]. Não levanto bandeira, mas sigo minha vida tentando me manter ativa, atenta e rejeitando qualquer tipo de preconceito. O Brasil ainda é um país muito preconceituoso. Para um relacionamento amoroso não há regras etárias‖, afirma.

ESTÁ COM TUDO Coroa empoderada em Bom Sucesso, Angela Vieira diz que Brasil é preconceituoso... - Leia mais em https://noticiasdatv.uol.com.br/noticia/novelas/coroa- empoderada-em-bom-sucesso-angela-vieira-diz-que-brasil-e-preconceituoso-32452?cpid=txt. Publicada em 11/01/2020. Acesso em 22 de jan. de 2020.

160

ANEXO C

BETTY FARIA (08/05/1941)

1- BETTY FARIA Atriz de A Força do Querer reclama da velhice: 'Melhor idade é o cacete'...

Aos 76 anos, Betty Faria entra em A Força do Querer como Elvira, uma senhora que vai se aventurar em bailes funks e chocar com sua postura "aberta ao novo

Para a atriz, que no ano passado teve de operar os dois joelhos, envelhecer não é tão agradável quanto sua personagem fará parecer. "É um saco, melhor idade é o cacete!", diz às gargalhadas....

Disponível em Acesso em 22 de jan. de 2020.

2- Betty sofreu muito com dores nos joelhos. Durante o trabalho em Boogie Oogie (2014) tomava uma injeção a cada 15 dias. "Faço fisioterapia para fortalecer as pernas, mas não posso dançar nem muito menos usar salto alto. E eu gosto desses saltos altos de ―cachorra‖, como eu gosto... -

3- Ela trabalha sua cabeça para encarar o passar dos anos. Diz que psicologicamente é muito difícil envelhecer. A veterana foi musa da TV nos anos 1970 e 1980. Posou nua e até hoje é lembrada pela fogosa protagonista da novela Tieta de 1989.

3-Budista há 20 anos, ela afirma que cuidar do lado espiritual também é muito importante para sobreviver com dignidade. A atriz diz que cultiva diariamente a "gratidão de estar viva" como um mantra.

4- "Essa palavra gratidão está na moda, mas eu a uso há anos porque chegar na minha idade e poder conversar com alguém mais jovem e passar uma coisa boa, só me dá mesmo gratidão. Sou uma sobrevivente de tempos, tempestades e trovoada. Estou contentinha de trabalhar, fazer novela", comenta. 161

5- "O que é bom [na terceira idade] é só essa liberdade de não precisar virar uma velha loira, ficar assim natural, como estou. Meu cabelo está virgem, é a cor que tenho agora", diverte-se.... Disponível em Acesso em 22 de jan. de 2020.

6- De gíria gay à polêmica do biquíni, Betty Faria continua um ícone da identidade nacional.

Uma das mulheres mais cariocas e, ao mesmo tempo brasileira e universal, atende pelo nome de Betty Faria (talvez só perca para a Garota de Ipanema, mas esta, sabemos, é paulista). A atriz, que completa 73 anos, nesta quinta-feira (08), esteve de volta aos assuntos das rodinhas nacionais com a recente reprise da novela Água Viva, no canal Viva, e também por ter tido a ―ousadia‖ de ir à praia de biquíni.

Sobre este último episódio, ela recebeu uma avalanche de críticas por ter ido à praia de biquíni e, aos caretas e vigilantes da vida alheia, respondeu irônica se queriam que ela fosse de burca. O fato gerou uma discussão sobre o direito (novamente) das mulheres vestirem o que bem entenderem assim como sobre como deve ser encarada a velhice.

―Pude viver momentos de beleza, não tenho mais, mas não é por isso que não vou poder ir à praia de biquíni. Não sou ressentida, posei três vezes para a Playboy e tenho o direito de ficar velha. Se não gosta, não publica, não olha, deleta, vai a m… Fiquei com raiva porque me arrasaram. É como se quisessem que eu estivesse com o porte da Tieta‖, disse a atriz para a série Depoimentos para a Posteridade, do Museu da Imagem e do Som (MIS), no Rio de Janeiro e reproduzido pelo jornal O Globo.

Ela afirma que, apesar de todo o policiamento que fizeram, ela continua indo à praia de biquíni, quase como um ato de resistência.

Assim como Sonia Braga e Vera Fischer, Betty é um ícone dos anos 70. Simbolizando a mulher independente, livre, que sabe pensar por conta própria, ela não poderia deixar de fascinar os homossexuais. Ela virou até verbete do Aurélia, o dicionário de termos gays. Betty Faria é ―uma expressão usada quando se vê alguém que é bonito e gostoso e que incita o desejo sexual‖. 162

Enfim, seja para gays, idosos, cariocas e brasileiros de todas as regiões, Betty Faria continua divando!

Disponível em - Publicado em 08 de maio de 2014. Acesso em 17 de jan. de 2019

7- BETTY FARIA DIZ TER PREPARADO A CABEÇA PARA ENVELHECER E DEFENDE REGINA DUARTE: 'EGO MAL RESOLVIDO E MACHUCADO' A atriz que foi bonita, famosa, a namoradinha, se não trabalhar o ego, vai ficando magoada. Essa é a cilada. E quando aparece um trabalho que dá a chance de a pessoa aparecer, um trabalho em que ela se dá importância, acontece isso. Foi isso que aconteceu com a Regina. Um ego mal resolvido e machucado. Fiquei pensando muito nela e por que a pessoa vira isso de repente". É assim que, na flor de seus 79 anos de vida, Betty Faria descreve a recente situação vivida por sua colega, que, assim como ela, passou a vida sendo desejada e protagonizando novelas na TV. Para não cair no que ela chama de "cilada", a atriz disse que se preparou, emocional e espiritualmente, para o passar dos anos.

"O ego da atriz que foi famosa e bonita é muito mais duro. É mole ficar velha se você foi a coadjuvante e a baranga a vida inteira. Primeiro porque, mais velha, você desperta menos tesão. Tem sempre alguém que gosta um pouco, mas não era como antes. Além disso, a pessoa tem que saber que o protagonismo é dos mais jovens, os papéis não terão o mesmo destaque. A atriz vai sofrer com a idade se não estiver trabalhando a cabeça. Trabalhei muito a minha. Quem sabe a Regina, por exemplo, não esteja com o ego ferido. É importante falar isso. Quem sabe o ego dela não estava profundamente ferido para aceitar isso", observou Betty Faria numa live com Maria Ribeiro, referindo-se à rápida passagem de Regina Duarte pela secretaria de Cultura do Governo Federal.

O nome de Regina surgiu na conversa quando Betty foi questionada por que não reclamava da falta de trabalho para uma atriz da idade dela. A veterana reconhece que é preciso um exercício de humildade a essa altura da profissão "Existem histórias protagonizadas por pessoas mais velhas, mas isso é exceção. Eu tive minhas oportunidades e agora vou fazer o que é possível. Fazer uma protagonista com a minha idade seria fisicamente complicado para mim. Não sou de reclamar. Posso fazer de tudo e não corro de trabalho. 163

Posso fazer uma velhinha dramática, engraçada, assassina, bandida...", disse a atriz, que passa a quarentena em seu apartamento no Leblon, Zona Sul do Rio.

Disponível em Acesso em 10 de jun. de 2020.

164

ANEXO D

BRUNA LOMBARDI (01/08/1952)

A boa forma da atriz despertou também interesse para os segredos de sua beleza. "Gosto de pensar que tenho muitas coisas para cuidar, corpo, cabeça, emoção, sentimentos, valores, e acho que tudo se conecta".

A idade, ela garante, não é problema. "Para mim, idade nem mesmo é um número, porque eu normalmente não penso em números em qualquer circunstância. Sou regida por outros valores, que me interessam mais. O universo é imenso e somos todos mínimos diante da sua abrangência." Bruna Lombardi

Comentário de um internauta (em 24/02/2017):

―A Bruna Lombardi é uma musa. É uma beleza em sua totalidade. Não é vista. É admirada. Desperta um oceano de desejos. Não é imagem. Real. Ao mesmo tempo, as fantasias que brotam são bloqueadas pela sua dignidade como mulher. A vida me parece para ela, um fruto que saboreia. Não se acaba. A árvore pais desse fruto é fecunda. Cultivada sempre por ela. Um casamento perfeito. "Juntos até que a morte os separe". Não tem o assédio da mídia do glamour. Não precisa voz para dizer não. Basta sua postura.”

Disponível em Acesso em 13 de jan. de 2020.

Envelhecer é um privilégio

Aos 67 anos, Bruna Lombardi soma uma prolífica carreira em diversas frentes. Começou a trabalhar aos 14 anos como modelo. Saltou para as novelas aos 20 e poucos. Comandou um programa de entrevistas. Abraçou o cinema nacional. Lançou dez livros. E hoje se divide entre influenciadora digital, com o site Rede Felicidade, e a série da HBO, criada e protagonizada por ela, A Vida Secreta dos Casais – que retorna para sua segunda temporada no domingo, 13. Em entrevista a VEJA, Bruna fala sobre sua trajetória, do trabalho em família (a série conta com a participação de seu marido, Carlos Alberto Riccelli – com quem ela está há 40 anos – e do filho, Kim Riccelli) e da beleza exuberante que ostenta sem o auxílio de plásticas 165 ou do famigerado botox. ―A pele boa vem de uma vida vivida com inteireza‖, diz, sorridente. ―Tive grandes momentos de derrota e de vitória. Aprendi a nem me deslumbrar com um elogio, nem me amargurar com uma crítica.‖

Sobre o passar do tempo, Bruna garante com leveza: ―Eu acho envelhecer um grande privilégio, inclusive porque a outra opção seria não envelhecer. Não estar viva. E eu amo a vida. Envelhecer não é só um privilégio, como acho uma maravilha lidar com o tempo. O tempo é um grande mestre. Uma grande fonte de sabedoria.‖

Disponível em Acesso em 13 de jan. de 2020 – Matéria veiculada em 29/10/19.

166

ANEXO E

ELBA RAMALHO (17/08/1951)

Yoga está mesmo na moda, e as famosas lembram disso a toda hora. A cantora Elba Ramalho, que completa 60 anos em agosto, animou o carnaval nordestino mostrando que tem o mesmo pique do começo da carreira. A cantora paraibana aproveitou para passar suas dicas às mulheres que querem manter a boa forma depois dos 50:

Me alimento moderadamente, sou vegetariana, consumo tudo que vem da terra, como frutos, vegetais, cereais. Não costumo seguir dietas. Normalmente acordo cedo e tomo dois copos de água. Quando quero limpar no intestino, tomo apenas água morna com limão e fico sem alimento até meio dia. Gosto de juntar vegetais crus com frutas e fazer sucos deliciosos. Às vezes, como pão integral ou tapioca - resume a cantora, que ainda dá detalhes sobre a rotina e os cuidados com a saúde física e mental:

Faço yoga e meditação, e acho que isso mantém minha alegria, meu equilíbrio e a beleza de dentro. Ah, sempre retiro a maquiagem com um bom demaquilante e uso hidratante, acrescido de um protetor solar. Sou vaidosa como todo artista, mas sou serena e confiante - esse é o segredo da juventude. Há trinta anos, achava que cairia em depressão ao me ver envelhecendo. Mas o tempo chega para mim, para todos. Não posso fazer nada em relação a isso. Com essa idade, a insegurança passou, e estou mais exigente. Envelhecer não é tão ruim assim. Elba Ramalho Disponível em Veiculada em março de 2011. Acesso em 13 de jan. de 2020

1- Como você mantém a disposição do corpo e mente? Com a responsabilidade de que quem está na chuva é para se molhar, se está viva é para se viver. Não sinto o envelhecer como um fardo que está pesando nos meus ombros, nem um empecilho para produzir coisas. Me sinto vivaz, jovem, com muita saúde e disposição para seguir. Sou muito serena no meu dia a dia, tenho uma vida de regras, claro, como outros artistas como Ivete, que tem carreira de palco dinâmica. Tenho cuidado com a alimentação, rezo, medito, fico em silêncio, compartilho muitas coisas com amigos, isso me ajuda bastante. 167

Disponível em Acesso em 13 de jan. de 2020.

168

ANEXO F

ELZA SOARES (23/06/1930)

'Grito muito, mas quero eco', diz Elza Soares sobre combate ao racismo

Elza recebe a BBC Brasil sentada com uma almofada firme nas costas, e permanece na mesma posição até irmos embora, reflexo dos problemas na coluna que a obrigam a fazer fisioterapia três vezes por semana e apresentar todos os shows também sentada. A cantora é avó e bisavó, com sete netos e quatro bisnetos.

Com um medalhão dourado de São Jorge no peito, Elza fala sobre as lutas às quais empresta sua voz rouca e potente, reforçadas pela imagem "guerreira" de quem superou a pobreza, o preconceito, a morte de três filhos e a violência do ex-parceiro, o jogador Mané Garrincha.

Elza se mostra avessa a perguntas que tematizem o passado e a velhice. Medo da morte? "Nunca conversei com ela não. Deixo ela distante."

BBC Brasil - Elza, existe um conflito sobre a sua data de nascimento. Qual é a verdadeira? Elza Soares - Não comento. Não se pergunta sobre idade a mulher. Esse negócio de idade... não tem idade, cara. Sou atemporal. BBC Brasil - Você teve um ressurgimento surpreendente depois do lançamento de A Mulher do Fim do Mundo. Como é se tornar um ícone pop na sua idade? Elza Soares - Gente, eu não sei sobre esse negócio de idade, o que que tem idade, idade... Você tem o tempo, a matéria, o espírito, entendeu? Acho que quando você resiste, você está bem, aguentando tudo, é maravilhoso. Eu vejo meninos aí não aguentando nada, meninas não aguentando nada. BBC Brasil - Então como você se sente na fase de vida em que está hoje? Elza Soares - Completamente bem, fantástica, maravilhosa, trabalhando, viajando muito. Sucesso absoluto. Feliz. BBC Brasil - Em seu último disco você toca em temas sensíveis, e um deles é violência doméstica, com a música Maria da Vila Matilde, que virou uma espécie de hino pela 169 causa. Você sofreu esse problema no passado - o que fez com que, em 2015, você quisesse falar no assunto? Elza Soares - Eu já vinha falando sobre isso há muito tempo. Eu falo de política desde que comecei a cantar. De ser mulher, de ser negra. De ser mulher negra.

A violência doméstica, por mais que você fale e tente combater, ainda é muito presente. É triste que você ainda tenha a necessidade de fazer músicas falando da violência contra a mulher, que é uma coisa horrível. Isso você vai ter que falar a vida toda? É um câncer, né?

A gente fala da negritude, tem que falar da cor de pele, que é uma coisa absurda, né, tem que estar toda hora gritando, "olha!", "olha!", como um pregão, sempre.

BBC Brasil - Com toda essa rotina de shows, como é seu dia a dia, sua de cuidar da saúde? Elza Soares - Eu sou muito tranquila. Cuido muito bem do meu corpo. Três vezes por semana tenho fisioterapia. Cuido da minha saúde, da minha alimentação, eu sei que preciso me cuidar. Por isso que eu digo, cuidem do Brasil porque o Brasil precisa se cuidar. BBC Brasil - As pessoas às vezes te associam a cirurgias plásticas, às intervenções que você fez. Como você vê a vaidade feminina e a imagem que você tem? Elza Soares - Adoro um espelho. E para adorar um espalho adoro cirurgia plástica, adoro tudo. Acho que a mulher merece tudo, tem que ser linda, vaidosa. Mulher. Bons vestidos de seda, boas camisolas lindas, maravilhosas. Olhar no espelho e dizer, sou feliz comigo mesma. É muito bom. BBC Brasil - Mas a mulher sofre uma objetificação muito forte, a ideia do corpo sarado, das capas de revista com mulheres perfeitas. Você acha que isso tem que ser questionado nesse novo movimento de feminismo? Elza Soares - Não sei. Eu sei que eu gosto de mim, gosto de malhar, gosto de estar bem. Gosto de fazer uma cirurgia plástica se precisar. Eu não vou fazer mais.

Mas faria cirurgia plástica maravilhosamente bem, não sei se precisa; se precisar, também faço. Eu acho que é por aí. Se o espelho me questionar, vou. Eu falo até para o espelho, pode esperar que eu volto amanhã para você. BBC Brasil - Você casou com 12 anos. Como foi para você casar tão cedo, e como a sua sexualidade se desenvolveu ao longo da sua vida? 170

Elza Soares - Eu soltava pipa, jogava bola de gude, com filho no colo. Pegava balão, corria muito, brincava com eles. Foi assim que foi a minha vida. Era criança e mãe. Tanto que meus filhos me chamam de Conceição até hoje. Era como se fôssemos amigos. BBC Brasil - Você tem medo da morte, Elza? Elza Soares - Nunca conversei com ela não, entendeu? Deixo ela distante. Não tenho muita confiança com ela não. Deixa ela pra lá. BBC Brasil - Você não para de fazer planos para o futuro. Elza Soares - Não, lógico, meu futuro está aí. My name is now. E deixa o futuro vir. Como deveria ser. O passado já foi. BBC Brasil - O que você diria que é a mulher do fim do mundo? Elza Soares - É uma mulher que tem coragem de dizer, de lutar, de buscar. Uma mulher que luta, sozinha. Mulher. Disponível em . Publicada em 10 de fev. de 2018. Acesso em 27 de jan. de 2020.

171

ANEXO G

FERNANDA MONTENEGRO (16/10/1929)

Adepta das redes sociais, mas com pouco tempo para atualizar sua página no Facebook, Fernanda conta que jamais deixaria de ler um livro para ficar de olho no que dizem sobre ela. Livre, leve e solta, com seu cabelo ao natural, a global de 88 anos de idade esbanja autoestima em sua nova fase.

―Deixar o cabelo branco é repousante, muito confortável. Pintar toda semana é um horror porque uma hora a tinta deixa de pegar na raiz. Agora que estou natural, é como se eu fosse uma criança de novo. Viu como tem vantagem a velhice?‖, diverte-se. Disponível em Acesso em 11 de jun. de 2019. Matéria veiculada em 19 de Nov. de 2017

Poderíamos levantar inúmeras respostas para essa questão quase ―insuportável‖ de viver a velhice, mas o que parece ser o ponto crucial é a proximidade do fim, o enfrentamento da finitude quando há tanto de bom para viver (mesmo que, de fato, não haja). ―O mais difícil é saber que você está na fase definitivamente conclusiva da vida. É melhor encarar‖.

Um processo entremeado, necessariamente, de muitas perdas: referência de experiências vividas, corpo e mente que já não respondem como gostaríamos e pior, amigos, amantes e amores que se vão levando parte de nós e de nossas histórias. É…a finitude bate à porta de todos, ninguém escapa, nem mesmo os ―soberbos‖.

Perdas democráticas, todos, um dia, as terão. Lembrando a morte do companheiro de 60 anos de vida, Fernando Torres, a atriz lamenta: ―A coisa mais dolorosa pela qual tenho passado é ver a minha geração morrer. Nos últimos cinco anos, morreram, além dele, Paulo Autran, Raul Cortez, Gianfrancesco Guarnieri, Renato Consorte, Sérgio Viotti, Sérgio Brito, Ítalo Rossi e Millôr Fernandes‖.

Ela se emociona ao concluir: ―Você olha em volta e a sua memória está ligada a todo esse mundo que se vai. É muito forte‖. Na lista de baixas recentes, tem ainda Hebe Camargo que, 172 como ela, nasceu em 1929. ―Vivemos o mesmo período da história. Quem substitui? Ninguém‖.

E continuam morrendo. Hoje, por exemplo, foi a vez do poeta Décio Pignatari. Morreu aos 85 anos.

É bobagem dizer que tudo e todos são substituíveis. Se assim fosse, apagaríamos a essência de quem somos. Como bem lembra Fernanda, lá se vai, e eu diria, se esvai nossa memória.

Disponível em Acesso em 11 de jun. de 2019.

173

ANEXO H

LAURA CARDOSO (13/09/1927)

Antes de completar 90 anos, Laura Cardoso desabafa: 'Tratam o idoso como se ele fosse um robozinho'

―Estou sempre de olho no futuro‖.

―Tinha uma colega que dizia que minha autoestima era grande, porque eu sempre confiei na minha cara do jeito que estava (risos). Não tenho problema algum com minhas rugas. Meu rosto reflete a minha vida, a minha alma, o que amei, o que sofri... Eu me gosto assim.‖ As pessoas tratam o idoso como se ele fosse um robozinho. É um tal de ―senta aí‖, ―come isso‖, ―faz aquilo‖... Nunca fui vítima de grosserias, as pessoas se dirigem a mim com carinho e respeito. Mas não tem essa de ―melhor idade‖, não! De melhor, a essa altura do campeonato, só a experiência adquirida. Eu amo a juventude, a mocidade! Hoje, não tenho mais a força muscular e a pele bonita de anos atrás. É muito diferente! Acho que é o jeito com que você leva a vida que faz a idade ser melhor ou pior, seja na velhice ou na mocidade. Ah, não sou muito de férias nem de aposentadoria. Acho que, se você parar, morre alguma coisa por dentro. Trabalho é vida, faz a cabeça e o corpo funcionarem, o coração pulsar forte. Disponível em Acesso em 11/06/19

No programa Encontro da Fátima Bernardes, a atriz Laura Cardoso fez questão de dizer que não gosta quando as pessoas tentam tomar decisões por ela, só porque ela já envelheceu.

"Detesto. Não quero que ninguém tome decisão por mim. Se a pessoa não está bem de saúde, se precisa de alguém, é lógico que alguém vai tomar decisão por ela...", disse. "Agora, se ela está bem de cabeça, ela toma decisões."

Ela deu um exemplo simples de que muita gente pensa que ela está precisando de ajuda. "Sempre estão perguntando: 'Você não quer sentar?' Eu não quero sentar, quando eu quiser, 174 eu falo", afirmou, arrancando risadas da plateia e dos convidados. "Parece que a pessoa quer tirar sua capacidade de decidir o que você quer."

Disponível em acesso em 11 de jun de 2019

―Nunca que quero me aposentar e fazer tricô, já falei 500 vezes, não sou a velhinha que faz tricô, sou um demônio, quero trabalhar, interpretar, fazer mil vidas. Até sei fazer tricô, mas não, ficar quietinha, não. Não posso viver sem trabalhar, sem me imaginar fazendo teatro, TV, cinema, não consigo, aí eu morro‖. Disponível em https://istoe.com.br/aos-91-anos-laura-cardoso-afirma-nunca-que-quero-me- aposenar-e-fazer-trico/ Acesso em 13 de jan. 2020.

175

ANEXO I

MAITÊ PROENÇA (28/01/1958)

Maitê Proença fala da idade e chama a atenção dos seguidores

Maitê Proença chamou a atenção dos seguidores ao falar da idade nas redes sociais. A veterana atriz escreveu um textão em seu perfil, no Instagram, e refletiu sobre o que viveu. A famosa ainda fez um desabafo:

―Não são as rugas e dores articulares que perturbam, mas o olhar do mundo que exige uma transformação repentina. Uma jovem bonita age com trejeitos e maneirismos que o mundo lhe impõe“, começou Maitê.

“Seduz sem se dar conta de que a beleza e juventude são o alicerce de seu encantamento. Nada daquilo, no entanto, vai servir na velhice. Uma senhora com cacoetes da juventude é apenas uma velha vulgar“, concluiu.

Seus seguidores comentaram a foto. “No seu caso Maitê, continua linda e que reúne atributos que poucas têm e que nunca envelhecerá que é o talento e inteligência! Te admiro dentre muitas coisas por sua história de vida e forma que encontrou para superar tudo usando do bom senso e como supracitado sua sabedoria que lhe é peculiar“, escreveu um fã.

“Maitê…linda demais, te adoro, você é talentosa, maravilhosa,acompanho seus trabalhos há anos, adoro seus papéis …você toca a alma das pessoas…jamais deixe a sua luz apagar, sua essência, seu coração brilha como as estrelas do céu…sou apenas uma fã que te admira muito e que deseja pra sempre sucesso.. tenha um ótimo dia“, disparou outro.

Disponível em Publicado em 08/10/19. Acesso em 24 de jan. de 2020.

176

ANEXO J

NATHÁLIA TIMBERG (05/08/1929)

Veterana das telenovelas, Nathalia Timberg chegou aos 90 anos lúcida e esbanjando vitalidade. A atriz, que está no ar na novela das nove, ―A Dona do Pedaço‖, aproveitou sua nova idade para comemorar um novo momento de sua vida e demonstrou desejo por não parar de atuar.

―No dia que eu parar, é porque morri e esqueci de cair―, declarou a atriz de forma polêmica. Nathalia se dedicou à profissão durante toda a vida e afirmou: ―Só me sinto bem trabalhando―. O amor pelo que faz rendeu à atriz, em 2016, um teatro com seu nome.

Embora com ―alta idade‖, Timberg segue atuante no que faz. Ela continua com a peça ―Através da Íris‖, em cartaz no Rio de Janeiro, além de marcar presença na trama da Globo, na pele de Galdys, uma mulher nascida em uma família tradicional, mas que perdeu suas riquezas; porém, manteve a pose.

―No dia que eu parar, é porque morri e esqueci de cair―. ―Só me sinto bem trabalhando‖ Disponível em (11/08/2019) Acesso em 13 de jan. de 2020.

177

ANEXO K

NEUSA BORGES (08/03/1941)

―Quero voltar a trabalhar. Você sabe que pobre e preto não pode ficar doente muito tempo. Imagine ficar desempregado dois anos? São 65 anos de carreira, 48 deles na Globo. Não dá para o povo esquecer de mim. Não tenho seqüela, estou numa boa. Estou entre os 14 milhões de desempregados no Brasil.‖

―Sou uma desempregada. Participei na Record de ―Escrava Mãe‖, me prometeram que me chamariam para mais coisas, mas o povo esquece da gente com facilidade.‖

Disponível em Acesso em 03 de nov. de 2019.

178

ANEXO L

RITA LEE (31/12/1947)

Rita se mostra bem resolvida com a idade e tenta olhar a vida pelo lado positivo, sem crises. "Conquistei uma certa serenidade. Sempre fui muito ansiosa, compulsiva até. Agora, sinto um pouco mais de controle na minha cabeça, nas coisas que eu quero, nas minhas orações. Estou gostando mais de mim e percebendo que fiz coisas boas. É o meu processo de envelhecer com dignidade, ver os pontos bons, afastar mágoas que tinha comigo mesma. Eu me perdoei de tudo. Estou me achando legal. Roberto sempre me fala: "Pô, se ache legal. Você é legal, é bonita!‖Então, estou aqui, tem umas pelanquinhas, umas rugas, mas estou bem. Tem uma hora que ou você entra na sala de espera da morte ou vê a vida de forma mais leve. Resolvi torcer a favor"

Disponível em . Acesso em 13 de set. 2019.

179

ANEXO M

RUTH DE SOUZA (12/05/1921)

Quisera Deus qualquer um de nós chegar aos 97 anos com a disposição de Ruth de Souza. Quase centenária, a icônica atriz brasileira mostra-se categórica quando o assunto é a possibilidade de se aposentar: ―Jamais. Trabalhar para mim é uma terapia‖, revelou, em entrevista ao Observatório da Televisão.

Para Ruth, o segredo de tamanha vitalidade é um só: não parar nunca! ―Deus tem sido muito generoso comigo. Desde que comecei a trabalhar, nunca parei. Numa profissão instável como a minha, é uma bênção de Deus ter podido estar sempre ativa‖, agradeceu, durante a coletiva de Se Eu Fechar os Olhos Agora.

Mesmo fora da telinha, sua agenda é sempre muito movimentada. Tudo isso, claro, graças à importância histórica de Ruth para o panorama da dramaturgia nacional, coisa que a faz ser constantemente lembrada em premiações e honrarias do segmento. ―Todo dia tem uns dois, três eventos‖, brinca a estrela.

Tirando de letra

Na história recriada por Ricardo Linhares, a partir do romance original de Edney Silvestre, Ruth interpreta Madalena. Idosa e abandonada, ela acaba sendo ‗adotada‘ pelos meninos Paulo Roberto (João Gabriel D‘Aleluia) e Eduardo (Xande Valois) antes de ser assassinada de forma brutal e misteriosa.

Se é difícil para a veterana fazer cenas de morte? Que nada! ―É só ‗parar‘ de respirar e fechar os olhos‖, dispara, franca, arrancando gargalhadas de seus interlocutores.

Essa volta à televisão, aliás, tem um gosto todo especial para a artista. ―Amo ver TV. Passo o dia com o aparelho ligado. Gosto muito de programas como o The Voice Kids, o Caldeirão do Huck, o Esquenta [hoje extinto]… Nas minhas horas vagas também gosto de ler e rever meus filmes antigos‖, confessa Souza, que marcou época em produções das telonas como Sinhá Moça (1953) e O Assalto ao Trem Pagador (1962). 180

Disponível em Acesso em 11 de jun. de 2019

“É difícil a gente descrever a si própria, mas eu diria que sou maravilhosa.” Ruth de Souza, primeira mulher negra a pisar no palco do elitizado Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Disponível em Acesso em 11 de jun de 2019.

Ruth faleceu em 28/07/2019 aos 98 anos.

181

ANEXO N

SIMONE (25/12/1949)

Simone revela que tem 70 anos e choca artistas e internautas

Quem viu Simone no fim de semana no Faustão – ou na semana passada com Ana Maria Braga, no Mais Você, ambos na TV Globo – ficou surpreso com a jovialidade e a beleza da cantora, que andava longe da TV.

Sim, Simone revelou que está com 70 anos e deixou artistas, telespectadores e internautas chocados, de queixo caído, com a boa forma física da artista.

Igualmente surpreso, Faustão brincou: ―Você que está reclamando da vida, ó, só parar de beber vinho e comer pizza‖, disse o apresentador.

Simone mostrou que não é só comida, bebida e malhação que ajudam a melhorar a vida. Estar feliz com você mesmo e ser verdadeiro com seus sentimentos têm importância também.

―Nunca tive medo, acho que você tem que se posicionar como mulher, como cidadã, nunca fiquei em cima do muro‖, disse a cantora. ―Nem politicamente, nem sexualmente‖, completa Faustão.

A Voz

Mas não se trata apenas de aparência física, a voz de Simone permanece a mesma. Ela cantou ao vivo e mostrou que continua afinada e com a voz potente de sempre. Faltou perguntar a ela o segredo dessa jovialidade aos 70 anos. Claro que os mais céticos e críticos vão falar em plástica, botox, médicos caros etc....

Segredos

Mas repare nela para tirar algumas conclusões:

Pelo corpão esguio, fica claro que Simone, ex-jogadora de basquete, não é de exageros com comida.

A carga genética certamente contribui, somada a alegria, que pode ser outra ferramenta para levar à jovialidade da cantora.

Veja o sorriso aberto de Simone nas fotos e no vídeo dos programas. Estar bem com você, se aceitar do jeito que é – com os cabelos brancos, inclusive – e fazer o que gosta 182 parecem ser fortes ingredientes para melhorar a vida de Simone... Dizem também que amar faz bem para a pele...

Boas idéias para estabelecer como metas para 2020, não acha?

Disponível em Publicado em 30 de dez. de 2019. Acesso em 25 de jan. de 2020.

183

ANEXO O

SUSANA VIEIRA (23/08/1942)

1 Susana Vieira desabafa sobre idade: 'Tô inteira. Não faço nada contra a velhice' fevereiro de 2015 Após emagrecer seis quilos para ser rainha de bateria da Grande Rio, Susana Vieira disse que não estava satisfeita com as antigas medidas. ―Eu boto um vestido um pouco justo e fico uma (mulher) fruta‖ declarou ela durante o Programa Encontro com Fátima Bernardes.

Disponível em . Acesso em 13 de jan. de 2020.

2- "Que mulher quer ser velha e feia? Nenhuma!", diz Susana Vieira

"Que mulher quer ser velha e feia? Nenhuma!". A declaração foi feita pela atriz Susana Vieira, 68 anos, 51 de carreira, em entrevista que foi ao ar neste domingo (14), no Fantástico. Adepta das cirurgias plásticas, liftings e tudo o mais que a ajude a manter a aparência sempre mais jovem, ela garantiu não ligar para a idade, afirmando viver atualmente como se fosse uma "menina de 70 anos".

Apesar de se sentir jovem e alegre, Susana afirmou ter sim um grande medo, a morte. "Não estou preparada ainda para isso. Eu tenho ainda muita cena de beijo para gravar, muita novela para fazer". A velhice incapaz, como chamou a situação na qual a pessoa sequer consegue se locomover sozinha, também é vista com temor pela atriz, cuja filosofia de vida, disse, é "viva e deixe viver". "Enquanto houver um rastro de respiração, existe a vida, o sexo, o amor. Vamos ser felizes".

Disponível em https://www.terra.com.br Matéria publicada em agosto de 2011. Acesso em 13 de jan. de 2020.

"Não sei o que é velhice, o que é terceira idade. Continuo vivendo exatamente como vivia com 20 anos, mas com um imposto de renda maior", divertiu-se.

Disponível em Matéria publicada em fevereiro de 2017. Acesso em 13 de jan. de 2020. 184

―Ninguém chega para mim e pergunta a minha idade. Não tem necessidade. O maior xingamento para mim é me chamar de velha. Eu aparentemente não tenho 72 anos Não faço parte dos velhinhos. Não tenho medo de envelhecer. Me desculpem se eu cheguei aos 72 anos sem estar caquética e estando maravilhosa, com tudo em cima.‖ Disponível em Matéria publicada em março de 2015. Acesso em 13 de jan. de 2020.

"Eu gostaria de ser mais tranquila, mas eu acho que é essa insegurança que revela uma pessoa consciente de que não depende do meu corpo e da minha mente para trabalhar. Eu dependo dos autores. Não tenho dúvidas do meu talento. Diz Susana Vieira-no- domingao.htm. Não tenho modéstia em dizer isso. O problema é me sustentar. Isso é o que me preocupa. E, logicamente, 50 anos depois, mais preocupada eu fico. Por isso, mais eu malho, mais eu continuo bonitinha, porque, senão, serei mais uma derrotada... - Veja mais em

Disponível em https://televisao.uol.com.br/noticias/redacao/2015/01/11/nao-tenho-duvida-do- meu-talento-diz-susana-vieira-no-domingao.htm?cmpid=copiaecola Acesso em 13 de jan. de 2020.

A atriz fez críticas ainda ao Brasil, que, segundo Susana, não dá valor ao artista que possui uma idade mais avançada. "A gente fica totalmente insegura em uma terra que não dá o menor valor a uma história, a uma carreira, o menor valor a uma pessoa velha...

Disponível em < https://televisao.uol.com.br/noticias/redacao/2015/01/11/nao-tenho-duvida- do-meu-talento-diz-susana-vieira-no-domingao.htm?cmpid=copiaecola> Acesso em 13 de jan. de 2020.

Susana Vieira se envolveu em uma polêmica recentemente: A atriz publicou um clique em que aparece sem maquiagem ao lado de seu cachorrinho, William, e acabou recebendo uma enxurrada de críticas por sua aparência! Ela foi perguntada sobre a repercussão de sua foto, e resolveu desabafar:

"Eu estou no auge da fama, da beleza, então fico achando ridículo, porque se eu tivesse depressão, eu entraria em depressão. Se eu estivesse sem trabalhar, eu estaria ferrada, então vocês não sabem o mal que fazem falando umas besteiras que não existem. Se eu fizer uma novela sem maquiagem agora, vocês vão falar todo dia?" 185

"Eu me incomodo por que eu postei a foto e eu me achei linda. O que acontece é que ninguém aguenta que eu me amo, tenho uma autoestima maravilhosa e me acho bonita, o problema é esse".

Disponível em (11/06/2019) Acesso em 13 de jan. de 2020.

186

ANEXO P

VERA FISCHER (27/11/1951)

Vera Fischer, aos 63 anos, afirma não ter medo da velhice e brinca: ―Estou novinha como os brotos de alface‖ Disponível em Matéria publicada em agosto de 2015. Acesso em 13 de jan. de 2020.

A Miss Brasil em 1969, aos 17 anos, diz que "não é fácil ser um ícone e a velhice é inevitável". "Nunca foi um problema falar sobre a idade. A idade chega para todos, a beleza da maturidade está em aceitá-la e conviver com isso com dignidade. Eu estou na minha melhor versão, me sinto mais livre para ser eu mesma."

"Eu faço karatê, é um aeróbico que para minha idade é excelente. Faço tratamento para cabelos finos. A pele está sempre limpa, por causa do excesso de maquiagem que uso nos trabalhos e passo muitos cremes. Jovem não serei mais, tenho que dormir bem, se alimentar bem e tentar não fazer extravagâncias". http://www.missnews.com.br/historia/aos-67-anos-vera-fischer-afirma-equotestou-na-minha- melhor-versaoequot (18/09/2019). Acesso em 13 de jan. de 2020.

187

ANEXO Q

ZEZÉ MOTA (27/06/1944)

Com certeza é uma data marcante. Eu nunca escondi a idade. Estou achando legal ter 70… Quer dizer, se a gente pudesse escolher, não passaria dos 30, né? (gargalhada). Mas existem algumas vantagens, por exemplo: eu tive a crise dos 30, dos 40, dos 50 e dos 60. E de repente aos 70 não, desencanei.

Ah, essas coisas da velhice, da passagem do tempo, é uma doideira. Não tenho mais medo da velhice. É inevitável o sofrimento, sofrer faz parte.

Disponível em Acesso em 11 de jun. de 2019

Quando minha mãe se casou com quase 70 anos (hoje, ela tem 93), pensei com meus botões: “Ah, ela está casando para ter uma companhia para jantar, para ir ao cinema e ao teatro‖. Depois, percebi que não era bem por aí (risos). Sinto falta de sexo, sou uma mulher saudável. Agora, não vou transar por transar. Quero um companheiro. Mas faço as minhas caminhadas, uma vez por semana tem massagem relaxante, tomo meu vinho. Recebo cantada, mas só de rapazes muito mais jovens, e não rola mais para mim. Aqui (a velhice) não é o paraíso", escreveu.

Disponível em Acesso em 11 de jun. de 2019.

Tive a crise dos 30, dos 40, dos 50 e dos 60 anos. Com 70, cansei, achei que era palhaçada. Na juventude a gente sofre mais, é muita ansiedade, dúvidas e cobranças. Na velhice, o que incomoda é a solidão. No momento, vivo sozinha, mas estou na pista".... Disponível em Acesso em 13 de jan. de 2020.

"Eu nunca escondi a idade. Nada contra aos que mentem e invernam... Estou achando legal ter 75... Quer dizer, se a gente pudesse escolher, não passaria dos 30, né? Mas existem algumas vantagens..."

Disponível em Acesso em 13 de jan. de 2020. 188

ANEXO R

ANTÔNIO FAGUNDES (03/04/1947)

Para Antonio Fagundes, ―o problema da velhice é a associação com a doença‖ O eterno galã Antonio Fagundes garante que a velhice não o preocupa de forma exagerada. Irreverente, faz piada com a vaidade quando indagado pela repórter sobre seus cabelos brancos e rugas. São poucos os atores que têm coragem de falar abertamente deste tema, a velhice, o que prova o quanto a questão ainda é cercada de receios e tabus, especialmente no mundo da televisão. Na entrevista concedida à repórter Aline Salcedo, à revista Contigo (editora Abril) que circula com a data de 17/8, Fagundes fala sobre muitos assuntos, sempre com bom-humor. O trecho em que toca no envelhecimento é reproduzido abaixo:

―De pertinho, o veterano ator – que estreou na teledramaturgia em 1969, na novela Nenhum Homem É Deus, na pioneira TV Tupi – parece vaidoso. É cheiroso, o cabelo brilha e a pele está sempre bronzeada. Mas, durão, diz que o máximo que faz é tomar banho. O cabelo só lava com sabonete. Nunca usou cremes. Nem fez plástica. Pintar os cabelos brancos, então… Nem pensar. ‖Tenho cabelo branco desde os 30 anos. Já pintei, mas não acredito que isso faça a pessoa parecer mais jovem. Fora que dá trabalho, ter de retocar a cada 15 dias. E aí eu ia ter de pintar outras coisas, o peito, por exemplo. Dá trabalho, né?‖, justificou. E dei risada. Detalhe: ele me disse que só tem cabelo branco do lado esquerdo do peito. ‖É que o coração está velho.‖ (Suspiros!) E diz que não liga para esse papo de velhice. ‖Não me sinto velho, estou ótimo. Em queda. Mas, até agora, tudo bem.‖ E haja bom humor. ‖Acho que o problema da velhice é a associação com a doença. Mas não tenho ficado doente, não tenho tempo. Só estou com uma dor aqui nas costas, será o pulmão?‖, emendou aos risos. Fagundes diz que não foi e nem é radical com nada – de dieta à política. E não gosta nem mesmo da expressão ‖politicamente correto‖. Para isso, tem até uma teoria engraçada: ‖Charuto faz mal, mas bem menos que o cigarro, porque não tem 4 mil substâncias químicas. E não vicia. Mas sabe o que faz mais mal ao organismo? Oxigênio. É a pior coisa. Porque o que faz você envelhecer são os radicais livres que o oxigênio libera.‖

A doença tem sido de fato uma de suas preocupações. Em outra entrevista, realizada no ano passado pela Gazeta online, Fagundes reconhecia que chegará uma hora em que terá que se cuidar um pouquinho. Na ocasião disse que ―viver é muito perigoso‖. E comentou que 189 costuma brincar que o que ―mais faz mal ao organismo é o oxigênio, que oxida as suas células e cria os radicais livres, que acabam envelhecendo e matando‖.

Nessa mesma entrevista, ao ser perguntado sobre o que achava sobre a morte – na ocasião um dos assuntos abordados na sua peça ―Restos‖, em que ele interpretava o personagem Edward Carr, ele respondeu: Tem um filósofo (Lucrécio) que resume muito bem: ―Onde a morte está, eu não estou. Onde estou, a morte não está. Por que me preocupar?‖ Só que ela existe, faz parte da vida. Não me preocupo muito com a morte. Me preocupo mais com a doença. Porque a morte é isso mesmo. Acabou, morreu. Agora, ficar no sofrimento é horrível em qualquer idade. O Schopenhauer (Arthur Schopenhauer, filósofo) dizia que, se você tem 15 anos, é bonito e rico, mas não tem saúde, está perdendo para um cara de 80, feio e pobre, mas com saúde.

Disponível em Acesso em 17 de jan. de 2019.

“Costumo brincar que sempre tive a nostalgia da velhice. Queria ser velho quando era moço, comecei fazendo velho no teatro. Sempre tive fascínio pela velhice. Você só não vai ficar velho se morrer jovem. Então a velhice e a morte estão ligadas, você tem que encarar. Venho me preparando. Claro que a coisa muda, você não sobe mais a escada de três em três degraus, mas estou subindo de dois e dois ainda‖.

Disponível em Acesso em 17 de jan. de 2020.

"Sempre tive um fascínio pela velhice. É claro que você só não vai ficar velho se morrer antes. Então, a velhice e a morte estão, de uma certa forma, ligadas. São coisas que vão acontecer, e você vai ter que encarar. É bom se preparar, e eu venho me preparando o tempo todo.... Disponível em Matéria publicada em 26 de jul. de 2019. Acesso em 13 de jan. de 2020.

190

ANEXO S

CID MOREIRA (29/09/1927)

Cid Moreira posta sobre velhice: “uma dádiva não ter esquecido o meu nome”

Jornalista escreve sobre aceitar as fases da vida e seguidores agradecem pelo texto

O aniversário de Cid Moreira não está tão próximo. O jornalista, locutor e apresentador completará 92 anos somente em 29 de setembro. Ainda assim, ele aproveitou para projetar a nova idade e falar sobre velhice nesta manhã de sábado (25). ―Agradeço a Deus, na minha idade, indo para os 92, ter a cabeça bem boa para ter consciência de tudo ao meu redor! É uma dádiva não ter esquecido o meu nome, o nome dos meus familiares e queridas pessoas que passaram pela minha vida!‖, escreve como legenda de uma publicação em que aparece descendo escadas e, de acordo com o diálogo do vídeo, indo para o estúdio. No texto, Moreira pede que as pessoas tenham paciência com os velhinhos. ―Se não é pelo merecimento deles, faça isso pelo futuro de vocês‖. Os seguidores elogiaram as palavras dele e relembraram momentos vividos com familiares.

Disponível em Publicação de 27 de maio de 2019. Acesso em 24 de jan. de 2020.

Cid Moreira reflete sobre velhice e confessa: "graças a Deus continuo sonhando"

Cid Moreira tem 91 anos, mas não deixa de se atualizar. O jornalista, locutor e apresentador, que tem 137 mil seguidores no Instagram, interage com eles sempre que pode. Nesta segunda-feira (14), ele foi dar uma dica de leitura e acabou refletindo sobre envelhecimento. "Até bem pouco tempo, eu pensava assim: 'Velhos são os outros'. Bem, esse é o título do mais novo livro da Doutora Andréa Pachá. Acabei de ler, vi a minha própria história em vários casos. Sensível e profundo. Cada relato trata da beleza e das angústias do envelhecimento. O bom texto nos leva à reflexão e percebi que, de repente, a gente nota o envelhecimento. Estou caminhando para os 92, mas, graças a Deus continuo sonhando", contou Cid. 191

Há cinco dias, Cid dividiu com seus fãs um momento íntimo ao lado de sua mulher, Fátima, de 55 anos, com quem está casado há 19. O jornalista postou um vídeo em que aparece sentado sem camisa enquanto sua mulher passa um hidratante em seu corpo: "Acabei de fazer uma sauna. Ela agora tá passando creme em mim. Ando meio desidratado porque abusei muito do sol, tá vendo?", disse ele. "E quem ama, cuida, né Cid? Agora é hora de cuidar", respondeu ela. "Deus deu a sabedoria para o homem usar a sabedoria", falou Cid. "Estamos há quase 19 anos juntos e é hora de cuidar de você", completou Fátima. Disponível em Acesso em 24 de jan. de 2020.

Cid Moreira comove com texto sobre velhice, não desiste do trabalho e dá lição aos jovens

O jornalista Cid Moreira é um dos nomes mais icônicos da história da TV brasileira. Os mais velhos se lembram dele à frente do Jornal Nacional. Os mais jovens recordam de sua voz inconfundível no Fantástico. Ambos programas da Rede Globo.

O tempo passou e Cid Moreira completará 92 anos no próximo mês. Aos 91, Cid não desistiu de trabalhar. Ele continua na ativa. Nesta terça-feira (27), ele postou um vídeo no Instagram comentando sobre o trabalho.

Ele começa o vídeo dando bom dia aos seguidores e agradecendo a Deus por mais um dia de vida. Cid afirmou que acordou cedo e viajaria do aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, para São Paulo.

O motivo da viagem era trabalho. Cid Moreira foi convidado para participar de um evento com influenciadores digitais. ‖Estou comentando isso só para dizer que não é mais fácil viajar na minha idade, a movimentação do aeroporto, todos com muita pressa‖, comentou Cid Moreira.

O dono de uma das vozes mais conhecidas do Brasil citou ainda as grandes distâncias, a espera e as escadas rolantes como problemas no aeroporto. Mas, segundo ele, isso só é notado na velhice. 192

Texto completo – Instagram

Bom dia pessoal! Tudo bem? Quero agradecer a Deus esse lindo dia! Hoje acordei cedo apesar de estar escrevendo só agora para vocês. Praticamente daqui um mês farei 92 anos, se Deus quiser! Neste momento me encontro no aeroporto do Galeão à espera de um voo para São Paulo. Vou participar de um evento amanhã pela manhã com ―influencers‖ digitais. Estou comentando isso só para dizer que não é mais fácil viajar na minha idade, a movimentação do aeroporto, todos com muita pressa. Escadas rolantes, grandes distâncias entre um portão e outro, longas esperas, mas a gente só nota isso depois que envelhece. Mas eu ainda não desisti de trabalhar! Isso me dá satisfação e a sensação de estar envolvido com o movimento da vida me dá ânimo.

Disponível em Publicado em setembro de 2019 por Diogo Marcondes. Acesso em 24de jan. de 2020.

Cid Moreira dá lição de sabedoria e diz que nem todo velho aprendeu com a vida

Apresentador tem tido uma velhice feliz!

O apresentador Cid Moreira chama atenção nas redes sociais por todo o amor que recebe mesmo estando aposentado e brilha no instagram. Ao lado de sua esposa que cuida dele, o jornalista desfruta de uma velhice saudável e tranquila.

Cid Moreira fez uma bela reflexão de sabedoria enquanto tomava sol pela manhã em sua luxuosa mansão. Cid agradeceu pela vida e falou sobre a importância de evoluir com a vida, aprender as lições e melhorar com o tempo. O dono de uma das vozes mais conhecidas do Brasil, incentivou aos seus contemporâneos velhinhos que tomem sol.

O apresentador de décadas do Jornal Nacional escreveu na legenda do vídeo em seu instagram:

―Bom dia pessoal, tudo bem com vocês meu povo do Instagram!? Eu estou recebendo esse solzinho da manhã e meditando sobre o que vou escrever hoje. 193

Quero agradecer primeiramente a Deus por essa paz e tranquilidade nesse pequeno paraíso. Desejo a vocês toda essa paz e tranquilidade também. Então pensei! Todo velhinho precisa pegar um sol! Não se esqueçam é vital! Mas não pode ser esquecido lá fora e se queimar! Mas quero falar sobre velhice e sabedoria. Não se iludam, a velhice não traz sabedoria! A sabedoria também é aprendida na infância.

Existem velhos que vão morrer e não aprenderam nada sobre bondade, paciência ou resiliência! Serão ranzinzas. Mal-educados e mal-humorados! Grosseiros. Bandidos, assassinos, traficantes, corruptos e perversos também envelhecem. É uma ilusão achar que o envelhecimento faz as pessoas melhores.

O velhinho continua arrogante. Aprontando. Se achando! Eles serão o que foram a vida toda! O que torna uma pessoa melhor é uma decisão dela de ser melhor! A gente vê crianças da mesma idade e criação com diferentes comportamentos! Os exemplos são muito fortes, mais do que as palavras... Não se iludam! Um grande abraço e bom dia!‖

Disponível em

CID MOREIRA CONTA COMO MANTÉM A CHAMA DO AMOR ACESA, AOS 86 ANOS, COM A MULHER BEM MAIS JOVEM: „TUDO CONTINUA FUNCIONANDO‟ Casado há 14 anos com a jornalista Fátima Sampaio, Cid Moreira, de 86 anos, garante que mantém a chama do amor acesa até hoje. ―Não percebo essa questão da idade. Por enquanto, tudo continua funcionando‖, disse o ex-apresentador do Jornal Nacional, em entrevista à revista ―Caras‖ desta semana.

O segredo de tanta paixão, segundo ele, está na jovialidade da sua quarta mulher, 36 anos mais nova. ―Ela é maravilhosa, dedicada, educada, tem todas as qualidades do mundo‖, derrete-se Cid, que também recebeu elogios de Fátima.

À publicação, Fátima narrou um momento de intimidade constante do casal, que adora namorar diante da lareira, com um bom vinho, e contou que o marido exige sempre vê-la arrumada. 194

―Gosto de beijar, abraçar e, de tanto agir assim, o Cid passou a fazer também. Então, ele tem um comportamento bem legal, gosta que eu me arrume, quer me ver bonita. De repente, fala: ‗Vamos comemorar algo!‘. Então, assistimos a um filme romântico ou sensual na sala de cinema da nossa casa na serra do Rio, estouramos champanhe, dançamos. Adoramos dormir abraçados, com as pernas entrelaçadas‖, conta ela. ―Lá, também namoramos, bebendo vinho diante da lareira‖, completa Cid.

A diferença de idade entre eles também nunca foi um tabu para o casal. Fátima admite que tem horas em que os papéis se invertem:

―Brinco que sou uma sombrinha pernambucana de frevo e ele, um guarda-chuvinha inglês, mas andamos juntos (...) Eu cuido dele, quero proteger, tenho essa preocupação, e isso é amor. Nessas horas, me sinto mais mãe. Tem momentos em que sou filha, amiga, amante‖.

Com saúde de ferro e ótima memória, Cid conta que às vezes exagera nos exercícios físicos e que mantém a forma praticando musculação, pilates, futebol e tênis. Além disso, ele segue uma rotina saudável de hábitos alimentares com saladas e alimentos integrais. ―Há mais de meio século tirei a carne vermelha do meu cardápio. Minha fisioterapeuta diz que tenho a musculatura de um homem de 60 anos‖, conta ele, enquanto tem um outro segredo seu revelado pela mulher:

―O Cid é cheiroso, limpinho. Algumas pessoas, quando ficam velhas, costumam se entregar, não têm mais qualquer ânimo para ficar se cuidando, ao contrário do Cid. Acho que meu marido é um belo exemplo‖.

Disponível em Publicado em 30 de set. de 2015. Acesso em 24 de jan. de 2020.

195

ANEXO T

FRANCISCO CUOCO (29/11/1933)

O tempo passa para todo mundo. O importante é a gente ter cada vez mais consciência de que idade não é um problema, idade é uma consequência. Esqueça os números e os anos. O passado é lindo, ficou lá pra trás, é uma referência importante. O futuro é o minuto seguinte, que é tão precioso que a gente chama de 'presente'. Então, o presente é importante para que você esteja bem, esteja saudável, esteja feliz!‖, disse Cuoco, durante a entrevista dada ao Portal.

Disponível em Acesso em 17 de jan de 2019

Francisco Cuoco não usa remédio para ter ereção; chegue aos 80 como ele...

Aos 80 anos, o ator Francisco Cuoco afirmou que não usa remédio algum para ter relações sexuais com sua namorada Thaís Almeida, de 27 anos. A declaração, dada à revista ―Contigo!‖, despertou a curiosidade de homens que também querem alcançar a terceira idade com um desempenho sexual satisfatório e gerou a dúvida: é possível chegar à velhice sem precisar usar remédios para ter ereção?

Segundo o médico geriatra José Campos Filho, do Hospital Israelita Albert Einstein, é possível, sim, mas a probabilidade de um idoso ter dificuldade de ereção é grande. ―Vários estudos mostram que, com a idade, a capacidade sexual diminui. É uma questão orgânica, que faz parte do envelhecimento. Assim como perdemos agilidade, força muscular, a ereção também é afetada", afirma.

No entanto, a sexualidade cada vez mais faz parte da vida dos idosos. Segundo dados da pesquisa Mosaico Brasil, que contou com mais de 8 mil entrevistados e foi coordenada em 2008 pela psiquiatra Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora do ProSex (Programa de Estudos em Sexualidade da USP), 87,1% dos homens acima dos 61 anos afirmam ser sexualmente ativos. 196

Disponível em

Acesso em 17 de jan. 2019.

197

ANEXO U

STÊNIO GARCIA (28/04/1932)

Mulher defende Stênio Garcia após ator revelar que já usou Viagra: ―Nunca falhou‖

Marilene diz ainda que o dia em que o marido sofrer de impotência, o casal pretende recorrer a outras fórmulas para manter a chama acesa.

―Como ele não pode usar essas pílulas, e eu também sou contra que ele use, vamos recorrer a outras brincadeiras. O casal de duas mulheres não transam? Então, dá pra gente improvisar também com uns brinquedinhos. Isso não será um problema. Mas acho que isso ainda vai demorar para acontecer. Ainda temos muita química, desejo e paixão um pelo outro‖.

Em entrevista à revista "Contigo!" desta semana, Stênio admitiu que já fez uso do Viagra e relatou que não teve uma boa experiência com a pílula.

"Nunca mais uso remédio para impotência sexual, porque me faz muito mal. Experimentei o tal do Viagra, e o coração veio na boca", disse ele.

Disponível em Acesso em 17 de jan. de 2019.

198

ANEXO V

TARCÍSIO MEIRA (05/10/1935)

―Ficar velho é muito chato, esse papo de melhor idade é bobagem‖. ―Sou velho, mas não me sinto idoso.‖ Disponível em Publicada em 09 de jul de 2016 – Acesso em 4 de nov. de 2019

―Ninguém gosta de pensar que o fim está chegando. Mas ele está chegando para mim. É triste também lidar com a perda dos amigos. Certa vez, fui receber um prêmio de cinema. Dei de cara com o diretor de teatro Antunes Filho. Foi uma alegria, porque fazia anos que não o via. Eu disse: ―Antunes, somos sobreviventes‖. Pouco tempo depois, o próprio Antunes morreu. A esta altura da vida, muitos colegas da minha idade se foram. Daqui a pouco, vou eu. Talvez eu deixe um vazio nas pessoas.‖

―A gente tem que aceitar ser velho e tirar alegrias da velhice. São poucas, mas são boas, como por exemplo, a companhia de minha mulher, Glória. A gente se gosta muito, se curte muito e se cuida muito.‖

Disponível em. Acesso em: 13 de jan. de 2020.

―A morte me assusta. Ninguém gosta de pensar que o fim está chegando. É triste também lidar com a perda dos amigos. Daqui a pouco, vou eu. Talvez deixe um vazio nas pessoas‖

Os autores não acreditam que existam velhos na família brasileira, nem que eles tenham papel relevante. Sabe como é, são jovens autores, que se preocupam com os jovens. O que eles deveriam saber é que hoje são as pessoas de idade que passam mais tempo na frente da televisão assistindo às novelas. E essas pessoas sempre acompanharam minha carreira e a da Glória.

Disponível em Publicado em 06 de dez. de 2019. Acesso em 13 de jan. de 2020.