UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU AVM FACULDADE INTEGRADA

FORMAÇÃO EM TEATRO MUSICAL NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS - REALIDADE E DESAFIOS

DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Por: Fidelcino Neves Reis

Orientador Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho

Rio de Janeiro 2013

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU AVM FACULDADE INTEGRADA

FORMAÇÃO EM TEATRO MUSICAL NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS - REALIDADE E DESAFIOS

Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Docência do Ensino Superior Por: Fidelcino Neves Reis

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AGRADECIMENTOS

....a todos os colegas de curso em especial a Sayonara Azevedo, Erick Zickwolff, Sabrina Kehl, Rodrigo Ventura e Edilce Terra, a todos os meus mestres em Teatro e professores do AVM, a Reiner Tenente, aos sites: Cena Musical e Mr. Zieg e a Deus.

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DEDICATÓRIA

Dedico aos meus pais: Davi e Aracy, a minha irmã Claudia, a minha afilhada Bella, aos sobrinhos de coração: Natália Luíza, Larissa e Martin, ao orientador Vilson Sergio, a Renata Lorena e a todos os profissionais que se dedicam ao Teatro Musical no Brasil.

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RESUMO

As universidades públicas precisam com urgência estar em sintonia com a realidade do mercado de trabalho e dar suporte na formação de atores que pretendam ingressar na área do Teatro Musical. A distinção dos gêneros dramáticos e a mudança da função da arte na Filosofia foram, de certa forma, fatores determinantes para agravar o descaso das universidades, que pensam segundo um ranço histórico deixado pelo Teatro Clássico Grego. A Tragédia foi eleita como gênero “nobre”, “mais elevado” por fazer o homem pensar, refletir pelo sofrimento de seus personagens em detrimento da Comédia e demais gêneros que causavam o riso não levando os mesmos a reflexão, ao pensamento crítico. O riso era tido como um elemento de distração da plateia do tema apresentado em cena levando-os a fuga da realidade, ao devaneio. Este pensamento ignora o lema latino, que fundamenta a comédia, e que diz: “Ridendo castigat mores” (“Pelo riso corrigem-se os costumes.”). O humor pode ser um instrumento poderoso que permite a um indivíduo fazer uma crítica de nossa sociedade. Analisar a importância da qualidade na formação do corpo e da voz do aluno para que ele possa atuar em todos os gêneros dramáticos de maneira satisfatória. Mostrar que todo ator, ao passar por uma Universidade de Artes Cênicas, ou Artes Dramáticas, deveria ser capaz de conquistar o seu lugar no mercado de trabalho independente do gênero dramático e fosse respeitado como tal. A implantação de Cursos de Pós-Graduação em Teatro Musical e Comédia nas Universidades Públicas e Privadas podem garantir a especialização de atores que se interessem por estes gêneros dramáticos que conquistaram o grande público e os críticos de arte e consolidaram o seu espaço na indústria do entretenimento.

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METODOLOGIA

1- Num primeiro momento a pesquisa foi feita através de um traçado histórico sobre a distinção dos gêneros dramáticos para analisar o porquê do gênero Musical ser considerado “inferior” e por isto ser tratado com um certo descaso, até mesmo preconceito no âmbito acadêmico.

Livros de suporte para a pesquisa: • HAUSER, A. História social da arte e da literatura. São Paulo: Martins Fontes, 2003. • CAFEZEIRO, Edwaldo. História do teatro brasileiro: um percurso de Anchieta a Nelson Rodrigues/Edwaldo Cafezeiro e Carmem Gadelha. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/EDUERJ/FUNARTE, 1996.

2- Refletir através da Filosofia como a função da arte mudou através dos tempos e com isto mostrar a importância do surgimento de novos gêneros dramáticos (Teatro Musical) como resposta ao mundo contemporâneo.

Livros de suporte para a pesquisa: • CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1997. • MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia: dos pré- socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997.

3 – Mostrar a importância da preparação corporal e vocal para formação e qualificação do profissional deste gênero.

Livros de suporte para a pesquisa: • LABAN, Rudolf. Domínio do Movimento. São Paulo: Summus Editorial, 1978. • BEUTTENMÜLLER, Maria da Glorinha e LAPORT, Nelly. Expressão vocal e expressão corporal. Rio de Janeiro: Enelivros, 1992.

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• WEIL, Pierre e TOMPAKOW, Roland. O Corpo Fala. Petrópolis: 20ª Edição, 1980. • BENNET, Roy. Uma Breve História da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1986. • BENNETT, Roy. Elementos Básicos da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998

4 – Entrevista com Cláudio Botelho e Charles Möeller, responsáveis pelo ressurgimento do Teatro Musical no Rio de Janeiro a partir de meados da década de 1990, para o programa “Marilia Gabriela Entrevista”, de Marília Gabriela falando sobre o teatro Musical no Brasil e sua trajetória nos últimos anos.

Livros de suporte para a pesquisa: • CARVALHO, Tânia. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009.

Pesquisa Webgráfica • data de acesso: 02/09/2012. • data de acesso: 17/10/2012. • data de acesso: 22/12/2012. • data de acesso: 22/12/2012.

5 - Entrevista com o ator Reiner Tenente (ator do Musical “Tim Maia – Vale Tudo”) escrito por Madame Brice para o site de teatro Mr. Zieg com finalidade de mostrar a realidade atual do profissional desta área em busca de formação / qualificação.

Pesquisa Webgráfica:

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data de acesso: 26/05/2012. • data de acesso: 17/10/2012.

6 - Apresentar o IBTM (Instituto Brasileiro de Teatro Musical) - 1º Curso Profissionalizante de Teatro Musical criado na cidade do Rio de Janeiro com artistas do bem sucedido Musical “Tim Maia – Vale Tudo”, que sabem por experiência própria das dificuldades enfrentadas por eles para se qualificarem atendendo assim as exigências do mercado de trabalho.

Pesquisa Webgráfica: • data de acesso 18/08/2012.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO I - A Distinção dos Gêneros Dramáticos através da História 13

CAPÍTULO II - A Mudança da Função da Arte através dos Tempos pela Filosofia 37

CAPÍTULO III – A Importância do Corpo e da Voz para a Formação de um Ator 46

CAPÍTULO IV – A Entrevista com Charles Möeller e Cláudio Botelho por Marilia Gabriela 59

CAPÍTULO V – A Entrevista com Reiner Tenente pelo site Mr. Zieg 91

CAPÍTULO V – O IBTM – Instituto Brasileiro de Teatro Musical 100

CONCLUSÃO 107

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 110

ANEXOS 113

ÍNDICE 170

INTRODUÇÃO

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O Brasil nos últimos 10 anos, segundo informações do jornalista Edgar Olimpio Souza (Revista Stravaganza, 2011) se transformou no terceiro país do mundo que mais produz Musicais, principalmente no eixo Rio de Janeiro - São Paulo. Desta forma nosso país só perde para os Estados Unidos (com a Broadway em Nova York) e a Inglaterra (com o West End em Londres) em número e qualidade de espetáculos.

Este gênero conquistou o Brasil de forma avassaladora, no entanto, as Universidades Públicas de Artes Cênicas continuam se preocupando e se comprometendo mais em transmitir aos alunos a importância da Arte em busca da “Pura Arte” e / ou “Arte Nobre” e menos com o Mercado de Trabalho. Desta forma acabam limitando a vontade dos seus alunos atores em viverem do seu ofício. As Universidades Privadas também não estão preparadas para esta nova realidade.

Existe uma carência de instituições que ofereçam cursos de graduação que formem um profissional qualificado para atender a esta demanda do mercado. E por este motivo ele está necessitando cada vez mais de atores especialistas para ocupar estas vagas que normalmente são bem remuneradas.

Este é um dos grandes dilemas das universidades públicas. Ao mesmo tempo em que elas são pressionadas para atender a demanda do mercado de trabalho, que exige mão-de-obra qualificada, elas precisam de autonomia para promover o ensino, a pesquisa e a extensão de maneira autônoma.

Numa primeira instância, as universidades públicas permitem ao aluno ter acesso ao conhecimento produzido por nossa cultura, possibilitando ao mesmo ter meios, recursos para construir o seu próprio. Em nossa sociedade o acesso a uma universidade é tido como uma porta para o “saber” e conhecimento adquirido é poder, tendo em vista que ele pode ser um poderoso instrumento não só para a ascensão social, como de controle e manipulação por parte das classes dominantes. Quando o ensino universitário se dá em uma instituição pública ele é ainda mais valorizado.

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No geral as universidades não formam um ator capacitado a cantar e a dançar, elementos imprescindíveis ao profissional deste gênero. Não podemos ignorar que o corpo e a voz do ator são os seus principais elementos de comunicação, em outras palavras, são as suas verdadeiras “armas” para uma boa performance. Em relação aos demais gêneros esse é o grande diferencial do Musical, onde a música, através do canto, faz parte da estrutura dramatúrgica tendo o corpo, através da dança, como elemento estético nesta elaboração.

Dentro do atual sistema de formação educacional do ator, a nível universitário, o aluno se forma muitas vezes não estando apto a atuar, de maneira plenamente satisfatória, em gênero dramático nenhum com o pouco exercício da prática. Quem quer se profissionalizar nesta área acaba gastando muito dinheiro para estudar nos poucos cursos existentes e tempo, pois estes mesmos cursos, quando existem, situam-se em lugares diversos.

Podemos encontrar atores com muito potencial e talento, mas, muitas vezes, com pouca ou nenhuma formação acadêmica na área dos Musicais. E quando eles se veem lutando por uma vaga no mercado de trabalho percebem que para exercer a profissão também precisam de um ensino formal, mais específico e direcionado.

O que acontece normalmente é que os interessados têm que buscar sua formação fazendo aulas e cursos livres de dança, canto e interpretação cabendo a eles integrar e articular o conhecimento adquirido. Dificilmente estes alunos-atores têm a oportunidade de pesquisar e experimentar de forma profunda e contínua a junção destas artes nos cursos livres. Acaba ficando por conta do aluno estabelecer uma possível integração entre elas e realizar uma síntese que lhe permita exercer com competência sua profissão. Para os que querem ser profissionais os cursos livres voltados para o teatro Musical se multiplicam principalmente pelo eixo Rio de Janeiro - São Paulo, onde o gênero conquistou o seu espaço com mais intensidade. Atualmente existem vários

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cursos em escolas de teatro, sempre com salas de aula cheias de interessados em entrar neste mercado que não para de crescer.

Vale a pena ressaltar que, em nenhum momento, esta pesquisa questiona a formação humanística e cultural oferecida nos curso de graduação em Artes Cênicas no país. O que se questiona é a Universidade continuar ignorando a força que estes gêneros, tanto o Musical quanto a Comédia Stand up, conquistaram em mais de uma década em nosso país. Pelo contrário, a criatividade e o espírito questionador precisam ser estimulados constantemente no aluno durante todo um curso, para formar “verdadeiros artistas” e não apenas “repetidores técnicos”.

O presente estudo foi dividido em seis capítulos. No 1º há um enfoque histórico na distinção dos gêneros dramáticos para analisar o porquê do Musical ser menosprezado no âmbito acadêmico. No 2º analisa-se a mudança da função da arte na Filosofia destacando o surgimento de novos gêneros dramáticos, em especial o Musical, como resposta ao mundo contemporâneo. No 3º a pesquisa mostra a importância do estudo do corpo e da voz do ator para uma melhor formação. No 4º é comentada a entrevista com a dupla de produtores de Musicais, Cláudio Botelho e Charles Möeller, para o programa “Marilia Gabriela Entrevista”, falando sobre os Musicais no Brasil e sua trajetória nos últimos anos. O 5º é centrado na entrevista comentada com o ator do Musical “Tim Maia – Vale Tudo”, Reiner Tenente escrita por Madame Brice para o site de teatro Mr. Zieg com finalidade de mostrar a realidade atual do profissional desta área em busca de qualificação. No 6º e último capítulo é apresentado o primeiro Curso Profissionalizante de Teatro Musical criado na cidade do Rio de Janeiro, o IBTM (Instituto Brasileiro de Teatro Musical), com artistas do bem sucedido Musical “Tim Maia – Vale Tudo”, que por experiência própria sabem das dificuldades enfrentadas para se qualificar atendendo as exigências atuais do mercado de trabalho.

CAPÍTULO I

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A DISTINÇÃO DOS GÊNEROS DRAMÁTICOS ATRAVÉS DA HISTÓRIA

A partir de uma análise da função social do teatro ao longo da história tão bem pesquisadas e analisadas por Arnold Hauser em seu livro “História Social da Arte e da Literatura” podemos constatar que todos os gêneros dramáticos que aqui serão apresentados, de uma maneira geral, surgiram em resposta às questões pertinentes ao seu tempo. Assim como na “Arte Poética” de Aristóteles, que faz um estudo detalhado das obras de artes tanto da fala e da escrita, quanto do canto e da dança, assim como da poesia e do teatro (tragédia e comédia) como sendo fabricações de seres e gestos artificiais, pois são produções dos seres humanos; neste capítulo serão estudados todos os dados históricos fornecidos por Hauser (2003) sobre os gêneros dramáticos que fundamentaram os pilares que serviram de base para o surgimento do Teatro Musical.

A Tragédia originou-se de dois gêneros dramáticos: o Mimo e o Ditirambo:

1.1 O Mimo

O Mimo foi uma forma teatral cultivada na Grécia e na Roma antigas. Não deve ser confundida com a mímica nem com a pantomima. O mimo não é apenas muito mais antigo do que a tragédia; é provavelmente pré-histórico na origem e está diretamente relacionado com as danças simbólico-mágicas, os ritos agrícolas sazonais, a magia da caça e o culto dos mortos. Sendo um cânone no qual podem encontrar lugar elementos novos, espontaneamente inventados e naturalisticamente diretos.

O mimo que consiste numa prosaica cena naturalística, ou numa frouxa sequencia de tais cenas, não tem uma trama estereotipada reduzível a um padrão fixo, nenhum personagem típico ou extraordinário, nenhuma moral rígida, nenhum estilo idealizado distinto da linguagem coloquial.

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O mimo não tem uma origem esclarecida, mas iniciou a ganhar destaque no período helenístico, e pelo menos a princípio parece ter-se tratado de um teatro popular com uma abordagem vulgar e grosseira, apelando às paixões e gostos mais baixos. Sobrevivem poucos textos de mimes, mas a partir dessa evidência se presume que fossem geralmente peças curtas em monólogo ou diálogo, com um foco no realismo e na comédia (Arnold Hauser, 2003).

Pouco se sabe sobre a natureza de sua apresentação. Os mais antigos exemplos aparentemente eram representados em qualquer lugar onde se reunisse uma plateia. Mais tarde passaram a ser apresentados também em teatros com cenários elaborados e sofisticados recursos cênicos, modificando também sua temática e estilo, introduzindo temas filosóficos e literários e um texto de maior requinte. Mesmo assim, foi um gênero que permaneceu largamente à margem dos grandes festivais e do patrocínio oficial, dependendo antes do pagamento direto do público. Parece ter exigido sempre um único ator, o arquimime, mesmo quando havia mais de um personagem, e apesar da existência de um texto, o ator devia dar conta da representação basicamente através da gesticulação e da expressividade. Relatos antigos dizem que muitos mimes sequer foram escritos para representação, sendo destinados apenas à leitura.

Era o verdadeiro “teatro do povo” dos antigos tempos, que não recebia qualquer subvenção do Estado e, por conseguinte, não tinha de aceitar instruções do poder, pondo em prática seus princípios artísticos a partir única e simplesmente da experiência imediata que lhe provinha do contato com as reações da plateia. A natureza genuinamente popular do mimo se dá por ser uma arte espontânea e ingênua. Oferecia ao público cenas naturalistas curtas, esquemáticas, com assuntos e personagens inspirados na vida cotidiana mais trivial. Aí estamos lidando, enfim, com uma arte que foi criada não meramente para o povo, mas, num certo sentido, também pelo próprio povo.

Os mímicos podem ter sido atores profissionais, mas permaneceram populares e nada tinham a ver com a elite educada, pelo menos enquanto o mimo não se

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tornou moda. Vindos do povo, compartilhavam de seus gostos e eram guiados por seu bom-senso. Não tinham a pretensão de educar nem de instruir, mas apenas de divertir o público.Esse teatro popular, despretensioso e naturalista foi o produto de uma evolução, muito mais longa e contínua, e tinha a seu crédito uma produção muito mais fértil e mais variada do que o teatro clássico oficial; mas infelizmente, essa produção se perdeu quase por completo para nós. Se essas peças tivessem sido conservadas, certamente teríamos da literatura dramática grega e talvez de toda a sua cultura uma ideia muito diferente da que possuímos hoje.

O mimo gradualmente cresceu em importância a ponto de ultrapassar os outros gêneros dramáticos, e no tempo da Roma Antiga se tornou o gênero preferencial. Com o advento do Cristianismo, também foi o gênero mais atacado pelos primeiros escritores cristãos, por causa de sua escandalosa licenciosidade e irreverência. Porém, diante de críticas cada vez mais frequentes, e apesar de sua versatilidade e adaptabilidade a variados contextos e públicos, o mime declinou e não foi capaz de sobreviver à Idade Média.

1.2 O Ditirambo

Nas origens do teatro grego, o ditirambo (do grego dithýrambos, pelo latim dithyrambu) era um canto coral de caráter apaixonado (alegre e sombrio), constituído de uma parte narrativa, recitada pelo cantor principal, ou corifeu, e de outra propriamente coral, executada por personagens vestidos de faunos e sátiros, considerados companheiros do deus Dionísio, em honra do qual se prestava essa homenagem ritualística.

Ditirambo ("hino em uníssono"), consistia numa ode entusiástica e exuberante dirigida ao deus, dançada e representada por um Coro de 50 homens (cinco por cada uma das tribos da Ática) vestidos de sátiro (meio homem, meio bode, uma espécie de servo de Dioniso) (Arnold Hauser, 2003).

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Os "sátiros" tocavam tambores, liras e flautas e iam cantando à medida que dançavam em volta de uma esfinge de Dionisio. Há quem diga que usavam falos postiços. Mas apesar do que se possa pensar, esta cerimónia era totalmente religiosa, uma espécie de hino no meio de uma missa. Também se acredita que haveria o sacrifício de um animal, provavelmente de um bode. (A idéia do sacrifício é conotativa, pois representa a mudança humana de consciencia animal, por assim dizer, para um nível de consciencia mais elevado, realmente "humano" no sentido real da palavra. Isso explica- se pela simbologia da estrela de cinco pontas (pentagrama), que de cabeça para baixo faz ilusão a ideia de um bode (dois cifres, orelhas e barba), e no sentido convencional a alusão a figura humana como mostrada por Da Vinci.

À medida que o tempo ia passando, o Ditirambo foi evoluindo para a ficção, para o drama, para a forma teatral, como a conhecemos hoje. Quem dirigia o ditirambo ia juntando gradualmente relatos de façanhas de heróis que tinham passado grandes tormentos pelo seu Povo. Também as danças que no início seriam descontroladas e caóticas iam gradualmente passando a danças organizadas e elaboradas. Também se começa gradualmente a introduzir poesia no ditirambo. O próprio filósofo alemão Friedrich Nietzsche utilizou esse estilo em seu livro “Assim falou Zaratustra”.

1.3 A Tragédia

A Tragédia é a representação de um fato trágico, suscetível de provocar compaixão e terror. Aristóteles em sua Poética afirmava que a tragédia era “uma representação duma ação grave, de alguma extensão e completa, em linguagem figurada, com atores agindo, não narrando, inspirando dó e terror”. A tragédia origina-se no ditirambo, uma forma de arte não-dramática, e tudo leva a crer que tenha derivado sua forma teatral, envolvendo a transformação dos atores em personagens fictícios e a transposição do passado épico para o presente, do mimo. Na tragédia, o elemento dramático mantinha-se sempre subordinado, por certo, ao elemento lírico e didático; o fato de o coro ter podido sobreviver mostra que a tragédia não se preocupava

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exclusivamente com obter efeito dramático, mas pretendia servir a outros fins, além dos de mero entretenimento.

A Tragédia é a criação artística mais característica da democracia ateniense; em nenhuma outra forma de arte são apresentados tão direta e claramente quanto nela os conflitos internos da estrutura social de Atenas (Arnold Hauser, 2003). Oferecia ao público dramas artisticamente construídos à maneira trágico-heróica, com personagens nobres ou até mesmo sublimes. Os aspectos externos de sua apresentação às massas eram democráticos, mas o conteúdo, as sagas heroicas com sua perspectiva trágico- heróica da vida, era aristocrático.

Desde o começo, a tragédia dirige-se a um público mais numeroso e variado do que aquelas distintas assembleias à mesa das quais se recitavam as baladas heroicas ou os poemas épicos. Por outro lado, faz inegavelmente a propaganda dos padrões do indivíduo de coração generoso, do incomum homem eminente, consubstanciação do ideal de benevolência. Sua origem devia-se à separação do líder do coro do próprio coro, o qual convertia a execução coletiva de canções em diálogo dramático, e essa separação, por si só, marca uma tendência para o individualismo; por outro lado, porém, para alcançar seu efeito, a tragédia depende da existência de um sentimento de comunidade no público e da possibilidade de ser apreciada por grandes massas que estão no mesmo nível, só pode realmente obter êxito quando constitui uma experiência de massa.

Mas até mesmo o público da tragédia grega era, em certa medida, um público seleto; no melhor dos casos, consistia em cidadãos livres e não era mais democrático, no conjunto, do que as classes que governavam a polis. Além disso, o espírito que orienta a administração do teatro oficial é ainda muito menos popular do que a composição do público, visto que as massas que constituíam a audiência não exercia qualquer influência decisiva na escolha das peças ou atribuição dos prêmios. Assim, as tragédias eram francamente tendenciosas e não fingiam ser outra coisa. Tratavam questões da política corrente e giravam em torno de problemas que tinham

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todos relação direta ou indireta com as questões mais candentes do momento, o contraste entre o Estado-clã e o Estado popular. A concepção de arte daquele período estava de acordo com a ideia de que o teatro devia manter-se em relação direta com a vida e a política. A tragédia grega era “teatro político”.

Esse controle político do teatro trouxe à tona o antigo critério de que o poeta é o guardião de uma verdade superior e um educador que conduz o povo a um plano superior de humanidade. Através da representação de tragédias nos festivais que o estado organizava, assim como das circunstâncias que levaram a tragédia a ser considerada a interpretação competente dos mitos nacionais, o poeta uma vez mais assume uma posição quase equivalente à do profeta-vidente de tempos pré-históricos.

Na formação desses vínculos entre religião e política a tragédia provou ser excelente mediadora, assumindo uma posição intermédia entre religião e a arte, entre o irracional e o racional, entre o “dionisíaco” e o “apolíneo”. O fator racional, a conexão causal da trama, é desde o começo quase tão fundamental para a tragédia quanto o elemento irracional, o temor religioso. Mas, quando o estilo clássico amadureceu, o elemento racional da trama passou a predominar cada vez mais, e o elemento irracional tornou-se cada vez menos importante. Tudo o que tinha sido confuso e sombrio, místico e estático, incontrolado e inconsciente, é finalmente trazido para a luz clara da experiência; o significado verificável, a conexão causal, o motivo lógico, por toda a parte se requer sua revelação e demonstração. A tragédia, com sua tendência para o rigor formal, é uma forma que se separou do mimo naturalista, e o naturalismo trágico equivale tão somente a uma exigência de probabilidade lógica na trama e de plausibilidade psicológica nos personagens.

1.4 A Comédia

O novo interesse pela psicologia dá origem agora à comédia burguesa. Seus enredos, principalmente histórias de amor localizadas no mundo remoto da saga e da lenda, constituem a criação da literatura helenística. É esse o universo das comédias de

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Menandro, que contém praticamente tudo o que sobrevivera da Antiga democracia citadina e do culto de Dionísio (Arnold Hauser, 2003). Os personagens pertencem às classes média e baixa; os enredos gravitam em torno de amor, dinheiro, testamentos, pais avarentos, filhos estroinas, amantes insaciáveis, parasitas velhacos, criados manhosos, falsos gêmeos e filhos que reencontraram pais perdidos depois de ignorar- lhes por largo tempo o paradeiro.

O amor é indispensável como motivo que desperta o interesse. O motivo amoroso da comédia burguesa talvez seja a mais burguesa de todas as suas características, uma vez que os amantes não lutam contra deuses e semideuses, mas contra a engrenagem da própria sociedade burguesa. São pais que contrariam as paixões dos filhos, rivais ricos, cartas denunciadoras e testamentos ardilosamente maquinados. Sem dúvida, todo esse aparato complicado de intriga amorosa reflete o “desencanto” e a racionalização da vida que sempre acompanha o triunfo da economia monetária e o espírito mercantilista. Com a Comédia o burguês finalmente tem um teatro próprio, no qual se sente realmente em casa.

A Comédia é a representação de um fato inspirado na vida e no sentimento comum, de riso fácil, em geral criticando os costumes e está ligada às festas populares, celebrando a fecundidade da natureza. A importância da comédia era a possibilidade democrática de sátira a todo tipo de ideia, inicialmente política. Assim como hoje, em seu surgimento, ninguém estava a salvo de ser alvo das críticas da comédia: governantes, nobres e nem ao menos os Deuses (como pode ser visto, por exemplo, no texto As Rãs, de Aristófanes). Já Sófocles, no dizer de Aristóteles, tinha observado que Aristófanes retratava os homens como deviam ser, ao passo que Eurípedes os retratava como eram (Poética, 1460b, 33-5).

Assim, atualmente, não há grande distinção entre a importância artística da tragédia (mais popularmente conhecida simplesmente como drama) ou da comédia. O próprio crítico de artes Rubens Ewald Filho em defesa do gênero lembra o ditado: "Morrer é fácil, difícil é fazer comédia". De fato, entre os artistas, reconhece-se que para

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fazer rir é necessário um ritmo, conhecido como timing, especial que não é dominado por todo ator.

O que faz uma pessoa rir ou o que é engraçado, ou não, é difícil de ser analisado cientificamente. Mas uma característica reconhecida da comédia é que ela é uma diversão intensamente pessoal. Para rir de um fato é necessário re-conhecer (rever, tornar a conhecer) o fato como parte de um valor humano, dos os homens comuns, a tal ponto que ele deixa de ser mitológico, ameaçador e passa a ser banal, corriqueiro, usual e pode-se portanto rir dele. As pessoas com frequência não conseguem achar as mesmas coisas engraçadas, mas quando o fazem isso pode ajudar a criar laços poderosos.

Hoje a comédia encontra grande espaço e importância enquanto forma de manifestação crítica em qualquer esfera: política, social, econômica. Encontra forte apoio no consumo de massa e é extremamente apreciada por grande parte do público consumidor da indústria do entretenimento.

1.5 Os Festivais de Teatro na Grécia Antiga

A inauguração do culto de Dioniso foi, sem dúvida, um lance no jogo político com a intenção de suplantar o culto de Adrasto pelas famílias nobres locais (Arnold Hauser, 2003). As dionísias eram um festival político-religioso, com o fator político incomparavelmente mais importante do que o religioso. Mas as instituições e reformas religiosas levadas a efeito pelos tiranos baseavam-se, sem dúvida, em emoções e necessidades populares autênticas, e essas disposição emocional do povo foi, em parte, a causa de seu êxito. À semelhança do que haviam feito os tiranos, a democracia também utilizou amplamente a religião com o intuito de vincular as massas ao novo Estado.

Nos festivais de teatro, a tragédia era o mais valioso instrumento de propaganda da polis, que certamente não pensaria em permitir que um poeta fizesse o que bem lhe aprouvesse. De fato, os trágicos eram bolsistas do Estado e fornecedores do

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Estado. É o Estado quem lhes paga pelas peças levadas à cena, mas, naturalmente, não permitiam a encenação daquelas que fossem contrárias à sua política ou aos interesses das classes dominantes.

Os festivais teatrais na democracia ateniense não eram, certamente, expressões de “teatro do povo”, uma vez que a escolha das peças, bem como a atribuição dos prêmios, naturalmente estavam nas mãos dos cidadãos ricos, a quem cabia financiar o custo das representações, a título de “contribuição especial”. A atribuição de prêmios competia a juízes que nada mais eram do que funcionários executivos do conselho e cujas decisões eram ditadas, em primeiro lugar, por considerações de ordem política. O ingresso gratuito e o pagamento de subsídios pelo tempo gasto no teatro, vantagem que é costume exaltar como última palavra em democracia, constituíam exatamente os fatores que impediam as massas de influenciar os destinos do teatro. Arnold Hauser diz : “Só um teatro cuja própria existência dependa do pagamento das entradas será realmente um “teatro do povo” (2003, p. 85)

Aristóteles, em sua Arte Poética, para diferenciar comédia de tragédia diz que enquanto esta última trata essencialmente de homens superiores com seus heróis, a comédia fala sobre os homens inferiores, as pessoas comuns da pólis. Isso pode ser comprovado inclusive através da divisão dos júris que analisavam os espetáculos durante os antigos festivais de Teatro, na Grécia. Quando uma pessoa era escolhida para ser um jurado de uma tragédia era a comprovação de que o mesmo fazia parte da nobreza e tinha uma figura de representatividade na sociedade. Já o júri da comédia era formado por cinco pessoas sorteadas da plateia no dia dos festivais.

Nesta passagem nós podemos ver claramente a distinção entre a arte definida como sendo da “nobreza”, da “elite”, a Tragédia e de uma arte do “povo”, a Comédia. Sabendo-se que entendesse por uma arte da nobreza como sendo uma arte “culta” só para os eleitos, os escolhidos, uma minoria privilegiada; em detrimento da arte do povo considerada “inculta” e “inferior”, voltada para as grandes massas.

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1.6 O Teatro Medieval

O Teatro na Idade Média descreve as peças teatrais europeias que foram criadas entre a queda do Império Romano do Ocidente e o início do Renascimento (Arnold Hauser, 2003). Não há uma documentação precisa deste tema dada a falta de textos remanescentes do período além da oposição do clero a algumas performances. No início da Idade Média a Igreja Católica baniu as performances teatrais como forma de controlar os excessos do teatro romano. De qualquer modo o teatro romano se encontrava em declínio por causa das condições políticas e econômicas desfavoráveis a indústria de entretenimento que havia florescido durante o Império Romano.

Hauser (2003) ainda salienta que no período gótico tardio só no teatro encontramos algo que se avisinha da poesia popular. Mesmo neste caso está fora de questão a obra ser a criação original do “povo”, mas, de qualquer modo, é a continuação de uma genuína tradição popular, transmitida desde os dias iniciais da era clássica no mimo e prosseguindo depois nos dramas religiosos e seculares da idade Média. É verdade que a partir da tradição mímica muitos temas da arte poética, sobretudo as comédia romana, penetraram no teatro medieval, mas a maioria desses temas estavam profundamente enraizados em solo popular, que à plebe estava apenas sendo devolvida boa parte do que era, afinal sua propriedade cultural.

O teatro religioso da Idade Média é, por outro lado, uma arte inteiramente popular, não só por causa do público, mas também porque os próprios atores provêm de todos os níveis da sociedade. Os membros das companhias são clérigos, mercadores, artesãos, em parte também simples elementos da multidão, numa palavra, diletantes, em contraste com os atores do teatro secular, que são mimos profissionais, dançarinos e cantores. O espírito diletante, que só em tempos muito recentes conseguiu voltar a manifestar-se nas artes plásticas, deixou sua marca na poesia e no teatro medieval em todas as mudanças registradas na estrutura sociológica da vida cultural.

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As tragédias medievais, como as clássicas, seguem muitos dos preceitos aristotélicos. Entretanto, os trabalhos produzidos durante a Idade Média geralmente tratam de temas de cavalaria e Cristandade e seus preceitos morais. Há poucos registros sobre o teatro secular neste período, sendo a maior parte dele trazido das culturas pagãs como relatado pelos clérigos que as desaprovavam. Sabe-se que havia contadores de histórias, bardos e malabaristas que viajavam em busca de audiência e apoio. Não existem exemplos de tragédias escritas durante a Idade Média. Duas epopeias medievais importantes, que trazem ingredientes trágicos, mas são apenas longos poemas narrativos são Beowulf e La chanson de Roland.

1.7 A Farsa Medieval

É um gênero teatral que mistura comédia e crítica social dos comportamentos desviantes. Suas peças costumam ser pequenas de caráter ridículo e caricatural. Baseia-se no lema latino: “Ridendo castigat mores” (“Pelo riso corrigem-se os costumes.”).

1.8 O Melodrama

É uma forma mista que compartilha com o vaudeville seus acessórios Musicais, mas com outros gêneros “inferiores”, sobretudo com o drama sentimental e a peça de exaltação histórica, seus enredos sérios e frequentemente trágicos. O Melodrama tem uma estrutura mais complexa do que o Vaudeville e a genealogia mais ramificada. Um de seus muitos predecessores é o monólogo apresentado com acompanhamento Musical, à forma original do gênero híbrido com que ainda deparamos nos programas de representações amadores. Este é o ponto de partida do ressurgimento da declamação dramática com acompanhamento Musical – uma forma intrinsecamente muito antiga. Uma outra fonte, tecnicamente muito mais rica do melodrama, é o drama doméstico, que de acordo com Hauser (2003) se popularizou muito nas classes “inferiores”desde a Revolução, devido à sua natureza chorosa e moralizante. Contudo o

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recurso, protótipo, mais importante do melodrama é a pantomima, que surgiu pela primeira vez no último terço do século XVIII.

Os melodramas começaram por tratar de temas mitológicos e dos contos de fadas, mas posteriormente também temas contemporâneos. Essas pantomimas consistiam usualmente em agitadas e tempestuosas cenas reunidas à maneira de revista, sem coerência orgânica ou desenvolvimento dramático, e visavam a criação de situações em que o elemento misterioso ou milagroso, fantasmas ou espíritos, masmorras e sepulturas, desempenhava um papel de destaque. Com o correr do tempo, foram inseridos pequenos comentários explicativos e diálogos em cada cena e desse modo, converteram-se, curiosas pantomimas dialogadas e, finalmente no melodrama à grande espetáculo, que foi perdendo gradualmente o seu caráter espetacular e seus elementos Musicais para transformar-se na peça de intriga, de fundamental importância histórica do século XIX (Arnold Hauser, 2003).

Todas essas influências, porém, só resultaram na modificação e ampliação do núcleo da forma melodramática, o próprio núcleo é o conflito do drama clássico. O melodrama nada mais é do que a tragédia popularizada ou, se preferirmos, corrompida. O melodrama, embora derive do teatro literário, acabou descendo ao nível das camadas mais amplas do público urbano. O melodrama procura obedecer aos refinados princípios formais da tragédia, adquiridos no curso de um desenvolvimento longo e coerente, embora os reflita num estilo tosco, desprovido das sutilezas psicológicas e da beleza poética da forma clássica.

No plano puramente formal, o melodrama é o gênero mais convencional, esquemático e artificial que se pode imaginar. Possui uma estrutura estritamente tripartite, com um forte antagonismo como situação inicial, uma violenta colisão e um desfecho que representa o triunfo da virtude e a punição do vício, numa palavra, uma trama facilmente entendida e economicamente desenvolvida; com a prioridade da trama sobre os personagens; com figuras bem definidas: o herói, a inocência perseguida, o vilão e o cômico; com a cega e cruel fatalidade dos acontecimentos; com uma moral

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fortemente enfatizada, que, por sua tendência insípida e conciliatória, baseada em recompensa e castigo, discorda do caráter moral da tragédia, mas compartilha com esta uma elevada, embora exagerada, solenidade.

O melodrama denuncia a sua dependência da tragédia, sobretudo em sua observação das três unidades (ação, tempo e espaço) ou, pelo menos, em sua tendência para levá-las em consideração . O melodrama pode ser visto como uma continuidade histórica dos mistérios medievais, da peça pastoril, da arte de Moliére e do mimo, porém tudo o que o melodrama tem em comum com o mimo é o ímpeto de suas cenas e a crueza de seus efeitos, a falta de discriminação em sua escolha dos meios e o caráter popular dos motivos; em tudo o mais, respeita o ideal estilístico da tragédia clássica. Obviamente, o rigoroso convencionalismo de uma forma não é em si mesmo, de forma alguma, o sinal de um propósito superior.

Segundo Hauser (2003) o melodrama dominou a vida teatral durante três décadas e sua popularidade só declinou depois de 1830, quando o nível do gosto popular começou a elevar-se e a crueza das peças, sua falta de lógica, a insuficiência de sua motivação e a linguagem afetada eram cada vez tidas como cada vez mais desconcertantes. Os românticos tinham, porém, um fraco pelo melodrama, não só em decorrência de sua hostilidade às camadas conservadoras do público culto, mas também porque, em virtude de suas concepções menos preconceituosas, mostravam maior dose de compreensão pelas qualidades não-literárias, puramente teatrais, desse gênero.

Os elementos comuns entre o teatro romântico e o melodrama são, sobretudo, os conflitos intensos e os choques violentos, a trama sinuosa, ousada, sanguinolenta e brutal; o predomínio do milagre e do acaso, as súbitas reviravoltas, usualmente sem motivo justificável, os encontros e reconhecimentos imprevistos, a constante alternância entre tensão e descontração; os ardis violentos e irresistivelmente brutais, os assaltos ao público pelo horrível, o fantasmagórico e o demoníaco; o desenvolvimento mecânico da trama, os disfarces e dissimulações, as conspirações e armadilhas; finalmente, os coups de théâtre e os motivos cênicos indispensáveis, sem os

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quais um drama romântico é totalmente inconcebível: as prisões e seduções, os raptos e resgates, as tentativas de fuga e assassinatos, os cadáveres e caixões, os porões e os túmulos, as torres de castelos e as masmorras, as adagas, espadas e frascos de veneno, os anéis, amuletos e heranças de família, as cartas interceptadas, testamentos perdidos e contratos secretos roubados.

1.9 O Vaudeville

É a comédia Musical ou, mais exatamente, a comédia com canções interpoladas, que deve ser incluída entre as predecessoras diretas da opereta. Possui uma trama episódica dividida em cenas separadas, suas canções interpoladas, seus tipos populares extraídos da vida cotidiana, seu estilo picante, arejado e aparentemente espontâneo, está muito mais próximo do antigo teatro popular do que o Melodrama, apesar das influências literárias que não lhe faltam, por certo. A vertente moderna do mimo não é o melodrama e sim o Vaudeville.

O período entre 1815 e 1848 exibe uma fertilidade sem precedentes nesse gênero, ao qual pertence um interminável número de pequenas peças, ligeiras e divertidas, cujas produções fizeram muito sucesso e alarmaram os literatos em face da profusão. Durante a Revolução e a Restauração, a comédia exauriu-se, tal como a tragédia já se provara estéril numa época anterior (Arnold Hauser, 2003). O Vaudeville destacou-se como uma forma corrupta e externalizada de comédia, do mesmo modo que o melodrama representou uma forma corrupta e externalizada de tragédia.

O Vaudeville e o Melodrama não significaram, porém, a morte do drama, mas antes o seu ressurgimento, pois o drama romântico nada mais era senão o melodrama alcançado, enquanto o moderno drama de costumes era apenas uma espécie de vaudeville.

A enorme produtividade dos gêneros populares, especialmente do Vaudeville e do Melodrama, e a substituição gradual do teatro literariamente mais

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pretencioso são explicáveis, a partir do fato de que a Revolução abriu os teatros para as grandes massas populares e de que o sucesso das peças representadas era determinado por essas classes, e principalmente pela influência da censura sobre o desenvolvimento do repertório. A censura na época de Napoleão e da Revolução impediu que as questões do dia e os costumes da classe dominante fossem discutidos e descritos no drama literário sério. Por outro lado a farsa, a comédia Musical e o melodrama possuíam maior liberdade, porque não eram levados tão a sério e por esta razão não eram considerados motivo de grande preocupação.

Nos teatros de boulevard nenhum obstáculo era colocado no caminho da implacável descrição de costumes e situações, o que era proibido na Comédie Française, nisso residia o atrativo de tais teatros, tanto para os teatrólogos quanto para o público. As mais importantes e interessantes formas dramáticas da época são, do ponto de vista histórico, o Vaudeville e o Melodrama, que representavam o verdadeiro ponto de mutação na história do teatro moderno e foram a transição entre os gêneros dramáticos do classicismo e o romantismo. Através deles, o teatro recuperou o seu caráter, o de oferecer entretenimento, sua vivacidade, seu apelo direto aos sentidos e a sua clareza.

1.10 A Opereta

Opereta, ou comumente em Italiano, operetta, etimologicamente, "pequena ópera", é um estilo de ópera leve. Leve em termos tanto na sua substância Musical como no conteúdo do assunto. É mais próxima, em estilo, com a ópera e a outras formas do teatro Musical mais leve, e em muitos casos é difícil definir uma obra de teatro Musical a um gênero específico. De um modo geral, era uma versão mais curta, menos ambiciosa e ostensiva do que a ópera, da mesma maneira que outros estilos como, Vaudeville, Singspiel e ballad opera. A opereta é também proporcionalmente mais recitativa (não cantadas) do que uma ópera séria.

A opereta surgiu da opéra comica francesa do século XIX, Opéra Comique, para satisfazer à necessidade de obras mais curtas e leves, em contraponto à opéra

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comique, que tinha obras mais sérias e longas. Na época o termo comique já não tinha grande significado, passando a designar, apenas, que a ópera não era inteiramente cantada, tendo algumas partes faladas. Para esse mesmo gênero os alemães davam o nome de Singspiel. Carmen (1875) é um exemplo de opéra comique com trama trágica. Jacques Offenbach costuma ser creditado por ter escrito as primeira operetas, como a sua La Belle Hélène (1864).

Para Hauser (2003) é o mais original e, muitos aspectos, o mais expressivo produto artístico do Segundo Império. Representa a continuação de dois gêneros mais antigos, a ópera buffa e o vaudeville, transmitindo a essa época carente de humor algo do espírito jovial, despreocupado e nada romântico do século XVIII. É a única forma ligeira, graciosa e travessa do período. A opereta constitui um mundo próprio, um reino intermediário a par das tendências conformistas, em harmonia com o sisudo gosto burguês, e da arte naturalista da oposição. É muito mais atraente do que o teatro ou o romance popular da época, sociologicamente mais representativa do que o naturalismo e, como tal, o único gênero em que são produzidas obras populares de apelo amplo e um certo valor artístico.

Do ponto de vista naturalista a mais notória e mais peculiar característica da opereta é sua absoluta improbabilidade, a natureza irreal, inteiramente imaginativa, de suas cenas turbilhonantes. As fórmulas estereotipadas de seu conteúdo, as complicações e os desfechos convencionais, são puras formas teatrais sem a menor relação com a realidade. A natureza dos personagens, lembrando marionetes, e a forma aparentemente improvisada da apresentação apenas acentuam a impressão de artificialismo e de ficção.

A opereta era o produto de um mundo de liberalismo econômico, social e moral, um mundo em que cada um podia fazer o que quisesse, desde que se abstivesse de questionar o próprio sistema (mundo de “laissez-faire”, deixar-fazer e de “laisser passer”, negligenciar). No entanto o entretenimento não era, porém, tão inofensivo quanto parecia. A opereta desmoralizou pessoas, não porque escarnecesse de tudo o que era “venerável”, não porque zombar da Antiguidade, da tragédia clássica e da ópera

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romântica fosse apenas uma forma disfarçada de crítica da sociedade, mas principalmente porque destroçou a crença na autoridade sem a negar em princípio. A imoralidade da opereta consistiu na tolerância estouvada com que conduziu as suas críticas ao sistema corrupto de governo e à sociedade depravada da época, na aparência inofensiva que deu à frivolidade das pequenas prostitutas, dos galanteadores extravagantes e dos velhos e amáveis viveurs.

O apogeu da opereta ocorreu no final do Século XIX, no período entre as duas exposições mundiais de 1855 e 1867, até o início do Século XX. Após a agitação política do final dos anos 60, faltou um público apropriadamente despreocupado ou mesmo um que tivesse a ilusão de segurança e despreocupação. A opereta acercou-se mais da revista, mas não representou, de maneira nenhuma, a mais antiga forma em que o espetáculo triunfava sobre a dramaturgia (Arnold Hauser, 2003).

A ascensão da opereta assinala a penetração do jornalismo no mundo da música. Depois do romance, do teatro e das artes gráficas, foi a vez do teatro Musical comentar os acontecimentos do dia. Mas o jornalismo da opereta não se restringe às referências tópicas nas canções e piadas dos cômicos; o gênero assemelha-se todo ele a uma coluna de fofocas dedicada aos escândalos da sociedade elegante.

Com o Segundo Império, os melhores dias da opereta chegaram ao fim, mas o estilo existe, hoje em dia, na forma de Comédia Musical. A opereta é uma precursora da moderna "Comédia Musical". É uma pequena ópera encenada, com o elenco formado por cantores de ópera treinados no estilo clássico. Já a "Comédia Musical" é uma peça teatral cantada, que utiliza atores que também são cantores.

1.11 O Teatro de Revista

No Brasil o Teatro Musical se originou do Teatro de Revista e a Opereta. O teatro de revista brasileiro se caracterizou como um veículo de difusão de modos e costumes, um retrato sociológico de uma época, com peças alegres, muitas vezes com

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falas irônicas e de duplo sentido, e finalmente canções "apimentadas" e hinos picarescos. Além disso, destacam-se como elementos composicionais de uma revista o texto em verso, a presença da opereta (da comédia musicada), o fandango, o samba, e em tempos modernos a bossa nova.

A linguagem é marcada pela valorização do texto, assim como da encenação e da dança, com uma crítica de costumes e cheia de versos e personagens. Nas revistas a cada novo quadro apresentam-se o resumo de fatos reais ou fictícios, numa retrospectiva crítica e bem-humorada. As cenas curtas são representadas por um grupo de personagens que falam sobre os acontecimentos enquanto andam pelos cenários e / ou espaços propostos.

O teatro de revista brasileiro tem início em 1859, no Teatro Ginásio, no Rio de Janeiro, com o espetáculo As Surpresas do Sr. José da Piedade, de Justiniano de Figueiredo Novaes (Veneziano, 1994). Assim como o nosso teatro musicado surge como um derivado da opereta francesa, a revista também recorre ao modelo francês: um enredo frágil serve como elo de ligação entre os quadros que, independentes, marcam a estrutura fragmentária do gênero. Seu ingrediente mais poderoso é a paródia, recurso do teatro popular que consiste em denegrir um aspecto, fato, personagem, discurso ou atitude proveniente da cultura erudita ou, em outras palavras, da classe dominante.

A Revista brasileira pode ser dividida em 3 fases distintas: 1. Nessa primeira fase do gênero, que tem seu apogeu com as revistas e burletas de Artur Azevedo, a linguagem é marcada pela valorização do texto em relação à encenação, e pela crítica de costumes abordada com versos e personagens alegóricos. Nas revistas de ano, apresentadas ao início de cada ano como resumo cômico do ano anterior, as cenas curtas e episódicas que parodiam acontecimentos reais são ligadas por um tênue fio narrativo, obedecendo ao modelo que aqui chegou e exigia o compère e a commère, em geral conduzido por um grupo de personagens que transita pelo Rio de Janeiro à procura de alguma coisa - o que possibilita a abordagem de lugares distintos como a rua, os teatros, a imprensa, o jóquei ou mesmo na imprensa, à procura de alguma

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coisa que revelasse o humor. O casal de cantores e bailarinos deviam serguir a regra de ela ser obrigatoriamente elegante e bonita, e ele, alegre e malandro, colocando um toque de sátira em cada frase e em cada nova seqüência do espetáculo. No coro, acompanha uma orquestra de cordas. Artur Azevedo disse que:

“o teatro que mais convém nos países novos como o Brasil é o teatro de costumes, e esse, deixem lá, é o verdadeiro teatro” (Rio de Janeiro, Palestra, O País 24/07/1895)

2. Década de 20 e 30 – Nessa segunda fase, a revista é movida por grandes nomes que levam o público ao teatro. Firmou-se o gênero de revista Musical de costumes. É uma fase em que a revista se equilibra entre quadros cômicos e de crítica política, e os números Musicais e de fantasia. Novas ideias vindas de Paris revolucionaram o teatro de revista no Rio de Janeiro. Foi introduzido pela companhia francesa Ba-ta-clan o desnudar do corpo feminino, despindo-o das grossas meias que até então eram a base do espetáculo, mostrando partes do corpo feminino, que passam a ser mais valorizadas em danças, quadros Musicais, etc. Surge o elemento cenográfico se contrapondo ao elemento coreográfico. Jardel Jércolis substituiu a orquestra de cordas pela banda de jazz e a performance física do maestro passa a fazer parte do espetáculo, demonstrando a influência dos ritmos americanos. Seu maior nome é o empresário teatral Manoel Pinto. As peças têm destaque igual para as paródias e para a encenação.

3. Féerie - A terceira fase do teatro de revista se deve à gestão de Walter Pinto, à frente dos negócios do pai, que falece em 1938. Sua companhia substitui o interesse dos primeiros atores pela credibilidade da empresa na produção de grandes espetáculos, em que um elenco formado por numerosos artistas se revezam em cada temporada. A direção investe na ênfase à fantasia, por meio do luxo, de grandes coreografias, cenários e figurinos suntuosos. A maquinaria, a luz e os efeitos equivalem ao intérprete em importância. Mas, aos poucos, a revista começa a apelar fortemente para o escracho, para o nu explícito, em detrimento de um de seus alicerces: a

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comicidade, e, assim, entra em um período de decadência, praticamente desaparecendo na década de 60 (Veneziano, 1994).

Quanto ao público do Teatro de Revista, é importante ressaltar que o teatro de revista visava a agradar a diferentes segmentos da sociedade, mas seu foco era a pequena burguesia. Os elementos que a caracterizam são demonstrativos disso. A forma popular de representação abrangia a ópera-cômica, a opereta, o vaudeville (interpretação de canções curtas, ligeiras e satíricas) e a revista.

Para a pesquisadora Neyde Veneziano em seu livro “Não Adianta Chorar: Teatro de Revista Brasileiro...Oba!” todo o encanto da revista reside no prazer da alusão. E a alusão é um recurso de linguagem que consiste em se dizer uma coisa e fazer-se pensar em outra. Por isto o Teatro de Revista é um espetáculo inteiramente composto por alusões voluntárias a fatos recentes. Ela assim resume a importância do teatro de revista brasileiro:

"Ao se falar em teatro de revista, que nos venham as idéias de vedetes, de bananas, de tropicália, de irreverência e, principalmente, de humor e de música, muita música. Mas que venha também a consciência de um teatro que contribuiu para a nossa descolonização cultural, que fixou nossos tipos, nossos costumes, nosso modo genuíno do 'falar à brasileira'. Pode-se dizer, sem muito exagero, que a revista foi o prisma em que se refletiram as nossas formas de divertimento, a música, a dança, o carnaval, a folia, integrando-os com os gostos e os costumes de toda uma sociedade bem como as várias faces do anedotário nacional combinadas ao (antigo) sonho popular de que Deus é brasileiro e de que o Brasil é o melhor país que há." (1996)

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1.12 O Musical

Sendo o Teatro Musical um estilo de teatro que tem como objetivo contar uma história ou mostrar uma ação através da dramatização combinando música, canções, diálogos falados, atuação e dança, ele acaba tornando mais acessível o teatro ao grande público. A história e o conteúdo emocional da peça - humor, pathos, amor, raiva - são comunicadas através das palavras, música, movimento e aspectos técnicos do entretenimento como um todo integrado. Torna-se um poderoso instrumento de comunicação. Tem uma longa tradição de adaptar livros e outros materiais para este gênero. É um trabalho colaborativo com uma longa tradição histórica tanto nos tratados como na estrutura, embora novos autores dos Musicais tentem flexionar esta forma de expressão. Desde o início do século 20, obras teatrais Musicais de teatro têm sido geralmente chamado, simplesmente, Musicais.

Existem três componentes para um Musical: a música, interpretação teatral e o enredo. O enredo de um Musical refere-se à parte falada (não cantada) da peça; entretanto, o "enredo" pode também se referir à parte dramática do espetáculo. A interpretação teatral se relaciona as performances de dança, encenação e canto. No Musical geralmente cada artista deve executar as funções de cantores, atores e bailarinos, sendo um grande desafio e uma grande experiência.

1.12.1 Diferenças entre o Musical e a Ópera

Musicais estão intimamente relacionados com a forma de ópera teatral, mas os dois são geralmente distinguidos por pesagem de um certo número de fatores. Embora se compare teatro Musical com outras formas teatrais como ópera e dança, pode ser distinguido pela importância igualmente dada à música, em comparação com o diálogo, movimento e outros elementos das obras.

Alguns Musicais, entretanto, tem canções entrelaçadas e não tem diálogos falados. Esta é uma das linhas fronteiriças entre Musicais e ópera, mas não é a única.

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Outras diferenças entre ópera e Musical é que enquanto a ópera costuma ser apresentada em sua língua original, o Musical geralmente é traduzido para a língua nativa de onde está sendo apresentado. Numa ópera geralmente o elenco se divide entre cantores, atores e bailarinos, enquanto que, no Musical, cada artista deve executar as três funções. Um momento de grande emoção dramática é frequentemente encenado numa canção.

Musicais geralmente têm um maior foco no diálogo falado (embora alguns Musicais são inteiramente acompanhada e cantada por meio, e por outro lado, algumas óperas, como a Flauta Mágica, ea maioria das operetas, têm algum diálogo desacompanhados); dançando (particularmente pelo principais intérpretes ou executantes, bem como o refrão); sobre o uso de vários gêneros de música popular (ou, pelo menos, estilos de canto popular), e na prevenção de certas convenções operísticas. Em particular, um Musical é quase sempre realizada na língua do seu público. Musicais produzidos em Londres ou Nova York, por exemplo, são invariavelmente cantadas em Inglês, mesmo que tenham sido originalmente escrito em outro idioma (por exemplo, Les Misérables foi escrito originalmente em francês).

Enquanto um cantor de ópera é principalmente um cantor e apenas secundariamente um ator (e raramente necessita de dançar), um ator de teatro Musical é muitas vezes um ator em primeiro lugar e, em seguida, um cantor e dançarino. Alguém que é realiza igualmente bem todas as três funções é referido como uma "tripla ameaça". Compositores de música para Musicais muitas vezes consideram as exigências vocais de papéis com artistas de teatro Musical em mente. Hoje, grandes testes de teatros Musicais geralmente usam amplificação das vozes dos atores cantando de uma forma que, em geral, seria reprovado em um contexto lírico.

Algumas obras (por exemplo, por George Gershwin, e ) receberam tanto o título de produções de "teatro Musical" quanto "operísticas". Da mesma forma, algumas operetas mais velhas ou óperas leves (como Os Piratas de Penzance de Gilbert e Sullivan) tiveram adaptações ou produções modernas que foram tratadas como Musicais. Para alguns trabalhos, os estilos de

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produção são quase tão importantes quanto o conteúdo Musical ou dramático do trabalho na definição de em qual forma de arte a peça cai. Sondheim disse: "Eu realmente acho que quando algo toca Broadway é um Musical, e quando é jogado em uma casa de ópera. Ópera é. É isso. É o terreno, o campo, as expectativas do público que o tornam uma coisa ou outra ". Embora este artigo diz respeito principalmente a obras de teatro Musical que são" não-líricos ", ao mesmo tempo a dúvida permanece entre formas mais claras de ópera e Musicais mais ambiciosos ou complexos Musicalmente. Na prática, muitas vezes é difícil distinguir entre os vários tipos de teatro Musical, incluindo "Musical", "comédia Musical", "opereta" e "ópera luz".

1.12.2 A Função da Música

A música é utilizada no Teatro Musical como elemento determinante e fundamental nesta estrutura, uma vez que a música e a letra juntas formam o escopo do Musical. Alguns Musicais, entretanto, têm canções entrelaçadas e não tem diálogos falados. Um momento de grande emoção dramática é frequentemente encenado numa canção. Uma canção deve ser adaptada ao personagem (ou personagens) e na sua situação dentro do enredo. Um show normalmente se abre com uma canção que dá o tom ao Musical, introduz de alguma forma os personagens principais, e mostra o enfoque da peça. Dentro da concentrada natureza do Musical, os autores devem desenvolver os personagens e o planejamento. A música apresenta uma forma excelente de expressar a emoção.

O teatro foi sempre um porto seguro para os mais importantes compositores do nosso país. Os autores sempre usaram a música para dar um carater lúdico aos comentários sobre a realidade cotidiana tornando mais eficiente a transmissão das mensagens. Existem normalmente vários autores em um Musical. São poucos os Musicais que foram escritos por apenas uma pessoa. Uma parceria de colaboradores compositores, letristas e escritores são gerenciados, por um compositor / letrista, letrista / escritor (também conhecidos como letristas) ou por fim de um escritor / compositor. Pode haver muitos escritores, letristas e compositores em um Musical.

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Não existe uma resposta fácil para a constante dúvida sobre o teatro Musical: "O que vem primeiro a letra ou música?" Cada colaborador trabalha de uma forma diferente, e tende a ser único em sua forma de trabalhar. Ás vezes uma melodia inspira uma letra. Ás vezes uma letra inspira uma melodia. Entretanto, a maior inspiração para todos os autores é movida pelo tema da história principal apresentada no show. A ideia inicial para um novo Musical pode vir dos próprios autores, ou eles podem ter sido contratados para escreverem um Musical sobre um assunto especifico.

1.12.3 A Função da Dança

A questão visual sempre foi uma grande preocupação, por este motivo o teatro Musical conta com a possibilidade de enriquecimento cênico através da dança. Em peças deste gênero, a coreografia faz-se necessária para manter o "clima" alegre, descontraído, ao mesmo tempo em que se revela, em última instância, a nossa sociedade. O corpo, neste contexto, é muito valorizado, seja pelo uso de figurinos fantasiosos, exóticos e multicoloridos ou não; quanto pelas danças. Proverbialmente, "quando a emoção torna-se tão forte no discurso, você canta; quando ela se torna tão forte na canção, você dança.".

1.13 Considerações Finais do Capítulo I

Talvez a maior força do Teatro Musical reside nas várias influências recebidas por ele de características de todos os gêneros dramáticos revisitados e estudados neste capítulo a partir do livro “História Social da Arte e da Literatura” de Arnold Hauser (2003). Ao se apropriar de recursos de outros gêneros, ele bebe na fonte da farsa e pode ser dramático como a tragédia ou divertido como a comédia, leve como o vaudeville ou denso e pesado como o melodrama. E a sua cara alegórica e festiva maquia a possibilidade de crítica que ele pode fazer a moral e aos bons costumes da nossa sociedade e consequentemente da nossa própria política corrupta.

CAPÍTULO II

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A MUDANÇA DA FUNÇÃO DA ARTE ATRAVÉS DOS TEMPOS PELA FILOSOFIA

2.1. Introdução à Estética

Estética (“aesthesis” significa conhecimento sensorial, experiência, sensibilidade): Alexander Gottlieb Baumgarten, filósofo alemão, em seu trabalho: Meditações Filosóficas Sobre a Questões da Obra Poética (1735), utilizou a palavra poética para se referir aos estudos das obras de arte enquanto criações da sensibilidade, tendo como finalidade o belo. Pouco a pouco, substituiu a noção de arte poética e passou a designar toda investigação filosófica que tenha por objeto as artes ou uma arte. Do lado do artista e da obra, busca-se a realização da beleza; do lado do espectador e receptor, busca-se a reação sob a forma do juízo de gosto, do bom-gosto. 1 – A arte é produto da sensibilidade, da imaginação e da inspiração do artista e que sua finalidade é a contemplação; 2 – A contemplação, do lado do artista, é a busca do belo (e não do útil, nem do agradável ou prazeroso) e, do lado do público, é a avaliação ou o julgamento do valor de beleza atingido pela obra; 3 – O belo é diferente do verdadeiro. O verdadeiro é o que é conhecido pelo intelecto por meio de demonstrações e provas, que permitem deduzir um particular de um universal (dedução) ou inferir um universal de vários particulares (indução) por meio de conceitos e leis. O belo, ao contrário, tem a peculiaridade de possuir um valor universal, embora a obra de arte seja essencialmente particular. A obra de arte, em sua particularidade e singularidade única, oferece algo universal – a beleza – sem necessidade de demonstrações, provas, inferências e conceitos. Quando estou diante de uma obra de arte posso dizer que são belos ou que ali está a beleza, embora esteja diante de algo único e incomparável. O juízo de gosto teria,

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assim, a peculiaridade de emitir um julgamento universal, referindo-se, porém, a algo singular e particular. Desde o início do século XX, todavia, abandona-se a ideia de juízo de gosto como critério de apreciação e avaliação das obras de arte. De fato, as artes deixaram de ser pensadas exclusivamente do ponto de vista da produção da beleza para serem vistas sob outras perspectivas, tais como expressão de emoções e desejos, interpretação e crítica da realidade social, atividade criadora de procedimentos inéditos para a invenção de objetos artísticos, etc. Essa mudança fez com que a ideia de gosto e de beleza perdessem o privilégio estético e que a estética se aproximasse cada vez mais da ideia de poética, a arte como trabalho e não como contemplação e sensibilidade, fantasia e ilusão. A estética ou filosofia da arte possui três núcleos principais de investigação: a relação entre arte e Natureza, arte e humanidade, e finalidade-funções da arte.

2.1.1. Relação entre Arte e Natureza

2.1.1.1. Imitação

A obra de arte resulta da atividade do artista para imitar a Natureza, e o valor da obra decorre da habilidade do artista para encontrar materiais e formas adequados para obter o efeito imitativo. Imitar não significa reproduzir, mas representar a realidade através da fantasia e da obediência a regras para que figure algum ser (natural ou sobrenatural), algum sentimento ou emoção, algum fato (acontecido ou inventado).

Estas características de inventar, recriar a realidade através da fantasia podem ser observadas de maneira poética no fragmento abaixo do livro do “Livro do Desassossego” de Fernando Pessoa:

“Eu tenho uma espécie de dever, dever de sonhar, de sonhar sempre, pois sendo mais do que um espectador de mim mesmo, eu tenho que ter o melhor espetáculo que posso. E, assim, me

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construo a ouro e sedas, em salas supostas, invento palco, cenário para viver o meu sonho entre luzes brandas e músicas invisíveis.”

2.1.1.2. Criação

O valor é localizado na figura do artista como gênio criador e imaginação criadora. A ideia de inspiração torna-se explicadora da atividade artística: o artista, interioridade e subjetividade especial, recebe uma espécie de sopro sobrenatural que o impele a criar a obra. A obra deve exprimir sentimentos e emoções, muito mais do que figurar ou representar a realidade. A obra é a exteriorização dos sentimentos interiores do gênio excepcional e deve ser espontânea e livre. A arte liberta-se da Natureza criando uma realidade puramente humana e espiritual: pela atividade livre do artista, a fantasia, os homens se igualam à ação criadora de Deus. Essa concepção é contemporânea, na Filosofia, à idéia kantiana de diferença entre reino natural da causalidade necessária e o reino humano da liberdade e dos fins (diferença essencial para a ética.), e à idéia hegeliana do Espírito como cultura e história, oposto e negador da passividade e da causalidade mecânica da natureza. Em resumo, a estética da criação corresponde ao momento em que a Filosofia separa homem e Natureza. Quanto a esta característica do artista ter uma inspiração divina existem rituais teatrais que evocam tal inspiração: Todos em roda de mãos dadas resgatando o significado da palavra “dança”, que significa “roda” (referência as celebrações dos homens das cavernas retratadas nas pinturas rupestres) dizem em voz alta a seguinte mensagem:

“Eu seguro a minha mão na sua, e junto o meu coração ao seu, para que juntos possamos fazer aquilo que não quero e não posso fazer sozinho. Anjo do dia, da tarde e da noite nos proteja de dia, de tarde e de noite, mas principalmente anjo agora!”

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Ou

“Deus, Transforme-me no guardião da criatividade e das idéias puras, Dai-me a força para trabalhar, Revelar a verdade e encorajar a todos, Com meus sentimentos mais exaltados de bondade. Fazei-me um vínculo para as experiências angelicais! Quero viver com muito amor, coragem e sabedoria. Que isto seja uma constante, na Grande Ordem Celeste! Iluminai-me para continuar digno e forte, Para prestar vossos serviços de pureza. Dai-me sua proteção. Viva sua Luz! Amém.”

2.1.1.3. Construção

A obra de arte é expressão de um sentimento novo, escondido no mundo, e um processo de construção do objeto artístico, em que o artista colabora com a Natureza, luta com ela ou contra ela, separa-se dela ou volta a ela, vence a resistência dela ou dobra-se às exigências dela. A arte é trabalho da expressão que constrói um sentido novo (a obra) e o institui como parte da cultura. O artista é um ser social que busca exprimir seu modo de estar no mundo na companhia dos outros seres humanos, reflete sobre a sociedade, volta-se para ela, seja para criticá-la, seja para afirmá-la, seja para superá-la. Aqui o artista é colocado num embate contínuo com a natureza e com a sociedade, deixando de vê-lo como gênio criador solitário e excepcional. Esta característica é reforçada pelo juramento artístico dito pelo orador de cada turma que se forma no Curso de Artes Cênicas com Habilitação em Direção

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Teatral da UFRJ, escrito pelo professor, das disciplinas História da Arte, Iluminação e Direção, José Henrique Barbosa Moreira:

Juramento Artístico “Juro que, no exercício da profissão e em toda a minha vida artística, manter-me-ei dentro da ética social e dos deveres da cidadania, contribuindo com o meu saber para o engrandecimento e a democratização da cultura no Brasil, e criando e produzindo Arte a serviço do bem-estar coletivo” (2003)

2.1.2. Relação entre Arte e Humano

A valorização das artes como expressão do conhecimento encontra seu apogeu durante o Romantismo, quando a arte é concebida como “o órgão geral da Filosofia”, sob 3 aspectos diferentes: 1 – Para alguns, a arte é a única via de acesso ao universal e ao absoluto: 2 – Para outros, as artes são a 1ª etapa da vida consciente do Espírito, preparando a religião e a Filosofia, como Hegel; 3 – E outros concebem as artes como sendo o único caminho para reatar o singular e o universal, o particular e o geral, pois, atrávés da singularidade de uma obra artística, temos acesso ao significado universal de alguma realidade. Essa última perspectiva é a que encontramos, por exemplo, no filósofo Martin Heidegger, para quem a obra de arte é desvelamento e desvendamento da verdade. A concepção aristotélica parte da diferença entre o teórico e o prático, decorrente da diferença entre o necessário e o possível, tomando a arte como atividade prática fabricadora. Essa concepção, mantida durante séculos e rivalizando com as variantes platônicas, recebe 2 grandes contribuições no século XIX: 1 – Utilidade Social das Artes (particularmente, a arquitetura); 2 – Caráter Lúdico das Artes: para Nietszche – A Arte é jogo, liberdade criadora, embriaguez e delírio, vontade de potência afirmativa da vida: é “um estado de

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vigor animal”, “uma exaltação do sentimento da vida e um estimulante da vida” – “espírito dionisíaco”. Fantasia, jogo, sabedoria oculta, desejo, explosão vital, afirmação da vida, acesso ao verdadeiro: eis algumas maneiras pelas quais a estética concebe a atividade artística. 2.1.3. Finalidades-Funções da Arte

Sentimento do Sublime – A concepção pedagógica da arte reaparece em Kant quando afirma que a função mais alta da arte é produzir sentimento do sublime, isto é a elevação e o arrebatamento de nosso espírito diante da beleza como algo terrível, espantoso, aproximação do infinito. Hegel também insiste no papel educativo da arte – A pedagogia artística se efetua sob 2 modalidades sucessivas: 1ª – A arte é o meio para a educação moral da sociedade; 2ª – Pela maneira como destrói a brutalidade da matéria, impondo-lhe a pureza da forma, educa a sociedade para passar do artístico à espiritualidade da religião, isto é, para passar da religião da exterioridade (os deuses e espíritos estão visíveis na Natureza) à religião da interioridade (o absoluto é a razão e a verdade). Por estabelecer uma relação intrínseca entre arte e sociedade, o pensamento estético de esquerda também atribui finalidade pedagógica às artes, dando-lhe a tarefa de crítica social e política, interpretação do presente e imaginação da sociedade futura. A Arte deve ser engajada ou comprometida, isto é, estar a serviço da emancipação do gênero humano, oferecendo-se como instrumento do esforço de libertação.

Essa posição foi defendida pelo(a):

• Teatro por: Brecht e no Brasil por Augusto Boal • O Teatro Musical no regime militar: Roda Viva (1968), Calabar, Gota d'Água (1975) e Ópera do Malandro (1978), todos de Chico Buarque;

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• Música: Música de Protesto, e no Brasil pela Música Popular dos anos 60 e 70, foi de Protesto Político com Edu Lobo, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Geraldo Vandré, Milton Nascimento, entre outros. • Cinema de: Einsestein e Chaplin, e no Brasil pelo Cinema Novo • Romance de: Sartre, e no Brasil por Graciliano Ramos • Poesia de: Maiakóvski e Pablo Neruda, e no Brasil por Ferreira Gullar e José Paulo Paes • Pintura de: Picasso, e no Brasil por Portinari

Numa outra perspectiva, a arte é concebida como expressão, transformando num fim aquilo que para as outras atividades humanas é um meio. Aqui, a arte é revelação e manifestação da essência da realidade, amortecida e esquecida em nossa existência cotidiana, reduzida a conceitos nas ciências e na Filosofia, transformada em instrumento na técnica e na economia. Como expressão, as artes transfiguram a realidade para que tenhamos acesso verdadeiro a ela. Desequilibra o instituído e o estabelecido, descentra formas e palavras, retirando-as do contexto costumeiro para fazer-nos conhecê-las numa outra dimensão, instituinte ou criadora. A arte inventa um mundo de cores, formas, volumes, massas, sons, gestos, texturas, ritmos, palavras, para nos dar a conhecer nosso próprio mundo. Por ser expressiva, é alegórica e simbólica. Alegoria do grego significa falar de outra coisa ou falar de uma coisa por meio de outra. Essa outra coisa é o símbolo. O símbolo, em grego, é o que une, junta, sintetiza numa unidade os diferentes, dando-lhes um sentido único e novo que não possuíam quando separados. A obra de arte é essa unidade simbólica e alegórica que nos abre acesso ao verdadeiro, ao sublime, ao terrível, ao belo, à dor e ao prazer. A Arte como expressão não é apenas alegoria e símbolo. É algo mais profundo, pois procura exprimir o mundo através do artista. Ao fazê-lo, leva-nos a descobrir o sentido da Cultura e da História. Em todas as artes o momento fundamental, o instante expressivo, é instituinte do novo. Realizada a obra – o instituinte –, ela passa, graças aos leitores, espectadores, ouvintes, a fazer parte da cultura existente, tornando-se instituída. Dessa

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maneira, obra de arte nos traz uma 3ª revelação. Mostra que a Cultura é um movimento contínuo em que o instituído é descentrado, desequilibrado, deformado, modificado pelo novo, que, a seguir, graças aos destinatários da obra (o público), é depositado e sedimentado como parte do instituído, ficando disponível para todos como algo que é integrante de sua Cultura. Esse duplo movimento – do instituído ao instituinte e deste para aquele – assinala que a obra de arte expressiva é interminável. De fato, cada artista, para exprimir-se, retoma as obras dos outros e as suas próprias para produzir uma obra nova que, por sua vez, será retomada por outros para novas expressões. Um artista supera e ultrapassa outros porque os retoma e os transforma, fazendo vir à expressão aquilo que outros prepararam para ele. Cada obra de arte parte de um duplo ponto de partida: do desejo do artista de exprimir alguma coisa que ainda não sabe bem o que é e que somente a obra realizada lhe dirá; e do excesso de significações que as outras obras possuem e que elas próprias não chegaram a exprimir, excesso que só existe porque tais obras existem e o fizeram aparecer. Assim, a obra de arte nos traz uma última revelação: mostra que a História é o movimento incessante no qual o presente (o artista trabalhando) retoma o passado (o trabalho dos outros) e abre o futuro (a nova obra, instituinte).

2.2. Arte e Sociedade

São atitudes filosóficas opostas o formalismo puro e conteudismo engajado:

2.2.1. Arte pela Arte (Formalismo Puro)

A arte só é arte se for pura, se não estiver preocupada com as circunstâncias históricas, sociais, econômicas e políticas. Seu problema: Imagina o artista e a obra de arte como desprovidos de raízes no mundo e livres das influências da sociedade sobre eles – o que é impossível. Esta

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concepção desemboca no formalismo (é a perfeição da forma que conta e não o conteúdo da obra).

2.2.2. Arte Engajada (Conteudismo Engajado)

O valor da obra de arte decorre de seu compromisso crítico diante das circunstâncias presentes. O artista toma posição diante de sua sociedade, lutando para transformá-la e melhorá-la, e para conscientizar as pessoas sobre as injustiças e as opressões do presente. Seu problema: Corre o risco de sacrificar o trabalho artístico em nome das “mensagens” que a obra deve enviar à sociedade para mudá-la, dando ao artista o papel de consciência crítica do povo oprimido. Esta concepção leva ao conteudismo (é a “mensagem” que conta, mesmo que a forma da obra seja precária, descuidada, repetitiva e sem força inovadora.)

2.3. Considerações Finais do Capítulo II

Em resumo a arte possui intrisecamente valor de exposição ou exponibilidade, isto é, existe para ser contemplada e fruída. É essencialmente espetáculo, palavra latina que significa dado à visibilidade. As obras de arte exigem de nós atenção, pensamento, reflexão, crítica, pertubação de nossa sensibilidade e de nossa fantasia. As obras de arte e de pensamento nos pedem: trabalho sensorial e mental para compreendê-las, amá-las, criticá-las, superá-las. A Cultura nos satisfaz, se tivermos paciência para compreendê-la e decifrá-la. Exige maturidade. A obra de arte tem o poder extraordinário de tonar presente o ausente, próximo o distante, distante o próximo, entrecruzando realidade e irrealidade, verdade e fantasia, reflexão e devaneio. E o Teatro Musical, enquanto obra de arte, pode ir muito além do formalismo puro, da arte pela arte. Ele pode ter um conteudo engajado e mesmo assim não perder o seu caráter de entretenimento.

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CAPÍTULO III A IMPORTÂNCIA DO CORPO E DA VOZ PARA A FORMAÇÃO DE UM ATOR

“Se você pode andar, você pode dançar. Se você pode falar, você pode cantar.” (Provérbio Africano)

Este provérbio africano nos revela que tanto os recursos de voz, quando os de corpo podem ser bem mais explorados no processo de comunicação possibilitando um melhor desempenho do ator em um espetáculo. Para isto os alunos de teatro precisam estudar estes elementos a fim de que se desenvolvam e possam promover uma melhor performance. Este princípio também é compartilhado e defendido pela doutora, em Estudos da Performance pela New York University e docente do Curso de Direção Teatral da UFRJ, Eleonora Fabião.

3.1. A Importância do Corpo

3.1.1. O Corpo na Comunicação

O corpo possui duas funções básicas no processo de comunicação. Quando associado à fala, o corpo serve para fortalecer aquilo que se quer dizer, ou contradizer aquilo que se quer expressar.

Quando o ator se apropria da linguagem corporal, ele adquire consciência da importância do movimento no processo de comunicação. Assim ele consegue se expressar da melhor maneira possível através do corpo no teatro Musical, transformando o caráter mecânico e rígido, que uma coreografia pode ter, em movimentos naturais.

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É possível se contar uma história através da dança sem a utilização de palavras. Em países orientais, como Japão (ex.: Teatro Nó e Kabuki), Índia (ex.: Katakali), Tailândia (ex.: Teatro Balinês) e etc., teatro e dança são uma única arte sem divisão de papéis e se fundem a música, a história, a filosofia e a religião com o objetivo de transmitir todo o conhecimento produzido pelo o seu povo.

É importante observar a expressão do movimento como sendo elemento essencial para se estabelecer a comunicação nestes países do extremo oriente, onde existem diferenças linguísticas de uma região para a outra. Muitos desses países possuem duas ou mais línguas oficiais, com dialetos locais; mas, no entanto, os gestos e os movimentos presentes nos seus espetáculos são conhecidos por toda a população. Sendo assim, esta espécie de “dança dramatizada”, também conhecida como “teatro- dança” é a única via de comunicação direta.

Por estas questões referentes à importância do corpo no processo de comunicação, que o aluno de teatro, que pretende ingressar em um Musical, precisa cursar aulas de expressão corporal e dança, sejam elas jazz, ballet e sapateado para conhecerem melhor o seu instrumento de trabalho.

3.1.2. Consciência Corporal e Corpo Cênico

Na preparação inicial de um aluno é fundamental para o desenvolvimento de uma consciência corporal, que o corpo do ator seja adotado como elemento determinante para o acontecimento do fenômeno teatral.

Através de jogos dramáticos, improvisos e exercícios físicos é possível estimular e potencializar o corpo, a mente e os sentidos dos alunos-atores e também dos profissionais das artes cênicas para que a diferença entre movimento e ação física possa ser percebida de forma natural, empírica, espontânea e prazerosa.

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A ação é o elemento primordial do jogo teatral, pois mobiliza a totalidade do intérprete, tornando possível a projeção de seus impulsos criativos e uma comunhão mais efetiva com o público. Desta forma, durante as aulas é possível explorar a força expressiva e reveladora do agir para motivar a criatividade, a inteligência e o desejo pelo novo construindo o corpo cênico do ator.

O alongamento e o trabalho com as articulações proporcionam mobilidade, flexibilidade e consciência, produzindo um corpo cênico preparado a conjugar expressividade, qualidade e percepção do movimento.

Após o primeiro contato com aulas de Expressão Corporal e Consciência Corporal, onde o aluno adquire ritmo, coordenação motora e disponibilidade corporal, é necessário estudar técnicas acadêmicas de Dança.

3.1.3. A Dança no Teatro Musical:

Dança e Teatro são artes de integração, a própria palavra dança significa “roda”, uma vez que os homens das cavernas se reuniam em roda para comemorar ou poderem ter uma boa caçada. A dança surgiu como sendo uma manifestação coletiva dentro de uma função ritualística.

Existe uma carência de atores, no mercado de trabalho, que não só executem passos precisos, mas que também consigam se expressar bem através da dança. Analisando o conceito mais moderno de dança, advindo dos estudos preliminares do movimento de Rudolph Laban em seu livro Domínio do Movimento, que diz: “A repetição de movimentos leva à perfeição. E a perfeição de movimentos é dança.” (1978), à conclusão que se chega, num primeiro momento, é que este conceito acaba sendo muitas vezes utilizado de um modo muito restrito e deve ser melhor interpretado.

A ideia de que dançar é muito mais simples do que imaginamos é maravilhosa, e serve como estímulo para todos que pretendem começar a fazer qualquer estilo de

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dança. É nas aulas de dança e expressão corporal, o local certo para estudar o seu próprio corpo. As técnicas acadêmicas de dança possibilitam ao aluno uma adequação á uma interpretação mais elaborada dos personagens. Através de jogos teatrais, relacionados com a música e com a dança, é possível fazer com que os alunos-atores passem a ter uma visão mais ampla do que seja a dança em um Musical. Dançar em um Musical é se expressar através do corpo.

Uma aula de dança tem por objetivo propor maior conhecimento de possibilidades e habilidades físicas através de dinâmicas que exploram tempo, espaço, fluxo, peso e volume. Porém sabemos que para ser um bom profissional em um Musical apenas executar movimentos perfeitos não basta, é preciso saber colocar o corpo a serviço de uma série de elementos que fazem parte de um espetáculo: música, coreografia, texto, contexto, história, emoção.

A dança para atores de Musical precisa ter o enfoque nas técnicas de jazz, ballet, contemporâneo e sapateado. Além das técnicas acadêmicas o aluno também deve ter na prática contato com os diversos estilos de coreografias realizados por diferentes coreógrafos renomados no mundo dos Musicais até hoje, como Bob Fosse, Gilian Lee, Chad entre outros.

Dentro de uma nova nomenclatura de dança, em boa parte das universidades especializadas em dança, os profissionais saem habilitados a serem coreógrafos e intérpretes. O titulo de bailarino e dançarino cai em desuso, o que foi uma grande evolução na dança contemporânea; pois ser um intérprete de uma coreografia e / ou composição - partitura física significa ser um atuante em dança e não apenas um mero repetidor de movimentos perfeitos.

É neste conceito em que o ator, que deseja ingressar em um Musical, deve se apropriar para desenvolver o seu trabalho e se tornar um “intérprete”.

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3.1.4. O Ator como um Intérprete:

Um intérprete em Musical é aquele que está habilitado para enfrentar e vencer os obstáculos que por ventura, venham a surgir durante a exibição de um espetáculo. O espetáculo acontece no palco, mas nos ensaios os atores descobrem suas virtudes e limitações. O intérprete ensaia para o erro, pois ele é um visionário que consegue prever as dificuldades da execução de um determinado número Musical, e passa a treinar para corrigir os possíveis deslizes, sem menosprezar momentos de simples expressão, mas não menos importantes.

Numa apresentação de um Musical, o ator pode até, eventualmente, errar o passo, mas não pode perder nunca a expressão. O excesso de técnica muitas vezes tira a expressividade do ator. Tem atores que ficam tão obcecados em acertar os passos, que esquecem a música e a emoção que ela transmite. Este ator, que não costuma dar atenção necessária à expressão no seu trabalho, torna-se vítima de sua própria arte, assim quando ele erra um passo a coreografia fica vazia.

No caso do ator de Musical que associa técnica e expressão, quando erra um passo, seu movimento mesmo que impreciso, está preenchido de expressividade. Assim, o erro se torna, muitas vezes, imperceptível para o público, os companheiros de trabalho, incluindo o coreógrafo e o diretor. Quando o ator deixa de se queixar de suas limitações, começa a trabalhar para transformar um defeito em efeito.

A visão do ator, como sendo um elo de uma corrente, é definitiva para o entendimento do conceito de um verdadeiro trabalho em equipe:

Um guindaste é avaliado pelo seu elo mais fraco, ou seja, ele só consegue levantar um determinado peso pelas condições dos elos que formam a sua corrente, em

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outras palavras, se um dos elos estiver danificado a capacidade de um guindaste de levantar este peso será reduzida.

A mesma coisa acontece no Teatro, um número Musical bem executado depende do grupo que a interpreta, se um dos atores não estiver tendo um bom desempenho dentro do espetáculo, a apresentação será avaliada por ele e não pelos demais. Aqui podemos perceber que no teatro é fundamental desenvolvermos uma relação mais íntima e satisfatória do indivíduo com a coletividade na qual está inserido.

Um ator íntegro é aquele capaz de transmitir a sua segurança de palco aos demais companheiros fazendo com que os mesmos também cresçam na apresentação, transformando cenas coreográficas muito simples em um momento espetacular, elevando os números Musicais a uma “obra prima” de primeira grandeza. Para se chegar a esse nível, é preciso ter o mínimo de domínio do seu instrumento de trabalho: corpo, mente e emoção. A dança deve ser libertária e não castradora do corpo; quando se chega a esse patamar, descobrimos o verdadeiro prazer de se dançar em um Musical.

3.1.5. A Integração do Movimento Coreográfico com o Canto

Atualmente também tem sido muito úteis os princípios de preparação física com matt pilates para a combinação de um corpo que possa coordenar as funções de respiração, integrando o movimento coreográfico ao canto.

3.2. A Importância da Voz

3.2.1. A Voz na Grécia Antiga

Uma boa voz já era algo admirado pelos gregos desde a Antiguidade Clássica. Na mitologia grega a Musa Calíope, também conhecida como “Bela Voz”, ligada à poesia épica e a ciência em geral, era a mais velha e sábia das musas, e considerada por alguns, a rainha dessas exatamente porque sabia usar bem as palavras e

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era dotada de grande eloquência. Outro mito grego que destaca a importância de se expressar bem através da fala é o mito de Eco.

3.2.2. O Mito de Eco na Versão de Ovídio

Segundo a narrativa de Ovídio, Eco era uma das Oréades, as ninfas das montanhas, que tinha os maravilhosos dons de canto e dança e adorava a sua própria voz. Eco amava os bosques e os montes, onde muito se distraía com as demais ninfas. Zeus adorava estar entre as belas, visitava-as com grande frequência. Em certa ocasião suspeitando que Zeus se divertia com as ninfas, Hera desconfiou com razão da ausência do seu marido e resolveu vir à terra a fim de flagrá-lo com suas amantes. Sendo a prolixa Eco a única do grupo que não se divertia com Zeus, a fim de continuar seu adultério ele resolveu usar o dom da comunicação de Eco para distrair a esposa.

Enquanto as ninfas se escondiam, Eco para salvar suas amigas, tentou distrair Hera com uma conversa e falou ininterruptamente, de forma a possibilitar que o deus e as outras ninfas escapassem. No entanto a deusa conseguiu livrar-se dela e, chegando ao campo onde os amantes estavam, encontrou-o deserto. Percebendo que tinha sido enganada pela ninfa, resolveu castigá-la. Ela não teria mais o poder de iniciar uma conversa, condenou-a para sempre a repetir apenas as últimas palavras das frases que os outros diziam (ecolalia). A Ninfa Eco, depois de ser punida pela deusa Hera, passou a ser: "aquela que não sabe falar em primeiro lugar, que não pode calar-se quando se fala com ela, que repete apenas os últimos sons da voz que lhe chega" (Ovídio, Metamorfoses. Ano 8 d.c.).

A ninfa perdia assim seu mais precioso dom, aquilo que mais amava. Enquanto vagava em seu sofrimento, noutra parte havia um homem chamado Narciso. Era ele tão belo que mulheres e homens ao verem-no logo se apaixonavam. Mas Narciso, que parecia não ter coração, não correspondia a ninguém.

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Certo dia, vagando Eco pelos bosques, encontrou o belo mancebo por quem, claro, caiu de amores. Como não podia falar-lhe, limitou-se a segui-lo, sem ser vista.

O jovem, porém, estando perdido no caminho, perguntou: "Tem alguém aqui?" Ao que obteve apenas a resposta: "Aqui, aqui, aqui…". Narciso intimou a quem respondia para sair do esconderijo. Eco apareceu-lhe e, como não podia falar, usou as mãos para em gestos dizer do grande amor que lhe devotava. Narciso, chateado com a quantidade de pessoas a amarem-no, rejeitou também à bela ninfa.

À pobre Eco, tomada de desgosto, rezou para que Afrodite lhe tirasse a vida, mas a deusa, entretanto, tanto gostou daquela voz, que a deixou viver. Então ela se refugiou em uma caverna, e por lá viveu até a sua morte. Após a sua morte a deusa Gaia, apiedada de seu sofrimento, espalhou a sua voz em cavernas por toda a Terra, que repetem até hoje as últimas palavras que os seus visitantes dizem. Este mito grego explica o porquê da existência do eco nas cavernas.

3.2.3. A Voz na Comunicação

“A voz é o eco da alma” – Pitágoras

A voz é importante no processo de comunicação porque ela tem a função de ser a expressão do nosso “eu”, nossos pensamentos, emoções e intenções. Não podemos esquecer que a voz também é “corpo”, uma vez que tem forma e ocupa lugar no espaço. A área preenchida pela voz do ator em cena é chamada de “Espaço Sonoro”. A voz não pode se restringir a área do palco, ela precisa chegar à plateia. Por isto o “espaço sonoro” é definido como a soma da área ocupada pelos atores, o palco, mais a área ocupada pelo público ouvinte, à plateia. Para se estabelecer o envolvimento sonoro com o público, o ator deve aprender a dar aquele “abraço sonoro” na plateia com a sua voz. Para que isto aconteça de fato, é necessário que o ator se familiarize com as técnicas de projeção da voz e sua adaptação às diferentes linguagens do teatro e às várias formas de atuação.

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Para uma melhor compreensão do texto pelo público é preciso que o ator aperfeiçoe a forma de dizer, a expressão, a interpretação de textos através da imagem visual das palavras, a Gestalt, favorecendo a modulação adequada de sua voz. Não podemos esquecer que interpretar um texto não é somente entender o que está escrito. Interpretar é analisar criticamente todas as possibilidades do texto, para que se possa extrair de cada palavra, de cada frase, de cada parágrafo um todo significativo.

Outro fator relevante de se estudar a voz é identificar e corrigir possíveis problemas articulatórios e vocais que prejudicam a comunicação oral. Uma boa articulação permite ao ator uma emissão da voz cristalina, dando liberdade ao som. É fundamental aperfeiçoar a articulação das palavras e orientar os atores quanto ao uso correto da voz e dos exercícios específicos para cada tipo de interpretação.

3.2.4. A Aula de Canto

Na parte Musical o aluno precisa conhecer o seu aparelho fonador, além de cursar aulas de percepção Musical, que aprimoram a capacidade de perceber a hora certa de entrar e cantar no tom correto, mesmo que diferente dos demais, com a finalidade de desenvolver a sua Musicalidade e descobrir suas possibilidades ao cantar, seja sozinho ou em conjunto.

O aluno-ator também necessita desenvolver a habilidade de cantar independente de acompanhamento Musical, pois cantar a Capella é uma etapa recorrente em muitos testes, além de ser um recurso que proporciona momentos de intensa dramaticidade nos Musicais.

Manter as características do personagem durante todo o espetáculo é um dos maiores desafios do Teatro Musical. Muitas vezes há uma tendência natural do aluno ou até mesmo do profissional do ramo se tornar um “cantor” na hora da canção e um “ator” na hora do texto. Para que isto não aconteça o aluno de teatro precisa ter contato também com diferentes técnicas vocais para voz falada e cantada em um Musical.

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Estas técnicas são fundamentais para a manutenção das características do personagem em todos os momentos do espetáculo, mesmo quando o ator passa por cenas faladas, cantadas ou dançadas, garantindo assim uma unidade, uma harmonia do início ao fim da apresentação. Como ator de Musical precisa o tempo todo manter a interação com a cena, a canção e a coreografia, é necessário desenvolver a capacidade de cantar se movimentando nas mais diversas direções e posições sem perder a qualidade vocal.

3.2.5. Cantar Um Solo

No Teatro Musical a música acontece em uma transposição da cena, e se a transição da fala (texto) para a canção for feita de forma sutil e linear a informação chega mais claramente ao público.

Em casos específicos, quando os atores têm pouco tempo disponível ou um personagem com características muito peculiares, existem aulas personalizadas, desenvolvidas por um profissional chamado de Coach, uma espécie de “treinador”, onde o objetivo é trabalhar técnicas individualizadas dentro das características e necessidades do aluno-ator ou de um ator profissional.

O objetivo principal de se cursar uma aula de canto é fazer com que os alunos atinjam o conhecimento e entendimento necessários para conduzirem seus estudos vocais de forma saudável no cotidiano e em eventuais construções específicas de personagens.

Dentro da técnica vocal voltada para o ator/cantor o estudo deve englobar basicamente o controle de expulsão de ar para que o resultado da voz seja leve e saudável com potência suficiente para poder cantar todos os dias, transformando o ato de cantar em algo tão natural quanto falar. Já que falamos naturalmente, podemos cantar naturalmente. Com o controle de ar é possível alcançar diversos timbres e musculaturas vocais, resultando em uma gama de possibilidades faladas e cantadas para o ator.

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Com o estudo das vogais (abertas, estreitas, cobertas, posteriores) não só o texto cantado, nomeado Recitativo, fica mais compreensível como o sotaque para outras línguas se torna muito mais facilmente neutralizado. Todo o trabalho vocal proposto deve ser feito de maneira dinâmica e maleável, com muita comunicação e visando sempre o maior conforto físico e psicológico possível.

3.2.6. Cantar Em Conjunto (Coral)

Cada vez mais crescem as oportunidades de trabalho nos Musicais. Normalmente as chances de entrar para um Musical de grande porte, por incrível que pareça, são muito maiores nos personagens que compõem o coro. Atualmente são muitos os destaques e personagens principais que começaram inclusive a cantar nos coros.

Para isto é importante que um ator estude em um curso de canto em coro com um enfoque específico sobre a prática de cantar em conjunto (coral), visando os trabalhos de abertura de vozes para aprender a cantar em tons diferentes dos demais mantendo a afinação e, principalmente, a timbragem das vozes. Desta maneira é possível exercitar a identidade e a personalidade vocal de cada indivíduo dentro de um conjunto vocal.

Através do trabalho em grupo se aprimora as noções básicas da técnica e da expressão vocal. Ao se utilizar o repertório oriundo do gênero Teatro Musical, os exercícios podem ser focados basicamente em duas ou mais melodias sobrepostas que permitam o exercício do “ouvir” e da emissão da voz de forma afinada.

3.2.7. Teoria Musical

Também aulas de teoria Musical podem ser bastante úteis ao trabalho do ator, uma vez que pretendem iniciar e aprimorar a capacidade de leitura e escrita Musical, priorizando a experiência auditiva e percepção nos alunos.

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3.1. Integração do Corpo a Voz com a “Técnica Alexander”

Segundo informações da ABTA (Associação Brasileira da Técnica Alexander) e da professora Gabriela Geluda, F. M. Alexander foi um ator e declamador australiano que se deparou com problemas vocais e no processo de tentar resolver suas próprias dificuldades acabou desenvolvendo no final do séc. XIX o que hoje é conhecido como a “Técnica Alexander”. Durante seu processo de auto-observação, Alexander se deparou com a “força do habito” e dedicou-se de maneira incansável a lidar com isso. Alexander observou uma série de tensões que eram acionadas em reação ao simples estímulo de produzir um som e que se acentuavam durante a atividade em si.

Em cursos de integração corpo e voz podem ser apresentados e desenvolvidos os princípios desta técnica que possibilita a sua aplicação no trabalho de expansão vocal do aluno-ator. Sendo assim tais princípios podem ser aplicados no estudo de qualquer texto, na pesquisa vocal, na preparação dos atores tanto no processo de ensaio quanto de aquecimento antes de qualquer apresentação e durante a mesma.

Além de uma vivência intensa, devem ser abordadas a anatomia e a fisiologia da voz e as questões ligadas à prática Musical. Dessa forma o ator irá garantir um melhor desempenho e saúde vocal além de abrir horizontes criativos através de um aprofundamento do entendimento do funcionamento e integração psico-física.

Desta forma a Técnica Alexander é consagrada como uma poderosa ferramenta de libertação de padrões habituais de tensão, o que é extremamente útil para todos os atores e por esse motivo, consta como disciplina em grandes Universidades de Teatro e Música no mundo como a Juliard School em Nova York, Guildhal School of Music and Drama em Londres e Conservatoire de Paris.

Aqui no Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro, este trabalho pioneiro é desenvolvido pela preparadora Musical de atores Gabriela Geluda, que além

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da experiência profissional como cantora é a única professora no país que possui formação dupla: na Técnica Alexander pelo Alexander Technique Studio (Londres) e em Canto lírico pela Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio). Sendo também afiliada à Associação Brasileira da Técnica Alexander ABTA. E desde 2009 faz parte do corpo docente da “Pós Graduação em Preparador Corporal" da Faculdade Angel Viana e a partir de 2010 também da "Pós Graduação em Corpo Diferença e Educação".

CAPÍTULO IV

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A ENTREVISTA COM CHARLES MÖELLER E CLÁUDIO BOTELHO POR MARILIA GABRIELA

No dia 2 de setembro de 2012, a jornalista e apresentadora, Marília Gabriela, conversou com dois nomes determinantes para a renovação do Musical Teatral no Brasil: Charles Möeller e Claudio Botelho. Os dois produtores foram os grandes responsáveis pelo resgate e consolidação do gênero no país. Eles foram os convidados do programa Marília Gabriela Entrevista, apresentado há mais de 12 anos todos os domingos às 22 horas no GNT/Globosat (canal 41 das operadoras de tv por assinatura NET/SKY) e falaram sobre essa parceria tão bem-sucedida, dos espetáculos em cartaz e dos próximos projetos. Durante a entrevista, a dupla também antecipou os próximos espetáculos. A estreia de “Como vencer na vida sem fazer força” em São Paulo foi um dos trabalhos citados. Charles e Claudio ainda comentaram sobre a parceria com Milton Nascimento. O projeto “Nada Será Como Antes” é inspirado nos 50 anos de carreira do cantor que celebra também 70 anos de vida.

A entrevista foi disponibilizada no dia 04 de setembro de 2012 na conta do Youtube do site Cena Musical. O site foi criado por Marilia Di Dio e Michelle Camhaji, ambas recém-formadas em Rádio e Televisão pela FAAP – Fundação Armando Álvares Penteado. Como consta na própria página virtual, as duas se apaixonaram por teatro Musical ainda na faculdade e resolveram montar um site sobre esse gênero, que está em constante crescimento no Brasil. No site podem ser encontrados tópicos com entrevistas, notícias, fotos e músicas com o objetivo de divulgar os espetáculos em cartaz, o trabalho dos atores e atrizes e tudo o mais que estiver relacionado a essa área. Com uma produtora própria, as duas também produzem grande parte do material do site Cena Musical em vídeo, como entrevistas, coletivas de imprensa e profile dos atores, com o intuito de levar o melhor conteúdo a quem se interessa por teatro Musical e também contribuir para o desenvolvimento desse gênero no país.

4.1. Os Entrevistados: Charles Möeller e Cláudio Botelho 4.1.1. Charles Möeller

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Santista de 30 de abril de 1967. Profissional polivalente começou aos 13 anos como ator ainda em sua cidade natal no SESC. Na época, Santos ainda tinha um movimento cultural forte e as peças estreavam no teatro Municipal. Em São Paulo no ano de 1985 estreou sua carreira profissional na peça "O Noviço" com direção de Neyde Veneziano, a maior pesquisadora do Teatro de Revista no Brasil. Fez licenciatura em artes cênicas e artes Musicais na Faculdade do Carmo, na Ponta da Praia em Santos. Mais antes disso, porque tinha facilidade para desenhar e influenciado por um irmão mais velho que também fazia arquitetura, prestou vestibular aos 16 anos para arquitetura, e chegou à cursar um ano. Mas sentia-se frustrado e, aos 18 anos, mudou-se de vez para São Paulo, onde participou, por três anos, do CTP (Centro de Pesquisa Teatral), fundado pelo diretor Antunes Filho. Neste período, Charles também começou a fazer assistência de cenografia para um dos maiores cenógrafos desse país, J.C. Serroni, já que desenhava e possuía algumas noções de plantas em arquitetura. Da cenografia chegou aos figurinos. Em 1989 com 22 anos ele virou figurinista e trabalhou com Gabriel Vilella em “O Concílio do Amor”, montagem do grupo Boi Voador. Por seu trabalho com o cenário e os figurinos deste espetáculo, Charles ganhou os prêmios Mambembe, Shell, Associação dos Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo (Apetesp) e Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Mudou-se em 1991 para o Rio de Janeiro, e depois assinou importantes cenografias e atuou com diretores de prestígio. Na televisão atuou nas novelas "Mico Preto" (90/91 – TV Globo), "Ana Raio e Zé Trovão" (92/93 – TV Manchete), "A Idade da Loba" (94/95 – TV Plus / Band) e "Xica da Silva" (1996 – TV Manchete), além de muitos casos especiais como "Você Decide" e "A Vida Como Ela É", na TV Globo. Em 1997 ganhou o Prêmio Shell pelos figurinos de "O Casamento". Charles também criou cenários e figurinos para óperas do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e de São Paulo, entre elas "Cavalleria Rusticana", "La Bohème", "La Traviatta" e "Madama Butterfly". Em 1999, ele fez assistência de direção e assinou a concepção artística no Theatro Municipal para a minissérie "Chiquinha Gonzaga", da TV Globo. Em 2008 recebeu o Prêmio Shell pela direção de "7 – O Musical" e o Prêmio APTR de Teatro de Melhor Autor pelo mesmo

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Musical. O seu último trabalho televisivo foi dirigir as cenas Musicais da minissérie “Dalva e Erivelto” na rede Globo.

4.1.2. Claudio Botelho

Mineiro de Ariguari, nasceu em 20 de novembro de 1964. Ator, cantor, compositor, diretor e tradutor, ele também é um profissional premiado e disputado no mercado teatral. Foi criado em Uberlândia e mudou-se para o Rio de Janeiro em 1978. Foi no Rio que ele teve seu primeiro contato com um piano – de uma tia. Quando ia à casa dela, corria para o piano e aprendeu a tocar sozinho. Em 1980, estudando no São Vicente de Paulo, começou a fazer a aula de teatro com o professor Almir Telles na própria escola, passando os três anos do ensino médio se apresentando nos saraus do colégio. Foi o próprio professor quem incentivou Claudio a escrever textos para os espetáculos escolares e a compor canções para os pequenos Musicais encenados. Em 1992, se formou na primeira turma da Casa das Artes de Laranjeiras – CAL. Desde meados da década de 90, o seu nome já esteve à frente de importantes montagens dirigidas por diretores como Marco Nanini e Bibi Ferreira. Em 1998 recebeu o Prêmio Mambembe pelo conjunto da obra como compositor. No ano 2000 ganhou o Prêmio Governador do Estado do Rio de Janeiro pelas versões de - Ele Nunca Disse que me Amava. Em 2004 ganhou o Prêmio Shell pelas versões para o português do Musical "Tudo é Jazz!". No ano de 2010 também ganhou outro Prêmio Shell na Categoria Especial pela versão das músicas de "Avenida Q". Hoje por sua trajetória, pontuada de sucessos, pode-se dizer que Claudio Botelho ajudou a criar um novo padrão de qualidade para o Teatro Musical no Brasil. Ao lado de Charles Möeller, é considerado um "mago dos Musicais" da atualidade. O trabalho de Claudio Botelho como tradutor de Musicais é bastante conceituado e elogiado. São suas as versões dos principais espetáculos de teatro Musical apresentados no Brasil nos últimos anos, tais como "Les Misérables", "O Beijo da Mulher Aranha", "", "Victor ou Victoria", "", "A Bela e a Fera", "Chicago", "O Fantasma da Ópera", "", "O Rei e Eu", "Mamma Mia!", "Evita", "A Família Addams", entre outros. 4.1.3. A Parceria de Charles Möeller e Claudio Botellho

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A dupla se conheceu no ano de 1990 e no ano seguinte Charles Möeller assinou a cenografia e o figurino de “Hello Gershwin” dirigido por Marco Nanini, e trabalhou pela primeira vez com Claudio Botelho. Claudio Botelho ao lado da atriz Claudia Netto atuaram juntos neste espetáculo, que estreou no Teatro Ipanema, às segundas e terças-feiras, e foi apresentado também no Teatro Rival, no Rio Jazz Club e no Teatro do Crowne Plaza, em São Paulo.

O Musical teve certa repercussão, porque ninguém nunca tinha feito nada parecido. No roteiro, os clássicos em inglês e letras em português para as canções menos conhecidas, especialmente as cômicas, tornando-as acessíveis ao público. O crítico João Máximo, então no Jornal do Brasil, assistiu e escreveu uma pagina inteira, falando muito bem das letras de Claudio.

Em janeiro de 2010, celebrando os 20 anos de parceria artística com Charles Möeller, Claudio Botelho estreou, no Espaço SESC, no Rio, o espetáculo "Versão Brasileira". No show, Claudio, acompanhado pelos músicos Edgar Duvivier (sax e clarinete), Marcelo Castro (piano) e Thiago Trajano (violão, guitarra e banjo), fez um panorama da bem-sucedida trajetória da dupla. Ele apresentou algumas canções no original, e outras em português, já que são suas as versões dos principais Musicais encenados no Brasil nos últimos 10 anos.

Após a estreia de "Versão Brasileira" foi lançado, no espaço multiuso do SESC-Copacabana (RJ), o livro "Os Reis dos Musicais", escrito por Tânia Carvalho para a Série Aplauso, da Imprensa Oficial de São Paulo. O livro é uma homenagem ao trabalho realizado pelos dois diretores ao longo dos últimos 20 anos e de sua importância para a história do teatro Musical brasileiro. Atualmente os dois já dirigiram juntos 31 Musicais e estão em cartaz com os espetáculos: “O Mágico de Oz” e “Milton Nascimento – nada será como antes”.

4.2. A Entrevista Comentada

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4.2.1. Primeiro Bloco: Charles Möeller e Claudio Botelho No primeiro bloco da entrevista Marilia Gabriela conversa com a dupla Charles Möeller e Claudio Botelho, que revela como se conheceu:

MARILIA GABRIELA - Muito bem. Eu acho que nunca perguntei como é que vocês se conheceram? CHARLES MÖELLER – A gente se conheceu... Eu fazia uma novela chamada “Mico Preto” como ator. MARILIA GABRIELA – Mas você é paulista? CHARLES MÖELLER – Paulista MARILIA GABRIELA – De Santos? CHARLES MÖELLER – De Santos. MARILIA GABRIELA- Hã... CHARLES MÖELLER – E em 90 eu fui para o Rio de Janeiro fazer uma novela chamada “Mico Preto”, e eu fazia o filho do Miguel Falabella nessa novela. E o Miguel ensaiava um espetáculo com o Ítalo Rossi e um rapaz que tocava violão e cantava umas músicas (Claudio Botelho) e ele me chamou para o ensaio. E eu me lembro que eu assisti aquele ensaio e depois a gente saiu para jantar: Eu, Ítalo, Miguel e o Cláudio e agente falou a noite inteira de Musical e começou aí.

Claudio Botelho quando compôs músicas para o espetáculo de Sérgio Britto o "Casamento Branco", foi apresentado ao ator Ítalo Rossi. Num primeiro momento este espetáculo não estreou, mas Ítalo estava estreando um outro espetáculo na mesma época com poesias de Manuel Bandeira e Fernando Pessoa chamado "Um e Outro" e convidou Claudio Botelho para tocar violão. Viajaram com este espetáculo e na volta, para a temporada carioca, Ítalo convidou Miguel Falabella para redirigir. Depois, quando finalmente estreou o espetáculo o "Casamento Branco", de Sérgio Britto, Claudio recebeu excelentes críticas pelas músicas compostas por ele. (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.)

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MARILIA GABRIELA – Vocês se identificaram imediatamente? CHARLES MÖELLER – De cara. Imediatamente MARILIA GABRIELA – Eu me lembro de você cantando com a Claudia Netto as músicas do Chico num teatro lá embaixo na Rua Augusta, aqui em São Paulo. CLAUDIO BOTELHO – o Teatro Bibi Ferreira MARILIA GABRIELA – Do Teatro Bibi Ferreira. Que ano foi aquilo? CLAUDIO BOTELHO – 98!

No verão de 1998, Claudio Botelho e Claudia Netto estrelaram um dos maiores sucessos da dupla, o Musical "Na Bagunça do Teu Coração", com texto de João Máximo e Luiz Fernando Vianna, e direção de Bibi Ferreira. O espetáculo contava uma história de amor por meio das músicas de Chico Buarque, e foi grande sucesso de crítica e público. Mas foi em "Tambores da Noite", de Brecht, dirigido por Luís Fernando Lobo, amigo de Sérgio Britto, onde Claudio Botelho, que fez as músicas, conheceu a atriz Claudia Netto. Apesar de ter um papel pequeno no espetáculo, ela cantava muito bem e acabou recebendo três músicas para interpretar. Ali nascia uma parceria que rendeu muitos frutos. Na TV, Claudio e Claudia participaram do Programa "Série Grandes Compositores", na TVE, apresentando, em cinco programas, canções de Gershwin, Cole Porter, Irving Berlin, Rodgers & Hart e Jerome Kern, com direção de Dermeval Netto. Também na TVE, a dupla apresentou, em 1995, quatro programas dedicados aos 100 anos da Broadway, a Kurt Weill e à dupla Rodgers & Hammerstein, com direção de Maurício Sherman. Em 2000, a dupla Claudio e Claudia, comemorando 10 anos de parceria, estreou, no Teatro Café-Teatro de Arena, o espetáculo "Musicais in Concert", uma colcha de retalhos da década de palco em comum. Os artistas mostraram em cena os melhores momentos dos Musicais em que atuaram. (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.)

Um pouco da história dos espetáculos de sucesso do Teatro Musical atuais e nas décadas de 50 e 60 no Brasil :

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MARILIA GABRIELA – Porque brasileiro gosta tanto de Musical? CLAUDIO BOTELHO – Acho que brasileiro gosta muito de teatro ... e gosta muito de teatro que se comunique, que conte uma boa história. O que aconteceu acho que o brasileiro já gostava muito de Musical nos anos 50 e 60. A gente teve muitos Musicais aqui como, como o próprio “Como Vencer na Vida Sem Fazer Força” que a gente vai refazer agora; como o “Pippin”, como “My Fair Lady”, e tudo isto era muito sucesso. E isso desapareceu do mercado. Acho que...

O Regime Militar no Brasil, que compreendeu o período que foi de 31 de março de 1964 até 15 de março de 1985, deu uma freada nesse tipo de produção. Durante toda a Ditadura o teatro Musical ainda produziu os seguintes espetáculos: Roda Viva (1968), Calabar: o Elogio da Traição (1973, em parceria com Ruy Guerra), Gota d'Água (1975, em parceria com Paulo Pontes), Ópera do Malandro (1978) e O Grande Circo Místico (1983, em parceria com Edu Lobo) todos de Chico Buarque:

MARILIA GABRIELA – Mas desapareceu por algum motivo! CLAUDIO BOTELHO – ...Eu acho que pela situação política. O país embarcou numa ditadura. O Teatro passou a tratar de assuntos não tão “business”, não tão “alegres”, com nem tanto “final feliz”. O Teatro passou a ser um lugar de “resistência”. E coincidentemente com a volta das liberdades é o começo de uma retomada do Musical. A volta do liberalismo econômico. Né?! Você poder cobrar caro por um ingresso e tudo. Isso ajudou com que você pudesse a ter produções grandes novamente. Porque elas existiram. A Bibi (Ferreira), o Paulo Autran, a Marília Pêra, essas gente toda fez muito Musical, e viveu muito disso, 7, 8 sessões por semana.

O Teatro Musical ressurgiu brandamente no final da década de 80, mas ganhou mais força no final da década seguinte, se popularizando em função da melhoria do perfil econômico do brasileiro. Com o liberalismo econômico o poder de consumo da população brasileira aumentou, o que ajudou a democratizar o gênero.

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Charles Möeller relata como surgiu a sua paixão pelos Musicais, assistindo aos filmes da MGM e a fascinação pela a estética do Musical:

MARILIA GABRIELA – Você gosta de Musical porque? Ou gostava? Vamos falar ainda no passado CHARLES MÖELLER – Eu acho que assim. Eu aprendi a gostar de Musical... eu acho que por causa do meu pai que era fã dos filmes da Metro. Eu lembro de ter essa conexão com ele de assistir aos filmes e ficar fascinado com aquela estética do Musical, porque pelo tipo de interpretação “mentirosa” que o Musical tem. Eu adoro esta possibilidade.

Acima quando Charles fala dos filmes da Metro, ele esta se referindo a Metro-Goldwyn-Mayer Inc., ou MGM, empresa norte-americana de comunicação de massa, envolvida principalmente com produção e distribuição de filmes e programas televisivos. A MGM foi fundada em 1924 quando o empresário do ramo do entretenimento, Marcus Loew, adquiriu o controle da Metro Pictures, Goldwyn Pictures Corporation e da Louis B. Mayer Pictures.

Charles volta a enaltecer a Estética do Musical e como ela causa um efeito arrebatador na plateia. Também toca na questão do gênero ser considerado inferior pelo seu caráter de entretenimento:

MARILIA GABRIELA – Porque é isto mesmo né? CHARLES MÖELLER – É! Claro que é. MARILIA GABRIELA – Você está ali e ninguém se ilude. Você não é aquela pessoa. Você está atuando ali. É isso? Essa é a sensação do ator no Musical? CHARLES MÖELLER – Eu acho que é tão interessante quando a arte, ela passa, ela assume a mentira. Assim eu acho que o que me fascina é quando a gente assume esse estar sendo enganado. Eu acho que o Musical, de todas as manifestações artísticas é a mais mentirosa porque eu não começaria esta entrevista com você cantando. Então

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assim, a estética toda do Musical, ela te dá toda uma liberdade para a mentira absoluta que é muito fascinante. Né?! Então assim... é aquilo povoou os meus sonhos durante muitos anos. E de uma certa forma... eu acho que... de um tempo... quando eu vim para São Paulo estudar teatro isso tudo ainda não se abria essa história do Musical. O Musical era considerado um gênero menor, era um entretenimento pelo entretenimento. É... eu acho que a minha “saída do armário” do Musical foi quando eu conheci o Cláudio (Botelho), pro Rio de Janeiro, que tinha essa liberdade de falar disso que é um gênero muito importante, muito avassalador.

A influência dos Musicais Americanos foi fundamental para a formação da escola de Musicais no Brasil. A partir das primeiras adaptações e versões bem feitas dos Musicais Americanos em terras brasileiras foi possível descobrir a nossa própria linguagem, criando assim uma identidade nacional no gênero em questão.

MARILIA GABRIELA – Quer dizer a nossa escola de Musicais passa necessariamente pela Americana porque eles são os pais da matéria. É isso? CHARLES MÖELLER – É eu acho que a gente já adaptou assim depois de tantos Musicais a gente já bebeu muito na fonte deles. Coisas que eu acho que eles realmente inventaram este gênero. É um gênero. É uma arte que nasceu com eles. De qualquer jeito, um jeito de produzir. E de deixar a coisa objetiva e não se perder muito tempo. Porque no Musical é diferente num teatro. Né!? Você ao pode perder muito tempo. Né?! Você ensaia estas 8 semanas, mas como a gente com 3 salas consecutivas. Para você chegar as 8 semanas, você tem que estar com todos os figurinos desenhados e alguns já mandados em confecção. Os cenários praticamente encaminhados para que tudo isto dê certo. É lógico que a fonte sempre serão eles, mas a gente já adquiriu um jeito muito próprio de fazer as nossas coisas.

O Fenômeno de “Cole Poter - Ele Nunca Disse que Me Amava”. O espetáculo foi um marco para a consolidação do gênero no país:

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MARILIA GABRIELA – Deixa eu terminar este bloco fazendo uma pergunta para você. Eu me lembro do... acho que o 1º espetáculo que eu vi de vocês... foi o Cole Porter? CHARLES MÖELLER – Pode ser. MARILIA GABRIELA – no Rio de Janeiro? CHARLES MÖELLER - Sim MARILIA GABRIELA - Não era o 1º de vocês? CHARLES MÖELLER – Não.

A parceria artística de Charles Möeller & Claudio Botelho foi efetivada em 1997, a partir de quando os diretores passaram a se tornar referência no teatro Musical do Brasil. O primeiro espetáculo da dupla, "As Malvadas" estreou naquele ano e era um tributo ao repertório das comédias Musicais com espírito de filmes B. (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.)

CLAUDIO BOTELHO – Mas foi onde agente apareceu! MARILIA GABRIELA – ...apareceu! É. CLAUDIO BOTELHO - Em 2000. MARILIA GABRIELA – Eu gostei demais. Não ouve quem não ficasse tocado por aquele espetáculo, mas me lembro que era ... desculpe... “pobrinho”. CHARLES MÖELLER – É! CLAUDIO BOTELHO – Sim! MARILIA GABRIELA – Era “pobrinho”, foi ali que vocês perceberam também que era o caminho certo ou ali é que vocês perceberam que havia um outro caminho a percorrer? CHARLES MÖELLER – Olha. O Cole Poter era um tapa buraco, assim... uma vontade nossa de fazer Musical. A gente tinha o teatro. A gente não tinha o dinheiro. A gente fez com dinheiro emprestado. Eu me lembro que eram 5000 reais . MARILIA GABRIELA – A não dá! Gente! Com 5000 reais em que ano? CLAUDIO BOTELHO – 2000..

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CHARLES MÖELLER – 2000. MARILIA GABRIELA- 2000 CLAUDIO BOTELHO – Era o que seria hoje uns... 50, 60 mil. MARILIA GABRIELA – ...Como se inflacionou o teatro! Hoje com 5000 mil reais você não passa na porta de um teatro para montar nada. CHARLES MÖELLER – Não. Nada! Era o Carlito na época administrava o Teatro de Arena e ele praticamente deu o espaço para a gente. E a gente fez uma cooperativa de amigos. Chamamos umas amigas, uns iluminadores, e .... CLAUDIO BOTELHO – E a gente ensaiava em casa.

No mesmo ano de 2000, Claudio Botelho recebeu o Prêmio Governador do Estado do Rio de Janeiro pelas versões que fez para o Musical “Cole Porter - Ele Nunca Disse que me Amava”. A sua montagem foi o grande divisor de águas que alavancou de vez a nova era dos Musicais no Brasil (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.):

MARILIA GABRIELA – Umas amigas talentosas. CHARLES MÖELLER – talentosa,. uns figurinos emprestados e era isso. E assim... eu me lembro que o Cole Poter foi uma coisa tão impressionante que a gente começou de sexta a domingo, e em 2 semanas a gente já fazia de quarta a domingo e recuperamos as matinês de sábado e de domingo e ficamos 3 anos em cartaz. E temporada de 3 meses em Portugal. Então aquilo deu um gás para a gente. Porque o teatro estava meio mendigo. Estava meio assim de sexta a domingo ou só sábado e domingo. A volta de todas estas sessões e matinês isto deu mais um respiro porque eu não aguentava mais escutar as pessoas, como a Bibi que falava: ah a gente fazia de terça a domingo, de quarta a domingo, a Fernandona (Fernanda Montenegro) falava de quarta a domingo, terça a domingo. E a gente estava muito de sábado a domingo e olhe lá né!?. Quando apareciam as pessoas. MARILIA GABRIELA – Que bom! CLAUDIO BOTELHO – e outra... os 5 mil foram um dinheiro bom

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CHARLES MÖELLER – Dinheiro bom (risos) ... que a gente pagou e devolveu, MARILIA GABRIELA – Vocês pagaram com lucro? Que dinheiro quente! CHARLES MÖELLER – Um lucrinho né!!! CLAUDIO BOTELHO - Com CDB. MARILIA GABRIELA – Olha! E foi ali que vocês souberam... CHARLES MÖELLER – ...Foi... MARILIA GABRIELA – ... souberam que dava pé fazer Musical? CHARLES MÖELLER – uma fatia do bolo que estava abandonada.

O Eixo Rio de Janeiro - São Paulo se tornou o pólo principal para o mercado de Musicais no Brasil:

MARILIA GABRIELA – E o Rio de Janeiro é o lugar que mais curte Musical no Brasil ou não? CLAUDIO BOTELHO – As 2 cidades. CHARLES MÖELLER - As 2 cidades. São diferentes. MARILIA GABRIELA – Rio e São Paulo!? CLAUDIO BOTELHO – Os movimentos são diferentes. MARILIA GABRIELA - OK! Eu quero falar desse movimento.

4.2.2. Segundo Bloco: Charles Möeller No segundo bloco Marilia Gabriela entrevista Charles Möeller que fala do seu contato com o Teatro de Revista e Neyde Veneziano, a maior estudiosa do gênero no País: MARILIA GABRIELA – Oh CHARLES MÖELLER, você sabe que lendo. Né. Estudando a seu respeito. Eu vi que você começou em Santos. E você foi dirigido por Neyde Veneziano, que é a maior estudiosa do Teatro de Revista no Brasil. CHARLES MÖELLER – É verdade. MARILIA GABRIELA – Vocês não têm vontade de fazer Teatro de Revista?

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CHARLES MÖELLER – Olha. Eu acho que o Teatro de Revista, ele é um ofício muito complexo. Eu acho que a Neyde é uma mulher perfeita para fazer esse tipo de espetáculo assim. O Teatro de Revista, ele é maravilhoso. Ele é quase um jornal, né; um jornal de época e que as notícias são dadas, é... tem os seus números de cortina, tem esses comediantes. É... é... Mas eu acho que precisa de um profissional bem gabaritado para fazer isso. Assim, eu acho, eu acho que eu não me sinto preparado para encarar um teatro de Revista como ele deve ser feito, como ele deve ser resgatado. A Neyde fez espetáculos lindos. Ela é uma mulher que sabe fazer isso.

Charles Möeller relata as suas angústias e as dificuldades de sua época que um ator enfrentava para se manter no mercado de trabalho:

MARILIA GABRIELA – Venha cá. Um pergunta... atrevida, mas eu vou fazer. Você fica frustrado de não ser ator, hoje em dia? CHARLES MÖELLER – Eu não fico frustrado MARILIA GABRIELA. Sabe porque? Porque a minha profissão como diretor, ela me deu tantas coisas. Assim, a minha profissão como ator era uma profissão, era um estado eterno de ansiedade assim. Um... MARILIA GABRIELA – Era isso? CHARLES MÖELLER – É. MARILIA GABRIELA – Era. Eu não sou bom. Que me parece que é o drama de todos os atores a vida inteira. Eu não sou bom o suficiente. Eu estou... Era isto? CHARLES MÖELLER – Era isto piorado. Porque eu acho que era assim.... Você... Eu fui para a Globo muito jovem. Eu fui para a Globo com 22 anos. E era uma época que não era, você não podia errar 350 vezes. Você tinha que fazer as novelas. Elas eram muito maiores. Era um esquema muito complicado. Então assim... E já com essa possibilidade de você já... é assim... você com 22 anos já fica se sentindo velho, porque tem um de 18 mais incrível chegando... assim sabe. E essa coisa do ator no país é muito complexo. Porque eu sempre brinco assim é... o ator, ele não tira férias, ele está

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desempregado, NE. Assim.... acabava uma novela. A novela durava um ano. Ótimo! Paguei as minhas contas. Você fica lidando com você gostando tanto, não gostando as vezes, porque é uma obra muito aberta. Então você não acerta todos os dias. Você não está bem em todas as cenas. E fica.... E no fundo você percebe que isso não é tão importante. Acaba uma peça, você está desempregado. Aquele eterno voltar para a fila era muito... MARILIA GABRIELA – ...doloroso....

Com o sucesso da dupla na direção e produção dos principais Musicais no país Charles Möeller acabou abrindo mão do seu trabalho de ator. Charles encontrou um porto seguro na direção:

CHARLES MÖELLER - ...doloroso. Eu acho que o envelhecer para mim como diretor me deu outra base. Me deu um plano de vida. Que como ator eu não tinha esse plano de vida. MARILIA GABRIELA – Então você nunca passou pela crise? CHARLES MÖELLER – Eu não passei pela crise porque a profissão de diretor me salvou. A profissão de ator ela... eu emendei muitas coisas assim. Eu lembro que eu emendava uma novela na outra, porque eu precisava trabalhar. E outra eu nunca deixei de fazer teatro. Então tinha brigas homéricas dentro das produções, porque eu não queria abandonar o meu lado de ator no teatro. As minhas peças como ator assim... eu fracassei em todas as peças assim. MARILIA GABRIELA – É mesmo? CHARLES MÖELLER – É porque as pessoas não iam. Eu fiz peças lindas com o Abujamra, lindas com o Gabriel (Vilella) MARILIA GABRIELA – Você foi dirigido por Gabriel, Abujamra, Bibi, quem mais? CHARLES MÖELLER – Bibi. Assim... eu tive muita sorte assim... eu tive assim... eu como ator pelo Takla... é assim... é eu pelo Antunes. Eu tive muita sorte como ator, porque eu sou de uma geração, eu tenho 45 anos.... e que todos esses grandes mestres... é eu estava no meio disso tudo, sabe assim. Então eu... acho bebi na fonte de todos...

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MARILIA GABRIELA – ...bebeu dessas fontes... CHARLES MÖELLER – E foi muito importante porque assim... é claro que assim... eu tenho... eu sou grato e são amigos queridos, ou a todos, porque eu acho que todos eles de uma certa forma contribuíram é para o ator e principalmente para o diretor que eu sou hoje. Assim todo o rigor do Antunes me traumatizou na época, mas o rigor do Antunes hoje é o rigor que eu levo a minha profissão então eu vejo claramente onde mora o Antunes dentro de mim assim onde mora o Abujamra dentro de mim.

A experiência do trabalho de ator com diretores renomados do teatro brasileiro foi fundamental para a construção da postura de Charles Möeller enquanto diretor de Musicais:

MARILIA GABRIELA – Mas você que trabalhou com diretores- diretores e atores-diretores, você é um ator-diretor você percebe um olhar mais generoso? CHARLES MÖELLER - Eu percebo completamente, porque por exemplo assim, eu como ator eu tinha horror a sentir medo enquanto eu... MARILIA GABRIELA -...era dirigido... CHARLES MÖELLER - ... era dirigido. Então assim... eu sei que por exemplo um processo de teatro existem 8 semanas. Eu preciso acarinhar o ator que está comigo, porque são 8 semanas. Ás vezes, a gente como ator, a gente tem uma péssima tendência a não entender que agente está em um processo. Que a gente não vai ter todas as respostas naquele minuto. Que a gente não vai conseguir escutar o que o diretor fala e realizar naquele segundo. A gente fica num estágio de ansiedade de poder realizar uma coisa...

À baixo ele explicita que as experiências mais significativas na vida são aquelas construídas com o passar do tempo. É durante o período de ensaio que o ator tem a possibilidade de se conhecer, de se revelar, de se reinventar, de se construir e principalmente amadurecer:

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MARILIA GABRIELA - ...que atrapalha CHARLES MÖELLER – que atrapalha. Porque eu acho que se você tem medo, você patina. E eu acho que se você tem uma ansiedade aquilo... eu sempre brinco com o meu elenco que parece aquela arara azul, que fica no teu ombro falando: “você está errado, você está errado, você está ruim”. Esse olhar de fora te atrapalha muito. Quando o ator, ele consegue ficar completamente pleno, a vontade, sabendo que hoje ele conseguiu aquilo hoje, e ele amanhã ele vai conseguir aquilo mais um pouco. Se ele entender que o método de criação ele é dia a dia. E o método de compreensão é sempre quantitativo, ele explode. Porque eu acho que o método de ator é igual à física. É de quantidade para qualidade. Se você pega água e põe no fogo, vai depender da quantidade daquele calor para aquele estado de água virar outra coisa. É exatamente o processo de ator. É preciso ter uma chama acessa, acender você de uma certa chama, para aquele estado líquido virar o gasoso. MARILIA GABRIELA - É muito bonito. Olha aí é . Também não só na física, na arte como na vida. CHARLES MÖELLER – Na arte como na vida. MARILIA GABRIELA - O acúmulo é que vai te dando, vai te trazendo conhecimento, a experiência a tranquilidade para você fazer a coisa direito.

Através do exercício da repetição o ator se treina, se desenvolve e se aperfeiçoa descobrindo novas possibilidades a cada novo dia de ensaio:

CHARLES MÖELLER – E a repetição, né. MARILIA GABRIELA – Repetição CHARLES MÖELLER – Repetição. A gente, os brasileiros, eles têm uma negação com a repetição. E é uma coisa que eu não admito assim. Nos elencos, eu faço eles repetirem a exaustão, porque quando você prende, você liberta.

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4.2.3. Terceiro Bloco: Claudio Botelho No terceiro bloco Marilia Gabriela entrevista Claudio Botelho que relata como foi o seu primeiro contato com o teatro e quando surgiu a sua paixão pelos Musicais: MARILIA GABRIELA – Mas o teatro veio para você lá em Minas Gerais?... CLAUDIO BOTELHO – ...Não... MARILIA GABRIELA – já com Música ou não? CLAUDIO BOTELHO – Não. Eu não sabia nem que existia. Eu gostava muito de música, do rádio. E de ouvir rádio. E a minha família é muito modesta e tudo. Então não tinha nem tanto acesso a discos. Era uma coisa até cara para a gente. É... mas gostava muito de música. E a minha ligação era totalmente com a música. O teatro apareceu com... no Rio de Janeiro ao ver o Sergio Britto pela 1ª vez num teatro.... MARILIA GABRIELA – Fazendo o quê? Se lembra? CLAUDIO BOTELHO – Fazendo “Papa Highirte”. MARILIA GABRIELA – Ah! CLAUDIO BOTELHO – Era o auge do governo Figueiredo. Acho que 78, talvez 79. MARILIA GABRIELA – Não vou saber que ano era. CLAUDIO BOTELHO – Para mim sim era forte, por causa disso eu estava saindo do Colégio São Vicente e fui... Ah vamos a um lugar chamado teatro. Não sabia nem o que era isso. MARILIA GABRIELA – Ah! CLAUDIO BOTELHO – E era “Papa Highirte”, do Vianninha com o Sergio Britto ali na minha cara e aquilo. Aquilo mudou a minha vida assim. Foi como eu... E tinha música por acaso na peça. E era uma peça muito forte. E o Sergio se tornou o meu amigo, meu professor.

Aqui é válido ressaltar que além do “gosto pessoal” e do “talento nato” que as pessoas costumam atribuir a um profissional de artes; antes mesmo de ele pensar em se dedicar ao teatro Musical, ele já estudava música tocando instrumentos Musicais

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como violão e piano, lendo partitura. O estudo, a dedicação, o envolvimento e o comprometimento dele com a Música foi fator determinante para ele se enveredar por este caminho e obter reconhecimento da qualidade do seu trabalho desenvolvido. A Educação é um investimento à longo prazo.

MARILIA GABRIELA – Mas você já cantava e tocava instrumentos até? CLAUDIO BOTELHO – Tocava violão, tocava piano. Sempre fui muito Musical e tocava tudo de ouvido. E fazia... e estudava um pouco também. Era música a minha coisa, mas o teatro, eu acho que o teatro quando chega perto da gente, ele toma um espaço muito grande, né. MARILIA GABRIELA – Nossa CLAUDIO BOTELHO - Ele passou até por cima da música. É eu acho que sim. Ele é muito sedutor, né, o teatro. Ele é...

MARILIA GABRIELA – É que você faz... você basicamente faz Musical? CLAUDIO BOTELHO – Sim! É... eu acho que eu tive essa... Eu comecei fazendo qualquer coisa que aparecesse. Principalmente a parte de música na peça das pessoas. Na peça do Sergio Britto tinha um lugar para alguém tocar piano. E era a minha maneira de me aproximar. Na peça do Ary Fontoura, foi o 1º a me dar um emprego de verdade. Eu com 19 anos escrevi canções para uma comédia do Ary Fontoura. E era ali que eu conseguia ficar perto do teatro. E ai eu entendi que havia um jeito que aquilo fosse um pouco melhor para mim. Além de fazer canção, era fazer daquilo um Musical, né. E existia Musical. E eu aprendi fazendo.

O ator Ary Fontoura convidou Claudio Botelho para musicar a peça "Moça, Nunca Mais", que ele estava fazendo. Claudio compôs as músicas, fez as letras e ganhava 2% da bilheteria do espetáculo, que foi estrelado por Suely Franco e chegou a viajar para Portugal. Ary tomou conhecimento do talento de Claudio quando este

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resolveu fazer uma adaptação do Musical "Oliver Twist". Como sabia que não podia usar as músicas originais, decidiu fazer sua própria versão de Oliver, para a qual Claudio compôs 20 músicas com letra e tudo. Tomou coragem e levou a adaptação para Ary, que elogiou a peça, e disse que gostaria de ouvir as músicas. (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.)

MARILIA GABRIELA – E você cantou a partir de quando? CLAUDIO BOTELHO – Cantar sempre.

Claudio Botelho revela que foi Miguel Fallabella quem o incentivou e o colocou cantando pela primeira vez em um espetáculo na montagem de “Um e Outro”. Um fato curioso é que, apesar de Ítalo e Miguel esta peça foi um grande fracasso. Segundo Claudio, nem dez pessoas em média iam assistir. (Tânia Carvalho. Charles Möeller e Claudio Botelho: Os Reis dos Musicais. 2009.)

MARILIA GABRIELA – Sempre? CLAUDIO BOTELHO – Mas não me sentia cantor. E ai comecei a achar que eu cantava direitinho. São muitas tarefas, né. E fui juntando um pouco as coisas. E tinha... eu sou um oportunista eu acho que... eu diria assim. Precisou de cantar, eu cantei. Nesse Musical aonde eu conheci o CHARLES MÖELLER, era... o Ítalo Rossi dizia poemas e eu em tese deveria tocar o violão. Mas o Fallabella estava lá e falou “canta uma coisa aí”. Eu cantei. Ele gostou e ficou, e foi ficando. Então eu virei cantor.

Como se dá a preparação do ator de Musical nos dias atuais na visão de Claudio Botelho por conta do sucesso do gênero no país:

MARILIA GABRIELA – Você acha que hoje, com o sucesso dos Musicais, os atores já estão se preparando mais para cantar e ser ator? CLAUDIO BOTELHO – Acho que a mudança é exponencial. Em 10 anos a mudança do 0 para o 80 por exemplo. MARILIA GABRIELA – É mesmo?

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CLAUDIO BOTELHO – É porque temos. Hoje a gente considera... Há 10 anos nós não poderíamos falar de um West Side Story no Brasil, né. E já tivemos. Não poderíamos falar de uma “Noviça Rebelde” onde todos cantassem. Tivemos. De “Um Violinista no Telhado” com um ator galã de televisão fazendo o papel e cantando as mesmas notas que o Topol (Chaim Topol) cantou nos anos 60 na Broadway. Nós estaríamos aqui falando disso? Não. MARILIA GABRIELA – Porque quem resolveu Zé Mayer? CLAUDIO BOTELHO – Quem o convidou? MARILIA GABRIELA – É. CLAUDIO BOTELHO – Nós, a gente já namorava o Zé Mayer MARILIA GABRIELA – Porque assim. Por causa do Musical que ele fez antes? CLAUDIO BOTELHO – Nem isso. Foi quando a gente fez “”. Já em 2001. O Zé foi assistir. Ou eu acho que foi a Verinha (Vera Fajardo), a mulher do Zé foi e falou: “Olha o Zé canta!”. Aí os loucos. Nós, Eu e o CHARLES MÖELLER loucos falamos: “Se ele canta então nós vamos fazer Follies com ele.” Loucos, nós queríamos fazer Follies, que é um Musical dificílimo. E aí ligamos para o Zé na cara de pau assim: “E você não que fazer um negócio chamado Follies e tudo?”. Aí ele foi até um teatro, o Café Pequeno, que a gente administrava na época e cantou para a gente. E a gente tomou um susto. E ele cantava muito. É musicista. Lê música e tudo. E Follies não saiu. E esse namoro continuou. A gente chamou ele para a “Ópera do Malandro”, ele não pode e aconteceu no “Violinista” e acho que aconteceu no lugar certo.

Mais uma vez pode-se constatar que o estudo, que a formação em música ajudou o ator José Mayer a passar no teste, realizado pelos diretores no Teatro Café Pequeno, e conquistar um papel de destaque, vivendo o personagem principal em um Musical. Não foi a fama de “galã” de novelas a porta de entrada dele neste gênero dramático, mais sim o estudo da música, do canto.

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MARILIA GABRIELA – Você também é uma coisa excepcional. Você é um adaptador-tradutor. Compositor Musical você já falou que é. É... música e literatura sempre estiveram presentes no seu trabalho me parece. É isso? Porque como é que você vira um adaptador? Como é que se pega um texto e faz? Você já ganhou prêmios por isso. Como é que dá para pegar um texto e saber como é ele vai soar semelhante em outro idioma completamente diferente? Você tem que ter a literatura na cabeça e na alma. Não é isso?

Atualmente o Teatro Musical no Brasil segue duas linhas: versões e / ou adaptações dos Musicais Norte-Americanos e Musicais Biográficos sobre compositores e cantores brasileiros, onde se associam acontecimentos marcantes da vida do personagem em destaque ao repertório Musical mais expressivo de sua carreira ou se criam uma nova história, independente da vida da personalidade em questão, se apropriando somente de seu repertório Musical.

CLAUDIO BOTELHO – Acho que você tem que ser letrista antes de mais nada. E eu tenho uma paixão muito grande por letras, por Chico Buarque. Eu acho que eu aprendi a gostar de música, de boa música por causa do Chico e das letras do Chico. Me sinto muito influenciado por isso. É... e ao entender que alguém precisava escrever as letras em português pro Cole Poter. Para aquele espetáculo que você viu. Eu falei: “Eu vou tentar.” E foi assim que eu... foi absolutamente tentativa e erro. E eu tenho uma coisa de fazer cantando. Imaginar como aquilo vai soar. Eu tenho é... acho que esta vantagem talvez de ser uma pessoa que canta. E ficar imaginando: “Isso vai soar estranho. Parece traduzido.” Então eu acho que eu tenho o despudor de dizer que as minhas letras não parecem traduzidas... MARILIA GABRIELA – ... E não parecem mesmo. CLAUDIO BOTELHO - ...Elas precisam soar como se fossem escritas por alguém nosso. MARILIA GABRIELA – Precisam caber na melodia. CLAUDIO BOTELHO – Sim.

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MARILIA GABRIELA – Por que a sensação que a gente tem, quando a coisa é mal traduzida. É que a letra não está cabendo na música. Não é isso? CLAUDIO BOTELHO – E que a maneira de falar é diferente da maneira de cantar, né. Tudo parece... eu não estou julgando a letra de ninguém, nem outros espetáculos, mas pode parecer que você inseriu um corpo estranho dentro da peça. Quando a letra não bate, né.

Uma das vertentes do teatro Musical no Brasil são as versões e / ou adaptações dos Musicais Norte-Americanos. Claudio Botelho é bastante respeitado e elogiado pela crítica especializada pelo o seu trabalho como tradutor de Musicais. As versões dos principais espetáculos de teatro Musical apresentados no Brasil nos últimos anos foram feitas por ele. No entanto há um déficit de compositores brasileiros voltados para o teatro Musical, mas com o crescimento deste segmento no mercado consequentemente despertará o interesse de alguns e surgirão novos compositores:

MARILIA GABRIELA – Agora. Porque é que nós temos tantos espetáculos importados? Porque não existe uma autoria brasileira na atualidade para Musicais? CLAUDIO BOTELHO – Acho que Musical é principalmente, como o nome diz, música. É o Musical americano existe porque houve um Gershwin, um Cole Poter, um Richard Rodgers basicamente houve compositores. No Brasil nós tivemos no início do século a Chiquinha Gonzaga, o Ary Barroso. Essa gente escreveu para o Musical, parou. O Gênero não evoluiu. Ele voltou a funcionar nos anos 60 e 70 com o Chico, o Edu Lobo que também pararam de escrever para o teatro, ou não se interessam ou esse mercado não existiu. E é por isso que a gente não tem essa dramaturgia. Acho que a gente vai construí-la agora de novo. MARILIA GABRIELA – Acho que sim. Como se construíram, como tem se construído os atores de Musicais? CLAUDIO BOTELHO – Sim. MARILIA GABRIELA - Você acha que estão surgindo tentativas de autoria?

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CLAUDIO BOTELHO – Eu acho que sim. Nós tentamos com um espetáculo chamado “7”, que nós fizemos junto com o Ed Motta. Então o nosso foco era que... MARILIA GABRIELA – E fez sucesso CLAUDIO BOTELHO – Fez! Fez muito sucesso. Ganhou todos os prêmios. Nós ganhamos o APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes). Eu acho que é uma coisa rara ganhar uma dupla de diretores de Musical, hoje em dia, ganhar um prêmio tão importante quanto o APCA por conjunto da obra, por causa do “7” inclusive. A gente trouxe o Ed Motta e dissemos: “Você precisa escrever canção de teatro.”. E era deslumbrante o trabalho dele. Eu fiz as letras. É... e acho que essa é a maneira de você fazer Musical. Porque você precisa ter um compositor, senão não existe teatro Musical.

Diferenças entre os Movimentos do Teatro Musical em Rio de Janeiro e São Paulo e as dificuldades de transportar toda a produção de um espetáculo:

MARILIA GABRIELA – Agora. Quando eu perguntei assim: “Quem gosta mais é o Rio de Janeiro é que gosta mais de Musicais?” Você virou... vocês 2 falaram assim: “Os 2!”. Os 2 você resumiu a São Paulo e a Rio de Janeiro. Eu quero saber se reside nessa resposta a dificuldade de viajar com o Musical? Você disse que são 70 pessoas para montar um espetáculo todos os dias. Não é isso? Estou imaginando em cena e fora dela. CLAUDIO BOTELHO – Sim. MARILIA GABRIELA – Cenários, tudo,... CLAUDIO BOTELHO – ...Orquestra... MARILIA GABRIELA – ...Figurinos, orquestra. Isso inviabiliza viajar o espetáculo? CLAUDIO BOTELHO – Se você quer viajar com a qualidade de onde ele nasceu sim. Eu acho que a gente vai evoluir. Os próprios Musicais americanos viajam, mas eles têm um sistema que chama Broadway Tour. Que ele foi inventado até por um sujeito que a gente conhece hoje em dia. É um cara chamado Becker (Rob Becker). Que

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criou uma coisa que você coloca no caminhão, ele viaja, ele entra e o ator chega depois e só entra em cena. Mas isso levou anos. Antigamente também não se viajava. É... nós não conseguimos fazer isso ainda. Até porque para você montar “Um Violinista no Telhado” você precisa de 10 dias num teatro. É... e nenhum teatro em Belo Horizonte ou em... MARILIA GABRIELA – Tem essa disponibilidade? CLAUDIO BOTELHO – É assim. Eu posso ficar... bloquear um teatro por 10 dias. Você não consegue explicar para os donos de teatro. Ainda somos índios nesse sentido. Já crescemos demais. É... eu não estaria aqui com essa honra de falar com você, se a gente não tivesse evoluído tanto. Mas ainda tem muita coisa pela frente.

Claudio Botelho explica muito bem a diferença entre versões, adaptações e franquias de Musicais e a liberdade que os diretores têm com relação à recriação dos espetáculos estrangeiros em solo brasileiro:

MARILIA GABRIELA – Agora oh CLAUDIO BOTELHO é... você... qual é a sua liberdade, quando você vai montar um espetáculo importado. Porque eu sei que vocês trazem, bom quase sempre, vem uns técnicos dos Estados Unidos para verem tudo, do cenário ao elenco. É isso? CLAUDIO BOTELHO – Não, não. São 2 maneiras... quer dizer, existem várias maneiras de fazer, mas os Musicais, chamados Musicais da Broadway você pode fazer o que é feito por exemplo pela Time For Fun, que é onde eu trabalhei anos e fiz “O Fantasma do Ópera”, “A Bela e a Fera” “Les Meserables”, “Chicago”, fiz tudo montado por estrangeiros. Essa é uma maneira do que você chamaria de “franchising” ou “réplica”. O que nós fazemos é a gente compra os grandes direitos que são: música, letra e texto, e nós fazemos o que queremos. Não tem ninguém supervisionando. MARILIA GABRIELA – Ah! É mesmo assim?! CLAUDIO BOTELHO – O meu e do CHARLES MÖELLER, nós nunca fizemos réplica.

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MARILIA GABRIELA – Então o que a gente vê desses que vem de fora e que está na mão de vocês é a versão dos 2? CLAUDIO BOTELHO – É a nossa versão. É como se fosse “A Gaivota” do Tchekhov por exemplo. Entendeu?! Você tem “A Gaivota” do Lavelle (Jorge Lavelle), “A Gaivota” do... Infelizmente aqui tem “O Violinista no Telhado” de CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. É no caso do “Violinista”, por exemplo, faz parte do obra a coreografia do Jerome Robbins. Montar aquilo sem essa coreografia me parece montar a Sinfonia de Bethoveen com outra orquestração. MARILIA GABRIELA – Entendi. CLAUDIO BOTELHO – A coreografia do Jerome Robbins também é replicada. Porque vem um guia para você fazer. Mas a nossa “Noviça rebelde” é a nossa. Não existe. O nosso “Mágico de Óz” inclusive nunca foi feito na Broadway. Está em cartaz ainda no Rio. Essa é uma montagem ainda inédita, né. MARILIA GABRIELA – E “O Mágico de Óz” é um antigo espetáculo? CLAUDIO BOTELHO – É um espetáculo de 39, né. MARILIA GABRIELA – De 1939! CLAUDIO BOTELHO – Foi um filme, né. MARILIA GABRIELA – É... o filme bom... CLAUDIO BOTELHO – Ele não era uma peça. MARILIA GABRIELA - .... o Filme é... CLAUDIO BOTELHO - Pois é aquilo foi criado para o filme, né. Ele nunca foi um Musical de teatro. Foi antes, mas com outras músicas. Ao virar filme, ele não chegou a Broadway. Ele teve uma temporada no Madison Square Garden até com o Mickey Rooney fazendo o Mágico. E tem uma montagem em Londres agora, mas que é uma montagem híbrida, porque ela tem músicas do Andrew Lloyd Webber, versão dele do “Mágico”. A nossa versão é a única baseada no filme.

Mesmo com o sucesso da dupla na direção e produção dos principais Musicais brasileiros Claudio Botelho, ao contrário de Charles Möeller que abriu mão do

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seu trabalho de ator, fala que não conseguiu abdicar do ofício e da experiência de atuar em personagens “menores” em suas próprias produções:

MARILIA GABRIELA – Para terminar esse nosso bloco eu quero fazer a pergunta diferentemente para você. O CHARLES MÖELLER se encontrou. Ele se definiu pela direção. Fazer o que ele faz. E explicou muito bem porque. Você continua atuando? CLAUDIO BOTELHO – Eu.. eu.... MARILIA GABRIELA – pelo menos foi quem atuou mais desde que a dupla se formou? CLAUDIO BOTELHO – Por ironia né! MARILIA GABRIELA – É você que tem atuado mais. Por quê? É uma escolha sua? CLAUDIO BOTELHO - Eu morro de vontade de fazer mais. Não faço porque não dá tempo. Acho que o meu ofício é ficar por trás. É escrever as letras. É trabalhar na produção. Dirigir e brincar com a música, mas adoraria poder fazer mais. Mas acho que é apenas vaidade. Então às vezes eu deixo para lá. E prefiro trabalhar para que a gente consiga fazer mais espetáculos. Ma sou... adoro ficar em cena. Adoro poder cantar e adoro toda a oportunidade que eu tenho de inventar uma coisa que seja para mim. Nunca fazer uma coisa que não pareça comigo. Mas se tiver uma coisa meio Gosh, meio onde eu possa me expressar. Eu adoro fazer. MARILIA GABRIELA – Como que é mesmo que é feito para você, por exemplo? CLAUDIO BOTELHO – Por exemplo, “Company” é um personagem cinzento, né?! Ele fica em cena. Ele é o principal, mas ele mal fala. Então eu acho... eu poderia... eu fiz Company. MARILIA GABRIELA – Você é um cara tão eloquente. CLAUDIO BOTELHO – É. MARILIA GABRIELA – Você é tão preparado. Porque você fala: eu quero estar em cena, mas sombriamente de alguma maneira? É isso que você está falando?

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CLAUDIO BOTELHO – É... talvez eu esteja sendo modesto, né mas eu acho que é... eu tenho um pouco de medo de pessoas que por terem o poder. Eu tenho o poder de decisão, né?! Atualmente eu tenho 47 anos, consegui construir algumas coisas e posso dizer: “Vou montar West Side Story e eu sou o Tony”. Porque isso existe na nossa profissão, né?! MARILIA GABRIELA – Eu entendi agora. CLAUDIO BOTELHO – As pessoas são Hamlet. Não é isso?! Elas são um monte de coisas, né?! Eu tenho muito medo “de pagar esse mico”. Então eu prefiro ficar sendo o “Nacinho”, o “Cinzento” e tudo. E aí eu me divirto do mesmo jeito né.

4.2.4. Quarto Bloco: Charles Möeller e Claudio Botelho No quarto e último bloco Marilia Gabriela entrevista a dupla junta novamente Charles Möeller e Claudio Botelho. Charles Möeller começa revelando as dificuldades técnicas de se montar uma superprodução como o espetáculo “O Mágico de Oz”: MARILIA GABRIELA – Olha aqui... Qual foi o espetáculo ah... mais complicado, para vocês, nos detalhes, até ficar pronto? Qual foi? CHARLES MÖELLER – O Mágico de Oz. MARILIA GABRIELA – O Mágico...Porque? CHARLES MÖELLER – Porque a gente teve que lidar com equipes diversas em 8 semanas. Tinha equipe de voou, equipe de efeito especial, equipe de pirotecnia, equipe de 3 cachorros. Foi um cronograma de produção muito complexo. O Mágico ele é a verdade um espetáculo de poucos personagens, mas com muitos bailarinos. É um espetáculo que é quase um roteiro de cinema. Ele nunca volta para um lugar. Ele começa no Kansas e acaba no Kansas. O meio disso é uma Zona. Inclusive tem um tornado no meio. MARILIA GABRIELA – Tem um tornando é?!. Eu ainda não vi o espetáculo. Vocês conseguiram fazer um tornado lá? CHARLES MÖELLER - Existe um tornado? CLAUDIO BOTELHO – Um tornado. MARILIA GABRIELA – É? E não é o ”Tony”?

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Aqui Marília faz uma brincadeira se referindo ao Antoinette Perry Awards for Excellence in Theatre ou mais comumente Tony Award, é o nome do maior prêmio dado no teatro dos Estados Unidos, equivalente ao Oscar no cinema, Grammy na música e Emmy na televisão, entregue pela American Theatre Wing em cerimônia anual na cidade de Nova Iorque. CHARLES MÖELLER – Não CLAUDIO BOTELHO - Seria bom fazer um “Tony”. A dupla explica como será o futuro das produções dos Musicais no Brasil com a nova parceria feita com a GEO Eventos e como será a sua participação na administração do Teatro GEO:

MARILIA GABRIELA - Este é um tornado. Olha aqui. Eu li também que vocês estariam fechando uma cede em São Paulo. Que seria o Teatro GEO. É verdade isso? CLAUDIO BOTELHO – Nós somos é..., atualmente, é...contratados da Geo. Somos parceiros da Geo Eventos, que é um braço das Organizações Globo.

A GEO Eventos é uma plataforma das Organizações Globo que atua nas áreas dos esportes, de entretenimento ou de encontros de negócios ao vivo.

MARILIA GABRIELA – Que é um teatro maravilhoso, que foi inaugurado com o Fagundes e o Takla CLAUDIO BOTELHO – com o Fagundes e com o Takla

No dia 30 de março de 2012, a casa de espetáculos abriu para o público, com a estreia da peça "Vermelho", protagonizada por Antonio Fagundes e seu filho Bruno, com texto de John Logan e direção de Jorge Takla. Mas antes disto, no dia 19 de março de 2012 o teatro foi aberto, em cerimônia só para convidados, sendo embalada por show de Arnaldo Antunes, Marcelo Jeneci e Tulipa Ruiz. (Gustavo Fioratti, 2012)

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MARILIA GABRIELA – e o Takla, e fica no Instituto Tomie Ohtake. CLAUDIO BOTELHO – Isso. Esse teatro, ele então, de certa forma, a gente passa a dirigir o teatro artisticamente já parceiros. MARILIA GABRIELA – Você está falando: vão ser curadores? CHARLES MÖELLER – É. CLAUDIO BOTELHO – De certa forma. Curadores dos Musicais que vão acontecer. Que tem muitos eventos e tudo. Mas dos Musicais certamente. Vamos estrear lá “Como vencer na vida sem fazer força”, que é essa minha peça do coração.

A ideia de criar um Musical em homenagem a Milton Nascimento surgiu em 2005 e só começou a ganhar forma em 2011. Estreou no dia 9 de agosto de 2012 no Theatro Net Rio e chega a São Paulo só em maio de 2013. A produção, que não possui “marcas circenses” nem coreografias, foi definida pela dupla como "caseira e simples". O espetáculo contrasta com o gigantismo de montagens como "O Mágico de Oz" e marca a estreia da parceria com a GEO Eventos. Antes Charles Möeller e Claudio Botelho produziam os seus espetáculos em parceria com a Aventura Entretenimento. (Marco Aurélio Canônico. 2012)

MARILIA GABRIELA – E Milton Nascimento? CLAUDIO BOTELHO – Milton Nascimento CHARLES MÖELLER – O Milton foi um assim, na verdade, uma paquera antiga. Né?! A gente tinha um projeto de fazer um espetáculo que ele seria o autor chamado “O Último Trem” é... há muitos anos atrás. E esse projeto foi, entrou numa entre-safra e isso foi meio esquecido. A gente fez os “Beatles”. O Milton enlouqueceu com os “Beatles”. Ele assistiu os “Beatles” 8 vezes. E a gente ficou vamos retomar esta parceria. Vamos retomar o espetáculo com a gente. Acho que era o aniversário de 50 anos de carreira dele. E a gente está muito feliz de fazer. O espetáculo chamado “ Nada será como antes”. E com um “elencasso”. E a gente está estreando agora. Né!

O texto de “Milton - Nada Será Como Antes - O Musical”, veio exclusivamente das canções para homenageá-lo e foi elaborado de um ponto de vista

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teatral. A ideia básica era não contar a vida de Milton Nascimento. Para que a produção tivesse cara de teatro e não corresse o risco de parecer um show, uma história foi criada em cima da obra, e não em sua vida. É uma outra possibilidade cênica de se fazer um Musical baseado no repertório de um cantor-compositor de sucesso aclamado pela crítica e pelo grande público, e que confirma uma tendência nas produções brasileiras em priorizar uma temática mais nacional ao invés de importar espetáculos da Broadway. (Marco Aurélio Canônico. 2012)

Charles Möeller aponta o “possível segredo”, o principal fator que desencadeou o sucesso da dupla e a longevidade de sua parceria com Claudio Botellho; parceria esta que já dura mais de 15 anos a frente dos principais Musicais produzidos no país e mais de 20 anos de trabalhos realizados juntos:

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MARILIA GABRIELA – Agora... porque é que vocês brigam? CHARLES MÖELLER – Eu acho que o sucesso da dupla, vamos dizer assim, acho que está no atrito. Acho que a gente ainda tenta se provar muito um com o outro assim. Eu acho que seria muito difícil a gente está no nosso 32° espetáculo MARILIA GABRIELA – Nossa... que maravilha isso! CHARLES MÖELLER – É. E se você... MARILIA GABRIELA - Maravilha e que drama! CHARLES MÖELLER – É... e eu acho que na verdade assim, se você não tem ainda esse atrito né... para andar, para provar. Eu ainda me sinto... é.... no dever de me superar, para mostrar para o CLAUDIO BOTELHO que eu posso melhorar e eu acho que vice-versa. A gente ainda é... MARILIA GABRIELA – O vice-versa é verdade? CLAUDIO BOTELHO – É verdade. Mas as brigas são todas... MARILIA GABRIELA – Você também tenta se provar para ele? CLAUDIO BOTELHO – O tempo inteiro. E as brigas eu acho que são... brigas artísticas. São de bater porta. Porque acha que o ator devia entrar pela direita. Não é pela esquerda. E isso gera um atrito mesmo. CHARLES MÖELLER – E eu acho que tem uma coisa bacana e eu acho até como o jeito que a gente encara a nossa profissão, é sempre um pouco, é tudo é uma questão de vida ou morte. Então, ás vezes assim, quem está de fora não acredita que a gente está brigando, quase se enfartando por causa de uma marca, por causa de uma palavra na versão dele, porque eu botei o ator sentado antes e não devia, é assim, são brigas e eu acho que é essa, a gente aprendeu a brigar bem. É todo mundo pergunta qual é o segredo desta longevidade eu acho a gente é bom de briga.

A dupla Charles Möeller e Claudio Botelho, no final da entrevista, mostra a total dedicação e devoção que os dois têm com os Musicais, uma vez que até mesmo nas

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férias a diversão é assistir aos Musicais da Broadway em Nova York e do West End em Londres: MARILIA GABRIELA – Vocês são bons de briga e vocês devem ter férias um do outro também ou não? Ou quando vocês têm férias vão os 2 procurar espetáculos um para o outro mundo a fora? CHARLES MÖELLER – É tipo isso. MARILIA GABRIELA – É isso? CLAUDIO BOTELHO – É uma vida boba. Né. MARILIA GABRIELA – Que coisa horrorosa. CLAUDIO BOTELHO – É férias é Nova Iorque ou Londres para assistir Musical. MARILIA GABRIELA – É o que vocês fazem? CHARLES MÖELLER – É. CLAUDIO BOTELHO – Ãh. Infelizmente ou felizmente. Que tem alguma coisa melhor do que ver Musical!? MARILIA GABRIELA – Não. Eu acho que não. CLAUDIO BOTELHO - e sair toda noite para jantar depois?! Deve ter. CHARLES MÖELLER - Lógico MARILIA GABRIELA – Não. Eu acho que não. MARILIA GABRIELA – Olha! Muito bom ver vocês. Levamos 9 anos para esse encontro profissional aqui. Quero dizer. Aquele outro nosso a gente vai combinar depois. E eu quero saber de vocês hoje a frase, o ditado, pensamento ou o verso do dia. Quem começa? CLAUDIO BOTELHO – Antes só do que mal acompanhado. CHARLES MÖELLER – A vida é muito difícil para ser levada a sério.

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CAPÍTULO V ENTREVISTA COM REINER TENENTE PELO SITE MR. ZIEG

5.1. O Site Mr. Zieg

O site Mr. Zieg é especializado em Teatro Musical e foi criado por profissionais de diferentes áreas ligadas a este gênero. No ar desde fevereiro de 2012, o site já começou a ser conhecido como o ponto de encontro dos interessados pelo teatro Musical e proporcionam uma comunidade virtual para discussão do gênero que mais cresce atualmente no Brasil. Nele pode ser encontrado todas as notícias sobre as produções em cartaz no Brasil, além de novidades da Broadway, West End e muito mais. Alem disso o site oferece informações especializadas, com uma abordagem moderna e prática, sobre Musicais e serviços para os profissionais de Teatro Musical e para aqueles que pretendem ingressar no mercado: atualizações sobre casting, workshops, audições, cursos e escolas especializadas para aperfeiçoamento profissional.

O nome do site é uma homenagem ao célebre empresário Florenz Ziegfeld nascido em Chicago no ano de 1867, e que se tornou o maior produtor de teatro de Nova Iorque nas primeiras décadas do século XX e que ficou conhecido como o “Criador de Estrelas”. Inspirado no Teatro de Revista francês, Florenz Ziegfeld ficou conhecido por produzir espetáculos suntuosos recheados de glamour e brilho, com grandes e exuberantes cenários, efeitos especiais e elencos numerosos. Seus espetáculos se tornaram referência para as megaproduções teatrais que vieram depois, como as que vemos hoje na Broadway e em todo o mundo.

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5.2. O Entrevistado: Reiner Tenente

O ator Reiner Tenente, uma das revelações mais recentes do Teatro Musical brasileiro, foi entrevistado pelo site Mr. Zieg. O texto foi publicado em 26 de maio de 2012 e escrito por Beatriz Lucci, que assina com o pseudônimo de Madame Brice. Beatriz Lucci é atriz, cantora e bailarina. Ela leciona técnicas para teatro Musical e audição com especialização em Acting Your Song. Já o ator Reiner Tenente tem recebido desde 2011 inúmeros elogios pela crítica especializada ao seu sólido trabalho no bem-sucedido Musical Tim Maia – Vale Tudo, ao lado de Tiago Abravanel e interpretando duas das figuras mais emblemáticas da cena Musical brasileira, o cantor e compositor Roberto Carlos e o escritor e produtor Musical Nelson Motta. Na matéria ele relata fatos da história do Teatro Musical e do Teatro Brasileiro em geral. Por conta de sua experiência profissional no mercado de Musicais, também falou sobre a importância da formação dos profissionais deste segmento, sobre ética profissional e anunciou em primeira mão a inauguração do IBTM (Instituto Brasileiro de Teatro Musical) sediado no Rio de Janeiro e que promete mudar o panorama da formação de atores, cantores e bailarinos no Brasil.

Reiner Tenente é um ator, cantor e arte educador. Formado em Artes Cênicas (Interpretação e licenciatura), pela UniRio (1998/2004) e pós graduado em Preparação corporal nas artes cênicas na Faculdade Angel Vianna onde teve sua pesquisa voltada para ação física e vocal no teatro Musical com um olhar pedagógico. Já fez diversos cursos e aulas com profissionais renomados, como Ana Achcar (interpretação), Mirna Rubim , Danilo Timm e Anna Federecci na Suécia (canto) além Elaine Petricoff e Christian Flescher da AMDA (teatro Musical) e Flavio Salles (sapateado) entre outros Nos Estados Unidos fez curso de interpretação no California Institute of Arts. Professor de teatro Musical no curso de extensão da Univercidade (2010 e 2011) e no SESC Escola em 2011. Entre suas mais importantes experiências teatrais estão o espetáculo “A Erosão de Eros”, de Carmen Moreno, com direção de Fidel Reis; e o espetáculos Musicais “Roda Viva” de Chico Buarque com direção de

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Patricia Zampiroli e supervisão de Andre Paes Leme, “Tip e Tap ratos de sapato” com direção de Ronaldo Tasso e musicas de Tim Rescala e “Tim Maia –Vale Tudo – O Musical” com direção de João Fonseca e texto de Nelson Motta além de performances como ator cantor e dançarino no Grona Lund Tivoli Park em Estocolmo –Suécia.

5.3. A Entrevista Comentada

Num primeiro momento ele fala sobre a sua formação pessoal procurando se direcionar para o gênero e como o ator brasileiro se prepara estudando para os espetáculos Musicais: MR. ZIEG: Com tantos anos de carreira e intenso investimento pessoal no mercado do Teatro Musical, como você vê o ator desta área no Brasil? REINER TENENTE: Eu estou em processo de produção da minha monografia para o meu curso de Pós-Graduado em Preparação Corporal nas Artes Cênicas e o foco dessa monografia está em um olhar pedagógico sobre o ensino do Teatro Musical, então eu estou desenvolvendo esta visão do panorama da formação dos atores através de experiências que eu tive tanto como ator quanto como arte educador. Eu dou aula desde os 18 anos, então já dou aula há bastante tempo (risos) e eu pude experimentar algumas coisas. Eu tenho feito pesquisas com os meus alunos de uns 3 ou 4 anos pra cá e eu fui instigado a fazer essa pesquisa por vários motivos. Um é porque não existe ainda essa sistematização para formar atores de Musical no Brasil. Geralmente, nossos atores têm que ir pra fora para adquirirem formação nessas três áreas abordadas pelo Teatro Musical. Já tem pouco mais de 10 anos desde o retorno definitivo do gênero no Brasil e já somos o terceiro país que mais produz Musicais no mundo. E apesar de as pessoas falarem que já tem muita gente preparada para o mercado no Brasil, ainda estamos bem aquém do nível de qualidade que o brasileiro realmente pode alcançar. O Teatro Musical sempre foi colocado à margem por vir de uma cultura popularesca, então os intelectuais sempre menosprezaram a nossa arte por ela supostamente

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ocupar o lugar das ‘grandes manifestações artísticas’ como a ópera, por exemplo. Por isso, o Teatro Musical tende a entrar no lugar do entretenimento, só que nós não podemos esquecer que Teatro Musical é, antes de tudo, teatro! Nós não podemos ter apenas virtuoses em cena, senão a gente só confirma o lugar do entretenimento pelo entretenimento.

Reiner também explica a diferença que existe entre as exigências que os mercados brasileiro e americano fazem para os profissionais desta área. Muitos diretores de Musicais atuais compartilham a hipótese de que é mais fácil trabalhar com cantores profissionais que estão começando no Musical e ensinar a eles as técnicas do gênero, pois no Brasil quase não existe grandes atores que cantem bem. Isto se deve ao fato do gênero ter passado muito tempo sendo ignorado no país. E por este mesmo motivo raramente os atores estão preparados para esse tipo de espetáculo:

MR. ZIEG: E isso se confirma no seu próprio trabalho no Musical Tim Maia… REINER TENENTE: (Risos…) Obrigado! Isso é um elogio! Mas é o que eu tento fazer! O meu diretor (João Fonseca) esteve em Nova York e me disse: “Reiner Tenente, cantar e dançar todos já fazem! Lá, os caras têm que provar que são bons atores”. Aqui no Brasil, priorizamos quem canta, se não atua, dá-se um truque.

Aqui ele salienta a importância de um ator questionador e consciente do seu papel social enquanto artista criador. Também alerta sobre os riscos do ator extremamente técnico e que, consequentemente, não dá a devida atenção à qualidade crítica - reflexiva inerente a sua formação:

MR. ZIEG: Então como você vê essa balança entre técnica e o talento, o dom natural? REINER TENENTE: O ator de Teatro Musical tem que ter um domínio técnico muito grande! Mas se ele tiver só o domínio técnico, ele vira o que eu costumo chamar de marionete do diretor. O cara não

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propõe, não cria, não tem senso crítico, nem poder de análise, nem questionamentos. O teatro é arte! E a arte tem uma função. A arte não pode só divertir, precisa fazer sentir, fazer pensar, precisa instigar, precisa ser transformadora! Então o Musical tem esse grande poder de ser transformador, até porque ele usa de cara três vertentes: dança, canto e teatro. Portanto temos ainda mais armas para cumprir essa função transformadora da arte do que o teatro, a dança e a música isoladamente. Mas por alguma razão, no Teatro Musical, essa função nem sempre está sendo cumprida! E não é porque o espetáculo não é bom, a dramaturgia não é boa, a música não é boa, mas porque o ator, muitas vezes, tende a ser apenas um virtuose. Ele se armou de aparatos técnicos, foi preparado pra fazer aquilo, se enfiou numa aula de canto, se jogou na aula de dança, fez um curso de interpretação aqui, outro ali, mas não cumpre verdadeiramente o ofício do ator que deveria ser à base de tudo que ele faz num palco! Hoje nós quase não temos teste de interpretação nas audições de Musicais! E foi isso que me instigou nessa pesquisa! Eu sou, antes de tudo, ator. Depois eu fui estudar canto e dança para poder fazer o que eu sempre fui apaixonado: Teatro Musical. Desde antes de existir mercado eu já era completamente apaixonado por isso, então o que existisse eu queria estar fazendo, mesmo que eu precisasse criar meu próprio espetáculo ou a minha própria linguagem.

Reiner também relata como foi o seu processo de criação com o auxílio de uma “coach”, preparadora de atores, para a construção dos seus personagens no Musical. Através da sua pesquisa pessoal pontua a diferença do trabalho de um ator para um humorista imitador: MR. ZIEG: No Musical Tim Maia você faz vários personagens, mas tem dois deles que o público reconhece e responde prontamente, que são o Roberto Carlos e o Nelson Motta. Como foi o processo de criação e pesquisa para a preparação destes personagens? REINER TENENTE: Eu vou falar uma coisa que, na verdade, eu acho que ninguém sabe. Vocês vão ser os primeiros à saber. O único que fez teste para o Musical foi o Tiago (Abravanel) com outros possíveis

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atores para o papel do Tim. O restante todo do elenco, foi convidado. E o João (Fonseca – diretor) não sabia quem ia fazer o que. Quando ele me ligou, ele disse que queria me ver e ver se eu era capaz de desenvolver o que ele queria e citou nessa ligação o Roberto Carlos. Na hora que ele desligou, eu pensei ‘Ele vai me fazer imitar o Roberto Carlos!’, então eu corri para uma preparadora de atores e fiz um trabalho com ela muito rápido e específico em que nós fizemos uma pesquisa juntos para trazer a voz do Roberto, até porque eu não queria imitá-lo. Eu não sou humorista, imitador, eu sou ator! E eu precisava fazer este personagem ser verdadeiro o bastante para chegar na plateia e ajudar a contar esta história, então eu não podia ficar na caricatura. Teve gente que me elogiou usando o termo caricato depois que viu o Musical. Eu nunca vi como crítica negativa. A Veja até fez uma matéria com o título Emoções Sim, Caricatura Não. Eu não acho ruim a questão do caricato, contanto que a verdade esteja ali. Se tem verdade, se tem força, não tem nenhum problema a caricatura. Acho até divertido (risos). E aí eu fiz essa pesquisa rápida e dois dias depois a produção estava me ligando para negociar cachê. Uma semana depois começamos a ensaiar e ainda não tinha nada definido, então o João colocou cada um de nós para ler um personagem e eu li o Roberto e acabou rolando. Aí eu fui pesquisar de verdade sobre a vida dele e, claro, os trejeitos de falar e andar. Ele é um cara que não tem escândalos na vida, ele é um cara muito reservado. Eu interpreto o Roberto Carlos numa época em que não se tem nenhum registro dele, que é na adolescência, quando ele formou a banda Os Sputniks com o Tim… Eu precisei ver o que o Roberto se tornou e como ele se portou desde que se tem registro dele para poder resgatar esse adolescente. Então, levando em conta essa personalidade tranquila e reservada, eu criei um Roberto tímido. Não se sabe e eu não tive acesso a ele para compor o personagem. Ele não foi ver ainda, mas o Otávio Mesquita entrevistou a gente e me disse que tinha entrevistado o Roberto um dia antes e que falou pra ele: “Tem um cara no Tim Maia que não tem nada a ver com você, mas que a gente te vê em cena e ele é melhor do que você!”. Eu achei isso um superelogio!

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Porque eu realmente não tenho nada a ver com o Roberto, mas se as pessoas acreditam nesse Roberto Carlos, eu fico feliz pois acho que eu consegui cumprir meu ofício de ator, que é o que eu preciso fazer, né?

Reiner também salienta o papel da música e a tendência de migração de diretores renomados do teatro convencional para o Musical em função do crescimento do gênero no mercado nacional e como é necessário o mínimo de intimidade com a linguagem Musical por parte de todos os profissionais envolvidos, além de uma dedicação ferrenha: MR. ZIEG: Então você acha que o futuro do Teatro Musical no Brasil é de se ter diretores de teatro convencional vindo para o Musical, tratando a música da mesma forma que se trata um monólogo, um diálogo…? REINER TENENTE: Sem dúvida! A música faz parte da estrutura dramatúrgica de forma fundamental. A música é texto. Ela só entra como música por uma questão de estética e de linguagem e porque eu acho que a música faz aquele texto ter muito mais vida e muito mais força. O entendimento do texto a pessoa tem que ter, independentemente de ser musicado. É elemento fundamental. Os diretores brasileiros de Teatro Musical tendem a ter suas origens no teatro convencional porque a cultura do Musical é muito recente. O (Jorge) Takla é do ‘teatrão’, o Charles (Môeller) é do ‘teatrão’, antes de serem do Musical, ou seja, são antes de tudo homens de teatro e por isso são bons. O João Fonseca e o Charles foram dirigidos pelo Takla. Então eu reafirmo que a questão, que eu nem vou chamar de problema, está no material artístico que esses diretores têm na mão. Eles têm que ter bons atores-cantores, têm que ter, senão o cara não vai atingir aquela nota e vai ser mais difícil ele ficar confortável para atuar e se jogar no personagem. Quem tem que se preocupar é o ator. O ator tem que ter todo o aparato técnico, mas também tem que ter esse material artístico para oferecer pro diretor. Se o diretor não tem esse material, ele vai ter que fazer quase o impossível pra esse material brotar em pouquíssimo tempo de ensaio. E ainda tem o perfil

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vocal, o perfil físico, é muita coisa. Então eu acho que o cara já tem que chegar pronto! O que falta pra produção no Brasil ser genial não são os diretores, nós já temos muitos diretores que têm competência pra isso. Não é grana, a gente já tem grana pra investir nisso. A gente também tem cenógrafos, figurinistas e equipes técnicas boas o suficiente para fazer isso. Eu acho que ainda faltam os atores! Ator nenhum nasce do dia pra noite. Começa a se preparar hoje e já projeta sua primeira audição pra daqui pelo menos 3 ou 4 anos de trabalho duro. Não é assim com médicos, advogados, etc? Com o ator não deve ser diferente.

Abaixo o ator explicita que não só é preciso que sejam criados cursos para formação de atores qualificados para atender as necessidades deste segmento do mercado como também para todas as áreas técnicas:

MR. ZIEG: E em relação às áreas técnicas? O Brasil ainda tem uma defasagem muito grande com relação a cursos para stage manager, produção, cenografia, direção para Teatro Musical… REINER TENENTE: Tem que ter esses cursos! Muita gente está aprendendo estas áreas técnicas batendo a cabeça na parede e entrando no mercado. Mas a nossa preocupação inicial é a formação de atores de ponta para o mercado, porque essa é nossa maior urgência. Vamos focar na qualidade destes profissionais mesmo. Só sai da escola formado quem tem a qualidade que o nosso mercado merece! E uma coisa muito importante que eu queria falar é que a gente quer fomentar o Teatro Musical brasileiro. Eu sou apaixonado pelo Teatro Musical americano, acho que eles são os papas da nossa profissão, mas eu acho que a gente já tem material para começar a fomentar o nosso Teatro Musical. O brasileiro é Musical por natureza, tem muita cultura. A gente já tem o projeto de um curso de dramaturgia para Teatro Musical, um curso de composição para Teatro Musical, um curso de direção para Teatro Musical e o curso de atores. Então um aluno do curso de dramaturgia escreve o texto e se junta com os compositores do outro curso. Essa obra pronta, com

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dramaturgia e canções elaboradas em conjunto entre os alunos do curso é levada para o curso de direção e os alunos de direção vão selecionar os atores que estão se preparando na escola. E esse espetáculo vai ser montado com tudo sendo produzido pelos próprios alunos para começarmos a nutrir o Teatro Musical brasileiro. Porque hoje em dia a gente tem muito Musical biográfico. Tem o Tim, tem o Musical da Elis (Regina)… E também temos criadores de espetáculos brasileiros como o Chico Buarque, o Charles e o Cláudio com o Ed Motta no 7- o Musical, o Gustavo Gasparani, o Oswaldo Montenegro, o Daniel Salve… Mas precisamos de mais pessoas criando e fazendo estes Musicais brasileiros ganharem a mesma proporção que as produções importadas ganham quando chegam aqui! Temos matéria- prima pra isso já…

O ator enumera os cursos e escolas existentes no Brasil que um ator pode fazer para se preparar para os Musicais, a carência de disciplinas voltadas para o gênero e sua imagem marginalizada no âmbito universitário:

MR. ZIEG: E com o que o Brasil oferece hoje, como você acha que um ator se prepara? REINER TENENTE: Um ator se prepara fazendo aula de canto, aula de dança e aula de interpretação! De preferência uma aula de interpretação voltada para o Teatro Musical, mas teatro é teatro e ele vai ter as especificidades do ofício e vai adaptar isso pra linguagem do Teatro Musical. Mas ele precisa fazer essas aulas! No Rio de Janeiro, não se tem uma escola especializada. Em São Paulo, nós temos uma boa escola especializada (4Act Performing Arts), o que é pouco perante a esse mercado gigante. As academias e as universidades não têm uma matéria voltada para o Teatro Musical, é uma luta, eles não reconhecem o gênero como importante e significativo ainda e acabam deixando o Musical à margem. O ator de Musical tem que correr de uma aula pra outra, gasta uma fortuna e ele aprende todas essas linguagens de forma separada e depois tem que juntar tudo isso na marra quando ele passa numa audição!

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CAPÍTULO VI O IBTM – INSTITUTO BRASILEIRO DE TEATRO MUSICAL

Ainda na entrevista do ator Reiner Tenente, concedida ao site Mr. Zieg, ele termina apresentando à primeira escola de teatro que está sendo criada para atender as especificidades do mercado na cidade do Rio de Janeiro, o IBTM (Instituto Brasileiro de Teatro Musical).

6.1. A Origem: Como Tudo Começou Reiner Tenente, como professor, deu um curso de extensão na faculdade da UniverCidade. Ele teve um aluno chamado Fábio Gonçalves há cerca de dois anos e meio. Este aluno é um apaixonado por Musical desde sempre e morou em Nova York. Faz aulas de canto e trabalha na área da educação. Este mesmo aluno foi com a filha e fez o curso. Por se identificar com o trabalho e metodologia do professor, perguntou ao mesmo se ele gostaria de dar aula numa escola de Teatro Musical. Ele revelou que pretendia montar uma escola voltada para este gênero. Segundo relatos do próprio Reiner Tenente, ele prontamente disse que adoraria e que seria uma realização.

Passou-se um ano e os dois ficaram conversando sobre como seria essa escola. Até que em outubro de 2011, Fábio Gonçalves convidou Reiner Tenente para ser sócio dele nessa escola que seria a primeira voltada para o teatro Musical do Rio de Janeiro. Fábio Gonçalves resolveu fazer esse investimento, não só financeiro, mas também como um investimento de vida, de carreira, um investimento pessoal.

A escola recebeu o nome de IBTM – Instituto Brasileiro de Teatro Musical, que já possui um prédio comprado na Zona Sul do Rio de Janeiro no bairro do Flamengo e que estava em finalização de reforma com projeto do arquiteto Miguel Pinto Guimarães para ser inaugurada em agosto de 2012. O arquiteto, além de ser renomado, é

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também outro apaixonado por Musicais, e por isto se dedicou para fazer esse projeto com muito critério.

6.2 A Instituição e os Cursos Oferecidos

Segundo as informações contidas no site em construção e desenvolvimento o IBTM, Instituto Brasileiro de Teatro Musical, está se preparando para ser a mais completa instituição de ensino para teatro Musical do Brasil. Para isto está reunindo em uma só instituição os melhores profissionais de todas as áreas artísticas que envolvem o Teatro Musical (Canto, Dança, Interpretação e demais áreas fundamentais) com o objetivo de formar Performers, profissionais altamente qualificados e capazes de atuar com excelência em todas essas áreas artísticas para atender tanto o mercado nacional quanto o internacional.

A escola está sendo aberta com cursos livres de canto e música (com aulas de Coach Personalizado, Coro, Acting Your Song (Interpretando Sua Canção) e Teoria Musical), dança (com aulas de Ballet Clássico, Jazz, Jazz Broadway, Sapateado Americano e Video Dance) e interpretação e teatro (com aulas de Circo, Estudos Dirigidos, Profissional de Teatro Musical, Criando um Musical e Produzindo Seu Próprio Musical), workshops específicos (Repertório de Coreografias de Teatro Musical, Teatro Musical e Prática de Montagem) e uma Pós-Graduação em Teatro Musical com a chancela da Universidade Gama Filho.

Em breve também serão oferecidos cursos profissionalizantes em cada área específica. Já está sendo encaminhada também a criação de uma primeira Faculdade de Teatro Musical no Brasil, que, diferentemente de uma graduação em artes cênicas, vai trazer uma grade curricular completa para o aluno ter a junção dessas três vertentes abordadas pelo Musical em quatro anos de curso.

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6.3 O Corpo Docente

Do bem sucedido Musical “Tim Maia – Vale Tudo”, Reiner Tenente convidou para fazer parte do corpo docente o assistente de direção Musical e co- arranjador e ensaiador vocal Felipe Habib, que é bacharel em Canto pela UFRJ, pós- graduado e hoje mestrando em Música na UniRio sendo orientado por Salomea Gandelman na área de Práticas Interpretativas, para ministrar as aulas de Canto em Conjunto (Coral); a diretora de movimento e coreografias Sueli Guerra, que é formada em dança pela UniverCidade, com curso de especialização na Washington School of Ballet, para dar as aulas de O Movimento Coreográfico E O Canto (Integrada com Canto em Conjunto) e o próprio Tiago Abravanel, que interpreta o personagem título Tim Maia, para dirigir os alunos na disciplina de Prática de Montagem.

Os alunos do IBTM ainda terão a oportunidade de participar de audições simuladas, práticas de montagem e apresentações em público com Reiner Tenente em conjunto com os demais profissionais do curso e professores convidados e atuantes nos espetáculos Musicais em cartaz para que possam vivenciar e se preparar para todas as oportunidades que o mercado oferece.

Por exemplo, na matéria de Técnicas de Audição e Mercado de Trabalho com a orientação de Reiner Tenente o aluno aprenderá como se apresentar de forma adequada para o mercado de trabalho e desenvolverá seu olhar critico perante este mercado. Visando o aprendizado através da prática, desde o início do curso os alunos serão preparados pelo professor Reiner Tenente e dirigidos por Tiago Abravanel na aula de Prática de Montagem seguindo todos os seus processos e participarão de uma experiência de levantamento de um espetáculo.

A integração da aula de Ação Física e Vocal no Teatro Musical com a disciplina de Prática Cênica possibilitará ao aluno-ator realizar uma cena com profundidade e domínio. No início do processo o aluno será apresentado e terá a

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oportunidade de experimentar o método desenvolvido por Reiner Tenente baseado em técnicas e métodos pré-existentes e preparados vocalmente por Danilo Timm, que é professor de canto, compositor, instrumentista e vocalista da Banda Lotus. Em seguida os alunos serão dirigidos pela renomada atriz e diretora Paula Sandroni, mestra em Artes Cênicas pela UNI-RIO, que se utilizará do material anteriormente preparado pelos dois professores para desenvolver o seu trabalho.

Ainda fazem parte do Corpo Docente: Na Área de Teatro:

• Marcus Fritsch Ator, professor formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mestre em Teatro pela Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO), com orientação de Luis Arthur Nunes e Doutorando em Teatro (UNIRIO) com o projeto: Ações Físicas: a pedagogia do ator de Stanislavski a Grotowski.

• Ana Achcar - professora convidada Possui Graduação em Bacharelado em Artes Cênicas (1984), Mestrado em Teatro(1999) e Doutorado (2007) em Teatro pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro UNIRIO.

Na Área de Canto e Música:

• Gabriela Geluda Formada em Canto lírico pela Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio), Pós graduada em Música Antiga pela Guildhall School of Music and Drama (Londres) e formada na Técnica Alexander pelo Alexander Technique Studio (Londres).

• Lucas Ciavatta Criador do método de Educação Musical O Passo. Diretor do grupo de percussão e canto “Bloco d'O Passo”. Professor do Conservatório Brasileiro de Música

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(CBM), do Colégio Santo Inácio (RJ) e do Westminster Choir College (EUA). Coordenador do Grupo de Professores d’O Passo, composto por professores brasileiros, norte-americanos e franceses.

• Marina Considera Formada em canto pela UNIRIO e mestre pela Escola de Música da UFRJ.

• Marli Brito Fonoaudióloga Especialista em Voz, Pós-graduada em Patologias da Voz . Título de especialista pelo Conselho Federal de Fonoaudióloga.

• Adriana Miana - professora convidada Mestrado em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (1997), na área de Musicologia. Bacharelado em Música, com habilitação em Composição, pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (1992) e graduada em Educação Artística, Licenciatura Plena, pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (1994).

Na Área de Dança e Preparação Corporal:

• Alan Rezende Bailarino, coreógrafo e professor de dança, estudou dança com Tatiana Leskowa e no Centro de Artes Nós da Dança, além de cursos e workshops em Nova York e Europa. • Patricia Carillo Formou se em Licenciatura plena em Educação Física, concluído em 2004 pelo Centro Universatário da Cidade - UniverCidade além de ter passado pelos cursos de Ballet Clássico, em 1988, pelo Joffrey Ballet ,Elementary Course de Jazz e de sapateado em 1988, pela Broadway Dance Center.

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• Paulo Trajano Ator formado pela CAL e pela Faculdade de Dança Angel Vianna (FAV). Mestrando do PPGAC da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UNIRIO). Pós- graduado em Estudos Avançados em Dança Contemporânea pela UFBA / FAV. Estudou na Escola de Mímica Corporal Dramática de Paris.

• Sabrina Korgut Atriz, cantora e bailarina com formação em Jazz e Tap Dance pela academia UNIC e pela Starlight School of Dance, Orlando, Florida. Atualmente estuda licenciatura teatral na UNIRIO.

6.4 A Grade Curricular

O curso antes mesmo de começar a funcionar já está muito bem organizado e estruturado. A princípio é um curso de pós-graduação intensivo em regime integral (manhã / tarde) com aulas que se iniciam às 9:30h da manhã e que se encerram às 16:30h da tarde e intervalo de uma hora para o almoço que vai de 12h às 13h. Possui uma grade curricular dividida em 3 períodos com 5 disciplinas cada, com duração média de 1 hora ou 1 hora e meia de aula de acordo com as suas especificidades e agrupadas da seguinte forma:

1º PERÍODO – DISCIPLINAS: (1) Preparação Inicial para o Ator (Consciência Corporal e Jogos Dramáticos) com Paulo Trajano (1:30h), (2) Canto em Conjunto com Felipe Habib (1h), (3) O Movimento Coreográfico e o Canto (Integrada com Canto em Conjunto) com Sueli Guerra (1h), (4) Teoria e Percepção Musical com Adriana Miana (1:30h) e (5) A Voz no Trabalho do Ator com Marli Brito (1h).

2º PERÍODO – DISCIPLINAS: (1) O Jogo e a Máscara como Treinamento do Ator com Ana Achcar (1:30h), (2) Integração Corpo e Voz (Técnica Alexander) com Gabriela Geluda (1h), (3) Sapateado com Patricia Carilo (1h), (4) Canto Solo com Danilo Timm e Ester Elias (1h) e (5) Jazz com Alan Rezende (1:30h).

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3º PERÍODO – DISCIPLINAS: (1) Técnicas de Audição e O Mercado de Trabalho com Reiner Tenente e convidados (1:30h), (2) História do Teatro Musical com Marcus Fritch (1h), (3) Canto com Danilo Timm (1h), (4) Ação Física e Vocal com Reiner Tenente (1h) e (5) Prática Cênica com Paula Sandroni (1:30h).

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CONCLUSÃO

A implantação de um curso de Pós Graduação em Teatro Musical em uma universidade, seja ela Pública ou Privada é algo inovador, já que o mercado de teatro Musical, apesar de amplo, é considerado ainda recente no Brasil. Por este motivo ainda carecemos de possibilidades de formação no país. As academias e as universidades ainda não têm uma matéria voltada para o Teatro Musical, pois não reconhecem o gênero como sendo importante e significativo o suficiente e o acabam deixando de lado.

As universidades precisam estar atentas às necessidades da sociedade em que vivemos e onde os alunos vão exercer sua profissão para se pensar num currículo mais atualizado, discutindo que profissional se pretende formar, pois um currículo compreende muito mais que um conjunto de disciplinas organizadas. Currículo é um conjunto de conhecimentos, de saberes, competências, habilidades, experiências, vivências e valores que os alunos precisam adquirir e desenvolver, de maneira integrada e explícita, mediante práticas de ensino e de situações de aprendizagem planejadas intencionalmente.

Cabe às universidades definir as características que pretendemos que os profissionais formados desenvolvam quanto ao conhecimento, às habilidades humanas e profissionais e aos valores e atitudes. Promover integração da teoria com a prática, das áreas de conhecimento, das disciplinas e das atividades propostas. É dever das universidades estar atenta aos conhecimentos atuais que surgem, investigar novas possibilidades, estimular aos alunos à desafiar os limites estabelecidos e pensar um ensino superior que responda às exigências atuais e futuras propondo formar profissionais voltados para a transformação da ordem social.

Garantir um ensino superior de qualidade é preciso, dando ao aluno suporte para que ele possa fazer, por si próprio, a escolha de ingressar no mercado de trabalho, tanto quanto a garantir a ele o mesmo direito de acesso aos campos da pesquisa e extensão.

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O mercado de teatro Musical, que vem se firmando com estabilidade há mais de uma década no país, está longe de se tornar saturado e tem gerado efeitos positivos como a profissionalização do setor que inclui, além de atores capazes de interpretar, cantar e dançar, figurinistas, cenógrafos, músicos, produtores, entre outros, além gerar oportunidades de trabalho com estrutura financeira para manter e remunerar estes profissionais. O teatro nacional passa por uma excelente fase e o preconceito contra o Musical, que era visto como fútil e americanóide, está acabando. Uma avalanche de Musicais vem sendo produzidos no país e são aplaudidos por um imenso público brasileiro que hoje venera os Musicais.

O êxito dos Musicais no Brasil tem sido tão grande que temos montado verdadeiras superproduções que empregam mais de uma centena de profissionais, entre atores, bailarinos, músicos e equipe técnica. As produções mais recentes foram destaque na Revista Stravaganza em 2011, pelo jornalista Edgar Olimpio Souza, revelando que os Musicais podem chegar a custar R$ 12 milhões, como foi o caso do espetáculo Miss Saigon (2007), que abrigava um helicóptero em tamanho real no palco. Os salários dos atores podem variar de R$ 10 mil a R$ 40 mil mensais ao longo da temporada ou por prazo de trabalho. Por isto a criação de uma especialização nesta área se faz tão necessária. Uma Pós Graduação em teatro Musical deve se propor a ser um curso onde o aluno tenha a oportunidade de se desenvolver tecnicamente nas três vertentes exigidas pelo gênero, que são: interpretação, dança e canto, sendo que cada uma destas artes tem suas variações estéticas. Durante todo o curso é preciso oferecer ao aluno a possibilidade de vivenciar e praticar diferentes formas de interpretação, que necessitam ser trabalhadas desde suas expressões corporais e vocais mais variadas, sejam elas realistas ou até mesmo as técnicas mais histriônicas e grotescas.

É de suma importância, em um curso de Pós Graduação em Artes Cênicas, independente do gênero a que ele pertença, oferecer não só instrumentos técnicos, mas também desenvolver um olhar crítico e questionador inerente à arte.

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“O problema não consiste em confinar a arte ao horizonte atual das grandes massas, mas em ampliar o horizonte das massas tanto quanto possível. O caminho para uma apreciação autêntica da arte passa pela educação. Não a simplificação violenta da arte, mas o treinamento da capacidade de julgamento estético é o meio pelo qual se pode impedir a constante monopolização da arte por uma pequena minoria.” (Arnold Hauser, 2003, p. 992)

Até porque precisamos mudar a mentalidade dos que pensam que um gênero dramático, quando se torna popular, como é o caso dos Musicais e das Comédias Stand Up hoje em dia, ao atingir as grandes massas, não significa que eles perderam o seu valor, que tenham se tornado “incultos”. Enquanto arte engajada o teatro reúne e organiza conhecimentos múltiplos e é um grande estimulador para a discussão de temas da contemporaneidade. Por trás dele podemos levar conhecimento e abrir os olhos e a mente do público para a realidade a sua volta.

O que esta pesquisa se propôs foi uma análise dos cursos de Artes Cênicas, que mantém uma visão “elitista” de que a “verdadeira arte” é privilégio para poucos. Em nenhum momento este estudo questiona a formação humanista e cultural dos cursos de Artes Cênicas, pois ela é fundamental para a formação de um artista crítico e reflexivo da realidade a sua volta e que procure respostas para as questões do seu tempo. O que as universidades públicas não podem deixar de lado é o compromisso que elas têm em preparar profissionais qualificados que atendam as necessidades do mundo atual.

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SOUZA, Edgar Olimpio de. Revista Stravaganza. A Hora e a Vez dos Musicais. acesso 29 /01/ 2013.

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ANEXOS Índice de Anexos

Anexo 1 >>Entrevista 1;

Anexo 2 >> Entrevista 2;

Anexo 3 >> Reportagem;

Anexo 4 >> Internet 1;

Anexo 5 >> Internet 2.

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ANEXO 1 ENTREVISTA 1

Marilia Gabriela Entrevista: Charles Möeller & Claudio Botelho Transcrição por Fidelcino Neves Reis

Marilia Gabriela Entrevista: Charles Möeller & Claudio Botelho – 1º Bloco

MARILIA GABRIELA - “Se você pode andar, você pode dançar. Se você pode falar, você pode cantar.” Este é um provérbio africano que diz algo sobre os meus convidados de hoje. Os produtores de Musicais teatrais: CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. MARILIA GABRIELA – Os 2 começaram esta parceria de sucesso há 15 anos. De lá para cá uma avalanche de Musicais aplaudidos por milhões de pessoas: “Um Violista no Telhado”, “Beatles no Céu de Diamantes”, “O Mágico de Oz”, “Hair”, “Gipsy” “A Noviça Rebelde”, e muitos, muitos, muitos outros. Eles estão aqui para falar

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desta parceria tão bem-sucedida dos espetáculos em cartaz e dos próximos projetos para um imenso público brasileiro que hoje venera Musicais. Eu começo conversando com os 2, depois com cada um separadamente e nos juntamos no último bloco do programa. MARILIA GABRIELA - Muito bem. Eu acho que nunca perguntei como é que vocês se conheceram? CHARLES MÖELLER – A gente se conheceu... Eu fazia uma novela chamada “Mico Preto” como ator. MARILIA GABRIELA – Mas você é paulista? CHARLES MÖELLER – Paulista MARILIA GABRIELA – De Santos? CHARLES MÖELLER – De Santos. MARILIA GABRIELA- Hã... CHARLES MÖELLER – E em 90 eu fui para o Rio de Janeiro fazer uma novela chamada “Mico Preto”, e eu fazia o filho do Miguel Falabella nessa novela. E o Miguel ensaiava um espetáculo com o Ítalo Rossi e um rapaz que tocava violão e cantava umas músicas e ele me chamou para o ensaio. E eu me lembro que eu assisti aquele ensaio e depois a gente saiu para jantar: Eu, Ítalo, Miguel e o Cláudio e agente falou a noite inteira de Musical e começou aí. MARILIA GABRIELA – Vocês se identificaram imediatamente? CHARLES MÖELLER – De cara. Imediatamente MARILIA GABRIELA – Eu me lembro de você cantando com a Cláudia Netta as músicas do Chico num teatro lá embaixo na Rua Augusta, aqui em São Paulo. CLAUDIO BOTELHO – o Teatro Bibi Ferreira MARILIA GABRIELA – Do Teatro Bibi Ferreira. Que ano foi aquilo? CLAUDIO BOTELHO – 98! MARILIA GABRIELA – de outro século, senão me engano (risos) CLAUDIO BOTELHO – Verdade! MARILIA GABRIELA – Nós somos vintage querido CHARLES MÖELLER – Hum, isso é chic! CLAUDIO BOTELHO - Ôh estamos aqui MARILIA GABRIELA – Porque brasileiro gosta tanto de Musical?

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CLAUDIO BOTELHO – Acho que brasileiro gosta muito de teatro ... e gosta muito de teatro que se comunique, que conte uma boa história. O que aconteceu acho que o brasileiro já gostava muito Musical nos anos 50 e 60. A gente teve muitos Musicais aqui como, como o próprio “Como Vencer na Vida Sem Fazer Força” que a gente vai refazer agora; como o “Pippin”, como “My Fair Lady”, e tudo isto era muito sucesso. E isso desapareceu do mercado. Acho que... MARILIA GABRIELA – Mas desapareceu por algum motivo! CLAUDIO BOTELHO – ...Eu acho que pela situação política. O país embarcou numa ditadura. O Teatro passou a tratar de assuntos não tão “business”, não tão “alegres”, com nem tanto “final feliz”. O Teatro passou a ser um lugar de “resistência”. E coincidentemente com a volta das liberdades é o começo de uma retomada do Musical. A volta do liberalismo econômico. Né?! Você poder cobrar caro por um ingresso e tudo. Isso ajudou com que você pudesse a ter produções grandes novamente. Porque elas existiram. A Bibi (Ferreira), o Paulo Autran, a Marília Pêra, essas gente toda fez muito Musical, e viveu muito disso, 7, 8 sessões por semana. MARILIA GABRIELA – Você gosta de Musical porque? Ou gostava? Vamos falar ainda no passado CHARLES MÖELLER – Eu acho que assim. Eu aprendi a gostar de Musical... eu acho que por causa do meu pai que era fã dos filmes da Metro (Metro- Goldwyn-Mayer ou MGM). Eu lembro de ter essa conexão com ele de assistir aos filmes e ficar fascinado com aquela estética do Musical, porque pelo tipo de interpretação “mentirosa” que o Musical tem. Eu adoro esta possibilidade. MARILIA GABRIELA – Porque é isto mesmo né? CHARLES MÖELLER – É! Claro que é. MARILIA GABRIELA – Você está ali e ninguém se ilude. Você não é aquela pessoa. Você está atuando ali. É isso? Essa é a sensação do ator no Musical? CHARLES MÖELLER – Eu acho que é tão interessante quando a arte, ela passa, ela assume a mentira. Assim eu acho que o que me fascina é quando a gente assume esse estar sendo enganado. Eu acho que o Musical, de todas as manifestações artísticas é a mais mentirosa porque eu não começaria esta entrevista com você

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cantando. Então assim, a estética toda do Musical, ela te dá toda uma liberdade para a mentira absoluta que é muito fascinante. Né?! Então assim... é aquilo povoou os meus sonhos durante muitos anos. E de uma certa forma... eu acho que... de um tempo... quando eu vim para São Paulo estudar teatro isso tudo ainda não se abria essa história do Musical. O Musical era considerado um gênero menor, era um entretenimento pelo entretenimento. É... eu acho que a minha “saída do armário” do Musical foi quando eu conheci o Cláudio (Botelho), pro Rio de Janeiro, que tinha essa liberdade de falar disso que é um gênero muito importante, muito avassalador. MARILIA GABRIELA – Entre a produção e a estreia, entre o começar e a estreia quanto tempo vai? CLAUDIO BOTELHO - Isso vem mudando muito na nossa vida. Mas acho que entre ter uma ideia e estrear leva mais ou menos um ano e meio, sendo que os ensaios são sempre 8 semanas. É muito prático isto. MARILIA GABRIELA – Ah são 2 meses e ponto? É isso? CLAUDIO BOTELHO – Sim porque você tem que pagar essa gente toda né?!. É um serviço muito profissional. Ninguém se reúne para debater um Musical, uma peça, vamos ver no que vai dar. Quando você começa, todo mundo já está ganhando. Então você tem que fazer aquilo caber em 8 semanas. Sendo que as primeiras 6 numa sala de ensaio e as 2 últimas dentro do cenário. Isto é o famoso Musical da Broadway em 2 atos. Aqueles grandes em que você obedece uma certa categoria de montagem... Já a coisa experimental... MARILIA GABRIELA – ...Já um método de trabalho? CLAUDIO BOTELHO – Um método de trabalho. CHARLES MÖELLER – É. MARILIA GABRIELA – Quer dizer a nossa escola de Musicais passa necessariamente pela Americana porque eles são os pais da matéria. É isso? CHARLES MÖELLER – É eu acho que a gente já adaptou assim depois de tantos Musicais a gente já bebeu muito na fonte deles. Coisas que eu acho que eles realmente inventaram este gênero. É um gênero. É uma arte que nasceu com eles. De qualquer jeito, um jeito de produzir. E de deixar a coisa objetiva e não se perder muito tempo. Porque no Musical é diferente num teatro. Né!? Você ao pode perder muito

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tempo. Né?! Você ensaia estas 8 semanas, mas como a gente com 3 salas consecutivas. Para você chegar as 8 semanas, você tem que estar com todos os figurinos desenhados e alguns já mandados em confecção. Os cenários praticamente encaminhados para que tudo isto dê certo. É lógico que a fonte sempre serão eles, mas a gente já adquiriu um jeito muito próprio de fazer as nossas coisas. MARILIA GABRIELA – Eu achei graça, mas me contive quando você disse a gente já pode cobrar caro um ingresso de teatro. E eu fiquei quieta. Porque? Como é que você concluiu que já se pode cobrar caro? Sabe porque é que eu estou perguntando isto? Porque eu tenho visto, e ouvido e conversado a respeito disso com atores, que não estão fazendo Musicais, mas que estão fazendo espetáculos nada baratos, atores de peso e de nome que acabam cobrando mais caro. E me parece que quando eles fazem a promoção, diminuem o valor do ingresso enche a sala. Porque que no Musical você acha que é mais fácil cobrar mais caro? CLAUDIO BOTELHO – Eu nem sei se é fácil. Eu acho que a gente vive é um movimento de mercado. Acho que similar a qualquer tipo de entretenimento, televisão. Você cobra porque o público quer ver. Então eu acho que você oferece muito em troca do R$ 180,00. Você não oferece... MARILIA GABRIELA – E quanto custa hoje um ingresso? CLAUDIO BOTELHO – R$ 180, 00, acho que chega a R$ 200,00 ou... mas ah como existe uma lei nacional contra nós todos, produtores que é a lei da meia-entrada para todo mundo. É?! Quer dizer para estudantes e pessoas acima de 65 anos. E fora aquelas coisas que são clube disso e clube daquilo. Então na verdade você baseia o nosso preço é baseado a meia. Ele nunca é baseado no ingresso cheio. Eu nunca penso... porque são 12 a 15 % da bilheteria que paga inteira. Por causa desse absurdo que eu acho que a gente não deve dedicar muito tempo a falar dele, mas... MARILIA GABRIELA – ...Não... CLAUDIO BOTELHO – É... então o que eu ofereço em troca são, em média, 70 pessoas trabalhando por dia para que aquele evento aconteça... MARILIA GABRIELA - ...Loucura... CLAUDIO BOTELHO – Então É... ou aquilo faz sucesso ou a gente fecha em 2 semanas!

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MARILIA GABRIELA – Mas fecha mesmo? Porque os Estados Unidos é assim. Se ao der certo na estreia. Falou assim: vamos, parou CLAUDIO BOTELHO – Pára!!! MARILIA GABRIELA - que vai ser prejuízo imenso. CLAUDIO BOTELHO – A regra inclusive no contrato americano é... você para depois de 21 espetáculos. Porque se você para depois de 21 espetáculos aquilo virá um ... Como é o nome? MARILIA GABRIELA – Bola de neve CLAUDIO BOTELHO – Um papagaio. Um papagaio de você pagar um monte de gente. Até 21 você não precisa pagar MARILIA GABRIELA – AH!!! CLAUDIO BOTELHO – É então por isto que acaba tão rápido MARILIA GABRIELA – Ah! É por isto! CLAUDIO BOTELHO – É. São investidores. MARILIA GABRIELA – Ah! Olha que bom! Aprendi mais essa. CLAUDIO BOTELHO – É dinheiro bom. Não é dinheiro incentivado!!! Então assim... para você montar um elefante daqueles... MARILIA GABRIELA – “É dinheiro bom”, você quer dizer é um produtor americano. É aquele que pega o dinheiro ... CLAUDIO BOTELHO – É! MARILIA GABRIELA - ... da conta dele, abre o cofre vai lá e põe? é isso? CLAUDIO BOTELHO – a gente até esteve recentemente numa back audition, uma audição para investidores, para um Musical do Harold Prince para você ver: o “Papa dos Musicais”, o homem que inventou isto. Ele estava lá contando uma historinha e as pessoas catando. E os produtores sentadinhos. E nós estávamos lá de convidados. Até muito honrados. E o sujeito saia de lá com um caderno para dizer: eu quero investir 2 milhões isso ,ou quero investir 1 milhão. Ai existe uma conta lá. Que é assim. A partir de 21 espetáculos, o doo daquilo, o Harold Prince, tem que pagar o sujeito como se fosse um CDB... MARILIA GABRIELA – Hum!!!

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CLAUDIO BOTELHO – Entendeu? Assim... Ele tem que garantir que aquilo vai para Miami, vai para Cuba, vai para a Alemanha... MARILIA GABRIELA – Vai se pagar! CLAUDIO BOTELHO – Vai se pagar. Até 21, não deu certo, vamos parar! Todo mundo perdeu! Eu, você que botamos R$ 500,00... MARILIA GABRIELA – ...Gente do céu... CLAUDIO BOTELHO – Então é fascinante por esse lado. Eu adoro esse mundo dos negócios também. MARILIA GABRIELA – Mas isso não acontece com vocês? CHARLES MÖELLER – Não! CLAUDIO BOTELHO – Não porque aqui é um outro tipo de relacionamento. MARILIA GABRIELA – Aqui é o incentivado CLAUDIO BOTELHO – Porque o incentivado, às vezes, até te obriga a manter em cartaz um fracasso. Né!? CHARLES MÖELLER – Fazer as 2 cidades por exemplo. MARILIA GABRIELA – Já aconteceu? CHARLES MÖELLER –É! CLAUDIO BOTELHO - A gente não faz só sucessos, a gente faz sucessos médios. Eu não vou dizer que a gente faz fracasso, porque a gente tem sido muito sortudo... e tem conseguido chegado a algum público, mas tem espetáculos de muito sucesso como “O Violinista no Telhado” e espetáculos que vendem menos por exemplo “Hair” em São Paulo não vendeu como no Rio. Foi uma surpresa! A temporada de “Hair” em São Paulo nos decepcionou. Teve muito menos público, mas ficamos lá. MARILIA GABRIELA – Deixa eu terminar este bloco fazendo uma pergunta para você. Eu me lembro do... acho que o 1º espetáculo que eu vi de vocês... foi o Cole Porter? CHARLES MÖELLER – Pode ser. MARILIA GABRIELA – no Rio de Janeiro? CHARLES MÖELLER - Sim MARILIA GABRIELA - Não era o 1º de vocês?

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CHARLES MÖELLER – Não. CLAUDIO BOTELHO – Mas foi onde agente apareceu! MARILIA GABRIELA – ...apareceu! É. CLAUDIO BOTELHO - Em 2000. MARILIA GABRIELA – Eu gostei demais. Não ouve quem não ficasse tocado por aquele espetáculo, mas me lembro que era ... desculpe... “pobrinho”. CHARLES MÖELLER – É! CLAUDIO BOTELHO – Sim! MARILIA GABRIELA – Era “pobrinho”, foi ali que vocês perceberam também que era o caminho certo ou ali é que vocês perceberam que havia um outro caminho a percorrer? CHARLES MÖELLER – Olha. O Cole Poter era um tapa buraco, assim... uma vontade nossa de fazer Musical. A gente tinha o teatro. A gente não tinha o dinheiro. A gente fez com dinheiro emprestado. Eu me lembro que eram 5000 reais . MARILIA GABRIELA – A não dá! Gente! Com 5000 reais em que ano? CLAUDIO BOTELHO – 2000.. CHARLES MÖELLER – 2000. MARILIA GABRIELA- 2000 CLAUDIO BOTELHO – Era o que seria hoje uns... 50, 60 mil. MARILIA GABRIELA – ...Como se inflacionou o teatro! Hoje com 5000 mil reais você não passa na porta de um teatro para montar nada. CHARLES MÖELLER – Não. Nada! Era o Carlito na época administrava o Teatro de Arena e ele praticamente deu o espaço para a gente. E a gente fez uma cooperativa de amigos. Chamamos umas amigas, uns iluminadores, e .... CLAUDIO BOTELHO – E a gente ensaiava em casa. MARILIA GABRIELA – Umas amigas talentosas. CHARLES MÖELLER – talentosa,. uns figurinos emprestados e era isso. E assim... eu me lembro que o Cole Poter foi uma coisa tão impressionante que a gente começou de sexta a domingo, e em 2 semanas a gente já fazia de quarta a domingo e recuperamos as matinês de sábado e de domingo e ficamos 3 anos em cartaz. E temporada de 3 meses em Portugal. Então aquilo deu um gás para a gente. Porque o

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teatro estava meio mendigo. Estava meio assim de sexta a domingo ou só sábado e domingo. A volta de todas estas sessões e matinês isto deu mais um respiro porque eu não aguentava mais escutar as pessoas, como a Bibi que falava: ah a gente fazia de terça a domingo, de quarta a domingo, a Fernandona (Fernanda Montenegro) falava de quarta a domingo, terça a domingo. E a gente estava muito de sábado a domingo e olhe lá né!?. Quando apareciam as pessoas. MARILIA GABRIELA – Que bom! CLAUDIO BOTELHO – e outra... os 5 mil foram um dinheiro bom CHARLES MÖELLER – Dinheiro bom (risos) ... que a gente pagou e devolveu, MARILIA GABRIELA – Vocês pagaram com lucro? Que dinheiro quente! CHARLES MÖELLER – Um lucrinho né!!! CLAUDIO BOTELHO - Com CDB. MARILIA GABRIELA – Olha! E foi ali que vocês souberam... CHARLES MÖELLER – ...Foi... MARILIA GABRIELA – ... souberam que dava pé fazer Musical? CHARLES MÖELLER – uma fatia do bolo que estava abandonada. MARILIA GABRIELA – E o Rio de Janeiro é o lugar que mais curte Musical no Brasil ou não? CLAUDIO BOTELHO – As 2 cidades. CHARLES MÖELLER - As 2 cidades. São diferentes. MARILIA GABRIELA – Rio e São Paulo!? CLAUDIO BOTELHO – Os movimentos são diferentes. MARILIA GABRIELA - OK! Eu quero falar desse movimento. Ok. Mas hoje eu entrevisto Os produtores de Musicais, os famosos, os bem sucedidos CHARLES MÖELLER, não é Miller exatamente, é Möeller e CLAUDIO BOTELHO. Depois do intervalo eu converso com o CHARLES MÖELLER. CHARLES MÖELLER – Oba!

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Marilia Gabriela Entrevista: Charles Möeller & Claudio Botelho – 2º Bloco

MARILIA GABRIELA – Agora eu converso com o meu convidado: o produtor CHARLES MÖELLER. Profissional polivalente, o CHARLES MÖELLER começou como ator. Aos 22 anos ele virou figurinista e foi logo premiado pela APCA, que é a Associação Paulista de Críticos de Arte, recebeu o Prêmio Shell. E depois assinou importantes cenografias e atuou com diretores de prestígio. Na televisão fez 5 novelas e muitos casos especiais. Na rede Globo o seu último trabalho foi dirigir as cenas Musicais da minissérie “Dalva e Erivelto” CHARLES MÖELLER – Santista de 30 de abril de 1967. Diretor de Musicais. 31 espetáculos. Em cartaz com os Musicais: “O Mágico de Oz” e “Milton Nascimento – nada será como antes”

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MARILIA GABRIELA – Oh CHARLES MÖELLER, você sabe que lendo. Né. Estudando a seu respeito. Eu vi que você começou em Santos. E você foi dirigido por Neyde Veneziano, que é a maior estudiosa do Teatro de Revista no Brasil. CHARLES MÖELLER – É verdade. MARILIA GABRIELA – Vocês não têm vontade de fazer Teatro de Revista? CHARLES MÖELLER – Olha. Eu acho que o Teatro de Revista, ele é um ofício muito complexo. Eu acho que a Neyde é uma mulher perfeita para fazer esse tipo de espetáculo assim. O Teatro de Revista, ele é maravilhoso. Ele é quase um jornal, né; um jornal de época e que as notícias são dadas, é... tem os seus números de cortina, tem esses comediantes. É... é... Mas eu acho que precisa de um profissional bem gabaritado para fazer isso. Assim, eu acho, eu acho que eu não me sinto preparado para encarar um teatro de Revista como ele deve ser feito, como ele deve ser resgatado. A Neyde fez espetáculos lindos. Ela é uma mulher que sabe fazer isso. MARILIA GABRIELA – Você começa em Santos a fazer que tipo de teatro e se você foi fazer arquitetura, eu imagino que a sua família, quando você resolveu: “não, não, eu vou para o teatro”, não deva ter ficado muito contente. Porque ouve uma época em que não se ficava contente quando um filho decidia isso. CHARLES MÖELLER – É assim, na verdade assim, eu sou um filho de um militar com uma colona alemã. Então assim, já não ficaria contente. Eu sou o 8° filho. MARILIA GABRIELA – Você está brincando? CHARLES MÖELLER – verdade. MARILIA GABRIELA – São 8 irmãos? CHARLES MÖELLER – São 8 irmãos. Eu sou o 8°, eu sou o temporão. Invento de fazer teatro em Santos. Não é uma pessoa que precise tomar cuidado com ela. Eu acho que assim, e de qualquer maneira eu comecei muito cedo. Eu comecei com 13 anos. MARILIA GABRIELA - No colégio? CHARLES MÖELLER – Não! Num teatro profissionalizante. Precisavam de uma criança de 13 anos para fazerem uma montagem do SESC. É... eu passei para fazer um anjo, uma coisa assim. E eu fiquei muito estimulado e eu já tinha a coisa do

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teatro comigo assim. Na época Santos ainda tinha um movimento cultural um pouco forte. As peças estreavam em Santos, no SESC, no teatro Municipal. Eu via muitos espetáculos. O Fagundes fazia muitas estreias lá. Então assim, eu acho que ainda brilhava. E ainda a proximidade de Santos com São Paulo atrapalhou muito a cidade, né. Porque as pessoas, o movimento cultural as pessoas começavam a emergir, pulavam para cá... MARILIA GABRIELA - para São Paulo. CHARLES MÖELLER – Para São Paulo. É lógico, que assim, quando eu fui fazer arquitetura. Eu me formei muito novo. Eu tinha 16 anos. Não tinha nenhuma faculdade de artes cênicas na época. Eu queria estar formado e eu me lembro que na época o meu pai me deu uma enganada assim, militar é esperto né, falou assim: “não enquanto não tem nenhuma faculdade... MARILIA GABRIELA – Militar é esperto e brabo.. CHARLES MÖELLER – e brabo. “...enquanto não tem nenhuma faculdade aqui”. Minha mãe sempre falando: “Ele vai fazer o que ele precisa fazer para ele ser feliz.” Então ela segurou muito a minha onda. Daí pintou a coisa da arquitetura, porque eu tinha facilidade com o desenho e etc. Eu tinha um irmão mais velho que fazia arquitetura. Eu gostava da turma de arquitetura que era mais artística. E eu fiz 2 anos de arquitetura. É... quando eu completei 18 anos, abriu uma faculdade de artes cênicas em Santos e eu migrei praticamente para a faculdade. Tentei conciliar as 2 e não deu muito certo. Então eu fiquei só com artes cênicas. Depois eu corri para São Paulo para o Antunes Filho. MARILIA GABRIELA – Com o Antunes no CPT (Centro de Pesquisa Teatral do SESC em São Paulo). CHARLES MÖELLER – No CPT. MARILIA GABRIELA – No CPT deve ter sido lá, com certeza, que você conheceu JC Serroni (José Carlos Serroni) ... CHARLES MÖELLER – ...Sim. M - Que é um dos maiores cenógrafos desse país. CHARLES MÖELLER – Sim, com certeza. MARILIA GABRIELA – ...Premiado, um talento...

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CHARLES MÖELLER – ...Que é o meu mestre assim... MARILIA GABRIELA – ...O seu mestre. Você começou a trabalhar com ele porque você desenhava bem. É isso? CHARLES MÖELLER – É. Na verdade assim Eu estava no CPT um pouquinho antes do Serroni. É... o Antunes resolve ter um cenógrafo contratado para desenvolver os trabalhos do centro de pesquisa. E eu já estava numa fase no CPT bem triste, bem molado. MARILIA GABRIELA – Porquê? CHARLES MÖELLER – Porque é muito difícil o CPT. O CPT é um processo muito difícil de você estar lidando o tempo inteiro com a sua auto-destruição, né. É uma “Faixa de Gaza”, né. Você está no CPT o tempo inteiro. Você lida com um mestre que estava lá com um bando de adolescentes e que começa a encarar o real da profissão. O real da profissão não é aquele glamour. Não é aquela possibilidade de sucesso, de glória. Quando você entra numa companhia tão séria quanto o CPT, você começa a tomar algumas porradas, NE. Você toma... precisa ter... eu tinha 18 anos. Tinha que ler a “Dialética”, a “Metafísica”, fazer o Desequilíbrio... MARILIA GABRIELA – ...a Retórica... CHARLES MÖELLER – ...a Retórica. Na verdade a gente não sabe nada disso. E você acaba não aprendendo direito. Você lê de orelha. Você tenta se enganar, que você está dentro daquele processo. Você fica lidando o tempo inteiro com a negação, né. Você não é bom, você não é o suficiente, você não nos interessa. É difícil essa fase da vida, você adolescendo, cheio de inseguranças, lidar com isso. Então, eu acho que a cenografia, ela me salvou muito disso, porque o Serroni entra no CPT. Ele faz uma audição é... para assistentes e ele logo vê em mim uma possibilidade de alguém que desenhava, que tinha alguma experiência com edificação, com planta e me chamou para trabalhar com ele. E ali o mundo começou, porque daí eu fiquei perto da companhia principal do Antunes, e comecei a trabalhar como assistente do Serroni em outros espetáculos fora do CPT. Porque a gente fica muito numa ilha no CPT. Você não podia fazer televisão naquela época. Eu praticamente vivia de comercial, é... de publicidade. Então assim... era muito fechado. O Serroni abriu muitas portas para mim, muitas portas e inclusive o amor a cenografia e o figurino.

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MARILIA GABRIELA – E o figurino veio também aí? CHARLES MÖELLER – O figurino veio porque o Serroni gostava mais de fazer cenografia do que figurino. Então assim... A força dele estava mais vinculada. Eu acho até que o próprio CPT exigia mais dele na parte de cenografia. E a gente que estava muito próximo começou a correr atrás do figurino. Então eu acho... que a gente correu paralelo ao figurino. E quando eu fui fazer um espetáculo junto com o Gabriel Vilella, o “Conselho do Amor”. O Gabriel ia fazer a cenografia e falou: “Eu vou te chamar para fazer o figurino. Então assim... me ajuda na cenografia, mas o figurino é seu.”. Então também era uma oportunidade de sair do CPT, sair do Serroni depois de 3 anos e assinar as minhas próprias coisas. MARILIA GABRIELA – Venha cá. Um pergunta... atrevida, mas eu vou fazer. Você fica frustrado de não ser ator, hoje em dia? CHARLES MÖELLER – Eu não fico frustrado MARILIA GABRIELA. Sabe porque? Porque a minha profissão como diretor, ela me deu tantas coisas. Assim, a minha profissão como ator era uma profissão, era um estado eterno de ansiedade assim. Um... MARILIA GABRIELA – Era isso? CHARLES MÖELLER – É. MARILIA GABRIELA – Era. Eu não sou bom. Que me parece que é o drama de todos os atores a vida inteira. Eu não sou bom o suficiente. Eu estou... Era isto? CHARLES MÖELLER – Era isto piorado. Porque eu acho que era assim.... Você... Eu fui para a Globo muito jovem. Eu fui para a Globo com 22 anos. E era uma época que não era, você não podia errar 350 vezes. Você tinha que fazer as novelas. Elas eram muito maiores. Era um esquema muito complicado. Então assim... E já com essa possibilidade de você já... é assim... você com 22 anos já fica se sentindo velho, porque tem um de 18 mais incrível chegando... assim sabe. E essa coisa do ator no país é muito complexo. Porque eu sempre brinco assim é... o ator, ele não tira férias, ele está desempregado, NE. Assim.... acabava uma novela. A novela durava um ano. Ótimo! Paguei as minhas contas. Você fica lidando com você gostando tanto, não gostando as vezes, porque é uma obra muito aberta. Então você não acerta todos os dias. Você não

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está bem em todas as cenas. E fica.... E no fundo você percebe que isso não é tão importante. Acaba uma peça, você está desempregado. Aquele eterno voltar para a fila era muito... MARILIA GABRIELA – ...doloroso.... CHARLES MÖELLER - ...doloroso. Eu acho que o envelhecer para mim como diretor me deu outra base. Me deu um plano de vida. Que como ator eu não tinha esse plano de vida. MARILIA GABRIELA – Então você nunca passou pela crise? CHARLES MÖELLER – Eu não passei pela crise porque a profissão de diretor me salvou. A profissão de ator ela... eu emendei muitas coisas assim. Eu lembro que eu emendava uma novela na outra, porque eu precisava trabalhar. E outra eu nunca deixei de fazer teatro. Então tinha brigas homéricas dentro das produções, porque eu não queria abandonar o meu lado de ator no teatro. As minhas peças como ator assim... eu fracassei em todas as peças assim. MARILIA GABRIELA – É mesmo? CHARLES MÖELLER – É porque as pessoas não iam. Eu fiz peças lindas com o Abujamra, lindas com o Gabriel (Vilella) MARILIA GABRIELA – Você foi dirigido por Gabriel, Abujamra, Bibi, quem mais? CHARLES MÖELLER – Bibi. Assim... eu tive muita sorte assim... eu tive assim... eu como ator pelo Takla... é assim... é eu pelo Antunes. Eu tive muita sorte como ator, porque eu sou de uma geração, eu tenho 45 anos.... e que todos esses grandes mestres... é eu estava no meio disso tudo, sabe assim. Então eu... acho bebi na fonte de todos... MARILIA GABRIELA – ...bebeu dessas fontes... CHARLES MÖELLER – E foi muito importante porque assim... é claro que assim... eu tenho... eu sou grato e são amigos queridos, ou a todos, porque eu acho que todos eles de uma certa forma contribuíram é para o ator e principalmente para o diretor que eu sou hoje. Assim todo o rigor do Antunes me traumatizou na época, mas o rigor do Antunes hoje é o rigor que eu levo a minha profissão então eu vejo claramente onde mora o Antunes dentro de mim assim onde mora o Abujamra dentro de mim.

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MARILIA GABRIELA – Mas você que trabalhou com diretores-diretores e atores-diretores, você é um ator-diretor você percebe um olhar mais generoso? CHARLES MÖELLER - Eu percebo completamente, porque por exemplo assim, eu como ator eu tinha horror a sentir medo enquanto eu... MARILIA GABRIELA -...era dirigido... CHARLES MÖELLER - ... era dirigido. Então assim... eu sei que por exemplo um processo de teatro existem 8 semanas. Eu preciso acarinhar o ator que está comigo, porque são 8 semanas. Ás vezes, a gente como ator, a gente tem uma péssima tendência a não entender que agente está em um processo. Que a gente não vai ter todas as respostas naquele minuto. Que a gente não vai conseguir escutar o que o diretor fala e realizar naquele segundo. A gente fica num estágio de ansiedade de poder realizar uma coisa... MARILIA GABRIELA - ...que atrapalha CHARLES MÖELLER – que atrapalha. Porque eu acho que se você tem medo, você patina. E eu acho que se você tem uma ansiedade aquilo... eu sempre brinco com o meu elenco que parece aquela arara azul, que fica no teu ombro falando: “você está errado, você está errado, você está ruim”. Esse olhar de fora te atrapalha muito. Quando o ator, ele consegue ficar completamente pleno, a vontade, sabendo que hoje ele conseguiu aquilo hoje, e ele amanhã ele vai conseguir aquilo mais um pouco. Se ele entender que o método de criação ele é dia a dia. E o método de compreensão é sempre quantitativo, ele explode. Porque eu acho que o método de ator é igual à física. É de quantidade para qualidade. Se você pega água e põe no fogo, vai depender da quantidade daquele calor para aquele estado de água virar outra coisa. É exatamente o processo de ator. É preciso ter uma chama acessa, acender você de uma certa chama, para aquele estado líquido virar o gasoso. MARILIA GABRIELA - É muito bonito. Olha aí é . Também não só na física, na arte como na vida. CHARLES MÖELLER – Na arte como na vida. MARILIA GABRIELA - O acúmulo é que vai te dando, vai te trazendo conhecimento, a experiência a tranquilidade para você fazer a coisa direito. CHARLES MÖELLER – E a repetição, né.

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MARILIA GABRIELA – Repetição CHARLES MÖELLER – Repetição. A gente, os brasileiros, eles têm uma negação com a repetição. E é uma coisa que eu não admito assim. Nos elencos, eu faço eles repetirem a exaustão, porque quando você prende, você liberta. MARILIA GABRIELA – Muito bom! Conversei com o produtor e diretor de Musicais CHARLES MÖELLER. Daqui para frente ninguém mais vai me ouvir falando CHARLES MÖELLER, chamando Praça Pan-Americana. CHARLES MÖELLER. Daqui a pouco eu volto com o também produtor CLAUDIO BOTELHO. Até já. Marilia Gabriela Entrevista: Charles Möeller & Claudio Botelho – 3º Bloco

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MARILIA GABRIELA - E agora eu continuo com o meu outro convidado o produtor CLAUDIO BOTELHO. Ator, cantor, compositor, diretor e tradutor, ele também é um profissional premiado e disputado no mercado teatral. Desde os anos 90, o seu nome já esteve à frente de importantes montagens dirigidas por diretores como Marco Nanini e Bibi Ferreira. Hoje por sua trajetória, pontuada de sucessos, nós podemos dizer que CLAUDIO BOTELHO ajudou a criar um novo padrão de qualidade para o Teatro Musical no Brasil. CLAUDIO BOTELHO Botelho – Mineiro de 20 de novembro de 1964. Diretor de Musicais. 31 espetáculos. Em cartaz com os Musicais: “O Mágico de Oz” e “Milton Nascimento – nada será como antes” MARILIA GABRIELA – Foi lá em Minas Gerais que surgiu esta inquietação que eu sempre imagino que seja o artigo 1º que dá num artista ou não? CLAUDIO BOTELHO – Acho que sim. Eu sou mineiro de Araguari. Eu nasci lá e morei em Uberlândia até os meus 13 anos. MARILIA GABRIELA – E esconde o sotaque até onde? Quando voçê... CLAUDIO BOTELHO – ...Escondo?! MARILIA GABRIELA – Quando você fica comovido, por algum motivo, volta? Vem ...beraba, ...berlândia, tudo aí ou não? CLAUDIO BOTELHO – Vem muito quando eu vou visitar os meus pais em Copacabana. Moro no Leblon, mas vou muito à casa dos meus pais. Aí em família é outro mundo. É isso. E quem está de fora acha muito engraçado, porque vem natural. É automático. MARILIA GABRIELA – Mas o teatro veio para você lá em Minas Gerais?... CLAUDIO BOTELHO – ...Não... MARILIA GABRIELA – já com Música ou não? CLAUDIO BOTELHO – Não. Eu não sabia nem que existia. Eu gostava muito de música, do rádio. E de ouvir rádio. E a minha família é muito modesta e tudo. Então não tinha nem tanto acesso a discos. Era uma coisa até cara para a gente. É... mas gostava muito de música. E a minha ligação era totalmente com a música. O teatro apareceu com... no Rio de Janeiro ao ver o Sergio Britto pela 1ª vez num teatro....

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MARILIA GABRIELA – Fazendo o quê? Se lembra? CLAUDIO BOTELHO – Fazendo “Papa Highirte”. MARILIA GABRIELA – Ah! CLAUDIO BOTELHO – Era o auge do governo Figueiredo. Acho que 78, talvez 79. MARILIA GABRIELA – Não vou saber que ano era. CLAUDIO BOTELHO – Para mim sim era forte, por causa disso eu estava saindo do Colégio São Vicente e fui... Ah vamos a um lugar chamado teatro. Não sabia nem o que era isso. MARILIA GABRIELA – Ah! CLAUDIO BOTELHO – E era “Papa Highirte”, do Vianninha com o Sergio Britto ali na minha cara e aquilo. Aquilo mudou a minha vida assim. Foi como eu... E tinha música por acaso na peça. E era uma peça muito forte. E o Sergio se tornou o meu amigo, meu professor. MARILIA GABRIELA – Mas você já cantava e tocava instrumentos até? CLAUDIO BOTELHO – Tocava violão, tocava piano. Sempre fui muito Musical e tocava tudo de ouvido. E fazia... e estudava um pouco também. Era música a minha coisa, mas o teatro, eu acho que o teatro quando chega perto da gente, ele toma um espaço muito grande, né. MARILIA GABRIELA – Nossa CLAUDIO BOTELHO - Ele passou até por cima da música. É eu acho que sim. Ele é muito sedutor, né, o teatro. Ele é... MARILIA GABRIELA – É que você faz... você basicamente faz Musical? CLAUDIO BOTELHO – Sim! É... eu acho que eu tive essa... Eu comecei fazendo qualquer coisa que aparecesse. Principalmente a parte de música na peça das pessoas. Na peça do Sergio Britto tinha um lugar para alguém tocar piano. E era a minha maneira de me aproximar. Na peça do Ary Fontoura, foi 1º a me dar um emprego de verdade. Eu com 19 anos escrevi canções para uma comédia do Ary Fontoura. E era ali que eu conseguia ficar perto do teatro. E ai eu entendi que havia um jeito que aquilo fosse um pouco melhor para mim. Além de fazer canção, era fazer daquilo um Musical, né. E existia Musical. E eu aprendi fazendo.

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MARILIA GABRIELA – E você cantou a partir de quando? CLAUDIO BOTELHO – Cantar sempre. MARILIA GABRIELA – Sempre? CLAUDIO BOTELHO – Mas não me sentia cantor. E ai comecei a achar que eu cantava direitinho. São muitas tarefas, né. E fui juntando um pouco as coisas. E tinha... eu sou um oportunista eu acho que... eu diria assim. Precisou de cantar, eu cantei. Nesse Musical aonde eu conheci o CHARLES MÖELLER, era... o Ítalo Rossi dizia poemas e eu em tese deveria tocar o violão. Mas o Fallabella estava lá e falou “canta uma coisa aí”. Eu cantei. Ele gostou e ficou, e foi ficando. Então eu virei cantor. MARILIA GABRIELA – Você acha que hoje, com o sucesso dos Musicais, os atores já estão se preparando mais para cantar e ser ator? CLAUDIO BOTELHO – Acho que a mudança é exponencial. Em 10 anos a mudança do 0 para o 80 por exemplo. MARILIA GABRIELA – É mesmo? CLAUDIO BOTELHO – É porque temos. Hoje a gente considera... Há 10 anos nós não poderíamos falar de um West Side Story no Brasil, né. E já tivemos. Não poderíamos falar de uma “Noviça Rebelde” onde todos cantassem. Tivemos. De “Um Violinista no Telhado” com um ator galã de televisão fazendo o papel e cantando as mesmas notas que o Topol (Chaim Topol) cantou nos anos 60 na Broadway. Nós estaríamos aqui falando disso? Não. MARILIA GABRIELA – Porque quem resolveu Zé Mayer? CLAUDIO BOTELHO – Quem o convidou? MARILIA GABRIELA – É. CLAUDIO BOTELHO – Nós, a gente já namorava o Zé Mayer MARILIA GABRIELA – Porque assim. Por causa do Musical que ele fez antes? CLAUDIO BOTELHO – Nem isso. Foi quando a gente fez “Company”. Já em 2001. O Zé foi assistir. Ou eu acho que foi a Verinha (Vera Fajardo), a mulher do Zé foi e falou: “Olha o Zé canta!”. Aí os loucos. Nós, Eu e o CHARLES MÖELLER loucos falamos: “Se ele canta então nós vamos fazer Follies com ele.” Loucos, nós queríamos fazer Follies, que é um Musical dificílimo. E aí ligamos para o Zé na cara de

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pau assim: “E você não que fazer um negócio chamado Follies e tudo?”. Aí ele foi até um teatro, o Café Pequeno, que a gente administrava na época e cantou para a gente. E a gente tomou um susto. E ele cantava muito. É musicista. Lê música e tudo. E Follies não saiu. E esse namoro continuou. A gente chamou ele para a “Ópera do Malandro”, ele não pode e aconteceu no “Violinista” e acho que aconteceu no lugar certo. MARILIA GABRIELA – Você também é uma coisa excepcional. Você é um adaptador-tradutor. Compositor Musical você já falou que é. É... música e literatura sempre estiveram presentes no seu trabalho me parece. É isso? Porque como é que você vira um adaptador? Como é que se pega um texto e faz? Você já ganhou prêmios por isso. Como é que dá para pegar um texto e saber como é ele vai soar semelhante em outro idioma completamente diferente? Você tem que ter a literatura na cabeça e na alma. Não é isso? CLAUDIO BOTELHO – Acho que você tem que ser letrista antes de mais nada. E eu tenho uma paixão muito grande por letras, por Chico Buarque. Eu acho que eu aprendi a gostar de música, de boa música por causa do Chico e das letras do Chico. Me sinto muito influenciado por isso. É... e ao entender que alguém precisava escrever as letras em português pro Cole Poter. Para aquele espetáculo que você viu. Eu falei: “Eu vou tentar.” E foi assim que eu... foi absolutamente tentativa e erro. E eu tenho uma coisa de fazer cantando. Imaginar como aquilo vai soar. Eu tenho é... acho que esta vantagem talvez de ser uma pessoa que canta. E ficar imaginando: “Isso vai soar estranho. Parece traduzido.” Então eu acho que eu tenho o despudor de dizer que as minhas letras não parecem traduzidas... MARILIA GABRIELA – ... E não parecem mesmo. CLAUDIO BOTELHO - ...Elas precisam soar como se fossem escritas por alguém nosso. MARILIA GABRIELA – Precisam caber na melodia. CLAUDIO BOTELHO – Sim. MARILIA GABRIELA – Por que a sensação que a gente tem, quando a coisa é mal traduzida. É que a letra não está cabendo na música. Não é isso? CLAUDIO BOTELHO – E que a maneira de falar é diferente da maneira de cantar, né. Tudo parece... eu não estou julgando a letra de ninguém, nem outros

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espetáculos, mas pode parecer que você inseriu um corpo estranho dentro da peça. Quando a letra não bate, né. MARILIA GABRIELA – Agora. Porque é que nós temos tantos espetáculos importados? Porque não existe uma autoria brasileira na atualidade para Musicais? CLAUDIO BOTELHO – Acho que Musical é principalmente, como o nome diz, música. É o Musical americano existe porque houve um Gershwin, um Cole Poter, um Richard Rodgers basicamente houve compositores. No Brasil nós tivemos no início do século a Chiquinha Gonzaga, o Ary Barroso. Essa gente escreveu para o Musical, parou. O Gênero não evoluiu. Ele voltou a funcionar nos anos 60 e 70 com o Chico, o Edu Lobo que também pararam de escrever para o teatro, ou não se interessam ou esse mercado não existiu. E é por isso que a gente não tem essa dramaturgia. Acho que a gente vai construí-la agora de novo. MARILIA GABRIELA – Acho que sim. Como se construíram, como tem se construído os atores de Musicais? CLAUDIO BOTELHO – Sim. MARILIA GABRIELA - Você acha que estão surgindo tentativas de autoria? CLAUDIO BOTELHO – Eu acho que sim. Nós tentamos com um espetáculo chamado “7”, que nós fizemos junto com o Ed Motta. Então o nosso foco era que... MARILIA GABRIELA – E fez sucesso CLAUDIO BOTELHO – Fez! Fez muito sucesso. Ganhou todos os prêmios. Nós ganhamos o APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes). Eu acho que é uma coisa rara ganhar uma dupla de diretores de Musical, hoje em dia, ganhar um prêmio tão importante quanto o APCA por conjunto da obra, por causa do “7” inclusive. A gente trouxe o Ed Motta e dissemos: “Você precisa escrever canção de teatro.”. E era deslumbrante o trabalho dele. Eu fiz as letras. É... e acho que essa é a maneira de você fazer Musical. Porque você precisa ter um compositor, senão não existe teatro Musical. MARILIA GABRIELA – Agora. Quando eu perguntei assim: “Quem gosta mais é o Rio de Janeiro é que gosta mais de Musicais?” Você virou... vocês 2 falaram assim: “Os 2!”. Os 2 você resumiu a São Paulo e a Rio de Janeiro. Eu quero saber se

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reside nessa resposta a dificuldade de viajar com o Musical? Você disse que são 70 pessoas para montar um espetáculo todos os dias. Não é isso? Estou imaginando em cena e fora dela. CLAUDIO BOTELHO – Sim. MARILIA GABRIELA – Cenários, tudo,... CLAUDIO BOTELHO – ...Orquestra... MARILIA GABRIELA – ...Figurinos, orquestra. Isso inviabiliza viajar o espetáculo? CLAUDIO BOTELHO – Se você quer viajar com a qualidade de onde ele nasceu sim. Eu acho que a gente vai evoluir. Os próprios Musicais americanos viajam, mas eles têm um sistema que chama Broadway Tour. Que ele foi inventado até por um sujeito que a gente conhece hoje em dia. É um cara chamado Becker (Rob Becker). Que criou uma coisa que você coloca no caminhão, ele viaja, ele entra e o ator chega depois e só entra em cena. Mas isso levou anos. Antigamente também não se viajava. É... nós não conseguimos fazer isso ainda. Até porque para você montar “Um Violinista no Telhado” você precisa de 10 dias num teatro. É... e nenhum teatro em Belo Horizonte ou em... MARILIA GABRIELA – Tem essa disponibilidade? CLAUDIO BOTELHO – É assim. Eu posso ficar... bloquear um teatro por 10 dias. Você não consegue explicar para os donos de teatro. Ainda somos índios nesse sentido. Já crescemos demais. É... eu não estaria aqui com essa honra de falar com você, se a gente não tivesse evoluído tanto. Mas ainda tem muita coisa pela frente. MARILIA GABRIELA – Agora oh CLAUDIO BOTELHO é... você... qual é a sua liberdade, quando você vai montar um espetáculo importado. Porque eu sei que vocês trazem, bom quase sempre, vem uns técnicos dos Estados Unidos para verem tudo, do cenário ao elenco. É isso? CLAUDIO BOTELHO – Não, não. São 2 maneiras... quer dizer, existem várias maneiras de fazer, mas os Musicais, chamados Musicais da Broadway você pode fazer o que é feito por exemplo pela Time For Fun, que é onde eu trabalhei anos e fiz “O Fantasma do Ópera”, “A Bela e a Fera” “Les Meserables”, “Chicago”, fiz tudo montado por estrangeiros. Essa é uma maneira do que você chamaria de “franchising” ou

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“réplica”. O que nós fazemos é a gente compra os grandes direitos que são: música, letra e texto, e nós fazemos o que queremos. Não tem ninguém supervisionando. MARILIA GABRIELA – Ah! É mesmo assim?! CLAUDIO BOTELHO – O meu e do CHARLES MÖELLER, nós nunca fizemos réplica. MARILIA GABRIELA – Então o que a gente vê desses que vem de fora e que está na mão de vocês é a versão dos 2? CLAUDIO BOTELHO – É a nossa versão. É como se fosse “A Gaivota” do Tchekhov por exemplo. Entendeu?! Você tem “A Gaivota” do Lavelle (Jorge Lavelle), “A Gaivota” do... Infelizmente aqui tem “O Violinista no Telhado” de CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. É no caso do “Violinista”, por exemplo, faz parte do obra a coreografia do Jerome Robbins. Montar aquilo sem essa coreografia me parece montar a Sinfonia de Bethoveen com outra orquestração. MARILIA GABRIELA – Entendi. CLAUDIO BOTELHO – A coreografia do Jerome Robbins também é replicada. Porque vem um guia para você fazer. Mas a nossa “Noviça rebelde” é a nossa. Não existe. O nosso “Mágico de Óz” inclusive nunca foi feito na Broadway. Está em cartaz ainda no Rio. Essa é uma montagem ainda inédita, né. MARILIA GABRIELA – E “O Mágico de Óz” é um antigo espetáculo? CLAUDIO BOTELHO – É um espetáculo de 39, né. MARILIA GABRIELA – De 1939! CLAUDIO BOTELHO – Foi um filme, né. MARILIA GABRIELA – É... o filme bom... CLAUDIO BOTELHO – Ele não era uma peça. MARILIA GABRIELA - .... o Filme é... CLAUDIO BOTELHO - Pois é aquilo foi criado para o filme, né. Ele nunca foi um Musical de teatro. Foi antes, mas com outras músicas. Ao virar filme, ele não chegou a Broadway. Ele teve uma temporada no Madison Square Garden até com o Mickey Rooney fazendo o Mágico. E tem uma montagem em Londres agora, mas que é uma montagem híbrida, porque ela tem músicas do Andrew Lloyd Webber, versão dele do “Mágico”. A nossa versão é a única baseada no filme.

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MARILIA GABRIELA – Para terminar esse nosso bloco eu quero fazer a pergunta diferentemente para você. O CHARLES MÖELLER se encontrou. Ele se definiu pela direção. Fazer o que ele faz. E explicou muito bem porque. Você continua atuando? CLAUDIO BOTELHO – Eu.. eu.... MARILIA GABRIELA – pelo menos foi quem atuou mais desde que a dupla se formou? CLAUDIO BOTELHO – Por ironia né! MARILIA GABRIELA – É você que tem atuado mais. Por quê? É uma escolha sua? CLAUDIO BOTELHO - Eu morro de vontade de fazer mais. Não faço porque não dá tempo. Acho que o meu ofício é ficar por trás. É escrever as letras. É trabalhar na produção. Dirigir e brincar com a música, mas adoraria poder fazer mais. Mas acho que é apenas vaidade. Então às vezes eu deixo para lá. E prefiro trabalhar para que a gente consiga fazer mais espetáculos. Ma sou... adoro ficar em cena. Adoro poder cantar e adoro toda a oportunidade que eu tenho de inventar uma coisa que seja para mim. Nunca fazer uma coisa que não pareça comigo. Mas se tiver uma coisa meio Gosh, meio onde eu possa me expressar. Eu adoro fazer. MARILIA GABRIELA – Como que é mesmo que é feito para você, por exemplo? CLAUDIO BOTELHO – Por exemplo, “Company” é um personagem cinzento, né?! Ele fica em cena. Ele é o principal, mas ele mal fala. Então eu acho... eu poderia... eu fiz Company. MARILIA GABRIELA – Você é um cara tão eloquente. CLAUDIO BOTELHO – É. MARILIA GABRIELA – Você é tão preparado. Porque você fala: eu quero estar em cena, mas sombriamente de alguma maneira? É isso que você está falando? CLAUDIO BOTELHO – É... talvez eu esteja sendo modesto, né mas eu acho que é... eu tenho um pouco de medo de pessoas que por terem o poder. Eu tenho o poder de decisão, né?! Atualmente eu tenho 47 anos, consegui construir algumas coisas

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e posso dizer: “Vou montar West Side Story e eu sou o Tony”. Porque isso existe na nossa profissão, né?! MARILIA GABRIELA – Eu entendi agora. CLAUDIO BOTELHO – As pessoas são Hamlet. Não é isso?! Elas são um monte de coisas, né?! Eu tenho muito medo de pagar esse mico. Então eu prefiro ficar sendo o “Nacinho”, o “Cinzento” e tudo. E aí eu me divirto do mesmo jeito né.

Marilia Gabriela Entrevista: Charles Möeller & Claudio Botelho – 4º Bloco

MARILIA GABRIELA – Olha aqui... Qual foi o espetáculo ah... mais complicado, para vocês, nos detalhes, até ficar pronto? Qual foi? CHARLES MÖELLER – O Mágico de Oz. MARILIA GABRIELA – O Mágico...Porque? CHARLES MÖELLER – Porque a gente teve que lidar com equipes diversas em 8 semanas. Tinha equipe de voou, equipe de efeito especial, equipe de pirotecnia, equipe de 3 cachorros. Foi um cronograma de produção muito complexo. O Mágico ele é a verdade um espetáculo de poucos personagens, mas com muitos bailarinos. É um espetáculo que é quase um roteiro de cinema. Ele nunca volta para um lugar. Ele começa no Kansas e acaba no Kansas. O meio disso é uma Zona. Inclusive tem um tornado no meio. MARILIA GABRIELA – Tem um tornando é?!. Eu ainda não vi o espetáculo. Vocês conseguiram fazer um tornado lá? CHARLES MÖELLER - Existe um tornado? CLAUDIO BOTELHO – Um tornado. MARILIA GABRIELA – É? E não é o ”Tony”? CHARLES MÖELLER - Não CLAUDIO BOTELHO - Seria bom fazer um Tony. MARILIA GABRIELA - Este é um tornado. Olha aqui. Eu li também que vocês estariam fechando uma cede em São Paulo. Que seria o Teatro GEO. É verdade isso?

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CLAUDIO BOTELHO – Nós somos é..., atualmente, é...contratados da Geo. Somos parceiros da Geo Eventos, que é um braço das Organizações Globo. MARILIA GABRIELA – Que é um teatro maravilhoso, que foi inaugurado com o Fagundes e o Takla... CLAUDIO BOTELHO – ...com o Fagundes e com o Takla... MARILIA GABRIELA – ...e o Takla, e fica no Instituto Tomie Ohtake. CLAUDIO BOTELHO – Isso. Esse teatro, ele então, de certa forma, a gente passa a dirigir o teatro artisticamente já parceiros. MARILIA GABRIELA – Você está falando: vão ser curadores? CHARLES MÖELLER – É. CLAUDIO BOTELHO – De certa forma. Curadores dos Musicais que vão acontecer. Que tem muitos eventos e tudo. Mas dos Musicais certamente. Vamos estrear lá “Como vencer na vida sem fazer força”, que é essa minha peça do coração. MARILIA GABRIELA – E Milton Nascimento? CLAUDIO BOTELHO – Milton Nascimento CHARLES MÖELLER – O Milton foi um assim, na verdade, uma paquera antiga. Né?! A gente tinha um projeto de fazer um espetáculo que ele seria o autor chamado “O Último Trem” é... há muitos anos atrás. E esse projeto foi, entrou numa entre-safra e isso foi meio esquecido. A gente fez os “Beatles”. O Milton enlouqueceu com os “Beatles”. Ele assistiu os “Beatles” 8 vezes. E a gente ficou vamos retomar esta parceria. Vamos retomar o espetáculo com a gente. Acho que era o aniversário de 50 anos de carreira dele. E a gente está muito feliz de fazer. O espetáculo chamado “ Nada será como antes”. E com um “elencasso”. E a gente está estreando agora. Né! MARILIA GABRIELA – Quando foi mesmo que vocês brigaram de porrada? CHARLES MÖELLER – É... CLAUDIO BOTELHO – É porque você não viu. CHARLES MÖELLER – Você não viu como ficou a porta. MARILIA GABRIELA – Agora... porque é que vocês brigam?

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CHARLES MÖELLER – Eu acho que o sucesso da dupla, vamos dizer assim, acho que está no atrito. Acho que a gente ainda tenta se provar muito um com o outro assim. Eu acho que seria muito difícil a gente está no nosso 32° espetáculo! MARILIA GABRIELA – Nossa... que maravilha isso! CHARLES MÖELLER – É. E se você... MARILIA GABRIELA - Maravilha e que drama! CHARLES MÖELLER – É... e eu acho que na verdade assim, se você não tem ainda esse atrito né... para andar, para provar. Eu ainda me sinto... é.... no dever de me superar, para mostrar para o CLAUDIO BOTELHO que eu posso melhorar e eu acho que vice-versa. A gente ainda é... MARILIA GABRIELA – O vice-versa é verdade? CLAUDIO BOTELHO – É verdade. Mas as brigas são todas... MARILIA GABRIELA – Você também tenta se provar para ele? CLAUDIO BOTELHO – O tempo inteiro. E as brigas eu acho que são... brigas artísticas. São de bater porta. Porque acha que o ator devia entrar pela direita. Não é pela esquerda. E isso gera um atrito mesmo. CHARLES MÖELLER – E eu acho que tem uma coisa bacana e eu acho até como o jeito que a gente encara a nossa profissão, é sempre um pouco, é tudo é uma questão de vida ou morte. Então, ás vezes assim, quem está de fora não acredita que a gente está brigando, quase se enfartando por causa de uma marca, por causa de uma palavra na versão dele, porque eu botei o ator sentado antes e não devia, é assim, são brigas e eu acho que é essa, a gente aprendeu a brigar bem. É todo mundo pergunta qual é o segredo desta longevidade eu acho a gente é bom de briga. MARILIA GABRIELA – Vocês são bons de briga e vocês devem ter férias um do outro também ou não? Ou quando vocês têm férias vão os 2 procurar espetáculos um para o outro mundo a fora? CHARLES MÖELLER – É tipo isso. MARILIA GABRIELA – É isso? CLAUDIO BOTELHO – É uma vida boba. Né. MARILIA GABRIELA – Que coisa horrorosa.

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CLAUDIO BOTELHO – É férias é Nova Iorque ou Londres para assistir Musical. MARILIA GABRIELA – É o que vocês fazem? CHARLES MÖELLER – É. CLAUDIO BOTELHO – Ãh. Infelizmente ou felizmente. Que tem alguma coisa melhor do que ver Musical!? MARILIA GABRIELA – Não. Eu acho que não. CLAUDIO BOTELHO - e sair toda noite para jantar depois.?! Deve ter. CHARLES MÖELLER - Lógico MARILIA GABRIELA – Não. Eu acho que não. MARILIA GABRIELA – e vocês brigam nas férias, ou nas férias não tem briga? CHARLES MÖELLER – Eu acho que a gente briga sempre. CLAUDIO BOTELHO – A gente não brigou aqui CHARLES MÖELLER – É a gente está bem em São Paulo, essa época MARILIA GABRIELA – Olha! Muito bom ver vocês. Levamos 9 anos para esse encontro profissional aqui. Quero dizer. Aquele outro nosso a gente vai combinar depois. E eu quero saber de vocês hoje a frase, o ditado, pensamento ou o verso do dia. Quem começa? CLAUDIO BOTELHO – Antes só do que mal acompanhado. CHARLES MÖELLER – A vida é muito difícil para ser levada a sério. MARILIA GABRIELA – Muito bem! Gente, muito obrigado! Parabéns mesmo! Obrigado pela entrevista. Eu conversei hoje sobre tudo isso que vocês viram: Musicais, talentos, palcos, vida. Com os produtores e tudo mais que eles são, os talentosos CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. E a gente se encontra aqui na semana que vem. E até lá.

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ANEXO 2 ENTREVISTA 2 http://mrzieg.com/2012/05/26/zieg-de-olho-reiner-tenente/

Zieg de Olho: Reiner Tenente Escrito por Madame Brice. Postado em Em Foco, Zieg de Olho

Publicado em maio 26, 2012

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Reiner Tenente O Mr. Zieg dessa vez foi atrás de um grande talento, uma das revelações mais recentes do Teatro Musical brasileiro: Reiner Tenente. Nascido em Divinópolis, o mineiro tem muita bagagem e não é surpresa para quem já o acompanha há tempos ver esta enxurrada de elogios e críticas positivas pelo seu sólido trabalho no incrivelmente bem-sucedido Musical brasileiríssimo Tim Maia – Vale Tudo, ao lado de Tiago Abravanel.

Reiner é ator, cantor e arte educador. Com formação em Artes Cênicas (Interpretação e Licenciatura) pela UniRio, além de Pós-Graduação em Preparação Corporal para Artes Cênicas naFaculdade Angel Vianna, Reiner também fez diversos cursos com profissionais renomados como Ana Achcar (interpretação), Mirna Rubim e Danilo Timm (canto), Elaine Petricoff e Christian Fletcher (teatro Musical), Flavio Salles (sapateado), entre outros. Nos Estados Unidos, fez curso de interpretação no California Institute of Arts.

Veterano no teatro, podemos destacar entre seus trabalhos: Roda Viva, de Chico Buarque, com direção de Patrícia Zampirolli e supervisão de André Paes Leme; Tip e Tap – Ratos de Sapato, com direção de Ronaldo Tasso e músicas de Tim Rescala; O Avarento de Moliére, com direção de Bruno Bacelar; Guernika, de Fernando Arrabal, com direção de Manoel Guerreiro; I Capuleti e I Montecchi, com direção de Ana Kfouri; A Era dos Festivais e Raul Fora da Lei, ambos com direção de Roberto Bomtempo, além de performances como ator, cantor e dançarino no Grona Lund em Estocolmo, na Suécia.

Desde o ano passado, Reiner passou a colecionar não apenas mais fãs de seu trabalho, mas também elogios fervorosos de grandes peritos como o diretor João Fonseca, a atriz Alessandra Maestrini, o jornalista Ubiratan Brasil do jornal Estadão, Artur Xexéo do jornal O Globo, Sabrina Wurm da Veja Rio, Rubens Ewald Filho em seu blog de críticas, Dirceu Alves Jr. da Veja São Paulo e o escritor e produtor Musical Nelson Motta, uma das figuras icônicas interpretadas por Reiner

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em Tim Maia. Além de Nelson Motta, Reiner dá vida a ninguém menos que Roberto Carlos sem jogar o personagem na caricatura, geralmente vista por comediantes e imitadores, entre outras figuras históricas na vida de Tim.

Em uma entrevista descontraída e bem-humorada, Reiner nos presenteou com ‘causos’ e fatos da história do Teatro Musical e do teatro brasileiro, deu uma aula de preparação e ética profissional, além de uma notícia em primeiríssima mão para os nossos leitores: a inauguração do seu IBTM (Instituto Brasileiro de Teatro Musical) sediado no Rio de Janeiro e que promete mudar o panorama da formação de atores, cantores e bailarinos no Brasil.

Mr. Zieg: Com tantos anos de carreira e intenso investimento pessoal no mercado do Teatro Musical, como você vê o ator desta área no Brasil?

Reiner: Eu estou em processo de produção da minha monografia para o

meu curso de Pós-Graduação em Preparação Corporal nas Artes Cênicas e o foco dessa monografia está em um olhar pedagógico sobre o ensino do Teatro Musical, então eu estou desenvolvendo esta visão do panorama da formação dos atores através de experiências que eu tive tanto como ator quanto como arte educador. Eu dou aula desde os 18 anos, então já dou aula há bastante tempo (risos) e eu pude experimentar algumas coisas. Eu tenho feito pesquisas com os meus alunos de

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uns 3 ou 4 anos pra cá e eu fui instigado a fazer essa pesquisa por vários motivos. Um é porque não existe ainda essa sistematização para formar atores de Musical no Brasil. Geralmente, nossos atores têm que ir pra fora para adquirirem formação nessas três áreas abordadas pelo Teatro Musical. Já tem pouco mais de 10 anos desde o retorno definitivo do gênero no Brasil e já somos o terceiro país que mais produz Musicais no mundo. E apesar de as pessoas falarem que já tem muita gente preparada para o mercado no Brasil, ainda estamos bem aquém do nível de qualidade que o brasileiro realmente pode alcançar. O Teatro Musical sempre foi colocado à margem por vir de uma cultura popularesca, então os intelectuais sempre menosprezaram a nossa arte por ela supostamente ocupar o lugar das ‘grandes manifestações artísticas’ como a ópera, por exemplo. Por isso, o Teatro Musical tende a entrar no lugar do entretenimento, só que nós não podemos esquecer que Teatro Musical é, antes de tudo, teatro! Nós não podemos ter apenas virtuoses em cena, senão a gente só confirma o lugar do entretenimento pelo entretenimento. Mr. Zieg: E isso se confirma no seu próprio trabalho no Musical Tim Maia…

Reiner: (Risos…) Obrigado! Isso é um elogio! Mas é o que eu tento fazer! O meu diretor (João Fonseca) esteve em Nova York e me disse: “Reiner, cantar e dançar todos já fazem! Lá, os caras têm que provar que são bons atores”. Aqui no Brasil, priorizamos quem canta, se não atua, dá-se um truque.

Reiner em cena

Mr. Zieg: Então como você vê essa balança entre técnica e o talento, o dom natural?

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Reiner: O ator de Teatro Musical tem que ter um domínio técnico muito grande! Mas se ele tiver só o domínio técnico, ele vira o que eu costumo chamar de marionete do diretor. O cara não propõe, não cria, não tem senso crítico, nem poder de análise, nem questionamentos. O teatro é arte! E a arte tem uma função. A arte não pode só divertir, precisa fazer sentir, fazer pensar, precisa instigar, precisa ser transformadora! Então o Musical tem esse grande poder de ser transformador, até porque ele usa de cara três vertentes: dança, canto e teatro. Portanto temos ainda mais armas para cumprir essa função transformadora da arte do que o teatro, a dança e a música isoladamente. Mas por alguma razão, no Teatro Musical, essa função nem sempre está sendo cumprida! E não é porque o espetáculo não é bom, a dramaturgia não é boa, a música não é boa, mas porque o ator, muitas vezes, tende a ser apenas um virtuose. Ele se armou de aparatos técnicos, foi preparado pra fazer aquilo, se enfiou numa aula de canto, se jogou na aula de dança, fez um curso de interpretação aqui, outro ali, mas não cumpre verdadeiramente o ofício do ator que deveria ser a base de tudo que ele faz num palco! Hoje nós quase não temos teste de interpretação nas audições de Musicais! E foi isso que me instigou nessa pesquisa! Eu sou, antes de tudo ator. Depois eu fui estudar canto e dança para poder fazer o que eu sempre fui apaixonado: Teatro Musical. Desde antes de existir mercado eu já era completamente apaixonado por isso, então o que existisse eu queria estar fazendo, mesmo que eu precisasse criar meu próprio espetáculo ou a minha própria linguagem.

Mr. Zieg: No Musical Tim Maia você faz vários personagens, mas tem dois deles que o público reconhece e responde prontamente, que são o Roberto Carlos e o Nelson Motta. Como foi o processo de criação e pesquisa para a preparação destes personagens?

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Reiner como Roberto Carlos ao lado de Tiago Abravanel em Tim Maia

Reiner: Eu vou falar uma coisa que, na verdade, eu acho que ninguém sabe. Vocês vão ser os primeiros a saber. O único que fez teste para o Musical foi o Tiago (Abravanel) com outros possíveis atores para o papel do Tim. O restante todo do elenco, foi convidado. E o João (Fonseca – diretor) não sabia quem ia fazer o que. Quando ele me ligou, ele disse que queria me ver e ver se eu era capaz de desenvolver o que ele queria e citou nessa ligação o Roberto Carlos. Na hora que ele desligou, eu pensei ‘Ele vai me fazer imitar o Roberto Carlos!’, então eu corri para uma preparadora de atores e fiz um trabalho com ela muito rápido e específico em que nós fizemos uma pesquisa juntos para trazer a voz do Roberto, até porque eu não queria imitá-lo. Eu não sou humorista, imitador, eu sou ator! E eu precisava fazer este personagem ser verdadeiro o bastante para chegar na plateia e ajudar a contar esta história, então eu não podia ficar na caricatura. Teve gente que me elogiou usando o termo caricato depois que viu o Musical. Eu nunca vi como crítica negativa. A Veja até fez uma matéria com o título Emoções Sim, Caricatura Não. Eu não acho ruim a questão do caricato, contanto que a verdade esteja ali. Se tem verdade, se tem força, não tem nenhum problema a caricatura. Acho até divertido (risos). E aí eu fiz essa pesquisa rápida e dois dias depois a produção estava me ligando para negociar cachê. Uma semana depois começamos a ensaiar e ainda não tinha nada definido, então o João colocou cada um de nós para ler um personagem e eu li o Roberto e acabou rolando. Aí eu fui pesquisar de verdade sobre a vida dele e, claro, os trejeitos de falar e andar. Ele é um cara que não tem escândalos na vida, ele é um cara muito reservado. Eu interpreto o Roberto Carlos numa época em que não se tem nenhum registro dele, que é na adolescência, quando ele formou a banda Os Sputniks com o Tim… Eu precisei ver o que o Roberto se tornou e como ele

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se portou desde que se tem registro dele para poder resgatar esse adolescente. Então, levando em conta essa personalidade tranquila e reservada, eu criei um Roberto tímido. Não se sabe e eu não tive acesso a ele para compor o personagem. Ele não foi ver ainda, mas o Otávio Mesquita entrevistou a gente e me disse que tinha entrevistado o Roberto um dia antes e que falou pra ele: “Tem um cara no Tim Maia que não tem nada a ver com você, mas que a gente te vê em cena e ele é melhor do que você!”. Eu achei isso um superelogio! Porque eu realmente não tenho nada a ver com o Roberto, mas se as pessoas acreditam nesse Roberto Carlos, eu fico feliz pois acho que eu consegui cumprir meu ofício de ator, que é o que eu preciso fazer, né?

Mr. Zieg: Mas quando você canta, você não tenta imitar a voz dele…

Reiner: Na verdade, eu faço uma menção. Eu jogo a voz um pouquinho mais pro nariz (demonstra) e limito a isso, porque se eu imitar de verdade, a pessoa vai conseguir ver o personagem, pode rir muito dele, mas não vai a fundo, não fica humanizado. Eu preciso colocar características minhas pra essa criação ficar orgânica. A vivência do cara é diferente, a estrutura do aparelho fonador é diferente, então iria pra um outro lugar onde eu possivelmente não conseguiria me conectar tanto com a verdade desse personagem.Eu não copio e nem tento, só menciono.

Reiner como Nelson Motta ao lado de Tiago Abravanel em Tim Maia

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Com o Nelson Motta foi diferente porque a filha dele, a Joana Motta, é a nossa produtora, então eu tive ela ali para me auxiliar com algumas informações. Ela me disse que a voz do pai dela, quando ele era jovem, não era essa voz grave de hoje que a gente conhece. E eu não tinha esse material em vídeo pra poder ficar examinando como eu tinha com o Roberto, então com o Nelsinho eu fui muito mais nas questões psicológicas e nos sentimentos e sensações que o Tim causava nele e eu resolvi teatralizar isso. Tem uma cena em que eu dou um piti absurdo. É claro que o Nelsinho não fez aquilo, mas eu tomei a liberdade junto com o meu diretor e inclusive mostramos pro Nelsinho num ensaio pra ver se ele aprovava, e ele superaprovou. Eu só teatralizei um estado de desespero que o Nelsinho estava naquele momento. Ele estava muito inquieto, roendo unha, porque a Joana me contou que ele rói muito a unha, e eu fiz isso explodir em cena para funcionar teatralmente. Então foi assim que eu criei estes personagens e eu fiquei muito satisfeito com o resultado porque de alguma forma isso comunicou e chegou no publico ajudando a contar essa história. E eu não tinha recursos cênicos pra isso como figurino e caracterização, tinha que ser só com trabalho de ator. Pra não dizer que não tem nada, o Nelson Motta coloca uns óculos escuros, então eu tinha que me garantir na atuação assim como o restante do elenco. O João tem essa característica: ele troca, ele se estofa muito do material do ator, ele vai descobrindo com o ator o que fazer, vai arrancando o melhor do ator. Eu acho isso uma direção muito inteligente, não é essa direção vazia, plastificada e estética apenas que a gente vê às vezes.

Mr. Zieg: Então você acha que o futuro do Teatro Musical no Brasil é de se ter diretores de teatro convencional vindo para o Musical, tratando a música da mesma forma que se trata um monólogo, um diálogo…?

Reiner: Sem dúvida! A música faz parte da estrutura dramatúrgica de forma fundamental. A música é texto. Ela só entra como música por uma questão de estética e de linguagem e porque eu acho que a música faz aquele texto ter muito mais vida e muito mais força. O entendimento do texto a pessoa tem que ter, independentemente de ser musicado. É elemento fundamental. Os diretores brasileiros de Teatro Musical

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tendem a ter suas origens no teatro convencional porque a cultura do Musical é muito recente. O (Jorge) Takla é do ‘teatrão’, o Charles (Môeller) é do ‘teatrão’, antes de serem do Musical, ou seja, são antes de tudo homens de teatro e por isso são bons. O João Fonseca e o Charles foram dirigidos pelo Takla. Então eu reafirmo que a questão, que eu nem vou chamar de problema, está no material artístico que esses diretores têm na mão. Eles têm que ter bons atores-cantores, têm que ter, senão o cara não vai atingir aquela nota e vai ser mais difícil ele ficar confortável para atuar e se jogar no personagem. Quem tem que se preocupar é o ator. O ator tem que ter todo o aparato técnico, mas também tem que ter esse material artístico para oferecer pro diretor. Se o diretor não tem esse material, ele vai ter que fazer quase o impossível pra esse material brotar em pouquíssimo tempo de ensaio. E ainda tem o perfil vocal, o perfil físico, é muita coisa. Então eu acho que o cara já tem que chegar pronto! O que falta pra produção no Brasil ser genial não são os diretores, nós já temos muitos diretores que têm competência pra isso. Não é grana, a gente já tem grana pra investir nisso. A gente também tem cenógrafos, figurinistas e equipes técnicas boas o suficiente para fazer isso. Eu acho que ainda faltam os atores! Ator nenhum nasce do dia pra noite. Começa a se preparar hoje e já projeta sua primeira audição pra daqui pelo menos 3 ou 4 anos de trabalho duro. Não é assim com médicos, advogados, etc? Com o ator não deve ser diferente.

Mr. Zieg: E com o que o Brasil oferece hoje, como você acha que um ator se prepara?

Reiner: Um ator se prepara fazendo aula de canto, aula de dança e aula de interpretação! De preferência uma aula de interpretação voltada para o Teatro Musical, mas teatro é teatro e ele vai ter as especificidades do ofício e vai adaptar isso pra linguagem do Teatro Musical. Mas ele precisa fazer essas aulas! No Rio de Janeiro, não se tem uma escola especializada. Em São Paulo, nós temos uma boa escola especializada (4Act Performing Arts), o que é pouco perante a esse mercado gigante. As academias e as universidades não têm uma matéria voltada para o Teatro Musical, é uma luta, eles não reconhecem o gênero como importante e significativo ainda e acabam

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deixando o Musical à margem. O ator de Musical tem que correr de uma aula pra outra, gasta uma fortuna e ele aprende todas essas linguagens de forma separada e depois tem que juntar tudo isso na marra quando ele passa numa audição! Eu fui professor da UniverCidade e eu dava um curso de extensão na faculdade. Eu tive um aluno há mais ou menos um ano e meio que se chama Fábio Gonçalves. Esse aluno foi com a filha dele e ele é um apaixonado por Musical desde sempre, ele morou em Nova York, faz aulas de canto e trabalha na área da educação. E ele fez o meu curso e, por se identificar com meu trabalho e metodologia, me perguntou se eu gostaria de dar aula numa escola de Teatro Musical que ele pretendia montar. Eu prontamente disse que adoraria e que seria uma realização. Passou-se um ano e ficamos conversando sobre como seria essa escola.

O prédio que abrigará o IBTM está sendo reformado

Até que em outubro do ano passado, ele me convidou para ser sócio dele nessa escola que seria a primeira escola para teatro Musical do Rio de Janeiro. E já tem nome, se chama IBTM – Instituto Brasileiro de Teatro Musical, já tem um prédio comprado no Flamengo (bairro carioca) que está em finalização de reforma com projeto do arquiteto Miguel Pinto Guimarães para ser inaugurado em agosto. O Miguel, além de ser um arquiteto renomado e maravilhoso, é também outro apaixonado por Musicais, então eu sei que ele está fazendo esse projeto com muito mais amor. O Fábio resolveu fazer esse investimento, não só financeiro, mas um investimento de vida, de carreira, um investimento pessoal mesmo. E a gente já vai abrir a escola com cursos livres de canto, dança e interpretação, workshops específicos e uma Pós-Graduação em Teatro Musical com a chancela da Gama Filho. Já estamos encaminhando a criação de uma primeira

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faculdade de Teatro Musical no Brasil, que, diferentemente de uma graduação em artes cênicas, vai trazer uma grade curricular completa para o aluno ter a junção dessas três vertentes abordadas pelo Musical em 4 anos de curso.

Mr. Zieg: E em relação às áreas técnicas? O Brasil ainda tem uma defasagem muito grande com relação a cursos para stage manager, produção, cenografia, direção para Teatro Musical…

Reiner: Tem que ter esses cursos! Muita gente está aprendendo estas áreas técnicas batendo a cabeça na parede e entrando no mercado. Mas a nossa preocupação inicial é a formação de atores de ponta para o mercado, porque essa é nossa maior urgência . Vamos focar na qualidade destes profissionais mesmo. Só sai da escola formado quem tem a qualidade que o nosso mercado merece! E uma coisa muito importante que eu queria falar é que a gente quer fomentar o Teatro Musical brasileiro. Eu sou apaixonado pelo Teatro Musical americano, acho que eles são os papas da nossa profissão, mas eu acho que a gente já tem material para começar a fomentar o nosso Teatro Musical. O brasileiro é Musical por natureza, tem muita cultura. A gente já tem o projeto de um curso de dramaturgia para Teatro Musical, um curso de composição para Teatro Musical, um curso de direção para Teatro Musical e o curso de atores. Então um aluno do curso de dramaturgia escreve o texto e se junta com os compositores do outro curso. Essa obra pronta, com dramaturgia e canções elaboradas em conjunto entre os alunos do curso é levada para o curso de direção e os alunos de direção vão selecionar os atores que estão se preparando na escola. E esse espetáculo vai ser montado com tudo sendo produzido pelos próprios alunos para começarmos a nutrir o Teatro Musical brasileiro. Porque hoje em dia a gente tem muito Musical biográfico. Tem o Tim, tem o Musical da Elis (Regina)… E também temos criadores de espetáculos brasileiros como o Chico Buarque, o Charles e o Cláudio com o Ed Motta no 7- o Musical, o Gustavo Gasparani, o Oswaldo Montenegro, o Daniel Salve… Mas precisamos de mais pessoas criando e fazendo estes Musicais brasileiros ganharem a mesma proporção que as produções importadas ganham quando chegam aqui! Temos matéria-prima pra isso já…

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Mr. Zieg: Muito obrigada pela deliciosa entrevista, Reiner!

Reiner: Obrigada vocês! O Mr. Zieg é mais uma conquista imprescindível para a nossa arte. O site de vocês é fundamental para o nosso ofício e alimenta novos talentos e pessoas que já estão no mercado, mas não tinham o acesso a essas informações. Vocês estão ajudando a fomentar o ‘pensar Teatro Musical’. Vocês estão trazendo o Teatro Musical para esse lado do intelecto, para o lado do pensar, que antes só pertencia aos acadêmicos do teatro convencional ‘sagrado’ (risos). E isso contribui de forma significativa para o reconhecimento do nosso trabalho! Parabéns pela iniciativa e por estarem correndo atrás da dignidade e da força para que o Teatro Musical mostre que cumpre de forma mágica a sua função artística.

Follow Spot em Reiner Tenente

Musicais favoritos: Company, My Fair Lady, A Bela e a Fera, Sweeney Todd, Gypsy, Wicked, Billy Elliot, Spamalot, Tim Maia (é claro… risos), Oui, Oui, a França é Aqui, Roda Viva e A Gota D’Água. Atores e atrizes que admira: Alessandra Maestrini, Fred Silveira, Tiago Abravanel, Sutton Foster, Fernanda Montenegro, Matheus Nachtergaele, Fernanda Torres, Karine Telles, Elisa Pinheiro, Sabrina Korgut e mais um monte que não caberia aqui (risos).

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Ele indica para assistir: Um Violinista no Telhado, Tim Maia (é claro… risos), A Família Addams, R&J Shakespeare, O Filho Eterno e todos os shows das cantoras Anna Bello e Tabatha Fher.

Filmes: Pina Bausch 3D, Amor Além da Vida, O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, Tina – A verdadeira história de Tina Turner e todos do (Pedro) Almodovar.

Livros: Retorno e terno (Rubem Alves), Voz: Partitura da Ação (Lúcia Helena Gayotto), O Ator no Século XX (Odete Aslan) e O Corpo Poético (Jacques Lecoq).

Passatempo: Estar com amigos, ir ao teatro e sair para comer… De preferência japa!

Mensagem para alguém que quer começar: Aconteça o que acontecer tenha determinação e disciplina sempre!

Conselho: Respeitar e ter cuidado com o outro mesmo que, em alguns momentos, isso pareça impossível.

Tim Maia – Vale Tudo, o Musical Teatro Procópio Ferreira. Quartas e quintas às 21h, sextas às 21h30, sábados às 21h e domingos às 18h. Até 19 de agosto de 2012.

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ANEXO 3 Reportagem

http://revistastravaganza.com.br/index.php/teatro/reportagem/322-a- hora-e-a-vez-dos-Musicais

Revista Stravaganza A HORA E A VEZ DOS MUSICAIS Criado em Segunda, 24 Outubro 2011 22:45 Escrito por Edgar Olimpio de Souza

A Broadway nova- iorquina e o West End londrino são o epicentro do teatro Musical, mas as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro também estão se tornando parte do circuito. O mercado Musical brasileiro já é o terceiro maior do mundo. Nas duas capitais é possível assistir algumas das mais famosas produções Musicais, na forma de franquia ou adaptadas ao jeito brasileiro, sem precisar viajar para os Estados Unidos ou a Inglaterra. O fenômeno, que já dura uma década e está longe de saturar, gerou efeitos colaterais positivos, como a profissionalização do setor. A repetição não só permitiu o apuro técnico de figurinistas, cenógrafos, músicos, produtores e outros profissionais do ramo, como revelou ao grande público a existência no país de uma porção de atores

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capazes de interpretar, cantar e dançar. Ou seja, transitar do texto falado para o cantado sem maiores traumas e ainda arriscar passos de coreografia. Em que pese o valor salgado dos ingressos – Mamma Mia!, por exemplo, custa até 250 reais o tíquete, os Musicais arrastam multidões aos teatros. O Fantasma da Ópera (2005, SP) foi o mais visto até hoje no País, somando quase 900 mil espectadores, muitos deles desembarcando de caravanas organizadas em outras cidades, algo habitual durante as temporadas dessas superproduções. O negócio, inclusive, atiçou o carnaval. No desfile de 2012, a São Clemente vai levar para o sambódromo o tema Uma Aventura na Sapucaí, que pretende narrar a história dos Musicais brasileiros ao longo das décadas. Freqüentador da ponte aérea São Paulo-Broadway, o crítico de teatro Vinício Angelici, 64 anos, avalia que pontualmente a filial supera a matriz. “O Rei e Eu era tão sofisticada que botava a montagem que vi em Nova York em 1996 no chinelo”, compara, referindo-se à luxuosa produção dirigida por Jorge Takla no ano passado em São Paulo.

Nesse momento, estão em cartaz nos palcos cariocas Beatles num Céu de Diamantes (2008), que chegou a se apresentar na francesa Lyon e é um dos raros sucessos sem vínculo com a Broadway, Emilinha e Marlene – As Rainhas do Rádio (foto ao lado), de Julio Fischer e Thereza Falcão, e Tim Maia – Vale Tudo, o Musical, de Nelson Motta. Os dois últimos, aliás, seguem uma vertente comum no Brasil, o de encenar grandes nomes da música popular brasileira. Em novembro subirá ao palco Judy Garland – O Fim do Arco Íris.

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Na cena paulistana destacam-se As Bruxas de Eastwick, adaptação cheia de efeitos especiais a partir do romance de John Updike, Mamma Mia!, de Catherine Johnson, e a ousada versão de Cabaret, estrelada por Cláudia Raia. Em janeiro próximo aterrissará o libelo pacifista Hair e em março Um Violinista no Telhado, baseado em contos judaicos de Sholom Aleichem, ambos escorados em boas carreiras no Rio de Janeiro. Ao longo do ano ganharão vida ainda as superproduções O Mágico de Oz, A Família Addams e Priscila, a Rainha do Deserto. As estrelas sobem. “Hoje temos condições de montar grandes Musicais com a mesma qualidade da Broadway”, atesta o ator José Mayer, 61 anos, que interpretou o rústico e histriônico leiteiro judeu Tevye em Um Violinista no Telhado. Quem faz coro é Saulo Vasconcelos, 37, figura onipresente no gênero (Cats, em 2010, e A Bela e a Fera, em 2002, entre outros) e atualmente no papel de Sam em Mamma Mia!. “Já não é mais boom, mas uma realidade”, comemora.

Ele contracena com a protagonista Kiara Sasso (foto ao lado) que, apesar de seus 32 anos, pode ser considerada uma veterana no meio, enfileirando um trabalho atrás do outro, como Miss Saigon (2007), A Noviça Rebelde (2008) e Jekyll & Hide – O Médico e o Monstro (2010). “O Musical comove e emociona, por isso agrada tanto ao público”, acredita ela. Da mesma geração e, como a colega, com sólida formação no Exterior, Bianca Tadini (West Side Story e Evita), 31, ensina que o segredo em uma atividade cada vez mais rigorosa é estudar sempre “e cuidar da voz, não expondo-se ao frio, ao cigarro e à bebida.”

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A nova geração, simbolizada por nomes como Kiara, Bianca, Alessandra Maestrini, Fred Silveira e Patti Amoroso, de carreiras consistentes, é reverenciada pelo ator Eduardo Galvão, 49, que vive o misterioso personagem que seduz três mulheres solitárias em As Bruxas de Eastwick. “Esta galera é preparadíssima, bem diferente de outros tempos”, coteja ele, que atuou em Gloriosa (2008) e Gypsy (2010). Quem sentiu na pele este upgrade técnico foi Aniela Jordan, 48, uma das sócias da Aventura Entretenimento, ao lado de Luiz Calainho, Charles Moeller e Cláudio Botelho – a dupla Moeller e Botelho, por sinal, contribuiu decisivamente para a consolidação do teatro Musical no País, com mais de quarenta espetáculos na bagagem. Em apenas dois anos de existência, a produtora conduziu mais de dois milhões de pessoas ao teatro para ver superproduções como A Noviça Rebelde, O Despertar da Primavera, Hair e Um Violinista no Telhado. “Foi um sufoco compor o elenco de A Ópera do Malandro” (2003, de Chico Buarque), recorda Aniela. Dos 500 atores que enfrentaram as audições, sobreviveram apenas 40%. “Não tínhamos gente que cantasse, interpretasse e dançasse a altura do exigido. Mesmo assim, ficamos onze meses em cartaz, com ingressos esgotados”, conta. “Hoje, daria para montar até dois grupos de primeiríssima qualidade”, garante. O divisor de águas, em sua avaliação, se deu a partir de A Noviça Rebelde, encenado no Rio de Janeiro e São Paulo com enorme sucesso de público e crítica.

Perseverança. Atualmente, um anúncio para testes para um Musical pode registrar até cinco mil inscrições, caso de Hair. Em O Despertar da Primavera (2010) (foto ao lado), por exemplo, dezenove atores têm entre 16 e 25 anos foram pinçados entre mais de três mil candidatos. Os selecionados têm de exibir não só habilidade para interpretar, cantar e dançar como

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demonstrar fôlego de maratonista para encarar até sete sessões por semana de um espetáculo em cartaz. “Nosso material humano atual é tão bom que nos igualamos à Broadway”, afirma a produtora de elenco Marcela Altberg, 38, pioneira nessa função. “Um crítico escreveu que a cena do sonho em Um Violinista no Telhado é a mais bonita de todas as montagens desse texto que ele viu pelo mundo”, orgulha-se ela, que costuma receber emails diários de interessados em enviar currículos e saber de audições. Um dos militantes pela causa Musical no Brasil, o diretor Jorge Takla, 60, do recente Evita, penou para fechar o time de Cabaret (1989), protagonizado por Beth Goulart e Diogo Vilela. A missão, hoje, ficou mais fácil. “Agora já sabemos levantar um Musical sozinhos, sem a ajuda de profissionais da Broadway”, celebra. Outro diretor conectado ao gênero, José Possi Neto (New York, New York e Emoções Baratas), 64, garimpou 38 atores e músicos para a sua versão de Cabaret, assinado pela Chaim Produções (Tim Maia – Vale Tudo, o Musical e Os Produtores), forte produtora no meio. “Parte do sucesso desse movimento deve-se à perseverança das atrizes Bibi Ferreira, Marília Pêra e Cláudia Raia”, elege ele, acrescentando que o teatro Musical hoje tomou o lugar das grandes produções teatrais, cada vez mais escassas.

A gênese do gênero. Antes do chamado boom, a tradição Musical brasileira estava restrita ao teatro de revista na década de 1920, ao primeiro espetáculo importado da Broadway, Minha Querida Lady (1963, com Paulo Autran e Bibi Ferreira) (foto ao lado), às montagens engajadas dos anos 1960 e 1970, exemplos de Roda Viva (1968) e Ópera do Malandro (1978), e Musicais

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esforçados como A Chorus Line (1983), com uma então adolescente Cláudia Raia. Foi a encenação de Rent (1999) que detonou a primeira onda. O tsunami irrompeu de vez com Les Miserables (2001), inspirado no épico de Victor Hugo, que atraiu 350 mil espectadores em quase um ano em cartaz. O êxito auferido por essa franquia da multinacional Time 4 Fun (ex-CIE), especializada em importar Musicais enlatados, estabeleceu uma norma, o das superproduções que empregam mais de uma centena de profissionais, entre atores, bailarinos, músicos e equipe técnica, e chegam a custar até 12 milhões de reais, como Miss Saigon (2007), que abrigava um helicóptero em tamanho real no palco. O Musical mais caro de todos os tempos da Broadway, o atual O Homem Aranha, teve um orçamento equivalente a 110 milhões de reais. Como a demanda por Musicais se anabolizou, com cachês que variam de 10 mil a 40 mil reais mensais ao longo da temporada ou por prazo de trabalho, brotaram cursos específicos de olho nesse mercado promissor, como a paulistana Casa de Artes OperÁria, que prepara atores nas três especialidades exigidas pelos Musicais - canto, dança e interpretação. Aulas particulares também são procuradas. “Os atores estão se especializando e quem chega entoando qualquer coisa não passa nos testes”, explica a preparadora vocal Amélia Gumes, 34. Uma das responsáveis por levar aos Musicais a técnica de canto belting, ela educou as vozes de Arlete Salles e Danielle Winits para Hairsrpay (2010).

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(Foto de abertura: Cabaret / Por Daniel Klajmic) Nem só de superproduções Musicais, no entanto, vive a temporada. Espetáculos de orçamento modesto, sem cenários e figurinos suntuosos, mas enaltecidos pela crítica especializada, também têm público cativo. Nara, sobre a musa da Bossa Nova Nara Leão, excursiona com sucesso pelo País. “Como não encontrava atores que tocassem bem instrumentos (percussão, piano e violão), tive que optar por músicos que soubessem atuar”, revela o autor (em parceria com Fernanda Couto, a protagonista) e diretor Márcio Araújo, 40. Na mesma linha de encenar um Musical com sotaque brasileiro, avesso às fórmulas da Broadway, a atriz Rachel Ripani, 34, em cartaz em Mamma Mia!, escreveu e atuou no sensual Cabaret Luxúria (foto ao lado), que deve retornar repaginado nos próximos meses. “Eu acho que a música aproxima muito o público da história”, resume. A explosão do gênero, ao que parece, parece cobri-la de razão.

O QUE ELES DISSERAM “O som é uma função complexa. Eu cuido das caixas acústicas, dos modelos, onde estarão posicionadas, os microfones, como serão usados. Não dou conta de tanto trabalho. Sou autodidata, tive que inventar a minha formação, até estudei na Alemanha.” (Marcelo Claret, 43, sound designer de Um Violinista no Telhado, Hair e Beatles num Céu de Diamantes)

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"Eu preciso estar atento ao equilíbrio da orquestra. Hoje o músico está mais preparado, antigamente muitos não sabiam o que era uma partitura. Não adianta o ator cantar bem e perder a voz durante a temporada. Eu o ensino a poupar o seu instrumento vocal.” (Marcelo Castro, 35, diretor Musical de As Bruxas de Eastwick e regente da orquestra em Um Violinista no Telhado)

“As atrizes voam por cima da platéia e é a primeira vez que essa técnica é desenvolvida na América Latina. Os cabos e cadeirinhas eu trouxe dos Estados Unidos. Eu posso fazer um personagem ficar gordo ou um carro explodir. Todo efeito envolve um risco.” (Heitor Cavalheiro, 23, responsável pelos efeitos especiais de As Bruxas de Eastwick)

“No Brasil ainda não há uma indústria de cenografia. No Musical, a cenografia precisa dialogar com a música, a coreografia e a intenção do diretor. Nesta montagem, disponho de quinze maquinistas para mudar os diversos ambientes da trama.” (Rogério Falcão, 50, cenógrafo de As Bruxas de Eastwick)

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(Fábio Namatame, 52, figurinista de Cabaret) (foto ao lado)

“Como as temporadas são longas, os figurinos precisam ter durabilidade e resistência e isso envolve uma tecnologia específica. Sapatos acabam em um mês. Em O Rei e Eu importamos tecidos da Tailândia, China e Índia. Foi uma experiência de delírio.” “Eu monto toda a estratégia de produção. Nos ensaios, usamos três salas simultâneas e preciso maximizar o tempo para não deixar o pessoal esperando, se não viramos a madrugada. Quero que eles se sintam acolhidos e respeitados. É um quebra- cabeça.” (Tina Salles, 40, coordenadora artística, que criou essa função ao lado de Charles Moeller e Cláudio Botelho)

“Como transitei por dramas, comédias e shows, acabei adquirindo cancha para Musicais. No Musical, a iluminação pode se permitir um nível de abstração grande porque as pessoas conversam cantando. Neste espetáculo, a luz virou um personagem.” (Paulo César Medeiros, 45, iluminador de As Bruxas de Eastwick)

“Meu desafio é fazer o elenco dançar bem. A coreografia num Musical ajuda a contar a história, por isso tenho de estudar muito o texto, entender a linguagem do

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diretor para casar com o tipo de movimentação. O segredo para o ator é ter inteligência corporal.” (Tânia Nardini, 49, coreógrafa de May Fair Lady e Evita, entre outros)

Anote aí:

SÃO PAULO As Bruxas de Eastwick. De John Updike. Adaptação e Direção cênica de Cláudio Botelho e Charles Moeller. Direção Musical de Marcelo Castro. Com Eduardo Galvão, Maria Clara Gueiros, Sabrina Korgut, Renata Ricci e outros. Teatro Bradesco (Shopping Bourbon. Rua Turiaçu, 2.100, Perdizes. Fone: 11. 4003-1212). Quinta e sexta, 21h; sábado, 17h e 21h; domingo, 16h e 20h. Ingresso: R$ 10 a R$ 190. Até 11 de dezembro. Cabaret. De Joe Masteroff (texto), John Kander (música) e Fred Ebb (letras). Adaptação de Miguel Falabella. Direção cênica de José Possi Neto e Direção Musical de Marconi Araújo. Com Cláudia Raia, Jarbas Homem de Mello, Marcos Tumura e outros. Teatro Procópio Ferreira (Rua Augusta, 2.823, Cerqueira César. Fone: 11. 3083-4475). Quinta, 21h; sexta, 21h30; sábado, 18h e 21h30; domingo, 18h. Ingressos: R$ 40 a R$ 200. Em cartaz por tempo indeterminado. Mamma Mia! De Benny Andersson, Björn Ulvaeus e Catherine Johnson. Adaptação de Cláudio Botelho. Direção geral de Robert McQueen e Direção local de Floriano Nogueira. Com Saulo Vasconcelos, Kiara Sasso, Patti Amoroso, Rachel Ripani e outros. Teatro Abril (Avenida Brig. Luis Antônio, 411, Bela Vista. Fone: 11. 4003-5588). Quinta e sexta, 21h; sábado, 17h e 21h; domingo, 16h e 20h. Ingresso: R$ 80 a R$ 250. Até 18 de dezembro.

RIO DE JANEIRO Beatles num Céu de Diamantes. Direção e Criação de Charles Moeller e Cláudio Botelho. Com Sabrina Korgut, Alessandra Verney, Ivana Domenico e outros. Teatro Clara Nunes (Rua Marquês de São Vicente, 52, Shopping da Gávea. Fone: 21.

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2274-9696). Quinta a sábado, 21h; domingo, 20h. Ingresso: R$ 60 e R$ 70. Até 11 de dezembro. Emilinha e Marlene – As Rainhas do Rádio. De Júlio Fischer e Thereza Falcão. Direção cênica de Antonio de Bonis e Direção Musical de Marcelo Alonso Neves. Com Vanessa Gerbelli, Solange Badin, Stella Maria Rodrigues e outros. Teatro Maison de France (Avenida Presidente Antônio Carlos, 58, Centro. Fone: 21. 2544- 2533). Quinta e sexta, 19h30; sábado, 20h30; domingo, 18h30. Ingresso: R$ 60 e R$ 70. Até 11 de dezembro. Tim Maia – Vale Tudo, o Musical. De Nelson Motta. Direção de João Fonseca. Direção Musical de Alexandre Elias. Com Tiago Abravanel, Isabella Bicalho, Lilian Valeska e outros. Teatro Carlos Gomes (Praça Tiradentes, 19, Centro. Fone: 21. 2232-8701). Quinta a sábado, 20h; domingo, 18h. Ingresso: R$ 40. Até 13 de novembro.

ANEXO 4 INTERNET 1

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1064015-teatro-geo-abre-as-portas-no- instituto-tomie-ohtake-em-sp.shtml

A Folha 19/03/2012 - 23h00 TEATRO GEO ABRE AS PORTAS NO INSTITUTO TOMIE OHTAKE, EM SP Por Gustavo Fioratti Colaboração para A Folha

São Paulo ganhou mais um teatro. Com um pé-direito de 14 metros, uma boca de cena com 13 metros de largura e fosso para orquestra, o Geo, que inaugura hoje (19) dentro do prédio do Instituto Tomie Ohtake, em Pinheiros, entra no circuito cultural da cidade como mais uma opção para abrigar produções de grande porte.

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A abertura, em cerimônia só para convidados, vai ser embalada por show de Arnaldo Antunes, Marcelo Jeneci e Tulipa Ruiz. No dia 30 de março, a casa abre enfim para público, com a estreia da peça "Vermelho", protagonizada por Antonio Fagundes e seu filho Bruno, com texto de John Logan e direção de Jorge Takla. As dimensões do espaço são similares às do teatro Frei Caneca, que fica em um shopping de mesmo nome, próximo à avenida Paulista. Há 627 poltronas, divididas entre a plateia principal e um balcão no segundo piso. A visibilidade para o palco é boa em todos os pontos da casa, inclusive nas laterais. A programação prevista para ocupar a casa, tanto de música como de teatro, dá atenção especial ao circuito mainstream. Musicais, por exemplo, são fortes candidatos a ocuparem os horários reservados para as artes cênicas.

Foto: Lenise Pinheiro - 9.mar.12/Folhapress

A plateia do teatro Geo, que entra para o circuito cultural paulistano em 30 de março "A falta de teatros na cidade representa hoje o grande gargalo da indústria do entretenimento, principalmente quando se fala de Musicais", defende Marcelo Frazão, diretor da Geo Eventos, empresa das Organizações Globo que hoje responde pela grade

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do novo teatro. No contrato firmado com o Instituto Tomie Ohtake, a Geo Eventos paga pelo direito de locação e comercialização do espaço. A programação da casa, por sua vez, será firmada em uma parceria com a empresa norte-americana Base Enterteinment, que hoje se dedica a administrar propriedades intelectuais internacionais. O interesse principal desse dueto, diz Frazão, é investir em espetáculos Musicais. A Base e a Geo produziram, por exemplo, o Musical "Priscila - A Rainha do Deserto", que estreou na sexta no Teatro Bradesco. Ou seja, a febre dos Musicais ainda deve subir alguns graus nos próximos anos. O novo teatro Geo, lembra Frazão, também pretende reservar horários para peças infantis. Um forte candidato a estrear na casa é a peça "A Galinha Pintadinha", que está em cartaz no Rio desde janeiro, também produzida pela Geo Eventos.

ANEXO 5 INTERNET 2 http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1130539-Musical-foca-na-obra-de-milton- nascimento-nao-em-sua-vida.shtml

A Folha 03/08/2012 - 04h18 MUSICAL FOCA NA OBRA DE MILTON NASCIMENTO, NÃO EM SUA VIDA Por Marco Aurélio Canônico Do Rio

Quando decidiram criar um Musical em homenagem a Milton Nascimento -- uma ideia que surgiu há seis anos e que começou a ganhar forma em 2011--, Charles Möeller e Claudio Botelho tinham uma ideia básica, de saída: não contar a vida do cantor.

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Show marca 50 anos de Milton Nascimento na estrada "Quando a gente fez 'Clube', minha música ganhou gênero", diz Milton Nascimento

"O mais importante para nós era a obra, tentar olhar as canções do Milton de um ponto de vista teatral", diz Botelho. Assim, "Milton Nascimento - Nada Será como Antes", que estreia na próxima quinta (9), no Rio, é um Musical em que o texto vem exclusivamente das canções. Para que a produção tivesse cara de teatro e não de show, a dupla criou uma história que gira em torno de um grupo de pessoas reunidas numa típica casa do interior mineiro. "Imaginamos uma casa de criação, um clube da esquina, onde um grupo de pessoas vai juntando instrumentos e interpretações para salvar a casa do abandono", diz Möeller. Entre atores e músicos, são 14 pessoas em cena, quase todos veteranos de trabalhos com a dupla, como os jovens irmãos Estrela Blanco e Pedro Sol (netos de Billy Blanco) e Claudio Lins (filho de Ivan). "Não queríamos marcas circenses nem coreografias, mas um olhar que significasse muita coisa. O Milton tem uma singeleza que, se o ator não tiver dentro de si, não vai conquistar", diz Möeller. A produção, definida pela dupla como "caseira e simples", contrasta com o gigantismo de montagens como "O Mágico de Oz" e marca a estreia da parceria com a GEO Eventos. Chega a São Paulo só em maio de 2013. Milton assistiu ao ensaio na terça. "Tive que disfarçar o choro", disse.

MILTON - NADA SERÁ COMO ANTES, O MUSICAL DIREÇÃO Charles Möeller e Claudio Botelho QUANDO estreia em 9/8; qui. a sáb., às 21h; dom., às 20h; até 25/11 ONDE Theatro Net Rio (r. Siqueira Campos, 143, Rio, tel.: 0/xx/21/2147-8060) QUANTO de R$ 80 a R$ 110 CLASSIFICAÇÃO livre

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTO 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 09 INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO I A DISTINÇÃO DOS GÊNEROS DRAMÁTICOS ATRAVÉS DA HISTÓRIA 13 1.1. - O Mimo 13 1.2. - O Ditirambo 15 1.3. - A Tragédia 16 1.4. - A Comédia 18

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1.5. - Os Festivais de Teatro na Grécia Antiga 20 1.6. - O Teatro Medieval 22 1.7. - A Farsa Medieval 23 1.8. - O Melodrama 23 1.9. - O Vaudeville 26 1.10. - A Opereta 27 1.11. - O Teatro de Revista 29 1.12. - O Musical 33 1.12.1 - Diferenças entre o Musical e a Ópera 33 1.12.2 - A Função da Música 35 1.12.3 - A Função da Dança 36 1.13. Considerações Finais do Capítulo I 36

CAPÍTULO II A MUDANÇA DA FUNÇÃO DA ARTE ATRAVÉS DOS TEMPOS PELA FILOSOFIA 37 2.1. - Introdução à Estética 37 2.1.1. - Relação entre Arte e Natureza 38 2.1.1.1. - Imitação 38 2.1.1.2. - Criação 39 2.1.1.3. - Construção 40 2.1.2. - Relação entre Arte e Humano 41 2.1.3. - Finalidades-Funções da Arte 42 2.2. - Arte e Sociedade 44 2.2.1. - Arte pela Arte (Formalismo Puro) 44 2.2.2. - Arte Engajada (Conteudismo Engajado) 45 2.3. - Considerações Finais do Capítulo 45

CAPÍTULO III A IMPORTÂNCIA DO CORPO E DA VOZ PARA A FORMAÇÃO DE UM ATOR 46

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3.1. - A Importância do Corpo 46 3.1.1. - O Corpo na Comunicação 46 3.1.2. - Consciência Corporal e Corpo Cênico 47 3.1.3. - A Dança no Teatro Musical 48 3.1.4. - O Ator como um Intérprete 50 3.1.5. - A Integração do Movimento Coreográfico com o Canto 51 3.2. - A Importância da Voz 51 3.2.1. - A Voz na Grécia Antiga 51 3.2.2. - O Mito de Eco na Versão de Ovídio 52 3.2.3. - A Voz na Comunicação 53 3.2.4. - A Aula de Canto 54 3.2.5. - Cantar Um Solo 55 3.2.6. - Cantar Em Conjunto (Coral) 56 3.2.7. - Teoria Musical 56 3.3. - Integração do Corpo a Voz com a “Técnica Alexander” 57

CAPÍTULO IV A ENTREVISTA COM CHARLES MÖELLER E CLÁUDIO BOTELHO POR MARILIA GABRIELA 59 4.1. - Os Entrevistados: Charles Möeller e Cláudio Botelho 60 4.1.1. - Charles Möeller 60 4.1.2. - Claudio Botelho 61 4.1.3. - A Parceria de Charles Möeller e Claudio Botellho 62 4.2. - A Entrevista Comentada 63 4.2.1. - Primeiro Bloco: Charles Möeller e Claudio Botelho 63 4.2.2. - Segundo Bloco: Charles Möeller 70 4.2.3. - Terceiro Bloco: Claudio Botelho 75 4.2.4. - Quarto Bloco: Charles Möeller e Claudio Botelho 85

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CAPÍTULO V A ENTREVISTA COM REINER TENENTE PELO SITE MR. ZIEG 91 5.1. - O Site Mr. Zieg 91 5.2. - O Entrevistado: Reiner Tenente 92 5.3. - A Entrevista Comentada 93

CAPÍTULO VI O IBTM – INSTITUTO BRASILEIRO DE TEATRO MUSICAL 100 6.1.- A Origem: Como Tudo Começou 100 6.2. - A Instituição e os Cursos Oferecidos 101 6.3. - O Corpo Docente 102 6.4. - A Grade Curricular 105

CONCLUSÃO 107 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 110 ANEXOS 113 ÍNDICE 170