DIRETOR - FRANCISCO MADELINO JORNAL BIMEStrAL 3.a SÉRIE • 1€ N.0 20• Nov-dez 2019

Combate à pobreza

TL nov-dez 2019 3

4 8 10 14 16 18 22 Reportagem: Gala Viajando com livros Memórias Ciclo Mundos: Viagens: Ver | Ouvir Contos do Zambujal Social Inatel de Júlio Isidro Leyla McCalla Carnaval de Nice

6 9 12 Carnaval 20 23 Reportagem: Inatel A Casa na árvore Entrevista: de Vale Ílhavo Notícias | Coluna do Passatempos 55+.pt Inclusivo Edmundo Martinho Provedor ÍNDICE capa Editorial

FRANCISCO MADELINO Presidente da fundação inatel

Pobreza: ainda a grande Questão Social

pobreza é uma das razões que mais justificou e justi- fica as políticas públicas e os programas e teorias po- usa Monteiro vive em Beja, lítico-sociais que lhes estão associadas, seja na lógica cidade onde nasceu. Estudou Realização Plástica da justiça, seja na igualdade de oportunidades. Os fi- do Espectáculo na Escola lhos dos pobres não partem em igualdade no acesso às Superior de Teatro e Cinema oportunidades que a vida e a sociedade lhes abrem. Os e cinema de animação no pobres, em regra, têm origem já pobre. Paralelamente, CITEN. Durante alguns Apara muitos, a pobreza não resultou sobretudo das consequên- Sanos trabalhou como figurinista, cias das suas decisões individuais perante a vida, mas é determi- caracterizadora e aderecista para o teatro nada por relações de poder no acesso aos bens e ao saber, assim ilustração e para o cinema. como pela lotaria da vida e da natureza. Susa Monteiro Em 2009, com a inauguração Justiça e igualdade de oportunidades, são assim temas que sur- da Bedeteca de Beja e do Festival gem associados inevitavelmente à pobreza. Assim como a digni- Internacional de Banda Desenhada dade do homem e os seus direitos inalienáveis. de Beja (onde é responsável pela é, no quadro dos países europeus e mais desenvol- linha gráfica e coorganizadora), deixa definitivamente as artes do espectáculo vidos, uma exceção negativa em termos de pobreza. Estamos e passa a dedicar-se exclusivamente à na União Europeia no top da pobreza e da desigualdade social. banda desenhada e à ilustração. Muito por culpa de décadas e décadas de enorme pobreza e da Nos últimos anos ilustrou livros para desigualdade da distribuição do capital humano. diversas editoras como a Pato Lógico, Em 2018, segundo o INE, 17,3% dos portugueses estão abaixo Bertrand, Asa, Verbo, Bruáa, Oficina do do limiar de pobreza. Nas últimas décadas, ao longo da Demo- Livro, etc. E ilustrou cartazes e panfletos cracia, esta variável tem descido tendencialmente, sofrendo ape- para várias instituições e projectos (Casa nas, durante os radicalismos da Troika, um aumento e inversão da Música, Palavras Andarilhas, Almarte (chegou aos 20%). Quase metade dos portugueses (41,3%) não – Festival de Artes na Rua, La Guarimba tem capacidade para pagar uma semana de férias, por ano, fora International Film Festival, Festival du de casa. Quase 35% não tem capacidade para pagar imediata- Court Métrage de Clermont-Ferrand, mente uma despesa, sem recorrer a um empréstimo. Mais de 7% etc.) Publica regularmente ilustrações e dos que trabalham, continuam em pobreza (sendo quase 11% há bandas desenhadas em vários álbuns, quatro anos, antes da subida do salário mínimo). fanzines, jornais e revistas. Assim uma Fundação como a Inatel, inclui na génese da sua Tem exposto frequentemente o Missão o lazer para todos, e o combate à exclusão social dos po- seu trabalho em festivais de Banda bres, promovendo a inclusão social, a cultura e a educação. Desenhada e galerias individual e Este número do Tempo Livre centra-se assim na raíz da génese colectivamente. da Inatel, há 84 anos. Usufrua dele e reflita connosco.

Jornal Tempo Livre | email: [email protected] | Propriedade da Fundação Inatel | Presidente do Conselho de Administração Francisco Madelino Vice-Presidente Lucinda Lopes Vogais Álvaro Carneiro e José Alho Sede da Fundação/ Sede do Editor/ Sede da Redação Calçada de Sant’Ana, 180 – 1169-062 Lisboa NIPC 500122237 Diretor Francisco Madelino Publicidade Tel. 210027000/ [email protected] Impressão Lidergraf Sustainable Printing – Rua do Galhano, 15 – 4480-089 Vila do Conde Tel. 252 103 300 Dep. Legal 41725/90 Registo de propriedade na ERC 114484 Preço 1 € Tiragem deste número 110.746 exemplares Membro da APCT – Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação | Estatuto editorial publicado em www.inatel.pt 4 TL NOV-DEZ 2019 reportagem

O Teatro da Trindade foi o palco da primeira edição da Gala Social Inatel, que se realizou no dia 22 de outubro, com apresentação GALA SOCIAL de José Carlos Malato bem-estar integral e o desen- Já no palco e ao mesmo tempo que rece- volvimento pessoal de cada bia o testemunho da aldeia vencedora na um é um dos pilares das várias edição passada, o representante da aldeia Prémios Personalidade missões da Fundação Inatel, as- da Estrela, afirmou que estas iniciativas sim como abraçar causas sociais fazem toda a diferença, principalmente CULTURA que promovam a inclusão de quando há habitantes que nunca saíram Cinema: Abi Feijó todos os cidadãos. “A Fundação da aldeia e nunca fizeram uma coisa tão Etnografia e Tradição: Mário Correia Oalterou o seu funcionamento e alguns dos simples como ver o mar. Música: António Vitorino de Almeida seus objetivos mas a sua missão, nestes 84 A Conversa Amiga é uma linha de aten- Teatro: Carlos Fragateiro anos, tem permanecido, praticamente, a dimento telefónico, um espaço de escuta, Cultura e Multiculturalidade: Mia mesma”, referiu Francisco Madelino, pre- sete dias por semana, 365 dias por ano, em Couto sidente do Conselho de Administração da que uma empenhada rede de voluntários, Fundação Inatel, na sessão de abertura. de forma comprometida e empática, ouve DESPORTO É através deste evento que se revela a quem mais precisa de uma voz amiga. An- Personalidade no Desporto: Nuno importância do trabalho desenvolvido em dreia Condesso foi quem subiu ao palco Delgado Portugal, no campo das políticas sociais, para receber o prémio de reconhecimento, Desporto no Coletivo: Centro de e onde se reúnem os principais interve- e ilustrado pelo espetáculo “Por Terras do desabafando que, por vezes, é ajudando Recreio Popular de Formoselha – nientes de iniciativas promovidas pela Zeca”, uma homenagem à obra de José os outros que se ajuda a ela própria. Associação Cultural, Desportiva e de Fundação Inatel, bem como pessoas e or- Afonso, autor e cantor português. A distinção dos Centros de Cultura e Solidariedade ganizações da Administração Pública e da “Índios de Meia-Praia” e “Venham mais Desporto filiados na Fundação Inatel que, Desporto para a Inclusão: Associação Sociedade Civil, que assumem um papel Cinco”, foram alguns dos temas ouvidos em 2019, celebraram 100 anos ao serviço Jorge Pina importante para a vida da comunidade. no palco do Teatro da Trindade, que sur- da comunidade também foram premia- Entre os envolvidos, estiveram cerca de giram revestidos de novos arranjos de dos. Foram eles: a Associação Filarmónica TURISMO, SUSTENTABILIDADE 25 pessoas na organização e cerca de 350 Davide Zaccaria e com as vozes residentes Lyra Barcoucense, a Associação Recreativa E ECONOMIA SOCIAL pessoas no público, numa noite repleta de deste projeto, Filipa Pais, João Afonso, Ma- e Cultural de Serzedo, O Clube de Futebol Envelhecimento Ativo: José Eduardo sentido de humor, boa disposição e tam- ria Anadon e Stefania Secci. “Os Belenenses”, o Clube Desportivo de Pinto da Costa bém alguma emoção à mistura. Pedrouços, o Clube Nacional de Natação e Acessibilidade: Tur4All, Accessible Premiados a Sociedade Filarmónica Flor do Alva. Portugal O espetáculo A Aldeia dos Sonhos é um programa dire- O reconhecimento aos trabalhadores da Sustentabilidade: Alfredo Sendim, José Carlos Malato foi o apresentador que cionado para os habitantes de aldeias por- Inatel também é um momento esperado Herdade do Freixo do Meio guiou esta noite de Gala, confessando que tuguesas isoladas geográfica e socialmen- nesta gala onde a Fundação reconhece o Economia Social: Edmundo Martinho é um grande privilégio fazer parte deste te, onde vivem 100 ou menos pessoas. Esta trabalho de colaboradores que tenham Formação e Inclusão: Associação projeto de reconhecimento e valorização iniciativa proporciona experiências turísti- passado à condição de reformados duran- Portuguesa de Surdos e estar ao lado da Fundação Inatel para cas, culturais e desportivas. Em 2019, a al- te os últimos 12 meses e tenham dedicado Direitos Humanos: Teresa Tito de dar a conhecer estas iniciativas. A Gala So- deia premiada foi a Estrela, localizada no anos de vida ao serviço da Instituição. Morais cial Inatel contou com um programa rico concelho de Moura, Alentejo. Mafalda Carvalho TL nov-dez 2019 5

Fotos: beatriz Lorena 6 TL NOV-DEZ 2019 reportagem Inatel 55+.pt Inclusivo Quando a oportunidade é de todos e para todos Inclusão. Assistência. Tolerância. Igualdade. São tudo sinónimos de Inatel 55+.pt

Programa da Fundação Inatel 55+.pt, em parceria com as áreas governativas do Trabalho, So- lidariedade e Segurança Social e da Economia e o Turismo de Portugal, destina-se à população idosa, pessoas com deficiência Oou carência económica. O Programa pre- tende disponibilizar atividades de lazer, associadas a ações integradas de apoio à cidadania e ao envelhecimento ativo, apro- veitando as infraestruturas hoteleiras exis- tentes, na época de baixa sazonalidade. De norte a sul, nas Inatel locais, são re- cecionadas muitas candidaturas de quem nunca tem a oportunidade, ou tem muito poucas oportunidades, de sair e de conhe- cer outros lugares que não aqueles que estão a apenas 100 km de distância da sua área de residência. Numa viagem de 5 dias, pela cidade de Setúbal e Lisboa, conhecemos um gru- po de mais de 20 pessoas, das cidades de Leiria, Coimbra e Aveiro. Casais. “Corajo- sos” que se aventuraram sozinhos e hou- ve quem viesse com amigos e amigas. Em comum, a vontade de sair de casa e de conhecer outros semelhantes, que em tudo e nada, são iguais a eles próprios. Das visitas pelas cidades, aos almoços te- máticos, às noites de baile, passando pela do. Amigos tinha, amigos foram.” E amigos nhou – mas foi surpreendido pela boa von- história com base nas vivências de cada um. formação, a criação e o trabalho em grupo, tem com programas como este que, pre- tade de muitos que estavam sempre atrás E nem todos tiveram uma infância feliz. o Programa Inatel 55+.pt tem a missão de, tendem chegar aos “Josés” do país, e que da cadeira, ou de olhar atento, só para per- “A gente espera que o mundo seja bom, e mais do que passear, é partilhar. Tolerar. façam pensar as “Marias” e os “Antónios”. ceber se precisava de mais tempo ou se es- não é assim, viver é difícil e sofremos quan- Saber olhar de forma diferente o que está Quando confrontados com a situação tava a acompanhar a velocidade do grupo. do somos crianças e são esses momentos para lá da porta de casa. Dar a conhecer do José, ou com um outro participante de A Isilda é analfabeta. Ou antes, sabe ler, e que nos marcam e marcam aquilo que que- histórias de outras pessoas que riem dos cadeira de rodas, ninguém hesita nas res- escreve o seu nome. E dá. Dá para viver e remos ser. Quando tens uma pessoa que próprios problemas, pessoas que não fa- postas, “está tudo pronto para ajudar o se- para dizer sim ao pedido da filha “Tinha re- conta que aos 18 anos o pai lhe disse: ‘sai zem do analfabetismo ou uma cadeira de nhor de cadeira de rodas e o senhor cego, morsos de vir sozinha lá de Coimbra, mas a de casa ou espeto-te com uma forquilha’, rodas razão, ou até desculpa, para deixar porque hoje são eles, amanhã somos nós. minha filha disse para eu vir e vim”. Tem 86 tu pensas que o teu pai nunca te diria uma de fazer, ou mais do que isso, deixar de ser. Todos ajudam”. E todos têm contacto com anos. É exemplo para muitos. No primeiro coisa dessas, mas alguém ouviu isso”, parti- São vidas reais, testemunhos como o do uma realidade que não é assim tão distante. dia da viagem perdeu-se. Não sabia para lhou connosco um dos testemunhos de um José Acácio que dão voz, vida e razão ao A importância da tolerância, do aceitar onde ir nem como ir. Não tinha telemóvel. dos participantes do programa. Inatel 55+.pt. a diferença. Para o José faz todo o sentido Tinha um papel com nome e número de A Andresa conseguiu que muitos tivessem O José é cego. Não é invisual. “Cego sem- que ela diga sim a estas oportunidades, telemóvel da guia, a Susana. uma experiência que marcará as suas vidas. pre, invisual, nunca. Invisual é a pessoa “para mim é importante, para não tornar A Susana recebeu uma chamada de um “Saímos desta viagem melhores pes- que passou e não nos viu. Aí tornamo-nos a minha vida monótona, e para levar as número estrangeiro, era Isilda a dizer que soas”, ou “incentiva as pessoas a trabalhar todos invisuais”, são palavras dele. Ele que outras pessoas, que não estão habituadas estava perdida. A Isilda, a senhora que não em grupo e a cultivarem mais e o espírito anda sempre acompanhado pela Felicida- a lidar com a deficiência, a interagir con- sabe escrever, “desenrascou” e mostrou de camaradagem não podia ser melhor”, e de, a mulher, mas se ela não consegue ir, nosco. Isso é ótimo.” É trabalho social. É porque é que com 86 anos tem um sorriso ainda “este workshop foi espetacular. Uma ele encontra sempre coragem e vontade. missão Inatel. fácil e pernas “ligeirinhas”. forma diferente se ser e de agir. Puxou pela “Quando entro em dificuldade e estou sem À semelhança do ano transato, o progra- Uma das atividades/formações que dei- nossa imaginação, pelo nosso à vontade, a minha mulher, ganho coragem para agar- ma Inatel 55+.pt 2019 tem previstas três xou a sala em lágrimas de alegria foi a for- acabei abraçada à Andresa para lhe agra- rar num cotovelo e dizer: olhe, só preciso tipologias de viagem, todas com a dura- mação de Teatro com a Andresa. Ela como- decer por ela ter puxado por mim e fiquei que me ajude até àquele sítio e se vir que ção de 6 dias, 5 noites: “Base”, “Bem-Estar veu e deixou-se comover. surpreendida com a história dos meus co- vou cair ou vou para um sítio que não devo Termal” (com práticas de bem-estar termal “Eu não consegui conter, eles são tão aco- legas”, foram alguns comentários que se ir, diga esquerda ou direita, por favor”. O incluídas) e “Inclusivo” (dirigido preferen- lhedores. Fui muito bem-recebida por eles, ouviam pelo corredor das salas, depois dos José não deixa de viver por não conseguir cialmente a destinatários com dificuldades muito carinhosos e disponíveis para os abraços e da entrega ao projeto, ao desafio ver. locomotoras, uma vez que prevê transpor- trabalhos que propus. Disseram que sim e da Andresa, um desafio que espelha a vida “Umas mais outras menos, mas ajudam te especial adaptado a cadeiras de rodas). abriram a vida deles, e fazer isso, contar e de muitos daqueles que vivem numa luta sempre, porque não estão habituadas a “Iria ter muito mais dificuldade em via- expor as tuas vivências para alguém é um constante com a inclusão. Uma luta por se- contactar nestes passeios com este tipo de jar se não fosse a Inatel. Aqui há sempre ato de generosidade. E foi isso que eles fi- rem aceites e por serem apenas mais um. deficiências, mas ajudam sempre. A Inatel pessoas de boa vontade que nos ajudam zeram comigo.” Quantos de nós lutamos por não sermos ajuda-me, não por ser cego, mas porque me e auxiliam”, Joaquim Frazão, ele também O exercício que a Andresa propôs ao gru- “só mais um”, e quantos lutam por serem leva a sair da minha casa e a conviver com fez parte deste grupo inclusivo e que teve po baseava-se nas histórias de infância de esse “só mais um”? A vida é difícil de viver. outras pessoas, o mundo dos cegos é fecha- o apoio, não só da mulher – que o acompa- cada um e, em grupos, criarem uma nova Maria João Costa INATEL 55+.pt - 2020 - UM PAÍS A DESCOBRIR

• VIAGENS DE MÉDIA DURAÇÃO (6 DIAS, 5 NOITES) A PARTIR DE TODOS OS DISTRITOS DE PORTUGAL CONTINENTAL • DESTINATÁRIOS: CIDADÃOS COM 55 OU MAIS ANOS, RESIDENTES EM PORTUGAL CONTINENTAL • ATIVIDADES DE LAZER TURÍSTICAS, CULTURAIS, GASTRONÓMICAS E FORMATIVAS

DATAS PREVISTAS DE CANDIDATURAS* 1ª FASE - JANEIRO 2020 | 2ª FASE - JUNHO 2020 ESCALÕES**

Rendimento mensal Valor a pagar pelo destinatário

Escalão 1 0€*** Até 1 IAS (435,76€) (inclusive)

Escalão 2 A partir de 1 IAS (435,76€) 115€ até 2 IAS (871,52€) (inclusive)

Escalão 3 A partir de 2 IAS (871,52€) 184€ até 2,5 IAS (1.089,40€) (inclusive)

Escalão 4 459€ A partir de 2,5 IAS (1.089,40€)

IAS (Indexante de Apoios Sociais) = 435,76€ (valor referente a 2019)

Notas * Datas sujeitas a recon rmação. ** Valor do IAS referente ao ano de 2019, sujeito a atualização em 2020, de acordo com a legislação em vigor *** Obrigatório o pagamento de caução no valor de 30€ por pessoa, reembolsável após o regresso da viagem.

Programa com o apoio de: Candidaturas Contacte as INATEL Locais

Informações gerais Contacte as INATEL Locais ou através do email [email protected] 8 TL NOV-DEZ 2019

Viajando com livros Natal entre as estrelas

Por António Valdemar

DR empo repleto de memórias e que faz evocar na intimidade do lar e em redor da mesa da consoada os nomes de todos os que já passaram pelas nos- sas vidas, de longe e os amigos de perto. Os amigos Tdas horas difíceis e amigos das horas alegres. Jaime Cortesão voltara do exílio, no Brasil, em 1957 e faleceu em 1960. O regresso que o fixou em Lisboa e lhe permitiu completar investigações em arquivos nacionais e percorrer Portu- gal de norte a sul, detendo-se em tudo quanto lhe interessava, também teve horas de atribulação política ao ser pre- so, com mais de 70 anos, em Caxias, por estar a organizar uma conferência sobre Democracia, a proferir por um deputa- do trabalhista britânico. Mesmo assim, Jaime Cortesão man- teve a atividade intelectual até quase aos últimos dias e fez, no seu último Natal, uma divagação entre o humano e o simbólico. Estávamos numa época assinalada pelas aventuras espaciais, cujos primórdios Jaime Cortesão acom- panhou com interesse. O lançamento do primeiro Sputnik ocorreu a 4 de ou- tubro de 1957 e, pouco depois, a 31 de janeiro de 1958, surgiu o primeiro saté- A imaginação mergulhou no passa- do Universo – terão forças para realizar lite, o Explorer. O mundo inteiro, apesar do e procurou avançar para o futuro: todas as promessas do Natal e ouvidos da desconfiança e o ceticismo de muitos Dias tão íntimos «Vejo raiar na grande noite a Estrela que para escutar o coro dos Anjos e a música perante estas e outras audaciosas ino- anuncia eternamente o nascimento do das estrelas.» As prodigiosas aventuras vações, viria a assistir à chegada à lua. que acordam Menino; vejo o estábulo sem conforto que se realizavam para além do planeta Foi a 21 de julho de 1969, com a nave onde a vaca rumina e o burro sonha; e levaram o homem – interrogava ainda Apollo 11. Neil Armstrong protagonizou fantasmas reais vejo os Pais que se debruçam com ter- – a sentir-se «desterrado do seu próprio este acontecimento que ficou na histó- nura sobre o filho que vai remir a Hu- mundo onde viveu milénios». ria universal. ou imaginários que manidade. A criação do Homem e a sua A chegada à lua constituiu uma eta- O Natal de Jaime Cortesão convocou redenção sobre o Amor continuam.» pa de uma exploração espacial que tem os valores e ensinamentos tradicionais, ganham um rosto Mas Jaime Cortesão distinguiu-se de prosseguido, nos últimos 50 anos, que de quem nasceu, em Ançã e nunca se todos os seus contemporâneos, da Águia não se sabe quando virá a ser concluí- desligou – ele próprio confessa – das de inquietação ou e da Renascença Portuguesa de Pascoaes da, que abre ampla reflexão acerca da suas origens, de uma terra de dunas a Afonso Duarte e da Seara Nova, de cultura humanista e a cultura científica, e lagunas, de bairrada e de pinhais, de esperança, que Aquilino a Raul Brandão, sem esquecer entre as dimensões culturais, políticas e gândaras e pedreiras e de tão pródigas Santiago Prezado, do Auto dos Pastores mediáticas. Confronta-nos com dinâmi- entranhas que a sua pedra, o calcário nos aproxima ou Brutos, em poesias e prosas com a mar- cas de conflito que caracterizam a con- macio de Ançã de Outil e de Portunhos, ca que singulariza cada um. Cortesão temporaneidade. forneceu retábulos, púlpitos e imagens separa dos laços associou a era espacial aos momentos Todas as situações da natureza hu- de meio Portugal. alegóricos da comemoração do Natal: mana, neste tempo de Natal, vêm à «Nascemos todos – escreveu – no que nos prendem à «O ser terrestre conhecerá em breve ou- superfície nos dias tão íntimos, em que mesmo estábulo. O melhor tesouro de tros seres. Outros Céus. Outras Terras. fantasmas reais ou imaginários andam cada um será o riso das crianças, as lá- terra Outras manhãs e ocasos múltiplos de dentro de nós e caminham dentro de grimas de ternura, a alegria sem pala- sóis. Quando sobre nós raiarem todos nós. Ganham um rosto de inquietação vras, a bondade que brota, espontânea os sóis dos Céus, então os homens – ao ou de esperança, que aproxima ou se- e gratuita como as flores na primavera.» mesmo tempo vermes da Terra e águias para os laços que nos prendem à terra. TL nov-dez 2019 9

A Casa na árvore

del Castillo (1496-1584), autor da Historia verdadera de la conquista de la Nueva España, 1576, devemos um dos primeiros relatos sobre a utilização do liquidâmbar pelos índios. No final de uma cerimónia par- tilhada com Cortés e os seus homens, o Imperador Montezuma (1480-1520) inala fumo de tabaco aromatizado com liqui- dâmbar e por fim adormece. Conhecido por ser muito asseado, tomando, por ve- zes, dois banhos por dia, Montezuma te- ria tido necessidade de se purificar face ao cheiro dos invasores ou antevendo o sa- que e queda do seu Império fumara para se evadir? Ao observar a copa vermelha dos novos liquidâmbares, plantados nas ruas de Lis- boa e no Jardim das Conchas, ao Lumiar, é-me impossível não associar esta árvo- re, que pode atingir 40 metros de altura, aos rituais sanguinolentos das culturas mesoamericanas e ao etnocídio que os invasores espanhóis levaram a cabo du- rante o período colonial. Aparentemente, uma espécie de resina de Liquidâmbar, proveniente de outras regiões, já era co- nhecida na Europa, onde chegava solidi- ficada, mas durante um longo período, até à expedição de Cortés, ninguém tinha visto a árvore americana. O Liquidâmbar, também chamado “Madeira-de-crocodi- lo” (pela semelhança da casca com a pele A pastilha elástica do réptil) exsuda este líquido gomoso como um antisséptico destinado a prote- ger feridas que atinjam a sua casca. Uma virtude antisséptica (proveniente da «es- torenina»), valorizada pelos herbalistas da nação índia Cherokee, que incluíram do bosque o Liquidâmbar na sua farmacopeia, uti- lizando-o com frequência no tratamen- to de feridas, na cura da sarna e outras As muitas vidas do Liquidâmbar e o sonho de uma traça verde doenças de pele, bem como na higiene Por Susana Neves bucal. Alguns descendentes dos índios norte-americanos recordam ainda terem usado a resina como pastilha elástica do o subir as altas montanhas do De facto, o Liquidâmbar ou Árvore-do- bosque, a par da goma de faia, pinheiro e Novo Mundo (México) em -estoraque, também nativa nos Estados abeto, mais apetecíveis por serem menos direcção a Tenochtitlán, um Unidos (desde o Connecticut até à Flórida amargas. perfume trazido pela brisa, e além do sul do Texas), fizera os religiosos Apesar do seu grande valor ornamental primeiro surpreende, e depois espanhóis ajoelharem-se e cantarem lou- e da rapidez de crescimento ter feito do emociona o conquistador es- vores a Deus por nela terem reconhecido Liquidâmbar uma árvore urbana estima- panhol Hernán Cortés (1485- um potencial «incensário» e não uma “ár- da nos Estados Unidos da América – em A1547), fazendo ajoelhar o padre Juan Diaz vore Pintora”. Illinois, no século passado, substituíram (1480-1549) e o frade Bartolomé de Olme- Para a poderosa nação Azteca, que bebia os ulmeiros atacados pela grafiose –, nes- do (1484-1524) que o acompanham. De chocolate, jogava uma espécie de futebol, te momento é considerada uma espécie a onde provinha o perfume desconhecido e e temia os sacrifícios humanos, praticados plantar com moderação devido à amplitu- adocicado? Os índios mexicas, pertencen- pelos seus sacerdotes, esta resina aromá- de do seu sistema radicular e ao facto de tes ao corpo expedicionário, aproximam- tica que dá o nome à árvore tinha outra produzir um fruto que se torna lenhoso -se de uma árvore cortam-lhe um ramo função. Ao soldado espanhol Bernal Díaz (cápsula de sementes) demasiado abun- e mostram a resina aromática que dele dante, e susceptível de ferir quem o pisar se desprendia. Era a resina de Liquidâm- de pés descalços. bar (Liquidambar styraciflua L.), na língua A substituição das nossas árvores flu- “Nahuatl” (Azteca): “Xochiocotzoquahui- viais – em particular, o Choupo e o Freixo tl”, ou “Ocotzocuahuitl”, que quer dizer – por árvores de montanha do continen- árvore (“cuahuitl”) que dá resina (“tzol”) te americano, como o Liquidâmbar, como de pinheiro (“ocotl”) –, embora não seja está gradualmente a acontecer na Aveni- um pinheiro. da Guerra Junqueiro, em Lisboa, trará, O relato contado pelo escritor, historia- por certo, uma multidão de estetas que à dor mexicano Fernando Benítez (1912- maneira japonesa rumarão a esta rua para 2000), no livro La Ruta de Hernán Cortés, apreciarem a lenta mutação cromática das decorre no Verão, quando as folhas em suas folhas mas quem sabe, a americani- forma de estrela – desta árvore longeva zação das nossas ruas com estas árvores (pode viver 400 anos), apreciadora de so- florestais, habituadas a conviver com ur- los húmidos bem drenados e da boa expo- sos, veados, lobos, castores, esquilos e a sição solar – ainda proporcionavam uma grande borboleta nocturna verde da Vir- ampla sombra verde. Como se infere das gínia (Traça Luna) acabem também por es- palavras de Benítez, a comoção dos inva- timular o aparecimento do imprescindível sores europeus, em 1519, nada teve a ver silêncio dos índios e o olhar profundo do com o fascínio que a espécie actualmente bisonte. desperta, resultante da beleza cromática das suas folhas no Outono. Liquidâmbares no Jardim das Conchas, em Lisboa, durante o mês de Novembro [A autora escreve de acordo com a antiga ortografia] 10 TL NOV-DEZ 2019

MEMÓRIAS DE JÚLIO ISIDRO CARLOS DO CARMO VEIO PARA O e FICOU dr

ue ambiente de irmandade fadis- Carlos Ramos. Gostava do fado que lhe um acto de sedução e uma troca de senti- meu. Uma bela entrevista e dois a ta tinha o restaurante O Faia, nos corria nas veias mas Sinatra ou Brel fasci- mentos e emoções. emoldurar a conversa. anos 60. navam-no. Vivi algumas por ele e com ele. O concer- No final, no aperto de mão grato disse- O jovem gerente, vindo da Tomada a decisão, a vida foi um turbi- to de 1991, no Casino do Estoril, após meses -me: “Quando quiser virei a qualquer pro- Suíça com um curso de línguas e lhão feliz de acontecimentos. O primeiro de recuperação de uma queda de um palco grama seu.” Respondi: Mas não devemos um diploma de gestão hoteleira, disco foi uma “Loucura” com instrumentos em Bordéus. De fato branco Carlos espa- ter verba para lhe pagar… filho da dona da casa, a consa- nada afins com o fado mas conquistou os lhou magia com a sua música naquela noite. Sorriu: “Eu venho sempre e depois man- Qgrada Lucília do Carmo, punha em prática gira-discos das rádios. Vibrei com o Festival da Canção de 1976 de flores à minha mulher, Judite.” os seus conhecimentos do ramo e interva- E depois veio o primeiro prémio, melhor onde cantou as oito canções concorrentes A tia Judite tem estado sempre ao lado lava com alguns fados, coisa só para ami- intérprete, atribuído pela Casa da Impren- num desafio à sua capacidade interpreta- de Carlos do Carmo desde 1964. No cama- gos e clientes habituais, quando altas horas sa seguindo-se o melhor disco do ano, tro- tiva. Melodias de rara qualidade, palavras rim, acerta-lhe o nó da gravata, assenta-lhe da noite, o amador experimentava a coisa féu Pozal Domingues. E tantos agora, sem cheias de poesia, e a sua voz única que dei- um cabelo desalinhado, faz-lhe uma carícia amada. conta. xava uma réstia de fado em cada canção. e murmura um voto de muita sorte para o Carlos do Carmo tinha ali duas heranças O que se seguiu foi um trajecto feito de Emocionei-me numa noite única para palco que o espera. pesadas, gerir bem como o seu falecido pai, muito trabalho, milhares de quilómetros e uma vida, quando Carlos do Carmo apre- No dia 9 de Novembro, num Coliseu a e cantar sem desmerecer do prestígio de milhões de aplausos por esse mundo fora. sentou no Teatro Aberto, em Lisboa, o seu rebentar de corações a vibrar, o Carlos do sua mãe. O Olympia de Paris, a Ópera de Frank- álbum “Um homem na cidade” com poe- Carmo, octogenário no dia 21 de Dezem- E foi assim, passo a passo, fado a fado furt, o Teatro de São Petersburgo ou o Tivo- mas de e músicas de alguns bro, disse adeus aos palcos. que um dia (terá sido uma noite) que Car- li de Copenhaga, entre outros. dos nossos melhores compositores. Esteve épico porque sempre quis sair los se decidiu: “a minha carreira, a minha O jovem cantor que tinha vivido a sua Anos antes, por razões que envergo- pela porta grande. vida vai ser a música.” infância no bairro da Bica, conquistava nham uma democracia, Carlos do Carmo Carlos do Carmo veio para o fado e… Aprendeu e apreendeu bem a partir dos plateias com o charme de quem um dia o esteve discretamente afastado da nossa te- ficará. melhores que passavam pelo Faia, Alfredo apelidou de Carlos Charmoso. levisão. A música era outra… Marceneiro, Maria Teresa de Noronha ou Ele próprio assume que estar em palco é Decidi convidá-lo para um programa [O autor escreve de acordo com a antiga ortografia]

12 TL NOV-DEZ 2019 Entrevista Edmundo Martinho “Sinto que fiz parte de uma grande mudança”

Edmundo Emílio Mão de Ferro Martinho, 64 anos, alentejano, e com o “gosto pessoal” para o social. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) há dois anos

ntrou na faculdade no curso apesar de durante muito tempo não ter temos hoje, em Portugal, uma prestação que era maioritariamente de praticado, era um “social não praticante”. que se chama complemento solidário “Temos coisas mulheres, Assistente Social, Mas esse lado esteve sempre cá, e na para idosos, e que adota como referencial e durante 20 anos desviou-se altura conjugou-se o meu gosto pessoal e de pobreza o valor estipulado na Europa, extraordinárias da vocação. Foi em 1996 que o os meus interesses com a oportunidade, e o valor do limiar da pobreza, o que ministro do Trabalho, na altura, foi isso que aconteceu em 1996 quando fiz significa dizer que teoricamente nenhum que vamos fazendo Eduardo Ferro Rodrigues, o parte da equipa que lançou o rendimento idoso deveria ter um rendimento inferior Edesafiou a voltar às origens e redescobrir mínimo em Portugal. a esse limiar. Mas se não souberem, se em Portugal, mas o lugar de onde nunca deveria de ter Deram um passo importante que marcou não requererem, não vão usufruir do saído: a economia social. e ainda marca a sociedade atual. mesmo. depois não temos a Admite que gostava de se ter dedicado Sem dúvida alguma e sinto que fiz E não requerem por vergonha? mais ao voluntariado e que a ambição parte de uma grande mudança. Não sei se é vergonha, se tem que capacidade de dar enquanto provedor da SCML passa pela Independentemente do impacto que tem ver com o modelo administrativo que modernização. Enquanto Edmundo, na vida das pessoas beneficiárias, obrigou pode levantar alguma dificuldade às a visibilidade que que não lhe falte a energia para fazer e a que todos os serviços, em particular pessoas, mas esse também é o dever dos ver acontecer e para garantir que perde na Segurança Social, a reinventarem- serviços, o facilitar, estimular as pessoas a mereceriam” mais tempo no terreno do que a dar se na forma de abordar este tipo de requererem os direitos que têm, porque entrevistas. problemas. Na altura foi a primeira vez nós temos condições, apesar de tudo, “Eu sou rápido, vai ver”. E foi mesmo. que aconteceu uma prestação social que para não ter idosos em Portugal em risco Sabe o que dizer e como o dizer, e tinha, obrigatoriamente, a si associado, de pobreza. tem orgulho em Portugal e no que um programa de inserção para cada uma Como é que é a SCML contribui para se faz por cá. Fala o homem que já das pessoas e isso obrigou a que o modo diminuir essa pobreza? viveu em Genebra, e que é atualmente como se trabalhava, sofresse uma grande O trabalho que esta Santa Casa faz tem presidente do Grupo de Trabalho sobre reconversão, o que foi extraordinário. O impacto em Lisboa. Mas aqui tentamos Envelhecimento da Comissão Económica impacto que teve, e que se vai sentindo dirigirmo-nos não à pobreza que é das Nações Unidas para a Europa ao longo dos anos, obviamente, acabou vista como ausência ou diminuição de (UNECE). por ser um impacto muito grande rendimento, embora façamos algum Como é que chega à Segurança Social? porque mudou o centro referencial de apoio irregular – não é uma prestação Fiz um percurso em empresas privadas intervenção dos técnicos da Segurança mensal – mas o nosso trabalho existe durante grande parte do meu tempo, Social, mudou para algo que se centra e atinge sobretudo as outras áreas de em 1996 estava numa fase de acalmia nas pessoas e nos percursos da vida das privação que não apenas a pobreza profissional e fui convidado pelo pessoas e isso foi muito transformador. material ou financeira. Por exemplo, ministro do Trabalho, da altura, Ferro Em 2019 temos notícias de que há lançamos uma iniciativa que é um centro Rodrigues, para me associar ao processo mais de 2 milhões de portugueses em de medicina dentária completamente de lançamento do rendimento mínimo risco de pobreza. Muitos deles idosos gratuita até aos 18 anos, com 10 garantido. E foi assim. Nunca mais parei. e a viver com 250 euros. Mesmo com consultórios em permanência e que E porquê a escolha do lado social. Por rendimentos, e apoios, vamos ter sempre atualmente faz 700 a 800 consultas por que não enveredar por outra área? pobres? semana. O que queremos é ajudar a Há um gosto pessoal pelo social, aliás, Com os mais velhos, os reformados, diminuir o impacto em algumas áreas de a minha formação de base é nessa área, não há razão para isto acontecer porque privação na sociedade. Outra iniciativa TL nov-dez 2019 13

vando campos

tem que ver com a empregabilidade de sociedade mais velha? aprende-se imenso com outros países, pessoas com deficiência, que é hoje um Ninguém está preparado para isto. Não “Quero mesmo até mesmo os que têm uma realidade dos problemas com que nos debatemos. estamos preparados no sentido em que completamente diferente da nossa, mas Há muito poucas pessoas com deficiência não acompanhamos este processo de ser parte deste que servem de inspiração para nós, assim a trabalhar, no sentido de ser um trabalho aceleração, e porque continuamos a como nós somos inspiração e modelo com progressão de carreira, que não seja trabalhar como há vinte ou quarenta processo de para outros. um trabalho precário. É ainda visto, como anos. E é isso que temos que fazer, é dar O senhor provedor é “nacional” e é emprego assistencial e nós temos que esse passo transformador no modo como transformação inspiração para muitos ao ser galardoado mudar esse modelo. trabalhamos para assegurar a estabilidade com o Prémio Economia Social da Gala Lançaram também o programa “Lisboa, financeira e a estabilidade social das da organização, e Reconhecer da Fundação Inatel. Estava à Cidade de Todas as Idades”, é a resposta comunidades para que se permita acolher espera? a uma sociedade envelhecida? toda a gente, independentemente das desta se adaptar Acho que foi simpatia da Fundação É mais do que isso. Hoje em dia não suas necessidades, num lugar comum. Inatel. É sempre difícil de perceber onde há nenhum setor da sociedade que Esse é o desafio do nosso país e de às exigências e é que está o limiar do mérito, mas admito não seja impactado pela longevidade, muitos outros, e qual é maior desafio que, como estou nisto há muitos anos, até mesmo o lazer, por exemplo, onde para o provedor da SCML? expectativas das tenho dedicado uma parte da minha vida a Inatel tem um grande papel – por Não lhe chamo desafio, mas sim aquilo e da minha energia a estas áreas, e como isso, é obrigatório que as cidades se que me mobiliza mais é assegurar que pessoas” tinham de arranjar alguém, calhou-me preparem ou se adaptem a isso e que a instituição se modernize, que seja a mim (risos). Mas entendo isto como, as próprias instituições, como a Santa capaz de responder aos desafios que vai por um lado, o reconhecimento da Casa da Misericórdia, se adaptem a encontrando pela frente; e modernizar importância da economia social, e por estas novas realidades. É preciso mudar significa evoluir nas tecnologias, na outro, o facto de estar na SCML porque é os métodos de trabalho. Temos que organização, no planeamento, na uma casa com grande peso social. Tudo se ser mais pró-ativos e estar à frente capacidade de prever e aí temos dado conjugou para isso, mas haveriam mais desses acontecimentos. Esse programa, passos significativos nesse sentido. pessoas, mais merecedoras do prémio “Lisboa, Cidade de Todas as Idades”, Modernização essa que é igualmente do que eu. Mas fico satisfeito e gostamos quer alcançar isso mesmo. Por exemplo, notória na Fundação Inatel ao aprofundar sempre destes momentos para afagar o o projeto “Radar” que tem voluntários aquilo que são as suas áreas de tradição ego. responsáveis pelo levantamento de e estas organizações têm essa obrigação, O que é que ainda quer fazer enquanto todas as pessoas que vivem sozinhas fazer o que sabem fazer bem e aquilo que provedor? em Lisboa, e que procura, não só, fazem bem, aprofundar ainda mais. Quero mesmo ser parte deste processo de descobrir as necessidades e fragilidades E por falar em fazer bem, ainda transformação da organização e desta se das mesmas, mas também as suas continuamos a insistir com o “Lá fora é adaptar às exigências e expectativas das expectativas, o que é que ainda querem que se faz bem”, “Lá fora é que é bom”? pessoas. Essa é a minha maior ambição fazer. Até agora foram identificadas 30 Não. Temos é alguma dificuldade em como provedor, modernizar a instituição. mil pessoas. Este programa é o exemplo fazer passar a nossa imagem. Temos E enquanto Edmundo? de como as instituições mudam os seus coisas extraordinárias que vamos fazendo Enquanto poder cá andar, quero ter métodos de trabalho para responderem a em Portugal, mas depois não temos a energia e força suficiente para continuar novas necessidades da sociedade. capacidade de dar a visibilidade que a fazer aquilo em que acredito. Portugal está preparado para esta mereceriam. Mas ao mesmo tempo Maria João Costa 14 TL NOV-DEZ 2019 ciclo mundos Entrevista Leyla McCalla O BAIÃO DA PENHA DE FRANÇA Largou o violoncelo e pegou no banjo e na guitarra eléctrica. Ao Ciclo Mundos, Leyla McCalla, trouxe o manifesto económico, político e social “Capitalist Blues”. Terceiro álbum no qual questiona se vive de facto numa sociedade democrática, dentro de um sistema que não pode controlar

asceu em Nova Iorque e crioulo.” é importante é levar o ouvinte a viajar reside actualmente em Nova E porquê em crioulo? Por ser uma língua numa jornada sonora. Não me sinto Orleães. Durante a infância de resistência? comprometida com uma única forma de e a adolescência, passou Sim. É uma língua de resistência. a apresentar. Nunca. Isto é o agora. longas temporadas de verão Hoje em dia não tanto. Penso que as Na escrita de uma canção, o assunto no Haiti, na casa dos avós, e revoluções dos escravos não teriam que aborda, seja a guerra na Síria, o chegou a viver dois anos no sido possíveis sem um meio de capitalismo selvagem, ou as carências no NGana. Verdadeira filha da “crioulização” comunicação comum entre todos estes sistema de saúde e de segurança social (processo que a “nossa” lisboeta de diferentes grupos étnicos, de diferentes dos Estados Unidos, determina a sua sangue cabo-verdiano Carmen Souza tão “backgrounds” que sentiam que tinham abordagem sonora? “Aleppo” pede uma bem desmonta em “Creology”), Leyla um assunto para resolver, fossem sonoridade mais noise rock? McCalla serve-nos no seu terceiro álbum, franceses ou africanos. O crioulo foi a De uma certa maneira. Os assuntos “Capitalist Blues” (2019), um faustoso língua que deu origem ao país que é hoje abordados numa canção conduzem o e diversificado banquete de música o Haiti. processo de sentir a que é que a canção mestiça contemporânea e ancestral, de Do segundo álbum “A Day for the precisa de soar. raiz afro-americana e francófona: jazz e Hunter, A Day for the Prey” (2016) para O álbum “Capitalist Blues” é festividades mardi gras de Nova Orleães, o terceiro “The Capitalist Blues” (2019), extremamente diversificado. Cada oldtime, calypso, zydeco, cajun, blues, r&b, que veio apresentar ao Ciclo Mundos, canção tem um ambiente musical soul, noise rock, mizik rasin, konpa e até houve uma alteração significativa no distinto... mesmo o nordestino baião. formato da sua banda. Está a tocar muito Lembro-me da primeira vez que trabalhei Assim que subiu ao palco do Teatro da mais banjo e guitarra eléctrica e muito com um produtor musical em que ele me Trindade Inatel, Leyla McCalla cantou menos violoncelo. Deixou de ter uma perguntou muito abertamente: queres em português, francês e crioulo do Haiti violinista. Tem agora um baterista e um fazer um disco para a tua banda ou o “Baião da Penha” do pernambucano baixista. O que é que mudou na sua queres fazer um álbum para cada canção? Luiz Gonzaga que conheceu na versão forma de compor? Quero fazer um álbum para cada canção. de Caetano Veloso em “Circulado” (1991). O que muda são os elementos à minha Tem um potencial maior. Pensei que este “Os meus pais são fãs do Caetano Veloso. volta. Sempre toquei violoncelo, banjo e era o melhor caminho para fazer o disco. É por isso que estou tão familiarizada também toco guitarra eléctrica há algum Este é um álbum que gira à volta da com a música brasileira”, refere McCalla. tempo. São ferramentas que uso há muito canção “Capitalist Blues” gravado em “Quando estava na Universidade estudei tempo para criar música, para escrever Nova Orleães com uma sonoridade português porque queria ir ao Brasil canções. Nunca tinha tocado com um jazzística local muito acentuada, com estudar a música local. Nunca cheguei baterista e com um percussionista. Havia festividades mardi gras, sobretudo em a ir, mas estou agora em Portugal. muitos elementos que, ao ouvi-los, me “Settle Down”. Tema que fecha o disco Consigo perceber algumas frases e inspiravam para criar música e que e onde surgem uns convidados muito fiquei abismada com as semelhanças não ouvia na que havia feito antes. especiais do Haiti: Lakou Mizik. que encontrei entre o Brasil e o Haiti. Particularmente, música haitiana konpa “Capitalist Blues” é o ‘chapéu’ que As inúmeras favelas, a extrema pobreza. (compas) dos anos 60 e 70 onde a guitarra alberga todas as canções do disco. É a No caso do ‘Baião da Penha’, traduzi-o eléctrica substitui o banjo. Absorvi muito razão de ter feito este disco e naquilo para inglês e a letra mexeu comigo. esses discos de Coupé Cloué com muitas que estava a pensar quando as gravei. Pensei que era uma canção muito bonita, partes de guitarra. Fiquei entusiasmada O que significa viver numa sociedade descobri que foi o Luiz Gonzaga que com a possibilidade de desenvolver capitalista que adquire capital, bens, que a escreveu. E então voltei a traduzi-la este tipo de sonoridade e não com a se endivida, que usufrui do direito de para crioulo. Penso que, na América vontade de tornar a minha música mais votar em democracia, que se questiona Latina, há uma imensa história comum eléctrica. Queria que a minha música se vivemos realmente numa democracia. derivada do colonialismo, que ambos os fosse o espelho das minhas influências Só porque temos eleições, nem tudo povos partilham. Tinha essa necessidade crioulas. Tenho um potencial maior para acontece democraticamente. Muito de ouvir como soaria esta canção em fazer mais ruído mas, para mim, o que do poder nos Estados Unidos está TL nov-dez 2019 15

Fotos: beatriz lorena

concentrado nas grandes corporações, superar para tratar a sua filha que havia nos lobbistas e não nas pessoas, nem nos sido diagnosticada com elevados níveis serviços sociais. Há um enorme défice de chumbo no sangue. de igualdade. Olhamos para o Haiti e Este disco reflecte sobre quais realmente vemos um país extremamente pobre. são os nossos valores. Muita gente na Mas não é assim tão pobre, tão desigual. igreja católica não acredita no direito de Temos o mesmo nos Estados Unidos a escolha das mulheres. Mas se a vida é tão um nível macro-económico. Obviamente, sagrada, porque é que toda a gente não temos uma classe média mais rica. Sabe, pode ter um seguro de saúde? Porque é a eleição de Trump provocou uma série que não protegemos a vida das pessoas de questões de como a sociedade se que nos rodeiam? Porque não temos um encontra estruturada. Para as pessoas acordo sólido sobre direitos humanos nos da minha geração, a eleição do Trump Estados Unidos? Temos de comprar tudo. foi uma surpresa, mas não deveríamos O acesso à escola, à segurança social, aos estar surpreendidos porque o Reagan já seguros de saúde. tinha sido eleito antes. Só que ainda não Pouco tempo depois de lançar tínhamos nascido quando isso aconteceu “Capitalist Blues”, foi editado o projecto (risos). “Songs of Our Native Daughter” É neste contexto que, em “Heavy As desenhado por Rhiannon Guiddens, Lead”, este disco aborda outros assuntos com quem tocou nos Carolina Chocolate delicados como as fragilidades dos Drops, no qual quatro tocadoras sistemas de saúde pública que teve de de banjo afroamericanas abordam questões históricas que influenciaram a identidade das mulheres negras nos Estados Unidos, como a escravatura, o racismo e o sexismo. Para além de si e “Este disco de Rhiannon, participam neste projecto Allison Russell dos Birds Of Chicago reflecte sobre e Amythyst Kiah. Consegue encontrar uma relação entre ambos os discos? quais realmente Relativamente às mulheres negras, não lhes deram o devido crédito no papel são os nossos que desempenharam nas mudanças sociais que foram ocorrendo nos Estados valores. Muita Unidos. Mulheres em geral, mulheres negras em particular. Este disco passou gente na igreja por um processo muito diferente de criação. Ouvi várias vezes as canções católica não que queria gravar, pensei nelas durante algum tempo. O estilo de produção, o acredita no direito trabalho que os produtores tiveram, foi completamente diferente. de escolha das Uma mulher negra com um banjo em 2019 é uma forte imagem que não mulheres. Mas se a tínhamos visto muito no passado, mas vamos vendo cada vez mais nos vida é tão sagrada, dias de hoje. Acho que o racismo nos Estados Unidos contribuiu para este porque é que toda contexto monolítico. Mas este não é um diálogo monolítico, é um diálogo de a gente não pode diversidade e estou muito grata por ter ter um seguro de participado nele. Luís Rei saúde?” [O autor escreve de acordo com a antiga ortografia] 16 TL NOV-DEZ 2019 VIAGEns FESTA NA RIVIERA FRANCESA

Carnaval de Nice e Festival do Limão para viver três dias de alegria

DR

CARNAVAL DE NICE E FESTIVAL DOS LIMÕES EM MENTON Data: 21 a 24 de fevereiro Partida: Lisboa Informações: Tel. 211 155 779 [email protected] | www.inatel.pt

a famosa Riviera francesa a so- fisticação e a beleza natural con- jugam-se na perfeição. Nice, no coração da Côte d’Azur (Costa Azul), tem muito para maravi- lhar. As praias, a colina do Caste- lo, o Teatro Nacional, a Ópera, o NBairro Antigo, com palácios, ruas e fachadas coloridas. No centro da cidade, o Museu de Arte Moderna e Arte Contemporânea, um impressionante edifício neoclássico, o Mu- seu Henri Matisse, criado pelo próprio em 1952, o Museu Marc Chagall, que teve o envolvimento do artista, e ainda, o Palácio Lascaris, do século XVIII, atual museu de instrumentos musicais, com uma das mais importantes coleções de França. A tarde de sábado será animada com a Batalha de Flores. O escritor francês Al- phonse Karr, apaixonado pela botânica e tendo vivido em Nice, esteve na origem da primeira batalha, em 1876. O desfile À noite, a praça Masséna e as ruas do desde o século XIX, será o “Rei da Moda”. de flores e frutas cítricas nos jardins, de carros floridos, cuja decoração contém centro de Nice enchem-se de diversão Domingo é dia de Festival do Limão, o sucesso foi tal que no ano seguinte milhares de pétalas coladas na véspera, é com o desfile dos carros iluminados, gru- em Menton, com carros alegóricos de- a festa saiu para a rua. E continua até pontuado por inúmeras flores que são lan- pos musicais e muita animação. O tema corados de citrinos. Em 1929, um hotel hoje, com o desfile de Frutas Douradas çadas ao público. do corso do Carnaval de Nice, célebre teve a ideia de organizar uma exposição e Exposição de Citrinos.

CARNAVAL EM VALE ÍLHAVO Data: 24 a 26 de fevereiro Partidas: Faro, Beja, Évora, Setúbal, CARNAVAL EM VALE DE ÍLHAVO Lisboa Informações: Tel. 211 155 779 Os Cardadores saem à rua para cumprir uma [email protected] | www.inatel.pt antiga tradição, com muito divertimento

© nuno feliz ela manhã passeamos pela vila termal do Luso. Vamos à Mata Nacional do Bussaco, planta- da pela Ordem dos Carmelitas Descalços, no primeiro quarto do século XVII, constituída por cerca de 250 espécies de árvores Pe arbustos, com exemplares extraordiná- rios. Avistamos o Palace Hotel do Bussaco, mandado construir pelo rei D. Carlos I, entre 1888 e 1907, como pavilhão real de caça. Este palácio, hoje um lendário hotel, é um belo exemplo da tendência arquite- tónica daquela época, conhecida por “Ro- mantismo castelar”. Em Vale de Ílhavo vamos conhecer os Cardadores, grupos exclusivamente mas- culinos. A preparação destes mascarados é feita cerca de um mês antes, através de um sigiloso processo, que inclui a execução das máscaras e a aprendizagem dos rituais a ter durante os festejos. Esta tradição cum- pre-se no domingo gordo e na terça-feira de Carnaval, dias em que os Cardadores correm e saltam para “cardar”, sobretudo, as mulheres. É uma antiga brincadeira que lembra a carda da lã. AF_Galp+Inatel_Dezembro_259x393,7mm_V3_OL.pdf 1 23/10/2019 16:18:51

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O cinema que aí vem Celebrar a entrada de 2020 com bons concertos Há filmes para todos os gostos e idades. Logo, não há desculpas para não se sair do conforto do sofá

Technoboss, de João Nicolau | Portugal, • O tema do abuso de menores tratado 2019. Com: Luísa Cruz, Miguel Lobo de modo delicado mas frontal, sem Antunes, Américo Silva. sensacionalismos panfletários de qualquer • Um sénior, à beira da reforma, espécie. Grande Prémio do Júri do Festival experimenta o de Berlim. sabor da liberdade ao volante, cantarolando os Violeta, de Kantemir Balagov | Rússia, males da vida moderna e 2019. Com: Viktoria Miroshnichenko, reencontrando a paixão Vasilisa Perelygina, Andrey Bykov. e o amor. Fabulosa é a • No meio da destruição e caos da cidade interpretação de Miguel de Leninegrado, no pós-guerra de 45, Lobo Antunes. Grande duas jovens mulheres reerguem as suas Prémio do Júri no Festival de Cinema de vidas com o olhar fixo na esperança. Sevilha. Prémio Melhor Realizador, Prémio FIPRESCI Festival de Cinema de Cannes. Comportem-se como adultos, de Costa- Gavras | França/Grécia, 2019. Com: Made in Bangladesh, de Rubaiyat Christos Loulis, Alexandros Bourdoumis, Hossain | França/Bangladesh/Dinamarca/ Ulrich Tukur. Portugal, 2019. Com: Rikita Nandini • Depois de “O Capital” (2012) – Shimu, Novera Rahman, Parvin Paru. abordagem pura e dura do mundo • Face às duras condições financeiro – o celebrizado cineasta do de trabalho e exploração thriller político revisita a crise grega, uma operária têxtil e mais reconstituindo (a partir das memórias outros colegas decidem, políticas de Yanes Varoufakis) o árduo contra ventos e marés, trabalho negocial do ex-ministro das criar um sindicato para finanças helénico com o Eurogrupo. garantir a defesa dos seus interesses. Tristeza e Alegria na Vida das Girafas, Devendra Banhart de Tiago Guedes | Portugal, 2019. Com: A Ovelha Choné O Filme – A Quinta Gonçalo Waddington, Miguel Guilherme, Contra-Ataca, de Richard Starzak | Reino Maria Abreu. Unido, 2019. Animação. • Uma fábula – uma rapariguinha em • A nova aventura – intergaláctica! – niciamos 2020 com os tradicio- certo de Aranjuez de Joaquín Rodrigo deambulação por Lisboa plena de criatividade, nais Concertos de Ano Novo. interpretado pelo guitarrista argen- em busca da superação inteligência e poder de Logo no dia 1 de janeiro, a Or- tino Rolando Saad, que de uma for- da dor pela trágica e sedução – da bonecada questra Metropolitana de Lisboa ma brilhante transmite ao público a irreparável perda da mãe de plasticina saída do faz duas sessões do seu já habi- riqueza tímbrica e a beleza sonora da – que traz à memória, Studio Aardman promete tual Concerto de Ano Novo da guitarra espanhola de concerto. “Extremamente alto, deliciar, uma vez mais, Metropolitana. Este concerto, marco da fusão da incrivelmente perto” os espectadores infanto- IO Grande Auditório do Centro música popular com uma escrita (2012), de Stephen juvenis. Cultural de Belém recebe às 11h30 mais erudita, terá ainda peças no Daldry, outro olhar sobre as dores de e às 17h, dirigida pelo maestro Se- seu programa como El Amor Brujo crescimento. Cats, de Tom Hooper | Reino Unido/EUA, bastian Perlowski, polcas e valsas de Manuel de Falla, Carmen de Bi- 2019. Com: Francesca Hayward, Jennifer da família Strauss. Também no dia zet, Introdução e Rondo Caprichoso de Passámos Por Cá, de Ken Loach | Reino Hudson, James Corden. 10 de janeiro, no Teatro Tivoli BBVA Saint-Saëns e Melodias Ciganas de Sa- Unido/França/Bélgica, 2019. Com: Kris • Adaptação à grande tela do mítico teremos o espetáculo O Grande rasate. Hitchen, Debbie Honeywood, Rhys Stone. espectáculo musical “Cats” da Broadway Concerto de Ano Novo, pela Strauss Sem apresentações necessárias, a • Da uberização desenfreada do mercado que subiu à cena no New London Theatre Festival Orchestra e o Strauss Festi- rainha da música Pop, Madonna tem de trabalho e da desumanização da em 1981 – onde permaneceu por 21 val Ballet Ensemble. Um espetáculo já marcadas 8 datas para o Coliseu sociedade trata “Sorry We Missed You” gloriosos anos – e foi visto por mais de que se pautará por valsas, polcas de Lisboa, a 12, 14, 16, 18, 19, 21, 22 e (título original), último filme do autor 81 milhões de espectadores incluindo e marchas de Johann Strauss. Os 23 de janeiro. de “Eu, Daniel Blake”, sobre uma família digressões a mais de cinquenta países. espectadores podem esperar mui- O Hard Club no Porto, e no Capi- sacrificada aos excessos do modelo ta magia com um guarda-roupa de tólio em Lisboa recebem o Devendra ultraliberal. Star Wars: A Ascensão de Skywalker, luxo e coreografias exuberantes! Um Banhart a 15 e 16 e 17 de fevereiro, de J. J. Abrams | EUA, 2019. Com: Daisy entusiasmante concerto para dar as respetivamente. Devendra, de as- Celle que vous croyez, de Safy Nebbou | Ridley, John Boyega, Oscar Isaac. boas vindas a 2020. cendência venezuelana vem trazer- França, 2019. Com: Juliette Binoche, Nicole • Com o confronto final pela Para os fãs de bandas sonoras, te- -nos o seu renovado Indie Folk com Garcia, François Civil. liberdade que opõe remos as melhores bandas sonoras a apresentação do novo álbum inti- • O tema dos perigos da os sobreviventes da de Hollywood com o espetáculo A tulado Ma. realidade virtual – uma Resistência e a poderosa Celebration of John Williams, no dia Membro dos famosos Buena Vis- mulher de cinquenta ‘Primeira Ordem’ dar- 9 de janeiro, no Teatro Tivoli BBVA ta Social Club, Eliades Ochoa, de anos que finge ser uma se-á por encerrada a pela Hollywood Symphony Or- 73 anos ou o Sr. Chan Chan, como jovem nas redes sociais saga Skywalker mas questra. é chamado em Cuba irá passar por – suas implicações não, por certo, a de “Star Melodias imortais do nosso imagi- Lisboa para um concerto inédito, psicológicas e fictícias, Wars”, criada em 1977 nário como Tubarão, Star Wars, India- a 24 de fevereiro no Teatro Tivoli abordado num thriller por George Lucas sob forte inspiração (e na Jones, Parque Jurássico, E.T., O Patrio- BBVA. Acompanhado da sua guitar- interessante que tem Juliette Binoche. influência) do filme clássico japonês, “The ta, O Resgate do Soldado Ryan, A lista ra, poderemos ouvir neste concerto Hidden Fortress” (1958), do grande mestre de Schindler e Harry Potter compostas a solo temas do repertório popular Graças a Deus, de François Ozon | Akira Kurosawa. por este magnífico compositor. cubano – um concerto a não perder. França/Bélgica, 2019. Com: Melvil A 14 do mesmo mês, no mesmo O início de 2020 promete um ano Poupaud, Denis Ménochet, Swann Joaquim Diabinho Teatro damos destaque a uma Noite cheio de excelentes concertos! Arlaud. [O autor escreve de acordo com a antiga ortografia] de Música Espanhola, com o Con- Susana Cruz de Fred ebb e bob fosse Música John kander Encenação Diogo Infante

Viagens a partir de vários pontos do país para um espetáculo coprodução imperdível! teatro da trindade inatel e força de produção ATÉ 29 MAR Informações: 210 027 000

PARCEIROS TEATRO DA TRINDADE INATEL APOIOS MEDIA PARTNERS COPRODUÇÃO M 12 2019 © Pedro Ferreira 20 TL NOV-DEZ 2019

o Coluna 4. Trail da Subida DO provedor à Serra de São Macário No passado dia 10 de novembro, na cidade de São Pedro do Sul, realizou-se o 4.º Trail à Serra de São Macário. Uma organização da Fundação Inatel com os associados GTT.SPS – Grupo Todo Terreno de São Pedro do Sul. Manuel Camacho [email protected]

o dia 9 de novembro comemoraram-se 30 anos sobre a queda do Muro de Berlim. A recordação desse dia tão festejado pelos alemães de ambos os Nlados do muro, mas também por todo o mundo que, mais ou menos, de perto acompanhou a sua “história”, surgiu em todos os órgãos de comunicação. Durante as comemorações, nas televisões, nos jornais, nas rádios e nas redes sociais, não se cansaram de lembrar, das mais diversas formas, este acontecimento que acabou por ficar definitivamente ligado ao fim da famosa “Guerra Fria” entre a União Soviética e os Estados Unidos da América. No entanto, foram muitas as histórias de sangue, suor e lágrimas que ao longo dos 28 anos da sua existência fizeram do “muro” um ponto de passagem para a tristeza, a repressão, a dor e até mesmo o afastamento forçado de muitas famílias. om 400 inscritos, nas provas de De uma maneira geral o tempo Trail Longo, Trail Curto, Mini atenua a mágoa, mas não apaga Trail e Caminhada, foram mui- a História e neste caso, mais tos os atletas, que dos vários uma vez, acabámos por recordar pontos do país, se deslocaram inevitavelmente histórias que para uma aventura pela serra, fazendo parte de um passado com chuva e frio, condições ainda muito recente acabaram por Cessas que, nestas provas, tornam a prova nos trazer à memória os factos e as ainda mais desafiante. circunstâncias que ditaram o curso Dos 31 km, no Trail Longo, passando dos acontecimentos. pelos 20 km, no Trail Curto, e o mini trail Ao longo do século XX foram e caminhada de “apenas” 10 km, partir muitos os momentos de alegria e chegar tinha como cenário a XXI Fes- e euforia devidos ao fim de ta da Castanha e do Mel. Saíram com o ditaduras, de guerras e de regimes estômago aconchegado de produtos de desumanos. Mas a maior felicidade produção local – de fruta, a compostas, teria sido ter-se evitado os danos e passando pelo mel, pelos bolos e doces o sofrimento causados. de castanha, sem deixar escapar a jeropi- Quase sempre, a passagem ga e os licores. destes regimes repressivos para Nas palavras do presidente da câmara regimes democráticos mais justos municipal de São Pedro do Sul, Vítor Fi- traz também muito sofrimento gueiredo, “isto é mais uma festa tradicio- tas para as provas duras que tinham pela a Fundação estes eventos”, diz um dos àqueles que lutam para o nal que vamos fazendo ao longo de todo o frente. Água, fruta, frutos secos e barras membros do GTT, associado Inatel, quan- conseguir. ano, e onde estamos a promover os nossos energéticas. A maior preocupação não era do perguntávamos o que é que os move, Na nossa História mais recente, produtos endógenos, que é disto que pes- a chuva, a lama ou frio, era o nevoeiro que o que faz com que continuem, todos os resta aos portugueses a consolação soas de cá vivem e ao mesmo tempo dar podia ser traiçoeiro, mas com a sinalização anos, a organizar eventos como este. de que, apesar de termos sofrido cor a esta serra, com as centenas de atletas mais indicada e devidamente distribuída, O primeiro a chegar à meta foi o José 48 anos de ditadura, conseguimos a subir a serra e a terminarem aqui, na Fei- a única coisa que podia falhar eram as per- Nunes, do concelho de Penalva do Cas- fazer uma Revolução com cravos ra da Castanha e do Mel. Chegam gelados nas, o resto estava assegurado. telo, Viseu, ele que percorreu 20 Km em em vez de sangue. e arranhados, é verdadeiramente agreste, Os GTT.SPS, envolvidos desde o primei- 2 horas e 36 minutos. Já é atleta de trail A verdade é que, apesar de toda mas a verdade é que as pessoas gostam ro momento no evento, estavam presen- desde 2013, mas foi a primeira vez que a evolução tecnológica das últimas disto, o trail está na moda, está na vida dos tes na Feira, na meta das diferentes com- participou na subida à Serra de São Macá- décadas, o ser humano ainda não cidadãos, e se as pessoas gostam nós esta- petições, não apenas para receberem os rio, e apesar do frio, valeu a pena, “a vista descobriu a “fórmula” para evitar mos aqui para trabalhar para isso.” atletas, mas para “reforçar” a chegada com é lindíssima, estava a ficar nevoeiro, mas confrontos e construir a PAZ sem o Antes da prova, o aquecimento teve os alimentos necessários para reporem as valeu a pena o esforço. O trail para mim é sofrimento de alguns. direito ao acompanhamento das concerti- calorias perdidas de forma imediata antes uma terapia, a serra significa paz, dá para Enquanto aguardamos, porque nas Vale do Bestança e a partida do Trail do banho merecido. “Gostamos mesmo limpar os problemas do trabalho, e fico acredito na potencialidade do ser Longo teve como batida os Bombos e Ta- disto, é amor à camisola. E as pessoas gos- sempre bem”. Isto porque o desporto, na humano, desejo-vos um Bom Natal rolas de Negrelos, e assim que se ouviu o tam muito destes eventos e gostam muito medida certa e adaptado a cada um, nun- e um Ano 2020 feliz e solidário. “agora” foram muitos os que partiram de desta serra e nós tínhamos que estar cá, ca fez mal a ninguém. É remédio santo. mochila às costas com as provisões cer- e não podemos parar de organizar com Maria João Costa TL nov-dez 2019 21

Comemorações dos 75 anos Inatel Leiria

Inatel Leiria está a comemorar 75 anos de existência e, para as- sinalar esta importante data, a Fundação Inatel tem organiza- do vários eventos para simboli- zar estas comemorações. No dia 4 de novembro, no Pa- Alácio dos Ataídes, em Leiria, inaugurou-se a exposição do artista Rodrigo Baeta, com o tema 75 Anos Inatel Leiria. Integrada no ciclo de comemorações, a exposição apresenta trabalhos que indivi- dualmente marcaram momentos impor- tantes no desenvolvimento da escultura comemorativa desta efeméride. No distrito de Leiria, a Fundação Ina- tel tem-se destacado através dos mais di- versos e distintos serviços, sobretudo no incremento e dinamização de atividades culturais, desportivas, turísticas e sociais, destacando-se a defesa do associativismo e, pelo seu pioneirismo, a chama de aten- ção para o direito aos tempos livres dos cidadãos, sendo precursora no turismo social, partilhando novos conceitos de fé- rias e de lazer. A Gala Reconhecer Inatel Leiria foi ou- tro acontecimento que fez parte das co- memorações dos 75 anos, que teve lugar no dia 17 de novembro, no Teatro Miguel Franco, em Leiria. Esta Gala deu destaque ao trabalho que pela Inatel Leiria e por outras entidades campo da cooperação e do desenvolvi- de Pedro Barroso, a comemorar cinquen- foi desenvolvido no distrito de Leiria, no que fazem parte do seu universo, bem mento sustentável. ta anos de carreira, do pianista, leiriense, campo das políticas sociais. Num ambien- como pessoas e organizações da adminis- Fernando Correia, conhecido jornalista, João Costa Ferreira e, por surpresa, de An- te de celebração, reuniram-se os principais tração Pública e da Sociedade Civil que foi o mestre de cerimónias desta grande tónio Manuel Ribeiro, vocalista dos UHF. intervenientes em iniciativas promovidas assumiram um papel preponderante no celebração, que contou com a presença Mafalda Carvalho

Portugal no Coração

primeira expressão deste pa- rágrafo só poderia ser «sejam bem-vindos». O que será estar fora do nosso país, da nossa pá- tria, da nossa tradição por mais de vinte, trinta ou quarenta anos? O programa “Portugal no ACoração” tem como objetivo proporcionar aos emigrantes portugueses a oportunida- de de revisitar o país que deixaram nou- tros tempos. Criado em 1996 este é um programa tu- rístico e cultural para todos os emigrantes portugueses com 65 ou mais anos de ida- de, residentes fora do território europeu e que não tenham visitado Portugal há pelo menos 20 anos. Foi no dia 9 de novembro que o grupo, oriundo de países como o Brasil, a Argen- tina, a Venezuela e a África do Sul, chegou ao aeroporto de Lisboa e se preparou para começar um programa de doze dias, pelo sul, centro e norte de Portugal. Esta iniciativa é promovida pelo Minis- tério dos Negócios Estrangeiros, pela Dire- ção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, pelo Ministé- rio do Trabalho, Solidariedade e Seguran- ça Social, pela Fundação Inatel e pela Tap Air Portugal, e proporciona ao grupo de emigrantes a oportunidade de, ao longo bordava emoção, surpresa e felicidade. Algarve com apenas dois anos de idade gado de São Paulo, Brasil. Ao lado estava o de treze dias, revisitar alguns dos locais e Uns nunca tinham visto a paisagem do e nunca mais lá voltou. Já não se lembra senhor Aníbal que nos diz que está à espera monumentos mais emblemáticos da nossa rio Tejo, outros ainda nem acreditavam do cheiro, da temperatura nem sequer da de voltar a Pombal, a sua aldeia natal, para história e das nossas cidades, assim como que estavam a pisar o solo português, mas paisagem. Garante que estar em Portugal rever alguns amigos que ainda lá estão. partilhar e deliciar os sabores únicos da uma coisa era unânime, a água que, volta é um sonho concretizado e não se poderia Até dia 20 de novembro, este grupo de nossa gastronomia. e meia, invadia o olhar. sentir mais feliz e agradecido. 14 participantes andaram por Portugal a Foi no dia da primeira visita, em Belém, O senhor Orlando, tinha voado de Bue- “Um novo sonho é voltar cá, novamen- reviver memórias e ganharam muitas his- que acompanhámos este grupo que trans- nos Aires, Argentina, e contou que saiu do te”, afirma Maria de Fátima, que tinha che- tórias para depois contar. Mafalda Carvalho 22 TL NOV-DEZ 2019

Os contos do zambujal

EM DIRECTO E A CORES Mário Zambujal

élio Bernardo entrou em casa eu compreenderia apesar de te censurar. culo, tu não dizes uma palavra em inglês, curvado e de nariz torcido. Mas a tua imagem não era de alguém com francês, mesmo italiano ou espanhol e no Algum dissabor. Giovanela peso na consciência, pelo contrário, a cer- entanto gesticulavas a falar, falavas muito Branca, sua dilecta esposa, es- to passo pareceu-me que deslocavas um e ela toda sorrisos. tranhou, tanto mais que o es- pouco a cadeira para ficar bem de frente As mesmas três palavras saíram da boca perava contente pelo correr do na televisão. semicerrada de Célio: dia. Ela sim, tinha pública razão Como única resposta, Giovanela só ou- — Não era eu. Cpara o receber de má catadura. viu do marido três palavras: — Até a carteira! A carteira que te ofere- Ele despiu o casaco, revirou os bolsos, — Não era eu. ci no dia do aniversário, amarela e preta, despejou sobre o tampo da mesa a sacola Agastada, a mulher retomou o discurso: bem a vi quando te prontificaste a pagar a que era hábito trazer ao ombro, mas desa- — E o boné, esse boné que te ofereci no conta, a tua e a dela, olha que coincidên- lentado deixou-se cair no sofá. Natal do ano passado, com as riscas azul cia, nesse momento acabou a entrevista Sem uma palavra. Foi Giovanela quem claro e grená como desejavas ter, quantas para a televisão, desligaram, deixei de te falou: vezes o colocas na cabeça para o tirares ver. — Estavas mais bem-disposto esta ma- passados minutos? Gestos que te observei — Não era eu. nhã. Diria mesmo que parecias feliz da na tv, mas não era necessário, bastava-me — E agora chegas a casa com cara de vida, repousado numa esplanada a horas ver a cara, a tua cara inconfundível, não enterro, tão bem-disposto que estavas, em que seria natural ocupares o teu lugar deve encontrar-se nariz igual em toda a principalmente com a brasileira – era bra- no emprego. Mas não. Recostavas-te ali, cidade. Tu não percebeste, Célio Bernar- sileira, não? – que pode ter acontecido ao risonho, na ignorância – suponho que na do, que estavas em frente de uma câmara, senhor meu esposo depois de uma manhã ignorância – de seres observado por mi- que, o mesmo é dizer, em frente do país em directo e a cores? lhares de pessoas. Uma delas, eu. Ao prin- todo, incluindo a tua surpreendida mu- — Decididamente, Célio Bernardo pou- cípio nem acreditava, mas depois tornou- lher? pava palavras: -se nítido, não havia confusão possível, Com as palmas da mão suportando a ca- — Não era eu. estavas sentado um metro à rectaguarda beça e os cotovelos apoiados nas pernas, Este foi o momento em que soou a cam- do entrevistado, um senhor ambientalista Célio disse, em voz baixa: painha da porta e Giovanela foi abrir. Re- que falava acerca dos perigos que corre o — Não era eu. conheceu a morena da televisão sentada planeta, secas, dilúvios, tufões, a catástro- Nesse ponto, a irritação de Giovanela na mesma mesa que Célio Bernardo. Fi- fe climática que faz do mundo todo um cresceu um pouco, gritou: cou muda de surpresa, só ouviu: lugar perigoso. Nem ouvi tudo, atenta — Caramba, é preciso desplante. Por- — O senhor Célio Bernardo de Assun- que fiquei à imagem da segunda fila. Será que é que vais continuar a negar que às ção Silvestre reside aqui? possível? Será possível? O meu Célio Ber- onze da manhã estavas refastelado numa — Conforme – disse Giovanela na de- nardo pespegado em frente de uma câma- esplanada da Baixa, contentinho da vida, fensiva. – Que lhe quer? ra de televisão? Sem intenção, poderás tu sobretudo quando uma jovem bonitona — Ver ele – respondeu a visitante e a dizer. Calhou sentarem o ambientalista à se foi sentar à mesma mesa, ela pediu li- dona da casa sorriu por ver confirmado o tua frente, e vá de conversa, nem sabias cença, foi o que entendi, e tu levantaste-te, palpite de que seria brasileira. E então, iró- – poderás tu dizer – que a tua imagem es- todo mesuras, a segurar-lhe as costas da nica, chamou com o sotaque da visitante: tava a ser captada pela câmara da tv. cadeira? Comigo não és tão atencioso, mas — Célio, amô, chega aqui meu bem. Célio Berardo remexeu-se, levantou o bem percebi como ficaste encantado com Aproximou-se o reclamado com os olhar para a mulher e disse: tão bela companhia. Era brasileira? Cal- olhos arredondados pelo espanto. E a vi- — Não era eu. sitante esclareceu: Ela soltou um riso forçado e áspero, res- — Sorte você ter na carteira informação pondeu de pronto: da sua residência. Eu encontrei no chão e — Não eras tu? Então eu não conhe- vim trazer. Gostei de conhecer você. ço o homem com quem casei há dezoito “Comigo não és Foi Giovanela quem agradeceu, Célio si- anos? Seria capaz de confundir esse quei- lencioso. Retirou-se a brasileira e, de novo xo quadrado, o nariz redondo, as orelhas tão atencioso, a sós, ela tornou à carga: avantajadas como asas de pássaro? Além — E agora? Não é altura de me contares dos gestos: o cruzar e descruzar dos bra- mas bem percebi qual o motivo por que faltas ao emprego ços, o entrelaçar dos dedos, o modo como e me entras em casa pela televisão, em coças a nuca com a ponta da esferográfica. como ficaste directo e a cores, com ar feliz, e chegas a Célio, Célio, voltei com as imagens até ao casa com ar infeliz? E nem falaste com a começo, é bom que as televisões permi- encantado com tão menina com quem eras todo sorrisos de tam agora rebobinar, e se alguma dúvida manhã? pudesse ter ficou desfeita. Podias, ao me- bela companhia. Caminhando em direção do quarto, Cé- nos, ter a franqueza de confessar que su- lio Bernardo cortou a conversa: cumbiste ao impulso de faltar ao trabalho Era brasileira? — Não era eu. Calculo, tu não dizes uma palavra em inglês, francês, mesmo italiano ou espanhol” TL nov-dez 2019 23

Passatempos

Palavras cruzadas POR josé lattas

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 HORIZONTAIS: 1-Samário (s.q.); VERTICAIS: 1-Aquentara. 1 Abrirais e fechais rapidamente, 2-Mensalidade; Agrada; Cântico. os olhos. 2-Divina; Ilha do Mar 3-Solteirona (pop.); Levantar. 2 da Irlanda, pertença da Coroa 4-Cabelos; Sus. 5-Agastamentos; Britânica, apesar de a jurisdição, Para barlavento (naut.); Germânio não fazer parte do Reino Unido. (s.q.) (inv.). 6-Catedrais; Caritativo; 3 3-Acoitas; Mérito. 4-Contração Admiti. 7-Cálcio (s.q.); Espáduas; de preposição e artigo (pl.); Nome de santa de origem italiana, 4 Borras. 5-Ósmio (s.q.); Concórdia; que viveu entre os séculos XIV Compareça. 6-Pauta; Lamentação; e XV, e faleceu em Cássia, em 22 Sigla de conhecido instituto de de Maio de 1457 (inv.). 8-Dezena; 5 tecnologia de Massachusetts. Dinheiro. 9-Âmagos; Rotina. 7-Sódio (s.q.); Gavinha; Lítio (s.q.). 10-Sigla do satélite europeu de 6 8-Camareiro; Sapo do Amazonas. meteorologia, associado com o 9-Rebola; Atola. 10-Sufixo, número 24; Cachorro; Bárbaro. com o significado de aumento, 11-Escusa. 7 quantidade; O que se encarrega de editar, publicar ou fazer uma 8 edição. 11-Arvorara; Certo.

9

Soluções:

10 UM. 11-ERIGIRA; EDITOR. 10-ADA; ATASCA. 9-ROLA;

5-OS; S; PAZ; VA. 6-ROL; AIS; MIT. 7-NA; ELO; P; LI. 8-A; AIO; ARU; V. V. ARU; AIO; 8-A; LI. P; ELO; 7-NA; MIT. AIS; 6-ROL; VA. PAZ; S; 5-OS; 11 G. PÈS; AOS; 4-M; DOTE. 3-ASILAS; MAN. 2-ETÉREA; PISCAIS. 1-SM;

EGIPTO FARAÓNICO 21 a 29 março de 2020 COM CRUZEIRO NO NILO PARTIDA: Lisboa Viagem com Especialista Prof. Doutor José Sales (Egiptólogo)

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