Coimbra No Romance Jornada De África, De Manuel Alegre Autor(Es

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Coimbra No Romance Jornada De África, De Manuel Alegre Autor(Es Coimbra no romance Jornada de África, de Manuel Alegre Autor(es): Hörster, Maria António Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra URL persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/38694 DOI: DOI:http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1164-8_17 Accessed : 28-Sep-2021 21:38:13 A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis, UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos. Conforme exposto nos referidos Termos e Condições de Uso, o descarregamento de títulos de acesso restrito requer uma licença válida de autorização devendo o utilizador aceder ao(s) documento(s) a partir de um endereço de IP da instituição detentora da supramencionada licença. 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Havia de suceder prestar-se justa 4º Conde da Ericeira), a Doutora homenagem a uma universitária que sobejamente a merece, sem para isso Ofélia Paiva Monteiro tem-se afirmado como figura de referência ter feito outra coisa que não aquilo que mais e melhor tem feito: ensinar, em vários domínios dos nossos investigar, orientar, estimular nos seus incontáveis discípulos o desafio estudos literários. Integrando-se Série Investigação de aprender. Por isso encontramos, neste livro de celebração de uma numa geração onde a história • grande senhora da universidade portuguesa, ensaístas de várias gerações, da literatura se constituía como Imprensa da Universidade de Coimbra UMA COISA formações e origens. Nem todos terão sido formalmente alunos de Ofélia dominante, concedeu sempre ao Coimbra University Press 2012 texto uma atenção destacada, Paiva Monteiro; todos foram seus discípulos, no sentido mais rico do termo, assumindo-se como intérprete fina NA ORDEM o de aprender com quem, tendo a superioridade do saber não exibe ORDEM DAS COISAS de estruturas, estilos e subjetividades. a arrogância de o impor. Assim foi e continua a ser Ofélia Paiva Monteiro, Professora de Literaturas Francesa UMA COISA NA DAS COISAS ao longo de uma vida consagrada a ler e a ensinar a ler muitos autores de e Portuguesa na Faculdade de Letras ESTUDOS PARA OFÉLIA PAIVA MONTEIRO muitos tempos; é também resultado da motivadora pluralidade de saberes de Coimbra (entre 1959 e 1999), não se limitou a investigar uma e da homenageada a diversificada gama de temas literários e culturais que outra, assumindo perspetivas de CARLOS REIS estes estudos contemplam. Todos e cada um deles são testemunho de comparatismo fecundo e muitas JOSÉ AUGUSTO CARDOSO BERNARDES gratidão pelo exemplo da Mestra. vezes inovador. Tendo-se dedicado MARIA HELENA SANTANA primacialmente a Garrett (com quem COORD. construiu, ao longo de décadas, uma forte intimidade intelectual e cuja edição crítica vem dirigindo), não deixou de visitar, em registo de articulação periodológica, nomes como Camões, Herculano, Stendhal, Castilho, Victor Hugo, Eça de Queirós, André Gide, Vergílio Ferreira entre muitos outros. 9 789892 602738 IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA COIMBRA UNIVERSITY PRESS Verificar dimensões da capa/lombada. Lombada com 39mm Maria António Hörster Universidade de Coimbra COIMBRA NO ROMANCE JORNADA DE ÁFRICA, DE MANUEL ALEGRE Coimbra na estrutura romanesca A cada releitura de Jornada de África (1989) ganha mais força a impressão de estarmos perante uma espécie de jogo de bonecas russas: julgamos ter surpreendido a face do romance e eis que, por detrás dela, ou de dentro dela, novas dimensões de leitura vão emergindo, sem que possa dizer-se qual a que mais justiça faz à obra, se a que se desvela à superfície, se a mais íntima e bem guardada. Num primeiro plano, o romance dá-se a ler como a crónica da guerra colonial, sendo essa a tónica de leitura colocada pela quase totalidade, se não a totalidade, da crítica1. O próprio autor terá afirmado no lançamento do romance que “é uma espécie de crónica de fim de Império, o fechar de um ciclo onde está presente o sopro de Alcácer-Quibir”2. Ainda que dando caução a inter- pretações mais amplas, estas palavras parecem abonar em primeira linha o destaque dado pela crítica ao tema da intervenção militar portuguesa em África a partir de 1961. E para tal não faltam as razões. Efetivamente, quer o título, que retoma o de uma crónica de Jerónimo de Mendonça, reunida por António Sérgio numa coletânea de 19243, quer a ação do romance, que decorre na sua quase totalidade em terras africanas e tem como personagens de primeiro plano 1 A guerra colonial constitui o foco de leitura, ainda que não de modo exclusivo, por ex. em Arnaut (1989), Ferreira (1989), J. C. (1989), Lepecki (1989), Melo (1989a), Rocha (1990 e 1997), Teixeira (1998). 2 Cf. J. C, “Viver uma «Jornada de África» com a escrita de Manuel Alegre”, in Jornal de Coimbra – Letras & Artes, 5 de abril de 1989, p. 17. 3 Essa colectânea surge identificada no próprio texto do romance com nome do editor, título, casa editora e data (Alegre 1989a: 74). as tropas portuguesas – que ora discutem a intervenção portuguesa naqueles territórios, ora relatam episódios da guerra, ora se encontram envolvidas nos combates –, quer ainda todo o denso trabalho intertextual com o mito de D. Sebastião, levam a colocar a guerra colonial no centro da conceção do texto. As evidentes relações com o mito sebástico, de dimensão estruturante, in- vestem-se de significado a vários níveis: da diegese, da estrutura temporal, da conceção das personagens, da composição do tecido discursivo, bem como num outro plano ainda, que podemos considerar o estrato comentador. Assim, as ressonâncias sebásticas do título apontam não só para o tema central da diegese, o de uma campanha militar portuguesa em terras africanas, como simultanea- mente detêm um valor proléptico, na medida em que criam a expetativa de um fim catastrófico, com o desaparecimento da figura central no meio do combate. Para além desta relação fundamental, o entrecruzar dos dois planos históricos conduz a toda uma gama de anacronias4 bem como de anacronismos5. No que respeita à conceção das personagens, o facto de um núcleo central dos com- batentes em Angola ostentar o nome de figuras que em Alcácer-Quibir ficaram estropiadas ou sucumbiram, a começar pelo protagonista, Sebastião, se por um lado é objeto de tratamento irónico por parte dessas mesmas personagens6 e, 4 Sobre o conceito de anacronia, cf. Silva 1993: 751-758. 5 Chama já a atenção para estes anacronismos Clara Rocha: “Do mesmo modo são curiosos os anacronismos resultantes da sobreposição da história à História, como a identificação de naus e de aviões, de corcéis e de jipes, de reino e de Império, etc.” (Rocha 1990: 188). 6 No primeiro encontro de Sebastião com o Escritor, em Luanda – marcado por meio de um jogo de “revelação” de identidades para o qual a apresentação da página 149 da crónica de Jerónimo de Mendonça “Jornada de África”, inserida na coletânea de António Sérgio O Desejado, na edição das livrarias Aillaud e Bertrand, 1924, funciona como santo-e-senha –, os interlocutores travam o seguinte diálogo, pleno de reflexões metaficcionais, em que ironicamente se procura jogar com o argumento da verosimilhança e da razão, por um lado, e o do acaso e da coincidência, por outro: “ – Porque é que o pôs [ao livro de António Sérgio] a fazer de credencial? – Talvez por superstição. Sou um sebastianista do avesso. Sebastião curva-se ligeiramente para ele: – Por isso ou porque se chama como o autor de uma das crónicas. – E você já reparou como se chama? – Há várias gerações que há sempre um Sebastião na minha família. Homenagem a um avô que se perdeu em Alcácer. Agora calhou ser eu. Se isto fosse um filme, diria que é um truque para produzir efeitos especiais. Como não é, cheira-me a ficção da própria vida. A razão diz-me que não pode ser, mas o que é a razão. A verdade é que você é Jerónimo de Mendonça e eu sou Sebastião, comigo veio um que se chama Jorge Albuquerque Coelho. Pode ser um acaso, tudo afinal é acaso, mas não serão coincidências a mais? – Talvez a imaginação nos tenha levado sem darmos por isso. Será que nos chamamos real- mente assim? – Que quer dizer? – Quero dizer que talvez usemos pseudónimos, talvez não saibamos os nossos próprios nomes.” (Alegre 1989: 76-77). 282 como tal, desmascarado enquanto jogo do narrador, por outro lado aponta, se passarmos por cima desta ironia metaficcional, para uma ideia de História como repetição e sugere uma componente fatalista, uma admissão da força do destino, a que as personagens porventura não se podem eximir: São quase dez da noite e ele ainda não sabe: algures, em Angola, o destino já está em marcha. (Alegre 1989a: 21) Podia estar a dar o salto, mas aqui vai. Há muito que a tribo não tem senão uma vida vidinha.
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