Tese Eduardo José Dos Santos De Ferreira Gomes.Pdf
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE HUMANIDADES, ARTES E CIÊNCIAS PROFESSOR MIL- TON SANTOS PROGRAMA MULTIDISCIPLINAR DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CULTURA E SOCIEDADE VEDAÇÃO À CESSÃO DE DIREITOS AUTORIAS: UMA ABORDAGEM CONSTI- TUCIONAL E CULTURALISTA. por EDUARDO JOSÉ DOS SANTOS DE FERREIRA GOMES Orientadores: Prof. Dr. MESSIAS GUIMARÃES BANDEIRA – Universidade Federal da Bahia. Prof. Dr. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO – Universidade de Lisboa. SALVADOR – LISBOA, 2018 UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE HUMANIDADES, ARTES E CIÊNCIAS PROFESSOR MIL- TON SANTOS PROGRAMA MULTIDISCIPLINAR DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CULTURA E SOCIEDADE VEDAÇÃO À CESSÃO DE DIREITOS AUTORIAS: UMA ABORDAGEM CONSTI- TUCIONAL E CULTURALISTA. por EDUARDO JOSÉ DOS SANTOS DE FERREIRA GOMES Orientadores: Prof. Dr. MESSIAS GUIMARÃES BANDEIRA – Universidade Federal da Bahia. Prof. Dr. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO – Universidade de Lisboa. Tese apresentada ao Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos da Universidade Federal da Bahia, com perí- odo sanduíche na Faculdade de Direito da Universi- dade de Lisboa, como requisito parcial para obten- ção do grau de Doutor. Esta pesquisa utiliza a linguagem portuguesa cor- rente no Brasil, obedecendo ao Acordo Ortográfico de 1990, em vigor no Brasil desde 1° de janeiro de 2009. No entanto, a redação original foi mantida nas citações de obras portuguesas feitas de forma literal e direta. SALVADOR – LISBOA, 2018 Oh, musa do meu fado Oh, minha mãe gentil Te deixo consternado No primeiro abril Mas não sê tão ingrata! Não esquece quem te amou E em tua densa mata Se perdeu e se encontrou. Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal: Ainda vai tornar-se um imenso Portugal! Sabe, no fundo eu sou um sentimental. Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo (além da sífilis, é claro). Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esga- nar, trucidar, o meu coração fecha os olhos e sinceramente chora... Com avencas na caatinga Alecrins no canavial Licores na moringa: Um vinho tropical E a linda mulata Com rendas do Alentejo De quem numa bravata Arrebata um beijo... Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal: Ainda vai tornar-se um imenso Portugal! Meu coração tem um sereno jeito E as minhas mãos o golpe duro e presto De tal maneira que, depois de feito Desencontrado, eu mesmo me contesto Se trago as mãos distantes do meu peito É que há distância entre intenção e gesto E se o meu coração nas mãos estreito Me assombra a súbita impressão de incesto. Quando me encontro no calor da luta Ostento a aguda empunhadora à proa, Mas meu peito se desabotoa. E se a sentença se anuncia bruta Mais que depressa a mão cega executa, Pois que senão o coração perdoa Guitarras e sanfonas Jasmins, coqueiros, fontes Sardinhas, mandioca Num suave azulejo E o rio Amazonas Que corre Trás-os-Montes E numa pororoca Deságua no Tejo... Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal: Ainda vai tornar-se um império colonial! FADO TROPICAL Chico Buarque e Ruy Guerra 1973, ditadura em Portugal e no Brasil. Agradecimentos Aguei a Samambaia e o Alfinete. A Muçambê, caída para a esquerda, lado contrário de onde o sol batia, parecia saber que estava de partida... Entre nós, findava o inverno e os cora- ções já se preparavam para a estação do floreio. A um Atlântico de distância e muitas toneladas de sal, fim do verão, com um outono, antecipadamente, já dando o ar da graça. Era, precisa- mente, 11/09/2015, um quarto para as onze, quando a aeronave, afinal, depois de algumas en- carnações, aterrissou em Lisboa. Com os olhos pregados no monitor à frente de meu assento, calculando, com precisão, cada milha percorrida e cada milímetro que o desenho do avião se movia no mapa da tela, o pensamento era apenas a imagem congelada da expressão de minha senhora, mulher de maior importância em minha vida, de cujo ventre saí, que, junto com meu pai, minha tia Rilda e minha amiga Dil, deixaram-me no aeroporto de Salvador na noite anterior. Festejavam o meu crescimento. No meu peito, um misto da catarse do carnaval com a melancolia do natal... Queria conhecer o apartamento que moraria; a gata Zuri, que minha senhoria condicionou o aluguel e que passaria a ser minha única companhia no inverno europeu que fatalmente viria; a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa; os professores; meus novos colegas; os vizinhos... Exilei-me em Portugal. Buscava renovar minha vida. Respirar outro ar e obter nova corrente sanguínea. Foi o doce e ideal cárcere que construí para a escrita desta tese. Com o passar das semanas, leituras e fichamentos iam sendo concluídos. Aos poucos, o sumário ia ganhando forma. Ao rasgar madrugadas sempre frias, páginas nasciam com o pri- meiro eléctrico da rua. Quando em vez, nas saídas dos sebos do Chiado, dava-me com as pro- cissões a cheirar a rosmaninho, transportando-me, imediatamente, a Cachoeira. Depois, a ca- minho de casa, a pé, descia para o Rossio, com parada obrigatória na Confeitaria Nacional, para tomar uma bica, enfeitiçado pelo cheiro das castanhas assadas. E foi assim que, com as tempe- raturas caindo pelas tabelas e quebrando os termômetros, luziu os dois primeiros capítulos. Já era tempo de as rosas florirem nas tapadas e de ver os craveiros nas águas furtadas dos casarões do Bairro Alto dividindo espaço com roupas coloridas dependuradas. O quentinho já chegava e já se via nitidamente, da minha varanda, o castelo de São Jorge. Aos poucos, entre aulas na Faculdade de Direito, para além do Campo Pequeno, e noites de leituras com cheiro de mar e sabor de Dão, o meu predileto, o capítulo três foi despontando. Mudanças aquecem o coração... aproveitando o novo clima, mudei-me, também, de morada; passei a viver na Graça, na mais alta das sete colinas. Almoçar vitela com ovo à moda do Alentejo no Copélia, servido por Seu Sebastião, indicação da amiga Fran Bergamo, já não mais era corriqueiro. Mas, a casa da Graça tinha na sala um piano, era no rés-do-chão e ficava a poucos minutos do Miradouro de Santa Luzia, onde podia acalentar a saudade do Brasil. Passei muitas tardes quase quentes lendo e fazendo fichamentos nos bancos da praça do Miradouro da Senhora do Monte... pró- ximo, fica o Museu do Aljube, onde há na fachada uma placa com o escrito: Aqui do silêncio das gavetas da pátria amordaçada dos peitos desfeitos pelas torturas da pide subiu o clamor da liberdade floriu Abril. Sempre lia, relia... Cabisbaixo, minha´lma chorava os que estavam nas gavetas, incon- formado como foi possível que a humanidade já tivesse vivido tais momentos de trevas. Sem aviso, junho chega e já se vê muitas sardinhas a assar nos finais de tardes nas ruas de Lisboa. Em junho, toda cidade é de António, mas, sem dúvida, é da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, os mais belos adornos. O coração se alegra nas festas dos santos populares de Lisboa. Nascia o capítulo quarto ao som de cantigas como: Quatro paredes caiadas, Um cheirinho à alecrim, Um cacho de uvas doiradas, Duas rosas num jardim, Um São José de azulejo (...) Como o comboio da vida sempre acelera e pede pressa, a estação do sol desponta com força e muito calor. Com a alegria do verão e as tardes de domingo de praia em Cascais ou São Pedro do Estoril, a saudade do Brasil intensifica sua dor. Entre uma imperial em Alfama e na Madragoa, e noites quentes de solidão nos fados Luso, Caldo Verde e Adega Machado, sempre com o sabor encorpado dos alentejanos, bom para encontrar argumentos sobre a nostalgia das lembranças do lugar abaixo da linha do equador, do outro lado do Atlântico, em que se come tudo com dendê, o capítulo derradeiro, o quinto, vai ganhando feitio. No Miradouro de São Pedro de Alcântara, onde gostava de ver o pôr do sol tomando um gelado de ameixa d’Elvas artesanal de Dona Idalina, o tempo, senhor da razão, já mandava o vento avisar que o regresso para o Brasil se aproximava. Estar em Lisboa foi da maior impor- tância... é a terra natal de meu pai e, portanto, capital do país de minha outra nacionalidade. É uma grande felicidade para mim ser luso-brasileiro e ter no peito o pertencimento a estas duas pátrias amadas; é como se confirmasse, de Buarque, os alecrins no canavial do meu recôncavo e as rendas do Alentejo. Já havia ido inúmeras vezes ao velho mundo, mas nunca tinha morado... faltava-me para uma melhor compreensão de meu pai e seu mundo, o que, depois que vivenciei, transformou o meu eu. Conheci mais familiares e novas histórias sobre minhas origens, em especial a de meu bisavô, Duarte Ferreira Gomes, nascido em 1880, militar e advogado que foi à primeira guerra mundial defender Portugal. Em 12/09/2016, com uma primeira versão escrita dos cinco capítulos da tese, nostalgia e alegria pletora ao mesmo tempo... Deixava minha Lisboa com a alma lavada. Agora, mais do que nunca, para além de documentos, sentia-me, efetivamente, português. Sentia-me, o que era ainda melhor, um brasileiro-português. Obrigado, Portugal, por todo acolhimento; aconchego; arte; música; fados; poesia; Amálias; Pessoas; culinária; sonhos; vinhos; mais vinho; um pou- quinho mais de vinho; vá lá, uma sangria; ah! E a imperial, com certeza... Jamais me olvidarei desse um ano que passou feito um torvelinho; foi uma fração de segundo... os alecrins, as cores, os caramanchões, os jardins, os miradouros, os batéis e as naus, o mar, o Tejo, as janelas ma- jestosas e as gelosias, a arquitetura, enfim, tudo que havia lá, tornando-se parte de mim, num vicejo infindo de voltar, de voltar, de voltar..