Estratégias De Hoje Para Contar O Ontem: a Transmidiação Nas Telenovelas Lado a Lado E Joia Rara, Da TV Globo Luiz Gustavo Di
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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Manaus - AM – 28 a 30/05/2015 Estratégias de hoje para contar o ontem: a transmidiação nas telenovelas Lado a Lado e Joia Rara, da TV Globo1 Luiz Gustavo Dias FERREIRA2 Maria Ataide MALCHER3 Universidade Federal do Pará, Belém, PA RESUMO Este artigo tem como objetivo identificar e analisar a adoção de estratégias de transmidiação, processo comunicacional de proliferação de novas possibilidades de envolvimento do público por um produto cultural em vários suportes, nos sites oficiais das telenovelas Lado a Lado e Joia Rara, da TV Globo. Tal identificação, a partir de uma categorização de conteúdos transmidiáticos de 30 produções de teledramaturgia da emissora entre 2010 e 2014, pode auxiliar na compreensão de como tais conteúdos são concebidos para telenovelas de época, considerando os temas históricos, e de que maneira essas estratégias podem auxiliar o público na missão de acompanhar as tramas pela TV e pela internet. PALAVRAS-CHAVE: Teledramaturgia, Telenovelas de época, Televisão, Transmidiação, TV Globo. INTRODUÇÃO No Brasil de 65 anos atrás, o presidente era Eurico Dutra, o país era predominantemente rural, a Seleção Brasileira de Futebol ainda não havia conquistado o primeiro de seus cinco títulos de Copa do Mundo, e o rádio era o grande porta-voz dos brasileiros. Jornal impresso ainda era luxo. Nesse momento de reestruturação política, econômica e social do Brasil (RIBEIRO, SACRAMENTO, ROXO, 2010, p. 7), nasce a TV Tupi, primeira emissora de televisão da América Latina. Uma nova era estava no ar! Era do acesso à informação por meio de diferentes suportes, de integração por redes de comunicação, de autoconhecimento do Brasil como país plural, diverso, um todo feito de particularidades. Com o tempo, para Carminha (2010, p. 124), “A televisão, mais do que meio, passou a ser uma das instâncias centrais na fabulação de 1 Trabalho apresentado no IJ05 – Rádio, TV e Internet do XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte, realizado de 28 a 30 de maio de 2015. 2 Graduado em Comunicação Social – Jornalismo da FACOM-UFPA, email: [email protected]. 3 Orientadora do trabalho. Professora do Curso de Comunicação Social – Jornalismo da FACOM-UFPA, email: [email protected]. 1 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Manaus - AM – 28 a 30/05/2015 um novo modo de agir, composto pelos próprios referentes históricos que ela acabou de criar”. E uma das formas que o brasileiro encontrou para se reconhecer foi a teledramaturgia4. A partir da telenovela, o cidadão passou a se ver e se envolver com histórias que poderiam ser as suas. Malcher, nesse sentido, diz que “Não se pode desconsiderar o importante papel desempenhado pela televisão e tão pouco admitir que essas obras de ficção televisionadas não sejam expressivamente o passaporte para quebra do cotidiano, para suspensão da realidade” (MALCHER, 2009, p. 163). A telenovela brasileira tem como característica principal contar histórias possíveis, com tramas prováveis, mesmo envoltas em temas fantásticos e aparentemente surreais. Histórias de hoje, de amanhã e de ontem. Neste último caso, as telenovelas também ajudar a contar o que não vivemos, a partir de viagens no tempo e no espaço. As tramas de época trazem ao espectador a experiência de ver e sentir, mesmo que pela ficção, um pouco de histórias passadas. Para contar esses fatos de outrora, a TV Globo desenvolve estratégias nos sites oficiais de cada produção no portal de entretenimento da emissora na internet, Gshow. Dentre essas estratégias, são produzidos conteúdos transmídia. Segundo Jenkins (2009, p. 138), a narrativa transmídia é aquela que se desenvolve em mais de uma plataforma, na qual os diferentes textos contribuem para sua construção. A telenovela se transforma, nesse panorama, em um produto com mais de um texto, o roteiro ficcional primário, e se configura com potenciais expansões das mais distintas ordens. No Brasil, Fechine (2011, 2013) compreende a noção de transmidiação jenkiniana e traz para o cenário peculiar da telenovela brasileira. A partir dessa compreensão, a autora cria uma categorização das estratégias e dos conteúdos transmidiáticos, com base em estudos de sites de telenovelas da TV Globo. Fechine (2013) divide os conteúdos em estratégias de propagação e estratégias de expansão, sendo a primeira denominação aplicada a ações de disseminação da narrativa principal, 4 A teledramaturgia brasileira, configurada como um gênero próprio e único no mundo, foi construída ao longo do tempo. Nos primeiros anos da TV brasileira, havia a simples transmissão de apresentações teatrais e os próprios teleteatros, geralmente clássicos da literatura universal em versões interpretadas pelos principais nomes da cena no Brasil da primeira metade do século 20. Esse gênero e seus principais programas (“Grande Teatro Tupi”, “TV de Vanguarda”, “TV de Comédia”) foram os produtos de maior prestígio segundo o público, os profissionais da área e os críticos (BRANDÃO, 2010, p. 37). Ainda não se falava em teledramaturgia como se conhece hoje, em termos de estrutura e linguagem. 2 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Manaus - AM – 28 a 30/05/2015 e a segunda denominação a conteúdos que ampliam as possibilidades de envolvimento da audiência com a telenovela. Esta foi a metodologia adotada na construção, a partir da proposta de Fechine, de uma sistematização das estratégicas transmidiáticas presentes em sites de 30 produções dramatúrgicas da TV Globo – 28 telenovelas e 2 minisséries – exibidas entre os anos de 2010 e 2014, para montar um quadro quantitativo de conteúdos e suas respectivas naturezas e, com isso, identificar as características do processo de transmidiação aplicado pela emissora que, em 2015, completa 50 anos. Um dos pontos que chamou a atenção com o estabelecimento da categorização foi a quantidade de conteúdos contextuais desenvolvidos nos sites de telenovelas de época, em especial Lado a Lado (2012) e Joia Rara (2013). As duas foram exibidas no horário das 18h, faixa de 80% das telenovelas analisadas – apenas uma, Gabriela (2012), foi exibida às 23h. Lado a Lado e Joia Rara foram escolhidas pela quantidade e pelo teor das estratégias identificadas, além do fato de as duas produções terem sido premiadas na categoria Melhor Novela com o Emmy Internacional, mais importante reconhecimento a produções televisivas do mundo. Este artigo busca analisar tais conteúdos, identificados por Fechine (2013) na categoria de estratégias de propagação, como extensões transmidiáticas de um produto atual com temática histórica, e como esses conteúdos ajudam a contar não apenas a trama dos personagens, mas também a conjuntura de tempos passados. São estratégias de hoje que narram o ontem. TELENOVELA BRASILEIRA COMO NARRATIVA TRANSMÍDIA A telenovela no Brasil se constituiu como um paradigma construído ao longo do tempo e das transformações sociais e da própria televisão. Brandão (2010) lembra que: Se hoje é nas telenovelas e minisséries que encontramos a linguagem e o padrão de qualidade tão procurados no universo ficcional da TV, não há dúvida de que o teleteatro, nas duas primeiras décadas de instalação da TV brasileira, foi o desbravador do desconhecido terreno da linguagem televisiva. (BRANDÃO, 2010, p. 41) O teleteatro, espécie de sinergia entre uma das artes mais tradicionais da Humanidade e a mídia que acabara de nascer em 1950, teve fundamental destaque no desenvolvimento da TV no Brasil, nos aspectos tecnológico e artístico. Os primeiros grandes nomes da dramaturgia brasileira surgiram no teatro ou no próprio rádio, como 3 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Manaus - AM – 28 a 30/05/2015 Cassiano Gabus Mendes, Geraldo Vietri, Walter George Durst, Walter Avancini e Daniel Filho. Com o passar dos anos e das primeiras experiências em narrativas dramatúrgicas para a televisão, desde a estreia de Sua Vida Me Pertence (TV Tupi, 1951), passando pela primeira telenovela diária, 2-5499 Ocupado (TV Excelsior, 1963), até a aproximação com o cotidiano dos brasileiros em Beto Rockfeller (TV Excelsior, 1969), a telenovela se consolidou como um dos elementos de identificação cultural do brasileiro com ele mesmo e com sua história. Um dos responsáveis por tamanho destaque da telenovela brasileira – dentro e fora do país – foi a TV Globo, inaugurada em 26 de abril de 1965. Em 50 anos a emissora já produziu 301 telenovelas nos horários das 18h, 19h, 21h, 22h e 23h, além de centenas de outras produções em formatos diferentes, como minisséries, macrosséries, seriados e especiais. A emissora sediada no Rio de Janeiro criou personagens que persistem no imaginário popular dos brasileiros. A jovem escrava5, o dono do mundo6, a senhora do destino7, o comendador8. Por meio das telenovelas o Brasil conheceu o mundo e o próprio Brasil. Do extremo sul ao norte, do sertão à metrópole, do rio à rua. E a viagem não se restringiu à geografia e permeou o tempo. Azevedo & Elias (2013) afirmam que “O brasileiro muitas vezes é cobrado por ser um povo sem memória, mas, pela ótica da ficção pode ser transportado a diferentes épocas e aprender um pouco mais sobre determinados períodos históricos, ainda que de forma romanceada” (AZEVEDO