Cartas De Chamada. a Dimensão Familiar Da Emigração 53 1

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Cartas De Chamada. a Dimensão Familiar Da Emigração 53 1 CARTAS DE CHAMADA BRASILINA PEREIRA DA SILVA CEPESE AUTOR Brasilina Pereira da Silva TÍTULO Cartas de Chamada A dimensão familiar da emigração Sernancelhe no Início do séc. XX EDITOR CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade Rua do Campo Alegre, 1021-1055 Edifício CEPESE 4169-004 Porto DESIGN EDITORIAL Diana Vila Pouca ISBN 978-989-8434-29-6 PORTO, 2014 CARTAS DE CHAMADA BRASILINA PEREIRA DA SILVA CEPESE Agradecimentos Este é uma trabalho de demorada entrega pessoal que obriga a silêncios e a dis- tanciamento dos outros. Mas é, simultaneamente, empresa que, em seus avan- ços se socorre das ajudas que se procuram durante os múltiplos contactos que se fazem no terreno, das que concorrem para a reunião dos indispensáveis ma- teriais e necessários testemunhos, e daquelas que, mais específicas, permitem construir hipóteses e definir as formulações que conduzem a investigação. E de tudo eu me sinto devedora e agradecida a muita gente. Em primeiro lugar à Profª Doutora Fernanda Paula Sousa Maia, profissional na área do conhecimento e investigação e que foi uma mais valia para a rea- lização de algo que se tornou mais que um projecto. Foi um desafio pessoal. À dr.ª Maria das Dores Almeida Henriques que me serviu de guia no Arquivo Distrital de Viseu do qual exerce a competente direcção e que tão generosa- mente, com seu pessoal, me trouxe a ajuda de muitas horas de busca. A todas as pessoas que, como minha mãe, evocaram, de memória ou trou- xeram a recordação de idas e regresso de brasileiros de família de quem, às vezes, guardam os retratos de cor sépia. Ao dr. Alberto Correia, leitor atento dos meus textos, seu revisor algumas vezes e conselheiro, particularmente no que respeita aos testemunhos de Aquilino. Aos amigos que se prestaram à busca de uma informação necessária num Ar- quivo ou Biblioteca mais distante. Ao CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade, na pessoa do seu Presidente, Prof. Doutor Fernando de Sousa bem como a todos os que com ele fizeram com que se concretizasse esta edição. Por fim, à família mais chegada, ao meu marido João e aos meus filhos Pedro, e Marisa, de quem fiquei algumas vezes mais ausente. Índice 11 INTRODUÇÃO PARTE I TERRITÓRIO E EMIGRAÇÃO PARA O BRASIL 15 1. A TERRA E OS HOMENS 15 1.1. A construção de um território 20 1.2. Uma estrutura económico-social 26 1.3. A aldeia. Casa e família como microcosmo 29 1.4. A transparência da religiosidade 31 1.5. Um lugar na ficção de Aquilino Ribeiro 33 2. A EMIGRAÇÃO PARA O BRASIL 33 2.1. Mobilidade. Contextos. 38 2.2. As freguesias como território de partida 39 2.3. Emigração por estado civil, sexo e idade 42 2.4. A profissão dos emigrantes 47 2.5. A alfabetização dos emigrantes 49 2.6. O destino particular dos emigrantes PARTE II CARTAS DE CHAMADA. A DIMENSÃO FAMILIAR DA EMIGRAÇÃO 53 1. CARTAS DE CHAMADA – UMA TEORIA DE COMUNICAÇÃO 53 1.1. Cartas de chamada – A singularidade de uma fonte 56 1.2. Da carta privada ao documento oficial 60 1.2.1. A estrutura das cartas de chamada 60 1.2.1.1. Invocação 61 1.2.1.2. Pórtico ou abertura 62 1.2.1. 3. Conteúdo 62 1.2.1.4. Formulário de saudação 64 1.2.2. Carta de chamada – Documento oficial 67 1.3. Os escreventes 72 1.4. A relação homem - Mulher 79 1.5. A relação pais - Filhos 84 1.6. Relações de compadrio 88 1.7. Cartas de chamada – Expressão de religiosidade 90 1.8. Testemunho de intervenção cívica 94 1.9. Uma evidência de conflito 98 1.10. A doença e a morte – Um problema 101 1.11. O retorno como intenção 106 2. CARTAS DE CHAMADA – O DISCURSO SOBRE A VIAGEM 106 2.1. Uma decisão: ir ou ficar 109 2.2. Os “papéis”. Agentes e abonadores 117 2.3. A “mala” de viagem 122 2.4. A viagem 127 2.5. Desembarque. Acordar no outro lado 131 CONCLUSÃO 137 ANEXOS 376 FONTES E BIBLIOGRAFIA 10 CARTAS DE CHAMADA RESUMO Introdução É reconhecido o impacto que a emigração para o Brasil teve na Beira Alta a partir dos finais do séc. XIX definindo um ciclo de forte intensidade que vai encerrar-se apenas nos finais da década de cinquenta do séc. XX. A sensibilização para esta problemática da emigração para o Brasil, no uni- verso físico e cultural do Concelho de Sernancelhe e alguns estudos académi- cos anteriormente feitos no âmbito da Histórica Ibérico-Americana tornaram oportuno ampliar a investigação no referido Concelho desenvolvendo tal as- sunto e referenciando-o com o tema assinalado. Havia ainda a intenção de identificar a intensidade dessa onda migratória que correra nos dois sentidos, de compreender as razões que motivaram a ida de tantos e o regresso de alguns, de conhecer melhor quem eram os actores desta autêntica epopeia, de encontrar finalmente um sentido para a envolvên- cia de um imaginário moldado pela ideia de que o Brasil era uma espécie de Terra Prometida, a terra da “Árvore das Patacas” da linguagem mais comum, de onde chegavam cartas e dinheiro, baús que adivinhavam riqueza, fotogra- fias de gente que parecia feliz. A leitura de alguns livros de Aquilino Ribeiro, um fecundo escritor oriun- do do Concelho de Sernancelhe que oferecia inúmeros e intensos registos de teor regionalista acerca dos “brasileiros” que partiam com esperança e que às vezes regressavam, nem sempre afortunados, acrescentou uma sólida mais-valia a esse interesse. Acrescia o facto de não ter sido ainda levado a cabo qualquer estudo sobre esta problemática no Concelho de Sernancelhe, município beiraltino possui- dor de credenciais históricas de forte expressividade, caracterizado, no entan- to, por uma economia de teor agro-pastoril sem grande capacidade de transfi- guração devido à interioridade a que ficara sujeito. E como razão última estava o facto de ser natural de uma freguesia do referido Concelho, de aí ter estado responsável por actividades culturais e nele exercer a actividade docente. 12 CARTAS DE CHAMADA Construído um modelo teórico e definido ainda um arco temporal de aná- lise que iria de 1901 a 1930, período suficientemente longo para garantir a eficácia de qualquer metodologia e que fora atravessado por circunstâncias históricas de relevo, tal a Revolução Republicana de 1910, na conjuntura nacional e o eclodir da 1.ª Grande Guerra onde Portugal se veria também envolvido nos últimos dois anos. Este período, mediando entre a realização dos Censos da População reali- zados em 1900 e 1930 e que incluía a data da realização dos Censos de 1911 e 1920, permitiria ainda cruzar os dados fornecidos pelos mesmos, particular- mente os de matriz sociocultural, com outros elementos da investigação. Deu-se então início à investigação que levou de imediato ao Arquivo Distri- tal de Viseu onde, nos Fundos do Governo Civil, haveria de achar matéria de substância para o específico retrato que propusera realizar, particularmente nos registos de pedidos de passaporte e nos mapas que os confirmariam. Quis a sorte que tivessem aparecido algumas “cartas de chamada”, diplo- mas agora oficiais, mas que não haviam perdido a fecundidade das cartas pri- vadas que começaram por ser, e a atenção que logo mereceram fazia antever um enriquecimento qualitativo deste estudo que não mudara ainda de linha. Aqui, alguma perspicácia fez inflectir a linha de orientação antes traçada. As cartas de chamada ocupariam agora a centralidade das preocupações. e o significativo número das noventa cartas encontradas, não desprezível em quantidade, mas valiosíssimo enquanto factor qualitativo, permitiria conhe- cer por dentro os núcleos familiares a que as mesmas se prendiam, permitiria identificar melhor o quadro de recíprocas relações que se estabeleceriam no seu seio e simultaneamente permitiria situar indivíduos e famílias dentro dos contornos de uma comunidade em turbulência, dividida entre cânones de vi- ver ancestral, de limitados horizontes e a aventura da emigração para o Brasil que todos viviam mesmo que alguns nunca chegassem a partir. Todavia, a compreensão inteira das mesmas cartas, da razão que as ditara e da resposta que tivessem obtido assentava, em boa parte, na natureza física e humana de um território dado, o Concelho de Sernancelhe. E assim se divide este trabalho em duas partes. Na Parte I, intitulada Território e emigração para o Brasil, procuraria em primeiro lugar identificar a construção histórica do município enquanto espa- ço habitado, obediente a determinadas coordenadas socioeconómicas susten- tadas no quadro de um típico modo de viver aldeão fortemente impregnado por uma catequese cristã. CARTAS DE CHAMADA 13 Em segundo lugar, como resultado da intensiva pesquisa feita no Arquivo Distrital de Viseu, já cruzada com outras fontes, procuraria traçar o retrato global da emigração para o Brasil identificando a raiz paroquial da mesma, o sexo e a idade de quem partia, os atributos profissionais, o estatuto cultural, os lugares escolhidos do destino. Na Parte II, intitulada Cartas de chamada. A dimensão familiar da emigra- ção, tentaria empreender uma mais objectiva análise das cartas de chamada en- quanto instrumentos que permitissem aferir a dimensão familiar da emigração, isto é, que permitissem compreender a problemática interna gerada no seio da família a partir da deslocação para o Brasil de um dos seus membros. Na perspectiva de uma teoria da comunicação determinaria a função da carta como privilegiado veículo para as necessárias mensagens enquanto pro- curaria compreender a sua estrutura interna e a particular natureza dos seus conteúdos onde se haveria de definir o grau de cultura de emissores e recepto- res e onde se revelaria a textura desse espaço em que se movimenta a família e onde interage com a comunidade.
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