1 a Burla Do Gênero: Cacilda Becker, a Mary Stuart De
1 A burla do gênero: Cacilda Becker, a Mary Stuart de Pirassununga. Heloisa Pontes (profa. do Departamento de Antropologia da Unicamp e pesquisadora do Pagu, Núcleo de Estudos de Gênero) I- Corpo, nome, marca, gênero. Um dos domínios sociais e simbólicos mais intrigantes na circunscrição das relações de gênero diz respeito às conexões entre corpo, marca, nome e renome. De acordo com a literatura antropológica disponível sobre o assunto, o processo de renomeação, quase sempre associado a situações rituais, é um dos marcadores sociais por excelência da aquisição de prestígio e de status nas sociedades não ocidentais. Marcados nos corpos, esses ritos sinalizam, sobretudo para os homens que deles participam, a transição para a maioridade e o avanço na “carreira” social1. Essa conexão entre corpo, marca e gênero tem suscitado interpretações distintas a respeitos dos significados envolvidos nos rituais que a enfeixam: ritos de passagem, na acepção de Van Gennep, ou de instituição, como mostra Bourdieu. Assentados na exclusão e na violência simbólica, eles visam separar, segundo o sociólogo francês, “aqueles que já passaram por eles daqueles que ainda não o fizeram e, assim instituir uma diferença duradoura entre os que foram e os que não foram afetados”2. Uma versão ligeiramente modificada e com fotos das atrizes Cacilda Becker e Maria Della Costa foi recentemente publicada na revista Tempo Social. Revista de sociologia da Usp, vol.16, n.1, 2004, pp.231-262. 1 Sabemos, por exemplo, a partir da documentação deixada pelos viajantes e cronistas dos séculos XVI e XVII, brilhantemente analisada por Florestan Fernandes, que, para os homens da sociedade Tupinambá, fazer a guerra, sacrificar ritualmente os prisioneiros, ganhar nome e renome eram a face e contra-face de um mesmo fenômeno e a forma suprema de “graduação” social.
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