FACULDADE DE BELAS-ARTES DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

EM TORNO DA CONCEÇÃO E DA RECEÇÃO DA ARTE PÚBLICA: A REPRESENTAÇÃO NO LUGAR

JOANA LINO NETO MOTTA GUEDES

MESTRADO EM PINTURA

LISBOA

2012 FACULDADE DE BELAS-ARTES DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

EM TORNO DA CONCEÇÃO E DA RECEÇÃO DA ARTE PÚBLICA: A REPRESENTAÇÃO NO LUGAR

JOANA LINO NETO MOTTA GUEDES Nº 3124

MESTRADO EM PINTURA ORIENTAÇÃO: PROFESSOR DOUTOR JOSÉ QUARESMA

LISBOA

2012

Ao meu Pai

- 2 -

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer a todos aqueles que me contribuíram para a realização deste trabalho de investigação. Em primeiro lugar ao Professor Doutor José Quaresma, meu orientador, pelos valiosos aconselhamentos e indicações que abriram novos caminhos de investigação e muito contribuíram para o enriquecimento do presente ensaio, assim como pela partilha de conhecimentos em conversa e cedência de algumas fontes importantes, para além da sua disponibilidade incansável para analisar criticamente e ajudar no desenvolvimento da dissertação. Ao meu Pai, João Augusto, pela importância que teve no meu desenvolvimento como artista, assim como na realização deste trabalho pelas sugestões, pelos conselhos e ensinamentos, assim como pelo interesse demonstrado e presença atenta sempre que precisei. Queria também agradecer à minha Mãe, Maria de Jesus, pelo seu amparo, carinho e preocupação comigo ao longo de todo este período de trabalho e sempre, assim como pelas ajudas que me deu. À minha irmã Leninha, pela motivação e pelo empenho em me ajudar, pelo auxílio na redação do trabalho e por ter velado pelo meu bem-estar sempre ao longo de todo este tempo. De forma muito especial, gostaria de agradecer ao António, pelos conselhos e motivação que me deu, pelas vezes que leu e releu o trabalho ajudando-me a melhorá-lo, pelas conversas que teve comigo, pelo seu amor e apoio incondicional.

A todos o meu mais profundo reconhecimento.

- 3 -

ABSTRACT

In this paper an approach is made to the subject of public art from the point of view of artistic practice and specific issues it raises, linking it with the theoretical reflection. The "public sphere" is addressed as a privileged mean for interpersonal relationships and hosting public art. Some definitions of public art are reviewed and the difficulty of defining this artistic field is reasoned. Contemporary public art has a hybrid character, integrating multiple discourses and practices, various foundations and motivations. A critical analysis is developed through the work of public art by Eduardo Nery and Mary Keil in Portugal, as well as Daniel Buren and Olafur Eliasson abroad. We explore the question of artistic production in the public space field, exposure and characterization of the concerns, conception and execution stages of my own plastic work with an intervention in the urban space, conducted between 2010 and 2012. For each author’s work we dissect working methods, development of the creative process, motivation, speech, formal and expressive elements, concepts and central ideas of work, possible interpretations and meanings. The public art projects that are designed to treat the installation’s specific place are addressed to the general public and are designed to open a fruition, which causes different readings. We inquire artistic creation in public space as a compromise to several factors, examining their relationship with their spaces and their publics and simultaneously a challenge for the artist and for observers. Several artistic proposals which are developed around the urban and social multiplicity seeking to connect people to places through art are investigated.

Keywords: public art, public space, contrasts, tangle, movement.

- 4 -

SINOPSE

Neste trabalho fazemos uma aproximação ao tema da arte pública do ponto de vista da prática artística e questões específicas que levanta, articulando-a com a reflexão teórica. Abordamos o “espaço público” como meio privilegiado para as relações interpessoais e que acolhe a arte pública. Revemos algumas definições de arte pública e falamos da dificuldade de delimitação deste campo artístico, que na contemporaneidade tem um caráter hibridista, integrando múltiplos discursos e práticas, diversos fundamentos e motivações. Desenvolvemos uma análise crítica dos trabalhos de arte pública de Eduardo Nery e em Portugal, assim como de Daniel Buren e Olafur Eliasson no exterior. Exploramos a questão da produção artística no domínio do espaço público, pela exposição e caraterização das preocupações, fases de conceção e execução de um trabalho plástico de intervenção no espaço urbano, da nossa autoria, realizado entre 2010 e 2012. Para a obra de cada autor dissecamos métodos de trabalho, desenvolvimento do processo criativo, motivações, discurso, elementos formais e expressivos, conceitos e ideias centrais do trabalho, interpretações e sentidos possíveis. Os projetos de arte pública que tratamos são pensados para o lugar específico da sua instalação, dirigirem-se ao público em geral e são concebidos para uma fruição aberta, que origina diferentes leituras. Indagamos a criação artística no espaço público enquanto compromisso com vários fatores, examinando a sua relação com os seus espaços e os seus públicos e simultaneamente como desafio para o artista e para os fruidores. Investigamos várias propostas artísticas que se desenvolvem em torno da multiplicidade social e urbana e procuram ligar as pessoas aos lugares, através da arte.

Palavras-chave: arte pública, espaço público, contrastes, emaranhado, movimento.

- 5 -

ÍNDICE

AGRADECIMENTOS 3 ABSTRACT / SINOPSE 4 ÍNDICE 6 INTRODUÇÃO 8

1. SOBRE A ARTE PÚBLICA 13 1.1. O Espaço Público que a acolhe 13 1.1.1.Esfera Pública: espaço amplo de discussão e inter-relação dos indivíduos 13 1.1.2. A Experiência Comunicacional no Espaço Público 16 1.2. Definições ou in-definição da Arte Pública 18 1.3. Arte e Compromisso com o público. O Local e outros fatores. 22 1.3.1. Obra de arte em conexão com o espaço específico da sua instalação: Arte Pública in Situ 24 1.3.2. As vicissitudes dos projetos “negociados” entre autores e instituições 25 1.4. Arte Pública como desafio para o artista e provocação para o fruidor: Pluralidade de Fruições e de Significados no espaço público 26 1.4.1. O Desejo de Relação Interpessoal na Arte Pública 27 1.4.2. Possibilidade de intervenção na sociedade e no espaço público 28 1.4.3. Melhorias no espaço público e qualidades da arte pública 29

2. ESTUDO DE CASOS PARTICULARES DE ARTE PÚBLICA 31 2.1. Maria Keil: Intervenção na Estação dos do Metropolitano de Lisboa (1966) 31 2.1.1. Sumário do projeto: revestimento das paredes de um espaço arquitetónico utilitário para o decorar e humanizar 31 2.1.2. Desenvolvimento do projeto: o azulejo como presença sensível de cor e brilho 32 2.1.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: envolvimentos visuais e táteis de conceção global para o espaço arquitetónico ao serviço do público 33 2.2. Eduardo Nery: Internacional de Macau - Painel monumental de azulejos na varanda contínua do terminal de embarque (1995) 34 2.2.1. Sumário do projeto: grande painel de azulejos para um espaço público de grande movimento de transeuntes 34

- 6 -

2.2.2. Desenvolvimento do projeto: criação de uma malha geométrica baseada na estrutura quadricular do azulejo, no desenho, cor e luz 36 2.2.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: espaço ótico vibrátil, ligado ao movimento dos transeuntes e inserto na arquitetura 37 2.3. Daniel Buren: Les Couleurs Traversées - Instalado em 2001 nos três andares da Kunsthaus, em Bregenz, na Áustria 38 2.3.1. Sumário do projeto: transformação do espaço de exibição num novo espaço 38 2.3.2. Desenvolvimento do projeto: trabalho in situ que congrega desenho-pintura-escultura-arquitetura 39 2.3.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: dedução a partir do sítio de intervenção, integração no lugar e relação com o observador 42 2.4. Olafur Eliasson: Glass Brick for the Façades of the Harpa Reykjavik Concert Hall and Conference Centre (2005-2011) – East Harbor, Reykjavik, Iceland 43 2.4.1. Sumário do projeto: desenho das fachadas de um espaço em contexto social 43 2.4.2. Desenvolvimento do projeto: o quasi-tijolo, pesquisa e experimentação geométrica, conceção e produção colaborativa 45 2.4.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: intervenção na arquitetura para uma experiência ativa dos observadores e exploração do espaço e do tempo 46

3. PROJETO ARTÍSTICO INDIVIDUAL INTEGRADO NO ESPAÇO PÚBLICO: INTERVENÇÃO NA ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DE AGUALVA-CACÉM (2010-2012) 49 3.1. Sumário do Projeto, Contexto. 49 3.1.1. Lugar de Integração. Conceitos Centrais. 50 3.2. Delineamento do Projeto. Trabalho em Equipa. 52 3.2.1. Propostas Iniciais, Estudos de Composição, Pesquisa Cromática. 54 3.2.2. Opções Técnicas, Definição dos Materiais. 55 3.3. Projeto Definitivo. Caracterização Formal. 58 3.3.1. Alterações, Produção dos Azulejos, Montagem no Local 66 3.4. Resultantes Expressivas da Composição Estrutural. Integração Conceptual. 71 3.4.1. O trabalho enquanto arte pública, análise conceptual: compromisso, desafio, provocação, relação com o público, caráter permanente 74

CONCLUSÃO 78 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 81 FONTES DAS IMAGENS 88 ANEXOS

- 7 -

INTRODUÇÃO

Estado da Questão: a Teorização e a Prática da Arte Pública em Portugal

A arte pública em Portugal, durante grande parte do século XX, esteve ligada ao regime do Estado Novo, preponderando obras com sentido simbólico, caráter narrativo, e função propagandística. A arte pública limitava-se quase só à estatuária comemorativa, que seguia códigos de representação historicista, utilizando uma iconografia ideológica de exaltação de valores culturais e nacionalistas facilmente apreendidos pelo público que com eles se identificava. Este tipo de escultura pública esteve bem representado na Exposição do Mundo Português, que aconteceu em 1940 em Lisboa, um grande evento que promoveu a manifestação artística coletiva, marcado pelos objetivos programáticos do regime estado- novista. Por contraste com aquilo que ocorreu em Portugal, no Reino Unido e nos EUA, ainda nos finais do século XIX e no princípio do século XX, a arte pública era orientada por associações privadas sem fins lucrativos que se dedicavam não só à arte pública como também ao planeamento urbano como foi o caso da Fairmont Park Art Association em Filadélfia, Pensilvânia, nos Estados Unidos, criada em 1872, sendo a arte pública orientada essencialmente para obras realizadas por trabalhadores de construção ou imigrantes como é o caso, em Los Angeles na Califórnia, de Watts Towers terminada em 1954 ou Nuestra Puebla realizada por imigrantes italianos também nos Estados Unidos, e peças de arte ou memoriais dedicados a pessoas comuns, tendo um dos primeiros surgido no Reino Unido Memorial to Heroic Sacrifice de George Frederik Watts, 1899-1933, em Postman’s Park, em Londres. A arte pública nos EUA, ainda em 1933-34 tornou-se acessível a grande número de artistas, já que mais de 4000 artistas foram convidados a criar aproximadamente quinze mil trabalhos de arte que fizeram parte do primeiro programa federal de arte pública, o chamado PWAP- Public Works of Art Projet.1 Em Portugal, só no final do século XX, começam a surgir no nosso país projetos de arte pública contemporânea que partem de novas filosofias de ocupação do espaço público.

1 Para um desenvolvimento da história da arte pública no início do século XX nos Estados Unidos e Reino Unido, cf. CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly (eds.), The Practice of Public Art, Nova Iorque, Routledge, Taylor & Francis Group, 2008, pp. 231-246.

- 8 -

Concebidos para um determinado espaço e para influir na vivência desse lugar. Deste período foram notórias as várias intervenções realizadas para a Exposição Internacional de Lisboa em 1998 - Expo’98. Estes projetos de arte pública, ao contrário dos trabalhos anteriores, tinham um sentido dinâmico, irreverente, provocador e desestabilizador, de forma a questionar a cidade e o espaço que ocupam. Segundo Paulo Simões Nunes, pretendiam ser abertos à “participação dos espectadores-cidadãos convertendo-se em espaços de estar, de fruição e de reflexão.”2 Foram concebidas para ser integradas no espaço urbano contemporâneo: heterogéneo, fragmentado e multicultural. Afirmam, em geral, a consciência cívica do artista e um entendimento do site specific, numa reflexão e valorização do espaço envolvente, numa arte pública de cariz político e social. Hoje as instituições e entidades são mais permeáveis a este género artístico e a encomenda pública e privada tem estimulado novas propostas interventivas e de expressão plástica, mais ou menos transgressoras, mais ou menos inseridas e relacionadas com a arquitetura e o urbanismo, abertas a várias interpretações, e têm-se espalhado diversas obras de arte pública pelo país, para além de intervenções efémeras de grande alcance plástico e urbano, entre as quais as realizadas no âmbito das Festas da Cidade de Lisboa, entre outras. Mas na realidade, a colaboração da arte com a arquitetura, que sempre existiu, continua a levantar discussões e a ser posta em causa a sua legitimidade enquanto ‘Arte’. Muitos críticos, teorizadores, artistas, colecionadores, curadores e outros do meio artístico focam-se nesse aspeto, descurando a obra em si, e muitos trabalhos, nomeadamente de intervenção permanente no espaço público, ficam por explorar devido ao preconceito que subsiste e que os leva a vê-la como uma prática de compromisso. Continuam a existir muitos mal-entendidos quanto à arte pública socialmente comprometida, devido à ideia de que a arte por ser pensada para o Outro, é sinónimo de dependência e de falta de originalidade. Embora toda a arte seja pensada, mesmo que inconscientemente, para um público específico: seja ele a comunidade da arte, a crítica, ou outros, a arte pública continua a ser marginalizada e a não ter reconhecimento ou sequer análise crítica. No entanto, a arte pública é um tema atualmente muito pertinente, não só porque nos interpela de forma sistemática e quotidiana, mas também dados os desenvolvimentos que tem vindo a tomar nos últimos anos, com a utilização de cada vez mais médiuns e o cruzamento de diversas disciplinas. No entanto, entre nós, carece de um estudo mais alargado. Grande

2 NUNES, Paulo Simões, «Arte Pública», in PEREIRA, José Fernandes (dir.), Dicionário de Escultura Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2005, p. 62.

- 9 - parte dos ensaios e estudos sobre o tema têm sido feitos no mundo anglo-saxónico, nomeadamente nos Estados Unidos. O livro de Suzanne Lacy, Mapping the Terrain3 foi um marco neste campo, em que a partir da definição da nova arte pública se gerou grande entusiasmo no meio crítico em torno das suas novas possibilidades: novos médiuns, performance, site-specific e arte ativista, além dos trabalhos de arte pública permanente considerada “convencional”. Em Portugal têm sido publicadas obras e realizadas exposições sobre este assunto tal como a Expo’98, que já referimos, que foi um espaço de celebração da Arte Pública, com a participação de inúmeros artistas de destaque na esfera portuguesa e também vários artistas estrangeiros. Outro exemplo foi o projeto transdisciplinar Lisboa Capital do Nada, Marvila, 2001: criar, debater, intervir no espaço público, coordenado por Teresa Alves, Daniela Brasil e Luís Seixas em 20014 (evento cultural, com debates e textos sobre o espaço público, assim como intervenções de artistas e outras). Pode-se ainda referir os projetos que têm sido desenvolvidos por José Quaresma5 no Chiado com intervenções artísticas, textos dos artistas que participam e textos críticos sobre arte pública e espaço público, como é o caso das exposições e publicação ainda este ano de Instituições Culturais e Representatividade. Chiado, Baixa, Arte Pública e Esfera Comunicacional6, com a participação de Pedro Cabrita Reis e outros. Para além disso, os ensaios sobre o tema de José Quaresma, de José Pedro Regatão7, ou os coordenados por Pedro de Andrade, Carlos Almeida de Marques e José da Cunha Barros8, entre outros. Sobre as obras permanentes de vários artistas no espaço público, foram ainda realizadas em Portugal diversas publicações do Metropolitano de Lisboa e da Refer sobre as intervenções nas suas estações. Também nesse sentido foi feito um livro pelo artista plástico

3 LACY, Suzanne (ed.), Mapping the Terrain, New Genre Public Art, Seattle, Washington, Bay Press, 1995. 4 AAVV, Lisboa Capital do Nada, Marvila, 2001. Criar, Debater, Intervir no Espaço Público, coords. Teresa Alves, Daniela Brasil, Luís Seixas, Lisboa, Extra Muros, Associação Cultural para a Cidade, 2001. 5 QUARESMA, José (coord.), Efervescência Urbana, Artística e Literária de um Lugar, Lisboa, FBAUL/CIEBA, 2010. QUARESMA, José (coord), O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011. 6 QUARESMA, José (coord.), Instituições Culturais e Representatividade. Chiado, Baixa, Arte Pública e Esfera Comunicacional, Lisboa, CIEBA, 2012, pp. 95-108. 7 REGATÃO, José Pedro, Arte Pública e os Novos Desafios das Intervenções no Espaço Urbano, 1975, 2ª edição, Lisboa, B on D - Books on Demand, 2010. 8 ANDRADE, Pedro de; MARQUES, Carlos Almeida de; BARROS, José da Cunha (coords), Arte Pública e Cidadania. Novas Leituras da Cidade Criativa, («Colecção Pensar Arquitectura»), Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2010.

- 10 -

Eduardo Nery9, em que fala da sua obra pública e da de outros autores em Portugal. No entanto, estas publicações são mais uma compilação de obras numa abordagem descritiva e histórica, do que uma análise crítica ao trabalho inserido na problemática da arte pública.

O que pretendemos fazer com este estudo é uma aproximação ao tema da arte pública do ponto de vista do artista que trabalha nesse campo, abordando metodologias, processos de trabalho, etapas, conciliação do trabalho em equipas multidisciplinares, assim como a relação entre localização e motivação da encomenda, com a intenção do artista, o seu discurso plástico e os valores estéticos e sentidos transmitidos. Deste modo, pretende-se articular a reflexão no âmbito da arte pública e das questões específicas que a prática artística nesse campo levanta. No primeiro capítulo começaremos por delimitar o âmbito do conceito de “espaço público”, enquanto campo onde se insere a chamada arte pública, baseando-nos essencialmente em Jürgen Habermas, Charles Taylor e João Pissarra Esteves. Em seguida abordaremos algumas definições de arte pública, e a dificuldade de definição desta prática artística. Continuaremos a analisar criticamente as motivações e fundamentos diversos de que partem os projetos de arte pública contemporânea: comemorativo, monumental, pedagógico, comunitário, ativista, lúdico, site-specific, arte permanente, efémera e performativa, entre outros. No segundo capítulo faremos uma análise crítica de quatro obras inseridas no espaço público no século XX ou XXI: duas em Portugal e duas no exterior: metodologias e processos de trabalho de cada um, caraterísticas formais e expressivas das obras, conceitos e motivações de que partem, significações e interpretações que permitem. Estes trabalhos caracterizam-se em linhas gerais na sua conceção enquanto intervenção global específica para o lugar enquanto espaço urbano ou arquitetónico; pela sua ligação ao público; por terem sido pensadas para fruição coletiva; por se vincularem a questões como a repetição, o ritmo, a perceção e as diferentes leituras originadas. No terceiro capítulo articularemos estes aspetos com algumas preocupações centrais do nosso trabalho plástico no domínio do espaço público, que tem vindo a ser realizado desde 2008. Abordaremos as várias fases de conceção e pintura dos murais em azulejo da estação de caminho-de-ferro de Agualva-Cacém da nossa autoria, realizados entre 2010 a 2012: será

9 NERY, Eduardo, Apreciação Estética do Azulejo, («Colecção História da Arte»), Lisboa, Edições Inapa, 2007.

- 11 - feito um sumário do projeto em análise, dos objetivos iniciais da encomenda, sua função, utilização prevista, contexto, caracterização do lugar, desenvolvimento do projeto, caracterização material e formal, com base nos estudos, no projeto e nas imagens do trabalho final, análise expressiva e conceptual. Para a descrição, análise da composição e interpretação de cada uma destas obras de arte pública seguiremos as seguintes fases propostas por João Rocha de Sousa, Isabel Sabino e Hugo Ferrão10: a obra será abordada primeiro pela análise dos componentes visuais, suas relações e resultantes expressivas - matéria, forma, cor, composição e elementos percetivos - e dos dados que dizem respeito ao fazer artístico – organização de ideias e procedimentos, escolhas, etapas, método seguido, opções técnicas, operações e gestos particulares, propostas, alterações, resultado final – e dos componentes legíveis da obra – motivações, intenções, narrações e conceitos. Depois faremos a sua integração a nível conceptual, para reflexão sobre a possibilidade de conotações, interpretações e articulações que o discurso pictórico provoca. No final faremos uma aproximação entre os vários trabalhos de arte pública abordados, aparentemente muito diferentes, com o meu próprio trabalho, estabelecendo a ligação com as questões relacionadas com o âmbito da arte pública: a obra enquanto compromisso, a obra como desafio para o artista ou como provocação ao público, a relação com o sítio específico e com o público, além de outras questões que esta prática artística levanta.

10 Cf. SOUSA, João Rocha de, Composição e Forma Visual, textos de João Rocha de Sousa, Isabel Sabino, Hugo Ferrão, s.l., Universidade Aberta, 2001, passim.

- 12 -

1. SOBRE A ARTE PÚBLICA

1.1. O Espaço Público que a acolhe

A “arte pública” é, de forma geral, toda a obra de arte realizada para o espaço público, para se integrar neste, que emana dele, se refere e se relaciona com o mesmo, que nele intervém ou põe em causa, para fruição do público em geral que habita e ocupa esse espaço: um público vasto e múltiplo nas suas motivações e interesses. Nesta dissertação vamos debruçar-nos sobre o “espaço público” que acomoda estas obras, entrando em relação direta com elas, seja de confrontação, reunião ou provocação. Quer a obra ressalte, frise ou sublinhe o lugar, quer ela se saliente ou evidencie deste. Vamos ver como o espaço público possibilita a transmissão de ideias e mensagens, a comunicação ou a não-comunicação, como se torna o meio de ligação ou conexão dos indivíduos, onde acontece a participação ativa dos cidadãos, o debate crítico, as trocas voluntárias e involuntárias de informação, ideias, opiniões e críticas, incluindo a receção ativa, a fruição ou o contato com as obras de arte pública que este espaço alberga.

1.1.1. Esfera Pública: espaço comum amplo de discussão e inter-relação dos indivíduos

A expressão “público” é utilizada com significados díspares, e isso relaciona-se diretamente com o sentido que damos à arte pública, o que é que faz dela “pública”. De acordo com Jürgen Habermas usamos este conceito em relação a eventos ou locais acessíveis a toda a gente, de frequência pública; mas pode também definir edifícios e locais “públicos” no sentido de serem do Estado em oposição aos lugares privados; é também usado em relação a receção pública, reconhecimento público, figura pública, ligando-se aos media, a imprensa e os meios que permitem a comunicação do público ou com o público, adquirindo em cada uma destas situações significações muito diferentes.11 Também em relação à arte, quando é que ela é pública? É por ser publicamente acessível apenas, ou é mais do que isso? De acordo com o

11 HABERMAS, Jürgen, Strukturwandel der Öffentlichkeit, 1962, (tr. brasileira Flávio R. Kothe, Mudança Estrutural da Esfera Pública, Investigações quanto a uma Categoria da Sociedade Burguesa, col. «Biblioteca Tempo Universitário», nº 76, Série Estudos Alemães, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1984), p. 14-15.

- 13 - autor, é “público” o que é de uso comum e acessível a todos, em contraste com o que é “privado”, particular, separado ou individual. É a esfera comum aos indivíduos, que se constitui na conversação, na vida comunitária, social ou pública.12 Vamos aprofundar mais esta questão da esfera pública para tentar dar resposta às questões aqui formuladas. Segundo Jürgen Habermas a “esfera pública” surge no século XVIII com o desenvolvimento da sociedade burguesa liberal e do Estado moderno13, com a emergência de uma “esfera pública literária” definida por “um público pensante constituído de pessoas privadas”.14 Só aí surge o conceito de “opinião pública”, cujo sujeito é um público informado e polémico, e que tem uma função crítica na sociedade, em relação aos seus aspetos sociais, económicos, políticos, jurídicos e outros15, e serve como legitimadora e contraponto do poder político,16 função esta que se mantém até hoje. Contrapõe-se ao poder público, surgida de uma época em que sociedade e Estado se separaram.17 Com a sociedade mercantil surgiu a troca de informações permanente, originando formas de comunicação como os correios e a imprensa. Estes tornaram a informação “pública”, acessível ao público em geral, a todos os cidadãos. Isso criou na sociedade uma zona de mediação entre o poder público e a “esfera privada” mas separada de ambos, onde se exerce a “função crítica de um público pensante”18, que permite o exercício livre da reflexão, da cultura, da opinião, do ensaio crítico por parte das pessoas privadas. Esta zona de interesse público é a “esfera pública”, e o seu surgimento permite a um público constituído por indivíduos conscientes expressar ideias próprias e fazer “juízos públicos”19, diz o autor, mesmo em relação ao poder público. A esfera pública, permite exercer a crítica contra o poder público, regulamentar a sociedade civil, através do debate público. O poder passa a estar dependente da racionalidade, que emana da “opinião pública”. Por um lado a esfera pública política permite a emancipação dos indivíduos em relação à autoridade política, e na vida social aparecem os interesses privados e a liberdade individual.20 A individualidade e a autonomia do ser humano passam a

12 Ibid., p. 15-18. 13 Ibid., pp. 9, 17. 14 Ibid., pp. 10-11. 15 Ibid., pp. 9, 17. 16 Ibid., p. 14. 17 Ibid., p. 24. 18 Ibid., p. 39. 19 Ibid., p. 40 20 Ibid., pp. 72-74.

- 14 - estar asseguradas, na esfera pública literária os indivíduos exercem a sua subjetividade livremente.21 A “esfera pública” inclui toda a gente: não só o público que se reúne num espaço público, mas todo o público que lê, comunica e se relaciona, um “público que julga” e que forma uma opinião crítica: a “opinião pública”, explica Jürgen Habermas.22 Para outro autor, Charles Taylor23, a esfera pública é o espaço comum onde os indivíduos da sociedade se encontram e se relacionam, para a discussão de assuntos de interesse comum e partilha de opinião, para chegar a uma visão geral ou uma mentalidade comum a seu respeito. É um lugar de intercomunicação, onde os indivíduos se associam através de trocas interpessoais e de diversos meios de comunicação, incluindo os virtuais. Reúne numa grande permuta todas as discussões, num espaço comum amplo e não local, que transcende os espaços locais ou temporais, incluindo diferentes sítios físicos e alturas. Por isso é um espaço “metatópico”24, constituído pela reunião das pessoas numa discussão comum, por comum concordância e focada num objeto, propósito ou intuito comum. É o lugar de uma discussão que implica todos os indivíduos da sociedade, para chegar a uma “mente comum” acerca de matérias importantes: a “opinião pública”, explica Charles Taylor,25 que é uma visão reflexiva que emana do debate crítico e ilustrado de um público pensante. A esfera pública contemporânea tem um papel muito importante na sociedade, na medida em que é independente do poder e está para além dos estados, ou seja, é extrapolítica e internacional, diz Charles Taylor26, e por isso livre. Aspira à impessoalidade e à imparcialidade, pretende que a discussão vá além de "toda a visão privada ou parcial"27, por isso procura o bem comum, implicando toda a gente na discussão. Define-se também pela sua “secularidade radical”, já não se fundamenta no divino, no espiritual ou no transcendente, mas no temporal e no profano. A sociedade passou a estar radicada na ação comum

21 Segundo Karl Marx emancipação política e emancipação “humana” estão interligadas. Cf. MARX, Karl, in HABERMAS, Jürgen, Op. Cit., p. 74. 22 HABERMAS, Jürgen, Op. Cit., pp. 40-41. 23 TAYLOR, Charles, «A Esfera Pública», Imaginários Sociais Modernos, Lisboa, Grafia e Texto, 2010, cap. 6 (tr. port. Artur Morão, Covilhã, LusoSofia Press, Universidade da Beira Interior, 2010), passim. 24 Ibid., p. 7. 25 Ibid., pp. 5-6. 26 Ibid., pp. 11-15. 27 Ibid., p. 12.

- 15 - contemporânea. Os acontecimentos profanos da época e a ação conjunta dos indivíduos no presente são aquilo que constitui a esfera pública.28 A esfera pública evidencia uma sociedade sem unidade ou ordem social, caraterizada pelo conflito, pela divisão, pela tensão de forças e pela diferença. Ela permite no entanto que a controvérsia e o debate irrompam e persistam incessantemente, e mediante a troca de ideias permite aos indivíduos chegar a uma mente comum. É uma discussão fora do poder, racional, que implica toda a gente na tentativa de definir o bem comum, por isso segundo Michael Warner29, a esfera pública traz consigo uma nova unidade, uma sociedade que se baseia num ideal de debate público, momentaneamente isento de conflitos sociais e de consequências divisivas ou destruidoras. De acordo com outra autora, Patricia Philips, o espaço público é a esfera que partilhamos em comum30. É o lugar de encontro e intercomunicação dos indivíduos de uma sociedade. Caracteriza-se pela sua diversidade própria, variedade da interação social e do quotidiano. A arte pública é a arte integrada nesse espaço comum, acessível ao público, relacionada com a multiplicidade das relações humanas no espaço público. É a arte de caráter público no sentido de permitir uma diversidade de fruições e de opiniões, de ser aberta à discussão pública, à inter-relação com um público pensante, à expressão de ideias próprias e de juízos num espaço comum, imparcial e livre. Continuaremos a desenvolver este tema mais à frente.

1.1.2. A Experiência Comunicacional no Espaço Público

O espaço público é, como vimos, fundamentalmente um lugar comum de interação, discussão e troca. A cidade contemporânea enquanto espaço público é, para João Pissarra Esteves, um lugar privilegiado para a sociabilidade e para comunicação no seu sentido alargado: de relação do ser humano com o exterior, com os outros e com a vida. Por isso a experiência urbana é uma “experiência comunicacional”31. Interliga cidade, sociedade e

28 Ibid., pp. 15-16. 29 Apud TAYLOR, Charles, Op. Cit., p. 13. 30 Apud CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly (eds.), Op. Cit., p. 70. 31 ESTEVES, João Pissarra, «Para uma Reinvenção Comunicacional da Cidade, Dialogismos entre a Arte e a Vida», in QUARESMA, José (coord.), Instituições Culturais …, p. 98.

- 16 - cultura, estabelecendo “redes comunicacionais”32 que tornam o espaço público vivo, rico e diversificado. O autor afirma que, apesar da quantidade de discursos que invadem as cidades contemporâneas: publicidade, sinalética, símbolos, imagens, mensagens, e outros, o espaço urbano não tem evoluído para uma abertura à comunicação e ao diálogo público. Pelo contrário existe uma “sobre-saturação discursiva”33, um excesso de mensagens. Muitas deles dirigem-se a um público passivo, construídas e pensadas para irem de encontro às suas expetativas, e não para serem questionadas ou fazerem pensar. Segundo ele, há uma “tendência de contração do espaço de comunicação das nossas cidades.”34. Com os novos meios de comunicação tecnicizada, esta torna-se cada vez mais abstrata e anónima. As sociedades modernas têm evoluído para o isolamento e o afastamento dos indivíduos, o individualismo e o egoísmo.35 Na sociedade contemporânea, tem havido uma regressão dos espaços público e privado. O espaço privado está cada vez mais suscetível de ser invadido física e tecnologicamente. Através dos media e do mundo virtual a vida pública penetra no espaço privado. Os espaços públicos já não são verdadeiramente abertos e livres. Foram substituídos por espaços pseudo-públicos, por ex. os parques de diversões e os centros comerciais, onde prazer e lazer estão confinados, com limitações de segurança e de circulação, que negam a possibilidade de confronto público. A reunião pública e a interação não mediada característica do espaço público estão a ser substituídas pelo consumismo passivo em espaços privados e controlados. O autor considera que as cidades contemporâneas são “refratárias à comunicação, (…) separam e isolam as pessoas em vez de as ligarem e aproximarem.”36 Esta tendência regressiva da estrutura urbana constitui um desafio para os urbanistas, arquitetos e também para os artistas que intervêm no espaço urbano com projetos de arte pública. Segundo Paulo Simões Nunes:

Face ao caos de sinais, à efervescência do quotidiano e à proliferação de imagens que homogeneízam a cultura visual urbana, a cidade exige signos que a identifiquem e formas que a

32 Ibid., p. 97. 33 Ibid., p. 100. 34 Ibid., p. 100. 35 Ibid., p. 98. 36 Ibid., p. 102.

- 17 -

caracterizem. Juntamente com a arquitectura, é inquestionável a contribuição da "arte pública" para a redescoberta dos lugares, a retribuição de sentido aos espaços e a rehumanização do meio ambiente, acrescentando-lhes novos valores e conduzindo a novas percepções.37

Os artistas podem, com o seu trabalho, abrir novos caminhos à comunicação no espaço urbano e ao debate público. Este é um dos desafios da arte pública contemporânea.

1.2. Definições ou in-definição da Arte Pública

Paulo Simões Nunes define “arte pública”, de forma geral, como toda a obra de arte concebida para ser instalada num lugar público, e que estabelece uma relação - ainda que involuntária - com o espaço coletivo e a comunidade, desencadeando valores simbólicos, estéticos e outros.38 Na realidade, nem toda a arte é “arte pública” e ainda que instalada no espaço público nem sempre foi pública. A arte estava no espaço público como símbolo de poder e de imposição, não para ser questionada. O conceito de arte pública intersubjetiva e efémera, ligado às recentes intervenções no espaço público, é um fenómeno contemporâneo, que só surgiu nas últimas décadas. No século XIX a arte aparece no espaço público com um carácter comemorativo e glorificador, ligada ao conceito de "monumento público”. Era a estatuária pública de função representativa e laudatória enquanto referências visuais e simbólicas no espaço urbano. Na segunda metade do século XX, com a renovação do conceito de "obra de arte" enquanto objeto, há um enfoque nos aspetos conceptuais, metodologias e processos artísticos, utilização de novas linguagens, novas matérias e novos meios técnicos. Da mesma forma, expande-se o âmbito de intervenção das artes plásticas.39 A arte enquanto "operação estética" intervém no domínio da arquitetura e da paisagem e surge de forma cada vez mais preponderante no espaço urbano. O espaço público é usado como suporte ou campo de ação, para as novas manifestações e exibições das obras. A arte conquista o espaço exterior real, para além dos espaços institucionais ou habituais para a sua exibição, como as galerias e os museus, que lhe permite confrontar-se com o público em geral, não especializado e

37 NUNES, Paulo Simões, «Arte Pública», in PEREIRA, José Fernandes (dir.), Op. Cit., p. 60. 38 Ibid., p. 58. 39 Cf. Modelo do Campo Expandido de Rosalind Krauss, referido por CARTIERE, Cameron, Op. Cit., pp. 11- 13.

- 18 - involuntário. Com o surgimento do conceito de “arte pública” há uma reaproximação da arte ao homem e à vida. A arte pública proporciona novas formas de interação formal e semântica no espaço público, através das novas intervenções in situ. Nestes projetos, a criação plástica tem como base a especificidade do sítio e das qualidades do espaço concreto onde intervém, com resultados plásticos e estéticos que veiculam uma experiência do lugar, e que criam espaços com significado e reinventam o espaço urbano. Com a indiferenciação arquitetónica e urbanística da cidade contemporânea, que caiu numa “planificação anónima generalizada”40 como a define João Pissarra Esteves, há uma alienação do ser humano perante o seu meio. Nas últimas décadas, urbanistas, arquitetos e artistas unem-se para dignificar, requalificar o espaço urbano e conferir-lhe identidade. As intervenções artísticas no espaço público com criação de referências estéticas, permitem restabelecer a ligação entre a arte, o espaço urbano e o homem. Com o objetivo de interligar o público e o espaço que ele habita, estas propostas têm em conta questões comunicacionais, fatores sociais, condicionalismos urbanos, e muitas vezes ligam-se à arquitetura, ao urbanismo e a exigências funcionais. Desta forma estabelecem uma relação com o espaço multifacetado da cidade, estimulam o interesse e dialogam com uma pluralidade de públicos, interligam arte e vida, experiência estética e experiência urbana. Por isso, a arte pública humaniza os espaços arquitetónicos e urbanos, e reaproxima as pessoas, a cidade e a vida, porque restabelece a comunicação. Citando Paulo Simões Nunes:

Muito simplesmente, assumimos a definição de "arte pública" como um género artístico cujo objetivo é produzir uma solução satisfatória para um determinado contexto urbano, do ponto de vista estético, comunicativo e funcional, contribuindo para uma boa consciência da identidade de um lugar por parte da comunidade.".41

Na realidade não se pode falar de arte pública como um “género artístico”, como este autor a define, já que a arte contemporânea se carateriza pelo hibridismo, numa conjugação de uma multiplicidade de géneros, sendo a arte pública um campo cada vez mais vasto, que compreende projetos e abordagens muito diferentes: obras de arte permanentes, temporárias, por comissão, ao serviço, de cariz ativista, de carácter anti-monumental, lúdico, obras

40 ESTEVES, João Pissarra, in QUARESMA, José (coord.), Instituições Culturais …, p. 106. 41 NUNES, Paulo Simões, in PEREIRA, José Fernandes (dir.), Op. Cit., p. 61.

- 19 - politizadas, performativas, projetos comunitários, earthworks, intervenções site-specific, monumentos, memoriais, inseridas em projetos urbanos, paisagísticos ou arquitetónicos mais vastos, e outros. O objetivo da arte pública não é simplesmente “produzir uma solução satisfatória” para o contexto urbano particular, como afirma o autor, mas na realidade é o de inserir um projeto artístico contemporâneo válido, numa pesquisa estética cuja subordinação ao espaço dado não lhe retire coerência. É preciso vencer os preconceitos gerais que existem em relação à arte pública, associada ao monumento comemorativo e glorificador ou às intervenções de caráter decorativo do século passado. Uma proposta de intervenção artística no espaço público pode ser pensada de forma que possa influir nas práticas vivenciais daquele espaço urbano dinamizando-o, ou que confira àquele lugar uma nova imagem, ou dando-lhe novos significados, ou chamando a atenção para as suas caraterísticas ou problemas particulares, ou colocando novas questões e atribuindo-lhe novos sentidos. Nem sempre contribuindo para a “boa consciência” da identidade de um lugar, porque por vezes a arte pública tem apenas por objetivo levantar mais dúvidas, mais questões, focar-se nas problemáticas relacionadas com o sítio, para alertar ou fazer o público pensar, embora não seja assim em todos os casos. Uma obra de arte pública tanto pode inserir-se no espaço urbano suscitando a sensação de harmonia e de que sempre devia ter estado, como se pertencesse àquele espaço, interligando-se com ele, ou pelo contrário pode entrar em choque com ele, pondo em causa as suas caraterísticas, propriedades, funções ou utilizações, e ambas as abordagens são válidas. A problemática do espaço público e da sua vivência é cada vez mais discutida, e para o artista que intervém no espaço público representa um grande desafio, devido à opinião generalizada de que o espaço público é um território cada vez menos vivido e propício à comunicação e às trocas interpessoais e relacionais. Uma obra inserida no espaço público pode promover a criação de espaços de referência, mais humanizados e habitáveis, pensados para as pessoas, e tem a possibilidade de as confrontar, questionar e provocar, vencer preconceitos, e desafiar, desviando-as do quotidiano indiferente e repetitivo, chamando a sua atenção para novos assuntos e problemas, levando-as para novos espaços ideais e subjetivos, pedindo-lhes uma resposta, uma reação, com diferentes possibilidades de interpretação e de fruição. A eficácia comunicativa que Paulo Simões Nunes diz ser um dos objetivos da arte pública, também não é na nossa opinião uma questão fundamental, porque uma obra de arte

- 20 - pode não ter a pretensão de querer comunicar uma ideia definida e unívoca. Uma intervenção de arte pública pode estar inserida num discurso de conjunto sobre o próprio espaço e não pretender comunicar nada para além disso, ou pode pretender ser apenas um ponto de partida para divagações livres e exteriores a ela a partir do que a sua fruição possa suscitar, ou pode apenas confrontar o público com objetivos paradoxais, anti-comunicativos, que não digam respeito a nada e diferenciados da sua envolvente, de forma a reagir com a indiferença generalizada. José Quaresma defende uma definição provisória de Arte Pública, que permite novas aberturas e progressos:

Por Arte Pública entendemos todas as manifestações artísticas, obtidas a partir dos mais diversos media, que são exibidas num espaço, externo ou interno de confluência de transeuntes, com a clara intenção artística de colocação num lugar especificamente selecionado para esse fim, determinando o espírito do lugar a própria produção da peça em foco. Este domínio de expressão artística pode apresentar-se sob as mais diversas formas, sejam estas caracterizadas por simbolizantes de escala sobre-humana, simbolizantes discretos no seu aparato formal, ou ainda, secretos, nos jogos de linguagem que estabelecem com os espectadores que dos mesmos se acercam, ou com os quais interagem.42

A arte pública incorpora inúmeros movimentos da arte contemporânea, atravessa várias áreas artísticas, utiliza processos híbridos, metodologias de diferentes disciplinas e uma multiplicidade de médiuns, com resultados plásticos muito díspares e desconcertantes. É uma área sempre em expansão, flexível, complexa, multifacetada, que colabora com outras disciplinas, como a arquitetura, o urbanismo, o design, a ciência, a história, a sociologia, a psicologia e outras, e que se compromete com o público, daí a controvérsia que muitas vezes suscita. De acordo com Suzanne Lacy, a definição de arte pública tem de ser tão flexível como o médium em si43 devido à contínua evolução desta prática artística. Doutra forma rapidamente a definição estaria ultrapassada. Conforme referem as autoras Cameron Cartiere e Shelly Willis a definição de arte pública está relacionada com assuntos como intenção, interesse, localização e financiamento:

Arte Pública é a arte fora dos museus e galerias, que esteja de acordo com, pelo menos, uma das condições seguintes: arte em público (acessível ou visível para o público); arte de interesse público

42 QUARESMA, José, Projetos de Arte Pública, Diapositivos da 1ª Sessão do Núcleo de Arte Pública, (por gentil cedência do autor). 43 LACY, Suzanne (ed.), Op. Cit., p. 3.

- 21 -

(preocupada ou afetando a comunidade e os indivíduos); arte em lugar público (para uso da comunidade e dos indivíduos); arte de financiamento público (paga pelo público).44

Consideramos que arte pública é aquela que é concebida para ser integrada no espaço público, fora dos espaços institucionais da arte, como galerias e museus e que desde o início do processo criativo é pensada para o lugar específico da sua instalação, criada para interagir com o público em geral e não com um público específico como sucede nas instituições artísticas. Pode incluir expressões, materiais e linguagens muito diversos e utiliza por vezes processos e meios de outras disciplinas artísticas. Muitas vezes, tem de ter em conta condicionantes como: espaço de apresentação, duração – arte pública efémera ou permanente, opinião pública e receção, financiamento, processo de encomenda, necessidade de colaboração com equipas de trabalho, entre outros. As suas qualidades são: o melhoramento do espaço público, conferindo-lhe qualidades estéticas e significado; a comunicação com um público alargado e diversificado; a provocação, que faz pensar, desperta do quotidiano e liberta da rotina; expressar um aspeto lúdico; a colocação de novas questões; a permissão de várias interpretações; o requerimento ou convite da participação do público; a exigência de uma resposta; a interligação das pessoas e dos lugares; em suma, o relacionamento entre o artista e o público.

1.3. Arte e Compromisso com o Público. O Local e outros fatores

Com a arte pública, o acesso à arte tornou-se público, saiu das instituições e está por todo o lado, no nosso quotidiano e nas nossas vidas diárias. Portanto, existe a necessidade dela interpelar um público diversificado, proveniente de diferentes contextos sociais, níveis culturais e económicos, faixas etárias, raças e etnias. As propostas de arte pública devem incluir essa multiplicidade, sendo a sensibilidade acerca do público fundamental para o seu desenvolvimento. As obras de arte pública, exibidas num espaço de confluência de transeuntes, espectadores ou possíveis participantes, são para usufruto de um público massificado. Portanto, preocupam-se com conceitos como relação, comunicação e intenção. Durante o

44 CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly, Op. Cit., p. 15, (trad. da nossa autoria).

- 22 - processo criativo, é pensada a eficácia comunicativa da obra, de forma a chegar a um público alargado e a articular audiências específicas ou atípicas da sociedade. Os autores deste tipo de arte pública procuram o consenso, a inclusão e a universalidade. Pretendem, segundo Suzanne Lacy, incluir e chegar a todos os públicos.45 Focam-se na diversidade, controvérsia e riqueza social. Envolvem-se e comprometem-se com o público, aceitam a complexidade e contradição. O artista que pretenda forjar esse tipo de ligação com o público, articula as suas motivações e a sua linguagem estética única e identificável, com a sensibilidade pública, expetativas e sistemas sociais. Os seus trabalhos nascem de uma estreita relação com o público. Estão ligados à variabilidade do público, à reversibilidade do mundo, à ambiguidade dos valores e à volatilidade dos lugares. Interrogam e põem em evidência a complexidade e as dualidades sociais. Provocam e colocam questões que pedem uma reação do público. Delfim Sardo afirma que em certos trabalhos se pretende a integração e simultaneidade com o espectador, num cruzamento entre obra, espectador, espaço e tempo.46 Segundo Birgit Pelzer, o destinatário é nestas obras indispensável como experimentador social, coautor ou corresponsável, conforme os casos.47 Na arte pública esse aspeto é fundamental. Muitas propostas para o espaço público contemporâneo, consistem em práticas artísticas hibridistas e experimentais que privilegiam as relações. A maior parte destes trabalhos não tem um público específico, por isso podem abarcar várias camadas diferentes e suscitar uma multiplicidade de interações possíveis. Daniel Buren diz a este respeito que “os trabalhos experimentais - não falarei em trabalhos de arte - não têm nenhum público. Portanto, têm a possibilidade de o criar, embora subsistam ainda muitas interrogações.”48

45 LACY, Suzanne, Op. Cit., p. 32. 46 SARDO, Delfim, «Aqui e Agora, A Propósito do Minimal», in COSTA, Marina Sequeira, Aqui e Agora, Here and Now. Em Torno do Minimal na Coleção Berardo, On Minimal Art in the Berardo Collection, Sintra, Museu de Arte Moderna, Coleção Berardo, 2003-2004, p. 31. 47 PELZER, Birgit, «”Desaparece, Objeto!”, A Revolução Inatingível», in LOOCK, Ulrich (ed.), A Obra de Arte sob Fogo, Inovações Artísticas 1965-1975, s.l., Jornal Público, Fundação de Serralves, 2004, Coleção de Arte Contemporânea Público Serralves, passim. 48 BOTELHO, Margarida, «Entrevista com Daniel Buren à Edição Especial (12-03-1980)», in 75 Artistas em Portugal, Maia, Castoliva Editora, 1989, p. 72.

- 23 -

1.3.1. Obra de arte em conexão com o espaço específico da sua instalação: Arte Pública in Situ

Os artistas são chamados a requalificar o espaço público, revitalizar zonas urbanas, reclamar e humanizar o ambiente urbano, melhorar a vida do público. O papel da arte pública contemporânea na sociedade é decorativo, provocativo, revelador e integrador, afirma Jean- Louis Maubant.49 O sítio onde a obra de arte pública é integrada determina todo o processo criativo, e existe uma interdependência entre as propostas e o local específico da sua apresentação. Por isso, denominamo-las de obras de arte pública site-specific. São concebidas e desenhadas para um lugar particular e têm em conta os seus aspetos físicos, visuais, históricos, ecológicos, sociológicos e/ou outros. Estão intrinsecamente ligadas a um espaço real e a um tempo específico. Ligam assuntos correntes, referências às comunidades e memória locais, eventos e histórias invisíveis, a conceções mais alargadas de identidade e experiência. O processo de trabalho para a conceção de uma peça ou de um projeto a integrar no espaço público é, geralmente, longo e complicado, pois implica satisfazer vários públicos. Existe um conjunto alargado de pessoas que observa todo o processo, em vez de o artista trabalhar no isolamento como acontece noutras práticas artísticas. Tem de haver um esforço de adaptabilidade por parte dos artistas, devido à diversidade e volatilidade dos lugares e do público, que implicam um balanço constante. Daí decorre o ajustamento da obra ao espaço público ao longo de tempo, a sua integração local e social. Diversas hipóteses criativas incluem elementos e formas do local no trabalho, segundo a visão individual do artista, de forma a levantar novas questões. A significação da obra depende da participação do observador, da qualidade do trabalho artístico e do compromisso com o público e com o lugar. A relação dos artistas com as comunidades às quais se dirigem, é um dos grandes desafios da arte pública. A conexão com o lugar é um componente necessário para o artista se sentir próximo das pessoas e vice-versa. Para isso, o artista tem de se tornar participante no processo e viver no lugar, seja física, simbólica ou em empatia. De acordo com a temporalidade, duração, intenção e realização do projeto de arte pública, ligadas ao lugar específico, originam-se diferentes intervenções no espaço público.

49 MAUBANT, Jean-Louis, La Ville, L'Art & La Voiture, Villeurbanne, Art Edition, Art Entreprise, 1995, (tr. ing. Towns, Art and The Car), pp. 22-26.

- 24 -

1.3.2. As vicissitudes dos projetos “negociados” entre autores e instituições

A arte pública contemporânea é uma prática muitas vezes colaborativa, que resulta da reflexão de equipas de artistas, designers, arquitetos e paisagistas. Por vezes envolve as próprias comunidades, na execução, no funcionamento futuro ou na prestação de informação. Um artista público tem de ter em conta certas condicionantes, que exigem um compromisso, na obra a produzir: o orçamento definido pelo encomendador e que tem de ser cumprido se o artista quiser ver a sua peça realizada de facto; os materiais a utilizar, muitas vezes escolhidos em conjunto com o arquitecto ou urbanista; o espaço a ocupar definido habitualmente pelos encomendadores, entidades autárquicas ou reguladoras, ou pela equipa projetista - arquitetos, urbanistas, paisagistas, designers; e o espírito da peça, que por vezes é um compromisso entre as motivações do artista, os sentimentos do público, por exemplo no caso dos memoriais, e a vontade das pessoas ou entidades que fizeram a encomenda. O resultado do trabalho depende e é definido por aspetos como financiamento, localização, interesse e intenção. A arte pública influencia a vida diária de um público muito alargado, e grandes investimentos são feitos neste campo. No entanto, Cameron Cartiere e Shelly Willis consideram que por vezes a arte pública ainda é marginalizada no mundo da Arte, considerada uma prática de compromisso e dependência em vez de ser reconhecida como uma expressão válida na arte contemporânea.50 Criar uma obra para o espaço público implica: pensá-la para um espaço específico e definido muitas vezes a priori; estabelecer uma relação entre a obra e a comunidade específica a que ela se dirige e que vai afetar; utilizar uma linguagem universal que chegue ao público em geral e abarque o maior número de pessoas possível; utilizar e adaptar-se a diferentes materiais, por razões de funcionalidade, destino da peça, segurança pública, orçamento, ou outras; escolher um tema comum de acordo com o público; ter em conta fatores como política ou cultura; chamar a atenção das pessoas; fazê-las refletir; proporcionar um escape do quotidiano pelo lado estético ou lúdico; agradar a um público abrangente e diversificado; responder ao processo de comissão; que consistem todas elas em questões desafiantes para o artista.

50 CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly, Op. Cit., p. 4.

- 25 -

A arte integrada no espaço público serve para embelezar, despertar sensações, sentimentos, reflexões no público, desafiar convenções, contribuir para a mudança, educar, dar significado, representar a memória, ser pedagógica, contribuir para o progresso urbano e social. O compromisso com todos estes fatores exige uma reflexão aprofundada por parte do artista e representa um grande desafio, para conseguir criar um equilíbrio entre funcionalidade, estética, comunicação e provocação.

1.4. Arte Pública como desafio para o artista e provocação para o fruidor: Pluralidade de Fruições e de Significados no Espaço Público

Muitos trabalhos de arte pública contemporânea não têm uma mensagem acabada e definida, mas rica e plurivalente. São inesgotáveis e ambíguos. Tanto comunicam como podem ter um sentido oposto ao da comunicação, provocando antíteses de sentidos. Tanto podem querer transmitir uma ideia específica como servir de mote para divagações plurivalentes e alargadas, abrindo um campo de possibilidades, sem passar mensagem alguma, apenas pela sua presença física naquele sítio específico em confronto com o público, que o impele à participação ativa na atribuição de significados. Seja qual for o caso, é no espaço público específico, e na relação com o público, que o seu sentido se completa, a partir das múltiplas fruições e integrações do trabalho. Os projetos artísticos para o espaço público deste género utilizam o discurso aberto e criativo da arte contemporânea, descrito por Umberto Eco51, por isso veiculam a possibilidade de várias organizações e interpretações. Podem ser finalizados no momento da fruição estética. São obras orgânicas, que se desenvolvem na relação com o outro, numa atitude flexível de adaptabilidade. Estes trabalhos colocam novos problemas, provocam, informam e renovam a nossa relação com o mundo. São um estímulo para a sensibilidade, imaginação e razão. Convidam à participação do público, ao diálogo. Permitem uma transação rica e múltipla. Sujeitam-se a diferentes fruições e integrações possíveis, permitem diferentes respostas e possibilidades de significado. Por isso apelam à responsabilidade e à escolha pessoal, requerem um esforço do

51 ECO, Umberto, Opera Aperta, Itália, 1962 (tr. port. Sebastião Uchoa Leite, Obra Aberta, Forma e Indeterminação nas Poéticas Contemporâneas, 2ª ed., São Paulo, Editora Perspectiva, 1971, Colecção Debates), passim.

- 26 - público, promovem atos de liberdade e momentos de autoconsciência no espetador. Portanto, são obras caraterizadas pela totalidade inclusiva, devido à sua organização comunicativa e abertura. Pierre Macherey afirma a este propósito, “A obra não está fechada sobre um sentido, que ela dissimula dando-lhe a sua forma realizada. A necessidade da obra funda-se na multiplicidade dos seus sentidos (...).”52 As linguagens utilizadas na arte contemporânea, inclusive na arte pública, embora por vezes se misturem e tenham ligações, partem de motivações e intenções diferentes daquelas em que se baseia a sua utilização pelos media, pela comunicação de massas e pela publicidade, entre outros. Estes expressam um género de discurso persuasivo, segundo Umberto Eco53, ligado à ordem e ao estereótipo. Utilizam a redundância, a repetição, o confortável e o óbvio, para consolar, convencer e confirmar. Prescrevem o que o público deve querer, temer, compreender e sentir. Criados para ser apreendidos por audiências entorpecidas, vão de encontro aos desejos mais íntimos, opiniões e convicções do público. Definem a realidade de modo definitivo e confecionado. A arte no espaço público de caráter tradicional, glorificadora e aurática, relacionada com a tipologia do monumento público, passava também uma mensagem deste tipo. Utilizando a expressão de Merleu-Ponty, “É portanto essencial à coisa e ao mundo apresentarem-se como 'abertos'...prometer sempre 'algo mais a ver'”54. Na nossa opinião não só na arte em geral, mas também na arte pública essa capacidade é essencial para estabelecer a inter-relação com o público que se procura. Desta forma os observadores ligam-se e interagem com a obra, e podem sempre voltar a ela para novas fruições.

1.4.1. O Desejo de Relação Interpessoal na Arte Pública

Na arte pública contemporânea de que falamos, todo o trabalho artístico se baseia na relação entre o artista e o público. Há um desejo de ligação dos artistas à sociedade. As peças artísticas são inseridas no espaço aberto, dinâmico e inter-relacional que é o espaço público. Pensadas para a interação com os espectadores ou utentes, baseiam-se numa noção de

52 Apud HADJINICOLAOU, Nicos, Histoire de l'Art et Lutte des Classes, Paris, François Maspero, 1973 (tr. port. António José Massano, História da Arte e Movimentos Sociais, Lisboa, Edições 70, 1989, Coleção Arte & Comunicação), p. 145. 53 ECO, Umberto, Op. Cit., passim. 54 Apud ECO, Umberto, Op. Cit., p. 59.

- 27 - intersubjetividade. Estes trabalhos nascem, segundo José Quaresma55, da tensão entre a intuição interna do artista e a necessidade de comunicação com o outro. Da relação intersubjetiva no espaço público. Segundo Feuerbach, só na partilha, na exposição entre os seres humanos, nos atos comunitários e no discurso, nascem o sentimento, a imaginação e a razão.56 Num projeto destes para o espaço público existe um esforço criativo pela conexão e a ligação ao outro. A empatia, o relacionamento, o diálogo, a conversação aberta, o respeito, o ouvir e incluir, são essenciais nestas obras. Por isso são generosas, o processo criativo tem a ver com um compromisso com a realidade, com os locais, a memória, a comunidade e os indivíduos, em que o artista se entrega ao público. Um projeto de intervenção pautado por estes valores dá origem a uma arte interativa, participatória, afetiva, que promove a colaboração do fruidor e a permuta. Pelo seu caráter subjetivo, plasticidade, situacionalidade e historicidade dos valores que comunica, está relacionada com os lugares e as pessoas neles. Provoca a relação recíproca, fala de quem somos, de qual o nosso lugar, de como a nossa cultura e o nosso ambiente nos afetam, de como o trabalho artístico afeta e comunica com as pessoas expostas a ele. A arte pública, segundo José Quaresma57, é um desenvolvimento criativo das relações no espaço público desde os trabalhos permanentes aos efémeros ou experimentais, que enriquece a vida em comunidade e a esfera pública.

1.4.2. Possibilidade de intervenção na sociedade e no espaço público

A arte pública está ligada à vida diária dos cidadãos. Por isso, o artista que intervém no espaço público pode ter um papel ativo na sociedade: informar, mudar ou criticar. O depoimento da artista pública Helen Mayer Harrisson confirma-o: “We artists are myth makers, and we participate with everybody else in the social construction of reality.”58

55 QUARESMA, José, «Arte Pública e Reconhecimento Mútuo», Efervescência Urbana, Artística e Literária de um Lugar, Lisboa, FBAUL/CIEBA, 2010, p. 243. 56 Apud QUARESMA, José, «Intersubjetividade e Espaço Público, Entre a Folha “Perene” e a Folha “Caduciflora”», O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011, p. 139. 57 QUARESMA, José, «Intersubjetividade e…», p. 144. 58 Apud LACY, Suzanne, Op. Cit., p. 40.

- 28 -

Patricia Phillips59 considera que este género de trabalho tem uma função ou conteúdo social. São obras que exprimem esteticamente preocupações sociais, intenções cívicas, valores públicos e ideais comuns. Focam assuntos como: identidade, diversidade humana, humanismo, imaginário social, relações de força, exclusão social, paz, ecologia, entre outros. Permitem explorar a relação entre os valores duradouros e os eventos correntes, e enfatizam a ideia do comum nas nossas vidas. Os trabalhos que se preocupam com estas questões comprometem-se com o mundo e a sociedade, suas convenções e sistemas. Mas ao fazê-lo têm a possibilidade de manipulá-los, pô-los em causa, trazê-los à consciência, ajudar à libertação. Estas obras pretendem ter uma intervenção benéfica e socialmente responsável, ser transformadoras ou curativas. Incitam a conversação e a consciência social, focam-se na mudança e promovem a ação coletiva. A intencionalidade do artista tem consequências e resultados concretos no espaço público, tem impacto na ação e na consciência do público e do próprio artista. Projetos destes estabelecem um diferente tipo de relação entre o artista e o público, a obra de arte e a sociedade, a perceção estética e a produção da obra de arte. É um trabalho processual, em que o objetivo não é o produto, mas o processo de procura de valores e ideias, enquanto ação ética. Suzanne Lacy afirma:

(…) public art contributes to the ongoing desire to identify who we are, beautifies, contributes to social change, shocks, excites, challenges social conventions, has meaning, educates, inspires, celebrates and remembers, draws us together, envisions new paradigms and crosses disciplines, and is a catalyst for change.60

1.4.3. Melhorias no Espaço Público e Qualidades da Arte Pública

Os projetos de arte pública que se integram no lugar de acolhimento, promovem a experiência estética e melhoram o espaço público. Conjugam a materialidade do espaço real com uma dimensão imaginativa. Iluminam e transformam o quotidiano. O trabalho de produção do espaço, origina espaços vividos, ocupados, numa reinvenção do seu significado. Cria também um tempo vivido, que origina momentos de consciência e transformação na rotina diária.

59 Apud QUARESMA, José, «Intersubjetividade e…», p. 139. 60 LACY, Suzanne, Op. Cit., p. 2.

- 29 -

Segundo Marianne Doezema:

The public monument has a responsability apart from its qualities as a work of art. It is not only the private expression of an individual artist; it is also a work of art created for the public, and therefore can and should be evaluated in terms of its capacity to generate human reactions.61

Na nossa opinião, são as reações do público, a sua inter-relação com a obra de arte, a ligação que esta estabelece com as pessoas que a definem como uma obra de arte pública. Por se tratarem de obras para o público em geral, devem conseguir estabelecer uma relação com ele, consegui chamar a sua atenção, abordá-lo, cativá-lo, provocar uma reação ou fazê-lo parar para contemplar e pensar, porque só desta forma podemos dizer que é verdadeiramente arte “pública”, para todos, para as pessoas. Por isso ela deve significar algo para elas, querer dizer alguma coisa, ser relevante e não indiferente, e para isso tem que estar relacionada com os assuntos que lhes dizem respeito ou com aquilo que as toca. Existe um contínuo desejo de conversação entre: artista, local, passado, público e visão para o futuro. Estas obras comunicam valores coletivos, relacionam-se com as comunidades, revelam histórias e memórias do lugar. Chamam a atenção para as suas características e problemas específicos. Mostra aos observadores o significado mais profundo de um lugar. Numa sociedade fragmentada e heterogénea, a arte pública une diversas experiências e memórias, cria ligações entre as pessoas e os lugares, origina um sentido de pertença social. Todos estes fatores proporcionam o significado da obra no local. Através do seu trabalho, o artista tem a possibilidade de devolver os lugares às pessoas que já não os vêm. A obra pode originar uma troca generosa que permita aos indivíduos interpretar o seu ambiente físico e social. A arte pública permite relacionar passado e presente num sítio específico, motivar o futuro, libertar, afetar e unir as pessoas, através do encontro estético.

61 Apud COHN, Terri, in CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly, Op. Cit., p. 177.

- 30 -

2. ESTUDO DE CASOS PARTICULARES DE ARTE PÚBLICA

2.1. Maria Keil: Intervenção na Estação dos Anjos do Metropolitano de Lisboa (1966)

Fig. 1 – Maria Keil, Revestimento de Azulejos da Estação de Metro dos Anjos, Lisboa, 1966.

2.1.1. Sumário do projeto: revestimento das paredes de um espaço arquitetónico utilitário para o decorar e humanizar

Maria Keil realizou as intervenções plásticas de dezanove estações do Metropolitano de Lisboa (cf. Anexo I – Biografia resumida e algumas considerações sobre a produção artística de Maria Keil). O arquiteto Francisco Keil do Amaral, seu marido, fez as primeiras estações. O orçamento era limitado, para aquisição das máquinas, construção das linhas e estações com átrios e escadas de pequenas dimensões e em materiais modestos. No entanto, as estações de metro são locais com grande impacto no público. Espaços abertos onde passam milhares de pessoas diariamente. Quando foram construídas, surgiu a vontade de humanizar os espaços subterrâneos, de os tornar mais acolhedores. Estas encomendas, afirma Manuela Synek, partiram de uma necessidade de “humanizar o espaço circundante, correlacionando vários fatores, isto é: espaço – função – público.”62 Maria Keil optou por revestir as paredes com azulejos, “algo absolutamente inesperado” confessou.63 Apesar de ser um material de longa tradição em Portugal, era na época mal visto no meio artístico, além disso era barato.

62 SYNEK, Manuela O. B., «Metropolitano de Lisboa, Uma Exposição em Permanência», Arquitectura e Vida, Nº 18, Jul/Ago 2001, p. 117. 63 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, «Maria Keil, Entrevista», Arquitectura e Vida, Nº 97, Ano IX, Out 2008, p. 16. - 31 -

Foi à Fábrica da Viúva Lamego, onde fez o trabalho para todas as suas estações, com extrema economia de meios, mas de forma visualmente eficiente, como podemos ver na figura 1. A Estação de Metropolitano dos Anjos é a única da sua autoria que não sofreu remodelações ou alterações, conservando-se de forma integral. Foi a 15ª estação do metropolitano de Lisboa a ser construída. Concebida com pequenos átrios nas duas extremidades do cais e com uma forma alongada.64 Por dificuldades financeiras foi feita em duas fases. A inauguração da primeira fase foi em 1966.65

2.1.2. Desenvolvimento do projeto: o azulejo como presença sensível de cor e brilho

Sendo espaços de passagem, escolheu motivos não figurativos para não provocar a paragem dos utentes. Criou apenas movimentos de cor, utilizando formas elementares que repete e conjuga, em composições de uma aparente simplicidade. A opção pelo azulejo baseou-se na resistência, brilho, frescura, simplicidade e versatilidade deste material. Teve presentes desde o início as condicionantes da produção industrial na Fábrica Viúva Lamego, concebendo azulejos de padrão para reprodução industrial com métodos simples como o da estampilha.

Figs. 2 e 3 – Maria Keil, Revestimento de Azulejos da Estação de Metro dos Anjos, Lisboa, 1966.

Tomando o quadrado como base da composição, cria com as formas dos azulejos padrão uma infinidade de combinatórias possíveis, que se podem observar na figura 2. Partiu de um módulo simples com listas paralelas a branco sobre fundo azul, branco sobre fundo

64 Solução adotada para todo o primeiro ciclo de estações no centro da cidade. 65 Na segunda fase, em 1976, foi aumentada para as dimensões definitivas, que mantém hoje: a obra consistiu na ampliação do cais e construção do átrio norte, com intervenção plástica do pintor Rogério Ribeiro. - 32 - verde, e azul sobre fundo verde. Estabelece uma elaborada composição em ecrãs, numa articulação de planos fortemente vertical, com marcação das linhas verticais a negro que cria efeitos volumétricos. Com o azulejo industrial pôs em diálogo formas orgânicas estilizadas de cardos agrestes e floridos, que evocam as barras arte nova.66 Como se vê na figura 3, estas inscrevem-se em longos retângulos horizontais, que interrompem os ritmos dos padrões visuais. As reservas com formas sinuosas que se abrem sobre os fundos de diferentes tonalidades, criam ilusoriamente planos avançados e recuados.

2.1.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: envolvimentos visuais e táteis de conceção global para o espaço arquitetónico ao serviço do público

Nesse tempo, Maria Keil recupera e atualiza o conceito do azulejo padrão numa perspetiva contemporânea. A conceção dos revestimentos tem um sentido global, pois os padrões não foram pensados como amostras nem na sua lógica de repetição mais óbvia. Projetou desde logo toda a superfície de intervenção, criando envolvimentos visuais, que fazem vaguear o olhar nas suas infinitas variações. O módulo do azulejo padrão, subdividido e desmultiplicado em escalas diversas, tem a capacidade de criar constantes acontecimentos visuais, sujeitos à estrutura ortogonal do material. Os padrões não têm sentido iconográfico ou representativo, mas uma presença táctil como valor sensível de cor e brilho. Por vezes não os vemos mas sentimo-los, afirmava Maria Keil.67 A sua intervenção resultou de uma perfeita adequação dos materiais, de uma compreensão profunda do azulejo, que alia a funcionalidade prática e a potencialidade estética deste registo. De uma “excelente conceção global e adaptação à arquitetura” 68, segundo José Meco, o seu trabalho plástico ilumina e anima o espaço subterrâneo escuro e austero. Os seus murais integrados e em estreita relação com a arquitetura, dinamizam o espaço urbano, e conferem-lhe um sentido e dimensão diferentes enquanto arte pública. Articulou o domínio das formas, a expressividade da cor e o caráter lúdico, para transformar as paredes da estação em superfícies vibráteis que envolvem os transeuntes. Criou sequências de estruturas geométricas abstratas que se desenvolvem verticalmente, que acompanham o percurso do

66 Motivos pictóricos executados por Maria Keil na Fábrica da Viúva Lamego. Foi o único caso nas suas dezanove estações em que executou ela própria a pintura dos azulejos. 67 KEIL, Maria, in SYNEK, Manuela, Op. Cit., p. 114-115. 68 MECO, José, O Azulejo em Portugal, Lisboa, Publicações Alfa, 1989, p. 250. - 33 - utente e se aproximam de uma linguagem musical em constante renovação. A multiplicidade de planos promove situações ambíguas de espaço, cria encadeamentos labirínticos que tendem para o infinito. Sobre as suas composições disse A. Rodrigues:

Concebido como uma arquitetura cenográfica instauradora de um espaço lugar autónomo, por articulação de segmentos de padrões, dispostos de modo irregular e dinâmico, em função dos ritmos de utilização, ascendente e descendente, dos lances de escadas, com evidente mas fundamental recusa do padrão em tradicional disposição serial (…) [Criava uma] obsessiva construção por sobrearticulação de planos – redes de movimento, como se a parede se desmultiplicasse numa espacialidade imaterial de cortinas entreabertas…69

Apesar de a sua obra não fazer referência explícita à cidade, às coisas, às pessoas ou à vida, sente-se sua proximidade. Estabelece um diálogo intimista com o lugar e com o público, e ajuda a renovar a sua relação quotidiana. Está ligada a aspetos atuantes e objetivos de democratização do usufruto da arte, a um sentido de responsabilidade devido ao contato com o vasto público. Enquanto envolvimento estético total e coletivo, a sua arte é um meio de fazer diferença e de estar ao serviço de todos, de comunicar com as pessoas. Maria Keil dizia: “Fazer coisas para a arquitetura permitia-me estar ao alcance de toda a gente.”70 Afirmava que “um quadro não adianta nada. O que adianta é a parede. Essa é que tem de ser bonita, proporcionada e de acordo com as pessoas. O quadro põe-se, tira-se.”71

2.2. A arte pública de Eduardo Nery: Aeroporto Internacional de Macau – Painel monumental de azulejos na varanda contínua do terminal de embarque (1995)

2.2.1. Sumário do projeto: grande painel de azulejos para um espaço público de grande movimento de transeuntes

Em 1994 Eduardo Nery foi convidado pelo Governo de Macau para realizar uma obra mural no interior do terminal de passageiros do Aeroporto Internacional de Macau (cf. Anexo II – Biografia resumida e algumas considerações sobre a produção artística de Eduardo Nery).

69 Apud PEREIRA, João Castel-Branco, Azulejos no Metropolitano de Lisboa, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1990, p. 14. 70 Apud BOTELHO, Margarida; CABRAL, Pina, Anjos, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1996, pp. 7-8. 71 KEIL, Maria, in ABRANTES, José Carlos; SANTOS, Dora, «À Conversa com… Maria Keil», Noesis, A Educação em Revista, Nº 54, Abr/Jun 2000, p. 19. - 34 -

Figs. 4 e 5 – Eduardo Nery, Painel monumental de azulejos na varanda contínua do terminal de embarque do Aeroporto de Macau, 1995.

O autor deslocou-se ao local para conhecer o território, ver o edifício da aerogare em fase avançada de construção e estabelecer contato com os clientes e as entidades envolvidas. A encomenda foi feita pela CAM – Sociedade do Aeroporto Internacional de Macau, SARL. O projeto consistia na intervenção num espaço público de grande rotatividade como é um aeroporto. Por isso a ênfase foi colocada no médium eleito, que condicionaria o trabalho artístico. Nos primeiros contactos com o encomendador ficou decidido que a obra seria executada em azulejo e que o tema seria “Macau como local de convergência das culturas portuguesa e chinesa”, conta Eduardo Nery.72 O edifício do terminal tem uma forma arquitetónica geométrica simples e simétrica. O trabalho encomendado foi um grande painel de azulejos, para ocupar toda a frente da mezanine da sala de partidas do aeroporto, como podemos ver na figura 4. As suas dimensões são: 210 metros de comprimento e 2,10 metros de altura. Grande parte do painel de azulejos seria em curva suave e o resto plano, interrompido apenas por escadas simétricas. O autor teve que o realizar num curto espaço de tempo, até Dezembro de 1995, quando o aeroporto foi inaugurado.73 A execução de todo o painel esteve a cargo da Fábrica Viúva Lamego, desde a afinação de cores e produção dos azulejos monocolores, à pintura dos motivos figurativos, a partir das rigorosas maquetes do artista.

72 NERY, Eduardo, in PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Painel de Azulejo do Aeroporto Internacional de Macau, Eduardo Nery, s.l., Missão de Macau em Lisboa, 1996, p. 9. 73 Esta obra foi distinguida com o Prémio Bordalo da Imprensa / Artes Plásticas’95, e o artista foi condecorado pelo Governo de Macau com a Medalha de Mérito Cultural, no dia 10 de Junho de 1996. - 35 -

2.2.2. Desenvolvimento do projeto: criação de uma malha geométrica baseada na estrutura quadricular do azulejo, no desenho, cor e luz

Esta intervenção consiste numa composição monumental em friso contínuo, em que o espaço plástico foi planificado. É uma obra que se desenvolve em extensão, não em profundidade, afirma o seu autor.74 Eduardo Nery utiliza neste trabalho duas linguagens opostas: o desenho abstrato-geométrico e a representação figurativa, que se entrecruzam e se equilibram, como se constata na figura 5. A composição estrutura-se com base numa grelha quadricular de azulejo, uma malha geométrica de diagonais e de verticais, onde se inscrevem os diversos motivos figurativos. Esta rede abstrata organiza todo o conjunto, serve de teia ou elemento aglutinador, e vive de forma autónoma. O painel resulta de uma lógica interna do abstracionismo, explica Eduardo Nery,75 unificado pela ação da malha estrutural geométrica. Para os motivos figurativos, Eduardo Nery conta que começou por fazer uma investigação sobre as culturas chinesa e de Macau e aconselhou-se com especialistas orientais.76 Os temas são: as Religiões e os Mitos portugueses e chineses; o Mar que ligou Portugal e Macau por quatro séculos; a Ciência Náutica, a Cosmografia e a Astronomia; a Aviação em Macau; e a cultura portuguesa do século XVI-XVII com alusão à Música e à Dança, com representação de personagens portugueses da época. A definição dos elementos figurativos tem o desenho como base. Aqui o autor demarcou-se da representação estereotipada, ilustrativa, retórica ou didática dos temas. Para isso, partiu de imagens antigas e autênticas que redesenhou e simplificou.

Fig. 6 – Eduardo Nery, Painel monumental de azulejos no Aeroporto de Macau, 1995.

As diagonais da malha geométrica atravessam os motivos integrando-os plasticamente num todo, como podemos verificar na figura 6. Há uma relação dinâmica

74 NERY, Eduardo, in PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Op. Cit., p. 12. 75 Cf. CUNHA, Luís, in PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Op. Cit., p. 7. 76 NERY, Eduardo, in PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Op. Cit, p. 9. - 36 - entre o desenho e a vibração da cor e da luz, num jogo de claros e escuros. Este processo abstratiza os elementos figurativos, onde a cor e a luz contribuem para os irrealizar, umas vezes dissolvendo-os, outras vezes desligando-se deles. A malha abstrata evolui em sucessivas gradações cromáticas, num jogo ótico complexo. Eduardo Nery explica que organizou “o painel como pulsação de claro-escuro e de vibração cromática, através de um ritmo contínuo, por vezes sincopado, que muito deve à minha experiência anterior no domínio da «Op-Art».”77 Utilizando o princípio do módulo de repetição, combinou as seguintes cores: amarelos, laranjas, vermelhos, rosas, brancos, azuis e turquesas, que desdobrou numa escala de 28 tons em dégradé. A divisão ordenadora da superfície, com as rigorosas variações progressivas ou regressivas das cores e das formas, geram modelações e ritmos dinâmicos, numa mobilidade ótica da superfície.

2.2.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: espaço ótico vibrátil, ligado ao movimento dos transeuntes e inserto na arquitetura

Este trabalho de Eduardo Nery tem múltiplos sentidos, é um espaço congregador de múltiplas fruições. A recusa de narratividade e a ambivalência simbólica, permitem que seja interpretado de forma diferente, pelos diversos utentes de várias culturas que passam no local. Reflete a convergência de culturas portuguesa e chinesa, que liga harmoniosamente. A conciliação de conceitos, referências, técnicas e linguagens plásticas opostos, é caraterística da sua obra, geradora de sentidos duplos, num discurso inventivo. Pela sua imensidão, pode ter várias leituras: de perto ressaltam os motivos figurativos, as cores particulares, suas harmonias e modulações claro-escuro; de longe domina o jogo ótico, os ritmos de luz e de cor. Cria um espaço ambíguo, desafia a perceção, conduz o olhar ao engano, em superfícies que se retraem e se expandem, num exercício ótico que conquista a atenção permanente do observador. Eduardo Nery diz que tinha como objetivo a procura de “um espaço elástico e vibrátil, gerado pela ação conjugada da luz e da cor”78. A composição geométrica ritmada, o código regrado de sucessão das formas e a articulação seriada das cores, impõem intencionalmente um ritmo de leitura, e induzem diversos percursos, num jogo

77 Ibid., p. 12. 78 Apud NEVES, Susana, «O Caçador de Imagens», in MACHADO, Rosário Sousa (coord.), Eduardo Nery 1956-1996, catálogo, s.l., Culturgest, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 249. - 37 - lúdico. A linguagem própria de Eduardo Nery exprime a preocupação com as singularidades da perceção visual79 e uma rigorosa metodologia operacional. A sua intervenção plástica é, numa primeira apreensão, de leitura imediata e de grande impacto. É uma arte que vai de encontro aos seus fruidores. Procura provocá-los visualmente, proporcionar o deslumbramento ótico, o encantamento lúdico dos espectadores, o sentido dinâmico, a espetacularidade, o movimento cinético. Considera o tipo de visão acelerada e desatenta do espetador-transeunte. Por isso não existe um centro na composição nem um ponto de vista privilegiado. Permite o movimento dos espectadores, e liga-se a ele alternando espaços de paragem e de movimento. Existe uma vontade de interpelar quem passa, despertar a consciência crítica do público, transformar a sala de partidas num espaço estético virtual que obriga à reflexão. Provocar a consciência de que a perceção do espaço não é linear, mas um complexo processo que ativa a memória, numa livre associação de ideias, são questões recorrentes na sua obra. Este painel revela grande eficácia conceptual e estética, responsabilidade criativa e preocupação técnica. É uma intervenção artística funcionalista. Não pretende ser objeto de contemplação, mas uma presença envolvente a ser sentida nos espaços arquitetónicos. Integra e qualifica esteticamente o espaço em que intervém. Este trabalho veio reforçar os traços do edifício, como a sua simetria, marcada pelos eixos da composição e pelo desenvolvimento lateral dos motivos. É uma intervenção plástica inserta na arquitetura, que respeita o lugar e as particularidades da base arquitetónica, com a qual se articula diretamente, de forma pragmática, coerente e harmoniosa.

2.3. Daniel Buren: Les Couleurs Traversées. Instalado em 2001 nos três andares da Kunsthaus, em Bregenz, na Áustria

2.3.1. Sumário do projeto: transformação do espaço de exibição num novo espaço

O edifício da Kunsthaus é muito fora do comum. Tem uma planta quadrada e foi desenhado para que a luz se difunda igualmente por todo o espaço. Os materiais utilizados são cimento e painéis translúcidos de vidro, nas fachadas, paredes, telhado. No primeiro andar é o hall de entrada, o segundo, terceiro e quarto andar são salas de exposições, com paredes em

79 Eduardo Nery investigou exaustivamente os mecanismos da perceção. - 38 - cimento e com acessos de escada e elevador entre cada piso, encostados às paredes, deixando o resto do espaço aberto. Os tetos falsos que dividem os pisos são feitos em painéis quadrangulares de vidro opaco suspensos, que difundem a luz por todo o interior com um efeito de claraboia, criando espaços de exibição que parecem estar sob a luz do dia, do primeiro ao último piso, apesar de ser um espaço fechado. O projeto de Daniel Buren foi concebido para este espaço preciso, ocupou os três andares de exposição, transformando cada andar idêntico num espaço dissemelhante. O tema e composição derivaram diretamente das propriedades do lugar de integração, aos quais adicionou o elemento da cor e o seu ‘utensílio visual’ das listras, elemento caraterístico da sua obra (cf. Anexo III – Biografia resumida e algumas considerações sobre a produção artística de Daniel Buren).

2.3.2. Desenvolvimento do projeto: trabalho in situ que congrega desenho- pintura-escultura-arquitetura

A arquitetura da Kunsthaus, serviu como ponto de partida para a instalação de Daniel Buren, que foi posicionada em relação à grelha formada pelos planos translúcidos dos tetos. A partir da sua dimensão ele criou um princípio ordenador, segundo uma rede ortogonal regular, que marcou a composição de cada andar.

Fig. 7 – Daniel Buren, Les Couleurs Organisées. Kunsthaus, Bregenz, Áustria, 2001.

No segundo andar, Les Couleurs Organisées, colocou um conjunto de pilares verticais de secção quadrada, do chão ao teto. Os pilares tinham uma disposição oblíqua no espaço, definida pela grelha estrutural dos planos de vidro. Os pilares, iluminados pelo interior, tinham quatro faces translúcidas, cada uma com uma cor diferente: azul, amarelo, vermelho, e uma face com listras brancas e pretas, o seu ‘utensílio visual’.80 Cada cor estava virada na mesma direção em todos os pilares, como podemos observar na figura 7. Um arranjo simples que criava diferentes campos visuais,

80 Cf. Anexo IV, n. sobre o ‘utensílio visual’. - 39 - dependendo do ponto de vista do observador. Em cada uma das quatro vistas na diagonal, viam-se dois lados com cor dos pilares, e as faces ocultas dos pilares iluminavam as paredes visíveis desse ponto. Estas polaridades encorajavam os espetadores a mover-se no espaço, para obterem diferentes perceções do mesmo.

Fig. 8 – Daniel Buren, Les Couleurs Organisées. Kunsthaus, Bregenz, Áustria, 2001

No terceiro andar, Les Couleurs Multipliées, criou a ilusão de espaço infinito, que podemos observar na figura 8. Parte dos planos opacos de vidro do teto - 26 - foram cobertos com filme de cor, usando uma disposição oblíqua em relação à grelha do teto, como no andar anterior. Utilizou cinco cores - ciano, azul, amarelo, verde, verde alface e magenta - que se sucediam sequencialmente, segundo uma das diagonais da sala. Todas as paredes foram cobertas com espelhos que multiplicavam as várias vistas até ao infinito. Esta multiplicação veio acentuar a horizontalidade do espaço e retirar a sensação de confinamento arquitetónico, fez desaparecer a forte presença das paredes de cimento, e revelou as aberturas que dão acesso aos outros pisos, portas para as escadas e elevadores. Multiplicou a pontuação regular e colorida do teto infinitamente, de forma que se podia experimentar o seu progressivo desaparecimento com a distância. O 'utensílio visual' é usado aqui de forma muito subtil, marcado na grelha do teto, como moldura das áreas de cor. Os filmes coloridos tinham dois lados a direito rematados por uma listra branca contínua de 8,7 cm de largura que os separava do limite do plano de vidro. Tinham outros dois lados formados por listras descontínuas, compostas por quadrados brancos e de cor de 8,7 cm de largura e espaçamento. O 'utensílio visual' foi desta forma incorporado nos planos de vidro e nas áreas de cor, transformando-se num desenho virtual, que só pode ser reconstituído por uma observação apropriada.

O quarto andar, Les Couleurs Mélangées, era uma complexa composição de construções que se expandiam e interpenetravam, que podemos ver na figura 9 que se segue.

- 40 -

Fig. 9 – Daniel Buren, Les Couleurs Organisées. Kunsthaus, Bregenz, Áustria, 2001.

Situadas em relação aos painéis do teto, uma ao centro, quatro nos vértices e quatro encostadas ao centro das paredes da sala. A do centro ocupava uma área de 16 painéis do teto, as dos vértices 9 painéis e as das paredes 4 painéis, todas com a mesma altura. As paredes eram construídas numa leve grelha em madeira, que as dividia em planos quadrados com metade do tamanho dos do teto. Os planos das paredes foram preenchidos com painéis de espelho ou de plexiglas brancos, azuis, amarelos, encarnados, opacos e transparentes. As construções tinham um género de 'portas' projetadas para planos paralelos fora delas, que se juntavam e misturavam interior e exterior. Segundo Daniel Buren, a complexidade deste espaço advinha destas construções que se sobrepunham e encaixavam umas nas outras, jogando com a cor transparente, produzindo uma profusão de fusões, misturas e combinações. Algumas paredes de vidro refletiam as cores ao seu redor, misturando-as de novo de forma diferente.81 Para além disso, os painéis de vidro opaco do teto foram rebaixados no sítio onde se encontravam as construções, para servirem como seus tetos. Consequentemente passaram a existir aberturas no teto da sala, que possibilitavam ao visitante ver o sistema de luz que produz o efeito de claraboia, dependente da luz natural que ele reflete e de lâmpadas de néon que modulam a intensidade desta. A área aberta permitia estabelecer uma relação entre perceção e funcionamento. Possibilitava ao espetador compreender toda a estrutura da obra, indicava como é que ela foi construída, qual a regra que determinou a sua conceção, e revelava como todo o edifício funciona. O teto como um todo torna-se portanto, paradoxalmente, um mapa que indica como todo o conjunto foi construído, explica Daniel Buren. Pode-se em seguida vaguear a partir de uma construção explodida para outra, de uma cor para outra, por fora, por dentro, de uma transparência para outra.82 O 'utensílio visual' estava presente apenas nas verticais desenhadas na estrutura em grelha das paredes, em que se alternavam bandas de adesivo com a madeira natural. As listras estavam presentes virtualmente nos planos das paredes. Estas construções combinam: desenho nas listras brancas e de madeira alternadas, pintura pela introdução dos grandes

81 Cf. LELONG, Guy, Daniel Buren, s.l., Flammarion, 2001 (tr. ing. David Radzinowicz , 2002), p. 167. 82 Ibid., p. 167. - 41 - planos de cor que se misturam, escultura pela sua tridimensionalidade e arquitetura, apesar da ausência de função estrutural, pelo efeito de integração em relação à envolvente arquitetónica.

2.3.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: dedução a partir do sítio de intervenção, integração no lugar, relação com o observador, a perceção como base para a compreensão

É um trabalho in situ que dialoga com o sítio de intervenção e produz uma leitura estética e crítica do lugar. Daniel Buren diz que os espaços públicos onde intervém conservam a sua função incorporada no dispositivo, mas vão-se colorir de maneira diferente.83 Ele transformou o espaço que lhe foi dado, construiu um novo lugar, pessoal e efémero. Daniel Buren afirma: “It is by working for a given exhibition site that the work in situ – and it alone – opens up the field for a possible transformation of the very place itself.”84 O seu trabalho in situ é feito no próprio lugar a que se destina, em relação com o sítio de integração, deduzido a partir das suas caraterísticas. A implantação desta obra derivou da arquitetura do espaço de exibição, nomeadamente do teto em vidro, que foi utilizado como uma "grelha de leitura", considera Guy Lelong.85 Criado a partir do sítio de intervenção, integra o papel do observador, e esta relação é percetível visualmente. O ritmo do seu ‘utensílio visual’ está integrado neste trabalho de forma subtil nos pilares do 2º piso, na grelha do teto do 3ª piso, e nas grelhas das paredes do 4º piso. A utilização do ‘utensílio visual’ das listras serve para revelar ou criticar, pela sua localização, as caraterísticas do lugar. Guy Lelong afirma que a disposição das suas listras alternadas e os aparatos espaciais que elas criam são obras virtuais, que esperam por ser realizadas por uma visão ou apreensão apropriada.86 O modo de ler a sua obra requer que o espetador conduz uma investigação visual apropriada para entender o processo que está por trás do trabalho, as ligações com o lugar que o acolhe, e a sua razão de ser, diz Guy Lelong.87 As ambiguidades visuais e diferenças intrigam e encorajam o observador a mover-se ao longo do espaço para obter diferentes perceções do trabalho. A estrutura deduzida a partir da grelha reguladora do teto, detetável a

83 Ibid., p. 8. 84 Ibid., contra-capa. 85 Ibid., p. 167, (trad. da nossa autoria). 86 Ibid., p. 31. 87 Ibid., p. 98. - 42 - olho nu, incita o visitante a procurar a lógica interna desta complexa intervenção, e a completar os diversos planos virtuais que atravessam o espaço. No entanto, esta abordagem cognitiva, não impede fruições mais lúdicas. O trabalho possibilita múltiplos pontos de vista, utilizações e diversas posturas possíveis. Diversas reações, leituras e fruições do trabalho in situ. Uma obra complexa, ambígua, que faz pensar, desperta a atenção, provoca. Daniel Buren questiona constantemente como a arte é concebida e percecionada, afirma Guy Lelong.88 As suas obras têm de ser lidas segundo um princípio de confrontação com o espaço e tornam percetíveis as propriedades visuais que exploram. Por isso, diz Lautréamont, os trabalhos in situ de Daniel Buren “são legíveis por todos, não por alguns.”89 Tornam a arte acessível e aberta ao público. Só são válidos em relação com o lugar que os acolhem, são abertos ao pensamento e requerem a participação ativa do espetador. São em parte virtuais e depende do espetador “criá-los” através dum princípio de investigação, contrario ao habitual tipo de visão passiva ou negligente dos observadores perante a arte em geral. Funcionam como pintura-escultura-arquitetura, não para ser vistos de frente numa posição imóvel, como a pintura, mas para ser percecionados pelo espetador em movimento no espaço. Levam o observador a mover-se em vez de adotar um ponto de vista fixo. Permitem que o espetador apreenda visualmente o trabalho e o perceba a partir da informação direta da sua perceção. Reduz ao mínimo a informação lateral (exterior à obra) necessária à compreensão do seu trabalho. Torna-o por isso mais acessível.90

2.4. Olafur Eliasson: Glass Brick for the Façades of the Harpa Reykjavik Concert Hall and Conference Centre (2005-2011) – East Harbor, Reykjavik, Iceland.

2.4.1. Sumário do projeto: desenho das fachadas de um espaço em contexto social

Eliasson e o seu Studio desenharam as fachadas de “quasi-tijolo” do centro de concertos e de conferências Harpa Reykjavik, em colaboração com o gabinete de arquitetura Henning Larsen Architects (cf. Anexo IV – Biografia resumida e algumas considerações sobre a produção artística de Olafur Eliasson).

88 Ibid., sobrecapa. 89 Ibid., p. 60. 90 Ao contrário de outras obras que pelo contrário exploram e requerem informação exterior a elas de forma que só podem ser interpretadas por especialistas. - 43 -

Fig. 10 – Olafur Eliasson, Glass Brick for the Façades of the Harpa Reykjavik Concert Hall and Conference Centre, East Harbor, Reykjavik, Iceland, 2005-2011.

Fig. 11 – Olafur Eliasson, conceção dos “quasi-tijolos” no Studio, para a fachada do Harpa Reykjavic Concert Hall and Conference Centre.

A fachada do Harpa Reykjavik Concert Hall and Conference Centre foi a primeira estrutura espacial de ‘quasi-tijolo’ de grandes dimensões projetada por Olafur Eliasson. A forma do ‘quasi- tijolo’ foi desenvolvida por Einar Thorsteinn, nas suas pesquisas sobre geometria tridimensional do espaço. Olafur Eliasson sempre se interessou pelo espaço, o pensamento geométrico e a experimentação, e começou a trabalhar em conjunto com Thorsteinn. Desenvolveram o protótipo do ‘quasi- tijolo’ e várias formas relacionadas, sugerindo diversos princípios de empilhamento. Várias investigações, experiências e versões distorcidas foram executadas no Studio Olafur Eliasson, e o artista começou a utilizá-lo em vários projetos artísticos bi e tridimensionais. Novos detalhes foram desenvolvidos para esta forma multifacetada ser aplicada no âmbito desta obra com uma grande fachada e um telhado, ambos vidrados.

- 44 -

2.4.2. Desenvolvimento do projeto: o quasi-tijolo, pesquisa e experimentação geométrica, conceção e produção colaborativa

Para Olafur Eliasson, o processo de produção de uma obra de arte é tão importante quanto o produto final. O lugar onde a obra é produzida está ligado ao lugar onde ela é exibida e relacionam-se. É uma arte experimental, que se inspira na metodologia da ciência que procura compreender o mundo. O seu Studio é semelhante a um laboratório científico. Testa empiricamente a nossa perceção, relação e entendimento do mundo real, e apresenta os resultados como sistemas visuais. Para a sua produção contribuem a linguagem artística em diálogo com outras áreas, tais como a ciência, a indústria, a tecnologia, a arquitetura e o design. São obras de colaboração. O seu trabalho no Studio baseia-se numa pesquisa em torno do espaço, envolvendo-se em experiências espaciais. Trabalha com a complexidade das condições site-specific e baseia-se na relação entre o sujeito e a sociedade para os seus projetos. Expandiu os limites da prática artística e interessa-se pela crítica e pela reavaliação. Executou obras de arte de grande escala, e segue o trabalho desde o primeiro esboço à fase final. As principais fachadas a Sul do edifício, foram projetadas como uma estrutura tridimensional de ‘quasi-tijolos’ de vidro, cada um com as seguintes dimensões: 237 x 126 x 146 cm. O desenho das fachadas a Oeste, Norte e Este baseia-se numa geometria baseada numa secção bidimensional derivada do corte de um ‘quasi-tijolo’ tridimensional, como se pode ver na figura 12 que se segue.

Fig. 12 – Olafur Eliasson, Glass Brick for the Façades of the Harpa Reykjavik Concert Hall and Conference Centre, East Harbor, Reykjavik, Iceland, 2005-2011.

Esta forma geométrica baseia-se numa simetria quíntupla. Está relacionada com os cristais presentes na natureza.91 O que a torna atrativa é o seu potencial de empilhamento, que permite utilizá-la em trabalhos artísticos ou arquitetónicos de múltiplas formas. A sua estrutura simultaneamente irregular e regular, dada a sua

91 Encontra-se por exemplo nas colunas de basalto cristalizado, muito comuns na Islândia. - 45 - secção hexagonal, faz com que qualquer construção feita de ‘quasi-tijolos’ empilhados tenha um aspeto caótico. As fachadas facetadas de vidro têm qualidades dicromáticas e reflexivas, que criam mudanças na sua aparência e cor de acordo com o movimento dos visitantes e com o tempo atmosférico. Com esta proposta integrada na arquitetura, procurou transformar os limites do espaço arquitetónico. Procura provocar o contacto entre o público e a arte num contexto social, para além das fronteiras e restrições dos museus e galerias. O seu trabalho foi pensado em relação às pessoas que utilizam aquele espaço e que o experimentam: a escala, os materiais, a configuração, a imprevisibilidade, tendo em conta as noções de espaço e tempo.

2.4.3. Análise expressiva e conceptual da obra de arte pública: intervenção na arquitetura para uma experiência ativa dos observadores e exploração do espaço e do tempo

Olafur Eliasson explica que por 'quasi' quer dizer tanto isto como aquilo ao mesmo tempo.92 Algo não prescrito, imprevisível, onde as irregularidades surgem. Um objeto “relacional”, “mutável”,93 suscetível de estabelecer interações instáveis e complexas. A forma geral muda de acordo com a forma como empilhamos os 'quasi-tijolos', por isso eles são “quasi-formas”, diz Olafur Eliasson94, estão sempre abertos a outras formas de construir com eles. Desviam-se da conceção predominante do espaço, ancorada no racionalismo, que usa o cubo e outros elementos construtivos euclidianos. Têm portanto uma dimensão crítica. De certa forma incorporam o tempo, porque se relacionam com a natureza imprevisível das nossas expetativas, com a possibilidade de renegociação. Olafur Eliasson interessa-se pelas qualidades cristalinas dos materiais, porque estas têm a capacidade de expandir as superfícies de forma espacial e temática, penetrando na sua envolvente. A estrutura cristalina da superfície desta fachada reflete a imagem do lugar envolvente, o seu facetado quebra-a em novas imagens, que contorce e complexifica até ao máximo. Esta impressão de diversidade ainda se intensifica mais pelo fato dos observadores se poderem mover ao longo da instalação arquitetónica. A sua posição de observação não é

92 ELIASSON, Olafur, Studio Olafur Eliasson, An Encyclopedia, (ed. Anna Engberg-Pedersen; introd. Philip Ursprung; entrevistas Philip Ursprung), Köln, Taschen, 2012, p. 333. 93 Ibid., p. 334. 94 Ibid., p. 334. - 46 - fixa, e a perspetiva em mudança produz inúmeras variações e novas imagens. Isto relaciona-se com o interesse do artista pela perceção mutável do espaço. A perceção, para Olafur Eliasson, não é um ato desapaixonado e neutro, mas o produto de condições históricas e culturais.95 É uma construção do nosso cérebro segundo sistemas complexos, a partir da informação processada pelos sentidos. Portanto o espaço é um produto cultural que se modifica com o tempo e a forma como é usado, não é um lugar vazio, estático. Para ele, a experiência do espaço depende dos corpos e objetos que existem nele, se relacionam entre si e que geram e transformam o seu próprio espaço. O espaço funde questões sociais, mentais, arquitetónicas e históricas. O artista joga com as nossas contruções espaciais, desorganizando-as e reconfigurando-as. Explora os sentidos, desafia o lado intelectual e emocional da nossa perceção, a sua relação com o sentimento e o pensamento. Olafur Eliasson pretende que a sua intervenção na arquitetura enfatize o movimento físico, a presença do corpo. Procura fazer com que o espaço arquitetónico seja uma obra de arte, embora a sua função prática permaneça. A arte não tem esse caráter funcional da arquitetura, por isso pode explorar livremente assuntos ligados à espacialidade, como a experiência do utilizador, a temporalidade, e a sua forma de se relacionar com o mundo. Permite um maior nível de mediação com os participantes, provocam o encontro entre o espetador e o espaço, o conhecimento e a consciência crítica desse encontro. O artista gostaria de transformar o viver ou habitar um espaço quotidiano em arte. As qualidades dos materiais e da construção arquitetónica não são intrínsecas, estão ligadas ao contexto e à experiência que o utilizador tem deles. Interessa-se pela relação dos espaços com os nossos sentidos, por sua vez intimamente ligados aos nossos sentimentos e pensamentos. Por isso, a arte e a arquitetura não devem ser vistos como campos polarizados, devíamos antes explorar os interesses que interligam ambos. O seu trabalho precisa de tempo para ser contemplado, implica prestar atenção. Pode ser descrito como uma “presença”, afirma Philip Ursprung.96 Olafur Eliasson desmaterializa o status do objeto artístico, transforma-o num ‘quasi’ objeto. Não é fixo nem acessível de imediato. É vago para fazer pensar, para deixar espaço à interpretação. Por isso possibilita ver o mundo de forma diferente. Encoraja os visitantes a tomar posse dos seus trabalhos, a contemplá-los segundo a sua perspetiva, a contribuir com algo de seu, num processo constantemente aberto. Pede ao observador mais responsabilidade, que seja co-produtor das suas obras. O seu trabalho é um diálogo que convida à participação ativa e à contribuição

95 Cf. URSPRUNG, Philip, in ELIASSON, Olafur, Op. Cit., p. 12. 96 Ibid., p. 11. - 47 - pessoal na produção de significado. Dirige-se diretamente ao fruidor, pedindo uma resposta. O seu objetivo é que a obra crie algo em nós e nós nela. Que nos relacionemos e comprometamos com a obra. Interessa-se pela forma como as pessoas se relacionam com o seu ambiente e se asseguram da sua presença física concreta neste. Como interagem umas com as outras e como definem a sua identidade subjetiva e individual. Trata questões que dizem respeito e afetam toda a gente, interligando arte e vida e comprometendo-se socialmente. As suas obras têm como objetivo em simultâneo o observador individual e o público alargado. Ao contrário de certos trabalhos herméticos incompreensíveis para o público em geral, estas obras chegam a uma audiência que se estende muito para além do ‘mundo da arte’. Não têm um ponto de vista único privilegiado, são feitas para serem apreciadas por muitas pessoas ao mesmo tempo e incitam os espetadores a mover-se pelo espaço. Permitem ao observador confrontar-se com a sua relação com os objetos e ter consciência da sua presença física no lugar. Estão ligadas à dinâmica e à incerteza da nossa perceção do espaço e experiência do tempo, à constante transformação do mundo enquanto espaço negociável.

- 48 -

3. PROJETO ARTÍSTICO INDIVIDUAL INTEGRADO NO ESPAÇO PÚBLICO: INTERVENÇÃO NA ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DE AGUALVA-CACÉM (2010-2012)

3.1. Sumário do Projeto, Contexto.

Quando a nova Estação Ferroviária de Agualva-Cacém, da Linha de Sintra, foi projetada, apesar da falta de verba para a realização de obras de arte em edifícios públicos, nos últimos anos, surgiu desde logo por parte da equipa projetista e da Rede Ferroviária Nacional – REFER, EPE, a vontade de humanizar o ambiente daquele espaço público de grandes dimensões, que iria ser uma das estações com maior movimento diário de passageiros em todo o país. A realização de uma obra de arte no espaço público está dependente da entidade que a encomenda, neste caso a REFER. As entidades estatais e empresas públicas97 recorrem a intervenções de arte pública nos espaços que administram, porque reconhecem os benefícios da arte na requalificação dos seus espaços. Desta forma ultrapassam os seus deveres de serviço básico para com os cidadãos, permitindo-lhes usufruir e contactar com obras de arte concebidas para aqueles locais específicos, afirma Ana Almeida.98 Depois de já ter realizado as intervenções plásticas para uma série de estações ferroviárias da REFER na Linha do Alentejo, entre as quais: Setúbal, Barreiro Mar, Barreiro A, Lavradio, Baixa da Banheira, Alhos Vedros e Penteado, fui por esta empresa contactada em 2010 para desenvolver um projeto artístico a integrar na estação do Cacém. Foi-me sugerido que apresentasse diversas propostas à REFER, que encomendou o trabalho, para serem conciliadas com o projeto arquitetónico e urbanístico em desenvolvimento para o local, e que não ultrapassassem os fundos disponíveis para a sua realização. Após várias reuniões ficou decidido entre mim e a instituição que a obra seria realizada em azulejo. A verba disponível era limitada, por isso o projeto a conceber deveria ser de fácil execução. Entrei em contacto com a Fábrica Viúva Lamego, e com o grupo ALELUIA Cerâmicas SA, a quem a primeira pertence hoje em dia, e foram combinados todos os detalhes para a produção dos azulejos, para apresentação do orçamento à REFER por parte

97 Mas também empresas privadas, autarquias locais e outras. 98 ALMEIDA, Ana, Eduardo Nery, Os Desafios do Olhar. Arte Pública na EPAL, s.l., EPAL – Empresa Portuguesa das Águas Livres S.A., 2011, p. 49.

- 49 - da fábrica. A conceção do projeto deveria ser realizada ao longo de 2011, para no final desse ano começar a ser executado em simultâneo com a construção da estação, a fim de estarem prontos a tempo de ser colocados no local, antes do final da obra.

3.1.1. Lugar de Integração. Conceitos Centrais.

Comecei por fazer uma pesquisa sobre o lugar onde iria ser implantado o meu trabalho. A estação de comboios encontra-se em Agualva-Cacém, uma cidade portuguesa pertencente ao concelho de Sintra, com cerca de 81 845 habitantes99, da qual fazem parte as seguintes freguesias: Agualva, Cacém, Mira-Sintra e São Marcos, resultantes do desmembramento da antiga freguesia de Agualva-Cacém e da elevação da vila a cidade em 2001. A cidade de Agualva-Cacém é a quarta maior cidade da área metropolitana de Lisboa. Teve um crescimento rápido e desorganizado nas últimas décadas e possui como principal sustento económico a indústria, devido à existência de dois parques industriais de grande dimensão na cidade, nomeadamente na produção e comércio de máquinas industriais, equipamentos e produtos de serralharia, além da indústria pecuária, com produção de carnes e produtos derivados. É a cidade do concelho de Sintra que maior número de serviços disponibiliza. Esta área urbana tem, no entanto, diversos problemas intrínsecos, que se devem à falta de planeamento urbano, ao crescimento desordenado e ao pouco cuidado com o património local, ambiental e histórico. Por esses motivos enfrenta hoje diversos desafios urbanísticos e ambientais, para além de problemas sociais com origem nalgumas camadas problemáticas da população residente. Os equipamentos urbanos e arquitetónicos são, na sua generalidade, de fraca qualidade construtiva e estética. O aspeto geral do local é o de uma zona muito urbanizada e movimentada, mas desorganizada, pouco arranjada e mal planeada, funcional e esteticamente, apesar da quantidade de pessoas que ali vivem, que usufruem e convivem com aqueles espaços urbanos quotidianamente. Depois de várias idas ao local e de uma pesquisa aprofundada, resultaram diversas ideias, com base na realização de registos fotográficos e de séries de desenhos. Dessas ideias iniciais, derivaram os temas e conceitos que viriam a ser desenvolvidos no trabalho. Constatou-se que o Cacém, como é chamada esta zona comumente, é um local onde habita

99 Cf. http://pt.wikipedia.org/wiki/Agualva-Cac%C3%A9m (consultado em 08.10.2012). - 50 - uma população em grande número e muito diversificada, constituída por diferentes grupos etários, etnográficos e sociais, com algumas camadas atípicas e segregação de grupos. Para além disso, confrontei-me com o facto de que a envolvente urbana e paisagística da estação se carateriza por uma grande variedade nos materiais, formas e cores dos edifícios, pela quantidade de infraestruturas rodoviárias e ferroviárias, pela diversidade de equipamentos, mobiliário urbano, veículos de transporte, objetos e dispositivos de sinalética, de publicidade, e de iluminação, entre muitos outros. Tudo isto se conjuga naquele espaço de forma aparentemente improvisada e aleatória, com ausência de regra ou de ordem, numa enorme multiplicidade e variedade visual. As caraterísticas que mais me chamaram a atenção naquele espaço urbano, e que desde logo assinalei nos meus estudos, foram as seguintes: as cores fortes e contrastadas dos prédios, das casas, dos carros, e da publicidade, a urbanidade vs degradação, os graffitis, a diversidade de pessoas, de modos de vestir e de etnias, os ajuntamentos populares e a presença de grupos diversos num convívio de rua acentuado, e também a roupa nas janelas. Fiz diversos registos fotográficos no local dos prédios, viadutos, escadarias, janelas, roupa nos estendais, graffitis, pessoas, largos e ruas. Fiz ainda algumas fotografias e desenhos que se referem a temas como a urbanidade, a degradação, a paisagem urbana, a população urbana, e perspetivas urbanas não convencionais (cf. anexo V - registos fotográficos, pesquisa e experiências iniciais). A partir daqui estabeleci os conceitos em torno dos quais desenvolveria e centraria as minhas propostas de trabalho: - desagregação humana – problemáticas ligadas ao desenvolvimento urbano mal planeado, com segregação de zonas de habitação, em que grandes blocos construtivos criam um ambiente pesado e o afastamento entre os conjuntos habitacionais com grandes espaços vazios desertificados, criam a separação das pessoas, pela utilização fragmentária dos espaços; - desumanização do ambiente – crescimento urbanístico desadequado em relação às pessoas e à escala humana, tanto nos aspeto estéticos quanto funcionais, com criação de poucos espaços de encontro social em contexto urbano e de lugares apropriados para o ser humano estar e habitar, em vez de promover a vivência dos espaços públicos, isolam as pessoas e subtraem-nas do seu ambiente; - emaranhado urbano - construção desenfreada, numa disposição desordenada de vias de circulação, ruas, espaços abertos e edifícios, com sobreposição de massas construtivas e de elementos urbanos de forma confusa, contrastam com um desenvolvimento racional e humano;

- 51 -

- disparidades urbanas e sociais – a falta de planeamento urbano origina contrastes urbanísticos, problemas habitacionais, circunstâncias de vida difíceis e discriminação de camadas ou grupos sociais, pondo em evidência diferenças e conflitos sociais. O projeto foi concebido a partir destes conceitos, propondo o desenvolvimento racional de um espaço adequado ao ser humano e pensado para ele, relacionado e derivado do ambiente urbano onde se insere.

3.2. Delineamento do Projeto. Trabalho em Equipa.

O projeto da nova estação de comboios de Agualva-Cacém incluiu a conceção arquitetónica do novo edifício de passageiros e o arranjo urbanístico em redor da estação, nomeadamente da Praça da Estação, da Passagem dos Bons Amigos sob o viaduto por onde passa a linha ferroviária e a construção de uma interface rodoviária e de um de estacionamento para apoio dos utilizadores e passageiros junto à Praça da Estação (cf. anexo VI - fotografias da estação em construção). Esta estação é um espaço de grandes dimensões, com várias entradas, escadas e elevadores que acedem ao cais de embarque dos comboios. Tem uma passagem aérea ou viaduto por onde passa a linha ferroviária, sobre a Passagem dos Bons Amigos. Uma proposta artística especificamente elaborada para um determinado local no espaço público implica uma parceria entre o artista e os outros intervenientes do projeto de construção: entidade que fez a encomenda, arquiteto, projetistas, urbanistas, paisagistas, construtores, técnicos de produção, colocadores e técnicos de obra, entre outros. A responsabilidade do resultado final é partilhada por todos os intervenientes para a criação de uma nova vivência daquele espaço público, para qualificar os lugares anónimos e despersonalizados e para lhes dar significado. O trabalho em equipa permite assim a cooperação interdisciplinar e pode gerar um potencial criador. No entanto, esta integração da arte com a arquitetura e outras disciplinas é muitas vezes complexa e pode levantar alguns problemas. Quando se colabora ou trabalha em equipa há o risco das intenções dos vários intervenientes serem contraditórias entre si. É preciso que as diferenças não sejam tão desequilibradas, que possam ser conjugadas. De acordo com Fernando de Azevedo sobre a integração da arte na arquitetura:

- 52 -

A ‘integração’ não pode ser mais do que uma coexistência a nível poético, (…). Essa ‘integração’ terá, por norma, de corresponder a um programa formal de intenções, o que vai necessariamente limitar a liberdade do artista plástico. Mas, este limitar da liberdade, não corresponde a um ato censório: corresponde à definição necessária de um programa. Tal como, quando uma orquestra encomenda a um músico um concerto, ela não está a limitar a legítima liberdade de composição do músico. Está sim a propor uma linha de orientação, que ao músico cabe aceitar ou não, mas não faria sentido que ele se considerasse autorizado para, em nome da sua liberdade artística, apresentar como resposta uma peça para piano solo.100

Neste caso não houve limitação da liberdade criativa, mas estabeleceram-se as linhas gerais de orientação em equipa, mais concretamente, definiram-se os locais onde seria feita a intervenção plástica, que consistiria em vários murais de grandes dimensões. Depois de algumas reuniões ficou decidido em que paredes do edifício arquitetónico estes seriam implantados. Na figura 13 que se segue podemos ver a planta da estação com a localização de todos os painéis (cf. anexo VII – planta e alçados da Estação de Agualva-Cacém).

Fig. 13 - Planta da Estação de Agualva-Cacém com a localização dos painéis 1 a 17 de intervenção plástica.

No total iriam ser realizados dezassete painéis de várias dimensões e situados em diversas zonas da estação: - três painéis de 3,30 x 6,60 m na fachada principal da estação, dois deles junto à entrada principal e o terceiro no extremo direito da fachada (painéis 3, 4 e 5); - dois painéis de 1,236 x 4,326 m colocados simetricamente um em frente a outro, no átrio principal de acesso aos cais (painéis 15 e 16); - dois painéis de 1,236 x 4,326 m no átrio de entrada principal (painéis 12 e 13);

100 AZEVEDO, Fernando de, «Alguns Problemas Críticos em Torno da Obra de Eduardo Nery», in MACHADO, Rosário Sousa (coord.), Eduardo Nery 1956-1996, catálogo, s.l., Culturgest, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 38.

- 53 -

- um painel de 1,236 x 4,326 m e outro de 1,236 x 2,781 m no corredor de passagem entre o átrio de entrada X e o átrio principal de acesso ao cais (painéis 14 e 17, respetivamente); - quatro painéis de 3,30 x 3,30 m que ladeiam as duas entradas da Passagem dos Bons Amigos, dois de um lado da passagem (painéis 1 e 2) e dois de outro (painéis 6 e 7); - quatro painéis grandes de 3,30 x 6,60 m nas paredes interiores da Passagem dos Bons Amigos, dispostos frente a frente de forma simétrica, dois em cada parede (painéis 8 e 9 numa parede e os painéis 10 e 11 noutra).

3.2.1. Propostas Iniciais, Estudos de Composição, Pesquisa Cromática.

Comecei a realizar uma série de desenhos para estudar a composição dos painéis, explorando os conceitos definidos inicialmente como orientadores do projeto: desagregação, emaranhado, desumanização e disparidade relacionados com a envolvente urbana, social e ambiental. Em termos expressivos baseei-me na utilização dos seguintes elementos na composição: a racionalidade, a ordem, as variações, os contrastes, a harmonia, o movimento. Racionalidade pela utilização de uma estrutura compositiva em grelha. Ordem pela repetição de módulos e organização de sequências múltiplas. Variações criadas pelo brilho e reflexos da superfície, e pelas gradações de tons e de luz. Contrastes nas oposições cromáticas, de claro-escuro e de linhas retas ortogonais com elementos curvos e diagonais. Movimento no ritmo criado pela sucessão de elementos e de séries, na utilização de contrastes e no dinamismo das formas. Os elementos expressivos entram em interoposição com os conceitos centrais do projeto, ou seja, numa situação de oposição mas de entrelaçamento e ligação em simultâneo. O objetivo era a conceção de um projeto desenvolvido segundo uma orientação racional e humana, em contraste com o contexto urbano de inserção. Utilizando uma gama de cores diversificada, que incluiu amarelo, laranja, rosa, vermelho, verde, azul, cinzento, castanho e preto, realizei diversas experiências com várias cores dispostas segundo uma estrutura ortogonal, baseada em repetições e variações sequenciais ao longo de barras ritmadas verticais e horizontais. Fiz ainda um conjunto de estudos monocromáticos de organização das formas e dos elementos para os vários painéis de diferentes tamanhos e formatos. Investiguei diversas hipóteses compositivas a partir de uma estrutura em grelha, decorrente do elemento base da composição que é o quadrado do azulejo, - 54 - aqui utilizado enquanto módulo que se repete segundo várias regras, de acordo com as quais cria ritmos e dinamismos diversos (cf. anexo VIII – estudos de composição e de cor). Desenvolvi também várias experiências sobre a forma de integrar o tema da urbanidade com a estrutura ortogonal regrada e dinâmica das composições. Fiz vários estudos em que conjuguei uma linguagem geométrica abstrata com outra mais figurativa, embora utilizando nesta última um tipo de desenho simplificado, num vocabulário facilmente identificável e reconhecível, tendendo para a estilização e a geometrização, de forma a conjugar-se com os elementos abstratos e com a estrutura em grelha (cf. anexo VIII).

3.2.2. Opções Técnicas, Definição dos Materiais.

Depois da investigação sobre o lugar de integração do projeto, as suas caraterísticas, e após realizar várias experiências para poder definir a proposta final, dirigi-me então à Fábrica Cerâmica Viúva Lamego na Zona Industrial da Abrunheira, em Sintra, para escolher os materiais, os vidros e tintas a utilizar na produção, já que a componente técnica tem de ser tida em conta para a execução prática do projeto, assim como para a sua utilização e manutenção ao longo do tempo, tendo em conta questões como a durabilidade, resistência e facilidade de produção. Beneficiei do conhecimento e da experiência da Engenheira Química da Fábrica, Ana Paula Jarego, especialista em cerâmicas que dirige a produção industrial e faz a investigação e seleção de chacotas, cerâmicas, vidrados e pigmentos utilizados na produção. Tudo isto de acordo com critérios baseados na durabilidade dos materiais, resistência às condições atmosféricas ou ambientais tais como sol, chuva, intempéries, aquecimentos ou ares condicionados, humidade e outros, facilidade de limpeza e de manutenção, resistência aos produtos de limpeza, dureza da chacota para resistência ao choque, resistência dos vidrados para que estes não tenham tendência a rachar ou a formar craquelê, imutabilidade das cores e brilho ao longo do tempo e com a exposição à luz e à água, resistência à utilização, ao toque e à passagem de milhares de pessoas diariamente, superfície completamente lisa dos vidrados e não porosa para não absorver sujidades, utilização de pigmentos, de vidrados e matérias que cumpram os requisitos de segurança de utilização e os limites ambientais e ecológicos estabelecidos para a concentração de metais pesados como o chumbo, utilizado no vidro, e o selénio, usado para o vermelho em cerâmica, que não podem ultrapassar os máximos estabelecidos por lei para a produção industrial. - 55 -

De toda a produção de azulejos na fábrica existe uma grande diversidade de cores, transparência ou opacidade destas, do brilho ou matizado dos vidrados, do tamanho, espessura e forma dos azulejos. A minha escolha recaiu nos azulejos com tamanho de 10 x 10 cm, menos usual que o 15 x 15 cm que é o mais tradicional, mas que se adequava mais ao meu projeto, permitindo estruturar a composição com base numa grelha mais pequena, e compor inúmeras sequências a partir destes módulos. A espessura de cada azulejo é aproximadamente de 1 cm, numa chacota industrial de cerâmica, o que torna estes pequenos azulejos muito resistentes e adequados a um local de utilização massificada, mas de produção industrial e económica. Nessa altura escolhi também o vidrado, as cores e as tintas a utilizar. O vidrado selecionado tem a caraterística de ser efetuado em duas camadas diferentes: primeiro uma base de vidro opaca e mate branca que cobre a chacota cor de barro, e sobre esta o vidro com a cor pretendida de alto brilho e numa camada mais fina. Isto tem como consequência que o aspeto final seja o de cores vivas e brilhantes, com transparências e variações de tom em cada azulejo, o que lhes confere um aspeto que lembra o de uma mancha aguada de tinta. Essa caraterística é mais notória em certas cores que noutras, especialmente nas cores mais claras e suaves, mais do que nas cores fortes ou escuras, em que o pigmento está mais concentrado no vidro e não provoca tanto esse efeito de transparência, tendo por isso um aspeto mais uniforme. As cores definitivas escolhidas foram as seguintes, divididas em dois grupos: - oito cores frias – azul escuro, azul forte, azul claro, azul esverdeado, verde água, verde alface, verde e verde escuro; - oito cores quentes – encarnado, vermelho alaranjado, laranja escuro, pêssego escuro, pêssego claro, laranja, laranja amarelado, amarelo. Algumas das cores escolhidas já existiam e outras tiveram de ser criadas especialmente para este projeto e as suas fórmulas foram afinadas pela equipa técnica da fábrica. Estas duas séries de cores foram pensadas para serem utilizadas segundo sequências de tons, em variações cromáticas entre tons próximos da mesma escala tonal, ou formando contrastes em oposição de valores de uma escala cromática com a outra: contrastes dos verdes e dos azuis, com os vermelhos, laranjas e amarelos, assim como de todos os tons intermédios nos dois sentidos e das cores escuras com as claras. Estas relações estão patentes na figura 14 que se segue com a amostra realizada pela Fábrica Viúva Lamego do conjunto de cores escolhidas para o projeto.

- 56 -

Fig. 14 - Amostras dos Azulejos, realizadas na Fábrica Viúva Lamego em 2011.

Estas cores tiveram de ser submetidas a experiências sucessivas até se chegar ao resultado pretendido em termos de cor e em termos de brilho. Cada cor foi pensada, estudada e testada de acordo com a sua relação com todas as outras cores, de forma a atingir as escalas tonais e os contrastes de cor e de claro-escuro pretendidos. O resultado final tem muito brilho, caraterística que propositadamente foi escolhida, pela sua capacidade de refletir a luz ambiente, de proporcionar várias leituras, brilhos e reflexos, conforme a posição de quem olha. A face do azulejo não é totalmente plana, o que confere a uma superfície constituída por estes azulejos, uma vibração própria, que não é habitual no azulejo industrial, provocando alterações de acordo com o movimento do observador e com a luz incidente, promovendo vibrações cromáticas e reflexos, aumentando ainda mais a diversidade de visões possíveis conforme o ponto de vista, o aspeto da superfície em vez de ser plano e estático, vibra e reflete, movimenta-se, cria ondulações que ressaltam do plano ou se afundam nele, e que espelham o exterior, a luz e o próprio observador quando este olha com mais atenção. Foi também escolhida a base branca dos azulejos a serem pintados e a perfazerem todas as zonas da composição a branco, de entre uma série de vidrados brancos possíveis. Selecionei um branco pérola de meio brilho101. E foram escolhidas uma série de tintas para realização da pintura sobre azulejo branco dos motivos figurativos. As tintas foram selecionadas de forma a ter o acabamento mais semelhante possível do das cores dos azulejos monocolores, e foram as seguintes: amarelo, laranja, vermelho, verde alface, verde azulado, azul-cobalto e um preto cobalto. Foram realizados vários testes das tintas com as cores escolhidas, segundo várias concentrações e diluições, para ver o seu comportamento com a cozedura. Os tons das tintas a utilizar na pintura são muito próximas das dos azulejos de cor e foi esse o objetivo quando foram escolhidas, para que a pintura se integrasse perfeitamente dentro

101 Por motivos técnicos o branco não poderia ser brilhante como eu pretendia, já que o vidrado base sobre o qual é possível pintar sobre azulejo nunca pode ser brilhante; é habitualmente mate e no máximo há a possibilidade de ser semi-brilhante e foi por este último que se acabou por optar. - 57 - da composição geométrica dos azulejos monocromáticos, em termos de cor e brilho. O preto a ser usado para o desenho dos contornos na pintura é um preto especial muito rico em cobalto, que foi escolhido por motivos técnicos e estéticos. Por ser uma tinta que facilmente se torna opaca depois de cozida, mas sem ficar recozida ou rachada102. Além disso, optou-se por este preto por se aproximar cromaticamente do azul-cobalto escolhido, interligando-se bem com a escala de tons usada, ao contrário dos pretos usualmente utilizados na azulejaria que tendem a aproximar-se mais dos verdes ou dos castanhos, quando a cor abre ou se encontra mais diluída, o que neste caso não se pretendia.

3.3. Projeto Definitivo. Caracterização Formal.

Criou-se um desenho base à escala 1:20 para cada um dos 17 painéis em Auto CAD, que consistia na grelha de azulejos de 10 x 10 cm, contemplando também um espaçamento de 3 mm para cada junta entre azulejos (cf. anexo IX – grelhas de base para desenho dos painéis). Sobre estes desenharam-se os projetos definitivos suficientemente definidos, explícitos e precisos de forma a permitir ver claramente o aspeto final que teriam os painéis, para apresentar à REFER para aprovação e mais tarde à fábrica para a sua execução e ao empreiteiro para a sua montagem. Os desenhos foram entregues em conjunto com uma memória explicativa e com as contagens do número de azulejos a utilizar na sua execução.

Painéis 8, 9, 10 e 11 (32 x 64 azulejos cada um)

Foram os primeiros cujo projeto foi por mim concluído. A sua conceção partiu da premissa de que se encontrariam num túnel de circulação rápida de veículos automóveis e de passageiros nos passeios laterais. Por isso foram pensados de forma que a composição não tivesse um centro de leitura privilegiado, nem um ponto de vista único ideal, já que eles seriam percecionados em andamento, sem um ponto de vista fixo mas sim em movimento segundo um trajeto horizontal paralelamente e ao longo dos painéis.

102 Fenómeno que muitas vezes acontece na azulejaria com certas cores mais fortes. Quando são aplicadas muito concentradas, pouco diluídas ou em várias camadas na pintura, provocam um efeito que se chama recozer e que consiste na formação de bolhas de tinta cozida na superfície vidrada do azulejo. - 58 -

Utilizei toda a gama de cores escolhidas e o branco para servir de vazio ou de espaçamento, em zonas intercaladas para respiração do conjunto de cores. O painel 8 e 9 formam uma sequência em que um é a continuação do outro e vice-versa, e o painel 10 e 11 formam outra. Os painéis foram estruturados segundo sucessões matemáticas e numa estrutura geométrica precisa, estudadas com recurso a vários esquemas rigorosos, em que se utilizam séries de números, letras e espaçamentos para definição da composição (cf. anexo X – esquemas rigorosos de composição). Cada painel organiza-se segundo um ritmo de faixas verticais que se sucedem lateralmente, segundo a sequência representada no esquema que se segue (figura 15):

Fig. 15 – Esquema da organização em sequência das faixas verticais.

Esta sequência repete-se continuamente e corresponde ao número de azulejos da largura de cada faixa ou coluna. Essas faixas são depois organizadas segundo duas regras diferentes, as faixas aqui assinaladas a cinza (A) seguem uma regra e as faixas a branco (B) seguem outra. Nas colunas A as cores estão dispostas em segmentos horizontais duas a duas com espaçamento de uma linha segundo um dégradé de cores frias nos painéis 8 e 9, e de cores quentes nos painéis 10 e 11. Os espaçamentos entre essas cores são preenchidos com as cores da escala de tonalidades oposta ou com branco, de acordo com outra sequência geométrica: três colunas com espaçamentos a branco, uma com espaçamento de cor, duas a branco, três de cor, uma a branco, duas de cor e a regra repete-se, voltando ao início. Nas faixas B utilizou-se um ritmo que as divide horizontalmente e que é representado no esquema que se segue (fig. 16):

Fig. 16 – Esquema da disposição de cores nas faixas verticais B.

As linhas assinaladas a branco correspondem aos espaçamentos e as linhas

assinaladas a cinzento correspondem ao preenchimento com cor. As cores dispõem-se

nos painéis 8 e 9 a partir do amarelo em cima até ao encarnado em baixo, segundo

sequências tonais. Nos painéis 10 e 11, também em sequência desde o verde em baixo

ao azul em cima. Esta organização cria ritmos que dividem as colunas de forma

simétrica mas oposta: o que é cor em baixo é espaçamento em cima e vice-versa. Isso

- 59 - faz com que a cor esteja mais concentrada na zona inferior, como se do peso da gravidade se tratasse, e mais dispersa na parte superior, com mais zonas vazias de respiração. Nas figuras que se seguem (figs. 17-20) podemos ver as propostas definitivas para os painéis 8, 9, 10 e 11:

Figs. 17 e 18 - Projetos dos painéis 8 e 9, respetivamente, concebidos para a Passagem dos Bons Amigos, sob o viaduto da Estação de Agualva-Cacém.

Figs. 19 e 20 - Projetos dos painéis 10 e 11, respetivamente, concebidos para a Passagem dos Bons Amigos, sob o viaduto da Estação de Agualva-Cacém.

Nos painéis 8 e 9, numa das paredes, predominam as cores quentes e nos painéis 10 e 11, na parede em frente, as cores frias. Por se encontrarem nas paredes do interior da Passagem dos Bons Amigos, a sua composição dinâmica segundo eixos horizontais paralelos, entrecortados pelos ritmos verticais, remete para a visão em movimento que os observadores têm deles, enfatizando ainda mais a sensação de velocidade (cf. anexo XI - projeto final).

Painéis 12, 15 e 16 (12 x 42 azulejos cada painel)

O projeto com a sua composição sucedeu-se à dos painéis anteriores (cf. anexo X - esquemas rigorosos de composição), e utilizou-se a mesma regra matemática para organização da sequência das colunas verticais (cf. esquema da fig. 15), que se desenvolve lateralmente. As colunas A (assinaladas a cinza na fig. 15) no painel 12 são dominadas pelas cores frias, e nos painéis 15 e 16 pelas cores quentes, dispostas duas a duas com espaçamentos de uma linha a branco.

- 60 -

Fig. 21 – Esquema da disposição de cores nas faixas verticais B.

As colunas B (assinaladas a branco na fig. 15), seguem o ritmo representado no

esquema ao lado (fig. 21), mais preenchido em baixo, e mais leve na parte de cima. No

painel 12 com cores quentes e nos painéis 15 e 16 com cores frias. As sequências tonais das duas escalas contrastantes de cor desenvolvem-se em gradação ao longo do comprimento do painel, com os amarelos e azuis numa das extremidades e os vermelhos e verdes na outra. O projeto para o painel 12, pensado para a sua localização no átrio de entrada norte da estação, é apresentado na figura 22 que se segue:

Fig. 22 - Projeto para o painel 12, no átrio de entrada e saída norte da Estação de Agualva-Cacém.

Os painéis 15 e 16 foram concebidos para o átrio de entrada principal da estação, de acesso à zona do cais. Estão colocados em duas paredes opostas, um em frente ao outro. Por isso foram pensados como se fossem o espelho um do outro, e a composição dos dois é precisamente simétrica. Nas figuras que se seguem (figs. 23 e 24) estão os desenhos destes dois painéis.

Figs. 23 e 24 - Projetos dos painéis 15 e 16, respetivamente, no átrio principal de acesso ao cais da Estação de Agualva-Cacém.

Estes três painéis encontram-se em átrios amplos da estação, que são lugares de passagem rápida dos utentes, por isso baseiam-se em ritmos verticais e horizontais sincopados, que não implicam a paragem do observador para contemplação, mas antes acompanham o seu movimento. Por estarem em espaços amplos são percecionados a uma distância maior quando os passageiros vêm do exterior e entram na estação, aspeto que foi tido em conta na conceção da estrutura e dos afastamentos e larguras utilizados nas faixas (cf. anexo XI - projeto final).

- 61 -

Painéis 13, 14 e 17 (painéis 13 e 14: 12x42 azulejos; painel 17: 12x27 azulejos)

Estes três painéis encontram-se no corredor de passagem que faz o acesso entre as entradas da parte de trás da estação, as zonas técnicas e o átrio principal. Estão localizados num espaço mais estreito que os painéis anteriores, por isso a perceção que os utentes têm deles não é a de uma vista frontal como acontecia naqueles, mas uma visão lateral. Por isso, o ritmo aqui utilizado para a organização sequencial das faixas verticais ao longo do painel é mais entrecortado, com afastamentos e larguras das faixas mais estreitos, de forma a conferir- lhe um dinamismo de sequências rápidas que acompanham o movimento dos utilizadores, tornando-o mais apropriado a uma observação de perto por quem passa (cf. anexo X - esquemas rigorosos de composição). Foi utilizada a sequência explicitada no esquema da figura que se segue (fig. 25), que se desenvolve em largura e se repete continuamente.

Fig. 25 – Esquema da organização em sequência das faixas verticais.

Nas faixas verticais A, representadas neste esquema (fig. 25) a cinza, as cores quentes organizam-se duas a duas e em cima três, com espaçamentos de uma linha a branco. As colunas B, aqui assinaladas a branco, seguem a mesma regra que foi utilizada nos painéis anteriores (representada no esquema da fig. 21), com o conjunto de cores frias mais concentrado em baixo e mais espaçado em cima. As cores desenvolvem-se lateralmente ao longo dos painéis, segundo sequências de tons e em oposição entre os dois conjuntos de tonalidades quentes e frias. Organizam-se da seguinte maneira: no painel 13 a partir do azul e do amarelo ao centro, sucedem-se todos os tons intermédios até ao verde e ao encarnado nas extremidades. No painel 14 do verde e do encarnado centrais, seguem até ao azul e ao laranja amarelado nas extremidades. No painel 17 evoluem sucessivamente em gradações desde o azul e o amarelo num canto, ao verde e ao vermelho no extremo oposto. Nas figuras que se seguem (figs. 26-28) apresentam-se os desenhos finais destes três painéis (cf. anexo XI - projeto final).

Figs. 26 e 27 - Projetos dos painéis 13 e 14, respetivamente, concebidos para as passagens e zonas de ligação ao átrio principal da Estação de Agualva-Cacém.

- 62 -

Fig. 28 - Projeto do painel 17, de dimensões mais pequenas, também para ser instalado nas passagens e zonas de ligação ao átrio principal da Estação de Agualva-Cacém.

Painéis 1, 2, 3, 4 e 5 (painéis 1 e 2: 32 x 32 azulejos; painéis 3, 4 e 5: 32 x 64 azulejos cada um)

A composição destes painéis baseia-se numa série de sequências geométricas na parte inferior de cada painel, sobre as quais se desenvolvem formas urbanas orgânicas e desordenadas, que serão pintadas à mão. Esses motivos estilizados e simplificados de tendência abstrativa, dão continuidade à composição geométrica e ligam-se a ela. Ao mesmo tempo rompem com a grelha geométrica estruturante, encurvam-na e empurram-na para novas direções diagonais. Provocam movimentos de expansão e retração, desorganizando a ordem inicial imposta pelas regras matemáticas precisas. Para definição dos motivos a pintar foram necessárias diversas experiências até se chegar à configuração que viria a ser utilizada no projeto final (cf. anexo XII – estudos para os motivos figurativos). Para a composição geométrica da área inferior dos painéis também se realizaram desenhos rigorosos da estrutura, de acordo com regras matemáticas que criam diversos ritmos sequenciais (cf. anexo X - esquemas rigorosos de composição). Os painéis 3 e 4, que se encontram na fachada exterior junto da entrada principal da estação, um de cada lado, têm ainda pintado o símbolo da REFER e o nome da estação – Agualva-Cacém – pormenor que me foi solicitado pela empresa para constar nos painéis, de forma a assinalar o local. O painel 5 encontra-se na extremidade mais a Sul dessa mesma fachada. Os painéis 1 e 2 de dimensões mais pequenas e formato quadrangular, têm também o símbolo e o nome da estação, para os assinalar na fachada oposta da estação, já que se encontram do outro lado a ladear a entrada para a Passagem dos Bons Amigos. Foram realizados vários estudos para os caracteres a utilizar nestes painéis103 (cf. anexo XIII – estudos para os caracteres). Os desenhos definitivos dos painéis 1, 2, 3, 4 e 5 são apresentados nas figuras que se seguem (figs. 29-33).

103 O logótipo da REFER respeita as dimensões e proporção definidas pela entidade. - 63 -

Figs. 29 e 30 - Projetos dos painéis 1 e 2 na fachada exterior Este da Estação de Agualva-Cacém.

Figs. 31 e 32 - Projetos dos painéis 3 e 4 da fachada exterior Oeste da Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 33 - Projeto do painel 5 na fachada exterior Oeste da Estação de Agualva-Cacém.

A conceção destes painéis baseou-se no facto de que eles tanto são percecionados a uma grande distância como de muito próximo. São vistos ao longe por se encontrarem nas paredes exteriores de um edifício que se encontra num espaço aberto sem grandes obstáculos visuais, já que pela parte da frente a estação dá para uma rua muito larga, e na parte de trás está junto a uma praça aberta e ampla. São ainda observados de perto quando os utilizadores se aproximam da estação, encontrando-se em lugares chave por onde transita muita gente. Nas composições conjugam-se os elementos figurativos com as estruturas geométricas, segundo sequências numéricas de repetição e sucessão dos módulos de cor, com recurso a gradações de tons e contrastes cromáticos. Quando vistos de longe apreendem-se os ritmos geométricos, o conjunto de formas que se sobrepõem, os contrastes de cores quentes e - 64 - frias, os valores de claro-escuro, os brilhos, os reflexos e as vibrações de luz e cor dos azulejos. De perto observam-se os dégradés e as gradações suaves de cor, a sequência regrada dos módulos individuais na composição, os pormenores dos motivos figurativos, formados por manchas de cor e linhas pretas estilizadas e simplificadas, definindo formas ondulantes, contorcidas e orgânicas, que se interpenetram umas nas outras e nos ritmos geométricos. As curvas e diagonais destes elementos contrastam com a ortogonalidade estruturante da composição geométrica retilínea. A dinâmica e imprevisibilidade contrastam com a ordem e a repetição regrada das sequências matemáticas (cf. anexo XI - projeto final).

Painéis 6 e 7 (32 x 32 azulejos cada)

Depois de várias hipóteses compositivas, chegou-se ao projeto definitivo destes dois painéis, a integrar na fachada oeste da estação junto à entrada para a Passagem dos Bons Amigos, e que se apresenta nas figuras que se seguem (figs. 34, 35).

Figs. 34 e 35 - Projetos dos painéis 6 e 7 da fachada oeste da Estação de Agualva-Cacém.

Utilizando a mesma regra para a sequência de faixas verticais que se utilizou nos painéis 8 a 11, (representada no esquema da fig. 15), e que se desenvolve ao longo da largura dos dois painéis, formando dois tipos de colunas A (a cinza na fig. 15) e B (a branco na fig. 15). As colunas A são preenchidas com um ritmo vertical de cores frias que se desenvolvem de um painel para outro em gradações, desde os azuis fortes na extremidade esquerda do painel 6, passando pelos azuis-claros, verdes azulados, verde alface, até aos verdes intensos no extremo direito do painel 7. Este ritmo é interrompido por espaçamentos a

- 65 - branco ou preenchidos com cores quentes em contraste com as cores frias predominantes de cada coluna. Nas faixas B inseriram-se os motivos figurativos em grandes reservas a branco, rodeadas em cima e em baixo por pontuações de cores quentes sobre espaços brancos, formando sequências rítmicas, desde o amarelo ao laranja forte da esquerda para a direita no painel 6, e a partir do laranja até ao encarnado no painel 7, também da esquerda para a direita (cf. anexo X - esquemas rigorosos de composição). Os elementos figurativos foram pintados nesses retângulos de formato vertical, inseridos nos espaçamentos das faixas da composição (cf. anexo XII – estudos para os motivos figurativos dos painéis 6 e 7). Por isso os motivos estão entrecortados e são interrompidos pelas colunas verticais geométricas, o que confere um aspeto dinâmico aos painéis. Os elementos geométricos estáticos e verticais dos azulejos modulares de cor entram em confronto com os elementos dinâmicos das diagonais e curvas pintadas à mão, e os dois tipos de linguagem entrecruzam-se e relacionam-se diretamente (cf. anexo XI - projeto final).

3.3.1. Alterações, Produção dos Azulejos, Montagem no Local

Depois de prontas as propostas finais, foram apresentadas a todas as partes envolvidas: REFER, equipa projetista, Fábrica Viúva Lamego. Acrescentou-se ainda uma memória descritiva e uma lista completa das quantidades de azulejos pintados ou industriais utilizados em cada painel, ficando estes últimos identificados pelas referências de fábrica104 (cf. anexo XIV – tabela com as contagens e identificação dos azulejos por painel com amostras dos azulejos correspondentes). Essa lista com todas as contagens foi necessária para a realização do orçamento definitivo por parte da fábrica. Depois de aprovado o orçamento e o projeto procedeu-se à sua execução na Fábrica Viúva Lamego. Para a pintura dos motivos figurativos em azulejo assim como das letras e símbolos da REFER, realizei a ampliação à escala real de todos esses elementos, a preto sobre papel vegetal. Na Fábrica Viúva Lamego, utilizando a técnica do spolvero105, os desenhos em papel foram picotados com a ajuda das técnicas de pintura que trabalham na fábrica, com os

104 Cada cor ou cada branco corresponde a uma referência em fábrica. 105 O spolvero é uma técnica utilizada na pintura mural em que a partir do desenho à escala real dos motivos, se faz um picotado que depois se passa para o suporte definitivo utilizando uma boneca de carvão que se passa sobre o desenho para o decalcar. - 66 - instrumentos próprios106 pelo lado das avessas. De seguida, os desenhos picados foram decalcados107 sobre o azulejo, utilizando uma boneca108, para poderem depois ser pintados com todo o rigor e o resultado final corresponder nas dimensões e proporção exatamente ao que estava definido no projeto (cf. anexo XV –imagens da execução do decalque dos desenhos ampliados sobre os azulejos). As tintas das cores escolhidas foram produzidas pelo técnico de vidros para a pintura dos azulejos. Os azulejos brancos ainda por cozer foram montados em taipais verticais e sobre grandes mesas horizontais, para poderem ser pintados por mim, já que devido às enormes dimensões dos painéis tiveram de ser realizados por segmentos. Os técnicos da fábrica ajudaram na montagem dos azulejos nas superfícies para a sua pintura, que nessa altura eram numerados por trás, a partir da esquerda para a direita com números (1, 2, 3, …), de baixo para cima com letras (A, B, C, …), e com a designação do painel a que pertenciam. Este trabalho prévio é o que possibilita depois a montagem do trabalho no local a que se destina, de forma que não haja enganos na ordem das peças. No final da pintura, os painéis eram levantados e levados a cozer nos fornos industriais da fábrica, pelos técnicos de forno (cf. anexo XV – imagens da pintura, cozedura e embalamento dos azulejos). Num trabalho de dimensões tão grandes e com um processo tão longo e complexo, há sempre uma margem de imprevisibilidade que surge a cada momento da sua produção. Assim, o resultado final tem sempre alguns aspetos que não surgiam no projeto inicial, decorrentes de elementos espontâneos que surgem durante a pintura dos azulejos ou de imprevistos durante a execução e montagem das peças no local. Como era de esperar houve vários incidentes e percalços. Houve vários azulejos que se partiram no forno, ao serem transportados ou ao serem colocados nas paredes da estação. Outros ficaram esborratados quando foram levantados e manuseados antes de cozidos. Houve casos em que o vidrado abriu ou rachou. Noutros a tinta ficou recozida, formando camadas grossas com bolhas. Vários azulejos tiveram que ser emendados e levados a cozer segunda vez, e muitos deles ficaram irrecuperáveis e tiveram de ser repetidos novamente. Apesar destes episódios, no fim o trabalho foi concluído com sucesso, respeitando o projeto inicial e o tempo previsto para a sua execução na fábrica, que demorou ao todo cinco meses A partir da lista com as contagens foram produzidos em simultâneo os azulejos monocolores e brancos: cozeu-se a chacota em cerâmica, produziu-se o vidro para cada cor,

106 Uma agulha quando se tratam de curvas e uma roda dentada de picotar para os elementos retilíneos. 107 Ou estergidos de acordo com o termo muitas vezes utilizado em azulejaria. 108 Carvão em pó embrulhado em pano de algodão. - 67 - vidraram-se os azulejos e cozeram-se. Foram embalados em caixas identificadas com as referências das cores e com o painel a que pertencem, para seguirem para a obra. Terminada a pintura e a cozedura dos azulejos pintados, foram embalados por painel e por filas nas caixas (painel 1: fila A, fila B e assim sucessivamente) e seguiram com os outros para a obra. Foi realizado então um caderno explicativo com todas as instruções necessárias à montagem dos painéis no local. Desse caderno constavam as plantas e alçados com a localização dos 17 painéis (cf. anexo VII – plantas e alçados), um texto explicativo (cf. anexo XVI – memória explicativa da montagem dos painéis), a tabela com as contagens e as referências dos azulejos com a identificação da cor correspondente, as amostras dos azulejos monocolores utilizados (cf. anexo XIV – contagens e amostras das cores produzidas pela Fábrica Viúva Lamego), o desenho de cada painel em que se assinalaram todas as referências das cores correspondentes a cada área, assim como a localização das áreas de azulejos com pintura e a numeração destas, para serem usados como maquete na colocação dos painéis (cf. anexo XVII – desenhos explicativos para a montagem de todos os painéis da Estação de Agualva-Cacém). Fez-se uma reunião entre todos os intervenientes na obra, entre os quais estavam representados: a REFER, a FERBRITAS, a fiscalização da obra, o arquiteto projetista, o empreiteiro, os colocadores e eu. Todas as partes ficaram com uma cópia do caderno explicativo e foram discutidos todos os pormenores relativos à instalação dos painéis no local. O trabalho de colocação demorou ao todo dois meses, tendo sido executado de forma muito rápida apesar das suas grandes dimensões. Toda a montagem foi por mim acompanhada e supervisionada, assim como pelos engenheiros da REFER e da fiscalização. Todos os dias me dirigia ao local para esclarecer as dúvidas dos colocadores, para resolver qualquer problema que surgisse109, para confirmar que não havia erros e verificar o que tinha sido montado nesse dia (cf. anexo XVIII – fotografias da colocação dos azulejos). Devido ao fato do local de instalação do trabalho ser um espaço público de grande afluência, e especialmente uma zona com diversos problemas sociais e urbanos, teve de ser tomada a decisão de utilizar um sistema de proteção anti-graffiti110 nos painéis de azulejo. Foram realizados vários testes, já que infelizmente a maioria desses produtos retira o brilho ao

109 Como foi o caso dos azulejos que caíram durante a colocação e se partiram e de outros cujas quantidades foram insuficientes devido a um erro no embalamento, o que me obrigou a voltar à Fábrica Viúva Lamego para repetição dos azulejos em falta. 110 O sistema de proteção anti-graffiti consiste num produto primário sacrificável que depois da secagem se torna impercetível e resistente à absorção dos múltiplos tipos de tintas em várias superfícies, nomeadamente na cerâmica. Quando necessário esse primário é retirado com um produto próprio para a sua remoção, e mais tarde o primeiro é reaplicado novamente. - 68 - azulejo111. Finalmente, com ajuda da engenheira química da Fábrica Viúva Lamego, encontrou-se o produto adequado, que mantinha o acabamento brilhante dos azulejos. Em Setembro de 2012 a intervenção plástica integrada no edifício da estação, estava concluída e instalada no local, como se pode ver nas figuras 36 a 39, que se seguem (cf. anexo

XIX – outras imagens da intervenção depois de concluída).

Fig 36 - Fotografia de registo da intervenção artística na Estação de Agualva-Cacém, em Outubro de 2012.

Fig 37 - Fotografia de registo da intervenção artística na Estação de Agualva-Cacém, em Outubro de 2012.

111 Forma uma camada baça sobre os azulejos que mais tarde pode ser retirada com um detergente específico, e com ela saem todas as tintas que sejam aplicadas por cima. - 69 -

Fig 38 - Fotografia de registo da intervenção artística na Estação de Agualva-Cacém, em Outubro de 2012.

Fig 39 - Fotografia de registo da intervenção artística na Estação de Agualva-Cacém, em Outubro de 2012.

- 70 -

3.4. Resultantes Expressivas da Composição Estrutural. Integração Conceptual.

O trabalho encomendado consistia na intervenção em várias zonas de um espaço público de grandes dimensões. Foi concebido como um projeto de pintura mural integrada, cujo suporte seriam as paredes interiores e exteriores do espaço arquitetónico. A criação do projeto, baseou-se na técnica, material e suporte definidos. O azulejo foi utilizado enquanto matéria pictórica e o seu comportamento, qualidades e efeitos plásticos possíveis, foram tomados em conta desde o início. O processo criativo passou pelo uso da fotografia, de desenhos e experiências e consistiu num complexo estudo e projeto cuidadosamente planificado e concebido, que incluiu decisões a nível técnico e operativo e a escolha dos procedimentos pictóricos, tintas e materiais a utilizar.

Conjugação de linguagens

Todos os elementos de execução industrial, como os azulejos monocolores, as tintas, os vidros e as bases cerâmicas, foram previamente testados antes da sua produção, para que correspondessem exatamente ao definido no projeto. No entanto, na pintura sobre o azulejo de execução direta, existe maior espontaneidade onde está presente o gesto expressivo e inesperado da pintura. Conjugam-se deliberadamente na composição a geometrização e a figuração, a exatidão e o impulso. Na configuração da grelha modular abstrata inserem-se os motivos pintados orgânicos e imprevisíveis, numa linguagem pictórica de livre execução.

Suporte

Os limites e formato dos painéis enquanto suporte pictórico, impuseram-se, condicionando a composição. Nos painéis exteriores foram utilizados dois formatos: o quadrado e o retângulo com a proporção 1:2, que se caraterizam pela sua estabilidade. Deliberadamente tirou-se partido da dicotomia que eles estabelecem entre verticais e horizontais, utilizando o paralelismo e a perpendicularidade como elementos estruturais da composição. Nos painéis do interior da estação utilizou-se um formato em que predomina a horizontalidade, que cria tensões. Tanto nuns como noutros não existe um centro de composição ou um ponto de visão privilegiado. Dadas as suas grandes dimensões, geram a

- 71 - necessidade do espetador se deslocar para apreender o todo. Deste modo, criam variações de leitura, possibilitam uma diversidade de pontos de vista e promovem o dinamismo da observação.

Geometria e harmonia

Depois de definidos o contexto de integração e o suporte, os painéis foram projetados segundo uma conceção de conjunto que se relaciona com as proporções do homem e com a escala humana. A estrutura do espaço pictórico foi definida com recurso à geometria. A partir do desenho geométrico de grande rigor definiu-se um espaço planificado que se desenvolve lateralmente e não em profundidade, segundo uma grelha estrutural, que utiliza a geometria como traçado ordenador. A geometria está presente tanto na estrutura em grelha como no desenho dos motivos pintados, na utilização de perspetivas deformadas. Os padrões geométricos foram organizados pela repetição do módulo quadrado do azulejo segundo séries numéricas de sucessão e intervalos regrados (representadas nos esquemas 1 a 4 anteriormente apresentados), que procuram a ordem e a clareza formal. Trata-se de uma construção racional, que tem subjacentes as ideias de proporção geométrica e de harmonia, na composição dos diversos componentes estruturais. Conjuga direções opostas, forças horizontais e verticais, concilia formas, cores e elementos contrários ou diversos, de acordo com regras de continuidade e hierarquização, numa procura pelo equilíbrio. Estabelece-se uma simetria dinâmica, decorrente da repetição de elementos semelhantes e análogos, da associação de valores positivos e negativos, e da coexistência da regularidade geométrica com a irregularidade dos elementos figurativos.

Cor e luz

Outros elementos fundamentais da composição são a cor, o brilho e o reflexo. Jogou- se com a conjugação de cores quentes e frias, com os contrastes de claro-escuro, com as variações de tonalidades, os dégradés, as vibrações dos reflexos e dos brilhos, as alternâncias entre luz e sombra, produzidos pela superfície do azulejo. Isto provoca uma animação das superfícies e a sua alteração rítmica. Os pontos e áreas de cor organizam-se segundo múltiplas relações entre si numa lógica de repetição e variação, concebida de acordo com proporções matemáticas e harmonias cromáticas, que derivaram da experimentação ao longo do processo criativo, assim como da pesquisa sobre a teoria da cor de Johannes Itten. A partir daí

- 72 - utilizaram-se as seguintes cores: encarnado-laranja- amarelo-verde-azul-azul escuro, ordenadas em sequência segundo o espetro de cores definido pelo autor112, que se fizeram variar de acordo com graus de luminosidade/brilho e intensidade/ escuridão para formar as gradações tonais. Foram utilizadas dezasseis tonalidades com ligeiras diferenças e em progressão harmónica na escala de tons113, que introduzem um ritmo dinâmico no local. A cor usada neste espaço arquitetónico de grandes dimensões tem grande impacto percetivo e provoca imagens múltiplas, pelo seu caráter relativo. Segundo Johannes Itten:

As cores são forças, energias radiantes que nos afetam positivamente ou negativamente, quer estejamos conscientes disso ou não. (…) A descoberta das relações, mediadas pelo olho e o cérebro, entre agentes de cor e efeitos de cor no homem, é uma preocupação essencial do artista. Fenómenos visuais, mentais, e espirituais multiplicam-se e interrelacionam-se no campo da cor e das artes da cor.114

Aqui a cor relaciona-se com a vibração do espaço e com o movimento dos transeuntes. Induz os observadores a mover-se pelo espaço dando origem a diversas sensações visuais que não se podem explicar ou exprimir: “Quando o agente e o efeito não coincidem, temos uma expressão discordante, dinâmica, irreal, e fugitiva. É este poder das realidades materiais e cromáticas de gerar vibrações irreais que proporciona ao artista a oportunidade de expressar o inefável.”115 O efeito da cor no homem interliga entre as sensações que advêm da perceção através dos sentidos, com a razão e a emoção. Por isso ela tem a capacidade de gerar ou suscitar emoções, impressões e memórias.

Ritmo, dinamismo, movimento

A composição carateriza-se pela tensão dinâmica das formas e das cores. Nos elementos figurativos, a utilização de diagonais e curvas, de formas irregulares, assimétricas, descompensadas, que contrariam o equilíbrio das malhas ortogonais geométricas, originam um caráter dinâmico.

112 ITTEN, Johannes, Kunst Der Farbe, Studienausgabe, 1961, Ravensburger Buchverlag Otto Maier GmbH, Ravensburg, Germany, (ed. Faber Birren, The Elements of Color, A Treatise on The Color System of Johannes Itten based on his Book “The Art of Color”, New York, John Wiley & Sons, 1970), p. 15, (trad. da nossa autoria). 113 Além do preto utilizado na pintura dos elementos figurativos e do branco de fundo. 114 Ibid., p. 12. 115 Ibid., p. 18. - 73 -

Na malha textural de configuração geométrica, as séries em sequência, os paralelismos, as mudanças metódicas de escala e de ritmo, as variações e transformações progressivas dos elementos e das cores, os desfasamentos de cada coluna estruturante para a seguinte, sugerem o movimento. As alterações luminosas e cromáticas, a utilização de contrastes entre tons quentes e frios, a modulação das sucessões tonais e de valores, os contrastes simultâneos e sucessivos, provocam efeitos de aproximação e afastamento dos elementos e induzem o movimento. Desta forma dinamizaram-se as superfícies, promovendo a sua vibração e criando o efeito de movimento, que cativam visualmente. Sugere-se o movimento no espaço e no tempo enquanto efeito estético. As sequências de instantes visuais descontínuos e ritmados implicam o movimento do olhar, provocam no transeunte a sensação de velocidade, surgindo na memória a ideia de duração no tempo. A desmultiplicação e encadeamento dos módulos de azulejos de várias cores em bandas e escalas funcionam como ritmos musicais, na sucessão de massas geométricas e na sequência seriada de tonalidades. De certa forma o discurso utilizado aproxima-se da linguagem musical, na construção e organização interna das composições e nas relações que elas estabelecem com o observador. A perceção dos elementos implica um percurso de leitura. O olhar percorre-os ao longo do espaço e do tempo, segundo encadeamentos organizados em várias direções. Cria uma sequência de leituras e de percursos visuais, num jogo preciso de durações, proporções e variações definidas.

3.4.1. O trabalho enquanto arte pública, análise conceptual: compromisso, desafio, provocação, relação com o público, caráter permanente

Cativar o público - Preocupação formais e estéticas

Muitas vezes a arte pública, que procura a integração harmoniosa no espaço, agradar ou cativar os seus públicos e que se baseia em preocupações estéticas e formais, é criticada como jogo gratuito e desprovido de implicações pelos defensores da arte ao serviço das pessoas, da política ou de conteúdo social. Guy Lelong considera que os partidários da arte comprometida, política e socialmente, estão tão preocupados com isso, que são muitas vezes incapazes de considerar outras questões sociológicas que a arte pública permite colocar, tais como: a expansão da arte para lugares e

74 domínios pouco habituais ou inacessíveis, a alteração dos limites das várias práticas artísticas e a questão do papel do artista na sociedade.116 Mas na realidade a arte pública pode fazer ambas em simultâneo: agradar ou cativar os seus públicos e ao mesmo tempo comprometer-se socialmente, no sentido de partir de preocupações sociais e de se comprometer com as pessoas. Como acontece neste trabalho devido à vontade de inclusão de um público alargado, procurando dirigir-se a todos, pela expansão da arte para sítios que não são os seus locais habituais de apresentação, fora das instituições artísticas como as galerias e os museus, para acesso do público em geral e não de uma minoria especializada, através da abordagem de questões que dizem respeito a toda a gente. Para Nelson Goodman, os trabalhos caraterizados pelo formalismo têm uma qualidade: exploram as propriedades específicas dos media que usam cumprindo um dos objetivos da arte. No entanto, o autor considera que o formalismo puro não existe: nenhuma obra pode ser reduzida simplesmente às suas propriedades formais. Qualquer signo visual ou caraterística formal exibidos, estão implicitamente ligados a outros objetos e signos do mundo da arte ou do nosso quotidiano, e têm conotações sensoriais, emotivas e intelectuais. Há uma tensão entre propriedades intrínsecas e referências externas da obra, que atrai o observador no momento da fruição da obra.117 Uma obra pode provocar o nosso olhar, mas no entanto não deixar de se ligar a questões mais vastas. Ainda que um trabalho na arte pública tenha preocupações formais e estéticas, não pode ser considerado unicamente a partir desse ponto de vista. Neste caso foi fundamental a preocupação com o sítio específico de integração, nomeadamente pela relação com o contexto urbanístico e sociológico do lugar, pela preocupação com assuntos ligados às problemáticas que o lugar apresenta, tais como: a desorganização, a falta de planeamento urbano, os problemas sociais e humanos, dos quais partiu o desenvolvimento do projeto. Este trabalho pretende comunicar com várias pessoas ao mesmo tempo sem exigir conhecimentos e informações laterais, não se dirige ao público reduzido do meio artístico, mas a um público amplo e diversificado. Longe de ter apenas uma finalidade decorativa e um caráter lúdico, permite um campo amplo de leituras e é aberto a múltiplas interpretações. É um trabalho plural, aglutinador de sentidos, que pode veicular ideias diversas e ser visto segundo várias intenções.

116 LELONG, Guy, Op. Cit., p. 119. 117 Apud LELONG, Guy, Op. Cit., p. 114. 75

Articulação com o espaço público e integração na arquitetura

O seu discurso relaciona-se com o lugar e com o espaço urbano preestabelecido, e o sítio de intervenção determinou todo o processo evolutivo do projeto. A intervenção plástica de caráter permanente foi concebida para o sítio específico da sua integração, derivando do espaço definido pela arquitetura e do espaço urbano da cidade que a envolve. Transpõe a cidade real para o espaço da estação, associando-os de forma nova. Relaciona-se com os problemas urbanos e sociais, com a consciência do espaço, do público e do tempo específicos, da sua variedade e mutabilidade. Concetualmente existe uma complementaridade com o contexto. O trabalho é influenciado pelo meio em que se encontra e entra sempre em diálogo e confronto físico com ele, ou seja, relacionam-se os dois mutuamente. A atitude tomada para intervir na arquitetura da estação foi a de assumir as caraterísticas do espaço existente e procurar levar mais longe as suas potencialidades, com os meios disponíveis para torná-lo mais cativante e acolhedor. Para tal, procurou-se entender o espaço construído, os planos e volumes, as escalas, os pontos de visualização e os compromissos funcionais do suporte arquitetónico. De forma que o trabalho se integre harmoniosamente com ele e que os vários componentes estejam em sintonia, todos eles contribuindo para o ambiente criado. Por se tratar de um espaço público, não podia também ser esquecida a relação com o público, o movimento constante de pessoas e comboios, o dinamismo visual envolvente. A inclusão de propostas plásticas na arquitetura é delicada e complexa. Muitas vezes arquitetura e arte sobrepõem-se, mas aqui o que se pretendia era que as duas se integrassem, respeitassem e se relacionassem. Daí que tenha sido essencial trabalhar com a equipa projetista desde a fase inicial de conceção do projeto arquitetónico, para que o trabalho não funcionasse como decoração ou intervenção tardia, fora da ideia básica do projeto inicial. Foi necessário um criterioso trabalho do projeto de integração, com participação ativa numa equipa multidisciplinar. O objetivo era criar uma proposta coerente, numa ligação dinâmica e fluente com o espaço, que conseguisse um equilíbrio com a conceção geral.

Objetivos da Intervenção

Com as intervenções plásticas criaram-se pontualmente no espaço arquitetónico, momentos lúdicos, de espetáculo, de jogo, de diálogo, de inter-relação com as pessoas. São espaços de paragem, de confronto do quotidiano e habitual com o imprevisto e o insólito.

76

Pretendeu-se criar no quotidiano momentos lúdicos de deambulação visual e imaginativa, ou de pausa e contemplação estética. Procurou-se promover a qualidade de vida através da arte. Estabelecer a ligação do público com o novo espaço que lhe é destinado, através da perceção sensorial e da imaginação. Relacionar o cidadão - utente - fruidor com o interior e exterior do espaço arquitetónico e urbano que habita. Valorizar aspetos do espaço envolvente, criando uma nova paisagem urbana orgânica e apelativa, e levar o público a encontrar-se com o lugar. Pretendeu-se criar um espaço público vivido e humanizado, um espaço de fruição, que permita aos transeuntes experimentar sensações visuais, que chegue às pessoas, aberta a diferentes interpretações e leituras. Esta proposta relaciona-se com a volatilidade e multiplicidade humana e urbana, procurando “solidificar a malha urbana enquanto território heterogéneo, fragmentado e multicultural, tal como é genericamente caraterizado o espaço contemporâneo.”118 Centrando-se nos temas das diferenças e contrastes sociais, da segregação e separação das pessoas, da desorganização do território e desadequação do meio envolvente ao ser humano, desenvolveu-se um projeto onde se tentou promover a experiência do espaço urbano, enquanto meio de troca e inter-relação rica e diversificada, pensado para os utilizadores- fruidores, de forma a proporcionar o sentimento de pertença e de adequação do lugar às pessoas que o habitam.

118 PINTO, António Manuel, in AAVV, Arte Urbana, Urban Art. Lisboa ’98, Lisboa, Parque EXPO 98, 1998, p. 15. 77

CONCLUSÃO

Desenvolvemos neste ensaio uma investigação em torno da arte pública enquanto campo que integra múltiplos discursos e intencionalidades, abarcando várias práticas artísticas, de caráter hibridista. A partir da prática artística fizemos uma reflexão sobre este tema. Abordámos também o “espaço público” como meio de acolhimento da arte pública e privilegiado para o relacionamento interpessoal. Os trabalhos de arte pública que analisámos com mais detalhe, de Maria Keil, Eduardo Nery, Daniel Buren, Olafur Eliasson e o nosso, apesar das diferenças e especificidades de cada um, têm várias coisas em comum, especialmente nalguns aspetos da forma como se relacionam com o público e com o lugar onde intervêm. Estas propostas artísticas tomam em conta a integração na arquitetura em espaços públicos e as pessoas que os utilizam. Consideram o tipo de visão em movimento dos transeuntes-espetadores na sua conceção. É o caso do trabalho de Eduardo Nery, de Maria Keil e do nosso, que procuram envolver os espetadores enquanto presença sensível no espaço, para serem sentidos por quem passa. Dinamizam as superfícies, permitindo uma perceção mutável de acordo com o movimento dos transeuntes, o qual enfatizam pelas mudanças visuais de acordo com o ponto de vista, o que acontece também nos trabalhos de Olafur Eliasson e de Daniel Buren. No nosso trabalho, tal como nas obras de Eduardo Nery e de Maria Keil, as variações visuais acompanham o percurso dos utentes. Articulam-se ritmos de leitura diversos, pela desmultiplicação de formas e cores. Provoca-se um jogo lúdico e interpela-se visualmente os observadores. Existe também nestes projetos, nomeadamente o de Olafur Eliasson, o de Eduardo Nery e o nosso, uma preocupação com questões ligadas à perceção, nomeadamente na utilização da cor, sua relação com as outras cores e com a sua envolvência. Como afirma Daniel Buren119 a experiência da cor é uma sensação subjetiva, ligada ao sentimento estético, que interage com o lado intelectual e emocional dos observadores. A pesquisa e experimentação geométrica é central nos trabalhos de Eduardo Nery, Olafur Eliasson e no nosso, possibilita criar novos modos de apreensão do espaço, em peças que são para ser vistas a partir de diversos pontos de observação. Pela sua integração em

119 Apud LELONG, Guy, Daniel Buren, s.l., Flammarion, 2001 (tr. ing. David Radzinowicz , 2002), p. 148. - 78 - relação à envolvente e pela apreensão que pedem ao longo do espaço, estas obras combinam várias práticas artísticas: pintura, desenho, arquitetura e outras, de acordo com cada caso. São projetos concebidos para o sítio específico do seu acolhimento, que partem das suas propriedades e entram em diálogo com ele, produzindo uma leitura estética e crítica do lugar, que o transformam ou o revelam. São propostas muito bem estudadas e definidas desde o início, com várias fases de desenvolvimento do trabalho e que nalguns casos, como no trabalho de Olafur Eliasson e no nosso, utilizam um tipo de metodologia que se aproxima da utilizada na investigação, sendo fundamentais as etapas de pesquisa e a experimentação. O processo de produção destas peças é essencial para a compreensão do resultado final. A arte pública é uma forma de possibilitar o contacto do público em geral com a arte num contexto quotidiano, fora das instituições artísticas. Inclui todos e é pensada para as pessoas que habitam os espaços. Provoca o encontro entre as pessoas e os seus lugares, fomentando a consciência da sua experiência dos lugares. A atenção dos fruidores é pedida e estes são encorajados a dialogar e a interagir com estas obras, que se relacionam e comprometem com o lugar e com as pessoas. Interligam assim arte e vida, dizem respeito a toda a gente e são compreensíveis para um público alargado, muito para além do mundo da arte. Podem ser compreendidas a partir dos dados da observação, devido às ligações visíveis que estabelecem com os lugares que as acolhem. Possibilitam múltiplas integrações, não se encerram em si mesmas, gerando antes um processo de receção aberto. Baseiam-se no desejo de inter-relação dos artistas com os seus públicos e na vontade de restabelecer a ligação entre as pessoas e os lugares, proporcionando diferentes fruições, sentimentos e conotações dos lugares. Em resumo estes trabalhos artísticos contemplam os seguintes pressupostos: a relação com o espaço específico de implantação; a ligação ao tempo específico atual; o compromisso com o público; a preocupação com a eficácia da comunicação e da intencionalidade; a expressão estética de valores comuns; a interpelação de públicos diversos; a abertura e diversidade de interpretações possíveis; o desejo de partilha e de empatia com o outro. Os projetos desta forma inseridos no espaço público ligam-se à ideia de multiplicidade e diversidade, possibilitam o confronto entre as pessoas, a arte e os espaços. Transformam os lugares e a sua vivência pelas pessoas. Requalificam e revitalizam o espaço público, humanizando o ambiente urbano. Criados para se integrar local e socialmente, para dar significado aos lugares e reinventar o espaço urbano, restabelecendo a sua relação com as pessoas. Exprimem uma vontade de inclusão e universalidade, articulando a linguagem - 79 - estética do artista com a sensibilidade e expetativas do público. Baseiam-se na relação do artista com o público, no desejo de partilha inter-relacional no espaço público. Por isso estabelecem uma conversação aberta. Existem muitos tipos de trabalho artístico com outras formas de abordar e intervir plasticamente no espaço público, com motivações e preocupações diferentes das que foram referidas, integrados noutro género de lugares, com públicos e utilizações diversos destes, estabelecendo um outro tipo de relação com o público e o sítio, que seria interessante explorar, até mesmo sondando os utentes dos espaços urbanos para ter em conta a sua reação aos trabalhos e a sua integração a longo prazo a nível local e social. Isso não foi possível no âmbito desta investigação, que se dedicou especialmente a um género de arte pública, como foi dito anteriormente, assim como às questões e vicissitudes relacionadas com a sua prática artística. No entanto essas investigações poderiam abrir novos caminhos de reflexão teórica sobre a arte pública.

- 80 -

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AAVV, Arte Urbana, Urban Art. Lisboa ’98, Lisboa, Parque EXPO 98, 1998.

ABRANTES, José Carlos; SANTOS, Dora, «À Conversa com… Maria Keil», Noesis, A Educação em Revista, Nº 54, Abr/Jun 2000, pp. 15-22.

ABREU, José Guilherme, Espaço Público e Escultura Pública. Para um Estudo Transdisciplinar, Porto, 2003.

ABREU, José Guilherme, Um Modelo Fenomenológico para a Escultura Pública, Porto, Revista da Faculdade de Letras - Ciências e Técnicas do Património, I Série, Vol. 2, 2003, pp. 385-418.

ALMEIDA, Ana Cláudia Vespeira de, Da Cidade ao Museu e do Museu à Cidade. Uma Proposta de Itinerário pela Azulejaria de Autor na Lisboa da Segunda Metade do Século XX, Tese de Mestrado em Museologia e Museografia, Lisboa, Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, 2010.

ALMEIDA, Ana, Eduardo Nery, Os Desafios do Olhar. Arte Pública na EPAL, s.l., EPAL – Empresa Portuguesa das Águas Livres S.A., 2011.

ALVES, Teresa; BRASIL, Daniel; SEIXAS, Luís (coords.), Lisboa Capital do Nada, Marvila, 2001. Criar, Debater, Intervir no Espaço Público, Lisboa, Extra Muros - Associação Cultural para a Cidade, 2001.

ANDRADE, Pedro de; MARQUES, Carlos Almeida de; BARROS, José da Cunha (coords), Arte Pública e Cidadania. Novas Leituras da Cidade Criativa, «Colecção Pensar Arquitectura», Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2010.

ANTUNES, Marco António, O Público e o Privado em Hannah Arendt, s.l., Universidade da Beira Interior, s.d.

ARNHEIM, Rudolf, Art an Visual Perception, The New Version, The Regents of the University of California, 1954, 1974, (trad. Ivonne Terezinha de Faria, Arte e Percepção Visual, Uma Psicologia da Visão Criadora, 8ª edição, São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1994).

ARNHEIM, Rudolf, Para uma Psicologia da Arte, Ensaios & Arte e Entropia, Ensaio sobre a Desordem e a Ordem, 1966, (tr. port. João Paulo Queiroz, Lisboa, Dinalivro, 1997).

BACH, Balkin (ed), New Land Marks. Public Art, Community, and the Meaning of Place, Washington, D.C., Grayson Publishing, 2001.

BARRANHA, Helena Silva, «O Museu, Espaço de Encontro entre a Arte e a Arquitectura do Presente», Margens e Confluências, Nº 6, Dez 2003, pp. 9-15.

- 81 -

BEARDSLEY, John, Art in Public Places, Washington, D.C., Partners for Livable Places, 1981.

BOTELHO, Margarida, «Entrevista com Daniel Buren à Edição Especial (12-03-1980)», in 75 Artistas em Portugal, Maia, Castoliva Editora, 1989, pp. 70-73.

BOTELHO, Margarida; CABRAL, Pina, Anjos, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1996.

BOTELHO, Margarida; CABRAL, Pina, Estação Campo Grande, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1994.

BUREN, Daniel, «Exhibition of an Exhibition» 1972, in FILIPOVIC, Elena; HAL, Marieke van; ØVSTEBØ, Solveig (eds.), The Biennial Reader, An Anthology on Large-Scale Perennial Exhibitions of Contemporary Art, Bergen, Bergen Kunsthall, Ostfildern, Hatje Cantz Verlag, 2010.

BUREN, Daniel, «Where are the Artists?», 2004, in FILIPOVIC, Elena; HAL, Marieke van; ØVSTEBØ, Solveig (eds.), The Biennial Reader, An Anthology on Large-Scale Perennial Exhibitions of Contemporary Art, Bergen, Bergen Kunsthall, Ostfildern, Hatje Cantz Verlag, 2010.

CALABRESE, Omar, A Idade Neobarroca, 1987, (tr. port. Carmen de Carvalho e Artur Mourão, Lisboa, Edições 70, 1999).

CARTIERE, Cameron; WILLIS, Shelly (eds.), The Practice of Public Art, Nova Iorque, Routledge, Taylor & Francis Group, 2008.

COSTA, Marina Sequeira, Aqui e Agora, Here and Now. Em Torno do Minimal na Colecção Berardo, On Minimal Art in the Berardo Collection, Sintra, Museu de Arte Moderna, Colecção Berardo, 2003-2004.

DIAS, Fernando Paulo Rosa, «Memórias da Arte Pública em Portugal no Século XX, 1945- 1975. Entre a Retórica e a Elipse», in QUARESMA, José, O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011.

ECO, Umberto, Opera Aperta, Itália, 1962 (tr. port. Sebastião Uchoa Leite, Obra Aberta, Forma e Indeterminação nas Poéticas Contemporâneas, «Colecção Debates», 2ª ed., São Paulo, Editora Perspectiva, 1971).

ELIASSON, Olafur, Studio Olafur Eliasson, An Encyclopedia, (ed. Anna Engberg- Pedersen; introd. Philip Ursprung; entrevistas Philip Ursprung), Köln, Taschen, 2012. ELIASSON, Olafur, Your Lighthouse, Works With Light 1991-2004, Ostfildern-Ruit, Germany, Hatje Cantz Publishers, 2004.

ESTEVES, João José Pissara Nunes, «O Sujeito Moderno à Luz de uma Racionalização Comunicacional da Experiência» in QUARESMA, José, Revisitação da Querela Modernidade / Pós-Modernidade, (coord. José Quaresma, Fernando Rosa Dias), Lisboa, Ur, 2011.

- 82 -

ESTEVES, João José Pissara Nunes, Espaço Público e Democracia: Comunicação, Processos de Sentido e Identidades Sociais, («Cadernos Universitários», 15), Lisboa, Colibri, 2003.

ESTEVES, João Pissara, «Breve Revisitação do Conceito de Esfera Pública Literária», in QUARESMA, José, O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011.

ESTEVES, João Pissarra, «Para uma Reinvenção Comunicacional da Cidade, Dialogismos entre a Arte e a Vida», in QUARESMA, José (coord.), Instituições Culturais e Representatividade. Chiado, Baixa, Arte Pública e Esfera Comunicacional, Lisboa, CIEBA, 2012, pp. 95-108.

FINKELPEARL, Tom, Dialogues in Public Art, Cambridge, Massachusetts, MIT Press, 2001.

FLEMING, Ronald Lee, «Aesthetic Policy and Community Identity», in AAVV, Local Government and the Arts, Nova Iorque, American Council for the Arts, 2007.

FLEMING, Ronald Lee, The art of Placemaking. Interpreting Community Through Public Art and Urban Design, Londres, Merrell Publishers, 2007.

FLEMING, Ronald, Lee, «The Meaning of Place», in Public Interest, Janeiro, 1982.

FRANÇA, José Augusto, A Arte em Portugal no Século XX, Lisboa, Livraria Bertrand, 1974.

GOLDSTEIN, Barbara (ed.), Public Art by the Book, Seattle and London, University of Washington Press, Americans for the Arts, 2005.

HABERMAS, Jürgen, Strukturwandel der Öffentlichkeit, 1962, (tr. brasileira Flávio R. Kothe, Mudança Estrutural da Esfera Pública, Investigações quanto a uma Categoria da Sociedade Burguesa, col. «Biblioteca Tempo Universitário», nº 76, Série Estudos Alemães, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1984).

HABERMAS, Jürgen, The Public Sphere, Edinburgh, Media Studies, 2005.

HADJINICOLAOU, Nicos, Histoire de l'Art et Lutte des Classes, Paris, François Maspero, 1973 (tr. port. António José Massano, História da Arte e Movimentos Sociais, «Coleção Arte & Comunicação», Lisboa, Edições 70, 1989).

HUICI, Fernando, «Maquinando», Arte y Parte, Nº 43, Fev/Mar 2003, pp. 16-17.

ITTEN, Johannes, Kunst Der Farbe, Studienausgabe, 1961, Ravensburger Buchverlag Otto Maier GmbH, Ravensburg, Germany, (ed. Faber Birren, The Elements of Color, A Treatise on The Color System of Johannes Itten based on his Book “The Art of Color”, New York, John Wiley & Sons, 1970).

KNIGHT, Krause, Public Art, Theory, Practice and Populism, Londres, Blackwell, 2009.

- 83 -

KOWALSKA, Bozena, «Nowe Biennale w Paryzu, The New Biennale in Paris», Projekt, Nº 164, Mai 1985, pp. 2-13.

LACY, Suzanne (ed.), Mapping the Terrain, New Genre Public Art, Seattle, Washington, Bay Press, 1995.

LELONG, Guy, «Le Musée qui N’Existait Pas, Entretien avec Daniel Buren», Les Cahiers du Musée National d’Art Moderne, Nº 80, été 2002, pp. 4-17.

LELONG, Guy, Daniel Buren, s.l., Flammarion, 2001 (tr. ing. David Radzinowicz, 2002).

LEMMEN, Hans Van, Azulejos na Arquitectura, (tr. port. Paula Reis), Lisboa, Editorial Caminho, 1994.

LOOCK, Ulrich (ed.), A Obra de Arte sob Fogo, Inovações Artísticas 1965-1975, s.l., Jornal Publico, Fundação de Serralves, 2004, Colecção de Arte Contemporânea Publico Serralves.

MADUREIRA, Eduardo Jorge, «Jornais e Artes Plásticas», Margens e Confluências, Nº 9, Jun 2005, pp. 109-119.

MAUBANT, Jean-Louis, La Ville, L'Art & La Voiture, Villeurbanne, Art Edition, Art Entreprise, 1995, (tr. ing. Towns, Art and The Car).

MECO, José, O Azulejo em Portugal, Lisboa, Publicações Alfa, 1989.

MEDORI, Paula Brito, «Contra a Corrente», L+Arte, Nº 37, Jun 2007, pp. 44-56.

MONTEIRO, José Charters, «Maria Keil, Entrevista», Arquitectura e Vida, Nº 97, Ano IX, Out 2008, pp. 14-21.

MOURE, Gloria, «Behind the Facts, Interfunktionen 1968-1975», in LOOCK, Ulrich (ed.), A Obra de Arte sob Fogo, Inovações Artísticas 1965-1975, «Coleção de Arte Contemporânea Público Serralves», s.l., Jornal Público - Fundação de Serralves, 2004.

NADAL, Emília (coord.), Fernando de Azevedo, um Texto – uma Obra, Lisboa, Athena, Sociedade Nacional de Belas-Artes, 2012.

NERY, Eduardo, Apreciação Estética do Azulejo, «Colecção História da Arte», Lisboa, Edições Inapa, 2007.

NEVES, Pedro Soares , «Plataforma de Arte Urbana: Prenúncio de uma Mudança em Lisboa», in CRUZEIRO, Cristina Pratas; LOPES, Rui Oliveira (coords.), Arte & Sociedade, Quinto Ciclo de Conferências, s.l., CIEBA - FBAUL, 2011.

NUNES, Paulo Simões, «Arte Pública», in PEREIRA, José Fernandes (dir.), Dicionário de Escultura Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2005, pp. 58-64.

OLIVEIRA, Filipa, «A Construção de um Dicionário: Exposição», L+Arte, Nº 58, Mar 2009, pp. 34-36.

- 84 -

PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Painel de Azulejo do Aeroporto Internacional de Macau, Eduardo Nery, s.l., Missão de Macau em Lisboa, 1996.

PELZER, Birgit, " «Desaparece, Objeto!», A Revolução Inatingível", in LOOCK, Ulrich (ed.), A Obra de Arte sob Fogo, Inovações Artísticas 1965-1975, «Coleção de Arte Contemporânea Público Serralves», s.l., Jornal Público - Fundação de Serralves, 2004.

PELZER, Birgit, «"Desaparece, Objeto!”, A Revolução Inatingível», in LOOCK, Ulrich (ed.), A Obra de Arte sob Fogo, Inovações Artísticas 1965-1975, «Coleção de Arte Contemporânea Público Serralves», s.l., Jornal Público, Fundação de Serralves, 2004.

PEREIRA, João Castel-Branco, Azulejos no Metropolitano de Lisboa, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1990.

PEREIRA, João Castel-Branco; VILARINHO, António Júlio (coords.), As Idades do Azul, Formas e Memórias da Azulejaria Portuguesa, 1998, (2ª edição, col. «Catálogos FIA», Lisboa, IEFP - Instituto do Emprego e Formação Profissional, 2003).

PIRES, José Cardoso, «As Letras Subterrâneas, Metropolitano de Lisboa», Lisboa, Livro de Bordo. Vozes, Olhares, Memorações, 1997, (6ª edição, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2001).

QUARESMA, José (coord), O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011.

QUARESMA, José (coord), Repensar o Chiado, Reviver o Chiado. Conferências e Exposições, Jornadas Europeias do Património, Lisboa, CIEBA - FBAUL, 2011.

QUARESMA, José (coord.), Instituições Culturais e Representatividade. Chiado, Baixa, Arte Pública e Esfera Comunicacional, Lisboa, CIEBA, 2012.

QUARESMA, José, «Arte Pública e Reconhecimento Mútuo», Efervescência Urbana, Artística e Literária de um Lugar, Lisboa, FBAUL - CIEBA, 2010.

QUARESMA, José, «Arte Pública e Reconhecimento Mútuo», Efervescência Urbana, Artística e Literária de um Lugar, Lisboa, FBAUL - CIEBA, 2010.

QUARESMA, José, «Intersubjetividade e Espaço Público, Entre a Folha “Perene” e a Folha “Caduciflora”», O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública. Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011.

QUARESMA, José, Intersubjectividade e Abismo na Discussão Estética, Lisboa, 2008.

REFER, Rede Ferroviária Nacional, Sem Margens, Intervenções Plásticas nas Estações da Travessia Ferroviária Norte-Sul, (texto e entrevistas de Francisco Vaz Fernandes), s.l., Refer EP, 2001.

REGATÃO, José Pedro, Arte Pública e os Novos Desafios das Intervenções no Espaço Urbano 1975, (2ª edição, Lisboa, B on D - Books on Demand, 2010).

- 85 -

RIBEIRO, Fernando, O Perpétuo Presente, Heterotopias Glocais na Arte Contemporênea, Tese de Doutoramento em Belas-Artes: Arte Pública, Lisboa, Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, 2009.

RODRIGUES, Adriano Duarte, «Espaço Público», Revista de Comunicação e Linguagens, Dezembro, Nº 2, Porto, Edições Afrontamento.

RODRIGUES, Ana Maria (coord.), O Azulejo em Portugal no Século XX, Lisboa, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Edições Inapa, 2000.

ROMÁN, Juan Carlos, «Olafur Eliasson, El Artista que Espera a que la Naturaleza Realice la Obra de Arte», Arte y Parte, Nº 43, Fev/Mar 2003, pp. 58-65.

SAPORITI, Teresa, Azulejaria de Eduardo Nery, Lisboa, 2000.

SARDO, Delfim, «Aqui e Agora, A Propósito do Minimal», in COSTA, Marina Sequeira, Aqui e Agora, Here and Now. Em Torno do Minimal na Coleção Berardo, On Minimal Art in the Berardo Collection, Sintra, Museu de Arte Moderna, Coleção Berardo, 2003-2004.

SARDO, Delfim, Edit!, Coimbra, Centro de Artes Visuais – Encontros de Fotografia, 2007.

SELWOOD, Sara, The Benefits of Public Art: The Polemics of Permanent Art in Public Spaces, London, Policy Studies Institute, 1995.

SOUSA, João Rocha de, Composição e Forma Visual, texto de João Rocha de Sousa, Isabel Sabino, Hugo Ferrão, col. «Universidade Aberta – Composição», s.l., Universidade Aberta, 2001.

SOUSA, Pedro Miguel Alegria Lobo Pereira de, A Arte Op na Arte Pública em Portugal, Lisboa, 2008.

SPAYDE, Jon, «Six Loaded Questions for Contemporary Muralists», in Public Art Review, Outono/Inverno, 2005.

SYNEK, Manuela O. B., «Metropolitano de Lisboa, Uma Exposição em Permanência», Arquitectura e Vida, Nº 18, Jul/Ago 2001, pp. 114-119.

TABORDA, Helena, «Arte Pública na Estação Baixa-Chiado do Metro de Lisboa», in

QUARESMA, José; DIAS, Fernando Rosa (coords.), Chiado: Efervescência Urbana, Artística e Literária de um Lugar, Lisboa, CIEBA, 2010.

TAYLOR, Charles, «A Esfera Pública», Imaginários Sociais Modernos, Lisboa, Grafia e Texto, 2010, cap. 6 (tr. port. Artur Morão, Covilhã, LusoSofia Press, Universidade da Beira Interior, 2010).

TRIGO, Luís Filipe (coord.), Metro, A Arte que Lisboa Ainda Não Viu, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1996.

VIDAL, Carlos, «Espaço Público, Meios Privados. As Escalas da Arte Pública», in

- 86 -

QUARESMA, José, O Chiado, a Baixa e a Esfera Pública: Ensaios e Exposições de Arte Pública, Lisboa, Associação dos Arqueólogos Portugueses, 2011.

Catálogos

AAVV, Maria Keil, Exposição Pintura – Desenho, Almada, Galeria Municipal de Arte, Câmara Municipal de Almada, 1996.

HENRIQUES, Paulo, Eduardo Nery. Exposição Retrospectiva, Tapeçaria Azulejo Mosaico Vitral, [1961-2003], s.l., IPM - Instituto Português dos Museus, 2003.

MACHADO, Rosário Sousa (coord.), Eduardo Nery 1956-1996, catálogo, s.l., Culturgest, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997.

Webgrafia

http://artepublica.blog.com http://forecastpublicart.org/par.php http://ixia-info.com/ http://pt.wikipedia.org/wiki/Agualva-Cacém http://pt.wikipedia.org/wiki/Estação_São_Sebastião http://publicartdialogue.org http://www.art-public.com http://www.olafureliasson.net/studio.html http://www.publicartfund.org http://www.publicartonline.org.uk http://www.publicartreview.com/ http://www.refer.pt/MenuPrincipal/REFER.aspx

Outras fontes

Caderno de projeto da intervenção artística na Estação de Agualva-Cacém: registos fotográficos, desenhos, ilustrações, esquemas, simulações, textos, listas, anotações, memórias descritivas e imagens do trabalho (fonte própria).

- 87 -

FONTES DAS IMAGENS

Figs. 1-3 – Fonte: BOTELHO, Margarida; CABRAL, Pina, Anjos, Lisboa, Metropolitano de Lisboa, 1996.

Figs. 4-6 – Fonte: PEDRO, António; LADEIRA, Carlos (coords.), Painel de Azulejo do Aeroporto Internacional de Macau, Eduardo Nery, s.l., Missão de Macau em Lisboa, 1996.

Figs. 7-9 – Fonte: BUREN, Daniel, in LELONG, Guy, Daniel Buren, s.l., Flammarion, 2001 (tr. ing. David Radzinowicz , 2002).

Figs. 10-12 – Fonte: ELIASSON, Olafur, Studio Olafur Eliasson, An Encyclopedia, (ed. Anna Engberg-Pedersen; introd. Philip Ursprung; entrevistas Philip Ursprung), Köln, Taschen, 2012.

Figs. 13 a 39 – Fonte: Própria.

Figs. Anexos V-XIX – Fonte: Própria.

- 88 -

ANEXOS I - XIX

Nota: Os anexos completos encontram-se em formato digital. Os anexos I a IV dizem respeito aos trabalhos de Maria Keil, Eduardo Nery, Daniel Buren e Olafur Eliasson, respetivamente. Nos anexos V a XIX incluem-se todos os elementos e fases de desenvolvimento do projeto para da intervenção plástica da nossa autoria na Estação de Agualva-Cacém, dos quais fazem parte pesquisas, estudos, fotografias, desenhos realizados, propostas finais, registos fotográficos da produção e da instalação, assim como imagens do resultado final depois do trabalho integrado no local. Para o formato em papel, realizámos uma seleção e são apresentados apenas uma parte dos anexos que contêm estes elementos.

ANEXO I

Maria Keil

Biografia resumida, obras selecionadas e algumas considerações sobre a sua produção artística

Maria Keil do Amaral nasceu em Silves a 9 de Agosto de 1914 e morreu a 10 de Junho de 2012 em Lisboa. Inicia o Curso Preparatório de Pintura, da Escola de Belas Artes de Lisboa aos 15 anos, que não conclui. Em 1933 casa com Francisco Keil do Amaral, arquiteto, de quem tem um filho em 1935. Inicia a sua atividade artística em 1934, nas seguintes áreas: pintura, desenho, ilustração, publicidade, design gráfico, design de interiores, mobiliário, cerâmica, azulejaria, tapeçaria, cenografia e figurinos. Entre outros projetos executa, em 1937, um motivo decorativo na Salle IV – Outremer, do Pavilhão de Portugal na Exposição Internacional de Paris. Realiza a sua primeira exposição individual de pintura e desenho em 1939, na Galeria Larbom, em Lisboa. Faz uma pintura mural na Exposição do Mundo Português, na parede fronteira à entrada do Pavilhão dos Descobrimentos, em 1940. Faz também, no mesmo ano, quatro painéis para os Correios e Telégrafos do Funchal. Em 1941 recebe o Prémio de Revelação Souza-Cardoso, atribuído à obra Auto-Retrato, apresentada na VI Exposição de Arte Moderna do SPN, em Lisboa. Entre 1947 e 1948 faz a decoração de interiores da Pousada de São Lourenço, na Serra da Estrela, e do Restaurante no Campo Grande, em Lisboa, hoje destruído. Pinta dois painéis para o palco do Teatro Monumental, em Lisboa, em 1951, e no ano seguinte, faz uma série de painéis em calçada á portuguesa para a Cervejaria Trindade em Lisboa. No ano de 1954 realiza os primeiros projetos para revestimento com azulejos destinados à Aerogare de Luanda, Delegação da TAP em Paris, Escritórios da UEP em Setúbal e Refeitório da Colónia de Férias da UEP em Palmela. Em 1955 executa os seus dois primeiros painéis de azulejos: Mulher e Luta de Galos. A partir de 1956 começa a

desenvolver e executa o painel de azulejos O Mar, para a Infante Santo, em Lisboa, cujo assentamento é feito em 1958. Em 1957 recebe a encomenda para um trabalho de revestimento a azulejo do Metropolitano de Lisboa. Os azulejos para as estações dos Restauradores, Restauradores, Rotunda, Parque, São Sebastião, Palhavã, Sete Rios, , , Campo Pequeno e Entrecampos, viriam a ser concluídos e assentes entre 1958 e 1959. Inicia também nesta época os trabalhos de ilustração de livros infantis. Em 1960 recebe o Prémio “Diário de Notícias”. Em 1963 fica pronta e é inaugurada a estação do Metropolitano do . Em 1964 faz uma tapeçaria para o Hotel Estoril-Sol. Em 1966 são inauguradas as estações de Metropolitano do Socorro, Intendente e Anjos. Executa o revestimento a azulejo da Delegação da TAP em Nova Iorque, durante o ano de 1967, e três tapeçarias para a mesma empresa e para o Casino Estoril. Entre 1968 e 1969 executa mais duas tapeçarias para as Delegações da TAP em Copenhaga e em Madrid. Suceder-se-iam as estações de , , , e Alvalade, a partir de 1972. Realiza, em 1973, o revestimento de azulejos de uma sala do Casino de Vilamoura. Morre o seu marido, Francisco Keil do Amaral, em 1975. Em 1977 as estações de metropolitano são remodeladas e alguns dos seus trabalhos são destruídos: nas estações do Saldanha e de São Sebastião. Recebe uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, para um projeto de estudo das tendências da ilustração para crianças, para o qual visita vários países no início dos anos 80. Continua a fazer painéis de azulejos, tais como: A Raposa e o Espírito da Vinha de 1984, O Sol de 1986, e A Barca, Pinheiro de 1988. O Museu do Azulejo faz, em 1989, uma retrospetiva da sua obra azulejar. Em 1997 começa a dedicar-se à fotografia e realiza a exposição Roupa a Secar no Bairro Alto no Museu Nacional do Traje. Participa na Exposição do 50º Aniversário da Declaração dos Direitos do Homem, em 1999, com a obra Motauros. Fez ainda as intervenções plásticas na nova estação de São Sebastião, quando esta foi remodelada para expansão da rede de metro. Foi inaugurada em 2009. A sua obra mural e gráfica está presente em diversos edifícios e espaços públicos em Portugal, Espanha, Dinamarca, Estados Unidos, entre outros países. Participou em várias exposições individuais e coletivas, nacionais e internacionais. Está representada em várias coleções públicas e privadas por todo o mundo.

Maria Keil costumava dizer que foi a sorte que determinou o seu percurso, com as respostas exigentes que foi dando a cada momento.1 Que se tornou artista trabalhando, que se considera mais uma gráfica do que uma pintora: “eu não gosto de pintar. (…) cheira a óleo. Não vale a pena!” 2, dizia. Em entrevista explicou que aceitou a encomenda do Metro nos anos 50 porque “tinha de ser…”3. Era um trabalho que ninguém queria fazer. Os artistas consideravam que não era arte, era artesanato. Contava que os colegas lhe diziam que não o fizesse: “Uma pintora não faz isso; fazer azulejo…”.4 “Depois começaram a aceitar o azulejo de outra maneira. Mas ao princípio não era aceite. Foi uma luta muito grande.”5 Anos mais tarde ainda havia quem pensasse assim, comentou a autora.6 O seu trabalho foi ignorado e desprezado durante muito tempo, pelo meio artístico, pelos colegas e pelo próprio Metropolitano. Consideravam que aquilo não era uma obra de arte, era apenas revestimento, explicava ela.7 Diz que foi influenciada pelo seu marido e pelas pessoas que o rodeavam, avançados e cultos, ao contrário das pessoas da Escola de Belas Artes, muito clássicos e académicos e que só mais tarde se tornaram mais abertos, contava.8 Para si o que interessava era fazer o que lhe pediam, “fazer o trabalho que me encomendavam o melhor possível dentro daquilo que eu pensava.”9 No entanto, vários autores, como José Charters Monteiro, consideram que com Maria Keil, a tradição da azulejaria recebe um importante e inovador contributo, um sentido de modernidade pela introdução de novos temas e iconografias, e pela reutilização do tema do azulejo padrão. Maria Keil consegue um entendimento profundo deste material intrinsecamente ligado à cultura portuguesa e com uma presença quotidiana tão constante que muitas vezes nem reparamos nele. Na sua opinião criar azulejos “É tão simples que é difícil.”10 A artista afirmou em entrevista:

1 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, Op. Cit., p. 14. 2 KEIL, Maria, in ABRANTES, José Carlos; SANTOS, Dora, Op. Cit., pp. 18-19. 3 Ibid., p. 19. 4 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, Op. Cit., p. 18. 5 Ibid., p. 17. 6 KEIL, Maria, in ABRANTES, José Carlos; SANTOS, Dora, Op. Cit., p. 20. 7 Ibid., p. 20. 8 Ibid., pp. 17 e 22. 9 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, Op. Cit., p. 18. 10 KEIL, Maria, in ABRANTES, José Carlos; SANTOS, Dora, Op. Cit., p. 19.

A minha opinião é que com o azulejo não se brinca. É uma coisa para funcionar com um determinado sentido. E a arquitetura também tem a sua independência e a sua dignidade (…). Ali houve mesmo uma compreensão do azulejo; aquilo é lindo, com os reflexos.11

Em todas as suas intervenções no primeiro ciclo de construção do Metropolitano de Lisboa, de 1959 a 1972, criou revestimentos individualizados. Usou soluções inteligentes e nunca repetidas, apesar da austeridade que lhe foi exigida em termos de orçamento. De acordo com João Castel-Branco Pereira: “o princípio formal de sobrearticulação de planos, diferenciados entre si pelas associações e cores dos módulos iniciais, individualizam o espaço de cada estação.”12 As suas obras foram sempre apropriadas e articuladas com o espaço onde intervêm: ela dizia “não se faz uma parede só para brincar a fazer uma parede”, que estas têm as suas regras tal como a arquitetura, e que é preciso respeitá-las.13 Maria Keil trouxe um entendimento específico da valorização plástica dos espaços públicos em Portugal, que se tornou uma referência para o futuro e para vários artistas.

11 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, Op. Cit., p. 17. 12 PEREIRA, João Castel-Branco, Op. Cit., p. 15. 13 KEIL, Maria, in MONTEIRO, José Charters, Op. Cit., p. 18.

ANEXO II

Eduardo Nery

Biografia resumida, obras selecionadas e algumas considerações sobre a sua produção artística

Nasceu na Figueira da Foz em 1938. Uns meses depois a família muda-se com ele para Lisboa. Aos 14 anos decide ser arquiteto. Em 1956 entra na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. Ao contactar com a arte antiga e contemporânea decide-se pela Pintura. Em 1960 vai para França trabalhar para o atelier de Jean Lurçat, pintor francês e grande inovador da tapeçaria europeia, por quem foi convidado para um estágio. Desenvolve a partir daí o seu trabalho plástico nas áreas da pintura, desenho, gravura, colagem, tapeçaria, vitral, azulejaria, mosaico, fotografia, design, com destaque para as disciplinas de intervenção artística em espaços públicos. Trouxe para Portugal o movimento da Op Art – optical art com o arquiteto e escultor Artur Rosa, movimento que havia sido abordado por Vasarely em Paris nos anos 40 e que nos Estados Unidos se desenvolveria mais tarde, já nos anos 60. Desenvolve um trabalho de experimentação. Esta experiência veio a ter influência na sua obra, embora não a defina de modo direto, mas como base subtil das suas conceções formais: movimento, ritmo, cor, luz, espaço, rigor geométrico do desenho, disciplina, ilusionismo rigoroso e paciente. Rocha de Sousa escreveu sobre o seu trabalho:

Ao abordar a problemática do espaço, trabalhando segundo métodos rigorosos, o seu ângulo de análise inclui o conceito de mobilidade visual, a permanente mudança dos dados percetivos, tanto no campo operatório concreto como na fluidez das memórias que atravessam a face equívoca dos objetos.14

14 Apud AZEVEDO, Fernando de, «Eduardo Nery ou o Intrigante Teatro do Olhar», in MACHADO, Rosário Sousa (coord.), Op. Cit., p. 21.

Eduardo Nery escreveu diversos textos de carácter ensaístico e fez textos explicativos para todos os seus trabalhos, que se caraterizam pela clareza de ideias e pensamento sistemático. Apesar das constantes solicitações para intervir em espaços arquitetónicos e públicos, continua a dedicar-se à pintura, à fotografia e à colagem, embora com menos constância, e também lecionou no Instituto de Arte e Decoração (IADE) a disciplina “Desenho, Cor e Texturas”, de 1970 a 1972. Em 1973 fundou com outros professores o Centro de Arte e Comunicação Visual (Ar.Co), onde lecionaria a disciplina relativa ao estudo da cor, segundo o método de aprendizagem da cor de Itten, mestre da Bauhaus. Entre as suas diversas intervenções plásticas articuladas diretamente com a arquitetura, contam-se: pinturas murais, painéis de azulejos, paredes em relevo de metal e de betão, altos-relevos com espelhos, grades metálicas, tapeçarias, vitrais, mosaicos, painéis cerâmicos em relevo, pavimentos em calçada, projetos de cor para edifícios e conjuntos urbanos, numa diversificada e extensa obra plástica. Esta variedade de áreas de trabalho exprime a sua vontade de tornar ampla e acessível a produção artística, nomeadamente nas suas expressões mais públicas. Concebeu obras para espaços muito diversificados e de grande visibilidade pública, tais como: fábricas, galerias comerciais, estações de metropolitano e de comboio, viadutos, avenidas, jardins, e outros. Eduardo Nery diz que pretende através da sua arte em espaços públicos, “intervir na sociedade e na consciência do país”, reagir contra o gosto dominante e o consumismo kitsch.15 O seu objetivo é gerar “mecanismos de usufruto artístico no quotidiano e, deste modo, uma maior exigência de sensibilidade dos públicos e das sociedades”, segundo Paulo Henriques.16 Recebeu vários prémios pelas suas obras de arte pública e continua a trabalhar nesta área atualmente, para além da sua atividade paralela na pintura e fotografia. Realizou diversas exposições individuais e coletivas, tanto em Portugal como fora do país, e está representado em vários museus portugueses e no estrangeiro.

15 Apud NEVES, Susana, «O Caçador de Imagens», in MACHADO, Rosário Sousa (coord.), Op. Cit., p. 245. 16 HENRIQUES, Paulo, Eduardo Nery. Exposição Retrospectiva, Tapeçaria Azulejo Mosaico Vitral, [1961-2003], s.l., IPM - Instituto Português dos Museus, 2003, p. 11.

A sua primeira grande obra concebida para um espaço arquitetónico, foi a intervenção na Fábrica da ex-Sociedade Central de Cervejas, em Vialonga, projetada em 1966 e executada entre 67 e 68. Consistiu num grande painel de azulejos para uma parede exterior (retirado anos mais tarde), e nos pavimentos exteriores e interiores em “calçada-mosaico”17 e em mármore e mosaico hidráulico. De 1967 a intervenção na galeria comercial do edifício da Rua Brancaamp, nº 9, em Lisboa, de relevos em betão cofrado nas paredes, pinturas murais e empedrado do pavimento. Projeta, em 1968, o pavimento da Praça da República no Redondo, em paralelepípedos de calcário e basalto. Em 1971, realiza o revestimento das paredes na agência do Banco Nacional Ultramarino de Torres Vedras, com azulejo de padrão criado pelo autor em 1966. Em 1979 concebe o tratamento plástico com espelhos de uma parede na delegação da companhia aérea VARIG no Marquês de Pombal, em Lisboa. Aplicação de azulejo padrão da sua criação numa estrutura volumétrica no pátio interior do Centro de Saúde de Mértola, em 1981. Projeta em 1983 o painel Ritmo de Ondas, para a agência da União de Bancos Portugueses, e a intervenção plástica na delegação da Caixa Geral de Depósitos de Angra do Heroísmo. Ainda em 1983 é convidado pelo metropolitano de Lisboa, para fazer a organização plástica da estação e viadutos do Campo Grande. A estação viria a ser inaugurada só em 1992. Obra de grande dimensão, que incluiu o tratamento plástico do interior e do exterior, desde os pavimentos, às grades, às paredes das escadarias e dos acessos ao cais, ao exterior do edifício e dos viadutos. As suas investigações plásticas entre 1984 e 1987 dão origem aos painéis Vibração I e Vibração II. Faz as composições para o Centro de Saúde e Escola de Enfermagem em Angra do Heroísmo, em 1986. De 1986-1987 são as duas obras que realizou para a EPAL, uma na estação de tratamento da Asseiceira, e outra no Museu da Água em Lisboa. Concebe em 1987 um painel para o Centro de Emprego e Formação Profissional em Coimbra. Entre 1987 e 1991 realiza o projeto para o pavimento em calçada da Rua da Mouraria ao Largo do Martim Moniz, integrado na requalificação desta zona de Lisboa. Em 1991 recebe o convite para fazer o tratamento plástico da entrada sul do edifício sede da Caixa Geral de Depósitos, em Lisboa. Neste projeto

17 Ibid., p. 33.

articula a calçada no pavimento com o mosaico e o vitral que integra numa cúpula. Faz ainda o projeto de grande escala para a envolvente de duas salas do Banco Nacional de Crédito em Lisboa, executado entre 1991 e 1993. Realizou duas composições em mosaico vítreo para os muros do Parque de Material e Oficinas, PMO II do Metropolitano de Lisboa, em 1993-94. Projeto para as plataformas de embarque da estação de comboios de Contumil, de 1992-1994, retomando o azulejo padrão como módulo de repetição, tal como as composições para as salas de audiência do Tribunal de Setúbal, realizadas entre 1993 e 1994. Entre 1993 e 94 o projeto para os alçados de uma escadaria na Avenida Infante Santo em Lisboa. Concebeu a organização plástica do espaço interior do Centro Comercial do Laranjeiro, em 1994, em que utilizou o mosaico. Composição de um painel de grandes dimensões para o terminal de embarque do Aeroporto Internacional de Macau, com projeto e execução de 1995. Realizou o tratamento dos três lados da fachada da Farmácia Rodrigues no Cacém em 1996, em mosaico. De 1997 o projeto para o interior em azulejo do viaduto do Campo Pequeno, em Lisboa. Intervenção na requalificação da Praça do Município em Lisboa, em 1997, que consistiu na criação de um “tapete” em calçada, como lhe chamou o próprio artista18. Também de 1997 os revestimentos dos acessos ao estacionamento da Associação Nacional de Farmácias em Lisboa. Em 1998 executa a intervenção num espaço ao ar livre, na margem do rio Trancão. Realiza em 1998-1999 o interior da estação de comboios de Campolide, em Lisboa. Realiza uma intervenção na agência Portagem do Montepio Geral, Coimbra, em 1999, e o revestimento da piscina interior de uma moradia em Cascais, entre 1999 e 2003. Concebe o revestimento em azulejo para o viaduto da Avenida Infante Santo em Lisboa, e para o viaduto de Queluz/Massamá, em 2001. Também de 2001, a intervenção na Escola Secundária de Lagoa, em São Miguel, nos Açores, assim como o painel de azulejos para a área de serviço de Torres Vedras na autoestrada A8. Projetou, em 2003, uma composição de azulejos de cores lisas, para o Museu Municipal de Arte Contemporânea, Coleção José-Augusto França, em Tomar.

18 Ibid., p. 35.

ANEXO III

Daniel Buren

Biografia resumida, obras selecionadas e algumas considerações sobre a sua produção artística

Nasceu em França, em Boulogne-Billancourt, em 1938. Tem vivido e trabalhado em vários locais: Estados Unidos, Bélgica, França e Alemanha, entre outros. Em Setembro de 1965, descobriu o tecido com listras, que a partir daí usou constantemente, cujas faixas de igual largura, eram alternadamente brancas e coloridas, a que chama o seu ‘utensílio visual’. Começou, entre 1966 e 1967, época em que trabalhou com outros artistas como Mosset, Parmentier e Toroni, por executar várias pinturas sobre este tecido cobrindo em parte esta rede vertical, pondo em causa as noções de pintura, moldura e limites. Apesar de o tecido não ter qualquer interesse em si, permitia evocar a pintura, trabalhar com a repetição e com a redução. A partir daí os seus trabalhos começaram a ser executados in situ, ou seja, no próprio lugar para onde estavam destinados. Produziu mais de dois mil trabalhos até hoje, dos quais referimos à frente alguns dos mais representativos. Concebeu em 1971 uma peça in situ de grande escala para a sexta exposição Internacional do Guggenheim, no Museu Solomon R. Guggenheim, em Nova Iorque: Peinture/Sculpture. Para a Documenta V em Kassel, realiza em 1972, Exposition d’une Exposition, une pièce en 7 tableaux, junto a outros trabalhos na maioria relacionados com o minimalismo e a arte conceptual. Em 1973 criou a peça Within and Beyond the Frame, para a Galeria John Weber em Nova Iorque. A sua primeira intervenção de grande escala em Paris: Points de vue ou le Corridorscope, de 1983, exibida no ARC no Musée d’Art Moderne de la Ville de Paris. Em 1986 concebe Le Pavillon coupé, découpé, taillé, gravé, para o pavilhão francês na Bienal de Veneza desse ano. Realiza a exposição Arguments topiques, no capc Musée de Bordeaux em 1991. Em 2001, instala Les Couleurs traversées nos três pisos do Kunsthaus, em Bregenz, na Áustria.

Em paralelo com a prática artística, escreveu diversos textos, que estão coletados nos três volumes da obra Les Écrits de Daniel Buren. Consistem em comentários e opiniões sobre arte, transcrições de entrevistas, respostas a críticas ao seu trabalho, manifestos e descrições para cada trabalho projetado. A função dos textos em que explica os trabalhos advém da incapacidade da pintura discursar sobre si própria, porque é apreendida apenas com a visão. Reflete sobre os seus trabalhos e sobre as suas implicações profundas. A sua preocupação de os explicar não entra em contradição com o fato de as peças poderem ser entendidas por si próprias, com um mínimo de informação suplementar. Mas a explicação dissipa possíveis mal entendidos e apreensões inapropriadas. A descrição completa de cada trabalho acompanha as fotografias a que o autor chama photo-souvenirs, e que só por si não dão conta de todos os aspetos do trabalho. Como muitas das suas obras são efémeras e as fotografias não substituem, têm de ser acompanhadas de uma descrição detalhada que explica de que forma funcionam, reduzindo o risco de interpretações erradas. Permite também que certas peças sejam refeitas, reativadas ou reinterpretadas. Descrevem as condições da sua execução, as ideias estruturantes, a sua adaptação ao lugar, e ligação entre o conceito e o lugar que a acolhe. Embora diretamente dependentes do lugar específico, a descrição torna possível uma reactualização dos trabalhos, e reutilização das ideias. O seu trabalho plástico e os seus textos põem em causa o status das artes visuais. Segundo a teoria de Nelson Goodman, interpretada e simplificada por Gérard Genette19, existem dois tipos de obras de arte: as que consistem num objeto material único - como a pintura tradicional e as artes visuais em geral - e as que consistem num objeto idealizado passível de dar origem a múltiplas manifestações - como a música. O primeiro está ligado ao conceito de autenticidade, cópia e falsificação, enquanto objetos únicos e irrepetíveis. O segundo pode ser repetido e realizado inúmeras vezes. A diferença entre os dois é que os segundos estão escritos, o que permite a sua repetição, e os primeiros não. Ao descrever os seus trabalhos de forma verbal, Daniel Buren está a por em causa essa classificação, possibilitando que um objeto idealizado - um trabalho in situ - possa dar origem a várias manifestações, ser reatualizado ou reinstalado sem que isso o

19 Apud LELONG, Guy, Op. Cit., p. 84.

torne falso. Isso faz com que os seus trabalhos passem a pertencer ao segundo tipo de artes, e com isto alterou o status das artes visuais, tal como outros artistas nos anos 60. Trabalhos baseados em conceitos e em formulações verbais, cuja realização siga as proposições e o método criados pelo artista. Ao escrever essas formulações o artista está a emancipar a obra da sua condição inicial de manifestação única. Exige no entanto da sua parte, confiança e delegação, dando a outros um importante papel na realização da peça. Quem realiza não se torna por isso o autor, tal como um maestro que conduza uma peça não se torna o seu compositor. Daniel Buren afirma que os projetos para os seus trabalhos são desde logo suficientemente definidos, para que a realização final não difira muito deles, embora existam sempre elementos que não se podem prever e que fazem bifurcar, ao último momento, outros aspetos do projeto inicial.20 O autor inverte também a relação das obras de arte com o sítio de exibição. Em vez de as sujeitar ao local de apresentação, que não sendo neutro as altera, deduz dele as caraterísticas do projeto integrando-o no próprio trabalho. O “utensílio visual” pontua a envolvente urbana, intervindo nela. A arte pode assim sair dos espaços de exibição da galeria e do museu para o espaço urbano. Este autor interessa-se por intervir na rua, no espaço urbano, porque aí qualquer coisa que o artista faça é “estranho” ao ambiente, o que não sucede no museu ou na sala de exposições.21 Apesar da preocupação visual constante no seu trabalho, ele não se reduz ao “esteticismo”. Tem um impacto crítico. A obra advém da combinação de sensações, da compreensão e do jogo com o espaço. Acompanha-o sempre com um texto para explicar como os fez, para poderem ser compreendidos sem mal-entendidos. O seu tipo de público não é o público específico e limitado das galerias e dos museus, que é uma minoria, como se tratam de trabalhos experimentais na rua e no espaço público não têm um público, portanto, têm a possibilidade de criar o seu próprio público, diz o autor.22 Esta é uma das suas ambições.

20 LELONG, Guy, «Le Musée qui N’Existait Pas, Entretien avec Daniel Buren», Les Cahiers du Musée National d’Art Moderne, Nº 80, été 2002, p. 5. 21 MADUREIRA, Eduardo Jorge, «Jornais e Artes Plásticas», Margens e Confluências, Nº 9, Jun 2005, p. 115. 22 Apud BOTELHO, Margarida, «Entrevista com Daniel Buren à Edição Especial (12-03-1980)», in 75 Artistas em Portugal, Maia, Castoliva Editora, 1989, p. 72.

A sua produção in situ é um trabalho de experimentação. Não faz quadros, utiliza sempre materiais como o tecido ou o papel que adapta a lugares muito diferentes, desde a rua ao museu. Não há lugares privilegiados. Articula o trabalho com o lugar onde se encontra e as questões que esse lugar levanta, relacionadas com o mundo real. O lugar existente é por ele alterado, não de modo direto mas pela relação entre a peça e o lugar. A sua relação com o sítio não é apenas de justaposição. A obra só existe em relação com o lugar que lhe deu origem e que ela transforma. O seu trabalho foi alvo de críticas, como a de Arthur Danto, que considerou o seu trabalho meramente “listras monótonas”23. No entanto, as suas listras não podem ser apreendidas como um objeto. Daniel Buren utiliza-as não como finalidade ou obra em si, mas enquanto assinatura, a que ele chamou o “utensílio visual”24, cujo único valor é enquanto um meio. A função do ‘utensílio visual’ é revelar, pela sua localização, as características dos lugares em que é usado. Age como um material ou um elemento neutro. As suas únicas propriedades invariáveis são a sua alternância cromática entre branco/cor e a sua largura fixa de 8,7 cm.

23 Apud LELONG, Guy, Op. Cit., p. 31. 24 Ibid., p. 37.

ANEXO IV

Olafur Eliasson

Biografia resumida, obras selecionadas e algumas considerações sobre a sua produção artística

Nasceu em 1967 em Copenhaga, filho de pais da Islândia, estudou na Academia Real Dinamarquesa de Belas Artes, em Copenhaga, de 1989 a 1995. Cedo na sua carreira mudou-se para a Alemanha, estabelecendo o Studio Olafur Eliasson em Berlim. Reconhecido internacionalmente, vive e trabalha em Copenhaga e Berlim. O Studio Olafur Eliasson é um laboratório experimental dirigido pelo artista, que funciona como um espaço interdisciplinar, gerando novos diálogos entre a arte e outras áreas à sua volta. Ali desenvolve os seus inúmeros projetos e pesquisas. As suas instalações, fotografias, esculturas e projetos arquitetónicos, provocam o pensamento e a reflexão dos espetadores sobre o ambiente que as envolve e a forma como o percecionam. O Studio trabalha diariamente. É um local de trabalho onde não se cruza vida pessoal com profissional. Fez diversas exposições individuais e coletivas, instalações para lugares públicos e privados, em instituições artísticas, galerias e museus, assim como em espaços urbanos. Apresentamos uma seleção de alguns dos muitos trabalhos que realizou, em seguida. De 1995 são as instalações Wavemachines (com motores, acrílico e água) e Suney (em que uma película de plástico transparente amarela divide o espaço da galeria de forma desigual) na Künstlerhaus, em Estugarda na Alemanha. De 1998 é a peça Ice Pavilion, na Islândia, no Reykjavik Art Museum – Kjarvalsstaöir. De 1999 o trabalho Room For All Colours (projeção de luz num espaço através de filtros de cor, segundo uma sequência), apresentado no espaço Appel, em Amesterdão na Holanda. O trabalho Your Now is My Surroundings, de 2000, foi instalado inicialmente na Bonakdar Jancou Gallery em Nova Iorque, uma câmara caleidoscópica que liga o interior da galeria ao exterior. De 2001 a instalação no Museum of Modern Art, em

Nova Iorque, de Seeing Yourself Sensing, em que cinquenta painéis em vidro e espelho cobrem a fachada do museu, refletindo e misturando o interior e o exterior. Realiza um trabalho site-specific para a Fundação NMAC em Cádiz, Espanha, Quasi Brick Wall, de 2002. Em 2002 concebe Remagine (Large Version), que esteve depois instalado no Kunstmuseum Wolfsburg, na Alemanha, em 2004. Em 2003 concebeu Tirana House – Painting Project, em que foi pintada uma fachada de um edifício residencial com um padrão de ‘quasi-tijolos’ em Tirana, na Albania. De 2003 é também o Colour Spectrum Kaleidoscope, um caleidoscópio hexagonal em que os observadores vêm a realidade refletida numa miríade de cores e facetas. Esteve instalado no pavilhão dinamarquês da 50ª Bienal de Veneza, em 2003. Ainda de 2003, The Blind Pavilion, primeiro situado no telhado do pavilhão dinamarquês da 50ª Bienal de Veneza, Itália, e mais tarde exibido no cume de uma montanha em Videy na Islândia. A instalação em aço, madeira, luz fluorescente e filtros de cor: Your Double- Lighthouse Projection foi concebida em 2002 e exibida na Tate Modern – Londres - em 2004. The Weather Project, exibido do Inverno de 2003 à Primavera de 2004 no Turbine Hall da Tate Modern em Londres, no âmbito das Unilever Series, foi um dos seus projetos que recebeu mais atenção internacional e foi visitado por mais de dois milhões de pessoas. Your Colour Memory, também data de 2004, uma estrutura elíptica iluminada com as cores primárias, que se vão sucedendo ao longo do tempo, na galeria de arte da Arcadia University, em Glenside, nos Estados Unidos. Frost Activity é um projeto de 2004, de um padrão para pavimento, que foi utilizado para o ARoS Aarhus Kunstmuseum na Dinamarca, e para o Museu de Arte Reykjavik, em Hafnarhús, na Islândia. De 2004 as duas escadas em espiral que formam um loop contínuo, instaladas de forma permanente num edifício de escritórios em Munique, na Alemanha, com o título Umschreibung (Circumscription). Entre 2004 e 2008 realiza o projeto site-specific no edifício da nova Ópera de Oslo, na Noruega: The Other Wall. De 2005 o trabalho em fotogravura The Colour Spectrum Series. A partir de 2005 desenvolve o projeto de investigação comissariado pela BMW, intitulado Your Mobile Expectations, BMW H2R Project, cuja versão final foi apresentada em 2007 no Museu de Arte Moderna de San Francisco, CA, USA. Também de 2005 é a instalação,

pertencente a uma coleção privada, Your Invisible House, uma estrutura em aço e espelhos que refletem a paisagem envolvente. Realiza, em 2006, o projeto Music Wall, em azulejos cerâmicos de vidro platinado para o interior da sala de concertos de Alsion, em Sonderborg, na Dinamarca. A partir de 2006, executa o projeto para a instalação Your Rainbow Panorama, em ARoS Aarhus Kunstmuseum, na Dinamarca, concluída em 2011. De 2006 data a sua intervenção em azulejos cerâmicos de vidro platinado, Tile For Yu-un, para a casa Yu-un em Tóquio, no Japão. Em cooperação com o arquiteto norueguês Kjetil Thorsen, realizou para a Serpentine Gallery o pavilhão temporário nos Kensington Gardens, em Londres, Reino Unido, adjacente à galeria. Uma estrutura geométrica complexa, focada no movimento dos observadores que muda ao longo do seu percurso: Serpentine Gallery Pavilion 2007. De 2008 é o projeto The New York City Waterfalls, comissionado pelo Public Art Fund, e que esteve instalado em East River, Nova Iorque, nos Estados Unidos, temporariamente de Julho a Outubro de 2008. Paralelamente o Studio Olafur Eliasson publica a revista TYT (Take Your Time), desde 2007, uma plataforma de experimentação, pesquisa e reflexão, que pretende ser um desafio ao público, encorajar a exploração e o discurso.

Os títulos práticos dos trabalhos de Olafur Eliasson, funcionam como instruções e conselhos para o espetador utilizar ou lidar com eles. São também um desafio a participar na produção de significado, aceitar mais responsabilidade, e fazer a sua contribuição pessoal para o trabalho e as suas possibilidades. Para além disso, ele acompanha sempre os seus trabalhos com textos escritos. Estes escritos não são autónomos nem são uma chave para entender o seu trabalho. Eles propõem intensificar o efeito do trabalho, estender a sua superfície, levando-o a novos campos para além do mundo da arte, tais como arquitetura, ciência e política. São um meio de manter a discussão acesa, de deixar o significado aberto à interpretação, de interligar os objetos artísticos e o discurso. Quando refletimos sobre um trabalho, a reflexão torna-se parte do objeto, a nossa perceção muda-o e é modificada por ele. Estes textos não pretendem mostrar significados, mas que o público adicione novos significados pessoais. No Studio trabalha uma equipa de aproximadamente 30 pessoas, entre os quais assistentes, artistas, arquitetos e técnicos. Juntos investigam e experimentam como

num laboratório. Em simultâneo decorrem no Studio várias pesquisas independentes de ideias, séries de experiências e testes, esboços de modelos, produção de séries de desenhos e de variações, alguns dos quais farão parte de projetos a realizar. Olafur Eliasson é um artista experimental. Não trabalha como criador independente que controla todas as fases do projeto, mas em equipa, numa dinâmica de experimentação. A sua produção artística adaptou-se ao mundo de economia globalizada, em mudança constante, com novos mercados para a arte e grande necessidade de novas obras, projetos e exibições. Dá resposta a um crescente pedido para trabalhos comissionados para museus, coleções, e no campo da arquitetura. O “mundo da arte” expandiu-se e já não se refere a uma comunidade de artistas, colecionadores, curadores e críticos. É cada vez mais extenso. Teve de haver uma profissionalização do artista e diferentes modos de produção. Para o trabalho no Studio contribuem filósofos, sociólogos, historiadores de arte, arquitetos, curadores, patronos das artes, clientes, colecionadores, diretores de museus, galeristas e outros, numa rede de inter-relações. Também coopera com industriais, cientistas e empresários. Estes profissionais interessam-se pelo seu trabalho, porque este tem muitos pontos de contacto com a ciência e a tecnologia, e tem o potencial de criar sistemas complexos e de os apresentar de forma visual, percetível, tangível. A arte tem hoje a capacidade de articular as coisas que nos cercam, para nos ligar ao nosso ambiente em constante mudança. Segundo Olafur Eliasson e a sua assistente Anna Engberg-Pedersen a arte é uma linguagem que não pretende comunicar nada objetivamente em si, nem um sentido unívoco, mas que pode dar significado e proporcionar novas formas de ver o mundo e as coisas. Ao utilizar o espaço e os seus utilizadores como questões centrais, pode facilmente comprometer-se com a arquitetura, a ciência e o design, para levantar questões sociais, políticas, ecológicas, estéticas e éticas – qualquer área da realidade é um potencial colaborador e oferece terreno a ser explorado. A multiplicidade de áreas que interliga é o que torna a arte tão complexa e excitante.25 A arte tem uma natureza dialógica oposta à do entretenimento comercial, como o cinema e os media. Permite que o observador se veja como um produtor do fenómeno, um projetor de significado. O utilizador tem uma atitude proactiva, em vez de inativa

25 ELIASSON, Olafur; ENGBERG-PEDERSEN, Anna, in ELISASSON, Olafur, Op. Cit., p. 6.

que é a atitude de um consumidor. É um participante performativo, não um recipiente passivo. Esta performatividade partilhada é uma ideia central na teoria de arte dos dias de hoje, embora esteja pouco explorada de fato pelas instituições e pelo sistema artístico, em que o conceito predominante continua a ser as pessoas receberem, não darem. Os projetos de Olafur Eliasson relacionam-se com a nossa experiência dos espaços, coletiva e individual. Têm a ver com o modo como o nosso compromisso pessoal modifica as dimensões espaciais e o nosso entendimento das esferas públicas de que fazemos parte. As suas instalações encorajam a nossa exploração do espaço, seja o espaço da galeria ou do museu, o espaço urbano ou o espaço aberto da paisagem. Desconstrói as nossas construções aparentemente naturais, demonstrando como a nossa relação com o espaço e o tempo é incerta, condicionada culturalmente. Procura consciencializar-nos da nossa orientação espacial e orientação temporal, noções que no mundo globalizado de hoje muitas vezes esquecemos, com o desaparecimento das fronteiras físicas e com a supressão da memória histórica como se só o dia de hoje existisse. Os seus trabalhos relacionam o local e o tempo específico, com o global e o genérico. Servem de catalisadores, ligando diferentes esferas. O autor interessa-se pelo passado, pela história, pelo futuro, pelas nossas expetativas e lembranças. Permite-nos explorar e compreender esta perceção do tempo e situar-nos nela. As suas obras não adquirem significado por se referirem à arte de outros períodos. Aproximam-se destas questões de formas sempre novas e diferentes. Olafur Eliasson está mais interessado nas perguntas que nas respostas. Pretende tornar o significado da sua arte menos definida, em vez de mais clara. O seu trabalho é um processo que permanece constantemente aberto e que pode ser desenvolvido em qualquer direção. Cria sínteses de diferentes pontos de vista e atitudes, sem os sujeitar a uma perspetiva utópica e única do criador. Esforça-se por transmitir, tocar ou chegar a toda a gente envolvida, ao coletivo, ao conjunto. Por isso, todos nos sentimos parte das suas imagens ou construções, formam parte do nosso imaginário cultural, são obras de assentimento. Prestam-se a diversas interpretações, fazem-nos sentir que coprodutores dos trabalhos, envolvem-nos livremente na criação de significado. Pretende proporcionar o tipo de conhecimento gerado pela experiência empírica e subjetiva. Cria experiências sensoriais em que utiliza os elementos naturais – luz,

água, cor, ar - para questionar a perceção que o espetador tem dos fenómenos. Questiona como o indivíduo perceciona e integra a natureza, o espaço e os objetos, e como se vê a si próprio a percecionar, nessa atividade de descoberta. Por meio de evocações explicita a relação entre sujeito e objeto, mostra como são indissociáveis e se afetam mutuamente, e põe em causa o jogo de expetativas subjacente a essa relação. Por vezes, nas suas obras mostra explicitamente a relação de ilusão e desilusão, tornando a deceção óbvia. Contesta a ideia de visão objetiva que predomina hoje. A nossa experiência e as nossas noções de cor, luz e escuridão, não são apenas uma questão biológica, dependem de como a nossa visão foi cultivada. Os objetos mudam constantemente, numa negociação do objeto com a sua envolvente e connosco. O observador torna-se co-constitutivo. Explora diversas questões e temas ligados com a nossa perceção. Um dos seus pontos de interesse é a cor. Fez diversas investigações sobre como o olho funciona e como se pode usar a cor para explorar as diferenças no que nós vemos. Uma cor está dependente da existência das outras cores para se tornar compreensível para nós, assim como da luz e do ambiente em que o objeto se encontra. Interessa-se também pelo movimento que faz com que os objetos mudem de aparência, e se tornem relativos à nossa posição. Assim como pela vibração, ligada à energia, à expansão e à contração do espaço. O movimento e a energia são utilizados nas suas instalações complexas porque são formas de nos possibilitar questionar e avaliar o mundo. Por isso são conceitos essenciais no seu trabalho. Muitas vezes os seus trabalhos têm um impacto imediato nos observadores pela sua beleza, cativando-os e fazendo-os sentir bem por estarem envolvidos. Uma obra de arte pode ser bela ou sedutora, porque a racionalidade e a beleza não se excluem mutuamente. O conceito de beleza para Olafur Eliasson é relativo, negociável, tem a ver com a experiência individual, e com o compromisso com a obra de arte.26

26 Ibid., p. 75.

ANEXO V

Série de registos fotográficos de experimentação e pesquisa visual para o projeto de intervenção plástica na Estação de Agualva-Cacém

Figs. 1 a 72 (Anexo V) - Séries de registos fotográficos de experimentação e pesquisa visual para o projeto de intervenção plástica na Estação de Agualva-Cacém; realizados entre 2010 e 2011.

ANEXO VI

Registos fotográficos da Estação de Agualva-Cacém em fase de construção

Fig. 1 (Anexo VI) – Arranjo urbanístico na Rua Afonso de Albuquerque e na Praça da Estação, fotografia tirada a 23.09.2010.

Fig. 2 (Anexo VI) – Construção da Estação de Agualva-Cacém e arranjo urbanístico na Rua Afonso de Albuquerque, junto à Passagem dos Bons Amigos, fotografia tirada a 23.09.2010.

Fig. 3 (Anexo VI) – Avenida Elias Garcia, fotografia tirada a 23.09.2010.

Fig. 4 (Anexo VI) – Passagem dos Bons Amigos, fotografia tirada a 23.09.2010.

Fig. 5 (Anexo VI) – Construção da Estação de Agualva-Cacém, fachada principal, fotografia tirada a 30.09.2010.

Fig. 6 (Anexo VI) - Construção do parque de estacionamento de apoio à Estação de Agualva-Cacém, fotografia tirada a 30.09.2010.

Fig. 7 (Anexo VI) – Arranjo urbanístico da Praça da Estação, fotografia tirada a 23.09.2010.

ANEXO VII

Planta e Alçados da Estação de Agualva-Cacém

Fig. 1 (Anexo VII) – Alçados e Planta da Estação de Agualva-Cacém com a localização das zonas de intervenção plástica, 2011.

ANEXO VIII

Estudos de composição e de cor

Fig.1 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Figs. 2 e 3 (Anexo VIII) - Pesquisa cromática para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, 2011.

Fig. 4 (Anexo VIII) - Experiência cromática realizada para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, em 2011.

Fig. 5 (Anexo VIII) - Hipótese compositiva realizada para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, em 2011.

Fig. 6 (Anexo VIII) - Hipótese compositiva realizada para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, em 2011.

Fig. 7 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 8 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 9 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 10 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 11 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 12 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 13 (Anexo VIII) - Estudos de cor e composição para os painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2011.

Fig. 14 (Anexo VIII) - Experiência compositiva realizada para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, em 2011.

Fig. 15 (Anexo VIII) - Experiência compositiva realizada para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, em 2011.

Fig. 16 (Anexo VIII) - Experiências para a composição dos painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizadas em 2011.

Fig. 17 (Anexo VIII) - Pesquisa para a composição dos painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizada em 2011.

Fig. 18 (Anexo VIII) - Pesquisa para a composição dos painéis da Estação de Agualva-Cacém, realizada em 2011.

ANEXO IX

Grelha de base em Auto CAD à escala 1:20 realizada para desenho do projeto da Estação de Agualva-Cacém

Fig. 1 (Anexo IX) – Grelha de base para o painel 1 (e.g.), 2011.

ANEXO X

Esquemas rigorosos de composição com as sequências matemáticas e geométricas precisas utilizadas, definidas através de números, letras e espaçamentos, que correspondem às cores quentes, frias e ao branco respetivamente

Nota: A série de números de 1 a 8 equivale à escala de tons a partir do amarelo até ao vermelho; a sucessão de letras desde o ‘a’ até ao ‘h’ representa a gradação do azul escuro ao verde escuro e os espaçamentos correspondem aos azulejos brancos.

Fig. 1 (Anexo X) - Esquema rigoroso da composição do painel 1, definido pelas sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizado em 2011.

Fig. 2 (Anexo X) - Esquema rigoroso da composição do painel 3, definido pelas sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizado em 2011.

Figs. 3 a 5 (Anexo X) - Esquemas rigorosos da composição dos painéis 2, 4 e 5, respetivamente, com as sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizados em 2011.

Figs. 6 a 9 (Anexo X) - Esquemas rigorosos da composição dos painéis 6, 7, 8 e 9, respetivamente, com as sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizados em 2011.

Figs. 10 a 13 (Anexo X) - Esquemas rigorosos da composição dos painéis 10, 11, 12 e 13, respetivamente, com as sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizados em 2011.

Figs. 14 a 17 (Anexo X) - Esquemas rigorosos da composição dos painéis 14, 15, 16 e 17, respetivamente, com as sequências matemáticas e geométricas utilizadas, realizados em 2011.

ANEXO XI

Projeto final da intervenção plástica na Estação de Agualva-Cacém, realizado entre 2011 e 2012. Painéis 1 a 17.

Fig. 1 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 1.

Fig. 2 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 2.

Fig. 3 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 3. .

Fig. 4 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 4.

Fig. 5 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 5.

Fig. 6 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 6.

Fig. 7 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 7.

Fig. 8 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 8.

Fig. 9 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 9.

Fig. 10 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 10.

Fig. 11 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 11.

Fig. 12 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 12.

Fig. 13 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 13.

Fig. 14 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 14.

Fig. 15 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 15.

Fig. 16 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 16.

Fig. 17 (Anexo XI) – Projeto final para o painel 17.

ANEXO XII

Estudos para os motivos figurativos dos painéis das fachadas exteriores da Estação de Agualva-Cacém

Figs. 1 a 3 (Anexo XII) - Estudos para os motivos figurativos do painel 6, realizados em 2011 (e.g.).

Figs. 4 a 6 (Anexo XII) - Estudos para os motivos figurativos do painel 7, realizados em 2011 (e.g.).

ANEXO XIII

Estudos para os caracteres a inscrever nos painéis 1, 2, 3 e 4 das fachadas exteriores da Estação de Agualva-Cacém

Fig. 1 (Anexo XIII) – Estudo do símbolo da REFER para os painéis 1 e 3 realizado em 2012 (e.g.).

Figs. 2 e 3 (Anexo XIII) – Estudo dos carateres para as palavras “Agualva” e “Cacém” dos painéis 2 e 4, feitos em 2012 (e.g.).

ANEXO XIV

Tabela com as contagens e identificação dos azulejos por painel. Amostras dos azulejos para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 1 (Anexo XIV) - Tabela com as contagens de todos os azulejos utilizados, identificados e separados por painel, realizada em 2011. Fig. 2 (Anexo XIV) - Amostras dos azulejos utilizados para a intervenção na Estação de Agualva-Cacém, realizadas na Fábrica Viúva Lamego em 2011.

ANEXO XV

Produção dos Azulejos na Fábrica Viúva Lamego:

Figs. 1 e 2 (Anexo XV) – Execução dos picotados e decalque dos desenhos sobre os azulejos.

Figs. 3 e 4 (Anexo XV) - Ampliações em papel vegetal, para passar o desenho para os azulejo branco crus para serem pintados.

Figs. 5 e 6 (Anexo XV) – Desenhos já decalcados sobre o azulejo e início da pintura.

Figs. 7 e 8 (Anexo XV) – Pintura dos azulejos em taipal.

Figs. 9 e 10 (Anexo XV) – Pintura dos azulejos sobre mesas.

Figs. 11 e 12 (Anexo XV) – Montagem no chão para confirmação do resultado final.

Figs. 13 e 14 (Anexo XV) – Cozedura dos azulejos e resultados em termos de cor e brilho.

Figs. 15 e 16 (Anexo XV) – Correções de azulejos com falhas e resultados depois da segunda cozedura, respetivamente.

Figs. 17 e 18 (Anexo XV) – Marcações dos azulejos na parte de trás por linhas e filas para a montagem, e azulejos já embalados nas caixas para transporte e separados por painel e fila, respetivamente.

ANEXO XVI

Memória explicativa para a montagem dos painéis na Estação de Agualva-Cacém, realizada em 2012.

Fig. 1 (Anexo XVI) - Memória explicativa constante do caderno de montagem dos painéis na Estação de Agualva-Cacém, realizada em 2012.

ANEXO XVII

Desenhos explicativos de todos os painéis da Estação de Agualva-Cacém que constavam do Caderno de Montagem, realizado em 2012.

Fig. 1 (Anexo XVII) - Desenho explicativo para a montagem do painel 1 da Estação de Agualva-Cacém, realizado em 2012.

Figs. 2 a 4 (Anexo XVII) - Desenhos explicativos para a montagem dos painéis 2, 3 e 4.

Fig. 5 (Anexo XVII) - Desenho explicativo para a montagem do painel 5 da Estação de Agualva-Cacém, realizado em 2012.

Figs. 6 a 8 (Anexo XVII) - Desenhos explicativos para a montagem dos painéis 6, 7 e 8.

Fig. 9 (Anexo XVII) - Desenho explicativo para a montagem do painel 9 da Estação de Agualva-Cacém, realizado em 2012.

Figs. 10 a 13 (Anexo XVII) - Desenhos explicativos para a montagem dos painéis 10, 11, 12 e 13 da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2012.

Figs. 14 a 17 (Anexo XVII) - Desenhos explicativos para a montagem dos painéis 14, 15, 16 e 17 da Estação de Agualva-Cacém, realizados em 2012.

ANEXO XVIII

Fotografias da colocação dos azulejos na Estação de Agualva-Cacém, de Julho a Setembro de 2012.

Figs. 1 a 9 (Anexo XVIII) – Colocação dos azulejos na Estação de Agualva-Cacém, de Julho a Setembro de 2012. ANEXO XIX

Imagens da Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém já concluída

Fig. 1 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 2 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 3 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 4 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 5 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 6 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 7 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 8 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 9 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 10 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 11 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 12 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 13 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.

Fig. 14 (Anexo XIX) - Intervenção Plástica na Estação de Agualva-Cacém.