Tudo Que a Boca Come: a Capoeira E Suas Gingas Na Modernidade

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Tudo Que a Boca Come: a Capoeira E Suas Gingas Na Modernidade Universidade Federal da Bahia Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade PAULO ANDRADE MAGALHÃES FILHO TUDO QUE A BOCA COME: A CAPOEIRA E SUAS GINGAS NA MODERNIDADE Salvador 2019 PAULO ANDRADE MAGALHÃES FILHO TUDO QUE A BOCA COME: A CAPOEIRA E SUAS GINGAS NA MODERNIDADE Tese apresentada ao Programa Multidisciplinar de Pós- Graduação em Cultura e Sociedade do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos da Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Doutor em Cultura e Sociedade. Orientador: Prof. Dr. Adalberto Santos Salvador 2019 Agradecimentos Quero agradecer aos meus pais, Alba Mesquita e Paulo Magalhães, que com seus acertos e erros, me permitiram estar aqui; Aos meus filhos, Pedro e Inaiê, que com graça e teimosia, ajudam a lapidar minha pessoa; A todos os mestres de capoeira que me guiaram nessa caminhada: João Angoleiro, Virgílio de Ilhéus, Renê Bitencourt, Jorge Rasta, Ramiro, Gercino, Murcego...; Ao meu Mestre, Pelé da Bomba, pelo acolhimento, pelas experiências e instruções transmitidas no cotidiano; A toda a família da ABCA, Associação Brasileira de Capoeira Angola, pela rica convivência e ensinamentos partilhados; Aos meus alunos e companheiros do Coletivo Ginga de Angola, pela inspiração e motivação cotidianas; Ao meu Tata de Nkisi, Francisco de Tempo, pela proteção, conselhos e orientações, e a toda a família do Nzó Ndembwa Kaamuzambi; À turma do Conselho Gestor da Salvaguarda da Capoeira na Bahia e do Coletivo Capoeira e Militância, especialmente aos meus irmãos Mestre Duda e Tâmara Azevedo, pela luta coletivamente construída; A todos os que aceitaram dar depoimentos para esta tese; Aos amigos que direta ou indiretamente contribuíram para este trabalho, apresentando ideias, dialogando sobre temas, cedendo material ou fazendo traduções: Alessandra Carvalho, Leila Kissia, Mestre Paulão Kikongo, Mestre Bel, Contramestre Desenho, Olívia Oliveira, Dainho Xequerê, Toninho Muricy, Hilton Teimosia, Jeroen Rouxinol, Edu Pastrana, Gatinho Angola, Tatiana Badaró, Gabriel Wirz, Nathalie Pavelic e muitos outros que preencheriam um capítulo; Ao meu orientador, Adalberto Santos, pela paciência e persistência na condução dessa jornada; Aos meus chefes, Fabiana Britto e Guilherme Bertissolo, por serem compreensivos na concessão do afastamento para que pudesse concluir essa tese; A todas e todos que mantém essa cultura viva através de sua prática cotidiana. Nzambi kwa Ntesa! RESUMO Este trabalho procura entender como a capoeira se relaciona com a Modernidade. Os pensadores decoloniais argumentam que a Modernidade não pode ser pensada sem sua face oculta, a Colonialidade, e seus brutais processos de escravização e genocídio. Apesar de ser uma manifestação cultural que apoia sua identidade sobre um discurso de tradição, a capoeira é fruto desse violento encontro entre povos e culturas. Nos propomos a pensá-la como uma contracultura da Modernidade, que ginga com a colonialidade, com um pé dentro e outro fora da razão instrumental hegemônica, operando com distintas lógicas e racionalidades. A capoeira, em nosso trabalho, é pensada como um símbolo da sociedade brasileira com todos seus paradoxos, ambiguidades e contradições. Uma representante da nossa Modernidade, modelo próprio construído pela intersecção e cruzamento de diferentes heranças e temporalidades. Desafiamos aqui a profecia weberiana de que o advento da Modernidade - ou, sob um viés marxista, a expansão do Capital - levaria irreversivelmente à racionalização e desencantamento do mundo. Pretendemos demonstrar que, por um lado, a capoeira se racionalizou de diferentes formas, com seus processos de esportivização e normatização. Até as políticas culturais que pretendem salvaguardar os saberes tradicionais impulsionam os mestres e grupos a se burocratizarem para ter acesso ao poder público e suas verbas. Por outro lado, este mundo permanece encantado, guardando conexões e segredos sutis que, embora desafiem o senso comum do materialismo científico hegemônico, guardam estreitas relações com outras formas de descrição da realidade. Trataremos dessa relação íntima da capoeira com o candomblé, através do caboclo, de Exu e dos ancestrais. Palavras-chave: Capoeira, Modernidade, Desencantamento, Decolonialidade, Pensamento Bantu RESUMEN Este trabajo busca entender cómo la capoeira se relaciona con la modernidad. Los pensadores decoloniales argumentan que la modernidad no puede ser pensada sin tu cara oculta, la colonialidad, y sus brutales procesos de esclavitud y genocidio. A pesar de ser una manifestación cultural que apoya su identidad sobre un discurso de tradición, la capoeira es fruto de este encuentro violento entre pueblos y culturas. Nosotros proponemos pensarla como una contracultura de la modernidad, que ginga con la colonialidad, con un pie adentro y otro fuera de la razón instrumental hegemónica, operando con distintas lógicas y racionalidades. La capoeira, en nuestro trabajo, es pensada como símbolo de la sociedad brasileña con todas sus paradojas, ambigüedades y contradicciones. Una representante de nuestra modernidad, modelo propio construido por la intersección y cruce de diferentes herencias y temporalidades. Desafiamos aquí la profecía weberiana de que el adviento de modernidad, o, bajo una visión marxista, la expansión del Capital, conduciría irreversiblemente a la racionalización y el desencantamiento del mundo. Pretendemos mostrar que, por un lado, la capoeira se ha racionalizado de diferentes formas, con procesos de normalización deportiva. Hasta las políticas culturales que pretenden salvaguardar los saberes y tradiciones conducen los mestres y grupos a burocratizarse para tener acceso al poder público y sus verbos. Por otro lado hay un mundo que permanece encantado, manteniendo conexiones y secretos muy sutiles que, aunque desafían al senso común del materialismo científico hegemónico, guardan estrechas relaciones con otras formas de descripción de la realidad. Trataremos esta relación íntima de la capoeira con el candomblé, a través de caboclo, de Exu y los antepasados. Palabras clave: Capoeira, Modernidad, Desencantamiento, Decolonialidad, Pensamiento Bantú ABSTRACT This thesis aims to understand how capoeira relates to Modernity. Decolonial thinkers argue that Modernity can’t be thought outside its occult face, Coloniality, and its brutal slaver and genocide processes. Although being a cultural expression that supports its identity upon a speech of tradition, capoeira is an offspring of this violent encounter of nations. We propose to think it as a Modernity counterculture, that swings with and in it, a foot in and a foot out of the hegemonic instrumental reason, as operates by distinct logic and rationality. Capoeira, in our research, is treated as a symbol of Brazilian society in all its paradoxes, ambiguities and contradictions. A representant of our Modernity, a model built upon the intersection between different heritages and temporalities. Here, we defy the Weberian prophecy that the coming of age of Modernity (or as defined by Marx, Capitalism expansion) would irreversibly lead to rationalization and disenchantment of the world. We intend to demonstrate that, on one side, capoeira got rationalized in different ways, with its processes of becoming a sport and normatization. Even cultural politics that aim to guard and protect traditional knowledge that boosted masters and groups to became bureaucratic in order to get access to financial support from the government. On the other side, this world stays enchanted, keeping connections and subtle secrets that, although defying common sense of scientific materialism, has straight relations with other forms of reality description. We discus its intimate relation of capoeira with candomblé, through entities like Exu and the ancestors. Keywords: Capoeira, Modernity, Disenchantment, Decoloniality, Bantu Thinking RÉSUMÉ Cette thèse cherche à comprendre le lien entre la capoeira et la modernité. Les penseurs décoloniaux soutiennent que la modernité ne peut être pensée sans sa face cachée : le colonialisme et ses processus brutaux d’esclavage et de génocide. Même si elle est une manifestation culturelle qui soutient son identité autour d’un discours de « Traditions », la capoeira est le résultat de cette violente rencontre des peuples et des cultures. Nous proposons de la considérer comme une contre-culture de la modernité, qui ginga avec la colonialité, avec un pied dedans et l'autre en dehors de la raison instrumentale hégémonique, en opérant avec des logiques et des rationalités distinctes. La capoeira, dans ce travail, est considérée comme un symbole de la société brésilienne avec tous ses paradoxes, ses ambiguïtés et ses contradictions. Elle est une représentante de notre modernité, notre propre modèle construit par l’intersection et le croisement de différents héritages et temporalités. Nous défions ici la prophétie de Weber selon laquelle l'avènement de la modernité (ou, comme Marx le définit, l'expansion du Capital) conduirait de manière irréversible à la rationalisation et au désenchantement du monde. Nous avons l'intention de démontrer que, d'une part, la capoeira a été rationalisée de différentes manières, avec ses processus de sportivisation et de normalisation. Même les politiques culturelles qui cherchent à préserver les savoirs traditionnels poussent les maîtres et les groupes à se bureaucratiser afin d'accéder au pouvoir public et à leurs fonds. D'autre
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