CAMPUS JOSÉ SANTILLI SOBRINHO Coordenadoria de Jornalismo

Conceição Aparecida Rubira Danelon

ADAPTAÇÃO DO ROMANCE MEMÓRIAS DE UM GIGOLÔ, DE MARCOS REY, PARA UMA MINISSÉRIE DA REDE GLOBO

Novembro/2009 ASSIS

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CAMPUS JOSÉ SANTILLI SOBRINHO Coordenadoria de Jornalismo

ADAPTAÇÃO DO ROMANCE MEMÓRIAS DE UM GIGOLÔ, DE MARCOS REY, PARA UMA MINISSÉRIE DA REDE GLOBO

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado ao Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis (IMESA), como requisito parcial para aprovação no curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo.

Aluna: Conceição Aparecida Rubira Danelon Orientadora: Professora Mestra Eliane Aparecida Galvão Ribeiro Ferreira.

Novembro/2009 ASSIS

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FICHA CATALOGRÁFICA DANELON, Conceição Aparecida Rubira Adaptação do romance Memórias de um Gigolô, de Marcos Rey, para uma minissérie da Rede Globo / Conceição Aparecida Rubira Danelon. Fundação Educacional do Município de Assis – Fema : Assis, 2009 133p.

Trabalho de Conclusão de Curso ( TCC ) – Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo – Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis

1.Literatura. 2. Televisão. 3. Marcos Rey

CDD: 070 Biblioteca da FEMA

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Agradecimentos

Antes que qualquer palavra me venha à mente, agradeço ao Universo, comandado por Deus, que conspirou a meu favor quando me colocou nesta Faculdade. Sinto-me agora em condições de agradecer à minha orientadora Eliane Galvão, uma mulher sem igual, digna de toda sabedoria que lhe é peculiar. Sou, agora, um ser humano melhor e não somente uma criatura pensante por exclusiva responsabilidade sua. Aos demais professores, quero que saibam que nutro por eles um sentimento de gratidão que permanecerá por toda minha vida. Foram quatro anos extremamente especiais, em que me ensinaram mais que teorias, ensinaram-me a viver melhor. Por último, mas nem por isso, com menos importância, quero agradecer a cada um dos meus colegas de classe, fizeram minhas noites ficarem assim, com cheiro de livro novo. Em especial, agradeço a um trio de amigas que me fizeram rir muito dentro e fora da sala de aula, a Aline, a Denise e a Gleicy. Ensinaram-me que a alegria é umas das coisas mais importantes do mundo e que o riso cura muitas dores.

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Dedicatória

Aos três homens da minha vida: Valcir, meu querido e amado marido e Vitor Hugo e Miguel, meus dois doces filhos.

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. Comissão Avaliadora

Eliane Ap. Galvão Ribeiro Ferreira (Orientadora): ______

Elizete Mello da Silva (Banca): ______

Maria Lídia de Maio Bignotto (Banca): ______

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Resumo

O presente Trabalho de Conclusão de Curso tem por objetivo proporcionar uma reflexão acerca da adaptação do romance Memórias de um Gigolô, de Marcos Rey, para uma minissérie da Rede Globo. Pretendeu-se na análise da adaptação do romance, para a televisão, observar se esta se configurou como apenas mais uma produção massiva e alienante que impede seu receptor de exercer sua capacidade de reflexão crítica ou se o produto final conseguiu agregar valores à produção, resultando em um trabalho dotado de qualidades artísticas e validades estéticas.

Palavras-chave: literatura, televisão, Marcos Rey.

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Abstract

This work completion of course aims to provide a reflection on the adaptation of the novel Memoirs of a Gigolo, from Marcos Rey, a miniseries for the network Globo.

Sought in the analysis of adaptation of the novel, for television, see if it is configured as just another mass production and its receptor that prevents a seller from exercising their capacity for critical thinking or the final product successfully add value to the production, resulting in a work endowed with artistic qualities and aesthetic validity.

Keywords: literature, television, Marcos Rey.

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Sumário

Introdução ...... 12 Capítulo I – A Literatura em suas origens ...... 17 1.1 Brasil x Portugal ...... 17 1.2 O surgimento do Romance...... 19 2. O surgimento da comunicação para as massas ...... 20 2.1 Fases do Folhetim ...... 22 2.2 O Folhetim e a Literatura ...... 24 2.3 Jornalismo e Literatura ...... 26 2.4 Indústria Cultural ...... 27 2.5 Síntese do Romance ...... 35 2.6 Análise dos elementos...... 40 2.7 O autor Marcos Rey ...... 43 Capítulo II – A Origem ...... 49 2.1 História da Televisão ...... 49 2.2 Rede Globo ...... 58 2.3 Adaptações para Televisão ...... 62 Capítulo III – A Minissérie Memórias de um Gigolô ...... 67 3.1 Ficha Técnica ...... 67 3.2 Elenco ...... 67 3.3 Sinopse ...... 68 3.4 A estrutura da minissérie Memórias de um Gigolô ...... 69 3.5 Análise dos Fotogramas ...... 70 3.6 Quadro de semelhanças e diferenças entre o romance e a minissérie ...... 125 Considerações Finais ...... 127 Conclusão ...... 128 Referências Bibliográficas ...... 130 Referências Eletrônicas ...... 133

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Lista de Figuras

Figura 1: Literatura ...... 16 Figura 2: Folhetim...... 22 Figura 3: Capa do livro, Memórias de um Gigolô ...... 34 Figura 4: Marcos Rey...... 42 Figura 5: A televisão em questão ...... 48 Figura 6: Rede Globo ...... 57 Figura 7: Memórias de um Gigolô ...... 66 Figura 8: Cena da minissérie Memórias de um Gigolô...... 66

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Não sou ingrato, todavia, nem mesmo mau sujeito. Fui apenas um tipo ávido de novidades, capaz de mover-se com certa bossa e ritmo numa situação difícil. E que grande capacidade de improviso! Tive de sobra essa virtude nacional, útil à sobrevivência de milhões e milhões de brasileiros. (Memórias de um Gigolô,1986,p.5)

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Introdução

O tema deste trabalho foi escolhido como continuação das pesquisas desenvolvidas no Projeto de Iniciação Científica, em que analisamos a obra de Marcos Rey, enquanto autor de livros voltados para a literatura infanto-juvenil. Neste trabalho de conclusão de curso, procuramos analisar a adaptação de uma obra literária desse escritor, destinada ao público adulto, denominada Memórias de um Gigolô, para a televisão. Este texto justifica-se, tendo em vista que, como futura jornalista, o seu tema é fonte de interesse para a compreensão da realidade social. Conforme Marcos Rey, definindo a si mesmo:

Sempre vivi de escrever. Jornalista, redator de rádio, autor de programas e novelas para a tevê, criador de campanhas publicitárias e roteirista de filmes – enquanto publicava livros. Mas somente ao me aproximar dos 60 anos, consegui, enfim, viver de literatura num país em que se lê tão pouco. (REY, O último mamífero do Martinelli, 1993, p.3).

O escritor nasceu em São Paulo, em 1925, durante sua vida foi também jornalista, redator publicitário, roteirista de rádio, cinema e televisão, e teatrólogo. Conforme Sílvia Borelli:

A trajetória de Marcos Rey como produtor cultural permite a reflexão sobre algumas questões mais gerais que envolvem produção, produtores e produtos culturais em sociedades como a brasileira, em que o processo de modernização está diretamente vinculado à consolidação do mercado de bens simbólicos e à expressão da indústria cultural. O que marca, o que define Marcos Rey é a pluralidade de atividades desenvolvidas (BORELLI, 1996, p.123).

Considerando essas informações, cabe, no entanto, uma reflexão acerca da produção do autor, Marcos Rey, que, com uma intensa mobilidade em atividades como jornais, rádios, canais de televisão e nos campos da Publicidade e Propaganda, era considerado pouco popular para os padrões exigidos. Nos meios intelectuais, era criticado por escrever histórias populares, em contrapartida, era recusado nos meios de comunicação de massa por pertencer a meios culturais, por produzir literatura.

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Essa situação contraditória aguça, ainda mais, seu estilo polivalente, sua grande característica. Segundo Borelli:

A situação aparentemente contraditória e paradoxal revela que o estilo polivalente, característico da identidade de Marcos Rey nem sempre combina com o modelo de funcionamento administrado das empresas culturais. Não combina também com o projeto cultural mais à esquerda, de certa parcela de intelectuais brasileiros, em um momento em que se concebe cultura em oposição à cultura de massa, e cultura como manifestação engajada a projetos políticos de transformação da sociedade. (BORELLI, 1996, p.126)

Pela paradoxal situação de produção de Marcos Rey, justifica-se o interesse pela obra Memórias de um Gigolô, adaptada para o cinema em 1970 e, também, transposta para a TV, na Globo, em 1986, sob a forma de minissérie. Pela história da produção para TV no Brasil, pode-se observar que o primeiro filme brasileiro, originado a partir de um romance, foi O Guarani, de 1908. Essa produção apesar de não representar uma adaptação propriamente dita, antes apenas uma filmagem de uma pantomina circense, foi inspirada na obra de José de Alencar (REIMÃO, 2007, p. 115). As adaptações de obras literárias para o meio audiovisual são caracterizadas por “basear-se em”, “inspirar-se em” e “a partir de”. O fato é que sempre, desde as primeiras adaptações, percebe-se o quanto são relevantes. A partir da determinação do objeto de estudo, a obra de Marcos Rey, Memórias de um Gigolô, construímos a hipótese de que sua produção narrativa não só visava ao mercado como também possuía qualidades literárias que permanecem na adaptação para a minissérie da TV Globo. Nesta perspectiva, partimos do pressuposto de que a obra em estudo, embora tenha sido produzida como resultado da profissionalização do escritor, detém qualidades que merecem ser estudadas. Por meio de pesquisas bibliográficas e pesquisas de opinião, procuramos diagnosticar como os leitores e estudiosos de literatura veem o autor Marcos Rey, se ele é considerado um autor com produção significativa ou apenas um produtor cultural voltado para a produção sob encomenda e se sua obra foi adaptada de maneira que a minissérie possuísse virtude estética.

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Para a consecução do objetivo, analisamos a obra Memórias de um Gigolô. Procuramos, por meio da interpretação da obra adaptada para a televisão, detectar como ocorreu o processo de transposição da narrativa para um meio visual, a TV. A análise da produção de Marcos Rey, bem como a reflexão a partir da adaptação de sua obra para o meio audiovisual atende às necessidades de desenvolvimento de estudos sobre produção cultural, exigidos pelos cursos de Comunicação Social. Sabendo que o formato minissérie exige do adaptador a facilidade de criar episódios que não estão presentes na obra original, portanto, trata-se de projetos ousados dentro da produção televisiva, pois envolve um grande investimento (NAGAMINI, 2004, p.202). A partir de leituras teóricas, analisamos a referida obra tanto em sua construção estrutural fictícia, quanto em sua estrutura televisiva. Para tanto, utilizamos textos específicos da área de teoria da literatura e da área de Jornalismo. Para a consecução de seus objetivos, este trabalho estrutura-se em três capítulos. No primeiro, apresentamos o surgimento do romance, a origem do folhetim e a síntese do romance Memórias de um Gigolô, seguida pela análise bem como a biografia e a vida de Marcos Rey. No segundo, tratamos da história da televisão, da Rede Globo, e refletimos sobre a indústria cultural e adaptação para a TV. No terceiro, apresentamos a análise, por meio de fotogramas, da minissérie. Enfim, todos os capítulos se completam e constituem um todo que culmina na conclusão. As referências bibliográficas dispostas ao final do trabalho evitam as recorrências contínuas às notas de rodapé.

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Capítulo I

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Literatura

Figura 1: (Fonte:<:http://1.bp.blogspot.com/_Kog23raHRNE/SXk09ho_M6I/AAAAAAAAAAs/DeV_YaejNQM/s4 00/LITERATURA.jpg,>, 2009)

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Capítulo I - A literatura em suas origens

1.1 Brasil X Portugal

Durante a década de 1960, houve uma nova formulação do conceito de que a literatura deveria atender a uma função da linguagem: a função poética, e propuseram o estudo de marcas linguísticas, que deviam caracterizar a língua literária, pois explicariam como a literatura se “desvia” da norma. Para Sodré,

É com o folhetim, realmente, que o romance, entre nós, ganha grupos numerosos de leitores e define, pela aceitação, a presença de uma atividade literária ainda balbuciante que, antes disso, não conseguira afirmar-se muito menos definir-se (SODRÉ, 1964, p.322).

A partir da Revolução Industrial e, com ela, a ascensão da burguesia, amplia-se o público leitor. Para atender aos leitores que se formavam na época, as tiragens dos jornais multiplicaram-se com a invenção do linotipo, em 1880, pelo alemão Mergenthaler. A rapidez e maior conteúdo nas publicações, com a substituição dos tipos móveis por linha inteiras na composição gráfica, fez com que as publicações se tornassem até diárias. A antiga tipografia, que consistia na composição de linhas fundidas em chumbo, desenvolvida por Gutenberg, moderniza-se com a invenção do linotipo, facilitando a vida dos profissionais da área. Quase na mesma época do linotipo, surgiu a rotativa, uma máquina impressora que imprimia com bobina de papel ao invés de folhas soltas,. Com o sistema, a velocidade de produção aumentou ainda mais, pois permitia imprimir 15 mil exemplares por hora de um jornal de quatro páginas e já saía dobrado. Ao contrário do antigo sistema que permitia imprimir no máximo mil folhas por hora e que precisava voltar à máquina para que o verso fosse impresso. Somente os jornais eram dobrados manualmente. Nos séculos anteriores, a produção de impressos em larga escala era impedida por ainda conter um método muito rudimentar e também pela falta de tecnologia. Como destaca

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Laurence Hallewell (1985 p.5), no Brasil, além desse problema, enfrentava-se ainda a forte censura empregada pelos países detentores do poder, como por exemplo, nossa antiga metrópole: Portugal. Durante grande parte do período em que o Brasil foi colônia dos portugueses, a produção tipográfica em nossas terras praticamente inexistiu porque a administração era tão rudimentar e a população tão pequena e espalhada por uma área vasta, que a indústria impressora não era necessária e nem economicamente viável. A tecnologia não era permitida, por isso a produção de impressos em larga escala no Brasil era censurada e só praticada pelos países detentores do poder, como Portugal, nossa antiga metrópole. Enquanto o Brasil foi colônia dos portugueses, a produção tipográfica era quase inexistente, pois a administração do país era tão rudimentar e o número da população tão baixo que não era viável economicamente ter uma indústria impressora. A introdução da tipografia no Brasil se deu primeiro com os holandeses, entre os anos de 1630 e 1655, quando ocuparam o nordeste brasileiro. Recife foi a primeira cidade brasileira a ter uma impressora, mas Portugal interrompeu as atividades de impressão quando descobriu que todas as produções eram destinadas ao clero. O governo de Portugal, além de impedir o uso de impressoras no Brasil, proibia a entrada de livros no país. Assim, a única maneira de conseguir livros na colônia era através do contrabando. O Rio de Janeiro manteve-se com apenas duas livrarias durante o período colonial. Com a vinda da Família Real Portuguesa e dos seus assessores ao Brasil, a situação mudou, pois trouxeram com eles a impressão com tipos móveis, mesmo que a contragosto. Nessa época, todos os trabalhos produzidos pela Imprensa Régia (Imprensa Real) referiam-se a questões militares ou a despachos do governo.

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1.2 O surgimento do romance

Que é, pois, tal linguagem, que nada diz, jamais se cala e a que se chama „literatura‟? (FOUCAULT,1966, p.399)

Segundo Verena Alberti (1988), o surgimento do romance está estreitamente vinculado ao contexto de consolidação da burguesia. Por não ter ao certo formação genérica literária, é sabido que o romance teve início com Defoe, Richardson e Fielding. Justamente, por isso, essas obras não foram consideradas como pertencentes a uma escola literária. Conforme Ian Watt:

É verdade que Richardson e Fielding se consideravam criadores de uma nova forma literária e viam em sua obra uma ruptura com a ficção antiga. (WATT, 1990, p.12)

Contudo, nem eles e nem seus contemporâneos consagraram o termo. O gênero “Romance” teve sua caracterização somente no final do século XVIII. Para Ian Watt (1990, p.19), o conceito de popularidade realista na literatura é algo geral demais para que se possa demonstrá-lo concretamente, tendo que estabelecer uma relação entre a particularidade realista e alguns dos aspectos da técnica narrativa. O romance, gradualmente, foi sendo publicado na Europa, no século XVII, e no Brasil, no século XVIII, em dois ou mais volumes pequenos, vendidos encadernados ou em folhas soltas. Portanto, apesar de módico, em comparação com obras maiores, o preço do romance só estava ao alcance dos abastados, por exemplo, um livro custava mais do que um camponês ganhava em média por semana. No século XIX, o romance estava mais próximo da capacidade aquisitiva dos novos leitores da classe média, do que de outras formas estritamente de literatura erudita estabelecida e respeitável, porém não era um gênero popular. As pessoas mais pobres não constituíam o público-alvo dos romancistas, pois eles não tinham em mente uma forma de publicação voltada para as massas. A rápida expansão da leitura dos romances começou em Londres, em 1740, com a primeira biblioteca circulante.

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O romance constituía a principal atração e, sem dúvida, foi o gênero que mais contribuiu para ampliar o público leitor de ficção ao longo do século. Foi também a forma literária que suscitou o maior volume de comentários contemporâneos sobre a extensão da leitura às classes inferiores. Dizia-se que essas “lojinhas de literatura” corrompiam a mente dos lavradores. Para Edgar Morin:

A partir do século XVIII, o imaginário popular se fixa na tipografia na forma de romances populares de venda ambulante nos quais se encontram contos de fadas, lendas narrações maravilhosas do folclore e nos quais se introduzem temas que beiram o fantástico. Nesse imaginário popular, o extraordinário é mais alimentado que o ordinário. (MORIN, 1977, p.59).

Portanto, é extremamente relevante considerarmos a importância do surgimento do romance na história da literatura.

2. O surgimento da comunicação para as massas

Para Marlyse Meyer,

Brotou assim, de puras necessidades jornalísticas, uma nova forma de ficção, um gênero novo de romance: o indigitado, nefando, perigoso, muito amado, indispensável folhetim folhetinesco de Eugène Sue, etc. (MEYER, 1996, p.59).

O romance-folhetim surgiu na França, na década de 1830, por Émile de Girardim – feuilleton-roman –, tornando as leituras mais acessíveis à grande massa e democratizando-as nos jornais. “Inventado pelo jornal e para o jornal”, segundo Meyer, o romance folhetim era publicado nos rodapés dos periódicos como nova forma de entretenimento. A autora explica:

De início, ou seja, começo do século XIX, le feuilleton designa um lugar preciso do jornal: o rez-dechaussé – rés-do chão, rodapé -, um espaço vazio destinado ao entretenimento. E pode-se já antecipar, dizendo que tudo o que haverá de constituir matéria ao modo da crônica à brasileira já é, desde a

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origem, a vocação primeira desse espaço geográfico do jornal, deliberadamente frívolo, oferecido como chamariz aos leitores afugentados pela modorra cinza a que obrigava a forte censura napoleônica (Se eu soltasse as rédeas à imprensa, não ficaria três meses no poder), explica Bonaparte ao célebre Fouché, seu chefe de polícia. (MEYER, 1996, p.57).

Nesse espaço do jornal, encontravam-se várias modalidades de diversão como piadas, receitas de cozinha, matérias sobre crimes, críticas, comentários sobre peças teatrais. O rodapé dos jornais era um espaço utilizado para treino de narrativas e também de histórias e publicações em série. A grande popularidade do romance-folhetim ocorreu na Inglaterra e, mais tarde, com os franceses: Balzac, Dumas pai, Alphonse Karr, Paul de Kock, Soulié e Eugène Sue, que expandiram a ficção pela França e, consequentemente, pelo restante do mundo. Por volta de 1827, a expansão do romance começou na França quando os jornais passaram a depender exclusivamente de rendas publicitárias e, para aumentar o número de leitores, surgiu o romance em série. A primeira a introduzir a ideia foi a Revieu De Paris, no final da década de 1820, contudo, a prática só se generalizou por volta de 1836. Essa fórmula folhetinesca também foi incorporada por jornais conservadores, o Journal dès Dèbats é um exemplo, pois publicou a obra Os mistérios de Paris, de Eugène Sue, entre os períodos de 19 de junho de 1842 a 15 de outubro de 1843. O folhetim inovou ao permitir que as classes populares se vissem representadas como protagonistas da história e também as cartas dos leitores que, a partir delas, começaram a produzir mudanças na história com o uso da interatividade do romance folhetim.

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Figura 2: (Fonte:In:http://www.sergioaraujo.com/apres/folhetim2.jpg>, 2009)

2.1 Fases do Folhetim

A constituição do romance-folhetim ocorreu em três fases, de acordo com Marlyse Meyer (1996):  de 1836 a 1850 – Folhetim romântico ou democrático, seus representantes mais importantes eram: Eugène Sue e Alexandre Dumas, e as principais obras

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dessa fase foram: Mistérios de Paris, de Eugène Sue e O conde de Monte Cristo de Alexandre Dumas. Sue representou uma vertente realista do folhetim e Dumas inaugurou a vertente histórica e aventureira.  de 1851 a 1871 – Em homenagem a Rocambole, um herói que nasceu em 1857 e só morreria 14 anos depois, houve a fase rocambolesca. Essa produção não visava emocionar, nem pretendia tranqüilidade, constituiu um tipo definitivamente caracterizado. O romance de Gustave Flaubert, Madame Borary, foi adaptado pelo editor para ser publicado na Révue de Paris. O autor fez da personagem principal do seu livro, Emma Bovary, uma ávida leitora de folhetins e romances água com açúcar.  de 1871 a 1914 – Época de folhetins dramáticos e emocionais, lembrando os dramas da vida quer envolvem amor, ódio, paixão, ciúme, desejo, morte, luxúria, loucura e o final feliz. Segundo Meyer (1996, p.218-9), o folhetim da terceira fase é uma banalização do grande folhetim romântico, do folhetim do imaginário puro: acabou-se o herói. Ele foi diluído na vítima que respeita as convenções sociais até no mais extremo sofrimento.

Com a publicação da Gazeta do Rio de Janeiro que, a partir de 1822, passou a chamar-se Diário do Governo, em 1808, foi lançado o Diário do Rio de Janeiro, primeiro diário que só publicava anúncios. O precursor do folhetim, o Jornal do Commercio, surgiu em 1827. O primeiro romance-folhetim a ser publicado no Brasil foi O capitão Paulo, de Alexandre Dumas, em 1838, no Jornal do Commercio. A partir desse momento, nasce o romance-folhetim, aumentando em mais de cinco mil as assinaturas suplementares em três meses Maryle Meyer destaca que:

A partir de então, não se trata mais, para o romance folhetim, de trazer ao jornal o prestígio da ficção em troca da força de penetração deste, mas, pelo contrário, é o romance que vai devorar seu veículo. Este passa a viver em função do romance (...). Com o sucesso, Dumas assina com Lê Siécle um contrato de colaboração exclusiva: 100 mil linhas por anos a um franco e meio a linha. (MEYER, 1996, p.61).

Entre 1839 e 1842, os folhetins vão ser praticamente diários no Brasil no Jornal do Commercio, ocupando praticamente todo o suplemento dominical. Os romances

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começam a ser editados também em forma de livros por essa mesma empresa que vai vendê-los na própria sede do jornal. Os brasileiros que tinham a oportunidade de ler esses romances eram normalmente os jovens letrados em Direito. Nessa época, era muito difícil, para os brasileiros conseguirem publicar e valorizar suas obras no país. O escritor brasileiro, Manuel de Macedo, por volta de 1844, foi o primeiro a ver sua obra A Moreninha publicada. De 1856 a 1857, o público já esperava ansiosamente pela fatia de O Guarani, de José de Alencar, quando a imprensa começa a abrir espaço para a ficção nacional e o público começa a ter conhecimento de nossas peculiaridades literárias, como o indianismo de Alencar. O folhetim chega até nós, através dos textos franceses, traduzidos por nossos periódicos. Machado de Assis, por exemplo, traduziu, de Victor Hugo, a obra Os Trabalhadores do Mar, para o Diário do Rio de Janeiro, em 1866, conforme Sodré:

Vimos que foi a vulgaridade folhetinesca de Macedo, acompanhando os moldes da escola, mas adaptando o ambiente brasileiro apresentado como cenário a tais moldes, que possibilitou a aceitação do gênero. José de Alencar, utilizando o folhetim, lançaria as bases do romance brasileiro, sob todos os sentidos, inclusive na intenção de realizar, com ele, em literatura aquilo que a Independência realizara em política, extremando-se até no esforço por uma autonomia de linguagem que não estávamos em condições de suportar (SODRÉ, 1964, p.322-3).

Como se pode notar, Sodré destaca a adesão dos brasileiros ao gênero, produzida principalmente pelas obras de Macedo e de Alencar.

2.2 O folhetim e a Literatura

Ao longo do século XX, a imprensa ainda recorreu ao folhetim, quase todos os romances de Lima Barreto surgiram de forma seriada. Longe de desaparecer, o romance- folhetim passou por uma transformação. Abandonou o jornal por outros veículos de comunicação, numa contínua modernização, da novela radiofônica à dramaturgia em capítulos da televisão, na qual permanece até os dias atuais.

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A relação entre jornal e literatura pautou-se pela popularidade das crônicas, com destaque para Rubem Braga e Stanilaw Ponte Preta. Aos poucos, o escritor foi perdendo espaço na imprensa e afastando-se do leitor comum. A partir dos romances folhetins, que eram adaptados dos livros, as histórias ganharam o gosto popular com a sua apresentação informal feita para a grande massa. O sucesso foi abrangedor e fez com que os romances folhetins virassem novamente livros. As obras pós-folhetinescas eram vendidas a preços acessíveis à população e tiveram maior aceitação. Manuel Antônio de Almeida só passou a ser bem sucedido depois de publicar, em 1852-1853, Memórias de um Sargento de Milícias em folhetim na imprensa carioca. Entretanto, quando lançou o texto em livro, em 1854-1855, experimentou um notável fracasso. Para atrair o leitor, Almeida aproveita as técnicas do folhetim e procura conduzi-lo pela mão, como se o caminho a percorrer fosse difícil, desta maneira, o narrador da obra invoca o leitor da abertura do parágrafo, recapitula de modo sintético o lido e promete a continuação da história. De acordo com Lajolo e Zilberman:

Recurso de sedução do leitor, o estabelecimento da cumplicidade corre por diferentes caminhos, desvelando, algumas vezes, sua natureza instrumental: veja se quando o narrador chama a atenção para as virtudes do interlocutor, cujas inteligências e sensibilidade seguidamente celebra, o que transforma o leitor em pessoas arguta e capaz tanto de acompanhar os passos da intriga, como de refletir sobre ela (LAJOLO; ZILBERMAN, 1996, p.23).

Assim, o folhetim influenciou tecnicamente a formação dos romancistas nacionais, proporcionou um espaço de experimentação para os romancistas já estabelecidos e deu aos ficcionistas a primeira experiência de popularidade e de sucesso nacional. O romance folhetim teve seus dias de glória e faz parte da história jornalística e do crescimento dos meios de comunicação. Neste contexto, com o advento do folhetim o romance populariza-se ainda mais, ampliando seu público receptor e ocupa um lugar privilegiado nos jornais e revistas da época e alcança inconfundível expressão em relação a outras manifestações literárias e culturais. Conforme Martín-Barbero:

Fenômeno cultural muito mais que literário, o folhetim conforma um espaço privilegiado para estudar a emergência não apenas de um meio de comunicação dirigido às massas, mas de um novo modo de compreensão entre as classes (...). Conceber o folhetim como fato cultural significa, de início, romper o mito da escritura para abrir a história à pluralidade e à heterogeneidade das experiências literárias (MARTÍN-BARBERO,1987, p.136).

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Martín observa, de maneira crítica, que o surgimento do folhetim gera uma manifestação de oposição, pois considera que, ao mesmo tempo em que foi um fracasso literário e êxito da ideologia reacionária, também contribuiu para as reflexões da história da cultura.

2.3 Jornalismo e literatura

O campo literário possui relações com os meios de comunicação de massa e Haroldo Campos (1977) analisa “historicamente o surgimento de gêneros híbridos (...) e o significado das articulações entre a grande imprensa e a literatura”. Conforme Ramos:

Ainda que alguns autores ponderem positivamente sobre a importância das relações entre imprensa e literatura, o que nos anos 50 se colocava – e hoje, ainda de certa forma se coloca – é a existência de histórica polarização entre ato de informar e o fazer literatura. Entre ser jornalista – trabalhador da cultura – ou ser escritor. (1995 apud BORELLI, 1996, p. 80).

Para o cronista, a crônica é uma fronteira e um limite entre produção, eficiência, tecnologia, discurso poético, enfim, o que compõe a indústria cultural. Marcos Rey, escritor inserido, desde que começou a escrever, no mercado e na cultura de massa, encontra-se um pouco entre o jornalismo e a literatura e, mais, na relação entre esses dois e o rádio:

Eu sempre escrevi, eu comecei a escrever acho que com 10, 11 anos (...). A carreira de um escritor era o jornalismo (...), eu ia seguir o estilo: ia ser jornalista e depois tentar ser escritor ( REY. Depoimento. São Paulo, 08/01/91, p. 18-19).

Marcos Rey, em sua primeira crônica, deixa transparecer seu perfil autobiográfico de produtor cultural de múltiplas faces, pois além de romancista e escritor de livros infanto-juvenis, fazia também novelas e minisséries para TV, trabalhava em agências de

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publicidade e produzia roteiros cinematográficos. Entretanto, às vezes, se mostrava insatisfeito com a competitividade do mercado:

O doloroso é que temos de nos acostumar a essa barra neste mundo em que tudo é competição, é ver quem chega na frente. Desde a inscrição no concurso Bebê Johnson, somos lançados na arena. Disputa no colégio, na conquista da namorada, do emprego, da casa própria, e no terrível dia-a-dia de qualquer carreira profissional. Se você folgar, amolecer, distrair, escorregar, olhar as nuvens, alguém lhe passa à frente e cruza antes a linha de chegada (REY. Veja, 20/04/94, p. 114).

O escritor, neste caso, mostra-se preocupado com o mercado e o fato de ter que escrever para conquistar, a qualquer custo, a indústria cultural. O espaço reservado aos cronistas e ao texto literário tornam-no um contador de histórias e trocando experiências que lhe afirmam a existência. Segundo Borelli (1996), vivemos em um mundo moderno pleno de empresas culturais, onde narradores e literaturas convivem equilibrada e conflituosamente. Há uma produção industrializada da cultura, autores quase contratados e livros comercializados a despeito da presença ou ausência da aura literária. Assim, editoras, autores e livros se destacam na moderna produção literária.

2.4. Indústria Cultural

Os produtos da indústria cultural são sempre permeados da seguinte questão: se são bons ou maus para o homem, adequados ou não para o desenvolvimento das potencialidades e projetos do ser humano. Indústria cultural, meios de comunicação de massa e cultura de massa são expressões comuns sobre a área, parecendo ser sinônimas e uma seguida da outra. Mas não é bem assim. Segundo Teixeira Coelho (1980), a relação entre meios de comunicação de massa e cultura de massa só existirá se houver a presença dos meios e a invenção dos tipos móveis de imprensa, feita por Gutemberg no século XV. Conforme Coelho:

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A indústria cultural só iria aparecer com os primeiros jornais. E a cultura de massa, para existir, além deles exigiu a presença, neles, de produtos como o romance de folhetim – que destilava em episódios, e para amplo público, uma arte fácil que se servia de esquemas simplificadores para traçar um quadro da vida na época. (COELHO, 1980, p.9)

Para a existência da indústria cultural, iniciada com a Revolução Industrial, no século XVIII, foi necessário acrescentar uma economia de mercado, baseada no consumo de bens, ou seja, uma economia de consumo. Dessa forma, a indústria cultural, os meios de comunicação de massa e a cultura de massa surgem como funções do fenômeno da industrialização. Como características dessa indústria, vemos o uso crescente da máquina, a exploração do trabalhador, a divisão do trabalho, assim, percebe-se traços marcantes da sociedade capitalista liberal. Para melhor entendimento, é necessário um aprofundamento para explicar a coisificação, onde tudo é julgado como coisa e a alienação, onde o homem é alienado do seu trabalho, de seus projetos, da vida do país, de sua própria vida e não tem tempo de questionar o que consome. A cultura de massa – mass culture ou masscult-, tida como uma cultura inferior, arrasta outros conceitos como midcult ou cultura média, de pequenos burgueses, em que são executados Mozarts em ritmo de discoteca, por exemplo. Para Coelho, os produtos da masscult não são fáceis de catalogar, pois há um equívoco: [...] em que geralmente se incorre: o fato de a cultura fornecida pelos meios de comunicação de massa (rádio, TV, cinema) vir comparada com a cultura proveniente desses outros grandes meios de comunicação de massa que são a moda, os costumes alimentares, a gestualidade, etc. (COELHO, 1980, p.15)

Permanece a dificuldade na distinção entre as formas culturais e fica mais explícita quando se pretende estabelecer uma relação entre elas e as classes sociais. Porém, é que as formas culturais atravessam as classes sociais com uma intensidade e uma freqüência maiores do que se costuma pensar. Entretanto, a masscult seria mais sincera e sem segundas intenções (como o programa dos Trapalhões), mas a midcult seria a cultura desse equivalente ao “novo rico”

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que é o “novo culto”. Assim, é a midcult que surge como subproduto da indústria cultural. Para muitos é difícil entender que a cultura popular representa uma das fontes de uma cultura nacional, mas não a fonte, não havendo razão para usá-la como escudo num combate contra a cultura de massa, dita também como cultura pop. Conforme Teixeira Coelho:

(...) a cultura de massa aliena, forçando o indivíduo a perder ou a não formar uma imagem de si mesmo diante da sociedade, uma das primeiras funções por ela exercida seria a narcotizante, obtida através da ênfase ao divertimento em seus produtos. Procurando a diversão, a indústria cultural estaria mascarando realidades intoleráveis e fornecendo ocasiões de fuga da realidade. (COELHO,1980, p.23)

Por outro lado, uma das funções da indústria cultural é a de promover o conformismo social e, ainda, acúmulo de informação que acaba por transformar-se em formação (a quantidade provoca alterações na qualidade). Também, a indústria cultural pode acabar por unificar não apenas as nacionalidades, mas as próprias classes sociais, as massas. Massa é o povo, excluindo a classe dominante. Sabemos que os primeiros a utilizarem a expressão “indústria cultural”, na década de 1940, foram Adorno e Horkheimer e acreditavam que essa indústria desempenhava as mesmas funções de um Estado facista ou, ainda uma segunda visão, de que é o primeiro processo democratizador da cultura, ao colocá-lo ao alcance da massa. Para se chegar a uma conclusão é preciso examinar o quê diz ou faz a indústria cultural ou saber como é dito ou feito. Conforme a mensagem veiculada pelos produtos da indústria cultural é que eles serão classificados como bons ou maus. Teóricos da escola de Frankfurt identificaram a indústria de cultural como indústria da diversão entendida como instrumento de alienação, criticando-a por permitir um falso prazer. Após os estudos dessa escola, proclamadores de uma sentença de condenação contra a indústria cultural, o prazer foi particularmente banido dos produtos dessa indústria. Conforme Coelho:

Quer dizer: quando o negócio é com a cultura inferior, da masscult, exige-se seriedade. Este é um indício claro da existência de um preconceito contra a cultura pop, contra o povo: „a massa é ignorante e, portanto não pode perder tempo com prazer; temos, nós, de torná-la culta, através da seriedade‟. (COELHO,1980, p. 34)

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Combater o prazer na indústria cultural é um equívoco e também um caminho da colocação da indústria cultural a serviço da sociedade. Segundos estudos, hoje, está mais que demonstrado o papel essencial desempenhado pela catarse (entendida como libertação imaginária das tensões psíquicas individuais) no bom funcionamento psíquico do indivíduo – e o prazer tem sua função nesse processo de catarse. Para Teixeira Coelho, não há motivos para condenar a indústria cultural sob a alegação de que ela é uma prática do entretenimento, da diversão, do prazer: “O prazer é, sempre, uma forma de saber” (COELHO,1980, p. 41). Contudo, nenhuma sociedade existente, e que queira iniciar um processo de alteração social em seu interior, pode dar-se ao luxo de dispensar um meio como a TV e os produtos culturais gerados por ela. Sabemos que para Marshal McLuham, o meio é a mensagem, e ele observa que essa obsessão com o conteúdo é resquício de uma cultura letrada incapaz de adaptar-se às novas condições. Assim, na tese de McLuham, o meio mais expressivo é a TV e, segundo sua teoria, é um considerado um “meio frio” por favorecer a participação por parte da audiência, por ser de baixa definição fornece dados incompletos, exigindo um esforço por parte da audiência no sentido de tentar recompor a mensagem inicialmente transmitida. Enquanto os meios quentes (rádio e cinema) promovem uma baixa participação do espectador por fornecer muitos dados ao receptor quase não exigindo em termos de esforço no sentido de aprender o que está sendo transmitido. Para Coelho (1980), analisando sob esse aspecto, a TV não formaria audiências de indivíduos passivos, mas sim, de pessoas altamente ativas que, nesse processo, estariam no verdadeiro caminho da apreensão total das mensagens divulgadas. Contudo, é sabido que o ponto de vista é de quem detém o meio, a TV, que o produto carrega os traços do produtor. Analisando proposições da semiótica e os produtos da indústria cultural, o problema não é tanto o que ela diz ou não; não é tanto o fato de ser ela deste ou daquele modo; nem o fato de ter surgido neste ou naquele sistema político-social, mas, sim, no modo como diz. A indústria cultural, - principalmente a TV nas escolas e universidades – é o paraíso do signo indicial, da consciência indicial. Dessa maneira, provocando a formação e o desenvolvimento de indiciais. Ou seja, signos e consciências e objetos. A problemática recai no fato de suas informações serem efêmeras, rápidas, transitórias; não há tempo para a intuição e o sentimento das coisas, nem para o exame lógico delas: a tônica

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consiste apenas em mostrar, indicar, constatar. Não há revelação, apenas constatação, sendo assim uma mola para a alienação (COELHO,1980). São comuns questionamentos acerca de como se dá esse procedimento indicial na TV, conclui-se que é através da manipulação não de informações, mas de trechos de informações, apresentadas como que soltas no espaço, sem reais antecedentes e sem consequentes. E essas informações não revelam o que está por detrás e, sim, ocultam o que realmente representam, para interpor-se entre o receptor e o fato e não para abreviar o caminho entre eles, causando o conformismo, manipulado pela indústria cultural. Os receptores passam a contentar-se com “dados” que saem do nada e levam a parte alguma e assim, se acomodam. No Brasil, dados apontam que a TV alcança entre 60 a 80 milhões de pessoas, sabendo que TVs, rádios e imprensa vivem de publicidade, pode-se refletir sobre o poder desses meios de conduzir à massa ao consumo de produtos. Embora o rádio cubra praticamente a totalidade da população brasileira, dos grandes veículos é o que menos recebe verbas de publicidade. Sabendo que as classes com maior poder aquisitivo veem mais TV do que ouvem rádio. Conforme Coelho:

Seja como for, esses meios de comunicação de massa acabam produzindo uma estrutura cultural que se torna impositivamente comum ao número dos atingidos por esses meios, razão pela qual é possível falar na existência de uma cultura de massa e de meios de comunicação de massa, ainda que nossa sociedade não seja uma sociedade de consumo de massa; a inexistência desta não impede a existência daqueles. (COELHO, 1980, p. 75)

Para tanto, é necessário saber que a indústria cultural no Brasil apresenta-se marcada pelos traços mais evidentes e grotescos do comercialismo e capitalismo, pois o objetivo gira sempre em torno de vender alguma coisa, criando o hábito de consumir. E ainda, as emissoras educativas do Brasil não têm liberdade para estimular a reflexão crítica, ou seja, não recebem do governo para desenvolver um pensamento reflexivo em seus telespectadores. Uma outra forma de análise mostra que a indústria cultural brasileira está voltada para temas e assuntos referentes a culturas estrangeiras, em particular a norte-americana, também se comportam desta maneira, os noticiários que são alimentados por agências noticiosas estrangeiras, interessadas em divulgar os pontos de vista políticos e sociais de seus respectivos países.

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A maior consequência da indústria cultural é formar uma cultura homogênea, na qual a cultura de massa sofre com a ausência de diferenciadores da cultura superior e da cultura popular. Porém, no Brasil, as desigualdades na divisão de renda nacional impedem que a cultura seja homogênea, pois em certas regiões há grupos voltados para o subconsumo e a simples sobrevivência. Assim, permanece o grotesco na indústria cultural, mais propriamente após a Segunda Guerra Mundial a partir da industrialização. Alguns autores devem ser citados por apresentarem uma visão diferenciada sobre a indústria cultural, a indústria que busca “alcançar o grande público, cativar, seduzir” (MORIN,1977, p.36). Walter Bejamin também contribui para esta reflexão, atentando que o cinema procura chocar o espectador, oferecendo sucessivas imagens, impedindo a fixação e associação por parte do espectador, gerando assim uma completa falta de esforço. Reconhecendo que “a cultura de massa é utilizada como instrumento ideológico” (BENJAMIN, 2002). É significativa a reflexão que Horkheimer e Adorno fazem sobre tal indústria, ressaltando que ela aliena de forma com que as pessoas passem a consumir produtos de massa, a partir da categoria de cada um. Nessa perspectiva, quando um romance é produzido, já é feito tendo em vista sua versão para filmes, com todas suas particularidades, proporcionando certas distrações. “A distração significa o „não pensar‟, esquecer a dor, „mesmo onde ela se mostra” (2002, p.192). A partir daí, percebemos que a indústria cultural tem interesse nos homens por representarem meros clientes, desvalorizando o individual e valorizando o coletivo. Sobre a Massicultura Dwigth Macdonald afirma que: “ela pode ser estimulante ou narcótico, mas deve ser de fácil assimilação”(MACDONALD, 1971). Para ele, a Massicultura é uma paródia da Alta Cultura:

[...] consiste em transformar o indivíduo no homem de massa. As massas constituem-se por uma grande quantidade de pessoas incapazes de exprimir a sua qualidade humana, porque desligadas umas das outras não se reconhecem nem como indivíduos, nem como membros de uma comunidade (MACDONALD, 1971, p. 79).

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Dentro deste contexto, é clara a intenção dessa forma de cultura, a de agradar ao público que não tem um gosto muito apurado e formação cultural limitada. Já na Medicultura, a linguagem é moderna, mas com aspectos triviais e corriqueiros. Para Edgar Morin, surgiu uma terceira cultura no século XX, destinada a uma massa social que desenvolve artes técnicas novas objetivando ao lucro, dominando as comunicações de massa. Para a indústria cultural acontecer é necessário que o produto obedeça a certos moldes. Assim, o autor que tem sua obra adaptada para essa indústria cultural não a reconhece e até a nega, ainda que obtenha uma boa remuneração por isso. Conforme Morin, a vulgarização também aparece às vezes na adaptação de um romance da Alta Cultura. Essa adaptação resulta em um filme cuja linguagem, voltada para o grande público, é simplificada, modernizada, atualizada, e o enredo maniqueízado. Esses processos são resultantes da: “esquematização da intriga, redução do número de personagens, redução dos caracteres a uma psicologia clara, eliminação do que poderia ser dificilmente inteligível para a massa dos espectadores” (MORIN, 1977, p.54). Em sua obra Apocalípticos e integrados, Umberto Eco observa que a “fabricação de livros tornou-se um fato industrial, submetido a toda as regras da produção e do consumo; daí uma série de fenômenos negativos, como a produção de encomenda, o consumo provocado artificialmente, o mercado sustentado com a criação publicitária de valores fictícios” (ECO, 2001, p.50). Dessa maneira, o público tem o que deseja e a publicidade induz o que ele deve desejar, desvalorizando o esforço individual e a visão crítica. Conclui-se então que a indústria cultural é basicamente a indústria do divertimento, da distração, e não da reflexão sobre o que acontece na vida diária, alienante. Justamente, o que se busca compreender neste trabalho durante a análise da obra de Marcos Rey e de sua adaptação para televisão.

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Figura 3: Capa do Livro, Memórias de um Gigolô, 1986.

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2.5 Síntese do Romance - Memórias de um Gigolô

O romance, Memórias de um Gigolô, foi escrito em 1968. Nessa obra, Marcos Rey retrata o malandro paulista, mostrando que na maior metrópole do país não transitavam apenas senhores respeitáveis. O romance nada mais é do que a memória de Mariano, o protagonista, que também narra a história, em primeira pessoa, contando suas peripécias e trapaças ao longo de sua vida, desde que era um menino criado por sua tia Antonieta, uma mestre em trapaçarias que lhe ensinou a ler o baralho, vender rifas e outras coisas mais na arte de fingir e enganar, sempre fugindo da polícia. De estrutura linear, a história começa com Mariano, o protagonista, relatando que fará um “breve exame de consciência” e que não considerava a sua vida um fracasso. No decorrer da narrativa, o boêmio conversa (interage) com o leitor, como podemos conferir na primeira página e em muitas outras vezes ao longo do romance:

Sim, leitores, o autor destas linhas foi sobrinho da conhecida madame Antonieta, a astróloga, a quiromante, a cartomante, a médium vidente e auditiva, a telepata, a benzedeira, uma das mulheres mais procuradas neste país ( REY, 1986, p.5).

Boêmio, amante da noite, Mariano - habilidoso e incorrigível sedutor - circulava entre os bordéis e cabarés e sempre se mantinha em quase embriagues, bebericando uísque nos tempos em que seus golpes surtiam efeito ou até cachaça nos intervalos entre seus furtivos ataques. No leito de morte de sua tia Antonieta, a qual o menino considerava “simples e humana, igual e comunicativa” (1986, p.10), Mariano é apresentado, justamente por esta senhora, ao seu destino, através do baralho de cartomante que ela possuía. Nele estavam os principais personagens do seu destino: Madame Iara, a Dama de Ouros, uma mulher bondosa; a “desgraça de sua vida”, uma só mulher; o valete de espadas, Esmeraldo. Segundo o narrador, essa foi a maior previsão que sua tia Antonieta fez na vida. Mariano conservou consigo o encardido baralho, sua única herança. Após a morte de Madame Antonieta, o menino, com catorze anos, foi morar com A Dama de Ouro, Madame Iara, proprietária do maior bordel de luxo da cidade de São

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Paulo. Lá, o frágil garoto conheceu as delícias de ser bem tratado e alimentado pelas belas mulheres do estabelecimento: jovens, pintadas, pecaminosas e alegres. Deram-lhe banho, roupas, comida e muita atenção, foi tratado como um príncipe plebeu. Dali para frente, tudo em sua vida foi “sonho”. O menino puro encontrou a felicidade no bordel de Madame Iara, como era muito inteligente e já alfabetizado, passou a ganhar presentes e dinheiro escrevendo cartas para as moças da casa, tendo como primeiro emprego o de redator de prostíbulos, às vezes, recebendo “em espécie”. Ao completar dezoito anos, Mariano passou a frequentar cabarés, ganhando a fama de dissimulador, era mestre na sinuca, em um mundo de sensações baratas. O narrador sempre interagindo com o leitor, outra vez fala: “Esta era minha vida, minhas senhoras e meus senhores. Assim, ou quase assim, fui dos quatorze aos vinte anos, da morte da minha tia Antonieta, a astróloga, à decadência de minha Dama de ouro, madame Iara” (1986, p.37). Mas a história apenas começava, pois a cafetina recebeu em seu bordel uma nova maruja, Guadalupe – Lupe, ou apenas Lu. Para Mariano, a moça era a verdadeira visão do paraíso:

Mal completara dezoito anos e tinha dentro de si um motor que puxava sua carga leve com um tremendo arranco para a vida adentro. Quando passava pela gente chacoalhava o ar, emitia ondas sonoras, luminosas e magnéticas (REY, 1986, p. 37).

Porém, ao mesmo tempo, conheceu também o Valete de Espadas, Esmeraldo, o gigolô de Lu. Bastava que a moça fizesse um michê e ele já invadia o quarto para arrancar-lhe o dinheiro. Foi então que Mariano conheceu a paixão e o ciúme. Morria de amores e ciúmes de Lu, conforme o baralho da tia, que usava constantemente para suas indagações, ele conheceria uma só mulher, que desgraçaria sua vida. Esta mulher era Lu. Os negócios de Madame Iara viviam em altos e baixos, até que seu bordel foi fechado pela polícia e, na fuga, Mariano conseguiu levar Lu consigo. Ele sentia necessidade de conquistar seu lugar, inicia então, suas investidas sobre ela.

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Segundo o narrador, somente um cafajeste e sem vergonha aceitaria uma vida assim, Mariano que não era dado ao trabalho, aceita o dinheiro que Lu conseguia com suas saídas, passando a ser seu gigolô:

- Mas precisamos de dinheiro, Tumache. (Parênteses aberto por causa desse nome próprio que surge pela primeira vez no livro. Tumache era o mesmo que too much, expressão inglesa, que Lu ouvia muito nos filmes de amor. O apelido foi inventado por ela, razão por que o aceitava: Tumache.) (REY, 1986, p.52).

Depois de um tempo fora do contexto da história, o Valete de Espadas volta à cena. Havia passado seis meses na cadeia, por consequência de sua prisão quando o bordel de Madame Iara fora fechado e, por um momento, volta a dominar a situação. Mas o casal consegue driblá-lo e foge. Iniciam-se novos golpes. Milionários encantados pela beleza de Lu e enganados pelo teatro, sempre muito bem ensaiado, emprestavam, ofereciam e davam fortunas por noites de amor com a “moça”. A vida dos dois estava sempre envolta em mentiras, mas a mentira prosseguia. Até que Lu foge com Esmeraldo. Inicia-se uma nova trajetória para Mariano, a da miséria. Sem a mulher de sua vida, o gigolô chega ao chão, por diversas vezes dormia em albergues ou em bancos de praças. Para ele, procurar emprego era humilhante, mas teve que exercer pequenas funções, como guia de cego, garçom, guarda-noturno, ascensorista, vendedor de pedras de isqueiros, bolsas, máscaras, saca-rolhas, livros pornográficos e gravatas. O gigolô aproveitava-se da bondade de senhoras solteiras e carentes com dinheiro suficiente para lhe sustentar, ganhava presentes. Mas, transtornado, delirava de saudades de Lu, que o encontra magro e abatido e volta para os seus braços. Com ela, perdia a noção de tempo e espaço, não trabalhava, o que forçava a “Virgem de Guadalupe” a procurar sustento com a prostituição, dizendo sempre: “Não perca a calma, Tumache” (...) “agora, Tumache, deixe para mim” ( REY, 1986, p.98-9). Mariano ainda se arriscava a flertar com senhoras bolorentas, porém quem conseguia sustento era Lu, sempre seduzindo senhores ricos e poderosos sedentos por um corpo jovem, esbelto e macio. Passavam, então, por fases em que ingeriam uísque

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escocês, fumando cigarros americanos, comprando roupas novas e, ainda, o gigolô era assíduo e frequentador de bibliotecas, para ele era necessário tornar-se culto. O sucesso os enlouquecia, mas nem por isso eram bem vistos pela fina flor da sociedade, que os repugnava. A Virgem de Guadalupe não era uma simples profissional do sexo, era também bailarina, uma Bailarina Mascarada. Mariano soube usufruir de mais este dote da moça, ganhando muito dinheiro com isso. Entretanto, Lu não se sentia feliz com o sucesso, sempre queria mais, sofria ao saber que o Valete de Espadas passava por dificuldades e foi viver com ele, abandonando Mariano. Lu era uma moça de bom coração, não abandonava quem estivesse em dificuldades, quando um não estava bem corria acolher, abandonando o outro. E assim acontece toda a história. Não guardavam dinheiro, gastavam-no todo. Era sempre um recomeço. Um recomeço de trapaças e golpes, tendo Lu como um talismã. Entre uma fase e outra sem Lu, Mariano foi cantor de boates, trabalhou em fábricas como “dedo-duro”, decorou capítulos inteiros da Bíblia e foi evangelizador, em um momento desses, reencontrou Madame Iara, sua protetora, que o acolheu novamente, Agora, em um modesto apartamento com uma “nova safra de mocinhas ambiciosas, desiludidas ou transviadas” ( REY, 1986, p.145). Neste novo momento de sua vida, ganhou a simpatia e os cuidados de uma loira da casa, que lhe presenteou com uma gravata bordô, vindo a ser a cor que lhe trazia sorte e passou a ser conhecido como Mon Gigolô:

Não sei quem me chamou primeiro de Mon Gigolô [...] O apelido espalhou, colou, deu sorte. A mulherada viu nele mais um título, uma comenda, do que um mero cognome. Nenhum bola-murcha merecia ser chamado assim, convenhamos (REY, 1986, p.147).

Como gigolô que se preza, Mariano não se contentava em ter apenas uma mulher para lhe sustentar, arrumou outra, causando ciúmes na loira que conseguiu colocá-lo na cadeia, tendo ainda o auxílio de Esmeraldo, seu inimigo. Ficou atrás das grades por quase um ano, conseguindo inverter a situação e trancafiando o Valete de espadas em seu lugar.

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Seus esforços agora estavam voltados para encontrar Lu, gastou um ano de sua vida nesta procura quando, enfim, conseguiu. “Gostava de Lupe com seus mistérios, silêncios e perdões” (REY, 1986, p. 66). O casal volta a viver o romance recheado de histórias tórridas de paixões, golpes e trapaças. Andavam pelas ruas sempre em busca de prováveis vítimas:

- Vamos de mal a pior - eu lamentava. - Confie em mim, Tumache, dou um jeito. - Que jeito? - Viração. - Não, eu não quero. - Por quê? Estou velha? Nem eu sabia dizer. Que idade tinha Lu? Há quantos anos a conhecia? Tentei fazer as contas: uns quinze anos. Ela passara dos trinta, mas não parecia (REY, 1986, p.175).

Começavam a envelhecer e tudo parecia um pouco mais difícil, a sombra de Esmeraldo sempre espreitando a vida dos dois, as dificuldades pareciam maiores. Porém, o narrador do romance, mostra sua preocupação em torno das cenas picantes, cuida para que o leitor não se espante: “Não pensem, leitores ávidos de imoralidades, que fiz um diário de bordo como foi de hábito no passado. Sei o perigo que representam as coisas postas no papel. Confio, porém, na memória”(REY, 1986, p. 180). Segundo a memória de Mariano, a história nos leva a um fim surpreendente, em que os três, o Gigolô, a Virgem de Guadalupe e o Valete de Espadas acabam juntos, já velhos em um apartamento de um bairro de São Paulo, vivendo às custas do dinheiro aplicado com a venda das jóias que Lu adquirira em um dos melhores golpes que ela e Mariano haviam aplicado. Estavam os três idosos, sem qualquer vestígio da mocidade e formosura do passado, desfrutavam da companhia um do outro, o Valete de Espadas, já de cadeiras de rodas, tendo Lu como legítima esposa e Mariano, apenas, como um acompanhante que não tinha teto, contando com a caridade do casal. Como retrata bem o título do romance, Memórias de um Gigolô, a história traz as memórias de um rapaz que desfrutou da vida fácil até seu último instante de energia, com um desfecho inesperado, culminando na velhice do trio mais trapaceiro de que a noite paulistana já teve notícia.

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2.6. Análise dos elementos a- Espaço: São Paulo, na maioria das vezes em espaços fechados, dentro de quartos e salões de cabarés. Em alguns momentos, a trama acontece em parques ou praças, porém prevalecem os espaços fechados com iluminação própria de cada ambiente. b- Tempo: na década de 20, não coincidindo com a época em que foi publicada a obra, 1986. A história mostra a narrativa do gigolô Mariano desde sua infância, vivida ao lado de sua tia cartomante, Antonieta, até a idade adulta e a velhice. c- Enredo: linear, apesar do personagem principal, Mariano, começar a contar sua história já depois de velho, a partir de sua infância. Mesmo sendo dessa forma, a narrativa não altera a ordem dos fatos. Uma parte importante do enredo é o conflito existente entre o trio composto por Mariano, Lu e Esmeraldo. Possibilitando o leitor/espectador criar expectativa sobre os fatos do enredo e, assim, prender sua atenção ao clímax da história até seu desfecho. d- Focalização: o foco da narrativa é em primeira pessoa, o gigolô narra a trama de sua vida. Os protagonistas são planos, não se alteraram no decorrer da história, conservam suas próprias características com pequenos atributos, podendo ser identificados facilmente, sem nenhuma complexidade. e- Personagem: pertencendo à história, o personagem, sempre fictício, participa, age ou fala dentro do enredo, é ele quem faz a ação. Mariano, Lu e Esmeraldo são as personagens principais dentro da trama e são planas, permanecendo sem alteração psicológica alguma até o final da narrativa. Tendo como principal característica o fato deles serem todos anti-heróis. f- Narrador: é o próprio personagem, o narrador/protagonista da trama, Mariano. Ele narra a história da própria vida, sendo não onisciente e nem onipresente. Outra característica do protagonista é ser um anti-herói, ou seja, o gigolô que explora a sua amada, o “boa vida” que não gosta do trabalho, mas sim de frequentar bons restaurantes e ter a mesa sempre farta. Porém tem competência

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suficiente para ocupar tal função na história. Além disso, reconhece-se nessa personagem um tipo comum das grandes cidades, da década de 1920, que se torna cômico, pela caracterização estereotipada que Marcos Rey lhe atribui de: “o Mon Gigolô”.

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Marcos Rey

Figura 4: (Fonte: ideianovanaweb.blogspot.com/2008/01/ele-rey.html>, 2009).

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2.7 O autor Marcos Rey

Se algo devo ter fixado nessa vida, deixado explícito (pelo menos tentei), foi a luta de um escritor, que não veio das camadas privilegiadas da sociedade, para manter seu ideal, apesar de todas as adversidades. (REY, http://www.marcosrey.com.br/home.htm, 2009)

Como produtor policultural, Marcos Rey mostra sua pluralidade de atividades e representa o ponto que liga as diferentes literaturas, mercados e muitos receptores. No início, o autor era considerado pouco popular pelos padrões estabelecidos, posteriormente, foi criticado por intelectuais por escrever histórias populares e, ainda, recusado por ser de “meios culturais pouco legitimados e produzir uma literatura não consagrada” (BORELLI, 1996, p.126):

Houve também preconceito de origem: o fato de ter largado o jornalismo e ter começado a trabalhar no rádio. O rádio não era considerado pelos intelectuais. Não havia intelectuais no rádio (...). Além disso, meus colegas achavam que eu fazia literatura alienada, pouco engajada. (REY, Depoimento. São Paulo, 08/01/91).

Por estar mais voltado para a literatura e a produção de livros, Marcos Rey expressa uma opção de vida, pois primava pela autonomia e um certo distanciamento dos holofotes. Entretanto, era um “escritor disputadíssimo pelos produtores de cinema” (Veja, 13/12/78, p.153). Rey sempre se mostrava preocupado com a qualidade do produto e como era produzido, reconhecendo os limites da fabricação de certas formas literárias. Até 1993, publica um total de catorze títulos infanto-juvenis pela Ática, na série Vaga-lume, com um perfil de escritor urbano, cronista de metrópole, narrador do cotidiano. Para Marcos Rey, “as boas histórias vêm do fundo sempre ligadas às nossas experiências mais íntimas. Nascem do mergulho no grande oceano do inconsciente”. (In: , 2009). O autor foi considerado como mestre do romance urbano e criador hábil de enredos fascinantes. Essa classificação advém do fato de que seus personagens são singulares e suas histórias vivem infinitamente no imaginário coletivo do cotidiano nas grandes metrópoles. São Paulo foi a capital inspiradora desse escritor de múltiplas mídias e gerações.

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Marcos, sendo desde a infância um inveterado leitor, acumulou grande cultura literária e sempre viveu da palavra escrita. Publicou toda sua obra em vida, mais de cinquenta livros entre romances, contos, novelas e ensaios: uma produção intensa e extensa, realizada com a obstinada perícia do artesão em seu ofício. Seus textos são ambientados nas décadas de 1950 até o fim do século XX. Seus livros possuem narrativas fluentes e são temperados de humor, ironia e suspense. Há em sua produção uma habilidade para arquitetar a realidade da ficção tão verossímil quanto surpreendente pelos encantos e desencantos da realidade. Autor de uma consagrada coleção de títulos infanto-juvenis, romances de aventura e suspense que foram lançados a partir de 1980, e que 25 anos depois são cults do gênero: esses livros cruzaram a linha do tempo como um fenômeno editorial das duas últimas décadas. São leituras criativas e dinâmicas para o sabor dos jovens leitores. (In: , 2009). Marcos Rey, escritor, nasceu Edmundo Donato no dia 17 de fevereiro de 1925. Sua mãe, Mariana Coscia Donato, e seu pai, o gráfico encadernador, Luiz Donato. Desde muito criança, o pequeno Edmundo já dava ares do bom escritor que seria. Seu primeiro conto foi Ninguém entende Wiu-Li, em 1942, publicado no Suplemento Literário, da Folha da Manhã. Esse conto recebeu a ilustração do desenhista Belmonte, na época muito famoso pela sua arte. A vida de Marcos Rey foi furtiva, após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, foi para o Rio de Janeiro voltando para São Paulo no ano seguinte, onde publica artigos e contos na Folha da Manhã, já em 1949, foi contratado como redator na Rádio Excelsior. O ano de 1950 ficou marcado na história do escritor, pois foi nele que começou a escrever Um gato no triângulo, seu primeiro romance, sendo publicado pela Editora Saraiva em 1953. Além de escritor e redator de rádio, Rey teve suas primeiras experiências como roteirista de TV em 1955, na TV Paulista – canal 5, em que pôde mostrar também seu talento como publicitário, criando textos e campanhas para agências de publicidade. Por conta de tantos trabalhos, dedicação e competência, Marcos Rey recebe em 1956, o Troféu Roquete Pinto pelo programa “O Rádio – Almanaque Kolynos” e também o prêmio Tupiniquim, como redator do programa de TV “O Céu é o limite”. Para Marcos Rey, 1958 foi marcante, pois ano de fundação da Editora Mauá, de propriedade dele e de seu irmão Mário Donato. Neste ano também conheceu Palma Bevilacqua, por quem se apaixonou e se casou em 1960, ano de publicação do romance

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Café na cama, a partir do qual alcançou o sucesso e êxito pela crítica. Ainda neste ano, o escritor conclui o romance A última corrida e escreveu Entre sem bater, publicado como um folhetim diário no jornal Última Hora. A partir de 1961, Rey passou a exercer a função de presidente interino na UBE – União Brasileira de Escritores, onde cria o Troféu Juca Pato, que viria a premiar intelectuais e destaques da cultura brasileira. Suas publicações continuam a serem lidas até hoje. Ele publicou, em 1963, A última corrida; em 1967, O Enterro da Cafetina; em 1968, Memórias de um Gigolô e também criou formatos de minissérie para a TV, escrevendo Os tigres. Em 1970, seu romance, Memórias de um Gigolô, foi adaptado para o cinema pelo diretor Alberto Pieralisi. Na década de 1970, Marcos Rey se aprimorou como roteirista de televisão e tornou-se o profissional mais requisitado pelos diretores e produtores da então falada “Hollywood paulista”. Para a Rede Globo, escreveu as novelas A Moreninha e Cuca legal, em 1975, e com Sylvan Paezzo e Wilson Rocha, os episódios de O Sítio do Pica- Pau Amarelo (1978). No ano de 1980 foi contratado pela editora Ática para escrever romances infanto- juvenis e publica Não era uma vez. Até 1997, o escritor publica uma obra do gênero por ano, seu grande sucesso, O mistério do Cinco Estrelas é lançado em 1981, o qual alcança números altíssimos de vendas. O romance, Memórias de um Gigolô, foi adaptado para a Rede Globo, com roteiro escrito por ele e W. George Durst, em 1985. Mas foi ao ar só em 1986, ano em que Marcos Rey foi eleito para a Academia Paulista de Letras e tornou-se professor da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Marcos Rey escreveu crônicas semanais para a revista Veja, de 1992 até 1999. Publicou, em 1995, O Último Mamífero do Martinelli e Os Crimes do olho do boi. Em 1996, recebeu o troféu Juca Pato e, em 1998, publicou seu último romance, Fantoches. Edmundo Donato, cujo pseudônimo era Marcos Rey, morreu aos 74 anos, em São Paulo, no primeiro dia de abril de 1999. Depois de voltar de uma viagem à Europa, foi internado para fazer uma cirurgia, mas não resistiu. Marcos Rey teve seu corpo cremado e suas cinzas jogadas no centro da cidade de São Paulo, a grande metrópole que serviu de inspiração para os seus romances. No mesmo ano, sua viúva, Palma Bevilacqua Donato, inaugurou a Biblioteca Municipal Marcos Rey, no bairro do Campo Limpo, em São Paulo.

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Novas edições foram lançadas por Dona Palma depois de sua morte e, a partir de 2000, cuidou para que títulos inéditos saíssem no mercado, como O menino que adivinhava, Diários de Raquel e Mano Juan. Contudo, conforme site do autor: “Marcos Rey vive infinitamente em todas suas Obras”. (In: , 2009).

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Capítulo II

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A Televisão em questão

Figura 5: (Fonte: http:// projetofase4.googlepages.com/malet>, 2009).

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Capítulo II – A origem

2.1. História da Televisão

Admitir o gosto pela televisão pode representar a não-inteligência culturação, ao contrário de dizer que se ama literatura ou outras formas sofisticadas de arte demonstrando educação e refinamento, “a paixão pela televisão é, em geral, interpretada como sistema de ignorância, quando não de desequilíbrio mental” (MACHADO, 2001, p.9). A História da Televisão no Brasil inicia-se com sua pré-estréia, no dia 03 de abril de 1950, com alguns aparelhos instalados no saguão dos Diários Associados - cadeia de jornais e emissoras de rádio. Nessa data, o padre mexicano, Frei José Mojica, faz sua apresentação. No dia 18 de setembro do mesmo ano, Francisco de Assis Chauteaubriand Bandeira de Melo, dono dos Diários Associados, inaugura a TV Tupi de São Paulo, cuja razão social é Rádio e Televisão Difusora. Chauteaubriand importa alguns aparelhos de televisão e espalha pela cidade, mas encontra dificuldades em manter uma programação diária. Sendo que o roteiro de estréia ficou a cargo de Demerval Costa, o primeiro diretor de roteiros da TV Tupi. Cássio Gabus Mendes fica com a o cargo de primeiro diretor artístico, na época com 23 anos (In: , 2009). A televisão exigia uma nova linguagem, por isso, artistas que vinham do rádio, jornal e teatro buscavam desenvolver este novo gênero. O primeiro programa, TV na Taba, foi apresentado por Homero Silva e contou com participações históricas como a de Lima Duarte, Hebe Camargo, Mazzaropi, Ciccilo, Vadeco, Ivon Cury, Yara Lins, Wilma Bentivegna, Aurélio de Campos, o jogador Baltazar, a poeta Rosalina Coelho Lisboa, o balé de Lia Aguiar e a orquestra de George Henri. A frase, “Está no ar a TV no Brasil”, dita por Sônia Maria Dorce, na época com cinco anos, vestida de indiazinha, com cocar e penas na cabeça, fica marcada na história da televisão brasileira. Em 19 de setembro, foi ao ar o primeiro telejornal, Imagens do Dia, apresentado por Ribeiro Filho, com texto de Rui Rezende, o horário podia variar entre 9h30 ou 10h, por consequência de eventuais problemas técnicos.

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Nesse mesmo ano, em novembro, estreia o teleteatro A Vida por um Fio, adaptado do filme americano Sorry, Wrong Number, com direção de Demerval Costa e Cássio Gabus Mendes e estrelando Lima Duarte, Lia Aguiar, Walter Foster, Dionísio Azevedo e Yara Lins. O teleteatro contava a história de uma mulher que morria estrangulada pelo marido por um fio de telefone. Em 22 de novembro o governo autorizou as concessões para a TV Record, TV Tupi e TV Jornal do Comércio (Recife).. Conforme Reanto Ortiz, ainda em 1950:

A TV Tupi é hegemônica, mas Chateaubriand é o tipo ideal do „capitão de indústria‟ – busca nos acordos políticos a realização de suas propostas e se guia, quanto à avaliação de mercado, pelo empirismo e pioneirismo. Busca-se atingir, conquistar o consumidor, para transformá-lo em telespectador, por meio do discurso pedagógico, que se fundamenta na necessidade da construção da modernização da sociedade brasileira (ORTIZ, 2001, p. 7).

No ano seguinte, foi inaugurada, também no Rio de Janeiro, a TV Tupi e os primeiros televisores da marca Invictus começaram a ser fabricados no Brasil, porém ainda eram caros, simbolizando status. Escrita por Walter Foster, vai ao ar a primeira telenovela brasileira Sua Vida me Pertence, em 21 de dezembro de 1951, em dois capítulos semanais, sendo que foi nela que o primeiro beijo televisivo aconteceu entre o próprio Foster e Vida Alves. Recheado de estreias, o ano de 1951 se encerra com Grande Teatro das Segundas- Feiras, tendo como diretores Armando Bógus, Geraldo Vietri e Wanda Kosmos e como destaques atores que se consagraram: Cacilda Becker, Maria Della Costa e Procópio Ferreira. Seguem-se as estreias no decorrer dos anos, porém, merece ser ressaltado o programa jornalístico Repórter Esso, iniciado em 17 de junho de 1953, permanecendo no ar por 17 anos. Gontijo Teodoro, que comandava o programa tinha como marca registrada a frase: “Aqui fala o seu Repórter Esso, testemunha ocular da história” (In: , 2009). Em 1954, o Brasil já possuía 34 mil aparelhos de TV, mas apesar disso a notícia da morte de Getúlio Vargas foi dada pelo rádio, pois a transmissão da TV era só a partir das

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quatro da tarde. Em 1956, já com 141 mil aparelhos, a televisão atinge cerca de um milhão e meio de espectadores e Chauteaubriand inaugura mais nove estações da TV Tupi, entre elas a do Rio de Janeiro que teve Chacrinha em seu programa Rancho Alegre. O número de aparelhos aumenta de maneira assustadora, em 1958 atinge 344 mil. Nesse ano, foi criado o Troféu Imprensa pelo jornalista Plácido Manaia Nunes que premiava os melhores artistas do rádio e televisão. Para Renato Ortiz (2001) a dificuldade de expansão da TV se deu:

[...] pelo baixo poder aquisitivo da população = dificuldade de comercialização dos aparelhos, no início importados, só em 1959 passam a ser fabricados aqui. Possuía estrutura pouco compatível com a lógica comercial - poucos canais com produção e distribuição resumida ao eixo Rio/São Paulo; inexistência de sistema de redes; muitos problemas técnicos; só em 1959 introduz-se o videoteipe utilizado pela 1ª telenovela só em 1963. Capacidade de produção em 1954 - 18 mil aparelhos; 1951- 3500; 1955 – 141 000; 1959 – 434 000. Audiência: 1954 – aparelhos desligados: 50% a 90% em São Paulo e Rio; em 1959 – Rio: 7% classe C via televisão, contra 65% e 28% das classes B e A. Verbas aplicadas provenientes da publicidade: em 1958 – 8%, contra 22% no rádio e 44% nos jornais. Desconhecimento do target e do alcance, programação feita na base do feeling, ausência de planejamento (ORTIZ,2001, p.7).

Em meados de 1960, mais precisamente em 1962, a NASA lança o TELSTAR, satélite de comunicação social e o Brasil já conta com um milhão de aparelhos. Nesse período, o VT – videoteipe – auxilia no acabamento dos programas, as telenovelas podem ser gravadas com antecedência e é possível diminuir os erros de texto. Também no ano de 1962 foi criado o CONTEL (Conselho Nacional de Telecomunicações) e a ABERT (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão) (In:,2009). Ainda em 1962, Roberto Marinho, dono do Jornal “O Globo” ganha as concessões dos canais de TV no Rio de Janeiro e em Brasília. No dia 24 de julho, assina com o grupo americano Time Life o contrato de 5 milhões de dólares para adquirir equipamentos para criar a TV Globo, porém este acordo era proibido pela Constituição Federal do Brasil. Em 1963, chegam ao Brasil os primeiros aparelhos de TV em cores, importados dos Estados Unidos. A TV Excelsior é a primeira emissora a fazer uso da programação horizontal em que as novelas eram diárias e com horário fixo para exibição, sempre às 20h e a programação vertical, programas infantis eram exibidos depois da novela, jornal, show e filme para finalizar, ou seja, uma ordem de programação determinada. Nesse

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momento também a publicidade ganha seu primeiro filme, com criação de um jingle para o produto Leite de Rosas. O seriado Bonanza foi o primeiro a ser exibido em cores no Brasil, na TV Tupi. As organizações Globo, de propriedade de Roberto Marinho, recebem a concessão de um canal de televisão, nasce então a TV Globo. Nessa época, somam-se 34 estações de televisão e 1 milhão e 600 mil aparelhos televisivos. O apresentador Silvio Santos ganha, nesse ano, o primeiro Troféu Imprensa, como melhor animador. Por ser um período de centralização política e censura nos meios de comunicação, o ano de 1964 sofre a invasão dos seriados americanos entre eles, Jeannie é um Gênio. Em julho de 1965, o Ministério da Educação e Cultura – MEC- formalmente pede 100 canais de TV para exibir programas educativos, também neste mesmo ano Chauteaubriand vende a TV Cultura para o governo do estado (In:,2009). O ano de 1966 ficou marcado na história da TV, pois foi o ano do decreto nº59.366 de 14 de outubro em que foi instituído o Fundo de Financiamento de TV Educativa. Esse ano consagra Hebe Camargo como entrevistadora, pela TV Record, cujos estúdios pegam fogo em 29 julho. Apesar do incêndio, é realizado o II Festival de Música Popular Brasileira que premiou A Banda, de Chico Buarque, com interpretação de Nara Leão e Disparada, de Geraldo Vandré e Théo de Barros, tendo como intérprete Jair Rodrigues. Para estimular o surgimento de novas emissoras educativas, o Governo Federal cria, através do Ministério da Educação e Cultura (MEC), a Fundação Centro Brasileira de TV Educativa (FUNTEVE), em 1967. Um grande sucesso do ano de 1967 foi o III Festival de Música Popular Brasileira, que teve como vencedores Edu Lobo e Capinam, com Ponteio; Gilberto Gil/Mutantes com Domingo no Parque; Chico Buarque com Roda Viva; Caetano Veloso, com Alegria, Alegria e Luiz Carlos Paraná, na voz de Roberto Carlos, a música Maria, Carnaval e Cinza. A TV Bandeirantes foi inaugurada em São Paulo. Assis Chateaubriand, que trouxe a televisão para o Brasil, morre em 1968. Devido ao AI-5 o Jornal de Vanguarda sai do ar e termina a novela mais longa da história da televisão brasileira, Redenção, com 596 capítulos. Depois de 10 anos no ar, a TV Excelsior é extinta. No ano de 1970, o número de aparelhos chega a 4 milhões e atinge 25 milhões de espectadores por causa da Copa do Mundo. O Brasil ganha o tricampeonato mundial,

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porém como não havia aparelhos para transmissão e para recepção, os brasileiros assistiram a copa em preto e branco. Para Renato Ortiz:

Nos anos 70 a TV adquire uma qualidade empresarial e tecnológica, possibilitada pela filmagem de cenas externas, edição eletrônica, acompanhamento minucioso das cenas, pesquisas, o que permite uma aproximação convincente do mundo do telespectador. Destaca-se uma divisão entre novelas consideradas boas e “alienadas”, na linha do velho folhetim do século passado. As novelas começam a tratar de subtemas com apelos específicos para os públicos-alvo que se quer conquistar (mistura de personagens, temáticas para jovens, homens, mulheres, pessoas de idade etc.) (ORTIZ,2001,p. 18).

A TV Cultura/SP, em 1972 e 1973, se destacou por apresentar vários programas educativos como era seu objetivo, entre eles Vila Sésamo que era gravado em estúdios modernos da TV Cultura, tendo a TV Globo como co-produtora. Nesse mesmo período, a TV Bandeirantes foi a pioneira a transmitir toda a sua programação totalmente em cores (In:, 2009). Nessa mesma época, a TV Tupi tinha mais estações que a TV Globo, porém estava atrasada em relação ao sistema de rede, só começando a utilizá-lo a partir de 1973. Na TV Bandeirantes estréia A Hora do Bolinha, com Edson Curi, que depois passa a chamar Clube do Bolinha ficando 18 anos no ar. Um fato marcante aconteceu em 1975, o assassinato do jornalista Wladimir Herzog, do Departamento de Telejornalismo da TV Cultura de São Paulo, ele foi retirado de dentro da emissora e levado para o DOPs, onde foi encontrado morto com o próprio cinto. Só em 1988, o então Presidente Fernando Henrique Cardoso, reconhece sua morte como assassinato pelos militares e não suicídio. Depois de muito tempo na TV Globo, Sílvio Santos sai e muda para a TV Record com o programa Sílvio Santos Diferente que, em maio daquele ano, recebeu o título de “Carioca Honorário”, concedido pela Assembléia Legislativa na TVs – TV Studios. O programa era exibido aos domingos e lançou quadros como Arrisca Tudo em que os participantes ganhavam dinheiro respondendo a perguntas, um molde utilizado ainda hoje pelo apresentador. O decreto que regulamentou a propaganda governamental gratuita por dez minutos diários foi baixado em 1977 e o governo outorgou 83 concessões de canais de televisão. A TV Record pegou fogo novamente, mas os filmes mantiveram a sua programação.

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Em 1978, a ABEPEC (Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais) realizou uma pesquisa e constatou que 12% da programação total era de novelas e 22% de filmes e naquela época existiam 14 milhões e 800 mil de aparelhos de televisores no Brasil. Neste ano, a TV Cultura exibiu o II Festival Internacional de Jazz. No ano seguinte, em março de 1979, o então presidente Ernesto Geisel extinguiu o AI-5, que censurava alguns programas. Com 106 emissoras comerciais e 12 estatais, o ano de 1980 tinha, com pesquisa do censo nacional, 55 % de um total de 26, 4 milhões de residências já com aparelhos de televisão, eram 18 milhões e 300 mil de aparelhos, um marco histórico ocorreu no dia 3 de fevereiro o fim da censura no jornalismo (In:,2009). A TV Tupi, nessa década, passa por uma crise em que funcionários são demitidos, fazem greve e o governo cassa por corrupção financeira seus canais. Em 23 de julho, o Governo Federal abre concorrência para exploração de novas redes de TV e um dos primeiros concessionários foi Silvio Santos. O SBT – Sistema Brasileiro de Televisão - inicia suas operações como rede de emissoras, que em 1981, lança Gugu Liberato. Um momento histórico para a televisão brasileira aconteceu quando Silvio Santos e Adolpho Bloch, ao assinarem o contrato definitivo com o ministro da Comunicação, Haroldo de Correa de Mattos, permitiram ao SBT transmitir ao vivo o nascimento da emissora, já com logotipo. Em 1983, a inicia suas transmissões com cinco emissoras próprias. A TV Gazeta lança Fausto Silva, no programa Perdidos na Noite e estréia, no SBT, a série Chaves, de grande sucesso e o quadro Porta da Esperança. Em 1984, a Rede Manchete, pela primeira vez, transmite ao vivo os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro, com a inauguração do sambódromo da Marques de Sapucaí. Xuxa, estreia na Rede Manchete, em 1985, como apresentadora do programa infantil Clube da Criança, mas no ano seguinte começa a ter prejuízo, para tanto são contratados astros, objetivando contornar a crise. A TV Cultura também passa por dificuldades, um grande incêndio destrói praticamente 90% da capacidade de sua produção e a reportagem da própria emissora transmite cenas do incêndio, mas mesmo assim a TV não fica fora do ar, pois outras emissoras cedem ajuda e equipamentos como a TV Globo, a Bandeirantes e a Manchete. O jornalista Roberto Muylaert assume a direção com o objetivo de reerguer a TV Cultura.

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Em 1987, o SBT já alcançava bons índices de audiência, tendo como um programa de destaque o A Praça é Nossa. Ocorre nova crise na Rede Manchete, com isso há demissão de funcionários e surge o interesse em vender a rede. No dia 5 de outubro de 1988 foi promulgada a nova Constituição Brasileira que definiu o sistema de concessão de canais de rádio e TV. A partir dele, as renovações ou concessões dependem da aprovação do Congresso Nacional. Morre Chacrinha, José Abelardo de Medeiros Barbosa. Na tentativa de salvar a Rede Manchete, são colocados, em 1988, 19 novos programas no ar. Em 1989, a posse de Fernando Collor de Mello, no dia 1º de janeiro de 1990, como primeiro presidente eleito pelo voto direto, foi transmitida por várias emissoras ao vivo. A Igreja Universal do Reino de Deus, do Bispo Edir Macedo, compra a TV Record em 1990. A Rede Manchete lança a novela Pantanal, de Benedito Ruy Barbosa, rompendo uma linguagem tradicional das novelas. Neste ano, também nasce a MTV de São Paulo, sendo o primeiro canal de TV segmentado e o único com transmissão 24 horas por dia com vários patrocinadores (In:, 2009). O Sistema Nacional de Televisão passa por uma crise e Sílvio Santos autoriza a contratação de profissionais de marketing e vendas. A TV Jovem Pan obtém a concessão através do presidente Fernando Collor de Mello. Em 1992, a Rede Manchete é vendida para o Grupo IBF, de Hamilton Lucas de Oliveira, e canais de UHF, como MTV e Rede Vida estreiam com programações específicas. Em 1994, o Brasil é tetracampeão e alcança audiência de 3 milhões de espectadores. É inaugurada a Rede Mulher, pertencendo ao empresário Roberto Montoro. A rede Manchete dá sinais de recuperação, mas perde seu fundador, Adolfho Bloch. Um grande passo para o SBT, em 1996, foi representado pela exclusividade em transmitir o Oscar. Nessa época, a Rede Record elevou os índices de audiência, e a Rede Manchete levou ao ar Chica da Silva, um grande sucesso da emissora. Segundo Renato Ortiz:

Difícil aplicar à sociedade (...) o conceito de indústria cultural introduzido por Adorno e Horkheimer que pressupõe “que os indivíduos no capitalismo avançado se encontram atomizados no mercado e, desta forma, podem ser „agrupados‟ em torno de determinadas instituições. Porque a indústria cultural integra as pessoas a partir do alto, ela é autoritária, impondo uma forma de

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dominação que as „sintoniza‟ a um centro ao qual elas estariam „ligadas‟” (p. 48-9). No Brasil, falta às empresas culturais justamente o caráter integrador (ORTIZ, 2001,p.8).

A ANATEL, Agência Nacional de Telecomunicações, foi criada em 1997 para regular e fiscalizar o setor das telecomunicações. Já em 1998, o recorde de audiência deveu-se à Copa do Mundo, no entanto, o Brasil perdeu para a França. Ainda em 1998, com a dívida com a Embratel, a Rede Manchete sofreu com cortes diários das emissoras no satélite e os próprios funcionários puseram no ar slides exigindo solução para a crise. Em 1999, o sinal da TV Cultura foi cortado devido ao atraso no pagamento à Embratel e, no dia 15 de novembro, estreou oficialmente a Rede TV e a Rede Mulher.

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Rede Globo

Figura 6: Fonte: In: http://www.pensetv.com.br/wp-content/uploads/2009/03/globo1.bmp>,2009)

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2.2. Rede Globo

Em 26 de abril de 1965, a emissora do Rio de Janeiro, canal 4, através da TV Paulista, empresa de Roberto Marinho recebe a concessão que foi outorgada pelo presidente Juscelino Kubitschek. O grupo Time Life possibilita um maior faturamento da TV Globo, provocando uma grande diferença em relação às outras emissoras. Em 1966, uma CPI averigua a associação da TV Globo com a Time Life, graças a uma denúncia feita pelo senador João Calmon que tinha ligação com os Diários Associados (TV Tupi). Roberto Marinho compra de Victor Costa a TV Paulista que passa a se chamada TV Globo. A partir de então a televisão brasileira inicia uma nova fase. (In:2009). A administração da Globo é conduzida por profissionais de marketing muito bem preparados nos Estados Unidos. Walter Clark torna-se o principal diretor que cria o pacote publicitário em que o anunciante que quisesse seu produto no horário nobre teria que comprar também em outros horários. Assim, se dá o padrão Globo de qualidade. Inovando e impondo a idéia de que é a própria emissora que faz a televisão e não o patrocinador. Sílvio Santos estréia aos domingos o programa Música e Alegria, o contrato é renovado por cinco anos e passa a ser o Programa Sílvio Santos, então exibido no Rio de Janeiro também, um grande fenômeno de audiência com Luiz Lombardi que auxiliava na condução do programa. Uma das primeiras novelas da TV Globo foi Eu compro esta mulher, escrita pela cubana Glória Magadan e, depois, O Sheik de Agadir, da mesma autora. Faziam parte da primeira equipe da TV Globo: Walter Clark, responsável pela produção, programação, vendas e administração; Luiz Guimarães, diretor adjunto da vice-presidência; Joe Wallach, área administrativa; José Ulisses Arce, comercialização; José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, responsável pela produção e programação; Borjalo, na área de criação e José Armando Nogueira, jornalismo. Em 1967, vai ao ar a Discoteca do Chacrinha, que permanece até 1972, e o programa Dercy de Verdade, apresentado pela própria Dercy Gonçalves. Nesse período, novelas cubanas eram gravadas nos estúdios da Globo, elas eram dirigidas por Daniel

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Filho. Nesse ano foi transmitido, também pela TV Globo, o II Festival de Música Popular Brasileira. No ano seguinte, em 1968, Roberto Marinho, além das emissoras de São Paulo e do Rio de Janeiro, compra também a de Belo Horizonte. A TV Globo é pioneira na transmissão, via satélite, do lançamento da nave espacial, Apollo IX (In:2009). Para conquistar mais audiência, pois sofria ameaça constante da TV Record em São Paulo, a TV Globo lança outros novos programas como O Homem do Sapato Branco. No ano seguinte, a Time Life retira-se da Globo que passa a ser uma rede nacional. No dia 1º de setembro, estreia o Jornal Nacional entre duas novelas, e esse formato continua até nos dias atuais, o apresentador Cid Moreira fica por 27 anos no ar, com uma apresentação requintada e fria, dentro de um padrão de formalidade. A emissora carioca pega fogo no dia 10 de janeiro de 1970, e Chacrinha sai da Globo. Estréia o programa Som Livre Exportação, um programa musical, com o objetivo de minimizar a censura e a ditadura da época com compositores como Wilson Simonal, Don e Ravel, Antônio Carlos e Jocafi, Ivan Lins fazem uma propaganda pacífica e sentimentalista. O núcleo de novelas passa a ter como diretor geral Daniel Filho e se destacam as novelas Irmãos Coragem e Minha Doce Namorada. Em 1971, a Globo, do Rio de Janeiro, treina seus técnicos para implantar cor na imagem. Um padrão diferenciado de outras emissoras, com belos logotipos e imagens, instalou-se, proporcionando o distanciamento da realidade brasileira que, em sua maioria, vivia na miséria. O diferencial da TV Globo eram as novelas que mantêm o espectador em constante atenção, como fórmulas concretas, como o ar romântico das 18h, humorística das 20h, e as ousadas das 22h, no conteúdo e na técnica. A emissora, no dia 19 de fevereiro de 1972, exibe sua primeira transmissão em cores, via Embratel, a Festa da Uva de Caxias no Rio Grande do Sul. Há destaque para a TV Globo que apresenta seus astros e estrelas contratados e se consolida como maior rede nacional de televisão, contando 36 filiadas em apenas sete anos.O teatro Fênix, no Rio de Janeiro, é inaugurado com a Discoteca do Chacrinha. (In:2009). O programa em forma de revista que está no ar até hoje, o Fantástico, começou com a apresentação de Cid Moreira e dirigido por Augusto César Vanucci, em 1973. A

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programação da TV Globo, objetivava atingir um padrão visual de qualidade e com os maiores preços da televisão brasileira. A emissora alcança uma rentabilidade de 72% e dá início a uma programação totalmente nacional. No ano de 1976, um incêndio na TV Globo, do Rio de Janeiro, faz com que sua programação seja produzida em outras cidades. Nesse mesmo ano, Roberto Marinho recebe o prêmio internacional Emmy como Homem Destaque da Televisão. Os programas da Globo, dublados em espanhol, começam a ser exportados para países da América Latina. Em agosto, o Programa Sílvio Santos termina a fase da TV Globo e a censura veta a novela Roque Santeiro, indo ao ar somente dez anos depois. No dia 31 de dezembro de 1977, a Fundação Roberto Marinho (FRM), juntamente com a Fundação Padre Anchieta, é oficializada com telecursos, atividades cívicas, educativas, culturais, de lazer. Em 1978, o Telecurso 2º Grau, apresentado por artistas, transmite suas aulas em horários menos concorridos por não contarem com patrocínios. A novela Dancing Days, de Gilberto Braga, estreia introduzindo o merchandising nas novelas. As Séries Brasileiras passam a ser produzidas pela Rede Globo em 1979, substituindo as estrangeiras. Malu Mulher é uma delas, representando a realidade paulistana. Sob o comando de Roberto Carlos, a Rede Globo promove a maior campanha para arrecadar donativos e fundos no Ano Internacional da Criança. A série infantil, Sítio do Pica-Pau Amarelo recebe prêmio de melhor programa do ano pela UNESCO e é lançado o programa Globo Rural que permanece no ar até hoje. Em 1980, a Rede Globo é premiada pela Internacional Council of the National Academy of Television, Arts and Scienses, dos Estados Unidos, com o Prêmio Salute por sua grande qualidade na programação, assim adquire condições de exportar seus programas para 71 países. Com 16 anos no ar, a Rede Globo tem 60% da audiência e 75% na publicidade e, em 1981, atingiu o faturamento de US$ 3 milhões. O telecurso 1º grau vai ao ar apresentado por professores, e o telejornalismo recebe investimentos, lançando a TV Mulher e o Bom Dia Brasil. Ainda na liderança, a Globo, agora com 45% de audiência, sofre ameaça da TV Bandeirantes e do SBT. Porém, com 27 emissoras e 5.500 funcionários, introduz o uso de satélite na programação, em 1982, e a novela Dancyng in Days recebe a “Prêmio Asa de Ouro” da Crítica Italiana. (In:2009).

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A concorrência ameaça a audiência e, por este motivo, Chacrinha é recontratado estrelando O Cassino do Chacrinha, estreiam ainda Caso Verdade, Balão Mágico e a minissérie Avenida Paulista. O Jornal Nacional, em 1983, abrange a maior audiência da TV brasileira na época. Ano de Diretas Já, a Globo tentou omitir o movimento, mas em 25 de janeiro de 1984, transmite uma pequena parte de um comício da campanha. Nesse ano, o Jornal Nacional chega a 64 pontos no Ibope. Em 1985, a Rede Globo, já com 20 anos, é a quarta maior emissora comercial do mundo, cobrindo 98% do território nacional com 70% da audiência e exportando sua programação para 128 países. É criada a campanha Criança Esperança e a novela de maior audiência, atingindo 90%, da história da Rede Globo, é Roque Santeiro. O programa Som Brasil, em 1987, é eleito pela União Soviética, como melhor programa de televisão do mundo. No ano de 1988, a novela Vale Tudo obtém grande índice de audiência com o assassinato da personagem Odete Roitman, vivido pela atriz Beatriz Segal. No dia 23 de março de 1989, estreia o Domingão do Faustão, apresentado por Fausto Silva, permanecendo até os dias atuais. No ano seguinte, o SBT e a Manchete ameaçam a audiência da TV Globo, sai do ar o programa TV Pirata, por ser caro e ter pouca audiência, porém destacam-se as novelas Tieta e Rainha da Sucata, bem como o programa a Escolinha do Professor Raimundo. Um grande diferencial da Rede Globo, além do padrão de qualidade é que os autores escrevem as novelas enquanto são exibidas, podendo assim alterar o fim. Em meados de 1991, as minisséries ganham força e não perdem em qualidade para as séries. Mobilizando 500 profissionais, o jornalismo ocupa dez horas por dia de programação. Em 1995 é inaugurado o Projac (Projeto Jacarepaguá), Central de Produção, constituído por uma grande estrutura. E estreia Explode Coração, a primeira novela gravada nesse local. Já em 1996, Cid Moreira e Sérgio Chapelin saem do Jornal Nacional e dão lugar a Lilian Wite Fibe e Willian Borner. Este, em 1998, passa a apresentar o Jornal Nacional ao lado de Fátima Bernardes. O projeto “Brasil 500 anos – Como se muda um país através da educação”, em dezembro, anuncia o direito de exclusividade para a transmissão da copa do mundo. Em 1999, o Jornalista Roberto Marinho é eleito o Comunicador do século com o prêmio Brasileiro do Século, pela Revista Istoé.

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2.3. Adaptações para Televisão

- Não se espante de ver meu olhar constantemente perdido. Este é mesmo meu modo de ler, e só assim a leitura me é proveitosa. Se um livro me interessa de verdade, não consigo avançar além de umas poucas linhas sem que minha mente, tendo captado uma idéia que o texto propõe, um sentimento, uma dúvida, uma imagem, saia pela tangente e salte de pensamento em pensamento, de imagem em imagem num itinerário de raciocínios e fantasias que sinto a necessidade de percorrer até o fim [...]. - Eu o entendo [...] – intervém outro leitor [...] – [...] [mas] minha atenção, ao contrário da sua, não pode afastar-se das linhas escritas nem por um instante sequer. Não devo distrair-me para não deixar escapar nenhum indício precioso. ÍTALO CALVINO, Se um Viajante numa Noite de Inverno.

Segundo Sandra Reimão, “uma adaptação de um texto literário para um programa televisivo é, em primeira instância, um processo de mudança de suporte físico”(2004,107). Assim, um texto literário é uma produção individual, já os produtos de comunicação de massa são de produção conjunta. O leitor utiliza um único sentido, a visão da linearidade da linha impressa, enquanto o telespectador utiliza uma multiplicidade de sentidos e direções como a audição e a visão. Adaptar significa, de certa forma, tornar o texto de uma obra literária mais acessível ao público, transformando-o. Assim, são necessárias modificações, pois a TV reescreve o texto literário a partir de outros princípios discursivos, elaborados pelo adaptador. As adaptações têm condições de ampliar e diversificar a leitura de textos ficcionais, literários e até da própria linguagem televisiva (NAGAMINI, 2004, p.206). A adaptação é proveniente de técnicas jornalísticas, narrativas e redacionais, porém uma adaptação pode fazer contraposição à obra original em que se baseia, quando a Literatura sente-se traída ao ser transposta para o cinema:

Quando narramos apenas o que todos podem ver, ou quando simplesmente fazemos referência a seres e objetos cuja existência é tão palpável que qualquer pessoa pode comprová-la, torna-se impossível alcançar o plano da poesia. Motivo pelo qual usa-se palavras para construir o seu

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mundo, mas o que se passa ao leitor não está nas palavras em si, está no que elas significam e no que possuem de faunos e sereias, que só existem na confluência do real com o irreal. Porque o sentido da poesia – e, por extensão, da crônica, que tem suporte poético – está na ultrapassagem do que é para alcançar aquilo que pode ou poderia ser. (SÁ, 2002, p. 49-50).

Na década de 1970, havia uma enorme preocupação quanto à fidelidade da obra adaptada, mas esta preocupação está sendo modificada e, hoje, se tem grande liberdade no que se refere à obra final:

A adaptação pode parecer uma tarefa, mas na verdade ela exige muito cuidado e grande habilidade e compreensão do cinema. Entra aí a chamada licença dramática, onde se pode fazer alterações, simplificar, eliminar informações para que a história funcione e possa ser contada em outro veículo. (HOWARD, 1996, p. 36)

Há muitas situações escritas nos livros que não funcionam na tela. Em um livro, às vezes, o escritor tem o auxílio de figuras de linguagem para passar o que quer, já o roteirista precisa unir diferentes elementos como imagens, diálogos, narrações, música, efeitos sonoros, entre outros, para prosseguir com o resultado desejado. Portanto:

Adaptar um texto significa reinterpretar e redimensionar aspectos da narrativa a fim de adequá-la à linguagem do outro veículo. Não precisa ser uma cópia fiel, pois nem sempre é possível simplesmente transportar uma seqüência, um diálogo, além disso, a obra sofre uma estrutura narrativa, sobretudo quando adaptada para a televisão. (NAGANIMI, 2004, p.36)

Em um livro, o leitor tem a liberdade de ler a obra quando desejar, mas precisa ser alfabetizado. O autor descreve em sua obra, informações que ele julga ser imprescindíveis para o entretenimento, o restante, como imagens e sons, deixa por conta da imaginação de cada leitor. O leitor fica livre para escolher o melhor ambiente e o rosto para seus personagens. Já o telespectador não precisa ser alfabetizado, e os personagens, imagens e sons estão impostos desde o início. Não tendo trabalho algum, porque tudo está à sua frente, pronto para ser visto. Essa é uma das decepções do leitor, o filme não condiz com suas projeções imaginárias. Enquanto o leitor com pouco contato com a leitura prefere o filme proveniente de uma obra literária, pois não precisa necessariamente, ao assisti-lo, projetar cenários e personagens.

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Filmes comerciais, que são destinados à venda, não permitem a interação com o leitor, o final é fechado, as personagens não evoluem, são planas, e estão determinadas desde o início a serem más ou boas. Assim, o universo narrativo revela-se maniqueísta, premiando o bom herói, o modelar, e penalizando o considerado ruim, aquele que rompe com as normas sociais estabelecidas para sempre e jamais consideradas errôneas ou equivocadas. Para Howard e Mabley (1996, p. 36), sobre a adaptação, os autores afirmam que “adaptar uma história tirada de outra fonte em geral exige mais habilidade e maior compreensão do veículo cinematográfico do que criar uma história nova.” Em síntese, David e Edward ressaltam a diferença entre o filme e o livro e afirmam que “ o que é mostrado na tela é „real‟ para o espectador; os atores são as personagens, os lugares e fatos parecem tão reais quanto o cineasta consegue fazê-los parecerem reais. Já o leitor evoca imagens de pessoas, lugares e fatos que ele próprio tem na mente e encanta-se com os partes e reflexões do autor.”

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Capítulo III

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Figura 7: (Fonte:,2009)

Figura 8: (Fonte:< http://www.terra.com.br/.../159/celebridade/index.htm>,2009)

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3. A Minissérie Memórias de um Gigolô

3.1 Ficha Técnica Título Original: Memórias de um Gigolô Gênero: Alegoria romântica Origem/Ano: BRA/1986 Duração: 20 capítulos / 14 de julho a 8 de agosto de 1986 Horário: 22h Direção: Walter Avancini Roteiro: Walter Avancini / Walter George Durst / Marcos Rey Direção Músical: Murilo Alvarenga (em tom de opereta, com flashes musicais de sucessos da época de 20) Supervisão: Daniel Filho Produção do Núcleo: Ary Grandinetti Nogueira

3.2 Elenco:

Lauro Corona - Mariano

Bruna Lombardi - Lu

Ney Latorraca - Esmeraldo

Elke Maravilha - Madame Yara

Zilka Salaberry - Bianca Perla

Ida Gomes - Zizi de La Rocha

Zé Trindade - Buster Keaton

Oberdan Júnior - Mariano (criança)

Leiloca - Albina

Silveirinha - Gu

Marco Antônio Pâmio - Silva

Renato Coutinho - Baron

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Dênis Derkian - Tavinho Annik Malvil

Leiloca - Albina Newton Prado

Lutero Luiz - Lucas Tim Rescala

Selma Egrei Bárbara Fazio

Walter Forster Daniel Barcellos

Castro Gonzaga Bentinho

Serafim Gonzalez Kenny Castro

Lolita Rodrigues Paulo Fortes

Arlete Salles Débora Fuchs

Ileana Kwasinski Tereza Mascarenhas

Umberto Magnani Cristina Medeiros

3.3 Sinopse: Relata as memórias de Mariano, um aprendiz de gigolô criado por uma cafetina, Madame Iara, o qual se apaixona loucamente por Lu, uma prostituta que é protegida de Esmeraldo, cafetão profissional. Está armado o triângulo amoroso que gera grandes confusões: Mariano ama Lu, que ama Esmeraldo, que ama Lu, que também ama

Mariano. A história se passa no auge do ciclo do café, na São Paulo do anos 20, e retrata uma sucessão sem fim de golpes e maladragens aplicadas pelos dois protagonistas para seduzir sua amada, que por não conseguir se decidir, troca entre os dois amantes constantemente. (In:

%B4_(miniss%C3%A9rie)#Sinopse>, 2009)

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3.4 A estrutura da minissérie Memórias de um Gigolô

A minissérie possui trilha sonora em tom de opereta, com flashes musicais dos anos 20 e pode ser dividida em três atos. No primeiro ato, os personagens são apresentados ao espectador. A partir do segundo ato, os problemas começam a aparecer. Já no terceiro ato, há a resolução da trama.

Observe a seguir essa divisão feita por meio de fotogramas:

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3.5 Análise dos Fotogramas

1º Ato

Fotograma 1 – 00:02:15 - DVD 1

a. Plano conjunto: mostra Mariano ainda criança enquanto distribuía panfletos de sua tia Antonieta, que era cartomante. b. Posição da câmera: ao lado do personagem, movimenta-se junto com ele, produzindo um travelling, focando seu rosto. c. Cenário: aberto, durante o dia, na rua em frente à entrada de uma casa. Percebe- se uma grade. d. Estrutura: comunicativa, sério.

O protagonista caminha pelas ruas da antiga São Paulo, distribuindo panfletos da cartomante, sua tia Antonieta, interagindo com as pessoas que passam pela rua.

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Fotograma 2 – 00:02:29

a. Plano conjunto: mostra Mariano pensativo b. Posição da câmera: em close, em frente ao personagem (contra-plongé) c. Cenário: aberto, na rua, em seqüência da cena anterior. d. Estrutura narrativa: sério.

O personagem é focado para que a cena consiga mostrar seu semblante enquanto criança, apresentando o personagem Mariano ao seu espectador.

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Fotograma 3 – 00:02:56

a. Plano conjunto: Mostra Mariano com sua tia Antonieta caminhando nas ruas da antiga São Paulo, capital. b. Posição da câmera: de cima para baixo (plongé) c. Cenário: aberto, durante o dia, na rua com vários mercadores. d. Estrutura narrativa: alegria, entusiasmo.

Mariano e sua tia Antonieta caminham pelas ruas de São Paulo, a cartomante apresenta-se em um de seus vários perfis, como trapaceira.

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Fotograma 4 – 00:05:53

a. Plano conjunto: mostra a cartomante Antonieta explicando b. Posição da câmera: em frente aos personagens. c. Cenário: fechado, dentro de casa. d. Estrutura narrativa: conversa.

Madame Antonieta, como era conhecida, orienta seu sobrinho sobre suas inúmeras trapaças.

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Fotograma 5 – 00:05:57

a. Plano conjunto: mostra tia Antonieta em close, e Mariano em frente a ela, mas de costas para a câmera. b. Posição da câmera: em frente a personagem, em close. c. Cenário: fechado, dentro de casa. d. Estrutura narrativa: sério, conversa.

Como responsável pela “educação” do sobrinho, Madame Antonieta se sentia no dever de posicioná-lo perante a vida. Porém, sua orientação era sempre no sentido de prepará-lo para trapaças.

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2º Ato

Fotograma 6 – 00:08:46

a. Plano conjunto: mostra Madame Antonieta adoentada, muito mal e tirando as cartas para Mariano, lendo seu destino. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens, mas de frente para a cartomante, a câmera focaliza a carta que é apresentada a Mariano. c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: sério.

Em seu leito de morte, tia Antonieta revela a Mariano seu destino, tirando as cartas que revelam que em sua vida haveria um valete de espadas que lhe daria grande trabalho e a dama de ouro, a mulher, que desgraçaria sua vida. Pode-se notar que se inicia o segundo ato, pois surge a problematização que sustentará toda trama.

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Fotograma 7 – 00:16:03

a. Plano conjunto: mostra Mariano, já adulto, vivendo no bordel de Madame Iara. O rapaz cresceu em meio a climas furtivos e “garotas coloridas”. b. Posição da câmera: em frente aos personagens, gira em travilling dentro da casa de Madame Iara. c. Cenário: fechado, dentro da sala do bordel. d. Estrutura narrativa: sério, reflexivos.

Os personagens estão conversando, sentados em uma das mesas do salão do bordel, o clima é de cumplicidade, pois Mariano está acostumado ao ambiente que vive desde a morte de sua tia Antonieta.

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Fotograma 8 – 00:16:54

a. Plano conjunto: mostra Mariano em sua função principal dentro da casa, a de escritor de cartas. b. Posição da câmera: em frente aos personagens, movimenta-se com eles. c. Cenário: fechado, na sala de jogos da casa. d. Estrutura narrativa: sério, compenetrados.

O protagonista aparece exercendo um de seus primeiros empregos, Mariano escrevia cartas e cobrava por isso. As moças do “estabelecimento” não eram alfabetizadas, o que era comum na época, e necessitavam enviar cartas para os familiares contando como levavam a vida na capital de São Paulo, porém ficava a cargo de Mariano usar a criatividade para inventar histórias, função que desempenhava muito bem.

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Fotograma 9 – 00:23:24

a. Plano conjunto: mostra o momento em que Lu chega ao bordel. b. Posição da câmera: em frente à personagem, focalizando em close. c. Cenário: fechado, dentro da casa. d. Estrutura narrativa: sério, de sensualidade.

Guadalupe, Lupe ou simplesmente Lu, chega ao bordel como a grande novidade, com estilo afrancesado, imitando uma autêntica melindrosa. A moça causa euforia com sua estonteante beleza. Esta é a primeira visão que Mariano tem da Virgem de Guadalupe. Tem início o martírio em sua vida.

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Fotograma 10 – 00:32:31

a. Plano conjunto: mostra Madame Iara em uma das noites em sua casa, repleta de frequentadores, tendo ao seu lado está Lu. b. Posição da câmera: do lado das personagens, girando em travelling por todo o salão. c. Cenário: fechado, dentro do salão. d. Estrutura narrativa: alegre, festivo.

Madame Iara, a proprietária do bordel mais frequentado da cidade apresenta sua mais nova atração, a linda Guadalupe, conhecida por Lu. Porém, a moça não se mostra muito satisfeita com a euforia do lugar.

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Fotograma 11 – 00:35:24

a. Plano conjunto: mostra Lu e Mariano sentados à mesa lado a lado. b. Posição da câmera: em frente aos personagens. c. Cenário: fechado, dentro da sala de jantar. d. Estrutura narrativa: diálogo alegre durante a refeição.

Durante o jantar, Mariano tenta se aproximar de Lu, sentando ao seu lado para uma maior proximidade, já mostrando interesse em conquistá-la.

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Fotograma 12 – 00:44:06

a. Plano conjunto: mostra o momento em que Esmeraldo chega ao saguão da casa de Madame Iara. b. Posição da câmera: de lado, mostrando em primeiro plano Mariano e, ao fundo, Esmeraldo. c. Cenário: fechado, no rool de entrada do salão. d. Estrutura narrativa: sério, tenso.

O Valete de Espadas, Esmeraldo, aparece pela primeira vez na casa de madame Iara.

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Fotograma 13 – 00:47:43

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo e Lu em um abraço caloroso, Mariano presencia a cena.. b. Posição da câmera: do lado do personagem Mariano, focando o plano de fundo. c. Cenário: fechado, área de lazer da casa. e. Estrutura narrativa: sério, introspectivo.

Mariano sente ciúmes de Lu ao vê-la nos braços de Mariano. O rapaz, já apaixonado, a partir deste momento, trava uma batalha para ganhar a moça.

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Fotograma 14 – 01:06:28

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo e Guadalupe no quarto. b. Posição da câmera: em frente aos personagens. c. Cenário: fechado, quarto do casal. d. Estrutura narrativa: tensão, agressividade.

Esmeraldo, por ser o gigolô de Lu, a pressiona, percebendo que a moça começa a corresponder aos carinhos e interesses de Mariano.

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Fotograma 15 – 01:07:00

a. Plano conjunto: mostra Lu e Mariano no quarto. b. Posição da câmera: de frente aos personagens, girando em travelling e se posicionando em Mariano. c. Cenário: fechado, no quarto. d. Estrutura narrativa: sério, tenso.

Já apaixonados, os personagens começam a se envolver em um triângulo amoroso que compromete Mariano, Lu e Esmeraldo. Mas a moça fica dividida entre os dois amores e não consegue se decidir com qual deles gostaria de ficar.

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Fotograma 16 – 01:07:26

a. Plano conjunto: mostra Mariano jogando cartas. b. Posição da câmera: de cima para baixo (plongé). c. Cenário: fechado, dentro da sala de jogos. d. Estrutura narrativa: calmo, sério.

As cartas representam um plant (pista) dentro da narrativa, elas aparecem sempre. Nesta cena, Mariano as joga, tomando o devido cuidado para que ninguém perceba suas trapaças, recursos que herdou de sua tia Antonieta, o jogo e as trapaças.

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Fotograma 17 – 01:28:51

a. Plano conjunto: mostra Mariano prostrado em sua cama. b. Posição da câmera: em frente ao personagem, de cima para baixo (contra- plongé) c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: triste.

Por não ser correspondido como gostaria, Mariano adoece de amor por Lu, o enredo da história mostrará este perfil do personagem várias vezes, apaixonado, cabisbaixo, correspondido, traído. A trama girará em torno dessa paixão turbulenta e tempestuosa..

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Fotograma 18 – 02:18:13

a. Plano conjunto: mostra Mariano e as moças que trabalham na casa de Madame Iara. b. Posição da câmera: em frente aos personagens c. Cenário: fechado, no corredor da casa. d. Estrutura narrativa: alegria, entusiasmo.

As moças da casa de Madame Iara, A Dama de Ouro, a casa mais alegre da capital da antiga São Paulo, são alegres e coloridas, e isso faz com que Mariano esqueça um pouco o seu sofrimento por não ter seu amor por Lu correspondido.

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Fotograma 19 – 02:18:19

a. Plano conjunto: mostra Mariano lendo uma carta para as meninas de Madame Iara. b. Posição da câmera: de baixo para cima (contra-plongé) c. Cenário: fechado, na sala da casa. d. Estrutura narrativa: alegre, comunicativo.

Uma das funções que o protagonista exercia era a de escritor de cartas, e ele as lia também. Nessa cena, o foco principal é o de mostrar a alegria das moças ao receber uma correspondência, visto que elas viviam longe de seus familiares. Cartas sempre trazem notícias de quem está longe. Assim, duplica-se na narrativa o sentido do vocábulo “carta”, associado ora ao jogo, ora à correspondência. Contudo, em ambos casos prevalece a dissimulação.

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Fotograma 20 – 02:26:59

a. Plano conjunto: mostra Lu abandonada em sua tristeza com uma amiga. b. Posição da câmera: do lado da personagem, focando seu rosto de cima para baixo. c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: triste, introspectivo.

Lu, dividida entre dois amores, começa a pensar em abandonar Esmeraldo para ficar com Mariano, mas por temer a violência de seu gigolô, fica pensativa sobre o que fazer a respeito de tal situação.

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Fotograma 21 – 02:51:07

a. Plano conjunto: mostra as moças que trabalham na casa de Madame Iara. b. Posição da câmera: panorâmica. c. Cenário: aberto, durante o dia, no jardim da casa d. Estrutura narrativa: alegre, festivo.

Essa cena mostra todas as moças de “vida fácil” que trabalham com Lu em um treinamento como dançarina francesa muito experiente na arte de seduzir. Apesar de o clima ser alegre, há certa rivalidade por parte das moças que disputam entre si o título da mais graciosa e envolvente.

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Fotograma 22 – 03:07:12

a. Plano conjunto: mostra Lu e Esmeraldo dançando. b. Posição da câmera: de cima para baixo (plongé). c. Cenário: fechado, dentro do salão de baile. d. Estrutura narrativa: festivo e dançante.

Para mostrar sua autoridade sobre Lu, Esmeraldo a pega para dançar e dá um show em meio ao salão de bailes da casa. A presença de outros casais não ofusca o brilho dos protagonistas que desempenham excelente papel de dançarinos.

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Fotograma 23 – 03:27:42

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo sendo preso pelos policiais. b. Posição da câmera: em frente aos personagens, girando em travelling. c. Cenário: fechado, dentro da cadeia. d. Estrutura narrativa: tenso, cômico.

Esmeraldo, em uma de suas falcatruas, foi preso e condenado, deixando o caminho livre para Mariano que não perdeu tempo, “partiu para cima” de Lu sem nenhum constrangimento. Essa cena é cômica, pois o personagem principal, Esmeraldo, é preso nu, desprovido de roupas e de qualquer honestidade.

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Fotograma 24 – 04:00:57

a. Plano conjunto: mostra Mariano e Lu em seu quarto. b. Posição da câmera: de cima para baixo ( plongé). c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: calmo, sensual.

Depois que Esmeraldo foi preso, Mariano consegue, enfim, conquistar sua amada. Essa cena mostra o rapaz observando, apaixonado, a beleza e a sensualidade da moça que está se vestindo e se perfumando.

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Fotograma 25 – 04:01:50

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo preso. b. Posição da câmera: de frente ao personagem. c. Cenário: fechado, dentro da prisão. d. Estrutura narrativa: sério.

Enquanto Mariano vive com Lu uma tórrida história de amor, Esmeraldo continua preso, pagando por um dos inúmeros crimes que cometeu. Apesar da narrativa nesse momento ser de tensão e seriedade, é notável o uso das cores pelo diretor, sempre em tons fortes e quentes, um recurso próprio de alegorias românticas e cômicas.

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Fotograma 26– 04:29:37

a. Plano conjunto: Mariano e Lu analisando as contas que eles têm de pagar. b. Posição da câmera: em frente aos personagens, de cima para baixo (plongé). c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: sério.

O casal começa a perceber que o dinheiro é curto, não há maneira de sobreviver somente de amor, faz-se necessário trabalhar. Lu se disponibiliza a voltar a fazer programas como era de seu costume, porém Mariano se mostra resistente. Persiste, nessa cena, o recurso do uso das cores.

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Fotograma 27– 04:39:42

a. Plano conjunto: mostra Lu e Mariano em um jantar. b. Posição da câmera: em frente a personagem Lu, tendo ao fundo Mariano que a observa. c. Cenário: fechado, dentro do restaurante. d. Estrutura narrativa: sério, compenetrado.

Em clima de sedução, o casal planeja golpes em senhores ricos. Nessa cena, Lu tenta seduzir um senhor, mas sempre amparada pelo seu gigolô, Mariano.

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Fotograma 28 – 04:41:27

a. Plano conjunto: mostra Lu em frente ao espelho e Mariano. b. Posição da câmera: em frente a Mariano, com Lu de costas, mas focando seu reflexo no espelho. c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: diálogo, alegre.

Depois de concordar que Lu voltasse a fazer programas, Mariano começa a usar sua criatividade para elaborar planos para que a moça pudesse seduzir senhores respeitáveis da sociedade. Um dos disfarces era a de uma jovem estudante e inocente. Um outro recurso utilizado durante grande parte da trama televisiva é o espelho, ele aparece em muitas cenas, sempre refletindo a imagem de Lu.

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Fotograma 29 – 00:03:28 - DVD 2

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo saindo da prisão. b. Posição da câmera: de baixo para cima (contra-plongé) c. Cenário: aberto, durante o dia, tendo o prédio da cadeia e os policiais ao fundo. d. Estrutura narrativa: sarcasmo.

O personagem, agora livre, se sente feliz e pronto para resgatar a sua amada dos braços de seu rival, Mariano. Apesar de ter passado um bom tempo preso, o gigolô sai muito elegante e bem vestido, não perde sua “classe”. É perceptível, nessa cena, o tom de sarcasmo do personagem. Sai da cadeia trajando seu, bem alinhado terno, como se estivesse chegando de uma importante viagem, o gigolô mostra sua face dissimulada.

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Fotograma 30– 00:06:05

a. Plano conjunto: mostra Mariano, Lu e Esmeraldo. b. Posição da câmera: de baixo para cima ( contra-plongé). c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: sério, ameaça.

O trio está reunido “discutindo a relação”. Mariano sofre ameaça do Valete de Espadas (Esmeraldo) e é defendido pela Virgem de Guadalupe ( Lu). Essa cena confere permite certo tom de humor ao enredo e ao desenvolvimento da história. Os três sempre brigando e, ao mesmo tempo, em perfeita harmonia.

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Fotograma 31 – 00:29:11

a. Plano conjunto: mostra Mariano, Esmeraldo e Lu no quarto. b. Posição da câmera: de cima para baixo (contra-plongé) c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: calmo, humor.

Os protagonistas, agora vivendo todos juntos, mostram o dia-a-dia de uma vida familiar comum. Os homens consertando um tapete e Lu, lixando as unhas. Harmonia perfeita. Novamente as cores são o destaque, produzindo um efeito visual alegre e chamativo. Nessa cena, os dominadores mostram-se dominados pela fêmea explorada por eles.

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Fotograma 32– 00:40:12

a. Plano conjunto: mostra Lu sentada em um bando de praça com um de seus clientes. b. Posição da câmera: de cima para baixo, focando o casal. c. Cenário: aberto, durante o dia, na praça. d. Estrutura narrativa: diálogo, sensualidade.

A fim de programar um encontro mais íntimo, Lu encontra-se com o rapaz que está atraído por ela. Com roupas coloridas e mostrando os ombros, a garota está disposta a seduzi-lo.

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Fotograma 33 – 01:10:02

a. Plano conjunto: mostra Lu e Mariano em seu quarto. b. Posição da câmera: de baixo para cima (plongé). c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: diálogo, sensualidade.

A Virgem de Guadalupe se prepara para sair de casa, se perfumando. O olhar de Mariano a segue em seu ritual, está tranqüilo mesmo sabendo que sua amada se prepara para sair com outro.

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Fotograma 34 – 02:44:49

a. Plano conjunto: mostra Mariano chorando frente a uma carta. b. Posição da câmera: de frente ao personagem. c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: tristeza, comoção.

Abandonado por Lu, Mariano chora e se entristece por ter perdido o grande amor de sua vida. Como previu sua tia Antonieta quando tirou as cartas de seu baralho em que aparecia a mulher que desgraçaria sua vida. Assim, com os sofrimentos de Mariano, cumpre-se a profecia de sua tia.

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Fotograma 35 – 02:55:15

a. Plano conjunto: mostra Mariano andando pelas ruas maltrapilho. b. Posição da câmera: ao lado do personagem, focando seu rosto. c. Cenário: aberto, durante o dia, na rua da cidade. d. Estrutura narrativa: desesperança, tristeza.

Por ter ficado sozinho, o protagonista se vê desolado e sem destino. Não encontrando mais motivações para viver passa a perambular pelas ruas maltrapilho. O triângulo amoroso da trama, por vezes, deixa-o desamparado, então, nestes momentos Mariano fica sem forças para seguir adiante.

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Fotograma 36 – 03:09:36

a. Plano conjunto: mostra Lu como a bailarina mascarada. b. Posição da câmera: em frente a personagem. c. Cenário: fechado, dentro da boate. d. Estrutura narrativa: alegre, dançante, sensual.

Enquanto Mariano perambula pelas ruas, Lu se destaca como a melhor bailarina da noite paulistana, a Bailarina Mascarada, seu mistério advém do fato de que ninguém conhecia a sua identidade. Esmeraldo era seu gigolô.

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Fotograma 37 – 03:15:18

a. Plano conjunto: mostra Lu entristecida. b. Posição da câmera: ao lado da personagem, focando sei rosto em close. c. Cenário: fechado dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: sério, triste.

Mesmo ficando muito famosa e requisitada, como a Bailarina Mascarada, Lu não estava satisfeita com sua vida sem Mariano, que continuava sem dar notícias. A bela moça em momentos de introspecção, sente-se saudosa e triste.

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Fotograma 38 – 05:01:06

a. Plano conjunto: mostra Mariano ao lado de um morador de rua. b. Posição da câmera: de cima para baixo (plongé) c. Cenário: aberto, durante o dia, na rua. d. Estrutura narrativa: triste, comoção.

Se sentindo solitário e abandonado, o protagonista se vê na condição de mendigo. Sem Lu, sua Virgem de Guadalupe, a vida já não significa nada, não encontra estímulos.

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Fotograma 39 – 06:15:12

a. Plano conjunto: mostra Lu com traje de dançaria e Mariano como garçom. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens, girando em travelling dentro do camarim da boate. c. Cenário: fechado dentro do camarim. d. Estrutura narrativa: suspense, emoção.

Mariano, tendo reagido à sua tristeza por não encontrar Lu, consegue um emprego como garçom justamente na boate em que ela dançava todas as noites. O rapaz se apaixona pela dançarina e invade seu camarim para se declarar. Sua declaração acaba em revelação de que nunca, em toda sua vida, amou tanto quanto teria amado outra mulher que lhe abandonara - Lu. Então a Bailarina Mascarada revela sua identidade e os dois fogem juntos, deixando Esmeraldo à deriva.

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Fotograma 40 – 01:55:02 - DVD 3

a. Plano conjunto: mostra Mariano, Lu e um senhor da alta sociedade paulistana. b. Posição da câmera: em frente aos personagens. c. Cenário: fechado, dentro do restaurante. d. Estrutura narrativa: diálogo, calmo.

Depois que Mariano e Lu fugiram, a moça voltou à ativa tendo como gigolô seu próprio namorado. Ele contactava e marcava encontros entre senhores ricos e Lu, enquanto isso usufruía dos mais caros vinhos e comidas que o dinheiro deles podia comprar. Mariano passa a se conhecido como Mon Gigolô. Come em muitas outras, essa cena mostra a comicidade da minissérie.

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Fotograma 41 – 04:12:00

a. Plano conjunto: mostra Lu e Mariano em uma noite de festa na alta sociedade paulistana. b. Posição da câmera: panorâmica. c. Cenário: fechado, dentro do salão de festas. d. Estrutura narrativa: alegre, comunicativa, festivo.

O casal se destaca, despertando olhares repreensivos de alguns frequentadores. Lu é disputada por vários homens. O gigolô Mariano não se importa em dividir sua amada, pois recebe em troca altos cargos executivos, mesmo sem ter nenhuma formação superior.

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Fotograma 42 – 04:18:30

a. Plano conjunto: mostra Mariano e Lu em um jardim. b. Posição da câmera: panorâmica. c. Cenário: aberto, durante o dia na fazenda. d. Estrutura narrativa: alegre, contagiante.

O casal apaixonado e deslumbrando pela posição social que ocupam nesse momento da trama, planejam casamento para oficializar a união. Lu se sente feliz, pois seu grande sonho é se casar.

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Fotograma 43– 04:23:53

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo atrás da grade do portão. b. Posição da câmera: em frente ao personagem. c. Cenário: aberto durante à noite, na rua. d. Estrutura narrativa: sério.

Agora é Esmeraldo que está desamparado, sem Lu. Procura o casal em sua mansão em um bairro de classe média alta. A tensão dramática na minissérie é atenuada pela comicidade.

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Fotograma 44 – 04:24:16

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo e Mariano separados pela grade do portão. b. Posição da câmera: posiciona-se em frente a Mariano focando-o, Esmeraldo de costas. c. Cenário: aberto, durante à noite na rua. d. Estrutura narrativa: tensão.

Em sequência da cena anterior, essa mostra Mariano e Esmeraldo discutindo sobre quem ficaria com Lu. Porém, a situação favorece Mariano, que ocupa um alto cargo executivo e continua a ser o gigolô de Lu. A cena reflete a ambiguidade dos dois gigolôs, como um espelho.

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Fotograma 45 – 04:51:31

a. Plano conjunto: mostra Mariano e Lu na boate. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens, girando em travilling dentro da boate. c. Cenário: fechado, dentro da boate. d. Estrutura narrativa: melancolia, paixão.

A Virgem de Guadalupe se mostra desinteressada e melancólica, sentindo saudades do Valete de Espadas. Ao contrário da moça, o gigolô continua apaixonado e carinhoso, mesmo notando sua falta de interesse e estímulo. Como acontece durante toda a trama, o triângulo amoroso favorece ora a um, ora a outro.

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Fotograma 46 – 05:05:23

a. Plano conjunto: mostra Mariano chorando. b. Posição da câmera: em close no protagonista. c. Cenário: aberto, durante o dia na rua da cidade de São Paulo. d. Estrutura narrativa: tristeza.

Abandonado pela amada, Mon Gigolô novamente se vê sem rumo e sem destino, entristecido, perambula pelas ruas procurando conforto.

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Fotograma 47 – 05:05:33

a. Plano conjunto: mostra Mariano dormindo no chão do cemitério. b. Posição da câmera: ao lado do personagem. c. Cenário: aberto, durante o dia no cemitério. d. Estrutura narrativa: sério, triste.

Essa cena mostra a decadência em que chegou Mariano, antes morando em uma mansão, agora dormindo no chão do cemitério, abandonado à própria sorte, sem energia para seguir a vida.

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3º Ato

Fotograma 48 – 05:09:36

a. Plano conjunto: mostra Mariano já velho. b. Posição da câmera: ao lado do personagem. c. Cenário: aberto, durante o dia na rua. d. Estrutura narrativa: sério.

Passados muitos anos, depois que Mariano foi definitivamente abandonado por Lu, o rapaz, agora um senhor, reaparece envelhecido e em desalinho. As cores não estão mais presentes, agora permanece o preto e o branco em todas as cenas da minissérie. O desfecho da narrativa está próximo. O drama se encaminha para ao resolução.

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Fotograma 49– 05:15:45

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo em idade avançada. b. Posição da câmera: em frente ao personagem. c. Cenário: fechado, dentro da sala de estar da casa. d. Estrutura narrativa: triste, mas cômico.

A idade avançada já não permite que Esmeraldo se locomova com as próprias pernas, ele utiliza uma cadeira de rodas. Vivendo em um apartamento pequeno, pago com o dinheiro da venda de jóias que Lu ganhara quando estava no auge da juventude.

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Fotograma 50 – 05:15:55

a. Plano conjunto: mostra Lu com marcas de expressão causadas pela idade. b. Posição da câmera: ao lado do personagem, focando seu rosto em close. c. Cenário: fechado, dentro da sala do apartamento. d. Estrutura narrativa: sério.

A mulher, antes tão cobiçada pela sua beleza e sensualidade, agora, não passa de uma senhora marcada pelo tempo e pelas angústias. Além de traços de velhice, apresenta características de uma pessoa amarga, não sorri mais.

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Fotograma 51 – 05:16:04

a. Plano conjunto: mostra Esmeraldo atacando Mariano. b. Posição da câmera: ao lado do personagem. c. Cenário: fechado, dentro da sala de estar da casa. d. Estrutura narrativa: sério, agressivo.

Mariano, depois de tanto tempo à procura do paradeiro de Esmeraldo e Lu, encontra o apartamento em que moravam. Ansioso pelo reencontro, invade esse espaço e é atacado pelo Valete de Espadas com sua bengala.

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Fotograma 52 – 05:16:10

a. Plano conjunto: mostra Mariano sendo atacado. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens, focalizando Mariano sendo agredido. c.Cenário: fechado, dentro da sala. d. Estrutura narrativa: agressivo.

Com golpes o velho Esmeraldo ataca Mariano também velho, imaginando que ele fosse um assaltante.

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Fotograma 53– 05:17:28

a. Plano conjunto: mostra Lu e Esmeraldo observando Mariano deitado. b. Posição da câmera: de frente aos personagens, focando Mariano. c. Cenário: fechado, dentro do quarto. d. Estrutura narrativa: sério.

Muito ferido, Mariano fica descordado e é analisado por longo tempo pelo casal que, surpreso, tenta entender como foram encontrados por ele.

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Fotograma 54– 05:19:27

a. Plano conjunto: mostra Mariano e Lu conduzindo a cadeira de rodas de Esmeraldo. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens. c. Cenário: aberto, durante o dia no parque. d. Estrutura narrativa: melancólica.

O trio que causou grande polêmica, nos anos 20, na cidade de São Paulo, agora não passa de velhos senhores com uma velha senhora triste. A beleza que causava espanto não deixou qualquer rastro. A rivalidade entre eles não permaneceu, agora a solidariedade é o único sentimento.

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Fotograma 55– 05:19:31

a. Plano conjunto: mostra Mariano e Lu no parque. b. Posição da câmera: ao lado dos personagens. c. Cenário: aberto, durante o dia no parque. d. Estrutura narrativa: desilusão, tristeza.

Sem perspectiva, Mariano e Lu terminam a trama desiludidos e melancólicos, apesar de estarem juntos. Nada restou da alegria e do entusiasmo que viveram anteriormente. Não se permitem sequer as lembranças, estão vazios, secos.

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3.6 Quadro de semelhanças e diferenças entre o romance e a minissérie

Semelhanças Diferenças Alguns personagens exis- tentes no romance não Personagens Conservam as mesmas aparecem na minissérie, em características, os contrapartida, na adaptação protagonistas são planos e televisiva existem persona- anti-heróis. gens criados excepcional- mente para ela. Como descrito no romance, Existem cenários na minis- alguns cenários são série que não constam no Cenários constantes. Por exemplo: a romance, ou seja, foram casa de Madame Iara, ou criados para o formato seja, o bordel. Cenários televisivo. Por exemplo: como boates e cabarés cenários abertos como também são constantes. campo, fazendas. O enredo, em certos momentos, não segue a narrativa do escritor do romance, o diretor, na trama televisiva, cria novos conflitos e obstáculos que não existem no romance. Por exemplo: Lu se envolve A trama básica focada no em um romance com um Enredo romance, sob a forma de rapaz da alta sociedade triângulo permanece. através de cartas e bilhetes, usando o empregado da família como mensageiro que, apaixonado pela moça, se apresenta como sendo o rapaz rico. Outro exemplo de enredo criado para a trama televisiva é quando Mariano passa a roubar roupas do varal de vizinhos.

Tempo O tempo permanece o mesmo: 1920.

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No romance há variação no espaço. O Rio de Janeiro

também é citado pelo narrador, como refúgio de O espaço predominante Espaço Lu e Mariano, durante suas permanece constante: a “escapadas” de golpes. cidade de São Paulo. Contudo, na minissérie, os eventos se desenvolvem exclusivamente em São Paulo. Provavelmente, como contenção de despesas com cenários. Na minissérie, embora haja a referência ao relato em primeira pessoa. A voz narrativa desaparece e a Focalização A focalização efetiva-se no câmera domina todos os romance em primeira espaços e peripécias pessoa . narrativas. Como essa câmera mantém distanciada dos protagonistas, ela atua como um narrador observador. O narrador conta a própria A voz do narrador em história, logo não é primeira pessoa desapa- Narrador onisciente, nem onipre- rece, recebe relevo a sente. Ele desçonhece o que câmera objetiva que se as outras personagens comporta como observa- pensam e não ocupa todos dora, mostrando tudo ao os espaços. espectador.

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Considerações finais

O presente trabalho analisou a obra Memórias de um Gigolô, do escritor Marcos Rey, em sua adaptação para a minissérie da Rede Globo dirigida por Walter Avancini, em 1986. Nesta análise, procuramos estabelecer, a partir de uma perspectiva comparada e dialética, homologias entre a obra literária adaptada para a TV. Para tanto, enfocamos as características gerais da obra de Marcos Rey e de Walter Avancini em relação a seus elementos narrativos, tais como a trama, a caracterização das personagens e a adaptação para a minissérie da Rede Globo. Enfatizamos a produção, a partir da focalização do narrador na obra verbal, e da câmera na montagem cinematográfica.

Analisando a obra escrita e também televisiva, percebemos o quanto é difícil encontrar leitores e espectadores da mesma obra. Nessa perspectiva, partimos do pressuposto de que a obra em estudo, embora tenha se beneficiado da publicidade obtida pela apresentação, como na minissérie Memórias de um Gigolô, da Rede Globo, contém elementos atraentes. Do mesmo modo, pressupomos que a televisão tem contribuições importantes a oferecer, porém analisando a obra de Marcos Rey e, posteriormente, a sua adaptação para a televisão, percebemos que a narrativa sofreu pequenos prejuízos, pois foi explorado apenas seu lado cômico e não o literário.

Assim, é de grande valia observar se as minisséries que se baseiam em obra literária convertem-se em produtos culturais de qualidade ou são apenas produtos voltados para o consumo do espectador.

Pela análise da obra escrita de Marcos Rey, e de sua adaptação para a TV, pudemos observar que a sua transposição para a TV acarretou em perda do seu caráter literário. Por diversas vezes notamos, na minissérie, que o roteiro extrapolou o conteúdo da obra escrita, com cenas e recursos próprios criados pelo diretor, que não atraiu o telespectador. Porém, uma das características principais da adaptação foi a de alegoria romântica, em tom de comédia e até de deboche em relação à situação de gigolô do protagonista. Aliados a isto, estão a trilha sonora em tom de opereta com flashes musicais da época dos anos 20 e as cenas cômicas. Assim, pode-se deduzir que a versão adaptada televisiva também conseguiu criar estratégias que a tornassem atraente. Contudo, no seu anseio de

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prorrogar os capítulos, acabou por gerar em determinados momentos o tédio e o marasmo para quem a assiste.

Concluindo, há de se tomar extremo cuidado com a adaptação de obras literárias para as cinematográficas, pois há o risco do leitor/espectador se decepcionar.

Conclusão

A partir da análise do livro Memórias de um Gigolô, de Marcos Rey, e também da minissérie com o mesmo título, tomando como critérios para esta análise cada parte do todo como: espaço, tempo, enredo, focalização, narrador e personagem; pudemos constatar que nos dois formatos, no impresso e no televisivo existem semelhanças e diferenças. Porém, as diferenças se sobressaem, talvez porque o diretor tivesse a intenção de prolongar os capítulos. Ao se valer dessa estratégia, infelizmente, tornou a minissérie enfadonha em alguns capítulos.

De acordo com a análise, fica evidente que, apesar da comicidade e do uso das cores pelo diretor, os capítulos da minissérie são, em certos momentos, tediosos e deixam a desejar certo atrativo para o espectador. Na obra escrita, há um universo imaginário que requer do leitor o emprego de sua criatividade. Na versão adaptada, como não há lacunas, nem subentendidos, a interação do texto com o leitor é prejudicada, assim algumas cenas que não prendem a atenção do espectador.

Concluindo o presente trabalho, percebemos que a minissérie não conservou no espectador a mesma atração causada pelo romance junto ao leitor. Dessa forma, a adaptação do romance Memórias de um Gigolô, de Marcos Rey, para uma minissérie da Rede Globo não auxiliou muito na compreensão da realidade social. Pelo contrário, configurou-se apenas como mais uma produção massiva e alienante, resultante da indústria cultural, que impediu seu receptor de exercer sua capacidade de reflexão crítica.

O produto final televisivo não conseguiu agregar valores à produção ficcional narrativa, resultando em um trabalho dotado de poucas qualidades artísticas e validades

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estéticas. Todavia, sabendo que, na sociedade pós-industrial, o ser humano sente-se oprimido pela realidade voltada para o acúmulo de capital, em detrimento das relações humanas autênticas, torna-se compreensível e até desejável que os sujeitos tenham acesso a um produto escapista que lhes permita evasão.

O único problema reside na constatação de que, na nossa realidade social, em que o acesso à cultura é relegado somente àqueles que detêm poder econômico, sobra para a classe menos favorecida somente a alternativa do escapismo em detrimento da ênfase no desenvolvimento de um posicionamento crítico e consciente em relação à realidade social.

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Trabalho de Conclusão de Curso ( TCC ) – Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo – Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis

1.Literatura. 2. Televisão. 3. Marcos Rey

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