E Rodrigo Vivas

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E Rodrigo Vivas TRADIÇÃO E DIÁLOGO: ANÁLISE DO BAIXO-RELEVO DA IGREJA SÃO FRANCISCO DE ASSIS Gisele Guedes / Mestranda PPG–Artes UFMG Rodrigo Vivas / UFMG RESUMO O presente trabalho analisa o baixo-relevo realizado por Alfredo Ceschiatti que figura como espaço interno no bastistério da Igreja São Francisco de Assis em Belo Horizonte, cuja construção data de 1943. Executados por Ceschiatti em 1944, a obra é composta por quatro painéis de bronze fixados sobre uma estrutura em formato curvilíneo que delimita o batistério. O objetivo é levantar a iconografia da cena representada, relacionando os temas tradicionalmente situados no batistério e a opção temática feita pelo artista em recusar tal tradição e oferecer uma proposta inovadora. Outro aspecto presente na investigação, considerando-a em termos de “função” e “destinação”, será compreender seu significado enquanto espaço reservado à prática do sacramento católico denominado batismo. PALAVRAS-CHAVE Igreja São Francisco de Assis; iconografia; Alfredo Ceschiatti. ABSTRACT The present work analyzes the bas-relief made by Alfredo Ceschiatti appearing as internal space in the baptistery of St. Francis of Assisi Church in Belo Horizonte, whose construction dates from 1943. Executed by Ceschiatti in 1944, the work is composed by four bronze panels mounted on a curvy shaped structure that delimits the baptistery. The purpose is to withdraw the iconography of the scene represented by relating the themes traditionally located in the baptistery and the thematic option made by the artist to refuse such tradition and offer an innovative proposal. Another aspect present in the investigation, considering it in terms of “function” and “destination” of this art work, is to understand its meaning as placeholder to the practice of the catholic sacrament called baptism. KEYWORDS Church of Saint Francis of Assisi; iconography; Alfredo Ceschiatti. 914 TRADIÇÃO E DIÁLOGO: ANÁLISE DO BAIXO-RELEVO DA IGREJA SÃO FRANCISCO DE ASSIS Gisele Guedes / Mestranda PPG–Artes UFMG, Rodrigo Vivas / UFMG Comitê de História, Teoria e Crítica de Arte A construção do Complexo Arquitetônico da Pampulha na década de 1940 é parte do projeto de modernização e desenvolvimento aplicado pelo então prefeito Juscelino Kubitschek (JK) na cidade. Tais medidas voltaram-se para melhorias na vida econômica e social com amplas modificações na infraestrutura urbana, que passa a ser planejada para absorver a expansão da cidade. O Complexo da Pampulha é parte do processo de modernização que com a ajuda de Rodrigo Mello Franco de Andrade, possibilita que JK convide Oscar Niemeyer e Burle Marx para realização do projeto. Concebida como um complexo de turismo e lazer, o local deveria abrigar o Iate Clube, o Cassino, a Igreja de São Francisco de Assis, a Casa do Baile, A Ilha dos Amores, a residência particular do prefeito e um hotel, apenas esse último não fora executado. As obras foram iniciadas em 1941 e finalizadas em 1945. A inauguração oficial data de 1943, apesar de que no ano anterior – 1942, tanto a Casa do Baile quanto o Cassino, já estavam em atividade. A conclusão da construção da Igreja da Pampulha, ao contrário, viria somente em 1946. Apesar do inquestionável valor materializado no complexo e especificamente na Igreja – que abriga também os painéis interno e externo e a via sacra produzidos pelo artista Candido Portinari, são poucas as pesquisas realizadas. Alfredo Ceschiatti1 cria os baixos-relevos2 da Igreja de São Francisco de Assis em 1944 a pedido do arquiteto Oscar Niemeyer. Para o estudo da obra em questão, foram seguidos nessa pesquisa, os princípios analíticos correlatos à história da arte, passando pelo método iconográfico3 desenvolvido por Erwin Panofsky e pela tríade formada pelos conceitos de “função”, “destinação” e “problema artístico”,4 que permitiram de forma conjunta, o reconhecimento da iconografia da cena representada e a apreensão de sua autenticidade.5 Isto posto, delineia-se aqui, o objetivo em demonstrar sua inovação, pois mesmo que cada uma das imagens seja congruente com uma iconografia, o tema da gênese da humanidade, seu pecado e condenação, nunca foi – ou ainda inexiste seu conhecimento ou registro –, disposta como ornamentação em nenhum outro batistério como realizado por Ceschiatti. A obra é composta por quatro painéis de bronze fixados sobre uma estrutura de alvenaria em formato curvilíneo que ocupa o interior da Igreja da Pampulha. O lado externo da estrutura curva, que pode ser visto de fora da Igreja, é revestido por uma obra de Candido Portinari, feita em azulejos e pintados em tons de azul. O formato 915 TRADIÇÃO E DIÁLOGO: ANÁLISE DO BAIXO-RELEVO DA IGREJA SÃO FRANCISCO DE ASSIS Gisele Guedes / Mestranda PPG–Artes UFMG, Rodrigo Vivas / UFMG Comitê de História, Teoria e Crítica de Arte curvilíneo é responsável pela delimitação de um espaço reservado dentro da igreja conhecido como batistério e destinado à realização do batismo. Esse mesmo formato curvilíneo, acaba funcionando também, como um “abraço simbólico”, assegurando ao ambiente uma atmosfera acolhedora e segura. O interior da estrutura foi revestido com quatro chapas de ardósia, e sobre cada uma destas encontra-se um painel de bronze oco. A configuração curvilínea apresentada pelo batistério da igreja São Francisco de Assis, é justificada em termos arquitetônicos por deter em sua origem, associação aos edifícios públicos designados para o uso de água, a exemplo das termas e casas de banho, cuja planta central, possui formato circular ou poligonal. Os primeiros batistérios foram inicialmente construídos como edifícios avulsos da igreja e com a destinação única para o rito do batismo, essa acepção foi adotada somente do século IV ao V – primórdios do cristianismo –, quando era comum a exigência de batizaram-se pessoas adultas. Na definição mais detalhada do termo, o batistério aparece como salão ou capela, situada perto ou relacionada à igreja, sendo este o local no qual é administrado o sacramento denominado batismo. Originalmente, a forma do batistério evoluiu a partir de edifícios romanos pequenos e circulares que foram designados para fins religiosos, como exemplo do Templo de Vênus em Roma, Baalbek no Líbano e o mausoléu de Diocleciano na Croácia. A necessidade de alargamento dos antigos edifícios romanos para abrigar o crescente número de fiéis, veio quando o batismo deixou de ser realizado somente nos feriados da Páscoa, Pentecostes e Epifania. Entre todas as formas de arquitetura cristã, o batistério consta entre as mais simbólicas, seu desenho característico foi desenvolvido no século IV e pode ser visto no que é provavelmente, seu mais antigo exemplo existente: o batistério do Palácio de Latrão na cidade de Roma construído pelo Papa Sisto III, chefe da igreja entre 432 e 440. Seu plano comumente de configuração octogonal, apresenta-se como uma metáfora visual para o número oito, símbolo na numerologia cristã para um novo começo, pois oito é o sucessor ao número sete, tido como “completo”, o que nesse caso, indica o início da vida cristã que segue o batismo. A cobertura habitualmente é feita com uma cúpula, o símbolo do Reino celestial para o qual o cristão avança após a iniciação com o batismo. A pia batismal era geralmente 916 TRADIÇÃO E DIÁLOGO: ANÁLISE DO BAIXO-RELEVO DA IGREJA SÃO FRANCISCO DE ASSIS Gisele Guedes / Mestranda PPG–Artes UFMG, Rodrigo Vivas / UFMG Comitê de História, Teoria e Crítica de Arte octogonal, situada por baixo de um cibório coberto por uma cúpula, ou de um dossel e rodeado por colunas e de um deambulatório – características que foram primeiramente usadas pelos bizantinos no batistério quando alteraram as estruturas romanas. Batistérios eram comumente adjacentes ao átrio ou adro da igreja e muitas vezes eram grandes e ricamente decorados, tais como aqueles em Pisa, Florença, Parma e Nocera em Itália; El Kantara, e Poitiers, França. Depois do século VI foram gradualmente reduzidos a condição de pequenas capelas no interior de igrejas. No século X, quando o batismo por aspersão que consiste em derramar o líquido sobre a cabeça tornou-se prática padrão na igreja, os batistérios ou capelas batismais, foram muitas vezes inteiramente omitidos. Nas igrejas modernas a pia batismal passa a ser apresentada sozinha para a realização do batismo; sobrevivendo algo do simbolismo anterior, no entanto, a sua localização habitual, próximo a porta da igreja, funciona por sua vez, como uma alusão à entrada na vida cristã.6 Nesse seguimento, seria possível concluir que a proximidade com as casas termais romanas, se verifica como uma alusão a limpeza física praticada nas casas de banho, considerando que batismo e purificação se efetivam enquanto sinônimos. Essa particular conjunção de significados, é a responsável por demarcar para o batistério, ornamentações cujos motivos artísticos são diretos correspondentes à temas de renovação, renascimento e a vida eterna conferida por Deus. Entretanto, como será visto a seguir, Ceschiatti, não seguiu por esses mesmos princípios, optando por uma representação diferenciada em termos de significação. Alfredo Ceschiatti (1918–1989) Detalhe do primeiro painel do batistério da Igreja São Francisco de Assis, 1944 Bronze Igreja São Francisco de Assis (MG) 917 TRADIÇÃO E DIÁLOGO: ANÁLISE DO BAIXO-RELEVO DA IGREJA SÃO FRANCISCO DE ASSIS Gisele Guedes / Mestranda PPG–Artes UFMG, Rodrigo Vivas / UFMG Comitê de História, Teoria e Crítica de Arte Uma análise inicial interessada somente nas figuras distribuídas pelos quatro painéis e no tipo de relação estabelecida entre elas, torna possível o reconhecimento de suas possíveis identidades para, a partir disso, associá-las dentro de uma iconografia. Assumindo, portanto, a região interna oferecida pela sinuosidade do painel e tentando remontar a visualização que seria oferecida caso a entrada ocorresse pela porta principal de vidro7, temos como primeiro painel, o composto por duas figuras masculinas inseridas em uma forma oval que funciona como cercadura para a cena, cujo formato se apresenta como côncavo. Alfredo Ceschiatti (1918–1989) Detalhe do segundo painel do batistério da Igreja São Francisco de Assis, 1944 Bronze Igreja São Francisco de Assis (MG) No segundo painel, tem-se repetida a mesma estruturação côncava.
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