Terra De Gigantes Antonio Biondi E Cristina Charão Jornalistas, Membros Do Intervozes-Coletivo Brasil De Comunicação Social
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Janeiro 2008 Revista Adusp TERRA DE GIGANTES Antonio Biondi e Cristina Charão Jornalistas, membros do Intervozes-Coletivo Brasil de Comunicação Social A concentração dos meios de comunicação no Brasil segue como um dos pontos mais vulneráveis da nossa já frágil democracia. A mídia grande é o principal partido político no Brasil contemporâneo. Enquanto os grupos do setor se organizam para ampliar o domínio hoje exercido, empresas estrangeiras buscam formas de disputar o mercado. Sobrará espaço para sociedade e Estado desenharem uma agenda voltada ao interesse público? Revista Adusp Janeiro 2008 oucas famílias domi- capital, avançando e retrocedendo te — a não interferir no modelo da nam a comunicação no com os mercados. Empresas que, cla- TV aberta; ou mesmo a não-regu- Brasil, enquanto mi- ro, lidam com um capital simbólico lamentação de pontos básicos para lhões se calam. A co- que certamente multiplica seu peso o fortalecimento e aproveitamento municação é um dos na economia e na política nacionais. de conteúdo regional para o setor. rincões do país onde a Um capital que, muitas vezes, é usa- Neste reescrever constante das Pdemocracia ainda não chegou. A mí- do para burlar e, outras tantas vezes, regras, pelo menos seis dos oito dia grande é o principal partido po- reescrever as regras mercadológicas. grandes conglomerados de mídia do lítico no Brasil contemporâneo. As Alguns exemplos mais recen- Brasil mantêm-se, também, entre os imagens utilizadas para demonstrar tes de como as grandes empresas maiores grupos empresariais do país, a concentração do setor de comuni- midiáticas defendem a todo custo por receita. A edição 2007 de “Valor cação no país são muitas e a maioria seus negócios, exemplos restritos ao Grandes Grupos”, anuário do jor- delas, infelizmente, corretas. nal Valor Econômico, lista os grupos A realidade brasileira, hoje, é Sílvio Santos (na 97ª posição), Abril de que os grupos Globo, SBT, Re- (105ª), RBS (178ª) e Estado (183ª). cord, Abril, Folha, Estado, Rede Os grandes Outros dois gigantes, Organizações Brasil Sul (RBS) e Bandeirantes grupos passaram por Globo e Grupo Folha — exatamen- exercem um amplo domínio do te os que compartilham a proprieda- setor, numa clara configuração reestruturações forçadas de de Valor Econômico — não são de oligopólio. A concentração pelo endividamento, que veio citados no anuário, e conseguir fortalece esses grupos politi- informações sobre o faturamen- camente e afeta diretamente a ora de aventuras no ramo da to de ambos não é tarefa fácil, democracia no país — fenôme- telefonia (Grupo Estado e RBS), apesar de se organizarem como nos comumente analisados por sociedades anônimas (S/A), o que especialistas. ora da confiança exagerada teoricamente exige transparência Para se entender como tal no crescimento do mercado nos balanços financeiros. quadro é hoje possível (e como Só foi possível localizar infor- é possível alterar tal quadro), é da TV por assinatura e mações da Folha pelo noticiário. fundamental compreender como os Internet banda larga Às vezes, do próprio grupo. Já a principais grupos de comunicação Globo, apesar de fechar o acesso do país se organizam. Os setores (Globo e Abril) a seus relatórios financeiros, foi da economia por onde avançam os mais solícita e enviou seu último interesses de cada empresa, seus só- balanço. cios, os desdobramentos regionais A receita bruta da Globo Comu- de maior relevância. A atuação dos campo da comunicação: a escolha nicação e Participações (Globopar), grupos em um cenário de conver- do padrão japonês de TV Digital, holding que controla a maior parte gência tecnológica. E de que for- garantindo a permanência do mo- dos negócios das Organizações Glo- ma abocanham as verbas públicas delo de negócios da TV aberta por bo (incluindo a TV, jornais, rádio e no Brasil, ao mesmo tempo em que vários anos; a aprovação, em 2002, portais da internet) e tem partici- impõem agendas aos governos, re- da proposta de emenda à Constitui- pação em outros negócios (notada- ceosos de sua força e supostamente ção que permitiu o ingresso de ca- mente a TV por assinatura), somou dependentes de seu apoio. pitais estrangeiros nas empresas até R$ 6,8 bilhões em 2006. Este valor Em outras palavras, não se pode um limite de 30%; a não obrigato- colocaria o grupo na 36ª posição do deixar de pensar nos grupos de mídia riedade da Classificação Indicativa ranking dos maiores grupos empre- como empresas, jogando o jogo do na televisão, de forma — novamen- sariais do país. Janeiro 2008 Revista Adusp Já sobre o Grupo Folha, dono bilhão — um dos 20 maiores do jornal Folha de S. Paulo e do da economia nacional nesse portal e provedor UOL, as infor- ano, não por acaso o mesmo mações são mais difusas. Quando em que o grupo apresentou a anunciou, no início de 2005, a fusão maior margem de lucro líqüi- de todas as suas operações em uma do dentre todas as empresas só empresa, a Folha-UOL S.A., a brasileiras: 92%, segundo o família Frias, dona do grupo, afir- anuário “Valor 1000”, do jor- mava que estava consolidando o nal Valor Econômico, edição “segundo maior grupo de mídia do 2006. Em 2006, o lucro bruto país”, com faturamento de R$ 1,3 da Globopar foi de R$ 2,8 bilhão. Em 2006 o UOL faturou, bilhões. sozinho, R$ 634 milhões. Record e Bandeirantes acabam por não ser citados nos anuários dos “grandes” do empresariado. Falar em TV O cenário das mídias alterou-se, mas a concentração continua Porém, vale destacar que a própria As saídas encontradas pelas gran- por assinatura no Record admite ter alcançado um des das comunicações redesenharam faturamento de R$ 1 bilhão em Brasil, hoje, implica citar o cenário das mídias no Brasil. Não 2006, estimando um acréscimo a Embratel/Telmex de Carlos a ponto, no entanto, de modificar de 36% em 2007. A Bandeiran- a forma ultra-concentradora com tes teria obtido, em 2006, algo Slim (sócia da Net Serviços), que se organizam os grupos. próximo de R$ 250 milhões. a Sky/DirecTV de Rupert As novas tintas que mudaram Ser tão grande pode ser um o quadro geral vieram de gru- problema. E até dois anos atrás, Murdoch e a Telefónica de pos estrangeiros de mídia ou das realmente foi. Neste período, España (TVA). Mas os sócios grandes operadoras de telecomu- praticamente todos os grandes nicações. Em geral, até 2004 os ne- grupos passaram por reestrutura- e ex-sócios brasileiros vão gócios dos grandes grupos estavam ções forçadas pelo endividamento muito bem, obrigado apoiados ou sobre capitais próprios, excessivo. Dívidas que vieram ora ou sobre fundos de investimentos de aventuras no ramo da telefonia, internacionais (e alguns nacionais) como nos casos do Grupo Estado e cuja participação no bolo de acionis- da RBS; ora da confiança exagera- tas, contudo, era minoritária. da no crescimento dos mercados de Foi com o time montado desta TV por assinatura e Internet banda O anuário “Valor Grandes Gru- forma que os grupos de mídia bra- larga, casos da Globo e da Abril. E pos”, edição 2007, registra que o sileiros tentaram avançar sobre o valores que se viram multiplicados Grupo Estado obteve a melhor ren- setor da infra-estrutura de comuni- quando a política cambial do gover- tabilidade líqüida sobre o patrimô- cação a partir de meados da década no FHC ruiu, desvalorizando o real nio entre as 40 maiores organiza- de 1990. O foco, já naqueles tem- frente ao dólar. ções empresariais do setor de ser- pos, era a convergência dos serviços Os conglomerados midiáticos viços (que é parte do conjunto dos de comunicação e de telecomuni- encontraram saídas e os resultados 200 maiores grupos da economia cação, resultado dos processos de que colhem são significativos. Em brasileira, listados pela publicação). digitalização dos conteúdos. Pelas 2005 as Organizações Globo obti- Já a RBS auferiu o 20º maior lucro razões já apontadas — excesso de veram um lucro líqüido de R$ 1,99 líqüido no mesmo setor. euforia e crise cambial — os tradi- 8 Daniel Garcia Revista Adusp Janeiro 2008 para a Internet (lançou recen- e CNT — dirigiam diretamente 47 temente uma série interativa emissoras e, indiretamente, a atua- pelo sítio Kzuka). A Record ção de 249 emissoras de TV dos 138 investiu pesadamente em um grupos que figuram como afiliados centro de produção audiovisu- regionais. A estas seis redes de TV al no Rio de Janeiro. estão vinculados outros 372 veículos, A Abril, por enquanto, foi entre rádios, jornais e revistas. o único grupo a lançar mão Uma nova versão do estudo es- de sociedades internacionais tá sendo preparada pelo Epcom, para reforçar sua posição co- mas pode-se supor que, de lá para mo produtora de conteúdo. cá, as variações foram internas ao Em 2006, 30% do capital da quadro. A agressividade da Record controladora do conglomera- de Edir Macedo em sua estratégia do foi vendido para o grupo de expansão regional pode mudar Naspers, da África do Sul. A algo da correlação de forças entre O cenário das mídias alterou-se, mas a concentração continua Folha ensaiou o mesmo movimento: os grupos, mas não há novos atores, cionais grupos brasileiros de comu- no início de 2005, chegou a anunciar trazendo novos conteúdos ou forças nicação recuaram nesta estratégia. a fusão entre as duas grandes empre- políticas para este jogo. Já não é possível, por exemplo, sas do grupo, a Folhapar e a UOL Nem mesmo nos setores não atre- falar em TV por assinatura no Brasil S.A., visando a entrada de capital da lados às limitações da distribuição de sem citar a Embratel/Telmex de Car- Portugal Telecom. A operação não canais de rádio e TV pode-se falar los Slim (sócia da Net Serviços), ou se concretizou e a tele portuguesa em mudanças significativas.