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que entretanto descobriu obriga-o a ficar mais um de 2010 — que tinha tudo para correr melhor do à rodagem. Tudo começou de forma discreta, mas a mês de baixa. Os produtores abandonam o proje- que outros — não estava fadado a acabar sem um discrição rapidamente se esvaiu. As notícias de que to, numa altura em que os direitos sobre o argu- novo volte-face. E mais uma vez relacionado com a produção tinha danificado o Convento de Cristo, mento já estão na posse da seguradora. Gilliam dinheiro. O financiamento voltou a falhar e du- em Tomar, correram depressa, mesmo que afinal estava longe de imaginar que as disputas em tor- rante três anos ficaria em suspenso, altura em que os estragos não fossem tão vastos como à partida no dos direitos continuassem a preocupá-lo tan- Gilliam promete regressar aos trabalhos em “Dom denunciados. tos anos depois. Quixote”. Há nova promessa de dinheiro para a Enquanto o trabalho criativo decorria, primeiro Em 2001 não tinha como saber que em 2018 o produção num futuro próximo, mas esta é tam- do lado de cá e depois do lado de lá da fronteira, o filme se estrearia mas que a polémica estava longe bém uma oportunidade para o cineasta repensar a lado legal também ganhava novos contornos, alheio de acabar. Por não saber do futuro, optou sempre história. Agora já não lhe faz sentido que o prota- à trama do filme. Se Toby (Adam Driver) — um jo- por usar o presente entre películas para se dedicar gonista seja um viajante no tempo. Tudo se passará vem realizador de publicidade dos dias de hoje, que ao projeto de uma vida. Ainda nesse ano encon- na atualidade, nesta que parece também ser uma acaba preso nas ilusões de um sapateiro espanhol trou um investidor que julgava conseguir libertar forma de se desligar por completo da personagem que julga ser Dom Quixote (Jonathan Pryce), e que o guião, mas estava enganado. E 2002 também não que viu Depp (quase) encarnar. se torna Sancho Pança — é o protagonista da longa- passou sem que se falasse da longa-metragem. Kei- Entretanto, surgiu também “O Teorema Zero”, -metragem, na justiça são outros os nomes maiores. th Fulton e Louis Pepe, que já tinham mostrado a filme que serviria para intercalar com “Dom Qui- Os direitos sobre o argumento do filme voltavam a história por detrás de “12 Macacos” em “The Hams- xote” como aconteceu durante quase toda a carreira estar sob escrutínio uma vez mais, com Paulo Branco ter Factor and Other Tales of Twelve Monkeys”, de Gilliam, e que seria o último assinado pelo nor- a considerar que o filme teria sido rodado de forma voltam à carga com “”, um do- te-americano antes do derradeiro “O Homem Que ilegal, uma vez que era a ele que estes pertenciam. Os cumentário sobre o filme que não se fez. Também Matou Dom Quixote”. Os últimos anos foram outra tribunais de Londres e de Paris, onde Gilliam tinha não tinham como saber que este — ou outro, que aventura de proporções épicas, que parecia repetir aberto processos relacionados com a propriedade dos Gilliam passou uma vida a mudar a história do seu tudo o que acontecera no passado mas numa janela direitos, haviam deliberado a favor de Paulo Bran- “Dom Quixote” — havia de ser feito e que daria ori- temporal mais curta. Um pouco como se faz quando co — sem que isso impedisse no entanto a rodagem gem a “He Dreams of Giants”, já em fase de pós- é preciso cortar no custo de uma produção. Os pro- de “O Homem Que Matou Dom Quixote”. O norte- -produção e com estreia prevista para 2019. blemas de financiamento voltaram e os mais pró- -americano considerava que os contratos assinados Quatro anos passados desde o fatídico perío- ximos aconselharam Gilliam a desistir de uma vez com Paulo Branco não tinham validade por falta de do da rodagem da longa-metragem em Espanha, por todas, mas o conselho não foi seguido e o projeto pagamento, mas não foi essa a conclusão a que che- Gilliam tem novos projetos em cima da mesa. É seguiu o seu rumo. Resumindo o tempo que a Terra garam nas barras londrina e parisiense. sempre assim e o realizador chegou a dizer que demora para completar uma volta em torno do Sol, A intrincada intriga legal não tirou fulgor à pro- sempre que “Dom Quixote” falha há outro filme houve dias para tudo. E foram 365, melhor ou pior dução e o filme impossível acabou por ser termina- para ser feito, como se isso já fosse um ritual seu. contados. Ainda sem dinheiro garantido para a ro- do — com Adam Driver como Toby, Jonathan Pryce “Os Irmãos Grimm” e “Tideland — O Mundo ao dagem, John Hurt é anunciado como novo Quixo- como Quixote, Stellan Skarsgård como ‘The Boss’, Contrário” são as películas que se seguem, mas en- te, seguindo-se a boa notícia de que a Amazon iria Olga Kurykenko como Jacqui e Joana Ribeiro (que tre os dois houve ainda um período em que o rea- ajudar com o financiamento, à qual sucederia uma entrou no projeto com Paulo Branco e permaneceu lizador voltou a sonhar com o filme impossível. À das piores. John Hurt descobre que tem cancro no nele com ) no papel de Angélica. Este época, o objetivo era recuperar o guião à segura- pâncreas e a produção é adiada por alguns meses. ano, Cannes anunciou que “O Homem Que Ma- dora e trabalhar novamente com , ao Acabou por demorar muito mais e Hurt acabaria por tou Dom Quixote” seria o filme de encerramento qual pensou juntar Gérard Depardieu como Qui- morrer antes de o filme ser rodado, com ou sem ele. do Festival de Cinema e a polémica adensou-se. xote. Nada feito, até porque haviam de passar qua- Paulo Branco tentou impedir a longa-metragem tro outros anos até os direitos estarem disponíveis. REGRESSO AOS TRABALHOS de encerrar a 71ª edição do festival francês, através Foi há dois anos que o papel do Festival de Cannes de uma providência cautelar, mas esta acabou por FUGIR DAS TREVAS em “O Homem Que Matou Dom Quixote” cresceu, não ser deferida. Cannes recebeu Terry Gilliam em “Parnassus — O Homem Que Queria Enganar o com o realizador do malfadado filme a anunciar apoteose para que este mostrasse ao mundo o seu Diabo” também estava a dar problemas e Gilliam também uma troca de papéis e de produtores. Olga filme “amaldiçoado” (adjetivo do próprio, em tem- parecia não conseguir dar a volta à besta de forma Kurylenko, Adam Driver e Michael Palin, dos Mon- pos) e o Centre National du Cinéma et de l’Image alguma. A morte de Heath Ledger — depois subs- ty Python, são os novos nomes do elenco, com Pau- Animée até autorizou a estreia comercial em terri- tituído por Johnny Depp, Colin Farrell e Jude Law lo Branco a ser anunciado como produtor. O verão tório francês, mas a saga ainda não teria terminado. na longa-metragem — fez correr muita tinta na passa-se decerto em preparativos, mas o mês de se- Em meados de junho, Gilliam acabaria por sair imprensa, mas era nos bastidores que muito mais tembro termina sem que a produção entre em mar- perdedor numa batalha quase final. Os tribunais acontecia. Tony Grisoni, que tinha começado a tra- cha. Gilliam queixa-se do responsável português, franceses decretaram que os direitos pertencem à balhar com Gilliam no início dos anos 90, voltou que terá falhado com o dinheiro prometido. Era Alfama Films (do produtor português) e no dia 13 a olhar para o guião e juntos perceberam que era tempo de Gilliam avançar, como sempre fez desde deste mês foi um tribunal madrileno a confirmar a tempo para novas mexidas no texto. Afinal, já não o início, e procurar novos parceiros para fazer do plena validade do contrato de coprodução do filme. teriam um publicitário como protagonista e o filme seu sonho uma realidade de todos. Foi com a espa- Contactado pelo Expresso, Paulo Branco não quis devia antes centrar-se num cineasta. nhola Tornasol, a belga Entre Chien et Loup, a fran- prestar quaisquer declarações, mas a sua produto- Robert Duvall é o nome apontado para novo cesa Konologu e a portuguesa Ukbar Filmes que se ra explica, em comunicado, que esta decisão vem Quixote e Ewan McGregor foi o escolhido para to- fixaram os acordos — mesmo com Paulo Branco a confirmar a nulidade de qualquer contrato esta- mar o lugar entretanto deixado vago por Depp. manter que é ele o verdadeiro produtor do filme — belecido posteriormente. E comprova que é ela a Ambos estão confirmados no projeto, mas o ano para seguir em frente com a produção e dar início “única detentora de todos os direitos de explora- ção do filme, seja qual for o meio de exibição, e de 60% das receitas mundiais”, somando ainda que a Alfama Films é “legalmente o único vendedor in- ternacional” e que “todos os direitos de exploração, Paulo Branco tentou, sem sucesso, seja qual for o meio de exibição, e 10% das receitas mundiais pertencem à Leopardo Filmes, legalmen- impedir a longa-metragem de te a única sociedade de coprodução” em Portugal”. Por enquanto, “O Homem Que Matou Dom Quixo- encerrar a 71ª edição do Festival te” não tem data de chegada às salas nacionais. b de Cinema de Cannes [email protected]

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