http://dx.doi.org/10.1590/2238-38752017v725 1 Universidade de Coimbra, Faculdade de Economia, Coimbra, Portugal
[email protected] Elísio Estanque I A prÁxis do trote: breve etnogrAfiA históricA dos rituAis estudAntis de coimbrA* Este texto foi escrito originalmente em português de Portugal, onde a noção de trote tem a designação de praxe. A praxe é uma práxis que pode ser en- tendida em sentido amplo ou mais restrito. O Código que regula a praxe em Coimbra (com 290 artigos)1 define-a simplesmente como “o conjunto de usos e costumes tradicionalmente existentes entre os estudantes”. Numa linha que vai ao encontro da ideia de “ritual iniciático”, do antropólogo Van Gennep (1981), o historiador Paulo Archer de Carvalho, definiu as praxes como “a sobrevivência simbólica de rituais de passagem, de presentificação e de he- terorreconhecimento, balizadas por gestos que tentam assinalar a desbestia- lização do aprendiz e a sacralização do ofício intelectual, partindo do prin- 458, agosto, 2017 agosto, 458, – cípio – consagrado na própria nomenclatura (o burro, a cabra, o chocalho, a “magna besta”, etc.) – de que o ser humano é à nascença uma besta” (Assem- bleia da República, 2008). Tais rituais, por vezes considerados mecanismos de integração, visam “testar” ou “pôr à prova” o “novato”, o “recruta”, aquele que acaba de chegar a uma nova condição ou comunidade e que a ela deve submeter-se. Ao contrário do caso brasileiro, essas práticas (trote/praxe) são, ainda hoje, um verdadeiro fenômeno de massas nas universidades portuguesas. Segundo estudo internacional recente,2 cerca de 73% dos jovens universitários portugueses afirmaram ter sofrido alguma praxe mais pesada quando entra- ram na universidade (enquanto a média dos países estudados era de 25%), sociol.