Interior Das Redacções, Na Década Em Que O Mundo De Diana
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as primeiras mulheres repórteres Isabel Ventura as primeiras mulheres repórteres Portugal nos anos 60 e 70 Prefácio de Fernando Alves lisboa: tinta ‑da ‑china MMXII Índice 9 Agradecimentos 11 Prefácio, por Fernando Alves 17 Introdução 25 Parte I: Objectivos 27 Objectivos gerais e específicos 37 Parte II: Problemáticas 45 Parte III: As mulheres e o Estado Novo 47 A categoria género e as fontes orais nos estudos sobre as mulheres 53 Enquadramento do tema 73 O contexto histórico 135 Parte IV: As jornalistas 137 Perfis das jornalistas 141 Alice Vieira: «Não há jornalistos.» 147 Edite Soeiro: «Três dias depois de o © 2009, Isabel Ventura e meu filho nascer já estava a trabalhar.» Edições tinta ‑da ‑china, Lda. Rua João de Freitas Branco, 35A 153 Diana Andringa: «As jornalistas 1500 ‑627 Lisboa não eram mulheres… eram jornalistas.» Tels.: 21 726 90 28/9 | Fax: 21 726 90 30 E ‑mail: [email protected] 159 Leonor Pinhão: «Os dirigentes www.tintadachina.pt desportivos achavam graça ser uma miúda e estar ali.» Título: As Primeiras Mulheres Repórteres — Portugal nos anos 60 e 70. 165 Maria Antónia Palla: «Ela escreve Autora: Isabel Ventura como um homem.» Prefácio: Fernando Alves Revisão: Tinta ‑da ‑china 169 Maria Teresa Horta: «Li Simone de Capa e composição: Tinta‑da‑china Beauvoir aos 14 anos e isso mudou 1.ª edição: Julho de 2012 a minha vida.» isbn: 978 ‑989 ‑671 ‑003 ‑3 Depósito Legal n.º 345912/12 175 Conclusões 185 Notas 199 Bibliografia Agradecimentos Esta obra é fruto de um esforço colectivo, pois benefi‑ ciou do contributo de várias pessoas. Até à sua conclusão vivi dos meus amigos, que me suportaram as crises e angústias, que me patrocinaram gargalhadas e promoveram sorrisos, que me ajudaram a aguentar o peso do quotidiano cujo fio por vezes tão tortuoso me impelia para o caminho mais fácil — o da desistência. Mas nenhum me deixou cair. E o resultado são estas páginas, nas quais está parte da vida de algumas mulheres, às quais endereço um agradecimento particu‑ lar e a quem declaro a minha admiração. Uma lembrança especial a Edite Soeiro, intrépida repórter, cuja memória este livro pretende também homenagear. Registo igual‑ mente o meu agradecimento e reconhecimento ao Fer‑ nando Alves, pela enorme generosidade que revelou no prefácio do livro, e à equipa da Tinta‑da ‑china, pelo en‑ tusiasmo com que acolheu a ideia de publicar este texto. Nestas páginas estão também a paciência, a orien‑ tação e a amizade do dr. Mário Mesquita, sem o qual este livro jamais teria sido concluído; estão a amizade, [9] as primeiras mulheres repórteres o incentivo e a empatia da doutora Teresa Joaquim; está a grande amizade da Maria João Galvão Santos, do Ricardo Paes Mamede (sem os teus balões de oxigénio eu não estaria aqui), da Antónia Estrela (longo o caminho que percorre‑ Prefácio mos juntas), da Elisa Seixas e da Adriana Fernandes. E, por por Fernando Alves fim — mas não de somenos importância —, estão (sobre‑ tudo) a presença e o apoio discretos, mas sempre certos, da minha família (dos meus pais, do Marcelo e da minha irmã — de sangue e de água). Uma palavra especial para a u quis ler este livro porque num primeiro momento, Kiara, em cujo futuro reside a esperança. Eele me trouxe, de novo, a voz de Edite Soeiro. Quando, em finais de 1975, com apenas 21 anos, re‑ É, portanto, a todos(as) eles(as) que dedico este livro. gressei a Portugal, vindo de uma Luanda conturbada, onde a rádio já não era a mais bela trincheira da revolu‑ ção, António Macedo apresentou‑me a Edite Soeiro, ao tempo chefe de redacção da revista Flama. Eu era um rapaz desconhecido, de longa cabeleira indomável e sem almofada partidária. Edite Soeiro (figura mítica, cuja carreira começara aos 16 anos no Intransigente, na mes‑ ma Benguela amada onde, também aos 16 anos, eu entrei para a rádio) jamais me tinha escutado, muito menos lera uma pobre frase minha. Mas cuidou de mim como se eu fosse um filho pródigo. Certa vez, estando com ela na pastelaria Smarta, a conversa chamou a atenção de um cavalheiro na mesa ao lado. O cavalheiro era afinal Alexandre Manuel, chefe de redacção da Vida Mundial, dirigida por Augusto Abe‑ laira. Nesse mesmo dia, Alexandre Manuel desafiou ‑me a escrever sobre a actualidade angolana e mandou ‑me [10] [11] as primeiras mulheres repórteres prefácio entregar a prosa na Rua do Século. Foi lá que conheci O que aqui nos é revelado não será propriamente Diana Andringa, em cujas mãos depositei, com vénia e «novidade», salvo para os mais distraídos. Já sabíamos, já gratidão, os textos que lá me publicaram até que, entre‑ pressentíamos, que era assim, que fora assim. Mas não tanto, a rádio me cobriu, de novo, com a sua asa. tínhamos «visto», não tínhamos «entrado» desta manei‑ Este livro faz‑me reencontrar também a cumplicidade ra no interior das redacções, na década em que o mundo de Diana. E reconduz‑me aos dias em que o meu querido ia começar a mudar mas em que a percentagem de mu‑ amigo Manuel, da Lello, me passou, a um canto do balcão da lheres jornalistas sindicalizadas era apenas de dois por livraria, em Benguela, com um gesto cúmplice, um exemplar cento. É que, como nos lembra Isabel Ventura, em 1960 de As Novas Cartas Portuguesas, que fizera escapar à vigilância havia dez mulheres jornalistas sindicalizadas, algumas dos censores e que muito contribuiu para a minha toma‑ delas desempenhando apenas funções de apoio. As mu‑ da de consciência das hoje designadas questões de género. lheres que chegavam às redacções estavam confinadas E traz ‑me este livro, ainda, os testemunhos de outras à secção de Sociedade, às páginas culturais, aos suple‑ notáveis mulheres, das quais Isabel Ventura não pretendeu mentos juvenis. apresentar ‑nos um fio apetecido de biografias cruzadas. Maria Teresa Horta conta, por exemplo, que «a en‑ O que a autora exemplarmente visou foi a revisitação e a trada nas instalações do Século era reservada a homens e compreensão de um tempo de reposteiros e alçapões, de que as publicações femininas tinham redacções à parte». liberdades vigiadas e direitos minguados. Ela conta ‑nos o Um dos méritos deste livro é que ele nos leva a «ver» modo como seis mulheres jornalistas conquistaram o seu o que já sabíamos mas ainda não tínhamos «visto», o que lugar num «território de homens», num tempo de opres‑ sabíamos de um modo difuso, desenquadrado. Mas este são. Era a ditadura, era a censura. Mas era, também, um livro dá ‑nos, também, o contexto histórico em que a luta, conservadorismo beato e preconceituoso. tantas vezes silenciosa, desamparada e incompreendida, Estas mulheres tiveram de lutar, por um lado, contra das mulheres jornalistas se foi travando. Ela não deve, as arbitrariedades de um regime repressivo e, por outro, por isso, ser vista à margem de todas as outras lutas das contra a arrogância e/ou a insensibilidade dos seus pró‑ mulheres portuguesas. A História recente mostra ‑nos, prios camaradas de profissão, mesmo os mais «progres‑ aliás, que a luta das mulheres foi sempre redobrada e que sistas». E lutaram. elas raramente tiveram, no texto constitucional, no espí‑ Como se viu mais tarde, não bastava, não bastou, rito e na letra da lei, na tábua dos direitos, quinhão igual derrubar a ditadura para que tudo mudasse. ao dos homens. [12] [13] as primeiras mulheres repórteres prefácio Antes do Estado Novo, também a República não foi do pela imprensa estrangeira? Como a própria Maria justa para as mulheres que por ela tanto lutaram. Desde Teresa Horta sublinha, «é verdade que a censura não dei‑ logo no direito de voto. Não nos esqueçamos de Carolina xaria passar. Contudo, seria uma forma de marcar posi‑ Beatriz Ângelo, a primeira mulher que votou durante a ção e mostrar solidariedade». I República. Ela ousou fazê ‑lo contra a legislação exis‑ Essa ausência de solidariedade é muitas vezes eviden‑ tente e contra a vontade da própria direcção republicana. ciada ao longo deste livro, e de forma perturbadora. A dada E Maria Veleda, que em 1909 gritou, nas galerias do Par‑ altura, Diana Andringa conta que, quando propuseram a lamento, um vibrante «Viva a República!» — e já antes Carlos Ferrão que ela colaborasse na Vida Mundial, o di‑ discursara ao lado de Magalhães Lima —, viria a escre‑ rector, um velho republicano, respondeu ao interlocutor: ver, em 1912, profundamente desiludida, que é preci‑ «Deve estar doido, as mulheres não têm cérebro para fazer so começar pelo fim, isto é, pelos direitos políticos das jornalismo.» Muita coragem foi necessária para lutar simul‑ mulheres. taneamente em duas frentes: contra os abusos da ditadura É isso que este livro de Isabel Ventura nos diz tam‑ e contra as práticas sexistas mais descaradas ou subtis. E é bém: quando lembra o modo como Maria Lamas, direc‑ claro que esta não foi uma fatalidade portuguesa. tora da Modas e Bordados, sofreu as consequências de ter Quando mergulhava neste apaixonante livro de organizado uma exposição sobre mulheres escritoras; Isabel Ventura, encontrei, por mero acaso, uma nota ou quando sublinha a passagem da Constituição de 1933 sobre a composição do New York Times no início dos que, reconhecendo a «igualdade perante a lei», ressalva, anos 70. Entre os 420 repórteres do jornal, havia 40 em desfavor da mulher, as «diferenças resultantes da na‑ mulheres. Nem uma colunista, nem uma editorialis ‑ tureza e do bem da família». Daqui decorre, como con‑ ta, nem uma repórter fotográfica. Mas, desde o início clui a autora, que «as mulheres portuguesas eram, por de Setembro de 2011, Jill Abramson passou a ocupar o lei constitucional, seres biologicamente condicionados, lugar de editora executiva do jornal.