UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

O 4º e o 3º milénios a.n.e. no sítio da Ota (Alenquer) Perscrutando por entre colecções antigas e projectos recentes

Volume I

André Texugo Lopes

Dissertação de Mestrado em Arqueologia

2016 UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

O 4º e o 3º milénios a.n.e. no sítio da Ota (Alenquer) Perscrutando por entre colecções antigas e projectos recentes

André Texugo Lopes

Dissertação de Mestrado em Arqueologia

Tese orientada pela Professora Doutora Ana Catarina Sousa 2016 AGRADECIMENTOS

A realização desta dissertação de mestrado só foi possível graças à colaboração e ao contributo, de forma directa e indirecta, de várias pessoas e instituições, para as quais gostaria de exprimir algumas palavras de agradecimento, admiração e reconhecimento:

Aos meus pais e irmão, por serem o núcleo duro do que eu sou, por me formarem em todas as valências da palavra, por terem lutado, acreditado e reconhecido o meu futuro. Obrigado por me terem proporcionado este momento e por termos sido uma família, em todos os momentos deste percurso, face a tantas e tão duras adversidades.

Ao Diogo Lourenço, Nelson Mota e Ricardo Pereira, agradeço a amizade, ajuda em diversos pontos desta dissertação, nomeadamente, nos desenhos técnicos, mas, sobretudo, a presença, a confraternização, o empenho na elevação da moral e a resistência ao meu fatigante estado de alma.

Ao António Carlos Valera, que de forma directa, ainda que sem se aperceber (creio eu!), funcionou como exemplo de boas práticas e caminhos necessários na investigação, incutindo sempre um grande grau de exigência, que se reflecte em muitas das ideias apresentadas na dissertação. Também a forma como acarinhou a minha paixão pela Arqueologia, fazendo-me, desde o primeiro momento, saber qual seria a meta a atingir.

À Câmara Municipal de Alenquer, por pôr em marcha uma mudança em Alenquer, de forma sustentada, em que o Património Cultural tem lugar no discurso, caminhando-se para uma recuperação, valorização e divulgação de uma herança cultural que é de todos, e é, sem dúvida, um dos pontos mais destacados desta Vila. Ainda neste ponto, quero particularizar as pessoas de Rui Costa (Vice-Presidente da Câmara Municipal de Alenquer) e Paulo Franco (Vereador) que acederam sempre aos meus pedidos, correspondendo, com muito interesse, e tornando possível esta dissertação, nos moldes aqui apresentados.

Ao Filipe Rogeiro, uma enorme palavra de gratidão por ter me proporcionado, com extrema paciência, o acesso à colecção e os meus “caprichos” científicos.

Ao José Carlos Morais, por me ter confiado, em primeira instância, a coordenação dos trabalhos de arqueologia do Canhão Cársico de Ota e ter reconhecido em mim a capacidade e o engenho para os levar a cabo. Obrigado, também, pelo apoio na cartografia e nas questões climáticas, faunísticas e botânicas. À restante equipa do Canhão Cársico de Ota agradeço-lhes a aprendizagem, o entusiasmo e qualidade dos trabalhos produzidos, que irão reconhecer, devidamente, a excepcionalidade da paisagem cársica de Ota.

Às instituições de Ota, nomeadamente, a Junta de Freguesia de Ota e Centro Social Recreativo e Desportivo da Ota, representada pelos seus presidentes Diogo Carvalho e Alexandre Azevedo, respectivamente, que acederam afirmativamente a todos os meus pedidos e se demonstraram confiantes no sucesso dos trabalhos produzidos.

A toda à população de Ota, por me terem criado no vosso seio, por me terem ensinado a viver em segurança e em sociedade (para comigo e com os “outros”), por me terem apoiado, por um lado, e suportado, por outro, e me terem incutido um patriotismo desmedido, por esta terra.

Ao Miguel Cipriano Costa pelo apoio na bibliografia, nos trabalhos de campo e pela síntese que realizou nos seus trabalhos, que em muito serviram nesta dissertação.

Aos doutorandos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, especialmente, ao Marco, César e Henrique, pela prospecção e a ajuda no que concerne às geologias locais e aos locais de aprovisionamento.

Aos meus colegas de curso, particularmente, ao Gonçalo Sá-Nogueira, Álvaro Pereira, Richard Peace, Luís Constantino Rendeiro, Cátia Delicado, Ana Olaio, Patrícia Castanheira, Pedro Abade e Filipa Santos, uma enorme gratidão por terem feito parte do meu percurso académico, e de inúmeras histórias, discussões e sonhos, sempre tendo como pano de fundo uma Arqueologia melhor.

Ao João Pedro Cunha-Ribeiro, por ter acolhido os meus desafios e propostas, sempre com um entusiasmo contagiante.

À Ana Catarina Sousa, minha orientadora, que na verdade foi sempre mais do que isso, orientadora nos trilhos da Arqueologia, incansável, presente e, consistentemente, dedicada aos alunos, trabalhos, Arqueologia e ao 4º e 3º milénio a.n.e. Neste caso, partilhou o “brilhozinho nos olhos” pela estremadura portuguesa e persuadiu-me (não foi difícil) a trabalhar a minha “casa”, num percurso semelhante, com as devidas diferenças, ao seu.

À Ana Catarina Basílio por ter sido tudo desde o primeiro momento, pela paciência (e a falta dela), pela genialidade que lhe é característica e que me obrigou a crescer, por ter partilhado este caminho comigo, estando sempre pronta ajudar-me com textos, opiniões, discussões e grafismos. Agradeço-lhe tudo neste meu percurso, sendo muito mais do que qualquer linha que pudesse redigir. Obrigado pelo carácter, amizade, carinho, genialidade e coerência. O 4º e 3 milénio a.n.e. no sítio da Ota (Alenquer): perscrutando por entre colecções antigas e projectos recente.

A Ota tem sido, recorrentemente, integrada em mapas, em discursos e dados empíricos sobre as mais diversas temáticas, em muito devido à sua larga diacronia de ocupação - Neolítico Final ao Período Islâmico – essencialmente baseada no espólio do “Castro” de Ota, em depósito no Museu Hipólito Cabaço (Alenquer). Este foi integralmente apresentado em 1956, por Ernani Barbosa num artigo expositivo, funcionando, ainda nos dias de hoje, como base ilustrativa do espólio existente.

O estudo presente nesta dissertação conjuga as duas realidades disponíveis até à data, a coleção do Museu e o resultado do projecto COTA – Canhão Cársico de Ota – procurando o seu enquadramento sociocultural e cronológico. O vazio de conhecimento existente sobre as estruturas e espaços do sítio, em toda a diacronia, tornou de extrema utilidade esta abordagem, procurando compreender, e relacionar, a paisagem antrópica dos períodos Neolítico/Calcolítico, com a “Macro” Região da Estremadura Portuguesa e com a região imediata perfilada pela bacia hidrográfica dos rios de Alenquer, Grande da Pipa e Ota, que partilham a mesma base geológica – Jurássico “Lusitaniano”.

Apesar da fragilidade resultante da ausência de contextos, a procura de paralelos com os sítios mais reconhecidos, em áreas limítrofes, permitiu o estabelecimento de uma caracterização cronológica relativa e genérica dos materiais arqueológicos. A sua análise seguiu muitas das propostas de outros autores, ainda que se tenha procurado desenvolver alguns aspectos em particular, gerando interpretações e justificações preparadas para lidar, em alguns casos, com possíveis adaptações locais.

O arqueossítio da Ota terá sido, acreditamos nós, em finais do IV milénio e nos séculos seguintes do III, vivenciado mais intensamente por um conjunto de comunidades, cuja tipologia de ocupação do espaço, ainda se encontra por determinar, em especial porque pode ganhar ritmos diferenciados consoante a cronologia. Ainda que, segundo os dados disponíveis, as actividades agrícolas e florestais se encontrem, minimamente, fundamentadas, em associação ao elevado número de elementos de tear que poderão, também, suportar uma possível ocupação enquanto povoado, do local em estudo.

Simultaneamente, as comunidades revelam a manutenção de contactos inter-regionais, lidos através de algumas matérias-primas encontradas, quer seja devido a um intenso grau de mobilidade ou relacionado com redes de troca. Esta influência encontra-se registada em materiais como o anfibolito, os metais, o xisto e algumas tipologias cerâmicas. É certo que esta abordagem careça de um estudo futuro de proveniências, a fim de alargar o conhecimento acerca das matérias- primas em questão, ainda assim parecem-nos bons pontos de partida. A Ota representa assim, mais do que um regresso a um sítio clássico, um regresso à Estremadura Portuguesa, que carece de novas visões, dados, abordagens e preconceitos.

The 4th and 3rd millennium a.n.e. at the site of Ota (Alenquer): Peering through old collections and recent projects.

Ota has been recurrently integrated into maps, speeches and empirical data on the most diverse themes, much due to its wide diachronic occupation - Late Neolithic to the Islamic period - essentially based on the collection of the "Castro de Ota” in deposit at the Museum Hipólito Cabaço (Alenquer). The collection was fully published in 1956 by Ernani Barbosa in an exhibition article, running, still today, as the illustrative basis of the existing artifacts. The study presented in this dissertation combines the two realities available to date, the collection of the Museum and the result of the project COTA – Canhão Cársico de Ota - looking for its socio-cultural and chronological framework. The emptiness existing regarding the knowledge about the structures and spaces of the site, across the diachronic, has turned this approach extremely useful, once is seeking to understand and relate the anthropic landscape of Neolithic / Chalcolithic periods, with the "macro" region of Extremadura Portuguese and with the immediate region shaped by the river basin of the rivers of Alenquer, Grande da Pipa and Ota, who share the same geological base - Jurassic "Lusitaniano". Despite the fragility of the study, resulting from the absence of contexts, the demand for parallel with the most recognized sites in neighboring areas allowed the establishment of a relative chronological and generic characterization of the archeological materials. Its analysis followed many of the proposals already defined by other authors, although it has sought to develop some aspects in particular, generating interpretations and justifications prepared to deal with, in some cases, possible local adaptations. The “arqueossítio” of Ota have been, we believe, at the end of the fourth millennium and in the fallowing centuries of the 3rd, experienced more intensely by a number of communities whose occupation typology of space is still to be determined, especially because it can acquire differentiated rhythms, according to the chronology. Although, according to available data, the agricultural and forestry activities are minimally founded, in association with the high number of loom elements, the occupation of the site as a settlement, remains as the principal hypothesis. At the same time, communities reveal the maintenance of inter-regional contacts, read through some raw materials found, whether due to an intense degree of mobility or related with exchange networks. This influence is recorded in materials such as amphibolite, metals, shale and some ceramic types. It is true that this approach lacks a future study of sources, in order to extend the knowledge of the raw materials in question – even though it still seem, to us, a good starting points. Ota is thus, more than a return to a classic site, a return to Portuguese Estremadura, which lacks new insights, data, approaches and preconceptions. Índice

AGRADECIMENTOS RESUMO/ABSTRACT 1. INTRODUÇÃO...... 9 2. ENQUADRAMENTOS...... 11 2.1 - História das investigações: O “Castro de Ota”...... 11 2.2 - Ponto de Viragem?...... 15 3. MÉTODOS E PRÁTICAS...... 21 3.1 – Posicionamento teórico...... 21 3.2 – Prospecção ...... 24 a. Condicionalismos...... 24 b. Metodologia...... 25 c. Áreas naturais definidas ...... 26 4. SÍTIO ARQUEOLÓGICO DE OTA ...... 28 4.1 – Enquadramentos ...... 28 a. Enquadramento geográfico...... 28 b. Enquadramento geomorfológico...... 28 c. Enquadramento geológico ...... 29 d. Paleoambiental ...... 32 4.2 – Contextos...... 36 5. COMPONENTE ARTEFACTUAL...... 41 5.1 – O conjunto...... 41 a. Pedra lascada ...... 43 1. O conjunto...... 43 2. Núcleos...... 45 3. Produtos de preparação e reavivamento...... 47 4. Debitagem ...... 47 5. Lascas...... 47 6. Material residual ...... 48 7. Produtos alongados...... 49 8. Utensilagem...... 53 9. Utensílios diversos...... 54 9.1. Foliáceos...... 55 9.1.1. Foliáceos ovóides...... 55 9.2. Pontas de seta ...... 58 b. Pedra polida ...... 62 1. Caracterização tipológica ...... 64 2. Matérias-primas ...... 68 c. Pedra afeiçoada...... 69 1. Elementos de moagem...... 70 2. Polidores/Afiadores...... 71 3. Esferóides ...... 72 d. Recipientes cerâmicos...... 73 1. Caracterização do conjunto...... 73 2. Número mínimo de exemplares...... 75 3. Repertório formal...... 75 4. As decorações...... 80 4.1. Grupo 1 – Os bordos denteados ...... 81 4.2. Grupo 2 – Grupo Taças Caneladas ...... 82 4.3. Grupo 3 – Grupo Folha de Acácia...... 84 4.3.1. Caneluras...... 86 4.3.2. Folha de Acácia...... 87 4.4. Grupo 4 – Motivos Geométricos...... 91 4.5. Grupo 5 – Motivos Campaniformes ...... 93 e. Elementos de tear ...... 96 f. Os artefactos de osso polido ...... 99 g. Os artefactos metálicos...... 103 6. A OTA E O SEU ENTORNO: CONTRIBUTO PARA UMA LEITURA REGIONAL ...... 107 7. APONTAMENTOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS ...... 116 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 125

ÍNDICE DO VOLUME 2...... 140 INTRODUÇÃO

Proceder ao estudo de um sítio fortificado estremenho é relembrar uma parte essencial na história da Arqueologia Portuguesa, sendo uma actividade pontilhada de dados materiais, existindo uma vincada falta a nível contextual e estratigráfico. Esta realidade obriga os estudos recentes a apoiarem-se numa base totalmente artefactualista, sem conseguirem, de forma segura, aceder a dados contextuais e, acima de tudo, sociais, que permitiriam aceder a informações mais úteis e antropológicas. Ainda assim é necessário sublinhar que o processo de estudo e contacto com a componente material dos sítios, neste caso da Ota, apresenta-se como uma tarefa necessária e de extrema utilidade, necessária ao processo de investigação sobre as sociedades humanas antigas.

Tendo este conhecimento e pressupostos de base, partimos para o estudo do sítio da Ota, com o principal objectivo de compreender, clarificar e confirmar, caso assim se verificasse, os verdadeiros ritmos, fases e funcionalidades presente no sítio da Ota, essencialmente durante o final do 4º milénio e o 3º a.n.e., sem descurar uma visão geral da região, totalmente necessária para compreender a Ota numa possível rede, bem como de forma individual, tentando fundamentar algumas das nossas considerações com recurso aos trabalhos de prospecção – resultado do projecto de Caracterização e Plano de Ação do Canhão Cársico de Ota, votado e escolhido pela população afecta a este Património. As questões cronológicas mantêm-se como um dos principais problemas a ultrapassar, sendo necessário proceder a intervenções com pressupostos e técnicas contemporâneas, resultando num conjunto de informações crono- estratigráficas.

O presente trabalho encontra-se então dividido em quatro partes distintas, tentando dar uma visão ampla do sítio da Ota, do seu tempo e espaço, bem como do projecto, das prospecções realizadas e do posicionamento do autor, uma realidade básica necessária para compreender as escolhas e desenvolvimento do presente trabalho.

A primeira parte é dedicada aos enquadramentos gerais da presente dissertação, passando pela ideia e concretização do projecto do Canhão Cársico de Ota, bem como os antecedentes arqueológicos do projecto que influenciam a agenda e os condicionalismos existentes para a área da Ota. É uma parte relativamente curta, que serve essencialmente como justificação para o presente trabalho, representando uma necessidade científica, é igualmente como ponto de apresentação de um caminho a seguir no futuro da Arqueologia, aproximando-a da população, tornando a Arqueologia uma ciência totalmente participada ao serviço da comunidade.

A segunda parte versa sobre a componente metodológica, clarificando a corrente teórica pela qual o autor é influenciado, e a sua agenda científica, associando-se também a apresentação

9 das questões práticas (condicionalismos e metodologia de terreno) utilizada aquando dos trabalhos de prospecção. Acima de tudo o principal objectivo desta parte é o de esclarecer os leitores sobre os conceitos norteadores a aplicar na dissertação, sendo que o próprio autor reconhece os seus condicionalismos e potencialidades a nível teórico.

Na terceira parte serão realizados os clássicos enquadramentos geográficos, geomorfológicos, geológicos, paleoambientais e contextuais, tentando compreender todos os factores influenciadores do espaço de implantação da Ota e da sua região, e como esses factores influenciariam, certamente, as populações. Pretende-se então passar uma imagem completa do sítio e da sua envolvência.

A quarta parte é, sem dúvida, a parte mais extensa do trabalho, sendo aqui apresentada a componente material de forma individual, procedendo-se igualmente a uma leitura geral e agrupadora do conjunto. Todos os materiais são apresentados e comparados com sítios semelhantes, a nível regional e a nível de tipologia de implantação/arquitectura, pretendendo-se identificar pontos em comum, mas, essencialmente, particularidades que possam ser típicas do sítio da Ota, permitindo-nos aceder mais facilmente ao agente e à vontade e variabilidade humana. A análise aqui realizada é, como referido anteriormente, artefactualista, tendo-se em conta questões de aprovisionamento, gestos e técnicas na produção dos artefactos, bem como possíveis utilizações dos mesmos, tentando enriquecer-se ao máximo esta componente.

Por fim, no nosso entender uma das principais partes deste trabalho, o enquadramento efectivo da Ota no seu espaço e tempo, procedendo-se ao debate de conceitos operativos estruturantes do pensamento em torno dos sítios fortificados, realizando-se o exercício de pensamento crítico em relação à manutenção e aplicabilidade de alguns destes conceitos, tendo com base empírica e teórica o sítio da Ota.

O trabalho será apoiado com um conjunto de referências bibliográficas e anexos, quer sejam eles cartográficos, referentes aos critérios descritivos aplicados ou ainda contendo estampas ilustrativas dos materiais tratados e analisados. As diversas bases de dados seguem em anexos digitais, especialmente pela sua ampla dimensão, não sendo útil nem funcional a sua impressão.

Em suma, a presente dissertação serve como meio de realização pessoal e profissional, dando a conhecer uma realidade pouco tida em conta no panorama científico, pelo menos até ao momento, tendo-se revelado um sítio riquíssimo, possibilitando o seu contacto, valorização e divulgação por entre a população, facilitando e viabilizando as tentativas de aceder ao verdadeiro objecto da disciplina arqueológica – as comunidades do Passado.

Referimos ainda que não foi utilizado o novo acordo ortográfico, sendo que nos opomos totalmente à sua utilização e aplicação.

10

2. ENQUADRAMENTOS

2.1 História das investigações: O “Castro de Ota”

“(…) el científico, hijo de su tiempo, refleja las ideas preconcebidas de tipo ideológico u outro que son propias de su entorno e experiencias, así como inquietudes históricas o socialmente específicas” (Hobsbawn, E. 1998, p. 138)

O “Castro de Ota”, nome pelo qual é conhecido, ou o “sítio da Ota”, foi exposto à comunidade científica no ano de 1956, por intermédio do arqueólogo Ernani Barbosa. É de referir, contudo, que a sua descoberta e investigação se deve ao arqueólogo alenquerense Hipólito Cabaço, em 1932. No entanto, assumindo que um sítio arqueológico resulta de um processo somatório de realidades, entre as quais a história das suas investigações, retrocedamos até à génese das investigações do sítio arqueológico da Ota.

A história das investigações deste sítio centra-se, directamente, nos arqueólogos mencionados anteriormente: Hipólito Cabaço e Ernani Barbosa. No entanto, se recuarmos a uma das primeiras figuras da Arqueologia portuguesa, General Carlos Ribeiro, vemos, desde logo que este, embora não o tenha mencionado nos seus trabalhos, reconhece a importância do sítio arqueológico aqui em estudo. É ainda de sublinhar que Carlos Ribeiro procede à identificação de diversas áreas de aprovisionamento de sílex, num dos locais onde se detectam, em níveis superficiais, vestígios da larga diacronia de ocupação da Ota. A não referencia à identificação de uma ocupação mais recente é rapidamente justificada, se tivermos em conta a corrente teórica dominante à época (Ribeiro, 1871), bem latente num dos seus principais trabalhos: ALGUNS SILEX E QUARTZITES LASCADOS encontrados nas camadas dos terrenos terciário e quaternário das bacias do Tejo e do Sado. No entanto, Carlos Ribeiro é, ainda assim, um dos nomes que está na génese das investigações deste sítio arqueológico – não directamente ao “Castro de Ota” em si, mas do seu entorno, com a questão do Homem Terciário da Ota, bem como do próprio desenvolvimento e nascentes do Rio de Ota, tendo visitado toda a sua extensão (Ribeiro, 1867, p.72). Não podemos deixar de referir que o IX Congrès International d´Anthropologie et d´Archéologie Préhistoriques (CIAAP) teve o mérito de colocar a região de Alenquer, nomeadamente, Ota, no mapa da Pré-História internacional. (Branco, 2007, p. 12). A problemática dos trabalhos de Carlos Ribeiro permanece em aberto até ao ano de 1942, ano em que é encerrada, de forma definitiva, por H. Breuil e G. Zbyszewski, este último membro da mesma instituição a que pertencera também Carlos Ribeiro – os Serviços Geológicos.

11

Carlos Ribeiro não só influenciou toda uma geração arqueológica que lhe sucedeu, como todo um concelho, sentindo-se, ainda hoje, algumas dessas influências - Hipólito Cabaço é o melhor exemplo, sendo fruto e descendente de uma “geração de ouro” que, embora tenha herdado desta o reconhecimento pela classe arqueológica e a magia da “descoberta”, não recebeu o legado dos hábitos de registo e recolha sistemática ou de publicação internacional, dificultando a reconstrução dos antigos processos de escavação, não se tendo acesso a proveniências aproximadas que, nos dias de hoje, permitiriam definir funcionalidades e zonas específicas dentro dos sítios arqueológicos.

“A derradeira sequela da impressionante polémica desencadeada em há precisamente 120 anos sobre o Homem Terciário teve por palco, exactamente, os mesmos terrenos pisados por Carlos Ribeiro e seus pares, tendo por protagonistas os membros de uma equipa dirigi da por Mendes Corrêa. Admitindo a existência humana no Terciário, foi com grande expectativa, como declara, que este Professor de Antropologia se deslocou em 1926 à Quinta do Vale das Lapas, junto à estrada de Alenquer a Ota, onde Hipólito Cabaço havia recolhido ossos humanos em terrenos miocénicos. A confirmar-se a idade de tais restos, estava encontrada a prova que, em vão, insistentemente se procurou nas décadas anteriores. A escavação que, de imediato, ali se realizou, viria a revelar, porém, uma sepultura neolítica em covacho aberto no substrato miocénico (Corrêa, 1926).” (Cardoso, 1999/2000, p.49).

Hipólito Cabaço, o arqueólogo alenquerense - definido em 1970, ano do seu óbito, por Maria Amélia Horta Pereira como um pioneiro heróico e gigantesco - torna-se, a partir da descoberta do sítio Paleolítico na Quinta do Espírito Santo, o grande precursor da Arqueologia na região de Alenquer, a partir de 1903, sendo também responsável pela mais extensa e coerente obra de prospecção e exploração dentro dos domínios da Pré-história, realizada na primeira metade do século XX, sobretudo nesse sector ingrato, difícil e controverso que é o paleolítico. (Pereira, 1970, p.7).

Hipólito Cabaço nasce em 1885, numa freguesia do Concelho de Alenquer. Provém de uma família burguesa abastada, proprietária de inúmeros terrenos no concelho que via, no seu primeiro filho, o herdeiro natural dessas mesmas propriedades. É com o objectivo de manter o negócio familiar no activo que, em 1901, Hipólito se fixa na região de Bordéus, sob a protecção do seu padrinho. Contudo, segundo as suas próprias declarações, posteriormente descritas pela autora incumbida de realizar a devida homenagem: passava mais tempo nos museus do que nas adegas (Pereira, 1970). Foi nos museus que encontrou a sua verdadeira vocação: a Arqueologia. Não nos esqueçamos também que Hipólito Cabaço é influenciado por todo um crescimento apoteótico da arqueologia francesa, encabeçada por Boucher de Perthes (1788-1868), Édouard

12

Lartet (1801-1871) ou mesmo o Gabriel de Mortillet (1821-1898). É, nesse paradigma, que dois anos depois chega a Portugal e se lança na sua jornada de prospecções arqueológicas descobrindo, com apenas 18 anos, uma jazida paleolítica que viria a ser estudada por Henri Breuil e Georges Zbyszewski, em 1943. A esta descoberta sucedeu-se a localização de quase uma centena de estações de todos os períodos cronológicos, desde o Paleolítico Superior até ao período Medieval Cristão, ao longo de uma extensão territorial que percorre os concelhos de Alenquer, Salvaterra, Azambuja, Peniche, Caldas da Rainha, Santarém, Abrantes, Elvas, Cadaval, entre outros. No intervalo de 1920 e 1922, o arqueólogo alenquerense dedica-se às jazidas da Ota, onde explora a Caverna da Moura e, em 1925, descobre, no Vale das Lajes, uma jazida paleolítica e uma sepultura, classificada com cronologia Neolítica pelo professor de antropologia Mendes Corrêa. A chegada ao povoado da Ota dá-se pela aproximação do topónimo “Casal da Moura” à realidade aí existente, levando-o a identificar este sitio arqueológico no ano de 1932, onde realizou a sua exploração arqueológica, por meio de sondagens, dois anos depois.

Em situação semelhante encontra-se a estação arqueológica de Pedra d’Ouro, identificada em 1934, bem como Vila Nova de São Pedro, em 1936. Este conjunto de identificações são o resultado de uma observação por parte de Hipólito Cabaço que mostra ter reconhecido as características particulares e partilhadas por este tipo de sítios, que se localizam, tendencialmente, em altura onde o controlo visual de uma ampla paisagem é quase “obrigatório”, assim como as boas ligações a afluentes do Tejo. Tal como referido anteriormente, este arqueólogo não publica, tendo sido dadas a conhecer, as suas descobertas, por investigadores posteriores, entre os quais Afonso do Paço, Padre Jalhay e, no caso concreto da Ota, Ernani Barbosa.

Ernani Barbosa é outro dos nomes principais que se cruza na história das investigações do “Castro de Ota”, sendo que também se intersecta com o nome de Hipólito Cabaço. Porque se o explorador do arqueossítio recolhe os louros pela sua descoberta em 1932, deve-o ao arqueólogo Ernani Barbosa que, em contexto de realização da sua tese de licenciatura, publicada em 1955, expõe muitos dos sítios descobertos por Hipólito Cabaço, correspondentes aos períodos cronológicos situados entre o Paleolítico e a Idade do Bronze – Alenquer nas épocas Pré e Proto- históricas – apresentada na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, sendo bolseiro do Instituto da Alta Cultura. Entre os sítios arqueológicos publicados encontram-se o “Castro de Ota” e o “Castro da Pedra d’Ouro” que irão ter uma preocupação maior por parte do autor, que se vê reflectida na publicação, no ano seguinte (1956), na revista O Arqueólogo Português, de textos individualizados para ambas as jazidas, em detrimento das restantes estações trabalhadas na tese de licenciatura.

A publicação de 1956 é, sem sombra de dúvidas, o ponto de viragem para o sítio da Ota, Ernâni Barbosa leva a cabo um estudo tipológico e formal dos materiais, tentando ainda

13 compreender as dinâmicas de vivência do sítio, como se encontra explanado no capítulo A vida dos habitantes do Castro. A vida de Ernani Barbosa na Arqueologia portuguesa fica intrinsecamente ligada a esta publicação do “Castro de Ota” e ao seu congénere na revista do Arqueólogo Português, contudo a primeira ganhou maior destaque já que é a única, e mais extensa publicação, sobre o povoado. Este trabalho, apesar de não atingir a perfeição desejada por uma arqueologia actual, é a separata de eleição para identificar paralelos com as realidades presentes no Castro de Ota.

A biografia de Ernani Barbosa, ou mesmo os contornos mais básicos da sua vida, são desconhecidos nos dias de hoje, estando a sua “vida” arqueológica explanada na bibliografia que produz – podemos utilizar o ano da sua última publicação como referência, 1970 (ano da morte de Hipólito Cabaço), em que publica novamente materiais da colecção de Cabaço, desta vez sob o tema: Notícia de alguns achados romanos no Concelho de Alenquer., ficando claro que o autor está no activo e mantém a sua ligação à colecção nesta altura. Ernani Barbosa é assim um arqueólogo em toda a sua amplitude, denotando as suas raízes metodológicas, próprias da “escola” em que se licenciou.

A história das investigações do sítio arqueológico da Ota centra-se, essencialmente, nestas duas personagens: Hipólito Cabaço e Ernani Barbosa, mas outros arqueólogos podem ser associados à Ota, ainda que de forma fugaz, como o caso do Prof. Mendes Correia que é levado por Hipólito Cabaço e efectua recolhas no sítio arqueológico, sem qualquer publicação desses materiais; outro dos investigadores é Victor S. Gonçalves, que numa visita ao Castro de Ota encontrar uma das três moedas da 2ª guerra púnica em solo português, realizando, paralelamente a esta visita, a escavação do “Castro” congénere – Pedra d’Ouro (informação pessoal que se agradece).

Esta última intervenção explana a situação em que se encontra, até ao momento, a atenção do meio arqueológico face ao povoamento entre o 4º e 3º milénio a.n.e. no concelho de Alenquer, com uma divisão e interesse desigual. A especificidade da Ota, nomeadamente, o amplo leque cronológico – do Calcolítico ao Período Medieval Islâmico, revelado pelos materiais do local – torna qualquer leitura, baseada nas análises de superfície, mais prudente. É interessante verificar que, apesar do potencial deste sítio, os estudos a ele dedicado pouco avançam para além da longa lista de materiais sem grandes considerações teóricas (Barbosa, 1955 e 1956). A partir da década de oitenta as referências à área em estudo tornam-se pontos num mapa, menções pontuais em obras de carácter mais abrangente, como sejam os efectuados por João José F. Gomes (1978, 1987, 1994), que se resume a listagens de materiais depositados no museu Hipólito Cabaço. Passando pela tese de mestrado de Maria Miguel Lucas (1994), em que inclui a Ota no inventário dedicado às regiões de “Torres” e “Alenquer”, às referências de Kalb (1980) a propósito do

14

Bronze Atlântico onde incluí alguns materiais da Ota. Ainda na sequência se pode destacar Rollán (1996), que menciona os pesos de tear (placas) do sítio na sua vasta publicação sobre esta temática especifica, contudo, tal como os anteriores, vai beber à publicação de Ernani Barbosa e coloca a Ota como não tendo qualquer peso de tear decorado – o que não corresponde à realidade. As leituras ou investigações que se desenvolvem são feitas, na sua grande maioria, tendo por base um catálogo elaborado na década de sessenta - as revisões do conjunto são escassas e poderão ter sido iniciadas com o trabalho de Miguel Costa (2006). Apesar de este autor não ter feito um trabalho especificamente sobre o sítio em estudo ou sobre as temáticas do 4º e 3º milénio a.n.e., estudou o conjunto e visitou o sítio a fim de fazer a sua própria leitura espacial.

A Ota surge assim com um dos sítios arqueológicos com um maior potencial, e necessidade de estudo, já que até ao momento não é encarado como um ponto seguro no mapa do povoamento fortificado estremenho, no 4º e 3º milénio a.n.e.

2.2 Ponto de viragem?

O futuro, ou o presente, da Ota, surge ligado ao aparecimento de um fenómeno recente na sociedade portuguesa – os orçamentos participativos. É neste âmbito que esta dissertação se encontra, enquadrando-se no projecto denominado Caracterização e plano de ação do Canhão Cársico de Ota, tendo sido este vencedor do Orçamento Participativo do Município de Alenquer de 2014. O trabalho de investigação e desenvolvimento para a área do Canhão Cársico de Ota incide na caracterização da mesma área (mapa 1 e 3 – anexos), do ponto de vista da Biologia, Geologia e Arqueologia, através do trabalho de uma equipa multidisciplinar de técnicos e investigadores, todos eles ligados ao concelho de Alenquer. A implementação do projecto prevê também uma componente de divulgação e um plano de acção com identificação de valores, ameaças e recomendações de gestão a concluir até ao final de 2016. A coordenação da componente de Arqueologia ficou a cargo do autor da presente dissertação e tem, como principal objectivo, a identificação, localização, caracterização e valorização do património arqueológico.

A componente de Arqueologia está delimitada aos limites do geossítio – Canhão Cársico de Ota – exceptuando a área do “Castro de Ota” que se estendeu para além dos limites, impostos pela unidade paisagística do Canhão, tendo como objectivo maior compreender as dinâmicas da ocupação humana no espaço em estudo. Trabalhar a Arqueologia na área do Canhão Cársico de Ota é entrar numa viagem no tempo, remetendo para um período da História da Arqueologia em que os métodos e os pressupostos científicos refletiam as mentalidades da época. O principal sítio identificado, já referenciado nos anos 30, é o Castro de Ota (Barbosa, 1956). Este sítio tem, desde as primeiras publicações, uma cronologia de ocupação que remonta ao Neolítico/Calcolítico e se estende até ao Período Romano, sendo que atinge o seu auge no período Calcolítico/Idade do

15

Bronze – realidade observável pelos seus materiais. Juntamente a este sítio, já clássico da História da região foram identificados mais três (Outeiro do Seio I, CNS: 22073; Outeiro do Seio II, CNS: 22074; Via Romana/Moderna), no ano de 2005 (fichas de sítio – anexos), aquando do Estudo de Impacte Ambiental para a expansão da Pedreira do Outeiro do Seio (Monteiro e Caninas, 2005).

Estas eram as informações de que dispúnhamos no início deste projecto, sendo que careciam de confirmação e de adição de novos dados. E foi mesmo esta carência, que se encontrava disseminada pelas áreas de trabalho, que motivaram, numa primeira fase, o grupo de investigadores a que pertenço a intervir junto da comunidade. A criação de plataformas nas redes sociais facilitou o processo de divulgação de vídeos explicativos, de textos informativo sobre as mais diversas áreas e de explicações adicionais fundadas na curiosidade dos utilizadores. Toda esta dinâmica em torno de um espaço distinto no concelho de Alenquer, que mesmo assim era desconhecido por uma maioria esmagadora dos munícipes, aliada a um surpreendente «patriotismo local» dos habitantes da Ota, tornaram e possibilitaram que o projecto vencesse e conquistasse o financiamento exigido pelo grupo de trabalho.

A soberania cedida pelos organismos de representação, a nível municipal, aos cidadãos integra-os, desde da sua génese, aos projectos e promove a sua vinculação quanto ao desenvolvimento dos mesmos. O Orçamento Participativo implica a reintrodução de elementos de participação a nível local, tais como as assembleias locais e de grupos a nível municipal, representando, portanto, uma combinação dos métodos da tradição de democracia participativa. Em segundo lugar, é caracterizado por ser uma tentativa de reversão das prioridades de distribuição de recursos públicos a nível local, sendo estes deliberados pelos próprios munícipes (Santos e Avritzer, 2002). É, portanto, uma das respostas para os défices democráticos que têm sido vinculadas através de práticas de orçamento participativo, numa abordagem que visa colmatar as falhas dos sistemas democráticos, através do incentivo à participação e envolvimento dos cidadãos nos processos decisórios. Ainda que não tenha sido possível medir os impactos do 1º Orçamento Participativo de Alenquer, a sua continuidade foi assumida pela administração local e houve, no 2º Orçamento Participativo de Alenquer um incremento em cerca de 35% de participação, em relação ao anterior - faz-se notar um crescente interesse por estas prácticas de inclusão. O caso da Ota foi também ele representativo dessa evolução e de desenvolvimento alargado do anterior projecto, uma vez que, ainda que o projecto Caracterização e plano de ação do Canhão Cársico de Ota esteja a decorrer, foi submetido paralelamente a concurso o projecto de Requalificação dos Olhos de Água (Ota), que pretenderia melhorar a primeira imagem do Canhão Cársico de Ota. Essa mobilização fez-se notar num crescimento de 41% de votos face ao primeiro projecto vencedor da Ota, ainda que não tenha conquistado financiamento. Mesmo estando a concretização do projecto numa fase intermédia, a repercussão é já evidente e pode ser

16 visualizada e contabilizada em meios díspares, como é o das redes sociais ou mesmo da crescente procura das visitas guiadas e percursos pedestres à área em estudo.

O faseamento da execução da componente de Arqueologia do Canhão Cársico da Ota esteve, num primeiro momento, dependente de aprovação por parte da Direcção Geral do Património Cultural de um projecto de prospecções sistemáticas, numa área de 70 ha, denominado COTA – “Canhão Cársico da Ota” (2015/1 (174)). Viria a ser aprovado e iniciado no dia 4 de Agosto de 2015. A par do trabalho de campo foi desenvolvida a recolha bibliográfica em conjunto com o “estudo de materiais I”, numa primeira fase, apenas sobre a colecção Hipólito Cabaço e, posteriormente, incidindo nos materiais resultantes das prospecções. Esta segunda fase, estudo de materiais II, distingue-se do estudo de materiais I, uma vez que, logo na sua descoberta em campo, os materiais foram inventariados in situ com a devida georreferenciação e o registo fotográfico. Nestas prospecções apenas foram recolhidos elementos classificáveis e passiveis de estudo, fazendo-se assim uma recolha selectiva e mais cuidada com os contextos arqueológicos e os materiais. Já em laboratório foram devidamente lavados, tratados e marcados podendo assim, como estava estabelecido no Pedido de Autorização de Trabalhos Arqueológicos, aprovado pela tutela, ser devidamente acondicionados e preparados para integrar uma proposta de depósito no Museu Hipólito Cabaço. A última fase prevista, tanto no projecto do Caracterização e plano de ação do Canhão Cársico de Ota como no COTA, remete para a difusão dos resultados obtidos e destina-se a dois públicos distintos: um estritamente científico e um não especializado/ local. Independentemente das fases de concretização do projecto é mantido, desde do início, a plataforma na rede social – Facebook – que traz a todos os seguidores e interessados, as noticias semanais e actualizações relativas às diferentes componentes do projecto.

Os resultados preliminares decorrentes do estudo de materiais I, das prospecções arqueológicas e do estudo de materiais II são reveladores da dimensão arqueográfica, patente na área em estudo, e evidenciam a larga diacronia que já era referida por Ernani Barbosa, trazendo o elemento de campo que ficou perdido na memória do falecido Hipólito Cabaço. Em relação aos três sítios arqueológicos que já se encontravam registados aquando do início destes trabalhos, pode referir-se que o Castro de Ota se mantém como o mais rico a nível arqueológico, não só pelos seus contextos e estruturas, como pelo espólio em depósito no Museu.

Este último apresenta uma grande quantidade de materiais classificáveis estando, entre esses, fósseis directores que permitem confirmar que este local terá tido diversos momentos distintos de ocupação (conceito): entre o 4º e o 3º milénio; Bronze Final; Romano Republicano; Romano Imperial; Medieval. Estas várias fases e ritmos estavam implícitos nas arquitecturas que Ernani Barbosa transcreveu, a partir das descrições do descobridor do local (Barbosa, 1956). Estas estruturas que na sua maioria remetem para a Pré-História Recente, eram, até à data deste projecto,

17 desconhecidas e desapareceram por entre a vegetação intensa de carrascos e pinheiros bravos - como será apresentado no capítulo 4.2, muitas delas foram relocalizadas, não na sua totalidade, tendo sido também descritas e alvo de uma tentativa preliminar de interpretação.

O sítio do Outeiro do Seio 1 (CNS: 22073) é referenciado na bibliografia como um possível povoado fortificado Pré-Histórico (Monteiro e Caninas, 2005) - os resultados das prospeções efetuadas pela equipa de trabalho não confirmam estas informações. Os alinhamentos e estruturas descritas por aqueles autores no Relatório sobre a Avaliação do Descritor de Património Arqueológico, Arquitectónico e Etnológico do Estudo de Impacto Ambiental do Projeto de Execução da Ampliação da Pedreira Outeiro do Seio n.º 2 (Alenquer), resumem-se a blocos de grandes dimensões que se desprenderam dos afloramentos por via da erosão, ou mesmo afloramentos naturais típicos desta região, aos quais não foi possível associar qualquer vestígio da presença Humana. Como tal este sítio, Outeiro do Seio 1, em função das observações efetuadas, não pode ser considerado como um sítio arqueológico. A recomendação que será enviada à Direcção Geral do Património Cultural vai no sentido de rectificar este local na base de dados Portal do Arqueológo/Endovélico.

Outra das informações, proveniente dos trabalhos de campo efectuados no Estudo de Impacte Ambiental, referido anteriormente, é a caracterização do sítio do Outeiro do Seio 2 (CNS: 22074) (Monteiro e Caninas, 2005) enquanto abrigo com presença Pré-Histórica. Este carso é comparável a muitos outros “abrigos” /cavidades presentes nas vertentes calcárias que se encontram a descoberto no Canhão Cársico de Ota. No que concerne às gravuras filiformes - duas formas lineares que se cruzam formando dois V - a cronologia Pré-Histórica parece-nos pouco fundamentada já que, nas fotografias apresentadas aquando do já referido Estudo de Impacto Ambiental, as gravuras filiformes aparentam ter uma aparência bastante “viva” que apontaria para uma fabricação moderna ou contemporânea – as paredes calcárias presentes em todo o Canhão Cársico de Ota impossibilitam, salvo em raras excepções, devido à sua rápida erosão e constante transformação, a durabilidade de gravuras, ou pinturas, de períodos muito recuados. Estas gravuras não devem deixar de constar na lista de “sítios arqueológicos”, mas a sua cronologia deve sim ser revista e ponderada, já que pelas suas condições naturais envolventes a probabilidade de ter uma origem Pré-Histórica é remota.

As prospecções trouxeram também a identificação de uma Via Romana secundária que se encontrava sumariamente referenciada nos trabalhos de Miguel Costa (2010), tendo sido agora confirmada. Será objecto de inventariação junto da Direcção Geral do Património Cultural. Esta via é um potencial reaproveitamento de um caminho.

18

No âmbito do estudo dos materiais arqueológicos é de destacar as cerca de 160 peças que foram recolhidas no decorrer das prospecções na área do Castro de Ota. Estes materiais possibilitaram ensaiar e identificar manchas de ocupação, como adiante veremos, permitindo também uma análise territorial, bem como um rascunho do espaço e tempo no sítio da Ota. Foi também possível aceder ao conjunto de materiais que se encontram depositados no Museu Hipólito Cabaço, em Alenquer, o que permitiu assim testar modelos de associação entre os materiais georreferenciados decorrentes da prospecção e os materiais do Museu resultando, numa primeira instância, nas áreas de maior incidência de cada período histórico. Foi através do estudo de materiais que se aumentou o balizamento cronológico da ocupação no Castro de Ota e colocar um ponto no mapa a respeito a uma presença Islâmica, ainda que não se tenha averiguado a sua expressividade no território – foi possível identificar um fragmento de asa vidrada e uma peça estampilhada, decoração característica deste período, no decorrer dos séculos XII e XIII (Viegas e Arruda, 1999, p. 164; Bugalhão, Gomes e Sousa, 2007).

A segunda e última parte do projecto, financiado pelo Orçamento Participativo de Alenquer, corresponde à identificação e criação de um plano de acção para fazer face às ameaças encontradas. Até ao momento, foi possível apontar algumas das principais ameaças e efectuar algumas propostas para minorar os efeitos negativos, no diz respeito à preservação e conservação do património cultural. As ameaças identificadas para o geossítio da Ota correspondem às actividades de extracção de inertes, nas pedreiras “Serra da Atouguia” e “Outeiro do Seio”; à visitação e desportos de natureza e à destruição directa do património arqueológico.

As actividades de extracção de inertes, situadas a Norte da área afecta ao projecto Caracterização e plano de ação do Canhão Cársico de Ota, deverão ser fiscalizadas quanto ao cumprimento dos planos de lavra aprovados, ao respectivo faseamento e devido acompanhamento desses procedimentos. As visitas guiadas ou desportos de natureza necessitarão de uma regulamentação, em sede de plano de ordenamento e gestão de áreas, a criação de um centro de interpretação com funções de divulgação, sensibilização, apoio à visitação e, também, de fiscalização das medidas impostas. A marcação e delimitação de trilhos e estações de visitação do Canhão Cársico de Ota farão também parte de um plano de explicação e de sensibilização para o património natural e cultural, que culminará na elaboração de uma carta de boas práticas onde conste também o desporto de natureza. A destruição do património arqueológico que tem sido levada a cabo, até aos dias de hoje, tanto pelos “caçadores” de tesouros como pela falta de sensibilidade dos responsáveis florestais, já resultou no aparecimento de três “sondagens”, na zona do “Castro de Ota”, numa área estimada de afectação de 20m². Ainda assim, o maior atentado ao património cultural na Ota deu-se nos inícios dos anos 2000, com a abertura de um caminho florestal que invadiu o sítio arqueológico desde de a sua base até ao topo. Numa extensão 100

19 metros e numa área afectada próxima dos 685 m², todo este espaço foi arrasado por uma retroescavadora, ainda que haja esperança que não tenha atingido a base da ocupação humana do arqueossítio.

20

3. MÉTODOS E PRÁTICAS

3.1 - Posicionamento Teórico We are concerned to emphasise that the person of the archaeologist is essential in coming to understand the past. The past is not simply under the ground waiting to be discovered. It will not simply appear, of course, but requires work. Consider discovery. Discovery is invention. The archaeologist uncovers or discovers something, coming upon it. An inventor may be conceived to have come upon a discovery (Shanks e Hodder, 1995, p.11).

A provocação que segue na citação de Shanks e Hodder remete-nos para uma das principais dificuldades com que o arqueólogo se depara, a “invenção”. Esta resulta de uma dinâmica de diversos factores, como o geológico e o ambiental, por parte do meio, e social e cultural, por parte do arqueólogo que, sobre o sítio/contexto, actua (na escavação e/ou interpretação). Por este motivo, considero que a apresentação desta dissertação deve ser resguardada, ao máximo, pelo registo arqueológico, uma vez que esta sociedade, ainda que presente até aos dias de hoje, certamente não é a mesma que a do passado (Shanks e Hodder, 1995, p.12).

A pretensão deste trabalho resulta, invariavelmente, do posicionamento teórico e das motivações para a concretização do mesmo. A reflexão da minha posição teórica vai de encontro à definição e conceito proposto por Gandara (2008, p.74), e é tendo em conta os pressupostos valorativos, ontológicos, epistemológicos e metodológicos que se procurará explicar o questionário arqueológico empregue, e a minha relação com objecto de estudo, o Homem.

Na área valorativa, os supostos estão relacionados com as questões “para quê? E para quem?” se está a desenvolver a actividade científica, que assenta em quatro pilares estruturais. Os pilares éticos e políticos são os que permitem selecionar que problemas são relevantes – que sentido faz a investigação? E quem beneficia com a sua solução?. Que tipo de conhecimento é necessário produzir? é um marco a atingir com o chamado “objectivo cognitivo”, que elenca uma combinação entre a descrição, explicação causal, interpretação e compreensão e a glosa (em tradução livre, iluminar). Por fim, o pilar estético, que pretende definir as teorias a produzir, devendo ser formalmente simples, elegantes ou complexas, consoante o objectivo atingir.

A reflexão acerca desta dissertação perfila dois tipos de objectivos centrais tendo, naturalmente, dois tipos de grupos-alvo distintos – comunidade científica e comunidade local – o que discorre da natureza dos objectivos (éticos) e do sentido deste estudo. Em primeiro lugar, é o primeiro estudo dedicado, em exclusivo, ao conjunto de materiais da Ota, sendo, porventura, um dos sítios arqueológicos, na estremadura do 3º milénio a.n.e., com menos atenção por parte da

21 comunidade arqueológica, resultando na escassez de informações acerca do mesmo – podem resumir-se à tese, para a zona de Alenquer, e ao artigo de 10 páginas escritas por Ernani Barbosa, no Arqueólogo Português. A investigação levada a cabo torna-se, assim, essencial para o estudo da Pré-História recente em Portugal, uma vez que, além da Ota se encontrar desconhecida, a dicotomia entre a Estremadura e a região do Alentejo é avassaladora, pondo em contraste uma área que teve um alto impacto na Arqueologia - derivado das obras públicas que nessa região se implantaram - e uma outra que permanece “adormecida”, desde o frenesim das décadas de 40 a 80 – com uma carência clara de contextos, intervencionados segundo os paradigmas teórico- práticos contemporâneos. Do mesmo modo que se apresenta vital colocar a Ota no mapa da comunidade arqueológica, este trabalho pretende, também, corresponder e colmatar uma necessidade de conhecimento, acerca do sítio arqueológico de Ota, por parte da comunidade local, que tem demonstrado uma carência efectiva, que se demonstra através das suas pretensões: a enorme afluência a exposições, comunicações e, também, a sufrágios públicos (leia-se aqui, por exemplo, Eleições autárquicas e Orçamentos participativos), quando se encontra algum vinculo com o sítio.

Quanto ao “objectivo cognitivo”, que assenta nos quatro pilares anteriormente enunciados, estes irão ter graus de envolvimento e profundidade distintos, o que acaba por ser “normal”, segundo Gandara (2008, p.82), revelando que, no geral, a Antropologia e as Ciências Sociais só podem “navegar” num dos elementos estruturais, ao contrário das ciências exactas, ou mesmo das naturais. Contudo, o presente trabalho prevê ser mais do que somente uma descrição, ainda que se assuma que é uma das suas principais valências. As minhas ambições, quanto à presente investigação e às futuras intervenções neste local, são de ter a dimensão da descrição estabelecida e proceder a um desenvolvimento da “interpretação compreensiva” (Gandara, 2008, p. 86), que corresponde à tentativa de entender as populações do passado, através de um questionário sobre as acções, os objectos e os agentes. Ainda que reconheça as minhas fragilidades, provenientes das poucas leituras bibliográficas, ao nível da Filosofia, Antropologia, Psicologia e Sociologia.

A área Ontológica, no entender de Gandara (2008, p.93), é onde se localizam os pressupostos que correspondem ao questionário relacionado com as características das realidades. A ideia, segundo o autor, é simples: contestar a la pregunta de qué está hecha la realidad –en nuestro caso, la realidad social, la realidad arqueológica?; cuáles son las unidades relevantes de estúdio?; qué propiedades tienen? Os supostos ontológicos são metafísicos, precisamente, porque as disputas entorno à “estrutura arqueológica” não refletiam o total dos elementos de uma cultura, incluindo o nível social e ideológico, que, normalmente, não se resolvem mediante investigações empíricas. Fugindo, por falta de recursos, aos temas centrais da Ontologia, que não

22 se reduzem apenas aos problemas de que são feitas e onde reside a cultura, mas procurando corresponder às propriedades presentes.

A incapacidade de reconhecer a causalidade, a “nomologicidade” (Hair et al, 1998) e as hierarquias, discorrem dos objectivos desta dissertação e da proveniência do objecto de estudo que se suporta numa base empírica, sem contextos seguros, e recolhidos sobre normas, métodos e práticas não desejáveis em Arqueologia. Ainda que, reconheça uma visão sobre o objecto de estudo como proveniente de um Realismo Social de Durkheim (1894), e somando uma visão da cultura como mecanismo extrasomático de adaptação humana de White (1959). Em contra-senso, não na totalidade, está a minha posição na propriedade ontológica da agência face à estrutura, em que assumo a importância de um discurso assumido por Giddens (1989), no entanto, opto pela variante introduzida por Marcus e Flannery (1996) que, através da chamada teoria da acção, reconhece tanto a contribuição da estrutura, como a do agente, sendo que os poderes de decisão de ambos devem ser tidos em conta e os mesmos podem ser capazes de criar situações que promovem mudanças.

A área da epistemologia é um campo fértil na Arqueologia, sendo parte da constituição da mesma, de modo informal. Isto porque, a Arqueologia não tem acesso directo à realidade social que estuda, logo implica que o nosso acesso seja mediado, dependente do material arqueológico - com esse facto registou-se um aumento generalizado de cepticismo. A área da epistemologia, como Gandara a caracterizou, corresponde aos pressupostos relacionados com as questões até onde e como é que podemos conhecer o passado através do registo arqueológico. Sendo que se tratam, muitas das vezes, de conceitos profundamente integrados na prática quotidiana e que tendem a ser pouco aprofundados e examinados criticamente no seu uso. Na prática, esta realidade está enraizada na Arqueologia portuguesa, com um incontável uso de termos abusivos relacionados com funcionalidades, percepções e entendimentos da realidade arqueológica muito influenciados e condicionados pelo contexto em que se pensa sobre eles.

A análise do conhecimento é um dos principais propósitos da epistemologia, sendo expressa por António Valera (2008, p.4) como O ser humano quando conhece, conhece o quê?. Este é então um dos propósitos que a Epistemologia serve, estando sustentada numa tradição grega de análise clássica do conhecimento, que propõe cumprir três condições: crença, justificação e verdade. Para que algo conte como conhecimento, a crença deverá unir-se de razões e argumentos (justificação), e o seu resultado deverá reflectir a verdade. A apresentação de uma crença como uma verdade irrefutável, sem expor qualquer justificação, é conhecida como o dogmatismo. Esta dissertação conjectura, também ela, uma crença do autor que, neste caso, expõe uma propensão para a verdade sobre a presença Neolítica no local; o valor da Ota no panorama cientifico actual, principalmente nas questões do 3º milénio a.n.e.; a mais valia dos estudos de

23 coleções antigas em associações a trabalhos recentes e ainda à abordagem do Realismo Social com uma visão de Cultura como mecanismo extra-somático. A justificação das minhas crenças deverá ser tida em conta com o decorrer do trabalho, tanto na parte de descrição do conjunto como na abordagem à “integração” cultural, às conclusões acerca do conjunto, como na exposição e interpretação das estruturas encontradas na Ota. A verdade, em relação estreita com as teorias por detrás da justificação, é assente no coerentismo (Gandara, 2008, p.128; Oliva, 2002, p.62), que presume que a verdade de uma teoria não pode ser avaliada por uma comparação com uma realidade independente, dado que a dita realidade independente não existe. O máximo que poderemos atingir, ou aspirar, é a criação de um discurso coerente, sendo que é também assumida a possibilidade de haver mais do que um discurso coerente, respeitável e “verdadeiro”, ou complementar.

3.2 - Prospecção

a. Condicionalismos

Os principais condicionalismos com que nos deparámos na área do projecto do Canhão Cársico de Ota prendem-se com questões topográficas, tendo em conta que o terreno é bastante irregular, atingindo os 170 metros de altura, pontilhado de declives acentuados e zonas de escarpas, que dificultam o processo de prospecção. A este problema podemos adicionar a densidade da vegetação que, por inerência, diminui drasticamente a visibilidade do solo dificultando novamente a identificação de materiais e estruturas, bem como a própria circulação (Sousa, 2010).

Estas realidades surgem associadas ao fenómeno geológico do Canhão Cársico, que forma, por acção do rio, encostas muito acentuadas onde a vegetação, essencialmente herbácea e arbustiva é extremamente densa, pontilhada com alguns exemplares arbóreos – estas condições, como mencionado anteriormente, tornam a visibilidade para o solo, e por vezes para a própria paisagem, reduzida ou, em certos casos, nula. Ainda assim, com recursos às devidas medidas de segurança, foi-nos possível prospectar toda a área em estudo, onde se incluem também as cavidades naturais.

A nível de acessibilidades, a presença de caminhos florestais para combate a incêndios torna o acesso á zona do Canhão Cársico relativamente fácil. Quando estas não estão presentes utilizam-se os caminhos estabelecidos pelas explorações de inertes (pedreiras).

24

b. Metodologia

A metodologia de prospecção arqueológica a aplicar prende-se, essencialmente, com o objectivo e com a agenda científica por detrás dos trabalhos, estando, necessariamente, incompleto. Assim sendo, em primeiro plano, o principal objectivo está na identificação de realidades arqueológicas dentro da área do projecto do Canhão Cársico, tendo em vista a sua protecção, valorização, estudo e divulgação. Para tal é necessário compreender a dispersão dos achados e dos respectivos sítios arqueológicos, apreendendo, exaustivamente, a dinâmica das várias ocupações no Canhão Cársico da Ota. A prospecção pode, tendo a ideia anterior como norteadora, identificar artefactos, estruturas e solos antrópicos (leia-se aqui cortes) que, no caso da Ota não são possíveis de identificar uma vez que não estão presentes.

A prospecção sistemática e intensiva – tendo como objectivo identificar o maior número possível de sítios arqueológicos - foi realizada tendo em conta uma divisão artificial feita na área em estudo, tornando-a mais fácil de registar, já que a criação de áreas seguiu o declive natural das zonas – procedeu-se então à definição de áreas de prospecção naturais com imposição institucional (Bicho, 2011, p. 100), referente à zona do Canhão Cársico.

Foram feitas diversas campanhas de prospecção, percorrendo-se, várias vezes, as mesmas áreas, ainda que, com questões e intenções diferentes sobre os mesmos locais – procedeu- se a prospecções nas diversas estações do ano, sendo que no Inverno, depois de períodos de chuvas, novos materiais surgiam e peças, como o sílex, eram mais fáceis de identificar. As campanhas de prospecção foram realizadas, sistematicamente, pelo autor e por Ana Catarina Basílio, aos quais se associaram equipas de alunos, que fizeram incursões esporádicas ao território em estudo. Nestas prospecções colaboraram ainda os investigadores: Michael Kunst, Linda Batouille, Dirk Brandherm, Thomas Tews, Ana Catarina Sousa, João Pedro Cunha-Ribeiro, Marco Andrade, Henrique Matias, César Neves e António Valera, em ocasiões diferenciadas e com propósitos/objectivos distintos.

Algumas das prospecções, consoantes as áreas e as equipas, foram direccionadas para as diversas dinâmicas de cada período cronológico, bem como as ocupações que podem assumir, tentando proceder-se a um trabalho mais rentável e objectivo – reconhecemos também que o treino e formação académica pessoal, de forma consciente e inconsciente, a uma valorização de determinado período cronológico em detrimento de outro, tentando combater-se essa realidade com a diversificação das equipas em campo (Bicho, 2011, p. 101).

Assim sendo, a Pré-História Antiga teve em conta as realidades do período Paleolítico e Mesolítico onde, muitas das vezes, a acção humana se perde por entre a acção natural – neste caso, geológica. A acção sobre a Pré-História Recente tem como desafio principal as modalidades

25 de ocupação em altura, como o próprio Castro da Ota, tentando compreender a dimensão e dispersão de possíveis sítios arqueológicos. E, por fim, a Idade do Ferro ao período Islâmico, procurando evidências da sua passagem, ou ocupação, nas margens e no Vale do Canhão Cársico de Ota.

A nível da recolha dos materiais optou-se por se recolher os “fósseis-directores”, já que ilustram as cronologias em que se inserem, aos quais associámos a recolha de materiais associados a estruturas e de materiais que surjam em zonas onde a sua densidade é baixa. Cada material recolhido tem uma ficha individual, com referência à sua georreferenciação feita com recurso a GPS, com coordenadas geográficas, fazendo-se acompanhar de um inventário geral com todas as peças inventariadas e indicação da zona de proveniência, associadas a desenho de alguns dos exemplares recolhidos. A este registo associa-se a ficha de prospecção onde se (fichas de sítio – anexo) encontram todas as informações referentes às áreas prospectadas e, quando se justifique, fichas de estruturas simplificadas, também elas georreferenciadas e, quando possível, associadas a representação gráfica das mesmas estruturas.

Procedemos ainda ao levantamento das zonas de aprovisionamento de matérias-primas pétreas alargando-o a um raio de 30 Km em relação à área em estudo, considerando-se “exógeno” à área acima desse raio.

c. Áreas naturais definidas

Para facilitar as intervenções de campo procedeu-se ao estabelecimento de áreas naturais que, após compreensão da topografia do terreno, deram origem a um total de 5 parcelas de terreno. Cada uma foi individualizada com uma letra, de A a E, para facilitar a leitura dos materiais em relação às proveniências (mapa 7 – anexos).

A zona A corresponde à área do Castro de Ota, onde consta o principal sítio arqueológico do Canhão Cársico, o Castro de Ota. Para este caso específico foi incluída toda a zona da elevação, bem como os vales e cascalheiras de grande dimensão a ela associada. Corresponde, na sua maioria, a uma área que não apresenta um declive muito acentuado, contando também com algumas zonas de escarpa calcária, sendo a sua prospecção dificultada, essencialmente, por uma densidade elevada de arbustos cerrados.

Quanto à zona B, esta corresponde ao Outeiro do Seio, onde está implantada a zona da pedreira, também ela com a mesma designação/toponímia. Aqui estariam implantados os sítios do Outeiro do Seio I e II, correspondendo a um possível povoado fortificado e a uma gravura

26 filiforme, que foram, após o processo de prospecção desconsiderados. O declive é extremamente acentuado, dificultando a prospecção integral deste espaço, contudo é de sublinhar que nas escarpas orientadas para o interior do vale cársico foi possível explorar um conjunto de cavidades naturais, onde a Gruta do Texugo apresenta potencial a nível sedimentar e possivelmente arqueológico.

A área designada por C corresponde a uma vertente localizada nas proximidades do Castro de Ota, sendo conhecida como Cabeço do Pardal. Esta é a área mais reduzida, localizada já no limite da área de estudo. Aqui podemos encontrar um coberto vegetal pontilhado por arbustos de média/grande dimensão, associado a árvores dispersas, encontrando-se difundidas por entre cascalheiras de média dimensão.

A letra D é associável à Margem Esquerda do Canhão Cársico de Ota, sendo a maior área, em extensão, definida. Foi assumida como uma unidade, correspondendo a zonas de planalto, seguidas de áreas com declive muito abrupto, culminando num conjunto grande de escarpas calcárias, onde é possível, na sua base, distinguir algumas cascalheiras de média/grande dimensão. Esta área sofreu acções de prospecção extensivas, uma vez que algumas das suas zonas correspondem a área de extensão aprovada da pedreira localizada nas imediações.

Por fim, a zona E, a Margem Direita do Canhão – Bairro, foi definida por corresponder a uma área extensa de vale (vale da Ciência Viva e vale das Zelhas). Esta área é de difícil acesso, correspondendo a uma das zonas onde a fauna e a flora se encontram melhor preservadas. Neste caso as cascalheiras ali presentes são de pequena/média dimensão, o que vai novamente dificultar o processo de prospecção. Outros dos condicionalismos identificados nestes vales foi a insegurança inerente à proximidade com a pedreira, uma vez que são feitos despejos ilegais para a zona do vale, tornando-se perigoso a sua visitação.

Foi então esta a divisão operativa que fizemos, tendo sido aplicada desde o inicio ao fim do projecto, funcionando como uma divisão que facilita a prospecção a pente como uma distância lateral regular entre os diversos elementos, quando o terreno e a vegetação assim o permitem, de forma a abranger a maior área de superfície possível.

27

4. SÍTIO ARQUEOLÓGICO DE OTA

4.1 – Enquadramentos

a. Enquadramento geográfico

O assentamento do 4º e 3º milénio a.n.e. em estudo na presente dissertação, o “Castro de Ota”, situa-se a cerca de 1km a noroeste do centro da localidade de Ota (freguesia de Ota, concelho de Alenquer, distrito de Lisboa) (mapa 1 – anexos). As coordenadas geográficas (Datum WGS84) centrais do local são as seguintes: 39º06’54.2” N e -9º00’00.9”W ou UTM: 29SMD970210, sendo que se encontra implantado a uma altimetria média a rondar os 150 m. O “Castro” de Ota situa-se na margem direita do complexo geológico do Canhão Cársico de Ota, onde se encaixa o rio Ota, subsidiário do rio Tejo. Este rio tem a sua nascente na Serra do Montejunto, o que vai reafirmar ainda mais a importância não só da Serra, mas do próprio rio enquanto estruturador do Povoamento. O Castro de Ota é um dos reflexos dessa realidade, contudo esta associação povoado-rio será explorada mais adiante.

Imagem 1 – Implantação, na paisagem, do sítio da Ota, a partir da Margem Esquerda do Rio de Ota.

b. Enquadramento geomorfológico A área em estudo encontra-se inserida nos denominados afloramentos “Calcário de Ota, Alenquer e Silveira” (Jurássico Lusitaniano), estes estão na origem dos mais imediatos relevos da

28 região a sul do Montejunto: a serra da Atouguia, a serra de Ota, o afloramento calcário de Monte Redondo e os afloramentos calcários do vale da Ribeira de Alenquer. Estes são calcários, por vezes margosos, dispostos em bancadas compactas com níveis de desagregação, dando passagem a grés micáceo. A geomorfologia do território da área em estudo constitui um relevo de forma tabular cujo eixo maior tem orientação S-N. Este relevo representa uma mesa com cerca de 220 m de comprimento máximo, 126 m de largura máxima e uma altitude entre os 133-169m, como referido anteriormente. O topo do relevo, no essencial, é aplanado, compondo uma pequena área com cerca de 9 800 m², este planalto está associado a um declive ligeiro para Sudoeste, do topo à base, tendo este uma área útil e passível de utilização a rondar os 57 600 m². As vertentes Norte, Este e Sul são assimétricas e íngremes, sendo constituídas por escarpas que atingem os 50 m de altura em qualquer um destes sectores, tendo sido talhadas por acção fluvial nas rochas carbonatadas.

A elevação em que se localiza o arqueossítio encontra-se enquadrada no conjunto de relevos calcários que compõem o Canhão Cársico da Ota, ainda que se encontre individualizada dos restantes por vales talhados na mesma formação geológica. No sector a Este desenvolve-se um vale de orientação N-S, o principal vale do complexo geológico e onde está encaixado o rio Ota. A Sul do “Castro” de Ota encontra-se o vale em que se encaixa a ribeira soalheira, esta apresenta uma orientação O-E e por último, a Norte, o vale da “Ciência Viva” que tem uma orientação oblíqua, desenvolvendo-se de Sudoeste para Nordeste. No horizonte, a partir do local com maior visibilidade no arqueossítio, salientam-se os relevos calcários do Montejunto (a Norte) e o Monte Redondo (a Este), sendo estruturantes marcos na paisagem.

c. Enquadramento geológico

Circunscrevendo-nos à actual zona político-administrativa – neste caso o concelho de Alenquer – tentamos proceder a uma compreensão do entorno geográfico e geológico, focado mais concretamente no povoado da Ota e na sua envolvência imediata e inata. Este espaço integra- se na Estremadura, dominada pela grande diversidade geológica que, segundo Orlando Ribeiro (1998, p.154), “os arredores de Lisboa, por exemplo, os barros basálticos dão campos limpos e abertos destinados a cultura do cereal; os calcários secundários, charnecas abandonadas ao mato e pasto; os calcários terciários cobrem-se de olivedo; as baixas argilosas, de hortas regadas; o pinhal reveste as colinas de arenito improdutivo” Tal como apresenta Ribeiro, a área em estudo encontra-se na charneira entre a Estremadura, em sentido estrito (Península de Lisboa) e o Ribatejo, no ponto de contacto entre a Orla Mesocenozoica (Maciço calcário estremenho) e a Bacia Terciária do Tejo e Sado, em sentido lato, relativas às zonas de baixios e de aluvião - esta área integra-se assim numa área de influência mediterrânica (1998, p. 152).

29

A geologia do território é composta por formações do Jurássico que, segundo a Carta Geológica de Portugal (Noticia Explicativa da Folha 30-D – ALENQUER), correspondem a cerca de 60% da área alvo desta dissertação. As formações jurássicas, ou seja, as rochas mais antigas, são as “Camadas de Montejunto e de Cabaços”, complexo que possui na sua consistência as margas com intercalações de xistos. Neste complexo, aparentemente, estão relatadas ocorrências de formações siliciosas que de acordo com Choffat (1884): “corte de Cabanas de Torres e do Vale dos Cortes (Flanco Sul da Serra de Montejunto) foram detectadas lentilhas achatadas de sílex branco ou cinzento inserido nas bancadas delgadas de calcário margoso”. Estes materiais silícios foram caracterizados por Aubry (2009), resultado das amostras recolhidas, como sendo silicificações heterogéneas e de fraca aptidão para o talhe. Contudo, segundo a descrição de um corte, realizado pelos Serviços Geológicos, que está presente na Notícia Explicativa 30-D, no flanco W da serra de Montejunto nas proximidades da cota 546, a 900 m do barranco do Convento de S. João, foi encontrado sílex abundante inserido nas bancadas delgadas de calcário – a existência deste corte ainda está por atestar, visto que as diversas visitas feitas ao local foram inconclusivas, no entanto, o objectivo de verificar a qualidade o sílex presente nesse local está por concluir.

Outros factores comuns que veremos mais adiante, além da geologia partilhada pelo “Vale da Ribeira de Alenquer” e pela “serra da Atouguia e serra de Ota” (ou, Canhão Cársico de Ota), é o facto de ambos terem sido braços de água da ria flandriana e, pela idêntica estratégia de ocupação, utilizada pelas populações calcolíticas.

O território circundante ao povoado da Ota corresponde também aos seus povoados contemporâneos – Pedra d’ Ouro (Barbosa, 1956 e Branco, 2007) e Castro do Amaral (Barbosa, 1955; Paço, 1966; Andrade, 1973; Branco, 2001) – e é essencialmente repleto de acidentes orográficos a Oeste, com efectiva relação à “espinha dorsal” do Maciço Calcário Estremenho, já a Este as planícies dominam cerca de dez por cento do total da área territorial. Este é então um espaço de charneira entre o maciço calcário estremenho e as planícies de aluvião do Tejo – realidade já frisada anteriormente.

A área de estudo é constituída, como já foi reconhecido, por formações do Lusitaniano (Jurássico) na sua maioria, ainda que, num raio de 10 km se possa verificar uma diversidade significativa como o complexo Pteroceriano (Jurássico), sem grande expressão. É na zona de contacto entre o complexo Lusitaniano e os complexos detríticos de Ota (Miocênico) que surge o complexo detríticos de Cheganças e de Runa (Paleogénico). Nota ainda para duas formações geológicas de Basalto muito circunscritas, a Oeste e Sudoeste do arqueossítio, e o grés de Torres Vedras (Cretácico) a Oeste. Esta geologia possibilita e oferece uma enorme riqueza de recursos fiáveis, com a possibilidade de produções de artefactos siliciosos em larga escala e, no caso do

30 substracto de base do sítio, a produção de contentores ou recipientes cerâmicos de qualidade que, derivado à proximidade do grés e das argilas das camadas detríticas, permitem a execução de materiais de excelência.

Imagem 2 – Enquadramento regional geológico e cultural. 1 – Ota; 2 – Alto do Pedregal; 3 – Alenquer (Castelo/Porta da Conceição); 4 – Refugidos; 5 – Amaral; 6 – Pedra de Ouro. (Escala 1:50 000)

Por fim, a sua aptidão agrícola deve ser considerada, uma vez que, a Mata de Otta, sendo um antigo couto real, é descrito nas Memórias Paroquiais (Cura, 1758, p.337) como um uma fragoza matta (…) cujos arebaldes se não podem cultivar por serem muyto ásperos, e de muyta pedra, e só serve para pastos de gados, graço, e miúdo. Actualmente, este território, na sua totalidade, é gerido pela Associação de Baldios de Ota e mantém-se, na sua maioria, tal como é descrito pelo Padre Cura, em 1758, excepto no que toca à densidade de vegetação que se crê que, nos de dias de hoje, seja mais densa. Isto porque não existe, actualmente, nenhuma prática de pastoreio, ao contrário do panorama que se vivia até às décadas de 70, onde a realidade passava pela presença constante de rebanhos, provenientes das freguesias limítrofes, nos pastos da zona da Serra de Ota. Esta situação é também verificada para o concelho de Alenquer, nomeadamente, para as freguesias localizadas no limite Norte do concelho – Abrigada, Cabanas de Torres, e Labrugeira – onde a presença de um rebanho comunitário, de grandes

31 dimensões, que se alimentava do coberto vegetal da paisagem calcária, era tratada como a “nuvem do Montejunto”. Posto isto, os terrenos imediatos do arqueossítio de Ota – calcários vermelhos (Atlas do Ambiente, 2002) - apresentam uma classe D com limitações severas ao nível da sua exploração, devido ao risco de erosão elevado, sendo não susceptível de utilização agrícola, salvo casos muitos especiais - ainda que possam ter utilidade como zona de pastagem, exploração de matos ou aproveitamento florestal. Esta situação, descrita acima, é entendida pelos seus horizontes do solo, com camadas incapazes de lavra, dada a proximidade com o substrato geológico. Segundo o Serviço de Reconhecimento e Ordenamento Agrário, o terreno onde se implanta o sítio arqueológico de Ota, e os seus terrenos imediatos (cerca de 100ha), representam um solo calcário, vermelho, semi-húmido e semi-árido, que encontraria aptidões na sua exploração enquanto barreiros.

A agricultura, contudo, seria uma tarefa, acreditamos nós, principal nas sociedades que habitaram, vivenciaram, ou permaneceram na Ota, no 3º milénio a.n.e., apesar de estar pouco atestada, pela falta de sinais evidentes de produção. Ainda assim, poderia ser uma tarefa economicamente viável, que seria possibilitada pela sua proximidade e fácil acessibilidade com os terrenos a SE – terrenos miocénicos, que perfazem o solo onde se implanta actual freguesia de Ota, que, em certas áreas, podem ser caracterizados como solos de classe A, constituindo a actual Reserva Nacional Agrícola (Atlas do Ambiente, 2002) – sem limitações, sem riscos de erosão e susceptível de utilização agrícola intensiva.

d. Paleoambiente A reconstituição paleoambiental, na nossa perspectiva, é um dos grandes objectivos da Arqueologia, enquanto domínio científico, onde ocorreram nos sistemas socioculturais em que se integraram as populações do passado e das diversificadas adaptações e transformações. O estudo do sistema paleoambiental abarca a investigação das variáveis físicas, biológicas e climáticas que se relacionam com o Homem, influenciando o seu modo de vida e operando como factor de mudança dos sistemas socioculturais.

Esta tentativa de reconstituição é de âmbito limitado, ainda que se socorra das outras duas áreas que suportam o projecto vencedor Canhão Cársico da Ota – sendo elas a Biologia e Geologia. Esta abordagem é um estudo preliminar que se apoia, essencialmente, no cruzamento da informação facultada por estudos geoarqueológicos, arqueobotânicos e botânicos, zooarqueológicos e paleoclimatológicos em confrontação com os resultados preliminares para a área do Canhão Cársico de Ota.

O paleoclima correspondente ao âmbito cronológico em estudo encontra-se entre os períodos climáticos Atlântico, entre 5000 – 3000 a.n.e., e o Sub-boreal, entre 3000 - 500 a.n.e.

32

(Lage, Salsón, 2006, p.96). Este último terá como principal indicador e identificador, em termos globais, um clima sub-húmido, favorecendo a expansão da vegetação esclerófila da quecetalia ilicis (Mateus e Queiroz, 1993, p.125). Segundo Lage e Salsón (2006, p.96), a Terra, de modo geral, tem tido uma variabilidade entre glaciações, nas quais o gelo chega a revestir latitudes baixas nas zonas actualmente temperadas, e períodos interglaciares, os quais distam em termos de cronologias e geologias. O período que concerne a esta dissertação sucede à última glaciação, designada como Würm - tal como as restantes glaciações apresenta limites indefinidos, arrastando-se, as suas fases de transição, por períodos longos no tempo. Neste âmbito, compreendendo as cronologias em estudo, constatou-se que os registos que documentam detalhadamente, em termos espaciais e temporais, as alterações ocorridas, integram esta cronologia no período interglacial corrente, o Holocénico (desde 11.500 a.n.e.) – este é distinto especialmente quando se refere o fortalecimento dos processos antrópicos e mudanças sequenciais de ambiente local, como os usos dos solos, e até mesmo o ambiente global, no que respeita à composição atmosférica. O 4º e 3º milénio a.n.e. seriam, segundo as descrições dos registos (Lage, Salsón, 2006), num sentido mais amplo, caracterizados por um clima quente compatível com as temperaturas actuais que, numa segunda fase, teriam apresentado uma variabilidade/instabilidade entre períodos frios e quentes.

A costa, que era bastante recortada, tornar-se-ia, a partir do momento em que a transgressão flandriana atingiu o seu máximo, mais estável - entre 6000 e 3000 a.n.e. (Dias, 1997) ter-se-á iniciado o processo da sua rectificação, ainda que de um modo bastante suave, até aos dias de hoje. Esta situação correspondeu a uma invasão marinha, nas partes baixas do litoral, o que acentuou a respectiva sinuosidade da costa, assim como terá sido registado um avançar dos rios principais nos seus subsidiários. Como foi verificado para a planície aluvionar do Sizandro, a transição do Neolítico para o Calcolítico está associada a uma manutenção e estabilização do paleoambiente (Dambeck et al, 2011, p.394).

A bacia hidrográfica do rio Ota é indissociável dos dois rios homólogos “vizinhos”, sendo eles o rio Alenquer e o rio Grande da Pipa, com uma área conjunta de aproximadamente 400 Km2. O rio Ota nasce no sopé da serra do Montejunto, o seu curso é de Norte para Sul, tendo uma extensão de aproximadamente 8 km, até atravessar a freguesia do mesmo nome, entrando no Tejo perto da freguesia Vila Nova da Rainha, com um total de 20 km de extensão. Em situação semelhante encontra-se o rio Alenquer, que nasce na orla da serra Alta, corre na direcção Oeste – Este, atravessa a sede de concelho e, actualmente, lado a lado com o rio Ota, desagua no Tejo, no mesmo local que o anterior. O rio Grande da Pipa é o mais “independente” dos três, corre no mesmo sentido que o rio de Alenquer, contudo passa junto à povoação dos Cadafais e desagua no Tejo, perto da estação do Carregado, a cerca de 15Km dos rios mencionados. Tal como Suzanne Daveau, no seu artigo Espaço e Tempo (1980) alerta, a ligação entre a ocupação e abandono dos

33 sítios, como Vila Nova de São Pedro, pode estar relacionada com a evolução dos cursos de água adjacentes.

Os rios, supracitados, no máximo da transgressão flandriana, foram um braço expressivo do Tejo, no entanto, a ausência de dados paleogeográficos, não permite fundamentar esta questão a outros níveis, e apreender os efeitos que as oscilações dos níveis da água do mar (variações eustáticas) tiveram na evolução sedimentar nesta região. Assim sendo, podemos presumir que acompanha o processo geral de assoreamento das zonas estuarinas, apesar de o mar se encontrar, no período do 4º e 3º milénio a.n.e, estabilizado na altitude 0 m, a ria ramificada do Tejo e afluentes (Daveau, 1980, p.24). Como foi referido no capítulo referente ao enquadramento geológico, as zonas de aluvião, cerca de 80% da actual freguesia de Ota, são responsáveis pela grande fertilidade que apresentam os solos da região, e pelo fenómeno da acumulação aluvial, que colmatou o profundo estuário do rio Tejo, resultante da “transgressão flandriana” (Daveau, 1980).

Contudo, verifica-se que na bacia do Tejo e do Sado se protagoniza um declínio dos pinhais, nomeadamente da espécie Pinus pinaster, associado ao incremento substantivo dos urzais altos, em simultâneo com a Quercus coccifera. Temos, em síntese, uma paisagem muito diferente da actual, onde predominam os pinheiros mansos, cedros, eucaliptos e, os raros, sobreiros. Já a paisagem dos antigos estuários fica demarcada pelos grandes cultivos cerealíferos, pelos famigerados eucaliptos, que dominam a paisagem, e pelas culturas diversas de pouca expressão. A Ota possui uma singularidade na sua implantação face aos seus congéneres, situa-se num dos topos mais proeminente do Canhão Cársico de Ota, o que lhe confere uma paisagem mais diversificada, devido aos diversos microclimas que ai existem. São estes microclimas que espelham, em primeira instância, a flora presente. Acrescente-se a vegetação casmofítica, própria das paredes rochosas do canhão, os bosques e carrascais com rocha calcária aflorante, os juncais, os caniçais e as comunidades eutróficas, os bosques densos de sobreiros e, por fim, presumivelmente, podemos admitir que junto das linhas de água florescia “o crescimento do freixo, do choupo e do medronheiro” (Sousa, 1998). Tal como ficou demonstrado para o caso do Zambujal, por Mateus (1992), a influência humana no balanço ecológico local começa a ser visível por volta de 6400. BP, tendo as recentes análises polínicas corroborado as primeiras alterações por influência antrópica por volta de 5400 cal. BC, em associação ao aparecimento do cultivo de cereais, entre eles o trigo domesticado (Dambeck, et al, 2011, p.395). Os autores do anterior estudo reforçam que, num espaço próximo à Ota (vale do Sizandro), a escassez de dados provenientes do Neolítico, em conjunto com os numerosos indícios da existência de uma diversa fauna, essencialmente de grandes animais, durante o início do Calcolítico, não pode constituir uma argumentação válida para a tese de que a influência humana sobre a paisagem, até ao 3º

34

Milénio BC, teria sido marginal, realidade expressa nos resultados da investigação em Coutada e Benfica.

Em suma, os recursos nos terrenos do Jurássico são férteis e encontram-se, hoje, praticamente todos ocupados pela cultura vinícola, salvo excepção para algumas áreas de eucaliptos que, felizmente, não predominam nestas áreas. Para além destes cultivos surgem também, a cultura do olival, figueiral e das árvores de fruto. Podemos referir que em determinadas manchas, mais ou menos dispersas, as espécies vegetais de pequeno porte, nomeadamente herbáceas e pequenos arbustos, são dominantes.

A fauna será um exercício mais difícil de realizar, sendo que dependemos, em muito, das observações empíricas do espaço actual e do conhecimento local, ainda que os nichos florestados se tenham mantido nos microclimas, com poucas perturbações e longe da acção humana. Porém, as espécies que habitavam nesses locais foram sucessivamente desviadas, quer pela poluição no leito do rio, quer mesmo pelas actividades cinegéticas, que descuraram da variedade faunística e conservaram apenas as espécies de maior rentabilidade. Presume-se, com todas as inseguranças devidas, que seria habitado por espécies de bosques e que ainda restam, embora em pouco número – raposa, texugo, manguço, esquilo vermelho, gineta, javali – assumindo-se que, também o veado e o cavalo, possam ter pertencido a este nicho ecológico. Esta ideia encontra sustentação nas Memórias Paroquiais (1958), retratadas pelo pároco local, que descreve uma fauna própria destes ambientes calcários, com várias aves, entre as quais se destacam os corvos ou gralhas e os bufos. Nas raízes destes penhascos (Cura, 1758, p.337) encontram-se muitos lobos, raposas e texugos que, segundo o inquirido, fazião muyta perda estes lugares circumvezinhos assim nos gados como nos frutos; e esta foy a razão de se lhe queymarem os mattos. Esta última explicação pode ter feito parte do leque de factores favoráveis à alteração do coberto vegetal e, por consequente, a uma modificação, ou desvio, da fauna presente. A realidade faunística estimada para a Ota é, também, suportada pelos estudos dos povoados contemporâneos, como é o caso do Penedo do Lexim (Garcia e Sousa, 2015), que, para além, das espécies selvagens, mostram uma evidência significativa, e atestada, para a presença de animais domésticos, como é o caso das ovelhas (Ovis aries), cabra (Capra hircus), gado bovino (Bos sp.), de suídeos (Sus sp.) e de Coelho (Oryctolagus cuniculus).

Os recursos minerais são igualmente diversificados no actual concelho de Alenquer, onde estão representados: argilas, margas, areias, saibros, grés, calcários, rochas eruptivas e minérios de ferro. (Carta geológica 30D- Alenquer). Segundo G. Zbyszewski e Guilherme Henriques (Costa, 2011, p. 17) existe cobre no concelho, mas o primeiro não especifica a localização e o segundo remete para os autores antigos que falam nas minas de azeviche (minério de cobre?) que havia em Monte Junto, mas não nos consta que as haja actualmente. A sua existência parece ser

35 inconclusiva e nem mesmo a carta mineira assume qualquer presença. Outra das referências a frisar é a existência, na Ota, de uma zona com vestígios de uma cascalheira do Miocénico, não registada na carta geológica, onde constam sílex que podem ter sido utilizados como matéria- prima na produção de artefactos. A abundância do sílex nos terraços Miocênicos da Ota, e no Jurássico Lusitaniano que, em combinação compõem, maioritariamente, a actual zona administrativa de Alenquer, são as mais prováveis zonas de aprovisionamento de matéria-prima das populações calcolíticas que vivenciaram este espaço. Ainda por atestar, está a expressão qualitativa destes materiais, sendo certa a presença de sílex em bancada na Serra do Montejunto (Zbyszewski, 1965, p. 30), e de sílex em posição secundária, possivelmente decorrente da acção aluvionar. Este tipo de disponibilidade e constituição de solo vai influenciar, de forma clara e estruturante, o tipo de vegetação e de animais que vão surgir e desenvolver-se.

4.2 – Contextos

Os resultados da prospecção realizada no âmbito do projecto de Caracterização e Plano de Acção do Canhão Cársico de Ota foram, sem dúvida, muito ricos e diversificados. Permitiram- nos confirmar que as dinâmicas de ocupação humana do Castro de Ota são muito mais densas e intensas do que se reconhecia até então, permitindo ainda atestar uma presença/passagem humana que se pode estender até ao Período Islâmico. A estes dados podemos ainda adicionar a identificação de um total de oito estruturas arqueológicas que, ainda que não tenham fornecido informações cronológicas, apontam para um grande potencial científico do sítio, aliado a um grau de conservação relativamente bom.

Esta realidade prende-se, essencialmente, com a existência de um conjunto de características que captam a atenção das antigas populações, tais como a localização numa zona relativamente elevada sobranceira a um rio, atribuindo ao sítio potenciais a nível de protecção natural, bem como um grande raio de visibilidade, aliado á exposição solar, sendo o Castro o sítio com mais luz natural durante o dia. Esta realidade já tinha sido identificada e sublinhada por Hipólito Cabaço que, desde cedo, identificou a ocupação da Ota, compreendendo um padrão de ocupação do espaço por parte do Homem pré-histórico e que como vimos, anteriormente, permitiu localizar Alto do Pedregal, Amaral, Pedra d’Ouro, Vila Nova de São Pedro e no nosso caso, a Ota.

Para o sítio da Ota o principal objectivo prendia-se com a identificação dos limites do sítio arqueológico, procurando aferir os vários ritmos de ocupação, bem como identificar e delimitar as estruturas existentes. As condições do sítio permitiram-nos criar zonas de maior concentração de materiais a nível de cronologia, podendo frisar-se que a ocupação

36

Neolítica/Calcolítica tem pouca visibilidade no topo da elevação, encontrando maior destaque a meia encosta – esta realidade seria facilmente explicável se assumíssemos o processo de escorrência natural, mas aquando da identificação de um total de cinco estruturas com planta e desenvolvimento semelhante a cabanas, assumimos que o povoamento da Pré-História recente (Neolítico/Calcolítico/Idade do Bronze) parece centrado a meia encosta. Esta realidade parece ir de encontro com uma possível cronologia mais tardia da muralha, podendo as estruturas circulares estar associadas a uma fase prévia à sua construção. Ainda assim sublinhamos que os dados aqui apresentados são muito frágeis, baseando-se em observações de materiais de prospecção, sem fundamento estratigráfico/cronológico. Já a ocupação do Período Romano parece ter como núcleo central a área do topo da elevação, onde a densidade de materiais é muito grande, parecendo associar-se a uma área mais limpa de vegetação que, segundo fontes locais, representaria uma estrutura de planta rectângular, os materiais de construção de época romana, parecem suportar relativamente estas informações. A ocupação Romana aqui aparenta ter uma justificação forte aquando do período das conquistas, já que a Ota é o último reduto até à chegada do Montejunto, mas quando pensamos a ocupação em época Imperial, altura de “paz” em que os sítios em altura são abandonados em detrimento de uma ocupação na planície, podemos conjecturar que tipo de realidade, função e contexto ali existiria.

Em suma, podemos referir que o Castro de Ota terá tido três ocupações efectivas principais, uma delas referente ao Neolítico/Calcolítico (extensão diacrónica que, todavia, não está atestada), seguido de um período de menor visibilidade, até ao Período Romano Republicano e que iria culminar no Período Romano Imperial – podemos ainda destacar a presença de um conjunto significativo de peças metálicas com tipologias associadas à Idade do Bronze, o que pode indicar uma presença menor ou até um possível “depósito”.

Outra das realidades identificadas é a ausência de materiais enquadráveis no período Paleolítico, bem como na Idade do Ferro ou Medieval Islâmico/Cristão, podendo sugerir hiatos na ocupação do sítio.

As oito estruturas detectadas representam o mais significativo achado identificado no decorrer dos trabalhos de prospecção. Estas podem ilustrar que tipo de ocupação e utilização teria este sítio, sendo mais um ponto a acrescentar ao estudo deste espaço que, até ao momento, tinha referenciado, por Ernani Barbosa (1956), a existência de duas linhas de muralha, várias estruturas circulares, uma rectangular e uma estrutura associada à muralha (possível entrada), sem qualquer referência à localização ou planta.

A linha de muralha (estrutura 1, no desenho 3 e 4) encontra-se implantada no sítio onde não se verifica uma grande defensabilidade natural, realidade semelhante aos povoados

37 fortificados da Estremadura Portuguesa (Sousa, 2010; Cardoso, 2010; Gonçalves et al, 2013), apresentando um total de 150 metros de comprimento, com cerca de 3,27 m de largura – esta última medida é necessariamente aproximada, já que o paramento externo é difícil de definir pelo extenso derrube. A nível construtivo aparenta uma afinidade grande com as tipologias construtivas das muralhas dos povoados estremenho (Gonçalves, Sousa, Costeira, 2013). Ainda assim, esta estrutura, independentemente das questões cronológicas, encontra-se associada a uma outra estrutura circular com cerca de 3 metros de diâmetro, que é assumida enquanto torre (Barbosa, 1956; Gonçalves, et al, 2013), marcando uma interrupção na muralha que pode ser considerada como a entrada de acesso ao sítio arqueológico. Este tipo de estruturas é também comum nos sítios Neolítico/Calcolíticos em altura (Gonçalves, Sousa, Costeira, 2013).

Imagem 3 – Posicionamento das estruturas identificadas no âmbito do projecto de prospecção COTA – 1 – Muralha; 2 - Estrutura circular adossada à muralha; 3 – Estrutura circular negativa; 4, 5, 6, 7 e 8 – Estruturas circulares, de tipo cabana. Imagem de ESRI (2016) a uma altitude de 580m.

A estrutura 3, que representa uma estrutura negativa com tendência circular, mostrou ser uma das mais interessantes (nº 3 na imagem 3). Esta encontra-se totalmente escavada, com um formato circular, com diâmetro 3,50 m, e com uma profundidade a rondar o 1 m, apresentando um conjunto diversificado de artefactos no seu entorno, tais como cerâmica lisa, fragmentos osteológicos e algumas peças líticas, mostrando que existiu uma escolha na recolha dos materiais, podendo remeter-se para as intervenções de Hipólito Cabaço, ainda que este não a refira. Este tipo de realidades aparenta ter relações com contextos funerários, podendo ser esta a origem para o fragmento de mandibula humana, oito dentes humanos isolados, ou de uma figura zoomórfica (coelho - lagomorfo) presente no Museu Hipólito Cabaço em Alenquer – novamente os dados

38 contextuais são frágeis. Podemos mencionar que é comum a identificação de vestígios humanos em sítios arqueológicos congéneres aos de Ota, como o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 142), ainda que estes não estejam associados a nenhuma realidade construída, e como no Zambujal e Leceia (Kunst et al, 2014) onde os vestígios ósseos surgem associada às estruturas de tipo muralha. Em Vila Nova de São Pedro foi identificado um conjunto de fossas que, ainda que não sejam estruturadas, podem ser idênticas com a estrutura da Ota.

Já na Pedra de Ouro, em Alenquer, foi identificado um possível monumento funerário, que é referido por Ernani Barbosa como um tholos com entrada virada a nascente, situado dentro da fortificação, no canto SW, e de uma estrutura circular, talvez uma torre de observação, no lado oposto – NW (Barbosa, 1955, p. 117-118). A opinião de Afonso do Paço entra em contradição com a anterior, que coloca no limite NW da zona escavada, os supostos restos do monumento, bem definido no que toca o seu desenvolvimento, ainda que muito arruinado a nível estrutural (Paço, 1966, 148). Esta contradição é expressa num artigo de J.L.Cardoso (2004, p.74), que dúvida da interpretação de ambos, baseado na confusão demonstrada, bem como da atribuição funcional desta estrutura como um monumento funerário que, segundo este, é uma estrutura defensiva adossada à estrutura amuralhada. Apesar da dúbia interpretação da estrutura, estas são apresentadas por Schubart e Leisner (1966) e por Schubart (1969), sendo desmistificadas e enquadradas na teoria interpretativa, em voga na década de 60, de Beatrice Blance, que define este tipo de estruturas, agregadas às muralhas, nestas cronologias, como torreões. Por fim, é importante salientar a interpretação desta estrutura como monumento funerário, baseado, simplesmente, no seu desenvolvimento arquitectónico, o que, na realidade, nos parece ser bastante redutor para fundamentar a sua funcionalidade. Esta interpretação original pode revelar um processo de reconhecimento empírico, por parte dos escavadores, que tiveram acesso a uma dimensão contextual no decorrer do processo de escavação, que pode suportar a sua interpretação primária enquanto estrutura funerária – sublinhamos que nenhuma das prespectivas pode ser excluída ou descurada, sendo certo que, a sua interpretação, ainda está pouco fundamentada, para ambos os casos. Outra questão que se põe no caso da Pedra de Ouro, está relacionada com as estruturas negativas retratadas nas plantas, estas pouco discutidas no discurso científico, podendo ter sido parte da construção da teoria do Tholos da Pedra de Ouro, sendo que, uma delas, se encontra dentro de uma possível estrutura de tipo torre oca, chegando a atingir os 0,50 m de profundidade.

A estrutura 3 encontra-se dentro do perímetro muralhado, sendo necessária uma aferição cronológica, de ambas as estruturas, para poder compreender a sua relação temporal e funcional. Em suma, esta estrutura traz uma diversidade de questões que só podem ser respondidas com um

39 conjunto de intervenções arqueológicas em várias áreas do sítio, em relação directa a datações por radiocarbono, que clarifiquem, essencialmente, as problemáticas cronológicas.

As estruturas 4, 5, 6, 7 e 8 podem ser tratadas enquanto conjunto, uma vez que se apresentam com arquitecturas semelhantes e partilham uma proximidade espacial muito grande. Estas estruturas foram caracterizadas enquanto possíveis cabanas, já que apresentam uma planta tendencialmente circular, associadas a um derrube que seguem o pendor do declive. No caso da estrutura 4, foi identificado um paramento de aproximadamente 30 centímetros, enquanto que nas restantes esta realidade não foi identificada. A densa vegetação dificulta a sua leitura integral, bem como a relação entre estas estruturas, partindo-se do principio que estariam relacionadas, formando uma possível área de povoamento concentrado. A presença de barro de cabana/cerâmica de construção, nas estruturas 4 e 5, aponta para um desenvolvimento em altura destas estruturas, sendo compatível com a sua utilização enquanto habitação. É-nos impossível avançar com uma cronologia, uma vez que a visibilidade para o solo é reduzida – a arquitectura da estrutura parece apontar para uma cronologia mais recuada, recorrendo-se a blocos de média/grande dimensão, podendo encontrar paralelos desde Leceia (Cardoso, 2010) a São Pedro (Mataloto, 2010). As suas dimensões variam entre os 2,13 metros (estrutura 4), 4,30 metros (estrutura 5), 3,60 metros (estrutura 6), 3,10 metros (estrutura 7) e 2,80 metros (estrutura 8), sendo a estrutura 2 muito reduzida quando comparado com as restantes, em oposição à estrutura 5, a maior do conjunto, que parece ter várias fases construtivas.

De forma resumida, os trabalhos efectuados na área correspondente ao Castro de Ota, designado por nós como sítio da Ota, vêm trazer um conjunto de informações que acentuam a riqueza deste sítio arqueológico praticamente inexplorado. As várias dinâmicas, ritmos e utilizações identificados neste sítio, apontam para a necessidade de trabalhos que envolvam intervenções arqueológicas localizadas, já que as questões que surgiram, com a detectação das estruturas acima apresentadas, são diversificadas, e de interesse marcado, para a comunidade científica.

40

5. COMPONENTE ARTEFACTUAL

5.1 – O conjunto

O conjunto em estudo, proveniente da Ota, é apenas composto por materiais que podem remontar ao 4º e 3º milénio a.n.e., com uma maior preponderância no 3º milénio a.n.e., como veremos mais adiante, decorrente tanto das recolhas da década de 40, por parte de Hipólito Cabaço, como dos recentes trabalhos de prospecção, na base desta dissertação. Este projecto procura colmatar as deficiências contextuais existentes, aportando um maior conhecimento das áreas de maior concentração de materiais/estruturas, bem como conhecer, de forma individual e integrada, os diferentes tipos de artefactos existentes (Quadro 1). O objectivo foi a obtenção de uma visão de conjunto do remanescente das comunidades que habitaram o sítio da Ota, sendo que a aquisição de uma visão global do conjunto, poderá revelar, ou descobrir, as várias actividades, influências e vivências da sociedade calcolítica que ocupou o espaço da área em estudo. Por outro lado, perante um volume considerável de materiais arqueológicos, desprovidos de contextos, procurou-se a combinação de duas perspectivas - a exclusivamente tipológica e as leituras obtidas em âmbito de prospecção – a fim de atingir a percepção das realidades presentes na área do sítio da Ota.

Quantificação de tipo de material Colecção Museu HC % Prospecção CCO % Total Pedra Lascada 764 95,3 38 4,7 802 Pedra Polida 36 78,3 10 22 46 Pedra Afeiçoada 9 81,8 2 18 11 Osso Polido 55 100 0 0 55 Cerâmica 82 78,1 23 22 105 Pesos de Tear 18 95 1 5 19 Metalurgia 4 100 0 0 4 Total 968 92,9 74 7,1 1042 Quadro 1 – Quantificação de tipo de material por origem de recolha.

A densidade artefactual, de materiais enquadráveis no 4º e 3º milénio, da Ota é razoável, tendo em conta as escassas intervenções e trabalhos arqueológicos efectuados no local. A prospecção do Canhão Cársico de Ota permitiu vislumbrar que a área de “ocupação” é bastante maior do que se previa à partida, e que se encontrava relatada.

41

Tipos de artefactos 100 76,97 80 60 40 10,08 20 4,41 1,06 5,28 1,82 0,38 0 Pedra lascada Pedra polida Pedra Osso polido Recipientes Pesos de tear Metalurgia afeiçoada cerâmicos Presença (%)

Gráfico 1 – Presença percentual dos tipos de artefactos na Ota (Colecção Museu Hipólito Cabaço e Prospecões CCO).

Na generalidade, a pedra lascada é o elemento mais representado no conjunto, com uns esmagadores 76,97%, o número aqui indicado poderá revelar dois tipos de explicações – uma, de acordo com a proveniência, aptidão e “gosto” do colector da Ota, outra com a disponibilidade de matéria-prima, realidade que poderá ter originado uma especialização dentro do habitat da Ota, na Pré-História Recente.

O segundo tipo mais numeroso é o dos recipientes cerâmicos, com uma percentagem e presença compreensível, reflexo dos métodos de recolha deste conjunto. Ainda assim, os trabalhos de prospecção levados a cabo pela equipa do Canhão Cársico de Ota, resultaram nuns significativos 22 fragmentos classificáveis, na sua maioria fragmentos decorados - 14 exemplares – seguidos por oito bordos, sem qualquer vestígio de decoração – esta última realidade, a cerâmica lisa, é efectivamente pouca expressiva no conjunto.

O osso polido apresenta-se como o terceiro tipo mais abundante, reflectindo a disponibilidade de acesso à matéria-prima, sem se poder desassociar do elevado grau de conservação da matéria orgânica neste sítio arqueológico.

Em situação quase paralela, em percentagem, encontra-se a pedra polida, com uma representação significativa, sendo que na sua esmagadora maioria é referente a anfibolitos – matéria-prima exógena, que não estaria disponível nesta região – demonstrando que havia, ainda assim, um acesso directo às fontes de matéria-prima, ou às redes que as “trocariam”, e que estaria relacionado com tarefas quotidianas “pesadas”.

O número de pesos de tear presentes no sítio, 19 exemplares, é considerável e representa também um dos costumes praticados no quotidiano da população da Ota – a tecelagem.

Com um número reduzido de artefactos, encontra-se a pedra afeiçoada, 11 exemplares, conjunto que é dominado pelos esferóides, contando apenas com dois moventes.

42

Por fim, o conjunto mais problemático da Ota é a metalurgia, pela sua difícil atribuição cronológica. Do vasto conjunto de metais pertencentes ao sítio arqueológico, foram seleccionados quatro machados e uma ponta de seta, que foram considerados neste estudo, uma vez que, a sua possível cronologia, pode ir de encontro com as trabalhadas na presente dissertação.

a. Pedra lascada Proceder ao estudo da indústria lítica mostrou ser um grande desafio pela, já referida, escassez de estudos que permitam proceder a comparações e a estabelecimento de paralelos, sendo a única excepção o caso das pontas de seta, onde os estudos e tipologias são relativamente comuns e consensuais. É ainda de frisar a falta de apresentação dos valores em “bruto” (Sousa, 2010, p. 153), realidade que facilitaria uma reconstituição de técnicas de talhe. Este tipo de estudo tem como objectivo principal proceder a um ensaio inicial de padrões económicos e a identificação de especificidades na ocupação e exploração do espaço em estudo.

A aferição de uma economia de debitagem depende ainda, desde da génese, da adopção dos princípios da cadeia operatória (Julien, 1992), no sentido de concretizar uma “remontagem mental” (Sousa, 2010. p.155) dos procedimentos aplicados, desde o bloco em bruto até ao utensílio. Na abordagem ao conjunto em estudo definiu-se, genericamente, a prossecução dos critérios técnicos de análise de João Zilhão (1995), adaptado por António Faustino Carvalho (1996) e Mariana Diniz (2007), no que respeita à utensilagem – refere-se a excepção para a classificação tipológica dos elementos foliáceos que seguiram as propostas, resultantes de um estudo intensivo, de Forenbaher (1999). Quer o faseamento, quer a interpretação de diferenças ao nível dos espaços ocupado, foram e serão omissas neste estudo, devido à falta de contexto derivado das campanhas de Hipólito Cabaço, que desenharam um quadro de dados inconclusivo, que não conseguiu ser suplantado pelos dados que resultaram da prospecção arqueológica.

A nível terminológico optou-se por incluir a categoria de “Utensílios”, algo recorrente nos trabalhos referentes a pedra lascada. Esta opção terminológica é consciente, ainda que tenham sido reflectidas as implicações do seu uso nos trabalhos de Patrícia Jordão (2010), tendo como justificação a falta de trabalhos traceológicos que nos indiquem, de forma inequívoca, a utilização das peças e a sua categorização enquanto “utensílios”. Esta escolha foi feita em consonância com os trabalhos de referência para a área em estudo e para este tipo de materiais, seguindo a linha da harmonização conceptual.

1 - O conjunto No caso concreto da Ota foi possível identificar um universo de 802 registos, onde se reconheceram 40 núcleos; 324 materiais de debitagem, dos quais 131 lascas, 123 lâminas e 70

43 lamelas; 14 exemplares de material de preparação, onde apenas foram identificados flancos de núcleo; 168 elementos residuais, onde se integram restos de talhe, esquírolas e fragmentos inclassificáveis; e 328 peças retocadas (neste valor foram adicionadas as lâminas e lamelas retocadas), passiveis de serem classificadas como artefactos, com maior probabilidade de terem sido utensílios.

19%

81%

Fragmentado Inteiro

Gráfico 2 – Grau de conservação do conjunto

O conjunto apresenta-se consideravelmente fragmentado (81%), não tendo sido consideradas as esquírolas e restos de talhe, dificultando, por vezes, uma classificação técnico- tipológica precisa, principalmente no que concerne às peças retocadas (gráfico 2).

2%

5% Núcleos 32% Material de Reavivamento Material de Debitagem 40% Material Residual

21% Peças Retocadas

Gráfico 3 – Categorias tecnológicas

Este quadro de materiais destaca a debitagem de lascas e de produtos alongados (maioritariamente lâminas), reconhecendo-se cadeias operatórias com vista à produção de lascas, lascas retocadas e, possivelmente pontas de seta. A Ota, à semelhança do Penedo do Lexim (Sousa, 2010), Leceia (Cardoso e Martins, 2013), Zambujal (Uerpmann e Uerpmann, 2003) e S. Mamede (Jordão, 2010), revela uma reduzida quantidade de núcleos, de material de preparação e reavivamento de peças com córtex, contrastando com o elevado número de material de debitagem de fase plena e de peças no seu estado final, como utensílio. Provavelmente, parte das sequências de talhe seriam, como avançado por Sousa (2010) e Jordão (2010), efectuadas noutros locais do

44 povoado ou em locais possivelmente “especializados”, a partir dos quais os produtos debitados seriam transportados. Em Ota a situação parece ser semelhante, destacando-se a proximidade com as principais zonas de aprovisionamento de matéria-prima, o Montejunto e as zonas de aluvião miocênicas da Ota, podendo ser vinculadas as primeiras sequências de talhe a estes locais.

A leitura geral das matérias-primas indica o sílex como a matéria dominante (96,93%), seguida, com grande discrepância, pela calcite (1,75%), rocha de base do arqueossítio; quartzo- hialino (0,66%); xisto (0,22%) e indeterminadas (0,44%).

Material de preparação/reavivamento Nº % Flanco de núcleo 14 2 Tablette 0 0 Material de debitagem Lamela bruta 59 8 Lâmina bruta 60 8 Lasca bruta 131 18 Núcleos Núcleo 40 6 Material residual Resto de talhe/Esquírola 146 20 Utensilagem Furador 7 1 Ponta de seta 103 15 Lamela com retoque marginal 11 2 Lâmina com retoque marginal 63 9 Lasca com retoque marginal 39 6 Peça esquirolada 0 0 Raspadeira 34 5 TOTAL 707 100% Quadro 2 – Quantificação e economia da debitagem

2 - Núcleos Os núcleos estão representados por 40 exemplares, 38 pertencentes à colecção Hipólito Cabaço e dois às prospecções arqueológicas, dos quais apenas três se encontram fragmentados. A maior parte evidencia uma tendência de exploração preferencial de planos de percussão, como é possível verificar (gráfico 4) na quantidade abissal de núcleos do tipo prismático, face aos de tipo poliédrico. A tendência para os núcleos de tipo prismático resulta, como já tinha sido verificado nos trabalhos de Patrícia Jordão (2010, p.41), numa evidência da exploração para obtenção de lamelas. Contudo, a reduzida expressão de núcleos com extracção de lâminas pode ser rapidamente justificada se tivermos em conta o grau de utilização/estado em que se encontram – do total de 31 exemplares de tipo prismático piramidal, 25 encontram-se num grau exausto, cinco deles apresentam um abandono simples e apenas um representa um possível esboço.

45

30 25 20 Lâminas 15 Lamelas 10 Lascas 5 Ind. 0 Nódulo Discóide Poliédrico Prismático Fragmentado

Gráfico 4 – Produtos debitados por tipo de núcleo (nº de peças)

Na análise da debitagem, foram considerados apenas os tipos de núcleo expressos no gráfico 4, dos 40 núcleos apenas três se encontram fragmentados, como referido anteriormente, o que resultou numa indeterminação quanto à sua classificação formal e aos produtos debitados. A matéria-prima dos núcleos segue a tendência referida na descrição breve do conjunto, o sílex apresenta-se como maioritário (95%), registando-se ainda dois tipos de matéria-prima – Quartzo- hialino (2,5%) e Calcite (2,5%) – com grande possibilidade da sua proveniência ser local. Tal como se verificou no caso do Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.162), a Ota regista também um uso intensivo do sílex que fica patente no estado exausto (23 em 38) ou abandonado face à existência de defeito (15 em 38) dos núcleos em estudo – esta situação vai contra a relativa proximidade que a Ota apresenta em relação às zonas de aprovisionamento, contudo não nos surpreende se tivermos em conta o esforço económico empreendido na obtenção e tratamento de nódulos de sílex.

O conjunto de núcleos apresenta um elevado número de exemplares sem vestígios de córtex - 27 núcleos (68%), o que poderia significar um tratamento inicial dos nódulos de matéria- prima num local exterior ao sítio arqueológico (Sousa, 2010, p.162). Quando observamos a realidade dos produtos debitados, nomeadamente as lascas, estas apresentam uma tendência contrária, sendo que, de um total de 170 lascas, 60% (102 exemplares) são referente a lascas corticais – este domínio parece indicar que existiria um tratamento in loco dos núcleos. Esta questão permanecerá em aberto, pela já amplamente frisada falta de contextos, até à obtenção de novos dados, que nos façam vislumbrar uma maior percentagem do povoado, ou a existência de locais especializados, clarificando a possível presença de áreas funcionais no espaço da Ota.

O tratamento térmico presente nos materiais da Ota apontou, desde o primeiro momento, um domínio da técnica de preparação prévia à debitagem (Carvalho, 2012, p. 93) que ganha outra expressão se tivermos em conta que não se registam exemplares com presença de potlid ou crazing. A percentagem de 78%, que representa o tratamento térmico em todo o conjunto de núcleos, explana a presença efectiva deste modus operandi na população que habitou e vivenciou o sítio em estudo.

46

3 - Produtos de preparação e reavivamento A escassez de produtos de preparação e reavivamento, é representativa da incapacidade de discriminar o tipo de debitagem efectuada na Ota. No âmbito de produtos de preparação e reavivamento considerou-se a obtenção primária de produtos alongados (Sousa 2010, p.163) – Lascas de reavivamento parcial do plano de percussão, lascas de reavivamento total do plano de percussão (tablettes) e flancos de núcleo. A representatividade de 2% no conjunto lítico corresponde na sua totalidade (14 exemplares) a flancos de núcleo, que registam os indícios das tarefas de manutenção dos núcleos. Os flancos de núcleo, como verificado no Penedo do Lexim, contém um número considerável de peças com tratamento térmico, e o mesmo sucede entre os núcleos.

4 - Debitagem O material de debitagem em bruto corresponde a 40% do conjunto de pedra lascada (quadro 2). A produção parece estar tendencialmente orientada para a obtenção de lascas, 56% dos produtos de debitagem, com um contraste notório face às lâminas (28%), ou mesmo, às minoritárias lamelas (16%). Estas proporções são incomuns quando comparadas com o quadro do 4º e 3º milénios a.n.e. na Estremadura, na medida em que a ocorrência de produtos alongados supera a de lascas, tendo sido proposto por Ana Catarina Sousa (2010, p.166) que a proporção de suportes alongados vs lascas seja determinada por questões de aprovisionamento de matéria- prima.

É importante para nós voltar à génese da recolha dos materiais por Hipólito Cabaço, da qual não dispomos de qualquer informação dos seus métodos, que podem ter uma tendência por uma recolha preferencial, diferenciada ou, em suma, deficitária. Ainda assim, independentemente dos métodos e técnicas aplicadas na intervenção na Ota, é de destacar que os resultados parecem corroborar a tese anteriormente citada. No entanto, em situação em tudo semelhante à de Ota, encontra-se o Outeiro de São Mamede (Bombarral), que apresenta proporções, também elas, pouco consentâneas com a realidade proposta para o período cronológico aqui em estudo – realidade esta que obtém neste sítio arqueológico, uma maior expressão, ilustrada pelas lascas que atingem os 77% dos produtos debitados, em claro contraste com a obtenção de lamelas com 18%, ou das ainda mais escassas lâminas,5% (Jordão, 2010, p.42).

5 - Lascas O produto talhado mais representativo da Ota, neste caso entenda-se lascas, domina o conjunto dos produtos debitados, contendo um elevado número de lascas em bruto. Quando colocamos este conjunto em confronto com as lâminas, podemos identificar que a obtenção de lascas funciona como objectivo intermediário numa cadeia operatória como a dos foliáceos (Sousa, 2010, p.174). Considerando o número significativo de lascas corticais (60%), é

47 concebível que a cadeia operatória das lascas se encontre completa, ainda que não tenha sido realizado nenhum estudo de remontagem.

Entre as matérias-primas, o domínio absoluto do sílex verificado para as realidades anteriores mantém-se (95%), havendo um número residual de lascas de calcite (4%) e um ainda menos expressivo de quartzito (1%), configurando uma quase inexistente macro-indústria presente no conjunto em estudo, tal como é assumido nos casos homólogos que foram estudados, com a assunção de que «as tarefas “pesadas”» estão insuficientemente representadas nos povoados calcolíticos estremenhos. (Sousa, 2010, p.175).

O retoque também foi tido em conta, mesmo tratando-se de um produto que é tido como uma fase intermédia de uma cadeia operatória alargada - a elevada percentagem de produtos inteiros indicia que este tipo de materiais não seriam “compreendidos” como utensilagem. No entanto, como é possível verificar no gráfico 5, as lascas apresentam um significativo retoque (23%), não sendo identificável uma diferença significativa entre as lascas com presença de córtex e ausência, podendo revelar a utilização expedita para tarefas “pesadas” do quotidiano das sociedades do 4º e 3º milénios a.n.e. na Ota.

100

80

60 Lascas Cortícais 40 Lascas sem córtex 20

0 Retocadas Sem retoque

Gráfico 5 – Distribuição do retoque (nº de peças)

Por último, a anteriormente referida tendência para a utilização de tratamento térmico, fica expressa também no conjunto das lascas, revelando-se uma técnica clara de melhoria das aptidões de talhe nestas rochas (Crabtree e Butler, 1964), permitindo, entre outros aspectos, a extração de lascas mais longas e delgadas, requisito fundamental para o fabrico de foliáceos ou a obtenção de gumes mais aguçados (Carvalho, 2012, p.93; Bordes, 1969).

6 - Material residual Os restos de talhe, que representam 21% do conjunto lítico da Ota, quantificam 146 ocorrências, exibindo, porventura, as primeiras fases de preparação e debitagem de produtos não alongados. Para responder a esta questão de incidência nas fases de produção, procurou-se identificar a presença de córtex – foi possível detectar, em 30% dos elementos recuperados, a existência de vestígios corticais, denotando a tendência já demonstrada nas lascas. Já quanto ao

48 tratamento térmico, os 410 gramas de restos de talhe, evidenciaram a propensão para ausência (8%) de um tratamento prévio à debitagem. Quanto à matéria-prima corroboram-se os dados até agora esmiuçados, em que o sílex é predominante, com 94%, com registos vestigiais quanto às restantes matérias-primas presentes – quartzo, quartzito, quartzo-hialino, calcíte e xisto.

7 - Produtos alongados

70

242 123

Lamelas Lâminas Lascas

Gráfico 6 – Produtos brutos debitados

A expressão de 44% (193 peças) de produtos alongados, retocados e não retocados, do conjunto de pedra lascada remete-nos, em primeira instância, para a questão da divisão artificial, ao nível da largura, que define a delimitação entre lâminas e lamelas. Neste caso, optou-se por se utilizar o método mais recorrente, com o valor pré-definido de 12 mm (Inizan, 1995), tendo em vista a normalização de resultados e a facilitação de estudos comparativos.

20< 18-20 16-18 14-16 12-14 10-12 8-10 >8

0% 2% 4% 6% 8% 10% 12% 14% 16% 18%

Gráfico 7 – Largura dos produtos alongados (intervalos em mm)

A análise das larguras dos produtos em suportes alongados (193 exemplares) em categorias de 2 mm, como proposto para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.167), parece indicar uma dispersão por todas as categorias, demonstrando, provavelmente, uma grande disponibilidade de matéria-prima, como já verificado anteriormente para os núcleos, ou ainda

49 diferentes funcionalidades. As categorias (>8; 8-10;10-12) que dizem respeito aos produtos de pequena dimensão (lamelas), 70 peças, apresentam uma tendência equitativa, destacando-se a terceira categoria, com 32 exemplares, na fronteira com as lâminas.

As lâminas, com 64% (123 exemplares) dos produtos em suportes alongados, apresentam duas categorias mais salientes – larguras entre 12-14 e 20< – intervalos quase equivalentes, separados por três peças, que representam propensões distintas. A primeira, no limiar com as lamelas, parece traduzir uma uniformização da produção, em conjunto com a categoria anterior (10-12), enquanto que a segunda aponta a uma produção de produtos de grandes dimensões (29 peças) acima dos 20 mm. Ainda que possa ser assumido que a proveniência contextual dos materiais é um factor relevante e que, embora se apresente inalcançável, deve ser tido em conta – como já sublinhado, a possibilidade da existência/intervenção de um contexto funerário na Ota, por Hipólito Cabaço. A factualidade atingível através dos materiais, denota a predominância da debitagem de lâminas face às lamelas, num conjunto significativo, entrando em oposição com os recentes estudos para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.169) e Outeiro São Mamede (Jordão, 2010, p.44), ainda que em sintonia com a realidade observável no Zambujal (Uerpmann e Uerpmann, 2003, p.29) – 75% lâminas e 25 % lamelas. Esta ultima realidade descrita, similar à Ota, trata-se de um dos sítios mais estudado nas imediações, reforçando o carácter expressivo destas quantificações que, quando vistas como um todo, parecem traduzir uma expressão regional que deve ser, futuramente, transposta numa alargada linha de investigação.

A par desta opção metodológicas outras são aplicadas em contextos homólogos, sendo o exercício de comparação, entre os dados, viável, chegando inclusive a gerar novas interpretações e conclusões distintas. Segundo os pressupostos teórico-metodológicos propostos por António Valera para a área de Fornos de Algodres (2007, p.92), a fronteira entre lamelas e lâminas situar- se-ia ao nível dos 14 mm, em vez dos já referidos 12 mm (Inizan, 1995) - a expressão desta opção materializar-se-ia numa diferença significativa nos dados obtidos anteriormente, com uma supremacia da produção lamelar (53%, 102 exemplares) em relação à laminar (47%, 91 exemplares), tendo o intervalo de 12 a 14 mm (17%) um manifesto impacto no resultado.

A fim de avaliar a produção normalizada de lâminas e lamelas teve-se em conta mais uma variável, para além da já mencionada variação entre as larguras (gráfico 7), o cruzamento entre os resultados das formas dos bordos e a orientação das nervuras. A conclusão segue na mesma orientação que a já retirada para o gráfico 7, em que se verifica que 59% da produção aponta uma tendência de estabilização das técnicas extractivas, mostrando uma certa consonância com a tese previamente desenhada, em que se parecem destacar dois grupos estabilizados – grandes lâminas (20<) e peças com dimensão variável entre 10-14 mm – e um grupo de dimensões não padronizadas. O estabelecimento destes grupos está, intrinsecamente, relacionado com as

50 dimensões das peças e não com a criação de limites artificiais nos 12 mm (Inizan, 1995) ou nos 14 mm (Valera, 2007). Outra das realidades a ser tida em conta, como observado por Rui Boaventura (2009, p.225), é a necessária adaptação das metodologias às perguntas e aos contextos em estudo, sendo referido que outra das hipóteses de análise métrica pode passar pela definição de intervalos mais finos, diferenciando os produtos mais delgados (>9 mm), de um grupo intermédio (10-15 mm) e, por fim de um conjunto mais robusto (>16), cujas funcionalidades, certamente, variavam.

Lamelas Não retocadas

Lâminas Retocadas

0 10 20 30 40 50 60 70

Gráfico 8 – Produtos alongados retocados e não retocados (nº de peças)

Quanto ao retoque nos produtos alongados, destaca-se a tendência conferida noutros estudos homólogos para Estremadura portuguesa (Sousa, 2010; Jordão, 2010), em que se realça o predomínio das lamelas em bruto, realidade que não pode ser verificada no caso das lâminas, que se encontram quase equitativamente distribuídas (gráfico 8). O tipo de retoque dos produtos alongados é, na sua esmagadora maioria, marginal, estando entre rasante e semi-abrupto.

Triangular Trapezoidal Losangular Lamelas Plano-convexa Lâminas Biconvexa Indiferenciada

0 10 20 30 40 50 60

Gráfico 9 – Forma das secções transversais das lamelas e lâminas (nº de peças)

O estudo das secções transversais possibilitou verificar a presença de produtos alongados de fase plena de debitagem e de fases iniciais (gráfico 9), numa proporção similar entre lâminas e lamelas, denotando uma certa coerência no conjunto apresentado. Assim sendo, a fase inicial de debitagem, correspondendo a secções triangulares, exibe 33 lamelas (47% do conjunto das

51 lamelas), registo similar ao das lâminas com 47 exemplares (38% do conjunto das lâminas). A fase plena de debitagem, secções trapezoidal, revela um decréscimo nas lamelas (40% do conjunto das lamelas), em contraste com o aumento no caso das lâminas (41% do conjunto das lâminas), embora seja um aumento pouco significativo e expressivo.

Ausente

Potlid Lamelas Lâminas Tratamento térmico

0 20 40 60 80

Gráfico 10 – Presença de tratamento térmico (nº de peças)

O universo dos produtos alongados da Ota é extenso para um conjunto desta natureza contextual, denotando as evidentes fragilidades nos discursos e nos dados, no entanto expressa uma certa conformidade com resultados obtidos para os casos homólogos na estremadura portuguesa, verificando-se o enquadramento dos mesmos. Os estudos aqui efectuados revelam não só uma evidente produção de produtos alongados, como também uma regularização dos gestos técnicos que pressupõe uma partilha comum do saber, atestável através dos dados fornecidos anteriormente.

À realidade apresentada até aqui, pode ainda somar-se as alterações térmicas que se exibem, curiosamente, em desigualdade de circunstâncias, isto é, as lâminas apresentam um tratamento diferenciado (gráfico 10), em relação às lamelas, com uma expressa motivação para a ausência de qualquer tratamento (58% das lâminas), situação semelhante à observada nos dois únicos núcleos de lâminas (1 com tratamento térmico e outro com ausência de tratamento), contrariamente às lamelas que tendem a ter uma menos expressão na ausência de tratamento térmico (35% das lamelas). Quanto aos núcleos de lamelas, estes apresentam uma tendência semelhante à verificada nas lamelas, em que somente três dos 32 núcleos de lamelas evidenciam a ausência de tratamento térmico.

Por fim, e numa última consideração sobre os produtos alongados, procedeu-se a uma análise macroscópica com o objectivo de interpretar qualquer marca de uso ou expressão pós- deposicional, a busca pelo “brilho de cereal” revelou sete peças no conjunto dos produtos em suporte alongado, com destaque para as lâminas que contém seis dos sete exemplares identificados. O esquírolamento, que tende em ser interpretado como uso expedito, pouco intensivo ou resultado de fenómenos pós-deposicionais, tem alguma expressão no conjunto em estudo com uma presença em 59 peças de 193, sendo que a distribuição é equitativa entre lâminas e lamelas. As restantes 127 lâminas e lamelas não obtiveram qualquer presença de marcas de uso,

52 ainda assim deve ser sublinhado o carácter falível da técnica implementada para aferição deste tipo de marcas.

O estado de conservação dos produtos alongados do sítio da Ota é muito variado, principalmente quando comparamos a categoria das lâminas, em relação com as lamelas. No primeiro caso reflectem o conjunto mais fragmentado, existindo somente sete casos em que se encontram intactas – dominam os fragmentos mesiais com 43 em 67 exemplares, facilmente compreensível quando aceitamos o tamanho que estas peças poderiam atingir, seguido dos fragmentos proximais, com 46 em 72 e, por fim, os fragmentos mesiais, 43 em 67. Já a situação das lamelas é inversa, indiciando que estes objectos seriam utilizados ainda completos, em muito pela sua reduzida largura e dimensão, existindo nove lamelas completas, 26 fragmentos proximais, 11 distais e 24 mesiais.

A nível da fragmentação, a reduzida expressão de peças completas pode indicar que, principalmente, as lâminas seriam fragmentadas para se tornarem mais funcionais no desenvolvimento das suas funções – realidade observável no elevado número de fragmentos mesiais, bem como fracturas por flexão, tendo sido também identificadas peças com retoques em áreas fracturadas, acentuando a utilização destes elementos depois de fracturados. Como acontece para o Penedo de Lexim, também é possível falar em fragmentação intencional, directamente relacionada com a funcionalidade destes objectos em contextos domésticos (Sousa, 2010, p. 173)

8 - Utensilagem Os utensílios da Ota correspondem a 32% do total da pedra lascada, isto é, a 328 exemplares (quadro 3). Este é o segundo conjunto mais representativo da pedra lascada na Ota, em que se destacam equitativamente os utensílios diversos, onde está incluída a panóplia correspondente a uma diacronia entre o 4º e 3º milénio a.n.e. – utensílios de retoque marginal, entalhes, raspadeiras e furadores – e as peças foliáceas, com destaque para as pontas de seta, 103 em 175, e foliáceos ovóides com 72 ocorrências (Forenbaher,1999).

Peças Utensílios foliáceas diversos 53% 47%

Gráfico 11 – Presença de peças retocadas

53

9 - Utensílios diversos Os produtos de debitagem com retoque marginal (111), as raspadeiras (34), os furadores (7) e o entalhe (1) constituem o grupo minoritário das peças retocadas (utensílios diversos). Destacando-se, uma vez mais, as lâminas com retoque abrupto ou semi-abrupto, em proporções semelhantes, com alternância de inclinação de retoques similares. Supostamente, as peças denticuladas, ausentes no conjunto, estão associadas aos conjuntos Campaniformes e escassas nas fases mais antigas do Calcolítico (Sousa, 2010, p.184). A Ota não apresenta qualquer expressão de peças denticuladas e contém apenas um entalhe na sua colecção de pedra lascada, ainda assim, o conjunto não nos deixa de expressar um âmbito cronológico alargado.

Quanto à dimensão funcional das lâminas mesiais (Gutierrez Saez, 1998), não se conseguiu confirmar a sua utilização como utensílio, apesar das lâminas mesiais representarem 35% do conjunto laminar, apenas numa ocorrência se detectaram marcas de uso, nomeadamente o característico “brilho de cereal”.

Raspadeiras Furadores Lamelas retoque marginal Lâminas retoque marginal Lascas retoque marginal Entalhes 0 10 20 30 40 50 60 70

Utensílios diversos Gráfico 12 – Utensílios diversos

Já nas lascas retocadas, estas também apresentam retoque marginal, com um ângulo diferenciado - tipo de retoque semi-abrupto e o mais expressivo, rasante. Também, como verificado para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.178), o número de lascas com retoque descontínuo é elevado e, como proposto para o sítio homólogo, evidencia provavelmente um uso expedito. Contudo não foi detectada, na análise macroscópica, qualquer evidência de marcas de uso.

O entalhe (2009/89) pertencente à colecção de pedra lascada da Ota é do tipo espesso, sobre lasca, encontrando-se inteiro e com o bordo activo demarcado por um retoque semi-abrupto contínuo, no entanto, não foi possível detectar qualquer tipo de marca de uso.

Dos sete furadores que constituem o grupo de utensílios diversos, todos se apresentam sobre suporte de lasca, e encontram-se inteiros, conservando a parte distal que ainda se exibe aguçada. Este é um grupo restrito, tal como o entalhe, considerando que a sua reduzida expressão

54 possa ser explicada pela funcionalidade que lhe é atribuída – “furador” –, podendo sobrepor-se a outro tipo de utensílios – osso ou em metal – o primeiro com uma expressão significativa no conjunto da Ota e o segundo ainda sem qualquer ocorrência detectada. Outro dado a ser tido em conta na análise deste conjunto de reduzida expressão, é a sua amplitude cronológica e, tratando- se estes de proveniência contextual desconhecida, a sua leitura pode espelhar diferentes funcionalidades, cronologias distintas e, por inerência, diferentes maneiras de ocupar o espaço.

As raspadeiras, tal como os furadores, correspondem a um utensílio com uma longa diacronia e o número elevado de ocorrências, face a sítios congéneres como o Zambujal, Penedo do Lexim ou Outeiro de São Mamede, o que pode demonstrar que o conjunto de raspadeiras da Ota condiz com a larga ocupação cronológica da área em estudo. O conjunto é composto por 23 exemplares inteiros e 11 fragmentados, ao nível dos suportes existe uma clara opção pelas lascas (82%), seguido pelo grupo de indeterminados (15%) e, ainda menos expressivo, sobre lâminas (3%). A preponderância das lascas parece ganhar uma nova dimensão quando se observa que, de um total de 82% de lascas, 38% correspondem a lascas corticais, podendo revelar um aproveitamento das primeiras fases de debitagem de um nódulo de matéria-prima, para o aproveitamento funcional desse tipo de material – no conjunto em estudo, a única matéria-prima detectada é o sílex. Contudo, este facto não é determinante numa cadeia operatória de raspadeiras, podendo apenas configurar um momento no espaço que, todavia, não está aferido.

Quanto à morfologia, o conjunto apresenta uma grande heterogeneidade, o tipo de bordo funcional demonstra que não existe uma absoluta predominância evidente – Oval (6); Bilateral (8); Unilateral (12); Discóide (3); Circular (2); Disco-lateral (2); Alterno (1) – destacando-se a presença de retoque em ambos os bordos (bilateral) ou apenas num dos bordos (unilateral). O mesmo já não pode ser aferido para o tipo de retoque, em que se manifesta a presença maioritária de retoque abrupto ou semi-abrupto. Para a extensão do retoque que é, também, dominado pelo retoque marginal, 26 peças, em oposição ao cobridor, apenas uma ocorrência, ou ao invasor com 7 exemplares. Quanto à presença de tratamento térmico, confirma-se em 14 peças demonstrando uma tendência correspondente ao material de debitagem e aos núcleos estudados. As marcas de uso apenas foram confirmadas em 9 exemplares, 8 desses com o evidente “lustre de cereal” e um com uma marca de uso indeterminada.

9.1 - Foliáceos 9.1.1. Foliáceos ovóides

A questão em torno aos foliáceos ovóides é enorme e está expressa nos inúmeros termos que estes artefactos transportam, como lâminas ovóides, facas ovóides, foicinhas ou lâminas de foice. Tal como Forenbaher (1999, p.81), optou-se por utilizar o termo neutral de foliáceo ovoide, que não indicia uma suposta função, já que está não está, de todo, determinada ou estabelecida.

55

O conjunto de foliáceos de Ota, como quase toda a colecção de líticos, é proveniente de escavações antigas e, uma vez mais, a sua leitura será por isso limitada às características inatas dos materiais. A Ota, com as suas 72 peças, parece apresentar um grande potencial, ainda que não apresente os números do Zambujal (266 foliáceos ovóides) ou Leceia (288) supera o Penedo do Lexim (60) e, largamente, o Outeiro de São Mamede (5). Apesar de não ser conhecida a área de escavação de Hipólito Cabaço, a verdade é que a representatividade do conjunto de foliáceos ovóides, na pedra da lascada da Ota, é significativa face aos casos anteriormente mencionados e exemplo disso é o destaque que Forenbaher (1999) lhe atribui, sublinhando-se as abundantes pré- formas deste sítio arqueológico. Não foram identificadas grandes pontas bifaciais no universo da Ota.

O estudo levado a cabo na presente dissertação não confirmou a existência “An unspecified number of large, bifacially worked pieces” (Forenbaher, 1999, p.62), ainda que tenham sido identificadas quatro pré-formas – três inteiras e uma parcialmente fragmentada. O número oficial de foliáceos ovóides também aumentou de 18 para 68, remetendo unicamente para o estádio 6: fase final (Forenbaher, 1999), sendo esse o número mínimo de exemplares, uma vez que o conjunto se apresenta muito fragmentado – proximal (17), mesial (37), distal (10) e parcialmente fragmentado (4) – procedeu-se à tentativa de remontagem com base no estado, na matéria-prima (colorações e defeitos), nas técnicas de retoque tendo sido apenas possível encontrar correspondência em dois fragmentos. A altíssima fragmentação, 100% dos foliáceos ovoides neste conjunto, excluindo as pré-formas, é, por enquanto, inexplicável, ainda que seja reconhecido que a fractura dominante, em 99% dos casos, é por flexão e, apenas num caso, 1%, é por retoque.

A fragmentação deste conjunto suscita diversos entendimentos imediatos, em primeiro lugar, surge de uma colecção que resultou de uma escavação com técnicas e métodos rudimentares na Arqueologia actual, com um modo de recolha não cientifico, ainda que estejamos perante um conjunto lítico coerente com o panorama dos sítios contemporâneos a este. Os fenómenos de natureza pós-deposicional podem explicar a perfeitamente casual agência da natureza sobre os estratos históricos e pré-históricos, podendo estes, através de fenómenos de bioturbação, gerar uma deformação ao nível sedimentar que provoque uma distorção no registo arqueológico. Ainda assim, a mera casualidade parece não explicar o número mínimo de exemplares que não permite qualquer remontagem, a fragmentação de 100% dos foliáceos ovóides, excepção relativa às pré- formas, e a diversidade de “tipos” de sílex. A próxima explicação que nos surge é motivada por Forenbaher (1999, p.63) “These were interpreted as blanks, indicating the existence of a workshop” que tem ser equacionada, mesmo que não exista a representatividade de pré-formas que o autor supracitado conjectura e, desta feita, a explicação para a fragmentação tem de passar

56 pela escavação de uma zona de talhe por parte de Hipólito Cabaço na década de 30. Ou seja, os fragmentos de foliáceos ovóides tratar-se-iam de produtos com defeito, enganos de oficina, erros de talhe ou de reciclagem de foliáceos ovóides.

Por fim, a explicação pela “Arqueologia da fragmentação”, cujos estudos tem estado em voga na última década, é uma “estratégia social ao serviço da comunicação e da gestão de relações” (Valera, 2010, p.31), ou seja, podendo-se levantar a questão, para este caso concreto, de que um fragmento, uma metade, pode assumir-se como representativa de um todo. Contrariamente à tese anterior, que se apoia na noção do objecto (fragmento/lixo) e que este tenha sido deliberadamente abandonado ou deitado ao “lixo” pelas comunidades do passado (Thomas, 1999, p.62). Chapman (2009, p.131) responde a este facto, explicando a quase completa inexistência de construções criativas baseadas no fragmento. As interpretações acerca da fragmentação começaram por se centrar no grupo de fragmentos mais comum do registo arqueológico – cerâmica – com Schiffer (1987, p.271) a sublinhar um conjunto de características dos artefactos, que poderiam revelar informações acerca da formação dos depósitos, em que esses mesmo artefactos se encontrariam inseridos. O autor ainda adiciona a noção de “fragmento órfão”, que corresponde a fragmentos que não colam com outros. E foi esta adição que, para Chapman (2007, p.100), representa o conceito mais importante que Schiffer introduziu nos estudos de fragmentação, já que Chapman considera que a grande maioria dos “fragmentos órfãos” nos sítios arqueológicos pré-históricos não se ficam a dever tanto aos processos tafonómicos, mas a práticas sociais que envolvem a fragmentação intencional e a sua posterior manipulação. Esta questão nunca poderá ser respondida para o caso da Ota, pela já amplamente referida falta de inserção contextual de todo o conjunto artefactual.

A fase de processamento das peças é também atestada pelos seus perfis (Sousa, 2010, p. 187), conferindo a presença de peças de perfil simétrico nas etapas finais. O conjunto de foliáceos ovóides demonstra uma maioria absoluta das secções biconvexas (72%), seguido pelas menos expressivas trapezoidais (15%), pelas indeterminadas (9%) e, as minoritárias, plano-convexas (4%). Este resultado expõe a presença maioritária das fases finais de produção.

Outra das características da produção foliácea é a presença de tratamento térmico, contudo o conjunto “apenas” regista a presença de tratamento térmico em 50% das peças. Quanto à classificação formal das peças, utilizou-se o mesmo critério utilizado para o Penedo do Lexim (Sousa,2010, p.190), em que foram efectuadas de acordo com a geometria dos bordos e extremidades - tal como no Penedo do Lexim, a forma dos bordos mais comum são os convergentes que equivalem às convencionadas “lâminas ovóides”, constituindo a maioria (82%) das peças classificáveis. Foram também identificados bordos paralelos (15%) que identificam formas trapezoidais e, por fim, as menos expressivas, de bordos sinuosos (3%). A constituição de

57 um “catálogo de formas” foi, para nós, impossível, uma vez que o conjunto da Ota não dispõe de qualquer peça completa.

9.2 - Pontas de seta Entre os materiais retocados, as pontas de seta correspondem ao tipo mais representativos do conjunto de materiais arqueológicos em estudo, tal como acontece com as “colecções antigas”, preferencialmente recolhidas nos contextos calcolíticos na Estremadura. O caso da Ota não é excepção, todos os exemplares são provenientes da intervenção de Hipólito Cabaço e, a avaliar pelo número de exemplares (103), parece coincidir com o panorama detectado para o Penedo do Lexim (149), Zambujal (cerca de 900) e Outeiro de São Mamede (418). O conjunto integra 103 pontas de seta, das quais 79 se encontram completas, correspondendo a 77% do conjunto. Estes valores estão desenquadrados de outros contextos similares na Estremadura, exceptuando o caso do Outeiro de São Mamede (87%), podendo a causa deste fenómeno ser associada a uma “recolha direcionada apenas para peças inteiras” (Sousa, 2010, p.191). A categoria de “parcialmente fragmentado” foi incluída no grupo de peças inteiras, no qual as peças que, apesar de permitirem todas as mensurações, estão fragmentadas nas extremidades.

Face ao conjunto, optou-se por se adoptar o modelo de Forenbaher (1999), que tem sido amplamente utilizado na região em que a área em estudo se situa, privilegiando a normalização das designações e a regularidade dos dados.

A sistematização de Forenbaher (1999, p.77-79) que cruza a forma dos bordos das pontas de seta e a forma das suas bases, permitem configurar cinco tipos de pontas de seta, excepção para as pontas mitriformes. De acordo com esta proposta (Forenbaher, 1999,p.77-79) e sistematizadas por Ana Catarina Sousa (2010, p.193), os tipos configuram grupos amplos:

• Tipo 1: pontas de base convexa (base arredondada, base triangular, pedúnculo); • Tipo 2: ponta de base côncava ou plana; • Tipo 3: pontas mitriformes (único caso em que o tipo de bordos e a extremidade da peça determina a classificação morfológica); • Tipo 4: ponta de seta tipo Eiffel: base e bordos muito concâvos; • Tipo 5: pontas de seta alcalarenses (base muito concava e aletas pronunciadas); • Tipo 6: pontas ovais foliáceas; • Tipo 7: pontas modificadas.

Tal como se verifica na lista sistematizada, para além das evidentes particularizações, os tipos 1 e 2 integram uma grande diversidade de formas que seriam, tradicionalmente, individualizadas e, que no caso específico da Ota serão, mais à frente, aprofundadas por transportarem características morfológicas que lhe conferem atributos de “fóssil director”, como elementos de datação relativa.

58

1%

12% Pré-forma Final Reparadas 87%

Gráfico 13 – Estádios de produção das pontas de seta

No seguimento da proposta metodológica de análise de contextos de fabrico, sistematizada em Forenbaher (1999) e em Carvalho (1998), foi possível identificar o primeiro conjunto de produção de pontas de seta no actual território português (Sousa, 2010, p.194) - a abordagem ao conjunto em estudo teve em conta os diferentes estádios de produção, tendo sido essa a base através da qual se determinaram as 16 pré-formas - onde se incluíram cinco peças em estádio inicial – 85 pontas de seta em estádio final e duas que foram alvo de reparação.

Quanto aos tipos de suporte, muitas das vezes são de difícil identificação, devido ao facto de as superfícies se encontrarem largamente modificadas pelo retoque. Foi assim possível confirmar a utilização de lascas como suporte de 22 “projécteis”, sendo que 10 destes correspondem às fases iniciais da produção de pontas de seta, quanto aos restantes (81), o seu suporte foi entendido como indeterminado.

Quadro 3 – Tipos de Ponta de Seta representadas na Ota, quadro tipo Lexim (Sousa, 2010) TIPO Nº % O segundo tipo de ponta de seta (base côncava/ 1-Base convexa/ 3 3% plana) corresponde ao grupo maioritário, ascendendo a triangular 55% do total do conjunto, domínio que aparenta 2-Base côncava/ 57 55% confirmar-se genericamente em todos os povoados e em plana necrópoles (Forenbaher, 1999, p.101). Os restantes tipos 3-Mitriforme 0 0% de ponta de seta apresentam uma expressão residual no 4-Eiffel 1 1% conjunto, destacando-se ligeiramente as de tipo 5-Alcalarense 0 0% convexa/triangular, neste caso unicamente de base 6-Foliáceas 0 0% triangulares, as de tipo modificas e a exclusiva de tipo 7-Modificadas 2 2% torre Eiffel. Não foi detectada a presença de pontas de 8-Indeterminadas 24 23% seta “alcalarense”, ou de qualquer outro tipo que seja 9-Pré-forma 16 16% indicador das redes de troca transregionais (Sousa, 2010, TOTAL 103 100% p. 197). No entanto, pode-se especular a proveniência de um exemplar (1685/8) do tipo 2 (base concava/plana), inteiro sem qualquer fractura, no seu

59 estádio final de produção, cuja matéria-prima sobre a qual foi talhado se reporta a um material xistoide, vulgo xisto jaspoide, sendo esta a única presença de outro tipo de matéria-prima, assinalando-se como o único exemplar com uma possível proveniência exógena – ainda que permaneça por descodificar se foi a peça a viajar ou um bloco de matéria-prima, se chegou pelas teorizadas “redes de troca transregionais” (idem, ibidem, p.197) ou se reflecte um acto de mobilidade populacional (Oelze, 2012, p.15).

A análise das características morfológicas - alongamento, espessamento, perfil, secção, retoque, tratamentos de superfície e geometria dos bordos – seguiram os critérios descritivos propostos por Carvalho, 1998 e Valera, 2006, sendo que, quanto aos índices alongamento e espessamento, optou-se por se seguir a relação proposta por Valera (2006, p. 768). O gráfico 14 permite identificar a relação alongamento/espessura das pontas de seta da Ota, sendo visível que as 59 peças analisadas apresentam uma tendência para um espessamento entre os 12 e os 16 e com um índice de alongamento médio a rondar os 70.

140 120 100 80 60 40 20

ÍNDICE DE ALONGAMENTO DE ÍNDICE 0 0 5 10 15 20 25 30 ÍNDICE DE ESPESSAMENTO

Concavas/planas Convexas/triangulares Torre Eiffel Modificadas

Gráfico 14 – Dispersão das pontas de seta

A matéria-prima não é um factor que possa ser destrinçado ou funcione como factor determinante, como aconteceu para o caso da Malhada (Valera, 2006, p.768), ainda assim é possível constatar, através da relevância dada pelo preenchimento a vermelho no gráfico 14, que a peça - 1685/8 – de xisto jaspoide, ainda que isolada, denota um tratamento similar ao identificável no conjunto de pontas de seta em estudo, ou seja com uma menor robustez (mais alongadas e menos espessas). O conjunto é, na sua grande maioria, pouco robusto, em que os quatro tipos de pontas de seta não se destacam, para além destes existem 10 exemplares – nove do tipo côncavo ou plano e um do tipo triangular – que apresentam um alongamento médio a elevado e uma espessura bastante significativa, acima dos 20. O gráfico de dispersão parece configurar um modo de fazer tendencialmente regular, com algumas excepções mencionadas anteriormente.

60

Em relação ao perfil, existe claramente uma dominância das peças de perfil simétrico/recto que perfazem na totalidade as peças no estádio final, as pré-formas (16) são distribuídas pelos perfis rectos (56%), rectos com a extremidade distal arqueada (25%) e sinuosos (19%). Não foi detectado qualquer perfil convexo que, segundo Ana Catarina Sousa (2010, p.199), poderia configurar um estádio inicial de produção, desta feita a relação não se encontra corroborada para o caso da Ota. No que se refere à secção, a predominância recai sobre as plano- convexas (47%) seguidas pelas biconvexas (25%), este destaque sobre estes dois tipos de secção também foi verificado para o Penedo do Lexim, mas em situação inversa, com o domínio das biconvexas (50%) a que se seguem as plano-convexas (42%). Contudo, no nosso caso, as secções triangulares e trapezoidais reflectem uma maior expressividade no conjunto, com 18%, podendo estar relacionadas com aproveitamento dos produtos alongados enquanto suporte.

Ambos os bordos e base

Apenas um dos bordos

Ambos os bordos Verso Face Superficie total

Indeterminado

0 10 20 30 40 50 60

Gráfico 15 – Extensão do retoque das pontas de seta

A totalidade do conjunto de pontas de seta apresenta retoque bifacial, ainda que a extensão do retoque não seja uniforme em abas as faces. O grupo maioritário das peças foi retocado em ambos os bordos (45%), sendo a extensão do retoque mais comum, a referente ao verso das pontas de seta. A superfície total é o segundo grupo com mais representatividade, com 35% do conjunto, tendo sido a extensão de retoque na face, a mais característica.

Num conjunto considerável de peças, a análise do tipo de retoque revelou a frequência preponderante do tipo rasante, que abrange 71% do conjunto, aparecendo ainda um grupo de peças com um tipo de retoque semi-abrupto (19%) e um número reduzido com retoque abrupto (10%). A serrilha também foi detectada em 16% do conjunto, registando-se uma clara tendência para a ausência deste tipo de acabamento. A explicação para a sua pouca expressividade é teorizada por Forenbaher (1999, p.76) como sendo um meio para o sangramento das presas, o que lhes atribui uma funcionalidade específica e por consequência uma menor expressão no registo arqueológico. Outra explicação, admitida pelo autor anteriormente referido, é a que assume que a presença de serrilhas possa indicar um tipo de “adorno” de natureza não funcional.

61

A questão da fracturação ou fragmentação destes artefactos leva-nos a proceder, em primeira instância, à associação entre a funcionalidade e a produção. Ainda que seja muito difícil identificar os tipos de fractura presentes nas ocorrências de pontas de seta, estes tipos podem ser reconhecidos pela dispersão de energia expressa nas morfologias das fracturas, exercício facilitado pela matéria-prima em questão (sílex). Se, por um lado, os constituintes do conjunto que apresentam fracturas, são representados, maioritariamente, pelas fracturas por flexão (57%) – associadas à sua funcionalidade que envolve a existência de um impacto (Sousa, 2010,p.210) registado através de um padrão comum de fractura: extremidade distal e extremidade da base – por outro lado, verifica-se no conjunto a presença de um grupo de peças que apresentam uma fractura acidental (26%), embora estivessem no seu estádio final, podendo estar atribuído a fenómenos pós-deposicionais. Ainda num grupo mais restrito (10%), foram identificados dois tipos de fractura – acidental e por flexão – que ocorrem na mesma peça, constituindo um desafio à interpretação das suas possíveis causas. Por fim, e quanto às ainda menos expressivas fracturas por retoque (6%), podem corresponder a múltiplas interpretações das quais destacamos a reparação, acidentes em fases finais de talhe e/ou por reconversão.

Num balanço final do conjunto, a questão cronológica parece ser a que tem maior preponderância e relevância. É nesse sentido que o extenso conjunto da Ota pode alcançar um enquadramento crono-tipológico baseado nas morfologias analisadas. A questão tipológica é sobrevalorizada neste capítulo devido à escassez de proveniência contextual, assim sendo, e a par dos estudos no Outeiro de São Mamede, Zambujal e Penedo do Lexim, a Ota parece adequar-se às cronologias contextuais do Zambujal e do Penedo do Lexim, com um conjunto na sua grande maioria (tipos côncavos, Torre Eiffel, Modificadas) enquadrável no 3º milénio a.n.e., excepção para as reduzidas (3) evidências (tipo triangular) enquadráveis nos finais do 4º milénio a.n.e., como verificado nos contextos arqueológicos nos sítios homólogos à Ota.

b. Pedra Polida Quando falamos da pedra polida, na Estremadura portuguesa e, mais concretamente, no período entre o 4º e 3º milénio a.n.e., mencionamos um tipo de matéria-prima que possibilita uma leitura ampla sobre variadas temáticas, entre as quais podemos destacar as redes de troca e aprovisionamento a longa distância, as tecnologias de fabrico e as práticas desenvolvidas no quotidiano destas populações.

Foram contabilizadas um total de 46 peças entre utensílios, possíveis esboços e fragmentos de pedra polida, perfazendo um total de 9,216 Kg – um número relativamente reduzido quando comparado com outros contextos similares na mesma área geográfica (Sousa,

62

2010, p. 217) mas que ganha grande expressão se tivermos em conta a escavação antiga e, mesmo assim, reduzida levada a cabo por Hipólito Cabaço.

Dentro do conjunto em estudo foi possível identificar alguma diversidade de matérias- primas, sendo elas o anfiboloxisto que corresponde a um total de 42 exemplares e 8,609 kg – é interessante verificar que esta matéria-prima, dominante no conjunto, tem uma proveniência mínima de 80 km em linha recta (Abrantes) – o calcário, a matéria-prima local com 2 exemplares, correspondendo a 338 gr e duas peças cuja matéria-prima é indeterminada. Assim sendo, o estabelecimento de comparações com os trabalhos recentes, levados a cabo em sítios arqueológicos como Leceia (Cardoso, 1999/2000), Penedo do Lexim (Sousa, 2010. P. 216) e Pedra d’Ouro (Branco, 2007. P.87) é difícil, cingindo-se a uma comparação mais tipológico- formal e quantitativa do que contextual.

A nível do estado do conjunto é interessante constatar que o mesmo apresenta uma grande diversidade no tipo de conservação. Há um domínio das peças fragmentadas, representando um total de 26 fragmentos – esta leitura foi altamente dificultada pelas diversas reconstituições que o Museu Hipólito Cabaço levara a cabo em muitos destes fragmentos de machado, contudo a sua análise foi possível, sendo só de referenciar que as medidas retiradas podem sofrer ligeiras alterações. Deste total de 26 fragmentos foi possível criar 3 subcategorias que ilustram em que secção o fragmento se pode inserir: quatro exemplares de área mesial, que nos permitiu identificar tipos de polimento e matérias-primas, seis peças correspondentes á área proximal, ou talão, que foram analisados tendo como principal objectivo a procura de marcas de um uso complementar e, principalmente, marcas de encabamento, por último 16 peças que correspondem à área distal, mais comummente denominada de gume, que facilitaram as leituras referente a usos, simetrias e funcionalidades. Por último é de referir um total de 20 exemplares (44%) que se encontram completos e acabam por ser a categoria dominante no conjunto, realidade que é bastante rara em contextos homólogos na Estremadura Portuguesa, que apresentam um grau de fragmentação bastante elevado (Sousa, 2010, p.217) - no Penedo do Lexim, tendo em conta um conjunto de 48 peças, somente 16 se encontram completas, correspondendo a 33% (Sousa, 2010, p. 216), já no caso do “povoado vizinho” da Pedra de Ouro onde se verificam 97 peças, somente 24 (25%) correspondem a artefactos inteiros (Branco, 2007, p. 87). A realidade anteriormente referida muda a nível numérico quando analisamos os contextos de Leceia que, num total de 184 peças, aproximadamente 130 (71%) correspondem a materiais inteiros (Cardoso, 1999/2000, p. 241) - neste caso específico é de destacar que a área intervencionada é superior a 10 000 m², o que pode justificar o número avultado de peças completas. Para o contexto do Castro do Zambujal foi possível constatar que não existem dados compilados, o que vai impossibilitar as comparações. Novamente é de relembrar que o conjunto em estudo na presente dissertação resulta, na sua

63 maioria, de uma escavação “arqueológica” antiga que pode, entre outras realidades, ter intervencionado contextos não só de ocupação.

1. Caracterização tipológica No que toca aos “nomes das coisas”, neste caso à nomenclatura a atribuir a cada tipologia de materiais, foram utilizados termos como “machados”, “enxós” e “martelos” que tem uma conotação claramente funcional. Contudo, tendo em vista uma uniformização dos estudos e a possibilidade de estabelecer comparações que nos permitam leituras superiores, esta terminologia foi aqui também ela replicada.

Uma vez que o conjunto do “Castro” de Ota não se encontra significativamente fragmentado, foi possível ensaiar uma caracterização e inserção tipológico-funcional de 38 dos exemplares. Esta realidade só não foi possível de efectuar em oito casos, dois deles referentes a áreas mesiais, quatro de área proximal e dois da área distal – nestes oito fragmentos não foi possível entender o desenvolvimento da peça, tendo sido tomada a decisão de não os incluir em nenhuma categoria tipológica. Em oposição a esta realidade, conseguiu-se chegar á caracterização e inserção tipológica de 10 machados e oito enxós que, mesmo não se encontrando completos, permitiram ensaiar um desenvolvimento intrinsecamente ligado com o tipo de bisel do gume, com a secção longitudinal e evolução dos bordos do fragmento – estas opções metodológicas encontram-se em conformidade com as descrições metodológicas de Gertrudes Branco (2007, p. 88), António Fandos (1973, p. 203-208) e António Valera (2010, p. 763) que, neste caso, foram adaptadas para fragmentos e não somente para exemplares completos.

Tendo estes pressupostos como base metodológica, foram identificados então três tipos de categorias de materiais já referidas – machados, enxós e martelos.

No primeiro caso, os machados perfazem um total de 20 exemplares, dos quais 10 se encontram completos. A caracterização dos materiais completos foi feita a partir dos dados obtidos através do cálculo do índice de alongamento (largura/comprimento*100) – que varia entre os 35 e os 61 – e o índice de robustez (espessura/comprimento*100) - entre os 26 e 46 – em associação ao desenvolvimento formal da peça. A estes parâmetros foi adicionada a análise de secções, onde dominam, em 55% do conjunto, as secções rectangulares, seguidas pelas secções circulares com 20%, a análise do gume, onde se verifica uma grande homogeneidade no conjunto entre os gumes simples convexos (45%) e os simples planos (40%) e, por último, a análise do talão, no caso dos dez exemplares completos, que varia entre os talões truncados (40%), arredondados (30%) e pontiagudos (30%). Referimos que, nos valores de intervalo anteriormente referenciados, não foram incluídos três exemplares, tendo em conta o seu peso significativo, estando inclusive um deles fragmentado no talão, que claramente não se enquadram com os

64 valores médios do restante conjunto – realidade mais acentuada quando apresentados os pesos das referidas peças – o artefacto nº 1696 com um total de 1,200 kg, o nº1323 com 2,210 kg (com um índice de alongamento de 19 e de robustez de 17) e o nº1311 com 1,400 kg, todos eles de anfibolito. Estas três peças representam 52% do peso total do grupo de pedra polida em estudo, o que lhes atribui um grande valor influenciador nas análises deste conjunto artefactual.

A compreensão e leitura destas três peças é, de forma clara, bastante difícil de ensaiar, em especial pela falta de proveniências contextuais. Duas destas peças podem ser assumidas como similares a nível formal, tecnológico e do tamanho – peças nº1269 e 1311 – sendo que ambas apresentam marcas de uso nos gumes, podendo ser conjecturada uma funcionalidade mais “efectiva” no quotidiano destas comunidades, ainda que apresentem, como referido anteriormente, valores que extravasam as médias do conjunto. No terceiro exemplar não foi detectada qualquer marca de uso, podendo ser assumido como um machado votivo – votivo no sentido de não apresentar uma funcionalidade aparente. Este espécime apresenta características morfológicas semelhantes às peças das áreas de Benavila e Ervedal, Redondo, Mafra, Alpiarça, Várzea do Lírio, Vila Velha do Rodão e Castelo Branco que, curiosamente, apresentam uma dimensão média de 35 cm com corpo “afuselado” com matérias-primas similares (Andrade, 2014, p. 100-101; Gonçalves, 1982-83).

As justificações funcionais e cronológicas destes machados são diversificadas e pouco claras, tendo de estar necessariamente relacionas com a existência de vestígios de uso e o contexto da sua descoberta. No caso específico da Ota, como sublinhado várias vezes ao longo do presente trabalho, não nos é possível aceder ao contexto original da recolha deste machado de grandes dimensões, contudo, tendo em conta a já referida inexistência de marcas de uso, podemo-nos inclinar para uma funcionalidade/significado mais relacionado com um âmbito votivo, na senda do que Victor S. Gonçalves avança em 1983/1984 (p. 198). O carácter votivo, neste contexto, não pode ser desassociado do seu poder representativo de uma possível relha de arado (Andrade, 2014, p. 101), que ganharia um peso extra a nível cultural e simbólico, num período em que surgem novos métodos e paradigmas associados a uma “revolução” dos produtos secundários (Sherratt, 1995, p. 61-76).

Passando já ao caso específico das enxós, de um total de 17 exemplares identificados, nove encontram-se completos. Novamente foram usados os índices de alongamento, para os exemplares completos – onde se verificaram intervalos entre 30 e os 48 mostrando assim o seu diminuto alongamento – e ainda o índice de robustez – com valores entre os 10 e os 31, indicando uma robustez média. Foram também aqui analisadas as secções, dando-se destaque às secções rectângulares (65%), procedidas pelas de tipo quadrangular (24%), em associação a uma análise das tipologias do gume, onde domina o gume simples plano (82%). Quando olhámos para os tipos

65 de talão, foi-nos possível constatar que há uma tendência similar á já verificada para os Machados – talões truncados (33%), arredondados (22%) e pontiagudos (22%), sendo que o único dado a adicionar é o aparecimento de dois talões planos (22%). No caso desta categoria tipológica foi detectado um exemplar que extravasa a tendência geral do conjunto – uma peça de pequenas dimensões, cuja matéria-prima é indeterminada, tendo sido integrada neste conjunto sabendo-se, à partida, que não entroncava com as cronologias em estudo. Mais adiantamos que esta peça teria uma cronologia que pende entre dois períodos cronológicos distintos - o Neolítico Antigo, onde é possível identificar paralelos como o sítio dos Cortiçóis (Cardoso et al, 2013, p. 44), o Neolítico médio, com 1 registo similar no Algar do Bom Santo (Carvalho, 2015, p. 8) e o Bronze Final, onde se detecta uma enxó, também ela de pequenas dimensões, em Basalto, no sítio da Quinta Nova de Santo António (Neto et al, 2013, p. 38). O caracter votivo que os artefactos referidos assumem nos contextos apresentados, podem reforçar, uma vez mais, a mescla de contextos associados às intervenções de Hipólito Cabaço na década de 30. O seu simbolismo parece também estar patente na sua matéria-prima sendo esta, nos casos apresentados, sempre minoritária (Cardoso et al, 2013, p.59), algo que, no caso da Ota, também se verifica, permanecendo por identificar a matéria.

No caso concreto do único exemplar de martelo presente no conjunto em estudo, só foi possível proceder à sua identificação por este se encontrar completo. Uma peça de desenvolvimento circular, pouco alongada (44) mas com uma robustez considerável (também de 44) dado ao facto da sua suposta funcionalidade/utilização. Neste artefacto o “gume” apresenta- se martelado com intensos sinais de uso, realidade que também se verifica no seu talão, dando a entender que ambas as extremidades se encontrariam activas e em uso (martelo/pilão). Avançamos a hipótese de uma segunda funcionalidade enquanto pilão devido ao estado arredondado e esmagado do talão, realidade que também vai ser identificada na Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 88).

O domínio absoluto dos machados face às enxós, realidade comum na Estremadura portuguesa (Sousa, 2010, p. 218), não se verifica no contexto da Ota, onde se confirma uma certa homogeneidade dentro do conjunto – 20 machados (43%) para 17 enxós (37%). Esta realidade também não encontra paralelos nos contextos das Beiras, onde se verifica uma presença mais acentuada para as enxós do que para os machados (Valera, 2007, p. 384). Quando procuramos paralelos a uma escala mais reduzida, local/regional, mais especificamente na Pedra de Ouro, detecta-se uma situação similar – os machados representam 29% do conjunto, enquanto que as enxós espelham 17%. Para outros contextos que partilham algumas semelhanças com a Ota, o Penedo do Lexim e Leceia, os machados são os mais representativos com 33% dos conjuntos em ambos os casos (Sousa, 2010, p. 218; Cardoso, 1999/2000, p. 257). No nosso entender a justificação para esta realidade que, aparentemente é “local”, passa pela falta de contextos

66 concretos na Ota, aliado a uma recolha selectiva que favorece determinadas peças em detrimento de outras, e, no caso da Pedra de Ouro, a análise centrada nos artefactos completos (Branco, 2007, p. 87) pode distorcer os dados reais.

Tentámos suplantar algumas das falhas contextuais com recurso à prospecção arqueológica e respectiva georreferenciação dos achados, contudo os resultados apresentam-se em sintonia com o conjunto e com as elações previamente descritas – num total de sete peças recolhidas, uma amostra mesmo assim pouco significativa, três correspondem a machados (43%), uma enxó (14%) e três peças indeterminadas (43%).

Dentro destas categorias tipológicas foi ainda feita uma análise transversal que se debruça sobre a técnica de produção destes artefactos – mais concretamente o polimento. Este tipo de observações pode dar indicações sobre os tipos de técnicas de polimento e o seu respectivo domínio e ainda sobre maneiras de proceder aos encabamentos e utilizações das peças (Sousa, 2010, p. 223). No caso concreto da Ota foi possível compreender uma tendência generalizada para o polimento total (80%), o que acaba por dificultar e impossibilitar ensaios sobre tipologias de encabamento. A esta realidade segue-se o polimento exclusivo em uma das faces (13%), surgindo quer em enxós quer em machados, sendo ainda de realçar dois exemplares com recurso à técnica do picotado – este tipo de tratamento é muitas vezes associado a marcas de encabamento (Orozco, 1999) contudo, no nosso entender, mostram efectivamente uma técnica diferenciada que pode ilustrar um tipo de trabalho prévio a um polimento total. No caso da Ota o machado nº1696, onde o picotado está presente na totalidade da peça, podemos assumi-lo como um material em processo de conclusão (1º processo de definição da morfologia da peça com recurso á técnica da picotagem e 2º polimento que “apague” as marcas desse mesmo processo), é interessante verificar que mesmo assim apresenta marcas de uso em ambas as extremidades – mesmo podendo ser uma peça por finalizar não perde a sua funcionalidade e utilidade. Estas teorias e ideias necessitam de uma comprovação que passa, necessariamente, por um estudo mais aprofundado das técnicas de criação e polimento de utensílios em pedra polida.

Quanto às marcas de uso foram identificados 30 exemplares com diversos tipos de marcas – partido/lascado (2), boleado (3), intensos sinais de uso (12), ligeiros sinais de uso (12) e percussão (5). O grupo mais significativo, com 29 peças, é referente às marcas presentes no gume. Quando falamos dos sinais de uso alusivos ao talão, estes descem para 5, existindo uma sobreposição entre marcas no gume e talão em 4 peças – só um fragmento, que corresponde à área proximal, tem, exclusivamente, sinais de percussão no talão. Ensaiar justificações para os graus de utilização é difícil neste sítio arqueológico, muito pela já referida falta de contextos mas também pela falta de recursos laboratoriais, que permitam afinar as conclusões traceológicas, e pela falta de estudos no âmbito da Arqueologia experimental. O que podemos avançar é que o

67 domínio das marcas de uso no gume mostra a utilização “típica” deste tipo de artefacto, á qual podemos associar utilizações de ambas as extremidades, fazendo-se uso de todas as características destes materiais.

2. Matérias-primas Como referido anteriormente, o conjunto em estudo apresenta alguma diversidade no que toca a matérias-primas. Verifica-se um domínio total de anfiboloxisto (42 exemplares que correspondem a 8,609 kg), estando também presentes o calcário, a rocha local com duas peças com 338 gr no total, por último, duas peças cuja matéria-prima não foi possível identificar.

Estes números permitem-nos constatar que a rocha local, mais acessível a estas comunidades, não seria a matéria predilecta para a fabricação deste tipo de utensílios e artefactos. Esta situação tem paralelos em locais como a Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 87) e Leceia (Cardoso, 1999/2000, p. 266) onde toda a matéria-prima é exógena, não sendo encontrado nenhum artefacto de pedra polida de calcário. Conseguimos compreender a não utilização de tal matéria, ainda mais se relacionarmos a teórica funcionalidade deste tipo de utensílio, com a questão da durabilidade e resistência deste tipo de rocha. Ao longo da prospecção arqueológica desenvolvida no âmbito do projecto de Caracterização e Plano de ação do Canhão Cársico de Ota foi-nos possível identificar uma realidade para a qual, de outro modo, não estaríamos sensibilizados – o surgimento de um machado de calcário, com intensos sinais de uso, que passaria despercebido por entre os diversos fragmentos da rocha de base, presentes á superfície. Esta pode ser uma das justificações para a diminuta presença destas matérias-primas em utensílios de pedra polida e de pedra lascada, uma invisibilidade e desconhecimento que pode ter influenciado as recolhas antigas, bem como as recentes. Salientamos ainda que um destes machados de calcário, o nº2034, foi “esculpido” num bloco de matéria-prima proveniente de uma camada geológica exposta a menos de 1km do sítio arqueológico – actual pedreira do Outeiro do Seio (informações orais do geólogo José Ferreira) – sendo a sua identificação possível pela presença de oncóides e pisóides, fósseis característicos das camadas de Calcários Corálicos do Amaral. É um artefacto não só interessante pela sua proveniência, mas também pelo seu valor estético-simbólico, patente na sua exímia manufacturação que lhe atribui uma elevada componente estética, materializada na sua simetria, mesmo que este não se apresente como um artefacto funcional – pela matéria-prima porosa, incapaz de resistir a choques muito violento, e a não presença de qualquer marca de uso.

O grande grupo de matéria anfiboloxistos, também eles dominantes nos sítios arqueológicos homólogos à Ota (Sousa, 2010, p. 221), não apresenta uma categoria tipológica dominante, sendo transversal a todo o conjunto. Neste grupo podemos inserir vários tipos de anfiboloxistos que podem revelar diferentes fontes, potenciais, de aprovisionamento. Podemos destacar a presença de anfiboloxistos da série negra que podem ser provenientes de Abrantes

68

(Cardoso, 1999/2000, p. 266), área que se encontra a aproximadamente 80 km da zona de estudo. Os anfiboloxistos que apresentam uma tonalidade mais “esverdeada” podem pertencer aos denominados “xistos verdes” nas imediações de Montemor-o-Novo (87 km) ou a Sul de Grândola a 111 km (Cardoso, 1999/2000, p. 266).

No caso da Ota não foram registados quaisquer vestígios de transformação de matéria- prima, sejam eles blocos em bruto, lascas ou esboços, realidade que pode igualmente ser observada no Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 222). Esta situação, previamente referida por Valera (1997, p. 116-117), remete assim para um tratamento prévio dos lingotes no local original da sua extracção, sendo invisível no registo arqueológico dos locais em que estes materiais seriam utilizados. Estas ideias partem de um pressuposto teórico que assume a existência de redes de troca estabelecidas, derivadas de uma intensificação económica (Cardoso, 1999/2000, p. 263), que poderiam entrar num esquema semelhante ao da exploração e circulação do sílex da Estremadura Portuguesa (Forenbaher, 1998), onde existiria uma produção especializada/centralizada que posteriormente procederia a trocas de média e longa distância (Branco, 2007, p. 89), podendo socorrer-se dos rios como vias de comunicação. Posto isto, devemos ter sempre em conta a cada vez mais atestada mobilidade das comunidades em estudo entre o Neolítico médio (Carvalho, 2015) e o Calcolítico (Valera, 2003), podendo ser reconsiderado o impacto efectivo das distâncias e os termos “local” e “sedentário”.

O conjunto de pedra polida da Ota mostra uma grande compatibilidade dos dados obtidos face aos dados obtidos no povoado congénere da Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 88), podendo ser conjecturada uma homogeneidade tecnológica de âmbito local/regional. Quando ampliamos a área de análise, verificamos que se mantem uma certa coerência com sítios como o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 216-225) e Leceia (Cardoso, 1999/2000), esta situação está certamente relacionada com as características das implantações, a reunião de condições para adquirir matérias-primas e com o período cronológico das ocupações. A Ota é assim, no que toca à pedra polida, um local com especificidades interessantes mesmo não tendo tido o mesmo volume de trabalhos e intervenções que os diversos locais supracitados.

c. Pedra Afeiçoada Os materiais afeiçoados que surgem nos sítios arqueológicos são, normalmente, agrupados consoante a sua suposta funcionalidade, os exemplos mais comuns passam pelos percutores, bigornas ou os elementos de moagem, sendo estes os utensílios que podem levantar mais questões. O reduzido conjunto que o sítio da Ota ofereceu, com nove elementos provenientes da colecção do Museu e dois exemplares das prospecções arqueológicas, não nos permitem tecer grandes conclusões sobre as actividades e funções que estes objectos teriam desempenhado. Esta ausência é relativamente comum nos sítios arqueológicos com uma recuada história de

69 intervenções, em especial nos sítios da estremadura portuguesa (Sousa, 2010, p.211), explicada pelo desconhecimento e não reconhecimento deste tipo específico de artefactos – no caso do explorador da Ota, Hipólito Cabaço, mostra já um conhecimento mais aprofundado destas realidades, explanado na recolha de quartzitos com marcas de uso, na Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 90), e ainda percutores e elementos de moagem, tanto no sítio anteriormente referido, como na Ota.

No conjunto dos procedimentos de recolha actuais podemos ver uma valorização crescente dos artefactos de pedra afeiçoada a partir dos trabalhos de Victor S. Gonçalves, em 1989, no Alto Algarve Oriental. Estes vestígios mostram assim um reconhecimento das comunidades do 4º e 3º milénio enquanto comunidades produtoras e transformadoras.

1. Elementos de moagem Os artefactos da Ota que podem ser enquadrados na categoria “elementos de moagem” são muito reduzidos, ideia já salientada anteriormente, correspondendo a três moventes e um dormente (um movente e um dormente do Museu Hipólito Cabaço e dois moventes resultantes de prospecção). Esta denominação, inicialmente teorizada por Victor Gonçalves em 1989, é aqui aplicada tendo em vista uma homogeneização terminológica que facilite e fomente as comparações entre variados contextos.

A nível dos dormentes, como referido antes, só foi possível registar uma peça que, curiosamente, apresenta uma gravação na sua superfície activa. Tendo em conta que esta peça se encontra fracturada de forma natural, a sua descrição tipológico-morfológica foi impossível de efectuar, sabendo-se, contudo, que tem 10,5cm de comprimento por 6cm de altura, enquadrando- se assim com os exemplares de pequenas dimensões recolhidos no Penedo do Lexim, onde a altura mínima corresponde a 5cm (Sousa, 2010, p.213). A nível da utilização esta peça apresenta algumas marcas de desgaste, situação que se detecta em alguns exemplares a Sul, estado a sua superfície activa ligeiramente côncava, com um polimento vivo, efectivando assim um uso moderado desta peça. A matéria-prima é claramente uma rocha granitóide, cuja proveniência é externa em relação à área em estudo, surgindo a uma distância mínima de 10/15km, conhecido por “grés de Torres Vedras” (Zbyszewski e Assunção, 1965). Não está relatado, no caso dos moventes, o aproveitamento de matérias locais. Em suma, este único exemplar mostra a reduzida presença destas peças no espólio resultante das intervenções de Hipólito Cabaço no sítio da Ota, podendo não ter sido escavada nenhuma área produtiva ou de actividade específica.

Os moventes representam um conjunto mais elevado, com um proveniente da colecção do Museu e dois resultantes de prospecção, podendo ainda ter sido maior se tivermos em conta que podiam ter existido moventes em materiais perecíveis, como a madeira (Menansanch et al, 2002), que não se preservem no registo arqueológico estremenho. Os exemplares melhor

70 conservados são os provenientes de prospecção, estando um deles completo e outro parcialmente fragmentado, com uma espessura que ronda os 3,5cm e um comprimento entre os 6cm e 10cm, um deles ovalado e outra circular. A matéria-prima destes exemplares condiciona em muito os seus polimentos e picotados, enquanto que uma das peças, cuja matéria prima é basalto, se apresenta com um picotado vivo e polimento visível, na outra não é possível identificar qualquer marca de picotado mas vê-se um polimento vivo, numa peça conglomerada. Ambas as matérias- primas podem ser consideradas rochas de proveniência local, com captação num raio máximo de 5/6km, contrariando a realidade que se verifica para o dormente. A peça do Museu também se enquadra nestas características, mas apresenta um grau de fragmentação maior, não acrescentando muitos dados às conclusões retiradas a partir dos exemplares de prospecção. Esta peça é também ela de basalto.

Este conjunto reflecte uma tendência generalizada que se sente nos contextos da Estremadura Portuguesa, onde os vestígios de elementos de moagem são uma realidade pouco expressiva, podendo esta fraca presença ser justificada por uma prática produtiva/consumista que não requeresse este tipo de utensílios, mais centrada em “hortícolas” (Cardoso, 1989, p. 107) – o caso da fava, presente no registo antracológico de Vila Nova de São Pedro (Jalhay e Paço, 1945, p. 85) – ou uma “técnica” de transformação que não deixasse marcas claras no registo arqueológico, contrária ao que se detecta no registo alentejano (Gonçalves e Sousa, 2010). Estas questões só podem aspirar a respostas mais concretas quando os estudos antracológicos e paleobotânicos se tornarem uma realidade mais generalizada na Península de Lisboa, podendo clarificar sobre os tipos de espécies vegetais consumidas e, por sua vez, transformadas (Sousa, 2010, p. 212).

2. Polidores/Afiadores Outra categoria de objectos em pedra afeiçoada que foi identificada na Ota é a correspondente aos polidores/afiadores. Uma única peça, cuja cronologia é impossível de alcançar, que pode ser enquadrada tipologicamente nos polidores/afiadores com uma ampla superfície de utilização (Diniz e Vieira, 2007, p.86), teria uma utilização em superfícies maiores e, possivelmente, mais duras. O polidor/afiador de arenito da Ota tem um total de 7,5cm de comprimento, encontrando-se parcialmente fracturado, e com uma espessura de 2,5cm, relativamente reduzida quando comparada com o exemplar de Leceia (Cardoso, 1986, p. 107), também ele de arenito, que apresenta cerca de 7cm. Apresenta uma concavidade relativamente demarcada, o que pode indicar um uso intensivo desta peça, funcionando como um “polidor” ou “afiador” de artefactos de pedra (Cardoso, 1986, p.107), osso ou ainda outros materiais perecíveis.

71

3. Esferóides Os artefactos afeiçoados com uma forma esferoidal apresentam-se como um grande desafio a nível tipológico, morfológico e, acima de tudo funcional. São relativamente comuns em contextos de necrópole, surgindo pontualmente em contextos de habitat (Cardoso, 2001/2002, p. 81; Sousa, 2010, p. 215). Na Ota foi possível identificar, na colecção do Museu Hipólito Cabaço, um total de seis esferóides todos eles de granito, contrariamente aos exemplares de Leceia todos eles de calcário/calcarenito brando (Cardoso, 2001/2002, p. 77-78). Dois exemplares encaixam na categoria de média dimensão (45mm a 75mm) definida por João Luís Cardoso (2001/2002, p.77), enquanto que os restantes quatro, se podem enquadrar na grande dimensão (>75mm). Apresentam todos um afeiçoamento por picotagem, mas só dois foram alvo de polimento posterior, sendo ainda de frisar uma peça com ligeiras marcas de percussão.

Se tivermos em conta a distribuição estratigráfica e cronologias propostas por João Luís Cardoso para o caso de Leceia, este tipo de conjunto surge entre o Neolítico final e o Calcolítico pleno (Cardoso, 2001/2002, p.79; Gonçalves, 2009, p.433) – como já referido anteriormente, a falta de contextos arqueológicos da Ota impossibilita este tipo de leituras, podendo estes materiais ser enquadrados em qualquer período cronológico. Para além da cronologia, este conjunto parece entroncar na já referida tese de estarmos perante uma intervenção antiga que possivelmente sondou não só contextos do suposto “povoado” como também realidades de cariz funerário, visível na presença de um lagomorfo, no machado “votivo” de grandes dimensões e agora na presença de esferas.

As peças esferoides representam um verdadeiro desafio a nível da sua funcionalidade, levando a conjecturas que podem variar entre a corrente funcional, como balas de funda ou mós para cosméticos/corantes (Cardoso, 2001/2002, p. 79), e a votiva. O nosso pensamento estrutura- se, para este caso específico, em torno das interpretações que assumem este tipo de objectos como multifuncionais, atendendo às suas características morfológicas, contudo, quando observamos mais atentamente os contextos onde estas ocorrem com maior incidência – sendo eles a Anta de São Gens, Anta 1 de Sobreira, Anta de Entreáguas 1, São Martinho, Praia das Maçãs, Casa da Moura, Cova da Moura e Poço Velho (Cardoso, 2001/2002; Sousa, 2010, p.215) -chegamos à conclusão que apresentam uma forte ligação com o âmbito funerário e, por sua vez, “ganhando” um caracter representativo e simbólico. Novamente o número relativamente baixo de ocorrência destes objectos em intervenções com pressupostos e técnicas recentes, impossibilita os estudos mais aprofundados sobre as questões cronológicas e funcionais.

O conjunto de pedra afeiçoado da Ota foi integralmente analisado, tendo sido apresentados nos parágrafos anteriores. É curioso que, mesmo tendo a Ota uma longa diacronia de ocupação, o conjunto mostra uma compatibilidade e homogeneidade de técnicas, matérias-

72 primas e influências que nos permitem avançar com uma inserção cronológica, de todas as peças, dentro do 3º milénio a.n.e. e de um quadro mental compatível com a macrorregião da Estremadura Portuguesa.

d. Recipientes cerâmicos

O conjunto cerâmico, do 4º e 3º milénio a.n.e., da Ota padece das mesmas problemáticas da grande maioria dos conjuntos cerâmicos provenientes de sítios arqueológicos contemporâneos, em especial na actual Estremadura Portuguesa. Essencialmente compostos por recolhas antigas, com um acesso muito dificultado aos contextos em que estes estariam integrados, dificultando a tentativa de reconstituição ou, acima de tudo, de compreensão de possíveis sequências cronológicas que facilitariam o estabelecimento de considerações sobre “continuidades”, “rupturas”, “avanços” e “recuos”.

Aliado à realidade arqueológica exposta, podemos associar a falta de trabalhos monográficos e aprofundados, que tenham em conta a vertente contextual, dificultando as comparações e as leituras que tenham, como objectivo central, as visões descentralizadas e menos artefactualistas dos conjuntos e das redes de relações. Estes pressupostos “modernos”, só podem ser observados num número limitado de obras na região da área em estudo, sendo esses os trabalhos escolhidos para base metodológica da presente dissertação. A estes foram ainda adicionados sítios que facilitem e permitam o estabelecimento de paralelos crono-tipológicos – são desta realidade exemplo os casos de Leceia (Cardoso, 2006), Penedo do Lexim (Sousa, 2010), Pedra de Ouro (Branco, 2007) e, onde existem estudos sistemáticos das cerâmicas decoradas que se detectam na Ota, o Castro do Zambujal (Kunst, 1987).

1. Caracterização do conjunto

No caso específico da Ota, o total de fragmentos enquadráveis dentro da categoria dos exemplares cerâmicos, corresponde a 105 exemplares (representando 10% das 1042 peças em análise) – apenas um exemplar dispõe de perfil completo, acentuando-se o estado fragmentado do conjunto. Foi possível individualizar 38 bordos, sendo que dois deles correspondem a bordos de tipo denteado e outros sete categorizados como indeterminados, não se conseguindo informação a nível formal. A estes exemplares podemos adicionar uma peça, isolada, onde se identificou uma carena acentuada, directamente associada a decoração enquadrável no universo Campaniforme. A grande fragmentação do conjunto, já sublinhada nas linhas anteriores, apresenta-se como uma realidade compatível com a atestada para os contextos homólogos da Estremadura, tal como foi verificado por Ana Catarina Sousa (2010, p. 237) - mesmo não existindo conjuntos publicados sistematicamente, é patente o reduzido número de recipientes de perfil completo. As remobilizações sucessivas dos solos, através da longa diacronia da ocupação

73 do espaço, podem, eventualmente, ser a explicação lógica para o resultado encontrado. Ainda assim, esta situação parece traduzir mais do que uma mera coincidência, apontando sim para a evidência de um conjunto de práticas que ainda não foram reconhecidas no nosso registo arqueológico, que nos escapam por entre métodos e enquadramentos teóricos pouco sensíveis a esta realidade. No estudo dos materiais cerâmicos da Ota, só numa situação foi possível proceder à correspondência entre fragmentos, mais especificamente no caso de dois fragmentos com decoração do tipo Losangos preenchidos, ambos provenientes de prospecção, mostrando assim a amplamente citada recolha selectiva de peças por Hipólito Cabaço, a possível diversidade e extensão das áreas por si intervencionadas, podendo ainda espelhar fenómenos tafonómicos e/ou deposicionais diversos. Os parâmetros descritivos, usados para a classificação das formas dos recipientes, resultam de uma combinação entre a metodologia usada por Victor Gonçalves (1989, p. 147-151), Carlos Tavares da Silva e Joaquina Soares (1976-77, p. 181-184), em especial porque estas foram também utilizada nos estudos de Leceia (Cardoso, Soares e Silva, 1985, p. 54-64; Cardoso, Soares e Silva, 1996, p. 47 - 91). A combinação destas metodologias procura evitar a multiplicação de critérios e designações, ou seja, uma tentativa de homogeneização a nível “linguístico”. Outra questão, também ela saliente quando se trabalha nestes domínios, é a predominância da cerâmica decorada em detrimento dos exemplares lisos, não nos sendo possível atestar e aceder ao real significado percentual das decorações. No caso dos vários fragmentos em estudo, a cerâmica decorada apresenta-se com um domínio bastante acentuado – 91 peças em 105 – sendo as restantes correspondentes a cerâmica lisa, de prospecção, com associação indirecta à estrutura 2 e um recipiente de tipo copo, facilmente compatível com um contexto “votivo” ou funerário. Os grupos decorativos possíveis de identificar são correspondentes aos “tipicamente” associados a contextos das cronologias em estudo: Folhas de Acácia, motivos geométricos, Campaniforme e ainda bordos denteados. Quanto à metodologia usada para o estudo da decoração, tendo em conta a importância que a cerâmica decorada assume no conjunto e no discurso arqueológico do 4º e 3º milénio a.n.e. na Estremadura. Na maior parte dos casos, optou-se pelas designações fixadas na terminologia arqueológica, com expressões como “bordos denteados”, “losangos preenchidos”, “folha de acácia”, “copo”, entre outras, sendo estas expressões incontornáveis e padronizadas, ainda que discutíveis. No caso do conceito “folha de acácia”, por exemplo, este apresenta-se como um termo amplamente reconhecido e assumido pela comunidade arqueológica nacional e, nesta presente dissertação, será empregue para designar, no nosso entender, o motivo espinhado. Ainda assim, assumimos que o “nome das coisas”, neste caso específico, é bastante discutível, sendo certo que representa uma linguagem intangível até ao momento, por essa mesma razão, este motivo decorativo é apresentado, neste trabalho, de forma acrítica.

74

2. Número mínimo de exemplares

Uma das realidades analisadas para os períodos cronológicos mais recentes, encontrando-se já estabelecidas e com processos metodológicos concretos, é o ensaio de número mínimo de exemplares, permitindo o investigador ter uma ideia geral da real expressão do conjunto e qual o seu significado a nível material.

Para tal, a quantificação tem de assentar no cruzamento de variantes como a análise do estado dos fragmentos (formas e número de bordos em relação com os fundos), identificação das especificidades referentes às pastas (componentes não plásticos, tratamentos de superfície) em intrínseca relação com o estudo das decorações.

Assim sendo, para o conjunto cerâmico da Ota, foi possível estimar um número mínimo de 24 recipientes cerâmicos que se podem resumir, a nível formal, a dois recipientes do tipo pote simples, dois correspondentes a formas dotadas de paredes rectas, oito globulares de bordo reentrante, nove taças em calote e três campaniformes. Se a esta realidade adicionarmos os dados relativos à decoração, podemos destacar um claro domínio dos recipientes com um desenvolvimento decorativo do tipo “Folha de Acácia” – realidade a ser clarificada mais adiante no trabalho – com um total de sete globulares e cinco taças, seguido dos motivos geométricos (dois recipientes de paredes rectas, três taças e um globular), uma taça com bordo denteado, três exemplares de cerâmica campaniforme e dois potes lisos.

Neste tipo de estudos, ainda em fase embrionária e com pouca expressão em trabalhos similares, as conclusões a que se chega são, necessariamente, curtas com necessidade de confirmação posterior. Não deixam, ainda assim, de funcionar como linhas de orientação para possíveis ensaios semelhantes que tenham, como objectivo, demonstrar a expressão física dos conjuntos cerâmicos.

3. Reportório formal

Um dos objectivos principais de um estudo artefactualista, sobre a componente cerâmica, é estabelecer um catálogo de formas que se mostra essencial para a sistematização dos tipos de recipientes presentes – tendo em vista os estudos comparativos, com os sítios congéneres, e o enquadramento da realidade, presente na Ota, com contextos que dispõem de relações estratigráficas, tentando aceder-se a actividades produtivas, rituais e sociais (Sousa, 2010, p.320). Outra das áreas de estudo facilitada pela sistematização formal do conjunto, está intrinsecamente relacionada com a identificação de espécimes cerâmicos atípicos, que apoiem considerações de proveniências ou ainda, numa análise mais aprofundada, elacções que tentem sistematizar e encontrar pontos de simbiose, contacto ou influência inter-regional, ou numa escala mais

75

“europeia”. Nenhuma das questões anteriormente levantadas pode ser respondida se a análise arqueológica, e o próprio investigador, não tiver ciente a grande necessidade de conhecer um sítio, bem como as suas especificidades, antes de avançar para leituras suprarregionais, sendo que são estes particularismos que nos indicam, acima de tudo, questões, paradigmas, influências e quadros culturais/sociais diferentes.

Estas tabelas formais, no caso concreto da Pré-História, têm de apresentar um certo grau de flexibilidade, aceitando a diversidade inerente à produção de recipientes por via manual – não nos podemos esquecer que estas tabelas resultam de um processo de reconstituição por parte do investigador, sendo necessário ter em conta que a maneira como procedemos à reconstrução das peças pode não corresponder ao seu desenvolvimento original. Os “subtipos”, quando existentes, devem ser alvo de um processo de ponderação, sendo que temos de tentar compreender se as

Imagem 4 – Tabela de formas criada para o sítio da Ota

76 diferenças são alvo da intenção do agente produtor, ou reflectem actos involuntários singulares (Sousa, 2010, p.239). No nosso caso concreto, a existência de variantes, prende-se com alterações intencionais que modificam as morfologias gerais dos recipientes – formas abertas, fechadas, espessamentos de bordos e a presença, num único exemplar, de um ombro/carena acentuada - foi possível individualizar um total de cinco formas tipológicas, com oito subcategorias correspondentes. A nível dos bordos, a componente material utilizada na elaboração desta tabela, foram trabalhados e analisados 37 exemplares, correspondendo a 35% do total das 105 peças cerâmicas do 4º e 3º milénio a.n.e.- tendo sido aqui incluídos os dois exemplares de bordos denteados. A homogeneidade destes bordos, a nível da regularidade da espessura e da superfície, permitiu considerar que as técnicas produtivas, bem como os gestos técnicos por detrás da produção cerâmica, encontravam-se aperfeiçoados e padronizados, existindo, ainda assim, espaço para a variabilidade decorrente da acção manual, que, no nosso caso concreto, se encontra atestada na presença de três bordos irregulares, na sua espessura e superfície, levando à impossibilidade da reconstituição da sua forma final. Um dos pontos de coesão do conjunto de bordos é o predomínio dos perfis de tipo arredondado, com 19 exemplares, e tipo plano, com 14 ocorrências – este tipo de perfis é compatível com os dados obtidos para sítios congéneres, especialmente se tivermos em conta as tabelas formais existentes (sousa, 2010, p. 240). Podemos ainda sublinhar a existência de duas peças com terminação em bisel simples, bem como dois exemplares enquadráveis na categoria dos “bordos denteados” – ambos os perfis de bordo levantam problemas a nível cronológico, já que nenhuma destas realidades é específica de um período temporal/cultural concreto. O predomínio das formas abertas, 22 exemplares no conjunto em estudo, pode estar intimamente relacionada com o grande número de peças cuja forma é indeterminada – seis fragmentos. Estes dados não vão de encontro com o tipo de orientação de bordo predominante no conjunto – o bordo recto, com 17 fragmentos – sendo que muitas das peças estudadas, ainda que apresentassem bordos com orientação tendencialmente recta, foram assumidas como desenvolvendo formas abertas – podemos ainda referir a existência de sete peças com bordos extrovertidos, realidade que apoia as conclusões anteriores, assim como nove peças com bordos introvertidos e quatro impossíveis de orientar. O conjunto da Ota não levanta grandes problemas a nível forma, já que as formas vão de encontro com as tipologias homólogas, contudo é necessário ter em conta que as formas a que chegamos reflectem a análise de uma pequena porção da realidade, sendo que o todo não pode deixar de ser uma projecção do que cremos ter existido. A nível das designações atribuídas às formas cerâmicas, como referido anteriormente, muitas delas seguem padrões e normativas já estabelecidas para a Estremadura Portuguesa (Sousa, 2010, p. 238) – fracturar as análises ao criar nomenclaturas distintas, vai dificultar o processo comparativo, evitando o estabelecimento de paralelos e a detecção de influências/padrões. Assim

77 sendo, optou-se por se proceder a uma distinção primária entre as formas, passando-se das formas mais simples e comuns, como o caso dos copos, taças e potes, para as menos presentes no registo arqueológico, como as paredes rectas ou a cerâmica Campaniforme. As variantes resultam, como sublinhado anteriormente, de pequenas variações relacionadas com o tipo de desenvolvimento dos recipientes – as formas 2.1. representam taças com tendência para desenvolver um recipiente aberto e a 2.2., contrariamente, com tendência para recipientes fechados, ambas as variantes sem espessamentos do bordo, sendo que a forma 2.3. representa taças onde foi identificado um espessamento interno. A forma 3.3., dentro da categoria dos potes, reflecte um tipo de forma – recipientes globulares de bordo reentrante - muito característica, a nível cronológico e regional. Os acampanados foram divididos, por sua vez, em dois subgrupos, que reflectem, um, a existência de uma carena/ombro num dos exemplares e, dois, a indeterminação em torno da forma dos restantes fragmentos.

Na primeira das categorias, as taças e potes, correspondentes às formas 1 e 2, não apresentaram grandes informações a nível de contactos ou influências, já que são o tipo de recipientes mais comuns nos contextos em estudo (Sousa, 2010, p. 239). Dentro das várias subcategorias criadas, reflectindo alterações ligeiras a nível formal, foram individualizadas as formas correspondentes a Taças caneladas (com dois exemplares), bem como a forma dos recipientes globulares com bordo reentrante, representando dois fragmentos dos bordos reconstituíveis. Este tipo de recipiente surge, tendencialmente, associado a decorações do tipo Folha de Acácia (Sousa, 2010, p. 329), assumindo-se como o resultado da resposta a uma necessidade concreta, no Calcolítico pleno, gerada por uma “intensificação económica” – a armazenagem (Cardoso, 2006, p. 36). No nosso entender, este tipo de conclusões necessita não só de leituras estratigráficas sólidas, que sustentem as considerações cronológicas – mesmo estando estas relativamente restritas ao Calcolítico Pleno (Sousa, 2010, p. 239; Gonçalves e Sousa, 2006, p. 239) - bem como de análises específicas, que nos permitam aceder, ainda que de forma incompleta, a possíveis conteúdos e, por inerência, funções.

Os acampanados surgem, representados pela categoria formal 3, corresponde a vasos acampanados onde só foi possível inserir uma peça – um fragmento onde uma carena/ombro foi identificada. A nível formal, o seu principal paralelo encontra-se no Tholos da Tituaria, onde foi possível reconhecer um recipiente de perfil quase completo que conta, também, com uma carena acentuada na parte inferior do vaso (Cardos, 2014, p.314; Cardoso, 2014b, p.285). Esta similitude formal vai ser apoiada por uma forte semelhança a nível decorativo, a ser explorada mais à frente no trabalho. Conta referir que, do sítio da Ota ao Tholos da Tituaria, estaríamos a falar de aproximadamente 26/27 km, em linha recta, não sendo considerável uma distância elevada, tendo em conta a grande mobilidade humana, já atestada no Neolítico (Carvalho, 2015).

78

Os recipientes com paredes rectas apresentam-se como um verdadeiro desafio, a nível das reconstituições formais e ensaios sobre possíveis utilizações, já que os exemplares onde o perfil da peça se encontre completo, são raros (Sousa, 2010, p. 604). Certo é que este tipo de formas é, muitas vezes, assumido como um “substituto”, a nível funcional, dos copos (Cardoso, 2006), mesmo que alguns dos exemplares apresentem grandes diâmetros. Tal como os recipientes globulares, anteriormente referidos, as reais utilizações e funções, só serão acedidas com estudos mais completos – ainda assim, este tipo de exemplares tem de corresponder a uma categoria formal diferenciada, já que apresentam especificidades formais, em associação a características de fabrico e decorativas muito próprias.

Por último, a categoria formal 5 os copos, só nos foi possível identificar um exemplar. As suas dimensões são reduzidas, correspondendo a uma peça parcialmente fragmentada, que apresenta um tipo de constituição e fabrico característico, com pastas pouco cuidadas, aparentado uma cozedura redutora, com alisamento interno e externo, não tendo sido identificado qualquer tipo de decoração nas suas superfícies. A forma que desenvolve justifica, claramente, a sua inserção na categoria isolada dos recipientes de tipo copo, mas a sua cronologia, pela amplamente sublinhada falta de informações contextuais, apresenta-se dúbia e difícil de conjecturar. Este tipo concreto de morfologia dos recipientes pode ser assumido como sendo um representante da “família” dos copos que surgem, nos contextos portugueses, no início do Calcolítico, podendo, inclusive, representar um tipo de realidade artefactual que permite teorizações e pensamentos sobre as suas origens, que se inserem nas discussões relacionadas com as origens da metalurgia – os copos, sendo completamente novos no registo arqueológico das cronologias em estudo, apresentam-se como bons marcadores cronológicos, tendo uma morfologia dispare em relação a um reportório estremenho tendencialmente repetitivo e monótono (Sousa, 2010, p. 240). No caso específico do exemplar da Ota, o seu perfil e a sua técnica de fabrico apresentam características diferentes às sistematizadas para os recipientes de tipo Copo que surgem em sítios arqueológicos homólogos – quer sejam eles o Penedo do Lexim (Sousa, 2010) ou Leceia (Cardoso, 2006) – podendo sugerir uma produção mais tardia, não enquadrável no ambiente cultural do Calcolítico Inicial. Outra das questões que esta forma levanta, acima de tudo pelo seu estado de conservação único, quando comparado com todo o restante conjunto em estudo, é a sua proveniência contextual, podendo pensar-se que provem de um contexto com menos perturbações/ocupações – aqui relembramos a ideia anteriormente levantada, da existência de um contexto funerário no sítio da Ota, ou imediações, onde o conjunto artefactual se apresenta, tendencialmente, mais completo e menos fracturado.

Em suma, estamos perante um conjunto que se apresenta como homogéneo, não deixando de incluir especificidades formais que, quando se associarem outros dados referentes a decorações e

79 pastas, se vão intensificar e permitir um conjunto de conclusões enquadráveis num “horizonte” formal característico da Estremadura Portuguesa.

4. As decorações

O estudo, e sistematização, das decorações permite aceder a um conjunto de informações, que possibilitam o estabelecimento de considerações sobre influências, contactos, partilhas e ainda significados e funções. No caso concreto do conjunto em estudo, a sua heterogeneidade gera um tipo de análise fracturada, que pretende analisar as “famílias” decorativas em conjunto, permitindo leituras gerais sobre realidades com um pendor mais regional – as identidades locais/regionais começam, dentro das cronologias em estudo, a acentuar-se (Sousa, 2010, p. 241; Gonçalves e Sousa, 2006, p. 238). Temos consciência que a análise individual das questões decorativas reflecte uma maneira de fazer histórico-culturalista, ainda assim, tendo como base os estudos homólogos, é um exercício que não pode deixar de ser feito, reflectindo a combinação de técnicas e gestos decorativos, motivos e padrões (Sousa, 2010, p. 244). Esta -separação por grupo decorativo vai ainda perpetuar a existência de “fósseis directores”, um termo inicialmente aplicado para a Geologia, que ainda hoje servem como indicadores cronológicos relativos – este tipo de análise tem, necessariamente, de ser complementado com leituras gerais e de conjunto, não só no sítio em estudo, bem como nas áreas envolventes.

Falando especificamente do caso da Ota, foi possível analisar um total de 92 fragmentos dotados de decoração (88% do conjunto cerâmico) – apenas num deles a decoração se localizava na superfície interna. Os números obtidos reflectem, como falado em capítulos anteriores, um processo de selecção por parte do descobridor do Castro de Ota – Hipólito Cabaço – sendo essa a principal justificação para o domínio, praticamente absoluto, da cerâmica decorada, em detrimento dos exemplares liso – os 12% do conjunto que corresponde á cerâmica não decorada (13 peças), são provenientes dos trabalhos de prospecção levados a cabo no sítio da Ota. A nível decorativo foram individualizados quatro grupos decorativos, sendo que o correspondente ao grupo Folha de Acácia engloba não só os motivos que lhe dão nome, mas também motivos geométricos que lhe surgem, a nível contextual ou decorativo, associados. Assim sendo os grupos identificados correspondem a 1) Bordos denteados, 2) Taças Caneladas, 3) Grupo Folha de Acácia, 4) Decoração Interna e 5) Campaniforme – conceitos e nomes amplamente utilizados e explorados na bibliografia referentes a este tipo de ocupações e sítios arqueológicos, ilustrado na tabela decorativa, elaborada para o sítio da Ota (tabela 1,2 e 3 – anexos).

80

4.1 Grupo 1 – Os bordos denteados

Os bordos denteados são, no caso concreto da Ota e como referido anteriormente, um grupo cerâmico praticamente inexistente no espólio cerâmico, correspondendo a duas peças (2%) de um total de 105. A falta de contextos arqueológicos, quer sejam eles referentes a estratigrafia horizontal ou vertical, dificulta as leituras cronológicos e de significados, que nos iriam permitir atestar se, efectivamente, podemos assumir uma ocupação de finais do 4º milénio a.n.e. ao sítio da Ota. Certo é que esta aferição cronológica, a partir dos materiais, é impossível, tendo em conta que este tipo de peças surge, igualmente, em contextos de transição do Calcolítico para a Idade do Bronze, também eles atestados no sítio em estudo – podem surgir associados a cerâmicas com asas, pegas e carenadas (Sousa, 1998, p. 99), estando estas ausentes na Ota.

As principais variantes nesta categoria “decorativa” passam pelo posicionamento – topo do bordo, ou uma das faces - e desenvolvimento da técnica que cria o “bordo denteado” – entalhe, incisão, impressão ou aplicação de um cordão (Sousa, 1998, p. 108; Sousa, 2010, p. 252). Esta característica é, normalmente, identificada em taças de pequenas dimensões, como acontece em Leceia (Cardoso, 1989), Vale de Lobos (Valente, 2006) e vasos de bordo em aba, como verificado também em Leceia (Cardoso et al, 1982-83, p. 61) e Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 253). No caso dos bordos denteados da Ota, um deles corresponde a uma taça de pequenas dimensões (18cm de diâmetro), encontrado no âmbito dos trabalhos de prospecção, com um tipo de “denteado” com desenvolvimento no topo do bordo, gerando uma “decoração” entalhada. A segunda peça, identificada no depósito do Museu Hipólito Cabaço, em Alenquer, representa um tipo de bordo denteado com desenvolvimento sobre um recipiente com bordo em aba, com 14cm de diâmetro.

Novamente referimos que, pela falta de estratigrafias claras, o ensaio cronológico deste tipo de expressões teria de assentar num reconhecimento completo das morfologias e tipologias dos bordos denteados (Sousa, 2010, p. 254), permitindo compreender evoluções e alterações nos métodos e técnicas, que nos facilitassem o exercício de reconhecimento das cronologias relativas das peças – principalmente a um nível mais amplo, relacionado com a inscrição no final do Neolítico, ou já na transição do Calcolítico/Idade do Bronze.

A nível técnico, foi possível compreender que, para a criação de ambas as peças, se utilizou a técnica da impressão, ainda que tenham recorrido a materiais diferenciados – enquanto a peça nº10, proveniente de prospecção, apresenta uma impressão com matriz rectilínea de pequenas dimensões, o exemplar nº1865/17 foi realizado através de uma matriz ovalada mais robusta e larga, criando espaços vazios mais acentuados. A matéria-prima utilizada para este tipo

81 de impressões mais largas, segundo as ideias de João Luís Cardoso, pode passar pelo recurso a uma “haste de madeira ou de osso” (2006, p. 21), materiais que podem não se preservar, ou ser identificados, no registo arqueológico. Este pendor maior para a realização do “denteado” recorrendo à técnica da impressão, está patente em diversos sítios arqueológicos, entre os quais o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 254) e Leceia (Cardoso, 2006, p. 21), os principais sítios, na Península de Lisboa, com monografias e estudos intensivos.

A nível técnico, as peças em estudo apresentam uma grande homogeneidade, ainda que não o mostrem a nível “decorativo”. Ambas apresentam pastas compactas, com inclusões de Calcite, Quartzo e Micas, podendo ensaiar-se uma proveniência comum, corroborada pelo tipo de tratamentos, com alisamentos intensos, seguidos de aguadas de tonalidade mais esbranquiçada em ambas as faces – estas parecenças técnicas podem fornecer alguma base à ideia de uma coexistência cronológica de ambas as peças, ainda mais acentuada quando analisamos as cerâmicas lisas do conjunto, que apresentam as mesmas características a nível do tratamento das superfícies e constituição das pastas, a nível mineralógico, com diferenças na compacidade das pastas.

Este tipo cerâmico só pode ser alvo de mais conclusões e considerações quando a sucessão cronológica e a estratigrafia do sítio da Ota estiverem clarificadas e atestadas, sendo possível, na altura, responder à existência, ou não de uma fase de transição Neolítico/Calcolítico, onde constem os bordos denteados.

4.2 Grupo 2 – Grupo Taças Caneladas

Este grupo encontra-se representado por duas peças, ambas dotadas de bordo. Surgem, muitas vezes, associados a contextos onde os copos canelados estão presentes (Sousa, 2010, p. 271), apoiando as teorias da dualidade de produtores, sendo os copos associados a uma produção externa/exógena (Cardoso, 2006; Sousa, 2010, p. 271) e as taças a uma adaptação local. Esta realidade não é verificável no caso da Ota, muito pela ausência de informações estratigráficas, ainda agravadas pela não identificação de copos enquadráveis nas categorias de “canelados”. Este tipo de técnica decorativa – caneluras - vai dar nome a este grupo cerâmico, apresentando-se como um dos motivos que perdura e é mais identificado em cerâmicas decoradas ao longo das cronologias em estudo (Sousa, 2010 p. 272).

A nível decorativo, as taças identificadas apresentam a técnica das caneluras, neste caso, paralelas ao bordo, inserindo-se num motivo de desenvolvimento linear simples, apresentando, ainda assim, especificidades na gramática decorativa interessantes – em ambos os exemplares é possível verificar que a horizontalidade não é totalmente conseguida, realidade à qual podemos acrescentar a falta de homogeneidade na espessura, chegando a existir sinais de descontinuidade

82 e ligeiros erros na produção das caneluras. Não nos e possível tecer considerações acerca da dimensão da banda de caneluras, já que ambas as peças se apresentam fracturadas, preservando- se, num dos exemplares, um total de cinco “linhas” (1644/58), e no outro (4989/9), nove. As caneluras da Ota apresentam uma execução derivada da utilização de um objecto com ponta romba, não aguçada, como verificado para Leceia (Cardoso, 2006, p.27), gerando caneluras pouco profundas e finas, com uma dimensão de 0,21cm na peça 1644/58 e de 0,15cm no exemplar 4989/9, com uma distância de 0,08cm a 0,15cm entre si.

A nível formal, ambas as peças, como o nome indicado na tipologia decorativa, são enquadráveis dentro da forma 2) Taças, subcategoria 2.2) Taças Caneladas, apresentando diâmetros enquadráveis nas taças de dimensão média – 15cm (1644/58) e 13cm (4989/9), não nos sendo possível, pela reduzida amostragem, compreender possíveis funcionalidades para este tipo de recipientes. É curioso verificar que, quando comparamos os nossos resultados com os obtidos para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 273, as dimensões obtidas para as taças da Ota, correspondem ao intervalo de tamanhos encontrados para os copos canelados, contudo é sempre necessária cautela ao se comparar conjuntos cerâmicos que dispõem de informações contextuais e de um maior número de exemplares. A espessura dos exemplares é diferenciada, já que um deles (4989/9) apresenta uma largura muito estreita, sendo dos exemplares menos espessos do conjunto cerâmico da Ota, enquanto o outro reflecte uma espessura de 7mm, enquadrando-se nos valores de espessura médios do conjunto.

As pastas apresentam-se como um ponto que une as peças, especialmente se tivermos em conta o tipo de elementos não plásticos identificados, atribuindo uma maior compacidade às pastas – micas, quartzos e calcites – e um alisamento em ambas as superfícies, dado um aspecto cuidado aos exemplares, mas que, ao mesmo tempo, nos mostra que dentro do mesmo “quadro” técnico, mental e cultura podemos ter realidades divergentes resultantes de processos involuntários, ou voluntários – neste caso concreto o tipo de cozedura, redutora num dos artefactos e oxidante noutro, é apresentando para enfatizar o facto de a coloração da superfície estar intimamente relacionada com o processo e modo de cozedura, existindo pouco controlo efectivo, já que estas se encontram dependentes do contacto com matéria orgânica, acesso a maior ou menor oxigénio, estar mais próximo do epicentro de calor, ou mais afastado, um conjunto de realidades que, no nosso entender, deve ser referida mas pouco determinante.

De forma resumida, podemos caracterizar este “grupo” das taças caneladas com uma realidade homogénea, que apresenta ligeiras diferenças técnicas que não devem ser lidas como fracturantes. Uma decoração transversal, a nível regional e cronológico, que pode servir como um indicador da existência de uma “ocupação” /passagem no Calcolítico inicial (Sousa, 2010, p. 314) mas que, no caso da Ota, não pode passar de um indicador, por falta de aferições estratigráficas.

83

4.3 Grupo 3 – Grupo Folha de Acácia

O estudo da cerâmica com decoração do tipo Folha de Acácia é uma realidade que podemos encontrar em vários estudos, mais ou menos sucintos, sobre realidades semelhantes ao que podemos encontrar na Ota.

Representou, desde cedo, um ponto de interesse para investigadores como Carlos Ribeiro que publica, sobre os contextos encontrados em Leceia no ano de 1879, uma pequena nota sobre exemplares que caracteriza como tendo “ornatos mais bem-feitos do que os demais restos cerâmicos encontrados…” (1879, p.45). A este, seguem-se as intervenções realizadas em Chibanes, onde se procederam a trabalhos de reconstituição (Costa, 1908), tendo em conta o conjunto e métodos disponíveis, que levaram, mais tarde, a uma teorização cronológica, por parte de Savory, que remetia estas cerâmicas para períodos cronológicos da Idade do Bronze, posteriores à cerâmica Campaniforme (Savory, 1968, p. 206). É aquando da intervenção no sítio de Vila Nova de São Pedro, numa fase já tardia (Sousa, 2010, p. 282), que vemos os primeiros enquadramentos cronológicos a surgir, seguindo os preceitos estratigráficos, inserindo esta decoração cerâmica entre os Copos e o Campaniforme – no Calcolítico da Estremadura Portuguesa (Ferreira e Silva, 1970; Gonçalves, 1971; Sousa, 2010, p. 282). Actualmente, esta tripartição do Calcolítico estremenho é ainda seguida, de forma acrítica, sendo que para nós essa divisão é o reflexo de um processo de compartimentação, a cargo do Homem, na tentativa de se facilitar as leituras de partes, integrantes num todo e numa realidade maior. As cerâmicas com decoração de tipo Folha de Acácia surgem associadas a copos, a nível estratigráfico, bem como à cerâmica Campaniforme (Kunst e Lutz, 2008), mostrando que não há uma tripartição efectiva, mas sim uma divisão, em que a cerâmica de tipo Folha de Acácia é transversal, e está presente, desde o início do Calcolítico, até ao seu final, como pensado para a realidade do Castro do Zambujal.

Outro dos pontos fracturantes na análise deste tipo de decoração e peças prende-se com a nomenclatura e terminologia utilizada para as descrever e caracterizar. Enquanto que no início estas apareciam descritas consoante as suas características formais, como é caso de ornatos gravados (Ribeiro, 1879, p. 45), rapidamente são associadas a um sítio arqueológico, passando a ser conhecidas como “cerâmica de tipo Chibanes” (Sousa, 2010, p. 282). Mais recentemente, quando a sistematização e a dispersão começa a ser pensada e atestada, surgem conceitos como “folhas compostas” (Sousa, 2010, p. 282; Zbyszewski e Ferreira, 1958, p. 51), tendo sido substituído por um termo amplamente reconhecido na comunidade científica, resultado dos trabalho realizados para a Península de Setúbal (Sousa, 2010, p. 282), a designação “Folha de Acácia” (Ferreira e Silva, 1970; Gonçalves, 1971).

84

É interessante explorar mais a fundo o conceito de “Folha de Acácia”, já que este representa um processo, única e exclusivamente, estético, de aproximação e semelhança, sem grande fundamento científico ou empírico por trás. É curioso compreender que as folhas de acácia, no sentido natural e original, só se encontram presentes no nosso território a partir dos inícios do séc. XVII, representando uma espécie endémica, não detectável, em estado natural, no nosso território em períodos pré-históricos. Como tal, tendo em conta estes dados, o termo parece- nos pouco correcto, tendo de se difundir a necessidade de pensar criticamente sobre os conceitos que utilizamos, praticamente, de forma acrítica e pré-determinada. No nosso entender, o conceito actualmente difundido, contribui para uma homogeneização a nível de vocabulário, facilitando a compreensão dos trabalhos de vários investigadores, é esta a principal razão pela qual mantemos estas terminações e nomenclaturas, contudo, parece-nos que os termos “espinhado” e “cruciforme”, reflectindo unicamente considerações sobre o desenvolvimento decorativo, se apresentam como mais neutrais e objectivos. Ainda assim, parece-nos interessante o desafio da ponderação e revisão conceptual, tendo em vista análises e trabalhos mais distanciados das nossas crenças e tendências, mas mais próximo da verdadeira expressão e significado destas peças e desta linguagem decorativa. Contudo, é importante ter em conta que “A questão de terminologias não é contudo a chave para a descodificação do significado destas cerâmicas…” (Sousa, 2010, p.288).

Em suma, e seguindo os preceitos pré-estabelecidos, o termo Folha de Acácia representa um conjunto de gramáticas decorativas em associação a formas de recipientes concretas – a existência de caneluras profundas parece ser um dos pontos em comum dentro deste grupo tão diverso a nível decorativo (Sousa, 2010, p. 283), bem como os recipientes de dimensões médias a elevadas, produzidos sobre pastas que, quando comparadas com a utilizada em copos e Campaniformes, não apresentam um cuidado tão grande. A nível decorativo, já tendo em vista os dados da Ota, foi possível individualizar três subgrupos que reflectem, acima de tudo, padrões e gramáticas decorativas diferenciadas – 1) Impressão de Folhas de Acácia; 2) Motivos Geométricos e 3) Motivos mistos. O último grupo, correspondente a motivos mistos, reflecte uma necessidade descritiva que surgiu no conjunto da Ota, onde surgem, ainda que de forma minoritária, peças com Folhas de Acácia, em associação, por exemplo, a losangos preenchidos. A caracterização da gramática decorativa, apresentada em cima, foi criticamente pensada e utilizada segundo a proposta de sistematização de Michael Kunst (1996) e a revisão/adição levada a cabo por Ana Catarina Sousa (2010), sendo que esta autora veio simplificar o trabalho de Michael Kunst, chegando a incluir-lhe um quarto motivo, preenchendo uma lacuna da proposta de Kunst. Uma proposta que, desta forma, encontra-se com possibilidades de abarcar diversas realidades, como é verificada, através do abrangimento de contextos diferentes como Leceia (Cardoso, 2006), Zambujal (Kunst, 2005) ou Penedo do Lexim (Sousa, 2010).

85

Um dos principais pontos a discutir passa pelas questões de significados e funcionalidades. É certo que este tipo de decoração cerâmica não surge em contextos funerários (Sousa, 2010, p. 288), sendo claro que o seu significado está relacionado com uma funcionalidade associada a contextos “domésticos”, muitas vezes assumidos como reflexos de uma actividade de armazenagem. No nosso entender, a decoração cerâmica funciona, em toda a sua multiplicidade e variedade, com uma linguagem que faz, neste caso, sentido para um conjunto de comunidades que partilham o mesmo espaço cultural. Esta linguagem é, claramente, impossível de aceder totalmente nos dias de hoje, contudo podemos avançar com teorias, mais ou menos fundamentadas. Para nós, a cerâmica com decoração de tipo Folha de Acácia, e se assumirmos a ligação entre este tipo de decoração e alguns recipientes de armazenagem, pode reflectir ou conter imagens que sejam ilustrativas da sua função ou conteúdo – não podemos deixar de referir que as semelhanças entre a decoração dita Folha de Acácia e a organização em espiga de cereais, por exemplo de trigo, ou mesmo, quando analisada individualmente, com o grão dos cereais, é muito grande e tem, necessariamente de ser tida em conta nas análises de significados e funcionalidades – como já foi sublinhado para as cerâmicas com decoração “falsa Folha de Acácia” (Nukushina, 2015, p.420; Simões, 1999, p. 98). Os motivos decorados representam, por si só, um tipo de linguagem que denota um código, até ao momento, não compreendido.

Assim sendo, o conjunto em estudo é composto por um total de 82 fragmentos, sendo que a amostra se encontra muito fragmentada, integrando apenas 21 bordos, dos quais 18 permitiram reconstituição formal – oito globulares de bordo reentrante, sete taças, três recipientes de paredes rectas. Em termos gerais, a fragmentação é uma característica deste tipo de cerâmicas, especialmente as que provêm de sítios com longas diacronias de ocupação, escasseando as formas completas, ainda assim o grau de preservação pode ser considerado bom, quando falamos das decorações, permitindo-nos ainda proceder a uma correcta classificação.

4.3.1 Caneluras

Um dos grupos formais/decorativos mais importante é aquele referente aos potes de bordo reentrante, onde surgem caneluras profundas paralelas ao bordo. Estas organizações em banda são relativamente comuns nos motivos Folha de Acácia (Sousa, 2010, p. 284), contudo a ausência de peças de perfil completo impede-nos de compreender o desenvolvimento total destes motivos decorativos. No caso da Ota não nos foi possível identificar nenhum exemplar com esta decoração e posição, em exclusivo, levando-nos a não proceder a uma análise individual deste motivo decorativo, sendo que se optou por o incluir nas descrições das Folhas de Acácia em si, contudo temos consciência que este motivo surge em locais congéneres, como Leceia (Cardoso, 2006), Chibanes (Carreira, 1996) e Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 284), podendo os fragmentos da Ota reflectir uma não recolha/identificação e não uma inexistência deste motivo decorativo. Ainda

86 assim, é possível identificar uma diversidade de associações ao motivo decorativo das caneluras, sendo disso exemplo a combinação entre Folha de Acácia + caneluras, ou motivos geométricos + caneluras, apresentando uma tendência para o desenvolvimento de bandas delimitadoras, funcionando quase como um “acessório” ao motivo decorativo central – novamente esta tendência verifica-se para Leceia (Cardoso, 2006) e Zambujal (Kunst, 1987), não apresentando muita expressão no caso do Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 286).

O número de caneluras por banda varia de duas a sete, recorrendo-se a uma matriz tendencialmente romba, tornando as caneluras vivas e marcadas no perfil da peça, apresentando um intervalo de dimensões entre os 2 mm e os 10 mm, enfatizando a sua diversidade tecnológica. Até ao momento, as principais formas onde estas caneluras profundas surgem são compatíveis com os recipientes fechados, quer sejam eles potes ou globulares de bordo reentrante, indo de encontra com os dados para o sítio arqueológico mais próximo (Branco, 2007, p.56).

4.3.2 Folha de Acácia

O conjunto de Folhas de Acácia da Ota é, sem dúvidas, o mais rico de todo o conjunto cerâmico, permitindo observar um leque de organizações decorativas e motivos amplos e diversificados, mostrando que o significado real desta linguagem decorativa suporta vários tipos de expressão e reinterpretações. A Folha de Acácia, por si, permite estabelecer considerações cronológicas relativas, sendo, ainda hoje, considerada um dos “fósseis directores” para uma ocupação concreta em altura e fortificada (Sousa, 2010, p. 287), contudo é necessário um trabalho de análise de caso, que possibilite considerações mais concretas e “contextuais” que nos permitam entender os tipos de ocupação dos locais onde surge. Certo é, segundo os conhecimentos actuais, que este grupo decorativo não surge em ambiente funerário, indicando uma relação intima com as actividades dos “vivos”.

Como referido anteriormente, o ponto de partida metodológico baseia-se nas considerações e conclusões sistematizadas para os motivos e variáveis no Castro do Zambujal (Kunst, 1996; Kunst, 1987), recorrendo-se e incorporando as adaptações feitas por Ana Catarina Sousa (2010) que, no nosso entender, têm um factor de complementaridade grande, tendo em vista uma facilitação das leituras com o objectivo central de proceder a uma sistematização, com uma maior abrangência a nível do território estremenho. As três principais famílias, que agrupam e sistematizam os desenvolvimentos dos motivos decorativos em grupos iniciados com a letra K (Kerblattvertzierte Keramic), são o grupo K1, correspondente a Folhas de Acácia com uma organização espacial horizontal, o K2 associável a Folhas de Acácia verticais e ainda o K3, o grupo mais distinto, que se resume a uma organização decorativa em crucífera, não deixando de ser enquadrável nas técnicas e gestos associados à Folha de Acácia, bem como o grupo K4 que

87 reflecte a existência de motivos oblíquos. Ana Catarina Sousa acrescenta o grupo KC, reflexo das necessidades que encontra ao estudar as cerâmicas do Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 288), que assume a existência de motivos compósitos, que combinam os grupos anteriormente mencionados. Optámos por não aplicar as variáveis sistematizadas por Michael Kunst (1987) por considerarmos que, para o caso da Ota, as grandes famílias seriam suficientes para enquadrar as cerâmicas em estudo – ainda assim frisamos que a maneira de expressar as variáveis do método, por exemplo K212 (Folha de Acácia vertical, com distância curtas), podem levar a erros que podem alterar totalmente os dados. Outras maneiras, mais simples, seriam essenciais para tornar estes métodos descritivos efectivamente “universais”.

As grandes famílias estão bem representadas, existindo uma predominância para a Folha de Acácia horizontal (K1) que conta com um total de 32 fragmentos no seu conjunto dominando, correspondendo a 53% do conjunto deste tipo decorativo. Este resultado vai de encontro com a preponderância deste motivo, face às outras grandes famílias, verificando-se em alguns dos sítios mais importantes da Península de Lisboa como o Penedo do Lexim - 60% (Sousa, 2010) - Zambujal - 65% (Kunst, 1996) - Leceia - 75% (Cardoso, 2006). Já os motivos K2 (Folhas de Acácia verticais), detêm oito exemplares e os K3 (crucíferas) com dez correspondências – estes números vão de encontro com a ideia de que o motivo mais difundido e compreendido seria o que mostra a aplicação e desenho de Folhas de Acácia na sua forma horizontal. Por sua vez, o grupo KC permite proceder a uma subdivisão derivada do estabelecimento de combinações entre os grupos previamente sistematizados e, quando aplicável, outros – o KC1 correspondente a Folha de Acácia horizontal (K1) + Crucífera (K3) com cinco exemplares na Ota; KC2 representa a combinação entre Folha de Acácia horizontal (K1) e vertical (K2), não tendo sido identificado nenhuma peça enquadrável nesta categoria; KC3 a união entre a Folha de Acácia vertical (K2) e crucífera (K3), com uma peça; o KC4, correspondendo à soma de todos os grupos (K1+K2+K3), também com um exemplar e, por fim, o KC5, que une a Folha de Acácia vertical (K2) e os motivos encontrados e sistematizados para as decorações geométricas, tendo sido encontradas duas peça. Estes grupos, aquando de estudos estratigráficos mais finos e objectivos, podem ainda permitir desenhar evoluções ou adaptações cronológicas que podem vir a servir como marcadores cronológicos relativos, mais concretos. Como é sabido, a influência do grau de fragmentação poderá condicionar todo o processo de classificação, uma vez que a caracterização poderá ser determinada pela incapacidade de leitura do todo, a partir de uma das partes.

As pastas destes exemplares mostram uma grande diversidade, em especial no tipo de compacidade e elementos não plásticos, indiciando proveniências, a nível de barreiros, diferentes. Estas questões podem aumentar o grau de fractura das cerâmicas (Sousa, 2010, p. 288-290), ainda

88 assim parece-nos que os fenómenos pós-deposicionais, tendo igualmente em conta os tipos de contextos, podem ajudar na explicação da fracturação e da dispersão dos fragmentos pelo terreno.

Outra das questões que prendeu a nossa atenção foi o estudo das “folhas” da decoração Folha de Acácia. O principal intuito deste processo descritivo passa, em primeira instância, pela identificação de técnicas de “desenho”, quer sejam elas a impressão ou incisão. Por outro lado, permite-nos fornecer dados e considerações sobre técnicas de produção das decorações, à comunidade científica, não deixando de ser um processo interessante para compreender intencionalidades do Homem, nos processos decorativos. A tipologia das “folhas” vai, novamente, socorrer-se de estudos já realizados, (Sousa, 2010, p.293), tendo sido consideradas quatro variantes, para as Folhas de Acácia impressas, de dois grandes grupos: as folhas de tendência oval (F1 e F2) e as folhas de tendência linear (F3 e F4), também representadas no povoado de Ota – em suma, a F1 está associada à forma oval, a F2 à forma oval alongada, F3 à linear rectilínea e a F4 à forma linear côncava.

Os tipos de “folha” com maior expressão no conjunto são as folhas de tendência oval (F1), representando um total de 57% do conjunto (34 exemplares), centrando-se maioritariamente em motivos de Folha de Acácia horizontal (15 peças), seguido dos motivos cruciformes, onde foram registados oito fragmentos, e das Folhas de Acácia verticais, com sete registos. A forma F2, tendência oval alongada, apresenta-se em 11 exemplares, na sua maioria relacionados com o motivo decorativo K1 (Folha de Acácia horizontal), realidade semelhante à identificada antes, rapidamente explicada com a hegemonia deste motivo decorativo, estando também presente em motivos enquadráveis na categoria dos motivos compósitos. Este tipo de dados é também observável para as 13 peças onde foi identificada a forma F3 (linear rectilínea). O último tipo de “folha” é o associável à forma linear côncava (F4), sendo o grupo constituído por dois fragmentos cerâmicos, nos quais não foi possível identificar um motivo decorativo, pela sua reduzida dimensão. Estes dados vão de encontro com os obtidos, essencialmente, para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 294) e para Leceia (Cardoso, 2006, p. 36), realidade que vai ajudar na inscrição e identificação da Ota como um possível sítio congénere a estes.

A existência de exemplares incisos tem pouca expressão no conjunto da Ota, representado 11 peças, estando estes, na sua totalidade, empregues em decoração de tipo Folha de Acácia horizontal. Esta realidade, sempre diminuta em contextos semelhantes (Sousa, 2010; Cardoso, 2006) pode levantar questões teóricas relacionadas com a sua cronologia, sendo estes espécimes incisos muitas vezes associados à “falsa” Folha de Acácia que surge em contextos Neolíticos. Ainda assim, não crendo que o conceito “falsa” seja o mais correcto e pela amplamente mencionada falta de referências contextuais e cronológicas, as nossas menções, em relação a estas peças são, necessariamente, diminutas e pouco concretas.

89

A já referida pluralidade de formas nos motivos revela, consequentemente, diversas técnicas que estão, certamente, relacionadas com o modo de execução das mesmas, podendo ter sido desenvolvidas através de “haste de madeira polida, pequeno seixo alongado ou mesmo, um bordo regularizado de concha” (Cardoso, 2006, p 36), no entanto, parece mais provável que se utilizasse matizes tendo em conta um objectivo final, que considerasse não só o tipo de “folha” a desenvolver, mas também a forma e a pasta – estas decorações são transversais a nível formal, aparecendo quer em taças quer em potes, mostrando que o seu significado e verdadeira expressão é adaptável consoante as necessidades dos indivíduos. Novamente, estas considerações são extrapoláveis para sítios como o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 296-296), Zambujal (Kunst, 1987), Leceia (Cardoso, 2006) e Castro da Rotura (Gonçalves, 1971). Neste último caso, na Rotura, foi identificado um vaso de paredes rectas, onde tendencialmente surge decoração Folha de Acácia vertical (Sousa, 2010, p. 295) associada a motivos geométricos, realidade também identificada para a Ota. Este tipo de recipientes vem sendo assumido como um recipiente tipo copo, que marca a transição entre os copos canelados e as formas posteriores (Cardoso, 2006), uma perspectiva mais moderada, face às ideias de sucessão directa entre os copos e o Campaniforme, teorizadas para o Zambujal, por Michael Kunst (1996). Ainda assim inscrevemo- nos numa linha mais cuidadosa (Sousa, 2010, p. 295), que não assume nenhum tipo de forma ou funcionalidade para estes recipientes, já que, até ao momento, não foi recuperada nenhuma peça com perfil completo.

Avançando já para as questões relacionadas com os aspectos técnicos de preparação dos recipientes para a aplicação da linguagem decorativa, como referido anteriormente taças e globulares, podemos sublinhar uma grande homogeneidade em relação aos tratamentos de superfície. Na Ota, as cerâmicas decoradas com Folha de Acácia apresentam, tendencialmente, uma correspondência entre os tratamentos de ambas as superfícies, demonstrando, apenas, uma discrepância quanto ao tratamento recorrendo às aguadas vermelhas e negras, que evidenciam dez casos (17%) na superfície externa, face à inexistência de exemplares em que se verifica este tipo de tratamentos internamente. Este dado da Ota é corroborado com os dados recolhidos por Michael Kunst (1996), Ana Catarina Sousa (2010, p.296) e João Luís Cardoso (2006), que reconheceram, e registaram, o reduzido investimento nos acabamentos, sobretudo nas superfícies internas. Ainda assim, na Ota, assiste-se a uma uniformização dos gestos e das técnicas, que se traduzem na correspondência dos tipos de tratamento em ambas as superfícies. Em primeiro lugar, não foi detectada qualquer face rugosa e o alisamento tosco, apesar de estar presente, está reduzido a seis fragmentos (10% do conjunto). A grande maioria dos exemplares cerâmicos (75%), com este tipo de decoração, denota um alisamento interno e externo. Face à existência de cerâmicas com decoração Folha de Acácia que apresentam superfícies alisadas ou com aguadas, é proposto,

90 para o Zambujal (Kunst, 1996), um tratamento posterior à decoração. Contudo, esta análise não foi, até ao momento, apurada para o conjunto da Ota.

Os recipientes cerâmicos que apresentam este tipo de decoração denotam características técnicas díspares. A compacidade das pastas demonstra-o, com uma distribuição desigual entre pastas compactas (20%), semi-compactas (68%) e pouco compactas (12%), tendo os componentes não plásticos sido assumidos como “o verdadeiro elemento diferenciador” (Sousa, 2010, p.296). O conjunto ostenta uma abundância considerável (73%) de elementos não plásticos com uma granulometria, maioritariamente, marcada por componentes médios (70%). Estas proporções enquadram-se com o panorama do 3º milénio a.n.e. na estremadura portuguesa, ainda que, no nosso caso, o domínio seja da associação de componentes não plásticos de granulometria variada (finos, médios e grandes).

Em suma, podemos concluir que, no que toca às cerâmicas com decoração específica com o motivo Folha de Acácia, estas são enquadráveis dentro das principais características detectáveis para os sítios arqueológicos congéneres. As diferenças, especialmente relacionadas com as técnicas de fabrico e gestos de produção, não tornam o conjunto da Ota diferenciado, sendo assumidas, essas especificidades, como resultantes de um papel claro do individuo por de trás do recipiente e de uma variação associada às produções de recipientes de forma manual.

4.4 Grupo 4 – Motivos Geométricos

O estudo integral das cerâmicas decoradas possibilitou a identificação de um total de 22 peças com decoração enquadrável dentro dos motivos geométricos. Dentro destes, procedeu-se a uma individualização de quatro motivos, sendo eles os a) Triângulos preenchidos com linhas obliquas, onde constam dez peças, b) Banda com linhas intercruzadas, um fragmento, c) Losangos preenchidos, identificados quatro exemplares e d) Bandas cruciformes, onde se inscrevem quatro espécimes. O grupo referente ao motivo indeterminado conta com duas peças. Neste caso específico é contemplada a única peça em que se associa a Folha de Acácia ao motivo geométrico, sendo que, no nosso entender, ainda que representem outro tipo de linguagem, expressa através de um motivo decorativo diferente, podem ser associadas e fazer sentido dentro do mesmo recipiente. Ainda assim não discutimos aqui questões cronológicas e de contemporaneidade, já que estas cerâmicas aparentam surgir em associação aos motivos Folha de Acácia. A nível formal, ainda que já tenhamos referenciado este aspecto, os seis bordos em que foi possível identificar decoração geométrica, apontam um domínio para as formas de paredes rectas (quatro peças), também elas sublinhadas anteriormente. Esta forma apresenta, em três dos fragmentos, decoração exclusiva de tipo Losango Preenchido, correspondendo, o último

91 fragmento, a um exemplar compósito, onde se associam os Losangos Preenchidos e os motivos Folha de Acácia vertical, uma associação que é recorrente em recipientes homólogos (Sousa, 2010, p.303), sendo disso exemplo o recipiente proveniente do Castro da Rotura (1971). As restantes formas, dois globulares de bordo reentrante e uma taça sem espessamento do bordo, encontram-se todas associadas a decoração de Triângulos preenchidos com linhas oblíquas, apresentando uma grande similitude, a nível de técnica e desenvolvimento, às cerâmicas, formas e pastas com motivos Folha de Acácia, embora com uma diversidade menos acentuada. Frisamos aqui a ausência, assim como verificado para o Penedo do Lexim, de recipientes de pequenas dimensões, identificados por João Luís Cardoso em Leceia, sendo este assumidos como “antepassados dos potes decorados com folha de acácia” (Cardoso, 2006, p. 36). De forma geral os motivos geométricos dominantes na Ota são equiparáveis aos locais congéneres, onde se apresenta uma tendência para a dominância dos Triângulos, como detectável para Leceia e Penedo do Lexim, realidade também presente no sítio aqui em estudo – não podemos deixar de sublinhar que as 22 peças da Ota são claramente reduzidas para proceder a constatações relacionadas com domínios e tendências, sendo que os dados que aqui apresentamos, provenientes de prospecção e de recolhas antigas, são, necessariamente, fugazes. Acrescentamos ainda que os motivos são integralmente mono-temáticos, exceptuando o caso da associação entre geométrico/Folha de Acácia, fazendo novamente a integração e associação da Ota aos sítios congéneres estudados – leia-se aqui Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 298), Leceia (Cardoso, 2006), Pedra de Ouro (2003) e Columbeira (Marques Gonçalves, 1994). No que toca aos motivos com Triângulos preenchidos, como o próprio nome indica, somente foi possível identificar peças onde os triângulos são dotados de um preenchimento com linhas oblíquas. Estes surgem associados a caneluras que, no nosso caso específico, não foram possíveis de contabilizar devido ao estado fragmentado da amostra, realidade que não ajuda na compreensão total do desenvolvimento da expressão decorativa. As linhas intercruzadas, ou linhas horizontais oblíquas intecruzadas, vão de encontro com os restantes motivos geométricos, recorrendo-se à técnica de incisão para a sua produção, como identificado para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 302), Olelas (Marques Gonçalves, 1997) e Leceia (Cardoso, 2006). Neste caso concreto as matrizes de produção assumem-se ligeiramente diferenciadas, consoante o tipo de realidade decorativa a desenvolver – as matrizes aplicadas na produção das linhas delimitadoras de bandas apresentam-se como mais largas, sendo que as utilizadas nas produções das linhas intercruzadas apresentam uma incisão mais fina e que, em muitas das vezes, extravasa as linhas delimitadoras de banda. Contrariamente à realidade do Penedo do Lexim, não foi identificado nenhum fragmento onde se mantivessem vestígios de uso de pasta branca (Sousa, 2010, p. 302), o que não aponta para uma inexistência desta realidade que, por motivos de conservação, podem já não ser identificáveis.

92

Já os losangos preenchidos, realizados recorrendo à técnica de incisão, essencialmente fina, ainda que tenham sido identificados um total de XX fragmentos, a sua constituição a nível de pastas, forma e decoração, parece apontar para um único recipiente dotado de uma perfuração – única no contexto da Ota. Estas peças encontram-se ainda em sítios como a Penha Verde, onde é abundante, chegando a servir como nome deste motivo (Ferreira e Silva, 1970, p. 216). Acrescentamos ainda, como referido anteriormente, que este recipiente apresenta claros paralelos com o recipiente do Castro da Rotura, sendo estas decorações normalmente associadas a períodos mais tardios (Sousa, 2010, p. 301) – realidade para a qual não dispomos de dados elucidativos e explicativos. Por fim, o motivo que nos levantou mais problemas, o que denominámos como bandas cruciformes. Ainda que reconheçamos que esta terminologia não seja a mais correcta e objectiva, surgiu-nos como a mais ilustrativa da realidade a tratar e, devido às reservas do registo, optou-se por não se incluir no grupo Folha de Acácia, como realizado para o sítio da Penha Verde, para o único fragmento com um motivo decorativo similar ao aqui apresentado (Cardoso, 2010/2011, p.513). Estas peças apresentam motivos geométricos agrupados em bandas, cuja realização de triângulos preenchidos forma, no somatório dos seus vértices, losangos não preenchidos. Estes fragmentos não se separam das restantes cerâmicas a nível técnico, podendo representar motivos locais ou ainda uma realidade com pouca expressão no registo arqueológico. No que toca à técnica de produção dos motivos, a incisão, mostra uma intenção clara na demarcação dos triângulos e, por sua vez, dos losangos, sendo as linhas de preenchimento, com uma tendência ligeiramente oblíqua, realizadas através de uma incisão mais fina e menos marcada. Este motivo pode ser enquadrado nos Triângulos preenchidos, ainda que os motivos apresentem tendências e associações decorativas diferenciadas. A nível de paralelos estilísticos, sublinhamos a existência deste tipo de decoração num fragmento proveniente de Leceia (Cardoso, 2006, p.221), assim como o já referido pertencente ao espólio de Penha Verde (Cardoso, 2010/2011, p.536), uma realidade que vai de encontro com a hipótese de um estilo decorativo com pouca expressão no registo arqueológico. Neste último caso, o fragmento de Penha Verde, foi possível proceder ao estabelecimento formal, apontando para um recipiente de paredes rectas que, pela sua forma, e como foi problematizado anteriormente, não nos permite tecer considerações cronológicas ou contextuais – mais frisamos que os fragmentos da Ota são integralmente referentes a bojos, não nos sendo possível estabelecer relação directa com o fragmento de paredes rectas de Penha Verde (Cardoso, 2010/2012, p.513).

4.5 Grupo 5 – Motivos Campaniformes O estudo da cerâmica Campaniforme é uma componente com grande potencial informativo, a nível de técnicas, mobilidade e contactos. No caso do Castro de Ota, a cerâmica de

93 tipo Campaniforme não tem grande expressão no conjunto cerâmico, tendo mesmo passado despercebido aquando da publicação de Ernâni Barbosa – este descreve um dos fragmentos Campaniforme como “linhas horizontais formadas por pequenos traços (a carretilha?) de que há variados exemplares na Pedra de Ouro” (Barbosa, 1956, p.122). Contudo, com o presente trabalho, foi possível encontrar, nos depósitos cerâmicos recolhidos por Hipólito Cabaço, um total de dois fragmentos enquadráveis nas tipologias e decorações das cerâmicas Campaniformes.

Estas peças correspondem, na totalidade, a bojos com decoração externa, sendo que um deles representa um fragmento com um ombro/carena marcado. Novamente, como em todo o conjunto de peças provenientes dos depósitos do Museu Hipólito Cabaço, não nos é possível tecer conclusões contextuais, mas a existência de peças como a cerâmica Campaniforme permitem-nos retirar, do sítio da Ota, um conjunto de informações que se prendem com questões cronológicas, faseamento, de utilização e significados baseados em análises integralmente artefactualistas. Como referido por Ana Catarina Sousa (2010, p. 306), para o caso concreto do Penedo do Lexim, onde o número de fragmentos é igualmente reduzido, a fraca presença deste tipo de peças pode indicar o abandono do sítio arqueológico, no período cronológico de vigência destas cerâmicas. Neste caso específico, o abandono do sítio é, como sublinhado antes, difícil de atestar, contudo, se tivermos em conta toda a diversidade material estudada, podemos assumir um possível “abrandamento” da ocupação no final do Calcolítico seguido por uma presença mais destacada na Idade do Bronze (pleno?).

Todos os fragmentos apresentam pastas compactas, onde os elementos não plásticos são raros e, quando visíveis, de reduzidas dimensões – esta característica é muitas vezes usada como ilustradora de uma maior relevância destas cerâmicas para a comunidade que a produzia, podendo, no nosso entender, reflectir sim um processo de selecção e intenção relacionadas com o conhecimento e desenvolvimento de novas técnicas produtivas. As cozeduras são, nos dois fragmentos com decoração linear, oxidantes, onde foi possível identificar a existência de um alisamento seguido de uma aguada, com uma tonalidade esbranquiçada – mostrando aqui que estes fragmentos apresentam um cuidado e um processo de execução apurado, indiciando uma finalidade específica, quando comparado com os restantes fragmentos e motivo decorativos, cuja funcionalidade não necessitaria de recipientes tão cuidados e finos. As considerações que se prendem com as tipologias formais destas peças são escassas, ainda que seja possível compreender, pelo perfil de um dos fragmentos (com decoração linear pontilhada) que pertenceria possivelmente a um recipiente acampanado, já que este apresenta-se ligeiramente concavo, correspondendo a uma das partes inferiores destes recipientes. A peça dotada de ombro não permitiu uma reconstituição de diâmetro a partir do lado interno da carena, mais ainda assim pode ser enquadrado nas tipologias das taças, tendo como paralelo mais directo a forma identificada no Tholos da Tituaria (Cardoso et al, 1996, p.187), ainda que pouco mais se possa adiantar

94 relativamente a este fragmento. Assim sendo, ficam excluídas quaisquer considerações ou conclusões relativamente a afinidades formais que foram ultrapassadas ao se olhar mais atentamente para as técnicas, motivos e padrões decorativos.

Os dois fragmentos de que dispomos ilustram as diversas variantes e técnicas associáveis aos recipientes Campaniformes – a técnica incisa, larga, está presente num dos fragmentos, nas suas variantes lineares, assim como a técnica do pontilhado, como referido acima, onde se identifica o motivo linear pontilhado, muitas vezes associado e enquadrado no “pacote” internacional. A existência da técnica do pente não é exclusiva das realidades Campaniformes, encontrando-se já presente no registo arqueológico antes da chegada destas influências (Cardoso e Martins, 2009, p. 277) – referimos, no seguimento desta ideia, que não foram identificadas na Ota cerâmicas com decoração “penteada”, que produziriam, tendencialmente, motivos ziguezagueantes, constando com uma ausência que pode encontrar paralelos nos povoados congéneres, mais especificamente a Sul da linha do Montejunto, onde a sua presença é também ela diminuta (Gonçalves, 1991, p. 216).

Os motivos são relativamente simples, já que a tendência do conjunto é a produção de motivos lineares: o fragmento com motivo linear pontilhado apresenta afinidades culturais com os fragmentos semelhantes identificados para o sítio da Penha Verde (Cardoso, 2010-2011, p. 505) ou Leceia (Cardoso, 1997-1998, p.311), onde este motivo está presente em recipientes acampanados, compatíveis com o motivo e possível forma identificados para o fragmento em questão. Já o motivo linear inciso, uma adaptação da realidade anteriormente expressa, encontra paralelos formais, assim como de motivo, na Tituaria, ainda que a decoração deste seja pontilhado – ambos os motivos, quer incisos, quer pontilhados, apresentam uma afinidade grande com as maneiras de fazer associáveis ao estilo internacional, ainda que o fragmento inciso possa indicar uma “imitação” ou réplica dos motivos lineares originais.

Outra das características muito associável às decorações Campaniformes é a incrustação de pasta branca nas incisões ou impressões (Harrison, 1977, p. 44-45). A composição e constituição dos componentes utilizados para a produção desta pasta têm vindo a ser estudados quer em contextos peninsulares como internacionais, podendo estes reflectir a utilização de Cálcio carbonatado (Salanova, 2000) ou ainda de uma mistura de ossos reduzidos a pó, associados a água ou a um agente gorduroso (Odriozola e Hurtado Pérez, 2007, p.1). Na Ota só um dos fragmentos, referente ao ombro, conservava vestígios de utilização de pasta branca, podendo indicar fenómenos tafonómicos diferenciados em relação aos restantes exemplares, ou ser o reflexo da utilização de diferentes técnicas de fabrico de pasta branca – o significado desta aplicação é muito diversificado, podendo ser interpretado quer a nível mágico-simbólico (Harrison, 1977, p. 44-45), em que se relacione o facto de se incluir uma componente óssea (animal ou humana) em peças

95 com decoração Campaniforme, ou ainda lido com um olhar mais decorativo e “funcional”, tentando evitar-se um esbatimento decorativo que reduziria as decorações e o seu significado (Odriozola e Hurtado Pérez, 2007, p. 9).

Em suma, o Campaniforme do Castro de Ota apresenta, ainda que reduzido, uma diversidade interessante a nível decorativo, mostrando que um estudo artefactualista pode, no caso específico das cerâmicas Campaniformes, ajudar no estabelecimento de paralelos e contactos que mostram, neste caso, que a Ota estaria inserida numa rede maior de relações e influências que originaram estes dois fragmentos. Mais adicionamos que os poucos exemplares em estudo, realidade semelhante a outros sítios arqueológicos congéneres (Sousa, 2010, p. 306), mostram uma diversidade de técnicas e motivos que implicam um necessário conhecimento das práticas e maneiras de fazer que são apuradas com a chegada dos paradigmas Campaniformes – não podemos conjecturar uma ocupação para a Ota desta cronologia, mas ainda assim não existe um vazio temporal na ocupação, mas sim um possível abrandamento que se coaduna com as revisitações das populações onde o Campaniforme existiria, a sítios que outrora teriam significado outro estilo de vida.

e. Elementos de Tear A presença de artefactos que, segundo as teorias actuais, reflectem actividades relacionadas com a exploração secundária dos recursos animais ou com a agricultura do linho (Greenfield, H. J., 2010), está bastante bem documentada em diversos sítios arqueológicos do 3º milénio, em especial na Estremadura Portuguesa (Sousa, 2010, p. 341). É interessante compreender que há uma generalização deste tipo de artefactos nas publicações arqueológicas, em especial se observarmos o trabalho de sistematização dos elementos de tear em placa no Calcolítico Peninsular, desenvolvidos por Rollán em 1996, onde se constatar que “…son muy (…) pocos, también, los hallazgos de elementos de telar…” (Rollán, 1996, p. 125). Esta realidade pode ser rapidamente justificada pelo método de “sistematização” utilizado pelo autor supracitado, que recorre a publicações que não reflectem integralmente os espólios dos sítios.

Este tipo de utensílios é um dos que mais facilmente nos mostra diferenças culturais e tendências regionais de produção, desde logo, pela forma maioritariamente quadrangular e rectangular, onde se registam tendencialmente quatro perfurações, na região da Estremadura Portuguesa e a Norte do país, e pela dualidade placa/crescente bem patente nos contextos Alentejanos (Costeira, 2012, p. 650). As já referidas variações culturais podem expressar-se assim em modos diferentes de fazer e entender o acto de tecelagem, podendo estar patentes em teares verticais (Diniz, 1993, p. 241), teares horizontais (Boaventura, 2001) ou ainda integrados em estruturas tipo “prancheta” destinadas á tecelagem (Cardoso, Carreira, 2003, p. 141) – não excluímos nenhum deste tipo de estruturas de produção, ainda mais quando não dispomos de

96 nenhum tipo de contexto arqueológico, sendo certo que a finalidade seria a criação de um produto específico em cada uma destas realidades. A identificação de áreas funcionais ou de concentrações, como as identificadas em Santa Justa (Gonçalves, 1989, p.250) ou recentemente no Cabeço do Pé-da-Erra (informações obtidas na conferência – Gonçalves, V. S. e Sousa, A.C., Cabeço do Pé da Erra: uma quinta calcolítica com 4500 anos), não foi possível de concretizar para o caso da Ota pela já largamente mencionada falta de informações contextuais.

No caso concreto da Ota foram detectados 19 elementos de tear, sendo 18 correspondentes a recolhas antigas com depósito no Museu Hipólito Cabaço e uma outra proveniente de prospecção arqueológica. Deste universo, sete (37%) elementos encontram-se completos e 3 (16%) parcialmente completos, correspondendo assim à maioria do conjunto em estudo (53%). As restantes peças (21%) encontram-se fragmentadas nas zonas dos orifícios, algo que se explica de forma relativamente fácil já que são estes os principais diferenciadores destes artefactos. Como já detectado para os artefactos em pedra polida, o Museu procedeu ao restauro de cinco elementos de tear (26%), sendo impossibilitada a análise dos vários fragmentos que compunham os restauros. A existência tendencial de placas quadrangulares e rectângulares na Estremadura Portuguesa (Sousa, 2010, p. 341) é corroborada quando se analisam os dados da Ota, onde os 19 elementos de tear se subdividem em cinco placas de forma rectângular (26%), 10 placas quadrangulares (53%) e quatro de desenvolvimento impossível de conjecturar (21%), por corresponderem a fragmentos das zonas perfuradas. É de referir a existência de uma placa de pequenas dimensões decorada, que apresenta um tipo de cozedura diferenciada das restantes placas, com uma superfície mais negra – no conjunto dominam as placas de tonalidades avermelhadas. Estas pequenas placas foram também detectadas por Ana Catarina Sousa, no Penedo do Lexim (2010, p. 342), não tendo grande expressividade no registo arqueológico estremenho.

Podemos ainda referir a peça nº1872 que, pelas suas características morfológicas (14 cm de comprimento, 10 cm de largura e uma espessura de 2,6 cm) aparenta ter algum tipo de afinidade cultural com as realidades que surgem nas Beiras, com pouca expressão na Estremadura (Valera, 2007) – uma ocorrência paralela à da Ota, é o elemento de tecelagem do Monte da Quinta 2 (Valera et al, 2006, p. 304). Esta ocorrência, com uma constituição de argila similar aos restantes elementos de tear, mostra que há uma socialização e uma troca de técnicas e maneiras de fazer, que se pode prender com a movimentação de matérias-primas e redes de trocas. Pode ainda reflectir uma necessidade específica e fugaz, que não deixou grandes marcas nos materiais recolhidos, até ao momento.

Todos os elementos de tear apresentam um número de perfurações cilíndricas que varia entre uma, nas peças fragmentadas, e quatro, não tendo sido encontrado nenhum exemplar que

97 apresentasse mais do que quatro perfurações em simultâneo. A localização das perfurações é relativamente constante, estando todas elas próximas dos cantos das placas. A nível das arestas e dos cantos, o conjunto apresenta-se integralmente arredondado, quer em placas quadrangulares quer em rectangulares, realidade que contrapõe aos dados obtidos para a Pedra de Ouro, onde há uma tendência geral para os cantos e arestas vincados (Branco, 2007, p. 69).

A decoração das placas é um processo relativamente comum na Estremadura Portuguesa, contrapondo novamente com a situação que se sente no Sul do país, onde a decoração é pouco expressiva (Costeira, 2010, p. 73; Sousa, 2010, p.241). Um conjunto de seis elementos de tear (32%) apresentam decorações na face, sendo que todas elas ilustram a técnica da incisão – motivos decorativos criados através do desenho, por arrasto de estiletes ou pontas rombas, na pasta fresca ou em início de processo de secagem (Costeira, 2010, p. 74). Os motivos decorativos são integralmente geométricos, podem desenvolver-se de forma simples – linhas – ou de forma mais complexa – com motivos intercruzados/axadrezados ou, surgindo no exemplar nº1855/2b, criando um motivo que pode ser encarado como vegetalista, com paralelos em pesos de tear decorados de Vila Nova de São Pedro (Paço, 1940, p.241 e 243; Arnaud, 2013, p. 449), ou zoomórfico, desenhando o que aparenta ser um pequeno peixe. A grande densidade de decorações nas placas de locais como Vila Nova de São Pedro e Pedra de Ouro, levou Afonso do Paço a conjecturar uma hipotética natureza votiva para este tipo de artefactos (Paço, 1940, p.241 e 243; Sousa, 2010, p. 342).

Para o caso concreto da Ota o carácter votivo poderia ser um dos significados destas peças, já que só dois dos exemplares decorados apresentam marcas de uso, mas quando olhamos para a realidade mais próxima, novamente para o sítio da Pedra de Ouro, a funcionalidade está atestada (Branco, 2007, p. 70) e intrinsecamente relacionada com a linguagem representativa do imaginário destas comunidades. Aceder ao “verdadeiro” significado das decorações apresenta-se como um objectivo difícil de alcançar, contudo a imagética que surge expressa nas placas aparenta uma associação directa entre cenas e fenómenos do quotidiano – chuva, animais, motivos vegetalistas, entre outros - representados em artefactos que também eles se inscrevem nessa rotina. Esta ideia surge como uma resposta alternativa às leituras feitas até ao momento, em que se assume que, por um lado, estas representações estariam ligados a mecanismos supersticiosos usados para evitar o enleio das fibras ou a quebra da teia (Valera, 1997; Diniz, 1994) ou, por outro, assumindo-se que as figuras estariam conotadas com o ciclo produtivo e múltiplas actividades necessárias ao fabrico dos tecidos (Cardoso, 1981).

98

f. Os artefactos de osso polido Os artefactos em osso polido da Ota mostram que a preservação de matéria orgânica neste sítio arqueológico é bastante boa e, pela quantidade de peças, enfatiza que este tipo de utensílios teria um grau importância nas comunidades que habitavam e vivenciavam a Ota – quer seja nas tarefas do dia a dia, ou em realidades mais enquadráveis nos contextos do simbólico.

A falta de estudos monográficos, realidade também frisada para os contextos dos sítios fortificados estremenhos, dificultam o estabelecimento de paralelos e comparações que facilitariam a identificação de tipologias, funcionalidades e cronologias deste tipo de materiais. As principais obras a salientar são os estudos realizados para Leceia, que abrangem desde os utensílios mais comuns a outro tipo de artefactos ósseos (Salvada e Cardoso, 2001/2002; Cardoso, 2003), assim como um estudo mais generalista, que inclui um conjunto de contextos funerários e de povoados abertos da Estremadura Portuguesa (como Outeiro da Assenta, Outeiro de São Mamede e Pragança, no caso dos povoados, e Serra das Éguas, Moinhos da Serra e Monsanto III, como contexto funerários), realizado por Clara Salvado (2004). Devido às escassas tipologias criadas para estes materiais, decidiu-se seguir as já existentes, procedendo a uma adaptação ao contexto da Ota.

O conjunto de osso polido da Ota é proveniente, de forma integral, do espólio em depósito no Museu Hipólito Cabaço, não tendo sido identificado nenhum exemplar em âmbito de prospecção. Foi possível identificar um total de 56 fragmentos de objectos em osso polido, tendo sido todos estudados e tratados de forma individual, ainda que existam problemas na definição cronológica dos mesmos – por precaução foram todos incluídos, sendo que só recorrendo a datação directa, e destrutiva, se poderia reconhecer a cronologia a que pertencem efectivamente estas peças. É um conjunto de pequenas dimensões, em especial quando comparado com outros que apresentam mais de 300 peças, como o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.), Zambujal (Uerpmann e Uerpmann, 2003) e Leceia (Cardoso, 2003, p. 33). As peças aqui apresentadas foram alvo de um estudo preliminar, na tentativa de compreender quais os animais utilizados para obtenção das matérias primas, não tendo produzido qualquer resultado, tendo em conta o grau de transformação dos materiais.

A nível da fragmentação destas peças é bastante grande, encontrando-se somente cinco fragmentos completos – dois deles correspondendo a furadores, um a uma agulha/sovela, outro fragmento referente a um brunidor e por fim uma peça com dupla funcionalidade. O estado dominante é referente à área distal, com 25 peças enquadráveis nesta categoria, seguido das peças mesiais, cujo potencial de informação é ligeiramente menor. Por fim foram identificadas cinco peças proximais, que nos poderiam dar indicações de técnicas produtivas e cadeias operatórias que, para esta tipologia de materiais, são de difícil acesso (Sousa, 2010, p.226). Outra das questões

99 que se apresenta difícil, em muito pela falta de contextos concretos onde os materiais surjam em âmbito de “uso”, é a nomenclatura que lhes é atribuída, estando em muito contaminada pelas funcionalidades e utilizações modernas de objectos com formas similares – assim sendo, tentando proceder a um estudo integrável e comparável com as realidades já existentes, optámos por seguir as terminologias já estabelecidas por Clara Salvado (2004) e João Luís Cardoso (2003), ainda que se tenha, em alguns caso, procedido a uma análise e aplicação crítica das mesmas. Optámos por não proceder a uma divisão entre utensilagem de uso comum e objectos de osso, como realizado por Ana Catarina Sousa (2010, p. 228), devido à reduzida amostragem em estudo que, em certa medida, não nos permite tecer considerações fiáveis e extrapoláveis para uma realidade arqueológica maior.

Em primeiro lugar falamos de furadores, que podem adquirir um diverso leque de funcionalidades relacionadas com o tratamento e/ou cosedura de peles, onde se enquadram todos os objectos com uma extremidade pontiaguda, com excepção dos alfinetes que decidimos individualizar. Novamente, como referido antes, seguimos as divisões criadas por João Luís Cardoso (2003, p. 27), diferenciando-se os furadores obtidos por seccionamento longitudinal sobre esquirolas de diáfise de ossos longos – encontrando-se dois dos quatro exemplares inteiros – dos restantes quatro fragmentos, cuja tipologia não foi possível identificar. Quanto aos alfinetes, foi possível identificar um total de cinco peças que se enquadram nas tipologias definidas por Clara Salvado (2004, p. 81), tratando-se estes de exemplares fragmentados, de pequenas dimensões, aparentemente totalmente produzidos em osso – aqui poderíamos ainda incluir os alfinetes de cabelo que, como efectuado por Ana Catarina Sousa (2010, p. 230), aparentam indicar uma outra realidade ou função, onde consta uma extremidade lisa ou com uma decoração/trabalho elaborado. Na Ota foram identificados sete exemplares enquadráveis dentro desta categoria classificativa, não se encontrando nenhum completo – são realidades fáceis de identificar, em especial porque todos os fragmentos em estudo são referentes às “cabeças” que, neste caso, não são amovíveis. O conjunto em estudo é bastante significativos quando tomamos consciência da densidade da sua presença em sítios semelhantes à Ota – no caso do Penedo do Lexim constam um total de três peças (Sousa, 2010, p. 230), enquanto que no Zambujal foram identificados 18 (Jimenez Gomez, 1995, p. 163), número que dão algum destaque ao conjunto da Ota.

Foi possível individualizar cinco fragmentos distais de espátulas, cuja funcionalidade poderia passar, como o próprio nome sugere, por um instrumento para mexer e misturar ou, no nosso entender, ter servido como instrumento de produção de recipientes cerâmicos e, possivelmente, respectiva decoração – estas realidades só são confirmáveis com estudos traceológicos, que esclareceriam muitas duvidas funcionais e, por consequência, terminológicas. Identificaram-se igualmente quatro peças enquadráveis na categoria dos brunidores que, pela sua superfície rugosa e tendencialmente desgastada, apontam para processos relacionados com

100 tratamento e acabamento de peles ou cerâmicas, num acto de abrasão. Não foram identificados fragmentos semelhantes a escopros ou formões.

Referindo-nos já à categoria das agulhas, optámos por seguir as indicações de Clara Salvado, que assume que a terminologia “agulhas” só deve ser aplicada a peças com sinais evidentes de preensão de fio (Salvado, 1999, p. 79). Por sua vez, João Luís Cardoso, assume, como característica essencial, a capacidade de perfuração destes objectos, não sendo obrigatória a existência de perfurações, chegando ainda a associar as agulhas às sovelas (Cardoso, 2003, p. 26). Tendo estes pressupostos morfológicos em mente, foi possível identificar um total de seis agulhas, onde se incluí um exemplar cuja perfuração se encontra inacabada. O conjunto da Ota é, ainda que reduzido, expressivo, quando comparado com Penedo do Lexim, onde somente se registou um exemplar (Sousa, 2010, p. 229, ou ainda o sítio da Pedra de Ouro, com três exemplares “pontiagudos” (Branco, 2007, p. 91).

Às agulhas poderíamos associar, como referido antes, as sovelas que, ainda hoje, se apresentam como o grupo tipológico-formal mais discutido e difícil de gerar consenso (Sousa, 2010, p. 231). Esta designação, inicialmente aplicada para os contextos do Castro da Rotura por Victor Gonçalves (1971), significa, a nível literal, uma ferramenta que serve para perfurar couro, contendo uma ponta afilada e uma base que se destaca na peça (Sousa, 2010, p. 231). João Luís Cardoso denomina estes objectos como “pontas de seta”, descrevendo-as como objecto robustos, dotados de corpo cónico com uma parte inferior dotada de um espigão mais estreito (Cardoso, 2003, p. 30), salientando a sua ausência nos espólios funerários. Já Clara Salvado procede à sua descrição enquanto alfinetes (2003, p.31), realidade que nos parece pouco justificável, a nível empírico, devido à falta de estudos traceológicos, optando-se, no presente trabalho, por assumir estes artefactos, profundamente afeiçoados, enquanto sovelas - os exemplares da Ota já tinham sido referenciados por Spindler em 1981, associando-os a objectos bélicos, mas optou-se por renomeá-los e reenquadra-los na categoria das sovelas. Foram identificados três exemplares destas peças, um número relativamente reduzido que, ainda assim, vai de encontro com os identificados para sítios com as mesmas cronologias de ocupação, como o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 231), Leceia (Cardoso, 2003, p. 30), Rotura, Vila Nova de São Pedro e Zambujal (Spindler, 1981).

Identificou-se igualmente uma peça com dupla funcionalidade, única no contexto em estudo, que apresenta uma extremidade pontiaguda, indicando uma utilização enquanto agulha, enquanto que na extremidade oposta se apresenta em forma de espátula. Sublinhamos ainda a existência de 15 fragmentos indeterminados que, em muito devido ao seu estado de conservação – 15 peças referentes aos fragmentos mesiais e três a fragmentos distais – não nos possibilitaram

101 uma inserção tipológica/morfológica específica e, essencialmente, segura, preferindo-se integrá- los na categoria de indeterminados.

Falamos ainda, enquanto categoria tipológica final, de um objecto muito concreto, considerado como recipiente, por Ana Catarina Sousa (2010, p.231), ou ainda como caixa, por Clara Salvado (2004). O fragmento da Ota apresenta uma decoração incisa muito fina numa das extremidades do objecto, tendo sido ainda identificada uma perfuração regular, também ela de pequenas dimensões – estas peças apresentam-se tendencialmente decoradas (Sousa, 2010, p. 231) através de processo de incisão (Salvado, 2004, p. 60), não sendo possível reconstituir a sua forma com um fragmento de diminutas dimensões. Ainda assim é de salientar que a perfuração pode ser associada à aplicação de rebites, possivelmente em materiais que não se conservam, ou ainda enquanto pontos de suspensão (Salvado, 2004, p. 59), sendo esta uma das principais causas da sua nomenclatura enquanto caixas, ainda que permaneça discutível. A nível funcional estes objecto apresentam-se de difícil interpretação e pensamento, já que as teorias pendem entre uma utilização enquanto recipientes para guardar “fármacos ou unguentos, incluindo psicotrópicos” (Cardoso, 2003, p. 30) ou uma funcionalidade mais genérica que se prende com a suspensão destes recipientes/caixas (Salvado, 2004, p. 60) – todas estas hipóteses se apresentam plausíveis, sendo necessário justifica-las dentro do seu contexto concreto, não deixando de frisar que tendencialmente surgem associados a contextos funerários (Salvado, 2004, p. 60), apresentando- se aqui em contexto de habitat. Estes objectos são bons indicadores cronológicos, uma vez que os estudos realizados sobre eles permitem apontar para o período de transição entre o Neolítico Final/Calcolítico inicial (Sousa, 2010, p. 231), reforçando a ideia, que tem vindo a ser confirmada por alguns dos dados apresentado, que a ocupação na Ota pode recuar até ao Neolítico, ainda que final.

Por último fazemos referência à existência de uma figura zoomórfica de reduzidas dimensões, 2,4 cm por 1,3 cm, enquadrável dentro das figuras caracterizadas como tipo coelho. Um dos sítios onde foi possível identificar uma datação, ainda que indirecta, foi no sítio da Pedra Furada, uma gruta natural a cerca de 15 km do sítio arqueológico em estudo, onde a datação de um perónio de um dos inumados, resulta no intervalo, a dois sigma cal BC, 3095-2900 (Silva, et al, 2014, p. 176), ainda que se possa levantar problemas ao nível da relação contextual. Se tivermos em conta a proximidade geográfica, bem como a cronologia disponível, a presença deste fragmento pode ser assumida como um dos melhores indicadores para a presença humana no sítio da Ota durante o Neolítico final, transição para o Calcolítico.

É também curioso compreender que estas peças são, na sua grande maioria, associadas a contextos funerários, na diversidade construtiva que estes podem estes assumir (Valera et al, 2014, p. 20) – sendo que o exemplar da Ota é o único, até ao momento, proveniente de um

102 contexto habitacional. Esta realidade vem alimentar, e fundamentar, a ideia já amplamente referida, ao longo do presente trabalho, da possível existência de uma estrutura funerária/enterramento no sítio arqueológico da Ota, sendo assim explicada a proveniência do “coelho”. A própria inscrição deste zoomórfico na categoria dos coelhos levanta alguns problemas que, devido à falta de paralelos, não podem ser mais clarificados - assim sendo, o facto do exemplar da Ota conter um “focinho” mais alongado do que a maioria dos coelhos existentes, onde existe uma relativa homogeneidade representativa e de dimensões (Valera et al, 2014, p. 31) levanta dúvidas sobre se representaria, efectivamente um lagomorfo, ainda que esquematizado, ou se poderia desenhar um outro tipo de espécie animal, como se verifica para os suídeos e aves (Valera, et al, 2007), ou inclusive para raposas (Valera, et al, 2014, p. 21; Gonçalves, 2009). Estas representações mostram o caracter mais natural do Homem, efectivando assim, uma relação com o meio e com a fauna envolvente, reconhecendo-se não só a sua beleza a nível estético, como também o seu poder enquanto símbolo, que permite exteriorizar um quadro conceptual que pode reflectir, exclusivamente, a relação Homem-animal, ou um posicionamento social partilhado por diversas regiões – este tipo de artefactos acentua ainda a ideia de que os objectos, em todas as suas vertentes, têm um papel social activo, funcionando como meio de comunicação, mas também como estimulante de novos pensamentos e acções por parte dos agentes (Valera, et al, 2014, p. 36-37)

Como nota final referimos o tipo de tratamento geral do conjunto, onde a grande maioria, leia-se aqui 53 peças, apresentam um processo de polimento total, tendo as restantes três um polimento parcial – aqui podemos compreender o processo de transformação da matéria-prima, que teria de ser profundamente trabalhada para se obterem este tipo de materiais.

g. Artefactos metálicos Estudar os artefactos metálicos e a inerente produção metalúrgica apresentou-se difícil para o contexto específico da Ota. Certo é que este tipo de povoados – com uma implantação de altura e, possivelmente amuralhados - foram, até há pouco tempo, caracterizados como os principais focos produtivos e exploradores das realidades cupríferas do período Calcolítico na Península Ibérica (Sousa, 2010, p. 347). Com estudos mais aprofundados e cuidados, chegou-se à conclusão que este tipo de povoados apresenta uma distância relativa das áreas de aprovisionamento das matérias-primas e a densidade produtiva e correspondente transformação e produção, não seria muito significativa (Sousa, 2010, p. 349; Branco, 2007, p. 97; Soares et al, 1994).

Outra das questões prende-se com a cronologia tardia destas produções, estando a sua introdução centrada no Calcolítico Pleno em Leceia (Muller e Cardoso, 2008), no Penedo do

103

Lexim (Sousa, 2010, p. 347), também em Vila Nova de São Pedro (Savory, 1982/93, p.26; Pereira, 2011) e no Zambujal (Kunst, 2001, p. 87; Muller, 2007.) – os materiais que surgem nas camadas do Calcolítico Inicial são residuais (Muller e Cardoso, 2008, p.66; Sousa, 2010, p. 348)., Para a Ota esta realidade é impossível de constatar, em muito pela já referida falta de contextos, a que se alia a falta de materiais que indiquem, mesmo que remotamente, a transformação e produção de artefactos metálicos.

O conjunto da Ota abarca um total de 54 artefactos metálicos de diversas cronologias. A sua maioria permanece por identificar a nível de tipologias e cronologias (33) por corresponderem a materiais informes ou cujas cronologias são incertas, podendo inserir-se em qualquer período pré-histórico, necessitando de análise para determinação. Do conjunto de 20 materiais cuja tipologia é identificável, quatro machados planos e uma ponta de seta apresentam características tipológicas que podem inserir-se na segunda metade do 3ºmilénio ou ainda nos primórdios da Idade do Bronze – é necessário referir que um dos machados que surge referenciado e desenhado nos trabalhos de Maria Amélia Horta Pereira (1970) não se encontra no depósito do Museu Hipólito Cabaço, mais adiantamos que na publicação de Philine Kalb, de 1980, o mesmo já não surge analisado, tendo “desaparecido” num espaço de 10 anos do depósito do Museu, contudo será analisado tendo como base os dados da 1ª publicação referida. Como referido anteriormente, no conjunto da Ota não se identificaram materiais que indiquem o trabalho do metal, quer nos trabalhos mais antigos de Hipólito Cabaço quer nos trabalhos de prospecção, sendo eles os cadinhos, pingos de fundição, escórias ou fragmentos informes, realidade antagónica à Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 95). A invisibilidade deste tipo de materiais justifica-se quando tomamos em conta os critérios de recolha das intervenções de Hipólito Cabaço, a área intervencionada que pode não reflectir uma “área” de produção (Sousa, 2010, p. 350; Kunst, 1995) ou ainda a efectiva não presença dos mesmos na Ota, indicando a que não se produzia neste local. Um dos factores que nos leva a considerar a existência de mais artefactos metálicos é a constante presença de “marcas” de detectoristas, que continuam a “profanar” os contextos da Ota. Contudo só poderemos ter a certeza se a Ota é um mero local com “artefactos metálicos”, um sítio de “metalurgistas” ou um espaço de “mineradores” (Gonçalves, 1989, p. 156), com recurso a uma escavação arqueológica com pressupostos e técnicas modernas.

Os quatros machados que foram alvo de estudos tipológicos e morfológicos (tendo sido já ressaltada a questão do desaparecimento de uma das peças) foram enquadrados em duas categorias consoante a tipologias definidas por Luís Monteagudo (1977), estes representam, no nosso entender, duas fases de desenvolvimento destes artefactos. A primeira, onde se inscrevem 3 exemplares, corresponde a machados planos, dos tipos 3, 5 e 8 de Monteagudo, que foram integrados pelo seu desenvolvimento e dimensões, que variam entre 10 e 12 cm, mostrando uma certa unidade morfométrica (estampa 10 – anexos). O exemplar cujo paradeiro é desconhecido

104 representa uma diferença ligeira em relação ao restante grupo, uma espessura 1,5 cm que contrapõe com os 0,7 cm das outras peças, realidade também observável no peso, atingindo os 450gr, enquanto que os restantes não atingem as 200gr. O segundo grupo, que pode ser a imagem de um segundo estádio de desenvolvimento no que toca às morfologias e tipologias dos machados, é representado por uma única peça – esta é a menor peça do conjunto, tendo 6cm de comprimento, 0,6 cm de espessura e 60gr. Este corresponde a um machado que pode inserir-se no tipo “Bujões” (Senna-Martinez et al, 2013, p.599) ou tipo 14 argárico de Monteagudo (1977), podendo fazer avançar as cronologias desta peça para o Bronze Pleno (Senna-Martinez et al, 2013, p.595). Os paralelos para este tipo de peça, de dimensões relativamente reduzidas, encontram-se quando olhamos para a região NO da Serra do Montejunto mais precisamente para a Gruta da Columbeira, Reguengo Grande, na Lourinhã (Senna-Martinez et al, 2013, p.594) e, a SE na Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 96), relativamente perto da Ota. Não nos podemos esquecer que a Serra do Montejunto funciona como uma barreira cultural, sendo que este tipo de machados não é muito comum nos contextos a SE.

A nível da constituição mineralógica, as peças da Ota foram alvo de um estudo radiográfico realizado, em 1970, pelo Laboratório Mineralógico e Geológico da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que, embora obsoleto, nos deu algumas luzes sobre a constituição das peças – neste caso Cu (Cobre) com alguns vestígios de Zn (Zinco), uma realidade que não surge muito na bibliografia temática. As peças da Columbeira e Reguengo Grande apresentam uma constituição mineralógica compatível com o cobre arsenical (Senna-Martinez et al, 2013, p.595). Não nos é possível tecer mais considerações sobre as constituições das peças, em especial porque o estudo radiográfico de 1970 carece de confirmações e novos olhares que permitam, finalmente, afinar os enquadramentos cronológicos destas peças – podem então pender entre o Calcolítico e a Idade do Bronze.

A funcionalidade dos machados está intrinsecamente ligada com a sua cronologia, não alcançável para já na Ota, podendo passar por utensílios realmente funcionais com marcas de uso nos gumes ou, no caso dos machados planos, podendo servir como lingotes (Soares et al, 1994; Branco, 2007, p. 97). O carácter votivo também pode ser levantado pela raridade deste tipo de artefactos, que acabam por não ter grande expressão no registo arqueológico.

Já no que toca à ponta de seta, esta representou o verdadeiro desafio a nível de classificação morfológica e de cronologia. Com um total de 9,5 cm de comprimento, esta peça contém um pedúnculo com cerca de 6 cm, culminando num conjunto de pequenas aletas/ombros pouco marcados. Foram utilizados os critérios descritivos de José Kaiser (2003), que permitem relacionar e articular as diversas pontas de seta metálicas existentes na Península Ibérica, tendo como base três parâmetros descritivos – o tipo genérico das peças (Palmela, Foliáceas,

105

Triângulares…), a variedade das aletas/ombros (podendo estes ser desenvolvidos ou incipientes) e, por fim, a presença e o desenvolvimento do pedúnculo (largo, subtriangular, pequeno…). Em relação à peça específica da Ota, esta, como expresso anteriormente, é dotada de um pedúnculo comprido, associado a ombros pouco marcados, assumindo-se como uma ponta de seta de tipo “triangular” – este tipo morfológico apresenta uma dispersão espacial, na Idade do Bronze Inicial (Kaiser, 2003, p. 78), condizente com a actual área da Andaluzia espanhola, não tendo sido identificados vestígios deste tipo de materiais no actual território nacional - ou de tipo “foliáceo” – que, tal como as anteriores, não apresentam exemplares em Portugal. Desta forma, tendo em conta os dados apresentado por Kaiser, qualquer um dos tipos associados a esta peça, seria um exemplar demonstrativos de possíveis trocas e contactos com as áreas mais orientais da Península Ibérica, acentuando a ideia já tecida para o sítio da Ota, como recebendo objectos que implicam, necessariamente, mobilidade.

Por outro lado, este tipo de materiais apresenta algumas proximidades formais com outro tipo de pontas metálicas presentes em território português, nos finais do 3º milénio/inícios do 2º milénio a.n.e. (Mataloto, Martins e Soares, 2013, p. 327) – peças como os punções losânguicos “Alénes” de influências mediterrânicas (Gonçalves, 1988/1989, p. 53), bem representados em sítios próximos à Ota (Carreira, 1994), como Vila Nova de São Pedro, Alto das Bocas, ou as cavidades Casa da Moura, Abrigo Grande das Bocas, podem apoiar e, em certa medida, justificar a presença desta peça, bem como as suas divergência morfológicas, podendo resultar de um processo adaptativo local, com o desenvolvimento de um pedúnculo mais largo e comprido. Esta é, sem dúvida, a hipótese menos fundamentada, essencialmente pelas diferenças formais, contudo, é necessário sublinhar, e ter em conta, a presença bastante acentuada, na região, deste tipo de utensílio.

Uma das categorias morfológicas que surge é a associação entre este material e as pontas de tipo “jabalinas”, identificadas no Tholos de La Pastora (Almagro, 1962), La Pijotilla (Ortiz, et al. 2012), Outeiro de São Bernardo (Cardoso, et al. 2002). Este tipo de artefacto é composto por um pedúnculo de grandes dimensões, muito superior ao existente na peça proveniente da Ota, o que, por si só afasta estas peças. Outra das características é a presença de uma nervura central, ainda que incipiente, também não registada na peça em estudo.

A hipótese mais provável, ainda que pouco sustentada, é da associação da peça da Ota às peças de tipo Palmela que, se apresenta difundidas por toda a Península Ibérica. Estas peças, dotadas de um pedúnculo de médias dimensões, com uma tendência de crescimento desde o início do pedúnculo, até à sua terminação, com ombros ligeiramente marcados na peça, aparentam ser dotados das características encontradas na peça em questão – ainda assim são necessários estudos complementares, que permitam confirma se a peça da Ota é, ou não, referente a cobre ou bronze

106 arsenical, ainda que, de qualquer das formas, a sua cronologia e “normal” associação contextual, apontem para os períodos de transição do 3º/2º milénio a.n.e (Delibes de Castro e Fernández- Miranda, 1981, p. 157; Sousa, 1998, p.141), em muitas das vezes associado ao “pacote” Campaniforme, que começa a constituir-se também no sítio da Ota (cerâmica Campaniforme + Ponta Palmela). O exemplar de Ponta Palmela mais semelhantes, a nível formal, com a peça identificada para a Ota, é proveniente do Alto das Bocas (Caldas da Rainha).

Os dados ténues de que dispomos não nos permite clarificar várias das questões com que começámos este estudo. Não conseguimos entender se há transformação metalúrgica no sítio da Ota, não existindo nenhum tipo de evidência que aponte para tal realidade, exceptuando o trabalho do metal no sítio congénere da Pedra de Ouro (Branco, 2007, p. 96) e Vila Nova de São Pedro (Pereira, 2011, p. 36). A possibilidade da existência de redes de troca está patente na circulação de matérias-primas, mas nada nos indica se os artefactos circulariam já transformados. O problema da cronologia continua em aberto, havendo uma necessidade imediata de clarificar esta questão permitindo leituras mais globais e, essencialmente, integradas, do sítio como um todo com todas as suas componentes.

6. A OTA E O SEU ENTORNO: CONTRIBUTO PARA UMA LEITURA REGIONAL

Proceder a uma leitura geral e integrada é, sem dúvida, uma das componentes mais importantes no desenvolvimento de uma dissertação, sendo que só assim podemos compreender o sítio como um todo, bem como interliga-lo com as realidades regionais. Estas interligações estão sempre dependentes dos ritmos de investigação associados à área em estudo, neste caso a Estremadura portuguesa que, desde cedo, viu identificada a “Cultura de Vila Nova de São Pedro”, utilizada como base para estudos nacionais e internacionais, ainda nos dias de hoje. Esta noção de uma cultura estremenha é ainda hoje difundida, encontrando-se melhor fundamentada em muito pelos contextos identificados e intervencionados até ao momento, que suportam este conceito supraestrutural organizativo do pensamento mais materialista - o tipo de implantação dos locais, os artefactos associados e as mentalidades/ideais conjecturados para estes sítios arqueológicos suportam, de forma empírica, a existência de uma realidade cultura superior agrupadora. Ainda assim é necessário compreender que cada sítio arqueológico representa um conjunto de pessoas diferenciados, agentes e identidades distintas, bem como ritmos e vivências condicionadas pelo espaço que experienciam, tendo de se ter em conta que é necessário conhecer profundamente um sítio antes de proceder a leituras gerais e integradoras que vão, certamente, negligenciar as especificidades internas do local em estudo – esta foi a realidade seguida no

107 decorrer deste trabalho, estando agora, depois da análise completa das suas realidades territoriais, materiais e contextuais, mais aptos e prontos para posicionar o sítio da Ota numa corrente cultural e identitária regional, ou numa rede de contactos maior.

Uma das principais condicionantes na estruturação, e posterior identificação de territórios, é o próprio espaço em si, já que funcionaria enquanto realidade natural com pouco espaço para alteração antrópica. Outra das esferas onde o Meio vai actuar é a esfera social e mental, afectando assim o povoamento em todas as suas possíveis justificações – com os métodos e preceitos processualistas o destaque encontrava-se mais relacionado com as questões práticas e económicas do espaço, o tempo de obtenção de matérias, as horas de marcha associadas a cada tipologia de povoamento e as questões de visibilidade, contudo, com o surgimento e consolidação da corrente pós-processualista, mais especialmente nos modelos pós-antropocêntricos pensados por Gavin Lucas (2012), começam a surgir as questões mais sociais e culturais em relação ao espaço, recorrendo-se à Antropologia do Espaço, pensando mais como o Homem se entendia e se influenciava, a nível de pensamento e de materialização, pelo Ambiente.

O primeiro e principal conceito que surge, estruturando marcadamente a leitura que temos do sítio da Ota ou dos sítios congéneres, é a noção de sítio/povoado fortificado, assumindo-se que os sítios com estas características funcionam como sítios centrais de um território (teoria do lugar central), promovendo uma leitura directa da área envolvente aos espaços (Kunst, 1995) seguindo um modelo de observação linear (e redutor), esperando aceder-se, bem como determinar, qual a zona de influência e domínio da comunidade presente no recinto fortificado. A estes locais é ainda associada a prática da agricultura que, funcionando como riqueza (Gonçalves, 1989), vai gerar modelos territoriais mais rígidos, relacionados com o controlo das terras e gestão dos recursos produtivos (Sousa, 2010, p. 581).

Neste pacote conceitual é então inserido o sítio da Ota, que apresenta um conjunto de fragilidades que, essencialmente, se relacionam com o facto de este sítio não dispor de datações radiocarbónicas, ou de intervenções arqueológicas, que facilitariam, através da existência de um perfil estratigráfico e contextos, considerações de sucessões de ocupações, bem como ritmos e funcionalidades do espaço. Assim sendo torna-se difícil enquadrar temporalmente a estrutura defensiva existente na Ota, ainda que esta apresente paralelos com as técnicas construtivas das estruturas construídas no final do 4º/ inícios do 3º milénio, como o caso de Olelas (M. Gonçalves, 1997; Sousa, 2010), Moita da Ladra (Cardoso, 2010). A sua implantação, e desenvolvimento, bem como o tipo de materiais identificados inscrevem a Ota nesta linha dos povoados fortificados, com paralelos em sítios como Pedra de Ouro (Branco, 2007), Vila Nova de São Pedro (Paço e Jalhay, 1945), Leceia (Cardoso, 2006), Penedo do Lexim (Sousa, 2010), entre outros. Ainda assim, no que toca às questões de definição do posicionamento e funcionalidade do sítio, numa

108 teórica rede de povoamento especializado/hierárquico, não conseguimos estabelecer grandes considerações, podendo sim referir que, pela única linha de muralha identificada no terreno, a área do sítio da Ota, intramuros seria de 6653 m2, podendo ser considerado de pequenas dimensões (Sousa, 2010, p.585), quando comparado com sítios como o Zambujal (Kunst, 1987; 2005), Vila Nova de São Pedro (Paço e Jalhay, 1945) ou Leceia (Cardoso, 2006). Os sítios anteriormente referidos, apresentam uma complexidade arquitectónica muito grande, aliada a uma distribuição equilibrada no espaço estremenho (Sousa, 2010, p. 585) à construção de diversas linhas de muralha, podendo representar ritmos de ocupação e estruturação maiores enquanto “sítios centrais” de uma área de influência. Neste caso concreto, tanto Ota como Pedra de Ouro, o sítio congénere mais próximo, também ele de pequenas dimensões, se poderiam inserir dentro da esfera de influência do sítio de Vila Nova de São Pedro, partilhando, essencialmente, afinidades geográficas e culturais. Sublinhamos ainda que, tal como verificado para o Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p.585), não é possível identificar a área total ocupada, já que assumimos que os sítios têm, certamente, uma vida externa ao perímetro muralhado, como tal, e relembrando a existência de cinco estruturas circulares de tipo cabana na parte mais baixa do vale, bem como a existência de uma segunda linha de muralha identificada por Hipólito Cabaço, essa área é sempre fictícia e reflexo das realidades identificadas – se tivermos em conta o limite definido pelas estruturas e pela dispersão de materiais, é-nos possível chegar a um segundo valor, para lá da área do recinto muralhado, de 58131 m2, duplicando o recinto definido pela linha de muralha visível no terreno.

A visão hierárquica do espaço local tem vindo a ser questionada (Hurtado, 2003; Valera, 2006), sendo sim necessário compreender o sítio numa rede maior de interligações, totalmente dependente dos ritmos de investigação e publicação (Sousa, 2010, p.583), não se podendo olhar para o espaço exclusivamente de forma económica, sem ter em conta a realidade social - não definimos claramente redes de povoamento afectas a Ota, contudo reconhecemos que com um estudo mais aprofundado do espaço, tal realidade se pode tornar possível, como é teorizado para Porto Torrão e Porto das Carretas (Soares, 2013).

Associar locais arqueológicos entre si, em especial este tipo de sítios fortificados, parte, essencialmente, de bases arqueográficas e empíricas pouco sólidas, em muito justificadas pelos trabalhos antigos que muitos destes sítios sofreram, não tendo sido documentadas as suas sequências estratigráficas ou ritmos/fases de ocupação. A Ota sofreu do mesmo problema, ainda que aparente ter áreas que permaneceram por escavar, identificadas no âmbito dos trabalhos de prospecção, que possibilitarão, no futuro, conhecer a sequência estratigráfica do “Castro” – as cronologias para aqui desenhadas baseiam-se, assim, em meras correspondências tipológico- formais com sítios com cronologias fundamentadas. Tendencialmente estes sítios, tanto os considerados de grandes dimensões, como os mais reduzidos, apresentam ocupações que

109 remontam ao Neolítico final (Sousa, 2010, p. 586) - indicando que os ritmos de desenvolvimento dos sítios podem não ser de crescimento, mas sim de retrocesso, como claramente identificado para o sítio do Zambujal (Kunst, 1987; 2005) – tendo uma maior expressão, sempre inflaccionada pela maior visibilidade das últimas fases de ocupação, ou pelas fases cujos “fósseis-directores” são mais abundantes e reconhecíveis. O Neolítico final da Ota assenta, em termos gerais e de forma relativa, nas propostas cronológicas estabelecidas para Leceia

O Calcolítico Inicial, já identificado para sítios como Leceia, Vila Nova de São Pedro, Olelas, Pragança, Castelo e Penedo do Lexim (Sousa, 2010, p. 586), não foi identificado, claramente, para o sítio da Ota, pela ausência de copos canelados – esta realidade pode ser justificada com um efectivo abrandamento da ocupação entre 2870-2400 a.n.e. (Cardoso e Soares, 1996), ou com uma invisibilidade relacionada com a pressão da ocupação posterior na Ota. As restantes peças, como as taças caneladas, foram detectadas, não sendo a sua cronologia totalmente clara.

Não há dúvida que as fases mais visíveis e mais comuns neste tipo de sítios, são as referentes ao Calcolítico Pleno, onde as cerâmicas de tipo Folha de Acácia, extremamente abundantes neste tipo de contextos domésticos, servem enquanto elementos datantes, bem como elementos funcionais determinantes das actividades praticadas nos sítios onde surgem – entenda- se aqui actividades relacionadas com a produção e armazenamentos de alimentos, realidade que seria praticável nos terrenos próximos ao Castro – sem deixar de, nas fases finais, se sentir um abrandamento e transformação nas dinâmicas presentes (Sousa, 2010, p. 587), surgindo, em sítios como o Penedo do Lexim, Zambujal e Leceia, utilizações de cariz funerário, indiciando já o fim da correspondência mental entre estas estruturas e uma realidade exclusiva dos “vivos”.

Quanto ao surgimento da cerâmica Campaniforme neste tipo de contextos, esta parece ter uma distribuição irregular, a nível temporal e espacial, dependendo essencialmente das implantações no terreno, ainda que surja em praticamente todos os sítios fortificados estremenhos. A principal diferença encontra-se na expressão e na cronologia de introdução destas influências, já que existem locais onde os conjuntos Campaniformes são amplos e ricos a nível decorativo, como o caso do Zambujal e Vila Nova de São Pedro, podendo ser associados a introduções precoces, novamente no Zambujal e em Leceia (Sousa, 2010, p. 588; Kunst, 1987; Cardoso, 2004). Na Ota, ainda que os fragmentos sejam de reduzidas dimensões, podemos aceitar que existe uma revisitação neste período cronológico – entre o final do 3º milénio e o 1º quartel do 2º milénio a.n.e. – que, tendo em conta as realidades estruturais identificadas, mais propriamente a estrutura 3, se pode assumir como uma possível presença associada a um contexto funerário ou, como acontece noutros sítios, um período de colapso/abrandamento do sítio. Na área de Ota, definida por uma mesma base geológica, encontramos o sítio da Porta da

110

Conceição/Alenquer/Castelo que apresenta um conjunto de 29 fragmentos com decoração campaniforme (Gomes, 1978, p. 61), sem se conhecer o tipo de utilização do espaço ou se reconhecer a existência de uma muralha – esta realidade permite, de acordo com os dados disponíveis, enquadrar este sítio dentro das tendências que se registam noutras áreas regionais, como a Ribeira dos Cheleiros (Sousa, 2010, p. 588), onde se verifica o surgimento de sítios abertos com grandes concentrações de cerâmica Campaniforme.

Estas dinâmicas temporais não podem ser desassociadas das questões espaciais que permitiram entender o destaque de determinadas ocupações, em alturas que outros locais sofrem um abrandamento, contudo, para a área da Ota, a inexistência de datações e de contextos minimamente seguros dificulta este processo de leitura mais ampla. Estes ritmos diferenciados e mais, ou menos, complexos podiam ser justificados como sendo um reflexo de um processo de especialização, como pensado por Francisco Nocete (2001), mas quando observada a componente material compreendemos que as evidências primárias lidas através dos materiais nos mostram uma realidade relativamente homogénea, sem sinais de concentração dos sítios em torno de uma função concreta. A especialização compreende-se, de forma mais clara, quando analisamos a presença da cadeia de produção da metalurgia (não identificada na Ota) e da produção de artefactos em Pedra Lascada, esta última bem representada – não podemos deixar de referir que na área do Canhão Cársico de Ota foi identificada uma zona com nódulos de sílex abundantes, enquanto que para outros sítios esta realidade não se verifica, tendo sido possível encontrar toda a cadeia operatória referente ao trabalho do sílex, onde contam núcleos não exaustos, pré-formas de diversos materiais, bem como um conjunto bastante grande de resto de talhe, mostrando que os materiais seriam talhados e trabalhos no espaço do sítio arqueológico, contrariando a ideia de que, na Estremadura, a mobilidade passa por peças já transformadas, e não pelas matérias-primas em bruto (Sousa, 2010, p.590, Aubry, Llach e Matias, 2014). A presença total dos processos de debitagem no sítio da Ota surge como uma realidade diferenciada da identificada para os sítios semelhantes, que não apresentam este tipo de registo (Sousa, 2010, p. 590), sendo mais compatível com cronologias mais recuadas (Diniz, 2003; Carvalho, 2007). A nível de representatividade e de evolução da presença das peças líticas, esta realidade é-nos impossível de alcançar pela inexistência de contextos e de sequências, ainda assim é certo que os materiais como as pontas de seta (103), as lâminas (123) e lamelas (70) têm uma grande representatividade no conjunto, sendo curioso que único paralelo para o domínio das Lâminas face às Lamelas é no sítio do Zambujal (Uerpmann e Uerpmann, 2003, p.29).

Outra das realidades que aproxima alguns dos povoados fortificados identificados para a área da Estremadura portuguesa, é o tipo de arquitecturas existentes, quer nos sítios arqueológicos em si, como nas imediações. A questão já debatida para a presença de fossas/estruturas funerárias no interior dos sítios parece começar a constituir-se como uma realidade recorrente, podendo

111 demonstrar que estes sítios, claramente marcados na paisagem e na sua envolvência, permanecem na memória das comunidades, sendo integrados, ainda que com outro sentido e noutra esfera do mundo social, nas práticas e vivências das populações posteriores, funcionando como mecanismo de legitimidade espacial através da associação aos antepassados, ainda visíveis no espaço. Estes dados necessitam de maior fundamentação teórico-prática, já que os dados da Ota e da Pedra de Ouro são baseados em realidades já intervencionadas e descritas há algumas décadas.

As questões identitárias não são exclusivas das fases seguintes ao abrandamento da ocupação dos sítios arqueológicos, estando igualmente expressas em realidades decorativas e tecnológicas, essencialmente identificadas na cerâmica e nos líticos, sendo estes o reflexo de um enquadramento conceptual mais amplo, quase normativo, em muito influenciado pela transmissão social dos preceitos e técnicas de produção (Sackett, 1977), que suporta, ao mesmo tempo que reflecte, a visão e a interpretação do Agente. Assumimos, claramente, que as afinidades morfológicas, bem como a diversidade formal, podem ser o reflexo de uma resposta eficaz a necessidades semelhantes, a práticas e ritos diferentes, ainda assim é necessário compreender que os elementos estilísticos são, necessariamente, diferentes dentro dos próprios sítios, tendo em conta que a interacção social é a verdadeira influenciadora da partilha de semelhanças culturais e, por inerência, sociais (Sackett, 1977, p. 376).

Dentro desta realidade teórica podemos igualmente inserir as questões decorativas, que, na área em estudo, ganham um ênfase maior quando compreendemos a importância que a cerâmica decorada têm nos conjuntos – uma análise deste tipo é sempre difícil para o caso da Ota, ainda assim a expressão decorativa é muito maior quando tidos em conta os números do Sul do país (Silva e Soares, 1987, p. 75; Gonçalves, 1989; Sousa, 2010, p.601) encontrando paralelos no Norte de Portugal (Valera, 2007, p. 606; Jorge, 1986). Na Ota a existência de cinco grupos decorativos vêm sustentar as considerações feitas acima, sendo que o 78% do conjunto vem dar destaque à ocupação do Calcolítico Pleno, essencialmente representa pelos motivos Folha de Acácia. Estas aparecem numa grande diversidade de formas, não sendo exclusivas, como se verifica, por exemplo para as taças caneladas presentes na Ota, agrupando um conjunto de motivos dentro de uma única “família” decorativa, que partilha uma técnica decorativa comum (Sousa, 2010, p. 605). A quase exclusividade do motivo decorativo Folha de Acácia em contextos domésticos, permite um pensamento mais concreto sobre o seu possível significado e funcionalidade, ainda que seja sempre uma análise hipotética, permitindo uma rápida associação com as noções de armazenagem e produção agrícola, sendo associada a uma produção menos cuidada de uso “diário”, não conotada com possíveis elites (Sousa, 2010, p. 607). A nível regional o sítio da Ota é de difícil integração, em especial porque os números integrais dos conjuntos dos principais sítios no seu entorno não se encontram publicados ou disponíveis. Para outras áreas, foi identificada uma diversidade de motivos dominantes consoante o sítio que se analisava,

112 ilustrando diferentes tipos de recolhas ou, efectivamente, ritmos, preferências e correspondências identitárias maiores com determinados motivos decorativos – esta questão é detectada quando observamos o caso da Pedra de Ouro, onde a cerâmica Folha de Acácia, dominante em Ota, tem pouca expressão (38 fragmentos em 238), podendo desenhar-se dinâmicas diferenciadas para estes dois sítios arqueológicos, que partilham uma mesma base geológica, mas aparentam ter identidades dominantes diferentes.

Novamente, a questão das identidades levanta problemas a nível do estabelecimento de limites identitários regionais que, para a Estremadura, parecem refectir ritmos de investigação, estabelecendo-se áreas de influência e de partilhas à medida que se vão conhecendo melhor as realidades arqueológicas. Os graus de mobilidade destas sociedades reflectem um modelo organizativo urbano (Ver conceito de Rémy e Voyé, 1994), onde existe uma necessidade de se movimentar para suprimir uma necessidade, podendo ela ser de caracter económico, produtivo, social ou cultural, funcionando o espaço como uma realidade móvel influenciadora da esfera mental do Homem que, pelo grau de mobilidade, se vai relacionar e deparar com outras realidades que podem, de certa forma, ser absorvidas e replicadas – é neste sentido que se podem então explicar as especificidades quase locais, dentro de uma área, a Estremadura, com semelhanças culturais e sociais claras.

É também a mobilidade que justifica os modelos economicistas muitas vezes aplicados na aquisição, troca e “comércio” de determinadas matérias primas e objectos, ainda que a noção de comércio actual não possa ser transferida, directamente, para os contextos mais antigos. A existência de trocas, num sentido mais genérico e neutral, esta atestada pelo menos desde o Neolítico, onde se verifica um gosto especial pela pedra verde, extraída em várias minas na Península Ibérica (Edo et al, 1997; Sousa, 2010, p 613; Odriozola et al, 2013). Outra das matérias que implica também um grande grau de mobilidade é o anfibolito, podendo ser considerado uma matéria-prima relativamente rara (Sousa, 2010, p. 614), mas que contribuiria e seria, certamente, usada enquanto ferramenta diária – a esta realidade podemos adicionar, na Ota, a presença de materiais metálicos cuja base de transformação, os minérios, também não se encontrariam na zona estremenha, sendo estes utensílios reduzidos no conjunto.

O anfibolito tem um grande destaque no conjunto da Ota, sendo que os 31 fragmentos caracterizados como anfibolitos, representam um peso de 7904 gramas de peso total, enfatizando- se ainda que a existência de utensílios de morfologia semelhante foi igualmente detectada em matérias calcárias locais, podendo ser utilizada como recurso mais substituível, não sendo possível aceder a distribuições cronológicas, ou espaciais. Certo é que a maioria das peças da Ota apresentam sinais de uso, acentuando, claramente, a utilização destes objectos enquanto ferramentas. Alguns dos machados identificados na Ota, sem marcas de uso, aparecem associados

113 a contextos funerários, pela sua dimensão, peso e polimento cuidado – esta realidade vai dar fundamento à ideia da existência de uma estrutura funerária/enterramento na área da Ota. Certo é que a proveniência desta matéria seria externa à Estremadura, sendo genericamente associada a filões no Alentejo (Cardoso, 1999/2000, p. 267), não se devendo deixar de referir que poderia, igualmente, ser proveniente do Norte de Portugal, da área das Beiras (Cardoso, 1999), intensificando e criando uma imagem mais ampla das possíveis redes de troca inter-regionais. Não foram identificadas peças inacabadas, ou blocos de matéria-prima, dando-nos a imagem de que estes materiais chegariam já transformados ao sítio da Ota, podendo existir uma rede de relações a uma micro-escala, já que na Pedra de Ouro foram identificados materiais inacabados (Branco, 2007), bem como em Vila Nova de São Pedro (Paço e Jalhay, 1945, p. 199), acentuando a eficácia que estes materiais teriam, na realização das suas funções, sendo as matérias primas locais preteridas em relação a este material “exógeno”.

No que toca à metalurgia, esta é sempre difícil de trabalhar quando não se encontra associada a contextos estratigráficos bem definidos. Ainda assim, de forma geral, representam sempre conjuntos minoritários, realidade também observável para o sítio da Ota, ainda que, se os machados planos e a ponta confirmarem, após estudos arqueométricos, terem sido desenvolvidos com uma liga de cobre, este seja um dos conjuntos metálicos melhor conservados. As cincos peças metálicas cujas tipologias parecem apontar para as cronologias aqui em estudo, pesam um total de 1153 gramas, número que ultrapassa o peso para as 130 peças identificadas para Leceia (Muller e Cardoso, 2008), mostrando que as peças da Ota saem do paradigma observado para contextos semelhantes, tendo estes dados, certamente, implicações cronológicas, até ao momento, inacessíveis. Estas quantificações têm, necessariamente, de ser lidas em conjunto com as possíveis áreas de aprovisionamento – possivelmente a Faixa piritosa - que permitirão ter outra noção das influências culturais e sociais, sentidas nos sítios da Estremadura, bem como compreender o verdadeiro significado da metalurgia para estas comunidades, passando pela esfera do social e da partilha de técnicas, não estando necessariamente associados a especialização e a materiais de “excepção” (Cardoso e Guerra, 1997/1998, p. 76). Para a Ota é-nos possível verificar a existência de uma relação com o Sul do país, tendo em conta que as relações com a zona das Beiras não se encontram totalmente atestadas. Esta circulação e movimentação de gentes e bens reflecte o modelo territorial e social vivido por estas comunidades que, com os ritmos de investigação dos últimos tempos, se têm mostrado, e generalizado, como comunidades complexas, ainda que relativamente simples a nível da estruturação e posicionamento social, com necessidades identitárias, territoriais e individuais grandes, expressas numa ideia precoce de “Cultura Material” – na origem real do termo, de uma produção em massa justificada por uma intensa procura (Lucas, 2012) – inerente à sua grande mobilidade e urbanização (Rémy e Voyé, 1994).

114

A estratégia de subsistência destas comunidades estaria relacionada não só com as trocas e redes de contactos, como com uma produção agrícola, mais ou menos intensiva, associada à presença de animais de consumo domésticos, explorando os seus produtos secundários (Sherratt, 2006). Para o sítio em estudo, as evidências directas desta realidade não foram possíveis de identificar, já que não foram encontrados vestígios de sementes, sendo os elementos indirectos igualmente diminutos - os elementos de moagem são claramente minoritários, bem como as peças de sílex utilizados como elementos de foice, com vestígios de utilização em cereais. Assim sendo não nos é possível estabelecer paralelos com sítios como Vila Nova de São Pedro (Paço, 1952) onde parecem ter sido detectados silos de armazenagem, associados aos primeiros níveis de ocupação do sítio (Arnaud e Gonçalves, 1995, p.24), o que apoiaria a ideia da hierarquização social assente no controlo dos excedentes (Nocete, 2001) – estas diferenças só vêm acentuar a necessidade de um estudo completo e aprofundado dos sítios arqueológicos, em todas as suas vertentes, sendo que só assim as comparações e a identificação de casos/funções/especializações se podem aceder, trabalhando com dados minimamente equivalentes a nível de dimensão.

Em suma, a Ota apresenta-se como um sítio arqueológico que, na sua generalidade, se enquadra bem dentro da região onde se implanta, não tendo diferenças significativas a nível material, de área ou de implantação. Ainda assim apresenta especificidades próprias que parecem apontar para dinâmicas e ritmos sociais, de contactos e possivelmente produtivos, mais complexos do que os que lhe eram associados e reconhecidos até ao momento, sendo que as comunidades que ali habitariam seriam muito móveis, tendo ritmos de ocupação diferenciados ao longo do tempo – podendo inclusive ter sido palco de um processo de associação identitária, em fases posteriores, mostrando que o espaço era reconhecido pelos diversos Homens na sua envolvência. Não podemos deixar de sublinhar que a Ota se relaciona claramente com a região de Alenquer, quer seja com sítios como Pedra d’ Ouro (Paço, 1940; Leisner e Schubart, 1966; Branco, 2007), Alto do Pedregal (Paulo, 1940; Lucas, 1994; Branco, 2001), Castro do Amaral (Barbosa, 1955; Paço, 1966; Andrade, 1973; Branco, 2001), Porta da Conceição/Castelo (Gomes, 1978; Lucas, 1994; Branco, 2001) e com a Gruta dos Refugidos (Athayde, 1933; Spindler, 1981; Lucas, 1994; Branco, 2001) sem deixar de ser influenciado e determinado a nível espacial e cultural, pelas influências marcadas e ditadas pela Serra do Montejunto, cujo papel catalisador e estruturador de influências culturais se encontra já atestado (Basílio, 2016). Urge, para o caso da Ota e de outros sítios fortificados na região, compreender as suas sequências temporais e construtivas, sendo que muitas das questões pendentes e levantadas com o presente trabalho seriam prontamente respondidas com a combinação dos dados de uma área que, mesmo com uma diversidade local muito grande, partilha influências estruturantes e organizativas mais amplas.

115

7. APONTAMENTOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

A apresentação de conclusões depende, essencialmente, do acumular de experiências, vivências, visões e opiniões do autor, sendo que, ao longo do trabalho, também essa componente humana tem um forte papel influenciador. Ainda assim, é necessário um processo de resumo e apresentação das principais ideias explanadas no texto, facilitando o acesso às novas informações trazidas por este trabalho.

Uma das primeiras componentes a ser tida em conta é, essencialmente, a reflexão feita em torno do posicionamento teórico do autor, bem como a verdadeira motivação, e agenda, por detrás do desenvolvimento desta dissertação. As motivações da investigação que discorrem deste trabalho estão, intrinsecamente, ligadas ao “Eu”, enquanto Ser Humano, de onde emerge uma espécie de força interna que regula e sustenta todas as acções mais importantes. Contudo, é importante entender que a motivação é uma experiência interna que não pode ser estudada directamente. Ainda assim, no exercício apontado – Capítulo 3 (3.1), posicionamento teórico – foi possível apreender a resposta à pergunta: “Porque é que se fez?”, uma introspeção que ajuda a entender as influências da activação, força e direção dos comportamentos tidos, desde o momento inicial desta dissertação (orientação e plano de estudos), até a este momento conclusivo - uma etapa fundamental deste processo.

Neste conjunto de factores mentais incluem-se, necessariamente, o posicionamento contextual do autor, numa comunidade, a Ota, estreitamente relacionada com a paisagem onde se insere, e vinculada com a sua herança cultural. O objecto de estudo desta dissertação – as comunidades neolíticas e calcolíticas – também se constituem parte dos factores a ter em conta, na medida em que o começo do estudo e a compreensão da Ota podia, também, ter sido em sentido cronológico descendente, e não ascendente, na sua larga diacronia, tendo sido a escolha da temática e técnica de abordagem à Ota, nada arbitrária. No entanto, a avaliação desta escolha é inconclusiva, e o exercício do seu entendimento terá de ser reforçado com um aumento qualitativo no estudo, não sendo suficiente, uma resposta relacionada com o gosto ou desafio, mas sim uma resposta que tenha em conta um entendimento da relação entre este período cronológico e o autor.

Posto isto, o ponto de partida para a escolha, o plano e a orientação da dissertação, teve como ponto central a Ota, de onde se erguem as perguntas máximas e orientadoras – “O que é a Ota no 4º e 3º Milénio a.n.e.?”, “Quais seriam as realidades, práticas e vivências desta comunidade?” e “Como alcançar o “génio”, o pensamento, no fundo, a realidade destas comunidades, através da materialidade que chegou até aos dias de hoje?”. Esta dissertação afigura-se, assim, como, simbolicamente, a primeira pedra de um processo continuo em torno da Ota.

116

No seguimento destes objectivos, surge então a necessidade de nos inserirmos/criarmos um modelo teórico interpretativo, que nos permita pensar e compreender as sociedades do final do 4º milénio e do 3º milénio a.n.e., tendo em conta o principal objectivo expresso, a inserção e compreensão do sitio da Ota numa realidade maior. Este foi, sem dúvida, um verdadeiro desafio, em muito devido à situação “científica” da Estremadura Portuguesa, onde, apesar da diversidade e abundância de estudos e revisões, a falta de visões gerais e abordagens contemporâneas dificulta, em muito, o exercício de sistematização regional. A polaridade e centralização de estudos mais recentes – Leceia, Zambujal e Penedo do Lexim - dificulta igualmente a tarefa, secundarizando-se sítios de menores dimensões, não se abrangendo nem reconhecendo especificidades locais, o que não permite a compreensão efectiva do espaço, enquanto uma realidade una e indissociável. Reconhecemos que estudos monográficos dos sítios levam o seu tempo, em especial na maturação das ideias e das interpretações, ainda assim seria útil a existência destas monografias, tendo em conta que, em muitos destes sítios arqueológicos, a história das suas investigações pode remontar ao século XIX ou XX – como o caso do sítio da Ota.

Ainda que o âmbito deste trabalho não permita uma grande extensão a nível de páginas é importante sublinhar que o sítio da Ota permitiu ler um conjunto de realidades outrora desconhecidas para este sítio, que permitiram chegar perto do Homem (leia-se aqui comunidade) do tempo aqui em estudo.

A nível arquitectónico e espacial, ainda que não tenham sido realizados trabalhos de escavação, foi possível identificar um conjunto de realidades que, independentemente do âmbito temporal, se apresentam como complexas, a nível de desenvolvimento e posicionamento no espaço. A implantação do sítio da Ota, numa elevação com destaque natural, mas, em simultâneo, uma extrema protecção fornecida pela formação geológica do Canhão Cársico, atribui-lhe um conjunto de características semelhantes a outros locais, ainda que o diferencie, em simultâneo, gerando, necessariamente, particularidades. A presença de uma estrutura de tipo muralha, à qual podemos associar uma possível torre é também uma das realidades que agrupa o sítio da Ota a sítio congéneres – Zambujal, Leceia, Vila Nova de São Pedro, Penedo do Lexim, Pedra de Ouro - nos quais estruturas semelhantes assumem o papel de defensivas, tendo em conta a sua localização e implantação. Ainda assim parece-nos arriscado assumir, claramente, um papel exclusivamente residencial para a Ota, pela inexistência de contextos, claramente, habitacionais, dentro do recinto amuralhado, não podendo ser excluídas outras realidades funcionais – a falta de informações cronológicas vai originar bases frágeis a nível empírico para estas conclusões, contudo é necessário não assumir nenhuma realidade de forma taxativa, sendo que informamos e frisamos estas fragilidades. Se adicionarmos algumas das informações materiais analisadas, a ideia de uma ocupação habitacional parece mais sustentada, ainda que tenham sido identificados ritmos e tendências específicas – indicando a presença de contactos com outras regionais

117 nacionais, mas evidenciando uma certa independência a nível de matérias primas. Uma das principais realidades que nos leva a ter um discurso mais cuidadoso prende-se com a existência de espólio tipicamente funerário, como o caso do zoomórfico, em âmbito de “povoado”, bem como a presença de uma estrutura negativa, não adoçada à muralha, implantando-se no interior do recinto murado, sugerindo a sua utilização enquanto possível estrutura funerária – novamente as questões cronológicas não permitem compreender se esta realidade representa uma reconversão do significado social do sítio e uma “refuncionalização” do espaço posterior, ou se os ritmos e praticas seriam diferenciadas na Ota, em especial no decorrer do 3º milénio a.n.e.

A existência de especificidades locais/regionais é uma questão já atestada quando aumentamos a nossa escala de análise, opondo a região da Estremadura Portuguesa e o Sul Peninsular – enquanto que o povoamento da Estremadura não permite discernir redes de relações regionais, polos centrais catalisadores e sítios mais reduzidos especializados, no Sul da Península Ibérica estas realidades e a complexidade inerente encontra-se matizada e reconhecida de forma transversal, com a presença de grandes sítios de fossos funcionando enquanto agregadores. A presença de fossos na Estremadura, até há pouco desconhecida, aponta para uma complexidade arquitectónica maior na Estremadura, tendo sido já identificado um possível troço em Leceia, no sítio da Travessa das Dores, em Santa Sofia (Pimenta et al, 2013, p.182) e em Gonçalvinhos (Sousa, 2010) e, ainda que não se encontre totalmente confirmado, Vila Nova de São Pedro, o que vem chamar a atenção para a métodos de intervenção mais finos – para a Ota não foi, até ao momento, identificado nenhum troço de fosso, o que pode reflectir um desconhecimento deste tipo de realidades arquitectónicas ou de uma realidade arquitectónica pouco viável face ao substracto geológico .

Ainda que exista a possibilidade de um povoamento organizado em rede, a nível material, onde incluímos também elementos menos representados ou de “excepção”, parece existir uma certa homogeneidade, com pequenas variações internas, que permitem enquadrar e comparar todos os sítios semelhantes, indicando que as diferenças existentes não são muito expressivas, tendo de ser procuradas noutros âmbitos.

A questão crono-estratigráfica é, como já mencionado, um dos principais problemas da Ota e, essencialmente, de muitos dos sítios estremenhos, impossibilitando comparações e confrontações, sendo um dos principais pontos a ser trabalhado em investigações futuras – ainda que existam 87 datas disponíveis para sítios fortificados estremenhos (Sousa, 2010, p. 661) estas apresentam-se claramente insuficientes para compreender as dinâmicas e ritmos internos dos sítios, e da região. Para o caso da Ota, as cronologias avançadas baseiam-se numa abordagem materialista sustentada por comparações e correspondências, sendo minimamente fundamentadas.

118

A existência de dados cronológicos e de faseamento irão, essencialmente, responder a questões específicas do sítio em estudo, do mesmo modo que contribuiriam para entender o “fenómeno” dos sítios fortificados na Estremadura – a presença de uma ocupação posterior, o âmbito temporal em que foram construídas as muralhas, relacionando a cronologia com as possíveis necessidades existentes, do mesmo modo que permitiriam entender a dinâmicas finais dos sítios, e o processo de desapego das comunidades com o espaço.

A presença de uma fase do Neolítico final (finais do 4ºmilénio a.n.e.) encontra-se explanada na identificação de três pontas de seta de base triangular, dois fragmentos de bordos denteados, bem como da presença do zoomórfico já referenciado anteriormente, que, mesmo sendo reduzidos e pouco expressivos, parecem apontar uma presença enquadrável no Neolítico final/Calcolítico inicial, ficando por esclarecer o tipo de ocupação e a intensidade da presença – estas ocupações estão pouco visíveis, à superfície, podendo representar uma inexistência ou, ainda, uma invisibilidade perante a ampla visibilidade e expressividade Calcolítica e Romana. Asseguradas encontram-se as ocupações do Calcolítico pleno e final, mesmo que o seu cariz e duração não se encontre totalmente compreendido. Esta reduzida expressão, e clareza, de uma ocupação Neolítica na Ota foi já identificada para outros locais, entre os quais o Penedo do Lexim que, mesmo com intensas escavações e estudos, ainda não possibilitou a clarificação quanto às suas cronologias mais recuadas.

O surgimento e presença das estruturas defensivas assume-se, de forma genérica, para sítios como Penha Verde, Rotura, Leceia, Penedo do Lexim, Pragança, entre outros, por volta de 2890-2800 a.n.e. (Sousa, 2010, p. 662), sendo de destacar que no sítio de Pragança aparenta igualmente existir uma ocupação prévia, necessitando, este sítio arqueológico, de clarificação sobre a sua tipologia de ocupação. No caso específico da Ota a estrutura apresenta uma similitude construtiva com as existentes nos sítios supracitadas, referindo-se que, com a identificação de estruturas circulares, de tipo cabana, em áreas externas ao perímetro muralhado, a correspondência cronológica se apresente mais difícil – voltamos a sublinhar que, segundo os trabalhos de Hipólito Cabaço, se pode aceitar a existência de uma segunda linha de muralha, não identificada nos trabalhos de prospecção, que pode conter estas estruturas.

A existência de uma fase de abrandamento da ocupação, possivelmente associada à presença de cerâmicas Campaniformes e metais é também difícil de identificar, em especial pela invisibilidade de uma presença do Bronze inicial, que se encontraria expresso em fragmentos lisos, bastante reduzidos no conjunto em estudo – a presença de reduzidos fragmentos Campaniformes indica um desigual acesso a estas cerâmicas/preceitos, contraposto pela ampla presença de machados de Cobre/Cobre Arsenical, o que, caso as cronologias destes materiais sejam confirmadas, podia indicar uma acesso privilegiado e diferenciado da Ota a matérias

119 primas/materiais já transformados. Estes locais poderiam ter vários impactos nas comunidades posteriores, podendo reocupa-los, ou manter a sua ocupação, como sítios de habitação, revisita- los num óptica de legitimação da ocupação da paisagem ou, ainda, como sítio funerário, nunca com uma expressão intensiva, mas como sítios de aproximação, contacto e apropriação dos antepassados. Para a Ota, com os dados existentes, é-nos difícil avançar com uma hipótese taxativa, sendo necessários estudos mais profundos sobre as realidades “seguintes” a nível cronológico.

Sem dúvida que a componente material da Ota foi a principal fonte de informações, em especial permitindo conhecer marcas, gestos, tendências e identidades por trás do conjunto artefactual que, em alguns casos, permitiu a inserção em quadros identitários mais amplos. A leitura geral do conjunto, como uma realidade única, permite aceder a pormenores, em relação ao sítio, únicos, inacessíveis com análises exclusivas das componentes materiais isoladas. Foram amplamente utilizados os “Fósseis-directores” como indicadores de cronologia e de contactos, necessariamente directos, originando uma uniformidade estilística muito acentuada, essencialmente no Calcolítico Pleno, um dos melhores representados no sítio da Ota.

A cerâmica decorada é ainda hoje tratada como indicador cronológico, mesmo que se assuma a permeabilidade de camadas e a coexistência de vários estilos e técnicas como, por exemplo, se regista no Zambujal. Como não conseguimos aceder a informações contextuais seguimos igualmente estes pressupostos, ainda que as leituras realizadas sejam totalmente influenciadas por um domínio e presença esmagadora de cerâmica decorada – estas realidades foram aqui tratadas mais na óptica explicativa, tentando-se encontrar explicações e significados para estes motivos, estando estes, certamente, relacionados com componentes do mundo real importantes e expressivos para as comunidades em estudo, assumindo-se uma forte representatividade, ainda que esquemática, de motivos relacionados com práticas agrícolas. Salientamos também que os motivos e formas estremenhos aparentam e resultam, necessariamente, de um processo cumulativo, em muito fomentados por contactos, não existindo quebras de população ou pensamento, sendo sim verificada uma absorção de outras influências em realidades diárias – não conseguimos compreender totalmente a evolução cronológica dos motivos e subgrupos da cerâmica com decoração Folha de Acácia, contudo esse não foi o objectivo com que começamos o nosso trabalho, chegando a ser redutor pensar estas realidades sem ter em conta o Homem e as realidades humanas, a sua variabilidade e vontade totalmente expressas na produção e decoração cerâmica.

A cerâmica Campaniforme, muito reduzida na Ota, representa igualmente uma realidade tendencialmente analisada através do seu “pacote”, sem se tentar compreender e atestar o papel social nos grupos humanos, bem como a sua variabilidade totalmente regional/local, sugerindo

120 uma fragmentação de uma relativa unidade anterior, existindo agora diferentes correspondências socias/culturais. O Campaniforme identificado na Ota não permite conclusões relativamente a estas questões, tendo a sua análise passado pela inserção numa rede maior, na qual a Ota se pode inserir – a presença de Campaniforme na área é bastante numerosa, quer seja na Serra do Montejunto, bastante próximo do sitio da Ota, bem como em sítios como Pedra de Ouro e Porta da Conceição, a aproximadamente 11km da Ota, onde este motivo decorativo e formal está bastante bem representado.

Compreender um sítio arqueológico de forma isolada é um exercício necessário para compreender as dinâmicas internas do seu contexto, contudo é necessário compreende-lo num espaço mais alargado, tendo em conta que as comunidades apresentavam grandes graus de mobilidade e contactos, expressos nas afinidades construtivas, tipológicas, decorativas e organizativas. A Ota foi lida, essencialmente, tendo em conta as áreas estabelecidas pela bacia hidrográfica, os únicos afluentes do Tejo no Concelho de Alenquer, do Rio de Ota, Grande da Pipa e Alenquer, sendo esta uma região relativamente homogénea a nível geográfico, geológico e Humano – os dados existentes permitem compreender que a Ota partilha algumas características com os sítios presentes na região, ainda que estes se encontrem relativamente desconhecidos, com poucas referências publicadas, à excepção do sítio da Pedra de Ouro, onde foi também possível identificar uma estrutura negativa de dimensões semelhantes à existente na Ota, para lá das semelhanças a nível material e de implantação espacial. Quando comparada com a região podemos identificar uma realidade que se encontra mais destacada na Ota, a presença de grandes quantidades de peças em metal, podendo ainda referir-se que foi identificada toda a cadeira operatória do trabalho do sílex – estas presenças podem indiciar uma possível especialização do sítio da Ota, ainda que esta hipótese não nos pareça corresponder às reais dinâmicas do sítio, sendo sim um resultado de disponibilidades locais, no caso do sílex.

O estudo desta área geográfica é então uma ferramenta que permite compreender a expressão cronológica a nível espacial, tendo mais visibilidade os sítios Calcolítico em altura, existindo, genericamente, uma invisibilidade de manifestações Neolíticas na zona, o que pode indicar uma continuidade de ocupação entre o Neolítico/Calcolítico, bem como uma necessidade de investigação latente. Ainda assim, com poucos dados empíricos sustentáveis, parece-nos mais cuidadoso indicar uma possível continuidade, ainda que os indícios sejam relativamente fracos, do que assumir directamente processos de ruptura, mais difíceis de assimilar e expressar a nível cultural e social, que necessitariam de agentes externos (como “colonos”). Esta invisibilidade e concentração dos/nos sítios em altura parece indicar uma construção e organização social de maiores dimensões, reflectindo um possível aumento populacional calcolítico ou, no nosso entender, o resultado de um processo adaptativo voluntário, mais útil e funcional, para todos os indivíduos da comunidade – o sítio da Ota, dentro do recinto muralhado, apresenta um total de

121

6653m2 de área, enquanto que, se tivermos em conta a área das estruturas, a sua área duplica, podendo conter e agregar o dobro dos indivíduos, apresentando uma grande capacidade polarizadora.

As dinâmicas sociais calcolíticas, na Estremadura Portuguesa, começam assim a apresentar-se mais complexas do que pensado até ao momento, em diferente escala do que o que existiria no Sul peninsular, sendo um reflexo de uma menor desarticulação e afastamento dos grupos humanos que, para se manterem relativamente “unidos” com características semelhantes, necessitariam claramente de processos de gestão semelhantes aos realizados a Sul, onde não existiria marcadamente um poder pré-definido hereditário, mas possivelmente um poder/hierarquia temporária e dissolúvel, inerente e necessária a uma organização grupal humana.

Estas diferenças sociais são igualmente expressas nos dados materiais e culturais que, na própria Estremadura, deixam extravasar influências regionais relacionadas com o posicionamento no terreno, dos sítios – uma maior proximidade com o Tejo e as suas influências a Sul/Sudeste do Montejunto, contrapondo as influências e tendências oceânicas a Norte/Noroeste que, numa leitura mais ampla se esbatem, enfatizando a oposição entre a realidade estremenha, o Norte e Sul do país. É certo que a existência de vincados contrastes sociais/culturais, em associação à produção agrícola e à presença e estabelecimento de rotas de trocas e de contactos gera, possivelmente, tensões intergrupais que se encontram expressas, para muitos autores, na existência de uma fortificação, de material “bélico” (ponta de seta e metais) – certo é que, até ao momento, as evidências não são totalmente sólidas sendo necessário criar visões alternativas para estes recintos murados que podem reflectir a separação de espaços, criando a noção intramuros e extramuros, bem como servir como delimitadores e condicionadores da maneira como o Homem circula e, por consequência vê a paisagem, sendo que não excluímos a sua funcionalidade enquanto muralha, tentando somente dar novas visões e hipóteses para este fenómeno.

O futuro para o sítio da Ota passa, essencialmente, pelo planeamento e realização de um conjunto de intervenções estratégicas, que tenham como objectivo clarificar um conjunto de questões levantadas com o presente trabalho. Em primeira instância será necessário compreender as dinâmicas, cronologias e ritmos do conjunto de estruturas identificadas no âmbito dos trabalhos de prospecção: a estrutura 3 terá de ser alvo de um intenso processo de limpeza, tendo em vista compreender o tipo de arquitectura e técnica construtiva, bem como tentar identificar possíveis vestígios materiais ainda in situ, que nos permitiriam conhecer o tipo de utilização e cronologia desta estrutura. Nesta mesma linha poderíamos inserir uma possível intervenção numa das estruturas circulares, possivelmente a nº 5 (?) que, pela sua dimensão e pela presença de cerâmica de construção, apresenta mais potencial – também nesta estrutura o objectivo se prenderia com a identificação da sua funcionalidade e cronologia, permitindo compreender não só a estrutura em

122 questão, como possivelmente responder à funcionalidade das restantes estruturas. A clarificação da cronologia de construção da estrutura de tipo muralha, através de uma sondagem, em zona afectada por uma abertura de um “guarda-fogo”, de dimensão reduzida, tendo como objectivo a obtenção de um perfil estratigráfico e construtivo desta estrutura, que permitira agrupar, ou separar, a Ota do grupo dos sítios fortificados Calcolíticos – a par desta intervenção seria realizado um levantamento fotogramétrico da estrutura, permitindo um posicionamento territorial exacto e preciso. A par destas intervenções será necessário proceder a uma limpeza geral do topo da elevação onde se implanta o sítio da Ota, tendo em vista a facilitação de leituras de possíveis estruturas e solos antrópicos, invisíveis com a densidade do coberto vegetal. Esta última intervenção permitiria também entender, através de uma sondagem, a crono-estratigrafia da Ota, no local, aparentemente, com a maior dinâmica humana, além de que, segundo a publicação de 1956 de Ernani Barbosa, o local fotografado presente na publicação, seria o local das únicas sondagens de Hipólito Cabaço. Contudo, como podemos aferir com alguma certeza, a estrutura 3 também deverá ter sido alvo de uma incursão intensa.

A divulgação e participação da comunidade fará sempre parte de todos os projectos pensados para Ota, encontrando-se já submetida, ao Orçamento participativo de Alenquer, uma outra ideia de valorização e divulgação do Património arqueológico e arquitectónico, com uma fonte de financiamento alternativa, mas que, em simultâneo, espelha o empenhamento e interesse da população na valorização e divulgação do seu património. Uma proposta que segue os modelos de community archaeology, de Yvonne Marshall (2002), distinguindo-se, no âmbito da disciplina, enquanto um conjunto de práticas, pela gestão partilhada do poder decisório, e dos processos dos projectos arqueológicos, com a sociedade civil. A realização de conferências, palestras e actividades que envolvam a população, numa óptica de Arqueologia Participada, a par de um processo de divulgação científica, tendo em vista uma possível publicação monográfica do sítio da Ota.

A Ota deverá ser, nos próximos anos, insistimos nós, o local ideal do florescimento de uma realidade em que o “conhecimento” deverá assumir uma forma, e uma postura, mais activa no quotidiano desta comunidade, devendo ambos formar parte de uma espécie de organismo vivo, cuja produção deverá, necessariamente, orientar-se para o colectivo. Este deverá ser o desígnio social relevante da Arqueologia na Ota.

Em suma, a Ota apresentou-se mais complexa do que inicialmente esperado, permitindo ler um conjunto de informações sociais, culturais e de implantação que nos permitem enquadrá- la e associa-la aos restantes sítios fortificados, sem perder uma identidade própria, cultivada pelas populações que por ali passaram/habitavam, nos finais do 4º milénio/ inicio do 3º milénio a.n.e. Ainda assim deixamos, como nota final, a necessidade de estudos e revisões de colecções e sítios

123 com pressupostos teórico-metodológicos contemporâneos, tendo em vista uma valorização do agente social, em paralelo com uma análise da componente material e espacial.

124

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMAGRO BASCH, M. (1962) - El ajuar del ‘Dolmen de la Pastora’ de Valentina del Alcor [sic] (Sevilla): Sus paralelos y su cronología. Trabajos de Prehistoria 5. p. 1-35.

ANDRADE, G. (1963) - Castro do Amaral. Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa. Série 81. 7-9 e 10-12 Julho - Set. e Out.- Dez. Lisboa: SGL. p. 236.

ANDRADE, G. (1973) - Estações arqueológicas do Amaral ou das Curvaceiras (Alenquer) – II.

ANDRADE, M. A. (2014) – Sobre os Conjuntos de Artefactos de Pedra Polida das Áreas de Benavila e Ervedal (Avis, Portugal). Al-Madan Online. IIª Série. 19. p. 92-104

ARNAUD, J. M. (2013) -Reflexões em torno das placas de cerâmica com gravuras de Vila Nova de S.Pedro (Azambuja). In ARNAUD, J.M.; MARTINS, A.; NEVES, C. - Arqueologia em Portugal. 150 Anos. Lisboa: Associação dos Arqueólogos Portugueses. p. 447-455

ARNAUD, J. M. ; MARQUES GONÇALVES, J. L. (1990) – A fortificação pré-histórica de Vila Nova de S. Pedro (Azambuja) : balanço de meio século de investigações : 1ª parte. Revista de Arqueologia da Assembleia Distrital de Lisboa. Lisboa. 1. p. 25-48.

ATHAYDE, A. (1933) – Ossadas Pré-históricas da gruta dos Refugidos. Homenagem a Martins Sarmento. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento. p. 31-36.

AUBRY, T.; LLACH, J. M.; MATIAS, H. (2014) - Matérias-primas das ferramentas em pedra lascada da Pré-história do Centro e Nordeste de Portugal. In DINIS, P.A.; GOMES, A.; S. MONTEIRO-RODRIGUES S. eds. - Proveniências de Materiais Geológicos. Associação Portuguesa para o Estudo do Quaternário. p. 165-192.

BARBOSA, E. (1956) - O castro de Ota (Alenquer). O Arqueólogo Português. Lisboa. 2.ª série, 3. p. 117-124.

BASÍLIO, A. C. (2015) – A cerâmica Campaniforme e Pontilhada na serra do Montejunto. Dissertação de Licenciatura em Arqueologia apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. 66 p.

BICHO, N. (2011) – Manual de Arqueologia Pré-histórica. Lisboa: Edições 70. 552 p.

BLANCE, B. (1957) – Sobre o uso de torreões nas muralhas de recintos fortificados do 3.º milénio a. C. Revista Guimarães. 67. p. 169-177.

BOAVENTURA, R. (2001) – O Sítio Calcolítico do Pombal: Uma Possível Recuperação de Velhos e Novos Dados. Lisboa: IPA.

125 BOAVENTURA, R. (2009) – As antas e o Megalitismo da região de Lisboa. Lisboa : [s.n.], 2009. Tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Letras de Lisboa. 2 vol. Policopiado.

BORDES, F. (1969) – Reflections on Typology and Techniques in the Palaeolithic. Artic Anthropology, 6. p. 1-29.

BRANCO, M. G. A. (2001) – PNTA/2001 – O Povoamento do Calcolítico ao Bronze Pleno na actual Bacia Hidrográfica do Rio Alenquer. Lisboa: IPA.

BRANCO, M.G. (2007) - A Pedra de Ouro (Alenquer): uma leitura actual da colecção Hipólito Cabaço. Lisboa. Instituto Português de Arqueologia. (Trabalhos de Arqueologia, 49).

BREUIL, H.; ZBYSZEWSKI, G. (1945) - Contribution à l'étude des industries paléolithiques du Portugal et de leurs rapports avec la Géologie du Quaternaire. Les principaux gisements des plages quaternaires du littoral d 'Estremadura et des terrasses fluviales de la vallée du Tage. Lisboa: Comunicações dos Serviços Geológicos de Portugal. 26. 662 p.

BUGALHÃO, J.; GOMES, A. S.; SOUSA, M. J. (2007) – Consumo e utilização de recipientes cerâmicos no arrabalde ocidental da Lisboa islâmica (Núcleo Arqueológico da Rua dos Correeiros e Mandarim Chinês). Revista Portuguesa de Arqueologia. Lisboa. 10. 1. p. 317-343.

CARDOSO, J. L. (1981) – O povoado pré-histórico de Leceia : estudo da colecção do Escultor Álvaro de Brée : 2ª parte. Revista de Guimarães. Guimarães. 91. p. 190-235.

CARDOSO, J. L. (1989) – Leceia: resultados das escavações realizadas : 1983-1988. Oeiras: Câmara Municipal.

CARDOSO, J. L. (1999-2000) – Os artefactos de pedra polida no povoado pré-histórico de Leceia (Oeiras). Estudos Arqueológicos de Oeiras. 8. p. 214-323.

CARDOSO, J. L. (1999-2000) – As Investigações de Carlos Ribeiro e de Nery Delgado sobre o «Homem do Terciário»: resultados e consequências na época e para além dela. Estudos Arqueológicos de Oeiras. 8. p. 33-54.

CARDOSO, J. L. (2001-2002) – Os esferóides de calcário do povoado pré-histórico de Leceia (Oeiras) e suas possíveis finalidades. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 10. p. 77-88.

CARDOSO, J. L. (2003) – A utensilagem óssea de uso comum do povoado pré-histórico de Leceia (Oeiras). Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 11. p. 25-84.

CARDOSO, J. L. (2004) – A Baixa Estremadura dos finais do IV milénio A.C. até à chegada dos romanos: um ensaio de História regional. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras: Câmara Municipal. 12.

126 CARDOSO, J. L. (2006) – As cerâmicas decoradas pré-campaniformes do povoado pré-histórico de Leceia : suas características e distribuição estratigráfica. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 14. p. 9-276.

CARDOSO, J. L. (2010a) – Moita da Ladra (Vila Franca de Xira): Resultados preliminares da escavação integral de um povoado calcolítico muralhado. In GONÇALVES, V.; SOUSA, A. C., eds. – Transformação e Mudança no Centro e Sul de Portugal: o quarto e o terceiro milénios a.n.e. Cascais: Câmara Municipal de Cascais, p. 97 -129.

CARDOSO, J. L. (2010b) – O povoado calcolítico fortificado do Outeiro Redondo (Sesimbra): Resultados das escavações efectuadas em 2005. In GONÇALVES, V.; SOUSA, A. C., eds. – Transformação e Mudança no Centro e Sul de Portugal: o quarto e o terceiro milénios a.n.e. Cascais: Câmara Municipal de Cascais, p. 97 -129.

CARDOSO, J. L. (2010/2011) – O povoado calcolítico da Penha Verde (Sintra). Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 8. 579-590 p.

CARDOSO, J. L. ; CARREIRA, J. L. (2003) – O povoado calcolítico do Outeiro de São Mamede (Bombarral) : estudo do espólio das escavações de Bernardo de Sá (1903-1905). Estudos arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 11. p. 97-228.

CARDOSO, J. L. ; GUERRA, M. F. (1997-98) – Análises químicas não destrutivas do espólio metálico do povoado pré-histórico de Leceia, Oeiras e o seu significado no quadro da intensificação económica calcolítica da Estremadura. Oeiras: Estudos Arqueológicos de Oeiras. 7. p.61-89.

CARDOSO, J. L. ; SOARES, J ; SILVA, C. T. (1996) – A ocupação neolítica de Leceia (Oeiras): materiais recolhidos em 1987 e 1988. Oeiras: Estudos Arqueológicos de Oeiras. 6. p. 47-91.

CARDOSO, J. L. ; SOARES, J. ; SILVA, C. T. (1983-84) – O povoado calcolítico de Leceia (Oeiras) : 1ª e 2ª campanhas de escavação (1983-84). Clio Arqueologia. Lisboa. 1. p. 41-68.

CARDOSO, J. L.; CARVALHO, A. F.; GIBAJA, J. F. (2013) – O sítio do Neolítico Antigo de Cortiçóis – Almeirim, Santarém. Revista Portuguesa de Arqueologia. Lisboa. 16. p. 27-61.

CARDOSO, J. L.; MONGE SOARES, A. M.; ARAÚJO, M. de F. (2002) - O espólio metálico do Outeiro de S. Bernardo (Moura): uma reapreciaciâo à luz de velhos documentos e de outros achados. O Arqueólogo Português. 4. 20. p. 77-114.

CARDOSO, J.L. (2013) - A necrópole campaniforme da gruta da Ponte da Lage (Oeiras): estudo dos espólios cerâmicos e metálicos e respectiva cronologia absoluta. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 20. p. 589-604.

127 CARDOSO, J.L. (2014a) - Absolute chronology of the Beaker phenomenon north of the Tagus estuary: demographic and social implications. Trabajos de Prehistoria. Madrid. 71. p. 57-76

CARDOSO, J.L. (2014b) – Manifestazioni del vaso campaniforme nel território portoghese. In MARINIS, R.C. de ed. – Le Manifestazioni del sacro e L’età Del Rame Nella Regione Alpina e Nella Planura Padana (Palazzo Broletto, Maggio 2014). p. 279-319

CARDOSO, J.L.; CARVALHO, A.F. (2010/2011) – A gruta da Furninha (Peniche): Estudo dos espólios das necrópoles Neolíticas. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras: Câmara Municipal de Oeiras. 18. p.333-392.

CARDOSO, J.L.; MARTINS, F. (2009) – O Povoado Pré-histórico do Outeiro da Assenta (Óbidos). Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras: Câmara Municipal de Oeiras. 17. p. 261-356.

CARREIRA, J. R. (1994) – A Pré-História recente do Abrigo Grande das Bocas (Rio Maior). Trabalhos de Arqueologia da EAM. Lisboa. 2. p. 47-144.

CARREIRA, J. R. (1996) – A ocupação da Pré-história recente do Alto de Chibanes (Palmela), Setúbal. Trabalhos de arqueologia da E.A.M. Lisboa. 3-4. p. 123-213

CARVALHO, A. F. (1998) – O talhe da pedra no Neolítico antigo do Maciço Calcário das serras d’Aire e Candeeiros (Estremadura portuguesa): um primeiro modelo tecnológico e tipológico. Lisboa: Edições Colibri (Textos Monográficos, 2).

CARVALHO, A. F. (2008) – O talhe da pedra na Pré-História recente de Portugal: 1: Sugestões teóricas e metodológicas para o seu estudo. Praxis Archaeologica. Lisboa. 3. p. 167-181.

CARVALHO, A.F. ; GIBAJA, J.; GAVILÁN, B. (2012) - Technologie, typologie et analyses fonctionnelles de l’outillage lithique durant le néolithique ancien dans la Cueva de Murciélagos de Zuheros (Córdoba, Espagne) : réflexions sur la néolithisation du sud de la Péninsule Ibérique. L’anthropologie. [Em linha]. 116, p. 148-170. [Consult. 3 Julho 2016]. Disponível em WWW: URL: http://linkinghub.elsevier.com.

CARVALHO, A.F.; ALVES-CARDOSO, F.; GONÇALVES, D.; GRANJA, R.; CARDOSO, J.L.; DEAN, R.M., GIBAJA, J.F.; MASUCCI, M.A.; ARROYO-PARDO, E.; FERNÁNDEZ, E.; PETCHEY, F.; PRICE, T.D., MATEUS, J.E.; QUEIROZ, P.F.; CALLAPEZ, P.M.; PIMENTA, C.; REGALA, F.T. (2015) – The Bom Santo Cave (, Portugal): catchment, diet and patterns of mobility of a Middle Neolithic population, European Journal of Archaeology, 19. 2. 187-214 p.

CHAPMAN, J.; GAYDARSKA, B. (2009) - The fragmentation premise in archaeology: from the Paleolithic to more recent times. In The fragment: an incomplete history. Tronzo, W. Los Angeles: Getty Research Institute. p. 131-153.

128 CHAPMAN, R. (2003) – Archaeologies of complexity. London : Routledge, 2003.

CHOFFAT, P. (1884a) - Excursion a Otta. Congrés International d'Anthropologie et d'Archéologie Préhistoriques. Ci-R. geme Session. Lisboa: Typographie de l'Académie Royale des Sciences. p.68-72.

CHOFFAT, P. (1884b) - Conclusions sur la Commission chargé de l'examen des silex trouvés à Otta. Congrés International d'Anthropologie et d'Archéologie Préhistoriques. C.-R. geme Session (Lisbonne, 1880). Lisboa: Typographie de l'Académie Royale des Sciences. p.92-118.

COSTA, A. I. M. (1906) – Estações pré-históricas dos arredores de Setúbal. O Arqueólogo Português. Lisboa. 11. p. 40-50.

COSTA, M.C.E. (2006) - Presença humana no actual território do Concelho de Alenquer, no II Milénio a.C. Coimbra. Dissertação de licenciatura em Arqueologia apresentada ao Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. [Policopiada].

COSTA, M.C.E. (2010) - Redes viárias de Alenquer e as suas dinâmicas: um estudo de arqueogeografica. Coimbra. Dissertação de mestrado em Arqueologia apresentada ao Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. [Policopiada].

COSTEIRA, C. (2012) - Placas e crescentes - Análise de um conjunto de componentes de tear do sítio arqueológico de S. Pedro (Redondo), 3º milénio a.n.e. Arqueologia & História. Lisboa. p. 23-37

CRABTREE, D. E.; BUTLER, B. R. (1964) – Notes on Experiments in Flint Knapping: 1. Heat Tratment of sílica Minerals. Tebiwa, 7. p. 1-6

CURA, Pe (1758) – OTTA. Memórias Paroquiais. Lisboa. p. 37-41.

DAVEAU, S. (1980) - Espaço e Tempo: Evolução do ambiente geográfico de Portugal ao longo dos tempos pré-históricos. Clio.Revista do Centro de História da Universidade de Lisboa, 2. p. 13-37.

DIAS, J. M.; RODRIGUES, A.; MAGALHAES, F. - (1997) - Evolução Da Linha De Costa, Em Portugal, Desde O Último Máximo Glaciário Ate À Actualidade: Sintese Dos Conhecimentos. Estudos Do Quaternário. Vol. 1. Lisboa: APEQ. p. 53-66.

DINIZ, M. (1993) – Pesos de tear, fiação e tecelagem. In GONÇALVES, V. S., coord. - História de Portugal. Lisboa: Ediclube, 1993. Vol. 1. p. 241-243.

DINIZ, M. (2007) – O sítio da Valada do Mato (Évora) : aspectos da neolitização no Interior/Sul de Portugal. Lisboa : Instituto Português de Arqueologia. (Trabalhos de Arqueologia ; 48).

129 DINIZ, M.; VIEIRA, T. (2007) – Instrumentos de Pedra Polida e Afeiçoada do Povoado do Neolítico antigo da Valada do Mato (Évora): estratégias de produção e modelos de uso. Vipasca. 2. 2. p. 81-94.

DURKHEIM, E. (1894) – Les Régles de la méthode sociologique. Revue philosophique. 37. 168 p.

EDO, M. ; FERNANDEZ TURIEL, J. L. ; VILLALBA, M. J. ; BLASCO, A. (1997) – La calaíte en el cuadrante NW de la Peninsula Ibérica. In BALBIN BEHERMANN, R. ; BUENO RAMIREZ, P., ed - Neolítico, Calcolítico Y Bronce. [S.l.]: Fundación Rei Afonso Henriques, 1997. (Actas do II Congresso de Arqueologia Peninsular, Zamora, 1996 ; vol. 2). p. 99-121.

FANDOS, A.J. (1973) – Nota preliminar para una tipologia analítica de las hachas pulimentas. Munibe. II-IV. San Sebastián. p. 203-208.

FERREIRA, O. da V. ; SILVA, C. T. (1970) – A estratigrafia do povoado pré-histórico da Rotura (Setúbal) : nota preliminar. In Jornadas da Associação de Arqueólogos Portugueses. Lisboa: AAP. Vol. II. p. 201-226.

FORENBAHER, S. (1999) – Production and exchange of bifacial flaked stone artifacts during the Portuguese Chalcolithic. Oxford : Archaeopress, 1999. (BAR. International Series ; 756).

GANDARA, M. V. (2008) – El análisis teórico en ciências sociales: Aplocación a una teoria del origen del Estado en Mesoamérica. Dissertação de Doutoramento em Antropologia apresentada à Escuela Nacional de Antropologia e História. México. [Policopiada].

GIDDENS, A. (1989) – A constituição da sociedade. São Paulo: Martins Fontes.301 p.

GOMES, J. J. F. (1978) – Loiças antecampaniformes do Museu Municipal de Hipólito Cabaço. Alenquer. In Actas das III Jornadas Arqueológicas. Lisboa: Associação de Arqueólogos Portugueses. Vol. 1. p. 112-124.

GOMES, J. J. F. (1987) – Pulseira de cobre de Ota (?) do Museu Municipal de Alenquer. Arqueologia. 16. Porto. p. 56-57.

GOMES, J. J. F.; DOMINGOS, J. (1994) - Sítios arqueológicos representados no Museu Municipal de Hipólito Cabaço. In Actas das V Jornadas Arqueológicas (1993). Lisboa: Associação dos Arqueólogos Portugueses. p. 7-11.

GOMES, J. J. F.; DOMINGOS, J. (1994) - Sítios arqueológicos representados no Museu Municipal de Hipólito Cabaço (Alenquer) 2. Complexo arqueológico de Ota. Actas das V Jornadas Arqueológicas (Lisboa, 1993). Lisboa: Associação dos Arqueólogos Portugueses. p. 7- 15.

130 GONÇALVES, V. S. (1971) – O Castro da Rotura e o vaso Campaniforme. Setúbal: Junta Distrital, 1971. 196 p.

GONÇALVES, V. S. (1983-84) - Artefacto de Pedra Polida de Grandes Dimensões Proveniente de Almodôvar (Beja). Clio Arqueologia. Lisboa. 1. p. 197-199.

GONÇALVES, V. S. (1989) – Megalitismo e metalurgia no Alto Algarve Oriental. Lisboa. INIC/UNIARQ. 2 vol.

GONÇALVES, V. S. (2009) - Construir para os mortos. Grutas artificiais e antas na Península de Lisboa. Algumas leituras prévias. Estudos Arqueológicos de Oeiras. 17. p. 237-260

GONÇALVES, V. S.; SOUSA, A. C. (2006) – Algumas breves reflexões sobre quatro datas 14c para o Castro da Rotura e o 3º milénio nas Penínsulas de Lisboa e Setúbal. O Arqueólogo Português. Lisboa. S.4. 24. p. 233-266.

GONÇALVES, V. S.; SOUSA, A. C. (2006) – Algumas breves reflexões sobre quatro datas 14c para o Castro da Rotura e o 3º milénio nas Penínsulas de Lisboa e Setúbal. O Arqueólogo Português. Lisboa. S.4. 24. 233-266.

GONÇALVES, V. S.; SOUSA, A. C.; COSTEIRA, C. (2013) – Walls, doors and towers. Fortified settlements in the south and center of Portugal: some notes about violence and walls in the 3rd millenium BCE. Cuadernos de Prehistoria y Arqueologia de la Universidad de Granada. Granada. 23. p. 35-97.

GREENFIELD, H.J. (2010) - The Secondary Products Revolution: the past, the present and the future. World Archaeology 42. 1. p. 29-54

GUTIERREZ SAEZ, C. (1998) – Aportaciones del estudio de la industria lítica a la compreensíon del fenómeno calcolítico. Yacimiento de Llanete de los Moros (Montoro, Córdoba). Espacio, Tiempo y Forma. Serie I, Prehistoria y Arqueologia. Madrid. 11. p. 191-210.

HARRISON, R.J. (1977) - The bell beaker cultures of Spain and Portugal. Cambridge: Peabody Museum, Harvard University

HOBSBAWM, E. J. (1998) - Sobre história: ensaios. São Paulo: Companhia das Letras. 336 p.

HURTADO, V. (2003) – Fosos y fortificaciones entre el Guadiana y el Guadalquivir en el III milenio a.C. : evidencias del registro arqueológico In JORGE, S. O., ed. lit. - Recintos murados na Pré-História Peninsular… Porto : Centro de Estudos Arqueológicos da Universidade do Porto, 2003. p. 251-268.

131 INIZAN, M.-L.; REDURON-BALLINGER, M.; ROCHE, H.; TIXIER, J. (1999) – Techonology and Terminology of Knapped Stone. Nanterre: CREP. (Préhistoire de la Pierre Taillée; 5).

JALHAY, E. ; PAÇO, A. (1945) – El castro de Vila Nova de S. Pedro. Madrid : S.E.A.E.P., 1945. (Actas y memórias de la Sociedad Española de Antropologia, Etnografia y Prehistoria ; 20). 93 p.

JIMÉNEZ GÓMES, M. C. (1995) – Los amuletos en el Eneolítico portugués : Zambujal. In KUNST, M., ed. lit. - Origens, estruturas e relações das Culturas Calcolíticas da Península Ibérica: actas das I Jornadas Arqueológicas de Torres Vedras, 1987. Lisboa : IPPAR, 1995. (Trabalhos de Arqueologia ; 7). p. 31-36.

JIMÉNEZ GÓMEZ, M. C. (1995a) – Zambujal: los amuletos de las camoañas 1964 hasta 1973. In SANGMEISTER, E. ; JIMENEZ GOMEZ, M. C. - Zambujal : die Kupfunde aus den Grabungen 1964 bis 1973. Mainz : Philipp von Zabern, 1995. (Madrider Beiträge ; Bd. 5). p. 157-239.

JORDÃO, P. (2010) – Análise de proveniência de matérias-primas líticas da indústria de pedra lascada do povoado calcolítico de S. Mamede (Bombarral). Apresentada como tese de Mestrado em Geoarqueologia. Lisboa: Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

JORGE, S. O. (1986) - Povoados da Pré-História Recente da região de Chaves e Vila Pouca de Aguiar (Trás-os-Montes Ocidental). Porto: Universidade.

JULIEN, M. (1992) - Du fossile directeur à la chaîne operatoire. Evolution de l’interpretation des ensembles lithiques et osseux en France. In J. GARANGER (dir.) – La Préhistoire dans le Monde. Paris: P.U.F., pp. 163-193.

KÁISER, J.M.ª (2003) - Puntas de flecha de la Edad del Bronce en la Península Ibérica. Producción, circulación y cronología. Complutum. 14. p. 73-106.

KALB, P. (1980) – Zur Atlantischen Bronzezeit in Portugal. Germania. 58. p. 25-59.

KUNST, M. (1987) – Bell Beakers sherds in Zambujal. In WALDREN, W. H. ; KENNARD, R. C., ed. lit- Bell beakers of the Western Mediterranean : definition, interpretation, theory and new site data : the Oxford international conference, 1986. Oxford: B.A.R., 1987. (BAR. International series; 331). Vol. II. p. 591-601.

KUNST, M. (1987a) – Zambujal Glochenbecher und Kerbblattverzierte Keramik aus der Grabungen 1964 bis 1967. Mainz aus Rhein [etc.] : Deutch Archaeologishes Institut, 1987. 2 vol.

132 KUNST, M. (1995) – Central places and social complexity in the Iberian Copper Age. In LILLIOS, K., ed. - The origins of complex societies in Late Prehistoric Iberia. Michingan : International Monographes in Prehistory, 1995. (Archaeological Series ; 8). p. 32-43.

KUNST, M. (1996) – As cerâmicas decoradas do Zambujal e o faseamento do Calcolítico da Estremadura Portuguesa. Estudos Arqueológicos de Oeiras. 6 (1996). p. 257-287.

KUNST, M. (2001) – Invasion? Fashion? Social Rank? Consideration concerning rhe Bell Beaker phenomenon in Copper Age fortifications of the Iberian Penninsula. In NICOLIS, F., ed. lit. – Bell Beakers today : pottery, people, culture, symbols in prehistoric Europe : proceedings of the International Colloquium Riva del Guarda, Trento. Trento : Servizio Beni Culturali, 2001. p. 81-90.

KUNST, M. (2003) – Muralhas e derrubes: observações sobre a fortificação calcolítica do Zambujal (Torres Vedras) e suas consequências para a interpretação estratigráfica: um resumo. In JORGE, S. O., ed. lit. - Recintos murados na Pré-História Peninsular… Porto: Centro de Estudos Arqueológicos da Universidade do Porto, 2003. p. 169-176.

KUNST, M. (2006) – Zambujal and the Enclosures of the Iberian Peninsula. In HARDING, A.; SIEVERS, S. ; VENCLOVÁ, N., ed. lit. - Enclosing the past : inside and outside in prehistory. Sheffiel: J. R. Collis, 2006. (Sheffield Archaeological Monographs ; 15). p. 76-96.

KUNST, M. ; LUTZ, N. (2008) – Zambujal (Torres Vedras, Portugal). Zur Präzision der absoluten Chronologie durch die Untersuchungen an der vierten Befestigungslinie. Madrider Mitteilungen.

LAGE, A., SALSÓN, S. (2006) – Variabilidade interanula do clima. A Variabilidade Natural do Clima en Galícia. Santiago de Compostela: Conselleria de Medio Ambiente e Desenvolvimento Sustible. 95 – 122 p.

LEISNER, V.; SCHUBART, H. (1966) – Die kupferzeitlicbe Befestigung von Pedra do Ouro. Madrider Mittelungen. Heidelberg, 7. 9-60 p.

LUCAS, G. (2012) – Understanding the Archaeological Record. Cambridge: Cambridge University. 320 p.

MARCUS, J. e FLANNERY, V. (1996) – Zapotec civilization: How urban society evolved in Mexico’s Oaxaca Valley. London: Thames and Hudson. 211 p.

MARQUES GONÇALVES, J. L. (1994) – Castro da Columbeira: uma primeira fase do Calcolítico médio Estremenho? Al-madan. Almada. S.2:3. p. 5-7.

133 MARQUES GONÇALVES, J. L. (1997) – Olelas e Pragança : duas fortificações calcolíticas da Estremadura. O Arquéologo Português. Lisboa. S.4. 8-10. p. 31-40.

MATALOTO, R. (2010) - O 3º/4º milénio a.C. no povoado de São Pedro (Redondo, Alentejo Central): fortificação e povoamento na planície centro alentejana. In GONÇALVES; V.; SOUSA, A.C. (eds) - Transformação e Mudança no Centro e Sul de Portugal: o 4º e o 3º milénio a.n.e. Cascais: Câmara Municipal de Cascais. p. 263-295.

MATALOTO, R.; MARTINS, J. M. M.; SOARES, A. M. M. (2013) – Cronologia absoluta para o Bronze do Sudoeste. Periodização, base de dados tratamento estatístico. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras. 20. p. 303-338.

MATEUS, J.; QUEIRÓZ, P. F. (1993) – Os estudos de vegetação quaternária em Portugal ; contextos, balanço de resultados, perspectivas. In CARVALHO, G. S. ; FERREIRA, A. B; SENNA-MARTÍNEZ, J.C., ed. lit. - O Quaternário em Portugal: balanço e perspectivas. Lisboa : Colibri, 1993. p. 105-131.

MATEUS, J.E. (1992) - Holocene and presente-day exosystems of the Carvalhal Region, Southwest Portugal. Apresentada como dissertação para o Doutoramento. Utreque: Universidade de Utreque. 184 p.

MONTEAGUDO, L. (1965) - Hachas prehistóricas de Europa Occidental. Conímbriga, IV. Coimbra.

MONTEAGUDO, L. (1952) – La XV campaña de excavaciones en el castro de Vila Nova de São Pedro (Bronce I e II). Archivo Español de Arqueologia. Madrid. 25. p. 353-355.

MONTEAGUDO, L. (1977) - Die Beile auf der Iberischen Halbinsel. Prähistorische Bronzefunde. München.

MONTEIRO, M. e CANINAS, J.C. (2005) - Relatório sobre a Avaliação do Descritor Património Arqueológico, Arquitectónico e Etnológico do Estudo de Impacto Ambiental do Projecto de Execução da Ampliação da Pedreira Outeiro do Seio n.º 2 (Alenquer). Lisboa: EMERITA.

MULLER, R. ; CARDOSO, J. L. (2008) – The origin and use of copper at the chalcolithic fortification of Leceia (Oeiras, Portugal). Madrider Mitteilungen. Wiesbaden. 49. p. 64-93.

NETO, N.; GONZALEZ, C.; REBELO, P.; SANTOS, R.; ROCHA, M. (2013) – Trabalhos arqueológicos na Quinta Nova de Santo António ou dos Ingleses – Carvavelos: A Ocupação do Bronze Final. Cira-Arqueologia. Vila Franca de Xira. 2. p. 19-39.

134 NOCETE, F. (2001) – Tercer milenio antes de nuestra era: relaciones y contradicciones centro/periferia en el valle del Guadalquivir. Barcelona: Bellaterra. (Bellaterra arqueología).

NUKUSHINA, D. (2015) - A presença da decoração “falsa folha de acácia” nas cerâmicas do Neolítico antigo: o caso do Abrigo Grande das Bocas (Rio Maior, Portugal). Actas do 5º Congresso do Neolítico Peninsular.

ODRIOZOLA, C.P.; HURTADO PÉREZ, V.M. (2007) – Estimate of firing temperatures through Bonebased chalcolithic decorated pottery. Journal of Thermal Analysis and Calorimetry. 87. 1. p. 135–141

OLIVA, A. (2011) – Teoria do Conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Zahar. 55 p.

OROZCO, T. K. (1999) – Señales de enmangue en el utillaje pulimentado del Neolítico Valenciano. Saguntum. Valéncia. Extra 2. p. 135-142. (Congrés de Neolitic a la Peninsula Ibérica, 2, Valencia, 1999).

ORTIZ, M. A. H; NAVARRETE, M. I.; HURTADO PÉREZ, V. MONTERO-RUIZ, I. (2012) – Procedencia de las puntas de jabalina del “Dolmen de la Pastora (Valencina de la Concepción, Sevilha). Trabajos de Prehistoria. Vol 69, nº2.

PAÇO, A. (1966) – Castelo da Pedra de Ouro. Anais da Academia Portuguesa de História. Série II. Vol. 16. Lisboa. p. 117-152

PAULO, L. (1940) – Restos humanos Pré-históricos do Monte do Pedregal. Congresso do Mundo Português. Vol. 1. Lisboa. p. 653-665

PEREIRA, F. (2011) - Archaeometallurgical Study of Artefacts From Castro de Vila Nova de São Pedro (Azambuja, Portugal). apresentada como tese de dissertação para obtenção do mestrado em Conservação e Restauro, Lisboa: Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

PEREIRA, M. A. H. (1969) – 6 machados do Castelo da Ota e 1 lâmina de punhal de S. João de Abrantes ou as Culturas do Cobre e do Bronze na bacia do Tejo. Actas das I Jornadas Arqueológicas. Lisboa. p. 239-270.

RÉMY, J.; VOYÉ L. (1994) – A cidade: Rumo a Uma Nova Definição. Lisboa: Afrontamento.

RIBEIRO, C. (1867) – Memoria sobre o abastecimento de Lisboa com agua de nascente e água de rio. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias de Lisboa.

RIBEIRO, C. (1871) – Descripção de alguns sílex e quartzites lascados encontrados nas camadas dos terrenos terciário e quaternário das bacias do Tejo e do Sado. Memória apresentada à Academia Real das Sciencias de Lisboa. Lisboa: Typographia da Academia. 67 p.

135 RIBEIRO, C. (1878) – Estudos préhistóricos em Portugal : I : notícia da estação humana de Licêa. Rreedição. Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras.1 - Reedição da ed. da Academia Real das Ciências de Lisboa, 1878.

RIBEIRO, O. (1998) - Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico: Esboço de relações geográficas. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora. 189 p.

ROLLÁN, M.C.L. (1996) - Las Textile Manufacture in the Prehistory: The tablet-weaving in the Copper Age in the Iberian Peninsula. Zephyrus. 29. Salamanca. p. 125-145.

RUIVO, J. (1993-97) - A circulação monetária na Estremadura portuguesa até aos inícios do séc. III. Nvmmvs. 2ª Série. XVI/XX. p. 7-177.

SACKET, J.R. (1977) - The meaning of style in Archaeology: A general model. American Antiquity. [S. l.: s.n.], v. 42. p. 369-380.

SALVADO, M. C. (2004) – Apontamentos sobre a utilização do osso no Neolítico e Calcolítico da Península de Lisboa : as colecções do Museu Nacional de Arqueologia. Lisboa: Museu Nacional de Arqueologia, 2004. (O Arqueólogo Português. Suplemento ; 2).

SANTOS, B.S., AVRITZER (2002) – Para Ampliar o Cânone Democrático. Democratizar a Democracia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

SAVORY, H. N. (1968) – Spain and Portugal : the prehistory of the Iberian Peninsula. London: Thames and Hudson, 1968.

SAVORY, H. N. (1983-84) – Um corte através da fortificação interior do castro calcolítico de Vila Nova de S. Pedro. Clio Arqueologia. Lisboa. 1-2. p.19-29.

SCHIFFER, M. B. (1987) - Formation Processes of the Archaeological Record. Albuquerque: University of New Mexico Press. 428 p.

SCHUBART, H. (1967-69) – Las fortificaciones eneolíticas de Zambujal e Pedra do Ouro, em Portugal. In Congreso Nacional de Arqueologia, X, Mahón, 1967 - Crónica del Congreso Nacional de Arqueologia. Zaragoza: Secretaría General de los Congresos Arqueológicos Nacionales. p. 197-204.

SENNA-MARTINEZ, J. C.; LUÍS, E.; PIMENTA, J., FIGUEIREDO, E.; LOPES, F.; ARAÚJO, M. F. e SILVA, R.J.C. (2013) – Nota sobre um machado plano em bronze de “Tipo Bujões” de Vila Franca de Xira. CIRA Arqueologia. 2.

SERRÃO, E. C. (1983) – A estação pré-histórica da Parede : documentos inéditos sobre estratigrafia e estruturas (Campanha de 1956). O Arqueólogo Português. Lisboa. S.4. 1. p.119- 147.

136 SHANKS, M. e HODDER (1995) – Processual, postprocessual and interpretive archaeologies. In: HODDER, I. (ed) - Interpreting Archaeology: Finding Meaning in the Past. Londres: Routledge.

SILVA, A. M. S. (1983) – Portugal: Atlas do Ambiente. Notícia explicativa I.13: Carta litológica. Lisboa: Comissão Nacional do Ambiente.

SILVA, A.M.; BOAVENTURA, R.; PIMENTA, J.; DETRY, C.; CARDOSO, J.L. (2015) - Perscrutando espólios antigos: A gruta de Pedra Furada 1 (Vila Franca de Xira). Estudos Arqueológicos de Oeiras. Oeiras: Câmara Municipal. 21. p. 159-182.

SILVA, C. T. ; SOARES, J. (1976-77) – Contribuição para o conhecimento dos povoados calcolíticos do Baixo Alentejo e Algarve. Setúbal Arqueológica. Setúbal. 2-3. p. 179-272.

SILVA, C. T. ; SOARES, J. ; CARDOSO, J. L. (1995) – Os povoados fortificados do Monte da Tumba e Leceia - elementos para um estudo comparado. In KUNST, M., ed. lit. - Origens, estruturas e relações das Culturas Calcolíticas da Península Ibérica: actas das I Jornadas Arqueológicas de Torres Vedras, 1987 . Lisboa : IPPAR, 1995. (Trabalhos de Arqueologia ; 7). p. 159-168.

SIMÕES, M.M. (1994) - As Regiões de “Torres” e “Alenquer” no contexto Calcolítico da Estremadura. Tese de Licenciatura apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto [Policopiada].

SIMÕES, T. (1999) – O Sítio Neolítico de São Pedro de Canaferrim (Sintra). Lisboa: Instituto Português de Arqueologia, 1999. (Trabalhos de Arqueologia; 12).

SOARES, A. M. M. ; ARAÚJO, M. F. ; CABRAL, J. (1994) – Vestígios da prática de metalurgia em povoados calcolíticos da bacia do Guadiana entre o Ardila e o Chanca. In CAMPOS, J. M. ; AURELIO PEREZ, J. ; GOMÉZ, F., coord. - Arqueologia en el entorno del Bajo Guadiana, Huelva : actas del Encuentro Internacional de Arqueología del suroeste, Huelva y Niebla, 1993. Huelva: Universidad, 1994. p. 165-200.

SOARES, J. (2013) - Transformações sociais durante o 3.º milénio AC no sul de Portugal. O povoado do Porto das Carretas. EDIA (Memórias d´Odiana, 2.ª série, 5).

SOARES, J., TAVARES DA SILVA, C. (1974-77) - O Grupo de Palmela no quadro da cerâmica campaniforme em Portugal. O Arqueólogo Português. S. 7/9. p. 102-112.

SOUSA, A. C. (1998) – O Neolítico final e o Calcolítico na área da Ribeira de Cheleiros. Lisboa: Instituto Português de Arqueologia. (Trabalhos de Arqueologia; 11).

137 SOUSA, A. C. (2009) - Mapear o povoamento estremenho do 4.º e 3.º milénios a.C.: um caso de estudo e algumas reflexões sobre os processos de identificação.

SOUSA, A.C. (2010) - O penedo do Lexim e a sequência do neolítico final e do calcolítico na península de lisboa. Tese de Doutoramento apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

SPINDLER, K. (1981) – Cova da Moura : die Besiedlung des Atlantishen Küstenbent Mittelportugals von Neolithikin bis an der Ende der Bronzeveit. Mainz : Philipp von Zabern, 1981. (Madrider Beiträge ; 7).

THOMAS, J., (1999) - Understanding the Neolithic. Routledge, London.

UERPMANN, H.-P.; UERPMANN, M. (2003) – Zambujal : die stein und beinartefakte aus den Grabungen 1964 bis 1973. Mainz am Rhein : Philipp von Zabern, 2003. (Madrider Beiträge ; Bd. 5).

VALENTE, A. (2006) – Cerâmicas com bordos denteados no Povoado de Vale de Lobos (Sintra). Lisboa: [s.n.], 2006. Mestrado em Pré-História e Arqueologia apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

VALERA, A. (2003) – Mobilidade estratégica e prolongamento simbólico : problemáticas do abandono no povoamento calcolítico do ocidente peninsular. Era Arqueologia. Lisboa. 5. p.128- 151.

VALERA, A. (2006) – A margem esquerda do Guadiana (região de Mourão), dos finais do 4.º aos inícios do 2.º milénio a.C. Era Arqueologia. Lisboa. 7. p.136-210.

VALERA, A. (2007) – Dinâmicas locais de identidade : estruturação de um espaço de tradição no 3º milénio AC (Fornos de Algodre, Guarda). Fornos de Algodres : Câmara Municipal.

VALERA, A. ; TERESO, J. ; REBUGE, J. (2006) – O Monte da Quinta 2 (Benavente) e a produção de sal no Neolítico final/Calcolítico inicial do estuário do Tejo = Monte da Quinta 2 (Benavente) and the production of salt in the Late Neolithic/Early Calcolithic of the Tagus estuary. In BICHO, N. F. VERÍSSIMO, H., ed. - Do Epipaleolítico ao Calcolítico na Península Ibérica : actas do IV Congresso de Arqueologia Peninsular, Faro, 2004. Faro: Universidade do Algarve, 2006. (Promontória Monográfica ; 4). p. 291-305

VALERA, A. C.; EVANGELISTA, L. & CASTANHEIRA, P. (2014) – Zoomorphic figurines and the problem of humananimal relationship in the Neolithic and Chalcolithic Southwest Iberia. Menga. 5, p. 15-41.

138 VALERA, A.C. (2010) – Marfim no recinto calcolítico dos Perdigões (1): Lúnulas, fragmentação e ontologia dos artefactos. Apontamentos de Arqueologia e Património. Nº5. NIA-ERA. p. 31- 42.

VIEGAS, C.; ARRUDA, A. M. (1999) - Cerâmicas islâmicas da Alcáçova de Santarém. Revista Portuguesa de Arqueologia. Lisboa: Instituto Português de Arqueologia. 2. 2. p. 105-186.

WHITE, L. A. (1959) – The Evolution of Culture: The development of civilization to the fall of Rome. New York: Mc Graw-Hill.

ZBYSEWSKI. G. ; FERREIRA, O. da V. (1958) – Estação pré-histórica da Penha Verde (Sintra). Comunicações dos Serviços Geológicos de Portugal. Lisboa. 39. p. 37-58

ZBYSZWESKI, G.; ASSUNÇÃO, C. T. (1965) – Carta geológica dos arredores de Lisboa na escala de 1/50.000: Notícia explicativa da folha 30-D Alenquer. Lisboa: Serviços Geológicos de Portugal.

ZILHÃO, J. (1995) – O Paleolítico Superior da Estremadura Portuguesa. Lisboa: Colibri.

139

Índice Volume II

Introdução ...... 6 Parte 1 – Cartografia ...... 7 Mapa 1- Localização do sítio e da área do projecto ...... 8 Mapa 2 – Localização do sítio da Ota ...... 8 Mapa 3 – Distribuição da área do projecto ...... 9 Mapa 4 – Sítios nas bacias dos rios Ota, Alenquer e Grande da Pipa ...... 10 Mapa 5 – Carta de ocupação do Solo ...... 10 Mapa 6 – Carta geomorfológica ...... 11 Mapa 7 – Áreas e sítios arqueológicos identificados nos trabalhos de prospecção ... 11 Mapa 8 – Ocorrências arqueológicas identificadas ...... 12 Mapa 9 – Ocorrências arqueológicas inventariadas ...... 12 Imagem 1 – Planta do sítio ...... 13 Imagem 2 – Planta das estruturas na cartografia do sítio ...... 13 Imagem 3 – Modelação 3D do território ...... 14 Imagem 4 – Perfil altimétrico 3D ...... 15 Imagem 5 – Mapa de visibilidade ...... 16 Parte 2 – Imagens e fotografias de campo ...... 17 Fotografia 1 – Vista de Este para Oeste; ...... 18

Fotografia 2 – Vista de Oeste para Este (vertente Oeste) 1; ...... 18

Fotografia 3 – Vista de Oeste para Este (vertente Oeste) 2; ...... 19

Fotografia 4 – Fotografia de Ernâni Barbosa 1; ...... 19

Fotografia 5 - Fotografia de Ernâni Barbosa 2; ...... 20

Fotografia 6 - Estrutura 1; ...... 20

Fotografia 7 - Estrutura 1; ...... 21

Fotografia 8 - Estrutura 2; ...... 21

Fotografia 9 - Estrutura 3; ...... 22

Fotografia 10 - Estrutura 3; ...... 22

Fotografia 11 - Estrutura 3; ...... 23

Fotografia 12 - Estrutura 3; ...... 23

140

Fotografia 13 - Estrutura 4; ...... 24

Fotografia 14 - Estrutura 5; ...... 24

Fotografia 15 - Estrutura 5; ...... 25

Fotografia 16 - Estrutura 7; ...... 25

Fotografia 17 - Estrutura 8; ...... 26

Fotografia 18 – Machado in situ; ...... 26

Fotografia 19 - Gruta do Texugo; ...... 27

Fotografia 20 – Gruta do Texugo; ...... 27

Fotografia 21 - Prospecção na Margem Esquerda do Canhão Cársico; ...... 28

Fotografia 22 - Gravura filiforme...... 28

Parte 3 – Desenhos de Campo ...... 29

Desenho 1 - Planta da estrutura 3 ...... 30 Desenho 2 – Perfil da estrutura 3 ...... 31 Desenho 3 - Perfil da estrutura 1 (muralha) ...... 32 Desenho 4 – Alçado da estrutura 1 (muralha) ...... 33 Parte 4 – Estampas ...... 34

Pedra Lascada ...... Estampa 1 - Núcleos ...... 35 Estampa 2 – Lascas retocadas ...... 36 Estampa 3 – Produtos alongados (completos) ...... 37 Estampa 3.1 – Produtos alongados (fragmentos) ...... 38 Estampa 4 - Foliáceos ...... 39 Estampa 5 – Pontas de seta ...... 40 Pedra Polida ...... Estampa 6 – Pedra Polida ...... 41 Estampa 6.1 – Pedra Polida ...... 42 Estampa 6.2 – Pedra Polida ...... 43 Estampa 6.3 – Pedra Polida ...... 44 Pedra Afeiçoada ...... Estampa 7 – Pedra Afeiçoada (moventes) ...... 45 Estampa 7.1 – Pedra Afeiçoada (polidor) ...... 46 Estampa 7.2 – Pedra Afeiçoada (esferoides) ...... 47

141

Cerâmica ...... Estampa 8 – Recipiente cerâmico (copo) ...... 48 Estampa 8.1 – Recipientes cerâmicos (Bordos denteados) ...... 49 Estampa 8.2 – Recipientes cerâmicos (taças caneladas) ...... 50 Estampa 8.3 – Recipientes cerâmicos (Folha de Acácia) ...... 51 Estampa 8.4 – Recipientes cerâmicos (Folha de Acácia) ...... 52 Estampa 8.5 – Fragmentos cerâmico (Folha de Acácia) ...... 53 Estampa 8.6 – Fragmentos cerâmicos (Folha de Acácia) ...... 54 Estampa 8.7 – Fragmentos cerâmicos (Folha de Acácia) ...... 55 Estampa 8.8 – Fragmentos cerâmicos (Folha de Acácia) ...... 56 Estampa 8.9 – Recipientes cerâmicos (Geométricos) ...... 57 Estampa 8.10 – Fragmentos cerâmicos (Geométricos e decoração interna) .... 58 Estampa 8.11 – Recipientes cerâmicos (Campaniforme) ...... 59 Estampa 8.12 – Recipientes cerâmicos lisos da Estrutura 3 ...... 60 Estampa 8.13 – Elementos de tear simples ...... 61 Estampa 8.14 – Elementos de tear decorados ...... 62

Artefactos Osso polido ...... Estampa 9 – Brunidores, espátulas, alfinetes, furador e “caixa” ...... 63 Estampa 9.1 – Dupla funcionalidade; agulhas ou sovelas ...... 64 Estampa 9.2 – Representação zoomórfica ...... 65

Artefactos metálicos ...... Estampa 10 – Artefactos metálicos (Machados planos e ponta de seta) ...... 66

Parte 5 – Critérios descritivos ...... 67

Pedra Lascada ...... 68 Pedra Polida ...... 71 Pedra Afeiçoada ...... 72 Cerâmica ...... 72 Artefactos Osso Polido ...... 74 Artefactos metálicos ...... 74 Parte 6 – Tabela decorativa ...... 75

Tabela 1 - Grupo 2 (Taças caneladas); Grupo 3 (Folha de Acácia) ...... 76 Tabela 2 - Grupo 3 (Folha de Acácia); Grupo 4 (Motivos geométricos) ...... 77 Tabela 3 – Grupo 5 (Cerâmica Campaniforme) ...... 78

Parte 7 – Dados adicionais ...... 79 Pedra Lascada Núcleos Gráfico 1 – Produtos extraídos; ...... 80

142

Gráfico 2 – Grau de utilização; ...... 80 Gráfico 3 – Alterações térmicas; ...... 81 Gráfico 4 – Planos de debitagem; ...... 81 Lascas ...... 81 Quadro 1 – Descrição geral do conjunto; ...... 81 Lâminas e Lamelas Quadro 2 – Estado de conservação; ...... 82 Quadro 3 – Matéria-prima; ...... 82 Quadro 4 – Presença de retoque; ...... 82 Quadro 5 – Forma dos bordos; ...... 82 Quadro 6 – Alterações térmicas; ...... 82 Quadro 7 – Marcas de uso; ...... 83 Foliáceos – Lâminas ovóides ...... 83 Quadro 8 – Estado de conservação; ...... 83 Quadro 9 – Secção; ...... 83 Quadro 10 – Suporte; ...... 83 Quadro 11 – Fractura; ...... 83 Quadro 12 – Alterações térmicas; ...... 84 Quadro 13 – Marcas de uso; ...... 84 Pontas de seta Quadro 14 – Estado de conservação; ...... 84 Quadro 15 – Formato da base; ...... 84 Quadro 16 – Geometria dos bordos; ...... 84 Quadro 17 – Secção; ...... 85 Quadro 18 – Localização do retoque; ...... 85 Quadro 19 – Extensão do retoque; ...... 85 Quadro 20 – Fractura; ...... 85 Quadro 21 – Aletas; ...... 85 Quadro 22 – Estado de produção; ...... 86 Quadro 23 – Matéria prima; ...... 86 Restos de talhe Quadro 24 – Matéria prima; ...... 86 Quadro 25 – Córtex; ...... 86 Quadro 26 – Alterações térmicas; ...... 86 Cerâmica Quadro 27 – Tipo fragmento; ...... 86 Quadro 28 – Técnicas decorativas; ...... 87 Quadro 29 – Espessamento dos bordos; ...... 87 Quadro 30 – Forma dos bordos; ...... 87 Quadro 31 – Direcção dos bordos; ...... 87 Quadro 32 – Forma dos recipientes; ...... 87 Quadro 33 – Morfologia dos recipientes; ...... 88 Gráfico 5 – Relação bordo e motivo decorativo...... 88

143

Parte 8 – Fichas de sítio ...... 89

Ficha 1- Atouguia das Cabras ...... 90 Ficha 2- Bairro ...... 90 Ficha 3- Castro de Ota ...... 90 Ficha 4- Mata de Ota ...... 90 Ficha 5- Grutas na Atouguia ...... 91 Ficha 6- Grutas na Ota ...... 91 Ficha 7- Outeiro do Seio I ...... 91 Ficha 8- Outeiro do Seio II ...... 92 Ficha 9- Caminho do Outeiro do Seio ...... 92 Ficha 10- Via secundária Romana do Cabeço do Pardal ...... 92 Ficha 11- Terraço Paleolítico na margem esquerda do Canhão Cársico ...... 93 Ficha 1a- Ota ...... 94 Ficha 2a- Alto do Pedregal ...... 94 Ficha 3a- Alenquer -Porta da Conceição ...... 94 Ficha 4a- Refugidos ...... 94 Ficha 5a- Castro das Curvaceiras/Amaral ...... 95 Ficha 6a- Pedra de Ouro ...... 95

144