Sexta-feira 28 Agosto 2009 www.ipsilon.pt

Quentin Tarantino, novo filme ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7087 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE DO PÚBLICO, EDIÇÃO Nº 7087 INTEGRANTE DA PARTE FAZ ESTE SUPLEMENTO

A obra-prima de um sacana

NICOLAS GUERIN/CORBIS NICOLAS Hayao Miyazaki John Landis Mário Zambujal Fiery Furnaces Festival de Atenas e Epidauros Wavves em Dezembro

por todos os caminhos das harmonias vocais) em Micachu inesperados para criar canções descalabro “who cares?” de ética “d.i.y.” e alto teor adoptado directamente do trauteável. Segundo anuncia o punk (ou da adolescência). Os e Wavves MySpace da banda de Mica Levi Wavves cantam coisas (Micachu) - onde já está intemporais como os “No hope para a disponível “Kwesachu”, kids” que não têm carro, nem “mixtape” criada em parceria miúda, nem emprego, e, com o músico e artista -, depois de dois concertos rentrée os Micachu passam pelo Plano portugueses cancelados em B, no Porto, dia 20 de Maio, consequência de uma São boas notícias para a rentrée Novembro, descendo até passagem desastrosa pelo ou, se quisermos ser Lisboa, à Galeria Zé dos Bois, no festival Primavera Sound – verdadeiramente precisos, para dia seguinte. “Misturar ecstasy, Valium e a pré-época natalícia. Quatro Um mês depois, chegarão os Xanax antes de tocar em Flash concertos e duas bandas, Wavves de Nathan Williams, frente de milhares de pessoas Micachu & The Shapes e miúdo aborrecido com a vida na foi uma das piores decisões Wavves, daquelas que, para o Califórnia que transformou o que já tomei”, foram as bem ou para o mal, vale mesmo aborrecimento em matéria palavras imortais de Nathan a pena ver neste preciso inspiradora. “Wavves” e Williams à altura -, agora Sumário momento. “Wavvves”, os seus dois álbuns, será tempo de redenção. Primeiro chegarão os londrinos são uma colecção de canções de Segundo anunciado no blogue Quentin Tarantino 6 Micachu & The Shapes, autores gravação caseira, construídas de Williams, ghostramp. Grita “Eureka!” a propósito de um dos discos do ano, com guitarra, bateria e o blogspot.com, os Wavves do novo “Sacanas sem Lei” “Jewellery”, maravilha ocasional sintetizador, que actuarão em Portugal no contemporânea que leva a pop transformam a pop dia 19 de Dezembro, solar dos Beach em sala a Hayao Miyazaki 10 Micachu & The Shapes em Novembro Boys (cortesia anunciar. Desenhou um tsunami - à mão, com papel e lápis - em “Ponyo à Beira-Mar” Jimi Hendrix americano e o super-estrelato centrado no de ali atingido em Woodstock até à mesmo aparecer, vai ter um “biopic” morte, a sua pouco explicada tema ou por já não John Landis 12 morte num hotel de Londres em persona- haver lugar O senhor “Thriller” Desta vez parece que nem a meia- 1970, com compridos e álcool à gem. O nenhum Redford vem ao MoteLx irmã, Janie, vai impedir que a mistura. Depois dos planos risco de para visitar e Spielberg coisa avance (pelo menos até certo abortados em anos recentes Spielberg é que se disputam ponto): depois de vários projectos envolvendo músicos como Lenny que muitos assemelhe Mário Zambujal 16 Lincoln recusados pela entidade gestora Kravitz e Andre Benjamin dos espectadores remotamente “Making of” do novo do legado de Jimi Hendrix, Outkast, não houve ainda não queiram ao que romance, entre Benfica presidida por Janie, a Legendary comentários sobre o elenco. Sabe- ver duas fitas Visconti filmou. e Alcoutim Pictures vai avançar com um se apenas que Thomas Tull e Bill sobre Lincoln As autoridades de “biopic” sobre aquele que foi o Gerber seriam os produtores e que uma a seguir à Veneza estão a Seun Kuti 19 maior guitarrista “rock” de o argumento é de Max Borenstein. outra. E Redford, que planear construir uma Filho de Fela continua sempre (“” dixit). pretende James McAvoy para duna de 50 metros de largura Dados os exemplos do realizador o papel principal, tenciona ao longo de 80 metros de praia, as lutas do pai John Hillman e da Dragonslayer Spielberg e Redford filmar já neste Outono, muito com vista a proteger uma área Films, em 2006 (não conseguiram preparam filmes antes de Spielberg começar classificada como reserva natural. Fiery Furnaces 20 direitos da música), a ideia é sequer a trabalhar no seu Se o projecto for avante, o local A banda mais surpreendente inverter o processo: arrancar com sobre Lincoln projecto, que deverá basear-se ficará irreconhecível, afirma o da pop contemporânea edita o filme primeiro e conseguir num argumento de James Comité Alberoni, criado para fazer autorização depois. A chegar aos Steven Spielberg está a planear Solomon. campanha contra o um álbum convencional cinemas, segundo a “Variety”, o fazer um “biopic” de Abraham empreendimento. E Stefano Bartoli, filme deve retratar a vida do Lincoln, e até já escolheu o actual proprietário dos Banhos músico desde a sua passagem pelo actor para interpretar o mais Duna artificial Alberoni, fundados no início do Ficha Técnica exército norte- idolatrado dos presidentes ameaça cenário de século XX, garante que estes terão americanos: Liam Neeson. O de encerrar, caso a duna venha ser Director José Manuel Fernandes sucesso parecia garantido, mas “Morte em Veneza” construída. Editor Vasco Câmara, agora surgiu um obstáculo. Inês Nadais (adjunta) Segundo garante o jornal Numa das cenas mais pungentes de Conselho editorial Isabel “Hollywood Reporter”, Robert “Morte em Veneza”, de Visconti, o Coutinho, Óscar Faria, Cristina Redford também se lembrou de envelhecido Gustav Aschenbach Fernandes, Vítor Belanciano Lincoln e está a preparar um (Dirk Bogarde) deleita-se, uma vez Design Mark Porter, Simon filme focado em Mary Surratt, mais, a observar o deslumbrante Esterson, Kuchar Swara uma taberneira acusada de ter Tadjio (Bjorn Andersen) a brincar Directora de arte Sónia Matos fornecido a John Wilkes Booth a na praia. Há um momento em que o Designers Ana Carvalho, arma com que este assassinou o adolescente loiro aponta Carla Noronha, Mariana Soares presidente. enigmaticamente para o mar e, ao Editor de fotografia Não seria a primeira vez, em mesmo tempo, Aschenbach tomba Miguel Madeira Hollywood, que um previsível para diante, fulminado por um E-mail: [email protected] êxito de bilheteira redundaria ataque cardíaco. A cena foi rodada A praia onde Visconti rodou em fracasso por alguém se ter no Lido, mais precisamente nos o filme vai ficar irreconhecível antecipado com um filme Bagni Alberoni, que o filme baseado na novela de Thomas Mann transformou num dos locais mais Só falta a autorização da irmã para Jimi visitados pelos turistas. Hendrix ter uma segunda vida no cinema Mas estes poderão em breve deixar

2 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon

Alain de Botton passa uma semana no aeroporto

mulher para aquelas que Todo o Miles por 258 euros O aeroporto londrino de Heathrow convidou um ambos sabiam ser as suas Columbia Records escritor para ali residir últimas férias. Ela estava edita (o seu) Miles durante uma semana. Deu- doente com um cancro no lhe a acesso a tudo e total cérebro. A mulher já Davis completo liberdade na sua escrita, na viajava de cadeira de rodas e com aparelhos Este é ainda o mês em que se esperança de que ele se assinala o cinquentenário da edição inspire na azáfama do dia- para a ajudar a de “Kind of Blue”, o álbum gravado a-dia de um dos aeroportos respirar. Tinha 49 pela Columbia Records e lançado mais movimentados do anos, era no dia 17 de Agosto de 1959 que com mundo. A tarefa cabe a perfeitamente o tempo se tornou na mais vendida saudável até que gravação em estúdio da história do Alain de Botton, o escritor jazz, para além de ser considerado e filósofo suíço que em em Abril passado um dos melhores discos da história Portugal tem a sua obra lhe apareceram da música. Mas este vai ser também editada na Dom Quixote. umas estranhas o ano em que a etiqueta americana “Sempre considerei os dores de cabeça. marca a celebração da arte de Miles O livro que Davis (1926-1991) com a edição de aeroportos fascinantes. Se uma caixa monumental – pela quiséssemos levar um Alain de Botton extensão, mas principalmente pelo marciano a um local que escrever a conteúdo –, que incluirá todo o representasse tudo o que partir das Miles gravado na Columbia, entre há de especial e de impressões da os discos “Round Midnight” (1955) e sua vivência no “Filles de Kilimanjaro” (1968). particular na sociedade A caixa, intitulada “The Complete moderna com os seus altos aeroporto será Album Collection”/Columbia e baixos, escolheríamos distribuído Legacy, conterá 70 CDs com todas sem dúvida nenhuma um gratuitamente no as gravações conhecidas e inéditas aeroporto”, disse o escritor dia 21 de Setembro a do genial compositor e trompetista 10 mil dos passageiros (entre as últimas, estará o concerto à AFP. Para o autor de “A de Miles no Festival da Ilha de Wight Arte de Viajar”, os que passem por em 1970). Mas a “pièce de aeroportos encarnam todos Heathrow. Já tem résistance” será um DVD também os grandes temas de hoje: o título, deverá absolutamente inédito, “Live in poder da tecnologia, a chamar-se “A Europe’67”. E haverá ainda, como Week At The bónus, um livro de 250 páginas... globalização, o debate Toda esta informação é avançada sobre o meio ambiente, o Airport: A pelo “site” de música frenesi dos locais de Heathrow Media, que anuncia o lançamento trabalho modernos e o Diary” e será para 10 de Novembro, sonho da viagem. publicado pela especificando que a caixa só poderá Profile books. ser adquirida via Amazon. Custa Alain de Botton tem agora tudo 369,98 dólares (pouco mais de uma secretária Só mais tarde 258 euros), o que Tom Breihan, estrategicamente colocada chegará às autor da notícia, considera “uma no hall do moderno livrarias. pechincha”. E é! E será também, terminal 5 de Heathrow, Isabel certamente, uma edição para fazer Coutinho história, como a de “Kind of Blue”. que abriu no ano passado e foi concebido pelo arquitecto britânico Richard Rogers. Levou consigo o portátil e as pessoas que por ali passam diariamente vêem o que ele O aeroporto é a melhor síntese está a escrever no seu da vida moderna, diz o autor computador através de de “A Arte de Viajar”: a sua semana no terminal 5 de Heathrow vai dar um livro uma tela gigante colocada atrás dele. Ao jornal “The Sunday Times” já contou algumas histórias. Talvez a mais impressionante seja a de um homem que partia para o Bali com a sua

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 3 “Sacanas sem Lei” era o filme que Tarantino nunca ia fazer, e afinal fez. Estava previsto que tivesse o tamanho d caçadores de nazis, em missão na França ocupada durante a Segunda Guerra Mundial), mas acabou p declara a sua inabalável fé no cinema como instrumento de t O “eureka” de Quentin Tarantino

Era uma vez na França ocupada tatuagem traçada a faca na testa Aldo concretiza a sua “obra-pri- rantino, o homem que criou Aldo dres – mas isso é novidade para al- por Hitler... dos nazis caçados: uma cruz suás- ma”. É ele que o diz: “Acho que es- (interpretado por Brad Pitt) e todas guém? Aldo Raine, “hillbilly” das mon- tica para que eles, se sobreviverem, ta é a minha obra-prima”, depois as personagens de “Sacanas sem “Na verdade, só posso pensar tanhas do Tennessee, é um ameri- não possam esconder a vergonha. de uma cruz suástica ser rasgada Lei”. Por isso é natural querer sa- que tenho de competir comigo pró- cano com uma missão: caçar nazis. Aldo não está sozinho nisto: co- na testa de um “caçador de judeus” ber do sacana-mor se com esse pe- prio. Não consigo ainda classificar Também conhecido como “O Apa- manda um grupo de abnegados por uma faca que parece cortar daço de diálogo no seu filme ele ‘Sacanas sem Lei’. Preciso de uns che”, a alcunha indica-nos algo da vingadores, americanos de origem queijo. quer afirmar que escreveu e reali- três anos antes de dizer em que lu- sua especialidade: mais do que o judaica, e o seu plano cruza-se com “Acho que esta é a minha obra- zou, também, a sua obra-prima. gar é que fica na minha lista. Adoro taco de basebol que estoira as ca- o de ingleses, alemães arrependi- prima”... Notamos em Aldo Raine “Adoro a competição”, diz aos todos os meus filmes” – e isso, tam- beças, é o escalpe (coisa que tam- dos e alemães que estão contra Hi- uma teatralidade e uma bazófia jornalistas num encontro com a bém é novidade para alguém? bém não faz bem à cabeça). E uma tler. E vai chegar a altura em que que reconhecemos em Quentin Ta- imprensa internacional em Lon- “Se as pessoas perguntam qual u o e

euahmngmau ugnr ocnm eaço( itra mguod igdrsjdu, deumahomenagem aumsubgénero docinemadeacção devingadores (ahistória:umgrupo judeus, transformação domundo. por terotamanhodeumaobra-prima. Mais:otamanhodaobra-prima emqueTarantino Vasco Câmara, Londres em

Capa

VALERY HACHE/ AFP é o meu favorito, eu deveria dizer: quanto mais suave é a seda, mais bru- Do género: vamos deixar-nos de fitas E vamos perceber, finalmente, co- vimento descendente, é brutal... ‘Cães Danados’ [1992]. Pareceria sa- tal vai ser o momento da explosão. e pôr esta gente a falar em inglês, se mo é que o argumentista e o cineasta Teremos depois de concordar que crilégio não o fazer, foi o filme que É assim também a sequência de não vai ser uma confusão com as le- estão em sintonia para cada um trans- este virtuosismo é o menos narcisista mudou a minha vida e a incrível exci- abertura de “Sacanas sem Lei”: pai- gendas, até porque o público ameri- cender o outro. Vamos perceber, e do cinema de Tarantino. Porque o tação que tive ao fazê-lo não pode ser sagem que podia ser o Oeste dos fil- cano não está habituado a legendas. garantimos que existirá euforia nessa malabarismo com as palavras é a pró- igualada. Mas, por estranho que isso mes de Michael Cimino – “As Portas Um pouco mais à frente, a concluir descoberta, o que é “mise-en-scène” pria matéria de um filme onde só se possa parecer, agora o meu filme fa- do Céu” – mas já tintado a “spaghetti”, este duelo de sedução, aproximação e como é isso que “escreve” um filme: salva quem é suficientemente teatral vorito é ‘Kill Bill I e II’ [2004]. Revi-o só que é a França ocupada. Era uma e ataque em cenário de pastoral, per- quando a câmara finalmente se move, e suficientemente poliglota – se ao noutro dia, e fiquei espantado: deve vez uma cabana, um camponês fran- cebemos porque é que Landa (outra nessa cabana francesa do I Capítulo, menos os judeus escondidos naquela ser o meu melhor filme!”. cês e as suas filhas e um carro alemão figura do teatro, da manipulação, do iluminando a razão da passagem do quinta francesa, nesse I Capítulo, sou- Ninguém escapa à sua própria na- que se aproxima. logro, como Aldo Raine – como, arris- francês para inglês, e desenha um mo- bessem falar inglês... tureza. Quentin é o mais feroz com- Vamos conhecer uma figura ines- camos, Tarantino...) mudou a conver- petidor de Tarantino, por isso há mais quecível, o coronel Hans Landa, um sa para inglês. Vai ser brutal e ainda recordes para bater... “Acho que o I caçador de judeus – não é insulto, ele estamos no Capítulo I (o filme há-de Capítulo de ‘Sacanas sem Lei’ fica já tem orgulho no que faz e, para cum- chegar ao V). como uma das melhores coisas que prir as suas tarefas, até é “capaz de Vamos perceber que Tarantino não escrevi... só é ultrapassada pela se- pensar como um judeu”. Landa quer tem medo nenhum de legendas, antes quência siciliana em ‘Amor à Queima- descobrir os únicos judeus da aldeia pelo contrário: “Sacanas sem Lei” es- Roupa’, o meu primeiro argumento que faltam deportar. Hans é poliglota tá cheio delas porque as várias línguas, [1993]. Acho que finalmente a igualei, e gosta de se ouvir falar. É personagem inglês, alemão, francês, italiano, são, ou mesmo ultrapassei, com esta se- tarantóide por excelência, com aque- neste falso filme de acção, uma série quência...”. le lado infantil e razoavelmente re- de máscaras com que as personagens gressivo do universo Tarantino, em- conquistam poder e uma série de más- Perdidos (e achados) bora o facto de ser europeu dê uma caras que, ao caírem, fazem as perso- na tradução componente aristocrática, culta e de- nagens perderem o poder e perde- Descansemos um pouco nesta subida cadente a essa narcisista compulsão rem-se – só se conversa em “Sacanas alpinista de Quentin e paremos para para lançar o fogo de artifício e apa- sem Lei”, eis a versão de Quentin de olhar para a “sequência siciliana” de nhar as canas com as suas próprias um filme de porrada. “Amor à Queima-Roupa”, filme de tiradas. Bebe leite, este nazi. E, cortês Tony Scott. Encontramos Christopher como é, começa por fazer as despesas Walken, em mafioso siciliano, a inter- da conversa em francês com o cam- “Acho que o I Capítulo rogar Dennis Hopper, polícia refor- ponês que – o nazi suspeita – esconde mado e pai de um Christian Slater que a família judaica. de ‘Sacanas sem Lei’ acabou, inadvertidamente, por dar Às tantas, Landa (o austríaco, e po- um golpe nos negócios de Walken. liglota, Christoph Waltz, prémio de fica já como uma das Este quer que Hopper lhe diga onde interpretação em Cannes – ver texto melhores coisas que pára Slater. A conversa começa envol- nestas páginas) propõe que a conver- ta em elegâncias de seda: as persona- sa passe para inglês. À primeira vê-se escrevi” gens de Tarantino gostam de falar, nisso uma manobra do argumentista gostam sobretudo de se ouvir falar. E Quentin para introduzir a convenção. Quentin Tarantino FRANCOIS DUHAMEL

“Acho que esta é a minha obra-prima”, diz Aldo Raine depois de rasgar mais uma cruz suástica na testa de um nazi, na obra-prima de Tarantino

6 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon Vamos na conversa FRANCOIS DUHAMEL deste nazi Se não tivesse encontrado Christoph Waltz, Tarantino não teria feito este filme: “Sacanas “Não podia avançar sem Lei”, diz o actor, devolveu-lhe uma vocação desbaratada em papéis secundários. se não tirasse este argumento da cabeça O preciosismo quase amoroso, o que estamos a fazer. Como em mim o suficiente a ponto (...). Era uma diríamos mesmo libidinoso, na vida real, dizemos uma de eu poder ler a história toda, do nazi Hans Landa com as coisa e fazemos outra. então não sei o que estou a fazer montanha que tinha palavras sabemos agora de Estamos sentados aqui, a ter no filme”. onde vem: do argumento de essa conversa incrivelmente de escalar antes de Tarantino, sim, mas para isso charmosa, e estamos todos a Do lado mau foi necessário Christoph Waltz pensar: ‘Como é que vou passar Waltz tem mesmo uma relação poder ver o horizonte – austríaco, 53 anos, pai de isto ao meu editor? Como é que com as palavras, os sotaques – o e as outras família, centenas de papéis na ele vai editar isso...’ enquanto chegar à ausência deles. Gosta de TV, participações secundárias perguntamos ao entrevistado: se ouvir e de se ver a encontrar montanhas à minha em filmes – para o interpretar. ‘Como foi trabalhar com Quentin palavras pela frente, gosta de Onde é que Quentin o foi Tarantino?’. É isso que torna exibir isso. Como uma dança frente. Tinha que desencantar? Esse é um dos interessante trabalhar sobre sensual. Mas suave, infantil – segredos da coisa: o “casting”. um argumento dele: tentar exactamente como o nazi Landa. escrever para tirar Preciso, certeiro, como o disparo encontrar as várias camadas, Mas a coisa torna-se explosiva, de um paciente atirador de os pormenores e o que temos de no encontro com os jornalistas isso do meu corpo” elite. (“O difícil, mesmo, é ser fazer; a ideia não é uniformizar em Londres, quando a relação de Quentin Tarantino contratado. Ele [Tarantino] tudo, pelo contrário, é separar “Sacanas sem Lei” com a História apenas contrata quem acha que tudo”. é interrogada. Pode-se brincar seja cem por cento certo para o O argumento, sublinha, com esse período da História? “Foi por causa dessa sequência que papel. Não interessa se somos o é a chave: “Quentin manda Faz sentido caricaturar Hitler? percebi que não podia deixar cair este Brad Pitt ou um desconhecido...”, todo o argumento às pessoas “Sacanas sem Lei”, propondo argumento. Podia até chegar à conclu- diz a experiência da alemã envolvidas no filme, o um “e se...?” para o final da II são que era coisa do passado, que se Diane Kruger). argumento nunca é um segredo, Guerra Mundial, incorre em calhar já não tinha a mesma pica de Tarantino já afirmou que não é como aqueles casos em revisionismo irresponsável? quando comecei a escrever a história, se não tivesse encontrado que nos dão uma página apenas “Tenho uma opinião particular há dez anos. Mas estava convencido Christoph Waltz, alguém que com o que a nossa personagem sobre esse assunto. Detesto esses que eram boas personagens. Eu tinha desliza sobre as palavras, as diz. Odeio isso, significa que não filmes que nos tentam fazer investido nelas, não queria deixá-las línguas e os sotaques como estão realmente interessados acreditar que estão a contar cair. Percebi também que não podia quem se encanta com a neve em nós. Pelo contrário, quero a verdade. Acho isso ridículo, avançar se não tirasse este argumento fofa, não teria feito o filme. saber do que é que o filme trata, embora não risível. É hipócrita da cabeça. Mesmo que escrevesse e Enorme elogio para este actor, qual a história. Se não confiam dizer: ‘Queremos mostrar aos não gostasse, era uma montanha que a quem saiu “a lotaria”, a quem jovens como Hitler foi como tinha de escalar antes de poder ver o Tarantino devolveu, palavras de pessoa’. Porque é que os jovens horizonte e as outras montanhas à mi- agradecimento do actor, a sua “Somos a segunda têm de saber como era Hitler na nha frente. Tinha que escrever para “vocação”. Para já, conta com vida real? Em que é que isso os tirar isso do meu corpo.” um prémio de interpretação ou terceira geração vai ajudar? É essa uma forma em Cannes e sinais de que uma de lidar com a questão de forma Operação cinema carreira, longa mas cuja rotina depois do maior responsável? Não. Essa é a forma “Sacanas sem Lei” faz figura de mito não permitia que se esperassem irresponsável. Os nazis eram na “vida e obra” de Quentin. Era o cumes, pode ser ainda palco de desastre da pessoas? Sabemos que sim. E argumento que ele nunca conseguiria acontecimentos. que fazemos com isso? Acho que acabar de escrever, jurava-se. “Foi em “A mudança mais drástica Humanidade e as pessoas querem sobretudo 1998 que tive a ideia para ‘Sacanas sem nos últimos meses é que não usamos isso para apaziguar as suas consciências: Lei’, e é preciso lembrar que teria sido tenho de ficar à espera da minha sentir que estão do lado bom. Isso o meu primeiro argumento original bagagem nos aeroportos”, dizer: somos todos é o lixo politicamente correcto”. depois de ‘Pulp Fiction’ [1994]. Estava, brinca Waltz, que quer manter Também é uma questão compreensivelmente, sob pressão: uma posição “razoavelmente bons, porque sabemos geracional, acrescenta: “Somos tinha sido atacado pelo oposto do ‘blo- céptica”. “As coisas estão a a segunda ou terceira geração queio do escritor’, não conseguia con- acontecer, estou a ter uma que eles eram maus. depois do maior desastre da ter as minhas ideias, escrevia, escre- exposição como nunca tive. Humanidade e usamos isso para via, escrevia... O resultado podia dar Não é ainda incontrolável, E o que é que isso dizer: somos todos bons, porque uma mini-série de sete ou 12 horas, vamos ver o que acontece nos nos ajuda? Nada. sabemos que eles eram maus. E nunca um filme”. próximos meses. Não ter já 25 o que é que isso nos ajuda? Nada. A história original tornou-se “gran- anos torna-se útil. A excitação é Mas vejam o que faz Mas vejam o que faz Quentin: de de mais”. Podia ser o romance que lisonjeira, mas vai desaparecer, rasga o politicamente correcto. Tarantino ainda não escreveu. Mas se e partiremos então daí. Estar ao Quentin” E ganhamos uma perspectiva as situações e personagens principais nível desta personagem vai ser diferente. O ‘e se....?’ do filme não se mantiveram, o regresso ao argu- difícil. Sei que só conseguirei Christoph Waltz é irrespondável, desencadeia mento em 2008 originou uma história influenciar o meu destino FRANCOIS DUHAMEL antes um processo em nós e isso “completamente diferente”. Aparece- de actor dizendo ‘não, implica-nos nesse desastre: ram, por exemplo, outras persona- obrigado’. Isso será sempre é uma forma de lidarmos gens. uma opção”. activamente com a questão em Já havia na versão original o grupo E essa coisa de os vez de nos colocarmos apenas dos “basterds”, com o álibi de uma argumentos de Tarantino em segurança, do lado bom. Rir homenagem a um subgénero do cine- serem geniais, de os é uma reacção de ma de acção, o de “homens em mis- diálogos serem sempre catarse. Por isso o são” – o mais referenciado era “Quel os melhores que alguma som é explosivo, Maledetto Treno Blindato” (1978), de vez vão parar às mãos dos liberta tensão. Enzo Castellari, de que Tarantino era actores... isso vê-se onde, está E nesta história a suposto fazer o “remake”. “Já tinha em quê, é o quê? “Os diálogos tensão é tão grande planeado que os ‘basterds’ seriam a são tão bons – a melhor que precisamos de resistência apache aos nazis”. coisa que alguma vez rir para aguentá-la Já havia até uma personagem femi- receberemos – porque até ao fim. Desculpem nina, judia, Shoshana (Melanie Lau- não estão de acordo mas fico apaixonado rent), que escapa a um massacre, num com aquilo que se com este assunto...”. plano que parece vir de “A Desapare- passa. Ou seja, Hans Landa, o nazi com jeito Inglês irrepreensível, o deste cida”, de Ford, e se torna proprietária nunca dizemos para as palavras que domina austríaco. V.C. de um cinema em Paris. toda a abertura do filme Mas não só os “sacanas” acabaram por ser personagens... secundárias,

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 7 Quentin contra o ecrã demoníaco “Sacanas sem Lei” é o filme em que Tarantino leva mais longe o seu habitual jogo de citações cinéfilas. Não é só efeito: esta história não poderia passar sem ele. Luís Miguel Oliveira

Como de costume, há piadas e Leni propaganda até ao fim, e filmes piscadelas de olho aos montes. Riefenstahl, AFP em muitos casos “engolidos” Nos nomes (o Aldo Raine de cineasta pelo próprio curso da História Isto é Brad Pitt alude obviamente a do regime (como um “Titanic” que era “kosher- Aldo Ray) e nas imagens, como suposto representar o destino porn”, diz Eli o plano, em fecho da primeira dos EUA e da Grã-Bretanha Roth, um dos sequência, que parece citar às mãos da Alemanha, e ficou “basterds”: “A Desaparecida” de Ford na prateleira porque em 1945 ao fazer (Tarantino na “Sight & Sound”: a “metáfora” já seria outra…). destes três “Mesmo que a mãe de John Ford Foi um regime construído e judeus os nunca tivesse encontrado o pai sustentado em grande parte seus de John Ford, julgo que teria pela imagem (e pela imagem “sacanas”, percebido por mim mesmo que de cinema), um regime que Tarantino aquela era uma boa maneira incorporou uma lógica de vingou o de filmar uma porta”, o que é cinema-espectáculo ou de Holocausto? pelo menos uma boa resposta). espectáculo pensado para o E outras, bem mais obscuras. cinema (o que é “O Triunfo da Mas “Sacanas sem Lei” mostra Vontade”?). Não é a primeira – talvez como nunca um vez que isto acontece, mas aqui Tarantino parece, em mais uma Este universo (...) ocasião, encontrar Godard: ou não se assemelha este universo em que um regime alternativo em que um regime que viveu pelo cinema que viveu pelo cinema morre pelo cinema a uma “correcção” morre pelo cinema da história do próprio cinema, espécie de fantasia teórica é uma “correcção” vindicativa? (O cinema que, como Godard abundantemente da história do próprio repete nas “Histoire(s) du Cinéma”, ficou manchado não só cinema - que ficou por não ter impedido Hitler, mas manchado não só por tê-lo servido). Por ser uma questão de como o “remake” do filme de Cas- por não ter impedido cinema, um dos “heróis” tem tellari se tornou definitivamente outra que ser… um crítico de cinema coisa. Em “The Inglorious Bastards”, Hitler, mas por (a personagem de Michael título americano de “Quel Maledetto Fassbender), especialista no Treno Blindato”, Quentin introduziu tê-lo servido cinema de Weimar (o cinema gralhas – “Inglourious Basterds” – pa- do “ecrã demoníaco” que foi ra deixar claro que a coisa era dele. de “Caligari a Hitler”, para Sem deixar, ao mesmo tempo, de pres- glosar numa mesma frase os tar afectuosa homenagem a Enzo, fil- célebres livros de Lotte Eisner e mando-o como figurante numa cena: Siegfried Kracauer) e com uma a sequência na sala de cinema. adoração por Pabst. Porquê A propósito... mais importante do Pabst? Talvez por ter sido um que tudo é que, entre a versão do ar- cineasta de mulheres e heroínas gumento de há dez anos e a versão (foi ele que imortalizou Louise actual, irrompeu entretanto o cine- Brooks na “Boceta de Pandora”), ma. como Tarantino cada vez mais E se...? E se os “basterds” (entre os um filme “sobre o cinema”. é (a Shosanna deste filme é quais estão Eli Roth e Til Schweiger), Louise Em “Sacanas sem Lei” isso uma prima da “Noiva” de “Kill mais o inglês Archibald Hicox (Micha- Brooks, uma é perfeitamente claro: esta Bill”), talvez por ser um nome el Fassbender), que antes de ser te- das heroínas espécie de “história alternativa” relativamente “menor” quando nente era crítico de cinema (com de Pabst, em do fim do III Reich é colocada comparado com outros vultos do monografia sobre Pabst e tudo), mais “A Boceta de como uma questão de cinema, cinema alemão deste período, uma diva do cinema alemão, Bridget Pandora” a resolver com o cinema e pelo talvez por, depois da guerra von Hammersmark (Diane Kruger, cinema. É a própria narrativa ter feito filmes sobre o fim de mais Hildegard Kneff que Marlene filme de Tarantino tinha tão que põe as coisas nesses Hitler e sobre a “conspiração Dietrich), e ainda a proprietária de evidentemente mostrado – a termos. O que torna isto ainda de Julho” (“Aconteceu a 20 uma sala de cinema (Shosanna, anjo que ponto o seu uso da citação mais estimulante, ainda mais de Julho”, que por cá saiu há vingador) juntassem esforços para ou da alusão cinéfila é muito profundo e labiríntico, é o facto pouco tempo em DVD). Talvez encurralar Hitler, Goebbels e os ou- mais do que um jogo para coca- de o III Reich ter vivido pelo ainda por ter colaborado tros numa sala de cinema? bichinhos: faz parte do filme, é cinema como provavelmente com Leni Riefenstahl num E se essa sala, em Paris, onde a pro- um elemento (“discursivo”), um nenhum outro regime viveu. Não daqueles “filmes de montanha” paganda do regime vai coroar uma instrumento (“performativo”), há de nada de particularmente (e Tarantino inclui toda uma nova estrela, Frederick Zoller (Daniel matéria tão real como um “irrealista” na premissa conversa sobre esse filme, “O Bruhl), exibindo o seu novo filme em adereço, um actor, um som. Não é narrativa central de “Sacanas Inferno Branco do Pitz Palu”) estreia de gala, “O Orgulho de uma um adorno, é uma condição para sem Lei”: o estado-maior nazi, já em que ela se popularizou nos Nação”, fosse o cenário para uma su- o sentido. em 1944, reunido para a estreia anos 20 como uma espécie de prema vingança, a Operação Kino Talvez “Kill Bill”, filme de um filme de propaganda. “action woman”. E porque talvez (em português, Operação Cinema), de “calígrafo” (e filme sem Os filmes de Riefenstahl sobre Pabst, Riefenstahl (mas também tornando-se a pira funerária do Na- “sentido”), tendesse para os comícios de Nuremberga Brigitte Helm ou Lillian Harvey, cional Socialismo? o palimpsesto, mas em (“O Triunfo da Vontade”) ou vedetas populares fugidas ao “Comecei a escrever e de repente “Deathproof” esta ligação sobre as olimpíadas de Berlim nazismo citadas no filme), etc, estava perante a cena entre Zoeller [o da alusão cinéfila a uma (“Olympia”), ou panfletos anti- ponham a questão do “destino” actor do regime] e Shosanna, e eles austeridade essencial já semitas como o “Judeu Suss” e das escolhas que se fazem face estão a falar sobre Max Linder, Cha- influi, com alguma clareza, (de Veit Harlan), são célebres ao “destino” – e isto também é plin e Pabst... e de repente, bum!, um no entendimento do filme exemplos de propaganda nazi. uma questão importante em filme sobre a Segunda Guerra Mundial – enquanto, precisamente, Mas os nazis fizeram cinema de “Sacanas sem Lei”. transforma-se numa carta de amor ao cinema. Uma das coisas que é sempre fabulosa nos filmes, quando podemos

8 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon realiza filmes de “horror porn”. falamos da carreira de um realizador”, Não é por variações de subgéneros conclui o sacana-mor com a sua más- Z, no entanto, que anda a cinefilia de cara de teoria de autor à europeia, “a “Sacanas sem Lei”. Nem por aí, nem filmografia é tudo. O nosso trabalho pelo “exploitation”, nem pelas artes cresce, muda de direcção, mas é algo FRANCOIS DUHAMEL marciais. É pela vertente mais euro- de reconhecível. Há qualidades que peia do ecléctico gosto de Tarantino. quero que os meus filmes tenham. Há É coisa mais canónica. Ouvimos mui- um adjectivo: exuberância. Quero que to falar em Pabst, sentimos muito a os meus filmes tenham exuberância “presença” de cineastas europeus que de narrativa, exuberância cinemato- filmaram na América, como Lubitsch gráfica. Quando isso começar a desa- e o seu jogo de máscaras chamado parecer, eu desapareço também. Não “Ser ou não Ser”, ou Fritz Lang. E por quero fazer filmes de velho. Esses fil- isso “Sacanas sem Lei” vibra com as mes poderiam ser uma reflexão inte- texturas das várias línguas europeias. ressante sobre quem eu seria aos 66 Até uma actriz alemã, Diane Kruger, anos, mas não quero isso. Nessa altu- que passou os últimos anos da sua vi- ra, paro de escrever filmes, e escrevo da a tentar livrar-se do sotaque alemão romances, críticas, ensaios. Nessa al- para ter carreira na América, teve de tura quero tornar-me um homem de convencer Tarantino que... era alemã. letras. Adoraria escrever um romance A ironia não escapou a Kruger. Que, agora, mas não posso, tenho de dar aqui, sim, parece actriz. E que figura tudo ao cinema. E depois vai acabar. numa das sequências “tour de force” E vou dar tudo à literatura”. Não ou- do filme e que pertencerá a uma an- vem Aldo Raine, faca na mão, serviço tologia do cinema do realizador: o acabado, “Acho que esta é a minha jogo no “bistrot”, uma daquelas se- obra-prima”? quências para as quais Tarantino ins- talou uma câmara, apenas uma, e O Ípsilon viajou a convite da Zon filmou “takes” de 10 a 12 minutos, 15 Lusomundo páginas de diálogo, com os actores a terem de estar todos “em Ver crítica de filmes nas cena” como no teatro. págs. 36 e segs. “Para mim, e quando ANNE-CHRISTINE POUJOULAT/ AFP ANNE-CHRISTINE POUJOULAT/

Tarantino com os seus actores, em Cannes, onde “Sacanas sem Lei” teve antestreia

EL tal, mas não vai evitar a questão... “Sim, um dos elementos mais in- trigantes que me fez querer escrever esta história foi a ideia de ‘vingança judaica’. Não sei que reacções o filme FRANCOIS DUHAM vai desencadear por causa disso. Um Shosanna, a dos aspectos sobre as personagens proprietária judias, os ‘sacanas’, é que eles são da sala de judeus americanos. Há uma mitolo- cinema onde gia nisso. Aldo Raine não é judeu, o Terceiro mas podemos imaginá-lo a falar com Reich acaba os sacanas: ‘a coisa é assim, meus, os com estrondo nazis vieram bater nos vossos ante- passados europeus, tios, tias e avós, e não havia nada que eles pudessem fazer a não ser aguentar. Mas vocês são os filhos americanos deles, têm o mais forte exército do mundo a apoiar-vos...’. E também há uma fi- losofia por trás da razão por que Aldo fazê-lo, é fazer duas coisas ao mesmo está a usar soldados judeus: o facto tempo. Sobre essa coisa de o cinema “De repente, bum!, de os soldados gentios americanos salvar o mundo, as pessoas podem terem o privilégio de ser soldados. dizer: ‘ah, que bela metáfora’. Mas não um filme sobre a Normalmente, os judeus têm o dever é metáfora nenhuma: é uma coisa prá- Segunda Guerra de ser soldados por estarem a lutar tica. É a película, o nitrato, que destrói uma guerra santa, sob pena de serem o Terceiro Reich. Devo dizer que em Mundial transforma- apagados da face da terra. Sei que toda a minha carreira de argumentis- pelo menos os machos judeus-ame- ta houve um ou dois momentos ‘eu- se numa carta de ricanos das últimas gerações vão ado- reka!’ em que encontrei uma coisa que rar isso. Não sou perito no que toca parece ter sido escrita ou dada por amor ao cinema (...). a gerações mais velhas, mas sei que Deus. Quando cheguei a esta ideia de É a película, o nitrato, os americanos judeus da minha ge- usar a película em nitrato como ex- ração, ou mesmo os mais novos, es- plosivo pensei: ‘Oh meu Deus, como que destrói o tão fartos das outras histórias sobre é que nunca ninguém pensou nisso!!!! o Holocausto, querem outra coisa”. Oh meu Deus, isto vai resultar!!!! Oh Terceiro Não sabemos se isso enforma pro- meu Deus!!!!’ Foi um desses momen- priamente uma mundivisão — o que tos ‘eureka’!”. Reich” quer que seja, é algo criado algures O cinema é o instrumento da vin- em Los Angeles, Manhattan Beach, gança, e assim termina o Terceiro Quentin a ver muitos filmes. Mas Eli Roth, Reich: à paulada, à facada e numa Tarantino que interpreta um dos “basterds” fornalha. e que é, ele próprio, realizador (foi ele que filmou “O Orgulho de uma Vingança judaica Nação”, o filme dentro do filme, A questão da vingança judaica é deli- regurgitação a partir do cinema cada. Não é uma proposta politica- de Samuel Fuller), sintetizou mente correcta. Quentin diz que, en- Lubitsch é um dos cineastas em Cannes: “Sacanas sem fim, podia argumentar que em todo europeus que “vemos” em Lei” é “kosher-porn”. Roth o cinema de acção há vingança, etc e “Sacanas sem Lei” saberá do que fala, porque

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 9 No mundo da animação, não há nin- filme mais recente, a busca de Ponyo guém acima do co-fundador da Pixar, provoca um desequilíbrio na Nature- John Lasseter. Mas quando se fala com za que desencadeia um gigantesco este homem ele diz que a sua maior tsunami. fonte de inspiração foi Hayao Miya- “É minha convicção pessoal que zaki, o desenhador japonês de anima- não podemos separar-nos da Nature- ção em 2D que insiste em usar ima- Miyazaki za”, afirma ele. “À medida que formos gens desenhadas à mão. continua a penetrando mais fundo dentro de “Ele é o maior animador vivo do acreditar na nós, acabaremos por alcançar o pon- mundo”, diz Lasseter sobre Miyazaki, animação com to do nosso regresso ao oceano. Es- que é indiscutivelmente o produtor imagens tamos ligados.” de cinema mais bem sucedido do Ja- desenhadas à Ele encontrou o dele neste filme - pão. O seu filme vencedor de um Ós- mão, com embora a água do mar, explique, seja car de 2001, “A Viagem de Chihiro”, papel e lápis, REUTERS MARIO ANZUONI/ a coisa mais difícil de animar. acerca de uma rapariga de dez anos como “Nunca quis fazer “Disse ao meu pessoal que dese- presa num mundo de espíritos, man- antigamente nhasse o oceano com vida, pois é um tém-se como o maior sucesso de bi- um filme para criar ser vivo e mostrar a forma ou movi- lheteira do país, e a Studio Ghibli, a mento da água e das ondas não chega. empresa que fundou nos arredores ansiedade. Não é o Eles desenharam o oceano com uma de Tóquio, transformou-se numa es- meu objectivo data de lixo, porque é assim que ele pécie de monumento (existe até um está hoje. Não estou a dizer se isso é museu muito popular que homena- quando faço cinema. bom ou mau, mas creio que o oceano geia o seu trabalho). neste filme está bastante mais limpo Enquanto Lasseter, na Pixar, se lan- Os japoneses não são do que o oceano verdadeiro.” em explosões emocionais. Quando çou para o futuro com a animação por A história da relação do Japão com um terramoto atingiu o Japão e houve computador em 3D, Miyazaki preser- bons em explosões o mar foi, diz, determinante para ima- uma casa que ficou destruída, o pro- vou a tradição da animação em 2D ginar “Ponyo à Beira-Mar”. “Ao longo prietário apareceu na reportagem do desenhada à mão. Agora que a Pixar emocionais” de muitos, muitos, muitos séculos, o noticiário com um sorriso na cara: faz parte da Disney, Lasseter usou a nível das águas subiu e causou erosão ‘Oh, a minha casa ficou simplesmente sua influência para conseguir que o se trata de histórias para crianças. da terra; noutros períodos, a água re- destruída. Tenho de viver assim.’ Eu estúdio distribuísse nos EUA o mais “Vivendo no Japão, vim natural- cuou e deixou a terra com uma forma gosto desta mentalidade japonesa: as recente filme de Miyazaki, “Ponyo à mente a conhecer os contos japone- diferente. Por isso, vamos esquecer o catástrofes naturais fazem parte da Beira-Mar”, adaptação livre de “A Pe- ses, mas também contos de todo o aquecimento global e todos os estados nossa vida e vivemos em consonância quena Sereia” de Hans Christian An- mundo, como ‘A Pequena Sereia’, que anormais da Natureza hoje, pois sem- com elas, em vez de nos opormos.” dersen sobre uma jovem peixinho é muito bom. Existe frequentemente pre houve constante interacção entre dourado que aspira a tornar-se huma- um tema comum sobre o mar, o oce- o Homem e a Natureza. O problema Pais e filhos na. ano. Isso como que sugeriu o tema é que os seres humanos têm um tem- Embora Miyazaki diga que a história Miyazaki, 68 anos, um senhor gri- principal para pano de fundo desta po de vida limitado, de menos de cem de Ponyo se destina a crianças de cin- salho e de aspecto tímido que usa uns história de Ponyo.” anos”. Fala mais baixo: “Olhe, eu nun- co anos, ela contém igualmente mui- óculos de armação grossa e sorri cons- A frágil relação entre os humanos ca quis fazer um filme para criar mais to para os adultos. A protagonista é tantemente durante as entrevistas, é e o meio ambiente é um tema recor- ansiedade ou receio de um contratem- uma rapariga, como em tantos filmes mais expressivo do que a maioria dos rente no trabalho de Miyazaki. Se an- po. Esse é o lado negativo da emoção, deste animador, mas “Ponyo à Beira- japoneses. Admite que adora as his- das por aí a brincar com a natureza, não é o meu objectivo quando faço Mar” é também acerca de um rapaz

tórias europeias, em especial quando Cinema é melhor que tenhas cuidado! No seu cinema. Os japoneses não são bons de cinco anos chamado Sosuke, que

O maior animador vivo do mundo foi à praia O novo filme de Hayao Miyazaki, “Ponyo à Beira-Mar”, é uma história para crianças de cinco anos, mas traz uma mensagem na garrafa: a histeria em relação ao aquecimento global é despropositada. Como qualquer japonês, Miyazaki aprendeu que as catástrofes naturais fazem parte da vida. Helen Barlow

10 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon vive na falésia junto a um farol e se decididamente a ressentir-se de que mas um avô pode. Já lho disse umas filme dele mas é suposto que isso se- sente sozinho, porque o pai está sem- o trabalho de criar a família lhes caiba três vezes.” ja segredo. Mamoru Oshi é outro dos pre fora, no mar. Quando Ponyo é só a elas. As coisas estão a mudar, es- meus amigos chegados e eu tão-pou- arrastada para terra pelas ondas, ele tão decididamente a mudar.” Contra o computador co vi os seus filmes nos últimos tem- torna-se seu amigo, embora ela em Na verdade, o homem que temos à Evidentemente que algumas coisas pos. Portanto, para falar com franque- breve seja puxada de novo para o oce- frente possui claramente um sentido nunca mudarão para o Miyazaki mais za, não vejo filmes, não vejo televisão ano pelo seu pai feiticeiro. Mas con- de humor de miúdo – ainda que sen- velho: o modo como faz animação, por e, em geral, não leio banda desenha- segue escapar e, antes de o fazer, des- do uma espécie de deus no Japão. exemplo. Nunca permitiu que mais de da. Agora que estou a ficar mais velho, peja a reserva de elixir mágico do pai Curiosamente, o seu dínamo de dez por cento da extensão do filme fos- quero ter a certeza de que não perco para as águas do mar, o que provoca “workaholic” não era forte na juven- sem produzidos em computador. tempo. Estou a tornar-me muito ego- um tsunami. De regresso a terra fir- tude. “Foi estranho. Eu era tipo rapa- “Utilizar o computador afecta len- ísta e faço coisas de que gosto. Andar me, ela transforma-se numa rapariga zinho fraco, mas quando cheguei aos tamente o nosso sistema cerebral”, a pé é uma maneira melhor de gastar bonita muito apreciadora de presun- 14 anos, de repente, ganhei algum vi- diz ele, “por isso, voltando ao desenho o meu tempo. Gosto verdadeiramen- to e com poderes especiais muito gor. Algo fez clique e passei a conse- a lápis, o animador tem oportunidade te do panorama e ao deslocar-me pos- úteis no salvamento da mãe de So- guir correr mais depressa.” O que é de pensar, de tentar obter o melhor so ver a vista mudar. Isso dá muito suke, que tinha ido visitar um lar de que o tornou fraco? “Nesse tempo, de si próprio. Eu sinto firmemente mais gosto do que o enquadramento idosos quando o tsunami atingiu a depois da Segunda Guerra Mundial, que, pelo desenho à mão, o trabalho fixo. Mas não faço ‘jogging’”, diz, aba- costa. foram dias difíceis. Havia escassez se torna mais simples e, ao simplificar fando o riso. É a história dele, também. Quando alimentar e o nível sanitário era baixo o trabalho real, levamos menos tem- Embora não tenha planos de se re- falámos com o filho de Miyazaki - Go- no Japão. Muitas crianças pequenas po. Em geral, fazemos um esforço pa- formar, Miyazaki está desejoso de ro, 42 anos - a propósito do filme que tinham pouca saúde.” ra dar mais pormenores ao barco e transmitir o que sabe a animadores realizou em 2006, “Tales from Earth- É compreensível, portanto, que não ao movimento; desta vez, fizemos mais novos. “Preciso de lhes dizer que sea”, pareceu uma pessoa mais séria durante a infância ele tivesse desen- um desenho simples do barco e dedi- parem de usar a Internet e o correio do que o pai e recordou como tinha volvido o gosto pelos livros e pelo de- cámos mais tempo aos movimentos.” electrónico, que voltem ao papel e ao sido duro crescer com um pai que es- senho. As suas personagens femininas Quando comparado com o seu filme lápis e utilizem os seus cinco sentidos tava a maior parte do tempo ausente. têm a ver com o facto de ter tido uma anterior, “O Castelo Andante”, “Ponyo para desenhar. Tenho o projecto de É um bocadinho como no filme quan- mãe forte, mas Miyazaki colhe inspi- à Beira-Mar” é mais simples, diz Miya- montar um estúdio inteiramente no- do o pai está fora, no barco. Será ração para os seus filmes a observar zaki. “Desde o princípio, o filme tinha vo, afastado da cidade muito populo- “Preciso de dizer Miyazaki o pai no barco? as crianças de hoje. “Quando se ob- a intenção de ter um cenário e um te- sa, barulhenta e movimentada de Tó- Ele solta um dos seus risinhos um serva com atenção crianças de três ma simples. Não estou a prometer que quio. E quero começar a ensinar uma [aos animadores mais pouco embaraçados e diz que não é anos, nota-se como vivem uma tre- continuarei a manter-me simples”, diz jovem equipa desde o princípio. Que- o único. “Muitas das pessoas com menda quantidade de experiências ele, fazendo uma pausa para efeito ro tornar isso um programa de forma- novos] que parem quem trabalhamos, como o meu pro- num curto espaço de tempo. Talvez dramático, “porque, no geral, gosto ção para novos animadores jovens.” dutor principal, Toshio Suzuki, e os agora eu já seja suficientemente idoso de alguma sofisticação; gosto de coisas Nem esse projecto nem “Ponyo à de usar a Internet e o seus amigos, são exactamente iguais para as admirar. Quando era mais no- com complexidade.” Beira-Mar” são ainda um testamento, a esse dedicado pai ‘workaholic’. Por vo, pensava sempre que as crianças Não está necessariamente a referir- mas a verdade é que Miyazaki se di- correio electrónico, isso, é um desafio que temos de pas- eram demasiado barulhentas. ‘Calem- se a John Lasseter e aos filmes 3D da vertiu claramente a desenhar as pes- que voltem ao papel sar à geração mais nova. O meu filho, se!’”, grita ele, rindo-se. Pixar: Miyazaki começa a trabalhar à soas de idade do lar de idosos, que por exemplo, já tem de conseguir fa- Hoje que é um avô orgulhoso (teve sete da manhã todos os dias e, no pou- rejuvenescem graças à magia do mar. e ao lápis e utilizem zer ambas as coisas: assumir a pater- o primeiro neto em Maio), ainda gos- co tempo de ócio que ainda concede “Sabe, sou um homem idoso, tam- nidade e dedicar-se ao seu trabalho. ta mais de crianças. “Disse ao meu a si próprio, dá passeios a pé, olhando bém! Um idoso principiante.” os seus cinco sentidos No Japão, muitos pais mais novos es- neto ‘segura no lápis’, e isso é algo constantemente à sua volta em busca tão realmente a assumir esse desafio que só um avô podia dizer. Penso que de inspiração. ”John Lasseter é um Ver crítica de filmes nas págs. 36 e se- para desenhar” dado que as mulheres japonesas estão um pai não podia dizê-lo aos filhos, dos meus melhores amigos; não vi o gs.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 11 John Landis, o homem que realizou o teledisco mais decisivo da história da indústria musical, vai estar em Lisboa mas não necessariamente para falar de “Thriller”. Vem ao MoteLx mostrar “Um Lobisomem Americano em Londres” em versão remasterizada. É um dos “mestres vivos” do festival que começa na quarta-feira. Luís Miguel Oliveira És capaz de me transformar num

“Um Lobisomem monstro? Americano em Londres” (1981) é o filme que traz John Landis por cá

O “mestre vivo” do MoteLx não se vê como um “cineasta de género”

12 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon Na obra de John Landis, os filmes mais conhecidos oscilam entre a comédia e o terror, frequentemente concilian- do os dois géneros. “Blues Brothers” e “Um Lobisomem Americano em Londres” (que o MoteLx vai exibir em versão remasterizada no dia 5) foram títulos importantes do cinema ame- ricano na viragem da década de 70 para a de 80. Mas Landis também foi o realizador por trás do mais célebre teledisco da história, o “Thriller” de Michael Jackson. Em conversa com o Ípsilon, Landis falou um pouco da sua obra, e explicou que “Thriller” come- çou quando Michael Jackson lhe per- guntou: “És capaz de me transformar num monstro?”. Vem a Lisboa no contexto de um festival de cinema de terror. Não é o género em que mais trabalhou, e “Um Lobisomem Americano em Londres” tem mesmo vários elementos de comédia. Qual é a sua relação com o género do “horror movie”? É verdade que não me vejo como um realizador de género, muito menos como um realizador do género de ter- A ideia principal Cinema ror. Mas é um género que aprecio. E de Michael Jackson, diz Landis, na verdade o meu primeiro filme era aparecer feito monstro [“Schlock”, de 1973] foi um filme de terror. Claro, com elementos paródi- cos, em parte comparáveis com o que fiz no “Lobisomem”. Fundamental- mente, encaro o terror como outro género qualquer. Também gosto de “westerns”, gostava de um dia fazer um “western”… Também tratou os vampiros em “Innocent Blood” [1992], e dirigiu um episódio da versão para cinema de “Twilight Zone” [1984]. Que talvez seja a coisa mais séria e mais severa que já fez [conta a história de um indivíduo racista sucessivamente castigado por todos os alvos do seu preconceito]. FHE=H7C7wÁE (.7=EIJEW''E É possível. O filme era uma homena- KJK8HEÉ&/ gem a Rod Serling [criador da série de TV homónima], e portanto querí- amos que cada episódio fosse abso- lutamente fiel ao seu espírito. Nos episódios da série havia frequente- mente um tom grave, e o “fantástico” H:I9>6'=:GB6C?DHw era uma maneira de exprimir um sen- 9>6.8:7DA6BDA9>6&+6C67G>ID:8JC=6 tido político ou filosófico. Foi esse 9>6'(;:GC6C9DB:C9:H9>6(%DH=DB:CH96AJI6 espírito que quis reproduzir, sem in- 66'.9:DA>C96 DJI9>6,E:9GDID8=6H terferências paródicas. É uma obser- H:I9>6*IG>D@J=CK>IDJH=JB6>G vação do preconceito, com uma con- clusão implacável. 9>6&'B6;6A96K:><69>6&.E:9GD67GJC=DH6 Por outro lado, e falou-se muito 9>6'+E6JAD6(GJ>K:ADHD sequência da morte de Michael 9>6&&C>AIDCA>H7DC;>ABDG8=:HIG6 Jackson, uma das suas mais 8DG:D66A:M6C9G6I>C>I6 96Cv6G>CDH célebres incursões no terror K:C=696Cv6G:6EG:C9:G foi o teledisco de “Thriller”. H:I9>6(B:G:C6&%I6C6&,9>H8D9>6')H6AH6 aconteceram? O Michael Jackson tinha visto “Um 66(%âE:G6K>K6 DJI9>6&8=6"8=6"8=69>6-B:G:C6+A>H7DC;>ABDG8=:HIG6 dres”, e tinha gostado muito. Ti- 9>6'%A>H7DC;>ABDG8=:HIG69>6',7:A86CIDA6I>CD nha ficado especialmente fasci- DJI9>6)86H68AÛHH>86EDGIJ6'-6CIâC>DO6B7J?D nisso, é estranho, já naquela al- H:I9>6)E:9GDBDJI>C=D tura… [pausa]. Mas então veio 9>6&&6C6BDJG69>6&-86GB>C=D ter comigo e perguntou-me: “És E6G696IJB76A6BåH>866DK>KD:MEDH>vÁ:H 9>6'*?DG<:;:GC6C9DIG>D capaz de me transformar num E>CIJG6H9:I:A6H6C>B6vÀD9:GJ668I>K>969:H>C;6CI>H monstro?”. A ideia principal DJI9>6'8G>HI>C67G6C8D dele era esta, queria aparecer feito monstro. E então pus-me a trabalhar com Rick Baker [que tam- bém criara os efeitos de maquilhagem do “Lobisomem”] e durante semanas fomos a casa dele com estudos e más- caras que o transformassem em monstro… Foi muito estranho, por- que ainda por cima ele neste altura vivia em casa dos pais [risos]… A ideia de fugir ao conceito

ALESSANDRA BENEDETTI típico do teledisco ilustrativo também foi dele? Ele achou óptima ideia e encorajou-

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 13 “O Michael Jackson tinha visto ‘Um Lobisomem Americano em Londres’. A metamorfose era uma coisa que o obcecava. Pensando nisso, é estranho, já naquela altura…” “Pontypool”, de Bruce me, mas creio que isso partiu de McDonald mim. Quando aceitei a tarefa havia uma coisa de que tinha a certeza: não queria fazer um “rock vídeo” no gé- nero dos que se viam na altura. Não me interessava, pura e simplesmente. Desde o princípio que trabalhei no teledisco como se estivesse a fazer uma curta-metragem para ser exibida em salas de cinema. Mais tarde voltou a dirigir um Cinco dias para meter teledisco de Michael Jackson [“Black and White”, nos anos 90], onde a metamorfose, por medo ao susto via do “morphing”, voltava a ser importante… Breve viagem à programação da terceira edição da mostra Mas aí a história foi diferente. O Mi- de cinema de terror de Lisboa. Jorge Mourinha chael estava a trabalhar com outro realizador, mas verificavam-se imen- Chegado ao terceiro ano Tom Shankland, a prolongar o sos problemas. Entre ele e os realiza- consecutivo, o MoteLx aposta em “survivor” de “O Lago Perfeito” dores, porque ao todo houve quatro, mostrar ao público português (domingo, 19h00, sala 1). Há mas também com a equipa, a produ- um concentrado de muita da também tempo para descobrir ção, a companhia discográfica… Nun- produção corrente do cinema de o que se anda a fazer na Europa ca percebi exactamente o que se pas- terror que ou não chega cá, ou continental e no Extremo Oriente “Not Quite Hollywood”, onde “Mum & Dad”, sou, acho que correspondeu a um chega com atraso (basta recordar (com enviados da Indonésia, Mark Hartley se debruça sobre de Steven período errático do Michael. Mas foi que a abertura da edição 2008, Tailândia e Japão, entre os quais o cinema de género filmado na Sheil por isso que alguém, sabendo que eu o delirante “Juízo Final” de Neil um dos mais recentes delírios de Austrália (sexta 4, 22h00, sala 3). tinha ficado com uma ligação de ami- Marshall, apenas há poucas mestre Takashi Miike, “Detective Sem esquecer, claro, a presença zade com o Michael, me convidou semanas chegou às salas), ou Story”, quinta, 3, 15h30, sala 3). do veterano John Landis, que para pegar no projecto. Lembro-me sai directo para DVD. Os cinco Uma das coisas mais trará a “versão restaurada” de que a maneira como mo pediram foi dias da edição 2009, que arranca agradáveis do MoteLx tem sido “Um Lobisomem Americano em mesmo assim: “Podes ajudar-nos?”. quarta à noite e se prolonga a sua vontade de “explicar aos Londres” (sábado 5, 21h45, sala Aceitei, mas apenas com esse espírito. até domingo (6), vão mostrar incautos” um pouco da história 1). Não olho para o teledisco de “Black no cinema São Jorge 28 longas do género — é para isso que serve E é para isso também que and White” como uma coisa minha. produzidas entre 2007 e 2009, a curta retrospectiva dedicada serve o olhar para alguns das quais apenas seis estão ao americano Stuart Gordon, esforços pouco vistos do Contra o disco adquiridas para o nosso país autor das seminais adaptações cinema fantástico em Portugal: O seu filme mais famoso talvez (todas, com uma única excepção, de Lovecraft “Re-Animator” a fantasia de 1929 de Jorge seja “Blues Brothers” [1980]. pela mesma distribuidora...), com (sexta 4, 21h45, sala 1) e “From Brum do Canto “A Dança dos Alguma vez sonhou que se ia um pé em cada uma das grandes Beyond” (sábado 5, 17h30, sala Paroxismos” (exibida com uma tornar um objecto de culto de tendências do cinema de terror 3), dois dos grandes filmes de nova banda-sonora ao vivo tamanhas proporções? contemporâneo. culto do fantástico dos anos por Legendary Tiger Man e Nunca. Fiquei totalmente espantado Assim, temos a renovação dos 1980. É para isso também que Rita Redshoes quinta 3, 21h45, com o sucesso do filme. Não com o filmes de zombie, a que George A. serve a secção documental sala 1), a curta de 1975 de Sinde sucesso que teve na altura, mas com Romero (que vai apresentar em que, este ano, mostra “Viva la Filipe “O Leproso”, baseada em o sucesso que ainda tem hoje. Acho Veneza a mais recente iteração Muerte!” (sexta 4, 19h30, sala Miguel Torga, e “A Maldição do que estas coisas são decididas pelo do seu universo, “Survival of 3), um olhar do crítico francês Marialva”, adaptação da “Dama tempo, é a única medida válida do the Dead”) deu as suas cartas de Yves Montmayeur sobre o novo Pé de Cabra” por António de sucesso… alforria – nas vertentes paredes- cinema fantástico espanhol Macedo datada de 1990 que não Foi um filme importante, meias com a “exploitation” (curiosamente ausente da mostra viu exibição em sala (ambos no e alguns defendem que (“Deadgirl”, de Marcel deste ano, à excepção de “No-Do”, dia 6, 19h30, sala 3). “fundador”, para a comédia Sarmiento e Gadi Harel, sábado de Elio Quiroga – domingo 6, Há, para além de todas estas americana dos anos 80, e não 5, 19h00, sala 1), filme de autor 15h30, sala 3) e o muito aclamado longas, uma competição de apenas a cinematográfica… claustrofóbico (“Pontypool” curtas – doze internacionais Na verdade a ideia do filme surgiu-me de Bruce McDonald, sábado e nada menos de catorze um pouco por reacção. Em 1979 a mú- 5, 22h00, sala 3) e comédia O MOTELx tem tido portuguesas (entre as quais “X”, sica que estava a dar era o “disco”, e (“Wasting Away” de Matthew de Jorge Cramez, realizador de “O eu já estava enjoado de tanto “disco”. Kohnen; sábado 5, 00h15, sala 3). vontade de “explicar Capacete Dourado”), que serão Pensei então em fazer uma homena- Passamos por França, local de julgadas por António de Macedo, gem ao “rhythm and blues”. Na Uni- algumas das experiências mais aos incautos” um Yves Montmayeur e o realizador versal toda a gente torceu o nariz: radicais do moderno cinema Tiago Guedes, naquela que é “ninguém quer ouvir ‘rhythm and fantástico, com o muito polémico pouco da história a única secção competitiva do blues’, tens que fazer um filme com “Martyrs”, de Pascal Laugier, que do género MoteLx. Ao todo, cinco dias para música ‘disco’”. Dan Aykroyd e John gerou enorme controvérsia em meter medo ao susto. Belushi estavam então ligados a uma França (quinta, 3, 24h00, sala 1), sala de espectáculos onde se fazia e “Vinyan”, onde o belga Fabrice “stand up comedy”. Chamava-se Se- du Welz dirige Emmanuelle cond City, e havia a Second City de Béart e Rufus Sewell numa Toronto, onde estava Aykroyd, e a de mistura de “survival” e “Coração Chicago, onde estava Belushi. Tinham das Trevas” (sábado 5, 17h00, formado uma dupla, uma espécie de sala 1). Damos um salto a O MoteLx faz paródia revivalista do “rhythm and Inglaterra e à actual ebulição uma JEAN-PIERRE MULLER/ AFP JEAN-PIERRE blues”, e tinham alcançado alguma da sua produção local, com o retrospectiva celebridade pelas participações no humor negro de “Mum & Dad”, GETTY IMAGES CARR/ MATT de Stuart “Saturday Night Live”. Com a força e de Steven Sheil (sexta 4, 00h15, Gordon e o entusiasmo deles, consegui levar sala 3), e “The Children”, de mostra um dos para a frente a ideia do meu filme so- últimos bre “rhythm and blues”… Takashi Miike

14 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon ÖÖÖI7B7(ÖÖÖÖÖÖ

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16 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon Ao lado de uma placa que veio do jornal     “O Século”        silva!designers está um    (   computador:      ( o autor ainda     não atingiu  $    %      com ele a       2  relação que  ( (    tem com a   7     #             & esferográfica    &%          &( *    &        (       “Não há uma            %        % ( (  6$( buzina. Se um gajo       6    não escrever aqui  8   alguma coisa de      5  2  ( % ( jeito, é porque  #   2 5       3  4       as cadeiras. Há ainda uma cozinha e não nasceu para  1$ (           um quarto de hóspedes, “muito fre- "   !%      isso” '(            quentado no Verão”. Os cavalos con-   &    #           3 (           8   tinuam cá, agora em imagens pendu-       5         +   '  3   $  radas nas paredes. “Decidi pôr isto                  !%     Mário      $ aqui em homenagem aos donos da #  &      5     + Zambujal casa”, ri-se Zambujal enquanto olha      $       %    %          "% escreve a gravura do “Filho-da-puta”, um dos                     $ numa antiga cavalos de corrida mais importantes quando começo a entrar na zona do       )       &  cavalariça do século XIX, pintado por John Fre- sacrifício.”       5           de Alcoutim, derick Herring em 1815. “Vejam lá não Zambujal há-de guardar as maiores  (     (   com vista para me fotografem ao lado disto, ainda revelações sobre o seu sétimo livro   ' !% os últimos  as pessoas vão pensar que pode ser para a hora de almoço, em Alcoutim.  '(  (+  2 3 metros de a legenda da foto.” Antes, tempo de conhecer mais um        !%  5    Portugal Voltamo-nos para a mesa de traba- pouco da casa e do Marmeleiro, “um    '(   +   "! ( $   2  e os primeiros lho. “Aqui é onde vou tentando es- lugar onde os adolescentes têm 65  5     %   $ "   ( de Espanha crever alguma coisa.” Da janela que anos”. Do ponto mais alto da eira,    '   +     se abre diante de nós avistam-se os onde chegamos subindo 99 degraus     %   % +   últimos metros de Portugal e os pri- mandados construir monte acima, "       5     meiros de Espanha, ocupados pela Mário explica a organização familiar.      (     povoação de Sanlúcar de Guadiana. Aponta a casa da filha Isabel, publi- (   Sobre o tampo de madeira, ao lado citária e escritora de livros infantis. ' de uma placa com o nome do autor E a outra, mais rústica, onde fica com que veio do jornal “O Século”, onde a mulher e o filho Rui, outro que de- foi chefe-de-redacção, está um com- ve estrear-se nos livros em breve.      (   putador. Desconfiamos. Mário Zam- “O Rui recolheu uma data de infor- 6(      bujal escreve os seus livros no portá- mação muito científica e queria que til? “Nem pensar. Entre a mente e a eu escrevesse um livro a partir dali. mãozinha armada de caneta ou esfe- Mas não podia ser, a minha escrita e rográfica existe uma relação antiga o meu tom não servem aqueles pro- que não atingi com Sua Excelência, pósitos.” O filho viu o pai recusar-lhe o computador.” O aparelho é, então, o livro, a irmã (a quem recorreu) dar- o depósito posterior daquilo que nas- lhe outro não e ficou sem alternativa: ce entre o “papel branco e a tinta teve de avançar sozinho e “2009-

preta” que o autor não dispensa. 2049, 40 Anos de Montanha Russa” Livros Passou-se assim com as cerca de deve mesmo sair ainda antes do Na- 130 páginas de “Uma Noite Não São tal. “Gostava de fazer um “booktrai- www.ipsilon.pt Dias”, nova novela de Mário Zambu- ler” e começar com a frase ‘O livro jal que chega em Outubro pela edito- que Mário Zambujal não quis escre- ra Planeta. “A história foi em grande ver’”, brinca Rui. O pai está satisfeito parte imaginada e escrita aqui. Tra- mas avisa que ainda falta muito tra- balho mais durante o dia – três, qua- balho de revisão. “Estou sempre a tro horas, raramente mais do que dizer-lhe, como dizia aos mais novos isso. Escrevo por prazer, desligo nos jornais, para ter cuidado com os

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 17 “Quando vejo grandes romances com pouca intriga, penso que aquilo até daria uma boa noveleta. Eu escreveria uma noveleta, uma coisa curta, e não chateava as pessoas”

verbos ser, estar e ter. Eles apos- Sobre o livro, Dinis Machado escre- sam-se da nossa linguagem e de re- veu: “Se isto não é literatura, quem pente estamos sempre a utilizá- perde é a literatura.” A eterna discus- los.” são sobre méritos mais ou menos li- terários não tira o sono a Mário Zam- Lisboa em 2044 bujal. “Isso não me interessa nada. Deixamos o Marmeleiro rumo a Al- Na altura pareceu-me giro (é mesmo coutim com Mário a explicar que, esta a palavra que quero usar) contar “com este calor, o ideal é um tipo dei- a história assim, da maneira que está. tar-se tarde, levantar-se cedo e depois Podia ter encontrado uma forma dormir a sesta”. É assim que gere os mais literária de fazê-lo, mas não seus dias na parte do ano em que es- quis. Aquilo é uma banda-desenhada tá por aqui. A visita a Alcoutim é pra- por escrito.” ticamente diária, para comprar os Ainda hoje, que passa as noites de jornais e beber café. Desta vez o ar verão a apreciar o céu muito estrela- está quase irrespirável mas o autor do de Alcoutim, Mário não se leva sobe escadas e ruas ao mesmo tempo demasiado a sério como escritor. “Já que fuma e conversa – ninguém lhe o Laborinho Lúcio [antigo ministro adivinharia a idade. “Estive 13 anos da Justiça] dizia que ‘não se é político, sem fumar, desde que nasci até aos está-se político’. Eu também estou 13. Agora estou proibidíssimo pelo São Dias” antes desta entrevista e tu- Renato, seria o ultimo risco, a despe- escritor agora, outra vez. O ser car- meu médico, mas não resisto. Ele do o que Zambujal revela à mesa de dida, a apoteose, o gozo e a calmaria rega uma obrigação que não me agra- pergunta-me porquê e eu digo-lhe ‘Ó almoço são completas novidades. até ao fim da vida, vida boa, tudo de da.” Tanto é assim que existe um doutor, porque me dá um prazer do Uma das personagens da novela será tudo, que nem uns senhores”, lê-se intervalo de quase 20 anos entre “À caraças.’ Se não fumar um cigarro um historiador que estuda a primei- na página 20 de “Crónica dos Bons Noite Logo se Vê” (1986) e “Fora de depois de almoço, é como se não ti- ra década do século XXI, a nossa. O Malandros”. E podia ser o resumo do Mão” (2003) – foram os tempos em vesse almoçado.” que “dá muito jeito” ao autor, porque que aconteceu com o livro de estreia que Mário Zambujal fez e escreveu À nossa frente almoça este homem pode “pô-lo a falar e a fazer desco- do autor, feito meio a brincar em para a televisão. sorridente, com o apetite de quem bertas incríveis sobre o que está a 1980: deu certo. Da escola jornalística, que come- está de bem com a vida. Conta que acontecer hoje”. Há, portanto, um Estamos de regresso ao Marmelei- çou no jornal “A Bola”, ficou-lhe a “Uma Noite Não São Dias”, um livro investigador que olha o nosso pre- ro, para continuar a conversa debai- “necessidade de contar coisas sem que viaja até ao ano 2044, parte de sente com grande admiração e que xo do alpendre que serve as almoça- estacar na descrição marginal, de não uma certeza: “A de que tudo vai mu- constata coisas deste género: “Aque- radas com amigos. O alentejano de sair do tempo”. Os seus livros são dar menos os sentimentos, as paixões les gajos de 2000-2010 [...] andavam Moura, criado nas terras algarvias de curtos porque custa-lhe encher. humanas.” Depois de olhar para os todos vestidos de azul da cintura pa- Faro, conta que escreveu mais de 60 “Quando vejo grandes romances com anos 1950 no livro anterior, Zambujal ra baixo [alusão às calças de gan- por cento dessa primeira obra em 15 pouca intriga, penso que aquilo até tenta agora antever um futuro em ga].” dias de férias, na aldeia de Açoteias. daria uma boa noveleta. Eu escreve- que as mulheres dominam. “Saí do No livro de Zambujal há cada vez “Fiquei em casa a tomar um whisky ria uma noveleta, uma coisa curta, e meu tempo e pus-me a imaginar com menos pernas azuis e “cada vez mais com muitas pedras de gelo, não es- não chateava as pessoas.” Consegue base nas tendências. Na minha visão gajos que ganham a vida de robe e tava com grande vontade de praia. identificar – até em Gabriel García do futuro só há ministras, não há mi- pijama, trabalhando a partir de ca- Tinha sido muito instado a escrever, Márquez – um ritmo narrativo jorna- nistros. Existem secretários em vez sa”. É assim que Mário imagina a so- pelo Urbano Tavares Rodrigues [com lístico em autores que passaram pelas de secretárias e as mulheres jogam ciedade lisboeta daqui por 30 anos. quem trabalhou no “Diário de Lis- redacções para se transformarem em melhor futebol do que os homens. Mas vai já avisando que perderá o boa”] e outros companheiros. Quan- ficcionistas que “têm uma história Alguns homens têm mesmo medo de espectáculo, por falta de comparên- do comecei nem sequer sabia se o para contar e vão-se a ela”. Esse é o ajuntamentos de mulheres, especial- cia. Por agora, ainda é na capital que que estava a escrever era um livro – traço que ainda o liga aos jornalistas mente das operárias da construção se sente em casa. Porque é “um autor era uma coisa que eu queria contar actuais, que trabalham em redacções civil, que têm uma língua desbraga- citadino” e porque ainda há muita e pronto.” “sem a banda sonora que era o bater da.” coisa a amarrá-lo ao Tejo. “Gosto de Nada fazia prever o sucesso. A obra da máquina de escrever”. Mário, também presidente do Clu- estar por lá e tenho sempre coisas a teve “uma saída modesta nos primei- Mário Zambujal é de uma época be de Jornalistas, garante ter-se di- tratar. Quando ligo para o Marmelei- ros três meses” e Zambujal nem se- em que “as pessoas perguntavam vertido a escrever este livro, “uma ro digo-lhes: ‘Daqui o delegado da quer contava que a coisa ultrapassas- coisas umas às outras” mas vive num galhofa” que usa Lisboa como “cari- família em Lisboa. Como vão as coi- se o círculo de companheiros e ami- tempo em que “a gente pergunta tu- catura da evolução comunicativa”. sas?’” gos interessados, então composto do à Internet”. Por isso gosta deste No ano 2044, a odisseia do autor é por gente como Mário Castrim, Au- lugar onde os dias são grandes e as por uma cidade cheia de túneis e via- Contar e pronto gusto Abelaira, Francisco Mata, Luís horas torram devagar. A noite vem dutos. “A heroína da história é, aliás, Desconhece-se se haverá mais ma- de Sttau Monteiro, José Cardoso Pi- longe quando, com pena, deixamos a directora dos Túneis de Lisboa, os landros nas cidades do que no cam- res, Fernando Assis Pacheco ou Car- o Marmeleiro. Estamos com Zambu- Viadutos são os concorrentes. E tem po, mas o livro que colou o adjectivo los Pinhão. Só que os bons malandros jal: “Apetece mesmo estar por aqui, até um slogan: ’Para baixo é que é ao nome de Zambujal começou a nas- pegaram e transformaram a crónica no sossego absoluto que só se quebra Lisboa’.” cer nas travessas do Bairro Alto, onde de Zambujal num dos primeiros ao descer à costa algarvia ou à Anda- Foi impossível ler “Uma Noite Não trabalhava. “Se desse certo, prometia “bestsellers” portugueses. luzia”.

18 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon Seun Kuti O afrobeat é a verdade Não se sente intimidado com as comparações com o pai, o mítico Fela Kuti. Vê-se como um guerreiro que prossegue uma luta inacabada. Amanhã vem apresentar o seu primeiro álbum, “Many Things”, a Lisboa. Mário Lopes

Vemos-lhe o corpo e a forma como o É nela, três décadas depois, que Seun corpo se move, um lento bamboleio tem o seu quartel-general. Ali ensaia que, num segundo, se transforma em com os músicos dos Egypt 80, alguns movimento frenético de saltos e torso deles contemporâneos do seu pai, da- ondulante. Ouvimos a voz de tom gra- li sai para levar mundo fora “a verda- ve e a verve de agitador de consciên- de” do afrobeat. Amanhã, dia 29, ac- cias. Ouvimos a música que o faz mo- tua em Lisboa, no Grande Auditório ver-se, invenção imponente em que do Centro Cultural de Belém (21h), em o jazz norte-americano, o highlife ni- concerto integrado na secção África geriano e o funk de James Brown se da programação de 2009 do CCB Fo- Música fundiram num som baptizado como ra de Si. afrobeat. Vemo-lo ao vivo e está lá tu- do isso. O coro feminino, com as suas De África para o mundo vozes agudas em resposta às incita- Seun Kuti subiu pela primeira vez a ções do vocalista, e a dança exube- um palco há muito. Tinha oito anos. rante correspondendo à luxúria do Disse ao pai que queria tocar com ele. ritmo. Os metais reunindo-se em cur- Fela pediu-lhe que mostrasse do que tas e poderosíssimas frases que er- era capaz e Seun criança cantou e guem a música até outra dimensão. dançou. “Não és nada mau”, a respos- A guitarra bailando com precisão mi- ta do pai, foi o selo de aprovação. Ho- litar e a secção rítmica incrivelmente je com 27 anos, diz-nos, primeiro, que encantatória. “sempre quis a música – nada mais”. Seun se sentisse o prolongamento de “Quem vem aos mundo”. Antes, cantava-se “get up Vemos a banda, os míticos Egypt Recorda, depois, essa infância em que um legado, um guerreiro que prosse- and fight” [“levanta-te e luta”], agora, 80, e vemos o homem que a lidera. foi “mascote” de Fela Kuti & Egypt 80. gue uma luta inacabada. “Estou no concertos e ouve é tempo de “get up and think” [“le- Não é Fela Kuti, um dos músicos in- Lembra-se, principalmente, da “in- início de uma longa maratona”, afir- vanta-te e pensa”]. Citamo-lo da bio- dispensáveis do século XX, inventor tensidade da música e do que rodea- mou pouco após editar “Many Thin- afrobeat, quem grafia disponível na sua página de do afrobeat, activista e pensador po- va a música”. Mesmo que “houvesse gs”, o álbum de estreia longamente MySpace: “A minha geração não está lítico, lutador incansável contra men- coisas que não percebia”, foi essa a maturado. Antes de o editar, conta- o dança, já recebe a pensar e a culpa, na verdade, não é talidades colonialistas e ditaduras sensação que ficou – intensidade. nos, estudou no Instituto de Artes nossa. A geração do meu pai lixou militaristas. Não é Fela que dirige, em Isso é algo que continua a carregar Performativas da Universidade de Li- a mensagem. tudo. E não fomos criados para solu- 2009, os Egypt 80. Aquele que vemos consigo. Para Seun, não existe dife- verpool – “pus-me a par de músicas O afrobeat é, em si cionar isso”. nos concertos e nos vídeos disponí- rença entre aqueles que seguem os do mundo e isso foi uma experiência Seun quer ser alavanca de mudan- veis na Internet, aquele que ouvimos seus manifestos políticos em forma importante para a minha progressão a mensagem. ça. Musicalmente fiel à tradição pro- em “Many Things”, disco de afrobeat de música (o álbum “Many Things”, enquanto artista”. Nos intervalos, gressista do afrobeat, recusa vitimi- majestosamente clássico, editado em com canções como “Think Africa” ou aprofundava a liderança dos Egypt Já contém tudo. zações e a segurança do politicamen- 2008, é Seun Kuti. Filho de Fela, o “Na Oil”, é declaramente de “inter- 80. Foi a última banda de Fela Kuti e te correcto. Diz-se farto de eventos mais novo de todos eles, o que não venção”) e os que dançam a música Seun tornou-se o seu líder, ainda ado- Não é apenas um de beneficência como o Live 8 e ques- foge da imensa sombra de seu pai. alheados do que nela se diz: “Quem lescente, após a morte do pai, em tiona por que razão os músicos oci- Alimenta-se dela. vem aos concertos e ouve afrobeat, 1997. Ser aceite e respeitado pelos género musical, dentais “solidários” nunca aparecem Aquilo por que lutou Fela Kuti é ain- quem o dança, já recebe a mensagem. músicos veteranos que acompanha- é um movimento em África sem trazerem câmaras e da projecto por cumprir e Seun segue- O afrobeat é, em si a mensagem. Já ram o seu pai durante décadas é pro- jornalistas consigo. Critica a atitude lhe o encalço. “O afrobeat é a verda- contém tudo. Não é apenas um géne- va definitiva do seu talento e carisma: político e cultural” passiva de muitos dos seus conterrâ- de”, dirá ao Ípsilon desde a ex-capital ro musical, é um movimento político descrevem-no como “rapaz pequeno neos perante os governantes e a des- nigeriana, Lagos. Ali vive, na chamada e cultural”. com bom senso de homem grande” Seun Kuti culpabilização destes com a invoca- República de Kalakuta que Fela Kuti, Ao contrário do seu irmão Femi, 20 Seun explica que não quis apressar ção da colonização branca. nos anos 1970, fundou e proclamou anos mais velho, Seun não se sente nada. Que teve de aprender e de so- “Não acredito em pregação, acre- independente. Centro artístico e sede intimidado com as constantes com- lidificar as suas ideias musicais e po- dito na criatividade e na verdade”, de activismo político, foi destruída parações com Fela. E isso não nasce líticas. Só plenamente formado se dir-nos-á quase no final da curta con- pelo governo militar nigeriano – Fela de qualquer comodismo ou, em sen- apresentaria definitivamente ao mun- versa com o Ípsilon. Pois bem, se o foi espancado, a sua mãe morreu dos tido contrário, de um receio de me- do. É o que faz agora. “Antes, fazia-se “afrobeat é a verdade”, Seun Kuti é ferimentos - e reconstruída depois co- norização perante a estatura mítica afrobeat para mostrar o afrobeat a agora um dos seus mais distintos em- mo prova de tenacidade e resistência. do pai. De certa forma, é como se África, agora, temos que o mostrar ao baixadores.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 19 Ao sétimo álbum, os Fiery Furnaces rio musical e génio rock, classifica do muito bem quem diz que este dis- completam um ciclo. Antes, em discos como “um álbum convencional”. co é um passo atrás, porque o é real- como “” ou “Bitter Pois bem, ouvir o álbum e pensar, mente”. Aí está. Parem as rotativas! Tea” aprimoraram um método. Amal- “ora aqui está um álbum de canções, “Estamos Um músico a assumir que o seu novo gamaram 30 canções numa e criaram simplesmente canções”, é uma coisa. num momento álbum é, digamos, pouco conseguido, letras cujo sentido não seria facilmen- Ter Friedberger, directamente de pertence em jornalismo à categoria te desvendado pelo melhor linguista Nashville, onde os Fiery Furnaces to- de mudança. “homem que mordeu o cão”. Isto sim, de Cambridge – o segredo delas, de caram na noite em que falou com o é notícia. Ou melhor, sê-lo-ia, se não resto, reside mais nas imagens que Ípsilon, a dizer-nos que “sim senhor, Terminámos algo estivéssemos a falar dos Fiery Furna- convocam do que na linearidade da ‘I’m Going Away’ é um álbum conven- ces e se “I’m Going Away” não fosse “história” contada. Ei-los então, eles cional”, é outra completamente dife- e o que vier a seguir aquilo que é: um magnífico álbum de que no passado gravaram “Rehearsing rente. Quereria isso dizer que, depois canções em que, apesar de serenada My Choir” com a avó octogenária – de anos a subverter a ideia de canção será diferente. Temos a criatividade torrencial de experiên- fresco surreal sobre a Chicago de há rock, foi tempo de voltar ao prazer de que lidar com esta cias anteriores, a marca da banda es- muitas décadas -, eles que no último escrever uma canção simples, bonita, tá definitivamente presente. Que con- “Widow City” conduziram as canções, directa? Oh, quão ingénuos seríamos pop tolinha que nos tinuem a rodar as rotativas. Quando como habitualmente, por rumos ines- se acreditássemos realmente nisso. Matthew Friedberger concordou com perados, com sintetizadores enfure- Os Fiery Furnaces podem ter ima- rodeia e tentar mudar os críticos de “I’m Going Away”, não cidos trespassando as agradáveis me- ginado um álbum convencional, mas confessou o inconfessável. Começou lodias de Eleanor, a vocalista, com não foi exactamente isso que grava- a forma como a abrir o jogo. bom rock’n’roll para mover a anca a ram. Ainda assim, já há fãs que acu- ser transportado para vertigens rítmi- sam “I’m Going Away” de ser um re- as pessoas olham Curto e simples cas deliciosamente tresloucadas; eis trocesso, uma colecção de canções para um álbum Os Fiery Furnaces nasceram em 2000 então os Fiery Furnaces, dizíamos, a demasiado normais. Apresentámos em Brooklin, Nova Iorque, para onde chegar a “I’m Going Away” e, nele, a as críticas a Matthew e a resposta sur- e para uma banda” os irmãos Eleanor e Matthew se ha- gravar aquilo que Matthew Friedber- giu rápida e directa. Ele não está aqui viam mudado vindos de Oak Park, no

Música ger, o guitarrista e compositor, operá- para enganar ninguém: “Compreen- Matthew Friedberger Illinois. Quando editaram o álbum de

O magnífico passo atrá Matthew Friedberger compreende quem acusa o novo álbum de ser um retrocesso, “ se “I’m Going Away” não fosse aquilo que é: um magnífico álbum de c

20 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon estreia, “Gallowsbird’s Bark” (2003), “Ir a um concerto foram recebidos com o espírito da época. Ou seja, sendo banda de ra- não exige mais do que paz-rapariga, versada nas coisas das folks e do rock’n’roll, só podiam ser estar numa bancada iguais aos White Stripes. Felizmente, não demorou muito até se perceber a gritar pela equipa. o equívoco da comparação. Basica- mente, demorou o ano que passou Na verdade, exige até chegar “Blueberry Boat”, disco menos porque não de 2004 que os estabeleceu como uma das mais interessantes e idios- há risco. A tua banda sincráticas vozes criativas do univer- so pop contemporâneo. Álbum longo nunca perde” e labiríntico, construía um imaginário de conto fantástico que transbordava Matthew Friedberger para cenários de urbanidade mui mo- derna, recorria aos The Who, aos Beatles e aos Led Zeppelin, à herança do krautrock, experimentalismos só- nicos e a trovadorismo de cantautor é o “statement”: “Espero que enco- para os remisturar com precisão clí- raje as pessoas a reflectir sobre a for- nica evidente (apesar do alvoroço em ma como pensam num disco, como que toda aquela música parecia vi- ouvem música pop. Um álbum ainda ver). A partir dele, deixaram de exis- é visto como um documento em si tir comparações. Quer se dedicassem mesmo, imutável, mas já não é real- ao arco-íris pop da colecção de sin- mente isso”. O que nos leva ao segun- gles intitulada “EP” (o título do álbum do projecto pós “I’m Going Away”. de 2005 é todo um programa), quer “Silent Record”. Vamos ouvir falar investissem na dinamitação e recons- disto daqui a alguns meses e não, não trução da memória rock das últimas é uma homenagem ao histórico quatro décadas, como em “Bitter “4’33’’” de John Cage. Tal como apon- Tea” ou “Windy City”, os Fiery Fur- Os irmãos ta o título, trata-se de um disco silen- naces passaram a ser os Fiery Furna- Matthew cioso. Coisa muito antiga: uma colec- ces. e Eleanor ção de pautas e anotações prontas a Matthew Friedberger é um criador Friedberger: serem interpretadas por quem o sou- obcecado e incansável – disse em a pop actual ber fazer (tal como se fazia antes de tempos que grava álbuns incessante- teria muito a gravação fonográfica iniciar o pro- mente porque é obrigado a isso (“Se menos cesso de comercialização da música ficar um ano parado, esqueço-me de interesse gravada). Os Fiery Furnaces lembra- como os fazer”). É alguém que pensa sem eles ram-se disto porque, genericamente, ao detalhe a música que faz. Nada estão fartos. A palavra a Michael: “Ac- existe ali de intuitivo mas, eis o se- tualmente, as pessoas vão a concer- gredo do seu brilhantismo, a sua mú- tos para se validarem a si próprias ou sica convence-nos de que é intuição à banda. Tornaram-se acontecimen- a intuição que simulam. Naturalmen- tos semelhantes a eventos desporti- te “I’m Going Away”, o “álbum con- vos. Ir a um concerto não exige mais vencional” dos Fiery Furnaces, não do que estar numa bancada a gritar foge à regra: “O plano era fazer um pela equipa. Na verdade, exige menos álbum de canções rock simples, pou- porque não há risco. A tua banda co elaboradas. Em que fossem as can- nunca perde. Detesto isso, mas exis- ções a estabelecer a narrativa e não te ali algo que pode ser facilmente o contrário”. trabalhado”. Com Eleanor nas funções de letris- E portanto, agora “que já não se ta, algo que não acontecia desde o faz dinheiro com a venda de discos”, disco de estreia, Matthew viu-se pe- mas ainda é possível “fazê-lo com rante “letras curtas e simples, que concertos”, os Fiery Furnaces, per- mais do que contar uma história, es- versos, querem ceder também as ac- tabelecem uma cena”, e lembrou-se tuações ao público. O plano é montar das bandas sonoras de séries televi- concertos que não o serão realmente. sivas da década de 1970 (tem referido Serão antes encontros de fãs que, ar- “Taxi”, onde encontrávamos Andy mados das pautas e anotações de “Si- Kaufmann). Define: “Mais simples do lent Record”, poderão tocar as can- que os Carpenters, mas com o mesmo ções uns para os outros, gritar em valor sentimental, declaradamente aprovação uns para os outros. Passa- sentimental: metade reconfortante, do algum tempo, prevê Matthew Frie- metade desesperante”. contraste “com o passado”, que pos- vier a seguir será necessariamente dberger, “alguns fãs vão deixar de sa “iluminar os outros álbuns de ou- diferente. Temos que lidar com esta tocar a música que lhes mandarem. Um disco em silêncio tra forma”. Num belo momento de pop tolinha que nos rodeia e tentar Vão rebelar-se e tornar-se indepen- Não há qualquer razão para os Fiery auto-ironia, acrescenta: “Já aqueles mudar a forma como as pessoas dentes”. Ou seja, os copistas tornar- Furnaces terem feito agora este ál- que não nos conhecem, podem apre- olham para um álbum e para uma se-ão criadores e a normalidade será bum. Imaginaram um conceito e di- ciá-lo por ser aborrecido como a mú- banda”. Os Fiery Furnaces vivem reposta. vertiram-se a concretizá-lo. “Foi um sica de que gostam ou não gostar alheados de questões menores. Nes- Esta é, portanto, a nova e última desafio. Propusemo-nos gravar um dele por ser demasiado aborrecido e se aspecto, Matthew actua mais como ideia dos Fiery Furnaces, o seu delírio disco de estúdio que fosse conven- por quererem algo mais desafian- cientista social de guitarra na mão. futurista pós-“I’m Going Away”. E, de cional na estrutura e na instrumen- te”. Se não vejamos. Em Setembro, será facto, alguém acreditava verdadeira- tação, mas criado num apartamento Desafiante. Bom adjectivo para fa- editado um álbum de versões de “I’m mente que os mais fascinantes inven- de Nova Iorque com um laptop”. Es- lar dos Fiery Furnaces. Ainda agora Going Away”, metade obra sua, me- tores pop da actualidade iriam encar- tá feito e Matthew acha-lhe piada – no- acabou de chegar “I’m Going Away” tade de sua irmã. Será, prognostica- rilar nos trilhos da normalidade? ta-se que não o vê propriamente co- e Matthew Friedberger já olha em mos sem grande margem de erro, um mo grande manifesto criativo. Espe- frente. “Estamos num momento de óbvio suicídio comercial. Para Frie- Ver crítica de discos nas págs. 30 e se- ra que o público ache “engraçado” o mudança. Terminámos algo e o que dberger, porém, o mais importante gs. rás dos Fiery Furnaces , “porqueoérealmente”.Discordamos.Sê-lo-iasenãofalássemosdosFieryFurnaces, e canções criado pela mais interessante banda pop da actualidade. Mário Lopes

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 21

O milenar Festival de Atenas e Epidauros voltou a reunir as tragédias gregas num palco especial. Este ano, pela primeira vez, encerrou com Shakespeare. “O Conto de Inverno”, encenado por Sam Mendes, faz parte da estratégia encontrada pela organização para sobreviver no mercado. Tiago Bartolomeu Costa, em Epidauros Ethan Hawke, Teatro rei em Epidauros

A inclusão de coproduções “bestsellers” com actores de Hollywood, como este “O Conto de Inverno” “starring” Ethan Hawke, faz parte da estratégia de Epidauros para pôr o festival no mapa dos destinos de férias culturais

Não será preciso muito para encontrar Quando Ethan Hawke tadores e só o palco tem mais de 20 ciado pelo Estado, tem feito um es- é a confirmação de que “o festival nas ruínas do imponente teatro de Epi- metros de abertura, fazendo uma cir- forço de adaptação estratégico força- conquistou o seu espaço na rede de dauros, 140 quilómetros a sul de Ate- entrou em cena, cunferência perfeita rodeada por uma do pela pressão económica. grandes eventos europeus”. Diz o pro- nas, Grécia, a permanente herança plateia em semi-lua. Mas entre proi- Desde 2008, por força dessa estra- gramador que, “se ganhar a aposta deixada pelas celebrações em honra as máquinas bições dos imperadores e ocupações tégia de concertação, Epidauros faz com uma programação mais ambicio- de Asclepios, o deus da medicina. As bélicas, o teatro teve que esperar até parte de uma rede europeia que inclui sa que procure abraçar as redes já representações, ligadas desde o início fotográficas 1954 para passar a receber um festival o Festival de Avignon, em França, o existentes [dentro da cidade], haverá à história do local, datam do início do digno desse nome e, até 2006, exclu- Grec, em Barcelona, e o Festival In- muito mais a ganhar na viagem que é século IV antes de Cristo, e continuam dispararam como sivamente pertença dos artistas gre- ternacional de Teatro de Istambul, a criação artística”. a marcar a existência de um edifício se ninguém tivesse gos. permitindo-lhe trabalhar em três fren- A programação, que resulta de há paradigmático na arquitectura teatral Com a entrada de Giorgos Loukos, tes: compensar os custos de produ- uns anos a esta parte da fusão com o da civilização helénica. escutado o insistente um polivalente programador grego ção, adaptar-se a um público que exi- Festival de Atenas, começa em Maio Com uma acústica única no mundo, também responsável pelo renasci- ge produções de alto nível, e colocar - este ano com peças de Alain Platel, que torna inúteis os mais modernos anúncio de proibição mento do Ballet da Ópera de Lyon, o o festival no circuito de destinos de Romeo Castelluci, Stefan Kaegi ou An- equipamentos, alberga 14 mil espec- festival, apesar de inteiramente finan- férias culturais. Para Giorgos Loukos, ne Teresa de Keersmaeker - e esten-

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 23 de-se até Agosto, incluindo no car- Cusack e Simon Russell Beale, actores dápio espectáculos de teatro, dança da bela escola tradicional inglesa. e música sugeridos por um grupo de E, no entanto, a chegada a Epidau- especialistas como Vincent Baudriller, ros desta colaboração entre a Brooklyn co-director do Festival de Avignon, e Academy of Music, em Nova Iorque, Alistair Spalding, director artístico do e o Old Vic, em Londres, marcou o fim Sadler’s Wells, em Londres. de uma digressão atípica para as lógi- O cartaz deste ano incluiu três tra- cas ocidentais mas consciente das gédias (“Alceste” e “As Troianas”, am- soluções que o dinheiro novo vindo bas de Eurípides, e “Os Persas”, de da Ásia pode trazer. É isso que repre- Ésquilo), duas comédias (“As Aves” e senta a coprodução com o Repertory “As Nuvens” ambas de Aristófanes), Theatre, de Singapura, onde a peça todas assinadas por encenadores gre- encontrou nova vida depois da estreia gos - com excepção de “Os Persas”, em Janeiro, em Nova Iorque, e antes montado pelo búlgaro radicado em de seguir para Auckland, na Nova Ze- Berlim Dimiter Gotscheff, “Fedra”, lândia, o Teatro Español, em Madrid, de Racine, uma encenação de Nicho- Ruhr, na Alemanha, e Londres. las Hytner para o inglês National The- O fim de carreira em Epidauros atre, com Helen Mirren; “O Conto de serviu para o encontro da deposta Inverno”, de Shakespeare, com ence- realeza grega com a nova realeza ins- nação de Sam Mendes, naquela que tantânea dos programas de televisão foi uma estreia em Epidauros das pe- e das revistas do coração. Quando ças do autor inglês; e a entretanto Ethan–o chamariz–Hawke entrou em cancelada primeira encenação do re- cena, jocoso e vívido no seu Autócli- alizador israelita Amos Gitai, “La to desregrado, as máquinas fotográ- Guerre des Fils de Lumière contre les ficas dispararam como se ninguém Fils des Ténèbres”, com Jeanne Mo- tivesse escutado o insistente anúncio reau como narradora, tido como “o” de proibição. E a cada nota solta, a Sam Mendes projecto desta edição. cada gesto operático, a cada piscar instalou a sua de olho cúmplice com o conhecimen- peça “pronta- Ethan entra em cena to superficial que cada espectador a-fazer” num É nessa lógica que encontramos a en- tem das estrelas, os flashes das câma- cenário cenação de Sam Mendes para “O Con- ras fizeram as vezes da iluminação pensado para to de Inverno”, de Shakespeare, pro- genérica. um teatro jecto internacional comissariado por Pouco mais haverá a relatar, se ti- tradicional diferentes e surpreendentes teatros vermos em conta que entre o início e que acusam já a necessária estratégia o fim de uma peça que nem todos co- globalizante que surge agora como nheciam, bocejaram à mesma veloci- tábua de salvação de um teatro tão dade os mais belos vestidos e os afi- dispendioso quanto utópico. Alicer- cionados, aplaudindo no final e de pé çado num “desejo simples”, como uma peça imaculadamente servil de explicou o realizador de “Beleza Ame- uma escola vencedora. ricana” e “Revolutionary Road” - de- sejo o de “partilhar a experiência, o Um frio inverno talento e o trabalho dos dois lados do No “New York Times” Chester Higgins Atlântico” -, reuniu um elenco ponti- Jr. escreveu que os primeiros 90 mi- lhado por estrelas como Ethan Hawke nutos de um total de três horas “têm e os talentos inigualáveis de Sinéad uma força emocional que nos deixa de queixo caído e olhos húmidos”, Epidauros marcou mas que no resto Mendes perde o pé. Michael Billington, do “The Guar- o fim de uma dian”, achou a peça é “bem feita”, mostrando cepticismo em relação à digressão atípica segunda parte, em que à austeridade e frieza da Sicília, que Mendes enten- para as lógicas de tresler como Inglaterra no século XVIII, se opõe uma Bohemia bufona ocidentais mas a representar, com “rodeos” incluí- consciente das dos, os Estados Unidos da América. Uma leitura simplista que lineariza a soluções que o abstracção shakespeareana e evita procurar relações entre dois territó- dinheiro novo vindo rios que possam ir para além da cari- catura. da Ásia pode trazer Para mais, ao fazer da cegueira ciu- menta de Leontes uma comédia de costumes, Mendes parece esquecer- ritmos singulares da prosa e do verso se que o sofrimento que o rei enlou- escritos por Shakespeare, e ilude-se quecido inflige a si mesmo e aos ou- em mecanismos teatrais fantasistas tros é um acto de desespero e não um em vez de marcar com opções cénicas acesso momentâneo e caprichoso. Ao vincadas a passagem do tempo e a aprisionar a sua mulher julgando-a efabulação característica desta peça. culpada de amar outro rei seu amigo, Mendes instala a sua peça “pronta-a- Leontes cria um universo particular, fazer” num cenário simplista e pen- certamente fantasioso, mas longe da sado para um teatro tradicional, fe- comédia irónica e cínica criada por chado na retaguarda e desatento aos Mendes. E a resolução, com a aben- olhares oblíquos que um teatro como çoada boda dos filhos dos dois reis, o o de Epidauros permite, desiludindo regresso da morte da rainha e o festim aqueles que acreditam na honra que característico são expurgados da sua é ser-se apresentado num lugar míti- moralidade, da mesma forma que o co para a história do teatro como o histrionismo com que pinta as perso- conhecemos. nagens de Bohemia surge como op- Nada disto foi, naturalmente, im- ção fácil. Ethan Hawke tem, nesse peditivo do sucesso da performance. aspecto, campo livre para desbaratar É só a terrível falta de ambição que a complexidade de um burlão sedutor surpreende quando se reúnem tantos - e o gosto que deve ser para um actor talentos - sobretudo num espectácu- interpretar sem rédeas e com muita lo apresentado num palco como o de chama as personagens cómicas de Epidauros, que se impõe em vez de Shakespeare facilita. se vergar, que resiste à mudança mas No geral, o encenador abandona não a rejeita, que existe para adorar os actores à sua sorte em linhas geo- uma arte e não para a prolongar. E métricas, sustentando-se numa acu- onde, razão tinham os gregos, menos mulação de sequências indistintas; é sempre mais. amplia-lhes os movimentos já de si presos por fios, prolonga-lhes as fra- Ver versão integral deste artigo em ses, e as gargantas, esquecendo os www.ipsilon.publico.pt

24 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

“Este Oeste Éden” de regresso ao Teatro da Cerca de São Bernardo

Nem essência nem ego: nada

“Ego”, com encenação de João Pedro Vaz, é a peça de abertura de temporada do Dona Maria II. Vanessa Rato

Ego De Mick Gordon e Paul Broks. Encenação de João Pedro Vaz. Com Catarina Lacerda, Gonçalo Waddington, António Fonseca.

Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II - Sala Estúdio. Pç. D. Pedro IV. De 03/09 a 11/10. 4ª a Sáb. às 21h45. Dom. às 16h15. Tel.: 213250835. 6€ a 12€.

Há um momento de “Ego” – e é logo no início – em que temos que decidir de que lado estamos. Há apenas dois: o lado dos positivistas e o lado “Ego” parte desta pergunta: como é que o quilo dos outros, aqueles que acreditam e meio de carne que constitui o nosso cérebro se transforma em mente? numa metafísica da vida; o lado daqueles que consideram sermos exterior ao homem. Estes foram os anda a brincar com uma máquina de a maior de todas as questões meras (incríveis, mas meras) que entenderam a necessidade de teletransporte; até ao dia em que um filosóficas e científicas. Pede-nos que máquinas, e o lado dos outros, manutenção de princípios como a erro o duplica e o outro Alex ocupa a pensemos no que somos, para além aqueles que acreditam em qualquer defesa do oculto, do mito e do ritual sua vida ao lado de Alice (Catarina da nossa pele e osso e dos nossos coisa além, qualquer coisa mais. como experiências humanas cruciais, Lacerda), a sua mulher, e de Dereck, cem mil milhões de células É uma batalha histórica. mas é deles que Alex, a personagem seu sogro e mentor (António cerebrais. Reflecte o modo como Tivemos a Revolução Industrial, a principal de “Ego”, começa por se rir. Fonseca). esse ‘tu’ consciente se eleva da muda Revolução Francesa, a Primeira “Nem essência, nem ego, nem É isto a peça do encenador Mick escuridão da caixa cerebral para um Guerra Mundial e, elo após elo, ‘eu’”, diz ele. Caso para corrigir – Gordon e do neuropsicólogo Paul mundo de lugares e de pessoas, fomos mergulhando no Mundo caso para recordar que quem ri por Broks com que o encenador João prazer e dor, amor e perda. Quer Moderno. Para uns, os progressistas último ri melhor. Pedro Vaz abre a temporada do saber quem é ‘tu’. A resposta é ou racionalistas, esse mundo de O enredo: o dito Alex (Gonçalo Teatro Nacional Dona Maria II, agora desconcertantemente simples: não desenvolvimentos tecnocientíficos Waddington), um neurologista, não dirigido por Diogo Infante. E é em és quem julgas ser.” implicou uma mudança fundamental acredita na ideia de identidade, acha relação a isto que Mick Gordon diz: “Ego” baseia-se no primeiro livro na condição existencial do homem; que não somos mais do que um feixe “Como é que o quilo e meio de carne de Paul Broks, “Into the Silent para outros, os primitivistas ou de reacções físico-químicas e, com que constitui o nosso cérebro se Land”, um dos nomeados para o irracionalistas, o progresso foi todas as suas convicções em punho, transforma em mente? Esta é talvez Guardian First Book Award de 2003.

Agenda

Luto Clandestino Santos Fonseca, entre outros. Teatro Coimbra. Teatro da Cerca de São Bernardo. De 2/09 a 13/09. 4ª a sáb., às 21h30; dom. às 16h. Tel.: Continuam 239718238. Hedda Gabler A Idade do Ouro De Henrik Ibsen. Encenação de Encenação de Filipe Crawford. Com Celso Cleto. Com Sofia Alves, Ana Ana Peres, Carla Mendes, entre Rocha, Elisa Lisboa, Guilherme outros. Lisboa. Castelo de São Jorge. Castelo. Até 29/08. 5ª a Filipe, Maria Dulce, Paulo Rocha, Sáb. às 21h30. Tel.: 218800620. 5€ a 10€. Vítor de Sousa. Porto. Teatro do Campo Alegre. R. das Estrelas s/n. A Última Porta De 03/09 a 13/09. 5ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. De Pedro Estorninho. Encenação de Tel.: 226063000. 15€ (sujeitos a descontos). Pedro Estorninho. Com António De Jacinto Lucas Pires. Encenação de As Justiceiras Parra, André Brito. João Brites. Pelo Bando. Com Dinis De Aristófanes. Encenação de Steve Porto. CACE Cultural do Porto. Rua do Freixo, 1071. Machado, Paula Só. Até 06/09. 2ª a Dom. às 22h00. Tel.: 225191600. Jonhston. Setúbal. Praça do Bocage. Dia 29/08. Sáb. às 21h. Setúbal. Parque do Bonfim. Av. Alexandre Entrada gratuita. TINK Herculano / Av. 22 de Dezembro. Dia 02/09. 4ª às Festa do Teatro. A partir de Herman Melville. Pela Cão Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande 22h. Solteiro. Com Paula Sá Nogueira, Auditório. Praça do Império. Dia 28/08. 6ª às Festa do Teatro. Entrada gratuita. Cafundó - Onde o vento faz a Paulo Lages, Miguel Manso, Mariana 21h30. Tel.: 213612400. 5€. Retalhos em Viagem curva Sá Nogueira, entre outros. CCB Fora de Si. Teatro/Dança Encenação de Catarina Lacerda. De e com Amaury Tangará. Pela Cia Lisboa. Cão Solteiro. R. Poço dos Negros, 120. Até 30/08. 3ª a Dom. às 22h00. 5€ a 10€. Void Pelo Teatro do Frio. Com Rodrigo d’Artes do Brasil. Setúbal. Escola Sebastião da Gama. Rua da Escola De Clara Andermatt. Com Avelino Malvar, Inês Lua, Vasco Gomes, Gil Técnica. Dia 28/08. 6ª às 22h. Dança Chantre e Sócrates Napoleão. Mac, Joana Moraes. Festa do Teatro. Carnaxide. Auditório Ruy de Carvalho. Centro Lisboa. Centro Cultural de Belém - Jardim das Cívico de Carnaxide. Rua 25 de Abril, lote 5. Dias Oliveiras. Praça do Império. De 28/08 a 30/08. 6ª Este Oeste Éden Estreiam 3/09 e 4/09. 6ª e Sáb., às 21h30. Tel.: 214170109. às 17h. Sáb. e Dom. às 16h e 18h. Tel.: 213612400. De Abel Neves. Pela Escola da Noite. Entrada gratuita. Entrada gratuita. Encenação de Sílvia Brito. Com Ana Waxtaan MITO - Mostra Internacional de CCB Fora de Si. Mota Ferreira, António Jorge, Hugo Pela Jant-Bi. Teatro de Oeiras.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 25 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Ficção Clézio (n. 1940) como Nobel da monumento anti-moderno que Literatura, já quase ninguém se constitui a trilogia formada por “La A fachada lembrava do jovem que aos 23 anos Guerre” (1970), “Les Géants” (1973) O regresso recebeu o Prémio Renaudot pelo e “Voyages de l’autre côté” (1975). A livro de estreia, “Le Procès-verbal”. partir daí, Le Clézio concentrou-se O subúrbio é o sítio onde do profeta (Publicado em 1963, voltou às na vida dos povos nómadas, como a patologia é normal e a livrarias portuguesas em Dezembro os berberes de Marrocos e os índios normalidade é patológica. de 2008, numa edição Europa- emberas do Panamá, factor que terá Pedro Mexia Le Clézio adopta o ponto América, com o título “O Processo contribuído para desviar o foco da de Adão Pollo” e tradução de Manuel cena literária. A idade explicará a Bullet Park de vista do narrador Villaverde Cabral.) Não se recente deriva autobiográfica, com “ultramarino” que ajusta John Cheever compreende que uma obra epicentro na família Brun, originária Trad. Margarida Periquito contas com a pátria de importante e extensa como a sua — da ilha Maurícia. Na realidade, os Relógio D’Água origem. Eduardo Pitta meia centena de títulos de ficção, Clézio, originários da Bretanha, ensaio e literatura para a infância — estão na ilha desde o século XVIII. mmmnn A Música da Fome tenha uma divulgação errática em Ethel Brun é o alter-ego da mãe do J.-M. G. Le Clézio Portugal: sete livros traduzidos em autor, circunstância que o narrador Arranjos florais, Trad. Isabel St. Aubyn 45 anos. Isto a despeito dos prémios não dissimula. cocktails, golfe, Dom Quixote (muitos), dos textos laudatórios que A pretexto do quotidiano debutantes. Os Beckett e Foucault lhe dedicaram, e parisiense de Ethel, “A Música da casamentos são

Livros mmmmm de uma vida aventurosa reportada Fome” ilumina a vida dos imigrantes sociedades na imprensa. Natural de Nice, filho desenraizados, apanhados na curva comerciais. E o Em Outubro do de um cirurgião britânico que dos anos 1920-30, quando, para as trinado dos ano passado, regressou à Maurícia depois de uma pessoas comuns, bolchevismo e anti- pássaros ecoa quando a comissão de serviço na Nigéria, Le semitismo eram conceitos difusos, nomes de Academia Sueca Clézio passou a infância naquela ilha num tempo em que a França escritórios de escolheu Jean- do Índico, dividindo actualmente o começava a deixar de ser a terra dos advocacia. É o mundo dos subúrbios Marie Gustave Le seu tempo entre os Estados Unidos e “sem-Pátria”. O preâmbulo é americanos, de que John Cheever a Riviera francesa. O escritor tem eloquente: “Conheço a fome, sofri-a. (1912-1982) foi um dos grandes dupla nacionalidade: britânica e Criança, no fim da guerra, faço parte poetas, juntamente com Updike ou

SCANPIX SWEDEN SCANPIX francesa (e não mauriciana, dos que correm pela estrada ao lado Yates. “Bullet Park” (1969), terceiro como por vezes aparece dos camiões dos Americanos, romance de Cheever, é tão fiel a esse escrito). As razões da sua estendo as mãos para apanhar mundo que começa com uma expulsão da Tailândia, embalagens de chewing-gum, detalhada descrição ferroviária e país onde trabalhou chocolates, sacos de pão que os defende logo que “o cenário” é “o como cooperante soldados arremessam pelo ar. âmago da questão”. Os burgueses militar no fim dos Criança, sinto tanta sede de gordura com algum desafogo económico anos 1960, que bebo o azeite das latas de mudam-se para aquelas zonas de nunca foram sardinha...”. Le Clézio confronta a vivendas nos arredores das cidades devidamente França com as suas porque ali encontram tranquilidade, esclarecidas. responsabilidades históricas na espaços verdes, um sentido de “Ritour- ocupação alemã. A hipocrisia da comunidade. É tudo muito nelle de la maioria silenciosa, orgulhosa da sua superficial, muito pela rama, mas faim” foi “superioridade moral”, conivente parecem entretidos em recepções e publicado com os pacifistas, os defensores dos festas e idas à igreja, uma pela acordos de Munique, os “comunidade” feita apenas de Gallimard colaboracionistas, os activistas de amenidades inócuas, com uma pouco antes da extrema-direita reunidos na CSAR “tranquilidade” que esconde atribuição do (Comissão Secreta de Acção frustrações e raivas. Em Bullet Park, Nobel. Na sua Revolucionária), em suma, com um imaginário subúrbio de Nova aparente Pétain e a essência do nazismo. Iorque, Eliot Nailles conhece Paul simplicidade, o Tudo no mesmo saco: “os Hammer (o trocadilho entre pregos e título português, “A oportunistas, os corruptos, os martelo é escusadamente óbvio). Música da Fome”, é saqueadores [...], os realistas, os Nailles, a sua mulher Nellie e o filho de rara felicidade: o fourieristas, os racistas, os Tony, são uma família “normal”. termo ritornelo é suprematistas, os misticistas...”. Não Hammer é um homem “perturbado”. aplicado à introdução havia como escapar, o regime de Sucede que normalidade e instrumental de Vichy atolou a França num lodaçal. perturbação, nos subúrbios como composições vocais como Ethel sabia que o seu mundo se em todo o lado, mudam de madrigais e refrões, o que faz desmoronara, ficando “reduzido à posição com frequência. todo o sentido numa obra de água de um canal”. Vagueava como Podemos mesmo dizer que o carácter fragmentário como uma sombra, Nice era agora uma subúrbio, como território esta. cidade de opereta, “pano de fundo físico e mental, é o sítio onde Não obstante certa dos ingleses do tempo de Lord a patologia é normal e a desaceleração de fôlego, pode-se Brougham & Vaux, russos do tempo normalidade patológica. dizer, sem risco de escândalo, que da imperatriz e de Marie Como acontece “A Música da Fome” é um Bashkirtseff, cidade indiferente e demasiadas vezes na ficção regresso aos melhores cruel, sobreexposta ao sol e ao longa de Cheever (ao contrário momentos: “A Febre” vento...”. A narrativa é um ajuste de dos contos, perfeitos), há um (1965), “Le Déluge” contas com esse passado de desequilíbrio na construção da (1966) e esse vergonha. narrativa. Cheever vai O aspecto mais interessante é o deambulando por ponto de vista do narrador. Le Clézio personagens e escreve “de fora”, isto é, como estrangeiro. É o francês Le Clézio corre atrás da “ultramarino” capaz de John Cheever, mãe - e da desgraça da França distância crítica para lavar as menos bem na ficção colaboracionista - em “A Música da Fome” mãos da herança de Céline. do que nos contos

26 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon A Livraria Latina pode ser Janeiro, pregava a lotaria é o seu anjo da guarda. um paraíso nesta capital desapareceu. E a sua voz. Henrique Perdigão, Espaço da solidão. Lá encontro Eu, perdido, a (na)demorar nome de aristocrata, Público Borges, Hermano Saraiva, entre a grave amizade eternizou-se ao criar D. Manuel Clemente, das lombadas, porque me este templo (o senhor Manuel de Freitas, Rui lembrei da voz do cego? bispo que me perdoe). Pires Cabral (sou um dos Um livro (sobre o Almada) O seu neto [também seus 300 leitores), o Brás está há um ror de tempo Henrique Perdigão], Cubas (sou um dos seus à minha espera. Um não, outro aristocrata, sereno, dez leitores), na bonita dois. Ainda não li “Pedro e atento, dizem que morreu. edição da Cotovia, e teoria Paula” do Helder Macedo. Morreu? “Vou-me embora da literatura. A Latina está agora mais pra Pasárgada”. O homem cego que, entre próxima do céu. Sobe- Nelson Bandeira, Santa Catarina e 31 de se uma escada. Camões desempregado, 25 anos

reminiscências, numa estrutura Hammer, que domina a segunda Hemingway transformaram a frente O desembarque na Normandia episódica, baseada em monólogos parte do livro, repre-senta de uma aberta no Norte da França num tornou-se um acervo de ícones da cultura ocidental interiores sarcásticos. Sempre que forma especialmente cansativa o anjo enorme acervo de ícones da cultura aparece algum figurante novo no vingador que pretende redimir pelo ocidental. Qualquer novo livro que romance, ficamos com ele um certo sangue aquela comunidade. Cheever se dedique a analisar o Dia D e os tempo, com os seus pensamentos e demora dezenas de páginas a quase três meses de combates que se medos, e embora isso seja descrever os antecedentes familiares seguiram até à reconquista de Paris infalivelmente interessante também e psíquicos da personagem, incluindo corre por isso o risco de cair no “déjà prejudica o eixo central da história. É uma bastardia traumática, uma mãe vu”, na eterna repetição dos mitos como se Cheever fosse inventando meio louca e uma homossexualidade criados pelos vencedores, na personagens romanescas só para reprimida. Hammer traz as suas exaltação da glória americana e na escrever pequenos contos sobre cada tragédias para Bullet Park e decide denúncia da vileza nazi. De resto, há uma delas. Gente sensual, com uma castigar Bullet Park pelos pecados décadas que destacados nostalgia pela juventude e por um próprios e alheios. Mas enquanto os historiadores militares, como Max mundo mais simples, gente assustada Nailles são personagens com Hastings ou John Keegan, se dedicam com as contestações da década de espessura, Hammer é um quase um a esmiuçar os detalhes das operações 1960, gente maledicente e perigosa. pretexto, um castigador bíblico, ou as teses que estiveram na base da Eliot Nailles, um modelo de como tantas vezes acontece na ficção estratégia aliada. burguês, só se sente bem quando norte-americana. Todos estes receios seriam está pedrado com comprimidos, vai Há no romance momentos de sensatos se em causa não estivesse onde, como avisou no dia crucial o que a resistência nazi sucumbisse. e volta no comboio suburbano grande brilhantismo de escrita, da um novo livro de Antony Beevor, coronel George Taylor, “as únicas Quando o que restava da enorme metido numa nuvem de métrica das conversas banais à publicado no final da Primavera no pessoas” presentes eram “os que força defensiva da muralha do esquecimento. O seu ramo de relação entre as Escrituras e as Reino Unido e nos Estados Unidos e morreram e os que estão para Atlântico ruiu de vez na bolsa de negócio é o elixir bucal, ocupação épocas do ano, mas Cheever, mestre que a Bertrand deverá publicar em morrer”. Na verdade, nesse dia Falaise, no final de Julho de 1944, a entediante mas que promove o da violência subentendida, levou à Portugal lá para Outubro. Nada de perderam a vida entre 1200 e dois estrada para Paris estava aberta e “bom hálito” como condição exasperação o conflito entre novo haveria de facto a dizer se em mil americanos, menos que os três restava ao ditador um acto de metafórica da vida em sociedade. aparência e realidade. E construiu causa estivessem apenas ofensivas, o mil franceses vitimados pelos desespero: mandar arrasar a capital Nellie tem uma doce inquietude, uma denúncia demasiado jargão das frentes, a lógica do bombardeamentos que antecederam francesa e transformá-la num campo ensaia tentativas adúlteras denunciada. “Bullet Park” é um armamento ou as opções dos e acompanharam a invasão. Outro de batalha corpo-a-corpo. Uma canhestras e lê Camus fracasso, embora um belo fracasso. políticos e dos generais. Com Antony mito, mais raro, que cai por terra é o loucura que o comandante alemão, (“Camooooo”). Tony é um miúdo Beevor, não se corre esse risco. Em que se refere à relativa brandura dos Chotitz, teve a coragem de não zangado e deprimido. O sofrimento, circunstâncias similares, as suas combates, principalmente quando cometer. como se diz a certa altura, é como História obras dedicadas a Estalinegrado, à comparados com a ferocidade na A festa de álcool, de sexo e de “um principado”, uma zona distante queda de Berlim ou ao assalto a Creta frente Leste. Ora, apesar de as bases júbilo que pôs Paris às avessas nesses e fechada, ou íntima e inexpugnável. conseguiram impor-se à vastíssima de comparação não serem dias de euforia do final de Agosto são Tudo ajuda ou nada ajuda, de O desem- bibliografia pré-existente pela sua homogéneas, Beevor conclui que as levemente referidas no livro (mas são psiquiatras a gurus, o importante é enorme capacidade de nos fazer perdas calculadas por divisão/mês detalhadamente descritas na sua que a vida burguesa mantenha de barque compreender a guerra nas suas foram superiores às registadas nos outra obra, “Paris Após a algum modo a sua fachada plácida: “ múltiplas causas e consequências. Se combates sanguinários das planícies Libertação”, Ed. Bertrand, 2006). (…) raios os partam a todos, pensou que moldou até há muito pouco tempo a História da Ucrânia ou da Bielorrússia. Estava na hora de os franceses o adolescente. Raios partam as luzes militar se afirmava pelas opções dos No seu esforço por chegar o mais iniciarem a sua “épuration sauvage”, brilhantes junto das quais ninguém altos comandos e se decifrava por perto possível da realidade da uma vingança sobre os suspeitos de lê, raios partam a música contínua a Europa mapas e setas que revelavam o guerra, Beevor, um britânico, não se colaboracionismo que matou mais que ninguém ouve, raios partam os sentido das ofensivas, Beevor coíbe de sublinhar a superioridade de 14 mil pessoas, grande parte delas pianos de cauda que ninguém sabe Antony Beevor dá-nos inaugurou com “Estalinegrado”, a militar dos americanos no terreno mulheres acusadas de “collaboration tocar, raios partam as casas brancas sua obra mais conseguida, de 1998, face às tropas inglesas, canadianas e horizontale”. Ou de se dedicarem à hipotecadas até aos algerozes, raios em “D-Day” um retrato um novo balanço entre a frieza da australianas, facto que terá guerra “franco-francesa”, que opôs os partam por saquearem o mar completo das batalhas decisão política e a carga dramática confundido os alemães. Na já velha as diferentes franjas do gaullismo aos para apanharem os peixes como que que mudaram o curso da do quotidiano de milhares de polémica em torno da avaliação dos comunistas. Outras polémicas se alimentam as martas, cujas peles Segunda Guerra Mundial. homens no terreno, soldados e civis, soldados, o autor evita fazer a iniciaram e que ainda hoje usam, e raios partam as suas vencedores e vencidos. A leitura das oposição entre a coragem e o perduram, como se pode ler na obra estantes em que repousa um único Chega a Portugal em suas obras torna-se assim muito mais fanatismo dos alemães e o calculismo de Beevor: seria necessário livro – uma copia da lista telefónica, Outubro. Manuel Carvalho absorvente porque consegue dos soldados aliados. “Os alemães bombardear tão duramente Caen ou encadernada em brocado cor-de- aproximar-nos da realidade total da continuam aí apenas pela coragem St. Lô, matando milhares de civis rosa. Raios partam a sua hipocrisia, D-Day, The Battle for Normandy barbárie europeia iniciada há 70 dos seus soldados. Nós somos 10 sem que a capacidade defensiva raios partam o seu jargão, raios Antony Beevor anos. para 1 na infantaria, 5 para 1 na alemã se tenha ressentido? Teria sido partam os seus cartões de crédito, Penguin Books Não se julgue, ainda assim, que “D- artilharia e temos uma superioridade possível evitar a brutalidade, os raios partam o seu desprezo Day” é apenas o repositório de infinita em meios aéreos”, escrevia o saques e a violência sobre civis pela indomabilidade do mmmmn saberes adquiridos sobre a Batalha General Barton no auge dos cometidas pelas forças invasoras, espírito humano, raios da Normandia revestidos com uma combates, acrescentando: “Temos num quadro de total desumanidade partam a sua lascívia e Poucos episódios nova narrativa. Nas grandes de combater pelo nosso país como os como o de uma guerra? Uma das raios os partam acima de da Segunda divergências de interpretação sobre alemães lutam pelo deles”. Antony feridas que Beevor, de facto, tudo por terem depurado Guerra Mundial a condução da guerra, Beevor toma Beevor, porém, recorda que “não sublinha na operação é o número de a vida daquela força, serão tão partido e ajuda-nos a perceber o devemos nunca esquecer que não se baixas civis francesas, que superou daquele fedor, da cor e conhecidos como contexto geral do conflito. No novo poderia esperar de soldados civis de de longe as mortes de britânicos no do entusiasmo que lhe a série de batalhas livro, sustenta que Churchill teve uma democracia o mesmo nível de decorrer das várias campanhas de dão sentido. Raios, que se sucederam razão quando resistiu à pressão de auto-sacrifício dos membros da bombardeamentos aéreos. raios, raios” (págs.12- à Operação Estaline e do próprio Roosevelt e Waffen-SS, doutrinados e Lugar de actos de barbárie, mas 13). É uma litania Overlord, o decidiu adiar o desembarque de 1943 convencidos de que defendiam o seu também de pungentes testemunhos previsível mas que revela desembarque para 1944 - para que a batalha país da aniquilação”. Não seria esta a de humanidade (como aquele caso uma condição exis-tencial. aliado na Normandia, na madrugada pudesse ser ganha, “era necessária questão principal para o desfecho da de um soldado alemão que se Como se todo o de 6 de Junho de 1944. As fotografias uma superioridade esmagadora e foi guerra, mas a tenacidade alemã e a encontrava com um inglês numa mundo possível de Capa ou filmes como “O Resgate importante a lição do Norte de superioridade tecnológica de adega abandonada na terra de fosse aquele do Soldado Ryan”, de Spielberg, as África, da Sicília e de Itália”, escreve algumas das suas armas ninguém), a guerra na Normandia mundo. lendas que se fizeram em torno de Beevor. Um outro mito desfeito é o (metralhadoras, tanques e armas é talvez o testemunho mais evidente generais como Rommel, Eisenhower, que aponta para a carnificina do anti-tanque) explicam ao menos de que um novo colosso, os Estados Patton ou Montgomery, as aventuras primeiro assalto, principalmente na porque foram precisos dois meses e Unidos, se preparava para a era meio literárias, meio militares, de praia com o nome de código Omaha, meio de combates duríssimos para hegemónica que se seguiu a 1945.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 27 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Este espaço vai ser sobre ele, concordando seu. Que filme, peça de ou não concordando Espaço teatro, livro, exposição, com o que escrevemos? Livros Público disco, álbum, canção, Envie-nos uma nota até concerto, DVD viu e 500 caracteres para gostou tanto que lhe [email protected]. E apeteceu escrever nós depois publicamos.

Sem o poder industrial e sem a um caso com a sogra e um divórcio. demente. É pena que Stuhlmann, de Ciberescritas extraordinária capacidade de Vivia com June Mansfield, bailarina acordo com as suas próprias planeamento dos americanos de cabaré (com quem casou em palavras, tenha deixado de fora as A Bubok.pt está aí dificilmente teria sido possível 1924), que lhe inspirara os primeiros missivas em que Nin e Miller realizar a maior invasão anfíbia da livros, “Moloch” e “Crazy Cock”, e discutem Dostoiévski, Proust, Joyce, empre quis publicar o seu livro e nunca História ou de garantir lhe fazia a vida negra. Anaïs habitava D.H. Lawrence e todos os escritores conseguiu? Agora é mais fácil. Porquê? Porque a supremacia sobre um exército gerido uma grande casa nos arredores de que os fascinavam, para se Bubok já está em Portugal. E o que é a a Bubok?, por oficiais talentosos e formado por Paris, tinha dinheiro, conhecimentos concentrar nos assuntos mais Sperguntam vocês. “É um serviço de auto- soldados fanáticos. A crueldade dos e um desejo insaciável de liberdade e pessoais como o triângulo amoroso publicação on-line e gratuito que oferece a todos combates e o número elevado de de sexo. Hugo proporcionou-lhe a formado por Miller, Nin e June, os os autores a possibilidade de serem os seus próprios vítimas (200 mil baixas entre os primeira, Miller iniciou-a nas mais detalhes da vida alegremente editores”, explicam quando se chega ao “site” português. aliados, 240 mil entre os alemães) desvairadas experiências eróticas. desregrada de Miller e a sua total Na Bubok qualquer pessoa pode publicar e divulgar foram o preço a pagar para que a Nos anos que precederam a Segunda dependência financeira. Isabel gratuitamente as suas obras e pode optar por publicá-las marcha para Berlim se tornasse Grande Guerra, “Paris era uma festa Anaïs conseguia dinheiro de Hugo Coutinho em papel (através da tecnologia Print On Demand) ou inexorável. O encontro no Reno entre em permanente movimento”, como para o escritor sustentar June e para em formato digital. Cada escritor decide o formato do os Aliados e o gigantesco exército disse Hemingway, e foi nessa cidade, satisfazer todas as suas necessidades seu livro, se quer vendê-lo e a que preço pretende fazê- soviético que iniciara a sua marcha onde os artistas e escritores boémios e caprichos (na página 81, escreve lo. Mais: recebe 80 por cento do lucro das vendas e tem imparável para Ocidente após a se misturavam alegremente com Anaïs: “Só conseguia pensar em controlo sobre todo o processo editorial. vitória de Estalinegrado, em patronos endinheirados, que se mandar-te dinheiro para gastares A Bubok encarregar-se-á ainda da cobrança e do Fevereiro de 1943, estava garantido. A desencadeou um dos mais célebres com uma mulher… pensei na negra, envio do livro aos leitores e de remeter mensalmente os Alemanha nazi perdera a guerra e o encontros de amantes, retratado gosto dela, porque consigo sentir a rendimentos dos livros aos respectivos autores. É um Exército Vermelho não chegaria ao nestas cartas escolhidas por Gunther minha suavidade a derreter-se faça-você-mesmo. A empresa já existia em Espanha, Oceano Atlântico. Sem esse sucesso, Stuhlmann, que também editou o nela”). Henry instigava Nin a ser livre mas agora alargou a sua equipa e tem duas pessoas o “mapa e a História da Europa célebre “Diário de Nin”. A leitura é mas queixava-se da distância que ela a trabalhar em Portugal. Dizem que o processo de seriam sem dúvida muito diferentes”. reveladora de alguns aspectos mais impunha amiúde por causa de Hugo. publicação é tão simples que “em apenas cinco passos” ou menos “picantes” da vida de Quanto a Anaïs, apesar dos seus os candidatos a escritores podem tornar “o sonho ambos entre 1932 e 1953, mas não modos livres, comportava-se por [publicar um livro] numa realidade com páginas.” Biografia traz realmente nada de novo para vezes como uma esposa ciumenta e Lançaram até uma obra, que se pode descarregar quem conhece o percurso destas diminuía-se propositadamente como para o computador gratuitamente, que serve de guia duas grandes figuras da Literatura. forma de sedução, “controlando” para quem está a aventurar-se nisto pela primeira vez. Os modernos (Stuhlmann, que também escreve Miller e aconselhando-o em relação a Intitula-se “Como Publicar com a Bubok” e explica desde uma introdução bastante mulheres, comidas, estilos literários, como se deve fazer o registo de utilizador no “site” até O melhor desta informativa, foi um cioso guardador etc. ao processo de publicação do extenso material deixado por Nin, A paixão inicial deu lugar a um (como preparar o seu livro correspondência é a forma tendo criticado asperamente, esfriamento progressivo mas ambos Na Bubok qualquer para fazer “upload” na como os dois escritores juntamente com Rupert Pole, o trataram o assunto de forma pessoa pode publicar Bubok, como convertê-lo em descrevem o “triunfo do último marido da Anaïs, outras obras inteligente, mais ou menos terna e PDF, como desenhar a capa, amor carnal”. sobre ela, como foi o caso da cuidadosa, ao longo dos anos, gratuitamente etc) e também como fazer a biografia de Deirdre Bair). incluindo o tempo que durou a personalização da página de Helena Vasconcelos O melhor desta correspondência é, Segunda Grande Guerra e o regresso as suas obras autor no “site”. Quem preferir indubitavelmente, o estilo de ambos à América. pode optar por comprar Anaïs Nin & Henry Miller. e a forma, umas vezes extensa e Nin teve muitos amantes de ambos o guia numa versão impressa numa encadernação de Cartas de Amor torrencial, outras seca e quase os sexos (Edmund Wilson, Gore Vidal argolas. Trad. de Tiago Marques telegráfica, como descrevem a e Otto Rank contam-se entre os mais Mas os passos de que falam são os seguintes: depois de Edição Caleidoscópio explosão do “triunfo do amor carnal” importantes) e travou uma luta se registar no “site”, o autor faz o “upload” da sua obra e o desenrolar da sua relação. Miller constante entre, por um lado, uma em PDF ou em formato de texto, gratuitamente. A seguir mmmmn não se coibia de arvorar a sua faceta educação católica e a dedicação ao decide se quer que o seu livro seja público ou privado, maníaca, obsessiva e compulsiva, marido, e, por outro, o desejo de pôr aprova o custo de produção e, se for o caso, decide o A história é bem implorando, à prova o seu talento para o amor e preço de venda. conhecida e ameaçando e para a escrita, centrada na afirmação Quem navegar no “site” da Bubok.pt e decidir documentada: expressando um do direito das mulheres ao prazer comprar esse livro em formato electrónico só tem que o escritor amor intenso e erótico. Esse percurso é amplamente descarregar para o seu computador. Se preferir adquirir americano quase documentado nestas cartas, tal como a obra em papel, ela é impressa com a tecnologia POD autodidacta, já no seu “Diário” (uma espécie de (Print On Demand). entrado em anos “work in progress” à maneira de Actualmente a Bubok.pt trabalha apenas com gráficas (41), chega sem “Folhas de Erva” de Walt Whitman) instaladas em Espanha (cuja capacidade de impressão um tostão a Paris, que sofreu cortes, adendas e com a tecnologia POD excede os cinco mil livros por em 1930, dorme em vãos de escada e alterações ao longo dos anos. dia). No futuro, dizem, procurarão estabelecer parcerias em pensões baratas, frequenta tascas Miller não lhe ficou atrás. Viveu com empresas portuguesas. Para já o custo médio da e bares, demonstra uma especial até aos 89 anos, a sua obra é produção para um livro com 150 páginas é de 7,50 euros. predilecção por bordéis, ao mesmo intensamente autobiográfica e foi A Bubok.pt tem também um blogue onde vai tempo que luta por um reverenciado como o homem que colocando dicas para os subscritores do serviço e não reconhecimento que tarda em “libertou” gerações de só. Por exemplo, recentemente explicava-se o que é um chegar; e jovem exótica e muito constrangimentos sexuais e morais. Bubok livro electrónico e o que são os “e-book readers”. inteligente - filha de pai cubano e de Casou cinco vezes, teve filhos e http://bubok.pt É possível seguir a Bubok.Pt no Twitter e no . mãe de ascendência francesa e netos e nunca se esqueceu da amiga Dois meses depois do seu lançamento, já tem mais de um dinamarquesa - casada com um e amante (“Amo-a pelo o que ela Blogue Bubok milhar de seguidores nestas redes sociais. O comunicado banqueiro, Hugo Guiler, escritora ousou ser, pela sua dureza, a sua http://www. de imprensa diz que, em Agosto, a Bubok.pt tem tido a compulsiva de diários e desejosa de crueldade, o seu egoísmo, a sua bubok.pt/blog/ média de uma publicação por dia. “Os autores registados experimentar prazeres até então perversidade, ao seu lado na Bubok.Pt aumentam diariamente e foram capazes de insuspeitados, encontram-se e destrutivo e demoníaco. No Twitter fixar a média, possivelmente recordista entre as editoras iniciam uma relação cheia de furor e Ela conseguia reduzir- https://twitter. portuguesas, de um novo livro publicado a cada dia.” sexo, que durou o resto da vida de me a cinzas sem com/bubok_pt ambos. qualquer hesitação… [email protected] Henry Miller viera da sua cidade, Eu venero-a”). Em Espanha Nova Iorque, deixando para trás http://www. (Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/cibe- viagens à boleia, empregos menores, Henry Miller a nu bubok.es/foros rescritas) um primeiro casamento, um filho, nas cartas a Anaïs Nin

28 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

“Pele”, de Rui Ferreira

Ângelo de Sousa na Quadrado Azul

apontado para esta época são, mais A arte que do que a oposição velhinha entre figuração e abstracção, a da interrogação sobre a pertinência (ou faz figura não) da arte, e a que desta decorre, que se prende com o conceito de “Arriscar o Real” é mais originalidade e autoria. Por isso, a forma e o espaço onde ela se insere, a uma visita de um comissário figura que se faz e a que se desvanece convidado à colecção nesse mesmo espaço acabam por se Berardo. Desta vez, tornar uma espécie de denominador o tema é a figura. comum de toda a produção artística do último meio século, com algumas Luísa Soares de Oliveira incursões pertinentes à arte anterior. O comissário dividiu a exposição Arriscar o Real em três núcleos: “Espaços reais: a De vários autores. figura em recuo”, “O real para lá dos limites: a figura em actos” e “O real Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça do Império - traumático: a figura sob todos os seus Centro Cultural de Belém. Tel.: 213612878. Até 30/08. 6ª das 10h às 22h (última admissão às estados”. O visitante não deixará de 21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom. das 10h às 19h (última reter a sensação de que estas divisões admissão às 18h30). são levemente aleatórias e artificiais: Pintura, Outros. a montagem, voluntariamente labiríntica, provoca contaminações mmmmn entre obras e salas, contaminações essas que acabam por ser mais O convite para trabalhar a colecção provocadoras do que a indicação de Berardo foi desta vez feito a Larry leitura que os títulos dos diferentes Frogner, que escolheu como conceito núcleos sugerem. Globalmente, a o trabalho sobre a figura. “Arriscar o exposição segue uma linha coerente, Real”, a mais recente exposição- que começa na negação da figura e Dan Flavin, exemplo de um artista que abdica da figura como obra montagem da colecção, articula-se acaba no excesso dessa mesma assim sobre a expressão “fazer figura. É isso que importa aqui reter. Anish Kapoor, Cindy Sherman, características da época que figura”, que adquire diversos Mas nem essa negação deixa de Albuquerque Mendes, Cabrita Reis vivemos. Depois de uma passagem sentidos em português – entre os ser ambivalente. A exposição abre (de quem, juntamente com Gina pela tenda listada de Daniel Buren, quais um mais coloquial, sendo com as belíssimas obras Pane, se apresentam novas um espaço limitado que se torna sinónimo de sobressair, distinguir-se, minimalistas e pós-minimalistas da aquisições), Julião Sarmento, Roy quase claustrofóbico, o visitante ser valorizado -, mas que, em todos colecção, de Sol LeWitt a Richard Lichtenstein, Andy Warhol, Bacon, desemboca numa sala onde, a par de eles, guarda sempre uma conotação Serra, núcleo em que também se Helena Almeida, Thomas Ruff, Larry esculturas, um enorme néon laranja em comum: inscrever uma forma podem integrar os sete trabalhos de Bell (cuja magnífica escultura vale, recorda as volutas das imagens do num fundo e, consequentemente, Dan Flavin pertencentes à Colecção por si só, a visita), Frank Stella, José cérebro humano. Depois, os dois permitir à percepção de cada um Panza. Dan Flavin, cuja obra é Loureiro, Ernesto de Sousa, Monory, cãezinhos de Jeff Koons dispõem-se individualizar essa forma. caracterizada pela utilização de Ana Mendietta são alguns dos 200 como esfinges pós-modernas de um É esta definição essencial que o lâmpadas de néon como meio e artistas representados, a quem se lado e do outro da saída: esfinges do comissário destaca no seu suporte da escultura, é um excelente juntam alguns históricos: Picabia, kitsch mais inútil, esvaziadas de programa. Fazer figura, na arte exemplo de como o minimalismo Pollock, Duchamp... No fundo, como qualquer sentido que alguma vez contemporânea (ou seja, aquela que transfere a tarefa de dar sentido à todas estas exposições sobre a possam ter possuído. Por isso, a se produz depois da Segunda Guerra obra para a presença e percepção do própria colecção, esta é também um figura em recuo do primeiro núcleo Mundial), é um pouco a espectador; ou seja, de como abdica modo de a mostrar dinamicamente. da exposição talvez esteja aqui, no condensação de toda a produção da figura como obra e aposta numa Como mencionámos, a mostra fim, no espaço da figura traumática, artística, já que as questões que a realidade que não controla, sempre encerra com obras que traduzem o lugar de todas as contradições e Exposições historiografia e a crítica de arte têm em dinâmico movimento. excesso e a saturação, também sínteses.

Agenda Inauguram Almeida e Sousa, Luís 05/09. 3ª a Sáb. das 10h às 20h. 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 20h. Silveirinha, Sofia Aguiar, Pintura. Pintura, Escultura, Outros. Mikael Levin - Cristina’s History Diogo Guerra Pinto, Tomás A Experiência da Forma Vermelho ou Azul/Red or Blue Colaço, Rosário Rebello de De Joaquim Rodrigo, Artur Rosa, De Daan van Golden. Andrade, Inês Favila, Helena Almeida, António Areal, Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da Marta Wengorovius. Lourdes Castro, Pedro Calapez, Pedro CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das Lisboa. Alecrim 50. R. do Alecrim, 48-50. Tel.: 11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e 213465258. De 01/09 a 03/10. 2ª a 6ª das 11h às 19h. Proença, Rui Sanches, Joana Feriados das 14h às 20h (última admissão às Sáb. das 11h às 19h. Vasconcelos, entre outros. 19h30). Pintura, Outros. Calheta, Vale dos Amores. Estrela à Baixo, Centro das Pintura, Fotografia. Artes - Casa das Mudas. Tel.: 291822808 Até 15/11. 3ª Fotografia. Retrato Número 0 a Dom das 10h às 13h e das 14h às 18h. Mikael Levin conta De Joana Queiroz. Pintura, Outros. Luís Coquenão a história de Cristina Lisboa. Fábrica do Braço de Prata. Braga. Galeria Mário Sequeira - Parada de Tibães. R. da Fábrica do Material de Guerra, 1. Tel.: Ângelo de Sousa/Fernando Quinta da Igreja (Parada de Tibães). Tel.: no Museu Colecção Berardo 218686105. De 03/09 a 27/09. 4ª e 5ª das Lanhas/Francisco Tropa/Paulo 253602550. Até 15/09. 2ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb. Lisboa. Museu Colecção Berardo. Praça 18h às 02h. 6ª e Sáb. das 18h às 04h. Dom. das 15h às Nozolino das 15h às 19h. Espaço 2. 00h. do Império - Centro Cultural de Belém. Tel.: Porto. Galeria Quadrado Azul Q2. R. Miguel Pintura. Luís Coquenão 213612878. Até 08/11. 6ª das 10h às 22h (última Fotografia. Bombarda, 553. Tel.: 226097313. De 01/09 a 10/09. 3ª em Braga, na Mário Sequeira admissão às 21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom. das 10h às a 6ª das 10h às 19h30. 2ª e Sáb. das 15h às 19h30. Control Z 19h (última admissão às 18h30). Inaugura 30/8 às Continuam Pintura, Escultura. De Yonamine. 19h30. Lisboa. Cristina Guerra - Contemporary Art. Fotografia, Instalação, Outros. Pele Serralves 2009 - a Colecção Rua Santo António à Estrela, 33. Tel.: 213959559. De Rui Ferreira. De vários autores. Até 19/09. 3ª a 6ª das 11h às 20h. Sáb. Summer Comes In a Postcard - II Lisboa. Galeria Filomena Soares. Porto. Museu de Serralves. Rua Dom João de Castro, das 12h às 20h. De Tomás Cunha Ferreira, André Rua da Manutenção, 80. Tel.: 218624122. De 01/09 a 210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª das 10h às Vídeo, Instalação, Outros.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 29 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Jazz Coleman, ”Time Out” pelo quarteto improvisações atingiam uma de Dave Brubeck, “Giant Steps” pelo intensidade incendiária, quarteto de John Coltrane (gravado misturando-se com as mensagens Ouro negro! nesse ano e editado no ano seguinte) politicamente empenhadas de e este “Mingus Ah Um”, um dos mais algumas das canções – “Fables of extraordinários discos de jazz de Faubus” referia-se a um governador Reedição de luxo de um dos sempre e um exemplo maior da arte do Arkansas que insistia em manter mais extraordinários discos de Charles Mingus. Possuidor de um a separação entre brancos e negros feitio irascível, “bandleader” de nas escolas, tendo sido censurada de jazz de todos os tempos, excepção e iconoclasta radical, inicialmente pela própria Columbia gravado no mítico ano de apenas comparável a Coleman, – e produzindo um registo poderoso 1959. Rodrigo Amado Mingus passou subitamente, com cujo significado ultrapassa em muito este registo, de figura underground a simples esfera do jazz. Nesta Charles Mingus a um reconhecimento generalizado reedição é ainda incluído o álbum como um dos maiores “jazzmen” da “Mingus Dynasty”, registo que lhe Mingus Ah Um Columbia, distri. Sony altura. “Mingus Ah Um” representou sucedeu tendo ficado um pouco na uma explosão de criatividade, com sua sombra, apesar de incluir temas mmmmm composições e arranjos de génio – como “Gunslinging bird” ou “Mood “Better get it in your soul”, Goodbye indigo”. No longínquo ano pork pie hat” - e execução brilhante de 1959, Ornette a todos os níveis por uma banda que Coleman realizava integrava Booker Ervin, John Handy, Pop Discos as suas famosas Jimmy Knepper, Horace Parlan ou sessões no clube Danny Richmond, entre outros. Five Spot de Nova Sendo o contrabaixista um dos O álbum Iorque, Thelonious Monk dirigia líderes que mais puxava pelos seus uma big band no Town Hall e George músicos, as conven- Os Fiery Furnaces ao volante Russell terminava de escrever as de um disco cantarolável suas influentes teorias sobre jazz cional modal. Cinquenta anos naturalmente -, versos e refrões no passados, muito se tem sítio habitual e a voz de Eleanor, escrito sobre o impacto dos Fiery contadora de histórias que alguns dos discos “extraordinaire”, a lançar-nos nas gravados nesse ano Furnaces canções de “I’m Going Away”, todas tiveram na evolução elas curtos contos sobre relações dos caminhos do jazz que, basicamente, dão, deram ou contemporâneo, “I’m Going Away” é uma hão-de dar para o torto. reavaliando-se agora a admirável subversão “I’m Going Away”, entre o blues- sua importância da ideia clássica de canção. rock movido a anfetaminas da histórica. Foram eles Mário Lopes canção título, o r&b lustroso como “Kind of Blue” pelo memória da década de 1970 sexteto de Miles Davis, Fiery Furnaces (“Charmaine champagne”) ou a “The Shape of Jazz to belíssima queda de “The end is I’m Going Away Come” pelo Thrill Jockey near” – perfeita a linha de piano que quarteto de a guia -, é o álbum “convencional” Ornette mmmmn dos Fiery Furnaces. Por um momento, os Fiery Pianos criando Furnaces esqueceram a música melodias que labiríntica de “Blueberry boat” e o seguimos rock’n’roll Frankenstein de “Widow confiantes, City” para fazer canções, sabendo que não simplesmente canções. Claro que as haverá letras, agora a cargo de Eleanor, inesperadas ainda que menos “cut up” do que mudanças de anteriormente, continuam a ser rumo. Solos no tudo menos convencionais – não sítio certo – a esperávamos, de resto, nada menos seguir ao do que isso. Porque este álbum “Mingus Ah Um” estabeleceu refrão, convencional é, afinal, uma Charles Mingus como génio admirável subversão dessa ideia clássica de canção. Tudo está no sítio certo: o piano e a guitarra de cantautor folk-rock de “Even in the rain”, uma das doze canções da imaculada concepção de “I’m Going Away”. Algo não está exactamente como se esperaria. Ouça-se “Staring at the steeple”: “I’m staring at the steeple / I wonder who’s preaching / They say two women in there / One wears a robe, one wears a crystal / One keeps time, the other keeps a pistol”. Convencionais? Nada disso. Estes tão deliciosamente cantaroláveis Fiery Furnaces de “I’m Going Away” são subversivos com o dom da subtileza.

30 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon álbum dos Arctic Monkeys. guitarras reverberantes, teclados Perspectivemos: chegaram como estelares, rock feito de mistério e mais uma banda da fornada brit de cintilações – “My proppeler”, a início da década e houve quem lhes primeira canção, é de resto a chamasse, pelas letras, “cronistas de introdução perfeita ao novo quadro uma geração”, houve gente que, ao mental da banda. Dito isto, é óbvio vê-los e ouvi-los em todo o lado, se que eles não conseguem negar os irritou ao ponto de colocar um painel genes. Para cada “Potion à entrada do seu estabelecimento approaching”, em que se imaginam comercial: “Proibida a entrada a fãs em jam com os Queens Of The Stone de Arctic Monkeys” – vimos um aviso Age, há algo como a precisão pop do desses, com estes olhos que a terra refrão de “Crying lightning”. Como há-de comer, num pub londrino ali contraponto à tensa paranóia de pelo ano de 2006. “Pretty visitors” – um surpreendente Ora, depois de toda essa euforia, “vaudeville” hard-rock -, existe essa do “hype” e do “anti-hype”, é que as “Secret door” que, lá para o final, se coisas se tornaram realmente transforma em cabaré pop que Jarvis interessantes. Porque os frenéticos Cocker adoraria cantar – “Fools on Arctic Monkeys aprimoraram a parade”, afina Alex Turner. fórmula e, ao contrário da maioria Concisos como deveria ser dos seus companheiros de geração, obrigatório por lei (dez canções, 39 editaram um bom segundo álbum. E minutos), os Arctic Monkeys fazem porque, depois disso, o vocalista e agora “voodoo love songs” (“Fire guitarrista Alex Turner inventou uns and the thud”), embrenham-se em magníficos Last Shadow Puppets, psicadelismos que divagam sem repletos de orquestrações alienar, cantam “tribal dances” com denunciando audições atentas de riffs bombásticos (“Dangerous Scott Walker, e mostrou que havia animals”). Foram ao deserto em vida interessante na anémica cena busca de um espaço que lhes pop britânica. servisse e transformaram-se sem Os Arctic “Humbug” era, portanto, um negar aquilo que são. É oficial: as álbum ansiado com curiosidade. novas cabeleiras assentam-lhes bem. Monkeys Sabíamos que trabalharam com Josh M.L. Homme, sabíamos que andaram a foram ao ouvir Black Sabbath, Nick Cave e Os indies Creedence Clearwater Revival e que brincam ao R&B deserto e não havia hipótese de se repetirem. Estaria a melhor banda britânica do Discovery pós-Strokes e Franz Ferdinand sobrevi- LP prestes a entregar-se às delícias da XL Recordings; distri. Popstock catarse “caveana” e do peso veram “Sabbath”? Ouvido “Humbug”, a mmmnn resposta é sim – mas não propriamente. Um tipo dos “Humbug” tem um sinistro No novo álbum, desaparecem os Vampire Weekend, psicadelismo de “road- polaroids do quotidiano juvenil, o teclista Rostam movie”. Mário Lopes desaparece a quase neurótica Batmanglij, e outro efervescência que lhes conhecíamos, dos Ra Ra Riot, Arctic Monkeys substituídos por um sinistro Wes Miles, juntam- psicadelismo de “road movie”: se à volta de Humbug Domino; distri. Edel Os Arctic Monkeys deixaram crescer o cabelo mmmnn

Basta vê-los para perceber que algo mudou. O cabelo curto, certinho, deu lugar, com a excepção do baterista Matt Helders, a barbas e melenas mais consentâneas com rock’n’roll de riffalhada monumental e psicadelismos avulsos. Claro que é um pouco, digamos, idiota analisar a evolução musical de uma banda tendo por base um corte de cabelo, mas não será isso a deter-nos. Pegamos no cacho capilar caindo- lhes sobre os ombros, juntamos-lhe uma estadia nos estúdios no deserto de Joshua Tree com Josh Homme, ele dos Queens Of The Stone Age, e chegamos aos “uh uhs” à “Sympathy for the devil” de “Potion approaching”, uma das canções de “Humbug”, o terceiro

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 31 Discos

Discovery, eufóricos e efémeros como este Verão

sintetizadores e imaginam-se uns discos a solo e colaborações (em Loren Connors, outro guitarrista. Jean-Efflam Bavouzet fez uma das melhores Daft Punk em estreita colaboração grupos regulares ou formações “ad É notório que a arte de Mota gravações de sempre dos Prelúdios de Debussy com Timbaland. O resultado é “LP” e, hoc”) com gente igualmente reside no próprio acto de tocar, à primeira audição, é bizarro e respeitada como David Maranha, Sei entendido enquanto procura e FAIR J HENRY inesperado, com os seus arpeggios de Miguel e Margarida Garcia. Este descoberta (é por isso que se diz um sintetizador, a voz alienígena de “auto- corpo de trabalho, iniciado em 1989, músico de jazz, género que, como tune” e efeitos de produção que, tem em “Sings”, lançado na pequena explicou numa entrevista, “sacraliza suspeitamos, nascem mais do gozo de editora montada pelo músico, um o momento de execução, o tocar”). dois músicos com a maquinaria que novo episódio. “Sings” pode ser comparado a uma têm à frente do que de uma firme Gravado unicamente com guitarra imagem que sugere um desenho intenção criativa. Ora, acontece que eléctrica, depois de o antecessor, através de vários pontos dispersos, essa impressão inicial não perdura. “Outubro”, de 2006, ter mostrado sem linhas a uni-los. A sua beleza Sim, “LP” é bizarro e inesperado, também o lado acústico de Manuel está na união dos pontos, tarefa que mas também contagiante e Mota, “Sings” partilha das o guitarrista entrega também ao absurdamente solar e optimista. características que tornaram a sua ouvinte. Miúdos indie a atirarem-se música reconhecível e única, apesar descomplexados às mecânicas da das naturais comparações a produção r&b moderna e, entre guitarristas como Derek Bailey (que Clássica palmas sintetizadas e uma distorcida qualificou o português com um ideia de soul, a inventar um conjunto guitarrista “radical”): meditativa, de pérolas pop incrivelmente lúdicas, profundamente interrogativa, Prelúdios inevitalmente descartáveis. imprevisível, simultaneamente Chamam Amber Deradoorian, dos austera e confortável. a Debussy Dirty Projectors, para criar o girl Para Manuel Mota, experimentar group futurista de “I wanna be your não significa subverter ou destruir, boyfriend” e transformam o vocalista antes pesquisar e interiorizar a Nem sempre os grandes dos Vampire Weekend, Ezra Koening, linhagem dos estilos musicais (o nomes oferecem as num Justin Timberlake alternativo – jazz, no sentido mais aberto do melhores gravações, como um, entenda-se, que aprecia mais os termo, os blues, a improvisação capacetes dos Daft Punk que o livre) para apresentar algo que é comprovam recentes “moonwalk” de Michael Jackson. marcadamente seu. E “Sings” gravações de Debussy. Michael que, de resto, com demonstra esta atitude de forma Rui Pereira inadvertido sentido de “timing”, brilhante. O músico assume que teve surge em “LP” numa versão de “I como referencial o jazz, em especial Debussy want you back”, possivelmente a Billie Holiday, afirmação que se Prelúdios melhor canção dos Jackson 5, toda estranha inicialmente, mas que se Jean-Efflam ele sintetizadores-orquestra a marcar percebe depois: Mota refere-se ao Bavouzet, piano a melodia e sintetizadores-bola-de- seu discurso à guitarra, elíptico e Chandos 10421 sabão a esvoaçar entre a voz esparso à superfície, mas, quando distorcida até ao delírio. apreciado ao detalhe, melódico e mmmmm “LP” tinha tudo para resultar mal, extremamente trabalhado. para ser um impressionante monu- “Sings” caracteriza-se pela Prelúdios I, mento ao mau gosto - daqueles tão gravação caseira e pela contenção de Children’s realmente maus que são bons. Aplau- meios, habitual nos últimos discos a Corner sos então para Rostam e Wes. A inv- solo de Manuel Mota (apenas uma Nelson Freire, entidade do R&B, o espírito festivo do guitarra eléctrica, tocada com os piano electropop, os flashes do Daft Punk e dedos, sem palheta, nem pedais de Decca 4781111 um sentido pop assinalável: um efeitos). Entremeia frases de guitarra álbum tão eufórico e efémero quanto com o silêncio, parte fundamental mmmnn mesmo galardoado com o título de carreira pianística teve nos últimos o Verão em que o ouvimos. M.L. desta música. Na maior parte do Melhor disco do ano instrumental anos um novo fôlego e nos dois tempo o som é seco, mas, a espaços, O registo de Jean-Efflam Bavouzet, em 2009 pela prestigiada revista da últimos anos foi distinguido com Mota joga com a reverberação das pianista que tem vindo a gravar a BBC. Desde logo, porque o pianista importantes galardões (escolhas do O desenho cordas. Apesar das diferenças, integral do compositor francês, francês segue a edição revista da editor e melhor álbum do ano) da lembra, por vezes, a melancolia de merece amplos louvores e foi Durand (1991), partitura que veio revista britânica Gramophone. Era corrigir alguns erros gravíssimos e pois, com especial interesse que se escondido A guitarra de Manuel Mota é sempre uma descoberta amplamente discutidos pela aguardava a sua mais recente comunidade internacional de gravação num mercado saturado de Nem jazz, nem blues, nem musicólogos, e porque é um oferta em Debussy mas que recebe virtuoso de grande calibre. A sua sempre com entusiasmo mais uma improvisação livre, mas visão é extremamente analítica, versão de “um dos grandes”. No tudo isso ao mesmo tempo: reflectindo uma visão polifónica de entanto, a sua abordagem é “Sings” é a visão sobre a grande detalhe e uma total desligada de qualquer interesse pelo compreensão do protagonismo de rigor para com a investigação sobre guitarra eléctrica de um cada linha. Debussy era obcecado as obras e Nelson Freire segue uma músico único. Pedro Rios pelo detalhe, usando mesmo versão desactualizada da partitura tamanhos de escrita diferente para que perpetua erros amplamente Manuel Mota destacar a importância de cada voz discutidos pela comunidade (recurso utilizado no 2º caderno científica e que já foi rectificada em Sings Headlights, distri. Flur dos Prelúdios). Parte da integral 1991. Numa primeira audição o seu completa de Debussy, o presente som imediato é cativante por ser um mmmnn disco ombreia com as melhores pouco mais cheio do que o dos seus gravações e transmite uma pares, aparentemente rico em Manuel Mota é interpretação informada, harmónicos. Mas depois perde por uma das de tempo rigoroso como Debussy um sentido de intuição que não é luminárias da aclamava. suficiente para transmitir toda a música O pianista brasileiro Nelson Freire riqueza da obra de Debussy, quer experimental possui qualidades extraordinárias e nos Prelúdios quer na Childrens portuguesa, com um som de ouro. A sua longa Corner.

32 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Pop com vozes secundárias como nos anos 90”. Los Angeles, a cidade onde vive, O quarto influenciou a criação desta “música de dança de quarto”, como lhe chamou a revista é uma pista digital de música “Dusted” (que notou que a pista de de dança dança pode ser um lugar tão solitário como um quarto). “Descobri que as pessoas gastam Ramona Gonzalez comprou mais tempo consigo mesmas aqui e equipamento barato, socializam menos. Isso leva ao fechou-se num quarto desenvolvimento do ‘eu’, à introspecção e, talvez, ao egoísmo”. e fez “Good Evening”, O que Nite Jewel tem de música de conjunto de canções pop dança surge sem esforço: o facto de enevoadas, entre a dança e a as canções “serem dançáveis é um introspecção. Pedro Rios acidente feliz”. Dizemos-lhe que não a Nite Jewel imaginamos a gravar um disco com uma produção mais sofisticada; ela Coimbra. Via Latina. R. Almeida Garrett, 1. Quinta- feira, dia 2, às 23h. Tel.: 239820293. 7€. responde que estamos errados. “Adoraria fazer um disco num Com o dinheiro de uma bolsa estúdio com um bom sistema de escolar, Ramona Gonzalez comprou gravação e microfones super caros. um sintetizador, um “sampler”, um Com efeito, a próxima coisa que gravador portátil de cassetes de oito gravar será analogicamente, mas pistas e um microfone. “Parei de não em cassetes [como “Good socializar e comecei a estudar e a Evening”]. Mas numa coisa está gravar as minhas composições. A correcto: não me vejo a gravar algo dada altura, as pessoas directo para o computador”. encorajaram-me a pôr as canções em vinil”, explica Gonzalez, por e- mail. Este processo, “muito fluido e O previsível inconsciente”, resultou em “Good Evening”, álbum de estreia do seu projecto Nite Jewel, editado no fim fim do Verão do ano passado. Gonzalez, que se apresenta pela Uma mostra da melhor primeira vez em Portugal (dia 3 em Coimbra, dia 4 no Plano B, Porto, e música portuguesa nas dia 5, na ZDB, Lisboa), tem Três noites no quarto com Nite Jewel, Noites Ritual, hoje e recolhido elogios em diferentes a partir de quinta-feira amanhã no Porto.

Concertos círculos, desde os adeptos da música electrónica aos da pop Pedro Rios experimental. “Good Evening” é Noites Ritual um conjunto de canções Porto. Palácio de Cristal. R. D. Manuel II. Hoje e influenciadas pela disco de outros amanhã, às 21h30. Tel.: 226057080. Entrada tempos, pela languidez dos Roxy gratuita. Music (traz uma versão de “Lover”, Dia 28: Deolinda + Dead Combo um lado B da banda de Bryan Ferry) + Foge Foge Bandido + Noiserv e pela pop dançável de figuras + Peltzer + One Man Hand esquecidas como Debbie Deb. Ao Dia 29: Mão Morta + Blind Zero vivo, Gonzalez faz-se acompanhar + Os Pontos Negros + Hot Pink Abuse por dois outros músicos. + Andrew Thorn + Paul da Silva Tal como Ariel Pink, seu amigo, Nite Jewel remexe no baú da É uma espécie de fim não oficial da história da música popular para época de festivais de Verão. O que criar canções deslavadas, atrai nas Noites Ritual é a enevoadas e desfocadas - constância: duas noites, dois palcos características que tornam esta pop (colocados nos sempre magníficos tão experimental quanto acessível. jardins que rodeiam o Pavilhão Rosa “Durante algum tempo fui Mota) e uma selecção da melhor apaixonada pela música do Ariel, música portuguesa. O cartaz deste por isso é normal que os meus ano não é excepção e há seis nomes projectos criativos acabem por da primeira linha da música tocar no dele. Mas não sei se a nacional e um conjunto névoa na música do Ariel é interessante de promessas a ter em equivalente à minha. Talvez tenha conta. tudo a ver apenas com o [gravador Hoje, Manel Cruz mostra na sua de] oito pistas. Mas adoro essas cidade o que andou a fazer durante qualidades”, diz Gonzalez, nove anos. Foi esse o tempo, com desiludida com a pop actual. “As muitas intermitências, que levou a pessoas estão a produzir em confeccionar “O Amor Dá-me demasia a sua música”, corrobora. Tesão/Não Fui Eu Que Estraguei”, o “Deixem as canções falarem por si primeiro álbum de Foge Foge mesmas, não precisamos de faixas Bandido, editado no ano

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 33 Acompanho a viagem embebida em fumo e Coimbra a dar corpo e musical de Mazgani desde álcool à Tom Waits e o forma num contrabaixo Espaço a casa de partida e foi com amor escrito a sangue de aos sonhos e pesadelos Público grande espanto e emoção Nick Cave, num céu onde cantados, é uma viagem que assisti ao concerto no abutres combatem por musical da qual não Cineteatro João Mota, em um corpo que se deixe apetece voltar. Sesimbra. Se no primeiro adormecer à sombra de Foi um deleite ver disco habitava uma uma árvore enfeitiçada. Shahryar dançar entre produção muito polida, O formato trio, com chamas, gritando a como se imperasse o medo Shahryar a dançar entre plenos pulmões como se de deixar a nu algum a voz e a guitarra de duas o mundo fosse acabar no

Concertos grão de sujidade, agora faces, Sérgio Mendes dia seguinte. entramos num universo a desenhar paisagens Pedro Miguel Silva, bem diferente, algures inóspitas numa guitarra 35 anos, técnico de entre a declamação deslizante e Victor comunicação RITA CARMO RITA

Agenda Sexta 28 Obituary + Firewind + Textures A digressão dos Xutos & Pontapés continua: Corroios e Grândola Rossio da Vila, às 21h. Tel.: 245990110. 8€. + Disbelief + Dark Moor + The Festival do Crato. Emir Kusturica Temple + One Man Army and The Reamonn & No Smoking Orchestra Undead Quartet + Thanatoschizo Crato. Recinto da Feira. Rossio da Vila, às 23h00. Crato. Recinto da Feira. Rossio da Vila, + Desire + Witchbreed + Killem Tel.: 245990110. 8€. às 23h30. Tel.: 245990110. 8€. + Seregon + Confront Hate + Festival do Crato. Festival do Crato. Decrepidemic + Solid Spectrum Ilha do Ermal, a partir das 14h. 30€ (dia) a 60€ Sepultura + Pestilence JP Simões (passe). + Korpiklaani + Hatesphere Crato. Recinto da Feira. Rossio da Vila, às 20h45. Festival Ilha do Ermal 2009. + Nightrage + Heavenwood + The Tel.: 245990110. 8€. Festival do Crato. Firstborn + W.A.K.O. + Wykked Sábado 29 Wytch + Concealment + E.A.K. Susana Félix + Sérgio Godinho + De Profundis + My Enchantment + António Eustáquio Josh Wink + Super Mayer + Assassinner + My Eyes Inside Crato. Recinto da Feira. Rossio da Vila, às 22h. + Buraka DJ + Lovefoxx Ilha do Ermal, a partir das 14h. 30€ (dia) a 60€ Tel.: 245990110. 8€. + Rui Vargas + Miguel Rendeiro (passe). Festival do Crato. + Nuno Lopes + Mo Horizons Festival Ilha do Ermal 2009. Soundsystem + Kumpania José Cid Grândola. Parque de Feiras e Exposições, Algazarra + João Dinis Domingo 30 Azurara. Praia de Azurara, a partir das 17h. às 22h. Tel.: 269750260. Entrada gratuita. 12€ (pré-venda) a 17€. Rita Redshoes Quarteto Liandara Azurara Beach Party 09. Grândola. Parque de Com Daniel Ferreira (violino), Feiras e Exposições, Ângela Silva às 22h. Tel.: António Pereira (viola d’arco), e Francisco Sassetti 269750260. Entrada Raquel Andrade (violoncelo), Lisboa. Jardim Botânico de Lisboa. gratuita. Lígia Madeira (piano). Rua da Escola Politécnica, 58, às 19h. Lisboa. Jardim Botânico de Lisboa. Rua da Escola Tel.: 213921800. Entrada gratuita. Amália Hoje Politécnica, 58, às 19h. Tel.: 213921800. Entrada Alcobaça. Praça do Clássicos na Rua. Obras de Mosteiro, às 22h. Tel.: gratuita. Lacerda, Carneyro, Neves, Clássicos na Rua. Obras de Brahms 262580843. Entrada Santos, Carrapatoso, Pearce gratuita. e Mozart. de Azevedo e Moraes Graça. Rui Veloso André Sarbib Adriana Cascais. Baía, às 22h. Porto. Clube Literário do Porto - Piano-bar. Rua Lovefoxx Estoril. Centro de Congressos do Tel.: 214815810. Entrada Nova da Alfândega, 22, às 23h. Tel.: 222089228. Giovanni Andreoli. Martinho da Vila Estoril. Av. Amaral, 21h30. Tel.: na Azurara gratuita. Entrada gratuita. Figueira da Foz. Centro de Artes e Vale de Milhaços. Quinta da 214647575. 10€. Festas do Mar. Jazz no Clube. Espectáculos - Grande Auditório. R. Marialva. Corroios, às 22h. Tel.: Beach Party Estoril Summer Abade Pedro, às 22h. Tel.: 212535814. Entrada gratuita. Set Ópera Viva Fun’09. 233407200. 20€. Vaguement la Jungle Lisboa. Parque Mayer. Travessa do Barcarena. Fábrica da Pólvora de Barcarena. Mandrágora Salitre, às 21h30. Tel.: 966917499. Estrada das Fontaínhas, às 22h. Tel.: 214387460. Tucanas Seun Kuti Torres Novas. Praça 5 de Outubro, às 22h. 5€. Entrada gratuita. Sesimbra. Cine-Teatro Lisboa. Centro Cultural de Entrada gratuita. Lisboa ao Parque. Festival Sete Sóis Sete Luas 2009. Municipal João Mota. Av. Belém - Grande Auditório. Liberdade, 46, às 22h. Rita Redshoes Praça do Império, às 21h. Tel.: José Cid Tel.: 212288715. 10€. 213612400. 5€. Lamego. Av. Dr. Alfredo Sousa, às 22h00. Melech Mechaya Xutos & Pontapés nas festas de Grândola Estoril. Centro de Congressos do Vale de Milhaços. Quinta da Marialva. Corroios, às CCB Fora de Si. Tel.: 254609600. Entrada gratuita. Estoril. Av. Amaral, às 21h30. Tel.: 22h. Tel.: 212535814. Entrada gratuita. Gala de Ópera Pela Companhia Ver texto na pág. 19. Deolinda 214647575. 2,5€. The Gift Portuguesa de Ópera. Lisboa. Parque Mayer. Travessa do Salitre, Estoril Summer Cascais. Baía de Cascais, às 22h. Tel.: 214815810. Direcção musical de Polkaholix às 21h30. Tel.: 966917499. 5€. Fun’09. Entrada gratuita. Vila Real. Teatro de Vila Real Lisboa ao Parque. Festas do Mar. - Auditório Exterior. Alameda Blind Guardian de Grasse, às 22h30. Tel.: 259320000. Emir Kusturica & No Smoking + Angra + Ramp António Zambujo Entrada gratuita. Orchestra + Nightmare Lisboa. Parque Mayer. Travessa do Salitre, às Festival de Músicas Albufeira. Marina, às 22h. Tel.: 289510180. 15€. + Thunderbolt + Men 21h30. Tel.: 966917499. 5€. do Mundo. Eater + Deville Lisboa ao Parque. The Gift Crato. Recinto da Feira. + Pitch Júlio Pereira Caldas da Rainha. Praça da República, às 22h30. Tel.: 262889650. Entrada gratuita. Carminho Estoril. Centro de Congressos do Estoril. Av. Amaral, às 21h30. Tel.: 214647575. 2,5€. Estoril Summer Fun’09. SERGIO AZENHA

Domingo é dia de Amália Hoje em Alcobaça

J.P. Simões faz companhia a Kusturica no Crato

34 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Rodrigo Gonçalves regressa a Tribology no Museu do Oriente

Jazz

Black + Gauntlet + Switchtense O aguardado + Crushing Sun + Sound Storm + Angriff + Minim + Duelo Eterno Ilha do Ermal, a partir das 14h. 30€ (dia) a 60€ regresso (passe). Festival Ilha do Ermal 2009. O pianista Rodrigo Segunda 31 Gonçalves regressa Xutos & Pontapés aos palcos como líder, Grândola. Parque de Feiras e Exposições, às 22h. Tel.: 269750260. Entrada gratuita. numa reformulação do Ensemble Português de seu aclamado projecto Tubas “Tribology”. ter maior impacto no meio do jazz projectos colectivos, nomeadamente Guimarães. Praça da Oliveira, às 22h00. Tel.: 253424700. Entrada gratuita. Rodrigo Amado nacional. Gravado com a o Septeto do Hot Clube de Portugal. Encontros Internacionais participação dos saxofonistas Mark Cinco anos após a sua estreia de Música de Guimarães. Rodrigo Gonçalves Turner e Perico Sanbeat e discográfica, o pianista regressa consagrado como um dos melhores agora com uma reformulação do Quinta 3 “Tribology Vol.2” Com Jesús Santandreu, Mário lançamentos do ano, representou na mesmo projecto, desta vez liderando altura a consistência e a qualidade uma banda que integra o excelente Liftoff Delgado, Bernardo Moreira e Com Jeffry Davis (vibrafone), Carlos Miguel que começavam a ser alcançadas saxofonista espanhol Jesús Óscar Graça (piano), Nélson Cascais por alguns dos mais jovens músicos Santandreu, o guitarrista Mário Manuel Cruz em casa Lisboa. Museu do Oriente - Auditório. Av. (contrabaixo), Alexandre Frazão do nosso país. Após esse poderoso Delgado, o contrabaixista Bernardo nas Noites Ritual, com o projecto Brasília - Edifício Pedro Álvares Cabral - Doca de (bateria). Alcântara Norte. Hoje, às 19h. Tel.: 213585200. 5€. arranque, Gonçalves optou, no Moreira e o baterista Carlos Miguel. Lisboa. Centro Cultural de Belém - Cafetaria Foge Foge Bandido entanto, por se dedicar a projectos Serão interpretados temas originais Quadrante. Praça do Império, às 22h. Tel.: 213612400. Entrada gratuita. passado. É uma notável manta de Editado em 2004, “Tribology” de outros músicos, como é o caso da do pianista, num jazz dinâmico de Jazz às 5.ªs. retalhos na qual se encontram as (vol.1) foi um dos discos de estreia a Song Band de Laurent Filipe, ou a filiação bop e colorações ibéricas. melhores canções de Cruz depois Da Weasel + Kumpania do fim dos Ornatos Violeta. Algazarra Montemor-o-Novo. Parque Seguem-se os Dead Combo, autores de Exposições Municipal, de uma maravilhosa ponte entre às 21h30. Tel.: Carlos Paredes, e 266898100. Entrada outras latitudes, e o fenómeno de gratuita. popularidade Deolinda, com as suas canções, ora melancólicas, ora garridas e atrevidas, em que se divertem a brincar com a tradição musical portuguesa - sem reverências, como convém às coisas vivas. “Canção Ao Lado”, o disco de estreia dos lisboetas, já vendeu mais de 40 mil exemplares. Amanhã, as Noites Ritual recuperam o “rock” que já fez parte do seu nome. Os Pontos Negros PASCAL GUYOT/ AFP mostram a quem ainda não sabe de que é feito o seu “Magnífico Material Inútil” (algumas pistas: têm a pose “cool” dos Strokes e uma urgência que lembra o rock’n’roll português dos anos 1980). Os Blind Zero jogam em casa e devem aproveitar para revelar canções de “Luna Park”, o sexto disco da sua carreira. “Slow time Emir Kusturica love”, o primeiro “single”, deixa traz a No Smoking Band contaminar-se por melodias de ao Crato e a Albufeira órgão e mostra um lado épico inédito na banda do Porto (lembra até os U2). Os Mão Morta, pela quarta vez nas Noites Ritual, já não editam um disco “normal” desde 2004. O último registo do grupo de Braga foi “Rituais Transfigurados”, a banda- sonora que fizeram para acompanhar a projecção de curtas- metragens de Maya Deren, pioneira do cinema experimental, no festival Curtas de Vila do Conde de 2008. No concerto de amanhã, espera-se, no entanto, a habitual sucessão de hinos do rock marginal português, em jeito de pré-bodas de prata - em Novembro, os Mão Morta cumprem 25 anos de carreira.

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 35 Jorge Luís M. Mário Vasco As estrelas do público Mourinha Oliveira J. Torres Câmara 4 Copas mmnnn mmmnn mmmmn mmmnn Blood: O Último Vampiro a nnnnn nnnnn nnnnn Duplo Amor mmmnn mmmmn nnnnn mmnnn Inimigos Públicos mmmnn mmmmn mmmmn mmmmn Nunca é Tarde Demais nnnnn mnnnn nnnnn nnnnn Ponyo à Beira-Mar mmmnn nnnnn mmmmn nnnnn As Praias de Agnès mmmnn mmmmn mmmmn mmmnn Sacanas sem Lei mmmmn mmmmn nnnnn mmmmn Sinédoque, Nova Iorque mmmnn nnnnn nnnnn mnnnn Up-Altamente mmmmn mmmnn mmmnn mmmnn

Campo Pequeno Praça de Touros: Sala 2: 5ª 6ª 14h, 17h30, 21h 6ª Sábado 14h, 17h30, 21h, 00h20; inimigo. É o que faz Shosanna, a Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h30, 21h30, ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado miúda judia que gere o cinema que é Justiça 00h30; CinemaCity Classic Alvalade: Sala 3: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h30; Domingo 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h35, 21h30 6ª Sábado ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado o lugar central da acção, quando 13h35, 16h35, 21h30, 00h30; Medeia Fonte Nova: Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 17h, 21h10, 00h35; ZON interpõe, por entre as imagens do poética Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado filme de propaganda dos nazis, 17h30, 21h30; Medeia Monumental: Sala 4 - Cine Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 17h10, 21h10, 00h35; ZON Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 16h, Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª Sábado Domingo planos de si própria, em estética e outros 19h, 22h; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h25, 21h, 00h35; ZON quase “riefenstahliana”, a anunciar 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h20, 21h30, 00h25 Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª aos presentes o que lhes vai Domingo 11h30, 15h15, 18h20, 21h30, 00h25; UCI 3ª 4ª 14h, 17h35, 21h10, 00h40 assuntos Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª acontecer (e o plano em que o ecrã 3ª 4ª 15h15, 18h15, 21h15, 00h15; ZON Lusomundo Faríamos mal em acreditar que está já a ser consumido pelas Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª “Sacanas sem Lei” é o simples filme chamas mas ainda se vê a imagem da 13h30, 16h50, 21h10, 00h25; ZON Lusomundo Ao centrar o filme no poder Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, de aventuras na Segunda Guerra rapariga a gritar algo como “olhem das imagens e das palavras, 17h30, 21h, 00h10; ZON Lusomundo Mundial que a publicidade (alguma, bem para mim, eu sou o rosto da CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª pelo menos) tem querido vender. vingança judaica!” é o plano mais Quentin Tarantino dá a 13h10, 17h, 21h, 00h25; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h30, Tarantino recolhe elementos de absolutamente assombroso de “Sacanas sem Lei” uma 21h, 00h20; ZON Lusomundo Dolce Vita Miraflores: múltiplos filmes de aventuras, na “Sacanas sem Lei”). E é, a outro 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, 21h20 6ª Sábado Segunda Guerra Mundial e não só nível, o que fazem os “Bastardos”, o dimensão que transcende 15h, 18h10, 21h20, 00h30; ZON Lusomundo Odivelas em muito a questão da Parque: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, (em certos momentos, a memória do grupo de americanos que dá ao 16h30, 21h, 00h10; ZON Lusomundo Oeiras Parque: “western”, como género e como nome ao filme mas tem uma Segunda Guerra Mundial. 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 17h, 21h, “mundo”, é extremamente presença quase secundária (em 00h20; ZON Lusomundo Torres Vedras: 5ª 6ª Luís Miguel Oliveira Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h30, 21h, importante), mas o que faz com eles termos de “screen time”, pelo 00h20; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª está bem longe de ser simples ou, menos), com a história das suásticas Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h30, 21h, sequer, típico. Por outro lado, e isto cravadas nas testas dos nazis que Sacanas Sem Lei 00h15; Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª Inglourious Basterds 3ª 4ª 15h30, 18h30, 21h30 6ª 15h30, 18h30, 21h30, também é uma razão, esta Segunda encontram pelo caminho: usar a 00h30 Sábado 12h30, 15h30, 18h30, 21h30, 00h30 De Quentin Tarantino, Guerra Mundial não é bem a que imagem do inimigo, dominá-la, e Domingo 12h30, 15h30, 18h30, 21h30; Castello Lopes conhecemos. Ou é a que utilizá-la contra ele (alguns dos nazis com Brad Pitt, Diane Kruger, Daniel - Fórum Barreiro: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo Bruhl, Samuel L. Jackson, Mike 2ª 3ª 4ª 12h30, 15h30, 18h30, 21h30; Castello Lopes conhecemos mas com um “twist”, o de “Sacanas sem Lei” terão tido mais - Rio Sul Shopping: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo Meyers, Michael Fassbender, Mélanie “twist” suficiente para a lançar dificuldade em viver anonimamente 2ª 3ª 4ª 12h30, 15h30, 18h30, 21h30, 00h30; UCI numa espécie de universo na América do Sul, depois da guerra, Laurent, Eli Roth. M/16 Freeport: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15,

Cinema 18h15, 21h20 6ª Sábado 15h15, 18h15, 21h20, 00h25; alternativo. Na cena crucial de do que os seus equivalentes da vida MMMMn ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado “Sacanas sem Lei”, quando as pilhas real). Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h30, 21h, 00h20; ZON de rolos de película de nitrato Justiça poética, claro, que como Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª Sábado Lisboa: Atlântida-Cine: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 17h, 21h, 00h15 pegam fogo ao estado-maior do sabemos não tem forçosamente a 15h30, 21h30 Sábado Domingo 15h30, 18h15, 21h30; Terceiro Reich, torna-se claro que ver nem com “justiça” nem com Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Porto: Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h35, 15h35, 18h35, 21h35; Domingo 2ª 3ª 4ª 15h05, 18h15, 21h30, 00h40; Tarantino não reconstitui, reinventa, “poesia”. É outra das coisas que liga Castello Lopes - Londres: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, e que o seu filme é um exercício de “Sacanas sem Lei” aos filmes de Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 18h45, 21h45; 21h35 6ª 15h30, 21h35, 00h25 Sábado 14h55, 17h50, história alternativa, de história Tarantino como “Kill Bill” ou Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 6: 5ª 6ª 21h35, 00h25 Domingo 14h55, 17h50, 21h35; Medeia Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h40, 18h45, Cidade do Porto: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª ficcional. “Deathproof” - e a personagem de 21h50; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª 3ª 4ª 14h30, 18h, 21h30; ZON Lusomundo Dolce Não necessariamente implausível Shosanna, cuja família é morta na 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 23h40; CinemaCity Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, nos seus pormenores decisivos - a primeira sequência, obviamente se Alegro Alfragide: Cinemax: 5ª 6ª Sábado Domingo 16h20, 21h, 00h25; ZON Lusomundo GaiaShopping: 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h35, 21h30, 00h30; CinemaCity 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h20, 17h50, 21h10 6ª película de nitrato ardia facilmente aparenta com as mulheres em Beloura Shopping: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo Sábado 14h20, 17h50, 21h10, 00h20; ZON (como, se por mais nada, o leitor missão de vingança desses filmes. 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h30, 21h30, 00h30; CinemaCity Lusomundo MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª saberá através do “Cinema Paraíso” Filme sobre imagens, “Sacanas de Tornatore…) e os nazis gostavam sem Lei” não é menos um filme muito de assistir a estreias de gala sobre palavras. Tarantino, dos seus filmes de propaganda. Essa dialoguista genial que chega ao cena do incêndio, e como Tarantino ponto, nas entrevistas, de dizer que não se tem cansado de dizer em se vê como um “escritor” antes de entrevistas, reflecte o “poder do ser ver como um cineasta, constrói cinema” de modo simultaneamente praticamente todas as sequências “literal e metafórico”. Ora tendo o como “peças de conversa”, Terceiro Reich vivido pelo cinema, e integralmente assentes num sido em parte não negligenciável delicado equilíbrio do poder uma construção para o cinema, que decorrente da linguagem e de quem aqui o Terceiro Reich morra pelo a usa, e de como a usa – não é por cinema é menos um cúmulo acaso que uma das cenas mais absurdista do que um fecho de prodigiosamente tensas de “Sacanas círculo, tão lógico e inevitável como sem Lei” (a da taberna, com o jogo qualquer outro. Num certo sentido, das adivinhas) decorre sob o signo a Segunda Guerra de Tarantino é dos sotaques e das expressões uma guerra decidida pelas imagens, idiomáticas (mesmo quando são combatida com as imagens. Mais apenas gestuais, como descobre o uma vez, o exagero é muito leve: pobre oficial inglês interpretado por toda a propaganda de qualquer dos Michael Fassbender). E ao centrar o lados em conflito sabia-o bem, fosse filme, com uma expressão quase o lado dos alemães, dos americanos teórica, no poder das imagens e das “Sacanas sem Lei” é um ou dos ingleses (Churchill chegou a palavras, no poder da linguagem filme sobre imagens, mas também comparar um filme, o “Mrs Miniver” visual e da linguagem falada, sobre palavras: Tarantino é um de Wyler, a um “bombardeiro”). Um Tarantino conquista-lhe uma dialoguista genial elemento essencial da propaganda dimensão fria, “intelectual”, nem consistia numa apropriação da por isso demasiado subterrânea, que imagem do inimigo, para a desviar, transcende em muito a questão da para a tornar na caricatura de si Segunda Guerra Mundial. É um filme próprio. Em “Sacanas sem Lei” isto sobre o poder e sobre os é, mais uma vez, “literal e instrumentos do poder - que hoje já metafórico”: tudo se joga pela não são analógicos mas digitais. maneira como se podem controlar, Como se pega fogo a um monte de interferir, dominar, as imagens do ficheiros de computador?

36 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Este espaço vai ser sobre ele, concordando seu. Que filme, peça de ou não concordando Espaço teatro, livro, exposição, com o que escrevemos? Público disco, álbum, canção, Envie-nos uma nota até concerto, DVD viu e 500 caracteres para gostou tanto que lhe [email protected]. E apeteceu escrever nós depois publicamos.

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 22h, 00h25; ZON pouco a atirar o barro à parede a ver Há vida Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª se pega. Não invalida que “4 Copas” 3ª 4ª 13h50, 16h35, 19h10, 21h50, 00h30 seja um dos melhores esforços do além do Dá vontade de gostar muito mais de cinema português dos últimos anos, “4 Copas” do que a quarta ficção de acessível e popular sem por isso Manuel Mozos nos deixa: a história insultar a inteligência do espectador. computador de uma jovem que procura impedir Jorge Mourinha a separação do pai e da madrasta A nova animação de seduzindo o segurança com quem ela tem um caso não cai nas Miyazaki evita com total armadilhas do melodrama barato rigor o maniqueísmo da nem nos lugares-comuns do drama burguês de câmara, é muito bem imensa maioria das histórias Inocência infantil, servida por duas interpretações infantis e o cansaço da mas sem ponta de demagogia: femininas de estarrecer (Rita a marca Miyazaki animação digital robotizada. Martins, a filha, e Margarida Mário Jorge Torres da vida, e, com a ajuda da mãe, demenciais e as crianças aumentam Marinho, a madrasta - e só não deusa das águas (uma espécie de e diminuem de tamanho, como se elogiamos mais Filipe Duarte e João Ponyo à Beira-Mar deslumbrante Iemanjá) e das irmãs estivéssemos no universo alegórico Lagarto porque são elas quem Gake no ue no Ponyo transformadas em gigantescas vagas, do Swift de “As Viagens de Gulliver”, sustentam o filme). O problema é De Hayao Miyazaki, capazes de submergirem toda a pensado mais como sátira do que que a última meia hora descamba com Yuria Nara (Voz), Jôji Tokoro aldeia, consegue alcançar os seus como produto para consumo numa série de elipses que (Voz), Hiroki Doi (Voz). M/4 intentos. infanto-juvenil. E, no entanto, a parecem saltar alguns Desenhado por uma extensa “mensagem” persiste: o triunfo da momentos importantes para MMMMn equipa de mais de trezentos inocência infantil, do amor maternal apressar um final linear e desenhadores, com base na estética (do amor em geral como valor certinho, demasiado Rita Martins, Lisboa: Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª da aguarela, em cores pastel e com indiscutível), do respeito pelos mais convencional depois do peça fundamental 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 18h20 (V. imensa energia visual, o filme evita velhos, soerguidos das cadeiras de que ficou para trás, um deste “4 Copas” Port.); CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h40, 16h10, com total rigor o maniqueísmo da rodas, correndo, para ganharem 18h20; CinemaCity Beloura Shopping: Sala 5: 5ª 6ª imensa maioria das narrativas uma nova vida autónoma (porque Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h05, 14h20, 16h40, infantis e uma dimensão sado- nos lembrámos de “Cocoon”?) e útil. 18h50; Medeia King: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 17h40, 19h50, 22h, 00h15; masoquista predominante. Em vez Tudo sem ponta de demagogia, nem Medeia Saldanha Residence: Sala 6: 5ª 6ª Sábado disso, opta, dentro de uma extrema um olhar auto-complacente. Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h20, 17h30, 19h40, simplicidade de processos e de Mas regressemos a uma peculiar 21h50, 00h15; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 10: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h25, 18h40, 21h15 definição de personagens, por uma questão formal, cansados que (V.Port.) Domingo 11h30, 14h10, 16h25, 18h40, 21h15 perspectiva ecológica, insistindo na estamos de uma animação digital e (V.Port.); UCI Dolce Vita Tejo: Sala 4: 5ª 6ª Sábado harmonia entre a figuração humana robotizada, sem alma e 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h10, 21h (V.Port.) Domingo 11h30, 13h40, 16h, 18h10, 21h (V.Port.); ZON e o meio ambiente, com o cuidado reproduzindo até ao infinito Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª de preservar a acessibilidade dos estereótipos de um confrangedor 13h30, 16h10, 18h40, 21h20, 23h30 (V.Port.) mais novos, embora sem nunca cair facilitismo: “Ponyo” opera, embora Domingo 11h10, 13h30, 16h10, 18h40, 21h20, 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª na tentação da imbecilidade sem patéticos passadismos, um Sábado 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h20, 19h (V.Port.) redutora: menos “adulto” do que “A retorno a processos tradicionais e a Domingo 11h30, 13h50, 16h20, 19h (V.Port.); ZON Princesa Mononoke”, menos todo um trabalho de combinação de Lusomundo CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h30, 15h50, 18h20 (V.Port.) Domingo 11h, rebuscado em termos de desenho do cores e de efeitos manuais, 13h30, 15h50, 18h20 (V.Port.); ZON Lusomundo que “A Viagem de Chihiro”, este transfigurando, inclusive, a relação Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, “Ponyo” aspira a atingir um público- directa com o fantástico, de 15h50, 18h20 Domingo 11h, 13h25, 15h50, 18h20; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 5: 5ª 6ª alvo, facilmente encantado com o cambiantes neo-românticas. Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h20 (V. lado feérico das transformações Claro que haveria outras Port.); ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª visuais (veja-se a fascinante interessantes leituras a sugerir, de Sábado 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h05, 18h30 Domingo 11h10, 13h35, 16h05, 18h30 configuração da mãe, entre a fada- cariz psicanalítico (a criação de um Porto: Arrábida 20: Sala 14: 5ª 6ª Sábado madrinha e a rainha boa), próximo renovado inconsciente colectivo), de Domingo 2ª 14h, 16h25, 18h55, 21h25 (V.Port.) 3ª 4ª dos contos de fadas, mas contornos autobiográficos (uma 16h25, 18h55, 21h25 (V.Port.); ZON Lusomundo suficientemente verosímil para infância possivelmente decalcada a GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h10, 17h30, 19h45 (V.Port.) Domingo 10h40, nunca forçar a nota e desejar a partir das memórias felizes do 13h05, 15h10, 17h30, 19h45 (V.Port.); alienação num mundo “irrealista”. animador), mas o essencial passa Sosuke é um rapazinho vulgar e o pela afirmação de que ficção infantil “Ponyo à Beira-Mar”, livremente seu quotidiano torna-se facilmente não tem de (não deve) servir de inspirado em “A Pequena Sereia”, de identificável, embora contaminado trampolim para elaborados jogos de Hans Christian Andersen, é uma pela magia da fábula, com ondas computador. Que melhor dizer? longa-metragem de animação antropomórficas ou barcos de assinada pelo nome prestigioso de brinquedo que aumentam de 4 Copas Hayao Miyzaki, conhecido entre nós tamanho e bolhas gigantes que De Manuel Mozos, por dois enormes sucessos permitem respirar debaixo de água. com Margarida Marinho, João anteriores, “A Viagem de Chihiro” Para os mais velhos (porque se Lagarto, Rita Martins, Filipe Duarte. (2004) e “A Princesa Monokoke” trata com efeito de um filme para M/12 (1997): Sosuke, um azougado rapaz todos), valerá a pena alertar para a que vive numa casa no topo de uma belíssima relação intrínseca com as MMnnn falésia com o pai, capitão de um estampas dos mestres japoneses navio, e a mãe, empregada num lar (sobretudo Hokusai), integrando-as Lisboa: CinemaCity Campo Pequeno Praça de de idosos, encontra aprisionada com inteligência num universo Touros: Sala 8: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 16h55, 19h05, 21h55, 00h10; UCI Cinemas - El Corte uma criança-peixe vermelha, pictórico mais ambicioso: os navios Inglés: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª decidindo guardá-la num balde de metamorfoseiam-se em cidades 21h50, 00h25; ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª praia verde. Fascinada pelo mundo luminosas, as estradas da costa em Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h40, 24h; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado dos humanos, a menina-peixe linhas curvas e serpentes gráficas, os Domingo 2ª 3ª 4ª 21h15, 23h50 afronta o pai, poderoso feiticeiro, mares em paisagens submarinas de Porto: Arrábida 20: Sala 17: 5ª 6ª Sábado outrora humano, que a quer prender sedutor mistério, em fusão com a Domingo 2ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h45, 00h20 3ª no fundo do mar, e regressa ao terra em que os ecossistemas 4ª 16h40, 19h15, 21h45, 00h20; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª convívio do amigo, roubando o elixir prosperam, a lua atinge proporções 21h50, 00h10; ZON Lusomundo Parque Nascente:

Ípsilon • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • 37 Cinema

Lusomundo Fórum Montijo: Up - Altamente 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª Cinema Aquele Querido + Parcialmente 13h35, 16h15, 18h45, Mês de Agosto Nublado 21h15, 23h45 (V. De Miguel Gomes Port./3D) Domingo Up 11h, 13h35, 16h15, A resistência Edição O Som e a De Pete Docter, 18h45, 21h15, 23h45 Fúria com Edward Asner (Voz), (V.Port./3D) à transição Christopher Plummer Porto: Arrábida 20: Sala mmmnn (Voz), Jordan Nagai 1: 5ª Sábado Domingo 2ª 13h35, 15h45, 17h55, Extras (Voz). M/4 20h05, 22h15, 00h30 (V. O filme-fenómeno português DVD mmmnn Port./3D) 6ª 13h35, 15h45, de 2008 chega ao DVD, em MMMnn 17h55, 20h05, 00h30 (V. “Up” mostra que a máquina Port./3D) 3ª 4ª 15h45, edição simultânea com o Dificilmente podemos encontrar 17h55, 20h05, 22h15, Lisboa: Castello Lopes - da Pixar está bem oleada 00h30 (V.Port./3D); primeiro e mal-amado filme maior amplitude térmica na resposta Cascais Villa: Sala 5: 5ª 6ª Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª a dois filmes de um mesmo cineasta Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20, Sábado Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h30, de Miguel Gomes. E fazem 19h30, 21h40 (V.Port.); Castello Lopes - Londres: português. 00h05 3ª 4ª 16h35, 19h, 21h30, 00h05; Cinemax - Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, todo o sentido juntos. Cinema da Praça : Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h30 (V. Faz agora um ano, “Aquele 16h30, 19h (V.Port.); Castello Lopes - Loures Port.) Sábado Domingo 15h, 17h30 (V.Port.); Querido Mês de Agosto”, a segunda Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª Jorge Mourinha Cinemax - Penafiel: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h30 4ª 12h45, 14h50, 17h, 19h10, 21h15, 23h30 (V.Port.); longa-metragem de Miguel Gomes, (V.Port.) Sábado Domingo 15h, 17h30 (V.Port.); CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Medeia Cidade do Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado conseguia o consenso (raríssimo Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h45, 16h, 18h15, 21h40, A Cara que Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 15h40, 17h40, 19h40, para um filme “de autor”) da 23h55 (V.Port.); CinemaCity Beloura Shopping: Sala Mereces 21h40 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 11h40, 13h55, recepção calorosa tanto da imprensa 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h30, 18h De Miguel Gomes 16h10, 18h35, 21h40, 23h55 (V.Port./3D); CinemaCity (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª como do público (20 mil Campo Pequeno Praça de Touros: Sala 3: 5ª 6ª Edição O Som e a Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h40, 21h20, 23h50 espectadores, número mínimo Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h50, 16h15, Fúria (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h, 18h40, 21h20, 18h40, 21h40, 24h (V.Port./3D); Medeia Fonte Nova: comparado com os “blockbusters” 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Ferrara Plaza: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h20, 5ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h15, 19h30, 21h40 (V.Port./3D) mmnnn americanos, mas suficiente para ser 16h30, 19h, 21h40 (V.Port.); Medeia Saldanha 6ª Sábado 15h, 17h15, 19h30, 21h40, 24h (V. o segundo filme português mais Residence: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª Port./3D) Domingo 11h10, 15h, 17h15, 19h30, 21h40 Extras 4ª 13h, 15h05, 17h10, 19h15, 21h20, 23h30 (V. visto de 2008 e um dos mais (V.Port./3D); ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª 2ª Port./3D); Medeia Saldanha Residence: Sala 8: 5ª 3ª 4ª 12h50, 15h, 17h20, 19h40, 22h (V.Port./3D) 6ª mmmnn rentáveis dos últimos anos). Tudo 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 15h45, 17h50, 12h50, 15h, 17h20, 19h40, 22h, 00h25 (V.Port./3D) devido ao engenho de um 19h55, 22h, 24h; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala Sábado 10h40, 12h50, 15h, 17h20, 19h40, 22h, 14: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h45, 19h05, dispositivo que, partindo 00h25 (V.Port./3D) Domingo 10h40, 12h50, 15h, 22h, 00h15 Domingo 11h30, 14h10, 16h45, 19h05, 17h20, 19h40, 22h (V.Port./3D); ZON Lusomundo do documentário, 22h, 00h15; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 6: MaiaShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 18h45, constrói uma ficção 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 14h15, 16h30, 18h50, 21h15, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado 13h15, 16h, 18h45, 23h30 (V.Port./3D) Domingo 11h30, 14h15, 16h30, literalmente à 21h20, 23h30 (V.Port./3D) Domingo 10h50, 13h15, 18h50, 21h15, 23h30 (V.Port./3D) 4ª 14h15, 16h30, 16h, 18h45, 21h20 V.Port./3D); ZON Lusomundo vista do 18h50 (V.Port./3D); UCI Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª Marshopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, espectador, 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20, 18h55, 21h30, 15h40, 18h, 21h20, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 23h50 (V.Port.) Domingo 11h30, 14h, 16h20, 18h55, usando 10h50, 13h20, 15h40, 18h, 21h20, 23h50 (V. 21h30, 23h50 (V.Port.); ZON Lusomundo Alvaláxia: Port./3D); ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª actores não 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h45, 18h10, 21h, 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h, 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 profis- 23h15 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h25, 15h45, (V.Port./3D) Sábado Domingo 10h30, 12h40, 15h, 18h10, 21h, 23h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo sionais e 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 (V.Port./3D); ZON Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª décors 18h45, 21h25, 23h40 Domingo 11h, 14h10, 16h30, 4ª 13h20, 15h50, 18h30, 20h50, 23h30 (V.Port./3D) reais do 18h45, 21h25, 23h40; ZON Lusomundo Amoreiras: Domingo 11h, 13h20, 15h50, 18h30, 20h50, 23h30 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30, 18h20, 21h20, “Portugal (V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª 23h30 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h10, 15h30, Sábado 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h10, 18h50, 21h30, profundo”. 18h20, 21h20, 23h30 (V.Port./3D); ZON Lusomundo 00h10 (V.Port.) Domingo 10h50, 13h30, 16h10, No entanto, há CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 18h50, 21h30, 00h10 (V.Port.); ZON Lusomundo 16h, 18h30, 21h10, 23h30 (V.Port./3D) Domingo 11h, quatro anos, a Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 13h20, 16h, 18h30, 21h10, 23h30 (V.Port./3D); ZON 16h20, 19h05, 21h45, 00h25 (V.Port./3D) primeira longa do Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª mesmo Miguel Gomes, “A Cara 13h05, 15h30, 17h55, 21h45, 00h05 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05, 15h30, 17h55, 21h45, 00h05 Mesmo para quem tenha problemas que Mereces”, esbarrava (V.Port./3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª com o cinema de animação, os numa das mais calamitosas Sábado 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h50, 18h20, 21h10, 23h40 produtos da Pixar possuem uma recepções de que nos (V.Port.) Domingo 11h, 13h15, 15h50, 18h20, 21h10, 23h40 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita visualidade inconfundível, um recordamos no cinema Miraflores: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h10, 17h30, 19h40, 21h50 “touch” especial, que passa por uma português, rejeitado por (V.Port.) 6ª Sábado 15h10, 17h30, 19h40, 21h50, 24h extraordinária paleta de cores e por uma crítica que nele (V.Port.) Domingo 11h, 15h10, 17h30, 19h40, 21h50 (V.Port.); ZON Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 6ª uma imaginação transbordante, bem viu Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30, 18h, 21h20, 23h30 patente no modo como se efectua a maioritariamente (V.Port.) Domingo 11h, 13h10, 15h30, 18h, 21h20, viagem para uma América do Sul de uma 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h, 21h10, 23h40 sonho e fantasia, transportando uma indulgência (V.Port.) Domingo 11h, 13h, 15h20, 18h, 21h10, 23h40 casa pelos ares, com reminiscências insuportável (V.Port.); ZON Lusomundo Torres Vedras: 5ª 6ª do tornado de “O Feiticeiro de Oz” e por um Sábado 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h15, 16h, 18h30, 21h30, mas completamente original na sua público que 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Vasco da desmesura. No entanto, o que cativa pareceu Gama: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h15, em “Altamente” não passa fazer 17h30, 19h45, 21h50, 23h55 (V.Port.) Domingo 11h, 13h05, 15h15, 17h30, 19h45, 21h50, 23h55 (V.Port.); meramente por esse lado questão de o Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª “ilustrativo”: tudo funciona como evitar. 15h30, 17h50, 21h30 (V.Port.) 6ª 15h30, 17h50, uma máquina, desde a arquitectura Com os 21h30, 23h40 (V.Port.) Sábado 13h20, 15h30, 17h50, 21h30, 23h40 (V.Port.) Domingo 13h20, 15h30, da narrativa até à definição de dois filmes a 17h50, 21h30 (V.Port.); Castello Lopes - Fórum personagens, embora se possa chegarem ao Barreiro: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, falar de alguma excessiva DVD ao 15h10, 17h15, 19h25, 21h30 6ª Sábado 12h50, 15h10, 17h15, 19h25, 21h30, 23h50; Castello Lopes - Rio Sul simplificação, sobretudo na mesmo tempo, Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª representação do velho “herói”. acompanhados 4ª 12h50, 15h10, 17h15, 19h20, 21h25, 23h30 (V. De qualquer modo, numa altura por edições Port./3D); UCI Freeport: Sala 5: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h25, 18h20, 21h10 6ª 15h25, 18h20, 21h10, 23h20 Sábado em muito do que é feito em cuidadas, a 13h20, 15h25, 18h20, 21h10, 23h20 Domingo 13h20, “imagem real” parece comprazer-se ocasião é “Aquele Querido Mês de Agosto”, 15h25, 18h20, 21h10; ZON Lusomundo Almada cada vez mais em apelar a demasiado boa para Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h35, 18h, um filme que é o seu próprio “making of” 21h30, 23h55 (V.Port./3D) Domingo 10h45, 13h10, adolescentes idiotas, é bom ver a deixarmos passar 15h35, 18h, 21h30, 23h55 (V.Port./3D); ZON como a ficção para os mais jovens sem perguntar: o que Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª atinge níveis de exigência capazes de é que mudou entre “A 4ª 13h20, 16h, 18h25, 21h, 23h25 (V.Port.) Domingo 11h, 13h20, 16h, 18h25, 21h, 23h25 (V.Port.); ZON seduzir todas as idades. M.J.T. Cara que Mereces” e

38 • Sexta-feira 28 Agosto 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

“Aquele Querido Mês de Agosto”? ficção sobre um romance de Verão filmes em conjunto é importante gala de fim de ano), percebemos que magazine e o novo formato, Na realidade, muito pouco. Miguel entre dois primos adolescentes, pelo modo como desenham a o “carjacking” é tão 2008... Tanto anunciado para a iminente Gomes continuou a seguir o seu criada a partir de pessoas, locais e construção do próprio percurso de quanto as arribas instáveis são “rentrée” como sendo algo similar caminho singular, crescendo como situações apresentadas na primeira Gomes — como se a criança totalmente 2009. O Gato Fedorento ao “Daily Show da Comedy realizador (mal estaríamos se não o parte. É quase como se a ficção escondida de “A Cara que Mereces” implantou-se no panorama cómico Central”. A edição do DVD é tivesse feito) mas sem mudar de propusesse no corpo do filme o seu tivesse cedido lugar aos adolescentes português pelos seus cromos do sintomática: permite saltar os universo nem de abordagem (e é próprio extra de DVD, “making of”, românticos do “Mês de Agosto”, “very typical”: os rústicos, os fala- momentos de pivots e conversa em sintomático que Gomes seja génese. O conceito, em si próprio, é confirmando que, como já se barato, os palermas, etc. Comentário estúdio, quebras de ritmo que o actualmente, a seguir a Pedro Costa, excelente, mesmo que o filme esteja adivinhava nas múltiplas curtas- social. Na ida para a RTP1, o novo grupo não conseguiu ultrapassar o novo “cavalo de batalha” dos longe de ser perfeito (à imagem da metragens que antecederam as formato tipo magazine dava ao desde a estreia do formato na TV do críticos estrangeiros mais atentos às “Cara”, também o “Mês de Agosto” longas, a força do realizador é olhar quarteto um pendor mais solene Estado. “Zé Carlos” foi também cinematografias periféricas). E muito poderia ganhar com uma maior para as mesmas histórias de sempre (ainda que involuntariamente, seja uma série em que o grupo, do que faz o charme de “Aquele concisão, embora a distensão jogue a partir de um ponto literalmente pelos fatinhos bem comportados pressionado pelo tempo e pela Querido Mês de Agosto” — a aqui a favor). Mas que a conjugação fora dos miradouros habituais. O seja pela postura de comentadores omnipresença na produção, se sobreposição entre a cuidada do olhar terno e lúcido sobre a vida que torna ainda mais da actualidade) e ao mesmo tempo afastou da sua capacidade de sofisticação formal do objecto-filme de província com um dispositivo imperscrutáveis – mesmo que nada permitia-lhes dosear a actuação, a diagnóstico de cromos e apostou e a ingenuidade clássica das suas narrativo sofisticado tenha surpreendentes – os extremos da imitação, os momentos musicais e os ainda mais na actualidade. Sem um histórias, a meio caminho entre um conseguido quebrar a resistência do recepção acordada a ambos os “sketches” sem ligação à actualidade referendo ou um Marcelo Rebelo de “naïf” deliberado e um público é em si algo de filmes entre nós. noticiosa. E, aí, os Gato deram um Sousa, com Paulo Bento em fase de deslumbramento arregalado; a extraordinário. novo salto numa carreira marcada saturação e Scolari fora de cena, presença de actores Precisamente por “Aquele pela progressão rápida e pelo algumas das âncoras dos seus maioritariamente não-profissionais; Querido Mês de Agosto” já ser o seu Televisão controlo autoral. Tiago Dores, trabalhos anteriores, a actualidade a utilização da música como próprio extra de DVD, o segundo Miguel Góis, José Diogo Quintela e traiu, em parte, o Gato. Brincam tradução de estados de espírito disco de extras não é tão estimulante Ricardo Araújo Pereira escrevem, consigo mesmos pela obsessão pelo interiores; a distensão do tempo e como seria desejável. A única Gato de interpretam, coordenam a azulinho Magalhães, mas a culpa dos planos; a divisão do filme em “novidade” é uma curta inédita, produção. Quatro pessoas, que não será deles – o Magalhães esteve duas partes só aparentemente “Carnaval”, lúdico jogo de esquivas à transição evoluíram para o comentário não só mesmo em todo o lado, ou já não se desconexas, um prazer subterrâneo volta de Paulo “Moleiro” e do seu social, mas político. lembram? Abusam de Sócrates – da cinefilia clássica reimaginada célebre salto da ponte de Côja; o Com a passagem para a SIC, num mas ele também não estava em todo irreverentemente para uma nova resto são meia hora de cenas A edição de “Zé Carlos” momento em que eram trunfos o lado? Talvez por tudo isto, nota-se geração — estava já inteirinho em “A inéditas (algumas das quais em DVD permite saltar assumidos na luta entre os uma ligeira quebra numa das suas Cara que Mereces”. excelentes, com especial destaque os momentos mortos generalistas e em que os seus capacidades maiores – a de O que não está em “A Cara que para a deliciosa montagem de cenas contratos publicitários lhes davam equilibrar o apelo popular e o apelo Mereces”, infelizmente, é uma de festa sem som devido à ausência do formato e revisitar um peso financeiro considerável no intelectualizado. Os seus cromos e estrutura — a liberdade formal e de direitos para a música), mais sete um ano, 2008, marcado mercado, os Gato tinham um mesmo os “sketches” de tema livre criativa que Gomes procura versões longas e oito alternativas por fenómenos como o desafio. Mais um. E sempre a quatro. permitiam-lhes falar a quem talvez desintegra-se na ausência de uma para cenas incluídas na montagem Magalhães, Obama e o Desta contabilidade saíram várias não ache tanta piada a um narrativa coerente (factor final, mas nada que ilumine ou abra conclusões, medidas à luz de segmento sobre a censura do importante, mesmo que não novas pistas para o filme. silêncio de Manuela audiências, do horário (domingos à Governo na Agência Lusa, mas essencial, para a sustentação de uma Já “A Cara que Mereces”, em DVD Ferreira Leite. noite), da perpetuação dos seus nesta série conseguem chegar a duração de longa-metragem). Claro simples, traz como bónus a curta de Joana Amaral Cardoso dichotes na rua, da eficácia do seu esse público quando emulam um que, sendo o filme o delírio febril de 2006 “Cântico das Criaturas”, humor, dos projectos relato na Benfica TV. E tentam um trintão aniversariante mal- peculiar exercício a três tempos (o Zé Carlos “concorrentes”. “Zé Carlos” é uma cruzar tudo num excerto sobre as disposto com o mundo, com a melhor dos quais gloriosamente Edição iPlay espécie de magazine, com Tumba figuras de estilo usadas por Ferreira cabeça partida e um ataque de Monteiriano facção “Silvestre”) à em vez de Tesourinhos Leite ou Sócrates em declarações sarampo, que imagina as volta da figura de S. Francisco de mmmnn Deprimentes, com momentos polémicas. O Gato Fedorento é um desventuras dos “sete anões” que Assis, e “À Volta da Árvore”, musicais (vénia a Armando Teixeira, dos produtos maiores do humor Extras supostamente estão a tomar conta “making of” supérfluo onde Jorge Tiago Dias e João Rato) alimentados actual. Sintomaticamente, quando dele, não se esperaria Cramez filma a preparação de um mmmnn pelos Gato em vez de convidados e são chamados a falar do seu necessariamente uma narrativa plano particularmente complicado. com rubricas regulares: Gato trabalho, tendem a recorrer à coerente. O problema é que essa Mas o extra principal é um Em 2008, Manuel Fedorento Salva o Universo, as subvalorização (se quisessem uma ausência de narrativa não é “comentário audio com cocktails”, Pinho ainda não Listas, Entrevistas, etc. figura de estilo para isso, é qualquer suficiente para sustentar “A Cara que “masterclass” crítica sobre o filme tinha usado os “Zé Carlos” é marcado pelo coisa como o contrário da Mereces”, sobretudo depois de uma em que os críticos Francisco indicadores para humor com o Magalhães, pelo hipérbole, a lítotes). primeira meia-hora relativamente Ferreira, do “Expresso”, Luís Miguel o mal, Manuela controlo de Sócrates sobre a Uma nota final para o DVD, com “convencional” e muito bem Oliveira, do PÚBLICO, Jean-Philippe Ferreira Leite era comunicação social, pelo mutismo menus simpáticos para quem quer observada. O que aparece em Tessé, dos “Cahiers du Cinéma”, e uma líder de Ferreira Leite, pelos professores saltar directamente para alguma das seguida, apesar de perfeitamente Jean-Pierre Rehm, director do FID silenciosa, não com “guichet” de atendimento, por rubricas e com extras que não o são: controlado por Gomes, parece Marselha, lançam em diálogo aberto havia gripe A Obama e pelo duelo habitual o especial de fim-de-ano e toda a esticar-se para lá do que seria um sem-número de pistas de leitura nem TVI24 e o regresso Benfica-Sporting. Que faz lembrar série “Barbosa” (2005), ainda desejável, sem resolução que feche o que vão do inspirado ao rebuscado, de Santana Lopes à liça Paulo Bento, que por sua vez faz dos tempos da Radical. Um círculo narrativo ou una as duas enquanto o próprio Miguel Gomes, eleitoral rumo à Câmara lembrar a qualidade das imitações pacote bastante completo e que metades do filme, e resulta num qual “barman” de Lisboa ainda era um do grupo, que por sua vez nos leva permite comparar momentos exercício algo vão em que a privativo, serve rumor. Ao ver “Zé à constatação de que “Zé Carlos” é distintos da vida do grupo e sinceridade de propósitos e de vodkas tónicos, Carlos”, a série que um híbrido em casulo. antecipar, peça a peça, o atitude pode muito facilmente ser (e imperiais e outras inaugurou o regresso Representará, na carreira dos Gato, que será o seu em alguns casos foi de facto) mal margaritas. dos Gato Fedorento à SIC um ponto de passagem – regresso em interpretada como sobranceria ou Mas ver os dois (seguir-se-ia uma entre o 2009. onanismo e se “fecha” ao

espectador. ENRIC VIVES-RUBIO Exactamente o oposto do “Mês de Agosto”, que desde o princípio convida o espectador para participar no enorme jogo da construção do “Zé Carlos” é uma série completamente próprio filme, através da progressão 2008 mas que antecipa o que será de uma primeira parte em registo de o regresso do Gato Fedorento em 2009 documentário picaresco em direcção a uma segunda parte de        E,&+(          % #  *?> 8:  @:%       437+6'%61&+4+)'7/=&16#0-@37' "   $#( $ &'5'081.8'241,'%615&'*#$+6#DC151%+#. '+0(4#'5647674#52H$.+%#564#05(14/#0&1 !    % *(   #%+&#&'07/#2.#6#(14/#&'+)7#.&#&'51%+#. %))) $& ' ' #?7:>  1/&+('4'06'5'5%#.#5'6+21.1)+#5155'75 241,'%6152412G'/.'+674#5&'5#>#06'5&1 '52#D1'037#061+06'4(#%'*7/#01'0#674#. 241%74#0&1#%6+8#4+06'4#%DG'551%+#+5 *?7> )> @7  B/#+5&' #01537'/#4%##%7.674#8+57#. &1015516'/21/1&+>%#0&1#4'.#DC1'064' #46'&'5+)0'%1/70+%#DC1 &736! =6 4> >   06')4#1%1.'%6+81 1/#61&'5&'  8:  @: ) :> :7 "( 7 ?DD7:7 &'5'081.8'0&1)4#>5/15+/24'5515 F 73  ::= '#0+/#&152#4#$4#0&+0)'%1/70+%#DC1 &')4#0&'5/#4%#5 B> "( 7 ?DD7:7",%74!?R //+561&'=%+'06+56#.17%1&1/#&14 &'74515/'564'&'4'+-+'%106#$+.+56#(14# &'*14#5@#E7/#/#+5+018#&14#5 '/24'5#5&'&'5+)0&1/70&1 &7360 ?:5 !$ 1/7/#%#44'+4#37'1.'817&'*14&+6%* #*7'0!#0E7/&15&'5+)0'45&'/#+14 4'.'81&#57#)'4#DC1 "(%74!?R #?7:> &736! =6 4> > H2> $ :=>:>7: 373 0#0+/'/'06'#%.#/#&1%1/17/&15/#+5 %10%'+67#&15'+0?7'06'5&'5+)0'45 &##%67#.+&#&' 7?7 ;;7:7", 437+6'%61'564#6')#'&+4'%614%4+#6+81 %1/7/(#41#274#&12#4#018#56'0&F0%+#5 '6#.'0615'/'4)'06'5     +  %#    % " &7360 ?:5 $ :=>:>7: 373 7?7 ;;7:7           F,72  D7 (=75:= 3KQ=3 :>; I:= 701 4674+.8#  108+&#&15A+.+2'1/'/105'%#  1C112'5  #4+#1C147<  '&41#�*1  &?:  #8+#+&11"  108+&#&15A#$;&' $4'7"  #6*#0'&&;"  -*'05#0+-15+"  ' @=4 ==75: #1.# 0610'..+  108+&#&15A'8+0.#8+0  '?:  >? 7@ +@7'7 )> @7 F::==: '4+:/#0  410#665  @ > 4?>?  =75: .+%'#956*140' 108+&#&15A'04;  +0&;1;"  15'2*4+/#  > ; ,67:9 '.>/#4&1  108+&#&15A#:47+05/#6'/5 6'(#011'4+ $+6#4'  !#.6'4'66'05  0 .  , "!) # "#  !$ #" #  %!!$% 73+A=>6 :    !$!!"! #     F"!, 72?: &"#'!#$%! $%   # , #"% # + &&&'!#$%! $%

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