Sustentabilidade urbana: Análise de viabilidade da implementação de um digestor anaeróbio de Resíduos Orgânicos na freguesia dos Olivais, Lisboa

Samuel Acúrcio Jacinto

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Mecânica

Orientadores: Dr. Samuel Pedro de Oliveira Niza Dr. André Alves Pina

Júri Presidente: Prof. Mário Manuel Gonçalves da Costa Orientador: Dr. Samuel Pedro de Oliveira Niza Vogal: Prof. Paulo Manuel Cadete Ferrão

Outubro 2014 Agradecimentos

Agradeço ao Professor Dr. Samuel Niza e Dr. André Pina por me terem sugerido um tema que pouco conhecia e que ganhei muita afinidade. Também agradeço a paciência, o ecorajamento e orientação quando mais precisei dela.

Agradeço à Dra. Inês Cristovão do Departamento de Higiene Urbana da Câmara Municipal de Lisboa por gentilmente ter cedido os dados que serviram de base a todo este trabalho.

Agradeço à Junta de Freguesia dos Olivais por ter mostrado interesse no presente trabalho.

Agradeço à equipa do IN+ do Tagus por me ter recebido de braços abertos e pela boa disposição à hora de almoço.

Agradeço à minha familia pelo apoio verdadeiramente incondicional durante o curso. Agradeço à Daniela por estar sempre presente, por me apoiar e partilhar todos os momentos bons e maus do último ano.

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Resumo

A presente dissertação tem como objectivos dimensionar uma unidade de digestão anaeróbia para valorização da fracção orgânica de resíduos sólidos urbanos através de uma unidade de cogeração a ser instalada na freguesia dos Olivais, Lisboa, e desenvolver uma análise técnica e financeira da mesma. O dimensionamento da unidade foi baseado na legislação nacional e comunitária em vigor e segundo as práticas de construção e operação destas unidades de pequena dimensão descentralizadas. A unidade terá capacidade para valorizar aproximadamente 1200 toneladas/ano de resíduos orgânicos em regime contínuo, mesofílico (35 ⁰C), por via húmida (14 % de sólidos totais) com capacidade de produzir 211.665 m3/ano de biogás. Uma análise cuidada da dimensão do digestor, do gasómetro, da unidade de cogeração e também da energia consumida pelos equipamentos da unidade, em termos eléctricos e térmicos, também foi feita. Do balanço energético, determinou-se que aproximadamente 17 % dos 1950,7 GJ/ano da energia eléctrica obtida é para consumo próprio, e cerca de 22 % dos 2763,5 GJ/ano da energia térmica obtida é utilizada para aquecimento do digestor e da unidade de pasteurização. Em termos financeiros o projecto tem como receitas a venda de energia eléctrica à rede, a venda de calor e o valor da taxa de gestão de resíduos. Os custos foram determinados segundo unidades semelhantes. A central proposta tem um custo de investimento inicial de 362.174 € que, para um período de funcionamento de 20 anos, apresenta um Valor Actual Líquido de 295.942 € com uma taxa de desconto anual de 8,43 %.

Palavras-Chave: Digestão Anaeróbia, Valorização, Resíduos Orgânicos, Descentralizadas, Balanço Energético e Mássico, Investimento.

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Abstract

This dissertation has the objective of dimensioning an anaerobic digestion plant to make the valorization of the organic fraction of municipal solid waste trough a cogeneration unit to be installed in the parish of Olivais, , and also to develop a technical and financial analysis of it. The plant sizing was based in the current Portuguese and European legislation and following the construction and operation standards for small-scale decentralized units. This unit will have the capacity to treat 1200 tons/year of organic waste at continuous feeding, mesophilic (35 ⁰C) wet digestion (14 % total solids) producing 211.665 m3/year of biogas. Further detailed analysis of some characteristics like the dimension of the digester, gasholder, cogeneration unit and the energy consumed by the plant equipment was also made. From the energy balance, it was determined that 17 % of the 1950,7 GJ/year of electrical energy obtained is used by the plant; and 22 % of the 2763,5 GJ/year of thermal energy is used by the digester and the pasteurization unit. Financially, this project’s revenues are the sales from electricity to the grid, the sales from heat and the tipping fees. The costs were defined according to similar scale projects. The proposed plant has an initial investment of 362.174 € which for a working period of 20 years has a Net Present Value of 295.942 € with an annual discount rate of 8,43 %.

Key-words: Anaerobic Digestion, Valorization, Organic Waste, Decentralized, Energy and Mass Balance, Investment.

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Lista de Acrónimos

AGV – Ácidos Gordos Voláteis ANR – Autoridade Nacional de Resíduos ARR – Autoridade Regional dos Resíduos CHP – Combined Heat and Power CML – Câmara Municipal de Lisboa CST – Conteúdo de Sólidos Totais CSTR - Continuously Stirred Tank Reactor CSV – Conteúdo de Sólidos Voláteis DA – Digestão Anaeróbia DHU – Departamento de Higiene Urbana DMC – Digestor de Mistura Completa EBITDA – Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization EET - Encefalopatia Espongiforme Transmissível ENRRUBDA – Estratégia Nacional para a Redução dos Resíduos Biodegradáveis Destinados a Aterros ETVO – Estação de Tratamento e Valorização Orgânica FORSU – Fracção Orgânica dos Resíduos Sólidos Urbanos INE – Instituto Nacional de Estatística IRR – Internal Rate of Return MAOTDR – Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional NPV – Net Present Value PCI – Poder Calorífico Inferior PERSU – Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos PRI – Prazo de Recuperação do Investimento RCE – Redução Certificada de Emissão RSU – Resíduos Sólidos Urbanos RUB – Resíduos Urbanos Biodegradáveis TGR – Taxa de Gestão de Resíduos TIR – Taxa Interna de Rendibilidade TRH – Tempo de Retenção Hidráulico VAL – Valor Actual Líquido

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Índice

Agradecimentos ...... i

Resumo ...... ii

Abstract ...... iii

Lista de Acrónimos ...... iv

Índice ...... v

Índice de Figuras ...... vii

Índice de Tabelas...... viii

1. Introdução ...... 1

1.1. Motivação ...... 1

1.2. Objectivos ...... 1

2. Legislação ...... 2

2.1. Definição de Resíduos Sólidos Urbanos...... 2

2.2. Enquadramento Nacional ...... 2

2.3. Licenciamento de Operadores de Gestão de Resíduos ...... 5

2.4. Unidades de Digestão Anaeróbia ...... 5

2.4.1. Categorias de matérias a valorizar em unidades de biogás e compostagem ...... 6

2.4.2. Aprovação de unidades de biogás e de compostagem ...... 6

2.4.3. Monitorização da digestão e da compostagem ...... 6

2.4.4. Localização ...... 7

2.5. Mini-Produção e Venda de Energia Eléctrica ...... 7

3. Digestão Anaeróbia ...... 9

3.1. Enquadramento Histórico ...... 9

3.2. Processo Bioquímico da Digestão Anaeróbia ...... 10

3.3. Parâmetros que Afectam as Reacções da Digestão Anaeróbia ...... 13

3.4. Parâmetros Operacionais que Influenciam a Digestão Anaeróbia ...... 16

3.5. Digestores Anaeróbios ...... 18

3.5.1. Caracterização ...... 18

3.5.2. Aspectos a Considerar na Escolha do Digestor ...... 19

3.5.3. Digestores de Alimentação Contínua ...... 21

v

3.5.4. Digestores de Alimentação Descontínua ...... 23

3.6. Unidades de Digestão Anaeróbia Existentes em ...... 23

3.6.1. Estação de Tratamento e Valorização Orgânica da Valorsul ...... 23

4. Metodologia ...... 25

5. Estudo de Caso: Freguesia dos Olivais, Lisboa ...... 31

5.1. Caracterização da Freguesia dos Olivais ...... 31

5.2. Proposta de Unidade de Digestão Anaeróbia para a Freguesia dos Olivais ...... 37

5.3. Descrição do Processo, Equipamentos e Critérios de Escolha ...... 38

5.3.1. Critérios de Escolha ...... 38

5.3.2. Entradas e Pré-tratamento...... 38

5.3.3. Digestão...... 41

5.3.4. Saídas e Pós-tratamento ...... 46

6. Resultados ...... 50

6.1. Análise Energética e Mássica ...... 50

6.1.1. Produção Energética ...... 50

6.1.2. Consumo Energético ...... 51

6.1.3. Balanço Energético ...... 56

6.1.4. Balanço Mássico ...... 57

6.2. Viabilidade Económica...... 58

6.2.1. Despesas...... 59

6.2.2. Receitas ...... 61

6.2.3. Balanço Económico ...... 62

6.3. Análise de Sensibilidade ...... 66

Conclusões ...... 70

Bibliografia ...... 72

Anexo 1 ...... 77

vi

Índice de Figuras

Figura 1 - Metas PERSU versus Situação Verificada em 2005 (PERSU II) ...... 2 Figura 2 - Metas de redução de RUB para aterro (base 2002) (PERSU II) ...... 3 Figura 3 - Etapas do processo de DA ...... 11 Figura 4 - Taxa de reacção do processo de DA versus Temperatura (Ostrem et al, 2004) ...... 14 Figura 5 - Exemplos de tipos de agitação e mistura existentes em digestores anaeróbios ...... 17 Figura 6 - Aspectos a considerar na escolha do biodigestor ...... 19 Figura 7 - Digestor UASB (Alves, 1998) ...... 21 Figura 8 - Digestor de mistura completa (Bisschops et al, 2009) (adaptado) ...... 22 Figura 9 - Digestor de contacto (Alves, 1998) ...... 22 Figura 10 - Digestor plug-flow (Bisschops et al, 2009) (adaptado) ...... 22 Figura 11 - Digestores de alimentação descontínua (De Baere et al, 2002)(adaptado) ...... 23 Figura 12 - Diagrama de processo da ETVO (ValorSul, 2003) ...... 24 Figura 13 - Sistemas considerados no balanço de massa ...... 26 Figura 14- Mapa com o enquadramento geográfico da freguesia dos Olivais, Lisboa ...... 31 Figura 15 - População residente na freguesia dos Olivais, Lisboa (cálculos próprios com base em projecções nacionais do INE, 2014) ...... 32 Figura 16 - Quantidade da Fracção Orgânica dos RSU recolhida diariamente na cidade de Lisboa (CML, 2014) . 33 Figura 17 - Distribuição geográfica dos pontos de recolha de FORSU na freguesia dos Olivais, Lisboa ...... 34 Figura 18 - Diagrama da central de digestão anaeróbia proposta ...... 38 Figura 19 - Contaminantes metálicos (Monson et al, 2007) ...... 40 Figura 20 - Triturador proposto para a unidade de digestão anaeróbia ...... 40 Figura 21 - Representação esquemática do digestor anaeróbio proposto (daviddarling.info, 2014) (adaptado) 44 Figura 22 - Prensa parafuso separadora sólido-líquido ...... 47 Figura 23 - Unidade de potência e calor combinado (Viessman Group, 2014) ...... 51 Figura 24 - Balanço de massa da unidade de digestão anaeróbia (Monson et al, 2007) (adaptado) ...... 58 Figura 25 - Investimento inicial previsto em função da potência eléctrica instalada ...... 60 Figura 26 - VAL em função da taxa de desconto ...... 64 Figura 27 - Valor actual do projecto ao longo dos anos e fluxo monetário acumulado (r=8,43%) ...... 65 Figura 28 - Influência da variação da potência instalada no valor do investimento inicial ...... 67 Figura 29 - Influência da variação de potência instalada na despesa, receita e VAL do projecto ...... 68 Figura 30 - Influência da variação das receitas/despesas calculadas ...... 68 Figura 31 - Influência do crescimento anual da receita/despesa ...... 69

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Índice de Tabelas

Tabela 1 - Gamas e intervalos de temperaturas no processo de DA [23] ...... 14 Tabela 2 - Tempo de retenção mínimo utilizado para as diferentes gamas de temperatura ...... 17 Tabela 3 - Vantagens e desvantagens da digestão anaeróbia por via seca e via húmida [30]...... 20 Tabela 4 - Percentagem cumulativa de centrais termofílicas e mesofílicas instaladas em 2014 na Europa [31] . 20 Tabela 5 - Evolução histórica da potência instalada das unidades de produção de biogás em Portugal [33] ...... 23 Tabela 6 - Quantidade e volume dos contentores para recolha de FORSU na Freguesia dos Olivais, Lisboa; por rota de recolha de orgânicos (CML, 2014) ...... 34 Tabela 7 - Quantidades estimadas de orgânicos recolhidos na Freguesia dos Olivais, Lisboa, no período 2010- 2014; por rota de recolha de orgânicos ...... 35 Tabela 8 - Composição dos bio-resíduos alimentares, segundo várias fontes ...... 36 Tabela 9 - Densidade dos resíduos orgânicos segundo diversas fontes ...... 37 Tabela 10 - Histórico da quantidade de resíduos alimentares recolhidos de 2010 a 2014 (CML, 2014) ...... 39 Tabela 11 - Tempo de Retenção hidráulico e Carga Orgânica usada em unidades de digestão anaeróbia...... 42 Tabela 12 - Composição esperada do biogás produzido pela digestão de bio-resíduos alimentares e FORSU .... 48 Tabela 13 - Produção anual de biogás, energia eléctrica e térmica na unidade de digestão anaeróbia ...... 50 Tabela 14 - Propriedades térmicas dos materiais utilizados no digestor anaeróbio ...... 52 Tabela 15 - Energia consumida por diversos equipamentos da unidade de digestão anaeróbia ...... 55 Tabela 16 - Consumos energéticos anuais da unidade de digestão anaeróbia ...... 56 Tabela 17 - Balanço energético da unidade de digestão anaeróbia ...... 56 Tabela 18 - Valores de investimento inicial típico em unidades de digestão anaeróbia ...... 59 Tabela 19 - Estrutura dos custos do investimento inicial (Hahn, 2011) (adaptado) ...... 60 Tabela 20 - Depreciação dos diversos componentes da unidade de digestão anaeróbia proposta ...... 63 Tabela 21 - VAL para várias taxas de desconto ...... 64 Tabela 22 - Parâmetros que afectam os resultados obtidos ...... 66

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1. Introdução

1.1. Motivação

A presente dissertação tem como motivação a solicitação por parte da Junta de freguesia dos Olivais, em Lisboa, para se propor soluções que ajudem a aumentar a sustentabilidade da freguesia em questão. A solução aqui proposta insere-se no ramo da ecologia industrial e da gestão de energia. Os sistemas urbanos são as principais áreas de consumo e de crescimento económico num mundo globalizado, com os impactes ambientais e energéticos associados, sendo que o crescente fluxo de energia e materiais coloca sérios problemas à sustentabilidade global. No contexto da ecologia industrial a natureza é encarada como modelo para redesenhar as estratégias de sustentabilidade pela observação de comunidades ecológicas resilientes, robustas e de longa duração, exemplos típicos de sistemas sustentáveis. Os sistemas urbanos podem assim ser encarados sob uma perspectiva ecossistémica, tal como sugerido pela Ecologia Industrial. Um desafio crítico neste cenário é conseguir balancear nas áreas urbanas os níveis de serviço das infra-estruturas de rede, a gestão dos activos e a eficiência na utilização dos recursos (materiais, energéticos e financeiros). Nesse sentido é vital identificar potenciais novas áreas de negócio, que acompanhem a aposta da ecologia industrial em sistemas distribuídos (e portanto com potencial de dispersão de riscos) em detrimento das soluções tradicionais centralizadas. A necessidade da obtenção de soluções económicas e ambientalmente sustentáveis, para fazer face ao aumento da produção de resíduos sólidos urbanos e ao aumento do consumo energético em meio urbano, justifica a concretização de um estudo que procure uma solução prática e implementável, abrangendo ambas as problemáticas. Um exemplo disto é o potencial de utilização dos resíduos orgânicos produzidos nas áreas urbanas para produzir energia para consumo local. O digestor anaeróbio que aqui é proposto para a freguesia dos Olivais, foi escolhido com base em informação cuidadosamente seleccionada de vários relatórios de instalações com dimensões muito semelhantes à que aqui se testemunha. Nesta proposta todos os requisitos estruturais são cumpridos e a sua tipologia resultante das condições de funcionamento previstas anteriormente e das características dos resíduos que se pretendem valorizar.

1.2. Objectivos

Os objectivos da presente dissertação são: 1. Dimensionar uma unidade de digestão anaeróbia a instalar na freguesia dos Olivais, em Lisboa, para aproveitamento dos resíduos orgânicos produzidos nesta freguesia para a produção de energia, eléctrica e térmica, através da queima de biogás; 2. Desenvolver uma análise da viabilidade técnica e financeira da instalação.

1

2. Legislação

2.1. Definição de Resíduos Sólidos Urbanos

O quadro jurídico da gestão dos resíduos foi pela primeira vez definido entre nós pelo Decreto-Lei n.º 488/85, de 25 de Novembro, que seria revogado, 10 anos depois, pelo Decreto-Lei n.º 310/95, de 20 de Novembro, o qual transpôs as Directivas n.º 91/156/CEE, de 18 de Março, e 91/689/CEE, de 12 de Dezembro [1]. O Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro, define resíduos urbanos como “os resíduos domésticos ou outros resíduos semelhantes, em razão da sua natureza ou composição, nomeadamente os provenientes do sector de serviços ou de estabelecimentos comerciais ou industriais e de unidades prestadoras de cuidados de saúde, desde que, em qualquer dos casos, a produção diária não exceda 1100 l por produtor” [1].

2.2. Enquadramento Nacional

O Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU I) na sua primeira versão aprovada em Julho de 1997 visava:  A criação de um verdadeiro mercado sectorial com significativa relevância no domínio do ambiente e que actualmente emprega milhares de trabalhadores;  A erradicação total das lixeiras;  Cumprir os objectivos globais de reciclagem de resíduos de embalagem para 2005;  Promover a optimização de circuitos de recolha e transporte para os Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) e as suas fracções valorizáveis;  A implementação dos Sistemas Multimunicipais e Intermunicipais de gestão de RSU. Para o ano de 2005 o PERSU I definiu também algumas metas de gestão de resíduos, sendo que estas se encontram apresentadas na Figura 1 onde também se procurou ilustrar a comparação com o que realmente foi verificado nesse ano.

23%

22% 63%

25%

21% 25% 9% 5% 7%

Metas PERSU 2005 Situação Verificada 2005

Redução Compostagem Reciclagem Inceneração Aterro Sanitário e ECTRU Lixeiras

Figura 1 - Metas PERSU versus Situação Verificada em 2005 (PERSU II)

2

De acordo com a Figura 1, verifica-se que: (PERSU II)  O objectivo de encerrar a totalidade das lixeiras foi cumprido;  A quantidade de resíduos colocados em aterro foi superior ao definido no plano, 63 % dos resíduos produzidos contra o objectivo de 23 %;  A incineração de resíduos apresenta um valor ligeiramente inferior ao preconizado;  Apenas 7 % dos RSU sofreram valorização orgânica ao invés dos 25 % previstos no plano  A reciclagem apresenta valores muito inferiores aos 25 % definidos; No acompanhamento das acções levadas a cabo pelo PERSU I, foi apresentada pelo governo português, em Julho de 2003, a Estratégia Nacional para a Redução dos Resíduos Biodegradáveis Destinados aos Aterros (ENRRUBDA) que estabeleceu metas e princípios orientadores em três eixos distintos:  Redução na Fonte – intervenção ao nível dos processos de fabrico e compostagem em pequena escala;  Recolha Selectiva – de matéria orgânica, em sistemas de recolha “porta-a-porta”, em ecopontos/ecocentros, com pré-tratamento mecânico;  Valorização Orgânica – por processos aeróbios, processos anaeróbios e com pré-tratamento mecânico. Conceptualmente, os passos dados no sentido de cumprir as metas propostas nos três eixos, desenrolaram-se no sentido de optimizar as capacidades disponíveis dos sistemas de gestão, recorrendo, sempre que possível, a processos de tratamento utilizando as melhores tecnologias existentes. Também importante foi a definição de objectivos faseados de recolha selectivas para vários fluxos de resíduos como os Resíduos Urbanos Biodegradáveis (RUB) e a redução da deposição destes em aterro, como evidenciado na Figura 2 para os anos de 2006 a 2016.

% 100

80

60

40

20

0 2006 2008 2010 2012 2014 2016

Figura 2 - Metas de redução de RUB para aterro (base 2002) (PERSU II)

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A fim de alcançar o cumprimento dos objectivos do terceiro eixo de acção da ENRRUBDA, foram promovidos novos mercados para os produtos resultantes do tratamento destes resíduos e a promoção destes produtos junto dos principais consumidores, procurando manter padrões de qualidade elevados [2]. A necessidade de minimizar a produção de resíduos e de assegurar a sua gestão sustentável tornou-se, entretanto, numa questão de cidadania. Existe uma consciência cada vez mais clara de que a responsabilidade pela gestão dos resíduos deve ser partilhada por todos: do produtor de um bem ao cidadão consumidor, do produtor do resíduo ao detentor, dos operadores de gestão às autoridades administrativas reguladoras. Para tal, a Lei-quadro do Resíduos, aprovada pelo Decreto-Lei nº 178/06, de 5 de Setembro, aprovou o novo Regime Geral da Gestão dos Resíduos que invoca a responsabilidade dos custos inerentes à gestão de resíduos ao “poluidor” (princípio poluidor-pagador). A regulamentação das operações de gestão dos resíduos como recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorização e eliminação, específicos para cada fluxo de resíduos também foi apresentada, sendo supervisionada pelas recém-criadas Autoridade Nacional de Resíduos (ANR) e Autoridades Regionais dos Resíduos (ARR), bem como as operações de descontaminação de solos e monitorização dos locais de deposição, após encerramento das respectivas instalações. Deste Decreto-Lei surge também a necessidade da criação de um novo plano específico de gestão de resíduos urbanos (PERSU II) [2]. O PERSU II, aprovado pelo despacho do Ministério do Ambiente, do Ordenamento de Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR), de 28 de Dezembro de 2006, veio reafirmar estratégias e prioridades e estabelecer metas em relação à gestão de RSU para o período de 2007-2016. A criação do PERSU II deu também resposta à necessidade de definir um plano específico de gestão de resíduos e procurou dar resposta às dificuldades de implementação da ENRRUBDA. De um modo geral no PERSU II é enfatizada a necessidade de se apostar na prevenção da produção de RSU. Importante, também, é o desvio de resíduos biodegradáveis destinados a aterro, por via das unidades de digestão anaeróbia, compostagem, tratamento mecânico e biológico (TMB) e incineração com recuperação de energia [2]. Mais recentemente, o Decreto-Lei nº 73 de 2011, de 17 de Junho, vem alterar a Lei-quadro dos Resíduos e transpõe a Directiva n.º 2008/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Novembro, relativa aos resíduos [3]. O presente decreto-lei vem clarificar conceitos chave, como as definições de resíduo, prevenção, reutilização, preparação para a reutilização, tratamento e reciclagem, e ainda a distinção entre os conceitos de valorização e eliminação de resíduos, com base numa diferença efectiva em termos de impacte ambiental. Neste Decreto-lei está previsto:  O reforço da prevenção da produção de resíduos e o fomentar da sua reutilização e reciclagem com vista a prolongar o seu uso na economia antes de os devolver em condições adequadas ao meio natural;  Promover o pleno aproveitamento do novo mercado organizado de resíduos como forma de consolidar a valorização dos resíduos, com vantagens para os agentes económicos, bem como estimular o aproveitamento de resíduos específicos com elevado potencial de valorização;  O incentivo à recolha selectiva, em particular dos bio resíduos e estabelece-se um enquadramento regulamentar para a livre comercialização do composto para valorização agrícola;  A aprovação de programas de prevenção e estabelecem-se metas de reutilização, reciclagem e outras formas de valorização material de resíduos, a cumprir até 2020;

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 Alargar o âmbito do mercado organizado de resíduos aos subprodutos, materiais reciclados e resíduos perigosos;  Estabelecer-se requisitos para que substâncias ou objectos resultantes de um processo produtivo possam ser considerados subprodutos e não resíduos;  Introdução do mecanismo da responsabilidade alargada do produtor. Esta abordagem da gestão de resíduos tem em conta o ciclo de vida dos produtos e materiais e não apenas a fase de fim de vida, com as inerentes vantagens do ponto de vista da utilização eficiente dos recursos e do impacte ambiental. O presente trabalho pretende estar enquadrado no segundo ponto aproveitando o novo mercado organizado de resíduos e ser assim uma alternativa aos agentes existentes.

2.3. Licenciamento de Operadores de Gestão de Resíduos

O Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, veio definir novas regras para o licenciamento das operações de gestão de resíduos revogando o Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro e a Portaria n.º 961/98, de 10 de Novembro. Pretendeu-se com a publicação deste Decreto-Lei reformar o mecanismo da autorização prévia de modo a aproximá-lo dos modelos em vigor nos ordenamentos jurídicos dos demais parceiros comunitários, sujeitando as operações de gestão de resíduos a um procedimento administrativo célere de controlo prévio, que se conclui com a emissão de uma licença, e a procedimentos administrativos que assegurem uma efectiva monitorização da actividade desenvolvida após esse licenciamento. Neste diploma introduziram-se mecanismos de adaptação das licenças às inovações tecnológicas que constantemente surgem neste sector e de resposta a efeitos negativos para o ambiente, que não tenham sido previstos na fase de licenciamento, introduzindo-se, igualmente, procedimentos que visam acompanhar as vicissitudes da actividade de gestão de resíduos, como sejam as da transmissão, alteração e renovação das licenças. Com a publicação do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho, que alterou e republicou o Decreto-Lei nº 178/2006, de 5 de Setembro, o regime de licenciamento simplificado permite a emissão de uma licença num prazo máximo de 30 dias [4]. Este Decreto-Lei define que podem ser estabelecidas normas técnicas relativas à gestão de resíduos de modo a assegurar que os resíduos são tratados em conformidade com o princípio da protecção da saúde humana e do ambiente. Assim em relação às operações de gestão de resíduos como o transporte de resíduos está sujeito a registo electrónico a efectuar pelos produtores, detentores, transportadores e destinatários dos resíduos, através de uma e-GAR disponível no sítio da ANR na Internet [3].

2.4. Unidades de Digestão Anaeróbia

O Regulamento n.º 1774 de 2002, de 3 de Outubro, da Comissão Europeia, define regras para aprovação de unidades de biogás e compostagem. Este documento compreende a classificação das matérias (ou tipos de resíduos) a valorizar, os requisitos para aprovação de unidades de biogás e de compostagem, os cuidados a ter na monitorização das unidades e como pode ser definida a localização das mesmas.

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2.4.1. Categorias de matérias a valorizar em unidades de biogás e compostagem No regulamento estão categorizados os subprodutos animais, não destinados a consumo humano, em três categorias:  Matérias da categoria 1 - Que incluem os subprodutos animais suspeitos de estarem infectados com uma, não incluídos nas categorias dos animais de criação e dos animais selvagens, para experiências e Restos de cozinha e de mesa provenientes de meios de transporte que efectuem transportes internacionais  Matérias da categoria 2 – Onde se encontrem chorume e conteúdo do aparelho digestivo, produtos de origem animal que contenham resíduos de medicamentos veterinários e contaminantes e animais ou partes de animais que não tenham sido abatidos para consumo humano  Matérias da categoria 3 – Que contenham partes de animais abatidos, próprias para consumo humano, partes de animais abatidos, subprodutos animais derivados do fabrico de produtos destinados ao consumo humano, restos de géneros alimentícios de origem animal ou restos de géneros alimentícios que contenham produtos de origem animal, para além dos restos de cozinha e de mesa, e restos de cozinha e de mesa. Na unidade de digestão anaeróbia a instalar na freguesia dos Olivais, Lisboa, a categoria que se pretende considerar para valorização orgânica é a categoria 3.

2.4.2. Aprovação de unidades de biogás e de compostagem Para o estudo realizado no âmbito da tese a categoria que é pertinente considerar é a que se insere na tipologia 3. Uma unidade de biogás deve dispor de uma unidade de pasteurização/higienização, meios adequados para a limpeza e desinfecção de veículos e contentores aquando da sua saída da unidade de biogás e um reactor de compostagem fechado que não possa ser contornado com monitorização de temperatura. Cada unidade de biogás e de compostagem deve também dispor de um laboratório próprio ou recorrer aos serviços de um laboratório externo. O laboratório deve dispor de equipamento que lhe permita efectuar as análises necessárias e deve ser aprovado pela autoridade competente. As matérias da categoria 3 utilizadas como matéria-prima numa unidade de compostagem devem obedecer aos seguintes requisitos mínimos [5]:  Dimensão máxima das partículas antes de entrarem no reactor de compostagem: 12 mm;  Temperatura mínima na totalidade das matérias no reactor (ou unidade de pasteurização/higienização): 70 °C;  Tempo mínimo no reactor (ou unidade de pasteurização/higienização) a 70 °C (todas as matérias): 60 minutos.

2.4.3. Monitorização da digestão e da compostagem Com o objectivo de monitorizar o processo, as amostras representativas dos resíduos da digestão ou do composto colhidas durante ou imediatamente após a transformação na unidade de biogás ou de compostagem devem obedecer às seguintes normas:  Escherichia coli: n = 5, c = 1, m = 1 000, M = 5 000 em 1 g, ou  Enterococaceae: n = 5, c = 1, m = 1 000, M = 5 000 em 1 g, em que:

6 n - número de amostras a testar; m - valor limiar para o número de bactérias; o resultado é considerado satisfatório se o número de bactérias em todas as amostras não exceder m; M - valor máximo para o número de bactérias; o resultado é considerado insatisfatório se o número de bactérias numa ou mais amostras for igual ou superior a M; c - número de amostras cuja contagem de bactérias se pode situar entre m e M, sendo a amostra ainda considerada aceitável se a contagem de bactérias das outras amostras for igual ou inferior a m. As amostras representativas dos resíduos da digestão ou do composto colhidas durante a armazenagem na unidade de biogás ou de compostagem ou no termo desta devem obedecer à seguinte norma:  Salmonela: ausência em 25 g: n = 5, c = 0, m = 0, M = 0. Os resíduos da digestão ou o composto que não cumpram os requisitos estabelecidos no presente capítulo serão novamente transformados; em caso de presença de Salmonela serão manuseados ou eliminados em conformidade com as instruções da autoridade competente [5]. Os resíduos da digestão e o composto devem ser manuseados e armazenados, respectivamente, na unidade de biogás ou de compostagem, de forma a evitar a recontaminação. Por essa razão as matérias da categoria 3 serão recolhidas, transportadas e identificadas sem demoras desnecessárias.

2.4.4. Localização Segundo o Decreto-Lei n.º 239 de 1997, de 9 de Setembro, os projectos de operações de gestão de resíduos devem ser acompanhados de parecer da Câmara Municipal competente que ateste a compatibilidade da sua localização com o respectivo plano municipal de ordenamento do território, bem como de parecer favorável à localização, quanto à afectação de recursos hídricos, a emitir pela direcção regional do ambiente e dos recursos naturais competente.

2.5. Mini-Produção e Venda de Energia Eléctrica

A actividade de produção de energia eléctrica descentralizada de pequena escala é regulada pelo Decreto-Lei n.º 363 de 2007, de 2 de Novembro, que foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 118-A de 2010, de 25 de Outubro, e pelo Decreto-Lei n.º 34 de 2011, de 8 de Março. Este último exclui a regulamentação para instalações de microprodução. O DL n.° 34 de 2011 classifica as instalações de microprodução em três escalões, em função da sua potência:  Escalão I: até 20 kW;  Escalão II: 20 a 100 kW;  Escalão III: 100 a 250 kW. A remuneração de sistemas de mini-produção é feita através de uma tarifa bonificada, cujo valor é calculado em função do escalão de potência da instalação e do tipo de tecnologia de produção utilizado. Para produtores de energia através de biogás, existe um regime bonificado de venda, cujo preço é calculado dependendo do escalão.

O produtor cuja unidade de mini-produção se insira nos escalões II e III é remunerado com base na tarifa mais alta que resultar das maiores ofertas de desconto à tarifa de referência apuradas nos respectivos escalões. O

7 produtor cuja unidade de mini-produção se insira no escalão I é remunerado com base na tarifa de referência, que para o ano de 2014 está fixado pelo Decreto-Lei n.º 25 de 2013, de 19 de Fevereiro, e corresponde a um valor de 159 €/MWh [6]. Através Decreto-Lei n.º 25 de 2013 define-se que a tarifa bonificada de venda de energia eléctrica à rede a partir de biogás, caso em que se insere este estudo, durante os primeiros 15 anos do projecto, possui o valor de 95,4 €/MWh, correspondendo este valor a 60 % da tarifa de referência. Após os primeiros 15 anos de funcionamento de uma unidade de mini-produção, a energia passa a ser vendida ao preço de mercado, nas mesmas condições das grandes centrais de produção. Esta tarifa representa a mais importante fonte de receita do projecto estudado na presente tese.

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3. Digestão Anaeróbia

3.1. Enquadramento Histórico

A digestão anaeróbia (DA) era utilizada no século X, a.c., pelos Assírios para aquecimento de águas de banhos através da queima do gás resultante da digestão. No século XVII, Robert Boyle e Stephen Hale, reportaram que a matéria orgânica em decomposição produzia um gás inflamável. A razão pelo qual este fenómeno de libertação de gás acontecia era desconhecido, assim como qual o gás que era libertado no processo de decomposição orgânica. No entanto esse gás continuava a ser utilizado para aquecer água [7]. Em 1770 os primeiros passos no sentido de conhecer melhor o fenómeno foram dados, com o desenvolvimento de estudos e trabalhos de investigação. Os primeiros sistemas de DA, assentes sobre esses estudos, eram grandes, sem aquecimento e sem misturadores com problemas operacionais significativos devido à deposição de sólidos e afins. Estes problemas recorrentes limitaram a implementação destes sistemas até ao século XX. Os avanços feitos no campo da microbiologia na década de 1930 permitiram aos investigadores identificar que o mecanismo responsável pela produção de biogás dependia de bactérias anaeróbias. Ensaios laboratoriais subsequentes foram realizados para identificar as condições óptimas para a produção do gás. Como resultado, a complexidade dos digestores foi aumentando na Europa, para comportar os novos parâmetros de mistura e de aquecimento. Como seria de esperar, as primeiras aplicações comerciais destinavam-se à digestão de estrume em quintas para a produção de electricidade e calor. À medida que a base de conhecimento foi aumentando, também, foi aumentando a capacidade de emprego de novos materiais a serem digeridos, como é o exemplo de materiais orgânicos industriais e RSU [8]. Áreas rurais, especialmente em países em vias de desenvolvimento, têm vindo a empregar sistemas de DA há algum tempo por ser um procedimento económico para tratamento de resíduos e produção de combustível para aquecimento e cozinha. Actualmente em países como a China e Índia, onde os resíduos orgânicos são dominantes, unidades rudimentares destes sistemas de aquisição de energia, ainda são regra [9]. A história da exploração e utilização do biogás na China cobre um período de mais de meio século. As primeiras unidades de produção de biogás por DA foram edificadas na década de 1940 por famílias abastadas e desde a década de 1970 com os avanços e investigação feitos, promovidos pelo governo Chinês, mais de 5 milhões de digestores de biogás de pequena dimensão foram construídos e na actualidade mais de 20 milhões de pessoas beneficiam da utilização deste gás. A Índia, à semelhança de China, possui actualmente cerca de 1 milhão destes pequenos biodigestores em zonas rurais [10]. Através de investigação com financiamento governamental, assim como demonstrações piloto nos últimos 30 anos, as instalações de DA na Europa têm sofrido grandes evoluções. A investigação académica tem permitido a comercialização das técnicas que ainda hoje são aperfeiçoadas por via de incentivos fiscais, que trazem a diminuição dos desperdícios, e devido a políticas de resíduos mais apertadas [11]. O mais recente desenvolvimento tecnológico da DA a nível mundial permite o tratamento de resíduos industriais e de águas residuais. Na Europa, Austrália e Ásia, a DA é a solução preferencial para tratamento da fracção orgânica dos resíduos industriais de várias fontes. Vários benefícios são retirados deste tipo de tratamento para as empresas que o aplicam. A produção de biogás pode ser aproveitada como fonte de energia, redução de odor

9 e volume de lamas produzidas, assim como sanitização dos resíduos. Também fruto desta nova investida são os novos desafios que a tecnologia tem de ultrapassar. A variabilidade dos resíduos a serem tratados e as limitações em termos espaciais onde as instalações de digestão têm que ser implantadas são um deles. A fracção orgânica dos Resíduos Sólidos Urbanos (FORSU) podem conter restos alimentares, resíduos de jardim ou papel em concentrações, tamanhos e composições muito variáveis. Além disso os RSU estão contaminados com inorgânicos como o metal, plásticos e vidros, que requerem pré-tratamento e serem retirados do material a ser digerido. Apesar destes desafios, os países Europeus têm mostrado e liderado o caminho na expansão da DA em relação ao tratamento dos RSU nas cerca de 70 unidades de tratamento de RSU existentes na Alemanha, Dinamarca, França, Espanha, Áustria, Holanda, Inglaterra, Bélgica e outros países da Europa [12].

3.2. Processo Bioquímico da Digestão Anaeróbia

A Digestão Anaeróbia é a designação de um processo biológico de decomposição de matéria orgânica em metano, dióxido de carbono, nutrientes inorgânicos e composto num ambiente desprovido de oxigénio e na presença de hidrogénio gasoso. Este processo, que também é conhecido como bio-metanogénese, ocorre naturalmente em pântanos, campos de arroz, nos intestinos dos animais, estrumes e sedimentos aquáticos, e é parte importante no ciclo de carbono [13]. As fontes naturais e antropogénicas correspondem, respectivamente, a 30 e 70 % das emissões totais de metano para a atmosfera todos os anos [14]. A digestão anaeróbia pode ser usada para o processamento de qualquer material com conteúdo em carbono, incluindo alimentos, papel, esgotos, aparas de jardim e resíduos sólidos em vários estágios de degradação. A FORSU consiste assim num substrato que requer variadas etapas de reacções metabólicas complexas para ser digerido. As reacções serão em seguida descritas de forma detalhada, definindo os produtos resultantes dessas reacções e os microrganismos envolvidos. O processo global ocorre em quatro etapas principais, designadas (Figura 3):  Hidrólise – onde as moléculas mais complexas são reduzidas aos monómeros constituintes;  Acidogénese – onde se formam ácidos;  Acetogénese – onde ocorre produção de acetato, ou ácido acético;  Metanogénese – onde é produzido metano através de acetato ou hidrogénio.

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Figura 3 - Etapas do processo de DA

Hidrólise A hidrólise consiste na redução de grandes e complexas moléculas orgânicas nos seus constituintes mais simples e elementares. Como resultado as grandes proteínas são quebradas em aminoácidos, os lípidos em ácidos gordos e glicerol, e os hidratos de carbono complexos (como polissacarídeos, celulose e lenhina) em açúcares simples como a glucose. Os agentes responsáveis pela criação de monómeros que seguem para outras fases do processo de digestão anaeróbia são as bactérias hidrolíticas ou fermentativas que segregam enzimas responsáveis pela catalização da hidrólise, como proteases, celulases e lípases. Os bio-resíduos alimentares podem ser representados genericamente pela molécula C6H10O4 [15]. E a reacção de hidrólise onde as moléculas dos bio- resíduos são quebradas em glucose é traduzida pela reacção seguinte [16]:

퐶6퐻10푂4 + 2퐻2푂 ↔ 퐶6퐻12푂6 + 2퐻2 Equação 1 Se a matéria-prima a digerir for complexa, como no caso dos resíduos com elevado teor em celulose, que contem lenhina, a fase hidrolítica é mais lenta. Por esta razão, resíduos lenhosos não são considerados como um material ideal para o processo de DA. Por outro lado, os hidratos de carbono são mais rapidamente convertidos em açúcares e consequentemente fermentados em ácidos gordos voláteis [17].

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Acidogénese O processo de hidrólise é seguido imediatamente pela fase de formação de ácidos gordos que se dá o nome de acidogénese. Neste processo, as bactérias acidogénicas, ou fermentativas, utilizam os produtos da hidrólise como substrato e convertem-nos em compostos orgânicos simples como ácidos gordos voláteis (ácido propiónico, butírico, fórmico, láctico ou valérico), cetonas (acetona) e álcoois (etanol, metanol, glicerol). Pequenas concentrações de dióxido de carbono, de acetato e hidrogénio são também formadas nesta fase [18]. As concentrações específicas dos produtos formados nesta fase do processo de digestão anaeróbia dependem do tipo de bactérias assim como as condições de temperatura e o pH [19]. As reacções de formação acídica são expressas em baixo. Na primeira equação a glucose é convertida em etanol e na segunda equação a glucose é transformada em propionato. [16]

퐶6퐻12푂6 ↔ 2퐶퐻3퐶퐻2푂퐻 + 2퐶푂2 Equação 2

퐶6퐻12푂6 + 2퐻2 ↔ 2퐶퐻3퐶퐻2퐶푂푂퐻 + 2퐻2푂 Equação 3 Acetogénese Esta fase de acetogénese é tipicamente associada à acidogénese, sendo agrupadas em uma fase de formação de ácidos. A acetogénese ocorre aquando da fermentação de hidratos de carbono, através da qual é principalmente formado acetato, e em menores quantidades, dióxido de carbono e hidrogénio. Aqui o hidrogénio vai ser o mais importante intermediário nas reacções da digestão anaeróbia. Nesta fase também os ácidos gordos, formados através da hidrólise dos lípidos, são oxidados, formando também hidrogénio. Em condições normais este hidrogénio serviria para inibir a oxidação e por isso mesmo a reacção apenas continua se a pressão parcial deste gás for baixa o suficiente para termodinamicamente permitir a reacção. Para tal acontecer é necessária a presença de bactérias consumidoras de hidrogénio. Como resultado, a concentração de hidrogénio, medida pela pressão parcial, é um excelente indicador do bom funcionamento do digestor [17]. Na acetogénese ocorrem três reacções principais de conversão de glicose (Equação 4), etanol (Equação 5) e bicarbonato (Equação 6) em acetato.

퐶6퐻12푂6 + 2퐻2푂 ↔ 2퐶퐻3퐶퐻2퐶푂푂퐻 + 2퐶푂2 + 4퐻2 Equação 4 − + 2퐶퐻3퐶퐻2푂퐻 + 2퐻2푂 ↔ 퐶퐻3퐶푂푂 + 2퐻2 + 퐻 Equação 5 − + − 2퐻퐶푂3 + 4퐻2 + 퐻 ↔ 퐶퐻3퐶푂푂 + 4퐻2푂 Equação 6 Existe também a reacção (Equação 7) que converte propionato em acetato, reacção esta que se torna termodinamicamente inviável quando não há intervenção de bactérias consumidoras do mesmo, baixando assim a sua pressão parcial [16]. − − + − 퐶퐻3퐶퐻2퐶푂푂 + 3퐻2푂 ↔ 퐶퐻3퐶푂푂 + 퐻 + 퐻퐶푂3 + 3퐻2 Equação 7

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Metanogénese A metanogénese é a etapa final do processo, responsável directa pela produção de metano e constitui, em muitos casos, a etapa controladora do processo. Os responsáveis por este processo são as bactérias metanogénicas, que são bactérias anaeróbias estritas, requerendo para o seu desenvolvimento um potencial redox entre -250 e -300 mV. As bactérias metanogénicas degradam apenas um número limitado de substratos com baixo número de carbonos: acetato, metanol, metilaminas, formato, hidrogénio e o dióxido de carbono [20]. As populações de bactérias convertem o material solúvel em metano, do qual dois terços são provenientes da conversão de acetato (Equação 8 e Equação 9), ou da fermentação de um álcool, como o metanol (Equação 10), e um terço provém da redução do dióxido de carbono pelo hidrogénio (Equação 11) [19].

2퐶퐻3퐶퐻2푂퐻 + 퐶푂2 ↔ 2퐶퐻3퐶푂푂퐻 + 퐶퐻4 Equação 8

퐶퐻3퐶푂푂퐻 ↔ 퐶퐻4 + 퐶푂2 Equação 9

퐶퐻3푂퐻 + 퐻2 ↔ 퐶퐻4 + 퐻2푂 Equação 10

퐶푂2 + 4퐻2 ↔ 퐶퐻4 + 2퐻2푂 Equação 11 As bactérias metanogénicas são muito sensíveis e as condições ideais para a sua proliferação, em termos de pH, residem em meios neutros a meios ligeiramente ácidos (entre 6,6 e 7) [21]. Uma vez abaixo de um valor de pH de 6, as bactérias metanogénicas morrem. A metanogénese é o processo que controla a velocidade da digestão, isto porque as bactérias envolvidas têm um crescimento mais lento que as bactérias envolvidas nas fases descritas anteriormente. Assim sendo a cinética de todo o processo pode ser definida pela cinética da metanogénese [22]. Apesar de a apresentação da DA se ter realizado em quatro etapas, na verdade todos os processos ocorrem em simultâneo e de forma sinérgica.

3.3. Parâmetros que Afectam as Reacções da Digestão Anaeróbia pH O pH afecta a taxa de crescimento dos microorganismos, pelo que uma variação neste parâmetro pode causar importantes alterações na constituição microbiana dos consórcios. O pH afecta o metabolismo, nomeadamente a utilização das fontes de carbono e energia, as reacções de síntese e a produção de metabolitos extracelulares [20]. Por esta razão a melhor forma de medir a “saúde” de um biodigestor é pelo nível de pH, que se altera em consequência das conversões biológicas no decorrer dos diferentes processos da DA. Um pH estável é indicativo da estabilidade e equilíbrio do digestor. Da mesma forma que uma queda do pH indica uma desestabilização acídica, devido a acumulação de ácidos, colocando em causa o bom funcionamento da instalação. Existe ainda outra forma de verificar o bom funcionamento do biodigestor, pela produção de gás, sendo este o único parâmetro que permite verificar a instabilidade de forma mais rápida que o nível de pH. O intervalo de pH aceite pelas bactérias envolvidas no processo situa-se entre 5,5 e 8,5, embora quanto mais próximo do valor neutro melhores serão as condições para as bactérias metanogénicas [16].

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Temperatura Devido à forte dependência da taxa de digestão da temperatura, este constitui-se como outro parâmetro crítico a manter num determinado intervalo. Como a Figura 4 mostra, as bactérias envolvidas no processo de digestão anaeróbia conseguem sobreviver a um largo espectro de temperaturas [16].

Figura 4 - Taxa de reacção do processo de DA versus Temperatura (Ostrem et al, 2004)

As taxas de reacção à temperatura são medidas pela taxa de produção de gás, taxas de crescimento bacteriológico e a performance de degradação do substrato. Pela observação do gráfico podemos identificar duas gamas de temperaturas em que a taxa de reacção é mais elevada, a gama de temperatura mesofílica e termofílica. Existe ainda uma terceira gama de temperaturas, que é a gama de temperaturas que se encontra em pântanos e afins, ou seja, onde a digestão anaeróbia ocorre naturalmente, que é a gama psicrofílica. Na Tabela 1 encontram-se os intervalos de temperatura usuais para estas gamas, retiradas de fontes mais recentes.

Tabela 1 - Gamas e intervalos de temperaturas no processo de DA [23]

Gama de Intervalo de

Temperatura Temperatura Psicrofílica < 25 ºC

Mesofílica 35 - 40ºC

Termofílica 50 - 60ºC

Escolher uma temperatura de funcionamento envolve balançar características. A digestão termofílica permite maiores taxas de alimentação do digestor, uma maior eliminação de agentes patogénicos e uma maior

14 degradação de substrato. No entanto, é mais sensível a toxinas e pequenas alterações do meio, e é menos atractiva do ponto de vista energético devido ao calor necessário fornecer ao processo [19]. As bactérias que operam na gama mesofílica são mais robustas e são mais tolerantes a desvios dos parâmetros ambientais óptimos, incluindo temperatura. Flutuações de temperatura podem ser extremas em digestores de pequena dimensão, digestores mal isolados termicamente ou em digestores presentes em climas frios, sugerindo que tais digestores devem funcionar precisamente na gama mesofílica a fim de evitar quebras no seu desempenho. A temperatura pode ser mantida através de bons isolamentos, banhos de água ou através de aquecimento solar passivo. Calor pode ser adicionado usando permutadores de calor na mistura reciclada, resistências ou injecção de vapor directamente no digestor [16].

Razão C/N Tal como em todos os processos naturais, os microorganismos vivos presentes na digestão anaeróbia necessitam de nutrientes para que as suas funções celulares possam ocorrer. Entre eles podemos destacar o carbono (C), azoto (N), fósforo (P), e enxofre (S) comos os mais importantes para a sobrevivência dos microorganismos. Contudo, é bastante frequente a quantidade de carbono ou azoto ser um factor limitante. Microorganismos utilizam o carbono para energia e crescimento, enquanto o azoto é utilizado para a síntese de proteínas e reprodução. Para que o processo de digestão anaeróbia ocorra sem problemas, estes dois nutrientes deverão estar disponíveis em quantidades suficientes, e devem estar biologicamente disponíveis para os microorganismos. A maioria dos substratos provenientes de RSU geridos pelas instalações de compostagem municipais contêm quantidades suficientes de fósforo e potássio necessárias para subsistência dos microorganismos. Resíduos alimentares e vegetação são exemplos de matérias com relativamente altos níveis de azoto e, assim, baixos valores de razão C/N (carbono/azoto). Aparas de madeira, folhas secas e cartão têm uma maior proporção de carbono, logo maior razão C/N. Uma vez que a razão C/N do substrato a digerir nem sempre se encontra nos valores ideais, é prática comum misturar substratos, ou adicionar correctores ao substrato antes do processo de digestão. Por exemplo, um substrato com elevadas concentrações de azoto, como alimentos, será corrigido com um substrato com elevado teor de carbono, como aparas de madeira e papel, para se obter uma mistura com a razão C/N dentro do intervalo ideal [24].

Inibidores da Reacção Como em qualquer processo biológico, também a digestão anaeróbia sofre com a existência de certos elementos inibidores. Estes elementos, ou substâncias, podem ser produto das reacções biológicas, como ter origem no próprio substrato a ser digerido. Das substâncias inibidoras da reacção podemos contar com ácidos gordos voláteis amoníaco, metais, sulfuretos e oxigénio:  Ácidos Gordos Voláteis - A estabilidade do processo de DA é reflexo da concentração de produtos intermédios como os ácidos gordos voláteis (AGV). Os AGV são subprodutos formados no decorrer do

15

processo de acidogénese com cadeias de carbono com um máximo de seis átomos, como o acetato, propionato, butirato e lactato;

 Amoníaco - O amoníaco (NH3) é um composto importante, com uma função significativa no processo de DA. A concentração de amoníaco livre é directamente proporcional á temperatura, por isso existe um risco mais elevado de inibição por amoníaco em processos de digestão termofílicos comparando com os processos mesofílicos [25];  Metais - Apesar de alguns elementos metálicos como o ferro, níquel, cobalto, selénio, molibdénio ou tungsténio serem importantes no desenvolvimento das bactérias participantes na digestão anaeróbia, estes e outros metais pesados em concentrações elevadas podem inibir estes mesmos microorganismos; sendo menos afectados pelo níquel e o chumbo [26];

 Sulfuretos - A existência de elevados níveis de sulfuretos, sob a forma de H2S, inibem o processo de digestão. Foi mostrado em [27], que concentrações superiores a 50mg/dm3 inibem a produção de metano, devido a uma quantidade muito grande no substrato a digerir de compostos de enxofre, incluindo proteínas [24].

3.4. Parâmetros Operacionais que Influenciam a Digestão Anaeróbia

Tempo de Retenção Hidráulico O tempo de retenção hidráulico (TRH) nos digestores anaeróbios refere-se ao tempo que o substrato permanece no mesmo. Este parâmetro é muito importante no dimensionamento do digestor e durante a operação do mesmo. O THR pode ser calculado pela Equação 12 [25]: 푉 푇푅퐻 = 푄

Equação 12 Em que: 푇푅퐻 – Tempo de Retenção Hidráulico [dias]; 푉 – Volume do digestor [m3]; 푄 – Caudal de substrato [m3/dia]. De acordo com a Equação 12, o aumento de caudal do substrato leva a uma diminuição do TRH. O tempo de retenção tem de ser suficientemente longo para garantir que a quantidade de microorganismos removidos pelo digerido efluente não supere a quantidade reproduzida no processo. A taxa de duplicação das bactérias anaeróbicas é normalmente dez dias ou mais. O TRH depende, também, da temperatura a que o processo se efectua. Na Tabela 2 estão os TRH típicos para as gamas de temperaturas típicas [25].

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Tabela 2 - Tempo de retenção mínimo utilizado para as diferentes gamas de temperatura

Tempo de Gama de Retenção Temperatura Mínimo Psicrofílica 70 a 80 dias

Mesofílica 30 a 40 dias

Termofílica 15 a 20 dias

Um TRH curto permite um bom fluxo do substrato a ser digerido, mas uma baixa produção de gás. É por isso importante ter em consideração as diferenças de substrato e das taxas específicas de decomposição dos mesmos, uma vez que o TRH depende da sua composição [25].

Agitação e Mistura no Digestor A forma como os materiais fluem no digestor tem impacto no grau de contacto que o substrato tem com as bactérias residentes, e assim na rapidez com que o substrato é digerido. A agitação e mistura podem resultar do simples movimento que o substrato realiza ao entrar e sair do digestor. O substrato pode ser ainda mais misturado através de processos mecânicos ou através de misturadores gasosos que mantêm os sólidos em suspensão. O biogás resultante da digestão é muitas vezes utilizado como uma forma de promover o movimento do substrato sem custos adicionais [16]. Os diferentes sistemas de agitação e mistura podem ser agrupados em três categorias, hidráulicos, mecânicos e gasosos. Apresentam-se alguns exemplos na Figura 5 [10].

Figura 5 - Exemplos de tipos de agitação e mistura existentes em digestores anaeróbios Os principais objectivos da agitação e mistura no digestor são:

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 Remover metabolitos produzidos pela metanogénese (biogás);  Misturar substrato fresco com a população de bactérias;  Evitar a formação de escória e sedimentação da mesma;  Evitar gradientes de temperatura muito elevados no interior do digestor;  Uniformizar a densidade populacional das bactérias;  Prevenir a formação de espaços vazios que reduzam o volume eficaz do digestor.

Aquecimento do Digestor Para se atingir a produção óptima de biogás, a digestão anaeróbia necessita de condições ambientais constantes, preferencialmente próximo do ideal do processo. A temperatura no digestor é neste caso o parâmetro de maior importância, mesmo em zonas temperadas são necessários sistemas de aquecimento e bom isolamento térmico. É extremamente importante ter acesso a dados da variação de temperatura ao longo do ano para o local a instalar o digestor, como uma aproximação do perfil da temperatura média e os extremos de temperatura ao longo do ano. Uma unidade de DA com sistema de aquecimento pode ser accionada pela energia do processo. Em todo o caso o dimensionamento do sistema de aquecimento revela-se sempre uma tarefa difícil, uma vez que o substrato, que beneficia do aquecimento, não é homogéneo.

3.5. Digestores Anaeróbios

3.5.1. Caracterização O processo de digestão ocorre no interior de um digestor, ou reactor. Este processo necessita das condições ambientais e energéticas descritas anteriormente para que a decomposição da matéria orgânica, substrato, origine o biogás na ausência de oxigénio atmosférico. Para que estas condições se mantenham ao logo do processo, independentemente da dimensão e design escolhido, o digestor, tem de atender aos seguintes requisitos [10]:  Estanquicidade – De forma a prevenir poluição de solos e assegurar efectiva retenção da totalidade do biogás produzido, assim como evitar a entrada de ar no processo;  Isolamento Térmico – Depende fortemente da temperatura de processo escolhida, do clima local e meios financeiros, e independentemente destes factores o digestor deverá minimizar as trocas térmicas com o exterior;  Área Superficial Mínima – Mantém os custos de construção baixos e reduz perdas térmicas através das paredes do digestor. Uma superfície esférica tem a melhor razão superfície/volume para o efeito. Mas a utilização de superfícies hemisféricas tem tido bons resultados;  Estabilidade Estrutural – Suficiente para resistir todas as cargas dinâmicas e estáticas, durável e resistente à corrosão. Quando se procede à escolha de um digestor, é necessário ter em consideração alguns parâmetros específicos [28]. A Figura 6 mostra os quatro parâmetros mais importantes, usados no âmbito desta dissertação que serão descritos na secção seguinte.

18

Figura 6 - Aspectos a considerar na escolha do biodigestor

3.5.2. Aspectos a Considerar na Escolha do Digestor Teor de Humidade do Substrato A digestão anaeróbia é feita em duas categorias abrangentes de teor de humidade: digestão por Via Seca, com um conteúdo de sólidos totais (CST) típico de 25 a 30 %; e digestão por Via Húmida, com um CST, tipicamente, inferior a 15 %. No caso do substrato ser RSU existe sempre a necessidade de adicionar água para baixar o CST. A digestão feita por via seca conduz a menores e, consequentemente, mais baratos reactores de digestão. Estas poupanças no reactor podem ser atenuadas pelo maior custo inerente do equipamento de bombagem necessário para mover material mais denso. Grandes valores de CST também causam resistência ao escoamento nas tubagens. Este tipo de resistência propicia grande desgaste nos equipamentos mecânicos, logo, maiores cuidados de manutenção são necessários [16]. Sistemas de digestão por via húmida têm, tendencialmente, melhores misturas e agitação, assim aumentando o grau de digestão. São, também, mais propícios a co-digestão com substratos mais diluídos como lamas residuais ou estrume [29]. Para muitos substratos, são adicionadas grandes quantidades de água para reduzir o CST, aumentando assim o custo de operação [16]. Na Tabela 3 podemos ver as vantagens e desvantagens principais de cada tipo de digestão mencionada anteriormente.

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Tabela 3 - Vantagens e desvantagens da digestão anaeróbia por via seca e via húmida [30]

Teor de Humidade Vantagens Desvantagens ●Equipamentos de menor dimensão ●Reduzida possibilidade de diluir

por haver maior carga orgânica inibidores da digestão com água ●Pré-tratamento mais simples ou ●Equipamento mais caro, com

Via Seca inexistente necessidade de ser mais robusto ●Menor consumo de água e energia ●Maior susceptibilidade de

para aquecimento ocorrência de entupimentos ●Maior produção de biogás

●Equipamento mais barato ●Pré-tratamento mais complexo ●Processo mais utilizado e por isso mais ●Mais sensível a inibidores

conhecido ●Capacidade de diluir inibidores da ●Maior consumo de água e energia Via Húmida digestão adicionando água para aquecimento de um digestor maior ●Menor susceptibilidade de ocorrência ●Menor produção de biogás de entupimentos e bloqueios

Gama de Temperatura Como foi referido anteriormente, existem três gamas de temperatura na qual a DA é feita. Duas delas (mesofílica e termofílica) são as mais utilizadas.

Tabela 4 - Percentagem cumulativa de centrais termofílicas e mesofílicas instaladas em 2014 na Europa [31]

Percentagem Gama de Cumulativa Temperatura Instaladas Mesofílica 67%

Termofílica 33%

Digestão mesofílica sempre foi predominante, muito à custa de ser a temperatura de excelência para a maioria das aplicações de tratamento de águas residuais e estrumes. Outras razões para esta preferência são as baixas necessidades de aquecimento e por ser um processo mais estável. Contudo, a digestão termofílica sempre desempenhou um papel muito importante na digestão da fracção orgânica dos RSU [31].

Número de Etapas do Processo Como o processo de DA pode ser visto como um processo global com várias etapas em que intervêm microorganismos distintos, será natural considerar uma instalação que permita a utilização de mais que um digestor, separando cada etapa, ou várias etapas, por diversos digestores funcionando em série. Numa instalação em que seja apenas utilizado um digestor, todas as reacções ocorrem ao mesmo tempo, havendo necessidade de manter as condições ambientais favoráveis para todos os microorganismos. O desenvolvimento de digestão

20 anaeróbia em múltiplos digestores permite flexibilidade para optimizar cada reacção biológica. Tipicamente quando esta separação de etapas é feita, dois digestores são utilizados, o primeiro para a hidrólise/acetogénese e o segundo para a metanogénese [21].

Alimentação do Digestor Em relação ao modo de alimentação do digestor, e também à remoção do substrato digerido, existem dois tipos de digestores anaeróbios: Digestores descontínuos (batch) ou contínuos. Digestores descontínuos são alimentados com uma certa quantidade de substrato e, depois de digerido o substrato, este é completamente removido do digestor após um tempo de retenção fixo [10]. O digestor é depois alimentado novamente com uma nova porção de substrato e o processo repete-se. Neste tipo de alimentação a produção de biogás é inconstante [10]. Digestores contínuos são alimentados e evacuados de substrato de forma constante. A remoção do substrato digerido é feita de forma automática por alimentação de novo substrato, o que faz com que o mesmo seja fluido e homogéneo. Devido à continuidade do processo de digestão anaeróbia, a produção de biogás é constante e mais elevada que em digestores descontínuos ou em batch [10].

3.5.3. Digestores de Alimentação Contínua UASB – Upflow Anaerobic Sludge Blanket Como se pode verificar na Figura 7 existem duas zonas distintas neste tipo de reactor: a zona inferior designada por leito de lamas, que tem uma concentração elevada de biomassa constituída em grânulos com elevada velocidade de sedimentação e a zona superior onde predominam flocos de pequeno tamanho e em que a concentração de biomassa é muito menor. O biogás produzido e alguma biomassa flutuante que existe na secção superior são separados da corrente líquida de saída por meio de um separador gás-sólido-líquido colocado no topo do digestor [20].

Figura 7 - Digestor UASB (Alves, 1998)

Digestor de Mistura Completa (CSTR – Continuously Stirred Tank Reactor) Neste tipo de sistemas (Figura 8), o substrato não é estritamente continuamente alimentado, mas sim em intervalos de hora a hora, para instalações maiores [28]. O substrato é constantemente agitado no interior do digestor, fazendo assim com que o contacto entre o mesmo e os microorganismos seja mais eficiente. Globalmente a produção de biogás destes sistemas é constante [30].

21

Figura 8 - Digestor de mistura completa (Bisschops et al, 2009) (adaptado)

Digestor de Contacto É um digestor com processo análogo ao tradicional sistema aeróbio do tipo CSTR e um decantador que provoca a separação e recirculação das lamas, permitindo assim uma elevada concentração de biomassa no digestor (Figura 9). Muitas vezes existe um sistema de desgaseificação entre as duas unidades, que proporciona uma decantação mais eficiente, melhorando o desempenho geral do sistema [20].

Figura 9 - Digestor de contacto (Alves, 1998)

Digestores Plug-Flow Este tipo de digestores (Figura 10) é normalmente utilizado para tratamento de substratos com maiores teores de sólidos, e são geralmente constituídos por grandes tubos horizontais, no qual a alimentação é feita pela introdução do substrato numa das extremidades do digestor e a saída do digerido se faz por outra.

Figura 10 - Digestor plug-flow (Bisschops et al, 2009) (adaptado)

22

3.5.4. Digestores de Alimentação Descontínua Existem dois tipos de digestores anaeróbios descontínuos (Figura 11), digestores de etapa única e digestores de múltiplas etapas. Em digestores de etapa única, pode ocorrer recirculação de digerido do fundo do reactor para o topo, de forma a possibilitar agitação parcial. Em digestores de múltiplas etapas existem dois ou mais digestores com funcionamento sequencial em que o digerido do primeiro digestor, onde ocorre a hidrólise, é recirculado para o terceiro, onde ocorre a metanogénese, e o digerido do terceiro é recirculado para o segundo, pelo seu elevado poder tampão causado pelo elevado pH. Finalmente o digerido do segundo é recirculado para o primeiro digestor de forma a estabilizar o pH [21].

Figura 11 - Digestores de alimentação descontínua (De Baere et al, 2002)(adaptado)

3.6. Unidades de Digestão Anaeróbia Existentes em Portugal

A primeira unidade de DA a ser instalada em Portugal remonta a 1953 e era constituída por digestores descontínuos que valorizavam dejectos de bovinos. Mais tarde, entre 1970 e 1980, apareceram os primeiros problemas de resíduos produzidos pelas agro-pecuárias que a digestão anaeróbia veio dar solução e que permitiu um aumento destas unidades pelo país [32]. Desde então a tendência tem sido de crescimento deste tipo de unidades e, nos últimos anos, o aproveitamento energético tem ganho expressão em potência instalada de unidades de aproveitamento de biogás provenientes de unidades de digestão anaeróbia e de aterros como se mostra na Tabela 5.

Tabela 5 - Evolução histórica da potência instalada das unidades de produção de biogás em Portugal [33]

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014*

Potência Instalada 8 8 15 16 24 34 50 62 67 68 Biogás [MW] *até ao mês de Abril

3.6.1. Estação de Tratamento e Valorização Orgânica da Valorsul A Estação de Tratamento e Valorização Orgânica (ETVO) da Valorsul destina‐se ao tratamento, através de digestão anaeróbia, dos resíduos orgânicos recolhidos selectivamente nos sectores da restauração, hotelaria, mercados abastecedores e retalhistas, entre outros. Em termos dos produtos resultantes da valorização, a unidade de digestão anaeróbia encontra‐se dimensionada para uma produção de cerca de 14.700 toneladas/ano de composto, que poderá ser utilizado como correctivo orgânico para uso agrícola e doméstico, e energia, a

23 partir do aproveitamento do biogás produzido no processo. No que diz respeito à energia eléctrica prevê‐se uma produção de 10,9 GWh/ano, em que cerca de metade será utilizada para autoconsumo. O processo consiste numa digestão termofílica, por via húmida, em duas fases, seguida de uma pré- compostagem em túnel com arejamento forçado e pós‐compostagem em pilhas não arejadas, em área coberta, que são revolvidas semanalmente. É indicada uma capacidade de tratamento de 60.000 toneladas de matéria orgânica por ano [34]. Na Figura 12 apresenta‐se o diagrama de processo.

Figura 12 - Diagrama de processo da ETVO (ValorSul, 2003)

Neste diagrama é evidente a quantidade de pré-tratamento e pós-tratamento que uma unidade de digestão anaeróbia destas dimensões necessita. A grande quantidade de resíduos aqui valorizados é notoriamente a razão disso. Estas etapas do processo são as principais responsáveis pelo elevado auto-consumo que a unidade apresenta.

24

4. Metodologia

A metodologia do presente trabalho consiste sequencialmente na(o):  Levantamento da legislação pertinente para o projecto e implantação de uma central de DA para valorização energética de resíduos orgânicos;  Levantamento das tecnologias existentes em matéria de digestores anaeróbios (capacidade, eficiência etc.);  Análise da produção média de resíduos orgânicos na freguesia dos Olivais, Lisboa, por diversos agentes (refeitórios, restaurantes, cantinas) a ver no capítulo do estudo de caso;  Dimensionamento de uma central de DA com base no histórico de resíduos orgânicos recolhidos e a serem recolhidos na freguesia, também a ver no capítulo 5;  Análise custo-benefício da solução descentralizada de tratamento dos resíduos e de produção energética em comparação com a actual solução, centralizada e gerida pela Valorsul. Este último ponto seram os parágrafos seguintes e que encerram em si a análise energética e mássica, a viabilidade económica e a análise de sensibilidade.

Análise Energética e Mássica Primeiramente, e para que a análise energética seja feita, é necessário quantificar a produção energética que neste caso está associada à produção de biogás, seguidamente o consumo energético na unidade de digestão anaeróbia é estimado tendo em conta o que será definido no capítulo 5.3 e assim o balanço energético é feito. Para finalizar esta análise o balanço mássico é, também, realizado com base numa tonelada de resíduos orgânicos recebidos. A produção de biogás será definida no capítulo 5.3.4 e com base no teor energético do biogás obtêm-se o equivalente energético dessa quantidade. O consumo energético está dividido em duas vertentes, eléctrico e térmico, e em vários equipamentos (bombas, digestor, pasteurizador, agitadores, etc.). No lado do consumo térmico é necessário contabilizar o aquecimento do digestor e do pasteurizador assim como a transferência de calor, ou perdas térmicas, pelas superfícies dos mesmos. A primeira quantidade referida é calculada segundo a Equação 13 [35]. A segunda quantidade, perdas térmicas pelas superfícies laterais, inferior e superior, é calculada pela aplicação da Equação 14 [36].

푄푟 = 푚 × 퐶 × ∆푇

Equação 13 Em que:

푄푟 – Calor necessário a fornecer aos resíduos [kJ/ano]; 푚 – Massa de resíduos a digerir [kg/ano]; 퐶 – Calor específico dos resíduos [kJ/kg.⁰C]; ∆푇 – Diferença de temperatura entre os resíduos que são alimentados ao digestor/pasteurizador e a temperatura alvo do digestor/pasteurizador [⁰C].

25

푄푠 = 푈 × 푆 × ∆푇 Equação 14 Em que:

푄푠 – Perdas térmicas pelas superfícies do digestor/pasteurizador [W]; 푈 – Coeficiente de transmissão de calor [W/m2.⁰C]; 푆 – Área da superfície que ocorre a troca de calor [m2]; ∆푇 – Diferença de temperatura entre o interior e o exterior do digestor/pasteurizador [⁰C]. Para cada superfície é necessário calcular o coeficiente de transmissão de calor pela Equação 15 [37]: 푛 1 1 푙푖 1 = + ∑ + 푈 ℎ푒 푘푖 ℎ푖 푖=1 Equação 15 Em que: 푈 – Coeficiente de transmissão de calor [W/m2.⁰C];

2 ℎ푒 , ℎ푖 – Condutância térmica exterior e interior respectivamente [W/m .⁰C];

푙푖 – Espessura do elemento i [m];

푘푖 – Condutibilidade térmica do material do elemento i [W/m.⁰C]. Do lado do consumo eléctrico é feito o levantamento dos equipamentos consumidores necessários ao funcionamento da central, o seu tempo de funcionamento e a sua potência, sendo assim possível determinar a energia eléctrica consumida anualmente. O balanço é finalmente feito com base na conversão da energia do biogás em energia térmica e eléctrica consoante o rendimento térmico e eléctrico da unidade de cogeração, CHP, escolhido para a unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa. Para o balanço mássico definiu-se dois sistemas, como se observa na Figura 13, o sistema do digestor anaeróbio que tem como entradas os resíduos orgânicos a serem valorizados e como saídas o digerido e o biogás resultantes do processo de digestão, e o sistema da unidade de CHP que tem como entradas o biogás proveniente do digestor e o ar atmosférico para o processo de combustão do mesmo e como saídas os gases de escape. Deste processo é aproveitada energia térmica e eléctrica.

Figura 13 - Sistemas considerados no balanço de massa

26

A passagem de resíduos orgânicos a biogás e digerido, no sistema 1, depende da composição dos mesmos como será definido no capítulo 5.3, e tendo em conta as quantidade de sólidos voláteis iniciais, presentes em 1000 kg de resíduos orgânicos, determina-se a quantidade de sólidos voláteis a serem transformados em biogás pela diferença entre a sua quantidade inicial e a quantidade dos mesmos no digerido (Equação 16).

푚푆푉 푐표푛푣푒푟푡푖푑표푠 = 푚푆푉 푛표푠 푟푒푠í푑푢표푠 − 푚푆푉 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 Equação 16

Em que 푚푆푉 푛표푠 푟푒푠í푑푢표푠 é definida anteriormente e 푚푆푉 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 é calculada através da Equação 17.

푚푠ó푙푖푑표푠 푓푖푥표푠 + 푚푆푉 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 %푆푇 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 = × 100% 푚푆푇 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 + 푚á푔푢푎 Equação 17

Em que %푆푇 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 também será definido no capítulo 5.3 e 푚푠ó푙푖푑표푠 푓푖푥표푠 e 푚á푔푢푎 não dependem do processo de digestão, apenas das características dos resíduos orgânicos que dão entrada no digestor. A quantidade

푚푆푇 푛표 푑푖푔푒푟푖푑표 é a soma da quantidade em numerador na fracção do segundo membro da Equação 17. Com a quantidade de sólidos voláteis transformada em biogás é oportuno definir a quantidade de metano (parte combustível do biogás) para se determinar, em condições estequiométricas, a massa de ar atmosférico a dar entrada no sistema 2 (unidade de CHP) e os seus constituintes. No capítulo 5.3.4 as quantidades de metano no biogás apenas seram definidas em percentagem de volume e para determinação dessa quantidade em termos mássicos e molares é necessário recorrer à expressão:

푚푖 %푚 = × 100% ∑ 푚푖

Equação 18 Em que:

푚푖 – Massa do componente i [kg]. Como apenas temos a massa total e considerando o biogás como um gás perfeito, podemos recorrer à lei dos gases perfeitos em condições PTN para determinação da massa de cada componente do biogás:

푉푖 = 푛푖 × 22,4 Equação 19 Com,

푚푖 푛푖 = 푀푖 Equação 20 Em que:

3 푉푖 – Volume do componente i [m ];

푛푖 – Quantidade do componente i [kmol];

푀푖 – Massa molar do componente i [kg/kmol].

Substituindo 푛푖 na primeira equação pela segunda e pondo a massa do componente i em evidência ficamos com:

27

푉푖 × 푀푖 푚 = 푖 22,4 Equação 21 Substituindo este resultado na Equação 18, aplicando percentagem e simplificando obtém-se a percentagem mássica de metano e de dióxido de carbono, respectivamente, no biogás:

%푉퐶퐻4 × 푀퐶퐻4 %푚 푑푒 퐶퐻4 = × 100% %푉퐶퐻4 × 푀퐶퐻4 + %푉퐶푂2 × 푀퐶푂2 Equação 22

%푉퐶푂2 × 푀퐶푂2 %푚 푑푒 퐶푂2 = × 100% %푉퐶퐻4 × 푀퐶퐻4 + %푉퐶푂2 × 푀퐶푂2 Equação 23 Em que:

푀퐶퐻4 – Massa molar do metano (16kg/kmol);

푀퐶푂2 – Massa molar do dióxido de carbono (44kg/kmol). De forma a se obter as quantidades de ar atmosférico e seus componentes a dar entrada no sistema da unidade de CHP é necessário ter em consideração a reacção de combustão do metano em condições estequiométricas:

퐶퐻4 + 2(푂2 + 3,76푁2) → 2퐻2푂 + 퐶푂2 + 2 × 3,76푁2 Equação 24 Aplicando as relações de estequiometria e a Equação 20 obtém-se a quantidade de ar atmosférico e os seus principais constituintes a dar entrada no sistema 2 e dos gases de escape que dão saída do mesmo sistema. É possível também calcular a eficiência de conversão de matéria orgânica volátil do digestor utilizando simplesmente a Equação 25.

푚푆푉 푐표푛푣푒푟푡푖푑표푠 휂푚á푠푠푖푐푎 푑표 푑푖푔푒푠푡표푟 = 푚푆푉 푛표푠 푟푒푠í푑푢표푠 Equação 25

Viabilidade Económica Para análise de viabilidade económica ou financeira existem dois indicadores muito importantes que servem de bitola para aceitação ou rejeição de um projecto de investimento. Estes indicadores são o Valor Actual Líquido (VAL ou NPV do inglês Net Present Value) e a Taxa Interna de Rendibilidade (TIR ou IRR do inglês Internal Rate of Return). O VAL indica o valor actual de um montante a obter no final do projecto, tendo em conta as taxas de desvalorização e fluxos monetários ao longo dos anos. A TIR representa a rendibilidade gerada por determinado investimento, ou seja, representa uma taxa de juro tal, que se o capital investido tivesse sido colocada a essa taxa, obteríamos exactamente a mesma taxa de rendibilidade final. Por outras palavras, representa uma taxa que se utilizada como taxa de desconto, torna o VAL igual a zero [38]. Um projecto de investimento pode ser rejeitado se [39]:  VAL < 0;  TIR < r, r sendo a taxa de desconto anual. O VAL é determinado da seguinte forma:

28

푛 퐶퐹푖 푉퐴퐿 = −퐶퐹 + ∑ ( ) 0 (1 + 푟)푖 푖=1 Equação 26 Em que:

퐶퐹0 – Valor do investimento inicial [€];

퐶퐹푖 – Fluxo monetário (cash-flow) do ano i [€]; 푟 – taxa de desconto. A taxa de desconto esta associada à valorização do projecto de investimento e depende da taxa de juros sem risco, a taxa de risco e do valor da inflação. Esta relação é evidenciada na Equação 27.

푟 = [(1 + 푟1). (1 + 푟2). (1 + 푟3)] − 1

Equação 27 Em que:

푟1 – Taxa de juros;

푟2 – Taxa de risco;

푟3 – Taxa de inflação. A TIR é solução da Equação 28 em ordem a 푟. 푛 퐶퐹푖 −퐶퐹 + ∑ ( ) = 0 0 (1 + 푟)푖 푖=1 Equação 28 Para finalizar a análise económica, determina-se o Prazo de Recuperação do Investimento (PRI). O PRI, ou pay- back period, representa o tempo que demora a recuperar os montantes investidos através dos cash-flows gerados por esse mesmo investimento. Por outras palavras, representa o tempo necessário para que o VAL atinja valores positivos, ou seja, a solução da Equação 29 em ordem a 푛 [40]. 푛 퐶퐹푖 ∑ ( ) = 0 (1 + 푟)푖 푖=1 Equação 29

Análise de Sensibilidade A análise de sensibilidade é um tipo de análise efectuada no âmbito dos estudos de análise de viabilidade económica e financeira e que tem como objectivo medir a sensibilidade dos indicadores de viabilidade a determinadas variáveis fundamentais da análise e assim medir o próprio grau de incerteza e de risco das conclusões obtidas. De facto, qualquer estudo de viabilidade económica e financeira inclui sempre algum grau de incerteza que, apesar de poder ser reduzido através de detalhados estudos de mercado, nunca deixa de existir. Para ultrapassar esta situação, e para que as conclusões do estudo apresentem maior margem de segurança, é habitual estabelecer mais do que um cenário: geralmente um cenário base (o que serve de base ao estudo), um cenário muito pessimista, um cenário medianamente pessimista, um cenário optimista e um cenário muito optimista. Para isso são simuladas variações positivas e negativas nas receitas e nos custos. Estas variações

29 poderão ser efectuadas em simultâneo nos custos e nas receitas ou separadamente. A partir destas variações calculam-se os novos indicadores de viabilidade do projecto. Se, os indicadores se tornarem muito desfavoráveis após reduzidas reduções nas receitas ou após reduzidos aumentos dos custos, o projecto apresenta um grau de risco muito elevado.

30

5. Estudo de Caso: Freguesia dos Olivais, Lisboa

5.1. Caracterização da Freguesia dos Olivais

O local escolhido para a implementação do estudo de caso é a freguesia dos Olivais. Olivais é o nome do limite administrativo que resulta da reformulação da freguesia de Santa Maria dos Olivais, sendo que o limite anterior continha, na sua zona ribeirinha, a área onde decorreu a Expo 98 que agora se destaca e forma, juntamente com território contíguo a norte (pertença do Concelho de ), um limite administrativo autónomo, resultando numa nova freguesia - Parque das Nações [41].

Localização A freguesia dos Olivais está inserida no município de Lisboa sendo delimitada por [42]:  Avenida Marechal Craveiro Lopes (Segunda Circular): estabelece a sul o limite com a freguesia de Alvalade;  Praça do Aeroporto (Rotunda do Relógio): estabelece a sul o limite com as freguesias de Alvalade e de Marvila;  Avenida Marechal Gomes da Costa: estabelece a sul o limite com a freguesia de Marvila;  Avenida Infante D. Henrique: estabelece a nascente o limite com a freguesia do Parque das Nações;  Praça José Queirós: estabelece a nascente o limite com a freguesia do Parque das Nações e a freguesia de Moscavide e , situada no município de Loures;  Término do município: estabelece a norte o limite com as freguesias de Moscavide e Portela, de Sacavém e Prior Velho e de Camarate, Unhos e Apelação, situadas no município de Loures;  Avenida Santos e Castro: estabelece a poente o limite com as freguesias de Santa Clara e Lumiar.

Figura 14- Mapa com o enquadramento geográfico da freguesia dos Olivais, Lisboa

31

População A fim de se poder avaliar o número de potenciais beneficiários e/ou agentes de influência da implantação de um digestor anaeróbio, recorreu-se a dados estatísticos para a determinação da população residente na freguesia dos Olivais, Lisboa. Estes dados foram obtidos através de uma publicação do Instituto Nacional de Estatística (INE) que projecta a população portuguesa até ao ano de 2060 em vários cenários. A população residente na freguesia dos Olivais foi então obtida assumindo uma proporcionalidade do número de habitantes da freguesia em relação à população nacional.

Habitantes População (Histórico) 52000 População (Cenário Baixo) População (Cenário Central) 50000 População (Cenário Alto)

48000

46000

44000

42000 2005 2010 2015 2020 2025 2030 2035 Ano

Figura 15 - População residente na freguesia dos Olivais, Lisboa (cálculos próprios com base em projecções nacionais do INE, 2014)

O período de referência de 2015-2035 abrange a vida útil (20 anos) da unidade de digestão anaeróbia para a qual vai ser analisada a viabilidade. Através da Figura 15 é possível constatar uma diminuição da população residente, quer em termos de estimativa referente a um cenário baixo (e por isso mais conservadora) quer em termos de estimativa referente a um cenário alto. Esta evolução resultará consequentemente numa diminuição dos resíduos orgânicos produzidos na área de estudo implicando efeitos nos resultados deste projecto, nomeadamente na viabilidade da unidade de digestão anaeróbia proposta, conforme avaliado em 0. Em todo o caso, e para efeito de uma análise em cenário base, o período que é relevante considerar para a avaliação e estudo da proposta de uma unidade de digestão anaeróbia na freguesia dos Olivais, Lisboa, é o de 2010 – 2014. Este período corresponde à data dos dados fornecidos pelo Departamento de Higiene Urbana (DHU) da Câmara Municipal de Lisboa (CML) sobre as quantidades da fracção orgânica dos RSU recolhidos em rotas específicas para o efeito que são utilizados como base nesta tese.

Consumo de Electricidade Segundo os dados mais recentes, de 2012, da Direcção Geral de Energia e Geologia, no município de Lisboa existem 313.611 utilizadores de energia eléctrica do tipo “doméstico”, consumo eléctrico esse que ascende a 726.563 MWh no período referido. Para o mesmo ano o Instituto Nacional de Estatística estima terem existido 524.282 residentes também no município de Lisboa. Estes valores indicam que no município de Lisboa, onde se

32 insere a freguesia dos Olivais, o consumo por habitante é de 1,39 MWh/ano, ou 4,99 GJ/ano. Assumindo que o número de residentes por habitação são três, obtemos uma média de 14,97 GJ/ano de consumo eléctrico por habitação na freguesia dos Olivais, Lisboa.

Bio-resíduos Produzidos e Caracterização Existem rotas de recolha de resíduos, nomeadamente de FORSU, junto de vários estabelecimentos comerciais alimentares, cantinas, refeitórios e afins, na cidade de Lisboa. Estas rotas são designadas internamente por rota O0401 e O0402, a partir deste ponto designadas por Rota 1 e Rota 2 respectivamente, e cada uma delas encontra-se actualmente a cargo da CML possuindo um valor aqui considerado constante de quantidades de FORSU recolhidos ao longo do ano. Esta consideração é baseada na observação dos gráficos seguintes com as quantidades diárias recolhidas junto das entidades colaboradoras.

kg de FORSU 12.000 Rota 1

10.000

8.000 Rota 1

6.000

4.000

2.000

0 mar-10 set-10 mar-11 set-11 mar-12 set-12 mar-13 set-13 mar-14

kg de FORSU 14.000 Rota 2 12.000 Rota 2 10.000 8.000 6.000 4.000 2.000 0 mar-10 set-10 mar-11 set-11 mar-12 set-12 mar-13 set-13 mar-14

Figura 16 - Quantidade da Fracção Orgânica dos RSU recolhida diariamente na cidade de Lisboa (CML, 2014)

A Rota 1 é a que apresenta menores quantidades efectivamente recolhidas de orgânicos, apresentando em média o valor de 5 toneladas diárias, ao passo que na Rota 2 são recolhidas cerca de 8 toneladas de FORSU diariamente. Na Rota 1 também podemos observar uma maior dispersão de valores de resíduos orgânicos

33 recolhidos. No que diz respeito aos resíduos recolhidos selectivamente na freguesia dos Olivais, existe um conjunto de pontos de recolha exclusivos da freguesia, esses pontos estão assinalados na Figura 17 em que os pontos verdes correspondem à Rota 1 e os pontos azuis à Rota 2.

Figura 17 - Distribuição geográfica dos pontos de recolha de FORSU na freguesia dos Olivais, Lisboa

Podemos verificar pela Figura 17 que existem pontos de recolha muito próximos efectuados por rotas de recolha distintas, podendo ser um parâmetro a melhorar no futuro. Cada rota de recolha de orgânicos tem associada uma certa quantidade de contentores com um volume especificado. Na Tabela 6 pretende-se evidenciar as características volumétricas dos contentores que servem os pontos de recolha na freguesia.

Tabela 6 - Quantidade e volume dos contentores para recolha de FORSU na Freguesia dos Olivais, Lisboa; por rota de recolha de orgânicos (CML, 2014)

Rota 1 Rota 2

Capacidade dos Quantidade Quantidade Contentores 140 L 17 9

240 L 28 24

1000 L 4 2

1100 L 1 0

34

Este levantamento do volume dos contentores serve de base ao cálculo de resíduos efectivamente recolhidos nos pontos definidos na Figura 17. Considerando que a distribuição dos volumes dos contentores é proporcional à distribuição das quantidades de resíduos orgânicos recolhidos nas rotas de recolha de FORSU, obtêm-se os valores estimados na Tabela 7 para as quantidades de resíduos orgânicos recolhidos apenas na freguesia dos Olivais com base nos valores médios diários, em cada ano, de cada rota.

Tabela 7 - Quantidades estimadas de orgânicos recolhidos na Freguesia dos Olivais, Lisboa, no período 2010-2014; por rota de recolha de orgânicos

Rota 1 Rota 2

Quantidade Quantidade Ano [ton] [ton] 2010 362 691

2011 449 813

2012 431 779

2013 391 871

2014* 127 280 *Até ao início de Maio

Estimadas as quantidades de resíduos orgânicos passíveis de valorização através de digestão anaeróbia, é necessário conhecer a constituição destes. Apenas desta forma se pode garantir a fiabilidade dos cálculos dimensionais, energéticos e económicos da unidade proposta. Não existindo uma caracterização da composição dos resíduos orgânicos recolhidos nos Olivais, recorreu-se a estudos realizados com misturas de resíduos orgânicos provenientes de cantinas e restaurantes em Portugal, na União Europeia e nos Estados Unidos da América. Na Tabela 8 encontram-se reunidos os resultados desses mesmos estudos e análises destacando os valores do conteúdo de sólidos totais e de sólidos voláteis. O valor da razão C/N serve apenas como referência a valores comuns para este tipo de resíduos.

35

Tabela 8 - Composição dos bio-resíduos alimentares, segundo várias fontes

Parâmetro

Tipo de Bio-Resíduo Alimentar Referência Sólidos Sólidos Razão C/N Totais [%] Voláteis [%] Doméstico 30 27,5 [43]

Doméstico <30 28 [13]

Doméstico 23 [44]

Cantina - Campo Militar (Portugal) 16,54±0,16 15,12±0,14 16±3 [45]

Cantina - Universidade 28 28,5 [46]

Cantina - Universidade 22 [47]

Cantina - Universidade (Portugal) 23,8±1 21,4±7 13±1 [48]

Restaurante (Portugal) 32 [49]

[50] FORSU (E.U.A) 46,58±4,6 34,85±3 36,14±3,18 (adaptado) 28 26 22 Média

Podemos observar uma grande variabilidade dos valores sendo de destacar a diferença entre as análises feitas a cantinas e restaurantes em Portugal, que serve de origem aos resíduos considerados neste trabalho, e as análises feitas à FORSU nos Estados Unidos da América. Esta preocupação com a FORSU prende-se pelo facto de ser possível uma expansão dos pontos de recolha referida anteriormente, para o sector residencial. A partir dos dados sintetizados na Tabela 8 assumiu-se a seguinte composição, à entrada, para os resíduos orgânicos a valorizar na unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais: 28 % de Sólidos Totais, 26 % de Sólidos Voláteis e razão carbono/azoto de 22. Estes valores poderão, num trabalho futuro, ser cuidadosamente selecionados de forma a dar mais relevância a valores nacionais, representativos dos resíduos recolhidos na freguesia em causa. Outro parâmetro que importa determinar é a densidade dos resíduos orgânicos a valorizar. Este parâmetro influi na análise volumétrica, energética e mássica. A Tabela 9 mostra os valores da densidade mássica dos resíduos orgânicos obtidos em diversos estudos verificando-se que a densidade média dos FORSU é de 570 kg/m3.

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Tabela 9 - Densidade dos resíduos orgânicos segundo diversas fontes

Densidade Referência [kg/m3] 400-600 [51]

514 [52]

540 [53]

600 [54]

700 [55] 570 Média

5.2. Proposta de Unidade de Digestão Anaeróbia para a Freguesia dos Olivais

A partir da análise dos dados descritos nas secções anteriores e dos critérios que são desenvolvidos nas secções seguintes propõem-se as seguintes características para a unidade de digestão anaeróbia:  Unidade de valorização de cerca de 1200 toneladas de resíduos orgânicos anuais com um CST de 28 %;  Triagem manual e mecânica na recepção dos resíduos;  Triturador de resíduos;  Misturador com 18,07 m3 de volume para diluição e homogeneização dos resíduos;  Digestor anaeróbio mesofílico de alimentação contínua e mistura completa com 348 m3 e TRH de 35 dias;  Produção de 579,9 m3 diários de biogás;  Gasómetro comprimido de 63,24 m3;  Gerador de calor e energia eléctrica com uma potência instalada de 172 kW (88 kWT e 62 kWe respectivamente);  Unidade de pasteurização para cumprimento de normas sanitárias comunitárias com um volume de 1 m3;  Tanque de digerido com 70,8 m3;  Separador centrífugo da fracção líquida e sólida do substrato digerido para reaproveitamento da fracção líquida. Estas características inserem-se no diagrama da Figura 18 que representa os vários equipamentos da central proposta. A descrição mais detalhada desta unidade de digestão anaeróbia e os critérios utilizados para a escolha dos diferentes equipamentos e características são apresentados nos parágrafos seguintes.

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Figura 18 - Diagrama da central de digestão anaeróbia proposta

5.3. Descrição do Processo, Equipamentos e Critérios de Escolha

5.3.1. Critérios de Escolha Vários são os critérios para a escolha da unidade de DA aqui proposta. Os critérios prioritários foram respeitantes à legislação nacional e comunitária para a instalação de unidades de digestão anaeróbia. Para além do cumprimento da legislação pretendeu-se ainda:  Maximizar o rendimento de produção de biogás;  Maximizar o aproveitamento do efluente da digestão, composto;  Minimizar os gastos energéticos na unidade de digestão anaeróbia, seja por consumo de periféricos ou relativos a perdas;  Minimizar o espaço ocupado pelas instalações, reduzindo os custos associados a construção civil;  Uma unidade robusta e com alargado tempo de vida sem manutenção intensiva e complexa;  Ter baixos custos de instalação;  Ter baixos custos de manutenção;  Ser de fácil monitorização e controlo.

5.3.2. Entradas e Pré-tratamento Quantidade de Resíduos Valorizados na Unidade A quantidade de resíduos a valorizar são a base e o dado crítico de forma para o dimensionamento. A dimensão dos equipamentos, o seu consumo energético, rendimento e custo depende fortemente da quantidade de resíduos a valorizar. Como foi demonstrado no capítulo 5.1, existem duas rotas de recolha de orgânicos que para a Freguesia dos Olivais somam as quantidades presentes na Tabela 10.

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Tabela 10 - Histórico da quantidade de resíduos alimentares recolhidos de 2010 a 2014 (CML, 2014)

Quantidade Ano [ton]

2010 1053

2011 1262

2012 1210

2013 1262

2014* 407

*Até ao início de Maio A partir das quantidades de resíduos orgânicos recolhidos nos quatro anos é possível estimar uma quantidade média de resíduos orgânicos recolhidos de aproximadamente 3280 kg, que irão servir como substrato da unidade de digestão anaeróbia.

Armazenamento dos Resíduos Recebidos Seguindo os critérios para selecção da unidade de digestão anaeróbia proposta, e como foi referido no capítulo 2.3, o armazenamento dos resíduos alimentares tem de obedecer às normas definidas no Decreto-Lei n.º 73 de 2011, de 17 de Junho. Assim sendo, os resíduos serão descarregados dos veículos de recolha por um colaborador com o auxílio de um ‘’bobcat’’ para um espaço onde os resíduos deverão aguardar o mínimo de tempo possível para serem encaminhados para a fase seguinte: a triagem.

Triagem dos Resíduos A pureza do substrato é condição essencial para o sucesso de uma unidade de digestão anaeróbia, sendo de extrema importância a triagem, para separação dos contaminantes antes de se iniciar o processo de digestão. Os contaminantes mais comuns, que podem causar danos em bombas, bloquear tubagens e até digestores [25], são as embalagens que acondicionam a comida ou produtos alimentares, metais, madeiras, vidros e outros materiais não digeríveis (Figura 19).

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Figura 19 - Contaminantes metálicos (Monson et al, 2007)

Este tipo de contaminantes pode ser removido por meios mecânicos, magnéticos ou de forma manual [25]. A responsabilidade social apontaria para um quadro de criação de emprego e nesse quadro a forma de triagem seria manual. Um colaborador responsável pelo processo de recepção de resíduos removeria os contaminantes de maior dimensão para um contentor de RSU. Devido à quantidade de resíduos a receber diariamente (3280 kg), a remoção de contaminantes de menor dimensão pode tornar-se difícil para a metodologia de triagem referida anteriormente e portanto outros métodos de triagem poderão vir a ser necessários para se conseguir extrair de forma eficaz esses contaminantes, por forma a tornar esta fase o mais eficiente possível.

Triturador e Misturador dos Resíduos Após a triagem os resíduos sofrem um processo de trituração para diminuição da sua dimensão. A dimensão das partículas dos resíduos triturados não deverá exceder os 12 mm de diâmetro. Esta dimensão além de facilitar o processo de mistura e contacto entre o substrato, aumentando a eficiência da DA [25], é a máxima permitida pela legislação comunitária no Regulamento n.º 1774 de 2002. O triturador será um equipamento em tudo semelhante ao triturador comercial da Figura 20.

Figura 20 - Triturador proposto para a unidade de digestão anaeróbia

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A mistura dos resíduos, num tanque de mistura, serve simultaneamente para diluir os mesmos com adição de água. Esta diluição tem o intuito de se fazer atingir o conteúdo desejável de sólidos totais, ou seja 14 % [16]. O tanque de mistura deverá ter a capacidade de reter e diluir o equivalente a dois dias de recepção de resíduos, que implica a capacidade de reter e diluir os resíduos em dias de pico e assim garantir o funcionamento constante do digestor durante, por exemplo, o fim-de-semana. Para este efeito, o volume do tanque misturador deverá ser então de 18,07 m3, o dobro do volume relativo aos 3280 kg diários de resíduos diluídos. Os cálculos desta diluição serão apresentados mais à frente.

5.3.3. Digestão Nesta fase os sólidos voláteis contidos nos resíduos, são transformados em biogás. Este processo é um processo biológico complexo como já foi visto anteriormente que pode ser parametrizado em várias categorias que serão discutidas de seguida. Os valores dos parâmetros são estimados nos parágrafos que se seguem garantindo uma unidade de digestão anaeróbia conforme com os critérios definidos no capítulo 5.3.1.

Parâmetros de Funcionamento da Unidade  Temperatura Já no capítulo 3.3 se havia procedido à análise das gamas de temperatura a que a DA pode estar sujeita e o efeito dessas gamas na produção de biogás. A gama escolhida para a concretização da unidade de digestão anaeróbia proposta incidiu sobre a gama mesofílica, 35 a 40 ⁰C, pelo facto de a estas temperaturas o processo de DA se fazer de forma mais estável [16]. Para que o rendimento da produção de biogás se mantenha a níveis elevados, é de extrema importância que a temperatura no digestor se mantenha em mínimos de 35 ⁰C e constantes [56], devido aos efeitos nocivos que as variações abruptas de temperatura têm na população de microorganismos. A variação máxima de temperatura no digestor anaeróbio é de ±1 ⁰C/h para esta gama de temperatura [10]. Unidades de DA com funcionamento mesofílico são, geralmente, mais fáceis e baratas de construir e operar, quando comparadas com as unidades termofílicas [13].  pH O pH durante o processo de DA pode variar entre os valores 5,5 e 8,5 [16]. No entanto, numa unidade mesofílica, destinada a valorizar resíduos orgânicos, o pH ideal deverá ser de 7,0, para com isto potenciar condições que possibilitem a existência de bactérias acidogénicas e metanogénicas, sem que a inibição das mesmas seja atingida [57].  Tempo de Retenção Hidráulico O TRH, como referido no capítulo 3.4, é um parâmetro fundamental para maximizar a produção de biogás e para dimensionar a unidade de DA. Na Tabela 11 apresentam-se diferentes TRH e correspondentes cargas orgânicas usadas em diversas unidades de digestão anaeróbia desenvolvidas para valorizar resíduos orgânicos, na gama mesofílica, em regime contínuo.

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Tabela 11 - Tempo de Retenção hidráulico e Carga Orgânica usada em unidades de digestão anaeróbia

Tempo de Carga Orgânica Retenção Referência [kgSV/m3.dia] Hidráulico [dias] 20 [55]

31,5 6,7 [57]

40 [28]

42,5 8,3 [58] 42,5 10,6 35,3 8,5 Média

O valor médio de TRH que se obtém por observação da Tabela 11 é de 35,3 dias, que acaba por ser um valor conservador [59]. O valor médio da carga orgânica que se obtêm para este valor de TRH é de 8,5 kgSV/m3.dia. Desta forma, e com base nas considerações supramencionadas o valor de TRH considerado para o presente estudo de caso é de 35 dias.  Teor de humidade Para a unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, foi escolhido a via húmida com teor de sólidos totais de 14 % [16]. Esta escolha visa garantir a funcionalidade da operação e da manutenção para uma unidade desta dimensão. Com esta escolha é possível dimensionar:  Uma unidade de digestão anaeróbia mais robusta em termos do processo, por haver menos possibilidade de inibição através da diluição do substrato (vide Tabela 3);  Equipamento com um custo menor devido às condições de trabalho menos severas em comparação com o equipamento utilizado na via seca; e  Necessidade de manutenção dos equipamentos mais reduzida. Esta solução apresenta como desvantagem (Tabela 3), a necessidade de uma maior quantidade de água para o processo que pode no entanto ser evitada através da recirculação da água retirada ao substrato já digerido e valorizado no digestor. Para além disso, diversas fontes [57] [28] [55] indicam que, a uma pequena escala e de projecto piloto, a via húmida é a tecnologia mais correta para garantir o cumprimento de toda a legislação em vigor na União Europeia.  Número de Etapas A escolha por um digestor de uma única etapa justifica-se pela simplicidade do próprio, pelo consequente custo inferior, pelo menor espaço ocupado por este tipo de digestores e pela diminuição da energia a ser despendida na valorização dos resíduos orgânicos, tudo isto critérios que apoiam os requisitos apontados no capítulo 5.3.1. Uma vez mais diversas fontes [57] [28] [55] indicam que, para a escala da unidade de digestão anaeróbia aqui proposta, seja usado apenas um digestor anaeróbio.

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 Alimentação do Digestor A alimentação do digestor anaeróbio proposto deverá ser contínua. Mais concretamente de hora a hora no estudo de caso aqui referido. A escolha foi feita com base na prioridade de garantir um funcionamento simplificado da instalação, possibilitando a redução dos equipamentos de controlo e principalmente para se obter uma produção de biogás tão constante quanto possível. Os autores já referenciados [57] [28] [55] consideram a alimentação contínua como o mais apropriado para a valorização de resíduos orgânicos em unidades de digestão anaeróbia de pequenas dimensões.

Constituição do Digestor Anaeróbio Depois de definidos os parâmetros de funcionamento do processo de digestão, é necessário fazer o dimensionamento do digestor anaeróbio, que sendo equipamento fundamental em todo o processo influi em todos os equipamentos de valorização de resíduos e consequentemente a rentabilidade energética e económica deste projecto. São apresentados em seguida todos os cálculos realizados para dimensionar o digestor anaeróbio. Como referido o digestor terá uma alimentação contínua e far-se-á uma redução do teor de sólidos totais dos resíduos orgânicos por via de realimentação da fracção líquida do produto da digestão anaeróbia, resultante de um pós-tratamento. De acordo com estas características propõe-se para a freguesia dos Olivais, Lisboa, um Digestor de Mistura Completa (DMC ou CSTR). Esta tipologia justifica-se por possuir um sistema de agitação e mistura que permite um contacto mais eficiente entre o substrato e os microorganismos responsáveis pela digestão anaeróbia. A recirculação da fracção líquida do digerido proporciona um aumento do rendimento do digestor pelo facto de haver uma grande quantidade de bactérias fermentativas que irão acelerar a primeira etapa, hidrólise, no processo de DA [28]. A forma do digestor anaeróbio é um factor que influência a sua performance energética, nomeadamente na troca de calor com o exterior, mais acentuada nos meses mais frios do inverno. É também importante recorrer á forma mais compacta possível para reduzir o espaço necessário para a instalação do digestor anaeróbio assim como os custos associados ao material. Para estes parâmetros a forma mais comum que um Digestor de Mistura Completa toma é a de um cilindro [60]. De forma a minimizar a área lateral o diâmetro da base do digestor terá o mesmo valor que a altura. Esta relação resulta da determinação do mínimo da expressão da área do cilindro em função do diâmetro do mesmo. Recomenda-se como material constitutivo o aço permitindo dar resposta aos requisitos de construção apresentados no capítulo 3.5.1. O digestor em aço soldado, mais concretamente o inoxidável, apresenta um longo tempo de vida útil, boa estabilidade estrutural, uma excelente estanquicidade tendo ainda a seu favor a relativa facilidade de construção [10]. Para este tipo de digestor é, no entanto, necessário ter alguns cuidados, como por exemplo a corrosão. A corrosão pode ter origem no interior ou no exterior (devido a fenómenos atmosféricos) do digestor. No primeiro caso a situação poderá ser resolvida com a aplicação de revestimentos de vidro ou epoxi [60]. No segundo caso a solução poderá passar pelo recurso a revestimento sintético como poliuretano expandido, poliestireno e outros polímeros e/ou revestimentos naturais como lã de vidro, lã de

43 rocha, argilas entre outros [18]. Estes revestimentos servem também como isolamento térmico do digestor anaeróbio. No caso proposto, o isolamento térmico será garantido através de um revestimento simples de lã de rocha com 80 mm de espessura, por ser uma das maiores espessuras comercialmente disponíveis, e uma cobertura de chapa de aço perfilada trapezoidal lacada para garantir o isolamento térmico, como se mostra na Figura 21. A alimentação do digestor anaeróbio far-se-á por um tubo de entrada que será inserido no interior do digestor até bem perto do fundo do digestor, onde estará a hélice de agitação. Também estão previstos os tubos de saída do digerido na parte superior do digestor, para funcionamento em contínuo. No fundo do digestor existirá um modo alternativo de saída de lamas residuais através de um tubo colocado na parte mais baixa e, também, uma conduta para injecção de material para ajudar a mistura do substrato. Estas soluções estão também representadas na Figura 21.

Figura 21 - Representação esquemática do digestor anaeróbio proposto (daviddarling.info, 2014) (adaptado)

Dimensionamento do Digestor O volume necessário de um digestor anaeróbio é obtido segundo uma relação entre o volume de resíduo a valorizar por dia e o tempo de retenção hidráulico, em dias [10]. Essa relação é traduzida na equação seguinte:

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푉 = 푉푡표푡푎푙 푟푒푠푖푑푢표푠 × 푇푅퐻

Equação 30 Em que: 푉 – Volume do digestor anaeróbio [m3];

3 푉푡표푡푎푙 푟푒푠푖푑푢표푠 – Volume total de resíduos a valorizar por dia [m /dia]; 푇푅퐻 – Tempo de Retenção Hidráulico [dias]. Para determinação do volume de resíduos a valorizar diariamente, é necessário considerar não só os resíduos recolhidos como também a fracção líquida do digerido a recircular para a diluição do substrato. Como já foi referido no capítulo 5.1, a quantidade de resíduos a tratar será de 3280 kg diários, apresentando um teor de sólidos totais de 28 %, ou seja, 918,40 kg de sólidos e 2361,60 kg de água. Para obter um teor de sólidos de 14 % é necessário adicionar 3280,00 kg de água. 918,40 푘푔 푑푒 푆푇 14% = × 100% 푆푇 (2361,60 + 3280,00)푘푔 푑푒 á푔푢푎 + 918,40푘푔 푑푒 푆푇 Os 3280 kg de resíduos diários médios apresentam um volume de 5,75 m3 tendo em conta a densidade mássica de 570 kg/m3 determinada anteriormente. A massa de 3280 kg de água adicionada para diluição apresenta um volume de 3,28 m3 tendo em conta a densidade mássica de 1000 kg/m3 da água. Somando os volumes, obtemos o valor de 9,03 m3 de substrato a valorizar por dia. Seleccionando um TRH conservador de 35 dias (como visto anteriormente) obtemos o valor mínimo para o volume do digestor de 347,82 m3. Este valor será agravado de 10 % de volume extra para garantir volume disponível na cúpula para retenção do biogás [61].

Agitação e Mistura No capítulo 3.4 foram referidas as vantagens da utilização de sistemas de agitação e mistura integrado no digestor anaeróbio, entre elas a de contribuir para a melhor mistura do substrato e consequentemente o aumento do rendimento da reacção de digestão, bem como a promoção de libertação do biogás e ainda a distribuição mais uniforme da temperatura no digestor. Para um sistema de digestão com alimentação contínua, como o que aqui se propõe, usualmente a alimentação é realizada de hora a hora com uma certa quantidade de substrato, sendo servido de uma agitação descontínua. Esta descontinuidade poderá ser por um curto período de tempo e com a mesma regularidade que a alimentação do digestor apresenta, ou seja uns minutos de hora a hora [28] [10]. Como visto anteriormente existem diversos sistemas de mistura e agitação. Para digestores da escala pretendida a agitação mecânica através de um misturador de hélice vertical é o método mais utilizado, visto ser o mais eficiente para estas dimensões [57] [28]. Uma ilustração do que é pretendido encontra-se representada na Figura 21. Para o tipo de agitador e misturador referido a potência do motor será de 0,1 kW/m3 [62]. Assim sendo a potência do motor eléctrico a instalar para mover o hélice do misturador será de 31,62 kW, contando com um volume útil de 316,20 m3 de resíduos a tratar. Este misturador funcionará durante aproximadamente 10 minutos, de hora a hora, e estará instalado na cobertura do digestor.

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5.3.4. Saídas e Pós-tratamento Digerido do Processo de Digestão Anaeróbia O digerido é um dos resultados do processo de DA. A DA retira, entre outros, hidrogénio, oxigénio e carbono do substrato, restando neste os nutrientes essenciais para plantas e outros seres vegetais, como o fósforo, o potássio e o azoto [10]. A utilização directa nos solos do digerido não é visto de forma consensual como boa prática. Segundo alguns autores, o resultado da DA por via húmida não é, em geral, adequado para ser aplicado em solos agrícolas de forma directa. O seu elevado teor de humidade e o seu elevado conteúdo em ácidos gordos voláteis que podem ser fitotóxicos sao as razões apontadas para desencorajar o uso directo [17]. Na unidade de tratamento de resíduos orgânicos proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, existe um equipamento de separação das fracções líquida e sólida, como foi referido anteriormente. O digerido assim tratado, nomeadamente a fracção líquida, servirá de diluente dos resíduos para se obter o conteúdo de sólidos totais desejado.

Armazenamento do digerido Após a fase de digestão, o digerido, agora com um conteúdo de sólidos total de 7 % ( [63] ), após a fase de pasteurização será armazenado num reservatório para evitar efeito tampão para outros processos de pós- tratamento. A quantidade de digerido que resulta do processo de digestão anaeróbia é cerca de 2 % inferior à quantidade de resíduos orgânicos que dá entrada no digestor, 8,85 m3/dia [10]. É também definido um funcionamento em contínuo do armazenamento de digerido e um tempo de retenção máximo do mesmo de oito dias, e tendo em conta o volume de digerido, o volume do reservatório deverá apresentar um volume mínimo de 70,8 m3. Este equipamento, à semelhança do digestor anaeróbio, terá também uma conduta de alimentação de digerido, aqui no topo ligado à unidade de pasteurização, e um tubo de extracção do digerido armazenado no fundo do reservatório.

Pós-tratamento Para tornar o produto da digestão anaeróbia seguro e de qualidade para futura utilização para composto é necessário efectuar um pós-tratamento de pasteurização. Este processo garante o cumprimento das regras comunitárias no que concerne à saúde humana, descrito no Regulamento n.º 1774/2002, de 3 de Outubro. Este regulamento que foi revisto no capítulo 2.4.2 estabelece:  Temperatura mínima no interior da unidade de pasteurização de 70⁰C;  Tempo de permanência mínimo de uma hora, sem interrupções, a essa temperatura. Não existem provas sobre a vantagem ou desvantagem em termos técnicos de colocar a unidade de pasteurização antes da fase de digestão ou após esta fase [63]. Apenas é referido que ao utilizar a unidade antes da fase da digestão se provoca uma perda de sólidos voláteis e consequentemente uma perda no rendimento da produção de biogás [60]. A unidade de pasteurização deverá possuir um volume de 1 m3 para assim ser possível tratar diariamente todos os resíduos orgânicos que dão entrada no digestor. Após a fase de pasteurização e de a qualidade do substrato digerido estar assegurada, deverá ocorrer um processo de separação da fase líquida e da fase sólida. A fase líquida é recirculada para a diluir os resíduos

46 orgânicos frescos prontos a alimentar o digestor, num esforço de diminuir ou mesmo evitar recorrer a água potável. A fase líquida que se encontrar em excesso neste processo poderá ser utilizada como fertilizante líquido de elevada qualidade, por já ter passado por um processo de tratamento [63]. A fase sólida, já tratada, servirá de ingrediente a composto orgânico de elevada qualidade, obtido através de um processo de compostagem. O equipamento escolhido para esta separação é uma prensa de parafuso como a da Figura 22. Uma prensa de parafuso funciona utilizando um parafuso rodeado por uma membrana permeável, que ao empurrar o digerido através de um canal com diâmetro cada vez menor, exerce uma pressão crescente e permite a passagem da fracção líquida pela membrana [59].

Figura 22 - Prensa parafuso separadora sólido-líquido

Biogás Para a determinação da quantidade de biogás a ser produzido pela unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, recorreu-se a uma revisão bibliográfica com incidência em digestores de pequena dimensão e dimensão laboratorial, assim como unidades piloto. Obtiveram-se valores de quantidades de produção de biogás resultante da digestão anaeróbia de resíduos orgânicos provenientes de cantinas, cozinhas e de restaurantes, por via húmida e condições mesofílicas numa única etapa. Por semelhança, e aproximação a dados de estudos de caso de escala semelhante, a unidade de DA considerada, terá uma produção média de 0,68 m3/kgSV (m3 de biogás por kg de sólidos voláteis) [63]. A partir da Tabela 8 como já foi referido, obtém-se um teor médio de sólidos voláteis para os resíduos orgânicos de 26 % em massa, o que em termos absolutos corresponde a 852,8 kg, dos 3280 kg a serem valorizados diariamente, de sólidos voláteis. Assim sendo será esperada uma produção média diária de 579,9 m3 de biogás na unidade de DA a instalar na freguesia dos Olivais.

Composição do biogás Para caracterizar a potencial composição do biogás produzido na unidade de DA a instalar na freguesia dos Olivais, Lisboa, recorreu-se a igualmente ao processo de revisão bibliográfica cujos resultados se resumem na Tabela 12, incidindo estes sobre trabalhos de digestão anaeróbia por via húmida em condições mesofílicas de

47 etapa única. Da Tabela 12 retira-se um valor médio para a percentagem de metano (CH4) presente no biogás produzido na unidade de digestão anaeróbia proposta de 65,7 %. Tal teor de metano tem como correspondente um PCI (poder calorífico inferior) de 25,6 MJ/m3.

Tabela 12 - Composição esperada do biogás produzido pela digestão de bio-resíduos alimentares e FORSU

CH4 CO2 H2O PCI Referência [%v/v] [%v/v] [%v/v] [MJ/m3] 56,8 41,7 [58]

57,0 - 21 - 25 [64] 70,0

62,6 37,4 [65] Bio-Resíduos Alimentares 64 [56]

65 [66]

89 31 - 32 [45]

55,0 - 35,0 - 2 (20ºC) - [17] 60,0 40,0 7 (40ºC) FORSU 55,0 - 30,0 - 20 - 25 [67] 70,0 45,0 65,7 38,5 4,5 25,6 Média

Armazenamento do biogás O armazenamento do biogás produzido pela unidade de DA é realizado num gasómetro. Existe uma relação empírica entre o volume do digestor e o volume do gasómetro, para este tipo de aplicações, que varia entre os 3:1 e os 10:1, sendo o mais comum 5:1 a 6:1 [10]. Em concordância, o volume do gasómetro a ser instalado na unidade de digestão anaeróbia proposta será cerca de 63,24 m3. Outro parâmetro importante é a pressão de trabalho do gasómetro. Existem três patamares de pressões de trabalho que se podem considerar [25]:  Baixa pressão – Pressão de trabalho desde 0,05 a 0,5 mbar de sobrepressão;  Média pressão – Pressão de trabalho desde 5 a 10 bar;  Alta pressão – Pressão de trabalho até 300 bar. Tendo em conta a necessidade de alimentar um motor de potência e calor combinado (CHP – Combined Heat and Power – em inglês) o reservatório terá que estar sob pressão superior à atmosférica [28]. A pressão de trabalho escolhida para o gasómetro a instalar na unidade de digestão anaeróbia é de 9,2 bar. A esta pressão é possível comportar a produção de, aproximadamente, 24 horas de biogás. Devido ao facto de a pressão ser superior à pressão atmosférica, o material a utilizar para a construção do gasómetro deverá ser em aço, e as

48 válvulas de segurança de alta pressão e de baixa pressão deverão ser usadas [28]. O gasómetro terá uma forma esférica com 2,47 m de raio e um consumo eléctrico, associado a periféricos, no valor de 0,22 kWh/m³.dia, ou seja, 13,91 kWh/dia [25].

Redução de Sulfuretos Os principais elementos presentes no biogás são o metano, em maior quantidade, o dióxido de carbono e a água, como mostrado na Tabela 12. Para maximizar a produção de metano e minimizar a quantidade dos restantes componentes do biogás são muitas vezes utilizados sistemas de purificação do biogás. Estes sistemas permitem a eliminação dos gases que possam ser prejudiciais para os equipamentos de valorização do biogás e conduzem consequentemente, ao aumento da concentração do metano [10]. Técnicas de secagem permitem a redução da humidade presente no biogás, aumentando o seu PCI, e reduzindo o teor de CO2, possibilitando a obtenção de um biogás com elevada percentagem de CH4. Estas técnicas e sistemas são no entanto utilizados apenas em unidades de digestão anaeróbia de grandes dimensões centralizadas [10]. Em unidades de escala comparável à escala da unidade de digestão anaeróbia proposta a opção de purificação do biogás passa pela redução do conteúdo do gás sulfídrico ou sulfureto de hidrogénio, H2S [25]. Além de possuir um odor desagradável, o sulfureto de hidrogénio, é tóxico e corrosivo, pois em combinação com o vapor de água presente no biogás forma o ácido sulfúrico. Este ácido danifica a cúpula do digestor, tubagens, gasómetro, válvulas, e também os motores de combustão de biogás. De uma forma geral, estes motores admitem um valor limite de H2S de 700 ppm, o que torna este equipamento especialmente sensível [10]. Com o propósito de evitar os inconvenientes da formação do H2S, diversos autores [28] [10] [25] recomendam que o teor deste gás seja reduzido mesmo em unidades de digestão anaeróbia de pequenas dimensões. Duas técnicas estão disponíveis em unidades de digestão anaeróbia de pequena escala [25]:

 Remoção do H2S por oxidação;

 Absorção do H2S em hidróxido de ferro hidratado, Fe(OH)3. A técnica mais utilizada, efectivamente, em unidade de digestão anaeróbia da escala pretendida é a primeira. Esta oxidação tem como base a injecção de ar numa proporção de 2 a 8 % da produção de biogás na cúpula do digestor. O oxigénio presente no ar faz, então oxidar o sulfureto de hidrogénio, como se traduz nas seguintes equações químicas [25]:

2퐻2푆 + 푂2 → 2퐻2푂 + 2푆

Equação 31

2퐻2푆 + 3푂2 → 2퐻2푆푂3

Equação 32 O ar poderá ser injectado na cúpula do digestor anaeróbio através de compressores de muito pequena dimensão [25].

49

6. Resultados

6.1. Análise Energética e Mássica

6.1.1. Produção Energética A principal fonte de energia na unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, é o biogás resultante do processo. Assim sendo todo o balanço energético depende e é determinado através da quantidade de biogás obtido. Admitindo uma produção média constante de biogás de forma a simplificar os cálculos anuais para o cenário base, obtêm-se na Tabela 13 os valores de produção de biogás anual e o seu teor energético. Este teor energético tem como base um PCI de 25,6 MJ/m3 definido no capítulo 5.3.4.

Tabela 13 - Produção anual de biogás, energia eléctrica e térmica total na unidade de digestão anaeróbia

Produção de Biogás Produção de Biogás Energia Eléctrica Produzida Energia Térmica Produzida

[m3/ano] [GJ/ano] [GJ/ano]1 [GJ/ano]2

211.665 5.418,6 1.950,7 2.763,5 1 – Com base em 36% de capacidade de transformação da energia contida no biogás em energia eléctrica [68] 2 – Com base em 51% de capacidade de transformação da energia contida no biogás em energia térmica [68]

A produção eléctrica e térmica estão a cargo de uma unidade de CHP em que 36 % da energia contida no biogás consumido é transformado em energia eléctrica e 51 % em energia térmica utilizável [68]. Este equipamento consiste num motor alternativo, em tudo semelhante às unidades comercializadas pela empresa Viessman, na Figura 23, desenvolvida para biogás. Esta unidade transforma a energia química contida no biogás em energia mecânica através da queima directa para accionamento de um gerador que transforma a energia mecânica em energia eléctrica. A conversão de energia química em energia térmica está a cargo de diversos permutadores de calor anexos ao motor, nomeadamente do sistema de refrigeração do mesmo, sistema de refrigeração do óleo do motor, intercooler do primeiro estágio de admissão de ar, dos gases de escape resultantes e da radiação proveniente do gerador [69]. Esta energia térmica é a energia total que a unidade produz, podendo ser obtido o valor de energia disponível para aquecimento do digestor e pasteurizador através da Equação 13 e considerando a diferença de temperatura dos gases de escape da unidade de cogeração e a temperatura no interior do digestor (300 ⁰C [70] e 35 ⁰C respectivamente). Considerando a capacidade térmica mássica dos gases de escape 1,045 kJ/kg.K [71] e uma massa de 2.180 toneladas/ano (retirado do balanço mássico) obtem-se assim o valor de 603,7 GJ/ano para a energia disponível.

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Figura 23 - Unidade de potência e calor combinado (Viessman Group, 2014) O cálculo da potência instalada tem como base a energia anual contida no biogás a ser consumida em contínuo ao longo de um ano. Não estão contempladas nesta aproximação as paragens para acções de manutenção e as variações sazonais de produção de biogás. Assim sendo obtém-se a potência instalada da unidade de CHP: 퐸푛푒푟푔𝑖푎 푡표푡푎푙 푎푛푢푎푙 푃표푡ê푛푐𝑖푎 퐼푛푠푡푎푙푎푑푎 = 푡푒푚푝표 푑푒 푓푢푛푐𝑖표푛푎푚푒푛푡표 푑푎 푢푛𝑖푑푎푑푒 Equação 33 Aplicando a Equação 33 com os valores obtidos neste estudo obtém-se: 5418,6 × 106 푘퐽/푎푛표 = 171,82 푘푊 365 푑𝑖푎푠 × 24 ℎ표푟푎푠 × 3600 푠푒푔푢푛푑표푠

6.1.2. Consumo Energético Neste capítulo, e com o intuito de suportar os cálculos do balanço energético da unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, foi feito um levantamento das necessidades energéticas térmicas e eléctricas da mesma. Primeiramente as necessidades térmicas concentram-se no aquecimento dos resíduos alimentados ao digestor, que é realizado no interior do mesmo, e no aquecimento do pasteurizador, para um eficaz pós-tratamento e concordância com a legislação. O consumo de energia eléctrica estará a cabo dos diversos equipamentos que embora anexos aos equipamentos principais como digestor, gasómetro e unidade de potência e calor combinado, são vitais à unidade de digestão anaeróbia. Estes equipamentos compreendem as bombas de circulação de substrato, bombas de água, motores eléctricos de agitadores, compressores de ar e biogás, motor do separador líquido-sólido, iluminação e equipamentos de medição e controlo.

Aquecimento e Isolamento do Digestor No capítulo 5.3.3 foi já referido que a temperatura mínima que se teria que registar no interior do digestor seria de 35 ⁰C. É de extrema importância que esta temperatura se mantenha o mais constante possível, sendo a variação máxima de temperatura no digestor de 1 ⁰C/h [10]. Existem muitas formas de aquecimento, e para o digestor anaeróbio em estudo foi escolhido o uso de tubagens com água quente proveniente do sistema de refrigeração do gerador de energia eléctrica, uma solução que aproveita o calor que de outra forma seria transferido para o exterior e que elimina a necessidade de utilização de energia eléctrica adicional ou queima de

51 combustíveis fósseis, por exemplo, embora haja um sistema de recurso para aquecimento do digestor constituído por uma caldeira de biogás mas que para este estudo não se entrará em detalhes. O sistema de aquecimento para este tipo de aplicações está normalmente instalado com algum afastamento das paredes interiores do digestor anaeróbio, [57] [28], e em conjunto com o sistema de agitação do mesmo, proporciona uma distribuição de temperatura homogénea. A estimativa das necessidades de calor de um digestor pode ser feita sabendo o calor necessário para igualar a temperatura do substrato à do digestor e da quantidade de energia que é necessária para compensar as perdas energéticas que ocorrem pelas superfícies laterais, inferior e superior do referido digestor anaeróbio [36]. A primeira quantidade referida é calculada segundo a Equação 13 como visto no capítulo 4. Devido á sua diluição e baixo teor sólido, os resíduos orgânicos a serem tratados têm um valor de calor específico aproximadamente igual ao da água, 4,2 kJ/kg [35]. A massa de substrato a ser alimentado ao digestor no período de um ano é de cerca de 2394 toneladas. Este valor é obtido através da soma dos 3280 kg/dia de resíduos e os 3280 kg/dia de água de diluição. Considerou-se, para efeitos práticos, que a temperatura de entrada dos resíduos é igual à temperatura média do ar, 17 ⁰C [72]. Esta temperatura média serve de referência para um cálculo de energia total ao longo de um ano com amplitudes térmicas diversas, e para que os cálculos globais tenham essas amplitudes térmicas em consideração. Tendo estes dados em conta, a quantidade de energia térmica que é necessário fornecer aos resíduos é de cerca de 181,02 GJ/ano, que equivale a 50,28 MWh/ano. A segunda quantidade referida anteriormente, perdas térmicas pelas superfícies laterais, inferior e superior, é calculada pela aplicação da Equação 14, também referida no capítulo 4. Para o efeito de cálculo das perdas térmicas é necessário, primeiramente, determinar a área superficial do digestor. Como foi visto anteriormente neste capítulo a forma escolhida foi a cilíndrica em que a medida do diâmetro da base é igual ao valor da sua altura, 7,62 m. A única superfície em contacto com o solo é o fundo do digestor, de forma circular, com uma área de 45,62 m2, que é o mesmo valor para superfície superior do mesmo. A superfície lateral tem uma área de 182,50 m2. A Tabela 14 dá a conhecer as características térmicas e espessuras dos materiais usados na construção e isolamento do digestor anaeróbio.

Tabela 14 - Propriedades térmicas dos materiais utilizados no digestor anaeróbio

he K hi Material l [m] Referência [W/m2.⁰C] [W/m.⁰C] [W/m2.⁰C] Ar 25 - - - [73]

Aço - 53 0,005 - [37]

Lã de - 0,04 0,08 - [74] Rocha

Betão - 0,57 0,2 - [74]

Digerido - - - 50 [37]

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A configuração escolhida para as superfícies já foi vista na Figura 21. Assim sendo o coeficiente de transmissão de calor das paredes laterais, calculado pela Equação 15, e cúpula, é de 0,485 W/m2.⁰C. Para a superfície inferior do digestor o reservatório assenta sobre uma fundação de 20 cm em betão, que permite um coeficiente de transmissão de calor de 0,249 W/m2.⁰C. A temperatura média do ar e do solo são respectivamente 17 ⁰C e 18,5 ⁰C [72]. Com estas informações e aplicando a Equação 14 obtêm-se as perdas térmicas por unidade de tempo para a superfície lateral e superior do digestor, 1993,18 W, e para a superfície em contacto com o solo de 187,26 W. Contabilizando esta análise em termos totais temos 188,39 MJ/dia ou 68,76 GJ/ano de perdas térmicas no digestor que correspondem 19,10 MWh/ano. Juntando a energia necessária para aquecer o substrato e a energia contabilizada nas perdas energéticas obtém-se o valor de 684,33 MJ/dia de energia a fornecer ao digestor anaeróbio, que corresponde a 249,78 GJ/ano. Aquecimento e Isolamento do Pasteurizador O raciocínio para a determinação da energia térmica, necessária para o aquecimento do pasteurizador e para fazer face às perdas térmicas do mesmo, é em tudo semelhante ao do digestor anaeróbio. A principal diferença entre estes dois equipamentos é em primeiro lugar a temperatura necessária no seu interior e em segundo lugar o seu volume, logo a sua área de superfície. A energia de aquecimento para o caso do pasteurizador é obtida considerando que a massa de substrato a ser tratado é cerca de 2 % inferior à massa de substrato que dá entrada no digestor, como visto no capítulo 5.3.4, é cerca de 2346 toneladas. A temperatura de entrada do substrato aqui também é diferente, sendo esta igual à temperatura mínima considerada para o digestor de 35 ⁰C. A temperatura alvo mínima dentro do pasteurizador é de 70 ⁰C como indicado também no capítulo 5.3.4. Assim sendo, considerando também a capacidade térmica mássica da água, a energia de aquecimento no pasteurizador é de 344,94 GJ/ano. No que diz respeito às perdas térmicas, o esquema do isolamento térmico e a forma é a mesma, logo para um volume definido de 1 m3 temos um diâmetro e uma altura de 1,08 m com os mesmos coeficientes térmicos aplicados ao digestor. O resultado da aplicação da Equação 14 indica que são necessários 349,05 GJ/ano para que as perdas térmicas sejam mitigadas.

Consumo Térmico Total Depois da análise cuidadosa anterior, finalmente podemos definir o consumo de energia térmica na unidade de DA proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa. Este consumo fixa-se em 598,83 GJ/ano.

Equipamentos Consumidores De modo a se efectuar o balanço energético da unidade de digestão anaeróbia em questão, um cálculo da energia consumida tem de ser feito. Para este efeito, foi feita uma listagem dos equipamentos consumidores de energia na Tabela 15 e determinou-se o seu consumo energético através da potência e do seu tempo de operação diário. A Tabela 15 apresenta os equipamentos que foram designados como consumidores de energia e escolhidos como parte integrante da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, em concordância com o que foi apresentado no capítulo 5.3.

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O equipamento triturador foi escolhido depois de uma busca em indústrias que fabricam este tipo de equipamentos e após uma selecção do equipamento com a capacidade de processar as quantidades de resíduos pretendidas. O equipamento de pasteurização foi seleccionado apenas o parâmetro que aqui mais interessava, a potência do agitador, uma vez que existe uma grande variabilidade de aplicações e construções deste tipo de equipamento. O mesmo foi feito para o sistema de agitação e gasómetro, que neste caso apenas é do interesse do trabalho o dimensionamento energético do mesmo. O compressor de ar foi seleccionado pela sua capacidade de produção para tratamento do biogás.

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Tabela 15 - Energia consumida por diversos equipamentos da unidade de digestão anaeróbia

Tempo de Consumo Potência Equipamento Modelo Funcionamento Eléctrico Eléctrica Referência Observações diário [min] [MJ/dia] [kW] Taskmaster Triturador 40 5,38 2,24 [75] TM8500

batch Pasteurizador 480 21,6 0,75 [76] 1000 l pasteurizer

Sistema de M3BP 225 240 455,33 31,62 [77] Agitação SMC

Compressor de ar SF 1-22 240 14,4 1 [78] 10 m3/h

Bomba de SK1500C- Alimentação ao 48 4,32 1,5 [79] 700 l/min 230 Digestor

Bomba do SLV/SL1 48 2,59 0,9 [80] 500 l/min Digerido

Gasómetro ACME 1440 50,09 0,58 [25] 63,24 m3

Diversos Equipamentos de 1440 259,2 3 [10] Iluminação e Controlo

Bombas Diversas 480 86,4 3 [81]

Separador Líquido SEPCOM 60 7,92 2,2 [82] 15 m3/h Sólido 015

As bombas, no geral, foram escolhidas também dentro da pesquisa feita em indústrias que apresentam produtos específicos para tratamento de resíduos como o que se pretende nesta dissertação, tendo sempre em conta equipamentos e modelos com as capacidades que satisfazem os requisitos da instalação aqui proposta. O separador líquido-sólido aqui escolhido é, uma vez mais, o resultado da pesquisa por equipamentos simples e de dimensões mais reduzidas na indústria de tratamento de digerido que respeite as necessidades definidas neste trabalho. Diariamente, com base na Tabela 15, os consumos de energia dos equipamentos da unidade de digestão anaeróbia são de 907,23 MJ, que corresponde a 331,14 GJ/ano. Estes são os consumos projectados para um dia de funcionamento normal, em que todos os resíduos orgânicos são tratados de forma faseada ao longo de um dia.

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Totais De uma forma global e total, a Tabela 16 apresenta os consumos discriminados pelo tipo de energia de todos os equipamentos associados à gestão e funcionamento da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, em Lisboa. É possível observar uma maior necessidade térmica para o correcto funcionamento de processos chave como sejam a digestão e a pasteurização.

Tabela 16 - Consumos energéticos anuais da unidade de digestão anaeróbia

Consumo Eléctrico Consumo Térmico

[GJ/ano] [GJ/ano] 331,14 598,83

6.1.3. Balanço Energético Já tendo então as necessidades energéticas e a produção, podemos finalmente calcular e definir a energia útil, disponível para venda, proveniente da instalação. A Tabela 17 mostra então de forma resumida os balanços energéticos da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa.

Tabela 17 - Balanço energético da unidade de digestão anaeróbia

Energia Energia Térmica Eléctrica Útil Útil 1619,6 GJ/ano 2164,7 GJ/ano ou ou 449,9 MWh/ano 601,3 MWh/ano

Estes valores revelam uma maior quantidade de energia térmica utilizável comparando com a energia eléctrica. Esta quantidade de energia térmica tem potencial de ser vendida a espaços públicos e/ou privados que durante os meses mais frios tenham necessidades de aquecimento. No entanto, sendo esta uma análise anual, é necessário um estudo mais aprofundado das reais potencialidades desta energia ser utilizada nos meses mais frios directamente. Contudo este estudo não será feito neste trabalho. Relativamente aos valores de consumo e produção, podemos observar que apenas 17 % da energia eléctrica e 21,7 % da energia térmica obtida através do biogás é utilizada para consumo próprio. Fazendo a comparação com a unidade centralizada da ETVO da Valorsul, em que cerca de metade da energia eléctrica é para autoconsumo, observa-se uma, proporcional, menor necessidade energética por parte desta unidade de digestão anaeróbia de pequena dimensão. Segundo a análise que foi feita no capítulo 5.1, em relação aos consumos domésticos, a energia eléctrica obtida nesta unidade de digestão anaeróbia é capaz de servir cerca de 108 habitações por ano.

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6.1.4. Balanço Mássico Para melhor avaliar as potencialidades da unidade de DA, foi efectuado um balanço de massa ao sistema, mais concretamente ao digestor e à unidade de CHP, como referido no capítulo 4. O balanço apresentado de seguida tem como base 1 tonelada (1000 kg) de resíduos orgânicos recebido na unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa. Como foi referido anteriormente, e de forma simplificada, é esperado que os resíduos recolhidos tenham um conteúdo de sólidos totais de 28 % em que o restante, 72 %, é água. Assim por cada tonelada de resíduos orgânicos que dão entrada no sistema do digestor temos:  280 kg de sólidos totais, dos quais 260 kg são sólidos voláteis, e;  720 kg de água. Apesar de o substrato ser diluído, essa quantidade de água é recirculada de uma outra quantidade de resíduos tratados, e por isso não faz sentido ser contabilizada neste balanço. Como saídas do digestor temos o digerido e o biogás. O digerido como foi referido no capítulo 5.3.4 ao sair do digestor tem um teor de sólidos totais de 7 %. Tendo em conta que apenas os sólidos voláteis sofrem a transformação para biogás e que a água contida nos resíduos não participa no processo de digestão à saída do digestor temos, da parte do digerido:  54,2 kg de sólidos totais, dos quais 34,2 kg são sólidos voláteis e;  720 kg de água. Estes valores foram obtidos através da Equação 16 e Equação 17. Deste primeiro resultado podemos afirmar que 225,8 kg de sólidos voláteis foram transformados, por meio da DA, em biogás. Como definido anteriormente, o biogás é essencialmente composto por metano e dióxido de carbono, nas razões de 0,657 e 0,343 respectivamente em volume. Assim à saída do digestor vamos ter os 225,8 kg de sólidos voláteis que após digestão se torna biogás com:

 92,7 kg de CH4 e;

 133,1 kg de CO2. Estas quantidades mássicas foram determinadas através da Equação 18 e através das percentagens, obtidas na Equação 22 e Equação 23, aplicadas à quantidade de biogás obtida de 225,8 kg. O biogás que é dado como saída no sistema do digestor, é aqui uma das entradas do sistema da unidade de CHP. Esta unidade, como foi visto anteriormente, é peça fundamental que transforma a energia contida no biogás em energia eléctrica e térmica. A forma como esta energia é transformada é por via de combustão do biogás, aqui considerando condições estequiométricas e sem dissociação. Dito isto a outra entrada do sistema aqui em estudo é o ar atmosférico que contém o comburente necessário à combustão, o oxigénio. De forma a se obter as quantidades de ar atmosférico e seus componentes a dar entrada no sistema da unidade de CHP é necessário ter em consideração a reacção de combustão do metano em condições estequiométricas traduzidas na Equação 24. Como 92,7 kg de CH4 correspondem a 5,8 kmol de CH4, através da equação em cima obtemos:

 370,8 kg de O2, de 11,6 kmol;

 1220 kg de N2, de 43,6 kmol.

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Estas quantidades são as quantidades mássicas dos componentes do ar atmosférico que dá entrada no sistema da unidade de CHP para combustão do metano. Como saídas obtém-se os gases de escape resultantes da combustão do biogás, electricidade e calor. Os gases de escape são constituídos por:

 1220 kg de N2, como produto da combustão;

 388 kg de CO2, em que 254,6 kg são produto da combustão e 133,1 kg estão já presentes no biogás;  208,6 kg de água resultantes da combustão. Como forma de comparação com a análise energética feita anteriormente, com este balanço mássico obtêm-se também uma relação entre a energia eléctrica e térmica obtida pelo tratamento de 1000 kg de resíduos orgânicos.

Tendo em conta o poder calorifico inferior de 48,7 MJ/kgCH4 [37] e as eficiências de conversão, em energia térmica de 51 % e de energia eléctrica de 36 %, da energia química presente no metano por parte da unidade de

CHP, os 92,7 kg de CH4 permitem 1625,3 MJ de electricidade e 2302,5 MJ de calor utilizável.

Figura 24 - Balanço de massa da unidade de digestão anaeróbia (Monson et al, 2007) (adaptado)

A Figura 24 mostra então o balanço de massa feito com base em 1000 kg de resíduos orgânicos recebidos como substrato ao digestor. É de extrema importância realçar que o balanço de massa feito à unidade de CHP tem como base a reacção de combustão do CH4 em condições estequiométricas. Também como resultado desta análise verifica-se uma eficiência de 86,8 % do digestor na conversão da matéria orgânica em biogás.

6.2. Viabilidade Económica

Existem alguns exemplos de unidades de digestão anaeróbia nos Países Baixos, na Roménia e Estados Unidos da América com informação financeira sobre a implantação, manutenção e receita destas unidades. A maioria dos estudos e artigos consultados divulgam apenas valores indicativos dos custos de implantação de unidades de DA por unidade de potência instalada que servirá de base para a determinação do custo total do projecto aqui descrito e os custos específicos dos equipamentos, quando necessário serão escalonados à dimensão da unidade

58 de DA proposta. Como receitas contabilizou-se a venda de energia eléctrica e térmica produzida a partir do biogás, as receitas das taxas de gestão de resíduos e a remuneração por parte do mercado de carbono como cenário central da análise. Posteriormente, realizou-se uma análise ao conjunto de custos e receitas obtidos.

6.2.1. Despesas Investimento Inicial O investimento inicial diz respeito aos custos de aquisição dos componentes da unidade de DA, como sejam o tanque de mistura e diluição, digestor, unidade de pasteurização, tanque de armazenamento de digerido, gasómetro, caldeira de biogás, instalação da unidade de CHP e tubagens. Estes equipamentos são ainda acompanhados pelo triturador, pelo separador sólido-líquido, todos os periféricos como bombas e unidades de controlo, e trabalhos de construção [83]. De acordo com algumas fontes podemos obter os valores de investimento inicial em €/kW, apresentados na Tabela 18. De notar que outros parâmetro podiam ser utilizados, como por exemplo €/m3 de resíduos valorizados, €/tonelada de resíduos valorizados ou €/m3 de biogás produzido, mas na informação acessível pouco ou nenhum dado existia nestes moldes.

Tabela 18 - Valores de investimento inicial típico em unidades de digestão anaeróbia

Potência Investimento Instalada Inicial Referência [kWe] [€/kWe] 30 8000

100 5000 [84] 500 4250

1000 3750 150 4000 [85] 500 3000

A partir desta tabela é possível obter uma tendência de valores de investimento inicial que servirá de base à restante análise económica. Também se verifica um aumento do custo por unidade de potência ao se diminuir a potência eléctrica instalada. Isto indica que os custos do investimento inicial relativo para unidades de digestão anaeróbia mais pequenas são maiores e por isso mesmo menos atractivas financeiramente, em termos de rendimento, levando ao domínio das soluções centralizadas. A Figura 25 apresenta então a tendência referida anteriormente e permite a obtenção de uma função para o cálculo do investimento inicial com base na potência eléctrica instalada na unidade de digestão anaeróbia.

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€/kWe 10000 Investimento Inicial

8000 y = 14509x-0,22 R² = 0,7272 6000

4000

2000

0 kWe 0 200 400 600 800 1000

Figura 25 - Investimento inicial previsto em função da potência eléctrica instalada

A função que melhor se adapta à tendência é a que se mostra na Figura 25: € 퐼푛푣푒푠푡𝑖푚푒푛푡표 퐼푛𝑖푐𝑖푎푙 [ ] = 14509 × (푃표푡ê푛푐𝑖푎 퐸푙é푐푡푟𝑖푐푎 퐼푛푠푡푎푙푎푑푎[푘푊푒])−0,22 푘푊푒 Equação 34 Dado que a potência eléctrica instalada é cerca de 62 kWe, 36 % da potência total instalada de 172 kW, o investimento inicial da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, fixa-se em 5.855 €/kWe. Assim, para os 62 kWe, o valor do investimento inicial total é de 362.174 €. A estrutura dos custos do investimento inicial pode ser esquematizada e resumida na Tabela 19, que tem como base a estrutura mais comum na Alemanha, país com enorme relevância no sector.

Tabela 19 - Estrutura dos custos do investimento inicial (Hahn, 2011) (adaptado)

Componente Fracção do Custo do ou Grupo de Custo Investimento Componentes Correspondente Inicial [€] Digestor 37% 134.004

Equipamento 30% 108.652 Periférico

Unidade de 23% 83.300 CHP

Planeamento e 7% 25.352 Licenciamento

Conexão à 3% 10.865 Rede Total 100% 362.174

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O digestor anaeróbio, na sua construção e aquisição dos equipamentos próprios ao seu funcionamento como o agitador, detém o estatuto de componente mais dispendioso. O equipamento periférico fica em segundo lugar, agrupando bombas, misturador, unidade de pasteurização, tubagens, triturador, separador sólido-líquido, armazenamento de digerido, etc, que fazem parte da unidade de DA. A unidade de CHP aqui incluindo os permutadores que auxiliam o aproveitamento térmico e o gerador eléctrico, ocupa a terceira posição. O planeamento e licenciamento referem-se aos custos associados a autorizações, pareceres, projectos, etc. A conexão à rede contempla as unidades de transformação, inversores, contadores, etc. Todos estes custos incluem a construção civil da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa.

Operação e Manutenção Os custos de operação referem-se essencialmente aos encargos com colaboradores e custos administrativos, podendo também contemplar encargos com análises físico-químicas e gastos de água [86]. Os custos de manutenção referem-se à manutenção necessária do equipamento electromecânico. Os custos de operação e manutenção, tal como o investimento inicial, dependem da capacidade da instalação e das suas características técnicas e são alvo de economias de escala [87] [88]. De acordo com diversos autores [86] [89] [90] [91] os custos de operação e manutenção correspondem a 5 % do investimento inicial ao ano. Segundo estes autores, estes custos referem-se à operação recorrente e à manutenção das instalações e equipamento. Um outro relatório [85] indica que os custos de operação e manutenção podem ser calculados em função da quantidade bruta de energia eléctrica produzida por 0,010 €/kWhe e 0,025 €/kWhe respectivamente. Esta segunda forma de cálculo inclui as manutenções mais profundas da unidade de CHP de 6 em 6 anos. Assim sendo temos como custos de operação e manutenção para a primeira opção: 퐶푢푠푡표푠 푑푒 푂푝푒푟푎çã표 = 5 % × 362.174 € = 18.109 € Ou para a segunda opção: € 퐶푢푠푡표푠 푑푒 푂푝푒푟푎çã표 = (0,01 + 0,025) × 541.862,30 푘푊ℎ푒 = 18.965 € 푘푊ℎ푒 Estes valores têm como base custos e produções energéticas anuais. Comparando estes dois métodos não se verifica diferenças significativas. Em todo o caso a abordagem mais conservadora será a segunda, que também permitirá um escalonamento dos custos anuais de acordo com o biogás produzido e a conversão da sua energia química em energia eléctrica. Assim sendo a segunda opção foi a escolhida para se obter o valor dos custos de operação e manutenção.

6.2.2. Receitas Venda da Energia Eléctrica à Rede De acordo com o Decreto-Lei n.º 25/2013 de 19 de Fevereiro, como foi visto no capítulo 2.5, a tarifa de electricidade produzida com recurso à valorização de resíduos por digestão anaeróbia fixa-se em 95,4 €/MWh. De acordo com os valores obtidos para a produção útil de energia eléctrica no capítulo 6.1.3, 449,9 MWh, obtém- se uma remuneração de 42.919 €/ano.

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Venda de Energia Térmica Uma mais-valia da unidade de digestão anaeróbia proposta neste documento é a sua produção de energia térmica que, em termos económicos pode ter um impacto relevante na sua viabilidade. De forma a contabilizar- se financeiramente o seu impacto no balanço económico, fez-se uma análise que tem por base a tarifa para venda de calor aplicada pela Climaespaço no ano homólogo de 2011, não havendo outra referência até à data. Esta análise é feita assumindo que toda a energia térmica disponível é vendida ao longo do ano, para aplicações que vão desde climatização até águas quentes sanitárias, com uma perda de 10 % na rede de distribuição [92]. A tarifa aplicada pela Climaespaço foi de 0,035 €/kWh no ano de 2011. A tarifa representa um valor de 9,72 €/GJ que para a energia térmica disponível para venda anual de 1948,2 GJ, com as perdas de 10 % contabilizadas, perfaz uma receita de 18.940 €.

Receitas de Taxas de Gestão de Resíduos O Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho, indica que à luz do Regime Geral de Gestão de Resíduos é aplicada uma Taxa de Gestão de Resíduos (TGR) por cada tonelada de, neste caso, resíduos urbanos ou equiparáveis que é encaminhada para aterro. Essa taxa é definida por aplicação do índice de preços no consumidor publicado pelo INE, que para o ano de 2013 estava fixado em 4,27 €/tonelada. É este valor, ou custo, que ao valorizar os RSU por meio de uma unidade de digestão anaeróbia se pretende evitar, ao mesmo tempo que é aplicado um valor de operação de gestão de resíduos, por exemplo 28 €/tonelada (no caso da ValorLis) mais o valor da TGR, sendo assim uma fonte de receitas. Tendo em conta que na unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, se prevê a valorização de 1200 toneladas anuais temos uma remuneração por parte das taxas de gestão de resíduos de 38.633 €.

Receitas de Créditos de Carbono A preocupação com o meio ambiente levou os países da Organização das Nações Unidas a assinarem um acordo que estipulasse limites sobre as intervenções humanas no clima. Este acordo nasceu em dezembro de 1999 com a assinatura do Protocolo de Quioto. Um dos mecanismos criados é o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e a criação de um mercado de créditos de carbono. O crédito de carbono do MDL é denominado Redução Certificada de Emissão (RCE) - ou em inglês, Certified Emission Reductions (CER). Uma RCE corresponde a uma tonelada de Dióxido de carbono equivalente. O CO2 equivalente é o resultado da multiplicação das toneladas emitidas do GEE pelo seu potencial de aquecimento global. O potencial de aquecimento global do CO2 foi estipulado como 1 [93]. Segundo [94] [95] os valores apontados para as emissões de GEE em aterro sanitário, corresponderam a 0,69 e 0,54 kgCO2eq/kg de RSU, respectivamente. Segundo [96] o valor de uma RCE é de

7,14 €. Para cerca de 1200 toneladas/ano de resíduos equivale a 728 toneladas de CO2eq, ou seja, 728 RCE. Tendo isto tudo em conta, as receitas provenientes dos créditos de carbono ascende a 5.257 €.

6.2.3. Balanço Económico O balanço económico para o cenário base apoia-se nos valores calculados anteriormente para os custos e receitas. Para o balanço económico anual, fluxo monetário, considerou-se a depreciação que certos

62 equipamentos sofrem, Tabela 20. Na mesma tabela constam o investimento, receitas, despesas e período de depreciação. Para uma análise de viabilidade económica completa, é oportuno fazer uma análise para um período de 20 anos de vida previstos para o projecto o que passa por se obter o fluxo monetário do projecto ao longo do seu período de vida. Na tabela do Anexo 1, são representados todos os fluxos monetários. A EBITDA, do inglês Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, é obtida pela diferença entre as receitas e as despesas. Os custos financeiros para este cenário não são contemplados, estando a ser considerado que o financiamento provém de capitais próprios (ou de investimento privado ou com suporte de fundos comunitários a que a freguesia concorra). O resultado bruto é obtido pela diferença entre a EBITDA e a depreciação, sendo sobre este valor que recai o cálculo de impostos, aqui definidos em 27,5 % [39].

Tabela 20 - Depreciação dos diversos componentes da unidade de digestão anaeróbia proposta

Componente Período de Valor da ou Grupo de Depreciação Depreciação Componentes [anos] Anual [€]

Digestor 20 6.700

Equipamento 10 10.865 Periférico

Unidade de 7 11.900 CHP

Planeamento e 20 1.268 Licenciamento

Conexão à 20 543 Rede

Valor Actual Líquido O VAL do projecto de investimento disposto neste documento, com as características apresentadas no Anexo 1, é de 295.942 €. Este valor faz com que o projecto de investimento seja rentável no período que o define.

Taxa Interna de Rendibilidade (TIR) Como a resolução em termos matemáticos da TIR requer aproximações por interacções ou graficamente, decidiu-se optar pela abordagem gráfica. Na Tabela 21 estão os valores utilizados para determinação da TIR de forma gráfica. A Figura 26 é a representação dos mesmos graficamente, onde é possível observar o valor da TIR.

63

Tabela 21 - VAL para várias taxas de desconto

Taxa de VAL [€] Desconto - r 5% 494.195

10% 228.449

15% 75.462

20% -19.642

25% -82.789

30% -127.092

VAL [€] 600.000 500.000 400.000 300.000 200.000 100.000 Taxa de Desconto 0 0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% -100.000 -200.000

Figura 26 - VAL em função da taxa de desconto

Conseguimos através deste gráfico verificar que taxa interna de rendibilidade é de aproximadamente 18,5 % que é um valor superior à taxa de desconto anual definida como 8,43 %.

Prazo de Recuperação do Investimento (PRI) Da mesma forma que a TIR beneficia de uma análise gráfica, o PRI também pode ser obtido através da Figura 27, que representa os fluxos monetários anuais e acumulados ao longo dos anos.

64

[€] 400.000 300.000 200.000 100.000 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 -100.000 Anos -200.000 Valor Actual -300.000 Fluxo Monetário Acumulado -400.000

Figura 27 - Valor actual do projecto ao longo dos anos e fluxo monetário acumulado (r=8,43%)

Da Figura 27 podemos observar que para o projecto da implementação da unidade de DA na freguesia dos Olivais aqui estudada, o PRI é de aproximadamente 7 anos. Tal PRI torna este projecto pouco apetecível no caso de a opção passar por um investimento privado. No caso de o investimento ser público a solução pode considerar-se viável, na medida em que o investimento se paga antes do período de vida útil previsto.

65

6.3. Análise de Sensibilidade

Parâmetros Os parâmetros que aqui são usados como base ao estudo da viabilidade da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, podem sofrer variações e essas variações afectam os resultados anteriormente obtidos. A Tabela 22 resume os parâmetros aqui analisados, as consequências previstas e o resultado que essa variação afecta.

Tabela 22 - Parâmetros que afectam os resultados obtidos

Parâmetro Possível Variação Consequência Prevista Afecta

Diminuição ao longo dos Diminuição dos resíduos População Receitas anos recolhidos Quantidade de Aumento da rede de Aumento dos resíduos Receitas Resíduos recolha de resíduos recolhidos Aumento ou diminuição Taxas Aumento ou diminuição Receitas das taxas

Maior ou menor produção Receitas Aumento ou diminuição de biogás da quantidade de SV

transformados em biogás Maior ou igual potência Custos instalada Biogás Maior ou menor teor Receitas Aumento ou diminuição energético do biogás da % de metano no

biogás Maior ou igual potência Custos instalada Necessidade de Qualidade dos Boa qualidade ou má equipamento de triagem Custos Resíduos qualidade para remover impurezas Aumento ou diminuição Operação e da manutenção Variação dos custos de Custos Manutenção necessária aos operação e manutenção equipamentos

Estes parâmetros e as suas implicações resumem-se a aumentos e diminuições de receitas e/ou custos que ultimamente influenciam o principal indicador da viabilidade do projecto, o VAL. De maneira a se perceber como é que certos parâmetros afectam a viabilidade do projecto, procedeu-se a uma variação percentual de alguns valores que traduzem a variação dos parâmetros revistos na Tabela 22. Para começar por fazer a comparação com o cenário base determinado anteriormente neste documento, podemos assumir que alguns parâmetros que foram definidos a priori assumem valores diferentes. A potência instalada, para começar, depende a quantidade de biogás obtida da digestão, já visto anteriormente. Por sua vez a quantidade de biogás tem dependência, em menor escala, na eficiência da digestão anaeróbia e na quantidade de resíduos orgânicos que são valorizados. Esta última é de enorme importância e na Figura 28 está patente a

66 influência da variação destes, que foram definidos como base deste projecto, no valor do investimento inicial. A influência da quantidade de resíduos traduz-se ultimamente em potência instalada, o que faz variar os valores de investimento inicial.

[€] 600.000

500.000

400.000

300.000 Investimento Inicial

200.000

100.000

0 80 90 100 110 120 130 140 150 160 % de Potência Instalada

Figura 28 - Influência da variação da potência instalada no valor do investimento inicial

Pela Figura 28 observa-se um aumento do valor do investimento inicial (para um aumento da potência instalada), que traduz um aumento do custo de aquisição dos equipamentos constituintes da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, devido a um aumento da quantidade de resíduos valorizados. Estando a variação do investimento inicial contabilizada, o próximo passo será quantificar a variação das despesas e das receitas decorrentes da exploração da unidade de DA. A importância desta variação prende-se na necessidade de se perceber a influência que o aumento da valorização tem nas despesas de manutenção e operação, assim como nas receitas provenientes da venda de energia térmica e eléctrica. Uma vez mais, a potência instalada serve de proxy à variação de resíduos valorizados na unidade e na Figura 29 apresenta-se a variação da despesa de operação e manutenção e da receita. Tendo estes valores, de despesa e de receita, e fazendo a avaliação económica de acordo com o Anexo 1 obtém-se a variação do VAL do projecto de investimento de acordo com o referido anteriormente. A Figura 29 foi obtida assumindo que o consumo energético próprio da unidade de digestão anaeróbia é proporcional à potência instalada. Na Figura 29 é também notória a influência mais acentuada da variação da potência instalada no valor da receita, em comparação com a despesa. Esta influência também beneficia o VAL, aumentado mais que os outros parâmetros, quando a potência instalada aumenta.

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[€] 120.000

100.000

80.000

60.000 Despesa Receita 40.000 VAL

20.000

0 80 90 100 110 120 130 140 150 160 % de Potência Instalada

Figura 29 - Influência da variação de potência instalada na despesa, receita e VAL do projecto

Para que a análise fique mais completa e avançando no raciocínio da Figura 29, é útil analisar a sensibilidade que o VAL tem à variação das despesas e das receitas e consequentemente a sensibilidade ao risco a que o projecto está afectado. A Figura 30 permite a analise da variação do VAL do projecto aquando da ocorrencia de uma variação nas despesas ou nas receitas face ao inicialmente previsto. O valor base das receitas/despesas é representado na Figura 30 com o valor de 100 %. Assumiu-se para esta anállise que as variações das receitas são independentes das despesas.

VAL [€] Influência da Variação das Receitas/Despesas Calculadas 150.000

100.000

Receitas 50.000 Despesas

0 80% 85% 90% 95% 100% 105% 110% 115% 120%

-50.000 Receitas/Despesas

-100.000 Figura 30 - Influência da variação das receitas/despesas calculadas

Como se pode observar pela Figura 30, as receitas são mais sensíveis a alterações, evidência disso é o maior declive da recta que traduz a influência da variação das receitas no VAL. Verifica-se, para uma operação constante da unidade de digestão anaeróbia proposta para a freguesia dos Olivais, Lisboa, que a partir de uma redução de, aproximadamente 6 % das receitas calculadas inicialmente, o projecto não apresenta uma avaliação favorável à

68 sua implementação. Do lado das despesas apenas quando o aumento das despesas é de 20 %, ou mais, em relação ao definido inicialmente dão ao projecto um VAL nulo. Já na Figura 31 as variações são influenciadas pelas actualizações anuais dos valores das tarifas aplicadas à energia e à taxa de gestão de resíduos, para as receitas, e pelas actualizações anuais dos custos de material consumível e mão-de-obra, por parte das despesas. Os valores das receitas e despesas para o primeiro ano são os valores determinados no cenário base.

VAL [€] Influência do Crescimento Anual da Receita/Despesa 700.000 600.000 500.000 400.000 300.000 Receitas 200.000 Despesas 100.000 0 -10% -5% 0% 5% 10% -100.000 -200.000 Variação das Receitas/Despesas ao ano -300.000 Figura 31 - Influência do crescimento anual da receita/despesa

Na Figura 31 também se verifica uma maior sensibilidade das receitas a alterações. A análise representada neste gráfico foi feita para a avaliar os casos em que de ano para ano as receitas ou as despesas crescem ou decrescem a um ritmo constante. Para um crescimento anual da despesa na ordem dos 2,5 % o projecto de investimento aqui analisado passa a ter um VAL negativo. Por parte das receitas, uma diminuição de, aproximadamente, 1,5 % ao ano também garante um VAL negativo ao projecto. Estas duas últimas análises evidenciam um risco relativamente elevado para este projecto de investimento.

69

Conclusões

A digestão anaeróbia como forma de valorização de resíduos sólidos urbanos ainda se encontra em desenvolvimento em Portugal existindo unidades em fase de construção. Contudo estas unidades têm geralmente uma elevada dimensão e visam a valorização dos RSU de forma centralizada. Esta solução foi a resposta Portuguesa aos diversos documentos legais que têm sido preparados em Portugal e na União Europeia, que têm como objectivo diminuir as quantidades de resíduos, orgânicos e não só, depositados em aterro. Centrais de digestão anaeróbia de pequenas dimensões descentralizadas existem apenas em pequenas indústrias agro-pecuárias e à escala laboratorial, verificando-se a inexistência de unidades da tipologia estudada neste documento. Na presente dissertação foi realizada a análise de viabilidade técnica da implantação de um digestor anaeróbio para valorização da fracção orgânica de resíduos sólidos urbanos através de uma unidade de cogeração a ser instalada na freguesia dos Olivais, Lisboa, e uma análise da viabilidade financeira da mesma. A partir da quantidade de resíduos orgânicos recolhidos nos últimos anos na freguesia e nas previsões de recolha para os próximos anos conclui-se que é possível garantir uma média diária de cerca de 3280 kg de resíduos. Para valorizar esta quantidade de resíduos propõe-se uma unidade de digestão anaeróbia com um tempo de retenção hidráulico de 35 dias, funcionando em regime contínuo numa gama de temperatura mesofílica (35 ⁰C), por via húmida. Esta solução possibilita a produção diária de 579,9 m3 de biogás a ser posteriormente utilizado como combustível numa unidade de co-geração para transformação da energia química em energia eléctrica e térmica. A solução apresentada garante o cumprimento da legislação específica comunitária, que regulamenta as unidades de digestão anaeróbia da fracção orgânica dos RSU, presente no Regulamento n.º 1774/2002, de 3 de Outubro. Em termos energéticos a unidade apresenta um balanço positivo, evidenciando o autoconsumo energético, eléctrico e térmico, inferior ao valor da energia total obtida pela unidade de co-geração. O valor deste autoconsumo, é de aproximadamente, 17 % e 22 % para as energias eléctrica e térmica respectivamente. Para estes parâmetros verifica-se um balanço energético mais favorável da unidade aqui estudada em comparação com a unidade centralizada da Valorsul (ETVO) que tem de autoconsumo 50 % da energia produzida. A capacidade da unidade estudada possibilitaria que as necessidades energéticas, de electricidade, de 108 habitações na freguesia dos Olivais, Lisboa, seriam suprimidas anualmente. A solução apresentada revelou-se atrativa para um potencial investimento privado. Este resultado é apoiado pelos indicadores financeiros como o VAL, a TIR e um PRI com os valores de 295.942 €, 18,5 % e 7 anos respectivamente. Estes indicadores apresentam valores favoráveis podendo encorajar muitos investidores. É tmabém um investimento perfeitamente viável para uma entidade pública como a junta ou a própria Câmara Municipal, que poderiam nomeadamente recorrer a fundos comunitários de apoio às energias alternativas. De acordo com a análise o investimento previsto seria coberto antes do fim de vida útil previsto para a instalação (20 anos). A partir da informação transmitida pela Figura 29, é possível concluir que para valores cada vez maiores de potência instalada o projecto de investimento torna-se cada vez mais atractivo por garantir maiores retornos,

70 pelo valor crescente do VAL, mesmo quando o valor do investimento inicial e as despesas de manutenção e operação crescem. Estes valores podem justificar em parte a apetência dos investidores, por maiores instalações de digestão preterindo as soluções descentralizadas. Não são aqui, no entanto contabilizados todos os custos associados ao transporte de resíduos necessários para alimentar esse tipo de instalações. Da análise de sensibilidade também é possível concluir que o alto investimento inicial por unidade de resíduos a valorizar de unidades de DA de pequena dimensão é o factor que mais contribui para o rendimento financeiro que estas apresentam. Assim sendo uma hipótese para tornar este meio de valorização de resíduos bastante atractiva seria a diminuição dos custos de investimento inicial, fosse por subsídios comunitários ou pela diminuição do custo dos equipamentos constituintes das unidades de digestão anaeróbia. Também se verificou que a sensibilidade ao risco deste projecto é relativamente elevado, e que tal podia ser melhorado por uma diminuição da despesa ou mais facilmente pelo aumento da receita. Este aumento da receita poderia ter origem numa tarifa a cobrar por tonelada de resíduos recebidos para valorização, em concordância com o que é feito em centrais de DA centralizadas como a ETVO da ValorSul. Mais do que uma oportunidade de negócio, o estudo aqui apresentado é um exemplo de que a descentralização é viável e tem vantagens em termos energéticos, não sendo esta a única hipótese que traria este benefício. Outras soluções poderão ser estudadas como a venda directa do biogás para uso particular ou comercial. A implementação desta unidade na freguesia dos Olivais, Lisboa, poderia beneficiar de um estudo para a localização da mesma e traria consigo uma solução para a crescente problemática da gestão de resíduos, neste caso a fracção orgânica dos resíduos sólidos urbanos. De futuro será pertinente fazer uma análise de ciclo de vida a unidades de digestão anaeróbias descentralizadas comparando com soluções centralizadas em termos de emissões de CO2 (nomeadamente os resultantes do transporte dos resíduos) e outros gases que promovem o efeito de estufa para uma melhor compreensão do impacte que estas soluções poderão ter no ambiente.

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76

Anexo 1

0

8511

20

12954

65346

56835

21558

78394

86905

18965

295942

105870

0

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56835

21558

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282988

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0

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15229

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21558

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268942

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21558

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253713

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0

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16

17905

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0

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18965

219295

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0

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56835

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199881

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0

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178831

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0

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24747

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18965

156008

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0

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11

26833

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18965

131260

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0

10

30425

68334

48958

18570

67528

19376

86905

18965

104427

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0

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74002

32989

68334

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67528

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0

362174

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OM

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4,50%

3,50%

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Resultados Líquidos Resultados

Impostos

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Receitas Investimento Ano

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