Mergulhando nos mangues de Cuba

REVISTA TRIMESTRAL | ANO 10 | Nº 39 | julho, agosto e setembro/2013 | R$ 18,25 e mais Um dia complicado no CT Paraíba As belezas submarinas do Sudão Sidemount: do Rec ao Tec

enfrentando o

Revista DecoStop - R$ 18,25 DecoStop Revista Siltno mergulho

02 | Decostop - Edição 39 editorial

ste ano, quando completamos 10 anos de vida, es- tamos comemorando uma marca histórica: somos a maior revista de mergulho do Brasil e uma das maio-

res do mundo. Diretor ComoE conseguimos esta marca? Com investimentos entre 2012 Rodrigo Coluccini Jornalista Responsável e 2013 que nos proporcionou a entrada no mundo digital. Hoje, André Moreira Junqueira - MG 10191-JP além da versão impressa, oferecemos aos nossos leitores versões Revisores Técnicos Roberto da Luz (Bob Light) digitais para eles lerem a revista em seus smartphones e tablets Revisão sistemas IOS ou Android. Inauguramos também a versão para ser André Moreira Junqueira Foto Capa lida em computadores. Renata Unger Para gerenciar tamanha revolução contratamos uma empresa es- Projeto Gráfico Clovis Mello pecializada e muito profissional. E com ela temos acesso a di- Editoração versos dados como georeferenciamento, quantos downloads são Clovis Mello www.clovix.com.br feitos por hora e dia, quais páginas são mais lidas, suporte técnico rápido e verificação de circulação. Tudo o que uma publicação Colaboraram nesta Edição: André Luiz Woitech Hecksner, Roberto séria precisa para funcionar. da Luz, José Roberto Faria, Gilson Junior, A versão digital da revista permite ao nosso leitor acessar o conte- Karoline Meyer, Tiago Jr, Flávia Dabbur, Romeu Dib, César Gentile, Fernanda Paiva, údo da Deco Stop em qualquer lugar do mundo, 24 horas por dia Marcel do Espírito Santo, Marcel Souza, e 7 dias da semana. Renata Linger, Thiago Brunelli Someva e HP Hartmann Desde nossa última edição voltamos a abordar assuntos relacio- nados a técnicas de mergulho, tema principal do lançamento da A revista Deco Stop é uma publicação trimestral direcionada ao mergulhador revista em 2003. Alguns dos melhores mergulhadores técnicos do brasileiro. Temos como objetivo suprir a Brasil já se juntaram ao nosso time de colaboradores e as maté- necessidade constante de conhecimento que todo mergulhador necessita para rias publicadas em nossa última edição fizeram bastante sucesso, realizar esta atividade. principalmente sobre sidemount e sobre a Mina da Passagem em Atenção Mariana. A prática de mergulho exige a realização de E assim continuamos nosso trabalho, não só mergulhando, mas um curso específico. entendendo do que se trata e explicando para o grande público o Não incentivamos ou recomendamos que que é o mergulho e o ambiente onde nós o praticamos. qualquer prática/procedimento ou técnicas ligadas ao mergulho sejam realizadas sem que um treinamento adequado tenha sido Boa leitura, feito previamente.

As matérias ou opiniões apresentadas Rodrigo Coluccini na revista, não refletem necessariamente a opinião do editor, sendo de total responsabilidade de seus autores.

04 | Decostop - Edição 39 www.decostop.com.br índice número 39 | julho, agosto e setembro de 2013

06 Mercado Brasil 34

12 Smoke on the water - SILT

18 O mergulho como profissão

24 Lei de Murphy

28 Mergulho no mangue em Cuba

34 Buddy Dive Event

38 O paraíso subaquático: Sudão

46 Sidemount do tek ao rec

50 Mergulho em cavernas da Austrália 28

Para contato, não esqueça de colo- fale com a gente! car seu nome completo, endereço com cidade e estado, telefone e data Você quer dar sugestões, tirar dúvidas, de nascimento. Para assinar, acesse fazer comentários ou participar das seções o site www.decostop.com.br e cli- da Deco Stop? Entre em contato conosco. que em Assine já. O processo é rápi- Tel.: 31 3517.8771 - De segunda a sexta, das 10 às 16h do e fácil. Se você tem interesse em adquirir exemplares anteriores pelo Carta: Revista Deco Stop | Av. Picadilly, 55, Center I, preço da capa atual, acesse o link Sala 209 | Alphaville Lagoa dos Ingleses www.decostop.com.br/atrasados. CEP 34000-000 | Nova Lima - MG shtml. Para anunciar, entre em con- tato via e-mail por meio do endereço E-mail: [email protected] [email protected] Site: www.decostop.com.br

Decostop - Edição 39 | 05 mercadoBrasil

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08 | Decostop - Edição 39 amigosdojoe borbulhando 2 A segunda edição da maior feira de Instrutor e Fotógrafo profissional dores do Brasil que tiveram oportunidades de mergulho realizada por um centro de mergu- • Paulo da Silva treinamento em mergulho recreativo, técnico e lho do Brasil aconteceu nos dias 7, 8 e 9 de Proprietário da marca FUN DIVE profissional através de palestras específicas junho de 2013 no Centro de Mergulho Ami- • Fernando Martins e workshops. Não obstante, todos os partici- gos do Joe. Gerente Regional da PADI no Brasil pantes ganharam assinatura digital da revista A escola paulistana localizada no • Milton Marinho de mergulho brasileira DECO STOP. bairro Paraíso na cidade de São Paulo pro- Course Director PADI O evento também contou com moveu palestras, workshops, gincanas e • Leandro Antonicelli venda promocional de equipamentos de muitas promoções e prêmios para os fre- Instrutor e Gerente da importadora diversas marcas e cursos de mergulho. Os quentadores da feira. SEASUB resultados de vendas de equipamentos e Mais de quatrocentos mergulhadores • Joe Botero principalmente de cursos de especialidades e interessados na atividade se reuniram du- Instrutor Técnico e proprietário do impressionaram e alcançaram resultados rante os três dias do evento que contou com Centro de Mergulho Amigos do Joe ainda maiores do que do ano anterior graças muita animação, brincadeiras e sorteio de ao apoio das empresas SEASUB, FUN DIVE, mais de 200 brindes entre equipamentos de Devido ao grande sucesso da primeira CRESSI, KS SPORT, ADVENTURE TRAVEL, mergulho e cursos de especialidades. edição ocorrida em 2012, o centro de mergu- OXIGENAÇÃO TURISMO, ARRIBATUR e lho se empenhou muito para fazer uma evento REVISTA DECO STOP. Em 2014 a AMIGOS Entre os palestrantes maior e melhor este ano, afirma Joe Botero - DO JOE já promete um evento com mais um presentes destacamos: proprietário da escola. E mais uma vez alcan- dia de duração para atender a demanda de • Sandro Cesar çou grande repercussão entre os mergulha- seus clientes e alunos.

Entrega da nadadeira X-FIN na premiação da gincana subaquática

Paulo, da Fun Dive, realizou palestras sobre seus produtos Fernanda Papassoni recebe seu prêmio – um regulador SUB GEAR

10 | Decostop - Edição 39 matériadecapa

Smoke on

12 | Decostop - Edição 39 Por Rodrigo Coluccini Pouco tempo se passou até que uma nuvem Percebo em conversas com alguns Fotos Renata Linger de silt se elevasse e o mergulhador do lado mergulhadores que o temor em relação ao de fora percebesse que era um mergulhador silt é muito presente e uma ameaça para A música do Deep Purple, conjunto em pânico dentro da nuvem de silt. Neste a segurança do mergulho. E realmente é famoso desde a década de 70, descreve momento, a oitenta metros de profundida- assim quando o individuo não está devida- bem um cenário de silt ou suspensão de de, o mergulhador teve que negar socorro, mente preparado. Quando o mergulhador partículas durante um mergulho: é como se pois seria quase certo, naquele momento e faz o dever de casa proposto pelo bom ins- estivéssemos dentro de uma fumaça debai- circunstâncias, que não um, mas dois mer- trutor, o silt é apenas uma parte do mergu- xo dágua. E aprender como enfrentar bem gulhadores acabariam morrendo no local. lho, um momento onde você vê que sabe tal situação é crucial em cursos de mergulho Aprendizado, treinamento e preparo mergulhar e que está integrado ao ambien- técnico. físico são pontos chave na constituição de te aquático. Nada mais compensador! Para os mergulhadores interessa- um bom mergulhador. Primeiro é preciso É bom lembrar que para um curso dos em realizar mergulhos em cavernas aprender, corretamente, as técnicas neces- de mergulho técnico é preciso que você e naufrágios, entender a mecânica do silt sárias. Depois é preciso praticar o que foi escolha um bom instrutor. Antes de ser um é indispensável para garantir a segurança ensinado, de modo a deixar as técnicas au- bom instrutor ele tem que ter sido um bom individual e da equipe de mergulho. Silt ou tomáticas e naturais e finalmente, o preparo mergulhador, ter feito mergulhos diversos suspensão é o efeito causado por agitação físico. Enfrentar uma situação de stress sa- e variados e ser reconhecido por isto. Se na água onde um conjunto de partículas di- bendo que você está preparado fisicamen- informe no mercado sobre as credenciais versas acumuladas em determinado local se te para o desafio faz muita diferença, te dá daquele que vai te ensinar. Não adianta falar movimenta podendo causar baixa ou zero segurança principalmente no quesito consu- bonito e usar as palavras certas. Seu instru- visibilidade. mo de ar, que com certeza será bem baixo. tor tem que ter história. Um dos livros mais emblemáticos da Pessoas com muita adaptação ao Seu dupla de mergulho também história do mergulho, “O Último Mergulho”, meio submerso enfrentam uma situação de deve ser muito bem escolhido. Não bas- cita bastante o cenário de silt tanto como visibilidade zero com muita naturalidade. Al- ta ter feito o curso e comprado o melhor grande vilão como o “divisor de águas” de guns bons mergulhadores que tive o prazer equipamento de mergulho do mercado. um mergulhador técnico, ou seja, se con- de ter como meus duplas eram capazes de Alguns mergulhadores técnicos equipados seguiu superar o momento aquele pode ser segurar no cabo, fechar os olhos, diminuir o parecem prontos para irem a um baile, de considerado um mergulhador “safo”. ritmo de respiração e aguardar o silt diminuir, tão arrumados, mas dentro dágua é preci- A passagem que mais me marcou mesmo que demorasse alguns minutos. so mais que isso. Conheça seu dupla. Faça na leitura deste livro foi o ocorrido durante Vale lembrar que em algumas cavernas ou primeiro mergulhos de reconhecimento, um mergulho no Andrea Doria onde o autor compartimentos de navios com fluxo de mais rasos e fáceis para depois fazer os relata que um mergulhador estava nadando água inexistente é preciso se mover, pois a mergulhos mais complexos. Descobrir que por um bordo do navio quando viu uma agi- nuvem vai demorar muito tempo para dissi- seu dupla não tem as habilidades neces- tação em um dos compartimentos onde era par, mas o bom mergulhador percebe isto sárias durante um silt vai ser muito desa- notória a existência de peças de porcelana. com antecedência. gradável. the water Como enfrentar o silt durante o mergulho

Decostop - Edição 39 | 13 Por Roberto da Luz Era realmente interessante encontrar cluir que não era fácil escalar a pirambeira em cada restaurante, abrigo ou operadora para atingir a abertura lá em cima... Sabemos desde os primeiros cursos de mergulho, companheiros que há algum Após a breve pausa retornamos ao básicos que SILT é como se designa aque- tempo não víamos ou com quem só mantí- cabo para o trajeto de volta. la névoa que surge em alguns ambientes nhamos contato, ultimamente, pela internet. aquáticos e que tende a dificultar a visibilida- O ambiente era descontraído e cada time Tudo bem até aí? de e por consequência, o desenvolvimento procurava dar continuidade aos seus plane- Não exatamente. tranquilo do mergulho. jamentos. Mesmo os leitores não experts em Podemos nos deparar com ele em Eu viajava com a turma da DiveGold mergulho em caverna já devem ter ouvido ambientes confinados como naufrágios ou , do Romeu Dib, um grupo super agradá- falar da regra dos terços, fundamental para cavernas e mesmo em águas abertas. vel e de fácil convivência e integrava o time a segurança. Ao nos interessar pelo mergulho em do Rio que tinha o Rafael Zibelli como líder O mergulhador deve iniciar o regres- caverna, o enfoque sobre o silt é mais aper- e contava ainda com o fotógrafo Pedro Sal- so ao atingir um terço do seu gás, de modo feiçoado tendo em vista os diversos tipos de danha Werneck. a otimizar seu retorno diante de um proble- ambientes que serão encontrados e conse- Fizemos alguns mergulhos iniciais ma qualquer, seu ou de alguém do time. quente influência deles nos futuros mergu- e contamos com fatores pouco comuns às Eu havia atingido o terço pouco an- lhos em ambiente com teto. cavernas da região, caracterizadas pelo in- tes de chegar ao Chalenger, de sorte que, Embora com muitos anos de água tenso fluxo. Nesses dias a tal força da água ao iniciarmos o retorno estava com menos e milhares de mergulhos em destinos bem na entrada das cavernas não se manifestou gás do que devia. distantes minha experiência com o silt se re- o que se traduziu como decepção para al- Até hoje acredito que o Zibelli não sumia até dois anos atrás em episódios em guns... Afinal o mergulho é melhor quando é me “finalizou” quando mostrei a ele o manô- que a visibilidade era tão baixa que mergu- mais difícil e você tem que aplicar a técnica metro, devido ao medo de ter que se expli- lhos foram abortados por inexequíveis. que tem (ou acha que tem). car à polícia da Flórida. Até que chegou o dia em que “o bi- Mas, como diria o cara que se atirou A NationalGeographic cho pegou”... do Empire State, ao passar pelo 10º andar, conceitua o fenômeno Entramos no sistema PEACOCK “Até aqui tudo bem...” “O Silt é formado por partículas de para fazer o percurso de Peacock I até Chal- Já havíamos completado cerca de pedras e rochas que são maiores que argila, lenge Sink quando algumas equipes já es- vinte minutos do nosso regresso quando mas menores que areia. Partículas indivi- tavam no mesmo há algum tempo. Nosso repentinamente fui apresentado ao tal do duais de silt são tão pequenas que temos planejamento incluía seguir o cabo guia pas- Silt. Não um Silt como o descrito na litera- dificuldade em vê-las. Para ser classificada sando por uma região conhecida do Rafa- tura, mas uma camada de cascalho, argila como Silt a partícula tem que ser menor que el, com restrições interessantes e com solo e areia microscópica que tornou o ambiente .005 centímetros”. de areia fina, até atingir um ponto onde era com uma coloração dourada e impossível Como exemplo do quanto pode ser possível visualizar uma abertura no alto de de visualizar alguma coisa. Fui para o cabo vasta a diversidade do silt podemos citar uma escarpa, que se afigurava como uma guia e em seguida senti a mão do Rafael so- que, após apenas uma hora de chuva pe- chaminé (Challenge Sink). bre a minha, sinalizando para que eu ficasse sada, a baía de Anabela em KWAI-Hawai, O trânsito era intenso e nos depara- parado ali. foi tomada por um extenso silt que quase a mos com alguns grupos usando scooters, Logo percebi que o Pedro Werneck cobriu totalmente. A baía é lar de recifes de tendo inclusive de cruzar com eles em áreas continuara à nossa frente e a intensão do coral que podem ser sufocados pelo exces- mais ou menos confinadas, mas sem ne- Rafael como líder do grupo era buscá-lo e so de silt que é transportado pela água, gelo nhum problema. retornar até onde eu ficara. e vento que ao cessar gera o depósito. O cenário, para mim inédito, era Na minha já longa vida, devido à mi- Depois desse breve introito vamos muito interessante já que as “minhas” caver- nha atividade profissional anterior, já estive narrar uma experiência vivida por mim inte- nas eram as da Riviera Maya, bem diferen- em muitas situações de alto risco, o que tal- grado a um time de mergulhadores de ca- tes das que agora mergulhava e que julguei vez se traduza num certo cinismo diante de verna, em 2011, na região do WES SKYLES mais técnicas. mais uma. O certo é que o pensamento que STATE PARK, na Florida. Após completar o trajeto planejado me ocorreu foi o de que aquele era o pior Era o fim do ano de 2011 e diversas chegamos a Challenge onde, sem teto, po- momento para ficar parado gastando o gás equipes de mergulhadores brasileiros para lá díamos atingir um pequeno lago encimado em vez de sair em direção à entrada. Aí vem convergiram em busca de um dos destinos pela tal chaminé. Parada para um papo, tirar aquele momento do “pense, pense, mante- mais desejados pelos caverneiros. as máscaras, examinar o ambiente, e con- nha o ritmo lento de respiração etc, etc.”

14 | Decostop - Edição 39 “O Silt é formado por partículas de pe- dras e rochas que são maiores que argila, mas menores que areia. Partículas indivi- duais de silt são tão pequenas que temos dificuldade em vê-las. Para ser classifica- da como Silt a partícula tem que ser menor que .005 centímetros”.

No primeiro sinal de silt tome as providências com antecedência

Decostop - Edição 39 | 15 Em cavernas o silt também está presente. Saiba com que está mergulhando para evitar problemas

O Silt pode transformar uma ótima visibilidade para zero ou quase zero em alguns segundos

Naufrágios possuem sedimentos depositador em diversas partes e a simples movimentação das bolhas

Uma regra que eu sempre segui em termos de mergulho é verna freática e com constante fluxo, a possibilidade de que aquela que eu sempre soube com quem estava mergulhando em locais que “nuvem” estivesse em grande parte do nosso trajeto de retorno, ficava desconhecia. Eu confiava na experiência do Rafael naquele tipo de ainda mais real. caverna e sabia que em último caso haveria a possibilidade de retornar Chegando ao nosso laguinho, foi o momento de tirar o equi- ao tal Challenger, isso se eu não ficasse parado onde estava. pamento e examinar o local a essa altura já no escuro. Mais uma vez Pouco tempo depois retornam os dois ainda no meio daquele coube ao Zibelli a tarefa de escalada até a boca do buraco enquanto Silt dourado e Zibelli sinaliza para o retorno para a tal chaminé. eu e Pedro esperávamos pacientemente e imaginando o que o resto Como um bom gerenciador de risco ele analisou a possibili- da turma estaria pensando devido a nossa demora. dade de que aquele Silt (que continuava a nossa frente) poderia estar Depois de mais de uma hora apareceram os “socorristas” espalhado durante todo o nosso trajeto de retorno o que fatalmente que nos auxiliaram na retirada das tralhas e na nossa própria escalada (fatalmente mesmo) iria nos atrasar. rumo a escuridão e ao ar livre. Claro que no dia seguinte já estávamos, de novo, naquele Como o nosso caminho vindo da abertura cenário, prontos para outras, graças à “pilha” colocada pelo Romeu. estava límpido, era essa a nossa opção. A decisão adotada pelo líder do grupo, optando pelo retorno Vale lembrar que o surgimento do Silt foi muito rápido e ha- a um local mais próximo está de acordo com os mais conceituados via alguns mergulhadores que cruzaram conosco ainda na nossa ida, experts em gerenciamento de risco em mergulhos em caverna. Pre- mergulhadores esses que podem tê-lo provocado. O uso da técnica ceituam eles que, você não deve lidar com mais de um problema. em que o mergulhador usa as mãos para ajudar na sua progressão Já havia o do meu gás, e não era prudente acrescentar o do retorno pode, também, ter contribuído para o aparecimento do sedimento. envolto no Silt durante um tempo que não podíamos prever. “Ao surgir Outro aspecto que pesou na decisão é que por ser uma ca- o primeiro problema, resolva-o e chame o mergulho”. E assim foi feito.

16 | Decostop - Edição 39 LIVE ABOARD 75’

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Maceió possui excelentes mergulhos em naufrágios e esse é o novo escritório da Fernanda

18 | Decostop - Edição 39 como profissão Quem nunca sonhou em trabalhar com o que e ter seu escritório no mar?

lhava. Mas o outro lado da balança era que eu não tinha vida pessoal, O mercado do mergulho recreativo está crescendo a vivia para o trabalho, não tinha muitos amigos e para tirar férias era uma cada dia. O turismo de mergulho é dos que mais cresce no negociação árdua. Várias perguntas não saiam da minha cabeça, tinha Brasil e no mundo. E as empresas não encontram mão de um desejo de mudança, mas eu não sabia direito o que fazer. obra qualificada. Não só na parte de cursos, onde faltam dive Em agosto de 2011 decidi ir para o nordeste com os meus pais masters e instrutores de mergulho, mas também na área ad- para passar minhas tão sonhadas férias. Fomos de carro de Resende- ministrativa, como financeiro, marketing e vendas. São raras -RJ até Maceió-AL. Programei finalmente meu tão sonhado curso de as pessoas que se formam em administração ou turismo e mergulho. Acho que já fazia mais de 2 anos que eu tentava reunir a olham para o mercado do mergulho recreativo como uma galera em São Paulo para fazer o curso, mas quem vive em São Paulo oportunidade. Uma empresa de mergulho que geralmente sabe como as coisas são. Era difícil reunir os amigos, pois cada um oferece ao mercado cursos de mergulho também vende equi- tinha uma prioridade, os horários não batiam, quando a gente não es- pamentos e organiza viagens, ou seja, é uma empresa como tava trabalhando ou preso no trânsito a gente queria ficar em casa ou outra qualquer e oferece muitas oportunidades para quem descansar. Nossas aventuras eram ir para Ubatuba e pegar em média quer no futuro levar uma vida com as quais os outros apenas umas 6 horas de engarrafamento. SONHAM. Aqui em Maceió conheci o Luis Miguel, que foi meu instrutor de Simpatia e profissionalismo são marcas registradas de mergulho e atualmente é meu namorado e meu sócio na Let’s Dive. Ao Fernanda fazer o curso de mergulho comecei a pensar em como seria legal traba- lhar com isso. Seria uma grande mudança sair de um escritório para um ambiente totalmente descontraído com contato direto com a natureza. Pensei comigo: será possível? Voltei para São Pau- lo e pensei muito na possibilidade e daí fiz minha escolha. Larguei tudo e me mudei para Maceió. No começo até procurei um trabalho na minha área, mas depois resolvi entrar de cabeça e resolvi trabalhar com o Miguel na parte administrativa da Escola de Mergulho. Foi uma decisão difícil, com certeza. Acho que a mais difícil da minha vida, mas hoje depois de 2 anos sei que foi a melhor coisa que eu fiz. Lógico que no começo foi muito difícil, pois comecei tudo do zero. Tive que correr atrás do tempo perdido. Fiz todos os cursos de mergulho até virar instrutora de mergulho no final de 2012. Costumo dizer que dei um passo para trás para no futuro dar 2 para a frente. Sei que foi uma mudan- ça radical e só consegui fazer em tão pouco tempo porque eu ainda não tinha família, tinha feito um pé de meia e ainda tive o apoio do Miguel, que me ensinou grande parte das coisas que sei hoje. Entretanto, conheço algumas pessoas com família formada que fizeram essa mudança aos poucos. Levaram as duas carreiras em paralelo até que se sentiram seguros para viver só do mergulho.

Decostop - Edição 39 | 19 Marcel Souza Sempre gostei de esportes alternativos, Porém o mar continuava cada vez me bike, trilhas, camping, escalada, etc. atraindo mais. Em 95 me formei instrutor Como todo bom mineiro passava as fé- pela PDIC e percebi que poderia utilizar rias escolares na praia. Foi aí que tive o o mergulho como uma segunda fonte de primeiro contato com uma máscara de renda e até, quem sabe, passar a viver mergulho e com a pesca submarina. Isto apenas do mergulho. aconteceu em meados de 1985. Hoje quase 20 anos depois, não conse- Algum tempo depois, em um passeio na gui transformar o mergulho na minha serra do Cipó, o Roberto da Trisport co- principal fonte de receita, mas mentou comigo que conhecia a dona de certamente é a minha princi- uma escola de mergulho e me pergun- pal fonte de boas histórias e tou se eu não queria fazer um curso de onde eu conheci pessoas mergulho autônomo. e lugares incríveis. Depois de pensar muito, quase meia Para os próximos 20 hora, decidi que queria me aventurar anos? Quem sabe? debaixo d’água. E em agosto de 1990 Ainda tenho mui- eu, Rodrigo Coluccini e Paula Loque, fi- to que compartilhar zemos o curso básico de mergulho na com meus alunos, Mar a Mar. muitos lugares para Entre 1990 e 1995 me formei em enge- conhecer, e uma rou- nharia, continuei fazendo mais cursos de pa seca novinha que mergulho e consegui um bom emprego precisa ser amaciada. na área de telecomunicações.

Marcel Souza Foto: Flávio Martins Foto Flávio Martins

Cesar Gentile Me tornei instrutor de mergulho e passei a traba- lhar com isto porque desde pequeno era malu- co pelo mar, mergulho, histórias de tubarões e naufrágios, sendo as de naufrágios que mais me fascinavam. Assistia tudo de mergulho na TV, lia revistas, colecionava e usava a máscara até no seco dentro de casa quando criança. Acabei me formando em administração por ne- cessidade da minha família, mas anos depois quando tive a oportunidade, entrei de corpo e alma na minha formação e passei a trabalhar e viver apenas do mergulho! Atividade que me dá muito prazer, que dou muito valor, que me dá o pão de cada dia e me mostra o mundo em cada grupo que levo ao exterior. Hoje sou proprietário da Cesar Dive Team, loja e escola em Caraguatatuba, Instrutor Trainer PDIC, IANTD e SDI e TDI.

20 | Decostop - Edição 39 Marcel do Espírito Santo tinha ênfase na exalação). As primeiras Quando ainda adolescente disse que que- palavras ao invés de gugu dadá, ria ser instrutor de mergulho e fui motivo de como toda criança normal, chacota para muita gente, até mesmo meu foi CCPA. pai tentava me convencer do contrário, me Meu primeiro mer- dizia que mergulhador não ganhava dinheiro gulho foi aos sete (como ele adivinhou?!). anos, dentro Mesmo com toda oposição fui em frente, de um tambor depois de uma lista incontável de empregos, de 200 litros, juntei um dinheiro e com muita insistência com água acabei convencendo meu pai e com o apoio suja e fria da minha família comecei meu longo trajeto que o pe- até esse objetivo. dreiro usava Foram tempos difíceis, andei muito de ôni- numa obra bus, trem, metrô, carona, a pé, tendo sempre em casa (já como fiel companheira minha “LEVÍSSIMA” foi em con- mala de mergulho nas costas. Foram mui- dições exte- tas noites em pensões meia boca, na casa nuantes e com de amigos, no relento e em barcos, tendo a baixa visibilidade), companhia de pernilongos e de baratas. onde na verdade Não foi fácil, mas consegui e só posso agra- queria testar um relógio decer a todos que me ajudaram e principal- N a que acabara de comprar no mente a Deus por poder fazer da minha vida verda- camelô e dizia ser à prova d’água. o que amo e por poder dividir com cada vez de “nascido pra (Testemunhei ele alagar à menos de 1 mais pessoas o que ele criou de mais perfei- mergulhar” não é apenas uma frase em vão, ATM). to: O MAR! mais que um estilo de vida, tem comprova- Um pouco mais crescido, depois de co- Sei que é só o começo, tenho muito a cres- ção fisiológica e assim como nitrogênio solu- nhecer o mar (pois até então só conhecia cer e a aprender, mas também muito a dividir, bilizado, está no sangue de verdade... rios e represas que cercam minha cidade, pois hoje sou mergulhador e com esse dom Minha mãe conta que eu era um bebê tran- minha maior felicidade até então era o rio tenho um mundo inteiro a percorrer e apenas quilo, só chorava na hora do banho, quando Tietê), tive a confirmação de que nunca um limite: O FUNDO! ela tentava me tirar da banheira (esse choro já mais poderia viver sem ele.

Ricardo Diniz Desde que comecei a mergulhar, sempre foi puro prazer. Como instrutor ministro meus treinamentos seguindo os padrões da certificadora IANTD com esse mesmo senti- mento, com o objetivo de formar um grupo de amigos mergulhadores, fazer viagens, sempre aprendendo coisas novas, novos limites. Não dependendo financeiramente do mergulho, trabalho no Ministério Público. Sou instrutor por gostar muito de mergulhar e ter a vontade de que todos os meus amigos conheçam o mar da forma como nos o descobrimos.

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complacência A temida e a lei de Murphy Tudo que pode dar errado vai dar errado.

A turma unida em cima e embaixo da água

Por Roberto da Luz a asa ao contrário, só vendo o erro por indi- de descer cerca de 3 metros. Saímos, as- cação do André. sim, à tona na proa da embarcação e não No dia 31 de agosto nosso grupo Fora do comum no meu costumei- iniciamos a descida como seria o normal. formado por três mergulhadores de rebre- ro equipamento, figurava, ainda, um cilin- Após chamar a atenção do mari- ather, Eduardo Davidovich (Doc), André dro de tamanho médio, contendo argônio, nheiro que efetuara o lançamento do cabo, Domingues e Fabio Azevedo,e dois (eu e anexado do lado esquerdo da minha dupla. Basílio rumou direto para o fundo, fazendo Basílio) em Circuito Aberto, rumamos para Este seria o segundo item fora da minha periodicamente sinalização de OK com a aquele que seria mais um mergulho no CT configuração habitual. lanterna, sinais que eu respondia normal- Paraíba,à bordo da lancha Darth Vader II. Chegando ao ponto do naufrágio, mente. A manhã iniciava com um belo dia após a fixação do cabo, foi dado início ao Deixamos, assim, de fazer o clássi- e o mar propício a uma boa navegação, lançamento dos mergulhadores. co check de bolhas aos seis metros. Notei, favorecia mais um bom mergulho naquele Ao entrar na água, por último, já no trajeto, que meu dupla descia bem de- naufrágio que já visitara mais de 250 vezes, que os três de CC já haviam iniciado o pressa, o que é normal para ele, enquanto e que se transformara no “playground” dos mergulho, juntei-me ao Basílio (comandan- eu não conseguia acompanhá-lo. mergulhadores técnicos no Rio. te da embarcação e com mais mergulhos Até então nada de anormal eu sen- No decorrer do trajeto, alguns deta- no naufrágio do que eu) e descemos pelo tira, até porque ao descer com a célula lhes, que se revelariam importantes, foram denominado “Bobline”, que é um cabo que vazia e apenas compensando levemente a se sucedendo. saindo da popa, vai unir-se, aos seis metros pressão da roupa seca com o argônio, não Já no início da montagem do meu de profundidade, ao cabo da garatéia que havia porque acionar meu lift. equipamento, passei a usar uma S/80 do desce da proa e é fixado ao navio. Chegando ao naufrágio onde todos Doc como suprimento para deco com EAN Nessa etapa, deparamo-nos com se encontravam, fui logo avisado pelo An- 40, em substituição a minha S/40 habitual. o que seria o primeiro problema, o Bobline dré Domingues para chamar o mergulho, Ainda nessa fase consegui montar subia, novamente, até a superfície depois com o clássico sinal de polegar. Ao mesmo

24 | Decostop - Edição 39 Quanto mais mergulhamos, mais precisamos nos policiar e checar tudo nos mínimos detalhes no nosso equipamento tempo ele sinalizou para que eu não assu- dois stages e mais o cilindro de argônio es- Vale lembrar que fui durante muito misse o tradicional “Trim”, pois estava com tava perigosamente tombado e impedindo tempo adepto das chamadas arruelas de problema na minha asa. que inflasse a célula. pressão que ajudam a garantir a fixação Sem poder, até então, aquilatar o Mantendo precariamente a flutuabi- das borboletas nos respectivos parafusos. problema que ele percebera, retornei para lidade apenas com o argônio parcialmente Com o tempo, e a repetição constante de o cabo e avisei ao Doc que iria subir. injetado na roupa, meu deslocamento esta- mergulhos sem que fosse notada qualquer Ele, de imediato sinalizou que iria va sendo uma tarefa árdua e só com auxilio anormalidade nos conjuntos mesmo sem junto e abortou o mergulho no que foi consegui chegar à popa da embarcação o uso das arruelas, terminei por “dispensá- acompanhado pelos demais. Nessa hora onde até a costumeira faina de passar os -las” embora recomendando sempre aos eu constatei que a coisa era séria mesmo. stages para o tripulante, ficou difícil. Mais meus amigos e alunos o seu emprego. Foi quando o conjunto backplate- asa, às uma vez precisei de apoio para desvenci- Abro um espaço para relembrar minhas costas, girou (parecendo que es- lhar-me de toda a tralha. que, em alguns artigos e em palestras, por tava quase solto), pendendo para o lado Uma vez na lancha, constatamos diversas vezes fiz referência a um proble- esquerdo. que a borboleta da parte de baixo do ma que acomete alguns mergulhadores Sempre monitorado pelo Doc, subi back-plate havia se soltado e o parafuso experientes e em constante atividade. Por (respeitando as paradas, inclusive as dele, saíra do orifício, fazendo que todo o con- coincidência, numa matéria, nesta revista, obviamente mais longas, pois descera an- junto girasse, afetando definitivamente sobre esse mesmo naufrágio, de autoria do tes), até a superfície, após 35 minutos de qualquer possibilidade de equilíbrio. Para- Rodrigo Coluccini, (na qual eu colaborei), mergulho e ter atingido apenas 41 metros lelamente o esforço concentrado no único abordei exatamente esse problema. Ele de profundidade máxima. parafuso restante forçou a outra borboleta se caracteriza como uma atitude que se Ao chegar à tona, senti a dificulda- e terminou por criar uma folga significativa apossa dos mergulhadores após anos de de de me manter na superfície já que o lado cuja tendência seria acabar por também mergulhos sob as mesmas condições (al- esquerdo do back-plate que suportava perdê-la. gumas vezes bem radicais) e sempre com

Decostop - Edição 39 | 25 pleno sucesso nas suas imersões. Há uma zona muito próxima da complacência. Na descida, com o problema do tendência a certo relaxamento, “já fizemos Eu, principalmente, assumo que ela Bobline na superfície, deveríamos ter com- isso centenas de vezes...” o que pode con- esteve presente em algumas das minhas binado o check de bolhas ao iniciar a desci- duzir à desatenção e consequentemente atitudes, embora tenha sido sempre um da no cabo principal, o que provavelmente, ao desastre. Isso é a terrível complacência. dos seus maiores críticos. evidenciaria o problema (se ele já tivesse Analisando cuidadosamente toda a A inclusão de dois itens não comu- surgido naquele momento). operação e recapitulando as diversas eta- mente usados nas minhas outras imersões Como somos eternos aprendizes, pas desde a equipagem e a preparação (S/80 stage e argônio em cilindro maior) de- resta nossa lição e esperar que, de alguma para o mergulho até a entrada na água, veria motivar mais atenção na montagem forma ela sirva, também, para que nosso concluímos (conversei sobre o ocorrido do equipamento e cheque da asa – back- leitor não venha a se tornar vítima da temida com outros mergulhadores que comumen- -plate. A borboleta soltou porque foi mal complacência. te nos acompanham no mesmo point) que, apertada? Ainda mais que, anteriormente Quanto à Lei de Murphy, há que apesar dos diversos problemas resolvidos já montara a asa erroneamente. (meu dia segui-la como um dos mais importantes seguidamente, estamos entrando numa já se pronunciava como não dos melhores). mandamentos do mergulho técnico.

O CT Paraíba em ação

O mergulho no CT Paraíba é um dos mais técnicos em nosso litoral. Foto: José Roberto Faria

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MERGULHO NO MANGUE EM JARDINES DE LA REINA Texto e fotos Flávia Dabbur desde minha infância fui inserida no contexto mangue até porque frequentava praias do litoral norte paulista desde os 4 anos e que Gostar de mangue? Sei que não é de gosto universal. Pou- ainda hoje tem um mangue preservado nas redondezas. cas pessoas tiveram a oportunidade de contato mais íntimo como Só que gostar de mangue e mergulhar em mangue para cursos, pesquisa ou mesmo lazer. Meu caso foi diferente, pois mim sempre foi uma controvérsia, afinal a maioria das vezes está localizado na costa, em rios, lagoas e com um fundo lodoso com muita matéria orgânica em suspensão e por isso a visibili- dade da água é de uma média geral muito ruim. Mas meu de- sejo de ver as criaturas deste ecossistema (um berçário) sempre se manteve comigo; até enxergar as raízes rizóforas e pneuma- tóforos de outro ângulo sempre me fascinou. Para minha surpresa e felicidade ao mesmo tempo, numa viagem a Jardines de La Reina em Cuba e na expectativa de ver o que foi mostrado nos vídeos e reportagens me sur- preendi quando em nosso primeiro dia fomos dar uma volta de lancha no manguezal. Manguezal? Quando me dei conta estávamos cercados de mangue. O hotel flutuante é no meio de uma área estuarina. Olhei para baixo e uma visibilidade caribenha. Fiquei radiante perante a situação. Antes mesmo de Gustavo, nosso divemas- ter, explicar como seriam os mergulhos e nossa rotina naquela semana eu perguntei: podemos mergulhar no mangue? Ele res- pondeu que lógico, poderíamos. Mas ainda sem sentir firmeza na resposta e num desespero de sair dalí sem poder colocar o rosto debaixo d’água perguntei mais duas vezes. Ele já rindo e não acreditando que estava mais preocupada com os mergu- lhos no mangue do que com os mergulhos com os tubarões foi categórico: pode até me dizer que dia você prefere! Depois dessa fiquei feliz e acalmei. Nosso primeiro “mangroove dive”, digo nosso, pois to- dos entraram na minha loucura e foram juntos no mergulho do mangue, mesmo sem entender o que realmente poderíamos

Decostop - Edição 39 | 29 ver ali (digo isso, pois metade do grupo me paisagens. Não preciso dizer que eu e um da área estuarina mais distante. Nesse dia perguntou sobre mangue, o que era e o alemão fomos os últimos a voltar, muito somente eu, Sam e Gustavo (DM). A água porquê seria interessante mergulhar alí). Fi- tempo depois do restante do grupo, o que estava muito limpa, pois ficava numa área zemos o mergulho no segundo dia depois gerou muita gozação, pois segundo o pes- voltada ao mar aberto, o que modificou dos três mergulhos nos recifes. soal que esperava no barco, e não tinha o bastante a fauna e o visual. Em alguns mo- Cinco minutos de navegação na que fazer, só viam nossas nadadeiras en- mentos parecia que estávamos em águas lancha e caímos na água em profundida- trando e saindo da água por conta da bai- rasas no mar e outras realmente no meio de máxima de 3 metros. Logo me perdi de xa profundidade. Sem comentários! Voltei do mangue. Nesse mergulho encontramos todos quase que de propósito para evitar mais do que realizada. Gustavo percebeu muitos peixes recifais (moréias, barracudas, a suspensão que seria muito fácil levantar. a minha empolgação que quase que ime- xiras, frade, muitos juvenis), lagostas, co- Foi fascinante. Platelminto, muitas medu- diatamente se ofereceu para fazermos mais rais, bivalves, algas e visuais incríveis. sas de diferentes cores, diferentes tipos de um “mangroove dive” num ponto diferente. Fica a dica a quem for para Jardi- algas, muitos peixinhos, ouriços, estrelas, Lógico que aceitei. nes curtir os tubarões que são sensacio- crustáceos aderidos nas rizóforas e o pró- Dois dias depois, também depois nais, mas também fazer como mergulho prio mangue por si só já gerava excelentes do terceiro mergulho, fomos a outro ponto adicional os “mangroove mucky dive”.

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Como é bom retornar ao paraíso!

Os alunos realizando os mergulhos do curso sob a supervisão de Karol Meyer

34 | Decostop - Edição 39 Impressões do Buddy Dive Freediving Event Próximos eventos na ilha!

Rei Willem-Alexander e Rainha Maxima irão visitar em 16 de novembro de 2013 Por Karoline Meyer Fotos Tiago Jr. Sua Majestade Rei Willem-Alexander e sua majestade Rainha Ma- xima anunciaram planos de visita a todas as seis ilhas do Caribe Chegando no Buddy Dive resort, é impossível resistir à água e não que fazem parte do Reino da Holanda de terça feira dia 12 até quinta feira, 21 de novembro de 2013. Essa é a primeira visita cair ali mesmo, no Buddy Dive’s , colorido de peixes e corais. E por do novo rei após a coroação em 30 de abril de 2013. A visita falar em corais fiquei espantada com a velocidade com que a “enfermaria começa em St. Maarten, seguidos por Saba, St. Eustatius, Bonaire, de corais” cresceu! Curaçao e Aruba. Sua expectativa com esta visita é que o máximo Mergulhe comigo nos recifes: http://youtu.be/fnNLUk2JbJE de pesoas possam ver e conhecer o Rei e a Rainha que serão Para quem não conhece ainda o projeto de restauração que foi acompanhados durante a visita pelo ministro de assuntos interio- res e relações do reino Dr. R.H.A Plasterk. Haverá uma agenda de instalado pelo resort, faça uma visita e veja de perto a “enfermaria” de co- eventos planejada para 16 de novembro, sábado, em Bonaire. No- rais, onde eles conseguem se multiplicar e crescer saudáveis. vas informações serão publicadas no Bonaire Insider. (Fonte: RCN) Além disto, nova decoração, novo restaurante e novo barco, reafirmam o resort como o melhor de Bonaire Prova de natação anual até Klein Bonaire para os mergulhadores. Os primeiros dias do Buddy Dive Freediving A 12ª prova de natação anual Jong Bonaire até Klein Bonaire acon- event 2013 foram destinados ao treinamento em tecerá na largada da semana da regatta no sábado, 6 de outubro. A prova partirá da praia do Eden Beach Resort e os participantes profundidade, como de praxe. Em 2011 foi criado devem chegar antes das 7 horas da manhã. A entrada custa $ um ponto de mergulho denominado carinhosamente 15,00 por pessoa e $10,00 por crianças. A taxa de entrada inclui de “Karol’s buoy”, onde foram realizadas todas as ten- camiseta, almoço e bebidas. Os ingressos podem ser adquiridos tativas de recorde de profundidade anteriores. O mesmo antecipadamente na Jong Bonaire, Bon Fysio ou Freewieler. A pro- ponto serviu de base para os cursos e treinamentos desenvolvidos espe- va pode ser feito com ou sem e alguns mais resistentes até fazem o percurso de volta. Muitos barcos irão auxiliary aqueles que cialmente para meus alunos. cansarem ou precisarem de algum tipo de auxilio para o retorno Entre os dias de treino foram realizadas também saídas de aventu- seguro a praia. ra “Freediving Adventures” onde toda a turma sai em busca de um ponto legal de mergulho para curtir o fundo do mar de Bonaire. Os points deste Previsões do Coral Spawning para 2013 já estão ano foram: The Lake, Hilma Hooker, 1000 Steps, Klein Bonaire com direito disponíveis. à por do sol no Woodwind Snorkel, Salt Píer e mais: mergulhos noturnos com enormes tarpões! Muitos visitantes dos meses de agosto, setembro e outubro terão o prazer e a surpresa de estar em Bonaire durante a temporada Em meio a tanta paisagem e vida submarina, o destaque foi um e atividades relacionadas ao spawning de corais e outros inverte- belo encontro com uma raia manta, que você poderá curtir neste link: brados. Alguns visitantes planejam suas viagens até Bonaire espe- http://vimeo.com/66324944 cificamente para ter a chance de ver este evento único. Embora Durante o período do evento realizei também quatro palestras certamente não é uma ciência exata, é largamente documentado versando sobre minha carreira, os recordes, as aventuras e a relação do que várias espécies de corais e outros invertebrados marinhos Spawn em ciclos que são próximos a períodos de lua cheia nos mergulho com a preservação do ambiente, que foram realizadas no pool meses de agosto, setembro e outubro a cada ano. Após anos de bar do resort, no Rotary club e também com a garotada do Ranger’s Ju- estudos temos previsões que são os melhores palpites de quando nior, grupo de estudo e orientação ecológica coordenado pela Sr. Desire haverá o spawn e de qual espécie. A melhor maneira de ver estes do Stinapa. Após a palestra levei os jovens da ilha para um mergulho em eventos é agendar o máximo possível de mergulhos noturnos du- apnéia. Foi impressionante! Com apenas algumas dicas eles já estava lá rante a temporada. no fundo comigo! Tourism Corporation Bonaire América do Sul Os cursos de apnéia, com certificação internacional da A.I.D.A., Rio - Brasil Tlf 55- 21 3958 0195 atingiram a expectativa. Formei ao longo do evento 11 novos alunos!

Siga-nos no Facebook e Twitter Alunos e staff do Buddy Dive após as saídas de aventuras

Parabéns a todos por Performances: Estática 2’33” Lastro Constan- atigirem o verdadeiro espírito da te - 30m apnéia: Para completar toda a programação, • Jarno Ottens – Holanda realizei uma sessão especial de dicas de res- • Erwin Fanayete - Holanda piração com prática de yoga para os clientes • Dedrie Pedersen – Trinidade Tobago do hotel, bem cedinho, antes do delicioso café • Ian Christopher Hansen – USA da manhã, visando proporcionar uma maior • Tiago Junior da Silva - Brasil consciência corporal e da respiração e melho- • Maristela Oliveira - Brasil rando a qualidade dos mergulhos. • Aldemar Araujo Castro - Brasil O último dia, aquele que a gente nun- A bóia marca o ponto batizado de Karol em • Cilmery Oliveira – Brasil ca quer que chegue... chegou, o último mer- homenagem a atleta brasileira • Nelson Razzo Neto – Brasil gulho nos recifes em frente ao hotel, o último • Diogo Julien Miranda – Brasil por do sol magnífico, todo mundo na mesma • Junior Rangers - Bonaire vibração, com o mesmo objetivo, curtir a vida do jeito que mais gosta. Coordenei também, como juíza in- Um pouco de melancolia, mas nada ternacional, ao lado de Francesca Virdis, um como um Punch Party especialmente progra- animado torneio de apnéia estática e lastro mado para os brasileiros para quebrar a triste- constante, cujos resultados foram válidos para za, tornando a despedida um momento para o ranking list da Aida Internacional: que todos já programassem a volta! A festa, que normalmente é coman- Feminino dada pelo som caribenho de Moogie, deu 1º lugar - Maristela Oliveira – Brasil espaço para que o samba rolasse numa exi- Performances: Apnéia Estática 2’44” e Lastro bição extraordinária dos jovens músicos do Treino no cabo Constante – 20m Jong Bonaire. 2º lugar – Dedrie Pedersen – Trinidade Tobago O resort estava lotado de brasileiros e Performances: Estática 2’36” Lastro Constan- a todo o momento trocávamos idéias sobre os te - 20m mergulhos e também sobre as próximas aven- turas, mas a certeza era uma só, ano que vem Sob responsabilidade da Aida Internacional estaremos juntos para mais um Buddy Dive para reconhecimento como recorde nacional Freediving em Bonaire. Quem quiser se programar para 2014, Masculino me escreva! 1º lugar – Erwin Fanayete – Holanda [email protected] Performances: Estática 3’36” Lastro Constan- “Mergulhe fundo nos seus sonhos!” te -27m Karol Meyer 2º lugar – Tiago Junior da Silva – Brasil www.karolmeyer.com Os alunos aprendem os segredos da respiração

36 | Decostop - Edição 39 Decostop - Edição 39 | 37 Sudão

Grandes cardumes são avistados na região

02 | Decostop - Edição 39 regras severas, solo desértico e um mar simplesmente perfeito

Texto e fotos Gilson Junior até o ponto de embarque no Live Abord é Dubai onde teríamos uma única noite de uma decisão muito importante. As regras descanso e na manhã seguinte o destino Eu não sei ao certo qual seria o do país são severas, as exigências po- é Port Sudan, a segunda maior cidade do real motivo daquelas lágrimas, tão pouco dem acabar atrapalhando a realização da Sudão, lugar que não traz nem um pouco o porquê daquele desespero, mas quan- viagem e na prática, o desespero de não qualquer característica que exemplifique do resolvi fazer parte do primeiro grupo conseguir embarcar para o destino final este título. A saída dos Emirados Árabes de mergulhadores brasileiros a descobrir o atordoou por alguns longos minutos a an- não foi nada simples. A burocracia com a fascínio das águas do Sudão já imaginava siedade da viagem. Ainda no Brasil, foram documentação, que teoricamente estaria que voltaria de lá com muitas imagens e exigidos todos os documentos necessá- conforme a exigência, praticamente im- principalmente muitas histórias que fica- rios para o embarque e a certeza que os possibilitava o embarque para o próximo riam por muitos e muitos anos na minha passaportes ficariam retidos com as auto- país. As regras quanto aos equipamentos mente. Ver aquele rostinho infantil aos ridades locais, desde o dia de entrada até o de mergulho e fotográfico só foram venci- prantos, pedindo desesperadamente que último dia que ficaríamos no país. Afinal de das depois de muitas conversas. Mas final- nós a levássemos embora daquele lugar, contas, éramos o primeiro grupo do Brasil mente embarcamos, cruzamos novamente foi infelizmente uma das cenas mais mar- embarcando para aquela região e não sa- o Mar Vermelho e íamos deixando a imagi- cante da viagem. bíamos o final desta história. nação fluir de como seria pousar naquele Chegar ao Sudão não é tão sim- Com partida principal no aeropor- país de regras severas, de solo desértico e ples. A escolha por onde será a viagem to de Guarulhos, fomos rumo a escala em de um mar simplesmente perfeito.

02 | Decostop - Edição 39 Um aeroporto tão simples nos fez assim que a embarcação ancorar, finalmen- é autorizada a ser explorada pelo turismo. A ter a certeza que algo, de um modo geral, te iremos para água. No velho e bom esti- nossa grande expectativa seria o mergulho iria fazer valer a pena a viagem. O transfer lo da saída com as pangas, partimos para no enorme naufrágio Umbria, que ficaria até a embarcação foi em grande estilo, um o primeiro mergulho. Há exatos três anos para o último mergulho do último dia de ex- ônibus antigo, pintado com as mais variadas atrás, eu estava pela primeira vez nas águas pedição. Eu, como sempre sentia a espe- cores possíveis. E nossos equipamentos no do Mar vermelho, teoricamente desta vez rança de poder encontrar alguns tubarões, bagageiro do teto amarrado com cordas foi não seria muito diferente, estaríamos mais obviamente que nas vésperas do embarque praticamente o nosso primeiro contato com ao sul de um mesmo mar exuberante. Esse busquei um pouco de informação sobre os o mundo real dentro do Sudão, mas pelo primeiro mergulho no Sudão só se diferen- mergulhos com tubarões na região. Haveria menos o ar refrigerado funcionava perfeita- ciaria pelo contexto geral da viagem e por uma grande possibilidade de encontros com mente, o que não aconteceu exatamente ser o lugar escolhido pela equipe de Couste- cardumes de muitos Martelos em alguns nos dias embarcados. au para construção do laboratório submerso pontos. Mas na prática, não foi o que real- Conforme combinado, o sr Chico conhecido como Pré-Continente II em 1964. mente aconteceu. Por causa da água a uma nos aguardava para dar as boas vindas e fa- A obra conserva-se em perfeito estado até temperatura sempre em torno dos 28 graus, zer nossa entrada no país, o encontro com os dias atuais e o lugar, um recife digno de os tubarões ficavam abaixo dos cinquenta o Live Aboard e reter nossos passaportes. elogios do lendário Cousteau. Sha’ab Rumi metros de profundidade. Uma embarcação Um porto as margens de uma praça que é uma mistura de perfeição com o sonho, com certa restrição no uso do oxigênio e mais parecia um local de desfile do povo su- uma realidade de um recife que encantou provavelmente um atendimento médico danês com lindas mulheres com seus trajes até o maior de todos os mergulhadores de especializado muito limitado, achei que não característicos, homens deixando o tempo todo o mundo. A vida subaquática que o seria interessante se arriscar nos limites de passar entre uma partida e outra de sinuca, rodeia faz valer as centenas de horas que um mergulho recreativo. Os paredões que tudo isso fazia parte do cenário de nossa me ansiava desde o dia do convite para esta estão presentes em praticamente todos os primeira noite naquele destino. Ainda não expedição. mergulhos não nos davam permissão para zarparíamos, essa noite seria por alí, ao som O calor intenso castigava nossos buscar tão excessivamente os tubarões. de seus TukTuk e ao fundo alguma música intervalos de superfície, e o que mais nos Equipado com uma lente macro 60 mm e árabe. Assim que o sol se escondeu, o can- assustou foi saber que o período não era o duas fontes de iluminação suficientemente saço tomou conta do meu corpo, apenas mais quente do ano, muito pelo contrário, o fortes para repor a falta de luz em qualquer um passeio pela calçada para que pudesse M/Y Suzana só operava naquela região du- detalhe que fosse, me perdia no tempo de ver de perto a vida naquela praça. rante três meses por ano, após esse tem- fundo em meio a tantos detalhes. A quanti- Finalmente o dia amanhece e minha po ele retorna para o Egito, por causo do dade de vida, a harmonia nos corais de re- alma se presenteia com a felicidade de ou- calor praticamente insuportável no restante cifes e a perfeição de um lugar praticamente vir os sons dos motores que se misturavam do ano. Na companhia de uma tripulação intocável, foi suficientemente perfeito para com o bailar das águas sendo cortadas pelo Egípcia, exceto um único sudanês, fizemos uma imaginação que se matutava de como imponente Live Aboard. É hora do briefing e praticamente a única rota de mergulho que seria o lugar.

Paisagem típica da região

40 | Decostop - Edição 39 Distante das margens o sufi- ciente para que nossos olhares se per- dessem somente em águas e no azul esfumaçado dos longos dias ensola- rados, fomos explorando mergulho a mergulho os pontos de recifes já co- nhecidos do guia local. Um experiente mergulhador italiano não se continha na ansiedade de nos levar ao encon- tro com os tubarões e sua descida era praticamente vertical até os limites. Na briga contra o tempo de fundo e na expectativa de ver mais e mais os Explosão de cores tubarões, me mantive em uma profun- didade bem menor e sempre atento ao brilho de seu cilindro para que ele não se perdesse de meu olhar naquelas águas escurecidas pela profundidade. Isso me roubava alguns bons minutos que poderia estar grudado nos pare- dões que me satisfaziam absurdamen- te mais as minhas fotos de um modo geral. Já há alguns dias embarcados relativamente longe de qualquer terra firme, fomos presenteados com um passeio na ilha junto ao recife de San- ganeb, um pequeno ponto de apoio com um enorme farol rodeado de uma visão simplesmente paradisíaca. O en- cantamento de todos nós apenas na aproximação da embarcação, se fez insignificante no que se pôde admirar estando no topo do farol. Ilhado por uma base de corais a poucos metros de profundidade, envolvido por tons de azuis que iam ao longo se escurecen- do até o ponto que o horizonte limitava nossa visão. Sob o comando de alguns Alguns cenários parecem aquários faroleiros que ficam naquele remoto lu- gar por um curto período até que se- jam rendidos por uma nova equipe, fizemos o passeio em pouco tempo, o calor ainda nos castigava. Brasileiros não estão acostumados com aquela temperatura tão elevada e, também já era hora do sol se por. Mas ainda iría- mos para água, a visão praticamente aérea não iria deixar que descansásse- mos se não caíssemos na água para O local oferece grandes poder ver ainda mais de perto a perfei- oportunidades para fotos macro ção da natureza. Penetrar pelos pontos de mergu- lho que o Sudão nos oferece é algo muito além de qualquer imaginação, dos poucos lugares que ainda podemos ter o prazer de mergulhar sem a invasão turística, o Sudão é certamente o ponto perfeito. O contraste na realidade de um sofrido povo, obrigado a viver em uma terra que parece ser esque- cida por toda humanidade e ainda poder desfrutar de um mar perfeito, são detalhes que vão complementando um destino de viagem. De águas calmas e formações

Explosão de vida coralíneas que vão quase a superfície, ro- deados de alguns tubarões aos cinquenta metros de profundidades e vida, vida e mui- to mais vida aos poucos metros da superfí- cie, é o cenário constante de praticamente todos os mergulhos. Para os que não se contentam na necessidade de querer foto- grafar tudo que envolve o mergulho, o lugar realmente se faz perfeito. A iluminação for- te que vem do sol, uma corrente parada a ponto quase estático, uma água com visibi- lidade até aos limites de nossa visão e ainda para completar tudo isso, um ecossistema completamente harmônico entre milhares de forma de vida subaquática. Sudão ain- da é um ponto que merece ser visitado por qualquer amante do mergulho. De um modo geral a vida marinha no Sudão não se repete do tradicional en- contrado pelas rotas do Egito, no meu pon- to de vista, os recifes estão mais conser- vados e, consequentemente, a quantidade de vida em pequenos espaços é maior que a encontrada mais ao norte. Achei que o Sudão perdeu se comparado ao Egito, na quantidade de grandes peixes. Não vi- Vista do farol mos tantos atuns grandes com a mesma frequência que encontrei no Egito, as bar- racudas também não eram em grandes números. Apesar de um belo cardume de napoleões ter feito nossa alegria no final de um dos mergulhos. No Egito quando se via algum napoleão estava sozinho ou no máximo em dois, já esse cardume que nos acompanhou no Sudão haviam mais de dez grandes lindos indivíduos. Mas no resu- mo, não sou a favor dessas comparações, acho que cada destino de viagem é único e vão apenas complementando um currículo de experiência no mergulho.

Gilson Jr, o autor desta incrível reportagem Sete dias embarca- mais próximo o dia que didade. Um gigante com ções, carros e muitas gar- dos na rotina de dois mer- iríamos conhecer o naufrá- mais de cento e cinquen- rafas de vinhos que ainda gulhos antes do almoço e gio Umbria. Tem quem diga ta metros de comprimen- permanecem em seus po- um pela tarde, exceto um que é um grande concor- to, que segundo a história rões. Infelizmente o último único mergulho noturno rente do famoso Thistle- foi afundado pelo próprio mergulho também chega no mesmo ponto do check gorm também naufragado capitão Italiano, evitando ao fim e é hora de lavar e dive foi fazendo a semana nas águas do Mar Verme- que fosse dominado pelos secar todo equipamento, parecer passar mais rápido lho bem ao norte do Egito. ingleses durante a guer- aproveitar o calor intenso do que na realidade, mas O Úmbria está relativamen- ra. Esse lindo navio à va- no deck superior e registrar ao mesmo tempo em que te às margens do porto em por está deitado sobre seu mais algumas imagens até os mergulhos iam chegan- Port Sudan, entre vinte e costado de bombordo. Um nosso iate aportar nova- do ao fim, também ficava trinta metros de profun- navio carregado de muni- mente no cais.

O hélice do Umbria

O Umbria navegava com elegância

Decostop - Edição 39 | 43 O navio ainda possui vários pontos de penetração

Sem muitas opções para visitar, uma feira com produtos para alimen- imagem daquela face umedecida com fomos até uma cidade em ruínas co- tação. Meu desespero em ver tanta as lágrimas que realmente não sei a nhecida como Porto Suakin, cultural- pobreza não foi maior que da pequena real origem. mente um ponto interessante, mas in- menina que se entregou as lágrimas Sudão, um país as margens de felizmente uma obra que custou muitas quando achou que poderia fugir de um mar que supera qualquer expecta- vidas de corais do Mar Vermelho, os sua própria vida, junto daquele grupo tiva. blocos que ergueram a cidade foram de sul americanos. retirados dos corais daquela região. É hora de embarcar novamen- Hoje em dia é realizado um trabalho te com destino a Dubai, fazendo uma que tenta reestruturar a cidade e acre- rápida escala em Cartum, capital do dito que esta recuperação ainda irá país. Apenas um dia na grande cidade levar longos anos até que a obra re- cheia de exuberâncias para na manhã almente chegue ao fim. No trajeto até seguinte embarcar no voo direto com esta cidade, pudemos ver toda aridez destino ao aeroporto internacional de e pobreza daquela terra, algo que haví- São Paulo. Das lembranças da viagem, amos visto e imaginado durante o voo de todas as belezas e expectativas que quando cruzamos a região. Famílias de foram superadas naquele país, muitas nômades, acampamentos no meio de imagens ficaram em minha mente. um deserto sem qualquer esperança. Os funcionários do barco saltando do E talvez fosse esta falta de esperança deck superior ao entardecer, da vida que fizeste uma linda menina sudanesa dos corais aos poucos metros de pro- chorar tão desesperadamente quando fundidade, da visão do sol despencan- nos viu partir de uma feira. Próximo a do ao entardecer de cima do farol, da cidade em ruínas, paramos para po- calçada ao anoitecer com seu desfile der vivenciar um pouco do dia a dia da de tradições, mas nenhuma dela me população local em suas compras em ficou tão intensamente marcada com a Posters da época anunciavam as viagens de navio do Umbria 44 | Decostop - Edição 39 Enorme visibilidade e visual de tirar o fôlego

gilson Jr. autor do blog Fo- tografia de Verdade, um blog destinado ao trabalho fotográ- fico subaquático e também as imagens terrestres. Um pouco da cultura de cada país, o grande encontro com a onça do pantanal, sessão fotográfica com os primatas brasileiros, tudo isso apresentado ao público em seu site com fotos e textos na primeira pessoa, transportando o leitor a um mundo de co- res, sensações, e emoções. o blog nasceu junto com a prática fotográfica e a experiência de mergulho em diversos países, tais Brasil, Egito, África do Sul, Cuba, Venezuela e Equador. Centenas de mergulhos, milhares de imagens e um ideal para transfor- mar toda essa história em um livro. O “Diário a Bordo Ga- lápagos” contará em mais de 150 páginas entre fotos e texto toda trajetória dos mergulhos por esses países finalizando com um diário dos mergulhos nas ilhas de Darwin e Wolf no arquipélago de Galápagos. Além dos capítulos extras Nitrox, A Dificuldade da Fotografia em Galápagos, Iguanas Mari- nhas. Vincule sua marca a realização deste ideal, seja uma empresa patrocinadora para publicação do livro “ Diário a Bordo Galápagos”.

Acessem o blog www.fotografiadeverdade.com Curtam a página facebook.com/fotografiadeverdade.blog

Sem Limite, Sem Fronteira.

02 | Decostop - Edição 39 Sidemount

As habilidade do sidemount estão trazendo vantagens para o mergulho recreativo Foto: HP Hartmann do Tek ao Rec

Por Thiago Brunelli Somera configuração, mas também em como tra- O aluno vai aprender a trabalhar Fotos HP Hartmann e Renata Linger balhar com a montagem e desmontagem com redundância real de gás e com habi- de reguladores e coletes. lidades antes só apresentadas aos alunos Com a difusão do Sidemount, vá- A utilização do Sidemount no mer- nos níveis de mergulho recreativo técnico. rias áreas do mergulho recreativo se adap- gulho recreativo vem se desenvolvendo de Ele também vai notar que todos os taram trazendo inovações em configura- diversas maneiras, com algumas configu- esforços durante a vida de mergulhador ção e padrões de cursos. rações já bem desenvolvidas para todas para desenvolver uma boa flutuabilidade, Algumas certificadoras inclusive as áreas. Vamos conhecer algumas delas um bom posicionamento e alinhamento na relançaram alguns cursos na versão Si- água e uma excelente técnica de propul- demount, adaptando uma tendência do Sidemount são, vão ser finalmente recompensados mundo do mergulho em buscar conforto, com cilindro duplo com o Sidemount. Apesar da adição de praticidade e acima de tudo, segurança. mais equipamento a natação e o equilíbrio Algumas mudanças vieram trazer Com certeza a grande sacada do ficam mais fáceis, mas não dispensam a para o mundo do mergulho recreativo, mergulho recreativo. Nesse nível de trei- maestria nas habilidades mencionadas fundamentos do mergulho técnico, pre- namento o aluno é apresentado a novos anteriormente. Como grande benefício, zando por mais segurança, principalmente fundamentos e direcionado a aperfeiçoar a configuração com dois cilindros vai ser no que diz respeito a redundância de gás. outros que ele já conhecia. Como grande muito bem aproveitada em mergulhos Outras mudanças, um pouco mais exigen- novidade, o uso de 2 cilindros e 2 regu- usando Nitrox e em mergulhos profundos. tes, exigem que o mergulhador seja mais ladores trazem grandes benefícios, mas Todo instrutor vai concordar comigo: era o crítico com a sua própria configuração e também adicionam ao mergulho uma sonho de vocês ensinar um aluno de mer- forçando o mesmo a buscar um conheci- nova carga de equipamento que o aluno gulho profundo a trabalhar com 2 cilindros, mento um pouco maior não só na parte de não estava acostumado a lidar. não era? Agora isso é possível!

Com o sidemount o sistema de duplas é indispensável, mas cada mergulhador tem mais autonomia

Decostop - Edição 39 | 47 Sidemount com cilindro simples

Nessa configuração o mergu- lhador trabalha da mesma maneira que trabalhava na configuração Backmount, apenas um cilindro e um regulador. Ok, você deve estar se perguntando: e cadê a vantagem? A vantagem vem de alguns as- pectos bem simples e vou fazer algu- mas perguntas pra que você mesmo responda e encontre as soluções.

• Com o cilindro nas costas você con- segue acessar (abrir e fechar) facilmen- te a sua torneira? • Com o cilindro nas costas você con- segue checar vazamentos sozinho? • Com o cilindro nas costas você consegue se livrar facilmente de um enrosco no equipamento? • Se a posição do cilindro nas costas não está confortável, você consegue ajustar sem ajuda?

Poderia fazer uma lista enorme de perguntas, mas algumas delas já es- clarecem bem o que eu quero mostrar. Com o cilindro montado lateralmente você reduz mangueiras, reduz arrasto e reduz uma enormidade de tarefas de time que você vai conseguir resolver so- zinho. Em momento nenhum o seu du- pla vai ser dispensado, mas o trabalho de ambos vai ser bem reduzido, deixan- do a atenção voltada para outras coi- sas. Dentro de todas as áreas do mergulho técnico e recreativo, existem mergulhos específicos onde o Side- mount tem se desenvolvido muito bem como, por exemplo:

• Mergulho sob o gelo; • Mergulho de exploração em nau- frágios (se John Chatterton e Richie Kohler mergulhassem em sidemount, “Mergulho na Escuridão” teria 100 páginas a menos, risos); • Mergulho técnico profundo; O Sidemount proporciona facilidade de penetração em naufrágios Foto: Renata Linger

06 | Decostop - Edição 39 Através do sidemount acessar torneiras e reguladores fica mais fácil Foto: HP Hartmann

Claro que eu deveria citar o mergulho em cavernas, mas já ser desenvolvidos com o aluno conforme a sua necessidade. está mais do que provada a sua excelente utilização nessa modali- Como o título da própria matéria diz, os fundamentos do dade, que, aliás, foi onde o sidemount surgiu. mergulho técnico vem sendo trazidos lentamente para o mundo do O treinamento oficial Razor Sidemount prepara o mergulha- mergulho recreativo, adicionando mais segurança. dor para os níveis desejados e possui diferentes níveis de treinamen- Com treinamento adequado o mergulhador pode evoluir no to que se adéquam a todos os mergulhadores. Alguns deles são: mergulho recreativo e encaminhar para o mergulho técnico com ha- Basic Sidemount Diver para águas abertas e caverna e Advanced bilidades mais sólidas. Agora, é só ir pra água e começar a brincadei- Sidemount Diver para águas abertas e caverna. Além desses níveis, ra. Go hard or, go home! outros cursos como DPV Sidemount e Multistage Sidemount podem Mais informações: [email protected] Mergulho em Cavernasna Austrália

Texto e fotos Romeu Dib quem o filme é dedicado estavam explorando um sistema de ca- vernas chamado Cocklebiddy, situado sob a planície do deserto Apesar do grande apelo visual e emocional que o mergu- de Nullarbor, na Austrália. Uma tempestade (400 mm de chuva lho em cavernas exerce no público em geral, os grandes estúdios em 25 minutos) fez a entrada da caverna desmoronar, deixando de Hollywood poucas vezes se aventuraram em produzir filmes grande parte do grupo preso no subterrâneo. Eles procuraram sobre o assunto. Os poucos que foram feitos ou eram documen- uma saída para o mar por dois dias, quando uma equipe de res- tários ou filmes B, de baixa qualidade e com pouca visibilidade. gate conseguiu retirar todos com vida. A experiência rendeu um Porém no ano de 2011, o aclamado produtor e diretor documentário, intitulado Nullabor Dreaming [1989] e escrito por James Cameron, que tem em seu currículo “blockbusters” como John Larkin. Titanic e Avatar, abraçou a idéia de produzir um filme sobre o Como era de se esperar, a vida real é muito maçante mergulho em cavernas. Como de costume em suas produções, para o cinema e os roteiristas deram uma “caprichada” na histó- Cameron esbanjou talento e tecnologia, o que resultou em um ria, que acabou em uma sequência de mortes e suspense, que filme com imagens impressionantes em 3D, amparadas por um deram ao filme uma emoção “hollywoodiana”. roteiro eletrizante, que fez com que o espectador grudasse os Opiniões pessoais à parte, o filme é muito bem feito e olhos na tela do início ao fim. despertou a atenção do pessoal da Rede Globo, mais especi- O fato real que inspirou o roteiro se deu em 1988, quan- ficamente do Clayton Conservani e da equipe do Planeta Extre- do Andrew Wright (um dos roteiristas do filme Santuário) e ou- mo. Como já havíamos trabalhado juntos antes, eles me conta- tros 14 mergulhadores, incluindo Wes Skiles – famoso fotógrafo taram sobre a possibilidade de rodar um episódio do programa e cinegrafista subaquático que participou da produção e para nas locações reais de Santuário.

50 | Decostop - Edição 39 Fundo da escada na Tank cave

Decostop - Edição 39 | 51 Em minhas pesquisas para a produção inicio de março. Essa época é favorável, pois a Apesar de uma antecedência de três desse episódio do Planeta Extremo (que acabou temporada de chuvas já teria passado e o frio, meses nos preparativos, foi apenas durante a via- não sendo gravado por opção da emissora), presente no sul da Austrália durante boa parte gem, em uma escala em Santiago do Chile, que descobri que a maioria das imagens foram feitas do ano, ainda não teria chegado. Resgatei an- recebemos a notícia de que havíamos consegui- em um tanque de água no Village Roadshow tigos contatos que eu havia feito na época da do o sponsor. A notícia de que finalmente iríamos Studios em Queensland- Austrália. Apesar dis- pesquisa para o Planeta Extremo, e comecei a mergulhar nas cavernas australianas quase nos so várias das imagens foram feitas em locações programar nossa viagem. fez esquecer o atraso de 6 horas nos vôos da reais. As imagens impressionantes da entrada De cara barramos com um detalhe: TAM / LAN e da noite passada no aeroporto de da caverna (um imenso) foram feitas no o mergulho em cavernas na Austrália somen- Santiago. México, no município de San Luís de Potosi, em te pode ser praticado por membros da CDAA Chegamos a Sydney, onde alugamos uma caverna chamada Sótano de las Golondri- (Cave Divers Association of Australia). Isso um carro e passamos duas noites e dois dias nas, abismo que tem 376 metros de queda livre significava que teríamos que nos associar. O fazendo turismo. Também aproveitamos que es- mas nada de água no fundo. Porém o que me processo de associação é bastante moroso e tava acontecendo uma feira de mergulho técnico, chamou a atenção foram as imagens rodadas burocrático. Primeiramente é preciso que se a OZ Tek, onde passamos algumas horas. Fiquei nas cavernas alagadas australianas, sobretudo envie uma documentação completa (cópias muito impressionado com a cidade. Um lugar be- na região de Mt. Gambier - South Australia. do passaporte e certificações de mergulho em líssimo, que reúne a modernidade de uma gran- Aquilo ficou na minha cabeça martelan- cavernas, além de um currículo detalhando as de metrópole com a arquitetura histórica de dois do, até que no início de 2013, em uma conver- atividades de mergulho de cada um) para o di- séculos atrás. sa despretensiosa com meus amigos Joaquim retor de registros. Ainda é necessário pagar uma Nos hospedamos em Darling Harbour, Batista e Mário Paz, decidimos meter as caras e taxa de AU$ 100,00 por mergulhador. Também que fica em frente a uma baía bastante abrigada, viajar para a Austrália para mergulhar nas caver- é preciso que se tenha um sponsor, que é um de onde saem embarcações para passeios marí- nas de Mt. Gambier. mergulhador local, membro da CDAA, que dê timos nos arredores da cidade e em torno da qual Pra garantir que não voltaríamos atrás as dicas de acesso às cavernas e acompanhe se situam diversas atrações como museus, res- na decisão, emitimos logo as passagens para os mergulhos. taurantes, casas de show, shopping centers, etc.

A água na Tank Cave

52 | Decostop - Edição 39 A água nas cavernas da Austrália são frias Existem outras diversas cavernas na região, mas nossa logística não nos permitiu visitá-las

Antes do Mergulho na Tank Cave Apesar de claramente freáticas, elas não apresentam nenhum fluxo de água Darling Harbour em Sydney Uma excelente escolha pra quem tem “barberagens” que fazíamos ao volante, si- Possui infra estrutura turística invejável, com pouco tempo para passeio na cidade. Após o tuado no lado direito do carro, e dirigindo no pontos de apoio e informações espalhados final de dois dias cheios, ficou aquele gostinho lado esquerdo da pista. Paramos pra dormir pela cidade. Optamos por