A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE GOVERNO DO ESTADO DE SERGIPE

Governador Belivaldo Chagas Silva Vice-Governadora Eliane Aquino Custódio Secretário de Estado do Governo José Carlos Felizola Soares Filho

SEGRASE - SERVIÇOS GRÁFICOS DE SERGIPE

Diretor-Presidente Ricardo José Roriz Silva Cruz Diretor Industrial Mílton Alves

Gerente Editorial Jeferson Pinto Melo Conselho Editorial Antônio Amaral Cavalcante Cristiano de Jesus Ferronato Ezio Christian Déda Araújo Irineu Silva Fontes João Augusto Gama da Silva Jorge Carvalho do Nascimento José Anselmo de Oliveira Ricardo Oliveira Lacerda de Melo GILFRANCISCO

A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Aracaju 2019 Copyright©2019 by Gilfrancisco

CAPA Cícero Guimarães

DIAGRAMAÇÃO Cícero Guimarães REVISÃO Yuri Gagarin Andrade Nascimento PRÉ-IMPRESSÃO Marcos Nascimento Dalmo Macedo

Dados DadosInternacionais Internacionais de Catalogação de -Catalogação-na-Publicaçãona-Publicação (CIP) (CIP) AssociaçãoAssociação Brasileira Brasileiradas Editoras Universitáriasdas Editoras (ABEU) Universitárias (ABEU)

S234b Santos, Gilfrancisco dos A biblioteca provincial de Sergipe [recurso eletrônico] / Gilfrancisco dos Santos. – Aracaju : Editora Diário Oficial do Estado de Sergipe - Edise, 2019. 234 p.: il.; 22 cm. E'book PDF.

Modo de acesso: world wide web: https://segrase.se.gov.br/

ISBN 978-85-53178-23-0

1. Livros. 2. Biblioteca. 3. Leitores. 4. Política. 5. Sergipe. I. Gilfrancisco. II Título.

CDU: 027

Elaborado por Neide M. J. Zaninelli - CRB-9/ 884

Editora filiada

Editora Diário Oficial do Estado de Sergipe - EDISE Rua Propriá, 227 · Centro 49010-020 · Aracaju · Sergipe Tel. +55 (79) 3205 7421 / 3205 7420 [email protected] Entre as 30 Bibliotecas mais antigas do país em funcionamento até os dias atuais, encontra-se a Biblioteca Epifânio Dória, classificada em 17º lugar e quarta Biblioteca Pública mais antiga do Brasil.1

1 Fonte: Consultoria KSD cultura e Diversificação. São Paulo, 2 de abril, 2013.

A criação de bibliotecas populares me parece uma das atividades mais necessárias para o desenvolvimento da cultura brasileira. Não que essas bibliotecas venham resolver qualquer dos dolorosos problemas de nossa cultura (…), mas a disseminação no povo do hábito de ler, se bem orientada, criará fatalmente uma população urbana mais esclarecida, mais capaz de vontade própria, menos indiferente à vida nacional.

Mário de Andrade (1893-1945)

Ah, esses livros que nos vêm às mãos, na Biblioteca Pública e que nos enchem os dedos de poeira. Não reclames, não. A poeira das bibliotecas é a verdadeira poeira dos séculos.

Mário Quintana (1906-1994)

ste ensaio faz parte de uma pesquisa iniciada em 2010 que tinha como proposta elaborar um estudo sistemático sobre a Biblioteca Pública Provincial. Na verdade, uma amostragem do percurso da Equarta Biblioteca Pública criada no país, passando pela Biblioteca Pública do Estado, até ser denominada Biblioteca Epifânio Dória, a partir de 1974. Concluída recentemente, a pesquisa contempla o histórico da fundação da Biblioteca Pública de Sergipe, partindo de uma análise parcial da sua história nesses 168 anos de atividades (1848-2016). Apresentando também discursos de personalidades envolvidas na construção e inauguração da sede própria em 1936, salientando a vida intelectual e a participação de Epifânio Dória (1884-1976) na organização da Biblioteca Pública. Por mais de século a história da Biblioteca Provincial permaneceu adormecida, à espera de ser redescoberta, registra o testemunho daquilo que vislumbrou toda uma geração de intelectuais, não só de sergipanos, mas também visitantes de outros estados, alargando os horizontes de seu tempo, aos olhos dos modernos. Ao realizarmos a pesquisa para esta edição especial que nos parece muito oportuna, registramos os nossos agradecimentos a todas as pessoas que de uma forma ou de outra nos ajudaram na elaboração desta publicação. Ficam também registrados os agradecimentos ao Governador do Estado de Sergipe, Belivaldo Chagas Silva e o Diretor-Presidente da Segrase-EDISE Ricardo José Roriz Silva Cruz.

O autor

mataram meus amigos meus amigos mortos mortos amigos meus se vivo é apenas bondade de deus ou complacência dos diabos

Carlos Sampaio (1942-1993)

In memorian aos amigos

Marcelo Déda Chagas (1960-2013) Irani dos Santos Carvalho (1974-2019) O bibliotecário é o profissional que conhece o acervo, ou seja, o que a biblioteca contém. É ele quem orienta os usuários. Dirija-se a ele antes de tudo. O bibliotecário vai indicar a você onde estão os fichários por assunto e por autor e poderá ajudá-lo a encontrar os livros de que você necessita. SUMÁRIO

Uma Virtuosa História de Livros 19

Antecedentes 21

Origens, 1848-1855 23

José Gonçalves Barroso, Vigário: 27

Transferência da Capital, 1855 31

Gabinete Literário 37

A Biblioteca em Aracaju 41

Discursos Pronunciados na Inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe 57

A Imprensa na Inauguração 57

Discurso Proferido pelo Dr. Nobre de Lacerda, Orador Oficial 59

Discurso Proferido por D. Sylvia Ribeiro 67

Discurso Pronunciado pelo Desembargador Evangelino José de Faro 69 Discurso Proferido pelo Diretor da Biblioteca Pública, Epifânio da Fonseca Dória 77

Discurso Pronunciado pelo Desembargador Carlos Barreto 83

Discurso Pronunciado pelo Dr. Prado Sampaio 85

Discurso Pronunciado pelo Jovem Antonio Tavares Bragança 91

Discurso Pronunciado pelo Desembargador A. Teixeira Fontes 93

As Bibliotecas de Gumercindo Bessa, Felisbello Freire e Silvio Romero 103

Novas Mensagens Presidenciais 111

Polêmica: O Estado de Sergipe versus Epifânio Dória 121

I. Foi um dia a Biblioteca Pública 121

II. Foi um dia a Biblioteca Pública 123

III. O provérbio do côxo e do mentiroso 125

IV. Os Erros da Administração, no caso da Biblioteca Pública 127

V. Os Erros da Administração, no caso da Biblioteca Pública 129

VI. Para por ponto final 132

Batida a primeira pedra do novo edifício 137 Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, Emílio Odebrecht 141

Inauguração da Nova Sede 145

I. Discurso de Alfredo de Araújo Pinto 151

II. Discurso de Vicente Calamelli 153

III. Discurso do Governador Eronides Ferreira de Carvalho 155

IV. Discurso de Epifânio Dória 161

Gilberto Freyre mostra-se surpreso com a Biblioteca Pública 165

Mensagens Apresentadas na Assembleia Legislativa 167

Aposentadoria de Epifânio Dória pela Biblioteca Pública do Estado 173

Educação e Cultura - Biblioteca Pública 175

Reorganização da Biblioteca 177

A falta de funcionários 183

Os Governos Militares 187

Variações em Fá Sustenido, Zózimo Lima 191

Novas Reformas 195 Biblioteca Pública, Zózimo Lima 197

Expectativas da Nova Biblioteca 199

Biblioteca: Inauguração dia 29 203

Biblioteca Epifânio Dória: Inauguração 205

Discurso do Governador do Estado, Paulo Barreto 207

Biblioteca Epifânio Dória, Acrísio Torres 211

Patrono: Epifânio Dória 213

Recopilador Sergipano 217

Antigos Problemas Reaparecem 219

BPED 221

Alguns Diretores da Biblioteca Pública 223

Instituições Pesquisadas 225

Agradecimentos 227

Referências Bibliográficas 229 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Uma Virtuosa História de Livros

Ítalo Calvino, o grande escritor italiano, definiu as bibliotecas como os melhores refúgios para as pessoas.

Este livro que iremos ler, é mais um que o estrênuo lidador com as fontes de pesquisas Gilfrancisco Santos, acrescenta à sua obra, toda ela voltada para as origens, a trajetória e as realizações da gente sergipana. É uma história de livros, daqueles reunidos e guardados em locais públicos, onde pudessem ser manuseados e lidos. Uma história perpassada de amor, dedicação e o reverencial respeito dos que valorizam o saber, a cultura. Gilfrancisco vai às origens do maior dos nossos “refúgios”, a Epifânio Dória, a quarta mais antiga biblioteca pública do Brasil, nascida com um modesto acervo constituído através de doações na capital provincial, São Cristóvão. Desde então, o acervo zelosamente conservado se amplia continuadamente. Transfere-se, quando em 1855 começa a ser construída a nova capital, Aracaju, e se vai abrigar em locais improvisados. Esteve em dependências do Palácio do Governo, da Assembleia Legislativa, até que em 1936, o interventor Eronides de Carvalho inaugura o que, para a época, era um suntuoso prédio, localizado na Praça Fausto Cardoso. Ali, logo se constitui um local de referência na vida cultural sergipana, onde se realizavam frequentes eventos. O acervo cresceu a ele acrescentou uma hemeroteca, e o espaço se foi tornando exíguo. Epifânio Dória, intelectual, bibliófilo, autor, entre outras obras, das Efemérides Sergipanas, diretor e quase residente no que ele considerava o “templo sergipano do saber”, começou a ter a ousadia de imaginar um prédio estruturado para Biblioteca Pública, e adequado para guardar com segurança o acervo, tendo características atualizadas de funcionalidade. O governador Paulo Barreto de Menezes transformou o sonho em realidade ao inaugurar, em outubro de 1974, o moderno edifício da nova

19 GILFRANCISCO

Biblioteca que recebeu o nome de Epifânio Dória, reverência permanente ao homem que passou a vida escrevendo e zelando pelos livros. Este livro de Gilfrancisco Santos é lançado exatamente no momento em que se inaugura uma completa reforma, e a readequação do prédio da Biblioteca Pública Epifânio Dória. A obra, tão ansiada, tornou-se possível graças a uma portentosa empresa que veio instalar-se em nosso estado, trazendo-nos desenvolvimento econômico com responsabilidade social, a Centrais Elétricas de Sergipe (CELSE). O lançamento de mais este livro assinala o desempenho eficiente da Editora do Diário Oficial de Sergipe (EDISE), a qual o nosso governo entrega a responsabilidade de gerar um novo alento ao nobre mercado livreiro, porta de acesso ainda principal ao conhecimento. No decorrer deste ano novos lançamentos irão se suceder, entre eles, as obras completas do romancista, contista e ensaísta sergipano Ranulfo Prata, um dos precursores da literatura social no Brasil, já biografado também em livro do escritor Gilfrancisco Santos, lançado recentemente em Barretos-SP, no átrio de uma das instalações da grandiosa obra social tocada pelo seu neto, Henrique Prata. Nada mais adequado, portanto, para assinalar a renovação de uma Biblioteca do que, justamente, acrescentar ao seu acervo este livro, A Biblioteca Provincial de Sergipe, completa e primorosa história do nosso “melhor refúgio”, aquela denominação mais adequada que o escritor famoso encontrou, referindo-se aos locais que guardam livros para serem lidos pelo povo. No nosso renovado “refúgio”, haverá um espaço reservado à memória do governador e poeta Marcelo Déda, um homem que amava livros.

BELIVALDO CHAGAS Governador de Sergipe

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Antecedentes

A tradicional classificação das bibliotecas em dois grandes ramos (públicas e particulares) vem perdendo a validade prática diante do surgimento de tipos outros como as empresariais, especializadas, as de instituições, ou mesmo de grandes colecionadores, as quais são, em maior ou menor grau, bibliotecas públicas na medida em que franqueiam suas coleções a estudantes e pesquisadores. Será preferível, portanto, adotar critérios múltiplos de classificação. Desse modo, as bibliotecas serão ditas públicas apenas para indicar as que são realmente mantidas pelo poder público; e particulares apenas para indicar que pertencem a indivíduos, famílias, empresas, sindicatos, associações, etc. A partir da invenção da tipografia, o número de livros disponíveis começou a aumentar, expandindo no mesmo ritmo o círculo de pessoas desejosas de consultá-los. O fim dessa evolução é hoje o predomínio total das bibliotecas públicas, realmente abertas ao uso de todos. As grandes bibliotecas individuais ou são características dos países subdesenvolvidos, ainda carentes de acervos públicos de grande porte, ou representam coleções de bibliófilos. É paradoxal, mas as bibliotecas são anteriores aos livros e até aos manuscritos. Tanto as de Antiguidade quanto às da Idade Média – na realidade, são um prolongamento das bibliotecas antigas, seja na sua composição, seja na organização, na natureza ou no funcionamento. Portanto, a biblioteca foi assim, desde os seus primeiros dias até os fins da Idade Média, o que o seu nome indica etimologicamente, isto é, depósito de livros, estando mais para o lugar onde se esconde o livro do que o espaço ideal onde se procura fazê-lo circular ou perpetuá-lo. A própria disposição arquitetônica dos prédios demonstra essa tendência – na Biblioteca de Ninive, o depósito de livros não tem saída

21 GILFRANCISCO para o exterior. A sua única porta parece dar, ao contrário, para o interior do edifício. Da mesma forma, as bibliotecas medievais se situam no interior dos conventos, lugares dificilmente acessíveis ao leitor comum. Por isso, as bibliotecas mais renomadas da Antiguidade pelo número de livros que continham no seu acervo, não podem, por consequência, ser comparadas às bibliotecas modernas.

22 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Origens, 1848-1855

Em 1848 o deputado Martinho de Freitas Garcez (1810-1861), apresentou à Assembleia da Província um projeto de lei criando uma biblioteca na cidade de São Cristóvão. No dia 16 de junho do mesmo ano, o Presidente da Província, Dr. Zacarias de Góis e Vasconcelos sancionou a lei número 233, na antiga capital, criando a Biblioteca Pública Provincial:

Art. 1º. Fica criada na Capital desta província uma biblioteca com a denominação de Biblioteca Pública Provincial, que constará de obras antigas e modernas em todos os ramos de conhecimentos humanos, escolhidas e das melhores edições. Art. 2º. Compete ao presidente da Província designar aquelas obras que devem ser compradas com preferência a outras, e ordenar a sua aquisição anualmente com as quantias marcadas nas leis de orçamento. Art. 3º. A biblioteca poderá ser colocada em um dos conventos desta cidade, onde melhor parecer ao governo. Art. 4º. Fica também criado o lugar de bibliotecário, que será da nomeação do presidente, e vencerá ordenado que por este lhe for arbitrado. Enquanto a biblioteca não contiver para mais de mil volumes não perceberá ele se não metade do ordenado, e em seus impedimentos proporá ao governo que o substitua sem que o substituto perceba cousa alguma pelos cofres providencias. Art. 5º. Far-se-á a abertura regular da Biblioteca quando o número de seus livros excederem ao designado no artigo antecedente. Art. 6º. Na biblioteca haverá uma seção denominada Arquivo, que será destinada: 1. Para originais ou cópias de mapas e relações estatísticas; 2. Para originais, ou cópias de quaisquer papéis do governo geral, ou

23 GILFRANCISCO provincial, cuja guarda no arquivo se julgar conveniente, e para notícias de acontecimentos agradáveis ou desastrosos, provenientes de causas naturais; 3. Para notícias de descobertas úteis de produtos da história natural, mineralógica e botânica, bem assim originais de memórias remetidas ao governo da província para serem oferecidas à biblioteca, e que disserem respeito à história dela e do Império, ao aumento e progresso da agricultura, comércio, navegação, indústria, ciências e artes. Art. 7º. Os cidadãos que querem doar livros à Biblioteca o poderão fazer por intermédio do governo da Província sendo logo seus nomes publicados pela ficha oficial, bem como o número de livros oferecidos, com designação de seus títulos. Art. 8º. Fica o presidente da Província autorizado a marcar gratificações, se as pedirem, aos escrivães, ou a outras pessoas, que lhe apresentaram cópias autênticas de sesmarias, de escrituras, ou papéis que contenham fatos importantes para a história da Província. Art. 9º. O regulamento que for dado pelo governo para a boa execução desta lei será dependente da aprovação da Assembleia Provincial. Art. 10º. Revogam-se as disposições em contrário.

Zacarias de Góis e Vasconcelos (1815-1877), advogado e político, foi presidente das províncias do Piauí, Sergipe e Paraná, deputado provincial pela em 1843, reeleito em 1845 e 1847, presidente da Câmara dos Deputados pelo Paraná em 1864, deputado geral, senador do império pela Bahia (1864 a 1877), entre outros cargos. Como pensador político, legou para a nação brasileira o livro “Da Natureza e Limite do Poder Moderador”. Neste livro, o conselheiro Zacarias faz uma análise do Poder Moderador, sugerindo que seu poder deveria ser reduzido. Essa Lei não foi logo executada. Somente na Presidência de Amâncio João Pereira de Andrade que lhe deu execução, a 2 de Julho de 1851, quando a Biblioteca é acomodada num compartimento do Convento de São Francisco, em São Cristóvão, sendo nomeado para o

24 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE cargo de bibliotecário o padre e político, José Gonçalves Barroso (1821- 1882), ardoroso adversário do Dr. Zacarias de Góis e Vasconcelos, portanto nada fez em favor da Biblioteca Pública Provincial que teve vida curta, desaparecendo em março de 1855, com a mudança da capital. Sergipe ficou sem biblioteca pública, durante todo o resto do período monárquico. A Biblioteca Pública Provincial tinha três funcionários e foi instalada em um dos compartimentos do convento. Com a mudança da capital, em 1855, por falta de casa, o acervo da Biblioteca ficou a cargo de um zelador, Benjamin do Prado Leite Salgado criado pela resolução provincial nº 424 de 3 de maio de 1855, que estabelecia a gratificação de 300$000 para o zelador, ficando este sujeito ao regulamento que fosse baixado pela presidência para o bom funcionamento da Biblioteca. Benjamin do Prado era pai do farmacêutico Joaquim do Prado Sampaio e avô do ilustre escritor sergipano Prado Sampaio. Na tarde de 24 de maio de 1858 foi extinto pela resolução provincial nº 496, sancionada pelo presidente João Dabney de Avellar Brotelho, o cargo de zelador da Biblioteca Pública Provincial. A nova resolução expedida extinguiu o “depósito” provisório e determinou que os livros fossem transferidos para a secretaria da Assembleia, ficando aí a cargo do respectivo oficial-maior, percebendo este a gratificação adicional de 200$000 anuais, sob a condição e franqueá-los à leitura pública ao menos uma vez por semana. Ao porteiro da Assembleia foi abonada também uma gratificação adicional de 120$000 por esse acréscimo de serviço.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

José Gonçalves Barroso, Vigário:

Filho do capitão Antonio Gonçalves Barroso e D. Martinha Maria do Sacramento, nasceu na então vila de Laranjeiras a 21 de março de 1821 e faleceu na cidade de S. Cristóvão a 17 de setembro de 1882. Feito com rápido progresso o curso das aulas do seminário arquiepiscopal da Bahia, concluiu os seus estudos antes de completar a idade precisa para receber a investidura clerical, e por esta circunstância foi obrigado a recolher-se à província por determinado tempo, no decurso do qual se lhe deparou o ensejo de inscrever-se candidato a cadeira de latim da Capela então em concurso, e na qual foi promovido lente substituto por ato de 13 de dezembro de 1842. Passados dois anos voltou à Bahia, onde lhe foram conferidas as ordens sacras de presbítero secular. No primeiro quinquênio após a sua ordenação foi chamado a ocupar no funcionalismo público os cargos de lente de Filosofia Racional e Moral em 1845, os cargos de secretário e lente de Filosofia em 1846 do extinto Liceu de S. Cristóvão, de que fora também diretor por nomeação feita em 1848 pelo Presidente Joaquim José Teixeira, bibliotecário (o primeiro na ordem cronológica) da Biblioteca Pública Provincial, 1851-1854, e diretor da Imprensa do governo por ato de 27 de abril de 1852 em substituição ao tenente coronel Domingos Mondin Pestana. Dada em 1853 a vaga da freguesia de N. S. da Vitória da cidade de S. Cristóvão, então capital da província, por falecimento do respectivo pároco, o cônego Luiz Antonio Esteves, foi nomeado vigário colado, por Dec. de 21 de abril desse ano, atentas às provas exibidas no concurso aberto para esse fim, tendo exercido as funções paroquiais desde sua posse a 5 de junho seguinte até aos seus últimos dias. De 24 de agosto de 1861, data da respectiva provisão, até ao ano de

27 GILFRANCISCO

1831 acumulou o lugar de vigário geral da província, que já o havia exercido anteriormente em virtude de nomeação interina. Na primeira fase de sua vida política militou ativamente nas fileiras do partido conservador, que o elegeu em 1852 vereador da Câmara Municipal de S. Cristóvão para o quatriênio de 1853-1856. Foi o primeiro cargo eletivo que ocupou no longo estágio percorrido durante trinta anos de lutas partidárias, no decurso dos quais figurou como deputado provincial em onze legislaturas, sendo quase sempre elevado à cadeira de presidente da Assembleia por seus colegas de representação. Entre as graves questões suscitadas no largo período do seu mandato legislativo, deu-lhe grande nomeada a que se discutiu na memorável sessão de 1854. Apresentada nesse ano no seio da Assembleia Provincial a ideia da mudança da Capital para Aracaju, não vacilou em colocar-se entre os opositores do projeto que era francamente apoiado pelo presidente, Bacharel Ignácio Joaquim Barbosa. Extremadas as opiniões, foi indiferente ao sacrifício dos próprios interesses, que a sua atitude hostil iria acarretar, e então o combateu tenazmente por cinco dias consecutivos, revelando na tribuna raros dotes oratórios e extraordinários vigor de uma robusta inteligência. Tudo foi inútil. O seu ingente esforço esterilizou-se ante a vontade irredutível do governo, cujo pensamento teve de ser convertida em lei da província e punida a independência do deputado oposicionista com a jubilação na cadeira de lente de Filosofia do Liceu Sergipano. Desde então o valente defensor dos direitos da metrópole sergipana filiou-se ao partido liberal, em que teve posição eminente. Era principalmente na tribuna sagrada que mais realçava o seu grande mérito de orador consumado, vantajosamente conhecido não só na província, como na outrora Corte do Império, onde os sermões do digno sucessor de Frei José de Santa Cecília se anunciavam pela imprensa com antecedência de dias. Foi isso em 1866 e 1867, na mesma época em que o pregador provinciano, recordando seus primeiros tempos de magistério, prestou-se a dar lições de latim e filosofia no colégio “Santo Antônio”.

28 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Desempenhou honrosas comissões e pelos serviços prestados à matriz de sua freguesia por ocasião da visita de D. Pedro II ao Norte do Império, em 1860, foi agraciado com a comenda da Ordem de Cristo. Por ato de 26 de outubro de 1870 foi nomeado inspetor paroquial da Instrução Pública de S. Cristóvão. O Vigário Barroso redigiu vários jornais: A Assembleia Católica, 1859; O Voto Livre: periódico político e literário de São Cristóvão, 1857-1860; O Liberal: órgão político. Aracaju, 1868. Com o Doutor José de Barros Pimentel; O Eco Liberal: órgão do partido de Sergipe. Aracaju, 1877-1884.2

2 Dicionário Biobibliográfico Sergipano. Armindo Guaraná. Aracaju, Edição do Estado de Sergipe, 1925.

29 GILFRANCISCO

Leis e Resoluções da Assemble’a Provincial de Sergipe (1855).

30 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Transferência da Capital, 1855

Com a transferência da capital para Aracaju em 1855, o pequeno acervo foi disponibilizado numa sala da Tesouraria Provincial. Vejamos a Portaria de 1862 que removia os livros e objetos da Biblioteca Pública – da Secretaria da Assembleia Provincial – para a Secretaria do Governo: O Presidente da Província, à vista do dever que lhe corre de guardar a mais severa economia na despesa pública provincial já tão avultada, e sem dúvida superior às forças atuais da mesma Província, compreendendo, outrossim, que o espírito da Resolução Provincial nº 496 de 24 de maio de 1848, e o desejo do legislador não foi senão por em melhor guarda os livros da extinta Biblioteca, e franquear ao mesmo tempo sua leitura, quanto fosse possível: vendo o referido Presidente, pelo exame e conferência que naqueles livros mandou proceder por dois empregados da Secretaria do Governo, que a conservação dos mesmos livros na Secretaria da Assembleia, além de prejudicial, não satisfaz a intenção da lei, e é sobretudo oneroso à Fazenda Provincial, pelos dispêndios que com isso faz: em face de tais razões, e em consideração a outras que se evidenciam da certidão que lhe foi apresentada pelos encarregados do sobredito exame e conferência, tem o mesmo Presidente por muito conveniente mandar que se observe o seguinte: 1º Os livros e objetos da extinta Biblioteca da Província passarão desde já a ser recolhidos, e condicionados em uma das salas da Secretaria do Governo, sendo recebidos em presença da certidão acima aludida, e por um dos funcionários nela firmados, que o Secretário da Província designar. 2º Recolhidos os livros e objetos em questão à indicada Secretaria, serão aí zelados pelo mesmo modo que são os móveis da mesma repartição.

31 GILFRANCISCO

O Secretário velará no exato cumprimento desta disposição. 3º O mesmo secretário poderá franquear a leitura dos livros da Biblioteca quem lhe a reclamar: mas nunca fora da repartição ao seu cargo, devendo, portanto, designar o lugar em que tal leitura se possa verificar, de modo que se não transgrida o preceito do Regulamento, que proíbe o ingresso de pessoa estranha no recinto da Repartição. 4º Fica desde já suspenso, até definitiva deliberação da Assembleia Legislativa Provincial, a cujo conhecimento será o presente ato oportunamente submetido, toda e qualquer despesa que os cofres Provinciais estejam fazendo com a guarda dos livros e objetos da Biblioteca supracitada – assim se cumpre, expedindo-se as convenientes comunicações.

Palácio do Governo de Sergipe em 14 de janeiro de 1862 Joaquim Jacintho de Mendonça.3

Na Mensagem do Presidente Joaquim Jacintho de Mendonça, apresentado a Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe, em 1º de março deste mesmo ano, sobre a Biblioteca Pública diz o seguinte:

Correndo-me o dever, nas críticas circunstanciais em que vim encontrar a Província, de guardar a mais severa economia na despesa pública, já tão avultada; reconhecendo que era um penoso e improfícuo sacrifício para os cofres à conservação dos poucos e estragados livros dessa Biblioteca na Secretaria desta Assembleia; atendendo que a despesa de 320$ réis que com esse serviço se fazia, pouco menos era do que a importância

3 Anexo à fala do Presidente Dr. Joaquim Jacintho de Mendonça à Assembleia Legislativa Provincial em 1º de março de 1862.

32 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE que presentemente valem esses livros: considerando que na Secretaria da Presidência eles seriam cuidados, e podiam, em qualquer dia útil, ser franqueados, como estão sendo, aos que quisessem lê-los, sem que com isso a Província fizesse o menos dispêndio, determinei que esses livros e mais objetos a ela pertencentes, fosse transferidos para essa Repartição, e que cessasse a despesa que estava fazendo com isso até vossa ulterior deliberação. Entre os Apensos encontrareis o Ato que baixei para esse fim. Persuando-me que fiz o que devia. – Vós direis se procedi bem ou mal.4 Sobre a Biblioteca Pública, vejamos o Relatório apresentado à Assembleia Legislativa Provincial de Sergipe no dia 1º de março de 1869, pelo Presidente Evaristo Ferreira da Veiga: Em um dos salões da Secretaria da Presidência foram recolhidas desde janeiro de 1862 as estantes e algumas centenas de livros, que pertenceram à antiga Biblioteca Pública desta Província; e desde então aí se conservam em completo esquecimento. O estrago do tempo, que se não tem procurado remediar, e o abandono feito aos vermes destruidores, vão dia a dia reduzindo e em breve, caso não se tome alguma providência, se extinguirá o precioso legado que robustas inteligências deste e de passados séculos deixarão a posteridade. Em 1867 existiam 764 livros em bom estado; em 1868 uns e outros somavam 840 volumes; hoje não chega a este número: daqui a alguns anos terão desaparecido de todo mais de um milhar de livros, que constituirão a Biblioteca Pública desta Província. O Dr. Moraes, e outros antecessores meus, lembrarão que fosse a Biblioteca posta à venda em hasta pública e o seu produto recolhido aos cofres Provinciais; ou então votado o preciso crédito para a sua conservação, compra de livros e aproveitamento dos existentes. Eu desejaria bem que a Província tão falta de instrução superior, pudesse oferecer aos habitantes da Capital, ao menos, um estabelecimento

4 Mensagem do Presidente (1º de março de 1862) Dr. Joaquim Jacintho de Mendonça Aracaju Typ. Provincial.

33 GILFRANCISCO regular onde a mocidade estudiosa fosse encontrar as inestimáveis riquezas da inteligência, estudar a história dos povos e dos heróis e aprender as verdades que lhe são desconhecidas. Não é uma despesa improdutiva aquela que se faz com a instrução, único meio de civilizar os homens e formar bons e prestáveis cidadãos. Adoto, pois, o segundo alvitre. A despesa de conservação não será grande; e com qualquer auxílio que voteis poderá a Biblioteca Pública da Província prestar importantíssimos serviços. Não vos é estranho que a maior parte dos livros que ainda existem e muitos dos que se tem perdido foram doados por particulares: pois bem; hoje como então domina o mesmo espírito de engrandecimento, a mesma filantropia, e não faltará, estou bem certo, quem espontaneamente concorra com obras de súbito valor para o enriquecimento da nova Biblioteca. Depois se se realizar a ideia de um curso de instrução superior na Capital, em edifício que tenha as acomodações necessárias, pode a Biblioteca tornar um de seus salões com proveito da mocidade estudiosa. O Inspetor Geral das Aulas, que ali terá a sua reparição, será o chefe desse estabelecimento público, e o Amanuense e o Porteiro da Inspeção cuidarão do seu expediente, mediante pequena gratificação. O amor das letras entre nós está morto: espera apenas que o tirem do estado de torpor à que se acha condenado pelo indiferentismo. Tratando deste assunto não posso deixar de pedir a vossa atenção para o folheto publicado por Etelvino José de Barros sob o título “Ideia Grandiosa”, que tem por fim salvar da completa ruína os restos da extinta Biblioteca Pública de Sergipe. Deixo a vossa sabedoria este assunto à importância que merece.5 O Relatório apresentado em 1872 ao Exmo. Snr. Presidente da Província pelo diretor da Instrução Pública, Manuel Luiz Azevedo d’Araújo, referindo-se a Biblioteca, diz o seguinte: Relíquias quase inaproveitáveis da primitiva Biblioteca Pública são

5 Typ. do Jornal de Sergipe. Aracaju, 1869.

34 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE os livros que se guardam ainda em uma das salas do Atheneu. Truncadas as melhores obras e todas elas carcomidas das traças e dos vermes, é contristados contemplar-se até onde chegaram à incúria e o desprezo aos trabalhos do gênio, aos despojos das ciências, aos frutos das letras; que não pouco importaram mesmo os sacrifícios da província, na aquisição desses mestres mudos da inteligência, que, desgraçadamente contrariados em seus destinos, foram cedo atirados, como em um sarcófago, nas prateleiras empoeiradas das estantes. Como sergipano, e principalmente como homem de letras, choro sobre essa página da nossa história, que registrando o passamento do liceu de S. Cristóvão, marcou a data igualmente infausta da biblioteca que bem enriquecida já contávamos. Não havia que ver. Quando a aula se extingue, é natural que a biblioteca se feche: esta é a conclusão daquela. Como havia de ler o povo que não se ilustra? Como despertar na população o amor das letras, apurar-lhe o gosto pela literatura, fazê- la depositária das verdades científicas, se lhes fecham as veredas que até lá conduzem, se lhe apaga o fogo único de luz que a pode iluminar no seu caminho? Como fazê-la senhora da opulência das letras, gregas e latinas, das belezas da literatura de todas as idades, das verdades filosóficas, religiosas e políticas, da coparticipação dos inventos das ciências diversas, quando lançados esses magníficos despojos em altas prateleiras, se lhe tira a instrução secundária, que é a escada que até lá a consegue levar? Um véu, entretanto, sobre o passado; é o futuro que se nos enfrenta, e que exige-nos a reforma. É justa essa exigência, que única pode matar a sede de ilustração às massas, e simultaneamente por um termo à expiação que experimentando, pelo abandono de sua causa. A biblioteca pública ao lado do Atheneu é de primeira necessidade. “A escola sem a biblioteca é infrutífera, diz um escritor de gênio, porque o ler não deve ser procurado, senão como instrumento para alcançar os grandes resultados. Saber ler os diversos ramos necessários ou agradáveis

35 GILFRANCISCO das letras, sem a possibilidade de lê-los, é como ter conseguido penetrar num pomar verdejante povoado das árvores mais úteis, e não colher nenhum dos multiplicados frutos que estejam convidando com as vantagens dos seus resultados medicinais ou com as delícias do seu agradável sabor”. Encareço quaisquer esforços de V. Exe. No sentido de prover-se a esta necessidade. Há também nesta capital um Gabinete de Leitura, dirigido por uma associação, que amplifica-lhe todos os dias as proporções, prometendo- lhe longa vida, e os frutos de que é ele susceptível, pela dedicação, gosto e solicitude dos seus respectivos membros. Falo do Gabinete Literário Sergipense, brilhante atestado do sumo poder da iniciativa particular, que, ainda em um solo pouco favorável e subjulgado pela tirania do obscurantismo, tem com tudo obtido notáveis triunfos. Distinguido por essa nobre associação com o diploma de seu sócio honorário, aceitei a honra que se me conferira na maior efusão de júbilo e reconhecimento; e quando em mim cabe tenho concorrido e concorrerei para a sua obra civilizatória. Por vezes visitei a sua sala de leitura, e se bem que ainda modestas sejam as suas proporções, já há, todavia, muito com que a inteligência e a imaginação se entretenham. Ultimamente procurou o Gabinete Literário Sergipense, criar em um dos seus salões uma aula noturna de Francês, que ainda não funcionou, mas que começará efetivamente no ano vindouro.6

6 Jornal do Aracaju. Aracaju, Ano III, nº261, 13 de abril, 1872.

36 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Gabinete Literário

O Gabinete Literário sergipano teve ultimamente os seguintes oferecimentos. Pela Ex.ª Sr.ª Maria do Prado Pinto, das obras de J. Verne: Os náufragos do ar. O abandonado, Da terra à lua, Ao redor da lua, O chanceler, A terra das peles, Viagens e aventuras do capitão Hattoras, Aventuras de três russos e três ingleses. Theop. Gantier, Novelas. O rei Candaule. Pelo Sr. Antonio Martins de Almeida: A escola do amor. Pelo Sr. Belmiro Paes de Azevedo: Apontamentos para a história dos jesuítas no Brasil, do Dr. A. H. Leal. Pelo Exmo. Sr. conselheiro Saldanha Marinho: A Igreja e o Estado, importante obra em 3 grandes volumes, trabalho do mesmo autor Sr. Conselheiro. Em nome do Gabinete Literário sergipano, agradecemos a todos tão generosos oferecimentos. Sem concurso de todos os amigos das letras, decerto não poderia sustentar-se uma sociedade de tal ordem. Felizmente o gabinete literário de Sergipe tem encontrado apoio de pessoas distintas, e animado prossegue contando que tão bens exemplos serão imitados pelas senhoras e pelos cavalheiros que sentem no peito a chama do entusiasmo pelo progresso e pela liberdade, de que é sempre novel – o livro.7

7 Jornal do Aracaju. Aracaju, Ano VI, nº633, 13 de outubro, 1875.

37 GILFRANCISCO

Somente a 27 de março de 1890 o governador e historiador Felisbello Firmo de Oliveira Freire (1858-1916), autor da História de Sergipe 1575-1855 (1891); História Constitucional do Brasil (1894); História Territorial do Brasil (1906), Nos Bastidores da Política (1911); pelo decreto de número 374, de 27 de março, criou a Biblioteca Pública do Estado. Nesse mesmo ano o diretor da Biblioteca Pública, jornalista Francisco de Carvalho Lima Júnior, solicita ao jornal ‘O Republicano’, a publicação de um ofício dirigido à diretoria do Gabinete de Leitura. Vejamos e seu teor: Ilustres cidadãos, comunico-vos que em virtude de achar-se funcionando, sob minha direção, a Biblioteca Pública deste Estado, me tenho dirigido a diversos jornais e escritores nacionais, solicitando donativos de livros para aumentar o cabedal já existente no mencionado estabelecimento. E como os sergipanos devem ser os mais interessados pelo progredimento dos nossos diminutos créditos literários e científicos, peço-vos para conservar nas estantes da Biblioteca os livros, que ainda restam do antigo Gabinete de Leitura. Lamento que semelhante instituição tenha sido abandonada talvez a falta de leitores mas por isso mesmo que os livros restantes estão condenados às traças, não servindo a ninguém, podendo ser uteis a todos, julgo muito mais proveitoso, que estes bons amigos dos espíritos perfectíveis façam parte integrante da Biblioteca Pública do Estado, onde serão conservados como merecem, pelos bons serviços que ainda possam prestar ao público pensante. Assim sendo, e não podendo supor a ausência de sergipanismo em vós, nem tão pouco, que vos seja indiferente à sorte da nascente instituição da Biblioteca Pública fundada no Estado com tão bons intuitos, conto que, por semelhantes serviços, fareis jus à gratidão de nossa mocidade que

38 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE estuda, e dos velhos que não se desprezam de aprender nos bons mestres. Saúde e Fraternidade.

Aracaju, 14 de agosto de 1890. Ilustres cidadãos presentes e mais membros da Diretoria do Gabinete de Leitura desta Capital. Francisco A. de Carvalho Lima Junior.8

Em 1908, Edilberto Campos, secretário do governo (1907-1908) tomou as primeiras medidas para conservação da Biblioteca, período em que é nomeado a 21 de outubro como bibliotecário, Epifânio Dória, que juntamente com o diretor deu início aos melhoramentos necessários: ordenando e anotando os maços de livros e jornais existentes no acervo.

8 O Republicano. Aracaju, 24 de agosto, 1890.

39

A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

A Biblioteca em Aracaju

Apresentando um gráfico que mostra o movimento da Biblioteca Pública entre os meses de setembro de 1902 a julho de 1903, confeccionado pelo bibliotecário Cícero d’Ávila Garcez, o Presidente do Estado em Relatório de 14 de agosto de 1903 apresentados pelo Secretário interino do Governo, Tito Gomes de Araújo Pinto, diz que: A biblioteca há pouco revista, por funcionário de indiscutível competência, continua a prestar ao público os serviços para o que foi estabelecido. Os seus funcionários satisfazem as exigências do serviço. Tendo sido frequentada pelo modo que se vê do quadro junto.9

9 O Estado de Sergipe. Aracaju, Ano II, nº1476 de 1º de outubro, 1903.

41 GILFRANCISCO

Gráfico de frequência da biblioteca durante o período de setembro de 1902 a julho de 1903.

42 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Durante a Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa de Sergipe na 2ª sessão ordinária da 9º Legislatura em 7 de setembro de 1909, pelo vice-presidente do Estado, Manoel Baptista Itajahy, ao tratar sobre a Biblioteca Pública, fala da instalação provisória dessa repartição e das condições em que se encontra seu acervo: Esta repartição se conserva ainda em uma das dependências do Palácio do governo por falta de um local mais apropriado. Conta um considerável número de obras importantes sobre ciências, artes, literatura, teologia, jurisprudência e história, conforme se ver do catálogo ultimamente publicado. Funciona durante o dia nas horas do expediente das demais repartições e à noite até às 8 horas, sempre com regular concorrência. Não seria fora de propósito reunir àquele estabelecimento o arquivo das demais repartições da capital. O Estado não possui até hoje um arquivo público onde possa ser recolhido os documentos de importância relativos à sua história política e administrativa. E com a realização dessa ideia seria preenchido tão sensível lacuna com a vantagem considerável de centralizar o serviço de arquivamento dos papéis públicos. Aos cartórios seria imposta a obrigação de remeterem para o arquivo os processos findos de certa época para trás. Penso que centralizado assim esse serviço ficaria o arquivo constituindo uma fonte de renda para o Estado, porque uma vez publicados os catálogos e conhecida a existência de certos documentos ignorados, poderiam os interessados requerer certidões, que, além do selo, pagariam os emolumentos que reverteriam para os cofres do Tesouro. A razão de ser dessa anexação assenta no fato da regularidade do serviço, pois que nos arquivos onde só há um funcionário deles incumbido dão-se por vezes alterações bem prejudiciais. Si se ausenta, em virtude de moléstia ou por outra qualquer circunstância, esse funcionário, o que o substitui, sem a prática e

43 GILFRANCISCO conhecimento precisos daquele serviço, não raro o desorganiza por completo. O mesmo não se dá, porém, em uma repartição aonde os empregados se reversão no mesmo serviço. Este é sempre feito regularmente. Para se pôr em prática semelhante medida não seria mister sobrecarregar o Estado de maior despesa. Ai fica a ideia, que, aliás, não é nova, pois já foi praticada em outros Estados.10

10 O Estado de Sergipe. Aracaju, Ano XI, nº3089 de 11 de setembro, 1909.

44 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Mensagem do Vice-Presidente do Estado Dr. Manoel Baptista Itajahy.

45 GILFRANCISCO

José Rodrigues da Costa Dória (Propriá, 25 de julho, 1857 - Salvador, 14 de janeiro, 1938), foi médico e político, que presidiu o Estado de Sergipe de 24 de outubro, 1908 a 10 de julho, 1909 e de 13 de novembro do mesmo ano a 24 de outubro, 1911. A Mensagem apresentada à Assembleia do Estado de Sergipe, pelo Presidente do Estado José Rodrigues da Costa Dória em 7 de setembro de 1911, trata a Biblioteca Pública com indiferença, sem apresentar planos para um melhor funcionamento, limitando-se a mencionar algumas doações de livros e periódicos à Biblioteca: O major João Menezes, distinto Deputado Estadual, teve ontem a generosa lembrança de oferecer à biblioteca Pública do Estado a coleção completa das obras do imortal Voltaire. A referida coleção que se compõe de 70 grossos volumes excelentemente encadernados foi editada em 1734, pelo que já entrou no seu 137 anos de existência. A biblioteca está recebendo atualmente várias publicações periódicas que até há pouco tempo não recebia, por gentileza das respectivas redações. O Dr. Carvalho Aranha, residente em Pindamonhangaba, Estado de S. Paulo, tem remetido sempre várias publicações a Biblioteca e como ele o Dr. Heitor de Souza residente em Bole Horizonte, Estado de .11

***

Em agosto de 1912, quando Epifânio Dória apresentou o Relatório da Biblioteca ao Dr. Silvio Mota, Secretário do Governo, expôs alguns problemas pontuais enfrentados por ele: A Biblioteca continua a sentir a necessidade de um edifício próprio, e agora mais do que nunca, uma vez que o seu serviço tem tomado nestes últimos tempos um incremento extraordinário, graças à vossa valiosa proteção e a boa vontade do impoluto militar que ora dirige os nossos destinos.

11 O Estado de Sergipe. Aracaju, Ano XIII, nº3654 de 17 de setembro de 1911.

46 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Felizmente o Exm.º Sr. General Presidente do Estado pretende em breve satisfazer esta necessidade do tempo a Biblioteca com um edifício vasto e apropriado.12 Um ano depois, em 1913, no governo do general José Siqueira de Menezes (1852-1931), a biblioteca foi instalada num prédio da Praça Olímpio Campos, no mesmo imóvel onde funcionava o antigo Atheneu Sergipense, permanecendo ali durante 23 anos. Vejamos a Lei nº 639 de 7 de outubro de 1913:

Dá nova organização à Biblioteca Pública do Estado. O Presidente do Estado de Sergipe:

Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado decretou e eu sanciono a seguinte lei: Art. 1º. A Biblioteca Pública do Estado, criada por Decreto de nº 34 de 27 de março de 1890, é o depósito de obras científicas e literárias, de memórias e impressos, de cartas e manuscritos, de plantas, mapas e desenhos, de quadros, estampas e gravuras, de moedas e medalhas, selos, etc., adquiridos por doação ou a custa do cofre do Estado, ficando por força da Presente lei, separada da secretaria do Governo, para funcionar como qualquer das repartições públicas do Estado. Art. 2º. Conservar-se-á aberta e franqueada ao público a Biblioteca durante todo ano, desde as nove horas da manhã até às duas da tarde e das seis às oito da note; exceto os domingos, dias feriados da República ou do Estado e os que decorrerem de 23 de dezembro a 7 de janeiro. Art. 3º. Haverá na Biblioteca o número de estantes necessárias para arrumação e conservação dos livros, jornais, manuscritos e mais papéis; de caixas e urnas para o depósito de metais, gravuras, selos de coleção, etc; bem como, haverá mesas para a leitura, bancas e cadeiras para uso do

12 Exposição apresentada ao Dr. Sylvio Mota Secretário do Governo – 8 de agosto, 1912. Aracaju, Typ. d’O Estado de Sergipe, 1912.

47 GILFRANCISCO estabelecimento, além da mobília necessária para as visitas. Parágrafo único. Pode igualmente ser admitido, para a arrumação e conservação dos livros e quadros o sistema de estantes giratórias, prateleiras e galerias. Art. 4º. Todas as obras serão carimbadas na primeira página com o sinete da Biblioteca. Art. 5º. Para a boa regularidade do serviço haverá na Biblioteca um catálogo organizado, do qual constarão todas as obras nela existentes. Este catálogo será intercalado às obras posteriormente adquiridas. Parágrafo único. De um livro especial constarão, por ordem alfabética, quanto possível, e por ordem cronológica, as gravuras, estampas, quadros, selos, que estiverem em arquivo, bem como as moedas e medalhas. Art. 6º. É expressamente vedada a saída de livros, folhetos, jornais e manuscritos da Biblioteca ou quaisquer outros objetos constantes dos seus arquivos a não ser para o Gabinete do Presidente do Estado e Secretaria do Governo por ordem do respectivo secretário, para consultas. Art. 7º. Além dos livros que forem necessários para o registro da correspondência e dos de que trata o parágrafo único do art. 5º haverá os seguintes:

a) Um livro para nele inscrever o visitante o seu nome, as obras, jornais, manuscritos ou quaisquer outros papéis e documentos que consultar; b) Um em que serão inscritos os nomes das pessoas que fizerem donativos de obras, com indicação do objeto sobre que versarem; c) Um para o lançamento do título de cada obra que for adquirida.

Art. 8º. É livre a toda pessoa decentemente vestida a entrada e permanência no salão de leitura da Biblioteca, quer como mero visitante, quer para a leitura ou exame de livros, jornais, manuscritos e quaisquer outros papéis, ou artefatos do estabelecimento. § 1º É expressamente proibido ao visitante ou leitor tirar qualquer

48 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE obra ou jornal das estantes e repô-las no lugar, podendo pedi-las ao empregado competente. § 2º O visitante ou leitor que entrar na Biblioteca com livro, jornal ou outro qualquer objeto, o depositará no lugar para isso reservado, que lhe será indicado por qualquer dos empregados presentes. Art. 9º É vedado passear nas salas da repartição, falar alto ou perturbar de qualquer modo a quem estiver lendo ou estudando. A pessoa imprudente que assim proceder será advertido, e caso reincida, será intimada; desobedecendo a intimação, será autuada. Art. 10º São também proibidas longas conversação quer entre pessoas admitidas, quer destas com os empregados, seja debaixo de que pretexto for. Art. 11º A Biblioteca terá os seguintes empregados que perceberão os vencimentos fixados na tabela anexa: Um diretor; Um ajudante secretário; Um porteiro-contínuo;

49 GILFRANCISCO

Do Diretor

Art. 12º. Ao diretor compete: 1º Velar pela segurança da repartição e pela conservação dos livros e tudo mais que a ela pertencer, evitando extravios. 2º Dirigir todo o serviço da Biblioteca. 3º Corresponder com o governo e com os particulares, nacionais ou estrangeiros, sobre os negócios do estabelecimento. 4º Propor ao governo as medidas que julgar conveniente à boa marcha de todo o serviço da Biblioteca, no relatório que é obrigado a lhe enviar até o dia 15 de agosto de cada ano do que houve ocorrido no estabelecimento. 5º Organizar o catálogo das obras e o livro de que trata o parágrafo único do art. 5º desta lei. 6º Fiscalizar todos os trabalhos bibliográficos, de maneira que as novas aquisições sejam inscritas nos catálogos o mais depressa possível. 7º Examinar todos os dias se as obras pedidas no dia anterior foram colocadas nos respectivos lugares, abrindo logo rigorosa sindicância, por qualquer falta encontrada, a fim de apurar a responsabilidade de quem de direito. 8º Ministrar as informações pedidas pela Secretaria do Governo. 9º Remeter, no princípio de cada mês, a esta, para ser publicado, um quadro contendo o número de visitantes e das obras, jornais, papéis e documentos consultados no mês anterior. 10º Providenciar para que aos visitantes sejam com prontidão entregues as obras pedidas para leitura ou consulta. 11º Ministrar todas as informações que lhe forem pedidas por visitantes estrangeiros ou de fora do Estado, atendendo com a máxima presteza as que forem perdidas pelas repartições de estatística. 12º Procurar ter, na melhor ordem dispostos, todos os dados estatísticos da Biblioteca, do município da Capital do Estado ou da

50 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

República em livros especiais, para as consultas e estudos. 13º Requisitar do Governo a compra de obras e objetos precisos para o estabelecimento e do expediente do mesmo quando não for este votado em lei. 14º Distribuir o trabalho aos empregados da repartição como melhor convier às necessidades do serviço e exercer rigorosa fiscalização no estabelecimento para que em dia estejam sempre os trabalhos distribuídos. 15º Procurar manter inalteráveis em todos os salões da Biblioteca o silêncio e a ordem. 16º Admoestar os empregados que faltarem ao cumprimento de seus deveres, suspendê-los por oito dias no máximo em casos de reincidência, dando parte ao governo. 17º Observar e fazer observar as disposições do Presente Lei.

Do Ajudante Secretário

Art. 13. Ao ajudante secretário compete: 1. Substituir o diretor em seus impedimentos. 2. Conservar e ter em dia o inventário completo da Biblioteca no que diz respeito ao depósito literário, arqueológico, etc., e ao que se refere ao mobiliário e utensílios do uso do estabelecimento e objetos da sua ornamentação, escriturando tudo que se for adquirido. 3. Cuidar da conservação do arquivo e dos objetos que constituírem ornamento dos salões da Biblioteca. 4. Escriturar o livro de contas, o de registro de ofício e ordens que forem expedidas e outras que forem exigidas no serviço do estabelecimento. 5. Assinar os recibos de todas as publicações que forem enviadas à Biblioteca. 6. Catalogar todos os livros, cartas, manuscritos, estampas, gravuras, mapas, moedas e medalhas de acordo com o estabelecido no art. 5 e seu § único.

51 GILFRANCISCO

7. Presidir ao serviço da sala pública, cuidando dos objetos confiados aos leitores para que se não extraviem ou estraguem. 8. Cumprir todas as ordens do diretor no que for concernente ao serviço da Biblioteca. 9. Abrir, numerar, rubricar e encerrar, precedendo ordem do diretor, os livros necessários à escrituração do estabelecimento. 10. Fiscalizar o livro de ponto, encerrando-o às 9 ½ da manhã.

Do Porteiro contínuo

Art. 14. Ao porteiro contínuo compete: 1. Abrir e fechar o estabelecimento à hora regulamentar. 2. Cuidar do asseio da casa, estante, livros, quadros, mobiliário, etc. 3. Como contínuo substituir o ajudante-secretário em suas faltas e impedimento, e não consentir que saia pessoa alguma levando livros, papéis jornais ou qualquer outro objeto da Biblioteca. 4. Além desses serviços, o porteiro-contínuo ocupar-se-á com todo e qualquer outro que o diretor determinar.

Da Leitura Pública

Art. 15. Na Biblioteca só serão admitidas as pessoas de ambos os sexos maiores de 14 anos, que se apresentarem decentemente vestidas; quinze minutos antes do encerramento dos trabalhos, não será permitido fazer pedidos. Art. 16. Nunca poderão duas obras ser pedidas a um tempo; e se o leitor declarar que no dia seguinte voltará a consultar a mesma obra, poderá esta deixar de ser colocada no respectivo lugar até o dia seguinte apenas. Art. 17. Os livros raros só serão confiados ao público em uma mesa especial e o mais próximo possível do empregado do serviço. Quanto aos manuscritos, medalhas, moedas, selos e coleções de objetos, serão sem

52 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE exceções prestados a exame, na presença de qualquer empregado. Parágrafo único. Na mesa dos livros raros serão lidas também as obras enriquecidas de estampas numerosas, e as pessoas que as consultarem não poderão servir-se de tinta: tomarão notas, ou farão desenhos a lápis. Art. 18. O leitor não poderá colocar o papel em que escrever ou desenhar sobre o livro ou objeto que lhe for entregue. Art. 19. A cópia dos mapas ou cartas geográficas será feita somente a lápis e em papel vestal e não embebido em óleo, e precedendo para isso permissão do diretor da Biblioteca, sucedendo o mesmo com as plantas e gravuras, sendo proibido a tudo aplicar o compasso. Art. 20. A cópia das peças de que trata o art. anterior não poderá ser tirada sem expressa licença do Governo do Estado. As pessoas a quem for concedido esse favor ficarão obrigadas a dar à Biblioteca dois exemplares da cópia que for publicada. Art. 21. Havendo manuscritos reservados, não poderão ser estes patentes ao leitor sem expressa permissão do diretor, e quando por ventura a tais manuscritos se referirem a licença para tirar cópia de que trata o art. antecedente, empregar-se-ão todos os meios adequados para preservá-los de qualquer acidente. Art. 22. Nenhuma estampa solta será mostrada ao público sem permissão do diretor, esta proibição não se estenderá às fotografias. Parágrafo único. Aos menos de 21 anos não se facultarão obras que ofendam a moral.

Disposições Gerais

Art. 23. De entre os salões da Biblioteca, quando em edifício apropriado, será um destinado à conferências públicas literárias, de instrução cívica e primária, no qual será colocada uma tribuna para o orador ou conferencista. Parágrafo único. Esse salão poderá, mediante licença do Governo, ser

53 GILFRANCISCO cedido ao Diretor da Instrução Pública, ou diretor de algum estabelecimento de ensino público ou particular para a realização de festas com caráter literário, como de férias por encerramento das aulas; bem assim, ao diretor de algum estabelecimento pio de caridade em benefício da instituição, excetuando-se as quermesses e congêneres. Art. 24. Ficam revogados os Arts. 62 a 77 do Regulamento que baixou com o Decreto nº 514 de 20 de junho de 1902 e mais disposições em contrário.

Palácio do Governo do Estado de Sergipe, Aracaju, 7 de outubro de 1913, 25º da República.

General José de Siqueira Menezes.

José Alípio de Oliveira

Tabela de vencimentos dos funcionários da Biblioteca Pública desta cidade ______Cargos Ordenado Gratificação

1 Diretor 2:000$000 1:000$000 1 Secretário ajudante 800$000 440$000 1 Porteiro 600$000 300$000

Palácio do Governo do Estado de Sergipe, Aracaju, 7 de outubro de 1913. General José de Siqueira Menezes 13

13 Coleção de Leis e Decretos de 1913. Aracaju, Typ. do “O Estado de Sergipe”, 1913.

54 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Em setembro de 1913 o General José de Siqueira Menezes em Mensagem apresentada á Assembleia Legislativa de Sergipe sobre a Biblioteca Pública diz o seguinte: Também mereceu de meu governo um olhar de carinho a Biblioteca Pública desta Capital, a única que temos no Estado, a qual continua a funcionar no pavimento térreo ao lado direito do edifício do Palácio do Governo. Devido à execução de obras de maior urgência, não dei inicio as da Biblioteca, estando, porém encarregado de levantar a planta do prédio e fazer o respectivo orçamento um distinto e competente profissional, nosso ilustre patrício. Por ora, apenas adquiri os 24 volumes da Biblioteca Internacional de Obras Célebres, que apareceram precedidas dos maiores elogios, vindo assim, mais enriquecer a coleção de obras que possui a Biblioteca Pública desta Capital. O seu movimento de agosto de 1912 a julho de 1913, consta do mapa anexo, sob nº 21.14

14 Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa de Sergipe em 7 de setembro de 1913. Aracaju, O Estado de Sergipe, 1913.

55 Biblioteca Pública inaugurada em 1914, atual Câmara Municipal de Aracaju. A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discursos Pronunciados na Inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe

A Imprensa na Inauguração

Inaugura-se hoje, das 11 às 18 horas, o novo edifício da Biblioteca Pública do Estado, que acaba de ser construído aos esforços do eminente Sr. General Siqueira Menezes. Às 11 horas o Sr. bispo diocesano lançará a benção de inauguração e instalação, sendo paraninfos S. Ex. o Sr. General Siqueira Menezes e o desembargador Caldas Barreto: às 12 abrir-se-á a sessão magna de inauguração presidida pelo eminente presidente do Estado, orando por esta ocasião o Dr. Nobre de Lacerda. Após isso será colocado no salão o retrato de S. Ex. o Sr. general Siqueira, encarregando-se do discurso a talentosa senhorita Sylvia Ribeiro. Falará depois o Dr. Evangelino de Faro, por ocasião de ser colocada do grande salão do edifício a placa denominando-o “Salão Siqueira Menezes”. Seguindo, falará o diretor da Biblioteca, terminando pelo oferecimento das medalhas especialmente cunhadas. Por uma comissão de senhoritas serão distribuídas postais. Logo depois inaugurar-se-á o salão “Felisbello Freire” onde, ao ser colocada placa, orará o desembargador Teixeira Fontes. O lanche se efetuará após, num dos compartimentos do edifício. No salão “Siqueira Menezes” terminará festa, uma imponente matinê. Não há convites especiais, nem luxo, absolutamente, para os atos.

(Correio de Aracaju, 14 de julho, 1914.)

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discurso Proferido pelo Dr. Nobre de Lacerda, Orador Oficial

Em nome da comissão promotora desta festa, em nome desta Biblioteca, o que importa dizer, em nome do seu operoso e inteligente diretor, Epifânio Dória, que tem sido para esta útil instituição o que é o oxigênio para as células vitais do organismo humano, é que tenho a honra de falar-vos. Li há poucos dias em Foustel de Coulanges que era costume entre os oradores de Athenas, ao assomarem à tribuna, invocar os deuses e os heróis, antes de proferirem os seus discursos. Remontando a uma época já quase de todo extinta pela distância que vai dos nossos dias, mergulhando no mar sereno de sua história à cata de tradições dignas de serem imitadas, eu invoco, neste momento, os manes gloriosos dos heróis de 89, que, com o 14 de julho, nos deram a fraternidade universal, para que me não abandonem nesta tarefa a que me impus em obediência à amizade. Quando convidado para orador oficial nesta festa dos livros, uma multiplicidade de ideias me ocorreu, uma seriação de nomes ilustres nos domínios da política me assaltou o espírito desde logo. É que no momento atual da nossa civilização, a política é elemento indeclinável, sobretudo tratando-se de uma instituição que é obra exclusiva dos seus corifeus. Penso ter dito uma verdade, quando aventei ser a política elemento indeclinável, nos tempos que correm, desde quando já antes de mim o egrégio Ruy Barbosa houvera afirmado ser ela a atmosfera das nações. É certo que não pretendo tomá-la por tema exclusivo do meu discurso. Aliás, se o fizera, não seria fora de propósito, desde que à políticos

59 GILFRANCISCO devemos nós a existência desta Biblioteca e a sua remodelação. Projetou a sua criação um político eminente, o Dr. Martinho de Freitas; converteu-se em realidade uma assembleia de políticos, em 16 de junho de 1848, com a lei 233: inaugurou-a um delegado da política de então, o Dr. Amâncio João Pereira de Andrade; foi seu primeiro diretor um peregrino da política, homem de farta ilustração, vigário Barroso, que durante meio século arrastou no carro triunfal de seus arroubos oratórios a fama gloriosa de uma geração. Depois disto... ah! contrista dizê-lo... dias sombrios pesaram sobre este venerável santuário das letras e da ciência. E, assim permaneceu por largo estádio, até que o espírito clarividente de Felisbello Freire veio levantá-la, em 1890, do marasmo a que tinha sido votada. Como vedes senhores, o seu resurgimento foi ainda a obra do político... Daí por diante o gênio tutelar que havia inspirado o erudito constitucionalista sergipano, não mais abandonou um só dos seus sucessores e ela continuou a ter o cuidadoso desvelo que merece. E hoje, quem lhe proporciona tão completa remodelação, quem a instala em tão magnificente palacete, é este venerado patrício a quem, em momento de verdadeira inspiração patriótica, entregamos os destinos de nossa terra. E que é Siqueira Menezes senão o genuíno representante do espírito liberal e político do nosso povo? Não me proponho fazer a psicologia de sua obra, nem o momento se me depara oportuno. Apenas direi que é relevante sob qualquer prisma por que se a quiser encarar: na quietude remansosa de paz ou nas agitações ciclópicas da guerra. No primeiro caso ele realizou o ideal dos estadistas americanos de que fala Horácio Mann, quando doutrina que o primeiro dever dos

60 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE magistrados e dos chefes de república é subordinar tudo à instrução pública, que é o interesse supremo; no segundo, traduziu o gênio indômito das batalhas que encarnou Napoleão. Quando a honra da Pátria periclitava ameaçada por uma horda de brasileiros inconscientes e ferozes, foi na couraça invulnerável do seu civismo irredutível e na firmeza da sua espada de têmpera inflexível que encontrou a mais cabal desafronta. Os seus feitos fulguram nessa epopeia homérica escrita por um pugilo de herói nos campos cambiantes de luz intensa e crua, nos monumentos com que a sua visão aquilina de estadista equilibrado tem sabido dotar a nossa terra. Uma constituição, sendo, no conceito esclarecido de Euclides da Cunha, “a resultante histórica de componentes seculares, é sempre um passo para o futuro garantido pela energia conservadora do passado. Tradicional e relativa, despontando de leis que se não fazem, mas que se descobrem no conciliar novas aspirações com os esforços das gerações anteriores, é um traço de aliança na solidariedade dos povos”. Bem como esses monumentos legislativos são as bibliotecas, porque transmitem de umas às outras gerações os princípios edificantes das artes e das ciências, da filosofia e do direito. Fundar estabelecimentos como este, onde o povo possa beber ensinamentos cívicos e conhecimentos de toda ordem, deve ser a preocupação dos governos bem orientados. Uma biblioteca, no conjunto dos elementos que a compõem, ensina-nos a amar a pátria e os seus heróis e derrama em nosso espírito os germes da fraternidade e da liberdade, de onde deriva todo o progresso. Com a remodelação desta Biblioteca, Sergipe escreve hoje uma das páginas mais sugestivas de sua história político-social. É que este edifício não significa somente a magnificência de uma obra de arte no complexo de sua beleza arquitetônica, mas principalmente uma conquista radioso do espírito liberal da nossa época nos domínios da inteligência.

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O ar que aqui se respira não se embebe do ódio que envilece, nem se peja se sentimentos bastardos. Penetrando por estas janelas ele canta, numa escala ascendente de harmonias, o hino alvissareiro do trabalho. É que sob este teto se albergam na mais estreita comunhão os maiores representantes da intelectualidade mundial nas diferentes etapas do saber. Juristas e filósofos guerreiros e industriais, artistas e poetas aqui confraternizam. Entre eles, seja qual for o raio visual de cada um, existem apenas divergências aparentes, supostas contradições. No fundo é admirável o consórcio. Porque no conceito de Edmond Picard, o destino de todas as forças sociais é funcionar num fraternal entendimento. Para que uma nação seja grande e nobre, e cumpra o seu destino, continua o ilustre enciclopedista, é necessário que mostre num só cortejo os jurisconsultos e os artistas admiráveis e aclamados pelo povo inteiro. É dos contrates da natureza que nasce a harmonia do Universo. A noite e o dia, na sua flagrante divergência, o átomo e a montanha na diferença espantosa de sua grandeza, formam elos da mesma cadeia, propendem para, o mesmo fim. O mesmo se verifica na ordem intelectual. Na elaboração contínua de sua obra eficaz; sintam e pensem de modo diverso embora, os homens que vivem pelo pensamento visam um escopo único – o progresso da Pátria. Nas estantes que ornamentam as paredes deste edifício, o poeta sente-se perfeitamente bem no convívio do jurista, o filósofo no do artista. E não é sem razão de o ser. Houve época em que as leis eram escritas em versos. Todos nós, que perlustramos a história, sabemos que os códigos, sob Dracon e Lycurgo, eram verdadeiros poemas.

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E Foustel de Coulanges refere que as leis eram feitas em decretos tão breves, que pela forma se poderiam comparar a vesícula de Moisés. As palavras das leis eram rimadas. Aristóteles afirma que as leis antes de serem escritas eram cantadas. Os romanos as chamaram – versos, e os gregos – cantos. É que a poesia, na finíssima dialética de Artur Muniz, um dos mais vigorosos pensadores pernambucanos, “foi sempre, através de todas as idades e de todas as raças, uma força e uma luz; força para manter na decomposição das idades e vitalidade e o gênio das raças, e luz para guiá-las à perfeição moral e estética. Romanos! Exclamava o romano imortal, honrai o título de poeta, vós, o mais civilizado dos povos, porque ele jamais foi desconhecido das nações as mais bárbaras. Os rochedos respondem à sua voz, os animais os mais ferozes se enternecem, ouvindo os seus cânticos! E se não bastar, se o grande Cícero, para os que não mergulham no mar de suas obras, ora revolto, ora sereno, for um espírito distante do nosso tempo, temos Tarde dizendo: a música cria, muito, mas exprime confusamente; a escultura cria pouco, mas exprime com precisão e vigor; a poesia, porém, reúnem estas duas qualidades; é a arte soberana, e, dia virá, em que ela, essência da arte, será a religião da humanidade, a síntese supracientífica do universo... Senhores! Obedecendo às injunções do programa desta festa, que me concedeu apenas quinze minutos para faltar, vos rematar o que venho dizendo. Honram este festival representantes de todos os matizes sócios, exército, clero, artes, letras, ciências e, para coroá-lo de esplendor paradisíaco – a síntese de todas as grandezas do universo – a mulher. Pois bem, em Noé dos que povoam, de glórias este ambiente, em que em suas obras imortais nos contemplam do alto das estantes que

63 GILFRANCISCO ornamentam este edifício: sacerdotes, guerreiros, poetas, artistas, filósofos e juristas, aos quais tenho a honra de representar, como orador que sou, por parte desta instituição, eu agradeço a gentil comparecia de todos vós. E ficai certos de que se os meus constituintes pudessem objecturar- se fisicamente neste instante, diriam, cada um a seu turno, tendo em vista a feição intelecto-social dos que compõem este escolhido auditório: – Alma de estetas, eu simbolizo o gênio da harmonia. Nasci da vibração contínua dos elementos da natureza; enriqueci de mágicas dolências a voz inimitável dos rouxinóis; enchi de inspirações a psique incomparável de Mozart. Na Alemanha canteis os – Niebelungen; na Itália – a Tosca e no Brasil a sinfonia augusta do Guarani. – Na talagarça imensa do infinito debuxei as nuanças do arco-íris, iluminei de vívidos clarões o – Paraíso de Tintoreto; ofereci aos olhos pasmos de muitas gerações as belezas inexcedíveis do Juízo Final de Miguel Ângelo. Fiz de Pedro Américo e Horácio Hora os expoentes brilhantes de minha conquista no Brasil. – Alma de jurista, eu represento o gênio tutelar da ciência do direito. Nasci com os primeiros albores do sentimento humano. Ainda o homem era o selvagem das cavernas e eu já trabalhava a obra do seu aperfeiçoamento moral. Insinuava em sua alma embrionária o sentimento altruístico do dever. Das taboas da lei passei às páginas luminosas dos códigos modernos. Aonde tirania irrompe ferindo o povo com o instrumento da mais revoltante violência levanta-me para defendê-lo com a cava poderosa da justiça. Na antemanhã das civilizações, incorporei ao meu apostolado Papiniano; na moderna Alemanha, Rudolph Von Lhering e no Brasil, Ruy Barbosa.

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Alma de sacerdotes: Eu represento o gênio do cristianismo. Com Vicente de Paula percorri as ruas de Paris para abrigar à sombra passional das minhas virtudes as louras criancinhas abandonadas; com Diogo Feijó forrei de estofo invulnerável a alma de uma nacionalidade, sobre a qual pesavam dias sombrios de crise avassaladora e dissolvente; com Olympio Campos ensinei à terra de Tobias Barreto a litania afetiva da abnegação e do civismo. – Alma de herói: Eu simbolizo o gênio das batalhas. Na antiguidade fui César, com ele, conquistei as Gallias e vitorioso proferi – em, vini, vidi et vici; na idade contemporânea segui Napoleão através a sua luminosa trajetória e submeti a vassalagem do meu império poderosas nações da Europa; com o Brasil tracei a epopeia imortal do Paraguai; fui Andrade Neves; fui Ozório; inspirei Deodoro na obra grandiosa do 15 de novembro; com Floriano Peixoto consolidei a República; com Siqueira Menezes traspus heroicamente os redutos inacessíveis de Canudos. Alma de mulher: Eu sou o gênio da poesia. Nasci dos rutilos lampejos do primeiro olhar feminino. Com Luiz de Camões atravessei impávidos os mares tempestuosos do Ocidente para enaltecer a pátria e levantar o padrão de suas vitórias, cantando a apoteose de sua grandeza e a beleza escultural de Catarina; nas Liras dulçorosas de Gonzaga opulentei as graças infinitas de Marília; na magia teorba de Pedro de Calasans tracei a silueta do divino sorriso de Ofenísia e a serena grandeza do heroísmo de Camerino... Que mais vos posso dizer meus senhores, em nome dos meus constituintes, senão – obrigado, síntese do mais nobre dos sentimentos humanos, a gratidão? Agora, tu, fecunda e gloriosa terra, onde na serena mudez do campo santo repousam os meus antepassados, e em cujo seio pretendo descansar no derradeiro sono, tu, a quem a natureza caprichosa e bela concedeu as maiores opulências na feracidade do teu solo e na pujança do talento

65 GILFRANCISCO dos teus filhos, dando-te ao mesmo tempo, na configuração geográfica, a forma expressiva de um coração, recebe, como penhor do nosso carinho, as homenagens que hoje te rendemos, com a inauguração desta Biblioteca, que será um marco miliário a atestar às gerações que se sucederem o teu grande amor pelo progresso.15

15 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. , Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 29-33.

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Discurso Proferido por D. Sylvia Ribeiro

Exmo. Sr. General Presidente do Estado; Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano; Distintos cavalheiros e Exmas. Senhoras:

Neste recinto, onde se reúne a elite de nossa sociedade, não vos admireis que eu vos diga que experimento uma emoção insuperável, um acanhamento invencível, e que comece reclamando a vossa benevolência. Há honras que se não pedem, mas que se não rejeitam. Convidada para tomar parte nesta festa, onde fulguram oradores de brilhante talento e reconhecida eloquência, tentei esquivar-me por não julgar-me na altura de satisfazer a tão honroso convite; mas, ao saber que tinha sido eu a escolhida para falar ao descerrar as cortinas do retrato do benemérito Presidente General Siqueira Menezes, este sergipano que tem enviado todos os esforços pelo engrandecimento de dever e gratidão, num surto de entusiasmo, acedi voluntariamente. Se não é lícito ao soldado recusar-se a defender a sua pátria, também não o é à admiradora das letras e do progresso esquivar-se de elevar, pela palavra, o merecimento de um princípio, a grandeza de uma ideia. Está justificada perante vós a minha presença. Hoje, em Sergipe, estamos em plena paz. As ondas beijam de manso a praia, os rios deslizam placidamente em seu leito, as nuvens são límpidas e serenas. Pode-se dizer que o governo descansa: não nas delícias de Capua, pois os louros conquistados, os triunfos obtidos numa batalha pacífica de civilização e de progresso, não poderão entorpecer um espírito superiormente elevado, antes concorrerão para vivificá-lo, servindo de incentivo aos futuros representantes da nossa Pátria. Agora que os partidos descansam, que a paz reina no Estado, que se estreitam os laços de fraternidade, é o momento em que todos se devem unir.

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A fraqueza comum impõe-nos a união para realizar o progresso. Nas associações agrícolas e indústrias desenvolve o homem as suas forças: nas associações artísticas sua imaginação; nas associações científicas sua inteligência; nas associações religiosas e beneficentes seu amor a Deus: nas sociedades de socorros mútuos a garantia de sua existência, o futuro de sua família; nas associações políticas sua vontade e seu direito. Se queres a tranquilidade de vosso espírito, dissipai as incertezas do futuro pela associação. Associemo-nos, pois, neste momento, para render um justo preito de homenagem àquele que imortalizou o seu nome nos fastos da história pela nobreza de seu caráter, que se recomenda pelo amor da Pátria e justiça inexcedível, que soube erguer em nossos corações um trono, cujo pedestal será o nosso eterno reconhecimento. Graciosas senhoritas, que representais na terra mimosas açucenas em manhãs primaveris, símbolo de paz e de esperança, descerrai com veneração as cortinas, para que possamos contemplar, ao som do hino da liberdade, o retrato do General, o benemérito. Exmo. Sr., o sol do vosso governo acha-se no ocaso, mas o da verdade que vos ilumina na estrada da vida, conservar-se-á em pleno Zenith. Prossegui, semeando o bem, tendo por divisa o dever e a justiça, e tereis alcançado, para unir à coroa de louros que conquistastes, não somente os aplausos que se perdem na confusão das turbas, mas as bênçãos de um povo agradecido, que através dos tempos saberá bem dizer o vosso nome e o vosso governo. Sede feliz é os meus sinceros e ardentes votos.16

16 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 35-36.

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Discurso Pronunciado pelo Desembargador Evangelino José de Faro

Exmo. Sr. General; Exmo. Sr. Bispo; Exmas. Senhoras; Meus Senhores:

A fatalidade, na sua marcha inconsciente, determinou este momento de duplo sacrifício. Havendo por bem inaugurar-se este edifício, após a sua restauração, com o fim grandioso a que se destina, coincide fazer-se aqui neste instante uma grande manifestação ao administrador emérito, que divinamente inspirado determinou a sua restauração, com o intuito especial de ser a Biblioteca Pública do Estado. A estrela do destino alumiou o meu nome para ser o orador na inauguração desta sala, que será denominada – Salão Siqueira Menezes – especialmente destinada às conferências públicas, firmando na escolha uma humilhação ao homenageado, pela insuficiência de luzes do escolhido para a sua declaração, enquanto verbos fulgurosos dissertariam eloquentemente as loas que tem jus o insigne Presidente. A minha palavra pobre de expressão, humilde na forma, sem a veemência sugestiva dos grandes oradores, e balda de doutrina, naufragaria no mar agitado de vossas aspirações, se não houvesse de vossa parte, dos que me ouvem, a inspiração que se pode dar ao poder da vontade, força que me sustenta e me anima amparado, ainda mais, na elétrica simpatia, que é justa, e que é santa, da causa que abraço, e fomentado pelo amplexo da vossa benevolência. Senhores: Esta festa não é um simples cumprimento de ritual, uma coisa vulgar, como outras que por ai se fazem. Não. É mais do que isso, é mais mesmo do que uma inauguração especial. Não é a simples entrega deste majestoso edifício ao público que o vai usufruir, na conquista da luz do espírito; é uma

69 GILFRANCISCO consagração significativa ao Benemérito Administrador que tem a glória de dar o nome imorredouro a este salão. É muito solene a ocasião, bem se vê; e, por isso que ela é tão solene, abre caminho a alguma coisa mais expressiva do que uma simples manifestação. É uma consagração pública do supremo valor do homem elevado ao pináculo da glória administrativa, pelo complexo dos seus serviços. A composição mais sublime do livro das administrações deixa aqui aberta uma página, à contemplação dos vindouros, para que nela atentamente vejam que o caos governamental do Brasil, as agitações que encapelam o mar das ambições políticas, encontrou um quebra-mar indestrutível, no patriota, a quem a luz divina alumiando, apontou como teatro de seu desenvolvimento a administração de Sergipe – o Exmo. Sr. General Siqueira Menezes. Nesta página de empolgantes ensinamentos hão de ler as gerações vindouras que a administração de um Estado é compatível com todas as classes de funcionários, quando o chefe do governo tem os olhos voltados para a felicidade do povo genuflexo, em oração, diante do altar da Pátria. Senhores, se em política, muitas vezes é preciso assombrar para governar, subjugando, na sociedade é mister marchar adiante para se fazer surgir; arrastar para conduzir. Daí vem dizer um grande alemão, escritor de nota – Edmundo Scherer – que o meio mais fácil e seguro de dirigir nas sociedades modernas, não é só persuadir discutindo, é também conciliar obrando. Não se convencem os espíritos, senão por uma iniciativa grande, fecunda, sempre nova. O primeiro passo foi dado; imitem-no os que vieram. No cérebro grandioso do eminente General, espírito purificado no cadinho do patriotismo, alma eleita para o bem, duas ideias, além do mais, superavam a sua orientação – a conquista o saber e o aformoseamento desta cidade – surgindo, então, o engrandecimento do ensino em geral, e o saneamento da capital. Tudo ele queria, e muito fez. Atestam-nos os seus atos que são públicos, ao alcance de qualquer apreciação. Ele sabe que a ignorância sevandija o fraco e tiraniza o forte. Sem instrução não há liberdade, há licença, há corrupção.

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É preciso instruir para libertar. Sem instrução a ideia de igualdade se amesquinha. A instrução faz a liberdade, faz a fraternidade, faz a igualdade. Só se é irmão quando se sente impulsionar pelo mesmo ideal. A ignorância traz a desigualdade, como traz o despotismo, como traz a corrupção, como traz o aniquilamento, que é a consequência imediata de tudo isso. A liberdade é a vida, diz um poeta. Senhores. Não era liberdade, era vilipêndio, o desrespeito às autoridades, abrindo caminho à anarquia, princípio da morte os governos em geral; não era liberdade a devassidão as ideias, na licenciosidade da linguagem, que usavam em contínuo, os transviados da moral, qualquer que fosse o meio onde estivessem os abusados, que é o princípio a animalidade, correndo para a bestialidade, que é o início do aniquilamento social: não era liberdade o afastamento dos representantes da política adversa ao governo, eliminado o seu direito de se representar, eu é o facho incendiário o absolutismo; não era liberdade o ouvirem-se lastimosamente gemerem os dryades dos bosques, quando tombavam as árvores matando a natureza na derrubada das nossas florestas, e, sim, o suplício da poesia, no aniquilamento da flor, que embalsama o ar, e a supressão dos gorjeios, pela emigração da passarada que perdera seu trono; não era liberdade o viver parasitário e número infinito de meninos, crianças, que sem o incentivo que anima, e o conforto que atrai, olhava indiferentes a passagem de uma dúzia de irmãos, sem santa romaria, diariamente, ao templo augusto das letras, que se chama “Escola”, era ao contrário, a retroação, a conivência criminosa do horrendo delito do analfabetismo, que selvagiza e embrutece. Senhores, já se não podia suportar o atraso em que se vivia, sem luz para respirar, sem liberdade para agir, sem energia para se engrandecer, porque de tudo carece o homem civilizado, consoante o grão de adiantamento que a ciência e a arte combinadas determinaram para o seu viver. Não é de palácios que carecemos; é de conforto; não é propriamente de abundância material, é e qualidade e substância; não é de força bruta, é de esclarecimento de

71 GILFRANCISCO espírito; como não é do número dos obreiros do futuro, e sim de sua seleção no aperfeiçoamento do seu cérebro. Que importa que sejam milhares sem educação? A máquina é o expoente da força; o maquinista é a sua divindade. Com a administração do Exmo. Sr. General Dr. José de Siqueira Menezes, surgiu o dia radiante da instrução do povo em todo o sentido falando; nas letras pela difusão do ensino; nas funções públicas pelo prestígio das autoridades; nas artes pelo conceito dispensado ao operariado, festejando o dia do trabalho; na industria animando a manufatura, insinuando à política a necessidade de aceitar no seio da representação os influentes neste departamento da atividade social;ma agricultura promovendo o desenvolvimento do centro agrícola, cuja ideia principal é a educação do lavrador nacional, fixando-o ao solo, como pequeno proprietário, roubando-o à vida nômade de produtor inconstante e operário errante, e, também animando a formação do campo de experiências e de demonstrações, laboratório onde, na promiscuidade de tarefas, combinam- se as forças impulsionadoras da agricultura, dando melhor orientação aos seus agentes, afim de lhes abrir as vistas para novas aplicações: na família por um viver exemplar e cuidadosamente meticuloso, superior mesmo a toda a apreciação, além da repressão absoluta aos desvios da moral, onde quer que ele se desse, e sobre qualquer que fosse a forma; na política, ordenando a quantos o obedeciam, que éramos todos nós, o respeito completo à vontade popular, na orientação dos partidos, que são a alma do povo livre; na instrução reorganizando o ensino e ampliando-o consoante os modernos e mais proveitosos métodos adaptados, fazendo-o ainda mais acessível a qualquer pessoa, que reunindo os dotes precisos tentasse elevar-se, despertando a cúbica e sede de saber, na proporcionalidade de um ensino fulgurante e atrativo; na justiça, finalmente, fixando a ideia de ordem de divinizando o Direito, na criação de leis sábias e úteis, além da sua complicação num código de organização judiciária, o primeiro que se publicou neste Estado. Senhores: Quando sinto e lastimo não saber dizer tudo o que penso

72 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE e que todos vós experimentais, e quanto ele, na sua tranquila consciência sabe que fez, e, consequentemente, sabe o que vale! Quem me dera que a natureza me fosse propícia, enchendo-me o cérebro de ideias e que a minha voz soubesse exprimir quanto há no meu coração duplamente agradecido de sergipano e amigo particular. Quem dera! Supram, porém, a deficiência das minhas palavras o gozo dos benefícios por ele aqui espalhados tão largamente; falem mais eloquentemente do que o humilde orador e dedicado amigo os grandiosos monumentos, materiais e morais, palpitantes de utilidade que todos usufruímos. Exmo. Sr. General. O Brasil inteiro vos honra e vos quer, porque sois brasileiros: Sergipe todo vos prende no seu coração e vos ama porque, antes de tudo, sois sergipanos. As irradiações do vosso espírito não encontram barreira em todo o vasto território nacional, convenho, porque elas são as proporcionalidades das luzes do vosso saber. Mas, as pulsações do vosso coração, queremo-las guardadas aqui como um privilégio do nascimento que tivestes. Quando Deus vos determinou como Pátria este abençoado canto da nossa querida terra, foi condoído da sua pequenez territorial, procurando compensar esta falta na grandeza de vosso coração e na imensidade de vossa inteligência. Por muito que vos louvem, onde quer que sejam, nas muitas manifestações que vos façam homenagens aos grandiosos serviços prestados e por prestar, aclamaremos, aplaudindo-as, a honra, nós os sergipanos, de vos possuir como o primeiro irmão. A nossa externarão não é somente o orgulho procedente da nossa promiscua notavidade, como é também o testemunho do nosso respeito, admiração e engrandecimento aos inumeráveis benefícios que vós tendes feito. Crescentes para o nosso engrandecimento; glorificaste-vos para a nossa exaltação. Nas páginas sublimes da história da vossa vida encontraremos os sergipanos as inspirações precisas para aprendermos a bem servir à Pátria, nas largas demonstrações do desamor à sua própria existência, quando se fazia preciso uma conquista para glória de sua terra, ou um sacrifício para bem da humanidade.

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E se não explicam de outro modo a abnegação e o desprendimento na forma de servir com que vos dedicastes às várias missões que desempenhastes. Não vos aterrorizaram os micróbios do Acre, inimigo pequeníssimo, porque insidioso e perverso, como vos não intimidaram as iras dos grevistas da Bahia, sendo Canudos a estrela mais brilhante da coroa de louros que vos cinge a fronte, porque, ela só, esta estrela, seria bastante para vos levar à imortalidade. E, senhores, não eram estes os primeiros voos da águia sergipana como o chamavam o vigário Barroso, uma das maiores mentalidades da nossa tão amada terra, porquanto, em muitas ocasiões já lhe havia dado o destino oportunidade de prova do seu valor. Eu era bem menino ainda, ainda me lembro, quando uma agitação popular nesta cidade, oriunda de que causa não precisa, determinou uma ameaça de invasão ao palácio do Presidente da Província, de quem era ajudante de ordens o Tenente Siqueira. Chamado pressurosamente ao serviço, a externação do jovem soldado foi a mais franca solidariedade ao governo ele: “Sr. Presidente, se vierem a palácio só subirão passando por cima do meu corpo.” Divulgada a notícia a franca externação do bravo militar, sustaram-se todas as ações e restituiu-se a paz e a clama à cidade. E começou de acentuar-se a força e o valor do grande patriota, no limitado cenário sergipano como a porta do teatro das grandes manifestações da sua competência nos momentos do futuro. Não foi só a bravura militar que o engrandeceu, porquanto outros círculos de ação da vida humana igualmente Le deram ensejo de expandir seu fulgurante talento. O saneamento esta cidade já o preocupava desde os primeiros dias da sua carreira, brilhante e gloriosamente desempenhada, sendo ele o iniciador as obras e arte que forma o complexo deste serviço desde 1874. O acendrado amor com que o vemos cuidando atualmente de tudo, numa vigilância absoluta nos negócios da pública administração, na ânsia do engrandecimento geral do Estado, nada mais é que aquele germe de

74 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE patriotismo que há trinta anos passados se lhe irrompia d’alma agitando toda a sua existência. Homem de coração e homem de cabeça, a sua função, tornou-se múltipla, agindo simultaneamente como administrador e servindo como amigo, de modo que a sua individualidade tornou-se original. Não era nas culminâncias da política que ele procurava as pessoas para o preenchimento das vagas, quando elas natural ou ocasionalmente se davam, porque ele não sabia provocar as lágrimas do desespero na demissão dos empregados, dispensando funcionários públicos zelosos e cumpridores dos seus deveres, fossem quais fossem as suas adoções partidárias; era, sim, no cadinho apurador do conceito geral, atendendo à sua criteriosa e discreta observação. As elevações só se faziam pela escada do merecimento individual, proscrito terminantemente o nepotismo, que amesquinha o funcionalismo e entorpece a administração. Credor de tantos benefícios para todos nós, ele é merecedor de quantas homenagens lhe possamos tributar. O seu nome que já fulgura no Pantheon da Glória Brasileira, imorredouro, formará, ainda mais, em nossos corações, um trono excelso de veneração e respeito, como reconhecimento ao seu extremo amor pátrio. Vou terminar meus senhores, não porque não tenha mais o que dizer, porque a sua vida é um livro de intermináveis lições e substâncias leituras. Cada página traz um ensinamento; cada capítulo uma doutrina, e ele todo é um modelo digno da mais fiel imitação. Este edifício sente-se extremamente honrado, assim grandioso que já e, tendo em seu conjunto um salão em que fulgure o nome augusto do venerado sergipano, uma das maiores glórias do nosso querido Brasil. Assim, pois, declaro estar inaugurado o Salão Siqueira Menezes. Viva o General Siqueira Menezes!17

17 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 37-41.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discurso Proferido pelo Diretor da Biblioteca Pública, Epifânio da Fonseca Dória

Exmo. Sr. Marechal Presidente do Estado Exmo. E Revmo. Sr. Bispo Diocesano; Ilustradas Comissões da Assembleia Legislativa e do Instituto Histórico; Sr. vice-cônsul português, representante da Sociedade de Geografia de Lisboa; Srs. representantes da imprensa; Exmo. Senhoras; Meus Senhores;

Porventura é uma realidade a inauguração deste palácio da Biblioteca Pública? Eis uma interrogação, pois a excepcionalidade do fato que ora nos reúne aqui dá margem a que se vacile em acreditar se estamos dentro de um sonho ou se apenas começamos a experimentar uma feliz realidade. A consciência humana vacila sempre diante da realidade dos grandes acontecimentos, como sempre reluta em se conformar com a verdade dos grandes infortúnios. A Biblioteca Pública tem levado uma existência cheia de acidentes de toda ordem, uma vida deploravelmente vegetativa, como se o monstro da barbaria houvesse banido a civilização do nosso meio. Há 66 anos que a Assembleia Provincial de Sergipe, tão cheia de gloriosas tradições pelo valor moral e intelectual de seus membros, levantou- se uma voz para pedir a votação de uma lei que autorizasse ao poder executiva a fundação de uma Biblioteca Pública, na capital da província, que era então a hoje decadente cidade de São Cristóvão. Essa voz foi a do bacharel Martinho de Freitas Garcez, cujo talento foi sempre admirado e acatado pelos seus contemporâneos e cujos serviços

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à causa comum jamais serão olvidados pela posteridade. Triunfou o projeto do Deputado Martinho Garcez e a 16 de junho de 1848 o saudoso Presidente da Província, Dr. Zacarias de Góis e Vasconcelos, depois Conselheiro de Estado, sancionou a lei da Biblioteca Pública Provincial de Sergipe. Como se vê, foi precisa uma peregrinação de 66 longos anos, uma penosa marcha de mais de meio século para que ela deixasse os andrajos de mendiga, afim de vestir as roupagens ricas e deslumbrantes que lhe são próprias, para ela deixasse o pobre asilo que a excessiva parcimônia dos governos lhe proporcionara afim de transpor os pórticos iluminados do belo palácio com que lhe acaba de dotar o honrado Presidente, Sr. Marechal Siqueira Menezes. Aos olhos dos indiferentes, ao ver dos que na balança social só crescem na concha negativa, a soberba obra do ilustre milita, impulsionando o ensino público e consagrando um templo aos livros, poderá parecer desvaliosa ou despida de mérito; aos olhos, porém, dos homens iluminados pelo saber e aureolados pelo talento, não o parecerá. Os edifícios com as suas suntuosidades abatem-se enquanto que a ciência alcandora-se nas asas do talento humano. Meus senhores, por uma biblioteca se pode aferir o grau da cultura de um povo. Um povo que lê é um povo que se ilustra, e um povo que se ilustra é uma potência que se prepara para dominar. Manoel Luiz de Azevedo de Araújo, um dos maiores espíritos da intelectualidade sergipana e um dos melhores corações que esta terra já produziu. Manoel Luiz de Azevedo de Araújo, cujo nome jamais deverá ter sido atingido pelo esquecimento dos seus conterrâneos e cuja memória a cada dia mais idolatro e venero, dizia em 1871 ao Presidente da Província estas palavras que a minha admiração não pode olvidar:

“A Biblioteca Pública ao lado do Ateneu é de primeira necessidade.

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A escola sem a biblioteca é infrutífera, diz um escritor de gênio, porque ler não deve ser procurado senão como instrumento para alcançar os grandes resultados” As bibliotecas de caráter geral, como são a nossa que não se propõem a prestar serviço exclusivamente a um Estado, a um país, ou a um continente, que realizam o soberbo ideal, o maravilhoso sonho da confraternização universal, são uma glória para os governos que as instituem para os homens que as protegem. Nas estantes de uma biblioteca se confraternizam os sábios de todos os tempos. Zoilo senta-se ao lado de Homero e Renan ombreia com São Francisco de Assis. E sempre uma boa medida a fundação de bibliotecas, ainda mesmo contando-se com a indiferença popular. Essa medida sabe matar a indiferença. Ouçamos o que nos dizem as lições da experiência: “Hoje, dizia oficialmente em 1867 o Sr. Maggiolo, inspetor da Academia de Nancy, hoje há em França perto de dez mil bibliotecas escolares para adultos. Eis os algarismos do departamento, onde vi nascer e crescer esta excelente providência, a qual é atualmente fácil tornar em benefício da comuna mais insignificante. Em 15 de janeiro de 1862 o Meurthe possuía 26 bibliotecas populares e 650 volumes que ninguém lia... Em 1863 tinha 250 bibliotecas, com 11,770 volumes e alguns leitores. Em 1865 a estatística revelava a existência de 305 bibliotecas contendo 34.517 volumes, e o que indicava, sobretudo o progresso moral é que o número dos livros emprestados se elevava a 20.192, de 1º de janeiro a 31 de dezembro. Em 1866 havia 401 bibliotecas, 52.146 volumes e 46.479 empréstimos”. As bibliotecas são os templos da ciência.

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Dentro delas estão expostos à veneração da posteridade todos os sábios que fizeram a sombria romagem dos túmulos. Os templos da fé obedecem a divisões, têm determinadas classes de crentes; os templos da ciência, porém, são universais, os seus legionários não se subdividem. Diz à história que as bibliotecas surgiram dois mil anos antes de Cristo e hoje há quem acredite que o seu aparecimento remonta a época ainda mais remota. A meu ver o aspecto mais simpático de Osimandias e dos Ptolomeus do Egito é o do fundador de bibliotecas, que eles foram ao tempo que floresceram. Meus senhores tem a honra de um acontecimento notável, de um fato excepcional na vida dos Estados pequenos como é o nosso, o soerguimento de um suntuoso palácio para servir de paço imperial aos livros. Estamos numa época de prosaico utilitarismo, na qual nada é meritório se não vem precedido de imediato valor monetário. A moeda é a febre do tempo – crestou o ideal como a canícula costuma crestar as ervas da campina. Os sonhos, o ideal, todos os reflexos da nossa quase divindade, passaram pelo cadinho do utilitarismo e passaram a ser mania, ou loucura. Criou-se mesmo uma nova ordem de loucos – a dos homens que se não deixam empolgar pelas seduções do egoísmo. E o olho utilitário do homem, hodierno, projetando-se através da história, vai fiscalizando dentro da noite do passado vultos como Jesus, para, estudando-o à luz do materialismo hodierno, levá-lo a esta nova classe de loucos. Mas, sejamos indiferentes ao julgamento que nos reservam s homens que pesam o nossos atos na balança do interesse, porque atrás de nós vem a história, que saberá julgar-nos com justiça. Levantemos bibliotecas, iluminemos os cérebros com a luz do saber, trabalhemos pela felicidade coletiva, e assim, teremos cumprido a nossa missão sobre a terra. Senhores, desde os primeiros tempos da humanidade que se procura

80 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE perpetuar a memória dos grandes feitos e dos grandes homens. Disso dão testemunho eloquente as decantadas pirâmides do Egito. A inauguração deste prédio assume, para Sergipe, as proporções de um grande acontecimento e como o venerado Marechal que ora empunha as rédeas do governo do nosso Estado, é um dos maiores sergipanos, entendi que deveria perpetuar no bronze a memória deste acontecimento e a efígie do notável conterrâneo. Assim, mandei cunhar na Alemanha medalhas de bronze para distribuí-las nesta festa. Destas medalhas destacam-se três, cunhadas de prata, laminadas a ouro, que são destinadas; uma a fazer parte da coleção numismática da Biblioteca, uma que será oferecida ao venerando chefe da nação, o Exmo. Sr. Marechal Hermes da Fonseca, e a outra que pertencerá ao benemérito Marechal Siqueira Menezes, honrado Presidente deste Estado. As demais serão oferecidas aos beneméritos da Biblioteca, aos chefes de repartições que nos honraram com a sua presença a esta festa, às bibliotecas públicas, aos arquivos e institutos históricos que se correspondem com a Biblioteca. Terminando, passo às mãos do Exmo. Sr. Marechal Presidente do Estado as duas medalhas especiais que lhe pertencem e ao venerando Marechal Hermes da Fonseca.18

18 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 43-45.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discurso Pronunciado pelo Desembargador Carlos Barreto

Exmo Sr. Presidente do Estado Exmo. Sr. Bispo Diocesano; Minhas senhoras; Meus senhores:

É profundamente verdadeiro este pensamento virgiliano: “mens ogitat molem”. Sim, o espírito faz mover o mundo. “A civilização espiritual orienta o progresso material.” “Ai dos povos, em que essa deusa não tenha altares nem apóstolos!” E é assim pensando, que o benemérito Presidente dos Sergipanos acaba de coroar a sua grande obra, oferecendo a seus patrícios mais este edifício, que é um documento do quanto confia na vitória do nosso futuro. Congratulo-me neste instante com o meu caro Sergipe e com S. Ex., General Siqueira Menezes, que depois de haver impulsionado fortemente o nosso progresso físico e moral, vem, deste modo, prestar incontestável e valiosíssimo serviço à causa do nosso alevantamento intelectual. É com o mais intenso desvanecimento que o faço, em nome do Poder Judiciário do Estado, nesta breve e rápida alocução, que, sem brilhos outros, tem a sinceridade de uma admiração reverencial, tem o calor de um hino que entoo ao futuro brilhante que nos aguarda. Este futuro, felizmente, já purpúrea os horizontes da nossa vida social. Vemos claramente que uma nova ordem de fatos e acontecimentos nos prepara para o advento de novo estádio da civilização. Além do progresso material, devemos à administração, que em breve findará, o máximo de garantias que pode legar um governo no que se refere aos direitos individuais e políticos dos seus jurisdicionados, o que importa dizer a tudo quanto se relaciona com a liberdade, que é a condição de todo

83 GILFRANCISCO o desenvolvimento, máxime do desenvolvimento moral e intelectual dos povos. Se a veneração tributada aos grandes benfeitores é inconcusso documento de vida, porque é um ato grandemente humano, eu me consórcio com os brilhantes sentimentos da alma sergipana e, em frente das esperanças que nos sorri, dou os meus vibrantes aplausos ao brasileiro notável que vai fulgir na História, como exemplo edificante das gerações porvindouras. General! Sois um consagrado da pátria sergipana!19

19 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 46.

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Discurso Pronunciado pelo Dr. Prado Sampaio

Exmo. Sr. General!; Exmo. E Revmo. Sr. Bispo; Minhas Senhoras; Meus Senhores:

Do alto da escarpada montanha de um passado incomensurável, a cujo tope ascendeu o espírito humano, sentindo ao fim que a representação do grande fenômeno da vida universal já se lhe começa a tingir no lilás melancólico de poente amortalhado na dolorida saudade da despoetização científica, alça-se agora aos nossos olhos, impiedosa e irreverente, ao através do extraordinário e intérmino processo do desenvolvimento coletivo, a mais assinalada das vitórias, que é a vitória da célula sobre as forças da natureza bruta. De certo, constata a evolução da ciência que, iniciando- se pelo emirismo espontâneo, a frase primordial das observações, passou ele a uma espécie de dinamismo generalizada, elevando-se depois a um realismo fenomenista, desdobrando-se, neste momento do século, na larga e vasta concepção do evolucionismo naturalístico, atualmente em plena florescência. E, a seu turno, o evolucionar filosófico ritmado pelo evolver científico, manifestou-se inicialmente por uma espécie de arquitetônica do Universo, a que deram nascimento as mais remotas concepções dos povos orientais, secundada por uma arquitetônica das ideias, monumental edifício levantado sobre o solo sacratíssimo da Helada, donde promanou a arquitetônica dualística, sob cujos escombros que se firmou irresistível e promissora, a irradiante e gloriosa concepção da atual arquitetônica monística, a Haeckel ou a Noiré. Então, apoiados à massa extraordinária dos fatos e o conhecimento do fieri permanente da evolução cósmica e telúrica que ruma ao homem à conquista da civilização, insuperável e pertinente, se oferece à Ciência e à Filosofia a ingente e magna solução do problema do futuro, que contém

85 GILFRANCISCO e repousa na seguinte interrogativa: Como, e até onde às descobertas científicas será dado arrastar o pensamento e o saber? A Renan afigurou-se estéril e ridículo todo o esforço empregado para imaginar o futuro; mas com Hegel é tal a perspectiva, que se lhe desdobrou por força da razão humana, que não nos devemos considerar incapazes de atingir, às mais altas verdades e penetrar inteiramente o mistério do mundo. Consoante à trajetória até agora percorrida, parece-me, de modo inconteste, que o porvir há de arvorejar com a mudança que repousa no fundo das demais mudanças da natureza, isto é, pela integralização dos fenômenos do sentimento com os fenômenos do movimento, integralização que se me afigura apta a nos fornecer a fórmula suprema das civilizações porvindouras. E é este o ponto de vista de Noire, quando escreve que a Kinetica e a Estética hão de fundar, como princípios basilares, a dupla divisão da ciência do futuro, desde que e no consórcio do movimento com o sentimento que a filosofia superior vai encontrar explicação para os fenômenos da vida psicológica e da vida cósmica. E por quê? Porque no Universo toda a pluralidade quer se resolver em unidade. A massa é como o átomo: a mesma química, a mesma gravitação, as mesmas condições. E eis também porque, se uniformes não se nos apresentam há esta hora os desdobramentos das ideias e dos sentimentos, o que importa dizer – da ciência e da fé, nem por isto sou levado a pensar com Guyau, na irreligiosidade do futuro, que surgiu-lhe por força da sua concepção – de sociomorfismo universal; porém, bem ao contrário,a ver e a sentir essa tendência harmonizadora do cérebro e do coração, no referente às suas grandes criações intelectivas e sentimentais, o que de tudo, de certo, nos levará à pacificação dos conflitos da ciência com a religião, dos quais a história, no entender de Draper, vem recolhendo, através dos séculos, armas e troféus.

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Porquanto, de certo, a ciência e a religião não giram em órbitas diferentes, quando idêntico é o movimento de translação que as faz percorrer o céu do pensamento. O próprio ideal moderno da educação integral colima este alvo supremo; o desenvolvimento harmônico da ideia e da emoção. Bem como nos é possível constatar, na mecânica natural, a lei da causalidade, a lei do porque de todos os fenômenos; também, na mecânica social, o que se nos antolha é a lei da finalidade, determinadora do princípio de sociabilidade, a lei do para que dos fenômenos que constituem a vida em comunhão. Tal, meus senhores, a vasta e consoladora perspectiva que surge ao espírito hodierno através de mistérios, de desilusões e de canseira, e que nos faz entrever o purpurear de novos horizontes ao raiar de alvorejante aurora, a espadanar as incertezas do futuro. O processo, de que se vem irradiando essa convicção, processo que é a verdadeira e gloriosa história do homem sobre a crosta do Planeta, teme- lo nós agora nos documentos das civilizações extintas, nos depoimentos dos sábios e cientistas de todas as épocas, concerradas aqui, neste edifício, que munificência de um homem de governo, digno por todos os títulos, oferece à inteligência e à alma nobre do pobre sergipano. Cumpre-nos, pois, a nós, os seus patrícios, agradecer a S. Ex. o Sr. General Dr. José de Siqueira Menezes, mais esta prova de grande afeto, tributada aos nossos esforços e labutas, no combate pelo domínio do pensamento. É o que, neste instante, desvanecido e emocionado, ainda que sem as inspirações da musa da saudade, eu o faço, em nome do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, contemplando, no acontecimento que hoje solenizamos as cimalhas do gigante edifício a coroarem a grande obra do governador excelso e do sergipano digno das mais acendradas venerações. E este serviço, penso, atesta que, em S. Ex., o sociólogo, conhecedor da nossa história, todo confiante no futuro que nos aguarda, sobreleva ao homem de governo. E ainda bem.

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Porque, se passar um povo da bárbara para a civilização, prosseguindo um sonho, depois de chamar e morrer, logo que esse sonho perdeu a sua força, é, segundo Le Bom, o ciclo de sua vida, bem é que o momento fatal surge para nós, envolto ainda em densas névoas de longínqua posteridade. Somos atualmente uma unidade do povo brasileiro, um simples agregado que já possui caracteres e sentimentos comuns, que a hereditariedade vai fixando cada vez mais. À luz vacilante dessa aurora social, ora contemplamos o alvorecer da nossa civilização com as suas instituições, crenças e arte. Amamos a liberdade, cremos possuir elementos latentes de vida própria a nos garantir o futuro, e, sobretudo, já adquirimos um ideal, o ideal do belo, no culto que rendemos à arte, o qual no entender de Sergi, leva a humanidade a se sentir fascinada por um sentimento que lhe brota até das próprias fontes da existência. No atual momento evolucional da Nação, é ideia minha que nenhuma das associações que a constituem apresenta caráter mais homogêneo e estável. Estanque entre nós o influxo da imigração estrangeira, quase insignificante ao longo de todo o nosso período de formação e autonomia, a nossa homogeneidade e estabilidade se acham comprovadas até pela nossa própria linguagem. E, sob tais condições físicas e sociais, o sergipano, alma fustigada por alguma cousa de nobre e elevada, deixa naturalmente entrever, com mais radiosa clareza, na sua música, na sua poesia e em todas as artes plásticas, o lirismo que, despindo as roupagens de um semi classismo com Constantino Gomes de Souza, deu à sua musa as notas de um Bittencourt Sampaio, de um Pedro Calazans, de um José Maria Gomes, de um Tobias Barreto de Menezes, o iniciador de uma nova fase do romantismo nacional para surgir criticista com Silvio Romero, e cientificista com João Ribeiro. A História constata que do seu solo, físico e moral, fundamente revolvido por extraordinários acontecimentos políticos, de que foi cenário,

88 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE se partiu o primeiro grito de revolta contra as poderosas fortificações de Nassau, que, após o grandioso influxo de exploração de minas e da invasão holandesa, nele se travaram as lutas pela reconquista; e, finalmente, que a população sergipana, ardente e patriótica, a ponto de se deixar inflamar pelos ideais revolucionários de 1817 e 1824, jamais trepidou em derramar o seu sangue em defesa da integridade territorial da Nação, acompanhando- lhe o progresso e toda a sua vida intensa pela larga trajetória da civilização. Dito isto, cumpre-me concluir, declarando não ser um hino o que teve em mira entoar a esta terra e a este povo, cujos encantos foram bem cedo sublimados por liras incultas, mas idolatra do belo e do amor. Diverso o meu intento: – assinados, neste momento, ao povo sergipano, em nome do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, as condições de sua vitalidade física, moral e intelectual no seio a Federação pátria, e avigorar-lhe, pedindo ao eloendro de nosso desenvolvimento, as energias gloriosas de que somos dotados, e sobre as quais repousam a conquista e grandeza do futuro que nos aguarda. Marchemos!20

20 Apenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 50-51.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discurso Pronunciado pelo Jovem Antonio Tavares Bragança

Exmo. Sr. General; Exmo Revmo. Sr. Bispo; Exmas. Senhoras; Meus Senhores:

A amplidão que é o espaço incomensurável em que gravitam todos os astros, tem a forma concreta de um nada, um zero: mas, lhe não impede a forma aparente da negação, a posse da riqueza descomunal de todas as grandezas apreciáveis na vida. Miríades de estrelas, numa harmonia divinal, bailam no seu âmbito, fulgurantes e majestosas, transmitindo-nos a benfazeja luz que é a graça, e o precioso calor que é a vida. Graça a vida, tudo haurimos, como seres privilegiados de Deus, que a força criadora de tudo, onde quer seja o mundo de sua ação. Assim, pois, não estranhei que eu, pequenino, minúsculo no mundo das letras, zero na coleção dos algarismos cientistas que enchem este salão, também vos fale. É que o Grêmio Escolar, o menor dos astros no céu brilhante das iluminações literárias de Sergipe, como apaixonado satélite, acompanha entusiasticamente o astro rei, que o atrai, que o fascina. Hoje, que se rende grande preito de homenagem ao maior dos sergipanos, por todos os títulos, o Exmo. Sr. General Dr. José de Siqueira Menezes, em nome dos meus colegas, e no do meu querido diretor, o Exmo. Sr. Desembargador Evangelino de Faro, venho trazer as singelas flores do nosso reconhecimento àquele que, de Deus recebendo a graça de tanto talento e de tanta bondade, emprega estes dons no engrandecimento da sua Pátria, fazendo-lhe tantos benefícios. Aceitei, pois, Exmo. Sr. General, as minhas humildes palavras,

91 GILFRANCISCO como o eco do nosso entusiasmo pelos honras que vos tributam, e do reconhecimento pelos tão grandes benefícios que tendes feito. Viva o General Siqueira!21

21 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 53.

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Discurso Pronunciado pelo Desembargador A. Teixeira Fontes

Exmas. Senhoras; Gentis Senhoritas: para vós os meus sinceros respeitos; Exmo. Sr. General Dr. José de Siqueira Menezes, M. D. Presidente do Estado; Exmo. Revmo. Monsenhor D. José Tomaz Gomes da Silva, venerando Bispo desta Diocese; Exmo. Cavalheiros assistentes: para vós as minhas saudações.

Depois do que, com vantagem, disseram os ilustres oradores que me precederam; depois do que se ouviu, com proveito para o entendimento e para o sentimento, cabe-me ocasião para justificar a minha posição agora nesta tribuna. Não venho alardear dotes que não possuo, e muito menos fazê-lo espontaneamente; mas, incumbido de encargo nobilíssimo, não me era lícito dizer – não, – já em homenagem à pessoa ausente que faz o assunto desta sessão, já por deferência ao seleto auditório que se enfastia de ouvir- me, e cuja presença jamais se supôs sujeita às dúvidas das probabilidades. Mas, se todos os atos e fatos da vida, quer se trate da social-civil, quer mesmo da social-religiosa, obedecem a um preceito, a uma série de ensinamentos, a uma associação de regras para a plena realização de cada um, forçoso é vir em apoio da “ordem”, abraçando os seus dispositivos. Digo da “ordem”, não dessa que emana do poder, da autoridade, visando os interesses de feição pública oficial; mas da que estabelece o modo de fazer ou dispor as cousas, com observação restrita de todas as suas partes, mais acentuadamente chamada – programa. Se como refere Saint Albin, “La vortu c’est l’ordre”, ainda uma vez a observemos, cumprindo com agrado o que a grande comissão elaborou, e vem sendo realizado na festa de hoje. Para mim sobe de satisfação estar presentemente nesta tribuna, e

93 GILFRANCISCO neste edifício, de gratas recordações para a mocidade, que passou a vida de luz e de esperanças, para a velhice, que avança, enchendo de lágrimas a fonte dos seus amores, na causticante lembrança dos descuidosos prazeres de outrora. Estamos meus senhores, no edifício do antigo Atheneu Sergipense, deste prédio especialmente edificado para funcionamento do curso de humanidades anexo ao curso normal, criados pela aplaudida reforma da instrução pública da então Província, em 1870, por lei, e regulamento nº24, de 24 de outubro, elaborado pelo nosso compatrício, o jamais esquecido Dr. Manuel Luiz de Azevedo, seu diretor, e posso dizer, sábio na espécie; prédio iniciado na administração do venenando Marechal Dr. Francisco José Cardoso Junior, e terminado dois anos depois, quando na presidência o conspícuo mineiro Dr. Joaquim Bento de Oliveira Junior. Durante o período da construção do prédio, os matriculados dos dois cursos do Ateneu Sergipense ouviam as lições dos seus dignos mestres em edifício particular, inscritos, no curso normal, quem neste momento vos trás à mente esse saudoso passado de mais de quarenta anos, e bem assim Cipriano Pinheiro, Terêncio Gonzaga e Antonio Ribeiro; no curso de humanidades, Albano Prado, Jason Valladão, Felinto Elysio, Antonio Motta, Capitulino Costa, Cyro de Azevedo, Apulcro Motta, Balthazar Góes, Manoel Carlos, Aristides Villasboas, Juvência Montes, Manoel Botelho, José Botto, Manoel dos Passos, Ernesto Ramos, Antonio Baptista, Vicente Tabica, José Lopes, João Monteiro, Valeriano Souza, José Vellozo, Austricliano Leão, Gabriel Villasboas, Francellino Freire e muitos outros, cujos nomes o amistoso coleguismo desejaria registrar, mas recua diante da insuficiência da memória. Em fins de 1872, dois alunos terminaram o curso normal, ficando habilitados para exercerem o magistério público primário, ao tempo que se inaugurava este almejado edifício. Perante uma reunião erudita, como a atual, foram pelo Presidente entregue aos dois primeiros normalistas os seus títulos-diplomas, dos quais

94 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE o que me foi conferido conservo como uma relíquia, cabendo-me a honraria de ocupar a tribuna a fim de agradecer, na forma da pragmática regulamentar. E digo sem vaidade, fui eu o primeiro que ocupou a tribuna nesta casa, aos meus dezoito anos, sem ser orador, como não sou, porque orador, como define o padre At, “é aquele que não contente de traduzir as suas paixões, traduze também as de multidão: ele só o consegue sob a condição de falar a língua que esta fala” e eu não alimento essa veleidade. Como agora, estávamos outrora em pleno azul, que é a pátria dos anjos, onde “as mulheres, quando olham, vêm tudo com o coração”. Julguei- me por momentos na posse do soberano bem, a felicidade, que faz pequenas aparições aqui e ali, para tornar a vida mais triste, como o fogo de artifício que só ilumina à noite. E o Ateneu Sergipense progrediu. Com os exames gerais de preparatórios nele realizados e válidos em qualquer escola superior do país, mais vasto tornou-se o campo de ação: novas e aproveitáveis mentalidades ocuparam cadeiras de examinando, erguendo-se delas com os desejados lauréis de aplicados. Nesse tempo figuraram Militão de Bragança, Olinto Dantas, Denitério Hércules, Theodomiro Telles, Eutychio Lins, José Cupertino, Teodureto Nascimento, Ramalho Silva, Rodrigues Dória, João Machado, Mateus Machado, Francisco Vieira, Guilherme Nabuco, Ladislao Barreto, Daniel Campos, Gonçalo Faro, Gouvêa Lima. Evangelino de Faro, José Maria, Cândido e Artur de Oliveira, João Ribeiro, João Gomes, Fabrício Vampré, os irmãos Marsilac, Melchisedeck Cardoso, Turíbio Fontes, Baptista Itajahy, Orestes de Andrade, Silvério Fontes, Fausto Cardoso, José Matheus, Leandro Maciel, José Freire, Emiliano Mattos, Philomeno Hora, Manoel Nobre... e outros, e muitos outros ainda, podendo fechar o cvelo em que radiava essa geração estudiosa, o sergipano Felisbello Freire. Desses, alguns enchem a vasta extensão do espaço com os fulgores das suas inteligências, dedicados a diversos ramos de atividade; outros cedo, bem cedo, disseram adeus à vida, evolando-se nas tristezas dos cânticos

95 GILFRANCISCO da saudade, à guisa dos homens gênios de uma nação, que ela os entrega à morte: – Sócrates foi a glória de Atenas, que julgou não poder viver com ele; Spinoza foi o maior dos judeus modernos do seu tempo, e a sinagoga excluiu-o com ignomínia; Jesus foi a glória do povo de Israel, que o crucificou (Renan – Vida e Jesus). Sergipe é a pátria amada que canta e chora, ri e blasfema ante a dureza do Destino, quando roubam-lhe os filhos, seus queridos. E o Atheneu Sergipense continua a progredir. A necessidade, porém, que, assim como o carinho, não invade espontaneamente somente o lar da família, mas também a amplitude social levou-o a ceder às leis da evolução no desenvolvimento das ideias, para torná-lo, não o centro do ensino superior, mas o núcleo da leitura; não o areópago dos moços que buscam aprender, mas a escola resultando dessa leitura acurada compreender-se o que se quer tudo o que o alfabeto traduz. Este prédio que, na infância, recebeu, no batismo, o nome de Ateneu Sergipense, na confirmação da fé do A.B.C. na idade constante, tem o nome de Biblioteca Pública do Estado. Contempla transformação de estética e de fim, que ficará assinalada como um rasgo de progresso, um passo para o adiantamento moral e intelectual do povo. A imprensa do vizinho e amigo Estado da Bahia condenou os atos dos poderes competentes, quando decretaram a demolição da igreja da Ajuda, em nome do saneamento e da higiene local, assim se exprimindo: Os edifícios públicos perpetuam fatos históricos, e um povo que se presa, não destrói seus monumentos. “Em nenhum país civilizado se destrói um edifício que simboliza, na praça pública, uma das páginas da história pátria”. E acrescenta o sapiente Monsenhor Dr. José Basílio Pereira22, a propósito do que se leu no Instituto Histórico da mencionada cidade; “Recolher entre as coleções do Instituto Histórico tudo o que for possível dos edifícios a se demolirem, é fecha de consolação; é nada menos que

22 Nota à tradução da História de Santo Antonio de Pádua, do Padre At.

96 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE desagregar e reduzir a inertes mudas curiosidade de museu aquilo que em seu conjunto possuía a vida e era como que a voz das gerações extintas, falando às novas gerações”. Não pode haver nenhum confronto, meus senhores, no caso da Bahia com o de Sergipe, no da igreja com o do Ateneu. Ali se demoliu, arrazoou um edifício público por exigências das condições salutares, aqui se aumentou, ampliou-se este que nos abriga para satisfazer as aspirações intelectuais. Ali, o poder que determinou a destruição foi censurado, envolto na túnica do ódio público; aqui, o poder que autorizou a ampliação é festejado, cingido do manto dos louvores que há de colocá-lo no apogeu da história, com as bênçãos dos seus governados. Meus senhores, achamo-nos na Biblioteca Pública do Estado, nesta fonte de luz onde todos os que vivem nas trevas poderão encontrar o manancial para afogar-lhes a ignorância. Ela vai ficar-nos como uma lembrança que um homem de honra lega à sua pátria, um símbolo do bem querer por tudo que nobre e encantador. Não é, aliás, uma instituição nova, como já referiram os fluentes oradores; foi ainda um sergipano que fê-la resurgir do esquecimento em que jazia, como a fênix lendária, a viver sempre um quingentésimo, e morrer, para, em igual período, resurgir das próprias cinzas. Esse sergipano, não é novidade declarar; neste salão destinado à leitura, tem o seu nome esculpido na placa ali fixada, a impor-se à admiração, como um produto do trabalho e da dedicação do nosso incansável conterrâneo e amigo Epifânio Dória, encarregado de vigiar por esse trono das letras, no intuito de animar aos mais tímidos, ao contrário do que se lia à porta do Inferno, de Dante, para que entrem cheios de esperanças. Meu colaço, que ambos viemos à vida na aprazível Villa de Itaporanga, Felisbello Freire, fez com proveito o curso primário na laboriosa cidade do Lagarto, vaidosa dos seus méritos, por ter sido o berço de Silvio Romero. Aqui realizou preparatórios, acompanhados das mais edificantes

97 GILFRANCISCO notas, matriculando-se na Faculdade de Medicina da Bahia, onde começaram a projetar a olhos vistos as irradiações do seu talento. Diplomado doutor em medicina, veio estabelecer-se na pensativa Laranjeiras, e ali brotaram e tomaram vulto as suas impressões republicanas, fundando um período de propaganda com o título desse nome. Pequeno o âmbito para a encenação do gênio, e tendo em mente o conceito de que “o mundo é de quem se levanta mais cedo”, transportou-se para o Rio de Janeiro, depois de ter construído família na cidade do seu início clínico. Ai entregou-se de corpo e alma ao trabalho intelectual. Na política, nas letras, nas ciências positivas tornou-se em breve uma notabilidade, criando uma nova virtude, a do prestígio; uma Nova glória, a do saber. O advento da República no país veio colocá-lo como governador no seu Estado, cargo espinhosíssimo, de que se saiu sem desdouros, certo de que a lição da vida é – o dever praticar o bem. Reformou o serviço público, regularizou as finanças, colocou em sua plenitude a lei e o direito da Pátria e do cidadão, em uma época exigente de completa reorganização social. Manda a gratidão que cite um fato todo pessoal. Na minha família todos somos solidários no reconhecimento, seja manifesto por atos e ações, seja um dia de público. O partido liberal, na ascensão ao poder em junho de 1889, destituiu- me do cargo de promotor público da comarca de Boquim. Conformei-me com a vontade partidária, mas ufanei-me pelo substituto que me deram – Fausto Cardoso. Um dos primeiros atos do primeiro governador republicano foi nomear-me promotor público na comarca de Vila Nova, restaurada. Neste, como em todos os cargos públicos que exerci, tenho a consciência e a tranquilidade do cumprimento do meu dever. Voltando ao Rio de Janeiro, o nome de Felisbello Freire tornou-se unanimemente conhecido, cercado da aureola que o acompanhava: o seu coração, aberto a todas as grandezas que a alma aspira, não era um mundo,

98 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE mas todos os mundos para refugio, amparo e acolhimento. Na política colocou-se sempre em plano de destaque. Por mais de uma vez tem representado o seu Estado na Câmara dos Deputados da Nação, e os seus trabalhos são aplaudidos com entusiasmo. As mais sérias questões da administração pública lhe tem sido confiadas, e os pareceres e opiniões ouvidos e observadas como regras de ensinamento para novos e velhos. Na época de menor dificuldade para a República foi entregue a Felisbello a pasta da Fazenda do Ministério do Marechal Floriano. A sabedoria e o tino com que se houve em tais emergências e de que surgiu sem deslizes o jovem ministro sergipano, autoriza asseverar-se que fora não menos intrépido que César, quando no meio de uma tempestade dizia ao piloto: – Levas contigo César e a sua fortuna. Jornalista de primor, não é de menos historiador e publicista. Além de muitas outras obras de literatura escreveu a História de Sergipe, em que narra acontecimentos e fatos até então desconhecidos ou ignorados, o melhor trabalho de compilação entre os poucos publicados. Na História da Revolta de 1906, que encheram o povo brasileiro de pavor e de receio. Foi também um acendrado cultivador da arte de Euterpe, produzindo verdadeira fascinação em quantos tiveram a ventura de ouvi-lo nos acordes de magas melodias, na duração dos sonhos d’alma da sua mocidade. Eis aqui, meus senhores, em ligeiras notas, a história do sergipano a quem é rendido nobilitante preito, dando-se ao salão de leitura da Biblioteca Sergipense o seu nome dele. Não é um favor, menos uma esmola de lembrança, mas um tributo prestado ao seu mérito, que é grande, política, literária, histórica, social e artisticamente grande. É um sergipano, um homem como há poucos e como poucos haverá no futuro. Exmo. Sr. General: Permiti seja para vós a minha última palavra.

99 GILFRANCISCO

Dentro de poucos dias tereis deixado esta terra, que vos estimava, porque vos foi berço, vos ficou idolatrando, porque soubestes reverenciá-la. As mães nunca julgam e nem condenam: amam. A ausência é uma segundo morte; a alma do morto ou do ausente torna-se imortal, quando a sua imagem vive no coração de todos os que o respeitavam, porque viam nele o protótipo da integridade aliada à competência pouco comum. Perdoai o arrojo: não devíeis ter nascido, ao menos para Sergipe, para não serdes um morto ou um ausente; e a vossa ausência vai deixar- nos isolados na casa da saudade, “que é a casa da dor, onde Deus fecha os corações dos pequeninos, para que eles se não despedacem”. Os profícuos exemplos que soubestes dar aos vossos conterrâneos, de moralidade e de justiça; de paz e de harmonia; de igualdade e de benefícios, são no todo correspondentes aos serviços de progresso, de adiantamento, e comodidade e que ficam em prova ativa. Seja-me permitido equiparar os sentimentos de coragem, de energia, de empreendimento, com que vós tendes distinguido e pasmado os descrentes, com os desse vulto impoluto que iluminou o seu Estado, que também é o nosso, com as fulgurações do seu gênio de escol: Monsenhor Olympio Campos. A Natureza tem os seus escolhidos; ela é poderosa e nenhum de nós pode resistir no misterioso apelo que ao nosso sangue vem do sangue que nos deu a vida. Quem acompanhou os atos administrativos, quando ele no governo ou depois na direção do partido, não lhe regateará justiça aos serviços materiais prestados, e que ai figuram como um atestado vivo da sua atividade e do seu amor pátrio. Nomeadamente, o da estrada de ferro, graça, ora rodante, exclusivamente a ele devido. Resta-nos o consolo de que a morte acolhe igualmente todos os vencidos, a religião abre os seus braços a todos os malfeitores arrependidos. Venho fazer-vos, Exmo. Sr. General, as minhas despedidas.

100 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Deixastes uma vez escapar pelos lábios, traduzindo eles o sentimento íntimo de vossa alma, que não sabeis dizer – não! Todos os vossos atos confirmaram a sublime evangélica asserção. Os sergipanos agradecidos juncam com as flores da boa vontade e do perfume da amizade o caminho de passagem da vossa ínclita personalidade e da de vossa extremosa esposa e dos jovens filhinhos. E se tanto se fizer mister, para acentuar a expressão das nossas saudades, e da nossa recíproca estima, no abraço de despedidas, pedi as nossa vidas porque os nossos corações nunca deixarão de pertencer-vos.23 O Jornal do Povo, de propriedade de J. Silva, dois meses após a inauguração das novas instalações da Biblioteca Pública, publica em sua edição de 14 de setembro de 1914 uma pequena Nota esclarecendo os custos empregados na reforma do prédio: Criada em 1848, inaugurada em 1851, instalada no convento de S. Francisco em S. Cristóvão (antiga capital) foi extinta em 1855, ao passar a sede do governo para Aracaju, restaurada em 1890, pelo presidente Felisbello Freire e reorganizada, em março de 1913, pelo presidente Siqueira Menezes, está instalada no palacete da praça Benjamim Constant. Tem dois pavimentos, reconstruídos do antigo Atheneu Sergipense, por contrato com o coronel Francisco de Andrade de Melo, pela quantia de 68:324$440, além da cobertura e da armação do teto, feitos de ferro, na Europa, na importância de 8:454$216, e de acréscimos feitos no valor de 5:278$860, importando a reconstrução e remodelação da Biblioteca Pública em 82:054$516. Até junho último havia sido pagos, por conta dessa quantia, 42:613$436. Com as estantes, também de ferro, vindas da Alemanha, o governo do Estado despendeu a quantia de 13:903$310, o que perfaz um total de 95:957$826.24

23 Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920, p. 55-60.

24 Jornal do Povo. Aracaju, 14 de setembro, 1914.

101 GILFRANCISCO

Convento São Francisco. Pela descrição do vigário Barroso no seu relatório ao presidente da Província, a biblioteca seria na sala onde hoje funciona o auditório do Museu de Arte Sacra de São Cristóvão. Fonte: arquivo IPHAN.

102 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

As Bibliotecas de Gumercindo Bessa, Felisbello Freire e Silvio Romero

Segundo Mensagem dirigida à Assembleia Legislativa de Sergipe, em 7 de setembro de 1915, por ocasião da abertura da 2ª sessão ordinária da 12ª legislatura, pelo Presidente do Estado General Manuel P. de Oliveira Valladão, propõem compra da Biblioteca do magistrado e jornalista Gumercindo de Araújo Bessa (1859-1913) para incluí-la ao acervo da Biblioteca Pública: Já tendo sido executado por meu antecessor a Lei nº633, de 26 de setembro de 1913, na parte referente aos livros que pertenceram ao falecido Dr. Dionísio Telles de Menezes, estendi que era um dever de justiça não demorar por mais tempo a execução da citada Lei, na parte relativa aos livros do nosso saudoso e abalizado jurisconsulto, Dr. Gumercindo Bessa. Para examiná-los e avalia-los nomeei uma comissão composta do Desembargador Simeão Telles de Menezes Sobral, como Presidente Fiscal, Dr. Carlos Alberto Rolla e do Diretor da Biblioteca Pública, Epifânio da Fonseca Dória. Esta comissão, depois de minucioso exame, apresentou o seu laudo acompanhado de uma extensa relação de todas as obras, que compunham a Biblioteca d’aquele honrado e eminente extinto, figurando entre tais obras algumas de inestimável valor. Para adquiri-las, abri o crédito extraordinário de 10:000$000, em que foram avaliados pela Comissão, achando-se já recolhidas à Biblioteca Pública, conforme preceitua a Lei que autorizou a aquisição.25 Gumercindo de Araújo Bessa (1859-1913), advogado, magistrado e jornalista, foi Deputado Provincial (1888) e Deputado Federal (1909-1911), participou da instalação do Tribunal de Apelação de Sergipe. Gumercindo ficou conhecido em todo o país pela defesa que fez dos acreanos, na questão movida pelo Estado do Amazonas e que tinha como advogado Rui Barbosa.

25 O Estado de Sergipe. Aracaju, 10 de setembro, 1915.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Gumercindo de Araujo Bessa (1859-1913)

Em outubro de 1916, o diretor da Biblioteca Pública, Epifânio Dória publica na imprensa sergipana o seguinte Convite: “O Diretor da Biblioteca Pública tem a honra de convidar a todos os cavalheiros, excelentíssimas senhoras e senhoritas para honrarem com as suas presenças o ato solene da inauguração do salão “Gumercindo Bessa” e dos retratos deste notável e pranteado jurisconsulto e do Sr. Vicente Calamelli, ilustre benfeitor da Biblioteca, residente na Capital Federal. Não haverá convites especiais. A mulher é sempre a graça e o encanto de todas as festas onde o sol da beleza aparece a iluminar os olhos e as almas, por isso o aludido diretor espera que o seu convite seja acolhido por todos, e muito especialmente pelas excelentíssimas senhoras e senhoritas. A sessão solene será presidida pelo honrado e venerando Sr. general presidente do Estado, que tem dado grande impulso à Biblioteca”.26

26 Correio de Aracaju. Ano VI, nº 1622, 21 de outubro de 1916.

105 GILFRANCISCO

Sobre a sessão solene ocorrida na Biblioteca Pública da inauguração do salão Gumercindo Bessa e aposição de retratos de homenageados. O Diário da Manhã publica a seguinte Nota: “Às 7 horas da noite foram colocados os retratos do grande jurisconsulto sergipano Dr. Gumercindo Bessa, do Exmo. Sr. general Valadão, ilustre presidente do Estado e benfeitor da Biblioteca de Sergipe, o ilustre Sr. Vicente Calamelli. Falaram por essa ocasião o esforçado diretor daquele estabelecimento Sr. Epifânio Dória, o ilustre Sr. Dr. Manoel dos Passos e a senhorita Ítala Silva de Oliveira. S. ex. o Sr. General Valadão encerrou aquela solenidade com as mais expressivas palavras. Tocou durante o ato a banda policial. O comparecimento de pessoas foi numerosíssimo, notadamente de senhoritas”.27

27 Diário da Manhã. Aracaju, Ano VI, nº1.625, 26 de outubro de 1916.

106 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Manuel Prisciliano de Oliveira Valladão (1849-1921)

Vejamos o texto referente à Biblioteca Pública, na Mensagem dirigida à Assembleia Legislativa de Sergipe pelo Presidente do Estado General Manuel P. de Oliveira Valladão, em 7 de setembro de 1917, ao instalar-se a 1ª sessão ordinária da 13ª Legislatura: Continua dirigindo esse estabelecimento o Sr. Epifânio da Fonseca Dória, seu antigo diretor, cujo zelo e solicitude estão sobejamente provados. O edifício onde funciona a Biblioteca, a despeito da solidez de seus alicerces e das precauções tomadas por ocasião de sua remodelação, já carece de alguns reparos. Até o dia 31 de dezembro possuía esse estabelecimento 7.264 obras, em 11.522 volumes, exclusive um total de 7.066 folhetos que, com as obras, formam um total de 11.330. Foi de 10.508 o número de visitas, sendo consultados 5.767 volumes.

107 GILFRANCISCO

As diversas coleções existentes na Biblioteca como de numismática, postais, cédulas de papel moeda, manuscritos originais, retratos, peças musicais, plantas e mapas geográficos tem sido enriquecidas com valiosas ofertas. Na conformidade da dotação orçamentária foram compradas setenta e seis obras com cento e noventa e seis volumes, entre elas a coleção da Revista do Direito, excelente repositório de doutrina e jurisprudência nacionais.

108 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Biblioteca do Dr. Felisbello Freire

Usando da autorização que me foi conferida pelo art. 2º da Lei nº702, de 15 de julho de 1916, adquiri para a Biblioteca Pública pela quantia de 10:000$000, que já foi paga, o livros e mais papeis pertencentes à biblioteca do nosso ilustre e falecido conterrâneo dr. Felisbello Firmo de Oliveira Freire. A comissão por mim designada para catalogar e avaliar tais livros e papeis dissentiu na avaliação: dois dos membros avaliaram em 6:000$000 e o terceiro em 10:000$000. Considerando que se tratava de um ato que visava beneficiar a família de quem tanto lustre dera a sua terra, conformei-me com o voto divergente, convencido de que assim procedendo interpretava fielmente os nobres intuitos do Poder Legislativo ao decretar aquela beneficiadora Lei.28 O jornal Estado de Sergipe, órgão oficial, em sua edição de 15 de setembro publica a Mensagem dirigida à Assembleia Legislativa de Sergipe pelo Presidente do Estado, general Manuel P. de Oliveira Valladão, em 7 de

28 Mensagem do Presidente. Aracaju, Estado de Sergipe, Ano XVIII, nº5.282 de 14 de setembro, 1917.

109 GILFRANCISCO setembro de 1918, ao instalar-se a 2ª sessão ordinária da 13ª legislatura, relata as novas providência tomadas em relação ao acervo da Biblioteca Pública: Continua a ser enriquecida com obras de valor a nossa Biblioteca Pública, que com muito zelo é dirigida pelo Sr. Epifânio Dória. A Biblioteca que pertenceu ao saudoso patrício Dr. Silvio Romero, que vai ser adquirida pelo Governo, conforme autorização contida na Lei nº746, de 16 de novembro de 1917, aumentará as suas coleções, emparelhando com as de Gumersindo Bessa e Felisbello Freire, também adquiridas pelo Estado. O número de visitas a esse nosso estabelecimento foi, no ano findo, de 8.455, sendo consultados 8.903 volumes.29

Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero (1851-1914)

29 Mensagem de Presidente. Aracaju. Estado de Sergipe, Ano XIX, nº5.557 de 15 de setembro, 1918.

110 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Novas Mensagens Presidenciais

José Joaquim Pereira Lobo mais conhecido como Pereira Lobo (1864-1933) foi um militar e político, presidindo o Estado de Sergipe no período de 1918 a 1922. Exerceu também o mandato de senador pelo nosso estado de 1914 a 1918 e de 1923 a 1930, além de ter sido deputado estadual em 1893 e vice-presidente do Estado de 1896 a 1898. A Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa, em 7 de setembro de 1919, ao instalar-se a 3ª Sessão Ordinária da 13ª Legislatura, pelo Coronel Dr. José Joaquim Pereira Lobo, Presidente do Estado, sobre a Biblioteca Pública do Estado diz o seguinte:

José Joaquim Pereira Lobo (1864-1933)

Vai tomando as mais satisfatórias proporções o serviço da Biblioteca Pública do Estado, hoje uma repartição já digna de ser tida entre as mais bem organizadas.

111 GILFRANCISCO

Seu esforçado diretor, o Sr. Epifânio da Fonseca Dória, muito e muito tem contribuído para que ela se coloque no nível em que atualmente se vê, não somente quanto à disposição do trabalho, mas, também, quanto à expansão de comunicação com as congêneres, tanto do país, como do estrangeiro. As regras adotadas nos estabelecimentos similares do país têm sido ali encaradas, pelo que, há diversões de gabinetes para leitura, e esmerada catalogação de livros, moedas, quadros, manuscritos, fotografias e cartões-postais. No intuito de acrescer o número de volumes de que já dispõe a Biblioteca, o meu ilustre antecessor procurou adquirir a biblioteca do falecido Dr. Silvio Romero e solicitou em mensagem de 27 de setembro a abertura de um crédito de 14:000$000 que atendesse à compra das obras e documentos de que ela se compunha, operação que havia sido iniciada com o ato nº156 de 24 de agosto, o qual designava uma comissão para catalogá-las. A lei nº755, de 21 de outubro, autorizou este pagamento, o qual foi efetuado a 13 de janeiro deste ano. As obras em número de 1.717 apresentavam 1.949 volumes, incluindo-se entre estes coleções de revistas, muitas incompletas. Não vieram, infelizmente, porém, os manuscritos do grande literato e crítico sergipano, nem tampouco a coleção de suas obras já publicadas. Não obstante a notável prosperidade que a Biblioteca Pública revela, merece, contudo, os maiores cuidados do Governo.30 Em 8 de julho de 1920 o Correio de Aracaju publica um texto muito interessante: Uma relíquia do passado sobre uma armação de um guarda- chuva, provavelmente do século XVIII doado a Biblioteca Pública pelo Dr. João Dantas Martins dos Reis. Vejamos:

Graças à obsequiosidade de nosso prezado amigo Dr. João Dantas

30 Mensagem do Presidente. Aracaju, O Estado de Sergipe, Ano XX, nº5.850 de 26 de setembro, 1919.

112 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Martins dos Reis, integro juiz de direito interino da Comarca de Maroim, acaba a Biblioteca Pública de receber uma curiosa velharia. Trata-se de uma armação completa e perfeita de um guarda-chuva usado nos últimos dias do século XVIII e nos primeiros do XIX. Posto que já apresente algumas modificações comparadas com o tipo primitivo, o guarda-chuva recebido pela Biblioteca é um exemplar bastante curioso se quisermos confortá-lo com os que se usam atualmente. Pesando 1.225 gramas (excluído o peso da cobertura) mede ele cerca de um metro de comprimento. As armas, que são de grossas barbatanas, medem, por uma vez, 72 centímetros. O tronco e as travessas que sustentam as armas são feitas de cobre. O cabo é de osso lavrado e desfaça no âmago do tronco e cuja lâmina mede 40 centímetros de comprimento. O guarda-chuva, cuja invenção é atribuída aos chineses, é um objeto antiquíssimo. Nos primeiros tempos do seu aparecimento era usado exclusivamente pelos soberanos e príncipes. Conta-se que Pytagoras ensinava aos seus discípulos defendendo-se da canícula com um guarda sol. Uma passagem de Diodoro da Cecília dá a conhecer que Aspasia possuía magníficos skiadions (guarda-chuva). Entre os romanos o guarda- chuva era ornamento das ricas patrícias e fazia parte do enxoval das matronas. Entre os presentes de Antonio a Cleopatra figurava um guarda-sol. Antigamente este móvel era um objeto de família que passava de geração em geração. Da China passou o guarda-chuva às Índias e à Grécia. Da África e das Índias trouxeram-no os portugueses à Europa. De passou à Inglaterra, aparecendo em França nos meados do século XVII. Em 1640 tinha ele o cabo de carvalho e de outras madeiras fortes. Media um metro e vinte centímetros de comprimento e pesava cerca de dois quilos. As armas eram de barbas de baleias e mediam 80 centímetros. As

113 GILFRANCISCO travessas que sustentavam as armas eram de cobre. A primitiva cobertura era de couro, depois passou a ser de encerado, pano oleado, papel envernizado, tafetá forte, estofo de seda muito encorpado, etc. No tempo da Revolução a cobertura era cor de rosa, depois se admitiu o amarelo e o verde escuro liso ou lavrado. Mais tarde adotaram- se as cores vermelhas, verde claro e azuis, e de 1885 em diante entraram a dominar as cores escuras: verde myrto, marron, preto, etc.31 Em agosto do ano em curso, o diretor da Biblioteca Pública solicita apelo ao Correio de Aracaju, para a republicação da seguinte Carta, conforme esclarece o redator do periódico aracajuano. Do Sr. Epifânio da Fonseca Dória, diretor da Biblioteca Pública de Sergipe, classificada dentre as melhores dos Estados do Norte, pelo ilustre historiador Sr. Rocha Pombo, recebemos a carta que abaixo publicamos, pedindo para ela a generosidade de nossos dignos leitores:

“Prezado Sr. redator: Desejamos reunir e conservar neste estabelecimento a mais copiosa coleção de documentos úteis à história vem solicitar neste sentido o vosso auxilio generoso. A imprensa deve ser considerada como o braço forte das bibliotecas. Estas e ela prestam à humanidade serviços relevantes. Ambas trabalham para o mesmo fim: a perfeição espiritual do homem. Uma vai produzindo o livro que as outras vão colocando na mão do povo. Uma é a centelha que inflama, as outras são luzeiros projetando clarões sobre a inteligência. Este estabelecimento coleciona todas as publicações que recebe, não acontecendo o mesmo com as bibliotecas de caráter particular. Parece que as bibliotecas e a imprensa não podem deixar de, a mãos dadas, perlustrar as mesmas sendas e palmilhar os mesmos areais. O decreto de 3 de julho de 1847, que obrigava os impressores a remeter na Corte à Biblioteca Nacional, e nas providenciais à Biblioteca da capital, um

31 Correio de Aracaju. Ano XIII, nº 2.913, 8 de julho de 1920.

114 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE exemplar de todos os impressos que saíssem das respectivas oficinas, caiu em desuso para ficar à imprensa o direito de ser voluntariamente generosa. Apelando, pois, para a vossa generosidade, subscrevo-me antecipadamente grato”.32

Maurício Graccho Cardoso (1874-1950)

Maurício Graccho Cardoso (1874-1950), filho do professor Brício Cardoso, estudou na Escola Militar, participando ativamente dos movimentos militares dos primeiros anos da República. Após deixar a Escola entra para a Faculdade de Direito do Rio de Janeiro e do Ceará, onde fixa residência, casa-se e ingressa na vida pública como Secretário de Estado da Fazenda. Graccho tem sido considerado, até hoje como o maior dos administradores sergipanos pelo conjunto de sua obra renovadora quando governou o Estado de Sergipe de 1922 a 1926. É responsável pela construção do Hospital de Cirurgia; o prédio da Prefeitura de Aracaju; Caixa D’água de Aracaju; Atheneu Pedro II; Associação Comercial de Sergipe e vários Grupos Escolares.

32 Jornal da Noite. Santos. Republicado no Correio de Aracaju, Ano XIII, nº 2.933, 3 de agosto de 1920.

115 GILFRANCISCO

Vejamos as três Mensagens (1923, 1925 e 1926) apresentadas à Assembleia Legislativa pelo presidente do Estado, Graccho Cardoso:

1ª Mensagem

Pela sua hábil e completa direção, a Biblioteca Pública é um dos acontecimentos que mais recomendam o Estado. A consulta, que era de 7 horas por dia, passou a ser de 12, como antigamente, e franqueada aos leitores nos domingos e feriados até às 14 horas, dias em que não havia expediente e o edifício se conservava fechado. Encadernaram-se, durante o exercício, 514 volumes inclusive 11 coleções de jornais, com um dispêndio de 3:851$000. Para a coleção numismática, foram adquiridas, por compra 1 moeda de ouro, brasileira, de 1840, 5 de prata, raras, 2 de bronze dourado, e duas de níquel, 4 de alumínio e 102 de bronze. A coleção fiduciária foi enriquecida com 24 cédulas diferentes de papel moeda, também oferta particular. Com as novas aquisições elevou-se a 127 o número atual de cédulas. A seção de manuscritos e autógrafos, conta mais de um precioso elemento: o autógrafo do trabalho Crítica Literária às poesias de Pedro Calazans, escrito, em 1956, pelo notável publicista Aurelino Cândido Tavares Bastos, que então contava 17 anos.33

2ª Mensagem

Estabelecimento que pode ser considerado o índice da cultura e progresso intelectual de um povo, uma biblioteca de caráter geral, como é a que mantém o Estado, merece os sacrifícios de que por capaz o erário público.

33 Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa, em 7 de setembro de 1923, ao Instalar-se à 1ª sessão Ordinária da 15ª Legislatura pelo Presidente do Estado, Graccho Cardoso.

116 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

A lei orçamentária, entretanto, não tem sido prodiga para com a Biblioteca, que, num ambiente de estreitezas, vê restringir-se a sua inestimável atuação. Assim é que as verbas para aquisição e encadernação de livros são de uma parcimônia desalentadora, máxime para a época atual em que a carestia assume, com relação a todos os objetos de comércio, proporções assustadoras. Não fora a inteligente vontade, a vocação e o gosto do seu direito, que faz dessa repartição uma oficina modelar, a utilidade das suas coleções ver-se-ia ainda mais sensivelmente reduzida. Dado o desenvolvimento que tem tido a Biblioteca, já se vai notando a incapacidade e insuficiência do edifício para contê-la. Esse inconveniente sobe ainda de ponto com a circunstância do Instituto Histórico e Geográfico continuar a ocupar grande parte do pavimento superior. Continua a ser mantido o horário estabelecido pela atual administração em 9 de novembro de 1922, segundo o que a Biblioteca permanece ininterruptamente acessível de 9 horas da manhã às 21 horas, nos dias úteis e das 9 às 13 horas nos domingos e feriados. A frequência viu-se prejudicada com o movimento sedicioso de 13 de julho; 9.849 foram os visitantes, sendo 3.940 no primeiro horário (das 9 às 15 horas) e 5.909 no segundo, ou seja das 15 às 21 horas. As consultas elevaram-se ao número de 10.457, sendo 10.315 em português, 108 em francês, 25 em inglês, 5 em latim, 3 em espanhol e 1 em italiano. Estas consultas se fizeram às seguintes seções: periódicos e obras gerais – 517; belas letras – 2.815; ciências e artes – 782; história – 517; direito – 124; religião – 22. Nos 71 domingos e feriados do ano, a frequência não excedeu de 526 e 584 consultas seguintes: religião – 2; direito – 4; ciências e artes – 48; belas letras – 141; história – 15; periódicos e obras gerais – 374. Adquiriram-se por doação, exceção feita de 4 moedas de prata, consideradas preciosas por sua raridade, 65 moedas diversas de cobre, prata e níquel.

117 GILFRANCISCO

Recebeu essa coleção apenas a oferta de 4 exemplares, 2 cédulas alemãs de 1.000 e 100.000 marcos, 1 brasileira do império e 1 falsificação de cédula brasileira. Passaram a figurar como propriedade do Museu 8 quadros e estudos do ilustre pintor sergipano Horácio Hora, mandadas restaurar pelo governo, o ano próximo passado, sendo 6 a pastel e 2 a crayon. Esses trabalhos foram executados pelo jovem e estudioso artista Sr. Jordão de Oliveira. Entraram no decurso do ano 796 obras diferentes de somenos valor, repetidas em 915 volumes. À falta de espaço, não teve ainda o governo ensejo de organizar a Biblioteca Infantil.34

3ª Mensagem

Estabelecimento de grande utilidade para a ilustração do povo, correndo parelha com a missão transcendental da Escola, a Biblioteca Pública cumpriu mais um ano de nobre esforço para o cultivo das novas gerações, já mantendo o seu pesadíssimo horário, já procurando atender com solicitude e carinho incentivador a quantos deram acesso aos seus salões de estudos e leitura. Pena é que o seu edifício já se resinta de capacidade suficiente para o seu regular funcionamento e melhor dispositivo de suas seções de ciências, artes, letras e periodismo. O seu patrimônio foi acrescido no decurso do ano, pela aquisição de 66 volumes, representando 40 obras novas. Sendo ainda encadernado nesse espaço 159 volumes diferentes e 12 coleções de jornais. A coleção numismática foi aumentada por 53 moedas de cobre, 3 de níquel, 4 de prata, além de 4 medalhas de bronze. Esta coleção, que o ano passado custava de 2.636 peças, 2877 moedas e 149

34 Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa em 7 de setembro de 1925, ao instalar-se a Sessão Ordinária da 15ª legislatura pelo Dr. Maurício Graccho Cardoso, presidente do Estado. Aracaju, Imprensa Oficial, 1925.

118 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE medalhas diferentes, dispõe atualmente de 2.700 peças, 2.547 moedas e 153 medalhas. As coleções fiduciária, fotográfica e postal conservam o estado anterior. O museu ali em organização foi presenteado com um seixo colhido na Cachoeira de Paulo Afonso, muito curioso por sua irregularidade, e uma grande pele de jiboia, réptil morto no engenho Glória, neste Estado. O serviço de permuta acusou diminuta intensificação. Os donativos de obras atingiram a 1.360 volumes, entre remessas oficiais e ofertas particulares. Com a remodelação dos serviços de luz e os movimentos sediciosos ocorridos no Estado, à frequência foi notadamente prejudicada.35

35 Mensagem apresentada a Assembleia Legislativa em 7 de setembro de 1926, ao instalar-se a 1ª Sessão Ordinária da 16ª Legislatura, pelo Dr. Maurício Graccho Cardoso, presidente do Estado. Aracaju, Typ. do Instituto Profissional “Coelho e Campos”, 1926.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Polêmica: O Estado de Sergipe versus Epifânio Dória

I. Foi um dia a Biblioteca Pública

Quando aqui chegava uma personalidade de marcado destaquei no terreno espiritual, uma cousa que nós, sergipanos, mostrávamos com ufania era a Biblioteca Pública, obra recomendável do dinâmico governo do Marechal Siqueira de Menezes, precursor do desenvolvimento de Aracaju, a quem dotou de admiráveis obras de progresso. Aos forasteiros, em geral, a capital sergipana apresentava, orgulhosamente, o palácio da Praça Olimpio Campos, atestado vivo da extraordinária administração de um governo probo e adiantado. Tínhamos, até então, onde receber homens de mérito intelectual e artístico que aqui aportavam para nos trazer às luzes das suas privilegiadas inteligências. E ao terminarem os aplausos, envaideciam-nos, sobremaneira, as expressões que deles ouvíamos sobre o salão da Biblioteca Pública: – Admirável! – Um dos maiores que conheço, no Norte. Quando nada, isto nos valia. Podíamos, assim, ter conosco aqueles que quisessem vir a Sergipe, tais como Ângela Vargas, Reis e Silva, as irmãs Baldi, Padre Cabral, etc. As grandes solenidades de colação de grau das nossas professoras eram também, lá que se realizavam. E hoje? Tudo acabado. A Revolução entendeu, no mais louvável dos propósitos, aliás, concertar a Biblioteca Pública, e sem atinar bem no vulto dos reparos, mal orientada, portanto, começou o serviço, indo paralisá-lo quando jaó não podia fazer, porque então o edifício estava em condições de não mais ser ocupado.

121 GILFRANCISCO

Se se houvesse com calma e reflexão, a Interventoria não teria causado o dano que aos patrimônios espiritual e material do Estado está causando com a atual situação da Casa do Livro: sem valor e utilidade. Uma obra não se faz sem precede de um orçamento, para saber o quanto se vai despender. Cremos que se isto se houvesse feito, não teria acontecido o que aconteceu e, hoje, embora carecendo de reparos grandes, ainda estaríamos com a nossa Biblioteca com os seus muito bons livros e grande salão superior. Mas a Interventoria, erroneamente, pretendeu fazer uma obra sem consultar as possibilidades do Tesouro, sem prever, talvez, a crise que por traz dela caminhava, e o resultado é o lastimável estado em que se acha o grande edifício. Não se perderá somente o edifício. Há uma outra perda, muito maior que a primeira, e que ameaça vivamente o Estado. Ela é o do patrimônio valioso constante nos livros da Biblioteca que, não tendo a sua casa, está nas dos outros. Hoje, a nossa Biblioteca, pequena, modesta, mas muito bem organizada, graça à capacidade do seu diretor, Sr. Epifânio Dória, está divida, havendo livro em se o desaparecimento de livros e documentos tudo quanto é canto facilitando-os outros, pois nem todos estão sob completa custódia. Quando Sergipe chegar a ter novamente a sua Biblioteca, o que não há de ser tão em breve, deverá de estar muito desfalcado o número dos seus volumes, em vista da dispersão em que hoje se encontram, fora das vistas do infatigável bibliotecário Epifânio Dória, que, com tanto zelo se tem entregue à sua função. Espera-se que o Sr. Intervetor, reparando no grande prejuízo que o Estado está ameaçado de ter, desfalcando o valor da sua Biblioteca, envide esforços para pelo menos diminuir os danos certos, concentrando o que for pertencente à Biblioteca em um só edifício, atenuando, desta forma, também, a sua culpa neste coso de prejudicial e inadmissível imprevidência administrativa.36

36 O Estado de Sergipe. Aracaju, 21 de outubro, 1933

122 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

II. Foi um dia a Biblioteca Pública

Do Sr. Epifânio Dória recebemos a seguinte carta:

Aracaju, 21 de outubro de 1933. Ilmo. Sr. diretor do O Estado de Sergipe. – A local de vossa ilustrada folha de hoje, referente à Biblioteca Pública do Estado, está a merecer reparos que me apresso em fazer.

Há equivoco na afirmativa de que o Governo do Estado começou o serviço de reforma do edifício da Biblioteca sem prévio cálculo das despesas que os mesmos acarretariam ao Tesouro. O Sr. Interventor, atendendo a pedido meu para acudir à Biblioteca, cujo edifício ameaçava ruir, em consequência do apodrecimento impressionante do seu antigo madeiramento, largamente acometido pela praga do cupim, praga que já vinha atentando contra o próprio acervo bibliográfico, mandou imediatamente levantar a necessária planta e organizar o indispensável orçamento, autorizando desde logo, dada a delicada situação que em se achava a Biblioteca, a remoção dos livros, afim de que não houvesse retardamento nas obras, prevenindo, mesmo, um iminente desabamento do prédio. Acontece, porém, que a certa altura dos trabalhos, falharam os recursos com que o honrado Governo da República vinha socorrendo os flagelados sergipanos, numa seca sem precedentes em alguns aspectos na sua história. Desmobilizar de um momento para outro um exército de famintos, reunidos em levas sucessíveis, através de longo período de tempo, seria mais do que uma crueldade, porque seria um perigo, pois toda aquela multidão, entregue à própria sorte, aglomeradamente, poderia, em desespero de situação, obedecendo aos instintos naturais, entregar-se à toda a sorte de desatinos, a começar pelo desrespeito à segurança da vida e da propriedade

123 GILFRANCISCO particular,perdido ao mesmo tempo todo o sacrifício anteriormente feito. Nesta difícil emergência teve o Sr. Interventor de fazer o que lhe cumpria, como homem de coração e de inteligência; tomou uma medida de emergência: Empregou no auxílio aos flagelados de nossa gleba os recursos com que ia acudir à Biblioteca, fazendo-o entretanto, como um empréstimo ao Governo Federal, disposto a retomar, com o devido empenho, o serviço da Biblioteca logo que recebido mesmo Governo Federal a avultada importância a este adiantada. Cavaleiro de apurada educação estou que não duvidareis da minha palavra, mas se for necessário prova material esta poderá ser encontrada, à vossa disposição, na Diretoria de Obras Públicas, onde se acham três plantas diferentes levantadas por técnico estrangeiro, para a reforma do edifício da Biblioteca. Outra afirmativa também pouco segura é a de que os livros da Biblioteca estão expostos a extravios. Eles estão em compartimentos de edifícios públicos ao abrigo de mãos criminosas. O Governo não se tem descuidado de dar-lhes a devida segurança. Algumas coleções de jornais e revistas que, pelas suas desmarcadas proporções, pedem espaço maior para o seu abrigo, vão encontra-lo em salões amplos do edifício do antigo Ateneu Sergipense, os quais estão sendo devidamente aparelhados. Agradecendo as vossas generosas referências à minha obscura pessoa, em vossa local a que me refiro, rogo-vos a fineza da publicação destas minhas na vossa ilustrada folha, como uma justa retificação à mesma local. Com todo o apreço, patrício e admirador, – Epifânio da Fonseca Dória.37

37 O Estado de Sergipe. Aracaju, 22 de outubro, 1933.

124 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

III. O provérbio do côxo e do mentiroso

Os repórteres políticos da U.R.S. andam agora celérrimos e farejantes cata de qualquer tolice para empanturrar as colunas da sua gazeta. Tem sido, porém suficientemente infelizes nos furos. Esse da Biblioteca Pública, então, foi uma catástrofe reporteril sem precedente na história das reportagens ruins. No mesmo dia do furo o Diretor da Biblioteca Pública, Sr. Epifânio Dória, dirigiu ao “Estado” uma carta exata e arrasadora, cujas precisas informações fizeram nó na língua e na pena dos eternos maldizentes e malévolos jornalistas ursísticos. E o casa de recordar o velho provérbio popular: mais depressa se pega um mentiroso que um coxo. Isso é confirmado pela seguinte carta:

Aracaju, 21 de outubro de 1933. Ilmo. Sr. diretor de O Estado de Sergipe. – A local de vossa ilustrada folha de hoje, referente à Biblioteca Pública do Estado, esta a merecer reparos que me apresso em fazer.

Há equivoco na afirmativa de que o Governo do Estado começou o serviço de reforma do edifício da Biblioteca sem prévio cálculo das despesas que os mesmos acarretariam ao Tesouro. O Sr. Interventor, atendendo a pedido meu para acudir à Biblioteca, cujo edifício ameaçava ruir, em consequência do apodrecimento impressionante do seu antigo madeiramento, largamente acometido pela praga do cupim, praga que já vinha atentando contra o próprio acervo bibliográfico, mandou imediatamente levantar a necessária planta e organizar o indispensável orçamento, autorizando desde logo, dada a delicada situação que em se achava a Biblioteca, a remoção dos livros, afim de que não houvesse retardamento nas obras, prevenindo, mesmo, um iminente desabamento do prédio. Acontece, porém, que a certa altura dos trabalhos, falharam os recursos com que o honrado Governo da República vinha socorrendo os flagelados sergipanos, numa seca sem precedentes em alguns aspectos na sua história.

125 GILFRANCISCO

Desmobilizar de um momento para outro um exército de famintos, reunidos em levas sucessíveis, através de longo período de tempo, seria mais do que uma crueldade, porque seria um perigo, pois toda aquela multidão, entregue à própria sorte, aglomeradamente, poderia, em desespero de situação, obedecendo aos instintos naturais, entregar-se a toda a sorte de desatinos, a começar pelo desrespeito à segurança da vida e da propriedade particular, perdido ao mesmo tempo todo o sacrifício anteriormente feito. Nesta difícil emergência teve o Sr. Interventor de fazer o que lhe cumpria, como homem de coração e de inteligência; tomou uma medida de emergência: Empregou no auxílio aos flagelados de nossa gleba os recursos com que ia acudir à Biblioteca, fazendo-o entretanto, como um empréstimo ao Governo Federal, disposto a retomar, com o devido empenho, o serviço da Biblioteca logo que recebido mesmo Governo Federal a avultada importância a este adiantada. Cavaleiro de apurada educação estou que não duvidareis da minha palavra, mas se for necessário prova material esta poderá ser encontrada, à vossa disposição, na Diretoria de Obras Públicas, onde se acham três plantas diferentes levantadas por técnico estrangeiro, para a reforma do edifício da Biblioteca. Outra afirmativa também pouco segura é a de que os livros da Biblioteca estão expostos a extravios. Eles estão em compartimentos de edifícios públicos ao abrigo de mãos criminosas. O Governo não se tem descuidado de dar-lhes a devida segurança. Algumas coleções de jornais e revistas que, pelas suas desmarcadas proporções, pedem espaço maior para o seu abrigo, vão encontra-lo em salões amplos do edifício do antigo Ateneu Sergipense, os quais estão sendo devidamente aparelhados. Agradecendo as vossas generosas referências à minha obscura pessoa, em vossa local a que me refiro, rogo-vos a fineza da publicação destas minhas na vossa ilustrada folha, como uma justa retificação à mesma local. Com todo o apreço, patrício e admirador, – Epifânio da Fonseca Dória.38

38 Diário da Tarde. Aracaju, 23 de outubro, 1933.

126 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

IV. Os Erros da Administração, no caso da Biblioteca Pública

Ao Sr. Epifânio Dória e ao público devemos esclarecer algo sobre o caso da Biblioteca Pública, que já ventilamos neste jornal, mostrando, com argumentos calcados em fatos, o lastimável estado em que se encontra o edifício daquele serviço público e os seus livros, ameaçados de desaparecimento parcial. Logo que saiu a nossa edição tratando do assunto, o Sr. Epifânio Dória, com aquele mesmo zelo com que trata da repartição a seu cargo, procurou justificar a atitude do Sr. Interventor, escrevendo-nos uma carta, que publicamos no dia imediato. S.S., na sua missiva, afirma que o Sr. Maynard Gomes, ao contrário do que dissemos,mandou fazer o indispensável orçamento para levar a efeito a remodelação da Biblioteca, adiantando, até, que existem três plantas para esse serviço, feitas por técnicos estrangeiros. Esqueceu-se o Sr. Epifânio Dória de dizer o valor deste orçamento, de modo que o povo permanece ignorando o vulto da obra. A declaração de S.S. de que existem três plantas serve, tão só, para provar a desordem, reinante na efetivação do serviço. Não precisam três, nem dez, como não é a quantidade de plantas que justifica um serviço e indica a existência de orçamento. Bastaria uma só, da autoria mesmo de profissional brasileiro, devidamente calculada, para que boa fosse a orientação administrativa. Com as informações do Sr. Epifânio Dória, temos o suficiente para incriminar o governo. Sendo a obra da Biblioteca de quantia superior, estava a Interventoria, sob pena de infringir a lei, na obrigação restrita de pô-la em concorrência, e não executá- la administrativamente, como estava fazendo. Se o Sr. Interventor precedeu os trabalhos aludidos do orçamento respectivo, errou da mesma forma, porque, como administrador, tem que ser previdente, e, como tal, concluiria, em face do orçado, de que Sergipe,

127 GILFRANCISCO com a seca inclemente, não poderia arcar com as despesas do serviço, em virtude das obrigações outras de caráter inadiável. Há ainda uma outra parte a esclarecer e que diz diretamente ao Sr. Epifânio Dória. Os livros da Biblioteca, aqueles que se acham espalhados nos edifícios públicos, não estão acoberto de mãos criminosas, como pensa o seu guardador. Vai S.S. ter uma prova disto. Na sala em que funciona o escrivão do crime, há uma boa porca de livros, alguns deles importantes. Saiba o Sr. Epifânio Dória que no dia do julgamento de Honório Mendonça Filho e Benilde Vieira de Araújo uma grande quantidade de pessoas invadiu esta dependência do Palácio da Justiça. No meio dessas poderia haver uma de costume pouco honesto que se lembrasse de levar uma das obras da Biblioteca. Neste mesmo dia, o Sr. Rui Penalva perdia um chapéu que lá se encontrava e outro advogado do nosso Foro tinha o seu feltro inutilizado com o derrame de tinta. Na sala das audiências, também se encontra uma filial da Biblioteca. Neste lugar nem sempre entram, somente, pessoas do Foro. Outras há que por qualquer motivo até lá chegam, podendo em meio destas aparecer alguma menos cerimoniosa. Negar isto é tapar o sol com uma peneira. Nem persista em tal, porque constrangia aqueles que creem na sua dedicação à Biblioteca. Acredite-nos, sinceramente, que todos que veem o deplorável estado da nossa Biblioteca, olhando os livros dispersos, dizem, uma você: – Foi um dia a Biblioteca... E alguns chegam a adiantar. – O Epifânio tinha tanto gosto... Por mais que S.S. queira inculpar o Sr. Interventor, ressaltam de sua carta os erros da administração no caso da Biblioteca Pública.39

39 O Estado de Sergipe. Aracaju, 27 de outubro, 1933.

128 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

V. Os Erros da Administração, no caso da Biblioteca Pública

Recebemos a seguinte carta:

Aracaju, 27 de outubro de 1933 – Ilmº Senhor redator do O Estado de Sergipe. – Não me anima o desejo de manter polêmica, desejo, a meu ver, extravagante, porque elas descambam quase sempre para o terreno pessoal, e quando aí chegam se transformam em fogueiras de ódio, em assassinas da Paz, o melhor e o mais doce dos frutos da sociabilidade humana. A vossa local de hoje, da mesma forma que a primeira, está a merecer alguns reparos que venho fazer, acreditando que vos não animam propósitos menos elevados no traçar das vossas considerações de referência à Biblioteca. Na minha carta anterior não procurei justificar o Sr. Interventor Federal, cidadão honesto, operoso e bem intencionado, que está a cavaleiro, não precisando dessemelhante gesto de minha parte. O que procurei em minha aludida carta, com a obscuridade talvez da minha falta de talento, foi dar esclarecimentos que melhormente vos deixassem a par da verdade que se deu com o nosso estabelecimento cultural, afim de que, sendo o vosso propósito o de bem acalentar e não o de estabelecer combate sistemático, pessoais escapar de cometer injúria. Quando vos afirmei que se tinham levantado três plantas por profissional estrangeiro, plantas que nada custaram ao Estado, fi-lo para demonstra-vos o vivo interesse em que estava o Sr. Interventor Federal de executar as obras ajustando-as, o mais possível, às condições do meio e do tempo e às possibilidades do Estado. S. Excia, teve em vista encontrar uma planta cuja execução menos custasse ao Tesouro, sem incorrer nos inconvenientes verificados nas outras administrações, aliás, também suficientemente honestas, em que se fizeram custosas reformas parciais, continuando o edifício sem a sua segurança garantida. A primeira remodelação foi feita em 1914, quando o dólar custava

129 GILFRANCISCO apenas 3$200 e a libra não ia além de 15$000 estando à moeda nacional relativamente bem valorizada. Esta remodelação custou ao Estado cerca de cem contos de reis, quantia redonda. Em 1915, menos de um ano depois, se fizeram necessárias reformas urgentes que custaram algumas dezenas de contos de réis; e ainda assim foram necessárias novas obras na administração de 1918-1922, despendendo-se de novo não pequenas quantias. A esse tempo foi feita em todas os quadrantes do edifício uma cuidadosa amarração com fortes vergalhões de ferro, pois as paredes mostravam trincaduras que denunciavam insegurança do prédio. A vossa estranheza pelo fato de na ter eu mencionado a quantia orçada para a execução das obras de reconstrução, revela de alguma sorte, excessiva exigência, perdoai que o diga. Não fiz semelhante menção porque seria descer a detalhes que não comportavam os limites de uma simples carta e mesmo porque seria cair na alçada da Diretoria de Obras, a cuja frente se acha um profissional esforçado e bastante competente. Está visto que quem tem pano para as mangas pode gastá-lo à vontade, não lhe sendo necessários estudos mais demorados com orçamentos nem preocupações com plantas menos ou mais dispendiosas. No caso da Biblioteca o Sr. Interventor, de vez que podia tê-las sem ônus para o Estado, precisava de mais de uma planta para escolher a que melhoramento se ajustasse às possibilidades do Tesouro e às necessidades da Biblioteca. A censura feita ao governo pela falta de concorrência pública, permiti que o diga sem outro propósito que não seja o dizer a verdade, foi extemporânea. O Sr. Interventor ordenou apenas a execução dos serviços de urgência dadas as precárias condições do prédio e cogitando de abrir concorrência para o serviço de reconstrução, o que não fez pelos motivos já divulgados em minha carta anterior, isto é, o emprego dos recursos de que o Estado dispunha no amparo aos flagelados, a título de empréstimo ao Governo Federal. Como já ficou dito o edifício ameaçava ruir sendo urgente a retirada dos livros. Em face dessa urgência e não dispondo o governo de um edifício que

130 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE comportasse o vasto acervo da Biblioteca, forçoso foi recorrer-se a instalação de urgência, falha consequentemente. A parte mais valiosa do mesmo acervo foi, entretanto recolhida às salas seguras que se pode conseguir no momento, ficando nos salões a que alude vossa local coleções de revistas e jornais que exigiam espaço maior. Entretanto, como já ficou dito as providências vêm sendo dadas pelo governo para que tudo fique na maior segurança. Não faz muitos dias que a Diretoria de Obras Públicas, com o preciso consentimento das autoridades judiciárias, preparou um cômodo no palácio da justiça para nele se recolherem com segurança várias coleções de revistas, então guardados nos salões em que se acham instalados os cartórios dos Srs. Mário Xavier e Pelino Tavares. Ninguém mais do que eu e do que o Sr. Interventor, vos asseguro, lamenta a situação difícil em que se acha a Biblioteca, padrão da nossa cultura, orgulho das nossas tradições de povo inteligente e estudioso. Ninguém, entretanto, podia prever que a seca se prolongasse tanto e que, de um momento para outro, faltassem, como aconteceu, os socorros do Governo Federal. Relevai Sr. Redator a extensão demasiada destas linhas, cuja publicação rogo seja feita na vossa conceituada folha, como uma necessária resposta à vossa local de hoje.40

Com toda a estima: Crº atº obrº

Epifânio da Fonseca Dória

40 O Estado de Sergipe. Aracaju, 1º de novembro, 1933.

131 GILFRANCISCO

VI. Para por ponto final

Para que os nossos leitores possam fazer um juízo seguro sobre o procedimento da Interventoria no caso da Biblioteca Pública, trazemos mais dois fatos que servem para atestar a desídia com que tem agido o poder público, nesta questão. Não vale estar a discutir quando o adversário envereda pelo caminho da sofística. Como responder a um Chefe de Repartição que vem para a Imprensa dizer alto e bom som que o Governo que tem dinheiro, na ocasião, pode gastá-lo à vontade, “não lhe sendo necessários estudos mais demorados com orçamentos nem preocupações com plantas menos ou mais dispendiosas?” O Sr. Epifânio Dória achou que ainda nesta sua segunda carta não devia dizer o valor do orçamento das obras da Biblioteca, sob a alegação, pueril de que isto é um detalhe “que não comportavam os limites de uma simples carta, e mesmo porque seria cair na alçada da Diretoria de Obras”. Dissemos, no nosso primeiro artigo, que não havia orçamento; o Sr. Epifânio contestou dizendo que havia; declarar o valor deste orçamento será um detalhe? Absolutamente. É o essencial na resposta. Desde que S. Excia afirmou que tinha orçamento, estava n obrigação, para comprovar mais sua asserção, de declarar que o seu valor era de tanto. Nem alegue S.S. de que isto não é de alçada. De sua alçada era somente a parte relativa ao patrimônio espiritual, no entanto S. S. não se lembrou disso quando veio tratar da parte referente à construção. O Sr. Epifânio que sabe que existem três plantas na Diretoria de Obras, que existe um orçamento, etc. não sabe, entretanto; dizer o quanto deste mesmo orçamento! Mostraram e disseram a S. S. tudo, menos o valor do orçamento! Mas como pode haver orçamento se ainda não se sabe qual a planta da obra? Efetivamente só havia para o Diretor da Biblioteca uma resposta: que não era de sua alçada, embora não lhe custasse indagar, pelo telefone, da Diretoria de

132 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Obras, o total deste orçamento, total este que ocuparia na extensa carta que S. S. nos fez um espaço muito pequeno, cabendo nela, portanto. Asseverou o Sr. Epifânio Dória de que o Interventor fazia as obras indispensáveis “de caráter urgente”, para depois, então, abrir concorrência. Isto é contra a realidade dos fatos. As obras estavam sendo executadas com caráter definitivo, tanto assim que se começou a descascar o prédio e colocar andaimes, cujos paus ainda hoje lá se encontram. Quer dizer assim que já se sabia o que se ia fazer, passando esses preparativos da categoria dos “serviços indispensáveis”. Outra mais: No dia 25 de fevereiro deste ano, o Diário Oficial publicava o despacho de um requerimento sob nº249, do Sr. José Ribeiro da França, mandando pagar a este a importância de RS. 2.734$020, pelos serviços de pintura decorada que executou no salão nobre da Biblioteca Pública, por determinação da Repartição de Obras Públicas, Diário Oficial de 21 de fevereiro de 1933. – Logo a obra estava sendo feita, como o dissemos, a trouxe-mouxe, sem a observância das determinações legislativas. Um outro fato, este de competência do Sr. Epifânio Dória: No dia seguinte ao do sensacional júri deste ano, ilustre magistrado, chegando no cartório em que funciona o escrivão do crime, deu pela falta de um dos volumes do Larousse ilustrado, da Biblioteca, que se achava naquela dependência do Palácio da Justiça. Chamou o Sr. Durval Correia de Araújo e mandou que ele fosse à Biblioteca saber se tinham levado para lá o volume desaparecido. Teve resposta afirmativa. Mais tarde, indo ao Palácio da Justiça um funcionário da Biblioteca, o aludido magistrado, alegando o valor da obra, fê-lo levar o restante dos volumes. Isto serve para provar que o acervo espalhado não é somente de revistas e jornais, e que no local em que nos referimos em nossa nota, tinha obras do valor do Larousse ilustrado! O caso está por demais explanados, não só pelo que dissemos como pelo que declarou o Diretor da Biblioteca. A conclusão, para o julgamento, deve-o tirar o público a quem o entregamos.

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Já conseguimos uma vitória. Está é a de saber, que, segundo nos garante o Sr. Epifânio Dória, as obras da Biblioteca, quando se realizarem, sê-lo-ão por concorrência pública.41

41 O Estado de Sergipe. Aracaju, 5 de novembro, 1933.

134 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Quando aqui chegava uma personalidade de marcado destaque no terreno espiritual, uma cousa que nós, sergipanos, mostrávamos com ufania era a Biblioteca Pública, obra recomendável do dinâmico governo do Marechal Siqueira de Menezes, precursor do desenvolvimento de Aracaju, a quem dotou de admiráveis obras de progresso.42

42 O Estado de Sergipe. Aracaju, 21 de outubro de 1933

135 GILFRANCISCO

A Biblioteca Pública do Estado foi enriquecida com um contingente de livros antigos legado pelo saudoso desembargador Teixeira Fontes. A propósito deste legado recebeu o diretor da Biblioteca a seguinte carta do Sr. Antonio Fontes, alto funcionário da fiscalização da Fazenda Nacional:

Meu caro Epifânio Dória Cumprindo o desejo que deixou escrito o meu velho e lembrado tio desembargador Teixeira Fontes, desejo, aliás, a que eu sem o saber já me antecipara, em conversa certa vez, com o nosso amigo distinto Dr. Nobre de Lacerda, venho oferecer por seu intermédio à Biblioteca Pública do Estado, de que é v. tão digno diretor, os 350 volumes de obras diversas que formavam a biblioteca particular daquele meu velho e prezado parente. Cumprindo a vontade de meu tio, faço tanto mais satisfeito peã certeza de que a Biblioteca Pública do Estado, em tão boa hora confiada aos seus cuidados, BM saberá zelar uma dádiva de tal preço, pois que aumentada com o ser uma disposição de ultima vontade. Os dous quadro também agora para ai os remetido de formatura dos bacharéis de 1887 pela Faculdade de e o de Monsenhor Olympio de Campos – destinam-se ao Instituo Histórico e Geográfico de Sergipe, uma homenagem que lhe quis prestar o velho Teixeira Fontes, que dele foi sócio fundador, pedindo-lhe eu aqui, meu caro Epifânio, que desta parte dê conhecimento ao nosso distinto amigo Dr. Nobre de Lacerda. Sou o conterrâneo amigo e adoro muito ato – (a) Antonio Fontes. Praça Barão do Rio Branco, 7 (antigo largo S. Pedro).43

43 Diário Oficial do Estado. Aracaju, nº 5275 de 3 de julho, 1935.

136 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Batida a primeira pedra do novo edifício

Na Praça Fausto Cardoso, no local do antigo prédio dos Correios e Telégrafos, teve lugar em 5 de outubro de 1935, às 15 horas, a cerimônia do batimento da pedra simbólica do edifício que ali seria construído para a Biblioteca Pública do Estado. Presentes o Governador, secretários de administração, o deputado Epifânio da Fonseca Dória, diretor da Biblioteca, desembargador Edison de Oliveira Ribeiro, autoridades e grande número de pessoas representativas da comunidade. Em seguida falou o Governador do Estado, Eronides Ferreira de Carvalho:

Meus senhores:

Não havia sergipano, ou quem a esta terra tenha afeição, que se não condoesse com o malbarato do patrimônio da sua Biblioteca Pública. Motivo de orgulho sempre foram o seu elegante edifício e as suas preciosas coleções. A par de tudo isso, senhores, é preciso não esquecer uma direção zelosa, toda devotada ao enriquecimento e conservação da riqueza cultural que nela se encerrava. Sustentávamos, com vaidade justificada, a superioridade da Biblioteca de Sergipe, sobre muitas das congêneres do país, ostentando-a como prova do valor e capacidade dos nossos conterrâneos. Eis que, tudo derruiu de um momento para outro. Houve mister remodelar com urgência o edifício que a comportavam, e pairou, então, sobre o rico patrimônio dos nossos livros, a ameaça do desaparecimento e da destruição. Bem sabeis que sem dispormos de um outro edifício em que se pudesse aloja-la, quase que, praticamente,teria desaparecido a biblioteca. O acervo foi distribuído por diversas partes, e improvisou-se no

137 GILFRANCISCO

Palácio do Governo, um salão de leitura, onde ficaram, também, as obras de mais alto valor. Somente por ai vive, ainda hoje, a Biblioteca Pública. Era meu dever, portanto, como responsável pela cousa pública, zelar e defender a riqueza cultural do sergipano. Encontrei o Estado vinculado, por força de um contrato, com a firma Emílio Odebrectch e Cia., para construção do Palácio das letras, onde ficaria, também, a Biblioteca Pública. Muito bom seria que pudéssemos realizá-lo. Entretanto era ele muito superior às possibilidades financeiras de Sergipe. Entrei em entendimentos com os contratantes e, finalmente conseguimos um aditivo ao referido contrato, de modo que hoje, vendo bater a primeira pedra do edifício da Biblioteca Pública. Ficará Sergipe com mais um edifício público digno da sua capital civilizada e se salvará o renome da Biblioteca que tanto nos orgulhava. Bem vêm os sergipanos que o seu Governador não descura dos interesses da sua terra. Aqui vai surgir a Biblioteca Pública; no Poxin, já se constrói a ponte que ligará esta capital à futurosa praia de banhos, desenvolvendo desta maneira, a Barreta e os povoados próximos; nesta capital mesmo o Hospital da Criança está em vias de ser coberto e, brevemente, assistireis idêntica cerimônia a esta, num dos bairros proletários de Aracaju, quando se tiver de iniciar a construção do Jardim da Infância Operária. Se atentardes que Sergipe ainda não descansou de prélios eleitorais, haveis de concluir que o Governo não se descuidou um instante sequer dos interesses do Estado. As questiúnculas da política mal orientada, não lhe trazem a mais mínima preocupação. O Governador cumprirá serenamente o mandato que o povo sergipano lhe conferiu, tendo como objetivo, doar a nossa querida terra dos melhoramentos indispensáveis, zelar o seu patrimônio, e, sobretudo,

138 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE garantir a paz e a tranquilidade da família sergipana.44 Eronides Ferreira de Carvalho (1895-1969) militar nascido em Canhoba, dividiu com Augusto Maynard o poder revolucionário de 1930 a 1945. Formado na Faculdade de Medicina da Bahia (1918), ao regressar a Sergipe lutou contra a epidemia da gripe espanhola que assolava Estado. Eleito Governador Constitucional em 1935, realizou notáveis obras públicas: Biblioteca Pública; Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, além de ampliar o Hospital de Cirurgia. A Mensagem apresentada por Eronides de Carvalho à Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe, 1ª Sessão Ordinária de 1935, sobre a situação da Biblioteca Pública diz o seguinte: A situação anormal em que caiu a Biblioteca Pública de Sergipe em setembro de 1932, com o seu desalojamento para se promoverem reparos no edifício em que funcionava que, depois de pronto, foi dado à Diretoria de Finanças e Recebedoria Estadual, faz com que permaneça ela desmontada e na mais precária das situações. O seu acervo que é um dos mais ricos que se contam no País, se acha, desde aquela data, exposto aos estragos que e podem prever quando um estabelecimento de tal natureza se reduz a um amontoado de livros e jornais atirados a salas fechadas, sem areação, sem luz e sem espanejamento constantes. Vencendo-se dificuldades de toda a ordem, se tem mantido até aqui o serviço de leitura pública em um dos salões do lado sul do pavimento térreo do Palácio do Governo, onde foi possível montar-se uma instalação de emergência e aí conservarem os livros e coleções de maior procura. Para resolver tão premente situação, o Governo está empenhado em construir, no edifício em que funcionava a Administração dos Correios, à praça Fausto Cardoso, um próprio para a Biblioteca Pública, dentro dos recursos financeiros do Estado. Sobre este assunto, tem se entendido com a Firma Emílio Odebrecht & Cia., que, na situação passada, firmou com

44 Diário Oficial do Estado de Sergipe. Aracaju, nº 4804, 6 de outubro, 1935.

139 GILFRANCISCO o Estado um contrato para, naquele mesmo local, construir o Palácio das Letras. A realização deste contrato, porém, é impossível para as condições financeiras do Estado, em virtude do valor da operação, 787.000$000, superior à maior das boas vontades. Atendendo à necessidade imprescindível de dar à Biblioteca uma instalação que preserve o seu patrimônio da destruição, e considerando o vínculo obrigacional do Estado para com os Srs. Emílio Odebrecht & Cia., é que estou, enviando esforços para construir um edifico mais modesto, compatível, porém, com as nossas possibilidades e exigências do serviço a que se vai destinar. Tudo leva a crer que o Estado se acordará com a firma contratante, amparando o direito de ambos, e Sergipe não perderá ima das maiores riquezas bibliográficas do País, que é a sua Biblioteca.45

45 Mensagem Apresentada pelo Dr. Eronides Ferreira de Carvalho – Governador do Estado de Sergipe à Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe. Aracaju, Imprensa Oficial, 1935.

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Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, Emílio Odebrecht

Ao Público

Em obediência aos imperativos dos próprios créditos de capacidade técnica, fartamente demonstrada, em várias regiões do norte e do sul do País, nas construções de edifícios, pontes, chaminés, silos, barragens, fundações de máquinas e tantas outras, sob a nossa direta responsabilidade, especialistas que somos em concreto armado, cumpre-nos declarar ao publico consciente de Sergipe, que paralisada a obra da Biblioteca Pública do Estado, submeteu-a sua fiscalização à “Prova de Carga”, para verificação da maior estabilidade na viga, nas respectivas colunas de apoio, como determinam os regulamentos que regem a matéria, subscrevendo os Srs. técnicos oficiais o seguinte e honroso.

Laudo Pericial

Aos vinte e um dias do mês de janeiro do ano de mil novecentos e trinta e seis, presentes os Srs. engenheiro Clodoaldo Vieira Passos, Diretor de Obras Públicas do Estado, Adbee! Góis Ferreira, engenheiro auxiliar da Repartição de Obras Públicas, Armando Cezar Leite e Leandro Diniz de Faro Dantas, engenheiros fiscais por parte do Governo do Estado, Osvaldo Cohim Ribeiro e Eugenio Odebrecht, engenheiros da firma construtora Emilia Odebrecht & C, Romeu Santos, auxiliar da fiscalização, lançando-se mão de um meio mais direto para estudo de comportamento da estrutura de concreto armado do edifício da Biblioteca Pública em construção, foi feito o ensaio experimental constante de uma prova de carga em uma das vigas do primeiro pavimento da referida construção. Sobre a viga em apreço aplicou-

141 GILFRANCISCO se então uma carga estática simétrica em relação ao eixo da viga, uniforme de 1.870 kilos por metro corrente num total de 23.000 kgs, correspondente a 1,5 da carga acidental com a qual deverá trabalhar a peça em questão, além do peso próprio da pavimentação. Após doze horas de permanência desta carga, como resultado experimental alcançado, verificou-se a inexistência de trincaduras na viga, nas respectivas colunas de apoio, e tão pouco deformação visível. À falta de aparelhos de precisão, sensível e apropriado, que registra com ampliação os deslocamentos (tenso metro) não se podem aferir as deformações provocadas, e, conseguintemente tornou-se impraticável a medição da fecha, conforme exigem os regulamentos ou normas adaptadas nas construções de concreto armado desta natureza. E em virtude se acharem as demais vigas do dito andar identicamente dimensionadas, semelhantes distribuídas às armaduras, e, trabalhando em condições iguais, julgamos comprovada a estabilidade de todas, principalmente pelo fato de que a carga considerada na estrutura e que agiu nas experimentações jamais deverá ser atingida.

Diretoria de Obras Públicas do Estado, em 21 de janeiro de 1936. Clodoaldo Vieira Passos - Diretor de Obras Públicas Adbeel Góis Ferreira - Engenheiro ajudante Armando Cezar Leite - Fiscal do Governo Leandro Diniz de Faro Dantas - Fiscal do Governo Osvaldo Cohim Ribeiro - Pela firma construtora Eugenio Odebrecht - Pela firma construtora Romeu Santos - Auxiliar da fiscalização

É de notar-se, porém, ainda em beneficio dos foros de plena consciência com que executamos as nossas construções, baseadas em cálculos detalhes, ensinamentos outros dos mestres do concreto armado, e

142 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE minúcias adquiridas em longos vinte anos de práticas, naquelas grandes e citadas obras, em diferentes Estados do Brasil, que a viga mencionada no Laudo Pericial acima foi calculada para suportar 17.000 kgs, no máximo e sem permanecia de carga, de 6.000 kgs, e num prazo de 12 horas, se verifiquem as deformações. Ainda mais: a carga excessiva lá se encontra, sobre a viga em questão, até agora, podendo ser vista por quantos se interessarem, numa demonstração eloquente da sua completa estabilidade. Finalmente, como se afirma no Laudo Pericial, após doze horas de permanência desta carga, como resultado experimental alcançado, verificou- se a inexistência de trincaduras na viga, nas respectivas colunas de apoio, e tão pouco de formação visível, o que mesmo não se poderia verificar, pois uma Empresa que ha 20 anos, vem levantando o seu nome, no País, não iria deixá-lo cair, bruscamente, por causa de alguns kilos de ferro e sacos de cimento. Esse, o esclarecimento que devíamos ao honrado e laborioso público sergipano.

Emílio Odebrecht & Cia. Aracaju, 25 de Janeiro de 1936.46

46 Estado de Sergipe. Aracaju, Ano IV, 26 de janeiro, 1936. A Emílio Odebrecht & Cia. foi a responsável pela construção da Ponte José Américo de Almeida, conhecida pelos sergipanos como Ponte de Pedra Branca, sobre o rio Sergipe, situada na BR 101, que limita os municípios de Maruim e de Laranjeiras, foi inaugurada em 30 de agosto de 1933, pelo presidente Getúlio Vargas e sua comitiva, além do Canal de Santa Maria e a Casa da Criança.

143 GILFRANCISCO

Biblioteca Pública do Estado, inaugurada em 1936, atual Arquivo Público.

144 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Inauguração da Nova Sede

Finalmente em 1936, ela passou a funcionar num edifício construído especialmente para esse fim, na Praça Fausto Cardoso, onde atualmente funciona o Arquivo Público Estadual. Quando a Biblioteca Pública do Estado foi inaugurada em 14 de novembro de 1936, o diretor interino, Alfredo de Araújo Pinto, proferiu o seguinte discurso:

Exmo. Sr. Dr. Governador do Estado Exmo. e Revmo. Sr. Bispo Diocesano Exmo. Sr. Prefeito da capital Minhas senhoras, meus senhores:

No mundo biológico a necessidade faz o órgão; no social é o órgão que, muitas vezes, faz a necessidade. Eu estou no segundo caso, eis que sou o diretor interino da Biblioteca, sobre a qual tenho de dizer algo, neste instante de transbordante contentamento, em que se inaugura este majestoso templo. Não me dado, pela justa razão de não me caber ser enfadonho, vos faltar detalhadamente sobre o papel de instituições como esta na formação espiritual de todos os povos e de todas as épocas. Direi, apenas, que a instituição das bibliotecas (do grego: biblio – livro: teko – estante) é tão antiga como o livro. Este nasceu da necessidade que sentiu o homem de perpetuar o seu pensamento, e por isso, elaborados os livros, sobreveio o natural desejo de conservá-los, de colecioná-los. As pesquisas arqueológicas efetuadas, desde o alvorecer do século XIX na bacia do Mediterrâneo, na Mesopotâmia e na Pérsia, revelaram a existência de verdadeiras bibliotecas do tempo dos antigos faraós e dos monarcas caldeus, assírios e persas. Verdade é que estas bibliotecas viviam

145 GILFRANCISCO inacessíveis ao público. Eram apenas de uso privado dos reis e das classes sacerdotais, verdadeiros arquivos onde aqueles colecionavam os anais dos seus atos administrativos e das suas proezas militares, e, estas, os seus livros sagrados. Citam-se entre as primeiras – a do santuário de Phta, em Memphis, criada por vontade do faraó Osymandias, no dealbar do penúltimo milênio anterior à nossa era; a de Souza, entre os persas; - a do templo de Jerusalém, que foi reconstruída depois do cativeiro da Babilônia por Nehemias e Esdras; as das ricas e florescentes cidade de Fenícia e de Cartago. Em muitos lugares da Caldéia ou da Assíria, nas ruínas de Nínive, encontraram-se ricas coleções de ladrilhos de barros cosidos, que traziam gravadas em caracteres cuneiformes a história dos seus reis. Introduzidos na Grécia pelo fenício Cadmo os primeiros caracteres alfabéticos escritos em papiros, já no século XVI anterior a vinda de Cristo, foi este acontecimento o primeiro passo para a evolução intelectual daquele povo privilegiado. Foi entre eles – os gregos – que se implantou o regime de bibliotecas acessivas ao povo, conquanto não fossem propriamente público. A mais antiga que a história registra entre os helenos, foi a erguida em Atenas, ao calor do entusiasmo de Pisistrato. Chegada a época chamada helenista, resultante das guerras medo- persicas, as bibliotecas tomaram ainda maior incremento, ficando célebres duas dentre as muitas: a de Pergamo, fundada por Eumene II e Attalo II, com os seus 200.000 volumes, e a de Alexandria, fundada por Ptolomeu Sotero, a qual possuía, além dos seus 700.000 volumes, a tradução do original grego dos livros hebraícos do Velho Testamento, além de belíssima coleção de lâminas de chumbo. Dividida esta, pelo seu vultoso acervo, em duas partes, uma ficou no próprio bairro de Alexandria e a outra no de Serapeion. Desgraçadamente a primeira parte foi sacrificada pelos incêndios ateados pelos soldados romanos, quando Julio César se apoderou da cidade; a segunda, porém, aumentada com a de Pérgamo, Marco Antonio fez presente à Cleopatra. A mão da fatalidade, entretanto, pesava sobre estes

146 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE inestimáveis tesouros da civilização antiga. No dealbar da nossa era, em 390, esta última parte pagou o tributo aos conflitos verificados entre pagãos e cristãos, pois que pouco se salvou dos incêndios, e esse pouco desapareceu de todo quando, em 641, os árabes se apoderaram de Alexandria. Dest’arte ficou a nossa civilização privada deste formidável contingente de conhecimentos armazenados nas duas mais importantes bibliotecas da antiguidade. Todavia, algumas lâminas de chumbo puderam escapar à voragem dos inconoclastas, e isso por terem sido escondidas em subterrâneos dos mosteiros locais, só conhecidos das mãos piedosas que as guardaram. Depois que a Grécia caiu em poder de Roma, os gregos começaram a exercer no espírito dos seus vencedores uma sensível influência intelectual e artística. Paulo Emílio, depois de concluída definitivamente a conquista da gloriosa terra de Sócrates, de Platão e de Aristóteles, trouxe para Roma a biblioteca dos reis da Macedônia, sendo que a esse tempo o gosto pela literatura atingiu a tal grau entre os romanos que muito deles se tornaram verdadeiros bibliomanos. No entanto, até o advento de Octaviano Augusto ao poder, não houve em Roma bibliotecas verdadeiramente públicas com as que existiam na Grécia, Júlio César foi que encarregou Varrão de organizar uma para uso do povo. Pouco a pouco foram se fundando novas, chegando a Cidade Eterna possuir 28 desses centros de cultura. Com a queda do império romano, decorrente da invasão dos bárbaros, nova fase de depredação se abriu para as bibliotecas, salvando-se apenas uma parte que foi escondida em Bisâncio, a Constantinopla de hoje. Assim, enclausuradas e, por vezes, exiladas, viveram elas durante o longo crepúsculo da Idade Média. Depositária, porém, dos tesouros do saber humano, acumulados através das gerações passadas, a Igreja criava, por sua vez, uma escola de literatura religiosa, da qual Santo Thomaz de Aquino tornou-se o seu maior expoente, ao tempo em que, sob as suas visitas e influências, nascia uma

147 GILFRANCISCO nova corrente filosófica - a Escolastica - inspirada nas teorias de Aristóteles. Já ao findar o VII século, o arcebispo Theodoro, grego por nascimento mas educado em Roma, levava para as Ilhas Britânicas as luzes de uma vasta cultura clássica, que foi naquela terra,até então inculta, um manancial de ciências e artes. Não quero deixar em silêncio um outro fator que muito contribuiu para a preservação da cultura antiga - os árabes. A florescência deste povo foi tão brilhante e ao mesmo tempo de tão curta duração que só pareces tê-lo a Providência destinado a sustentar, por um pouco de tempo embora, em suas mãos, o facho de civilização ocidental, enquanto que a Europa se preparava para por sua vez, empunhá-lo. Certo é que, sem embarco de Constantinopla e a Igreja, terem sob sua guarda a literatura e a filosofia clássica, os árabes sustinham e desenvolviam a indústria, as ciências físicas e naturais e as matemáticas. Talvez vos pareça, senhores, que me propondo a falar sobre bibliotecas queria me distanciar, divagando sobre história, mas é necessário não esquecer que não se pode discorrer sobre esses assuntos sem lhes associar o livro, que, por seu turno, se relaciona com as bibliotecas. Chegamos, afinal, ao surgir da Renascença! Com a divulgação das obras clássicas, com a invenção da imprensa e com o defluir da literatura moderna, a produção literária e científica aumentou extraordinariamente, e, com ela, também, a necessidade do povo se instruir, determinando dai até a época contemporânea o desenvolvimento sempre crescente das bibliotecas, que hoje se contam aos milhares em todo o orbe, dando ensanchas a que Thomaz Lincolin Cayse, ao inaugurar a do Congresso Americano, por sinal a maior do mundo, pronunciasse estas palavras: “agora sei que os americanos têm a sua maior e mais vasta escola”. Mas particularizemos o assunto e falemos sobre a nossa biblioteca. Criada a 2 de julho de 1851 pelo Dr. João Amâncio Pereira de Andrade, e acomodada em um dos compartimentos do convento de São Francisco, em São Cristovão, então capital do Estado, elevou o seu acervo a

148 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

415 volumes. Mudada a capital para Aracaju, esse pequeno acervo veio parar numa sala da então Tesouraria Providencial, até que o presidente Felisbelo Freire, em 1890, resolveu restaurá-la. Os maus fados, porém, como sempre acontece a todas as bibliotecas, conspiraram contra o seu futuro, pois que, de independente que era em 90, passou a dependente em 91, tendo uma vida apagada até 1908, quando o espírito cívico de Edilberto Campos, secretário do Governo, daquela época, começou a lhe dispensar proveitoso amparo. Data daí, praticamente, a existência desta nossa querida instituição. Sendo nomeado bibliotecário seu atual diretor efetivo, o exmo. Sr. Epifânio da Fonseca Dória, cuidou ele, desde logo, de orientar o amontoado de maços de livros e jornais que existiam e que não passavam de oitocentos. O que foi desse tempo para cá o trabalho desse notável organizador e muito ilustre sergipano no elevar a repartição a seu cargo a uma altura condigna, é tarefa que entrego no espírito de justiça de quantos vivem nesta terra. Batalhando sem tréguas nem esmorecimentos, estimulou a admiração e o entusiasmo do Marechal Siqueira de Menezes, que governava, em 1914, Sergipe, tendo conseguido não só a emancipação da Biblioteca como, ainda, uma moderna instalação em espaçoso prédio. Para não me alongar muito na apreciação do assunto, passa a ler um resumo. “Esta Biblioteca recebe, no momento, 201 revistas e 171 jornais. Possuía, em dezembro de 1935, 38.752 obras, por 25.483 pessoas que consultaram 46.844 obras. Os presentes ajuízem do que ela foi e do que ela é. Meus senhores: Falar de Biblioteca de Sergipe, sob a incomum direção de Epifânio Dória, é lembrar, para logo, a grandeza d’alma de um ilustre filho das margens do Adriatico: Vicente Calamelli. Nascido sob as auras sadias de Veneza e vivido por entre as extasiantes conquistas artísticas e faustosas glórias dos seus antepassados trocou,

149 GILFRANCISCO enamorado e ainda cedo, o romântico dos passeios nos canais bordados a mármore de sua terra pelas aurifulgentes areias da praia de Copacabana, e o pitoresco panorama que se desenrola do Monte Catini pelo maravilhoso esplendor que se domina do Corcovado. Diretor de uma das mais autorizadas revistas no assunto – a ‘Brasil- Ferro-Carril’–, recebera, em 1908, um pedido de assinatura generosa que lhe fizera o diretor da Biblioteca Pública de Sergipe. Atendendo ao apelo feito e ciente de que à frente desta Biblioteca se achava um organizador de primeira água, não se limitou, dai em diante, a ajudar a enriquecer o nosso repositório apenas com a sua revista, mas com todas as outras publicações que recebia em serviço de permuta. Dois anos após, começou a fazer dádivas de obras impressas, chegando a oferecer até a presente data, cerca de 12 mil obras. Amigo intransigente de Sergipe, ninguém lhe corre parelhas quando se acha em jogo e interesse de sua biblioteca; e, meus senhores, si bem que vos pareça extraordinário, eu vos afirmo que entre os bons sergipanos que amam a sua Biblioteca, na capital da República, Vicente Calamelli tem sido o maior dos sergipanos”.

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I. Discurso de Alfredo de Araújo Pinto

Senhor Dr. Governador do Estado: Há cataclismos políticos; há choques nas esferas jurídicas; há reações de natureza científica; há redemoinhos sociais; há neurastenias do infinito; há convulsões geológicas; há modificações, reformas, concertos, concílios, congressos. E tudo passa, afastadas que sejam as causas determinantes. Só as bibliotecas ficam. Só elas enfrentam a ação devastadora dos tempos e a fúria vandálica dos inconscientes, guardando, com exagerados cuidados de usurário, o resultado daquelas modificações, daquelas reformas, daqueles concertos, daqueles concílios, daqueles congressos. Vivendo paradoxalmente da mudança de gerações, nutre-se do tempo através dessas mesmas gerações. Os helenos apunham no pórtico de suas bibliotecas esta sabia inscrição: “Remédio da alma”. Por uma dupla e feliz coincidência, exmo. Sr. Eronides Ferreira de Carvalho, v. excia, que durante todo o seu passado de aureolado clínico e de cirurgião perfeito vem prodigamente estereotipando os preceitos emanados de Jesus, sofrendo pela dor alheia, tendo sempre estendida a benfazeja mão aos descurados da sorte, alevantando da penosa estrada da amargura os combalidos corpos que se tornaram indóceis à vontade; v. excia, repito, que tem tido a ventura de contar pelos lares dos sergipanos as parcelas da grande soma dos remédios ministrados aos seus corpos, acaba de lhes dar, também nesta hora, o específico para alma, alevantando, desta vez, não só a eles como a Sergipe, que se vai curar da grande chaga aberta pela fatalidade em um dos seus mais necessários órgãos, que é a sua casa dos livros; dupla e feliz coincidência, torno a dizer, porque o específico de agora vai ser manipulado por um técnico da altura da inteligência e do escrúpulo de Epiphanio Dória. Eu agradeço a V. Exa. em nome dos sergipanos.47

47 Diário Oficial do Estado de Sergipe. Aracaju, 18 de novembro de 1936.

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II. Discurso de Vicente Calamelli

Após o discurso de Alfredo de Araújo Pinto, falou o jornalista carioca, Vicente Calamelli, convidado especialmente pelo governo do Estado, por ocasião da inauguração da Biblioteca Pública do Estado:

Exmo. Sr. Governador do Estado, Exmo. e Revmo. sr. Bispo de Aracaju, Exmo. Sr. secretário geral. Minhas senhoras, meus senhores:

No contato físico com a terra, no envolvente concílio com a sua gente generosa, apenas se exalta e põe uma luz nova e uma doçura maior no coração o meu longo amor por Sergipe. São, desde o instante feliz do desembarque, de ternura e de deslumbramento as impressões que me dominam. Tão grandes e tão fortes que a palavra humana, embora melhor empregada do que sou capaz de o fazer, não conseguiria exprimi-las. Sergipe é, territorialmente, o menor dos Estados brasileiros. E, entretanto, as impressões da sua grandeza me esmagam! Grandeza de civilização material, que se ostenta no adiantamento da sua bela capital, no ambiente de trabalho fecundo e produtivo que aqui se encontra e na própria solidez e perfeição do edifício que agora nos abriga e é esta Biblioteca, esta maravilhosa Cidade dos Livros! É exatamente porque nos encontramos nesta Cidade dos Livros, possuidora de admirável tradição e de onde se desprende uma luz que, com a da inteligência sergipana, lança clarões magníficos em todas as direções, é que podemos proclamar que a grandeza de Sergipe, para glória maior da Pátria brasileira, sobretudo na ordem espiritual esplende e se afirma!

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O valor da inteligência sergipana culmina em fatos como o do nome e a obra dos seus filhos notáveis constituírem matéria para preciosos volumes entre outros “História de Sergipe” e “História Constitucional da República”, de Felisbello Freire; “Concepção nomistica do Universo”, de Fausto Cardoso, ou o do “Dicionário Bio-Bibliográfico Sergipano”, do meu saudosa amigo, desembargador Armindo Guaraná. E se eu quisesse citar figuras a que as mais altas virtude da cultura dão uma irradiação solar bastaria lembrar esta trilogia de sergipanos: Tobias Barreto, Silvio Romero e João Ribeiro. Que pude fazer no meu amor a Sergipe? Bem pouco decerto, e isto serve para salientar que, ainda na ordem espiritual, a civilização desta terra abençoada se exprime pela bondade de seus filhos. Na manifestação que aqui me é feita, nas eloquentes e comovedoras palavras que ouvi dos oradores que me precederam, o que avulta e fulgura não é o meu escasso mérito, mas a bondade incomparável dos sergipanos. Repito que, por mais que procurasse, não encontraria palavras suficientes para descrever os meus sentimentos de admiração e gratidão. O glorioso apogeu a que chega esta Biblioteca e se patenteia em todas as suas instalações principalmente se deve ao admirável esforço do meu querido amigo de longos anos, Epiphanio Dória, merecidamente prestigiado por este espírito de administrador, de qualidades admiráveis, que é o Dr. Eronides de Carvalho. Cumprindo o grato dever de citar estes dois nomes possam apenas vos dizer, por mim e pelos meus: - Muito obrigado!48

48 Diário Oficial do Estado de Sergipe. Aracaju, 18 de novembro de 1936.

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III. Discurso do Governador Eronides Ferreira de Carvalho

Eronides Ferreira de Carvalho (1895-1969)

Estiveram presentes, sábado, ao ato inaugural do novel e imponente edifício da Biblioteca Pública, segundo relatos, saíram magnificamente impressionados com o discurso pronunciado pelo Governador Eronides Ferreira de Carvalho, em rápida exposição historia algumas realizações de sua administração:

Exmo. e revmo. Sr Bispo Diocesano: Minhas Senhoras: Meus Senhores:

O Governo do Estado sente-se verdadeiramente ufano em declarando inaugurado o novo, o majestoso edifício da Biblioteca Pública. É uma divida de honra para com o patrimônio intelectual dos sergipanos, que coube a mim a ventura de salda-la.

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Dívida de honra, sim, meus senhores, porque não seria possível relegar ao abandono o precioso ativo espiritual desta casa, que se deteriorava e desviava, na maior das afrontas aos foros de inteligência dos filhos de Sergipe. Não houve quem não se condoesse ante a sorte por que passavam os livros da nossa Biblioteca, desde a data que foi desalojada do edifício que lhes pertencia. Andaram por aqui e por ali, ocupando, de favor, este ou aquele compartimento doutras repartições! E dizer-se que eles representam um dos justos orgulhos nossos! E dizer se que anos e mais anos foram consumidos para adquiri-los conservá-los em boa guarda! E dizer-se que, no Norte como no Sul, Sergipe avultava na inteligência pelo bem organizada e valorosa Biblioteca que possuía! Não era, pois admissível, consentir continuasse ela na situação deplorável em que a encontrei. Todos os sacrifícios se justificariam para dar-lhe uma Casa condigna, em a qual pudesse restaurar o fastígio de que sempre gosto. Foi o que fiz. Entendi que os meus conterrâneos, quer os que aqui vivem, ou os que fora estão, me atenderiam nos apelos que por acaso lhes dirigisse, se, sozinho, não me for a dado levar de vencida o que almejava. Felizmente, ao Estado foi permitido realizar, por si só, o compromisso de honra que tinha para com a tradição intelectual de Sergipe – está construído o edifício da Biblioteca Pública! Tranquilizem-se os meus conterrâneos porque os seus livros não correm mais o risco de se extraviarem. O que foi possível ao Governo fazer para dar-lhe instalação condigna, vós estais vendo que foi feito. Foi o povo que o construiu, com o valor dos tributos com que concorreu para o erário público. Ao povo fica entregue, a partir deste momento, para que dele tire o proveito que a sua finalidade indica.

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Meus Senhores: O Governo cumpria o seu dever, de referência ao patrimônio e vida da Biblioteca. Quer cumpri-lo, rigorosamente no exercício geral do seu mandato. Os empreendimentos que ele há iniciado em Aracaju, e no interior, carecem do apoio e do amparo do povo sergipano. Estes não lhe faltarão, estou certo. Ainda não ouve por onde desmerecer a confiança que lhe depositastes, em prélio cívico que a história de Sergipe registra carinhosamente. Os princípios pelos quais convocamos às urnas o eleitorado sergipano vêm sendo defendidos com retidão pelo Governo. Não lhe move sendo o desejo de atender aos reclamos das nossas necessidades, solucionando os problemas que pedem as providências mais urgentes. Quanto maior for à atividade do meu Governo, construindo a Biblioteca do seu Estado, a Ponte sobre o Poxim, o Hospital Infantil, o Cais da Praia “13 de Julho”, o Campo de Aviação, o edifício para a Polícia Civil, em substituição ao velho pardieiro da Cadeia Velha; reconstruindo a Penitenciária, sem segurança e o mais mínimo conforto, adquirindo um custoso imóvel para a Recebedoria, reformando os edifícios públicos, em geral; construindo os grupos de Laranjeiras, Itabaiana e Riachuelo, as pontes sobre o Cotinguiba, Vassa Barris, Piauí, Sergipe e Japaratuba, para seguir com as rodagens para Riachuelo, Boquim, Riachuelo-Siriri e Carmo. Propriá, construindo as estradas e Cohé Carmo e prosseguindo na de Carmo-Capela dentre outros melhoramentos difundindo e amparando a educação, dando-lhe uma assistência eficiente e dotando as suas escolas de edifícios e mobiliário apropriados; empregando todo o seu esforço em colaboração com os seus representantes no Senado e na Câmara, junto aos Poderes da União para que venham a Sergipe os benefícios do Governo Federal, na construção de um leprosário, na dragagem da barra de Aracaju e nas obras do seu porto, na construção do Quartel do 28º B.

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C, na demolição do trapiche do Lloyd, na ampliação dos serviços das repartições do Ministério da Agricultura, criando a Estação Experimental de Fruticultura, aumentando as possibilidades do Aprendizado Agrícola Federal, incrementando a pecuária, desenvolvendo e amplificando o Serviço de Plantas Têxteis, valorizando-o até materialmente, com a construção de vários edifícios no Quissamã; quanto maior for este meu empenho em trabalhar pelo vosso bem estar e do povo sergipano, – tanto mais contrariarei aqueles que desejariam vê o Governo se estiolar numa nociva esterilidade. Ao restituir-vos o vosso patrimônio espiritual, desejo que nele aprendais, mais e mais, a querer ao Brasil, a amar a Sergipe com fervor e dedicação, prestigiando a autoridade do seu Governo, para que, como esta, se sucedam outras e mais outras realizações.49

49 O Estado de Sergipe. Aracaju, 17 de novembro, 1936.

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Quatro anos após a inauguração (1940), a Biblioteca Pública do Estado em suas estantes acomodavam 275.000 volumes. No primeiro semestre deste ano, foram consultadas 12.701 obras, registrando-se uma frequência superior a 11.113 consultantes. Em seu salão de honra – Siqueira de Menezes – realizaram várias conferências públicas e concertos.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

IV. Discurso de Epifânio Dória

Discurso pronunciado por Epifánio Dória, secretário geral do estado, na solenidade da inauguração do novo edifício da Biblioteca Pública, no dia 14 de novembro de 1936:

Exmo. Sr. Dr. Governador do estado Exmo. e Revmo. Sr. Bispo Diocesano, Minhas senhoras, Meus senhores:

Duas circunstâncias cuja prioridade não é possível distinguir quebram-me o selo dos lábios e me levam a abusar da vossa nobre complacência em me ouvir, nesta solenidade: uma a minha qualidade de velho servidor da Biblioteca, que hoje recebe este suntuoso templo, erguido ao culto de suas relíquias, - outra a presença aqui de Vicente Calamelli, cuja nobre amizade venho cultivando com desvanecimento há mais de um quartel de século, e a cujo espírito finíssimo de cooperação abnegada, de idealismo sem máculas, de tenacidade benfeitora, deve a Biblioteca serviços inestimáveis. Calamelli perdoe-me ele o vexame que lhe causo ferindo-lhe a modéstia, é um modelo de virtudes cívicas, um exemplo raro de bondade humana agitando-se dentro de uma época de utilitarismo enervante de ambições desorientadas, de egoísmo desconcertante. O seu espírito delicado, imune as doença morais que vão combalindo os caracteres nesta hora trepidante de materialismo desanimador, voeja bem alto, como uma garça branca, olhando sempre para cimo, desviando nos horizontes longínquos estrelas que lhe fascinam, irradiações que lhe deslumbram. Deve-lhe a Biblioteca, por donativos ininterruptos, através de 27 anos seguidos, a posse de cerca de doze mil volumes, ou seja quatro vezes,

161 GILFRANCISCO quase, o total dos livros que possuía em 1908, quando passei a servi-la. Não foram, pois, pruridos de oratória nem validades que não sei acariciar, que forçaram a falar nesta hora passageira, mas de grande significação para a vida mental de Sergipe. Nossa Biblioteca já vai beirando o seu primeiro século de existência. Abrolhada em 1851, na antiga Capital, teve de então para cá as suas crises de crescimento, os seus colapsos graves, os seus perigos de vida, e um deles foi o que se vai a encerrar agora, sob a terapêutica providencial e salutar deste espírito arrojado e ao mesmo tempo atilado que é o exmo. sr. dr. Eronides de Carvalho, cidadão à altura de sua época com pulso e habilidade suficientes para se não apoucar ante entraves de ordem material e para vencer as resistências avassaladoras que se lhe antolhem neste setor da vida nacional buscando quebrar o ritmo de civilização de que desfrutamos. Dotado de alma aberta aos gestos mais delicados que se possam imaginar, animado sempre por sentimentos que traduzem um requinte de perfeição moral, s. excia. é, no entanto, um homem enérgico com os que mais o forem, sem conhecer, porém, os matizes do ódio nem o sabor das vinganças, a que é impermeável o seu nobre coração. Profundamente preocupado com os problemas que interessam à grandeza do Estado, o seu dinamismo construtivo se nota por toda a parte, na construção de edifícios, de pontes e de estradas; na abertura de escolas; na criação de serviços novos, de interesse - para a economia geral; na moralização dos costumes políticos; no saneamento dos meios acessíveis aos surtos epidêmicos; no amparo aos enjeitados da sorte, e o que é mais: erguendo templos, como este, ao culto da ciência. Meus senhores, o dia de hoje há de constituir um marco luminoso na história do estado, pelo fato histórico que nele estamos celebrando. Este edifício, com suas instalações modernissimas, com a sua justificada suntuosidade, será sempre um motivo de justo orgulho para Sergipe que sendo o menor Estado do Brasil, no ponto de vista geográfico, é ao mesmo tempo dos maiores no culto das ciências e das letras.

162 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Quem quer que percorra as capitais brasileiras há de notar que poucos Estados possuem bibliotecas nas condições da nossa: apenas três - S. Paulo, e Bahia. Fora desta tríade brilhante, a que se junta Sergipe, com destaque, não se conta outro Estado com biblioteca tão bem instalada. Nos demais Estados as bibliotecas são vistas com certa displicência. É que no Brasil se não compreendeu ainda o papel marcante das bibliotecas na obra da civilização. Sem estas arcas santas da ciência, piras sagradas do saber, sacrários a que se recolhem com verdadeira unção as hóstias da eucaristia das letras, não teríamos atingido o grau de civilização de que nos orgulhamos. Sem elas não se teria verificado a renascença, porque se teriam perdido irremediavelmente os tesouros da sabedoria antiga. Exmo. Sr. Dr. Eronides de Carvalho, fora de qualquer suspeição que se me possa atribuir, posso afirmar que bastaria a construção deste tempo erguido ao culto da ciência para perpetuar na história o seu nome já aureolado por feitos de tão alta projeção. Que Deus vos inspire sempre para cometimentos tão altos e glória da terra sergipana.50

50 Diário Oficial do Estado de Sergipe. Aracaju, 19 de novembro, 1936.

163

A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Gilberto Freyre mostra-se surpreso com a Biblioteca Pública

Nenhuma voz das que se hão pronunciado sobre as nossas coisas, e, entre estas, a Biblioteca Pública – agora instalada condignamente, num prédio que chama a atenção de quem olha a cidade – é mais autorizada ou imparcial do que a do escritor sociólogo, professor Gilberto Freyre (1900-1987), nosso hóspede por ocasião do Segundo Congresso de Psiquiatria do nordeste. Muita gente tem a impressão de que o elogio à Biblioteca é feito por gentileza ao governo. Outras pessoas ficam de fora e supõem que é tudo fachada. Outras, ainda, acham natural que assim seja, que não há motivo para admiração (...). Uma das minhas tristezas de brasileiro é a que me vem do meu Estado em que quase sempre encontro as bibliotecas e os arquivos do nosso país. Daí meu espanto diante a Biblioteca de Sergipe, que acabo de visitar. Quando eu disser aos meus amigos dos Estados Unidos – onde as bibliotecas são maravilhosas de organização – que pedi um livro na Biblioteca de Sergipe e esse livro me veio às mãos em menos de um minuto, eles próprios se espantarão. Há aqui uma tradição rara de eficiência que o atual diretor desta casa – Alfredo Pinto – conserva administrativamente viva.51

51 Diário Oficial do Estado de Sergipe. Aracaju, 23 de novembro, 1940.

165 GILFRANCISCO

Gilberto Freyre (1900-1987)

166 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Mensagens Apresentadas na Assembleia Legislativa

José Rollemberg Leite (1912-1996) engenheiro de formação, exerceu diversas funções técnicas e com a redemocratização de 1945 elegeu- se Governador do Estado de Sergipe (1947-1951). Rollemberg realizou grandes empreendimentos, alguns como a criação da Escola Normal Rural Murilo Braga, criação das primeiras faculdades, a de Economia e a de Química. Entre 1975-1979 governou pela segunda vez o Estado de Sergipe. A Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa Estadual por ocasião da abertura da Sessão Legislativa de 1948 pelo Dr. José Rollemberg Leite, governador do Estado, referindo-se as atividades da Biblioteca Pública, diz em poucas palavras o mesmo que seus antecessores: Funcionou regularmente no ano de 1947. O seu movimento foi o seguinte: visitaram-no 50.576 leitores que fizeram 53.466 consultas, distribuídas pelas seguintes seções: Obras Gerais – 11.260; Literatura – 10.637; Ciências Puras – 8.564; - Linguística e Filologia 8.159. A média mensal foi de 4.455 consultas, e a média daria, levando-se em conta os 357 dias de trabalhos foram de 148. Por doação, a Biblioteca Pública foi acrescida de mais de 643 obras com 1.023 volumes, no valor de Cr$12.860,00. Foram encadernados 398 volumes no valor de Cr$11.955,00. Nos serviços de correspondência houve permuta com 21 países estrangeiros, dando como resultado a aquisição de 40 obras com 41 volumes e com a remessa de 5 obras com 7 volumes. O movimento de expediente atingiu as cifras de 442 ofícios recebidos, 486 cartas e 26 circulares para uma remesa de 395 ofícios, 1.263 cartas e 189 cartões sobre diversos assuntos.52

52 Mensagem Apresentação à Assembleia Legislativa Estadual por ocasião da abertura da sessão Legislativa de 1949 pelo Dr. José Rollemberg Leite, governador do Estado de Sergipe, 1948.

167 GILFRANCISCO

Na Mensagem ao Povo Sergipano de 1951, concluindo o seu mandato diz o seguinte: Nos sistemas pedagógicos, a biblioteca é órgão fundamental, pois que completa ou continua a escola. Não basta a rede educacional, se o livro não existe na escola para suprir deficiências, dar vida e substância à própria escola. Se as bibliotecas escolares são hoje peças indispensáveis organizações de aprendizagem, o que se não dizer das Bibliotecas Públicas, autênticas instituições de cultura. Ideal seria houvesse no Estado, em todos os Municípios, um serviço de Biblioteca – completando o processo educacional. Urge assim a criação das Bibliotecas Municipais, a fim de promover a divulgação de conhecimentos mediante livros sérios e básicos. A Biblioteca Pública é uma das instituições de cultura mantidas pelo Estado. Bem instalada e já possuindo um acervo satisfatório, esta capacitada a prestar serviços inestimáveis ao público. Basta ver o movimento nos últimos anos, para constatar a importância desse órgão da administração para a cultura em Sergipe.53 Arnaldo Rollemberg Garcez (1911-1919), agricultor e pecuarista, fez carreira política como Deputado Estadual em 1934. Governador do Estado (1951-1955), Deputado Federal (1959-1963; 1963-1967; 1967- 1971) e prefeito, duas vezes de Itaporanga da Ajuda. No seu governo foi criada a Faculdade de Serviço Social, Auditório do Colégio Atheneu (1954), Parque de Exposições João Cleofas. Sua Mensagem a Assembleia Legislativa apresentada por ocasião da abertura da Sessão Ordinária de 1952, quando governador do Estado de Sergipe: Inestimáveis são os serviços prestados à cultura pelas bibliotecas públicas. Permitem o fácil acesso às maiores obras do espírito humano a pessoas de todas as condições sociais. Delas se aproveitam mesmo os que dispõem de recursos, pois, com a extensão do número das produções culturais

53 Mensagem ao Povo Sergipano, José Rollemberg Leite, apresentada à Assembleia Legislativa Estadual, por ocasião da abertura da sessão de 1951. Aracaju, Imprensa Oficial, 1951.

168 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE hodiernas, impossível seria às bibliotecas particulares preencherem os requisitos que se fazem mister para a formação de um saber verdadeiramente completo, baseado na multiplicidade dos conhecimentos humanos. A Biblioteca Pública de Aracaju é procurada, sobretudo, pelos nossos estudantes pobres, que nela consultam os livros didáticos de aquisição tão difícil a quem dispõe de parcos meios. Entretanto, a impossibilidade de atribuir a dita repartição maior verba, impediu a aquisição de novas obras. As que foram obtidas se devem à munificência de particulares, embora, em sua maioria, sejam de valor reduzido. Ao todo, trezentos e duas (302) obras, com quatrocentos e quatro (404) volumes, estimadas em CR$4.552,00 (quatro mil quinhentos e cinquenta e dois cruzeiros). Quanto a jornais e revistas perfizeram o total de duzentos e oitenta e três (283). Foi satisfatório o número de consultas, atingindo o número de cinquenta e duas mil quatrocentos e oitenta e cinco (52.485), para cinquenta e hum mil quatrocentos e setenta e sete (51.477) consulentes.

Assim estão distribuídos:

Obras Gerais 13.345 Filosofia 2.601 Religião, Teologia 44 Ciências Sociais 2.335 Filologia 4.459 Ciências Puras 6.294 Ciências Aplicadas 2.776 Belas Artes 38 Literatura 13.547 História e Geografia 7.046

169 GILFRANCISCO

Obedeceram aos seguintes idiomas

Português 51.342 Francês 325 Inglês 301 Espanhol 242 Latim 84 Italiano 156 Alemão 33

Em 21 de dezembro de 1951, a Biblioteca Pública possuía cinquenta e seis mil quinhentos e duas (56.502) obras, com sessenta mil trezentos e setenta e oito (60.378) volumes, não computados três (3) cimélios, em três (3) volumes.54 Leandro Maynard Maciel (1884-1984), engenheiro civil, exerceu funções técnicas na Paraíba e Sergipe antes de ingressar na política concorrendo para a Câmara Federal (1930-1932). Eleito para a Constituinte (1933-1934) como senador, permanecendo na legislatura ordinária (1935- 1937) quando foi decretado o Estado Novo. Com a redemocratização do país a partir de 1945, funda a União Democrática Nacional (UDN) em Sergipe, elegendo-se Deputado Federal (1946-1950) e (1950-1954), e depois Governado do Estado (1955-1959). A Mensagem enviada à Assembleia Legislativa apresentada por ocasião da abertura da sessão ordinária de 1957 pelo Governador do Estado de Sergipe, Leandro Maynard Maciel, igualmente a muitos dos seus antecessores, refere-se à Biblioteca Pública: A centenária instituição cultural, no ano de 1956, passou por várias reformas, a fim e melhor corresponder a seus objetivos. O número de frequentadores vem sendo crescido e as consulta acima

54 Mensagem a Assembleia Legislativa – apresentada por ocasião da abertura da Sessão Ordinária de 1952 – Arnaldo Rollemberg Garcez, governador do Estado de Sergipe. Aracaju, Imprensa Oficial, 1952.

170 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE de 50.000, testemunham a ânsia de conhecimento e de saber. Realizou-se uma exposição de livros, em solenidade de marcante interesse, tendo sido convidado para falar, o ilustre jurista e intelectual sergipano Desembarcador Hunald Cardoso.55 Em sua gestão, no ano de 1957 por decreto do Governador do Estado foi nomeado diretor da Biblioteca Pública do Estado o jornalista João Aguiar, velho combatente nas fileiras da UDN, que por isso, por seus méritos, por sua lealdade, desde os primeiros momentos da luta pela vitória udenista, travara o bom combate como soldado disciplinado ao lado de Leandro Maciel.

55 Mensagem à Assembleia Legislativa, Leandro Maynard Maciel. Aracaju, Imprensa Oficial, 1957.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Aposentadoria de Epifânio Dória pela Biblioteca Pública do Estado

Expressivo documento que elogia a situação do seu ex-diretor.

O Dr. Antonio Manuel de Carvalho Neto, ilustre Consultor Jurídico do Estado, e presidente a Academia Sergipana de Letras, acaba de dirigir ao Sr. Epifânio da Fonseca Dória à missiva que a seguir divulgamos: Ilustre conterrâneo e prezado amigo Epifânio Dória – acabo de ler, no Diário Oficial, o ato de sua aposentadoria. Fora negar-lhe justiça – com o que senão acomoda a minha consciência – o não reconhecimento dos inestimáveis serviços que você prestou a Sergipe, como Diretor da Biblioteca Pública. Sei do empenho indefeso, das horas ininterruptas, que lhe consagrou, sem desfalecimentos. As magníficas e preciosas coleções que possui esse estabelecimento, a sua organização, o seu vasto círculo de correspondência, no país e no estrangeiro, a tudo presidiu – colhendo, classificando, selecionando – a sua infatigável operosidade, o seu senso de ordem e disciplina. Lamento que essa casa de estudos – o melhor refúgio para os homens de espírito, em nossa terra – se veja, agora, sem a sua diligente e inexcedível colaboração. Faça, entretanto, um esforço a mais, na sua dedicação aos livros, aos livros e Sergipe. Mesmo sem função oficial – de que se acaba de despir com tão reais serviços – continue a ter por eles o mesmo carinho de sempre, esquivando-

173 GILFRANCISCO se de uma aposentadoria estéril – otium sine litteris – como em acontecido a tantos de nossos intelectuais aposentados. Com a velha estima, por dilatado tempo, cordialmente,

Carvalho Neto. Aracaju, 26-05-1943.56

(Portaria da aposentadoria de Epifânio Dória)

56 Correio de Aracaju. 28 de maio, 1943.

174 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Educação e Cultura - Biblioteca Pública

É conhecida a função cultural a Biblioteca Pública. Dão as massas acesso ao mundo do saber. Favorecem os desprotegidos da fortuna. Ervem especialmente em tempo como o atual, quando a impera carestia dos livros, cuja aquisição se tornou proibitiva até para as classes intelectuais, como o magistério, as quais recebem salários insuficientes. Entretanto, na é somente este o papel de uma Biblioteca Pública. Ela é também depósito e livros esgotados, de preciosidades bibliográficas; de jornais, revistas e documentos o passado; reúne ainda copiosamente livros de diversos autores e assuntos, em quantidade e qualidade que não podem ser encontrados nas bibliotecas particulares. Exerce igualmente importante função didática, abrindo as portas da cultura a muitos jovens estudantes sequiosos de conhecimentos. Infelizmente, a nossa Biblioteca vem sendo sistematicamente esquecida pelos Governos e continua sendo pelo atual. As suas dotações orçamentárias são reduzidas, não lhe permitindo incorporar as últimas publicações de autores antigos e novos, em língua nacional ou estrangeira de preparar pessoal técnico para a organização do seu fichário e de suas estantes, assim como para atender e orientar os leitores. Provoca até riso ver como certos leitores sabem consultar melhormente os absoletos catálogos que os funcionários por critérios antiquadros, abundam em erros que desorientam e desanimam qualquer consulente, além de envergonhar os sergipanos diante dos estranhos que visitam a Biblioteca. Por outro lado, continuam em vigor medidas ridículas, que só contribuem para afastar os possíveis leitores e, sobretudo os jovens estudantes. Ninguém pode entrar sem gravata. Não há mesas ou salão para estudo coletivo. É imposto um silêncio absoluto, próprios das escolas matusalêmicas. Pior ainda é o horário de expediente. A atual direção, certamente para favorecer os funcionários, agravou o mal, prejudicando o público, numa lamentável inversão das finalidades na Biblioteca. O

175 GILFRANCISCO expediente começa, é suspenso e recomeça a todo o momento. Vai das 9 às 12, das 14 às 17, das 19 às 20 ½ ou 21 horas. Enquanto isso, nas Bibliotecas e outros lugares procuram-se ininterrupto e servindo aos interesses de toda classe de leitores Aliás, nada mais contrário a um estudo sério e rendoso que a interrupção do esforço e a suspensão da atenção. Há outro regulamento que nos parece estar sendo felizmente descumprido pelos funcionários, o qual proíbe o pedido de consulta de mais de três livros simultaneamente e de assuntos diferentes. Só a ignorância de que estabeleceu e mantém essa medida pode explicá-la. Tal pessoa desconhece ou desconhecia as exigências o trabalho e reflexão e pesquisa. Em tais condições, a Biblioteca Pública é mais um ônus para o Estado do que um verdadeiro serviço público. Espanta surpreender o heroísmo dos poucos consulentes que se atrevem a defrontar o código draconiano de proibições lá existente. Urge uma nova atitude do Governo quanto à escolha do pessoal e a distribuição de verbas. Urge uma reforma do regulamento pela Direção. É o apelo que aqui deixamos por bem a cultura de Sergipe.

(Gazeta Socialista. Aracaju, Ano I, 2ª Fase, nº33, 25 e agosto, 1956)

176 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Reorganização da Biblioteca

João Freire Ribeiro (1911-1975)

Em julho de 1959, o poeta Freire Ribeiro (1911-1975) exercia a função de diretor técnico da Biblioteca Pública do Estado, época em que concedeu longa entrevista ao jornal O Nordeste, órgão do P.T.B., dirigido por Francisco de Araújo Macedo, onde abordava vários aspectos da funcionalidade da Biblioteca Pública. Vejamos a entrevista na íntegra:

Na Casa do Pensamento

É bem conhecida a função educativa das bibliotecas, a sua importância no desenvolvimento cultural do povo. As bibliotecas nasceram nos templos e podem ser considerados verdadeiros templos. Informados de que o atual diretor técnico da nossa Biblioteca Pública está envidando esforços no sentido de vivificar esta grande instituição, tornando-a atuante nas suas finalidades, a nossa reportagem esteve, há poucos dias, no Palácio Carvalho Neto, onde se demorou em palestra com o poeta Freire Ribeiro.

177 GILFRANCISCO

A Casa do Pensamento

Inicialmente, disse-nos o poeta Freire Ribeiro, diretor técnico da Biblioteca Pública: – Seja bem-vindo O Nordeste à Casa do Pensamento, no magnífico Templo da Ciência e da Arte.

A seguir declarou-nos: – Possui a Biblioteca Pública um acervo de quase 60.000 volumes. A sua organização tem merecido elogios de destacados intelectuais brasileiros, como Gilberto Freyre que disse certa vez: “quando se pede um livro cá embaixo, ao subir já o encontramos em cima, à nossa disposição”. A nossa Biblioteca tem merecido as atenções dos governadores, que sempre se empenharam no manter bem alto as tradições desta Casa de cultura. O Governador Leandro Maciel iniciou a sua atualização, com a aquisição de volumes que fixam a idade contemporâneas no mundo da ciência e de pensamento, e com a instalação da Seção Circulante que muito tem servido para difundir a cultura e auxiliar os estudantes pobres (só em junho emprestamos mais de cem livros didáticos). O Governador Luiz Garcia já prestou um serviço notável à pinacoteca, mandando reentelar preciosos quadros de Horácio Hora, que há mais de 50 anos estavam sem conservação.

Grandes Diretores

Prosseguindo declarou o poeta que desejava ressaltar o esforço e a dedicação de ilustres sergipanos que prestaram reais serviços à Biblioteca Pública. – Não posso ocular o trabalho magnífico de Epifânio Dória, que foi um dos grandes diretores da Biblioteca, tendo ao seu lado a figura do Sr. Alfredo Pinto, de saudosa memória, depois diretor técnico, a quem a Biblioteca muito deve. O eminente Monsenhor Carlos Costa, na sua

178 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE profícua gestão, se desvelou imensamente pela Casa, que lhe deve assinalados serviços. Atualmente, tem a Biblioteca, na direção administrativa monsenhor Eraldo Barbosa, a cuja iniciativa deveu a Seção Circulante, já sonhada pelo Monsenhor Carlos Costa, e a cujos esforços devemos a doação de livro pelo Instituto Nacional do Livro e pelo Ministério da Educação e Cultura. Passaram por aqui, como diretor técnico, os Srs. Aristides Rego e João Aguiar. O primeiro procurou melhorar as condições materiais da Casa, na sua pintura interna, nos fichários e na iluminação do salão nobre. O segundo, o jornalista João Aguiar, que substituiu Aristides Rego, foi logo após a sua posse, requisitado para o Gabinete do Governador Leandro Maciel, onde serviu durante o tempo de sua gestão. Fui sucesso de João Aguiar, nomeado pelo Governador Leandro Maciel e o meu propósito é de continuar zelando pela Biblioteca Pública, deixando que o futuro fale de minha atuação.

A Eficiência dos Funcionários

O poeta Freire Ribeiro fez questão de frisar a dedicação dos funcionários que servem na Biblioteca.

– Os servidores da Biblioteca – disse-nos – são eficientes e colaboram de muito boa vontade no bem servir, não só no Estado como às finalidades das seções em que murejam. Aqui está, ao nosso lado, por exemplo, uma grande funcionária: D. Noêmia Barreto, chefe da seção de catalogação. Espero e tenho certeza que o Governador Luiz Garcia atenderá aos justos reclamos dos funcionários estaduais que vivem quase todos com salários de fome, em vista da pobreza do Estado, cuja grande esperança, no seu desenvolvimento econômico, reside na extração do salgema. Tenho certeza, repito, que o Governador há de dar melhores níveis de remuneração, não só aos funcionários da Biblioteca, como a todos, em geral.

179 GILFRANCISCO

Seção Sergipana

Interessados nas cousas do nosso Estado, desta terra adorada, que nos marca extremado amor, pedimos ao poeta nos mostrasse a Seção Sergipana e dela nos falasse:

– Uma das seções que mais me empolgam, declarou-nos é a Seção dedicada aos autores sergipanos. Nos seus livros, temos o espelho vivo dos que, dentro e fora da terra pequenina, foram o pensamento de Sergipe no seio da cultura brasileira. É uma prova inconteste de que somos a fração imprópria de que falou Hermes Fontes – temos um numerador maior do que o denominador, a cabeça maior do que o corpo. Para nós, escritores, pensadores, poetas, obreiros da cousa eterna, esta seção é uma pequena imortalidade porque os nossos nomes irão além de nós, depois do nosso desaparecimento no mundo das cinzas. É com respeito profundo que folheio, na “Sergipana”, o preciso autógrafo de Manoel dos Passos, do seu A Conquista de Sergipe, escrito em 1903, na velha Cidade de São Cristovão. Futuramente, falarei com o Sr. Governador do Estado, para que saia a lume tão precioso trabalho. Temos na Seção Sergipana, catalogados, até agora, 1.620 volumes. A Seção Sergipana era a predileta do Monsenhor Carlos Costa, que a criou, sendo alvo sempre de seu amor, de sua veneração aos homens de letãs de nossa terra.

Numismática

– Que nos diz Freire Ribeiro sobre a seção numismática? – Quanto à seção numismática, que é preciosa e, no dizer de Epifânio Dória, uma das mais notáveis do país estou aguardando a providência que solicitei ao Sr. Secretário da Justiça e Interior, o ilustre desembargador João Dantas Martins dos Reis, Ito é a nomeação de uma comissão para fazer uma retombagem, a fim de dar conhecimento da mesma a todos os sergipanos, que precisam saber o que possui a nossa Biblioteca.

180 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Preciosidades

A nossa Biblioteca – disse o poeta Freire Ribeiro, que quase não nos dava oportunidade de fazer-lhe perguntas – a nossa Biblioteca possui muitas preciosidades: obras raras e valiosíssimas. Veja este volume: é “O Valoroso Lucideno e Triunfo da Liberdade”, do padre mestre Frei Manoel, impressa em Lisboa, no ano de 1648. Só quatro bibliotecas no mundo possuem esta obra. Veja este outro volume: é “Trabalhos de Jesus”, do venerável fr. Thome de Jesus, impresso em Lisboa, no ano de 1668 na oficina de Domingos Carneiro. Veja as “Obras Completas” de Voltaire (70 volumes), edição primitiva, de 1784. Veja aqui é a coleção do “O Correio Sergipense” do ano de 1847, 10 anos de sua publicação. Temos verdadeiros tesouros. E o poeta mostrou-nos outras raridades que, a falta de espaço, deixamos de enumerar.

É preciso dar vida à Biblioteca

Uma biblioteca não deve ser encarada como simples depósito de livros, mero arquivo de jornais, revistas ou mesmo preciosidades, cousas raras. Temos que ser para cumprir as suas finalidades, uma cousa viva atuante. Por isso, perguntamos ao poeta:

– Quais são os seus planos para tornar mais viva e mais atuante a nossa Biblioteca Púbica? – O meu conceito sobre biblioteca é o seguinte: movimento, contato dos livros o mais possível com os leitores, pois acho melhor que um livro envelheça nas mãos dos consulentes do que permaneça virgem na estante como um enfeite sem ser consultado. Tenho, no procurar realizar a finalidade da Biblioteca, emprestar livros a domicílio, mesmo não sendo da Circulante, livros estes que vão emprestados sob carga e responsabilidade das pessoas de responsabilidade que nos solicitam especialmente professores, intelectuais

181 GILFRANCISCO e jornalistas. Faço exceção aos livros da Seção Sergipana e da coleção brasiliana que não têm duplicatas. Estou empenhado nos trabalhos de encadernação. Tenho contado felizmente, com a boa vontade do Sr. diretor da Imprensa Oficial, Aroldo Santos, que tem atendido às solicitações que lhe faço, não só para a encadernação de livros, como no preparo do material para o expediente. Logo que me sejam devolvidos os volumes da Seção Circulante, que foram enviados para encadernação, tratarei, imediatamente de encadernar os livros em brochura da Seção Sergipana. Depois de percorrer, com o poeta, todas as dependências da Biblioteca, encantados com o seu entusiasmo pelos livros, com as suas tiradas poéticas, voltamos à nossa redação para transmitir aos leitores as palavras do diretor técnico da Biblioteca Pública e convidá-los a requentar mais a nossa grande e venerável Casa do Pensamento, cujas portas estão abertas a todos os sergipanos para o delicioso banquete ao espírito.57

57 O Nordeste. Aracaju, nº1161, 8 de julho de 1959.

182 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

A falta de funcionários

A ocorrência que vamos tomar conhecido agora, a qual foi relatada pelo repórter da Gazeta de Sergipe, não é novidade, sempre ocorreu na Biblioteca Pública do Estado, delitos cometidos por usuários: arrancar páginas de livros, recortar páginas de jornal ou arranca-la toda por inteira, tomando os livros como empréstimos sem devolvê-los jamais ou roubar livros, motivado pela falta suficiente de funcionários na referida repartição. Vejamos o artigo publicado em duas partes: “O atual diretor da Biblioteca Pública, com a melhor das boas intenções, fez reviver a seção circulante naquela repartição, através da qual os leitores, podem tomar, por empréstimos e levar para ler na sua residência, qualquer obra pertencente ao acervo daquela biblioteca. De acordo com o regulamento baixado para essa seção circulante, o prazo máximo pelo qual uma mesma pessoa poderá ficar de posse de qualquer livro tomado por empréstimos, é de quinze dias. Acontece, porém, que a nossa reportagem, em recente visita que fez a Biblioteca Pública do Estado, verificou que a tal seção circulante, está provocando um grande desfalque na referida biblioteca, pois, nem sempre o prazo para a devolução das obras está sendo cumprido. Pessoas que tem tomado obras emprestadas estão de posse das mesmas, até por prazo superior a um ano. Isto tem acontecido até com obras importantes e mesmo com edições já esgotadas, como a História do Brasil, de rocha Pombo (número 11.282) Curso de Física, de Aníbal Freire (número 9.545), Física Experimental, de J. C. Carvalho (9.119) e vários outras, não relativas a didática como literatura em geral. A direção da biblioteca Pública não ignora esta situação, pois no seu arquivo estão as fichas de empréstimos com os nomes das pessoas que devem estar de posse das obras.

183 GILFRANCISCO

Estiveram em nossa redação os funcionários da Biblioteca Pública, Aurélio Torres e Romeu Barreto. Trouxeram e exibiram obras que a nossa reportagem apurou e noticiou na edição do dia 29 do mês passado, não se encontravam nessa data, naquela instituição. Noticiamos ainda que a seção de empréstimos de livros estava contribuindo para desfalcar o patrimônio da Biblioteca Pública do Estado. Disseram os visitantes que realmente no dia da visita do nosso repórter a Biblioteca as referidas obras não estavam à mão, mas isto porque se encontravam sendo encadernadas ou não foram encontradas no momento, e não por se acharem emprestadas. Asseverou ainda um dos visitantes que todos os livros emprestados são recuperados no prazo determinado e que somente o Sr. Governador ou outra “qualquer autoridade” tem o direito de tomar livros por empréstimos sem prazo para devolução, mesmo assim só o fazem mediante requisição”.58

58 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano V, nº 135, 29 de abril, 1960 e nº 141, 6 de maio, 1960.

184 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Vejamos a Mensagem à Assembleia Legislativa da abertura da 4ª Sessão Ordinária da 4ª Legislatura, apresentada pelo Governador Luiz Garcia em 1962:

Biblioteca Pública – Repositório de obras valiosas e raras é o maior patrimônio cultural do Estado. Localizada em prédio próprio, sempre conservado e asseado para atender a sua missão. Com um acervo de 57.773 obras, 62.058 volumes, conta ainda, com simelios de rara preciosidade bibliográfica. No seu programa de difusão cultural, emprestou a domicílio 3.888 livros.59

Luiz Garcia (1910-2001)

59 Mensagem à Assembleia Legislativa – 3º ano de Governo – Luiz Garcia, Governador do Estado. Aracaju, Imprensa Oficial, 1962.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Os Governos Militares

Abandonada desde 1954, a Biblioteca Pública do Estado e Sergipe, encontrava-se em 1965 num estado desolador, entregue à inércia administrativa, sofrendo todo tipo de descaso, de ordem material e humana. Durante o início do governo de Seixas Dória (1917-2012) foi apurado várias irregularidades no prédio da Biblioteca, tais como a destruição de vidraças que ocasionavam infiltração de água das chuvas, vazamento pelo terraço, um grande número de estantes de aço enferrujadas, livros praticamente inutilizados, e um perigo eminente do desabamento do teto, por falta de reparos, e a falta constante de funcionários que viviam sempre em férias, licenças ou à disposição de outras entidades, e, sobretudo a falta de zelo na conservação do patrimônio histórico cultural do Estado. Nas eleições estaduais de 1962, numa chapa composta pelo deputado federal Seixas Dória ao governo do estado, foi eleito vice-govenador de Sergipe, a quem substituiu quando o mesmo foi deportado no Golpe Militar de 1964, atuando de modo politicamente diverso ao antecessor. Nomeado a governador de Sergipe, governou de 1º de abril de 1964 a 31 de janeiro de 1967. Durante o governo de Sebastião Celso de Carvalho (1923-2009) conforme notícias circuladas na imprensa sergipana:

Sebastião Celso de Carvalho (1923-2009)

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Conseguiu recuperar para a aquisição 84 volumes e leis do Brasil de 1954 a 1964, para completar a coleção existente a partir e 1750, interrompida há dez anos. O Diário Oficial da República estava também interrompido há três anos. Á seis anos não existia um relógio sequer na Biblioteca Púbica e já foi adquirido um novo. Em fim, um mundo de irregularidades vinha campeando na Casa de Tradições, oficial, do Estado.60 Ao assumir o Governo do Estado de Sergipe, Seixas Dória procurou melhorar as condições da Biblioteca Pública, nomeando para diretor Epaminondas Rocha Teles, antigo funcionário da Casa e conhecedor de seus problemas. Considerada como uma das melhores Bibliotecas do Brasil pela sua organização, na década de sessenta esteve mais uma vez abandonada, necessitando de cuidados imediatos, de catalogação, arrumação e constituição de obras raras, que se encontravam no mais completo esquecimento. O Sergipe-Jornal de outubro de 1964 confirmava que a Biblioteca Pública do Estado de Sergipe vinha passando por uma fase, de reorganização, visando à recuperação do estado de completo abandono em que se encontrava há pouco mais de um ano, quando a sua diretoria foi substituída pelo atual diretor, Epaminondas da Rocha Teles. Trabalhos contínuos vêm sendo feitos, no afã de salvar o que não foi perdido do nosso patrimônio cultural. Vidros quebrados, desleixo administrativo, desaparecimento de coleções, destruição de obras valiosas e abandono do prédio, eis o saldo e gestão anteriores.61 Sobre os móveis e coleções de jornais da instituição, o diretor da Biblioteca faz “queixas de sangrias no conteúdo da instituição, ocorridas em 1961, quando cerca de 350 cadeiras e inclusive poltronas, foram removidas para outros locais, deixando o Salão de Festas com apenas 60 assentos, dos quatrocentos e tantos que possuía o piano foi removido, para

60 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano IX, nº 2514 de 25 de setembro, 1964, p. 1. 61 Sergipe-Jornal. Aracaju, 11 de outubro, 1964.

188 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE o auditório do Colégio Estadual de Sergipe. Administrações anteriores venderam a quilo coleções de jornais de órgãos da imprensa de todo o país. Somente um comerciante de Aracaju, comprou 5 toneladas”.62

62 Sergipe-Jornal. Aracaju, 11 de outubro, 1964.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Variações em Fá Sustenido, Zózimo Lima

Zózimo Lima (1889-1974)

A nossa Biblioteca Pública já foi considerada a terceira do Brasil, pelo volume do seu conteúdo do seu conteúdo literário e científico. A coleção de jornais era das maiores e de raríssimos exemplares. Lá ainda se encontram preciosos incunábulos, a despeito dos ladrões de livros, que, depois de consultá-los, os levam tranquilamente para casa sem os devolver. Lá o leitor encontra à “Valeroso Lucideno”, de El Manoel Calado, edição princeps, boa quantidade de obra e Sá e Miranda, Pantaleão de Aveiro Garcia de Rezende e numerosos outros clássicos esquecidos. As obras dos escritores portugueses e franceses em boa encarde nação, guarnecem as estantes sempre expurgarão dos insetos devoradores de papéis, como a traça e o cupim. Incidente se perde naquele mundo de livros instigados, raríssimos, uns, de história, ciência, literatura, sociologia e filosofia, outros. Ali na Biblioteca você terá encontros saudáveis, através das suas obras,

191 GILFRANCISCO com S. Tomaz de Aquino, Voltaire, Santo Agostinho, Spinoza, Nietzsche, Wiliam James, Emerson, Cícero, Marco Aurélio, Platão e Schopenhauer. Quando atravesso as portas da Biblioteca e me sento lá no fundo, sozinho, sem perturbações não mais tenho vontade de sair, nem mesmo para as refeições. Perco-me lá dentro, por vontade irreprimível, deslumbrado, entre as suas estantes, a conversar espiritualmente, na leitura dos seus livros, com Curzio Malaparte, Santayana, o abade Charles Moelles, Froust e Kant. Isto sem manusear os escritores brasileiros e portugueses, que os temos de alto valor mental, tanto na prosa como no verso, na crítica e na filosofia. Releio sempre com prazer a Filosofia da Arte, do malogrado Vicente Licinio Cardoso, que se suicidou em 1931, e O Mundo interior, de Farias Brito. Esses mancebos dos cursos superiores deviam frequentar constantemente a nossa Biblioteca Pública e abandonar essas futilidades livrescas encontradiças em revistas e opúsculos vários de escritores que se ocupam para efeito de venda, de problemas em que entra o sexo de preferência. Infelizmente as coleções de jornais da Biblioteca estão seriamente desfalcadas, venderam, tomem nota em administrações anteriores mais de cinco toneladas de jornais preciosismos, de todas as partes do país, inclusive do Acre, Xapuri Rio Branco, quais deviam estar colecionados, encadernação à disposição dos leitores ávidos de novidades da história política e social naquelas regiões que se desconhecidas. O atual diretor Sr. Epaminondas Teles antigo funcionário, está agora pondo a casa em ordem prestigiado pelo governador Celso Carvalho, que lhe deu água abundante, luz, recursos para a manutenção do expediente e do asseio absoluto. Ao meu caro secretário perpétuo Freire Ribeiro, quando diretor foi negado o essencial. Tornou-se a Biblioteca ponto de encontro dos intelectuais a terra e dos visitantes de fora. Falava-se ali de romances, poesias,

192 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE candomblé e medicina empírica. O Epaminondas agora tem recursos para manter a casa escrupulosamente asseada e com pessoal capaz de atender ao público. Falta-lhe uma datilógrafa e um encadernador.

(Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano IX, nº2503 de 11 de setembro, 1964, p. 2.)

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Novas Reformas

Em maio de 1965, o periódico Sergipe-Jornal traz em sua primeira página, uma pequena nota “Biblioteca adquire livros”: A Biblioteca Pública do Estado acaba de adquirir cerca de quinhentos novos exemplares. Estas declarações partiram do Sr. Epaminondas Menezes, diretor daquela Casa de leitura, que afirmou da apreciação que por certo haverá por parte dos amantes da cultura. As coleções são de autores famosos, o que mostra o bom gosto na escolha de livros, pelo Sr. Epaminondas.63 Na edição de 16 de junho da Gazeta de Sergipe, o diretor Epaminondas Menezes entrevistado pelo periódico, informou que esta casa recebeu cerca de setecentos livros, adquiridos por uma verba de dois milhões de cruzeiros, concedida pelo Ministério de Educação e Cultura. Vejamos alguns dos títulos mais importantes: Coleção completa do Prêmio Nobel de Literatura; Enciclopédia Larousse, em quinze volumes. Ambas as coleções, foram adquiridas por seiscentos e cinquenta mil cruzeiros. O mesmo periódico sergipano através da coluna O Povo Reclama, em edição de 29 de julho, registra a seguinte reclamação sobre a Biblioteca Pública: Apesar das anunciadas reformas no prédio onde funciona a Biblioteca do Estado, apregoadas pelo atual diretor da mesma, continua àquela Casa a necessitar de sérios reparos e cuidados, não só na parte que concerne à conservação do edifício, como também no atendimento às pessoas que lá comparecem para consultar alguma obra, ler uma revista, um jornal, ou ainda fazer pesquisa aprofundada. Sabemos ser a BP uma das mais aquinhoadas em livros do país. Falta apenas um bibliotecário e funcionários dedicados

63 Sergipe-Jornal. Aracaju, nº14.597, 19 de maio, 1965.

195 GILFRANCISCO que adinamizem as mais diversas seções e saibam trabalhar com um pouco mais de eficácia, obedecendo a um planejamento prévio. Precisa que se diga a cultura não pode esperar tanto tempo, ficando às ordens da vontade daqueles que a tratam esportiva, graciosa e parasitariamente.64

64 Sergipe-Jornal. Aracaju, nº 14.655, 29 de julho de 1965.

196 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Biblioteca Pública, Zózimo Lima

O atual diretor da Biblioteca Pública, Epaminondas Teles, preparou orçamento cuidadoso para efetuar consertos urgentes no edifício da sua repartição e o remeteu, para as devidas providências, ao Ministro da Educação. A despesa prevista era orçada em cinco milhões de cruzeiros para a substituição das basculantes quebradas, portas empenadas, piso gasto e com o mosaico despregado, teto e paredes com rachaduras por onde escorrem as águas pluviais, correção à rede interna de iluminação etc. Atirou o Epaminondas no que viu e matou o que não viu. Em vez dos 5 milhões solicitados pra as reformas chegaram trazidos pelo deputado José Carlos Teixeira, cinco mil contos de réis, já depositados no Banco do Brasil, o Epaminondas poderá aumentar mais o volume de obras didáticas e literárias, para a leitura dos intelectuais da rapaziada dos ginásios, colégios e academias. Em 1965 a Biblioteca comprou de livros mais de um milhão de cruzeiros. Está enriquecida a nossa Biblioteca de novos dicionários, de muitos volumes, compêndios de filosofia, ciências, filologia, história, arte e literatura. A nossa Biblioteca está passando por completa renovação no que diz respeito à sua opulenta coleção bibliográfica. E tudo isso e um ano para cá. Eu só desejava, agora, que o gatuno que roubou os dois grossos volumes a História da Faculdade de Direito de Recife, escrita por Clovis Bevilaqua, fizesse voltá-los à estante onde se encontravam. Eu manuseei esses volumes até à direção técnica do Freire Ribeiro, mostrando-lhe a data em que foi formado seu ilustre avô Dr. José Freire da Costa Pinto. O gatuno surrupiou os dois volumes e saiu sorrateiramente sem que fosse percebido pelos funcionários. Esse roubo deve ser cometido há pouco tempo.

197 GILFRANCISCO

A mesma coisa aconteceu no Instituto Histórico. Roubou dali o volumoso dicionário dos escritores paulistas, publicação comemorativa do 4º Centenário de Piratininga. Eu estava sempre a folheá-lo a procura de dados biográficos e bibliográficos dos intelectuais paulistas. Do desaparecimento desse precioso livro dei ciência ao atual dono do Instituto Histórico e Geográfico, quando eu ainda fazia parte daquela instituição, de cujas comissões permanentes fazem parte alguns iletrados coronéis da extinta Guarda Nacional. Os roubos na Biblioteca e no Instituto Histórico devem ter sido perpetrados por algum amante da literatura que se preocupa com biografias e bibliografias. Ele deve estar lendo esta nota com o maior cinismo deste mundo. Eu lhe pediria restituísse o que lhe não pertence. Evolva, embrulhados, os livros citados, por pessoa desconhecida daquelas duas casas acanhada de comparecer pessoalmente com os pacotes à portaria.

(Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XI, nº2932, 6 de fevereiro, 1966, p.2)

198 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Expectativas da Nova Biblioteca

Biblioteca

Já com projeto aprovado, com concorrência pública feita, a construtora de uma nova Biblioteca Pública do Estado. O local será junto ao “Baptistão” e integrará o conjunto desportivo a ser construído e que constará de uma piscina, um centro de educação física e um ginásio coberto. Não vemos porque e onde se apoiam os argumentos dos técnicos que querem, naquele local, a presença de uma biblioteca. Em todos os Estados brasileiros as Bibliotecas Públicas ficam em lugares centrais e nunca afastadas, sem condições de transporte e com outras dificuldades que se transformam em obstáculos ao bom uso dos livros. Mas diante do fato concreto, só resta lamentar. É mais uma construção grandiosa.65

Biblioteca, o assunto

Em conversa com nossa reportagem, o Superintendente da Sudepe in formou que dando continuidade ao plano de trabalho daquela autarquia, foram pré-qualificadas para participarem da concorrência que se encontra aberta para a construção da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, a ser realizada no próximo dia vinte e dois de maio, as seguintes construtores: Celi Ltda, sociedade Nordestina de Construção Ltda (Norcon), Comércio Imóveis de Construção, Construtora Ott Sharpp, Construtora José Lessa Ribeiro, Construções e Habitações do Nordeste (Cohabita), Soares Leone S/A, Construtora Civil Industrial da Bahia.66

65 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XVII, nº 4.646, 9 de fevereiro de 1972. 66 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XVII, nº4.710, 27 de abril de 1972.

199 GILFRANCISCO

Governador vê planos para nova Biblioteca

Secretário de Educação e Cultura acompanhado do Diretor da Biblioteca Pública de Aracaju, Edvaldo de Assis foi recebido na manhã de ontem pelo Governador Paulo Barreto de Menezes, em seu gabinete, quando na oportunidade mostrou os planos que deverão ser aplicados na nova biblioteca pública em fase de conclusão. Ontem o Diretor da Biblioteca, explicou a Gazeta de Sergipe que falta somente para a biblioteca entrar em funcionamento a conclusão dos trabalhos devendo ocorrer no final deste mês. Disse ainda que o seu acervo contará com duzentos mil livros e terá condições de receber duzentas pessoas ao mesmo tempo. Suas salas, afirmou, serão todas com ar condicionados.

Concorrência

Por outro lado à concorrência para a compra dos móveis a serem utilizados deverá ser feita nestes quinze dias e para tanto a Superintendência de Obras Públicas do Estado, vem tomando as devidas providências para que a biblioteca não sofra atraso em sua inauguração. Já o Secretário de Educação professor João Cardoso do Nascimento, acha que a nova biblioteca com seu acervo de duzentos mil livros darão melhores condições aos estudantes e efetuarem suas pesquisas. Este mesmo pensamento é do senhor Edvaldo de Assis afirmando que nenhum estudante passará por dificuldades como ocorre com a atual que em época de vestibular os livros do programa tornam-se diminutos não podendo atender um por cento dos vestibulandos.67

Diretores de Bibliotecas Reunidos

O diretor da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe viajou neste

67 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº4.741, 5 de abril de 1974.

200 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE fim de semana a Capital Federal, onde se encontra reunido com diretores de bibliotecas públicas de todos os Estados do País. Edvaldo de Assis está participando do Seminário sobre Planejamento e Sistemas regionais de Bibliotecas Públicas, uma promoção da Unesco em convênio com o Ministério da Educação e Cultura e Instituto Nacional do Livro; que foi iniciado ontem. O encontro se estende até o próximo dia dezesseis, com palestras e debates tendo lugar no Departamento de Biblioteconomia da Universidade de Brasília.68

Biblioteca terá 200 mil livros

Duzentos mil livros integrarão o acervo da Biblioteca Pública de Sergipe quando passar a funcionar normalmente na nova sede perto do Baptistão. A informação foi prestada pelo Diretor daquela Casa de leitura professor Edvaldo de Assis. Sabe-se que, até o final da primeira quinzena ou mesmo início da segunda quinzena no próximo mês todo o trabalho de remoção dos livros da antiga biblioteca para a nova será concluído desde quando, a sua inauguração está prevista para o dia 29 de outubro. Por outro lado de prédio da antiga biblioteca não se sabe até o momento que pensa fazer o governo estadual, porém prevê-se que seja utilizado pela Secretaria de Educação e Cultura para instalar algum dos seus setores.69

Biblioteca conclui mudança de livros

Até hoje todos os livros que se encontram na Biblioteca Pública, localizada na Praça Fausto Cardoso deverão ser removidos para a nova casa de leitura situada nas imediações do Estádio Estadual Lourival Baptista.

68 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº4.850,14 de agosto de 1974. 69 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº 4.882, 26 de setembro de 1974.

201 GILFRANCISCO

A informação é do Diretor da Biblioteca Pública Sr. Edvaldo de Assis adiantando que para tanto todos os funcionários trabalharam sábado o dia inteiro. Ontem fizeram o mesmo no sentido de que este trabalho não sofra qualquer atraso. Quanto à inauguração disse o Sr. Edvaldo de Assis que a solenidade será oficialmente aberta com um pronunciamento do Secretário de Educação e Cultura seguindo por um outro do Governador Paulo Barreto de Menezes. Finalizando será oferecido um coquetel.70

Semana da Biblioteca

Sem nenhum programa oficial foi aberta a Semana da Biblioteca, que tem encerramento previsto para o próximo dia 28, com a inauguração da nova Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, construída pelo Governador Paulo Barreto de Menezes. A nova Biblioteca Pública do Estado de Sergipe em o nome de Epifânio Dória e está situada na Praia 13 de Julho, nas proximidades do Estádio Lourival Baptista, ao lado do futuro Ginásio Barretão. Todo o acervo da antiga casa da leitura da Praça Fausto Cardoso já foi transferido para o novo prédio, devendo o programa de a inauguração ser anunciado no decorrer desta semana.71

70 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº4.897, 15 de outubro de 1974. 71 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº4.906, 25 de outubro de 1974.

202 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Biblioteca: Inauguração dia 29

A nova Biblioteca Pública do Estado terá o nome de Epifânio Dória, grande escritor sergipano e Presidente de honra do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Sua inauguração será mesmo dia 29 do corrente, data do encerramento da Semana Nacional de Bibliotecas, comemorada todo de 22 a 29 de outubro cumprindo disposição federal. É o que informa o diretor da Biblioteca. A nova casa de leitura devido à sua arquitetura arrojada, modernas instalações dotadas de ar condicionado, música ambiente e circuito de TV em suas dependências, será uma das melhores do Nordeste. O Sr. Edvaldo de Assis, Diretor da Biblioteca Pública do Estado, disse à reportagem que o novo prédio de leitura já conta 30 mil livros, dos quais 5 mil foram adquiridos recentemente.72

72 Jornal da Cidade. Aracaju, Ano III, nº771, 11 de outubro de 1974.

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Biblioteca Epifânio Dória: Inauguração

Inaugurado em 29 de outubro de 1974, registrada sob o número 003530 no Cadastro Geral de Bibliotecas, do Ministério da Educação e Cultura, a Biblioteca Pública do Estado passou a denominar-se, Biblioteca Epifânio Dória, justa homenagem ao sacrifício, zelo e incansável dedicação emprestados pelo saudoso intelectual Epifânio Dória, à vida da própria instituição. O monumental prédio onde hoje funciona a Biblioteca, erguido no bairro 13 de Julho, prolongamento da Rua Vila Cristina, foi construído no governo de Paulo Barreto de Menezes. A Biblioteca Pública Epifânio Dória, unidade da Secretaria de Estado da Cultura, em seus dois pisos, abriga vários setores: Documentação Sergipana, Circulante, Hemeroteca, Referência, Acervo Geral, Cultura Popular e Obras Raras, registrando uma freqüência mensal, em média, de 2.500 pessoas e um acervo em torno de 36 mil títulos. Dirigida por Maria Sonia Santos Carvalho, a Biblioteca Epifânio Dória tem desenvolvido vários projetos e participado de programas criados pela Fundação Biblioteca Nacional, visando o melhor atendimento ao usuário da capital e, também, do interior do Estado. Vejamos alguns desses projetos: Projeto de Formação Continuada de Mediadores de Leitura, Curso de aperfeiçoamento de profissionais que atuam nas bibliotecas pública municipal e Roda de Leitura. A realização destes projetos é marcado pelo Convênio firmado entre a Fundação Biblioteca Nacional com a Secretaria de Estado da Cultura, por meio do Comitê Sergipano do Proler e do Sistema Estadual de Biblioteca Pública. Além do Projeto Livro Vivo - Leitura para Cidadania, parceria da Editora Paulus com a Secretaria de Estado da Cultural, através da Biblioteca Pública Epifânio Dória. A Biblioteca em Ação, em parceria com várias instituições, realizou o Curso Básico de Organização de Bibliotecas, para capacitar os bibliotecários

205 GILFRANCISCO sergipanos que, até então, ainda não tinham passado por qualquer treinamento de reciclagem. Com a duração de quatro meses, esse curso contou com o apoio da Força Sindical, Ministério da Educação, Universidade Nacional de Brasília (UNB), Fundo de Amparo ao Trabalhador (Fat), Instituto de Pesquisa e Cultura (Ipec), Governo do Estado. Outro evento foi o III Seminário Estadual do Programa de Leitura (Pro ler), patrocinado pelo Governo do Estado através da Secretaria de Estado da Educação e Cultura, Ministério da Educação (Mec), Ministério da Cultura (MinC), Fundação Cidade de Aracaju (Funcaju) e Fundação Biblioteca Nacional. Por outro lado, deve-se destacar que também é atribuição da Biblioteca Epifânio Dória a coordenação do Sistema Estadual de Bibliotecas, em parceria com a Coordenação Nacional do Sistema de Bibliotecas, num programa desenvolvido pela Fundação Biblioteca Nacional.

Paulo Barreto de Menezes (1925-2016)

206 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Discurso do Governador do Estado, Paulo Barreto

Inaugura hoje o Governo do Estado uma das suas mais importantes obras e a mais importante no setor cultural nesta data tão significativa para mim que é o dia do funcionário público a que tenho dado o máximo de atenção. Preocupação constante e permanente da minha Administração, a cultura mereceu sempre uma atenção especial, viajando, sobretudo incentivar, nos meios estudantis e comunitários, o gosto e a admiração pelos valores da Arte e do Saber. Os esforços empregados pelo um Governo no setor cultural não foram em vão. Com o esforço consciente e objetivo, e com a Graça de Deus, podemos hoje apontar, como realizações positivas no campo cultural, uma série de providências e medidas, a exemplo da restauração da Casa de João Ribeiro, onde funciona um Centro de Cultura, na cidade de Laranjeiras e colaboração com a Arquidiocese de Aracaju, para a criação do Museu de Arte Sacra de São Cristovão, a reestruturação do Conselho Estadual de Cultura e a promoção e apoio a uma série de atividades artísticas, através da Secretaria de Educação e Cultura. Cooperando com a Universidade Federal de Sergipe, na divulgação da cultura, o Governo deu todo o apoio, através de seus órgãos e com ajuda financeira, ao Terceiro Festival de Arte de São Cristovão. Fruto também desse esforço consciente e objetivo são as novas escolas que se espalham por todo o Estado de Sergipe, na capital e no interior, formando todo um complexo educacional, que, ao final se constituí na base, racional para aflorá-lo de um ambiente cultural mais dinâmico e pujante. O coroamento desse trabalho voltado para a educação e a cultura, promovido pelo meu Governo, é essa obra que agora temos a grata satisfação e entregar a todos os sergipanos: uma ampla e moderna biblioteca pública, que, em boa hora, vai ser batizada com o nome do consagrado e dedicado

207 GILFRANCISCO homem ligado à cultura em nosso Estado, Epifânio Dória numa justa homenagem a quem dedicou quase uma vida inteira à pesquisa e à guarda dos livros que cuidava com inigualável desvelo. Resultado da implantação e ampliação da infraestrutura constatada hoje na área escolar do Estado, tanto dos setores sob a responsabilidade do Governo Estadual, como dos setores entregues à responsabilidade do Governo Federal a iniciativa ou à iniciativa privada é crescente a cada dia que passa o número de estudantes cursando os nossos estabelecimentos escolares e dos estudantes níveis primário, secundário ou superior. Dentro desse quadro de democratização da cultura e da educação, nada melhor para servir como instrumento de amparo, notadamente aos estudantes pobres, do que a criação de uma ampla e moderna biblioteca, dotada de todos os requisitos necessários para a pesquisa, o estudo e o aprimoramento da informação cultural. As bibliotecas são instrumentos democráticos de levar a cultura e todos quebrando o círculo privado da aquisição comercial de livros que se encontram por preços altos resultantes da elevação provocada pelo alto custo do papel. De acesso franco para a consulta não somente dos estudantes, mas de toda a comunidade sergipana, aí está a nova Biblioteca Pública, simbolizando nas suas arrojadas formas arquitetônicas, a sabedoria e a tradição intelectual de tantos e tantos sergipanos ilustres nas letras, nas artes, na cátedra, na política, na administração e em todos os campos. Encontrei aqui o estudante e o homem ávido de cultura, as condições e o ambiente necessários para o estudo, valendo destacar que todas as comunidades civilizadas apresentam dentro de uma paisagem a biblioteca como um dos maiores orgulhos da sociedade. Em nosso País, que caminha para um futuro promissor, forjado pela Revolução de 1964, e pelo tirocínio dos Governos Humberto de Alencar Castello Branco, Artur da Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel uma elevada percentagem de estudantes são filhos de pais que não possuem a riqueza dos livros dentro dos seus lares, valendo citar que foi constatado que, na Universidade de São

208 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Paulo, a maior do País, quarenta por cento dos universitários são filhos de pais analfabetos ou que não possuem o curso primário completo, em um País, repito, que desponta para um futuro maior, uma biblioteca moderna, com um grande acervo, é uma necessidade imprescindível. Valem destacar eu, ao contrário do pensamento de alguns, que acreditam não ser necessário um prédio belo e amplo para os livros, especialistas em educação provam que a própria beleza e conforto dos prédios das bibliotecas atraem maior número de leitores efetivos e de visitantes periódicos. Acredito que nesta hora, o Governo do Estado cumpre com mais uma meta do seu programa no setor cultural e educacional, dotando o Estado de uma arrojada obra voltada para o Saber, na qual não foram esquecidos nem a criança e nem o universitário, nem tampouco os valores já formados que se dedicam a pesquisas, acreditando também, que graças a Deus e o esforço conjunto que todos nós empreendemos para a construção de um futuro melhor para Sergipe, estamos com a consciência tranquila do dever cumprido. É de justiça manifestar o meu agradecimento ao dedicado e dinâmico Secretário de Educação e Cultura, Doutor João Cardoso do Nascimento Junior e aos seus assessores, ao jovem idealista Superintendente de Obras Doutor Sérgio Barreto de Melo e a sua eficiente equipe. Agradeço também ao ilustre Prefeito de Aracaju a colaboração prestada, objetivando urbanizar esta área, mandando pavimentar ruas, abrir outras, num trabalho que vai ter prosseguimento, mas que já está sendo bastante visível. Aqui nesta Casa, os Grandes homens de todos os quadrantes armaram as suas tendas para conviver com quantos fazem do aperfeiçoamento dos espíritos a realização plena de suas existências. Declaro inaugurada esta bela obra d’arte, a Biblioteca Pública, Epifânio Dória.73

73 Jornal da Cidade. Aracaju, Ano III, nº786, 29 de outubro p.7, 1974.

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Biblioteca Pública Epifânio Dória, inaugurada em 1974 pelo Governador Paulo Barreto de Menezes.

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Biblioteca Epifânio Dória, Acrísio Torres

Nada mais justo que lembrar, hoje, aqueles que deram os primeiros passos, e talvez com o pensamento no futuro tivessem sonhado com a beleza arquitetônica da Biblioteca Epifânio Dória que, como diziam os egípcios da época das pirâmides, abriga tesouros da alma. E, pois, momento de evocação histórica. Foi do Zacarias de Vasconcellos, um dos mais destacados políticos do império, quando no governo de Sergipe, a ideia da criação da biblioteca pública. E a Assembleia Provincial a convertera em lei nº233, de 1848, embora só inaugurada na administração seguinte de Amâncio João Pereira de Andrade. Tendo-se iniciado com 415 volumes, conta hoje, nas suas estantes importadas da Alemanha, com mais de 40 mil volumes. E na sua destinação superior, não deixa de ser expressivo que a biblioteca tivesse sido inicialmente instalada no Convento de São Francisco, na então capital sergipana, São Cristovão. Barroso, o Vigário Barroso, um dos maiores tribunos sacros de Sergipe, grande como Mont Alverne, como Frei Santa Cecília, foi o primeiro diretor da biblioteca pública. E durante sete anos iniciais teve ela papel de relevo na formação dos jovens provincianos, muitos dos quais vieram a alcançar projeção nacional, e até internacional. No entanto, anos de obscuridade de ineficiência, estavam destinados à biblioteca pública, desde 1855, quando Inácio Barbosa mudou a capital para Aracaju, até 1890, quando é restaurada por Felisbello Freire. Neste longo hiato de trinta e cinco anos, nenhum serviço prestou à mocidade sergipana. Felisbello Freire, notável historiador, nomeado por Deodoro para o governo de Sergipe em 1890, volta de logo sua atenção para a biblioteca,

211 GILFRANCISCO

Não apenas a restaura, mas imprime sua organização e promove o enriquecimento de suas estantes adquirindo novas obras de atores nacionais e estrangeiros. No governo de Guilherme Campos em 1908 inspirado pelo filho e secretário particular, Edilberto Campos, novo alento ganhar a biblioteca. E isso, indiscutivelmente, foi possível por causa da nomeação de Epifânio Dória para seu diretor, cuja capacidade de trabalho e amor à causa da cultura é proverbial, de todos conhecida. Novo impulso ocorreu em 1914 no governo de Siqueira Menezes, visto que este administrador retira a biblioteca das peregrinações de funcionamento, de repartição em repartição, instalando-a no antigo Ateneu Sergipense. E, em 1936 Eronides de Carvalho a instalou no belo prédio onde esteve até esta data, e agora doado pelo atual governo à Academia Sergipana de Letras. Entre outros, estes foram os precursores da Biblioteca Epifânio Dória, hoje inaugurada pelo Governo do Estado. Nesta hora, é nosso dever evocar os seus nomes, porque para eles, nós somos a posteridade que através desta obra que reputamos magnífica lhes presta as homenagens a justiça pelas ideias, pelos sonhos e pelas realizações culturais que levaram a cabo. Na inauguração da Biblioteca Epifânio Dória, portanto não podemos ter povo e governo, outro pensamento senão de que a posteridade somente a posteridade pode pagar o tributo devido ao mérito dos homens. É uma lei histórica, cujos efeitos não podem alcançar agora a obra do governante sergipano, mas tem ele o direito de esperar, do tempo, o reconhecimento que neste dia, testemunha aos que o antecederam nas mesmas preocupações culturais únicas capazes de elevar, de enobrecer o homem.

(Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XIX, nº 4.909, 29 de outubro, 1974.)

212 A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Patrono: Epifânio Dória

Epifânio da Fonseca Dória (1884-1976)

Nasceu na fazendo Barro Caído, município de Campos, hoje Tobias Barreto, em 7 de abril de 1884, numa situação liberal a que seu pai pertencia. Foram seus pais o Capitão da Guarda Nacional José Narciso Chaves de Menezes e D. Josefa da Fonseca Dória e Menezes, que se transferiram para o povoado hoje Vila do Poço Verde, pouco antes da abolição. Estudou primeiras letras em curtos e alternados períodos com um Américo, de cujo nome completo se não recorda e Irênio Vital de Souza, em Poço Verde, e com Josué do Rosário Montalvão e José Rodrigues da Silva, em Campos. Não podendo seguir a carreira das letras, em face de seus pais terem os recursos econômicos devastados pelas secas de 1877, 1887 e 1898, se fez comerciário, começando em Campos e mais tarde em Boquim, em fins de 1899. Na terra de Hermes Fontes começou a sua vida pública como secretário tesoureiro da Intendência Municipal, na administração do Major Leônidas Fontes (1904-1905). No Boquim foi suplente de Juiz Municipal do termo, tendo em 1905 carregado sobre os ombros, sem remuneração, o

213 GILFRANCISCO alistamento eleitoral do termo, pela Lei Rosa e Silva. Em 1907 veio para esta capital, surgindo dificuldades em Maruim para a nomeação de um adjunto de Promotor Público que assumisse o cargo de Promotor da Comarca foi convidado para aceitar o lugar. Nomeado Adjunto assumiu, interinamente a promotoria pública da Comarca que exerceu até o fim de 1907. 1908 foi nomeado amanuense da Secretaria do Governo e logo depois bibliotecário da Biblioteca Pública, então considerado uma seção da mesma Secretaria e sendo o lugar de bibliotecário sinecura de afilhados de situação. Encontrou a biblioteca, que funcionava em dois salões do pavimento térreo do Palácio do Governo, com um cabedal de livros que não atingia a três mil obras. Desenvolveu grande atividade até tornar a Biblioteca uma das mais ricas do país, conseguindo no governo do General Siqueira Menezes torná-la repartição autônoma, instalada em grande edifício, que é o em que funcionava o Tesouro do Estado. Serviu na Biblioteca até 24 de maio de 1943, quando foi aposentado, com mais de 35 anos de serviço só na Biblioteca, sem nunca ter gozado férias nem licença, e deixando o estabelecimento com cerca de 50 mil volumes, instalado em prédio magnífico. Em 1935 foi eleito, em pleito disputadíssimo, deputado de classes à Assembleia Legislativa do Estado, tomando assento na mesma em 5 de outubro desse ano. Estava no exercício desse mandato quando foi nomeado a 21 de outubro, Secretário geral do Estado, n governo do Dr. Eronides Ferreira de Carvalho. Desdobrada a Secretaria Geral em três outras foi nomeado para a Secretaria de Justiça e Negócios do Interior em 3 de fevereiro de 1937, respondendo pelo expediente das outras duas enquanto se lhes não deu titular. Em dezembro de 1937 deixou a Secretaria de Justiça e Negócios do Interior, passando a exercer a de Fazenda e Obras Públicas, que exerceu até 30 de junho de 1941, depois da exoneração concedida ao Interventor Eronides Ferreira de Carvalho.

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Deixando a Secretaria da Fazenda em junho de 1941, voltou ao seu antigo cargo de diretor da Biblioteca Público, onde permaneceu até 1943, quando se aposentou. Como Secretário da Fazenda representou o Estado na conferência dos Secretários da Fazenda, reunida no Rio de Janeiro em março de 1938, e na Legislação Tributaria reunida na mesma cidade em maio de 1941, tendo tomado parte, ainda como representante do Estado nas reuniões de Técnicos em Contabilidade e assuntos fazendários realizados na Capital Federal nos anos de 1939 e 1940. Em fevereiro de 1940 compareceu, como auxiliar do Interventor Eronides de Carvalho, a Reunião dos Interventores do nordeste, realizada no Recife. Em fevereiro de 1941 compareceu ainda como representante do estado à reunião regional preparatória da Conferência Nacional de Legislação Tributária, realizada na Bahia. Foi membro titular fundador da Academia Sergipana de Letras e membro correspondente das Academias de Letras de Alagoas, Paraíba, Petrópolis, Piauí e Rio Grande do Sul, da Academia Polimática do Ceará, do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas, do Centro Catarinense de Letras, da Associação Marabaense de Letras; de Marabã, Pará; do Clube Esperanto de Aracaju. Do Centro de Intelectuais de Campinas, da Sociedade Sergipana de Cultura Artística, da Associação Sergipana de Imprensa, de que se afastou por motivos pessoais, do Instituto Genealógico Brasileiro de São Paulo; do Instituto de Estudos Genealógicos também de São Paulo, da Sociedade Musical Santa Cecília de Aracaju, da Sociedade Numismática Brasileira de São Paulo e delegado da Associação Internacional de Imprensa, neste Estado. Epifânio Dória foi também sócio benemérito e secretário geral perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e sócio correspondente dos Institutos Históricos do Acre, Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Petrópolis e Rio Grande do Sul. Maçon colado no grau 30 tendo prestado a Loja Cotinguiba

215 GILFRANCISCO serviços de relevância, exercendo durante 20 anos os cargos de secretário, muitos reeleito, de orador por várias vezes, Hospitaleiro e Venerável, em duas eleições, não tendo aceitado a última pelos motivos que apresentou. Foi absolutamente seu o plano para aquisição de que se fizera necessário para a reconstrução do templo com o aumento do andar superior, como foi igual plano para construção do imponente edifício do Instituto Histórico. Foi um dos fundadores, em 1934, do Rotary Club de Aracaju, a que serviu por anos sucessivos, eleito e reeleito secretário, a despeito de não ser regular as reeleições em Rotary. Epifânio Dória foi um dos principais fundadores da sociedade Beneficente dos Funcionários Públicos do Estado, fazendo, durante 20 anos seguidos, sem qualquer remuneração os serviços que mais tarde seriam bem remunerados pelos que trabalharam na mesma Sociedade. Colaborador em vários jornais e revistas dirigiu desde 1925 a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Quando morava em Buquim, na sua adolescência promoveu ali a fundação de um Club Literário Progressista e de uma banda musical, tudo desaparecendo com sua saída daquela localidade. Quando de sua permanência e Maruim, em 1907, organizou pacientemente o arquivo de jornais do Gabinete de Leitura de Maruim de que foi secretário durante o tempo em que ali permaneceu. Epifânio da Fonseca Dória e Menezes faleceu em Aracaju, no dia 8 de junho de 1976, aos 92 anos de idade, em sua residência na Rua Santa Luzia, cercado de filhos e netos.

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Recopilador Sergipano

Quando Epifânio Dória foi nomeado em 1908 para o cargo de bibliotecário da Biblioteca Pública, encontrou por detrás das grandes estantes de madeira, entre elas e a parede, um amontoado de papéis velhos atirados ao chão e após remoção conseguiu salvar das traças, uma coleção incompleta do Recopilador Sergipano, nosso primeiro jornal, impresso na Vila Constitucional Estância em 3 de setembro de 1832, editado por Monsenhor Antonio Fernandes da Silveira.

Recopilador Sergipano, primeiro jornal do estado (1832), editado por Monsenhor Antonio Fernandes da Silveira.

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Antigos Problemas Reaparecem

Biblioteca encontra-se em total abandono

É nesse prédio que funciona a Biblioteca Pública Epifânio Dória que atualmente está sofrendo os efeitos das chuvas, mormente, agora, neste período de inverno. Os vazamentos por si só recomendam seja processada uma restauração, que começa o surgimento de danos e perdas irreparáveis no que diz despeito a integridade na memória cultural do Estado de Sergipe, como de resto da cultura universal. O prédio da Biblioteca Pública é uma bela obra arquitetônica, que orgulha aos sergipanos, no entanto o seu interior envergonha a todos que veem a memória cultural de um povo ser destruído pelo descaso das autoridades.

Livros e documentos estão ameaçados na Biblioteca

A Biblioteca Epifânio Dória está com sérios vazamentos, ocasionados pelas chuvas. Como é do conhecimento de todos, ali estão guardados milhares de livros e documentos de valor inestimável, e que estão correndo o risco de serem deteriorados. Informações dão conta de que quando chove uma das salas mais prejudicadas é justamente aquela que abriga a documentação sergipana. Outro dia quando o funcionário chegou para o Trabalho, deparou-se com alguns papéis que haviam caído da sua mesa boiando, no chão. Nessa ocasião as estantes tiveram de ser mudadas de lugar as pressas, depois que alguns livros já estavam molhados e outros umedecidos, ocasionando sérias preocupações, que infelizmente foram momentâneas, pois não houve uma providência no sentido de sanar esse grave problema.

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Solicitação de recursos

Por outro lado, corre a notícia de que o atual secretário da Cultura, Joel Silveira, já solicitou ao Governador do Estado Antonio Carlos Valadares, a verba irrisória de Cz$200.000,00 (duzentos mil cruzados), para fazer esses reparos, não obtendo sucesso, pois o seu pedido até a presente data não foi atendido.74

74 Gazeta de Sergipe. Aracaju, Ano XXXII, nº 8.575, 10 de junho, 1987.

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BPED

A Biblioteca Epifânio Dória (BPED) em 2011 atendeu aproximadamente 26.233 usuários oriundos dos diversos bairros da capital, de cidades sergipanas e de outros Estados. A BPED ampliou seu horário de funcionamento e destacou-se na execução de ações para acesso das pessoas com deficiência visual, através da dinamização de sala com acervo em Braile. Buscando apoio e articulação com instituições locais e nacionais, empresas e produtores culturais, foram realizadas diversas atividades pontuais e sazonais, como o projeto Livro Vivo – Leitura para a Cidadania; cursos e encontros; Festival de Quadrinhos; lançamentos de livros; exposições temáticas e comemorativas; teatro; música; e cinema. Segundo Relatório de Atividade do governo Marcelo Déda “O Comitê Sergipano do Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler), em parceria com a Fundação Biblioteca Nacional, continuou seu trabalho de promoção de práticas leitoras, formação de agentes multiplicadores de leitura e valorização e utilização de bibliotecas, com destaque para a Roda de Leitura realizada regularmente”.75 Com a participação ativa da BPED, dirigida por Maria Sônia Santos de Carvalho (2007-2014) e da Biblioteca Infantil Aglaé Fontes, dirigida por Claudia Stocker (2007-2018), a Secretaria Estadual de Cultura (Secult) articulou à elaboração do Plano Estadual do Livro, Leitura e Literatura (PNLL), tendo como finalidade mobilizar, capacitar e assessorar prefeituras e secretarias de Educação e Cultura para o desenvolvimento de políticas locais de incentivo à leitura.

75 Relatório de Atividades, 2011, governo Marcelo Déda. Aracaju, 2012.

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Alguns Diretores da Biblioteca Pública

Vigário Barroso Francisco de Carvalho Lima Junior Cícero d’Avila Garcez Epifânio da Fonseca Dória Alfredo de Araújo Pinho Epaminondas da Rocha Teles Edvaldo Assis João Freire Ribeiro João Aguiar Antonio Carlos Viana Eliane Moraes Justino Alves Lima Raquel dos Reis Morais Maria Sonia Santos Carvalho Genilda Mendes de Farias Hunald Alencar Myriam Elorza Juciene Maria Santos

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Instituições Pesquisadas

Academia Sergipana de Letras – ASL

Arquivo Público do Estado de Sergipe – APES

Biblioteca Epifânio Dória

Biblioteca da Universidade Federal de Sergipe – UFS

Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe

Serviços Gráficos de Sergipe – Segrase (Hemeroteca)

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Agradecimentos

Carlos Pinna de Assis Claudia Stocker Raquel dos Reis Morais Jackson da Silva Lima José Carvalho de Menezes ( Juquinha) Luiz Eduardo Costa Luzia Inês de Jesus Mílton Alves Milton Barbosa Pedrinho Santos Ricardo José Roriz Silva Cruz Sonia Maria Santos Carvalho Tito Nunes de Brito Valéria Bari Adailton Andrade Daysi Ramalho Guarani Vladimir Capinan Gilson Sérgio Matos Reis

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A BIBLIOTECA PROVINCIAL DE SERGIPE

Referências Bibliográficas

BARRETO, Luiz Antonio. Correio de Sergipe – Memórias de Sergipe, Epifânio Dória, Vol. XLIII, Aracaju, 4 de junho, 2006.

CANFORA, Luciano. A Biblioteca Desaparecida (História da Biblioteca de Alexandria). São Paulo, Companhia das Letras, tradução de Frederico Carotti, 1989.

DÓRIA, Epifânio. Relatório de 1913-1914 Apresentado ao Exmo. Sr. coronel Pedro Freire de Carvalho vice-presidente do Estado pelo diretor Epifânio Dória – em 15 de agosto de 1914 – Appenso – Discursos Pronunciados na inauguração do Palácio da Biblioteca Pública do Estado de Sergipe, em 14 de julho de 1914. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Comércio, de Rodrigues, 1920.

______. A Biblioteca Provincial de Sergipe – Elementos para a sua História. Aracaju, Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, Vol. 11, nº16, p. 75-89, 1942.

______. Efemérides Sergipanas, Org. Ana Maria Fonseca Medina, Vol. I e II. Aracaju, Governo do Estado/Banese, 2009.

GILFRANCISCO. As Bibliotecas, ontem e hoje. Aracaju, Jornal da Cidade, 6 de abril, 2003.

______. Biblioteca Epifânio Dória. Aracaju, Revista Aracaju Magazine nº106, julho, p. 10-11, 2004.

229 GILFRANCISCO

______. O Mestre Clodomir Silva. Aracaju, Revista Ícone, Ano 5 nº20, maio/junho, p. 24-27, 2012. ______. A Biblioteca Epifânio Dória. Aracaju, Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, nº39, p. 129-155, 2009.

GUARANÁ, Armindo. Dicionário Biobibliográfico Sergipano. Edição do Estado de Sergipe, 1925.

MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita – História do Livro, da Imprensa e da Biblioteca. São Paulo, Editora Ática, 2ª edição, 1996.

MILIANES, Luiz. O que é Biblioteca. São Paulo, Editora Brasiliense, coleção, Primeiros Passos, nº94, 1987.

RIZZINI, Carlos. O Livro, o Jornal e a Tipografia no Brasil (1500-1822). São Paulo, Imprensa Oficial do Estado S.A. IMESP. (edição fac-similar), 1988.

230 GILFRANCISCO, nascido em 27 de maio de 1952 em Salvador. Começou como jornalista, trabalhando nas sucursais dos jornais Movimento, Em Tempo e Voz da Unidade no início dos anos setenta, época em que participou das atividades culturais no Estado, produzindo vários shows musicais, passando a integrar o Grupo Experimental de Cinema da Universidade Federal da Bahia – UFBA. Em 1975, como assistente de fotografia do cineasta Thomas Farkas participou no filme Morte das Velas do Recôncavo, dois anos depois como assistente de produção de Olney São Paulo, no filme Festa de São João no interior da Bahia, ambos documentários dirigidos por Guido Araújo, entre outros. Foi durante algum tempo consultor e professor do Centro de Estudos e Pesquisa da História. Licenciado em Letras pela Universidade Católica do Salvador (UCSal), é professor universitário e jornalista. É autor de Conhecendo a Bahia; Gregório de Mattos: o boca de todos os santos; As Cartas, uma História Piegas ou Destinatário Desconhecido (com Gláucia Lemos); Ascendino Leite; Crônicas & Poemas recolhidos de Sosígenes Costa; Flor em Rochedo Rubro: o poeta Enoch Santiago Filho; Godofredo Filho & o Modernismo na Bahia; O Poeta Arthur de Salles em Sergipe; Imprensa Alternativa & Poesia Marginal, anos 70; Musa Capenga: poemas de Edison Carneiro; Tragédia:Vladimir Maiakóvski; Walter Benjamin: o futuro do Passado versus Modernidade & Modernos; Literatura Sergipana, uma Literatura de Emigrados; A Romancista Alina Paim; O Contista Renato Mazze Lucas; Instrumentos e Ofício:inéditos de Carlos Sampaio; Santo Sousa: Pássaro de Pedra e Sono na Transversal do Tempo; Época (1948-1949), revista modernista de época; Jordão de Oliveira, poeta-pintor; Ranulfo Prata - Vida & obra; Paulo de Carvalho Neto - vida & obra, Biblioteca Provincial de Sergipe, entre outros. Tem publicações em diversos periódicos do país: Revista da Bahia (EGBA); Revista Exu (Fundação Casa de Jorge Amado); Revista Travessia (UFSC); Revista CEPA (BA); Revista Teias (UFSC); Revista Kawé Pesquisa (UESC); Revist’aura (SP); Revista Arte Livro (BA); Judiciarium (SE); Revista da Literatura Brasileira (SP); Nordeste Magazine (SE); Aracaju Magazine (SE); Preá (Fundação José Augusto-RN); Revista de Cultura da Bahia; Candeeiro (ADUFS-SE); Letras de Hoje (PUCRS); Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; Revista Ícone (SE); Revista Memorial do Poder Judiciário (SE); Revista da Academia de Letras da Bahia; Salvador Aqui; Cumbuca (Segrase-SE); Revista do Tribunal de Contas do Estado – TCE (SE). Tiragem 300 exemplares Formato 17x22 cm Tipologia Adobe Caslon Pro, 12/16 Cash Currency, 18 Papel Off-set 75g/m² (miolo) Cartão Triplex 250g/m² (capa)

Nosso incansável pesquisador da cultura sergipana, Gilfrancisco, nos brinda com essa publicação instigan- te, texto narrativo que mescla história e documentação da Biblioteca Provincial de Sergipe. Espiando pelos postigos da história, veremos por meio de sua leitura a trajetória de nossa querida “Epifânio Dória”, nascida como Biblioteca Provincial de Sergipe. A Biblioteca Provincial surge como a realizaçãoA origem de dauma palavra grande Biblioteca vem do grego bibliotheke, através do latim bibliotheca que aspiração, asigni cava de fomentar edifício a inteligência ou aposento onde se guardam livros. A primeira biblioteca do mundo foi sergipana porerguida meio em da leituraNínive, pública. a cidade mais importante da Assíria (atual Iraque), pelo rei Assurbanipal II, Teve comopor pai voltao político do século Zacarias 7 a.C. de Nela foram armazenados milhares de tabuletas escritas com caracteres Vasconcelos,cuneiformes, visionário e aprogressista, mais antiga forma de escrita que se conhece. Há quem a rme ser a do faraó assim comoRamsés muitas II, mães, do Egito, que outroseram acreditam que a biblioteca mais antiga, e também a mais famosa, seja principalmentea Biblioteca as educadoras da Alexandria, na ou Biblioteca Real de Alexandria. antiga capitalA leiturasergipana. tem comoNascida objetivo possibilitar a entrada de outro mundo nas vidas dos indivíduos. É como uma comummenina algumasrecatada, pessoasem 1848, dizerem que não têm paciência para ler um livro, no entanto, é tudo uma já foi recomendadoquestão de ohábito, internato de transformar em a leitura em prazer. Por isso o hábito da leitura deve ser estimu- seu documentolado deainda criação. na infância Foi recebi para- que o indivíduo aprenda desde pequeno que ler é algo importante e, da no prédioacima do de Convento tudo, prazeroso. de São Além de aumentar o conhecimento, o hábito da leitura aprimora o Francisco, vocabulárioem São Cristóvão, e ajuda na e construção lá textual. permaneceu Fontepor muito de consulta tempo, imprescindívelsob para o entendimento cultural, social e político da nossa cuidados e formação,acesso muito desde moderado a fundação da da antiga capital, em São Cristóvão, até os dias atuais, A Biblioteca população. ProvincialPorém, a vontadede Sergipe, própria do pesquisador e jornalista Gilfrancisco, livro publicado pela EDISE-Edi- da adolescentetora Diário foi removendoO cial do Estado os de Sergipe é obra síntese que resume na perspectiva do autor alguns portões quedocumentos a separavam importantes da popula -encontrados ao longo de sua existência. ção, chamandoApesar a atençãode ser a quartapara as Biblioteca pública mais antiga do país, Wilson Martins em sua obra, A questões daPalavra cultura Escrita geral – ehistória local edo livro, da imprensa e da biblioteca, cuja primeira edição data de 1996, mobilizandoem a suasjuventude. 519 páginas, Em 1855, nem a mesmo registra a existência da Biblioteca Provincial de Sergipe. Segun- jovem vai doreceber a lista um das novo maiores título, bibliotecas a públicas do Brasil, a nossa Biblioteca está classi cada em 16º sua formaturalugar, como com Biblioteca 230.000 volumes.Públi- ca do Estado,O e seráque instaladainteressou no ao Palá autor- foi englobar numa visão de conjunto, os mais de 100 anos da existên- cio do Governocia dessa de instituição Aracaju. culturalEsse e educacional, cobrindo um imenso panorama histórico da Província crescimentoe dofoi Estado, muito revelando importante, o que há de mais signi cativo para a memória cultural de Sergipe. mas levou à algumas desilusões, já que o casamento entre essa jovem sonha- Carlos Pinna de Assis dora e o povo sergipano ainda estava Academia Sergipana de Letras longe de se concretizar. Na virada do século XX, a Biblioteca Pública do Estado de Sergipe chega à sua matu- ridade. Revigorando-se de seu perío- do de ostracismo, conseguiu desen