A Frelimo, O Marxismo E a Construção Do Estado Nacional 1962-1983
Total Page:16
File Type:pdf, Size:1020Kb
A FRELIMO, O MARXISMO E A CONSTRUÇÃO DO ESTADO NACIONAL 1962-1983 Luís de Brito A FRELIMO, O MARXISMO E A CONSTRUÇÃO DO ESTADO NACIONAL 1962-1983 A FRELIMO, O MARXISMO E A CONSTRUÇÃO DO ESTADO NACIONAL 1962-1983 Luís de Brito www.iese.ac.mz TÍTULO A Frelimo, o Marxismo e a Construção do Estado Nacional 1962-1983 AUTOR Luís de Brito EDIÇÃO IESE COORDENAÇÃO EDITORIAL KAPICUA MAQUETIZAÇÃO ELOGRÁFICO FOTOGRAFIA DA CAPA Ricardo Rangel – CDFF IMPRESSÃO CIEDIMA, LDA NÚMERO DE REGISTO 9994/RLINICC/2019 ISBN 978-989-8464-44-6 TIRAGEM 500 exemplares Maputo, 2019 ENDEREÇO DO EDITOR Avenida do Zimbabwe, 1214, Maputo-Moçambique [email protected] www.iese.ac.mz Tel.: +258 21 486 043 Nota prévia O presente livro é uma versão ligeiramente editada da tese de doutoramento, especialida- de de Antropologia e Sociologia do Político, submetida pelo autor, em 1991, na Universidade de Paris VIII, com o título “A Frelimo e a Construção do Estado Nacional em Moçambique – o sentido da referência ao marxismo (1962-1983)”. Embora o texto tenha sido redigido há trinta anos, a linha de análise nele estabelecida mantém-se ainda hoje válida em termos históricos e, ao mesmo tempo, ajuda a compreender o rumo que tomaram os posteriores desenvolvimentos políticos, sociais e económicos no país. Índice Introdução 9 O Moçambique colonial 13 Dependência colonial e integração regional 13 Exportação de mão-de-obra e economia de serviços 15 A estrutura da economia colonial 20 O Estado Novo 22 Os limites do “nacionalismo económico” 22 Trabalho forçado e culturas obrigatórias 25 Um sistema social bloqueado 27 A formação da Frelimo 31 A constituição da Frelimo 32 No norte, os Makonde 38 No sul, os Assimilados 41 Anticolonialismo e nacionalismo 44 A luta pela independência 47 Que luta? 47 A preparação da guerra 51 Uma guerra difícil 53 Lutas de poder 55 As “Zonas Libertadas” 62 A Frelimo, o Marxismo e a Construção do Estado Nacional – 1962-1983 7 Marxismo e libertação 67 A CONCP 68 A revolução 71 O mal-entendido 74 Um discurso e!caz 77 Moçambique independente: o novo espaço político 79 Que independência? 80 A Frelimo no poder 82 O novo campo político 87 Que marxismo? 90 Os militares 96 As cidades 99 A cidade no discurso da Frelimo antes da independência 100 “O Povo Organizado” 102 A cidade, espaço privilegiado do poder 104 A “Operação Produção” 110 O campo 115 A política de aldeamento 115 O Estado e a economia rural 123 O campesinato “cativo” 133 Conclusão 137 Anexo I – Tabelas Estatísticas 147 Bibliogra!a 151 1. Livros e artigos publicados 151 2. Trabalhos e documentos não publicados 155 3. Documentos da Frelimo e do Governo 158 A – Publicados 158 B – Não publicados 161 4. Estatísticas 164 5. Jornais e revistas 164 8 A Frelimo, o Marxismo e a Construção do Estado Nacional – 1962-1983 Introdução A evolução política da Frelimo desde 1984, data da assinatura do acordo de Nkomati com a África do Sul, das primeiras tentativas de negociar com a Renamo o !m da guerra em Moçambique e dos primeiros contactos do governo moçambicano com o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, criou um certo embaraço aos numerosos investigadores que vinham analisando e teorizando a “transição socialista” em Moçambique1. De facto, como explicar a falência da “experiência socialista” moçambicana, a aplicação de um “programa de ajustamento estrutural” a partir de 1987, o abandono do “marxismo-leninismo” no 5º Congresso da Frelimo (1989) e a elaboração de uma nova Constituição (1990) prevendo o estabelecimento de um sistema político multipartidário? Hoje, torna-se claro que as explicações destes autores sobre as di!culdades que a Frelimo teve que enfrentar desde a independência, invocando por um lado factores externos como a situação internacional desfavorável e mais particularmente a acção de desestabilização econó- mica, política e militar promovida pelo regime sul-africano e, por outro lado, factores inter- nos como os “erros” da Frelimo, particularmente em termos de política rural, mas também o surgimento de uma camada burocrática usando a sua posição dentro do aparelho estatal para bloquear a acção da liderança revolucionária do partido, não são su!cientes para dar uma interpretação consistente da realidade do processo moçambicano. Sem entrar nos detalhes da crítica dessas obras, muitas vezes muito ricas do ponto de vista da informação que contêm, sublinhamos aqui apenas um aspecto que as mesmas têm em comum: são formulações que seguem e reproduzem as análises presentes nos textos o!ciais 1 Ver, por exemplo, os artigos recentes de John Saul (1990) e Dan O’Meara (1991). Para uma revisão dos principais trabalhos sobre Moçambique publicados na década de 1980, ver Penvenne (1985) e Cahen (1988a e 1988b). Introdução 9 da Frelimo. Por outras palavras, esses autores – marxistas, engajados e solidários da Frelimo2 – assumem as construções e a ideologia do discurso o!cial, os mitos sobre os quais esse discurso assentava, participando assim do trabalho de legitimação próprio de qualquer discurso de po- der3. A simpatia que sentiam pelos revolucionários moçambicanos que tinham lutado contra o colonialismo português e seus aliados ocidentais, e que depois se engajaram na “construção do socialismo” numa região da África onde as potências brancas da Rodésia e da África do Sul eram dominantes – uma luta que merecia ser apoiada – não só os impedia de ter um olhar crí- tico sobre o processo moçambicano, como não os ajudava a desenvolver uma atitude de vigi- lância cientí!ca su!ciente para evitar as armadilhas do discurso o!cial. Em contrapartida, há muitos outros trabalhos (geralmente não publicados) sobre tópicos que, apesar de não envol- verem directamente uma interpretação sobre a natureza da experiência histórica da Frelimo, fornecem informações importantes sobre os diferentes aspectos da realidade económica e social moçambicana. Nesta categoria, conta-se um grande número de relatórios de pesquisa produzidos pelo Centro de Estudos Africanos (CEA) da Universidade Eduardo Mondlane4. Para além disso, ainda no CEA, foram realizadas investigações colectivas e individuais sobre a história da Frelimo e a luta armada. Estes trabalhos, embora baseados numa abordagem que não questiona o discurso o!cial, trazem, no entanto, novas informações sobre o período da luta pela independência, material muito útil desde que inserido numa problemática outra que a imposta pela versão o!cial da história da Frelimo e pela experiência das “zonas libertadas”5. Finalmente, entre os poucos trabalhos críticos, que não fazem parte da problemática domi- nante da “transição socialista”, mencionamos os de Christian Ge"ray e Michel Cahen, que abriram novos caminhos na análise da história recente de Moçambique: o primeiro com o seu estudo sobre a organização social das comunidades camponesas de Eráti (província de Nampula) prolongado por uma pesquisa na mesma região sobre a dinâmica local da guerra, e o segundo com uma série artigos de análise sobre a natureza do poder moçambicano. Neste estudo, analisamos o signi!cado da referência ao marxismo na luta de libertação e na construção do Estado em Moçambique, sendo a hipótese inicial que a Frelimo era – e permaneceu após a independência um movimento fundamentalmente nacionalista. Assim, a questão de analisar qual foi o papel do marxismo na experiência da Frelimo. Para responder a 2 A maioria deles trabalhou em Moçambique como cooperantes após a independência. 3 Esta corrente é representada, entre outros, por autores como Allen Isaacman, Barry Munslow, John Saul, Christine Verschuur, Marluza Lima, Philippe Lamy, German Velasquez, Joseph Hanlon, Bertil Egero, Dan O’Meara. 4 Esses trabalhos constituem uma parte importante da numerosa “literatura cinzenta” que existe em Mo- çambique. Ver na bibliogra!a a secção sobre as obras e documentos não publicados 5 Ver na bibliogra!a os textos da O!cina de História / CEA (incluindo o boletim Não Vamos Esquecer!), assim como os de João Paulo Borges Coelho, Aquino de Bragança e Jacques Depelchin, Isabel Casimiro, Teresa Cruz e Siva, José Guilherme Negrão e Alexandrino José. 10 A Frelimo, o Marxismo e a Construção do Estado Nacional – 1962-1983 esta questão, decidimos concentrar a atenção no período que vai desde a criação da Frelimo, em 1962, até ao seu 4º Congresso, em 1983. O uso desta cronologia, embora não correspon- da exactamente ao período durante o qual a Frelimo se reivindicou o!cialmente do marxis- mo-leninismo (1977-1989), justi!ca-se por três motivos: em primeiro lugar, não podemos compreender como e por que razão a Frelimo chegou ao marxismo sem estudar o processo da sua formação e os con#itos por que passou durante os primeiros anos da sua existência; em segundo lugar, porque o marxismo esteve de facto presente na orientação da Frelimo muito antes de ser reivindicado como doutrina o!cial, em 1977; !nalmente, porque o abandono do “marxismo-leninismo” pela Frelimo só ocorreu o!cialmente no 5º Congresso (1989), quando o país já estava em bancarrota desde 1984 e o partido já tinha embarcado no caminho da libe- ralização económica e solicitado a adesão de Moçambique ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial. Na nossa abordagem, rejeitamos a análise baseada na simples oposição entre discurso e prática, preferindo uma análise da função social do discurso marxista na história recente de Moçambique, a !m de compreender a dinâmica da formação e exercício do poder inde- pendente. Para isso, o estudo desenvolve-se em três linhas principais: por um lado, tentamos mostrar quais eram as condições sócio-históricas particulares em Moçambique que levaram o grupo de liderança da Frelimo a produzir um discurso político cuja referência teórica era o marxismo; por outro lado, exploramos, para além das representações o!ciais, qual o conteúdo real da política seguida pela Frelimo em nome do marxismo e da construção do socialismo; por !m, analisamos a evolução dos con#itos internos entre diferentes grupos, como o grupo dirigente se formou durante essas lutas e por que meios construiu a sua hegemonia no seio do movimento independentista e, depois, no Estado independente.