O Rio E a Casa Imagens Do Tempo Na Ficção De Mia Couto

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O Rio E a Casa Imagens Do Tempo Na Ficção De Mia Couto O rio e a casa imagens do tempo na ficção de Mia Couto Ana Cláudia da Silva SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros SILVA, AC. O rio e a casa : imagens do tempo na ficção de Mia Couto [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. 282 p. ISBN 978-85-7983-112-6. Available from SciELO Books < http://books.scielo.org >. All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution-Non Commercial-ShareAlike 3.0 Unported. Todo o conteúdo deste trabalho, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribuição - Uso Não Comercial - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não adaptada. Todo el contenido de esta obra, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento-NoComercial-CompartirIgual 3.0 Unported. O RI O E A CASA CONSELHO EDITORIAL ACADÊMICO Responsável pela publicação desta obra Alcides Cardoso dos Santos João Batista Toledo Prado Márcia Valéria Zamboni Gobbi ANA CLÁUDIA DA SILVA O RI O E A CASA IMAGENS DO TEMPO NA F I CÇÃO DE MI A COUTO © 2010 Editora UNESP Cultura Acadêmica Praça da Sé, 108 01001-900 – São Paulo – SP Tel.: (0xx11) 3242-7171 Fax: (0xx11) 3242-7172 www.editoraunesp.com.br [email protected] CIP – Brasil. Catalogação na fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ S578r Silva, Ana Cláudia da O rio e a casa: imagens do tempo na ficção de Mia Couto / Ana Cláudia da Silva. - São Paulo : Cultura Acadêmica, 2010. Inclui bibliografia ISBN 978-85-7983-112-6 1. Couto, Mia, 1955 - Crítica e interpretação. 2. Tempo na literatura. 3. Intertextualidade. 4. Ficção moçambicana - História e crítica. 5. Literatura africana (Português) - História e crítica. I. Título. II. Título: Imagens do tempo na ficção de Mia Couto. 11-0127. CDD: 869.8996793 CDU: 821.134.3(679)-3 Este livro é publicado pelo Programa de Publicações Digitais da Pró- Reitoria de Pós-Graduação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) Editora afiliada: Aos meus pais. Agradeço aos professores Maria Célia de Moraes Leonel e Francisco Noa por definirem com mais clareza os rumos de minha pesquisa. Com gratidão e amizade sempre renova- das, ao professor Luiz Gonzaga Marche- zan, que me orientou no doutorado com apoio lúcido e sempre generoso. SUMÁRIO Prefácio 11 Introdução 15 1 A literatura moçambicana e a obra de Mia Couto 19 2 A fortuna crítica de Mia Couto no Brasil 73 3 Um rio chamado tempo 137 4 Uma casa chamada terra 209 Considerações finais 263 Referências bibliográficas 267 PREFÁCIO Há muito Ana Cláudia da Silva lê a ficção de MiaC outo. Sua disser- tação de mestrado sobre o autor, no ano 2000, coincide com os avanços, no Brasil, dos estudos acerca da obra do escritor moçambicano. Este livro, O rio e a casa: imagens do tempo na ficção de Mia Couto, resulta da sua tese de doutorado no ano de 2010. Mia Couto caracteriza-se dentro do sistema literário moçambicano como um fino contador de histórias, que se alimenta tanto da cultura de matriz banta, como da intertextualidade mantida com seus autores preferidos. Ana Cláudia flagrou, de modo apurado, mais uma traves- sura do autor: a maneira como o conto Nas águas do tempo (de 1994, publicado no Brasil em 1996) e o romance Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra (de 2002, com edição brasileira de 2003) mantêm uma autointertextualidade. Esta foi sua tese. Dessa forma, o discurso literário poroso de Mia Couto sustenta uma literatura africana em língua portuguesa, o que a estudiosa tão bem discute enquanto disserta sobre a formação da literatura moçambicana. Noutro momento, então, o achado de Ana Cláudia: a análise da função da autointertextualidade – o modo como o conto encontra-se desenvol- vido no romance, a partir de aspectos da trajetória das personagens, sua formação e seu aperfeiçoamento acerca do entendimento do mundo, do universo da sua cultura, da institucionalização de sua nação. 12 ana CLÁUDIA DA silva O método da literatura comparada apoia a tese deste livro a partir de nexos comparativos localizados entre as categorias da ficção espaço e tempo trabalhados pela teoria bakhtiniana; no caso, a que provê a ideia de cronotopo. Tempos e espaços, cronotopos, constituem-se em conectivos, conexões entre os universos literários do conto e do romance interpretados. Dessa maneira, as personagens, no imaginário de Mia Couto, vivenciam, no tempo e espaço, circunstâncias da sua vida que atravessam, sem limites, questões da tradição moçambicana mescladas às da modernidade, o que traduz o próprio fazer literário do autor. As narrativas analisadas, no caso, perpetuam tal período interva- lar, que acomoda valores oriundos de substratos mitológicos com as experiências de realidades historicamente localizadas. Dessa maneira, conforme Mitologias, de Roland Barthes, os mitos constituem falas que lhes foram roubadas e resultam noutras que não se mostram as mesmas, quer no tempo quer no espaço. Assim, conforme a estudiosa: As culturas que subsistem na oralidade, em Moçambique, têm uma presença constante na obra do autor, que delas resgata elementos – histó- rias, mitos, crenças etc. – com os quais tece enredos que transitam entre o realismo e o inusitado das situações, permeados, sempre, de ironia, drama e crítica social, num equilíbrio que permite a abordagem de temas com- plexos – tais como as guerras, o racismo, a corrupção, o amor, a política e outros – de forma leve e bem humorada. Criatividade e competência literária, aliadas ao gosto de contar histórias e de permutar experiências tanto com o leitor como com outros autores, no diálogo intertextual, fazem da obra de Mia Couto um dos marcos mais importantes do sistema literário moçambicano. Por meio dela, uma identidade moçambicana, híbrida e, certamente, ficcionalizada, vai-se dando a conhecer em todo o mundo, abrangendo um número cada vez maior de leitores. A ficção de Mia Couto, como vemos, não trabalha com demar- cações de fronteiras entre o real e o sobrenatural, como demonstra o método de leitura de Ana Cláudia. O conto e o romance de Mia Couto em questão realizam, para o leitor, uma interlocução com a matéria literária atravessada pela oposição fundadora vida x morte, sensível a O RIO E A CASA 13 toda a humanidade e, de forma singular, à sociedade moçambicana, alegorizada em situações, como já dissemos, que sobrepõem sua tra- dição à modernidade. Ana Cláudia da Silva, leitora madura de Mia Couto, sempre soube que o ficcionista constrói suas narrativas por meio de motivos livres e composicionais, conforme observações de Tomachévski. Os livres funcionam de forma solta no âmbito das suas narrativas, transitam entre os mundos dos vivos e dos mortos; os composicionais deram à estudiosa os cronotopos – rio e casa, tematizados e figurativizados, configurados, que, para ela, constituíram-se no lugar da autointertex- tualidade. Diante disso, a autora realizou uma leitura e um inventário das obras voltados para o método comparado de análise literária. E deu-se muito bem. Luiz Gonzaga Marchezan INTRODUÇÃO Nossa leitura da obra de Mia Couto iniciou-se ainda na fase de graduação, com a disciplina Literaturas Africanas de Língua Portu- guesa, em 1996. Chamaram-nos a atenção, primeiramente, os poemas do autor; somente depois viemos a saber, pela leitura de alguns textos críticos, que sua obra ficcional era mais vasta e de melhor qualidade; dedicamo-nos, então, à sua leitura. Desse interesse surgiu o projeto no qual fizemos um estudo comparado das personagens infantis em Guimarães Rosa e Mia Couto; deste, abordávamos especialmente o conto “Nas águas do tempo” (Couto, 1996). Desde então temos acompanhado avidamente as publicações brasileiras da obra de Couto e também de alguma crítica. Em Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra (Couto, 2003), a temática do romance pareceu-nos próxima à daquele conto e, durante a leitura desses dois textos, essa impressão só fez confirmar-se. Os elementos em comum nessas duas narrativas deram origem à hipótese de que o romance teria sido concebido a partir de uma ampliação temática do conto. Guardamos essa ideia durante alguns anos. Em 2004, durante o curso de Especialização em Fundamentos da Leitura Crítica da Literatura, munidos de instrumentos teóricos que nos levaram a aprofundar nossa leitura do mesmo conto, tivemos a oportunidade de rever algumas questões que trazíamos conosco de 16 ana CLÁUDIA DA silva longa data. A primeira dizia respeito à historiografia literária moçam- bicana, cuja bibliografia é ainda muito restrita no Brasil; a segunda referia-se ao número crescente de trabalhos acadêmicos baseados na obra de Mia Couto. Vale lembrar que, desde que iniciamos nossa lei- tura da obra de Couto, o autor foi arrebanhando um grupo de leitores cada vez maior: suas publicações foram mais difundidas tanto pela sua presença na mídia quanto pelas suas frequentes visitas ao Brasil. Além disso, nossos estudos permitiram ampliar o leque de contribuições advindas da teoria literária, com as quais aprofundamos a reflexão sobre a obra de Couto. Este livro constitui-se de três momentos principais: a reflexão sobre a historiografia literária de Moçambique, as considerações a respeito da fortuna crítica acadêmica produzida no Brasil e a análise da autointertextualidade na obra ficcional de Mia Couto. No Capítulo 1, problematizamos algumas questões pertinentes à história da literatura moçambicana. Empreendemos, no início, uma discussão sobre a nomenclatura adotada para os estudos das literaturas africanas de língua portuguesa; a adoção de um ou outro termo para se referir ao conjunto dessas literaturas implica questões ideológicas que procuramos elucidar. Em seguida, procuramos refletir sobre a natureza da historiogra- fia literária à luz de estudos clássicos, como os de Vítor Manuel de Aguiar e Silva (1976; 1990), e de outros mais recentes, como aqueles produzidos no âmbito do Grupo de Trabalho (GT) em História da Literatura da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (Anpoll), nomeadamente os de autoria de José Luís Jobim (1998; 2005), Marisa Lajolo (1994) e Maria da Glória Bordini [199-?].
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