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As no horário das seis: a configuração do espaço na programação da Rede Globo1

LIMA, Denise (Me) 2 UFSM/RS

Resumo: O objetivo do artigo é a caracterização do espaço destinado às telenovelas na faixa das 18 horas na programação da Rede Globo de Televisão. Parte-se de uma observação empírica, de que as telenovelas da emissora exibidas nesse horário possuem características diferenciadas de outras da programação. Jost (2007), Duarte (2004) e Campedelli (2001) foram os autores utilizados para compreensão da programação televisiva. Para fazer essa caracterização, considerando o período de 2004 a 2014, foi feita também uma pesquisa documental em um corpus de 21 telenovelas veiculadas no horário das 18 horas. Essas foram descritas quanto ao período de exibição, número de capítulos, autores e diretores. Além desses pontos foi preciso categorizar as telenovelas de acordo com suas especificidades a partir de Fontanille (2012) e Jost (2007). Foram identificados três tipos de telenovelas quanto ao tempo e temáticas variadas. Através dos vários formatos veiculados nos últimos dez anos, foi feita a caracterização do espaço na grade de programação.

Palavras-chave: . Ficção televisiva. Programação. Classificação indicativa.

Introdução O horário das seis para telenovelas na Rede Globo de Televisão (RGT) foi criado em 1971, com a veiculação de Meu Pedacinho de Chão, um drama rural de Benedito Ruy Barbosa, conhecida como a primeira telenovela educativa brasileira. Desde então, diversas tramas foram apresentadas nesse horário. As emissões propostas para o horário são resultado de estratégias da emissora ao elaborar uma grade de programação, que combina gêneros apropriados ao gosto do público. Além disso, explica Jost (2007), considera-se a concorrência nos outros canais naquele horário, pois o programa pode perder audiência não só pela falta de interesse do telespectador, mas também pelo interesse menor em relação ao que é veiculado nos outros canais. Lopes, Borelli e Resende (2002, p. 258), esclarecem que as telenovelas são constituídas através da mistura de diversos elementos: “[...] pode-se falar de uma narrativa melodramática permeada por lances de aventura, por elementos fantásticos, pitadas de erotismo, ambivalências da comicidade e enigmas de mistério e suspense”. Mas é importante lembrar que a televisão como dispositivo midiático é um espaço onde

1 Trabalho apresentado no GT de História de Mídia Audiovisual e Visual, integrante do 10º Encontro Nacional de História da Mídia, 2015. 2 Doutoranda em Comunicação (UFSM), Mestre em Design (UFRGS), [email protected]

várias lógicas estão presentes, e a programação é uma delas, sendo possível a partir disso que as estratégias de programação para telenovelas constituam diferentes tipos de produtos. São traços pertinentes que se sobressaem aos demais podendo haver assim uma categorização do espaço. Assim, o objetivo do artigo3 é compreender, a partir das telenovelas exibidas nos últimos dez anos, considerando o horário na programação, como se configuram essas emissões na RGT. A motivação para o trabalho encontra respaldo na relevância que produtos televisuais têm na sociedade brasileira: a televisão ainda é o meio de comunicação mais próximo da população4. Além disso, o comprometimento com a narrativa e com o sentido da história são pressupostos que acompanham desde o início a investigação desse tipo de produto televisual e que podem estar relacionados ao espaço no qual é veiculado.

Programação televisiva: função vital das emissoras A programação da grade se tornou uma arte a partir do momento que a concorrência entre as emissoras ficou acirrada e a transformou em uma atividade especializada. Profissionais que trabalham na análise de conteúdos e da audiência costumam ser vitais, pois estudam dados de mercado, acompanham tendências, analisam concorrentes, enfim, fazem parte da inteligência da emissora e conduzem as linhas mestras da programação televisiva. Nos primórdios da TV, somente o planejamento com base no calendário social do público já era o suficiente para a programação. Com a disputa entre as emissoras, além dessa, outras questões foram levadas em conta com o objetivo de atrair telespectadores de outros canais (JOST, 2007). A programação é vista como uma macroestratégia ao estabelecer critérios de periodicidade e serialização, observando os dias e horários mais apropriados na grade, sem esquecer, obviamente, dos aspectos culturais e sociais relacionados aos hábitos do telespectador (DUARTE, 2004). Assim, a RGT se especializou nas telenovelas, tanto que possui cinco horários na grade para essas emissões. Atualmente, veicula à tarde, no

3 Esse estudo faz parte de um trabalho maior, uma tese que tem por interesse estudar as apropriações que as estruturas narrativas de telenovelas do horário das seis da RGT apresentam. 4 Apesar do rápido crescimento da internet, nada menos que 97% dos entrevistados afirmaram ver TV, um hábito que une praticamente todos os brasileiros [...].

espaço “Vale a Pena Ver de Novo”, a reprise da telenovela “Rei do Gado”5; a “Malhação”6 logo em seguida; no horário das seis, “”7; às sete, “”8; e no horário nobre, “Babilônia”9. Jost (2007, p. 52) ressalta que “a seleção, como a sucessão e a aproximação dos programas são criadores de sentidos”, o autor acrescenta que esse tipo de estratégia confere identidade aos canais. Nesse sentido, em fevereiro de 2014, a emissora decidiu aproximar as telenovelas que são veiculadas no “Vale a Pena Ver de Novo” com as demais na grade. E nos últimos quatro anos, o horário das 23 horas tem sido utilizado para veicular telenovelas de curta duração, a última foi o remake de “”, exibida entre 14 de julho e 12 de setembro de 2014. De tal modo, as emissoras criam espaços na programação aos mais diversos tipos de programas, mas que no conjunto da grade mantém uma coerência com a imagem que desejam passar ao público. A Rede Globo é reconhecida por suas telenovelas e uma de suas estratégias iniciais foi o planejamento na grade, com horários fixos a diferentes públicos. Esse tipo de estratégia de acordo com Jost (2007) é chamada de programação horizontal, e mobiliza uma técnica denominada stripping – programa passado no mesmo horário, todos os dias, de segunda à sexta-feira, ou no caso das telenovelas a partir das seis da tarde, de segunda à sábado. Campedelli (2001, p. 38) indica que a classificação de horários das telenovelas da RGT é resultado da primeira “modernização” para segmentar os públicos, embora, a mesma reconheça que se dirigem a um público familiar em geral. . Horário das seis da tarde – direcionada a adolescentes, domésticas e donas de casa. Temática: adaptações da literatura romântica; . Horário das sete – para adolescentes, donas de casa e eventualmente para a mulher que trabalha fora. São histórias leves, românticas e temperadas com humor; . Horário das oito – seu público são mulheres maduras, homens e família em geral. São histórias que enfocam o cotidiano, problemas familiares e grandes questões. Atualmente, inicia após às 21 horas;

5 Rei do Gado é reprisada desde 12 de janeiro de 2015, pela segunda vez em Vale a Pena Ver de Novo. 6 Malhação é uma soup opera, um seriado com característica de novela, os episódios não são fechados e há várias tramas paralelas. 7 Sete Vidas esta sendo exibida desde 9 de março de 2015, com previsão de 107 capítulos. 8 Alto Astral está em exibição desde 3 de novembro de 2014. 9 Babilônia é veiculada desde 16 de março de 2015.

. Horário das dez – é seletivo, destinado a histórias experimentais. Ressalta-se que esse horário não é fixo na grade e nos últimos anos apresenta-se às 23 horas.

Vê-se que essa estratégia continua, com evoluções ao longo dos anos, pois percebe-se uma abertura maior para as temáticas. Contudo, além do direcionamento a diferentes públicos, as histórias devem atender à classificação indicativa estipulada pela Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) que observa o cumprimento da Constituição Federal (1988) e o Estatuto da Criança e Adolescente (1990). Nesse processo, as emissoras são responsáveis pelo envio da sinopse e da classificação pretendida para o programa a ser veiculado. Enquanto isso, a emissora apresenta sua autoclassificação na vinheta de abertura no início de cada programa e no retorno dos intervalos, o que não tem sido cumprido, somente no início do programa. A SNJ, dentro de 60 dias, monitora a obra audiovisual e verifica se está de acordo com a classificação atribuída, caso não esteja, a emissora obriga-se a aderir à nova reclassificação, ou solicitar uma reconsideração. O quadro 1 apresenta o detalhamento dessa classificação indicativa, que faz parte de uma política pública de Estado, para que seus símbolos sejam reconhecidos pela maioria das famílias, evitando que crianças e adolescente assistam conteúdos de obras audiovisuais impróprios para a sua idade.

Símbolo Classificação Características Exibição Livre. Não expõe crianças a conteúdos potencialmente Qualquer prejudiciais. horário. Não recomendado Conteúdo violento ou linguagem inapropriada para Qualquer para menores de 10 crianças, mesmo em menor intensidade. horário. anos. Não recomendado As cenas podem conter agressão física, consumo de A partir das para menores de 12 drogas e insinuação sexual. 20h. anos. Não recomendado Conteúdos violentos e/ou de linguagem sexual mais A partir das para menores de 14 acentuada. 21h. anos. Não recomendado Conteúdos mais violentos ou com conteúdo sexual A partir das para menores de 16 mais intenso (tortura, suicídio, estupro ou nudez total). 22h. anos. Não recomendado Conteúdos violentos e sexuais extremos (cenas de A partir das para menores de 18 sexo, incesto ou atos repetidos de 23h. anos. tortura, mutilação ou abuso sexual).

Quadro 1 – Classificação indicativa da Secretaria Nacional de Justiça. Fonte: www.mj.gov.br/classificacao

O selo indicativo obedece a um padrão de cores e formato, junto a outras informações estipuladas pela SNJ como título “classificação indicativa”, descritores de conteúdo da obra, nome completo e por extenso da faixa de classificação. Esse controle de certa forma, já antecipa aos autores o que poderá ser incluído na trama e de que forma o conteúdo poderá ser exposto. O não planejamento no projeto da telenovela acarreta interferências posteriores como regravação de cenas e mudança no destino dos personagens. Um exemplo disso ocorreu na novela Babilônia (2015), o que obrigou os atores a regravarem várias sequências, por conterem cenas que não estão de acordo com a classificação indicativa de 12 anos. Um dos autores, Ricardo Linhares, revelou que a personagem Alice (Sophie Charlotte), que se tornaria garota de programa, terá outro destino na trama (KOGUT, 2015). Em razão disso, as cenas dessa personagem devem ser reescritas para se adequarem à classificação indicativa. Nesse sentido a telenovela das seis, ao ser escrita, exige um cuidado maior na construção dos enredos, pois o seu público é mais amplo, crianças e demais faixas etárias a partir de 10 anos.

Telenovela brasileira Com a missão de contar uma história, um projeto de telenovela envolve uma equipe técnica numerosa, determinada em transmitir a criação do autor para muitos milhões de pessoas. Refletindo um pouco ou muito da vida real, esse produto ficcional é um emaranhado de fluxos contínuos de intrigas, tramas principais e paralelas, inserções de merchandising social e comercial, inovações e gêneros literários misturados e orquestrados por um ou mais diretores, a telenovela é tudo isso. Para Souza et al. (2009) as telenovelas carregam marcas de autoria de muitos profissionais. O espaço do autor no processo de desenvolvimento de uma telenovela estabeleceu um campo, onde múltiplos conceitos, modos diferentes de pensar o projeto de alguma forma se fundem à formação do produto televisual. É importante lembrar que a telenovela que veicula no Brasil possui características próprias, o que a difere da matriz melodramática mexicana. Muito se fala em telenovelas de uma forma geral, em termos de produção e narrativa, mas, embora haja uma proximidade entre telenovelas latino-americanas e brasileiras, evidenciam-se

suas peculiaridades. Ressalta-se a partir disso, essas tramas no cenário televisivo no país, fixando a denominação telenovela brasileira. A telenovela configura-se em obra estética e cultural com especificidades muito particulares, que a destaca como figura importante para a história da televisão e para a cultura do Brasil (MOTTER, 2000; BORELLI, 2001; LOPES; 2009). A indústria de telenovelas passou por diversas mudanças até se estabelecer no final dos anos 60 com inovações que melhoraram seu processo produtivo. A década de 70 é marcada pela sua legitimidade e pelo diálogo com outros campos como o cinema, a literatura e o teatro. A telenovela se apropriou, inicialmente, de uma linguagem vinda do rádio e do cinema, essa combinação foi a responsável por trazer às telenovelas outras possibilidades além do melodrama, gênero que não abre espaço para o humor e discussões mais realistas (BORELLI, 2011; LOPES, 2009). Jost (2007) explica que os primeiros programas de TV podiam ser acompanhados também pelo rádio, pois eram retransmitidos sem as imagens. Ele compara a TV a uma fala televisionada, reforçando que a sua linguagem absorveu, inicialmente, as características radiofônicas. A grande audiência das telenovelas e o sucesso alcançado como produto midiático para exportação são responsáveis pela busca, a partir dos anos oitenta, da compreensão deste fenômeno: “[...] um formato singular do gênero ficcional na categoria entretenimento da comunicação televisiva latino-americana” (MELO, 2004, p. 07). Paiva e Sodré (2008) indicam outras características como a absorção de conteúdos e cenas de outros gêneros. Os autores expõem que há pouca criticidade quanto ao conteúdo dramatúrgico, ou quando há, realiza-se com base na teoria literária, porém, muitas vezes o juízo crítico é inibido, porque grande parte delas pode ser considerada pastiche. A telenovela “” (2006), por exemplo, usufruiu de conteúdos narrativos do filme “O Ilusionista” (2006). Esse tipo de apropriação ocorre também no cinema segundo esses autores. O clássico “Moby Dick” (1851) foi repetido em sequências homólogas por um filme americano (PAIVA; SODRÉ, 2008). Não é difícil encontrar alusões ao cinema na telenovela como mostraram Paiva e Sodré. Essa conversa intertextual também pode ocorrer de forma mais criativa, na convocação de antigos personagens da própria TV para uma ponta na produção. Em “Alto Astral”

(2014), a personagem Samanta, interpretada por Cláudia Raia, é presa e encontra outra personagem sua, o Tonhão, do programa de humor TV Pirata. O autor da telenovela escreveu uma cena especialmente para Claudia Raia reviver a antológica personagem (BITTENCOURT, 2015). Além de repetir conteúdos de obras literárias ou audiovisuais, Barbosa (2007) pontua que a narrativa televisual incorpora modos de narrar de outros meios. A televisão dedica parte de suas tramas à cultura oral e nas telenovelas, segundo a autora, a ênfase ocorre por meio de temáticas que exploram o universo fantástico, o mistério, a fantasia. No contexto da década 70, que primava pelo realismo como uma forma de modernização das tramas, a telenovela “Saramandaia”10 (1976) de Dias Gomes representou uma renovação da linguagem. Na análise de Sacramento (2014), essa obra se sobressaiu entre as tramas da época, apresentando elementos do fantástico e do grotesco, podendo ser classificada dentro do realismo fantástico. Ou seja, pode se considerar a telenovela um arcabouço de linguagens, com apropriações de outros meios, em constante atualização, constituindo o mundo fictivo da televisão. Jost (2007, p. 119), ao analisar alguns formatos ficcionais, explana que “[...] a ficção tem todos os direitos, e, nomeadamente, o de tomar emprestados os elementos do real, mas também de engendrar, a partir desse material, acontecimentos totalmente imaginários”, o autor diferencia ficções naturalizantes, aquelas que imitam situações do mundo real, das ficções abertamente ficcionais, que se desenvolvem em um mundo maravilhoso, onde tudo é permitido.

Caracterização do horário das seis Para a caracterização do horário na grade, fez-se uma pesquisa no site Memória Globo, no período de 2004 a 2014. Nesse recorte temporal, o espaço das seis na grade da RGT apresentou 21 telenovelas detalhadas no quadro 2.

10 Em 2013, foi veiculado um remake dessa telenovela no horário das 23 horas.

Telenovela Período/ Nº Autor(es) Diretor(es) exibição Cap. 2004 167 Edmara Barbosa e Edilene Rogério Gomes e José Luiz Barbosa Villamarim 2004-2005 179 Walther Negrão Dennis Carvalho e Mauro M. Filho Alma Gêmea 2005-2006 227 Walcyr Carrasco Jorge Fernando Sinhá Moça 2006 185 Benedito R. Barbosa Rogério Gomes O Profeta 2006-2007 178 Ivani Ribeiro Adap.: Duca Mario Marcio Bandarra Rachid e Thelma Guedes Eterna Magia 2007 148 Elizabeth Jhin Ulysses Cruz 2007-2008 154 Walter Negrão, Jackie Vellego Luiz Henrique Rios e Renato Modesto Ciranda de Pedra 2008 131 Alcides Nogueira Carlos Araújo Negócio da China 2008-2009 136 Miguel Falabella Mauro M. Filho Paraíso 2009 173 Benedito R. Barbosa Rogério Gomes Adap.: Edmara Barbosa 2009-2010 161 Duca Rachid e Thelma Guedes Escrito nas 2010 143 Elizabeth Jhin Pedro Vasconcelos Estrelas Araguaia 2010-2011 166 Walther Negrão Marcos Schechtman e Marcelo Travesso 2011 143 Duca Rachid e Thelma Ricardo Waddington e Guedes Amora Mautner 2011-2012 137 Lícia Manzo Jayme Monjardim e Fabrício Mamberti Amor Eterno 2012 161 Elizabeth Jhin Pedro Vasconcelos Amor 2012-2013 154 João Ximenes Braga e Dennis Carvalho e Vinícius Claudia Lage Coimbra 2013 159 Walther Negrão Leonardo Nogueira 2013-2014 173 Duca Rachid e Thelma Ricardo Waddington Guedes e Amora Mautner Meu Pedacinho de 2014 96 Benedito R. Barbosa Luiz Fernando Carvalho e Chão Carlos Araujo 2014-2015 185 Rui Vilhena Ricardo Waddington e Gustavo Fernandez

Quadro 2 – Telenovelas do horário das seis. Fonte: Elaboração da autora a partir de http://memoriaglobo.globo.com/

Através da leitura das informações disponibilizadas no site Memória Globo, como trama principal e paralelas, foi feita uma classificação por meio da identificação dos traços pertinentes dessas telenovelas. Fontanille (2012) considera a identificação de traços pertinentes uma forma para se chegar a uma categorização. Quando Jost (2007) propõe uma categorização dos produtos televisivos em três mundos (real, fictivo e lúdico) e os chama de arquigêneros, ele responde a uma inquietação sua, pois compreende que a identificação de traços comuns podem não estar no mesmo nível e assim, levar a uma fundamentação não racional dos gêneros. Para esse autor, um drama

e uma docuficção, são nomes de gênero que não estão em pé de igualdade, sendo que o primeiro tem procedência do teatro e em emissões que remetem à realidade, mas são representadas por atores. Um exemplo disto é a própria telenovela, em que os traços mais pertinentes, em alguns casos, é a temporalidade e em outros a tematização, obtendo denominação em diferentes níveis de categorização como novela-verdade ou novela de época. Inicialmente, propõe-se uma categorização em relação ao tempo pelo qual uma telenovela, sendo um subgênero, poderia ser classificada dentro do mundo fictivo: contemporânea, de época e atemporal. A telenovela contemporânea e a de época já são bastante conhecidas do público, a primeira se passa num tempo presente e trata de temas da atualidade, e última traz uma história que se passa em um tempo distante. O terceiro tipo de telenovela encontrado não se passa num tempo definido, assim, a chamamos de novela atemporal. Com isso, as emissões que estão representadas pelos formatos televisuais neste horário das 18 horas são apresentadas a seguir. Foram identificadas sete telenovelas contemporâneas. As tramas são em sua maior parte urbanas com apenas duas que se passam no cenário rural, nessas, o regionalismo é bastante explorado e há também uma telenovela com temática mística. 1) Como uma Onda – Conta uma história de disputa entre duas irmãs pelo amor do mesmo homem. 2) Negócio da China – A novela inicia com a situação de um roubo milionário e trama se desenvolve pela busca de um pen drive que contem informações sobre o paradeiro do dinheiro. A trama mistura comédia romântica e cenas de ação. 3) Paraíso – A trama é um remake e se desenvolve através da paixão proibida entre Zeca e Maria Rita. Peões, moda de viola, ligação do homem com a terra, discussões sobre reforma agrária e política são mostradas nessa cidade fictícia chamada Paraíso, localizada no interior do Mato Grosso. 4) Cama de Gato – A trama principal trata das transformações na vida de um homem, que após se tornar um poderoso empresário, perde tudo o que tem, mas recupera seu caráter e encontra um amor sincero.

5) Araguaia – A trama se passa nos arredores do Rio Araguaia. Conta a história de Solano, que luta contra uma maldição indígena lançada sobre a linhagem dos homens de sua família. 6) A Vida da Gente – A história é sobre as relações familiares entre uma mãe e suas duas filhas. Na trama são abordados os conflitos gerados pela preferência da mãe por uma das filhas, da amizade entre as duas irmãs que se abala pela disputa do mesmo homem. 7) – A história inicia contando o sumiço de um menino, herdeiro da família Borges. Na realidade se trata de um sequestro arquitetado pelos seus próprios tios. O fio condutor da narrativa é a busca desse menino, que possui um dom especial de domar animais, pelo amor que conheceu na infância, enquanto viveu com seus pais forjados. A trama aborda o espiritualismo, a reencarnação, espíritos obsessores.

Esse tipo de telenovela permite um diálogo direto com o público, admitindo uma inserção mais fácil de merchandising comercial. Foram encontradas 10 telenovelas de época - São telenovelas que constroem suas tramas em cima de períodos históricos. Figuram constantemente no horário das seis, apresentando-se, muitas das vezes junto a enredos místicos. 1) Cabocla – Adaptação de telenovela de Benedito Ruy Barbosa, a produção se passa no início do século XX. Romance entre dois jovens de etnias diferentes, posse de terras entre outros assuntos foram abordados. 2) Alma Gêmea – É uma trama que aborda o amor de um homem e uma mulher separados tragicamente, que após 20 anos voltam a se encontrar quando ela reencarna em um novo corpo. A história é ambientada nos anos de 1920 e 1940. 3) Sinhá Moça – A obra é um remake e se passa no ano de 1886, e seu enredo é construído em cima de temas como escravidão, amor, política e liberdade. 4) O Profeta – O remake conta a história de Marcos, jovem que tem o dom de prever o futuro. Se passa na década de 50 do século passado. 5) Eterna Magia – Aborda os conflitos entre duas irmãs da família Sullivam, que descendem da bruxa Valentina. Uma delas possui um dom especial e também é

a filha preferida pelo pai, causando inveja na outra irmã. É contada entre os anos 1938 a 1946. 6) Desejo Proibido – É contada nos anos 1930. Aborda um romance proibido devido à vocação religiosa de um deles. 7) Ciranda de Pedra - Ambientada em São Paulo de 1958, o remake traz personagens em busca de seus destinos, mas atados ao passado. 8) Lado a Lado - A história é contada num tempo pós-escravidão, mostrando a amizade entre duas mulheres de classes sociais diferentes mas com personalidades bastante parecidas. Num contexto histórico marcante, a trama aborda a afirmação dos negros e de sua cultura na sociedade da época. 9) Joia Rara – A história inicia contando de Franz ao Himalaia, onde sofre um grave acidente e é salvo por monges budistas. Na volta para o Brasil conhece Amélia, e com ela tem uma filha, Nina. A menina possui dons especiais, pois é a reencarnação de Ananda, um líder espiritual. 10) Boogie Oogie – Se passa no ano de 1978, a trama se desenvolve em torno da rivalidade de duas mulheres, que não sabem que suas vidas estão ligadas por uma mentira que as acompanha desde a maternidade.

Foram classificadas como telenovelas atemporais apenas duas emissões - Essas telenovelas se apropriaram de diferentes tipos de narrativas: do conto maravilhoso e do romance de cavalaria. Em localidades inventadas, os personagens encarnam estereótipos facilmente reconhecidos. 1) Cordel Encantado – Açucena e Jesuíno são amigos desde a infância e com o tempo descobrem o amor. Ambos desconhecem sua origem, Açucena é filha de um monarca da realeza europeia (Reino de Seráfia) e Jesuíno, é filho do rei do cangaço (região de Brogodó). São várias as tramas paralelas, a busca do Rei pela sua filha desaparecida; o mau caráter de Timóteo, filho do coronel, que insiste em namorar Açucena; as maldades de Úrsula e Nicolau que foram os responsáveis pelo desaparecimento da princesa. 2) Meu Pedacinho de Chão – A história é contada através de Serelepe, menino órfão que encontra em Pituca, uma grande amizade. Na fictícia vila de Santa Fé, o embate entre o Coronel Epa e Pedro Falcão em torno da construção de uma

escola é o fio condutor da trama. Com ares de fábula, o remake traz um enredo simples, mas muito expressivo, discutindo temáticas como coronelismo, política, educação e saúde pública.

O espaço das seis, na programação da Rede Globo, nesses últimos dez anos foi representado em sua maioria por telenovelas de época. Em boa parte dessas, a temática mística foi desenvolvida. As tramas contemporâneas, também figuraram, com temáticas urbanas em sua maior parte. As telenovelas atemporais veicularam em menor número, apresentaram narrativas diferenciadas, com histórias que lembravam fábulas.

Considerações finais A caracterização objetivada por esta pesquisa foi um modo de compreender, a partir dos produtos veiculados nos últimos dez anos, como se configurava a faixa das 18 horas na grade da RGT. Nesse espaço consolidado na programação, a classificação foi feita, a partir de elemento pertinente que é a temporalização e também do que é estipulado pela classificação indicativa. A classificação indicativa da telenovela atual, “Sete Vidas” (2015), assegura o conteúdo livre para exibição em qualquer horário para crianças e demais faixas etárias a partir de 10 anos. Embora, não se conheça a classificação das outras tramas exibidas no horário, pressupõe-se que sejam classificações homônimas, pois o horário não permite obras audiovisuais com classificações indicativas superiores. Com isso, o horário para telenovelas das seis se configura com histórias leves que não apresentam conteúdo violento ou linguagem inapropriada para crianças. Sobretudo, a Rede Globo, por estar atrelada a pensar conteúdos apropriados para o espaço, devido ao controle da SNJ, tende a buscar alternativas ao que leva à audiência em outras faixas horárias, que permitem histórias com uma liberdade maior aos personagens, podendo conter agressões físicas, consumo de drogas e uso de linguagem sexual mais acentuada. Quanto à temporalização, o espaço é ocupado em grande parte pelas telenovelas de época, em segundo lugar pelas tramas contemporâneas, e por último, pelas histórias atemporais em número reduzido. Considera-se que no recorte temporal investigado, houve um direcionamento a determinadas temáticas na produção ficcional em telenovelas, cujos traços pertinentes

poderiam se categorizados também, em um segundo momento por temáticas urbanas, místicas e regionais.

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