Relações Entre Tv E Poder Político: Dados Históricos Para Um Programa De Leitura Dos Produtos Televisivos No Ensino E Aprendizagem
Total Page:16
File Type:pdf, Size:1020Kb
RELAÇÕES ENTRE TV E PODER POLÍTICO: DADOS HISTÓRICOS PARA UM PROGRAMA DE LEITURA DOS PRODUTOS TELEVISIVOS NO ENSINO E APRENDIZAGEM Áureo BUSETTO1 Resumo: Trata-se de um levantamento e sistematização de dados e informações da relação entre TV e poder político ao longo da história do meio, quer em países da Europa, nos EUA e no Brasil. Seu objetivo é fornecer alguns elementos e subsídios históricos para que os professores ocupados com metodologias que tomem a TV como objeto de ensino e aprendizagem possam realizar uma leitura sócio-histórica do meio, portanto transcendente às leituras dos códigos internos dos programas de TV. Palavras-chave: TV; poder político; Estado. NOTA METODOLÓGICA Ao tomar a TV como objeto de ensino e aprendizagem, portanto em uma perspectiva para além do uso da tevê como mero recurso didático, o educador não deve tão somente apresentar e tratar os produtos oferecidos pela mídia televisiva unicamente por suas propriedades internas. É necessário que ele tenha em mente que as propriedades constituintes dos produtos oferecidos pela TV serão, sempre mais, fertilmente conhecidas e compreendidas quanto mais forem pensadas e tratadas como resultantes das relações entre a estrutura e a dinâmica do mundo televisivo, o qual deve ser entendido, no tempo e no espaço, à luz das relações existentes entre os agentes envolvidos com os processos de produção, divulgação e recepção da TV, das relações desse meio com as demais mídias e os outros domínios sociais específicos que, como ela, compõem a sociedade. Assim, é preciso que o professor busque conhecimentos sobre o organograma padrão, as técnicas e as tecnologias aplicadas no funcionamento geral da TV e, evidentemente, procure conhecer também a especificidade desses elementos em relação às emissoras que produziram o programa que será utilizado em sala de aula. Mas é fundamental também que ele procure conhecer as relações da TV - tanto do ponto de vista geral do meio como das emissoras em particular cujos produtos serão utilizados nas atividades didáticas - com as várias dimensões da sociedade – como a esfera social, política, econômica e cultural. O conhecimento dessas relações traz elementos e subsídios para melhor a melhor compreensão das razões e interesses de um produto televisivo ser o que tem sido. Caminho que possibilita a realização de uma leitura sócio-histórica dos programas de TV, logo uma leitura que não se restrinja apenas aos códigos internos e às técnicas aplicadas na sua produção. 1 Professor Assistente Doutor do Departamento de História da FCL-UNESP/Assis 189 Nessa direção, o professor deverá cuidar em primeiro lugar sobre a relação entre a TV e o poder político, dado que esse meio, diferentemente dos meios impressos, somente é possível de funcionar a partir desta relação, pois é sempre o Estado que controla as concessões para o uso do espectro eletromagnético necessário para a transmissão dos sinais televisivos, quanto não é ele próprio (Estado) que mantêm emissoras. Num mundo amplamente tocado pelas imagens e informações da TV, a relação entre o meio e o poder político ainda preocupa em termos das possibilidades ou consolidação de uma TV democrática. Elementos de reflexão para esse tema, assim como para uma leitura sócio-histórica dos programas televisivos, devem ser buscados primeiramente na história da relação entre TV e política, tanto no passado como no presente hoje, quer nas experiências de países europeus e nos EUA, quer no caso brasileiro. DO NASCIMENTO DA TV E DOS PRIMEIROS CUIDADOS POLÍTICOS COM O MEIO Em alguns países da Europa ocidental e nos Estados Unidos, as primeiras emissões regulares de televisão iniciaram-se durante o entreguerras. Porém, a operação do meio era ainda incipiente do ponto de vista tecnológico e limitada territorialmente. Entretanto, a trajetória inicial da TV, tanto a européia como a norte-americana, foi pautada por uma experiência à margem do rádio. Era propriamente a pré-história da TV - a sua infância feliz, como bem define o historiador francês Jeanneney (1996, p.222). Período que fora prolongado por conta da Segunda Guerra, uma vez que, ao eclodir esse conflito mundial, a técnica da TV não era ainda suficientemente avançada para poder servir às nações beligerantes. Dessa forma, a expansão técnica da TV fora praticamente abandonada, pois os esforços de cientistas e técnicos, as verbas e os subsídios oficiais foram aplicados amplamente no aperfeiçoamento de outras tecnologias mais desenvolvidas que pudessem colaborar na solução do conflito bélico mundial iniciado em 1939. Talvez a chegada da maioridade da TV após a Segunda Guerra possa dar pistas para explicar o excessivo alumbramento e exagerado empenho das redes de TV para cobrirem as posteriores guerras localizadas – como a Guerra da Coréia e a do Vietnã -, ou, ainda, sirva para explicar a escolha da Guerra do Golfo (1990) como marco inaugural do projeto telejornalístico da CNN. Durante a pré-história da TV, período de felicidades para o novo meio, mas, também, de hesitações, Grã-Bretanha, EUA, França e Alemanha destacaram-se em termos de experiências envolvidas com o avanço da qualidade, diversidade e vitalidade do então novo meio de comunicação social. Contudo, como enfatiza Jeanneney (1996,p.223), experiências que foram sempre conduzidas à pequena distância pelo poder político, o poder de governos ou do Estado. Acompanhamento que não deixaria de existir mesmo depois da TV alcançar a sua maturidade, embora com algumas inflexões nesse expediente com relação ao período inicial de funcionamento do meio. 190 Desde 1925, a Alemanha, assim como a Inglaterra e Estados Unidos, ocupava destacado papel no âmbito dos avanços científicos com relação à fotoeletricidade, fenômeno que aplicado em pesquisas e inventos tinha possibilitado a existência da TV, ao varrimento, um dos maiores obstáculos técnicos à efetivação do meio no período, e à substituição do sistema televisivo mecânico pelo eletrônico. Entretanto, as primeiras emissões experimentais de TV na Alemanha, operadas com 30 linhas, ocorreram em 1929, um ano após as realizadas pelos Estados Unidos, com 45 linhas, mas precedendo em três anos as ocorridas na Inglaterra e França, com iguais 30 linhas. Durante a segunda metade dos anos 1930, as inovações na área da tecnologia televisiva se concentrariam, mais significativamente, na Alemanha e Grã- Bretanha. A partir de março de 1935, o governo alemão oferecia um serviço regular de TV pública via o Centro Paul Nipkow. Segundo critérios da época, a TV alemã funcionava com um padrão de média definição, isto é, 180 linhas e 25 quadros por segundo. Padrão, no entanto, obtido desde 1933 e que fora superado somente três anos depois pela TV britânica. Assim, em novembro de 1936, o governo britânico iniciava seu serviço de emissão regular pela emissora pública da British Broadcasting Corporation (BBC), operando com 240 linhas. E o avanço da BBC não cessaria. Em fevereiro de 1937, passava a operar com 405 linhas, padrão considerado pelos técnicos do período como de “alta definição”, uma vez que garantia boa qualidade e nitidez da imagem. No início de 1939, já transmitia 24 horas semanais de programação para 20 mil televisores existentes na região londrina. Avanço considerável para a TV que já conseguira o marco de transmitir ao vivo, em 1937, a cerimônia de coroação de George VI para cerca de 50 mil telespectadores, embora esses não fossem assim denominados à época. Contudo, fora a TV alemã que alcançara o invejável feito de transmitir para seis cidades do território germânico e um público de quase 160 mil telespectadores a Olimpíada de Berlim, ocorrida em 1936 e considerada o primeiro grande acontecimento televisivo. Feito obtido graças a investimentos do governo nazista para cobrir o território alemão com cabos transmissores e a criação de centros coletivos de recepção de TV (Jeanneney,1996,p.222-4; Espada, 1982,p.120-2). Empenho resultante, provavelmente, do interesse do III Reich em obter um veículo de propaganda política mais eficaz do que o rádio, além da sua expectativa de que a tecnologia televisiva pudesse ser empregada num futuro conflito bélico. Mas, a TV não fora apenas colocada a serviço da política interna do III Reich, pois serviu, também, à sua propaganda internacional. Desde 1934, o governo alemão enviava aparelhagem e equipe técnica para realizar demonstrações públicas de televisão em diversos países (Espada, 1982, p.121), notadamente naqueles que o III Reich se interessava em estabelecer sua influência comercial e ideológica. Nos EUA, ao contrário da Grã-Bretanha e igualmente à história do rádio norte- americano, o setor privado domina a corrida pela TV. Em 1931, a poderosa RCA instala um 191 emissor no topo do Empire State e, em julho de 1939, lança a primeira emissora de televisão comercial do mundo: a NBC. O princípio da liberdade de empreendimento provoca uma grande desordem, cada fabricante se esforça por promover o seu televisor, retardando, assim, as vendas dos aparelhos receptores. Nesse período a TV não próspera na terra que, após a guerra, mais compreenderá e difundirá o meio televisivo. Na França, o governo federal se mostra, em 1934, completamente interessado nas experiências acerca da TV. No ano seguinte, é criado o primeiro estúdio televisivo em Paris. A Torre Eiffel é utilizada como antena da emissora. O sistema televisivo passa das precárias 60 linhas para o pouco menos limitado de 180 linhas. Em 1939, a TV francesa, também de natureza pública, já emitia 15 horas por semana e contava com centenas de receptores instalados na região parisiense, geralmente em lugares públicos (Jeanneney, 1996, p. 223-4) Ao contrário do que muitos desconhecem, o Brasil não passaria completamente ao largo dos primeiros passos da TV. Por certo, o país não realizara notáveis experiências e nem emissões televisivas regulares, mas contou com pontuais e limitados experimentos da TV. Em 1933, o médico e cientista Edgard Roquete Pinto, responsável pela instalação da radiofonia brasileira, realiza, no Rio de Janeiro, a primeira experiência com a TV (Xavier, 2000, p.