Observações sobre os ninhos, células, casulos e a ação de inimigos naturais de aureofaciale Strand, 1910 (grupo Pilosum) (: Sphecidae, , Trypoxylini). 49

OBSERVAÇÕES SOBRE OS NINHOS, CÉLULAS, CASULOS E A AÇÃO DE INIMIGOS NATURAIS DE PISON AUREOFACIALE STRAND, 1910 (GRUPO PILOSUM) (HYMENOPTERA: SPHECIDAE, CRABRONINAE, TRYPOXYLINI)

N.P.O. Pinto1, M. Scaglia2, N. Gobbi3, G.G. Zacarin4, A. Zanardo5

1Departamento de Ecologia, Instituto de Biociências, UNESP, Av. 24-A, 1515, CEP 13506-900, Rio Claro, SP, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO

Vinte e um ninhos de Pison (Hym.: Sphecidae, Crabroninae, Trypoxylini) foram coletados desde 1998 no Campus da UNESP, Bela Vista, Rio Claro, SP e identificados como Pison aureofaciale. Os ninhos, células, casulos e os himenópteros encontrados, tais como crisidídeos, calcidídeos, mutilídeos e formigas, foram relatados. Observações de um destes ninhos, durante a construção de três células, também foram descritas. Tanto quanto é conhecido, aranhas são usadas como presas por Pison e quatro famílias destas foram relatadas para os ninhos.

PALAVRAS-CHAVE: Hymenoptera, Sphecidae, Pison aureofaciale, ninhos de barro, inimigos natu- rais, aranhas.

ABSTRACT

OBSERVATIONS ABOUT THE NESTS, CELLS, COCOONS AND THE ACTION OF THE NATURAL ENEMIES OF PISON AUREOFACIALE STRAND, 1910 (PILOSUM GROUP) (HYMENOPTERA: SPHECIDAE, CRABRONINAE, TRYPOXYLINI). Twenty one nests of Pison (Hym.: Sphecidae, Crabroninae, Trypoxylini) were found and collected since 1998 in the Campus of UNESP, Bela Vista, Rio Claro, SP, Brazil, and the species was identified as Pison aureofaciale Strand, 1910. The nests, cells, cocoons and hymenopterous occurrence, such as chrysidids, chalcidids, mutillids, and ants were listed. The construction of three cells in one of these nests was described. So far it is known that spiders are the prey of Pison and four families of these were reported to the nests.

KEY WORDS: Hymenoptera, Sphecidae, Pison aureofaciale, mud nests, natural enemies, spiders.

INTRODUÇÃO São variadas as formas e substratos utilizados na construção de seus ninhos: células construídas den- As vespas da família Sphecidae são cosmopolitas, tro de cavidades, e em ramos de plantas, utilização predadoras e algumas também são clepto-parasíticas. dos buracos feitos por besouros e com as células A maioria das espécies constrói ninhos individuais separadas por barro. Há espécies que constróem as com células separadas as quais são provisionadas células em locais abrigados podendo estar separadas com uma grande variedade de insetos e aranhas em fileiras ou agregadas e cobertas com uma camada (BOHART & MENKE, 1976; MENKE & FERNÁNDEZ, 1996). de barro. Ninhos de outras vespas como Eumenes e Em Sphecidae a maioria das espécies é solitária, Sceliphron podem ser também usadas por espécies de porém nidificações em densas colônias também ocor- Pison. Ninhos de pássaros e de vespas sociais podem, rem, como por exemplo, em alguns Bembicini (BOHART igualmente abrigar as células de barro de espécies do & MENKE, 1976). Há cerca de 250 gêneros na família, gênero. Nidificações no solo, em ribanceiras próxi- dos quais 141 são encontrados na Região Neotropical mas a riachos e mesmo em solo mais duro, também (MENKE & FERNÁNDEZ, 1996). O gênero Pison contém, ocorrem (BOHART & MENKE, 1976). Em algumas espé- mundialmente, cerca de 200 espécies (MENKE, 1988). cies de Pison o macho permanece no ninho enquanto

2. Depto. de Biologia – IB – UNESP – Rio Claro (SP) 3. Depto. de Ecologia e CEA – UNESP – Rio Claro (SP) 4. Depto. de Ecologia – IB – UNESP – Rio Claro (SP) 5. Depto. de Petrologia e Metalogenia – IGCE – UNESP – Rio Claro (SP)

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a fêmea está ausente, agindo, no caso, como guarda levado para o laboratório e observado diariamente. (EVANS & EBERHARD, 1970; BOHART & MENKE, 1976). As As porções externa e interna dos casulos de Pison sp. presas são as aranhas de várias espécies que ficam foram observadas em microscópio petrográfico e fo- estocadas nas células. Algumas espécies de Pison ram feitas as respectivas análises, assim como parecem mostrar preferências por determinadas fa- fotomicrografias, nos laboratórios do Departamento mílias de aranhas e o ovo é depositado na última presa de Petrologia e Metalogenia do IGCE, UNESP, Campus (MASUDA, SHELDON & YOSHIMOTO in BOHART & MENKE, de Rio Claro, SP. 1976). As formas parasíticas de Pison incluem Eulophidae, Chrysididae e Diptera (SHELDON, 1968 in BOHART & MENKE, 1976). RESULTADOS As espécies fósseis descritas de Pison são: P. cockerellae Rohwer (1908), P. oligocenum Cockerell, Exemplares de Pison coletados no Biotério da UNESP (1908) (= oligocaenum Cockerell, 1909), P.electrum, em Rio Claro, SP, foram identificados como P. aureofaciale Antropov & Pulawski, (1989) e P. antiquum, Antropov sendo este o primeiro registro de sua presença no Estado & Pulawski (1996) o qual foi encontrado em âmbar de São Paulo, e não há maiores informações sobre seus datado do Oligoceno ao Eoceno superior, aproxima- ninhos, células, casulos e a ação de seus inimigos damente com 25 a 40 milhões de anos (LAMBERT et al., naturais, sendo inéditas as informações agora apresen- 1985: POINAR, 1992 apud A NTROPOV & PULAWSKI, 1996). tadas para a espécie, bem como a das famílias das Das espécies de Pison conhecidas, 44 estão no aranhas encontradas em seus ninhos. Novo Mundo preponderantemente na região A Figura 1 mostra um exemplar (macho) de Pison neotropical, porém nem todas são devidamente co- aureofaciale (Grupo Pilosum). Este grupo tem como nhecidas, ocorrendo espécies onde um dos sexos não característica a lamela polida que se estende ao redor é conhecido ou só existe 1 único exemplar (MENKE, da margem anterior do pronoto, a flange larga, a 1988). Estas 44 espécies estão segregadas em 12 gru- distorção da garra na perna anterior do macho, e pos. O grupo Pilosum contém 6 espécies (P. pilosum também os exemplares machos do complexo Pilosum Smith, P. aureofaciale Strand, P. vincentiMenke, P. possuem um espinho na parte inferior do trocanter gnythos Menke, P. oaxaca Menke e P. sphaerophallus anterior (MENKE, 1988). O exemplar da Figura 1 emer- Menke) sendo que os 3 primeiros formam o complexo giu do ninho 14 coletado no jardim, na face inferior de Pilosum. No Brasil há registros de P. pilosum em Santa uma folha de Strelitzia reginae (Musacea) e, 2 exempla- Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Pará; de P. res oriundos do ninho 16 coletado em uma janela, sphaerophallus no Pará e de P. aureofaciale na Bahia, e parcialmente abrigado do sol e da chuva, foram iden- possivelmente em Santa Catarina (MENKE, 1988). tificados como Pison aureofaciale, e estão incorporados Objetivou-se com o presente estudo observar ninhos, à coleção do MZUSP, São Paulo. No decorrer do células, casulos e excrementos característicos de Pison trabalho foram coletados mais 3 exemplares machos, (Grupo Pilosum), assim como é relatada a ação dos que foram enviados ao Ammophila Research Institute, inimigos naturais em ninhos de formatos semelhan- nos Estados Unidos, para identificação (amostras tes, e as famílias das aranhas encontradas em células números 70, 79, 80) e foram confirmados como P. desses ninhos. aureofaciale, e depositados no Smithsonian, Washing- ton, D.C., Estados Unidos, como espécies voucher. Não foram encontradas diferenças substanciais entre MATERIAL E MÉTODOS os casulos e excrementos das vespas construtoras dos ninhos 14 e 16. Os demais ninhos estavam situados O estudo foi realizado na área do Biotério (1.161 em locais variados como, armários de aço, paredes, m2) do Instituto de Biociências da UNESP, Campus de caixas de madeira e janelas, abrigados do sol e chuva. Rio Claro, SP (22°, 25' S, 47°, 32' W, Gr, 612 m). Ninhos Estes ninhos (Fig. 2) são construídos com barro e de formatos semelhantes foram coletados desde janei- apresentam um número variável de células, as vezes ro de 1998 até março de 2000 (n=21) e a maioria já apenas uma e mais comumente, de 3 a 6, ligadas entre possuía células com aberturas. Os ninhos foram ob- si, por vezes formando duas fileiras sendo que um dos servados em estereomicroscópio e tiveram os conteú- ninhos tinha as células dispostas em única coluna. A dos descritos quanto aos exemplares encontrados e média do comprimento de cada célula foi de aproxi- preliminarmente identificados, assim como os madamente 13 mm, sendo de 6 até 8 mm a largura na excrementos, casulos, presas, visitantes e inquilinos. parte mediana e algumas apresentavam a superfície Os exemplares foram colocados em solução de álcool externa mais lisa enquanto em outras eram irregula- 70%. Acompanhamos a construção do ninho 1 em res, mais grossas, com sulcos aproximadamente trans- suas 3 células finais (total de 5 células) e a ação de versais, como os encontrados nos ninhos 14 e 16. clepto-parasitóide em 2 destas células. Este ninho foi Peculiares são os casulos, constituídos de fragmentos

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d

c

a

b

Fig.1 - Exemplar macho de Pison aureofaciale (grupo Fig. 2 - Ninho nº 1, de Pison aureofaciale com as 5 Pilosum) ninho nº 14, com os detalhes: células, na face inferior de folha de Strelitzia reginae. a)mandíbula com entalhe b)perna posterior com 2 espinhos na tíbia cinza amarronzado claro, espessura média ao redor c)gaster com o tergo I corcunda de 100 µ, aspecto translúcido e microscopicamente d)Asas: anterior com as 3 células submarginais; e a demonstra ser constituída por grãos de quartzo (areia) posterior com as 2 fileiras de hamuli delicadamente arranjados um sobre o outro, forman- do uma única camada de grãos, cimentados por argilo- minerais misturados com óxidos e hidróxidos de ferro de origem mineral e possuem poucos fios incorpora- (hematita, goethita e ferro coloidal), com dimensões dos externamente (Fig. 3) e macroscopicamente de- inferiores a 1 µ de diâmetro, e matéria orgânica (Fig. 4). monstram ser constituídos por duas porções (zonas), No conjunto esse material pode ser denominado de com coloração, textura e espessura distintas, uma orgaferriargiloquartzas e o seu arranjo é idêntico ao externa e outra interna. A zona externa exibe cor dos revestimentos elaborados com rochas rústicas marrom avermelhada a vermelho tijolo, aspecto terroso nas paredes das construções. Os grãos de quartzo de barro trabalhado, espessura ligeiramente irregu- usados na construção do revestimento interno dos lar, com média pouco inferior a 1 mm e superfície casulos são arredondados, relativamente límpidos, externa ornamentada em ondas subparalelas, orien- hialinos e possuem dimensões variando entre 50 e tadas transversalmente ao casulo com comprimento 220 µ, com média ao redor de 100 µ, portanto com de onda da ordem de 1 a 2 mm. Microscopicamente dimensões e formas idênticas aos observados na por- mostra ser constituído por grãos de quartzo (areia) ção externa, diferindo por não estar emerso na fração com dimensões de areia fina e silte, normalmente com argilosa. Estão arranjados de forma a usar pouco diâmetros inferiores a 220 µ, e dimensões médias ao material cimentante intersticial e gerar uma superfí- redor de 100 µ. Esses grãos estão dispersos irregular- cie relativamente lisa, na face interna, com os grãos de mente em uma massa de granulação finíssima (fração diâmetros maiores projetando-se na superfície exter- argila) composta por argilo-minerais, óxidos e na, gerando um aspecto rugoso, que deve facilitar a hidróxidos de ferro (hematita, goethita e ferro coloidal) aderência com a zona externa (barro trabalhado). e possivelmente pequena quantidade matéria orgâni- Cabe ressaltar que depois de algum tempo por ca. Macroscopicamente a camada interna exibe cor

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Fig. 4 - Aumento aproximado de 200 vezes mostrando os fragmentos minerais encaixados na parte interna do casulo de Pison aureofaciale (Grupo Pilosum), ni- nho n°14.

Fig. 3 - Casulo de Pison aureofaciale (gupo Pilosum) desta vez em seu interior como ocorreu na terceira feito de fragmentos minerais, dentro da célula de célula (32,0°C, 32,0% U.R.). Após introduzir a última barro aberta (ninho nº 14). aranha na célula, a vespa ficou com a cabeça e o tórax para fora e o gáster dentro do ninho, por alguns segundos, o que pode indicar a oviposição na última ressecamento ocorre a separação das duas porções ou numa das últimas presas, tendo isto ocorrido na com a interna permanecendo coesa e a externa frag- terceira célula no dia 21 às 14 h e 55 min (32,5°C, 32,0% mentando-se. Os aspectos mineralógicos e U.R); na quarta célula no dia 22 às 16 h e 15 min granulométricos observados indicam que o material (32,0°C, 30,0% U.R.) e na quinta célula no dia 23 às 18 usado para a construção do casulo é um solo similar h (32,0°C, 37,0% U.R.), horário de verão. O período de ao que existe na parte leste do Campus da Bela Vista, construção das células, até a vespa deixar uma peque- formado por alteração de rocha básica (no caso na abertura para a introdução das presas, foi de diabásio), com contaminação de areias provenientes aproximadamente 3 horas na terceira célula, 1 h e 55 de coberturas superficiais recentes ou das formações min na quarta célula e de 2 h e 20 min na quinta célula. Rio Claro, Botucatu e/ou Pirambóia. Este casulo de P. O tempo de atividade (construção da célula, aureofaciale (ninho 14), mediu aproximadamente 8 mm provisionamento com as aranhas, introdução de frag- de comprimento e apresentou em uma de suas extremi- mentos minerais, oviposição e fechamento) da vespa dades internas o excremento que é constituído por uma na terceira célula foi de 14 h e 5 min, na quarta célula espessa camada de cor cinza e sobre ela, no fundo, uma foi de 9 h e 45 min e na quinta célula foi de 10 h e 25 outra camada, branca e mais fina (ácido úrico). min. Durante o período de atividades de construção A Figura 5 representa a atividade da construção da terceira célula houve 97 retornos da vespa ao das 3 últimas células do ninho 1 no qual foi observada ninho, na quarta célula esse número foi de 81 e na a presença do clepto-parasitóide Chrysididae, que quinta célula foi de 94. O período de início de ativida- possui cor predominante verde com tons em azul des da vespa construtora foi às 9 h e 50 min, às 10 h aproximadamente a 15 cm de distância do ninho, em e 20 min, às 9 h e 15 min, e 8 h e 55 min, e o término das posição perpendicular a este, pousado numa folha atividades ocorreu às 17 h, 17 h e 50 min, 17 h e 45 min, (verde) de S. reginae. A presença do Chrysididae na 17 h e 55 min e 18 h e 15 min. Este ninho foi levado para terceira célula ainda em construção, ocorreu às 13 h o laboratório em 23/10/98 e dele emergiu 1 exemplar do dia 20, na ausência da vespa, e novamente voltou de Chrysididae em 16/11/98, (oviposição em 21/10/ à posição imóvel nas imediações do ninho. Uma nova 98 na terceira célula),o que perfaz 26 dias para o ciclo visita ocorreu no dia 21 às 12 h, aproximadamente, na ovo, larva, pupa e adulto, (23,1°C e 76,6% U.R., médi- ausência da vespa, e desta vez adentrou ao ninho as). Foi encontrado morto, posteriormente, um outro ficando com a cabeça voltada para fora na abertura da exemplar de Chrysididae na quarta célula. Um exem- célula (31,0°C e 34,5% U. R.). Na quarta célula o plar de Pison emergiu da quinta célula sendo que o mesmo fato se repetiu e a primeira ida ao ninho de um orifício no barro foi notado em 30/11/98 porém não exemplar de Chrysididae ocorreu às 16 h e 55 min do foi localizado o exemplar e supomos que tenha esca- dia 21 e chegando à célula, como na vez anterior, pado do recipiente no qual estava o ninho, tendo enfiou a cabeça pela abertura e rapidamente saiu, e a transcorrido 38 dias desde a oviposição, (com 24,22°C segunda ocorreu no dia 22 às 10 h e 55 min, entrando e 73,57% de U.R., médias). Não foram notadas diferen-

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Fig. 5 - As 3 células de Pison aureofaciale construídas (ninho 1), em função dos dias observados de atividade da vespa construtora e a ação do clepto parasitóide.

ças entre o casulo e excremento do ninho 1 (quinta casulos e excrementos. Exemplares da formiga célula) com os demais casulos e excrementos de Pison Crematogaster sp. (Hym.: Formicidae, Myrmicinae) observados. foram encontrados vivos em células de dois ninhos, A Tabela 1 mostra a freqüência dos himenópteros tanto em casulos de P. aureofaciale como nos casulos encontrados nos ninhos coletados. dos outros himenópteros. Exemplares da formiga A análise do conteúdo das células dos 21 ninhos Solenopsis sp. (Formicidae, Myrmicinae) foram encon- de P. aureofaciale coletados, demonstrou que 10 ni- trados mortos em um dos ninhos. Foram obtidos 12 nhos (47,61%) não foram parasitados. Casulos e exemplares de P. aureofaciale nos ninhos coletados excrementos diferentes dos observados em espécies entre 1998 a março de 2000. Emergiram no laboratório deste grupo foram encontrados em células de 11 5 exemplares (1 escapou) e 7 estavam mortos dentro ninhos (52, 38%) e em 7 destes foram encontrados dos ninhos, e do total obtido, 5 eram machos. casulos e excrementos bem como exemplares de clepto Foram encontrados em todos os ninhos exempla- e/ou parasitóides; nos 4 ninhos restantes, foram en- res inteiros ou parcialmente consumidos de quatro contrados casulos e excrementos diferentes dos ob- famílias de aranhas: Salticidae, Araneidae, Therididae servados em células não parasitadas. Dos inimigos e Thomisidae (Tmarus sp.). Espécies de outro gênero naturais relacionados, crisidídeos (Hym.: de esfecídio (Trypoxylon), também foram Chrysidoidea, Chrysididae) foram encontrados em 5 observadas e coletadas no local e provisionam igual- ninhos sendo o mais freqüente dos himenópteros, e mente seus ninhos com aranhas dessas mesmas 4 um deles foi identificado como Caenochrysis Kimsey & famílias, além de outras 3 (54 ninhos coletados, PINTO Bohart. Em duas células do ninho 2 foram encontra- et al. não publ.), e ninhos de ambos os gêneros foram dos dois exemplares alados (machos) de mutilídeo observados em duas ocasiões, separados por menos (Hym.: Tiphiodea, Mutillidae). Exemplares de dimi- de 1 metro. Exemplares de espécies maiores de outros nuto calcidídeo (Hym.: Chalcidoidea, Eulophidae, dois esfecídios também predadores de aranhas, ob- Tetrastichinae, Melittobia sp.) foram encontrados em servados no mesmo local e período foram: Trypoxylon células de três ninhos, sendo que no ninho 21 apenas (Trypargilum), 9 ninhos, de barro, em locais abriga-

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Tabela 1 - Himenópteros encontrados nas células dos ninhos de Pison aureofaciale.

Himenópteros Ninhos de Pison aureofaciale

1234567891011 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21

Chrysididae (Hym.: Chrysidoidea) XXX XX Mellitobia sp. (Chalcidoidea, Eulophidae) XX X Mutilidae (Hym.: Tiphioidea) X Crematogaster sp. (Hym.: Formicidae, Myrmicinae) XX Solenopsis sp. (Hym.: Formicidae, Myrmicinae) X

X = Exemplares de himenópteros encontrados em células dos ninhos  = Ninhos com células que continham casulos e excrementos que não eram os característicos de Pison aureofaciale

dos, dispostos longitudinalmente, com incrustações quem uma possível sobreposição de hábito alimentar de barro em forma de V, às vezes com algumas deze- em relação às quatro famílias citadas. nas de centímetros de comprimento; e de Sceliphron, O percentual de ninhos de P. aureofaciale com Sphecinae, 3 ninhos, também de barro, encontrados células parasitadas foi alto e este dado é coincidente, em locais abrigados, com formato de torrões, e com as no geral, com a informação de que as formas extremidades superior e inferior alongadas termi- parasíticas mantém constante assédio em ninhos de nando em fina ponta, e as vezes, com réplicas menores Sphecidae (BOHART & MENKE, 1976). Dos parasitóides, ao lado do ninho principal. crisidídeos foram os mais comumente encontrados (clepto-parasitóides), sendo que parasitam igualmente ninhos de vespas e de abelhas (BOHART & MENKE, 1976; DISCUSSÃO KIMSEY & BOHART, 1980). Ninhos de P. aureofaciale continuaram a ser obser- As células dos ninhos de P. aureofaciale observa- vados durante o decorrer do ano 2000 indicando ser das eram aproximadamente ovais, construídas inde- a espécie freqüente no local, porém não sendo a única pendentemente, e as paredes com variáveis graus do gênero. Outras espécies de Pison foram encontra- de contato entre si, dependendo da forma como as das na mesma área de estudo (pouco mais de 1.000 células estavam colocadas. Eram os ninhos, em sua m2). Em ninho abandonado de vespa social coletado, maioria, constituídos de 2 até 6 células, unidos em foi observada célula fechada com camada de barro de uma ou duas fileiras, embora também fossem observa- onde emergiram exemplares de esfecídeos e foram dos ninhos com as células agrupadas formando um enviados ao Dr. Arnold S. Menke, nos Estados Uni- conjunto arredondado, e mesmo com célula única. dos, que os identificou como sendo Pison duckei Menke A presença apenas da vespa construtora durante (Grupo Stangei); porém com nota de dúvida (question o acompanhamento de um dos ninhos, indica que este mark) e situados fora da área geográfica conhecida comportamento não é o mesmo do observado em P. para a espécie. Seus casulos, diferentes dos de P. strandi Yasumatsu (espécie japonesa) onde a presen- aureofaciale contém poucas partículas de areia (PINTO ça do macho foi observada durante a construção do et al., não publ.). Exemplar único, de provável terceira ninho, agindo como guarda, na ausência da fêmea espécie (ainda não identificada), foi encontrado e (BOHART & MENKE, 1976; MASUDA, 1939, cf., IWATA, 1976, possui características que não o inclui entre as espé- apud SAKAGAMI et al., 1990). cies do Grupo Pilosum (uma das características das Dentro da evolução social, deduzimos que a espé- espécies deste grupo é a mandíbula com entalhe, cie situa-se na posição 5, que vai de 1 (menos evoluída) sendo que o exemplar não tem esta característica) ou a 10 (mais evoluída) do esquema de Evans (EVANS & em espécies do Grupo Stangei (uma das característi- EBERHARD, 1970). A seqüência observada foi: ninho cas das espécies deste grupo é a de apresentarem (célula)-presa(s)-ovo-célula fechada e nova célula muitas pequenas cerdas nos olhos, sendo que o exem- preparada, este último item quando o ninho possuía plar não tem esta característica). O exemplar estava mais de uma célula. morto em célula de um ninho coletado em local fecha- Tanto quanto são conhecidas, as espécies de Pison do, com pouca claridade (os demais ninhos coletados provisionam seu ninhos com aranhas, e ninhos de P. estavam todos em locais abertos), e o casulo seme- aureofaciale e de Trypoxylon (Trypoxylon), (igualmente lhante aos de P. aureofaciale. Este fato sugere que predadores de aranhas) foram encontrados a curta espécies de Pison podem ser encontradas dentro de distância, um do outro, supondo que esteja ocorrendo áreas não muito amplas. Observações, no mesmo abundância dessas presas, embora, os dados indi- local, indicam que o mesmo acontece com espécies de

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Trypoxylon (Trypoxylon). Supomos ser necessário À Profa. Dra. Maria Santina de Castro Morini, do um melhor conhecimento dos aspectos de CEIS, UNESP, Campus de Rio Claro, SP, pela identi- nidificação das espécies de Pison encontradas no ficação das formigas, Crematogaster sp. e Solenopsis sp. Brasil (além das presas e inimigos naturais), como Ao Marcelo Antonio Harada Penna, do CEA, os presentemente relatados para P. aureofaciale, UNESP, Campus de Rio Claro, SP, pelos comentários para uma melhor compreensão do gênero, pois são críticos do manuscrito. relatadas dentro dos limites do país cerca de 23 espécies de Pison ( P. fritzi Menke, P. eremom Menke, P. delicatum Menke, P. plaumanni Menke, P. duckei REFERÊNCIAS B IBLIOGRÁFICAS Menke, P. neutropicum Menke, P. euryops Menke, P. cressoni Rohwer, P. chrysops Menke, P. pentafasciatum AMARANTE, S.T.P. Sphecidae. In: BRANDÃO, C.R.F. & CANCELLO, Menke, P. maculipenne Smith, P. brasilium Menke, P. E. M. (Eds.) Biodiversidade do Estado de São Paulo, Brasil. arachniraptor Menke, P. cameronii Kohl, P. dementia Síntese do conhecimento ao final do século XX. (Invertebrados Terrestres, 5). São Paulo: FAPESP, Menke, P. abothrum Menke, P.aranevorax Menke, P. 1999. 279p. convexifrons Taschenberg, P. cooperi Menke, P. ANTROPOV, A.V.& PULAWSKI, W.S. Pison antiquum, a new longicorne Menke, P. aureofasciale Strand, P. pilosum species from Dominican Amber (Hymenoptera: Smith, P. sphaerophallus Menke) e destas, há infor- Sphecidae). J. Hymenopterol. Res., v.5, p.16-21, 1996. mações de construírem células de barro as seguin- BOHART, R.M. & MENKE, A.S. Sphecid wasps of the world: a tes espécies: P. cressoni, P. aranevorax, P. longicorne, generic revision. University of California Press, 1976. P. pilosum e P. sphaerophallus, sendo que esta última 695p. espécie também constrói casulos feitos com minúscu- EVANS, H.E. & EBERHARD, M.J.W. The wasps. Ann Arbor: los grãos de areia (MENKE, 1988), faltando, portanto, University of Michigan Press, 1970. 265p. informações complementares acerca dos hábitos de KIMSEY, L.S. & BOHART, R.M. A synopsis of the Chrysidid nidificação para 16 das espécies conhecidas. genera of neotropical america (Chrysidoidea, Hymenoptera). Psyche, v.87, p.75-91, 1980. MENKE, A.S. Pison in the new world: a revision (Hymenoptera: Sphecidae, Trypoxylini). Contrib. Amer. AGRADECIMENTOS Entomol. Inst., Ann Arbor, v.24, n.3, p.1-172, 1988. MENKE, A.S. & FERNÁNDEZ, C.F. Claves ilustradas para las Ao Prof. Dr. Sérvio Tulio Pires Amarante, do subfamilias, tribus y géneros de esfécidos neotropicales MZUSP, São Paulo, pela identificação de Pison (: Sphecidae). Rev. Biol. Trop., v.44, n.2, p.1-68, aureofaciale Strand, (1910). 1996. Ao Dr. Arnold S. Menke, do Ammophila Research SAKAGAMI, S.F.; GOBBI, N.; ZUCCHI, R. Nesting biology of a Institute, Bisbee, Arizona, Estados Unidos, pela con- quasisocial sphecid wasp Trypoxylon fabricator. Jpn. J. firmação da identificação de Pison aureofaciale Strand, Entomol., v.58, n.4, p.846-862, 1990. (1910) e identificação de P. duckei Menke. Ao Prof. Dr. Celso Oliveira Azevedo, da Universi- dade Federal do Espírito Santo, Vitória, pela identifi- cação do crisidídeo Caenochrysis. Ao Prof. Dr.Antonio D. Brescovit, USP, São Paulo, Recebido em 18/12/00 pela identificação das aranhas. Aceito em 5/3/01

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