REVISTA BRASILEIRA DE SEGURANÇA PÚBLICA

Volume 10 Número 2 agosto/setembro 2016

ISSN 1981-1659 Expediente

Expediente Esta é uma publicação semestral do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. ISSN 1981-1659 Rev. bras. segur. pública vol. 10 n. 2 São Paulo ago/set 2016

Comitê Editorial Equipe RBSP Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo (Pontifícia Universidade Cauê Martins, David Marques, Patrícia Nogueira Católica do - Porto Alegre/ Rio Grande Pröglhöf, Roberta Astolfi e Samira Bueno do Sul/ Brasil) Renato Sérgio de Lima (Fórum Brasileiro de Segurança Revisão de textos Pública – São Paulo / São Paulo / Brasil) Cláudia Malinverni e Denise Niy Olaya Hanashiro (Fórum Brasileiro de Segurança Pública - São Paulo / São Paulo / Brasil) Traduções Firm Translations Conselho editorial Elizabeth R. Leeds (Centro para Estudos Internacionais (MIT) Capa e produção editorial e Washington Office on Latin America (WOLA)/ Estados Seepix Unidos) Antônio Carlos Carballo (Polícia Militar do Estado do Rio Endereço de Janeiro – / Rio de Janeiro/ Brasil) Rua Amália de Noronha, 151, Cj. 405 Christopher Stone (Open Society Foundations - Nova Pinheiros, São Paulo - SP - Brasil - 05410-010 Iorque/ Estados Unidos) Fiona Macaulay (University of Bradford – Bradford/ West Telefone Yorkshire/ Reino Unido) (11) 3081-0925 Luiz Henrique Proença Soares (Fundação SEADE – São Paulo/ São Paulo/ Brasil) E-mail Maria Stela Grossi Porto (Universidade de Brasília – [email protected] Brasília/ Distrito Federal/ Brasil) Michel Misse (Universidade Federal do Rio de Janeiro - Apoio Rio de Janeiro/ Rio de Janeiro/ Brasil) Open Society Foundations e Ford Foundation Sérgio Adorno (Universidade de São Paulo – São Paulo/ São Paulo/ Brasil)

Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Elizabeth Leeds – Presidente de Honra Humberto Viana – Presidente do Conselho de Administração Renato Sérgio de Lima – Vice-Presidente do Conselho de Administração Samira Bueno – Diretora Executiva

Conselho de Administração Cássio Thyone Almeida de Rosa Luciene Magalhães de Albuquerque Cristiane do Socorro Loureiro Lima Marcos Aurelio Veloso e Silva Edson M. L. S. Ramos Marlene Ines Spaniol Elizabeth Leeds Renato Sérgio de Lima Haydée Glória Cruz Caruso Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo Humberto de Azevedo Viana Filho Sérgio Roberto de Abreu Jacqueline de Oliveira Muniz Silvia Ramos de Souza

2 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 2-4, Ago/Set 2016 Sumário Sumário

Dossiê Apresentação ...... 6

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública...... 12 Melina Ingrid Risso

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública...... 24 Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990...... 36 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina...... 58 Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo

Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação...... 72 Alberto Kopittke

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades...... 88 Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos

Artigos A formação das guardas civis municipais do Grande ABC...... 104 Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década...... 118 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias

O Herói-Envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial...... 134 Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros

“Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar...... 154 Fábio Gomes de França

Zonas do Medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009...... 172 David Maciel de Mello

Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)...... 192 Alan Fernandes

Entrevista Ponte para uma discussão pública mais ampla ...... 220 Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds

Regras de publicação ...... 236

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 2-4, Ago/Set 2016 3 Summary 4 Publishing Rules Interview Articles Dossier Table of Contents Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 2-4, Ago/Set 2016 ...... Christopher Stone interviewed by Elizabeth Leeds A bridgeto thebroader publicdebate...... Alan Fernandes Military of SãoPaulo State (2013-2014) ...... Police victimization: analysisof violent deaths suffered by membersof the David MacieldeMello Access to Justice supplement of the2009PNAD...... Zones of Fear: Geographic variations infeeling (un)safe inVictimization and Fábio GomesdeFrança police training...... “Hierarchy of invisibility”: prejudice andhomophobia inmilitary Rafael Alcadipani daSilveira eCintia Rodrigues deOliveira Medeiros police work...... tensions andcontradictionsThe Ashamed-Hero: ineveryday Sérgio AdornoeCamila NunesDias over thelast decade...... Timeline of “2006Attacks” andthenew power structure inprisons Juliana Barroso eJulianaTeixeira deSouza Martins Training of municipal civilguards of Greater ABC...... Eduardo Vieira Mattos Jardel FischerLoeck, ThiagoMedeiros Magnus,DanielMontenegro e Safety Observatory of Canoas(RS)andfresh possibilities ...... Information management andlocalgovernments: Experiences of the Public KopittkeAlberto of innovation...... Municipal Guards: Between thedraw of tradition andchallenge Flávia Carbonari, Gregor Wolf, JoanSerra Hoffman eDinoCaprirolo A multilateral perspective for violence prevention inLatin America...... Ursula DiasPeres, Samira BuenoeGabrielMarques Tonelli entities forsafety financingpublic since the 1990s...... The Cities andPublicSafety inBrazil: ananalysisof therelevance of local Almir deOliveira JunioreJoanaLuiza Oliveira Alencar safetyin thefield of public ...... New police? Municipal guards, institutional isomorphismandparticipation Melina IngridRisso public safety...... Violence prevention: creating anew meaning for participation of cities in Presentation

...... 192 172 154 134 118 104 236 220 88 72 58 36 24 12 6 5 Apresentação Dossiê Apresentação

6 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 Dossiê Apresentação

s municípios têm, hoje, um papel fundamental na cons- Otrução de uma nova narrativa para a segurança pública no Brasil. Se, por um lado, a violência, a exclusão territorial e o déficit de serviços públicos são vivenciados pelos cidadãos em seus municípios, por outro, também é nos municípios que se dá o exer- cício de seus direitos. Nesse contexto, o direito à cidade implica necessariamente no reconhecimento da segurança como um direi- to em si, cuja responsabilidade não depende apenas dos sistemas de polícia e justiça.

O Estatuto da Cidade (Lei 10.257), estabelecido em 2001, aca- bou preenchendo um vazio deixado na Constituição Federal de 1988 em relação às obrigações municipais na área da segurança pública. Essa nova abordagem se traduz em práticas institucionais que vão além das atividades policiais e penais, e envolvem inúme- ros outros atores.

Os municípios têm, assim, um potencial enorme na criação de processos capazes de produzir respostas eficientes na redução da

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 7 violência e, especialmente, em sua prevenção. Assim, este dossiê tem como objetivo trazer algumas reflexões que contribuam para o fortalecimento desses processos. Dossiê No artigo “Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pú- blica”, Melina Risso faz um breve histórico dessa recente partici- pação e destaca o protagonismo que os municípios assumem nas políticas de prevenção à violência e redução de fatores de risco. A grande novidade desse processo, como observa Risso, não diz respeito às ações de prevenção em si, mas ao sentido que essas práticas adquirem e à maneira como contribuem para um novo

Apresentação entendimento do que é segurança pública.

Continuando essa discussão, no artigo “Novas polícias? Guar- das municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública”, Almir de Oliveira Junior e Joa- na Alencar discutem a implementação das guardas municipais a partir das influências formais e informais das instituições policiais estaduais e a consequente inibição das oportunidades de inovação que os municípios apresentam, especialmente em relação à pro- ximidade com as comunidades locais. Os autores lembram como a participação da sociedade na gestão das políticas públicas em geral constitui um dos grandes desafios para a consolidação demo- crática. No campo da segurança pública, as dificuldades a serem superadas são ainda maiores, pois estão relacionadas à própria con- cepção da segurança pública em âmbito nacional.

Outro desafio particularmente difícil no que se refere às políti- cas públicas de segurança diz respeito à transparência e prestação de contas na execução orçamentária. No artigo “Os municípios e a segurança pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990”, Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Tonelli dis- cutem, a partir da relação federativa com a União, a crescente parti- cipação dos municípios no financiamento da segurança pública. Os autores chamam atenção para a descoordenação e descontinuidade que marcam as políticas públicas na área.

8 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 Os textos que dão continuidade à discussão apresentam pers- pectivas específicas de autores envolvidos em experiências con- cretas de municípios na segurança pública. A diversidade de ato- res e suas diferentes atividades exemplificam o novo significado atribuído à segurança pública e a relevância dos municípios em Dossiê sua consolidação.

Nos últimos anos, com o foco nos trabalhos de prevenção, as agências de assistência internacional tem procurado financiar pro- jetos ou programas na área da segurança pública. Flávia Carbona- ri, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo, em “Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na Amé-

rica Latina”, discutem a abordagem e os diferentes mecanismos Apresentação utilizados pelo Banco Mundial e pelo Banco Interamericano de De- senvolvimento (BID) na prevenção da violência e na promoção da segurança cidadã na América Latina e, especificamente, no Brasil.

Em “Guardas municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação”, Alberto Kopittke, enfatiza a oportunidade que a criação das guardas municipais significa para esse novo en- tendimento da segurança pública, mas observa que a simplificação do debate sobre o papel das guardas tem levado muitos municípios a reproduzir a polícia ostensiva de combate ao crime.

Destacando a relevância da pesquisa e produção da informação na área da segurança pública, Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos, em “Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades”, apre- sentam um exemplo empírico para a discussão e analisam alguns da- dos da pesquisa de vitimização realizada pelo Observatório em 2014. O artigo problematiza uma série de questões pertinentes à aplicação de estudos sociais em ações e políticas que tenham como objetivo for- talecer a capacidade institucional do município na segurança pública.

Encerrando o dossiê, Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Sou- za Martins, em “A formação das guardas civis municipais do Grande ABC”, apresentam elementos para uma discussão sobre as políticas públicas na formação das guardas municipais no Brasil. A

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 9 descrição do processo promovido pelo Grupo de Trabalho de Se- gurança Urbana do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, a partir da implementação de um centro de formação em segurança urbana, é um exemplo do papel inovador que os municípios po- Dossiê dem ter na segurança pública.

Em todos os textos podemos observar o papel que o municí- pio assume como grande articulador em âmbito local dos diversos atores sociais com responsabilidades na segurança pública. Se con- seguirem evitar a reprodução do velho paradigma repressivo-puni- tivo que ainda orienta as políticas na área e constituírem um corpo técnico com conhecimento e experiência de gestão, os municípios

Apresentação terão a possibilidade de ampliar e democratizar a visão sobre a se- gurança pública e, consequentemente, dar respostas mais eficientes para a redução da violência e da criminalidade.

Em plena campanha para as eleições municipais deste ano, espera-se que a segurança pública seja escolhida como um tema prioritário de atuação para as prefeituras e os candidatos assumam esse compromisso incluindo em seus planos de governo uma agen- da propositiva para a área.

É por meio de uma agenda pautada pelos preceitos demo- cráticos de participação, transparência e prestação de contas na busca de soluções de problemas e, sobretudo, na proteção de di- retos, que os municípios desempenharão um papel fundamental na construção de uma nova, e tão necessária, narrativa para segu- rança pública no Brasil.

10 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 Dossiê Apresentação

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 6-10, Ago/Set 2016 11 Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 12 municípios nasegurança pública para aparticipaçãodos construção deumnovo sentido Prevenção daviolência: pela FGV. Doutoranda emAdministração Pública eGoverno pelaFundação Getúlio Vargas -FGV. Mestre emGestãoePolíticas Públicas Melina IngridRisso Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 Prevenção daviolência.Atuação municipalna segurança. Segurança pública. Palavras-Chave não criminaisefocalização deprogramas preventivos. torno deumaagendasegurança; reorientação dopapelda guarda com enfoque comunitário eatuaçãoemquestões ções sobre fatores derisco para orientar efomentar políticas preventivas; articulação dediferentes açõese atores em ta quatro caminhos para atuação municipal considerando sua vocação ecompetência federativa: produção deinforma- que para uma atuação preventiva com foco em fatores de risco não há restrição constitucional. Na segunda parte, apon- O artigofaz umbreve histórico sobre aparticipaçãodosmunicípios naagendadesegurança pública nopaíseargumenta Resumo [email protected] de forma indiscriminada,o que tem como das açõesvoltadas paraoaumentodepenas como completamenteineficazes. É ocaso na aprovação deleis,medidasavaliadas no paíséareprodução, sejanodiscurso, seja cotidianamentesar disso, o que se observa realidade brasileira elatino-americana.Ape- que muitosdelescarecem de validação paraa tadas paraenfrentar esteproblema. Écerto diferentes políticasquetêmsidoimplemen- tudos na literatura internacionalavaliando lução. Há umconjunto consistentedees- ção eprevenção daviolência. inércia no tocanteapolíticaspúblicasderedu- gerar umacomoçãonacionaletiraropaísda para decrescer –aindanãofoisuficientepara lizmente, estenúmero aterrador–equenão das nopaís,1pessoaacada10minutos.Infe- pouco maisde53milpessoasforamassassina- rio do Fórum de Segurança Pública, em 2014, que começou a ser medido. Segundo o Anuá- O A violêncianãoéumproblema semso- gou aoseupatamarmaisaltodesde número de homicídios no país che- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 lência comunitária que funcionaemtermosderedução devio- sobremente naliteraturanorte-americana, o RA; BUCKLEN, 2014). CKENZIE; SOURYAL, 1994;NAKAMU- da criminalidade (PETERSILIA, 2003; MA- são éummecanismodissuasivo eficazdiante (PIEHL; USEEM,2011). Tampouco apri- de crimesviolentoscometidosnasociedade criminal,não altera o volumeda estrutura baixo potencial ofensivo oudobaixo escalão isto é,daquelesquecometeramdelitosde carceramento decriminososcomesteperfil, recrutamento paraocrimeorganizado. Oen- apenascomomeiode de violência,servindo de pessoasquecometeramcrimessemouso mesmo tempo,verifica-se oencarceramento amedrontada, pedepuniçõesmaisseveras. Ao único efeitoacalmaraopiniãopúblicaque, gares, específi- públicos e comportamentos a violênciacomunitáriase concentra emlu- ção daspolíticaspúblicas. Além disso,como utilização dedadoseevidências naelabora- Recente metanálise,combaseprincipal- 1 aponta a importância da apontaaimportância 13

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 14 ampliou olequedemunicípios Fundo Nacional deSegurança Pública, que rança Pública edaalteraçãodasregras do com a criação do Sistema Único de Segu- de2003,volvimento seintensificouapartir (DE MESQUITA NETO, 2004). Tal en- ganhou relevância naagendadosmunicípios prefeito daquelemesmoperíodoqueotema Pública em2000/2001edaseleiçõespara Pública e do Fundo Nacional de Segurança lançamento doPlano Nacional deSegurança tivamente recente nopaís.Foi do apartir gurança públicaéumacontecimentorela- municípios nasegurança pública com rela B um amploespaçodedesenvolvimento. consistência pelosmunicípiosecontamcom novos, aindanãoforamimplantadoscom ação, queemboranãosejamparticularmente gunda sãoapontadospossíveis caminhosde putas envolvidas emtornodotema.Na se- gurança nopaíseumabreve análisedasdis- do município na agenda de se- participação Na primeiraseçãoháumbreve históricoda rando suavocação ecompetênciafederativa. na redução eprevenção daviolência,conside- síveis atuaçõesparaosmunicípiosbrasileiros (ABT; WINSHIP,2016). concentradas, bem implementadas e avaliadas ainda, queaspolíticaspúblicasprecisam ser considerados emseudesenho. Constata-se, cos, as estratégias devem ter estes elementos Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 RUSO, 2007). Alémdeguardas municipais, pleitear recursos dofundo (RICARDO;CA- alanç O envolvimento dosmunicípiosnase- temcomoobjetivo indicar pos- Este artigo o equestões emdisputa ção àparticipa ção dos 2 quepodem pelos municípios ráter preventivo deveria ser implementada no qualumagrandegamadeaçõesca- governo federal e ao desenho do programa, ma àluzdasdiretrizes federais os diferentes atores doprogra- participantes ponsável peloplanejamentoconjunto entre gabinete degestãointegrada,instânciares- os entesfederativos deveriam instituirum deveu ao volume derecursos ção dos municípiosse intensificou. Isso se governo- federal,em2007,queaparticipa de Segurança comCidadania(Pronasci) pelo dainstituiçãodo Programaa partir Nacional em 2006(RICARDO;CARUSO, 2007),foi sos doFundo Nacional deSegurança Pública 100 milhabitantestenhamrecebido recur- CARUSO, 2007). itinerantes (RICARDO; população emfóruns iniciou debatessobre segurançapúblicacoma medida pelaqualganhougrandevisibilidade;e estabeleceu ofechamentodebares apósas23h, niões periódicascomaspolíciasmilitarecivil; cutir oplanejamentodopoliciamentoemreu- do prefeito, a gestãomunicipal passou adis- Metropolitana deSão Paulo. Sob aliderança agenda, comoDiadema, localizadonaRegião municípios assumiramprotagonismo nesta e instituíramconselhos. rias, elaboraramplanosdesegurançapública diversos municípiosconstituíramsecreta- prevenção, controle erepressão dacriminali- lar ações de segurança pública com foco na Ainda que100municípioscommaisde Na primeiradécadadosanos2000,alguns O Pronasci- tinhacomoobjetivo articu 4 .Para aderir ao Pronasci, 3 investidos pelo 5 . SEGURANÇA PÚBLICA,2013). al., 2011apudFÓRUM BRASILEIRO DE tivo policialecusteiodaspolícias(COSTA et alocados ao pagamento de efe- grande parte, blica, jáqueosrecursos dos estadossão,em te deinvestimento naárea desegurança pú- social (AZEVEDO etal.,2013). munidades marcadas pelavulnerabilidade bilizou aprevenção dasviolênciasemco- nitoramento; 3) Território da Paz, quevia- com novas tecnologias deprevenção emo- agências; 2)CanoaMais Segura, trabalho municipal edasuaintegraçãocomoutras daguardaliciamento comunitárioapartir comunitário, comoplanejamentodepo- de três programas estratégicos:1)Guarda de Segurança Pública eCidadaniaapartir aSecretarianicípio estruturou Municipal gião Metropolitana dePorto Alegre. O mu- cursos. Entre eles,Canoas,situadonaRe- principalmente pormeioderepasse dere- oferecidada oportunidade pelo programa, Alguns municípiossedestacaramapartir da paz venção da violência, entre eles o Mulheres cardápio comdiferentes projetos depre- projeto bolsa-formação. dosrecursosnada grandeparte pormeiodo da segurançapública,paraosquaisfoidesti- tante paraoprograma eramosprofissionais de crimesviolentos).Outro públicoimpor- urbanos comaltosíndicesdehomicídiose torial (regiões metropolitanas eaglomerados eles oetário(jovens entre 15e29)terri- dade. Oprograma tinhaalgunsfocos,dentre Os recursos daUnião fon- sãoimportante O Pronasci oferecia aosmunicípiosum 6 , o Territórios depazeoProtejo 7 . Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 o prismapreventivo. dasegurançapúblicaatuandosob participem para queosmunicípiosestruturem políticase sentido, abre-se um campo bastante ampliado cação dalei,tampoucoouso daforça. Nesse de prevenção daviolêncianãorequerem aapli- polícia. Todavia, muitas políticas e programas 144 daCF determina as atribuições de artigo possibilidade deusodaforça, umavez queo tido àluzdanecessidadedeaplicaçãoleie einstalações. seus bens,serviços guardas municipais destinadas à proteção de o parágrafo8º,éfacultadaaconstituiçãodas dade das polícias. Aos municípios, conforme Constituição Federal (CF)éderesponsabili- de acordo 144da comoestabelecidonoartigo verdade queaoperacionalizaçãodasegurança pliada sobre osentidodesegurançapública.É da sehouvesse nopaísumacompreensão am- DO; CARUSO, 2007), elapoderiasersupera- legal atribuírem aumaquestão estefatoem parte de segurança pública. Apesar de alguns autores não têmumpapelconsolidadonaspolíticas os programas, entre outros. poder, faltaderecursos paramantereexpandir políticono liderança políticaoudopartido se deve adiferentes fatores, comomudançada ção de investimento em seus programas. Isso mudançadeprioridade ou reduterrupções, - destacaram nacionalmentesofreram comin- Muitos municípiosquedealgumamaneirase são marcadas peladescontinuidadedasações. anos, aspolíticasmunicipaisdesegurança No entanto,essacompreensão sófazsen- Lamentavelmente, os municípios ainda Apesar detodooavanço nosúltimos15 8 (DEMESQUITA NETO, 2004;RICA- 15

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 16 em Ação Direta deInconstitucionalidade sendo questionadanoSuperior Tribunal Federal cional é a prevalênciase observa do paradigma tradi- do solo,entre outros. Infelizmente, oqueainda de, assistênciasocial,urbanismo,usoeocupação competências municipaiscomoeducação,saú- ferentes violências, em geral, referem-se a áreas e atuação domunicípio. Os riscosassociadosadi- da epidemiologia é bastante útil para pensar a Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 senvolver agressivos comportamentos oude- voltadas parapessoascomaltorisco de- lado comapolíciamilitar; (iii) social–ações que podeserdaguarda- municipalouarticu policial – ações focadas no patrulhamento, paraocorrênciaoportunidades decrimes;(ii) pretendem mudaroentorno,reduzindo as vide emprevenção: (i)situacional–açõesque ferente paraasaçõesdeprevenção. Ele asdi- (DE MESQUITA NETO, 2006). do crimeeaumentamasegurançadaspessoas reduzem aincidênciadodanoereincidência vas; (ii)pela suaconsequência,istoé,açõesque ou aviolênciaaconteceraçõesnãopuniti- reza, isto é, ações que ocorrem antes de o crime entendidas deduasmaneiras:(i)pelasuanatu- segurança pública para atua (Não tã)Novas perspectivas da guarda comoumanova polícia A grandequestãoemdisputaéalegitimação bre oEstatutoGeral dasGuardas Municipais. 13.022, de8agosto2014,quedispõeso- mobilização emtornodaaprovação daLeinº Cano (2006)utilizaumaclassificaçãodi- Ações de prevenção da violência podem ser O conceitode“fator derisco” 10 na disputa política, haja vista a grande nadisputapolítica,hajavistaagrande ção dosmunicípios na 9 11 emprestado e a lei está ealeiestá 12 . base noSistema deInformações deMortalidade micídios nopaís(Atlas daviolência2016 com de fogocorrespondem a76,1% dototaldeho- habitantes. Os homicídiosdecorrentes dearma em 2014,entre jovens ataxa foi de 61,0/100 mil dios correspondeu a29,1/100milhabitantes vítimas. Enquanto ataxanacionaldehomicí- mens jovens de15 a29anossãoasprincipais sibilidade deocrimeouaviolênciaacontecer. fatores que, combinados, potencializam a pos- ciada a determinados fatores de risco, isto é, a possui umadinâmicaespecíficaeestáasso- uma categoriaúnica.Cadatipodeviolência disso, nãoépossível trataraviolência como afeta todasaspessoasdemaneiraigual.Além centra-se emdeterminadosterritórios e não em muitoslugares domundo,aviolênciacon- disciplinares eintersetoriais.No Brasil, como seu enfrentamento sãonecessáriasaçõesinter- um fenômenocomplexo emulticausalpara campo dequesetrata.Aviolênciaconstitui da violência,éindispensável compreender o atuação domunicípionaprevenção eredução ações preventivas. amplo lequedepossibilidadesemtermos queosmunicípiosdispõemdeum da, écerto ajudar nareinserção socialdosautores. aliviar asituaçãodasvítimasdaviolênciaou ter atosviolentos;(c)terciária –cujametaé emriscodesofrernada aosgrupos oucome- à populaçãoemgeral;(b)secundária–desti- pode serdivididaem(a)primária–dirigida litivos. Estaúltimaformadeprevenção ainda No casodoshomicídios,porexemplo, osho- Antes deapresentar aspossibilidadespara Independentemente da classificação adota- desenvolver açõesdeprevenção daviolência. poucas ocorrências criminais também podem cípios pequenosemédios onde seregistram e aviolênciadoméstica.Nesse sentido,muni- serem agravados esetornarem casoscriminais, escolar, queincluiconflitoscompotencial de pal. Constituembonsexemplos aviolência violência podemseralvo deatuaçãomunici- aquela denatureza criminal e outros tipos de lembrar que a violência não é apenas portante qual ouquaistiposdeviolênciaabordar. Im- ser tomada no âmbito municipal recai sobre dinâmica emquestão. efetivamenteações capazes na deinterferir o municípioiráatuardeformaadesenhar conhecer cadaumadasviolênciasnoqual Eles tambémrevelam anecessidadedese vidos emcadatipodecrimeouviolência. dade decaracterísticas,dinâmicaseenvol - critos anteriormentedemonstram a diversi - amigos ouconhecidosdavítima. são ospróprios paisoupadrastose32,2%são Além disso,24,1%dosagressores dascrianças mais dametadetemmenosde13anosidade. 2011, 88,5% das vítimas são do sexo feminino e mação deAgravos deNotificação (Sinan) em Entre oscasosnotificadosao Sistema de Infor- são levados ao conhecimento das autoridades. Apenas 10% dos casos, na melhor das hipóteses, timo crimetemaltíssimataxadesubnotificação. QUEIRA; COELHO, 2014)revela queesteúl- o estupro. Nota técnicadoIpea de2014(CER- são diferentes daquelasnecessáriasparaenfrentar para enfrentar estetipo de violênciacertamente do Ministério daSaúde). Asaçõesdeprevenção A primeira decisão importante quedeve A primeiradecisãoimportante Além deserem chocantes,osdadosdes- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 que tangeao público-alvo. Mesmo açõesde capacidade de focalização, principalmente no que osprogramas deprevenção enfrentam éa nerável àviolência.Um dosgrandesproblemas possibilidade deidentificar o públicomaisvul- lescentes comaviolência. associada ao envolvimento fortemente de ado- dados desagregados deevasão escolar, variável estão naesferacriminal.Exemplo dissosãoos diferentes tiposdeviolência muitas vezes não ções, jáqueosfatores deriscoassociadosaos petitiva nageraçãoeanálisedestasinforma - municípios têmumaenormevantagem com- fatores dosistema.Os derisconãofazem parte cípios possamplanejarsuasações. de desagregação necessárioparaqueosmuni- menos criminaisedasviolências com ograu de permitirumaavaliação sistêmicadosfenô- lidade aconsolidaçãodeinformaçõescapazes nacionais. Porém, ainda está longe de ser rea- possibilitando análisescomparadasemtermos os mecanismosdecoletadadoscriminaise Segurança Pública (Sinesp) estáaprimorando ção doSistema Nacional deInformações de desempenhar umpapelbastanterelevante. este é um campo no qual os municípios podem das informações disponíveis não serem ideais, dências. Apesar de a quantidadeequalidade violência éadisponibilidadededadoseevi- nho deumapolíticaefetiva deprevenção da (2016), umadascondicionantesparaodese- Outra vantagem dos municípios inclui a Além disso,informaçõesrelevantes sobre Sem dúvida,aaprovação eimplementa- Como apontadoporAbt e Winship Conhecendo oproblema 17

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 18 o desenvolvimento depolíticasprevenção. sistema deinteligênciapara rar umimportante quando analisados conjuntamente, podem ge- saúde, assistênciasocialeconselhotutelar–, vinculados ao município – como educação, de diferentes secretarias municipaiseórgãos dos sobre diferentes fatores deriscooriundos orientar efomentarpolíticaspreventivas. Da- pode gerarinformaçõesfundamentaispara elaprovavelmentecerta, seráineficaz. nãochegaàpessoa tuação oucomportamento política públicaquepretende mudarumasi- apresentam derisco. comportamento Se uma mente osindivíduosmaisexpostosaelaeque tadas pelaviolêncianãoalcançamnecessaria- prevenção focalizadasemáreas bastanteafe- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 de ações portante que a gestão municipal estrutureportante resultados satisfatórios.Nesse sentido,éim- tado pelosmunicípiospara sealcançarem para oenfrentamento daviolência. de diferentespio da articulação órgãos e ações embora deâmbitoestadual,tinhamoprincí- Gerais, e Pacto pela Vida, em Pernambuco, bem-sucedidos comooFica Vivo, emMinas tes federadosdistintos.Programas queforam setores diferentes e,nocasodoBrasil, deen- lência, emgeral,estesatores eaçõessãode mum. Em funçãodascaracterísticasdavio- ações eatores emtornodeumobjetivo co- diferentesabrange acapacidadedearticular ticas eprogramas deprevenção daviolência Considerando oexposto,município Estrutura de governança earticulação Este tambémdeve seroprincípio ado- Outro grandedesafiopresente empolí- temente comunitário. nicipais deveriam assumirumcaráter eminen- polícias militares atualmente,asguardas mu - das atividadesdemanutenção daordem nas discutidas anteriormente,bem comoovolume nal. Considerandoasatribuiçõesdomunicípio nam diretamente aproblemas deordem crimi- quantidade deatividadesquenãoserelacio- FORST, 2013).Aprimeiraabarca umagrande ordem e(ii)combateaocrime(DEMPSEY; em duas grandes funções: (i) manutenção da polícia nassociedadesmodernas,elesedivide cia pel daguarda giraemtornodopoderdepolí- dadisputaenvolvida emrelaçãoparte aopa- para seproduzirem resultados positivos. a troca de recursos sãoelementosessenciais de dados,oreconhecimento deproblemas e ticipantes, umavez queocompartilhamento deve sercapaz degerarconfiançaentre ospar- sucesso dainiciativa. Alémdisso,esteespaço ciar objetivos comunséfundamentalparao liderança políticacapazdecoordenar enego- vernança, ao mesmotempoemqueumaforte dego- ciedade civildevem integraraestrutura justiça criminal, políciase organizações da so- municipal,órgãosdosistemadeda estrutura modelo ideal,diferentes secretarias eórgãos programa deprevenção daviolência.Em um cipam deaçõescoletivas, nestecaso,deum interdependência- de instituiçõesque parti prevenção daviolência. implementar eavaliar aspolíticaseaçõesde um modelodegovernança paradesenhar, 13 Como abordado naseçãoanterior, grande O papeldaguarda Governança aquiéentendidacomoa . No entanto,quandoseanalisaopapelda WINSHIP, 2016). tados emtermosderedução daviolência(ABT; tamentos deriscodemonstram melhores resul- concentram emterritórios,públicos ecompor- 2006). Em termosdeefetividade,ações quese da segurançacidadã(DEMESQUITA NETO, violência oudocrimeou,ainda,apromoção entre seusobjetivos eresultados aredução da Como característicafundante,precisam conter executadas poragentespúblicosouprivados. bastante amplodeatividadesquepodemser daaçãode policiais comunitários. instrumento to dehabilidadescomunicação,principal guarda deve estarcentradanodesenvolvimen- não resolvidos. Nesse contexto,aformaçãoda homicídio, porexemplo, decorrem deconflitos diferentes tipos de violência. Muitos casos de flitos temumgrandepotencialde redução de capacidade demediá-los.Amediaçãocon- vindo nosestágiosiniciaisdosconflitos,com tariamente emquestõesnãocriminais,inter- prescindir dasforças policiais. mos decontrole informais,deformaqueelapossa seusmecanis- auxiliar acomunidadefortalecer na segurança.Opoliciamentocomunitáriodeve que acomunidadeassumamaiorresponsabilidade vez queopoliciamentocomunitáriopressupõe historicamente,uma paração aoqueseconstruiu mudança nessaformaderelacionamento emcom- (SKOLNICK; BAYLEY, 2002).Isso envolve uma to deestabelecercomelaumarelação próxima o policialseinsere nacomunidadecomointui- associado atáticaseestratégiassegundoasquais As açõesdeprevenção englobamumrol Ações deprevenção daviolência A guarda, deveria atuarpriori- portanto, O conceitodopoliciamentocomunitárioestá Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 oferecidos pelos Centros deAtenção Psicossocial domunicípio,comoosatendimentos por parte e drogas direta podemseralvo deintervenção deriscocomoconsumoálcool portamentos de prevenção daviolência. estes devem serintegradosàpolíticamunicipal criação deprogramas deprevenção terciária e passaram aterresponsabilidade formalpela passou a ser dos municípios. Portanto, estes das medidassocioeducativas emmeioaberto programas deatendimentoparaaexecução vo (Sinase), a competência de criar e manter tema Nacional deAtendimento Socioeducati- de 18janeiro de2012,queinstituiuoSis- des envolvidas nessestiposdeação. de pessoascompreende umadascomplexida- eaidentificação desseconjunto to destegrupo, - mudança damentalidadeedocomportamen médio elongo prazos. Seus objetivos focam na fíceis de implementar e em geral são ações de que cometemcrimeseviolênciasãomaisdi- ação municipal. de, dentro dorol depossibilidadesparaaatu- contemplem incentivar aconvivência nacida- consideraraçõescujosobjetivos É importante ordenamento doespaçopúblico,entre outras. volvem iluminação pública, renovação urbana, petência exclusiva domunicípio. Tais açõesen- coordenação deatores eencontram-senacom- tica deimplementação. Elas envolvem pouca fáceis deimplementaremfunçãodacaracterís- noambiente,emgeral,sãomais à intervenção Por fim, açõesfocadasnamudançadecom- Vale ressaltar da Leinº 12.594, que a partir As açõesdirecionadas apúblicosegrupos As açõesdeprevenção situacionalvoltadas 19

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 20 conceitos deprevenção daviolênciaefatores constitui segurança pública. Adotando-se os reposicionamento do entendimento que longe deserem novidade. estão gurança públicaapontadosnesteartigo C que nãopossuamalvará defuncionamento. menores deidadeoufechandoestabelecimentos trativa, autuandobares quevendam bebidaspara utilizando paraissoseupoderdepolíciaadminis- forma indireta emquestõescomportamentais, (CAPs). Omunicípiotambémpodeatuarde Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 onclusão O cerne da questão, no entanto, está no Os caminhosdeatuaçãomunicipalnase- 13. 12. 11. 10. 9. 8. 7. 6. 5. 4. 3. 2. 1. A autorização para porte dearmas também éumaforte demandada categoria. ADI nº5156/2014. Inciso III do artigo 5º da Lei nº13.022, de 8 de agosto de 2014, que permite às guardas municipais o policiamento ostensivo nas vias públicas. Segurança pública como sinônimodepolícia. aumentam aschances deumapessoa seenvolver emumasituaçãodeviolência. segurança pública, osfatores derisco dizem respeito aosfatores individuais,comportamentais eambientais que,quandocombinados, o e a paraMINAYO, Adaptados bem-estar (SCHENKER; p.708). 1995)” 2004, al., et o JESSOR 1991; JESSOR, saúde, 1986; al., et (NEWCOMB a social desempenho para negativos resultados de ocorrência de possibilidade à associadas variáveis ou condições “Designa artigo 23,quetrata dascompetências concorrentes, nãomenciona asegurança. O órgãos. determinados a execução sua por responsabilidade a restringe porém, [...]”, todos de responsabilidade e direito Estado, do O capítulo III da Constituição Federal trata da Segurança Pública e no caput do artigo 144 estabelece que “A segurança pública [é] dever e era previsto orecebimento deumabolsamensalR$100,00. esportivas, culturais eeducionaiscom vistas àemancipaçãoesocialização. Oparticipantes podiamparticipardoprojeto poraté doisanos O projeto tinhacomo objetivo ainclusãodejovens eadolescentes emsituaçãodevulnerabilidade eexposição àviolênciaematividades jovens para arede deproteção. Para isso, oprojeto previa orepasse deumabolsaR$190,00mensaisàsparticipantes. objetivo de que estas pudessem exercer ações de justiça comunitária, mediação de conflitos, educação para direitos e encaminhamento de O projeto mulheres da paz era destinado à capacitação de mulheres em temas como direitos humanos, gênero e mediação de conflitos, com (Pronasci) edáoutras providências. Segurança Públicacomde Cidadania Programa Nacional o institui que 2007, de outubro de 24 de 11.530, nº Leiprevista na Instituição 182 aprovados foram 2008 projetos provenientes demunicípios,totalizando em R$119.755.827,00. que revelaram Pronasci, do monitoramento pelo responsável entidade FGV, da relatório do Dados No lançamento doprograma haviaprevisão deinvestimento emcinco deR$6bilhões anos,até ofinalde2012. Até 2003,apenasosmunicípios com guardas municipaispodiamsolicitar recursos aoFundo NacionaldeSegurança Pública. Frequentemente, osenvolvidos sãohomensjovens decomunidades vulneráveis. este tipo de violência é espontânea e impulsiva, embora tenha umgrande impacto, resultando em morte ou graves prejuízos. principalmente noespaço público; éinterpessoal eacontece entre pessoas oupequenosgruposqueseconhecem ounão. Geralmente ocorre são: características principais suas e homicídios de número grande um por responde Ela rara. ou comuminstrumental; se violência frequência, a uma (vi) é ou impulsivo e emocional caráter tem ela se (v) planejada; ou espontânea é ocorrida violência a se (iv) envolvidos; atores de número (iii) público; ou privado domínio em se ocorrência, de local (ii) danos; provocar de capacidade ou letatidade de grau (i) dimensões: seis de partir a metanálise classificada autores da violência pelos de tipo um comunitáriaé Violência E osmunicípiospodemserprotagonistas. ciedade brasileira precisam assumir seu papel. meros não deixadúvida. Todos osatores daso- gresso Nacional. A urgência traduzida em nú- parecem acreditar muitosmembros doCon- exclusiva dosistemadejustiçacriminal,como coletiva entre osatores envolvidos. deste novo sentido,quedeve sedardemaneira tes resultados. Ocuidadoreside naconstrução práticas deprevenção podeproduzir diferen- porém, a alteração do sentido atribuído às violência. Asaçõespodematéserasmesmas, diretamente noproblema da tral paraintervir de risco,omunicípiopassaaterumpapelcen- A soluçãodoproblema nãovirádaatuação vil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13022.htm>. . . em: Disponível providências. outras dá e Pronasci – Cidadania com Pública Segurança de Nacional Programa o institui BRASIL. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10201.htm>. e dá outras providências. Disponível em: . default/files/USAID-2016-What-Works-in-Reducing- . Acesso em14jul.2016 da%20Seguran%C3%A7a%20P%C3%BAblica%20no%20 -%20Pacto%20Federativo%20e%20Financiamento%20 ca.org.br/storage/download/Nota%20T%C3%A9cnica%20

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido Dossiê para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso 22 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 12-23, Ago/Set 2016 Segurança pública: um desafio para os municípios bra - municípios os para desafio um pública: C. Segurança G. Haydée CARUSO, Mattos; de Carolina RICARDO, Oxford University Press, 2011.p. 532-558. J. Q.; PETERSILIA, J. (Ed.). Prisons. In: WILSON, Bert. Anne Morrison; USEEM, PIEHL, 2003. reentry. prisoner and Joan. PETERSILIA, 2014. interventions. for implications and offending criminal in change and continuity Understanding desistance: and redemption, Kiminori; NAKAMURA, BUCKLEN, Kristofer Bret. Recidivism,

, v. 8, n. 4, p. 384-397,p. 4, v.n. Compass8,, Sociology hn rsnr cm home: come prisoners When xod Ofr Uiest Press, University Oxford Oxford: Crime and Public Policy. Oxford: Parole p. 17-28, 1998. proposi- five theory: tions. as Governance Gerry. STOKER, Edusp, 2002.(SériePolícia eSociedade, 6). Paulo: São mundo. do atravéspráticas e questões nitário: SKOLNICK, Jerome H.; BAYLEY, David H. pdf>. Acesso em20jul.2016.

Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 24 campo dasegurança pública institucional eparticipaçãono municipais, isomorfismo Novas polícias?Guardas Estatutário do Instituto de Pesquisa Econômica Graduada em Ciência Política Aplicada – IPEA. pela Universidade de Brasília - UnB. Joana LuizaOliveira Alencar nalidade eSegurança Pública –CRISP-UFMG eprofessor adjunto daPontifícia Universidade Católica deMinasGerais -PUCMinas. Universidade Federal deMinasGerais –UFMG. Mestre emSociologiapelaUFMG. Foi pesquisadordoCentro deEstudosCrimi- Técnico emPlanejamento ePesquisa doInstituto dePesquisa Econômica Doutor emSociologiaePolítica Aplicada pela –IPEA. Almir deOliveira Junior Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 Segurança pública. Participação. Guardas Municipais. Palavras-Chave como preconizado noEstatuto dasGuardas. ações ostensivas deenfrentamento àcriminalidade,emvez deprivilegiarummodelocom foco naatuaçãopreventiva, municipais corram orisco dereproduzir umapostura decerto distanciamento emrelação àpopulação, voltada para dência, muitas vezes presente, desetornarem organizações semelhantes àspolíciasmilitares faz com queasguardas de ações preventivas que deem resposta às demandas que emergem nesses espaços de participação. Contudo, a ten - comunidades. Nesse sentido, as guardas municipais são atores relevantes, com capacidade de apoio e implementação poderamento popularnasegurança podemsedaremconselhos comunitários, quesepretendem espaços deescuta das movimento, as guardas municipais podem ser consideradas uma inovação institucional no setor. A participação e o em- Os municípiosvêm ocupando cada vez maisespaço nocampo dasegurança pública noBrasil e,como parte desse Resumo [email protected] [email protected] çado pelasexpectativas culturais dasociedade que se colocam como modelo, o que é refor- sobre asorganizaçõespor outrasorganizações influências formaiseinformais sãoexercidas titucional. Fala-se emisomorfismoquando das guardas ofenômenodoisomorfismo ins- no desenvolvimentotudo, pode-seobservar como éocasodasguardas municipais.Con - capacidade decanalizarrecursos paraisso, tão dasegurançapública,buscandopodere atores nosentidodeseapropriarem daques- e, por outro, de um investimento de novos passam asorganizaçõesrepressivas doEstado lado, deumacriselegitimidadepelaqual te àviolênciaecriminalidaderesulta, porum papel dopoderlocalnaspolíticasdecomba- aos governos eàspolíciasestaduaisnosetor. do papelrelativo quepassamaassumirfrente implementação dasguardas municipaisapartir Introdução E A nova definiçãoque vem sendodadaao pios no campo da segurança pública e a pios nocampodasegurançapúblicaea analisaaincursãodosmunicí- ste artigo Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 em seucampo de políticapública. o diálogocomapopulaçãonos arranjosepráticas emoutros setoresobservados quejáincorporam da segurança,inibindoavanços quepodem ser social no campo aprimoramento da participação o isomorfismoatuacomoumaforça contráriaao ais (OLIVEIRAJUNIOR,2016).Desse modo, e programas desenvolvidos pelaspolíciasestadu- noplanejamento mento institucionalobservados reproduzindo osmesmosproblemas deinsula- com ascomunidadeslocais,elaspodemacabar mindo uma postura mais próxima e de diálogo papel diferenciado nasegurançapública,assu- guardas municipaisparaquedesempenhemum se processo. às Apesar abertas dasoportunidades estadual. Sendo parariscosnes- assim,adverte-se belecido pelasinstituiçõesconstituídasnonível nicipais aseguiromodelohistoricamenteesta- ção dasorganizaçõesdesegurançapúblicamu- GIO; POWELL, 2005). em queessasorganizaçõesatuam(DIMAG- Diversos fatores levam à tendência de atua- 25

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 26 pública Poder municipal esegurança Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 patrimônio público eapoioàcomunidade deslocamento dasatividades deproteção ao por elasatendidos,houve umprogressivo municipais e da quantidade de municípios rápido crescimento dosefetivos das guardas 2006 já apontava, à época, que, Nacional deSegurança Pública publicadoem só temaumentado. Um estudodaSecretaria municípios naspolíticasdesegurançapública prios municipais. dato legalparacuidardasegurançadospró- a criaçãodeguardas municipais,comman- implementadores. Contudo,tambémpreviu cias militares ecivisdefinidascomoórgãos lidade pelasegurançapública,comaspolí- atribui aosgovernos estaduaisaresponsabi- 144,constitucional de1988,noseuartigo bém àárea desegurançapública.Otexto te deixaria de se estender, na prática, tam- presente naConstituição,quedificilmen- daadoçãodomodelodescentralizadorpartir ção depolíticaspúblicasnosúltimosanos,a municipais passaram a ter na implementa- 2009). ZANETIC, titucional daquestãosegurança(KAHN; uma espéciede“alargamento” conceitualeins- paço considerável deatuação,caracterizando também osmunicípiospassaramaterumes- pação daUnião nocampodaspolíticas,como no setor. Não- somenteseampliouapartici relativização dopapeldosgovernos estaduais tem passadoasegurançapúblicanoBrasil éa Desde então,adiscussãosobre opapeldos É notórioodestaquequeosgovernos A maiormarca dasmudançaspelasquais : umaatua ção emexpansão ao pari passu ao indicadores nessecampo,principalmente no atuar sobre algunsfatores quemelhoramos preensão dequeopoder municipalpoderia da criminalidadeeviolência, houve acom- plexidade emulticausalidade dosfenômenos enfrentamento dosproblemas. Dada acom- consequente planejamentodasaçõesparao para elaboraçãodeestudosdiagnósticoseo dos seuscomponentes.Houve orientação pública, dosquaisaguarda seriaapenas um apresentassem projetos naárea desegurança das municipais.Foi recomendado queestes sivamente àcriaçãoemanutençãodeguar- sos aos municípiosnão se vinculou exclu- Segurança Pública (FNSP) se deucomacriaçãodoFundo Nacional de repasse derecursos. Um marco nesseprocesso produzidos pelogoverno federalnaformade blica, oquesesomaaosestímulosforam cias dosaparelhos estaduaisdesegurançapú- em atuarnosespaçoscriadospelasdeficiên- preocupação dasadministraçõesmunicipais 2006). Essefenômenodemonstraaconstante rências epoliciamentoostensivo (SENASP, cia militar, taiscomooatendimentoaocor- para outrasdecompetênciaoriginaldapolí- Deve-se queorepasse derecur observar - ZANETIC, 2009,p.ZANETIC, 83). guardas pelopaísdepoisde2000(KAHN; que oFNSPtenhaestimuladoacriaçãode atuação dosgovernos locais;épossível até legítima eprocurou incentivar desdeentãoa Isto significaqueogoverno federalviucomo verno federalparaprojetos desegurança. Municipal –requisitassem recursos dogo- municípios –apenasaquelescomGuarda nas aspolíciasestaduais,mastambémos (...) abriuapossibilidadeparaquenãoape- 1 , que: segurança pública Isomorfismo institucional e VEIRA JUNIOR;SILVA FILHO,2010a). tornarem umtipodepolíciamunicipal(OLI- regulamentação dasguardas nosentidodese que é reforçada pela diretriz que aponta para fundamental decogestãodasegurançapública, o espaçodamunicipalidade como instância sões entre osprincípiosqueaprovou, apregoou blica (Conseg), apesar das contradições e ten- meira Conferência Nacional deSegurança Pú- regiões metropolitanas. derados maisvulneráveis àcriminalidadenas vendo açõesvoltadas paraterritóriosconsi- governos municipaisnasuaexecução, envol- dosna implementaçãolocaleaparticipação nia (Pronasci), em2007,comasuaênfase Nacional de Segurança Pública com Cidada- foi reforçado comolançamentodoPrograma que dizrespeito àspolíticaspreventivas. Isso rior depoliciamento, reativo erepressor, grande descrédito quanto aomodeloante- sição nessaarena política, emqueseinstaura encontram emmeioaum processo detran- de segurança pública. Elas sedos serviços novas expectativas napopulação arespeito canalizar reivindicações próprias edegerar como umnovo profissional, capazde grupo As guardas municipaistêmseconfigurado diferentes agências da burocracia pública. tendida comogeradoradedisputasentre uma sociedadedemocrática,podeseren- como opapelquedeve desempenharem municipais? se tornado (“militares polícias ”) Posteriormente, realizada em2009,apri- A políticadesegurançapública,bem guardas TÊM : as Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 modelo daspolíciasmilitares tundente eque,naprática,iriaafasta-lasdo que poderiamdesenvolver deformamaiscon- ativa que paralisa opotencialprevencionista Desse modo, recebem influênciadalógica re- no país,principalmentenoscentros urbanos. dinâmica conflitiva das relações sociaisdifusa público pormaissegurança,bemcomoda guardas municipais sofre as pressões do clamor 2005). Nesse sentido,odesenvolvimento das po institucional(DIMAGGIO, POWELL, reflexo dos valores oudascrenças deseucam- mais demuitasorganizaçõesconstituemum basear. Em for- outras palavras, as estruturas setor, nasquaisosnovos gestores buscamse organizações maisantigas,comexpressão no entrarem emcena,tomamcomomodeloas blema dasegurança.Organizações jovens, ao às disputaspela“propriedade moral” cional emerge como força relevante em meio mente convincenteousatisfatório. foi substituídoporoutro quesemostre real- FILHO, 2010b),masquenaverdade não limitações (OLIVEIRAJUNIOR;SILVA já bastantedesgastadoecriticadoporsuas se alcançarfins bemdefinidos.Essadinâmica pensados em uma lógica objetiva, voltada para ras sãocriadoscomosefossem racionalmente curso, políticas,programas deação e carrei- mesmo campo de atuação. No nível dodis- influenciarem outros dentro fortemente do profissionais demaiorvisibilidade dos grupos das atividadesdesenvolvidas pordetermina- justiça criminal–podeocorrer atendência tucionalizadas –comoéocasodosistemade Assim, aquestãodoisomorfismoinstitu- Em outras palavras, em áreas muito insti- 3 . 2 dopro- 27

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 28 cias militares: o espectro deinfluênciadomodelodaspolí- Contudo, nãoraro, taisprocessos ocorrem sob um contextovariado edegrandeindefinição. como uma espécie de polícia ostensiva, em públicos municipais,orasecaracterizando mais voltado debens àvigilânciaepreservação municipais nopaís,oramantendoseupapel no processo deinstitucionalizaçãodasguardas 2010), exploraalgumasdasdireções seguidas des dediferentes Estados(MISSE;BRETAS, Misse e Marcos Bretas, realizada em oito cida- segurança pública. tentarem ostatus padrão deconformidadedisponível eporos- cias militares, porestasrepresentarem oúnico acabam recebendo influênciasdaspolí- fortes que foramimplantadas,asguardas municipais de experiênciasnascentenasmunicípiosem seja possível falar em uma grande diversidade inseridas (MEYER; ROWAN, 1977).Embora dade comocampoinstitucionalnoqualestão organizações, resultado da buscadeconformi- isso funcionacomoummitoadotadopelas espaço nasociedade.Contudo,muitasvezes permite àsorganizaçõesacumularem podere Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 Uma pesquisacoordenada porMichel Em nãopoucoscasos,os velhos atores es- como fazer segurançaparacuidardisso (...). militar, que se conhece sobre o único expert uma Guarda Municipal, echamaopolicial des inovadoras, omunicípio decidecriar novas condições. Na ausência decapacida- de técnicoseagentescapazes deoperarnas sem aexistênciadeumsaberespecializadoe blica, descobrimosquetaltransiçãoéfeita cesso demunicipalizaçãodasegurançapú- [...] namedidaemquetranscorre esse pro- de especialistasnosetorda vos paradigmas: disseminado, dificultando aemergência deno- rança públicaé“coisa depolícia” aindaémuito da área. Aimagemouoideáriodequesegu- pública quantonasdiscussõessobre políticas nal dasegurançapública,tantojuntoàopinião mente umlugarcentralnocampoinstitucio- criada pararegulamentar asaçõesdasguardas Geral dasGuardas Municipais” (Lei 13.022, Isso ocorre apesardaaprovação do “Estatuto militares, atuandodeformaostensiva nasruas. batalhões deoperaçõesespeciais daspolícias guardas municipais com divisões que lembram ser desenvolvidas pelasorganizações.Existem gadas easatividadesquerealmente deveriam res conexões entre asnormas e crenças propa- muitas vezes nãoépossível estabelecermaio - As políciasestaduaisocupamtradicional- É porissoque,numalógicamimética, BRETAS, 2010,p. 11-2). listas daárea desegurançapública(MISSE; estaduais, que,bemoumal,sãoasespecia- está frequentemente subordinada àspolícias vencional. Sua condução,noentanto,(...) políticos próprios deoposiçãoàpolíciacon- Em outros casos,desenvolvem-se projetos guardas subordinadas àspolíciasmilitares. tão conduzindo esse processo, tornandoas 2005, p. 83). e administradas(DIMAGGIO; POWELL, lação aomodocomodevem serestruturadas clientesemreexpectativas deimportantes - podem achar mais vantajoso satisfazer as cias paraselegitimarem. Tais organizações de seraltamentedependentesdasaparên- em discussãopossuemmaiorprobabilidade [...] organizaçõescommetasambíguasou sua criação, observa-se que: sua criação,observa-se sido regulamentadas paraserem polícias,desde das guardas municipais,apesardenãoterem de trabalhosãodesenvolvidas defato. No caso por um lado, e o modo pelo qual as atividades entre formais e legais, as estruturas servadas tuições militares. hierárquica diversosestruturação aos das insti- possuir capacitação, forma controle, normas e profissionais deseupróprio quadro, alémde devem serdirigidas,preferencialmente, por Inclusive, definequeasguardas municipais das funçõesjáatribuídasàspolíciasestaduais). cia, definindoseuâmbitodeatuaçãoàparte municipais noâmbitodaprevenção daviolên- guardas deveriam sempre ser pensadas no con- (política, orçamentária etc.) dos municípios,as é que,mesmotendodeseadaptar àrealidade GAS; OLIVEIRAJUNIOR, 2010).Ocerto ora paraarepressão ea aplicação dalei(VAR- mais voltada para o policiamento comunitário, nal queéprópria daspolíciasostensivas, ora pais têmporreferência umaculturaocupacio- e aformadeorganizaçãodasguardas munici - tos comoaformação,relação comopúblico Assim, verdadeiras lacunaspodemserob- Outras pesquisasconfirmamqueelemen- militar (PATRÍCIO, 2008,p. 69). res deavaliação comunsaouniverso policial produzam métodos,ideologiaseindicado- raro quealgumasinstituiçõesquasere- ção desuaidentidadeorganizacional.Não é - na definiçãodoseumandatoeconstru confusão sobre anatureza doseutrabalho, mas exceções, temimplicadoumaespéciede tares àfrente dessasinstituições,salvo algu- O predomínio dapresença depoliciaismili- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 gos referentes àsegurançapúblicanão sere- do Estado sobacoordenaçãoprios paraaparticipação, cada área, indicando a criação de espaços pró- o quefoiregulamentado posteriormenteem social,sejam conduzidas com participação assistência social,saúde,educaçãoecultura ma explícitaqueaspolíticasdeprevidência, rança pública. rem e democratizarem a visão sobre a segu- das municipaiséapossibilidadedeamplia- consolidação, algointeressante sobre asguar- sim, umavez queaindaestãoemprocesso de de polícia” (OLIVEIRAJUNIOR,2016. As- como ingerência externasobre os“assuntos tivos decriminalidade podematéservistos novos desenhoslocaisdeprogramas preven - das instituições policiais tradicionais, osparte zação daspolíticaspúblicas.No entanto,por tos, colaboraçãoduranteaexecução efiscali- deproje- para aagendapolítica,construção cia. Compreende desdeaproposição detemas consolidação eoaprimoramentodademocra- políticas públicaséumgrandedesafiopara a SEGURANÇA EDAAGENDA PÚBLICAS POLÍTICAS DAS INSTITUIÇÕES PARTICIPATIVAS NA solução paraaviolência. mais polícia e armamentos constituem a única dos projetos, quebrandooparadigmadeque nidades locaisdesdeoiníciodeimplantação poder públicomunicipalenvolvesse ascomu- carente deinovação. Seria fundamentalqueo pública nopaís,porsetratardeumcampotão texto deumanova proposta paraasegurança A ConstituiçãoFederal determinadefor- dasociedade nagestãodasA participação 3 - (BRASIL,1988). Embora osarti 29

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 30 cialmente, da saúde. trário dacultura,assistência sociale,espe- das políticasàépocadaConstituinte, aocon- integrou o movimento de redemocratização forma consideraqueasegurança públicanão tores da sociedade civil é mais antiga. Dessa política desaúde,cujaaproximação comse- ébemdiferentegestão maisparticipativa da Diante disso,suatrajetóriaemdireção auma vernamental epeladistânciadapopulação. intergo- te marcada pelafaltadearticulação política desegurançapúblicaéhistoricamen- Constituição. Lima(2012)consideraquea em relação àsáreas citadasdiretamente pela ção decontasaindaéumapossibilidadenova lização parademocratizarefacilitarapresta- teve início emumperíodoposterior. Sua uti- dessesespaçossegurança públicaaconstrução social. Nopaços departicipação campoda dees- eo fortalecimento para aconstrução hojedereferênciademocratização, servindo à sociedadeantesmesmodoperíododere- Iniciouinstituições participativas. a abertura çadas naimplantaçãoenofuncionamentode 2007). Aárea dasaúdeéumadasmaisavan- a sociedade(COELHO,2007;CUNHA, quepermitam ainteraçãocomzar estruturas ções conjuntas;assim,cabeaoEstadoorgani- os problemas de uma política e buscar solu- rios dapolíticaéfundamentalparaperceber menor quantidade(PIRES, 2011). outras áreas depolíticaspúblicasemmaiorou presentescomo instituiçõesparticipativas, em social,tambémconhecidosde participação a necessidadedecriaçãoespaçospróprios rança como responsabilidade de todos, com firam diretamente aotema,aponta-seasegu- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 Aproximar agestãopúblicadosdestinatá- mento por parte dosgestores:mento porparte intencional,queexigeumplaneja- construção a interagirconjuntamente.Isso envolve uma governo quantoasociedade precisam aprender zado democrático,considerandoquetantoo de políticas a área, de aprendi a construção - tar, além do acompanhamento e proposições entre Estadoesociedade;suaideiaépossibili- nos conselhos constitui exercício de interação gada a órgãos do poder executivo. A atuação também da sociedade. A maioria deles está li- representantes deórgãosdopoderpúblicoe calizar a política pública. São compostos por norma legal,responsáveis porpropor eatéfis- estáveis, geralmente criados por estruturas encontradas nos dados policiais, adequan- da populaçãotrazinformações quenãosão desegurança.Ouvir asdemandasao serviço que facilitaodiálogo,trazendo contribuição tencial degerarconfiança na comunidade, o pública. Aconvivência constante tem o po- entre Estadoesociedadenaárea desegurança cidadã éumapossibilidadedeaproximação daperspectiva desegurançacipais apartir Os conselhos de participação popular Ossão conselhos de participação Além disso,aatuaçãodasguardas muni - (FBSP, 2016,p. 24). tas desoluçãoepotencialidadesdasações recorra àpopulaçãoparalevantar propos- cesso pautadopelosdireitos humanoseque apenas deumdocumento,maspro- sas profissionais deopinião. Não setrata individuais oucoletivos, promover pesqui- comunitários desegurançaemencontros cias públicas,ouvirassociaçõeseconselhos isso pode-seconvocar moradores aaudiên- volve apopulaçãoemsuaelaboração. Para Um bomplanomunicipaldesegurançaen- superem aforça doisomorfismo institucional. digma, oquerequer mudançasculturaisque Hoje, vive-se odesafiodaadoçãodessepara- tão da política, especialmente em âmbito local. pação cidadã.Ocidadãodeve serativo nages- 5,IX).IssoArt. reforça- oparadigmadapartici segurança dascomunidades” (BRASIL,2015, locais voltados àmelhoriadascondiçõesde vil paraadiscussãodeproblemas eprojetos específicas é“[...]interagircomasociedadeci- guardas municipais,umadesuascompetências nidades locais.De acordo comoestatutodas segura deve serconduzidajuntocomascomu- percepção de uma cidade de que a construção gurança pública,desdequesetrabalhecoma dapopulaçãonase- possibilitar aparticipação ção edecaráterpreventivo. belecida uma relação mais próxima da popula- Subsídios diferentes dapolícia,umavez esta- de proposições paraaspolíticasdesegurança. subsídios daguarda municipalnaelaboração conselhos deâmbitomunicipalpodemreceber daconvocação daunião.partir Conferências e dasdiscussõesconferênciase participam a guns estadosemunicípiospossuemconselhos pública (Conseg),queaconteceem2009.Al- e comaprimeiraconferência desegurança do ConselhoNacional deSegurança (Conasp) Estado tematuadoemâmbitofederalpormeio cidadão (COELHO,2007). com ointuitodepromover do aparticipação fatório requer atuaçãoconstantedoEstado perspectiva, umprocesso satis- participativo às necessidadesdecadacomunidade.Nessa públicodesegurançapúblicado oserviço A atuaçãodosguardas municipaispode Para essapromoção nasegurançapúblicao Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 C em campanhas deeleiçõesmunicipais. Isso possível plataformapolíticaaserexplorada maiores efetivos paraasguardas municipais, um discursoquesebaseia em promessas de daopiniãopública, fomentadorade boa parte é verdade,isomórfico encontrasuporte, em sua atuaçãonasegurançapública.Essemodelo cia predominante dosgovernos estaduaisem comoéatendên- viaturas evigilâncianasruas, tralizado evoltado pararepressão, commais municipais optaramporseguiromodelocen- da, namedidaemquemuitasadministrações tunidade deinovação institucionalsejaperdi- cipativa no setor(FBSP, 2016). - va –possuem conselhoscomoinstituiçãoparti de mais100milagentessegurançanaati- plementaram asguardas –comumincremento que apenas22%dos1.081municípiosim- Pública, referentes aoanode2014,mostram divulgados peloFórum Brasileiro deSegurança lho preventivo social.Dados comaparticipação o queenvolve conjugarplanejamentoetraba- tem sido geralmente tratada deformasistêmica, paracooperaçãocom oscidadãos. runs ter guardas municipais.Deve-se estabelecerfó- preciso irmuitoalémdecriar, equipareman- prevenção e proximidade com a população. É necessidade deinvestir sistematicamenteem pública, osmunicípiosprecisam reconhecer a dos pelasestatísticasnocampodasegurança alarmantes quesãocontinuamenteconstata- que não têm obtido êxito em baixar os índices enfrentamento daviolênciaecriminalidade, onsidera Percebe-se, oriscodequeaopor- portanto, A segurançapúblicanonível municipalnão Como alternativa àsformastradicionaisde ções finais 31

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 32 esse isomorfismoinstitucionalnocampoda problemas dascomunidades.Conclui-seque busca umamaiorefetividadenasoluçãodos jáexistentesnem qualitativa dasestruturas lícias militares, quenãoenvolve umaalteração “polícia paralela”, mimética emrelação àspo- pouco maisoferecem doqueumaespéciede apenas legitimaprogramas que,naprática, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 4. 3. 2. 1. Art. 194, VII; art. 198, III; art. 204, II; art. 206, VI; art. 216-A, X. 216-A, 206,VI;art. 204,II;art. 198,III;art. 194,VII;art. Art. Político-Pedagógico eProjeto deSustentabilidade daAcademia Estadual deGuardas MunicipaisdoRioGrande doSul. Plano perspectiva. em socioprofissionais identidades lugar: algum a lugares muito Dos SUL. DO GRANDE RIO MUNICIPAISDO GUARDAS DE Quanto aesse potencial prevencionista dasguardas etambém sobre osriscos deumalógica deatuaçãoreativa, ver: ACADEMIA ESTADUAL Press, 1981). canalizar recursos estatais. O tema é amplamente explorado por GUSFIELD, J. (The culture of public problems. Chicago: University of Chicago solução, o que implica influenciar valores, atitudes e expectativas da população. ou Envolve, tratamento seu entre outras por coisas,responsável adquirir do poder e estabelecimento capacidade o de com problema, do moral” “propriedade da definição a com começaprocesso problemas públicos, desenvolvendo eorganizando aforma emquedemandassãoencaminhadas eprocessadas noâmbito doEstado. Esse Atoresgovernamentaisagências (exemplos:e transformaçãosociais educação,na questões saúde, atuam de cultura,segurança, em etc.) no nível municipal. do Ministério daJustiça. Oobjetivo foi apoiarprojetos naárea de segurança pública eprevenção àviolência,inclusive aqueleselaborados âmbito União,no orçamentáriosrecursosda com estabelecido foi FNSP o fevereiro2001, de de 14 de 10.201, n. Lei pela Regulamentado conselhos comunitáriosdesegurançapública. dá especialmentepelafaltadevalorização dos cas emseucampodepolíticapública.Isso se diálogo comapopulação nos arranjos e práti- vados emoutros setores quejáincorporamo social, inibindoavanços quepodemserobser- aprimoramento do diálogoedaparticipação segurança atuacomoumaforça contráriaao na segurança pública. In: segurançapública. na municípios dos papel O André. ZANETIC, Tulio, KAHN, -10jun-final-b.p>. Acesso em:27jul.2016. rage/download//projeto-instituto-arapyau-v05- . Perfil%20das%20Organiza%C3%A7%C3%B5es%20

33

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional Dossiê e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar 34 Palabras clave: las Guardias. la actuaciónpreventiva, como preconizado enelEstatuto de criminalidad, enoposiciónaprivilegiarunmodeloenfocado en volcada haciaacciones ostensivas deenfrentamiento ala reproducir unaactituddealgúnalejamiento delapoblación, hace con quelasguardias municipales estén bajoelriesgode vuelvan organizaciones semejantes alaspolicíasmilitares embargo, latendencia, muchasveces presente, dequese demandas quesurgen enesosespaciosdeparticipación.Sin e implementación deacciones preventivas quecontesten las municipales sonactores relevantes, con capacidad deapoyo para oírselascomunidades. Enesesentido, las guardias en consejos comunitarios, quesonimaginadoscomo espacios y el empoderamiento popular en la seguridad pueden ocurrir como unainnovación institucionalenelsector. La participación movimiento, sepuedenconsiderar lasguardias municipales el área deseguridadpública enBrasil y, como parte deese Los municipiossevuelven cada vez másimportantes en seguridad de pública área el en participación y isomorfismo institucional municipales, Guardias policías? ¿Nuevas Resumen Almir deOliveira JunioreJoanaLuizaOliveira Alencar campo dasegurança pública isomorfismo institucional eparticipaçãono Novas polícias?Guardas municipais, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 Municipales. Seguridad pública. Participación. Guardias as provided for intheGuards´ Statute. opposed to adopting amodelcentered onpreventive action, the population, aimed at ostensive crime-fighting actions, as run theriskof replicating aposture thatdistances themfrom similar to thoseof themilitary police meansmunicipalguards However, thefrequent tendency to become anorganization response to demandsemerging from participative forums. actors supportingandimplementing preventive actionsin communities. Inthissense,municipalguards are important place through community councils, forums for hearingthe Popular participationandempowerment insafety can take can beconsidered aninstitutionalinnovation inthesector. public of field safety inBrazil the andaspartof thisshift municipal guards in importance gaining are cities The and participationsafety inthefield of public isomorphism institutional guards, Municipal police? New Keywords: Abstract Public safety. Participation. MunicipalGuards. Data derecebimento: Data deaprovação:

26/08/2016 28/06/2016 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 24-34, Ago/Set 2016 35

Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 36 Pública noBrasil: Os Municípios eaSegurança Graduando emGestãodePolíticas Públicas pelaUniversidade deSãoPaulo -USP. Gabriel Marques Tonelli tudos emAdministração Pública eGoverno (CEAPG)e do NúcleodeEstudosemOrganizações ePessoas (NEOP), ambosdaEAESP/FGV. Getulio Vargas -FGV. Graduada emCiênciasSociaispelaUniversidade deSãoPaulo -USP. Pesquisadora colaboradora doCentro deEs Diretora-executiva doFórum Brasileiro deSegurança Pública. Mestre edoutoranda emAdministração Pública eGoverno pela Fundação Samira Bueno mestre emEconomia pelaFundação Getúlio Vargas -FGV. Graduada emAdministração Pública pelaFGV. Gestão dePolíticas Públicas daEscola deArtes, Ciências eHumanidadesdaUniversidade deSãoPaulo -EACH-USP. Doutora e Professora Doutora deGestãoPolíticas Públicas edosProgramas deMestrado -Mudança SocialeParticipação Política e Ursula DiasPeres década de1990 financiamento dasegurançaa públicadesde da relevância dosentes locaispara o Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Segurança pública. Finanças municipais. Governos locais. Municípiosbrasileiros. Palavras-Chave a Uniãoefrente àcentralidade queaárea foi tomando naagendaurbanacontemporânea federativarelação da com luz segurança públicaà da financiamento no municípios dos participação a objetivoanalisar colocam asegurança como prioridadeemseusprogramas degoverno, atendendo àpressão social.Este artigotem por PIB nessa área. Já existem mais de 1.000 estruturas de guardas civis em todo país, além de prefeitos que cada vez mais de diferentes portes, quequase triplicaram seusgastos com segurança pública nosúltimos20anosegastam 0,08%do obrigatoriedade deenvolvimento das prefeituras naprevenção econtrole daviolência.Oquetemos hojesãomunicípios, da violênciaecriminalidadenoscentros urbanos,depoisinclusive emcidadesinterioranas edemenorporte, expôs a tucional dasegurança pública continuou focado no papeldaspolíciasestaduais efederais. Apesar disso, ocrescimento vez maisrelevantes, agentes damunicipalização daeducação, saúdeeassistência social,porexemplo, oarranjo insti- cadaforam entes essestornando-se áreas outras em enquanto 2000, e 1990 anos dos segurançalongo de pública.Ao A Constituição Federal de 1988 não atribui um papel de protagonismo aos municípios brasileiros no que tange às políticas Resumo [email protected] [email protected] [email protected] uma análise uma análise - tão propalado federalismo cooperativo (AR- atribuição decompetências para agerência de de centralizaçãoedescentralização, semclara nal tendênciassimultâneas econtraditórias no campodasegurançapública. descoordenação e descontinuidade de políticas sistêmicas naeducaçãoesaúdeporcerta de políticaspúblicas,marcadas pordecisões diferençashá importantes nostrês subsistemas dada pelaConstituiçãoFederal (CF)de1988, nárias, principalmentedainstitucionalidade da complexidadederelações federativas origi- saúde esegurançapúblicaindicaque,apesar A Introdução É possível identificarnotextoconstitucio - al brasileiro dasáreas deeducação, análise comparativa doquadro atu- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, finir osmandatos eatribuiçõesdasinstituições tuição Federal, 144,buscoude- emseuartigo no âmbitodofinanciamento dessaspolíticas. diversas limitaçõeseconflitos,especialmente básico foiseconsolidando,mesmoquecom como garantidordasaçõesdeatendimento de educação, nos quais o papel do município de sistemas públicos de saúde e construção possível perceber umaorquestração paraa marcada porconflitos,nofinaldos1990foi emconstrução, uma agendapolíticaaberta, os níveis degoverno [...]”(RIKER,1987)era distribuição dasfunçõesadministrativas entre 2001).SeZA, noiníciodosanos1990,a“[...] RETCHE, 2004;ALMEIDA,2005;SOU- No planodasegurança pública,aConsti- 37

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 38 rança pública, sejaporque háoreconhecimen- têm enormeexpressão no tratamentodasegu- refletir sobre ofatode que osentesmunicipais (COSTA; LIMA,2014).Éfundamental hoje para siasatribuiçõesdasdemais instituições processo deembatepolíticoafimtomarem entre osatores, queseveem emumcontínuo violência resultou emnovas situaçõesdefricção execução depolíticasprevenção ecombateà a introdução dosmunicípiosnaformulaçãoe RETTO; BUENO, 2015). Como agravante, agências (SAPORI,2002;LIMA;SINHO- por recursos escassosenãoacolaboraçãoentre deumalógicaque estimulaacompetição partir sistema dejustiçacriminal,queopera,assim,a entreções eumafrouxa articulação osatores do gerado ao mesmo tempo a sobreposição de fun- 144 têm ou dos parágrafos 7º e 8º do artigo regulamentação 23daCFde1988 doartigo tivos nocampo dasegurançapúblicaeanão distribuição defunçõesentre osentesfedera- mento ostensivo e de polícia judiciária. A vaga das políciasmilitarecivil,asfunçõesdepolicia- aos Estados.Isso porquecabe aeles,pormeio dasatribuições 1988 concentrou amaiorparte einstalações. seus bens,serviços se assimdecidirem, destinadasàproteção de cabe oestabelecimentodeguardas municipais, corpos debombeiros militares. Aos municípios ria federal,ferroviária federal,civis,militares e 144), pormeiodaspolíciasfederal,rodoviá- pessoas edopatrimônio” (BRASIL,1988,art. ção daordem pública edaincolumidadedas sabilidade detodos,éexercida- paraapreserva como “[...]dever doEstado,direito erespon- texto constitucionalprevê asegurançapública encarregadas emprover segurançaeordem. O Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Verifica-se quenadivisãodetarefas aCFde 1

ceria entre o Fórum Brasileiro deSegurança ca noBrasil, quevem sendorealizada empar- quisa sobre financiamento dasegurançapúbli- (FINBRA; SICONFI 0,03% para0,08%doPIB entre 2000e2015 aspectos: 1) em volume degastos,passando de consolidando eampliandoemtrês diferentes to dosmunicípiosnasegurançapúblicafoise dentre outros. cipais econselhoscomunitáriosdesegurança, secretarias desegurançaurbana,guardas muni- prioritárias nosúltimosanos,comacriaçãode incluir asegurançapúblicaentre suaspolíticas seja porque diversos municípiospassarama implicam açõeslocais,comfoconoterritório, to dequemuitassoluçõespolíticaspúblicas quanto porpressão social deacordosa partir decooperaçãocomEstados, de programação daUnião, econvênios porparte ticipação municipalnasegurança,tantoatravés mento, diferentes momentosdeinduçãodapar- estratégicas degovernos. Houve, poressemovi - tucionais e,sobretudo, emfunçãodeorientações Elas decomandosinfraconsti- sederamapartir municípios naatuaçãoemsegurançapública. Constituição tenhaesclarecido qualafunçãodos ao entefederativo local,ocorreram semquea mulheres (IBGE,2015). municipais, cujoefetivo éde99milhomens e mero deguardas civis, chegando a1.081forças tura administrativa, comocrescimento donú- - totais dosmunicípios;3)emtermosdeestru sando aocupar, namédia,0,61%dasdespesas Este textoéodesdobramento deumapes- Nas duasúltimasdécadasesseengajamen- Todas essas mudanças, no que se refere 2 ) em priorização, pas- 3 . Justiça emunicipais,noanode2016 comgestoresmiestruturadas doMinistério da complementar, foram realizadas entrevistas se- do Setor Público Brasileiro (Siconfi). De forma do Sistema deInformações ContábeiseFiscais e dosdadosdoFinanças doBrasil (Finbra) e Siga dasinformaçõesdoportal Brasila partir das civis e convênios dos municípios e Estados, segurança pública,finançasmunicipais,guar- do períodode1996a2015sobre gastosem tica, alémdeorganizadoumbancodados um levantamento bibliográficosobre atemá- neste artigo. Para esta pesquisa, foi realizado et al,2014;FBSP, 2012;2014),atualizadas 2012 e2014(PERES; BUENO, 2013;PERES (EACH/USP), que já gerou publicaçõesentre e Humanidades daUniversidade deSão Paulo Políticas Públicas Ciências daEscoladeArtes, Pública Interdisciplinar eoObservatório de novas criadas pela União, estruturas como a juvante naspolíticasdesegurança,ao ladodas momento omunicípiofigura comoatorcoad- de experiênciaslocaisprevenção; no segundo criação deguardas municipaiseadisseminação cípio nodebatesobre segurançapública,coma é tratadonestetextocomoaentradadomuni- nas políticas de segurança pública. O primeiro dosentesmunicipais momentos departicipação ca. Asseções3,4e5apresentam osdiferentes processo nofinanciamentodasegurançapúbli- orçamentária efinanceira,os reflexos deste passando agozardeautonomiaadministrativa, pio conquistoustatusdeunidadedafederação, de1988,quandoomunicí- tiva dopaís apartir ereestruturaçãoprocesso federa- de construção nais. Apróxima seçãotrazumbreve relato do além destaintrodução edasconsideraçõesfi- O artigo está organizado em quatro seções, estáorganizadoemquatro seções, O artigo 4 . Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, nal sobre oEstado eocrescimento dos recursos aprimoramento docontrole socialeinstitucio - cidiu comaampliaçãode direitos sociais,o derais pormeiodefundosparticipação. peloaumentodastransferênciase fortalecida fe- tendência verificada desdeoiníciodosanos1980 solidou tambémadescentralizaçãoderecursos, ao controle dasociedadecivil.Esseperíodocon- nacionais seriammaispermeáveis àsdemandase mento dademocratizaçãoporque osentessub- que adescentralizaçãopropiciaria umaprofunda- dopressupostono sentidocontrário,apartir de a nova constitucionalpretendia carta caminhar cado peloaltograudecentralizaçãopoder, e mocratização. Operíodoautoritárioforamar- influenciado pela de 1988foifortemente rede- modelo federativo estabelecidopelaConstituição des decoordenação efinanciamento. atribuições decadaentefederadoesuascapacida- do Estadobrasileiro, considerandoasrespectivas ensão dofederalismocomoformadeorganização cas desegurançanopaíspassatambémcompre- aspolíticaspúbli- torno domodeloqueestrutura Constituição Cidadã,compreender odebateem pública o papel dosmunicípios nasegurança após1988e Federalismo brasileiro rências doGoverno Federal. cas desegurança,apesardaredução dastransfe- como protagonista nofinanciamentodepolíti- (PNSP); enoterceiro, focamosomunicípio nasp) eoPlano Nacional deSegurança Pública Secretaria Nacional deSegurança Pública (Se - Este movimento dedescentralização coin- Abrucio eFrancezeo (2007)afirmamque Passados 28anosdesdeapromulgação da 39

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 40 destinados aos municípios Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Constituições deperíodosautoritários e daordem guarda grandessemelhançascomas mocrático, oeixo àmanutençãodalei reservado tenha inauguradoformalmenteoperíodode- resultado, emboraaConstituiçãoFederal 1988 organização dasinstituiçõespoliciaise,como ra institucionalqueregulamenta omodelode Não forampromovidas reformas naarquitetu- herdadas deperíodosanteriores (LIMA,2008). epráticasinstitucionais as mesmasestruturas segurança públicaejustiçacriminalmanteve de segurançaquasenadamudou: o sistema de No entanto,nocampodaspolíticaspúblicas DO; CARUSO, 2007). 2005;RICAR- gurança (KAHN;ZANETIC, cia dosatores subnacionaisnaspolíticasdese- utilizado como justificativa legalpara a ausên- eixo desegurançapúblicafoipor muito tempo constitucional domandatomunicípiono gurança pública. O resultado dessa indefinição União, Estadosemunicípios,mencionaase- entreca cujacompetênciaseriacompartilhada 12 incisos7asdiversas áreas dapolíticapúbli- instalações, conformedispuseralei”. e destinadas àproteção deseusbens,serviços “[...] poderãoconstituirguardas municipais grafo 8ºqueaCFestabeleceosmunicípios 144). Ésomentenopará- (BRASIL, 1988,art. vis, militares ecorposdebombeiros militares e PFF)aosEstadosagestãodaspolíciasci- das forças policiaisdeabrangênciaf(PF, PRF segurança pública,cabendoàUnião agestão ções dasinstituiçõesencarregadas deprover 144,dispõe sobreem seuartigo asatribui- Nem 23 daCF, oartigo querelaciona em Como dito,oatualtextoconstitucional, 5 (SOUZA, 2005). 2005). (SOUZA, 6 . são dosmunicípios. centivos financeiros demodoainduzir aade- entes federativos, masporque estabeleceuin- distribuição detarefas dogoverno federalaos de coordenação nãoaconteceuapenascom a 2005). Importante destacarqueesseprocesso ordenada efinanciada União (ABRUCIO, intergovernamental,articulação quefoi co- protagonismo da domunicípioveio apartir 2001; PERES, 2007).Já naárea dasaúde,o lorização doMagistério –Fundef (CASTRO, volvimento doEnsino Fundamental ede Va- instituição doFundo deManutenção eDesen- da ziu oprocesso demunicipalizaçãoapartir municípios (ABRUCIO; FRANZESE,2007). nais, o que funcionou como incentivo à adesãodos pelosentessubnacio- ção àprestação deserviços viabilizando recursos eestabelecendosuavincula- da distribuiçãodetarefas aosentesfederativos, mas Essa coordenação nãoaconteceuapenaspormeio do governo federalnacoordenação doprocesso. ram aquelasquecontaramcomoprotagonismo to deatribuiçõesnaredemocratização dopaísfo- - em termosdedescentralizaçãoecompartilhamen coalizões, aspolíticaspúblicasquemaisavançaram te destacar que, apesar dos diferentes contextos e te pormeiodesuaspolíciasmilitares. Importan- assumido pelosexecutivos estaduais,especialmen- sibilidade dosmunicípioseparaoprotagonismo pós-constitucional, oquecontribuiuparaainvi- sente dodebateemtornodaquestãonoperíodo Na educação, por exemplo, a União indu- Como agravante, ogoverno federalficouau- à prestação mais controlada de serviços pelas à prestação maiscontrolada de serviços vinculação dorepasse derecursos financeiros coordenação sedeubasicamente por meioda coalizões que envolvem ambas, o processo de Apesar dasgrandesdiferenças decontextoe mento dos crimes contra o patrimônio, contra mento dos crimes contra o patrimônio, contra 2005). pública ejustiça(KAHN;ZANETIC, não apenasaquelesdosistema desegurança atores nasoluçãodosproblemas criminais que me edaviolênciaincluemoutros recursos e que ampliamoolharsobre ofenômenodocri- blemas ejanelasquebradas(broken window), rias como a do policiamento orientado a pro- gurança émarcado peloaparecimento de teo- internacional, à mesma época, o campo da se- estes atores deveriam desempenhar. No plano entanto, umanoçãoprecisa sobre opapelque ciada àcriaçãodeguardas municipais,sem,no municípios nesse período está geralmente asso- residual nodebate.Nesse campo,aatuaçãodos blica, aparecendo oentesubnacionaldeforma de domunicípionocampodasegurançapú- dos anos1990émarcado pelainvisibilida- compreendido entre adécadade1980emea- sobre segurança pública entrada domunicípio nodebate M 1990, conformedescritonapróxima seção. dasegunda metadedosanos ca apenasapartir em segurançapúblicaentrou naagendapúbli - segurança pública.Aatuaçãodosmunicípios que nãoocorreu, nesseperíodo,noâmbitoda sino fundamental)esaúde(atençãobásica),o daUniãopor parte nasáreas deeducação(en- omento 1:da invisibilidade à Este momentocoincidetambém comoau- Como descritoanteriormente,operíodo que há uma indução portanto, Observa-se, FRANZESE, 2007,p. 9). nacionais depolíticaspúblicas.(ABRUCIO; xação demetas,sejapelaadoçãopadrões esferas degoverno subnacionais,sejapelafi- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, cessidade dedar respostas aumcontextode crise ro sobre opapeldogoverno nestaárea emaisàne- política públicaformuladacom umpropósito cla- ARES, 2007),mascorrespondeu menosauma peração daUnião comEstadose municípios(SO- representou oprimeiro esforço deinduçãoecoo- começou aassumirnaesferafederal.OPNSP um sinaldaprioridadequeotemasegurança Plano Nacional deSegurança Pública (PNSP),em Nacional deSegurança Pública em1997. Pública (Seplanseg), transformada emSecretaria Planejamento deAções Nacionais deSegurança tério daJustiça criouem1995aSecretaria de a essecenáriodeinsegurançanopaís,oMinis- tico noâmbitodasegurançapública.Em meio urbana levou aumreordenamento programá - na redução dosindicadores decriminalidade. nhecidos pelospesquisadores porsuaefetividade de projetos dosmunicípios,tornando-sereco- CARUSO, 2007)passaram acomporcartela jovem 2005;RICARDO; (KAHN;ZANETIC, núncia eaçõesdeprevenção comfoconopúblico comooDisquebares, De divulgaçãodeserviços - cimento debebidasalcoólicasefechamento marcou oinício da implementação dessas ações. violência. Easegundametadedosanos1990 fizessem frente aocrescimento docrimeeda ser demandadosaimplementarpolíticasque nião pública,osentessubnacionaispassarama social epolíticadopaís.Pressionados pelaopi- daagenda segurança públicapassaafazer parte nas grandescidades.Assim,adiscussãosobre a vidaeosacidentesdetrânsito,especialmente No iníciodosanos2000aSenasp criouoI No planofederal,oaumentodaviolência Programas comfoconocontrole doforne- 8 . 41

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 42 municipais noBrasil porquadriênios. 1 apresenta aevolução dacriaçãodasguardas GCM noquadriênio1999-2002.OGráfico explicaograndenúmero de o queemparte às cidadesquepossuíssemguarda municipal, a legislaçãoquecriouoFNSPpermitiarepasse SI, 2007).No quediz respeito aosmunicípios, policiamento comunitário(COSTA; GROS- ção profissional eimplantaçãodeprogramas de das políciasestaduais,treinamento ecapacita- mações eestatísticaspoliciais,reequipamento de atuação: implantação de sistemas de infor- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, gurança Pública foi criado,em2001,oFundo Nacional deSe- 10 12 14 16 18 20 Gráfico 1– 0 2 4 6 8 Como formadefinanciarasaçõesdoPNSP Até 1978 3,9 Fonte: Elaboração própria, apartirdosdadoscoletados naPesquisa Municipal deInformações (MUNIC-IBGE). Evolução dacriaçãodasguardas municipais, porperíodo de quatro anos 1979-1982 9 , comcincoáreas prioritárias 1,2 1983-1986 3,9 1987-1990 89 1991-1994 89 zação deverbas entre diversos entesdaFederação, sos, levando àadoçãodeumapolíticapulveri- impossibilitaram aadequadautilizaçãodosrecur- rativo naimplementaçãodepolíticassegurança e afaltadeclareza sobre opapeldecadaentefede- sustentação àSenasp, aausênciadevisãosistêmica criadas noiníciodosanos2000. cadas, 35%dasguardas civismunicipaisforam apesar dasériehistóricademaisquatro dé- do entre 2003-2006.Isso significadizer que, 1999-2002, seguidodoperíodocompreendi- expressivo aconteceuentre dessasestruturas 1995-1998 Mesmo com a criação de um fundo para dar Mesmo com a criação de um fundo para dar Verifica-se queoprimeiro crescimento 85 1999-2000 15,6 2003-2006 2007-2010 17,6 2011-2014 12,4 desde queasériepassousercontabilizada, o paísregistrou amaiortaxadehomicídios dos Estados(WAISELFISZ, 2004).Em 2002 contra avidapassarammigrarparaointerior talidade violentasofreu mudançaseoscrimes sobre opapeldomunicípionessapolítica. plementação eficazdoplano,mantendoconfusão dificuldades decoordenação, impossibilitouaim- nacional desegurançapública,oque,somadoàs diagnóstico efoconãoconsolidaramumapolítica inclusive municipais.No entanto,aausênciade Gráfico 2– Gov. Federal Estados Municípios Milhões Milhões Nesse mesmo período a distribuição da le- 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 10.000 20.000 Fonte: Elaboração própria, apartirdosdadoscoletados doMinistério daFazenda – STN/Finbra eSTN/Siconfi. 1.061,62 5.841,44 5.841,44 1.061,62 31.528,13 31.528,13 2000 5.84 31.5 1.06 Despesas nafunçãosegurançaDespesas pública,conforme ente da Federação. Emvalores de2015(IPCA)- 2001 6.45 36.2 1.19 2002 4.85 41.8 1.39 Gov. Federal Gov. Federal 2003 4.84 39.3 1.50 2004 5.18 37.4 1.71 2005 5.34 42.6 1.77 2006 6.72 47.0 2.10 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, 2007 8.70 49.5 2.37 dos anos2000podeserpercebida noGráfico 2. car esforços deformasistêmicaàárea dasegurança. momento em que os municípios passaram a dedi- segundo Ribeiro ePatrício (2008),representou o todo dedicado às reformas na esfera municipal. Isso, Nacional deSegurança Pública, cujocapítuloIVé políticas nocampodasegurançapública. pressionadosviram fortemente aimplementar nos anos1970,etodososentesfederativos se Estados Estados 2008 10.2 52.1 2.78 Essa alteração no papel municipal a partir Essa alteraçãonopapelmunicipalapartir Em 2003ogoverno federalcriouoProjeto 2009 11.8 57.0 3.01 13.677,26 13.677,26 2010 13.6 53.2 3.33 2011 10.1 60.4 3.86 2012 10.7 56.0 4.34 em R$Milhões Municípios Municípios 2013 10.7 58.0 4.29 2014 9.89 65.6 4.42 67.629,25 67.629,25 9.035,95 9.035,95 4.536,94 4.536,94 2015 9.03 67.6 4.53 43

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 44 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, CARUSO, 2007). polícias estaduais,dentre outras(RICARDO; municipais de segurança e parcerias com as desde quetivessem outras ações, como planos municipais tambémrecebessem recursos, que municípiosnãopossuíssemguardas rança Pública pelaLei10.746/03,permitindo gulamentação doFundo Nacional deSegu- possíveis paraessefenômenoconsistenare- claradas noGráfico 2. Uma dasexplicações ser verificado peloaumentodasdespesasde- ração comosgovernos estaduais,oquepôde máticos à prevenção da violência e à coope- municípios passamadedicaresforços siste- coadjuvante M sobre segurançapública. segundo momentodosmunicípiosnodebate de2004.Esse processo inauguroua partir o continuado desde2000emaissignificativo 1990, passaramaapresentar umcrescimento não tinhamdespesasrelevantes nadécadade destacar queosmunicípios,praticamente de contingentes.No entanto,éimportante principais forças policiaisdopaísemtermos ca, fundamentalmente,pelamanutençãodas gastos comsegurançapública, o queseexpli- fico, opapelpreponderante dosEstadosnos BRA; SICONFI,2015).Éevidente,nográ- em 2015,umtotalde1,5%doPIB (FIN- R$ 38,4bilhõesem2000para81,2 ao longodoperíodoemanálise,passandode tes aumentaramseusgastosemtermosreais, meiro pontodedestaqueéquetodososen- de2000.Opri- segurança pública,apartir pesas empenhadaspelostrês entesnafunção omento 2:omunicípio como ator Como já mencionado, a partir de2003osComo jámencionado,apartir O Gráfico 2apresenta aevolução dasdes- ao Distrito Federal, 31%foramaplicações di- dos recursos foramdirecionados aosEstadose Tesouro Nacional (STN),concluiuque32% ra doGoverno Federal (Siafi) da Secretaria do Sistema Integrado deAdministração Financei- do Pronasci, por modalidade de aplicação no transferências dogoverno federalnoâmbito lógicas. AnálisedeAlmeida(2014)sobre as denovaslimites deimplementaçãoapartir tos empreendidos peloprograma revela seus inovar noâmbito discursivo, aanálisedosgas- de injeçãorecursos naárea dasegurançae civil naárea (PEREIRA etal.,2010). pal, bemcomoderepresentações dasociedade o papeldoentemunici- ao PNSPfortalecendo ção das ações em segurança pública em relação 2012. Oprograma buscouinovar naorganiza- investimento eradeR$6bilhõesatéofinal Cidadania (Pronasci), cujaprevisão inicial de o Programa Nacional deSegurança Pública e lançamento deoutraaçãonoâmbitofederal, tendência dequedarecursos emfunçãodo pesas correntes. comdes- que osoutros anosecompartilhado do ovolume totalderecursos foimuitomaior de capital,comexceção doanode2007,quan- ainda semanteve aproeminência dadespesa co 3abaixo permitever queapósesseperíodo para as polícias, guardas e bombeiros. O Gráfi- sição deequipamentos e materialpermanente foi alocadaemdespesasdecapitalparaaaqui- entre dosrecursos 2000e2003amaiorparte distintos convênios. Segundo Grossi (2004), epulverizada em deu demaneiradesarticulada Apesar de o Pronasci representar uma gran- de2008,noentanto, houve uma A partir O usoderecursos doFNSP, noentanto,se Gráfico 4– Milhões Gráfico 3– Milhões 1.000 1.200 1.400 1.600 100 150 200 250 300 350 400 450 500 200 400 600 800 50 0 0 1996 R$ 724 2002 R$2 81% 19% Convênios doMinistério daJustiça com despesas municípios: Fundo NacionaldeSegurança Pública-Despesas (IPCA), emR$Milhões. empenhadas porano(1996-2015). Emvalores de2015 de 2015(IPCA),emR$Milhões Empenhadas noano, pornatureza -Emvalores dadespesa R$12 1997 R$ 614 2003 77% 23% R$17 1998 R$ 532 R$11 2004 1999 70% 30% R$189 2000 R$ 431 2005 30% 70% R$256 Fonte: Elaboração própria, apartirdosdadoscoletados noPortal daTransparência 2001 R$ 583 2006 R$77 2002 80% 20% Fonte: Elaboração própria, apartirdos dadoscoletados noPortal SigaBrasil R$ 1.376 R$57 2003 2007 52% 48% Capital R$80 2004 R$ 494 2008 48% 52% Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, R$66 2005 R$216 2006 R$ 319 Corrente 2009 57% 43% R$113 2007 R$ 291 2010 51% 49% R$341 2008 R$131 R$ 351 2009 2011 65% 35% R$450 2010 R$ 464 2012 72% 28% R$129 2011 R$ 429 2013 R$80 2012 52% 48% R$44 2013 R$ 400 2014 35% 65% R$126 2014 R$57 R$ 377 2015 2015 44% 56% 11 10 . . 45

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 46 po (SP),porexemplo, utilizaram o programa como Canoas(RS)eSão Bernardo doCam- induzir açõesnoâmbitomunicipal. Cidades Mulheres daPaz e Projeto, foramcapazes de sos, especialmentepormeio dosprogramas afirmar que atransferência de seus recur- institucional entre osentes,masépossível menos ambiciosaemtermosderegulação nesseprocesso.foi frustrada não prosperou e a transferência de recursos lação entre osentesparaatuação sistêmica, - complexidade deanálisediagnósticaearticu doSusp,inicial deconstrução emtodasua Talvez sejainteressante pensarqueaproposta processo de conveniamento juntoaosentes. cebe, oprimeiro conseguiuintensificar o obedece alógicasdistintase,aoqueseper- de2008. FNSP apartir formaesvaziando opapeldoSUSPe certa política desegurançadogoverno federal,ede de volume, demonstrando seu peso na então nasp, suplantou essa programação em termos o Pronasci, quetambéméexecutado pelaSe- 2004 até2007,comojámencionado. Depois FNSP, teve volume expressivo ecrescente de ção orçamentária queorganizaosrecursos do gurança Pública (Susp), queéumaprograma- gasto previdenciário. OSistema Único deSe - dos aosrecursos de administração da pastae sentado, comexceção dosprogramas destina- orçamentária aolongodetodoperíodoapre- descontinuidadenaprogramação importante não foiumanovidade nagestãodoMJ.Houve Pronasci do tram tambémqueainterrupção tade doexecutado em2010.Os dadosmos- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, O Pronasci apresentava umaproposta doPronasciA estruturação edoFUSP protagonista M SICONFI, 2015). rança públicadesdeosanos2000(FINBRA; 2.500 municípiosatuantesnafunçãosegu- da atuaçãomunicipal,vistoquehámaisde tuais enãonecessariamenterepresentativas no entanto,queessasexperiênciassãopon- VEDO etal.,2013).Énecessáriodestacar, políticas dosmunicípios(FBSP, 2016;AZE- vênio emqueestavam inseridas,tornando-se gestão equeacabaramextrapolandoocon- prevenção àviolênciaeaprimoramentoda do governo federalparadesenvolver açõesde de recursos direcionada aelespodeser compre- Estados. Se, porumlado,agrandeproporção pre teve seufocovoltado paraarelação com os que ogoverno federal,apesardodiscurso,sem - é nográfico5. O fato como podeserobservado momento estessuperamosconvênios estaduais, período devigênciadoPronasci, emnenhum de despesasconveniadas communicípiosno como podeservistonográficoaseguir. número deconvênios municipaiseestaduais, ci. Esseprograma influenciouoaumentodo facilitado pelaagilidadeconferidapeloPronas- -se peloesforço deincremento dosrepasses, rizada pelaredução dessastransferências. segurança, a década de 2010 tem sido caracte- naspolíticasdeestimulando suaparticipação rança públicadaUnião paraosmunicípios, marcada pelo aumentodosrepasses emsegu- federal omento 3:omunicípio como No entanto,apesardeummaiorvolume O períodode2008a2010caracterizou - Se aprimeiradécadadosanos2000foi dogoverno, apesar senta ovolume derecursos empenhadospelos políticas locaisdesegurança. OGráfico 6apre- esforços consideráveis no financiamentodas 2012, ascidadescontinuaram empreendendo recursos repassados de aos municípiosapartir federal edaexpressiva redução novolume de rente descoordenação do governo por parte dades deveriam desempenharnesseinterim. do ente central sobrepor parte qual papelasci- um novo modelo, assimcomoafaltadeclareza ficuldade da União emestimular aadoçãode pública brasileira,essedadorevela tambémadi- estaduais exercem naorganização dasegurança doprotagonismo queaspolícias endida apartir Gráfico 5– 1.000 1.200 1.400 1.600 1.800 2.000 De modocomplementar, apesardessaapa- 200 400 600 800 0 Estados 1996 R$ 565 R$ 315 1997 valores de2015(IPCA),emR$Milhões quantidade deconvênios firmados Em com osmunicípios. Convênios doMinistério daJustiça. empenhadase Despesas R$ 277 1998 R$ 59 1999 R$ 1.276 2000 R$ 1.807 Municípios 2001 R$ 1.039 Fonte: Elaboração própria, apartirdos dadoscoletados noPortal daTransparência. 2002 2003 R$ 1.013 R$ 561 2004 R$ 296 2005 Quantidade Total deConvênios Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, R$ 601 2006 habitantes) e médio (entre 100e500 mil) grande(maisde500milmunicípios deporte tada noGráfico 6équenãosãoapenasos nanciamento dasegurança públicaapresen- dificuldades degerar receita paraessaspolíticas. R$ 4 bilhões anuais, ainda que diante de várias ram amanteropatamardegastospróximo a dos recursos federais,osmunicípioscontinua- Mostra tambémque,mesmodiantedaredução série histórica para R$ 4,5 bilhões em 2015. saram demenosR$1bilhãonoinícioda do município. Verifica-se queasdespesaspas- populacional cluindo ainformaçãodoporte municípios brasileiros entre 1998e2015,in- Outra informaçãorelevante acerca dofi- 2007 R$ 561 R$ 1.516 2008 R$ 803 2009 R$ 931 2010 R$ 464 2011 R$ 747 2012 R$ 1.076 Total -EmR$mi 2013 R$ 822 2014 R$ 129 2015 47

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 48 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Tabela 1– TEMAS / PROGRAMAS (emR$Milhões) /PROGRAMAS TEMAS TOTAL ACESSO ÀINFORMAÇÃO ADMINISTRAÇÃO CIDADANIA EJUSTIÇA COMBATE ÀCRIMINALIDADE COMUNICAÇÃO CRIANÇAS EADOLESCENTES CRIANÇAS DIREITOS HUMANOS DROGAS ECONOMIA, CONCORRÊNCIA ECONSUMIDOR EDUCAÇÃO INTERNACIONAL JUSTIÇA OPERAÇÕES ESPECIAIS -DÍVIDA EXTERNA OPERAÇÕES ESPECIAIS -OUTROS POLÍCIA FEDERAL PORTADORES DEDEFICIÊNCIA PREVIDÊNCIA PRONASCI SISTEMA PENAL SISTEMA ÚNICO DESEGURANÇA PÚBLICA SOCIEDADES INDÍGENAS TRÂNSITO VIOLÊNCIA CONTRA AMULHER em R$Milhões Execução orçamentária doMinistério daJustiça. empenhadasconforme Despesas programa ougrupodeprogramas. Emvalores de2015(IPCA), Programas doMinistério daJustiça empenhadasnoano, -Despesas conforme programa ougrupodeprogramas (tema) -Emvalores de2015(IPCA)-EmR$Milhões 3.835 2.209 2002 8.065 739 114 333 298 146 148 75 74 15 11 24 13 1 4 6 4 9 7 - - - 2.160 2.172 1.258 2003 7.539 497 627 161 215 245 145 25 20 5 6 3 ------2.772 2.226 1.405 2004 8.038 411 208 274 543 137 23 24 8 4 3 ------2.655 2.340 1.553 2005 8.264 233 258 270 281 439 142 21 52 0 8 8 3 ------5.231 2.494 2006 9.798 153 378 520 592 118 111 23 78 72 20 4 1 ------11.483 5.857 2.680 1.389 2007 221 140 467 330 123 148 28 72 21 6 1 ------12.904 6.022 2.872 1.594 2008 329 185 290 352 595 421 138 30 59 10 4 3 ------13.164 6.304 3.021 1.843 2009 249 244 268 151 349 463 133 30 89 16 4 ------13.708 6.421 3.062 2.004 2010 382 341 256 127 318 505 131 31 34 89 6 ------12.744 6.215 3.008 1.035 2011 397 363 223 120 411 525 212 78 22 35 88 6 6 ------13.144 6.675 3.267 2.919 2012 Fonte: Elaboração própria, apartirdosdadoscoletados noPortal daTransparência. 22 87 18 46 10 83 15 ------13.260 6.937 3.096 2.909 2013 190 121 7 ------Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, 12.479 6.878 2.397 2.917 2014 213 67 7 ------11.286 6.525 1.653 2.888 2015 150 11 59 0 ------

70.464 11.840 37.718 TOTAL 6.995 1.480 1.257 2.701 6.476 2.697 4.637 3.053 5.253 671 257 127 10 78 74 15 11 55 1 9 % Total 0,01% 0,05% 7,60% 4,49% 0,00% 0,05% 0,01% 0,43% 0,16% 0,01% 0,04% 0,95% 0,81% 0,08% 1,73% 0,01% 4,15% 1,73% 2,97% 1,96% 3,37% 49

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê C entes locais saem dainvisibilidade e passama apontado umprimeiro momento,quandoos nal dosanos1990aoinício dosanos2000,é dos municípios na segurança pública. Do fi- cação detrês momentosprincipais daatuação e orientaçãodessasdespesas. a União noquedizrespeito aofinanciamento estabelecimento derelações entre oentelocale seus gastosdesdeofinaldosanos1990edo daanálisedocrescimentopública, apartir de dos municípios na segurança tar a participação onsidera Gráfico 7– A análise foi construída a partir daidentifi- apartir A análisefoiconstruída O presente teve porobjetivo artigo apresen- R$ 10 R$ 15 R$ 20 R$ 25 R$ 30 R$ 35 R$ 40 R$ 0 R$ 5 ções finais valores de2015(IPCA),emR$Milhões quantidade deconvênios firmados Em com osmunicípios. Convênios doMinistério daJustiça. empenhadase Despesas Fonte: Elaboração própria, apartirdos dadoscoletados doMinistério daFazenda –STN/Finbra eSTN/Siconfi De 50.001a100.000 Até 5.000 1998

1999

2000

2001

2002 De 100.001a500.000 De 5.001a10.000 2003

2004

2005

2006 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56,

2007 do município, háumcrescimento continuado gastos. Verifica-se que,independentedoporte tinuam aapresentar um crescimento emseus me derecursos detransferências federais,con- na qual,apesardecontarem commenorvolu- da umanova fase deatuaçãodosmunicípios, Pronasci. Por fim,nosanos2010,éidentifica- Nacional de Segurança Pública e, depois, do graças àstransferências derecursos doFundo cípios passamaterumaaçãomaiscoordenada em meados dos anos2000,quando os muni- de guardas civis.Osegundomomentoinicia-se que ocorre especialmentepor meiodacriação políticas de segurança no nível municipal, o atuar como atores relevantes no debate sobre

De 10.001a20.000 2008 Mais de500.000 Mais

2009

2010

2011

2012

2013 De 20.001a50.000

2014

2015 51

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 52 lidade edosdiferentes tiposdeviolênciaque consistente sobre ograve quadro decrimina- possível afirmarquejáexisteumaavaliação bastante prejudicadas peladescontinuidade. de tempoeavaliação desuaadequação,sendo maturação deprojetos eprogramas depende tuados comasociedade.Aimplementaçãoe dosobjetivos pac- ao longodotempo,apartir diagnóstica eatuaçãodinâmicamonitorada políticas sociais,temnecessidadedeanálise da atuaçãodosmunicípios. mento derelação deproximidade eindução segurança públicaquantoparaoestabeleci- direcionamento deumapolíticanacional mática quetrazconsequênciastantoparao Justiça, revela umadescontinuidadeprogra - da execução orçamentária do Ministério da ao longodemaisumadécada,pormeio governo federal.Aanálisedosgastosfederais vista municipaleseurelacionamento como safios dasegurançapúblicadesdeopontode informações relevantes parasepensarosde- tema assumenascidadesbrasileiras. pública, evidenciando a centralidade que o das despesas declaradas na área da segurança Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Do pontodevistadosdiagnósticos,é A segurançapública,comodiversas outras Assim, apesquisaaquiapresentada traz e necessidadesdascidadesbrasileiras. considerar asespecificidadeslocais,limitações belecer critérios e padrões de atuação, sem des- de segurançapúblicaparaqueseconsigaesta- zar ecoordenar açõesemumapolíticanacional atuação da União e sua capacidade de organi- tividade aessesgastosdosenteslocais. no federalqueconsigadarclareza, coesão e efe- atuação sistêmicacomcoordenação dogover- do cenário descrito, que não tem havido uma segurança pública,éforçoso admitir, apartir atores locaisassumiramnofinanciamentoda preciso reconhecer oprotagonismo queesses do pontodevistadaexecução orçamentária é compreendê-los eavaliá-los emsuaatuação. Se ca, apontandoparaanecessidadedemelhor municípios nocampodasegurançapúbli- redução daviolência. sistêmico nacionalcomobjetivo comumde tados às suas realidades de um arranjo e parte projetos quesejam,aomesmotempo,adap- dade, trazdificuldadesextrasdepactuação de localizaçãogeográficaetiposcriminali- vista gerencial efinanceiro quantoemtermos de nossosmunicípios,tantodoponto versos. No entanto,aenormeheterogeneida- eterritóriosdi- atingem municípiosdeportes Desse modo, faz-senecessáriorepensar a Este textobuscoureconhecer opapeldos 11. 10. 9. 8. 7. 6. 5. 4. 3. 2. 1. ao sbe ovno cltds a eã d Dwla d Dds o otl a rnprni. ipnvl m < http://www. < em: Disponível Transparência. da Portal do Dados de portaldatransparencia.gov.br/downloads/snapshot.asp?c=Convenios#get>. Acesso Download em:17deago. 2016. de seção na coletados Convênios sobre Dados disponibilizadas noPortal SigaBrasil. Disponível em:http://www12.senado.leg.br/orcamento/sigabrasil. Acesso em04ago. 2016. Justiça, da Ministério do ano, cada de (LOA) Anuais Orçamentárias Leis às referentesOrçamentárias, Execuções das coletados Dados Orçamento e Gestão, da Casa Civil, do Gabinete de Segurança Institucional e da Procuradoria-Geral da República (COSTA & GROSSI, 2007). O Fundo Nacional de Segurança Pública era formado por um comitê gestor porrepresentantes dos Ministérios da Justiça, do Planejamento, a morte docriminosoedeumarefém (SOARES, 2007) chacina daCandelária fez diversas pessoas derefém emumônibusnoRiodeJaneiro e,emumaaçãodesastrada dapolíciaacaba com da sobreviventejovem um qual no episódio 174, ônibus do sequestro o após apenas Justiça da Ministério pelo divulgado foi PNSP O 1988). apresentada noartigo144deprotetor dopatrimôniomunicipal(BRASIL, pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público”, reforçando a visão do município zelar “[...] municípios e Estados União, à cabe que afirmar ao pontual forma de I inciso no apenas aparece segurança da temática A policiais. leis 667 e 1.072 atribuem exclusivamente às PM o policiamento ostensivo fardado e proíbem os Estados de criarem outras organizações reforça alguns pontos já tratados pela CF de 1934 ao falar sobre segurança na perspectiva de segurança interna; e em 1969 os decretos das mesmas vantagens 167). A Constituição a estes atribuídas, de 1934, quando 1967 art. mobilizadas ou a serviço da União” (BRASIL, nesse texto constitucional, pelo seu artigo 167, que as polícias militares passaram a ser consideradas “[...] reservas do Exército e gozarão superiores hierárquicos; destinam-se a defender a pátria e garantir os poderes constitucionais, a ordem e a lei (POLETTI, 2012). É também seus aos obedientes essencialmente permanentes, nacionais instituições Armadas: Forças das clássica definição a surgeexemplo, que estrutura das polícias militares e das Forças Armadas, eixo que se tornará permanente nas futuras Constituições. É no texto de 1934, por a define que 1934, de Constituição pela fortementeinfluenciado é país no segurançapública de sistema do organização de modelo O 2007). FRANCEZE, Entre 1980 e 1995 a participação dos entes subnacionais na receita nacional passou de 8,7% para 16% (VARSANO, 1998 apud ABRUCIO; informaçõesAs sobre portais, bancos dedadoseentrevistas estãodiscriminadasnasreferências doartigo. preocupacao-dos-brasileiros-segundo-pesquisa.html>. dos preocupação maior segunda a era pública brasileiros, segurança perdendo apenas para saúde. Disponível em: . Acesso em03deago. 2016. http://www.tesouro. < em: Disponível (Siconfi). BrasileiroPúblicoSetor do Fiscais Contábeise Informações de Sistema e (Finbra) Brasil Dados coletados a partir dos sistemas disponíveis no site da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) do Ministério da Fazenda: Finanças do parte daspolíciasmilitares. acabapor suavez, com omonopóliodaPM nopoliciamento ostensivo e,porisso, tem sidoobjeto dediversos questionamentos por (ADI) 5156 proposta pela Federação Nacional de Entidades Militares (Feneme) contra a lei 13.003 que cria o Estatuto das Guardas. Este, A proposta tem gerado umforte embate entre aspolíciascivilemilitar. Outro exemplo recente éaAçãoDireta deInconstitucionalidade as todas para organizações policiais,oquepermitiriaaspolíciasmilitares passassemcompleto afazer investigações eaelaboração dotermo circunstanciado. ciclo o propõem que (PDT-MG), Gonzaga Subtenente deputado do autoria de 431/14, (PEC) Constitucional Como exemplos recentes daeterna competição entre asorganizações dosistema dejustiça criminaltemos oProjeto deEmenda Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, 53

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 54 BUI, . L. F. ABRUCIO, bibliográficas Referências Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, cionais, v. 18, n. 74, p. 11-32, Brasília, 2001. Educa - Pesquisas e Estudos de Nacional Instituto - Aberto CASTRO,A. J. Presidencial. Brasília: 2011. 2011. BRASIL. Presidencial. Volume I.Brasília: 2007. 2007. BRASIL. 1988. BRASIL. a Segurança Pública.v. 3, p. 205-282). Pensando (Coleção 2013. Pública, Segurança de Nacional Secretaria Justiça, da Ministério Brasília: diagnósticos. e (Org.). L. S. C. LIMA, C.; NEME, JaboatãoGuararapes/PE.e dos RS FIGUEIREDO,In: S.I. de; municipal: uma análise comparada das cidades de Canoas/ âmbito no segurança de políticas As al. et G. AZEVEDO, R. Perspectiva, SãoPaulo, v. 18, n.2, p. 17-26, 2004. autonomia. e coordenação de problemas Brasil: no Sociais Políticas e Federalismo M. ARRETCHE, Sociologia ePolítica, n.24, p. 2005. 29-40, federação? a Recentralizando M. ALMEIDA, Política). Ciência Universidade deBrasília, Brasília, 2014. em (Mestrado Dissertação il. 2014. f., (PRONASCI). 161 Cidadania com Pública Segurança de Nacional Programa do caso de estudo um pública: de. Bonecini Fabrício ALMEIDA, públicos. SãoPaulo: Edições FUNDAP, 2007.p. 13-31. (Orgs.). Lígia BEIRA, Infante; Fátima de Maria ARAÚJO, In: Brasil. no políticas públicas: o e impacto das Federalismo relações Cibele. intergovernamentais FRANZESE, Luiz; Fernando ABRUCIO, Revista deSociologiaePolítica, n. 24, p. 41-67, 2005. Lula. governo do desafios os e FHC período do experiência óio d eooi puit pr gestores para paulista economia de Tópicos Baíi: eao Federal, Senado Brasília: Federal. Constituição Em Brasil. no educação da Financiamento

. Mensagem Mensagem 2008-2011. Plurianual Plano . Mensagem 2012-2015Mensagem Plurianual . Plano A coordenação federativa no Brasil: a a Brasil: no federativa coordenação A : análise públicas: Políticas Orçamento e segurança e Orçamento São Paulo em Paulo São eit de Revista IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. e Geografia de Brasileiro Instituto - IBGE de Orçamento Público. Brasília, 2004. blicas da Universidade de Brasília e à Associação Brasileira grafia apresentada ao Núcleo de Pesquisa em Políticas Pú- Mono Pública. Segurança de Nacional Fundo do Caso de B. GROSSI, Paulo, 2014. Finanças do Brasil do Finanças MINISTÉRIO DA FAZENDA. Secretaria do Tesouro Nacional. Tesouro do Secretaria FAZENDA. DA MINISTÉRIO 30, n.1, p. 123-144, 2015. Brasil. no pública segurança da e vida da gestão A BUENO,SINHORETTO,S. S.;J.; R. LIMA, 2008. Cidadã. R. S. LIMA, Segurança pública e os 20 anos da Constituição pública. Estudos Criminológicos 4, p. 1-68, 2005. KAHN, T. O papel dos ZANETIC, municípios A. na segurança de Janeiro. 2015 Rio (Munic). Municipais Básicas Informações de quisa ______. Paulo, 2012 ______. lência 2016.SãoPaulo. 2016 FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. ca, ano1.v. 1, SãoPaulo, 2007. pública. gurança se de nacional fundo do análise uma pública: segurança e intergovernamentais Relações C. B. GROSSI, A.; COSTA, 2014. Contexto, Paulo: São G. Brasil. R. no AZEVEDO, justiça LIMA, e L.; pública. cia J. Segurança RATTON, S. S.; R. R. LIMA T.; A. COSTA, 03 ago. 2016. souro.fazenda.gov.br/pt_PT/contas-anuais>.em: Acesso

- Dados contábeis dos municípios – municípios dos contábeis Dados - ., Brasília, v. Brasília, estado., Soc. euaç pública. segurança rm, polí- Crime, Atlas da vio Pes São ------

(Org.). Mingardi. Guaracy In: Brasil. no Pública Segurança da to al. et J. C. A. PEREIRA, PERES, U. D,U. PERES, gócios, v. 9, p. 15-30, 2007. SetorPúblico.no ça PERES,U. D. Custos Transaçãode Estruturae Governande - 2010. Brasília: INESC, nia: RICARDO, e C. CARUSO, H. Segurança Pública: um - desa n. 2.,2008. caso. de estudo um de partir a reflexão uma pública: rança segu- de municipais políticas das avaliação e mento monitora- o para Indicadores PATRÍCIO, L. L.; RIBEIRO, blica, v. 8, p. 132-153, 2014. brasileiro.derativo fe contexto no públicas políticas suas de financiamento o sobre reflexões Pública: Segurança al. et D, U. PERES, p. 125-144. Abramo,PerseuFundação Paulo: São v.2013,1ed. ma. 1, uma análise orçamentária do PRONASCI (atualização). , v.2, Pública, Segurança de Brasileira Revista : os desafios de uma refor uma de desafios os segurança : de Política

BUENO,S. Revista Brasileira de Segurança Pú- Segurança de BrasileiraRevista RevistaBrasileiraNe de Gestão de Segurança pública com cidada- com pública Segurança Pacto Federativo e Financiamen- e FederativoPacto - - - Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, Brasília. 2004. WAISELFISZ, J. J. vironment andUrbanization, 13, 1, pp. 159-184. 2001 Possibilities. and SOUZA, C. Participatory Budgeting in Brazilian Cities: Limits çados, 21(61),2007 perspectivas. e histórico,dilemas Pública: Segurança de Nacional Política A E. Luiz SOARES, gia ePolítica, Curitiba, n.24, 2005. ções federativas no Brasil pós-1988.Brasil no federativas ções institui- e constitucional desenho Federalismo, C. SOUZA, – Companhia Riograndense deArtes Gráficas, 2002. cia: desafio da democracia brasileira. Porto Alegre: Corag (Orgs.). MARIANO,FREITAS, Isabel Benedito;In: do. sileira: os percalços de um sistema frouxamente articula- F. SAPORI, L. A inserção da polícia na justiça criminal bra- 1987. Norwell: Kluwer Academic, W.H. RIKER, de Segurança Pública,v. 1, n.1, 2007. brasileiros. pios municí- os para fio The development of American federalism. American of development The Mapa Mapa da violência IV: os jovens do Brasil. ulig eortc ntttos En- Institutions. Democratic Building Revista Estudos Avan- Estudos Revista Revista de Sociolo de Revista Revista BrasileiraRevista Polí- - 55

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes Dossiê locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli 56 situación federativa corriente. ente con elgobiernofederal ylosdesafíosplanteados enla la seguridadpública, buscando destacarde larelación deese financiación la en local participación la de crecimiento la presión social.Elobjetivo deeste artículo esanalizar ese como prioridadensusprogramas de gobierno, atendiendo a país, ademásdealcaides cada vez másponiendolaseguridad el todo en civiles guardias de estructuras 1000 que más hay años y gastan el 0,08% del PBI (Finbra, 2015) en ese área. Ya triplicado susgastos enseguridadpública enlosúltimos20 hoy sonmunicipiosdediferentes tamaños quehancasi la prevención yenelcontrol delaviolencia.Quetenemos del interior, expuso lanecesidad deinvolucrar lasalcaidías en centros urbanos,yluegohasta enciudadesmáspequeñas el crecimiento delaviolenciaycriminalidadenlos papel delaspolicíasestatales yfederales. Apesardeeso, institucional delaseguridadpública siguióenfocado enel la educación, saludyatención social,porejemplo, elarreglo cada vez más relevantes, agentes de la municipalización de y 2000,mientras queenotras áreas esosentes sevolvieron políticaslas pública.seguridad de largolo A 1990 años los de de protagonista papel a los municipios brasileños en lo que se refierea un atribuyó no 1988 de Federal Constitución La de laseguridadpúblicadesde ladécadade1990 financiación la para locales entes los de relevancia la de Los Municipios y la Seguridad Pública en Brasil: un análisis Resumen Ursula DiasPeres, Samira BuenoeGabrielMarques Tonelli década de1990 o financiamento dasegurança públicadesde a uma análisedarelevância dosentes locaispara Os Municípios eaSegurança PúblicanoBrasil: Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, clave: Palabras Gobiernos locales. Municipiosbrasileños. Seguridad pública. Finanzas municipales. Local governments. Brazilian cities. current Federal scenario. entity withtheGovernment posedinthe andthechallenges this of relationship the safety, describing public financing in this articlewas to analysisthisgrowth inlocal participation programs inresponse to socialpressure. Theobjective of mayors thatare makingsafety apriorityintheirgovernance besides nationwide, structures guard civil 1000 over are There area. this on 2015) (Finbra, GNP of 0.08% spending tripled theirexpenditure onpublicsafety inthelast20years, in violence prevention andcontrol. Citiesof varying size have reveals theneedfor involvement authorities of thecityhall and also subsequently in hinterland cities, and smaller Meanwhile, theriseinviolence and crime inurbancenters, continued to focus ontherole of State andFederal police. for example, theinstitutionalstructure of publicsafety the municipalization of education, healthandsocialwelfare these entities become increasingly relevant asagents of areas other in while 2000, and 1990s the During policies. role a of protagonist to Brazilian citiesinterms of publicsafety attribute not does Constitution Federal 1988 The the 1990s relevance of local entities for financing publicsafety since the of analysis an : in Safety Public and Cities The Keywords: Abstract ulc aey Mncpl finances. Municipal safety. Public Data derecebimento: Data de aprovação: 09/09/2016 15/08/2016 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública Ago/Set 2016 10, n.2, 36-56, 57

Os Municípios e a Segurança Pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 58 Washington pelaUniversidade eMBA Torcuato diTella emBuenosAires, Argentina. sidade NacionalAutônoma Metropolitana doMéxico. Mestre emEconomia doDesenvolvimento pelaUniversidade deGeorge sável pelossetores deSegurança CidadãeModernização doEstado doBIDpara oBrasil. Graduado emEconomia pela Univer Especialista PrincipalemModernização doEstado noBanco Interamericano deDesenvolvimento -BID. Coordenador respon- Dino Caprirolo Especialista sênioremprevenção daviolêncianoBanco Mundial.Doutora emPolíticas SociaispelaBrandeis University. Joan Serra Hoffman pela Universidade Alemanha. deHamburg, Coordenador dasOperações Setoriais naárea deDesenvolvimento Sustentável doBanco Mundial noBrasil. Doutor emBiologia Gregor Wolf Segurança daArgentina. nos pelaGeorgetown University. Assessora especialnaSecretaria deCoordenação, Planejamento eFormação doMinistério da Consultora especialista emdesenvolvimento socialesegurança cidadãdoBanco Mundial.Mestre- emestudoslatino-america Flávia Carbonari na AméricaLatina para aprevenção daviolência Uma perspectiva multilateral Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 Prevenção daviolência.Organismos internacionais. Violênciajuvenil. Segurança cidadã.Municípiosesegurança cidadã. Palavras-Chave promoção decidadesepaíses maisseguros. na prevenção da violência, ressaltando a importância do apoio dos organismos internacionais a governos locais para a municípios dos vocação a destaca fim, Por utilizados.cooperação de diferentesmecanismos os sobrediscorre e região na cidadã segurança da promoção na multilaterais das dever e potencial o sobre jovens.Reflete focadaem sobretudo das duasinstituiçõesnaagendadesegurança, enfatizando aimportância dosinvestimentos emprevenção daviolência, mente, noBrasil.naexperiência Baseado doBanco MundialedoBID, discute aabordagem teórica eomarco operacional Este artigo apresenta uma perspectiva de agências multilaterais sobre segurança cidadã na América Latina e, especifica- Resumo [email protected] [email protected] [email protected] [email protected] 1 - brasileiros residem onde 80%doslatino-americanos e85%dos ria dessescrimesocorre emzonas urbanas, 11% dototalglobaldehomicídios natos porano,oBrasil responde sozinhopor pulação mundial.Comquase60.000assassi- apesar daregião concentrarapenas8%dapo- cídios do mundo acontece na América Latina, segurar emultiplicaressasconquistas. tem como um dos principais desafios para as- entanto, acriminalidadeeviolênciapersis- tunidades parasieasgeraçõesfuturas.No melhoraram eapopulaçãoganhoumaisopor- cional, índiceseducacionaisedesaúdepública poucasvezesdez igualadanocontextointerna - Pobreza edesigualdadedecresceram com rapi- CONTEX O não é de surpreender que 41 das 50 cidades mas também a mais violenta. Nesse contexto, rada nãoapenasamaisurbanizada doplaneta, Atualmente, cerca deumterço doshomi- TO ciais eeconômicosnaúltimadécada. Brasil avanços obteve so- importantes 3 . Aregião éhojeconside - 2 . Amaio- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 mento depolíticas deprevenção nonível lo- a administraçãodasegurança eodesenvolvi- Esses dados são fundamentais para nas ruas. centrar-se embairros específicoseaté mesmo maneira distinta. A violência letal tende a con- desigual, afetandoterritóriosepopulaçõesde que aviolêncialetalsedistribuidemaneira (IPEA; FBSP, 2016). novos desafios para agestãopúblicalocal tente eaceleradanosúltimosanos,trazendo menores vem avançando demaneiraconsis- cídios brasileiros, acriminalidadeemcidades concentrem cerca de28%todososhomi- apenas dacidadegrande.Embora ascapitais formando edeixandodeserumproblema (2016). Destas, 21sãobrasileiras(42%). da ONGMexicana Seguridad, Justicia yPaz latino-americanos, segundooúltimoranking mais violentasestejammapeadasempaíses Dentro dessascidades,sabemostambém A violência urbana também vem se trans- 59

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 60 outro, queéocomponente racial:2decada3 2015). A esse problema agregamos ainda um nãoestudanemtrabalha(IBGE, te grupo) milhões dessesjovens (quase14%dototaldes - sigualdade racial.No Brasil, sabemosque 6,8 educação, trabalho,família,saúde,renda, de- volve asdiversas dimensõesdavidadojovem: a vulnerabilidadejuvenil àviolência,queen- nômeno complexo emulticausal,assimcomo desde osanos1980(FBSP, 2015). entrecausa demorte brasileiros de 15e24anos para aviolência.Homicídio tem sidoaprincipal quele ano,opaísperdeu maisde30miljovens apenas 25%dapopulaçãonacional.Apenas na- cídios, em 2013, apesar deste segmento compor representaram maisdametadedetodososhomi- dia mundial(UNODC,2014).No Brasil, jovens essa populaçãoéquatro vezes maiorqueamé- do Sul, porexemplo, ataxadehomicídiospara lino, entre 15e24anos.Nas AméricasCentrale dores são,emsuamaioria,jovens dosexo mascu- Em todos os países da região, vítimas e perpetra- demaneira desproporcional. minados subgrupos altos índices deviolência também afetam deter- de jovens quenãoestudamnemtrabalham. desemprego juvenil edeumapresença elevada de-série ereprovação, alémdealtosníveis de de abandonoescolar, repetência, distorção ida- bilidade econômicaesocial,comaltosníveis públicos e maiores níveis de vulnera- serviços criminalidade já sofrem com menor acesso a casos, asáreas ondehámaiorconcentraçãoda (CERQUEIRA etal.,2016).Na maioriados dios dopaísocorreram emapenas470bairros cal. Em 2014,porexemplo, 25%doshomicí- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 A criminalidadeeaviolênciasãoumfe- territórios,os Além daconcentraçãoemcertos se sentiainseguro emseupaís dia umemcadatrês adultoslatino-americanos tra 36.9%em2012)(LAPOP, 2015).Em mé- deseupaís(con- o problema maisimportante consideravam crime,violênciaouinsegurança nião LAPOP, em2014,49.6%dosbrasileiros os cidadãos.De acordo com apesquisadeopi- público eafetaaqualidadedevidatodos de uso do espaço que altera comportamentos também crescente sensaçãodeinsegurança, vítima dehomicídio(BRASIL,2015). vezes apossibilidadedeumjovem brancoser do noBrasil temaumentado esuperaem2,5 negros. Oriscodejovem negro ser assassina- são afrodescendentes, 76%dosquaisjovens vítimas de homicídios registrados no país hoje dios por 100.000 habitantes da América Latina, dios por100.000 habitantesdaAméricaLatina, Honduras, opaíscomamaiortaxadehomicí- de Desenvolvimento (BID),mostrou queem 2013. Outro estudo,do Banco Interamericano leram a cerca de 2,53% do PIB brasileiro, em no, medidaporanosdevidaperdidos, equiva- e dototaldoscustosdaperda decapitalhuma - acordo comasomadototaldascausasexternas Já oscustossociaisdaviolênciasobre oPIB, de a 1,3%doPIB nacional(LIMAetal.,2016). com segurançapúblicaem2014,equivalentes dicam queopaísgastoucerca deR$73bilhões Brasil, encomendadopeloBanco Mundial, in- gastos comsegurançaecustosdaviolênciano Resultados preliminares deumestudosobre os traves ao desenvolvimento e bem-estar social. sentando um dos mais persistentes e caros en- famílias easociedadecomoumtodo,repre- custos sociaisenormes,afetandoindivíduos, Todos essesdadossetraduzem emuma A dinâmica da violência descrita acima traz A dinâmicadaviolênciadescritaacimatraz

(LAPOP, 2015). de apoiovarie deumorganismo aoutro, de temáticas ou linhas embora aênfasedecertas As possibilidadesdecooperação sãodiversas e, uma AméricaLatinaeumBrasil maisseguros? dem edevem contribuir essesorganismospara lugares daregião. altos ecrescentes níveis deviolênciaem muitos íses ecidadesmaisseguras,tambémreflexo dos governos ecidadãos latino-americanosporpa- uma resposta direta àcrescente demandados Latina comoumtodo. Essedirecionamento é de segurançacidadãnoBrasil enaAmérica BID vêm se engajando cada vez mais na área PODEM CONTRIBUIR? COMO ORGANISMOS INTERNACIONAIS de cooperaçãointernacional. nhecimento darelevância dotemanaagenda veis e inclusivas, é mais um incentivo e reco- deinstituições eficazes, construção responsá- sustentável, oacessoàjustiçaparatodosea pacíficas einclusivas paraodesenvolvimento seu objetivo 16apromoção desociedades das Nações Unidas, em2015,contendo senvolvimento Sustentável pela Assembleia cionais. Aaprovação danova AgendadeDe- uma prioridadeparaosorganismosinterna- cidadã eaprevenção daviolênciadevem ser volvimento latino-americanoqueasegurança e altos custos socioeconômicos para o desen- tais custosequivalem a1.8%(GAMBI,2016). xas maisbaixasdeviolênciahomicidanaregião, 4.6% doPIB; no Chile,umdospaísescomta- o custototaldocrimeedaviolênciachegaa Mas, comoéesseengajamentoepo- Nos últimos15anos,oBanco Mundial eo É nessecontextodetantasvidasperdidas Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 e populações mais vulneráveis, combinando cia, emsuamaioriafocalizadas emterritórios naredução docrimeeda violên- intervenções evidência empíricasobre a efetividadedecertas nidade enasociedade. impacto nosindivíduos,nafamília,comu- responder aocrimeeàviolência e atenuar o a capacidadedosgovernos paraentendere sob maiorriscodevitimizaçãoedesenvolver civil) paraaumentararesiliência dosgrupos ções e setores (público, privado, da sociedade que envolve otrabalhocomdiferentes institui- está baseadaemumaabordagem abrangente agenda decooperaçãoambasorganizações urbana eàprevenção daviolênciajuvenil. A que dizem respeito àpromoção dasegurança sil segueessatendência,sobretudo empautas área desegurançanaAméricaLatinaenoBra- os ecomunidaderesilientes àviolência. tores deproteção quepodemtornarindivídu- to dosfatores dosfa- deriscoefortalecimento maisfocada noenfrentamenestaria, portanto, - segurança relacionada àpobreza. Essaagenda paz, violênciaarmada,prevenção deconflitose prevenção da daviolênciajuvenil, construção centrar-se emtemascomosegurançaurbana, reformas dosetordesegurançatendeacon- posta pororganismosinternacionaisnaárea de dos pelaevidênciaempírica. comuns eenfatizamtemáticassimilares, guia- cipais focosdeaçãobaseiam-seemprincípios com aquelasacordadas comospaíses,prin- acordo comsuasprioridadesinstitucionaise Esse trabalho parte deteoriasmudançae Esse trabalhoparte O trabalhodoBanco Mundial edoBIDna Segundo Tomesani (2015),aagendapro- 61

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 62 Tomesani (2016) ganizações deaplicaçãodalei,comoaponta com questõesrelacionadas diretamente aor- resistênciade certa destasagênciasparalidar pública, algunsdelesapontamparaaexistência po específico da reforma do setor da segurança sempenho dasagênciasinternacionaisnocam- minem de maneira mais ampla o papel e o de- de seusperpetradores. como fomentar mudanças culturais por parte apoio àsvítimasdeviolênciagênero, bem medidasdeiniciativas quebuscamfortalecer dessesprogramas, centrados emimportante risco devitimização,tambémsãoumfoco Mulheres, vulnerável outro esobmaior grupo emocional, cívico,intelectualeprofissional. ções quebuscamseudesenvolvimento físico, dos programas promovidos,- cominterven volvimento socialeeconômicolocal. medidas deurbanizaçãocomoutrasdesen- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 sistema dejustiça criminal.Os esforços privile- dosentes estaduais queoperam no articulação os sistemasdeinformação e acoordenação e lificado eainvestigação docrime,fortalecendo buscam melhoraraprevenção, ocontrole qua- bém incorporanoâmbitolocaliniciativas que violência, aagendadeapoiointernacionaltam- policiais. serviços dodiálogoetransparênciafortalecimento dos to deabordagens comunitáriaseprocessos de por meiodoapoioareformas,- fortalecimen podem terincidênciasobre assuntospoliciais, destacar queorganismosmultilateraistambém Embora existam poucos estudos que exa- Jovens sãoapopulação-alvo demuitos Dada anatureza multicausaldocrimeeda 4 . No entanto,éimportante coordenação entre distintos órgãos policias, intercâmbio deinformação,coleta dados, a melhoradagestão da segurançaatravés do os maiores índicesdeviolência;(ii)fomentar principalmente nasregiões queapresentam e lazer de cultura, para esporte jovens,serviços de ativa dasociedadecivilorganizadaeoferta de policiamentocomunitáriocomparticipação lidade e violência juvenil, incluindo atividades abordagem integraldascondiçõesdecrimina - Latina temcomoprioridades:(i)apoiaruma co Mundial na área de segurança na América dos nãogovernamentais. de diferentes instânciasesetores, bemcomo integração de diversos atores governamentais pública incluemofomentoàcoordenação e dagestãosegurança vas defortalecimento multissetorial coordenada. Por isso,asiniciati- o crimeeaviolência,querequer umaresposta mento deumfenômenotãomulticausalcomo especialmente necessárionocasodoenfrenta- dos grandesdesafiosdagestão,eissosefaz recursos destinadosaosetordesegurança. apoios quevisamàmelhoradministraçãodos agenda degestãovoltada pararesultados, com Busca-se intervenções. também influir emuma força nosterritóriosondeseimplementamas como decontrole externoeinternodousoda estratégica eintegradadasforças policiais,assim os programas incorporamatividadesdegestão de segurançamelhorqualidade.Finalmente, ridades eàsdemandasdacidadaniaporserviços ximidade ecomunitária,queresponda àsprio- orientada para a solução de problemas, de pro- giam aimplementaçãoefetiva deumapolícia Em resumo, o trabalho do BID e do Ban- Sabe-se queafaltadecoordenação éum remos aseguir. específicas,como ve- política ouintervenções medidas queapoiamdiretamente umareforma apoiar o diálogo sobre políticas de segurançaa para de atividadesquevão desdeinstrumentos mos naárea desegurançaabrangeumagama programas. Acrescente desses organis- carteira governos paraaimplementação depolíticase operações técnicasoufinanciamentosdiretos a das easiniciativas parapromovê-lo, sejaviaco- são diversas aslinhasdecooperaçãoestabeleci- DETRABALHO LINHAS em projetos. dores deresultado exigidos comocontraparte bem comoviainclusão de condiçõeseindica- intercâmbios sobre experiênciasnessasáreas, te, capacitaçãodefuncionáriosepromoção de pode dar-sepormeiododiálogopermanen- focada nosdireitos humanos.Essaingerência e aênfaseemumapautadesegurançacidadã nitoramento eavaliação depolíticasdosetor; ticipação cidadãnapriorização,desenho,mo- de segurança; a necessidadedepromover apar- rência dedadoseprestação decontasnaárea Entre elas,destacamosapromoção datranspa- sensíveis politicamente paraalgunsgovernos. pautas que possam ser mais influir em certas ganismos internacionaispodem–edevem – mos emodelosdegestão. através damelhoriaeinovação dosmecanis- e (iv)incrementar daeficiênciados recursos, deinclusãosocial; criação deoportunidades jovens emsituaçõesdeviolência,pormeioda de prevenção eredução davulnerabilidadede administrativos edajustiça;(iii)apoiaraações No descritoacima, marco deintervenção Por destacar que os or- fim, éimportante Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 tanks dedicadosàpesquisa de organizaçõesnãogovernamentais ethink de acadêmicoseuniversidades depontaou nacionalcombate àviolência,comaexpertise que tiveram experiênciasbem-sucedidasno em paísesqueenfrentam desafiossimilares e esses organismosnotrabalhodesenvolvido internacional, adquiridaporcom expertise senvolvidas. Tais estudosesistemascontam mar asestratégiasdecooperaçãoaserem de- contextualizado eespecíficoquepossainfor- Busca-se, dessamaneira, gerarconhecimento sões, tendênciasecaracterísticasdaviolência. paraentenderasdimen- to deobservatórios - possíveis soluções;ecriaçãooufortalecimen custos, paraaidentificaçãoe recomendação de radores dessescontextosdeviolênciaeseus para acompreensão dascausas,dosfatores ge- fomentar pesquisas e análises que contribuam formações de qualidade que ajudem a identi- e avaliação naárea desegurança,aoprover in- promoção deumaculturamonitoramento ção é também fundamental também para a temas deinformaçãosegurança. qualificação decoletaseanálisedadossis- uma área fundamentalparaformaçãoéade contra amulheresistemasdejustiçacriminal, de segurança,comoviolênciajuvenil, violência cíficas referentes a diferentes temas da agenda assistências técnicas.Para alémdasáreas espe- instituições dos diferentes paísespor meio de tros atores relevantes, das enofortalecimento estaduais emunicipais,assimcomodeou- pacitação eformaçãodegovernos nacionais, Uma primeiralinhadeaçãoconsisteem O fortalecimento desistemasinforma- O fortalecimento Uma segunda linha de trabalho foca na ca- 5 . 63

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 64 às vítimas. prevenção daviolênciadegênero eproteção demecanismos lização efortalecimento ventude, melhoradosprocessos deressocia - policiamento comunitário, centros paraaju- com evidênciaempíricadeefetividade,como da implementaçãodeiniciativas quecontam uma redução efetiva davitimizaçãopormeio tores causaisdaviolênciaepermitamlevar a respondam aosfa- rante queasintervenções de criminalidade.Oseuenfoqueintegralga- violentos emmunicípioscomaltapresença objetivo sejaaredução dosníveis decrimes tos diretos emprogramas ouprojetos cujo Os empréstimos podemserparainvestimen- crime; eressocialização deinfratores delei. prevenção, controle e investigação policial do vidades comoprevenção socialdaviolência; investimentos específicos,queincluemati- estão os empréstimosnor importância, para disseminação dasexperiênciasnacionais. zado sobre práticaspromissoras epermitindoa mentando atroca deexperiênciaseoaprendi- nhecimento comoutros paíseseregiões, fo- consiste napromoção deintercâmbios deco- ciclos políticos. uma contribuiçãosistemáticaquevai alémdos e destinarmelhorseusrecursos, fornecendo permitam aosgestores identificaros resultados tas vezes demasiadocarasparagovernos –que incluir ofinanciamentodeavaliações –mui- Por isso,aagendadecooperaçãotambémdeve uma melhorotimizaçãodosrecursos públicos. políticas e programas. Com isso, pretende-se ficar e sistematizar os resultados de diferentes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 Em quarto lugar,Em quarto mas nemporissodeme- Um terceiro mecanismodecooperação LIMA, 2016). de violência(CARBONARI; WILLMAN; de quedasignificativa econstantedos índices nestee emoutros casostambém foicrucial políticos ou governosde partidos distintos, ça políticacontínuaesistemática,paraalém para realizar osajustesnecessários.Alideran- focalizadas emedirsuaevolução eresultados tores geradores deviolência,desenharações que permitiamidentificarcomprecisão fa- ções dequalidadegeradasporobservatórios jetos parajovens), todasguiadasporinforma- com diversas campanhaseducacionaisepro- territórios commaioríndicedehomicídios, ções noespaçourbano,sociais(focadasem - ça incluíramumacombinaçãodeinterven por exemplo, estratégiasintegraisdeseguran- casos. Nas cidadescolombianasmencionadas, algumas tendênciassimilares emvários desses textos sejamdiferentes, épossível identificar ro eRecife ganharamdestaque. como deDiadema, São Paulo, Rio de Janei - e àviolência.Anosdepois,noBrasil, casos referências mundiaisnocombate aocrime tá eMedellín, naColômbia,setornariam pressionantes. Um poucomaistarde, Bogo- de redução àviolênciacomresultados im- EUA, adotaramestratégias compreensivas Nova Iorque, Boston e Los Angeles, nos lências letal.Nos anos1990,cidadescomo nificativa epermanentedeíndicesvio- tornaram-se emblemáticasnaredução sig- no. Nas últimasdécadas,algumascidades são fenômenosintrínsecosaoespaçourba- em tantascidades,ocrimeeaviolêncianão O FOCO EMMUNIC ÍPIOS Embora as estratégiasutilizadaseoscon- Apesar dosaltosíndices deviolências mesmo tempo emquepromovem odesenvol- to deprogramas quebuscammelhorá-la, ao ponentes desegurançacidadã emumconjun- Banco Mundial eoBIDtêmfinanciadocom- e deabordagem focadaemfatores deriscos, o políticas eprogramas deprevenção. segurança cidadã,pormeiodeum enfoque em passaram aexercer suavocação napromoção da lidade eviolência,muitosgovernos municipais por respostas aoscrescentes índicesdecrimina- policiais eoaumentodademandadecidadãos de segurança como algo não restrito a assuntos Com a evolução da compreensão do conceito o gerenciamento daspolíciasmilitares ecivis. dos municípios,umavez quecabeaosEstados que apromoção dasegurançanãoeraumdever (SOARES, 2006;BEATO, SILVEIRA, 2014). co erecursos dedestinoformamaiseficaz tificar asáreas geográficasepopulaçõesemris- executar políticasdeprevenção, podemiden- suficientemente competentes paraelaborar e constituintes, governos municipais,quando tarem, deseus emmuitosaspectos,maisperto detalhada docontextodesuascidades.Por es- compreensão maisamplaeaomesmotempo des municipaisnormalmentepossuemuma em políticaspúblicas.Isso porque autorida- na ecomoumafontedeinovação importante linha de frente na prevenção da violência urba- locais sãocadavez maisreconhecidos como prevenção docrimeedaviolência.Governos nas paraidentificarboaspráticasde redução e às vezes inovadoras, decidadeslatino-america- olhando paraasestratégiasbem-sucedidas,e Nesse contextodemudançaparadigma No Brasil, pormuitotempoentendeu-se Hoje, estão maiseobservadores Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 executado pororganizaçõesda sociedade à criminalidadeouespaços similares, sendo centros decidadania,juventude, prevenção soal. Esseconjuntodeações tomalugarem ederelacionamentocas, artísticas interpes- de desenvolvimento desuascapacidadesfísi- so ao primeiro emprego formal, assimcomo lar, deformaçãoprofissionalizante edeaces- deconclusãodoensinoreguoportunidades - tivas devida,brindando-oscomacessoa estimulam osjovens amudarsuasprospec- dos infratores dalei. gação policial;ereabilitação eressocialização social docrime;prevenção, controle einvesti- ra atividadesnoseixos críticosde:prevenção criminalidade eviolênciaéintegral,incorpo- ações paraaredução docrimeedaviolência. e tendênciascriminais,assimcomodefinindo capacidades municipais de identificar padrões as apoiar atomadadedecisões,fortalecendo informação dacriminalidadeeviolênciapara ossistemasde âmbito municipal,fortalecendo um plano estratégico de segurança pública no apoia-se primeiramenteodesenvolvimento de alternativas desolução. Em todososcasos, tificar osfatores causaisdoproblema edefinir específico domunicípio,oquepermiteiden- Assim, iniciam-sesempre comumdiagnóstico mico efragilizaalegitimidade institucional. o tecidosocial,detémcrescimento econô- do reconhecimento dequeaviolênciaquebra des deprevenção socialdaviolência,partindo te nonível municipalsãofocadasemativida- municípios. Asiniciativas apoiadasdiretamen- vimento urbanoeaatividadeeconômicados Os programas forneceminstânciasque naredução de O enfoquedasintervenções 65

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 66 as; (ii)desenvolvimento econômicolocal; urbana eambientaldesuas principaisáre- gradas de:(i)requalificação e revitalização da cidade gaúcha mediante de ações inte- lhoria daqualidadedevida doshabitantes RS doBID Municipal Integrado de Novo Hamburgo/ Mundial. OPrograma de Desenvolvimento violência comapoiodoBIDeBanco tando estratégias integrais de prevenção da exemplos decidadesquevêm implemen- mentos violentos. brechas- paraatividadesilícitasecomporta facilita aidentificaçãodaslacunasqueabrem tada aduplicidadedeaçõesnosterritóriosese em funçãodasprioridadeslocais.Assiméevi- nar osrecursos humanos,físicosefinanceiros e federais,oque,porsuavez, permitecoorde- ticuladoras dosesforços municipais,estaduais Municipal, quefuncionamcomoinstânciasar- à criação–deGabinetes deGestão Integrada –ouapoio municipais estáofortalecimento para jovens infratores demenorperigo. de medidassocioeducativas emmeioaberto pios asentidadesresponsáveis pelaaplicação de terrenos. Paralelamente, sãoosmunicí- como adoaçãodeespaçosfísicosecessão as condiçõesparaimplantaressescentros, os jovens econtribuemcom aosserviços autoridades deâmbitolocal,quereferem sucesso passa daspela efetiva participação próprios Estadosfinanciamasações.Oseu transferidos aosmunicípios,emoutros, os petitivos. Em alguns casos, os recursos são civil selecionadas mediante processos com- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 Nesse contexto,vale mencionardois dasiniciativasComo colunavertebral tem apoiadoapromoção dame- foco arevisão deboaspráticasprevenção de programa deformaçãoinicial,queteve como nização previstas desse originalmente.Apartir juntamente comasobrasdesaneamento eurba- tância dainclusãodeatividades deprevenção os próprios gestores doprojeto sobre aimpor- de crimeeviolênciaqueajudouasensibilizar grama de formação de equipes locais em temas nanciado peloBanco Mundial, incluiuumpro- Qualidade de Vida em Teresina, noPiauí, fi- das ereligiosas. se, entre outrasinstituiçõespúblicas,priva- de moradores, sindicatoseentidadesdeclas- ção deliderançascomunitárias,associações - foicriado comaparticipa nitária, ofórum conflitos. comu- Para garantiraparticipação deresolução de deserviços e fortalecimento agentes demudançaemrelação àviolência formação demulheres mãesdefamíliacomo tivo ede formação emvalores parajovens, vo, técnico-profissional, recreativo, despor- social daviolênciacomapoiosocioeducati- o monitoramentodoplano;e(c)prevenção municipal desegurançaparaavalidação e gurança Pública e a instalação de um fórum cução doPlano Municipal Integrado deSe- institucional, comaexe(b) fortalecimento - docrimeedaviolência;um observatório formação e conhecimentocoma criação de corporaram atividadesde:(a)gestãodein- número dehomicídios.Essasiniciativas in- controle daviolênciaembairros commaior a implementaçãodeaçõesprevenção e segurança pública no âmbito municipal e para aadoçãodeumapolíticaintegrada componente teve comoobjetivo contribuir e (iii)prevenção daviolência.Esteúltimo Já oprojeto Melhoria daGovernança eda venções baseadasemevidênciasque com- prevenção da violência,apostandoeminter- tratégico dosgovernos locaisnaredução e é crescente oreconhecimento dopapeles- América Latina e no Brasil. Nesse processo, tindo emprojetos desegurançacidadãna Mundial eBIDvêm cadavez maisinves- CONCLUSÃO cidadãos dessascidades dos tabilidade devido à apropriação por parte contextos locaisecommaiorchancedesusten- empírica deoutros lugares, masadaptadasaos permitam respostas baseadasemevidência eodesenho dediagnósticosque participação mecanismosde ca danecessidadedefortalecer entre outrascoisas,umamadurecimento acer- região, duranteasúltimasdécadas.Retratam, tes deprevenção daviolêncianoBrasil ena implementação deprojetos comcomponen- lições aprendidas porambososorganismosna nistrar todasessasações. de umcomitêgestãointegradoparaadmi- mas culturaiseeducativos eoestabelecimento ração de renda para jovens e mulheres, progra- prevenção dege- quejácontemplaintervenções nóstico, serádesenhadoumplanomunicipalde vindas dascomunidades.Combasenessediag- urgentes, bem como as propostas de soluções cando nãoapenasoslocaiseproblemas mais daviolêncianacidade,identifi- participativo nais, oprojeto realizou umdiagnósticolocale violência juvenil edeexperiênciasinternacio- Organismos internacionaiscomoBanco Esses doisexemplos abarcam umasériede 6 . Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 longo prazo. os resultados atingidossejam sustentáveis no avaliações tambémsãofundamentais para que a sociedadecivileinvestimentos empesquisae gurança. Por fim,parcerias comaacademia e e comoGoverno Federal emprogramas dese- a contínua cooperação com governos estaduais fios sozinhos. Uma resposta integrada requer municípios nãopodemenfrentar essesdesa- tas daviolência. Vale ressaltar, noentanto,que para contereprevenir asconsequênciasnefas- para prestar apoiotécnicoagovernos locais rentes esferasdagestãopública,assimcomo maiores investimentos emprogramas dedife- não hádesenvolvimento sustentável. social. Tal visãoreconhece quesemsegurança crescimento econômico e no desenvolvimento uma vidaseguraesemmedo,apoiando-seno as condições para queoscidadãosgozem de consiste em garantir A visão compartilhada no Brasil enaAméricaLatinacomoumtodo. instituições responsáveis pela segurança cidadã vidade eeficiênciadaspolíticaspúblicas timento, para a melhoria da qualidade, efeti- ciamento deprogramas dereforma edeinves- com seusprodutos deconhecimentoefinan- apoio nessaárea. da segurançadoscidadãosedemandando progressivamente oseupapelnapromoção prios governos municipaisestãoassumindo local ecomunitário. Por outro lado,ospró- provam aefetividadeeminvestir nonível Hoje, o momento é propício portanto, para As duasorganizaçõesbuscamcontribuir, 67

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 68 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 6. 5. 4. 3. 2. 1. específico da reforma do setor da segurança pública, indicando uma tendência a soluções generalistas para os diversos países, com a promoção deuma agenda“[...]desconectadacom com osarranjos locais organizacionais, países, institucionaiseculturais” (TOMESANI, 2016,p. 5). diversos os para generalistas soluções a tendência uma indicando pública, segurança da setor do reforma da específico A autora também aponta quehápoucos estudosqueexaminam opapeledesempenhodessas agênciasinternacionais nocampo (2012); e“Delegaciasdepolíciaviolênciadoméstica: evidência doBrasil” (2012). Estado às favelas do Rio de Janeiro: uma análise da transformação do dia a dia das comunidades após o processo de pacificação das UPPs” Brasil, específicos, por o “O países exemploretorno seguro” do regiões dentre quais (2012); e “Por Brasil mais em os um violência e crime a segurança como umaquestãocrítica aodesenvolvimento global.Esse documento foi acompanhado porvários estudosespeciaissobre colocou Mundial Banco o desenvolvimento”, e segurança “Conflito, 2011, de (WDR), Mundial Desenvolvimento o sobre Relatório seu Em Entre tais autores, Tomesani (2016)destaca Hammergren (2003),Leeds (2007)eBayley (2006). DadosdaONUedoBanco Mundial.Disponíveis em:. Homicide Monitor, Disponíveis em:. baseadoemdadosdaUNODC. exclusivamente naexperiência doBanco MundialedoBanco Interamericano deDesenvolvimento noBrasil enaAmérica Latina. Este artigo expressa a opinião de seus autores e não representa uma posição oficial das instituições às quais estão vinculados. Está baseado LAPOP - Latin - LAPOP Brasília: IPEA. FBSP.IPEA; 2016. 2015. IBGE, neiro: Ja- brasileirade população Rio da . vida condiçõesde IBGE. ramericano deDesarollo, 2016. nestar de America Latina. Washington, DC: Banco Inte (Ed.). L. JAITMAN, Uruguay.In: y Paraguay Honduras, Rica, ta Cos Chile, de casos los de comparado estudio un ble: conta- método el según delito del CostosO. M. GAMBI. Brasileiro deSegurança Pública.SãoPaulo, 2015. Pública. Segurança de Brasileiro Fórum – FBSP Nota Técnica, maio2016. n.18.Brasília: IPEA, Homicídios. de Redução pela Nacional Pacto pelo de educação e homicídios nos territórios focalizados al. et D. CERQUEIRA, 2016. Mimeo. Delaware,of University Newark: region. the across ties ci - 10 in decline crime of trends policy America: Latin CARBONARI, F.; S. R. LIMA, WILLMAN, A.; v. 3, n.1, 2014. Development, and Security of Journal International Gerais. Minas in Programs Prevention Crime BEATO, C; SILVEIRA, M. A. BIBLIOGRÁFICAS REFERÊNCIAS Síntese de indicadores sociais: uma análise das Los costos del crimen y la violencia en el bie el en violencia la y crimen del costos Los American Public Opinion Project. Project. Opinion Public American . Nota Técnica 17. Técnica Nota Violência . da Atlas niaoe multidimensionais Indicadores Effectiveness and evaluation of Learning from Stability: Stability: Anuário The po The - - - - Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 Austria: UNODC, 2014. Austria: UNODC, Vienna, data. context, trends, 2013: Homicide on Study United- UNODC Nations Office Crime. and Drugs on rica>. Acesso em:26jul.2016. Foreign_Aid_and_Security_Sector_Reform_in_Latin_Ame em: Disponível Internacionais, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016. Relações de Instituto – Internacionais)Relaçõestorado em 62f.2016. America. Latin in reform sector security and aid Foreign M. A. TOMESANI, pt>. Acesso de2016. em:24dejulho arttext&pid=S0103-40142006000100008&lng=pt&tlng=

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Dossiê Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo 70 Municipios yseguridadciudadana. internacionales. Violenciajuvenil. Seguridadciudadana. Palabras clave: clave: Palabras más seguros. a gobiernoslocales para lapromoción deciudadesypaíses la importancia delapoyo delosorganismos internacionales los municipiosenlaprevención delaviolencia,resaltando cooperación empleados. Finalmente, destaca la vocación de en laregión ydiscurre sobre losdiferentes mecanismos de las multilaterales enlapromoción delaseguridadciudadana jóvenes.Hace de reflexión deber una el potencial sobre y el en prevención delaviolencia,especialmente enfocada enlos de seguridad, enfatizando la importancia de lasinversiones estructura operacional delasdosinstitucionesenlaagenda Banco MundialydelBID, discute elacercamiento teórico yla del experiencia la en Basado Brasil. en específicamente, y, multilaterales sobre laseguridad ciudadana en Latino América Este artículo presenta unaperspectiva deagencias violencia enLatino la América de prevención la para multilateral perspectiva Una Resumen Flávia Carbonari,Gregor Wolf, JoanSerra Hoffman eDinoCaprirolo violência naAméricaLatina Uma perspectiva multilateral para aprevenção da Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 Prevención delaviolencia.Organismos promoting safer citiesandcountries. the supportof international organs andlocal governments in prevention ishighlighted, emphasizingtheimportance of co-operation used. Lastly, the vocation of cities in violence in theregion andexamines thedifferent mechanismsof duties of multilateral agenciesinpromoting citizen safety a focus onyouths. Thearticleaddresses thepotential and the importance of investment inviolence prevention with institutions for the safety agenda is discussed, emphasizing the theoretical approach andoperational goalsof thesetwo ontheexperienceBased of theWorld andtheIDB, Bank Brazil. in specifically and America Latin in safety citizen in This articlepresents aperspective of multilateral agencies America A multilateral perspective for violence prevention in Latin Keywords: violence. Citizen safety. Citiesandcitizen safety. Abstract Violence prevention. International Organs.Youth Data derecebimento: Data deaprovação: 09/09/2016 15/08/2016 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 58-70, Ago/Set 2016 71

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo Dossiê Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 72 da inovação tentação datradição eodesafio Guardas entre Municipais: a lica doRioGrande doSul-PUCRS. Bacharel emDireito peloCentro Universitário doDistrito Federal -UDF. Secretário deSegurança Pública eCidadaniadeCanoas -RS. Mestrando emCiênciasCriminaisnaPontifícia Universidade Cató- Alberto Kopittke Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 Guarda Municipal.Segurança Pública. Polícia. Prevenção. Palavras-Chave mesmos modeloseconcepções. as Guardas atuamdeforma integrada com aspolíciasestaduais enãodisputando osmesmospapéisoucopiando os Segurança Pública proativa, preventiva, integrada, com planejamento delongoprazo e baseadaemevidências, naqual da cidade de Canoas (RS), com protagonismo da Guarda Municipal, uma experiência concreta dessa nova concepção de Por fim, o artigo apresenta algumas das políticas preventivas que tem sido implementadas pela Secretaria de Segurança mais abrangente deaçõesmultidisciplinares deprevenção equejáseencontra recepcionada naLegislação nacional. resume prevenção apoliciamento ostensivo, oque seencontra superado emnível mundialporumaconcepção muito principal contra oEstatuto dasGuardas Municipais,oqual utiliza doutrinaconsolidada durante aDitadura Militar, que argumento como 5651) (ADIN Inconstitucionalidade de Direta Ação na apresentado prevenção de conceito o discute um debate muito maisamploerelevante sobre aconcepção deSegurança Pública existente nopaís.Opresente artigo rar com este debate fazendo uma retrospectiva histórica sobre o tema e busca demonstrar como a Lei 13022/2014 abriu O Brasil vive pelaterceira nosúltimos200anos,odebate sobre vez, opapeldasGuardas Civis.Este artigobusca colabo Resumo [email protected] - Dossiê Alberto Kopittke

Introdução

m falso dilema tem sido colocado so- te para uma concepção muito mais abrangente Ubre o papel das guardas municipais no de segurança pública, na qual profissionais de Brasil, como se só dois caminhos pudessem ser diversas áreas, policiais inclusive, convergem seguidos: a guarda como uma nova polícia os- para ações proativas, voltadas a atuar sobre os tensiva de combate ao crime (leia-se, uma nova fatores de risco individuais, ambientais e co- polícia militar vestindo uniforme azul marinho) letivos que fomentam a violência. Isso tem se ou a guarda exclusivamente como cuidadora de mostrado muito mais eficiente na redução da próprios municipais. Porém, o debate sobre o violência e até financeiramente mais viável que papel das guardas municipais é muito mais am- o antigo modelo. No debate atual sobre o pa- plo e diz respeito à forma como o Brasil lidará pel das guardas municipais, portanto, está se com a violência daqui em diante. decidindo em qual paradigma o Brasil seguirá.

Essa simplificação no debate se deve à visão Neste texto, o debate sobre o papel das e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas majoritária existente no país que resume segu- guardas municipais será abordado sob três rança pública ao trabalho da polícia e ainda se perspectivas: histórica, jurídica e de políticas limita a ver a atividade policial como ações re- públicas, buscando ampliar a abrangência e ativas pós-crime, sejam elas de atendimento de demonstrar sua importância para o futuro da emergências, combate armado ou investigação, democracia no Brasil. todas voltadas a realizar a prisão de criminosos. Uma longa história Nos últimos 40 anos, em diversos países, Vivemos hoje, no Brasil, o terceiro ciclo esse paradigma se transformou profundamen- histórico do debate sobre a possibilidade de

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 73 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 74 ram pelaRestauração (RIBEIRO, 2001) neutralizar unidadesdoExército queselevanta- anos, aGuarda Nacional chegouaconfrontar e LHNIKOFF, 2005,89 liberais queagitavam aEuropa eosEUA (DO- tuição congênere francesa, nascida dos ideais uma alternativa paramilitarinspiradanainsti- em 18deagosto1831,aGuarda Nacional, sem reanexar o Brasil, o Governo Liberal criou, Exército, em sua maioria leais a Lisboa, tentas- dias atuais.Comreceio dequeosoficiaisdo dilemas enfrentados pelasegurançapúblicanos titucional brasileira,eajudaacompreender os ainda no período do Império, na formação ins- te organizadaatuandonasegurançapública. existência deumaforça civilinstitucionalmen- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 das retomaram efetivamente opoderetrans- a Proclamação daRepública, asForças Arma- no Exército. Após o Golpe Militar que trouxe pendo totalmentecomomodelo referenciado va suatrajetóriatambémnesseperíodo, rom- civil, comoaPolícia deLondres. Estacomeça- não terevoluído efetivamente paraumaforça ter seguido o modelomilitar de organização e vocrata edocoronelismo, alémde,naprática, nal atuouparaamanutençãodaordem escra - anual superiora200milréis, aGuarda Nacio- mada apenasporhomensbrancoscomrenda oficiais. Vinculada àsoligarquias locaisefor- Justiça, denomeaçãodos que emitiaascartas cias, que faziam o alistamento, e o Ministro da buições cotidianas, os Presidentes das Provín- juízes depaz , queacoordenavam- nassuasatri por cional erageridadeformacompartilhada centralização edescentralização,aGuarda Na- O primeiro momento dessa disputa se deu O primeiro momentodessadisputasedeu Organizada nummodeloquemesclava - 93). Em seus primeiros . militar, tema policial consolidado durante a ditadura ministro doExército defazer alterações nosis- ção deumadoutrinacivilsegurançapública. ciamento ostensivo,- interrompendo aconstru militares assumiram,deformaexclusiva, opoli- guardas foramnovamente extintaseaspolícias CHA, 2015). para as ações de manutenção da ordem (RO- civis, ficandoaspolíciasmilitares reservadas a sermajoritariamenteexecutado pelasguardas tos estados,opoliciamentoostensivo chegou no períododemocráticoapós1946.Em mui- culo XX, e assumiram caráter mais profissional taleceram aolongodaprimeirametadedosé- rência aPolícia deLondres. Asguardas sefor- mandadas por oficiaisdaspolíciasmilitares, ou nho eatribuições.Muitas passaram aserco- cipais novamente voltaram acrescer emtama- pios, conformefuturaregulamentação legal. e instalações dos municí- teger bens, serviços municipais, comafinalidadeespecíficade pro- forma modesta,dorenascimento dasguardas conseguiram deixarfoiapenasainserção, de guardas civis, de forças policiais,passaramentãoacriaras em 1922,encerrandoesseprimeiro ciclo. cendo, atérealizarem asuacompletaextinção subordinada a ele, paulatinamente a enfraque- organização desegundalinhadoExército e formaram aGuarda CivilNacional emuma Já naConstituintede1988,proibidos pelo Porém, comogolpemilitarde1964, Ao longodetrês décadas,asguardas muni- Os municípioseestados,desguarnecidos 3 aúnicabrecha queosconstituintes 1 muitasjáutilizandocomorefe- 2 as as mimetizaram o modelo militar de organização. tuição Federal ao atribuir poder de polícia para Diversas organizações já possuem inclusive as guardas. A decisão sobre essa ADI definirá unidades especializadas de “caveiras”. Outras, esse terceiro ciclo das guardas civis no país. no entanto, vêm tentando criar e desenvolver novas atribuições utilizando um referencial di- Sobre a constitucionalidade Dossiê ferente, baseado numa concepção preventiva A constitucionalidade da Lei 13.022/2014 de segurança pública. precisa ser debatida de forma sistêmica à luz do arcabouço teórico, prático e jurídico que tem Foi nesse sentido que o Ministério da se consolidado no país nos últimos 20 anos. Justiça formulou e apresentou o texto que se Para isso, é fundamental definir de forma ade- transformou na Lei 13.022/2014, também quada qual conceito efetivamente está sendo

chamado de Estatuto das Guardas Municipais, objeto de análise. O principal ponto é que tem Alberto Kopittke buscando garantir que as guardas não confun- se afirmado que a Lei 13.022/2014 criou algo dam suas atribuições e sua identidade institu- que de fato ela não criou, pelo contrário, ela cional com as polícias militares, mas ao mes- veio exatamente para evitar que se criasse. mo tempo não se restrinjam ao cuidado dos prédios públicos. A lei, na prática, descreve e A petição da Feneme faz essa confusão, que organiza quais são os “serviços” de segurança se deve à “contaminação” do termo “preven- pública que um município pode desenvolver tivo” pelo modelo tradicional de segurança dentro do atual desenho constitucional. pública no Brasil, que se consolidou especial- mente ao longo dos regimes de exceção até a A proposta, no entanto, não tem sido de- Constituição de 1988: batida sob essa perspectiva, nem mesmo por O art. 2º caput da Lei 13.022/2014 inovou muitos dos seus defensores. Tendo o Brasil co- em relação ao texto da Constituição Federal, nhecido até hoje apenas o modelo profissional pois alterou a natureza das guardas municipais, tradicional de policiamento reativo, de aten- atribuindo a função do proteção municipal dimento de emergências e de combate (PON- preventiva, numa total invasão da competên- CIONI, 2005), o debate público enveredou cia constitucional das polícias militares, pois a para a discussão sobre o “poder de polícia” das elas cabe a proteção preventiva, por meio da guardas municipais, o que na prática equivale atribuição de polícia ostensiva, também cha- e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas a dizer que a Lei 13.022/2014 teria autorizado mada doutrinariamente de polícia preventiva. as guardas a desempenhar todas as atribuições Portanto, deve a expressão ser declarada in- das polícias militares. constitucional, por afronta ao art. 144, §§ 5º e 8º, da Constituição Federal (Grifo nosso).4 Com essa premissa, a Federação Nacional de Entidades de Oficiais Estaduais (Feneme) Existe uma profunda e fundamental dife- ingressou com uma Ação Direta de Inconstitu- rença entre polícia ostensiva, efetivamente de- cionalidade (ADI 5156), argumentando que o signada pela Constituição Federal às polícias Estatuto das Guardas Municipais fere a Consti- militares, e serviços municipais de segurança

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 75 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 76 polícias militares, 3º: emseuartigo que assimserefere àatividadepreventiva das referência noDecreto-Lei nº667,de1969, de policiamentoostensivo brasileiro temsua de formaexclusiva) paraasguardas municipais. preventiva, queaLei13.022/2014definiu(não Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 27), nominandoissopoliciamentopreventivo: 2º,n. (art. tensivo, por meioderadiopatrulha tares àconcepçãoreativa depoliciamentoos- e o decreto vinculou o papel das polícias mili- questionamento sobre suaconstitucionalidade nado pelosistemalegal.Até hojenãohouve foi totalmenterecepciocracia, semruptura, - razão decomosedeuatransiçãoparademo- como Regulamento dasPolícias Militares, em trativas municipais. oqueincluiasposturasadminis- seus serviços, seus próprios (o queincluiparques epraças) a não serpara o atendimento da proteção de de emergênciasparachamados sobre crimes, de ação(caveiras), decentraisatendimento especiais unidades dechoque,grupamentos municipais nãopodemdispor, porexemplo, de A caracterização legal sobre oatualmodelo O Decreto nº88.777,de 1983, conhecido Nessa perspectiva, ficaclaro queasguardas que violemaordem pública.(BRASIL,1983). prevenir, dissuadir, coibiroureprimir eventos ções predominantemente ostensivas, visandoa da segurançapública,manifestadoporatua- cício dinâmicodopoderdepolícia,nocampo 19) Manutenção daOrdem Pública: Éo exer- dem (BRASIL,1969). se presuma ser da possívelor- a perturbação dissuasão, emlocaisouáreas específicas,onde b) atuardemaneirapreventiva , comoforça de mas nãoseresumindo aisso: das paraproblemas depoliciamentoostensivo, lência. Podem ser utilizadas técnicas orienta- buscam atuarnosfatores deriscoparaavio- que envolvem diversas agências públicas e que segurança públicasedápormeiodeprojetos concepção doutrináriadeque“prevenção” na qualquer governo poderiafinanciar. número de policiaismuitomaisaltodoque se imaginava atéentão,ouentãorequer um relação custo-efetividademuitopiordoque ativo deatendimento deemergência,mostra no modelorefazendo policiamentonasruas, - evidenciou-se queaquantidadedepoliciais sas feitasnosEUA, WILLIS, 2014). Após uma série de pesqui- pública (REINER,2004;SHERMAN,2003; mática no que se compreende por segurança consolidada, provocando uma virada paradig- últimas décadas,nospaísesdedemocracia à violência” semodificoucompletamentenas Desde então, temseconsolidadoumanova Ocorre queaconcepçãosobre “prevenção entre outras).(SCHNEIDER, 2010,p. 3). prevenção comunitária, policiacomunitária, acional, desenvolvimento social-ambiental, diversos tiposdeabordagens (prevenção situ- assistência social[...],queseconcretizam em arquitetura eurbanismo,educação,economia, logia, sociologia,criminologia,saúdepública, nar, queincorporamconhecimentos dapsico- cias emultissetoriais,decaráterinterdiscipli- deparcerias multiagên- pública aimportância rencial domodelotradicionaldesegurança venção àviolência” [...], quetêmcomodife- programas quetêmsidonominadosde“pre - cimento extraordinário deteorias,atividadese Desde ofinaldosanos1960,houve umcres- 5 noiníciodosanos1970, Em sua definição de 1972, o National Cri- ração, logo são esquecidas em prol do paradig- me Prevention Institute, do governo do Ca- ma tradicional que se resume ao policiamento nadá, definiu prevenção como: “antecipação, reativo (KOPITTKE, 2015). São exemplos identificação, avaliação dos fatores de risco que os Planos Nacionais de Segurança Pública: o produzem a violência e as iniciativas voltadas primeiro deles foi apresentado no último ano Dossiê para afastar ou remover esses fatores de risco” do governo FHC,6 em 2001; o segundo7 foi (SCHNEIDER, 2010, p. 1). apresentado durante a gestão de Luiz Eduardo Soares, no primeiro governo Lula, e serviu de Em 1996, o Congresso Nacional dos EUA diretriz apenas no primeiro ano de governo, determinou que o Departamento de Justiça re- em 2003; e o Pronasci, que pode ser conside- alizasse uma pesquisa sobre o que efetivamente rado o terceiro Plano Nacional de Segurança

se sabia no país sobre prevenção à violência. O Pública, e que durou mais tempo, quatro anos Alberto Kopittke levantamento envolveu mais de dez centros de (2007-2011). O Pronasci foi definido pela Lei pesquisa e realizou uma revisão sistemática de 11.530/2007 da seguinte maneira: mais de 500 estudos científicos de alta qualida- Art. 2º O Pronasci destina-se a articular ações de sobre redução da violência. Desde então, essa de segurança pública para a prevenção, con- pesquisa serve para orientar os financiamentos trole e repressão da criminalidade, estabele- federais na área de segurança pública. O coorde- cendo políticas sociais e ações de proteção às nador da investigação, Lawrence Sherman, de- vítimas. (BRASIL, 2007, grifo nosso). finiu “prevenção do crime” de forma simples e abrangente: “qualquer prática que mostre resul- Para o desenvolvimento da segurança públi- tados cientificamente comprovados para redu- ca preventiva, a lei fez referência a um conjunto zir os crimes” (USA, 1998), modificando para de 17 tipos de ações, como criação e fortaleci- sempre a concepção de que prevenção se resume mento de redes sociais e comunitárias; criação a policiamento ostensivo reativo. de programas de prevenção à violência voltados prioritariamente para jovens e adolescentes, A pesquisa identificou pelo menos 15 prá- egressos do sistema prisional, famílias expostas à ticas que comprovadamente reduzem a violên- violência urbana; e medidas de urbanização que cia, e apenas 3 delas compreendem atividades garantam a recuperação dos espaços públicos. vinculadas ao policiamento ostensivo (saturação Tais ações deveriam ser desenvolvidas de forma e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas em hot spots, monitoramento e encarceramento integrada pelos órgãos e entidades federais en- de criminosos de alta periculosidade). As demais volvidos e pelos estados, pelo Distrito Federal e práticas devem ser desenvolvidas por profissio- pelos municípios (art. 5º). nais das mais diversas áreas, e o mais adequado parece ser a combinação de diversas dessas estra- A Lei 13.022/2014 é o legado dessas inicia- tégias exitosas ao mesmo tempo. tivas que nasceram de centenas de experiências comunitárias, ONGs, centros de pesquisas de Há tentativas de se estabelecer essa concep- universidades, prefeituras e estados, desde os ção no Brasil, mas as propostas têm curta du- anos 1990, e que alcançaram o seu ápice no

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 77 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 78 duzir aviolência. das evidênciassobre oque funcionaparare- dentro domandatoconstitucional, a partir visava enquadrarasatribuiçõesdas guardas como tendêncianatural.Ao mesmotempo a mimetizaçãoinstitucionalquedespontava simbólica eculturalque as PMsexercem e tamente para tentar reverter essa referência Segurança. Oestatutodasguardas veio exa- municipais ou das Secretarias Municipais de oficiais dasPMsparaadireção dasguardas até a promulgação da Lei 13.022, de nomear lha quemuitosprefeitos vinhamfazendo, militar edeemergênciasemrazãodaesco- das paraomodelodepoliciamentoostensivo ativas erealmente preventivas nosterritórios. deestratégiaspro - polícias, paraaconstrução comoeloentre aspolíticassociaise servir petência exclusiva dasPMs,epor isso podem a atender chamados de emergências, de com- polícias militares paracadaterritório. da econjuntaàsestratégiasdesenhadaspelas estratégias pelosmunicípios,deformaintegra- ser transformadasemnovas práticas,projetos e pecíficas que a delimitam e que agora devem reconhecida, através das18competênciases- municipal preventiva” deve serinterpretada e tucionalmente essanova visãonopaís. cionais tentaramfomentareconsolidarinsti- 2001 a2011,períodoemquetrês planosna- prevenção” governo federaldurantea“década deouro da Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 Na prática,asguardas têmsidoempurra- As guardas municipaisnãoestãoobrigadas É dessaformaqueaexpressão “proteção (KOPITTKE, 2016,p. 141),de Guarda Nacional) nãoémanteraordem para ção constitucional(diferentemente daantiga da ordem, simplesmente porque suaatribui- comoumsistemade defesa 88.777 estruturou cie de“terceira linha”, daquiloqueoDecreto guardas tambémnãoconformamuma espé- gada dapolíciamilitaroucivil.As realizá-las tãosomenteparaaguardar ache- essência dasuaatividadeeasguardas devem vados. Todavia, essastarefas nãoconstituema cumprir taistarefas, assimcomovigilantespri- buições elas nãopossam excepcionalmente não querdizer quenarealização dassuasatri- nem a enfrentar atividades criminosas, o que emergência, realizar deruas, opatrulhamento não estãoautorizadasaatenderchamadosde a utilizararmasdefogo. contratadas pelo poder público são autorizadas mesmo asempresas devigilânciamuitasvezes prédios edopatrimôniodasprefeituras. Até atuais atémesmoparaaproteção física dos (Lei 10.826/2003),oqueénecessárionosdias foi definido pelo Estatuto do Desarmamento toridade policial.Já odireito armas deportar soa deve ser apresentada imediatamenteàau- Federal, édetodocidadãobrasileiro eapes- cometendo crime,segundoaConstituição pode resultar numapolícia. petência paraprender eparautilizararmas,só que umaorganizaçãouniformizada,com- confusão, queleva aumafalsaconclusão:de liza essaexpressão. Oqueexisteémaisuma de polícia”, simplesmenteporque aleinãouti- da leinãosedáemtornoexpressão “poder As guardas nãosãopolícia,umavez que O direito deprender alguémqueesteja A interpretação sobre aconstitucionalidade os casos de graves distúrbios civis. A defesa da mente reconhecidas como as escolhas mais caras ordem, concorde-se com isso ou não, está res- e ineficazes, quando aplicadas de forma isolada.8 trita, no atual modelo constitucional brasilei- ro, às forças militares, sejam as PMs sejam as Dessa forma, contraditoriamente, aqueles Forças Armadas diretamente. que atacam a consolidação jurídica das guar- Dossiê das como forças de prevenção na verdade estão Portanto, aqueles que de forma mais ou fomentando a transformação das guardas em menos explícita defendem que as guardas mu- forças cada vez mais parecidas com as PMs. nicipais se tornem mais uma “força de comba- te ao crime”, com a utilização de armamento Novos horizontes pesado, uniformes camuflados e outros sím- A carência de conhecimento, expe-

bolos e práticas militares, devem reconhecer riências e metodologias sistematizadas numa Alberto Kopittke o argumento dos que defendem a inconstitu- perspectiva preventiva para o trabalho cotidiano cionalidade da Lei 13.022, uma vez que essa dos agentes de segurança pública deixa o espaço atribuição efetivamente já foi “ocupada” no aberto para a reprodução da subcultura policial sistema constitucional brasileiro atual. no Brasil (PONCIONI, 2005) e para a cópia da imagem institucional e organizativa das PMs. Como se viu, o debate sobre a ADI 5651 remonta a um debate de quase 200 anos e vai Desde os anos 1990 diversas cidades dizer muito sobre qual será o futuro da segu- brasileiras têm empreendido esforços no senti- rança pública, as políticas públicas de preven- do de reduzir a violência, que incluem controle ção à violência que as cidades brasileiras irão da venda de bebida alcoólica, obrigatoriedade implementar (se é que implementarão alguma). do fechamento dos bares em determinado ho- É compreensível que aos olhos da tradição bra- rário, criação de Disque-Denúncias, campa- sileira não haja mais nada que uma força de se- nhas de desarmamento e estímulo à entrega gurança pública possa fazer, além de patrulhar voluntária de armas de fogo. Há ainda projetos ruas, atender emergências e prender bandidos. de grande complexidade, como planos muni- Contudo, aqui reside o grande equívoco. cipais de metas em diversas áreas, o Programa Fica Vivo, em Minas Gerais, ou as UPPs, no Assim, a decisão sobre a ADI pode- Rio de Janeiro, e muitos deles demonstraram e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas rá encerrar o terceiro ciclo de disputa sobre a eficácia na redução da violência.9 possibilidade de existência de organizações não militares atuando no campo da segurança pú- Com o objetivo de colaborar de for- blica e, ao mesmo tempo, encerrar o ciclo de ma prática e demonstrar um vasto conjunto experiências de prevenção no Brasil, afirmando- de ações que as guardas municipais podem de- -se a exclusividade do modelo militar, baseado senvolver no campo de segurança preventiva, no policiamento ostensivo de emergências e de conforme conceito elaborado anteriormente, combate e no processo de encarceramento em apresenta-se a seguir a experiência que tem sido massa. Estas últimas estratégias são mundial- implementada na segunda etapa10 da política de

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 79 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 80 reduzir em38%oshomicídiosnacidade. prefeitura easpolícias,essainiciativa conseguiu Nos últimos 7 anos de esforços integrados entre segurança públicadacidadedeCanoas(RS). Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 e parques municipais.Em conjunto comaSe- das ilegaispelalegislaçãonacional empraças nores; iv)consumodesubstâncias considera- e distribuiçãodebebidasalcoólicas parame- edepósitoirregulardescarte delixo; iii)venda da alivre manifestaçãopolítica ereligiosa; ii) estiverem excetua produzindo aperturbação, - autuação eapreensão dosequipamentosque sive produzida porveículos automotores, com desossego,inclu- temas como:i)perturbação põe queelatenha a capacidadede fiscalizar nhamento paraosistemadejustiçacriminal. muito maisefetiva epráticadoqueoencami - passem asregras pactuadas, em geraldeforma aplicação demultasporatividadesqueultra- podem assumirumnovo papel,pormeioda niosa ecidadã.Nesse novo modelo,asguardas limites parapossibilitaraconvivência harmo- reconheçam asliberdades, masseestabeleçam realmente umapactuaçãodascidades,ondese guardas, osreferidos códigospodemconstituir mados recentemente. Comessaatuaçãodas Códigos deConvivência, comotêmsidocha- (na antigalinguagemdoRegime Militar), ou força evitalidade paraosCódigosdePostura tegrada àsdemaisfiscalizações,podedarnova dasguardastrativa porparte municipais,in- 13.022/2014, aatividadedepolíciaadminis- Seguindo oprevisto 5,XII,daLei noart. no Brasil, emdetrimento dasançãopenal. A nova legislação municipal daguarda pro- A sançãoadministrativa émenosprezada a) Polícia administrativa 11 e arquitetos da que Comissão fazemde parte pal, comaorientaçãotécnica deengenheiros coordenado diretamente pelaguarda munici- gurança públicaestásendo implementado, tos –naprevenção daviolência. dosempreendimeninternos econtrapartidas - e de outros aspectos – arquitetônicos, planos desse chamando aatençãoparaimportância pode contribuirparaoplanejamentourbano, gurança pública(Eisp). Dessa forma,aguarda cipal possarealizar estudodeimpactose- 5,XV,em seuart. prevê queaguarda muni- impacto desegurança pública) talizadores deviolência, urbano edodesigndascidadescomofatores ca- de osanos1930sobre opapeldocrescimento compromissos assumidos. sinar um Termo deAjusteConduta,comos Gabinete de Gestão Integrada, onde devem as- da podemserinterditados atéapresença no multados. Os estabelecimentoscomerciais ain- PC tambémsãoimediatamenteinterditados e ocorram apreensões dedrogas pelaPMou PM edosBombeiros. Estabelecimentos onde sanitária, econômica,doconsumidor, alémda Os plantõescongregam fiscalizaçãoambiental, das22h. dos todasassextasesábados,apartir Plantões Integrados de Fiscalização são realiza- deProteçãoServiço aoCrédito. inscrição nadívidaativa, eposteriormenteno sistema paraqueessasautuaçõesresultem em cretaria daFazenda estásendo constituído um Em Canoas,oestudodeimpacto se- Utilizando oconhecimentoproduzido des- b) Planejamento urbano(estudode Para a efetivação dessas atribuições, os 12 aLei13.022/2014, Controle Urbanístico (CCU). O Eisp baseia- ordenado e executado na maioria de suas ações -se em três eixos: 1) análise urbanística, com a pela guarda municipal, articulado com as de- elaboração do plano setorial específico dentro mais políticas sociais do município. Segundo do plano diretor e das diretrizes gerais no pla- a concepção preventiva recomendada pela Or- no de obras da cidade; 2) análise arquitetônica ganização Mundial da Saúde, o sistema está Dossiê dos novos empreendimentos e dos impactos desenhado em três níveis de prevenção. no seu entorno, com a definição de medidas compensatórias; 3) análise de planos privados No nível primário, aplica-se a experiência de segurança privada. da cidade de Caxias do Sul (RS), com a criação das Comissões Internas de Prevenção à Vio- As medidas compensatórias têm sido defi- lência (Cipaves). Por meio das Cipaves, cada

nidas como investimentos no entorno do local escola deve constituir um plano anual de pre- Alberto Kopittke do novo empreendimento ou estão sendo re- venção à violência, a partir de um cardápio de vertidas para o Fundo Municipal de Segurança boas práticas construído ao longo dos últimos Pública, com alocação posteriormente definida anos, com iniciativas simples e acessíveis que pelo Gabinete de Gestão Integrada, com as po- outras escolas da cidade já desenvolveram e lícias militar e civil. que foram exitosas em reduzir a violência. Para a produção e o monitoramento de dados, foi c) Construção de um sistema munici- criado o Registro de Ocorrências de Violência pal de prevenção à violência Escolar (Rove), em que cada escola deve regis- Caso se seguisse a concepção reativa de se- trar a situação de violência, suas motivações e gurança pública, que confunde a presença de o público envolvido (sem identificar nomes). agentes de segurança (na função de patrulha Todas essas informações servem de subsídio ostensiva) com prevenção, como explanado para a elaboração dos planos e são avaliadas anteriormente, o trabalho de prevenção à vio- a cada mês no Gabinete de Gestão Integrada lência das guardas municipais estaria restrito Escolar (GGI-Escola). Nos dias de reunião das às rondas escolares, com a mera presença física Cipaves, a equipe da guarda, que conta com dos agentes na porta das escolas. Mas a par- cinco pessoas, ainda desenvolve atividades tir da nova concepção de prevenção proativa e como o recreio animado, teatro de fantoches e multidisciplinar, e da previsão legal do art. 5º, palestras na escola.13 e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas XI e XVIII, do Estatuto das Guardas, a experi- ência de Canoas (RS) buscou avançar. Assim, Na prevenção secundária são desenvolvidos desde 2009 desenvolve o Programa Permanen- dois projetos. O Cada Jovem Conta! (CJC!) te de Prevenção à Violência Escolar, que agora atende os casos de comportamento precoce de se tornou o Sistema Municipal de Prevenção à risco, que são identificados pela rede de servi- Violência (CANOAS, 2010). ços. Seguindo a territorialização das Unidades Básicas de Saúde (UBS), cada território rece- O sistema tem enfoque especializado em beu um comitê, que se reúne a cada 15 dias crianças, adolescentes e jovens adultos, e é co- para avaliar o desenvolvimento de cada um

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 81 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 82 e estado,com atividadesdesaúde,educação, entrecomitê gestorcompartilhado município é aprimeiraunidadeprisional apossuirum se dá dentro da penitenciária da cidade, que gestão dos projetos. O primeiro tipo de ação da guardaca, com participação municipal na pela Secretaria Municipal deSegurança Públi- volve dois tipos de ações, também coordenadas culturaecidadania. oficinas coletivas dearte, zam atendimentosindividualizadossemanaise ciologia, além de educadores sociais, que reali- socialeso- profissionais depsicologia,serviço homicídio, entre outros. Cadacasacontacom liar nosistemaprisional,vítimadetentativa de de vulnerabilidade,comoevasão escolar, fami- que seenquadrem emalgumdos15critérios primento demedidassocioeducativas ejovens especializadas para os adolescentes em cum - cionaram deformamaisamplaeagoraforam período doPronasci (2009-2012),elasfun- Secretaria Municipal deSegurança Pública. No criou asCasasdaJuventude, coordenadas pela plano dasescolasdeprevenção àviolência. lescentes, alémdefortalecerem aexecução do em abordagem psicossocial de crianças e ado- alizado dosjovens, comodevidotreinamento fazem agestãoeoacompanhamentoindividu- Em cadaterritório,três guardas municipais culo dosequipamentosdeassistênciasocial. pes deSaúde daFamília devín- edosserviços atendidos recebem odobro devisitasdas equi- eculturais.Asfamíliasdosjovensesportivas especiais aosjovens doCJC!,comooficinas comatendimentos disponibilizaram serviços dos jovens. Todas assecretarias domunicípio Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 Na prevenção terciária, aprefeitura desen- Ainda naprevenção secundária,aprefeitura rança pública, decaráterproativo epreventivo, mudar a concepção sobre as políticas de segu- titucional, a leiem análise pode nãoconseguir C pesquisadores. de esforços deguardas municipais,gestores e das políticaspúblicas,quedependedasoma da constitucional,eadimensãodaspráticas pode analisarasdiversas propostas deemen- mãos doSTFeCongresso Nacional, que de duasdimensões:ajurídica,queestánas Sistema Nacional deSegurança Pública depen- concretização daLei13.022edo(inexistente) prédios municipaisversus policia ostensiva. A não se limitam à dicotomia de proteção de noas projeta umnovo universo deaçõesque e mediarconflitos. lecimento da sua coesão, a prevenir violências os moradores adesenvolver- atividadesdeforta guardas municipais ajudarão o condomínio e Minha CasaMinha Vida. Nesse projeto, os está sendoelaboradoparaoscondomíniosdo mas dedesenvolvimento socialecomunitário, individualizado, comoasaçõesmencionadas, reinserção social. cada território,comoobjetivo deacelerarsua apenados eosegressos dosistemaprisionalde multidisciplinar e que atende as famílias dos da Cidadania,aqualtambémpossuiequipe um outro equipamento especializado, a Casa a reincidência. Outra ação se dá por meio de comunitária,comoobjetivo dereduzirhorta oficinasdetrabalhoe cultura, esporte, renda e onclusões Mesmo que venha a serconsideradacons- Como sevê, aexperiênciarecente deCa- Um outro projeto, esse não mais de perfil e as guardas podem se tornar polícias muni- ir muito além, para construir políticas capazes cipais reativas, de emergências e de combate. de evitar que tantos jovens acabem trilhando o Isso significaria ao país continuar com o mes- caminho da violência. mo modelo que tivemos até hoje. Guardas municipais, prefeitos, ministros Dossiê É nessa perspectiva que o debate sobre a Lei do Supremo Tribunal Federal, os policiais mi- 13.022 vai para além de um debate corporativis- litares e civis e o conjunto da sociedade devem ta ou de uma disputa federativa. Ele é, sim, um encarar os desafios necessários para construir debate paradigmático, sobre o tipo de políticas um nova visão de segurança pública no Brasil, públicas de segurança que o país adotará. mais abrangente, integrada, multidisciplinar e orientada por evidências, superando a eterna

Engana-se e ilude-se quem, de forma ideo- busca de soluções mágicas e imediatas. Como Alberto Kopittke lógica, tanto pela esquerda, quanto pela direita, se buscou demonstrar, entre os vigilantes pre- pensa que esse debate busca o “fim da polícia diais e os policiais existe um imenso universo, militar”. As PMs fazem parte da história do país que pode (e deve) ser ocupado pelas guardas e dos estados brasileiros. O que se trata é de criar municipais, não só respeitando a Constituição, uma nova concepção de segurança pública, que como fortalecendo os seus princípios. Supe- fomente um novo sistema de segurança pública, rando as tentações da tradição e tendo a ousa- no qual as PMs continuarão tendo o papel fun- dia da inovação, talvez seja possível abandonar damental de proteger a sociedade contra o cri- o “mais do mesmo” e dar passos mais sólidos me violento. Contudo, é preciso urgentemente para superar a violência no país.

1. Conforme Battibugli (2006, p. 115; 304), a guarda civil de São Paulo, por exemplo, foi criada pelo governo estadual paulista em 1926, nos moldes da Polícia Metropolitana de Londres, fazendo policiamento ostensivo em regiões urbanas. Era uma polícia civil fardada e de carreira independente da polícia civil, e atendia às cidades de grande e médio porte como São Paulo, Santos, Campinas, Sorocaba, Ribeirão Preto, Bauru, Marília e Presidente Prudente. Em 1964, a guarda civil chegou a ter metade do orçamento da força pública, de caráter militar, e também metade do efetivo (15 mil, na guarda, e 31 mil, na força pública).

2. Decreto-Lei nº 667, de 2 de julho de 1969, e Decreto-Lei nº 1.072, de 30 de dezembro de 1969.

3. Gonçalves (2009, p. 21) narra episódio em que o presidente da Constituinte, deputado Ulysses Guimarães, teria afirmado a interlocutores que a Constituinte não poderia modificar a estrutura da segurança pública, pois essa era uma exigência do então ministro do Exército do

governo Sarney, general Leônidas Pires. e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas

4. Petição Inicial ADI 5156, p. 29. Disponível em: .

5. Em 1970, a Fundação Ford criou aquele que viria a ser o centro de pesquisa mais importante dos EUA sobre polícia, a Police Foundation, a qual recebeu U$ 30 milhões e desenvolveu cinco grandes experimentos de campo. O mais famoso desses experimentos, feito entre 1972 e 1973, foi o Kansas City Preventive Patrol Experiment, que não encontrou diferenças nos níveis de criminalidade conforme o volume de patrulha empregada nas 15 diferentes regiões em que a cidade foi subdividida (TONRY; MORRIS, 2003.)

6. O Plano era subdividido em 15 compromissos, tinha 124 metas estabelecidas para os anos de 2000 a 2002, e estava fundado nos seguintes princípios: interdisciplinaridade, pluralismo organizacional e gerencial, legalidade, descentralização, imparcialidade, transparência das ações, participação comunitária (BRASIL, 2000).

7. O segundo plano tinha como metas iniciais: a construção de um consenso com os governadores, a desconstitucionalização do modelo de polícia, a criação de matrizes nacionais de formação, análise de dados e padronização de procedimentos e a normatização do Sistema Único de Segurança Pública. (GONÇALVES, 2009, p. 101).

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 83 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 84 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 13. 12. 11. 10. 9. 8. Rltro a oíia uiia d Peeço Voêca soa ete s ns e 09 21 pd sr notao m . anos os entre Escolar Violência à Prevenção de Municipal Política da Relatório O Sobre otema, ver oclássico deJacobs (2000). primeiro semestre de2016com oprimeiro semestre de2009,quandoaexperiência começou aserimplementada. Tanto osdadosdabrigadamilitar quanto osdoobservatório municipalapontaram uma redução de38%doshomicídios,comparando-se o sobre aprimeira etapa daexperiência deCanoas, ver Kopittke (2016),Spaniol(2012)ePazinato, Kerber eDalSanto (2013). de umesforço integrado queenvolveu políciacivil,militar, ministério público etodos osórgãos daprefeitura. Para maisinformações o Sistema deVideomonitoramento. Aaçãomaismarcante daqueleperíodofoi aimplementação doTerritório daPaz Guajuviras, através Pronasci. Naquele momento foi criadooGabinete deGestãoIntegrada, oObservatório MunicipaldeSegurança Pública, aRonda Escolar e o conjuntocom em 2009, de partir a implementada foiCanoas de cidade da segurançapública de municipal política da etapa primeira A Sobre oPrograma Fica Vivo, ver Silveira (2010). (2005). Zanetic e Kahn de detalhado bastante estudo o Paulo,ver São de municípios dos atuação da resultados os e experiência a Sobre Para umarevisão sistemática sobre “oquefunciona”eo“nãopara aredução daviolência,ver Lum,Koper eTelep (2011). Referências bibliográficas

BATTIBUGLI, T. Democracia e segurança pública em São lei-ordinaria-n-5505-2010-cria-as-comissoes-internas-de- Paulo (1946-1964). Tese (Doutorado em Ciência Políti- -prevencao-a-violencia-escolar-cipaves-o-forum-munici- Dossiê ca)–Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da pal-de-prevencao-a-violencia-escolar-e-o-comite-munici- USP, São Paulo, 2006. pal-de-prevencao-a-violencia-escolar>.

BRASIL. Projeto de Emenda Constitucional nº 138, de DOLHNIKOFF, Miriam. O pacto imperial: origens do federa- 21 de setembro de 2015. Altera os arts. 21, 23, 24 e lismo no Brasil do século XIX. Rio de Janeiro: Globo, 2005. 109 da Constituição Federal para acrescentar a segurança pública às competências comuns da União, dos Estados, do DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Penal: parte geral: Distrito Federal e dos Municípios. Disponível em: . Acesso em: 3 ago. 2016. Editora, 2007.

BRASIL. Ministério da Justiça. Secretaria Nacional de Segu- GONÇALVES, Ligia Maria Daher. Política de Segurança Pú- rança Pública. Plano Nacional de Segurança Pública. Bra- blica no Brasil: deslocamentos em um modelo resis- sília, DF: Secretaria Nacional de Segurança Pública, 2000. tente. Dissertação (Mestrado em Administração)–Escola de Disponível em: . Acesso em: 20 ago. 2015. JACOBS, Jane. Morte e vida nas grandes cidades. São Pau- BRASIL. Decreto-lei nº 667, de 2 de julho de 1969. Reorgani- lo: Martins Fontes, 2000. za as polícias militares e os corpos de bombeiros do estados, do território e do Distrito Federal e dá outras providências. KAHN,Túlio; ZANETIC, André. O papel dos municípios na se- Brasília, DF, 1969. Disponível em: . Disponível em: . BRASIL. Decreto nº 88.777, de 30 de setembro de 1983. Acesso em: 29 jul. 2016. Aprova o regulamento para as polícias militares e corpos de bombeiros militares (R-200). Brasília, DF, 1983. Dispo- KOPITTKE, Alberto L. Segurança Pública e democracia no nível em: . trado em Ciências Criminais)–Faculdade de Direito da PUC. Porto Alegre, 2015. 172 f. BRASIL. Lei nº 11.530, de 24 de outubro de 2007. Institui

o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidada- KOPITTKE, Alberto L. O (novo) papel dos municípios na se- e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas nia – Pronasci e dá outras providências. Brasília, DF, 2007. gurança pública. In: MENDES, Gilmar F.; CARNEIRO, Rafael Disponível em: . e Desafios. São Paulo: Saraiva, 2016.

CANOAS. Lei Municipal nº 5.505, de 20 de maio de 2010. LUM, Cynthia; KOPER, Christopher S.; TELEP, Cody W. The Cria as Comissões Internas de Prevenção à Violência Escolar Evidence-Based Policing Matrix. Journal of Experimental (Cipaves), o Fórum Municipal de Prevenção à Violência Es- Criminology, v. 7, p. 3, 2011. Disponível em: .

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 85 Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Dossiê Alberto Kopittke 86 do Estado do Rio de Janeiro. ção profissional do futuro policial nas academias de polícia PONCIONI, Paula. O modelo policial profissional e a forma- Alegre, v. 13, n.1, p. 77­ segurança. da municipal pública gestão à servatório de Segurança Pública de Canoas – Contribuições Ob SANTO,Rafael. DAL PAZINATO,Aline KERBER, Eduardo Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 72-87, Ago/Set 2016 SCHNEIDER, Stephen.SCHNEIDER, ria%20-%20desmilitarizacao.pdf>. rio/31/Documentos/New%20folder/Texto%20Consulto

Desmilitarização das polícias polícias das Desmilitarização Soc. Soc. Estado, Brasília, v. 20, n. dsosrid mi- desconstruindo – Theory and Prac Porto Civitas, - - - - - and Policing. Oxford: Oxford University Press, 2014. Michael D.; KANE, Robert J. REISIG, In: police. the of HistoryRecent A J. James WILLIS, Acesso em:1ago. 2016. . em: vel Disponí- 1998. Park, College brief. in Research – Justice Justice. of Departament US USA. 7 ed.SãoPaulo: Edusp, 2003.(Coleção Polícia eSociedade). TONRY, Michael H.; MORRIS, Norval. iniciais. Porto Alegre: Spazio Itália,2012. Canoas: de blica Inês. Marlene SPANIOL, g=en&nrm=iso>. Acesso em:3ago. 2016. php?script=sci_arttext&pid=S0034-89102010000300013&ln

Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 44, n. 3, p. 496-502, análise da sua implantação e resultados e implantação sua da análise bevtro e euaç Pú- Segurança de Observatório The Oxford Handbook of Police Policiamento Moderno. National Institute of of Institute National Po - Guardas Municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação

Alberto Kopittke Dossiê

Resumen Abstract

Guardias Municipales: entre la tentación de la tradición y Municipal Guards: Between the draw of tradition and Alberto Kopittke el desafío de la innovación challenge of innovation Por la tercera vez en los últimos 200 años Brasil vive el Brazil is revisiting, for the third time in the last 200 years, debate sobre el papel de las Guardias Civiles. Este artículo the debate over the role of Civil Guards. This article seeks intenta colaborar con este debate haciendo una retrospectiva to contribute to the debate by producing a historical histórica sobre el tema e intenta demonstrar como la Ley retrospective on the topic and showing how Law no. 13022/2014 abrió un debate mucho más amplio y relevante 13022/2014 has sparked a much wider and relevant debate sobre la concepción de Seguridad Pública existente en el país. El on the concept of Public Safety in Brazil. The present article presente artículo discute el concepto de prevención presentado discusses the concept of prevention contained in the Direct en la Acción Directa de Inconstitucionalidad (ADIN 5651) como Action of Unconstitutionality (ADIN 5651) as the main argumento principal en contra el Estatuto de las Guardias argument against the Municipal Guards´ Statute, which used Municipales, que emplea una doctrina consolidada durante doctrine consolidated during the Military Dictatorship that la Dictadura Militar, que resume la prevención a la acción reduces prevention to ostensive policing, superseded globally policial ostensiva, lo que está superado mundialmente por una by a much broader concept of multi-disciplinary prevention concepción mucho más amplia de acciones multidisciplinares de actions embraced in national Legislation. Lastly, the article prevención y que ya está amparada por la Legislación nacional. outlines some of the preventive policies implemented by the Finalmente, el artículo presenta algunas de las políticas Secretariat for Safety of Canoas city (Rio Grande do Sul State) preventivas que se han implementado por las Secretaria de involving the Municipal Guard and representing a concrete Seguridad de la ciudad de Canoas (RS), con protagonismo experience of this new conception of proactive, preventive, de la Guardia Municipal, una experiencia concreta de esa integrated Public Safety with evidence-based, long-term nueva concepción de Seguridad Pública proactiva, preventiva, planning, in which Guards work in an integrated manner e o desafio da inovação da tradição a tentação Municipais: entre Guardas integrada, con planificación de largo plazo y basada en with State police without conflicting roles or replicating the evidencias, en la que las Guardias actúan de forma integrada same models and concepts. con las policías estatales y no disputando los mismos papeles o copiando los mismos modelos y concepciones. Keywords: Municipal Guard. Public Safety. Police. Prevention. Palabras clave: Guardia Municipal. Seguridad Pública. Policía. Prevención.

Data de recebimento: 08/03/2016 Data de aprovação: 26/08/2016

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 72-87, Ago/Set 2016 87 Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 88 (RS) enovas possibilidades de Segurança PúblicadeCanoas experiênciaslocais: doObservatório Gestão dainformação egovernos Sociais pelaUniversidade Federal doRioGrande doSul(UFRGS). Coordenador de projetos da área de Sistemas de Justiça e Segurança Pública Bacharel em Ciências no Instituto Sou da Paz. Eduardo Vieira Mattos doRio Grande doSul(UFRGS). Federal Universidade pela Geografia em Bacharel (RS). Canoas de Pública Segurança de Observatório do Geógrafo Daniel Montenegro Rio Grande doSul(UFRGS).Especialista emSegurança Pública eMediaçãodeConflitos pelaUFRGS. Coordenador do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS). Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Thiago Medeiros Magnus associado aoNúcleodeEstudosInterdisciplinares sobre Psicoativos (NEIP). Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Pesquisador Universidade pela Social Antropologia em Mestre e Doutor (RS). Canoas de Pública Segurança de Observatório do Sociólogo Jardel FischerLoeck Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 Segurança pública. Gestãodainformação. Pesquisa devitimização. Palavras-Chave Canoas. Aofinal,chama-seaatenção para aimportância dodiálogoentre academia egestãopública naárea dasegurança. recentesPesquisaSegunda a Vitimização, de realizadosestudos OSPC: pelo realizada janeirocomem 2014, de moradores de ram sobre agestãodasegurança pública emCanoas. Emumsegundomomento, apresenta-se eproblematiza-se umdosmais campo. Primeiramente, apresenta-se umbreve focando resgate dahistória doOSPC, nosdiagnósticos sociológicos queincidi- plo empírico dautilização aplicada dasciênciassociais para ofortalecimento dacapacidade institucionaldomunicípionesse públicas. Destaca-se a atuação do Observatório de Segurança Pública de Canoas (OSPC), no Rio Grande do Sul, como um exem- todologias científicas, com a intenção de qualificar institucional e tecnicamente a formulação, execução e avaliação de políticas O presente tem trabalho como objetivo ressaltar arelevância dagestãoinformação naárea dasegurança, apartirdeme Resumo [email protected] [email protected] [email protected] [email protected] - em janeiro de 2014 com moradores da cidade. da Pesquisa de Vitimização Canoas,realizada objeto deanálisedopresente aSegun artigo: - blica, comvistasacontextualizar oprincipal da gestãoinformaçãopara asegurançapú- apresentamos umabreve introdução àquestão gurança Pública deCanoas. OSPC noescopodaPolítica Municipal deSe- o contextoinstitucionaldesurgimentodo segurança cidadã. Na sequência, resgatamos ve revisão bibliográficasobre oparadigmada OSPC noanode2014. zação deCanoas,projetada erealizada pelo samos algunsitensda2ªPesquisa de Vitimi- da segurançapública.Especificamente,anali- de Porto Alegre (RS),juntoàgestãomunicipal de Canoas(OSPC),naRegião Metropolitana INTRODUÇÃO O Continuando, noterceiro itemdoartigo Antes disso,porém, realizamos umabre- Observatório deSegurançaObservatório Pública presente analisa o trabalho do artigo Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 procuramos demonstrar. que nãosemalgumastensões, comotambém sua relação com a prefeitura de Canoas, ainda de Segurança Pública deCanoasexerce na dos, papeldemediaçãoque oObservatório com o objetivo de atingir melhores resulta- entre academiaegestãopúblicadasegurança dodiálogomos, também, para a importância minalidade earedução deviolências.Aponta- políticas públicasvisandoocontrole dacri- município emplanejar, executar emonitorar acapacidadeinstitucionaldopara fortalecer daaplicação de estudossociaisa importância esses resultados sãoumaformadedemonstrar interpretação dosmunícipes. de segurança implantadas; segurança cidadã; e seguintes eixos temáticos:território;medidas dos cipal dasegurança,identificadosapartir tiveram implicações práticasnagestãomuni- cificamente três resultados dessapesquisaque No itemdotrabalhoanalisamosespe- quarto Nas consideraçõesfinais reiteramos que 89

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 90 apoiam principalmente emprogramas gover- rança públicaesegurançacidadã”. segurança brasileira: nacional,segu- mento detrês paradigmasprincipais naárea da de 1988,atémeadosdosanos2000,odelinea- a ditaduramilitar, passandopelaConstituição que “[...]numperíodocompreende desde rico referido porFreire (2009,p. 101-102),em tégias semelhantes,considera-seorecorte histó- sas políticasdesegurançaapareçam comoestra- nopaís.Aindaquees- um paradigmaparticular ção de segurança cidadã comece a surgir como Brasil éode“segurança pública”, emboraano- referir-se aotemadepolíticasemsegurançano Para Cano (2006), o termo mais utilizado para “segurança cidadã” (COSTA; LIMA,2014). na América Latina e no Brasil, o conceito de meçaram adisseminar, dosanos1990, apartir Andina deFomento (CAF),entre outras,co- de Desenvolvimento (BID),aConfederação volvimento (PNUD),oBanco Interamericano o Programa dasNações Unidas paraoDesen- tradicionais, organizaçõesinternacionaiscomo direcional. Afimde romper comessesmodelos na gestãodosproblemas demaneiramenosuni- atores sociaiscapazes decompreender eauxiliar de combateàviolência,associaram-seaoutros cerçadas principalmenteemaçõesrepressivas públicas nessaárea, normalmentereativas eali- liciais. Asreferências tradicionaisdepolíticas centrados exclusivamente nasinstituiçõespo- revisão dosmodelosdepolíticassegurança do nosgrandesaglomeradosurbanos,forçou a PÚBLICA MUNICIPALIZA A SEGURANÇA CIDADÃ EA Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 As novas interpretações dessaspolíticasse O aumentodosconflitosviolentos,sobretu- ÇÃO DA SEGURANÇA tares, deque aprimeiradeve estaralinha- a repressão e a prevenção são complemen- da segurança, tais como aconstataçãodeque tamos vivenciando nosúltimosanos naárea se tornandoconsensuaisna guinadaquees- autores ainda afirmam quehá alguns valores situacional (...); e a prevenção social”. Os tária (...);ainserção local(...);aprevenção terdisciplinares; comuni- (...)aparticipação de projetos (...);orecurso àsabordagens in- tergovernamental (...);a gestão intersetorial Pronasci, dentre elesa“[...]integraçãoin- uma sériedeprincípiosqueperpassamo controle e/ou darepressão (SERRATO, 2014). des dos cidadãos, seja através da prevenção, do ou delituososquelesemosdireitos easliberda- e aresolução deriscoseconflitosviolentose/ ciais oujudiciais–voltados paraaabordagem – nãonecessariamenteligadosaquestõespoli- alizadas pordiferentes atores estataisesociais públicas recomo o - conjunto de intervenções Ministério daJustiça, podeserdefinida,então, Secretaria Nacional deSegurança Pública do de Segurança comCidadania(Pronasci), da de2007pelo Programalada apartir Nacional de segurançacidadã”, quepassaaserestimu- nitária eapolítica.Conhecidacomo“política e aalimentar, aambiental,pessoal,comu- ter amplo,queincluiasegurançaeconômica de. Dessa forma,asegurançaassumeumcará- retamente aorespeito pelavidaedignida- pelo PNUDcomoumassuntorelacionado di- (2014), atualmente a segurança é interpretada ciedade democrática.De acordo comSerrato do ofimmaiordasegurançapúblicanumaso- e assegurarosdireitos doscidadãos,considera- namentais criadoscomoobjetivo depromover Barbosa etal.(2008,p. 392)pontuam (2007, p. 27): do crime organizado. Nas palavras de Azevedo o racismo, e não apenas ao aumento de poder ção urbana,odesemprego, aexclusão social, locais, territorializadas,taiscomoadegrada- fatores conjunturaisqueremetem asituações lência estárelacionado aumaamplagamade segurança, uma vez queofenômeno da vio- éexatamentea blica setornamaisimportante protagonismo local(municipal)nagestãopú- e políticasdopaís.Uma dasáreas emqueo corrência demudançasnasdinâmicassociais dadécada de1990,em- em curso,apartir zação político-administrativa queé colocada pios nagestãopública,reflexo dadescentrali- e avalorização doprotagonismo dosmunicí- “raízes socioculturais”. de queascausasdacriminalidadepossuem significativo adesempenharnaprevenção e humanos, dequeaspolíciastêmumpapel da comagarantiaeorespeito aosdireitos der depolícia do Estadoeemaçõespuramente – estas baseadas quase exclusivamente no po- abordagens sobre otema mais conservadoras lização dasegurançapública, queseopõeàs Tem-se também,ocrescimento observado, O movimento emdireção àmunicipa- blemas sociais. dã nadiscussãoeequacionamentodospro- um processo deresgate cida- daparticipação capacitados paraatuarcomopropulsores de estejam maispróximos doproblema, emais gestores daspolíticaspúblicasdesegurança local, evidencia-seanecessidadedequeos de umcontextoglobal,masacontecemno lência eocrimesãofenômenosquederivam deumacompreensãoA partir dequeavio- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 OBSERVAT PÚBLICA ECIDADANIA EO DECANOAS A POLÍTICAMUNICIPAL DESEGURANÇA do presente artigo. blica locais,comooOSPC, objeto deanálise desegurançapú- -se acriaçãodeobservatórios dos fenômenosdasegurançapública,destaca- de diagnósticos locais gestão municipal a partir com essasiniciativas, nosentidodeauxiliara gurança eàsguardas municipais.Em conjunto aosconselhoscomunitários de se- importância segurança pública descentralizadas que dão ça maisdemocráticasaovalorizar políticasde repressivas –,apostaemformasdegovernan- cebidos como “três i(s)”: inclusão –execução direcionadas emtrêsintervenções eixos, con- depública, levada acabonacidadepartir tégias deordenamento socialedesegurança levam àviolência,simultaneamenteàs estra- priorizar asaçõesdeprevenção dascausasque ça Pública eCidadania(SMSPC),passoua tica pela Secretaria Municipal de Seguran- Metropolitana dePorto Alegre. noas comosededaetapareferente àRegião rança Pública, queteve omunicípio deCa- zação da1ªConferência Nacional deSegu- ações coincidiramcomoprocesso deorgani- deSegurançao Observatório Pública. Essas Conselho Municipal deSegurança Pública e de Gestão Integrada Municipal (GGI-M),o cal nesse âmbito foram promover o Gabinete município. As primeirasações do governo lo- mente aoiníciodaexecução doPronasci no Canoas começouem 2009, concomitante- cipal deSegurança Pública eCidadaniaem Essa políticamunicipal,colocadaemprá- A implementaçãodaatualPolítica Muni- ÓRIO DESEGURANÇA PÚBLICA 91

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 92 Brasileiro deSegurança Pública (FBSP)eo de umaparceria entre aprefeitura, oFórum nº 5.389,de19maio de 2009),através depois deserinstituídopela LeiMunicipal suas atividades,emmaiode 2010(umano Segurança Pública deCanoasdeuinícioàs uma nova cultura depazesegurança. governança assim democrática, construindo dacidadaniaativa edade violênciaapartir cretas para prevenir e reduzir os fenômenos dades das pessoas, oferecendo condições con- ou delituososquelesemosdireitos easliber- flitos (concretos ouprevisíveis) violentose/ eliminação dosriscosearesolução doscon- (MJ). Tal direcionamento estávoltado paraa vimento (PNUD)edoMinistério daJustiça grama das Nações Unidas para o Desenvol- e sociais,sobabordagem conceitualdoPro- ço coletivo entre osdiferentes atores estatais contexto do municípioresulta de um esfor- públicas desenvolvidas emCanoas. de segurançapúblicacomasdemaispolíticas eintegração daspolíticaspara aarticulação privilegiado– GGI-Menquantoumfórum ramento, audiomonitoramento;eintegração de tecnologiacomocâmerasvideomonito- ciamento, instalaçãoeoperaçãodossistemas ção desoftwares depesquisaegeorreferen- com a utiliza- produzidos pelo observatório estudos aplicadosediagnósticosterritoriais inteligência –açõescentradasnaexecução de ção principalmenteaosjovens eàsmulheres; venção dasviolências,ressaltando-se aaten- toriais quepromovem acoesãosocialepre- de projetos sociaiscombaseemaçõesterri- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 Foi de nessecontextoqueoObservatório A segurançapúblicacomcidadaniano

com uma instituição local, a Fundação La jeto, o executivo municipal firmou parceria A fimdegarantirasustentabilidade dopro- em funcionamento.manter oobservatório vas parcerias comatores tambémlocaispara o FBSP, aprefeitura decidiuestabelecer no- Pronasci edaparceria comaUFRGS ecom financiamento daesferafederalatravés do Canoas. Tanto que,mesmoapósofinaldo saram aassumirpara a gestãopúblicaem pas- tacado queosestudos do observatório nãoserãoretomadosportanto aqui. momento distinto(PAZINATO etal.,2011), tório jáforamapresentados ediscutidosem - Esses eoutros pontosdeatuaçãodoobserva cas (SIG)paraasegurançapúblicamunicipal. zação deumSistema deInformações Geográfi- Prevenção às Violências nasEscolas;e3)utili- à guarda comunitáriaeàPolítica Municipal de 1) atuação junto ao GGI-M; 2) atuação junto acréscimos,com importantes podemoscitar: nuam sendocolocadasempráticaatualmente, equeconti- buições iniciaisdoobservatório, ra deCanoas.Dentre contri- asimportantes do Pronasci, dogoverno federal,edaprefeitu- mentado, inicialmente,comrecursos advindos aplicada àsegurançapúblicaquefoiimple- res públicosmunicipais. para subsidiaratomadadedecisãodosgesto- ticos sobre segurançapúblicaeestudoslocais GGI-M, realizando periodicamentediagnós- atuar comoumaferramentaestratégicado (UFRGS). foiconcebidopara Oobservatório Universidade Federal doRioGrande doSul Grupo dePesquisa Violência eCidadaniada O que importa ressaltarO que importa é o papel des- Trata-se deumcentro depesquisasocial pilação dedados oficiais.Asbasesde dados não setratasimplesmenteda buscaedacom- adequada osgestores públicos nessaárea. Mas demaneiramaisprecisapossam instruir e diagnósticos sobre asdinâmicas criminaisque provisada. Em outras palavras, faltam estudos lidade dassituações,deformareativa eim- evidências científicas.Age-se,naquasetota- ta depolíticaspúblicaseaçõesbaseadasem às questõesdesegurançaestãoligadasàfal- para ofatodequeasrespostas estataisfalhas SEGURANÇA PÚBLICA A GESTÃO DA INFORMA em maiodomesmoano. Municipal deSegurança Pública deCanoas, diretrizes foramconsolidadasnaConferência cipal Participativo deSegurança Pública, cujas doPlanoamplo processo Muni deconstrução - deum importante pesquisa de2014foiparte fissionais daSMSPC. Ressalta-se, ainda,quea dores dosquadros pro quenãofaziamparte - (ROLIM, 2009)foiencomendadaapesquisa- vitimização realizada em2009nomunicípio 2014 –diferentemente, aprimeirapesquisade noanode tada eanalisadapeloobservatório de Vitimização deCanoas, formulada,execu- ocorre na prática. Trata-se da Segunda Pesquisa esse diálogocomagestãopúblicamunicipal recentemente parademonstrardequemaneira elaboradopeloobservatório duto particular suas atividades,atualmente. vem mantendorinstitucional oobservatório dessanovaA partir basedecooperaçãointe- um centro universitário local,aUnilasalle. Salle, quecontacom oapoioeaexpertise Alguns autores têmchamadoaatenção Focaremos, posteriormente,emumpro- ÇÃO EM de de Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 na sua análise, uma vez ainda haveria umgapnasuaanálise, umavez dados criminaisocorressem demaneiraideal, que explicamtalfatosãovariadas. mes érecorrente emtodoomundoeasrazões aponta Rolim (2009),asubnotificaçãodecri- característica exclusivamente brasileira.Como é reportada àsautoridades. Mas essanãoé uma deeventos criminaisnão fato dequeboaparte e análisedosdados.Estáligada,também,ao defasagem tecnológicaparaoregistro, coleta ta deintegraçãoentre diferentes setores eda dados não é unicamente consequência da fal- da criminalidade.Afaltadeconfiabilidadedos zes parao controle, aprevenção earedução possa planejareimplementarpolíticasefica- criminais sejamconfiáveis, afimde que se terializado, faz-senecessárioqueasestatísticas baseado em evidências e informações seja ma - frentadas tambémpelomunicípiodeCanoas. não policiais.Essassãotodasdificuldadesen- e penitenciário,bemcomocomoutros órgãos com as bases de dados dos sistemas de saúde sistema dejustiçacriminal;apoucainteração ciais nas instituições de segurança pública e no a diferença na coleta e análise de dados ofi- oficiais emtermosdedistribuiçãogeográfica; tros: adisparidadenacoletaeanálisededados sobre segurançanoBrasil, taiscomo,entre ou- obstáculos encontradosnaanálisedosdados dência, natureza etendência. práticas criminaisnossentidosdesuainci- não fornecemmedidasadequadassobre as dos registros oficiais, aindaqueimportantes, Ou seja,mesmoqueoregistro eacoletados Para queosistemadesegurançapública Miranda ePita (2011)enumeramalguns 93

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 94 vítima eascircunstâncias dos crimes–dentre tipo depesquisaéqueela tem comofocoa (ZILLI; MARINHO;SILVA, 2014). dos emdiferentes localidadesecontextossociais que inviabiliza a comparação dos dados coleta- lógica dessesdiferentes esforços depesquisa, o entretanto, éafaltadepadronização metodo- Um contrapontonegativo quepodesercitado, tos criminais,massimdonúmero devítimas. do númeroo fato de que não se de parte even- sidentes deumacidade,tendocomodiferencial exemplo, o total de crimes praticados contra re- de pesquisavitimizaçãopermiteestimar, por e asformasdecontrole docrime”. Omodelo significativa oconhecimentosobre aprevalência timas, “[...]oquepermiteaprofundar deforma de vitimizaçãobuscaminformaçõesjuntoàsví- Segundo Carneiro (2007,p. 63),aspesquisas na área. eficiência eeficáciadasintervenções segurança, proporcionando umaumentoda precisos queorientemaspolíticaspúblicasde que permitearealização dediagnósticosmais umavez mização sãoferramentasimportantes, lhas notrabalhoderegistro policial. minal, podeserdecorrente simplesmentedefa- como aredução dedeterminadoindicadorcri- te éconsideradopositivo pelaopiniãopública, maneira maiseficaz;eumfatoquenormalmen- do trabalho policial, que passou a registrá-lo de dor oficial de crimes pode significar a melhora ações. Por exemplo: oaumentodeumindica- policiais podeinduziraoerro emascararsitu- de iniciativas e ações unicamente pelos registros oficial doseventos criminais.Obalizamento que a subnotificação significa o não registro Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 Uma positivas desse dasparticularidades É nessecontextoqueaspesquisasdeviti- GESTÃO MUNICIPAL RESULTADOS SIGNIFICATIVOS PARA A ALGUNS (2014):ANALISANDO CANOAS UISA DEVITIMIZAA PESQUISA avaliações negativas. danças quepossamremediar fatores ligadosàs ações comimpactopositivo oupropondo mu- os gestores públicos para a continuidade das as avaliações positivas e negativas e instruindo tando parafatores específicosquedeterminam nas instituiçõesdesegurançapública,apon- de mensurarograuconfiançadapopulação tidianamente. Alémdisso,tambémépossível estimar afrequência decrimescometidosco- maisexpostosadeterminadosdelitos, grupos permitindo traçarmapasderisco,identificar te paraaformulaçãodepolíticaspreventivas, outros temas–,oqueéespecialmenterelevan- pesquisa, utilizou-se oprocesso deamostragem tegorias. Para garantirarepresentatividade da porções quantitativas de cada uma dessas ca- base nessasinformações,chegou-se àspro- mulheres, nível deescolaridadeerenda. Com a discriminaçãoentre quantidadedehomense município, bemcomoporbairro, assimcomo populacional daquantidadederesidentes no compor apesquisa,foifeitoumlevantamento processo de coleta de unidades amostrais para segurança públicamunicipal. Tendo emvistao sujeitas àsimprevisibilidades das questõesde que residem estavam nacidadee,portanto, nicípio. Apopulaçãodefinida foiadepessoas rança dos jovens e demais moradores no mu- Canoas. Ainda,diferenciar asensaçãodesegu- refletir ocenárioatualdasegurançapúblicade A pesquisaemquestãofoiplanejadapara Procedimentos metodológicos ÇÃO EM registros policiaiseocálculo dasubnotifica- possibilitando assim umcontraponto com os pessoas quesofreram crimes e/ouviolências, até aquelemomento;2)medir aquantidadede ca comcidadaniadesenvolvidas nomunicípio canoense sobre aspolíticasde segurançapúbli- objetivos: 1)captaraavaliação dapopulação ro de2014,apesquisateve comoprincipais população domunicípio. Aplicada emjanei- detoda safio deentenderocomportamento planejamento amostral,tendoemvistaode- mesmo nível deconfiança95%. -ia umamargemdeerro de4,4%,mantido o -se umaamostrade500respondentes ter-se- de erro de3,1%.Analogamente,aocoletar - de 1.000respondentes, ter-se-iaumamargem confiança de95%,aocoletar-seumaamostra constatou-se queparamanter-seumnível de fórmula elaboradaporestatísticoresponsável, canoenses (IBGE,2011).Aplicando-se uma baseou-se emumapopulaçãototalde323.827 apesquisa paranortear O cálculoqueserviu o tamanhodeamostraeasmargenserro. tam toda a área dacidade. Foram calculados em estratos(bairros) que,juntos,represen- “Estratificada”, poisomunicípiofoidividido mantendo-se umaproporção representativa. amostrais queaquelascompoucoshabitantes, mais populosasdevem contermaisunidades de preferência. “Proporcional”, poisregiões poderia ser selecionada, sem qualquer critério “Aleatória”, poisqualquerpessoadapopulação lecionada umaamostradepopulação. de confiança95%. aleatória proporcional estratificada comnível Esses cálculos serviram de referênciaEsses cálculosserviram parao “Amostragem”, devidoaofatodeserse- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 sua implicaçãoprática for ocaso. pontos positivos ealgumaslimitações,quando gestão dasegurançamunicipal,destacandoos tados que tiveram uma incidência prática na fazemos uma leituracríticadealgunsdosresul- sentar todososresultados dapesquisaperse, estatístico apresentado acima.Em vez deapre- ridade, respeitadas pelocritériometodológico ou mais,detodasasfaixasrenda eescola- masculino efeminino,comidadede15anos das asregiões dacidade,compessoasdosexo períodos. a fimdeplanejaraspolíticasparaospróximos dos munícipesemrelação àsegurançapública, ção; e3)conhecerosanseiosasnecessidades seguro nomeubairro”. Somando osvalores lise: “Me sinto seguro emCanoas” e“Me sinto que duasmerecem destaque napresente aná- totalmente”, paraalgumasafirmações,sendo nificava “discordo totalmente” e5 “concordo grau de concordância de 1 a 5, em que 1 sig- a cadaentrevistado queseposicionasseemum do quenomunicípioemgeral.Foi solicitado se sentirem seguros emseuspróprios bairros exemplo, umatendênciamaiordosmoradores violência dentro dacidade.Constatou-se,por percepção dosentrevistados sobre aquestãoda distintas territorialidades de Canoas, ligadas à de daconstrução paraaobservação -se partir lise dasdiferentes respostas coletadas,pode- das pessoascomoterritório. da aná- Apartir mulada especificamente para avaliar a relação Foram realizadas 1.055entrevistas emto- Uma sessãodareferida pesquisafoifor- a) Território Refletindo sobre alguns e resultados 95

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 96 Território dePaz seu bairro deresidência doqueforadele.No respondentes relatou sesentirmaisseguraem dos uma sensaçãodeinsegurança,grandeparte deveículos,roubo crimesgeradores efurto de crimes de mortes violentas crimes de mortes Mesmo nosbairros comosmaiores índicesde vado para a frase “Me sinto seguro em Canoas”. bairro” é em média maior do que o valor obser- cia com a afirmação“Me sinto seguro nomeu geral domunicípioo percentual de concordân - nos bairros comgraudevitimizaçãosuperiorao tretanto, merece destaqueofatodequemesmo napesquisa.En- no anoanterioràparticipação soas quehaviasofridoalgumtipodeviolência Canoas foide19,2%–estaaparcela depes- bairro deresidência. daram quesesentemseguros noseupróprio seguros nacidade,enquanto58,9%concor- dos entrevistados concordaram que se sentem de “concordo econcordo totalmente”, 52% Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 ser interpretados comomaisseguros, mesmo O próximo, oconhecido,familiar, tendema e Oliveira (2012) ao citar Liska et al. (1988). “sentir-se seguro”, como apontam Rodrigues dasensaçãode importante cimento sãoparte dade, aproximidade- e o sentimentodeperten afetivas comoterritório,nasquaisafamiliari- localidade estabelecemrelações simbólicase pessoas moradorasdedeterminadobairro ou tir “seguro nobairro” e56,6%,“em Canoas”. Grande Mathias Velho, 62,4%declarou sesen- “seguro emCanoas”. Já no Território dePaz no bairro”, enquanto59,5%declarou sesentir dores respondentes declarou sesentir“seguro O percentual geral de vitimização para toda O percentual geral de vitimização para toda Esse fatoapontaumatendênciaclara:as 2 Guajuviras, 65%dosmora- 1 , por exemplo, ou bramentos práticos positivos ligadosaouso de segurança.Não se podeignorarosdesdo- da criminalidadeeaoaumento dasensação audiomonitoramento relacionado àredução acerca da implementaçãodas câmeras e do profundo ouqualitativo comapopulação não houve, posteriormente,um debate mais daleituradosdadoséqueapontar apartir se. Entretanto, umalimitaçãoquepodemos dapopulaçãocanoen- sitiva damaiorparte que ascâmerasreceberam umaavaliação po- audiomonitoramento (37,2%). Projeto Território de Paz (39,2%) e sistemade te, câmerasdevideomonitoramento(56,3%), principais medidasavaliadas, respectivamen- desde 2009. Vamos nosatersomenteàstrês de segurançapúblicaimplantadasemCanoas à populaçãoarespeito doimpactodasmedidas NICK; BAYLEY, 2002). dendo assimàsespecificidadeslocais(SKOL- nos diferentes locaisondeestáinserida,aten- belecendo vínculoselaçoscomacomunidade deve serterritorializada, deproximidade, esta- baseada napremissa dequeaatuaçãopolicial estratégia de policiamento comunitário está mos discutidosemPazinato etal.(2011).A outros projetos sociais, sendo estes dois últi- da guarda municipal,os Territórios dePaz e como o policiamento comunitário, a atuação da gestãomunicipal,materializadaemações daatuaçãoterritorializadaporparte portância cia decrimes. Tal constataçãoreafirma aim- contexto geral da cidade, tenha maior incidên- que um determinado bairro, se analisado no O importante, nestemomento,éressaltarO importante, Em outra seção dapesquisafoiperguntado b) Medidas desegurança implantadas ta estimulada compossibilidadederesposta em Canoas?”,tambémnoformato depergun- sobre “as três maiores causas da criminalidade ção perguntou-se a opinião dos entrevistados munícipes a demandaporinstalaçãodemaiscâmeras. provável explicaçãoparaaaltaavaliação epara lação, oque pode serinterpretado comouma trabalhando nasuapublicidadejuntoàpopu- pria gestãomunicipaltendeainvestir naideia, ceiro. Dessa forma,aomesmotempo, a pró- pública quedemandaaltoinvestimento finan- um recurso tecnológicodaárea desegurança Deve-se levar emconsideração quesetratade mais votada em6dos15pontosdevotação. tivo, ademanda porcâmerasnacidadefoia em recente votação- doorçamento participa governo”. No casodascâmeras,porexemplo, com o objetivo de não perder uma “marca de acaba ficando “refém” dasuamanutenção, dessas medidas é de que a gestão municipal da boa avaliaçãopode ser discutido a partir dos equipamentos. vão dacapacitação depessoalàmanutenção humanos parasuaoperacionalização–que também umaltoinvestimento emrecursos e osistemadeaudiomonitoramento),existe (câmeraslogias quesematerializamnasruas investimento derecursos públicosnastecno- levar em consideração que, para além do alto o capitalpolíticodaadministração. Há dese grande impactosimbólicoequeincrementa trata-se deumainiciativa governamental com desse tipodetecnologia.Ao mesmotempo, Em outro trecho da pesquisa devitimiza- c) Asegurança cidadãea interpretação dos Um desdobramentomenospositivo que Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 dade de respostas múltiplas, ou seja, cada pessoa dade derespostas múltiplas,ouseja,cada pessoa criminalidade?”. Nesse casonãohaviapossibili- de Canoas,como“primeira açãoparadiminuira entrevistados, seestivessem nopapel deprefeito mento sequestionouarespeito doquefariamos respostas maiscitadas. policiamento” (15,4%), seguindoaordem das (22%), “falta de educação” (19,2%)e“falta de “desigualdade social” (23,4%),“pobreza” foram a“falta familiar” deestrutura (25,3%), dos comocausasdecriminalidadeemCanoas (2012) eLoeck(2014).Outros fatores aponta- autores, porPetuco (2011),Romanini eRoso de. Esse assunto foi explorando, entre outros usuários dessasubstânciacomacriminalida- RBS,aqualassociou diretamentedo grupo os com campanhascomo“Crack, nempensar”, intensa midiatizaçãodaquestãodasdrogas pode serreflexo deumfenômeno recente de tração depreocupações nessetemaespecífico (2010), Fiore (2013)eLoeck(2014). controvérsias sãoapresentados porPolicarpo tegorias. Debates interessantes arespeito dessas por vezes obscuranestadiferenciação entre ca- empíricos entre as duas esferas e a própria lei é da saúde.Mas há muitos entrecruzamentos daárea tas, passouaserobjetodeintervenção O “uso dedrogas”, mesmodesubstânciasilíci- “tráfico” dentro dosistemadejustiçacriminal. leira sobre drogas, de2006,interpreta apenaso 53,2%, respectivamente. drogas” lideraramasrespostas, com66,6%e múltipla. O“uso dedrogas” eo“tráfico de Em associaçãoaessapergunta,emoutro mo- Não podeserignoradoquetalconcen- A títulodeinformação,alegislaçãobrasi- 97

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos 98 que implicam nasegurançaeviolência foi desses problemas sociaisdeordem nãopolicial de pessoasqueatuariamfocando naresolução entrevistada colocariaem prática, opercentual quesito de “ações de governo” que a população tuais significativos deescolha. Entretanto, no e “falta deeducação” tambémtiveram percen- tura familiar”, “desigualdade social”, “pobreza” colha poraçõespolicialescas–,“falta- deestru formajustificariaaes- segundo caso,decerta pações desegurançadapopulação–oque,no tenham sidoeleitoscomoasmaiores preocu- mais policiaisnarua”. mento ostensivo –ouliteralmente“colocando sicamente com investigação policial e policia- fosse “combatendo otráfico” –oquesefazba- locadas empráticaatravés doaparatopolicial, cipalmente emaçõespunitivo-repressivas co- os entrevistados concentrariam esforços prin- vas enquanto gestores municipaishipotéticos, cas. Ao apontarem parasuasprimeirasiniciati- de duasleiturasespecífi- fica evidenteapartir dapopulação.assimilada porboaparte Isso gurança cidadãaindanãofoicompletamente em conjuntoficaperceptível queaideiadase- de diminuiçãodasituaçãopobreza”. 8,1% “criaria maisprogramas deinclusãosociale “aumentaria deemprego” asoportunidades e tes optaram por“melhoraria as escolas”, 9,8% cia dosresultados, apenas10,1%dosresponden- pouco maisdametadedasrespostas. Na sequên- ria otráficodedrogas”; juntas,ambassomaram mais policiaisnarua” eoutros 20,6%“combate - entrevistados, 30,3%responderam “colocaria podia escolherapenasumaresposta. Do totalde Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 Ainda queo“uso” eo“tráfico” dedrogas derespostasAnalisando-se osdoisgrupos CONSIDERA lidade econômicaesocial. reitos sociaiseaçõesdeprevenção àvulnerabi- que focamaisemaspectosdepromoção dedi- em geralcomapolíticadesegurançacidadã, nor reconhecimento dapopulação porparte bem menor. Mais umavez, demonstraumme- Serviços PúblicosServiços vam em funcionamento, como as Plenárias de popularnomunicípio quejáesta- participação te a legitimação de políticas ligadas aoscanais de - tório, concluímosquenestequesito éimportan ça cidadãeainterpretação dosmunícipes. medidas de segurança implantadas; a seguran- a respeito dostrês temasescolhidos:território; dos dadosestatísticos,esimumaanálisecrítica tamos pornãofazer umasimplesapresentação análises sobre osseusresultados. Tanto queop- apontar tambémparaalgumaslimitaçõesdas em 2014.Ao mesmotempo,nãodeixamos de Pesquisa de Vitimização deCanoas,realizada decorrentes dealgunsresultados daSegunda do presente desdobramentospráticos artigo pública municipaldeCanoas. deSegurançaservatório Pública comagestão científico. Tal qualocorre na relação do Ob- dências ou diagnósticos com embasamento dos gestores públicossejambaseadasemevi- tivos com oobjetivo depermitirqueasações realização deestudosquantitativos equalita- monitoramento de estatísticas criminais e da gestão dasegurançapúblicadizrespeito ao para adas contribuições mais importantes A respeito doprimeiro dessestemas,oterri- Procuramos demonstrarnoúltimoitem que umaDestacamos, aolongodoartigo ÇÕES FINAIS 3 easreuniões com associações mente em particular legitimamaarticulaçãomente emparticular cipes, osresultados apresentados anterior- segurança cidadãea interpretação dosmuní- diminuição decrimeseviolência. tencionandoasuaeficáciana mais estrutural, instalação decâmeras,esimatingirumpatamar tar simplesmenteàescolhadenovos locaispara ção. Parece-nos queodebatenãodeve selimi- ampliar oescopodadiscussãocomapopula- omonitoramento, entretanto, faz-senecessário diz respeito à boa avaliação das câmeras de víde- prevenção àsviolências.Especificamentenoque Paz, comabordagens integradaseintegraisde práticas dos projetos sociais nos Territórios de as boas em que pese articular de intervenção, das, faz-senecessárioapresentar novas propostas ração oumanutençãodasmedidasimplementa- rança Pública. Futuramente, no que toca à alte- mente oPlano Municipal Participativo deSegu- conjunta- e diversas entidades afimdeconstruir promover um debate junto com a comunidade tados dapesquisadevitimizaçãopermitiram às texto deCanoascomoumtodo. marcação territorial,emsuarelação comocon- que precisam sercontrolados nalógicadade- territórios comoindivíduosperigosos/violentos, justamente nãoestigmatizarapopulaçãodesses depolíticasterritorializadasseja cidadã apartir o maior desafio para a efetivação da segurança zadas. Entretanto, há de se destacar que talvez tas àsdemandaspúblicasdevem serterritoriali- quisa, ficouclaro paraoexecutivo queas respos- tido. Reiterando, dos resultados a partir da pes- de moradores, e de novas iniciativas neste sen- medidas desegurança implantadas,osresul- No quedizrespeito àdiscussãosobre a Sobre aavaliação dosmunícipesemrelação Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 questionamentos daimprensa. de acalmaraopiniãopública ouresponder a “para amanhã” –muitasvezes com oobjetivo e/ou diagnósticossobre situações específicas queapresenteexige doObservatório relatórios pesquisas demédioelongoprazo ouentãose por dadosinterrompem odesenvolvimento de casos, demandaspontuaisdaadministração da pesquisacientífica,uma que,emalguns vez nia entre otempodagestãopúblicae blica; e,talvez omaior deles,afaltadesincro- pelo sensocomumoumesmopelagestãopú- supostos consensosproduzidos pelamídia, sociedade, procurando nãosedeixarlevar por mação qualificadaetransparente paratodaa éproduzir infor- são centraldoobservatório sem interferência política, uma vez queamis- pela autonomia para a elaboração de estudos abusca feitos pelaspesquisasdoobservatório; dos gestores emseapropriar dosapontamentos relevantes: adependênciadavontade política as. Dentre eles podemos citar como os mais de SegurançaObservatório Pública deCano - práticos cotidianosaserem enfrentados pelo públicos serintegraleintegrada. devendo, por isso,aresposta dosgestores violências e da criminalidade são múltiplas, doentendimentodequeascausasdaspartir pulsionadas pelaSecretaria deSegurança, a ticulação comoutrasáreas degoverno, im- exatamente nanecessidadecrescente dear- constatação nagestãomunicipalsetraduz policiais. Um desdobramentopráticodessa da associaasegurançaapenasàsinstituições municipais, umavez queapopulaçãoain- Cidadania deCanoaseasoutrassecretarias entre aSecretaria deSegurança Pública e Para finalizar, ressaltamos quehádesafios 99

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades

100 Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 Secretaria Municipal deSegurança Pública e social aplicada,eatenderàsdemandasda autonomia enquantoinstitutodepesquisa passo para, aomesmo tempo, manter sua sentido detentarsincronizar essedescom- sedáno doobservatório tucional porparte pesquisa científica –, e o maior esforço insti- trabalho distintos–dagestãopúblicae Tratam-se dedinâmicas e temposde 3. 2. 1. críticas esugestõesavaliando osserviços eaçõesprestadas pelaadministração pública municipal. Conjuga Canoas. Tratam-se deespaços nosquaisoscidadãostêm voz emumfórum com oprefeito esecretários municipais,apresentando demandas, de nacidade conflagradas áreas configuram que investimentos bairros emprojetos deinclusãoecoesão social. em Integrada Territorial Ação de estratégico Programa violentas emnúmeros absolutos noano de2013. Os bairros Guajuviras, MathiasVelho eHarmonia,que compõem osTerritórios dePaz emCanoas, foram os quemaisregistraram mortes academia eagestãopública. cotidiano efazer otãonecessáriolink por contornaressespossíveis percalços do que se apresentam como essenciais na busca tório emeventos acadêmicossãoatividades - bate daspesquisasproduzidas peloobserva – comoestequeapresentamos aqui–eode- gos emperiódicoscientíficosespecializados - Cidadania deCanoas.Apublicaçãoarti entre a FREIRE, Moema Dutra. Paradigmas de segurança no segurança de Paradigmas Dutra. Moema FREIRE, de Campinas, 2013. de Estadual Instituto Universidade Humanas, Ciências e Social, Filosofia Antropologia em Pós- de Graduação Programa doutorado, de Tese eventos. e Maurício. FIORE, São Paulo, Contexto, 2014. L.; J. RATTON, G., S.; R. AZEVEDO, R. LIMA, in de. Pública, Sérgio Segurança Renato LIMA, Trindade; Arthur COSTA, pública. Perspectiva, v. 21, n.1, pp.60-75, 2007. segurança da gestão e vitimização de Pesquisas Piquet. LeandroCARNEIRO, de Direitos Humanos,v. 3, n.5, pp. 136-155, 2006. crime.contraguerra o a democratizaçãoversus e tentativasmodernização de CANO, Ignacio. Políticas de segurança pública no Brasil: 2008. Janeiro). de (Rio Gonçalo São de município do pública segurança de diagnósticodo partir segurançaa da a municipalização sobre Reflexões al. et Rafael Antonio BARBOSA, Justiça, da Secretaria Nacional deSegurança Pública,2013. Ministério DF: Brasília, diagnósticos. e L.. L. S. C. LIMA, C.; NEME, S.; I. FIGUEIREDO, In: Guararapes/PE. dos Jaboatão e Canoas/RS de cidades das comparada análise uma políticas ______. públicas As no âmbito municipal: Científico, 2007. Desenvolvimento de pesquisa. Nacional Conselho DF: de Brasília, Relatório RS. no implementação de experiências e teóricas bases segurançapública: da de. Ghiringheli AZEVEDO,Rodrigo bibliográficas REFERÊNCIAS Uso de drogassubstâncias,de sujeitosUso : rm, oíi e utç n Brasil. no justiça e polícia Crime, , [s.l.], v. 8, n. 3, p.386-408, 3, n. v.8, [s.l.], Civitas, Sur – RevistaInternacional– Sur Políticasanálise públicas: A municipalização A ã Puo em Paulo São Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 : o discurso de uma campanha de prevenção de campanha uma de discurso o palavras: Silva. da Roberto Dênis PETUCO, seguranca.pdf>. Acesso em26/10/2015. contribuicoes_a_gestao_publica_municipal_de_

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório Dossiê de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades

102 Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 88-103, Ago/Set 2016 rmvno ad o rfrad rlçe de relações reforçando dominação? ou saúde promovendo crack: e Mídia Adriane. ROSO, Moises; ROMANINI, 2009. VitimizacaoCanoasPDF.pdf>. Acesso em 25/10/2015.

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 104 municipais doGrande ABC A formação dasguardas civis Social pelaUSP. Graduada emPsicologia pelaPontifícia Universidade Católica deSãoPaulo -PUC-SP. Doutoranda emPsicologia Escolar eDesenvolvimento HumanopelaUniversidade deSãoPaulo -USP. Mestre emPsicologia Juliana Teixeira deSouzaMartins Pontifícia Universidade Católica deSãoPaulo -PUC-SP. Graduada emSociologiapelaUniversidade deBrasília -UnB. Gerente deFormação emSegurança UrbananaPrefeitura deSãoBernardo doCamposo -SP. Mestranda emCiênciasSociaspela Juliana Barroso Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 Guarda municipal.Formação deguarda municipal.Segurança urbana.Lei n°13.022/2014. Palavras-Chave públicas para formação dasguardas municipaisnopaís. o desenho e a implementação desse processo. Espera-se que este artigo possa contribuir para a reflexão sobre políticas região apartirdaimplementação doCentro Regional deFormação emSegurança Urbana.Aintenção édiscorrer sobre Segurança UrbanadoConsórcio Intermunicipal doGrande ABC noâmbito daformação dasguardas civismunicipaisda toras públicas em segurança pública. Pretende-se contextualizar as mudanças promovidas pelo Grupo de Trabalho de ges como anos últimos nos feitas observações as e 13.022/2014, Federal Lei Municipais, Guardas das Geral do Estatuto implementação de aniversário do ocasião por realizadas reflexões das acerca diálogo do resultado é artigo Este Resumo [email protected] [email protected] - políticas em segurança urbana,propondo a de ta, apostou na integração e na articulação de São Bernardo doCampo,noABCpaulis - mento comomeiodeatuação. também foram expostas a práticas de enfrenta- dos equipamentospúblicosmunicipais,elas regulação nãoviolentadeconflitoseproteção por meio de policiamento de proximidade, sando umaatuaçãodiferenciada nosterritórios ram criadasparadesempenharessepapel,vi- comunitária. é aconformaçãodeumaatuaçãopreventiva e pela legislação. O fio condutor dessas mudanças tativa de se alinharaosprincípiosreafirmados mudanças nagestãodestasinstituiçõesten- tituíram guardas municipaisvêm promovendo INTRODUÇÃO D Nas últimas gestões, a Guarda Municipal Se, porumlado,asguardas municipaisfo- 13.022/2014 osmunicípiosqueins- esde aimplementaçãodaleifederal Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 bates daimplementação dosprocessos adotados Urbana (2014/2015)eaterceira trabalha osem- do Centro Regional deFormação em Segurança municipais. Asegundadiscorre sobre acriação ra tratadaproposta paraaformaçãodas guardas foram processadas. refletindo comoasmudançasempreendidas ca doMinistério daJustiça ealei13.022/14, pela Secretaria Nacional deSegurança Públi- fundo apolíticaparaformaçãoestabelecida cessos deaprendizagem, tendocomopanode periência docentro deformaçãoeseuspro- presente ensaiopretende lançarluzsobre aex- da perspectiva comunitáriaepreventiva. O para integrarosprocessos formativos apartir Regional deFormação emSegurança Urbana, dessas ações foi a implementação do Centro para pensar e desenvolver ações na área. Uma pal doGrande detrabalho ABC,deumgrupo criação, noâmbitodoConsórcio Intermunici- O textosedivideemtrês Aprimei- partes. 1 . 105

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 106 das Municipais (MCN-GM), umreferencial da aMatriz Curricular Nacional paraasGuar- segurança pública. propostas deeducaçãoparaosprofissionais de modelo políticoepedagógico,orientandoas passouasertrabalhadocomoum e articulação LESTRERI, 2004).Oconceitodeintegração segurança ecomaintegraçãodosesforços (BA- instituições com essa concepção ampliada de cultura dapaz,requerendo ocompromisso das deumapráticaconvergente coma construção processos de atuaçãocomprometidos coma de sua atuação. Aproposta incorporava novos com foconocarátermultieinterdisciplinar prestados portaisprofissionais, são dosserviços área e, ao mesmo tempo, suscitando a dimen- passando aquestãodaaçãodoprofissional da conceito ampliadodesegurançapública,ultra- (Pronasci) – apontava para a formulação de um grama Nacional deSegurança comCidadania 2003) –posteriormentereafirmado pelo Pro - predominantemente comunitárioepreventivo às guardas municipaisasatribuiçõesdecaráter moção da segurança. Coube aos municípios e paraapro - atribuições conectadasearticuladas liciais, bombeiros eguardas municipais)tinha (federal, estadualemunicipal)instituição(po- Segurança Pública (Susp), no qual cada esfera como referência estratégicaoSistema Único de a formação das guardas municipais usando ca (Senasp), desenvolveu umaproposta para da Secretaria Nacional deSegurança Públi- CIVISMUNICIPAISDAS PROPOSTA PARA FORMA Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 Nessa perspectiva, foielaborada epublica- O paradigmaproposto peloSusp (BRASIL, Em 2004,oMinistério daJustiça, pormeio O DAS GUARÇÃO DAS - como objetivos essenciaisàformação: nhas gerais,aMCN-GM(BRASIL,2004)cita tre eixos articuladores eáreas temáticas.Em li- do diálogoen- unidade nadiversidade apartir de trabalhoemsegurança,proporcionando a orientação parapráticasformativas esituações zes de pedagógicasquepropõem instrumentos teórico-metodológico constituídopordiretri- independentemente das particularidades das independentemente dasparticularidades direcionada a todas as guardas municipais, comunitária. Essaorientação pedagógicafoi ção curricularvoltada paraprevenção egestão seus planosdecursopropondo umaorganiza - centivou asguardas municipaisaconstruírem GUARDAS MUNICIPAISNAS ORIENTA profissional mais reflexivo eautônomo. profissional efomentandoaformaçãodeum para atuaçãoemdiferentes situações daprática tos daárea desegurança,mobilizandosaberes cíficos e busca responder aos desafios concre- • emprego dediferentes linguagens, fontes • desenvolvimento doautoconhecimento;e • conhecimentoevalorização dadiversida- • percepção dosagentestransformadores da • compreensão doexercício daatividade • posicionamentocrítico,responsável econs- A partir dessasorientações,aSenaspA partir in- Para tanto,essamatriztrazconteúdosespe- de segurançapública. aatuaçãodosprofissionais daárea nortear de informaçãoerecursos tecnológicosa de dasociedadebrasileira; realidade socialehistóricadopaís; nasdiferentestrutivo situaçõessociais; GCM comopráticadacidadania; ÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA produção desteartigo. criado aindasuaguarda municipalquandoda da Serra, sendoapenasesteúltimoanãoter Diadema, Mauá, RibeirãoPires eRioGrande Bernardo doCampo, São Caetanodo Sul, preende osmunicípiosdeSanto André, São O PROCESSO NOGRANDEABC mentação dessaproposta: tificamos algunsdesafios básicospara a imple- sempenho (AZEVEDO 1998). ESOUZA, orientassem o guarda a refletir sobre seu de- fim, buscandonovas estratégiasdeensinoque senvolver conteúdos comomeioenão fossemcapazes de- currículos estruturados minimamente aformaçãodasGCM. instituições, numatentativa deuniformizar estrutural – nemtoda instituição possuía • estrutural • educacional–pelacompreensão dosas- • cultural-organizacional–pelaresistência • político–pelopactofederativo, ogoverno A região doGrande ABCpaulista com- denossaexperiêncianaárea,A partir iden- A proposta, àépoca,erapermitirqueos dizagem. locais adequadosaosprocessos deapren- operacional; e conhecimento paraalémdaperspectiva nhecimento danecessidadedeconstruir processos de aprendizagem epeloreco- pectos valorativos naformulaçãodos natural dasinstituições; que elestêm; federados, tendoemvistaaautonomia necessariamente desenvolvida porentes federal nãopodeimporumapolíticaaser Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 sabilidade dos Estados,masressalva queos deixa claro queasegurançapúblicaé respon- lho quedeve serdesenvolvido pelasGCM. sérias divergências emrelação aotipode traba- solidar umaidentidadeprópria. Mas aindahá buscadessesagentesmunicipaisporcon- forte instituições. Aexperiênciamostraqueháuma municipais de se incorporar ideologias de outras ma, masincentivava umatendêncianasguardas das deoutrasinstituiçõessegurança. educadores dessescursosfossempessoasoriun- dos guardas. queos Era comum,portanto, são profissional edemaiscursosdecapacitação vam eorganizavam aformaçãoinicial,ascen- por egressos da Polícia Militar, que coordena- foi comandadaemseusoitoprimeiros anos para contribuircomaformação. Ainstituição pessoas eram deslocadas de outras atividades nistrados. Quando havianecessidade,algumas ção deseusagentes,emboracursosfossemmi- não possuíaumórgãoespecíficoparaforma- em 2011.AGCMdacidade,criada2000, espaço que veio a ganhar instalações próprias o Centro de Formação em Segurança Urbana, e recursos destinadosàsegurança. Existem aindadisparidadeseminfraestrutura dessa diversidade, podeocasionarproblemas. conjuntas emáreas limítrofes, oque,diante de entre ascidadesacabapordemandarações totalmente distinta.No entanto,aproximida- fissionais quemuitas vezes atuamdeforma mam aproximadamente 2.500guardas, pro- A ConstituiçãoFederal, 144, emseu artigo Tal fatonãoconfigurava porsisóumproble- Em 2009, São Bernardo doCampo criou Os efetivos detodas asGCMdaregião so- 107

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 108 São Bernardo doCampo,Benedito Mariano, pelo entãosecretário deSegurança Urbana de lho desegurançapública, presidido àépoca do Grande detraba- ABC,através dogrupo âmbito federal,oConsórcio Intermunicipal ral dasGuardas Municipais eradiscutidoem 3º). 2014, Artigo nidade; eusodiferenciado daforça” (BRASIL, compromisso comaevolução socialdacomu- nuição das perdas; preventivo; patrulhamento vação davida,redução dosofrimentoedimi- da cidadaniaedasliberdades públicas;preser- direitos humanos fundamentais, do exercício GCM deve centrar-sena“[...]proteção dos tuições. Aleiaindareforça queaatuaçãodas va, respeitando competênciasdasoutrasinsti- a suaênfaseénaatuação municipal preventi - forma queaspolíciasmilitares. Pelo contrário, as guardas municipaisdevem atuardamesma texto legalnãodiz,emnenhummomento,que dos e do Distrito Federal” (BRASIL, 2014). O salvadas as competências da União, dos Esta- função de proteção municipal preventiva, res- forme previsto emlei[...]”epossuem“[...]a de carátercivil,uniformizadasearmadascon- que asguardas municipaissão“[...]instituições mizar suaação. das GCMnoBrasil, comointuitodeunifor- cionado, estabelecenormasgeraisdeatuação constitucional men- oitavo parágrafodoartigo cipais), criadaem2014pararegulamentar o 13.022 (EstatutoGeral dasGuardas Muni - e instalações(BRASIL,1988).Aleifederal municipais paraaproteção debens,serviços municípios podemconstituirsuasguardas Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 Ao mesmotempoemqueoEstatutoGe- O textodaleiafirma,jánosegundoartigo, poucos recursos. Por isso,umcentro defor- zes realizados sobaégidedoimproviso, com o queleva estesprocessos aserem muitasve- nos orçamentos municipaisparasegurança– GCM nãocostumafigurar entre prioridades beneficiar todauma região. compromisso porumaaçãocompotencialde de diferentes políticosassumindoo partidos de diferentes gestões.São prefeitos eprefeitas reduz aschancesdeserabandonadaaolongo transcende mandatospolíticos,oqueemtese pelos municípiosinteressados. Éumaaçãoque sil consolidadacomoprograma consorciado Grande ABCfoiaprimeiraexperiêncianoBra- blica. Mas oCentro Regional deFormação do e atécomoutrasinstituiçõesdesegurançapú- foram criadas em parceria com universidades outra. No Nordeste eSul dopaísacademias o professor deuma cidade podelecionar em ra própria cedeespaçoparaquemnãotem;e municipais: porexemplo,- quemtemestrutu si quandooassuntoéaformaçãodeguardas em diversas regiões brasileiras,cooperem entre região. Écomumquemunicípiosvizinhos, deaçõesaseremarticulação desenvolvidas na za autárquica dopaís. Visa oplanejamentoe cio multissetorial de direito público e nature- ABC, criado em 1990, é o primeiro consór- facilitando açõesconjuntas. ção dacomunicaçãoentre asGCM da região, federal, adquiriu equipamentos para a integra- quando, pormeiodeconvênio comogoverno havia protagonizado umaaçãoregional naárea mação emSegurança Urbana. Omunicípiojá debatia acriaçãodoCentro Regional deFor - Importante destacarqueaformaçãode O Consórcio Intermunicipal doGrande mento exigeque osagentespassemporforma - institucional dearma,oEstatuto deDesarma- armadas e, para que possam manter o porte fica da região: asguardas do Grande ABCsão concebido diantedeumanecessidade especí- dos paraocentro regional) detiro. einstrutor passageiros (visando os micro-ônibus adquiri- mação deformadores, condução deveículos de Entre os cursosespecíficosestavam odefor- guardas de todas as cidades do Grande ABC. necessária àregionalização daformaçãodos jetores e câmeras de segurança, infraestrutura ram adquiridosveículos, computadores, pro - receber, futuramente,aformaçãoregional. Fo- doespaçodestinadoa cursos paraestruturação orçado àépoca emR$1.630.811,14. tiça para a implementação do centro regional, nal deSegurança Pública doMinistério daJus- aprovação de projeto junto à Secretaria Nacio- região culminou,em2011,naapresentação e as instituiçõesqueprovessem asegurançana e profunda sobre earticular comoaperfeiçoar ações da gestão municipal. A reflexão contínua um espaçoregional jáestava nohorizonte de seu próprio centro deformação,acriação NO GRANDEABC EOCENTRO REGIONAL A CONSTRUÇÃO DA FORMA sional emsegurança. avalorização daformação profisportanto, - esse fimespecífico. Tomacomo premissa, de que os recursos estarão“carimbados” para municipal trazmaisforça políticaeagarantia mação comoprojeto deumconsórcio inter- O cursodetiro, porexemplo, tambémfoi O convênio previa autilizaçãodessesre- Quando São Bernardo doCampoinstalou O DAS GCM ÇÃO DAS Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 vistas aumaregião maissegura. o diálogoentre instituições ealinharaçõescom nais de segurança urbana da região, promover mento deumavisãocomum entre osprofissio- cedendo oespaçoparaincentivar odesenvolvi - firmou seucompromisso juntoaoconsórcio, André, São Bernardo eSão CaetanodoSul. Ribeirão Pires, Rio Grande daSerra, Santo àscidadesdeDiadema,pertencentes Mauá, guardas civismunicipais,defesaciviletrânsito tir daintegraçãodosprocessos deensinodas a intermunicipalidadedasaçõesnaárea, apar- Grande paraapoiar ABCcomoumaestrutura Urbana atuanoConsórcio Intermunicipal do Centro Regional deFormação emSegurança bito doGrupo de Trabalho deSegurança, o de funcionamentodocentro regional. termunicipal deliberava arespeito doestatuto Senasp, detrabalho doconsórcio in- ogrupo do, por meio do supracitado convênio com a quar oensinoàrealidade dasGCM. a outrasinstituiçõesde segurança epara ade- garantir independênciadasguardas emrelação para sino emarmamentoetiro éimportante no quadro defuncionáriosparapráticaen- com agentescredenciados pelaPolícia Federal na avaliação elaboradapelaprópria PF. Contar detiro eaprovaçãozação decursoinstrutor credenciamento exige a comprovação de reali- Polícia Federal podemministrartaisaulas.O mação, apenas profissionais credenciados pela anos, entre outrascoisas.Em relação aessafor- ção anualeavaliação psicológicaacadadois Em 2014,São Bernardo doCamporea- Idealizado, conformemencionado, noâm- Enquanto- oespaçoestava sendoestrutura 109

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 110 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 Franco daRocha eItaquaquecetuba. municipais de cidades de outras regiões, como tro regional jáacolheuaformação de guardas desde o início de seu funcionamento o cen- atuam emsegurançanaregião. No entanto, sito, profissionais dadefesaciviletodosque ro evetor deinovações. ço reconhecido pelasinstituiçõescomoparcei- va dasinstituições.Seu objetivo éserumespa- intermunicipal e acentuemavocação preventi- pautada emdiretrizes quevalorizem ocaráter na segurançadosmunicípiosdoGrande ABC, mover que atuam a formação dos servidores Missão efuncionamento tro patamar. quecoproduzemservidores asegurançaou - políticas públicas,elevando aeducaçãodos espaço físico,masumanova concepçãode direitos humanos. com focoprincipalmentenapromoção dos periência naformaçãodeguardas municipais, cluindo asdoGrande ABC,oCeeptemex- (Ceep). Comatuaçãoemvárias cidades,in- tor, oCentro deEducação, Estudos eProjetos contratou-se umainstituiçãodoterceiro se- abrigar asnovas concepções.Nesse processo, diretrizes deensinoereformas físicaspara presentantes dosmunicípios,elaboraçãodas de umadiretoria executiva compostaporre- nomeação da primeiragestãocompartilhada, instituição doregimento interno,instauração endidos paratornarocentro umarealidade: Destina-se àsGCM,aosagentesdetrân- O centro regional temcomomissãopro - O consórcio nãoinaugurou apenasum Desde então,vários esforços foramempre- seguintes cursos: por maisdoisanos. de doisanos,compossibilidaderecondução municípios consorciados epossuemmandato nicação. Todos indicadospelos sãoservidores mas, projetos ecursosassessoriadecomu- ca, diretor administrativo, diretor de progra- composta pordiretor geral,diretor delogísti- des eosvalores básicos paraodesenvolvimen- são consideradososconhecimentos, ashabilida- curso de aperfeiçoamento (CAper): • cursodeaperfeiçoamento visa • cursodeformaçãocontinuada(CFC): des- • cursodeacesso(CA): voltado aosque • cursodeformação(CF):atividades A instituiçãoresponde pelapromoção dos É formadoporumadiretoria executiva Na organizaçãodoscurrículos decadacurso aprimoramento. o específicas dainstituição,objetivando prias aospostossuperiores egraduações exercício edesempenhodefunçõespró- tos técnico-profissionais necessários ao atualizar eampliaronível deconhecimen- cimentos obtidosemoutros cursos;e ções, bemcomoampliaronível deconhe- de imediato as necessidades das institui- áreas e assuntos específicos, visando suprir em das municipaisedemaisservidores tinado à atualizaçãopermanente dos guar- e funçõesadministrativas eoperacionais; -los aoexercício edesempenho decargos ascenderam nacarreira, visandohabilitá- nas guardas municipaisedemaiscarreiras; cargo, destinadasacandidatosingresso gerais, indispensáveis para oexercício de educação emconhecimentostécnicos trabalhados deformamodularcomvistasaali- Os currículosforam GCM edemaisservidores. to dascompetênciasexigidasparaafunçãode ção doprofissional desegurança. operacionaldodesempenhodafun- na parte fissional edisciplinas normalmenteaplicadas templa disciplinasrelacionadas àpráticapro- prática profissional. apresentando fundamentosconceituaisparaa pelasinstituiçõesda fissional ofertados região, sentes emtodososcursosdeformaçãopro- Figura 1- Módulo eoperacional: con- instrumental Módulo básico–Reúne disciplinaspre- Organização curricular doCRFSU. Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 liaridades decadamunicípioconsorciado. cipalidade e,aomesmotempo,manteraspecu- nhar osconhecimentosemtornodaintermuni- milhão porano. gastos paraospróximos três anosédeR$1,5 convêniosprevisão comosmunicípios.A de dacelebração de dos peloconsórcio, apartir por elas. desenvolvidos atribuições eostiposdeserviços com vistasapromover esclarecimentos sobre as que caracterizamaidentidadedasinstituições O centro écusteado comrecursos reuni- Módulo específico:contempladisciplinas Fonte: Elaboração própria. 111

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 112 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 tos sobre quais conhecimentos são necessários à tos sobre quaisconhecimentossãonecessáriosà reuniões técnicas.Ele responde aquestionamen- dosmunicípiosemdistintas e daparticipação da colaboração ído em meados de 2016, a partir Tabela 1- Código deTrânsito Brasileiro Módulo 5–Trânsito econdução deveículo oficial Atendimento aopúblico Língua brasileira desinais Comunicação operacional Rotina administrativa eredação oficial Módulo 4-Comunicação egerenciamento de informações Filosofia dosdireitos humanosaplicadaà atuação policial Aspectos jurídicos naatuação policial Noções demedicinalegal Segurança públicanapreservação ambiental Mediação deconflitos Persecução penal(MP, polícia,judiciárioesistema prisional) Estrutura normativa brasileira (Constituições Federal eEstadual) Direitos humanos, direitos difusosecoletivos Direito penal Módulo 3–Conhecimento jurídico Lei 13.022/14 Símbolos nacionaisedaguarda municipal Ordem unida Ética eotrabalho daguarda municipal Módulo 02–Papel doguarda civilmunicipaleatuação profissional Violência epolíticamunicipaldesegurança urbana Sistema desegurança públicabrasileiro Comissão interna deprevenção deacidentes Regulamento disciplinarecorregedoria geral Administração públicaerecursos humanos Módulo 01- Conhecimentos institucionais - O currículoparaformaçãoinicialfoiconstru Currículo para formação inicial Educação aDistância daSenasp. adistânciapelaRedementados porumaparte de trabalhados namodalidadepresencial, comple- de 754 horas-aula e compreende módulos dez atuação doguarda. Perfaz umacargahoráriatotal 08 04 30 10 08 22 04 18 04 18 04 10 16 12 SENASP EAD/ 120h 04 12 12 10 08 38 24 Continua POLÍTICA DEFORMA NAIMPLEMENTADESAFIOS Tais diferenças deconcepçãogeram,natural - atuam deformamaisostensiva erepressiva. preventivo e comunitário, enquanto outras suem vocação eaçãovoltada aopoliciamento dos guardas municipais. Algumas cidades pos- de percepção sobre o que deve ser o trabalho região doGrande ABCeexistemdiferenças suscita inúmeros desafios. deumapolíticaintegradaformação trução Estágio supervisionado Avaliações Módulo 10–Avaliação geral decurso Condicionamento físico Controle dostress equalidadedevida Módulo 9–Conhecimentos complementares Segurança escolar Educação eprevenção aousoindevido dedrogas Módulo 8–Conhecimentos específicos Defesa civil Prevenção ecombate aoincêndio Primeiros socorros Módulo 7–Atendimentos emergenciais Uso diferenciado daforça Defesa pessoal eusodeequipamento nãoletal Procedimentos etécnicas operacionais depoliciamento preventivo ecomunitário Armamento etiro defensivo: leis, normaseprocedimentos; prática detiro defensivo Módulo 6–Funções técnicas eprocedimentos daguarda civilmunicipal Uso econservação dafrota Noções básicasde direção defensiva A atuaçãodasGCMnãoépadronizada na Como todaexperiênciainovadora, acons- ÇÃO INTEGRADA ÇÃO DEUMA Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 atuações distintas, mas, na prática, é enviado va, aprende que guarda municipais e PM têm agente épreparado paraumaatuaçãopreventi- Isso geraumacontradição:emsaladeaulao suprir carências deefetivo dapolícia militar. tores utilizarem asGCM,porexemplo, para impor umatarefa quaseimpossível se ges- ação preventiva dessasinstituições,maspode das municipais o papeldasGCM.Oestatutogeral dade derever posturasediscutircriticamente justamente emviabilizarodiálogo,apossibili- nessas instituições.Odesafio,contudo, reside mente, dificuldadesparasepensaraformação

também visaconsolidaraatu- Fonte: Elaboração própria. 40 18 40 08 08 08 04 08 12 08 40 50 100 04 12

das guar- 113

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 114 ga-se aoexpressivo contingente dequase100 mos em conta o número total de agentes, che- (547), seguidopeloSudeste (361).Ao levar- tra omaiornúmero demunicípioscomGCM considerarmos asregiões, oNordeste concen- e Maranhão (amboscom78municípios).Se pais, seguido pela Bahia (194), Rio deJaneiro com 211 cidades dispondo de guardas munici- Se considerarmosporEstado,São Paulo lidera, Pública (2015),1.081municípiostêmGCM. (2015) edoFórum Brasileiro deSegurança MUNICIPAIS QUEREMOS? REFLEXÕES FINAIS–QUEGUARDAS aprendeu emsaladeaula. ta. Oalunovai reproduzir aquiloque narua tratem osoutros deformahumanaeaten- humano e atento àqueles que queremos que estratégia deaprendizagem) edotratamento em relação ànaturalizaçãodaviolênciacomo incentivo ao pensamentocrítico(inclusive se podeabrirmãodagarantiadedireitos, do coletiva de políticasdeformação. Mas não uma tarefa difíciledesafiadoranaconstrução aprendizagem emsegurançapúblicaaindaé ehumilhação comotécnicasdeda tortura contexto brasileiro, poroutro, fugiràlógica para asguardas municipaiséalgoinovador no questionáveis daPM. a “suspeitos” reproduzindo aspráticasmais que podemfazer perseguiçõeseabordagens um aval paraumaatuaçãoequivocada. Acham municipais interpretam alei13.022/14como na cidade. Em razãodisso,nãoraro, guardas militares suficientesparagarantirasegurança sobopretextoàs ruas dequenãohápoliciais Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 No Brasil, de acordo com dados do IBGE Se, porumlado,possuir umaescolaúnica lítico que ganha votos e tratar da realidade seus dirigentes?Épreciso sairdodiscursopo- entende porprevenção? Eporintegração? E políticas sociais.Mas oquepróprio guarda ção comoutros setores daprefeitura ecom das guardas municipais,mencionaaintegra- 13.022/14 regulamenta as ações preventivas clareza eapoiemessasdemandas.Alei mandantes, secretários eprefeitos) tenham ve comoopapeldasguardas esuasatribuições. de GCM discutamcotidianamente temas-cha- dar. Éfundamentalqueasescolasdeformação construir, qualidentidadequeremos consoli- quer chegar, queguarda municipalqueremos saberondese qualquer forma,éimportante demanda análiseeavaliação acadapasso. De e longoprazo, que,comoqualquerprocesso, Uma experiência de transformação de médio Estatuto Geral dasGuardas CivisMunicipais. de umaexperiênciaúnicaepromissora àluzdo das GCM,assimcomoapresentar aestrutura o debate sobre o complexo tema da formação ram refletir acerca dequestões relevantes para guardas queremos emnossascidades? Quem as fiscaliza? Como são formadas? E que todo, estãofazendo? Comoéasuaatuação? sas guardas municipais,distribuídaspelopaís campo: quemsãoessesprofissionais? Oquees- periências exitosas, apoiando as reflexões neste discutir formação deGCM e divulgar suas ex- também dão a dimensão da urgênciadese ximadamente 120milagentes.Essesnúmeros bem próximo aoda polícia civil,queédeapro- por todooBrasil. Contingente, caberessaltar, mil pessoas atuando como guardas municipais É necessárioaindaqueseusgestores (co- As ideiasapresentadas busca- nesteartigo preventivo, queconheçamomunicípioonde fissionais quetenhamclareza sobre seupapel ção. Que guardas municipaisqueremos? Pro- dessapolíticaintegrada de forma- construção acreditamos nopotencialtransformadorda surgirão, fios quesurgiramecertamente em menteque,mesmocomtodososdesa- que possamsurgirnaexecução dotrabalho. os maisantigoserefletir acerca deproblemas no sentidodeorientarnovos agentes,cobrar E afiscalizaçãodotrabalhoéfundamental, para inúmerasinterpretações ecompreensões. do cidadão.a te e Não podehavermargem como elaé:consideraraperspectiva doagen- Ao pensarondequeremos chegar, temos 1. Agradecimentos: Benedito DomingosMariano eEverton Marcello Campos deVasconcellos. Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 se fazdeformacompartilhada. formação integradaparaguardas municipaissó res doqueosdesafioseumapolíticade mostra queaspossibilidadessãomuitomaio- do Consórcio Intermunicipal doGrande ABC Regional deFormação emSegurança Urbana respeitado/a emsuaprofissão. que o/a guarda municipal sinta-se seguro/a e sença daGCMtraga segurança ao cidadão e motores edefensores dedireitos. Que apre- ou outros setores da prefeitura; que sejam pro- atuar conjuntamente com outras secretarias oferecidos aoscidadãos;aformade serviços osbairros, os atuam emseusdetalhes:asruas, A experiência de construção do CentroA experiência de construção 115

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Dossiê Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins 116 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 para oBrasil. Brasília, DF, 2003. Pública. Segurança de Nacional Secretaria Justiça. da Ministério ______. Oficial daUnião, Brasília, DF, 11ago. 2014. Edição Extra. sobre o Estatuto Geral das Guardas Municipais. Municipais. Guardas das Geral Estatuto o sobre BRASIL. Bethier, 2004. Ed. Alegre:Porto justiça . da promoção e rançapública Brisolla. Ricardo BALESTRERI, diação metodológica. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998. ROS, Marilú. MEDEI- Marlene; GRILLO, In: projeto. próprio do autor de. Bidone Valdemarina SOUZA, E AZEVEDO REFERÊNCIAS Lei nº 13.022, de 13.022, nº Lei A construçãoA conhecimentodo me sua e Plano Nacional Segurança Pública Segurança Nacional Plano . Dispõe Dispõe 2014. de agosto de 8 Direitos humanos, segu- humanos, Direitos Tornar-se Diário Diário - Municípios Brasileiros 2015. IBGE, , 2015.RiodeJaneiro: INSTITUTOGEOGRAFIADE ESTATÍSTICA.BRASILEIRO E sileiro de Segurança Pública 2015. São Paulo: FBSP, 2015. PÚBLICA. SEGURANÇA DE BRASILEIRO FÓRUM va doBrasil. Brasília, DF:SenadoFederal, 1988. Constituição.BRASIL. Municipais. Brasília, DF, 2004. Projetos. e Programas Políticas, de Departamento Pública. Segurança de Nacional Secretaria Justiça. da Ministério ______. arz urclr ainl aa s Guardas as para Nacional Curricular Matriz Constituição da República Federati- Anuário Bra- Anuário Perfil dos Perfil dos guardias municipalesenelpaís. delas laformación para públicas políticas sobre reflexión la ese proceso. Seespera queeste artículo puedacontribuir a intención esdiscurrir sobre eldiseñoylaimplementación de del Centro Regional deFormación enSeguridadUrbana.La civiles municipales de la región a partir de la implementación del Grande ABC eneltema delaformación delasguardias de SeguridadUrbanadelConsorcio Intermunicipal delaRegión contextualizar loscambios realizados porelGrupodeTrabajo años como gestoras públicas enseguridadpública. Seintenta últimos los en realizadas observaciones las y 13.022/2014, Estatuto General de las Guardias Municipales, Ley Federal realizadas durante elaniversario delaimplementación del reflexiones las sobre diálogo del resultado el es artículo Este región delGrande ABC la en municipales civiles guardias las de formación La Resumen Juliana Barroso eJulianaT.eixeira deSouzaMartins do Grande ABC A formação das guardas civismunicipais Palabras clave: municipal. Seguridadurbana.Ley n°13.022/2014. Guardia municipal.Formación deguardia Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 104-117, Ago/Set 2016 Urban safety. Law n°13.022/2014. public policiesfor training municipalguards inthecountry. on reflection promote can article this hoped is It process. was to elaborate onthedesignandimplementation of this the Regional Center for Training onUrbanSafety. Theaim guards from theregion basedontheimplementation of of Greater ABC intheambitof training of municipal civil Safety Working Group of theInter-municipal Consortium was to contextualize thechangespromoted by theUrban in recent years aspublicmanagers inpublicsafety. Theaim the marking under Federal Law no. 13.022/2014, and observations made the anniversary on implementation of theGeneral MunicipalGuards Statute made reflections This articleistheresult of a dialogueconcerning the Training of municipal civilguards of Greater ABC Keywords: Abstract Municipal guard. Training of municipalguards. Data derecebimento: Data deaprovação: 26/08/2016 01/08/2016 117

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins Dossiê Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

118 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias UNESCO deDireitos Humanos,doNEV/CEPID/FAPESP. le Droit et les Institutions Pénales. Diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (USP). Coordenador da Cátedra nas prisões naúltimadécada e anova configuração depoder Cronologia dos“Ataques de2006” Pesquisadora colaboradora doNúcleodeEstudosdaViolênciaUSP-NEV/USP. ABC -UFABC. Doutora emestre emSociologiapelaUniversidade deSãoPaulo -USP. Graduada emCiênciasSociaispelaUSP. Professora adjunta ecoordenadora doPrograma dePós-Graduação emCiênciasHumanaseSociaisdaUniversidade Federal do Camila Nunes Dias Estudos da Violência - NEV-USP. de Núcleo do Científico Coordenador e USP - Paulo São de Universidade da Sociologia de Departamento do titular Professor Sérgio Adorno Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 Ataques Administração prisional.Prisão. de2006.PCC. Poder. Palavras-Chave gerando umcírculo viciosodemútuadependência. qual ocorre ofortalecimento mútuodoPCC edapolítica deencarceramento emmassa adotada pelogoverno doEstado, como seestabeleceram asrelações entre oPCC eaadministração prisionaladquiriram umcaráter simbiótico pormeiodo forma A prisões”. nas “ordem a manter para eficiente sido aqui até instável,tem precárioemborae que, equilíbrio um construção de acomodações envolvendo o PCC e a administração prisional. Tais acomodações, produziram por sua vez, a possibilitar a forma reconfiguradas de foram paulistas prisões nas poder de relações as quais complexasdas através a organização e trouxe importantes prejuízos políticos para ogoverno estadual. Dessa forma, apontamos estratégias para ganhos implicou não PCC” – Capital da Comando Primeiro do “Ataques como conhecido nacionalmente ficou que evento o que é central argumento O período. deste final ao paulistas prisões nas registradas políticas e sociais danças mu- as sobre reflexões algumas propor seguida, em e, ocorrem, eles que em momentos aos correspondentes partes, quatro em divisão sua da partir a 2006” de “Ataques dos cronologia reconstituira objetivocomo temtexto presente O Resumo [email protected] [email protected]

Doutor em Sociologia pela USP, com pós-doutorado pelo Centre de Recherches Sociologiques sur INTRODUÇÃO E ataques), asações persistiramatéametade do ram ao20demaio(oúltimo diadosprimeiros sões dosistemapenitenciário paulista. cujos centros dedecisãoestãosediadosnaspri- te oPrimeiro ComandodaCapital (PCC), ação do “crime organizado”, mais precisamen- logo, as ondas de violência foram atribuídas à disseminados entre osseushabitantes. Desde mente ossentimentosdemedoeinsegurança que contribuiuparaintensificarmuitorapida- todas as atividades da capital ao cair da tarde, o surpreendente foi a paralisação temporária de coletivo foramincendiados. O mais transporte predados assimcomoveículos de edestruídos, lícia. Edifícios públicoseprivados foramde- militares) econtrapostosdelegaciasdepo- nas prisões, ataques contra policiais (civis e seguidas deondasviolência,comomotins no estado de São Paulo A despeitodatrégua dos dias quesesegui- soas foram mortas por armas defogo soas forammortas ntre 12 e 20 de maio de 2006, 439 pes- 1 . Essas mortes foram . Essasmortes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 pelo governo doEstado. esse fato Certamente, enclausuramento massivo colocadoem prática pais seencontravam detidos,nocontextodo de segurançamáximaonde oschefesprinci- como territórioasprisões, sobretudo aquelas gurança pública. debate público,tendocomofocoacrisedase- ses acontecimentoseabriamespaçoparaoseu imprensa sobre dedicaramextensosartigos es- comuns. Asredes decomunicaçãoeagrande falas dosespecialistasemesmocidadãos dasautoridades,às trônicos, às intervenções ceu diariamenteaosjornaisimpressos eele- opressão nasprisões. minutos, pormeiodoqualoPCCfalava da emissão deum comunicado, emtorno de três conquistadaapósa questrado esualibertação e televisãobrasileira–Rede Globo –foise- cadeiaderádio jornalista damaisimportante mês deagosto. Elas terminaramquandoum Todos asordens paraosataquestinham Durante osataques,amatériacompare- 119

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

120 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias tivo de desfrutar da participação decertos da participação tivo de desfrutar (MOORE JR.,1987),todavia comoobje- nova ordem moralbaseadana justiçasocial não comopropósito dereivindicação deuma ciais; c)aorganizaçãode setores populares além domundodasleiseinstituiçõesofi- de novas formas de solidariedadesocialpara dapopulaçãourbana;b)aproduçãogrupos rior dotecidosocialemtornodeimportantes enraizamento docrimeorganizadonointe- ciedade brasileiravenha testemunhando:a)o violência urbanas. cimentos queconstituemacriminalidadee e ultrapassadasfaceàevolução dosaconte- presa aorientaçõesediretrizes tradicionais permanece, nocampodasegurançapública, desigualdades sociais),asociedadebrasileira e, maisrecentemente, àpequenaredução das socialede representaçãoparticipação política des civisepúblicas,àampliaçãodoespaçode Brasil (ao menos no que concerne às liberda- A despeitodoprogresso dademocraciano ciologia: dequalsociedadeestamosfalando? vestigação retornar aclássicasquestõesdaso- ilegalismos devárias espéciesquefazestain- desse gênero depessoasesuasligaçõescom pessoas anônimas.Éjustamenteapresença Tratava-se de umarede baseada em muitas doexteriordosmuros das prisões.a partir o PCCtinhaconstituídoumarede deapoio Paulo eRiodeJaneiro, emperíodosanteriores. Havia tambémantecedentesnasprisõesdeSão -americanas nosanos60doséculopassado. caso doslevantes erebeliões- nasprisõesnorte não eranovidade. Nunca édemaislembraro Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 Por causadisso,nãoéestranhoque aso- Porém, pôdeser notada uma novidade: tica dedefesadosdireitos humanos a modernizaçãodasleispenaisecontrapolí- contraa persistênciadereações conservadoras violência no contexto do Estado de direito; e) de dopoderpúblicoreprimir ocrimeea quentes epoliciaisqueenfraqueceacapacida- drogas; d) a guerra permanente entre delin- troca demercadorias, inclusive otráficode ao mercado informalenãoregulamentado da circuitos decirculação monetária,associados Secretaria Segurança Pública.: boletins deocorrência elaudos divulgadospela em CanoeAlvadia (2008),tendocomo fonte dramento comoagentepúblico oucivil,feita blização diáriadevítimas,segundo seuenqua- blica paulista. Dentre eles, destacamos a conta- período específicodahistóriasegurançapú- análises comoobjetivo decompreender este “Ataques de maio de 2006” provocaram várias PAULO: SÃO UMACRONOLOGIA EM 2006 DE ACONTECIMENTOS OS ao dacronologia queseráaquiapresentada. últimos 10anos,ouseja,noperíodoposterior ocorridas nosistemaprisionalpaulistanestes discussão arespeito daseventuais mudanças do evento demaio. Em seguida,propõe-se a comuns queossituamcomocontinuidades peculiaridades, adespeitodascaracterísticas tos, cadaumdosquaisapresentando algumas mento dessacronologia emquatro momen- agosto. Nesse sentido,propomos odesdobra- ciclo deataques,queocorre apenasnomêsde desde oiníciodasprimeirasaçõesatéfimdo dacronologia dosacontecimentos construção tos de2006,propõe-se, emprimeiro lugar, a Os acontecimentosqueintegraramos Para compreender osignificadodoseven- 2 . por utilizartempos verbais nopassadoparase estado deSão Paulo sobretudo dosjornaisde maior circulação no tir dematerialdaimprensa, nãoapenas,mas, com basenumbancodedados elaboradoapar- autoridades, moradores, familiares devítimas. ram ouvidosespecialistas,agentespúblicos, as primeiraspáginasdosprincipaisjornais.Fo - dias asnotíciasrelativas aos“ataques” tomaram na abordagem daimprensa. Durante vários análise específica,podesertambémpercebida referido períodoque,comotal,demandauma Tabela 1– A cronologia que se segue foi construída A cronologia queseseguefoiconstruída A percepção socialdaexcepcionalidade do 12/05/2006 13/05/2006 21/05/2006 14/05/2006 20/05/2006 19/05/2006 18/05/2006 17/05/2006 16/05/2006 15/05/2006 Sem data Total Dias Número devítimaspordia etipodevítima 3 . Na descrição,optou-se Agentes públicos Número devítimaspordiaetipovítima mortos 59 10 23 4 0 0 0 0 3 6 5 8 públicos feridos Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 Agentes fato ouacontecimentorelevante. quando sepretendeu sublinharaatualidadedo po verbal no presente foimantidotãosomente referir aacontecimentosjáfinalizados.Otem- ciência deque oPCCestava organizandonova aos parlamentares queogoverno doEstadotinha de armas. No depoimento, ambos informaram na CâmaradosDeputados paraapurar otráfico Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada prestaram depoimento da em sessão reservada to EstadualdeInvestigações Criminais (Deic), listas, entre osquaisodiretor- doDepartamen 13 3 8 0 0 0 0 0 0 1 0 1 10 de maio de 2006. Dois policiaiscivispau - Momento dacrise 1,maio :aexplosão Civis mortos Fonte:Adaptado deCano eAlvadia (2008). 505 107 12 39 80 13 22 65 75 84 2 6 Civis feridos 97 18 21 28 3 0 7 3 0 7 6 4 121

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

122 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias ação governamental. ciárias estavam informadasdoplanejamentoda espaçodetempotodasaspeniten- que emcurto lhos celulares àsliderançasdoPCC,deforma gravação foi transmitaporintermédiodeapare- criminosa. organização à tes Tão logo obtida, a que justamente representam presos- pertencen de gravação paraaCâmara,doisadvogados uma empresa terceirizada que realiza os serviços foi vendida, a200reais, porumfuncionáriode te deSão Paulo. Uma cópiadessesdepoimentos presídio desegurançamáxima,naregião Noroes- para apenitenciáriadePresidente Wenceslau, um da atransferência de765presos ligadosaoPCC de maio. Comoaçãopreventiva, foiprovidencia- megarrebelião no sistema prisional, para o dia 14 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 de mortos para 82,osataquespara93eas rede mortos - guns policiais. do crimeorganizado,afirmação negadaporal- acercaforam advertidas depossíveis represálias ões. O governo estadual afirma que as polícias interior. São e 27 rebeli 52 ataques, 54 mortos - lícia, queseestendemaoutros municípiosdo cas emtodooEstadoocorreram. com reféns empenitenciáriasecadeiaspúbli- e dointeriorforamalvejados. Duas rebeliões cípio de São Paulo, da Região Metropolitana Onze10 mortes. distritospoliciaisdomuni - quanto civis (inclusive agressores), totalizando liciais civis, militares e agentes penitenciários os primeiros ataques,queatingiramtanto po- dodia11para odia12,começam madrugada ferida paraoprédio doDeic, nacapital.Na 11-12 demaio.AcúpuladoPCC 14 de maio (domingo).Cresce onúmero 13 demaio.Prosseguem osataquesàpo- 4 étrans- dos ataquesedasrebeliões de acordo imediata comvistasàinterrupção aérea, paraapenitenciária,objetivando início advogada para, juntos, se deslocarem, por via comandante daPolícia Militar convidauma à penitenciáriadePresidente Bernardes. O dos. Nesse dia, comitiva dogoverno se dirige bancárias. Cerca de30ônibussãoincendia- prédios ondeseencontraminstaladasagências encarcerada doEstado. Os ataquesalcançam presos, oquerepresentava 62%dapopulação altura, jáestavam amotinadoscerca de77.000 (11 agentesdesegurançae19presos) beliões para53,com383reféns e30mortos escolas dispensaram alunos; fóruns encerraram encerraram escolas dispensaram alunos;fóruns deCongonhas;as chou osaguãodoaeroporto em todooEstado;umaameaça debombafe- de rodar após95veículos serem incendiados tendo 1/3dafrota deônibusdacidade parado penderam operações e osterminais ficam vazios, públicossus- ostransportes fechou suasportas; sidades. Logo no início da tarde o comércio ônibus, estabelecimentosbancárioseuniver- de pessoas,comoterminaistrens, metrô e áreasem em especial elevadade concentração vam alcançandoalvos indiscriminadamente, tintos bairros, rumores deque os ataquesesta- da manhã, começaram a circular, nos mais dis- a paralisaçãodacidadedeSão Paulo. No final 13 suspeitos. Todavia, omaissurpreendente foi pelapolícia nhã desegunda-feiraforammortos Entre 18horasdedomingoe6dama- Continuaram asreaçõese 17mortos. policiais. dades dosistemapenitenciário,com81reféns presos. Asrebeliões estenderam-separa82uni- em circunstâncias muitovariadas e91suspeitos de violência.Foram 116ataques,117mortos . O dia de maior intensidade 15 demaio. O dia de maior intensidade 6 . 5 . Aessa escolas. A justiça autorizou o isolamento de escolas. Ajustiça autorizou oisolamentode ameaças provocou a dispensa de alunos nas blicas noEstado. Nova ondadeboatossobre Bombas edisparos alcançamcincoescolaspú- dos poroportunistas. acreditar queosnovos ataquesforamrealiza- começa aserquestionada.Apolícia e prendeu 24.Aletalidadedasaçõespoliciais manhã deterça, apoliciamatou33suspeitos ná. Entre desegunda-feira ea amadrugada tinuam asrebeliões emMato Grosso ePara - Praia Grande ePeruíbe, São Sebastião. Con- São José doRioPreto, Tremembé; nolitoral, tucatu, Campinas,Piracicaba, Mogi Mirim, tensidade. Foram atacadasascidadesdeBo- terior osataquescontinuaramcombaixain- Tem-se ofimdosataquesnacapital. No in- e18 ônibusincendiados.ataques, 89mortos começam adiminuir. Neste dia,foram26 cerram-se as rebeliões no Estado; os ataques governo efeitos.En - paulistacomeçaasurtir lher vindonãosesabiadeonde. cumprido, semresistência, umtoquedereco- público circulava. Era comosetodostivessem privadocos; nenhumveículo ou detransporte ounospasseiospúbli- permanecido nasruas TV exibiamimagensdacapital:ninguémhavia bus foram incendiados. Às 19 horas, as redes de 56ôni- de passageiros ficaram semtransporte. congestionamento recorde. Mais de5milhões Paulo, normalmentemoroso, experimentou entrassem empane.OtráfegodacidadedeSão des detelefoniamóvel comqueoscelulares fez públicas;ocongestionamentoemrepartições - mais cedooexpediente,assimcomooutrasre- . Os ataques ainda persistiram. 17 demaio.Os ataquesaindapersistiram. 16 de maio. Oacordo entre oPCCe Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 mo patamar, com13mortos números permaneceram praticamentenomes- seguinte. não haverá maisataquesnofinaldesemana estadual declaraasituaçãosobcontrole e que alvejado o Fórum deMogi Mirim. Ogoverno lotação nobairro deHeliópolis. No interior, é Na capital registra-se um único incêndio: uma mero deataques diminuiemtodooEstado. equatro ônibusincendiados.Onú- mortos no primeiro trimestre de2006. pelapolícia o triplodamédiamensaldemortos Testemunhas acusampoliciais.Épraticamente emconfronto 93suspeitos. haviam sidomortos Em seisdias decrise,já um totalde62mortos. ra deOsasco. Apolíciamata22suspeitos,de guardas-civis sãoalvejados emfrente àprefeitu- Um batalhãodaPMsofre tentativa deinvasão; nal decelular. Cincoônibusforamincendiados. paulistas, ajustiçadeterminouobloqueiodosi- Em unidadespenitenciáriasdeseismunicípios (RDD), omaisrigoroso, peloprazo de90dias. Marcola noRegime Disciplinar Diferenciado namentos eataques voltam a ocorrer. Contudo, emmeadosdejunho novos tensio - autoridades, agentespúblicos, civisepresos. envolvem einteraçãoentre aparticipação da não completamente compreendidos, que de umasérieacontecimentos,atéhojeain- cerca denove diasapóso seu inícioedepois to –omaisagudodacrisede2006acaba 19 demaio.No últimodiadosataquesos 18 demaio.Foram 14ataquescom51 Pode-se afirmarqueesseprimeiro momen - *** 7 . 123

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

124 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 dos presos deAraraquara medidas paraproteger avidaeintegridade requereu queoEstadobrasileiro adotasse InteramericanaCorte deDireitos Humanos outras penitenciárias.Em finsdejulho, a determinou a transferência dos presos para O corregedor geraldo Tribunal deJustiça mentos eramjogadosdecimaparabaixo. de cordas que“puxavam ospresos”. Os ali- era feitaporintermédiodastorres eatravés comunicação entre funcionáriosedetentos soldadas. sos foramconfinadoseasportas A com capacidadepara160pessoas.Os pre- do porserem transferidosparaumanexo os presos asinstalações,acaban- destruíram doprotesto1.543. Em edarebelião, virtude 750 presos, encontrava-se comlotaçãode de Araraquara, com capacidade para abrigar fato inusitadovem àbaila.Apenitenciária sidente Wenceslau. Énesseperíodoqueum de 765detentosparaapenitenciáriaPre- Diferenciado (RDD),caosemAraraquara para oRDD. ção comatransferência dopreso deMarcola correlapenitenciária de Araraquara – e forte - cas unidadesprisionais,com odestaqueparaa bramentos bempontuais– rebeliões empou- rescaldo dacrisedomêsanterior, comdesdo- o comum pena deprisãomuitomaisrigoroso doque o RDD–umregime decumprimentoda testo contraatransferência deMarcola para rapina, Mirandópolis e Araraquara, em pro- do mêsforamregistradas rebeliões emIti- trégua, novas ondasocorreram. Em meados O segundomomentoapresenta-se como Meados domêsdejunho.Adespeitoda Momento 2,junho:Regime Disciplinar 8 – e em virtude da transferência – e em virtude 9 . diversificação dos ataques diversificação dosataques a opressão carcerária, umaformadejustificar protestandoram encontrados cartazes contra sendo2civis.Em algunsdoslocaisfo- mortes, as 19horasforamcontabilizadas 71açõese7 vo, bancos,ônibuseatésupermercados. Até diversificados: prédios dojudiciário,legislati- Estado umanova onda,destavez comalvos PCC iniciou,nodia12dejulho,emtodoo dois mesesdaprimeiraondadeataques,o como agentespoliciais. dos eduaspessoascivis,emboraaparentadas um guarda municipal,três vigilantespriva- policiais militares, umagentepenitenciário, compreendendoques com49mortes, dois dos seisagentespenitenciários. mente resolvido. Voltaremos aesteponto. da crise, em maio, ainda permanecia não total- nitenciário, sinalizandoqueofatodetonador ligada direta ouindiretamente aosistemape- delesestá quegrandeparte podemos observar cerne aosalvos preferenciais nessemomento, tos queenvolvem ounãooPCC.No quecon- se tornarátambémpráticacomumemprotes - cários atingidoseoincêndiodeônibus–que trar onúmero significativo deagentespeniten- ataques foram diversificadas. Importante regis- os alvos foramampliadoseasmodalidadesde mesma dimensãodestes.Nessa terceira onda, ridos no mês maio, sem alcançar, contudo, a tensidade dosataquesemrelação àquelesocor- . Após12/07/2006 – quarta-feira exatos 12-17 dejulho.Nova ondade449ata- Julho. No iníciodomês,foramassassina- Neste aumento da in- momento observa-se Momento 3,julho:ampliaçãodosalvos, malmente. O novo advogado deMarcola, do coletivos voltaramtransportes acircular nor- Os buidoras deenergia,emestado dealerta. gia, oquecolocouaAESEletropaulo, distri- eletricidade, fiosetransformadores deener- era atearfogoempneuspróximos apostesde para osataques.Uma dasideiasdoscriminosos trou emRibeirãoPreto comregras umacarta ciais eatéumaestaçãodetratamentoágua. supermercados, bancos,unidadespoli- fóruns, foram atacados. Os alvos se repetiram: ônibus, Preto. trabalhistasnointerior Ao todo,9fóruns giões de Campinas, Vale do Paraíba e Ribeirão No interiorosataquesseconcentraramnasre- Estado. Na capital eles foram menos intensos. os ataquesforammaisintensosnointeriordo cidade esuperlotandotrens emetrôs. Dessa vez pé, causandoumenormecongestionamentona ataques deixou maisde2milhõespessoasa de suafrota emcirculação. Omedodenovos emSãoravam Paulo oserviço colocaramparte do PCC,somente4das16empresas queope- bus incendiados,sendoestesosalvos preferidos mais de30ônibus. sensação deinsegurança.Foram incendiados tão, maisalvos civis,paraassimaumentara Filho, oPCCmudousuatática,atacando,en- de Segurança Pública, Saulo deCastro Abreu capital, foramatacados.Segundo osecretário municípios da Grande São Paulo, incluindo a abrangeram 30cidadesemtodooEstado;10 Paulo foramrealizadas 63ações.Os ataques mas nãoconseguiuimpedi-los.Na Grande São anterior, terça-feira, sobre osnovos ataques, os ataques.Apolíciafoiinformada,nanoite 14/07/06 – sexta-feira. A policia - encon 13/07/2006 –quinta-feira.Com46ôni- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 chando com o sequestro do repórter chando comosequestro dorepórter va acontecendoemSão Paulo. relação comosataqueselamentouoqueesta- líder dafacçãocriminosa,nãotinhanenhuma PCC, afirmouqueseuclientenãoeramaiso suspeitos presos pelapolícia eseismortos bancos epostosdegasolina,resultando em33 ram 167ataquesnoEstado,incluindoônibus, Secretaria deJustiça e Cidadania.No total,fo- Estado daFazenda easeçãode Transporte da dios do Ministério Público, da Secretaria de rior e 8 na capital, onde a polícia encontrou do PCC.Foram registrados 54casosnointe- rior doEstadofoialvo preferencial dosataques pode termotivado osataques. Araraquara, Itirapina e Mirandópolis também Além dasituaçãodospresídios edospresos de tanduvas (PR)podetersidoumdos motivos. escalão doPCCparaopresídio federaldeCa- possível transferência dehomensdosegundo mil homensseriambeneficiados.Ainda,uma nova ondadeataques doPCC–cerca de10 sídios) de Dia dos Pais pode ter sido a causa da suspensão doindulto(saídaprovisória dospre- sivos foram utilizadosnosataques.Apossível Armas, coquetéis molotov explo- e artefatos dos e um estacionamento próximo ao Deic. bus, bancos,postosdegasolina,supermerca - Foram 96ataquesem17cidades.Alvos: ôni- al, nocentro históricodacidadedeSão Paulo. realizado contraoMinistério Publico Estadu- maior destaquedanova ondadeatentadosfoi Nova ondadeataquesteve poralvo ospré- Momento 4,agosto:osúltimosatos,fe- 08/08/06 –terça-feira. Novamente ointe- 07/08/06 –segunda-feira.Oataquecom 10 . 125

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

126 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias dos acontecimentos de2006easensação geral estrapolou osmuros dasprisões.Agravidade ram simultaneamente, entretanto, acrise não por exemplo, 29 unidades prisionais se rebela- criminosas, especialmenteo PCC.Em 2001, gue deeventos anteriores atribuídosàs facções ação dogrupo. Portanova nãosofreu agressões. das eleições.Mas umaprecipitação acelerou a vídeo. Tal vídeodeveria serexibidopróximo jornalista foi liberado horas após a exibição do vídeo contendoasreinvidicações doPCC.O tradores exigiram que a emissora exibisse um elho foiliberadologoemseguida.Os seques- próxima àemissora,nacapital.Alexandre Co- trados pormembro doPCC,numapadaria nico Alexandre CoelhoCaladoforamseques- Globo Guilherme Portanova eoassistentetéc- mente destruído. Justiça foiincendiada e umcarro ficouparcial- capital, agaragemdaSecretária deEstadoda públicos foramalvos namaioriadasações. Na intensidade nointerior. Prédios efuncionários menor número deatentadosemanteve maior terceira ondadeataquesdoPCCregistrou o com asaídadeDia dosPais. evitar que113detentosfossembeneficiados subiu de2para7.OMinistério Público queria vos nointerior. Onúmero desuspeitosmortos guardas municipais, ônibus e bancos foram al- de julho. Prédios públicos,casasdepoliciaise uma granada que nãoexplodiu,naAvenida 9 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 É possível afirmarqueesseevento sedistin- *** 11/08/06 –sexta-feira.Ojornalista da TV . Oterceiro09/08/06 – quarta-feira diada liões emotins apósoanode2006. efeito maisvisível éadrásticaredução derebe- –edaestabilidadedasprisõescujo rupturas tenção deequilíbrio–frágil, sempre sujeitoà configuração deforças quepermite amanu- que sãofundamentaisparacompreender essa lista lidade que caracteriza o sistema prisional pau- processo aestabi- através doqualseconstruiu PAULO SÃO DE PRISÕES NAS PODER DE LIBRIO E NOVO O E PCC DO HEGEMONIA A der conformadonasprisõesdeSão Paulo. na compreensão deumnovo equilíbriodepo- do comolegado daquela crise, a resposta reside atuais. Se épossível falaremalgum aprendiza- das prisõespaulistas,equeperdura atéosdias ção deestabilidadesemprecedentes nahistória sentido, tem-seaconformaçãodeumasitua- administração prisional (DIAS, 2013). Nesse cer novos contornos às relações entre presos e de maio –, mas, principalmente, para estabele - momentos dacrise–essencialmente,oevento apenas parafazer arrefecer cadaumdesses4 que percebemos queelasforamessenciaisnão objetivo de colocarfimaosataques,ofatoé tivas envolvendo autoridadesepresos como sário estabelecerdiálogo,negociação,acordo. domaterialcoletado,foineces- fatos apartir fragmentos dasnarrativas edadescriçãodos tanto, peloquefoipossível depreender dos duais buscasseminterromper osataques.Para minada fizeram comqueasautoridadesesta- de insegurançaemedosocialmentedisse- Neste texto,nãovamos nosdetersobre o Qualquer quesejaonomedadoàstrata- 11 . Oobjetivo épontuaralgumasquestões QUI- tima década cuja expressão éaausênciaderebeliões naúl- estabilidade nosistemaprisionaldeSão Paulo, comum é umaunidadeprisionalderegime disciplinar prisional que,segundoasinformações oficiais, PCC pelas autoridadescomosendo“lideranças” do dos noRDD destacar oreduzido número depresos interna- tuar essaquestão. Em primeiro lugar, convém consideradas deformaconjunta,permitemsi- ção prisionalpaulista. ridades públicas,especialmentedaadministra- acomodações envolvendo os presos e as auto- uma “carta namanga” que permite produzir como prevê aLeiqueoinstitui–mas,sim, organizaçõescriminosas– para desarticular que oRDDsetornasse não uminstrumento nicação queeleimpõeaospresos fizeram com mento dapenaeamaiordificuldadedecomu- O rigordisciplinardesseregime decumpri- osistemaprisional(DIAS,2009). estruturam dasrelaçõestenção ouruptura depoderque (RDD) comoelementoessencialparaamanu- do Regimeportância Disciplinar Diferenciado tonio Ferreira Pinto, cujosecretário adjunto, e oficialda Polícia Militar de São Paulo An- xa ocargo. Assumeoex-promotor dejustiça Nagashi Furukawa, nocargodesde1999,dei- taria daAdministração Penitenciária (SAP), no finaldaquelemês,oentãotitularda Secre- sional apósosataquesdemaio2006.Ainda tiva mudançaocorridanaadministraçãopri- Podemos destacarduasevidênciasque, Primeiramente, destacaraim- importante É ainda importante considerarasignifica- É aindaimportante 13 estãoencarcerados emoutraunidade 14 . Em segundo lugar, ajámencionada 15 12 . . Inclusive ospresos apontados Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 dos como“lideranças” doPCC(DIAS, 2013). presos, notadamentealguns indivíduosaponta- autoridadades da administração prisional e os complexos processos envolvendo ogoverno, as tão daadministraçãoprisional epormúltiplos elas quaisforem, ocorreram danova apartir ges- isso, argumentamos que tais acomodações, sejam ainda três momentosapósesseepisódio. Com naquele mês; em segundo, os ataques tiveram tração prisionalfoisubstituídaporoutra,ainda terpretação: emprimeiro lugar, aquelaadminis- anos. que jáduradez eventos e, também,costurarumaestabilidade tro foicapaz decolocarumfimàsequência simbólico doqueindicativo dequeumencon - Marcola. Esseepisódiotalvez sejamuitomais como objetivo conversar comopreso devulgo tadual na área de segurança pública, que teria interior paulista,comacúpuladogoverno es- cionado antes,doaviãoquesedeslocaatéo da crisede2006. Trata-se doepisódio,men- emblemático ocorridoaindanomomento1 talvez nãopossaserexplicadopeloepisódio tual “acordo”, tal comocomumenteseaponta, em 2006.Oquesequersugeriréumeven - de poderquesedesenhaemSão Paulo, ainda sencial paracompreender anova conformação 2009; DIAS,2013). soas afastadasnagestãoanterior(TEIXEIRA, sua gestão,inclusive sendoassumidaporpes- sional mudoucompletamenteadireção de permanecesse omesmo,aadministraçãopri- de Nagashi. Ou seja,aindaqueogovernador espe, haviasido afastado noiníciodagestão Lourival Gomes, antigocoordenador daCo- Duas razões para colocar em dúvida essa in- A mudançaocorridanagestãodaSAPées- 127

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

128 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 nas prisõesdeSão Paulo a episódiosdesublevação, rebeliões oumotins cárceres, paradoxalmente nãoseassistiumais to dascadavez mais aviltantes condiçõesdos gradantes destesestabelecimentos;e,adespei- fundamento dascondiçõeshistoricamentede- aumento da superlotação nas prisõese oapro- nutenção doritmodeencarceramento, como nos ocorridosapósosataquesde2006:ama- compreender osseguintesfenôme- earticular nistração prisionalpaulistaeoPCCpermite ano. Asimbiosequeseestabeleceentre aadmi- 2006 equeseconsolidaaofinaldestemesmo formação dopoderqueemergeemmeadosde mais adequadoparacaracterizaranova con- guns presos (DIAS,2009;2013). pelo regime de cumprimento de pena deal- tais acomodaçõespassammuitofortemente prisional. Comojásugeridoanteriormente, garantindo a estabilidade e a“paz” nosistema privilegiado formasdeacomodaçõesquevêm cial anova administraçãoprisional,parece ter ação. Por outro, ogoverno paulista,emespe- necessidade deseadotarnovas estratégiasde dos nestetexto)–decorrentes dosataquesea militares, comomostramosdadosapresenta- número porpoliciais elevadíssimo demortos – financeiros e,essencialmente,pessoais(no geral ospoucosganhosemuitosprejuízos ção interna, a facção considerou de maneira lado, documentossugerem que,apósavalia- to ogoverno tiveram liçõesem2006.Por um sional nãoécapazdeoferecer obásicoparaa Simbiose (SHIMIZU,2011)éotermo Esse cenáriosugere quetantooPCCquan- Num cenárioemque aadministraçãopri- 1 . lações de poder no sistema prisional de São descritos, ocorreu umaconformaçãodasre- nal local presos entre sieestesaadministraçãoprisio- existentes dentro dasprisõesenvolvendo os de arbitragemtodosostiposconflitos ção deinstânciamediação,regulação e garantia da segurança e proteção e,nacondi- (maconha, cocaína,cigarro, bebidaalcoólica), tação, vestuário etc.),dedrogas lícitaseilícitas para ocumprimentodapena(higiene,alimen- através dosuprimentodemateriaisnecessários metida, inexoravelmente, aocontrole doPCC: que, pelascondiçõesdescritasantes,serásub- uma vez quemantémuma“clientela” cativa doPCC, elemento essencialnofortalecimento mesmo modo,oencarceramento massivo éum ceramento massivo tenha continuidade e, do dição necessáriaparaqueoprocesso deencar- de caos.Assim,ahegemoniadoPCCécon- forma, impor e garantiraordem numcenário ções deexercer controle sobre ospresos e,desta sistema prisionalpaulistaaapresentar condi- trada nacrisede2006,seriaoúnicoatorno PCC, cujahegemoniajáhaviasidodemons- descritas, oEstadonãotemessacapacidade.O (DIAS etal.,2015a).Pelas próprias condições tão edecontrole sobre apopulaçãocarcerária diretamente dependentedacapacidadedeges- dade doprocesso deencarceramento massivo é por maisvagas –apossibilidadedecontinui- penitenciário, aumentodecustos,demanda condições, redução daproporção preso/agente tema prisional–superlotação,precariedade das de aumentoconstantedaspressões sobre osis- manutenção dosindivíduossobsuacustódiae Em suma,apósoseventos de2006aqui 2 (DIASetal.,2015a;DIAS,2013). condições de se recompor e, assim, garantir a tudo, a conformação desta parece apresentar iminente.Con- oudeumaruptura ruptura percebidos sinais ou indícios de uma possível damente frágil,hajavistaqueregularmente são nas prisõespaulistas.Essaestabilidadeénota- crime” (FELTRAN, 2008)e,essencialmente, condição deatorhegemônicono“mundo do daordem.ruptura EstabilidadedoPCCna somente pouquíssimosepontuaiscasosde paulista, quenestaúltimadécadaapresentou tabilidade. Estabilidade do sistema prisional nais (DIAS,etal.,2015a;DIAS,2015b). Estado edeprecarização dascondiçõesprisio- em condiçõesdedificuldadeseconômicasdo dade doprocesso deencarceramento massivo do outro eambosconcorrem paraacontinui- um destes atores reforça diretamente o poder e aadministraçãoprisional,deformaquecada produz umasimbioseentre afacçãocriminosa da hegemonia do PCCnasprisõesestaduais e produndamente dependentedamanutenção administração prisional.Essaacomodaçãoé mente “representada” nafiguradoPCC–ea modação entre amassacarcerária –suposta- Paulo quetemcomoumadesuasbasesaaco- O principal efeito dessa simbiose é a es- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 tição de2006. a impossibilidadeouimprobalidade darepe- do PCCeagarantiadaordem prisional,istoé, mento emmassa,amanutençãodahegemonia tado numtripé:acontinuidadedoencarcera - equilíbrio –frágil,precário –queestáassen- estratégias (DIAS,2009)queproduziram um até entãoeenvolveram complexasemúltiplas ídas emtermosdiferentes daquelespresentes sentido, as relações- de poder foram constru eventual repetição, porambososlados.Nesse quele momentoedaindesejabilidadedeuma do houve um reconhecimento doextremo da- quanto dopontodevistagoverno doEsta- afirmar quetantodopontodevistaPCC prisional nasequênciadosataques.Épossível a acomodação entre oPCC e aadministração prisional paulista e os processos que indicam configuração das relações depodernosistema de 2006, é necessário ter em conta toda essa re- de umeventual aprendizado da crise apartir to massivo. daordemrupturas nasprisões,encarceramen- doPCC,ausênciade prisões, fortalecimento sivo, superlotação, condições degradantes nas continuidade dociclo:encarceramento mas-

Por fim,quandosecolocaaquestão 129

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

130 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 17. 16. 15. 14. 13. 12. 11. 10. 9. 8. 7. 6. 5. 4. 3. 2. 1. Documentos analisadosapontam adimensãomicroscópica docontrole exercido peloPCC dentro dasprisõesdeSãoPaulo. esse episódio, ver DiasEtal.,2015b. envolveu osistema prisional-adespeito dasprisõespaulistasnão terem sidoolócus deondepartiram asdiretrizes Sobre dasaçõesdoPCC. crise a vez, desta e, PCC o e paulo São de Estado do Governo o envolvendo crise outra ocorreu 2012 em que destacar Importante e com oMinistério Público Estadual). acordo comde pesquisadores paulistas, unidades de totalcontroladasPCC(cerca do são pelo 10% não de que prisionais poucasunidades Nestes últimosdez anosforam registradas poucas epontuais rebeliões nasprisõespaulistas. Algunsdesses episódiosisoladosocorreram nas ver Dias,Silvestre, Salla, 2012. regime comum. Para umadiscussão sobre aambiguidadeeausênciadeumenquadramento legalounormativo dessa unidadeprisional Trata-se daPenitenciária dePresidente Venceslau IIe,conforme asinformações disponiveis napáginaeletronica daSAP, umaunidadede paulista (caraterizado pelapresença doPCC) eaadministração daaplicação oudanãoaplicação dodispositivo legal.Ver Dias,2009. disjunção política entre o dispositivo legal (que prevê o seu uso para “desarticular organizações criminosas”), a situação do sistema prisional a focalizar é relevante parece nos que o Aqui, cruel”. “pena configurar como se mesmo podendo especialistas, indicam como discutíveis, como lideranças esta assertiva doPCC, nãosetraduz emaquiescência aesse regime, cuja constitucionalidade elegalidadesãobastante autoridades pelas identificados presos, de comum regime no permanência a e RDD no ausência a apontarmos ao que registrarConvém Penitenciária (CRP)dePresidente Bernardes. procurando a única unidade prisional em que oficialmente – conforme os dados da propriaSAP – o RDD é aplicado, o Centro de Reabilitação http://www.sap.sp.gov.br,em feitas ser podem consultas As 2006. de crise a após período no registrada quantidade maior a presos, 83 havia 01/08/2016, em 03/01/2011; em 60 09/09/2010; em presos 02 27/05/2009; em presos 35 exemplo: de título A presos. 160 de prisional, unidade da capacidade à relação em baixa sempre tendência uma e número neste variação uma verifica-se estabelecimento, Em consultas períodicas realizadas nosite daSecretaria deAdministração Penitenciária deSãoPaulo, queinforma ototal depresos emcada construída podemseracessados emDias(2013). foi poder de configuração essa que em político e social processo o sobre texto.Detalhes no exposto Paulo,seráconforme São de prisões das estabilidade a peremptória forma de confirmar pode-se 2016, de meados escrito, é texto esse que em momento o até menos Pelo Mesquita Neto, Paulo Fernando, eSalla, citado. Ver também Souza CEPID/USP. Apud Mesquita Neto, Paulo Fernando. eSalla, Acrise da segurança pública de maio2006:umano depois. Paper. NEV- SãoPaulo: Para maisinformações sobre oRDD, ver Dias(2009). 2007,p.CONDEPE, 41.Os demaisdadosforam fornecidos pelaimprensa enecessitam serrevisados. Os dadossobre mortos foram extraídos doRelatório daTabela doConselho Regional deMedicinadoEstado deSãoPaulo, A, citado. In: em resultou que acordo havido atendimento parcial dasreivindicações apartirdoqualcúpuladaorganização doPCC, ordenou ofimdosataques. ter confirmou Marcola Armas, de Tráfico do CPI à depoimento em tarde, Mais entendimentos. porém que o governo estadual hesitou em continuar negando. Preferiu minimizar o evento, afirmando que não se tratava de acordo ou negociação, Embora tenha inicialmente negado, nosdiasqueseseguiram asevidências davisita daadvogada foram setornando tãofortes naimprensa ataques e78rebeliões. Ver: domingo,125 comno mortos os Unesp,68 eramSegurançada Pública de Observatório do site no disponívelcronologia acordoa comDe e Alejandro Herbas, oJúnior. Julinho Carambola; Rogério Jeremias deSimone,oGegêdoMangue;DavidStockel Maluf, Ulhoa oMacgayver; JoséCarlos Rabelo, oPateta; Entre as lideranças, contam-se: Marcos Williams Herbeas Camacho, o Marcola (apelidado também de “playboy”); Júlio Guedes de Moraes, o aprofundar aquiessa reflexão. coletado eumtratamento crítico sobre aimprensa como fonte. Emrazão delimitações deespaço edoescopo deste texto, nãoserá possível material do detalhamento maior há que em trabalho (2013), Dias em descrita pesquisa da âmbito no construído foi dados de banco O Esses parágrafos iniciaisresumem descriçãocontida originalmente(2007). emAdornoeSalla São Paulo e,apartirdaí,avaliar seusefeitos nasprisõesdoEstado. ou membros do IssoPCC. quer dizer que, aqui, importa configurar esse evento como uma “crise” sem precedentes na segurança pública de é analisar os impactos dessa crise no sistema lo, v. 9, n.2, ago./set. 2015b, p. 160-179. caso. de estudo um 2012: de crise na Paulo São de politana Metro Região na execuções de prática A al. ______et de2016. julho 17 em: Acesso -como-politica-de-seguranca?page=full>. br/materias/nacional/o-encarceramento-em-massa-

um estudo sobre política política sobre estudo um A crise da segu- – políti- - - -

131

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração Artigos de poder nas prisões na última década

132 Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Palabras clave: dependencia mutua. por el gobierno delEstado, generando uncírculo viciosode del PCC ydelapolítica deencarcelamiento masivo adoptada simbiótico através delqueocurre elfortalecimiento mutuo el PCC ylaadministración deprisionesasumieron uncarácter entre relaciones la establecieron se como forma La prisiones”. las en “orden el mantener para eficiente sido ha ahora hasta produjeron unequilibrioque,aunqueprecario einestable, administración deprisiones.Tales acomodaciones, asuvez, la construcción deacomodaciones involucrando elPCC yla posibilitar para reconfiguradas fueron Paulo São de estado del través de las cuales las relaciones de poder en las prisiones estatal. Deesamanera, indicamos estrategias complejas a organización ytrujoimportantes perjuiciospolíticos algobierno la para ganancias en implicó no PCC” – Capital la de Comando que fue nacionalmente conocido como los “Ataques del Primer evento el que es central argumento El período. ese de final al y políticos registrados enlasprisionesdelestado deSãoPaulo sociales cambios los reflexiones sobre algunas luego,proponer correspondientes alosmomentosocurren, enqueellos y, partes, cuatro en división su de partir a 2006” de “Ataques los El objetivo del presente texto es reconstituir la cronología de última en la nueva década la las prisiones y en 2006” poder de de configuración “Ataques los de Cronología Resumen Sérgio AdornoeCamilaNunes Dias configuração depodernasprisões naúltimadécada Cronologia dos“Ataques de2006”eanova Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 prisiones. Prisión.Poder. Ataques Administración de de 2006. PCC. mutual dependence. by the government of the State, creating a vicious circle of of thePCC and of themass imprisonment policyadopted symbiotic nature thatpromoted themutualstrengthening the PCC theprisonadministration were formed took ona the prisons”. The manner in which the relationships between unstable, has so far proven effective for maintaining “order in turn, produced abalance which althoughprecarious and the PCC andprisonadministration. Thesecompromises, in restructured to allow construction of compromises involving by whichthepower relationship inSãoPaulo prisonswas State government. Thus, complex strategies are described the organization andhadmajorpolitical repercussions for the of the First Command of the Capital – PCC” led to no gains for “Attacks the as known nationally became which event the Paulo prisonsintheaftermath. Thecentral argument isthat inSão evident changes andpolitical social the on reflect parts according to when they occurred and to subsequently four into events dividing by Attacks” “2006 the of timeline The objective of thepresent text was to reconstruct the in prisonsover thelast decade structurepower new the and Attacks” “2006 of Timeline Keywords: Power. Abstract 2006 attacks. PCC. Prisonadministration.Prison.2006 attacks. PCC. Data derecebimento: Data deaprovação: 26/08/2016 05/06/2016 Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 118-132, Ago/Set 2016 133

Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias Artigos O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 134 trabalho policial e contradições nocotidiano do O herói-envergonhado: tensões Vargas -EAESP-FGV. Mestre emAdministração pelaUFUepeloCentro Universitário deFranca (2002). de Uberlândia-UFU. Doutora emAdministração pelaEscola deAdministração deEmpresas deSãoPaulo daFundação Getúlio Professora IIdoscursos deGraduação Ajunta ePós- Graduação daFaculdade deGestãoeNegóciosdaUniversidade Federal Cintia Rodrigues deOliveira Medeiros pela EAESP-FGV. Graduado emAdministração deEmpresas pelaEscola SuperiordePropaganda eMarketing -ESPM. pleno doFórum Brasileiro deSegurança Pública. Ph.DpelaManchester Business School. Mestre emAdministração deEmpresas Professor Adjunto daEscola deAdministração deEmpresas deSãoPaulo daFundação Getúlio Vargas -EAESP-FGV. Associado Rafael AlcadipanidaSilveira Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 Trabalho policial. Significações notrabalho. de“serpolicial”. Mal-estar Palavras-Chave sentimentos ecom ocontexto amplodotrabalho. seus histórias, suas vivências, suas com relacionam se que significações de conjunto um de constituem se sim, mas, os significados do trabalho atribuídos por policiais não se resumem aos referenciais positivos que valorizam a atividade, positivos e negativos, pois o significado é construído e reconstruído conforme o contexto social. Os resultados indicam que e as noções de mal-estar no trabalho. Nosso argumento é que os significados atribuídos ao trabalho contêm referenciais enchido por 305 respondentes. Para essa análise, tomamos como base os modelos teóricos sobre significado do trabalho trabalho policialnoBrasil, conduzimos umapesquisaqualitativa analisandoasrespostason-line deumformulário ao atribuem policiais que significados de reprodução e produção a compreender de objetivo o com pesquisa, Nesta Resumo [email protected] [email protected] pre - Artigos

Introdução

trabalho assumiu importância para a O significado do trabalho se constituiu como Ovida humana ao longo da história do campo de estudos recebendo contribuições de mundo, e, a despeito das mudanças ocorridas uma variedade de perspectivas teóricas originadas no modo de organização do trabalho, as quais da sociologia, da psicologia social do trabalho, da Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael apontam para a emergência de um novo para- socioeconomia e economia do trabalho, entre ou- digma (ANTUNES, 1995; RIFKIN, 1996), tros (ARDICHVILI; KUCHINKE, 2009). De ele ainda permanece como categoria central no modo geral, as tradições de pesquisas desse campo modo de vida contemporâneo. De acordo com se orientam pelos aspectos positivos do significa- a literatura especializada, o trabalho é conside- do do trabalho, como a sua importância para a rado central na vida humana por prover as ne- realização do indivíduo; no entanto, a experiência cessidades para a subsistência, fontes de identi- humana relacionada ao trabalho pode ser caracte- dade, oportunidades de realização e determinar rizada tanto pela satisfação, orgulho, exuberância padrões de status em uma comunidade mais e prazer, como pelo desapontamento, pesar, an- ampla (KUCHINKE et al., 2009), o que refle- gústia, desespero e sofrimento (ARDICHVILI; O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: te, também, as escolhas individuais de carreira KUCHINKE, 2009). e educação (HARPAZ; HONIG, COETSIER, 2002; WESTWOOD, LOK, 2003). Assim, o O trabalho policial é relacionado com as ati- significado atribuído ao trabalho, que trans- vidades do Estado voltadas para a segurança e cende modelos individuais de referência, exerce tranquilidade públicas e, como tal, é percebido influência no modo pelo qual o indivíduo inte- como um instrumento para legitimar a auto- rage socialmente, o que lhe confere importância ridade estatal (MONET, 2006; PONCIONI, como objeto de estudo. 2007; SANDES, DURANTE, 2009). Essa

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 135 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 136 significados Abordagens sobre o trabalho resultados efazemos nossasconsiderações. resultados encontrados.Ao final,discutimosos os procedimentos depesquisaeapresentamos os mal-estar notrabalho. Em seguida,descrevemos cas sobre o significado do trabalho e as noções de (GIBBS, 2009). ticas identificadasnoprocesso decodificação do asrespostas conformeastemá- agrupadas on-line preenchido por305respondentes, sen- composto pelasrespostas deumformulário mos umapesquisaqualitativa, cujocorpus é perspectiva depoliciais.Para tanto,conduzi- significados dotrabalhopolicialno Brasil, na do compreender aprodução ereprodução de teóricos designificadodotrabalho,buscan- -estar no trabalho e as dimensões dos modelos é serpolicial considerando as noçõesdemal- comuns àprofissão queescolheram. e identificação, valorespertencimento e crenças sentimentos de de trabalho, compartilhando trabalhadores quedesenvolvem umprocesso caberia executar”. No entanto,ospoliciaissão um jogodepodermaisessencialqueaelessó e ospoliciaisaparecem ‘apassivados’ diantede siderado como sujeito, ou seja, “[...] a polícia me Muniz (1999,p. 41),opolicialédescon- acadêmicos sobre apolícia,nosquais,confor- perspectiva temsidopredominante nosestudos Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 cebendo contribuições conceituaiseteóricas dada porumavariedade deabordagens, re- sofrimento Inicialmente, discutimosasperspectivas teóri- Nessa direção, nossapesquisa analisa o que A temáticasignificadodo trabalho éestu- , voca ção , mal -estar e : tados, que a centralidade do trabalho está sujeita tados, queacentralidade dotrabalhoestásujeita al. (2009), que identificaram, entre outros resul- sier (2002),Harpaz eFu (2002)e de Kuchinke et ções, entre as quais as de Harpaz, Honig e Coet- (MOW, 1987), queresultou emoutraspublica- realizou umapesquisaconsiderandooitonações campo deestudosdosignificadotrabalho,que Research Team (MOWIRT), umareferência no (2003) citamoMeaningof Work International Como exceção aessalacuna, Westwood eLok nados às atitudesdos indivíduos no trabalho. culturais sejamconsideradasemestudosrelacio- TWOOD; LOK, 2003),aindaqueasvariações - as implicaçõesdasdiferenças culturais(WES são raros os estudossobre otemaqueinvestigam fluenciados pelocontextosociocultural,porém, policiais àsatividadesquedesempenham. a compreensão dossignificadosatribuídospor 1976), perspectiva adotada nesta pesquisa para vem (MEAD, 1934;GEERTZ, 1973;MILLS, dos pelossistemassociaiseculturaisemquevi- coisas eàssuasexperiênciasdevidasinfluencia- duos atribuemmaioroumenorsignificadoàs 2003). Já noâmbitoda sociologia, osindiví- e interaçõesnotrabalho(WRZESNIEWSKI, subjetivas dosindivíduosdassuasexperiências significados são originadas das interpretações tiva seapoianapsicologia,aspercepções de organizacional,cujaperspec- comportamento a vidahumana(GILL,1999).Nos estudosdo cuniários, dandoênfaseàsuacentralidadepara social voltam-se para os seusaspectosnão pe- fazer dinheiro; jáasociologiaepsicologia de nomia, otrabalhosignificaaoportunidade DICHVILI; KUCHINKE,2009).Para aeco- com aidentidadeeescolhasdecarreira (AR- sobre ascondiçõesdetrabalhoesuarelação Os significados queotrabalhoadquire sãoin- a variações culturais. Desse modo, é possível que trabalho1. Morin (2004), por exemplo, utiliza os significados que os indivíduos atribuem ao o termo meaning of work, traduzido no Brasil que fazem sejam dependentes das relações sociais como “sentidos do trabalho” (MORIN, 2001), entre esses e o meio em que vivem, tendo caráter para se referir à significância que o sujeito atri- dinâmico e multifacetado. Para o MOW (1987), bui ao trabalho que realiza, suas representações Artigos os significados que as pessoas atribuem ao traba- e a importância que assume na sua vida. Já o lho estão relacionados com a institucionalização termo significado do trabalho refere-se ao valor do trabalho na sociedade e, também, com ou- da significância que alguma coisa, neste contex- tros papéis sociais que o indivíduo desempenha; to, o trabalho, tem para um indivíduo (PRATT; portanto, os padrões de significados do trabalho ASHFORTH, 2003). Conforme Rosso, Dekas podem afetar as estruturas sociais e, consequen- e Wrzesniewski (2010), o valor de significância temente, as organizações. percebida pode variar, pois, dependendo da ex- periência individual, o trabalho pode ser uma A pesquisa do MOW (1987) e a maioria dos experiência extremamente significativa ou nada pesquisadores da área concentram-se em quatro significativa. O fato é que o modo como os ter- principais dimensões do significado do traba- mos estão relacionados e são utilizados na litera- lho: (1) sua centralidade – grau da importância tura provoca sobreposições e, frequentemente, conferida à vida do indivíduo e a importância uma confusão conceitual (ROSSO; DEKAS; relativa do trabalho quando comparado com WRZESNIEWSKI, 2010). outras esferas da sua vida; (2) suas normas so- ciais – direitos e obrigações para com a socie- Outra diferença entre os dois termos é ex- Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael dade percebidos como associados ao trabalho plicada por Tolfo e Piccinini (2007, p. 44): “Os executado; (3) a importância dos seus objeti- significados são construídos coletivamente em vos – finalidade do trabalho para o indivíduo; um determinado contexto histórico, econômico e (4) os resultados valorizados – aquilo que as e social concreto, ao passo que os sentidos são pessoas buscam obter com o trabalho. Essas caracterizados por ser uma produção pessoal em dimensões são influenciadas por fatores socio- função da apreensão individual dos significados demográficos, educação e socialização, e, ainda, coletivos, nas experiências do cotidiano”. podem ter seus valores modificados ao longo da trajetória de vida do indivíduo, dependendo das A despeito das diferenças entre os dois ter- suas experiências de trabalho. mos, as tradições de pesquisas de ambos se O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: orientam para o estudo do modo como os em- A diversidade de perspectivas resulta em pregados encontram significados positivos no contribuições e debates, incluindo um quadro seu trabalho, as fontes de significado no tra- conceitual composto por termos utilizados, balho (ROSSO; DEKAS; WRZESNIEWSKI, muitas vezes, de forma intercambiável, como 2010) e aquilo que é tipicamente considerado faz o MOWIRT, a despeito de suas diferenças indesejável no trabalho (WRZESNIEWSKI, (TOLFO, PICCININI, 2007; ARDICHVILI, 2003). No entanto, Brief e Nord (1990) e Wr- KUCHINKE, 2009): sentidos e significados do zesniewski (2003) entendem que os significados

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 137 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 138 vidas àsatividades deoraçãoecontemplação aDeus dedicandosuas e padres queserviam lizada para referir-se ao trabalho de monges A vocação temorigensreligiosas, sendo uti- profissional, assumindoconotações diversas. ção nosdebatesnaárea deeducaçãoformale trabalho socialmenteútil. (calling) dizrespeito aoprazer emrealizar um da comocrescimento profissional ea vocação a serem preenchidas. Acarreira estárelaciona- com as recompensas financeiras e necessidades ou comumladoprincipaldavida,mas,sim, não estárelacionado comprazer ousatisfação go, umacarreira ouumavocação. Oemprego das pessoas vê seutrabalhocomo um empre- cando evidênciasqueindicamamaioria os significadospositivos dotrabalho,identifi- (2003) têmumaorientaçãodepesquisapara lazer (GILL, 1999). nomia do trabalho ele é associado à perda do CHINKE, 2009), enquanto no campo da eco- desespero e sofrimento (ARDICHVILI; KU- balho comodesapontamento, pesar, angústia, gligenciando dimensõesqueassociamotra- 2004; STEGER,DIK,DUFFY, 2012),ne- nificados (CODA,FONSECA FALCONE, orientadas paraosaspectospositivos dossig- vêm sendodesenvolvidas, principalmente, organizacionalaspesquisas comportamento bre significadosdotrabalhonocampo gativas ouneutras. inclusive notrabalho,podemserpositivas, ne- que aspessoasatribuemàssuasexperiências, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 O termo vocação tem sido uma preocupa- Wrzesniewski etal.(1997)e Wrzesniewski De modomaisespecífico,nosestudosso- (ANTUNES, 1995), otrabalhadorsevê de- do capitalsobre aforça humanadetrabalho cas (SENNET, 2006),prevalecendo a lógica social eaprofunda asdesigualdadeseconômi - revolução tecnológica resulta em instabilidade crescimento dasinstituiçõesocasionadopela tanto, no contexto contemporâneo, em que o o trabalhadorconfere aoseutrabalho. No en- está relacionado ouaovalor que à importância positiva, mesmoporque otermosignificado dos atribuídosaotrabalhoemumaperspectiva das normas. descompromisso com os fins e naobservância Portanto, avocação estánaimparcialidade, no ‘vocação’ dapolítica” 2003,p. (WEBER, 124). dizer ‘apesar de tudo!’, aquele e só aquele tem a oferecer-lhe, aquelequepermaneçacapazde mesquinho paramerecer oqueelepretende se revele demasiadoestúpidoou que omundo,julgadodeseupontovista, convencido dequenãoseabateránemmesmo política é encontrada naquele que “[...] esteja vicção pessoal.Para osociólogo,avocação da ca, apresenta adefiniçãode vocação comocon- cia nomundomodernoeoconceitodepolíti- 2000). LAENDER, no é, em sua essência, um trabalhador (MEI- pensamento entãocorrente dequeoserhuma- mem desatisfaçãoedignidade,reforçando o o trabalhoocupacionalcapazdeprover oho- o termo vocação passou a ser associado com assumido adimensãocentraldavidahumana, dor, nosséculosXVIIIeXIX;tendootrabalho ficou com aexpansão do espírito empreende- (DAWSON, 2005).Essaconcepçãosemodi- Essas abordagens privilegiamossignifica - Weber (2003),aodiscutiropapeldaciên- safiado a prosperar em condições instáveis e O sofrimento no trabalho é colocado por fragmentadas (SENNET, 2006). Dejours (1993, 1994, 2004) como a vivência de experiências dolorosas, as quais são carac- Assim, em outra direção, surgem aborda- terizadas por sentimentos gerados no espaço gens que se concentram nos aspectos negativos entre os seus desejos e a ausência de possibili- Artigos do trabalho, como as emoções tóxicas (FROST, dade de realização. Esses sentimentos, angús- 2003), o sofrimento (DEJOURS, 1994) e o tia, medo e insegurança, conforme Dejours mal-estar no trabalho (FERREIRA; SEIDL, (2004), são apenas uma ponta do que significa 2009), entre outras, apontando para uma di- o sofrimento, pois, pior que isso, é a responsa- mensão do significado do trabalho pouco con- bilidade que o trabalhador assume por eles, o siderada na literatura específica da significação que pode levá-lo, inevitavelmente, a uma sen- e sentidos do trabalho. Frost (2003) chama sação de impotência e incapacidade. E mais, de emoções tóxicas as dores emocionais que, de que seu esforço e sua dedicação são inúteis segundo o autor, são inevitáveis no ambiente e descartáveis. laboral, pois no trabalho as pessoas lidam com escassez de recursos, competição e orçamentos, Diante das perspectivas que tratam dos as- entre outras limitações, não sendo possível, as- pectos positivos e negativos do trabalho, é pos- sim, que todos sejam felizes ao mesmo tempo. sível que ambas emerjam quando se abordam Ferreira e Seidl (2009), diante da ausência de os significados que o trabalhador atribui ao seu um corpo conceitual sobre mal-estar no traba- trabalho, a exemplo dos resultados da pesquisa lho, utilizam-se dos estudos sobre o bem-estar de Mills (1976) em que o autor identifica que Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael no trabalho (BET) para pesquisar o que cha- o trabalho, ao longo da história da humanida- mam de “reverso da medalha”, ou seja, a outra de, esteve mais relacionado à pena e ao sofri- faceta do trabalho. mento do que ao prazer. E é na concordância de que os significados que o indivíduo atribui A abordagem de Dejours (1994, 1998, ao trabalho são influenciados pelo contexto 2000) estimulou estudos nos anos 1980, na sociocultural e histórico e, ainda, que estes França, que se alinham à perspectiva da psico- não estão concentrados em um único pólo – dinâmica do trabalho para pesquisar os impac- já que, para Dejours (2000, 2004), o prazer tos do trabalho na saúde psíquica dos trabalha- no trabalho pode estar acompanhado de sofri- dores. Ao colocar a subjetividade do trabalha- mento –, que nossa análise procura compreen- O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: dor no centro, as contribuições da abordagem der a produção e reprodução dos significados dejouriana proporcionam a compreensão das que os policiais atribuem ao seu trabalho, con- relações estabelecidas entre prazer, sofrimento forme descrevemos a seguir. e trabalho, considerando a interação entre as condições de trabalho e seus impactos na saú- Pesquisas sobre o trabalho policial de mental dos trabalhadores, visto que rejeita a A profissão policial carrega em si muita com- ideia da separação clássica de dentro e fora do plexidade. De um lado, o risco e o perigo são trabalho (DEJOURS, 2004). inerentes ao trabalho policial, o que se estende

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 139 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 140 cial, a integridade física e mental dos membros cial, aintegridade físicaementaldosmembros deexigênciasespecíficas dafunçãopoli- virtude sujeita ariscoseperigoscotidianamente, e,em resultados dessaspesquisas, acarreira policialé LIMA, 2012),entre outros. De acordo comos fasagem daorganizaçãoburocrática (ARAÚJO; al., 2012; MINAYO, ADORNO, 2013), a de- NAYO, CONSTANTINO, et 2007;SOUZA MINAYO,(SOUZA, 2005;BEZERRA,MI- CONSTANTINO, 2013),riscoseinsegurança em policiais mulheres (BEZERRA; MINAYO; CHIETA etal.,2011),estresse ocupacional sofrimento eadoecimentonotrabalho(AN- em policiaismilitares (DANTAS etal.,2010), DE, MERLO, 2006;LIMA,2003),estresse saúde mental(AMADORetal.,2002;SPO- policial (MOREIRA et al., 1999), prejuízos à sobre representações docotidianotrabalho natureza da atividade,como,porexemplo, quências emocionaisefísicasdecorrentes da modo geral, apontam para as graves conse- CONSTANTINO, 2008). em geral(FRAGA, 2006;MINAYO, SOUZA, em umaimagemdesvalorizada daforça policial ação policial,pelascondutasamorais,resultando da também negativa, pelaviolênciaetruculência culada nosmeiosdecomunicaçãoumaforma 2002). Por outro lado,aatividadepolicialévei - determinação esacrifício(BRETAS, 1997;SÁ, à profissão policialumaauradehonra,orgulho, goria (MILLER,2006).Essesfatores conferem 2003), sendoaltasastaxasdesuicídionestacate- (ANCHIETA etal.,2011;MINAYO, SOUZA, problemas desaúdeordem físicaepsíquica ses profissionais estão mais vulneráveis adiversos 2010; ANCHIETA etal.,2011);alémdisso,es- à suafamília(DERENUSSON, JABLONSKI, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 As pesquisassobre otrabalhopolicial,de to profissional dessa categoria no Brasil, o qual zação egestãodotrabalho. tanto emtermosmateriaisbem comodeorgani- e homicídio;(e)condiçõesdetrabalhoprecárias, ferimentos, agressão física,tentativa desuicídio suas atividades,porvivenciar violênciascomo (d) os policiais são vítimas do desempenho de no trabalho pelafaltade reconhecimento social; lho policialénegativa, oqueimplicasofrimento dos policiais;(c)aopiniãopúblicasobre otraba- o mesmoacontececomriscoeavitimização lhador nãotemrecebido aatençãomerecida; (b) citadas: (a)asaúdedopolicialenquantotraba- aqueles encontradosempesquisas anteriormente zem resultados que,demodogeral,resumem entre casaetrabalho. e esconderouniformeoudistintivo notrajeto coletivo pondentes afirmouevitarotransporte rias detrabalho. os res Ainda,amaiorparte - da sociedadeedocomando,condiçõesprecá- colegas vitimados,insegurança,faltadeapoio sua família,acusaçõesinjustas,discriminação, ameaça àsuavida,bemcomoademembros da bros e sua família. Entre essas consequências, a reta graves consequênciasparaosseusmem- (2015), mostrou queaprofissão policialacar- ca”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública profissionais dosistemadesegurançapúbli- ências, comohomicídiosesuicídios. tensões, transtornosàsaúdeeoutrasconsequ- eventos criminososeilegais.Essecontextocausa ainda expostoscotidianamenteàviolênciaea da força policialficamsujeitasariscos,sendo Assim, nãosepodedesconsiderar ocontex- Bezerra, Minyao eConstantino(2007)tra- A “Pesquisa devitimizaçãoriscoentre é caracterizado por pressões inerentes à atividade de trabalho do policial civil, a motivação para policial, tanto pelas expectativas de segurança da permanecer na corporação, as tarefas e ativida- sociedade, dos governos, agências e, também, dos des da profissão, os relacionamentos desenvol- membros da categoria. Trata-se de uma catego- vidos na polícia, o ambiente de trabalho e sua ria profissional que convive com a violência real relação com a vontade de ser policial, e, por Artigos (materializada pelos índices de homicídios, sui- fim, o respeito e a admiração das pessoas que cídios, injúrias físicas) e com a violência invisível ajudam no dia a dia. (originada da tensão cotidiana e manifestada no plano psíquico), devendo corresponder a anseios O link para acesso ao formulário foi en- e pressões sociais e governamentais (SOUZA et viado como um link por grupos do aplicativo al., 2012), configurando-se na situação de traba- WhatsApp, tendo sido respondido, no período lhadores que buscam ser bem-sucedidos em con- de 20 de janeiro a 15 de fevereiro de 2015, dições desafiadoras. por 305 membros dessa força policial, em di- ferentes cidades do Brasil, sendo: 16 agentes Procedimentos de pesquisa de polícia, 6 agentes de telecomunicações, 1 Esta pesquisa é parte integrante de um pro- auxiliar papiloscopista, 5 carcereiros, 185 de- jeto mais amplo, no qual um dos autores reali- legados, 21 escrivães, 3 fotógrafos técnicos- zou uma etnografia em polícia estadual de uma -pericial, 60 investigadores, 1 papiloscopista grande cidade brasileira, durante três anos. policial, 1 perito criminal, 5 agentes e 1 pessoa Isso indica que o autor possui conhecimento que não identificou sua função. As respostas expressivo a respeito do que é ser policial nes- foram opcionais e anônimas, sendo os respon- Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael sa instituição, o que possibilita a utilização do dentes identificados na pesquisa pela sigla RF formulário para perguntas qualitativas, uma (respondente do formulário), seguida do nú- vez que o pesquisador possui profundo co- mero sequencial. O relatório com as respostas nhecimento do cotidiano da polícia. Com o resultou em 196 laudas impressas. objetivo de analisar os significados do trabalho policial atribuídos pelos respondentes da pes- Para a análise do material empírico foi em- quisa, nós utilizamos de uma abordagem qua- pregado o processo analítico de codificação, litativa de matriz interpretativista. que consiste em “[...] identificar uma ou mais passagens do texto que exemplifiquem alguma O material empírico analisado foi gerado a ideia temática e ligá-las a um código” (GIBBS, O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: partir das respostas obtidas de um formulário 2009, p. 77), o que permite acessar os textos on-line estruturado em duas partes. A primei- codificados de forma semelhante. Inicialmen- ra solicitava informações sobre a função que o te, foi realizada a leitura do material, a qual respondente desempenhava e o tempo de tra- permitiu identificar questões norteadoras sobre balho, o qual variou de 1 ano e 9 meses a 38 os aspectos positivos e negativos relacionados anos. A segunda parte continha questões sobre ao trabalho nos depoimentos dos participantes a motivação inicial para ingresso na polícia, da pesquisa. Concluída essa etapa, prossegui- as condições atuais de trabalho, o cotidiano mos com a etapa de codificação, que envolveu

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 141 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 142 policial confere status,sendoum“trabalho im- São expressões indicativas dequeaatividade fender osfracos” , “proteger apopulação”, na força policial foimotivado pelodesejode herói quando mencionaram que o seu ingresso buíram aotrabalhopolicialosignificadodeser nência nacarreira policial.Os entrevistados atri- apresentarem motivos para o ingresso e perma- as expressões dosentrevistados mencionadasao ciais positivos dosignificadotrabalho,estão honrado” Ser policialé“serher correspondem àstemáticasidentificadas. trabalho atribuídos pelos respondentes, que designificadosdo sentamos seteagrupamentos pesar, angústiaesofrimento. Nesta seção,apre- que associamotrabalhoadesapontamento, gativos (ARDICHVILI; KUCHINKE,2009) GER, DIK,DUFFY, 2012)eporaspectosne- (CODA, FONSECAFALCONE, 2004;STE- podendo semanifestarporaspectospositivos dos pelocontextosocioculturalemquevivem, destapesquisa, sãoinfluencia- participantes Ser policialé... lho paraembasarnossaanálise. do trabalho e as noções de mal-estar no traba- dimensões dosmodelosteóricosdesignificado Por fim,interpretamos omaterialutilizandoas ticipantes dapesquisaatribuíamaotrabalho. os significados que os policiais par- agrupam categorias, descritasnaseçãoseguinte,que seleção deregras deenumeraçãoeescolha individuais para cada questão do formulário), a escolha de unidades de registro (respostas Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 Nesse quecontémreferen agrupamento, - Os significados de “ser policial”, paraos “vontade omundo” deconsertar . “combater ocrime” , ói, dignoe “de - democrático de direito”, pantes emexpressões como“garantir oEstado - 2003), a vocação foi mencionada pelos partici tendida comoaéticadaconvicção(WEBER, balho pelos policiais é de natureza digna. En- indicando queosignificadoatribuídoaotra- das motivações paraoingresso nacarreira, racterística deserhonrosa edigna. porconferiremagrupamento àatividadeaca- ram citadoscomomotivadores eincluídosnesse decarreiraoportunidades eotrabalhoemsifo- Ainda, ainfluênciadefamiliares eamigos,as crescimento nacarreira”, um“sonho deinfância” . paraportante o Estado”, uma“possibilidade de da sociedade”, SON, 2005), nasexpressões útil à sociedade(DAWé prestar um serviço contra o mal”, sendo tomada como “amo aprofissão”, Expressões para muitosparticipantes. como contrário” (RF196). nosso trabalho, aindaqueascondiçõesdigamo terna” (RF295);e“Crença do naimportância in- atender asociedadeecombatercorrupção opossíveltando osdesafiosefazendo para bem têm aquemrecorrer” (RF037);“Seguirei enfren- família que são vítimas da violência e que não a diferença nasociedadecompostadepessoase “Insisto emcumpriromeupapel,queéfazer os depoimentosaseguirsãorepresentativos: tivos para apermanêncianacarreira, deque quando osrespondentes apresentaram osmo- cerdócio” e“fazer adiferença” , entre outras. A vocação tambémfoicitada como uma A profissão policial é objeto de satisfação A profissão policialéobjetodesatisfação Esse significadotambémfoimanifestado “contribuir para asociedade”, “me sintorealizado naprofissão “senso de justiça” , “trabalho em favor calling, que “lutar “sa - - policial”, “prazer em desvendar um crime”, “é uma e pela imprensa, que “desrespeita quem põe a atividade gratificante” foram comuns, refletindo própria vida em risco”. atribuição de significado positivo ao trabalho. Um aspecto recorrente nas respostas e que A literatura sobre significado do trabalho remete ao sentimento de vergonha referiu-se à Artigos em geral, e mais especificamente aquela desen- carga horária, gestão e organização do traba- volvida pelo MOW (1987) e seus seguidores, lho. Os respondentes mencionaram que a car- argumenta que as normas sociais relacionadas ga horária é desumana, extenuante, levando ao ao trabalho (direitos e obrigações com a socie- acometimento de doenças ocupacionais como dade percebidos como associados ao trabalho estresse, hérnia de disco e acidentes de trânsito executado) é uma dimensão relevante no mo- com a viatura policial por dormir ao volante. delo teórico deste campo. Isso porque é ine- O cansaço é ocasionado pela pressão da ad- rente ao trabalho policial as atividades voltadas ministração para que “trabalhemos à exaustão, para o bem-estar da população em termos de apesar do nosso nítido cansaço físico e mental”, segurança e ordem (SANDES; DURANTE, uma “gestão incompetente” (RF008) caracteriza- 2009). Sendo assim, essa categoria analítica da pelo excesso de burocracia, por uma chefia contribui para que os participantes da pesquisa omissa e pela ausência de definição da missão e atribuam significado positivo ao que fazem. visão institucionais.

Ser policial é “uma vergonha” O sentimento de vergonha foi manifestado Esse agrupamento constitui-se de referenciais quando os respondentes expressaram uma per- Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael negativos sobre as condições atuais de trabalho cepção de que as leis protegem mais aqueles que que levaram os respondentes a atribuir o signi- as infringem do que aqueles que as obedecem: ficado do trabalho como algo vergonhoso, pois “o poder de polícia está enfraquecido, a bandida- suas estruturas material e física são “precárias, via- gem cada vez mandando mais, nós reprimidos pela tura sem manutenção, delegacias caindo aos peda- corregedoria que ouve mais a denúncia do ladrão e ços, número insuficiente de viaturas”, um verdadei- cada vez mais age em nosso desfavor” (RF035); e, ro “sucateamento da polícia civil” (RF285). A car- ainda, no “medo de ser punido pelas leis atuais que reira já não tem mais tanto atrativo, pois há um são a favor dos criminosos” (RF078). abandono, falta de perspectiva de crescimento. Quando os respondentes discorreram sobre O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: A atividade policial não é valorizada nem o cotidiano do trabalho policial, o sentimen- reconhecida: pelo gestor público, que tem in- to de vergonha veio à tona, considerando a teresses escusos, “o governo está preocupado em atividade “desestimulante e vergonhosa. Eu não equipar a polícia com armas e viaturas, pois acre- me apresento como delegado, não por desdém ao ditamos que isso envolve outros interesses”; pela cargo, do qual me orgulho, mas por não ter mais sociedade, “que não vê a polícia com bons olhos” paciência para suportar o olhar que me é dirigido e “não reconhece nosso trabalho”; pela legislação, após a apresentação” (RF108). Nessa perspec- que “beneficia mais o bandido do que a polícia”; tiva, eles se veem “estigmatizado, considerado

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 143 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 144 e armas” (RF239). estatísticas”, fazendo “merchandising comviaturas e aofatodeque“o governo ilude opovo comfalsas caracterizada para dar a sensação de polícia na rua” referiu-se ao“investimento emmassaviatura exército” (RF075).Outra denúnciarecorrente qualidade porempresas nacionaiscontroladas pelo Imbel para deequipamentosbaixa fornecimento cia deum“monopólio criminosoda Taurus eda o quecustar”(RF039) edenunciaramaexistên- plano macabro para apolíciacivil,custe destruir polícia militaredoMinistério Público, quetemum a força policial]depropósito, cumprindoordens da impressões deque“o governo fazisso[desvaloriza Além disso, os respondentes apresentaram suas dos oscargosnecessáriospara supri-las” (RF069). atender interesses políticos, contudo, não foram cria- nopassadopara“há umexcesso dedelegaciasabertas vas de que o trabalho policial é uma ilusão, pois viver deilusão” Ser policialéa“enx tor, sãoinevitáveis nomundodotrabalho. nadas por Frost (2003), as quais, segundo oau- do trabalho,comoasemoçõestóxicas mencio - templada pelosmodelosteóricosdosignificado balho policial adquire uma dimensão nãocon- emoções denatureza similarrefletem queotra- policiais atribuemaotrabalho. referenciais negativos paraosignificadoqueos ninguém sabequaléaminhaprofissão” –são – casode(RF003),queadmite:“Onde moro fato deatémesmoomitirem quesãopoliciais pressões como“humilhante” e“vexatória” eo incapaz, indolenteeineficiente” (RF255).Ex- cidadão demenorvalor, vistocomocorrupto, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 Esse agrupamento reúneEsse agrupamento expressões indicati- Vergonha, humilhação,vexame eoutras ugar ogelo e

quanto aessesignificado, aoutilizaraexpressão pela instituição” ea“falta deperspectiva”. “explorados pelaadministração eabandonados de identidadedacarreira”, asensaçãodeserem mencionaramaindaa“perdaOs participantes esforço ededicaçãosãoinúteisdescartáveis. ção deimpotênciaeincapacidade,queseu jours (2004), leva otrabalhador a umasensa- do trabalho. Essessentimentos,conformeDe- tra expressão arefletir umsignificadonegativo que necessitaderápida manutenção”. nheiro dobolsopara algumacoisa poderarrumar definidos deatuação”, perícia técnica”, legais”instrumentos , (RF205). Alémdisso,muitosalegaram“falta de benefícios particulares desuperiores hierárquicos” paratam afunçãopúblicadapolíciaequeservem vidades advindasdeingerências quenãorepresen- desmotivados aprosseguir nacarreira: “as- ati desuas funçõesosdeixam dentes comoparte lhe servir, jáqueapolícianãotempoderlegal”. o papel que estão levando para casa de nadavai viço policial,pobre dopúblicoquenãosabe registrando fatosquenãotêmrelação comoser- gistro notarial,muitasvezes,enamaioriadelas, dereatendimento aopúblicovirou mero serviços - respondentes emfalascomoasdeRF123:“O dade dotrabalhopolicialfoiexpressada pelos ser policial.Ainutilidadeoufaltadeefetivi- dentes sereferiam aoquelhestiraavontade recorrente nasrespostas quandoosrespon- O depoimentodeRF139 éexpressivo Ser Muitas dastarefas descritas pelos respon- A expressão “enxugar ogelo” foibastante “otário aquinabananolândia” foiou- “ausência deobjetivos claramente “morosidade eineficiênciada “muitas vezestiramos di-

“lixeiro social” para se referir à seletividade do “trabalhamos como uma família”; “somos uma trabalho policial: “Sem dúvida nenhuma, [o que família”; “brigamos, mas somos uma família”. me tira a vontade de ser policial é] prender pobre. Penso que fazer o papel de ‘lixeiro social’ é um O sentimento de pertencer a uma família dos duros golpes que recebo todo dia que prendo contribui para que encontrem a vontade de Artigos um pobre cujo leque de opções de vida apontava, ser policial, como mencionou RF002: “o cli- na maioria das vezes, para a criminalidade”. Os ma de amizade que existe na delegacia de polícia participantes expressaram esses sentimentos ao da qual sou titular ajuda muito a aumentar a relatarem as condições de trabalho materiais e vontade de todos em fazermos o melhor”. Ainda emocionais: “funcionários veteranos que não têm que existam problemas, o bom relacionamen- condições emocionais e psicológicas de suportar o to e companheirismo são determinantes para trabalho policial e de atendimento ao público e continuarem na polícia, pois é nas interações que não se aposentam para não perder parcela dos do dia a dia do trabalho que os membros con- parcos vencimentos” (RF 109). tornam os desafios comuns: “Temos uma boa equipe, sendo que arestas são aparadas no coti- Essa categoria vai de encontro ao modelo diano” (RF077). teórico do significado do trabalho proposto por MOW(1987), uma vez que os policiais A metáfora da família obscurece a distinção participantes da pesquisa não sentem a impor- entre interesses materiais e os vínculos afetivos tância dos objetivos do trabalho que executam, que caracterizam a família, sendo esses elemen- o que implica, para esse modelo, um trabalho tos fundamentais para a coesão social, contri- Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael sem significado. No entanto, esse sentimento buindo para que os trabalhadores atribuam manifestado nas respostas é fruto de experiên- significados positivos ao trabalho que fazem cias de trabalho, e, como tal, deve ser conside- (WRZESNIEWSKI, 2003). rado como um significado atribuído ao papel social que o indivíduo desempenha. Ser policial é “dormir com o inimigo” Ser policial é “fazer parte de uma Ao mesmo tempo em que os respondentes família” manifestaram “ser uma família”, a expressão A metáfora da família foi evocada por di- “dormir com o inimigo” também foi recorren- versas vezes, inclusive, sendo o fato de perten- te nas falas de parte dos entrevistados. RF083, O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: cer a uma família de policiais uma das moti- por exemplo, respondeu: “Amigos??? A impres- vações para a escolha da carreira. Nas seções são que tenho é que as pessoas têm mais interesse do formulário destinadas aos relacionamentos em ver o colega se dando mal do que o contrá- desenvolvidos na polícia e ao ambiente de tra- rio!!!”. O ambiente de trabalho foi descrito balho e sua relação para continuar na institui- como um clima hostil, tenso, competitivo e ção foi recorrente a menção à família: “é minha ameaçador para muitos: “... tenho medo de ser [força policial] segunda família”; “minha equipe baleado pelas costas ou vendido pelos investiga- [membros] são verdadeiros irmãos de trabalho”; dores” (RF268); “Existe uma disputa insana por

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 145 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 146 quisarem omal-estar notrabalho. Isso também em relação ao bem-estar notrabalho,aopes- (2009) denominamdeo“reverso damedalha” dentes, apontandoparaoque Ferreira eSeidl satisfação foimanifestadopor muitosrespon- é a investigação”. Oclima de insegurança e in- que poucotêmaver comapremissa daPC,que estresse pelafaltadefuncionárioeascobranças decorrentes ounolimitedo dopróprio serviço policiais andanolimite,limitededoenças clima ésempre tenso, pois agrande maioriados de trabalhooambientetenso:“O (RF 162). senciar os desvios de condutas de alguns policiais” para desejarabandonaracarreira: “ter quepre- inclusive, apontadacomoumdosmotivos administração pública” (RF301),tendosido, ração dealgunssetores porparte dasociedadee nas instituiçõespoliciais,aresistência decolabo- nomeiopolicial: “Notíciasrupção decorrupção vontade de serpolicial” (RF173). trabalho emminhaunidadediminui polícia, viaderegra, éhostil.Oatualclimade de carreira: “Oambientedeumadelegacia O climahostilimplicanavontade demudar antipatia, discussões,individualismo” (RF014). gas, fofocas,corpomole,preguiça, onde“reina do inimigos velados” (RF 155), que tem intri - quer sobreviver, acabando, paradoxalmente, sen- rendo engolirooutro” (RF110). hipocrisia epuxaçãodesaco” (RF017);“um que- mesmo” (RF098);“Oclimaédepura falsidade, poder epara detudo, eporissofazem detudo Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 RF 019atribuiuàspressões econdições Várias foram,também,asmençõesàcor- Um ambiente de trabalho em que “cada um amaldiç Ser policialé“serreconhecido e fragilidade dasinstituições(SENNET, 2006). em razãodasinstabilidadessociaisquantoda bem-sucedido emcondiçõesinstáveis, tanto temporânea écaracterizadopelodesafiodeser tar aideiadequeotrabalhonasociedadecon- do trabalho,noentanto,nãosepoderejei- vai de encontro ao modelo teórico do significa- sentir ameaçados, desvalorizados pelapopula- reconhecimento doseutrabalho, disseramse um pedófilonointeriordo Estado”. menagem deCâmara Municipal, porterprendido ser unanimidade,masjárecebi umaplacadeho- sitivas, como RF156: depoimentos, algunsrelataram experiênciaspo- cer eelogiarotrabalho daequipe” (RF119).Nos dos sobre osmotivos daprisãoacabamporagrade - preso, apósserem tratados comrespeito- einforma elogios: via pública vez por outra”, e, por vezes, recebendo palavras demuitoobrigado”, sendo“abordado na nhado nodiaadia,naformade“retorno com a gratidãodapopulaçãopelotrabalhodesempe- Vários respondentes mencionaram o respeito e momentos traumatizantes pelosquaispassaram” . até seemocionaram emver quepodemsuperar os viram esclarecidos oscrimesqueasvitimaram e vas devítimas quereconheceram nossoemprenho, “Tive asatisfaçãodereceber respostas muitopositi- bui comrespeito eadmiração. RF070lembrou: população reconhece otrabalhopolicialeretri- no cotidianodoseutrabalho. Para muitos,a admiração daspessoasqueospoliciaisajudam emergiu nas respostas acerca do respeito e da Já osrespondentes quenãopercebem o A tensãodeserreconhecido eamaldiçoado “até mesmofamiliares deumindivíduo oado” “Não tenho a pretensão de ção: “Ao saírem até amaldiçoam, mesmo quan- Ser policial é “viver conviver com o do satisfeitas as expectativas” (RF212). Muitos medo, perigo e riscos” policiais descreveram uma percepção de que Acompanhando os mesmos resultados de a população os vê como uma “subclasse”, “um outras pesquisas (SOUZA, MINAYO, 2005; lixo”, entre outros adjetivos desqualificadores. BEZERRA, MINAYO, CONSTANTI- Artigos No depoimento de RF111, tem-se clareza do NO, 2007; SOUZA et al., 2012; MINAYO, sentimento de mágoa: “Nem nossa família gosta ADORNO, 2013), esse agrupamento reúne da polícia, só querem nossa presença quando pre- depoimentos sobre o cotidiano do trabalho cisam de algo”. RF120 alegou que “por maior policial. É recorrente a menção à violência, ao que seja o esforço, apenas fazemos nossa obrigação medo, ao perigo e aos riscos no desempenho de e, quando, eventualmente, falhamos, as consequ- suas atividades. FR228, por exemplo, descreve ências são fatais”; ou seja, “se acertamos é obri- o cotidiano de trabalho como o “enfrentamento gação, se erramos somos massacrados” (RF282). direto com criminalidade violenta, em favelas ou locais precários, quase um policiamento ostensivo Aqui também são contadas experiências ne- com incursões em áreas tomadas pela criminali- gativas: “Certa feita, há pouco tempo, recupera- dade fortemente armada e ligada ao narcotráfico, mos um bem furtado de cerca de R$ 120.000,00 são ações de guerrilha, de guerra urbana para as e a vítima sequer disse obrigado, além de resmun- quais não me sinto preparado e não entendo que gar a respeito de quem iria pagar o transporte de seja a função institucional da polícia judiciária”. seu bem, dizendo ser minha obrigação. Deixei-a no local e fui embora” (RF44). É comum ain- Ainda, o convívio nesse contexto de medo, pe- Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael da relatos de que “o povo, a imprensa, o Esta- rigo e riscos traz implicações à decisão de continu- do e a própria polícia têm raiva da instituição” ar na carreira. Foi comum a menção ao “medo da (RF089) e “a sociedade não vê a polícia com bons exposição pela qual fui submetido até aqui. Se deixar olhos” (RF0121), “o governo que não respalda os de ser policial, não poderei andar armado e estarei trabalhos policiais”(RF0168), “o Ministério Pú- à mercê do crime” (RF104) e ao “temor de voltar blico trata policial igual bandido”(RF211). a andar desarmado” (RF019). Os depoimentos indicam que o medo, risco e perigo são parte Os policiais percebem que a categoria pro- do cotidiano policial (DERENUSSON, JA- fissional está no “abandono”: “somos odiados pe- BLONSKI, 2010; ANCHIETA et al., 2011). los bandidos e nem um pouco amados pela popu- O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: lação. Os exemplos que repercutem na mídia são Os respondentes ainda mencionam as doen- sempre os desastrosos e os que denigrem a imagem ças ocupacionais comuns, como estresse, hérnia da polícia” (RF 219). Dessa forma, o trabalho, de disco, acidente de trânsito, carga horária de- para esses policiais que se percebem assim, ad- sumana, falta de segurança nos plantões notur- quire significado negativo, que pode estar as- nos, o que corrobora pesquisas anteriores sobre sociado ao sofrimento (DEJOURS, 1994), ao os riscos da profissão policial (BEZERRA, MI- mal-estar no trabalho (FERREIRA; SEIDL, NAYO, CONSTANTINO, 2007; ANCHIE- 2009) e às emoções tóxicas (FROST, 2003). TA et al., 2011; MINAYO, SOUZA, 2003).

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 147 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 148 de comunicação, que retratam a violência e a com aatividadepolicialéveiculada nos meios 2002). No entanto,umaassociaçãonegativa determinação esacrifício(BRETAS, 1997; SÁ, rem àprofissão umaauradehonra, orgulho, policial temsignificaçõespositivas queconfe- realização pessoaldoindivíduo. paraa trabalho évistocomouminstrumento expressa seusdesejosenecessidadese,assim,o nificado atribuídoaotrabalhopelotrabalhador trabalho. Essa literatura compreende que o sig- tivação interna eexternaasatisfaçãocomo pectos positivos dotrabalho,quaissejam,amo- 2010, entre outros), queseconcentranosas- 1987; ROSSO, DEKAS, WRZESNIEWSKI, da literaturatradicionalsobre otema(MOW, gativos, nos permitindodesafiarospressupostos trabalho podemterreferenciais positivos ene- preensão dequeossignificadosatribuídosao associamos àsnoçõesdemal-estarnotrabalho. do trabalho,ereferenciais negativos, que associamos aosmodelosteóricosdosignifica- ram duasformas:referenciais positivos, que na carreira policial). Tais significados assumi- policial) e (2) experiências (durante a vivência pectativas (antesdoseuingresso nacarreira trabalho em dois momentos distintos: (1) ex- que sereferem aossignificadosatribuídosao pectos relevantes, osquaiscontêmelementos aocorrência deas- formulários, observamos trabalho da centralidade ao mal policial significados dotrabalho C Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 onsidera Nesta pesquisamostramosqueotrabalho Assim, nossapesquisacontribuiparaacom- Ao analisarosdepoimentosincluídosnos ções finaissobreos -estar no : por seusempregadores. gelo, vivem de ilusão e sentem-se ludibriados que fazem o papel de lixeiro social, enxugam o de insegurançaseriscos.Além disso,sentem de trabalhocomohostil,tenso, hipócrita,cheio mília unida, no entanto, percebem o ambiente pelas instituições.Sentem-se deumafa- parte amaldiçoados pelapopulação,imprensa e pelo quefazem, porém, sentem-setambém perigo ecolocar-seemrisco. São reconhecidos trabalhar comopolicialéviver commedo,em mesmo tempo,sentem-seenvergonhados, pois cado deheroísmo, dignidadeehonra,mas,ao em condiçõesinstáveis, inseguraseprecárias. veem desafiados adesempenharsuasfunções ao trabalhopelosrespondentes, osquaisse policial serefletem nossignificadosatribuídos mal-estar presentes nocontextodaatividade mostramos queastensões,contradiçõeseo que podemserpositivas, negativas ouneutras, desuasexperiênciasnotrabalho, soas apartir cados do trabalho serem atribuídos pelas pes- chvili eKuchinke (2009)quantoaossignifi- e Nord (1990), Wrzesniewski (2003) e Ardi- sive, notrabalho. vidas (GEERTZ, 1973;MILLS,1976),inclu- os indivíduosatribuemàssuasexperiênciasde ciocultural queinfluenciaossignificados quanto aspositivas desenhamumcontextoso- TINO, 2008). Tanto asassociaçõesnegativas GA, 2006;MINAYO, CONSTAN SOUZA, - desvalorizada daforça policialemgeral(FRA- manente comapopulaçãoeemumaimagem tas amorais,repercutindo emumembateper- daaçãopolicial,alémdecondu- truculência Os policiais atribuem ao trabalho o signifi- Corroborando oentendimentodeBrief Nossa análise indica que o significado negativos e, portanto, não pode ser reduzido do trabalho atribuídos por policiais não se aos sentimentos de gratificação e prazer que resume a um significado, mas, sim, a um tornam o trabalhador mais produtivo e feliz conjunto de significações que se relacionam com sua atividade. Os resultados nos permi- com suas vivências, suas histórias, seus sen- tem ainda sugerir pesquisas que aprofundem Artigos timentos e com o contexto amplo do traba- nos referenciais negativos do trabalho e suas lho. É nesse sentido que argumentamos que significações para trabalhadores em outros o trabalho traz significados com referenciais contextos organizacionais.

1. Para uma discussão aprofundada, ver BENDASSOLI et al. (2015). Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado:

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 149 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 150 CODA, R.; FONSECA FALCONE, G. Em busca do significado do busca Em G. FALCONE, FONSECA R.; CODA, tional work. Lexington: Lexington Books, 1990.p. 1-19. ______. In: interpretations. and definitions meaning: and Work R. W.P.;NORD, BRIEF, A. Rocco,Janeiro: 1997. de 1907-1930.Rio Janeiro, de Rio no policial autoridade L. BRETAS,M. 2007. Janeiro,de v.Rio p.Pública , 2767-2779,11, n. Saúde 23, pública. (in)segurança na militares e civis policiais de vitimização e percebidos Riscos ______. de Coletiva, RiodeJaneiro, v. 18, n.3, p. 657-666, 2013. Estresse ocupacional em mulheres policiais. CONSTANTINO,P.S.; de C. MINAYO, M. M.; de C. BEZERRA, org/10.12804/apl33.02.2015.03. v.[S.l.], mericana, p.33,p.2, 203-221, dx.doi. doi: 2015. classifications. thematic current and terminology of use of review work: of ning mea- and sense productionon scientific Brazilian The C.S. P.BENDASSOLLI, F.; F.;P. GÊ, COELHO-LIMA, PINHEIRO, R.A.; ces Resour Human Develeping in theory.Advances chand resear currente working: workand of meanings the on P. K. perspectives International KUCHINKE, A.; ARDICHVILI, São Luís, v. 16, n.1, p. 247-259, 2012. coletiva. ação da significado o greve: em militares Policiais J. A. V.;LIMA, N. ARAÚJO, São Paulo: Cortez, 1995. Ed. 2. trabalho. do mundo do centralidade a e morfoses R. ANTUNES, , [S.l.], v.quisa 27, n.2, p. 199-208, 2011. civis. policiais entre estudo um ANCHIETA, V. etC. C. al. Trabalho e riscos de adoecimento: ência eprofissão, [S.l.], v. 22, n.3, p. 2002. 54-61, militar.brigada na trabalhador do mental F. programapreventivosaúde um em PorAMADOR, al. et bibliográficas Referências Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 , [S.l.], v. 11, n.2, p. 155-167, 2009. Ensaio sobre as meta - as sobre Ensaio trabalho? ao Adeus : o exercício cotidiano da cotidianoexercício o cidade : na Ordem AvancesPsicologíaLatinoa- en Revista Políticas Públicas, Políticas Revista Psicologia: Teoria e Pes Teoriae Psicologia: Meanings of occupa - of Meanings Psicologia: ci- Psicologia: Ciência & - Saú aens de Cadernos - - - do trabalho. In: LANCMAN, S.; SZNELWAR, L. I. (Org.). I. SZNELWAR,L. S.; LANCMAN, In: trabalho. do psicodinâmica à psicopatologia da – Addendum ______. 1994. p. 21-32. Atlas, Paulo: São trabalho. e sofrimento prazer, relação da análise à dejouriana escola da contribuições : balho (Org.). JAYET, C. E.; ABDOUCHELI, ______; In: trabalho. do psíquica carga A ______. quecidas. SãoPaulo: Atlas, 1993. organizações. O indivíduo na organização: dimensões es ______. FGV,neiro: 2000. ______. logia dotrabalho. SãoPaulo: Cortez, 1998. DEJOURS, C. Quarterly, [S.l.], v. 55, n.3, p. 220-231, 2005. purpose. moral and meaning, work, of keyword a tracing vocation: of history A J. DAWSON, p. 66-77, 2010. militares. policiais em estresse de Avaliação al. et A. M. DANTAS, 6, n.14, p. 7-18, 2004. tivos. qualitativoexecuentreestudo um relato- de trabalho: do Psicologia cultura organizacional de um contextoculturaum organizacionalde brasileiro.bancário da análise trabalho: no Mal-estar J. SEIDL, C; M. FERREIRA, cial. Aletheia [online]. v. 32, p. 22-37, 2010. poli- do família a sobre militar policial trabalho do pacto F.DERENUSSON, JABLONSKI,B. C.; EditoraRio deJaneiro: Fiocruz;Brasília: Paralelo 15, 2004. phe : Dejours da psicopatologia à psicodinâmica do trabalho. ipnvl m http://www.forumseguranca.org.br/sto em: Disponível 2015. jul. 29 Paulo, São pública. segurança de sistema vitimização e percepção de risco entre profissionais do PÚBLICA. SEGURANÇA DE BRASILEIRO FÓRUM 254, 2009. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, [S.l.], v. , [S.l.], p. 12, n. 3, n. 12, p. [S.l.], Prática, e Teoria Psicologia: Uma nova visão do sofrimento humano nas . Rio de Ja- de Rio social. injustiça da banalização A : A loucura do trabalho : estudo de psicopato , [S.l.], v.25, n. 2, p. 245- p. 2, v.25,n. [S.l.], Pesquisa, e Teoria cruzado: fogo Sob Psicodinâmica do tra- do Psicodinâmica dl Education Adult Pesquisa de Pesquisa Cristo o im- o - - - - rage/download//regionais_diagramado.pdf. Acesso em: gency Mental Health, [S.l.], v. 8, n. 3, p. 165-174, 2006. 20 fev. 2016. MILLS, C. W. A nova classe média. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.

FRAGA, C. K. Peculiaridades do trabalho policial militar. Artigos Revista Virtual Textos & Contextos, [S.l.], n. 6, ano V, p. MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R. Missão investigar: entre o 1-19, 2006. ideal a realidade de ser policial. Rio de Janeiro: Garamond, 2003. FROST, P. J. Toxic emotions at work: how compassionate managers handle pain and conflict. Boston: Harvard Busi- ______; ADORNO, S. Risco e (in)segurança na missão ness School Press, 2003. policial. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 18, n. 3, p. 585-593, 2013. GEERTZ, C. The interpretation of cultures. New York: Ba- sic Books, 1973. ______; SOUZA, E. R.; CONSTANTINO, P. Missão preve- nir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos GIBBS, G. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre: policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Artmed, 2009. Fiocruz, 2008.

GILL, F. The meaning of work: lessons from sociology, MONET, J. Polícias e sociedades na Europa. São Paulo: psychology, and political theory. Journal of Socio-Econo- Edusp, 2006. mics, [S.l.], v. 28, p. 725–743, 1999. MOREIRA, F. H et al. Do elemento a cidadão: transforma- HARPAZ, I.; FU, X. The structure of the meaning of work: a ções no cotidiano do trabalho do policial militar. Cadernos relative stability amidst change. Human Relations, [S.l.], de Psicologia Social do Trabalho, [S.l.], v. 2, n. 1, p. 25- v. 55, n. 6, p. 639-667, 2002. 38, 1999.

HARPAZ, I., HONIG, B.; COETSIER, P. A cross-cultural longi- MORIN, E. M. The meaning of work in moder times. In: Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael tudinal analysis of the meaning of work and the socializa- WORLD CONGRESS ON HUMAN RESOURCES MANAGEMENT, tion process of career starters. Journal of World Business, 10., 2004, Rio de Janeiro. Conference… Disponível em: [S.l.], v. 37, p. 230-244, 2002. . Acesso em: 14 set. 2016. KUCHINKE, K. P. et al. The meaning of working among professional employees in Germany, Poland and Russia. ______. Os sentidos do trabalho, Revista de Adminis- Journal of European Industrial Training, [S.l.], v. 33, n. tração de Empresas, v. 41, n. 3, p. 8-19, 2001. 2, p. 104-124, 2009. MOW. International Research Team. The meaning of LIMA, M. E. A. A polêmica em torno do nexo causal entre working. London: Academic Press, 1987. distúrbio mental e trabalho. Psicologia em Revista, [S.l.], v. 10, n. 14, p. 82-91, 2003. MUNIZ, J. Ser policial é, sobretudo, uma razão de ser:

cultura e cotidiano da Polícia Militar do Estado do Rio de policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado: MEAD, G.H. Mind, self, and society: From the standpoint Janeiro. 1999. Tese (Doutorado em Ciência Política) - Ins- of a social behaviorist. Chicago: The University of Chicago tituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Rio de Press, 1934. Janeiro, RJ, 1999.

MEILAENDER, G. Working: Its meaning and its limits. Notre PONCIONI, P. Tendências e desafios na formação profissio- Dame, IN: University of Notre Dame Press, 2000. nal do policial no Brasil. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 22-31, 2007. MILLER, L. Suicide by cop: causes, reactions, and practical intervention strategies. International Journal of Emer-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 151 O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Artigos Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros 152 aning of a work: theoretical integration and review. me the On A. WRZESNIEWSKI, H.; K. ROSSO,D.;DEKAS, B. RIFKIN, J.Theendofwork. New York: Putnam,1996. San Francisco: Berrett-Koehler Publishers, 2003. p. 309-327. QUINN, E.; (Ed.).E. R. J. DUTTON, ; S. K. CAMERON, In: work. at and working in fulness meaning Fostering E. B. ASHFORTH, G.; M. PRATT, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 134-153, Ago/Set 2016 Nacional de SegurançaPública. de Nacional brasileira: a participação da sociedade civil na Conferência democracia na Avanços O. M. DURANTE, F.; W. SANDES, RelumeDumará,Janeiro: 2002. na formação dos oficiais da Polícia Militar do Ceará. Rio de SÁ, D.L. de. 2010. 91-127,p.v. 30, [S.l.], Behavior, Organizational in arch morbimortalidade vinculada ao trabalho. MINAYO,______; Policial,riscoS. como profissão: C. M. n. 7, p. 1297-1311, 2012. Brasil. psíquico depoliciaismilitares dacidadedoRiodeJaneiro, sofrimento ao associados Fatores al. et de R. E. SOUZA, Record, 2006. SENNET, R. gurança Pública,SãoPaulo, n.3, p. 116-127, 2009. , Rio de Janeiro,v.de Rio 28, Pública, Saúde de Cadernos A cultura do novo capitalismo. Rio de Janeiro: Os filhos do Estado : autoimagem e disciplina Positive organizational scholarship. RevistaBrasileiraSe de Ciência & Saúde Rese - - - personality, [S.l.], v. 31, n.1, p. 21-33, callings: 1997. and careers, work. their to Jobs, relationspeople’s al. et A. WRZESNIEWSKI, Francisco:pline .San Berrett-Koehler, 2003.p. 296-308. disci- new a of Foundations scholarship: organizational CAMERON, S. K. ; DUTTON, J. QUINN, E.; R. (Ed.).E. In: work. in meaning positive Finding A. WRZESNIEWSKI, gement, [S.l.], v. 3, n.2, p. 139-165, 2003. context. Chinese in work of meaning P.The LOK, R.; WESTWOOD, Editora 2003. Claret, Martin M. WEBER, ção Especial,p. 28- 46, 2007. brasileiros. empíricos estudos e variáveis conceitos, explorando lho: TOLFO,PICCININI, V. R.; S. traba do significados - e Sentidos Career Assessment, [S.l.], v. 20, n.3, p. 322-337, 2012. the work and meaningwork: inventory (WAMI). STEGER,F.; M. B.DUFFY, R.; DIK, D. R. Measuring meaningful 362-370, 2006. litar. mi- polícia da capitães aos junto pesquisa uma saúde mental: e policial Trabalho C. R. A. MERLO, B.; C. SPODE, Coletiva, RiodeJaneiro, v. 10, n.4, 917-928 , [S.l.], v. 19, n. 3, p. 3, n. 19,v. [S.l.], Crítica, e Reflexão Psicologia: - Mana Cultural Cross of Journal International – duas vocações. São Paulo: vocações.São duas – política e Ciência , [S.l.], v.[S.l.], Sociedade, PsicologiaEdie 1,- n. 19, ora o rsac in research of Journal , 2005. Journal of Positive O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial

Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros Artigos

Resumen Abstract

El Héroe Avergonzado: tensiones y contradicciones en el The Ashamed-Hero: tensions and contradictions in cotidiano del trabajo policial everyday police work En esta investigación, con el objetivo de comprender la In this study, which sought to understand the production producción y reproducción de significados que los policías and reproduction of meanings that police attribute to police atribuyen al trabajo policial en Brasil, realizamos una work in Brazil, a qualitative survey was conducted analyzing investigación cualitativa analizando las respuestas de un the responses to an online questionnaire completed by 305 formulario en línea contestado por 305 respondientes. Para respondents. The analysis was based on theoretical models ese análisis, tomamos como base los modelos teóricos sobre of the meaning of work and the notions of bad feeling at el significado del trabajo y las nociones de mal-estar enel work. Our argument was that the meanings attributed trabajo. Nuestro argumento es que los significados atribuidos to work contain positive and negative references since al trabajo contienen referenciales positivos y negativos, una meaning is built and rebuilt according to social context. The Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros de Oliveira Rodrigues e Cintia da Silveira Alcadipani Rafael vez que el significado es construido y reconstruido conforme el results showed that the meanings of work attributed by the contexto social. Los resultados indican que los significados del police were not constrained to the positive references that trabajo atribuidos por policías no se resumen a los referenciales value work but represented a group of meanings that relate positivos que valorizan el trabajo, pero, de hecho, esos son with their experiences, histories, feelings and with the broad un conjunto de significaciones que se relacionan con sus context of work. experiencias, sus historias, sus sentimientos y con el contexto amplio del trabajo. Keywords: Police work. Meanings of “being a police officer”. Bad feeling at work. Palabras clave: Trabajo policial. Significaciones de “ser policía”. Mal-estar en el trabajo. O herói-envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial do trabalho no cotidiano e contradições tensões O herói-envergonhado:

Data de recebimento: 05/06/2016 Data de aprovação: 26/08/2016

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 134-153, Ago/Set 2016 153 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 154 formação policialmilitar preconceito ehomofobia na “Hierarquia dainvisibilidade”: relacionados àSegurança Pública eDireitos Humanos.Professor deCriminologiapeloCentro deEducação daPMPB. da Polícia Militar daParaíba -PMPB. Pesquisador naárea deSociologiadaviolência,dopoderecontrole socialeemtemas Doutor emestre emSociologiapelaUniversidade Federal daParaíba. Bacharel emSegurança Pública peloCentro deEducação Fábio Gomes deFrança Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 Polícia Militar. Virilidade.Homoafetividade. Palavras-Chave descortina-se uma “hierarquiafim, dainvisibilidade” Por aceitos. serem para identidades suas de afetiva e sexual dimensão a publicamente negando formação, de preconceito contra alunoshomoafetivos; poroutro, tais alunosconformam-se àsregras culturais encontradas no quartel obtidas, constatamos umasituaçãocontraditória: deumlado, temos acultura dacaserna policialmilitar voltada para o policial militar. Para tanto, aplicamos questionárioscom Apartirdasrespostas questões abertas, enviadas pore-mail. camos compreender como seconstitui apresença dealunoshomoafetivos masculinos emumambiente deformação consequente naturalização de uma cultura institucional na qual o atributo “ser homem” fortalece valores belicistas, bus da e policiais casernas das realidade na masculina” “dominação evidente da diante Assim, Bahia. da Militar Polícia da (CFO) Oficiais de Formação de Curso no ingressaram que homoafetivos alunos de visão a sobre debruça se artigo Este Resumo [email protected]

que leva esses indivíduosaocultarem seuautorreconhecimento. - Artigos Fábio Gomes de França Fábio

Introdução

a obra Toque de silêncio, Alves e é criar um lugar “seguro”, por parte dos policiais NBarcellos (2002) revelam a biografia homoafetivos, nutrido por reservas e cuidado de um dos autores acerca da difícil situação de com os “olhares”, quando o que dita a normali- ser homossexual e ingressar na carreira militar, dade das relações institucionais são regulamen- neste caso, na Marinha brasileira. Como afir- tos “formais” e “morais”. mam os próprios autores a respeito das Forças Armadas, “[...] nesta cultura permissiva em Nesse contexto, vislumbramos neste artigo relação aos poderes do macho, sexualidade e escutar essas vozes silenciadas no universo da moral têm caminhado lado a lado, num dile- formação policial militar, como forma de com- ma psicológico que vem gerando falsos con- preender quais são as experiências vivenciadas ceitos e dolorosos embaraços” (ALVES; BAR- em um ambiente em que predomina o ideal de CELLOS, 2002, p. 26). masculinidade pautado no machismo. Além dis- so, soma-se a essa lógica cultural o brio, a hon- Não poderia ser diferente quanto a ser um ra, o éthos belicista que incita à autossuperação policial militar e, ao mesmo tempo, assumir a em nome do espírito de camaradagem próprio condição homoafetiva1. Distante de parecer de um militar, capaz de criar novas identidades policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia uma tarefa fácil, tal condição leva muitos desses sociais, mas certamente incapaz de deteriorar a policiais, de um modo geral, a ocultarem suas força do desejo que habita cada um de nós. condições afetivas, na difícil decisão de assumi- rem identidades sociais que soam contraditó- Nesse caminho, mostraremos o sentido da rias. Assim, parece-nos que a regra para se ga- virilidade e como ele se atrela historicamente aos rantir uma vaga no honroso mundo masculino ideais civilizatórios que encontraram na cultura

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 155 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 156 torreconhecimento (OLIVEIRA,2006) tempo emquerenegam umasupostalutaporau- sição culturaldosvalores masculinos,aomesmo tornarem-se profissionais respeitados pelaimpo- o preconceito das casernas militares ao buscar enquanto indivíduoshomoafetivos, vivenciam tir dasquaischegamosàconclusãodequeeles, lisamos asfalasapreendidas doscadetes no tocanteàcondiçãohomoafetiva. Por fim,ana- coletiva quenãoadmiteexceções, especialmente policial militar, oqueconfiguraumaidentidade masculino adentram, em específico, na formação Adiante, exploramos comoavirilidadeeoéthos militarista um modelo propício de legitimação. Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 teria surgido no século XVIII, por meio de uma teria surgidono séculoXVIII,pormeiode uma que denominade“sociedade disciplinar”, aqual que propõe Foucault (1987)aodiscorrer sobre o lizador” de matriz europeia vai ao encontro do aparelho estatal(ELIAS,1993). meio deumconsensoentre asociedadeeo Forças Armadas eosorganismospoliciais,por através deseusaparatoscoercitivos, comoas cia, noentanto,foimonopolizadopeloEstado mes” nasociedademoderna, o usodaviolên- que passouaserconsideradoos“bonscostu- por meiodaexteriorizaçãoetiquetaedo dos instintosficouacargodecadaindivíduo 2011). Alémdisso,seoexercício decontrole nha na interação entre os indivíduos (ELIAS, o sentimentodeconstrangimentoouvergo - produção de hábitos corporais capazes de criar te noquetangeà agressividade, sexualidade e ao controle daspulsõesinternas,especialmen- virilidade A construção sócio O quesepercebe équeesse“processo civi- Sabemos queoidealcivilizadordizrespeito -hist órica da 3 2 . , apar-

çar segurança pessoal oindivíduomoderno e afirmar que, em nível inconsciente, para alcan - baseada noidealdeprogresso ecivilização ao preender aconsolidaçãoda “ordem” burguesa fera econômica. assim comoocapitalismoconsolidou-senaes- regras nocampocientífico,filosóficoepolítico, progresso. Opositivismo,porexemplo, ditouas zada porumasociedadeancoradanastrilhasdo ideológico deorganizaçãosocialnabuscaideali- esteio, a“ordem” ganhouforça comomodelo pela lógicaburguesa,urbanaeindustrial.Nesse 1982), em um mundo ditado escolas (WEBER, nascentes namodernidade,comoasfábricase tribuiu parainfluenciarasdemaisinstituições o modelo militar de organização em muito con- rização dodisciplinamentocorporalepsíquico, tratualista nocampopolítico. direitos fundamentaisbaseadosnopactocon- à lógicamilitarista,tivemos alegitimidadedos poral epsíquicadossujeitose,concomitante treinamento permanenteenadocilidadecor- cujas engrenagens baseavam-se nacoerção, no que visouàformataçãodeumamáquinasocial mente atrelada adoisprocessos: osonhomilitar sociedade ocidentaldesenvolveu-se historica- perspectiva foucaultiana,compreende-se quea por outro” (FOUCAULT, 1987,p. 142).Pela um lado, aordem eo silêncio obedientedapaz junção entre dabatalhapor aguerraeosruídos se especifica,duranteesseperíodo,nopontode a elesatreladas. Tem-se entãoque“[...]omilitar lar edisciplinaroscorposasforças individuais paracontro- nacionais emascensão,queserviu tática políticaemilitaradotadapelosEstados Freud (1978)tambémnos ajuda acom- Entre a pacificação doscostumes e a exterio- civilizado teria paradoxalmente desenvolvido sexual, a virilidade e, sobretudo, o desejo pelo o controle dos instintos, das pulsões sexuais e sexo oposto” (RAGO, 2012, p. 14). da agressividade, o que gerou menos liberdade. Para tanto, a “ordem”, a “beleza” e a “limpeza” A problemática do “agenciamento político são elementos caros à civilização, já que, como do desejo” foi estudada por Foucault (2007) em Artigos nos ensina Douglas (1976), todas as socieda- sua história da sexualidade, especialmente no des (primitivas e modernas) visam eliminar que tange à sociedade europeia do século XIX, suas impurezas de forma positiva para ordenar na qual se destaca a regulação da população en- as coisas e colocá-las no seu devido lugar. O quanto espécie por mecanismos biopolíticos. A que se busca é criar um padrão estético social- participação do Estado na vida privada incidiu mente orientado pela higienização dos com- por meio da produção de saberes, pela incitação portamentos e condutas, estabelecendo um re- ao discurso para revelar, por meio de técnicos ferencial que passa a ser o ideal a ser alcançado. habilitados para tal (psiquiatras, psicólogos, Fábio Gomes de França Fábio No caso da modernidade, que teve no modelo educadores, criminólogos), a “verdade” presente cultural imposto pela Europa sua forma mais no pensamento contaminado pela degeneração distinta de organização social, podemos falar moral, que revelava comportamentos indisci- de uma sociedade branca, culta, cristã, mascu- plinados, logo, patológicos. Os ditames da ci- lina e heteronormativa. vilização não permitiam, assim, as sexualidades periféricas e os comportamentos desregrados Nessa seleção de modelos a serem seguidos (prostitutas, homossexuais, delinquentes, vaga- para consolidar a civilização, as casernas mili- bundos, grevistas, loucos, crianças incorrigíveis, tares talvez sejam a melhor representação da mulheres adúlteras) e, neste caso, o “dispositivo “construção social da masculinidade” (OLI- de sexualidade” funcionava como um conjun- VEIRA, 2004) ou da gênese de uma “matriz to de elementos que aliava saberes e práticas de masculinidade” (LEÓN, 2009). Ser militar orientadas no alcance de um ideal: a civilização. e ser homem são atributos que se desenvolve- Colocou-se em funcionamento um “racismo ram de maneira indissociável, de modo que a estatal” na consolidação de uma ordem social cultura militarista sempre procurou coibir o pautada em uma política biologista que criou desejo atrelado às sexualidades indefinidas, às os seus “degenerados” para afirmar a hegemonia perversões, às imoralidades, à pederastia. O pa- das elites dominantes (burguesas) em prol de drão classificatório imposto pela modernidade “defender a sociedade” de seus inimigos inter- não permite ir contra os desígnios divinos e sua nos (FOUCAULT, 1999). honrosa celebração à monogamia heterossexual, policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia única possibilidade capaz de gerar descendentes Por ter sido colônia portuguesa, mesmo e os futuros “filhos da pátria”. Assim, “[...] nesse após a independência, o Brasil, especificamen- imaginário marcado pela intolerância ao outro te em fins do século XIX, se viu, por meio da e ao diferente, se às mulheres cabe a educação crença de suas elites, impelido a construir tam- das crianças e os cuidados do lar, aos homens é bém uma nação eivada pelo ideal civilizatório necessário ensinar o autocontrole, a contenção europeu em busca do progresso. O que estava

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 157 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 158 hinos erememorada nosmonumentos, baseia- “virilidade nacional”, muitasvezes entoadaem tamento àsForças ArmadasnoBrasil, quea vantamento históricosobre opapel dorecru- de umafamília(MISKOLCI, 2012). do pelo casamento e a consequente formação iliba- uma vida orientada pelo comportamento siderado umcidadãonacionalerapreciso ter Isso significava queparaobterstatusesercon- tocontrole dos homens que formavam a elite. de, colocandoemquestãoacapacidadedeau- a interrelação entre o Estado e a masculinida- ção viril”, oregime republicano trouxe consigo 2012, p. 43). ser evitadodetodasasformas” (MISKOLCI, equivalia ao passadoeatraso,quedevia na esferadanatureza, oque,emnosso país, preensão dodesejocomoinstintooinseria a condutadobrasileiro, jáque,“[...]a com- um doscomponentescentraisparamoralizar biopolítico queenxergou asexualidadecomo perigosas”. Tratou-se, também,deumprojeto dos eeliminaroucontrolar asnossas“classes visava corrigir os nossos indivíduos degenera- “desejo danação” (MISKOLCI, 2012),oqual te impostapelaselites.Estaríamosdiantedo no planodamentalidadecoletiva culturalmen- capazes depromover mudançassubstanciais -econômico atéentãovigente,masnãoforam moveram doregime adesarticulação político- blica (1889).Essesfenômenoshistóricospro- escravos (1888)edaproclamação daRepú- dos ciopolítica queseviudiantedalibertação esses objetivos, dadaanossaorganizaçãoso- dealcançar em jogoeraummodoparticular Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 Izecksohn aofazer umle- (2013)observa, Desse modo, paraseconsolidaruma“na- homens de uma forma geral comportamentos homens deuma formageralcomportamentos homem” em algo evidente, logo, exigindo dos REIRA, 2010)quetransforma acondição“ser tre militarismo,virilidade eviolência(MO- (SANTOS, 2004,p. 55; grifosdaautora). oExércitoque servir para aprender aserhomem” ses sociaisaafirmaçãodeque“filhomeutem social tornou-secomumemdeterminadasclas- de”, demodo que atémesmono imaginário através de“ritos devalidação damasculinida - formação, comoasdoExército, porexemplo, ser interiorizadoespecialmente nas escolasde transformou-se emumatributoquedeveria O papelvirilcomocorrelativo “ser macho” durando até osdiasdehoje (SANTOS, 2004). nal doséculoXIXeinícioXX,per- Forças dofi- Armadascomoumtodo,apartir identidade militardoExército brasileiro edas foi fatorfundamentalparaaconstituiçãoda sentido davirilidadeatrelado àquelebinômio direta entre militarismoemasculinidadeo doenças” (IZECKSOHN,2013,p. 297). físicos, vistoscomoantídotoscontravíciose noções dehigieneeàvalorização dosexercícios “[...] emergentespadrões demasculinidade, às pelos egressos nacarreira militarbaseadaem danças demarcaram abuscaporascensãosocial das trouxeram prestígio àinstituição. Tais mu- ocorrido em1916,astransformaçõesrealiza- militarobrigatório,fato ticamente oserviço do Exército, quebuscouracionalizarburocra- cularmente noesteiodaspolíticasreformistas tismo enonacionalismo.- Alémdisso,parti e osensobélico,tendosuasorigensnopatrio- -se naaproximação entre acondiçãomasculina Existe, nessesentido,umavinculação en- équearelaçãoO quesepercebe, portanto, naturalizados pela identidade masculina assu- ditatorial (1964-1985), e permaneceu com mida. Nos termos de Bourdieu (2002), tería- a promulgação da Constituição Cidadã de mos a exteriorização do habitus enquanto uma 1988. Enquanto forças auxiliares do Exérci- “lei social incorporada” que acaba tornando a to, as PM incorporaram a cultura belicista e masculinidade naturalmente biológica. Decor- organizativa que as transformaram, também, Artigos re desse fato que a virilidade é uma construção em instituições militarizadas. Nota-se tal prer- relacional efetivada dentro de si mesma por rogativa pelas crenças e comportamento dos parte dos homens por envolver a perda da es- seus integrantes e pela lógica dos símbolos, ri- tima, da honra e da coragem que podem ser tos cotidianos e festivos, num modus vivendi demonstradas por atos violentos para o grupo baseado na interiorização do “espírito militar” de homens ao qual se pertence, de forma que (CASTRO, 2004). compartilhar atributos viris nas Forças Arma- das e nas polícias denota não ser identificado Então, se a cultura organizacional diz res- Fábio Gomes de França Fábio como “mulherzinha”, “fraco”, “delicado” ou peito ao modo como os indivíduos são sociali- “veado” (BOURDIEU, 2002). zados para reproduzir formas de existência ba- seadas em valores e sentimentos que garantam Essa percepção por parte de militares das a perpetuidade da instituição, inclusive com a Forças Armadas e de policiais militares em punição pela quebra das normas e regulamen- nosso país nos conduz para o campo da ho- tos vigentes (BRITO; PEREIRA, 1996), tem- mofobia, que pode ser compreendida como -se também que nesse conjunto de princípios um sistema de humilhação vivenciado no co- as regras morais do grupo servem de referencial tidiano e que se generaliza por meio da ação para a convivência dos seus membros. Entre de indivíduos, grupos e instituições, visando comportamentos formais e regulamentos mo- à manutenção ou mesmo criação de formas rais, os integrantes das polícias militares her- coercitivas para adequá-los aos modelos de se- daram a visão de mundo do Exército, o que xualidade e gênero considerados hegemônicos inclui a crença no ideal de virilidade que, da (PRADO et. al., 2014). Por esse prisma, se a forma como historicamente aconteceu nas violência homofóbica tem sua origem relacio- Forças Armadas, acompanhou o desenvolvi- nada ao ideal de virilidade, como este mecanis- mento da profissão. mo normalizador de construção da masculini- dade se caracteriza nas polícias militares? Nessas corporações, a formalização dos re- gulamentos mantém estreita relação com os O papel da virilidade na formação valores morais que norteiam a conduta dos policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia policial militar PM, o que se traduz no “pundonor policial No Brasil, enquanto forças públicas estadu- militar”4. Assim como ocorre no Exército, esse ais, desde a Constituição de 1934 as polícias aspecto deontológico acaba, pois, por servir de militares são subordinadas ao Exército brasi- mecanismo cultural para o enaltecimento do leiro, fato ratificado nas Cartas constitucionais éthos masculino em detrimento da presença posteriores, especialmente durante o período de indivíduos homoafetivos nos seus quadros.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 159 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 160 presente no mundodascasernasedaatuação termo revela ecomoreforço dopreconceito “gays”, com todaconotaçãopejorativa queo para quemnãoprova gostarde“mulher”. Os quenãopermitemespaçoscomportamentos apreendidas ereforçadas naexteriorizaçãode assim, umagramáticasimbólicadecrenças colegas deofício(MUNIZ,1999). Temos, de respeito ecompanheirismo obtidodos tipo de termômetro capaz de mensurar o grau sa eexigentedeseusdotesoperamcomoum monstração paraumaplateiapolicialvaido- “a desejadamacheza” esuaconvincente de- cial militarécoisade“sujeito homem”, pois, fica queexisteacrença nativa dequeserpoli- afirmação doidealdevirilidade. 235 “homossexual ou não” da descrição do artigo “pederastia” dotítulocrime e aexpressão tar peloSupremo Tribunal Federal, apalavra e aprovada a retirada do Código Penal Mili- to, mesmoqueem2015tenhasidovotada que éconsideradonormalidade.No entan- diferente, umapráticasexualdiferenciada do homossexual, segundoseustermos,comoalgo o códigonormativo tornaexplícitaacondição derastia ou outro ato de libidinagem. Vê-se que (CPM, 2006,p. 742),configuracrimedepe- em lugarsujeitoaadministraçãomilitar[...]” pratique atolibidinoso,homossexualounão, praticar, oupermitiromilitarquecomelese militar), acerca dos crimes sexuais que “[...] ano de1969,em plena vigência da ditadura Armadas quantopelasPMefoiaprovado no Código Penal Militar (usadotantopelasForças Não 235 do por acaso, encontramos no art. Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 de “gays” É nessesentidoqueMuniz (1999)identi- 5 , as práticas discriminatórias pela presença 6 nas corporações PM fazem parte da nascorporaçõesPMfazem parte que osPMrevelam ser: policial militartornam-se“indesejáveis”, já posição o possuidor deste demonstra ter para posição opossuidor destedemonstrater para maisdis- “[...] quantomaismalhado eforte, policiais militares desenvolvem acerca docorpo: 2015). Oquepassaavigorar éavisãoqueos com aposturamilitar(ANDRADE; FRANÇA, ser repudiados ecombatidospornãocondizer afetivos comotrejeitos feminilizadospassama condição corporalatrelada aindivíduoshomo- social de virilidade. Aspectos particulares da ciedade, emumacrença sustentadapeloideal a imagem da própria instituição perante a so- o orgulhosentidoporserumpolicialmilitare po passaaservistocomooelodeligaçãoentre éthos militararaison d’être daprofissão. Ocor- seus corposconcomitanteàimposiçãomoraldo virilde cial, osalunosencontramnaconstrução tura, pois, desde o processo de formação poli- “ser militar” reforça no “ser policial” talconjun- BURKE, 1992)e,noBrasil, parece-nos queo 2004; PALMIOTTO; UNNITHAN,2011; sine quanondaculturapolicial(REINER, divíduos homoafetivos tornaram-seconditio A açãodiscriminatóriaeodesprezo ain- te” provocativa (MUNIZ,1999,247-248). como destoante e, porsuavez, “naturalmen- sados àquelesatores, cujaopçãosexualsoa na formadeabordagem etratamentodispen- anunciados tantonaordem discursiva quanto tegorizados como“desviantes” costumamser sexuaisca- rância comoscomportamentos modo geral,odesprezo emesmoaintole- nativas, como ohomossexualismo. De um deliberada aversão às práticas sexuais alter- e informais, também são retratados pela sua atividades heterossexuais consideradasilícitas Conhecidos pelasuaadesãoincondicionalàs enfrentar a criminalidade. Nesse sentido, é co- der quais são as dores morais, ou melhor, o mum a associação entre o corpo e um ideal de sofrimento advindo do preconceito sentido masculinidade comum à instituição policial” por alunos homoafetivos que ingressaram na (OLIVEIRA, 2010, p. 102). Então, como ser carreira policial militar. Para tanto, entrevis- um policial militar “gay”? tamos quatro alunos do Curso de Formação Artigos de Oficiais da Academia de Polícia Militar de “Síndrome de Esparta”7: entre Salvador, na Bahia. Quanto à amostra, por se o orgulho, a vergonha e o tratar de uma pesquisa qualitativa, a relevância reconhecimento do número de entrevistados cede espaço para Segundo os relatos históricos, a homoafe- as apreensões subjetivas e o significado dado às tividade era admitida no exército espartano respostas (REY, 2005). Além disso, levamos em como forma de criar um laço de proteção en- consideração a diminuta presença de indivídu- tre os homens que, no campo de batalha, de- os homoafetivos frente à maioria dos que se Fábio Gomes de França Fábio veriam lutar para proteger seus amados. Essa consideram heterossexuais presentes no CFO, lógica social era circunscrita pela relação entre pelo menos, segundo nossa ótica. Ademais, um adulto e um jovem, sendo este ensinado entrevistar pessoas que vivem num ambiente por aquele como forma de preparação para a não afeito à liberdade de expressão quanto às guerra através da “pederastia” (BERNARDET, identidades homoafetivas, mesmo que a dis- 2001). No entanto, o mais famoso relato do tância, demanda a confiança dos entrevistados amor entre homens guerreiros na Grécia antiga para com o entrevistador e o comprometimen- fica por conta da existência do Batalhão Sagra- to entre os próprios entrevistados, que criam do de Tebas, criado em 378 a. C. e formado um pacto de “sigilo” entre eles, mediado pela por 300 homens que formavam 150 casais de amizade. Destaco tal informação pelo fato de amantes. Sob a liderança de Epaminondas, que me foi possível chegar aos entrevistados esse exército lutou bravamente nos campos de por meio de um deles, que serviu como elo de batalha, sendo derrotado 40 anos depois pelas ligação com os demais.8 tropas de Filipe, da Macedônia (PASTORE, 2011; LUDWIG, 2002). As entrevistas foram estruturadas com questões abertas e realizadas por e-mail. O Ao contrário dos relatos históricos, assumir contato com os entrevistados foi estabelecido sua homoafetividade em uma caserna policial pelo fato de um deles ter procurado este pes- militar ainda não é motivo de orgulho, mas quisador pelas redes sociais após ter tido aces- sim de ocultamento desta face da identidade so a um trabalho lançado na Revista Brasileira policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia individual e social. Na profissão PM, não se de Segurança Pública.9 Nesse processo, nossa atua nas ruas com o intuito de se proteger um maior preocupação foi resguardar as identida- suposto amado, mas a si mesmo, já que o que des dos alunos, bem como os anos de que par- está em jogo é a sua imagem, a qual carrega ticipam da formação.10 Como quadro ilustra- consigo, também, a imagem institucional. tivo, atualmente a Academia de Polícia Militar Desse modo, fomos em busca de compreen- da Bahia possui um total de 115 alunos (sendo

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 161 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 162 mens e4mulheres. mulheres; quantoaoterceiro ano,são25ho- se total,osegundoanopossui79homense7 86 dosegundoanoe29terceiro ano).Des- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 entrevistas. primeiro ano,pelomenosatéarealização das muito discreto”, outera“homossexualidade des “por sermuito discreto enãoassumido”. O AlunoCacrescenta quenãopassadificulda- homossexualidade nãoéassumida” (AlunoB). mais pelasegundacondição,atéporque minha que já passei por situações constrangedoras mossexual, tambémsounegro, masconfesso uma ‘blindagem’” (Aluno D); “Além de ho- o mundocivil.Estarnoarmárioéconfortável, do publicamente,nãosintodificuldadescom condições homoafetivas: “Por nãoserassumi- publicamente paraasociedadeacerca desuas bém deixamclaro qualéaimagemquecriam rem aidentificaçãocomprofissão PM,tam- B); “Identificação comaprofissão” (AlunoC). do emeidentifiqueicom aprofissão” (Aluno pre sonheiemsermilitar. Fiz ocursodesolda- “Sempre admirei aprofissão” (AlunoA);“Sem- justificam abuscapelacarreira policialmilitar: lização profissional. Os próprios entrevistados nas PM),paraalcançarreconhecimento erea- militares (tantonasForças Armadasquanto do preconceito àhomoafetividadenascasernas reiras militares mesmosabendo daexistência duos homoafetivos resolvem ingressar emcar- “síndrome deEsparta”, ouseja,quando indiví- compreender oquepassamosadenominarde Nas falasapreendidas percebemos que“ser Por outro lado, os entrevistados, ao assumi- Nesse percurso, asrespostas noslevaram a 12 11 Não existiamalunosno descrevem aforça daqueladiantedesta: des sociais,amilitarehomoafetiva, osalunos tange especificamenteaassumirduasidentida- cesso deidentificaçãocomacarreira. No que pela culturamilitarreconhecendo-se nestepro- passam a aceitar as regras do ideal promovido MACHADO, 2008) seacentua,poisosalunos essa “hierarquia dainvisibilidade” (PRADO; mação possaparecer, nocasodacarreira militar tação social.E,pormaisevidentequetalafir- homoafetivo noBrasil dizrespeito anãoacei- pública reforça aideiadequeserumindivíduo pela “blindagem” socialutilizadanaimagem não assumida” eaindasesentir“confortável” por serem afeminados demais ou assumidamente colegas sendovítimasdehomofobia explícita, vi emsituaçõesconstrangedoras, masjápresenciei blemas. Comosalunostambémnunca meenvol- “Com oscoordenadores eoficiaisnuncative pro- e depoucosamigos...” (AlunoB). tando contatocomalunos.Soumuitonaminha trancando cadavez maisnomeumundo, evi- queencontreiA forma delidarcomissofoime issosozinho,B) fazer jáqueelegostadepau’. bradou, pra todomundoouvir:‘Deixa (Aluno rante arealização dessamissão, umdoscolegas para transferi-los para o almoxarifado, edu- fomos numamissãodepegarpausmadeira arrancando risosdoscolegas.Em outra ocasião, disse que‘ficariadifícilmeajudardessejeito’ morada, etambémdissequenão;daíeleme respondi não;depoisperguntouseeutinhana- da tropa, perguntouseeutinhafilhos,aoque ordem unida,porexemplo, umavez, nafrente mente dealunos.Um de capitãoqueéinstrutor piadas eindiretas deinstrutores eprincipal- que tenho trejeitos,zem não sei. Já ouvi muitas “Apesar denãoserassumido, algunsamigosdi- gays. Sobre evitar falar, não me sinto preparado, Nesse contexto, para Honneth (2003), a me coloco no lugar dos que são assumidos e me luta por reconhecimento atualmente perpassa imagino passando pelo que eles passam. Acho que não apenas o campo das desigualdades econô- hoje eu não teria estrutura psicológica pra lidar micas, mas especialmente os conflitos de ordem com a vida fora do armário” (Aluno D). moral, a partir de três dimensões (a família, a Artigos justiça e a sociedade), o que pode gerar, quando “Não sou assumido. Sou discreto, apenas alguns atendidos os direitos dos indivíduos, respecti- amigos próximos sabem de mim. Evito falar so- vamente autoconfiança (baseada no amor dos bre isso porque não gosto de que as pessoas me próximos e familiares); autorrespeito (quando a rotulem” (Aluno C). lei garante o exercício da normatividade jurídica no campo dos direitos) e autoestima (baseada “Não sinto dificuldades no curso por parte de na aceitação social). No entanto, parece-nos oficiais e coordenadores. Evito falar porque con- que as dimensões de reconhecimento tratadas Fábio Gomes de França Fábio sidero desnecessário. Acredito que a sexualidade por Honneth (2003) são formas exteriores de seja apenas uma faceta de nossa personalidade, e garantir uma autonomia democraticamente as- não precisa necessariamente estar envolvida com segurada. Nesse sentido, uma quarta dimensão a questão profissional” (Aluno A). deve ser problematizada quando o assunto diz respeito à condição homoafetiva de sujeitos in- Na análise das falas percebemos que o feriorizados socialmente: o reconhecimento de medo de serem rotulados acompanha o co- si mesmo. Nesse ponto, asseveramos por uma tidiano dos entrevistados, fazendo-os criar “moral do reconhecimento”, na qual “[...] esta- mecanismos de proteção que justifiquem a ria o autoconhecimento para lograr o respeito apatia na luta pelo reconhecimento de suas de si, condição para lutar pelo reconhecimento identidades, como quando se afirma o distan- de sua identidade e, com ela, situar essa luta no ciamento entre a vida profissional e a afetiva. rumo da busca pela cidadania, sem ter de abdi- A dura lição se evidencia nas brincadeiras de car da própria identidade” (OLIVEIRA, 2006, cunho sexual por parte dos colegas de tur- p. 54-55). Vislumbramos, pois, que essa dimen- ma ou na falta de profissionalismo dos co- são situa-se intrinsecamente nos indivíduos e, ordenadores e instrutores. Essa visualização nessa proposta inclusiva, “[...] isso significa que acaba servindo como campo simbólico para a demanda por direitos políticos passa a ser sus- mostrarmos a ausência da luta por parte dos tentada por argumentos de ordem moral e não alunos policiais contra a hierarquização social apenas políticos” (OLIVEIRA, 2006, p. 54). que os torna inferiores por serem considera- Aceitar e respeitar a si mesmo lutando por espa- policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia dos diferentes, pois, eles “[...] assimilam, na ços que garantam essa aceitação seria um passo construção de suas identidades sociais, as ca- fundamental para a aceitação pelo outro. racterísticas sociais e psicológicas negativas atribuídas a eles, fortalecendo e legitimando Só que, as idiossincrasias próprias da cop as formas de preconceito que incidem sobre culture sedimentam difíceis situações para os eles” (PRADO; MACHADO, 2008, p. 76). alunos policiais militares levarem em consi-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 163 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 164 da culturamilitarista: ideal devirilidadepresente naconsolidação ra apercepção dosalunossobre osentidodo signação doocultamentoafetivo deixamcla- eare(Aluno C).Omedodeserdescoberto - limitar aesseaspectodaminhasexualidade” descubram equepassemamerotular oume (Aluno B); “Tenho medo de que as pessoas “Jamais me assumiria.Acho e perigoso” forte são policial.Comoafirmamosentrevistados: sões” queenvolvem riscoeperigonaprofis- está sendotreinado pararesolver tantas“mis- talvez, a missão mais complicada paraquem se âmbito,“sair doarmário” temserevelado, desimesmos.Nessuas identidadesapartir - forma de luta política para a afirmação de deração amoraldoreconhecimento como Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 (Aluno A). damente gays ou que eles supõem que o sejam” que costumamestigmatizaros alunos assumi- reforçada porinstrutores epelospróprios colegas, homossexualidade éapiorpossível, esempre é Não existeespaçopara odiferente. Avisãoda toda atropa, dasmulheres. inclusive porparte “A instituiçãoexigeumapostura ‘de homem’ de nossa sociedade” (AlunoB). da polícia,ésóumreflexo doquejáexiste na mas acho que isso é cultural, extrapola omundo “Existe cobrança por virilidade,masculinidade, impõem medo” (AlunoD). nhar missõespoliciais,poisnãointimidamnem dos e tidos como ‘fracos demais’ para desempe- com facilidade, e muitas vezes sãodesacredita- vistas. Mulheres ehomossexuaisnãosãoaceitos Atitudes quedestoamdessepadrão nãosãobem a virilidade,agressividade, a‘cara fechada’. “A cultura policial valoriza a masculinidade, forte carregarforte issoconsigoesaber que haverá ro silenciaratomarpartido. Éumpesomuito me distanciosempre queasvejo. Hoje, prefi- as práticashomofóbicasde muitoscolegas,e de meassumir, pelomenosnãocontribuocom mentos passivos: “Já que não tenho coragem - que, para dirimir a culpa, aciona comporta vência psíquica,aqualdependedeatitudes fazem dosilêncioumespaçoparaasobrevi- políticas, asposturasdosalunos,naverdade, 2008). Na prática,distantedeserem atitudes da invisibilidade” (PRADO; MACHADO, zação e do preconceito próprios da “hierarquia rem “na pele” e“na alma” asdores daestigmati- assumirem suasidentidadesafetivas, porsenti- litar ensinam-lhesadescrença noorgulhode cotidiano daformaçãoeprofissão policialmi- aos alunos,asexperiênciasacumuladascomo “intimidar” e“impormedo”. naturalizados da identidade masculina como habilitasse osalunosademonstrarem aspectos fraco” comoseacondiçãohomoafetiva não incompatibilidade entre “ser homem” e“ser militar “gay”, aforça do discurso estabelece a parecem serambíguas,ouseja,umpolicial identidades sociaisquepelaimposiçãocultural licial militar como um todo. E ao assumirem lidade presente na formação e na profissão po- masculinidade” (OLIVEIRA,2004)edaviri- consciência quantoà“construção socialda Diante das condições e situações impostas Vê-se, que os alunos demonstram portanto, é naPM” (AlunoC). de ocorrências’ ou‘lugardegaysemulheres não como ‘só policiaishomensconseguemdarconta institucional reforça isso, pormeiodeideias A cultura valoriza amasculinidadeevisão pouca ou nenhuma aceitação verdadeira” (Alu- de forma forte e dolorosa. A primeira delas é no B); “Não costumo tomar parte nos deba- que, já trabalhando na rua, numa abordagem ter [sic] contra ou a favor. Apenas faço minha pessoal, lembro que havia uma mulher pra ser parte” (Aluno A); “Tento não reforçar comen- abordada, mas não havia a presença de policial tários e piadas homofóbicas e a defender, indi- feminina, e um dos colegas sugeriu que eu pro- Artigos retamente, esses policiais, ajudando-os sempre cedesse à abordagem, pois ‘era do mesmo sexo’ que possível e fazendo-os compreender que ser (na época, o colega era soldado também). Outra gay na polícia (mesmo que não assumido) não situação: precisei pedir auxílio psiquiátrico e é a pior coisa do mundo” (Aluno C). afastamento do serviço por quinze dias, e jus- tifiquei no trabalho que tinha feito um proce- Por fim, o apático posicionamento políti- dimento cirúrgico na garganta. Depois eu soube co dos alunos e a ausência de uma “moral do por amigos que esse Cabo com quem eu traba- reconhecimento” fazem emergir a vitória das lhava espalhou para toda a Companhia que o Fábio Gomes de França Fábio representações coletivas e sua força, no melhor motivo da minha cirurgia era por eu ter feito sentido durkheimiano, caracterizando a “sín- sexo oral demais”(Aluno D). drome de Esparta” como a ambivalente condi- ção de se sentir orgulho e, ao mesmo tempo, Considerações finais vergonha de ser um policial militar “gay”. Não A condição afetiva e sexual faz parte não é à toa que o Aluno D relata: “Durante a aula só da nossa constituição individual, mas tam- inaugural do nosso curso, nosso comandante bém está atrelada à designação de identidades disse que não toleraria a presença de homos- e papéis sociais que passamos a assumir como sexuais na polícia e que se descobrisse algum forma de inserção no mundo social, o que na turma, este deveria ‘pedir baixa’13, porque nem sempre é motivo de consenso, e sim de ‘lugar de viado não é na polícia’”. Além disso, conflito, quando passamos a ser considerados relembram os alunos: desiguais socialmente, por sermos diferentes. Essa diferença, portanto, por estar entrelaçada “Uma situação desconfortável que aconteceu nas por nossas preferências afetivas, define-se pela primeiras semanas do curso foi quando, sempre visão culturalmente construída pela sociedade que eu entrava no banheiro (que nos quartéis é por uma “hierarquia da invisibilidade”. compartilhado), alguns colegas gritavam ‘pista quente’ (a expressão é usada nas aulas de tiro pra Foi a partir dessa hierarquia estigmatizado- indicar que as armas estão prontas para disparo, ra que buscamos compreender como alunos demandando portanto cuidado por parte das pes- do Curso de Formação de Oficiais da Polícia policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia soas que estiverem no stand de tiro e, por analo- Militar da Bahia, enquanto indivíduos homo- gia, no banheiro, eles anunciavam a presença de afetivos, se veem diante do orgulho de serem um ‘perigo’, de um gay no local)” (Aluno A).14 policiais militares em formação e, ao mesmo tempo, sentirem-se envergonhados diante do “Tive algumas experiências marcantes enquan- olhar do grupo. Essa visão compartilhada pela to soldado.15 Duas ficaram fixadas na memória cultura policial militar enseja a “construção

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 165 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 166 constante. res hierárquicos ecolegasdecurso)éatônica (desuperio- para evitararotulação dogrupo cimento, jáqueomedode“sair doarmário” deixar espaçosparalutaspolíticasporreconhe- Essa situação inferioriza-os moralmente sem em quesofrem preconceito porserem “gays”. alunos comaprofissão PM,aomesmotempo que nospossibilitatraduziraidentificaçãodos namos chamar de “síndrome de Esparta”, é o afetivos nascasernas. possibilitando apresença deindivíduoshomo- enaltecimento da condição “ser homem”, não mentos caros àculturamilitarista,quevisa o social damasculinidade” edavirilidade,ele- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 Portanto, essefenômeno,queconvencio- 14. 13. 12. 11. 10. 9. 8. 7. 6. 5. 4. 3. 2. 1. presença doshomossexuais nosquartéis ofato deque estes nãosãocapazes decontrolar seusinstintos diante dapresença dehomens, não a para justificativa como usam heterossexuais os que relatar ao Armadas Forças nas fenômeno mesmo o observa (2008) D’Araújo Expressão nativa dacultura policial militar quesignifica desistência. foramOs e-mails respondidos aolongodomêsdejaneiro de2016. Informações obtidas com umdosentrevistados. período detrês anos.Logo, os alunosentrevistados poderiamseridentificados caso expuséssemos oanoaquepertencem. Destacamos esta informação pelo fato do Curso de Formação de Oficiais ser um bacharelado em segurança pública e funcionar durante um Ver França e Gomes,2015. do alfabeto –quetambém serviupara diferenciá-los. dispuseram livremente, a participar da pesquisa. Para por meio dos e-mails, resguardar asidentidades dos mesmos, utilizamos uma letra dosdemais.Nãofoiobter preenchido oe-mail nenhumTermo deConsentimento Livre eEsclarecido, noentanto, osentrevistados se Todos os contatos feitos com os entrevistados deram-se, como destacado, Após um primeiro contato por e-mail. com um deles, foi possível visto quetais guerreiros ficaram historicamente conhecidos peloidealbelicista deseupovo. explicar umproblema sociológico. Neste caso, fazemos alusãoaomito dosguerreiros espartanos daGrécia Antiga para cunhar tal termo, Utilizamos a palavra “síndrome” ao modo como Rolim (2006) explica a “síndrome da rainha vermelha”, ou seja, como uma metáfora para O usodapalavra gayaolongodotexto serve para denotar propositadamente asuapejorativação. do artigo235Código Penal Militar. Disponível em:. Ver decisão do Supremo Tribunal Federal sobre Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 291 acerca da constitucionalidade policial militar éomesmoqueagircontra oregulamento eaética daprofissão. disciplinares oucódigos deética detodas asPM brasileiras, bemcomo, éumanormadeconduta. Nesse sentido, ircontra ouferir opundonor O pundonorpolicialmilitar, quepodesertraduzido porhonra, decoro oudignidade,dizrespeito aumconceito encontrado nosregulamentos Gostaria deagradecer aoProfº AdrianodeLeón pelarevisão epelascontribuições dadasaotexto. O mesmoalunopolicialqueparticipadoCurso deFormação deOficiaisnas Polícias Militares, mas também nas Forças Armadas. utilizada pelospoliciaismilitares, oqueserá constatado nasfalas dosalunosentrevistados. usual forma a é homossexualidade científica, categoria da além para que, também esclarecerdevemos entanto, No homossexualidade. mesmo queapalavra carregue consigo umavisãoromanceada emilitante quevisadesconstruir opesopejorativo daexpressão Utilizamos otermo homoafetividade, aolongodotexto como umacategoria deanálisenosestudossociológicos queabordam oassunto, to. Quem sabeumdia...”. pra seressehomem,nemviver esseexérci- cito de um homem só’. Hoje, não tenho pulso que combateessaprática um dosentrevistados: “Penso queoguerreiro mento afetivo”, oumelhor, pelaspalavrasde segundo nossaótica,uma“ética dosilencia- cimento” peloautorreconhecimento torna-se, litaristas como asPM,a“moral do reconhe- de virilidadetraduzidopelasinstituiçõesmi- ção históricado“desejo danação” eseuideal estigmatizador. Em meio à força da consolida- des deresignação eapatiadiantedoprocesso que aliviemosentimentodeculpapelasatitu- criação deumasériemecanismosdefesa vidades naesferaemotiva e,alémdomedo,a Aos alunosresta anegaçãodesuassubjeti- 16 vive como ‘um exér- 17 como no compartilhamento de barracas em acampamentos militares. Tal situação pode vir a ameaçar a tranquilidade da tropa, bem como colocar em evidência o desrespeito aos padrões morais exigidos pela profissão de cunho militar. Disponível em: www.migalhas.com. br>art200806618-1.

15. Como as duas formas de ingresso nas corporações policiais militares são por concurso público ou por meio do Exame Nacional do Ensino Médio, para frequentar o curso de ora analisa, e através de concurso público para frequentar o Curso de Formação de Soldados, ocorre de soldados já formados ingressarem no CFO para ascenderem na escala hierárquica institucional, já que ser soldado diz respeito a estar localizado na base da hierarquia PM. Artigos 16. Referência à luta na caserna PM contra o preconceito aos indivíduos homoafetivos.

17. Aluno D. Fábio Gomes de França Fábio “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 167 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 168 BURKE, Marc. Cop culturehomosexuality. and Marc. BURKE, de Janeiro, 30(4):138-165, jul/agode1996. culturana organizacional:iniciação ção militar.a BRITO, Mozar José de; ValériaPEREIRA, da Glória. Socializa- Bertrandro: Brasil, 2002. BOURDIEU,Pierre. Contexto, 2001. Jaime. PINSKY, In: questão,a é não ser não BERNARDET,ou Ser Jean-Claude. 2015. p. 241-264. Ideia, Pessoa: João violência. e polícia humanos, direitos (Org.). dos Batista ardo Edu- Carlos SANTOS, de; Gomes Fábio FRANÇA, In.: licial. po profissão a e jurídica efetividade a sobre estudo um preconceito: e homossexualidademilitar, Polícia de. mes Fábio Nayhara Go Pereira Helena ANDRADE, FRANÇA, de; Paulo: Geração Editorial, 2002. São Brasil. do marinha na homossexualidade de história ALVES,BARCELLOS,Flávio; Sérgio. bibliográficas Referências Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 D’ARAUJO, Maria Celina. D’ARAUJO, Maria (org.). 2ªEd. AméricaJurídica,2006. RiodeJaneiro: In.: 1969. de outubro de 10 de 1.001, nº Decreto-Lei MILITAR. PENAL CÓDIGO Jorgeserna. RiodeJaneiro: ZaharEd., 2004. CASTRO,Celso. nal, [S.l.], v. 65, n.1, p. 30-39, jan./mar. 1992. ______. do e civilização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993. v. 2. Norbert. ELIAS, 1976. Mary.DOUGLAS, 01 ago2016, às14:00horas. ças armadas no Brasil. Zahar Ed., 2011.v. 1. Jorge Janeiro: de Rio Jungmann. R. de Tradução tumes. : uma história dos cos dos história uma civilizador: processo O : um antropólogo na ca - na antropólogo um militar: espírito O : formação do Esta- processodo formaçãoO civilizador: . São Paulo: Perspectiva,Paulo: São Purezaperigo. e . Rio de Janei - de Rio masculina. dominação A ã Paulo: São preconceito. do faces 12 . Equipe América Jurídica América Equipe 1. em 13 2008. Disponível em: . Acesso em: Estudos em segurança pública: segurança em Estudos Mulheres, homossexuais e for e homossexuaisMulheres, Toqueuma silêncio: de Policejour , Rio RAP, - - - - - Política) -IUPERJ, RiodeJaneiro,Política) -IUPERJ, 1999. Ciência em (DoutoradoTese f.. 286 1999. Janeiro. de Rio de ser”: cultura e cotidiano da Polícia Militar do Estado do Jaqueline. MUNIZ, 2010. dez. v.p.321-335,[S.l.],2, tendências , n. e 10,debates jul./ militar.corpo o e Virilidade Rosimeri. MOREIRA, me Editora, 2012. Annablu- Paulo: São XIX. do fins de Brasil no branquitude Richard. MISKOLCI, versity Press (C.U.P.), 2002. Uni- Cambridge theory.Cambridge: political Greek in nity Walter.Paul LUDWIG, , JoãoPessoa,balho Edição 27-30, 2009. perdido. falo do busca em direito e futebol mão: na caneta e pé no Bola de. Adriano LEÓN, Unesp, 2013.p. 267-297. (Org.). AMANTINO,Márcia Mary; PRIORE, DEL In.: Brasil. no social classificação e masculina condição compulsório, tamento Vítor.IZECKSOHN, recruhomem: - ser eraperigoso Quando moral dosconflitos sociais.São EditoraPaulo: 34, 2003. Axel. HONNETH, ções depsicanálise.SãoPaulo: AbrilCultural, 1978. In: civilização. da mal-estar O Sigmund. FREUD, 142-159, ago/set 2015. Paulo,São v.p.SegurançaPública, 2,Brasileira de n. 9, militar.policial curso um sofrimentoem do gogia peda- a sobre estudo um aguentar,corra!”: não “Se rias. Fa- de Letícia Janaína GOMES, de; Gomes Fábio FRANÇA, Graal,Rio deJaneiro: 2007. ______. Fontes, 1999. ______. nas prisões. Vozes, RiodeJaneiro: 1987. FOUCAULT,Michel. História dos homens no Brasil . São Paulo: Editora História da sexualidade I: a vontade de saber. . São Paulo: Martins Martins Paulo: São sociedade. da defesa Em : a gramática a reconhecimento : por Luta “Ser policial é, sobretudo, uma razão : história das violências das história punir: e Vigiar masculinidade e masculinidade nação: da desejo O : desire and commu- and desire polis: and Eros Revista política e tra- e política Revista História: Cinco li- Cinco Revista OLIVEIRA, Jonas Henrique de. O corpo como significado ou Camilo; FIGUEIREDO, Isabel Seixas de. Segurança pública o significado do corpo: poder, violência e masculinidade e direitos humanos: temas transversais. Brasília: Minis- na polícia militar. Vivência, [S.l.], n. 35, p. 101-117, 2010. tério da Justiça, Secretaria Nacional de Segurança Pública, 2014. p. 57-79. Artigos OLIVEIRA, Pedro Paulo de. A construção social da mas- culinidade. Belo Horizonte: Editora UFMG; Rio de Janeiro: RAGO, Margareth. Prefácio. In.: MISKOLCI, Richard. O de- IUPERJ, 2004. sejo da nação: masculinidade e branquitude no Brasil de fins do XIX. São Paulo: Annablume Editora, 2012. p. 13-15. OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. Caminhos da identidade: ensaios sobre etnicidade e multiculturalismo. São Paulo: REINER, Robert. A política da polícia. São Paulo: Edusp, Editora Unesp; Brasília: Paralelo 15, 2006. 2004.

PALMIOTTO, Michael J.; UNNITHAN, N. Prabha. Policing REY, Fernando González. Pesquisa qualitativa e subje- and society: a global approach. Delmar: Cengage Lear- tividade: os processos de construção da informação. São

ning, 2011. Paulo: Thompson, 2005. Gomes de França Fábio

PASTORE, Fortunato. O batalhão sagrado de Tebas: milita- ROLIM, Marcos. A síndrome da rainha vermelha: policia- rismo e homoafetividade na Grécia antiga. Revista Trilhas mento e segurança pública no século XXI. Rio de Janeiro: da História, Três Lagoas, v. 1, n. 1, p. 39-51, jun./nov. Zahar; Oxford, Inglaterra: University of Oxford, Centre for 2011. Brazilian Studies, 2006.

PRADO, Marco Aurélio Máximo; MACHADO, Frederico Via- SANTOS, Miriam de Oliveira. Berços de heróis: o papel das na. Preconceito contra homossexualidades: a hierarquia escolas militares na formação de “salvadores da pátria”. da invisibilidade. São Paulo: Cortez, 2008. São Paulo: Annablume, 2004.

PRADO, Marco Aurélio Máximo et. al. Segurança pública WEBER, Max. Ensaios de sociologia. Hans Gerth; C. Wright e população LGBT: formação, representação e homofobia. Mills (Org.). Tradução de W. Dutra. 5. ed. Rio de Janeiro: In: LIMA, Cristiane do Socorro Loureiro; BAPTISTA, Gustavo Guanabara, 1982. “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 169 “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Artigos Fábio Gomes de França 170 Palabras clave: lleva esosindividuosaocultar suauto-reconocimiento. que invisibilidad” la de “jerarquía una revela se Finalmente, sexual y afectiva de sus identidades para que se les acepten. el cuartel deformación, negandopúblicamente ladimensión otro, esoalumnosseconforman alasreglas encontradas en militar haciaelperjuicioencontra alumnoshomoafectivos; al contradictoria: a un lado, tenemos la cultura delcuartel policial partir delasrespuestas obtenidas, constatamos unasituación cuestionarios con cuestionesA abiertas, enviadas pore-mail. ambiente deformación policialmilitar. Para eso, hemosaplicado la presencia dealumnoshomoacfetivos masculinos enun valores belicistas, intentamos comprender como seconstituye cultura institucional en la que el atributo “ser hombre” fortalece los de cuarteles policiales y de la consiguiente naturalización de una realidad la en masculina” “dominación evidente la Policía MilitarDeesamanera, delestad deBahia. considerando han ingresado en el Curso de Formación de Oficiales (CFO) de la Este artículo examina lavisióndealumnoshomoafectivos que en laformación policialmilitar homofobia y preconcepto invisibilidad”: la de “Jerarquía Resumen Fábio Gomes deFrança homofobia naformação policialmilitar “Hierarquia dainvisibilidade”: preconceito e Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 154-170, Ago/Set 2016 Policía Militar. Virilidad.Homoafectividad. these individualsto concealing theirself-recognition. leads that unveiled is invisibility” of “hierarchy a Finally, dimension of theiridentities inorder to gainacceptance. training barracks, publiclydenying thesexual andaffective students, thisgroup adheredto thecultural ruleswithinthe police barracks involved prejudice againsthomoaffective a contradictory situation:whiletheculture of military administered byTheresponses obtained revealed e-mail. this end,questionnaires containing openquestionswere male students inamilitary police training To environment. values, we seekto understand thesituationof homoaffective bellicose underpins manly” “being of attribute the which and consequent naturalizing of aninstitutionalculture in prevailingdomination” policeevidentbarracks“male within the of view In Bahia. of Police Military the of (CFO) Course Training Officers the on enrolled students homoaffective of trainingThis articleexpounds ontheview police military in homophobia and prejudice invisibility”: of “Hierarchy Keywords: Abstract . Virility. Homoaffectivity. Data derecebimento: Data deaprovação: 25/08/2016 16/05/2016 Artigos Fábio Gomes de França Fábio “Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar na formação e homofobia preconceito da invisibilidade”: “Hierarquia

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 154-170, Ago/Set 2016 171 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

172 David Maciel de Mello PNAD de2009 Vitimização eAcesso àJustiça da (in)segurança nosuplemento geográficas dosentimento de Zonas variações domedo: Sociais pelaUFRJ. Doutorando e mestre em Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Graduado - UFRJ. em Ciências David deMello Maciel Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 Vitimização. Medodocrime.Percepção derisco. Palavras-Chave para pesquisasfuturas. tados, com exceção daParaíba. Aconclusão busca aprofundar osresultados, delimitar seualcance esugerircaminhos tem o domicílio como nível preponderante. Este padrão aparenta ser válido para o Brasil e tende a se replicar nos es insegurança de sentimento o geograficamente enquanto acumulável, segurançaseja de sentimento o que de hipótese levantam a resultados Os variações. terceira suas a explora enquanto cidade, e referência, domicílio, bairro gráficos de percebido emedodocrime.Asegundaparte trata dospressupostos teóricos desuaoperacionalização nosníveis geo risco de misto fenômeno como definido conceito,é do históriaele a brevesobre introduçãoApós domicílio. no quando rência. Oobjetivo éexplorar emquemedidasuaocorrência nacidadeacompanha omesmosentimento tanto nobairro refe de local segundo 2009, de PNAD segurança/insegurançana de sentimento do variações as aborda trabalho Este Resumo [email protected] - - - Artigos David Maciel de Mello Surveys de vitimização e medo do crime: EUA e Brasil

história do conceito de sentimento de et al. (2014, p. 23-239) elencaram 40 surveys Ainsegurança começa com as pesqui- do gênero realizados no país até 2012. À lista sas de vitimização, que nasceram na década de fornecida pode-se acrescentar outros dois: a Pes- 1960 no EUA. No início, seu objetivo era averi- quisa sobre as Condições de Vida e o Acesso das guar o descompasso entre as estatísticas oficiais e Pessoas a Serviços Públicos aqui na sua Região a incidência “real” de crimes: o fato de que, por (PCVAPSP), realizada pelo Instituto de Estudos diferentes razões, nem todos os eventos desse Sociais e Políticos da Universidade Estadual do tipo chegam ao conhecimento das autoridades. Rio de Janeiro (UERJ/Iesp) em parceira com o

Ibope (BORGES, 2013); e a Pesquisa Nacional da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento Mas se as pesquisas de vitimização nasceram de Vitimização (PNV), realizada pelo Centro de por causa das “cifras ocultas da criminalidade”, Estudos de Criminalidade e Segurança Pública não deixaram de assimilar outras preocupações ao da Universidade Federal de Minas Gerais em longo do tempo. Entre elas está o medo do crime. parceria com o Instituto Datafolha e a Secreta- no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas Em determinado lugar e em determinado mo- ria Nacional de Segurança Pública (DATAFO- mento, a taxa de criminalidade real pode ser das LHA; CRISP; SENASP, 2013). mais altas, mas não necessariamente as pessoas te- rão medo de serem vitimadas. Com a introdução Na lista mencionada, amostragens em es- desta variável, entra em questão um gap de outro cala nacional são exceção à regra. Entre os 42 tipo: aquele entre realidade objetiva e subjetiva. surveys de vitimização já realizados, apenas 5 possuem amostras representativas de todo o No Brasil, as pesquisas de vitimização co- Brasil: 1) a PNAD de 1988; 2) um módulo da meçaram tardiamente, apenas em 1988. Zilli Pesquisa Social Brasileira (Pesb) de 2002, rea-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 173 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

174 David Maciel de Mello neighborhood atnight/duringthe day?” (‘Quão you fillorwould you fillbeingoutalonein your da noNational Crime Survey: “how safedo derivadas deperguntassemelhantes à utiliza- lêmica acerca dasvariáveis demedo docrime por baseossurveys de risco oumedodocrime? Sentimento o queé,afinal,sentimentode(in)segurança. cessárias algumas considerações teóricas sobre tes deprosseguir paraaanálise,porém, sãone- resultados econclusõesexpostosaseguir. como a todos aqueles que queiram replicar os blicos facilita o acesso não só ao pesquisador, robusta. Por fim,ofatodeosdadosserem pú- lita desagregar os dados por estado de maneira quanto seuelevado tamanhoamostralpossibi- traçar resultados válidos paratodoopaís,en- 2010a). Sua abrangêncianacionalpermite Acesso àJustiça explorada: osuplementode Vitimização e trabalho porutilizarumafonteaindapouco que acabapordificultarsuacomparação. da pelafaltadepadronização metodológica,o ção oufoireaplicada. Aspesquisaspecamain- nacional ounão,possuiregularidade deaplica- cípio, comfoconaRegião Sudeste. Nenhuma, território doestadoouaomuni- 2014). Todas asdemaisserestringem ouao SENASP, 2013;ZILI;MARINHO;SILVA, (BORGES, 2013;DATAFOLHA; CRISP; a PCVAPSP de2010;5)aPNV2010-2012 zação eAcesso àJustiça lizada peloDataUFF; 3)osuplemento Vitimi- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 No densocorpus Apesar dessasdificuldades,optou-seneste de da PNADde2009(IBGE, segurança de vitimização,háumapo- da PNADde2009;4) de estudosquetêm : percepção 1 An- de qualquerobjeto exterioraosujeito. Aqui ele extremoconstrutivismo que negaaexistência tos dessasdefiniçõesnavida emsociedade. irrelevantes. Ointeressante éolharparaosefei- taxas decrimesquecorrespondam aomedosão pressuposto, questõessobre seháounãoaltas reais emsuasconsequências”. Com base nesse situaçõescomo as definemcertas reais, elassão THOMAS, 1928,p. 571-572):“Se aspesso- no conhecido Teorema (THOMAS; deThomas matista americana,eletemsuamelhordefinição pa oeixo central. Derivado dasociologiaprag- teórico, oconceitodedefiniçãosituaçãoocu- tação deRisco(MIR).Dentro deseuecletismo quais osefeitosqueissotrazparasuasvidas. interpretar situaçõescomoperigosas–e certas usam dosrecursos domundoasuavolta para dades criminais,oautorexplicacomopessoas - simbólico, ecologiasocialeteoriadeoportuni uma competenteaglutinaçãodeinteracionismo os doisconceitosdemodoeficaz. Por meiode tion Risk, risco eomedodocrime. apercepção do possuem suasparticularidades: ciam doisfenômenossemelhantes,masque que procuram medir. Isso porque não diferen- de essasmétricasnãocorresponderem àquilo ge (1987)chamamaatençãoparahipótese Laub (1978), Warr (1984)eFerraro eLaGran- DuBow, McCabe eKaplan(1979), Garofalo e dia?’) do seu bairrozinho na à noite/durante rua o seguro você sesente ousesentiriaestandoso- Mas Ferraro Tal teseéchamadadeModelo deInterpre- Em (1972 apudFERRARO, 1995,p. 22). Fear ofCrime: Kenneth F. Ferraro (1995)distingue não adotaumaposturade Interpreting Victimiza- concorda com Goffman (2012, p. 23), quan- de medo. Para o autor, este sentimento é uma do este diz que os atores não criam definições resposta puramente emocional às experiências de situação ao seu bel-prazer. Antes, tentam potencialmente danosas a si. Segundo ele, o sincronizar suas interpretações do que está medo desencadeia numerosas modificações acontecendo, do ponto de vista de seus papéis corporais – principalmente hormonais – que Artigos sociais. Para evitar cair na armadilha do idea- podem ou empoderar o sujeito ou aliená-lo lismo radical, o MIR incorpora uma distinção, de vez de seu autocontrole corporal. Uma si- já traçada por Thomas & Thomas (1928), en- tuação de risco pode gerar a descarga de altas tre situação e definição de situação. Enquanto a doses de adrenalina no sistema endócrino, o primeira se refere às condições objetivas sob as que estimula a ação para superar o perigo. Ou quais o sujeito se encontra, a segunda trata da então o pavor pode ser tão grande ao ponto de experiência subjetiva (FERRARO, 1995, p. 9) levar o indivíduo à total paralisia e inação. David Maciel de Mello O corolário deste arcabouço teórico com- O autor de Fear of Crime reconhece que preende três conceitos. Primeiro, há o risco real, capturar esse estado emocional em questionários que capta a chance objetiva de vir a ser vítima de não é tarefa das mais fáceis. No máximo, o que se determinado tipo de crime. É o que os surveys pode fazer é pedir ao entrevistado que diga como de vitimização tentam prever. O risco percebi- se sente numa situação imaginada. De fato, é o do vem em segundo. Ele define o julgamento que ele faz em um survey de elaboração própria, o cognitivo pelo qual se interpreta uma situação Fear of crime in America Survey, no qual testa como perigosa. Para tanto, pode-se usar de toda sua hipótese. Primeiro, demanda ao entrevistado a informação disponível ao redor: estatísticas que avalie o seu medo em uma escala de 1 a 10 oficiais, taxas de vitimização, notícias de jornal, para 10 tipos de crimes diferentes. Esta é a medi- conversas com conhecidos, traços de incivilida- da de medo do crime. Em seguida, pede que ava- de no bairro, percepção de si como “boa víti- lie, na mesma escala, a chance de vir a ser vítima ma”, experiência de vitimização prévia ou de al- em 10 tipos de crimes diferentes no ano subse- da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento gum outro dado significativo. Em terceiro e por quente. Esta última é a métrica de risco percebido último, o medo do crime, que representa uma (FERRARO, 1995, p. 35). resposta emocional de pavor que pode ocorrer após a percepção de risco. (FERRARO, 1995). Seja como for, esse procedimento tem o no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas Se o risco real equivale à situação e o risco perce- mérito de distinguir dois fenômenos antes bido, à definição de situação, o medo do crime é amalgamados. Por conseguinte, chama a aten- a consequência. Colocando os termos em uma ção para a possibilidade de alguém perceber sentença estruturalista, temos que: risco real : si- claramente os riscos de vitimização e mesmo tuação :: risco percebido : definição de situação :: assim não a temer – seja porque se acha capaz medo do crime : efeito da definição de situação. de lidar com a ameaça, seja porque é excessiva- mente confiante, ou até mesmo porque, como Todavia, Ferraro (1995, p. 24-25) parece tudo na vida, simplesmente se acostumou. Da adotar uma postura extrema na sua definição mesma maneira, pode-se possuir um medo ter-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 175 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

176 David Maciel de Mello e omedodocrime,apesardecorrelacionados nunca consigo. Em suma,apercepção derisco ta quetragédiassóacontecemcomosoutros, põe ao perigo ou simplesmente porque acredi- porque sabe queseu estilo de vida não a ex- derisco, que nãoseencontraemumgrupo para si –porque a pessoa tem consciência de plo, massemanecessáriapercepção desserisco rível de morrer de forma violenta, por exem- Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 Quadro 1– Pessoal Geral referência Nível de  referência Tipos depercepção decrime, segundonível de bairro durante anoite?) estando sozinho emseu sente ousesentiria (Quãoseguro voce se neighborhood atnight? being aloneinyour or would you feel How safe doyou feel Risco para si D casas durantecasas anoite?) estão seguras emsuas pessoas deste bairro (Você achaqueas at night? safe insidetheir homes in thisneighborhoodare Do you thinkthatpeople Risco para osoutros A Julgamentos Cognitivo tornar vítima de algum crime?) (Você sepreocupa emse crime? about becoming avictimof Are you concerned personally para si Preocupação sobre ocrime E ver ogoverno fazer algo) sobre oqualvocê gostaria de problema social–lista de10– (Escolha omaissério about government dosomething that you would like to seethe domestic problem (list of 10) Choose the single most serious os outros Preocupação sobre crimepara B Valores Tipos depercepção logia depercepções, reproduzida noQuadro 1. responder estaperguntapormeiodesuatipo- pletamente diferente? O mesmo autor ajuda a co oudomedocrime?Poderia seralgocom- ça? não sãoomesmofenômeno. e comaltaprobabilidade deocorrerem juntos, Ele estariamaispróximo dapercepção deris- Onde entra,então,osentimentodeseguran- cotidiana?) 16 crimes –nasuavida tornar vítimade–lista de (Quanto você teme se everyday life? of 16offenses) inyour becoming victimof (list How afraid are you of Medo davitimizaçãodesi F dos criminosos) está asalvo docrimee sobre sequemeuamo (Eu mepreocupo muito criminals ones from crimeand the safety of my loved I worry agreat dealabout outros Medo davitimizaçãodos C Afetivo Emoções Fonte: Ferraro (1995, p. 24). Já a PNAD, em seu questionário (IBGE, das hipóteses, um aglutinado de percepção de ris- 2010c : 64), aborda o sentimento de insegu- co e medo do crime (FERRARO, 1995, p. 23). rança da seguinte maneira: Além disso, estudos como o de Wilcox-Rountree e Land (1996) fornecem evidências adicionais ao Você se sente seguro(a) verificarem que um e outro se parecem em mui- Artigos a. No seu domicílio? tos preditores, ao mesmo tempo em que se dife- b. No seu bairro? renciam em outros. Destarte, pode-se dizer que o c. Na sua cidade? sentimento de (in)segurança lembra a vigilância dissociada de Goffman (2009), que aqui pode ser A pergunta da PNAD se assemelha mais conceituada como uma desconfiança latente no à questão da célula D na tipologia de Ferra- cotidiano, que leva o sujeito a estar sempre a pos- ro, que representa um julgamento cognitivo tos para uma reação.

pessoal de risco para si. Entretanto, quando David Maciel de Mello se pergunta a uma pessoa como se sente em Domicílio, bairro e cidade: três ní- determinada situação, há a sugestão para que veis do sentimento de segurança ela imagine como seria seu “estado de espírito” É prática comum dos surveys de vitimização, sob tais e tais circunstâncias. Nesse “estado de quando pesquisam o sentimento de insegurança, espírito” há certa dimensão de afeto que foge à averiguar a variação territorial do fenômeno. A esfera do racional – ainda que ele não seja tão PCVAPSP, por exemplo, distingue bairros conhe- agudo quanto o medo descrito pelo autor. Ao cidos de bairros desconhecidos (BORGES, 2013). mesmo tempo, o sentimento de insegurança A Pesquisa de Condições de Vida e Vitimização não deixa de remeter a uma dimensão sensorial (PCVV), realizada pelo Instituto de Segurança que não dissocia o sujeito do julgamento do Pública do Rio de Janeiro em 2007, separa o pró- ambiente a sua volta. Em que pese o aspecto prio bairro de outros bairros (DUARTE; PINTO; afetivo, o fenômeno não se encontra plena- CAMPAGNAC, 2008). A PNV, por sua vez, mente dissociado de seu lado racional. adota uma medida de medo do crime no local da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento de trabalho, em casa e na rua (DATAFOLHA; Portanto, o que é sentimento de insegurança? CRISP; SENASP, 2013). Já a PNAD, que aqui Percepção de risco ou medo do crime? Para os se utiliza como fonte, diferencia domicílio, bairro fins deste trabalho, opta-se por considerá-lo a e cidade (INSTITUTO BRASILEIRO DE GE- no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas mistura de ambos os fatores. Nem tão racional OGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010c). quanto o primeiro, nem tão emotivo quanto o segundo. No sentimento de insegurança parece Por trás dessas operacionalizações está a te- haver uma certa dose de afeto derivada do medo oria de que as pessoas se sentem mais seguras do crime, mas temperada com o julgamento cog- nos espaços que conhecem melhor em compa- nitivo do risco percebido. Ferraro concorda com ração àqueles lugares com os quais estão menos esta definição ao dizer que medidas como as do acostumadas. Ou seja, o sentimento de segu- National Crime Survey – às quais as questões da rança é encarado como correlato da familiari- PNAD se assemelham – representam, na melhor dade com o espaço. Quanto mais se conhece

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 177 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

178 David Maciel de Mello o mesmopara oslugares conhecidos? guro em lugares desconhecidos sem se verificar não conhecidos? Quão provável é se sentir se- conhecido tambémsesente assimnoslugares tumado? Quem se sente seguro no território queles lugares comosquaisseestámenosacos- de segurançanasáreas familiares serepete na- bairro e49,9%sentem-seseguros nacidade. cílio, 64,6%afirmamomesmoem relação ao dos entrevistados sesentemseguros nodomi- 2013, p. 151). Já na PNAD de 2009, 77,4% o bairro e 26,0%paraacidade(BORGES, minui, masarelação semantém:41,0%para mo horário. Durante anoite, proporção di- dia, emcontrastea43,0%nacidade,nomes- 63,0% sesentemsegurasnobairro duranteo SENASP, 2013,p. 228-229);naPCVAPSP, da cidadeemgeral(DATAFOLHA; CRISP; pria casa,emcomparaçãoa53,5%nasruas 84,7% daspessoassesentemsegurasnapró - nos menosconhecidos.Na PNV, porexemplo, sempre maior nos espaços mais conhecidos que proporção depessoasquesesentem seguras é intermediário dobairro. indiferente – odomicílioeavança atéomaisamploe que começanoespaçomaisíntimoefamiliar cidos. Já a PNADo hierarquiza em uma escala tomia de PCVV traduzem o fenômeno em uma dico- p. 108),de Teoria dasÁreas Concêntricas. que podemoschamar, paracitarSoares (2008, um lugar, maisseguro oindivíduosesente.É Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 No entanto, em que medida o sentimento Não qualaoperacionalização, importa Questões comoasdaPCVAPSP eda lugares conhecidosx – acidade–,passandopelonível lugares desconhe- Justiça daPNAD de2009foiaplicadoapes - do domicílio la suplemento da PNADde2009:acumu- O sentimento de(in) segurança no minhos parapesquisasfuturas. delimitar oalcancedosresultados esugerirca- identificados. Nessa seção tambémsealmeja do crimeparaproduzir quatro dos oitogrupos co percebido poderiasecombinarcomomedo dadescriçãodecomooris- da hipótese,apartir considerações teóricaseaprofunda aexploração A conclusãoretoma osresultados àguisadas tendência nacional–comexceção daParaíba. leiros eoDistrito Federal aparentam seguira Apesar dealgumasdiferenças, osestadosbrasi- entre desses oitogrupos asunidadesfederativas. Em seguida, busca-seinvestigar adistribuição mente tende a se replicar no bairro e na cidade. se manifestanodomicílio,quaseautomatica- enquanto osentimentodeinsegurança,quando de segurançasejaacumulável geograficamente, tados levantam ahipótesedequeosentimento sentimento de(in)segurançanoBrasil. Os resul- de geográficos foram identificadosoitogrupos meio da combinação das respostas possíveis, veis inferiores dobairro edodomicílio. Por do sentimentodesegurançanacidadenosní- lógicos. Aanálisecomeçacomadesagregação por meioderecursos gráficos e procedimentos cas dofenômenoemsuasdiversas combinações, ras. Optou-se porexplorarasvariações geográfi- mográficas, ecológicas ou de atividades rotinei- expliquem ofenômenoporvariáveis sociode- Para cumpri-lo,nãosãotestadosmodelosque perguntas constituioobjetivo destetrabalho. ção geográfica eacentralidade O suplementode Vitimização eAcesso à Fornecer subsídiospararesponder a essas soas de 10 anos ou mais. Com o intuito de sobre sentimento de segurança foram recodifi- ter mais precisão nas respostas, a amostra foi cadas para “seguro” e “inseguro”. recortada através da variável V2901, confor- me o dicionário de variáveis (IBGE, 2010b), Do total de 189.329 entrevistados, 94.900 para abarcar somente as pessoas que respon- (50,1%) relataram que se sentiam inseguros Artigos deram sobre si mesmas. O resultado foi um na cidade, enquanto 94.429 (49,9%) disseram total 189.329 casos, com 60,0% de mulheres que se sentiam seguros. No bairro, a quanti- e 40,0% de homens; idade média de 39 anos e dade de seguros foi de 122.336 (64,6%), en- 8,3% de autodeclarados negros, 43,5% de au- quanto os demais 66.993 (35,4%) responde- todeclarados brancos e 48,0% de autodeclara- ram que se sentiam inseguros. Já no domicílio, dos pardos. Pessoas que se identificaram como o número de pessoas seguras aumentou para “indígenas” ou “amarelas”, juntas, correspon- 146.493 (77,4%), enquanto as que relataram

deram a apenas 0,7%. Para facilitar a compre- sentimento de insegurança diminuíram para David Maciel de Mello ensão, as respostas “sim” e “não” às questões 42.836 (22,6%).

Figura 1 – Distribuição dos entrevistados, segundo árvore hierárquica dos sentimentos de segurança e insegurança e local de referência Brasil, 2009

Legenda: 189.329 Total Segurança 100% Insegurança suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento

Cidade 94.429 94.900 49,9% 50,1% Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas 5.056 13.963 61.937 Bairro 89.373 2,6% 17,4% 47,2% 32,7%

87.100 Domicílio 46% 2.273 2.875 2.181 31.123 1.840 25.395 36.542 1,2% 1,5% 1,1% 16,4% 1% 13,4% 19,3%

Fonte: PNAD 2009.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 179 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

180 David Maciel de Mello Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 nega essa tendência. Ou seja, o sentimento 46,0% dototal.Menos de4,0%daamostra quilas nobairro enodomicílio,oque perfaz da amostra–,87.100também sedizem tran- seguras nacidade–aproximadamente 50% baixo. Entre as94.429pessoasquesesentem no lado direito da figura, lidode cima para algo raro de ocorrer. Isso pode ser visualizado se sentirseguro nobairro e acumulável. Sentir-se seguro nacidadesem geográficos. Oprimeiro égeograficamente demodosdistintosentreportam osníveis to desegurançaeoinsegurançasecom- dois ladosdamesmamoeda,osentimen- e sereferem aototaldaamostra. gens foramaproximadas emumacasadecimal proporções dosníveis superiores. Asporcenta - sagrega nosníveis inferiores asquantidadese gunta. Ela hierárquica éumaárvore quede- domicílio? dade, tambémsesentemassimnobairro eno que relataram sentimentodesegurançanaci- plificando: quantos,dos94.429entrevistados nos espaçosmaisrestritos econhecidos.Sim- espaço mais amplo e desconhecido se repete a questão, pode-se perguntar se a segurança no dade, atravessando obairro. Para aprofundar micílio e diminui conforme se passa para a ci- a proporção depessoas segurasémaiornodo- confirma-se a Teoria das Áreas Concêntricas: to, osentimentodesegurança.Aprincípio, mínios dobairro edacasa,prevalece oopos- para osentimentodeinsegurança.Nos do- mente nacidade,comumapequenavantagem A Figura 1mostraque,apesardeserem A Figura 1procura responder aessaper- Seguros einseguros sedividemequanime- no domicílioé ro caso,osentimentode insegurança. “inseguro” etomarampor base,salvo oprimei- coloridas deazulpara“seguro” evermelho para no entendimento,ascélulas databelaforam compõem onível dodomicílio. Para auxiliar representados nafiguraanteriornositensque pos geográficos desentimento(in)segurança, respondem- aoquesepropõe chamardegru padrões deresposta (2x2=8).Eles cor- todas categóricas(“sim” e“não”), aotodohá8 tas possíveis paraastrês variáveis. Comosão de todas as uma classificação cruzada respos- É oqueprocura responder a Tabela 1.Ela é de sentimento(in)segurançapodemhaver? (in)segurança preponderante. o domicílioaparenta seraregião geográfica de. No sentimentodeinsegurança,portanto, o sentimentotantonobairro comonacida- cílio”), 36.542(19,3%daamostra)repetem de todososquadradosvermelhos do“domi- amostra, proporção representada pela soma dizem inseguras noseupróprio lar(22,6%da para acidade.Entre as42.836pessoasquese ele segeneralize tantoparaobairro quanto e adentraaresidência, émuitoprovável que dacasaultrapassa olimiarqueseparaarua lar. Contudo,quandoosentimentodeperigo bairro enodomicílio,ousomentepróprio de e,aomesmotempo,relatar segurançano padrão. Épossível sentir-seinseguro nacida- de insegurançanacidadenãosegueomesmo a percepçãoconhecidos. Em contrapartida, acompanha suaocorrência nosespaçosmais de segurançanosespaçosmenosconhecidos grupos Mas quantos tipos de experiências espaciais C ombinando geográficos respostas: de sentimento os oito de Tabela 1 – Número e distribuição dos entrevistados, segundo grupos geográficos de sentimento de (in)segurança Brasil, 2009 Artigos

Entrevistados

Classificação Nome Domicílio Bairro Cidade N. Abs. Distribuição do Grupo (%) Majoritário 1. Sentimento de Seguro Seguro Seguro 87.100 46,0 segurança total 2. Sentimento Majoritário de insegurança Inseguro Inseguro Inseguro 36.542 19,3 David Maciel de Mello generalizado 3. Sentimento Majoritário de insegurança Seguro Seguro Inseguro 31.123 16,4 somente na cidade 4. Sentimento de Majoritário insegurança no Seguro Inseguro Inseguro 25.395 13,4 espaço público 5. Sentimento Minoritário de insegurança Seguro Inseguro Seguro 2.875 1,5 somente no bairro 6. Sentimento Minoritário de insegurança Inseguro Seguro Seguro 2.273 1,2

somente no da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento domicílio 7. Sentimento Minoritário se insegurança Inseguro Inseguro Seguro 2.181 1,1

nos espaços mais no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas conhecidos 8. Sentimento de Minoritário insegurança nos Inseguro Seguro Inseguro 1.840 1 extremos Total: 189.329 99,9

Fonte: PNAD 2009.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 181 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

182 David Maciel de Mello Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 de insegurança se manifesta não nobairro nemnacidade.Seu sentimento que sesenteminsegurasnopróprio lar, mas domicílio. 6,porsuavez, édepessoas O grupo nhança –mesmoqueeleexista nareferência ao haver omesmo sentimento com relação à vizi- se chegaatéacidadesentindo-seseguro sem cumulativo dosentimentodesegurança:não proporção reforça ahipóteseacerca docaráter 2.875 pessoas,ou1,5%dototal.Sua baixa de quem se sente inseguro de conjuntominoritário. é Oquintogrupo amostra. Compõemoquesepropõe chamar menosde5%da desviantes, queperfazem 13,4% dototal. 25.395 casos, ou Aoperfaz todo, esse grupo o no espaço doméstico,ou seja, que apresenta daqueles que se sentem seguros apenasgrupo ou 16,43%doscasos).Por fim,nota-se o sentem inseguros somentenacidade(31.123, própria casa. Logodepoisvêm aquelesquese temida nacidade,nobairro eatémesmona anterior,da do grupo aqui a vitimização é rança generalizado . Em uma situaçãoinversa comsentimentodeinsegu- verifica-se ogrupo Em seguida, com36.542pessoas(19,3%), comamaiorproporçãogrupo populacional. as altastaxasdeviolêncianoBrasil, esteéo sentimento desegurança total.Não obstante micílio, bairro ecidade.Elas apresentam um sentem segurasnostrês níveis espaciais–do- depessoasquesetos (46,0%),estáogrupo tário. Em primeiro lugar, com87.100sujei- o quepodeserchamadodeconjuntomajori- dem acerca de95%doscasosecompõem sentimento deinsegurança noespaçopúblico. Já os padrões de 5 a 8 representam casos Os quatro correspon primeiros grupos - somente no domicí- somente no bairro: lio informação, mas paraoconjuntominoritário. e no Distrito Federal. O segundo traz a mesma majoritário ça paraaproporção populacionaldoconjunto deconfian- timativa porponto eosintervalos plotar os gráficosa seguir. No primeiro há aes- unidades federativas brasileiras? gurança. derância do domicílio no sentimento de inse- do sentimentodesegurançaquantoaprepon- proporção reforça tantoocarátercumulativo tremos. Assimcomoocasoanterior, suabaixa desentimentoinsegurançaeste grupo nosex - contra o“mundo láfora”. Resolveu-se nomear da privacidade eintimidade,últimafortaleza inseguros, assim como no próprio lar, reduto expectativas sãomenoscontroladas, sentem-se média –obairro. Na cidade,lócus seguros apenas noespaçodefamiliaridade é omaisintrigante. Seus membros sesentem menos de1%daamostra,ou1.840pessoas, apesardeperfazer O oitavo eúltimogrupo, de dodomicílionosentimentoinsegurança sentimento desegurançaquantoacentralida- porção reforça tantoocarátercumulativo do trevistados, ou 1,1% do total). de insegurança nosespaçosconhecidos(2.181en- foinomeadosentimento familiaridade, o grupo Uma vez queostrês espaçossãocorrelatos da domicílio e no bairro, mas seguras na cidade. 7aglutinapessoasquesãoinsegurasno grupo ção espacial do sentimento de insegurança. O o domicílioénível essencialnadistribui- proporção populacionalreforça aideiadeque (2.273 casos,ou1,2%dototal). Para responder aestaquestão,optou-sepor Mas até onde este padrão se repete nas 27 tanto noBrasil quantonosestados Sua baixa pro- em queas Sua baixa 2 Figura 2 – Proporção da população e intervalo de confiança do conjunto majoritário Brasil, 2009 Artigos David Maciel de Mello suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas

Fonte: PNAD 2009. Nota: O conjunto majoritário compreende as categorias de sentimento de segurança total, sentimento de insegurança gen- eralizado, sentimento de insegurança somente na cidade e sentimento de insegurança no espaço público.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 183 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

184 David Maciel de Mello Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 Nota: O conjunto minoritário compreende as categorias de sentimento de insegurança somente no bairro, sentimento de inseg- urança somente no município, sentimento deinsegurança nosespaços conhecidos esentimento deinsegurança nos extremos. Figura 3– Brasil, 2009 conjunto minoritário Proporção dapopulaçãoeintervalo deconfiança do

Fonte: PNAD2009. A barra vertical azul em ambas as figuras últimos contêm o do Brasil. Desta maneira, não representa o intervalo de confiança para a pro- parece haver diferença significativa entre os esta- porção de majoritários e minoritários para o con- dos e o país, tanto na proporção do conjunto ma- junto do Brasil. Pode-se visualizar que apenas 10 joritário quanto na do conjunto minoritário. das 27 unidades federativas brasileiras possuem Artigos ICs que se sobrepõem ao do país. São elas Ama- O caso da Paraíba constitui a exceção. A pe- pá, Amazonas, Espírito Santo, Maranhão, Mato culiaridade desta unidade federativa reside no Grosso, Pará, Paraná, Piauí, Rio Grande do Nor- fato de que ela é única que foge à regra de que a te e Sergipe. Mas se considerados em conjunto, proporção dos grupos do conjunto majoritário é e não somente cada um em referência ao Brasil, maior do que a verificada no conjunto minoritá- constata-se que seus intervalos se sobrepõem. O rio. O sentimento de insegurança apenas no bairro, intervalo do Acre não chega até o do Amazonas, do conjunto minoritário, compreende 11,6% da

é verdade. Mas alcança o do Amapá que, por sua população, o que supera, ainda que ligeiramen- David Maciel de Mello vez, abarca o do Amazonas, sendo que estes dois te, o sentimento de insegurança no espaço público

Figura 4 – Distribuição dos entrevistados, segundo árvore hierárquica dos sentimentos de segurança e insegurança e local de referência Paraíba, 2009

Legenda: 4.018 Total Segurança 100% Insegurança suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento

Cidade 2.519 1.499 62,8% 37,2% Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas

506 493 1.003 Bairro 2.013 12,7% 12,3% 50,1% 24,9%

1.951 Domicílio 48,6% 62 468 38 460 36 375 628 1,5% 11,7% 1% 11,4% 0,9% 9,3% 15,6%

Fonte: Elaboração própria.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 185 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

186 David Maciel de Mello para testes em dos constituem hipótesesaprioriparatestesem foram contempladasnométodo adotado. necessárias outrastécnicasestatísticas quenão de insegurança generalizada. Para issoseriam to na cidade, o que tem por efeito o mina omesmofenômenotantonobairro quan- sentimento deinsegurançanodomicíliodeter- segurança total. Tampouco épossível dizer queo que emconjuntodeterminamosentimentode causa dosentimentodesegurançanacidade,e sentimento desegurançanobairro, oqualé timento desegurançanodomicílioécausado Não sepodeafirmar, porexemplo, queosen- que existam relações de causalidade entre eles. Todavia, nãoépossível afirmarcategoricamente segurança nosseusdiversos locaisdereferência. na distribuiçãodosentimentodesegurança/in- go permitiramvislumbrarospadrões evariações geográfica dosentimentodesegurança. único casoemquenãoparece haver acumulação no nível dodomicílio. AParaíba, éo portanto, ao terceiro retângulo (da esquerda para a direita) essa probabilidade éde11,7%,correspondente sentimento nãoocorranobairro. Na Figura 4, seguro nacidadeenodomicílio,mesmoqueesse como anopaís.Na Paraíba é plausível sesentir ça nacidadenãosedistribuidamesmamaneira para baixo, mostraqueosentimentodeseguran- ça nesteestado,tem-seoseguinteresultado: tário. Ao desagregar osentimentode(in)seguran- cidade (9,3%) eosentimentodeinsegurança somentena Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 Feita estaressalva, osresultados apresenta - As explorações realizadas- ao longo deste arti C O ladoesquerdo dográfico,lidodecima onclusão (11,4%), dois grupos doconjuntomajori- (11,4%), doisgrupos sentimento sentimento Já o sentimento de segurança admite a ocorrência dois, osentimentodeinsegurança nãoépossível. Somente comamanifestaçãodeapenasumdos necessita de um pouco de ambos para ocorrer. como misturamediadorados doisfenômenos, tese de que o percebido Ferraro (1995), aanterioridadecausaldorisco crime. Além disso,caso se admita, como o faz intermediário entre acerca dosentimentode(in)segurançacomo claro aoseretomarem asconsideraçõesteóricas no sentimentodeinsegurança. reria devidoàcentralidadedestenível geográfico meiro caso e de 22,6% para o segundo. Isso ocor- cidade. Asproporções sãode19,3%paraopri- não ocorre omesmosentimentonobairro ouna sentimento de insegurança no domicílio quando insegurança generalizada tendeaseaproximar do pectivamente. osentimentode Em contrapartida, tra queessesvalores sãode46,0%e49,9%,res- seguras nacidade.AFigura 1,porexemplo, mos- aproxima daproporção depessoasquesesentem sentimentodesegurançapessoas nogrupo total se causa daacumulaçãogeográfica,aproporção de necessidade deacumulaçãogeográfica. sariamente para o bairro e para a cidade sem a festa nopróprio lar, generaliza-sequaseneces- o sentimento de pelo sentimentodesegurançanodomicílio;2) bairro, queporsuavez parece sercondicionado vem acompanhadodomesmosentimentono geograficamente. Sentir-se seguro nacidade 1) osentimentodesegurançasejaacumulável estudos futuros. Nestes termos,cogita-seque: O porquê destapossível diferença ficamais O corolário destasduashipóteseséque,por sobre omedodocrime,chega-seàhipó- sentimento de insegurança, quando semani- percepção de risco insegurança, e medo do medo do tomado tomado Figura 5 – Fluxograma dos grupos geográficos de sentimento de insegurança

Sentimento de Artigos Risco no sim Medo no sim insegurança Domicílio? Domicílio? generalizada

não não

Sentimento de Risco no sim Medo no sim bairro? bairro? insegurança no espaço público

não não David Maciel de Mello Sentimento de Risco na sim Medo na sim insegurança cidade? cidade? somente na cidade

não não Sentimento de segurança total

Fonte: Elaboração própria.

de risco percebido sem medo do crime. Ou mesmo res: a acumulação geográfica do fenômeno e de nenhum deles. O fluxograma a seguir resume a chance de ocorrer em duas modalidades: a) da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento as combinações necessárias entre os dois fenôme- percepção de risco sem medo do crime; b) ausên- nos para que se pudesse chegar até cada um dos cia dos dois. Quanto ao único caminho para se quatro grupos do conjunto majoritário. chegar até o sentimento de insegurança gene-

ralizada, ele também se deve a dois elementos. no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas A análise exaustiva da figura mostra que, De um lado, a sua ocorrência em apenas uma para se chegar ao sentimento de segurança total, modalidade: risco percebido + medo do crime. há sete caminhos possíveis; para o sentimento Do outro, a centralidade do nível do domicílio de insegurança na cidade, quatro; para o sen- na determinação do fenômeno, que dispen- timento de insegurança no espaço público, dois; saria a necessidade de acumulação geográfica, finalmente, para o sentimento de insegurança replicando-se quase automaticamente no bair- generalizada, apenas um. É provável que este ro e na cidade. grande número de possibilidades para o sen- timento de segurança total se deva a dois fato-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 187 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

188 David Maciel de Mello de áreas pobres dascidadesondehá domínio território porgangues.Finamente, habitantes somente noplanolocal,tal como adisputade a algumadinâmicadecriminalidade queatua guras apenasnobairro, podeestarrelacionado que háproporção considerável depessoas inse- no bairro enacidade.OcasodaParaíba, em um efeitocausalnosentimentodeinsegurança autos deresistência ehomicídios,podemter crimes noespaçopúblico,taiscomoassaltos, roubos a residência. Já um elevado número de deria sermaiorondehágrandeincidênciade então ainsegurançanodomicíliotambémpo- ração comhomensadultos,porexemplo. Ou sentirem insegurasnopróprio larnacompa- poderiam apresentar umamaiortendênciaase no espaço do domicílio. Essas pessoas, destarte, doméstica, umcrimeque,pordefinição,ocorre idosos sãoasvítimaspreferenciais deviolência ela vive ede ondeelavive. Mulheres, criançase ambiente asuavolta, dequemelaé,como sentir segura depende, além da percepção do níveis geográficos. Mas ofato de uma pessoa se to desegurança/insegurançanosseusdiversos somenteofenômeno dosentimen- perscrutar desta investigação foimantê-lasemsuspensoe e deincidênciacriminalidade.Aproposta variáveis sociodemográficas, de estilo de vida dois fenômenos, devem incorporar também feita nesteartigo. postura maisexplicativa doqueaexploração tarefa paratrabalhosfuturos, queadotemuma Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 tre não possuivariáveis quetestemaseparaçãoen- destahipótese,poisaPNAD na construção Tais pesquisas,alémdadistinçãoentre esses Infelizmente nãose pode aquiavançar mais Sugestões para pesquisasfuturas risco percebido e medo do crime. Esta é uma relações. Aqui oquese sugere équeelassejam para cadaumdelesebuscar compreender suas Modelos explicativos devem adotarvariáveis de criminalidade,regimes desociabilidade. estratificação social,estilo de vida,incidência terpenetrados: riscopercebido, medodocrime, ências causaisdistintas. podemexercersociabilidade, portanto, influ- segurança. Asdiferenças entre essesregimes de bido, uma vez rompidas, podemlevar ao riscoperce- ambientes transmiteexpectativas próprias que, cada umdestes causa destasparticularidades, res umgrandepapelnocontrole social.Por cidos, tendoa“fofoca” emecanismos simila- bairro, as relações ocorrem maisentre conhe- majoritariamente dasagênciasdepolícia.No nhos e onde o controle social externo depende com predominância dainteraçãoentre estra- miliares. Já nacidadeareciprocidade émenor, indivíduo baseadonaautoridadedealgunsfa- procidade, comumcontrole socialexternoao se basearno parentesco e possuem altareci- domicílio, porexemplo, asrelações tendema precisamparticularidades serconsideradas.No separação espacialdofenômeno. Por isso, suas relevância causal,nãoserestringindo àmera não deixamdepossuirtambémsuapossível nômeno. eles Comomostradonesteartigo, dar dosníveis geográficosondeocorre ofe- áreas maisfavorecidas. entre bandidoseapolíciaqueoshabitantesde mais medodeserem vítimasnosconfrontos nos crimescontraopatrimônio,massentir armado dotráficodedrogas podemtemerme- Em suma,todosessesfenômenosestãoin- Além dessasvariáveis, nãosedeve descui- ao medodocrimeousentimentode(in) usadas em uma abordagem que busque verifi- bém poderia ser captada em questionários car a aderência do risco real ao risco percebido e que, além de perguntarem ao entrevistado se deste ao medo do crime; entre a situação, a defi- sofreu tais ou tais tipos de crime durante tal nição da situação e sua consequência. Contudo, período, perscrutassem também como ele se as variações entre os diferentes espaços sociais sentiu ao se ver nessa situação de risco, tan- Artigos do cotidiano devem ser consideradas. to em relação a sua integridade física quanto a patrimonial. Seria interessante captar se Alguns modelos teóricos, além do pró- o entrevistado temeu pela sua vida ou pela prio Modelo de Interpretação de Risco de pessoas próximas, se foi apenas um sus- (FERRARO, 1995), já seguem esta tendên- to passageiro ou até mesmo uma banalidade cia. Um exemplo é o Modelo de Crenças com a qual se está acostumado, por exemplo. de Perigo (BORGES, 2011), que considera

cinco crenças de perigo como resultantes Apesar das sutilezas, tanto o medo do crime David Maciel de Mello de engajamentos na experiência prévia do quanto o sentimento de insegurança e a per- indivíduo. Nesse modelo, o sentimento de cepção de risco constituem fenômenos graves insegurança corresponde àquela situação em que devem ser mais bem compreendidos nas que se acredita que o ambiente é perigoso suas dinâmicas. Eles geram desconfiança entre (BORGES, 2011). Em uma dimensão mais as pessoas, minam a sociabilidade entre clas- geral, o neopragmatismo alemão de Hans ses sociais, consolidam a estratificação social Joas fornece subsídios para aprofundar esta no espaço, além de favorecer a ocorrência de perspectiva ao considerar em suas pesqui- comportamentos e juízos do tipo bode expia- sas a gênese e o comprometimento a valores tório, nos quais uma categoria social é arbi- como oriundos de experiências de autofor- trariamente responsabilizada e até punida por mação e autotranscedência (JOAS, 1996, todo o “mal” que ocorre. Muitos dos episódios 2000, 2012). Em uma abordagem mais em- de preconceito, linchamentos e extermínio em pírica, pode-se conferir atenção especial para nosso cotidiano são alimentados por este sen- da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento os casos em que há risco percebido sem a timento de perene ameaça a si e aos seus pró- ocorrência de medo do crime. A aderência ximos. Conhecer sua dinâmica e procurar suas ou separação entre os dois conceitos tam- causas é fornecer os subsídios para combatê-lo. Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas

1. Os microdados estão disponíveis para download em: .

2. O leitor interessado também poderá visualizar em um mapa a distribuição desses grupos por estados por meio do link https://davidmaciel. shinyapps.io/inseg/

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 189 Zonas do medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no Artigos suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009

190 David Maciel de Mello Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 172-191, Ago/Set 2016 FERRARO,KennethF. te of Law Enforcement andCriminalJustice, 1979.. Institu- National EnforcementAdministration,Assistance Law Justice, of Department D.C.: summary.Washington, crime: to DUBOW,Fred; MCCABE, Edward; Gail. KAPLAN, Vitimizacao.pdf>. Acesso em:19jun.2016.. proderj.rj.gov.br/isp_imagens/Uploads/PesqCondVida- . Acesso em:19jun.2016. wp-content/uploads/2013/10/Relat%C3%B3rio-PNV . lios_anual/microdados/reponderacao_2001_2012/ to/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domici- . . Acesso em:19jun.2016. microdados/reponderacao_2001_2012/PNAD_repondera- Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_anual/ nível em: .Acesso em:19jun.2016. microdados/reponderacao_2001_2012/PNAD_repondera- to/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_anual/

Resumen Abstract

Zonas del Miedo: variaciones geográficas del sentimiento Zones of Fear: Geographic variations in feeling (un)safe

de (in)seguridad en el suplemento Victimización y Acceso in Victimization and Access to Justice supplement of the David Maciel de Mello a la Justicia de la PNAD de 2009 2009 PNAD Este trabajo aborda las variaciones del sentimiento de This study addresses variation in the feeling of safety/lack seguridad/inseguridad en la PNAD de 2009, segundo local de of safety in the 2009 PNAD (Household Survey) according to referencia. El objetivo es explorar hasta cuanto su ocurrencia en place of reference. The objective was to explore the extent to la ciudad acompaña el mismo sentimiento tanto en el barrio which its occurrence in the city matched the same feelings in como en el domicilio. Después de una breve introducción sobre both neighborhood and household. After a brief introduction la historia del concepto, se lo define como fenómeno mezclado on the history of the concept, this feeling is defined as a de riesgo percibido y miedo del crimen. La segunda parte trata mixed phenomenon of perceived risk and fear of crime. The de los presupuestos teóricos de su operacionalización en los second part describes the theoretical presumptions of its niveles geográficos de referencia, domicilio, barrio y ciudad, operation at the geographic reference levels of household, mientras la tercera explora sus variaciones. Los resultados han neighborhood and city, whereas the third part explores their planteado la hipótesis de que el sentimiento de seguridad es variations. The results suggest that the feeling of safety is geográficamente acumulable, mientras que el sentimiento de geographically cumulative, whereas feelings of lack of safety inseguridad tiene el domicilio como el nivel preponderante. predominate at the household level. This pattern appears suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009 à Justiça Vitimização e Acesso suplemento Este patrón aparenta tener validad para el Brasil y tiende a to be valid for Brazil and tends to replicate in the different reproducirse en los estados, con excepción de la Paraíba. La states with the exception of Paraíba. The conclusion seeks conclusión busca profundizar los resultados, delimitar su alcance to further analyze results, define their scope and suggest y sugerir caminos para futuras investigaciones. directions for future studies.

no de (in)segurança do sentimento geográficas do medo: variações Zonas Palabras clave: Victimización. Miedo del crimen. Keywords: Victimization. Fear of crime. Risk perception. Percepción de riesgo.

Data de recebimento: 19/10/2015 Data de aprovação: 16/08/2016

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 172-191, Ago/Set 2016 191 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

192 Alan Fernandes Sociais pelaFundação Escola deSociologiaePolítica deSãoPaulo -FESP-SP. PMESP. pela Profissional) (Mestrado Pública Ordem UNIFESP.e Segurança de Policiais Ciências Mestre Estado deSãoPaulo (2013-2014) integrantes daPolícia Militardo mortes violentas sofridas por Vitimização policial:análisedas Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo - PMESP. - Paulo São de Estado do Militar Polícia da Oficial Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 Vitimização policial.Segurança pública. Polícia Militar. Vitimologia.Criminologia. Palavras-Chave para discussão deiniciativas queminimizem osriscos aquepoliciais,emespecialosmilitares, estãosujeitos. models), busca apresentar elementos opportunity ( “oportunidades” e models) style (life vida” de estilo de “teorias as PauloSão (PMESP) morreramque causapor violenta, Paulo,EstadoSão no de Tendo2014. e 2013 em como inspiração o presente trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa sobre casos de integrantes da Polícia Militar do Estado de promoção demelhorescondições deenfrentamento aocrimeeàviolênciajunto àsociedade.Com essa preocupação, números muitas vezes superiores aoutros grupossociais,eporatingir umgrupoparticularmente ligadoàsaçõespara a de, haja vista as condicionantes bastante próprias, quando comparadas à população em geral, que os tornam vítimas em A morte de policiais constitui um capítulo à parte dentre as mortes ocorridas no Brasil. Isso em razão de sua especificida- Resumo

Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Paulo - Paulo São FederalUniversidadede pela Sociais Ciências em Mestre Especialista em Ciências em Especialista Artigos Alan Fernandes

Introdução

Brasil exibe uma das mais altas taxas dizer, é especialmente preocupante quando se

O de mortes violentas intencionais do fala de pessoas que, na ponta da linha, deci- (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia mundo, próxima de 60 mil vítimas por ano. dem como e quando aplicar a força que o Esta- Tal retumbante número é o retrato mais per- do outorga. verso dos diversos problemas que cercam a se- gurança pública e a justiça no Brasil. Os poli- De outra forma, o problema suplanta o as- ciais militares (PMs) brasileiros integram esse pecto político narrado; trata-se, sobretudo, de universo e, em 2014, 352 PMs morreram em uma questão de reconhecimento dos direitos por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes serviço, em confronto ou por lesão não natural humanos. Segundo os dados obtidos nesta pes- fora do serviço (FÓRUM BRASILEIRO DE quisa, a taxa de mortes de policiais militares SEGURANÇA PÚBLICA, 2015, p. 22-23). em São Paulo foi de 50,00 por 100 mil PMs, Tal fenômeno ganha dimensão, não obstante em 2013, e de 38,67, em 2014. Para efeito de seu aspecto numérico, na medida em que se comparação, o Brasil registrou 25,40 homicí- refere à proteção daqueles que devem proteger. dios por 100 mil habitantes, em 2013, e 26,30 A convivência com a morte de colegas reper- por 100 mil hab., em 2014; o Estado de São cute nas práticas dos policiais, imersas em um Paulo, 10,90 e 10,30, respectivamente, para os ambiente de medo e insegurança. E isso, vale mesmos anos,1

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 193 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

194 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 desse panorama, a questão da morte de policiais de policiais desse panorama, a questão da morte SEGURANÇA PÚBLICA, 2015). Adespeito (FÓRUMfora doserviço BRASILEIRO DE algum colegapróximo foivítimadehomicídio e77,5%indicaramque emserviço ximo morto dos policiaismilitares tiveram algumcolega pró- sistema desegurançapública,noBrasil, 73,0% e Percepção de Risco, entre os profissionais do Gráfico 1– 10 20 30 40 50 60 por 100 mil policiais. Nãoforampor 100milpoliciais. encontrados dadosprecisos sobre oefetivo daPMESP; queacorporação estima-se conta Nota: Ataxa dehomicídiosdaPolícia Militar doEstado deSãoPaulo (PMESP) corresponde aonúmero depoliciaismortos 0 Segundo dados da Pesquisa de Vitimização 25,4 Por 100milhabitantes Estado deSãoPaulo, 2013-2014 (PMESP) Brasil, Estado deSãoPaulo ePolícia Militardo dolosos (Brasil eSãoPaulo) edemortes violentas Taxa por100milhabitantes devítimashomicídios Comparativo detaxa dehomicídiospor100mil com 150milintegrantes, entre osquais86.200sãodoserviço ativo (FOLHA DESÃOPAULO, 2015). Comparativo detaxahomicídiospor100mil 2013 10,9 Fonte: Fórum Brasileiro deSegurança Pública (2015);Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 50 mentalidade de nossa sociedade para quem o ser mentalidade de nossasociedadeparaquem o ser de estudossobre otemapode teraver “com a Minayo (2013,p. 590),paraosquaisacarência daopiniãodeAdornoponto, compartilha-se e dos trabalhadores dasegurança pública.Neste dedicam aorespeito àvidaeintegridadefísica ciais sobre aatençãoquesociedadeeoEstado ligada àárea, oqueafetaaspercepções dospoli- é umtemapouquíssimoexploradopelaliteratura 26,3

2014 10,3 38,66666667 PMESP SP Brasil humano [policial] nada mais é do que um objeto quisa compreenderam as investigações realizadas instrumental de produção de segurança pública”. pela Divisão PM Vítima, ligada à Corregedoria da PMESP e encarregada de investigar as mor- Para este estudo, foram pesquisados os ca- tes de policiais militares. Foram analisados 131 sos de integrantes da Polícia Militar do Esta- eventos oriundos dessa fonte (88,52% do total). Artigos do de São Paulo (PMESP) que morreram por Outros 17 eventos (11,48% do total) provieram causa violenta, no Estado de São Paulo, em do Centro de Inteligência da corporação. 2013 e 2014. Foram consideradas as mortes classificadas como homicídios e decorrentes de Entre junho e novembro de 2015, pesquisa- “acidente de trânsito” em serviço.2 ram-se todas as investigações sobre homicídios de integrantes da PMESP realizadas pela Divi-

O presente artigo está organizado em quatro são PM Vítima, relativas a 2013 e 2014. Os do- Alan Fernandes seções, além desta introdução. A seguir é apre- cumentos produzidos são reunidos em um pro- sentada a metodologia empregada e, depois, cesso, chamado Procedimento Investigatório, o descreve-se o perfil das vítimas, no que se refere qual, em geral, traz os Boletins de Ocorrência às variáveis cor/raça, estado civil, sexo, idade, da Polícia Civil e da Polícia Militar, dados fun- se pertencente ao serviço ativo ou aposenta- cionais, diligências realizadas e cópias de depoi- do, cargo ocupado na corporação e unidade à mentos de testemunhas e acusados, além de um qual pertencia. Nessa seção, dedica-se especial relatório final com o resultado das investigações. atenção às pessoas que se encontravam em ho- Dessa forma, ao pesquisar cada um dos proce- rário de serviço quando mortas. Na sequência, dimentos, foi possível colher dados funcionais analisam-se as circunstâncias em que ocorreram das vítimas, tais como unidade em que traba- as mortes, apresentando-se as variáveis local do lhava, idade, raça/cor registrada no sistema de

evento, instrumento empregado, presença de recursos humanos da instituição e tempo de (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia arma de fogo com a vítima e a motivação da serviço, além da motivação do homicídio quan- morte. Finalizam o artigo, além das reflexões fi- do os criminosos foram presos e interrogados.3 nais sobre os dados obtidos, algumas sugestões Importa salientar que a Divisão PM Vítima é para uma agenda pública. encarregada de colaborar com as investigações da Polícia Civil, para a identificação dos auto-

Metodologia res de homicídios contra policiais militares, em por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes A pesquisa se concentrou em pesquisar os ca- serviço ou de folga. Assim, na presente pesquisa, sos de integrantes da Polícia Militar do Estado não foram estudados, por não fazerem parte dos de São Paulo vítimas de morte violenta no Esta- casos investigados pela Divisão PM Vítima, os do paulista em 2013 e 2014, excluídas as mortes eventos em que o criminoso foi morto ou preso decorrentes de “acidente de trânsito” de folga. ainda durante o ocorrido. Aquelas mortes decorrentes de acidente de trân- sito que se deram em serviço foram consideradas. O Centro de Inteligência da Polícia Militar Os dados foram obtidos da Polícia Militar do forneceu os dados sobre as mortes decorrentes Estado de São Paulo (PMESP). As fontes de pes- de acidentes de trânsito em serviço, uma vez

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 195 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

196 Alan Fernandes analisam-se as mortes em suas condições sociais emsuas condições sociais analisam-se as mortes TANTINO, 2007;SPANIOL, 2009;).Aqui, MINAYO, 2013;MINAYO; CONS- SOUZA; (ADORNO; as doençaspsíquicasatéamorte os efeitos da atividadepolicial,englobando desde CHETTA, 2011),poroutro, buscamdiagnosticar - ocorrências emquesuavidaesteja emrisco(ZAN em militar quandoesteédemandadoaintervir tacam afaltadecapacitaçãotécnicadopolicial fenômeno adquire naatualidade . depoliciaisconsoanteàsvariáveismorte queo que sejamcapazes deenfrentar aocorrência de um referencial paraaformulaçãodeiniciativas mais atuaisdofenômenoe,comisso,oferecer 2014 –sedeuemrazãodebuscarasdinâmicas eventos – em relação àpresente pesquisa. 14 eventos –e104em2014aumentode15 diminuição de 60 casos em 2013 – portanto, o dadoédesagregado porano,poisteremos rença nouniverso analisado,impactaquando rença –1caso–,senãorepresenta grandedife- em 2014,oquetotaliza149casos.Essadife- o Anuário, foram 74 casos em 2013 e75 casos Secretaria EstadualdeSegurança Pública. Para 2015), tendo por fonte dados divulgados pela SILEIRO DESEGURANÇAPÚBLICA, sileiro deSegurança Pública (FÓRUM BRA- vergem daqueles presentes no 9º Anuário Bra- 148 vítimas,sendo88em2013e602014. PM Vítima. são que taiscasosnãosãoinvestigados pelaDivi - Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 Os trabalhos sobre o tema, por um lado, des- O recorte temporalestudado–2013e Por diferenças de classificação, Ao todo,registraram-se 148eventos, com 4 os dados di- to àcategoria raça/cor. 15,54% doscasosnãohavia informaçãoquan- os pretos, 2,70%,eosamarelos, 1,35%.Em tigações analisadas.Os pardos eram23,65%, cionais daPolícia Militar contidosnasinves- Ocorrência daPolícia Civiledosregistros fun- (56,76%), informaçãoextraídadosBoletinsde 10 em2014,comumadiminuiçãode50,00%. foram 20casosem2013e ocorridos emserviço, tou umaredução de15,25%;quantoaoseventos deram em2013e502014,oquerepresen- 30 (20,27%),duranteoserviço. (79,73%) foramvitimadosduranteafolgae vítimas Perfil das cumpriam escaladeserviço. durante ohorárioemque que forammortos tegoria “em serviço” designapoliciaismilitares Portanto, paraefeitodopresente aca- artigo, são abrangidas pela categoria “em serviço”. entre otrabalhoearesidência, porexemplo, elesões ocorridasnotrajeto o qualasmortes bro de1982, essabemmaisabrangente,para Decreto Estadualnº20.218,de22dezem - to difere desua conceituação legalprevista do que trazem maiorvitimização. cos demaiorvulnerabilidadeeenfrentar condições específi- formulação depolíticasvoltadas agrupos Tal metodologiapermiteoferecer elementosparaa empregado). unidades dasvítimas,instrumento vação, atividadeprofissional dentro dainstituição, (sexo, idade,raça/cor, cargo)esituacionais(moti- A maior parte dasvítimaserabranca A maiorparte Entre os118casosocorridosnafolga,68se Em 2013 e2014,118policiaismilitares A categoria“em serviço” utilizadanotex- Gráfico 2 –Número  de policiais militares mortos por causa violenta, segundo condição de trabalho Estado de São Paulo, 2013-2014 Artigos

SituaçãoSituação Funcional Funcional da da Vítima vítima

140 118 120

100

80 68 Total 60 50 2013 Alan Fernandes 40 30 2014 20 20 10

0 Serviço Folga

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Gráfico 3 –Distribuição  dos policiais militares mortos por causa violenta, segundo raça/cor Estado de São Paulo, 2013-2014 da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia

Cor/Raça Registrada Cor/Raça registrada

Branca Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes 0,0 15,54 1,95 Parda 2,70

Preta 23,65 56,76 Amarela

Vermelha

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 197 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

198 Alan Fernandes mente solteiras. segundo asquaisvítimassãomajoritaria- relação a outras pesquisas de vitimização, dados apontamumdistanciamentoem do estadocivildavítima.Aindaassim,tais do paraquesetenhaumaexatadimensão era informado, o que é um número eleva - 20,27% dosregistros oestadocivilnão Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 incidência desses crimesprincipalmenteentre lação deBelo Horizonte (MG),everificaram a – esuastentativas –eagressões físicasnapopu- roubo, rouboos crimesdefurto, aresidência (2004, p. 78-80) analisaram a vitimização para (50,68%), 29,05%eramsolteiros Gráfico 4– Sobre otema,Beato, Peixoto eAndrade das vítimas era casadaA maior parte Estado deSãoPaulo, 2013-2014 violenta, segundoestado civil Distribuição dospoliciaismilitares mortos porcausa 6 29,05 20,27 Estado Civil-% Estado Civil-% 5 epara 50,68 ça leva arefletir sobre acontribuiçãoque o era dosexo masculino. que repercutiram noshomicídios. sionais foramasqueinformaramdinâmicas as condicionantesligadasaosaspectosprofis- Assim, não impactaramonúmero demortes. o que leva a concluir que os hábitos privados não contribuiuparaumamenorvitimização, dos integrantes da PMESP, o fato de ser casado contatos quepossibilitamtaiscrimes.No caso em suaresidência, estariammenossujeitosaos enquanto oscasados,porficarem maistempo ceriam por mais tempo em espaços públicos, po. Segundo os autores, os solteiros permane- - solteiros, devido àmaiorexposiçãodessegru Em todososeventos analisados,avítima

Não-informado Solteiro Casado Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 7 , 8 Tamanhadiferen- papel do “policial militar homem” represen- os agentes públicos e os criminosos, são os ta para sua morte, em oposição à “policial “homens” que “combatem”. Tal reflexão será militar mulher”, tanto em relação às dinâ- mais bem desenvolvida adiante. micas ligadas ao desempenho da função, como nos momentos de folga. Tais dados Foram os policiais militares com idade en- Artigos refletem os contextos em que ocorrem tais tre 41 e 50 anos os que mais morreram, com mortes, emergindo duas razões principais. 52 casos, o que correspondeu a um percentu- A presença de certo ethos guerreiro,9 cujas al de 35,14%. bravura e coragem são destacadas, conduz o policial militar a reagir a seu oponente. Nota-se que há um crescente dos homicí- Nesse momento não está em jogo, somen- dios a cada recorte etário, reduzindo-se drasti-

te, a subtração do bem, que informa grande camente após os 50 anos de idade, coincidindo Alan Fernandes parte dos assassinatos (latrocínios) nos quais com a aposentadoria. Tal dado, assim como os são vítimas, mas a defesa de sua subjetivi- referentes ao estado civil, diferem dos relativos dade. Secundariamente, a mulher, nos casos ao conjunto da população brasileira (WAI- de execução, agrega um interdito para ser SELFISZ, 2015, p. 73-74), em que o grupo vitimada, uma vez que, nas “guerras” entre mais atingido é o de jovens.

Gráfico 5 –Número  de policiais militares mortos por causa violenta, por faixa etária

Estado de São Paulo, 2013-2014 (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia

Idade (2013-2014)

30 26 26 24 22

25 por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes 20 17 13 13 15 10 4 3 5 0 0 18-20 21-25 26-30 31-35 36-40 41-45 46-50 51-55 56-60 mais que 60

IDADE

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 199 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

200 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 riores àpresente pesquisa,relativos a2012. configuração sedeve aacontecimentosante- pontospercentuais.2013 de2014emdez Essa causa violenta.Essaproporção diminuiuentre sivo percentual deaposentadosquefalecepor morrerem emmaiorproporção, háumexpres- respondeu a85,00%e15,00%,respectivamente. aposentados. No anoseguinte,adistribuiçãocor- entre aqueles do “serviço ativo” e de 25,00% de sentados. Em 2013, a proporção foi de 75,00% (20,95%)deapo- em comparaçãoa31mortes 2013 e2014,totalizando117casos(79,05%), ram osquemaissofreram violentasem mortes Gráfico 6– Apesar de os pertencentes ao serviço ativo Apesar aoserviço deospertencentes ativoOs fo- policiaismilitares doserviço Estado deSãoPaulo, 2013-2014 violenta, segundocondição deatividade Distribuição dospoliciaismilitares mortos porcausa 0,75 2013 0,25 Serviço ativo XReformado em patamares semelhantesnosdoisanosana- dessa circunstância permaneceu de participação pela extrema doassassinato. crueldade caracterizam peloelevado número dedisparos ou cuções promovidas criminosos,quese porgrupos normalmente chegam a “fortes indícios”, e exe questões familiares , sobre asquaisinvestigações tados são assassinadossobretudo por duas razões: Polícia Militar. Isso emrazãodequeosaposen- nização criminosanacionalmenteconhecida,ea o Primeiro ComandodaCapital(PCC),orga- para essadinâmica:adiminuiçãodatensãoentre permitiu inferirumaexplicaçãopredominante 0,85 Quanto aos assuntos familiares, o percentual Quanto aos assuntosfamiliares, opercentual A leituradosProcedimentos Investigatórios 2014 Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 0,15

Aposentado Serviço Ativo - Gráfico 7 –Número de policiais militares mortos por causa violenta, segundo posto ou graduação Estado de São Paulo, 2013-2014 Artigos Posto/Graduação

90 79 80 70 60 50 40 29 30 17 20 8 6 10 0 0 1 3 0 2 0 3 0 0 0 Alan Fernandes

Major Cabo Capitão Coronel 1° Tenente2° Tenente Soldado Aluno-OficialSubtenente1° Sargento2° Sargento3° Sargento

Tenente-Coronel Soldado 2ª Classe Soldado Temporário

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

lisados.10 Já a questão que envolve o PCC, em Acredita-se que tal configuração não se deva 2012, aumentou a tensão entre o referido grupo somente ao maior contingente das posições

e a PMESP. Após a morte de seus integrantes em mais subordinadas, mas também aos maiores (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia ocorrências atendidas pela Polícia Militar, a cú- riscos a que estão expostos. Se, durante o ser- pula do PCC teria “determinado” a execução de viço, são aqueles que têm mais contato com membros da PMESP. O ápice dessa crise foi em as ocorrências, de folga, gravitam em locais e meados de outubro de 2012, com a morte de ao situações de maior vulnerabilidade, como as menos quatro policiais militares no Estado de São periferias e em atividades operacionais de se-

Paulo.11 Pode-se acreditar que essa crise ainda re- gurança privada. por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes percutiu nos dados de 2013 e com menor influên- cia em 2014. Como afirmado anteriormente, esse O gráfico a seguir mostra a unidade12 em fenômeno se fez sentir sobremaneira entre os apo- que os policiais serviam. Por razões de limita- sentados da PMESP, que, pela sua vulnerabilidade, ções gráficas, não são exibidos os dados de Uni- permitiram a ação criminosa com menores riscos. dades que contabilizaram apenas um caso de policial militar do seu efetivo morto nos anos Em termos absolutos, são os soldados os analisados.13 Destacam-se os batalhões territo- que mais morrem, seguidos pelos cabos e ter- riais, que são responsáveis pelo patrulhamento ceiros-sargentos. cotidiano e ordinário (nos quais são realizados

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 201 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

202 Alan Fernandes rio (Serra doMar), 36º Batalhão (Embu), Co- 11º Batalhão (Jundiaí), 1ºBatalhão Rodoviá- lhão (Zona Leste/Capital),33º(Carapicuíba), 19º Batalhão (Zona Leste/Capital),28ºBata- Batalhão (Santos). Registraram umamorte: ridos “em serviço”, no6º houve duasmortes Tática eronda comemprego demotos). os Programas Força deRadiopatrulhamento, Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016

1° Rodov(SerradoMar)

Gráfico 8– Cmdo RegPolSorocaba Considerando-se apenasoseventos ocor-

39° Btl(SãoVicente)

33° Btl(Carapicuíba) 16° Btl(ZonaOeste)

6° Btl(SantoAndré) 38° Btl(ZonaLeste) 28° Btl(ZonaLeste) 19° Btl(ZonaLeste)

5° Btl(ZonaNorte) 47° Btl(Campinas)

Escola deSargento 24° Btl(Diadema)

37° Btl(ZonaSul)

21° Btl(Guarujá)

11° Btl(Jundiaí) 36° Btl(Embu) 30° Btl(Mauá)

6° Btl(Santos) 50° Btl(Itu) Casa Militar 2° Trânsito Pol Rodov

3° Choq Estado deSãoPaulo, 2013-2014 segundo unidadepolicialaquepertenciam Número depoliciaismilitares mortos violenta, porcausa 0 1 2 a unidadenão foiinformada. lícia Ambiental.Há, ainda,nove casosemque 4º Batalhão (Bauru), CorpodeBombeiros Po - Capital), 49ºBatalhão (Zona Oeste/Capital), talhão (Itanhaém), 46ºBatalhão (Zona Sul/ 24º Batalhão (São José do Rio Preto), 29º Ba- (Botucatu), 20ºBatalhão (Caraguatatuba), (sem especificaçãodaunidade),12º Batalhão Escola deSargentos, Policiamento Rodoviário mando dePoliciamento Regional deSorocaba, 3 Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 4

5 6 Perfil das vítimas mortas durante o Assim, o Gráfico 9 reforça os dados sobre serviço maior incidência das mortes dos policiais mi- A seguir são analisados os dados relativos litares mais subordinados – e, portanto, com às mortes violentas no decorrer da atividade menor tempo de serviço – e indica que, quan- Artigos profissional14. do considerados apenas os casos em serviço, juventude e menor tempo de serviço são fatores A despeito de os policiais militares mais ve- de risco. Também pode ter como explicação o lhos (com idade entre 41 e 50 anos) serem as fato de que os policiais militares mais novos, principais vítimas de mortes violentas, os mais assim que se formam, são destacados para ati- atingidos durante o serviço são aqueles mais vidades operacionais e, ao longo da carreira,

novos na carreira, que ingressaram há menos são alocados para atividades mais administra- Alan Fernandes tempo na PM, ocorrendo uma drástica redu- tivas e, por essa razão, representam baixíssi- ção a partir dos 21 anos de atividade. mos riscos.

Gráfico 9 –Distribuição dos policiais militares mortos em serviço, segundo tempo de carreira Estado de São Paulo, 2013-2014

Tempo decorrido entre o ingresso na PMESP e a morte - considerados apenas os no serviço ativo (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia

25,00% 23,08% 22,22% 22,22% 20,00% Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes

15,00% 14,53% 11,79% 10,00%

5,98 5,00%

0,00 0,00% 0 a 5 anos 6 a 10 anos 11 a 15 anos 16 a 20 anos 21 a 25 anos 26 a 30 anos mais de 30 anos

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 203 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

204 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 envolvidos noapoioàatividade. to reside na quantidade de policiais militares - duranteoradiopatrulhamen mero demortes Outra explicaçãoparaoelevadomortes. nú - dotrânsitonoconjuntodas ta aimportância além doPoliciamento Rodoviário, oqueapon- liciamento ligadas aos batalhõesterritoriais, prego deMotos (RPM),modalidadesdepo- (Rocam) comEm- edoRadiopatrulhamento das Rondas Ostensivas comApoio deMotos Policiamento comemprego de motocicletas do policiamentodenominadoForça Tática, do ocorre omaiornúmero deeventos, seguido realizada pelas vítimas Gráfico 10– NÃO INFORMADO 10 12 É no serviço de Radiopatrulhamento que deRadiopatrulhamento É noserviço O Gráfico 10exibeaatividadeprofissional 0 2 4 6 8

Radiopatrulhamento 6 Estado deSãoPaulo, 2013-2014 segundo atividade querealizava quandofoi morto Número depoliciaismilitares mortos emserviço, 10

Força Tática no momento 2 Distribuição dasvítimasemserviço

ROCAM/RPM

Policiamento Rodoviário 2 por atividades realizadas de sua morte.

Agente de Inteligência 2

Atividade Delegada 1 1 as categoriasapresentadas nosgráficosaseguir que Decerto tâncias que cercaram as mortes. ANDRADE, 2004),descrevem-se ascircuns - models)(BEATO,(opportunity PEIXOTO e lo devida” (lifestylemodels)e“oportunidades” circunstAnálise das implica maiorvulnerabilidade. desenvolvida pordoispoliciaismilitares, ela éComo aatividadederadiopatrulhamento para três, elas caíram para apenas um caso. na medidaemqueonúmero deapoiosubiu caírampelametadee,um paradois,asmortes tes: namedidaemqueoauxíliopassoude policiais “no apoio”, maioronúmero demor- Tendo como inspiração das “teorias de esti- Nota-se quequantomenoronúmero de Operação Direção GuardaSegura 1 Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 1

Ronda Oficial 1

Salvamento

Comando de Compainha âncias 1

Policiamento Ambiental 1

1 Gráfico 11 –Número de policiais militares mortos em serviço, segundo número de policiais militares presentes no apoio no momento da morte Estado de São Paulo, 2013-2014 Artigos Quantidade de Policiais Militares “em apoio” nas mortes em serviço (nº de casos) 20 18 15

10 9 5 Alan Fernandes 0 1 1 0 0 1

1 2 3 4 5 6 número de policiais militares "no apoio"

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Gráfico 12 –Número de policiais militares mortos por causa violenta, segundo local de referência, (em serviço e de folga) Estado de São Paulo, 2013-2014

via pública 83 estabelecimento comercial 22 bar 11 residência 10 (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia posto de combustível 3 trânsito 2 ponto de tráfico 2 não informado 2 feira livre 2 saindo de boate com a namorada 1

leito fluvial (reio) 1 por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes residência da namorada 1 interior de base da PM 1 interior de viatura 0 embarcando passageiro em seu táxi 1 deslocamento para ocorrência 1 campo de futebol 1 caixa eletrônico 1 boate 1 a caminho da casa da namorada 1

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 205 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

206 Alan Fernandes ocorreram têmrelevância explicativa paraofe- precariamente, comooslocaisondeeventos em quepermitemdefinir, mínimae,decerto, rias adquirem dimensãoexplicativa, namedida Contudo,noseuconjunto, essascatego- rua. nos três casos,osassassinatosocorreram na “trânsito” ou“ponto detráfico”, hajavistaque, a categoria“via pública” confunde-secoma narrativa dosacontecimentos.Por exemplo: lises surgidasdoselementosquecompõema conduziram asinvestigações, exibemasaná- além doselementossubjetivos daquelesque outras palavras,dãosentidoaosfatos.Assim, ouque,em destacam nasdinâmicasdasmortes defogo–trazem oselementosquese de arma – com exceção daqueles relativos ao Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 Gráfico 13–

arma de fogo 84,46%

não informado Estado deSãoPaulo, 2013-2014 empregado (deserviço edefolga) damorteviolenta, segundocausa ouinstrumento Proporção depoliciaismilitares mortos porcausa 0,68%

faca/arma do PM 0,68% Intrumento empregado (%)

faca 0,68% desaparecimento 0,68% emprego

fogo 0,68% arma de fogo/golpes desconhecido/encontro de cadáver bar, tes claramentedefinidosedefiníveis (dentro tivessem ocorrido em ambien- que asmortes nômeno. Do contrário,anãoseremcasos mortes (Gráficomortes 17).Asvítimas,majoritaria- latrocínio, quecorrespondem a33,11%das residências (5,43%). mentos comerciais (14,86%),bares (5,97%)e homicídios (45,10%), seguida de estabeleci- inteligência dasdinâmicas. ampliada mento comercial, etc.),haveria umacategoria 1,35% A morte naviapública retrataA morte oscasosde É naviapúblicaondemaisocorrem os dentro deresidência, dentro estabeleci- de 0,68% via pública, que pouco auxiliaria na Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo.

ignorado 0,68%

atropelamento choque/colisão/capotamento 4,73% 4,05%

afogamento 0,68% de mente na condução de seus carros ou motos, da Capital (PCC) na eliminação deliberada de são abordadas por motociclistas que, ao iden- policiais militares, conforme analisado anterior- tificarem que ela é policial, matam-na, seja por mente e (ii) as redes violentas de relacionamen- medo da reação, seja por deliberada intenção tos em que os policiais militares se envolvem, de matar. Em alguns latrocínios, a vítima foi sobretudo nas práticas cotidianas de policia- Artigos abordada para a subtração de pertences e va- mento, o que aqui se denomina “contexto”.15. lores (dinheiro). Em contrapartida, as mortes em estabelecimentos comerciais parecem in- Em 84,46% dos eventos, o instrumento dicar que muitos policiais estavam realizando empregado foi a arma de fogo e, em outros atividade privada de segurança. 2,03% dos casos a arma de fogo foi emprega- da em conjunto com faca (0,68%) ou golpes

Em outra análise, os crimes ocorridos em (1,35%), reproduzindo a ampla participação Alan Fernandes bares e residências têm indícios de execução, das armas de fogo nos homicídios no Brasil, geralmente com elevado número de golpes ou como apontado nos estudos de Lima, Sinho- tiros. Emergem duas explicações, não excluden- retto e Pietrocolla (2000), Cerqueira (2014) e tes entre si: (i) o papel do Primeiro Comando Waiselfisz (2015).

Gráfico 14 –Proporção de policiais militares mortos por causa violenta, segundo porte de arma de fogo (de folga) Estado de São Paulo, 2013-2014 da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia

A vítima estava armada? (somente casos “em folga”)

82,20% Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes

7,63% 10,17%

SIM NÃO DESCONHECIDO

Fonte: Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 207 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

208 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 dia, dos elementos que Frise-secercam as mortes. pelaemergência, quasesempreconstruídas fugi- vada”, “questões familiares” e“latrocínio”) foram como”, “indícios deatividades segurança pri- de serpolicialmilitar, atuarouserreconhecido seção, ascategoriasreferidas (“morto emrazão ou nãodearmacomavítima. quais nãoerapossível determinaraexistência até omomentodasinvestigações, segundoas armada, emrazãodasinformaçõesdisponíveis sos nãofoipossível afirmarseapessoaestava arma.Em 10,17%dosca- zão, deviamportar e,poressara- aqueles queestavam deserviço de fogoem82,20%doscasos,jáexcetuados Gráfico 15– de serpolicialmilitar, Igualmente ao comentado no início desta Igualmente aocomentadonoiníciodesta Da arma mesmaforma,avítimaportava recohecido como morto emrazão atuar ouser 78,38% Estado deSãoPaulo, 2013-2014 declarada/presumidaviolenta, segundocausa Proporção depoliciaismilitares mortos porcausa latrocínio 33,11% 16

atividades de indícios de segurança 10,14% privada foi executado peloPCCequeestava reali- traram vários sentidos:opolicialmilitarque de algumsentidoàmorte. outros elementos quefavorecessem aatribuição denúncias anônimasrealizadas sobre oscasose nhas edoscriminososeventualmente ouvidos,as ficação as requereuversões dastestemu- observar investigações. Nessa medida,estabeleceraclassi- motivação nãoestãonocentro dosobjetivos das te jurídico-penale,poressarazão,dadoscomo São procedimentos com interesse eminentemen- riamente, ascircunstâncias subjetivas docrime. principal deidentificaroscriminosose,secunda- Vítima, fontedestetrabalho,têmafinalidade que as investigações promovidas pela Divisão PM Nessa algunscasosdemons- construção,

Fonte: Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. crimes de trânsito 9,46%

familiares questões 5,41% zando atividade de segurança; a vítima que para o serviço policial. foi morta a mando da esposa e o autor, tam- bém, roubou a arma da vítima (latrocínio), Por último, o latrocínio informa 33,00% entre outros casos de delicada intelecção. Por das mortes de policiais militares, e constitui essa razão, as categorias não são excludentes a principal causa dos assassinatos. Foram 29 Artigos entre si e, por isso, avançam os 100%, quan- mortos em 2013 e 20 em 2014. Com base em do somadas. dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública, divulgados no Anuário Brasileiro de É o papel de policial militar que informa Segurança Pública (2015), houve, no Estado a maior parte dos casos (78,38%). Os demais de São Paulo, 745 casos de latrocínios em são atribuídos a questões familiares ou a la- 2013 e 2014. De acordo com os dados obti-

trocínio em que os criminosos não identifi- dos na presente pesquisa, 49 policiais milita- Alan Fernandes caram a vítima como policial. Em 10,14% res morreram nessas condições; resulta, assim, (15 casos) há indícios de que a vítima foi que 6,57% do total de latrocínios ocorridos morta em razão de atividade de segurança, no Estado tiveram como vítimas policiais retratando, por um lado, as questões salariais militares. As taxas por 100 mil habitantes de e, por outro, as precárias condições de traba- latrocínio para o conjunto da população do lho que a iniciativa privada oferece, estabe- Estado foram de 0,9, em 2013, e de 0,8 ,em lecendo um duplo problema: o da retribui- 2014 (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGU- ção pelo serviço público e o das relações de RANÇA PÚBLICA, 2015, p. 14). Estiman- trabalho no ramo da segurança privada. As do-se o contingente de policiais militares, da questões de ordem familiar orientam 5,41% ativa e aposentados, em 150 mil, chegamos dos casos (8 mortes). às taxas por 100 mil de 19,3, em 2013, e de

13,3, em 2014. (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia Foram analisados somente os crimes de trânsito ocorridos durante o serviço.17 Eles re- Algumas razões podem explicar a ocorrên- presentam 9,46% (14) dos casos analisados. cia desses latrocínios, conforme se descreve a Apesar dessa expressiva participação, as mortes seguir, não necessariamente em ordem de im- ocorridas no trânsito não despertam atenção portância quanto ao grau de causalidade que em relação às demais mortes violentas, por guardam com os eventos: por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes acreditar-se que são “acidentes” e, por isso, resultado do infortúnio. Importa, nessa medi- 1. como hipótese, o aumento dos crimes da, rediscutir práticas de autoproteção pouco contra o patrimônio nas periferias, locais de re- adotadas pelos policiais militares dentro das sidência de grande parte dos policiais militares. viaturas, por exemplo, o uso do cinto de segu- O aumento da renda da população em geral, rança, assim como as condições de segurança o que não foi diferente para os policiais mi- que as viaturas apresentam, construídas para as litares, agravou a ocorrência de crimes contra situações convencionais de condução e empre- o patrimônio nessas áreas e, por conseguinte, go, pouco ou nada adaptadas em seus projetos dos latrocínios;

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 209 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

210 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 nos que o dano material, um dano de natu- vítima deroubo causaaele,sobretudo, me- bilidade desuplantarseu inimigo, poisser do seupatrimônio,aarma significaapossi- tantemente armado. Mais do que a “defesa” militar parao“combate”, razãodeestar cons- ao terceiro; cia do evento, fator que, por sua vez, remete fogo pelospoliciaismilitares aumenta aviolên- daarmade conjunto dapopulação,oporte Gráfico 17– Nota: As taxasNota: As para a população deSãoPaulo foram obtidas junto aoAnuárioBrasileiro deSegurança Pública (FÓRUM..., 3. umadisposiçãoconstantedopolicial 2. diferentemente do que ocorre para o 10 15 20 25 0 5 2015). Para astaxas por100milreferentes aospoliciaismilitares, umapopulaçãode150mil). estimou-se Estado deSãoPaulo, 2013-2014 Taxa delatrocínio napopulaçãoeentre policiaismilitares 0,9 Fonte: Fórum Brasileiro deSegurança Pública (2015);Polícia Militar doEstado deSãoPaulo. 19,3 Por 100milhab. (50,68%), brancos (56,76%),comidade en- dos (53,38%), homens (100,00%), casados C res, osquemorrem. os homens, e não as mulheres policiais milita- vitimização. Essaéumadasrazões porque são das comohabitus,tornam-sevetores desua inimigo”, na medida em que são incorpora- políticas desegurança”enfrentamento do valentia eseusvalores guerreiros. E,assim,as reza subjetiva, namedidaemqueafetasua onclusão Foram, no biênio analisado, os solda- 0,8 13,3 PM SP tre 41 e 50 anos (35,14%), com até 20 anos policiais que integram a equipe, menores as de serviço (79,49%),18 de folga (79,73%), chances de que ocorram mortes contra esses do serviço ativo (80,00%), pertencentes aos policiais (Gráfico 13).19 batalhões territoriais os mais vitimizados por mortes violentas no universo estudado. Des- Não menos importante é a acentuada pre- Artigos tacam-se as unidades localizadas em Santo sença das vítimas pertencentes às unidades André, na zona sul e na zona leste da capital, operacionais e ligadas ao radiopatrulhamen- com cinco vítimas, e em Diadema, com qua- to, evidenciando sua vulnerabilidade em rela- tro vítimas registradas em seu território. ção a outras atividades da instituição, inclusi- ve operacionais. Os eventos ocorrem em via pública

(56,8%), com o emprego de arma de fogo Também ligados às mortes em serviço, os Alan Fernandes (84,46%), estando a vítima também arma- crimes de trânsito têm importante participa- da (82,20%, entre os casos ocorridos em ção no total de mortes violentas. Sua dinâmica momentos de folga do policial). Contri- é negligenciada – quando comparada com os buem com 33,11% os casos de latrocínio e homicídios – sendo essas mortes classificadas 10,14% os casos com indícios de seguran- como “acidentes” e, por isso, entendidas como ça privada. decorrentes do infortúnio, do acaso.

No decorrer do texto, apresentaram-se aná- Parte das mortes conecta-se às redes de lises para os dados obtidos, que, observados à relacionamento dos policiais, chamadas aqui distância, possibilitam elaborar três conjun- de contexto. Este se estabelece nas dinâmicas tos explicativos: as mortes que ocorrem como profissionais, marcadamente próximas da vio-

(i)“acidente de trabalho”, (ii) as decorrentes do lência e do mundo do crime, ou nas dinâmi- (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia “contexto” de relações em que o policial mili- cas vicinais, nos bairros onde residem ou tra- tar está inserido e (iii) aquelas decorrentes de balham em atividades de segurança privada, seu estilo de vida (life-style model). comumente periféricos. Execuções por parte do crime organizado, mortes em razão de re- As mortes classificadas como acidente de lacionamentos extraconjugais, envolvimento trabalho remetem às condições em que esse com o crime e vingança são motivações cujas por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes profissional exerce seu ofício. São inúme- fronteiras não são facilmente decifráveis, mas ros os riscos possíveis – e não apreendidos que evidenciam as relações de sociabilidade pela pesquisa –, tais como más condições presentes, no que Machado da Silva (2000) das viaturas, falta de treinamento (ZAN- denominou “sociabilidade violenta”. Nesse CHETTA, 2011) e outras. Contudo, um ambiente marcadamente violento, policiais dado destaca-se: a quantidade de policiais militares se enredam em relações que os vi- militares que compõem a equipe influencia timizam, diante também da precariedade da diretamente o número de mortes em ser- tutela do Estado na gestão dos conflitos, so- viço, pois quanto maior a quantidade de bretudo nas periferias.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 211 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

212 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 e avidaprofissional seconfundememumasó. seus integrantes,demodoqueavidaparticular mento àinstituiçãocompõeasubjetividadede do RiodeJaneiro,- mostracomoopertenci em seutrabalhocomaPolícia Militar doEsta- companheiros, porexemplo). Muniz (1999), radiocomunicador, acionamentode“apoio” dos que garanta maior proteçãotrumental (viatura, estão emsuasatividades,sóque,agora,semins- se emigualmedida,nosmomentosquenão repercutem, qua- são expostosduranteoserviço folgas. Consequentemente,osriscosaqueeles que alcançaseuproceder, inclusive duranteas constituindo-seemumethos turno deserviço, à profissãoo vão além desuaatuaçãodurante atividades operacionais,osdeveres inerentes militares, sobretudo aquelesquetrabalhamem sivamente emsuavidaprivada. Para ospoliciais das recai sobre oestilodevidadasvítimas,exclu- A terceira explicação para as mortes analisa- A terceira explicaçãoparaasmortes por um novo nascimento, isto é, “o nascimento a ummundonovo (acorporação), inaugurado corroboraçãomente paraa do pertencimento em boa medida exegética, voltada cuidadosa - litar. Evidenciam umasimbólicaexpressionista, minha mulher”, plasmamasintaxe policialmi- vida” ou“a farda éaminhaesposaeamante primento do dever sacrificamos nossa própria Enunciados marcantes, taiscomo“no cum- reconstrução biográfica. sões religiosas e demaisprocessos profundos de testemunhos devidaqueinformamasconver- denarrativa muitopróximauma estrutura dos a missão de “proteger e servir”, fazem uso de quereceberam atribuições comoservidores – em verdade, uma escolha de vida – e às suas tam àsuavocação, àsuaescolhaprofissional Muitos policiaismilitares, quando se repor- de Adorno eMinayo. Nessemortes. sentido, destacam-seasanálises que, comomostrado,informa33,00%das a disposiçãodavítimaemreagir aoroubo, o mesmo nafolga. Tal colocação tememvista vê anteoproblema ecomoelesecomporta, tam diretamente aformacomqueosujeitose tam peloenfrentamento docriminoso,afe- segurança pública,namedidaemquesepau- tais limites,pode-seinferirqueaspolíticasde “serviço” e“folga” éfluida. Sendo permeáveis o quedemonstraquantoafronteira entre estarem te 20,27%dosmortos deserviço, vítima serpolicialmilitar, apesardesomen- foi em decorrênciaanalisados a morte de a Por essarazão,em78,38%doscasos do” (MUNIZ,1999,p. 103). alcançado”, emsuma,“em cadaexemplo deixa- farda” “em cada açãorealizada”, “em cadaideal vista ocomprometimento desempre “honrara existencial deprontidão, jamaisperdendo de se mantervigilante,emumaespéciedeestado cotidiana dessasubjetividadeparece serpreciso rio decriança,porexemplo. Na administração do mundo social, como uma festa de aniversá - conversos, atémesmonasesferasmaistriviais nos espaçosmaisdistintosdesociabilidadedos similada pelosindivíduosdevem serencenados à corporaçãoeprópria personainstitucionalas- cimento noqualafidelidadeeoamordedicados para avidapolicialmilitar”. Um- tipodeperten institucionais, emitidas pelasautoridadeshie- Não porém, émenoscerto, queorientações inerente à natureza das operações policiais. e podemperder queorisco é avida.Écerto nos confrontos armados,nosquaisseexpõem demiológico” se materializa, principalmente, Do pontodevistadospoliciais,seu“risco epi- rarquicamente superiores e não raro lastreadas • aumentar a composição do efetivo para em políticas governamentais de segurança pú- além de dois integrantes por equipe, blica podem agravar esse quadro de risco. Po- principalmente em regiões de maiores ní- líticas do tipo “mão dura”, voltadas para o en- veis de violência ou momentos de maior frentamento a qualquer custo do crime urbano vulnerabilidade pelos policiais militares, Artigos não raro potencializam o risco (ADORNO e como as mortes deflagradas pelo PCC em MINAYO, 2013, p. 588). 2006 e 2012. O Gráfico 13 aponta que a vulnerabilidade do policial militar aumen- Como exposto anteriormente, para o poli- ta na medida em que diminuiu a presença cial militar, ser roubado vai além do prejuízo de agentes, como na composição de dois material, mas diz a ele sobre sua derrota ante integrantes por patrulha, como é o caso do

o oponente, razão pela qual a reação é, no seu radiopatrulhamento, sendo esta uma das Alan Fernandes julgamento, a única resposta possível. Significa razões por que a vitimização é maior nessa dizer que os resultados da interação entre a ví- modalidade de policiamento (Gráfico 12); tima e o criminoso são informados inexoravel- mente pelo entendimento que ela – e, ousa-se • realizar campanhas que reforcem cuida- dizer também, o criminoso – tem sobre as sa- dos na condução das viaturas, tais como ídas aceitáveis, sob o ponto de vista subjetivo. o uso de cinto de segurança, comumen- Em um panorama de “guerra”, as únicas saídas te negligenciado pelos policiais militares. aceitáveis são “matar ou morrer”. Constitui prática usual entre os policiais militares. Alega-se que a necessidade de Também compõe o estilo de vida dos po- desembarcar da viatura de maneira rápi- liciais militares a realização de segurança pri- da seria dificultada pelo uso desse item de

vada, o que informa, ao menos, 10,14% dos segurança. Treinamentos focados na agi- (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia eventos analisados. Malgrado constituir trans- lidade de desatar o cinto trariam menor gressão disciplinar,20 a legislação trabalhista vitimização nos chamados “acidentes de ampara o vínculo empregatício estabelecido trânsito” e maior confiança aos policiais entre o empregador e o sujeito que realiza o militares no uso do equipamento; serviço de segurança. Nesse sentido, os casos de vitimização durante a realização desse ser- • expandir o serviço de amparo aos poli- por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes viço expõem as frágeis condições em que esse ciais militares vítimas, atualmente de- trabalhador exerce seu ofício. Dessa forma, o sempenhado pela Divisão PM Vítima, enfrentamento a essa questão passa também da Corregedoria, abarcando não apenas por tutelar essa relação de trabalho, diga-se, no as mortes e ameaças, mas buscando um âmbito da iniciativa privada. amparo mais holístico, que congregue assistentes sociais, psicólogos e advoga- Como forma de contribuir com uma agen- dos, no sentido de alcançar os conflitos da pública que atenda aos problemas aqui de- em que os policiais militares se veem en- monstrados, apresentam-se algumas propostas: volvidos. A noção de mortes decorrentes

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 213 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

214 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 lência noBrasil. Para ospoliciaismilitares, trata- para oalcancedeníveis maisaceitáveis devio- um dosassuntosprementes aserem enfrentados tico, comodopontodevistasimbólico,constitui desse fenômeno, tanto do ponto de vista estatís- para o enfrentamento do problema. A incidência de vitimização,apresentando, ao final,propostas paraanálisesdevetores 2013 e2014,partindo dos sobre de integrantes da PMESP em as mortes tribuir comosestudossobre o tema aotrazer da- • discutirsobre anecessidadedeutilização Em resumo, opresente trabalhobuscoucon- evitar odesfechofatal. que,no limite,poderia comportamental de folgapodepromover umamudança bre de arma de fogo em momento o porte deespaços dereflexão16). Aabertura so- (Gráficoampliação doriscodesermorto identidade, aindaqueissorepresente uma fesa própria oudade terceiros: adere àsua cial militarvai alémdanecessidadede- de folga.Ousodaarmafogopelopoli- tintivos da funçãopolicialnosmomentos da armadefogoeoutros elementosdis- dade dospoliciais; inseridos podemreduzir avulnerabili- a gestãodosconflitosemqueelesestão sileira. Assim,iniciativas quebusquem ciais queaoconjuntodapopulaçãobra- o condãodeserem maisletaisaospoli- e nasdiversas redes desociabilidadetêm violentas queseconstroem naprofissão causas devitimização. Relações sociais tares foiapontadacomumadasgrandes do “contexto” devidadospoliciaismili- iguais causasdaviolência. em geral, vítimas todos, em larga medida, de tantodepoliciais,comodapopulação mortos, campo dasegurançapública,queproduzem de respostas queoEstadobrasileiro oferece no -se diretamente arepensar umaconfiguração depoliciaismilitaresquestão dasmortes liga- analisar a motivo suficientementeimportante, oque,porsisó,constituium desse grupo, diferentes Estados: nográfico comintegrantesdapolíciamilitarem de Fernandes (2015),aorealizar umtrabalhoet- anos. Nesse sentido,reforçam-se asconclusões democráticos aqueopaísassistiunosúltimos -se, também, de se verem incluídos pelos avanços Assim, tantoquantoreconhecer osdramas lação. (FERNANDES,2015,p. 210). nos julgamentosdeimensaparcela da popu- mocracia –noçãoque,aliás,faz-sepresente tionamento dos“ganhos” obtidoscomade- corporação, trazaelesumprofundo ques- segurança, sobretudo emsuasvidasforada abandono emrelação aosgovernos. Essain- sentimentoderazão, tambémnota-secerto gurança –paraaqualsededicavam. Por essa afetados emrelação àgarantialegal–ase- maior intensidade.Paradoxalmente, eram do, doshomicídios,queosatingiramcom do aumentodacriminalidadee,sobretu- mo tempoemqueforamtambémvítimas ravam ascondiçõesdesegurança,aomes- lado, semasferramentasquelhesassegu- atuações maisviolentasdeixou-os, porseu esses trabalhadores, cujalimitaçãoàssuas significaram os “avanços democráticos” para Suas posiçõespermitemquestionaroque 1. Na Califórnia (EUA), entre 1980 e 2014, ocorreram 345 mortes de policiais, 187 por ataques de criminosos e 158 foram mortes acidentais. Em 1988, a taxa por 100 mil policiais foi de 27,4, tendo sido o maior número da série analisada. Disponível em .

2. Este trabalho insere-se no projeto “A contribuição da administração pública e dos estudos organizacionais para a constituição de uma rede de conhecimento e disseminação de informações sobre como prover segurança pública em ambientes democráticos e de modo

eficiente”, do Núcleo de Estudos de Organizações e Pessoas (Neop) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Artigos Getúlio Vargas (FGV).

3. Foram pesquisados os eventos registrados na Divisão PM Vítima em 2013 e 2014, de forma que uma quantidade residual de casos ocorridos em 2014 e registrados em 2015 não foram analisados, o que representaria uma reduzida parcela no total pesquisado, pois os procedimentos de investigação são “instaurados” imediatamente após o fato, exceto em casos de encontro de cadáver, cuja data da morte não foi possível determinar.

4. As classificações presentes no 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública são “policiais militares mortos em confronto em serviço” (20 ocorrências em 2014 e 14 ocorrências em 2014) e “policias militares mortos em confronto ou por lesão não natural fora de serviço” (54 ocorrências em 2013 e 61 ocorrências em 2014).

5. Os casos em que a vítima era “separada” ou “desquitada” foram incluídos na categoria “solteiro”. Não havia casos de “viúvos”.

6. Em estudo realizado pela Fundação Seade sobre os homicídios ocorridos no Estado de São Paulo em 1999, 68,01% das vítimas eram solteiras (MAIA, 1999). Alan Fernandes

7. O caso da Família Pesseghini não faz parte do universo de casos analisados. No evento, um casal, formado por um Sargento da ROTA e uma Cabo do 18º BPM/M, foi morto, além de outros dois parentes. Segundo o noticiário da imprensa, as investigações promovidas pela polícia civil estadual concluíram que todos foram vítimas do filho do casal que, após a chacina, também se matou.

8. Em 2012, 2.332 mulheres foram vítimas de homicídio no Brasil, representando 4% do total dos homicídios naquele ano (WAISELFISZ, 2015, p. 74).

9. “Ethos guerreiro” foi um termo empregado por Norbert Elias (1990) para caracterizar a nobreza europeia e sua disposição para a guerra em contraposição a formas menos violentas de composição das atitudes e personalidades (habitus) de certas classes, como a burguesia, em um processo de alguns séculos, chamado pelo autor de “processo civilizatório”. No Brasil, esta linha teórica foi empregada por Zaluar (1994; 2014) para analisar a disposição para a “guerra” de “jovens moradores das favelas tidas como perigosas” (ZALUAR, 2014, p. 44).

10. O percentual de mortes motivadas por questões familiares foi de 4,55% em 2013, com 4 casos, e de 6,67% em 2014, com iguais 4 casos.

11. Reportagem exibida pelo programa Fantástico, da Rede Globo, veiculou gravações e documentos dos integrantes do PCC que determinavam que a cada integrante morto pela PM, dois policiais militares também deveriam morrer. Disponível em: . Acessado em 05 mar. 2016.

12. Para facilitar a leitura, as abreviaturas utilizadas pela PMESP foram substituídas por outras de melhor entendimento para o público não afeto às terminologias da Corporação, instituídas pelo Decreto Estadual nº 60.175, de 25 de fevereiro de 2014.

13. São elas: 1º Batalhão (Zona Sul/Capital), 1º Batalhão Ambiental, 2º Batalhão de Choque, 2º Grupamento de Bombeiros, 3º Batalhão

Ambiental, 3º Batalhão (Zona Sul/Capital), 4º Batalhão Choque, 4º Batalhão (Bauru), 4º Batalhão (Zona Oeste/Capital), 8º Batalhão (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia (Campinas), 9º Batalhão (Zona Norte/Capital), 10º Batalhão (Piracicaba), 11º Batalhão (Zona Centro/Capital), 12º Batalhão (Botucatu), 12º Batalhão (Zona Sul/Capital), 14º Batalhão (Osasco), 17º Batalhão (Mogi das Cruzes), 18ª Batalhão (Zona Norte/Capital), 20º Batalhão (Caraguatatuba), 22º Batalhão (Zona Sul/Capital), 23º Batalhão (Lorena), 24º Batalhão (São João da Boa Vista), 29º Batalhão (Itanhaém), 31º Batalhão (Guarulhos), 35º Batalhão (Itaquaquecetuba), 39º Batalhão (Zona Leste/Capital), 40º Batalhão (São Bernardo do Campo), 45º Batalhão (Praia Grande), 45º Batalhão (Zona Centro/Capital), 46º Batalhão (Zona Sul), 48º Batalhão (Sumaré), 48º Batalhão (Zona Leste/Capital), 49º Batalhão (Jundiaí), 49º Batalhão (Zona Oeste/Capital), 50º Batalhão (Zona Sul/Capital), 52º Batalhão (São José do Rio Pardo), Assessoria do Tribunal de Justiça, Corpo de Bombeiros (não identificada as Unidades), Comando de Policiamento Ambiental, Comando de Policiamento da Capital, Comando de Policiamento empregado na Copa do Mundo, Diretoria de Finanças e

Patrimônio, Policiamento Ambiental. por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes

14. Para uma discussão sobre a categoria “acidente de trabalho”, dentro dos aspectos tanto trabalhistas como internos à Brigada Militar (a polícia militar do Rio Grande do Sul), ver Impacto do uso da arma de fogo: um estudo transdisciplinar da Polícia Militar do Rio Grande do Sul (SPANIOL, 2009). Para os conceitos de “risco” e “vitimização policial” abordados de mais ampliada que somente as questões das mortes, como tratado aqui, ver: Risco e insegurança na missão policial (ADORNO e MINAYO, 2013), Riscos percebidos e vitimização de policiais civis e militares na (in)segurança pública (MINAYO, SOUZA e CONSTANTINO, 2007).

15. O termo “contexto” se refere às relações que são construídas nos locais de trabalho (na polícia militar ou não) ou em seus locais de moradia, em que o contato com a criminalidade é inevitável, seja nas prisões, seja em atuações mais orgânicas e ilegais com o crime. Em muitos casos analisados, os criminosos presos narram um fato anterior ocorrido com a vítima (uma prisão efetuada, um relacionamento amoroso com a namorada do traficante, a participação em grupos de extorsão). E nesse “contexto”, são escolhidas as vítimas do PCC, retratando, assim, uma composição entre uma lógica formal (PCC x PM), mas também uma lógica mais informal, própria das sociabilidades dos bairros em que os policiais militares residem.

16. Segundo Lima, Sinhoretto e Pietrocolla (2000, p. 372), a parcela da população que possui arma de fogo corre um risco 56% superior de ser vítima fatal numa situação de roubo do que o restante da população.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 215 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

216 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 20. 19. 18. 17. constitui transgressão disciplinar “exercer ou administrar, o militar do Estado em serviço ativo, a função de segurança particular ou ou particular qualquer atividadeestranha àInstituiçãoPolicial Militar com prejuízosegurança doserviço oucom emprego demeiosdoEstado”. de função a ativo, serviço em Estado do militar o administrar, ou “exercer disciplinar transgressão constitui 2001), marçode de 9 de 893, nº Complementar(Lei PMESP da Disciplinar Regulamento do parágrafo36 único,13, nº art. Conformeo ambos osargumentos sãoválidos. que Decerto operando. patrulhas de quantidade a reduz-se militares, policiais os agrupam se quando pois oficiais, outros muitos por hoje maiores, maior autonomia para asaçõespoliciais,namedidaemqueaumentam suascapacidades deatuação. Tal efetivos argumentação écontraposta tenham da o depatrulhamento mas equipe”, da “segurança da o é não que asguarnições atores esses por acionado discurso O viatura. por de militares policiais dois compreendem a possiblidade reivindicam e praças oficiais tempos Há Dado referente aoefetivo do“serviço ativo”. informados peloCentro deInteligência daCorporação. que acreditar se de apesar 2014, e 2013 muitos policiais militares tenham falecido, de folga, nessas circunstâncias. Os casos em das vítimas de crimes de trânsito em serviço foram Vítima PM Divisão pela investigados trânsito de crimes havia não informado, Como Referências bibliográficas

ADORNO, S.; MINAYO, M. C. S. Risco e (in)segurança po- LIMA, R. S.; SINHORETTO, J.; PIETROCOLLA, L. G. “Também licial. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 18(3), morre quem atira”: risco de uma pessoa que possui arma 2013. de fogo ser vítima fatal de um roubo. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 8, n. 29, p. 365-373, Artigos BEATO, C.; PEIXOTO, B. T.; ANDRADE, M. V. Crime, oportu- jan/mar 2000. nidade e vitimização. Revista Brasileira de Ciências So- ciais, São Paulo, v. 19, n. 55, jun. 2004. MACHADO DA SILVA, L. A. Sociabilidade violenta: uma difi- culdade a mais para a ação coletiva nas favelas. In: SILVA, CALIFORNIA Department of Justice. Officer deaths repor- I. Rio – a democracia vista de baixo. Rio de Janeito: Ins- ted from 1980 to 2014. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2016. MAIA, P. B. Vinte anos de homicídio no Estado de São Pau-

CERQUEIRA, D. Causas e consequências do crime no Bra- lo. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 13, n. 4, p. Alan Fernandes sil. Rio de Janeiro: BNDES, 2014. 121-129, 1999.

ELIAS, N. O processo civilizador. Tradução de Ruy Jung- MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R.; CONSTANTINO, P. Riscos per- man. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990. cebidos e vitimização de policiais civis e militares na (in) segurança pública. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. FANTÁSTICO (TV GLOBO). Gravações revelam esquema de 23, n. 11, p. 2767-2779, nov. 2007. bandidos para matar policiais de São Paulo. Rio de Ja- neiro: Grupo Globo. 14 out. 2012. Disponível em: < http:// MUNIZ, J. O. Ser policial é, sobretudo, uma razão de globoplay.globo.com/v/2189194/>. Acesso em: 28 ago. ser: cultura e cotidiano da Polícia Militar do Rio de Janeiro. 2016. 1999. 289 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Institu- to Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro. FERNANDES, A. O pós-redemocratização (1985-2015) na visão de praças da polícia militar: avanços, rupturas e per- SÃO PAULO (ESTADO). Decreto n. 20.218. Define a concei- manências políticas na segurança pública. In: LIMA, R. S.; tuação de acidente em serviço e dá outras providências. BUENO, S. Polícia e Democracia: 30 anos de estranha- São Paulo: Imprensa Oficial, 22 dez 1982. Disponível em: mentos e esperanças. São Paulo: Alameda, 2015. p. 199- < http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decre- (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia 212. to/1982/decreto-20218-22.12.1982.html>. Acesso em: 20 mar. 2016. FOLHA DE SÃO PAULO. Efetivo da PM encolhe no ano em que SP bate recordes. São Paulo, 15 jun. 2015. SÃO PAULO (ESTADO). Lei Complementar Estadual n. Disponível em:

-no-ano-em-que-sp-bate-recorde-de-assaltos.shtml>. http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.com- por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes Acesso em: 26 jan. 16. plementar/ 2001/lei.complementar-893-09.03.2001. html. Acesso em: 20 mar. 2016. FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Braileiro de Segurança Pública. 9. ed. São Paulo: Urba- SÃO PAULO (ESTADO). Decreto Estadual n. 60.175. Dispõe nia, 2015. sobre a estruturação da Polícia Militar e dá proviências correlatas. São Paulo: Impresa Oficial, 25 fev. 2014. Dis- FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA; FUNDAÇÃO ponível em: . timização e percepção de risco entre os profissionais Acesso em: 28 ago. 2016. do sistema de segurança pública. São Paulo, 2015.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 217 Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes Artigos da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014)

218 Alan Fernandes Rev. bras.| SãoPaulo segur. v. pública 10, n.2, 192-219, Ago/Set 2016 UFRJ, 1994. UFRJ, ZALUAR, A. arma defogo. Brasília, DF:Brasil (Executivo), 2015. J. J. WAISELFISZ, Sul. Porto Alegre: Spazio Italia,2009. Grandedo Rio do Militar Políciatransdisciplinar estudona I. M. SPANIOL, Condomínio do Diabo. Rio de Janeiro: Revan/ um fogo: de arma da uso do Impacto mortes matadas por matadas mortes Violência: da Mapa São Paulo, 2011. Altos Estudos de Segurança da Polícia Militar do Estado de de Centro – Pública) Ordem e Segurança de Policiais cias Ciên- em f.(MestradoDissertação 107 2011. militar. cial ZANCHETTA, M. e Justiça noBrasil. SãoPaulo: Contexto, 2014.p. 35-50. G. R. AZEVEDO, L.; J. RATTON, S.; R. LIMA, In: violenta. criminalidade e guerreiro Ethos A. ZALUAR, O estudo do erro na vitimização do poli- Crime, Polícia Crime, Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014) Artigos

Alan Fernandes

Resumen Abstract Alan Fernandes Victimización policial: análisis de las muertes violentas Police victimization: analysis of violent deaths suffered sufridas por integrantes de la Policía Militar del Estado de by members of the Military Police of São Paulo State São Paulo (2013-2014) (2013-2014) La muerte de policías es un capítulo separado entre las The death of police officers constitutes a chapter apart muertes ocurridas en Brasil. Eso debido a su especificidad, among deaths occurring in Brazil. This is due to its specificity, considerándose los condicionantes muy específicos, cuando given the highly peculiar conditions involved compared to comparadas a la población en general, hecho que los hace the general population, where police are more prone to víctimas en números muchas veces superiores a otros grupos become victims than other social groups, and also because sociales, e por atingir un grupo particularmente vinculado the problem affects a group directly involved in actions to a las acciones a la promoción de mejores condiciones de promote better conditions for tackling crime and violence in enfrentamiento al crimen y a la violencia junto a la sociedad. society. Addressing this question, the present study reports Con esa preocupación, el presente trabajo presenta los results of a study on cases of members of the Military Police resultados de una investigación sobre casos de integrantes de of São Paulo State (PMESP) that died due to violent causes la Policía Militar del Estado de São Paulo (PMESP) que murieron in the State of São Paulo in 2013 and 2014. Drawing on da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014) de São Paulo Militar do Estado da Polícia por causa violenta, en el Estado de São Paulo, en 2013 y 2014. both lifestyle and opportunity models, the articles seeks to Teniendo como inspiración las “teorías de estilo de vida” (life present elements for discussion of initiatives minimizing the style models) y de “oportunidades” (opportunity models), risk to which police officers, particularly military, are subject. el artículo intenta presentar elementos para discusión de iniciativas que minimicen los riesgos a que policías, en especial Keywords: Police victimization. Public Safety. Military los militares, están sujetos. Police. Victimology. Criminology.

por integrantes sofridas violentas Vitimização policial: análise das mortes Palabras clave: Victimización policial. Seguridad pública. Policía Militar. Victimología. Criminología.

Data de recebimento: 05/06/2016 Data de aprovação: 26/08/2016

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 192-219, Ago/Set 2016 219 Ponte para uma discussão pública mais ampla Entrevista Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds

Christopher Stone Presidente da Open Society Foundations. Reconhecido estudioso internacional sobre reformas do sistema de justiça criminal, foi professor da John F. Kennedy School of Government da Universidade de Harvard e diretor do Vera Institute of Justice.

Elizabeth Leeds Pesquisadora associada do Centro de Estudos Internacionais do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e presidente de honra do Conselho de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte

220 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 Entrevista

trajetória profissional de Christopher Stone reflete a im- Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher A portância da pesquisa como bússola fundamental das políticas públicas na área da segurança. Na discussão sobre “segu- rança pública e economia” que abre esta entrevista (realizada em

15 de dezembro de 2015), Stone enfatiza a necessidade de pes- pública mais ampla uma discussão para Ponte quisa não apenas como exercício acadêmico, mas, sobretudo, para a formulação de ações específicas na área. Ao abordar o tema da “sociedade civil e segurança pública”, Stone levanta a questão de entender o que faz com que a sociedade se mobilize em torno de alguns temas e não de outros. Como fazer da sociedade civil uma parceira na redução de homicídios? Como fazê-la acreditar em sua capacidade de pressionar e vigiar as instituições e órgãos estatais? Em relação ao tema da “ajuda internacional”, Stone destaca a re- levância dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e das mudanças ocorridas nos últimos anos nas agências bilaterais e multilaterais de desenvolvimento que abriram mais possibilidades de financiamento para a sociedade civil. Por último, mas não me- nos importante, a questão dos “indicadores”. Além de melhorar a produção e a qualidade dos indicadores na área de segurança pública, é fundamental que o uso deles também melhore. Trata-se de um desafio cotidiano, em que Stone destaca o papel do Fórum Brasileiro de Segurança Pública em suas diferentes funções.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 221 Segurança pública e economia Elizabeth Leeds: De acordo com a sua perspectiva em segurança pú- blica, gostaríamos que falasse sobre algumas questões relevantes para o Brasil e a América Latina. Uma é a relação entre o crime, a segurança

Entrevista pública e a economia. Em um artigo escrito em 2006 sobre a África do Sul, você argumenta que os elevados índices de criminalidade e a violência estão impactando a economia. Seu argumento é que, ao in- vés de fazer uma afirmação genérica sobre como melhorar a segurança pública, você tem que entender qual aspecto da segurança pública tem que ser melhorado para que a economia também melhore.

Christopher Stone: Correto. Isso fazia parte de um grande projeto sobre o “crescimento compartilhado” na África do Sul, liderado pelo ministro das Finanças e por uma equipe de economistas do mundo todo. Eles estavam convencidos de que os altos índices sul-africanos de criminalidade estavam relacionados com o crescimento. Foi muito difícil encontrar uma evidência dessa realidade. É possível achar cor- relações e você pode supor que os crimes são motivados por diversos Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher fatores. Elas podem demonstrar que os países que apresentam altos índices de homicídio têm um crescimento mais lento e que aqueles com baixos índices possuem um crescimento mais rápido. Mas não é

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte possível demonstrar que se essa taxa é reduzida, então o crescimento muda. Existem muitas correlações, porém não há muitas evidências causais persuasivas.

Comecei a conversar com os investidores, pois há uma teoria sobre a atividade econômica: se você tem realmente uma área com altos ín- dices de criminalidade, as pessoas não aceitarão empregos que exijam que elas tenham que passar por estas áreas à noite para chegar até a fábrica ou ao local de trabalho. Não consegui achar uma evidência concreta. É inacreditável o que as pessoas enfrentam para conseguir um emprego, tendo em vista que além de baixos salários, trabalho noturno, ainda entram em áreas com alto índice de criminalidade. É perigoso, sim, mas isso também é perigoso para uma pessoa que de- seja fazer uma simples caminhada. Dessa forma, é complicado achar a evidência.

Isso não é um exercício acadêmico. Eles querem realmente diminuir o índice de criminalidade e querem entender o que o crime tem a ver

222 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 com a economia. A conexão que, por fim, me deixou mais confiante foi: para conseguir níveis mais elevados de crescimento – consistente- mente 6%, 7%, 8%, 9% ao ano, tipo de crescimento que a Índia e a China estavam apresentando –, você teria que, no decorrer do tempo,

migrar as atividades do setor informal para negócios do setor formal. Entrevista A desaceleração do setor formal não permitia gerar crescimento a ní- veis tão elevados, por isso seria necessário que houvesse uma grande quantidade de atividade econômica informal e sustentável por um período longo o suficiente para transformá-la em atividade formal.

Assim, descobri que minha suspeita era realmente uma forte evi- dência: um índice elevado de criminalidade faz com que as pessoas desistam do setor informal. Essa história diz respeito às mulheres em comunidades da África do Sul e de Gana. Os negócios na co- munidade sul-africana onde os índices de criminalidade eram altos duravam, em média, um ano. Esses negócios eram fechados, em sua maioria, por terem sido roubados diversas vezes. Os mesmos tipos [...] um índice de negócios em uma comunidade fora de Acra [capital de Gana] elevado de Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher prosperavam, durando em média de três a cinco anos, e muitos deles criminalidade faz com que as pessoas viraram um negócio formal. desistam do setor

informal. Essa O argumento era sobre a diferença no índice de criminalidade pública mais ampla uma discussão para Ponte história diz respeito dessas comunidades. Fisicamente, essas comunidades eram mui- às mulheres em to parecidas uma com a outra – nenhuma das duas era capital comunidades da e apresentavam diversos tipos de negócios. Achei uma fotografia África do Sul e de que utilizei em um artigo sobre esse assunto. Na África do Sul, as ‘‘Gana. Os negócios lojas ou as fábricas de tijolos eram completamente isoladas com na comunidade madeira e depois fechadas. Em Gana, tudo acontecia na rua. A loja sul-africana onde era fechada, mas abria novamente na manhã seguinte. Ninguém se os índices de preocupava com o fato de terem suas coisas roubadas. Não havia criminalidade eram sinais de pessoas com medo. altos duravam, em média, um ano. O que gosto nessa história é que ela nos dá sugestões muito es- Esses negócios pecíficas do trabalho da polícia. A polícia sul-africana achava que eram fechados, em sua maioria, por estava correspondendo àquilo que as pessoas desejavam e tinham terem sido roubados como prioridade: o crime violento. Quando as donas de loja re- diversas vezes. clamavam que estavam sendo roubadas, a polícia agia. Conforme dissemos, se você tem a intenção séria de tentar fazer com que a economia cresça, a polícia deve, além de priorizar a redução de

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 223 assaltos, também priorizar a redução dos crimes cometidos con- tra as propriedades comerciais nas comunidades ou vizinhanças de baixa renda e que apresentem esses negócios informais. A proteção da economia informal proporcionada pela polícia deve aumentar.

Entrevista Essa é uma ação que um governo pode colocar em prática.

Conforme Portanto, se desejar que o Ministro das Finanças apoie a reforma de dissemos, se você segurança pública, em vez de apenas conversar com a polícia, é ne- tem a intenção cessário associar este objetivo a uma história que fale do crescimento séria de tentar econômico no qual os economistas acreditam. Você sabe, não deve fazer com que a ser o tipo de histórias de jornais sobre crescimento econômico que economia cresça, as pessoas ligadas à segurança sempre promovem. Acho que esse foi a polícia deve, o ponto principal de toda minha jornada: tentar perceber que havia além de priorizar uma grande diferença entre esses artigos que aparecem no Banco a redução de Mundial ou nos periódicos sobre desenvolvimento que relacionam assaltos, também os homicídios ao crescimento econômico. priorizar a redução ‘‘dos crimes Na África do Sul os investidores me disseram: “Não nos importamos cometidos contra Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher com as taxas de homicídio, nos importamos apenas com o nível de as propriedades corrupção. Se o governo é corrupto, fica difícil conseguirmos autori- comerciais nas comunidades ou zações. Se o governo não é corrupto, ou se é corrupto de uma forma vizinhanças de

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte bem previsível, podemos conseguir as autorizações. Então, faremos baixa renda e que negócio”. Conversei com a maior rede nacional de supermercados apresentem esses da África do Sul. Perguntei: “Como o alto índice de criminalidade negócios informais. em certas regiões afeta seu negócio?” Eles disseram: “Não sabemos, não analisamos isso no momento de decidir onde instalar nossas lojas. Esse é apenas um fator no que se refere ao modo de protegê-las uma vez tomada a decisão de colocá-las nessas regiões. No entanto, o nível de criminalidade não orienta nossas decisões de investimento em uma comunidade específica”.

Sociedade civil e segurança pública Leeds: Uma questão importante para o Fórum é o papel da sociedade civil na tentativa de fazer com que a política de direito penal seja cor- retamente aplicada. A mim, parece que isso tem de acontecer em vários níveis. Por exemplo, o Fórum foca na responsabilidade pelas informações e dados verossímeis, esse é um nível, em âmbito nacional. No âmbi- to local há a sociedade civil tentando melhorar a atuação da polícia. Na semana passada, foi publicado um artigo no Washington Post1, que

224 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 provavelmente você viu, sobre o motivo pelo qual o movimento Black Lives Matter [A Vida de Negros Importa] nunca se firmou no Brasil, mesmo considerando que nos últimos anos o país registrou um número alarmante de jovens negros mortos pela polícia. Por isso é essencial que

a sociedade civil atue em vários níveis, em nível macro e em nível local, Entrevista em lugares como o Brasil, onde os índices de impunidade policial são tão altos que as pessoas têm medo de se mobilizar. Qual é a realidade e qual é a possibilidade real da sociedade civil conseguir desenvolvimentos substanciais nessa área?

Stone: É uma ótima pergunta. Você pode igualmente perguntar: por que o movimento Black Lives Matter surgiu há apenas dois anos nos Estados Unidos em vez de ter surgido há centenas de anos, há Taxista afro-americano vinte ou ainda há dez anos? É como se o índice de mortes tives- espancado pela polícia se mudado. Sabe-se, pelo menos, que o índice de mortes hoje em de Los Angeles, em dia é provavelmente menor. Desse modo, tem algo a ver com as março de 1991, sob a acusação de dirigir gravações em vídeo e o fato de que todos têm seu momento de Rodney King quando todo mundo pensa “Oh, meu Deus, todos

em alta velocidade. Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher A cena foi gravada têm uma câmera de vídeo em casa”. Mas, na verdade, nem todo em vídeo por mundo tinha sua própria câmera e o momento de Rodney King per- testemunha e gerou manecia relativamente incomum. Os vídeos de celulares que temos distúrbios violentos na cidade, em 1992, agora são completamente diferentes. Todo mundo tem. pública mais ampla uma discussão para Ponte após o julgamento e absolvição dos Também há uma mudança na política nacional. Eu acho que o policiais envolvidos. movimento Black Lives Matter não existiu até a eleição do presi- dente Barack Obama. A sociedade civil tem de acreditar que, na verdade, o governo não tem nada a ver com isso. Um fato interes- sante sobre o governo Obama é que durante muito tempo ele não falava sobre raça; na verdade, ele proibiu as pessoas do Departa- mento de Justiça dos EUA de realizarem reuniões em que a raça fosse o tema, pois ficava extremamente nervoso em ser identificado como um presidente de consciência racial. Se você pensasse no movimento Black Lives Matter e pensasse que um presidente ne- gro faria isso, ficaria desapontado com a administração do Obama como impulsora da sociedade civil. Acho que você deve ter visto isso no movimento em San Francisco, em Nova York. Ou seja, juntou-se a tecnologia de comunicação e o real desapontamento político sobre a vontade de um presidente negro em lutar por isso. Se você tem um presidente negro que não foca no fato de que pes-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 225 soas negras estão sendo mortas no país, então é preciso resolver o problema com as próprias mãos.

Acho que há algo diferente acontecendo em relação ao ativismo mo-

Entrevista derno. Há alguns fatores reunidos. A sociedade civil no Brasil e em alguns outros lugares é ativa para certas questões. A dúvida é: o que faz com que a sociedade civil direcione suas forças para esse proble- ma? É essa uma questão racial no Brasil? Recentemente, amigos que moram no Brasil me escreveram e se mostraram bastante esperan- çosos, pois um grupo de policiais militares que atirou em um carro matando cinco pessoas tinha sido preso. Sou norte-americano e a primeira pergunta que faço é: as pessoas que estavam no carro eram negras? E meus interlocutores não souberam responder, mesmo de- pois de terem lido várias histórias sobre o caso. As manchetes não diziam “Polícia mata cinco jovens negros”, que é o que teria apare- cido nos jornais norte-americanos. O fato é que foi necessária uma segunda conversa para identificar a raça das vítimas... evidentemente eram negros, mas essa não era a história inicial. Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher

Leeds: Bem, quando você fala de jovens da favela, não é preciso de- fini-los como negros, pois supõe-se que são afrodescendentes. O fato é

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte que as notícias sobre os cinco jovens de uma favela em uma parte X da cidade mostram uma suposição implícita de que eram negros.

Stone: É uma campanha diferente dizer Favela Lives Matter [A Vida de Favelados Importa] em vez de dizer Black Lives Matter [A Vida de Negros Importa]. Parte do movimento Black Lives Matter nos Estados Unidos está ligado ao fato de que muitos homens e mulheres negros constituem a classe média, são profissionais de classe alta ou super ricos, mas ainda assim... Durante muito tem- po, a promessa era a de que o dinheiro os tiraria da opressão de serem negros na América. O que aconteceu foi o seguinte, e você consegue ver isso nos argumentos sobre discriminação racial nos Estados Unidos: a história que as pessoas adoram contar na lite- ratura sobre discriminação racial é que o cara de terno foi parado pela polícia porque é negro. Isso é duplamente ultrajante, porque, teoricamente, supõe-se que o terno o protegeria. Não sei se esses dados no Brasil estão relacionados aos negros, à classe média ou a parte rica do país.

226 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 Leeds: Na verdade, acho que existe um movimento para além do que o artigo do Post reconhece. A Anistia Internacional, recentemente reaberta no Brasil, tem sido extremamente contundente em relação à questão racial. Os homicídios tem sido identificados como questões

raciais e os dados que o Fórum publica em seu Anuário, especialmente Entrevista nos últimos anos, tem destacado a grande proporção de jovens negros que compõem o total de vítimas de homicídio.

Stone: Acho que este número provavelmente crescerá. Lembro que o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) realizou uma pesquisa sobre abordagem policial e estereótipos raciais e o re- sultado foi desanimador2. Os números mostravam que havia um enorme crescimento da filtragem racial no trabalho da polícia, mas as pessoas não se preocupavam com isso. Logo, isso não gerou o tipo de preocupação que imaginávamos.

Assistência internacional Leeds: Outra questão que interessa ao Fórum é o impacto da assistência Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher internacional, mas desejamos defini-lo nos últimos dez anos: se houve uma mudança de foco ou se não houve nenhum impacto. É possível definir a assistência internacional de várias maneiras. Lembro do artigo

que Rachel Neild escreveu há alguns anos discutindo várias questões pública mais ampla uma discussão para Ponte sobre assistência bilateral e multilateral, como a visão muito reduzida das instituições multilaterais em relação à segurança pública e o medo de envolvimento com questões da polícia.

Stone: Na verdade, acho que, nesse tema em especial, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável [ODS, das Nações Unidas] são de um benefício extremamente importante. O grande número de homi- cídios no Brasil nunca foi um problema para os ministros de relações exteriores de outros países, a menos que estivessem visitando o país e com medo de serem mortos. O fato de o Objetivo 16 incluir um com- ponente de redução da violência faz com que os elevados índices de homicídio no Rio, em São Paulo e em várias outras cidades da Améri- ca Latina passem a ser meta internacional e deveriam receber atenção das agências de cooperação. No entanto, existem outros 168 objetivos que, supostamente, devem receber atenção, assim, todas essas agên- cias farão suas escolhas. Nos últimos quinze anos, vem acontecendo um diálogo ativo entre as agências de desenvolvimento. Não houve

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 227 um Objetivo de Desenvolvimento do Milênio [ODM, das Nações Unidas] que tratasse desses problemas e das prioridades que estavam sendo estabelecidas nos escritórios dessas agências, não se perguntava quais os objetivos que receberiam atenção e como eles poderiam ser

Entrevista alcançados. Agora há um ODS que se refere aos homicídios, criando a oportunidade para que as agências bilaterais e de desenvolvimento concentrem sua atenção em alcançar esse objetivo no mundo todo. Porém, não é possível atingi-lo se não focarmos nos locais onde os índices de homicídios sejam super altos. Dois terços das cidades no mundo com índices elevadíssimos de homicídios estão na América Latina e no Caribe. De modo que, inevitavelmente, enquanto os ODS importarem, eles mudarão a discussão em muitas das agências de desenvolvimento. Essa é uma chance que temos.

Leeds: E o que será feito para que isso tenha um impacto em nível nacional, ou no caso do Brasil, estadual?

Stone: Bem, é uma questão bastante complicada. O que foi feito Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher para que os ODM tenham um impacto em nível de política na- cional e estadual?

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte Leeds: Existem casos individuais, mas nos casos de violência policial que chegaram até a Corte Interamericana, o Brasil foi condenado e depois nada aconteceu.

Stone: Acho que, em relação à atenção mundial, diminuir o número de homicídios em geral é diferente de reduzir a violência policial, pois essa questão pode ser muito difícil para as agências de desen- volvimento, para as agências bilaterais governamentais e até mesmo para as agências multilaterais. A violência policial é uma questão estarrecedora para elas, porque tudo o que elas sabem fazer é finan- ciar o governo – e o governo, nesses casos, é quem está atirando nas pessoas. Então, quando isso acontece, a resposta instintiva das agên- cias é suspender o financiamento. E elas dificilmente sabem como financiar a sociedade civil. É mais fácil financiar o governo do que financiar a sociedade civil.

Então, duas coisas fazem a diferença. Uma é o foco nos homicí- dios versus a violência policial, já que os ODS permitem que os

228 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 governos ofereçam uma assistência séria para o governo que deseje diminuir o índice de homicídios. Outra, que está mudando, é que os bancos de desenvolvimento estão cada vez mais investindo na sociedade civil. Há dez anos, quando o Fórum começou, o Banco

Mundial não encontrava uma alternativa para financiar a socie- Entrevista dade civil sem ser pelo Fundo Social Fiduciário do Japão para a Sociedade Civil, e todos esses financiamentos deviam ser aprova- dos pelo Ministério das Finanças ou por quem quer que fosse a contraparte do Banco Mundial no governo. Assim, o Banco não tinha como financiar nenhuma organização de sociedade civil. Era muito difícil encontrar uma maneira de fazer isso. Havia apenas uma fonte de financiamento que poderia ser utilizada, e esta não poderia ser usada se você não conseguisse a assinatura do governo em questão para isso.

Atualmente, a Parceria Global para Responsabilidade Social do Banco Recentemente, Mundial financia de forma direta, sem a assinatura dos governos, as amigos que moram organizações de sociedade civil. Embora o Fundo em si seja modesto, no Brasil me Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher escreveram e se diferentes programas nacionais começaram, nesse momento, a ser fi- mostraram bastante nanciados ou complementados com dinheiro próprio, estreitando isso esperançosos, por meio da Parceria, já que podem obter isso para a sociedade civil.

pois um grupo de Esse é apenas um exemplo de um grande banco de desenvolvimento pública mais ampla uma discussão para Ponte policiais militares multilateral que encontrou uma saída, dez anos depois, para financiar que atirou em um a sociedade civil de forma direta e com muito mais facilidade. carro matando cinco ‘‘pessoas tinha Então, a questão é: eles financiariam a sociedade civil em relação a sido preso. Sou essas temas? Na minha opinião, isso exigirá que as organizações de norte-americano sociedade civil tenham um maior conhecimento sobre as agências de e a primeira desenvolvimento porque, se voltarmos ao início de nossa conversa, a pergunta que faço pergunta seria: é possível provar para essas agências a relação entre os é: as pessoas que índices de homicídio e o crescimento mensurável da economia ou a estavam no carro relação com alguma história sobre o crescimento econômico? eram negras? E meus interlocutores não souberam Além disso, também há outros fatores. De modo geral, algumas responder, mesmo agências bilaterais e multilaterais estão deixando o trabalho na área depois de terem da justiça, em geral, pois estão preocupadas com a corrupção, vio- lido várias histórias lência e outras questões governamentais. Conheci um alto funcioná- sobre o caso. rio do setor de desenvolvimento que me disse recentemente que eles achavam que este era o momento perfeito para impulsionar o finan-

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 229 ciamento da sociedade civil, uma vez que os governos não queriam ser vistos como se estivessem abandonando os direitos humanos e a justiça em seus países, mas estavam cada vez mais temerosos em re- lação ao financiamento de governos. Então, cada geração deve fazer

Entrevista uma tentativa. Mas a questão é: este é um mundo diferente daquele de dez anos atrás. Há um objetivo global de redução do número de Agora há um ODS homicídios, há mais instituições para financiar a sociedade civil e, que se refere por sua vez, essas organizações se sentem mais confortáveis para falar aos homicídios, sobre a reforma da polícia. criando a oportunidade para Indicadores que as agências Leeds: Por fim, também queria falar sobre os indicadores. Esse foi o bilaterais e de assunto de uma reunião organizada pela Open Society Foundations desenvolvimento (OSF), em Bogotá, sobre a possibilidade de um protocolo regional para concentrem sua mensuração dos homicídios. Atualmente, enfatiza-se a criação de in- atenção em dicadores na América Latina para a segurança pública e a justiça. ‘‘alcançar esse Acho que a noção de indicadores como um todo é ambígua. objetivo no mundo todo. Porém, não Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher Acho que estão sendo mal utilizados. Sobre o que realmente estamos é possível atingi-lo falando com os indicadores? Então, para realizar uma reunião sobre se não focarmos nos locais onde indicadores e a importância de gerar informações confiáveis, temos os índices de

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte de saber como traduzir isso em um trabalho útil nessa área, tanto homicídios sejam para a sociedade civil como no que se refere à criação de um espaço super altos. político no governo. Como venho trabalhando nisso há algum tempo, o aprendizado que tiro disso é que podemos promover todas essas or- ganizações, políticas, etc., mas, no final, para mim, é o espaço políti- co que fará a diferença. Há todos os tipos de movimentos de avanços e retrocessos. O pêndulo oscila e há momentos de esperança quando o espaço político existe, mas depois, inevitavelmente, esse espaço de- saparecerá. Dessa forma, como damos continuidade ao processo para que esses indicadores signifiquem algo que realmente faça diferença?

Stone: Há uma série de questões nisso. Realmente acho que me- lhorar os indicadores é uma parte importante do quebra-cabeça, pois as agências governamentais trabalham sobre eles. É o que elas fazem se os indicadores são bons. Mas, o uso de indicado- res é normalmente muito imaturo e eles nem sempre estão bem ajustados aos problemas que querem focar. Mas, no final, se você disser a um departamento de polícia que o que se deseja ver são

230 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 mais prisões, que você está contabilizando prisões, você pode gerar mais prisões. E, no sentido contrário, se você punir os po- liciais pelo número de prisões efetuadas, você consegue reduzir o número destas. Essa simples história tem muito a dizer. É ne-

cessário um indicador que seja relativamente fácil de mensurar, Entrevista que responda de maneira muito rápida a algo que você esteja tentando mudar e que esteja alinhado com alguém que tenha au- toridade sobre isso. Por exemplo, um indicador sobre os níveis de encarceramento nos Estados Unidos não funcionaria, pois não há ninguém responsável pelo encarceramento no país. Ninguém controla isso nem se responsabiliza por esse número. Dessa for- ma, não é um indicador útil; talvez seja útil para os jornalistas, para os advogados, mas não é útil como uma ferramenta para mudar essa prática. Para isso, é preciso que o número de pessoas acusadas em inquéritos criminais, em um determinado distrito, seja de responsabilidade de um oficial, pelo menos; de alguém que seja realmente responsável por isso e que a organização colo- que isso em prática. Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher

Por um lado, uma das coisas que tem sido frustrante para muitos reformistas do setor judiciário é que os indicadores devem respon-

der não apenas a uma decisão, mas também a quem toma a de- pública mais ampla uma discussão para Ponte cisão. Nem mesmo na China é possível mudar um indicador que está relacionado às decisões judiciais. Mesmo o Partido Comunista não consegue mudar o número de condenações dos juízes tentando direcioná-los para tomar certa decisão. Treinamentos são realizados esperando que consiga instruir poucos casos.

Por outro lado, na polícia militar, você tem um controle de co- mando, supõe-se que os policiais e as pessoas realmente obedecem às regras, então é possível fazer essa mudança. No setor judiciário estamos presos a muitos oficiais que têm muitos critérios indivi- duais e, portanto, é difícil mudar esta prática. É necessário focar em organizações como a polícia. Em alguns países, os promotores públicos não são individualmente responsabilizados. Assim, é ne- cessário encontrar um departamento de polícia que se comporte como uma organização, encontrar alguém que seja responsável por ela e, então, será possível mudar a prática.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 231 É nessas situações que eu acredito que os indicadores sejam úteis, ao contrário de muitas outras pessoas que gastam um tempo enorme tentando fazer com que os indicadores funcionem. Lembro de ter ido até uma unidade policial e conversar com a pessoa que reali-

Entrevista zou projetos de assistência internacional e que tinha um escritório e um bom cargo, acho que era um comissário adjunto ou algo assim. [...] o uso de Acho que foi na Jamaica. E esse simpático comissário era o responsá- indicadores é vel pela assistência financeira e pelo dinheiro vindo da União Euro- normalmente muito peia e dos EUA, ou seja, todos os doadores bilaterais e multilaterais. imaturo e eles Ele tinha um escritório e um monte de flipcharts que sobraram de nem sempre estão algum workshop ou conferência da qual tinha participado recente- bem ajustados aos mente e neles estavam relacionadas todas as coisas que eles fariam. problemas que E bem, bem abaixo, quase saindo da página, estavam: “monitora- querem focar. Mas, no mento” e “avaliação”. São sempre as últimas coisas. O problema dele final, se você disser a não estava no desenho dos indicadores. O problema dele é que es- um departamento de távamos justamente conversando durante uma reunião da equipe ‘‘polícia que o que se de comando da qual ele não fazia parte. Ele era o responsável pelos deseja ver são mais doadores internacionais, por enviar seus relatórios de projeto para prisões, que você Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher eles e por certificar-se da responsabilidade pelo dinheiro doado, mas está contabilizando na verdade ele não era o responsável pelo trabalho da polícia. Não fi- prisões, você pode gerar mais prisões. cava nem mesmo na sala quando eram dadas instruções aos policiais E, no sentido

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte sobre o que fazer, onde patrulhar, como usar as armas. Ou seja, tudo contrário, se você estava acontecendo com uma série de outros indicadores no saguão punir os policiais pelo dessa unidade policial e ele não tinha nada a ver com essas questões. número de prisões efetuadas, você Então, a ideia é de que você pode resolver o problema do policia- consegue reduzir o mento jamaicano por meio desses projetos financiados, liderados número destas. Essa por um comissário adjunto que tem uma parede cheia de flipcharts simples história tem e está completamente apartado do comando operacional da polícia muito a dizer. é equivocada. Ao mesmo tempo, não é possível oferecer um finan- ciamento para uma organização policial que o seu comandante permita que esse recurso interfira no trabalho real do cotidiano da polícia. É arriscado demais. Então, você tem que escondê-lo em algum lugar.

Não importa se o financiamento vem da Open Society, da União Europeia ou de qualquer outra pessoa. Porque você tem um recurso, eles podem fazer uma grande reunião e mostrar todos os tipos de coisas, mas isso não representa a realidade.

232 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 Os indicadores que o comandante utiliza em uma reunião de comando, esses são reais. Eles se afastam das estatísticas e di- zem: “Por que você demorou seis dias para investigar este caso na semana passada?” Isso, sim, é um indicador real e terá um

efeito real. Entrevista

Leeds: Uma das coisas com as quais o Fórum não tinha particular- mente se envolvido, mas que nos últimos dois anos começou a publicar dados no Anuário, são os estupros. E o número de 50 mil estupros ao ano chamou a atenção momentânea da presidenta Dilma. Mas o problema sumiu da visão pública. Essa é uma área em que alguém pode criar indicadores úteis. Mas, quando o problema some da agenda pública e deixa de ser uma grande questão, limita-se muito o que pode ser feito e o impacto político que os indicadores poderiam ter em uma área específica.

Stone: Eu e você conversamos sobre isso antes. Haverá um círculo de pessoas que trabalhará essas questões diariamente ao longo do Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher tempo. Na maior parte do tempo, isso não será uma prioridade política. Esses problemas vão depender das ambições individuais de pessoas que comandam as diferentes forças policiais. Um dia

será este estado, no outro dia será outro estado, mas se eles forem pública mais ampla uma discussão para Ponte bons oficiais e houver uma capilaridade como aquela que o Fórum está sempre promovendo. Uma lição aprendida é: quando, em um Referência ao local onde há um comandante policial ambicioso, esperto, enga- assassinato de Michael jado e esse comandante é transferido, outra pessoa, de uma parte Brown, em agosto de 2014. O jovem diferente do país, assume o seu comando mas começa a trabalhar negro de 18 anos, a partir do que esse comandante fez. sem antecedentes criminais e que não É preciso conectar sociedade civil, ativismo, jornalismo, protestos, portava arma, foi morto pelo policial coisas que são espasmódicas. Elas surgem, chamam muita atenção e branco Darren Wilson. impactam por alguma razão. Ligam-se a algo que aconteceu e com o A morte do jovem qual o presidente se preocupa. Se um jornalista escreve algo realmente desencadeou uma dramático usando essas questões, elas mudam. Ninguém sabe por que série de protestos na cidade, mas o policial Fergusson (Missouri), lançou uma série de problemas nacionais sobre não foi indiciado homens, mulheres, meninos e meninas negros baleados ou vítimas de pelo Departamento alguma forma de abuso policial. Havia milhares desses casos dispo- de Justiça norte- níveis. O de Ferguson teve impacto durante um tempo, gerando um americano. significado que se prolongou.

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 233 É quando todas essas outras coisas que você tem feito durante um tempo importam, pois é delas que virão as respostas. É quan- do a política muda e as pessoas se viram para você e dizem: “agora Por outro lado, na nós realmente temos que fazer alguma coisa. O que faremos?” polícia militar, você

Entrevista Os manifestantes não sabem o que fazer, apenas ficam com raiva. tem um controle Eles têm uma série de demandas que são razoáveis, mas geral- de comando, mente não para as coisas que serão politicamente implementa- supõe-se que das. Essa ajuda virá de todas essas pessoas que vem adquirindo os policiais e as experiência ao longo do tempo. pessoas realmente obedecem às regras, então Leeds: Você está certo sobre não deixar esses episódios momentâneos é possível fazer morrerem, nem suas histórias, pois sempre haverá alguém nessa rede essa mudança. que foi criada capaz de retomar o fio da meada. Há apenas que per- ‘‘ sistir e não deixar morrer, fazer um trabalho diário. Isso é muito do que o Fórum tem feito no decorrer dos anos. Acho que só temos que manter nosso foco na meta principal.

Stone: Acho que estando na articulação, quero dizer, o Fórum Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher tem uma dupla função: ele pode ser a conexão entre os refor- mistas, líderes individuais, inovadores e seus amigos na socieda- de civil que realmente tem estado com eles há muito tempo. E

Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte também pode ser uma ponte para uma discussão pública mais ampla, para os políticos, para os funcionários públicos que não são policiais nem funcionários da segurança, ou seja, muito mais ampla que isso. Eles apenas lidarão com a polícia quando tudo isso se tornar a “questão do dia”.

1. Ver .

2. Ver .

234 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 Entrevista Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds por Elizabeth entrevistado Stone, Christopher Ponte para uma discussão pública mais ampla uma discussão para Ponte

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 220-234, Ago/Set 2016 235 REVISTA BRASILEIRA DE SEGURANÇA PÚBLICA Escopo e política editorial A Revista Brasileira de Segurança Pública é a revista semestral do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e tem por objetivo a produção de conhecimento e a reflexão no campo da segurança pública no Brasil e exterior. Os autores(as) dos artigos podem ser pesquisadores, policiais e/ou demais profissionais da área que tenham desenvolvido pesquisas científicas dentro de suas respectivas instituições e desejem disseminar resul- tados. Pretende-se promover o intercâmbio de informações qualificadas no que tange às relações entre segu- rança pública, violência e democracia, focando em políticas implementadas na área, policiamento, ensino policial, monitoramento e avaliação de dados, justiça criminal e direitos humanos. Especialistas nacionais e estrangeiros podem ser convidados a conceder entrevistas ou depoimentos para a publicação. Regras Instruções aos autores 1 Os trabalhos para publicação na Revista Brasileira de Segurança Pública devem ser inéditos no Brasil e sua publicação não deve estar pendente em outro local. Deverão ter entre 20 e 45 mil caracteres com espaço, consideradas as notas de rodapé, espaços e referências bibliográficas. 2 Os trabalhos deverão ser enviados através do sistema on-line de gestão da Revista Brasileira de Segurança Pública, dis- ponível em http://revista.forumseguranca.org.br/. Para tanto, os autores devem realizar um cadastro, que permitirá o acesso à área de submissão de trabalhos, bem como permitirá o acompanhamento de todo o processo editorial. Toda a comunicação com os autores que submeterem o trabalho através do sistema será realizada por meio da ferramenta. 3 Recomenda-se a utilização de editores de texto que gravam em formatos compatíveis tanto com programas amplamente disseminados quanto, prioritariamente, com softwares de código aberto. 4 As opiniões e análises contidas nos textos publicados pela Revista Brasileira de Segurança Pública são de responsa- bilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a posição do Fórum Brasileiro de Segurança Públi- ca. A Revista Brasileira de Segurança Pública reserva-se todos os direitos autorais dos artigos publicados, inclusive os de tradução, permitindo, entretanto, sua posterior reprodução com a devida citação da fonte. 5 Todos os trabalhos serão submetidos ao Comitê e ao Conselho Editorial da Revista, que terão a responsabilidade pela apreciação inicial dos textos submetidos à publicação. 6 O Comitê Editorial da Revista Brasileira de Segurança Pública pode, a qualquer tempo, solicitar apoio de con- sultores AD HOC, sempre especialistas no tema do artigo submetido, para emissão de pareceres de avaliação sobre os textos encaminhados. Cada artigo receberá a avaliação de dois pareceristas, sendo os pareceres em blind review, portanto, sem a identificação dos autores ou dos pareceristas. Estes pareceristas podem aceitar recusar ou reapresentar o original ao autor com sugestões de alterações. 7 Os trabalhos poderão, ALTERNATIVAMENTE, ser enviados por correio, cuja correspondência deverá ser en- viada para a sede do Fórum, localizada à Rua Amália de Noronha, 151, Cj. 405, Pinheiros, São Paulo / SP, CEP 05410-010. Nesse caso, os textos deverão ser enviados em CD-R ou CD-RW e duas cópias impressas em papel A4 e deverão ser precedidos por uma folha de rosto onde se fará constar: o título do trabalho, o nome do autor(a) (ou autores), endereço, telefone, e-mail e um brevíssimo currículo com principais títulos acadêmicos, e principal atividade exercida, cidade, estado e país do autor. Recomenda-se que o título seja sintético. Qualquer identificação de autor(a) deve constar em folha ou arquivo separado. 8 A revista não se obriga a devolver os originais das colaborações enviadas por correio. 9 Após aprovação do trabalho para publicação, o(s) autor(es) deverão enviar a “Declaração de responsabilidade e trans- ferência de direitos autorais”, assinada por todos os autores. A declaração pode ser enviada por e-mail, escaneada em formato .jpg, ou para a sede do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O modelo da declaração encontra-se dispo- nível ao final das regras de publicação e no link: http://www2.forumseguranca.org.br/arquivos/declaracaorbsp.pdf 236 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 236-238, Ago/Set 2016 critérios bibliográficos

Resenhas Serão aceitas resenhas de livros publicados no Brasil, no máximo, há dois anos e no exterior, no máximo, há três anos, além de conter a referência completa do livro. Artigos Deverão ser precedidos por um breve resumo, em português e em inglês, e de um Sumário; Palavras-chave deverão ser destacadas (palavras ou expressões que expressem as idéias centrais do texto), as quais possam facilitar posterior pesquisa ao trabalho na biblioteca. Serão aceitos artigos escritos nas línguas portuguesa e espanhola. Artigos escritos em inglês ou francês pode-

rão ser submetidos para avaliação, mas, se aprovados, serão traduzidos para a língua portuguesa; Regras Não serão devidos direitos autorais ou qualquer remuneração pela publicação dos trabalhos em nossa revista, em qualquer tipo de mídia impressa (papel) ou eletrônica (Internet, etc.). A simples remessa do original para apreciação implica autorização para publicação pela revista, se obtiver parecer favorável. Quadros e tabelas A inclusão de quadros ou tabelas deverá seguir as seguintes orientações: a/ Quadros, mapas, tabelas etc. em arquivo Excel ou similares separado, com indicações claras, ao longo do texto, dos locais em que devem ser incluídos. b/ As menções a autores, no correr do texto, seguem a forma-(Autor, data) ou (Autor, data, página). c/ Colocar como notas de rodapé apenas informações complementares e de natureza substantiva, sem ultrapassar 3 linhas. Referências bibliográficas As referências bilbiográficas devem ser citadas ao final do artigo, obedecendo aos seguintes critérios: Livro: sobrenome do autor (em caixa alta) /VÍRGULA/ seguido do nome (em caixa alta e baixa) /PON- TO/ título da obra em negrito /PONTO/ nome do tradutor /PONTO/ nº da edição, se não for a primeira /VÍRGULA/ local da publicação /DOIS PONTOS/ nome da editora /VÍRGULA/ data /PONTO. Artigo: sobrenome do autor, seguido do nome (como no item anterior) /PONTO/ título do artigo / PONTO/ nome do periódico em negrito /VÍRGULA/ volume do periódico /VÍRGULA/ número da edição /VÍRGULA/ data /VÍRGULA/ numeração das páginas /PONTO. Capítulo: sobrenome do autor, seguido do nome (como nos itens anteriores) /PONTO/ título do ca- pítulo /PONTO/ In /DOIS PONTOS/ sobrenome do autor (em caixa alta) /VÍRGULA/ seguido do nome (em caixa alta e baixa) /PONTO/ título da obra em negrito /PONTO/ local da publicação /DOIS PONTOS/ nome da editora /VÍRGULA/ data /PONTO. Coletânea: sobrenome do organizador, seguido do nome (como nos itens anteriores) /PONTO/ título da coletânea em negrito /PONTO/ nome do tradutor /PONTO/ nº da edição, se não for a primeira / VÍRGULA/ local da publicação /DOIS PONTOS/ nome da editora /VÍRGULA/ data /PONTO. Teses acadêmicas: sobrenome do autor, seguido do nome (como nos itens anteriores) /PONTO/ título da tese em negrito /PONTO/ número de páginas /PONTO/ grau acadêmico a que se refere / TRAVESSÃO/ instituição em que foi apresentada /VÍRGULA/ data /PONTO. Os critérios bibliográficos da Revista Brasileira de Segurança Pública tem por base a NBR 6023:2002, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 236-238, Ago/Set 2016 237 Declaração de Responsabilidade e Transferência de Direitos Autorais Utilize o modelo abaixo, preencha e envie de forma digitalizada (.JPG) como documento suplemen- tar através do sistema on-line. Se preferir encaminhar por fax ou correio, também poderá fazê-lo para a sede do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, localizada na Rua Amália de Noronha, 151, Cj. 405, Pinheiros, São Paulo / SP, CEP 05410-010.

Declaração de Responsabilidade e Transferência de Direitos Autorais Primeiro autor:______Regras Título do artigo:______Nomes de todos os co-autores na ordem que aparecem no artigo: ______

1.Declaração de Responsabilidade - Garanto que em caso de vários autores, obtive, por escrito, autorização para assinar esta declaração em seu nome e que todos os co-autores leram e concordaram com os termos desta declaração. - Certifico que o artigo representa um trabalho inédito e que nem este manuscrito, em parte ou na íntegra, nem outro trabalho com conteúdo substancialmente similar, de minha autoria, foi publicado ou está sendo considerado para publicação em outra revista, que seja no formato impresso ou eletrônico. - Atesto que, se solicitado, fornecerei ou cooperarei na obtenção e fornecimento de dados sobre os quais o artigo está sendo baseado, para exame dos editores. - Certifico que todos os autores participaram suficientemente do trabalho para tornar pública sua responsabilidade pelo conteúdo. No caso de artigos com mais de seis autores a declara- ção deve especificar o(s) tipo(s) de participação de cada autor, conforme abaixo especificado: (1) Contribuí substancialmente para a concepção e planejamento do projeto, obtenção de dados ou análise e interpretação dos dados; (2) Contribuí significativamente na elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; (3) Participei da aprovação da versão final do manuscrito. Assinatura de todos os autores: ______Data:______

2. Transferência de Direitos Autorais – Declaro que em caso de aceitação do artigo, concordo que os di- reitos autorais a ele referentes se tornarão propriedade exclusiva da Revista Brasileira de Segurança Pública, vedada qualquer reprodução, total ou parcial, em qualquer outra parte ou meio de divulgação, impressa ou eletrônica, sem que a prévia e necessária autorização seja solicitada e, se obtida, farei constar o devido agra- decimento à Revista Brasileira de Segurança Pública. Assinatura de todos os autores: ______Data:______

238 Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 2, 236-238, Ago/Set 2016

Revista Brasileira de Segurança Pública

Dossiê Prevenção da violência: construção de um novo sentido para a participação dos municípios na segurança pública Melina Ingrid Risso

Novas polícias? Guardas municipais, isoformismo institucional e participação no campo da segurança pública Almir de Oliveira Junior e Joana Luiza Oliveira Alencar

Os municípios e a segurança pública no Brasil: uma análise da relevância dos entes locais para o financiamento da segurança pública desde a década de 1990 Ursula Dias Peres, Samira Bueno e Gabriel Marques Tonelli

Uma perspectiva multilateral para a prevenção da violência na América Latina Flávia Carbonari, Gregor Wolf, Joan Serra Hoffman e Dino Caprirolo

Guardas municipais: entre a tentação da tradição e o desafio da inovação Alberto Kopittke

Gestão da informação e governos locais: experiências do Observatório de Segurança Pública de Canoas (RS) e novas possibilidades Jardel Fischer Loeck, Thiago Medeiros Magnus, Daniel Montenegro e Eduardo Vieira Mattos

A formação das guardas civis municipais do Grande ABC Juliana Barroso e Juliana Teixeira de Souza Martins

Artigos Cronologia dos “Ataques de 2006” e a nova configuração de poder nas prisões na última década Sérgio Adorno e Camila Nunes Dias

O Herói-Envergonhado: tensões e contradições no cotidiano do trabalho policial Rafael Alcadipani da Silveira e Cintia Rodrigues de Oliveira Medeiros

“Hierarquia da invisibilidade”: preconceito e homofobia na formação policial militar Fábio Gomes de França

Zonas do Medo: variações geográficas do sentimento de (in)segurança no suplemento Vitimização e Acesso à Justiça da PNAD de 2009 David Maciel de Mello

Vitimização policial: análise das mortes violentas sofridas por integrantes da Polícia Militar do Estado de São Paulo (2013-2014) Alan Fernandes

Entrevista Ponte para uma discussão pública mais ampla Christopher Stone, entrevistado por Elizabeth Leeds