Luigi Fernandes é jornalista, escritor, historiador e pesquisador. Trabalha também como ghostwriter, orientador de estudos e edita o blog “Entre Fatos”.

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As fotos desse livro têm função apenas de registro histórico e foram reproduzidas do Youtube.

As publicidades reproduzidas neste livro também têm apenas caráter histórico e ilustrativo.

“Porque nada tenemos,

lo haremos todo”

Carlos Dittborn Pinto

ÍNDICE

Apresentação A Copa do Mundo 1930 – Uruguai 1934 – Itália 1938 – 1950 – Brasil 1954 – Suíça 1958 – Suécia 1962 – 1966 – Inglaterra 1970 – México 1974 – Alemanha Ocidental 1978 – Argentina 1982 – Espanha 1986 – México 1990 – Itália 1994 – Estados Unidos 1998 – França 2002 – Japão e Coreia do Sul 2006 – Alemanha 2010 – África do Sul 2014 – Brasil 2018 – Rússia

Apresentação

O clima de Copa do Mundo contagia até quem não gosta de futebol. Essa frase não é minha, nem saberei dizer realmente quem a formulou pela primeira vez, mas é verdadeira. Principalmente em se tratando de Brasil. “As Copas, entre outros fatos” nasceu justamente do fascínio que tudo o que envolve a Copa do Mundo sempre me causou. No mês de Copa do Mundo tudo é diferente. Pode-se afirmar que não é apenas futebol, é Copa do Mundo! A primeira vez que entendi que havia algo de “errado”, aliás, de muito certo, em casa, nesse período, foi logo na minha primeira Copa, a de 1974. O pai tirou a mesa de refeições da cozinha para colocá-la na sala, só para não perder a transmissão do jogo do Brasil naquele domingo, bem no horário do almoço. Foi algo delicioso almoçar tendo a Copa como companheira. Sim, já entendi que era algo diferente. O amendoim torrado da avó, a pipoca da mãe, refrigerante na geladeira mesmo quando não era domingo, o pai e o avô tomando uma cerveja. Era festa. Sempre foi festa. Em 1978, no domingo que a seleção brasileira enfrentou a Argentina, o pai saiu como um maluco atrás de uma bandeira do Brasil depois que o avô chegou do mercadão de Jaú sem o objeto que fora buscar. “Como não tem?” E ainda achamos uma pendurada num varal numa avenida. O vendedor já estava indo embora, mas deu tempo. Queria de pano, só tinha de plástico. Queria grande, só encontramos uma pequena. Queria a vitória do Brasil, veio o empate. Queria o título, veio o terceiro lugar. A Copa é assim. O futebol é uma lição de vida. Quatro anos depois tinha tudo para comemorar meu primeiro título mundial, afinal em 1970 eu comemorei no ventre da mãe, que saíra pelas ruas de Jaú no Gordini cheio de bandeirinhas do Brasil, depois dos 4 a 1 sobre a Itália naquele 21 de junho. De comemoração, portanto, eu entendia. E aquelas bandeirinhas, que enfeitaram o Gordini, a mãe achou guardada em cima do guarda-roupa, naquela segunda-feira, 05 de julho de 1982, quando o Brasil enfrentou a Itália de , no estádio Sarriá, em Barcelona. O fato de ser a Itália, como em 1970, e a seleção mágica como a de Pelé, animou a mãe a dar aquelas bandeirinhas de papel – “guardadas para quando você fosse grande” - onde o pai anotara a ficha técnica da finalíssima de 1970, para que eu pudesse comemorar com o espírito do ano em que nasci. O Bambino D´Oro não deixou. A Copa é assim. O futebol é uma lição de vida. Imaginei que nunca a tristeza da perda da Copa do Mundo de 1982 fosse superada por outra no futebol, falando apenas em Copa do Mundo, até que chegou 2014. Não, não foi a derrota para a Alemanha. Uma ironia do destino fez a Copa me pregar uma peça que, entenda, eu não merecia e muito menos esperava. Eu, que vivo e respiro futebol desde o ventre da mãe, tive a tristeza de não conseguir entender o que é o clima de Copa do Mundo ao vivo, no estádio. Eu merecia ter assistido pelo menos um jogo. Qualquer um. Minha geração sonhou que o Brasil sediasse um mundial. A Copa veio, passou a menos de 100 km da minha casa, mas eu não tive a menor condição de encontrá-la, ao vivo, de sentir na pele a sua magia, a atmosfera de um estádio onde várias línguas e culturas convergem para a alegria de um gol, de uma jogada, de uma defesa. Eu, que cresci em estádios de futebol, não pude entrar numa arena de Copa. Na sonhada Copa do Mundo da minha geração, eu não fui convidado. Como diria um italiano, “una delusione!”. Políticos com outros intere$$e$ jamais deveriam cuidar do futebol. Paciência. A Copa é assim. O futebol é uma lição de vida. Eu o amo ainda mais. É justamente da curiosidade para entender se a Copa do Mundo sempre causou esse fascínio que nasceu esse livro, que não tem a pretensão de transcrever fichas técnicas, escalações, gols etc. Tem a intenção de transmitir o clima da Copa do Mundo através da visão de um genuíno torcedor brasileiro. Como será que as outras gerações acompanhavam a Copa? Quais as notícias daquela época? O que passava nos cinemas? É isso que tento oferecer a você nesse livro. A ideia do livro é dar um panorama sem ser enfadonho, uma fotografia, um flash, de cada época, sempre tendo a Copa e a participação da seleção brasileira como o fio condutor. Espero que você faça uma viagem no tempo como eu fiz. Boa leitura!

À minha esposa Viviane, minha Vida em todos os sentidos. Sem você esse livro não existiria. Sinta-se culpada. Muito culpada! João, Pedro, Gabriela, filhos são sempre uma razão para praticarmos o ato de ensinar e orientar. Aqui vai mais uma dica, que aprendi bem cedo: o futebol é uma lição de vida. Uma deliciosa forma de aprender. Aproveitem! Babi, Melke, minhas companheiras adoráveis... Kiko, Minnie e Pepa, vocês também me acompanham, sinto vocês juntos. Pai, mãe, avô e avó, meu eterno obrigado. A você, leitor, que satisfação!

E surgiu o futebol, os clubes, as seleções, as competições, a Copa do Mundo!

A Copa do Mundo

Desde a fundação da Federação Internacional de Futebol Association (Fifa), em 1904, a intenção da realização de um campeonato mundial de futebol sempre foi manifestada. Com o final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) cresceu esse sentimento, principalmente no presidente da Fifa, o francês Jules Rimet, que entendia que o futebol poderia aproximar as nações. Ele assumiu a presidência em 1921, foi o terceiro dirigente da entidade, e desde então passou a arquitetar a realização do mundial.

Naquela época o futebol tinha nas Olimpíadas a sua competição mais importante. A Fifa considerava o torneio de futebol olímpico como o mundial do esporte. Portanto, o país que conquistava o ouro olímpico recebia o status de campeão mundial de futebol.

A partir de 1914, a Fifa reconheceu oficialmente o torneio olímpico como o mundial de futebol. Portanto, além de ser referência mundial, passava a também ter a chancela oficial da Fifa.

Por isso, o Comitê Olímpico Internacional (COI) passou para a Fifa a responsabilidade de organizar os torneios olímpicos de futebol nos jogos de 1920, 1924 e 1928, sempre com sucesso, o que fomentava ainda mais o crescimento do esporte em todo o mundo e caracterizava o campeão como a melhor seleção do planeta.

O ponto de divergência e que desencadeou a criação da Copa do Mundo de futebol aconteceu em 1928, justamente na conferência de início do torneio de futebol dos jogos olímpicos de Amsterdã.

O francês Jules Rimet, criador da Copa do Mundo

Os Estados Unidos, que organizariam os jogos olímpicos de Los Angeles em 1932, não tinham colocado o futebol no programa daquela competição pela baixa popularidade do esporte junto aos americanos. Nessa atitude também está embutida a intenção dos norte-americanos em não valorizar um esporte que poderia tirar público ou, a pior das hipóteses, dividir a atenção com o futebol americano, aquele da bola oval, na época em franco desenvolvimento na terra de Tio Sam. Em 26 de maio de 1928, a Fifa, através do seu presidente, o francês Jules Rimet, anunciou a intenção de promover um torneio de futebol mundial, com a participação de todos os países filiados à entidade e separado dos jogos olímpicos.

A ideia teve todo o apoio dos filiados. Imediatamente a Itália, Suécia, Países Baixos, Espanha e Uruguai manifestaram o interesse em sediar a primeira edição do que era chamado de Campeonato Mundial de Futebol, que seria realizado em 1930.

A Fifa aceitou a inscrição desses países e marcou uma nova conferência, apenas para decidir a sede do torneio, que fora aprovado por todos os membros.

Em 18 de maio de 1929, reunidos em Barcelona, os países membros da Fifa decidiram que a primeira Copa do Mundo seria realizada no Uruguai, o que provocou grande descontentamento dos europeus, que queriam o campeonato naquele continente. Ficou decidido, também, que o evento seria realizado de quatro em quatro anos, em anos pares, entre as edições dos Jogos Olímpicos.

A Europa passava por séria crise econômica, ainda como consequência da quebra da bolsa de Nova Iorque, em 1929. Dirigentes e atletas europeus não aceitavam a decisão sobre a sede escolhida e colocavam em risco o primeiro mundial, fato que merecia toda a atenção da Fifa.

O Uruguai foi escolhido por uma combinação de fatores. O primeiro deles era o fato da seleção uruguaia ser a atual bicampeã olímpica, vencendo as Olimpíadas de 1924 e 1928, portanto uma referência mundial no futebol, e também porque em 1930 o país comemoraria o centenário da sua independência.

A organização do mundial de 1930 não foi fácil. A Fifa entendia que precisava realizar a primeira edição para que o torneio ganhasse corpo e não mediu esforços para isso.

A primeira Copa foi a única que não teve eliminatórias. Todos os países membros da Fifa foram convidados, mas a resposta ao convite provocou certo alarde. Apenas países da América do Sul haviam confirmado a participação de imediato. Eram eles: Uruguai, Brasil, Argentina, Bolívia, Peru, Chile e Paraguai.

Logo depois vieram as confirmações de México e Estados Unidos, mas nenhum europeu se manifestara aceitando o convite. Os europeus alegavam dificuldades econômicas para a longa viagem cruzando o oceano Atlântico. Além disso, os jogadores tinham uma segunda profissão, o que dificultava a ausência da Europa por dois meses.

Sem poder preterir dos países europeus, a Fifa anunciou que pagaria a viagem das seleções que quisessem ir até o Uruguai. Dessa forma, França, Romênia, Bélgica e Iugoslávia aceitaram o convite e referendaram o campeonato como um verdadeiro mundial de futebol. Com 13 seleções, com os grupos sendo definidos pela Fifa e não sorteados, num país que era a referência do esporte naquele momento e que comemorava o centenário da sua independência, com as delegações sendo recebidas como visitantes ilustres pelos uruguaios, nascia aquele que se tornaria o maior evento do planeta, a Copa do Mundo de Futebol.

1930 – Uruguai

Cartaz da Copa do Mundo de 1930

O Uruguai utilizou apenas três estádios para os jogos da primeira Copa do Mundo e todos eles em Montevidéu. O maior, o estádio Centenário, com capacidade para 100 mil pessoas, foi erguido para comemorar o centenário da independência uruguaia.

Capa da Folha da Manhã sobre o início do mundial

A primeira partida, porém, aconteceu em 13 de julho, entre França e México, no estádio Pocitos, que recebeu 4.444 pessoas. Os franceses venceram os mexicanos por 4 a 1. Nesse jogo, o francês Lucien Laurent marcou aquele que a Fifa considera o primeiro gol da história dos mundiais, anotado aos 19 minutos do primeiro tempo. A entidade sempre foi questionada sobre o fato porque no mesmo horário jogaram Estados Unidos e Bélgica no estádio Parque Central e, no momento em que Laurent fazia o gol, o time norte-americano já vencia a Bélgica por 2 a 0. Em todos os documentos - no site da Fifa, no “Livro de Ouro do Futebol”, de Celso Unzette e no “Almanaque dos Mundiais”, de Max Gehringer - o primeiro gol do mundial anotado realmente é do francês Lucien Laurent. A seleção campeã olímpica confirmou seu favoritismo, conquistando a primeira Copa. Na estreia, venceram o Peru por 1 a 0, e garantiram a classificação no grupo 3 com uma goleada sobre a Romênia por 4 a 0. Nas semifinais mostraram realmente o poderio, derrotando a boa equipe da Iugoslávia por 6 a 1.

Uruguai e Argentina na partida final da Copa

O “clássico do rio da Prata” marcou a primeira final de Copa do Mundo. Uruguaios e argentinos colocaram toda a rivalidade em campo, no estádio centenário, em 30 de julho. Os portões do estádio foram abertos seis horas antes da partida. Na preparação para o confronto, os dois países mostraram ao mundo a que ponto chegava a rivalidade sul-americana. Os argentinos não queriam jogar com a bola fornecida pelos uruguaios e vice-versa. A discussão foi parar na Fifa, que decidiu que a Argentina forneceria a bola para o primeiro tempo e o Uruguai para o segundo tempo. A entidade deu sorte, já que o jogo não foi para a prorrogação.

Dorado abriu o para o Uruguai logo aos 12 minutos do primeiro tempo. Peucelle empatou aos 20 minutos e Stabille virou para 2 a 1 para os argentinos, dando números finais ao primeiro tempo. O segundo tempo foi todo uruguaio. Cea, Iriarte e Castro garantiram o título para a Celeste Olímpica, que teve seu jogador mais velho, Hector Scarone, considerado o craque da Copa. O artilheiro foi o argentino Guillermo Stabille, com oito gols. Ele também foi o primeiro jogador a fazer três gols num jogo de Copa. O hat-trick aconteceu na partida Argentina 6 x 3 México, na segunda rodada do mundial.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A organização da seleção brasileira de futebol para a participação na primeira Copa do Mundo foi confusa e refletia a rivalidade e a paixão que o esporte causava nos brasileiros, principalmente nos dois principais centros, que já naquela época eram e São Paulo.

Um desentendimento entre cartolas cariocas e paulistas impediu que a seleção tivesse força máxima no Uruguai. Apenas um jogador paulista, o atacante Araken Patuska, participou do selecionado, isso porque estava brigado com o seu clube, o Santos. Caso contrário, também não teria ido.

Tudo caminhava bem, a seleção brasileira contava com jogadores dos dois estados na preparação para o mundial. Os paulistas, inclusive, fizeram exames médicos para a Copa antes dos atletas cariocas, como noticiou a Folha da Manhã em sua edição de 08 de maio de 1930.

A CBD (Confederação Brasileira de Desportos), que comandava o futebol brasileiro, tinha definido que apenas atletas dos dois estados iriam compor o elenco brasileiro em terras uruguaias. O Rio de Janeiro, então capital federal, centro político e econômico do país, dominava a CBD e não escalou nenhum paulista na comissão técnica do treinador Píndaro de Carvalho, o que causou séri

[]o descontentamento na APEA (Associação Paulista de Esportes Atléticos), que dirigia o futebol no Estado de São Paulo.

Entendia a APEA que tudo deveria ser dividido na seleção entre paulistas e cariocas, inclusive os cargos na comissão técnica. Como a CBD se recusou a abrir uma vaga na direção técnica para um paulista, mesmo tendo mais jogadores que o Rio de Janeiro, eram 13 os paulistas, a APEA proibiu os clubes do Estado de cederem atletas para defender o Brasil no Uruguai. Araken Patuska foi inscrito como jogador da CBD e não do Santos, com quem estava brigado.

Para os paulistas, inclusive a imprensa, não era propriamente dita a seleção brasileira que estava em campo no Uruguai, mas sim a seleção carioca. Os paulistas pouco se entusiasmaram naquela Copa, mas o evento recebeu toda a atenção da mídia do Estado.

A bordo do navio Conte Verde, a seleção brasileira levou 15 dias para chegar em Montevidéu, cidade onde aconteceram todos os jogos da primeira Copa do Mundo.

Enquanto o argentino Huracán visitava o Brasil e enfrentava Corinthians e Palestra Itália, em São Paulo, a seleção recebia, ainda a bordo do navio, telegrama da CBD expressando confiança na participação dos brasileiros. O governo uruguaio, como fizera com todas as delegações, também expressou apreço à visita e à participação do Brasil no evento em que era anfitrião.

Enquanto os paulistas assistiam, no cine Paramount, ao filme “Um Perfeito Conquistador”, com William Powele, os brasileiros cariocas tentavam conquistar o mundo na partida de estreia, considerada “renhidíssima” pela imprensa da época, contra a Iugoslávia.

A partida teve altos e baixos e chegou a receber vaias do público que, para a surpresa dos brasileiros, consideravam a seleção como favorita na Copa. O futebol brasileiro já tinha o respeito dos sul-americanos. Envergando camisas brancas com punhos e golas azuis, os brasileiros foram derrotados pela Iugoslávia por 2 a 1. O primeiro gol brasileiro nas Copas, e o de honra na partida, foi de Preguinho, no estádio Parque Central, com público estimado em 5 mil pessoas.

Programação cultural durante a Copa

Como a Iugoslávia havia vencido também a Bolívia, os dois países sul-americanos fizeram um jogo apenas para cumprir tabela.

No estádio Centenário, com capacidade para 80 mil pessoas, apenas 1.200 assistiram a primeira vitória brasileira em Copas do Mundo, na goleada por 4 a 0 sobre os bolivianos, com dois gols de Preguinho e outros dois de Moderato.

Naquele período de Copa do Mundo, além dos paulistas que aproveitaram a derrota da seleção para zombar dos cariocas, comemoração mesmo apenas para Yoalanda Pereira, eleita em 15 de julho a “Senhorita Brasil”, concurso que antecedeu ao Miss Brasil que acontece até hoje, mas sem o mesmo glamour do passado. A representante do Rio Grande do Sul venceu o concurso e desfilou para milhares de pessoas na avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro.

Vitória mesmo foi para a Fifa, que acabava de realizar aquele que se tornaria, nos anos futuros, o maior evento do planeta.

A Copa era uma realidade.

Charge da Folha da Manhã brincando com a rivalidade entre cariocas e paulistas 1934 – Itália

Cartaz oficial da Copa de 1934

A primeira Copa do Mundo em solo europeu foi sediada pela Itália, que também se tornou a primeira seleção europeia a conquistar o título mundial. Mas não era a Itália que deveria sediar essa Copa.

O Congresso da Fifa, realizado em 1932 em Estocolmo, deveria indicar a Suécia como anfitriã dois anos depois. O país não teve a segurança econômica necessária para confirmar a intenção de ser sede.

Entendendo a dimensão do evento, o ditador italiano Benito Mussolini enviou um representante ao Congresso da Fifa. Giorgio Vaccaro imediatamente colocou a Itália à disposição da entidade e afirmou que dinheiro não seria problema para a realização do evento. Os delegados dos 29 países presentes no Congresso votaram por unanimidade pela Itália.

Benito Mussolini

O evento, portanto, aconteceu sob o regime ditatorial de Benito Mussolini, que tinha uma única intenção: transformar a Copa do Mundo em propaganda do seu governo. São muitas as histórias, algumas fantasiosas outras nem tanto, que ilustram a vontade de Mussolini em mostrar a pujança italiana. O título de campeão mundial de futebol viria coroar essa tal supremacia, além de projetar uma imagem italiana de país rico, desenvolvido e em paz.

Na organização da Copa foram utilizadas oito cidades: Roma, Florença, Turim, Gênova, Bolonha, Milão, Nápoles e Trieste. Especialmente para a realização do mundial, foram construídos três estádios: “Comunale Giorgio Ascarelli”, de Nápoles; “Del Littorialle”, de Bolonha e “Municipale Benito Mussolini”, de Turim. O estádio , de Milão, teve a sua capacidade ampliada de 35 mil para 45 mil espectadores.

A excelente repercussão do mundial de 1930 fez com que 34 seleções se inscrevessem para jogar a Copa. Foi realizada a primeira fase de eliminatórias, também no sistema de mata-mata, como o mundial. Foi a única vez que o país anfitrião teve que disputar uma vaga na Copa. A ausência bastante sentida foi do selecionado uruguaio. Os então campeões do mundo sequer defenderam o título. Entendendo que os países europeus haviam boicotado o mundial de 1930, o Uruguai, em represália, se recusou a participar da Copa de 1934. O Egito disputou o torneio e tornou-se o primeiro país africano a marcar presença na história das Copas.

Os jogadores italianos atuaram pressionados pelo regime de Mussolini, que não aceitava outro resultado senão o título. A pressão era tanta que o treinador da Azzurra, o jornalista , fechou os jogadores numa concentração dois meses antes do mundial. Todas as partidas da Itália tiveram a presença de Mussolini.

Antes da partida final da Itália contra a Tchecoslováquia, realizada em 10 de junho, em Roma, o ditador enviou um bilhete aos atletas italianos com os seguintes dizeres: “vitória ou morte”.

Puc, aos 31 minutos do segundo tempo, abriu o placar para a Tchecoslováquia, causando grande apreensão no estádio Nazionale. Orsi, aos 36 minutos, empatou e a partida foi para a prorrogação. O alívio aconteceu logo aos seis minutos quando Schiavio fez o gol do primeiro título da Azzurra.

Alguns árbitros estiveram sob suspeita durante a realização do evento. Um deles, o sueco , escolhido para arbitrar a semifinal e a final, teria mantido um encontro secreto com o ditador antes das partidas. Coincidência, ou não, houve lances que sua decisão beneficiou os italianos, como gols anulados e expulsão dos adversários.

Há relatos de árbitros que beneficiaram tanto a Itália durante a Copa que foram expulsos de seus países. Dois exemplos são citados: o suíço René Mercet e o belga Luis Baert.

A conquista do mundial era tão importante para a Itália que a seleção foi reforçada, de acordo com o que permitia o regulamento, por jogadores estrangeiros, mas que eram descendentes de italianos. Foram os casos de Di Maria, Orsi, Guaixta e Monti, que eram argentinos, e do brasileiro Filó que, portanto, tornou-se o primeiro jogador do Brasil a ser campeão mundial de futebol.

A Copa de 1934 teve como artilheiros três jogadores empatados com 4 gols: Nejedly, da Tchecoslováquia; Schiavio, da Itália e Conen, da Alemanha.

Craque italiano

O italiano Giuseppe Meazza, histórico atleta dos rivais de Milão, Internazionale e , foi considerado o craque do mundial. Cerebral, rápido e habilidoso, Meazza fez dois gols na Copa. Hoje o estádio de Milão, que é dividido pelos dois rivais, leva seu nome.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A filosofia que é preciso aprender com os erros para não voltar a praticá-los não serviu para o Brasil de 1934 em relação à experiência de quatro anos antes.

Mais uma vez o selecionado brasileiro esteve desfalcado de grandes jogadores, o que impediu melhor desempenho no torneio.

Desta vez os dirigentes se desentenderam por causa da filosofia da CBD, dirigida exclusivamente por cariocas, de convocar e dar prioridade para os jogadores amadores. O profissionalismo já estava instalado em São Paulo e a APEA não aceitou que seus jogadores profissionais participassem da Copa com os amadores cariocas.

A briga, porém, era maior que essa. A questão era de definição dos rumos que o futebol teria no Brasil. O profissionalismo pedia passagem e era defendido pela entidade paulista e pela Federação Brasileira de Futebol (FBF), enquanto que a CBD resistia àquele avanço, insistindo em convocar e valorizar apenas atletas amadores.

A situação foi levada ao extremo provocando ações inusitadas como a dos jogadores Romeu, Lara, Gabardo, Junqueira e Tunga, do Palestra Itália, que ficaram escondidos e protegidos por seguranças numa fazenda em Matão, interior do Estado de São Paulo, para que não aceitassem ir para o mundial, já que a CBD passou a oferecer altas quantias para que os atletas desobedecessem a APEA. Nesse momento a CBD esquecia os ares românticos do amadorismo e apelava ao dinheiro para convencer jogadores paulistas.

Mesmo com toda essa confusão, o selecionado brasileiro contou com quatro jogadores do paulista São Paulo da Floresta. Defenderam a seleção brasileira , , Luizinho e Waldemar de Brito, que mais tarde ficaria conhecido como o homem que levou o menino Pelé ao Santos, em 1954.

Programação do rádio em 1934

Outro fato importante para a história do futebol brasileiro foi a presença de da Silva, o Diamante Negro, então jogador do Vasco da Gama, que fez seu primeiro gol pela seleção em Copas do Mundo no único jogo da seleção na Copa da Itália, derrota para a Espanha por 3 a 1, dia 27 de maio, um domingo, dia em que a rádio Educadora de São Paulo apresentava, a partir das 20 horas, o programa Lourdinha Queiroz e a Record disputava a audiência do horário com o programa “Música Fina pela Orquestra”.

O paulistano tinha outra possibilidade de lazer na noite daquele domingo, enquanto os atletas arrumavam a mala para retornar ao país. Uma delas era ir até o cine Rosário e assistir ao filme “Dama Por Um Dia”, com Warren William e Walter Connolly.

Programação do cine Rosário Em terras italianas, na pior participação do Brasil em Copas, os jogadores brasileiros foram recebidos em jantar na Câmara de Comércio Ítalo-Brasileiro. Se Mussolini utilizava a Copa para fazer propaganda de seu regime, os brasileiros entendiam, também, a dimensão desse evento que estava apenas na sua segunda edição e aproveitavam para fazer propaganda do Brasil que, a partir daquele mês, contava com novo regulamento para embarque, transporte e exportação de café, produto essencial para a balança comercial.

Como viajaram quinze dias de navio, alguns atletas engordaram e prejudicaram a forma física ideal para um desempenho favorável no mundial, mesmo assim foram verdadeiros embaixadores do Brasil.

Pelo menos por uma noite.

1938 – França

Cartaz da Copa do Mundo de 1938

A Argentina tinha a certeza que realizaria a Copa de 1938, já que acreditava no rodízio entre os continentes. Nessa teoria, realmente a Copa seria na Argentina, mas houve disputa. E das boas.

Sobre a sombra da Segunda Guerra Mundial, os ditadores Adolf Hitler (Alemanha) e Benito Mussolini (Itália) tinham assinado o chamado “Tratado da Amizade”, que consistia na colaboração entre os dois países, formando o Eixo Roma- Berlim, que mais tarde se tornaria Roma-Berlim-Tóquio e enfrentaria os Aliados no período de 1939-1945.

Como a Itália tinha sediado a Copa de 1934 e obtido sucesso, inclusive com a conquista do título mundial, utilizando-o como propaganda pró-regime de Mussolini, a Alemanha entendeu que ser sede do mundial de 1938 poderia resultar na mesma propaganda favorável, desta vez ao nazismo de Adolf Hitler.

Durante o Congresso da Fifa, realizado no período dos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936, os países membros entenderam que era necessária uma alternativa para que a Copa fosse realizada na Europa e não servisse de propaganda ao nazismo. A saída foi entregar a realização do mundial à França, país do presidente da Fifa e mentor da Copa do Mundo, Jules Rimet.

Disputaram as eliminatórias para a Copa do Mundo da França 36 países. Desses, 16 chegaram até Paris para disputarem a então chamada “Taça do Mundo”, com o objetivo de desbancar os favoritos Itália, atual campeã mundial, Hungria, seleção que assombrava a Europa, Tchecoslováquia e o Brasil, que contava com seu primeiro grande craque, Leônidas da Silva, então jogador do Flamengo.

A Argentina não digeriu bem o fato de ser preterida na escolha da sede do evento e liderou o boicote dos países americanos àquela Copa. O Brasil, que não participou desse movimento, acabou beneficiado porque ganhou a vaga automaticamente, sem a necessidade de jogar as eliminatórias, que já estavam com datas marcadas. Já a Espanha, em meio a uma guerra civil, desistiu de disputar a qualificação. Egito e Japão foram ausência desde o início. Alguns países deixaram de disputar as eliminatórias embalados pela Inglaterra, que ainda considerava o mundial um torneio sem expressão, mantendo sua oposição à Fifa.

Leônidas da Silva

A proximidade da Segunda Guerra prejudicou o mundial. Exemplo disso foi a não participação da Áustria, apesar da seleção estar classificada em campo. Utilizando a justificativa da teoria expansionista de Adolf Hitler, o país fora anexado à Alemanha dias antes da estreia. A Fifa não modificou a tabela e a Áustria perdeu por W.O para a Suécia, que passou direto para as quartas de final.

As cidades francesas que receberam jogos da Copa foram: Paris, Marselha, Bordeaux, Le Havre, Estrasburgo, Toulouse, Lille, Reims e Antibes.

A França foi palco de uma das grandes zebras em mundiais. Cuba, primeiro país da América Central a participar da Copa, eliminou a forte Romênia. No primeiro jogo houve empate em 3 a 3. Como o regulamento previa, em caso de empate, novo jogo dois dias depois, nesse encontro os cubanos fizeram 2 a 1. Outra surpresa foi a eliminação da Alemanha, misturada forçosamente com a Áustria, pela Suíça, a quem caberia aos italianos eliminar depois.

A Itália conquistou o bicampeonato e tornou-se a primeira seleção a ter duas Copas do Mundo. Para a satisfação de Mussolini, na final os italianos bateram os húngaros, que praticavam o futebol mais bonito do torneio, por 4 a 2, fazendo prevalecer a força e determinação de seus jogadores com destaque ainda para o craque Giuseppe Meazza, Coloaussi e Piola, sob a batuta do técnico Vittorio Pozzo. Como treinador, Pozzo foi o único a ser campeão do mundo duas vezes.

Repetindo o que fizera quatro anos antes, nos momentos que antecederam à partida final, o ditador Benito Mussolini envio um telegrama para os jogadores da Azzurra com os dizeres: “vencer ou morrer”. Durante todo o torneio, os italianos contaram com a antipatia da torcida francesa.

O artilheiro do mundial foi o brasileiro Leônidas da Silva com 7 gols e o título de craque da Copa ficou com o italiano Piola.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Pela primeira vez na história das Copas do Mundo, a seleção brasileira se preparou em paz, sem as brigas entre dirigentes do Rio de Janeiro e São Paulo que tanto atrapalharam nas edições anteriores. O clima de paz da preparação foi mantido na concentração brasileira durante todo o torneio. O resultado foi o terceiro lugar, até então a melhor participação do país em mundiais. É possível afirmar que o Brasil sentiu o gosto do título ao chegar bem perto da final.

No início da participação brasileira, em 05 de junho de 1938, havia apreensão no clima político mundial já que o general Franco, na Espanha, que estava em devastadora guerra civil, anunciara que a rendição incondicional dos republicanos seria a única solução para o término da guerra espanhola entre os próprios republicanos e os nacionalistas liderados pelo general.

Cinema anuncia o filme de Brasil e Polônia

Franco disse que recusaria qualquer proposta de mediação. A Folha da Manhã noticiava que se sucederam violentos combates no setor de Albocacer e que a bandeira nacionalista estava hasteada em Pena Golosa. O governo britânico tentava mediar o conflito espanhol.

Em campo houve um jogo épico entre Brasil e Polônia, transmitido através do rádio pelo narrador Gagliano Neto, único profissional brasileiro presente no “Stade de la Meinau”, em Estrasburgo. A expectativa no Brasil era muito grande. A imprensa dizia que a Copa “finalmente” estava começando. O país tinha ciência que tinha um bom time e que a seleção estava unida.

A vitória por 6 a 5 contra os poloneses aumentou ainda mais a expectativa da torcida brasileira que, depois da “irradiação” da partida que começou às 13h20, horário do Rio de Janeiro, pôde acompanhar ao programa “Tapete Mágico”, no ar às 18h00 pela rádio Bandeirantes. Logo depois foi possível acompanhar A “Hora dos Ferroviários”, na mesma emissora. O rádio era o grande meio de comunicação de massa.

Outra opção de lazer naquela noite na capital paulista era o espetáculo do Circo Piolin, instalado na avenida Celso Garcia, 84, e que anunciava a partir das 20h30 a “gozada comédia ‘Delícias da Vida Conjugal’ com o impagável e famoso Piolin”. Quem preferia o cinema, a excelente opção era o longa-metragem “A Vingança de Tarzan”, com Glenn Morris e Eleanor Holm, em cartaz no Cine Rosário.

Capa da Folha da Manhã sobre a estreia brasileira

Enquanto isso a repercussão da boa atuação do Brasil contra a Polônia era grande. A imprensa francesa dizia que Leônidas era o organizador do time, mesmo sendo “marcadíssimo” pelos poloneses. Jornalistas europeus afirmavam que Leônidas, Romeu e Perácio “conquistaram tentos de maneira assombrosa”. Para os jornais de Paris, os brasileiros corresponderam às expectativas. O jornal “Le Petit Parisien” dizia que “os brasileiros são mestres supremos na arte de lidar com a bola”.

O segundo jogo aconteceu em 12 de junho e terminou em empate em 1 a 1 contra uma das favoritas, a Tchecoslováquia. Houve reclamação da violência Tcheca, com três expulsões (dois brasileiros) e Leônidas deixando o campo contundido. Indagado sobre a violência dos Tchecos, o técnico Adhemar Pimenta disse que aquilo “não era futebol”.

Programação cultural em 1938 No jogo de desempate, dois dias depois, os brasileiros confirmaram a disposição e a condição de lutar pelo título mundial e derrotaram a Tchecoslováquia por 2 a 1, classificando a seleção para a semifinal contra os italianos, então campeões mundiais. Há relatos que, no final da partida, cartazes com os dizeres “brasileiros, os reis do futebol”, foram vistos no público que acompanhou a decisão.

Torcedores na rua acompanham Brasil x Tchecoslováquia

No Brasil a seleção arrebatava os corações dos torcedores. Naquela época, em dias de jogos da seleção o funcionamento do comércio e empresas era normal. Ainda não havia o costume de parar as atividades para assistir aos jogos do Brasil, então transmitidos apenas pelo rádio. Mesmo assim, o torcedor parou suas atividades pela própria vontade. Esse fato foi tema de uma matéria da Folha da Manhã, que disse que “a vida da cidade esteve suspensa durante o transcorrer do jogo de ontem”. A seleção já tinha todo o apoio popular que a acompanharia ao longo da história.

A confiança era tamanha no time brasileiro que no dia do jogo semifinal contra os italianos, a imprensa brasileira dizia que a Itália já não era o mesmo time de 1934, alegavam que os adversários preferiam enfrentar a Tchecoslováquia e que o Brasil venceria a partida.

Não se sabe se foi por excesso de confiança, mas o treinador Adhemar Pimenta contribuiu, e muito, para a frustração do povo brasileiro. Com condições de jogo, o craque

Anúncio do cine Odeon em São Paulo Leônidas da Silva não atuou. O artilheiro daquela Copa fez muita falta. Em 16 de junho, no dia em que o general Alfredo Baldomir foi proclamado presidente do Uruguai, apesar de um primeiro tempo em zero a zero, os italianos fizeram valer a experiência no segundo tempo e venceram o Brasil por 2 a 1, com gols de Coloaussi e Giuseppe Meazza. Romeu, quando faltavam três minutos para o final, diminuiu para a seleção.

O jogo monopolizou todo o Brasil. Jornalistas de São Paulo afirmaram que “nunca o paulista torceu tanto pela seleção”.

Programação do cine Astoria

Enquanto o Cine Rosário anunciava, naquele domingo dia 19 de junho, a partir das 14 horas, a exibição da “reportagem completa” do jogo contra a Tchecoslováquia, a seleção vencia a Suécia por 4 a 2 e conquistava o terceiro lugar da Copa. Já o Cine Palácio anunciava, para as 14h00, o filme “O Homem Perfeito”, e logo depois exibiria a “reportagem completa” de Brasil x Polônia, a estreia brasileira na Copa. Mesmo que atrasado, o torcedor brasileiro já mantinha contato visual com os jogos da Copa.

Anúncio oferecia uma moderna máquina de beneficiar mamona A repercussão na Europa do bom futebol praticado pelos brasileiros foi grande. A delegação recebeu convites para continuar naquele continente e realizar alguns amistosos depois do torneio. A CBD enviou telegrama rejeitando os convites alegando que não queria prejudicar as equipes que haviam cedido jogadores para a seleção.

O Brasil já havia conquistado o respeito e o selo de praticar um bonito futebol.

Matéria da Folha da Noite sobre a campanha da seleção brasileira na Copa 1950 – Brasil

Cartaz oficial da Copa de 1950

Durante o período da Segunda Guerra Mundial não havia a menor condição e nenhum sentido realizar a grande festa que é a Copa do Mundo. Por isso houve um hiato na história das Copas. Depois de 1938, o maior torneio mundial de um esporte deixou de ter as edições de 1942 e 1946 e voltou a ser realizado apenas em 1950, no Brasil.

Assim que houve condições, com o fim da Guerra, a entidade convocou seus membros para discutir a realização da quarta edição da Copa do Mundo, que, no entender da Fifa, não poderia ser em solo europeu. A Europa ainda sofria as consequências econômicas do conflito devastador e passava pelo período difícil de reconstrução. A América do Sul seria a solução, principalmente porque a primeira Copa havia sido um sucesso e realizada com bastante competência pelos uruguaios. Além disso, a Fifa tinha a oportunidade de expandir ainda mais os horizontes do futebol, massificando o esporte.

Desde 1938, os dirigentes da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), que comandava o futebol, nutriam a vontade de realizar a Copa do Mundo no Brasil. No Congresso, realizado em Luxemburgo em 1946, a Alemanha, mais uma vez, informou o desejo de ser anfitriã, mas as dificuldades econômicas de um país semidestruído impediram que a candidatura prosperasse. Os alemães desistiram antes da votação.

Dessa forma, o Brasil foi escolhido como sede por unanimidade entre os membros da Fifa. Durante a defesa da candidatura brasileira, a CBD conseguiu encantar a Fifa ao afirmar que, especialmente para o mundial, construiria o maior estádio do mundo, com capacidade para 155 mil pessoas.

Inicialmente a Copa era para ser realizada em 1949. Esse era o plano da Fifa, que voltou atrás e confirmou a realização para 1950, mantendo período de realização previamente definido, em anos pares, intercalada com os Jogos Olímpicos. E ninguém se arrependeu.

Em 02 de agosto de 1948, o Rio de Janeiro lançava a pedra fundamental e dava início à construção do estádio do Maracanã. O gigante foi erguido por cinco construtoras e 3.500 operários em 22 meses.

Início da construção do estádio do Maracanã

O curto espaço de tempo das obras provocou medo nos cariocas. Muitos moradores do Rio de Janeiro achavam que a estrutura não resistiria ao primeiro jogo. Não havia nada parecido em arquitetura com o Maracanã no Brasil.

Para acalmar a população, a prefeitura do Rio convocou 3 mil operários para pular nas arquibancadas do estádio antes da inauguração, que, oficialmente, aconteceu em 16 de junho. O primeiro jogo foi realizado no sábado, dia 17 de junho, reunindo as seleções de São Paulo e do Rio de Janeiro, sem os atletas que estava servindo a seleção brasileira.

Didi, então meia do Fluminense, fez o primeiro gol do estádio. Osvaldo Pison, goleiro do paulista Ypiranga foi o atleta que levou o primeiro gol do Maracanã. No final, a seleção paulista venceu de virada, por 3 a 1. Durante muito tempo, era comum o estádio ser chamado de “Recreio dos Bandeirantes”, tamanho o número de vitórias dos paulistas ao longo do tempo, com destaque para Palmeiras e Santos que conquistaram títulos internacionais no estádio.

Em matéria do jornal O Estado de S. Paulo, sobre a inauguração do Maracanã, é possível notar que as obras, a uma semana do mundial, não haviam sido concluídas. Diz o jornal que “observou-se que duas regiões do estádio estavam repletas de andaimes sustentando dois lances da marquise que circula a arquibancada, impedindo a lotação máxima”.

Inauguração do Maracanã com obras inacabadas Sete dias depois, no jogo de estreia do Brasil contra o México, os andaimes foram retirados, mas ainda havia lama e material de construção no local.

O gigantismo do Maracanã ganhou repercussão na imprensa mundial. Um dado era bastante divulgado. A capacidade do maior estádio do mundo era de 200 mil pessoas. Portanto, 10% da população do Rio de Janeiro cabia dentro do estádio.

A Fifa tinha 72 filiados e 32 se inscreveram para disputar as eliminatórias para a Copa do Mundo de 1950. Muitos países não tiveram condições econômicas de participar da competição. Tchecoslováquia e Polônia estavam entre aqueles países sem condições de garantir a participação. Outras seleções como Argentina, Bélgica, Filipinas, Peru, Equador e Áustria, desistiram durante as eliminatórias.

Das 16 seleções que conseguiram a vaga para vir ao Brasil, Escócia, Índia e Turquia abriram mão da participação. A Fifa convidou França, Irlanda e Portugal, mas as três seleções recusaram o convite. Assim, a Copa de 1950 teve 13 seleções participantes.

Além do sucesso de público, acolhimento dos atletas estrangeiros, um país inteiro praticamente só falando em Copa do Mundo, impulsionado pelo ótimo selecionado anfitrião, a primeira edição brasileira do torneio foi um sucesso em organização e infraestrutura, a tal ponto da Fifa afirmar que o evento era um exemplo para o mundo.

Há quem atribua o sucesso à administração do presidente Getúlio Vargas. Ele adorava esporte e entendia que a sua prática, seus conceitos e a disciplina necessária para vencer e ser campeão, seria uma extensão da educação. O fato a ser ressaltado é que o evento teve sucesso de público e envolveu o país, que recebeu as delegações de forma exemplar. Durante muitos anos os brasileiros foram reconhecidos por ser um povo acolhedor.

As cidades que receberam os jogos das 13 seleções que estiveram na Copa foram: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Recife. Durante o planejamento do evento, as cidades de Santos, Campinas e Juíz de Fora manifestaram interesse em receber jogos da Copa do Mundo, mas acabaram sendo preteridas.

Apenas dois estádios foram construídos para a Copa. O Maracanã, um gigante com capacidade para 200 mil pessoas e arquitetura moderna e arrojada para a época, e o estádio Independência em Belo Horizonte, onde aconteceu a maior zebra do torneio, a derrota da seleção da Inglaterra, na primeira participação em Copas do Mundo, por 1 a 0 para os Estados Unidos. Os ingleses, tidos como os inventores do futebol, sucumbiram ante os norte-americanos, acostumados à bola oval. A surpresa da derrota inglesa foi tão grande que dois fatos ilustram a sua dimensão. A mídia internacional custou a acreditar no resultado. O jornal norte-americano The New York Times recebeu a informação de última hora e segurou a notícia temendo que fosse uma piada. Na Inglaterra, jornalistas acreditaram que pudesse ter ocorrido um erro do operador de telégrafo. Quando leram o resultado Inglaterra 0 x 1 Estados Unidos, imaginaram que o operador suprimira o número 1 e que o resultado correto era Inglaterra 10 x 1 Estados Unidos. Além de Maracanã e Independência, a organização brasileira utilizou o Pacaembu, em São Paulo, construído em 1940; a Ilha do Retiro, em Recife, que existia desde 1937; o estádio dos Eucaliptos, em Porto Alegre, inaugurado em 1931, e o Durival de Brito, em Curitiba, construído em 1947, de propriedade do Ferroviário, hoje Paraná Clube.

Estados Unidos x Inglaterra em Belo Horizonte

A primeira Copa brasileira teve excelente nível técnico e algumas goleadas: Uruguai 8x0 Bolívia, Brasil 7x1 Suécia e Brasil 6x1 Espanha. A partida que decidiu o título - não era final pois a fase decisiva foi disputada em quadrangular – foi Uruguai e Brasil, que chegaram dependendo de si para ser campeão, de acordo com os resultados das duas rodadas anteriores, por isso foi considerada uma final. Esse dia registrou o maior público da história das Copas, com 199.854 pessoas no Maracanã.

Foi a primeira Copa do Mundo em que os jogadores utilizaram numeração nas camisas. Ainda não havia cartões de advertência e expulsão - mas havia expulsão informada pelo árbitro -, nem substituições de atletas.

O artilheiro foi o brasileiro, rápido e habilidoso, de excelente finalização, Ademir Menezes, que jogava no Vasco da Gama. Já o melhor jogador foi Schiaffino, o cérebro da aguerrida equipe uruguaia.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Ninguém esperava outro resultado senão a vitória brasileira e a conquista do já sonhado primeiro título mundial. O futebol no Brasil arrebatava multidões, os clubes estavam cada vez mais fortes, muitos craques desfilavam nos gramados e a ótima participação na Copa do Mundo credenciavam o torcedor brasileiro a esperar o dia da final para comemorar o título.

O técnico Flávio Costa convocou os melhores atletas brasileiros e a rixa entre cariocas e paulistas havia diminuído, por isso é possível afirmar que havia uma união nacional em torno da seleção. O título era muito importante para o torcedor brasileiro. A estreia brasileira aconteceu em 24 de junho, no Maracanã. O Brasil fervia no estádio e nas ruas. Havia muitos eventos embalados pela realização da Copa. No dia do primeiro jogo, por exemplo, aconteceu um recital com o então famoso barítono Gino Bechi, na sala Vermelha do Cine Odeon em São Paulo. O evento tinha tamanha repercussão que foi transmitido ao vivo pela rádio Excelsior. Logo depois, a emissora levou ao ar o programa de auditório com Isaurinha Camargo e o Conjunto Ritmos. Para terminar a noite, mais um capítulo a radionovela “Tragédia em Meio do Caminho”, texto de Marcos Rey e direção de Tito Fleury.

Folha da Manhã e a vitória do Brasil

O povo tinha bons programas para comemorar a goleada de 4 a 0 contra o México. A seleção comprovava em campo a empolgação do torcedor. A imprensa refletia nas páginas de jornais e comentários de rádio o que acontecia no Maracanã. Expressões como “extraordinário acontecimento” e “impressionante massa humana” davam mais colorido à imaginação daqueles que não puderam estar entre os mais de 100 mil torcedores que proporcionaram uma renda de Cr$ 2.565.000,00, o que valeria hoje (março de 2018) cerca de R$ 13 milhões.

Anúncio de programa de rádio Enquanto isso o mundo ainda sofria as consequências da Segunda Guerra. O comentarista norte-americano Walter Winchell afirmava para a imprensa brasileira que o Primeiro-Ministro da União Soviética, Josef Stalin, considerava inaceitáveis as condições propostas pelos ocidentais para o fim da Guerra Fria.

O segundo jogo brasileiro foi a única oportunidade de o público paulista assistir o Brasil na Copa. Mais de 60 mil pessoas estiveram no Pacaembu, em 28 de junho, quarta- feira à tarde, dia normal de trabalho, mas considerado um “feriado” para os paulistas, que viram a seleção tropeçar na Suíça, no empate em 2 a 2.

Tentando agradar o torcedor paulista, o técnico Flávio Costa tirou do time os cariocas Juvenal, Augusto e Bigode e escalou um trio conhecido da torcida local com Rui, Bauer e Noronha, todos jogadores do São Paulo. Flávio Costa entendia que era desnecessário tal procedimento já que o público paulista estava abraçando a seleção e, inclusive, reivindicava mais jogos do Brasil na cidade, principalmente na fase final.

As modificações quebraram o ritmo da seleção que esteve duas vezes na frente do marcador, mas levou o empate. O gol do empate final foi feito a três minutos do término da partida. O Pacaembu ficou em silêncio, um ambiente constrangedor para a seleção brasileira, até aquele momento com enorme empolgação e festa no Rio de Janeiro.

A solução foi aproveitar os cinemas da capital paulista que, naquele dia, anunciavam a apresentação das reportagens dos jogos iniciais da Copa (Brasil x México, Inglaterra x Chile, Estados Unidos x Espanha e Iugoslávia x Suíça). À noite, no Cine Ópera, ainda foi possível assistir ao sucesso “Herói Por Acaso”, com o ator e humorista mexicano Cantinflas.

Programação do cine São João, em São Paulo, durante a Copa Como a Iugoslávia tinha vencido seus dois jogos, restava ao Brasil vencer o confronto direto no Maracanã, marcado para o sábado 01 de julho para se classificar à fase final. Foi o momento mais tenso daquela campanha. A manchete da Folha da Manhã era “Periga a situação do Brasil” e refletia o medo dos brasileiros em deixar a Copa na primeira fase, justamente jogando em casa.

Com péssima atuação do árbitro espanhol Ramon Azon que, segundo relatos da época, deixou de marcar quatro pênaltis para o Brasil, a seleção venceu os iugoslavos por 2 a 0, acabando com a apreensão do povo brasileiro que, a partir daquele sábado, foi informado que receberia a visita de recenseadores do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Estava iniciado o Censo de 1950.

Depois do que a imprensa nacional classificou de “espetáculo grandioso”, o Brasil começava a jogar a fase final. Naquela semana ficou definido que a equipe jogaria os três jogos (Suécia, Espanha e Uruguai) no Maracanã, o que foi bastante lamentado pelos paulistas, que queriam a seleção mais uma vez em São Paulo.

Em 9 de julho, domingo, a Suécia sentiu o poderio brasileiro. A goleada de 7 a 1 encantou os mais de 150 mil torcedores que estiveram no Maracanã, proporcionando uma renda de Cr$ 4.996.117,50, algo em torno de R$ 26 milhões em valores atuais (março de 2018). A imprensa brasileira disse que “foi indiscutível a superioridade dos nacionais”.

Anúncio de venda de aparelhos de rádio O próximo adversário foi a Espanha, em 13 de julho, uma quinta-feira com jeito de feriado. O carioca não falava em outra coisa. O confronto com os espanhóis seria decisivo e o clima no Maracanã era exatamente esse.

O selecionado brasileiro correspondeu às expectativas. Naquela que foi chamada de “extraordinária demonstração dos futebolistas brasileiros” a seleção goleou a Espanha por 6 a 1. Brasileiros e espanhóis saíram de campo ao som de “Touradas de Madrid”, uma marchinha de Carnaval lançada em 1938, de autoria de Braguinha, entoada pela torcida brasileira. A sensação era de título e só não foi confirmada de fato naquela tarde porque os uruguaios, jogando no Pacaembu, venceram a Suécia por 3 a 2.

O resultado fazia com que o Brasil jogasse por um empate contra os uruguaios, na última rodada do quadrangular final, que havia se transformado, de fato, numa partida finalíssima porque os Uruguaios, com uma vitória simples, levariam o bicampeonato.

A perda do título não passava pela cabeça de ninguém. A confiança era total e os jogadores entendiam esse clima, sabiam da responsabilidade e queriam jogar contra o Uruguai para poder comemorar o sonhado título de melhor futebol do planeta.

O clima de certeza do título era tão grande que o jornal vespertino A Noite, do Rio de Janeiro, publicou ainda no sábado, acima de uma foto do selecionado brasileiro, o título “Estes são os campeões do mundo”.

Naquele 16 de julho, enquanto o Brasil enfrentava os uruguaios, dois moinhos de trigo, adquiridos na Itália pelo governo do Estado de São Paulo, eram embarcados para o país. Esses moinhos eram destinados aos pequenos agricultores paulistas. Naquele período, o governo do Estado comprava sementes de trigo no Rio Grande do Sul e as repassava, gratuitamente, para os pequenos produtores paulistas. Os moinhos deixaram o trabalho mais ágil e ininterrupto.

A festa no Maracanã parecia completa quando Friaça, atacante do Vasco, abriu o placar a um minuto do segundo tempo. Mesmo com o empate de Schiaffino, a 26 minutos do final do jogo, o título não escaparia, já que o empate era brasileiro.

Mas o time e a torcida se assustaram com a possibilidade do segundo gol uruguaio. Houve certa apreensão e uma apatia inexplicável tomou conta dos jogadores brasileiros.

Os uruguaios tinham como base o Peñarol e o Nacional de Montevidéu. Apesar de chegar ao Brasil desacreditado, o fato de serem campeões olímpicos e mundiais provocava um respeito natural de todos.

Quem se aproveitou da instabilidade emocional do Brasil foi Ghiggia, que a 10 minutos do final fez o segundo gol para os uruguaios, num lance que o goleiro Barbosa foi acusado de falhar durante toda a sua vida. Havia tempo para a vitória, mas os brasileiros foram presa fácil e acabaram derrotados perante 199.854 torcedores. Muitos choravam, outros tantos permaneciam em silêncio, incrédulos ao bicampeonato uruguaio. A renda do encontro sul-americano nessa histórica final de Copa do Mundo teve recorde mundial de arrecadação. Foram Cr$ 6.272.959,00, algo em torno de R$ 35 milhões (março de 2018).

O Globo noticia o título do Uruguai

O meia Danilo, do Vasco, foi o último jogador a deixar o campo. Ainda atordoado com o que tinha acontecido, disse: “foi uma desgraça. Por Deus, não acredito que isso me sucedeu. Quisera que a terra se abrisse e me tragasse de vez”.

O jornal inglês “Evening Telegraph” que, como toda a imprensa mundial, esperava o título do Brasil, estampou em manchete: “Cancelado o samba brasileiro”. Uma geração de craques estaria impiedosamente marcada para sempre como os “fracassados”.

Naquela noite, a única forma de sorrir foi no TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), em São Paulo, que apresentou a peça “A Importância de Ser Prudente”, de Oscar Wilde, com direção de Luciano Salce.

Era prudente levantar a cabeça. Outras Copas viriam.

Iracema, de José de Alencar, no cine Broadway Ziembinsky em cartaz no TBC 1954 – Suíça

Cartaz oficial da Copa de 1954

A Suíça foi escolhida como sede do mundial de 1954 durante o 26º Congresso da Fifa, realizado em 1948, em Londres. Dois fortes motivos pesaram para a escolha. O primeiro deles foi o fato da Suíça ser sede da Fifa, que estava comemorando seu 50º aniversário de fundação, e o segundo era o fato do país ter saído ileso da Segunda Guerra Mundial.

A Europa já estava se recuperando daquele conflito e a realização da Copa seria importante e, realmente, contribuiu para que aquela triste página fosse sendo esquecida.

A Suíça construiu apenas um estádio para receber o mundial, o ST. Jabkob, na Basileia. Outros cinco foram utilizados, mas apenas o Olimpique La Pontaise, em Lausanne, necessitou de reformas. As cidades que receberam os jogos foram: Berna, Basileia, Lausanne, Genebra, Zurique e Lugano.

Nas eliminatórias houve recorde de inscrição. Foram 38 países que pleitearam uma vaga na Copa. Durante as eliminatórias, Polônia e China desistiram da competição. A ausência sentida foi da Argentina, que não conseguiu vaga. A América do Sul foi representada por Brasil e Uruguai, que já estavam com a vaga assegurada.

Foi um torneio bastante interessante do ponto de vista técnico. O futebol ganhou com aquela Copa, principalmente no que se refere ao futebol bonito, ofensivo e criativo da seleção da Hungria, que teve o melhor jogador da Copa: Ferenc Puskas, considerado um dos maiores jogadores do mundo em todos os tempos. Puskas marcou época como atacante do Real Madrid.

A ofensividade húngara contribuiu decisivamente para a maior média de gols da história dos mundiais. Foram 140 gols em 26 partidas, uma média espetacular de 5,38 gols por jogo. Então invicta há quatro anos, a Hungria justificou o favoritismo pré-Copa do Mundo, com um futebol envolvente e encantador. Na estreia, mesmo enfrentando um time misto da Alemanha, marcou 8 a 3. No segundo jogo a vítima foi a seleção da Coreia do Sul, goleada por 9 a 0. Ninguém acreditava que perderia o título.

Puskas, da Hungria

O Uruguai também era um dos favoritos, defenderam o título com a costumeira raça e dignidade, mas caíram diante do time húngaro.

Na Copa da Suíça foi registrada a partida com mais gols da história do mundial: Áustria 7x5 Suíça.

A média de gols da histórica seleção húngara, liderada por Puskas, jamais foi atingida por outra seleção em Copas. Foram cinco jogos e 27 gols, numa média de 5,4 gols por jogo.

Outro detalhe interessante é o fato de que em todos os jogos a Hungria conseguiu anotar dois gols antes dos primeiros 15 minutos de jogo.

O selecionado repetiu a dose na final com os alemães ocidentais (a Alemanha estava dividida depois da Guerra), mas foram surpreendentemente derrotados por 4 a 2, numa virada que jamais foi esquecida.

Com dois a zero contra, o técnico alemão Sepp Herberger colocou um dos destaques do time, , marcando o cérebro húngaro, Hidegkut. Essa mudança fez com que a Hungria perdesse a força e a rapidez dos contra-ataques. Pragmaticamente os alemães foram ganhando espaço e conseguiram uma virada sensacional.

A equipe de Puskas, Bozsik e Hidegkut entrava para a história como um dos grandes times que não conseguiu levantar a taça. Outras equipes fariam parte dessa galeria ao longo dos anos.

Os alemães Fritz Walter, Morlock e Schaeffer davam à Alemanha Ocidental o título mundial. A Copa de 1954 foi a primeira a ter transmissão ao vivo pela TV. Mas não para o Brasil.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Foram longos quatro anos até o Brasil voltar a ter a chance de conquistar a sonhada Copa do Mundo, que esteve tão perto no Maracanã.

E foi exatamente assim, querendo o título para esquecer 1950, que a seleção brasileira desembarcou na Suíça, depois de quatro vitórias nas eliminatórias contra Chile e Paraguai, em jogos de ida e volta.

No grupo, seis jogadores que estavam na Copa anterior: O goleiro Castilho, que fora reserva de Barbosa em 1950, o lateral Nílton Santos, mais Ely, Bauer, e Rodrigues. Para eles era, literalmente, uma segunda chance.

O técnico agora era Zezé Moreira, que chegou ao comando da seleção credenciado pelo título do Pan-Americano de 1952 no Chile.

Uniforme da Copa de 1954 utilizando a camisa amarela

A Copa do Mundo da Suíça marcou a estreia da camisa amarela como uniforme do Brasil. Até a Copa de 1950 a seleção jogava com uniforme inteiro branco, golas e punhos em azul. A camisa branca, na caça às bruxas pelo “Maracanazo”, como ficou denominada a derrota do Maracanã, foi eleita como uma das vilãs e, por isso, foi aposentada dos jogos do Brasil.

Sintetizando a vontade popular e a cobrança que os jogadores sentiam desde 1950, a Folha da Manhã, no dia da estreia brasileira, 16 de junho de 1954, mais uma vez contra o México, estampava manchetes com os seguintes dizeres: “Brasil joga almejando a classificação para a nossa gente”, “Em tempo algum a seleção se preparou com tanto esmero”. Nessa época, a televisão começava a entrar nos lares brasileiros e a fazer parte do cotidiano das famílias, iniciando uma rivalidade com o rádio, soberano até então. Mesmo assim, os jogos da Copa foram transmitidos apenas pelas emissoras de rádio.

O Brasil estreou com uma convincente vitória de 5 a 0 sobre o México, jogo realizado à tarde, no horário de Brasília. Os jogadores cumpriam as ordens de Zezé Moreira, que queria marcar o maior número de gols possíveis para levantar o moral dos atletas. As emissoras de rádio anunciaram a transmissão da partida em propaganda nos jornais de grande circulação, demonstrando o interesse que o futebol despertava e o apreço do brasileiro pela Copa do Mundo. O jogo foi transmitido pelas rádios Nacional (São Paulo), Mayrink Veiga e Nacional (Rio de Janeiro). O governo do Estado de São Paulo anunciou que, por causa do jogo da seleção, naquele dia 16 de junho não haveria qualquer interrupção de energia elétrica, fato costumeiro na época.

Com os iugoslavos reconhecendo nos brasileiros como “perigosos rivais”, a seleção entrou em campo no dia 19 de junho pronta para conquistar a classificação para as quartas de final da Copa. Pelo regulamento, bastava empatar com a Iugoslávia que as duas seleções se classificariam.

Rádios anunciam a transmissão de jogo do Brasil em 1954

Os iugoslavos entraram em campo mais relaxados, tentando provocar um jogo “amistoso” com os brasileiros, buscando a classificação das duas seleções. Mas os brasileiros não entendiam assim e não paravam de atacar. A Iugoslávia conseguiu fazer um gol e o Brasil buscou o empate: final em 1 a 1.

O regulamento não era claro para os brasileiros. Zezé Moreira declarou que não gostou do empate e os jogadores choravam no vestiário lamentando a imaginária desclassificação, quando foram avisados que estavam classificados para a próxima fase. Houve comemoração e alívio.

No sábado, 26 de junho, um dia antes da partida contra a Hungria, quando a seleção definiria uma vaga na semifinal do torneio, uma mulher era o centro das atenções em solo brasileiro. A baiana Maria Marta Hacker Rocha, ou simplesmente Marta Rocha, aos 21 anos conquistava o título de Miss Brasil 1954. Descrita pela imprensa como uma mulher “com 1,70 metros, 57 quilos, cabelos louros e naturais e olhos azuis límpidos”, Marta Rocha venceu o concurso que fora promovido pelo Diário Carioca e as Folhas de S. Paulo (Folha da Manhã e Folha da Noite), com a colaboração da Universal Internacional Filmes.

A imprensa anunciava, ainda, que “a Miss Brasil concorrerá ao título de Miss Universo na mundialmente famosa Parada internacional de Long Beach”. O julgamento aconteceu no Hotel Quitandinha, Rio de Janeiro, e teve cerca de três horas de duração.

No concurso de Miss Universo, Marta Rocha ficou em segundo lugar, perdendo o título para a norte-americana Miriam Stevenson. Diz a lenda que a brasileira perdeu por ter duas polegadas a mais nos quadris. Marta Rocha, naquele concurso, foi eleita a garota mais popular entre todas as competidoras.

Marta Rocha, Miss Brasil 1954

Na Suíça, no domingo dia 27, não houve nenhum tipo de comemoração. Brasil e Hungria protagonizaram uma verdadeira batalha campal. Os húngaros venceram por 4 a 2, mesmo sem Puskas que, machucado, não teve condições de entrar em campo.

Em sete minutos os húngaros venciam por 2 a 0. O Brasil encarou a sensação da Copa, jogou o que a imprensa mundial considerou em ótimo nível, mas a velocidade húngara e a efetividade nas conclusões derrotaram a seleção brasileira.

Aquilo que ficou conhecida como a “Batalha de Berna” teve seu ponto alto aos 25 minutos do segundo tempo. Por troca de agressões, Nílton Santos e Bozsik foram expulsos pelo árbitro inglês Arthur Ellis, que fora bandeirinha na final da Copa de 1950. Imediatamente Humberto acertou uma voadora em Lorant e também foi expulso. No final do jogo os dois times voltaram a se enfrentar, fora do campo, e protagonizaram uma pancadaria generalizada. Maurinho deu um soco em Czibor e, no túnel de acesso aos vestiários, Puskas deu uma garrafada em Pinheiro, abrindo a testa do jogador brasileiro. A imprensa mundial criticou com veemência essa “batalha”.

E mais uma Copa se foi.

Olívia DeHavilland em cartaz em 1954 1958 – Suécia

Cartaz oficial da Copa de 1958

Ainda antes da Copa do Mundo do Brasil, a Fifa, reunida em Londres em 1948, anunciava a intenção de que a Suécia pudesse ser a anfitriã da Copa do Mundo de 1958, dez anos depois.

Essa decisão foi confirmada, de forma oficial, no Congresso da Fifa, no Rio de Janeiro, por ocasião do mundial do Brasil, em 1950.

Foi a primeira Copa do Mundo sem seu idealizador e maior incentivador. Jules Rimet havia falecido em 1956.

Nesse período a Fifa contava com 95 países filiados. Inscreveram-se para disputar as eliminatórias da Copa do Mundo da Suécia, 53 países para 14 vagas, já que a Alemanha Ocidental (campeã) e a Suécia (anfitriã) já estavam garantidas na disputa.

Durante o período das eliminatórias, as seleções de Chipre, Egito, Formosa, Turquia e Venezuela desistiram da competição.

Como surpresa as eliminatórias apresentaram a não classificação dos bicampeões mundiais, Uruguai, e da detentora do título de 1934, Itália. Paraguai e Irlanda do Norte foram classificados nessas vagas.

A Copa de 1958 foi a primeira em que todo o Reino Unido (Escócia, Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte) esteve presente e também a primeira em que a Fifa utilizou os critérios de equilíbrio de acordo com as regiões geográficas durante o sorteio dos quatro grupos. A Suécia utilizou 12 cidades para receber as partidas do mundial: Estocolmo, Gotemburgo, Malmoe, Norrkoping, Helsinborg, Halmstad, Eskilstuna, Boras, Orebro, Sandviken, Vasteras e Udevalla.

Foram construídos três estádios especialmente para a Copa: Tunavallen, em Eskilstuna; Nya Ulevi, em Gotemburgo e o Malmo , em Malmoe. Reformados e ampliados foram os estádios Rasunda, em Estocolmo e o Idrottsparken, em Norrkoping.

Just Fontaine

O artilheiro da competição foi , da França, que anotou 13 gols, ainda o recorde dos mundiais. O brasileiro Didi foi considerado o melhor jogador da Copa. Oficialmente, a , prêmio que a Fifa entrega para o melhor jogador do mundial, foi instituído em 1982. Mas, desde a primeira Copa, mesmo que informalmente, o melhor jogador era apontado.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A seleção brasileira vinha de duas decepções em Copas do Mundo. Mesmo oito anos depois, o Maracanazo não saía da mente dos brasileiros e das costas dos jogadores, mesmo daqueles que não haviam participado da final do mundial de 1950. A campanha de 1954 era sentenciada também como decepção. Para os torcedores e os cronistas esportivos a seleção brasileira deveria, pelo menos, ter disputado uma nova final.

Mesmo assim, a geração de atletas que estava surgindo fez os brasileiros renovarem as esperanças de conquistar a cobiçada taça de campeão mundial de futebol.

A delegação do Brasil chegou à Suécia com um elenco que misturava jogadores experientes e outros promissores. Entre os experientes pode-se destacar Didi, Nílton Santos e o capitão Bellini. Já entre os mais novos o Brasil tinha e um garoto de 17 anos com apelido diferente: Pelé. Logo o mundo veria que não era apenas o nome que era diferente...

O adversário de estreia, em 08 de junho, era a Áustria, seleção que chamava a atenção pela solidez da defesa e que anunciava a estratégia de tentar anular Didi e com marcação especial. Queriam deter justamente o habilidoso setor de criação do Brasil. A vitória por 3 a 0 foi incontestável. Os jogadores brasileiros conseguiram acabar com o poderio defensivo austríaco e praticamente não foram importunados na defesa, a ponto do goleiro Gilmar dizer que não entendia os aplausos que recebia dos torcedores suecos: “não sei porque me aplaudiram bastante. Meu trabalho foi fácil”.

Nílton Santos, autor de um dos gols do Brasil, saíra de campo feliz. Disse que tinha a intenção de fazer um gol no mundial. “Já marquei meu gol. Sinto-me satisfeito”, completou.

TV Record anunciava uma novidade, a exibição de filmes dublados na TV

A próxima partida era encarada como um desafio. A seleção teria os ingleses pela frente no dia 11 de junho. Relatos da imprensa brasileira dizem que a cidade de São Paulo parou para ouvir a transmissão do jogo através das diversas rádios que transmitiam aquela Copa. Alto-falantes foram colocados em diversas praças da cidade para que os torcedores pudessem se reunir e torcer juntos pela seleção.

O jogo contra a Inglaterra terminou zero a zero e não foi decepcionante. Ficou claro que as duas equipes tiveram oportunidades de gol, foi um jogo disputado e caracterizado pelo equilíbrio. Cronistas presentes no estádio e os próprios jogadores afirmavam que a seleção brasileira tinha atuado melhor do que na estreia.

Antes do terceiro jogo, contra a União Soviética, a comissão técnica brasileira estava pressionada. O garoto Pelé, recuperado de uma contusão que o tirara dos dois primeiros jogos, e o jovem Garrincha treinavam melhor que os outros. O técnico sentia que havia um desejo de todos para que esses dois jogadores entrassem no time. Nas competições e amistosos que antecederam a Copa do Mundo, Pelé ainda não havia conquistado a titularidade de fato. Feola utilizava a seguinte estratégia: em jogos no Maracanã, o meia Dida, craque do Flamengo, começava como titular. Isso aconteceu contra o Paraguai (vitória de 5 x 1 pela Taça Oswaldo Cruz) e Bulgária (vitória de 4 x 0 em amistoso). Em ambos os jogos Pelé entrou no lugar de Dida. Contra o Paraguai ainda fez três gols. Nos jogos em São Paulo, o craque do Santos começava a partida. Isso aconteceu contra o Paraguai (0 x 0 pela Taça Oswaldo Cruz), Bulgária (vitória por 3 x 1 em amistoso) e Corinthians (vitória por 5 x 0 em amistoso).

Anúncio de venda de aparelhos de TV em 1958. A Copa não foi transmitida ao vivo pela televisão, apenas pelas emissoras de rádio

Foi justamente no amistoso contra o Corinthians que Pelé se machucou, depois de uma forte entrada de Ari Clemente, conforme relato do ponta-esquerda Pepe ao site da CBF. Devido à contusão, Pelé não conseguiu participar de dois jogos amistosos na Itália, que antecederam a Copa. A seleção venceu a Fiorentina (4 x 0 em Florença) e a Internazionale (4 x 0 em Milão). Por isso, não se sabia qual seria a posição do técnico Feola com Pelé em condições e Garrincha treinando muito bem. Havia uma tendência para que o treinador aproveitasse os craques no segundo tempo.

Para que o assunto não se tornasse um problema maior, o chefe da Delegação Paulo Machado de Carvalho decidiu, então, consultar os jogadores mais velhos sobre colocar como titular Pelé e Garrincha. Durante a conversa houve o que Bellini, Nílton Santos e Didi chamaram de “uma espécie de rebelião” para que Feola colocasse os garotos no time. Por isso, no domingo 15 de junho de 1958 o mundo pôde conhecer Pelé e Garrincha, maiores símbolos de uma geração talentosa e que mudou o patamar do Brasil no cenário futebolístico. Com Pelé e Garrincha o país deixou de ser uma referência de bom futebol na América do Sul para ser o país do futebol mundial.

O Brasil venceu a União Soviética por 2 a 0, garantindo a sua classificação para as quartas de final, com dois gols do rápido atacante Vavá, agora melhor acompanhado no ataque.

O mundo imediatamente repercutiu a atuação brasileira. O jornal sueco “Svenska Dagbladet” estampou uma matéria com oito colunas para comentar que “os brasileiros jogaram como campeões mundiais”. A Folha da Manhã, em São Paulo, dizia que fora uma “exibição de classe”. Gabriel Hanot, cronista francês, sentenciou: “O Brasil brincou com a União Soviética”.

Se a seleção evoluía em gramados suecos, em São Paulo a CMTC (Companhia Municipal de Transporte Coletivo) anunciava a aquisição de mais 120 micro-ônibus para as novas linhas que passariam a servir o bairro da Penha pela Marginal Tietê, Tremembé, Lapa, Cidade Vargas, Pinheiros e o aeroporto de Congonhas.

A TV, que ainda engatinhava, já começava a anunciar seus programas em jornais e a rivalizar com o rádio, então aparelho de comunicação de massa. Todas as segundas- feiras, por exemplo, a TV Paulista apresentava o programa “Em Nome Da Lei”, a partir das 22h10. Nesse programa, contos policiais eram dramatizados, com a produção de Seabra.

A partida válida pelas quartas de final da Copa de 1958 foi contra o País de Gales, em 19 de junho. Já apontado como favorito e o grande salvador da honra dos sul-americanos, o Brasil precisou ter paciência para furar o bloqueio dos galeses. A vitória aconteceu com um gol de Pelé, o primeiro do rei do futebol em Copas do Mundo e que teve a importância de levar a seleção para a semifinal, já garantindo estar entre as quatro melhores seleções do mundo.

Os críticos presentes na Suécia entenderam a atuação brasileira como “excelente”. Apontavam alguns erros de chutes de longa distância, mas em momento algum questionaram o merecimento da vitória. Era uma classificação com bastante dificuldades e muitos méritos.

Nesse momento da competição os brasileiros já esperavam a conquista tão aguardada do primeiro título mundial. Além de ganhar as partidas, a seleção jogava bonito e encantava o mundo. Rival na semifinal, a França, que contava com o artilheiro da Copa, o rápido atacante Just Fontaine, era encarada como o penúltimo obstáculo ao título mundial.

Enquanto isso, os jogadores da Argentina, última colocada do grupo 1 na primeira fase, na sua pior participação em mundiais, eram recebidos com uma chuva de moedas em Buenos Aires. Milhares de pessoas foram ao aeroporto esperar a chegada dos atletas argentinos, eliminados depois de levarem uma goleada de 6 a 1 da Tchecoslováquia. Bombeiros tiveram que usar mangueiras para conter a multidão que rotulara os jogadores como “bêbados e degenerados”. Moedas de 10 e 20 centavos foram atiradas nos atletas em sinal de desprezo.

No Brasil, a rádio Nacional do Rio de Janeiro anunciava a transmissão do confronto contra a França em cadeia com mais de 100 emissoras de todo o país, com destaque para as rádios Mayrynk Veiga (Rio de Janeiro), Nacional (São Paulo), Sociedade (Porto Alegre), Guarani (Belo Horizonte), Clube Paranaense (Curitiba) e Marumbi (Curitiba). A rádio Nacional prometia instalar alto-falantes em grandes cidades de todos os estados brasileiros. O país estava mobilizado.

O genial Cantinflas estava em cartaz

Naquele 24 de junho, a França apenas resistiu no início da partida. Com o passar do tempo, os atletas brasileiros foram se tranquilizando em campo, deixando fluir o futebol que encantava o mundo e o resultado não poderia ser outro: 5 a 2 e a classificação para a segunda final de Copa do Mundo da sua história.

O mundo se curvava rapidamente ao Brasil. A atuação contra a seleção francesa foi rotulada como “brilhante”. Pelé já era considerado um goleador e Garrincha um jogador “do outro mundo” pelos jornalistas na Suécia.

As tabelas de Vavá e Pelé enlouqueceram os amantes do futebol rápido e habilidoso. Diziam os franceses que aqueles lances colocaram “em polvorosa a defesa da França”, que não sabia como marcá-los. Os suecos disseram: “Garrincha aproveitou o baile para se divertir com seus marcadores”. Cercada de ansiedade e otimismo, com a população brasileira nas ruas, praças lotadas, Brasil e Suécia disputaram no domingo, dia 29 de junho, a grande final daquela Copa. Mais uma vez o Brasil tinha vários desafios: conquistar a Copa, vencer o fantasma da derrota de 1950, confirmar o favoritismo e, para isso, derrotar os donos da casa, que também tinham a missão de não decepcionar um povo que viveu intensamente aquele evento.

Manchete da Folha da Manhã

Um dia antes da final, as autoridades suecas foram desafiadas. Um anúncio de meia página num jornal oferecia ingressos para assistir a final na tribuna de honra do estádio Rasunda, em Estocolmo.

A United Press Internacional ligou para o telefone que constava no anúncio. A pessoa informou que o ingresso já fora vendido ao preço de 200 coroas, praticamente quatro vezes mais do que custava oficialmente. Para outros locais do estádio, a polícia encontrou o que chamamos de cambistas, vendendo entradas até 10 vezes mais caras.

Na concentração brasileira, o chefe da delegação, Paulo Machado de Carvalho, teve bastante sensibilidade ao tratar um fato que hoje parece corriqueiro, mas que poderia causar problemas psicológicos ao Brasil. Como a Suécia jogaria a decisão de amarelo, coube a seleção brasileira mudar a cor do uniforme. Como ninguém mais aceitava a camisa branca depois da derrota de 1950, aquele que ficou conhecido como o “Marechal da Vitória” convenceu os atletas que iriam jogar com o manto de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil. Por isso, a seleção adotou o segundo uniforme na cor azul, cujas camisas foram encontradas em lojas comuns do comércio na Suécia.

Na decisão os brasileiros confirmaram a beleza de seu futebol. Com alegria, toque de bola, criatividade, a seleção venceu sua primeira final de Copa do Mundo de maneira incontestável. Foram 5 a 2 nos donos da casa, com gols de Vavá (2), Pelé (2) e Zagallo. Após o apito final, o choro do menino Pelé, abraçado ao goleiro Gilmar, emocionou a torcida sueca, que aplaudiu de pé uma seleção que acabava de entrar para a história.

A imprensa mundial repercutiu com elogios a vitória brasileira. Em Estocolmo a manchete dizia que fora “a derrota mais popular da Suécia”. Londres disse que “o Brasil executou uma sinfonia de futebol”. Em Viena, a imprensa estampava que “os mágicos da pelota fizeram dos outros simples figurantes”. Os argentinos afirmaram que “o futebol sul-americano está na vanguarda”.

No Brasil, a imprensa também reconheceu a competência dos brasileiros e o fascínio que aqueles jogadores provocaram nos europeus. A Folha da Manhã afirmou que “foram 90 minutos de suspense e explosão delirante no final”. Os críticos atestavam que “o fenômeno Garrincha era difícil de ser marcado”.

A definição de toda a apoteose e simbiose vivida pelos torcedores e a seleção brasileira foi feita pela Folha da Manhã, afirmando que “o povo viveu o carnaval que o calendário marca para fevereiro”.

O bom humor, característico dos brasileiros, foi expressado pelo Governo do Estado de São Paulo, então comandado por Jânio Quadros, que decretou ponto facultativo no dia da chegada dos atletas à capital paulista. Afirmando que seria servido um almoço aos heróis brasileiros, o Governo fez uma alusão aos adversários da campanha vitoriosa ao anunciar o cardápio. “O almoço terá salada russa (União Soviética), champanha francesa (França), arenques suecos (Suécia), tudo com molho inglês (Inglaterra)”.

O Brasil era campeão!

Anúncio com referência ao Dia dos Namorados, publicado durante a Copa do Mundo

Anúncio de venda do LP contendo as narrações dos gols da campanha brasileira 1962 – Chile

Cartaz da Copa de 1962

A realização da Copa do Mundo no Chile foi um grande exemplo de superação.

Durante a realização da reunião do seu Comitê-Executivo, em 10 de junho de 1956, em Lisboa, a Fifa estava decidida a realizar a Copa do Mundo de 1962 em terras sul-americanas, que não recebia o evento desde 1950. Eram duas Copas seguidas na Europa e a entidade queria evitar a terceira.

Na abertura do encontro dos países-membros, inscreveram-se como postulantes à sede do torneio a Espanha, Alemanha, Argentina e Chile. Com a manifestação da Fifa em realizar a Copa na América do Sul, restaram Argentina e Chile.

Os argentinos estavam contrariados pois desde 1938 eram preteridos como anfitriões da Copa do Mundo, que já tinha sido realizada pelos seus rivais Brasil e Uruguai. Os argentinos apresentaram excelente infraestrutura e caminhavam para a conquista, enfim, da realização do torneio.

Coube ao dirigente chileno, presidente há menos de um ano da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol), Carlos Dittborn Pinto, nascido no Rio de Janeiro, filho de Eugênio Dittborn, então cônsul-geral do Chile no Brasil, reverter a situação e levar a realização da Copa do Mundo para seu país.

Em seu discurso chamou a atenção da Fifa para um dos artigos do seu estatuto, que dizia que a entidade tinha a missão de desenvolver o futebol em todo o planeta. Ele mostrou que na Argentina, que ofereceu quatro estádios para mais de 100 mil pessoas, o futebol estava bem desenvolvido. Segundo o jornal chileno “El Mercúrio”, Dittborn terminou seu emocionante discurso com a seguinte frase: “porque nada tenemos, lo haremos todo” (porque nada temos, faremos tudo). Ele conquistou o voto de 65% dos membros da Fifa. E a Copa foi para o Chile.

Carlos Dittborn

Tudo caminhava muito bem na preparação chilena para receber a Copa até a tarde do domingo 22 de maio de 1960. Um terremoto, que atingiu 9,5 na escala Richter, praticamente deixava o país sem condições de promover o torneio. Uma catástrofe!

Dittborn procurou o presidente chileno Jorge Alessandri e disse que devolveria todo o dinheiro do país empregado na realização do mundial de futebol. Alessandri não aceitou, pediu para que Dittborn mantivesse os preparativos para a realização do evento porque o povo chileno precisava da Copa. E assim foi feito.

Dittborn não conseguiu assistir a sonhada Copa no Chile. Um mês antes do evento morreu num acidente automobilístico. O estádio de Arica, com capacidade para 13 mil pessoas, construído especialmente para aquela Copa do Mundo, leva seu nome. Na placa que simboliza a inauguração, logo abaixo do seu nome está a enfática frase que encerrou o discurso na Fifa em 1956.

Inicialmente programada para ter oito cidades-sede, a organização reduziu para apenas quatro: , Viña del Mar, Arica e Rancgua.

No mundial de 1962 foi a primeira vez que a Fifa permitiu que um atleta defendesse outra seleção que não a do país natal, mesmo que já tivesse atuado por ela. Foram os casos de Di Stéfano (argentino), Puskas (húngaro) e Santamaria (uruguaio) que jogaram pela Espanha e Mazola (brasileiro campeão mundial de 1958), Maschio (argentino) e Sivori (argentino), que defenderam a Itália.

Na maioria dos sites e almanaques sobre as Copas do Mundo, consta que os artilheiros da edição de 1962 foram Vavá (Brasil), Garrincha (Brasil), Sanchez (Chile), Albert (Hungria), Ivanov (União Soviética) e Jerkovic (Iugoslávia) com 4 gols cada. Porém, em 1993 foi revisto o filme do jogo Iugoslávia 5 x 0 Colômbia, no estádio Carlos Dittborn, em Arica, pela última rodada da primeira fase do Grupo A. Notou-se que o terceiro gol iugoslavo foi anotado por Jerkovic e não por Galic, como está na súmula do jogo. Dessa forma, Jerkovic teria cinco gols e seria o artilheiro isolado da Copa de 1962.

Lev Yashin, um dos destaques da Copa

SELEÇÃO BRASILEIRA

O então atual campeão mundial chegou ao Chile favorito. Dividia as atenções com a União Soviética, que despertava interesse por ser a campeã europeia de 1960 e que tinha no gol Lev Yashin, que se transformaria em lenda do futebol, tido por muitos especialistas como o maior goleiro de todos os tempos. Era conhecido como “Aranha Negra”, porque os críticos diziam que ele tinha “vários braços” e por isso defendia tantas bolas....

A seleção pouco mudou seu elenco. A base era o time campeão mundial quatro anos antes. Pelé e Garrincha já tinham fama mundial e deixaram de ser revelações para se tornarem referências brasileiras. Todos os adversários do Brasil tentavam marcar a dupla.

A estreia aconteceu em 30 de maio, uma quarta-feira à tarde, dia em que a Folha da Manhã noticiava que uma equipe dos Estados Unidos poderia ir à lua em 1965. Isso só aconteceu em 20 de julho de 1969, com os astronautas Neil Armstrong e Edwin Aldrin.

A vitória sobre o México por 2 a 0 ratificou a expectativa do mundo do futebol e a confiança dos brasileiros no segundo título mundial. O torcedor brasileiro havia sentido o gosto de ser campeão mundial, e queria mais. Os jornais do Chile diziam que “foi a vitória dos favoritos” e que Pelé, ao fazer o primeiro gol, abrira o “ferrolho mexicano”.

O drama brasileiro começou aos 28 minutos do primeiro tempo do segundo jogo do Brasil, no sábado dia 02 de junho. Pelé fazia uma jogada individual e ao finalizar para o gol da Tchecoslováquia deu um grito e caiu no gramado. O melhor jogador do mundo estava fora da Copa com um estiramento muscular. O empate em zero a zero foi amargo.

Folha de S. Paulo anuncia o início da Copa de 1962

Amarildo foi o foco das atenções dos brasileiros. O meia-atacante do Botafogo (RJ), camisa 20, era o substituto do camisa 10 brasileiro, na partida contra a Espanha, em 06 de junho, quarta-feira. Destaque da Espanha, o argentino Di Stéfano também não pôde atuar contra o Brasil, que estaria classificado com o empate.

A vitória veio de virada por 2 a 1, com dois gols de Amarildo, que com boa atuação acalmava e renovava a esperança da torcida brasileira, atenta às transmissões de rádio diretas do Chile. Para a imprensa brasileira, Amarildo cumprira a missão de fazer gols.

Amarildo, que substituiu Pelé em 1962

Além de futebol, a seleção contou com a malandragem do lateral Nílton Santos e com a ajuda do árbitro chileno Sérgio Bustamante. O jogo ainda estava 1 a 0 para os espanhóis quando o atacante Collar entrou na área e foi derrubado por Nílton Santos que, imediatamente, levantou o braço acusando a autoria da falta, mas deu um passo para frente e saiu da área brasileira. Bustamante assinalou a falta fora da área e não o pênalti.

Na sequência do lance, Peiró acerta uma bicicleta espetacular. Era o segundo gol da Espanha. Bustamante assinalou “jogo perigoso” do atleta espanhol e anulou o gol. Para a imprensa brasileira, Amarildo cumprira a missão de fazer gols.

O italiano Peppino di Capri estava no Brasil

Ainda sem o costume de decretar ponto facultativo nos jogos do Brasil, a imprensa destacava que as autoridades deixavam seus afazeres nas repartições públicas para dar especial atenção à transmissão das partidas, que aconteciam no período da tarde. Para a população em geral, serviços de alto-falantes eram colocados em praças públicas. Existia um feriado de fato, mas não de direito.

Em 10 de junho, domingo, o Brasil tinha um jogo eliminatório contra a sempre difícil Inglaterra. Naquele dia a secretaria de Saúde de São Paulo finalizava a segunda fase da vacinação para a erradicação da paralisia infantil. Balanço divulgado no sábado dava conta que haviam sido vacinadas 620 mil crianças.

Sem Pelé, coube a Garrincha ser decisivo no Chile. Quando mais o time precisou de sua genialidade, ela não faltou. Foram dois gols na vitória de 3 a 1 sobre os ingleses. O terceiro foi de Vavá. O atacante do Palmeiras se entendia muito bem com o ponta do Botafogo.

A imprensa inglesa definiu o Brasil como “um conjunto de diamantes” e que “Garrincha presenteou o povo com uma atuação espetacular”. O Brasil chamava a atenção do mundo pela sua quantidade de craques. Para o torcedor brasileiro foi um domingo de muita festa. A semifinal se aproximava e quem procurou um bom programa para amenizar a ansiedade encontrou no cine Mônaco, na segunda-feira, quando estreou o filme “O Corcunda de Notre Dame”, com Gina Lollobrigida e Anthony Quinn. O longa-metragem seria um dos épicos do cinema no século 20.

Anúncio da rádio Bandeirantes de transmissão de partida do Brasil

Ainda com a expectativa pela volta de Pelé – o que não aconteceu -, já que o atleta ainda fazia tratamento intensivo na concentração brasileira, o Brasil enfrentou a seleção anfitriã na semifinal. Junto com a seleção chilena toda a expectativa e a comoção do povo do Chile, pelo sofrimento para que aquela Copa fosse realizada e a luta para chegar à final.

Mesmo sem Pelé, o Brasil, que era apontado como favorito, confirmou o prognóstico com uma atuação sensacional. Garrincha marcou duas vezes, a primeira logo aos 8 minutos, e silenciou o estádio Nacional em Santiago. O Chile diminuiu e foi a vez de Vavá marcar mais duas vezes. No final, 4 a 2 para os brasileiros.

Um incidente quase mancha a beleza do futebol brasileiro e a Copa que fazia Mané Garrincha. Quando o jogo já estava definido, cansado de ser “caçado” pela defesa chilena, Garrincha deu um chute no lateral Eladio Rojas, que estava caído. O brasileiro foi expulso de campo. Tentando conquistar a torcida chilena para que não ficasse contra os brasileiros na final, quando acabou a partida os jogadores do Brasil deram a volta olímpica com a bandeira do Chile, cumprimentando os torcedores. Não precisou mais nada. A seleção brasileira foi ovacionada pelo estádio e ganhou a simpatia para a grande final contra a Tchecoslováquia.

Brasileiros dão a volta olímpica com a bandeira do Chile, conquistando a simpatia da torcida anfitriã

Nos dias que antecederam a partida, o Brasil ganhou nos bastidores. Garrincha, em teoria, não poderia atuar já que fora expulso na semifinal. Acontece que, no julgamento de Garrincha pela Fifa, constatou-se que o árbitro peruano Arturo Yamazaki não havia relatado na súmula a expulsão. Não havia provas, portanto. Procurou-se, então, o bandeirinha uruguaio Esteban Martino. Foi constatado que ele havia sumido. Garrincha jogou a final.

Brasileiros e tchecos entraram no gramado do estádio Nacional de Santiago as 15h30 do domingo, 17 de junho. A imprensa brasileira dizia que o bicampeonato estava próximo. No Chile havia muita alegria com a conquista do terceiro lugar pela seleção anfitriã. O técnico Aymoré Moreira dizia que a tática era atacar em massa. Pelé foi mais uma vez vetado. Entendia-se que escalar o atleta era arriscado. O craque brasileiro assistiu e vibrou com a vitória, de virada, por 3 a 1 e a conquista do bicampeonato mundial.

Amarildo, o substituto de Pelé, mais uma vez foi brilhante. Apenas dois minutos depois do Brasil levar o gol, empatou a partida. No segundo tempo, Zito e Vavá confirmaram a vitória brasileira, bastante comemorada pelos 68.679 torcedores que pagaram ingresso.

Festa, rojões, comemorações nas ruas das cidades brasileiras e o sentimento de “somos os melhores do mundo”. Assim estava o Brasil naquele domingo. Depois da dor de 1950, a torcida comemorava de novo.

E queria mais. Anúncio comemora o título brasileiro

Folha de S. Paulo, edição do título mundial Mais um anúncio aproveitando o título brasileiro 1966 – Inglaterra

Cartaz oficial da Copa de 1966

A Copa do Mundo chegava ao país que inventou o futebol. É justamente por isso que os ingleses sempre tiveram o respeito do mundo do futebol, algumas vezes sem merecê-lo dentro de campo.

O inglês Arthur Drewry era presidente da Fifa na realização do 32º Congresso da entidade, em 22 de agosto de 1960, em Roma, agendado para definir o país-sede da Copa de 1966. Drewry sucedeu na presidência da Fifa o belga Rodolphe William Seeldayers, interino por 15 meses, desde o falecimento de Jules Rimet. Drewry foi eleito em 07 de junho de 1955 e permaneceu na direção da entidade até seu falecimento, em 1961. Foi sucedido pelo também inglês, Stanley Ford Rous.

Os países-membros deveriam optar entre Inglaterra, Espanha e Alemanha Ocidental. Antes que a votação tivesse início, a Espanha comunicou a sua decisão de não participar da eleição, que foi feita apenas com a Inglaterra e Alemanha Ocidental. A vitória dos ingleses foi apertada: 34 a 27.

O motivo alegado para a escolha dos ingleses foi o centenário da Football Association (FA), a primeira associação de futebol do mundo. Fundada na Inglaterra em 22 de outubro de 1863, a Football Association formulou as regras do esporte. Desde então, as regras sofreram poucas mudanças. A FA é membro da UEFA (União Europeia de Futebol) e da Fifa e tem acento permanente na International Football Association Board (Ifab), entidade responsável pelas regras do futebol. É a FA que governa a Premier League, a liga inglesa de futebol.

A Inglaterra não construiu estádios para a Copa. Wembley, em Londres, considerado o “templo do futebol”, era o estádio mais novo e já tinha 43 anos. Quatro estádios foram construídos no final do século 19 e outros quatro no início do século 20. As cidades que sediaram as partidas foram: Londres, Manchester, Liverpool, Middlesbrough, Sheffield, Birmingham e Sunderland.

Inscreveram-se para as eliminatórias 71 países dos 110 filiados. Dois países foram suspensos por motivos políticos: a Coreia do Norte e a África do Sul (apertheid). Os outros 18 países do continente africano fizeram boicote em razão da África não ter uma vaga garantida. A melhor seleção africana tinha que decidir a vaga com a melhor seleção de outro continente.

Willie, mascote da Copa

Foi a primeira vez que a Copa do Mundo teve um mascote. O escolhido foi o leão Willie. O leão é considerado um símbolo típico do Reino Unido.

O artilheiro da Copa de 1966 foi o craque de Portugal, o moçambicano Eusébio, que anotou nove gols. Ao longo dos anos, Eusébio ensaiou uma rivalidade com o brasileiro Pelé. Chegou a ser chamado de “Pelé da Europa”.

Bobby Charlton, o maior jogador inglês de todos os tempos, foi considerado o craque do mundial. A carreira de Charlton é uma das mais belas do futebol mundial, mas quase foi interrompida naquela que é considerada a “Tragédia de Munique”.

Parte do avião que levava a equipe do Manchester United

Bobby Charlton era um dos jogadores do Manchester United em 05 de fevereiro de 1958, na partida de volta das quartas de final da Copa dos Campeões da Europa (atual UEFA Champions League) contra o Estrela Vermelha, em Belgrado, Iugoslávia. O confronto terminou em 3 a 3, com o United classificado porque havia vencido os iugoslavos por 2 a 1 na Inglaterra. Na viagem de volta, em 06 de fevereiro, o bimotor Airspeed Ambassador, da British European Airways, transportava 44 passageiros, entre atletas, membros da comissão técnica e torcedores do Manchester United. Houve uma escala em Munique para reabastecimento e o tempo era muito ruim, com uma tempestade de neve. Depois da terceira tentativa de levantar voo, a lama na pista acabou prejudicando o procedimento, o avião chocou-se com uma casa, causando um gravíssimo acidente, matando 23 pessoas, sendo oito jogadores do lendário time do técnico Matt Busby e três membros da comissão técnica.

Bobby Charlton, então com 20 anos, sobreviveu à queda. Os jogadores que morreram no acidente foram: Duncan Edwards (que atuava pela seleção inglesa), Roger Byrne, Mike Jones, Eddie Colman, Tommy Taylor, Lian Whelan, David Pegg e Geoff Bent. Em dezembro de 2016, Sir Bobby Charlton, em entrevista ao site UOL Esporte, disse que pensa no acidente todos os dias. “Eu não acho que tive sorte ou algo assim. Nunca pensei desse jeito. Como pode eu estar bem e todos os outros terem ido embora? Você se sente um pouco culpado, mesmo agora enquanto digo isso”, afirmou

Depois de ser resgatado do acidente, Charlton permaneceu duas semanas internado em Munique. Ele disse que viveu situações que por muito pouco não colocaram fim à sua carreira. Para ele, foi necessário aprender a lidar com a dor e a saudade.

Oito anos depois, Bobby Charlton era escolhido como o melhor jogador da Copa, conquistada pela Inglaterra ao derrotar a Alemanha Ocidental por 4 a 2, depois de empate em 2 a 2 no tempo normal.

O terceiro gol, anotado por Hurst, é considerado um dos maiores erros da história das copas. O inglês chuta, a bola bate no travessão e cai em cima da linha. O árbitro suíço, Gottfried Dienst, confirma o gol. Esse erro não pode manchar a conquista de um time que tinha o espetacular goleiro Gordon Banks e craques como o próprio Bobby Charlton, , Hurst, Peters e Hunt.

A taça Jules Rimet foi entregue a Bobby Moore, capitão da Inglaterra, pela rainha Elizabeth, que torceu e vibrou durante toda a partida.

Enfim, os inventores do futebol conquistavam a Copa.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Poucas vezes na história das Copas, uma seleção chegou ao torneio com tanto favoritismo como o Brasil em 1966. Com um time recheado de craques remanescentes das duas conquistas anteriores, como Pelé, Garrincha, Gilmar e Bellini, além de promessas como Gérson e Tostão, a seleção era temida pelos ingleses a ponto de os organizadores da Copa estarem preocupados pela possibilidade de a Inglaterra cair no grupo brasileiro logo na primeira fase, o que não ocorreu. Havia uma campanha nacional da torcida brasileira pelo tricampeonato mundial. A confiança entre os cronistas esportivos era grande, mas foi diminuindo de acordo com as confusões da comissão técnica, desta feita voltando às mãos de Vicente Feola, técnico de 1958.

Manchete da Folha de S. Paulo na estreia do Brasil na Copa de 1966

Nesta Copa valeu a máxima do futebol quando um time é muito favorito: O Brasil só perderia a Copa “para ele mesmo”. E perdeu.

Feola mostrou-se perdido. Para o período de preparação convocou 45 jogadores. Depois, já durante os treinamentos, convocou mais dois, totalizando 47 atletas à sua disposição. Eram quatro times treinando.

Para complicar ainda mais, a seleção não se fixava numa cidade para os treinamentos. Muitos políticos queriam tirar proveito da seleção bicampeã mundial. Antes de viajar para a Inglaterra, a seleção brasileira realizou etapas de treinamentos em Caxambú (MG), Lambari (MG), Teresópolis (RJ), Três Rios (RJ) e Niterói (RJ).

Outra mudança que não deu certo foi na preparação física. Saiu o vencedor e entrou uma verdadeira aposta da comissão técnica, o professor de judô, Rudolf Hermanny, cujos métodos nunca haviam sido testados em atletas de futebol. O resultado foi uma preparação física muito abaixo das seleções do mundial. Aos 20 minutos do segundo tempo o time “morria” em campo e acabou como presa fácil dos adversários, mesmo tendo os melhores jogadores do mundo.

A estreia brasileira aconteceu em Liverpool, na terça-feira 12 de julho, quando o Brasil derrotou a Bulgária por 2 a 0. A televisão, que estava cada vez mais presente na vida das pessoas, em franco desenvolvimento no país, apresentou o “vídeo teipe” do jogo, em São Paulo, as 22h00 do dia 13. A partida foi a última que a seleção teve Pelé e Garrincha atuando juntos e eles marcaram um gol cada um.

Quando Pelé, que sofreu com a violência búlgara, abriu o marcador, aos 14 minutos do primeiro tempo, a praça da Sé em São Paulo teve um carnaval. Ainda assim alguns torcedores entraram em confronto pela rivalidade entre os clubes de futebol. Para a imprensa, a vitória dava “tranquilidade ao Brasil”, mesmo a seleção não tendo jogado bem.

As manchetes mudaram radicalmente para “Tri mais difícil” depois da derrota por 3 a 1 para a Hungria, na sexta-feira, 15 de julho. Sem Pelé, contundido depois de ser “caçado” pelos marcadores búlgaros, o Brasil foi apático e não teve criatividade. Feola mudara radicalmente a equipe, deixando claro que não tinha certeza de nada do que estava fazendo. A insegurança do treinador parece ter passado para os torcedores que, insatisfeitos, provocaram tumulto na praça da Sé após o jogo. A polícia foi chamada e prendeu vários torcedores.

Mesmo ainda sem Copa ao vivo, empresas aproveitavam para vender aparelhos de TV

Na partida decisiva para a classificação, com a seleção precisando vencer por três gols, as manchetes no Brasil reproduziam o pensamento dos torcedores: “Só Pelé salva a seleção”, dizia a Folha de S. Paulo. Abaixo da manchete, a declaração de Feola: “Só Pelé está escalado”. Ele não tinha um time titular em plena Copa do Mundo.

Não poderia dar certo. Portugal começou o jogo contra o Brasil, naquela terça- feira, 19 de julho, como a sensação da Copa. Era a primeira participação portuguesa num mundial e o moçambicano Eusébio vinha fazendo a diferença. Mais uma vez Pelé foi caçado, não conseguia articular uma jogada que era parado violentamente pelos portugueses. O resultado foi um incontestável 3 a 1 para Portugal e o Brasil se despedindo com um dos piores desempenhos da sua história.

Houve correria, tumulto e tiros na praça da Sé, em São Paulo. O técnico de Portugal, o brasileiro Oto Glória, que fora cotado para dirigir o Brasil, disse que a seleção teve um “esquema defensivo”. Folha de S. Paulo e a confusão na praça da Sé depois do jogo contra a Hungria

Em janeiro de 2018, Pelé declarou em entrevista ao Sportv, que se preparou para aquela Copa do Mundo ser a última da sua carreira. “Estava muito bem fisicamente, me preparei bastante para encerrar a minha participação em Copas com o tricampeonato, mas infelizmente não conseguimos aquele título”, disse. Mesmo com apenas 25 anos e no auge da forma física, Pelé tinha a intenção de disputar a sua última Copa. Ele sempre teve a filosofia de encerrar sua carreira na seleção em alta, nada melhor que um terceiro título na sua terceira Copa. Não deu e Pelé teve que mudar seus planos.

E o futebol agradeceu.

"Morte e Vida Severina" em cartaz durante a Copa 1970 – México

Cartaz oficial da Copa de 1970

O México foi escolhido como país-sede da Copa do Mundo de 1970 durante as Olimpíadas de Tóquio, em 1964. A decisão de seguir o rodízio entre os continentes estava mantida, por isso apenas o México e, mais uma vez, a Argentina se candidataram. Os argentinos tentavam sediar uma Copa desde 1938, mas não levaram novamente.

A escolha do México foi por 56 votos contra 32 entre os países-membros da Fifa. Cabia a Argentina se contentar com a realização da Copa de 1978, respeitando o rodízio de continentes.

Pesou para o México ser escolhido o fato de a Cidade do México ser sede dos Jogos Olímpicos de 1968. Isso revelava que o país tinha infraestrutura para oferecer aos atletas e turistas que acompanhariam aquele mundial, que se tornou cada vez mais um sucesso de público. Um fator negativo, que quase atrapalhou as pretensões mexicanas, foi a altitude. A Fifa já pensava no mundial fora das quatro linhas, envolvendo turismo e fatores comerciais.

Nenhum estádio foi construído especialmente para a Copa do Mundo de 1970. O México utilizou cinco cidades: Cidade do México, , León, Puebla e Toluca. O estádio mais novo era o Cuauhtémoc, em Puebla, construído em 1968.

Participaram das eliminatórias para a Copa do México 70 países. Houve desistências por motivos políticos, como a Coreia do Norte que se recusou a enfrentar Israel. Países que sempre geravam boas expectativas ficaram de fora da Copa, casos de Portugal (que naquele momento só havia participado de uma Copa, mas tinha fortes clubes como o Benfica), França, Hungria (até então tradicional em Copas), Argentina e Espanha.

Juanito, mascote do México 1970

O mascote escolhido foi o “Juanito”, vestido com tradicional “sombrero”, representando a cultura e o povo mexicano.

Foi na Copa do México de 1970 a primeira vez que foi permitida a substituição de jogadores. O primeiro atleta a ser substituído na história das Copas foi o soviético Viktor Serebryanikov. No intervalo do jogo de abertura entre México e União Soviética deu lugar a Anatoly Puzach. O confronto terminou em zero a zero.

Também pela primeira vez, a Fifa instituiu a apresentação de cartões amarelos (advertência) e vermelhos (expulsão). A inspiração para a apresentação de cartões veio de um fato que aconteceu nas quartas de final da Copa de 1966.

Jogavam Inglaterra e Argentina no estádio de Wembley, jogo que eliminaria os sul-americanos. O capitão da Argentina, Rattín, contestou a marcação de uma falta contra seu selecionado. O árbitro alemão não compreendia nada de espanhol. Para mostrar que o argentino estava expulso de campo, Kreitlein usou o dedo indicador e apontou para o jogador sair. Rattín também não entendia o que o alemão queria dizer e, já em desespero, pedia a presença de um tradutor em campo. De nada adiantou, Rattin foi expulso por reação acintosa.

Em protesto, o argentino saiu de campo e foi se sentar na cadeira reservada para a rainha da Inglaterra, que não estava no estádio. Não contente, Rattín ainda quebrou o mastro com a bandeirinha do escanteio que tinha a bandeira da Inglaterra.

Naquele dia eram três idiomas em campo. O alemão, do árbitro, o inglês e o espanhol dos argentinos. Estava criada uma polêmica, a necessidade de uma linguagem específica e universal dentro do campo, principalmente para evitar situações extremas como aquela e, também, para que o público e o próprio telespectador - já uma figura presente nos mundiais - entendessem o que estava acontecendo.

Coube ao inglês Keen Aston, o chefe da arbitragem na Copa de 1970, tentar resolver essa questão. Ele chegou ao México ainda sem qualquer decisão. Saiu do aeroporto e pegou um taxi. Ao veículo parar, Aston se inspirou nas cores do semáforo, uma linguagem universal, para instituir os cartões vermelho (pare) para a expulsão e o amarelo (atenção) como a advertência. Estava “inventada” a linguagem universal do futebol.

No jogo de abertura, cinco jogadores receberam o cartão de advertência (amarelo). Durante toda a Copa do Mundo nenhum jogador foi expulso.

Recheada de craques, a Copa de 1970 teve grandes jogos e, entre eles, aquele que foi considerado o “jogo do século”, na semifinal, em 17 de junho, no estádio Azteca, entre Alemanha Ocidental e Itália, que classificou os italianos para enfrentar o Brasil na final.

Logo aos 8 minutos a Itália marcou com Boninsegna. As equipes jogaram em nível máximo toda a partida, que chegava aos 45 minutos do segundo tempo. Parecia que estava tudo decidido. Italianos em festa nas arquibancadas, até que Schennellinger empata para os alemães no último lance, levando a semifinal para a prorrogação.

O tempo extra começou com gol do artilheiro da competição. Gerd Muller colocou a Alemanha Ocidental na frente aos 4 minutos. Antes do final do primeiro tempo da prorrogação a Itália já tinha virado com gols de Burgnich, aos 8 minutos e Riva aos 14 minutos.

Placa no estádio Azteca faz alusão ao confronto histórico entre Itália e Alemanha Ocidental como “Partida do Século”.

Aos 5 minutos do segundo tempo, o artilheiro Gerd Muller empata novamente. Apenas um minuto depois, Rivera desempatou. A vitória de 4 a 3 colocou a Itália na final. Foi a única partida da história das Copas que contou com cinco gols na prorrogação.

Esse confronto ficou marcado também pela superação e raça do craque alemão . Perto do final do tempo normal, o Kaiser alemão sofreu um deslocamento do seu ombro. Sentindo muitas dores, Beckenbauer tinha duas opções. A primeira seria deixar o gramado e a sua seleção atuar com dez jogadores até o final ou permanecer, mesmo com a contusão e suas consequências.

Beckenbauer foi à beirada do campo, enfaixou seu ombro, impedindo movimentos do braço direito e voltou ao campo, numa das atitudes mais dramáticas e de amor à seleção já vista em Copas do Mundo. O craque atuou dessa maneira, com dores e movimentos limitados, o restante do tempo normal e a prorrogação.

Para os brasileiros, um fato marcante e importante foi a inédita transmissão ao vivo, via satélite, de jogos da Copa do Mundo, que poderia ser vista “em cores”, apesar da maioria da população ter aparelhos de TV em preto e branco. Como a maioria das pessoas não tinha acesso à nova tecnologia, a Embratel (Empresa Brasileira de Telecomunicações) programou diversas demonstrações, com transmissões em cinemas e locais públicos de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro.

Segundo a Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão), em 1970 cerca de 5 milhões de residências tinham algum tipo de aparelho de televisão (preto e branco ou em cores) contra 10 milhões de aparelhos de rádio. A população brasileira estimada era de 90 milhões de habitantes.

As imagens chegavam ao Brasil através dos satélites Inter-Sat III F-6, em órbita na altura de Fernando de Noronha. A distribuição das imagens para o centro-oeste e nordeste era feita pelo Rio de Janeiro. Cabia a São Paulo a transmissão para o Mato Grosso do Sul e o sul do país.

Os técnicos que participaram das transmissões ao vivo fizeram cursos a partir de 1967. Algumas tecnologias da transmissão foram adotadas pelas TVs brasileiras depois da Copa. Uma delas foi o replay, que logo foi chamado de repeteco, e a colocação das câmeras em ângulos diferentes. Os mexicanos colocavam câmeras de TV em 180 graus.

Mesmo com o treinamento de profissionais, até 1968 a transmissão para o Brasil ainda não estava confirmada. Era preciso alto investimento em infraestrutura e o governo brasileiro dizia que não tinha dinheiro. Era necessária a construção de uma estação captadora de imagens via-satélite.

Em 1969 foi inaugurada a grande antena de Itaboraí, no estado do Rio de Janeiro, que custou à época US$ 1,5 milhão.

Mesmo assim a Copa ainda não estava garantida. Ainda seria preciso negociar os direitos de transmissão. Não era a Fifa que distribuía e comercializava os direitos como acontece hoje. José Andrade de Almeida Castro, considerado um dos pioneiros da TV no Brasil, representante da TV Tupi, foi negociar com Emílio Ascarraga, proprietário de três canais mexicanos que, depois se fundiriam na Televisa. Ele detinha os direitos de transmissão para todo o mundo.

Almeida Castro teve uma vida ligada à televisão. Foi repórter, noticiarista, produtor e diretor de jornais da cadeia Diários Associados, trabalhou em diversas rádios, mas a TV era sua paixão. Estagiou na Komu-TV, na KATTV em Los Angeles, fez cursos na BBC de Londres, TV Espanhola, Rai (italiana) e sobre transmissão de Copa do Mundo Via-Satélite na Intelsite. Voltou preparado ao Brasil para supervisionar a TV Tupi-Rio, TV Tupi-Difusora de São Paulo e a TV Iatcolomy, em Belo Horizonte.

Logo da REI Logo da Rede Globo durante as transmissões TV Tupi da Copa

Lançou, no Rio de Janeiro, o programa “O Céu é o Limite”, grande sucesso com Aurélio Campos e chegou a substituir o Chacrinha no programa “A Buzina do Chacrinha”, que era feito em Niterói. Almeida Castro também lançou o “Teatrinho Trol” e dirigiu “O Grande Teatro Tupi”, que tinha a participação de atrizes como Fernanda Montenegro, Nathália Timberg, entre outros.

Foi preciso três reuniões para as negociações até o acerto final e a confirmação da transmissão da Copa de 1970 para os brasileiros. A solução encontrada foi transmitir as partidas num pool de emissoras composto por Rede Globo, TV Tupi (Emissoras Associadas) e REI (Rede de Emissoras Independentes). As emissoras recebiam o mesmo sinal e retransmitiam.

Cada trecho do jogo era transmitido por uma equipe de cada emissora, algo impensável nos dias de hoje. Nomes consagrados fizeram parte dessas transmissões históricas, destacando: Geraldo José de Almeida e João Saldanha (Rede Globo), Walter Abrahão, Geraldo Bretas, Rui Porto e Oduvaldo Cozzi (TV Tupi), Fernando Solera e Leônidas da Silva (REI). Foram 11 jogos transmitidos ao vivo para o Brasil. As seis partidas da seleção brasileira, a abertura entre México e União Soviética, três partidas da primeira fase, a semifinal entre Itália e Alemanha e a decisão do terceiro lugar entre Alemanha e Inglaterra. Todos os demais jogos foram transmitidos em VT, às 23 horas, nas três redes simultaneamente.

Mesmo com todo o esforço, alguns estados brasileiros ainda não assistiram a Copa por falta de retransmissora. Foram: Amazonas, Maranhão, Piauí e na época ainda os territórios de Roraima, Rondônia e Amapá. Apesar de já contar com retransmissora, o estado do Pará assistiu aos jogos apenas em videoteipe.

As transmissões tiveram como patrocinadores a rede de postos de combustíveis Esso, Gillete e Souza Cruz.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A seleção brasileira chegou ao México sem o status de campeã mundial, mas recheada de talentos, com Pelé já sendo considerado o “rei do futebol” e com a consciência de que tinha todas as condições de reconquistar a Copa e assegurar, em definitivo, a posse da taça Jules Rimet. Pelo regulamento das Copas do Mundo, a seleção que ganhasse três vezes o torneio ficaria com a taça em definitivo.

Pelé estava sob pressão. Aos 29 anos, bicampeão mundial pela seleção e pelo Santos, teria que provar que era o melhor jogador do mundo. Mesmo sem ter chegado aos 30 anos, Pelé já sofria críticas que diziam que estava velho. Ele chegou na Copa em plenitude física e técnica.

Nas eliminatórias, a seleção brasileira passeou pelos campos sul-americanos e já dava mostras do que poderia fazer no México. Foram seis jogos, 23 gols marcados e

Saldanha orienta jogadores durante treino apenas dois sofridos. O time era dirigido pelo jornalista, membro do Partido Comunista, João Saldanha. O time ficou conhecido como “as feras do Saldanha”. Era uma equipe corajosa como seu treinador, conhecido como o “João sem medo”, que ao chegar ao comando técnico do Brasil disse: “aqui não tem nada de canarinho, tenho 22 feras”.

O Brasil vivia a ditadura militar. Próximo da Copa do Mundo, o presidente da República, general Emílio Garrastazu Médici, comentou que gostaria de ver o centroavante do Atlético Mineiro, Dário, o Dadá Maravilha, na seleção. Médici não ficou sem resposta. Irritado com o que entendeu ser uma intromissão do presidente, Saldanha, frontalmente contra o regime ditatorial, coisa que nunca fez questão de esconder, disse: “o general nunca me ouviu quando escalou seu Ministério. Por que diabos teria eu que ouvi-lo agora?”.

O Globo e a demissão de João Saldanha

Com essa resposta, Saldanha encerrou seu ciclo na seleção, já que ele tinha dado outros bons motivos, como por exemplo o fato de ter invadido, armado, a concentração do Flamengo para tirar satisfações com o técnico Iustrich, que o criticara, e ter dito que Pelé estava “ficando cego”, o que deu uma grande polêmica antes da Copa. Pelé teve até que se submeter a exames oftalmológicos para provar que não havia nada de errado com a sua visão.

Depois de um jogo de preparação em Bangu, subúrbio do Rio de Janeiro, no estádio Moça Bonita, quando a seleção empatou em 1 a 1 com o time da casa, já em desgaste até mesmo com os atletas, o diretor da CBD, Antonio do Passo, comunicou a Saldanha que a comissão técnica estava dissolvida. O treinador respondeu da seguinte forma: “não sou sorvete para ser dissolvido. Passar bem”. Fim da era Saldanha.

Então técnico do Botafogo, um dos melhores times do país, ponta-esquerda habilidoso das conquistas de 1958 e 1962, Mário Jorge Lobo Zagallo foi anunciado como o homem que teria a missão de domar as feras e levar o Brasil ao tricampeonato mundial no México.

Zagallo, técnico de 1970

Além de um grande jogador, técnico competente, Zagallo entendia bem o contexto em que estava inserido e, na primeira convocação chamou o centroavante Dario, satisfazendo o presidente Médici, que era fanático torcedor de futebol e fazia questão de ser fotografado nos estádios com seu radinho de pilha colado no ouvido.

A questão política era tão forte no país que, antes da Copa, políticos de esquerda chegaram a cogitar torcer contra o Brasil, já que se entendia que uma vitória brasileira fortaleceria o regime militar.

Nesse cenário, ao som da marchinha “A taça do mundo é nossa, com brasileiro, não há quem possa”, também considerada de apologia ao regime militar, o Brasil acompanhou a estreia da seleção no estádio , em Guadalajara, no dia 03 de junho, quarta-feira.

TV coloca a escalação do Brasil, com o time já batendo bola em Guadalajara. Era o primeiro jogo do Brasil em Copas sendo transmitido ao vivo.

O jogo, transmitido ao vivo pelo pool de emissoras de TV, teve início às 19 horas (Brasília). Antes os brasileiros puderam acompanhar, em cadeia nacional de radiodifusão, a fala do presidente Médici por ocasião de sua posse como presidente de honra do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro da Guanabara (hoje Rio de Janeiro).

Quem ficou na televisão, acompanhou antes pela TV Tupi, as 18h30, mais um capítulo da novela “A Gordinha”, de Sérgio Jockymann e direção da dupla Antonio Abujamra e Henrique Martins.

A vitória de 4 a 1 sobre a Tchecoslováquia foi o que faltava para empolgar o torcedor brasileiro. Com Pelé, e Rivelino em atuações de gala, os tchecos foram facilmente vencidos, apesar de assustarem a seleção quando fizeram 1 a 0, aos 11 minutos, com Petras.

Esse se tornou um gol histórico. Foi a primeira vez que um jogador fez o sinal da cruz ao comemorar um gol. Católico, Ladislav Petras queria mostrar a sua fé contra o regime ateu pregado pelo governo comunista da Tchecoslováquia, liderado pelo presidente Gustáv Husák. No gol na vitória contra a Inglaterra, na mesma Copa, Jairzinho faria a mesma comemoração.

Petras faz o sinal da cruz ao marcar contra o Brasil

Quem não saiu às ruas para comemorar a vitória brasileira, teve a oportunidade de assistir, na Rede Globo, mais uma edição do consagrado programa “A Discoteca do Chacrinha”, com o apresentador Abelardo Barbosa, apresentando cantores que estavam na “parada de sucesso” do país.

O segundo jogo é considerado o mais emblemático daquela Copa. O Brasil enfrentaria os campeões mundiais. A Inglaterra de Gordon Banks, Bobby Moore, Lee, Wright, Bobby Charlton, Hurst e outros, desafiava o Brasil a mostrar que era melhor. Antes da partida, realizada no domingo, 07 de junho, as 15h00, Pelé dava dimensão do que significava superar os campeões mundiais. “Faço questão de ganhar”, disse o rei do futebol.

Anúncio da transmissão pela TV do jogo entre Brasil e Inglaterra

Pelo Brasil, o presidente Médici apontava outro desafio ainda mais difícil. Ao encerrar uma visita de três dias ao nordeste, convocou uma reunião extraordinária da Sudene (Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste) e declarou que “nada, em toda minha vida, me chocou assim. Isto não pode continuar”, em relação ao estado de calamidade que vivia a população do interior daquela região por causa do período de seca.

Em Guadalajara, os ingleses também encaravam a partida como uma decisão e queriam provar que eram os melhores. Estava em jogo mais uma questão: quem pratica o melhor futebol, a Europa ou a América do Sul?

O jogo superou todas as expectativas. Uma batalha épica. Gordon Banks praticou, numa cabeçada de Pelé, aquela que é considerada a melhor defesa de todos os tempos, quando teve que mostrar reflexo, técnica e elasticidade. Félix, goleiro brasileiro, também praticou uma das grandes defesas daquela Copa, dando a entender o equilíbrio de forças.

Clodoaldo foi considerado o melhor em campo. O gol da vitória brasileira foi de Jairzinho, mas quem mostrou liderança dentro de campo foi o capitão . A partida tinha um clima quente e de tensão e Pelé, Rivelino e Jairzinho sofriam com as duras entradas dos ingleses. Torres aproveitou uma dividida com o inglês Lee e entrou com mais violência, irritado porque Bobby Charlton tinha agarrado Pelé pela camisa e o árbitro não o expulsara. Torres disse para Lee: “ou vocês param ou nós começamos”. A violência inglesa acabou e os craques da rainha resolveram apenas jogar bola.

No final da partida os brasileiros saíram às ruas. Carros enfeitados, pintados em verde e amarelo, papel picado sendo jogado das janelas dos edifícios. O Brasil estava em festa.

Jô Soares em cartaz durante a Copa de 1970

Para quem quis comemorar dando ainda mais risada, a opção foi assistir a peça “Todos Amam um Homem Gordo”, com Jô Soares, que estava em cartaz no teatro Aliança Francesa, em São Paulo.

Na quarta-feira, 10 de junho, quando enfrentou a Romênia, na última partida da primeira fase, a seleção ainda curtia a excelente repercussão da vitória contra a Inglaterra. O mundo parecia apenas aguardar o título brasileiro e desfrutava de cada atuação da seleção. Vitória de 3 a 2, com o time apresentando algumas falhas na defesa, que deu sinais de desconcentração nos dois gols romenos, conforme entendeu o próprio técnico Zagallo.

O Brasil partia para as quartas de final, quando enfrentaria o Peru, do técnico Didi, cérebro do meio de campo brasileiro nas conquistas de 1958 e 1962, autor do primeiro gol do estádio do Maracanã, em 1950. Foi mais um domingo feliz aquele 14 de junho. O torcedor que assistiu no Canal 7 ao seriado “Viagem ao Centro da Terra”, no ar às 13h45, depois vibrou com os gols brasileiros e a vitória de 4 a 2 sobre os peruanos, que garantiu a passagem para as semifinais e mais uma noite de carnaval no país.

“A mesma batalha de 20 anos”. “Paciência contra a fúria uruguaia”. Era assim que a imprensa brasileira anunciava o jogo semifinal contra o indigesto Uruguai, em 17 de junho, quarta-feira, no estádio Jalisco, em Guadalajara. O Brasil encontrava o mesmo adversário que 20 anos antes lhe tirara a chance do primeiro título mundial em pleno Maracanã.

Os uruguaios faziam questão de lembrar daquele feito e provocavam tentando mexer com o psicológico dos craques brasileiros. Depois de assistir ao seriado Zorro, na Rede Globo, o torcedor sentiu saudades do Sargento Garcia no início da semifinal. Logo aos 19 minutos, Luis Cubilla abria o marcador e dava sinais que outra catástrofe poderia acontecer. Ainda no primeiro tempo, aos 44 minutos, surge o primeiro herói brasileiro, Clodoaldo, que empatou a partida.

O seriado Zorro antecedeu a transmissão de Brasil e Uruguai

Cena de "Irmãos Coragem" O toque de bola da seleção prevaleceu no segundo tempo, aliado à velocidade de uma equipe que beirava a perfeição. Jairzinho e Rivelino deram números finais na partida que ainda teve o célebre drible, sem bola, de Pelé no goleiro Mazurkiewicz. Caprichosamente, a bola raspou a trave e não entrou. O histórico 3 a 1 sobre o Uruguai exorcizava o fantasma de 1950 e levava o Brasil à final da Copa, ficando a 90 minutos da consagração.

Para fechar o dia, quem dispensou o agito da torcida que estava novamente nas ruas, cada vez mais eufórica, pôde acompanhar as emoções de mais um capítulo da telenovela que foi um dos marcos da TV brasileira: Irmãos Coragem, de Janete Clair, pela Rede Globo, cujo índice de audiência só seria superado por Roque Santeiro, de Dias Gomes, em 1985.

O Brasil amanheceu em festa naquele domingo, 21 de junho, na expectativa para a confirmação da conquista, em definitivo, da taça Jules Rimet. A Itália, adversária do Brasil, também poderia conquistá-la em definitivo, já que também era bicampeã mundial.

Taça Jules Rimet

A taça Jules Rimet ganhou o nome do mentor da Copa do Mundo e terceiro presidente da Fifa durante Congresso da entidade realizado em 01 de julho de 1946, em Luxemburgo. Os delegados entendiam que Rimet deveria dar o nome à taça por tudo o que lutou para realizar a Copa do Mundo.

Durante o mandato do francês na Fifa (1921 a 1954) o número de países membros da entidade cresceu de 20 para 85. Rimet, que foi eleito presidente honorário da Fifa, deixou a presidência com 80 anos.

Quando criou a Copa do Mundo, Jules Rimet solicitou que fosse desenvolvido um troféu em ouro para ser entregue ao campeão e que, depois de três conquistas, esse troféu ficasse em posse definitiva do país que atingisse a marca. Ele entendia que levaria muito tempo para que isso acontecesse e tinha razão. Foram exatos 40 anos. O artesão francês Abel Lafleur foi quem desenvolveu o troféu. A imagem era uma alegoria de Nice, deusa grega da vitória, com asas estilizadas, com braços levantados segurando uma copa em formato octogonal.

O troféu tinha base em mármore onde era grafado o nome dos países que o conquistavam, media 30 centímetros e tinha 3,8 kg em ouro, totalizando um peso de 4 quilos.

A taça Jules Rimet viveu sua epopeia paralela à Copa do Mundo. Em 1939, na época da Segunda Guerra Mundial, para impedir que as forças nazistas tomassem a escultura, o vice-presidente da Fifa, o italiano , retirou secretamente o troféu do banco onde era mantido, em Roma, e o guardou numa caixa de sapato, embaixo da sua cama.

Já em 1966 houve o primeiro sumiço da taça. Como preparativo para o mundial que seria realizado na Inglaterra, a Fifa colocou a Jules Rimet exposta no Center Hall de Westminster, em Londres, junto à uma exposição filatélica. Apesar da vigilância, a taça desapareceu em 20 de março daquele ano. A Scotland Yard, a Polícia Metropolitana de Londres, não tinha pistas do paradeiro da Jules Rimet, nem mesmo de quem a roubou.

Em 27 de março, um senhor chamado David Corbett passeava com seu cão chamado Pickles numa praça no sul de Londres. Farejando um arbusto, Pickles localizou o troféu. Como recompensa, uma empresa de comida para cães ofereceu alimentação completa por toda a vida a Pickles.

Corbett e o cachorrinho Pickles, que encontrou a taça Jules Rimet em Londres

Em 19 de dezembro de 1983, na sede da CBF, na rua da Alfândega, 70, no centro do Rio de Janeiro, o troféu foi roubado e depois derretido, conforme relato histórico da imprensa brasileira. Os bandidos que invadiram a sede da CBF levaram, além da Jules Rimet, a Taça Independência, o Jarrito de Ouro e a Taça Equitativa, conquistas da seleção brasileira ao longo dos anos. Em 1986, a Fifa ofereceu à CBF uma réplica da taça, que está na nova sede da entidade, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.

O leitor da Folha de S. Paulo pôde apostar na conquista da Jules Rimet com convicção ainda maior naquele domingo. O horóscopo impresso no jornal previa para o nativo do signo de Escorpião que “obterá sucesso depois de muito trabalho e o seu estado de espírito está pronto para receber boas vibrações”. Escorpião é o signo de Pelé, nascido em 23 de outubro.

Folha de S. Paulo noticia o roubo da taça

E foi ele que abriu o placar da decisão. Aos 19 minutos cabeceou e venceu o goleiro Albertosi. Numa falha do goleiro Félix e Piazza, Boninsegna empatou e deixou os brasileiros apreensivos.

O segundo tempo foi todo do Brasil. A Itália pouco ameaçou e se curvou ao espetáculo proporcionado por Pelé e companhia. Gérson, Jairzinho (que fez gol em todos os jogos da Copa) e Carlos Alberto Torres (naquele que é considerado o gol mais bonito da seleção em Copas) marcaram e o Brasil derrotava os italianos por 4 a 1, conquistava a taça Jules Rimet em definitivo e a admiração de todo o mundo pelo futebol praticado.

Os brasileiros provaram que é possível jogar bonito e ganhar o título.

O apito final do árbitro alemão Rudolf Gloeckner deu início a mais uma noite de carnaval. Acompanhe a sequência que reproduz o quarto gol brasileiro:

Pelé, reverenciado pelos mexicanos e aplaudido pelo mundo todo, tinha conquistado o respeito definitivo do mundo do futebol. No Brasil, alguém precisava aproveitar a fama do craque brasileiro. Pelé recebeu um telefonema do presidente Médici, que assistiu a final em sua TV a cores em Brasília. Momentos antes, o presidente-torcedor saíra enrolado numa bandeira do Brasil, em meio ao povo que comemorava o título em frente ao Palácio da Alvorada, residência oficial, dizendo que aquele era o maior dia de sua vida.

O diálogo com Pelé foi inusitado. Tentando superar as dificuldades de comunicação naquela época, Médici buscava falar com Pelé. O diálogo, transcrito pela Folha de S. Paulo, edição de 22 de junho de 1970, foi o seguinte:

Médici: Pelé?

Pelé: Como vai, presidente?

Médici: Fala, imperador terceiro do Brasil! Aqui é o presidente do Brasil falando com o rei Pelé. Neste momento a ligação foi interrompida.

Médici, irritado, vira-se para o ministro das Comunicações, Hygino Caetano Corseti e pergunta incrédulo: “Como é, Corseti, esse negócio não funciona?”.

Corseti, ministro que tinha como missão o implemento das redes de telecomunicações do Brasil, teve que se virar, mas conseguiu fazer com que Médici tentasse faturar alguns dividendos políticos ao falar com Pelé.

O presidente ainda recebeu a delegação campeã do mundo, pousando para fotos com Pelé e os demais tricampeões.

O Brasil era, realmente, uma festa.

Folha de S. Paulo, edição de 22 de junho de 1970 Filmes nos cinemas no dia da final da Copa do Mundo

Anúncio da transmissão da final da Copa pelo pool de emissoras de TV

Anúncio comemora a conquista da Copa 1974 – Alemanha Ocidental

Cartaz oficial da Copa de 1974

Desde o início dos mundiais esperava-se uma Copa do Mundo na Alemanha. O regime nazista e o consequente envolvimento na Segunda Guerra Mundial prejudicaram e impediram que a Fifa oferecesse aos alemães uma Copa na década de 1940 ou 1950.

A Espanha, que também lutava para promover o evento há algum tempo, mais uma vez se inscreveu para disputar o direito de sediar a Copa de 1974. Os espanhóis retiraram a candidatura antes da votação, trocando seu voto pelo apoio dos alemães para que realizassem o mundial de 1982, o que acabou ocorrendo. Por isso, a Alemanha Ocidental foi aclamada vencedora.

As cidades-sede foram: Berlim Ocidental, Hamburgo, Munique, Stuttgart, Dortmund, Hanover, Gelsenkirken, Dusseldorf e .

Tip e Tap, os mascotes de 1974 Como mascotes foram escolhidos dois garotos, o Tip e o Tap, num gesto encarado como símbolo do desejo, pelo menos esportivo, da união entre as duas Alemanhas, então separadas em Ocidental e Oriental.

Países fortes no cenário futebolístico ficaram de fora do mundial. Foi o caso de Espanha, Inglaterra e França. Por outro lado, apresentavam-se pela primeira vez numa Copa do Mundo as seleções do Haiti, Austrália e Zaire.

Brasil e Itália, que haviam feito a final quatro anos antes, não foram bem, mas por motivos diferentes. Os brasileiros jamais reviveram o futebol de Pelé e companhia, mas foram evoluindo no torneio. Já os italianos saíram na primeira fase. No grupo 1 ficaram atrás da Polônia e Argentina.

Nos três jogos que a Azzurra fez na Alemanha em nenhum mostrou o futebol de 1970. Os resultados da Itália foram os seguintes: 3 a 1 no Haiti, empate em 1 a 1 com a Argentina e derrota por 2 a 1 para a Polônia, num jogo em que duas figuras que fariam sucesso na história do futebol se encontraram. Pelo lado da Itália o espetacular e lendário goleiro e pela Polônia o atacante , então campeão olímpico pela Polônia, dois anos antes nos Jogos Olímpicos de Munique e que seria o artilheiro daquela Copa com 7 gols.

A sensação do torneio foi a revolucionária Holanda do técnico Rinus Michels, para muitos o maior técnico de futebol de todos os tempos. A palavra “revolução” não é exagerada para o que a Holanda fez em terras alemãs. O chamado “futebol total” encantou o mundo com um time leve, veloz e criativo.

Os jogadores holandeses não tinham posição fixa. Quem atacava, defendia e em outro momento armava o time. Cérebro do time, craque da Copa de 1974, é exemplo disso. Não tinha posição, rodava pelo campo todo e para confundir ainda mais

O lendário Rinus Michels, técnico holandês os adversários, jogava com a camisa 14, numa época em que o número da camisa (tradicional de 1 a 11) refletia a posição do jogador.

Além de Cruyff, a Holanda, chamada de Laranja Mecânica, tinha a rapidez do inteligente Neeskens, que sabia buscar o espaço vazio no adversário e colocava os companheiros em excelente posição para marcar gols. Ambos eram jogadores técnicos e táticos. Destaque também para os eficientes Van Hanegem, Johnny Rep, Win Jansen e o goleiro Jan Jongbloed.

Rinus Michels montou com simplicidade aquele time que foi chamado de “Carrossel Holandês” pelo fato dos atletas girarem em campo o tempo todo. Aproveitou a base do Feyenoord, campeão mundial de clubes de 1970 e do Ajax, campeão mundial de 1972. A partir daí implantou seu conceito de futebol total e deixou o mundo boquiaberto, sem entender como aqueles jogadores conseguiam correr o campo todo sem comprometer a efetividade da equipe, que chegou ao vice-campeonato mundial, sendo derrotada pela dona da casa. Exceto os alemães ocidentais, o restante do mundo lamentou que aquele time não levantasse a Copa.

Cruyff e Beckenbauer na final da Copa de 1974

Um time frio, forte e determinado. Assim era a campeã Alemanha Ocidental, que tinha vários craques, numa geração que marcou época no país. Começando no gol com o excelente Sepp Maier, passando pela zaga com Vogts e Schwazenbeck, com o atacante artilheiro de 1970, Gerd Muller, chegando nos craques cerebrais Paul Breitner, Overath e Franz Beckenbauer. Três gênios que o futebol alemão produziu e que encantou o mundo. A conquista da Copa veio na vitória de 2 a 1 sobre os holandeses perante 75.200 pessoas no estádio Olímpico de Munique.

Como a taça Jules Rimet havia sido conquistada pelo Brasil, de acordo com o que previa o regulamento das Copas do Mundo, a Fifa criou uma nova taça para o campeão mundial. É a taça que existe até hoje, denominada de Taça Fifa, criada pelo escultor italiano Silvio Gazzaniga e produzida por Milano Bertoni. O troféu mede 36,5 cm e foi produzida com 5 kg de ouro 18 quilates com uma base de 13 cm de diâmetro, contendo duas camadas de malaquita. Cada vencedor desse troféu tem seu nome escrito na parte de baixo. A Fifa não tem planos de oferecer a taça em definitivo. Cogita-se trocá-la quando não houver mais espaço para escrever os nomes dos países vencedores. Isso ainda não passa de cogitação.

A Taça Fifa

Na Alemanha, algumas delegações reclamaram do excesso de segurança nas concentrações das seleções. A imprensa brasileira chegou a repercutir o assunto relatando que as concentrações eram verdadeiras prisões. Os alemães estavam apreensivos devido ao ataque terrorista acontecido na segunda semana dos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972. Até hoje é o maior ataque terrorista num evento esportivo.

Em 5 de setembro de 1972, oito jovens palestinos entraram na Vila Olímpica, pulando o muro e vestidos como atletas para que pudessem trafegar no local sem qualquer suspeita. Eles tomaram como reféns 11 atletas de Israel. O grupo terrorista palestino era denominado Setembro Negro e vinculado à OLP (Organização para a Libertação da Palestina). Alguns atletas lutaram e conseguiram escapar do sequestro.

Capa de O Estado de S. Paulo de 06 de setembro de 1972

Logo o fato ganhou repercussão mundial. Autoridades dos Estados Unidos, Israel e Jordânia pediram a imediata libertação dos reféns. Israel não aceitava negociar. A polícia alemã tentou várias emboscadas, inclusive colocando agentes disfarçados no avião que, depois de negociação, levaria os terroristas à Palestina. O despreparo das autoridades era evidente e nada deu certo, culminando num tiroteio com policiais de elite alemães ocidentais.

O saldo sangrento foi a morte de onze reféns e cinco terroristas, outros três foram capturados, mas o fato causou comoção mundial. Para não reviver fatos como esse, a polícia alemã protegia as delegações com um forte esquema de segurança. Não houve incidentes.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A seleção brasileira chegou à Alemanha Ocidental com a responsabilidade de defender o título e voltar a mostrar o futebol que encantou o mundo. Para isso, o treinador do timaço de 1970, Zagallo, foi mantido, assim como alguns jogadores. O novo camisa 10 era Rivelino, que substituía Pelé, que havia se despedido da seleção em amistoso, em 1971, que terminou em empate de 2 a 2, com a Iugoslávia no Maracanã.

Folha de S. Paulo sobre o início da Copa

No gol a seleção tinha um dos melhores da posição em todo o mundo, Emerson Leão, reserva quatro anos antes. Os tricampeões Wilson Piazza, Zé Maria, Jairzinho, Paulo Cézar Caju, Marco Antonio e Edu também permaneciam. Juntaram-se a eles craques como , , Carpegiani, Luis Pereira, César Maluco e Valdomiro. Um bom time no papel, mas que se mostrou heterogêneo, sem conseguir um padrão de jogo até o final.

O goleiro Leão, do Palmeiras, titular em 1974

Sem ter jogado bem nos amistosos preparatórios, a imprensa cobrava a seleção. As manchetes naquele 13 de junho, quinta-feira, dia em que o Brasil faria o jogo de abertura da Copa contra a Iugoslávia, mostravam ansiedade para que a seleção voltasse a mostrar seu verdadeiro futebol. A Folha de S. Paulo dizia que “chegou a hora de mostrar o jogo”. O jornal dava uma nova dimensão para a Copa do Mundo com as transmissões de TV crescendo rapidamente. Dizia a Folha que seriam 65 mil pessoas no estádio de Frankfurt e 1 bilhão no mundo. O futebol se transformava num grande negócio definitivamente, tendo ainda muito a crescer.

Informava a Folha que o presidente da República, general Ernesto Geisel, assistiria o jogo, marcado para às 13 horas, na sua TV a cores instalada na Granja do Riacho Fundo, em Brasília. Geisel era apreciador discreto do futebol, mas dizia-se - ou fazia-se divulgar - que era conhecedor profundo de táticas e regras. O presidente não havia assistido a nenhum jogo preparatório realizado na Europa, já que coincidia com seu horário de trabalho. Nessas oportunidades, era informado do resultado pelo ajudante de ordens.

No Brasil, o Campeonato Brasileiro continuava normalmente. No dia anterior os resultados da rodada foram os seguintes: São Paulo 0 x 1 Palmeiras, Santos 1 x 1 Santa Cruz, Rio Negro 0 x 0 CEUB, Fluminense 1 x 1 Coritiba e Sport 1 x 1 Ceará.

Os brasileiros também ficaram sabendo que o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, tinha recebido uma acolhida triunfal ao chegar ao Cairo, numa visita oficial de dois dias pelo Egito.

Enquanto isso, o Brasil sofria em Frankfurt. Não conseguiu sair do zero a zero com os iugoslavos. Para a imprensa brasileira o empate “foi um milagre”. Num jogo decepcionante, o destaque ficou para o goleiro Leão, que impediu a vitória da Iugoslávia, que ainda chutou uma bola na trave. Já o técnico Zagallo não admitia o péssimo jogo do Brasil e até dizia que previa outro empate com a Escócia, no jogo seguinte. “Teremos a mesma intenção de empatar se não pudermos vencer”, disse o treinador.

Anúncio convidava os torcedores a assistirem a seleção em telões

Em São Paulo, os grandes clubes colocaram telões coloridos em suas sedes e cobraram ingresso para que o torcedor pudesse acompanhar como se estivesse na Alemanha. Valia reproduzir o clima das torcidas nos estádios.

Irritada com as críticas recebidas pelo Brasil da imprensa internacional, os torcedores presentes na Alemanha exigiram a vitória no confronto contra a Escócia, na terça-feira, 18 de junho. Por isso, a imprensa dizia que a seleção jogaria “seu orgulho” contra os escoceses.

Foi um futebol apático e novo zero a zero, provocando a necessidade de os campeões do mundo vencerem o Zaire por uma diferença de três gols na última rodada do grupo para conseguir passar para a outra fase. A imprensa mundial dizia que o Brasil estava “estranho e até violento”. Zagallo afirmava estar satisfeito. “Só dependemos de nós”, disse, tentando desviar o foco das pesadas críticas.

Se a Copa deixava o torcedor brasileiro angustiado, nos alemães provocava uma febre tamanho o envolvimento com o evento. A população estava grudada na TV para acompanhar todos os jogos. A Associação dos Consumidores de Colônia fez um manifesto aconselhando os alemães “que atualmente passam horas seguidas diante dos televisores, acompanhando os jogos da Copa”, a se prevenir. Dizia o texto: “recomendamos doses maciças de vitamina A para que sejam evitados problemas visuais. Às donas de casa, aconselhamos temperos a base de tomate, espinafre, manteiga e fígado, fontes naturais de vitamina A”. No sábado, 22 de junho, o Brasil jogava sua sorte contra o Zaire, debutante em Copas. Os matemáticos apontavam que a seleção tinha 93% de chances de conseguir a classificação para a fase semifinal, que seria disputada em dois grupos de quatro seleções, onde os campeões de cada grupo se enfrentariam na grande final.

Passat, lançado em 1974

No dia anterior a Volkswagen, empresa alemã, aproveitando o clima de Copa do Mundo, lançou no Brasil o automóvel modelo Passat. A principal novidade do novo carro da Volks era a refrigeração à água. O modelo Passat L era comercializado a Cr$ 31.790,00 (cerca de R$ 105 mil em março de 2018) e o Passat LS a Cr$ 33.390,00 (cerca de R$ 111 mil em março de 2018).

A vitória da seleção foi justa. Exatamente os 3 a 0 que a equipe precisava. O Brasil não aproveitou a fragilidade dos africanos e Zagallo sentenciava: “chegou a hora de jogar”, virando a página e projetando as semifinais. O torcedor comemorou no final do jogo, mas não de forma efusiva. Houve muito nervosismo e agonia para que os gols saíssem. Como curiosidade, o terceiro gol, aquele que garantiu a classificação, foi feito por Valdomiro, que usava a camisa 13, o número de sorte de Zagallo.

Naquele sábado, restou aos brasileiros acompanhar mais um capítulo da novela “Fogo Sobre a Terra”, de Janete Clair, pela Rede Globo. Em São Paulo, o paulistano tinha boas opções para um programa fora de casa. No cine Paulistano estava em cartaz o sucesso “Golpe de Mestre”, com Paul Newman. Já no cine Ólido os fãs de John Wayne poderiam assistir “Fúria no Alasca”. Para quem preferia um show musical, o teatro Arena apresentava o show de Belchior. No teatro Maria Della Costa estava em cartaz Elis Regina.

Jardel Filho e Dina Sfat em "Fogo Sobre a Terra" Sem poder se divertir e sob pressão estava a seleção brasileira. Na estreia na fase semifinal o adversário era a Alemanha Oriental, em 26 de junho, quarta-feira, dia em que a Sunab (Superintendência Nacional de Abastecimento) divulgava os preços mínimos para produtos alimentícios a serem praticados no estado de São Paulo, a partir da quinta- feira. O leite em pó integral sofria um aumento de 12% e teria preço mínimo de Cr$ 7,20 (cerca de R$ 24,00 em março de 2018) a lata de 454 gramas.

O Brasil conseguiu uma vitória por 1 a 0 frente aos alemães orientais, gol marcado por Rivelino, de falta. A imprensa brasileira disse que Leão mostrou “a categoria de grande goleiro mundial”, mas os alemães ocidentais, que torceram pelo Brasil, esperavam mais. Os brasileiros também.

Anúncio vende aparelho de TV

A comemoração, no Brasil, provocou incidentes. Enquanto o país estava fixado na tela de TV assistindo ao jogo, ladrões roubaram produtos e dinheiro de gerentes e supervisores de um supermercado na rua Heitor Penteado, em São Paulo, e veículos e dinheiro dos funcionários de um posto de combustíveis na Casa Verde, também na capital paulista. As vítimas alegaram que faltava segurança e as ruas estavam desertas durante o jogo do Brasil.

Ao meio-dia no horário de Brasília, no domingo, 30 de junho, o Brasil entrou em campo para enfrentar a Argentina, numa partida que poderia encaminhar a decisão da vaga para a final para o jogo contra a sensação Holanda.

Jornais dividiam a atenção entre o jogo do Brasil e a situação político-institucional na Argentina, a rival na Alemanha Ocidental. No dia anterior Maria Estela Martinez de Peron, ou simplesmente Isabelita Peron, assumiu a presidência daquele país substituindo seu marido, Juan Domingo Peron, que estava com infecção pulmonar. Foi a primeira mulher a assumir o posto de chefe de estado da América Latina.

A vitória brasileira por 2 a 1 fez o técnico Zagallo respirar mais aliviado e acreditar que a seleção poderia vencer a Holanda de Cruyff. “Eles são fortes, não imbatíveis”, disse.

Enquanto os brasileiros comemoravam, o mundo lamentava a morte de Alberta King, aos 70 anos, mãe do líder negro Martin Luther King, assassinada a tiros por um jovem negro durante culto na Igreja Batista de Ebenezer, em Atlanta, Estados Unidos. Preso, o assassino Marcus Wayne, de 21 anos, disse que matou a mãe de Luther King porque ela era cristã e todos os cristãos eram seus inimigos.

Uma tragédia por pouco não aconteceu em São Paulo. Um balão comemorativo à vitória da seleção caiu na lona do circo Tonico e Tinoco, instalado na Vila Maria. Dezenas de pessoas estavam na arquibancada e outras do lado de fora, na fila para entrar. O fogo destruiu a lona do circo, mas os artistas agiram rapidamente e evitaram consequências piores. Houve apenas pessoas com leves ferimentos.

O comércio aproveitando a Copa do Mundo

O mundo do futebol parou em 03 de julho de 1974, quarta-feira. Dois jogos eletrizantes para definir os finalistas da Copa do Mundo. Às 12 horas (Brasília), Alemanha Ocidental e Polônia fizeram uma partida extremamente tática. Os alemães venceram com um gol de Gerd Muller, aos 36 minutos do segundo tempo.

Logo depois, às 15h30 (Brasília), o time de Zagallo ficava diante da Laranja Mecânica, o Carrossel Holandês de Rinus Michels. A imprensa mundial dizia que o rei estaria em xeque. Já Zagallo entendia que seria o “nosso jogo contra o futuro”.

A incontestável vitória da Holanda por 2 a 0 provocou reações no Brasil contra o futebol pragmático e sem gols proposto por Zagallo. A Folha de S. Paulo dizia que “o futebol sem gols morreu ontem”. O jornal chamava a equipe de medrosa. Zagallo disse aos jornalistas brasileiros que desejava que “todos os técnicos brasileiros tenham visto como joga a Holanda e façam seus times jogarem com essa nova fórmula”.

Radical foi o prefeito, nomeado e não eleito, de Porto Alegre, Telmo Thompson Flores, fanático torcedor do Internacional, time do atacante Valdomiro, que escreveu a seguinte mensagem ao atleta: “Valdomiro, por favor, nem volte mais ao Brasil”. A Folha de S. Paulo sentenciou na matéria sobre a semifinal: “o rei do futebol, vítima de ilusão, faleceu ontem na Alemanha”.

A gigante diferença entre o futebol praticado em 1970 e o de 1974 e o defensivismo de Zagallo não haviam sido digeridos por torcedores e críticos. Enquanto isso, a imprensa mundial exaltava a final entre Cruyff e Beckenbauer.

Em 06 de julho, um dia antes da final, o Brasil decidiu o terceiro lugar com a Polônia. A USP (Universidade de São Paulo) anunciava que no próximo exame vestibular, todos os candidatos deveriam prestar todas as provas. Até então, os candidatos de cada uma das três áreas oferecidas (ciências exatas e tecnologia, ciências biológicas e ciências humanas) faziam apenas as provas referentes à sua área de estudo. A partir daquele vestibular (1970-1971), independente da área, os candidatos teriam que responder perguntas universais.

No vestibular da Copa, o Brasil terminava em quarto lugar, depois da derrota por 1 a 0 para a Polônia, com gol do artilheiro Lato.

“Se o Brasil ganhasse seríamos deuses”, disse Zagallo na entrevista coletiva.

O Brasil perdeu.

A cantora Elis Regina em cartaz em São Paulo durante a Copa do Mundo 1978 – Argentina

Cartaz oficial da Copa de 1978

Tanto tentou, desde 1938, que a Argentina conseguiu sediar uma edição de Copa do Mundo.

O país vivia uma brutal ditadura comandada pelo general Jorge Rafael Videla Redondo, que havia tomado o poder destituindo a presidente Maria Estela Martinez Peron, a Isabelita Peron.

Videla havia sido nomeado chefe do Exército, por Isabelita, em 1975. Em 24 de março de 1976 liderou o golpe militar. Uma Junta de militares tomou o poder e em 29 de março Videla assumiu a presidência da República.

O general suspendeu a Constituição, proibiu partidos políticos e instituiu a censura nas rádios e televisões. Além disso, durante a sua gestão interveio na Suprema Corte Argentina e nomeou juízes de acordo com seus caprichos.

Videla ficou marcado pela brutalidade de suas ações, sequestros e mortes daqueles que levantavam a voz contra o regime militar. Em 22 de dezembro de 2010 foi condenado à prisão perpétua por crimes contra a humanidade. Faleceu na prisão, em 17 de maio de 2013, aos 87 anos.

A Fifa, ao escolher a Argentina como sede daquela Copa, durante uma ditadura, teve uma decisão extremamente difícil do ponto de vista diplomático.

O craque holandês, Johan Cruyff recusou-se a disputar o mundial em protesto à situação política do país anfitrião e a situação dramática vivida pelos opositores ao regime.

A seleção francesa, classificada para a Copa, cogitou e analisou também boicotar o evento, mas acabou desistindo. O protesto da França seria pela morte das freiras Renee Leonie Henrizette Duquet e Alice Anne Marie Jeanne Domon. Elas foram sequestradas junto com Azucena Villaflor, Esther Ballestrino e Eugênia Ponce, líderes e fundadoras da associação “Madres De La Plaza de Mayo” (Mães da Praça de Maio), formada por mães de desaparecidos durante a ditadura militar, que se reuniam na Praça de Maio, em frente a Casa Rosada, sede do governo argentino e também a militante humanitária Angela Auad.

As mulheres foram levadas para a Esma (Escola Mecânica da Armada), um dos maiores centros clandestinos do regime militar argentino. No local existiam prisões e torturas daqueles que ousassem desafiar o regime. Calcula-se que mais de 5 mil presos passaram pela Esma durante a ditadura (1976-1983). A maioria desapareceu ou foi assassinada.

Mães da Praça de Maio

As freiras francesas foram jogadas vivas ao mar, num dos chamados voos da morte da ditadura argentina. Seus corpos foram devolvidos pelas ondas nas praias de Santa Teresita e Mar del Tuyú no final de 1977. Essas mulheres foram sequestradas por um grupo liderado por Alfredo Astiz, conhecido como “O Anjo da Morte”.

Dos 107 países que participaram das eliminatórias, 16 se classificaram para a Copa que teve como mascote o menino “Gauchito”, desenhado com a camisa argentina, usando chapéu e faca, adereços típicos do campo.

O garoto Gauchito, mascote da Copa

A Argentina realizou a Copa utilizando apenas cinco cidades: Buenos Aires, Córdoba, Rosário, Mar del Plata e Mendoza. O improviso sempre esteve presente na organização do evento. Uma falha grave foram os gramados, muitos ainda novos e recém- plantados. Por isso, era comum placas de grama se soltarem durante as partidas. Outro fato inusitado aconteceu na última rodada do grupo 1 da primeira fase. Hungria e França, já desclassificadas, se enfrentariam em Mar del Plata. As equipes, devido ao frio que fazia na Argentina, entravam em campo com agasalho. O capitão francês percebeu que as duas seleções estavam com o uniforme de jogo com camisas brancas. As duas seleções também não haviam levado para o estádio camisas de outra cor, coisa impensável nos dias de hoje.

Dirigentes das duas seleções afirmaram que receberam circular da Fifa indicando o branco como a cor da camisa do uniforme para aquele jogo. Henri Patrelle, dirigente francês, assumiu a culpa e afirmou que não lera a segunda circular, que alterava a cor de camisa da França para o azul tradicional, uniformes que estavam a 400 km, em Buenos Aires, base daquela seleção na Argentina.

O público vaiava porque o jogo não começava. Um carro de polícia saiu em disparada do estádio e se dirigiu até a sede do Clube Atlético Kimberley, um clube de Mar del Plata que cedeu suas camisas brancas com listras verdes. A França jogou com essas camisas, calções azuis e meias vermelhas. Mais curioso ainda foi o fato de que o Kimberley só tinha camisas numeradas de 1 a 16. Os outros jogadores franceses assistiram a vitória da sua seleção, por 3 a 1, da tribuna do estádio.

França jogando com a camisa do Kimberley

Nunca uma seleção aproveitou o fato de jogar em casa tão bem quanto a Argentina em 1978. Na primeira fase a seleção atuou todos os jogos em Buenos Aires, enquanto que a maioria de seus rivais tinha que viajar pelo país. Destaca-se que o Brasil também atuou toda a primeira fase numa única sede, a cidade de Mar del Plata. A pressão da torcida da casa era forte e os árbitros acusavam o golpe, sempre com decisões mais “simpáticas” à Argentina. Os torcedores não tinham o espírito de Copa, mas de “guerra”. O país organizou o torneio com um objetivo, ser campeão, sem que nada pudesse atrapalhar.

Mesmo assim, na primeira fase, depois de duas vitórias contra Hungria (2 x 1) e França (2 x 1), a equipe foi derrotada pelos italianos (0 x 1), aumentando a possibilidade de alguma coisa não dar certo no final. A tensão era grande, inclusive no governo argentino.

A fase semifinal foi uma das mais polêmicas da história das Copas. Depois de vencer a Polônia (2 x 0) e empatar com o Brasil (0 x 0), na “Batalha de Rosário”, os argentinos entraram em campo, na última rodada, sabendo que precisavam vencer o Peru por quatro gols de diferença, pois o Brasil havia derrotado os poloneses por 3 a 1 e tinham mais saldo de gols. Os brasileiros iriam à final da Copa promovida pela Argentina se a seleção do técnico César Luis Menotti não conseguisse reverter a diferença de gols.

É do jogo entre Argentina e Peru que surgiu a denúncia de que o regime ditatorial do general Videla interveio em favor do seu país na Copa. O alvo, para garantir a classificação, foi o goleiro argentino, naturalizado peruano, Ramon Quiroga, que teria aceitado suborno para, digamos, facilitar para os atacantes argentinos.

Luque faz o quarto gol da goleada. Quiroga apenas observa

O fato é que a goleada de 6 a 0 sobre o Peru, que levou a Argentina para a final da Copa, foi, no mínimo, estranha. Os peruanos tinham um time bastante respeitado, terminaram a primeira fase na liderança do grupo 4 que tinha a então vice-campeã mundial Holanda, mais Escócia e Irã. Na segunda fase haviam perdido para Polônia e Brasil, mas sempre apresentando bom futebol.

Quiroga levou a culpa e a fama de ter entregado o jogo e nunca chegou a convencer a opinião pública do contrário. Numa patética entrevista ao jornal “La Nación” do Peru, reproduzida pela Folha de S. Paulo em 09 de outubro de 1998, o ex-jogador tentou se defender com argumentos rasos, o que aumentou ainda mais as suspeitas sobre ele mesmo.

O goleiro do Peru naquele 21 de junho, em Mendoza, disse que 20 anos depois estava seguro que “alguém ganhou” dinheiro na goleada sofrida pela sua seleção. “Naquele seis a zero vimos coisas raras”, disse. Quiroga apontou suspeitas sobre o jogador Manzo, alegando que “no ano seguinte foi jogar pelo Velez Sarsfield da Argentina”. Para ele, “foi escandaloso”. “Penso que Deus castiga”, disse.

Enveredando para a covardia com seus ex-companheiros, Quiroga passou a apontar para pessoas que já haviam falecido e insinuar que elas foram castigadas. “Creio que todos os que ganharam pegaram dinheiro... Dos que falam que pegaram dinheiro, vários morreram e outros morreram para o futebol”, disse o ex-goleiro, que continuou e acusou Roberto Rojas de estar vendido. “Ele nunca havia jogado e morreu num acidente. Já jogaram uma bomba em mim num estádio e eu não morri”, sentenciou, lembrando que o então técnico peruano, Marcos Calderon, morreu numa queda de avião. Ainda com relação a Manzo, Quiroga ressaltou que o jogador se agachou e deixou Tarantini sozinho para marcar o segundo gol argentino. “Gorriti deu outro gol de presente”, disse.

General Videla, presidente da Argentina

Quiroga supõe que os militares argentinos tenham subornado seus companheiros, mas ele não. “Antes do jogo, ou no intervalo, membros da Junta Militar da Argentina foram ao vestiário”, finalizou.

O fato é que a Argentina fez 6 a 0, mais do que precisava, numa atuação ridícula do Peru. O caminho para o título estava livre e os brasileiros iriam disputar a terceira colocação.

Ressalte-se que os dois jogos que definiriam o adversário da Holanda na final (Brasil x Polônia e Argentina x Peru) deveriam ter sido realizados no mesmo horário. A CBD chegou a enviar pedido formal à Fifa, mas não foi atendida. Os argentinos jogaram sabendo exatamente do que precisavam para conseguir a vaga.

A vice-campeã Holanda não contou com Cruyff, Neeskens e o técnico Rinus Michels. A magia da Laranja Mecânica ficou a cargo do excelente Rensenbrick. Foi dele o chute que deixou os argentinos sem fôlego na final. No último minuto, com o empate em 1 a 1, Rensenbrick fez jogada individual e acertou o travessão do goleiro , que só torceu para a bola não entrar. Na prorrogação, os argentinos fizeram mais dois gols e venceram por 3 a 1, enfim, levantando a Taça Fifa, para alívio do general Videla.

Mário Kempes, atacante argentino, foi o artilheiro da Copa com seis gols, todos anotados a partir da segunda fase do mundial. Mesmo ainda sem Bola de Ouro, que seria instituída em 1982, Kempes também foi considerado o melhor jogador da Copa.

O artilheiro Mário Kempes SELEÇÃO BRASILEIRA

A preparação da seleção brasileira foi conturbada, como na maioria das Copas. Dessa vez teve troca de técnico. Oswaldo Brandão, histórico treinador de Palmeiras e Corinthians, pediu demissão em meio às eliminatórias, ao retornar de Bogotá onde o Brasil empatara em 0 a 0 com a Colômbia.

Oswaldo Cláudio Brandão Coutinho, iniciou a o técnico preparação da Copa para a Copa

A imprensa carioca não gostava do treinador, identificado com o futebol paulista. Brandão afirmou, no aeroporto do Galeão (hoje aeroporto Tom Jobim), no Rio de Janeiro, ao retornar de Bogotá e já ter feito o pedido de demissão, que não tinha problemas com a imprensa carioca “como estão dizendo por aí”, além disso, não comentaria os motivos da saída. “As minhas paradas ficam comigo mesmo”, disse.

Folha de S. Paulo no início da Copa

O presidente da CBD, almirante Heleno Nunes, escolheu o então técnico do Flamengo, Cláudio Coutinho, que dois anos antes levara a seleção olímpica ao quarto lugar nos Jogos de Montreal. A troca deu resultado e a seleção não teve grandes dificuldades para chegar à Argentina. Nas eliminatórias restavam cinco jogos. O Brasil de Coutinho venceu quatro e empatou um, fez 17 gols e sofreu apenas um.

O elenco de 1978 era mesclado com jogadores experientes, como Leão - entre os três melhores goleiros do mundo - e Rivelino, e promessas que disputavam a primeira Copa, como , , Reinaldo, Edinho, e Batista. Se num país em que não houvesse tanta cobrança por títulos em todas as Copas, esse seria um time sendo formado para 1982. Mas a cobrança foi grande.

A estreia aconteceu no sábado, dia 03 de junho, em Mar del Plata. No Brasil o inverno estava rigoroso. Os termômetros marcaram -2 graus na cidade de Itapeva e -8 graus em Campos do Jordão, na sexta-feira, dia 02. Mas, na política, o clima era quente. A Arena (Aliança Renovadora Nacional) convocara uma convenção estadual para o domingo, dia 04, para decidir quem seria o candidato do partido (praticamente uma indicação já que o Colégio Eleitoral era composto por 1.001 votos para a Arena contra 251 do MDB) na eleição indireta para governador do Estado de São Paulo, na Assembleia Legislativa. No páreo Laudo Natel, indicado pelo governo federal e Paulo Maluf, que se indicou livremente. Paulo Maluf venceria e seria o governador do Estado de São Paulo.

Cláudio Coutinho afirmara na véspera da estreia que o time tinha a ordem para atacar a Suécia. Ele já enfrentava as críticas, principalmente da imprensa paulista, pelo modelo de jogo “cauteloso”. Muitas vezes o time era chamado de “mecânico”. O empate em 1 a 1 só veio corroborar com as críticas.

A seleção se apegava, como justificativa, ao erro grosseiro do árbitro do País de Gales, Cliue Thomas, que anulou um gol de Zico aos 45 minutos do segundo tempo. Depois de um escanteio cobrado, Zico cabeceou e fez o gol, anulado. Thomas terminou a partida enquanto a bola estava no ar. No mínimo, inusitado. Coutinho considerou o empate “bom”.

Zico coloca as mãos na cabeça quando juíz anula seu gol

Para o brasileiro, que não conseguiu comemorar a primeira vitória da seleção, restou acompanhar e se divertir com as aventuras do cego Léo (Luis Gustavo), Shana (Maria Cláudia) e Sabrina (Wanda Stefânia) protagonistas da novela “Te Contei?”, de Cassiano Gabus Mendes, no ar na Rede Globo às 19 horas. Logo depois era a vez de “O Astro”, de Janete Clair, mostrando as aventuras de Herculano Quintanilha (Francisco Cuoco), Salomão Hayala (Dionísio Azevedo) e Amanda (Dina Sfat).

Luiz Gustavo e Maria Cláudia em Te Contei?

A pressão sobre a seleção aumentou com as críticas de Pelé ao esquema tático de Coutinho. O rei do futebol entendia que a seleção era muito defensiva, queria a equipe mais ao ataque.

Tentando dar uma resposta a Pelé, a seleção entrou em campo contra a Espanha, na quarta-feira, 07 de junho, e mais uma vez não foi bem. Empate em zero a zero e Coutinho bastante questionado. Zico, treinado por ele no Flamengo, lamentou que a seleção não jogasse com pontas. Já o almirante Heleno Nunes queria a presença de Roberto Dinamite na equipe.

A última chance para a classificação para a fase semifinal era o jogo contra a Áustria, marcado para o dia 11 de junho, domingo à tarde.

Na Folha de S. Paulo, o jornalista Paulo Francis revelava que documentos, que se tornaram públicos, mostravam que o presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, em sua então recente visita ao Brasil, pedira ao presidente, general Ernesto Geisel, apoio contra as intervenções cubanas na África.

Roberto Dinamite entrou no time, fez o gol da vitória sobre a Áustria (1 a 0) e aliviou a torcida que, em São Paulo, comemorou a classificação para a fase semifinal na avenida Paulista. Roberto precisou ser atendido no ambulatório médico, pois sentiu-se mal e teve tonturas. O diagnóstico foi sobrecarga de emoção após o gol da classificação.

A primeira partida na fase semifinal da Copa, que contava com dois grupos de quatro seleções, onde os campeões fariam a final, foi contra a seleção peruana, em 14 de junho, dia em que foi anunciado aumento de 16% para a carne nos supermercados do Brasil

Os 3 a 0 sobre os peruanos contribuíram para a mudança no astral da seleção e, também, do torcedor brasileiro. A seleção começava com bom saldo de gols e Mendoza teve contato com o carnaval do Brasil. Domingo, 18 de junho, foi a prova de fogo para o time de Cláudio Coutinho. Uma verdadeira batalha contra os argentinos em Rosário. Logo depois do programa Sílvio Santos e antecedendo o programa Flávio Cavalcanti no Canal 4, o torcedor assistiu ao volante Chicão se impor com certa violência e muita personalidade no meio de campo, dando segurança para que a seleção pudesse ameaçar e quase vencer a partida. O empate em zero a zero deixava para tudo ser decidido na última rodada e provocava certo alívio nos argentinos.

Os dirigentes brasileiros fizeram tudo para que os jogos de Brasil e Argentina fossem no mesmo horário, mas prevaleceu a vontade dos donos da casa em jogar depois, algo impensável hoje, sabendo o que precisavam fazer naquela quarta-feira, 21 de junho, dia que o Brasil comemorava os oito anos do tricampeonato.

Toninho (2) e Chicão (21) no jogo contra a Argentina

O clima na seleção tinha piorado de novo, não por causa dos resultados, mas pela entrevista em que Heleno Nunes, presidente da CBD, criticava o técnico Cláudio Coutinho. Para os órgãos de imprensa brasileiros ele disse que estava arrependido de ter nomeado Coutinho como técnico da seleção. Veio mais uma vitória, 3 a 1 contra os poloneses, o que fazia com que a Argentina tivesse que vencer o Peru por quatro gols. Como se sabe, de forma polêmica, com acusações de suborno e entrega de jogo por parte dos peruanos, os argentinos fizeram 6 a 0 e passaram para a final do mundial.

Anúncio publicitário antes de Brasil e Argentina Para Cláudio Coutinho, vencer a Itália na disputa pelo terceiro lugar, em Buenos Aires, no sábado dia 24 de junho, era fundamental para que a seleção terminasse a Copa como campeã moral, sem derrota.

A vitória foi por 2 a 1, numa boa apresentação da equipe. Aposta de Coutinho, , autor de um dos gols - o outro foi de -, dizia que a crônica brasileira teria que aceitá-lo. “Agora terão que me engolir”, disse a frase que ficaria famosa, dezenove anos depois, na boca do técnico Zagallo.

Anúncio de aparelhos de TV durante o Mundial

Os brasileiros se prepararam para, depois do jogo final entre Holanda e Argentina, receber a medalha pelo terceiro lugar. Momentos antes de sair do hotel, a delegação brasileira foi impedida pela polícia argentina. Era grande o número de torcedores argentinos xingando os jogadores brasileiros na frente do hotel.

Ao site UOL Esporte, em setembro de 2017, o volante Batista lembrou que era uma multidão. “Xingavam a gente de macacos e outros palavrões. A polícia achou melhor a delegação não sair do hotel”, disse.

Anúncio com alusão à Copa A orientação foi obedecida, mas o inusitado é que as medalhas pelo terceiro lugar nunca foram entregues aos brasileiros. O UOL Esporte entrevistou o goleiro Leão, os atacantes Roberto Dinamite e Reinaldo, o meia Rivelino e o próprio Batista e a resposta foi unânime: “nunca vi essa medalha”.

Roberto Dinamite disse que gostaria ainda de receber o símbolo da conquista do terceiro lugar. “Não foi fácil. Tivemos que nos superar, superar a torcida contra dos argentinos, a arbitragem e os adversários”, disse.

O jogo contra a Itália, foi o último oficial de Rivelino com a camisa da seleção brasileira. Na saída do estádio, o tricampeão disse: “meu ciclo na seleção acabou. Espero que esse grupo de jogadores seja mantido. Em 1982 estarei na Espanha torcendo por eles”.

Aí é outra história.

Em tempos de ditadura, a Telesp anunciava que havia concedido linhas telefônicas e chamava as pessoas contempladas. Eram os chamados “Plano de Expansão” da estatal 1982 – Espanha

Cartaz oficial da Copa de 1982

A Espanha praticamente garantiu o seu mundial ao perder a organização da Copa de 1974, realizada na Alemanha Ocidental. Os espanhóis abriram mão da candidatura, em troca do apoio dos alemães para que realizassem o mundial de 1982. Acordo feito, acordo cumprido.

Nas eliminatórias, 105 países disputaram o direito de estar na Espanha em junho de 1982, na primeira Copa do Mundo que contou com 24 seleções e que garantiu a representação de todos os cinco continentes, algo que a Fifa desejava há algum tempo.

O mundo assistiu cinco seleções debutantes em Copas: Argélia, Camarões, Nova Zelândia, Honduras e Kuwait.

A Espanha utilizou 14 cidades: Barcelona, Madrid, Sevilha, Málaga, Elche, Vigo, Valência, Bilbao, Gijón, Zaragoza, Alicante, La Coruña, Valladolid e Oviedo.

Se o mundo conheceu mais cinco seleções em Copas, sentiu falta de seleções tradicionais que não conseguiram classificação como Holanda (sensação das últimas Copas com dois vice-campeonatos), Uruguai e Portugal.

O nível técnico da competição foi excelente. Havia muitos craques em campo e eles corresponderam encantando o mundo com um futebol habilidoso e técnico. Destaque para três seleções: a campeã Itália, com seu futebol pragmático e que contou com lances de extrema beleza, principalmente na semifinal contra a Polônia e na final contra a Alemanha Ocidental; o Brasil, considerada uma das melhores seleções da história das Copas, e a França, chamada pelos críticos de “Brasil da Europa”. O mascote escolhido pelos espanhóis foi o “Naranjito”. Era uma laranja vestida com as cores da Espanha. A fruta é típica da comunidade valenciana e da Andaluzia. A seleção espanhola jogou toda a primeira fase em Valência e nunca chegou a empolgar os fanáticos torcedores.

Naranjito, o mascote de 1982

A campeã Itália demonstrou que uma seleção, para levantar a Copa, precisa crescer dentro do torneio. Na primeira fase os italianos chamavam a atenção por mostrar um futebol que criava chances de gol, mas não conseguia finalizar corretamente. Os empates diante da Polônia (0 x 0), Peru (1 x 1) e Camarões (1 x 1), levaram a Itália a formar um “grupo da morte” com Argentina e Brasil. Só uma dessas seleções passaria para as semifinais. E foi a Itália, com uma atuação magistral do artilheiro Paolo Rossi contra a seleção brasileira, que pelo saldo de gols jogava por empate. Levou três gols do “Bambino D´Oro” (menino de ouro) italiano.

Por muito pouco Paolo Rossi, o personagem da Copa, o único a ganhar como melhor jogador e ainda ser o artilheiro do torneio, não deixou de disputar o torneio.

Formado nas categorias de base da Juventus de Turim, Paolo Rossi disputou a Copa de 1978, seis meses após ter estreado na Azzurra. Logo na primeira partida fez seu primeiro gol em Copas, contra a França, transformando-se na esperança italiana para o mundial da Espanha.

Em 1980, o chamado “Escândalo de Totonero” atrapalha a carreira do “Bambino”. Denunciado durante a temporada 1978/1979, mas que virou caso de polícia em 1980, o “Escândalo de Totonero” foi uma série de manipulações de resultados no futebol italiano, feitas por um grupo de apostadores da loteria esportiva do país, chamada de “Totocalcio”.

Paolo Rossi, artilheiro da Copa A farra veio à tona com o aparecimento de cheques de jogadores envolvidos, que resolveram fazer suas próprias apostas. As investigações concluíram pelo envolvimento de 27 atletas de sete diferentes clubes. Paolo Rossi foi um dos envolvidos. Ao todo, 48 pessoas foram presas, incluindo atletas e dirigentes. O escândalo parou a Itália. Era comum ver a polícia nos estádios, durante as partidas, prendendo atletas e dirigentes.

Rossi sempre negou a sua participação nas armações de resultados com veemência. A justiça comum italiana inocentou o artilheiro, mas a justiça esportiva o condenou a três anos de suspensão. Paolo Rossi não poderia jogar nem amistoso pelo Vicenza, clube pelo qual atuava.

O artilheiro só conseguiu jogar a Copa porque a pena diminuiu um ano e encerrou- se em 02 de maio de 1982. Rossi estava em Vicenza, apegado a ações católicas e a treinos diários para manter a forma, o que o ajudou a voltar e ser destaque da Copa. A pena foi diminuída porque um dos acusadores admitiu, em depoimento, que as provas contra Paolo Rossi foram forjadas e eram falsas.

Técnico

Mesmo Rossi sendo referência para a seleção italiana, o técnico Enzo Bearzot foi criticado, pela imprensa, por ter convocado o artilheiro. Diziam os críticos italianos que Rossi estava sem condições físicas de suportar a Copa pelo fato de estar parado há dois anos, mesmo tentando manter seu condicionamento com treinos diários. Bearzot manteve o artilheiro no grupo e como titular durante toda a Copa, provocando descontentamento nos críticos e esperança nos torcedores.

As críticas aumentaram com o decorrer da primeira fase. Rossi não conseguia balançar as redes adversárias, até que encontrou o Brasil, no quinto jogo do torneio. O artilheiro fez uma partida espetacular e eliminou a seleção favorita do mundo inteiro com três gols.

Paolo Rossi, em entrevista ao jornalista Andrea Chiavacci em 2014, publicada pelo site Fox Sports, afirmou que “a Itália jogou seu melhor futebol em toda a história” naquela reta final de Copa do Mundo. “Demos uma aula. A partir daquele momento, os brasileiros entenderam que futebol não é só ataque, mas defesa e meio-campo também”, disse.

O “Bambino” confessou que, quando criança, torcia pela seleção brasileira. “Acompanhei todos os jogos de 1970. Meus grandes ídolos eram Pelé, Carlos Alberto Torres e Rivelino”, afirmou. Rossi demonstra que tinha plena consciência do que representava para si aquele Brasil x Itália, no estádio Sarriá, em Barcelona, em 05 de julho de 1982. “Poderia ser meu funeral. Ou eu morreria ou algo muito feliz aconteceria”, disse ao site Globo Esporte, em 2014. Ele relatou que sentia dificuldades pelo tempo parado. “Encontrei um treinador que confiou em mim, apesar das críticas que recebeu”, disse.

Para Rossi, a equipe italiana era extraordinária. “Vencemos grandes campeões como Zico, Falcão, . Uma pena, para eles, que encontraram a Itália num dia incrível”, afirmou o artilheiro que ainda é reverenciado pelos italianos. “Os torcedores me param na rua para agradecer”, disse o ex-jogador, que hoje é produtor de vinhos na região da Toscana.

Ao relembrar a Itália de 1982 é preciso entender que a espinha dorsal da equipe era formada por cinco excelentes atletas da Juventus de Turim. O goleiro Dino Zoff, o líbero extraordinário , mais Antonio Cabrini, Cláudio Gentile e . Todos titulares e destaques da Azzurra.

Depois de enfrentar a seleção brasileira, Rossi fez gol em todos os jogos. Dois contra a Polônia, na semifinal (2 x 0), e um contra a Alemanha Ocidental (3 x 1), na final, apitada pelo árbitro brasileiro Arnaldo César Coelho.

Capa e charge dos campeões do jornal italiano "La Gazetta Dello Sport"

Na Copa decantada pelo profissionalismo, ações agressivas de marketing e a “mundialização” efetiva, com a presença de todos os continentes, um fato chamou a atenção pela referência aos tempos de futebol amador.

Em 21 de junho, jogavam França x Kuwait, seleção dirigida pelo brasileiro , pela segunda rodada do grupo 4, em Valladolid. A partida entrava nos 40 minutos do segundo tempo apresentando 3 a 1 para os franceses, quando Giresse fez o quarto gol da França. No lance do gol, ao ouvir um apito vindo da arquibancada, a defesa do Kuwait parou, mas o árbitro soviético, Myroslav Stupar, deu prosseguimento à jogada e confirmou o gol.

Indignados, os jogadores do Kuwait cercaram Stupar. Eles se recusavam a reiniciar o jogo. Na tribuna de honra, irritado com o gol, estava o sheik Fahad Al-Sabah, presidente da Associação de Futebol do Kuwait, que fazia sinal para que seus atletas deixassem o jogo. Ainda mais irritado porque os jogadores não entendiam os sinais, o sheik desceu e foi até o gramado, tendo sua entrada facilitada pela polícia espanhola. Al- Sabah pressionou o árbitro e o soviético, numa decisão histórica, anulou o gol francês, numa das cenas mais bizarras da história das Copas. No final, a França ainda fez mais um gol, deixando o placar em 4 a 1.

Em documentário realizado pela TV Tea y Deportea, da Espanha, o meia Giresse, autor do gol anulado pelo sheik, disse que os jogadores franceses ficaram com medo que o Al-Sabah mandasse o árbitro anular todos os gols franceses. “Perderíamos por 1 a 0”, disse. Outro craque do meio-campo francês naquele jogo, Marius Tresor, chama a atenção para outro fato, também importante e que ilustra a situação absurda vivida em Valladolid. “Não entendemos o fato de a polícia abrir espaço para o sheik entrar em campo”, afirmou no documentário do canal espanhol. Tresor relembra que Al-Sabah também queria que o árbitro expulsasse o treinador francês, Michel Idalgo, revoltado com aquela situação. Aí já foi demais...

O sheik invade o campo e conversa com seus Giresse, na entrevista à TV espanhola atletas, depois consegue a anulação do gol A Copa da Espanha apresentou, também, a maior goleada da história do torneio, acontecida em 15 de junho, na primeira rodada do grupo 3, em Elche, quando a Hungria aplicou 10 a 1 em El Salvador. Ambos caíram na primeira fase.

Foi a primeira vez que a Fifa entregou a Bola de Ouro para o melhor jogador do mundial. Coube ao bambino Paolo Rossi receber a honraria.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Ostentando pela primeira vez o escudo da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), que havia sido criada para suceder a CBD em 1979, a seleção brasileira chegou à Espanha como uma das favoritas e depois da primeira fase era “a” favorita para conquistar o caneco. Antigo escudo da CBD e o escudo da CBF usado em 1982, com a taça Jules Rimet, um ramo de café já que a entidade tinha contrato com o Instituto Brasileiro do Café e as três estrelas representando o tri mundial

Futebol de rara beleza, com o “quadrado mágico” do técnico Telê Santana, formado pelos craques Falcão, Cerezo, Sócrates e Zico, a seleção encantou o mundo. É apontada, ainda, como uma das maiores seleções de todos os tempos. É possível encontrar críticos que afirmam que se essa seleção tivesse conquistado a Copa, a seleção de 1970 teria uma rival à altura no coração do torcedor.

Telê Santana, ex-jogador do Fluminense, chegou a seleção depois de encantar o Brasil dirigindo o Palmeiras em 1979. A goleada de 4 a 1 no favorito Flamengo, em pleno Maracanã, pelo Campeonato Brasileiro de 1979, o credenciou a comandar a seleção brasileira. Chegava dando declarações que a seleção iria resgatar o verdadeiro futebol brasileiro. Formou uma máquina, comandada por Zico, Sócrates e Falcão.

O time passou pelas eliminatórias com quatro vitórias em quatro jogos. Fez uma excursão à Europa, em maio de 1981, e se credenciou como uma das favoritas ao derrotar a Inglaterra em Wembley, pela primeira vez na história, a França e a Alemanha, com atuações de gala de Zico, Sócrates e do goleiro Waldir Peres, que defendeu dois pênaltis do craque alemão Paul Breitner. A Europa conhecia e reverenciava o time de Telê Santana. Para aumentar ainda a credibilidade, no final de 1981 o Flamengo, dos craques da seleção Leandro, Júnior, Zico e , conquistou o mundial de clubes goleando o Liverpool, sempre uma referência europeia, por 3 a 0.

Telê Santana, técnico em 1982

A estreia da seleção foi contra a União Soviética, em 14 de junho, em Sevilha. Os soviéticos haviam vencido a seleção, numa virada épica no Maracanã em 1980, e tinham no goleiro Rinat Dasayev a segurança que precisavam para acreditar que poderiam complicar a estreia dos favoritos. A Folha de S. Paulo dizia que começava a "operação tetracampeonato"

No dia em que o jornalista Clóvis Rossi anunciava na Folha de S. Paulo que os ingleses estavam próximos da vitória na guerra contra os argentinos pela posse e administração das Ilhas Malvinas, vitória que se confirmou com a rendição da Argentina, os brasileiros comemoravam os 2 a 1, de virada, sobre os soviéticos, que abriram o placar numa falha de Waldir Peres.

Dasayev, um dos maiores goleiros de todos os tempos

Para a imprensa brasileira era o início da campanha pelo tetracampeonato. Embora destacasse algumas dificuldades, os cronistas exaltavam a tranquilidade dos jogadores em buscar a virada e ainda superar Dasayev, numa das maiores atuações de um goleiro em Copas. Anos depois, Telê Santana disse a Rinat Dasayev que se ele estivesse no gol brasileiro, a seleção ganharia aquela Copa. A declaração foi confirmada pelo próprio Dasayev ao site Globo Esporte em junho de 2017. O goleiro é o maior ídolo vivo do futebol russo. O outro é o goleiro Yashin, o Aranha Negra, já falecido.

Anúncio antes do jogo contra a União Soviética

Enquanto a Argentina anunciava a renúncia do presidente da República, general Leopoldo Galtieri, que reclamava a falta de apoio do seu exército para continuar a governar, o Brasil enfrentava a Escócia, em 18 de junho, em Sevilha, apostando no “Carrossel Mágico”, com a entrada de Cerezo no lugar de Dirceu. O volante estava suspenso do primeiro jogo pela expulsão na última partida das eliminatórias.

E foi um passeio. Os brasileiros fizeram 4 a 1 nos escoceses e receberam aplausos efusivos dos torcedores espanhóis, encantados com a seleção dentro de campo e com a festa que os brasileiros faziam fora dele. Sevilha se rendeu ao samba brasileiro. Se o futebol ganhava a admiração dos espanhóis, a simpatia fazia com que a torcida brasileira conquistasse ainda mais fãs para o Brasil. Essa era a tônica da cobertura da mídia brasileira.

Teatro durante a Copa de 1982

Naquela sexta-feira o torcedor comemorou muito. Quem não quis ir para as ruas, aproveitou para se divertir com mais um capítulo da novela Sétimo Sentido, de Janete Clair, que tinha Regina Duarte no papel de Luana Camará, às 20h25 na Rede Globo. O paulistano que buscou um programa fora de casa, teve como opção o show de Chico Anísio, com direção de Jô Soares, no teatro Zaccaro. Já no teatro Maria Della Costa, a opção foi a peça “Doce Deleite”, com Regina Casé e Marco Nanini.

Filme em cartaz durante a Copa da Espanha

Nos cinemas, havia opções interessantes. Os cines Marabá, Iguatemi e Bristol tinham em cartaz o longa “Toque de Recolher”, com Tom Cruise e Sean Peans. Já no Art- S.Paulo e no Top Cine em exibição “Fuga de Nova York”, com Kurt Russel e Lee Van Cleef. Nos cines Ibirapuera 1, Morumbi 3 e Center 3, o paulistano poderia assistir “Num Lago Dourado”, com Jane Fonda e Henry Fonda.

Quem não estava se divertindo era o técnico Telê Santana, conhecido por ser rabugento e perfeccionista. Preocupado em não ter uma surpresa desagradável contra a Nova Zelândia, nem cogitava poupar os titulares. Queria seriedade da equipe naquele 23 de junho, em Sevilha. Os jogadores corresponderam em mais uma grande atuação. Vitória de 4 a 0 sem sustos, respeitando o adversário, como queria Telê.

O grupo do Brasil na segunda fase chamava a atenção do mundo. Eram três campeões mundiais buscando uma vaga. Os italianos com Tardelli, Cabrini, Paolo Rossi e Zoff, os argentinos com Maradona, Passarela, Ramon Dias, Fillol e os brasileiros com o talento e o favoritismo de uma geração de craques.

Na primeira partida do grupo os italianos fizeram 2 a 1 nos argentinos. Dizia o regulamento que a seleção derrotada deveria enfrentar o Brasil. Em 02 de julho, no acanhado estádio Sarriá, em Barcelona, o clássico sul-americano fez o Brasil parar.

O treinador campeão do mundo, César Luis Menotti, afirmava que os argentinos eram capazes de tudo. As equipes se encontravam quatro anos depois da “Batalha de Rosário”, mas desta vez em “campo neutro”. No dia em que a inflação chegava a 8% ao mês no Brasil, a seleção despachava os argentinos com futebol de campeão. Foram sonoros 3 a 1, com direito a expulsão do então promissor craque Maradona e olé da torcida brasileira no final do jogo. E Telê afirmou: “nem chegados a jogar tudo”.

Se não jogou tudo contra os argentinos, muito menos contra os italianos. Naquele 05 de julho, o estádio Sarriá presenciou o maior jogo da sua história, no maior clássico das Copas do Mundo. Uma partida épica, com brasileiros e italianos praticamente “decidindo” quem seria o campeão do mundo. Uma final antecipada, era essa a expectativa do mundo do futebol.

Foram três gols de Paolo Rossi e uma defesa antológica de Dino Zoff, no último minuto de jogo, numa cabeçada de Oscar, que garantiram a classificação italiana, na derrota brasileira por 3 a 2. A Itália abriu o placar com Paolo Rossi aos cinco minutos do primeiro tempo, tirando a vantagem brasileira do empate. Logos aos 12 minutos, numa jogada individual de Zico que levou dois marcadores, Sócrates empatou. Ainda no primeiro tempo, aos 25 minutos, Paolo Rossi aproveita falha da defesa e faz 2 a 1 Itália.

A seleção volta em cima da Itália. Aos 22 minutos Falcão acerta um lindo chute, no ângulo de Dino Zoff, empatando a partida e colocando a classificação nas mãos do Brasil. Apenas sete minutos depois, num escanteio, a bola sobra para Paolo Rossi decretar os 3 a 2 da Itália que eliminaram a seleção de Telê Santana.

As críticas que Telê Santana não soube jogar pelo empate, que até o ídolo italiano Paolo Rossi defendeu, não são justas. O Brasil levou o primeiro gol, que tirou a vantagem aos 5 minutos, empatou aos 12 minutos e levou o segundo gol aos 25 minutos do primeiro tempo. Dos 45 minutos, a seleção jogou apenas 18 minutos com o resultado que lhe classificaria.

O espetacular goleiro italiano Dino Zoff, campeão do mundo aos 40 anos, que defendeu uma cabeçada de Oscar no último minuto. Ele considera a maior defesa de sua carreira

No segundo tempo, a seleção empatou aos 22 minutos e levou o terceiro gol aos 29 minutos. Portanto, jogou apenas sete minutos classificada. Ao todo, a seleção atuou 25 minutos classificada contra os italianos. O gol de Paolo Rossi no início do jogo mudou todo o confronto e fez com que, durante 65 minutos, a seleção estivesse em desvantagem, buscando justamente o empate.

Em entrevista ao jornal Zero Hora, em novembro de 2013, o goleiro italiano Dino Zoff demonstrou uma visão mais realista do que aconteceu no estádio Sarriá. “Nós tínhamos um time mais rápido. Éramos muito velozes e perigosos nos contra-ataques. O Brasil tinha uma boa posse de bola, mas nós éramos muito rápidos. O Brasil até tinha arranque e velocidade, mas nós tínhamos mais”, disse o goleiro, até hoje o jogador mais velho a levantar uma Copa do Mundo. Capitão da Azzurra, Zoff tinha 40 anos quando foi campeão mundial.

O torcedor estava frustrado. Imagens em telejornais, revistas e jornais, de torcedores, especialmente crianças, chorando pela desclassificação da seleção foram comuns. O povo brasileiro estava aguardando a quarta estrela na camisa, mas teve que assistir a conquista da terceira italiana. A tragédia de Sarriá foi comparada à derrota para os uruguaios em 1950.

Para uma geração que ainda não tinha visto o Brasil campeão mundial, era mais uma lição ensinada pelo futebol.

Uma triste lição.

Capas do Jornal da Tarde sobre a derrota brasileira e do jornal italiano "Stampa Sera" sobre a conquista da Copa

Capa da Revista Placar tendo como tema a derrota do Brasil para a Itália

James Bond nos cinemas durante o Mundial de 1982

Chico Anysio em cartaz em São Paulo O comércio aproveitava cada vitória da seleção durante a Copa

1986 – México

Cartaz oficial da Copa de 1986

A Fifa indicou a Colômbia como a sede para a Copa de 1986, continuando com a filosofia de revezamento entre os continentes. Em 1982, o presidente colombiano Belisario Betancur informou à Fifa que, devido aos graves problemas econômicos enfrentados pelo país, a Colômbia não poderia sediar o torneio. O investimento em infraestrutura seria grande. Não havia dinheiro para isso e para cumprir boa parte das exigências da entidade.

Rapidamente, Brasil, México, Estados Unidos, Canadá e Peru se inscreveram para sediar a Copa. Como restava pouco tempo para investimentos em estádios, hotéis e aeroportos para atender as exigências da Fifa, a entidade optou pelo México, que tinha infraestrutura praticamente pronta. Dessa forma, o país se tornou o primeiro a sediar o mundial pela segunda vez, numa diferença de apenas 16 anos.

Mesmo assim, a Copa de 1986 esteve seriamente ameaçada. A Fifa cogitou transferir o evento para 1987 devido ao grave terremoto que atingiu a Cidade do México. Eram 7h19 de 19 de setembro de 1985 quando um forte tremor atingiu a capital e mais quatro estados mexicanos. Com epicentro no mar de Michoacán, o terremoto atingiu 8,1 na escala Richter. Prédios desabaram, milhares de mortos, feridos, desaparecidos e desalojados. O país vivia um momento dramático.

Um dia depois, outro terremoto, desta vez atingindo 7,3 na escala Richter, voltou a atingir a capital mexicana. Mais edifícios desabaram, mais pessoas perderam a vida, ficaram feridas, desabrigadas ou desaparecidas. Aumentava o drama mexicano e a Copa do Mundo estava, também, ameaçada, preocupando a Fifa que não tinha uma alternativa imediata. Equipes de resgate dos Estados Unidos e da França participaram das buscas dos desaparecidos e da tentativa de ainda salvar vidas. Do Brasil, uma equipe de bombeiros e policiais paulistas esteve no México contribuindo com o esforço dos mexicanos para iniciar a reconstrução da capital e das cidades afetadas.

Os terremotos mataram mais de 10 mil pessoas, deixaram feridas cerca de 30 mil e 100 mil desabrigados. Cerca de 400 edifícios desmoronaram. Seria preciso uma verdadeira reconstrução.

O povo mexicano encarou a realização da Copa do Mundo como parte dessa reconstrução. O presidente da República Miguel de La Madri teve o apoio da Fifa e a Copa foi realizada, como 16 anos antes, com sucesso de público e envolvimento da população.

Apenas o estádio “La Corregidora”, em Querétaro, foi construído especialmente para a Copa de 1986. Os outros já faziam parte da infraestrutura do país, colocada à disposição da Fifa.

As cidades que receberam partidas do mundial foram: Cidade do México, Guadalajara, Monterrey, Puebla, Querétaro, Leon, Zapopan, Nezahualcoyotl, Irapuato e Toluca.

Participaram das eliminatórias 113 países. Mais uma vez a ausência bastante sentida foi da Holanda. Participaram da Copa pela primeira vez as seleções do Canadá, Iraque e Dinamarca, que foi uma das sensações do torneio, ao fazer uma primeira fase brilhante e golear os uruguaios por 6 a 1. A equipe de Laudrup, Elkjaer e Derby fez o mundo reviver o “Carrossel Holandês” de 1974, tamanha era sua velocidade e trocas constantes de posição. Comparações foram inevitáveis.

Andersen, Laudrup e Elkjaer, da Dinamarca, comemoram gol contra o Uruguai

O sonho dinamarquês terminou em Querétaro, nas oitavas de final, quando a seleção foi goleada pela Espanha, em tarde do artilheiro Emílio Butrageño, que fez quatro dos 5 a 1 impostos pelos espanhóis. Mesmo assim, a Dinamarca, que chegou a ser chamada de “Dinamáquina” no Brasil, deixou boas lembranças.

O mascote escolhido pelo México foi o “Pique”, uma pimenta vestida com “sombrero” e roupas típicas mexicanas, numa tentativa de vincular a Copa do povo mais humilde do México. Sempre sorrindo, o Pique é um dos mais festejados mascotes das Copas.

Pique, o mascote da Copa de 1986

A Copa de 1986 pode ser considerada a da consagração do craque , que fez um mundial impecável, no auge de sua forma física e técnica. A Argentina, comandada pelo técnico , ganhou a Copa sem sustos, sustentada em jogadores decisivos e comprometidos em oferecer a vitória ao povo argentino. Destaque, além de Maradona, para o goleiro Pumpido, o zagueiro Brown, o meia Burruchaga e o atacante Valdano. Eles foram a espinha dorsal da seleção campeã do mundo.

O jogo mais emblemático da Copa foi o confronto das quartas de final entre Argentina e Inglaterra, que contava com o excepcional goleiro Peter Shilton e o artilheiro daquele mundial, . Esse confronto extrapolou as quatro linhas e ganhou contornos políticos por causa da então recente “Guerra das Malvinas”, confronto militar entre a Argentina e o Reino Unido, acontecido entre 02 de abril e 14 de junho de 1982. As forças armadas da Argentina invadiram as ilhas Malvinas – chamada de Falklands pelos ingleses - buscando a conquista do território, que tem posição geográfica estratégica, no extremo sul do continente americano.

Os britânicos colonizaram e administraram o arquipélago desde 1883 e, em 1982 os argentinos entenderam que as ilhas Malvinas deveriam ser incorporadas ao seu território, já que com a sua independência, em 1822, teriam direito ao território que pertencia à Espanha. O governo militar do general Leopoldo Galtieri, em baixa com a população, precisava encontrar um inimigo externo e assim unir a população e desviar sua atenção dos graves abusos dos direitos humanos cometidos pela ditadura argentina. Os soldados argentinos foram “presa fácil” no confronto com o poderio bélico dos ingleses.

Maradona soube mexer com os brios argentinos e entendeu que iria mostrar, na bola, que eram superiores aos ingleses. Não contente em desfilar toda a sua genialidade nos campos mexicanos, contra a Inglaterra Maradona usou a malandragem ao dividir uma bola com o goleiro Shilton e desviá-la, com a mão, para o gol inglês. O árbitro Al Bin Nasser, da Tunísia, não viu o lance irregular e confirmou o gol de Maradona, para a irritação dos ingleses. No final da partida, o craque da Copa disse que o gol foi feito pela “mano de Dios” (mão de Deus).

"El Gráfico" brinca com a Inglaterra e o lance em que Maradona faz o gol com a mão contra a Inglaterra do goleiro Shilton

No segundo gol anotado na vitória por 2 a 1, Maradona fez aquele que é considerado um dos mais belos gols da história dos mundiais, driblando metade do time inglês. Uma vitória, segundo o craque, “para redimir o povo argentino”. No dia seguinte, o jornal “El Gráfico”, da Argentina, estampou na capa: “No llores por mi, Inglaterra” (Não chores por mim, Inglaterra).

Depois desse confronto, passar pela Bélgica (semifinal) do goleiro Pfaff e pela Alemanha Ocidental (final), de Rummenigge e Voller, foi até mais simples. Como em 1970, com Pelé, a Copa do México de 1986 foi parar nas mãos de um gênio.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A preparação da seleção brasileira para a Copa do México foi confusa. A CBF vivia um período eleitoral. Saía o presidente Giulitte Coutinho e assumia Otávio Pinto Guimarães e seu vice, Nabi Abi Chedid.

Por causa desse período, toda a preparação foi afetada. Boa parte dos craques da seleção foram jogar fora do Brasil, casos de Zico, Sócrates, Júnior, Toninho Cerezo e Edinho. Todos no futebol italiano. Como não havia “data Fifa” naquela época, esses atletas ficaram de fora de todas as convocações desde 1983. Por isso, a CBF tentou fazer uma “renovação”, mesmo que forçada. Saíam os craques derrotados de 1982 para entrar as promessas brasileiras. O técnico indicado para renovar a seleção, em 1983, foi Carlos Alberto Parreira, que tinha dirigido o Kuwait na Espanha. Não foi bem. A opinião pública não deu o tempo que ele precisava para encontrar uma equipe. Para apenas três jogos em junho de 1984, a CBF convidou Edu Coimbra, irmão de Zico e craque histórico do América do Rio de Janeiro, que havia conquistado o vice-campeonato brasileiro com o Vasco da Gama. O desempenho de uma vitória, um empate e uma derrota, apenas com seleções sul- americanas, não o credenciou a ser efetivado na seleção.

Capa da Revista Placar: fora Parreira

Nova mudança e em 1985 assume o técnico , ex-jogador de Barcelona, Real Madrid e Flamengo. Também não foi bem. Derrotas, inclusive para o Peru em Brasília, fizeram a CBF pensar em um nome que fosse consenso entre os torcedores. Esse nome era Telê Santana. Havia uma comoção no Brasil para que Telê voltasse ao comando técnico da seleção brasileira, que jamais apresentara futebol semelhante ao de 1982 e que ainda estava vivo na mente dos torcedores. Telê estava fora do Brasil. Era técnico do Al-Ahli, da Arábia Saudita.

Mesmo assim, a CBF conseguiu convencer Telê e os árabes a liberarem o preferido da torcida, apenas para classificar a seleção para a Copa. Faltando duas semanas para o início das eliminatórias, Telê Santana assume a seleção e traz de volta os craques de 1982.

Naquela época as eliminatórias eram disputadas em apenas um mês, nesse caso em junho de 1985. Três equipes disputavam uma vaga. No grupo do Brasil estavam Paraguai e Bolívia. No primeiro jogo, vitória em Santa Cruz de la Sierra, por 2 a 0, contra a Bolívia. Mesmo placar do confronto contra os paraguaios, em Assunção. Nos jogos de volta, em São Paulo e Rio de Janeiro, empates em 1 a 1 nos dois confrontos e a vaga garantida. Como combinado, Telê voltou para a Arábia Saudita, com o pedido da torcida para que ficasse. A seleção apresentara bom futebol nas eliminatórias. Qualquer pesquisa de opinião que era feita apontava o nome de Telê Santana como o preferido da torcida para dirigir o time na Copa. Os brasileiros sonhavam com uma espécie de segunda chance para Telê e seus craques.

Telê Santana voltou a dirigir a seleção no México em 1986

Apenas em dezembro de 1985 o treinador conseguiu rescindir o contrato com o Al-Ahli. Já sob nova direção, a CBF anunciou a contratação de Telê em 17 de janeiro de 1986.

O que parecia ser a realização de um sonho começou a se complicar devido às contusões. Atingido de forma desleal pelo jogador Márcio Nunes do Bangu, em agosto de 1985, Zico, que voltara ao Flamengo, tinha passado por uma cirurgia nos ligamentos do joelho esquerdo. No início de 1986 faz uma partida exuberante contra o Fluminense e anima a torcida. Parecia estar recuperado.

A técnica utilizada na cirurgia, feita no subúrbio do Rio de Janeiro, provocava instabilidade no joelho, o que facilitava torções e a possibilidade de um novo rompimento dos ligamentos. Depois de uma partida em que fez três gols, contra a Iugoslávia no estádio do Arruda, em Recife, Zico sofre nova torção no joelho na partida seguinte, despedida da seleção da torcida brasileira, contra o Chile, em Curitiba. A comissão técnica decide inscrever Zico na Copa pela sua genialidade, confiando que se recuperasse e estivesse em forma no terceiro jogo do mundial. Iniciava um drama na carreira do maior jogador brasileiro depois da geração tricampeã do mundo.

No embarque da seleção para o México mais uma confusão. Renato Gaúcho, ponta-direta do Grêmio, havia sido cortado por Telê Santana na véspera da viagem. Ele chegara atrasado na concentração, que acontecia na Toca da Raposa, em Belo Horizonte, junto com o lateral Leandro, do Flamengo. Telê perdoara Leandro, mas não Renato. Indignado com o que considerou ser uma injustiça, Leandro informou momentos antes do embarque que decidira não ir à Copa, em solidariedade a Renato Gaúcho. Mesmo com os apelos de Zico e Júnior, companheiro e ex-companheiro de Flamengo, o lateral decide ficar no Brasil. Folha de S. Paulo no dia da estreia do Brasil

A estreia aconteceu em 01 de junho, no estádio Jalisco, em Guadalajara, a mesma sede de 1970, contra a Espanha, do artilheiro Butrageño e do goleiro Zubizarreta. Jogo difícil, time mesclado entre remanescentes de 1982 e a nova geração, liderada por Casagrande e , que havia sido cortado por contusão, na Espanha.

Com gol de Sócrates, o Brasil venceu os espanhóis, também graças ao árbitro australiano Cristopher Bambridge, que anulou um gol legítimo de Francisco, quando o jogo ainda estava zero a zero. O domingo foi de vitória e de sinal de alerta. A seleção precisava melhorar.

Na sexta-feira, 06 de junho, o Brasil voltou a campo para enfrentar a Argélia. Jogo difícil, truncado e a seleção sem criatividade. Careca fez o gol da vitória por 1 a 0, classificando o time para a segunda fase.

A excessiva dificuldade encontrada tirava um pouco da animação dos brasileiros em comemorar. O jeito foi se divertir com mais um capítulo da novela Cambalacho, de Sylvio de Abreu, em cartaz às 19h00 na Rede Globo, com Gianfrancesco Guarnieri e Fernanda Montenegro nos papéis principais. Rir era o melhor remédio.

Quem quis aproveitar a noite de inverno no cinema encontrou o filme “De Volta Para o Futuro” em cartaz no cine Paramount 3, na capital paulista. Quem quis se assustar ainda mais também teve opção. Em cartaz nos cines Ipiranga 2, Center Norte 3, Metro 2, Paramount 5 e Gemini 1 estava “Sexta-feira 13 parte 5 – Um novo começo”.

No teatro Itália em cartaz a peça: “Sua Excelência, O Candidato” e no teatro FAAP “Um Dia Muito Especial”, com Glória Menezes e Tarcísio Meira.

Teatro durante a Copa de 1986

A participação de Zico, que entrou no segundo tempo, e o golaço do lateral Josimar foram os destaques da vitória por 3 a 0 sobre a Irlanda do Norte, na quinta-feira, dia 12 de junho. A seleção dava mostras que poderia voltar a jogar bem. Naquele dia, a Folha de S. Paulo publicou pesquisa para a intenção de votos para a eleição para governador do Estado de São Paulo, num país já redemocratizado. O líder das pesquisas, com 26% das intenções de voto era Paulo Maluf, seguido de Antonio Ermírio de Moraes com 21% e de Orestes Quércia, com 20%, mas que venceria o pleito em novembro.

A equipe da TV Bandeirantes em anúncio durante a Copa

Nas oitavas de final o Brasil enfrentaria a Polônia, na segunda-feira, 16 de junho, ainda em Guadalajara. Telões foram colocados na praça Ramos de Azevedo, na praça da Sé e na sede da TV Gazeta, na avenida Paulista, enquanto autoridades políticas e empresários discutiam se deveria ser feriado em dia de jogo da seleção. Num momento em que a democracia voltava a estar presente na vida política brasileira, qualquer assunto era motivo de muita discussão. Todo mundo queria dar a sua opinião e a questão da possibilidade de ser ou não feriado em jogos da seleção não escapou de ser tema de grandes debates.

O resultado de 4 a 0 sobre a boa seleção da Polônia, do craque Boniek, fez crescer a confiança no título, que seria conquistado novamente segundo 66% dos brasileiros. Além disso, Zico entrara no jogo e sofrera pênalti em jogada individual, quando precisou dar um pique e fintar o zagueiro polonês. A sua recuperação animava os brasileiros.

Anúncio da rádio Jovem Pan durante a Copa

A economia brasileira, ainda sob efeito do Plano Cruzado, tentava se recuperar. Naquele sábado, 21 de junho, dia da partida contra a França de Platini pelas quartas de final da Copa, a Sunab (Superintendência Nacional de Abastecimento) anunciava nova tabela de preços para produtos alimentícios. O governo do presidente José Sarney utilizava-se do tabelamento de preços para controlar o mercado e a inflação. Na média, os produtos estavam mais baratos, mas a inflação baixa era obra de ficção.

O jogo foi dramático e emocionante. Careca fez 1 a 0 e Platini empatou ainda no primeiro tempo. Zico, logo que entrara, no segundo tempo, fez uma jogada genial, acionou o lateral Branco que sofreu pênalti ao driblar o goleiro Bats. Justamente o craque de toda uma geração, que sofrera para jogar a Copa, perde a cobrança, defendida pelo goleiro francês. A partida vai para a prorrogação e depois para os pênaltis. Zico faz o seu, mas Júlio César e Sócrates desperdiçam. Fernandes coloca a França na semifinal contra a Alemanha Ocidental.

Telê Santana, desolado, afirmou que encerraria a sua carreira de treinador. Tinha desperdiçada a sua segunda chance. Por sorte, não era o último capítulo da história de um dos maiores técnicos que a seleção já teve. No início da década de 1990, Telê comandou o São Paulo em dois títulos da Taça Libertadores e dois mundiais.

Não era o último capítulo da seleção. Se uma geração sairia de cena sem conquistar a Copa, outra estava nascendo e poderia fazer o país voltar a comemorar a conquista de um mundial.

Último capítulo, naquele sábado, apenas de um sucesso da teledramaturgia brasileira, a novela Dona Beija, de Wilson Aguiar Filho, com Maitê Proença como protagonista, levado ao ar às 21h20 daquele sábado, pela Rede Manchete.

Para a seleção, a história continuava. Circo de Moscou em São Paulo durante a Copa

Show durante a Copa do Mundo

Anúncio do Governo do Estado de São Paulo durante o Mundial

1990 – Itália

Cartaz oficial da Copa de 1990

Pela segunda vez a Copa do Mundo chegava à Itália, que teve a União Soviética como principal adversária para receber a indicação da Fifa. Além desses dois países, Alemanha Ocidental, França e Inglaterra também se inscreveram para receber o mundial. Mesmo antes da votação esses países já haviam manifestado a desistência, restando apenas os italianos e soviéticos.

A decisão ficou mais fácil por questões políticas. A Fifa não gostou do boicote dos países comunistas aos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, ano que a entidade realizou a votação para a sede de 1990. A escolha da sede aconteceu dias depois do anúncio oficial do boicote e o resultado foi 11 a 5 para os italianos, que já haviam recebido o mundial de 1934. Como em 1986, a Fifa repetia novamente um país anfitrião.

A Itália tinha excelente infraestrutura. Os maiores jogadores do mundo jogavam o Campeonato Italiano, então o mais badalado do mundo. Por isso, o país construiu apenas dois estádios especialmente para a Copa: o “Delle Alpi”, de Turim e o “San Nicola”, de .

Ciao, o mascote italiano

Foram 12 cidades que receberam partidas da Copa de 1990: Roma, Turim, Milão, Firenze, Genova, Nápoles, Bari, Cagliari, Udine, , Bolonha e Verona. Como mascote os italianos escolheram o boneco “Ciao”, que tinha pequenas divisões representando a bandeira italiana e uma bola formando a sua cabeça.

O mundo vivia um momento político ímpar desde 1989, com a queda do muro de Berlim e do comunismo no leste europeu. Por isso, despediram-se do cenário das Copas do Mundo as seleções da Tchecoslováquia - que seria desmembrada em dois países a partir de 01 de janeiro de 1993, República Tcheca e Eslováquia, num processo pacífico e sem conflito armado; a União Soviética, que estava sendo fragmentada com a queda do comunismo no Leste Europeu; e a Alemanha Ocidental, em processo de reunificação com a Alemanha Oriental, que não se classificou para o torneio.

A França, destaque das duas Copas anteriores, também não se classificou. Já as seleções dos Emirados Árabes, Costa Rica e Eire (Irlanda do Sul) foram as debutantes.

A Copa da Itália é considerada aquela que dividiu a história entre o futebol arte e o futebol força. A maioria das equipes jogou de forma defensiva, a prioridade era não levar gol para depois tentar vencer o jogo. Foi o caso do Brasil, que atuou com líbero (três zagueiros, sendo o líbero aquele que ficava na sobra), num esquema consagrado e característico da Itália.

A Argentina, para tentar suprir a falta de talentos e tentar ajudar Maradona, que não estava em plenas condições físicas e fez um grande esforço para atuar nas partidas, também apresentou um esquema fechado, buscando o contra-ataque para ganhar os jogos.

Careca, Maradona e Alemão no Napoli

O craque argentino sabia a real dimensão que o torneio tinha para ele. Além de ser o grande craque mundial, destaque da Copa de 1986, Maradona jogava no Napoli, juntamente com os brasileiros Careca e Alemão. Não havia indiferença com o argentino em nenhum lugar do país-sede. Se era idolatrado em Nápoles, no restante do país aflorava a rivalidade com a equipe do sul da Itália. Além disso, a vida conturbada de Maradona fora dos gramados, o envolvimento com as drogas, as suas posições políticas, o tornavam um personagem inigualável naquele período.

Muitos craques, além de Maradona, desfilaram pelos campos italianos. Na seleção anfitriã os destaques eram o histórico líbero , , (considerado então o melhor goleiro do mundo), Donadoni e Salvatore Schillaci, que foi o melhor jogador daquela Copa e artilheiro com seis gols. A eleição para o melhor da Copa foi polêmica. Schillaci, artilheiro da Juventus de Turim, não era unanimidade. Os torcedores e a imprensa especializada apontavam o alemão Lothar Matthaus, capitão dos campeões mundiais, mas a Fifa resolveu premiar o italiano, repetindo o mesmo gesto que teve com outro italiano, Paolo Rossi, também artilheiro e craque da Copa de 1982.

Schillaci, artilheiro da Copa de 1990 , craque holandês

O artilheiro alemão Klinsmann

A Alemanha Ocidental tinha um time frio, mecânico, apoiado no talento e determinação de Matthaus, com o goleiro Illgner, Brehme, Voller e o artilheiro Jurgen Klinsmann. No comando o “kaiser” Franz Beckenbauer, campeão mundial como atleta em 1974.

Semifinalista, a Inglaterra tinha no goleiro Peter Shilton a experiência necessária nos momentos difíceis, juntamente com o oportunismo do artilheiro Gary Lineker. Destaque também para o defensor Whright e o atacante Paul Gascoine.

Considerada a melhor equipe do mundo, o Milan da Itália tinha em três jogadores holandeses a espinha dorsal para as grandes conquistas, o que levava o mundo a apontar a “Laranja Mecânica” como uma das favoritas, apoiada no talento de Marco Van Basten, , Ronald Koeman e Frank Rijkaard. Não tivesse encontrado a Alemanha Ocidental logo nas oitavas de final, a Holanda cresceria bastante durante a Copa, já que não fez boa primeira fase.

O Confronto com a Alemanha, justamente em Milão, chamou a atenção do mundo. As seleções eram base dos rivais da casa, Internazionale (Alemanha) e Milan (Holanda). Klinsmann e Brehme fizeram os gols da vitória alemã por 2 a 1 (Koeman). O jogo mais emblemático do mundial de 1990 aconteceu em Nápoles, na noite de 03 de julho, no estádio San Paolo, casa do Napoli de Maradona. Era semifinal, Maradona jogaria em casa com a sua Argentina, mas os adversários seriam os italianos.

Acostumado às diferenças político-culturais do sul da Itália, onde está localizada Nápoles, o inteligente craque argentino quis dividir a torcida no San Paolo. Um dia antes da partida contra a Itália Maradona declarou: “durante 364 dias do ano vocês são considerados, pelo resto do país, como estrangeiros e agora têm que fazer o que eles querem, torcendo pela seleção italiana. Eu, por outro lado, sou napolitano durante os 365 dias do ano”. Estava pronta a atmosfera para um grande jogo.

Schillaci abriu o placar no primeiro tempo dando esperança de conseguir levar a Itália à final tão desejada. É possível dizer que naquela noite, os italianos de Nápoles torceram para a seleção italiana e para Maradona, que lançou Caniggia aos 22 minutos do segundo tempo que, de cabeça, desviou do ótimo goleiro Walter Zenga. Empate em 1 a 1.

Maradona comemora gol argentino em Nápoles

O gol de Caniggia, que já havia feito contra o Brasil, no jogo que eliminou a equipe canarinho, acabou com a maior série invicta de um goleiro em Copas do Mundo. Do jogo das oitavas de final de 1986, derrota por 2 a 0 contra a França (segundo gol foi feito aos 12 minutos do segundo tempo) até o gol de Caniggia foram 517 minutos. Esse foi o primeiro gol sofrido pela Itália naquela Copa.

Na disputa de pênaltis apareceu outro personagem que vinha se destacando na Copa. O goleiro Goycochea substituiu o campeão do mundo Pumpido, contundido num treinamento quando prendeu o dedo anelar, com a aliança, num dos ganchos que sustentavam a rede. Pegador de pênaltis, Goycochea defendeu as cobranças do craque Donadoni e Serena. A Argentina se classificou e a Itália deixou de conquistar seu tetracampeonato em casa.

Na final, Maradona contou com toda torcida contra no estádio Olímpico de Roma. Irritados com as declarações do craque argentino antes da partida contra a Itália, os torcedores italianos vaiaram o hino argentino e o próprio jogador, que não fez a menor questão de esconder a sua irritação. A Alemanha levantou a Copa depois de vencer com um pênalti inexistente marcado pelo árbitro mexicano e convertido por Brehme. O ex-jogador Franz Beckenbauer levantava a taça também como treinador, assim como o brasileiro Zagallo.

Um fato triste mexeu com os brasileiros durante e no final da Copa do mundo. O jornalista João Saldanha, que foi técnico da seleção nas eliminatórias da Copa de 1970 e, por ser histórico comunista, não permaneceu à frente do grupo por ordem do regime militar, faleceu enquanto cobria a Copa pela TV Manchete.

Há dois anos Saldanha era portador de enfisema pulmonar, que se agravara antes do mundial, a ponto da direção da TV Manchete nem cogitar a sua ida à Itália. Saldanha, destemido, determinado, mais uma vez fez valer seu apelido de “João Sem Medo”. No dia do embarque dos profissionais da emissora, recorda-se o jornalista Paulo Stein, então principal narrador do canal, Saldanha apareceu na redação com a passagem comprada com seu próprio dinheiro. Chegou na Itália e teve que descer do avião de cadeira de rodas.

Durante a Copa o jornalista sequer foi a um estádio. Participava das transmissões do estúdio da TV Manchete em Roma. Precariamente conseguia, também, participar da mesa-redonda, um programa de debates nos finais de noite. Faleceu em 12 de julho, em Roma, depois de cumprir sua última missão, mais uma vez dando exemplo de amor à profissão.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Treinador campeão brasileiro pelo Guarani, com excelente passagem pelo São Paulo, o mineiro foi indicado para substituir Telê Santana e reformular a seleção brasileira, sem os craques de 1982 e 1986, para o mundial da Itália. O treinador não foi bem numa excursão à Europa e, para a Copa América de 1989, realizada no Brasil, o campeão estadual com Flamengo e Vasco, Sebastião Lazzaroni, foi nomeado treinador pela CBF.

Adotando conceitos polêmicos que deixavam o futebol brasileiro parecido com o europeu, em especial o italiano que privilegiava a defesa, Lazzaroni adota na Copa América um esquema com líbero (zagueiro na sobra). Mauro Galvão, o líbero de Lazzaroni, se adapta ao esquema e é um dos destaques da conquista brasileira, junto com e Romário. Ricardo Teixeira, presidente da CBF, anuncia Lazzaroni como técnico da seleção

A seleção inicia as eliminatórias, disputadas em apenas um mês, sendo desafiada pelo Chile, que promoveu um clima de guerra para o confronto no estádio Nacional de Santiago, quando as duas seleções vinham de vitórias sobre a Venezuela. O grupo tinha essas três seleções e apenas uma se classificava automaticamente. Empate em 1 a 1, com problemas fora e dentro de campo, com os chilenos abusando da violência e os torcedores extrapolando nas arquibancadas.

As duas seleções voltaram a derrotar a Venezuela no returno do grupo e, por causa do saldo de gols, o Brasil entrou em campo em 03 de setembro, no Maracanã, precisando do empate para garantir a classificação. Mais uma vez os chilenos fizeram toda a pressão, dessa vez com declarações polêmicas, para desestabilizar o Brasil.

A simulação de Roberto Rojas no Maracanã

Jogo difícil, mas com apenas a seleção brasileira procurando o gol, que saiu com Careca, aos três minutos do segundo tempo. Desesperados, os chilenos, que poderiam ter a chance de buscar a vaga na repescagem contra Israel, apelaram feio no Maracanã. Aos 24 minutos do segundo tempo, aproveitando um sinalizador da marinha atirado pela torcedora Rosenery Melo da arquibancada do Maracanã e que caiu no gramado, próximo ao gol defendido por ele, o goleiro Roberto Rojas simulou que havia sido atingido pelo sinalizador e, utilizando-se de uma lâmina que levou na sua luva, fez um corte próximo ao supercílio.

Rojas caído e com sangue no rosto e na camisa, foi a deixa para que todo o time do Chile fizesse um teatro em campo e os dirigentes autorizassem o abandono do jogo. Apostavam que ganhariam o direito de disputar nova partida em campo neutro ou sem torcida.

O árbitro argentino Juan Carlos Lostau relatou na súmula que os chilenos abandonaram o jogo e que o local apresentava todas as condições de segurança. Imagens de TV utilizadas pela CBF, fotos do jornal O Globo mostrando que o sinalizador caíra longe do atleta, e o próprio depoimento do goleiro Rojas, que atuava pelo São Paulo, comprovaram a farsa chilena.

Rojas disse ao site UOL Esporte que se cortou com uma lâmina. “A farsa foi descoberta, foi um corte em minha dignidade”, disse.

Rojas foi banido do futebol pela Fifa, que só o perdoou em 2001, quando retirou o banimento. Também foram banidos pela entidade o técnico , o médico Daniel Rodríguez e o dirigente Sérgio Stoppel.

O zagueiro Astengo, que apareceu ao lado do goleiro no momento do lance, foi suspenso do futebol por quatro anos. A seleção chilena ficou impedida de disputar as eliminatórias para o mundial de 1994.

Quando a Fifa retirou o banimento de Roberto Rojas, o ex-atleta trabalhou como treinador de goleiros do São Paulo, seu último clube como jogador de futebol profissional.

Já a torcedora Rosenery Melo ganhou notoriedade. Foi presa em flagrante durante a confusão no Maracanã e liberada depois do descobrimento da farsa. Ela passou a ser conhecida como a “Fogueteira” e foi capa da revista Playboy. Rosenery faleceu em 2011, aos 45 anos.

Rosenery Mello, a "fogueteira", foi parar nas páginas da revista Playboy

Não foi uma preparação tranquila até chegar a Copa. Apesar de bons resultados em amistosos, como a vitória contra a Itália por 1 a 0 em Bolonha, gol do zagueiro André Cruz, fora de campo a CBF mostrava inexperiência. Comandada por Ricardo Teixeira, eleito presidente em 1989, e com o dirigente vascaíno Eurico Miranda, como diretor de futebol, a entidade demorou em discutir a premiação da Copa com os jogadores. Isso irritou os atletas e a situação se tornou tão desconfortável que os jogadores reagiram com um protesto, cobriram com as mãos a marca do patrocinador (Pepsi) na camisa durante a foto oficial do torneio.

Essa situação acabou contornada, mas era claro que o clima entre os jogadores, comissão técnica e diretoria da CBF já não era o mesmo da arrancada para a conquista da Copa América de 1989 e a classificação nas eliminatórias. O grupo estava dividido em subgrupos e a presença constante de empresários na concentração aumentava a confusão na preparação. Lazzaroni acabou também refém dessa situação.

O Estado de S. Paulo sobre a estreia brasileira

A seleção brasileira iniciou a Copa do Mundo vencendo a Suécia por 2 a 1, no estádio Delle Alpi, em Turim, no domingo 10 de junho, dia em que o piloto Ayrton Senna, da McLaren, venceu o GP do Canadá de Fórmula 1. Outro brasileiro, Nélson Piquet, pilotando sua Benetton, ficou em segundo, seguido de Nigel Mansell da Ferrari.

Na Itália os brasileiros deixaram os torcedores frustrados. O time teve muitas falhas e jogou no contra-ataque, privilegiando a marcação e o esquema com três zagueiros, um deles o líbero inventado por Lazzaroni. Acostumada à ofensividade brasileira das últimas duas Copas, a torcida se recusava a aceitar o Brasil jogando em seu campo e esperando o adversário.

No Parque do Ibirapuera, em São Paulo, cerca de 800 pessoas comemoraram a vitória brasileira tomando sopa. A ideia foi de Wagner Sugamele, do Movimento de Revalorização do bairro do Cambuci. A empresa de alimentos Maggi investiu na época Cr$ 500 mil para colocar um telão de 12 m2 e oferecer um trio elétrico para os torcedores, na ação de marketing “Essa Copa vai ser sopa”. Sábado, dia 16 de junho, foi a vez do Brasil enfrentar e vencer a Costa Rica, por magro 1 a 0, aumentando ainda mais as críticas ao esquema tático da seleção. O time perdeu gols, dominou a partida, mas os brasileiros em Turim não perdoaram e chamaram o treinador de “burro”. Em plena Copa do Mundo, havia sério desgaste entre torcedores e treinador.

Pelo Brasil o jeito foi aproveitar a noite de sábado, assistir mais um capítulo da novela “Rainha da Sucata”, de Sílvio de Abreu, com Regina Duarte e Glória Menezes, pela Rede Globo. Na TV Manchete passou o longa “Crepúsculo de uma Raça”, último western do diretor John Ford, com James Stewart.

Glória Menezes, Tony Ramos e Regina Duarte em "Rainha da Sucata"

Em 20 de junho, quando o governo do presidente Fernando Collor de Mello, o primeiro eleito com voto direto depois do golpe militar de 1964, anunciava que a inflação atingira 9,1% e ameaçava o já combalido “Plano Collor”, a seleção enfrentou a Escócia, vencendo também por 1 a 0, na última partida da primeira fase.

Anúncio da rádio Bandeirantes durante a Copa

O Brasil sentia falta de um ataque mais eficiente. A grande esperança, o jovem Romário, do PSV Eindhoven, havia fraturado o tornozelo a três meses da Copa. O Baixinho entrou no jogo, tentou se movimentar, mas ainda estava longe da sua forma ideal. O jogo contra a Escócia, quando foi substituído no segundo tempo, foi o único de Romário naquele mundial. Para os brasileiros restou acompanhar os telejornais noturnos, antes de mais um capítulo da novela “Kananga do Japão”, de Wilson Aguiar Filho, pela TV Manchete. No final da noite, programa imperdível era o Jô Onze e Meia, um grande sucesso do SBT.

No sábado, 24 de junho, a expectativa era para que o Brasil eliminasse a Argentina de Maradona, então campeã mundial, num confronto que acontecia antes do esperado, já que o time de Maradona se classificou como um dos melhores terceiros colocados da primeira fase. A ideia era repetir 1982 quando a Argentina, também como campeã mundial, foi eliminada pelo Brasil no estádio Sarriá, em Barcelona.

Cinema durante a Copa de 1990

Nos jornais, mais uma pesquisa de intenção de voto para as eleições de governador do Estado de São Paulo. Paulo Maluf liderava com 39%, seguido de Mário Covas, com 36%, Luiz Antonio Fleury Filho com 4% e Plínio de Arruda Sampaio com 3%. Na eleição de novembro, Fleury Filho foi eleito governador.

Fernanda Montenegro em cartaz durante a Copa de 1990

O pragmatismo da seleção brasileira encontrou a genialidade de Maradona em Turim. Apesar do Brasil ter, pelo menos, cinco chances claríssimas de gol e fazer o seu melhor jogo na Itália, o craque decidiu em uma jogada individual aos 38 minutos do segundo tempo e com apenas um toque colocou o atacante Caniggia cara a cara com o goleiro Taffarel. O atacante argentino driblou o goleiro e tirou o Brasil da Copa, frustrando, como acontecia desde 1970, o torcedor brasileiro e adiando o decantado tetracampeonato.

Em todos os jogos, o técnico Sebastião Lazzaroni afirmava para a imprensa que os brasileiros precisavam ter paciência para esperar as vitórias chegarem.

Não se pode dizer que ele não avisou.

Sem acerto na premiação para a conquista da Copa do Mundo, ainda em Teresópolis, os jogadores da seleção brasileira escondem o patrocinador - Pepsi - como forma de protesto, na foto oficial

Anúncio após a eliminação brasileira A Copa sempre gerando eventos

Anúncio de cinema durante a Copa

1994 – Estados Unidos

Cartaz oficial da Copa do Mundo de 1994

Desde a década de 1970 os norte-americanos se esforçavam para competir no mundo do futebol, para eles o “soccer”. Implantaram o esporte nas escolas e contrataram lendas do futebol mundial para jogar seu campeonato, com características amadoras.

Nessa época destaca-se o Cosmos que contratou, entre outros, Pelé, Carlos Alberto Torres e Franz Beckenbauer.

Fazia parte do planejamento norte-americano sediar uma edição da Copa do Mundo. Para a Fifa seria um grande desafio promover o torneio onde o futebol não era o principal esporte, com risco de rejeição do público.

Durante seu 46º Congresso, realizado em 04 de julho de 1988, a Fifa anunciou que tinha aceitado o desafio e os Estados Unidos seriam a sede da Copa de 1994. Como o anúncio seria na data comemorativa da independência norte-americana, o mundo já esperava a vitória dos Estados Unidos, superando a concorrência de Brasil e Marrocos para sediar o torneio.

As cidades utilizadas para receber os jogos foram: Los Angeles, Chicago, Nova York, , Boston, Dallas, Detroit, Orlando e San Francisco.

A Copa foi um sucesso de organização e público, com os estádios sempre lotados e o povo norte-americano correspondendo e entendendo a dimensão do torneio que estavam recebendo.

Três grandes seleções ficaram fora da Copa: Uruguai, Inglaterra e França. A Iugoslávia foi impedida pela Fifa de estar no torneio porque vivia um período de guerra contra a Bósnia. Como mascote os Estados Unidos apresentaram o “Striker”, um cão simpático e sorridente, vestido com as cores da bandeira norte-americana, representando o esforço e superação do povo daquele país. Apesar da simpatia, o mascote não fez sucesso entre os torcedores.

Striker, mascote de 1994

Foi o último mundial com 24 seleções. A Fifa já havia anunciado que a próxima Copa, em 1998, teria a participação de 32 países.

Surpresas e decepções rondaram os estádios norte-americanos, que assistiram as excelentes participações da Romênia, do craque Hagi, da Bulgária, do artilheiro , e da Suécia, do goleiro Ravelli. Bulgária e Suécia chegaram às semifinais, disputadas contra Itália e Brasil, respectivamente, e fizeram a decisão do terceiro lugar da Copa (Suécia 4 x 0 Bulgária).

Stoichkov e Salenko, artilheiros da Copa

Devido ao futebol defensivo de 1990, a Fifa fez algumas mudanças na regra do futebol, tentando promover o jogo e punir o chamado “anti-jogo”. Foi a partir desta Copa que os goleiros não puderam mais pegar com as mãos as bolas recuadas, tinham que jogar com os pés. Apenas as bolas recuadas com a cabeça ou peito poderiam ser agarradas. As vitórias passaram a valer três pontos.

No banco de reservas as seleções poderiam deixar 22 jogadores, mas os treinadores tinham que indicar apenas cinco atletas que poderiam entrar na partida. Começou a valer, também, a possibilidade de substituir o goleiro em caso de expulsão ou contusão, mesmo depois que as duas substituições regulamentares tivessem sido feitas. A primeira seleção a utilizar a nova regra foi a Itália. Em 23 de junho, em Nova York, a Itália enfrentava a Noruega. O goleiro italiano teve que tocar a bola com a mão fora da área para impedir o contra-ataque norueguês. Como era o último homem, foi expulso. O técnico , então, tirou o craque e colocou o goleiro Luca Marchegiani. Pagliuca foi suspenso dois jogos e só voltou ao gol da Azzurra nas quartas de final contra a Espanha.

O torneio teve dois artilheiros com seis gols, o russo e o búlgaro Hristo Stoichkov. Salenko bateu um recorde nas Copas. Fez cinco gols na vitória por 6 a 1 da Rússia sobre Camarões, em 28 de junho, em San Francisco.

Outro fato marcante na Copa dos Estados Unidos foi a triste despedida do gênio argentino Diego Maradona, que se esforçou e venceu um período de recuperação e tratamento contra as drogas para estar presente no torneio. A Argentina também viveu um drama para ir à Copa. Goleada por 5 a 0 pela Colômbia, em pleno estádio Monumental de Nuñes, em Buenos Aires, a equipe teve que enfrentar a Austrália na repescagem. A vitória de 1 a 0, em casa, depois de empate em 1 a 1 na Austrália, confirmou que Maradona poderia tentar o título mundial novamente, naquela que seria sua última Copa.

Após o jogo contra a Nigéria, Maradona foi levado para fazer exame antidoping

Com Caniggia, destaque em 1990, e o artilheiro , Diego Maradona seria o maestro ideal. E parece que os argentinos iriam longe. A estreia foi excelente, em 21 de junho, massacrando a Grécia por 4 a 0, com direito a gol de Maradona e entusiasmo dos torcedores. Logo depois veio a vitória por 2 a 1 sobre a Nigéria.

Gabriel Batistuta, craque da Argentina em 1994

Na tarde de 29 de junho, a Fifa anunciou que um jogador havia sido pego no exame antidoping na Copa. Coube à Associação de Futebol da Argentina (AFA) anunciar que esse jogador era Maradona. De acordo com o resultado do exame, o craque argentino, então com 33 anos, consumira cinco drogas antes do embate contra a Nigéria, que seriam efedrina, norefedrina, pseudoefedrina, norpseudoefedrina e metaefedrina. Essas drogas estão presentes em descongestionantes nasais e podem dar um estímulo adicional aos atletas.

Maradona foi afastado temporariamente do mundial para, logo depois, ser excluído definitivamente. Chegava ao fim a história do atleta Maradona em Copas do Mundo. A Argentina caiu nas oitavas de final para a Romênia, que venceu por 3 a 2, em Los Angeles.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Depois do fracasso de 1990, a CBF entendeu que era preciso mudar radicalmente o comando da seleção. Inspirada na Alemanha, que teve no ex-jogador Franz Beckenbauer como o grande líder do título mundial, a entidade indicou o ex-jogador Paulo Roberto Falcão para preparar o time para o mundial de 1994. Falcão priorizou jovens jogadores, mudava constantemente os convocados, tentando encontrar aqueles que poderiam vestir a amarelinha nos Estados Unidos. Não teve tempo. Os péssimos resultados em amistosos e na Copa América de 1991 apressaram a sua saída.

Carlos Alberto Parreira, técnico em 1994

A CBF entendeu que o técnico Carlos Alberto Parreira, ex-membro da comissão técnica de 1970 (preparação física), que já havia passado pela seleção em 1983 e tinha experiência como ex-treinador do Kuwait e Fluminense, seria o nome com a experiência necessária para levar o time até a Copa. Junto com Parreira, a CBF chamou um ícone do futebol mundial, o tricampeão mundial Mário Jorge Lobo Zagallo, para ser o coordenador-técnico, uma espécie de “escudo” para Parreira, já que a seleção vivia momentos de turbulência e incerteza. Parreira tentou encontrar um time base, diferentemente do que fazia Falcão. Os resultados foram ajudando e a comissão técnica ganhando fôlego para continuar.

A opinião pública era de que a seleção não tinha muita confiança. Não praticava um futebol vistoso, como o torcedor se acostumou ao longo do tempo. Parreira entendia que era preciso ter organização tática para que o talento brasileiro pudesse decidir. O time tinha momentos de excessivo pragmatismo.

As eliminatórias para 1994 foram diferentes do que era praticado na América do Sul. Com o Chile suspenso pela punição de 1989 no caso da farsa do Maracanã, as seleções foram divididas em dois grupos. O grupo A com quatro seleções e o B com cinco, onde estava a seleção brasileira.

Na primeira partida, em Guayaquil, empate em zero a zero com o Equador e a torcida brasileira já fez cara feia. Para piorar, uma atuação desastrosa em La Paz e derrota, a primeira em toda a história das eliminatórias, para a Bolívia por 2 a 0. A primeira vitória veio apenas no terceiro jogo, contra a Venezuela em San Cristóbal, por 5 a 1.

Em solo brasileiro a seleção venceu o Equador, por 2 a 0, no estádio do Morumbi, em São Paulo. Mas a grande virada que levou a seleção ao tetracampeonato mundial aconteceu em 29 de agosto, no estádio do Arruda, em Recife. Criticados e vaiados, os jogadores entraram de mãos dadas simbolizando união e a torcida pernambucana ovacionou o time, que teve uma atuação espetacular, fazendo 6 a 0 na Bolívia, sensação daquelas eliminatórias e que chegaria à Copa do Mundo.

A seleção chegou ao último jogo das eliminatórias, contra o Uruguai no Maracanã, precisando vencer. Tinha 9 pontos, contra 10 do Uruguai e 11 da Bolívia, que não jogava naquela última rodada. A vitória levaria o Brasil diretamente à Copa e a derrota eliminaria, sem direito à repescagem.

Desde o amistoso de dezembro de 1992 contra a Alemanha (vitória brasileira em Porto Alegre sobre os então campeões mundiais), quando ficou na reserva, Romário vivia de rusgas com a comissão técnica. Craque do Barcelona e da Europa, o Baixinho foi chamado para o confronto contra os uruguaios. Chegou com personalidade e fez os dois gols da classificação brasileira, que venceu por 2 a 0. De brinde, a seleção ainda tirou da Copa os eternos rivais uruguaios.

Romário faz o segundo gol contra os uruguaios no Maracanã em 1993 A partir desse momento, Romário tomou conta da seleção e se preparou para chegar aos Estados Unidos em plena forma. Por outro lado, a comissão técnica passou a aceitar as individualidades do jogador e tentou, discretamente, encontrar formas para “domar” o Baixinho. , Ricardo Rocha e eram os atletas que se aproximavam do craque brasileiro para tentar “aparar arestas” ou controlá-lo. De personalidade oposta a de Romário, o companheiro de ataque Bebeto foi perfeito. O entendimento em campo levou o Brasil à vitória.

A seleção chegou aos Estados Unidos pressionada por dois fatores. O primeiro era o jejum de títulos mundiais. O último tinha acontecido há 24 anos, no tri de 1970. O outro era a tristeza dos brasileiros com a morte do ídolo Ayrton Senna, em Ímola, na Itália, dia 1º de maio, cerca de 50 dias antes da estreia do Brasil.

Já no primeiro jogo, contra a Rússia, na segunda-feira, 20 de junho, em San Francisco, Romário deixou claro que estava no auge da forma física e técnica. A vitória foi por 2 a 0. Se não houvesse problemas extracampo, a seleção poderia, enfim, ganhar a Copa, mesmo com Raí, camisa 10, decepcionando e deixando o time lento.

Anúncio da TV Bandeirantes antes da estreia contra a Rússia

Naquele dia 20, a Interpol comunicava ao mundo que, de acordo com as investigações sobre o acidente que vitimou o piloto brasileiro Ayrton Senna, a causa da morte seria falha mecânica. Investigações foram abertas para saber a real causa do acidente que matou um dos maiores pilotos de Fórmula 1 de todos os tempos. Ao longo do tempo soube-se que a barra de direção do carro de Senna rompeu e a suspensão perfurou o capacete atingindo o cérebro do piloto.

O piloto morreu quando liderava o GP de Ímola de Fórmula 1. Iniciando a sétima volta, Senna colidiu com o muro na curva Tamburello e faleceu ainda na pista. Dez dias antes do acidente fatal, em 20 de abril, Senna esteve junto do grupo da seleção brasileira no amistoso contra o Paris Saint Germain, reforçado por jogadores do Bordeaux, no estádio Parque dos Príncipes, em Paris. Senna cumprimenta Raí, capitão da seleção, antes de dar o pontapé inicial do amistoso entre Brasil e PSG. O piloto morreu dez dias depois

Na ocasião, o piloto deu o pontapé inicial da partida que terminou em zero a zero. Para o Jornal Nacional da Rede Globo, Ayrton Senna disse que esperava a conquista do título mundial nos Estados Unidos. “O Brasil está colocando a maior fé na seleção este ano. Tem chance, parece que estão jogando bem”, disse o piloto, que de forma descontraída comentou as chances na temporada de Fórmula 1. Nas duas primeiras etapas do ano Senna tinha abandonado as corridas, mas sabia que tinha o melhor carro daquele momento. “Restam muitos pontos. Se começamos mal é sinal que vamos terminar bem”, finalizou.

Ao ser solicitado a deixar uma mensagem, Senna disse: “acelera que tem muito pela frente!”.

Para os brasileiros era dia de comemoração nas ruas e de assistir o inesquecível programa “Apito Final”, na TV Bandeirantes, comandado por Luciano do Valle, com a participação de Juarez Soares, os ex-jogadores Gérson, Rivelino, Tostão, Zico e Mário Sérgio.

Luciano do Valle comandava o inesquecível "Apito Final", todas as noites, durante a Copa, na TV Bandeirantes

Logo depois do jogo, entrava no ar mais um capítulo da novela “Fera Ferida”, de Aguinaldo Silva, na Rede Globo. Bom para esquecer os problemas econômicos da era pré-Real. Havia sido anunciada a inflação de maio de 1994, que atingia 47,53%. A nova moeda seria implantada em 01 de julho.

Na sexta-feira, 24 de junho, preparando-se para o segundo final de semana de Copa do Mundo, o torcedor brasileiro vibrou com outra vitória, dessa vez mais tranquila. Foram 3 a 0 contra a seleção de Camarões. Romário brilhou novamente e Raí voltou a receber críticas, fato que deixou o técnico Parreira irritado.

Programação de teatro e circo agitando a vida cultural em São Paulo durante a Copa do Mundo

No fim da noite, a opção era o programa “Jô na Copa”, pelo SBT. Já a TVA Filmes anunciava Sharon Stone e Michael Douglas em “Instinto Selvagem”, a partir das 23h30.

Fora de casa, a noite paulistana oferecia teatro com Jardel Filho, em cartaz na peça “Como Encher um Biquíni Selvagem”, com Cláudia Jimenez e Miguel Falabella.

“O Estado de S. Paulo” de 01.07.1994 com o “Guia do Real”. A nova moeda entrou em vigor durante a Copa do Mundo Na terça-feira, 28 de junho, os brasileiros discutiam o salário mínimo, após anúncio do governo do presidente Itamar Franco que estabelecia o valor equivalente a US$ 70,00, a partir de 01 de setembro.

A seleção brasileira fez sua pior partida naquela Copa neste dia, empatando em 1 a 1 com a Suécia, em Detroit. A imprensa brasileira passou a fazer sérias críticas quanto ao pragmático esquema tático da seleção e exigiu mudanças. Raí era o alvo. O jogador, então capitão da equipe, não conseguia dar ritmo à seleção, errava passes e pouco chegava para concluir ao gol adversário.

Internamente, Parreira teve que controlar reclamações de jogadores contra o rígido esquema de concentração. Mais uma vez, os líderes do elenco atuaram e o clima melhorou, com mais flexibilidade da comissão técnica. Era momento de atenção porque os jogos eliminatórios iriam começar. “Acabou a possibilidade de erro”, disse um tenso Carlos Alberto Parreira durante coletiva aos jornalistas brasileiros.

A seleção dos Estados Unidos conseguia empolgar seus torcedores, que pouco esperavam em termos de resultados, mas que sentiam orgulho de estar nas oitavas de final e enfrentar o gigante Brasil. Para aumentar ainda mais a atmosfera, a partida seria disputada no dia em que os norte-americanos comemoram a independência, em 04 de julho.

O estádio em San Francisco ficou com sua lotação máxima e os Estados Unidos resistiram até onde deu. Mesmo com um jogador a menos - Leonardo havia sido expulso por dar uma cotovelada em Tab Ramos -, sem o meia Raí e com Dunga com a faixa de capitão, o Brasil contou com a genialidade de Romário, que deixou Bebeto em condições de fazer o gol da classificação brasileira.

Num jogo tenso e num sol escaldante, o gol foi de alívio. Bebeto retribuiu o passe com um beijo em Romário e a frase “eu te amo”. Mesmo assim, irreverente como sempre, o Baixinho declarou que o time estava ganhando, mas “apresentando um futebol pobre”. Mais uma flechada em Parreira.

Bebeto marca, abraça Romário e diz "eu te amo"

Se existe uma partida que aponta para o título, essa aconteceu em 09 de julho, em Dallas, quando a seleção venceu a Holanda por 3 a 2, num jogo com todos os ingredientes de emoção: gols bonitos, empate assustador, drama, superação e sorte. O primeiro tempo foi marcado por chances desperdiçadas pelos dois times. Em 17 minutos do segundo tempo o Brasil já vencia por 2 a 0, com gols de Romário e Bebeto, que comemorou “embalando” seu filho Matheus, que nascera um dia antes no Rio de Janeiro. Não há jogo fácil contra a Holanda. As duas equipes repetiam, 20 anos depois, a semifinal da Copa de 1974 e a “Laranja Mecânica” empatou o jogo com Bergkamp e Winter (aos 18 e 30 minutos).

Mazinho, Bebeto e Romário "embalam" Matheus, contra a Holanda

A atmosfera variava de drama para desespero. Mesmo assim, o lateral Branco, que substituía Leonardo suspenso e fora da Copa, conseguiu buscar uma falta em meio a defesa holandesa. Ele mesmo cobrou e fez o terceiro e decisivo gol. O Brasil chegava entre os quatro primeiros, estava na semifinal da Copa.

Quando o Brasil entrou em campo, em 13 de julho, para enfrentar a Suécia, em Los Angeles, os brasileiros torciam também pela recuperação do humorista Antonio Carlos Bernardes, o Mussum dos “Trapalhões” que, um dia antes, fizera um transplante de coração no hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo. O drama do artista se estenderia até 29 de julho, quando faleceu aos 52 anos.

A seleção foi mais pragmática do que nunca. Organizada taticamente, consciente da importância daquela semifinal, o Brasil esperou o momento certo para fazer o gol, bem no final do jogo, quando os suecos não conseguiriam reagir. Gol de Romário, de cabeça, vencendo o goleiro Ravelli. Esse 1 a 0 sobre a Suécia levava a seleção à sua primeira final desde 1970.

Antonio Carlos Bernardes, o Mussum, fez um transplante durante a Copa e faleceu logo depois do Mundial

O torcedor brasileiro aguardou com ansiedade a finalíssima contra a lendária Itália. As duas maiores camisas da história das Copas se encontravam novamente numa final. Uma geração que cresceu ouvindo as histórias do tricampeonato de 1970, tinha oportunidade de assistir uma final de Copa contra a mesma Itália de 24 anos antes.

Com lotação completa, o estádio em Los Angeles, assistiu a um duelo de titãs naquele 17 de julho. A tradição de duas seleções carismáticas e campeãs, com craques lendários ao longo de suas histórias, muito bem representados em Roberto Baggio e Romário, que se não tinham a mesma técnica de jogadores do passado, comandavam seus times com competência durante aquele mundial.

O jogo poderia ter sido melhor. É certo que o sol do meio-dia na Califórnia e os esquemas que priorizavam as defesas não contribuíram, mas a magia da camisa das duas seleções compensava, a ponto do goleiro Pagliuca, ao tentar dominar uma bola e vê-la escapar e bater na trave, para o jogo e dá um beijo na baliza direita de sua meta. Ato singelo, mas de enorme carisma, principalmente pela espontaneidade.

Vem a prorrogação e por muito pouco o mundo não conheceria um herói improvável. , centroavante da seleção que não jogara uma partida sequer, sem história com a camisa amarela, quase faz o gol que levaria a seleção ao título, mas que só foi conquistado na cobrança de pênaltis. Taffarel, depois de defender a cobrança de Massaro, viu o líbero Franco Baresi errar e o craque italiano Roberto Baggio chutar longe do seu gol o pênalti decisivo.

Na comemoração, os jogadores da seleção abriram uma faixa no gramado do estádio com os dizeres: “Senna: aceleremos juntos”.

Era o tetracampeonato mundial de uma seleção organizada e que teve o talento de entender que, naquele ano, o mais importante era chegar ao título.

Mesmo que fosse à moda Parreira.

E foi.

O dirigente Américo Faria e os jogadores Branco, Ronaldão, Gilmar e Viola seguram faixa em alusão a Senna Capa da Folha de S. Paulo em 18.07.1994 Capa de O Estado de S. Paulo em 18.07.1994

Sucesso do cinema lançado durante a Copa Anúncio da Revista Placar

Publicidade durante a Copa

Anúncio comemorativo ao tetra

1998 – França

Cartaz oficial da Copa de 1998

Mantendo o rodízio entre os continentes que sempre norteou as escolhas das sedes das Copas do Mundo pela Fifa, cabia a um país europeu sediar aquele mundial. A França teve como rivais o africano Marrocos e a Suíça, que antes da votação desistiu e apoiou a França, que derrotou os africanos com facilidade.

Foi a primeira Copa do Mundo que contou com 32 seleções. A mecânica de classificações e das partidas eliminatórias continuava a mesma, apenas os quatro melhores terceiros colocados não se classificavam mais. A partir de 1998 eram oito grupos de 32 seleções, passando para as oitavas as duas melhores. Diminuía a possibilidade de erros das seleções que buscavam a passagem para a reta final do torneio.

A França utilizou as seguintes cidades-sedes: Paris, Saint-Denis, Marselha, Montpellier, Lyon, Nantes, Saint-Etienne, Bordeaux, Toulouse e Lens.

Foi uma Copa que apresentou alguns craques atuando pela primeira vez no mundial e que tinha a expectativa sobre o comportamento de outros, em especial sobre Ronaldo, eleito em 1996 e 1997 o melhor jogador do mundo pela Fifa. O atacante, que tinha estado no grupo de 1994, mas não atuara, jogou com o peso de ter que provar que realmente era o melhor do mundo. Ronaldo, após a Copa dos Estados Unidos, se transferiu do Cruzeiro para o PSV Eindhoven da Holanda e depois para a Internazionale de Milão, onde se firmou como um craque mundial.

Alguns destaques daquela Copa: pela Holanda o goleiro Van Der Sar e Davids, Bergkamp e Kluivert; na Dinamarca estavam os irmãos Michael e Brian Laudrup; Gabriel Batistuta era o ídolo argentino e Suker o craque da Croácia, que acabou sendo o artilheiro da Copa com seis gols, numa ótima campanha dos croatas, que estrearam em Copas, chegando à semifinal contra a França. Footix, o mascote de 1998

A seleção anfitriã tinha bons jogadores, um craque e uma torcida que levou a equipe à final, superando momentos dificílimos, como a partida das oitavas de final contra o Paraguai do técnico brasileiro Paulo César Carpegiani, em que conseguiu vencer apenas no “golden goal”, o gol de ouro, outra novidade do torneio. Durante a prorrogação, em qualquer momento que acontecesse um gol, o jogo terminava. Nesse contexto, os franceses superaram os paraguaios, que tinham como destaque Arce e Gamarra.

Carpegiani orienta o lateral Arce

Craque do Mundial:

Destaques da seleção francesa campeã do mundo: Fabian Barthez (goleiro), Thuram, Desailly, Lizarazu, Blanc, , Djorkaeff e o craque Zinedine Zidane.

O mascote foi o galo Footix. O nome era uma mistura da palavra futebol com o nome do personagem de quadrinhos “Asterix”. O galo foi escolhido porque é um símbolo da França.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A seleção brasileira não precisou passar pelas eliminatórias por ser a então campeã do mundo. Para muitos críticos, isso diminuiu o poder de competição da equipe. Para combater essa tese, a seleção foi campeã da Copa América de 1997, realizada na Bolívia, competindo em alto nível. Foi a primeira vez na história que a seleção ganhou o torneio continental fora do território brasileiro. Depois de derrotar a Bolívia, em La Paz, na final da Copa América, foi que o técnico Zagallo soltou a frase para seus críticos: “vocês vão ter que me engolir”.

O "Velho Lobo" Zagallo volta a comandar a seleção

Zico, coordenador- técnico em 1998

Zagallo, aliás, era novamente o técnico da seleção brasileira. Era a terceira Copa como técnico (1970, 1974 e 1998), sendo que no tetracampeonato Zagallo era o coordenador-técnico.

Mesmo depois de avisar aos críticos que o engolissem, a torcida brasileira e a imprensa continuaram cobrando melhor futebol da seleção e também a definição de um time titular.

Devido a essa pressão e querendo ter mais controle sobre o que acontecia dentro da seleção, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, nomeou o ex-jogador Zico para ser o coordenador-técnico de 1998. Era uma espécie de “Zagallo do Zagallo”. A nomeação foi anunciada em 04 de março, na sede da CBF e não contou com a participação do “Velho Lobo” Zagallo, mesmo ele estando no prédio. A atitude já demonstrava vida dura para Zico, que pouco foi ouvido pela comissão durante a Copa. Fez figuração.

Além de Zico, Ricardo Teixeira informou a troca do preparador-físico. Saía Luiz Carlos Prima, da campanha do tetra e da Copa América, para entrar o preparador Paulo Paixão, que integrava a comissão técnica do Palmeiras. Teixeira colocava o dedo dentro da comissão técnica e mandava o recado de que estava atento ao que acontecia.

A comissão da seleção brasileira tinha um tripé básico e fechado. O técnico Zagallo, o supervisor Américo Faria e o médico Lídio Toledo. Eles tomavam as decisões e pronto. Teixeira sabia disso e não gostava. Zico nada pôde fazer.

A 35 dias do início da participação do Brasil na França, o Flamengo jogava contra a Friburguense pelo Campeonato Carioca, em Nova Friburgo. Romário, atacante do time carioca, tenta dar um pique no segundo tempo e leva a mão à parte traseira da coxa direita. Iniciava-se um drama na vida do jogador decisivo em 1994.

Romário sente a coxa em jogo do Flamengo

Romário viajou com a delegação para a França afirmando, com anuência do médico Lídio Toledo, que jogaria a Copa. O Baixinho acreditava que, no máximo, para o segundo jogo estaria pronto e, se fosse preciso, atuaria na estreia.

Acontece que Romário sentia dores constantes na coxa e não demonstrava evolução. Era comum vê-lo com a mão no local depois de sessões de fisioterapia, no refeitório e nos demais treinamentos que tentava participar. Era claro que não estava bem. Próximo de ter que entregar a lista final de inscritos para a Fifa, Zagallo pediu para Lídio Toledo uma definição. O médico levou Romário para fazer um exame e detectar o motivo das constantes dores do atacante.

Depois desse exame a comissão técnica decidiu pelo corte de Romário, convocando o volante Emerson do Bayer Leverkusen da Alemanha, já que Dunga e César Sampaio também não estavam cem por cento fisicamente.

Lídio Toledo disse em coletiva que não havia prazo para Romário estar curado, por isso a decisão pelo corte. “Pode ser 10, 15 ou 30 dias. Não dá para esperar”, afirmou. O atacante não digeriu bem a decisão e deu indiretas na sua coletiva, onde se emocionou e chorou. “Tem gente que está triste com meu corte, mas também tem aqueles que vão comemorar”, disse o Baixinho, mirando em Lídio Toledo, Zagallo e Zico, com quem discutira por críticas às suas atuações e comportamento no Flamengo.

Houve uma série de troca de farpas, durante anos, entre Zico e Romário. Depois que encerrou a carreira, o Baixinho pediu desculpas a Zico, entendendo que o então coordenador-técnico não foi responsável pelo corte. “Fui ingrato com Zico”, disse. Não foi e nem poderia ser. Zico não tinha voz naquela comissão técnica. O ex-meia da seleção de 1982 lembrou que quem convocava os jogadores era o treinador. “Quem convoca é quem pode desconvocar”, disse.

Do Rio de Janeiro, Romário conversa com o narrador Galvão Bueno. O Baixinho comentou a Copa que queria jogar

Com Romário comentando o jogo do Brasil nos estúdios Rede Globo no Rio de Janeiro e Zagallo afirmando que aquela seria uma “Copa das retrancas”, a seleção estreou contra a Escócia em Saint-Denis, no Stade de France, especialmente construído para a Copa do Mundo. A vitória por 2 a 1 aliviou o Velho Lobo, que disse que “o Brasil jogou tudo o que podia”.

Caderno sobre a Copa da Folha de S. Paulo na estreia do Brasil Quem não estava dando resultados satisfatórios e irritava a cúpula da Rede Globo era a novela Torre de Babel, de Sílvio de Abreu, que despencava no Ibope. O instituto

Cinema durante a Copa do Mundo

apontava que a novela, que tivera seu início em 25 de maio, estava com 32 pontos de audiência em média. No mesmo período, a novela anterior, Por Amor, de Manoel Carlos, tinha alcançado 50 pontos.

Na terça-feira, 16 de junho, o Brasil voltou a campo para enfrentar o Marrocos, com a torcida cobrando um gol de Ronaldo, o melhor do mundo e que passara em branco contra a Escócia. E teve gol dele na vitória de 3 a 0.

Na Folha de S. Paulo, o escritor Carlos Heitor Cony escreveu uma coluna dizendo que faltou brilho para o time e que os gols esconderam os defeitos do time de Zagallo. Fato lamentável foi uma séria discussão de Dunga, capitão do time, com o atacante Bebeto durante o jogo. Dunga cobrava a participação efetiva de Bebeto na marcação e deu uma cabeçada no atacante, correndo risco de ser expulso e causando constrangimento aos demais atletas.

Dunga discute com Bebeto

Dunga começou a ser questionado pelos jornalistas. O que se discutia nas mesas- redondas das rádios e TVs era se o capitão do tetra era uma liderança benéfica ou não. O comportamento de Dunga, muitas vezes desequilibrado, sempre foi um problema no grupo de 1998. A partir desse episódio, o jogador buscou ter mais controle, pelo menos em público.

A torcida fez festa na Vale do Anhangabaú em São Paulo, onde foi colocado um telão. Os torcedores puderam assistir a entrevista coletiva de Zagallo e aproveitaram para vaiar quando o treinador disse que o futebol do Brasil foi “vistoso”.

Uma semana depois, dia 23 de junho, a seleção sofreu a primeira derrota em Copas desde a eliminação para a Argentina em 1990. Para seleções europeias o Brasil não perdia desde 1982, quando foi derrotado pela Itália. Começou vencendo a Noruega, que chegou à Copa como uma sensação da Europa, mas levou a virada no final. Os 2 a 1 para os noruegueses, com pênalti infantil cometido pelo contestado zagueiro Júnior Baiano, não foi bem digerido por Zagallo. O Velho Lobo disse que a seleção se perdeu, estava desconcentrada e relaxada porque já havia conseguido inclusive a primeira colocação do grupo.

O cantor Leandro faleceu durante a Copa

Indo ainda mais longe, o treinador afirmou que o anúncio da morte do cantor Leandro, da dupla Leandro e Leonardo, que lutava em São Paulo contra um tumor no pulmão, abalara a equipe.

A Copa chegava num momento em que não seriam possível erros. Era a fase dos jogos eliminatórios e o primeiro adversário foi o Chile, em 27 de junho, um sábado. A vitória de 4 a 1 animou o Velho Lobo, que fazia uma contagem regressiva para o pentacampeonato em toda entrevista depois das partidas. “Agora faltam três jogos”, disse. Para a torcida, melhor que a contagem de Zagallo foram os dois gols de Ronaldo. O melhor do mundo parecia estar em forma.

O torcedor que quis comemorar a vitória em casa, no frio daquele sábado, teve boas opções. Na HBO, a partir das 20h30, o filme “O Paciente Inglês”. A Rede Globo apresentou “007 Contra Octopussy”, às 22h45. As polêmicas sobre a Copa do Mundo foram discutidas, a partir das 23h30, no programa “Apito Final”, na TV Bandeirantes. Para dar boas risadas, “A Praça É Nossa”, a partir das 21h45 no SBT.

Roger Moore como 007 contra Octopussy na TV

Preocupado com o desempenho da economia brasileira, o presidente Fernando Henrique Cardoso, candidato à reeleição naquele ano, pedia aos empresários que não demitissem os trabalhadores, tentando evitar o aumento de problemas sociais. O país vivia uma onda de desemprego e incertezas. Por outro lado, para tentar convencer o empresariado, Fernando Henrique exibia uma boa notícia: no período de junho de 1997 a maio de 1998, o país teve 1,87% de inflação, a mais baixa desde 1949 num período de 12 meses.

Anúncio da rádio Globo durante a Copa

Em Nantes, naquele 03 de julho, a seleção brasileira enfrentaria a perigosa Dinamarca, que voltava à Copa depois de encantar em 1986. Um bom teste para o Brasil, que havia tido grandes dificuldades contra a Noruega, outra escola europeia.

Depois de um jogo dramático, o Brasil conquistou a vaga para a semifinal vencendo por 3 a 2. O técnico Zagallo classificou a vitória como “dignificante”. A equipe levou um gol logo no início, anotado por Jorgensen e aos 10 minutos já tinha empatado com Bebeto. Aos 25 do primeiro tempo a seleção virava o jogo com .

A partir desse momento a partida ganha tons dramáticos. Bryan Laudrup empata a 5 minutos do segundo tempo e deixa o torcedor apreensivo, mas Rivaldo aos 15 da etapa final faz o 3 a 2. O Brasil segura o jogo e utiliza o toque de bola para fazer o tempo passar e envolver os dinamarqueses. Classificação garantida. A seleção voltaria a disputar uma semifinal, contra a velha e conhecida Holanda. O fracasso de 1974 rondava a seleção e a cabeça de Zagallo. Foi justamente numa semifinal que os brasileiros caíram para Cruyff e companhia. O Velho Lobo lembrava da Copa anterior, quando o Brasil vencera a Holanda em Dallas. Era um confronto com muita história e rivalidade, porém, de muito respeito dos dois lados.

Cinema durante a Copa

Naquele 07 de julho o estádio Vélodrome, em Marselha, assistiu mais uma partida épica na história das Copas. Os holandeses entraram em campo para vingar 1994. Os brasileiros, defendendo o título, queriam confirmar que eram os melhores do mundo. O primeiro tempo foi truncado, estudo de ambas as partes e gols perdidos. Já no segundo tempo a emoção continuou, mas com gols. Ronaldo abriu o placar para o Brasil aos 2 minutos, numa arrancada com finalização perfeita, mostrando o porquê era o melhor do mundo. Foi um dos gols mais bonitos de Ronaldo em todas as suas participações em mundiais. A Holanda empata aos 42 minutos, com Kluivert. A partida vai para a prorrogação.

Emoção, gols perdidos, erros e acertos de lado a lado. Holandeses e brasileiros cumpriam o script de um jogo épico, decidido nos pênaltis. Antes das cobranças, Zagallo mostrou porque conquistou tantos títulos e usou todo o seu carisma para falar com a equipe. Mexeu com os brios dos jogadores, falou no ouvido de cada um, gritou, torceu e rezou segurando um terço e uma gravura de Santo Antonio. Cocu e De Boer pararam nas mãos de Taffarel e o Brasil chegava, pela segunda vez consecutiva, à final da Copa.

Gol de Ronaldo para o Brasil ESPN Brasil em sua primeira cobertura de Copa do Mundo

Para o escritor Carlos Heitor Cony, cronista da Folha de S. Paulo, o Brasil fez seu melhor jogo desde 1982. “Foi de arrebentar porque a Holanda também estava lá, jogando o fino da bola”, escreveu.

A euforia tomava conta dos brasileiros. Ruas cheias depois do jogo, comemoração que mostrava que a seleção tinha conquistado a torcida e que todos deixariam de lado as discordâncias com a escalação de Zagallo. O penta estava próximo.

Anúncio da transmissão do SBT de Brasil e Marrocos

O Brasil se preparou com tranquilidade para a final, mas um imprevisto deixaria o país atônito, sem entender o que estava acontecendo. Cerca de 40 minutos antes do jogo, a Fifa divulga a escalação do Brasil sem o atacante Ronaldo, algo impensável. , então na Fiorentina da Itália, estava escalado.

Os brasileiros pediam a entrada de Edmundo no time durante o mundial. Queriam o atacante ao lado de Ronaldo, sem Bebeto. Zagallo não dera oportunidade para Edmundo durante toda a Copa. Por que estava escalando justamente na final? E no lugar do melhor do mundo?

É preciso voltar para a hora do almoço na concentração do Brasil, naquele dia 12 de julho, para entender a confusão. O jogo seria às 20h45, horário de Paris.

Ronaldo almoça tranquilamente e vai para o quarto repousar. O atacante dividia as instalações com o lateral Roberto Carlos. Pouco antes do café e da palestra com Zagallo, um corre-corre chama a atenção de boa parte da delegação.

Zico em entrevista ao Sportv relata o que aconteceu com Ronaldo momentos antes de Brasil x França

O coordenador-técnico da seleção, Zico, em entrevista ao programa “Bem Amigos” do Sportv, diz que foi chamado para o quarto de Ronaldo. “Quando cheguei o vi com os olhos arregalados. Roberto Carlos ao seu lado, muito assustado, dizendo que não tinha sido nada, para ele descansar. Fiz o sinal de positivo, ele deitou”, contou Zico.

Joaquim da Matta, outro médico da seleção na França, já estava com Ronaldo e atestava que ele tinha tido uma convulsão. “Os jogadores que presenciaram tudo ficaram abalados. Ninguém sabia o que Ronaldo tinha tido e nem porquê passara mal”, disse Zico.

Edmundo, ao canal Fox Sports, disse que viu Ronaldo passar mal e que a cena foi muito feia. Essa expressão também foi usada pelo zagueiro Júnior Baiano, titular da seleção de Zagallo, também ao canal Fox Sports.

Zico disse que nos corredores, enquanto chamavam o médico, alguns jogadores gritavam que “Ronaldo estava morrendo”. E isso a poucas horas de uma final de Copa do Mundo.

Quando se dirigia ao refeitório para o lanche, por volta das 17h00 (Paris), Zico disse que se encontrou com Ronaldo. “Estava atrás dele e vi que estava se exercitando, querendo se alongar. Brinquei com ele dizendo que ainda não era hora do jogo. Perguntei se ele já estava aquecendo, tentando descontrair”. Nesse momento o coordenador da seleção percebeu que Ronaldo não sabia o que tinha se passado. “Ele me disse que não entendia o que estava acontecendo, pois tinha dormido e acordado com dores musculares. Falou que parecia que tinha levado uma surra”, afirmou Zico. Os médicos da seleção encaminharam Ronaldo para um hospital de Paris para fazer exames para ter um diagnóstico do que tinha acontecido e entender a situação de saúde do jogador. O médico Lídio Toledo diz à Zagallo que Ronaldo não poderia jogar e sai com o jogador para o hospital. A delegação vai para o estádio sem Ronaldo.

Zagallo escalou Edmundo. “Ele fez uma ótima palestra, falou com Edmundo e nós fomos para o estádio de Saint-Denis”, conta Zico. E por isso a escalação que a Fifa divulgou para toda a imprensa contava com o nome de Edmundo.

Fifa divulgou a escalação oficial com Edmundo e Galvão Bueno mostra a surpresa na Rede Globo

Quando os jogadores já estavam se vestindo para iniciar o aquecimento, Zico é chamado para a sala da comissão técnica. “Quando chego, Ronaldo está na frente de Zagallo, com calção, meia, dizendo que estava bem e queria jogar”, afirma o ex- coordenador da seleção.

“Ronaldo implorava. Não me tira dessa pelo amor de Deus. Joguei a Copa inteira, meus exames não deram nada. Estava desesperado com a possibilidade de perder a final”, conta o técnico Zagallo, em entrevista ao Fox Sports. O Velho Lobo disse que esperou um posicionamento do médico Lídio Toledo. “Ronaldo falava e o Dr. Lídio quieto, não argumentava nada”, disse Zico. Zagallo segue na mesma linha. “O médico não falou nada, esperei sua posição, eu só poderia escalar. O jogador falou que estava bem e o responsável clínico não vetou”, afirma.

Ronaldo em campo contra a França Edmundo atesta a versão. “Quem decidiu foi o treinador e não o médico, como deveria ser”, disse. Junior Baiano ratifica, afirmando que “quem poderia tirar o jogador era o médico e não o técnico”.

E Ronaldo entrou em campo, mas seus companheiros não conseguiram se concentrar. O medo de que algo voltasse a acontecer rondava a cabeça dos atletas e da comissão técnica. “Eu tinha um olho na bola e outro no Ronaldo”, disse Júnior Baiano. Num lance de choque com o goleiro Fabian Barthez, o atacante cai e o lateral corre na direção de Ronaldo. “O time estava desesperado com a situação de Ronaldo”, conta Júnior Baiano.

No final a seleção foi goleada por 3 a 0, num show de Zidane, coroando uma geração francesa que merecia um título mundial.

Ronaldo nunca mais teve qualquer tipo de convulsão, nunca seus exames, segundo o próprio atleta, demonstraram qualquer tipo de anomalia.

O penta foi adiado.

Capa da Folha de S. Paulo sobre a Capa do caderno sobre a Copa de O derrota brasileira Estado de S. Paulo em 13.07.1998

Vera Fischer em cartaz em São Paulo Rede Globo comemora índice de audiência durante a Copa durante a Copa

Teatro durante o Mundial de 1998 Anúncio após a perda da Copa

2002 – Japão e Coreia do Sul

Cartaz oficial da Copa 2002

Fazia parte dos planos da Fifa a realização da Copa do Mundo fora da América e Europa. Utilizando como base o seu estatuto, que diz que a Fifa deve trabalhar para o desenvolvimento do futebol em todo o mundo, mas visando questões comerciais, a entidade indicou dois países para serem sede do mundial de 2002. O México foi o concorrente de Japão e Coreia, mas não foi páreo para o poderio econômico da dupla asiática

Japão e Coreia do Sul eram países emergentes no quesito futebol, principalmente o Japão, que nos anos 1990 contratou grandes craques para chamar a atenção para seu campeonato nacional e transmitir ensinamentos para os jovens. Exemplo dessa ação é o ex-jogador Zico, que em 1991, quando já tinha encerrado a carreira, aceitou o desafio de voltar a atuar num time amador, o Sumitomo.

Esse time, quando Zico encerrou a carreira em 1994, já havia se transformado no Kashima Antlers, que em 2016 conquistou o título de vice-campeão mundial, perdendo a decisão para o Real Madrid apenas na prorrogação. Foi um trabalho planejado em todos os sentidos.

Zico atuando pelo Sumitomo, que depois se transformou no Kashima Antlers Se o Japão entrava no mundo do futebol como uma opção para grandes jogadores, os sul-coreanos investiam na base, em clínicas de futebol para os jovens, massificando o esporte junto à população, buscando a formação de bons jogadores. Com esse cenário, as seleções desembarcaram na Ásia para a primeira Copa do Mundo do novo milênio.

Foi a primeira Copa a contar com três equipes pré-classificadas: as anfitriãs Japão e Coreia do Sul e a França, que era a atual campeã. Essa também foi a última vez que o campeão mundial teve vaga garantida. Desde então, os campeões participam das eliminatórias sem nenhum tipo de privilégio e vaga garantida só para a seleção anfitriã.

A Ásia recebeu a Copa do Mundo com muita festa, alegria, shows durante os dias de competição, infraestrutura em transporte e estádios modernos.

Cada país contava com 10 cidades, sendo 20 cidades-sede no total. Na Coreia do Sul as sedes foram: Daegu, Seul, Busan, Incheon, Ulsan, Suwon, Gwangju, Jeonju, Seogwipo e Daejeon. As cidades japonesas foram: Yokohama, Saitama, Shizuoka, Osaka, Miyagi, Oita, Niigata, Sapporo, Ibaraki e Kobe. A abertura foi na Coreia do Sul e a final no Japão.

Os mascotes de 2002

Como mascote foram escolhidos três personagens futuristas. O Kaz (cor roxa), Ato (laranja) e o Nik (azul). Os três excêntricos personagens imaginários teriam chegado de um planeta distante, onde havia um esporte semelhante ao futebol. Eles moravam em Atmozone e jogavam o Atmoball e se divertiram bastante no Japão e Coreia.

Foi uma Copa de surpresas e polêmicas. Os italianos, que passaram pelo saldo de gols na primeira fase, foram eliminados pelos sul-coreanos na prorrogação, no gol de ouro, num jogo que entraria para a história da diplomacia mundial.

Naquele 18 de junho, Itália e Coreia do Sul decidiram, em Daejeon, a última vaga para as quartas de final. O vencedor enfrentaria a Espanha. Logo no início os sul-coreanos têm um pênalti, cobrado por Ahn Jung Hwan defendido pelo goleiro . Logo depois, Totti leva o segundo cartão amarelo ao reclamar de um pênalti, claríssimo, que sofrera. Mesmo com a Itália com 10 jogadores, Vieri faz 1 a 0 ainda no primeiro tempo e o jogo caminha para a classificação da Itália, que perde uma série de gols o tempo todo.

Coreia do Sul empata no final do tempo normal Ahn Jung-Hwan comemora o gol da classificação

Aos 43 minutos do segundo tempo, Seol aproveita falha da zaga italiana e empata a partida, levando a decisão para a prorrogação, onde ainda valia a regra do “Golden goal”, quando a partida terminava, a qualquer tempo, após o primeiro gol.

Mais uma vez, prejudicada pelo árbitro equatoriano Byron Moreno, que anulara um gol legítimo de Tommasi, alegando impedimento e expulsara Vieri, a Itália era eliminada precocemente de uma Copa. O atacante Ahn Jung-Hwan, aquele mesmo que perdera o pênalti no início, fez o “gol de ouro”, irritando de vez os italianos.

O presidente da Federação Italiana de Futebol, Franco Carraro, ao ser perguntado pela atuação do árbitro equatoriano, que beneficiou a seleção anfitriã, afirmou que só falaria sobre o assunto quando estivesse em “território idôneo”.

Mas o fato mais grave, que acabou gerando até interferência diplomática da União Europeia, aconteceu com o atacante sul-coreano Ahn Jung-Hwan, jogador do Perugia, da Itália, e autor do gol que eliminou a Azzurra. O presidente do clube italiano, Luciano Gaucci, disse que não aceitava que o atleta colocasse os pés no seu clube. “Quando Ahn veio jogar com a gente não tinha dinheiro para comprar um sanduíche. Ficou rico sem fazer grandes coisas e agora, no mundial, humilhou o futebol italiano. Não vou renovar seu contrato”, disse.

Um dia depois a direção do clube emitiu uma nota afirmando que nada estava definido e que iria aguardar o retorno do atacante que, segundo seu treinador no Perugia, Serse Cosmi, tinha “enorme potencial”. Quando soube das declarações do dirigente italiano, Ahn afirmou que não voltaria mais para o Perugia. O caso já tinha envolvido diplomatas, dirigentes esportivos da UEFA e sindicalistas da Europa.

Antes do início da temporada de futebol na Europa (2002/2003) os dirigentes e o atleta chegaram a um acordo e a paz foi selada. Mesmo assim, Ahn não jogou mais pelo Perugia e se transferiu para o Shimizu do Japão. A Alemanha, que ninguém esperava boa campanha por estar com uma geração em formação, pensando em conseguir o título da Copa de 2006, quando seria a anfitriã, chegou à final com um futebol feio e defensivo, apoiado no excelente goleiro Oliver Khan, que ganhou o título de melhor jogador daquele mundial.

Lance do gol de Senegal contra a França na abertura da Copa

Mas a maior decepção foram os franceses, então campeões mundiais. Chegaram na Ásia com um grupo rachado, desunido e saíram sem fazer um gol sequer. Na abertura, em Seul, protagonizaram a primeira zebra e foram derrotados pela seleção de Senegal por 1 a 0. No segundo jogo, nova derrota, dessa vez para a Dinamarca, por 2 a 0. No último jogo um melancólico empate em 0 a 0 com o Uruguai.

Os argentinos também não passaram da primeira fase. Venceram a Nigéria por 1 a 0, perderam para a Inglaterra também por 1 a 0 e empataram com a Suécia em 1 a 1. Destaque para a Coreia do Sul, que com a preciosa ajuda da arbitragem contra a Itália e a Espanha (oitavas e quartas de final) chegou às semifinais contra a Alemanha. Terminaram a Copa em quarto lugar. Os japoneses caíram nas oitavas de final, contra o sólido time da Turquia, que conquistou a terceira colocação.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Mais uma vez a preparação para a Copa do Mundo foi cheia de confusão. Depois do vice-campeonato de 1998 com o técnico Zagallo, a CBF decidiu rejuvenescer a comissão técnica. Queria dar ares de modernidade, atender à opinião pública que clamava por mudanças, até radicais, de filosofia no comando técnico.

A escolha foi óbvia. , o melhor técnico brasileiro da década de 1990, foi anunciado em 11 de agosto de 1998. A missão era renovar a seleção com a saída de grande parte dos jogadores tetracampeões e iniciar a formação de mais uma nova geração campeã.

Como todo início de trabalho, Luxemburgo teve vitórias e derrotas, boas e más escolhas, mas ainda assim dava sinais de encontrar a espinha dorsal de um time para 2002. Ele trabalhava com resultados a longo prazo. chuta para fazer seu primeiro gol na seleção, na estreia contra a Venezuela, em 1999

O treinador conquistou a Copa América de 1999, quando promoveu a estreia na seleção do jovem Ronaldinho Gaúcho, revelação do Grêmio de Porto Alegre. Ronaldinho só chegou à seleção porque Luxemburgo cortou Edílson que, na final do , atuando pelo Corinthians, fez embaixadinhas em provocação aos jogadores do Palmeiras, o que resultou numa briga generalizada entre palmeirenses e corinthianos. Luxemburgo puniu Edílson por considerar aquele um ato antidesportivo e convocou Ronaldinho, que foi o destaque e a revelação da Copa América de 1999, disputada no Paraguai.

Em agosto daquele ano, o primeiro revés e as críticas mais acentuadas. A seleção perde a final da Copa das Confederações daquele ano para o México, por 4 a 3, numa partida em que a defesa esteve apática todo o tempo.

O ponto final do trabalho de Luxemburgo foi os Jogos Olímpicos de Sidney. O Brasil foi eliminado por Camarões que, mesmo com dois jogadores expulsos, venceu no golden goal.

Somado a esse péssimo resultado, Luxemburgo sofria um processo de sonegação de impostos pela Receita Federal, ao qual era réu-confesso; além de ser acusado de intermediação ilegal para a venda de jogadores, o que sempre negou; e adulteração da certidão de nascimento, o que também negou.

Emerson Leão, que treinava o Sport do Recife, assume durante as eliminatórias para a Copa. Sofreu muita pressão porque a seleção correu sério risco de não se classificar e ele tentava implantar a sua filosofia de jogo em plena competição.

Após derrota para a Austrália e o quarto lugar na Copa das Confederações de 2001, Emerson Leão já chegou demitido no Brasil. Seu trabalho não conseguiu decolar.

Campeão da Taça Libertadores por Grêmio e Palmeiras, , o Felipão, então treinador do Cruzeiro, assume a seleção em 12 de junho de 2001, tendo como única missão a classificação para a Copa. A CBF não queria nem imaginar a possibilidade, porém real, do Brasil não ir à Ásia. Apostou tudo na disciplina e certa truculência de Felipão. Deu carta branca ao treinador. Leão era técnico do Sport Recife quando foi convidado para dirigir a seleção brasileira

Na coletiva de apresentação, Felipão disse que entendia que estava no cargo para uma missão e sabia da sua dimensão. “Temos que classificar, não é? Então vamos classificar”, disse. Ao ser perguntado sobre o estilo do seu time, o treinador fez jus à sua fama de exigir um time com forte marcação e afirmou: “anjinho só no céu”.

Coletiva de apresentação de Luiz Felipe Scolari em 2001

No primeiro compromisso, a primeira polêmica. Na derrota por 1 a 0 para o Uruguai, em Montevidéu, Scolari iniciou a partida com Romário no ataque e como capitão do time. Tinha a intenção de tornar o Baixinho a sua referência em campo. Não foi possível.

Uma aeromoça entrou no caminho da seleção, dormiu com Romário no hotel da concentração e praticamente terminou com o sonho do atacante de jogar mais uma Copa do Mundo. Membros da delegação brasileira naquela viagem para o Uruguai confirmam e outros negam que isso tenha acontecido. “Falaram que eu fiquei com a aeromoça, mas não fiquei”, disse Romário. O fato é que o Baixinho não voltou a fazer parte das convocações de Felipão.

Com o Brasil classificado na última partida das eliminatórias, vitória por 3 a 0 contra a Venezuela, com dois gols do atacante Luizão, a seleção partia para a preparação final. O sinal de alerta estava aceso, era preciso melhorar muito. O Brasil ficou a três pontos da Colômbia, que não se classificou nem para a repescagem. O Estado de S. Paulo, em 06.04.2002, com matéria sobre a possibilidade da convocação de Romário

A novela Felipão convoca ou não Romário foi “líder de audiência” até a lista final. Programas esportivos faziam enquetes, pesquisas com o torcedor eram divulgadas. A maioria dos brasileiros queria o Baixinho na Ásia. A pessoa que convocava a seleção, não.

No dia do anúncio final dos convocados, Luiz Felipe Scolari tratou de se “esconder” onde ninguém o procuraria, justamente o hotel onde o anúncio seria feito no Rio de Janeiro.

Romário, dias antes, teve um encontro com o presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Ao jornalista Jorge Kajuru, no Esporte Interativo, o atacante disse que Teixeira tinha prometido que ele iria à Copa. “Disse para eu ficar tranquilo que ele garantia”, afirmou.

No mesmo programa, Luiz Felipe Scolari deu a sua versão. Afirmou que se escondeu no hotel e ninguém o achava. “Quando foram me receber no aeroporto, eu já estava no hotel”, disse, lembrando que despistou a imprensa ávida em saber notícias sobre Romário. Scolari lembrou que conversou com Ricardo Teixeira sobre Romário, mas que o dirigente jamais pediu a convocação do atacante. “Ele me disse para fazer o que eu quisesse, que as consequências da vitória ou derrota seriam minhas”, explicou. Segundo o treinador, Teixeira fez uma lista de razões e motivos, prós e contras, a convocação e não-convocação de Romário e deixou que tomasse a decisão. “Decidi sozinho”, disse,

Felipão foi convicto às suas ideias. Manteve Romário fora da seleção e optou por um ambiente mais tranquilo, num grupo homogêneo, que ficou conhecido durante a Copa como “família Scolari”.

A “família” teve uma baixa antes do mundial. O volante Emerson se contundiu e o meia Ricardinho, do Corinthians, foi convocado para a Copa. O grupo estava fechado. Felipão jogaria com as suas ideias, seus jogadores e sua sorte. Uma questão atormentava o treinador. Sem Romário, Ronaldo teria condições físicas de ser decisivo para o Brasil? Teria condições de jogar a Copa? E as contusões? E a convulsão de 1998, poderia voltar a acontecer? Felipão bancou o artilheiro e confiou na sua recuperação.

Contusão de Ronaldo contra a Lazio em 2000

Depois de 1998, Ronaldo passou por um calvário de contusões graves e demoradas recuperações. A primeira delas foi em novembro de 1999, num jogo entre seu time, a Internazionale de Milão, e o Lecce pelo Campeonato Italiano. Ronaldo deixou o campo mancando e foi parar na mesa de cirurgia. Operada a rótula do joelho direito, Ronaldo fica cinco meses longe dos gramados e sem poder ajudar a seleção, então sob o comando de Luxemburgo.

No retorno ao futebol, entra no segundo tempo da partida contra a Lazio, no estádio Olímpico de Roma, pela Copa da Itália, em 12 de abril de 2000. Seis minutos depois, Ronaldo parte para o gol em velocidade com a bola dominada, ao gingar o corpo para passar por seu adversário, o joelho direito, o mesmo operado, tem uma seríssima lesão, que o leva à nova cirurgia e a mais de um ano fora dos gramados.

Capa de O Estado de S. Paulo sobre a vitória na estreia da seleção Ronaldo correu o risco de não voltar a jogar. Seu joelho ficou atrofiado mais do que o normal nessas cirurgias. Teve que vencer mais este obstáculo para poder voltar a jogar e buscar um lugar entre os convocados. Scolari confiou nele e o Fenômeno correspondeu.

Para o torcedor brasileiro foi uma Copa diferente, principalmente devido ao fuso- horário de 12 horas. Os jogos aconteciam as 3h00, 5h30 e 8h00. Era preciso não dormir, acordar cedo ou de madrugada para acompanhar o Brasil na luta pelo penta.

Enquanto o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) anunciava uma trégua nas invasões de terra pelo país, já que não queria prejudicar a imagem do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, ligado ao grupo, na eleição presidencial em que liderava as pesquisas, a seleção brasileira iniciava a campanha vencendo a Turquia por 2 a 1, em 03 de junho, em Ulsan, Coreia do Sul, com uma importante ajuda do árbitro sul-coreano, Kim Young-Joo, que transformou uma falta fora da área num pênalti para o Brasil.

É sempre importante começar vencendo. O jogo foi o recordista em audiência na história das Copas até então. Segundo o Ibope, as 8h00 cerca de 70% dos televisores brasileiros estavam ligados e 90% deles no jogo do Brasil, um número altíssimo para aquele horário.

Anúncio durante a Copa

No sábado, 08 de junho, às 8h30, o Brasil venceu a China por 4 a 0 e atingia a melhor campanha entre todas as seleções até aquele momento na Copa. Na corrida presidencial, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva tinha 40% das intenções de voto, segundo pesquisa do Instituto Datafolha. Em segundo lugar estava José Serra, com 21%. Em outubro daquele ano, Lula foi eleito presidente da República. Anúncio alusivo ao jogo do Brasil contra a China

Dia 13 de junho os brasileiros tiveram que despertar as 3h30, quando o Brasil encarou a Costa Rica, na última partida da primeira fase, realizada em Suwon. Foi uma goleada animadora, 5 a 2, de uma seleção que chegava a jogar um futebol bonito e surpreendentemente ofensivo. O jogo lotou bares e casas noturnas no Brasil.

Defesa emblemática de Marcos contra a Bélgica: o Brasil tinha goleiro

A seleção ganhou o rótulo de favorita no primeiro jogo das oitavas de final, em Kobe, Japão, quando passou pela Bélgica, vencendo por 2 a 0, em 17 de junho. Nessa partida o torcedor teve mais tranquilidade, principalmente pela atuação do goleiro Marcos, jogador do Palmeiras, com quatro defesas, sendo duas quase impossíveis. Havia segurança no gol e Marcos confirmava o apelido de “São Marcos” dado pela torcida palmeirense depois dos dois pênaltis defendidos em partidas eliminatórias da Taça Libertadores, contra o Corinthians, em 1999 e 2000 (quartas de final e semifinal). Nos dois confrontos o goleiro defendeu as cobranças decisivas.

Sexta-feira, 21 de junho, dia que o Brasil comemorava os 32 anos do tricampeonato do México, a seleção decidia a passagem para as semifinais contra a Inglaterra. O jogo das 3h30 não deu sono. Michael Owen, numa falha do zagueiro Lúcio, colocou os ingleses na frente, aos 22 minutos. Jogo equilibrado. Beckham perde a bola no ataque, aos 46 minutos do primeiro tempo, Ronaldinho Gaúcho arranca e coloca Rivaldo na cara do goleiro Seamann. Era o empate e certo alívio, porque a seleção não começaria o segundo tempo em desvantagem.

Logo no início do segundo tempo, Ronaldinho bate uma falta com a intenção de procurar Ronaldo e Rivaldo na área, mas a bola toma outro rumo e entra no ângulo do gol inglês. O Brasil vencia por 2 a 1, mas perdia Ronaldinho, expulso por jogada violenta.

Ronaldinho cobra a falta para virar o jogo para o Brasil

Chegava mais uma semifinal, a terceira consecutiva. Naquele 26 de junho, as 8h30, o adversário era a Turquia, o mesmo da estreia. Ronaldo era o centro das atenções. O mundo falava da sua superação em jogar a Copa, mas também era cruel, lembrando a convulsão horas antes da final de 1998. Seria a convulsão algo relacionado à pressão por resultados?

Ronaldo com novo corte de cabelo na semifinal. O mundo passou a comentar o corte de cabelo do atacante

Tentando tirar o foco da imprensa, Ronaldo adotou um novo estilo de corte de cabelo, aquele que ficou conhecido como “Cascão”, raspando a cabeça, mas deixando a parte da frente. Pronto, a imprensa começou a repercutir o corte de cabelo e deixou o atacante tranquilo para se concentrar na semifinal. E Ronaldo decidiu. Com o bico da chuteira direita colocou o Brasil na final, depois de um jogo difícil e de forte marcação.

Antes do jogo, dirigentes turcos afirmavam que a Turquia iria deixar o mundo pasmo. Quem se encarregou disso foi Ronaldo, com sua história de superação e oportunismo para fazer gols da forma mais simples e objetiva; e Denílson, que entrou para segurar a bola no ataque. Segurou com tanta habilidade que acabou perseguido por quatro turcos enfurecidos por não conseguirem roubar-lhe a bola. Deu Brasil, 1 a 0. Denílson perseguido por quatro jogadores turcos

No domingo, 30 de junho, às 8h30, duas tradicionais escolas de futebol decidiram a primeira Copa do Mundo na Ásia e do século 21. Brasil e Alemanha fizeram o que suas campanhas no torneio apontavam. Os alemães aguardando a oportunidade para atacar e confiando no goleiro Kahn e o Brasil, com o trio Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho, abastecidos por Cafu e Roberto Carlos, atacando. Atacando e perdendo gols que chegavam a animar os alemães.

Os brasileiros tiveram que esperar o segundo tempo para assistir a redenção total de Ronaldo. Todo o esforço para jogar a Copa, se livrar de contusões e sofrer com elas, foi coroado com dois golaços, que venceram o melhor jogador da Copa, com a contribuição indispensável de Rivaldo, autor das assistências. Com oito gols, Ronaldo foi o artilheiro do mundial, depois de correr o risco de não jogar mais futebol.

A família Scolari atingia o topo do mundo. Foram 2 a 0 consagradores de uma seleção que teve falhas na defesa, saiu contestada do Brasil, mas que soube aproveitar o talento e privilegiar o gol, antes da defesa.

Os dois gols de Ronaldo que deram o pentacampeonato ao Brasil

Nascia o primeiro país cinco estrelas do futebol mundial, o único até então a conquistar a Copa do Mundo fora de seu continente e a produzir histórias maravilhosas como a de Ronaldo ou de Cafu, que escreveu em sua camisa, para levantar a taça Fifa, a inscrição “100% Jardim Irene”, bairro pobre de São Paulo onde nasceu. No momento de levantar a taça, uma declaração de amor, para a sua esposa, “Regina, eu te amo”. Cafu falava de amor e o Brasil perdia, naquela noite, um símbolo de amor ao próximo. Morria, em Uberaba, aos 92 anos, o médium espírita Francisco Cândido Xavier, ou simplesmente Chico Xavier.

O Brasil era campeão, com amor.

Capa de O Estado de S. Paulo sobre o penta

Anúncio durante a Copa

Folha brinca com a ausência de Romário

Cinema durante a Copa do Mundo

Publicidade da rádio Bandeirantes 2006 – Alemanha

Cartaz oficial da Copa de 2006

Para realizar sua segunda Copa do Mundo, a Alemanha contou com a concorrência do Brasil, Inglaterra, Marrocos e África do Sul, então considerada a favorita para ganhar o torneio, já que a Fifa havia anunciado a intenção de levar a Copa para todas as confederações filiadas.

O Brasil, antes da votação para eleger o país-sede, estrategicamente retirou a sua candidatura para apoiar a África do Sul, em troca do apoio dos africanos para que recebesse a Copa de 2014. Tudo levava a crer a eleição do país de Nélson Mandela.

Numa das disputas mais acirradas da história das Copas, a Alemanha conseguiu bater a África do Sul graças à virada de voto da Nova Zelândia, que tinha declarado apoio aos sul-africanos. Essa eleição ficou marcada por denúncias de compras de voto.

A Copa de 2006 foi a primeira em que todos os países, exceto os anfitriões, tiveram que disputar as eliminatórias. O Brasil era o primeiro campeão mundial que não tinha sua vaga assegurada para a próxima Copa, decisão que ainda permanece.

Foram 12 cidades utilizadas para receber os jogos: Berlim, Dortmund, Munique, Stuttgart, Gelsenkirchen, Hamburgo, Frankfurt, Colônia, Hannover, Leipzig, Nuremberg e Kaiserlautern.

Diferentemente do que aconteceu na primeira Copa que promovera, a Alemanha estava unificada, já que o muro de Berlim havia sido derrubado em 1989.

O muro começou a ser construído pela Alemanha Oriental em 13 de agosto de 1961, para separar Berlim Oriental de Berlim Ocidental. E dividiu o país. Com o final da Segunda Guerra Mundial, Berlim se dividiu entre o domínio soviético do lado oriental e o domínio americano, inglês e francês do lado ocidental e o muro é um dos símbolos dessa divisão. Tinha pouco mais de 3 metros de altura e foi construído com blocos de concreto.

Computação gráfica do jornal O Estado de S. Paulo mostra a estrutura interna do muro de Berlim

Buscando o direito à liberdade, 136 pessoas morreram ao tentar pular o muro, 200 ficaram feridas e 300 foram presas. O muro tinha torres de vigilância, sistema de alarme e armadilhas para pedestres e veículos. Mais de 5 mil pessoas conseguiram vencer o muro e a segurança dos alemães orientais.

O final da chamada “Guerra Fria”, desencadeada após a Segunda Guerra, fez com que a Alemanha Oriental abrisse toda a fronteira com a Alemanha Ocidental. Em 09 de novembro de 1989 teve início a retirada do muro. Em 10 de novembro daquele ano, 2 milhões de alemães orientais cruzaram a fronteira.

Das cidades utilizadas na Copa, pertenciam à Alemanha Oriental apenas Berlim Oriental e Leipzig.

As seleções estreantes naquela Copa foram: Angola, Costa do Marfim, Gana, Togo, Trinidad e Tobago, República Tcheca e Ucrânia.

O mascote Goleo

O mascote escolhido pela Alemanha foi o Goleo, que era um leão representado em bicho de pelúcia e a bola falante Pillie. Goleo tinha 2,30 metros de altura e seus movimentos foram controlados por um manipulador de títeres localizado em seu interior. Ele via o mundo exterior através de uma TV LCD. Pillie era movimentada por controle remoto. Em campo deu Itália, que conquistou seu tetracampeonato. A Azzurra teve um desempenho contestado pela imprensa italiana como em todas as suas conquistas, mas cresceu durante a competição com a segurança do excelente goleiro Buffon, a defesa com Materazzi, Zambrotta e Cannavaro, com destaque especial para Pirlo, maestro do time, Totti e , todos comandados por Marcelo Lippi.

Os donos da casa se prepararam para serem campeões em casa. Desde 2002 os alemães tinham como objetivo o mundial de 2006. Uma ótima geração foi formada e encantou os alemães durante a primeira fase até chegar ao confronto semifinal com os italianos. Destaque para Mertesacker, Lahm, Schnneider, Klose, Podolski, Schweinsteiger, comandados pelo campeão de 1990, Jurgen Klinsmann.

Gianluigi Buffon, goleiro da Itália

Contra a Itália, pronta para vingar a semifinal de 1970 e a final de 1982, a Alemanha tinha espírito de decisão, mas os italianos souberam defender muito bem e contra-atacar de forma efetiva, fazendo 2 a 0 na prorrogação. Aos alemães, assim como para os italianos em 1990, coube o honroso terceiro lugar e a certeza de que estava nascendo uma geração campeã e que a continuidade do trabalho poderia gerar títulos.

Fábio Canavaro, capitão italiano O alemão Podolski

Crescendo durante a competição, a França classificou-se na primeira fase de forma dramática, vencendo Togo por 2 a 0. A partir das oitavas de final o time cresceu, eliminou o Brasil nas quartas de final e Portugal na semifinal.

Na partida final, disputada em Berlim em 09 de julho, Itália e França empataram no tempo normal em 1 a 1. Na prorrogação a partida continuou empatada. Zidane, que havia feito o gol da França, num lance isolado, deu uma cabeçada no peito de Materazzi, que havia empatado para os italianos.

Esse lance deixou os espectadores perplexos. Um dos craques da história das Copas saia de cena expulso, depois de agredir um adversário. Os italianos venceram na cobrança de pênaltis. O francês Trezeguet errou a última cobrança.

Dez anos depois, em entrevista ao jornal francês L´Equipe, o zagueiro Marco Materazzi disse que provocou Zidane para tentar desestabilizar o craque da seleção adversária. “Disse algumas palavras estúpidas, mas que não eram suficientes para tal reação”, afirmou o italiano.

Materazzi, porém, não aceita a informação de alguns jornais da Europa que afirmaram, na época, que ele tinha insultado a mãe de Zidane. “Falei da irmã dele, mas não da mãe. Em campo já ouvi coisas muito piores. Jamais imaginei que teria aquela reação e nem era para tanto. Não seria baixo o suficiente para insultar a mãe dele”, completou Materazzi.

Zidane agride Materazzi com uma cabeçada na final da Copa

Ao UOL Esporte, em setembro de 2017, o craque Zinedine Zidane, então técnico bicampeão europeu pelo Real Madrid, disse que reprova aquela atitude, mas é um fardo que terá que carregar ao longo da vida. “Não sinto orgulho daquele gesto. Por todos os jovens, por todos os técnicos, por todos os voluntários que fazem do futebol algo diferente, mas é parte da minha carreira, da minha vida”, ressaltou.

SELEÇÃO BRASILEIRA

A seleção brasileira experimentou algo diferente na preparação para a Copa de 2006. Pela primeira vez, como campeã mundial, teria que disputar as eliminatórias para conquistar a vaga na Alemanha.

Zagallo e Parreira retornaram à seleção para 2006

A CBF não foi nada criativa. Depois do pentacampeonato e com a saída de Luiz Felipe Scolari, que não quis continuar à frente da seleção, a solução encontrada pelos dirigentes brasileiros foi antiga e de pouca criatividade, o retorno de Carlos Alberto Parreira, membro da comissão técnica de 1970, tetracampeão como treinador em 1994. Com ele, todo o lamento do povo brasileiro, que gostaria de um treinador “moderno”. Irritando ainda mais aqueles que reivindicavam mudanças e novos pensamentos na seleção, Parreira trouxe de volta Mario Jorge Lobo Zagallo, revivendo a parceria vitoriosa da Copa dos Estados Unidos.

Folha de S. Paulo e o favorito Brasil De forma pragmática, mais uma vez Parreira foi obtendo altos e baixos, mas com uma ótima geração de jogadores, com Kaká, Adriano, Ronaldinho Gaúcho e o próprio Ronaldo, ainda lutando contra muitas contusões e o excesso de peso. A seleção passou pelas eliminatórias sem sustos. Em 19 jogos foram 9 vitórias, 7 empates, duas derrotas e o primeiro lugar entre os sul-americanos.

Bastante badalada, com o “quarteto mágico” (Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Adriano e Kaká) chamando a atenção de todo o mundo já globalizado, a seleção desembarcou na Alemanha, depois de um período de concentração em Weggis, na Suíça, marcado pela badalação, oba-oba, compromissos comerciais e pouco treino. A falta de comprometimento dos badalados jogadores com a seleção era crítica comum dos jornalistas que cobriam o Brasil.

Anúncio rádio Bandeirantes em 2006

Ronaldo, visivelmente fora de forma, iniciou a Copa tentando mostrar que poderia ganhar ritmo durante a competição e que ainda poderia ser a solução para o Brasil.

Na estreia, em 13 de junho, a realidade começa a aparecer. Um time apático, Ronaldo sem movimentação, Ronaldinho Gaúcho, então o melhor jogador do mundo, desconcentrado, mais em busca de badalação do que do título e a vitória suada ante a Croácia, por 1 a 0, gol de Kaká, o único do quarteto que demonstrava foco e determinação pelo título.

A imprensa brasileira entendeu aquela como a pior atuação de Ronaldo, em toda a sua carreira, com a camisa da seleção. O futebol, mais uma vez, colocava em xeque o Fenômeno.

A vitória sem empolgar frustrou o povo brasileiro, ansioso para o primeiro jogo da seleção. Naquela terça-feira, a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), em São Paulo, registrou pouco antes do início do jogo, 174 km de congestionamento, quando a média do horário era 51 km. Às 18 horas, quando a partida terminou, São Paulo registrava nenhum km de congestionamento. Quem não conseguiu ir para casa, teve a oportunidade de assistir ao jogo num telão colocado no Vale do Anhangabaú. O real adversário do Brasil, naquele domingo, 18 de junho, era seus próprios problemas. A tabela marcava a partida contra a Austrália, que em condições normais seria presa fácil, mas as críticas, falta de seriedade entre os atletas e a omissão da comissão técnica poderiam fazer a diferença contra a seleção.

Cinema durante a Copa de 2006

Em linhas gerais, o país também enfrentava seus próprios problemas. Em mais uma eleição presidencial, a Folha de S. Paulo dizia que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva revivia uma prática de governos anteriores, distribuindo rádios e TVs a políticos simpáticos a Lula. Pelo menos sete concessões de TV e 27 de rádios educativas foram destinadas a fundações ligadas a políticos que apoiavam o governo. Outras 10 rádios e uma TV foram concedidas a organizações religiosas.

No sábado que antecedeu ao jogo com a Austrália, 17 de junho, morria na Alemanha o humorista Cláudio Besserman Vianna, o conhecido Bussunda do “Casseta e Planeta”, programa humorístico que era veiculado pela Rede Globo. Bussunda tinha 44 anos e sofreu um ataque cardíaco no hotel em que estava hospedado, cobrindo a Copa com seus companheiros do Casseta.

Bussunda parodiando Ronaldo Na vitória por 2 a 0 sobre a Austrália, o ataque passou a ser o grande problema brasileiro. Era o pior início em número de gols desde o fiasco de 1990. Jamais Ronaldo havia ficado dois jogos seguidos sem marcar em Copas e Ronaldinho Gaúcho saiu de campo sem dar um chute sequer ao gol australiano, deixando os jornalistas especializados, acostumados com seu desempenho no Barcelona, sem entender o que acontecia e os motivos para atuações tão fracas.

Fred marca contra a Austrália

A solução poderia ser Fred, atacante do Lyon, da França. E foi. Ele estreou em Copas, conseguiu participar de bons lances e fez o segundo gol do Brasil. O primeiro foi anotado por Adriano, também considerado fora de forma. Foi o primeiro gol em Copas do atacante revelado pelo Flamengo e que atuava na Internazionale de Milão.

No final da partida, os brasileiros ainda tiveram que engolir opiniões nada agradáveis do técnico australiano, : “O Brasil não jogou bem e vem decepcionando na Copa”.

Na quinta-feira, 22 de junho, o Brasil tinha uma sensação estranha. No banco do Japão, na partida que encerraria a primeira fase, estava o ex-jogador Zico, que atuou com a camisa de seleção brasileira em três Copas (1978, 1982, 1986), considerado o grande jogador depois da era Pelé. Responsável direto pelo crescimento do futebol no Japão, Zico enfrentava uma geração de jogadores brasileiros que o tinham como ídolo e referência. No Rio de Janeiro, a torcida do Flamengo afirmava que naquele confronto torceria para o grande ídolo da história do clube.

Parreira convivia com as críticas cada vez mais ferozes. A seleção não tinha padrão de jogo. Venceu os japoneses por 4 a 1, de virada, aproveitando a experiência dos jogadores e a fragilidade dos adversários.

Antes da partida, a coordenação da seleção informou que no período de Copa o atacante Ronaldo já havia perdido 4,2 kg e pesava naquele momento 90,5 kg. Era o jogador mais gordo da Copa e a sua silhueta indicava que deveria haver mais alguns bons gramas no peso real do atleta.

O ex-jogador e comentarista Tostão, afirmou que tinha perdido a esperança de ver Ronaldinho Gaúcho jogar como atuava no Barcelona. Juninho Pernambucano e , que atuaram na partida, estiveram bem e deixaram o time mais rápido. Pelo menos Ronaldo desencantou contra os japoneses. Com dois gols marcados, totalizando 14 em mundiais, tornou-se então o artilheiro de todas as Copas do Mundo, superando Pelé que tinha 12 gols. Ele dividia o posto com Gerd Muller, da Alemanha de 1970 e 1974.

Para os brasileiros, com esperanças renovadas em Ronaldo, o programa foi assistir mais um capítulo da nova versão de Sinhá Moça, novela de Benedito Ruy Barbosa, em cartaz na TV Globo, às 18 horas.

Osmar Prado e Patrícia Pillar em Sinhá Moça

O primeiro jogo da fase eliminatória foi contra Gana, na terça-feira 27 de junho. Parreira demonstrava que tinha desistido de fazer aquele time jogar e aproveitar todo o seu potencial. “O importante é o resultado”, sentenciou.

O 15º gol de Ronaldo em Copas, contra Gana, driblando o goleiro

Um golaço de Ronaldo, que o isolou como o “artilheiro das Copas” com 15 gols, num passe mágico de Kaká, foi o destaque na vitória sobre os africanos por 3 a 0, mesmo sem jogar bem e com o goleiro Dida fazendo boas defesas que impediram que a partida tomasse rumos mais dramáticos.

O jogo contra Gana trouxe mais recordes para os brasileiros. Cafu atingiu 16 vitórias em mundiais tornando-se o jogador mais vitorioso da história das Copas. O gol de Adriano, o segundo do Brasil, fez com que a seleção fosse a primeira a atingir a marca de 200 gols em Copas. Anúncio comemora recorde de Ronaldo

No Vale do Anhangabaú, em São Paulo, 15 mil pessoas se reuniram para assistir a partida num telão. A capital paulista ficou com as “ruas vazias”, segundo relatos dos repórteres de rádios escalados para cobrir o trânsito na cidade naquela terça-feira. Por isso, pouca gente viu o protesto de seis pessoas que tiraram a roupa na avenida Paulista, “para chamar a atenção para outros assuntos importantes além da Copa, como as crianças de rua e a corrupção”.

Brasileiros e franceses precisavam ganhar confiança na Copa e a partida pelas quartas de final era ideal.

Naquele sábado, 01 de julho, os brasileiros estiveram presentes de corpo, mas não de alma, em Frankfurt. Zinedine Zidane, craque francês apagado até então na Copa, foi um verdadeiro maestro, ditando o ritmo da partida e expondo as fragilidades da seleção que tinha chegado à Alemanha como favorita.

Foi 1 a 0 para a França, gol de Henry, num cruzamento na área brasileira, enquanto seu marcador, Roberto Carlos, desatento e descomprometido, ficava ajeitando sua meia. Retrato de uma seleção sem foco e concentração, sem qualquer comprometimento. A revanche de 1998, que o narrador Galvão Bueno pediu na sua chamada de transmissão da partida pela Rede Globo, ficou apenas no desejo. Como em 1986 e 1998, a França comemorava no final da partida. O time de 2006 foi um grande desperdício de talento da história brasileira das Copas. O torneio que seria da consagração de Ronaldinho Gaúcho, foi seu ocaso. Jamais o jogador foi importante para a seleção brasileira como foi para o Barcelona, nunca

Anúncio de cinema durante a Copa repetiu futebol sequer parecido, em momento algum demonstrou real desejo de ser protagonista. A confirmação de Adriano como um dos maiores atacantes do mundo jamais aconteceu.

Para os brasileiros de São Paulo, a opção foi ir ao teatro e se divertir com a sugestiva peça “Acorda Brasil”, de Antonio Ermírio de Moraes, com Arlete Salles, Mila Moreira e direção de José Posi Neto.

Na Alemanha, a diversão já acabara.

Roberto Carlos arruma a meia enquanto acontece o lance do gol que elimina o Brasil

Teatro durante a Copa

Jornal argentino Olé brinca com a eliminação brasileira

Cinema durante o Mundial

Anúncio durante a Copa Peça de teatro em cartaz durante a Copa 2010 – África do Sul

Cartaz oficial da Copa de 2010

A Copa do Mundo chegava ao continente africano 80 anos depois da sua primeira edição. A Fifa colocava em prática aquilo que discursava, afirmando que desejava realizar o mundial em todos os continentes. Não faltaria mais a África.

Durante o 54º Congresso da Fifa, realizado em Paris em 2004, a África do Sul foi o país escolhido para receber a Copa em 2010, numa disputa que envolveu Marrocos, Egito e Líbia. Os sul-africanos foram beneficiados pela riqueza e a diversidade cultural do país, os atrativos turísticos e a figura histórica, de alcance mundial, do líder do movimento contra o Apartheid e ex-presidente, Rolihlahla Madiba Mandela, ou simplesmente Nelson Mandela nome de origem inglesa, dado quando foi frequentar a escola.

Nelson Mandela

Mandela nasceu no vilarejo de Mvezo, região de Transkei, África do Sul, em 18 de julho de 1918. Foi líder do movimento contra o Apartheid, legislação que segregava os negros sul-africanos. Foi preso em 1962, depois de ter suas ações em prol da liberdade e direitos humanos, por viajar ao exterior sem autorização e incentivar greves, investigadas pela agência norte-americana CIA.

Em 1964 foi condenado à prisão perpétua, também por conspirar para ajudar outros países a invadirem a África do Sul. Mandela sempre negou essa acusação. Durante os 27 anos em que ficou preso, o líder sul-africano inspirou campanhas contra o Apartheid em diversos países do mundo, sempre com o lema “Libertem Nelson Mandela”.

Mandela rejeitou uma revisão de pena em 1970 e, 15 anos depois, rejeitou a liberdade condicional em troca de não incentivar a luta armada. Era impossível impedir a sua luta, mesmo na prisão.

A forte pressão internacional e a contínua luta da população sul-africana pela liberdade de Mandela acabaram dando resultado. Em 11 de fevereiro de 1990, com 72 anos, por ordem do então presidente sul-africano, Frederik Willem de Klerk, foi libertado.

Em abril de 1994, Nelson Mandela foi eleito, democraticamente, presidente da África do Sul, cargo que ocupou até 1999, tendo De Klerk como seu vice-presidente. Mandela e De Klerk dividiram o Prêmio Nobel da Paz em 1993.

No seu aniversário de 80 anos, Mandela, que havia se separado da esposa Winnie, após divergências políticas do casal se tornarem públicas, casou-se com Graça Machel, então viúva do presidente de Moçambique, Samora Machel.

Mesmo depois do final de seu mandato, o líder sul-africano continuou lutando e apoiando lutas de movimentos sociais do país e de todo o mundo. Uma das ações de maior repercussão mundial aconteceu em 2003, quando fez um duro pronunciamento contra a política externa do presidente norte-americano George Walker Bush. Apoiou a campanha de arrecadação de fundos contra a AIDS chamada de “46664”, que era o seu número de identificação quando estava na prisão.

Mandela na luta contra a Aids

Em 2004 fez o anúncio da sua retirada da vida pública, exceto no seu compromisso na luta contra a AIDS. Dois anos depois recebeu o prêmio da Anistia Internacional pela luta em favor dos direitos humanos.

Mandela faleceu em 05 de dezembro de 2013, em Joanesburgo. A África do Sul utilizou nove cidades para sediar o mundial: Joanesburgo, Cidade do Cabo, Durban, Polokwane, Port Elizabeth, Rustenburg, Pretoria, Nelspruit e Bloemfontein.

Todas as seleções que até então eram campeãs mundiais estiveram presentes. A equipe que passou maior sufoco nas eliminatórias foi a Argentina, que conseguiu sua classificação na última rodada do grupo sul-americano, quando venceu o Uruguai por 1 a 0, no estádio Centenário, em Montevidéu. As debutantes foram Sérvia e Eslováquia.

Zakumi, o mascote de 2010

Num mundial repleto de símbolos de lutas pelos direitos humanos e liberdade, os sul-africanos aproveitaram a escolha do mascote da Copa para passar mais uma mensagem ao mundo. O Zakumi era um leopardo, um dos animais da fauna do país. Vestido com shorts e camiseta, cabelo verde, representava a camuflagem para se esconder nas matas e escapar da extinção.

O mundo do futebol assistiu a confirmação da Espanha como uma das forças do futebol mundial. Conhecida por ser sempre apontada como uma das favoritas, a Fúria jamais havia confirmado tal prognóstico.

Xavi Hernandes Iniesta

Os espanhóis chegaram na África como os então campeões europeus, derrotando a Alemanha na Eurocopa de 2008 e com uma geração talentosa, com destaque para Xavi Hernández, Andrés Iniesta, Xabi Alonso, Fernando Torres, Piqué, Sérgio Ramos e Puyol, além do melhor goleiro do mundo nos dois anos anteriores, , que atuava pelo Real Madrid.

Puyol

A derrota para a Suíça na estreia da Fúria causou espanto e fez retornar os comentários de que a seleção nunca seria protagonista em Copas. Os gols de David Villa, então atacante do Valência, começaram a mudar esse conceito. Com vitórias apertadas sobre Honduras (2 x 0) e Chile (2 x 1), os espanhóis conquistaram o primeiro lugar do grupo H.

Daí em diante foram vitórias de 1 a 0 sobre Portugal, Paraguai e Alemanha e na final contra a Holanda, com gol de Andrés Iniesta, craque do Barcelona, aos 10 minutos do segundo tempo da prorrogação.

Casillas beija Sara Carbonero durante entrevista

O título da Espanha tirava um peso das costas de uma geração pressionada a jogar uma Copa para honrar a tradição do futebol espanhol. A leveza tomou conta dos atletas. O goleiro Casillas não conteve a alegria. Ao ser entrevistado por sua noiva, Sara Carbonero, jornalista de uma TV espanhola, o jogador do Real Madrid não pensou duas vezes e a beijou ao vivo, numa das cenas que entraram para a história daquele mundial. Suárez evita com a mão o gol de Gana que eliminaria o Uruguai

Outra cena marcante, durante as quartas de final, foi o gol evitado pelo atacante uruguaio Luiz Suárez, no último minuto da prorrogação contra Gana. Os uruguaios estariam fora da Copa. Numa confusão na área, a bola ia entrar e, em cima da linha, o jogador uruguaio espalmou para fora. Foi uma linda defesa do atacante, que lhe causou a expulsão, mas manteve a equipe viva na Copa, já que na cobrança desse pênalti Gana parou na trave. Na decisão nos pênaltis coube ao goleiro Muslera e ao atacante Loco Abreu garantirem a classificação da Celeste para a semifinal.

A decepção dessa Copa foi a seleção italiana, que defendia o título mundial. Eliminada na primeira fase, a Itália repetiu o desempenho da França, também a então campeã mundial, em 2002. Foram dois empates contra Paraguai (1 x 1) e Nova Zelândia (1 x 1) e uma derrota contra a Eslovênia (2 x 3).

Sneijder Diego Forlán David Villa Muller

A Copa marcou o terceiro vice-campeonato da Holanda (1974, 1978, 2010) e teve quatro artilheiros, todos com cinco gols: David Villa (Espanha), Diego Forlán (Uruguai), Sneijder (Holanda) e Thomas Muller (Alemanha). O craque do mundial foi o uruguaio Forlán.

Última aparição pública do ícone Nélson Mandela, momentos antes da final da Copa Momentos antes da final entre Holanda e Espanha, mais uma imagem marcante e emocionante. Durante a festa de encerramento, no estádio Soccer City, em Joanesburgo, em 11 de julho, o líder sul-africano Nelson Mandela, debilitado fisicamente, utilizando um carro aberto, deu uma volta no gramado para a ovação de 84.490 pessoas. Mandela não compareceu ao jogo de abertura porque na noite anterior sua neta havia falecido num acidente automobilístico. Acompanhado de sua esposa, Graça Machel, Mandela fez naquele domingo a sua última aparição pública.

Jabulani, que em 2010 virou "sinônimo de bola"

Durante o período de Copa do Mundo, a bola virou “Jabulani”, o nome do modelo desenvolvido pela Adidas, que significa “celebrar” na língua Bantu isiZulu, um dos onze idiomas oficiais da África do Sul. Já o som das torcidas foi substituído pelas vuvuzelas, espécie de corneta, com cerca de um metro de comprimento e que foi alvo de perseguição pela TV europeia, que queria proibir o objeto nos estádios tamanho o ruído que provocava nas transmissões. O presidente da Fifa, Joseph Blatter repudiou a ideia e garantiu as vuvuzelas para a alegria do torcedor sul-africano.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Depois da festança de 2006, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, declarou que a seleção brasileira precisava de um comando com pulso firme e jogadores comprometidos com o Brasil. O escolhido para ser o comandante até a próxima Copa foi o ex-jogador Dunga, capitão do tetracampeonato e cuja filosofia de trabalho ia ao encontro dos desejos de Teixeira. Pelo menos no discurso.

Dunga indicou como seu auxiliar o também ex-jogador Jorginho, lateral de 1994. Se Ricardo Teixeira queria um técnico que cobrasse determinação e comprometimento dos jogadores, encontrou um profissional inflexível, arrogante e implacável com a imprensa. Ao longo do tempo, Dunga foi colecionando inimigos, doutrinando os jogadores e desenvolvendo uma verdadeira guerra com a mídia. O técnico nunca aceitou que a derrota de 1990 fosse creditada à “Era Dunga”, como rotulou a imprensa brasileira, e mostrava-se avesso a qualquer tipo de perguntas e relacionamento com os jornalistas. Essa postura gerava antipatia à seleção. Dunga trancou os jogadores na concentração durante a Copa, isolando-os de badalações, compromissos comerciais e, em muitas vezes, até do contato com familiares, o que se tornou um problema no transcorrer do mundial. Dunga tinha boa intenção, mas pecava na forma de agir para implantar sua filosofia.

Na coletiva que antecedeu a estreia, contra a Coreia do Norte, Dunga reclamou dos jornalistas: “apanho dia e noite e quem me bate é alegre, feliz. Aí eu dou uma resposta eu sou rancoroso”. E mais uma batalha da guerra Dunga x imprensa estava iniciada.

Folha de S. Paulo na estreia do Brasil

Em 15 de junho, terça-feira, a seleção brasileira venceu os norte-coreanos por 2 a 1. Nesse dia o São Paulo FC encaminhou ao comitê paulista para a Copa de 2014, evento que teria o Brasil como anfitrião, as garantias financeiras para a reforma do estádio do Morumbi no valor de R$ 265 milhões. A reforma, que acabou não acontecendo, credenciaria tecnicamente o estádio para receber a abertura do próximo mundial.

Na política o Brasil preparava-se para nova eleição presidencial. A Folha de S. Paulo publicava a notícia que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva cedera aos apelos eleitorais e concedera 7,7% de aumento para os aposentados. Segundo a Folha, a atitude visava evitar um desgaste eleitoral da candidata oficial, Dilma Rousseff. A decisão beneficiava 8,4 milhões de aposentados e pensionistas que ganhavam acima de um salário mínimo.

Lula havia dado sinais que vetaria o aumento, já aprovado pelo Congresso Nacional, mas evitou o conflito e desgaste político. A atitude foi considerada “populista”. Na fan fest realizada no Rio de Janeiro, já como um evento experimental para a Copa de 2014, a camisa de Kaká, o grande craque da seleção, era vendida a R$ 15,00, o chapéu com a bandeira brasileira a R$ 5,00 e a vuvuzela a R$ 3,00.

Durante a Copa a TV Bandeirantes também mostrou o Festival Folclórico de Parintins

Em São Paulo, no Vale do Anhangabaú, o torcedor acompanhou a partida protestando por jogadores que Dunga não havia convocado para a Copa. Eram comuns as camisas 7 de Adriano, 9 de Ronaldo e 10 de Ronaldinho Gaúcho. Sensação do primeiro semestre do futebol brasileiro, a dupla Ganso e , recém promovidos da categoria de base e protagonistas no Santos FC, também era lembrada pelos torcedores. A convocação dos dois jogadores foi bastante pedida pela imprensa e torcida do Brasil, mas Dunga manteve-se inflexível durante todo o tempo. Nem para amistosos Ganso e Neymar foram convocados.

No domingo, 20 de junho, a seleção fez sua segunda partida na Copa. Venceu a Costa do Marfim por 3 a 1, com dois gols de Luis Fabiano.

A mídia brasileira dava destaque também ao torneio que seria realizado no Brasil dali quatro anos. A Folha de S. Paulo publicou que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Social) exigia estádios verdes para a Copa. Dizia a matéria que para conseguir financiamento estatal, as arenas deveriam ser projetadas para ter coleta seletiva de lixo, reciclar material de demolição e aproveitar água da chuva nos banheiros e gramados.

Já o torcedor enfrentava algumas situações diferentes ao acompanhar a Copa do Mundo pela TV. Era comum quem possuía TV HD (High Definition) escutar o grito de gol do vizinho antes de ver a bola entrar no gol. Os técnicos das TVs explicavam que quanto melhor a recepção em HD via satélite, maior o delay (retardo de sinais). Na linguagem do meio, as imagens ficavam mais pesadas. José Simão, jornalista da Folha de S. Paulo, elegeu o delay como o “vilão” da Copa.

Enquanto os jogos aconteciam na África, mensagens de Twitter cresciam pelo mundo, especialmente no Brasil em jogos da seleção. Na estreia, o Twitter passou a receber 2.928 mensagens por segundo, quando o comum era 750. Durante Brasil e Coreia do Norte, o Twitter chegou a sair do ar devido ao tráfego de mensagens. O recorde mundial do Twitter até então era 3.085 mensagens por segundo, obtido por ocasião do jogo final da NBA (Liga Profissional Norte-Americana de Basquete) de 2009/2010 entre Los Angeles Lakers e Boston Celtics.

Na coletiva oficial da Fifa, após a vitória sobre Costa do Marfim, o técnico Dunga piorou a sua já desgastada relação com os jornalistas brasileiros. O treinador disse que não iria dar folga aos jogadores porque “não adiantava nada”. “Dar tempo livre a eles por quê? Se a gente faz isso vocês vão atrás deles e isso não é folga, é trabalho”, disse em tom de ironia.

Dunga discute com jornalista em coletiva da Fifa

Nesse momento, Dunga ouve algum comentário na plateia composta por jornalistas e dirige-se a Alex Escobar, jornalista da Rede Globo:

_ O que foi? Algum problema aí?, pergunta Dunga.

_ Não, nenhum, não estava olhando para você, respondeu Escobar.

À noite, durante o programa Fantástico, a Rede Globo mostrou Dunga resmungando palavrões para o jornalista e se posicionou contrária ao comportamento destemperado do treinador brasileiro. Novo round na guerra Dunga x imprensa.

Considerado o grande teste para o Brasil até então na Copa, a última rodada da primeira fase teve o confronto contra Portugal, do craque , dia 25 de junho, sexta-feira. A seleção brasileira não teve Kaká, expulso contra Costa do Marfim, , machucado e que não jogaria mais na Copa, e Robinho, com dores na coxa.

O empate em zero a zero foi comemorado por Dunga e seus comandados. O treinador não apontou motivos pelo fraco futebol e a falta de alternativa no esquema, mas disse que o objetivo de ficar em primeiro do grupo tinha sido alcançado.

À torcida brasileira restou aproveitar a noite fria daquela sexta-feira e assistir à novela Passione, de Silvio de Abreu, ou a um bom filme. No Telecine Premium “A Vida Secreta das Abelhas”, às 23h40; no TNT foi possível dar boas risadas com “Penetras Bons de Bico”, às 22h00. A fase eliminatória (oitavas de final), para a seleção brasileira, teve início dia 28 de junho, contra o Chile, no estádio Ellis Park, em Joanesburgo. O adversário sul- americano, considerada “freguês” dos brasileiros, mais uma vez não ofereceu resistência e levou 3 a 0. Um jogo sem sustos e que deixava a torcida brasileira mais empolgada.

Mais uma vez a seleção tinha a Holanda pela frente. Desde 1974, quando o Brasil perdeu na semifinal, os holandeses estiveram no caminho dos brasileiros em 1994 (3 x 2 nas quartas de final) e 1998 (vitória nos pênaltis na semifinal). Era impossível não citar esses confrontos na véspera da decisão. Quem passasse já estaria entre as quatro melhores seleções do mundo.

Naquela sexta-feira, 02 de julho, pesquisa do Instituto Datafolha sobre as intenções de voto para a Presidência da República apontava a liderança de José Serra, com 39%, seguido de Dilma Rousseff com 38% e Marina Silva, com 10%.

Cruyff, carrasco do Brasil em 1974, técnico consagrado pelo Barcelona da Espanha, disse antes da partida que não pagaria ingresso para ver aquela seleção brasileira jogar. As críticas não foram apenas para o Brasil, Cruyff disse também que não gostava do pragmatismo da Holanda na Copa.

Sabias palavras do craque de 1974. Pragmática e focada, a Holanda derrotou o Brasil por 2 a 1, de virada. A Laranja Mecânica levou o primeiro gol aos 9 minutos, quando Robinho mostrou velocidade, oportunismo e talento. Kaká teve uma chance de ampliar o placar, mas o goleiro Stekelenburg praticou excelente defesa.

Momento do empate e depois a virada da Holanda sobre o Brasil, resultado que eliminou a seleção

Sem levar sustos no primeiro tempo, a seleção brasileira sofreu o empate logo aos oito minutos da etapa final. Sneijder bateu uma falta, Felipe Melo e o goleiro Júlio César foram na bola, mas ela desviou no volante brasileiro e foi para o gol.

O empate desestabilizou o Brasil e a Holanda passou a envolver os brasileiros com toque de bola rápido e objetivo. Aos 22 minutos, num escanteio, Sneijder fez 2 a 1 para a Holanda, que não foi pressionada em nenhum momento após passar à frente.

Abalado com as falhas nos dois gols holandeses, o goleiro Júlio César não conteve as lágrimas. No vestiário, o técnico Dunga também chorou. Kaká, que não atuou na África na plenitude de sua forma física, disse que fez tudo o que podia para o hexacampeonato ser conquistado. Sucesso durante toda a Copa do Mundo, uma das frases da música tema do mundial, Waka Waka (This Time for África – Dessa vez é pela África) interpretada pela cantora colombiana Shakira, namorada do campeão espanhol Piqué, já dava o recado para os brasileiros: “When you pall, get up”.

Quando cair, levante.

Shakira no clip Waka Waka, oficial da Copa de 2010

Os então jogadores do Santos, Ganso e Neymar, preferidos da torcida, não foram à Copa, mas fecharam contratos publicitários

Anúncio da TV Bandeirantes para transmissão de jogo do Brasil Sportv na Copa

Ganso, Robinho e Neymar em mais uma ação publicitária durante a Copa

Teatro

Show

Programação de cinema

2014 – Brasil

Cartaz oficial da Copa do Mundo do Brasil

Depois de 64 anos a Copa do Mundo voltou ao país do futebol.

O Brasil foi escolhido como sede da Copa do Mundo de 2014 em 30 de outubro de 2007, provocando alegria na população, que comemorou nas ruas a indicação.

Na disputa, o Brasil teve a companhia de Argentina e Colômbia durante um bom tempo. A Fifa acenava com o torneio na América do Sul.

Por outro lado, a Conmebol (Confederação Sul-americana de Futebol) temia que uma competição mais dura entre os países provocasse um racha e a América do Sul perdesse a oportunidade de sediar a Copa, o que não acontecia desde 1978 na Argentina.

O cenário ficou ainda mais favorável quando todos os países sul-americanos declararam apoio à candidatura brasileira, especialmente Argentina e Colômbia. O caminho ficou livre. O Comitê-Executivo da Fifa, por unanimidade, ratificou a decisão que todos esperavam. A Copa era do Brasil.

Para cumprir as exigências da Fifa o Brasil teve que realizar obras em todos os estádios, ou reformando-os ou construindo novas arenas. Disputas políticas começaram. A primeira delas foi para definir as cidades que receberiam jogos do mundial.

Foram escolhidas 12 cidades, duas a mais do que a orientação da Fifa e quatro além do mínimo exigido. As cidades que receberam os jogos foram: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Recife, Fortaleza, Manaus, Cuiabá, Brasília e Natal. Outras cidades lutaram bastante para receber a Copa, mas foram preteridas. Foram elas: Belém, Florianópolis, Goiânia, João Pessoa, Rio Branco e Teresina. Fuleco, o mascote de 2014

O slogan da Copa, anunciado em 29 de maio de 2012, foi “Juntos num só ritmo”. O evento teve como mascote o “Fuleco”, um tatu-bola, animal típico da caatinga. O nome era a junção de futebol e ecologia, foi até onde a criatividade brasileira conseguiu chegar sobre um tema tão importante e que merecia um posicionamento mais incisivo do Brasil.

A Copa de 2014 contou com a participação de todas as seleções campeãs do mundo. Foi a primeira vez que foi utilizada a tecnologia denominada “goal-live”. A bola da Copa, que levou o nome de “Brazuca”, não fez sucesso como a antecessora Jabulani, mas ganhou em tecnologia, sendo confeccionada com um chip em seu interior. Dessa forma era possível assinalar com precisão quando a bola passava, ou não, a linha do gol. Erros como na decisão da Copa de 1966 não ocorreriam mais.

Brazuca

Após o término do evento, a Fifa anunciou que a Copa de 2014 foi a mais poluente da história. Foram 2,72 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono produzidas durante o torneio. Por outro lado, foi a Copa mais sustentável, já que os estádios construídos ou modernizados para o mundial adotaram tecnologia para aproveitar a água das chuvas, a luz solar, fontes renováveis de energia e a iluminação com baixo consumo energético.

Em conferência organizada pela Fifa, realizada na Cidade do Panamá, em setembro de 2014, os representantes de 45 federações afiliadas à Concacaf e Conmebol avaliaram o trabalho realizado no Brasil como “o melhor futebol já visto na história dos mundiais”. Pode-se dizer que a Copa do Mundo foi realizada com certa apreensão pelas autoridades brasileiras e da Fifa. Um ano antes, em junho de 2013, durante a Copa das Confederações, considerada evento-teste para o mundial, o cenário político e social assustou os dirigentes da Fifa e colocou as autoridades brasileiras em alerta.

Manifestações em junho de 2013

Uma série de manifestações, inicialmente contra um aumento nas tarifas públicas de transporte em algumas capitais, ganhou corpo e envolvimento da população, transformando-se na maior manifestação de rua pós-impeachment do presidente Fernando Collor de Mello.

Depois do início contra o aumento da tarifa do transporte, as manifestações ganharam adesão de diversos seguimentos da sociedade, que gritou contra a corrupção, a qualidade dos serviços públicos e os políticos em geral. Foram chamadas de manifestações contra tudo e contra todos, tamanha a insatisfação manifestada pelos brasileiros com a política e os políticos.

A realização da Copa no Brasil e as constantes denúncias de corrupção nas obras para o evento, fizeram com que as manifestações atingissem a Copa das Confederações. Era comum nos arredores dos estádios algum tipo de manifesto, seguido da repressão policial. O que assustava o torcedor, a imprensa internacional e em especial os dirigentes da Fifa era que, na maioria dos casos, as manifestações terminavam sendo dominadas por grupos violentos, conhecidos como os black-blocs, que confrontavam policiais e depredavam bens públicos.

O argentino , craque da Copa Um ano depois, durante o mundial, algumas manifestações, em menor proporção, ainda aconteceram, principalmente contra as crescentes denúncias de corrupção. As manifestações conviveram democraticamente com a Copa, sem incidentes do tamanho de 2013.

Dentro do campo foi um mundial que agradou o torcedor. Muitos gols nos jogos e estádios lotados. O destaque foi a Alemanha, que conquistou seu quarto título mundial, o primeiro de uma seleção europeia no continente americano.

Boateng com a taça Fifa O goleiro Neuer da Alemanha

O ápice do futebol alemão aconteceu na histórica semifinal contra o Brasil. Num Mineirão perplexo, os alemães fizeram 7 a 1 na seleção brasileira, tiraram o sonho do hexa em solo brasileiro e a possiblidade da final contra a Argentina, desejo da maioria dos torcedores do Brasil.

Kroos

A Argentina esteve presente na final do Maracanã, em 13 de julho, graças ao craque Lionel Messi, que decidiu alguns jogos e a disputa dos pênaltis contra a Holanda, na outra semifinal, quando o goleiro Romero brilhou.

Na final, os argentinos tiveram chance de ganhar a partida, dois gols perdidos incríveis, mas a decisão foi adiada para a prorrogação. Gotze, a sete minutos do final do tempo extra, fez o gol que garantiu o título da Alemanha que teve como destaque o excelente goleiro Manuel Neuer, , Boateng, Hummels, Ozil, Schweinsteiger, Thomas Muller, Kroos, Klose e o ótimo técnico Joachim Low.

O Brasil recebeu um milhão de turistas estrangeiros durante a Copa. Eles injetaram cerca de US$ 3,2 bilhões na economia brasileira. Já o legado social para o povo brasileiro, tão prometido por ocasião da eleição como país-sede, ficou para o próximo mundial.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Em projeto de preparação para uma Copa do Mundo, nunca a CBF errou tanto como no conceito e estratégia para a formação do grupo e preparação para a Copa de 2014. Jamais a entidade colocou à frente um fato novo ante aos mundiais anteriores: a Copa seria em casa.

Logo depois da derrota para a Holanda na Copa da África do Sul, a CBF resolveu novamente trocar o comando técnico da seleção. E a escolha do novo técnico deu o tom de como seria toda a preparação.

Mano Menezes durante convocação da seleção brasileira

Escolhido pela cúpula da CBF, o então técnico do Fluminense, não aceitou o convite. Chegou a negociar com a CBF em algumas reuniões com o presidente Ricardo Teixeira, mas acabou recusando o convite quando o mandatário da CBF afirmou que ele teria que negociar a sua saída do time carioca. Muricy entendia que como fora convidado, seria correto que Teixeira falasse diretamente com a diretoria do Fluminense, o que foi recusado pela presidência da entidade. Muricy disse não.

Como plano B, o então técnico campeão da Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro (Corinthians) e da Copa do Brasil (Grêmio e Corinthians), o gaúcho acreditou no projeto que lhe foi apresentado e aceitou o convite de formar o grupo da seleção que disputaria a Copa do Mundo em casa com a missão de apagar o vice-campeonato de 1950. Brasil 2x0 Ucrânia em Derby, Inglaterra Brasil 0x1 Argentina, em Doha, Catar

O erro de planejamento foi conceitual. Preparando-se para jogar a Copa no Brasil, a seleção brasileira, sob o comando de Mano Menezes, atuou apenas seis vezes diante do seu torcedor. Foram jogos e mais jogos na Europa, Ásia e Estados Unidos. Uma geração de jogadores brasileiros, enraizados na Europa, perdia a oportunidade de manter contato com o torcedor do Brasil e, consequentemente, criar uma empatia entre time e torcida, fundamental para quem disputaria o mundial em casa.

Depois da medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, o trabalho questionado de Mano Menezes, que promoveu a estreia de Ganso e Neymar no time principal, jogadores pedidos pela torcida para a Copa da África, chegava ao final. A demissão foi anunciada em 23 de novembro.

Felipão, o presidente da CBF, José Maria Marin e Parreira, na apresentação da comissão técnica da Copa de 2014

Em 28 de novembro de 2012, a CBF, então presidida pelo ex-governador do Estado de São Paulo, José Maria Marin, anunciou a volta do técnico campeão de 2002, Luiz Felipe Scolari, que compunha uma supercomissão técnica com o coordenador Carlos Alberto Parreira, o comandante do tetracampeonato. Estava claro que a CBF colocava a responsabilidade da vitória ou fracasso nas mãos de um campeão, que contaria com mais paciência dos torcedores e da mídia.

A estratégia da CBF continuou equivocada e a seleção mantinha os jogos amistosos longe do país. Isso foi amenizado com a realização da Copa das Confederações, em junho de 2013, no Brasil, como evento-teste para o mundial.

Em meio às manifestações político-sociais, Felipão conseguiu envolver os jogadores naquele clima e a seleção conquistou o torneio numa atuação de gala no Maracanã, quando goleou por 3 a 0 a Espanha, então campeã mundial e bicampeã europeia. Neymar prepara o chute para fazer o segundo gol do Brasil nos 3 a 0 contra a Espanha em 2013

A atuação e a simbiose da Copa das Confederações jamais estiveram presentes durante a Copa em 2014. Os jogadores sentiram a responsabilidade e em nenhum momento conquistaram a torcida brasileira. Foi uma seleção muito distante da histórica relação do Brasil com a Copa do Mundo e seu torcedor.

A seleção brasileira estreou contra a Croácia, em São Paulo, em 12 de junho. No dia em que os metroviários da capital paulista ameaçaram parar suas atividades em protesto contra as condições de trabalho, o que acabou não acontecendo. O Brasil fez 3 a 1, com a ajuda do árbitro japonês Yulchi Nishimura, que marcou um pênalti inexistente, numa simulação grotesca do atacante Fred. Esse lance aliviou o Brasil, que tinha tomado o primeiro gol aos 10 minutos, anotado contra pelo lateral Marcelo e empatado com Neymar ainda no primeiro tempo.

O gol do pênalti inventado por Nishimura e anotado por Neymar, foi a virada brasileira, completada por Oscar fazendo o terceiro gol. Não foi uma boa estreia. No Jornal Nacional da Rede Globo, Felipão foi flagrado, pela leitura labial, tentando animar o time e fazer com que os jogadores se envolvessem emocionalmente com o jogo. Nunca conseguiu durante toda a Copa.

Anúncio da TV Bandeirantes para a transmissão do primeiro jogo do Brasil

O futebol decepcionante do Brasil rivalizou com outro assunto no início da Copa: as vaias à presidente Dilma Rousseff na abertura. Politicamente o Brasil ainda fervilhava, as denúncias de corrupção pipocavam, manifestações aconteciam e a população aproveitava para se manifestar, em especial quando a Copa do Mundo estava envolvida, o que dava ainda maior repercussão ao momento político do Brasil.

Capa de O Estado de S. Paulo no início do Mundial

No estádio da abertura da Copa, a Arena de Itaquera, a imprensa mundial teve que driblar o péssimo sinal de internet e telefone celular. A iluminação também apresentou falhas.

Em 17 de junho o Brasil fez seu segundo jogo na Copa, enfrentando o México, no estádio Castelão em Fortaleza. Um dia antes o mundo esportivo comemorou a notícia da saída do coma do piloto de Fórmula 1, o alemão Michael Schumacher. Ele batera a cabeça numa pedra enquanto esquiava na estação de Méribel, na França, em 29 de dezembro de 2013. Após cinco meses, o heptacampeão deixava o centro hospitalar universitário de Grenoble, na França, onde estava internado desde o acidente.

Para os brasileiros o dia 16 de junho reservou outra boa notícia. A ex-ginasta Lais Souza recebera alta após quatro meses internada em Miami, onde se preparava para as Olimpíadas de Inverno de Sochi, Rússia, onde competiria na modalidade de esqui aéreo.

O acidente aconteceu em 27 de janeiro de 2014, em Salt Lake City e deixou a brasileira sem movimentos e com uma lesão medular. Determinada e recebendo um tratamento então inédito de células-tronco, tetraplégica, Laís ainda luta para voltar a andar e tem tido evoluções significativas e impressionantes.

Evolução foi justamente o que a seleção brasileira não demonstrou no empate em zero a zero com o México, retratando o pior início numa Copa do Mundo desde 1978. Por muito pouco os jogadores brasileiros não provaram o sabor da derrota que os torcedores tiveram nas arquibancadas do estádio Castelão, quando foram abafados pelos gritos da fanática torcida mexicana.

A Copa no cinema em 2014

Nesse momento da Copa entrou em campo outra discussão. O alto preço dos ingressos deixava o torcedor acostumado a ir aos estádios brasileiros fora da Copa. Nascia a expressão “coxinhas” para denominar a elite que ia aos estádios para assistir os jogos da seleção. O alto valor dos ingressos fez com que as prostitutas de Fortaleza fizessem anúncios em jornais afirmando que eram “mais baratas que os ingressos da Copa”. Cada um tentava ganhar com o evento da forma que podia.

Defesa do goleiro Ochoa contra a seleção brasileira

Do lado mexicano, a comemoração era em torno do goleiro Ochoa, personagem da partida com pelo menos três grandes defesas. Do lado brasileiro, o técnico Luiz Felipe Scolari dizia que estava feliz com o que viu, irritando ainda mais o torcedor. Em São Paulo, o dia de fan fest da Fifa para acompanhar Brasil e México, uma terça-feira às 16h00, foi marcado pelo confronto entre policiais e torcedores impedidos de entrar pelo excesso de lotação. Até da festa, comum em todas as Copas, o brasileiro estava sendo excluído.

Teatro durante a Copa

Na segunda-feira, 23 de junho, a seleção brasileira entrou em campo no estádio Mané Garrincha, em Brasília, pressionada a dar uma resposta para a opinião pública. Embalada nas manifestações dos contrários à realização do mundial no país, que antes do evento bradavam o slogan “não vai ter Copa”, a torcida brasileira erguia cartazes com a pergunta: “vai ter hexa?”.

Brasil x Camarões prontos para começar a partida

A boa vitória sobre Camarões, por 4 a 1, foi a centésima partida da seleção em Copas do Mundo. Scolari promoveu a entrada do volante Fernandinho, do Manchester City, no lugar do criticado Paulinho, então no Tottenham da Inglaterra, considerado o símbolo do abalo emocional brasileiro.

Essa vitória gerava na comissão técnica a expectativa de que o time, enfim, embalasse e passasse a vibrar mais com a Copa e o fato de estar jogando em casa, algo que não foi pensado pela CBF em nenhum momento, principalmente para uma geração de jogadores que haviam deixado o país muito cedo para jogar na Europa.

Felipão sentia que os jogadores estavam abalados e tentava amenizar a pressão para o início dos jogos eliminatórios, onde qualquer derrota significaria a eliminação do torneio.

O primeiro adversário seria o Chile, no sábado, 28 de junho, às 13 horas, no estádio Mineirão em Belo Horizonte. “Uma derrota não será uma tragédia”, disse o técnico Felipão na coletiva à imprensa que antecedeu o confronto. Era uma declaração tática, tentando deixar a equipe mais leve, com menos responsabilidade.

No mundo político as peças se mexiam no tabuleiro, preparando-se para mais uma eleição presidencial. A senadora Marina Silva anunciava seu apoio ao candidato Eduardo Campos (PSB), o que aumentava a sua viabilidade eleitoral para enfrentar os candidatos do PT e PSDB. O ex-governador de Pernambuco não conseguiria participar daquela eleição, vítima de um acidente aéreo em 13 de agosto, em Santos. Marina Silva foi a candidata daquele grupo político, na eleição que reelegeu a presidente Dilma Rousseff (PT), no segundo turno contra Aécio Neves (PSDB).

Em São Paulo a notícia era o aumento dos pedágios das rodovias estaduais. O principal pedágio da rodovia dos Imigrantes teria aumento de 5,29%, passando a custar R$ 22,00.

Brasil e Chile fizeram um jogo dramático, que expôs todas as fragilidades brasileiras, sejam elas técnicas, táticas e emocionais.

A seleção saiu na frente com David Luiz e sofreu o empate ainda no primeiro tempo, gol do artilheiro Alexis Sanches. Emoção, gols perdidos e erros dos dois lados. O jogo vai para a prorrogação e a derrota brasileira não acontece no último minuto porque o travessão salvou o gol de Pinilla para o Chile.

O capitão da seleção é amparado por Scolari

O momento que antecedeu a disputa dos pênaltis assustou o torcedor brasileiro e deixou a mídia internacional perplexa. O zagueiro Thiago Silva, capitão da equipe, se isolou dos demais jogadores e começou a chorar muito, deixando claro o despreparo emocional.

Apontado como um dos responsáveis pela derrota quatro anos antes, o goleiro Júlio César também ficou bastante emocionado e foi amparado pelo lateral Marcelo. O goleiro se recuperou e foi um dos responsáveis pela vitória por 3 a 2 nos pênaltis. Na comemoração, Thiago Silva voltou a chorar copiosamente. A cena de Felipão tendo que levantar os jogadores, a maioria chorando, sem comemorar com a torcida, foi patética e trágica ao mesmo tempo. Parecia que choravam uma derrota, mas estavam classificados.

Programa "É Campeão" do Sportv

Essas cenas repercutiram no mundo todo. À noite, no programa “É Campeão” do Sportv, apresentado pelo jornalista André Rizek, o capitão do tricampeonato Carlos Alberto Torres estava irritado com a postura de Thiago Silva. “Fiquei preocupado. O Thiago tinha que estar com os companheiros, tinha a obrigação de ir ao encontro dos companheiros e dar força”, disse. Para Fábio Cannavaro, capitão do tetracampeonato italiano em 2006, um líder tem que ter serenidade.

No programa “Linha de Passe”, da ESPN Brasil, o jornalista Mauro César Pereira, que assistiu ao jogo do centro de imprensa no Rio de Janeiro, disse que os jornalistas estrangeiros estavam espantados com o péssimo futebol do Brasil. “Essa questão do emocional apenas mascara o péssimo futebol da seleção, que tem um técnico ultrapassado e que vive da vitória contra a Espanha na Copa das Confederações”, afirmou. Para José Trajano, da mesma ESPN Brasil, Felipão era apenas “um bom chefe de Torcida”.

Mauro César lembrou, também, que o favoritismo, a carga de pressão sobre o Brasil, foi colocada pelo coordenador Carlos Alberto Parreira. No dia da apresentação dos jogadores para a Copa do Mundo, no centro de treinamento da Granja Comary, em Teresópolis, Parreira deu uma entrevista coletiva e afirmou que o Brasil era o grande favorito para ganhar o mundial.

“Quando você consegue ganhar fora do campo, com logística, bom relacionamento com os torcedores e imprensa, você coloca uma mão na taça. Então, nós já estamos com uma mão na taça”, disse Parreira que, empolgado, continuou dizendo que era “só olhar o time que nós temos, uma zaga em que os melhores do mundo são titulares, é um timaço e os melhores jogadores do futebol mundial jogando em casa. Somos favoritos, sim!”, declarou Parreira.

Para Mauro César Pereira, a defesa não era tão forte como parecia e como Parreira acreditava no dia da apresentação para a Copa.

Em meio a tanta polêmica, o torcedor em São Paulo pôde aproveitar o sábado e comemorar a classificação para as quartas de final. Nos cinemas um cardápio eclético: a pré-estreia de “O Grande Hotel Budapeste”, com Ralph Fiennes e William Defoe; a animação “Como Treinar seu Dragão 2”; a aventura “O Espetacular Homem Aranha 2 – A Ameaça de Electro” e o drama adolescente “A Culpa é das Estrelas”.

Anúncio do "Cartão Verde" da TV Cultura durante a Copa

O Brasil voltou a Fortaleza para disputar a chance de ir para as semifinais. Dia 04 de julho, sexta-feira, enfrentou a Colômbia, com o povo brasileiro ainda tendo que digerir a notícia do dia anterior sobre a queda de um viaduto em construção em Belo Horizonte, que causou a morte de uma pessoa e feriu outras 22. O viaduto ficava a 6 km do estádio do Mineirão e era uma das muitas obras inacabadas da Copa, o que aumentava ainda mais o sentimento de indignação com o mau uso do dinheiro público e da enganação das obras de infraestrutura para o mundial.

Uma pesquisa publicada pela Folha de S. Paulo apontava que o atacante Fred era o pior jogador da seleção brasileira para 21% dos entrevistados pelo instituto Datafolha.

O confronto era considerado um teste psicológico, depois do jogo contra o Chile, para projetar o que o torcedor poderia esperar caso o Brasil jogasse a semifinal.

Com gols do zagueiro Thiago Silva e David Luiz, a seleção jogou aquela que foi considerada sua melhor partida na Copa do Mundo, manchada pela fratura da terceira vértebra lombar do atacante Neymar, numa disputa de bola com o colombiano Zuniga. Algumas horas depois, ainda em Fortaleza, os médicos da seleção confirmaram que Neymar estava fora do restante da Copa.

Imediatamente uma questão era colocada: seria possível ganhar a Copa sem Neymar? Era mais um abalo do lado psicológico, mesmo porque o jogador não vinha fazendo um mundial regular, mas a sua ausência poderia influenciar os demais jogadores, muitos deles já abalados emocionalmente.

A história das Copas do Mundo jamais esquecerá o dia 08 de julho de 2014. Era a primeira semifinal do mundial e a partida reunia duas seleções gigantes, que 12 anos antes protagonizaram a final da Copa do Mundo do Japão e Coreia do Sul. Lance com Zuniga, a contusão de Neymar

Brasil e Alemanha geravam a expectativa natural de uma semifinal, acrescida do fator que a seleção pentacampeã jogaria em casa e que, para o mundo do futebol, aquele jogo seria seu batismo de fogo. Criticada pela imprensa brasileira pelo futebol apresentado, a seleção jamais enfrentou, naquela Copa, um time tão tradicional e bom quanto a Alemanha, que era a favorita do confronto.

Cinema durante a Copa do Mundo

Para os brasileiros o dia começara com uma notícia que escancarava as mazelas da economia tupiniquim. A Folha de S. Paulo noticiou que apenas os juros dos empréstimos para a construção ou reforma de 11 estádios do mundial, daria para construir dois estádios como a arena de Itaquera, em São Paulo.

Mesmo com a taxa abaixo do mercado, os empréstimos de R$ 4,3 bilhões utilizados por todos os estádios da Copa, excetuando a arena Mané Garrincha, em Brasília, que utilizou o caixa do governo do Distrito Federal, geraram um ágio de R$ 2,4 bilhões.

No Rio de Janeiro, Raymond Whelan, diretor-executivo da Match Services, empresa associada à Fifa, única autorizada a vender ingressos com pacotes de hospedagem, foi preso acusado de ser o chefe da quadrilha de venda ilegal de ingressos. Ele negou o fato. Já o mundo do futebol dividiu a expectativa para Brasil e Alemanha com a tristeza do falecimento do ex-jogador argentino Alfredo Di Steffano, craque e lenda do Real Madrid, que sofreu uma parada cardíaca, aos 88 anos.

Pelo Brasil, a eleição presidencial esperava apenas o término da Copa do Mundo para ganhar as ruas. Os políticos conjecturavam e as análises sobre os benefícios, ou não, de uma conquista da Copa pela seleção brasileira era o assunto do momento. O ex- presidente Fernando Henrique Cardoso entendia que uma vitória da seleção não impediria a derrota da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição.

Teatro durante o Mundial

Quando a seleção entrou em campo, no estádio do Mineirão, todos os assuntos ficaram para depois. Era momento de comemorar a passagem para a final e projetar um possível confronto contra a Argentina, que disputaria a semifinal no dia seguinte, contra a Holanda, em São Paulo.

Dificilmente alguém imaginou, projetou ou sequer profetizou o que aconteceu naquela tarde em Belo Horizonte. A seleção pentacampeã do mundo, jogando uma semifinal de Copa em casa, com todo o apoio da torcida, era goleada impiedosamente, por 7 a 1, pela Alemanha, num jogo que parecia um treino tamanha a distância emocional, técnica e tática entre as duas equipes.

O mundo do futebol esfregava os olhos a cada gol alemão. Torcedores brasileiros não sabiam se choravam, vaiavam a seleção brasileira ou se divertiam com o lindo futebol praticado pelos alemães. Ainda no final do primeiro tempo, quando a partida estava 5 a 0 para a Alemanha, muitas pessoas deixaram o estádio, temendo algo muito pior do que os 7 a 1 finais.

Abaixo segue um relato resumido do site globoesporte.com em sua transmissão em tempo real do confronto do Mineirão. Nesse relato é possível entender a rapidez com que os gols aconteceram, bem como a reação naquele momento de alguns comentaristas.

Segue o relato resumido: Começa o jogo no estádio do Mineirão, valendo vaga para a final da Copa do Mundo de 2014.

05 minutos: A Alemanha marca a saída de bola do Brasil.

06 minutos: Khedira chuta para o gol do goleiro Júlio César, a bola bate em Kroos e vai para fora. Sorte do Brasil.

10 minutos: GOL DA ALEMANHA – Kroos bate escanteio e Muller aparece livre na área para bater para o gol. Alemanha 1 a 0. 12 minutos: David Luiz tenta lançamento longo, mas a bola fica fácil para o goleiro Neuer.

14 minutos: Hulk tenta abrir o jogo pela direita para Bernard, mas erra o passe. 22 minutos: GOL DA ALEMANHA – Kroos dá lindo passe para Klose na área. O atacante bate, Júlio César defende e no rebote Klose completa para o gol. Alemanha 2 a 0

Esse foi o 16º gol em Copas do Mundo do alemão Klose, que assim superou o brasileiro Ronaldo, que tinha 15 gols. Ronaldo viu seu recorde ser superado da cabine da Rede Globo no estádio do Mineirão, onde comentou a semifinal.

24 minutos: GOL DA ALEMANHA: Lahm sobe pela direita e cruza para a área. A bola passa por todo mundo e Kroos acerta um chute forte, no canto direito de Júlio César. Alemanha 3 a 0. Galvão Bueno, narrador da Rede Globo, nesse momento da transmissão: “Perdeu totalmente o controle do jogo o time brasileiro”.

25 minutos: GOL DA ALEMANHA – Fernandinho perde a bola na intermediária, Khedira toca para Kroos dentro da área e este completa para o gol. Alemanha 4 a 0. Ao dar a saída, depois do quarto gol alemão, o atacante Fred vira-se para Oscar e diz: “tá feio, vamo acalmar, vamo acalmar” (sic). 27 minutos: Hulk avança pela direita em lance individual, se joga na área e o árbitro Marco Rodriguez, do México, manda o jogo seguir.

28 minutos: GOL DA ALEMANHA – Khedira rouba a bola no meio, tabela com Ozil e chuta no canto direito de Júlio César. Alemanha 5 a 0. Galvão Bueno, na Rede Globo: “Toma-se o caminho do maior vexame brasileiro em 84 anos de Copa do Mundo”.

29 minutos: É grande o número de pessoas que estão deixando o Mineirão.

31 minutos: Lahm toca na entrada da área, Kroos chega finalizando, a bola desvia em Dante, quase engana Júlio César, mas vai para fora.

36 minutos: Alemanha toca a bola com tranquilidade.

39 minutos: Fernandinho tenta lançamento longo e erra por muito.

40 minutos: Torcedores deixando o Mineirão gritando “vergonha”.

43 minutos: Marcelo cobra falta na área. Schweinsteiger corta de cabeça.

44 minutos: Torcedores vaiam a seleção.

46 minutos: Uma torcedora passa mal e é levada de maca para a enfermaria do estádio.

Fim do primeiro tempo. Brasil 0x5 Alemanha.

Começa o segundo tempo.

03 minutos: Oscar passa por Boateng e cai pedindo pênalti. Marco Rodriguez, árbitro mexicano, manda o jogo seguir. 06 minutos: Ramires dá passe para Oscar que chuta forte em cima de Neuer, é o melhor lance do Brasil no jogo.

07 minutos: Paulinho entra na área, chuta forte, Neuer rebate, Paulinho chuta de novo e Neuer faz excelente defesa, cedendo escanteio para a seleção brasileira.

08 minutos: Klose é substituído por Schurrle e é aplaudido ao deixar o gramado.

14 minutos: Vaias e xingamentos para o atacante Fred.

15 minutos: Júlio César evita o sexto gol, espalmando chute de Muller.

19 minutos: Bernard faz jogada individual, erra o passe que seria para Paulinho.

O comentarista , da Rede Globo, diz: “A seleção faz uma péssima partida. Não me recordo e acho que nunca mais vou ver uma partida tão ruim como essa. O Brasil está caindo para o primeiro time de peso que enfrentou”.

23 minutos: GOL DA ALEMANHA – Lahm toca para Schurrle, que completa para o gol da pequena área. Torcida brasileira aplaude. Alemanha 6 a 0.

Ronaldo Fenômeno, na Rede Globo: “A seleção não empolgou em momento algum”. 33 minutos: GOL DA ALEMANHA – Schurrle recebe na área e chuta forte. A bola bate no travessão e entra. Alemanha 7 a 0.

39 minutos: Ramires chuta nas mãos de Neuer.

44 minutos: Quase mais um. Ozil recebe livre, frente a frente com Júlio César e chuta para fora. 45 minutos: GOL DO BRASIL – Oscar recebe no ataque, entra na área, dribla Boateng e bate sem chances para Neuer. Brasil 1x7 Alemanha. 47 minutos: Fim do maior vexame da história do Brasil.

Esse relato dá para entender o que foi aquele jogo. Acrescente-se a inércia da comissão técnica brasileira, totalmente assustada com o volume de jogo da Alemanha e sem esboçar qualquer tipo de reação a cada gol sofrido.

Felipão apostou na entrada de Bernard, atacante do Shakhtar Donetsk da Ucrânia, mas com histórica passagem pelo Atlético Mineiro. A ideia mostrou-se ineficaz e o treinador deixou claro que não tinha sequer um “plano b”.

O desenrolar da partida deixou o torcedor brasileiro paralisado e o restante do mundo perplexo pela facilidade com que os alemães derrotaram os brasileiros.

Cena comum: gol da Alemanha e Felipão de braços cruzados no banco brasileiro

Na coletiva de imprensa, após o jogo, o técnico Luiz Felipe Scolari assumiu toda a responsabilidade. Disse que optou por Bernard, aquele que ele dizia ter “alegria nas pernas” para dar mais leveza e velocidade ao time e negou o fato de o atleta ter jogado no Atlético Mineiro ter influenciado na decisão. Sobre Neymar, Felipão afirmou que a equipe sentiu a falta do companheiro, principalmente porque estava contundido. Como explicação disse apenas que a seleção teve um “apagão” depois do segundo gol.

Um dia depois, já nas dependências da Granja Comary, a comissão técnica voltou a falar com a imprensa. Foi uma entrevista patética, que ilustrou bem que os críticos tinham razão: a seleção estava entregue a pessoas que, naquele momento, mostravam despreparo e falta de sintonia com o que estava acontecendo.

Felipão voltou a assumir a culpa pela derrota, disse que sabia a dimensão do que tinha acontecido. “Sei que é uma vergonha. A vida segue e temos como o objetivo ser terceiro lugar no sábado”, disse. Para completar, o treinador disse: “se formos analisar por números, estamos no caminho certo. Perdemos apenas um jogo oficial em um ano e meio”. Para ele, “o resultado foi catastrófico pelo número de gols, mas a história tem que registrar que foi a primeira vez que o Brasil chegou nas semifinais depois de 2002 (quando também era o técnico)”.

O jornalista Paulo Vinícius Coelho, então trabalhando na ESPN Brasil, afirmou que entendia ter faltado treino para a seleção brasileira. “O time treinou pouco. A comissão técnica dizia que não queria machucar os atletas e por isso não forçava nos treinamentos”, afirmou.

O clima da entrevista estava ruim e as respostas não respondiam às verdadeiras questões formuladas pelos jornalistas, que durante mais de quarenta dias estiveram cobrindo a seleção brasileira. O coordenador-técnico, Carlos Alberto Parreira, conseguiu piorar a qualidade das respostas, mostrando arrogância e falta de preparo.

Parreira afirmou que a preparação “foi perfeita”. Disse em alto e bom som: “não houve erro. Tem que continuar trabalhando. O futebol brasileiro é muito forte”.

Num momento da coletiva, quando Felipão citava manifestações de apoio de torcedores que recebia, Parreira conseguiu se superar. Pediu a palavra e sacou um papel do bolso, para a surpresa do auxiliar de Felipão, Flávio Teixeira, o popular Murtosa, que estava ao seu lado.

Parreira disse que não queria mais interromper, mas que achava oportuno já que estava em suas mãos uma das “centenas de cartas e e-mails” de apoio que chegavam diariamente à CBF. Era a carta de uma suposta torcedora, chamada D. Lúcia. Parreira fez questão de ler na íntegra, conforme transcrito abaixo:

Cena patética: Parreira para a coletiva de Felipão para ler suposta carta de aprovação do trabalho da comissão técnica da seleção

“Professor Felipão,

Acabo de ver a coletiva dada pelo senhor. Mais uma vez vi, diante da câmera, um homem íntegro e corajoso falando à nação. Fiquei muito contente ao constatar que o ser humano, muitas vezes, é de uma crueldade sem limites. Tive esse sentimento ao ver um jornalista lhe perguntar sobre uma possível dívida do senhor com a nação brasileira e o senhor, mesmo sofrendo mais do que qualquer um ali, com toda humildade que lhe é peculiar, deu-lhe uma resposta verdadeira e coerente. Parabéns.

Mais uma vez provou que é um grande homem, um ser humano ímpar.

É claro, professor, eu, como os demais brasileiros, gostaria de estar comemorando um outro resultado, porém, sei que ninguém perde por vontade própria. Meu e-mail é apenas para agradecer os momentos de grande felicidade que o senhor e sua equipe proporcionaram a esta nação. Foram vários.

Parabéns pelo seu trabalho e boa sorte nos próximos jogos. Tenha certeza que o senhor comandará com sua inquestionável competência.

Dizem que as mulheres não entendem de futebol, porém, entendemos de seres humanos. Portanto, envio um abraço, carregado de carinho, para o senhor e toda a sua equipe.

Fique com Deus e lembre-se que o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem ao amanhecer.

Quero dizer com essa citação que vai passar e tudo ficará bem.

Saiba que, como eu, há várias pessoas que estão apoiando nossa seleção, que tem o privilégio de ser comandada pelo senhor.

Receba um abraço de uma brasileira anônima, que não conhece muito de futebol, mas que o admira muito e que sabe que fez o melhor.

Lúcia.”

Como não poderia ser diferente, a suposta carta tornou-se chacota nacional. O ex- jogador Vampeta, pentacampeão em 2002, durante entrevista à rádio Jovem Pan, em 2016, disse que já indagou Parreira sobre a tal “carta da Dona Lúcia”. “Encontrei Parreira num jantar de um amigo comum e perguntei para ele o que foi aquela carta. Parreira só deu risada”, disse. Para o jornalista Leonardo Bertozzi, no programa Linha de Passe, da ESPN Brasil, a carta da Dona Lúcia e a coletiva de Felipão no dia seguinte era pior do que a goleada imposta pela Alemanha. “Estava assistindo a coletiva e pensando o que era pior, a entrevista ou os 7 a 1. Estava empatado, até a carta da Dona Lúcia. Foi pior que a goleada”, disse.

Pelos lados de Brasília, a presidente Dilma Rousseff temia que a derrota da seleção tivesse prejuízos na economia e na sua reeleição. Depois de ser vaiada na abertura da

Capa da Folha de S. Paulo sobre a derrota brasileira

Copa, Dilma reavaliava a participação na final da Copa, no estádio do Maracanã, onde deveria entregar o troféu à equipe campeã mundial. Dilma não compareceu ao evento.

No sábado, 12 de julho, um cabisbaixo Brasil entrou em campo no estádio Mané Garrincha, em Brasília, para tentar uma saída honrosa, que no entender da comissão técnica seria a conquista do terceiro lugar, contra a Holanda, eliminada pela Argentina na cobrança de pênaltis.

A seleção voltou a ser goleada, dessa vez por 3 a 0, repetindo os mesmos erros e fechando a participação na Copa com recordes negativos: foi a primeira vez na sua história que o Brasil levou sete gols num jogo, sofreu o maior número de gols na história em Copas do Mundo, teve o pior aproveitamento desde 1974.

Foi uma despedida melancólica, no dia em que o governo federal divulgou que a Copa do Mundo aumentou em 132% o número de turistas no Brasil.

A dimensão do vexame foi maior ainda.

Capas de jornais do Brasil e do mundo sobre a goleada da Alemanha sobre o Brasil

O Estado de Minas - Belo Horizonte O Estado de S. Paulo - São Paulo

Meia Hora - Rio de Janeiro Olé - Argentina

A Tarde - Salvador Sport - Espanha

Correio Brasiliense - Brasília Marca - Espanha Diário de Pernambuco - Recife Mundo Deportivo - Espanha

Corriere Dello Sport - Itália O Dia - Rio de Janeiro

O Globo - Rio de Janeiro O Povo - Fortaleza

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2018 – Rússia

Cartaz oficial da Copa de 2018

A Rússia foi escolhida como sede da Copa do Mundo de 2018 no dia 02 de dezembro de 2010. O início do processo de escolha e apresentação das candidaturas aconteceu em janeiro de 2009.

A Inglaterra também se apresentou como candidata, além de duas candidaturas binacionais. De um lado Espanha e Portugal e de outro Bélgica e Holanda. Estados Unidos e México também manifestaram interesse, mas os mexicanos foram prejudicados pela situação econômica do país que não suportava a realização de um mundial.

Na votação final a Rússia conseguiu 13 votos. Em segundo lugar ficou Espanha e Portugal com sete votos, seguidos de Bélgica e Holanda com dois. A Inglaterra foi eliminada já na primeira votação.

Eleição de Gianni Infantino na Fifa

A Fifa apresentava-se sob uma nova realidade. Os anos que antecederam o mundial da Rússia foram de renovação para a entidade que dirige o futebol no mundo. Acusado de desvio de dinheiro da entidade e crimes financeiros, o suíço Joseph Blatter foi afastado do cargo em 2015. No início de 2016, o italiano Gianni Infantino assumiu a presidência da entidade, sinalizando novos tempos para a Fifa. Um de seus projetos é aumentar o número de seleções na fase final da Copa do Mundo.

Depois de organizar o evento no Brasil, num país com dimensões continentais, a Fifa tinha novamente esse desafio. A Rússia é um país com mais de 17 milhões de km quadrados e nove fusos horários, dados que dão plena dimensão da grandiosidade e complexidade da organização.

Mapa da Rússia

Foram escolhidas onze cidades para receber os jogos do mundial: Moscou, Kaliningrado, Kazan, Ecaterimburgo, Nijni Novgorod, Rostov, São Petersburgo, Samara, Saransk, Sochi e Volgogrado.

Quase todas as arenas foram construídas para receber o mundial. Sochi aproveitou-se da infraestrutura dos jogos Olímpicos de Inverno, realizado em 2016. Moscou contou com dois estádios. O mais antigo, Lujnik, construído em 1956 e reformado para a Copa, numa obra que custou algo em torno de R$ 1,7 bilhão, tinha capacidade para 80 mil pessoas e foi palco da abertura e da final. O outro foi o estádio do Spartak, inaugurado em 2014.

Os russos receberam o evento com alegria e aproveitaram para transmitir uma boa imagem do país, com cordialidade, tecnologia e excelentes arenas. A população do país esperou a Copa desconfiada de sua seleção pelos péssimos amistosos pré-Copa. A surpreendente boa campanha da Rússia, desclassificada apenas nas quartas de final para a Croácia, aumentou a simbiose do torneio com os torcedores locais.

O mascote escolhido foi o lobo Zabivara, anunciado em 22 de outubro de 2016, depois de uma votação pela internet, que reuniu mais de um milhão de pessoas, comandada por um programa de TV da Rússia. O nome do mascote significa “aquele que marca”. Zabivaka, mascote de 2018

Harry Kane, atacante da Inglaterra foi o artilheiro da Copa com seis gols. Foi a segunda vez que um jogador inglês foi o artilheiro da Copa. O primeiro foi Lineker, em 1986. O croata Modric ganhou o troféu de melhor jogador do torneio, enquanto que o francês Mbappé, de apenas 19 anos, foi considerado a revelação.

Mbappé foi o jogador mais jovem, desde Pelé, a fazer dois gols em um jogo de mata-mata em Copa, o que aconteceu contra a Argentina, na vitória francesa por 4 a 3 nas oitavas de final. Deixou sua marca na final, fazendo um dos gols dos 4 a 2 na Croácia.

Mbappé contra a Argentina

O mundial da Rússia ofereceu novos protagonistas ao mundo do futebol, como Croácia e Bélgica, resgatou a Inglaterra e solidificou a França como uma das grandes forças.

Na Copa do Mundo que sentiu a ausência de Itália e Holanda, que nem conseguiram uma vaga entre as 32 seleções, outras equipes decepcionaram, como a Alemanha, eliminada na primeira fase num grupo com Coreia do Sul, Suécia e México. Os então campeões mundiais protagonizaram um dos melhores jogos da primeira fase, quando conseguiram virar o jogo por 2 a 1 em cima da Suécia, no último minuto numa falta cobrada por Kroos, adiando a desclassificação que poderia ter acontecido já no seu segundo jogo na Copa.

Kroos cobra a falta, faz o gol e mantém a Alemanha na Copa. Alegria passageira

A Espanha foi outra seleção que decepcionou. Mesmo antes da Copa a Real Federação Espanhola já sinalizava que o mundial da Fúria poderia ser um fiasco.

Anunciado como novo técnico do Real Madri, Julen Lopetegui foi demitido do comando espanhol a um dia da abertura da Copa do Mundo e a dois da estreia da Espanha contra Portugal. O presidente da Federação Espanhola, Luis Rubiales, alegou que não poderia ter ficado à margem da negociação do seu treinador com o Real Madrid.

O ex-jogador do Real Madrid e da seleção espanhola, Fernando Hierro, que atuava como diretor de Futebol da Federação da Espanha, comandou a equipe na Copa. Os espanhóis fizeram uma grande partida contra Portugal, empate em 3 a 3, mas não conseguiram passar pela Rússia, nas oitavas de final, sendo eliminados nos pênaltis.

Cristiano Ronaldo contra a Espanha

O confronto entre Portugal e Espanha, um dos melhores em nível técnico da primeira fase, teve na atuação do atacante Cristiano Ronaldo o grande destaque. Considerado pela Fifa como o melhor jogador do mundo, o português foi o autor dos três gols da sua equipe nessa partida. Ainda fez mais um contra o Marrocos e teve atuação decisiva para conseguir levar Portugal até as oitavas, quando foi eliminado pelo Uruguai. Outro “melhor do mundo”, o argentino Messi, não teve um bom mundial e sucumbiu ante à desorganização da AFA (Associação de Futebol da Argentina), que comanda os destinos do futebol naquele país.

Messi bate para fazer o gol contra a Nigéria

O técnico não conseguiu organizar a equipe, totalmente dependente do futebol de Messi, prejudicado pela falta de “diálogo” com seus companheiros, como analisou a própria imprensa argentina durante o mundial.

O meia do Barcelona fez um gol na Copa, justamente na partida contra a Nigéria, que poderia eliminar a Argentina ainda na primeira fase, depois de empate contra a Islândia e da derrota por 3 a 0 frente à surpreendente e organizada Croácia. A vitória por 2 a 1, com o gol de Rojo, nos minutos finais, apenas adiou a desclassificação para a próxima partida, contra a França pelas oitavas de final.

Salah contra Sérgio Ramos na final da Champions League

Lamento do futebol também foi a condição física precária em que o atacante egípcio Mohammed Salah jogou o mundial. Vinte dias antes da Copa, jogando a final da Champions League pelo Liverpool contra o Real Madrid, em Kiev na Ucrânia, Salah sofreu uma contusão no ombro numa disputa com o espanhol Sérgio Ramos, que o impediu de finalizar a preparação com o Egito para a Copa.

Considerado o grande fenômeno do futebol europeu naquele momento, Salah ficou fora da estreia contra os uruguaios e marcou dois gols, contra a Rússia e Arábia Saudita, mas não conseguiu levar sua seleção para as oitavas. A campanha da França no seu bicampeonato mundial foi crescente. No início foi considerada uma pequena decepção pela falta de consistência no seu futebol contra a Austrália, Peru e Dinamarca, mesmo assim conseguiu a classificação como líder do grupo.

Técnico francês Didier Deschamps

O técnico Didier Deschamps, que se igualou a Franz Beckenbauer e Zagallo como campeão mundial como jogador e técnico, efetivou uma mudança decisiva na forma da equipe atuar, apostando no atacante Giroud como homem de referência e oferecendo mais liberdade para as jogadas dos craques Mbappé e Griezmann. A França cresceu muito e ganhou de Argentina, Uruguai, Bélgica e Croácia praticamente sem grandes sustos.

Modric, o melhor jogador da Copa

A Croácia, adversária da França na final, foi equilibrada durante todo o torneio e teve que superar os adversários e o cansaço que se acumulava depois de cada partida, já que teve prorrogação em todos os jogos antes da grande final. Mesmo assim, conseguiu desenvolver uma forma de jogo orquestrada pela categoria de Modric, que teve como parceiros importantes Rakitic, Perisic e Mandzukic, além do goleiro Subasic, que defendeu quatro cobranças de pênaltis na Copa, igualando o recorde do argentino Sérgio Goycochea, em 1990.

Confirmação mesmo foi da geração talentosa da Bélgica. Liderada por Hazard, com De Bruyne, Mertens, Lukaku, Curtois, Felaini e Kompany, o time chegou à terceira colocação, a melhor da história dos belgas em todos os tempos. Numa partida excelente, a Bélgica eliminou a seleção brasileira com merecimento.

Hazard, craque da Bélgica

Capítulo à parte no mundial da Rússia foi a implantação do VAR (Video Assistant Referee), o árbitro assistente de vídeo, numa tentativa, coroada de êxito, de diminuir os erros de arbitragem, que nos últimos anos estão sendo evidenciados, principalmente pela evolução tecnológica. Em 2010 a Fifa tinha implantado a bola com “chip”, que acionado indica no relógio do árbitro cada vez que a linha do gol é ultrapassada.

O VAR foi utilizado pela primeira vez na história das Copas no jogo entre França e Austrália, em 16 de junho, quando o árbitro uruguaio Andres Cunha paralisou a partida para consultar o vídeo, à beira do gramado, e confirmar um pênalti para a França, convertido por Griezmann, aos 12 minutos do segundo tempo.

"O Estado de S. Paulo" de 17.06.2018 no momento histórico da utilização do VAR

Ainda nessa partida, a vitória francesa foi confirmada também com o auxílio da tecnologia, já que o chip da bola acionou o relógio do árbitro informando que a bola dividida entre o francês Pogba e o australiano Behich havia entrado depois de bater no travessão.

No final da Copa, a Fifa anunciou que o índice de acerto das decisões da arbitragem foi de 99,3% e que sem o VAR o número cairia para 95,7%. Na partida final da Copa o VAR também auxiliou a marcação de um pênalti em favor da França. O árbitro argentino Nestor Pitana foi avisado pelos auxiliares de vídeo, que permaneciam na sede da Fifa em Moscou, portanto fora de todos os estádios, que deveria consultar o vídeo sobre o lance que originou o pênalti, posteriormente confirmado.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Erros, mais erros e muitos erros, todos eles recheados por uma enorme omissão. Esse foi o cenário da preparação da seleção brasileira para a Copa do Mundo de 2018.

O desastre da goleada por 7 a 1 para a Alemanha, na semifinal de 2014, acompanhou a seleção brasileira em todo o ciclo. Não poderia ser diferente. O que deveria ter sido diferente era os fins de utilização da vergonha da última Copa.

Em nenhum momento a CBF utilizou a fragilidade em que o futebol brasileiro se encontrava para propor qualquer atitude nova, de superação, de novo cenário e organização diferente. Muito pelo contrário. A goleada era sempre utilizada para justificar erros, mais erros e a omissão gritante de dirigentes descompromissados com o futebol.

O primeiro grande erro, fruto da omissão e do desejo de ter um anteparo às críticas, aconteceu logo depois da Copa. Apenas 14 dias após a goleada para a Alemanha, a CBF apresentou o técnico Dunga como o comandante para 2018. Junto com ele, iniciavam a trajetória na CBF o coordenador de seleções, Gilmar Rinaldi, ex-empresário credenciado pela Fifa.

Apresentação de Dunga em julho de 2014

Dunga viveu o ciclo para a Copa de 2010 e colecionou polêmicas e desafetos, principalmente junto à Rede Globo, detentora dos direitos de transmissão dos jogos da seleção brasileira.

Na coletiva de apresentação de Dunga, rejeitado por 80% dos torcedores brasileiros, em 22 de julho de 2014, o então presidente da CBF, José Maria Marin, perguntado se os jornalistas estavam diante do técnico de 2018, disse que esse era o objetivo e que tudo havia sido bastante conversado entre ele, o futuro presidente da CBF, Marco Polo Del Nero e o coordenador Rinaldi. “O Dunga ouviu atentamente nosso projeto que se estende até 2018, numa continuidade”, disse Marin.

Naquele momento, a intenção do dirigente era colocar outro alvo para as críticas da imprensa, nada melhor do que um desafeto dos jornalistas, em especial da Rede Globo. As críticas mudaram de destino. Prova disso é que a falada “continuidade” jamais existiu. Nem Marin continuou presidente e muito menos Marco Polo Del Nero. Marin foi preso e Del Nero afastado das funções. Os dois respondem a processos criminais.

Depois de duas desclassificações que resvalaram em vexames em edições de Copa América (2015 no Chile e 2016 – centenário da competição – nos Estados Unidos), e sétimo lugar nas eliminatórias da Copa após seis rodadas, Dunga também deixou a seleção.

Justamente na metade do ciclo para a Copa da Rússia, com as eliminatórias em andamento, Adenor Bachi, o , favorito da ampla maioria dos torcedores e jornalistas do Brasil, assume o comando técnico da seleção brasileira ante uma CBF totalmente fragilizada, mas ainda sob comando de um enfraquecido Del Nero, a quem o treinador criticava, mas que ofereceu um beijo durante a sua apresentação na sede da CBF. Em novembro de 2015, Tite assinou um documento intitulado “Por Uma Nova CBF” que pedia, entre outras ações, a renúncia do presidente Del Nero e de toda a sua diretoria. Em junho de 2016, Tite era o técnico desses dirigentes.

Tite recebe uma camisa da seleção com o nome da sua mãe e beija Del Nero, aquele que o treinador queria fora da CBF

Indagado sobre essa situação, na coletiva de apresentação em 20 de junho de 2016, o treinador saiu pela tangente e disse que a sua atividade seria ser técnico da seleção brasileira. “Entendo que essa é a minha contribuição ao futebol brasileiro”, disse.

A estreia do treinador foi em 01 de setembro daquele ano, contra o Equador, no estádio Atahualpa, em Quito, quando a seleção venceu por 3 a 0 com gols de (2) e Neymar. Estava inaugurado um ciclo de vitórias em nível continental e que, mais para frente, se provaria enganoso dada à fragilidade dos adversários sul-americanos e o péssimo planejamento da comissão técnica brasileira, que se esquivou de enfrentar as grandes seleções do mundo, preferindo amistosos contra times fracos ou medianos.

Chamada de "O Estado de S. Paulo" de 02.09.2016 sobre a estreia de Tite

O brasileiro não aguardou com ansiedade a Copa do Mundo. Os graves problemas políticos do país, a crise econômica, greve de caminhoneiros e a polarização ideológica entre esquerda e direita tiraram a atenção do torcedor comum, minando a maior expectativa sobre o evento, que sempre teve tamanho significado para todos os brasileiros.

Contribuiu para isso uma preparação insípida, sem emoção e qualquer empatia com o torcedor por parte da seleção brasileira, que sequer realizou um amistoso de despedida do Brasil, algo impensável em tempos anteriores. Uma seleção sem

Primeira página de "O Estado de S. Paulo" em 14.06.2018 pergunta se a Copa iria pegar identificação com o torcedor, mas que tinha bom conceito junto à opinião pública pelos resultados, jamais pelo futebol efetivamente praticado.

Em toda a história de Copa do Mundo, jamais uma seleção brasileira chegou ao mundial com o respaldo da imprensa como a de 2018. Jornalistas que cobriam a seleção brasileira não levantavam um problema sequer, apesar de eles existirem. Nem as seguidas contusões foram questionadas, assim como uma convocação que não privilegiava o real momento técnico e físico de alguns jogadores. O próprio técnico Tite justificava algumas convocações pelos “serviços prestados” à seleção desde as eliminatórias, desfocando do fato de não estarem na melhor forma, casos de , Fred, Fagner, Cássio, Douglas Costa, Neymar e Danilo, além de Daniel Alves, que sofreu uma cirurgia no joelho antes do torneio.

Neymar é um capítulo à parte. Para entender o fracasso de sua Copa do Mundo é preciso retornar para um ano antes do mundial, quando o jogador deixou o Barcelona, clube que tinha acabado de renovar seu contrato, para uma aventura no PSG da França, onde mirava a conquista da Champions League como grande protagonista e tornar-se o “bola de ouro”, o melhor jogador do mundo. Entendia o PSG como um clube à sua disposição. E de seus caprichos. O choque de realidade para os franceses aconteceu diante do Real Madrid, nas oitavas de final, com duas derrotas e a eliminação do torneio.

Antes mesmo do segundo jogo contra os espanhóis, uma fissura no quinto metatarso do pé direito, atuando pelo PSG no Campeonato Francês contra o Olympique de Marselha, em 25 de fevereiro, tirou Neymar dos gramados até as proximidades da Copa do Mundo. O jogador teve que se submeter a uma cirurgia para a colocação de um pino no local.

A badalada recuperação de Neymar teve de tudo. Fotos com a namorada atriz em momentos que pareciam de férias, jogos de pôquer, aniversário da irmã, eventos diversos, presença em vários programas da Rede Globo.

Neymar e a namorada na badalada "recuperação" da cirurgia

Na apresentação da seleção na Granja Comary, em Teresópolis, em 21 de maio, a comissão técnica realizou um pequeno trabalho de recondicionamento físico de Neymar. Tentou aproveitar o tempo restante até a Copa. O estado psicológico e o amadurecimento daquele que ainda era chamado de “menino Ney” parecem ter ficado de lado, principalmente o fato de estar longe dos gramados e ter a responsabilidade de vestir a camisa 10 da seleção brasileira, a mais importante e emblemática do futebol, justamente numa Copa do Mundo.

"O Estado de S. Paulo" no dia da estreia do Brasil

A seleção brasileira estreou no domingo dia 17 de junho, em Rostov, contra a Suíça. Justamente no dia em que o Ministério da Saúde divulgava uma pesquisa que a obesidade atingia um em cada cinco brasileiros, o time de Tite deixava de ter a “gordura” para queimar na primeira fase. O empate em 1 a 1 contra os suíços obrigava a seleção a não tropeçar mais na Copa.

Vários problemas e falhas foram evidenciadas logo no primeiro jogo, mas a incrível subserviência da imprensa brasileira e o pragmatismo misturado com soberba do técnico Tite contribuíram para serem encobertos. Inexplicavelmente escondidos.

Contra a Suíça começava o "show" de Neymar Gol da Suíça, reclamação brasileira

O primeiro dos problemas foi a situação de Neymar, uma máquina de simulação de faltas e rebeldia dentro de campo. Individualista, com falta de ritmo de jogo, seria necessária uma intervenção da comissão técnica para mudar o comportamento e o próprio desempenho técnico. A história mostra que isso jamais ocorreu. A opção foi criticar os raríssimos críticos brasileiros e a reação da grande maioria da opinião pública mundial.

A grande falha era de posicionamento da defesa brasileira e da fragilidade técnica do goleiro Alisson. O erro do sistema defensivo no gol de empate da Suíça, anotado por Zuber, foi evidente. A imprensa e a comissão técnica preferiram criticar o correto árbitro César Ramos. Queriam que o VAR fosse acionado numa falta, inexistente, no zagueiro Miranda. Mais uma vez a opção era para esconder os erros, preservar Tite e a comissão técnica.

A segunda partida aconteceu em 22 de junho, em São Petersburgo, com vitória por 2 a 0 diante de uma fraca Costa Rica. Mais uma oportunidade de correção de rumo que a seleção deixou passar.

Neymar simula pênalti contra a Costa Rica

No confronto contra os costarriquenhos o mundo presenciou algo inusitado. A mítica camisa 10 da seleção brasileira começava a se tornar chacota mundial devido às patéticas e inconsequentes simulações de Neymar.

Num lance com o defensor Gonzáles, Neymar simula um pênalti e o árbitro holandês Bjorn Kuipers, assinala a infração. Imediatamente o VAR chama o árbitro que revê o lance e marca a simulação do brasileiro. Logo depois Neymar xinga adversários e o próprio árbitro, numa clara demonstração de destempero e despreparo para estar onde estava e ser quem pensava que era.

O "choro" de Neymar. A fraca atuação do ator foi reduzida por Marcelo

A vitória com gols de Phillipe Coutinho e do próprio Neymar, ambos já nos acréscimos, mais uma vez mascara a realidade e Tite perde mais uma oportunidade para deixar de ser omisso e tentar corrigir o rumo. No final da partida mais um lance midiático e sem qualquer sentido. Neymar decide chorar na frente das câmeras, senta no meio de campo e só não atua ainda mais por causa do lateral Marcelo, que o retira de cena. Na entrada do vestiário mais xingamentos ao árbitro.

Teatro em São Paulo durante a Copa

O paulistano que quisesse mais um show de atuação, dessa vez feita por profissionais especializados, poderia ir até o teatro Procópio Ferreira. Era um bom programa para a sexta-feira à noite assistir à peça “Os Produtores”, com Miguel Falabella, Danielle Winits e Marco Luque. A Copa começava a chamar a atenção do Brasil e dos brasileiros. Na estação comandante Ferraz, base da Marinha na Antártida, 15 militares brasileiros acompanharam a partida graças a uma antena de internet instalada na Ilha do Rei George, a 130 km da península Antártica.

O Brasil apresentou contra a Sérvia, na vitória por 2 a 0 em 27 de junho, em Moscou, um Neymar pelo menos “domesticado”. Sem simular uma falta sequer, o jogador esteve abaixo do seu poderio técnico, mas contribuiu de maneira positiva para a boa vitória do time do técnico Tite. Os gols foram de Paulinho e Thiago Silva. Marcelo, contundido na coluna, segundo a comissão médica da seleção por causa do colchão do hotel, não teve a ausência sentida. Filipe Luis, que entrou logo no começo do jogo, deu conta do recado e conseguiu evitar cruzamentos para a área brasileira.

O confronto com o México pelas oitavas de final, mais uma vez escancarou o grave problema que Neymar representava para a seleção e a inexplicável inoperância da comissão técnica.

O "pisão" em Neymar

Jogo fácil, tranquilo e Neymar consegue virar piada mundial. Num lance isolado com Miguel Layún, sem qualquer justificativa, o jogador brasileiro simula uma agressão num pisão do mexicano. O próprio Layún admitiu que pisou “de leve” no brasileiro, mas que não entendeu a reação extremada de Neymar.

O mundo se divertiu com Neymar rolando em campo. Sua reputação e conceitos foram juntos, rolaram ladeira abaixo. A imprensa mundial não perdoou e ridicularizou o jogador. Neymar tornou-se sinônimo de quedas e reviravoltas no chão. Crianças, jovens, adultos e idosos brincaram na internet pelo mundo afora.

Na coletiva, o técnico Tite assinou embaixo tudo o que Neymar fez em campo, numa atitude gravíssima de omissão e submissão que, com certeza, acabava respingando na sua liderança junto aos demais jogadores.

O técnico do México, Juan Carlos Osório, fez sérias críticas ao brasileiro e utilizou-se, inclusive, de expressões do próprio Tite em 2012, quando disse que Neymar simulava faltas jogando pelo Santos e isso não era exemplo para seu filho, fato que ele próprio, depois, fez questão de... negar!!! Osório disse: “Neymar fica de palhaçada. É um péssimo exemplo para os jovens”, enquanto a imprensa brasileira era uma “decepção” por ter criticado Neymar e que sua fala era o “choro dos perdedores”.

Neymar Challenge no México

Meme na França

Crianças rolam no chão na Espanha Meme das simulações, o "alfabeto Neymar"

Antes da partida da seleção brasileira pelas quartas de final da Copa, o mundo foi informado que um mergulhador tailandês morreu na tentativa de salvar 13 pessoas, sendo 12 meninos e um adulto, integrantes de do time de futebol da Tailândia “Javali Selvagem”, que estavam presos numa caverna na província de Chiang Rai.

"O Estado de S. Paulo" em 06.07.2018 O mergulhador Saman Kunan não era mais oficial da Marinha tailandesa, mas se juntou ao grupo como voluntário na tentativa de resgatar as crianças e o treinador da caverna.

As crianças treinavam futebol nas proximidades da caverna Tham Luang. No dia 23 de junho decidiram entrar na caverna por curiosidade. A intenção era sair rapidamente porque tinham uma festa de aniversário.

A surpresa foi que a água subiu rapidamente no interior da caverna, o que provocou que o grupo entrasse cada vez mais para dentro. Houve também uma inundação subterrânea o que impediu a saída do local.

No dia 02 de julho, os mergulhadores ingleses Rick Santon e John Volanthen chegaram ao local onde o grupo estava abrigado.

Uma grande operação foi iniciada no dia 08 de julho para o resgate das doze crianças e do treinador. Foram envolvidos 90 mergulhadores, sendo 50 tailandeses e 40 voluntários de outros países. Ao todo mais de mil pessoas fizeram parte das equipes de salvamento, que exigiu uma estratégia espetacular e que foi concluído no dia 10 de julho.

Todos foram resgatados com vida e apesar de terem permanecido 9 dias sem comida, até serem localizados, e 17 dias no total dentro da caverna, o estado de saúde estava preservado.

O treinador da equipe, Ekkapol Chantawong, utilizou técnicas de meditação para que as crianças conseguissem superar os dias de agonia e fome. Ele explicou que o grupo tinha curiosidade de visitar a caverna e que nada havia sido programado.

"O Estado de S. Paulo" em 07.07.2018

Na sexta-feira, 06 de julho, em Kazan, a seleção brasileira ficou diante de uma dura realidade contra a Bélgica e sua talentosa geração. Era a realidade de um time de uma nota só, sem variedade de jogo, sem opções no banco de reservas, retrato do pragmatismo injustificável e das péssimas escolhas do seu treinador. A Bélgica, que para a subserviente imprensa brasileira não tinha a altura do Brasil, passeou em campo. Fez 2 a 0 no primeiro tempo e ainda poderia ter feito mais. Tite não conseguiu oferecer uma resposta para a surpresa que era Lukaku como o jogador que puxava os contra-ataques, caindo pelos lados do campo.

A seleção ainda teve chances de empatar o jogo. Renato Augusto fez um e poderia ter feito o gol do empate. Neymar, sumido da partida, ainda obrigou Curtois a uma defesa espetacular, mas a qualidade como time de futebol era desproporcional. A Bélgica era muito bem treinada, a seleção brasileira não conseguia responder às surpresas táticas belgas.

Terminava a Copa do Mundo para o Brasil. Terminava uma Copa fácil para a seleção ganhar, onde os principais adversários estavam eliminados ou não apresentavam grande poderio. Não havia equipe imbatível. Terminava a Copa que era para ser de Neymar, um torneio em que Cristiano Ronaldo e Messi foram desclassificados nas oitavas de final, abrindo caminho para o brilho do brasileiro.

Nesse livro tem histórias de superação, de grandes vitórias, de sofridas derrotas durante todas as Copas do Mundo. O futebol tem espaço para erros, para superações, para questões que escapam do nosso entendimento, como a sorte, aquela bola que iria entrar e bateu na trave, para uma avaliação errada de um árbitro.

O futebol tem espaço para quase tudo, menos para a omissão. O futebol não perdoa a falta de atitude, a conivência com o erro. Isso é fatal. Foi fatal ao longo do tempo. Foi fatal para a seleção brasileira e para a ilusão criada no entorno do técnico Tite.

A história das Copas continua. A próxima será contada do Catar. Há muito tempo para corrigir os erros, tirar a fantasia, entender a realidade, olhar para sua história, dignificar e valorizar o futebol genuinamente brasileiro.

Há tempo para recuperar um talento e ver nascer outros.

Melhor assim.

"O Estado de S. Paulo" em 16.07.2018 com a França campeã do mundo Fontes de pesquisa

Fifa ESPN Internacional

UEFA Esporte Interativo

CBF Rede Globo de Televisão

Jornal O Estado de S. Paulo Record TV

Jornal Folha de S. Paulo TV Bandeirantes

Jornal O Globo Sportv

Jornal do Brasil Fox Sports

Jornal Comércio do Recife TV Tea Y Deportea (Espanha)

Jornal Tribuna do Ceará Rádio Jovem Pan

Jornal Diário do Grande ABC Youtube

Jornal Zero Hora (Porto Alegre) Portal G1

Jornal L´Equipe (França) Manchester United Brasil

Jornal Mundo Deportivo (Espanha) RSSSBrasil.com

Jornal Marca (Espanha) Rare Historial Fotos

Jornal Sport (Espanha) Copacabanarunners.com

Jornal El Mercúrio (Chile) Junny.wordpress.com

Jornal La Gazzeta Dello Sport (Itália) Lostiempos.com

Jornal Corriere Dello Sport (Itália) Jogosdaseleçãobrasileira.wordpress.com

Jornal El Gráfico (Chile) Site Futpedia

Jornal Diário de Morelos (México) Site FutRio

Jornal Stampa Sera (Itália) Seuhistory.com

Jornal Diário do Nordeste Rarefoot.com

Revista Placar Acervo da Bola

Jornal Lance Biografias.netsaber.com.br

Jornal A Gazeta Esportiva Futebolvocêsabia.com.br

UOL Esporte Fichadojogo.wordpress.com

Portal Terra Martiresargentinos.blogspot.com.br

Agência Brasil – EBC Politize.com.br

Globo Esporte Mantosdofutebol.com.br

ESPN Brasil Significados.com.br Suapesquisa.com

Srcarirriemnoticias.blogspot.com.br

Arquivosmundiais.com.br

Campeõesdofutebol.com.br

Vagalume.com.br

Wikipedia