estudossemióticos www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es issn1980-4016 vol.8,n.1 junhode2012 semestral p.80-90 Mentirassincerasouocantodogrãodeamor

LeonardoDavinodeOliveira*

Resumo: Estetrabalhoinvestigacomoaspoéticasdacanção,apartirdaperspectivadavozdossujeitos cancionais, podem auxiliar na discussão sobre as categorias fluidas da verdade e da mentira. Intensificandoadiscussãoqueselocalizanafronteiramovediçaentreficçãoerealidade,taispersonagens sãoaproposiçãopossíveldeinvestigação,postoquesesituamnafronteira.Umadascaracterísticasmais radicais da verdade,prima-irmãdarealidade,éserincapturável.A verdade,no sentido deessência,é impossível de ser percebida, pois ela se prolifera em várias e insuspeitadas direções, dificultando a apreensão de sua origem. No entanto, amparados pela hegemonia de uma filosofia que tem na desvocalizaçãodo logos suabase,temosatravessadoépocasembuscadeumalógicaclara.Analisandoo discurso,afala,avozdetrêssujeitoscancionais–asaber:osdascanções“Rock’n’Raul”,deCaetano Veloso, “Para mano Caetano”, de Lobão e “Lobão tem razão”, também de Caetano, seguindo a cronologia de suas feituras –, o objetivo é entender os cantos (existenciais) sugeridos dentro das três canções:aconstruçãometacancional,aquiloqueestáatrásdasuperfíciedoqueécantado.Oumelhor, aquilo que faz da superfície o profundo. Este ensaio é atravessado pela leitura atenta e analítica dos ensaiosquecompõemo Críticaeverdade ,deRolandBarthes,evisaalançarcontribuiçõesàquilo quesetemclassificadodesemióticadodiscurso. Palavras-chave: mentira,verdade,CaetanoVeloso,Lobão,metacanção 1. Chegadeverdade sentidosmúltiplos?”(p.193).Háumsentidocerto da palavra? Este ensaio é atravessado pela leitura atenta e Uma das características mais radicais da analítica dos ensaios que compõem o livro Crítica e verdade,prima-irmãdarealidade,éserincapturável.A verdade(2003),deRolandBarthes,epelomeuobjeto verdade, no sentido de essência, é impossível de ser deestudo:acançãopopularmediatizada.Naverdade, percebida, pois ela se prolifera em várias e meu gesto aqui foi o de cruzar, justapor, cantar insuspeitadasdireções,dificultandoaapreensãodesua paralelamente, leituras e objetos a fim de pensar as origem. A originalidade, assim, está no arranjo dos ideiaseasinvestigaçõesdeBarthessobreaexperiência conceitos, ou, como Roland Barthes (2003, p. 192) críticaeanoçãodeverdade. questiona,com“oquefazercomosentidodapalavra”, Tentoanalisarascançõesobjetodesteensaiode jáqueela“nãotemmaisvalorreferencial,masapenas modoafixarasregrasdeconjunçãodaatividadecrítica mercantil” (p. 195). Ou seja, “a que instrumento de de arranjo dos compositores: forma e conteúdo se verificação, a que dicionário iremos submeter essa imbricam, no meu gesto de dar novo sentido aos segundalinguagem,profunda,vasta,simbólica,daqual objetos. éfeitaaobra,equeéprecisamentealinguagemdos

*UniversidadedoEstadodoRiodeJaneiro.Endereçoparacorrespondência:[email protected] estudossemióticos,vol8,n°1(junho2012) Desse modo, este ensaio é motivado pela Rock'n'roll querela (amorosa) entre Caetano Veloso e Lobão. O Rock'n'Raul objetivo é estabelecer relações para além do diálogo (público)entreosdoiscompositores.Tomo,portanto, Hojequalquerzé-mané ostextosecantosdos doiscomo pretextos para meu QualquerCaetano canto paralelo (minha paráfrase, ou melhor, noutro Podedizer campodesentido,maisbarthesiano,meuarranjo)sobre QuenaBahia ossentidosdaverdadeedarealidade.ParaBarthes,em MeuKrig-HaBandolo Crítica e verdade, o novo crítico é aquele que canta Épuroourodetolo(Eolobobolo) arranjandoaquiloquejáfoiditodeummodoacriar Masminhaalegria novos e luminosos sentidos. Eis o meu movimento Minhaironia aqui.Nãocabeaocrítico“clarear”aobra;ela,porsi,já Ébemmaiordoqueessaporcaria basta. Cabe ao crítico penetrar e ser penetrado pela obra,cantarjunto:lançarmundosnomundo. Lobão,criatropicalistaeherdeirodeRaul,não reconhece a máscara usada por Caetano. Muito 1.1.Querelaamorosa menos aceita quando o doce bardo, digo, o Raul Seixasficcionalizado,refere-seacerto“lobobolo”a fim de rimar com “ouro de tolo”, título de uma Em 2000 (no disco Noites do Norte ), Caetano canção de Raul (já cantada e gravada pelo dandi- Veloso lançou a canção “Rock’n’Raul”, uma dendê). Escusado dizer que, se Caetano canta ao homenagemàobradeRaulSeixas.Nacanção(letrae modo de Raul, Lobão canta ao modo dos dois: o melodia), Caetano faz às vezes de ghostwriter do canto de Lobão é duplo do duplo, labirinto de espírito de Raul, que, por sua vez, labirintos. As máscaras, com suas respectivas autobiograficamente,passaemrevistasuaestadiapor personas, dançam em um espiral de fumaça. Eis a aqui, pelo mundo dos vivos, entre outras coisas, letra de “Para o mano Caetano” ( 2001 – Uma apontando seus herdeiros: “Manos” que tentam odisséia no universo paralelo (CD).Brasil,Popcorn implantar o jeito norte-americanês de sobreviver: a Records,2001): ideologiadasegregaçãoracialexplícita,cantadapelo rap e hiphop ,porexemplo,quesedesviadalinhade Oquefazerdoouro-de-tolo/Quandoum cordialidade brasileira. Eis a letra da canção de doce bardo brada à toda a brida, / Em “Rock’n’Raul” ( Noites do Norte (CD) . Brasil, velas pandas, suas esquisitas rimas? / UniversalMusic,2000): Geografia de verdades, Guanabaras postiças / Saudades banguelas, tropicais Quandoeupasseiporaqui preguiças?/Abocacheiadedentes/De Aminhalutafoiexibir um implacável sorriso / Morre a cada Umavontadefela-da-puta instante/ Que devoraa voz do mortoe, Deseramericano(Ehojeolhaosmano) com isso, / Ressuscita vampira, sem o DeficarsónoArkansas menor aviso / A voz do morto que não EsbórnianaCalifórnia prestadepoimento/Perpetuaseusilêncio DiasruinsemNewOrleans deesquecimento/Nalápidepós-moderna OgrandemagoemChicago do eterno desalento: / E é o Raul, é o TerumranchodeéternoTexas Jackson,éopovobrasileiro/Éohiphop, UmaplantationdemaconhanoWyoming aentropia,entropicáliadopandeiro/Do Nadadeaxé,DodôeCuruzu passado e do futuro, sem presente nem AverdadeiraBahiaéoRioGrandedoSul devir/Éoputeiroqueoscanalhas/Não conseguem habitar, mas cafetinam / É a Rock'n'me belezadeveludo/Queosub-mundotem Rock'n'you 2 LeonardoDavinodeOliveira pra dar mas os canalhas subestimam / E balaperdidaquetefala,rapá!Teamo,te regurgitando territórios-corrimões / De amo. umreboladoagonizante/Restaoglamour fim-de-festa-ACM / De um império do Lobão considera as “rimas esquisitas” e parte Medocarnavalizante/Seráqueahoraé para o ataque, lançando (em 2001) a canção “Para o essa?/Abocacheiadedentesvaticina:/ mano Caetano”, uma bala que percorre a biografia Nãoprosmano,Nãoprasmina/Simpro estética e social de Caetano Veloso, espalhando uma meu umbigo, meu abrigo / Minhas tetas quantidade considerável de metonímias e metáforas profanadas / Santo Amaro doce amaro, queintencionamrestituireinstaurarumCaetanopara vacas purificadas / Amaro bárbaro, si,paraLobão.Umdiscursoentoadoporumavozirada Dândi-dendê/Minhasnarinasaorelento/ e apaixonada. Aqui, a mistura entre rock (ênfase no Cumulando de bundões que, por anos ritmo, que impulsiona a ira) e hip hop (ênfase na acalento / Estes sim, um monte de zé- palavra, que incomoda, pelo tom impositivo e mané / Que sob minha égide se intimidador) auxiliam na montagem do transformam em gênios / Sem quê nem testemunho/canto indignado de Lobão. Aliás, como a porquê / Sobrancelho Victor Mature / intençãosecretadetodapalavra(escritaoucantada)é Delineando barravento / Eu, americano? encontrarooutro,abalanãoétãoperdidaquantoquer não.Baiano./SoyloboportiHollywood ser.Elatemdestinocerto:asverdadesqueooutrotenta /Quempudermedesnature/Sobosolde construir. Mas, afinal, como Nietzsche pergunta em Copacabana /Eeusoy lobo-bolo?lobo- Eccehomo (1995,p.57):“Quantodeverdadesuporta bolo/Tipo,prarimarcomouro-de-tolo?/ umespírito,quantodeverdadeousaumespírito?”. Oh, Narciso Peixe Ornamental! / Tease Ao buscar referências, não apenas na vida real, me, tease me outra vez / Ou em banto mas também na obra ficcional de Caetano Veloso, baiano/OuemportuguêsdePortugal/Se Lobão motiva a dúvida sobre o que se entende por quiser, até mesmo em americano / De verdade. Lobão investe, desse modo, em uma crítica Natal/Issoélíngua!/ Línguaéfesta!/ nãodomundo,masdodiscursoficcionaledogestode Que um involuntário da frátria / Com verdade desempenhados por Caetano. Assim, o gesto certeza me empresta / Numa canção de de cantar, semelhante ao gesto de escrever, exílio manifesta / Aquele banzo baiano / institucionaliza a subjetividade: a verdade de cada Meu amado Caetano / Me ensinando a sujeito. falar inglês / London, London / E É desse modo que entendemos quando Barthes verdades,queeu,Lobóncontesto/Como (2003,p.221)afirmaque“ocríticonãopodepretender empolgado aprendiz / Enviando esta ‘traduzir’aobra,sobretudodemodomaisclaro,pois aresta / A quem tanto me disse e diz: / nãohánadamaisclarodoqueaobra”.Paraoautorde AmadoCaetano:Chegadeverdade/Viva O prazer do texto , o que o crítico pode fazer é alguns enganos / Viva o , meio “engendrar” certo sentido derivando-o de uma forma troncho,/Meiojácambaleando/Abossa queéaobra.Ouseja,acríticafeitaporLobãoduplica já não é tão nova / Como pensam os ossentidos,“fazflutuaracimadaprimeiralinguagem americanos / A tropicália será sempre o daobra[deCaetano]uma segundalinguagem,istoé, nosso / Sargent Pepper’s pós baiano / O umacoerênciadossignos”. Roqueerrou,vocêsabe,/Digoissosem Analisar o objeto é destruir o objeto; Lobão engano/Eeuseiquevouteamar,sejalá analisa e destrói para coroarcom o “eu te amo”, em comofor,portanto/Umbeijonoseulado repetições cansadas, no final de seu testemunho. A super bacana / Uma borracha no dark críticaéumaleituraprofunda:dequemama.Elanão side-macbeth-ACM,porenquanto/Ah!já desvendaosignificado,masacadeiadesímbolos.Sua iameesquecendo!lembrançasdoariano/ ironiaestáemfazerperguntasàlinguagemdeCaetano, Lupicíniassaudaçõesaquidomano,/Esta utilizandoapróprialinguagemdeste. Lobãofratura o mundodeseuamorpararefazê-lo. estudossemióticos,vol8,n°1(junho2012) Para dessacralizar a personagem figurativizada sol. Mas que, por outro lado, também é feroz e por Caetano em “Rock’n’Raul”, Lobão não encontra devorador. Esses torneios, retornos e idas e vindas outro meio senão radiografar o outro, investigando a dãosentidoàobra;nãorestituemomundodeondeas “geografia de verdades” cantada por Caetano Veloso. unidades foram tiradas, mas, recontextualizados, Ou seja, Lobão usa o canto (e a canção) do seu criamoutrossentidosepulverizamaverdade. aparente oponente como objeto e como arma para disparar a “bala perdida” contra o mesmo objeto 1.2.(Des)dobrar-separadentro (amado).Elejustapõe,nietzscheanamente,superfíciee A expressão “a boca cheia de dentes” vem dos profundidade. versos “eu que não me sento no trono de um SeCaetano“devoraavozdomorto”,comum apartamento coma boca escancaradacheia de dentes sorriso implacável, o que sublinha certa esperando a morte chegar”, de “Ouro de tolo”, já desconsideração com Raul Seixas, Lobão não deixa citada, de Raul Seixas, homenageado por Caetano e pormenosedevoraavozdovivo,deCaetano,pois defendidoporLobão.Essaimagemda“bocacheiade constróiumcantometacancional(cançãoque“come” dentes” é repetida duas vezes em “Para o mano asimesma)quesedesdobraparaforaeparadentro Caetano”, apontando que a canção se desdobra para desi;um“objetoolhanteeolhado”(Barthes,2003,p. dentro, com Lobão devastando o autor de Verdade 28). tropical (1997): livro de memórias no qual Caetano ParaBarthes(2003,p.218),“amortetemoutra Velosotentaapreendera(sua)verdade. importância:elairrealizaaassinaturadoautorefaz OLobón(deslizamentoficcionaldeLobão)põeo da obra um mito: a verdade das anedotas se esgota peixeornamentaldiantedoespelho(defragmentosde emvão,tentandoalcançaraverdadedossímbolos”. sua obra), nada mais agradável para um (confesso) Apagando a assinatura do autor, Lobão “mata” narciso,quecanta,“nãoprosmano,nãoprasmina,sim Caetanoefundaaverdadedaobra,queésempreum pro (próprio) umbigo”. Tal deslizamento da verdade enigma. Lobão conserva os enigmas que Caetano (jogoquetemaestruturadacançãocomosimulacrodo criou,ampliando-os. objeto)desmontaafiguradeCaetanoVeloso,vistonão “Para o mano Caetano” e “Lobão tem razão” poder defini-lo, cercando-o. A estrutura criada por (dodisco Ziiezie ,2009),defato,sãocançõessobre Lobãosimulaoobjeto:desmonta–dispersaaspartes– canção.Assimcomo“Rock’n’Raul”tambémoé.Há earranja–dásentidoàspartes.Porém,alutasugerida uma duplicação da história dentro de outra história, entre o lobo-bolo e o peixe (aquele que fecunda as sempreficcionais.Asinterferências,asjustaposições, águas)é,defato,umalutadoimbricamentoreal/ficção. os espelhos frente a espelhos põem a noção de Ahistóriaéreveladacomoumexercíciodeficção. verdade, enquanto totalidade, em questão; e ainda “Ohomeméoprópriolobãodohomem”eele, deixaclaroolugardocompositor,aquelequearranja Lobão, toma para si a função de ghostwriter de os versos (localizados na memória que, como Caetano, em um jogo de espelhamentos infinitos. Os sabemos,sendoumreservatóriodaidentidade,nãoé epítetos-provocações de Lobão, além de adensar a segura),impedindoaemoçãocartáticaefavorecendo querela, levam o amaro bárbaro ao estranhamento a emoção reflexiva. Personagens e autores se diante de si, levando-o a dar razão a quem a tem: misturam:oqueeradocampodavidaviraficçãoeo Lobão. Com as metáforas e metonímias dançando, os queera do campo da ficção pode ser ouvido como sujeitos reconhecem ficção na verdade montada por verdade. A memória usada como um exercício lobão.A verdade é portátil.O que não atorna menos ficcionalintenso.Nas palavrasdeBarthes(2003,p. verdade. Ao final, é o próprio Lobão quem convida 195): “A mesma banalidade rege o relacionamento Caetano a suspender o juízo, a viverem alguns humano no livro e no mundo”. Ou seja, ficção e enganos,amanteradúvida,poiséelaquempermiteao realidadesãofacesdeumamesmamoeda. sujeitocontinuaraquerersaber:oestadodeincerteza Olobo(predadoredevorador),quenamitologia intelectual como despoletador da produção de celta é um engolidor do sol, come Caetano, o leão pensamento. quetemrelaçãosimbólica(depersonificação)como 4 LeonardoDavinodeOliveira 1.3.(Des)dobrar-separafora “malíciadetodamulher”(ideianoelrosianareiterada por “Dom de iludir”, canção de Caetano Veloso): Lobãotomaparasiavozdomortoque,emseu “Chega de verdade é o que a mulher diz”. Este silêncio da lápide, não pode responder. Esse procedimentolembraaoouvintequeissoéarte,não procedimentoindiciaqueocantodeLobãosedesdobra uma incitação ao voyeurismo em relação ao afeto para fora. Duplica personagens, temas e versos. Só o (sensível) entre os compositores. Até porque, fato de “Para o mano Caetano” ser uma resposta a enquanto auditeurs (deslizamento semântico de “Rock’n’Raul” reitera isso. Quando Lobão contesta – voyeurparaasquestõesdoouvido),sótemosacesso “Eu americano? Não, baiano” – o Raul Seixas àquiloqueapersonagemnosmostra.Tudotemaver desenhadoporCaetano,acabacriandoumoutro,seu: comossujeitosCaetanoVelosoeLobão,enãotem, deLobão.Caetanoestánasfiligranas,navalidaçãoque devidoaocontextoficcional. Lobão investe sobre cada significante proliferado ao “Domdeiludir”,deCaetanoVelosoestabelece longodacanção.Proliferação(orgia deimagens)que umdiálogocomacanção“Praquementir”,deNoel determina,temporalmente,osignificado. RosaeVadico,etemimportânciafundamentalpara Só acontece o que está registrado no canto. O as questões aqui ensaiadas. A saber, na canção canto cria arealidade, haja vista que, com o registro parodiadaosujeitomasculinoquestionaamulherem vocal,proporcionadopela“eradareproduçãotécnica” relaçãoaodomqueela(vozsirênica)temdeiludire (Benjamim,1980),avozfixaapalavra,afala,overbo. de enganar. Já na canção de Caetano temos um Ocantoéoreconhecimentodaincapacidadededetero sujeito feminino respondendo aos argumentos do real.Issosóépossívelna“eradamobilidade”,coma homem. Interessa observar a presença da conjunção globalização que, para o filósofo Peter Sloterdijk “se” em momentos nodais na letra de “Pra que (2003), começou com as grandes navegações e os mentir”, sugerindo uma interferência do sujeito contatos por elas possibilitados. As canções aqui masculino(póloativo)nocomportamentodamulher analisadas (pretextos para este texto) falam com (e (pólopassivo),que,porsuavez,em“Domdeiludir”, sobre)alguémreal,sujeitosempíricoscolocadosdiante usa isso a seu favor: investe no poder material das doespelho quenãodáespaço paramentiras. Mas há concretudesdaspalavras. algo que vaza, mina: a estrutura das canções rompe Masmentirpareceserumdomnaturaldetodo com opactoautobiográfico. Aousarextratosda vida humano já que a palavra não traduz o sentimento. paratematizaravida,oartistaficcionalizaavida.Ou Culpada pela queda do homem, a mulher desde melhor, o que é propriedade da vida é (passa a ser semprefingiu,oufoiobrigadaaisso,poisdesdecedo também) propriedade da obra e, dessa maneira, aprendeuqueassensaçõessãointransmissíveis.Não propriedadedaverdade. éàtoa,portanto,queChicoCésar(emvozdetimbre Lobão,aprendizdeCaetano–“aquemtantome híbrido)canta“euseicomopisarnocoraçãodeuma disseediz”–,recusaaposturapop,aoironizarcomo mulher,jáfuimulher,eusei”,iluminandoapotência verso“soylocoportiHollywood”,aexpressão“soy dofemininoeafirmandoqueaspalavrascarregamo loco por ti América”, eternizada pelo canto de grauficcionalnecessárioatodaexistência.Osujeito Caetano. Ora, o que é Hollywood, a indústria interpretado por Chico César promove um cinematográfica, senão uma máquina de verdades? autorretornoàrelaçãomaternaeàmatrizvocálicada LobãobrincacomasmúltiplasaparênciasdeCaetano poesia. evice-versa,poisCaetanocriaumdiscursosobreos Recorrendo à História, percebemos que discursos,tambémficcionais,deLobão.Cadaverso enquanto o homem ficou perdendo tempo justapostoabrereferênciasereflexõesimpossíveisde questionando “pra que mentir”, a mulher, ser apreendidas também pelo ouvinte e pelo distraidamente,provocamovimentosnoar:panenos crítico/analista. Assim, cabe ao crítico se tornar sistemas. “Suponho que não entender não é uma cantor. questãodeinteligênciaesimdesentir,deentrarem A verdade (processo de construção discursiva) contato”, destacou Clarice Lispector em sua última está em movimento, por meio de argumentos que entrevista concedida a TV Cultura (programa retornam. A autorreferecialidade e os Panorama, 1977). Na canção “Pra que mentir”, a desdobramentos apontam para a ficção e para a estudossemióticos,vol8,n°1(junho2012) mulherdesdenhadohomem:“nãomevenhafalar”.E continuar seu trabalho de bricolage . Essa voz é uma se impõe, mandando-o desviar o olhar inquisidor. metonímia da realidade; ela permite o acesso parcial, Signodoelementofeminino,silenciadoaolongoda metonímico e metafórico a um Caetano que está tradição filosófica de viés platônico, que abjeta a filigranado nos significantes validados pelo canto de mulher, ela quer revocalizar o logos. Diante da Lobão. Canto que dissemina (espalha o sêmen) para hipervalorizaçãodosemântico,amulherresistecomo engendrar o outro, em uma narrativa não progressiva sereiaacantarmundosnomundo.“Chegadeverdade (hajavistaqueahistórialinearéassassina,poislevaao éoqueamulherdiz”,apontaosujeitode“Lobãotem fim:averdade),diferentedoquesupomosqueseja o razão”.A vozfemininaesedutoraestabelece novas real.ComoLobãonãoquermataroseuamor,elecanta relaçõescomoreal,distantesdeumlogosfundadona para organizar o mundo, e pensar. Falar do canto é clarezadosconceitos. voltar ao enigma da identidade enquanto Hádefatoumaapresentaçãodohomemcomo ficcionalização de um eu. Em um gesto (dirigido e senhordetudo:“vocêestá,vocêé,vocêfaz,vocêquer, interessado) de crítica estruturalista, Lobão restitui o você tem”. O que intensifica, de viés, a lúcida objeto: as regras de funcionalidade desse objeto. superioridadefeminina:amulherpersonificadanavoz Reconstituiroobjetoémanifestarsuasignificação. inflamada–tonsaltos,emgeraloitavaacima–deGal Costa(Minhavozminhavida,1982)estánoutroplano Emumaatitudeestruturalista,Lobãodecompõe mais feliz de vida. Aliás, os versos finais são aestruturadaquiloqueelesugereserCaetanoVeloso. deliciosamentecruéis:“vocêdizaverdade,averdadeé Nesse momento de decomposição dá-se, ao revés, o seu dom de iludir”. Eles mostram que essa voz surgimento de algo novo: o outro Caetano, posto que femininatemconsciênciadesuasestratégiasparaviver atravessado pelo exercício intelectual (o jogo da diante das investidas do macho adulto (e limitado) dúvida: a suspensão do juízo) de Lobão. Este, ao semprenocomando.Essainversãodeperspectivaea recolher os fragmentos (inteligíveis ao ouvinte da afirmação do jogo suspensivo que redefine verdade e canção,poissófazemsentidonointelectodeLobão), mentira desestabilizam o outro acostumado à lógica fabricaumaverdade,umarazão.Caetanopassaaser, clara.Se,comoBernardoSoaresanotouemseuLivro paraLobão,maisdoqueumaimpressãodemundo.A dodesassossego,“amamo-nostodosunsaosoutros,ea afirmaçãodoamor,aofinaldacanção,comoafirmação mentiraéobeijoquetrocamos”(Pessoa,2006,p.262), da existência, daquela pulsão que mantém o sujeito comoohomempodequererqueamulherváviversem vivo (Lobão) exatamente por impor a dúvida, reitera mentir? isso.Lobãorecompõeseuobjetoiluminandoosgestos (as filigranas) deste, descobrindo o percurso de vida 2. Mentirassinceras (sempreficcional)deste. “Chegadeverdadeéoqueamulherdiz”,tanto Aopraticaradesmontagem(decomposição)eo remeteaoverso-pedidodeLobão(“Chegadeverdade, arranjo(composição),procurandooselementosmóveis viva alguns enganos”) quanto à ideia defendida por (eenfatizando-os)eproduzindovariaçõesnoconjunto, NoelRosadequeamulhernãosabeviversemmentir, Lobãonosajuda(enquantoouvintesecríticos)apensar na letra da canção (já gravada por Caetano Veloso) asituaçãodiferencialdecadafragmento(semsentido “Praquementir?”.Certamisoginia(algohomoerótica, em si) das peças artísticas: poesia, canção, música, com a mulher como elemento ameaçador da fratria), pintura. Oimportanteé perceberque o menor desvio comum nas letras de rap e hip hop , paira no clima de posição de um elemento pode alterar todo o estabelecido pela relação (querela amorosa) entre conjunto.Diferentementedaquiloqueaprendemosnas Caetano e Lobão, revelando a intenção de primeirasaulasdeMatemática,aordemdoselementos cumplicidadeentreosmanos. altera(sim)oresultado. Apaisagemficcionalde Caetanoétão prolixa Porisso,aonossoentender,aênfasequeRoland queavozde“ParaomanoCaetano”precisarespirar– Barthes oferece ao conceito de “arranjo”. O arranjo “sob o sol de Copacabana” – para ganhar fôlego e permite que as unidades existam: elas dependem das

6 LeonardoDavinodeOliveira relações de intimidade (conjunções e disjunções) que dacanção“Lobãotemrazão”( ZiieZie .(CD).Brasil, estabelecem entre si. Aparentemente sem conexão, até UniversalMusic,2009): mesmo pelo potencial anárquico do sujeito em si, os versos de Lobão guardam um todo: Caetano Veloso. Lobãotemrazão Cadaparteédotadadediferença;afinalaspalavrasnão IrmãomeuLobão sãoascoisas,masarranjadas(peloartistaepelocrítico) Chegadeverdade montamosignificadoalmejado. Éoqueamulherdiz Lobãonãodescobreverdades,masvalidades,a Toutãoinfeliz partirdosistemacoerentedesignosqueCaetanousano gestodecompor.Aocriticar opensamentodeCaetano, Umcrucificadodeitadoaolado pretensamente exposto no objeto estético, Lobão tem Osnervostrememnochãodoquarto acessoàverdadedaobra,queéaúnicaverdadepossível. Porondeosêmenseespalhou Frágil,a verdade se multiplicano canto de Caetano, é recolhida no testemunho de Lobão e ratificada quando Omundoacabou Caetanodárazãoao“seuirmão”.Ojogometacancional Maselasvirão é,dessemodo,umjogosobreaessência,umadiscussão Enossalvarão acercadasgrandesperguntasqueinstigamoserhumano: Aambosnósdois o jogo da metaficção é o jogo humano. Ou seja, a Omedojáfoi metacanção“vaievoltaevaidenovo,passeandopelo OhomeméopróprioLobãodohomem labirintohumano semapreocupação de vê-lo decima, Elasóvemquandoosmortossomem mas sim por dentro, sem pretender dele sair, mas, ao Elaquequasenosmatou contrário, querendo explorá-lo recanto por recanto” (Bernardo,2010,p.158):sempresente,nemdevir,como Chovedevagar Barthes(2003)propõe. SobreoRedentor Nãoàtoa,acançãodeLobãocomeçacomuma Seelamechamar pergunta. Importa lembrar que Caetano, em um Agora procedimentoqueoaproximadaquiloqueMachadode Euvou Assisfeznaliteratura,éumcompositordemetacanções: daquelacançãoquenãoescondequeécanção.Apalavra MaisvaleumLobão cantada (a verdade) é a própria matéria do canto. O Doqueumleão crítico(Lobão)setornacantor,poisocantodooutrolhe Metoumsincerão constituiumproblema.Sujeitoeobjetoseatravessamem Enadasedá fasedomesmoobjeto:acanção,queéaverdade.Lobão Orockacertou exploraonomeCaetano,comoestefezcomRaul.Um Quandovocêtocoucomsuabanda toque(afeta)ooutrocomomesmoobjeto:avoz.Lobão Etamborimnaescoladesamba investenalinguagemdeCaetanoVelosoemdetrimento Efaloumaldoseuamor daobra. Como Lobão jamais vai chegar à essência do O gesto de Lobão, que chamo aqui, quesejaCaetano,eleresolveaquerelaassumindo:Te pretensamente,de“cansaço”,recuperadoporCaetano, amo!. Algo que ele nem precisava dizer, pois, a aponta que o Lobón suporta um “engajamento demonstração de conhecimento (mesmo, e sempre, fracassado”(Barthes,2003,p.35),tendoemvistaque incompleto) do outro que ele proliferou durante seu asfigurasnãoseesgotamjamais.Ocantoéaverdade discurso já indiciava o amor. Caetano, por sua vez, docantor. aproveitaotommaiscalmo,passional,dofimde“Para o mano Caetano”, sem deixar de lado o peso das 3. Verdade,umailusão guitarras,econstróiseucantoasseptizado.Eisa letra estudossemióticos,vol8,n°1(junho2012) Na coluna de 2/10/2011 (jornal O Globo ), Sujeitocancional,portanto,umailusão(ficção), Caetano Veloso anota: “De que vale a vida se não ele sabe tanto o preço do papel que tem, quanto a respondemosaoescândaloqueéexistirmoscomgestos necessidade urgente do ouvinte em ser cantado, igualmenteextremoscomoaféemDeus,adedicação mimado, ninado. Ele fala de si – constituindo obsessivaaumapessoa,umaarte,umacausa?(...) A “Verdade, uma ilusão” em uma metacanção (canção vida vale a sua evidência animal.” Sobre a nossa que pensa teoricamente a própria canção) – para se alegria terrível, para suportar o pensamento de Si, da aproximardooutro.EfazissoexibindoumCarlinhos sobrevivência no inferno e céu de todo dia, Brownalém do orientadordocarnaval.Ocorpoaqui transformamos o tédio em poesia, inventamos balançajuntocomapalavra(semântica)cantada. verdades. Engendramo-nos em homens-bomba-de- Toda vez que uma canção se confessa – “Eu estrelas: cantores. Afinal, “Não só de pão vive o possotefazercanções/Oamorsoaemminhavoz/Eu homem,masdetodapalavraqueprocededabocade possotefazersorrir”–elaseinscreveficcionalmente, Deus”(Mateus:4,4).EcomoDeususaoshomenspara revelando a ficção em nós (ouvintes: humanos na sereestarnoshomensviventesnaterra,épelabocado terra):averdadeilusória,ailusãoverdadeira.Poisno outroquenossituamos(encontramoslugar)nomundo. fundo,comoanotaecantaosujeitodacanção: Aqui ressoa algo de materno: da mãe ideal que alimentaofilhocomleiteepalavra. Ninguémprecisadecidir Porém,nãohámetáforasnemmisticismosnessa Verdade leitura,postoquetodavozvenhadeumapessoaviva: Umailusão boca,garganta,úvula,saliva.Avozimprimeunicidade Digodecoração à pessoa. Há aqui uma constatação da voz e sua Verdade autoficcionalização – aquilo que nos resgata do Seunomeémentira abandono profundo. Nesse movimento, a canção popularéo diáriodosdetentos quesomos.Pensamos A verdade é sempre o que está sendo dito e sobrenóspormeiodavoznascanções.Entrementiras ouvido no instante-já. Ela é o canto paralelo – e sinceras e falsas verdades, mantemo-nos atentos e mantenedor de – ao escândalo de nossa existência. fortes. Não à toa o sujeito da canção “Bogotá”, de Aqui a canção se dedica obsessivamente a arte de Criolo ( Nó na orelha (CD). Brasil, Independente, cantar.Verdades vindas docoração etravestidas na 2011),diz: voz de alguém, as canções nos alimentam de palavras, seguram nossa cintura e não nos deixam Sevocêqueramorchegueaqui cair: Sevocêqueresqueceradorvenhapracá Poisailusãoédocecomomel Eupossotefazerouvir Ecadaumsabeopreçodopapelquetem Milhõesdesinosaoredor Eupossotefazercanções É desse convite irresistível à canção que trata, por exemplo, o sujeito de “Verdade, uma ilusão”, de Énomeiodapontequevaido real ao ficcional , Carlinhos Brown, Marisa Monte e Arnaldo Antunes. que vai de mim para o outro, onde podemos ouvir Guardadanodisco Diminuto (CD.Brasil:SonyMusic, ressoaraquiloquesomos,oupodemosser.Alíngua 2010), essa canção tem um sujeito lúcido de sua queacançãocantaéamesmalínguaquelhecanta.É função: assimque“oamorsoaemminhavoz”,comodizo sujeito.Ovocálicoprecedeeexcedeosemântico.As Eupossotefazerfeliz palavras cantadas guardam sentido, embora nem Felizmesentirtambém sempre guardem significação. A palavra não nos Eupossotefazertãobem traduz,éinsuficienteparatanto.Énavozdealguém Euseiqueissoeufaçobem cantandoaspalavrasquenosforjamos:quesomose estamos.Eassimfazemosa vida valera pena.Ea 8 LeonardoDavinodeOliveira ilusãocriaaverdade:a verdade-mais-erro .Eohorror ouvintedecançãoe,portanto,deoutroscancionistas. desepercebervivoretorna,reinstala-se.Eascanções ÉdestemodoqueCaetanoescutaLobãoqueescuta (de novo) surgem como repostas (cíclicas) ao Caetano. escândalo.Eisostais“volteiosdadançadoespírito” apontados por Caetano. As nossas contrapartidas à vida. 5. Ocantodogrãodeamor Retomando à querela amorosa entre Lobão e 4. Elesseouvem Caetano,registramosque,paraMariaRitaKehl(2006, Emprincípio,acançãoéoequilíbrioentreum p.9),investigandoouniversodo rap edo hiphop ,“o texto (palavra) e uma melodia (instrumental). O tratamento de ‘mano’ não é gratuito. Indica uma equilíbrio se dá na performance (na gestualidade intençãodeigualdade,umsentimentodefratria”.Além vocal) do cancionista – que nem sempre é o disso, em mais um desdobramento para fora, Lobão compositor da canção. É na performance que o dialogacomaexpressão“manoqualquer”(dacanção cancionistaimprimeoefeitodereal:asensação–no “Branquinha”,1989,deCaetano),que,porsuavez, é ouvinte–denaturalidade,asensaçãodequeaquelas tomada da canção: “Mano Caetano” (S/D), de Jorge palavras só podem ser ditas (entoadas) da forma Ben Jor, que saúda o retorno de Caetano Veloso do ouvida. O cancionista dá sentido a sons, ritmos, exílio:“LávemoMano,meumanoCaetano”. sentimentos e experiências que estão soltas no Osuportedo rap eo hiphopcomoveículodo mundo. E cantar é sempre cantar a vida: afirmar a pensamento apontam a relação fraternal e amorosa, existência de quem canta e de quem é cantado. O vistoquebuscatocarooutrocomumamensagem.Ao sujeitode“Elemelê”,deAnaCláudiaLomelino,ao fazer uso do hip hip e do rock como ritmo para seu apontar o gesto do outro – “ele me lê” –, está testemunho,Lobãochamaatençãoparaoefeitodereal, chamando atenção para a surpresa de ser lido pelo enquanto “matéria bruta do dia-a-dia da periferia” outro. (Kehl, 2006, p. 23), naquilo que canta. Ao mesmo Guardado no disco Tono (2010), o verso “Ele tempoemqueocupaolugardosemelhante,aoladode me lê”, quando ouvido, mais parece uma palavra seu“mano”.Afinal,nacanção“Língua”,foiCaetano única–êlimilê–vindadealgumalínguaafro:nagô, Veloso quem pediu por fratria. Juntos, eles podem iorubá,bantu.Paraisso,ageomododepronúnciade mais.Éacumplicidade dosirmãoscontraaestrutura AnaLomelino:geradordeumdeliciosopalíndromo. assertivadalíngua:“línguaéfesta”. Além disso, a melodia mântrica, ampliada pela “O real é uma inferência” (Barthes, 2003, p. repetição ad infinitum do verso-título, a conjunção 78). Assumir a incapacidade de dar conta do real dossons/l/e/m/eosompalindromáticoreforçama (primáriaideiadecompletude)écrueletrazàtonaa gestualidade ritual da canção. O sujeito parece luta atroz de organização do pensamento. Lobão aprofundar-se mais e melhor em si, a cada nova assume–“Teamo!”–econvidaseuamorparafazero repetição:circularidadecartática.Isso,aliadoaosom mesmo:“Vivaalgunsenganos”,diz. Ouseja,entre o dabandaTono,queproduzumacirandaencantatória simeonão,otalvez:acertezadejamaister“acoisa entresintetizadoresepercussão,fazde“Ele melê” emsi”.Aoinvésdoconfrontodireto,acordialidade:a umabelaespiraldefumaçasonora.Acertaaltura,o fratriaentreosmanos. versoqueatéentãovinhasedobrandoparadentrode Em Fragmentosdeumdiscursoamoroso (1984) , sidesdobra-separaforaeentraocoro:“Eletelê”. Barthes aponta que a verdade (destruição do Eis o ápice da vontade do sujeito, o êxtase pensamento) é o que “está ao lado”. Assim, nessa ritualístico: oreconhecimentodaquiloqueelehavia querelaamorosa(no jogo deconjunçõese disjunções dito. entreorealeoficcional),nessecantodogrãodeamor, Composta depois que a cantora descobriu que nãohávencedor(ouperdedor).Quemganha,defato,é Caetano Veloso havia lido um email dela, “Ele me aficção:averdadeestética. lê”sintetizaaideiadequeocancionistamodernoé Referências

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Dadosparaindexaçãoemlínguaestrangeira

Oliveira , LeonardoDavinode Sincereliesorthesongofthegrainoflove EstudosSemióticos ,vol.8,n.1(2012),p.80-90 ISSN1980-4016

Abstract:Thispaperinvestigateshowthepoeticsofthesong,fromtheperspectiveofthe voiceofthesubjectsofsongs,mayassistinthediscussionaboutthefluidcategoriesoftruth andfalsehood.Intensifyingthediscussion,whichislocatedontheborderbetweenfictionand reality,suchcharactersarethepossiblepropositionoftheinvestigation,sincetheystraddle theboundary.Oneofthemostradicalcharacteristicsofthetruth,cousin-sisterofthereality, istobeuncatchable.Thetruth,inthesenseofessence,isimpossibletobeperceived,asit proliferates in various unsuspected directions, hindering the apprehension of its source. However,supportedbythehegemonyofaphilosophythathasbasisinavoicelesslogos,we havegonethroughtimesinsearchofaclearlogic.Analyzingthespeech,thethreevoice subjects-thesongs:“Rock’n’Raul”,byCaetanoVeloso,“ParamanoCaetano”,byLobão, and“Lobãotemrazão”,alsobyCaetano,followingthechronologyoftheircomposition– the goal is to understand the song (existential) within the three suggested songs: the metasongconstruction,whatisbehindthesurfaceofwhatissung.Orrather,whatmakesthe surfacetobeprofound.Thisessayiscrossedbycloseandanalyticalreadingoftheessaysin thebookCriticismandTruthbyRolandBarthes,andaimstolaunchcontributionstowhat hasbeenclassifiedthesemioticsofdiscourse. Keyword:lie,truth,CaetanoVeloso,Lobão,meta-song

Comocitaresteartigo

Oliveira,LeonardoDavino.Mentirassincerasouocantodogrãode amor. Estudos Semióticos. [ on-line ] Disponível em: (http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es ). Editores responsáveis: Franciso E. S. Merçon e Mariana Luz P. de Barros. Volume 8, Número 1, São Paulo, junho de 2012, p. 80-90. Acesso em “dia/mês/ano”.

Dataderecebimentodoartigo: 19/11/2011

Datadesuaaprovação :05/05/2012