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O início de uma história: o surgimento do G1 Campinas1

FABBRI JR., Duílio (Mestre)2 PUC-Campinas, Campinas, SP

ORMANEZE, Fabiano (Mestre)3 PUC-Campinas, Campinas, SP

Resumo: Este trabalho apresenta, a partir de pesquisa bibliográfica e também por meio do relato da experiência de um dos autores como gestor, uma retrospectiva histórica do G1 Campinas, portal de notícias ligado ao grupo EPTV Campinas. A história do portal, hoje com a maior quantidade de page views entre todas as afiliadas da Rede Globo de Televisão, começou em 2012, depois de outras experiências da afiliada, que, desde 2000, mantém produtos em ambiente digital. A transformação em G1 fez parte de uma estratégia nacional da Rede Globo, intitulada Projeto G1, que começou a ser implantada em 2010. Ao longo dos 15 anos de conteúdo na web produzido pelo Grupo EPTV, diversos formatos foram testados – com maior ou menor ligação com o jornalismo e o entretenimento, ora mais livres dos modelos propostos pela emissora- mãe, ora mais padronizados, como é o formato atual. Nesse sentido, destacam-se como os modelos de gestão empregados e sua relação com os demais produtos da rede foram importantes na definição de coberturas, na atuação social e na definição da linha editorial do veículo.

Palavras-chave: G1 Campinas; webjornalismo; linha editorial.

Introdução A história do jornalismo brasileiro na internet completa 20 anos em 2015 e, na compreensão da maioria dos especialistas, essa trajetória já passou por três fases distintas, encontrando-se agora numa quarta etapa de sua rápida evolução e transformação, principalmente se comparada ao desenvolvimento de outros veículos, como os jornais impressos, a televisão e o rádio, para os quais as mudanças foram muito mais lentas e consumiram décadas. Embora considera-se aqui como início para essa trajetória de duas décadas a

1 Trabalho apresentado no GT de História da Mídia Digital, integrante do 10º Encontro Nacional de História da Mídia, 2015.

2 Jornalista. Mestre pela Faculdade Cásper Líbero. Professor da PUC-Campinas, nos cursos de Jornalismo e de Design Digital, do qual é também diretor. E-mail: [email protected].

3 Jornalista. Mestre pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professor da PUC-Campinas, nos cursos de Jornalismo e de Relações Públicas. E-mail: [email protected].

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criação do site do Jornal do Brasil, lançado em 28 de maio de 1995, Palácios e Gonçalves (1994) relatam que as primeiras experiências brasileiras de publicação de conteúdo noticioso via computador foram feitas pela Agência Estado, em meados dos anos 80, como parte do projeto Notícias do Futuro, do Massachussets Institute of Technology (MIT)4. Interessante é notar que, mesmo detentor de maior tecnologia e de centros de pesquisa na área, os meios de comunicação dos Estados Unidos entram para o espaço virtual mais ou menos no mesmo período. Gonçalves (1996) lembra que, nos Estados Unidos, a ocupação do ciberespaço pelo jornalismo toma corpo por meio da publicação de periódicos como o San José Mercury (http://www.sjmercury.com), “que ocorre desde 1993” (p. 4). Ainda segundo o mesmo autor, o tradicional (http://www.nytimes.com), estreou na internet no começo de fevereiro de 1996. Como se percebe nesse momento ocorrido nos EUA – e também no Brasil –, nessa primeira fase, o jornalismo de internet, se é que já se podia ser assim denominado, marca-se pela implantação de sites ligados a jornais impressos. Esse processo, em parte, é fruto de uma dinâmica que, desde meados dos anos 1970, preconizava um possível fim dos veículos impressos, levando os jornais a buscar adaptações e saídas. Em meados dos anos 1990, os jornais impressos, ao criarem seus canais online, restringiam-se a fazer uma simples reprodução dos conteúdos publicados em outras mídias. Assim, esses veículos, simplesmente, publicavam em seus sites os mesmos textos, muitas vezes, sendo possível apenas a visualização das edições impressas e, posteriormente, o download de seus arquivos. Esse caminho, iniciado pelo Jornal do Brasil, foi continuado, nos meses seguintes, pelo Estado de S. Paulo, Folha, , O Estado de Minas, Zero Hora, Diário de Pernambuco e Diário do Nordeste. A entrada da Folha de S. Paulo na internet, em 9 de junho de 1995, significa uma inovação para esse período já que a empresa da família Frias se intitula “o primeiro jornal em tempo real na internet [no Brasil]”. Esse serviço

4 O MIT mantém, desde 1985, o Media Lab, destinado à pesquisa na área de tecnologias da informação. Atualmente, de acordo com o site da instituição, são executadas cerca de 350 pesquisas, que envolvem as mais diversas áreas de aplicação das evoluções tecnológicas, desde a comunicação jornalística, até acessibilidade, jogos e automobilismo. O projeto Notícias do Futuro foi desenvolvido na segunda metade da década de 1980, com o intuito de antecipar tendências e promover pesquisas sobre as novas tecnologias aplicadas às empresas de comunicação jornalística. Para mais informações, sugerimos consulta a www.media.mit.edu/about. 2

noticioso, que envolvia profissionais da Folha e da Agência Folha, incluía somente o noticiário das editorias de Informática e Ciência, além da coluna semanal NetVox e informações institucionais. Nos dias úteis, a média de textos colocados no ar era de apenas sete (FREITAS, 1999). Nos primeiros tempos, alguns jornais, como o Estado de Minas e o Zero Hora, tinham sequer atualizações diárias (GONÇALVES, 1996). Em geral, nos periódicos gaúcho e mineiro, a atualização num primeiro momento era feita semanalmente. Em 1997, foi a vez das revistas, cujo caminho no mundo digital, no Brasil, começou a ser percorrido pela Veja, da Editora Abril, em junho daquele ano. A segunda fase da história do jornalismo na internet no Brasil corresponde a aproximadamente aos cinco primeiros anos do século 21, quando as empresas de comunicação começaram a destinar investimentos e equipes para uma produção exclusiva para a internet, diferenciando-se dos outros produtos, mas também publicando aquilo que era destaque nas outras mídias do mesmo grupo: Cinco anos após o surgimento dos primeiros jornais online, as grandes empresas de comunicação decidiriam investir capital nos veículos e efetivamente produzir conteúdo específico para este canal. Assim, jornais como o Estadão Online, a Folha Online e a revista Veja passam a destinar espaços às notícias em tempo real voltadas exclusivamente para o público internauta. O ano de 2000 seria marcado também pela criação do primeiro jornal exclusivamente online. O provedor de acesso à internet iG (Internet Grátis) lançou o jornal Último Segundo, que contaria com notícias produzidas por agências de informações e reportagens produzidas por uma redação própria. O sucesso do novo empreendimento seria imediato. Até junho de 2002, segundo monitoramento da empresa de consultoria Media Metrix, o Último Segundo era o jornal online de maior audiência. (PEREIRA, 2002)

É nesse momento da história que a Rede Globo também vai entrar para a plataforma digital. Embora o jornal O Globo já mantivesse, desde 1996, seu site com notícias vindas do impresso, foi em 2000 que o conglomerado lançou-se à internet como negócio, implantando um produto exclusivo para a web: a Globo.com5. A empresa define-se da seguinte forma em seu site:

Globo.com opera as plataformas digitais do . A empresa, de capital nacional, foi criada no ano 2000 para reunir e distribuir todo

5 Como empresa do conglomerado, a Globo.com possui, atualmente, 500 mil assinantes, além de hospedar quase 700 sites e afiliados. De acordo com dados do medidor Alexa, é 6º site mais acessado do Brasil, e o 112º no mundo. Disponível em: http://www.alexa.com/siteinfo/globo.com. Acesso em: 20 abr. 2015. 3

o conteúdo digital do Grupo. Hoje, a empresa atua como provedora de serviços tecnológicos e plataformas web para o Grupo Globo, além de servir como suporte estratégico no planejamento de Internet. (GLOBO.COM, 2015)6

Ainda no ano 2000, também começa a ser trilhada a história dos portais das afiliadas, como se verá mais à frente. Em agosto de 2001, as Organizações Globo lançaram o portal de notícias Globonews.com, que traria o conteúdo produzido pelos diferentes veículos (TV, rádio, jornal), mas também possuía equipe e conteúdo próprios. Essa evolução do jornalismo de internet culmina também, nesse momento, com a publicação de uma série de livros sobre redação para a web e com a criação, nos cursos superiores, de disciplinas focadas no jornalismo online. Alguns fatos curiosos, relatados à época, convém ser relembrados. Em 11 de agosto de 2002, a Folha de S. Paulo noticiava que "80% dos leitores preferem versão impressa da Folha à eletrônica”. Por mais que se possa analisar essa manchete como uma demonstração de certa e natural resistência dos impressos verificada no período à concorrência com a internet e também como tentativa bastante comum de esses veículos demonstrarem a supremacia de seus conteúdos, é notável o destaque dado às seguintes informações: Entre os que leem as duas versões [impressa e digital], 31% consideram que a maior qualidade da impressa é poder ser lida em qualquer lugar. Outras vantagens: possibilidade de visualizar o jornal todo (17%), notícias mais aprofundadas (17%), não perder tempo acessando a internet (10%) e leitura menos cansativa (7%) (apud CAVALCANTI, 2002, grifos nossos).

O argumento de que o jornal impresso podia ser lido em qualquer lugar, rapidamente, tornou-se anacrônico, uma vez que o surgimento da internet wireless, em 2003, tornou possível a leitura longe dos computadores de mesa e em dispositivos como notebooks, celulares, smarthphones e tablets. Atualmente, inclusive, a maioria dos acessos à internet no Brasil já ocorre por meio de dispositivos móveis, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A explicação de “não perder tempo acessando a internet”, da mesma forma, soaria, hoje, risível, uma vez que a maioria das ações profissionais e intelectuais atualmente prescindem do e pressupõem o acesso à rede. Com a popularização da leitura por meio de telas também é menos comum o argumento

6 Disponível em: http://www.grupoglobo.globo.com/globocom.php. Acesso em: 17 abr. 2015. 4

do cansaço visual, uma vez que, inclusive, dispositivos foram criados ou adaptados para oferecer maior conforto para a leitura. Naquele momento, também era comum – e os recém-criados livros de jornalismo online defendiam – que os textos para o internauta devessem ser menores, o que era confundido, muitas vezes, com superficialidade. Hoje, a internet já demostra que, dependendo da apuração feita, consegue ter textos até maiores em tamanho e com maior profundidade que os demais veículos, pela possibilidade de hiperlinks e pela linguagem multimídia que emprega. A terceira fase do webjornalismo corresponde ao período de interatividade, em que conteúdo é produzido em linguagem própria para a web e em que se observa a convergência de linguagens e a participação cada vez mais crescente dos internautas, por meio de comentários, divulgação do material publicado pelos sites em redes sociais digitais e a possibilidade de o próprio internauta se tornar um produtor de conteúdo e fazer as escolhas do que, como e onde quer se informar. Do ponto de vista da história dos veículos no Brasil, essa fase corresponde, por exemplo, ao surgimento do G1 – site de notícias da Globo, em 18 de setembro de 2006. A data escolhida para o lançamento foi o aniversário de 56 anos de implantação da televisão no Brasil. Numa quarta etapa dessa breve e curta história do jornalismo digital, vivencia-se atualmente uma fase de grande interatividade e do crescimento do uso de mobiles, ou seja, o acesso à internet e à informação não se dá mais apenas por meio de computadores, mas também por celulares e tablets. Isso trouxe novas demandas, como a adequação da linguagem e dos formatos, além do crescimento da interatividade. Cada vez mais, surgem aplicativos que permitem ao usuário tornar-se colaborador dos veículos, enviando vídeos, fotos e sugestões para reportagens. Nesse momento, a gestão dos conteúdos passa também, necessária e obrigatoriamente, pela representatividade das redes sociais digitais e pelo papel dos sites de buscadores (notadamente o Google) como formas de acesso às informações.

A EPTV e a inserção no webjornalismo Depois desse breve retrospecto, atemo-nos a descrever a história do G1 Campinas, foco deste trabalho. Para tanto, faz-se necessário outro breve parênteses para compreender o contexto empresarial de sua criação, ou seja, a consolidação do Grupo EPTV no Interior Paulista e no Sul de Minas Gerais. 5

A concessão para a afiliada da Rede Globo em Campinas – a primeira emissora da cidade – foi outorgada em 1979 ao empresário José Bonifácio Coutinho Nogueira (1923- 2002) que, entre as atividades da vida pública, fora, na gestão do governador Abreu Sodré (1967-1971), presidente/fundador da Fundação Padre Anchieta, a TV Cultura, de São Paulo7. Em 1° de outubro de 1979, foi inaugurada a TV Campinas que, posteriormente, adotaria simplesmente o nome de EPTV (Emissoras Pioneiras de Televisão). À época, de acordo com Bazi (2001), o sinal da emissora atingia 20 cidades. “O público de Campinas e região desconhecia o que era telejornalismo regional, pois os únicos meios que os informavam eram o rádio e o jornal impresso” (BAZI, 2001, p. 39). Em 12 de novembro de 1980, o grupo inaugurou sua segunda emissora, a TV Ribeirão, posteriormente EPTV Ribeirão. Em 8 de agosto de 1988, foi a vez de criar a TV Sul de Minas, em Varginha, e, em 1° de julho de 1989, a EPTV Central, em São Carlos. Pela importância político-econômica das regiões que cobre, em 2005, a EPTV montou uma sucursal em Brasília, para cobertura política de assuntos que impactam diretamente suas áreas de atuação. Pouco depois da inauguração da TV Sul de Minas, o nome das emissoras mudou e passou a ser Empresas Pioneiras de Televisão. Antes, a sigla EPTV designava “Empresas Paulistas de Televisão”. De acordo com o próprio grupo, a sigla “surge da identidade entre as quatro emissoras [...], sendo reconhecido o pioneirismo de cada uma delas”8. No espaço reduzido deste artigo, limitamos a apresentar informações básicas da história do grupo, uma vez que essa trajetória está detalhadamente descrita por autores como Bazi (2001), Fabbri Jr. (2006) e Carmo-Roldão (2009). A EPTV é hoje uma das maiores afiliadas da Rede Globo que, para chegar à totalidade dos municípios brasileiros, conta com 123 emissoras afiliadas. De acordo com o Atlas de Cobertura da Rede Globo, as emissoras da família Coutinho Nogueira – hoje geridas pelos filhos do fundador – são responsáveis por 300 municípios e 11 milhões de pessoas. De acordo com a Rede Globo, a área de cobertura das emissoras da EPTV representa 6% de todo o Índice de Potencial de Consumo (IPC) do País:

7 Breves informações biográficas de José Bonifácio Coutinho Nogueira estão disponíveis em: http://www.museudatv.com.br/biografias/Jose%20Bonifacio%20Coutinho%20Nogueira.htm. Acesso em: 20 abr. 2015.

8 Disponível em: http://www.viaeptv.com/institucional/emissoras/historico.aspx. Acesso em: 20 abr. 2015. 6

A estratégia mercadológica das grandes redes de televisão é penetrar no mercado nacional por meio da regionalização, por meio da produção descentralizada ou emissão de caráter regional. Nesse sentido, as redes regionais são produtoras dos meios de comunicação de massa, podendo, assim, contribuir para a construção de identidades (FABBRI JR, 2006, p. 67.

Na área de mídia, o grupo proprietário da EPTV possui, atualmente, além das quatro emissoras de TV, outras três de rádio (CBN Ribeirão, Jovem Pan Araraquara, Jovem Pan Ribeirão) e dois jornais impressos (A Cidade, de Ribeirão Preto, e Tribuna Impressa, de Araraquara). É ainda acionista, desde 2012, da Rede Bahia de Televisão, com 33% das cotas. O G1 Campinas nasce nesse contexto.

Da experiência da TV para a internet No final de 2000, numa reunião com os acionistas das então 118 afiliadas da Rede Globo e a direção da emissora, decidiu-se que, a partir daquela data, todas deveriam ter um site ou portal local na internet, atendendo ao contrato de afiliação, além de seguir o mesmo modelo do recém-criado portal Globo.com. Ainda em 2000, o grupo campineiro criou o portal EPTV.com. Nele, além de notícias produzidas pelas quatro emissoras do grupo, havia uma redação que produzia conteúdo cultural e atuava como parceira na cobertura de entretenimento com um site local, Agito9, além de blogs. Quando surgiu, o mercado jornalístico de internet em Campinas dava passos ainda muito incipientes, assim como no resto do País. Já existia na cidade o CorreioNet, site do jornal impresso Correio Popular, o principal da cidade. A empresa colocou sua página na web em 1997, seguindo o movimento dos grandes impressos do País, mas apenas como uma forma de tentar angariar leitores para o veículo impresso. Não havia material exclusivo. Para os jornais impressos, essa migração para a internet foi um processo bastante complicado, pois significou a perda de leitores, de anunciantes e da venda em banca. Desde o início, a dúvida dos veículos impressos era como manter conteúdo na internet sem tirar leitores do impresso. Para as emissoras de televisão e rádio, esse

9 O Agito Brasil é uma rede de sites regionais, criada em 1999, focada na divulgação de informações culturais, cobertura de festas, agenda e guia de estabelecimento das cidades.

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processo foi menos traumático e representou menos perda de receitas, pois, ao contrário do jornal impresso, ninguém paga para ver o noticiário de TV aberta ou ouvir rádio. Outra prova do pouco impacto é que, ainda hoje, a TV fica com a maior parte dos investimentos publicitários (cerca de 60%), de acordo com dados do jornal Meio & Mensagem, especializado em mídia. Durante dez anos, o EPTV.com seguiu o mesmo modelo de conteúdo e negócio, produzindo material próprio e reproduzindo o que era exibido pelas emissoras do Grupo EPTV. Do ponto de vista mercadológico, havia a venda de banners, patrocínios e espaços comerciais dentro do portal. Em 2010, a EPTV decidiu dividir o site em duas unidades de negócio. A primeira, mantendo o nome e criando uma área especifica para o jornalismo, e a segunda, associando-se aos proprietários do Agito, site focado no entretenimento, cultura e galerias de fotos de baladas da região. Assim, o Agito criou um sistema de afiliação próprio, para integrar sites de várias partes da área de cobertura da EPTV e que cobriam exclusivamente aquilo que passou a ser chamado de infotenimento10 por autores como Dejavite (2006). O EPTV.com ficou com a marca do jornalismo, criando um site chamado EP Notícia11, que passou a contar com sete novas redações para abastecê-lo, nas cidades de Campinas, Ribeirão Preto, São Carlos, Araraquara, Piracicaba, Franca e Varginha. Destaque-se que, além das cidades em que havia emissoras de TV, o EP Notícia, em razão da importância das localidades como estratégia de negócios, também implantou redação em Franca, na área de cobertura da EPTV Ribeirão, em Piracicaba, área da EPTV Campinas, e em Araraquara, da EPTV Central. Essa estratégia justifica-se também pela busca do chamado hiperlocalismo. Para esse conceito, recupera-se aqui a posição de Castilho (2011), que o entende como uma tendência de o jornalismo para a web explorar temas e discussões de interesse local (região, cidade ou até mesmo bairro) como forma de gerar maior proximidade e identidade. Embora esse não seja um fenômeno novo, já

10 Infotenimento é a denominação para conteúdos que integram informação e entretenimento. Diz respeito, principalmente, às chamadas “notícias lights”, nos dizeres de Dejavite (2006), ao se referir a divulgação de eventos sociais, culturais, viagens etc., numa clara preocupação com os interesses do público e menos com os clássicos valores-notícia do jornalismo.

11 Um dos autores deste artigo, Duílio Fabbri Jr., trabalhou no Grupo EPTV entre 1989 e fevereiro de 2015. Entre 2010 e 2015, foi gerente de conteúdo dos sites noticiosos da rede, de modo que várias informações aqui apresentadas são relatos de sua própria experiência.

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que sua gênese está nos chamados penny papers12, do século XIX, as ferramentas tecnológicas atuais, o barateamento das produções e a possibilidade de interatividade foram facilitadores para o crescimento da informação hiperlocal. Em 2011, o site tornou-se um “case” do Grupo EPTV, pois foi o espaço escolhido pelos acionistas para manifestarem-se em forma de editoriais sobre o escândalo político que culminou com a cassação do então prefeito de Campinas, Hélio de Oliveira Santos (PDT), além do indiciamento de vários políticos ligados à administração13. Além disso, os textos dos editoriais ressoavam a polifonia que vinha das ruas, uma vez que outros veículos de comunicação da cidade passaram a cobrir o caso apenas posteriormente e, a princípio, de forma bastante tímida. Numa novidade no jornalismo de internet na cidade e no País, a emissora utilizou o EP Campinas para publicar nove editoriais. Cheida (2011, p. 7), em análise desses textos, conclui que O conjunto das peças opinativas, de caráter institucional, é enfático ao revelar a posição que a emissora adotou em relação ao governo do prefeito [...]. O apoio à ação do Gaeco, em especial à conduta do promotor Amauri Silveira Filho, e à decisão dos vereadores em cassar o mandato do prefeito são elementos suficientes para definir a posição crítica da empresa ao governo municipal.

A produção de editoriais é peça comum nos jornais impressos, mas raro em outras mídias. Como diz Melo (2003, p. 111), “no rádio e na televisão, a presença do editorial é episódica. Quase sempre ocorre em momentos de crise, de conturbação social, quando as emissoras se sentem compelidas a dizer o que pensam sobre os acontecimentos.” Ainda no período do EP Notícia, outro site do grupo que também tornou-se conhecido no mercado, mas com cunho claramente comercial, foi o Virando o Bixo, destinado a cobrir a vida do pré-universitário, informando sobre vestibulares, financiamento, intercâmbio e promovendo um simulado, cujo vencedor ganhava um

12 O penny papers, ou jornais de centavo, surgiram na Europa e nos Estados Unidos em meados do século XIX. Custavam até seis vezes menos que os principais veículos impressos do período e se dedicavam a um jornalismo que pode ser considerado percursor dos impressos populares e sensacionalistas de hoje.

13 O promotor Amauri Silveira Filho, do Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), divulgou, em 20 de setembro de 2010, as investigações sobre licitações fraudadas por empresas fornecedoras de serviços à autarquia Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S.A (Sanasa), além de prefeituras e outras autarquias de dez municípios e do governo de Tocantins. Segundo o Gaeco, o desvio de recursos públicos atingiu em torno de R$ 650 milhões nas licitações fraudadas nos 11 municípios e nos dois estados. 9

carro. O segundo colocado na disputa ganhava uma viagem de estudos de um mês num país de língua inglesa. O Agito teve uma vida curta e, após três anos, foi tirado do ar. Entretanto, a segunda unidade, focada no jornalismo, cresceu e, em 2012, tinha uma audiência média mensal de 18 milhões de page views, de acordo com o Google analytics, divisão da empresa Google, que analisa os dados de acesso de internautas. O sucesso do site fez com que a direção da Rede Globo convidasse a EPTV para ser uma das primeiras emissoras a entrar no que chamaram de Projeto G1, que consistiria na separação de duas principais editorias que compunham o Globo.com: o Esporte e o G1 (notícias). Todas os sites das afiliadas, assim, num prazo de três anos, passaram a fazer parte do G1. Essa mudança, para o internauta, começou a ser vivenciada no final de 2010, quando foram integrados os conteúdos da Globo São Paulo e da Globo Rio. Todo o material passou, assim, a ser disponibilizado na plataforma da Globo, seguindo seus princípios e padrões editoriais. De acordo com a importância da notícia, o G1 Nacional faz chamadas de capa para o material das afiliadas. Para o acesso aos sites, passou-se a usar o endereço www.g1.com.br/campinas, assim como www.g1.com.br/piracicaba, o que se configura como um modelo seguido por todos os integrantes do Projeto G1, que hoje possui 55 páginas noticiosas ligadas a regiões ou a Estados. O grupo EPTV decidiu esperar por mais um ano e meio para que conseguisse, em 12 de fevereiro de 2012, entrar com seis páginas com as chamadas das matérias produzidas por suas redações. A primeira manchete do portal abordava a explosão de três caixas eletrônicos numa mesma agência em Campinas. Outras duas páginas, Campinas e Ribeirão Preto, foram inseridas no Globoesporte.com. Nesse processo, a experiência da EPTV foi novamente diferenciada: pois cada afiliada da Rede Globo entrava no Projeto G1 com apenas a sede da emissora. O grupo não só entrou com oito páginas de uma vez (todas as que tinham, anteriormente, o EP Notícias), como foi um dos mais bem estruturados em termos de redação, com no mínimo três editores de jornalismo e dois repórteres para a cobertura geral, além de mais um editor e um repórter para o esporte. Em oito meses, essas oito páginas trouxeram para a afiliada o posto da mais bem posicionada no ranking interno da Rede Globo: os números atuais mostram uma média mensal de 25 milhões de page views por mês. Com a entrada do conteúdo jornalístico das emissoras do grupo pertencente à 10

família Coutinho Nogueira para o Projeto G1, a EPTV teve uma nova subdivisão no que tange a sua atuação no ciberespaço. Toda a parte cultural e de educação juntou-se às notícias produzidas pelos jornais impressos e rádios do grupo no portal Eptv.com, que passou a se chamar Via EPTV (www.viaeptv.com), que também reúne as informações institucionais do Grupo.

Considerações finais A breve história dos veículos jornalísticos digitais mostra como, em curto período de tempo, esses produtos estão sujeitos a transformações e adequações, ora em função das mudanças tecnológicas – cada vez mais rápidas –, ora em razão de decisões estratégicas nos planos de negócio, pois a discussão ainda é a saúde e a sobrevivência financeira desses meios. Observa-se que o chamado Projeto G1, responsável pela integração dos portais das emissoras afiliadas seguiu o mesmo raciocínio utilizado pela TV Globo para sua expansão pelo território brasileiro: por meio das afiliadas atingir a totalidade dos municípios, valorizando a interatividade, a identidade e o hiperlocalismo. Embora muito recente, faz-se necessário uma série de relatos históricos sobre os sites noticiosos, uma vez que esta é uma história bastante fluída e cujos registros e documentos facilmente se perdem. Ao contrário das TVs, rádios e impressos, o acesso aos conteúdos produzidos anteriormente é dificultado, pela falta de capacidade de armazenamento nas plataformas, pela alteração possível a qualquer momento nesses conteúdos (corrigindo erros, por exemplo), pelas alterações em softwares e plataformas e pela atualização constante. Neste artigo, relembramos o caso dos editoriais publicados pelo Grupo EPTV na ocasião do escândalo político que caiu sobre Campinas em 2011. Um analista que não tenha feito a coleta deste material no período de sua publicação, hoje, teria dificuldade para encontrá-los, pois já não estão mais online, desde a extinção do EP Notícias. A memória dos veículos digitais é volátil e, em grande parte, sua manutenção dependerá de relatos acadêmicos e das experiências de jornalistas e demais profissionais que a constituíram. Importante também destacar que pesquisas históricas em produtos digitais precisam ainda dispor de métodos alternativos aos já conhecidos para as mídias tradicionais, principalmente em função da constante atualização dos conteúdos. 11

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