O Golpe Na Perspectiva De Gênero.Pdf
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O Golpe na perspectiva de Gênero o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 1 23/02/2018 14:42:38 cult — centro de estudos universidade federal da bahia multidisciplinares em cultura reitor coordenação João Carlos Salles Pires da Silva Leonardo Costa vice-reitor vice-coordenação Paulo Cesar Miguez de Oliveira Renata Rocha assessor do reitor comissão editorial Paulo Costa Lima da coleção cult Alexandre Barbalho (Universidade Estadual do Ceará) Antonio Albino Canelas Rubim (UFBA) Gisele Nussbaumer (UFBA) José Roberto Severino (UFBA) editora da universidade Laura Bezerra (UFRB) federal da bahia Lia Calabre (Fundação Casa de Rui diretora Barbosa – RJ) Flávia Goulart Mota Garcia Rosa Linda Rubim (UFBA) conselho editorial Liv Sovik (Universidade Federal do Rio Alberto Brum Novaes de Janeiro) Angelo Szaniecki Perret Serpa Mariella Pitombo Vieira (UFRB) Caiuby Alves da Costa Marta Elena Bravo (Universidade Charbel Ninõ El-Hani Nacional da Colômbia – Medellín) Cleise Furtado Mendes Paulo Miguez (UFBA) Evelina de Carvalho Sá Hoisel Renata Rocha (UFBA) José Teixeira Cavalcante Filho Renato Ortiz (UNICAMP) Maria do Carmo Soares de Freitas Rubens Bayardo (Universidade de Maria Vidal de Negreiros Camargo Buenos Aires – Universidade San Martin) coordenador da comissão editorial Antonio Albino Canelas Rubim o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 2 23/02/2018 14:42:40 coleção cult O Golpe na perspectiva de Gênero Linda Rubim, Fernanda Argolo (Organizadoras) edufba salvador, 2018 o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 3 23/02/2018 14:42:40 2018, autores. Direitos para esta edição cedidos à EDUFBA. Feito o depósito legal. Grafia atualizada conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil desde 2009. diagramação e arte final Marcella Felgueiras de Freitas Napoli / Maria Tarrafa revisão Hilário Mariano dos Santos Zeferino normalização Daiane Cruz de Azevedo Sistema de Biblioteca – SIBI /UFBA O Golpe na perspectiva de Gênero / Linda Rubim, Fernanda Argolo (Organizadoras). – Salvador: Edufba, 2018. 186 p. (Coleção Cult) ISBN: 978-85-232-1684-9 1. Mulheres na Política - Brasil. 2. Igualdade de Gênero. 3. Direitos das Mulheres - Brasil. I. Título. II. Rubim, Linda. III. Argolo, Fernanda. CDD– 305.420981 editora filiada à: edufba Rua Barão de Jeremoabo, s/n – Campus de Ondina, Salvador – Bahia cep 40170 115 tel/fax (71) 3283-6164 www.edufba.ufba.br [email protected] o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 4 23/02/2018 14:42:40 sumário 7 “Precisamos falar de Gênero” Linda Rubim e Fernanda Argolo 23 Dilma – uma mulher política Céli Regina Jardim Pinto 33 Incongruências e dubiedades, deslegitimação e legitimação: o golpe contra Dilma Rousseff Clara Araújo 51 Imaginário, mulher e poder no Brasil: reflexões acerca do impeachment de Dilma Rousseff Cláudia Leitão 65 O golpe e as perdas de direitos para as mulheres Eleonora Menicucci 75 Uma mulher foi deposta: sexismo, misoginia e violência política Flávia Biroli 85 Direitos reprodutivos, um dos campos de batalha do golpe Maíra Kubík Mano, Márcia Santos Macêdo o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 5 23/02/2018 14:42:40 105 A máquina misógina e o fator Dilma Rousseff na política brasileira Marcia Tiburi 117 Mulher, negra, favelada e parlamentar: resistir é pleonasmo Marielle Franco 127 O golpe de 2016 e a demonização de gênero Mary Garcia Castro 147 Golpe disfarçado de impeachment: uma articulação escusa contra as mulheres Nilma Lino Gomes 161 Sobre o golpe e as mulheres no poder Olívia Santana 177 Dilma: símbolo para a participação política feminina Vanessa Grazziotin o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 6 23/02/2018 14:42:40 “Precisamos falar de Gênero”1 Linda Rubim* Fernanda Argolo** * Doutora em Comunicação e Introdução Cultura (UFRJ). Professora dos Programas de Pós-Graduação “Venho para abrir portas para que muitas outras Pós-Cultura e PPGNEIM/UFBA. mulheres, também possam, no futuro, ser presi- Membro fundador do CULT/ UFBA, onde coordena o grupo denta; e para que – no dia de hoje – todas as brasilei- de pesquisa Miradas. ras sintam o orgulho e a alegria de ser mulher”. O texto acima é parte do discurso de posse da ** Jornalista, Mestre em Cultura presidenta Dilma Rousseff, em 1º de janeiro de 2011, e Sociedade. Pesquisadora do Centro de Estudos durante a celebração da chegada de uma mulher à Multidisciplinares em Cultura presidência da República do Brasil, inaugurando o (CULT-UFBA), vinculada ao que se pensava que seria uma nova página da histó- grupo de pesquisa Miradas. ria cultural e política de um país, que, pela primeira vez, havia escolhido ser liderado por uma mulher. o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 7 23/02/2018 14:42:40 É inevitável que tal fato nos leve à revisitar diversos momentos da história das mulheres, nos quais o investimento desse gênero na con- quista de sua cidadania tem como uma das suas mais importantes con- quistas públicas, o direito político de votar e ser votada, ainda em um tempo em que as mulheres estavam cerceadas por inimagináveis obs- táculos. A conquista e consciência desse direito, também no Brasil, foi alvo de um processo longo e intenso, através de manifestações diver- sas, incluso campanhas em periódicos, que já eram produzidos por este gênero à época, como o jornal feminista “Voz Feminina”, fundado em Diamantina, Minas Gerais, por três jovens mulheres em 1900 com o explícito objetivo da defesa dos direitos das mulheres. (RUBIM, 1984) Um exemplo que pode ilustrar o envolvimento desse periódico na cam- panha pelo voto feminino é o artigo de Clélia Nícia Corrêa Rabello pu- blicado no número 18 do “Voz Feminina” em 16 de abril de 1901. E por que não havia de ter este direito? Não somos também, como é o homem, parte componente da sociedade? Não estamos sob o jugo da lei e não temos inteli- gência, lucidez, vontade livre? Para que o governo seja democrático, é necessário que todos que estejam sob seu domínio possam também agir sobre ele. Ou então tudo é absolutismo. Para haver liberdade de um povo é evidentemente necessário que seja o seu governo criado pelo sufrágio de todo ele. Mas se apenas uma metade pode agir livremente, a outra agirá automaticamente: só a primeira é livre, a segun- da escrava. São dois povos em um mesmo país, um livre e independente que confor- me sua vontade reina sobre o segundo: os homens são os soberanos: a mulher con- tinua a ser a súdita. (RABELLO, 1901 apud ALVES, 1980, p. 94) Esta, e diversas outras vozes de mulheres, de variados lugares de fala foram bastante atuantes na luta pelo voto feminino, até que finalmente em 1932, este direito foi garantido. Se por um lado tal conhecimento traduz o amadurecimento das lutas feministas e consequentemente o empoderamento das mulheres, com as conquistas dos seus pleitos, por outro é estigmatizado, e não raramente, apresentado através de 8 linda rubim, fernanda argolo o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 8 23/02/2018 14:42:40 narrativas pouco expressivas que escondem a força cultural e a impor- tância desse momento. A respeito disso, já nos anos de 1980, Branca Moreira Alves, na sua tese de doutorado sobre o assunto observa que, a historiografia brasileira, se e quando se refere ao decreto de 1932 ou a constitui- ção de 1934, concedendo o sufrágio feminino, geralmente silencia sobre o movi- mento, deixando crer que as mulheres se tornaram eleitoras por uma dádiva gene- rosa e espontânea, sem que tivessem lutado ou demonstrado qualquer interesse por esse direito. (ALVES, 1980, p. 13) A conquista do direito ao voto pelas mulheres brasileiras, no sentido de acontecimento, dado de realidade, é um fato irrefutável. No entanto, o olhar atento da pesquisadora sinaliza que os registros desse fato são narrativas dispersas e excludentes que invisibilizam o processo das lu- tas sufragistas e, de certo modo, os sujeitos que protagonizaram aquelas lutas. Essa atitude, entretanto, não é mero silêncio, em verdade é um “silenciamento”. Atitude política, que determinadamente produz o apagamento a quem não se reconhece e legitima sujeito, com autono- mia para constituir a sua história. É uma percepção que nos parece corroborar com a da professora Céli Regina Pinto (2007, p. 16) quando problematiza a exclusão da mulher no texto da constituição brasileira de 1891. Também para a referida profes- sora não acontece “como mero esquecimento”. A mulher não foi citada, é uma ausência na carta magna do país, porque ela simplesmente não existia, para os constituintes, como indivíduo dotado de direitos. Uma falta que rebate diretamente nas narrativas sobre as lutas das mulheres. Em consequência, a história desse gênero torna-se uma fragmentada e dolorosa saga, tecida por avanços e recuos. Assim sendo, retornamos a Branca Moreira Alves (1980, p. 14) quan- do diz: tratando-se da história da mulher, esse é um tema que não se esgota, num momen- to histórico definido, já que a condição de opressão contém um elemento de conti- precisamos falar de gênero 9 o_golpe_na_perspectiva_de_gênero.indd 9 23/02/2018 14:42:40 nuidade que permite criar uma ligação entre as gerações que se sucedem no inte- rior de um mesmo sistema de poder. Uma citação que nos ajuda a perceber o quão frágeis são os tecidos de uma cultura, no que diz respeito ao direito à cidadania das mulheres. Uma cultura que não tem pudor de cultivar quaisquer atos arbitrários e conservadores em favor da dominação masculina. Questões de gênero no impeachment de 2016 Oitenta e quatro anos se passaram desde a conquista do direi- to ao voto pela mulher no Brasil até a deposição da presidenta Dilma Rousseff. Optamos por fazer essa evocação de tempo, quase um século, para enfatizar o quão conturbada é a construção da história deste gê- nero, representada por avanços e retrocessos, solapada particularmente no que se refere às lutas pela constituição da cidadania. Consonante com tal realidade, somos de opinião que a eleição da mulher Dilma Rousseff, com 55.752.483 votos dos brasileiros em 2010, representou uma mudança significativa para a história das mulheres e, particularmente para o perfil presidencial do país, até então, exclusiva- mente, dominado por homens.