Hora Da ÆFrica
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Missão Espiritana Volume 15 | Number 15 Article 9 3-2009 Libermann e a "Hora da África" Adélio Torres Neiva Follow this and additional works at: https://dsc.duq.edu/missao-espiritana Recommended Citation Torres Neiva, A. (2009). Libermann e a "Hora da África". Missão Espiritana, 15 (15). Retrieved from https://dsc.duq.edu/missao- espiritana/vol15/iss15/9 This Article is brought to you for free and open access by Duquesne Scholarship Collection. It has been accepted for inclusion in Missão Espiritana by an authorized editor of Duquesne Scholarship Collection. A delio Torres N eiva Fundadores libermann e a hora da africa 1. A HORA DA AFRICA A Africa como os outros continentes tinha sido descoberta pelos portugueses, no seculo XVI. Mas enquanto nos outros conti- nentes a descoberta foi de imediato seguida da conquista e explo- ra<;ao do territorio, a Africa continuou durante os seculos XVII e XVIII um continente esquecido. As especiarias da India e o ouro e pedras preciosas do Brasil absorveram os interesses economicos da Europa, deixando a Africa, na periferia da historia. A ocupa^ao portuguesa, excep^ao feita ao Reino de Monomotapa em Mo9am- bique e a algumas regioes do interior de Angola, limitou-se a certos pontos estrategicos do litoral africano. As fortalezas militares eram a expressao deste dormnio muito localizado. Depois, no tempo do comercio dos negreiros, os europeus instalaranvse em pequenos corredores ou colonias de dimensao restrita e local. Foi preciso chegar ao seculo XIX para a hora da Africa soar. "Foi preciso Varios factores se juntaram para despertar a aten^ao do mundo chegar ao se' sobre a Africa: culo XIX para a hora da 1.1. Um primeiro factor foi sem duvida, a febre das explora-Africa soar. 9pes geograficas pelo interior dos continentes, nomeadamente na Varios factores Africa, que nessa altura contagia toda a Europa. Estas viagens fa- se juntaram zem com que a ciencia geografica se torne um dos principais focos para despertar do saber do velho continente. As Sociedades de Geografia que a atengao do entao se criam por toda a parte jogam um papel decisivo na orga- mundo sobre a niza<;ao dos itineraries das explora9oes que se abrem em todas as Africa." direc9oes sobretudo no continente africano. Livingstone, Stanley, Brazza, Hermenegildo Capelo, Serpa Pinto, Roberto Ivens, Silva Porto, sao apenas alguns nomes dos cientistas que abriram o cami- nho aos missionarios. Livingstone dira mesmo que “o fim da explo- ra9ao geografica nao e senao o, principio da era missionaria”. Livingstone percorre a Africa Central'Austral do Indico ao Pacffico; Stanley, partindo da costa oriental penetra ate ao cora9ao do continente, para depois sair pela costa ocidental, nas bocas do missao espiritana, Ano 8 (2009) n.2 15, 75-92 75 libermann e a hora da africa Congo, onde o tinha precedido Brazza. Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens fazem o reconhecimento de uma vasta regiao de Angola, ligando o Atlantico ao Indico. As exploragoes africanas foram acompanhadas das campa- nhas da guerra colonial onde pontificaram nomes que deixaram a sua memoria ligadas as terras onde combateram: Artur de Paiva, Paiva Couceiro, Pereira de Ega, Henrique de Carvalho, Lourengo Marques, Antonio Enes, Mousinho de Albuquerque, etc. Depressa, os pafses europeus, a princfpio reticentes, tomaram consciencia do interesse de tais exploragoes e a corrida a Africa comegou: corrida polftica, economica, cientffica, filantropica, hu- manitaria, para a ocupagao do continente africano nao se fez espe- rar. A Africa torna-se a vocagao da Europa. Criam-se os Ministe- rios das Colonias, fundam-se museus ultramarinos de Etnografia, de Botanica e de Antropologia, publicam-se relatorios das viagens e exploragoes, fazem-se convenios, congressos e conferencias. Esta corrida incontrolavel levou a Europa ao Congresso de Berlim, em 1884, em que o continente africano foi dividido e^distribmdo pelas potencias europeias. Foi a partir de entao que a Africa ficou divi- dida numa serie de colonias que nada tinham a ver com a identi- dade etnica ou cultural dos povos que as habitavam. "Esta crescente Esta crescente expansao colonial levara a uma movimenta- expansao colo gao missionaria dos povos e a um despertar do nacionalismo mis nial levara a sionary. Cada territorio sera missionado pelo pais colonial que o uma movimen- conquistou: os belgas para o Congo Belga, os franceses para o tagao missiona- Congo Frances, os portugueses para as colonias portuguesas, os ale- ria dos povos e maes para os territories alemaes... a um despertar do nacionalismo 1.2. Com a liberdade dos mares, conseguida em 1815, a des- missionary." coberta do ago e da helice e do barco a vapor, o aperfeigoamento dos transportes e da industria marftima e a criagao das grandes companhias de navegagao, abre-se um novo espago para a circula- gao a distancia: a circulagao marftima, e naturalmente, a missao longfnqua ira beneficiar grandemente deste novo espago e deste novo meio de mobilidade que lhe e oferecido. Este e o tempo da ocupagao do caminho marftimo para a Africa. 1.3. Outro fenomeno que marcara profundamente este seculo como sendo o seculo da Africa foi a aboligao da escravatura e a supressao do trafego dos negros.1 O “Codigo dos Negros”, estabelecido por Colbert em 1685, nos seus 60 artigos coloca os escravos na situagao de nao humanos. Paradoxalmente, e-lhes reconhecida uma alma: para a salvar e pre- ciso ensinar-lhes a obediencia e o medo do inferno. Durante muito 1 Koren. LES SPIRITAINS. P. 193 e sts. 76 missao espiritana Adelio Torres N eiva tempo a Igreja preocupou-se mais com humanizar a sua situa9§o do que em a abolir. A venda dos prisioneiros de guerra como escravos em vez de os matar, era considerada, mesmo pela Igreja, uma me- dida justa e humanitaria. Os missionaries aceitavam esta situa9ao. A propria Propaganda Fide em 1647 autorizou os negreiros a ex- portar escravos para as Antilhas em troca da passagem gratuita dos missionaries em viagem para o Congo.2 Conhecemos hoje a rota dos escravos da Africa para as Ame "Conhecemos ricas e os numeros de uma das mais tristes historias da humanidade. hoje a rota dos Calcula-se em pelo menos 12 milhoes por ano, o numero de depor- escravos da tados no Senegal, na Costa do Marfim, tambem chamada Costa Africa para as dos Escravos, no Gabao, no Loango, no Zaire, em Angola. 12 por Americas e os cento terao morrido durante a travessia. Durante os tres seculos em numeros de que este comercio esteve mais activo, devem ter sido 60 ou 70 uma das mais milhoes os escravos deportados. Certos portos da costa africana tristes historias ficaram celebres como polos de referenda desse comercio negreiro: da humani S. Jorge da Mina, na ilha Goreia; a 3 quilometros de Dakar, ainda dade." hoje existe a “Casa dos Escravos”, que Joao Paulo II apelidou do “santuario da dor africana”; a ilha de Zanzibar em frente a Baga- moio, era um dos principais centros do comercio dos negreiros da Africa Oriental. A aboli9ao do trafego dos escravos foi um processo lento que come90u pelos fins do seculo XVII e levou quase um seculo a im- plementar. As potencias coloniais, depois de muita relutancia, con- seguiram renunciar a este comercio e tomar as medidas necessarias para o suprimir. Nesta luta anti-esclavagista entraram varias for9as politicas, humanitarias e religiosas: os liberais e os filosofos da Enciclopedia saidos da Revolu9ao Francesa, defensores dos direitos do homem; os governos europeus, interessados em defender a sua imagem co lonial; as potencias protestantes apostadas em difundir o seu credo religioso e a Santa Se, que, depois de nao poucas hesita9oes, con- denava em 1839 o comercio dos escravos. Na costa ocidental, este comercio continuou a fazer-se clan- destinamente ate aos meados do seculo, mas os navios de guerra perseguiam os negreiros para libertar os escravos. Estes, uma vez libertos, eram colocados em aldeias especiais, sob a tutela dos seus libertadores, e assim nasceram aglomerados cujo nome identifica a sua origem como - Libreville e Freetown. Na Africa ocidental a persegui9ao foi ainda maior: foram necessarias verdadeiras expedi9oes militares para por fim ao trafego dos negros. Tambem aqui com estes escravos libertos se construi- ram as “aldeias da liberdade” de que a missao espiritana do. Baga- moio, perto de Zanzibar, foi o exemplo mais celebre. Nas missoes, 2 Koren H. LES SPIRITAINS. Beauchesne. p.198 missao espiritana 77 liberm;ann e a hora da afriica conhecemos as “aldeias da Missao” formadas por escravos libertos e os internatos da missao com um bom numero de crian9as libertas da escravatura. Por sua vez, apos a proclama^ao do edito da emancipa^ao, um certo numero de africanos levados como escravos para o Brasil, optaram por voltar para a sua patria de origem, constituindo, por vezes os primeiros elementos de novas cristandades. Em certos meios dos Estados Unidos, depois da Guerra da Sucessao, resolveu o Governo reconduzir ao pais de origem os ne- gros emancipados, cuja integra^ao parecia dificil e transportaram um certo numero deles para o Cabo das Palmas, onde viriam a formar o pais da Liberia.3 2. L1BERMANN E A HORA DA AFRICA "Antes de des- E preciso dizer-se que aoprincfpio Libermann nao pensava na cobrir a Africa, Africa. Antes de descobrir a Africa, Libermann pensava sobretudo Libermann pen- nos escravos do Haiti, de Bourbon e da Maurfcia, ilhas crioulas, que sava sobretudo nao faziam parte do continente africano. Os habitantes destas ilhas nos escravos eram os negros com que Libermann sonhava. Os negros nao eram do Haiti, de necessariamente da Africa Negra. Negros eram os mais desprezados Bourbon daquele tempo, sem qualquer conota^ao da pele ou da cor.