UNIVERSIDADE DE SXO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

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ARTES PLÁSTICAS» PARTICIPAÇÃO E DISTINÇÃO

BRASIL ANOS 60/70

Autora: Maria Amélia Bulhões Garcia

S3o Paulo, 1990 UNIVERSIDADE DE FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

ARTES PLÁSTICAS» PARTICIPAÇÃO E DISTINÇÃO

BRASIL ANOS 60/70

Autora: Maria Amélia Bulhões Garcia

Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Nogueira

Tese de Doutorado apresentada ao curso de Pós- Grasduação em História Social da Universidade de São Paulo, para obtenção do Título de Doutor.

São Paulo, 1990 III

Dedicatória

A Néstor Garcia Canclini que me auxilou a chegar até aqui e a todos a quem este trabalho possa ser útil em uma caminhada que é de muitos. AGRADECIMENTOS

Foram muitas as descobertas ao longo desta trajetória.

Como agradecer a todos se a grande descoberta foi a de quanto

* coletivo qualquer tipo de trabalho. Alguns estão aqui referenciados, talvez outros tenham sido omitidos. Não deveria agradecer a todos os estudados? Que fazer? Agradecimentos oficiais e afetivos aqui estãos

- Ao Departamento de História da UFRGS, pela liberação

dos encargos docentes, mas antes de mais nada pelos

desafios colocados.

Ao CNPq e FUNARTE pelo apoio à pesquisa possibilitando

a sua realização.

À CAPES pela bolsa que custeou meus estudos e pela

viagem ao México, fonte de inesgotáveis conhecimentos.

- À PROPESP, pelo apoio permanente.

Ao Prof. Dr. Carlos Guilherme Mota, que acreditou neste

projeto quando ele era ainda uma semente. V

- Ao Prof. Dr. Carlos Roberto Nogueira, um orientador

amigo-

- À Rosana e Meg, companheiras na pesquisa e nos

questionamentos.

- À Blanca e Mônica, as amigas de todos os momentos-

- À Loiva, por seu estímulo e exemplo.

- À M. L. Bueno Coelho de Paula, pelas valiosas informações.

- Ao Avancini pela leitura atenta.

- À Dione, pela amizade de sempre e a revisão ciudadosa.

- À Helena e Pancho, pela infraestrutura tão necessária.

- À Graça, pela orientação e questionamento permanentes e

principalmente pelo apoio em todos os momentos.

- Ao Irineu por partilhar dúvidas, por sucitar que eu

tentasse compreender a "falsa magia", pelo apoio e por

tantas coisas mais.

- Ao Thiago e Thiana por quem desejo construir um mundo VI

melhor, por compreenderem minhas ausências.

- Aos meus pais, na origem de tudo.

— Aos amigos a quem deixei de dar atenção e a tudo que

abandonei para me dedicar a esta tarefa que agora

ParBce tão pouco, mas que foi tanto, durante longo

tempo. SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS 09 resumo 10 abstract,

INTRODUÇÃO 01

1 - CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS 11

1.1 - Sistema das Artes Plásticas, conceito e ori-

gens ,

1.2 - As contribições de Pierre Bourdieu e Howard

S.Becker 24

1.3 — Uma proposta de abordagem do sistema das

artes plásticas

AS PRÁTICAS ARTÍSTICAS NO BRASIL NOS ANOS 60/70 51

2.1 - Tendência das práticas artísticas no Brasil.... 51

2.2 - Os Anos 60: Tempo de Projetos Democratizan-

2.3 Os Anos 70: O Estado Autoritário e a Indústria

Cul tura 1 82

0 SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NO BRASIL 94

O SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NA CRISE DO DESENVOL-

VI MENTI SMO POPULISTA 120 VIII

A consolidação da Modernização; primeira metade

da década de 60

- Disputas Sociais e Mobilizações no Sistema das

Artes Plásticas

As Vanguardas: disputas estéticas e disputas

poli ticas

5 - SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NO ESTADO AUTORITÁRIO

5-1 - Atuação do Estado: Repressão e Censura/Apoio

e Estímulo

5-2 - Fortalecimento das instâncias de difusão e

supremacia do mercado empresarial

5.3 - Avanços Democráticos e Estratégias de Sub-

versão

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS lista de anexos ABREVIATURAS UTILIZADAS

MAM/SP= Museu de Arte Moderna de São Paulo.

MAC/USP= Museu de Arte contemporânea - Universidade de

São Paulo.

MAM/RJ= Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.

MAP= Museu de Arte de São Paulo.

MNBA/RJ= Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.

FUNARTE= Fundação Nacional da Arte.

CPCs= Centro Popular de Cultura.

DIP= Departamento de Imprensa e Propaganda.

MCP/RECIFE= Movimento de Cultura Popular.

FAAP= Fundação Armando Alvares Penteado.

SESC= Serviço Social do Comércio. RESUMO

O objetivo do presente trabalho é compreender o papel social das artes plásticas, no Brasil, nas décadas de 60 e 70.

Para tal foi ultilizado o conceito- chave Sistema das Artes

Plásticas, a partir das contribuições de Pierre Bourdieu e

Howard Becker. Abordou-se este sistema como o conjunto de indivíduos e instituições que, interagindo, produzem eventos e objetos por eles mesmos considerados artísticos e estabelecem os critérios e valores da arte para toda uma sociedade.

Evidencia-se com este conceito, o caráter coletivo destas atividades, suas relações com o meio em que se encontram e sua função de distinção social.

Partindo destas considerações teóricas, foram analisadas a configuração e a dinâmica do Sistema das Artes Plásticas no

Pr<3sil, nos anos 60 e 70. Esta análise restringiu—se aos pólos hegemônicos Rio de Janeiro e São Paulo, tratando, nos anos 60 ha atuação do Sistema das Artes Plásticas naquele período de lutas democráticas e, nos anos 70, do papel deste sistema na consolidação da hegemonia dos grupos sociais no poder.

Enfatizou-se que o sistema, ainda que tendo uma e5trutura própria. responde a demandas oriundas dos processos XI históricos om que está inserido. tranformando—se neste «"nov irnen to, ABSTRACT

The main objective of the present paper is to understand

the social role of plastic arts in during the 1960s and

the 19705. With this intention, the key concept Sistema das

Artes Plásticas (The Plastic Arts System) has been used,

taking as a basis the contributions of Pierre Bourdieu and

Howard Becker. This system has been approached as the complex

^hole of individuais and instituions, which - as they interact

produce events and objects, regarded as artistic by

themselves, and also establish the criteria and values of art

for a whole society. This concept clearly shows the collective

aspect of these activities, their relations with the

environment where they are, and their function of social

tfistmc ion.

Taking these theoretical considerations as a basis, the

configuration and the dynamics of the plastic arts system in

Brazil tn the 19íj0s and the 1970s have been analysed. This

^nalysis has been restricted to the leading poles Rio de

Janeiro and São Paulo, dealing with the action of the plastic

ãrt5 system in the i960s, period of democratic struggles, and with the role of this system in the consolidation of the

leadership of the social groups in power in the i970s. XIII

The present paper emphasizes that even though the system has its own private structure it responde to demands which are originated from the historical processes in which it is inserted, this way changing into the movement itself. INTRODUÇÃO

"Para que Ias reflex iones estéticas no se extravien en el subjetivismo y el irracionalis- fnof debem ter em cuenta que el valor de Ias obras se producem en un campo complexo que

incluye el artista f los intermediários y el publico, que Ias relaciones entre ei los estan condicionadas por la historia social

Néstor Garcia Canclini

O objetivo do presente trabalho é compreender o papel social das artes plásticas, no Brasil, nas décadas de 60 e 70.

A maior parte dos estudos sobre artes plásticas centra sua análise na figura do artista, considerado como responsável individualmente pelas características e repercussão social de seu trabalho.

Parte-se aqui, ao contrário da idéia de que o trabalho artístico não é um fenômeno puramente individual, que se possa isolar do conjunto da sociedade. Para compreender as artes plásticas é preciso ir além do artista, investigando indivíduos e instituições que com ele interagem: críticos. 02 marchands, museus, galerias, revistas de arte, etc.. Este conjunto de indivíduos e instituições, por sua vez, não agem de forma autônoma; obras e eventos artísticos, bem como sua difusão, estão intimamnte relacionados com as relações econômicas, sociais, políticas e culturais do meio em que se encontram, isto ô, com o processo histórico do qual participam de maneira específica e na qual se transformam.

Para compreender as artes plásticas no Brasil hoje, como

Uma prática coletiva, inserida socialmente, e fruto de um

Processo histórico, é indispensável voltar às décadas de 60 e

70, nas quais, profundas modificações se realizaram no pais.

Estas duas décadas foram de fundamental importância para a história brasileira contemporânea, pois nelas o pais avançou

seu processo de modernização, integrando, sob a hegemonia do capital monopolista, os diversos setores da produção. A

Modernização oferecida pela expansão das indústrias de bens de

Consumo duráveis atingiu principalmente as grandes disputas

Sociais. Neste período ocorreram alterações na posição do

Erasil dentro da ordem capitalista internacional e

transformações profundas na estrutura sócio-econômica e

dolítica.

Já a partir de 1955 o pais sofrerá uma série de

transformações em sua estrutura produtiva, sendo estabelecidos

C*5 pressupostos do modelo de desenvolvimento que permanece até

Cs nossos dias. No início dos anos 60, o processo de 03

industrialização era já um dado irreversível na formação

social brasileira. As formas de exploração da força de

trabalho tornaram-se progressivamente incompatíveis com a

Política de integração dos trabalhadores desenvolvida pelos

governos populistas. O golpe de 64 redimensionou a atuação do

Estado no sentido de uma política econômica voltada para o

ostabelecimento das condições institucionais capazes de garantir a aceleração da acumulação do capital nesta nova etapa monopolista de seu processo. Assim, nos anos 60 se evidenciaram, pela radicalização dos conflitos sociais, as

implicações políticas existentes em todas as áreas culturais, sendo possível constatar a atuação de alguns setores das artes

Piásticas nas lutas pela democratização no país. Os anos 70,

Por seu turno, presenciaram a consolidação da modernização do

Psís, através de um regime político autoritário, durante o gual expandiu-se a indústria cultural e as artes plásticas, mantendo o tradicional elitismo, passaram a ocupar.

Progressivamente, maior espaço no cenário cultural, servindo à legitimação do modelo de desenvolvimento implantado no pais.

No processo histórico acima delineado, registra-se o fato

0,6 que as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo tornaram-se

Pólos das transformações ocorridas no período, concentrando apitai, trabalho e mercado e, em função disto, o desenvolvimento cultural. Nestas duas cidades se localizavam lmportantes espaços culturais, entre os quais a maioria das instituições do setor das artes plásticas, como por exemplo a 04

Bienal Internacional de São Paulo e o Salão Nacional de Arte

Moderna. Estavam também aí os mais atuantes museus de arte

(MAM, MAC) que, além de serem responsáveis pela conservação de produtos artísticos, interferiam na dinamização do setor. A importância destas duas cidades é demonstrada ainda pelo fato de que praticamente todas as publicações importantes sobre artes plásticas neste período (livros e periódicos) foram aí editadas. A circulação das publicações documenta a circulação do produto. Foi para este eixo que imigrou grande número de artistas e críticos, oriundos das mais diversas regiões do país. Focos de efervescência, estas duas cidades foram o cenário das principais transformações por que passou o país nestas duas décadas.

«Justifica—se, assim, a escolha destas duas capitais como espaço de observação da presente pesquisa.

Não se pode esquecer, no entanto, que ao longo da década de 70 emergiram, no setor das artes plásticas, produções regionais de grande significado, fazendo frente à hegemonia destas duas capitais. São exemplo destas produções regionais o grupo do Mato Grosso (com Aline Figueiredo e Humberto

Espíndola), o grupo do Rio Grande do Sul (Nervo ótico), o núcleo da Paraíba (com Raul Córdula), e em Goiás e as produções de Minas Gerais e Paraná ativadas por salões de repercussão nacional. A amplitude e o significado cultural destas produções, principalmente por representarem uma reação 05

à hegemonia do Rio de Janeiro e São Paulo, merecem um eetudo mais aprofundado. Fica aqui uma sugestão para futuros pesquisadores, uma vez que dentro da proposta de análise do presente trabalho, o privilegiamento dos pólos Rio e São Paulo se impõe.

Para compreender o papel social das artes plásticas, no

Brasil, nestas duas décadas, é preciso determinar com clareza sua especificidade. Assim considera-se para os objetivos do presente trabalho, como artes plásticas, o conjunto de

indivíduos e instituições que se articulam em torno da

produção e difusão de objetos e acontecimentos plásticos.

Para análise das relações que se estabelecem neste

conjunto de indivíduos e instituições, adotou-se o conceito

Sistema das /Qrtes Plásticas, que permite a apreensão da

global idade e do dinamismo destas relações. Vários autores

utilizam este conceito (inclusive em textos da época), mas o

fazem de maneira geral, sem preocupação em defini-lo. Usam-no

como um termo que evidencia determinada realidade explícita e

consensuaImen te aceita: a existência de um conjunto de

relações. A idéia de que existe um sistema das artes

plásticas, assim como existe um sistema social ou político,

está, no entanto, distante do uso que se pretende com este

marco conceituai. O presente trabalho partiu, portanto, ao

nível teórico, de uma discussão e definição do conceito

Sistema das Artes Plásticas, apresentados no primeiro 06

Capí tulo .

A adoção deste conceito permitiu uma visão sincrônica do

Conjunto de variáveis que interferem na produção e difusão das

artes plásticas e do papel destas artes nos processos sociais

econômicos e políticos- Permitiu, ainda, uma visão diacrônica

^ interferência desta prática social nos processos históricos

e de sua transformação nesta atuação-

Partindo, portanto, da consideração das artes plásticas

^mo um sistema inserido no processo histórico, buscou-se com

0 Presente trabalho responder, em relação ao período em

e^tudo, as seguintes questões:

- Como se estrutura o Sistema das Artes Plásticas? Quais seus componentes e articulações?

- Considerando a importância do Estado neste período,

Çual suas relações com o Sistema das Artes Plásticas?

Tendo em vista a existência de redefinições, neste

Período, das relações do Brasil a nível internacional, como

o Sistema das Artes Plásticas nestas redefinições?

- Como o Sistema das Artes Plásticas participa das

Questões populares e democráticas dos anos 60? 07

- Como o Sistema das Artes Plásticas se articula ao

modelo econômico e político consolidado nos anos 70?

- Qual o principal papel desempenhado pelo Sistema das

A^tes Plásticas ao longo de todo o período estudado?

As respostas a estas questões exigiram o levantamento de

informações em diferentes fontes. Considerou-se como

documentos básicos as matérias sobre artes plásticas

Publicadas em jornais e revistas de grande circulação e também

e(I> publicações especializadas. Outras fontes de pesquisa foram

05 relatórios de instituições e os catálogos de exposições,

decursos da história oral também foram utilizados, através de

ontrevistas, sempre tendo o cuidado de considerá-los como

r®sultados de posturas atuais e não da época do estudo. Como

fontes secundárias, utilizou-se os poucos livros e artigos

Publicados sobre as artes plásticas no período de nosso

estudo. Seu número limitado permitiu uma revisão exaustiva e

completa.

Os artigos em revistas e jornais de grande circulação

^tingiam o grande público, divulgando uma imagem de sistema

Pas artes plásticas, motivo pelo qual considermaos um canal

iviiegiado de informações. Mostrou-se tão útil na iclentificação dos eventos em destaque, quanto no levantamento dQs valores e da imagem que se divulgava das artes plásticas,

análise destas matérias permitiu detectar algumas das 08 transformações por que passou o sistema ao longo do período de estudo, ao ser feita de forma seqüenciada. Trabalhou-se com as revistas: Manchete, Vis^o, O Cruzeirof Senhor, Veja e Isto E.

Em termos de jornais utilizou-se O Globo, Jornal do Brasil 9

Estado de São Paulo e Folha de São Paulo,

Da mesma forma que as publicações anteriores, artigos em revistas e jornais de cultura ajudavam a traçar um perfil dos eventos mais significativos e destacados- Por outro lado, eles evidenciaram também o debate intelectual existente no período.

Utilizou-se, neste sentido, as revistas Vozes, Civilização

Brasileira, Cultura/MEC e Módulo, e os jornais Pasquim,

Opinião e Versas -

Revistas específicas de artes revestiram—se de

fundamental importância para este estudo, pois expunham as diferentes correntes artísticas existentes. Em linhas gerais estas publicações davam também informações gráficas.

Praticamente todas as revistas de artes editadas no período

foram revisadas: GAM, artes: Mirante das Artes, Vida das

Artes, Malasartes e Vogue Arte~ Infelizmente, apareceram ocasionalmente e tiveram vida curta, tendo sido peças-chave

no jogo do poder dentro do sistema das artes plásticas. Elas

permitiram observar os mecanismos que garantiam as posições

hegemônicas, desde o favorecimento na divulgação de

determinado tipo de produto ou acontecimnto até o uso da crítica na imposição de determinadas correntes. 09

Considerando-se os relatórios de instituições como

decisivos no conhecimento interno do poder e força das

instituições. Neles pode-se levantar todos os eventos

promovidos pela instituição individualmente, tendo-se assim

uma idéia ampla de sua atuação. Estes relatórios permitiram

também identificar redes de relações entre indivíduos e

instituições, e o tipo de vinculação com o Estado. Analisou-se

relatórios das seguintes instituições: MAM/RJ, MAM/SP, MASP,

MAC/USP, Pinacoteca Municipal de São Paulo, MPJBA/RJ, FUNARTE,

F. BIENAL. Catálogos de Exposição forneceram o discurso da crítica de arte, a ordem de valores que movimentava o sistema e também as relações entre artistas, críticos e instituições.

Utilizou-se catálogos de exposições coletivas e também de

Bienais e Salões. Nestes últimos buscou-se maiores dados sobre estes eventos, cuja evolução foi importante no período em estudo.

Realizaram-se, ainda, diversas entrevistas com críticos, artistas, marchands, colecionadores e diretores de instituições, buscando obter informações para melhor

:ompreensão do período e preenchimento de possíveis lacunas jeixadas pela pesquisa documental.

Levou-se em conta que, sobre este tema e período, a listória oral pode constituir-se numa contribuição significativa. 10

Ordenou-se a exposição dos resultados em cinco capítulos.

No primeiro capitulo, foi discutido o conceito de sistema das

Artes Plást icas, a partir das contribuições de Pierre Bourdieu e Howard Becker. No segundo capítulo se indicou o processo histórico em desenvolvimento no Brasil nos anos 60 e 70, observando como diferentes setores artísticos se comportaram, ho maneira geral, frente aos conflitos sociais que ocorriam.

No terceiro capitulo analisou-se o Sistema das Artes Plásticas no Brasil, com suas especificidades em relação às demais

Práticas artísticas. No capítulo quarto foi analisado o

Sistema das Artes Plásticas, na década de 60, no que diz respeito à consolidação da modernização e às disputas sociais e estéticas. Por último tratou-se do Sistema das Artes

S^sticas nos anos 70, considerando a ação do Estado autoritário, o fortalecimento das instâncias de difusão e s upremacia do mercado empresarial e as estratégias de

Questionamento desta realidade.

Com esta estrutura de análise, procura-se evidenciar as

âr^iculações entre o Sistema das Artes Plásticas e a realidade

^cio-política e econômica que o País viveu nestas duas

^Cadas fundamentais da história brasileira. 1 - CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS

"O indivíduo não é apenas aquilo que ele próprio crê nem o que o mundo crê; é também algo mais: é parte de uma conexão em que ele

desempenha um papel objetivow supra-individualf do qual não dá conta necessariamente".

Karel KosiK

1.1 - Sistema das Artes Plásticas, conceito e origens

A análise do Sistema das Artes Plásticas, no Brasil, nos

anos 60 e 70, torna-se viável hoje, em função do desenvolvi-

mento alcançado pelos estudos históricos e sociológicos que, nas últimas décadas, tém abordado as artes plásticas de forma

mais integrada ao meio social, superando os enfoques

idealistas com que foi tratado este tema até bem recentemente.

Na historiografia da arte, soberana por longo tempo, em geral, a arte é tratada de maneira idealizada, como produto de 12 uma genialidade individual venerada pelo público1. No mais das vezes, as análises se voltam para os elementos formais e signicos das obras e sua classificação estilística, sendo mínimas as contextualizações. Esta história das artes manteve—se tradicionalmente dedicada a identificar e consagrar os artistas e obras clássicas, incorporando, progressivamente como tais as manifestações contemporâneas já absorvidas pelo público especializado. A sociologia tradicional da arte2, por sua vez, se ateve mais a demonstrar a congruência entre formas de organização social e estilos ou temas artísticos do que a analisar a inserção social da produção plástica. Sem considerar a produção e circulação da obra de arte no meio social, de forma a percebê-las em sua dinâmica, esta

sociologia da arte trabalhou predominantemente com os

resultados (as obras) e não com os processos. Mais

A/esta historiografia se enquadram: Upjohn, Everard. História Mundial da Arte. São Paulo, Difel, s.d.; Bazim, Germain. História da Arte. São Paulo, Difusão Européia do Livro, s.d.; Leicht, Herrmann. História Universal da Arte.Rio de Janeiro, Melhoramentos, s.d.; Colombier, Pierre. História da Arte. Porto (Portugal),Tavares Martins, 1958; Rafols, J.V. História Universal dei Arte. Barcelona, Ramon Sopena, 1970; Ribeiro, Flexa. História Crítica da Arte. Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1965; Cavalcanti, Carlos. História das Artes. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968, 2 v.; Grombrich, E.H. História da Arte. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.

2 Fischer, Ernest - A necessidade da arte - Rio de Janeiro, Zahar, 1973., Nico Hadjnicolaus. Hauser, Arnold - História Social da Literatura e da Arte. São Paulo, Mestre Jov. 1972, vols - I e II. Francastel, PIERRE - Peiture et Societó Pariz, Danoel Gauttier, 1977. Bastide, Roger - Arte e Sociedade. São Paulo - Editora Nacional/EDUSP - 1971. Hadjnicolaus, Nicos - História da Arte e Movimentos Sociais, São Paulo, Martins Fontes s/d. 1 3

3 recentemente, no entanto, importantes estudos introduziram em relação às artes plásticas, novas abordagens mais amplas e científicas apresentando dois traços básicos comuns: progressivo abandono da perspectiva de análise que prioriza o caráter individual das atividades plásticas e a crítica aos aspectos elitistas da produção, circulação e consumo da obra de arte.

Uma série de tendências, no que diz respeito à prática da produção plástica, contribuíram para a formação desta nova abordagem social das artes plásticas. Dentre estas tendências, se destaca, em primeiro lugar, a generalização do processo de mercantilização dos objetos e eventos artísticos. Como afirma Orlando Suarez " Ia consciência de su importância

(do artista) no es más que Ia expressión de su valor de cottización. Y algo muy importante, con ei cambio dei status dei artista: de protegidos de un mecenas al de productor de uma mercancia — como es usual en el sistema capitalista — Ias obras de arte, como todos los bienes, son mercanciasr por lo cual su valor de cambio prevalece sobre su valor de uso. El

êxito en el mercado hace de los artistas, con talento

9 Bourdieu, Pierre — La distincion — critique sociale du jugement. Paris, liinuit, 1979. Becker, Haward - Les Mondes de'L'Art - Paris, Flamorion. 1988. Canclini, Néstor Garcia — La produccion simbólica. México Siglo XXI, 1979. Lauer, Mirko - La crítica do Artesanato. São Paulo, Nobel, 1983. Durand, José Carlos - Artesf Privilégios e Distinções — São Paulo, Perspectiva 1989. Suarez, Orlando Suarez - La jaula invisible. Habana, Ciências Sociales 1986. 14 reconacida, grandes sefíores"*.

A mercantilização atinge todo espaço das artes plásticas, desde a produção das obras em si até sua circulação em revistas e livros, também mercadorias. As atividades artísticas ficam assim diretamente decorrentes da sociedade de consumo, resultando paradoxalmente tanto mais alienada de sua realxdade social quanto mais proclama sua autonomia e liberdade expressiva.

A absorção das artes plásticas dentro da sociedade de consumo e sua sujeição às leis de oferta e demanda conduzem de certa forma a uma segunda tendência que é a complexidade crescente dos mecanismos de legitimação destas práticas e dos seus produtores - os artistas. Todo um marketing de comercialização tem sido realizado por galerias e marchands, nacionais e internacionais, a fim de que o mercado consiga articular harmoniosamente quadros e esculturas com hapenings e body art (estes últimos comercializados sob forma de fotos, filmes, vídeos...). Absorvidas pelas relações capitalistas, as artes plásticas tornaram-se progressivamente mercadorias de luxo em um circuito muito particular. No âmago de uma comercialização intensa, um fato se manifesta em relação à legitimação desta produção: o reconhecimento de um objeto ou evento como artístico e sua inserção no circuito comercial com várias etapas nesta legitimação, dificultando a definição

4 SUAREZ, Orlando Suarez. La jaula invisible. Habana Ciências Sociales, 1986. p. 40. 15 consensual daquilo que é ou não é arte. Somente o diálogo constante entre artistas, críticos e outros participantes do ambiente artístico tem conseguido ratificar regularmente critérios de julgamento e sua aplicação. A qualidade e valor das obras são, assim, definidos através das estruturas institucionais dentro das quais se insere a produção, distribuição e consumo da arte. Observa-se, ainda, uma complexidade crescente nos mecanismos para obtenção de consenso no processo de legitimação da obra de arte. A partir desta dificuldade, se fortalece a posição enunciada por Mareei

Duchamp9 de que o critério para definição do valor artístico

é a própria qualidade de artista reconhecida em determinado produtor. A crítica fica sujeita a encontrar formas de abarcar sob a designação "artes plásticas" objetos tão dispares quanto um quadro a óleo pintado por Salvador Dali e uma lata de cerveja assinada por Andy Warhol. Com isto, se evidencia que não há valores ou critérios de legitimação permanentes e universalmente reconhecidos, estabelecendo—se os mesmos a partir de um sistema de relações entre indivíduos e instituições.

Outra tendência que se destaca, no que se refere à prática da produção plástica, é a ênfase na afirmação do caráter não político das artes plásticas. Esta despolitização, que procura se apresentar como estrutural e essencial á arte

5 Esta postura de Mareei Duchamp está expressa em suas ações, sendo referidos pelos mais diversos autores que analisam seu trabalho. 16

^ na verdade, bastante circunstancial. Confirma esta afirmação a lembrança de como eram politizadas as práticas artísticas em geral na década de 60, e, dentro deste processo, também as artes plásticas. A abordagem, hoje predominante, que privilegia como mais legítimas as manifestações da "arte pela

arte", coloca a necessidade de revisão do papel poli tico desta aparente despolitização. Para isto, é preciso considerar por um lado, as desilusões com respeito às possibilidades revolucionárias da arte no pós-68 e, por outro, o encobrimento da função política de "distinção das elites" que a arte tem cumprido. A afirmação da despolitização tornou-se, assim, uma

forma de ocultação do papel político das práticas artísticas nas lutas pelo domínio simbólico dentro da sociedade.

Estes três fatores - mercanti1ização da obra de arte, complexidade dos critérios de valor artístico e afirmação do caráter despolitizado da arte - articulados entre si, concorrem para que se venha construindo, nos últimos anos, uma nova concepção da história social da arte. Concepção que não

aborda o artista individual e seu papel social ou obras em suas tendências e estilos ou tampouco grupos sociais como mentores de determinadas práticas plásticas, mas aborda o sistema de relações que é responsável pelas atividades de

produção, circulação e consumo artísticos. A história social da arte passa, assim, a ter como objeto específico de estudo este conjunto de relações dentro de uma determinada sociedade em um momento específico. 0 trabalho de Nestor Garcia 17

Canclini, (La produccion Simbólica) e o de J. Carlos Durand

(Arte privilégio e distinção) se encontram dentro desta nova concepção, na qual também se enauadra o presente estudo.

Este novo objeto de estudo coloca a problemática da adoção de um conceito chave para sua apreensão. Utilizar os conceitos "campo artístico" ou "Mundos da arte" é remeter—se diretamente às concepções de Pierre Bourdieu e Howard Becker respectivamente. Na busca de um conceito novo, encontra-se um mais antigo e já do senso comum: O "Sistema das artes plásti- cas". Ele é utilizado por vários autores que não se preocupam em defini-lo, Mirko Lauer, porém, o faz com as seguintes palavras: "Soma de mecanismos sócio-intelectuaisr através dos quais um grupo humano determina quais traços particulares e concretos de um objeto ou de um processo participam efetivamente de uma existência artística" (Lauer, 19 , p.

155)".

Pode-se ainda especificar e aprofundar melhor este conceito, incorporando nele as contribuições dos estudos de

Pierre Bourdieu e Howard Becker. Seu enunciado será então:

- Conjunto de indivíduos e instituições responsáveis pela produção, difusão e consumo de objetos e eventos por eles mesmos rotulados como artísticos e responsáveis também pela definição dos padrões e limites da "arte" de toda uma sociedade, ao longo de um período histórico.

" Lauer, Mirko. Crítica do Artesanatoj São Paulo, Nobel, 1983. 18

Assim enunciado, este conceito apresenta um caráter dinâmico e totalizante. Dinâmico, porque concebe seu objeto

como um conjunto em movimento; totalizante, pois o vê como

resultado de um conjunto de articulações internas e externas à

obra de arte.

Cumpre lembrar que a "arte" , assim, é um segmento

específico de todas as práticas plásticas, que em uma socieda-

de se realizam. Uma parte destas práticas administradas e

controladas pelo sistema das artes plásticas constituem,

portanto, as "artes plásticas" reconhecidas como tal em um

determinado espaço e tempo. Não se pode esquecer que existe

todo um amplo conjunto de produções plásticas que estão à

margem destas manifestações denominadas artísticas. A

incorporação ou não de elementos destas práticas marginais ao

conjunto administrado pelo sistema das artes varia amplamente

ao sabor de determinantes internas ao sistema, mas também de 7 demandas impostas pela evolução da própria sociedade .

Deve—se observar ainda que a existência deste sistema de

relações especí fico da "arte" não é um fenômeno permanente na

história da humanidade. Suas origens podem ser localizadas na

Europa Renascentista, no bojo de um processo histórico-cultu-

ral, em que o desenvolvimento da sociedade propiciou um

aprofundamento da separação entre trabalho manual e trabalho

7 A discussão filosófica sobre a categoria "arte" não é tema do presente estudo; demandaria um aprofundamento que não é exigido pelo enfoque escolhido. Não se discute aqui os aspectos de criação ou qualidades desta criação, mas sim a maneira como se dÀ sua legitimação social e reconhecimento. No caso do presente estudo, o conceito "arte" está em íntima relação com o sistema que o legitima como tal. 19 intelectual, com evidente supremacia do segundo sobre o primeiro. A figura do "artista" sobrepôs-se gradativamente à figura do artesão, dentro da mencionada supremacia do trabalho intelectual sobre o manual. Os pintores medievais, artesãos anônimos que podiam tanto pintar afrescos como decorar arcas, foram sendo suplantados pelo "artista", pintor de renome com um status que o colocava dentro das Cortes em posições privilegiadas. Esta mudança processou-se através da constituição do que se pode denominar "sistema das artes", na medida em que, para legitimação da produção de determinados

"artistas" e definição das diferenças entre "arte" e

"artesanato", estabeleceu-se um circuito de relações que envolvia artistas, mecenas e filósofos humanistas. A categoria

"arte" surgiu, assim, definida por um conjunto de relações, defendendo valores dos setores sociais com os quais se identificava naquele momento: nobreza e burguesia. A "arte" se estabeleceu, então, a partir de uma ruptura com as demais atividades plásticas (tecelagem, cerâmica, joalheria, etc.) que podem ser classificadas, portanto, como suas ancestrais.

Esta ruptura operou-se progressivamente e foi correlata à constituição do sistema das artes plásticas, dotado de regras próprias, onde se exige uma competência específica para as atividades, separando o profissional do leigo e o sagrado do profano e referendando a distinção social das elites.

É preciso destacar, portanto, que o sistema das artes plásticas surgiu também como um sistema de dominação, na medi- 20 da em que seus integrantes impuseram ao conjunto da sociedade

padrões que eram de uma minoria. No caso do mundo colonial, ocorreu também uma imposição sobre os povos colonizados dos

padrões plásticos de seus colonizadores. Ao apresentar os seus

critérios particulares como definidores dos produtos e

práticas a serem considerados "artísticos" e dando a estes um

status superior aos demais considerados "artesanato" ou

"artes menores", o "sistema das artes" impôs uma

hierarquização que legitimava seu poder e a superioridade de

seus integrantes. A ordem resultante da interação daqueles que

têm acesso ao sistema das artes passou a impôr uma dominação

simbólica sobre os demais, excluídos desta participação.

Marginalizava-se, assim, a elaboração simbólica dos extratos

sociais não integrados do sistema, estabelecendo-se mecanismos

de distinção que legitimavam a dominação social pré-existente,

da qual o sistema era também resultante. Esta distinção passou

a funcionar, desde então, como estratégia de poder político

dentro da sociedade: uma estratégia que se torna mais

eficiente, na medida em que é mais mascarada, aparecendo como

legi tima.

Esta forma de poder mascara-se através da crença na magia

do criador e na individualidade autônoma das produções; crença

na sabedoria despolitizada dos cri ticos e na devoção abnegada

dos consumidores. O que faz com que o sistema funcione é a

crença coletiva nos valores por ele estabelecidos. O que cria

a magia e o valor "artístico" dos objetos é a trama de todos 21 os agentes que participam do sistema das artes plásticas e sua crença nas tradições e na estrutura já estabelecida deste

^stema. O valor da obra de arte se estabelece nesta trama e nela se constrói também o próprio conceito de "arte". Valor de objeto e valor da própria arte estão intimamente ligados,

Senclo maior o poder do sistema das artes e o valor de seus

Produtos na medida em que a trama que o legitima encontra-se mais oculta, tanto aos que nele estão envolvidos quanto aos

PPe dele estão excluídos. A magia do sistema das artes é garantida pela convicção em seu valor principalmente por parte baqueies que nele atuam. A força do sistema das artes está

^Qada a sua própria estruturação; suas instituições, ao peso de sua história. A institucionalização mantém e renova os rituais, estabelecendo discriminações e hierarquizações dentro do variado universo das atividades plásticas.

A história deste sistema de relações é fundamental para a Ponipreensão de seu funcionamento atual, pois estabelece as

POs sibiiicjade5 e os limites do pensar e do realizar no

Ca mpo das arte5 plásticas. A autonomia relativa da arte é, pQrtanto, o resultado desta elaboração que o sistema das artes

COm° um todo faz das demandas e pressões externas. Este

Si5tema, com o peso da tradição de suas instituições, e stabelece o substrato que mantém a aura da "arte". As definiç(5es de critérios e valores, bem como os mecanismos para estas definições, se estabelecem a partir da história deste

Sistema que reforça a crença em sua sacralidade. 22

Em sua evolução, no entanto, este sistema tem apresentado

uma série de alterações que correspondem, em última análise,

d adaptações em sua dinâmica interna face às grandes

mudanças por que passou o capitalismo em sua evolução mundial.

^ sistema acadêmico do século XIX foi um ápice neste

processo. Articulado e justificado por um corpo filosófico

(estética), ele pode impor, sem reservas, todo um conjunto de

normas e padrões, onde "o belo" constituia o valor básico8.

Com a evolução da sociedade de consumo e a ampliação do

"público", o sistema tendeu a se abrir, incorporando produções

que representavam valores mais instáveis e visões

diversificadas da arte enquanto processo simbólico. O

modernismo das duas primeiras décadas do século XX introduziu

profundas alterações, não somente nas concepções estéticas,

como nas formas de circulação e consumo dos bens artísticos.

Na década de 60, pode-se observar novas transformações; este

momento, a própria arte, enquanto categoria filosófica e

social, foi questionada. No entanto, todos estes questionamentos não conseguiram anular o sistema, enquanto

instrumento de distinção. Ao sistema acadêmico do sec. XIX, novas instituições foram agregadas (museus e galerias...), outras desapareceram (academias de Belas Artes), outras se modernizaram (salões) e o sistema permaneceu, articulado em sua função primordial: distinção social das elites. A

0 ^r^s^e^er 1 in: "El pensàmi&nto renascentista y Ias artes"- Madrid, Taurus, 1986 realiza um estudo bastante aprofundado da evolução do sistema filosófico que se estabelece paralelamente à evolução das práticas artísticas no mundo moderno, servindo de ponto de partida para o presente estudo. 23

Par"ticipaçâo no sistema das artes, como forma de distinção

social * deve ser observada não só em termos de produção como

também de consumo. O interesse por esta distinção é um

elemento fundamental na determinação do caráter elitista das

artes plásticas. Este elitismo interessa a diferentes setores

de classes dominantes na sociedade, porque lhes justifica o

Poder através do reconhecimento de sua suposta superioridade,

Pcie sg expressa simbolicamente na participação. como

Produtores e/ou consumidores em um círculo artístico restrito,

que exige uma formação e informação que não estão ao alcance

de todos os indivíduos. Neste círculo restrito, as classes

dominantes se distinguem e as classes subalternas reconhecem como legítima a superioridade das primeiras. O consumo de od ras dg ar^e tornou-se um símbolo de distribuição, uma marca d® Poder, de hierarquia social, de bom gosto, de formação

Altura! erudita enfim de capital cultural que por sua vez é

Poder. Segundo Orlando Suarez "Hay dia. Ias famílias de la ul-íçargtjia financiera no sólo son coleccionistas como a Ias ar>teriores. el coleccionismo Ias coloca en una jerarquia

So ciai cfe élite - sino porque de esa manera crean una imagem

P^Izcas de su classe, como la classe salvaguardadora de los

Piores espirituales de Ia humanidade, simbolizados en el arte"0.

^ distinção social funciona portanto também como fórmula de loqitimação de poder das classes dominantes. A dominação

Qp cit. p. 42. 24

simbólica que se estabelece através do sistema das artes

plásticas é específica ao capitalismo, com ele surgindo e a ele servindo. Assim, o conceito "sistema das artes pláticas" e

a realidade por ele explicada devem ser pensados como

historicamente datados, negando, portanto orientações que

pretendem considerar a "arte" como um fenômeno universal e

permanen te.

Esta afirmação não deve levar a interpretações a respeito da capacidade humana criativa nem das necessidades de realiza-

ção plástica do ser humano, estas sim realidades permanentes ao longo da história da humanidade e presentes na sociedade contemporânea independente de condição social. O fenômeno da criação plástica enquanto realização humano é universal e

Permanente como o próprio homem. A apropriação pelas elites, has mais eficientes e adequadas produções plásticas, sob a designaçã o de "arte". este sim é um processo recente na história da humanidade e se realiza, na sociedade contemporâ- nea. dentro de um conjunto de relações denominado Sistema das

Artes Plásticas.

*•* ~ As contribuições de Pierre Bourdieu e Howard 8. Becker

Para discutir melhor o conceito "sistema das artes" e a realidade que ele abarca, podem ser utilizadas as contribuições de Pierre Bourdieu e Howard Becker. Estes dois autores analisam o mesmo objeto - as relações dos conjuntos 26 que envolvem tanto as etapas de produção como de circulação e consumo. Desta forma, desmistifica o trabalho artístico como uma unidade, fruto da atividade individual do artista e enfatiza a importância daqueles que chama genericamente de

Pessoal de apoio. Com isto, coloca no horizonte da pesquisa, permanentemente, a busca dos atores sociais envolvidos nos

Processos artísticos, redimensionando sua caracterização

tradicionalmente individualizada. Superando a visão mistificadora do artista como gênio individual e único, Howard

Becker percebe e destaca as redes de cooperação que

Possibilitam a existência de determinados objetos e eventos, befn como sua legitimidade artística em determinada sociedade.

Este tipo de encaminhamento aporta muitas contribuições, pois, e,ir* seu trabalho de levantamento e análise dos mundos da arte11, ele apresenta uma grande quantidade de referências concretas ao funcionamento das cadeias de cooperação no âmbito das artes plásticas.

Esta forma de encarar o objeto privilegia a cooperação como elemento integrador das relações e desarticula o todo, na mGdicia em que cada mundo pode ser tratado isoladamente. No er>tanto, a idéia de que se possa dividir todos os processos

PUg em uma sociedade se denominam "arte" em mundos, conforme as cadeias de coordenação que envolvam (fotografia, design, cerâmica, arte oficial...) se afasta da concepção globalizante

Pue o conceito "sistema das artes plásticas" propõe.

11~~ ^ " ~ B®cker, Howard Les Mondes de L'art, Flamarion, Paris 1988. 27

Pierre Bourdieu apresenta uma abordagem diferenciada do

mesmo fenômeno, trabalhando com um conceito mais amplo e

generalizado, que define nas seguintes palavras: "Chamo de

campo um espaço de jogo, um campo de relações objetivas entre

indivíduos ou instituições que competem por um mesmo obje- 2 to' ■ Ele aplica o conceito "campo" na análise de vários se-

tores da atividade social, quais sejam: o campo religioso,

Político, cultural... Dentro do campo cultural, Bourdieu fala

do campo de produção erudita ou campo artístico. Ê importante

destacar que Pierre Bourdieu não descreve o funcionamento dos

campos, mas busca descobrir e evidenciar as estruturas

invisíveis, responsáveis por este funcionamento, levantando

seus princípios básicos de existência. Segundo Pierre

Bourdieu, "Os campos se apresentam à apreensão sincrônica como

espaços estruturados de posições (ou postas) cujas

Propriedades dependem das posições nestes espaços, podendo ser

<3na2iSt3das independentemente das características de seus ocupantes em parte determinados por elas"13. Assim, o campo

uma estrutura que pode ser analisada independentemente das características dos indivíduos nela atuantes e que até mesmo interfere sobre eles, sendo, portanto, fundamental o estudo do campo e não dos indivíduos, como tradicionalmente se faz em artes plásticas. O estudo destas posições, destes postos e dos

Princípios de funcionamento desta estrutura apresenta uma

^tica desmascaradora e dessacralizante.

— Bourdieu, Pierre. Questões de Sociologia. Rio de Janeiro. Marco Zero, 1983 p. 55. 13 Bourdieu, Pierre. op. cit. p. 155. 28

As observações de Bourdieu sobre as regras e princl pios

de funcionamento dos campos permitem afirmar que para ele os

elementos estruturadores do campo artístico são a luta pelo

poder e a crença no universo mágico da arte. Para ele não há

nenhum sistema que não funcione, pelo menos em parte, devido à

crenças, sejam elas quais forem. O universo da arte é para

ele, no mundo contemporâneo, o universo da crença. O autor

chega mesmo a afirmar que a sociologia da cultura é a

sociologia da religião de nossa época. A eficácia do trabalho

de Bourdieu está em desvendar as crenças que sustentam os

mecanismos que fundam o mundo social e, dentro deste, o campo

artí stico.

Cabe apontar, aqui, a grande diferença de sua posição em

relação a Howard S' Becker, uma vez que, para Bourdieu, o

elemento fundador do mundo social é a luta pelo poder e não a

cooperação. Para Pirre Bourdieu, em cada campo se encontra uma

luta entre o novo que está forçando sua entrada e promovendo,

para tal, alterações tanto na distribuição de posições, quanto

nas Próprias regras de atribuições destas posições, e aqueles

clUe, mais antigos no sistema estabelecido, nele são dominantes

e tentam defender suas posições, seu monopólio, excluindo as

Possibi1 idades de entrada do novo e de estabelecimento de

concorrência. Bourdieu apresenta, assim, como principia de e>,istência de qualquer campo (do campo artístico também) as es^ra*:^<3iâs de conservação desenvolvidas pelos dominantes para

Psrmanecer e as estratégias de subversão tentadas por aqueles 29 que, pretendendo entrar no jogo, querem a alteração das regras a seu favor. O elemento básico de toda relação na sociedade capitalista á, portanto, a dominação e a luta pelo poder, é a sua forma de dinamismo. Neste sentido, Bourdieu opõe—se frontalmente a Howard Becker, que destaca a cooperação como elemento fundador dos diferentes mundos da arte e forma de manutenção dos mesmos.

Considerando os mundos da arte como elementos norteadores das atividades "artísticas", Howard S'Becker analisa as condições de sua existência aplicando sua teoria da rotulação (criada a partir do estudo dos comportamentos marginais) aos mundos artísticos. O ponto central desta teoria

ê a constatação de que a rotulação dos desvios se organiza a partir da criação de regras por um determinado grupo. O desviante ê aquele a quem um rótulo foi aplicado, baseado em um conjunto de regras e comportamentos, aceitos pelo grupo e pelo próprio desviante. Em termos de arte, "artista" é aquele a quem este rótulo foi aplicado com sucesso (rotulação aceita socialmente) e "comportamento artístico" em uma sociedade, é

aquele rotulado como tal, a partir de um corpo de convenções.

0 fato, então, de ser artista depende muito mais de como as

demais pessoas reagem a esta rotulação do que a uma qualidade

intrínseca ao indivíduo rotulado. Assim como um comportamento

pode ser uma infração de regras em um contexto e não em outro

também um mesmo abjeto ou evento pode ser artístico em um

contexto e não em outro. Pode haver uma infração, quando 30

determinado ato é cometido por um indivíduo e não quando come-

tido por outro, um ato pode ser astístico, quando produzido

Por alguém e não quando produzido por outro. Generalizando no

nivel da arte, em resumo, se poderia dizer que determinada

ação é artística ou não, em parte, pela natureza do ato, mas

ero parte por aquilo que as pessoas pensam em relação a ela.

Assim, a arte não é uma qualidade que existe no próprio

comportamento, mas resulta da interação entre a pessoa que

comete o ato e aqueles que respondem a ele. Considerando-se a

teoria do desvio, pode-se afirmar que as convenções definem a

Poa1 idade artística e a condição de artista. Nos mundos da

arte, segundo Howard Becker, são portanto, as convenções que determinam as possibilidades e os limites na produção, circulação e consumo dos objetos e eventos considerados artísticos. 0 autor não deixa, porém, de considerar a transgressão destas regras nos processos de mudança e,

-lnc lusive, a possibilidade de serem criadas novas regras

(transgredindo, portanto, as existentes) e articuladas em torno delas um conjunto de colaboradores: dá-se, assim a

Ç^nese de um novo mundo.

A imposição de regras, conforme Howard Becker corresponde

Poterminados valores vigentes para um grupo social.

r*ta-se, portanto, de uma questão de poder. Quando em uma

c:iedade existem vários mundos em disputa, a imposição de

e9ras vai corresponder à força poli tica e econômica que cada 31

um destes grupos possa ter14. A diferença na capacidade de

"fazer regras e aplicá-las expressa, essencialmente, diferentes

Qcaus de forças. Agueles grupos cujas posições sociais lhes

conferem armas e poder, são mais capazes de impor suas regras.

Ele afirma, ainda, que as regras criadas e mantidas pela

r°tulação não são universalmente aceitas; em vez disso, elas

constituem objeto de conflito e discordância, sendo parte dos Processos políticos da sociedade.

Pierre Bourdieu, por sua vez, ao tratar da questão do

Poder, afirma: "é preciso que haja objetos de disputa e

Pessoas prontas para disputar o joçor dotadas de habitus' que

Apliquem no conhecimento e no reconhecimento das leis

inanentes do jogo, dos objetos de disputa etc..."**. Nesta

^irmação, além da idéia de disputa dentro do sistema, aparece

0 conceito "habitus" que é, de certa forma, fundamental à

compreensão de seu pensamento. Este conceito permite observar

05 comportamentos sociais não como imposições, uma vez que

^âbitus" é uma interiorização de regras sociais, estabelecen— c'0 uroa orquestração da sociedade sem regente. Trata-se de uma manifestação individual inconsciente das regras sociais

lntrojetadas. Isto se dá devido ao fato de que as mesmas são aclquiridas desde a mais tenra idade, envolvendo, além da

fQrmação escolar. a formação familiar. As condições de 14 — — Howard Becker não aborda a questão do poder político e econômico em seu livro "Les mondes de Lart", onde trata e specificamente a questão artística a não ser em relação âos poderes dentro dos próprios mundos (dos críticos), por exemplo. Mas se refere, embora de forma superficial, a esta Pciestão no livro "Uma Teoria da ação coletiva", Rio de 15 Janeiro, Zahar, 1977. 0d- Clt. p.89. 32

existência dos indivíduos fazem com que ele absorva

normas e valores. Pode-se entender, assim, porque não há

necessidade, muitas vezes, de determinações evidentes, já que

elas são passadas de forma subliminar. Os indivíduos

Participantes de um campo artístico (quer como produtores,

difusores ou consumidores) trazem "habitus" decorrentes de sua

condição social, que lhes possibilitam o acesso ao campo e,

inclusive, determinam as posições que poderão ter dentro

deste. como o "habitus" é uma condição interna do indivíduo,

9^® se forma já no seio de sua família e prossegue através de

seus estudos escolares e outras experiências de vida, ele

está na base de toda diferenciação social; não é, portanto,

adquirido intencionalmente. A teoria do "habitus" possibilita

a constituição de uma ciência das práticas sociais em que se

escapa a alternativas de tipo finalista e mecanicista. Esta

teoria permite a compreensão das práticas humanas como

resultado de um funcionamento social regido por condições não

evidenciadas imediatamente.

Para Bourdieu, o "habitus" atua como forma de

1 ncorp0ração capital, uma vez que o indivíduo recebe, por

SUâ Posição familiar, não só o capital econômico, sob forma de

recursas materiais, como também o capital social, na forma de

Um circulo de relações e o capital cultural, sob suas duas

emasj incorporado e objetivado. O capital cultural ln Corporado é todo o conjunto de conhecimentos, informações e

iores que lhe permite, por exemplo, participar tanto como 33

produtor, quanto como consumidor artístico. Este capital

incorporado está embutido nas disposições inconscientes dos

indivíduos em relação às artes plásticas. O capital cultural

objetivado, por sua vez, se manifesta sob a forma de

propriedade de objetos, como livros, quadros, revistas e

também diplomas.

Assim para Pierre Bourdieu, na sociedade capitalista, existem trés diferenciadas categorias de capitais: o capital econômico, o social e o cultural. A propriedade destes diferentes capitais é fundamental na luta pelo poder político.

As diferentes frações da classe dominante detém diferentes

Proporções de diferentes espécies de capital. A propriedade de cada tipo específico de capital vai determinar uma disposição particular em relação ao sistema das artes

Plásticas.

Considerando o capital econômico, suficiente e

^rretamente estudado por diferentes autores, principalmente

0s clássicos do materialismo histórico, Bourdieu dirige sua atenção, com mais ênfase, aos espaços ainda a descoberto que são o capital social e cultural. Em sua teoria, no entanto, a importância do capital econômico como determinante dentro do mundo capitalista não é descuidada, ao mesmo tempo em que apresenta a possibilidade de conversão destes capitais entre

O capital econômico se converte em capital social que, por sua vez, pode se converter em capital cultural e este ainda 34

pode se tornar também capital econômico. Aplicada ao sistema

das artes plásticas, esta teoria pode evidenciar o espaço de

c:irculação como a "bolsa de valores" destas conversões. Em uma

mostra inaugural, por exemplo, o capital cultural do artista

se converte em capital social (notas em jornais,

entrevistas...) e o capital econômico do comprador em capital

cultural (a obra adquirida). Além destas, muitas outras

conversões podem ser realizadas na circulação das obras e

acontecimentos artísticos.

A afirmação de Bourdieu de que a propriedade de

^^ferentes tipos de capital, bem como de diferentes proporções destes capitais, estabelece um acesso hierarquizado aos esquemas de pensamento da sociedade, pode ser relacionada com a classificação que Howard Becker faz dos tipos básicos de

Pcodutores (artistas). Os quatro tipos de artistas por ele enunciados correspondem a quatro possíveis origens sociais e

Poemas de relacionamento com o sistema das artes. A primeira tipologia é formada pelos profissionais integrados, aqueles due seguem corretamente as convenções já estabelecidas em fiação ao fazer artístico, permanecendo restritos aos limites c®0 seu público potencial e às situações consideradas re5peitáveis. A segunda tipologia é a dos franco atiradores ou marginais, aqueles que, transgredindo as convenções artísticas

^dentes, enfrentam sérias dificuldades para verem seu tcabalho realizado e difundido. Estes, em geral, são ligados

âc> sistema das artes estabelecido (cursaram escola de artes ou 35

ateliers, freqüentam museus e galeria ...) foram treinados nele e continuam de certa forma voltados para ele. Estes artistas ou aspirantes não recusam todas as convenções, mas se concentram na mudança de algumas destas. Seus trabalhos inovadores, muitas vezes, acabam incorporados promovendo a modernização das convensões. A terceira tipologia engloba os artistas ingênuos ou naifs; estes, em geral, nunca tiveram celações com o sistema das artes, (não fazem escola de arte nem freqüentam o circuito artístico) sua habilidade foi obtida

P0r" outros meios (formação técnica ou autodidata experimentalista) e são absorvidos pelo sistema a partir da

0rigina1 idade e expressividade de sua produção. O último tipo

^ o dos artistas populares; aqueles inseridos dentro de uma

Pcodução mais coletiva, despreocupados de sua condição artística, seus trabalhos são considerados, pelo sistema, como artesanato, sendo menos valorizados que os anteriores.

Nas duas primeiras tipologias, têm-se indivíduos com

Vasto capital cultural que lhes facilita, de certa forma, sua integração no sistema, sendo que os marginais ou franco

Viradores, em geral, necessitam de um capital cultural excedente que lhes permita questionar as normas e5tabelecidas. Jã os dois tipos seguintes, (ingênuo ou naifs e

Populares) possuem um capital cultural mínimo, o suficiente

Pára a execução de seu trabalho, mas insuficiente para a

^-ntegraçâo no sistema das artes.

Dal, se conclui que esta abordagem pode explicar as 36

condições individuais a partir de suas origens sociais.

Torna-se, porém, necessário ir além, analisar as estruturas do

sistema das artes plásticas paralelamente às condições

individuais. Essas estruturas constituem uma ordem

institucional derivada da própria história das lutas travadas

para a sua permanência ou transformação. São heranças do

Passado que impõem aos indivíduos que têm acesso ao campo, à

movimentação e à luta dentro das condições dadas naquele

momento, ê preciso, portanto, conhecer a história do sistema,

e> para tal, abordar sua estrutura e funcionamento como

resultado e parte da história social em que está se

desenvolvendo, pois o sistema das artes faz parte dos

Processos de legitimação que se estabelecem dentro da

sociedade permanentemente.

Howard Becker, contribui para esta linha de análise com

seus estudos sobre os processos de formação dos diversos

mundos da arte; observa como a história do sistema é

utilizada na legitimação de novos mundos "... um mundo da arte

adata uma história tendente a demonstrar que, desde o seu

*-ní cio, ele produziu obras de valor e que uma evoluçõío lógica

induziu á sua filosofia atual que o coloca sem contestação

nnma posição de grande arte. Não esqueçamos que nos primeiras

Pompas de qualquer mundo da arte, uma multidão de pioneiros

^^^balhando a escala local realizaram obras extremamente diversas. Os historiadores podem fazer uma triagem dentro do d*-1® resta desta enorme acumulação para escrever uma história 37

que sustente a posição atuai do mundo da arte,/1<5-

Nesta afirmação, Howard Becker procura mostrar o peso da

história da arte sobre a evolução de um determinado mundo da arte- No entanto, para compreender o sistema das artes como uma globalidade, em que diversas tendências ou agrupamentos participam de forma interligada na dinâmica de cooperação e, fundamentalmente, de luta, é preciso pensar que esta história não ê apenas de um mundo específico- Existe uma história da arte já consagrada, na qual qualquer grupo para se legitimar precisa se inserir e encontrar sua fundamentação. Se não observarmos o processo histórico mais amplo, (história da sociedade em que esta produção se insere) caimos na tradicional história da arte que se presta a apresentar a produção contemporânea como fruto da evolução de todas as práticas artísticas da história da humanidade. Numa seleção arbitrária, são escolhidas aquelas obras que podem servir de ponto de apoio para a construção da identidade desta ou daquela produção contemporânea- Neste processo de construir uma história legitimadora, são deixadas de lado diversas práticas plásticas, que poderão no entanto, ser incorporadas nesta história, à medida em que as novas tendências artísticas assim exigirem. Um exemplo típico é o trabalho de Jeronimus

Bosch, ao qual não era dada grande importância no período acadêmico, e que foi retomado e revalorizado dentro do movimento surrealista. Os integrantes do sistema das artes

ic> Becker, Howard S'. Les mondes de i art. p. 343. 38

plásticas lançam mão, portanto, como afirma Howard Becker, de

algumas obras que, produzidas ao longo da história da

humanidade, podem servir para a legitimação de sua produção

atual. É preciso lembrar que, paralelamente a todas estas

obras que se encontram tradicionalmente nos livros de história

das artes, houve uma ampla produção plástica que ficou

esquecida ou relegada na triagem feita pelos historiadores da

arte. O fato de serem ou não retomados tem mais a ver com o

papel que podem cumprir em relação ao sistema das artes em um

novo momento do que com seus méritos em seu tempo.

No que diz respeito às mudanças no sistema das artes,

ambos os autores, aqui considerados, percebem as estruturas

responsáveis pela "arte" não como uma determinação estática e

permanente, mas como resultado de constantes renovações.

Porém, a mudança é compreendida de forma diferenciada por

Pierre Bourdieu e Howard Becker.

Howard Becker destaca como elemento básico de seus mundos

arte a cooperação, e, mesmo reconhecendo em determinado

momento, a existência de vários mundos, trabalha com o

surgimento e desaparecimento de diferentes mundos isoladamen-

te. Rara ele, estas cadeias de cooperação (mundos) podem

surgir e desaparecer ao longo de um determinado tempo, segundo

«s circunstâncias de sua evolução e do desenvolvimento da sociedade. Em seu livro, ele relata alguns casos, com o objetivo específico de comprovar esta possibilidade, mas a 39 forma como ele compreende a mudança é insuficiente- Ele afirma e busca comprovar com inúmeros exemplos, que a mudança é a regra e a permanência da exceção, resultando daí apenas uma troca de nomes. A mudança passa a ser a permanência, tão contínua como fora até então considerada a permanência. Falta a Howard Becker uma visão mais ampla, que permita perceber o que desaparece e o que surge dentro de um mesmo processo articuladamente e dentro do contexto social no qual este processo está intimamente inserido. Quando analisa o percurso do surgimento e desaparecimento de determinado mundo da arte,

Howard Becker trata este percurso isoladamente de todos os demais percursos de outros mundos que lhe são contemporâneos.

Assim, ele enfatiza o trabalho coletivo em cada mundo da arte, não tendo como preocupação o papel deste mundo dentro da sociedade global em que está inserido. Sua orientação metodológica é centralmente voltada para a mudança em cada mundo, independentemente das relações deste mundo com outros mundos e com a sociedade em geral, o que lhe impede de explicar coerentemente os processos de mudança que ele observa ocorrerem permanentemente no mundo das artes.

Pierre Bourdieu pelo contrário, apesar de abordar diferentes campos, concebe um único campo das artes eruditas, em um determinado momento; as disputas para ele não se dão

©ntre os campos, dentro do campo. Ele aponta a existência de

0bjetos de disputa e pessoas dispostas a disputar o jogo como

Principio básico de existência de um campo específico. De 40 certa forma, ele coloca como antagônicos os campos de produção para produtores (arte erudita) e o campo de produção para consumidores (indústria cultural). A este respeito, ele não

considera duas questões que são fundamentais em termos de

Brasil: o papel da arte popular e as interligações entre arte

erudita e cultura de massa.

Para Pierre Bourdieu a luta, ccmo base de toda relação

social, é o elemento que permite a atualização de cada campo.

Neste sentido, considera em sua análise as condições dadas: os

"habitus" dos indivíduos atuantes e a estrutura do campo,

resultado de sua história específica. A luta pela

transformação que promovem aqueles que querem se introduzir no

campo é o motor de renovação deste. A oposição entre o novo e

o consagrado, muda constantemente os conteúdos e objetos de

disputa, permanecendo o princípio de existência do campo. No

caso das artes plásticas este princípio é a distinção. A

mudança é, portanto, resultado da luta pelo monopólio da

distinção. E,a estrutura do campo á o resultado do conjunto de

forças dos agentes engajados nesta luta, ao mesmo tempo em que

é sempre ponto de partida para os comportamentos destinados a

transformá-la, estando assim, sempre em jogo.

Assim, a idéia de Howard Becker de que diferentes mundos

da arte, cada um deles constituído por uma cadeia de

cooperação, coexistem em um determinado período de tempo em

uma mesma sociedade, se completa com o princípio de luta por 41

hegemonia apontado por Pierre Bourdieu. Pode—se afirmar que

determinados grupos lutam por ser dominantes, hierarquizando

subalternamente os demais e, inclusive, muitas vezes, o

surgimento de uma nova cadeia de relações pode impulsionar o

desaparecimento de outra. Neste sentido, as lutas não são

individuais, mas de grupos (mundos ou cadeias de relações),

disputando a hegemonia de posições e controle das atribuições.

É preciso retomar esta questão observando que a luta, encaminhada dentro dos limites colocados pelo próprio sistema, garante sua renovação e conseqüente permanência. Podem ocorrer mudanças que ultrapassem os limites suportados pelo sistema, desarticulando—o. Este foi, por exemplo, o caso da passagem do academicismo para o modernismo. No entanto, esta

luta não colocou em questão os elementos da própria dominação cu1tura1.

Apesar das diferenças de abordagens, uma idéia básica comum se evidencia nos estudos de Howard S' Becker e Pierre

Bourdieu: existe um conjunto de indivíduos e instituições em interação na produção de bens culturais "artísticos"; esta interação deve ser o objeto da História Social da Arte, e não simplesmente das obras artísticas ou de outros elementos nela integrados. A ênfase no sistema de relações ê um elemento determinante no pensamento destes autores. No presente trabalho, esta abordagem privilegia o sistema de relações responsável pelas artes plásticas. 42

1.3 Uida pr*opo&tA d® abordagem do sistema das artes plásticas

Analisar as artes plásticas em determinado contexto, utilizando o conceito de sistema das artes plásticas, exige que se leve em consideração os limites do conceito, enquanto metáfora das redes concretas de relações que constituem a realidade estudada. No entanto, este conceito pode auxiliar a compreensão do real, ao colocar em evidência suas estruturas não aparentes. Não se pode, porém, descuidar de que o conceito

"sistema das artes plásticas" é somente um instrumento teórico, sendo o objeto por ele abordado muito mais complexo e contraditório.

Ao abordar as artes plásticas no Brasil, nos anos 60 e

70, deve-se considerá-las dentro de uma realidade

Internacional, buscando captar sua dinâmica e articulações, já que o sistema das artes plásticas no Brasil está intimamente re1 acionado com este sistema em outras nações.

Deve-se lembrar também que este sistema é uma estrutura dinâmica que, como elemento de distinção das elites, se formou e evoluiu dentro de um complexo mais amplo. Surgindo com o desenvolvimento da burguesia, o sistema das artes plásticas evoluiu ao longo da consolidação do capitalismo, estruturando-se definitivamente no século XIX, quando esta classe assumiu o nível internacional, o poder político. As m'-«danças que se estabeleceram, portanto, no sistema das artes 43

Plásticas tem estreita relação com as mudanças da própria

sociedade. No mundo moderno e contemporâneo (ocidental), o que

se tem são mudanças parciais, que constituíram, pouco a pouco,

formas de renovação. Nesta situação, o novo passou a ser, na

sociedade de consumo, a garantia de permanência e da

continuidade da estrutura social capitalista. Esta

continuidade interessa aos grupos dominantes, que assim

garantem seus privilégios, também através da renovação

constante dos signos de distinção, entre eles o sistema das

artes plásticas. Isto determina a necessidade de constante

renovação do sistema evitando a apropriação dos códigos pelo

grosso da população o que determinaria sua dessacralização e

Perda de status. A renovação permanente responde portanto às

exiqências da sociedade de consumo em seu constante atualizar—

~se mas também às necessidades de renovação para manter—se

fora do consumo generalizado.

Este processo, porém, não é uma farsa premeditada como

Poderia parecer. Ele se realiza a partir de um referencial dos

integrantes do sistema das artes plásticas, que agem segundo

seus "habitus", decorrentes das suas posições sociais e também

das posições que detêm na estrutura do sistema. 0 processo de

construção de uma história da arte legitimadora, é todo ele

Permeado pela introjeção que os integrantes do sistema fazem de seu papel. Eles acreditam que realmente a arte moderna resulta de uma evolução histórica da humanidade, sentindo-se herdeiros e continuadores desta produção especializada. 44

A classe dominante, em seus diversos segmentos, conside-

rã-se a detentora de todos os bens produzidos pela humanidade

em sua evolução, e, assim também, herdeira legítima desta

herança artística. A fração institucionalizada das práticas

Plásticas tem, portanto, sua existência determinada e

garantida pelo sistema das artes do qual participam

fundamentalmente indivíduos das classes dominantes ou a esta

servindo.

Este sistema tem uma estrutura que é resultado da

história de suas lutas internas, sendo também princípio e

condição das novas lutas que se estabelecerem. Pode-se

compreender o funcionamento deste sistema como resultado dos

habitus" introjetados de seus participantes e das

Possibilidades destes dentro da evolução de uma estrutura pré—

ostabelecida, na qual poderão ocupar determinadas posições.

Este processo ocorre de acordo com um mecanismo pré- estabelecido socialmente; os elementos que dele participam oele se reconhecem, sem que se possa identificar um plano oonsciente e previamente combinado ou planejado. Assim, os integrantes do sistema das artes, mesmo articulados dominante- mente em um mercado de arte, possuem uma representação muito

Particular de suas práticas. Consideram-nas irredutíveis ao s impies estatuto de mercadoria, defendendo uma a singularidade

SuPerior da condição artística. Uma dupla condição que é garantida por um sistema das artes plásticas organizado, e

^Paz de garantir a distinção deste círculo restrito de 45

©spec ia1istas.

o sistema das artes plásticas é formado, no caso

específico do presente trabalho, identifica-se com o seguinte

eonjunto de indivíduos e instituições em interação: artistas,

crlticos, marchands, professores de arte e administradores

atuando em instituições como museus, galerias, bienais,

salões, escolas de arte, e espaços específicos nos meios de

comunicação de massa.

Neste conjunto destaca-se a figura do artista que, no

mundo contemporâneo, expressa de certa forma a aspiração

generaliza da de sair do anonimato, a busca de

nclividual ização dentro da sociedade de massas. O fenômeno do

tista como "ser" original e único, que caracteriza tão

octemente nossa sociedade, é correlato à despersonalização e

mâ ssificação da maioria dos indivíduos. A individualidade

levada ao extremo sob a rotulação de "artista" é o contraponto

à Massificação que corresponde à maior parte da população. O

ârtista passou a ser aquele que torna algo "arte", dando-lhe

Uma esPécie de selo de autenticidade com uma assinatura.

Dentro do sistema, se definem os atributos e elegem as pessoas

Pazes de desempenhar as atividades especiais que se classificam c orno "ar tísticas". Assim, dentro do sistema das â f" es plásticas, se estabelece, de determinada maneira, os

^utos que correspondem aos artistas e os mecanismos que

PQssibi1itarão estas escolhas. 0 que é preciso ter claro é que i 46

alguns atos marcarão pessoas como artistas dentro de um grupo

em um determinado momento; portanto, esta "rotulação" é certo

tipo de consenso e corresponde a valores sociais. Compreender

como se dá esta rotulação a nível das artes plásticas exige j que se tome o conceito sistema das artes na sociedade i capitalista contemporânea como referente a um "espaço da

arte", sujeito à demandas sociais políticas e econômicas, mas

dotado de uma história, de uma lógica e, principalmente, de

uma estrutura própria.

A estrutura responsável por esta rotulação-legitimação dá

especial relévo ao papel do crítico, como difusor de

determinadas correntes artísticas ou produções. Sua atuação

nos meios de comunicação especializados e de massa

(principalmente revistas e jornais) garante a realização desta

tarefa, além de lhes possibilitar estabelecer distinções entre

o que é e o que não é arte, para o grosso da população. A

■análise dos discursos estéticos publicados evidencia os

valores e os interesses defendidos e a adaptação que realizam

das teorias estéticas á realidade da produção artística. A

importância de sua atuação aumenta nos momentos de disputa

entre tendências estéticas diferenciadas dentro do sistema das

artes. No caso das disputas entre as vanguardas e as produções

Já consagradas o apoio de críticos e sua defesa em jornais e

revistas além da própria promoções de eventos (Como o caso dos

Domingos da Criação" de Frederico de Morais) foram decisivas

Para a disseminação dos movimentos. Os administradores culturais (diretores de

museus,secretários culturais, membros de conselhos consultivos

etc..), em relação à legitimação, têm atuação paralela à do

crítico. Sua representatividade não está na ligação com os

meios de comunicação social, mas com as instituições que

administram. Seus poderes no sistema são proporcionais ao da

instituição a que estão ligados; no entanto, pelas suas

atuações, podem ter influências transformadoras nas

tuições que administram. Indivíduos ligados a

determinadas tendências, quando colocados em instituições

importantes do sistema, podem influenciar na legitimação

destas tendências.

Já os marchands são indivíduos ligados preponderantemente ao mercado de arte, sendo muito mais administradores econômicos do que culturais; no entanto, quando é fraca atuação da crítica e das instituições especializadas, o marchand também atua como administrador cultural, promovendo eventos e difundindo movimentos e produtores. Sua ação cultural, no entanto, sofre reflexos de interesses econômicos, uma vez que as galerias são, antes de mais nada, empreendimen- tos destinados ao lucro.

Quanto ás instituições, é importante verificar o peso de

Cada uma dentro da sociedade, considerando, inclusive, sua história específica. Esta história determina as estruturas internas das instituições e os limites de sua atuação. A 48

relação das instituições com os indivíduos (artistas,

críticos, marchands etc.) é fundamental, na medida em que é

Pela atuação destes que as instituições evoluem. Muitas vezes,

determinada instituição altera sua orientação pela ação de um

novo administrador, que representa novos interesses sociais.

Mas deve-se considerar que estas instituições são, antes de

mais nada, espaços de poder e, portanto, objetos de disputas

dentro do sistema.

Concluindo estas considerações, cabe indicar que a

existência de um sistema das artes plásticas torna-se eviden-

te, na medida em que se pode constatar a eficiência com que um

conjunto de indivíduos e instituições em interação "rotulam"

determinados objetos e eventos como artísticos e obtêm para

eles o reconhecimento consensual da sociedade em que estão

inseridos. É fundamental, portanto, identificar os mecanismos

responsáveis pela eficiência desta rotulação, bem como seu

significado social.

Para a compreensão de seu significado social deve-se

lembrar as palavras de Antonio Gramsci "Uma. das mais marcantes

características de todo grupo social que se desenvolve no

sentido do domínio é sua luta pela assimilação e pela conquista ideológica' dos intelectuais tradicionais, assimilação e conquista que são tão mais rápidas e eficazes quanto mais o grupo em questão elaborar simultaneamente seus 49

i Próprios intelectuais orgânicos"1'7 .

; Nesta perspectiva, os integrantes de um sistema das artes

plástic as, como intelectuais têm suas ligações com os setores

sociais em luta pelo poder na sociedade. Portanto, a análise

do sistema das artes plásticas exige compreensão do papel dos

indivíduos nele integrados enquanto intelectuais dentro da ) sociedade e a compreensão deste sistema como instrumento de

dominação, simbólica, sendo, assim, objeto de disputa entre j diferentes classes e segmentos de classe. A condição de j intelectuais (com privilégios em relação aos produtores

^anuais, na sociedade contemporânea) de que desfrutam os

integrantes do sistema das artes plásticas é garantida por seu

capital cultural. Este capital que, ainda que subordinado ao

capital econômico no mundo capitalista, é, por si só, um

elemento de poder. As relações e disputas que se estabelecem

entre indivíduos portadores dominantemente de capitais

culturais, econômicos e sociais podem ser observadas no

funcionamento do sistema das artes plásticas.

Como o sistema tem uma estrutura já herdada, de momentos

históricos anteriores, com um corpo de indivíduos atuantes,

estes podem ser pensados como intelectuais tradicionais, e os

intelectuais em luta, para penetrar no sistema e modificá-lo,

podem ser considerados intelectuais orgânicos dos novos grupos

Gramsci, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978, p. 50 sociais que buscam o poder político. A disputa pelo poder dentro do sistema das artes plásticas pode ser tratada, assim, como parte da estratégia de construção de hegemonia dos grupos dominantes mas também dos que buscam ser dominantes em uma sociedade. Os capitais de que dipSem aqueles que disputam espaços no sistema das artes plásticas define suas posições e possibilidades de atuação.

A problemática que se coloca ao presente trabalho é comprovar, em nível da realidade empírica a existência do sistema das artes plásticas. Identificar as lutas no seu interior e a relação destas com o processo histórico porque passa o pais nas décadas de 60 e 70. 2 - AS PRATICAS ARTÍSTICAS NO BRASIL NOS ANOS 60/70

"Existe u/na cultura brasileira porque existe uma histórià aue se desenrola dentro dos limites geográficos do país, sob condições econômicas, políticas, administrativas e culturais específicas. Ela tanto é produzida pelo povo analfabeto como pelas camadas alfabetizadas e pelas elites intelectuais, é um produto ideologicamente confuso e contraditório, marcado na maioria dos casos pela alienarão cultural e política em que vivem as grandes massas populares, e não só elas"

Ferreira Gullar

2.1 - Tendências das práticas artísticas no Brasil

Na realidade empírica, o sistema das artes plásticas,

mesmo apresentando especificidade, encontra-se integrado ao

conjunto das práticas artísticas. As práticas artísticas constituem um universo particular das práticas simbólicas, no qoal a ree1aboração e representação da realidade se faz através do uso de um coniuntn rte sinnos oroanizados em uma

linguagem, pressupondo o conhecimento por parte do grupo de produtores e consumidores de signos e códigos que lhe são próprios. Práticas estas controladas socialmente por uma 52

elite, através de determinadas estruturas historicamente

articuladas. Em princípio, cada modalidade de prática

artística (teatro, cinema, música, literatura-..) constitui um

sistema específico, assim como as artes plásticas. No presente

estudo, não há possibilidade de abordar cada um destes

sistemas individualmente. Assim, o que se pretende neste

capítulo é destacar algumas considerações básicas, em relação

^s práticas artísticas no Brasil, em qeral, e analisar como ao

longo dos anos 60 e 70 se configurou o panorama das práticas

artísticas. Desta forma, tendo-se uma visão geral dos

diferentes setores artísticos. entre os quais constatam—se

tendências comuns, se poderá observar com maior clareza as

especifieidades do sistema das artes plásticas.

A primeira consideração em relação às práticas artísticas

à a constatação da existência de intelectuais que produzem

eventos e objetos. De uma maneira ou de outra, o "artístico"

(considerado aqui como categoria definida historicamente por

uma sociedade) é sempre resultado da administração da cultura

exercida por um grupo de intelectuais especializados. Os

intelectuais constituem, segundo Pierre Bourdieu, uma fração

dominada da classe dominante. Isto porque o capital que detêm

basicamente,o cultural e, na sociedade capitalista,o capital econômico subordina os demais. No Brasil, a origem dos

intelectuais foi tradicionalmente de extratos da classe dominante. No entanto, a evolução das possibilidades do m©rcada de trabalho na área artística, através de três 53

alternativas: das instituições culturais dependentes de grupos

de elite; do mercado oferecido pela indústria cultural e do

serviço artístico público ou subvencionado pelo Estado,

favoreceu a formação de um contingente de profissionais das

artes, oriundos de diferentes classes sociais1.

Considerando que as práticas artísticas em sua evolução

contemporânea envolvem um staf considerável de especialistas

em funções articuladas e hierarquizadas, tende a se

estabelecer dentro do próprio setor artístico uma

diferenciação social. Esta diferenciação favorece a

representação de diferentes interesses de classe social nesse

fazer específico. Ainda que, na maioria das vezes, os

indivíduos originários dos extratos sociais mais pobres

encontrem no trabalho artístico um meio de ascensão social, em momentos de avanço dos movimentos populares, estas origens, muitas vezes, são retomadas, principalmente porque dentro do

Próprio ambiente mantêm-se as diferenças sociais e os

Privilégios das elites, o que gera contradições. Isto leva os indivíduos a lutarem por seus interesses dentro do seu setor

Profissional, identificando-se com os interesses de determinada classe. Assim, o papel ideológico que as práticas

Miceli Sérgio em Intelectuais e Classe Dirigente na Brasil. Rio de Jeneiro, Difel, 1979. Analisa a formação destas alternativas de mercado de trabalho no período de 20 a 45 considerando os intelectuais em geral e não especificamente os das áreas artísticas. Suas conclusões sobre as Possibilidades que se abrem nestas três direções apontam Para a expansão progressiva que vem até os dias atuais, com variações somente quanto ao peso que cada uma destas Possibilidades terá de acordo com as variações econômicas e políticas da sociedade brasileira. 54

artísticas desempenham na sociedade depende primordialmente da

expectativa de classe dos indivíduos que participam na

produção e difusão dos produtos artísticos a partir dos

conflitos sociais do meio em que se encontram, nos quais os

setores populares lutam por maior participação. Na sociedade

brasileira, onde a maioria dos indivíduos está à margem de

quase todas as decisões políticas e onde suas chances de

acesso aos bens produzidos socialmente são mínimas, as

possibilidades de alteração, na dinâmica elitista de produção,

difusão e consumo das artes, também são bastante restritas. Ao

mesmo tempo, porém, as práticas artísticas têm intensa

penetração na população de baixo nível cultural, (música,

teatro, cinema são linguagens de fácil absorção que envolvem audição, recursos visuais, mobilização espacial e outros efeitos já bastante conhecidos das elites em termos de manipulação social). Por isto, a indústria cultural no Brasil incorpora, principalmente através da TV, a maioria das

Práticas artísticas, tornando a análise de Bourdieu, que separa o campo cultural erudito do campo da cultura de massas, bastante impróprio para a análise das questões culturais no

Pai s.

Ainda que possam ser identificadas práticas artísticas mais eruditas (em geral as consideradas "verdadeiramente artísticas"), mais herméticas, intelectualizadas e exigindo um c:onjunto de conhecimentos para sua apropriação que não estão ao alcance do grosso da população, muitas destas práticas das 55

elites são difundidas através dos meios de comunicação de

massa. Na cultura de massa, então, é possível encontrar, por

um lado, muito das artes de elite (o melhor do teatro

brasileiro está nas telenovelas, o melhor da música se

apresenta em shows para grandes públicos) e também, por outro

lado, muito da chamada arte popular (música sertaneja é

apresentada em programação de rádio e TV e o carnaval é o

grande show dos meios de comunicação de massa ao longo do més

de fevereiro).

É preciso considerar ainda, como faz Néstor Garcia

Canclini, que "o capitalismo, sobretudo o capitalismo

dependente... não precisa eliminar as culturas populares/ ao

contráriof ele inclusive se apropria delas Com a finalidade

de integrar as nnnulares ao desenvolvimento

capitalista... reorganizando-as num sistema unificado de

Produção simbál ica"2 .

As práticas artísticas evidenciam, por um lado, as

disputas entre os diferentes segmentos de classe dominante

Pelo controle das estruturas de produção, difusão e consumo

destas práticas; por outro, evidenciam a utilização, por parte desta elites de elementos dos universos simbólicos populares.

Utilização que é feita descontextualizando e ressignificando os elementos destes universos, reordenando-os em um sistema simbólico abrangente de toda a sociedade. No caso brasileiro, a indústria cultural é a maior responsável por este processo. 56

Uma boa parte destes universos populares, no entanto, ficam à

margem desta cooptação, uma vez que não se desenvolvem só sob

o domínio da burguesia, mas em muitos casos em oposição à

este.Mesmo que muitas práticas populares não cheguem atingir o

rol das práticas artísticas, elas permanecem vivas, ainda que

restritas aos pequenos grupos de seus produtores e

consumidores. Se não desaparecem, também não se expandem para

outros grupos, porque os setores subalternos não dispõem de

roeios de difusão que lhes permitam ampliar o consumo de seus

Produtos. Algumas destas práticas são muitas vezes apropriadas

por segmentos de elite e incorporadas às práticas artísticas.

^ criatividade e a espontaneidade destas atividades populares

s3o alguns dos motivos que estimulam esta apropriação, assim

como a necessidade da indústria cultural de permanente

renovação e seu interesse de penetração popular para domínio

ideológico.

As práticas artísticas desempenham, portanto, dois

importantes papéis em termos de lutas pelo poder dentro da

sociedade brasileira. Primeiro o de legitimarem a

superioridade das elites face à maioria da população. Segundo o de servirem de instrumento para manipulações ideológicas que visam manter as estruturas de dominação, quando incorporadas

Pela indústria cultural.

Canclini, Néstor Gárcia. (As Culturas Populares Capitalismo. São Paulo, Brasiliense, 1983, p. 13. 57

Segundo Antonio Gramsci, "Uma das mais marcantes caracte—

ri-sticas de todo grupo social que se desenvolve no sentido do

domínio é sua luta pela assimilação e pela conquista

ideológica' dos intelectuais tradicionaisr assimilação e

conquista que são tão mais rápidas e eficazes quanto mais o

grupo em questão elaborar simultâneamente seus próprios

intelectuais orgânicos"3.

Esta afirmação que se estende aos intelectuais em geral,

pode ser observada de maneira mais especifica em relação

aos intelectuais dos setores artísticos. Estes, articulados

através de uma linguagem de seu uso comum, aparentemente à

fnargem das disputas sociais e políticas, também se incorporam

na construção das novas hegemonias. Pensar nestes

Participantes das atividades artísticas como intelectuais

tradicionais, é uma primeira possibilidade de descobrir como

elaboram os novos intelectuais orgânicos, referidas por

Gramsci. Como as práticas artísticas, para sua realização

(produção e difusão), contam com uma estrutura já herdada, que

Se transforma para responder às demandas externas, os

individuos atuantes nesta estrutura pré existente podem ser

considerados intelectuais tradicionais (ou profissionais

integrados como observa Howard Becker). Eles respondem às

e>:igéncias das classes dominantes, anteriormente hegemônicas, apresentando como fórmulas de sua linguagem os valores aceitos

~ Gramsci, Antonio. Os Intelectuais e a Organização da Cultura. Rio de Janeiro,Civi1ização Brasileira, 1978,p.9. e aprovados em momentos anteriores. A disputa de poder dentro

destas estruturas podem, portanto, ser pensados como ação de

intelectuais orgânicos dos novos grupos em ascensão,

penetrando nas práticas artísticas e modificando suas formas

de produção, difusão e os valores nelas implícitos. Isto

porque o próprio campo das práticas artísticas é um

instrumento de dominação simbólica. Ê um espaço de disputas

sociais não só por posiçSes dentro dele, mas por influência da

sua ação dentro da sociedade. Estes dois níveis de disputa

torna complexo os processos de legitimação que são, no fundo,

os objetos destas disputas. Legitimação das competências em

termos de representação simbólica que referenda o poder

Político de classes sociais. Estas disputas que aparentemente

poderiam ser analisada como estratégias de subversão e

estratégias de conservação referidas a indivíduos, na verdade,

são manifestações sociais embutidas em ações particularizadas.

Fazem parte das estratégias de hegemonia dos grupos sociais

dominantes na sociedade e daqueles que buscam construir uma

nova hegemonia.

Um dos aspectos que mais se destaca no campo das artes é

o empenho em ocultar ou pelo menos negar as disputas sociais nele envolvidas. Um dos maiores problemas para o pesquisador social nesta área é superar as barreiras deste aparente caráter supra-social das práticas artísticas. No Brasil, um dos raros momentos em que se apresenta bastante evidente esta

Problemática são nos anos 60, quando ações como a do CPC, dos 59

grupos Arena e Oficina, da música de protesto, inauguram uma

nova forma de pensar e atuar na área artística, que leva em

consideração sua ação na luta de classes. Por isto, o presente

trabalho elegeu este período como um momento privilegiado para

o estudo desta problemática.

A segunda consideração básica a fazer para a compreensão

das práticas artísticas no Brasil e a identificação da

condição do país como região periférica em que a elite,

responsável pela administração deste conjunto específico de

práticas simbólicas, é um segmento, não hegemônico, da

burguesia internacional. A compreensão das práticas artísticas

no Brasil passa, portanto, pela consideração do caráter

internacional dependente de sua classe dominante.

Nesse sentido, cumpre lembrar que o próprio conceito

"arte" surgiu no bojo da evolução do mundo moderno, na transição do feudalismo para o capitalismo, dentro de um processo de expansão de que o Brasil participou na condição de colonizado. O sistema das artes das elites européias, no mundo moderno, se organizou paralelamente, e em íntima relação, com a construção das identidades nacionais. As classes dominantes utilizaram as artes literárias, músicais, plásticas, etc., nas suas formações nacionalistas. Foram estes Estados Nacionais que empreenderam a expansão colonial, realizando seu bomínio nesta expansão também através de seus sistemas artlsticos. Além da dominação econômica imposta ao mundo 60

colonial, os colonizadores impuseram sua identidade artística,

como forma de dominação simbólica.

A estética barroca (tendo nela inseridos elementos do

pensamento e da estética renascentista), foi a primeira forma

de hegemonia artística internacional no mundo moderno. A

igreja e o estado, juntas, realizaram um trabalho de violência

simbólica em relação a todos os povos colonizados, impondo seus valores e padrões. Este foi um dos recursos utilizados na ordenação do mundo, segundo a ótica das classes dominantes européias, imposta a partir da expansão colonialista. No entanto, se por um lado, houve uma imposição de auto-negação das práticas locais e tradicionais, por outro se desenvolveu uma reação subterrânea que pode ser observada nos inúmeros sincretismos da cultura latino americana.

No caso do Brasil, a obra do Aleijadinho evidencia um pouco deste sincretismo, também presente de forma bem mais forte na santeria popular.

Nos países periféricos, a arte foi introduzida, portanto, como um instrumento de dominação, uma imposição dos colonizadores sobre os colonizados. Esta situação sofre alterações ao longo do processo histórico em que, de colonizados, estes países passam a estados nacionais.

Observa-se, no entanto, uma continuada ordem internacional em que se estabelecem cadeias de dependência, sempre com 61

profundas repercussões nas práticas artísticas. Isto porque os

diversos circuitos artísticos são controlados por elites

*oc:ais, associadas à burguesia internacional.

O capitalismo em sua fase atual, monopolista, não mais se

restringe a um ou outro país, mas caracteriza-se por uma

articulação internacional. Nesta, estão inseridos todos os

Países do mundo capitalista, alguns como pólos hegemônicos e

outros, como o Brasil, em condições de periféricos. A partir

desta ordenação econômica, as práticas artísticas também se

encontram sob influência estética dos grandes centros

internacionais. No entanto, certa absorção de elementos

simbólicos das regiões periféricas nestes modelos

internacionais, se faz necessária, como forma de renovação e

como meio para melhor atuar, permitindo a articulação com os

segmentos regionais, gerando a legitimação desta ordem

internacional, na qual estão engajados os setores dominantes

locais.

A terceira consideração básica para o estudo das artes no

Brasil refere—se à atuação do Estado. Para compreender melhor

0 Papel do Estado no Brasil, podemos recorrer a Alain Rouquier

Poe afirma:

"Podemos, desta forma, precisar determinadas particularidades do desenvolvimento do Estado

da América Latina... O Estado é primeiramente, pode ri amos inclusive dizer, desde o período colonial em que ainda não se havia formado o 62

Estada, a lugar das transações, das negociações entre as grupos de proprietárias locais e as burguesias estrangeiras. Nesse sentido, podemos afirmar, paradoxalmente, que o Estado das sociedades dependentes é um Estado relativamente independente dos interesses setoriais internos... o Estado, além de outras funções, procura em todos os casos, mas em graus e modos diversas, harmonizar os interesses divergentes das várias classes privilegiadas. Nestes países é raro - ou pelo menos mais raro que em outros lugares - que o Estado seja o instrumento de uma fração das classes dominantes. E sua margem de manobras é relativamente ampla... O equilíbrio dinâmico entre as burguesias internas e externas no seio do Estado continua não apenas conflitante mas eminentemente precário... o aparelho do Estado é o único em condições de arbitrar, ou seja, de assumir a direção da soeiedade e de proceder ás modif icações que nenhuma força social pode assegurar

Em decorrência desta condição, o Estado, no Brasil, tem atuado em relação às práticas artísticas, como em relação a

0,-itras práticas, como árbitro de interesses divergentes dos

^ánios segmentos de classe em disputa.

0 aparelho de Estado, através de seus segmentos especia 1izados na área artística, arbitra as mais diversas disputas, com uma autoridade que nenhum grupo social pode

Rouquier Alain - O Estado Militar na América Latina. São Paulo, Alfa - Omega 1984, p.51-2. 63

deter isoladamente. Com relativa independência dos interesses

setoriais internos, tem uma interferência permanente em

relação às práticas artísticas, apoiando ou reprimindo esta ou

aquela tendência de acordo com os interesses dos grupos mais

"fortemente representados no poder. Na medida em que detém as

condições de arbítrio em nível econômico e social, exerce esta

função também na área artística. O que explica a existência de

várias instituições públicas destinadas ao gerenciamento e

apoio às práticas artísticas, em interrelação, e muitas vezes

se sobrepondo em sua atuação, como é o caso das secretarias de

cultura estadual e municipal, ministérios de cultura e

conselho cultural do Itamaraty. Além disto, várias

instituições artísticas, embora gerenciadas como sociedades

Particulares, contam basicamente com o apoio estatal para sua

sobrevivência. É, portanto, a função de harmonizar interesses

divergentes das várias elites que concorre para que a ação do

Estado no que diz respeito às práticas artísticas tenha muitas

vezes um caráter oscilante aparentemente contraditório.

A verdade é que o Estado tem desempenhado

tradicionalmente no país o papel de mecenas, inaugurado com a

vinda da família real portuguesa e a criação da Academia Real

c,e Belas Arte. Este mecenato favoreceu a manutenção de

Pcáticas artísticas de consumo restrito e a conservação de objetos e monumentos que testemunham um passado heróico de sua e^i-te. O Estado assumiu ainda o compromisso de manter viva a memória nacional (documentos que preservam glórias e poder), 64

utilizando-a na construção de uma identidade. Desempenha assim

a tarefa de unificador simbólico (idéia de nação) que os

diversos segmentos de classe dominante não conseguem realizar

isoladamente, mas que é fundamental em termos de controle

Popular na sociedade contemporânea.

No entanto, é preciso lembrar que os intelectuais

atuantes nos aparelhos culturais do Estado, por suas condições

de existência, muitas vezes se identificam com os setores

Populares. Isto possibilita que ocasionalmente se evidenciem

atuações identificadas com os interesses e as demandas dos

segmentos silenciados da sociedade. As possibilidades de

atuação destes intelectuais, valorizando as práticas

simbólicas populares e atendendo às exigências de

democratização da participação na produção e consumo de bens

culturais, estão também sujeitas ao espaço aberto pelas

disputas dos segmentos das elites entre si.

Nos momentos em que diferentes grupos das elites disputam

mais acirradamente o controle dos aparelhos do Estado, se

torna mais evidente a emergência dos segmentos populares. Nas

brechas que se abrem no elitismo cultural, pode se detectar a

evoluçâo dos grupos subalternos em busca de maior participa- rão. Exemplos disto foram vários movimentos culturais dos anos

60.

Nas últimas décadas, na área cultural e estatal, segundo 65

Sérgio Miceli, duas tendências bem definidas têm dividido as

opiniões e ações dos órgãos públicos: a concorrente

Patrimonial e a executiva. A primeira está voltada à

conservação de monumentos históricos, ou seja, à conservação e

restauração de prédios ou conjuntos arquitetônicos. A segunda

apoia a difusão de produções artísticas, executando projetos

voltados principalmente ao fomento de práticas menos aceitas

pelo mercado, mais elitistas ou de altos custos e pouca

rentabilidade.

Sobre as disputas entre estas duas tendências da ação

estatal na área cultural Miceli assim se refere:

"Os sucessivos remanejamentas dos órgãos de cúpula do MEC, incumbidos de direcionar a

intervenção na área culturalf expressam não apenas os conflitos de interesses entre as

vertentes patrimonial' e executiva't mas também prenunciam a progressiva diferenciação organizacional, política e doutrinária da

vertente cultural em seu conjuntof quer no âmbito do próprio MEC, quer ao nível dos governos estaduais e municipais ou da •5 iniciativa privada" .

Podem ser melhor compreendidas estas divergências se observadas as colocações de Alain Rouquier sobre as relações das classes dominantes com o Estado na América Latina e

Miceli Sérgio. Estado e Cultura no Brasil. São Paulo, Difel. 1984, p. 59. 66

retomadas as observações iniciais deste texto sobre a condição

de classes dos intelectuais.

A progressiva diferenciação da vertente cultural, em seu

conjunto, corresponde, ainda, à importância gue as práticas

•artísticas (pensadas dentro de um quadro da cultura) passaram

a ter para o Estado a partir da expansão da indústria

cultural; processo que no Brasil se desenvolve a partir de

, evidenciando as íntifnas ligações do Estado com os meios

de comunicação de massas, mas que apresenta preocupações

organizadas de intervenção estatal a partir da década de 70.

Em diversos momentos da cultura Brasileira, a atuação do

Estado em relação às práticas artísticas foi basicamente de

controle, o qual era exercido tanto por meio da repressão e da

censura como do apoio e subvenção. O uso destes meios variava

de acordo com o caráter mais ou menos autoritário que o Estado

tinha em determinado momento. Repressão e censura, por

exemplo, tiveram importante vigência no Estado Novo e no

PerlotjQ de 68 a 73. A censura pode se realizar diretamente com

ócgãos como o DIP e a Censura Federal ou, pode ser mais

subliminar, como através de controle do papel para a imprensa

e controle da publicidade estatal para determinados veículos

c'e comunicação não identificados com as políticas do poder estabelecido.

Os incentivos podem também ser diretos ao produtor ou 67

indiretos, através de instituições que os repassam. Encontram-

~se dentro do aparelho de Estado, portanto, uma série de

órgãos e instituições responsáveis pela administração das

Práticas artísticas, pertencentes, inclusive, a diferentes

instâncias da administração federal estatal ou municipal. O

apoio material e institucional que cada tipo de prática recebe

da administração estatal é proporcional ao poder poli tico e

social de setores das elites ligados a cada tipo específico de

Produto artístico, junto a cada instância estatal. E a

sobreposição de atividades da esfera estatal, muitas vezes,

corresponde a tratativas, visando atender a interesses

conflitantes dos diferentes setores de classe dominante ou

também à gerências diversificadas em nível municipal, estadual

Qu federa1.

Howard BecRer*5 ao tratar das relações do Estado com a

arte, fixa sua atenção em dois tipos de modelos de atuação,

segundo os quais o Estado pode encaminhar sua política cultural. Um, mais centralizado, favorecendo as produções qualificadas e atualizadas dos grandes centros identificados com os modelos internacionais avançados. Esta é a política cultural que Howard Becker denomina de "política de democratização", em que o Estado atua no sentido de estender

0 consumo destas produções a maior parte da população. Esta difusão de bens artísticos, no entanto, pode ser falsamente o Becker, Howard. op. cit. 68

democrática, uma vez que, quando a população pode

assimilá-las, a elite já não mais os qualifica como arte,

passando às novas produções mais atualizadas. Além disso, os

elementos necessários à fruição deste tipo de arte

internacionalizada, são muito mais complexos do que aqueles

que o Estado pode dispor para distribuição à população em

geral, principalmente em países como o Brasil. O discurso de

elevar o padrão cultural da produção oculta a verdadeira

atuação do estado: proteger produções vanguardistas de difícil

aceitação do público, sustentando verdadeiros laboratórios

experimentais, que poderão posteriormente ser absorvidos pelo

mercado. A segunda opção do Estado, segundo Howard Becker, é a

descentralização, apoiando pólos regionais, dentro de uma

Política que ele denomina "democracia cultural". Q Estado se

volta, neste caso, às manifestações menos elitistas, mais

tradicionais ou populares, fortalecendo pólos regionais e

valorizando os elementos locais. Não há uma preocupação do

Estado com a formação artística do público e, as produções

aPoiadas muitas vezes são de cunho conservador e retrógrado.

Esta política pode dar lugar a obscurantismos, na medida em

que enfatiza espontaneísmos e desinformações.

É importante observar que, no Brasil, o Estado apresenta

0s dois modelos de atuação, variando a ênfase em um ou em outro, de acordo com condições conjunturais. Isto pode ser expliçado pelas observações anteriores sobre o papel do Estado na coordenação dos interesses das elites locais. A explicação 69

Para cada uma destas orientações precisa ser buscada nas

correlações de força dos grupos sociais nelas engajados, em

determinado momento. O que não se pode deixar de perceber como

tendência dominante é que as artes, no Brasil, estão

tradicionalmente sujeitas à ação administradora do Estado.

Principalmente certo tipo de produção das elites (música

erudita, teatro experimental, artes de vanguarda em geral),

que, sendo no mais das vezes de alto custo de produção e com

Uín público muito restrito de consumidores, não tem condições

de sobrevivência dentro da livre iniciativa. O Estado

subvenciona estas produções, designadas como "verdadeira

ârte11, reforçando uma imagem supraclassista destas práticas

artísticas e da atuação estatal.

A quarta consideração a ser feita refere—se à situação

das culturas populares. Como já foi destacado (a partir das

considerações de Néstor Garcia Canclini), no capitalismo,

principalmente no dependente, as culturas populares não

Precisam ser eliminadas. Pelo contrário, podem ser e devem ser

incorporadas. No caso do Brasil, o Estado também cumpre um

importante papel nesta apropriação das culturas populares, administrando—as conforme os interesses das classes dominantes. Nesta tarefa de descontextualização e ressignificação das culturas populares, a FUNARTE,

(Fundação Nacional de Arte, 1973—1990) órgão federal, r^sponsável pela administração das práticas artísticas, tem em sua estrutura o Instituto Nacional de Folclore. Através dele, 70

o Estado controla, apoia e divulga produções populares como

festas, artesanato, rituais... com vistas principalmente ao

turismo. Estas produções, assim administradas, se prestam a

manter uma economia informal subordinada à hegemonia do

capital, e é utilizada também para criar uma ilusão de

Participação cultural dos segmentos populares que responde aos

interesses do Estado na manutenção de uma imagem democrática7.

A incorporação de elementos dos universos das práticas

artísticas subalternas também se dá através da indústria

cultural, que possibilita o retorno destes elementos a estes

setores, através dos meios de comunicação de massa. Este

reordenamento da cultura brasileira que se realiza através da

cádio e da televisão deve ser analisado paralelamente as

mobi1izações artísticas dos anos 60, a fim de que se possa

Perceber as potencialidades das práticas artísticas nos

Processos da luta de classes, dentro de momentos mais

democráticos e dentro de períodos autoritários. Carlos Eduardo

Lins da Silva aponta alguns estudos que estão sendo

desenvolvidos neste sentido9.

Concluindo, pode-se dizer que se constatam quatro

tendências dominantes nas práticas artísticas no Brasil no

~ Uma análise profunda e completa destas manifestações do universo das práticas artísticas populares no México pode ser encontrada ems Culturas populares no Capitalismo, de

8 Néstor Gárcia Canclini. Carlos Eduardo Lins da Silva - Ind-ústria e Cultura Brasileiras pela utilização do conceito de Hegemonia Cultural. Iní - Encontros com a Civilização Brasileira, n. 23, Rio de Janeiro, 1980. 71

período em eetudo.

A primeira refere-se à posição ambígua dos artistas: como

intelectuais, podem ser considerados setor dominado da classe dominante, mas as condições concretas de existência de muitos deles ou sua origem social se aproximam bastante das classes subalternas. Daí decorre a possível instabilidade social da sua atuação, ora identificada com as elites, ora com os setores populares.

A segunda diz respeito à situação periférica do país no panorama internacional, que determina aos integrantes dos setores artísticos seguirem as tendências dominantes no âmbito internacional. Isto, no entanto, não impede que haja a integração de elementos locais, que dinamizam estas produções e facilitam sua absorção pelo público em geral.

A terceira tendência refere-se à dependência dos setores artísticos em relação ao Estado, que, apresentando-se como supra classista, apoia a arte de elite e também as manifestações simbólicas populares. Em sua ação cultural, o

Estado subvenciona aquelas produções que correspondem aos seus padrões e censura as que lhe são mais subversivas. Censura e

âpoio constituem as duas faces da mesma moeda.

Por último, evidencia-se, como uma tendência, a relação complexa entre as práticas artísticas controladas pelas elites

íerudita e de massas) e as práticas artísticas dos setores 72

subalternos. Apesar de manterem certa identidade própria e

autonomia, elas se absorvem umas às outras num movimento de

disputa permanente, ainda que dissimulada e com evidente

predomínio da força econômica e política das elites.

2.2 - Os Anos 60i Tampo da Projatos Democratizantas

"Uma das tarefas cruciais para os modernistas dos anos 60 era enfrentar o mundo da via expressa; outro era mostrar que este mSo constituía o único mundo moderno possível... Logo eles iriam encontrar esse algo mais na vida cotidiana da rua... sua mensagem era de que muito do significado que os homens e as mulheres modernos buscam desesperados encontra- va-se, de fato, surpreendendo próximo de suas

casasf perto da superfície e nas imediações de suas vidass estava ali, bastando que soubésse— o -mos procurar .

As palavras de Marshall Berman ilustram bem o clima desta década de crise e questionamento. Q modelo de desenvolvimento americano que se expandira pós-2- guerra, baseado no consumismo e na via expressa, a que alude o autor, entrara em crise. Trata-se, principalmente, de uma época de avanços populares, no mundo inteiro, de crescimento do movimento operário na Europa, de explosão dos movimentos estudantis e lutas nacionalistas e democratizantes na América Latina e

Asia.

Berman, Marshall. Tudo que é sólido se desmancha no ar. São Paulo, Companhia das Letras, 1986, p 297. 73

Integrado neste panorama internacional, o Brasil sofreu

uma série de transformações em sua estrutura sõcio-econômica e

política, sendo estabelecidos os pressupostos do modelo de

desenvolvimento que permanece até os nossos dias. A partir de

1956, o processo de industrialização constituía, jâ, um dado

irreversível na formação social brasileira. A exploração da

força de trabalho tornava-se progressivamente incompatível com

3 política de integração da classe operária desenvolvida pelos governos populistas.

Segundo Gctavio lanni, "d& fatoT nos anos 61 a 64 o povo brasileira defronta— sef de modo cada vez mais premente, com a necessidade de adotar uma opção drástica. For um lado, o modelo getuliano esgotava um ciclo de realização... Impunha-se uma decisão corajosaf no sentido de aprofundar rupturas estruturais indispensáveis á construção dos alvos inerentes a sua lógica... Por outro lado, no bojo do próprio modelo

Çetuliano ou muito preso a este, constituiu-se o modelo socialista... De outro ladof ainda, no interior do modelo getulista constituíra-se o modelo internacionalista... Esse quadro de possibilidades e dilemas — particularmente nos anos

1961 - 1964 torna-se real quando encarada no plano dos acontecimentos políticos"*0 .

to lanni Octávio. - Colapso do populismo no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1986, p. 129. 74

Num curto espaço de tempo, (1955-60) haviam ocorrido

modificações na estrutura industrial com o encadeamento das

relações intersetoriais. A modernização oferecida pela

expansão das indústrias de bens de consumo duráveis atingira

principalmente os grandes centros. Rio de Janeiro e São Paulo,

onde se desenvolveram também as mais importantes disputas

sociais. As disputas sociais tinham como princípio básico a

adoção de um dos modelos de desenvolvimento a que Octávio

lanni se refere.

Cabe destacar, no Brasil, neste período, a ampliação

numérica da pequena burguesia, no bojo do processo de

industrialização que se delineia mais claramente a partir do

governo JK. Este segmento de classe que está ligado aos

setores de serviço e à pequena indústria, fundamentalmente urbano, tem acesso, através da ampliação da rede de ensino

Público gratuito, a uma ilustração que lhe abre novas

Possibilidades como produtor e público de uma produção arfcistica própria.

Retomando as observações sobre a condição dos intelectuais, pode-se verificar que, no bojo destas alterações sociais, formou-se um quadro de intelectuais, originário desta classe média e responsável por uma série de manifestações artísticas comprometidas com a deselitização. Neste sentido, no Brasil, os anos 60, segundo também a dinâmica internacional

*0c:^lizada por Marschal Bermam, foram uma exceção dentro da 75

tradição de pouca participação popular nas práticas

artísticas. Neste período, as artes tomam novo impulso; o

cinema novo, a bossa nova, o neoconcretismo são alguns dos

movimentos resultantes desta expansão da vida urbana e da

Participação social mais diversificada. A identificação das

atividades criadoras com as realidades locais favoreceu toda

uma ampla e diversificada produção artística. Este fenômeno se

localizava principalmente no Rio de Janeiro que era já um

centro cultural importante dentro do país, inclusive devido a

sua condição de sede do governo federal. Condição que não

perdeu mesmo com a mudança da capital para Brasília. São

Paulo, pela expansão de seu parque industrial e setor

"financeiro, assumiu progressivamente a posição de sediar, junto com o Rio de Janeiro, os principais eventos artísticos d° país. Os pólos de concentração de renda, no modelo monopolista que se implantava, eram também o palco das grandes transformações artísticas no país.

O aumento do poder aquisitivo dos setores médios cepercutiu também em um fenômeno importante, em termos de arte, que foi o crescimento de público consumidor. Um setor da classe média urbana passou a ter oportunidade, através da ampliação das redes escolares e também de outras oportunidades de formação e informação, de acesso a uma produção artística que estivera até bem pouco tempo restrita aos setores de elite. Este é um fenômeno que surgiu no Brasil nos anos 60 e

^"e, sem dúvida, concorreu para o desenvolvimento vertiginoso 76

da indústria cultural nos anos 70.

As repercussões deste quadro no setor artístico fazem-se

sentirem um período de intensa fermentação, principalmente nos

setores que atingem o grande público. Ato teatro, por exemplo,

1960 foi o primeiro ano em que os originais brasileiros

despertaram maior interesse que os estrangeiros, tanto junto d

crítica, como junto ao grande públicoDestacar-se, neste

sentido, a colaboração do Teatro de Arena em São Paulo,

inaugurando um ciclo de autores locais. E mais ainda, de suas

eboliçSes internas, em 61, se ordenaram 3 importantes e

decisivos movimentos na área teatral: o próprio Arena que

seguiu atuando sob a coordenação de Augusto Booal e

Gianfrancesco Guarnieri, na linha de teatro de ação; o Centro

de Cultura Popular da União Nacional de Estudantes (UNE) sob a orientação de Oduvaldo Viana Filho (Vianinha), voltado para oma participação política; o Teatro Nacional de Comédia,

ligado ao Ministério de Educação e Cultura com participação decisiva de José Renato. As dissidências internas do Arena

Propiciaram ampliações e diversificações das ações teatrais o

Pue contribuiu, em última análise, para o crescimento desta prática neste momento.

Os Centros de Cultura Popular (CPCs da UNE) tiveram, de

61 a 64, uma intensa interferência no panorama cultural, tanto na área teatral como musical e mesmo cinematográfica.

Estiveram na sua direção Carlos Estevam Martins, Vianinha e 77

Ferreira Gullar. Num curto período de tempo, realizaram uma

obra intensa e de importante conseqüência no quadro

intelectual das esquerdas brasileiras em nível de cultura. Os

CPCs inauguraram um novo padrão de atuação dos intelectuais,

introduzindo novos debates e novas formulações teóricas que

são essenciais para o estudo da ação das esquerdas no campo

ãrtístico no Brasil. Para identificar a matriz ideológica que

se formou dentro dos CPCs, deve-se observar, antes de mais

nada, a consciência, por parte da maioria de seus integrantes,

sobre a luta política que se travava no seio da sociedade

brasileira neste momento. A identificação desta luta como luta

de classes e a busca de participação na mesma, alinhando—se

com os setores populares, foi o móvel de toda a atuação dos

CPCs. Quando se proporem a participar desta luta como um

Centro de Cultura, seus integrantes já estavam estabelecendo

novas bases de pensar e agir no campo cultural. Traziam, como

roarco, o compromisso dos intelectuais de esquerda, de atuarem,

no seio da sociedade civil, como profissionais da arte,

compromissados com as propostas de transformação social.

Na arte cinematográfica a atuação dos CPCs foi decisiva;

por seu patrocínio, produziu-se, em 1961, o filme "Cinco

Vezes Favela", reunindo Joaquim Pedro, , Carlos

Diegues, Leon Hisrzman. Esta película, composta de Cinco episódios, seguia as influências do realismo italiano e do

"Nouveau realisme" Francês. Documentando a realidade das

favelas cariocas, introduziu novos objetos, novos atores 78

sociais e novos métodos de trabalho cinematográfico.

Explorando esta nova tendência, também foi deste ano, o filme

"Barravento" de . Em 63/64, Nelson Pereira dos

Santos realizou uma das mais importantes produções do cinema

brasileiro: "Vidas Secas". Ainda em 62,

conseguiu obter a palma de Cannes para seu filme "O Pagador de

Promessas"; era a consagração do novo cinema brasileiro.

A efervescência desta época, em termos musicais também,

se fez sentir; o lançamento, em 1959, de "Chega de Saudade" de

João Gilberto, marcou o início da Bossa Nova. Numa mescla de

samba e jazz, a Bossa Nova, mais intimista, abriu novas

possibilidades de consumo musical ao vivo. Utilizando pouco

instrumental (um piano ou violão e a própria voz), muitos

shows e apresentações em boates e clubes foram realizadas,

atendendo às demandas dos novos consumidores de extratos

sociais médios urbanos. Na música, os CPCs marcaram presença,

com a atuação marcante de Carlos Lyra e . Um de

seus trabalhos significativos foi a publicação dos "Violões de

Rua", resgatando um rico potencial da música popular. Rodas de

samba e violão foram espaço de contato de uma juventude

ânsiosa por debater a realidade com que se deparavam e que os

wobi1i zava.

Uma ligação intensa entre os jovens intelectuais da época

Podia ser observada no Zicartola, restaurante de Zica, mulher d© , onde se reuniam: Cartola, Zé Keti, Geraldo Neves, 79

Paulinho da Viola, João do Vale, Arnaldo Jabor, Leon Hirszman,

Paulo Sarraceni e outros. Ali se encontrava o pessoal da

música, do cinema novo, do teatro de rua. Uma preocupação os

unia: tornar seus trabalhos mais populares e atuantes

politicamente. Esta movimentação cultural politizada

expressava a crise de valores que se instalara no bojo da

crise política, analisada por Octávio lanni. Jovens buscavam

novos caminhos, apresentando novas propostas, cuja tônica era

uma modernidade, mais popular e nacional. Nesta conjuntura, as

artes plásticas, mais elitistas e de pouco alcance em nível de público, não alcançaram repercussão, ficaram um pouco alheias ao modelo de atuação do intelectual-artista difundido.

Pela ação dos Centros de Cultura Popular.

A partir de 64, os grupos que assumiram o poder redimensionaram a atuação do Estado, dirigindo uma política econômica voltada para o estabelecimento das condições

institucionais capazes de garantir a aceleração da acumulação do capital nesta nova etapa monopolista internacionalizante.

Estabeleceram a central idade dos setores industriais e financeiros na economia, determinando profundas alterações no

Perfil da sociedade brasileira, atingindo também a área artística. Estas transformações internas ocorreram no marco das alterações na posição do Brasil na divisão internacional do trabalho, tratou-se de um processo de grandes mudanças que não se realizou sem lutas. No desenrolar destas lutas, definiram—se novas hegemonias de setores de classe dominantes 80

dentro da sociedade. É necessário compreender a ação dos

intelectuais do setor artístico dentro deste processo. Entre

65 e 69 ocorreram através das práticas artísticas uma série

de denúncias e tentativas de mobilização da sociedade civil

para o questionamento do regime político que se implantava. O

golpe de 64 e seu progressivo autoritarismo desencadeou uma

reação intensa no setor artístico do país, principalmente nos

seus segmentos identificados com projetos de democratização,

gue tentaram desempenhar o papel de foco de resistência ao

modelo autoritário do governo militar.

O ano de 1965 teve como marco a montagem pelo grupo

Opinião em co-produção com o Arena, do show "Liberdade

Liberdade", uma colagem de textos e músicas que iam desde

Jesus Cristo a Brecht passando por Unamuno e Aristóteles, organizada por Millor Fernandes e Flávio Rangel. Bastante mobi1izador, este espetáculo teve seu texto editado pela

Civilização Brasileira e o disco lançado em 66. Na mesma linha de atuação foi montado o show Opinião (1965), com músicas e depoimentos pessoais de Nara Leão, Zé Keti e João do Vale. No rastro do show Opinião foi inaugurada a exposição Opinião 65, com artistas plásticos brasileiros e franceses. Esta mostra foi muito significativa em termos de novos posicionamentos; rompendo com a abstração até então dominante, apontava para uma produção mais compromissada em termos políticos e sociais.

Dentre as inúmeras mobilizações de produtores artísticos 81

identificados com as forças democráticas que ocorreram neste

período, pode-se destacar, em 68, a devolução conjunta do

prêmio "Saci", entregue pelo Jornal do Estado de São Paulo, em

represália a um editorial publicado por este periódico

que apoiava a censura.

Dando continuidade à linha de espetáculos mais

questionadores e mobi1iradores tem-se "Arena conta Zumbi" e

"Arena conta Tiradentes". O musical "Roda Viva" pode ser

considerado o fecho desta linha de produções, tendo os atores

e mesmo o público sido agredidos por grupos de combate aos

comunistas. de Holanda, que se havia engajado em

uma produção mais crítica, sofreu, com este trabalho, uma

série de ações depredadores dos setores de estrema direita. A

música, aliás, vinha se evidenciando como altamente politizada

e questionadora. Desde que Geraldo Vandró explodira nas

paradas de sucesso com "Disparada", a chamada música de

protesto conquistara cada vez maior público. Disputando espaço

com o "ié lé lé", espécie de moda Beatle Nacional, a música de

protesto se firmou nos festivais Record, Tupy, destinados ao

Público universitário. Estes festivais eram, contraditóriamente, ao mesmo tempo, show room para as gravadoras e espaços de participação política para os músicos.

Foi no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record

(Í967) que se lançou a semente da tropicália, com as músicas

Alegria, Alegria" e "Domingo no Parque" de e

Gilberto Gil. Estas músicas não se apresentavam como parte de 82

nenhum movimento articulado, mas destacavam do que vinha sendo

feito em termos da moderna música popular brasileira onde a

nota dominante era a carga de participação político-social. O

movimento tropicalista pode ser compreendido dentro deste

momento em que a repressão e a censura vão progressivamente

fechando os espaços para as produções mais politizadas. A

geléia geral que a Tropicália propõe, responde aos conflitos

desta juventude. O AI 5, em 13 de dezembro de 68, limitou

violentamente as possibilidades de ação política no nível

das práticas artísticas. O vazio cultural que se estabeleceu

então foi ocupado pela indústria cultural que já se vinha

implantando maciçamente no país após o golpe de 64, através da

aliança do grande capital internacional com o capital

nacional. Muitos artistas, daquela época, saíram do país em

exílio voluntário ou forçado; perseguições e censura dificultavam ou impediam a ação dos que ficaram no país.

2.3 - os Anos 70s O Estado Autoritário e a Indústria Cultural

"Q que ocorreu na década de 70 foi quer justamente quando os gigantescos motores do crescimento e da expansão estancaram e o tráfego quase parou, as sociedades modernas perderam abruptamente sua capacidade de banir para longe o passado... eles tiveram que chegar a um acordo com o mundo que tinham e trabalhar 11 a partir dai- Z/

Berman, Marshall. Op. cit. p. 315. 83

Novamente as palavras de Berman ilustram a década. Os

anos 70, em nível mundial, representaram o estabelecimento das

possibilidades de grandes mudanças e o avanço do

neoliberalismo conservador. O capitalismo superou, através de

posições conservadoras, as crises da década anterior. A

América Latina, viveu uma época de golpes militares. No

Brasil, esta era já se inaugurara em 64, e se estabelecera

definiticamente em 69.

Fortemente instalada no poder, a burguesia nacional,

aliada à burguesia internacional procurou durante os anos 70

legitimar o seu domínio, através de um processo de moderniza-

ção que incluiu a introdução de novos modelos de consumo,

difundidos por uma indústria cultural em franca expansão. Esta

indústria cultural, compreendida como a articulação dos diversos meios de comunicação social em um sistema integrado roonopolístico, começou a ser implantada no Brasil sob controle desta burguesia, a partir da segunda metade dos anos

e se consolidou ao longo dos anos 70. Os processos

industriais de formação da opinião pública substituíram os processos artesanais, até então predominantemente utilizados.

Implicavam em uma monopolização altamente articulada ao grande capital internacional. "A primeira empresa de comunicação nos woldes de um oiigopóliaf os Pidrios Associadosf desenvolveu-se

«t par de uma concentração vertical (ocorref por exemplof quando um proprietário, além de um jornal f possui também uma

emissora de rádio ou um canal de televisãof isto éf concentra 84

em suas mãosr mídias diferentes) ou uma concentração

12 horizontal (vários canais de televisãor ou vários jornais.)" ,

A articulação mais definitiva de indústria cultural no país se

deu a partir da atuação do Estado, depois do golpe de 64,

quando se instaurou a segunda fase da TV brasileira. O acordo

Globo-Time Life Brodcasting Stations (1965) é o exemplo mais

ilustrativo desta associação de interesses, que modifica o

panorama cultural no Brasil.

O desenvolvimento de toda uma ampla produção destinada à indústria cultural, seja para a TV, gravadoras, rádios, editoras, etc., introduziu para o setor artístico nova problemática. Se inaugurou, por exemplo, uma nova relação com

0 público, mais massificada, rompendo com a tradição bastante intimista das práticas artísticas no Brasil. Tradição esta que tinha muito mais a ver com o restrito número do público consumidor do que com intenção dos produtores e difusores.

Esta relação colocava novas opções e alternativas que

■alteravam profundamente a própria essência dos objetos artísticos, suas configurações. Se alteram também os processos artesanais de produção e difusão, se incorporaram toda uma série de equipamentos e métodos de trabalho mais atualizadas e compatíveis com as exigências do grande público. Formas industrializadas, divisão de trabalho, instrumentos sofisticados e tecnologia especializada, na maioria das vezes

12 Caparei li, Sérgio. Televisão e Capitalismo no Brasil. Porto Alegre, LPM, 1982, p. 30. 85

importantes, passaram a dominar o panorama artístico. A

indústria cultural absorveu a maioria das produções, deixando

às atividades marginais, um espaço de circulação muito

restrito.

A indústria cultural, por outro lado, incorporou grande

Parte das produções artísticas disponíveis na sociedade e criou outras destinadas ao seu consumo próprio, como foi o caso da telenovela. As novelas absorveram nomes importantes e até mesmo dos mais politizados da dramaturgia, como foi o caso de e José Wilker, o primeiro oriundo do Arena e o segundo do MCP de Recife. 0 próprio Vianinha, um dos criadores do CPC da UNE, a partir de 73, escreve para a

Rede Globo a divertida série "A Grande Família", muito bem aceita na época. Escreveu, ainda, alguns casos especiais, baseados em clássicos, como Medéia, Dama das Camélias e

Mirando!ina. Muitos músicos populares também passaram a integrar os shows da TV, como foi o caso de ,

Rita Lee, , todos eles abrangendo um largo espectro de tendências musicais. Alguns viam isto, na época, como um recuo nas posições críticas dos artistas; a verdade, aPorém, é que de alguma forma esta atuação contribuiu para que a TV brasileira atingisse, em sua programação, níveis de gualidade em sua maioria invejáveis dentro do panorama internacional. Isto, com todas as críticas que possam ser

*eitas, e com todos os limites impostos, de certa forma atingiu o universo simbólico de um número de brasileiros que o 86 teatro e os shows, em escala artesanal, dos anos 60 não haviam sequer imaginado.

£ interessante observar que, no Brasil, diferentemente do caso francês, analisado por Pierre Bourdieu, não se encontra um campo erudito tão separado e antagônico ao campo da indústria cultural. Isto porque já, na sua origem muitos artistas atuaram nos dois campos como atores, escritores ou mesmo produtores plásticos, tornando muitas vezes, o limite entre estes dois campos difuso e ambíguo. Este fenômeno pode ser decorrente da fragilidade do próprio campo artístico no

Brasil, que esteve sempre mais ligado a modelos externos, sem que se desenvolvesse uma relação estreita com as condições locais13. A elite brasileira, bastante restrita em termos numéricos, também mantém—se mais ligada aos movimentos internacionais do que á realidade que a cerca. De certa forma, a indústria cultural veio oferecer um substrato comum

ás classes médias urbanas e às elites. A arte erudita, para ser reconhecida a sua distinção, servindo às legitimações das elites, precisa fomentar este relacionamento ambíguo com a indústria cultural, uma vez que é aquela que atinge o grande público e serve de sustentação ideológica ao poder estabelecido. Assim, ópera e balet clássico foram apresentados na TV, sem dispertar interesse do grande público, mas

13 Uma análise intepretativa desta relação do campo erudito com a indústria cultural no Brasil pode ser encontrada em Grtiz, Renato, na obra A Maderna Tradiç&a Brasileira. São Paulo, Brasiliense, 1988. 87 referendando o gosto das camadas intelectualizadas.

Ocorre com a intelectualidade mais vinculada a processos de democratização uma problemática que Renato Ortiz analisa com muita precisão o eixo do debete permanece ainda a queBtdío do nacional f sendo que a ela se agrega agoraf no final dos anos 60, uma nova dimensão: a luta contra o autoritarismo.

£ bem possível que este dado específico da vida política brasileira tenha em parte contribuído para que os intelectuais não percebessem com clareza a consolidação de mercado que se

realizava sob seus pés**. Na sua opinião, a questão específica da luta contra o Estado autoritário "desviou" a atenção dos intelectuais do fenômeno dominante no campo culturais a consolidação de um mercado de bens culturais- Consolidação esta que ocorreu no Brasil nos anos 70, atingindo praticamente todas as práticas artísticas e estabelecendo profundas modificações na maneira como elas vinham se desenvolvendo até então. A profissionalização foi uma das transformações mais determinantes, isto porque na sociedade brasileira a atividade artística teve quase sempre um caráter um tanto quanto amador, inclusive pelo número restrito de público consumidor• Os artistas, em geral, desempenhavam, paralelamente á arte, outras atividades de onde provinha sua subsistência.

Nesta década se solidificou o papel do empresário

14 Ortiz, Renato. A Moderna Tradição Brasileira. São Paulo, Brasiliense, 1988. p. 13- 88

artístico, verdadeiro executivo da cultura, cuja ação

possibilitou a edição de livros, revistas e mesmo gravuras, a

apresentação de grandes shows com cantores da música popular,

a produção de discos e filmes. A própria TV, por seu turno,

assumiu os artistas de forma profissional, obrigando atores,

diretores e autores a jornadas exaustivas e sistemáticas. O

trabalho de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni da

Rede Globo, é um exemplo deste tipo de empresário das práticas

artísticas que, neste momento, influenciou decisivamente o

panorama cultural.

Ocorreu assim a profissionalização do que Howard Becker

denomina "pessoal de apoio", estruturando—se as cadeias de

atividades que caracterizam as ações artísticas na sociedade de consumo. Em termos de música e teatro, por exemplo, aparecem as empresas de produção de espetáculos, estruturadas de maneira a fazer, destas artes, atividades lucrativas. Todo um sistema de editoração passa a coordenar o setor da

literatura, definindo inclusive os rumos da produção. Todas estas empresas, estruturadas nos mais modernos métodos administrativos, criam novas condições de difusão das artes, caracterizadas pelos estreitos laços com os meios de comunicação de massas.

O número de editoras criadas na década de 70 é surpreendente e assustador. A Editora Abril Cultural foi o maior exemplo de grande potencial empresarial no ramo, lançan- 89

do revistas destinadas ao grande público (Revista Veja) e

também as mais sofisticadas, como Artes nos Séculos e

Enciclopédia. Ela introduziu os fascículos, como uma nova

maneira de leitura especializada.

O número e o porte das gravadoras também introduzem,

nesta década, novos padrões de qualidade na indústria

fonográfica, resultado das alianças com o grande capital

internacional que introduz uma aparelhagem importada,

sofisticada. Músicos populares são integrados neste sistema

ideológico/industrial. Em 1971, por exemplo, Chico Buarque de

Holanda lança o disco "Construção" assumindo, por um lado, sua

participação na indústria cultural e, por outro, o compromisso em manter sua posição crítica e suas bandeiras de luta. A

integração de muitos nomes da década de 60 com estrelas dos anos 70, como Chico Buarque, Gil, Caetano, Betânia e outros, se deu paralelamente ao lançamento de muitos discos produzidos nos EUA. Também foram lançados cantores com falsos nomes, cantando e compondo em inglês, como, por exemplo, Christian. A

Indústria fonográfica alimentou-se também do rock brasileiro de , Mutantes e Fagner. Esta variedade de produtos expressava a realidade do mercado de um país com grandes diferenças culturais, regionais e sociais.

O outro lado desta expansão da indústria cultural foi a atuação da censura sobre as produções culturais, principal- mente aquelas dedicadas ao grande público. A censura, nesta 90

década, foi o maior inimigo da produção artística, pelo menos

de uma produção mais crítica e politizada. Em 72, por exemplo,

em apenas quatro meses, 170 músicas foram proibidas.

Espetáculos como Calabar (música de Chico Buarque) foi

censurado depois de meses de preparo e ensaios, às vésperas de

sua entrada em cartaz. Isto, quando não ocorria a censura

depois do produto ser apresentado ao público, como foi o caso

dos exemplares do Pasquim apreendidos já nas bancas. A censura

atuava tão intensamente e de maneira tão arbitrária, proibindo

autores clássicos como Sófocles, que os produtores artísticos desenvolveram verdadeiras paranóias e a censura prévia (auto—

—censura) funcionava com virulência talvez maior que a censura oficial.

Nesta década ainda, jornais, rádios, revistas e redes de televisão tornam-se elementos fundamentais na difusão das práticas artísticas. Com isto, não se quer dizer que desapareceram ou diminuíram de significado os espaços tradicionais de cada arte (a galeria, o teatro, o cinema ...).

0 que ocorreu foi que a própria programação destas passou a ser divulgada pelos meios de comunicação de massa, estabele— cendo-se uma série de dependências. Foram os meios de comunicação de massa que permitiram às artes eruditas, produções específicas da elite, chegar ao reconhecimento do grande público (ainda que não o seu consumo) cumprindo seu papel de elemento de distinção. Distinção que procuram alcançar também os setores médios urbanos, beneficiados com o 91

modelo concentrador de renda, através de uma participação,

mesmo que às vezes periférica, no consumo artístico.

Estabeleceu-se, assim, dentro das práticas artísticas, uma

série de produções diferenciadas, destinadas a atender a estes

vários públicos, de diversas origens sociais. Esta

proliferação de diferentes tendências ao mesmo tempo,

estabeleceu dificuldades na classificação e valorização das

práticas artísticas, exigindo instâncias de legitimação

antagônicas ou mesmo superpostas. Alguns exemplos podem ser

observados na especialização que as rádios desenvolveram em

relação a tipos particulares de músicas, ou também nos cinemas

de arte que proliferam em oposição aos circuitos mais

comerciais.

A sociedade de consumo, interferiu na área cultural

também com a constante imposição de renovação na produção; o

novo passou a ser o valor básico. Numa sociedade como a

brasileira, em que estruturas arcaicas convivem ao lado de grandes metrópoles e regiões de moderna industrialização, as

práticas artísticas evidenciavam esta contradição. O novo, constantemente perseguido, convive com o tradicional. Não possuindo o lastro de uma arte de elite reconhecida, como por exemplo o renascimento ou o barroco na Europa, a elite brasileira tem que apresentar o novo, absorvido do âmbito internacional, como valor máximo. A questão do nacional permanece não resolvida, reaparecendo ocasionalmente nas produções regionais e sendo utilizada, por vezes, como forma 92

também de legitimação do Estado. O Estado autoritário, que se

implantou pós 64, precisou de elementos para sua legitimação

ideológica. As práticas artísticas sofreram assim influências das oscilações das políticas culturais, estatais, que expressaram as variações das frações que controlavam o Estado.

Entender esta variação de valores artísticos exige que se entenda os conflitos das frações sociais no interior do

Estado. Os setores empresariais, grandes proprietários e altos executivos de empresas estatais ou internacionais associadas

às nacionais, foram, justamente com os setores financeiros e agro—exportadores, os grandes beneficiários do novo modelo-

Seus interesses, no entanto, não eram homogêneos; coube ao

Estado harmonizá-los, inclusive no campo dos valores e interesses artí sticos.

Cumpre ainda destacar, nesta década, integrando este quadro da produção artística, o papel da chamada produção alternativa. Surgindo como reação ao fechamento político, esta geração de artistas encontrou na arte postal, nos jornais nanicos, em produções comunitárias, um espaço mais autônomo de atuação. G primeiro jornal "nanico" foi lançado em 1969, O

Pasquim; a ele seguiram, l/ersus. Beijo, Flor do Mal e muitos outros. O Pasquim foi de todos estes, o único a ter tiragens nacionais e uma vida mais duradoura. A arte postal teve sua primeira mostra em Fortaleza (1970); daí para frente, muitas outras atividades se seguiram, com a atuação de Pedro Lyra e muitos outros poetas. O grupo Nuvem Cigana cumpriu um 93 importante papel na organização e divulgação destes poetas. O teatro também esteve presente na produção alternativa, com grupos que formaram verdadeiras comunidades, atuando na linha de teatro de invenção: dentre estes, destacou-se tfsdrúbal

Trouxe o Trombone. Esta efervescência dos alternativos correspondeu também a uma tendência internacional que expressava o avanço do conservadorismo, limitando a participação social dos artistas, resultando produção hermética e restrita a um público iniciado. No entanto, a criatividade aí desenvolvida, alimentou uma geração e apontou novos valores que, se destacando, «foram absorvidos pelos circuitos mais tradicionais na década seguinte. Foi o caso de

Wally Salomão, Cildo Meireles, e outros, num processo que abrangeu diferentes práticas artísticas a partir da segunda metade da década de 70. O grande limite que se colocou para este tipo de produção alternativa foi o fortalecimento das instâncias de difusão em todos os setores artísticos. Assim, quando não foram absorvidos pelos sistemas de difusão instituídos que realmente podiam alcançar o público, se mantiveram à margem de uma atuação social mais ampla. 3-0 SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NO BRASIL

"A sociedade sempre paga a si mesma com a falsa moeda de seu sonho~ O que quer dizer que neste jogo é preciso fazer o jogo: os que iludem são iludidos e iludem muito melhor quanto mais iludidos forem; ele são muito mais mistificadores quando são mais mistifiçados. Para jogar este jogo, é preciso acreditar na ideologia da criação". Pierre Bourdieu

No capítulo anterior foram abordados aspectos relativos

às artes no Brasil, nas décadas de 60 e 70, com objetivo de identificar de forma geral, o panorama em que se inserem as artes plásticas, sem, no entanto, aprofundar a análise desta produção, o que será realizado detalhadamente nos capítulos quatro e cinco- Antes, porém, de passar à análise das artes plásticas no referido período, faz-se necessário tratar, dentro de uma perspectiva histórica, de algumas questões chaves: a articulação do sistema das artes plásticas no Brasil em nível internacional, sua lógica de distinção social, suas relações com o Estado e suas articulações com a questão popular - 95

Primeiramente, deve-ee observar que, no Brasil, o sistema das artes plásticas foi implantado em 1816, com a chegada da missão Francesa e a criação da Academia Real de Belas Artes.

Até então, toda a atividade de artes plásticas estivera restrita aos trabalhos religiosos, sem construir um sistema com um mínimo de autonomia. A criação da Academia Real de

Belas Artes, com um corpo de profissionais especializados, determinando padrões de produção e consumo, implementou gran- des mudanças no panorama da produção artísticas. O sistema das artes plásticas que se estabeleceu neste momento, foi bastante duradouro, chegando mesmo a se realizar, regularmente, um

Salão Nacional de Belas Artes, patrocinado pelo governo federal, até 1977.

A primeira grande alteração neste sistema se deu com a introdução do modernismo, pioneiramente em 1922, e com uma penetração lenta e progressiva, apesar de fortes oposições, até o final da década de 40. Com o modernismo, se implantou uma nova orientação no sistema das artes plásticas. A corrente moderna utilizou algumas das instituições tradicionais do sistema acadêmico, como por exemplo a Escola Nacional de Belas

Artes e o Salão Nacional de Belas Artes, alterando as composições de força dentro deles, o que possibilitou a aceitação de novos padrões e a imposição de novas formas de atuação. A corrente moderna promoveu também a criação de novas instituições, como os Museus de Arte Moderna de São Paulo

(1948), voltado á defesa do projeto modernista. No entanto, as 96

inovações do modernismo foram muito mais no sentindo de

modernizar as velhas instituções do que no de criar novas1-

A segunda reatua1ização significativa do sistema ocorreu

no início da década de 50, com a criação da Bienal

Internacional de São Paulo- Precursora em seu tempo, a Bienal

deu início a uma série de modernizações que se foram

implantando progressivamente ao longo das década de 50 e 60- O

sentido maior desta reatualização foi a articulação com as

tendências abstracionistas predominantes nos EUA pós 45- Isto, no entanto, não ocorreu sem disputas, uma vez que o modernismo dos anos 40 apresentava uma proposta básica, voltada para as questões nacionais populares (embora em termos formais utilizasse os modelos do cubismo e expressionismo europeus), enquanto a modernização deflagrada pela Bienal era de cunho mais internacionalista em termos de linguagem, com predomínio da abstração- A importância da Bienal Internacional de São

Paulo pode ser constatada nas palavras de Marta Traba-

"Pesde 1951, a Bienal de São Paulo, convocada a nível internacional, converteu-se na mais forte competidora da Bienal de Veneza. Por um lado, os artistas locais sentiram-se fortemente estimulados} por outro, viram—se obrigados a entrar na estética da destruição- A

1 Amplos dados sobre estas mudanças podem ser encontrados em Maria Amélia Bulhões Garcia- O significado da atuação social dos artistas plásticos Gswaldo Teixera e Cândido Portinari durante o Estado Novo- Dissertação de Mestrado PUC/RS. 1983- 97

Bienalf além disso, forçou um estilo destinado a chamar a atenção dentro de conjuntos quilométricos, determinado pelo terror ao desaparecimento físico, e as premiações, como ocorreu também na Bienal de Veneza, começaram a manejar-se entre pequenos cendculos, obrigações contraídas de antemão, composições, concil iações. Final/nente, a Bienal foi o primeiro e principal veículo de internacionalização da arte no continente, jã que determinou a extinção das identidades e deslocou os valores artísticos da expressão até 2 a compulsão" .

Como resultado desta penetração de tendências

internacionais, via Bienal, e outros mecanismos, como

revistas, livros e mesmo exposições internacionais, pode-se observar que no início da década de 60, a maior parte da

produção na área das artes plásticas brasileiras era

"totalmente abstrata, abstrata com certas formas ou figurativa

tímida". Esta observação que Marta Traba faz a respeito das artes plásticas 1atino—americanas em geral se aplica com 3 adequação à produção brasileira -

Pode—se perceber, nas mudanças dos anos 60 e 70, uma progressiva articulação com o sistema das artes norte-americano. A integração da América Latina, sob

2 TRABA, Marta. - Duas décadas vulneráveis nas artes plásticas Latino-Americanas 1950/1970. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 3 1977. p. 131. 0p. cit., p. 57. 98

a hegemonia dos EUA em termos políticos, que caracterizou o

pós segunda guerra, teve também nas artes plásticas um ponto de apoio. Assim, o sistema das artes brasileiro, que sempre foi sub sistema de um sistema mais amplo, internacional

(primeiramente com um pólo hegemônico em Paris), foi se ordenando, a partir da década de 50, como uma extensão 4 bastante articulada do sistema norte-americano .

O texto de Ronald Brito sobre uma exposição realizada no

MAM/RJ em 1973 revela bem a visão colonizadora da plástica norte-americana. As alterações que se estabeleceram na produção artística por suas ligações com as diretrizes norte—americanas, e também as alterações do sistema das artes, no sentido de incorporar e se adequar a estas novas produções, no entanto, se fizeram, sem rupturas profundas que desestruturassem o sistema ou que construíssem outro totalmente independente do anterior. Assim, o que se pode perceber é uma modernização conservadora, que, aliás, é o modelo geral dos projetos de modernização, das elites no pais.

Modernização que possibilitou ao sistema das artes acompanhar

4 O processo de integração, em termos das artes plásticas da América Latina ao EUA, foi muito bem estudado por Orlando Suarez, op. cit. "La jaula invisible" 1986. 5 Opinião 20 de junho de 1973 n- 137, p- 23. "A colonização pelas coros" Ronaldo Brito com uma grande maioria de artistas norte-maricanos ou ali radicados e um ou outro europeu, ela se apresenta de modo causai, como uma visão universal da questão da cor na arte contemporanéa. A própria colocação ampla do tema - "A cor como linguagem" — implica essa universalidade. Trata—se evidentemente de uma exposição nacionalista... pretende estabelecer um "fato": a predominância da arte americana no panorama mundial nos últimos 25 anos". 99

o desenvolvimento do capitalismo internacional, mas com o conservadorismo suficiente para garantir a permanência dos privilégios tradicionais.

Este conservadorismo tem suas origens no caráter elitista do sistema das artes plásticas e em sua tradicional articulação com os setores de classe dominante no poder-Isto porque o Estado Brasileiro teve tradicionalmente, em relação

às artes plásticas um papel de mecenas. Um mecenato que se dava inicialmente de maneira direta, como no caso de Portinari durante o Estado Novo- Ao longo dos anos 60 e 70, a atuação do Estado passou a ser gerido por um conjunto de instâncias especializadas, podendo ser caracterizada como progressivamente ampliada e estruturada.

Existiam, já no início dos anos 60, algumas participações tradicionais do Estado nos artes plásticas, como a do

Ministério das Relações Exteriores. O Itamarati era responsável pela seleção e envio das representações brasileiras nas Bienais de Veneza, Paris ou Tóquio, e também pela realização de outras grandes exposições de divulgação do

Brasil no exterior. Para organizar estes envios, não havia dentro do Ministério uma estrutura especializada. O Conselho de Cultura convidava, em geral, um crítico ou diretor de instituições, de reconhecidos méritos dentro do sistema,para fazer a seleção através de indicações. Pode-se dizer, portanto, que o Itamarati não pensava dentro do Sistema como 100 um elemento legitimador em si, mas que referendava com a escolha do crítico as legitimações já estabelecidas- E, estas escolhas envolviam todos aspectos de relações de amizade

(capital social) com bem se evidencia nas declarações de

Rietro Maria Bardi ao jornal artes: "Parque o Sr - aceitou o convite da Itamarati para fazer parte da comissão que escolheu a delegação brasileira á Bienal de Veneza7 P* M. - Bardi em atenção ao pedida de um amigo o qual não jogarei no fogo, Mas depois me retirei da comissão quando resolveram, com um estalo excluir o Agnaldo da nossa representação"*5.

Havia, por outro lado, auxílio através de verbas des- tinadas a instituições atuantes na área das artes plásticas, como por exemplo o tradicional apoio das instâncias governamentais, nos níveis federal, estadual e municipal à

Bienal Internacional de São Paulo- Também o Estado sustentava os museus públicos, como o Museu Nacional de Belas Artes do

Rio de Janeiro e o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo; o primeiro ligado ao governo federal e o segundo ao governo do Estado de São Paulo- O Estado apoiava ainda instituições particulares, que praticamente viviam às suas expensas ou, pelo menos, contava com este apoio para sua sobrevivência. Era o caso do Museu de Arte Moderna do Rio de

Janeiro e do Museu de Arte de São Paulo- Ambos receberam, por doação do estado, os terrenos onde construiram suas novas sedes, e verbas para estas construções-

** Artes: São Paulo março/abril, 1966 ano 1 n- 5, p. 8, "Bardi, o veneziano"- 101

Além destas despesas com instituições, o Estado apoiava diretamente os artistas com o tradicional prêmio de viagem ao estrangeiro do Salão Nacional de Belas Artes. Outros salões

foram ainda criados, principalmente na segunda metade dos anos

60, com verbas estatais para sua organização ou premiação.

Estas vinham diretamente de órgãos governamentais, ou de empresas estatais. Algumas importantes contribuições foram para os Salões Jovem Arte Contemporânea do MAC/USP, para o

Salão Municipal de Campinas, para o Panorama de Arte

Brasileira do MAM/SP, além do já tradicional apoio financeiro

à Bienal Internacional de São Paulo. Exemplos típicos de empresas estatais que apoiaram as artes plásticas foram a

Caixa Econômica Federal e o Banco da Bahia. O Ministério dos

Transportes subvencionou ainda neste período, o Salão dos

Transportes. O Estado desempenha em relação às artes plásticas, este tipo de ação mediadora, integrando-se ao sistema através das instituições que mantinha ou apoiava.

Por outro lado o Estado desempenhou ainda um importante papel no estabelecimento de limites para o questionamento e a mobilização dentro do sistema das artes através do exercício da censura. Este mecanismo foi muito mais decisivo entre

1969-73 momento máis intenso de repressão no país. Até então a censura, que atuava em relação às artes plásticas, era incipiente, mesmo porque neste setor artístico, tradicionalmente ligado às elites, eram pouco evidentes avanços que exigissem uma atuação censurante do Estado. Os 102

limites se impunham pelo próprio sistema. As disputas sociais

que mobilizavam o sistema das artes, diziam respeito à

disputas de poder entre setores de classe dominante e à

tentativas de ampliação de participação no consumo de bens culturais de setores médios, sem praticamente nenhuma vinculação com setores populares em geral. Assim, as lutas por democratização do sistema (como ocorreram ao longo dos anos

60) encontraram resistências internas, no prórpio sistema das artes plásticas, e externas, decorrentes das condições de participação social no país.

Entre as diversas práticas artísticas, as artes plásticas são as que mais nitidamente têm preservado o distanciamento em relação ao grande público e à distinção entre arte erudita e arte popular. Uma primeira tentativa de ruptura com estes comportamentos anunciou—se dentro do Modernismo. Neste movimen to, o que ocorreu foi, preponderantemente, a absorção, por parte da arte erudita, de elementos de uma tradição plástica popular. Isto pode ser constatado na forma como temas e signos do imaginário popular aparecem nos trabalhos dos artistas modernistas sob uma roupagem que os dilui no interior de um tratamento formal, fortemente embasado nas correntes estilísticas da modernidade européia.

A questão do popular reaparece novamente nas artes plásticas nos anos 60; neste momento, com o novo enfoque das propostas de participação. Não se pode dizer que estas 103

propostas sejam de participação efetivamente popular, mas elas

trazem à tona, ao buscar uma abertura maior do sistema, a

problemática do popular ou, pelo menos, se integram a um

quadro de mobilização de setores sociais mais amplos. Esta

participação que se fomenta nas artes plásticas, basicamente

na segunda metade dos anos 60, se dá em dois níveis. O

primeiro, na participação do espectador na obra, que tem seus marcos iniciais com os trabalhos de Lygia Clark e Hélio

Oiticica ainda no neoconcretismo. Os "Bichos" de Lygia, por exemplo eram figuras bastante geometrizadas, realizadas em chapas metálicas com dobradiças que possibilitavam ao espectador alterar suas formas através da manipulação. Outro

tipo de trabalho que se incrementou, foram os ambientes em que o espectador penetrava e assim fazia, de certa forma, parte da própria obra, cuja existência só se realizava com a sua participação. Um exemplo disto foram os "Penetráveis" de Hélio

Oiticica. A idéia de que o artista não completa o trabalho, lança o de que o espectador é que o realiza, como afirma Lygia

Clark: "Oual éf então o papel do artista? Dar ao participante o objeto que .em si mesmo não tem importânciaf e só virá. a ter na medida em que o participante agir. £ como o ovo que só 7 revela sua substância quando o abrimos" 1965 Lygia Clark .

Num segundo nível, aparece ainda, a questão da participação agora no sentido de ampliação desta a segmentos

7 Clark, Lygia. - Arte Brasileira Contenporânea -RJ, FUNARTE - 1979, p. 27. sociais, tradicionalmente alheios ao sistema das artes. Isto

se deu através de mostras realizadas em espaços não

"consagrados'1 como feiras e espaços outros da cidade

(passarelas e avenidas), ou ainda, o "Supermercado de artes"

que Jacson Ribeiro inaugurou, na Zona norte da cidade do Rio

de Janeiro, fora dos espaços tradicionais e elitistas. Também

nesta linha, se colocaram as gravuras produzidas em

quantidades e variedades pelo Atelier do MAli/RJ, com a

intenção básica de ampliar o consumo de bens culturais, por

parte de setores sociais, para os quais o preço das obras

únicas cons titulam forte restrição ao consumo. "Premiada em

exposições nacionais e internacionaisf aclamadaf analisada e

ds icut ida como o gênero mais representativo da arte

brasileira, a gravura atingiu, nos anos óOf a um apogeu jamais

alcançado por nenhuma outra manifestação artística em nosso

pa is .

No entanto, estes projetos esboçados, nos anos 60,

rapidamente foram estancados e o que se pode perceber, ao

longo dos anos 70, é a retomada do caráter elitista,

distintivo e emblemático que o sistema das artes plásticas

propicia. Isto se se manifesta mesmo na vanguarda com sua

linguagem hermética e circuitos restritos. O que, no entanto,

não significa a inexistência de reações e lutas contra o

elitismo do sistema da arte. Estas podem ser detectadas em

0 Vida das Artes ano 1 n- 2 julho 72. Geraldo Edson de Andrade - "Gravura brasileira existe a crise?", p. 23. 105

muitos experimentos da chamada produção marginal que se

dissemina ao longo dos anos 70, quase que paralelamente ao

desenvolvimento do sistema das artes, ao qual fazem oposição.

Esta produção marginal, utiliza novos meios como a fotocópia

ou videoP, mas muitas vezes acabavam incorporados ao sistema

que questionavam. Pode-se também identificar, como luta contra

o elitismo, as tentativas de romper com a hegemonia dos

centros nacionais, mais integrados com as linguagens

intenacionais, através de regionalismos que se sustentam sobre

uma criatividade e uma tradição popular local. Nestes casos,

estão os trabalhos de Humberto Espíndola e seu grupo no Mato

Grosso, que teve, em Aline Figueiredo, um suporte teórico e

crítico muito importante. Também nesta linha estão as atuações

de Siron Franco, em Goiás, e do grupo da Paraíba. No entanto,

a questão do popular permanece não resolvida nas artes

plásticas brasileiras ao longo do período em estudo. Ao mesmo

tempo em que, em outras áreas das práticas artísticas como o cinema, a música, o teatro, se diluiam progressivamente a distinção entre o popular do erudito, através da integração

aos meios de comunicação massivos, as artes plásticas

preservam seu elitismo e restrito espaço de atuação.

O caráter eminentemente individual das formas de

trabalho nas artes plásticas tem preservado a idéia do artista

^ A este respeito consultar PECININI, Daysi — Arte Novos Meios Multimeios. São Paulo, FAAP, 1985. 106

como criador único, afastando-o de uma participação social

mais ampla- Isto dilui a força de suas tentativas de

intervenção junto a setores mais diversificados da sociedade.

Se, comparada com outras práticas artísticas, como o teatro ou mesmo a música, as artes plásticas são as que têm mantido mais

permanentemente as formas de trabalho individualizado, o sistema das artes plásticas reforça a figura única e especial do "artista" como um dos elementos básicos de sua dinâmica-

Isto pode ser constatado pela maneira como o nome dos artistas se destaca dentro de todas as atividades do sistema.

Através dos catálagos consultados e das referências a exposições em jornais e revistas, pode—se afirmar a total preponderância de mostras individuais sobre coletivas. Com as raras exceções do período natalino, quando então proliferam as coletivas e as mostras de acervo, de caráter comercial bastante evidente. O mesmo se verifica nos livros de artes plásticas. Em sua grande maioria se dedicam a artistas individuais, com textos laudativos e farto material visual, uma espécie de folhetos publicitários; assim também, são os catálogos de exposições. Os livros mais amplos incluem diversos artistas, mas mantém a mesma orientação. "A razõ.o disto é simples: quase sempre é o próprio mercado o responsá- vel pelas poucas iniciativas teóricas que ocorrem na arte brasileira. Praticamente desligada das outas áreas culturaisr a arte gira em torno do mercado e sua produçáo textual está em

10 geral comprometida com funções mercadológicas imediatas" m

10 Brito, Ronaldo. "Análise do Circuito", Halasarte n- 1 Setembro/outubro/ novembro, 75, Rio de Janeiro. 107

O nome do artista e seu trabalho ilustrativo formam a maior

parte de nossa história da arte- Para sustentar estas

afirmações, pode-se apontar alguns pequenos extratos destas

publicações:

"O esforço de GREGORIO é impressionante, EI& trabalhou dezenas de gravuras e desenhos numa procura de imagens e de colocar em discussão o verdadeiro objeto das artes visuais. Os trabalhos sucedem—se e o jovem apresenta como idéias e respostas aos problemas de nossa ópoca apenas o seu trabalho, Na verdade ele age como um verdadeiro artista* fala pouco e pinta muito", Jaccob Klintawtz, 1978.

"Mestre inconfundível da gravura e do desenho, senhor de cavalheiros e armaduras, animais e diabos, representante brasileiro da nobre linhagem do fantástico, MARCELO GRASSMANN tem conservado sou relato a sua presença entre nós comparecendo publicamente com desenhos e gravuras que se encontram sempre entre o que de melhor se produz no Brasil" Jacob Klintowtz, 1978".

"M3o resta dúvida, contudo, de que Krajcberg é um grande artista. E, como tal consegue aliar de maneira indissolúvel o propósito de seu trabalho aos meios que o sustentem, t/tiliza-se

11 Klintowtz, Jacob — Versus* iO anos de críticas de arte. São Paulo, Spade, 1978- Os nomes dos artistas vêm grifados no original. Neste texto se evidencia com bastante clareza o funcionamento do sistema das artes plásticas, o papel do crítico e dos salões bem como a hegemonia do Rio de Janeiro- 108

dos elementos naturais c/a mesma forma como o poeta das palavras* E da mesma maneira como na poesia, traz á luz expressões já e>;istentes, porém não percebidas. Serve como mensageiro de uma linguagem cifrada que lhe ditam o mar sobre a areia, o vento sobre as árvores, os troncos dentro da terra, revelando uma natureza apenas pressentida dentro dos cânones estéticos aos quais estamos habituados" Sheila Leirner, 1977.

"Felizmente, é verdade que desde o início a crítica brasileira soube ver com atenção a desenvoltura e a liberdade com que Maia se movia em seus estreito campo de escolha. Seu primeiro exegeta foi, provavelmente Clarival Vailadares, que o 'descobriu' num salão de Belo Horizonte, premiou-o e o convidou para expor individualmente na Galeria Goeldi, no Rio, em 19á4" Olivio Tavares de Araújo, Visão da Terra.

"Há uma sadia afobação nessa nova fase de Antonio Henrique do Amaral. Ele mistura tudo: formas objetivas da fase anterior com as formas criadas ao sabor da improvisação atual, o espaço real de antes com o espaço imaginário de agora, recursos da linguagem imitativas (sombras, sugestões de volumes) com as cores abstratas nascidas da fantasia" Ferraira Gullar 197712.

Aparece, neste último texto, uma outra tendência

42 Pontual, Roberto. - Vistes da Terra. Rio de Janeiro, Jornal do Brasil, 1977. 109

específica das artes plásticas: a mitificação do "artista

livre". Enquanto nas demais artes, devido às formas de

trabalho mais coletivas, relações mais estreitas com a

indústria cultural e maior dependência do grande público para

sua sobrevivência, o artista se dá conta,mais faci1mente,de

suas condições de dependência da realidade social e do caráter

coletivo de suas atividades. Nas artes plásticas, isto não

ocorre, o artista é iludido pela própria ilusão que cria da

genialidade individual de seu trabalho, único e pessoal, como

tendo um valor em si, não percebendo os vínculos sociais que

determinam este valor, o que facilita a manipulação da

produção por parte dos difusores.

Destinada, por suas próprias condições de produção e

consumo (produção de um artista para um número restrito de

espectadores, a um número reduzido de indivíduos), as artes

plásticas têm se prestado com bastante eficiência a servir de elemento de distinção das elites. Utilizada para demonstrações de status, têm estado fechadas em ricas e luxuosas residências, nas sedes de grandes empresas e em salas de chefias da administração estatal. Mesmo quando em museus abertos ao público, as obras de arte têm um número reduzido de espectadores. O grande público não tem formação nem estímulos publicitários pra este tipo de consumo cultural. A Bienal de

São Paulo, que usufrui de largos espaços nos meios de comunicação de massa, é ainda, o espaço de difusão das artes plásticas que conta com maior fluxo de público. Símbolo de bom no

gosto e requinte, as artes plásticas contam com pouco espaço

para questionamentos. Ou, pelo contrário, muito espaço interno

da obra (o que reforça o mito do artista livre), mas um

restrito alcance social neste questionamento, que não atinge o

grande público. Alguns exemplos de obras com intensa carga

crítica podem ser encontrados dentro do sistema das artes

plásticas. Elas foram expostas, figuram em catálogos e livros,

mas sua ação social fica restrita e o próprio elitismo do

sistema e de seus meios de difusão. Como afirma Ronaldo Brito

"E fácil compreender quef a prioridade, o circuito não tem

nada contra nenhum trabalho - na medida em que pode inclusive

recupera-lo. Recuperar um trabalho é precisamente vender e estabilizar uma leitura "recuparada" de em princípio, o circuito está pronto a abrigar toda e qualquer obra que julgue não afetar a sua condição de sistema autônomo e inatacável .

Nos chamados centros adiantados, ele vive em busca de novas experiências - o nosso, como vimos, está preso ainda aos velhos esquemas - que servem para mante-lo como espetáculo atraente, mas basicamente luta pela mesma coisa: a indevassab11 idade o caráter quase iniciático de que se reveste o aprendizado da leitura de arte, a distinção e a segurança 13 social advindos da sua freqüência

Articulado a seu circuito restrito, o caráter de emblema de distinção das artes plásticas é constantemente reforçado.

Isto pode ser observado, por exemplo, no fato de que o MASP,

19 Malasartes. n- 1 setembtro/outubro/novembro 1975, Rio de Janeiro. "Análise do Circuito", Ronaldo Brito. 111

Museu de Arte de São Paulo, contou com a presença da Rainha da

Inglaterra na cerimônia de sua inauguração (Foto anexa), o que

foi amplamente divulgado ao grande público através dos meios

de comunicação de massa. Esta tendência a utilizar as artes

plásticas como um símbolo de hierarquia distinção social e é

reforçado nas revistas especializadas como se pode ver nos

seguintes: anúncio publicitário.

"Quem presenteia com arte é visto com bons olhas, d Rainha Elizabetb veio ao Brasil e levou um quadro de Graubem. Quando o Príncipe

Herdeiro do Japcío esteve aquif o presente do governo brasileiro foi uma tela de Mercier. Pno passado o professor Marcelo Caetano nos visitou~ Ganhou um quadro primitivo de Rosina Becker do Vale. Você entra numa casa, olha logo as paredes. Q gosto da arte ê a marca do homem do século XX"14-

Com um papel social básico - o da distinção - o sistema

das artes plásticas tem procurado manter, da forma mais rígida

possível, os limites da "arte". Neste tipo de prática

artística, muito mais do que nas demais, se discriminam as

produções "não artísticas". Isto se faz basicamente por exclusão; assim, tudo que não é integrado ao sistema das artes

plásticas não é "arte". Por isto a importância, para os que desejam ser artista, de entrar no sistema, através de mecanismos mais variados que o próprio sistema oferece e que

14 GAM n- 24 Rio de Janeiro, 1970, reclame publicitário, p. 8. 112

se ampliam na segunda metade do século XX- Enquanto, no

sistema acadêmico, a academia era a entrada exclusiva, agora

se apresentam inúmeras entradas: (premiação em um salão

importante, uma exposição individual em galeria de destaque ou mesmo a citação por um crítico em uma coluna ou artigo). Todos estes caminhos se cruzam. Pode-se notar, por exemplo, na

pesquisa, que um salão, com um júri consagrado, tem também artistas reconhecidos. Um salão, com júri desconhecido, apresenta artistas igualmente desconhecidos. O círculo se

fecha em nomes e espaços consagrados. É preciso participar deles para ser rotulado, e, entrando no sistema é preciso obedecer as regras da "distinção". O depoimento de um artista ilustra este tipo de pressão.

"Em junho de 1978 fiz uma individual na Entreartes, de São Paulo. Era uma galeria

pequenaf praticamente desconhecida„ Sempre aparece alguém para dizer: Você precisa se cuidar. Afinal já foz uma individual no MAM, não vá baixar o ni vel

Tudo o mais que ocorre à margem deste conjunto de indivíduos e instituições, passará ao largo da história da arte brasileira, e, assim estão hierarquizados suba ternamen- te. Evidencia—se na pesquisa, um número restrito de nomes no

(artistas, críticos, marchands.- -) no sistema das artes

15 Streva, Sônia. "A valorização de Pi". Arte Hoje - janeiro, 1979, ano 2, n- 19, Rio de Janeiro, p. 59. 1 1 3 plásticas que se repetem constantemente ao largo de um

período. Para penetrar no sistema uma nova tendência

(geralmente sinalizada do exterior) tem que travar uma

ferrenha disputa que envolve produtores, critícos, diretores de instituições e marchands. Dividido entre tendências consagradas e novas propostas que buscam legitimação, o sistema das artes plásticas tornou-se, por excelência, um espaço de bens culturais de luxo, destinados a um público restrito e selecionado. Ter acesso a este circuito é garantia de status social e oportunidades de negócios lucrativos. Isto porque as obras de arte constituem também formas de inversão de capital que se desempenham bastante bem, mesmo em momentos de crises econômicas e inflação. As vantagens do mercado de arte são defendidas em matérias publicadas em jornais e revistas; um bom exemplo é o artigo "A valorização de Di":

"Para demos ntrar o processa de valori- COTAÇÕES DE DEPOSIÇÃO zação de uma obra de artef tomamos Ano/Preço (em Cr$) valorização como exemplo alguns trabalhos signifi- 1963 1965 ca ti vos de um pin- 3007. tor como Di e f em 10.000 30.000 especialf o quadro Depôsição reaIi zado 1965 1976 na década de 3Q, 13337. época extremamente 30.000 400.000 criativa do artista carioca 1976 1978

400.000 701.000

1963 1978 7.0007 10.000 701.000 114

C:OTAǻES DE C3RTNs

1964 1978(1) 3.1047. 10.000 310.400

(1) Até novembro Obs. - As ORTNs foram criadas em 1964. Só foi tomado por base o índice de valorização, deixando-se de compu- tar os juros e sua capitalização.

Sobre a problemática do mercado de arte e o controle da produção afirma Néstor Garcia Canclini

"(...) ei mercado cultural f a la vez que permittió algunos artistas vivir de su trabajo y estabeleció un âmbito especial para juzgarlo, sométio Ias obras a la homogeneidade de los precios y a la determinaciones estéticas de los compradores. El mismo processo soeio-económico que possibilitó el individualismo, acabó borrdndo Io, ai sujetatarlo ai intercâmbio comercial~ La experimentación individual deja de ser experimentac ión y deja de ser individual cuando la de Nueva York se parece a la de Roma, a Ia de São Pablo, a Ia de Tokio. No sólo los rasgos personales desaparecem, sino tambióm Ias diferencias entre naciones, que permitiam distinguir en los siglos passados una escuela flamenca de otra francesa o italiana (...) junto com su expansión econômica, el imperialismo norteamericano impuso un modelo cinematográfico, plástico, televisivo, gradas al monopolio de Ia produción y de la 115

distribuición"1** -

Tentando superar esta contradição, várias propostas foram

implementadas. As vanguardas, por exemplo, com sua ação

integradora (happenings e ambientes), tendem a ampliar seu espaço de atuação, utilizando recursos de linguagem mais contemporâneos. Ao abandonarem os suportes tradicionais, como as telas e materiais nobres, barateando a produção, buscam democratizá-la, facilitando, assim, a emergência de novos valores, sem a mediação do mercado tradicional. A produção de obras em série, (gravuras e múltiplos) entregues diretamente ao público pelo produtor, foi outra forma procurada como alternativa para baratear o produto e ampliar seu alcance social. Além das alterações na produção, também foram tentadas reações ao circuito tradicional das galerias e museus, utilizando, por exemplo, feiras e exposições em lugares públicos. Estas tentativas, bastante restritas em seus efeitos, tendem a ser absorvidos pela expansão de um mercado de arte que se institucionalizou no Brasil na década de 70, sob a hegemonia de marchands do tipo empresarial, com grande capital. Este mercado tipicamente capitalista de arte acrescenta ao valor das obras por ele comercializadas um valor de prestígio social. Neste processo, o artista se afasta cada vez mais do público, e cresce o poder dos meios de difusão intermediando esta relação. O poder destes difusores e suas

^ Canclini, N. Garcia. in: Suarez, Orlando - La jaula Invisible, 1986, op. cit. p. 49. 116 possibilidades de controle da produção não ocorreu unicamente no Brasil, Marta Traba analisa os aspectos nefastos de sua atuação em termos de América Latina:

", , , Por outro 1 ctdof ndio seio os artistas

norte-americanos ^ ou seus crí t icos f nem sepuer suas galerias ou seí.ts museus que têm pretendido

subj uga r-nos r mas os manipuladores de cultura que necessitam de elementos dóceis e correntes sucessoras para que nada interfira na absorção do artista como dissidente, A homoçeneização da arte latino—americana nas duas últimas

décadas (50 e óO) não éf nem sequerf uma homenagem ao grande espírito inventivo de muitos artistas do norte/ é tristemente^ um solicito cerrar fileiras em torno dos _ . ,,17 manipuladores da cultura

Sua posição, no entanto, não esclarece quem são estes

"manipuladores da cultura" e oculta a atuação de artistas, críticos, museus e galerias norte—americanas em relação ao sistema das artes latino—americanas, o papel político e econômico desta atuação- No entanto, ela deixa bem clara a homogeneização que estes "manipuladores", que se pode identificar com os difusores, controlam e estimulam. O que não se pode deixar de enfatizar é o papel que este circuito de difusão (revistas de arte, museus, galerias, críticos--.) passou a ter, ao controlar de forma preponderante a produção circulação e o consumo de artes plásticas no Brasil- Sobre a atuação do museu, por exmplo, fala Walter Zanini - "o próprio

17 Traba, Marta, op- cit-, p- 20- 1 1 7

sentindo processual que marca importantes tendências das artes

do presentef de similaridades evidentes com a pesquisa

cientifica, induz a instituição museológica a um corportamento

revolucionário, Não sendo mais apenas o órgão á espera dos

fatos, O museu deve envolver—se no próprio ato criador — sem

porém assumir atitudes protetoras. Oferecendo ao artista uma

série de recursos — espaço, instrumental adequado, assim como

uma atmosfera cmlltipla de relacionamentos - colegas, críticos

pesquisadores e o próprio çnlbl ico - er de sua parte,

usufruindo da presença ativa de todo este elemento humano, o

NAC ganhará uma nova dimensão de interesses,

descaracter izando-se como exclusivo centro receptor e de

administração contemplativa f inserindo—se portanto, no 4 0 contexto mais vivo da transformação da arte7

As artes plásticas, com seus métodos tradicionais,

bastante artesanais, pouco se atualizaram em comparação com o

avanço das midias que servem à música, ao cinema ou a TV, por exemplo. Pode-se dizer mesmo, que conservando seus métodos

individuais e artesanais, as artes plásticas têm dificuldade de atingir o grande público. Enquanto um espetáculo de teatro pode alcançar em uma temporada mais de 10 mil pessoas, uma exposição de arte poderá no mesmo espaço de tempo, ser vista por, no máximo, 100 pessoas. Nesta linha de análise, Jacob

10 "MAC - Um museu preocupado com a vanguarda visual Alberto Beuttenmüller, Cultura Brasileira, ano 5, n- 20, janeiro/ março 1976, p. 82. 118

1P Klintonitz escreveu um livro, analisando a pouca penetração

da Bienal Internacional de São Paulo, como vimos, o evento de

maior público em termos de artes plásticas. No entanto, este

tipo de limite não é o suficiente para determinar o

desaparecimento da Bienal nem do sistema das artes plásticas

ao qual se integra. Pois, como já foi colocada, a Idgica dos

sistemas das artes pldsticas é a distinção social. Atingir o

grande público se opõe a esta lógica e a sua função social

de legitimação da dominação.

Uma série de experiências com potencial de difusão, não

se consolidaram, como por exemplo os vídeos de artistas

realizados por Olivio Tavares de Araújo, as gravuras da empre-

sa Compass, as atividades da galeria Global, que contaram com

ampla cobertura dos meios de comunicação de massa. Estes

exemplos, entre outros, indicam a dificuldade do sistema de se

ampliar. Pode-se afirmar que o próprio sistema preserva seus

limites e público restrito. Assim, mesmo constantemente criticado por esta tendência, o sistema a preserva, ela é a garantia de distinção que, como afirma Pierre Bourdieu, "é a

iei implícita do campo". Um emblema de classe deixa de ter sentido de atuar como tal e perde seu poder, quando é colocado ao acesso da maioria. Assim se passa na nossa sociedade com as artes plásticas. 0 sistema das artes plásticas é o mecanismo que garante para as artes plásticas a permanência desta condição emblemática. i p Jacob Klintonitz. 50 segundos de televisão valem naus que dois meses de Bienal de São Paulo. Isto é Bom ou é Ruim? 119

Concluindo, pode-se observar que as artes plásticas, no

Brasil, têm se mantido bastante refratárias às análises de

cunho sociológico, no que não se diferenciam tanto do panorama

internacional. São mínimos e muito recentes os estudos nesta

direção. As duas contribuições mais importantes são "Art& Para

Que7" de Aracy Amaral e "Arte Privilégio e Distinção'120 de

José Carlos Durand. De maneira geral, no entanto, as artes plásticas têm sido vistas pelos sociólogos como pouco

importantes do ponto de vista de sua participação social, sendo deixada de lado. As publicações nesta área, como já foi observado, seguem a orientação centrada na figura do artista, principalmente na produção contemporânea, este enfoque é dominante. Os estudos sobre as artes plásticas expressam, assim, com lindas encadernações, inúmeras ilustrações e alto custo, o elitismo que as caracterizam. Não se analisa o seu papel social, o que contribui também para manter intacta sua função ideológica: distinção social do seu circuito restrito de especialistas e amadores. O presente trabalho aborta uma contribuição no questionamento deste papel, identificando as condições históricas que sustentam esta distinção nas décadas de 60 e 70 e analisando como o sistema das artes plásticas atua neste período e como se transforma a partir desta atuação.

20 Estas duas obras, de maneiras diferenciadas, apontam para as problemáticas sócias inseridas nas artes plásticas. Aracy Amaral procura destacar projetos de participação e crítica social por parte dos artistas plásticos. J. C. Durand aponta o elitismo e a distinção social presente no circuito das artes plásticas. 4—0 SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NA CRISE DO DESENVOLVI-

MENTISMO POPULISTA

"Em certos períodos históricos o tempo cronológico parece menor dadâ a rapidez e pro- fundidade com que as transformações econômicas e políticas ocorrem. Esta observação é válida

para a década dos anos 60f iniciada sob um governo populista e tendo seu término em pleno período presidencial de um dos governos militares mais repressivos que a memória brasileira registra".

Maria Moraes

4.1 — A consolidação da Modernização; primeira metade da

década de 60

Em termos gerais.no Brasil, pode-se considerar a década de 60, nas artes plásticas, como um período de consolidação da modernização internariolizante que se processou desde o início dos anos 50. Esta modernização expressa a incorporação do sistema das artes plásticas, orientado basicamente pela lógica de distinção social, ao projeto desenvolvimentista, no qual, segmentos da elite brasileira se empenharam. Este 121 projeto visava a superação da etapa de substituição de importações e a integração da economia brasileira a uma etapa mais avançada do capitalismo: a monopolista. Neste processo, a burguesia brasileira atua, como esclareceu Jacob Gorender , através de seu princípio básico de classe: a aceitação seletiva do capital estrangeiro.

As artes plásticas, como parte deste projeto, incorporaram—se aos movimentos internacionais, de ponta, no momento, o abstracionismo. A presença da abstração no panorama das artes plásticas brasileiras, no início dos anos 6o se evidencia no artigo publicado pela revista Visão "Veneza* abstrac ionismo foi. o denominador comum" • No panorama deste movimento, no Brasil, duas tendências se destacaram: o concretismo e o neoconcretismo. Os artistas identificados com a primeira tendência, sediados basicamente em São Paulo, em torno das figuras de Waldemar Cordeiro, Décio Pignatari e dos irmãos Campos, se identificavam com o projeto desenvolvimentista, sendo dele expressão e reforço. Voltados para os avanços da tecnologia, acreditavam na modernização internacionalizante como solução dos problemas do país. Muito atentos à implementação de medidas industrializantes e racionais, apoiavam o desenvolvimento do Design como forma

1 Gorender, Jacob. ^ burguesia brasileira. São Paulo, Brasi1iense, 1985. 2 Vis

Os artistas identificados com o neoconcretismo, sediados no

Rio de Janeiro, em torno de Ferreira Gullar, Hélio Oiticica e

Lygya Clark, tinham uma posição mais crítica em relação às vantagens da modernização da industrialização e das tecnologias de ponta. Partiram das propostas concretistas, mas tentaram romper com sua rigidez de postulados e racionalização através de uma atitude poética e participativa. A importância destes movimentos, ainda no início da década de 60, pode ser observada através das grandes mostras retrospectivas da arte concreta e neoconcreta que se realizaram no Museu de Arte

Moderna do Rio de Janeiro em 1960 e 1961 respectivamente, e a exposição neoconcreta apresentada no Museu de Arte Moderna do

Rio de Janeiro e no Museu de Arte Moderna de São Paulo em

1961. Ainda em 1963, a corrente concretista, ligada ao design,

■foi reforçada com a criação do Departamento de Desenho

Industrial na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e da

Escola Superior de Desenho Industrial instituída pelo governo do estado da Guanabara. Em relação à FAU(São Paulo) deve-se destacar: "A marca "faunana" apareceu em quase tudo que foi

feito em São Paulo no contexto dos anos 60. Aliás, a formação da artista plástico via Escola de Arquitetura é uma constante do período"3. Cavalcanti, Portinari, Anita, com alguns

primitivos destacados (Chico da Silva, Heitor dos Prazeres) e

total dominância, entre os mais novos, do abstracionismo,

3 Catálogo "Volta a Figuração: anos 60" museu Lazar Segai. São Paulo, Maio/jul. 1979. 124

criada em 51. "A Bienal de São Paulo colocou o Brasil no

ca lendário das grandes manifestações artísticas

internacionais. Muitos valores nacionais começam desde então a

ser reconhecido fora de nossas fronteiras" - À ela, no entanto, articularam várias outras instituições criadas nestas duas décadas, formando uma rede integrada na promoção das

tendências mais avançadas do panorama internacional. Este foi o caso, por exemplo, do Museu de Arte do Rio de Janeiro, criado em 48 e que tradicionamente expunha as mostras de maior destaque da Bienal. G público carioca podia, assim, entrar em contato com os movimentos que se introduziam no pais através das Bienais. O MAM se destacou também na valorização dos artistas modernos brasileiros, tornando—os mais conhecidos e vendáveis. A revista Manchete comenta sua atuação na reportagem "MAM: cor, forma e dinheiro"'*. A importância do MAM no panorama das artes plásticas no Rio de Janeiro foi enorme, principalmente no sentido de apoiar as propostas de renovação.

Na lista de eventos de "vanguarda" (anexo) pode-se ver que a maioria deles foi ali sediado

Museu de Arte Moderna de São Paulo, criado também em 48 se integrou na modernização abstracionista, tendo, no início da década de 60, como diretor, Mário Pedrosa, crítico de arte carioca, tradicionalmente ligado ao concretismo e neoconcretismo. O Museu de Arte de São Paulo foi fechado em

5 GAM - Editorial, n- 1, Rio de Janeiro, 1966. " Manchete, n2 427, 25/06, 1961, Rio de Janeiro, Bloch, p. 52 a 60. 125

63, quando seu acervo foi entregue para a criação do Museu de

Arte Contemporânea da USP, num acordo realizado por Ciccilo

Matarazzo para receber o espaço da Bienal no Ibirapuera. Por

um empenho dos antigos associados, ele foi reaberto em 69,

passando a ter, na década de 70, uma destacada atuação. O

Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo,

criado em 63, com o acervo do antigo MAM de São Paulo, recebeu

também as premiações e realizou aquisições nas Bienais. Seu

acervo, em relação âs tendências mais atuais, desde a

abstração, é o mais importante do país. Em sua direção esteve,

desde a fundação, Walter Zanini, sobrinho do pintor Mário

Zanini e irmão do cri tico de arte, responsável por uma coluna

da Folha de São Paulo, Ivo Zanini. Sob sua dinâmica direção, o

MAC destacou-se no panorama nacional e influiu decisivamente

na sustentação de tendências mais experimentais e de difícil

aceitação de mercado.

0 Museu de Arte de São Paulo, apoiado por Assis

Chateaubriand, e por toda a estrutura dos Diários Associados,

contou com a importante atuação de Pietro Maria Bardi. Com um

acervo, comprado na Europa do pós-guerra, com o predomínio da

arte clássica, ele passou a ter uma importância mais destacada depois de 68, quando se instalou em sua sede atual, em terreno doado pela Prefeitura. Também o MAM do Rio de Janeiro inaugurou em 1967 a sua nova sede, (construção em que utilizou verba do Fundo Monetário Internacional) com a presença do presidente Gen. Costa e Silva. 126

O que pode-se constatar é que dentre as diversas

instituições que constituem o corpo modernizante internaciona—

lista do sistema das Artes Plásticas, a maioria delas foi

criada na década de 50 e 60, ou, pelo menos, nestas duas

décadas consolidaram seu espaço e seu papel dentro dele. Foram

elas as responsáveis pela difusão e legitimação das novas

tendências, articulando-se entre si, o que era necessário para

fortalecer suas atuações inovadoras. Estreitas ligações e,

algumas vezes, concorrência entre si, caracterizou o

desempenho destas instituições. Também a ação do estado foi

determinante nesta modernização. Estas diversas instituições,

apesar de serem aparentemente privadas (sociedades civis sem

fins lucrativos) todas elas contavam com verbas públicas para

o seu funcionamento. Esta foi a forma como o mecenato estatal

das artes plásticas permaneceu, embora, agora, de forma

encoberta. O gerenciamento particular, inclusive muitas vezes

(conduzido com mão de ferro por alguns indivíduos, como por

exemplo Ciccilo Matarazzo na Bienal, Assis Chateasubriand, no

MASP e Terezinha Muniz Sodré no MAM), se realizava sobre

verbas públicas, que eram injetadas pelo Estado para, a construção e manutenção dos prédios, a formação de acervos e

realização de eventos. Das instituições criadas e fortalecidas neste período, somente o MAC/USP é realmente estatal, pertencendo ao governo do estado de São Paulo e, mais especificamente, à Universidade de São Paulo. Neste caso, a ação estatal é mediatizada por uma instituição cultural, a 127

Universidade. Esta forma de funcionamento e organização

evidencia a busca de autonomia que as artes plásticas

promovem, ao mesmo tempo em que, devido as restrições do meio

local, precisam contar com o apoio estatal, mas sem, no

entanto, reconhecê-lo ou evidenciá-lo. As relações do Estado

com as artes plásticas fica assim mediatizada pelo fato destas

instituições serem privadas, o que oportuniza o controle por

determinados segmentos da burguesia. Trata-se,

fundamentalmente, de um gerenciamento particular de verbas

públicas. Esta relação íntima do Estado com as artes plásticas

aparece, no entanto, na presença permanente de autoridades

públicas, como presidentes, em inaugurações de eventos, como

exposições, salões ou Bienais. Jânio Quadros, governador de

São Paulo, aparece como figura constante de mostras artísticas

assim como outros governadores, ministros etc.. E, a

inauguração da Bienal Internacional de São Paulo contou,

permanentemente com a presença do presidente da república, e

outras importantes autoridades. Se, por um lado, estas

presenças podem evidenciar a importância e o destaque destes

eventos dentro do panorama cultural, por outro, o Estado

legitima sua posição suprac1assista de defensor da cultura e

da civilização em seus mais destacados valores.

Quanto ao público, pode—se considerar a década de 60, no

Brasil, no que refere—se ás artes plásticas, como um período

voltado para ampliação do número de pessoas que tinham acesso

à produção plástica. Instituições culturais (principalmente os 128 museus e galerias) se articularam, na tentativa de implementar participação dos setores médios urbanos, até então inexistente. O sistema das artes plásticas seguiu, assim, a orientação democratizante do período, tanto em nível nacional como internacional. A ampliação do público consumidor, correspondeu ao crescimento numérico dos setores médios urbanos e de seu poder aquisitivo, dentro do processo de industrialização que se implementara a partir de 1955. O ingresso do Brasil no rol dos países de acumulação monopolista deflagrou, num primeiro momento, certa concentração de capitais nos pólos dominantes deste processo: Rio de Janeiro e

São Paulo. As galerias de arte em moldes empresariais fizeram parte deste impulso modernizador, deflagrado pelo grande capital, tanto em forma de legitimação como em termos de possibilidade de investimentos lucrativos.

Ressalta-se que, no início da década de 60, a inflação, presente ao longo do processo de industrialização, acentuou-se com bastante intensidade, o que favoreceu o mercado de artes plásticas. O valor crescente e a sua invariabi1 idade nos períodos de inflação faziam deste tipo de investimento uma atração para os capitais disponíveis, não aplicados, no período de crise política em investimentos produtivos. A dinamização do mercado de arte esta ainda ligada ao surgimento, no início da década, de um novo tipo de empreendimento que foi bastante decisivo nos rumos do sistema das artes plásticas: a galeria de arte com padrão empresarial. 129

O surgimento deste tipo da galeria, com marchand especializado, impulsionando a realização de vernissagens, como um evento cultural e social, se implementou a partir do

Rio de Janeiro no início dos anos 60. Três galerias, trabalhando com o lançamento de artistas e também com aqueles já consagrados, se rivalizavam em termos de legitimação das produções plásticas: Bonino, Relevo e Petite Galerie, no Rio de Janeiro.

A galeria Bonino criada em 1960, no Rio de Janeiro, trouxe a experiência de um marchand argentino. Segundo afirmação de Giovana Bonino "A gente tinha, todo um Know how do

Buenos /3ires, o mercado aqui era muito fraco9 quase inexisten- te. Havia algumas galerias, mas nenhuma se dedicava exclusiva- mente a isso"7. Sua primeira exposição foi com um grupo de artistas argentinos e brasileiros. Muito bem recebida pela crítica, esta mostra contou com uma apresentação de Mario

Pedrosa no catálogo. Ele destaca o mérito da iniciativa empresarial dos Bonino para as artes plásticas locais.

"£ com real oportunidade que se inaugura f agora nessa quer ida cidade do Rio de Jane iro * que mal acaba de ser despida das insígnias de Capital

do Brasilf uma galeria de arte como esta. Q fato mesmo da inauguração é outro indício de

que a nossa velha Capitalf se jd não detém o

cetro poli ticof tão cedo não perderá o cetro cultural e social do pais... Se a tentativa do

7 Entrevista de Giovana Bonino a autora em 22/julho/88, Rio de Janeiro 130

Sr, Bonina tiver êxito, tanto melhor: outras no gênero seguir-se-ão. E que seus resultados não são apenas de ordem material para os donos da

galeriaf mas, esperemos, tragam também /7>eIt>oria para a situação geral dos artistas, ajudando—os a transformar o meio em que tão precariamente

vivemr submissos que são aos caprichtos de um paternalismo já antiquado por parte de alguns poucos ricaços ou de outros tantos burocratas do Estado... Esperemos pois, que a Saieria Bonino venha trazer sua contribuição para este desideratum, a profissionalização da vida 0 artística do Rio" .

Em suas palavras, se evidenciam duas problemáticas

importantes na época: a disputa entre Rio e São Paulo pela

posição de cetro cultural do país e a contribuição do

trabalho, do "marchand1' para a profissionalização do meio

artístico. Ou seja, ele já percebe como este tipo de empreen-

dimento poderá interferir no sistema das artes plásticas, no

sentido da profissionalização de seus integrantes, A galeria

Bonino, teve importante atuação, estabelecendo inclusive

relações internacionais (tinha filiais em Buenos Aires e Nova

York) em nível de difusão e comercialização. Para evidenciar as relações desta galeria dentro do sistema das artes plásticas, basta observar que sempre expôs os nomes mais destacados, premiados na Bienal de São Paulo ou no Salão

Nacional de Belas Artes. E, entre as exposições escolhidas pelos críticos para destaque no Resumo JB, estiveram sempre

0 131 indicados pelo menos uma da Bonino, quando não várias (anexo).

Atuando com a mesma orientação modernizante e profissio- nal , o marchand Franco Terranova estabeleceu, no Rio de

Janeiro, também em 1960, a Petite Galerie. Já em 1962, inaugurou uma filial em São Paulo, dirigida por Raquel Babenco que se introduzira no ramo, trabalhando com Pietro Maria

Bardi. Para ter-se idéia da atuação desta galeria, basta ver a seguinte reportagem, notícias de arte do Jornal do Brasil, na coluna assinada pelo crítico Harry Lauss na reportagem.

"Reabertura da Petite Galerie do Rio com uma

exposição de Guinard- A Galeria f agora sob a

responsabilidade de Sérgio Bernardesr com a

colaboração do Banco Sotto Maiorf elaborou um plano de financiamento para a aquisição de

obras de artef com entrada de 20Z e em 6 prestações com juros de l'í ao més. Os idealizadores do Sistema foram José Luís de

Magalhães Linsf diretor do Banco Nacional de MG e sobrinho do novo Governador mineiro

(Magalhães Pinto); José Carvalhof diretor do DMAE; e Franco Terra nova, responsável pelo setor artístico. Guarenta artistas já assinaram contrato de financiamento com a Petite Galerie, entre eles: Manabu Mabe, Milton Dacosta, Maria Leontina, Mário Silésio, Rubem Vaientin, Loio Pérsio; o Glauco Rodrigues, Bianco e outros .

9 Visão, n2 18, v. 17, 28/10. São Paulo, 1960. p. 102-103. "Crediário para obras de arte" 1 32

A atuação do marchand Jean Boghici responsável pela

Galeria Relevo (Rio de Janeiro) foi também de grande destaque,

principalmente por seu apoio aos jovens da "vanguarda

carioca". Foi ele um dos organizadores da mostra "Opinião 65",

realizada no MAM do Rio de Janeiro, que foi considerada um

marco nas artes plásticas neste período. Jean Boghici foi

também o responsável pela articulação dos artistas locais com o grupo do nouveau realisme francês, promovendo inclusive a vinda do crítico francês Pierre Restauny, o principal teórico deste movimento, ao Brasil.

São Paulo, na década de 60, possuia um mercado de arte menos ativo, apesar de, como já foi visto, ter sido criada lá, uma filial da Petite Galerie. A atuação mais intensa neste

período inicial da década foi, em termos de leilões, nos quais se destacava Giuseppe Baccaro como organizador. De sua experiência com leilões, ele partiu para a inauguração de uma galeria em 1962, a Selearte, em sociedade com Biagio Motta.

Pelo quadro anexo observa—se o surgimento de várias galerias de arte em São Paulo, no início da década. Entre elas se destacavam a Atrium sob a direção de Emi Bonfim, Ambiente dirigida por Radha Abramo e a Seta onde atuava o marchand

Antônio Maluf.

Estas galerias apresentavam em comum o fato novo de atuarem com investimentos pesados, adquirindo obras dos artistas (não mais como meros intermediários), tendo um 133

projeto de trabalho com críticos, museus, salões, etc- e voltadas ao estabelecimento de estreitas relações com o campo cultural- Atuavam como instância de legitimação e não apenas como revendedores; interferiam na construção e determinação dos padrões de artes e na criação do valor da obra a partir de sua circulação- □ trabalho destes marchands foi de certa forma desbravador, criando um novo estilo de relações no sistema das artes plásticas, mais moderno e correspondente às transforma-

ções que ocorriam na economia brasileira que se internaciona-

lizava rapidamente- É importante destacar o surgimento, no sistema das artes no Brasil, da figura de marchand de tableaux e sua atuação nas galerias que mais se destacam.

Pode-se observar que quase todos eles (Boninos, Francos

Terranova, Jeam Boghici, Giuseppe Baccaro, Pietro liaria

Bardi) são estrangeiros, o que nos permite duas considerações.

A primeira relaciona-se com o papel que desempenham em um momento de internacionalização do sistema das artes quando seus contatos, experiências e Know how são decisivos. A segunda diz respeito ao capital cultural e social que possuem, tanto por suas formações no exterior, em centros de maior tradição cultural, quanto pelas relações sociais que aqui estabelecem, em decorrência de que, no pós-guerra, muitos estrangeiros para cá vieram, formando um certo núcleo cujas ligações com as artes favorecia estas atividades. A procedência estrangeira, principalmente italiana e francesa, era um fator que contribuía à carreira do marchand- 134

Outro elemento a considerar no processo de modernização

do sistema das artes plásticas é a atuação dos meios de

comunicação social, principalmente os jornais, que neste

período tinham uma atuação importante, com colunas de arte e

publicando ainda, ocasionalmente, artigos de críticos de

destaque. Mantendo colunas quase que diárias, a maioria deles

possuía, pelo menos, um crítico especializado, responsável por estas colunas. O Jornal do Brasil, por exemplo, tinha Harri

Laus; O Globo, Vera Pacheco Jordão; a Folha de São Paulo tinha

José Geraldo Vieira e Ivo Zanini. 0 Estado de São Paulo não

tinha colunista fixo mas apresentava artigos assinados por críticos como Aracy Amaral e Geraldo Ferraz. Nas colunas dos

jornais, eram divulgados as mostras e, principalmente, as

Bienais e salões. Como havia críticos especializados, esta coluna atuava também na formação do público, além de informar sobre os eventos de destaque. Publicavam—se, ocasionalmente, em todos os jornais, artigos de outros estudiosos, como Mário

Pedrosa, Aray Amaral, Geraldo Ferraz, Clarival Valadares10.

A ação dos meios de comunicação era dinâmica dentro do sistema, ou seja, não se tratava meramente de uma veiculação de um perfil do sistema para o público em geral, como fazem hoje, através do "colunismo de arte". Havia uma atuante crítica de arte que, de certa forma, era fundamental para a

10 Haviam ainda, na maioria dos jornais uma seção bastante regular denominada "Exposições". Elas funcionavam como roteiro das mostras abertas ao público da Folha de São Paulo foi extraído o anexo. 135

formação do público11- Alguns jornais promoviam inclusive

eventos importantes dentro do sistema das artes plásticas- O

Jornal do Brasil, por exemplo, era responsável, anualmente,

pelo Resumo JB, importante meio de sistematização do panorama

artístico, criado, em 63, por Harri Lauss colunista de artes

plásticas do jornal- Esta mostra era organizada, a partir de

indicações das melhores exposições do ano, por críticos de

reconhecidos méritos do sistema das artes plásticas. As

mostras que recebiam maior número de indicações eram

representadas, resumidamente, no MAM do Rio de Janeiro- O

Resumo JB apresentava, assim, um perfil da produção plástica e

também da crítica da época- Foram realizadas ao todo dez mostras, de 63 a 7212. A Folha de São Paulo também tinha sua premiação, que destacava anualmente artistas plásticos — o prêmio Lerner criado em 1959- Ele vigorou até 62, quando faleceu o industrial Isaias Lerner, seu financiador- A Folha mantinha, ainda, uma galeria de arte nas suas dependências, sob a direção de José Geraldo Vieira.

Em termos de revistas, na primeira metade da década não havia no país nenhuma publicação especializada em artes plásticas. As revistas de grande circulação como A Cigarra, O

11 Vários entrevistados, entre eles Carlos Zílio, Carlos Von Shimith, Aldemir Martins e também Aracy Amaral (na banca de qualificação), destacaram esta atuação dos meios comunicação mais comprometida e crítica, nos anos 60. A maioria, inclusive, lamentando as modificações que levaram as condições atuais. 12 (A lista de artistas selecionados nas 10 edições do Resumo JB estão em anexo). 136

Cruzeiro, Visão e Senhor apresentavam, ocasionalmente, artigos sobre artes plásticas. A revista Senhor tinha uma coluna especial para artes plásticas, onde noticiava exposições, salões, bienais, fazendo pequenos comentários informativos.

Centrava suas observações nos aspectos estilísticos e na

personalidade de artista. Esta coluna não era assinada. O

Cruzeiro e A Cigarra apresentavam reportagens fartamente

ilustrada, com temas da história das artes plásticas

internacionais ou reportagens sobre algum artista nacional de destaque como Portinari ou Alejadinho. A revista Senhor era a que mais se identificava com as tendências modernizadoras e com a corrente abstracionista, nas vertentes concreta e neoconcreta. Utilizava, inclusive, ilustrações e capa com obras de artistas plásticos.

Os meios de comunicação de massa, neste momento, tinham uma importante atuação dentro do sistema das artes, mas

bastante sujeita às orientações gerais dos críticos ou outros especialistas. Os meios de comunicação acompanhavam as modernizações do sistema e as divulgavam para o grande

público, apresentando uma idéia das artes plásticas como uma

importante manifestação cultural que acompanhava as grandes mudanças por que passava a sociedade brasileira. Um exemplo é o texto "Desenvolvimento muda a arte" no qual se afirma

Desenvolvimento econômico e filosófico determinaram novas 137

4 3 for/nas de expressão artística -

Ao abordar o sistema das Artes plásticas no Brasil, nos

anos 60, é preciso considerar o isolamento cultural das

diversas regiões deste extenso território, naquele momento em

que os sistemas de comunicação, via satélite, ainda não haviam

sido implantados. Este estudo, no entanto, ficará restrito às

cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, que não constituíam

um eixo, mas dois pólos que disputavam hegemonia. No início

dos anos 60 constata-se uma predominância do Rio de Janeiro,

onde se encontravam mais estruturadas as relações entre os

indivíduos atuantes nas artes plásticas. Isto porque, apesar

da transferência da sede do governo para Brasília, a antiga

capital continuava sendo um centro de poder. O Rio preservava

importantes estruturas sob forma de instituição, reconhecidas

e aceitas como legítimas e legitimadoras, tais como, o Museu

Nacional de Belas Artes, Escola Nacional de Belas Artes e o

Salão Nacional de Belas Artes. Ao longo dos anos 60, o Rio de

Janeiro permaneceu hegemônico, perdendo sua influência

gradativãmente, de maneira que, na década seguinte, São Paulo

o suplantou, em termos de importância, dentro do sistema das

arte plásticas, assim como em outros aspectos14. Esta mudança

do centro de influência fez parte da própria evolução

13 Visão* v. 16, n- 1, 01/01. São Paulo, 1960. No texto há comentários sobre a Bienal na qual Manabu Mebe ganhou o prêmio de melhor pintor nacional e houve ainda uma premiação acentuada para os valores jovens. 14 Ver anexos: "Salões e "Instituições" neles evidendia-se claramente a hegemonia carioca no início dos anos 60 e o progressivo fortalecimento de São Paulo chegando este ao 138

final da década de 70 como hegemônico.

capitalista do país, em que São Paulo se impôs como pólo de concentração de capitais no processo de transição para a etapa capitalista monopolista em que redefiniram-se as relações entre as diversas frações do capital e a própria inserção do país no sistema capitalista internacional.

As transformações, que já vinham ocorrendo desde a segunda metade da década de 50, no início de 60, acarretavam crises econômicas às quais se somavam as lutas populares e nacionais. O pacto populista se rompia, questionado pelos dois pólos nele envolvidos: dominadores e dominados. Como observa

Caio Navarro de Toledo, "Para os que vêem nos conflitos e antagonismos o sinal da desagregação socialf os de 'os tempos de Goulart' só podem ser encarados como trágicos 'tempos de caos e de anarquia' . Entre 1961 e 64, o poder político no país estava em crise, acelerando—se as disputas sociais e as mobilizações populares. A queda da taxa de lucro, decorrente da quebra de ritmo do crescimento industrial, dava mostras de fissuras no projeto desenvolvimentista. A luta política sobredeterminava a crise econômica.

Neste quadro da realidade nacional, o sistema das artes plásticas se manteve à margem das mobilizações que levaram ao amplo movimento cultural-conscientizador que tomou forma

Caio Navarro de Toledo - O governo Goulart e o Golp^ de 64. São Paulo, Brasillense 1985 p, 9. 139 através de diversos grupos, como se evidencio no segundo capítulo, relativo às práticas artísticas nos anos 60 e 70.

Neste momento dinâmico da história do país, enquanto vários setores artísticos se engajavam nas disputas democratizantes, as artes plásticas mantiveram posturas mais elitistas de orientação internacionalista. Não se introduziram alterações nos circuitos que indiquem tendências democratizantes.

Ocorreu, isto sim, algumas manifestações individualizadas como as participações de Aldemir Martins (neste momento morando na

Itália) e Marcelo Grassmann que produziam gravuras para um calendário produzido pelo Centro de Cultura Popular da União

Nacional de Estudantes. Estes artistas tinham já um renomado destaque no sistema das artes plásticas e sua participação foi importante para o sucesso das vendas. No entanto, isto não chegou a caracterizar uma atuação do sistema das artes plásticas, que permaneceu restrito a círculos elitistas, e sem questionamentos internos. Haja visto que, no início dos anos

60, não se podia entrar no MAM sem convite, terno e gravata.

No vernissage de "Opinião 65", houve um incidente com Hélio

Oiticica, que levara para o Museu seus Parangolés e também o pessoal da Escola de Samba Mangueira, da qual ele era passista. "Foi a primeira vez que o povo entrou no museu.

Ninguém sabia se o Oiticica era gênio ou louco e, de repentef eu o vi e fiquei maravilhado. Ele entrou pelo museu adentro com o pessoal da Mangueira e fomos atrds. Quiseram expulsd-los f ele respondeu com palavrões, gritando para todo mundo ouvir; é isso mesmof crioio nõ.o entra no MAM, mas isto é 140 racismo- E foi ficando exaltado. Expulso, ele foi se apresentar nos jardins, trazendo consigo a multidão que se acotovelava entre os quadros"1 **.

Evidencia-se assim, o caráter elitista do sistema das artes plásticas e as dificuldades que encontraram os intelectuais comprometidos com projetos de democratização, para atuarem dentro dele- Os momentos mais ricos e fecundos das artes plásticas no Brasil estiveram ligados aos projetos modernizadores dos setores dominantes: o modernismo, expressão do projeto de substitução de importação e o neoconcretismo, expressão do Projeto Monopolista. As elites brasileiras encontravam nas artes plásticas um espaço inestimável para a realização de sua representação simbólica. Embora utilizando, ocasionalmente, recursos do imaginário popular, as artes

plásticas expressavam, com maior eficiência, o ideário das elites, alcançando, nestes casos, maior desenvolvimento e, conseqüentemente, representatividade no âmbito nacional e

internacional. As inovações não eram bem recebidas pelo

público e colecionadores como mostra o seguinte depoimento.

"Comentava-se outro dia numa roda de jovens o sucesso financeiro de pintores a quem a crítica especializada não parece atribuir qual á altura do êxito alcançado. 'Ora acho fácil de compreender' disse uma jovem pintora, pois a pintura deles é agradável e neutra. Traz uma sugestão de mistério e, além do mais,

1<5 Catálogo "Opinião 65". Galeria de Arte do BANERJ. Rio de Janeiro, ago. 1985. 141

corresponde bem ao estila que está em moda na decoraçáo de interiores, Seus quadros nâto interferem com o sofá nem brigam com os cristais as pratas ou as opalinas * Sobretudo, não exigem atenção, Assim se o pintor

quizer seguir uma linha mais audaciosaf se abandonar as formas de arte contemporâneas já aceitas pelo público, dificilmente encontrará comprador, Os colecionadores são ainda muito tímidos e não ousam jogar com o desconhecido, Q artista que deseja inovar ou pesquisar tem que garantir seu ganha pão através de um emprego auxiliar, ou então enfrentar sérias dificuldades,,,"i7 .

Retomando a questão apresentada no primeiro capítulo,

referente a orientação básica de distinção social que

fundamenta o sistema das artes plásticas, pode-se afirmar que as elites, de maneira geral, olharam com desconfiança as mobilizações democratizantes que se desenvolviam neste momento. Delas não participavam, permanecendo as artes plásticas alheios a estas radicalizações. O sistema respondia assim aos interesses das elites em se manterem de fora e mesmo em oposição a estes "tempo de Caos". O que se observa é, pelo contrário, um fortalecimento do caráter distintivo das artes plásticas, expresso no crescimento do mercado de artes plásticas. Considerado como um investimento livre das flutuações decorrentes das políticas econômicas, o mercado de arte passou a representar a estabilidade dos investimentos. O

17 Realidade, n- 5, ed. abril. Rio de Janeiro, Ano I, ago. 66. "Esta é a arte de nosso tempo" Mario e Vera Pedrosa, p. 66. 142 artigo de capa da revista Visão "O nosso mercado de arte" demonstra a vitalidade deste setor. Nele, artistas e marchands concordam que no Rio e São Paulo há um mercado estável para a obra de arte. Enfatizam a popularização da arte através do lançamento de álbuns de gravuras e destacam a atuação das galerias Bonino, Petite Galerie, Barcinsky, Mommatre e Relevo, no Rio e Astréia e Seta em São Paulo18. Comparativamente à década seguinte, este ainda era um período de fraco movimento no mercado de arte; as exposições ainda não apresentavam a variedade e profusão, os catálogos eram simples e nem sempre contavam com a apresentação de cri ticos. Na verdade, o sistema de instituições que se consolidava, ainda não se articulara

profundamente com o setor comercial; algumas mobilizações,

disputas e questionamentos ainda se estabeleceriam na segunda

metade da década de 60, antes que o processo de

mercanti1ização do sistema se estabelecesse como dominante.

4.2 — Disputas Sociais e Mobilizações no Sistema das Artes

Plásticas

O golpe de 1964 instaurou uma nova ordem política, "A

crescente radicalização política do movimento popular e dos

trabalhadores, pressionando o Executivo a romper os limites do

pacto populista, levou o conjunto das classes dominantes e

setores das classes médias - apoiados e estimulados por

18 Vis<3o, v. 23, n2 26, 06/12. São Paulo, p. 20 a 23, 1963. "O nosso mercado de arte". 143 agências governamentais norte-americanas e empresas multinacionais - a condenar o governo Goulart, tf derrubada do governo contou com a participação decisiva das forças armadasf as guais - a partir de meados de abril do 19ó4 - impuseram ao pais uma nova ordem político institucional com características crescentemente militarifadas, tfs reformas exigidas polo capitalismo brasileiro seriam agora implementadas, Repudiando o nacional reformismo, as classes dominantes f através do Estado burguês militarizado f optariam pela chamada modernização conservadora f excluindo, assimf as classes trabalhadoras e populares da cena política e pondo fim d jip democracia populista .

As alterações que se estabeleciam na estrutura do sistema produtivo do país, com a hegemonia dos setores modernos, sob o ponto de vista da tecnologia e da orientação monopolista, introduziram diversificações na estrutura social e reorientaram novos ajustamentos entre os grupos sociais. O novo modelo de desenvolvimento que se impôs pós 64, exigiu a contenção das reivindicações das massas e a subordinação dos grupos empresariais tradicionais à crescente monopolização da indústria. Este processo atingiu os setores médios dos quais eram oriundos uma grande fatia da intelectualidade brasileira, principalmente os artistas. Desencadeava-se assim uma reação bastante localizada (centros urbanos como Rio de Janeiro e São

Paulo) que se expressava na mobilização promovida pelos ip TOLEDO, Caio Navarro. O Governo Goulart e o Golpe de 64. São Paulo, Brasiliense, 1985, p. 120. 144 movimentos artísticos. O teatro de opinião, a música de

protesto, foram alguns dos exemplos destas realizações. Otilia

Arantes descreveu: "Pode-se dizer que de 65 a 69 até a

revanche da regimef boa parte dos artistas brasileiros pretendiar ao fazer arte, estar fazenda política. Passada a

hesitação do primeiro momento - provocado pelo golpe militar e pelos primeiros expurgos e prisões — os intelectuais e artistas voltam a reclamar para si um papel de resistência ao processo por que passava o pais

A mi 1itarização do aparelho de Estado, exigiu a abolição dos partidos políticos e usurpações das prerrogativas

legislativas e judiciárias, dando origem a uma série de reações dentro mesmo das classes dominantes. Este processo de reação ao autoritarismo atingiu também os setores médios dos quais era oriunda uma grande parcela da intelectualidade brasileira. A intensa mobilização que se desencadeou nos diversos setores artísticos já foi referenciada no capítulo dois. O que se fará, aqui, é observar como isto se processou no sistema das artes plásticas que, na segunda metade da década de 60, não ficou mais alheio às mobilizações sociais, mas entrou em importante processo de dinamização.

Sobre este período Frederico de Moraes comenta: "... Os primeiros anos, após uma tentativa algo frustrada de uma arte

20 Arantes, Otilia. De "Opinão 65" a 18 Bienal - São Paulo, Novos Estados CEBRAP, n- 15, julho 86, p. 69-84. 145

voltada, para o diálogo com o povo - O Movimento de Cultura

Popular, o CFC - foram de indecisão e silêncio. O esforço para

falarf discutirf opinar e sugerir alternativas só tem início em 1965 e 1966f com a realização das mostras denominadas

'Opinião' , no Rio, e 'Propostas' em São Paulo'

Em termos de artes plásticas, já o ano de 1964 foi marcado por eventos que concorreramm para grande mobilização que se desencadearia: a exposição Nova Figuração na Galeria

Relevo, no Rio de Janeiro e a vinda de Pierre Restany ao

Brasil- Pierre Restany era o criador teórico do movimento

Nouveau Realismó francês; sua vinda ao Brasil foi propícia à penetração desta tendência no meio artístico- Neste sentido, convergiam os interesses de Jean Boguichi e Pierre Restany: ao primeiro interessava o aval europeu para os artistas com que trabalhava e ao segundo, o reforço para o movimento que criara e do qual era o principal teórico- Também a mostra "Nueva

Figuración'1 dos artistas argentinos Noé, Maccio, Leira, e De

la Vega, realizada em 63, na galeria Bonino, causou repercussão, principalmente entre os jovens artistas, insatisfeitos com os excessos decorativistas a que a abstração estava levando a grande massa da produção local- Nesta perspectiva foi realizada, no Museu de Arte Moderna do Rio de

Janeiro, a mostra "Opinião 65M. Organizada por Ceres Franco

(morando então em Paris) e Jean Boghici, marchand da galeria

Relevo- Esta exposição apresentou trabalhos de artistas

21 MORAES, Frederico. Catálogo "Arte Brasileira séc. XX Caminhos e Tendências" - Gal. Global, 1976. 146

Algumas de suas intenções se evidenciam no texto do catálogo, em que se destaca a relação desta mostra com as últimas tendências internacionais:

"Opinião 65 é uma exposição de ruptura, Ruptura com uma arte do passado- O exemplo vitorioso da 'pop-art' americana e as realizações do novo— -realismo europeu encontrarem eco no jovem artista de vanguarda e encoraj aram-no a contestar a famosa afirmação de Naurice Denis, sobre a qual se baseou a pintura abstrata -

Se a vanguarda artística mundial derruba assim os conceitos fixados durante tantos anos numa

estética comodaf é porque o artista hoje desem-

penhando um papel novo na sociedadey não aceita o tributo de uma tradição plástica caduca- A jovem pintura pretende ser independente,

polêmicaf inventiva, denunciadora, crítica, social, moral- Ela se inspira tanto na natureza urbana imediata como na própria vida com seu culto diário de mitos-

De minhas vindas últimas ao Brasil constatei que um número crescente de jovens artistas brasileiros trabalha com o mesmo intusiasmo e espirito de pesquisa que o jovem artista europeu- Por essa razão resolvi reuni-los nesta mostra que o museu de Arte moderna do Rio de Janeiro tem a gentileza de acolher"22 '

A retomada da figuração dentro dos moldes mais contempo-

22 Ceres Franco. Apresentação Catálogo Opinião 65. MAM - Rio de Janeiro, 1965. 147 râneos das vanguardas européias e norte americanas (Nouveau

Realisme e pop art) encontrou espaço fértil, neste momento, em que os setores jovens da intelectual idade,oriundos de classes médias urbanas, estavam tendo oportunidades de acesso

aos bens culturais e aos meios de sua produção- Estes elemen-

tos, jovens, oriundos ou ligados aos movimentos democratizan—

tes do início da década, forçavam uma abertura no sistema das

artes plásticas. E o faziam, utilizando estratégias de

subversão,que envolviam o questionamento da produção

institucionalizada nas também formas de ocupação de institui-

ções legitimadoras dentro do sistema das artes plásticas.

"Todos os entrevistados pela equipe da galeria de arte do BANERJ foram unânimes em situar a importância do Museu de Arte Moderna do Rio, como ponto de encontro da geração Opinião ó5... Costumavam se encontrar â porta da escola de Belas Artes: Dias, Gerchman, Adriano e Magalhães; freqüentavam, como alunos, o ateliê

de gravuraf primeiro com Goeldi depois com Adir Boteiho. Mas o fascínio residia mesmo no MAM - até porque sua ocupação era parte da estratégia

doz grupo 'O que queríamos era forçar a barraf abrir espaços em todos os lugares e exposições. Éramos uns brigões insuportáveis para os outros, imagino".

Conta Gerchman. E Dias confirmas

"Uma de nossas estratégias era participar em bloco de todas as exposições. E assim fizemos no Salão Esso de 1964 e no Salão Nacional, que

àquele tempo funcionava, tinha prestígio r 148

estava sempre cheio de gente, mas o pessoal jovem ainda n<3o tinha acesso a ele. Quanto ao

MAM f era de extremo interesse ocupd — Io, enehê-lo com a nossa produção, Afc5s queríamos fazer muito barulho, mudar o comportamento do

No entanto, a maneira como estas mobilizações atingiram o sistema das artes plásticas, permite retomar as colocações iniciais deste trabalho sobre a forma como as influências externas são filtradas pela estrutura do sistema. Toda mobilização dos anos 61—64, popularizantes e altamente politizados, não penetrou nas instâncias do sistema das "artes plásticas", lias, os questionamentos colocados pelas vanguardas internacionais do Nouveau Realisme Francês, e do pop americano, estes sim, penetram,legitimados pelas instituições do sistema. Opinião 65, por exemplo, foi uma exposição organizada por marchands com conexões internacionais,no

Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, contando com participação de artistas brasileiros e franceses. Ela foi o marco de uma série de outras manifestações que também estiveram referendadas pelos movimentos internacionais e por

instituições de reconhecido prestígio.

O ano de 1965 foi especialmente importante para estes

jovens, iniciando já em março com o primeiro Salão Esso de

Jovens Artistas, realizado no Museu de Arte Moderna do Rio.

Este salão abriu espaço específico para jovens (menos de 40

^Catálogo Opinião 65, Galeria do BANERJ, RJ, 1987. 149 anos) e foi organizado pelo chefe da Divisão de Artes Visuais da União Panamericana, em colaboração com institutos de belas artes públicos e privados dos países participantes. Ele foi realizado em 18 países latinoamericanos e Gomes Sincre, diretor desta divisão, tomou parte nos 18 júris nacionais. O prêmio era de 700 dólares para pintura e escultura; os ganhadores participariam de um Salão Esso de Artistas Jovens latinoamericanos a ser realizado em Washington, concorrendo a um prêmio de 1000 dólares. Os custos do evento estiveram a cargo das Esso Standard Oil. No Brasil, os ganhadores foram:

Mauricio Salgueiro, Alberto Teixeira, Yukata Toyota e Nicolas

VIavianos. Este salão demonstrava o interesse das instituições do sistema das artes plásticas na renovação da produção plástica e na sua orientação dentro das tendências internacionais e também o apoio que empresas multinacionais davam a este tipo de atividade. Fica bem evidente, nas palavras de Gomes Sincre, as relações do capital empresarial com o sistema das artes plásticas e a legitimação social que buscam.

"En todo esoT además f se habia destacado ei

hecho de que ia industria f ei capital privado, en un mundo libre, intervenia en ei proceso de aliento ai espiritu por médio de un acto de innegable trancendencia cultural. A ese acto, ia OEA contribuía, como afirmé antes, con la experiência y con la fe de su División de Artes Visual es"24-.

24 Sincre, Gomes. In: Orlando Soares. La jauia invisitoie, 1986. op. cit. p. 99-100. 150

A criação de revistas de arte foi também resultante dos processos modernizantes por que passava a sociedade brasileira. Publicações específicas de artes e, mais ainda, dominantemente de artes plásticas ou totalmente dedicada às artes plásticas, foram uma inovação introduzida neste período.

Elas foram palco e fizeram parte, de forma bastante intensa, das mobilizações que ocorriam no sistema das artes.

Em 1965, no MASP, foi lançado o jornal, sob forma tablóide - "artes": com cuidadosa impressão e diagramação inovadora foi um empreendimento ousado- Seu Diretor Carlos Vom

Schimit era um jovem egresso do mercado publicitário que percebeu a existência de um espaço neste momento para a divulgação artística em um meio mais amplo. Sua intenção era

atingir um público o mais abrangente possível; a primeira edição foi de 1500 exemplares, o preço era acessível em

relação ao poder aquisitivo da classe média e sua distribuição

era feita em bancas de jornais. Tinha nitidamente a intenção

de divulgar as tendências internacionais mais atualizadas.

Segundo palavras de seu editor:

"No início9 publicamos muitos artigos foca 1izando o que se fazia no mundo* À modida

em que as artes cresciam no paísf o que acontecia no mundo passava a interessar menos-Como fonte de informações havia as Bienais, Museus e secções de artes plásticas na

biblioteca municipalf dirigida por Maria 151

Eugenia Franco? com excelentes revistas internacionais sempre atualizadas, Eu era um assíduo freqüentador. Publicávamos traduções de textos ou artigos elaborados a partir de leituras, cobríamos os Bienais e expôs içr^es importantes, estávamos sempre muito bem informados e nossa intenção era colocar essas informações ao alcance do público em geral, Havia muito interesse por parte das pessoas pelos temas artísticos e culturais, Hma exposição? por exemplo? era um verdadeiro evento cultural? sendo visitado por um número grande de pessoas, Para isto concorria o fato de que cada artista sd raramente expunha (algumas vezes um espaço de três anos entre uma e outra exposição) e? portanto? todos queriam ver estas exposições e mesmo a Bienal era muito mais freqüentada? ou pelo menos era freqüentada por um público muito mais interessado e participativo

Também foi editada, neste momento (1966), a primeira

revista especialmente dedicada às artes plásticas: "GAM

Galeria de Arte Moderna". Esta revista era, na época de seu

lançamento, uma coletânea de artigos sobre as artes plásticas de alto nível, assinados pelos intelectuais mais destacados do setor: Mário Pedrosa, Clarival Valadares, Geraldo Ferraz, ...

Apresentava artigos com temas variados, em linguagem erudita,

referenciando informações que exigiam do leitor certa bagagem cultural. Não tinha muitas ilustrações, mas era bastante

trabalhadora em termos de diagramação, havendo ocasionalmente

23 Entrevista concedida por Carlos Von Schimith à Autora em nov. de 1987. São Paulo. 152

gravuras de artistas encartadas e a capa, em geral, apresentava a reprodução de um trabalho artístico. Com espírito empresarial em relação ao setor, utilizava publicidade de grandes empresas (brancos, estatais e multinacionais) e ainda de galerias e lojas de móveis e decorações. Os artigos ilustrados com reproduções de obras, passavam uma idéia confiável sobre artes plásticas; as críticas eram justificadas e havia bastante informações.

Havia, além disso, secções dedicadas a informar o que estava acontecendo (Bienais, salões, exposições, concursos, etc.) com indicações de nomes locais, data, sem avaliação ou posicionamentos críticos; estes ficavam restritos aos artigos assinados. A revista deixava sempre transparecer a idéia das artes plásticas como uma atividade dinâmica e modernizadora, e da revista, com um empreendimento qualificado no setor.

Publicada no Rio de Janeiro, em seu editorial se apresenta como uma resposta a expextativas do setor.

"GAM surge com a finalidade de servir de ponte entre as artistas e o público. Uma meta que é conseqüência mais de uma imposição que de uma eleição. Porque resultado da necessidade de eliminar o descompasso flagrante entre o desenvolvimento artístico do pais e as informações sobre ele disponíveis.

(...) Cresce com a proliferação das galeriasfo mercado de arte e número de artistas profissionais^ fenômeno que não se limita ao

Rio de Janeiro e São Paulo. E no entantof não havia uma só revista de artes plásticas. Um 153

claro enorme a preencher, tarefas que n3o pode ser exclusivas de GAM* Mas a satisfação da aventura pioneira pertence—lhe integralmente-

GWM é isenta de preconceitos. G ecletismo de seu quadro de colaboradores que não se restringem aos críticos de arte que aparecem neste prime iro número, atesta-o, Es tá aberta ao debate dos problemas da arte contemporânea, com a única preocupação de ajudar a esc 1 arecé-lo. Nem sentira temor diante do novo, ainda que ás vezes isso possa parecer arriscado.

Com este propósito, apresentara, nâío raro, ao lado de artistas de mérito já indiscutível, nomes desconhecidos e sujeitos a controvérsias, £ sd"2<\

Como evidência desta dinamização e articulação de

tendências, no ano seguinte (67) foi lançada, em São Paulo, a

Revista "Mirante das Artes", dirigida por Pietro Maria Bardi-

Ela ilustra outra orientação que se delineava no sistema das

artes neste momento a articulação de diversas instituições-

Pietro Maria Bardi era Diretor do Museu de Arte de São Paulo,

dono da Galeria Mirante das Artes e também diretor da revista

de mesmo nome. Embora esta não fosse uma revista só de artes

plásticas, era dominantemente dedicada a este setor. Eram

apresentadas matérias sobre fotografia, design, moda,

arquitetura em pé de igualdade como arte moderna ou

tradicional. Havia, artigos assinados por nomes de destaque

2C* GAM. Galeria de Arte Moderna - Editorial, n~ 1 - 1966. 154

dos diferentes setores artísticos- Aracy Amaral, Mario Chamié,

Roberto Schwartz, Ulpiano Bezerra De Menezes- Havia também

secções não assinadas, que faziam alusões críticas e pequenas

ironias a pessoas e instituições do sistema das artes

plásticas, como esta por exemplo.

"Mas o fato mais brilhante foi a nomeação da novo diretor da Pinacoteca do Pstado fcargo

políticof depois da administração do Espírito

que guiava conjuntamente ao Pr - Ruy r o Adhemar de Todas as Paradas- Naturalmente oram do zonas o dezenas os aspirantes fquem n&o entende de arte quando o bilhete premiado dá emprego público?) A escolha devo ria ser feita na redação de "O ESTADO DE SÃO PAULO"z depois das

semi—finais ficaram finalistas dois nomesf do

Sr, Geraldo Ferrazf o valoroso crítico de arte do £? Estado (que acompanha o movimento da arte nacional a trinta e cinco anos como

profissionalf homem viajadof com suas idéias mas com idéias, conhecimentos, curriculum, livros publicados!, e o Sr. Del miro Gonçalves, um redator do Suplemento Feminino do Grande jornal- Todo mundo, na jogada aponta o Geraldo- O Governador Sodré nomeou o Sr, Del miro, talvez sabendo que naqueles dias, na revista "Visáo", discursando sobre arte local, o convidado fazia uma clamorosa confusão entre Anita Malfati e , «2 7 Tarsila do Amaral

Nesta revista era dado ênfase ao colecionismo, com artigos sobre colecionadores, coleções e formas de colecionar.

27 Mirante das artes, n— 4, jul./ago. 1967, São Paulo: t/ma Cobertura Society no quadro da política palaciana das artes, p. 11. 155

O que evidencia preocupações com o mercado de arte. A busca da originalidade da diagramação, utilizando inclusive desenhos de

Wesley Duke Lee especialmente criados para tal, muitas vezes

dificultava a leitura, pois não ficava claro o início e fim

dos textos. A publicidade era apresentada no início e no fim

da revista sem interferir muito no corpo central.

Estas três publicações, lançadas quase ao mesmo tempo,

(65, 66, 67) evidenciam um panorama dinâmico, dentro do qual a

divulgação das artes plásticas atingia níveis de eficiência e

profissionalismo. Seu público era constituído por elementos da

elite intelectual e econômica, identificados com a

modernização da sociedade e também das artes plásticas. Estas

revistas atuarem como estratégias de subversão, na medida em

que noticiavam as vanguardas ao lado da produção já consagrada

(como foi dito no editorial da GAM) concorrendo para a sua

legi timação.

Como as estratégia de subversão visavam basicamente abrir

espaços para a nova produção e os novos artistas nas

estruturas já estabelecidas, deve-se observar ainda neste

momento, o importante papel que os salões desempenharam na

consagração destas novas tendências. Tradicionalmente, o que

ocorria de mais importante em termos de salões, era o Salão

Nacional de Belas Artes. Remanescente do academicismo e

modernizado pelas pressões dos modernistas, na década de

trinta, este salão oferecia um cobiçado prêmio de viagem ao 156 exterior. Apesar de não ter mais a importância que tivera para os modernistas, ainda era um evento fundamental, em termos de legitimação, pois garantia a saída para o exterior. Este prêmio representava possibilidade de atualização no circuito internacional e reconhecimento local. Sediado no Rio de

Janeiro, promovido pelo governo federal, o salão envolvia na sua maioria críticos e artistas cariocas ou lá radicados, constutindo um fator determinante na manutenção da hegemonia deste pólo. Além deste, havia ainda o Salão Paulista de Belas

Artes e a Bienal Internacional de São Paulo. Sendo esta última realmente um evento fundamental na modernização que se processava. Sua importância e destaque se evidencia no próprio noticiário de arte, onde ocupava um espaço que não podia ser alcançado nem de perto por nenhum outro evento do setor. A importância destes dois salões e da Bienal, ainda no início da década de 60, pode ser comprovada por sua constante citação em catálogo de artistas da época e pelo fato de que aqueles que eram premiados praticamente tinham garantidos, espaços para exposições em galerias importantes.

No entanto, a partir da segunda metada da década de 60, é surpreendente o número de novos salões que passam a ocupar os noticiários e a serem citados em catálogos de artistas. O quadro dos mais importantes salões (anexo) mostra sua

progressiva expansão com um período de concentração entre a segunda metade da década de 60 e a primeira de 70. Pode-se observar, ainda, é a constância de nomes dos jurados e a 157 ocorrência de premiações para os mesmos artistas (anexo) o que

reforça a idéia destes salões como espaço de consagração das novas tendências e o papel do crítico na sua legitimação.

A atuação das vanguardas com as disputas em que se

empenhavam, ficaram, no entanto, de certa forma, periféricas

nas divulgações que se fazem das artes plásticas nos meios

voltados ao grande público. □ sistema permanecia realizando

exposição de abstracionistas, primitivos e modernistas, e as

mesmas instituições que, ocasionalmente sediavam os eventos

das vanguardas, sediavam também exposições mais tradicionais.

O momento comportava esta dualidade.

Marcando o reconhecimento das vanguardas brasileiras e

promovendo sua legitimação, alguns importantes eventos

internacionais contaram com a presença de representantes das

vanguardas brasileiras. Na Bienal de Tóquio em 67, na

representação brasileira foram Maurício Nogueira, Hélio

Giticica, Nelson Leiner e Rubens Guerchman e ainda, no mesmo

ano, na Bienal de Paris, estiveram presentes também Hélio

Oiticica e Rubens Guerchman, além de Avatar Moares e Regina

Vater. E, foram ainda premiados nas Bienais de Paris (65)

Antonio Dias e Roberto Magalhães e na de Tóquio (65) Wesley

Duke Lee.

As vanguardas receberam também apoios internos por parte

de críticos, entre os quais se destacam Frederico de Moraes, 1 58

Mário Pedrosa, Ferreira Gullar, Walter Zanini e outros. O

Salão Jovem Arte Contemporânea, promovido pelo Museu de Arte

Contemporânea da Universidade de São Paulo, era um dos espaços onde as vanguardas encontravam abrigo. Também o Diário de

Notícias do Rio de Janeiro patrocinou o evento "Um més de arte pública", realizado em 68 sob a coordenação de Frederico de

Moraes, crítico do jornal. Foi uma importante mobilização, realizada no aterro do Flamengo da qual participaram Hélio

Oiticica, Rubens Guerchman, Vergara e muitos outros nomes da vanguarda carioca. O quadro anexo apresenta vários eventos das vanguardas evidenciando espaços institucionais e críticos que as apoiavam.

4.3 - As Vanguardas: Disputas Estéticas e Disputas Políticas

A modernização artística, como parte do plano desenvolvimentista, esteve voltada para a ampliação do público, basicamente nos grandes centros urbanos (SP e RJ), sob a bandeira da atualização com as vanguardas internacionais. As artes plásticas eram colocadas como parte do esforço modernizador em que o país, sob a direção de suas elites, se empenhava desde a segunda metade da década de 50.

Elas se prestavam com eficiência a esta tarefa de referendar a superioridade dos elite dirigente e de seu projeto político.

Na medida em que se acirram as disputas sociais, na década de

60, alguns setores artísticos se engajaram em projetos mais democratizantes, forçando a penetração desta disputa no 159

interior do sistema das artes plásticas como estratégia

democ rati zante.

As instituições do sistema das artes plásticas foram envolvidas pela mobilização decorrente das disputas que se

travavam na sociedade brasileira. O MAM do Rio de Janeiro, por exemplo, sediou exposição "Opinião 65" e, no ano seguinte.

Opinião 66; a FAAP em São Paulo realizou a exposição Propostas

65 e a Biblioteca Municipal de São Paulo organizou, no ano seguinte, a mostra Propostas 66, acompanhado de um seminário.

Ocorreu ainda, em 66, a i~ Bienal Nacional de Artes Plásticas na Bahia, promoção do Governo do Estado e do Banco da Bahia.

Estas diferentes promoções apresentavam alguns traços em comum. Primeiramente, uma disposição para renovação do sistema a partir das vanguardas contemporâneas: Pop americano, optical art e Nouveau Realisme. Em segundo lugar, uma idéia de que o fazer artístico deveria estar integrado ao cotidiano, envolvendo o espectador, saindo dos espaços da parede e do pedestal. Com isso, se alargou a atuação no sistema; mais espaços foram articulados (espaços públicos) e os espaços tradicionais (museus) se alteraram para receber as novas manifestações. Os Parangolés de Hélio Oiticica por exemplo, foram apresentados no MAM/RJ, mas não ficaram presos nas paredes e sim desfilaram pelo prédio no seu interior e exterior. As exposições de objetos, alguns de grande porte e complexas estruturas, exigiram alterações nas montagens e no dimensionamento das exposições. As aspirações políticas não se 160

manifestavam, como até então, preponderantemente em nível de conteúdo, mas também em alterações na dinâmica do sistema das artes plásticas. Muitos destes questionamentos, inclusive, tinham como objeto o próprio sistema e seu conceito básicos a

"arte". Nesta linha de ruptura e redimensionameto estiveram os trabalhos de Lígia Clark "Caminhando" (64) e "A cara é o corpo" (68), ou de Carlos Vergara "Berço Esplêndido" (69).

Todas estas obras exigiram, no mínimo, uma adaptção dos espaços tradicionais de difusão do sistema das artes plásticas, e mais ainda, um rendimensiomanto do conceito de arte. O questionamento do sistema das artes plásticas

(incluindo o próprio conceito de arte) e a aspiração de mobilizar a participação do público era comum a todos os grupos de arte de vanguarda, neste momento.

Esta produção, portanto, podia se altamente questionadora, mas se encontrava dentro dos limites do sistema no circuito mais restrito da circulação de suas obras. Seu alcance ficava limitado ao sistema das artes, passando por uma legitimação que vinha do exterior, sendo, portanto, muitas vezes, contraditória em relação as questões locais mais especí f icas.

Três grandes contradições se destacam nesta produção de vanguarda. A primeira é entre uma mobilização calcada ainda na matriz populista, mais participativa e democratizante, e o elitismo do sistema das artes plásticas ainda preservado. A 161

tendência a uma atuação mobilizadora de grandes contingentes de classe média urbana que estavam sendo incorporados como novo público consumidor e mesmo como produtor, repercutiu nas artes plásticas. Fazendo eco às efervescências do teatro

Opinião, Oficina e Arena, ao cinema novo, à música de protesto, as artes plásticas também se mobi1izavaram.

Mobilização que se evidenciava tanto nas novas temáticas, que passavam a abordar aspectos do cotidiano das grandes cidades

(futebol, as massas em suas disputas por espaço, a violência urbana, etc...) como nas tentativas de novos circuitos

(feiras, exposições em espaços públicos). Estas propostas, no entanto, conf1ituavam com a tradição elitista das artes plásticas e com seu papel de distinção e legitimação da dominação, que não iniciara neste momento, mas fazia parte da própria história deste sistema. Esta contradição ficou sem um encaminhamento de superação; uma vez que, passada esta conjuntura democrática, o Estado autoritário reforçou, através dos setores dirigentes, o elitismo do sistema das artes plásticas.

A segunda grande contradição deste momento foi entre o nacionalismo, defendido pelos setores envolvidos no projeto desenvolvimentista, e o internacionalismo, para onde se orientava o panorama geral brasileiro em conseqüência da penetração dos capitais estrangeiros, pós-55, e com o apoio do

Estado, pós-64. Em termos de artes plásticas, esta ambigüidade também se manifestava. Havia um grande envolvimento com as 162

questões locais, com a identificação dos problemas da realidade a qual o artista estava circunscrito, mas por outro lado, os modelos que serviam a estes projetos eram modelos importados das vanguardas internacionais- Na verdade, travava—se de um confronto entre um ideal nacionalista, que servira anteriormente à unidade das elites e também fora utilizado pelos setores identificados com os projetos democratizantes, e a realidade internacionalista, que o desenvolvimento industrial impunha via seu capital, sua tecnologia e seus modelos de consumo. Esta contradição se expressava dentro das próprias obras, podendo ser observado no trabalhos de Carlos Vergara "Os Carajás" (1968) ou "O Futebol

- Palmeiras x Flamengo" (196b) de Rubens Gerchman. Questões bastante específicas e regionais é tratadas, nestas obras, dentro de uma linguagem internacional (pop—art), vinculada à sociedade de consumo, á problemática das grandes metrópoles e

à estética dos quadrinhos- Este tipo de contradição pode ser identificada em muitos trabalhos da época, o que demonstra sua introjeção no nível da produção artística.

A terceira contradição é que o conjunto de idéias artístico—cu1turais que, nos anos 60 se disseminaram nos países desenvolvidos, estavam ligados basicamente a nova postura de vida, expressa fundamentalmente pelo movimento underground. Expressavam, de certa maneira, uma reação ao tipo de vida das sociedades desenvolvidas, reação ao consumismo e ao mecanicismo das relações que se estabeleciam nestas 163

sociedades, principalmente nas grandes metrópoles. O movimento underground inaugurou nova forma de vida que se fez acompanhar também por novas idéias estéticas. Não se deve esquecer ainda, que este movimento introduziu novas fórmulas também em relação

à produção, circulação e consumo dos produtos artístico—cu1turais. Propondo um rompimento com as estruturas rígidas das sociedades desenvolvidas, apostavam em fórmulas artísticas mais participativas e personalizadas, em que a separação entre produtor e público se dissolvesse e se rompesse a sacralidade da arte. A análise da penetração destas idéias no Brasil evidencia a contradição em que se viam envolvidas as vanguardas artísticas locais. Pois, se internacionalmente as vanguardas neste momento criticavam de certa forma as conseqüências da "vida moderna", das sociedades desenvolvidas, no Brasil esta "vida" estava sendo ainda introduzida através de todo o processo de modernização já analisada. Assim, contraditoriamente, estas vanguardas expressavam, por um lado, esta aspiração de modernidade típica da nossa sociedade subdesenvolvida, por outro, criticavam esta modernidade através dos movimentos artísticos culturais com os quais se atualizavam. Esta ambigüidade das vanguardas brasileiras é colocada com muita pertinência por Otilia F.

Arantes: "Combinam contudo à violência predatória em relação aos valores consagrados e à. consciência do subdesenvo 1 vimentof um forte elan construtivo"29.

20 Otilia F. Arantes. Op. cit. p. 23. 164

O sistema das artes plásticas se mobilizou, a partir do

momento em que as disputas que envolviam segmentos das elites,

se expressaram também em estratégias de subversão no interior

do sistema das artes. As reações de setores das elites contra

o autoritarismo favoreceram a disseminação de tendências

estéticas mais democratizantes, o que respondeu também á

orientações internacionais. As estratégias de subversão se

articularam com as novas tendências que estavam atuando em

nível internacional, também de forma questionadora.

"Embora existisse o interesse pela linguagem, fica sempre como núcleo de preocupações a marca de posições poli ticas-participante, preocupação esta que pode ser generalizada para quase toda zp a arte jovem da década7

As mobilizações que se realizavam no sistema das artes

plásticas, nesta segunda metade da década de 60, envolviam

disputas estéticas relativas ao questionamento das tendências abstracionistas e adesão aos movimentos internacionais da nova

figuração. Mas envolviam também demandas externas ao sistema das artes plásticas que diziam respeito á denúncias do

autoritarismo que se implantava progressivamente e à

tentativas de mobilização da opinião pública. Isto porque o projeto político-social, que o Estado militar impunha, assegurava a supremacia da camada monopolista da burguesia,

2P Catálogo. Volta á figuração: a década de 60. Museu Lazar Segai. São Paulo, maio/jul. 79. 165 causando insatisfação em outros setores das classes dominantes e nos extratos médios- A contradição entre os objetivos declarados pelo poder estabelecido, de reforçar a democracia e estabelecer a legalidade e a necessidade crescente de suprimir

focos de reação, favoreceram a dissenção entre setores da eli te -

A mostra "Opinião 65", que contou com as presenças dos

franceses Roy Adzak, Aiain Jacquet, do italiano Gianni

Bertir.i e do espanhol Juan Genovés e dos brasileiros Antonio

Dias, Ivan Freitas, Pedro Escosteguy, Aquino, Ivan Serpa,

Waldemar Cordeiro, Gastão Henrique, Vergara e Wesley Duke Lee,

foi um marco no processo de penetração das novas tendências

dentro do sistema das artes plásticas, neste momento,

concorreu para tal provavelmente a participação dos artistas

franceses, o que dava certo ar "internacional" ao evento- O

fato de ser sediado no MAM do Rio de Janeiro e ser organizado

por um marchand estrangeiro também colaborou na sua afirmação

e reconhecimento. Ainda neste mesmo ano, contando com alguns

dos artistas de "Opinião 65" realizou-se em São Paulo a mostra

"Proposta 65" a mostra Propostas 65- Esta exposição foi

apresentada na Fundação Armando Alvares Penteado, sendo

organizada por Waldemar Cordeiro com a ajuda de Ângelo de

Aquino na secção carioca lustra bem o posicionamento das novas

tendências, que neste momento constituiam estratégias de

subversão dentro do sistema, concorrendo para sua

transformação - 166

'VJ pintura nova se apropria dos progressos que

estas e outras tendências (a nova figuraçãor o

reaiismo fantásticof o neo—dadaismo e todas mais em que a crítica oficial subdivide o

movimento únicof embora complexof de hostilidade em relação as atuais condições de

existência.) efetuaram f aclarando porémr a

confusa trama dos movimentos concretosf pela elaboração de um espaço capaz de refletir as aparências e descobrir os fundamentos e as razões que as geraram. Emprega os novos elementos com a consciência de seus significados e implicações,,. A pintura se torna fundamentalmente aberta como forma de

pensamento^ evita o fechamentof a auto-sufi- ciência e as configurações definitivas, inclue opacidades e incertezas mas aceita a 30 responsabilidade de uma posição"

Um elemento que se destaca na atuação das vanguardas, neste momento, ê o caráter grupai de suas movimentações e estratégias de ação Isto é importante quando se considera as disputas em curso e se retoma as colocações de Howard Becker relativas à importância do trabalho coletivo na afirmação das novas tendências.

"Em que medida Gerchmann, Magalhães, Escosteguy, Vergara e Pias compem um grupo? E Gerchmann que respondez

- Somos um grupo na medida que procuramos uma comunicação mais direta com o público. Cada um

30 Catálogo "Propostas 65" Fundação Armando Alvares Penteado. São Paulo, dez. 1965, Sérgio Ferro Pintura Nova. 167

de nos procura modificar a real idadef através da ação crítica * Não concordo quando dizem que somos seguidosres da Pop—art ou do dadaí smo, Acho que poderíamos classificar o nosso trabalho de realismo crítico -

Havia também o grupo da Faculdade de Arquitetura da USP, do qual faziam parte Sérgio Ferro, Ubirajara Ribeiro, Flávio

Império, Maurício Nogueira Lima e outros, Estes dois grupos tinham comportamentos politizados, comprometidos com a mobilização da sociedade civil e com as questões de participação, resíduos ainda dos projetos democratizantes da primeira metade da década. Também Wesley Duke Lee, atuando de forma dinâmica e ousada, rapidamente teve em torno de si um grupo de jovens. Com formação nos EUA e na Europa, ele realizou, em 63, o que talvez tenha sido um dos primeiros um happenings no João Sebastião Bar. Em 66, Wesley o grupo de artistas ligados a ele: Nasser, Resende, Fajardo, Barros e

Leiner criaram a Rex Gallery lançaram ainda o jornal "Rex

Time" do qual foram publicados 5 números entre 66 e 67. A Rex

Gallery se pautou por uma atuação bastante irreverente, com fortes influências Underground, sem preocupações relativas às questões sociais e políticas locais. Como afirmava Weslwy Duke

Lee à imprensa, em junho de 1966, p. 81

"Fazemos parte de uma tendência experimental que poderiamos dizer ser nascida nos Estados Unidos... Q espírito de nossa galeria (e o

jornalf consequentementej... é mostrar essa arte á medida que ela vai sendo processada

31 Realidade n- 5. Abril Cultural - ano I ago. 66 p. 66. 168

32. & desenvolvida ,

Promoveram dentro desta orientação, uma agitação do circuito paulista que atingiu seu climax na exposição - happening de encerramento em 67: "Rex Caputz". As obras foram arrancadas das paredes e muitas destroçadas pelo público que desejava levá-las de graça, como fora anunciado na divulgação.

Este tipo de atuação voltada à crítica do próprio sistema das artes e de seus mecanismos e valores foi uma das linhas de ação desenvolvidas neste momento. Bastante agressiva, ela apresentou eventos que questionavam o sistema. Todos estes grupos, cada um com suas formas, tentaram atuar coletivamente, abrindo espaços, tanto em termos do sitema das artes, como em termos das disputas sociais que se desenvolviam na sociedade neste momento.

'V) preocupação com a modernidade, que es ti vera presente nas teorizaç ões e trabalhos das

vanguardas dos anos 50f especialmente no movimento da poesia concreta, seria de certa forma retomada e redimensionada por alguns setores da produção artística, A tentativa de trabalhar novas linguagens dentro de projetos que levassem em conta a intervenção política marcaria a presença de novos interlocutores no debate cultural"33 -

32 Arte em Revista n- i. São Paulo, Kairós, 1979. MRex Time". Depoimento. 33 Holanda Gonçalves - Cultura e Participação nos anos 60. São Paulo, Brasiliense, 1982, p. 26. 169

A "Declaração de princípios da Vanguarda", em Janeiro de

67, e a mostra "Nova Objetividade", representam por seu turno coroamento de um processo de politização das vanguardas nas artes plásticas. Encontra-se na Declaração de princípios:

"nosso projeto--* caminha no sentido de integrar a atividade criadora na coletividade, opondo-se inequivocamente a todo

isolamento dúbio e misteriosof ao naturalismo ingênuo e às

insinuações de alienação cultural 7 . E, no catálogo da exposição Nova Objetividade, encontra-se as seguintes

colocações: "(---) vontade construtiva geral (---)

participação do espectador (---) abordagem e tomada de

posições coletivas"3* - Ambos os documentos evidenciam a

preocupação com a problemática social e política e a ampliação

da participação do público, marcas do engajamento político

desta corrente da vanguarda. A consagração da nova

objetividade, como projeto artístico politizado nas artes

plásticas, representa, de certa forma, uma adesão aos projetos

mobi1izadores que neste momento envolviam grande parte da

intelectualidade brasileira. No entanto, é importante observar

que este não era o panorama total do sistema das artes

plásticas, mas constituía uma tendência dentro dele. Tendência

interessada em derrubar velhas hegemonias e impor uma nova

postura, resultado não só de interesses específicos no

sistema, mas também, de interesse de segmentos sociais em

34 "Princípios da Vanguarda" in: Daisy Peccinini. O objeto na arte: Brasil anos 60 p. e p. 33 Catálogo da exposição Nova Objetividade MAM - RJ - 1966. 170

luta, em diferentes instâncias da sociedade3**.

Os grupos que procuravam atuar, através de seu trabalho, nas disputas sociais em andamento, tiveram, no entanto, uma curta existência. O Estado autoritário fechou progressivamente suas possibilidades da ação. Em 68, por exemplo, foi proibida a colocação do cartaz "Seja Marginal" de Hélio Oiticica, uma

homenagem ao bandido Cara de Cavalo, na boite Sucata no Rio de

Janeiro. Logo em seguida, Hélio partiu para Londres, fugindo

às pressòes que estavam atingindo quase todos os integrantes do movimento Tropicália. Em 69, foi fechado o Salão de

Brasília e, na Bienal Nacional da Bahia, obras foram

apreendidas. Esta atitude da censura surpreendeu alguns

setores, como se pode notar as palavras de Mário Barata.

"Como já tivemos oportunidade de publicar no Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro, a grande mostra fora inaugurada com expressivo discursa do Governador Luis Viana Filho, a '■espeito dos valores de liberdade e criação da arte, A II Bienal Nacional de Artes Plásticas prefigura—se como um sucesso,,, £ um fato incompreensível, o das posteriores apreensão de obras e longo fechamento temporário da Bienal, noticiado nos 3 7 jornais da Bahia"

Vários artistas se afastaram do país a partir de 68,

30 Sobre a Nova Objetividade enquanto projeto estético/políti- co ver Daisy Pecinini de Alvarado. Tese de Doutorado ECA/USP. 1988. 37 Significação da Bienal da Bahia. Mário Barata. GAM Rio de Janeiro n— 18, 1969, p. 15. 1 71 como Antônio Dias, Hélio Oiticica, Rubens Guerchman, Lygia

Clark, Sérgio Ferro, Antonio Henrique Amaral, e outros, como

Pedro Escosteguy, abandonaram as práticas artísticas. No entanto, por um curto lapso de tempo, 65 a 69, dentro do sistema das artes plásticas disputaram espaços correntes 3 0 politizadas e comprometidas com mudanças sociais . Estas ações, no entanto, influiram mais na renovação do sistema do que na sua deselitização. A ação rígida da censura, a partir de 69, restringiu muito as atuações mais politizadas e questionadoras. E, o boom do mercado de arte, na década seguinte consolidou este elitismo. Os anos de 69 e 75 é bastante elucidativo sobre a diferenciação que se estabeleceu dentro das vanguardas, fazendo com que a censura atuasse internamente contra os setores mais radicais, seja em termos políticos, seja em termos morais, e, ao mesmo tempo, fossem apoiados outros trabalhos de vanguardas. Se o Estado, através da censura, estendeu suas garras sobre as manifestações mais politizadas e mobi1izadoras em termos sociais, por outro lado, o sistema das artes plásticas utilizava a idéia de vanguarda, misturando as tendências e diluindo-as no interior de uma rotu 1ação internacionalizante. A homogeneização se processava, ocultando as disputas sociais e colocando as vanguardas como um movimento unitário. A edição especial da Revista de Cultura

Vozes "Debate Vanguarda Brasileira" é um exemplo da maneira 3P homogenizada com que foram tratadas as vanguardas

30 Sobre a diferenciação interna da vanguarda e a censura sofrida pelos setores mais politizados foi ouvido o depoimento de Pedro Escosteguy. Porto Alegre, 19S7. 3I> Revista de Cultura Vozes, n- 1, fev. 1970. 172

Ao final da década de 60, fechou—se o ciclo de uma

vanguarda politizada no país, permanecendo uma outra, herdeira

da anterior, mas que atuou de forma distinta e com distintos

objetivos. Ela consolidou a modernização internacionalista do

sistema das artes e sua integração aos circuitos do grande

capital. Esta outra vanguarda, abandonando os princípios de crítica social e de arte politicamente engajada, correspondeu a uma nova conjuntura nacional e internacional, pois, afinal,

a década de 70 foi, como já se observou, uma década de retorno

à ordem. 3 - SISTEMA DAS ARTES PLÁSTICAS NO ESTADO AUTORITÁRIO

"Q ano de 196B constituiu um merco na história da acumulação capitalista no Brasil- Iniciava-

se o milagre brasileiro quef sob o escudo de um vigoroso autoritarismo militar, iria proporcionar lucros faraônicos para os monopólios nacionais e estrangeiros, A desarticulação das forças populares e o alijamento dos setores mais atrasados das classes dominantes dos centros de poder, deixava livre o caminho para consolidação dos grandes grupos econômicos e dava lugar a um dos períodos mais rendosos da acumulação capitalista no país".

Guido Mantega-

3.1 - Atuação do Estado: Repressão e Censura/Apoio e Estimulo

A atuação do Estado sob controle da burguesia monopolista teve, no Brasil, no período que se inicia com o ato institucional n- 3, um forte caráter repressivo. Esta repressão buscava conter todo o tipo de questionamento e reação à implantação de seu projeto de acumulação capitalista.

Coube ao Estado a condução deste projeto, definindo formas de regulamentação da economia, além de normas de atuação poli ticas e regulação das relações sociais. 0 direcionamento que o Estado deu a sua atuação, teve como sentido a 174

administração dos interesses dos grupos monopolistas no poder

e a construção de sua hegemonia.

Em termos de artes plásticas, neste período, tem-se como

traço marcante o do elitismo do sistema das artes plásticas,

já referido anteriormente. Se este elitismo foi, de certa

forma, abalado pelas estratégias de subversão que proliferaram

na segunda metade dos anos 60, o que se vai observar, no

início dos anos 70, é a sua retomada articulada à ação

repressiva, exercida pelo Estado. A repressão às artes

plásticas não pode ser comparada à que ocorria em relação a outros tipos de produções artísticas, como o teatro, cuia

penetração social mais ampla exigia uma ação repressiva mais

intensa. No sistema das artes plásticas, no entanto, alguns

segmentos sofreram também esta repressão que teve o objetivo de restabelecer limites e atuação para os elementos do próprio

sistema. O estabelecimento destes limites não se realizou

somente através da ação repressiva do Estado, mas através da

própria reestruturação do sistema, em moldes concentrador e elitista que respondiam às demandas dos novos grupos de elite no poder concentrador e elitista.

Muito pouco se encontra na literatura sobre artes

plásticas em relação à ação da censura na segunda metade dos

anos 60 e início de 701. A pesquisa em material da época e

1 Radha Abramo .Uma Arte Politizada- Retrato o Brasil,São Paulo, Políticas, v.l, fase. 43, p. 505-8. é o único texto com referências específicas à ação da censura em relação às artes plásticas, em outros estas aparecem ocasiona1men te. 175

entrevistas permite identificar duas diferentes orientações na ação repressiva aos artistas, críticos e diretores de instituições; a política e a moral.

É interessante observar que uma das primeiras atuações repressivas registradas no sistema das artes plásticas após

64, é em relação à administração de instituições públicas.

Logo após o golpe, em maio de 64, o Diretor da Pinacoteca do

Estado de São Paulo, Túlio Magnaine, foi chamado a depor a uma comissão encarregada de apurar questões ideológicas de funcionários. Logo em seguida, foi aposentado compu1soriamente e, em dezembro do mesmo ano, assumiu João Scantiburgo que ficou na direção da instituição até 67. Caso semelhante ocorreu no Rio de Janeiro, com José Roberto Teixeira Leite, que em 64 foi afastado da direção do Museu Nacional de Belas

Artes, cargo que ocupava desde 61, (também por motivos políticos), sendo substituído por Donato de Mello Júnior.

Evidencia-se, nestas ações, a importância que este tipo de espaço detém no Sistema das Artes Plásticas e o significado político de sua administração, que, em geral, não se evidenc ia.

Quanto a pressões diretas aos artistas, estas ocorreram já em 64, sendo, no entanto, dirigidas, em geral, às atividades poli ticas dos artistas, em movimentos e grupos de reação e não a sua ação artística. Pois, como já foi observado as artes plásticas até 65 não apresentava mobilizações politizadas e 176

críticas. Djanira, por exemplo, presa logo nos primeiros dias após o golpe, foi solta logo em seguida (este incidente nunca

foi bem esclarecido) e Di Cavalcanti, fugindo às perseguições, se exilou em Paris na mesma época. No entanto, pressões e ação da censura mais intensas e dirigidas diretamente à ação exercida nas artes plásticas, somente ocorreram a partir de

69.

A ação repressiva generalizada pós 69 atingiu um grande número de artistas plásticos, principalmente alguns setores das vanguardas, como já foi observado no capítulo quatro.

Cláudio Tozzi e Sérgio Ferro foram presos, Sérgio Ferro saiu do país como muitos outros já haviam feito, fugindo da

repressão e do vazio cultural que se estabelecera. Regina Boni que costurava as roupas do pessoal da Tropicalia declara: "O

Drom&drario acabou em ó9. Tínhamos nos dispersado, Caetano e

Gil exilados em Londres Wally sumido. Cal no Rio, Hélio

Oiticica em Nova Yorkf Torquato morreuf Ednilson desapareceu, 2 Robcío e Pericles também se foram para longo" .

G esvaziamento do panorama cultural atingiu amplos setores.

"Durante os anos óOf a Caleria Relevo, no Rio, Lançou alguns dos nomes mais expressivos das artes plásticas brasileiras, Jean Bogbici, seu proprietário, tornou-se então um dos marchands mais conhecidos e respeitados do país, vivendo o que hoje denomina o 'apogeu do mercado de

2 Tropicália 20 anos depois - SESC - São Paulo, 1987. 177

arte', Mas em 1969r com a emigração dos

artistas da nova figuraçãof a Relevo fechou suas portas e Boghici seguiu os rumos do exterior"3 ,

Também, em 1970, Raimundo Collares foi preso e espancado sob a alegação de "vagabundagem" (não havia carteira profissional para artista plástico); dois dias depois, ele recebia um grande prêmio de pintura do Salão Nacional de Arte

Moderna.

Foram também presos em 73 Radha Abramo, crítica de arte, e o artista francês, convidado da Bienal Internacional de São

Paulo, Fred Forest. A prisão ocorreu na Praça da Sé, durante a realização da atividade "arte sociológica". Radha Abramo foi presa novamente em 75, ocasião em que foi levada encapussada para o D0I/C0DI de São Paulo4.

Mário Pedrosa, o grande crítico brasileiro, reconhecido nacional e internacional. «lente, também teve que sair do País em

1970. Processado por difamar o Brasil no estrangeiro, com denúncias de perseguições,exilou-se no Chile. No Brasil, Mário

Pedrosa ocupara diversos cargos de destaque dentro do sistema das artes plásticas, como a direção artística da Bienal de São

Paulo, e a presidência da Associação Brasileira de Críticos

3 Arte Hoje n- 2 agosto 77 ano II, "A imagem das galerias em um encontro nacional", p. 52. 4 Radha Abramo in - Artistas x Críticos org. Alberto Beuttenmü1 ler. de Arte. Ferreira Gullar, figura de destaque no movimento neo-concreto, se afastou do país em 1970, por motivos políticos, exilando-se na Argentina e depois em Paris.

As próprias obras plásticas foram objeto de censura, como o trabalho de Gilberto Salvador premiado no Salão de Campinas

(68), uma boca gigantesca com bandeira americana que foi destruída pelos órgãos de segurança. Ou os desenhos de Farnese de Andrade, enviados para a Bienal Nacional da Bahia, (68) apreendidos por serem considerados eróticos; o mesmo também ocorreu com trabalhos da série "Ligas" de Wesley Duke Lee. Em

1970, a instalação realizada por Olney Krüse, no Paço das

Artes em São Paulo, foi destruída por ser considerada subversiva. Também as obras enviadas por Pedro Escosteguy para a Bienal da Bahia voltaram todas destroçadas, com sinais de machado5.

O caso mais conhecido de ação repressiva nas artes plásticas, ocorreu em 73, constituindo o único caso jurídico de ação direta contra um trabalho plástico. O pintor mineiro

Lincoln Volpini apresentou, no Salão municipal de Belo

Horizonte, um trabalho, "Penhor da Igualdade", que foi aceito e premiado. Posteriormente, foi preso e julgado por subversão pelo uso inadequado de símbolos nacionais. Os jurados do salão, alguns críticos de renome, como Frederico de Morais,

Estes foram alguns dos relatos que colhemos em entrevistas ou referências em publicações. Muitos mais ocorreram, ficando, no entanto, no esquecimento. 179

Caribê e Mário Cravo foram ouvidos no julgamento? que se

constituiu no primeiro e único do gênero.

Instituições do sitema das artes plásticas foram

igualmente alvo de ações repressivas. O Salão do Distrito

Federal, por exemplo, foi fechado por apresentar trabalhos subversivos, o mesmo ocorrendo como a Bienal Nacional de

Bahia. Este tipo de repressão visava desestimular o apoio de

instituições ás produções mais críticas e politizadas. Nesta

linha foi também fechada a mostra da representação brasileira para a Bienal Jovem de Paris, em 69, que estava sendo apresentada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Mário

Pedrosa, através da Asssociação Brasileira de Críticos de

Arte, reagiu com intensos protestos. A repercussão deste fechamento foi grande, no âmbito internacional, dando ensejo ao movimento de boicote à Bienal de São Paulo. A mostra da

Bienal, deste ano, teve seu alcance reduzido, tanto em nível nacional como internacional, pela disposição dos artistas de reagirem à censura que estavam sofrendo, por parte do Estado autoritário. Aliás já em 65, Bruno Zevi reagira com eloqüente discurso contra este tipo de ação repressiva que impedira a apresentação de uma mostra de arte popular brasileira organizada por sob os auspícios do governo da

Bahia e do Itamarati.

''São argumentos muito perigosos, subversivos, porque de formas opostas referem-se ao interior faminto do continente, d real idade do Pais e a 180

sua estrutura» Face aos 1 ema da real idader da miséria e da cultura* generais e embaixadores

perdem a cabeçaf desafiam o ridículo ef por

fimr proibem insensatamente uma exposição"**.

Outro aspecto a destacar é a censura aos meios de comunicação na divulgação das arbitrariedades promovidas.

Basta lembrar que quando foi proibido o envio da representação brasileira de artes plásticas, para a Bienal de Paris, nada saiu na imprensa da época. Em uma reportagem do Jornal do

Brasil7 há amplas referências aos setores de arquitetura e design, sem nenhuma referência ao corte ocorrido na representação de artes plásticas. Outro tipo de atitude repressiva pode ser exemplificada pela demissão de Harry Lauss do Jornal do Brasil, ocasionada por críticas realizadas à

Bienal de São Paulo em Í9670. A Bienal, de certa forma, representava a oficialidade dentro do sistema das artes plásticas; apesar de ser uma instituição particular, era constitui!da por representações oficiais, ligadas ao Itamarati e mantidas com polpudas verbas públicas. Neste caso, não há uma atuação direta da censura do Estado, mas indireta, através da direção do jornal.

Observa-se é que a maioria dos dados sobre censura e repressão, ocorridas neste período no campo das artes

** Zevi, Bruno artigo publicado em 14 de março de 65 no L'Expresso de Roma e traduzido apresentado na Revista da Civilização Brasileira n- 2 maio de 65. 7 Jornal do Brasil - 10/12 - 69 MA Bienal de Paris". 8 Relato de Harry Lauss em "De Como Ser" - Porto Belo, Lunardei li, 1978. 181 plásticas, devem ser buscadas em outras vias que não a da imprensa oficial do período. A maior fonte são, realmente, os depoimentos de pessoas atuantes na época. Mesmo assim, a idéia da arte, acima das disputas políticas, impregna de tal forma o sistema das artes, que faz com que, muitas vezes, os indivíduos omitam em seus relatos, acontecimento em que estiveram envolividos ou de que tiveram notícias, envolvendo p pessoas bastante próximas .

O Estado atuou a partir de 69 de maneira dura, no sentido de conter os avanços democráticos e populares dos anos 60, eliminando qualquer tipo de foco de resistência. Em conseqüência desta ação coercitiva, estabeleceu-se um vazio cultural, assim observado por Frederico de Morais: "Como conseqüência inevitávelf a partir de todos estes acontecimentos de 69 passa a haver uma evasoío crescente de artistas brasileirosf principalmente aqueles de vanguardaf que saem do Brasil , provocando o que foi chamado de vazio ou fossa cultural"t0. A atuação do Estado, no sentido de fazer ocupar este vazio, deixado pelos artistas que saíram do país e por

^ De todas as entrevistas realizadas a única que comentou a ação da censura apontando fotos e pessoas envolvidas foi a de Gilberto Salvador. As demais referenciaram este tipo de ação sem citar fatos ou nomes específicos ou ainda passando ao largo deste tipo de comentário. 10 Morais, Frederico. In: "Ciclo de Debates Casa Grande". Rio de Janeiro, Inúbia, 1976. p. 112. 182

aqueles que se calaram, foi o fomento a uma nova produção-

Produção esta esvasiada de conteúdos políticos e restrita aos

limites impostos pela censura, predominantemente voltada para questões de "segurança nacional e bons costumes"-

A censura como observa Renato Ortiz, possuia duas faces, uma repressiva e outra discipl inadora - "a9 primeira * diz nõ.ar é puramente negativa; a outra é mais complexa, afirma e

incentiva um determinado tipo de orientação"1 . Ao mesmo tempo que agia repressivamente em relação ãqueles que ultrapassavam os limites impostos, o rígido Estado autoritário atuava com magnanimidade em relação àqueles que podia utilizar para manter uma imagem do país de progresso e desenvolvimento-

Apoio e estímulo não faltaram para as artes plásticas no

período de maior repressão- De forma direta, este apoio se

efetuava através da dotação de verbas e da criação de

organismos para atuar no sistema das artes plásticas; de forma

indireta, o apoio se dava através da ajuda a instituições

particulares do sistema das artes que, por seu turno,

garantiam a manutenção dos limites desejados pelo Estado-

Neste caso, é importante observar que não havia antagonismo

entre Estado e instituições artísticas, uma vez que em ambas,

depois dos expurgos realizados, atuavam como dirigentes

individuos da classe dominante, ou com ela identificados- O

que ocasionalmente ocorreu foram diferenças e disputas entre

11 Renato Ortiz - A moderna tradição brasileira. São Paulo, Brasiliense, 1988- p- 14. 183 frações da classe dominante, manifestadas em relação ao apoio a determinadas produções- Estas diferenças, no entanto, não eram profundas ou incontornáveis. Por outro lado, o apoio e estímulo oficial, principalmente através de verbas, constituiu uma forma de dinamizar uma nova ordem social e legitimá-la.

Um dos mais tradicionais apoios estatais para as artes plásticas foi a manutenção da Bienal de São Paulo, transformada em fundação permaneceu, ao longo de toda a década cie 70, sustentada por verbas públicos mantida em sua estrutura funcional por dotações federais, estaduais e municipais. Jacob

Klitowtz analisa: "o custo de uma exposição programada pela

Bienal de São Paulof durante dois mesesf tem o seguinte custo: 2 aluguel de um prédio de 32.600m em pleno Ibirapuera, mais o

eus *~-0 de um imenso estacionamento em área de grande

circulação, mais manutenção parcial de esritórios diploma ticos

localizados no mundo inteiro (alguns meses por ano, mais verba dotada (150 mil dólares) mais custo de dezenas de delegações 4 2 estrangeiras .

O Estado mantinha também apoios tradicionais, como

manutenção de museus públicos, dotações para museus

particulares e fundações, montagens de mostras no exterior

promovidos pelo Itamarati etc., como já foi visto no capítulo

anterior. Além disto, as empresas estatais tinham dentro de

12 Klitowtz, Jacob 30 minutos de televisão valem mais do que dois meses de Bienal. Isto é bom ou ruim. São Paulo, Sumus, 1981. p. 30. 184

seus custos a promoção de eventos de artes plásticas- Casos

típicos foi o salão da Eletrobrás em 71, subvencionado pela

empresa estatal Eletrobrás- Além de bancar eventos estas

empresas, muitas vezes ofereciam prêmios em dinheiro, como nos

casos da Bienal Internacional de São Paulo, do Panorama da

arte atual brasileira, (Caixa Econômica Federal) e Bienal

Nacional da Bahia (Banco da Bahia).

Outro custo do sistema das artes plásticas que o Estado o assumiu, foi a criação da FUNARTE em 1973 e, dentro dela, do

INAP (Instituto Nacional de Artes Plásticas). Este órgão, além de manter uma equipe permanente de funcionários, equipamentos e prédios próprios, dispunha de verbas para distribuir em eventos, instituições e projetos para as artes plásticas.

Muitos salões regionais foram realizados com verbas desta fundação, além da transformação do velho Salão Nacional da

Arte Moderna no Salão Nacional, renovando assim o prestígio de uma instituição em franca decadência. A problemática dos

Salões e a ação da FUNARTE neste setor ficam claras nas palavras de Walmir Ayala:

"Num momento em que todos os salões de arte

convencionais estofo sondo quest ionados f paulatinamente reformulados em salões temdticos ou promoções autônomas sem o método da livre

concorrênciaf mas com a orientaçõo crítica do

enfoque e do convite adequadof é de se desejar 185

um novo Salão Nacional do Ar to Modo ma f com a salutar abortura a todos os possíveis

cand idatos f com uma promoção quo atinja os centros monos privilegiados pela informação o 13 subvenção artística'

A FUNARTE publicou vários livros de arte; entre eles,

destaca-se a coleção "Arte Brasileira Contemporânea"

(1973/79), que privilegiou basicamente as vanguardas: Barrio,

Waltércio Caldas, Wesley Duke Lee, Carlos Vergara, Rubens

Guerchman, Lígia Pape, Lygia Clark, Antônio Manoel, Antônio

Dias, Cildo Meireles e Ana Bela Geiger. Inauguraram-se ainda,

nas instalações da fundação, galerias de arte, que abriram

espaços para novos talentos e também realizaram retrospectivas

de nomes já consagrados como Djanira em 76 e Pancetti em 77.

Analisando a atuação específica da FUNARTE e, dentro

dela, do Instituto Nacional de Artes Plásticas, órgãos

federais responsáveis pelas artes plásticas, observar—se que os dois padrões de atuação cultural do Estado, definidos por

Howard Becker, estão presentes. Por um lado, há uma orientação para o interior do país, valorizando as produções locais menos elitistas e, menos comprometidos com as vanguardas internacionais. Exemplo disto é o apoio a uma série de salões regionais de pequena envergadura, como os salões universitários de diversos estados. Por outro lado, os órgãos

13 Salão Nacional de Arte Moderna 1976. Walmir Ayala. Cultura Brasília ano 6, n- 22, jul./set. 76. p. 104. 186

federais apoiavam também o Salão Global, promovido pela Rede

Globo, voltado para as manifestações mais vanguardistas e com padrão mais elitista, evidenciados nos júris formados por críticos e artistas de renome. O que ocorre é, portanto, uma combinação destas duas orientações, evidenciando o tipo de compromisso que o Estado tem com os diferentes setores da classe dominante, articulando os mais modernos e os mais atrasados setores da produção. Expressa também a prática de modernização conservadora que o Estado teve tradicionalmente em relação às práticas artísticas. A modernização apoiada pelo

Estado, expressava e legitimava o ingresso do Brasil na etapa internacional monopolista do capitalismo, e o conservadorismo era a forma pela qual se mantinha cs privilégios das elites e as estruturas distintivas do sistema das artes. No próprio texto do relatório de atividades do INAP (79), pode-se encontrar explicitadas estas duas orientações, na definição de seus objetivos: "... democratizar o acesso aos meios de produção e consumo do artes plástica no Brasil... propiciar meios de veiculaçcío de trabalhos representativos da vanguarda brasileira no sentido de abrir mercados internacionais para a obra de arte brasi leira//14 .

As vanguardas, tão faladas, apoiadas ou perseguidas, devem ser tratadas com mais profundidade. Retomando o que já foi visto no capítulo anterior, destaca—se, nos anos 60,

14 Relatório FUNARTE - INAP. 1978. 187

principalmente na segunda metade, uma vanguarda que propôs intensa mobilização, envolvendo o espectador. Esta mobilização tinha, na maioria das vezes, cunho claramente político com o sentido de criticar as estruturas econômicas e políticas do país como foi o caso dos trabalhos de Pedro Escosteguy, Carlos

Vergara e Rubens Guerchmann, Sérgio Ferro, Flavio Império e outros. A partir de 68, e nos primeiros anos da década de 70, esta preocupação desaparece reprimida pela censura.

A partir de 69, as vanguardas nas artes plásticas, perseguindo a temática da participação que se originara no momento democratizante e politizado da realidade nacional, expunha uma liberdade criativa levada aos seus limites, que contradizia as restrições impostas pelo regime político implantado neste momento. Esta arte, proposta então, como contra—cu1tura, experimentava intervenções as mais diversas.

No entanto, não propunha interferências e modificações, senão em nível da própria obra. Ou seja, suas propostas de transformações simbólicas, se limitavam ao espaço de distinção mantido pelas artes plásticas.

Esta vanguarda atuava portanto no sentido de dinamizar o sistema das artes plásticas (tradicionalmente sob o domínio das elites) preenchendo o vazio cultural criado pelo Estado autori tár10.

Enquanto a censura atuava severamente em diversos setores 188

da sociedade, curiosamente, as vanguardas das artes plásticas apresentavam uma dinâmica atuação, de certa forma confirmando a afirmação inicial sobre o elitismo do sistema das artes plásticas e seu compromisso com a legitimação da superioridade das elites- A vanguarda foi um espaço de

liberdade para setores das elites, dentro dos limites impostos pelo Estado- E mais ainda, com uma linguagem hermética, era uma arte para cuja apropriação se exigia uma série de informações e uma formação que não estavam ao alcance da maioria da população- Retornava, assim, o elitismo do sistema das artes plásticas, questionado pelos projetos democratizantes da década de 60- Projetos estes que envolveram tentativas de democratização, através do enfraquecimento do seu papel de distinção social.

O significado das vanguardas no autoritarismo, pode ser observado, por exemplo, nestes dois depoimentos de artistas de vanguarda:

"Devido a uma série de situações no setor artes plásticas, no sentido do uso cada vez maior de

materiais considerados carosf para nossaf minha

realidadef num aspecto sóc io-econôm ico do terceiro mundo (América Latina, inciusivej, devido aos produtos industrializados nõo

estarem ao nossof meu alcance mas sob o poder

de uma elite que contestof pois a criação não

pode estar condicionadaf tem de ser Jivre... £

claro que a simples participação dos trabalhos 189 feitos com materiais precários nos circuitos fechados da arte, provoca a contestação deste sistema em função de sua realidade estética atuai" Barrio - 1969, Rio de Janeiro.

"Manifesto: Contra as categorias de arte contra os salões contra as premiações contra os júris contra a crítica de arte" Barrio - 1970, Rio de Janeiro.

"Eu me lembro que em 1963-69-70, porque se sabia que estávamos começando a tangenciar o que interessava, já não trabalhávamos com metáforas (representações) de situações. Estava-se trabalhando com a situação mesmo, real. Por outro lado, o tipo de trabalho que se estava fazendo, tendia a volatizar-se, esta já era outra característica. Era um trabalho que, na verdade, não tinha mais aquele culto do objeto, puramente as coisas existiam em função do que poderiam provocar no corpo social. Era exatamente o que se tinha na cabeçaz trabalhar com a idéia de público. Naquele período jogava-se tudo no trabalho e este visava atingir um número grande e indefinido de pessoas: esta coisa chamada público. Hoje em dia corre—se inclusive o risco de fazer um trabalho sabendo exatamente quem é que vai se interessar por ele. A noção de público que é uma noção ampla e generosa, foi substituída

(por deformação) pela noção de consumidor, que 190

é aquela fatia de público que teria o poder aquisitivo" Cildo Meireles — 1970, Rio de Janeiro.

Fica claro nestes depoimentos15 que toda a crítica que esta arte desenvolvia, se dirigia ao sistema das artes em si mesmo e não ao seu papel social. Eles se colocavam contra as categorias de arte, contra os salões, as premiações, os júris, a crítica de arte. Não abordavam as problemáticas da sociedade, onde este sistema inseria e nem questionavam o seu papel social ou a dominação simbólica por ele exercida. O que se percebe são intenções de renovação das relações artísticas, com fortes influências das correntes internacionais de arte povera, body art e arte conceituai. O uso de materiais de baixo custo, bastante válido dentro da realidade econômica e social do país, não é relacionado com o nível mais amplo da sociedade, mas unicamente com a atividade individual do artista. A preocupação não era colocar os meios de produção e consumo artísticos ao alcance de todos, rompendo com a lógica de distinção do sistema das artes plásticas. Mas abrir espaço para que novos indivíduos ingressarem no sistema, renovando-o mas artistas, mantendo-se a idéia mágica da criação. Se todos se tornassem artistas, desapareceria a lógica de distinção do sistema, como afirmou Bourdieu:

15 O dois textos (Barrio e Cildo Meireles) são citados nos seus respectivos livros da Coleção "Arte Brasileira Contemporânea" FUNARTE, 1979.

"O que quer dizer que neste jogo é preciso 191

fazer o jogo: os que iludem s<3o iludidos e iludem muito melhor quanto mais iludidos forem; eles são muito mais mistifioadores quando são

mais mistificados, Para jogar este jogof é preciso acreditar na ideologia da criaçrdo"1 -

Gutra questão importante presente nos discursos da vanguarda, é a ênfase na liberdade individual. Isto fica claramente colocado: "a criação não pode estar condicionada,. tem que ser livre"* Que liberdade era esta, total, sem condicionamentos, dentro de um país que vivia em um regime de exceção? Na verdade, era uma grande contradição. A arte como que negava a realidade política em que o artista vivia. Como se o artista pudesse sair fora da realidade concreta do país, através de seu trabalho. Aliás, era tônica deste momento de repressão, sair fora da realidade; a arte e a droga cumpriam, 17 assim, papéis bastante semelhantes . □ empenho era sair fora da realidade política em que o artista vivia. Como se o artista pudesse sair fora da realidade sócio—econômica e política através de uma supra realidade artística. Aparece, aqui, bem evidente, a crença no poder mágico de tranformação do trabalho artístico. Este era visto como um instrumento de mudança do mundo cotidiano, com poderes que, na verdade, não detinha um poder mágico de ação em um espaço de total

1<5 Pierre Bourdieu. Questões de Sociologia. 1983. Op. cit. 17 Quanto ao uso da droga e ao escapismo da época ver Luciano Martins. Geração f)/5. Ensaios de opinião. Rio de Janeiro, VII, 1979. 192

liberdade de criação. Era reforçada assim, a mitica da arte,

ao acreditar-se que ela podia transformar sozinha uma rea1 idade estabelecida.

Evidencia-se, assim, a ambigüidade do discurso e da ação destas vanguardas, cujo compromisso com o novo era, na verdade, um compromisso com a manutenção do status quo. E, quando questionam o culto ao "objeto artístico", presa fácil do mercado, propõem a sua substituição pelo culto da "ação artística". Negavam o valor do objeto das obras e seu fetiche, mas o substituiam pelo fetiche dos processos, mantendo todo um corpo de crenças mágicas sobre a arte, principalmente utilizando estas crenças para preservar o espaço de autonomia e distinção da arte, dentro de um panorama cultural que se via incorporado rapidamente á sociedade de massas. Esta oposição à cultura de massa, que revela também o elitismo do sistema das artes plásticas, é a responsável pela contraposição entre público e consumidor que os artistas faziam, num momento em que no Brasil se implantava uma sociedade de consumo. Alguns artistas tentavam reagir e este processo de inserção das artes plásticas, antagonizando o conceito de público com o de consumidor, o que de certa forma era tentar fugir à inserção desta problemática de consumo e desta cultura de massa que estava em pleno estabelecimento, com a qual teriam de conviver e, de certa maneira, seriam absorvidos. 193

O Estado era, neste momento, o mecenas que, sustentando o trabalho experimental, possibilitava que este ficasse, de certa forma, à margem da indústria cultural. Esta ação do

Estado, foi intensa na primeira metade da década de 70, sob a forma de salões e premiações. Pelo gráfico anexo, observar—se a concentração de salões na segunda metade de 60 e primeira de

70, e a proporção acentuada de salões oficiais neste período.

Esta foi, sem dúvida, uma das mais importantes formas de mecenato estatal para as artes plásticas. Principalmente porque os salões faziam a difusão das vanguardas, dinamizando o sistema, sem que as galerias comerciais fossem obrigadas a investir nesta produção de difícil colocação de mercado. Os salões eram responsáveis pela modernização do sistema das artes plásticas. Subvencionando—os, o Estado assumiu o ônus da modernização artística, de forma semelhante a que ocorria em setores da economia brasileira pós 64. Na economia, o Estado arcava com a infraestrutura, para que a iniciativa privada pudesse ter o retorno para seus investimentos. Assim, o dinheiro público sustentava os investimentos de maior risco, o que ocorria também nas artes plásticas.

Um pensamento claro, exposto sobre este papel do Estado, foi o de Frederico de Morais.

"/9os museus cabe promover a arte mais experimental, paralelamente à revisão dos valores do passado. A promoção da vanguarda

caberáf em primeiro lugar ao museuf com apoio 194

da crítica, O mercado virá, em seguidaf museu e mercado não devem se excluir mas se

complementar, Divididas as áreasf o sistema se completa , E progride"19 ,

"Poderá viver a arte+ e mesmo o mercado de

artef sem a atividade de laboratório de 4 p vanguarda f isto éf sem renovação de valores7

Suas queixas evidenciam uma cobrança em relação à atuação

do Estado como mecenas, sustentando um laboratório que

pesquisa a inovação para garantir a renovação do mercado- Esta

obra foi escrita em 75 e Frederico de Morais, como porta voz das vanguardas, estava a exigir mais investimentos do Estado-

Isto porque as pressões do mercado empresarial de arte estavam

já suplantando a atuação do Estado e exigindo dos artistas novos comportamentos, evidenciados na análise de Roberto

Pontual:

". ., a nossa arte mais aguerrida de agora tem preferido retornar aos seus antigos espaços

fechadosf ainda que geralmente os modificando para se adaptarem ao cara ter não ortodoxo das apresentações, Esse fenômeno da reafirmação da adequabil idade do interior dos museus e galerias para a experimentação atual e de recuperação da especificidade do artista, que antes parecia encaminhar-se rumo ao anonimato esta merecer uma análise mais detida, O que

10 Morais Frederico (O Globo 30/12/75 Artes Plásticas, 1975: Ano bom, ano decisivo. ip Frederico de Morais. Artes Plást icas: a crise da hora atual.Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975, p. 117. 195

convém adiantar por enquanto é que ele talvez derive de uma situação nova de relacionamento

da vanguarda com o mercadof a ponto de que a negação deste -último por parte da primenria se faça nos termos de um circuito prévio a que todosr mais ou menos conscientemente, acabam se sujeitando. Sujeição que, na verdade, deve ser 20 vista também como tática"

O que se destacar, como realmente específico ao longo dos anos 70, foi a maneira articulada com que o apoio estatal se estabeleceu. Várias instituições se conectavam em uma malha de estímulo e controle das práticas plásticas, envolvendo um grande número de "administradores da cultura". A figura do intelectual, funcionário estatal, com intensa atuação no sistema das artes plásticas, como Walter Zanini, Diretor do

Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, reponsável pela seleção de representações brasileiras em diversas exposições no exterior. Diretor da Bienal

Internacional de São Paulo,é típico no segundo a metade dos anos 60, e primeira metade dos anos 70. A extensão de sua influência aparece no depoimento de Anna Bella:

"... começo a participar de exposições no exterior através de convites que vinham para o MAC, quando o Zanini dirigia o MAC. Este local, quando o Zanini dirigia passou a ser um ponto de contato com o exterior e com o exterior que

20 Pontual, Roberto. Jornal do Brasil, i/li/75. Rio de Janeiro. 196

compreende este trabalho no momento em que esta sendo feita//21

O Estado, representado pelas instituições que sustentava economicamente e pela ação de seus administradores, desempenhava um papel fundamental na integração que estava se consolidando, das instituições culturais com o setor empresarial. A verdade é que o Estado autoritário processou o desenvolvimento do capitalismo no Brasil não só em nível econômico e social, mas também em nível das representações simbólicas, estabelecendo uma relação mais orgânica entre os intelectuais e os setores empresariais. Os interesses globais dos empresários e do Estado, em relação ás artes plásticas, eram os mesmos: legitimação das estruturas de poder e afastamento das artes plásticas dos problemas econômicos, sociais e políticos da maioria da população.

5.2 - Fortalecimento das instâncias de difusão e supremacia do

mercado empresarial

A década de 70, no nível das artes plásticas, pode ser caracterizada como o período de consolidação do mercado de arte empresarial no país. Este processo, no entanto, já se desencadeara um pouco antes. O período de 68 a 73 é conhecido

21 Depoimento de a autora. 11 nov. 1987, Porto Alegre. 197

no Brasil pela denominação de "milagre brasileiro", se caracterizando como um dos mais favoráveis para a acumulação monopolista. Foi uma época das mais rendosas para o capital, aceleraram-se as taxas de acumulação, a concentração da renda, o incremento das exportações e principalmente ocorreu uma rearticulação e concentração do sistema financeiro. Tudo isto encaminhado através de uma atuação do Estado que favorecia a acumulação de capital, extorquindo das massas trabalhadoras as conquistas que haviam obtido no período populista.

"Enquanto as classes monos favorecidas da populaçdio assistiam do mdos amarradas ao enco-

lhimento de sou poder aquisitivof os segmentos mais elevados da classe média oram favorecidos

pela própria dinâmica da acumulação do capitalf norteada pelos bons do consumo duráveis Na verdade, a formação do um mercado consumidor suficiente para as necessidades de acumulação

deveu—se em parto f ao aperfeiçoamento do sistema financeiro nos anos óO o TO (quo corta — monto ampliou a capacidade de endividamento de toda a sociedade.) e, em parto à demanda automa- ticamente gerada pela dinâmica do próprio processo de acumulação, quo pagou maiores salários â mão—do—obra qualifiçada, relativa— monto escassa no país7

Neste quadro econômico se estabeleceu um novo padrão de consumo, baseado nos bens duráveis (automóveis, eletrodomésti—

22 Mantega, Guido e Moraes, Maria. Acumulação Monopolista e Crises no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979. p. 62. 198

cos), destinados também aos extratos médios da população, beneficiados pela disputa de mão-de-obra mais especializadas, empreendida pelos monopólios.

O mercado de arte apresenta algumas inovações que se colocam como parte destas modificações que estavam se implantando em nível econômico. □ impulso inicial do setor empresarial nesta área, que se estabelecera na primeira metade dos anos 60, se arrefecera. A ele, no entanto, foi dado nova expansão a partir de 69, com uma série de leilões produzidos por espaços especializados, entre os quais se destacaram a

Petite Galerie (RJ), a Bolsa de Arte (RJ), a Collectio (SP).

"... os l&ilõ&s não apenas tiveram seqüência como ainda conseguiram uma projeção incomum entre os colecionadores de São Paulo. O total

de obras arrematadas foi além das espectat ivas f motivando até dúvidas/protestos de alguns setores preocupados com a alta violenta dos preços das obras. Os realizadores dos leilões, no entantoem várias oportunidades procuram demonstrar que nada mais estava acontecendo do

que a consecução do preço médio da obra e quef isso sim, o mercado crescia em função do interesse cada vez maior dos novos coleciona- dores . Verdade ou não, o certo é que em São Paulo nunca houve tanta celeuma/aquisições em torno de pinturas, desenhos, gravuras do que nos últimos dois anos. Quanto aos preços justos, irão predominar, mais tempo menos tempo, pois o 199

comprador de Arte estd aprendendo tudo sobre cotações ^.

Estes leilões mtroduzem novas práticas na comercializa-

ção das obras de arte. Primeiro, porque eles são sustentados prepoderantemente por obras de artistas brasileiros contempo- râneos, o que não ocorria até então, quando os leilões tinham como linha de trabalho, peças de antigüidades e artistas acadêmicos europeus e brasileiros. Os leilões de novo tipo eram realizados sob a orientação de marchands especializados, sendo destacada a atuação de José Paulo Domingues, dono da galeria de arte Collectio. Além da seleção das obras, na qual utilizavam seu know how de mercado e seu conhecimento da produção plástica brasileira, estes marchands eram também responsáveis pelos esclarecimentos ao público durante o pregão. Seus esclarecimentos funcionavam como forma de orientação dos compradores, mas também para a formação de um público específico. Cada peça levada ao pregão era descrita, classificada; eram fornecidos dados técnicos sobre o artista e a obra, que constituíam verdadeiras aulas de história da arte.

Estes leilões concorreram, portanto, para que, neste momento, os setores sociais enriquecidos pelo processo de acumulação, bem como os setores médios, enriquecidos pelas possibilidades de absorção do mercado de trabalho de mão—de—obra mais qualificada, pudessem adquirir um capital cultural e, assim,

23 Anuário das Artes. São Paulo, APCA, 1972, Ivo Zanini. p. 96. 200

tornarem-se público consumidor no mercado de arte local. G

papel desempenhado por estes leilões foi muito importante para

a estruturação do mercado de arte brasileiro. Eles eram

realizados em espaços sofisticados, na própria galeria, em

salões de hotéis ou outros locais de status; os convites eram

destinados a um público selecionado, as obras eram

relacionadas em catálogos sofisticados, com reprodução a cores

das obras mais importantes dos lotes e havia durante o leilão,

o oferecimento de coquetel. Estes eventos sociais distinguiam

aqueles que recebiam convites e dele participavam. Fazer

lances era fonte de distinção, principalmente porque os

destaques da noite eram, em geral, noticiados em crônicas

sociais. Esta distinção social foi importante para as relações da nova elite, enriquecido com os lucros dos monopólios, que se impunha economicamente e estava consumindo arte no Brasil.

Os novos extratos eram uma fatia importante do mercado consumidor, mas não estiveram ausentes destes leilões os setores das elites tradicionais. Nos leilões foi comercializada a maior parte das obras do modernismo brasileiro e também se abriu espaço para a produção mais atualizada. A presença predominante de modernistas e abstratos pode ser observada no anexo.

As peças de destaque, nestes leilões, eram obras da arte brasileira, já histórica (anos 20, 30 e 40). Os leilões promoveram uma grande valorização dos modernistas, uma vez que 201

estas aquisições eram consideradas como investimentos de altos

lucros. Sendo uma produção dotada e limitada (a maioria dos

artistas eram já falecidos), contava com o fator escassez, que

lhe garantia o valor. Esta retomada da arte "histórica"

expressava uma orientação do sistema das artes como meio de

legitimação das elites enriquecidas com o processo de

acumulação monopolista. Este acervo se prestava à acumulação

de um capital cultural adquirido pelas novas elites. A disputa

por estas obras históricas foi, de certa forma, a disputa por

participação em uma história cultural e artística por parte de

grupos econômicos ou de indivíduos enriquecidos neste período.

Paralelamente a sua colocação nos leilões, estas obras

históricas, neste período, foram objeto de grandes mostras

retrospectivas, como por exemplo as obras de Lasar Segai 1 no

Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em 69.

Em conseqüência desta dinamização do mercado, a compra de

obras de arte começou a ser olhada fundamentalmente como um

investimento. Neste clima de especulação, a aquisição de um

óleo de Portinari era feita com o mesmo raciocínio despendido nas aplicações imobiliárias. Os valores da arte passaram a ser determinados pelo mercado, através de fortes e organizadas empresas especializadas em exposições e leilões responsáveis

por vendas em grande escala. Grupos financeiros estiveram

ligados aos leilões, destacando-seo Banco Real e o Nacional. 202

Eles eram responsáveis pelo financiamento das obras- Farta documentação ilustra o crescimento dos investimentos em artes plásticas.

"Antes era o mercado de imóveisf depois o de papéis- Agora é o de arte- Investir em arte

hojef é mais seguro do que aplicar em ações ou

em captaçõo imobiliária.»- aplique em artef ganhe na certa//24-

No bojo desta especulação com a arte, além dos modernistas históricos, foi comercializada uma leva de modernistas de segundo escalão. Orlando Teruz foi um exemplo típico- Seus quadros alcançaram cifras exorbitantes e, embora tivesse uma imensa produção, não conseguia dar conta das encomendas- Primitivistas também foram absorvidos neste processo, em que eram oferecidas obras de arte para combinar com a decoração das novas mansões que a especulação imobiliária produzia, atendendo às exigências daqueles que se enriqueciam com a concentração de capital promovida no país, com o apoio do Estado autoritário- O grande número de leilões neste período evidencia a dinâmica do mercado de arte.

O mercado de arte se implementava, ainda, com a criação de novas galerias de arte, a Collectio aparece como deflagadora de um novo processo. Sua breve trajetória (69-73)

24 Artes: São Paulo, 1971, ano VI n2 26 "Mercado de Arte" Carlos Von Schimidt. 203

inaugurou em São Paulo e, mesmo no país, uma forma de tratar a obra de arte semelhante a que estava ocorrendo nos grandes mercados internacionais — como investimento- Criada em fins de

69 por José Paulo Domingues, esta galeria foi responsável pelo mais dinâmico empreendimento da área neste período. Na

Collectio trabalharam Raquel Arnould Babenco e Nonica

Filgueiras. Um dos eventos mais importantes promovidos foi a mostra, acompanhada da publicação do livro "Arte Brasil Hoje -

50 anos depois", sob a coordenação de Roberto Pontual-

Destacando obras e artistas, desde a semana de 22 até 72, o crítico de arte selecionou também o acervo que foi adquirido

pela galeria- A Collectio aproveitou o momento propício da

economia, (o "milagre brasileiro") com capitais disponíveis,

envolvendo, em transações de artes plásticas, o sistema

bancário e o mundo dos negócios- Por sua intervenção, foram

abertas linhas de financiamento para aquisições, e se

deslocaram para o mercado de arte boa parte do capital

especulativo que abandonara a bolsa de valores. A derrocada da

galeria, em 73, teve mais a ver com ações especulativas de seu

proprietário do que com a recessão do mercado de arte- Prova

disto é o crescente avanço do mercado que se consolidava na

segunda metade da década de 70 o que pode ser observado no

anexo-

Os segmentos enriquecidos do empresariado constituiam uma

importante fatia do mercado de arte, mas os segmentos médios. 204

mão-de-obra mais especializada, exigida pelos novos processos

produtivos (executivos e técnicos especializados), também

foram acréscimos para o público consumidor de artes plásticas.

Para estes segmentos de poder aquisitivo mais restrito, o

mercado ofereceu uma proposta específica: a obra múltipla.

Gravuras assinadas e numeradas, pequenas esculturas em bronze,

terracota ou resina, fizeram parte dos muitos objetos de arte

disseminados no mercado, ao longo da segunda metade da década

de 70. Ainda em 71, foi criada a galeria de Arte Aplicada, em

São Paulo, voltada basicamente à comercialização de "objetos"

absorvendo uma fatia especifica de consumidores. Também nesta

linha atuou as galerias "Múltipla" (73) e Skultura (75). Este

tipo de atuação setorizada evidencia o desenvolvimento e a

amplitude que o mercado de arte vai atingindo ao longo da

década de 70. Testemunha do impulso dado a este tipo de

produção é o seguinte reclame publicitário:

"Gravuras de todas as técnicas e tendências de autores nacionais e internacionais, especializada em programação de paredes de

escritóriosf hotéis, saguões e residências, 25 edições de gravuras para brinde"

No entanto, apesar desta produção mais ampla, a circulação da obra de arte plástica manteve-se ainda bastante restrita. A introdução do múltiplo, na verdade, ampliou o

23 Vogue Arte, maio 77, n- 2, p. 21, reclame publicitário. 205

número de compradores e as possibilidades de lucro dos

revendedores, sem criar uma real alteração do elitismo deste

circuito, cujo destaque é ainda a obra única e a assinatura do

artista. O valor da obra, de certa forma, não é estabelecido

pela concorrência de mercado e aceitação do público, mas pela

sua inserção no circuito de difusão que lhe legitima. Esta

condição do consumo das artes plásticas sujeita o comprador e

artistas, às ingerências dos difusores (marchands, críticos,

diretores de instituições), uma vez que não é a aceitação do

público que define o sucesso de determinadas obras, como

acontece, por exemplo, na literatura e no cinema.

A partir de 1973, articulada com a crise internacional do

petróleo, a economia brasileira apresentava as fissuras do seu

projeto autoritário e concentrador• Neste momento, já se

anunciava no país que o ciclo de acumulação ultrapassara o

ápice e iniciava seu declínio, estimulando o crescimento de

oposição. Diversos setores soeiais desfavorecidos pe1o mode1o

de desenvolvimento, implantado pelo Estado autoritário

monopolista e mobilizaram divergências no interior do bloco de

poder. A abertura democrática que se ensaiou nesse momento

foi, por um lado, resultado destas pressões sociais e, por

outro, de uma estratégia de conservação do poder por parte dos

grupos dominantes. Esta abertura teve como conseqüência um

certo reaquecimento da produção cultural. Além disto, um

processo interno do próprio mercado de arte exigiu mudanças na 206

produção plástica. PraticaíTiente todo o acervo dos "Históricos'1

havia sido comercializado (principalmente através dos leilões

de arte), estando nas mãos de colecionadores; o mercado

necessitava de novas produções e valores, novo material para

trabalhar. Aliaram-se, assim, os interesses do mercado de

arte, que abria espaço para as novas produções, à fermentação

democrátrica que estimulava a produção artístiva com acenos de

"abertura". Retornaram à cena vários artistas da década de 6U e muitos novos se introduziram.

Carlos Vergara, que fizera sua última exposição

individual em 69, na Petite Galerie, retornou, em 73, com uma exposição individual na Galeria Luiz Buarque de Holanda; neste mesmo ano ele realizou também um painel para a sede do Jornal do Brasil no Rio de Janeiro. Rubens Guerchman, que expusera no

Brasil, em 68, na Galeria Relevo, voltou a expor individualmente em 73, na Galeria Ralph Camargo. Geraldo de

Barros, que fora ligado ao Grupo Rex retomou uma abstração que lembrava a arte concreta. Pouco a pouco encontravam—se mais fortes as expressões artísticas tradicionais (quadros, esculturas e gravuras) que pareciam esgotadas. Processo este no qual os artistas brasileiros também acompanham a tendência internacional. Segundo Olney Krüse

"A Bienal de São Paula deste ano, deixou uma lição para os artistas brasileiros. Depois de Rafael Canogar, Folon provou que para ser 207

artista atual atuante (ou contestador) não é necessário ser óbvio ou planfetário. Basta ser sutil, criativo, ter um traço simples e suave, cores delicadas, imaginação*■ Para analisarmos o compromisso social, poli tico e cínico do homem, não é preciso som, ruído, espalhafato "vanguarda"- O recado pode estar (como esta} num guache"2**.

No Brasil, o Estado, enfrentando a crise de seu modelo de desenvolvimento, buscava encontrar um equilíbrio entre a repressão seletiva e o restabelecimento de mecanismos de representação, que atraíssem, para sua sustentação, grupos de classe média e de elite até então afastados pelos excessos de repressão ou por interesses específicos não atendidos. A década de 60 havia sido caracterizada por uma orientação participativa e politizada, em termos das artes plásticas, isto é, pela preocupação temática e pela ampliação do acesso

às obras às camada mais amplas da população, os anos 70 apresentam, como tendência global, o aumento do volume e da dimensão do mercado de arte, afastado, porém, de preocupações democratizantes mais amplas e fortalecendo o elitismo típico deste tipo de produção. 0 mercado se ampliava e se especializava abrangendo diferentes produções destinadas a diversos tipos de público, capazes de se tornarem consumidores. Um levantamento dos nomes citados nas muitas

2<5 Anuário das artes. São Paulo, ARCA, 1973/4, Olney Krüse. p. 106. 208

publicações de artes desta década permite constatar esta tendência à ampliação de diversificação da produção. Estas publicações por seu turno fazem parte de dinâmica de fortalecimento das instâncias de difusão que também caracterizou este período. O grande n— destas e a qualidade do material utilizado (fotos coloridas e papel brilhoso e luxuosas encadernações) contrastam com o que se pode encontrar na década anterior (anexo).

No impulso que tomou o mercado de arte, incorporando novos artistas (na sua maioria jovens), foi fundamental a criação da "Galeria Global" em São Paulo (1974). Ainda no ano de 74, expuseram na galeria Milton Da Costa, Vanda Pimentel,

João Carlos Galvão, Guilherme Faria, Anna Maria Maiolino,

Paulo Roberto Leal, Flavio Shiró, Bruno Giorgi, Tomie Otake,

Edival Ramosa Hércules Barsotti e Júlio Pare. Atuando de

forma empresarial, responsabi1izado—se pelo convite—catálogo, coquetel e todas as despesas de divulgação, para as quais utilizavam os meios de comunicação de massa de que dispunham,

a galeria se colocava como intermediária, atuando na difusão.

Cumpria, assim, um papel básico nesta estruturação empresarial

do mercado dentro dos moldes internacionais monopolistas, onde

o controle dos meios de difusão garante aos intermediários um

poder enorme dentro do sistema das artes plásticas. Atuou como

Marchand, neste empreendimento, e como orientador artístico,

Franco Terranova (dono da Petite Galerie) e Rachel Babenco que 209

trabalhara na Collectio- Com larga experiência, eles deram à

galeria o perfil empresarial coerente com os novos tempos, contando para isto com as possibilidades de infra—estrutura da

Rede Globo. Esta aliança com grandes grupos, ligados aos meios de comunicação ou outros setores, como o capital financeiro,

se tornou uma tendência do mercado. A Galeria Global

trabalhava com nomes ja consagrados, mas seu grande papel foi

realmente abrir espaço para novos talentos, como produto que o mercado absorvia, principalmente porque, como foi observado os novos extratos sociais enriquecidos eram constituídos, em grande parte, por jovens executivos com amplos contatos

internacionais, interessados em encontrar aqui uma produção

tão moderna e arrojada quanto a dos grandes centros.

As vanguardas, que fermentaram nos laboratórios,

sustentandos pelo Estado (salões. Museu de Arte Contemporânea da USP, Espaço Experimental do MAM/RJ, etc.) foram a resposta

ao mercado em expansão. Para colocá-los em circulação, além da

Galeria Global, outros espaços foram criados. Luisa Strina abriu sua galeria em São Paulo, em 74, trabalhando exclusivamente com um grupo de artistas ela inaugurou um novo estilo que se evidencia em um anúncio publicitário onde ela

aparece pessoalmente fazendo a seguinte afirmação:

"Eu repreento os artistas, /4Ian Shields, Babinski, Baravelli, Edo Rocha, Fajardo, Hamaguchi, José Rezende, Nelson Leirner, 209

trabalhara na Collectio. Com larga experiência, eles deram à

galeria o perfil empresarial coerente com os novos tempos,

contando para isto com as possibilidades de infra—estrutura da

Rede Globo. Esta aliança com grandes grupos, ligados aos meios

de comunicação ou outros setores, como o capital financeiro,

se tornou uma tendência do mercado. A Galeria Global

trabalhava com nomes ja consagrados, mas seu grande papel foi

realmente abrir espaço para novos talentos, como produto que o mercado absorvia, principalmente porque, como foi observado os

novos extratos sociais enriquecidos eram constituídos, em

grande parte, por jovens executivos com amplos contatos

internacionais, interessados em encontrar aqui uma produção

tão moderna e arrojada quanto a dos grandes centros.

As vanguardas, que fermentaram nos laboratórios, susten tandos pelo Estado (salões. Museu de Arte Contemporânea da USP, Espaço Experimental do MAM/RJ, etc.) foram a resposta ao mercado em expansão. Para colocá-los em circulação, além da

Galeria Global, outros espaços foram criados. Luisa Strina abriu sua galeria em São Paulo, em 74, trabalhando exclusivamente com um grupo de artistas ela inaugurou um novo estilo que se evidencia em um anúncio publicitário onde ela aparece pessoalmente fazendo a seguinte afirmação:

"Eu repreento os artistas, /4Ian Shlelcfs, Babinski, Baravelli, Edo Rocha, Fajardo, Hamaguchi, José Rezende, Nelson Leirner, 210

27 Waltércio Caldasf Wesle/ Duke Lee" -

Mesmo ampliando-se numérica e diversificadamente- o mercado manteve—se restrito em comparação com o crescimento do consumo em geral que ocorria no país; nele circulavam poucos objetos, cujo valor estava em estreita relação com a exclusividade. Por isso, as reproduções eram sempre em número restrito,numeradas e assinadas, para garantir a permanência de certa aura de distinção, imprescindível à manutenção do próprio sistema.

"Todos também parecem céticos em relação ao chamado processo de democratização da arte,

pelo menos a curto prazo. Guerchmanf talvez o mais preocupado com esta questão, é o primeiro a reconhecer que o 'destino da obra, depois que 2 8 faço, é incontroldvel"

O processo de difusão tornou—se mais importante dentro do sistema das artes plásticas, fugindo praticamente das mãos do artista. As instâncias de circulação passaram a ter crescente importância. Por instâncias de circulação, entende-se o conjunto de meios de comunicação e das instituições que promovem circunstâncias capazes de fazer chegar ao consumidor os objetos e eventos artísticos. É importante constatar que estes canais de escoamento da produção, por seu turno, são

27 Vogue Arte, nov. 77, n2 2, p. 8. Anúncio publicitário. 20 Ronaldo Brito e Heliosa Buarque de Holanda. "Explosão de mercado e crise de criação" Opinião n2 54, 19, nov. 73, p. 26. 21 1

também os meios de sua legitimação- Veiculado como "arte", determinado objeto ou evento passava a ser consumido como tal; assim, um dos principais papéis que as instâncias de circulação assumiram foi o de legitimação, advindo, daí, seu fortalecimento. O fortalecimento das instâncias de circulação pressupõe o aumento do número destas e a sua diversificação, mas se caracterizou principalmente pela importância que estas adquiriram dentro do sistema das artes plásticas ao longo dos anos 70.

□s meios de comunicação social; jornais e revistas foram importantes canais de difusão, eles atuaram em dois níveis.

Primeiro, no sentido de divulgar para o grande público o que estava ocorrendo dentro do sistema das artes, reforçando a distinção deste circuito- Segundo, na difusão de idéias, valores e correntes estéticas dentro do próprio sistema, participando das disputas internas. No primeiro caso, atuavam, por exemplo, os artigos e colunas de arte em jornais e revistas dirigidos ao grande público; no segundo, os meios especializados, como as revistas de arte. Ao longo dos anos 70 aprofundou-se a separação entre a divulgação interna ao sistema aquela voltada ao grande público. Tendeu a se disseminar, nos jornais e revistas de grande circulação, o

"colunismo de arte", diferente da crítica de arte que se difundira nos anos 60. Ou seja, aumentou o número de colunistas que relatavam eventos, documentando e divulgando o 212

que estava ocorrendo em termos de arte plástica, sem um posicionamento crítico ou discussão de tendências- Na crítica de arte, que se desenvolvera nos anos 60, estivera muito mais evidente o posicionamento dos críticos, das colunas assinadas, que traziam explicitamente as posições daqueles que eram por elas responsáveis. O sumário de um exemplar da revista "Arte

Hoje" permite verificar também o enfoque homogeneizador com que os mais diversos temas de arte e as mais antagônicas tendências eram tratadas. "A rebelde primavera de Visconti",

"O Nepal" de Antônio Dias, "Barsotti,a cor em volume", "Andy

Warhol , indiferença dand1/" "A nobreza do móvel inglês"

"Pintando com fotos" "Arte como supérfluo" "Polêmica 2P concretista" "Os projetos do NAM" . A "neutralidade" do colunista e a homogeneização das tendências foi uma orientação mais genérica dos meios de comunicação na década de 70, e não uma orientação específica em relação as artes plásticas.

Outra tendência dos anos 70 foi a redução dos espaços diários dedicados ás artes plásticas e o aparecimento dos cadernos especiais de cultura, como por exemplo o Caderno 2 ou

Caderno 8, ou Folhetim onde são tratados sob forma de reportagem alguns eventos de mais destaque. Nos anos 70 observa-se um acentuado crescimento no espaço dedicado às artes plásticas nos meios de comunicação de massa, acrescendo-se a isto o aumento significativo de publicações

2Í> Sumário. Arte Hoje, out. 77, ano i, n— 4, p. 5. 213 periódicas destinadas ao grande público. A revista Realidade aparecerera como grande novidade ainda em 65, mas na década de

60 ocorreram novas inovações, no setor editorial, com "Veja"

(1973) e "Isto É" (1975). Mas dinâmicas, estas revistas apresentavam espaços específicos para divulgação de artes plásticas. Inicialmente estas colunas não eram assinadas, mas havia um crítico especializado respondendo por elas, como foi o caso de Harry Lauss na "Veja". Posteriormente passaram a ser assinadas por Glívio Tavares de Araújo (Veja) e Geraldo Edson de Andrade (Isto É). Estes espaços eram de pouco destaque, no corpo de revistas, em geral relatam eventos, com pequenos comentários do crítico e ilustrados com fotos coloridas. No entanto, mesmo não havendo uma crítica mais aprofundada, estes comentários eram importantes para a divulgação, sendo bastante disputados por galerias instituições e artistas, pois eles garantiam, uma difusão nacional o que não ocorria com os jornais. A importância dos espaços de arte nos meios de comunicação de massa pode ser observada, ainda, pelo fato de que a maioria dos críticos de destaque dentro do sistema, desde a década de 60, tiveram, pelo menos por algum tempo, atuação nos meios de comunicação. Neste caso estão: Roberto

Pontual (Jornal do Brasil) Frederico Morais (O Globo) Ivo

Zanini e José Geraldo Vieira (Folha de S. Paulo) Olivio T.

Araújo (Veja) Casimiro Xavier de Mendonça (Veja) Walmir Ayala

(Jornal do Brasil) Ronaldo Brito (Opinião) Antônio Bento

(Diário da Noite) Harry Lauss (Jornal do Brasil) Olney Krüse

(Jornal da Tarde). 214

Em termos de revistas específicas de arte., deve-se

destacar que, das revistas lançadas na década de 60,

praticamente a única a sobreviver, ao longo de 70, foi

"Artes", mesmo assim de forma irregular. Um novo surto

editiorial, no entanto, se desencadeou na segunda metade dos

anos 70, inaugurado com o lançamentos de "Malasartes" e "Vida

das Artes" (1975). A primeira era uma revista organizada e

dirigida por artistas plásticos e críticos: Vergara, Carlos

Zílio, Ciido Meireles, José Resende, Baravelli, Rubens

Guerchman, Waltércio Caldas, Bernardo Vilhena e Ronaldo Brito.

Lançada no Rio de Janeiro, ela contava com integrantes também

de São Paulo. Voltada basicamente para as artes plásticas,

veio ocupar um espaço importante, pois era bastante

aprofundada em seus artigos, atuando, assim, não só na

informação como na formação dos artistas e do pessoal de

apoio. Sua leitura exigia uma série de informações que a

colocava como destinada a produtores e especialistas.

Praticamente não tinha publicidade, destinava-se a veicular as

vanguardas; desapareceu após o terceiro número, não por

dificuldades de editoração, mas por divergência internas30.

Vida das Artes, lançado em 76, era uma revista com orientação mais abrangente, com artigos e reportagens sobre assuntos variados, privilegiando tendências diversas. Os artigos eram assinados por críticos e estudiosos como Aracy

30 Conforme depoimento de Carlos Zílio à autora. 1987, Rio de Janeiro. 215

Amaral, Frederico Morais, José Roberto Teixeira Leite e

outros. Apresentavam alguma publicidade, em geral ligada ao

setor (galerias, lojas de decoração ou distribuidores de

material de desenho...) seu papel era de qualidade e com farta

ilustração a cores. José Roberto Teicxeira Leite, crítico de

arte reconhcido dentro do sistema das artes, um de seus

editores, dando à revista uma orientaçãdo especializada,

voltada à formação e informação de produtores e consumidores.

Em 1977, foram lançadas Arte Vogue e Arte Hoje. A

primeira, sob a direção de Pietro Maria Bardi, tinha uma

orientação adequada ao jornalismo mais contemporâneo,

destinando-se a atender interesses diversos, e a estimular o

mercado. Era dinâmica em termos gráficos e de reportagens,

apresentando farta publicidade, articulada com as matérias de

arte. Pode ser considerada uma publicação de luxo, com fotos e

papel de excelente qualidade e diagramação profissional. Seus

artigos eram assinados: havia ainda secções diversas e uma

presença marcante de matérias relativas ao design e

arquitetura. Arte Hoje, cujo editor era Roberto Irineu

Marinho, abordava principalmente a arte histórica e

internacional, com pouca matéria sobre a arte brasileira do

momento. Os artigos eram mais de divulgação do que críticos,

e, em pequenas notas, eram apresentados ocasionalmente obras e eventos da atualidade local, com comentários de aspectos

formais: regularmente, apresentava, ainda, um secção de 216 leilões. Era uma das únicas revistas de arte com organização empresarial, mantendo repórteres e fotógrafos contratados e inserindo a publicidade no texto.

Em termos gerais, estas publicações tinham uma estrutura bem mais complexa e profissional do que as da década de 60.

Utilizavam meios mais sofisticados (papel de melhor qualidade, ilustrações a cores, etc.) e apresentavam mais anúncios pub 1 ic i tá.r ios e artigos de divulgação. Com exceção de fia 1 asar te, pode—se dizer que se destinavam mais ã formação e informação do público consumidor do que a dos produtores. No entanto, as revistas da década de 70, semelhantemente às da década anterior, tiveram vidas breves: Malasarte com os trés números; Vida. das de 75 a 76; Arte Hoje, de 77 a 79 e

Vague Arte, de 77, Apesar de terem uma organização bem mais empresarial e luxuosa que as de 60, não conseguiram permanecer por longo tempo. Isto evidencia o resetrito mercado de artes plásticas no país e o fato de que a circulação passava por diversos meios. O museu e a galeria faziam a difusão de maneira mais direta, indivíduo a indivíduo. Os compradores procuravam mais o apoio de marchands e outros especialistas na orientação de suas aquisições do que uma formação pessoal através da leitura de publicações especializadas. O consumo artístico se caracteriza assim como status social e não como a consolidação de um capital cultural. Colunas de artes plásticas, nos meios de comunicação voltados ao grande público, somente se destinavam a apresentar socialmente uma 21 7 fachada destas relações, bastante restritas a uma elite de in iciados.

Os museus, instituições responsáveis também pela difusão, como já foi visto, e eram, sua maioria, públicos ou mantidos com verbas públicas, o mesmo ocorrendo com salões e outras grandes mostras. O Estado, como principal financiador, foi, portanto, um dos mais importantes elementos de disfusão e legitimação, embora não aparecesse claramente como tal. Os adminisitradores, cuja escolha também levava em consideração aspectos políticos além de técnicos, detinham um poder que somente rivalizava com o dos marchands. E, mesmo neste caso, não se rivalizavam, mas se articulavam, uma vez que a legitimação dada pelas instituições era reconhecida e manipulada comercialmente pelas galerias. Além disso muitas vezes realizavam atividades conjuntas galerias e instituições oficiais, como por exemplo a ,, I Mostra do Móvel e Objeto

Inusitado", promovida pela Galeria Arte Aplicada sob o patrocínio da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo,

1978. Ou ainda apresentavam mostras paralelas aos grandes eventos das instituições oficiais como a Bienal Internacional de São Paulo.

A importância das instituições culturais (no caso das artes plásticas a mais destacada é o museu) na difusão das produções vanguardistas, com maior dificuldade para serem colocados no mercado, aparece ao longo de toda a década de 70. 218

Em 75, por exemplo, foi criado o espaço experimental do MAM do

Rio de Janeiro, por influência de artistas da vanguarda, entre os quais se destacava Cildo Meireles. Aracy Amaral, que assumiu a dire ção da Pinacoteca Estadual de São Paulo em

1975, organizara em 1976, a Expo/Pro j eção, dest\riada a artistas plásticos que estivessem pesquisando meios não convencionais. E, durante sua gestão na Pinacoteca deu especial destaque aos projetos de vanguarda. Walter Zanini, na direção do MAC-USP, por seu turno, organizou o Salão Jovem

Arte Contemporânea e muitos outros eventos, favorecendo sempre propostas experimentais e suas conexões internacionais.

Deve—se destacar que muitos destes jovens "descobertos"11 em promoções de instituições culturais foram, posteriormente, assimilados pelo circuito comercial. Muitos deles, inclusive, aprsdentavam em galerias trabalhos mais adaptados ás condições de exposição e comercialização, deixando para os espaços

"culturais", as experiências mais ousadas. Assim se estabeleceu a articulação: no museu expõe às realizações exóticas e ousadas, que davam notoriedade, e na galeria a produção mais comercial, que oferecia um retorno econômico.

Este tipo de ação conjunta dos canais de difusão se articularam ao longo dos anos 70, no Brasil, evidenciando, no sistema das artes plásticas, a aliança entre Estado e a acumulação privada de capital, presente da economia em geral.

Esta orientação, no entanto, descontentava alguns setores como pode-se observar: "Durante cerca de quinze anos a arte - ou a atividade artística - passou por todo tipo de 219

exp&rim&ntos, Em quinze anos valeram todas as

reaiizaçõesf o registro do processo de procura e a idéia, mesmo de procura, (, ) Neste período em que todos os experimentos foram admitidos se atribuiu mérito ao próprio fato de fazer o

experimentof o trabalho chamado tradicional da

arte - o desenhof a pintura, em todas as suas

infinitas variedades - continuouf porémf a existir, SÓ não mereceram os prêmios de costume e o apoio dos meios de comunicação - a cri ti ca

em geral r que preferiu gastar sua munição com os artistas ligados ao que se convencionou chamar

1 de vangaurda', Muito poucosr ai iás Os

próximos tempos serão5 todo leva a crer* de valorização dos aspectos esped ficos da

Nos currículos dos artistas na década de 70 aparecem, com mais constância, atuações no exterior, não só em delegações representativas do Estado, como também em exposições de galerias. Tornou-se muito mais usual para os artistas brasileiros, na segunda metade da década de 70, expor no exterior, do que na década anterior. Isto foi também resultado de maiores conexões do Brasil com outros países. Por seu turno, o crescimento do mercado de arte brasileiro, impôs a profissionalização dos artistas, exigindo permanente atualização, da qual faziam parte um conjunto de influências internacionais. Isto ocorreu tanto em seu trabalho diretamente, quanto em seus valores e aspirações de vida,

31 Klintow2, Jacob. Os Anos 7Q."0 fim das vanguardas quef na verdade, jamais existiram". Revista Isto E, n- 156, 19 dez.1979, p.74. 220

impregnados pela internacionalização da própria sociedade

brasileira neste período, e que se evidenciava também em seus

traba1hos-

Por outro lado, a introdução no mercado brasileiro de uma série de editoras internacionais favoreceu a penetração de um conjunto de informações que garantiam uma permanente atualização dos produtores e dos demais especialistas atuantes no sistema das artes plásticas. Livros e principalmente revistas, com farta ilustração, passaram a fazer parte do cotidiano dos membros do sistema das artes plásticas das grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro. Além disso, na década de 70, articulou-se no país uma indústria cultural nos moldes mais atualizados, calcada basicamente o sistema de telecomunicações. Imagens produzidas internacionalmente, como shows, exposições, espetáculos os mais diversos inundaram os

lares. 0 universo visual da elite brasileira se internacionalizou. Neste sentido, as artes plásticas, internacionalizadas, tornaram—se parte desta estrutura e não uma importação artificial. A moderna sociedade de massas rompeu com a tradicional oposição entre o nacional e o estrangeiro, em nível de toda a cultura brasileira.

No entanto, o mercado de artes plásticas, apesar de

trabalhar basicamente sobre matrizes internacionais, era ainda predominantemente local. Gs artistas brasileiros tinham uma cotação no mercado nacional sem correspondência no mercado 221

internacional. E o comprador brasileiro adquiria predominantemente artistas brasileiros. As empresas, mesmo as multinacionais, quando operando no Brasil selecionavam para seus imóveis obras de artistas do país. Isto que poderia oarecer contraditório, no entanto, se explica pela função social do sistema das artes plásticas - a distinção das e1i tes.

Concorrendo para esta distinção os setores de difusão acentuavam o elitismo do sistema e sua aura. Neste sentido, vermssagens sofisticadas, contando com a presença de destacadas figuras locais, quando noticiados nos meios de comunicação destinados ao grande público, reforçavam a distinção. O reconhecimento desta elite e de seus artistas, pelos demais setores sociais, era mais importante do que a aquisição de obras de artistas internacionais, desconhecidos nos meios locais. Os artistas brasileiros poderiam ser melhor aproveitados pelas instâncias de difusão, sua disponibilidade favorecia o uso de sua obra e de sua imagem.

5.3 - Avanços Democráticos e Estratégias de Subversão

As contradições de um passado de subdesenvolvimento, sociais e regionais, se acirravam pelo processo de crescimento econômico concentrado que ocorria no país. Uma arte mais politizada deveria dar conta desta problemática. Ocorre porém, que, na década de 70, se enraizou, em conseqüência, 222 principalmente, de dura repressão e censura, nos meios artísticos brasileiros, uma forte tendência aparentemente

"despolitizada". A arte pela arte, referendada como a verdadeira e a mais autêntica expressão artística passou a dominar o meio artístico principalmente nas artes plásticas.

"Será portanto num ambiente social marcado pela supremacia do principia autoritário, pela ausência de referências cri ticas, pelo desrespeito aos direitos individuais e pelo pensamento mágico que um jovem de lá ou 13 anos fará em 68 sua entrada neste universo herdado dos adultos e que ele percebe como repressivo, confusa e dominado por uma longinpua e onipotente gerontocracia marcial. Em síntese, numa situação na qual prevalece uma 'cultura autoritária' que, difusa mas penetrantemente, limita e ao mesmo tempo desorganiza comportamentos em três domínios fundamentais da interação do indivíduo com o mundoz o da sua liberdade, o da sua consciência crítica, o da sua ação política. Será nestes três domínios violados pelo autoritarismo que vão surgir pautas especí ficas de comportamento que serão 3 2 vividas como uma 'contra-cultura'"

A verdade ê que frente aos avanços populares da década de 60, as elites monopolistas se empenharam, na década seguinte, em implementar produções artísticas menos voltadas para as problemáticas sociais e políticas. Neste sentido, contribuiu também a lógica mercadológica que foi implantada no setor

32 Martins, Luciano. Geração AI 5. Op. Cit. p. 92. 223 cultural (indústria cultural), lógica que despolitizava o debate e o discurso, reconhecendo o consumo como a categoria básica para medir o valor dos produtos culturais- Este

processo, que poderia ser denominado de despolitização, no entanto, é mascarador, pois o sistema das artes plásticas permanecia politizado, na medida em que servia á manutenção das desigualdades estabelecidas-

Na segunda metade da década de 7o, o sistema das artes plásticas se apresentava, progressivamente, controlado pelos setores empresariais do grande capital- No entanto, novos ventos democráticos começaram a soprar, decorrentes das pressões sociais dos amplos setores prejudicados pelo modelo concentrador pelas disputas dos setores dominantes frente ás crises do poder autoritário-

"A extrema violência com que o Estado esmagou o dosa fio armado lançou as bases para o período de 'política formal' posterior a Í964- Este período foi marcado pela remobil ização política e pelas atividades oposicionistas cada vez mas vigorosas de setores de elite que atuavam

através de organizações. . .

Neste quadra de mobilização de segmentos das elites surgiram algumas propostas dentro do sistema das artes plásticas que se caracterizam como questionamentos ao poder

33 Alves, Maria Helena . Estado e Oposição no Brasil. pós-64. Petrópolis, Vozes, 1985. p. 317. 224

estabelecido. A Bienal Latino Americana de São Paulo, realizada em 73, bem como as duas Bienais Nacionais em 74 e

76, foram exemplos de atividades que evidenciaram as pressões democratizar» tes e as demandas de distensão política que estavam ocorrendo na sociedade brasileira. Ao voltar seus interesses para pólos não hegemônicos, alguns setores, dentro do sistema das artes plásticas, abriam questionamentos, ou pelo menos evidenciavam formas diversificadas de pensar as artes plásticas. Em termos de Brasil, as diversas regiões periféricas, contavam com uma presença marcante de elementos mais populares em suas produções plásticas, mesmo quando produzidas pelos artistas das elites. Além disto, as produções regionais apresentavam ainda rupturas e defasagens com as linguagens internacionais de ponta, utilizadas nas produções de São Paulo e Rio de Janeiro. Por este motivo, as Bienais

Nacionais, foram abertos espaços menos elitistas e monopolizados dentro do sistema das artes plásticas em nível nac iona1.

Quanto à Bienal Latino-Americana, evidencia-se uma nítida intenção de deslocar o eixo do debate artístico para as tradições mágicas destas culturas, retomando talvez o boom da literatura latino-americana na década de 70. O próprio tema da

Bienal, "Mitos e Magia", indica preocupações com as tradições regionais. O texto do catálogo ilustra suas orientações:

"Essa Bienal Lat ino-americana é nosso primeiro 225

momento de reflexãof primeiro obstáculo a ser

transposto para uma programação culturalf cada

vez mais atuantef atual e ativa* E para que

essa reflexão seja documentadaf discutida e decisiva para um caminho autóctone será necessária a presença e a ajuda de todos que

constituem este terceiro mundor tão desigual em suas formas de manifestações artísticas e cultural, tão semelhante diante de seus problemas históricos e sociais. O debate está aberto* Sejam bem-v indos" (Conselho de Arte e Cul tura )34.

Neste momento, voltar-se para o interior do Brasil ou mesmo para a América Latina era uma estratégia de subversão, no sentido de romper com as hegemonias internacionalizantes estabelecidas. Neste sentido, também a mostra promovida por

Roberto Pontual "Visões de Terra", em 1977, acompanhada de um

Catálogo-livre, insere-se nesta orientação. Ela trata de obras de 12 artistas plásticos dos quais somente um, Antônio

Henrique Amaral, é paulista, os demais são de diversas regiões do país, como por exemplo no Recife,

Humberto Espíndola em Cuiabá e Rubem Valentim em Salvador. A produção plástica apresentada na exposição é basicamente regional, no sentido de temáticas e materiais. E, sobre o trabalho de Antônio Henrique do Amaral, escrevia Ferreira

Gullar, que retornara do exílio. É bom lembrar que esta mostra e publicação foram realizadas sobre os auspícios do Jornal do

34 Texto do Catálogo "Mitos e Magias" da I Bienal Latino-ame- ricana de São Paulo, 1978. 226

Brasil, o que evidencia que estas estratégias de subverão contam também com apoio de alguns setores das elites.

A emergência dos pólos regionais neste período foi outro indicador desta tendência questionadora em relação ao domínio detido por São Paulo e Rio de Janeiro, dentro do sistema das artes plásticas no Brasil e sua orientação internaciona1izan- te. Humberto Espíndola e Aline Figueiredo, atuando junto ao

Museu de Arte e Cultura Popular da Universidade Federal do

Mato Grosso, a partir de 74, estabeleceram, por exemplo, uma dinâmica dessa produção, em nível local, que merece destaque.

Também o grupo "Nervo ótico", no RS, teve, nesta segunda metade da década de 70, uma atuação destacada, introduzindo propostas reflexivas, qu®? não tendo uma intenção regiona1izante, tinha a preocupação com o cotidiano e o meio circundante do artista. Nesta linha de olhar também atuou o

Núcleo de Arte Contemporânea da Paraíba, sob a coordenação de

Raul Córdula, desenvolvendo trabalhos de pesquisas e experimentação ligados a Uuniversidade Federal da Paraíba e com apoio da FUNARTE, eles publicaram o "Almanac", uma espécie de relatório ilustrado de suas atividades.

Como já foi dito na introdução, esse tipo de efervescência regional na década de 70 mereceria um estudo aprofundado que o presente trabalho não possibilita. De qualquer maneira, cabe salientar que a maioria destas 227

produções regionais se mantinha como núcleos um pouco isolados, mesmo em relação ao resto da produção de sua região, ainda que considerados como reações à hegemonia do centro do país eles não quetionam o sistema das artes plásticas em seu elitismo e em seu papel de distinção social. Atuaram mais como elementos de dinamização e atualização contemporâneas das produções regionais.

Um tipo de atuação que se evidencia como reação ao crescimento do poder das instâncias de difusão e ao controle do mercado sobre os produtores que caracterizam a segunda metade dos anos 70, é a criação da Cooperativa de Artistas

Plásticos de São Paulo35. A idéia deste tipo de organização surgiu em decorrência do êxito da mostra dos Artistas

Plásticos na campanha de Fernando Henrique Cardoso ao Senado.

Dando continuidade ao trabalho em conjunto, para benefício da

35 Boletin n- 182. Pinacoteca do Estado, julho 1979. "S&gundo

os estudos dos artistas participantes do grupof a Coope ra t i va de ve rá: !, Promover eventos culturaisf com participação total ou parcial de seus associadosr a partir do planejamento básico aprovado em assembléia, 2, Participar de eventos ou exposições organizados por outras áreas, instituições, etc.

J. Desenvolver atividades didáticas através de cursosr conferências, e publicações. 4. Promover intercâmbio cultural com grupos de artistas e instituições de outros Estados e países. 5. Conseguir melhores condições de qualidade e preço na contratação de serviços de terceiros. 6. Ampliar o mercado de trabalho de seus associados, de acordo com suas qualificações e potencial operativo. 7. Fornecer assessoria jurídica e seus associados. 8. Adquirir todo o material necessário para a produção de trabalho de seus associados. 9. Fornecer aos associados os serviços de outras cooperat ivas". 228

classe, realizaram a exposição "Papéis e Cia", em dezembro de

78, no Paço das Artes. Esta estratégia de atuação

"independente" dos produtores contou com uma atitude de represália por parte de alguns marchands que no dia da

inauguração anunciaram uma liquidação de gravuras em suas galerias. A Cooperativa realizou ainda, no ano seguinte, na

Pinacoteca do Estado, a mostra intitulada "Desenho como

Instrumento".

A exposição "Matrizes e Filiais", realizada no SESC São

Paulo, em dez de 79, com a participação de Flavio Motta,

Flávio Império, Cláudio Tozzi e Renina Katz, se apresentava ainda como uma proposta de deselitização dentro do sistema.

Esta mostra, coletiva, de trabalhos em litografia e serigrafia em papel e pano, desenhos e objetos, projetos de painéis e cartazes de rua, se unia pela possibilidade de convivência das pessoas com a obra de arte. Durante a exposição foram

impressos, ao vivo, litografias vendidas no local a preço de custo. Com a intenção evidente de aproximar o público do artista e dos processos de trabalho, a inauguração contou com a participação de Paulo Boca de Cantor. Estas palavras, de

Flavio Império, no catálogo, reforçam a intenção partic ipativa:

"Re-versos re-inv&nções re lembranças das festas da praça Gen Osório do

Jpanema quandof nos anos 60f Flavio Motta era o 229

porta-estandarte' dos artistas plásticos sonhadores e de suas bandeiras ma ra vi 1 hosas //3<5.

A década de 70 se encerra, por um lado com a consolidação

do poder das instâncias de difusão e da separação entre o

artista e o público, pelo elitismo do sistema; por outro lado,

com a consciência desta situação por parte de alguns

participantes e de tentativas para a sua superação.

37 "O círculo se fechour e nós ficamos presos dentro dele"

mas a reação é a marca do ser humano e as tentativas de

rompê-lo se sucederão.

3<5 Catálogo "Matrizes e Filiais". Flávio Império, dez. 79. 37 Bourdieu, Pierre. Questões de Sociologia, 1983. p. 172. CONCLUSÕES

Ao longo deste trabalho foi oossível analisar a estrutura do Sistema das Artes Plásticas no Brasil, no período em estudo, através da identificação de indivíduos e instituições que o constituem- Quanto às instituições, tem—se os museus, as escolas de arte, as galerias e os espaços específicos nos meios de comunicação social. Dentro destas instituições, indivíduos desempenham funções que determinam sua posição dentro do sistema. Este conjunto de funções constitue um espaço comum em que os indivíduos interatuam. Artistas como

Carlos Fajardo ou Fayga Gstrower e outros são professores de arte em Universidades e outros cursos públicos ou privados e atuam também como produtores. Por outro lado, tém sua obra comentada por críticos como Olívio Tavares, Frederico de

Morais ou Aracy Amaral que, por sua vez, desempenham, além das atividades cri ticas, a docência sobre teoria e história da arte e atuam também como administradores, na direção de museus e instituições de ensino. A atividade do marchand, que é basicamente a comercialização, também pode se estender à administração, como ocorre com Jean Boghici em relação à importante mostra "Opinião 65" ou à direção da galeria

Collectio, que promoveu a publicação do 1ivro-catá 1ogo "Arte 231

Brasil* 50 anos depois"*

Como pode-se observar, os indivíduos que atuam no

Sistema das Artes Plásticas, o fazem dentro das instituições

que compõem o sistema. Observa-se ainda que os mesmos

indivíduos realizam várias atividades, o que restringe

bastante as possibilidades de participação de outros

indivíduos no sistema.

As instituições interagem e alternam seus papéis. O Museu

de Arte Moderna do Rio de Janeiro, por exemplo, além da

atividade específica, de sediar mostras, manteve, durante

longo período,cursos de gravura em atelier próprio, além de

outros cursos, inclusive sob a coordenação do crítico

Frederico de Morais. Museus, como o MAM de São Paulo, foram

responsáveis pela produção de eventos como o Panorama da Arte

Atual Brasileira, premiando artistas numa espécie de seleção

nacional dos melhores em cada área (pintura, desenho, gravura

e escultura) anualmente. Estes museus, públicos ou privados,

indistintamente, se articulavam e interagiam com o circuito

comercial de galerias. Uma mesma mostra, como a do grupo de

artistas argentinos da Nova Figuração, foi exposta no MAM do

Rio de Janeiro e na Galeria Bonino. O Museu de Arte de São

Paulo promoveu, conjuntamente com a galeria Arte Aplicada, a exposição do Móvel e Objeto Inusitado.

Cabe, portanto, apontar o fato de que as instituições por 232

^eu turno, se articulam em uma rede de relações interagindo e

alternando seus papéis.

Pode-se, assim, afirmar que a estrutura do sistema das

artes plásticas é responsável pela produção circulação e

consumo de objetos e eventos plásticos, garantindo-os com sua

legitimidade e se fortalecendo com o sucesso destas

realizações. Em torno desta estrutura, se articula tudo que

pode ou aspira ser considerado arte dentro da sociedade. Os

indivíduos nela inseridos são responsáveis por um processo de

legitimação (a rotularão a que se refere Howard Becker).

Participar deste sistema de relações significa poder rotular

como "arte" determinadas produções e como a "artistas"

determinadas pessoas.

O Sistema das Artes Plásticas é apresentado à população

em geral através dos meios de comunicação de massa. Pode-se

perceber que a existência deste sistema se complementa, à

medida que se fortalece a indústria cultural no país, com a

atuação dos meios de comunicação social. Um espaço específico

de divulgação das artes plásticas dentro dos meios de comunicação de massa dá a seu responsável uma posição garantida dentro do sistema das artes. Assim, por exemplo, vários periodistas, jornalistas que se especializavam no tema, como Olívio Tavares,Glney Cruse, ou Harry Lauss, se integravam ao sistema das artes e passavam a dispor dentro dele um poder de rotulação que foi proporcional ao poder de penetração dos 233

periódicos em que atuavam. Os meios de comunica— ção, como um

todo, não faziam parte do sistema das artes, mas este sistema

deteve espaços dentro dos meios de comunicação, os quais se

tornaram, assim, segmentos dos sistemas das artes, como, por

exemplo, as colunas de arte em jornais e revistas de grande

circulação e destinadas ao grande público. A importância destes meios de comunicação de massa estava ligado ao fato de que eles divulgavam uma imagem do sistema das artes ao grande

público, reforçando o elitismo e o signo de distinção deste

sistema. As matérias sobre artes plásticas ocupavam um espaço dentro das páginas de cultura, o que já as colocava no espaço mágico a que se refere Pierre Bourdieu. Em geral, utilizavam uma quantidade de adjetivos superior á utilizada em outras matérias. Referenciavam a presença de personalidades nos eventos e as cifras astronômicas que as peças alcançavam. Além disto, estas matérias estabeleciam sempre uma relação da arte com a distinção e sofisticação de gosto, utilizada inclusive como chamada em anúncios publicitários.

À primeira constatação básica sobre a estrutura complexa e articulada do sistema das artes plásticas e de sua lógica de distinção social, podem ser acrescentadas algumas conclusões relativas a sua inserção no processo histórico por que o

Brasil passava ao longo destes 20 anos a que o estudo se ateve: .

A primeira metade dos anos 60 foi um período de crescente 234

mobilização popular que ativava uma dinâmica cultural,

bastante politizada e voltada para os interesses das classes

trabalhadoras. Alguns setores da intelectualidade brasileira,

neste momento, inauguraram um novo modelo de atuação artística

comprometendo seu fazer com as lutas sociais que estavamse

desenvolvendo. Algumas práticas artísticas, como o teatro, a

música e o cinema, tenderam a se democratizar, alterando sua

produção e suas formas de difusão. Neste momento, as artes

pláticas mantiveram-se praticamente à margem destas

mobilizações. 0 sistema seguia o seu curso de atualização

internacionalizante, com predomínio das tendências abstracionistas, que vinham se impondo desde a década de 50.

Estas tendências alcançaram seu ponto máximo no início dos anos 60, com o concretismo e neoconcretismo. As renovações se desenvolveram sem maiores alterações na estrutura do sistema, e, principalmente, sem que as disputas sociais, que conflituavam a sociedade, os atingissem. Pelo contrário, as artes plásticas foram apresentadas como sincnimo de estabilidade e valor garantido. Neste período, o mercado de arte apresentou um crescimento significativo, com a criação de galerias empresariais, demonstrando que a crise que envolvia alguns setores da sociedade brasileira não o atingia.

Pode-se observar, em matérias publicadas em jornais e revistas, que as artes plásticas eram vistas como um investimento seguro e em ascensão, portanto digno de confiança, um espaço para as elites depositarem seus ganhos e auferirem, um status significativo. Módulos publicitários 235 destacavam o nível e a classe da arte brasileira e seu internacionalismo. A arte era vista também como um signo da modernidade que as elites implantavam desde a década de 50, com o fortalecimento de um parque industrial de bens de consumo duráveis.

Desenvo1vimentismo e modernidade artística foram signos dos novos tempos que estas elites propunham-se construir. Na crise deste modelo (61—64), os questionamentos sociais náo atingiram as artes plásticas, cujo público, restrito e sofisticado, permaneceu identificado com o projeto de modernização que os setorese médios questionavam no sentido de sua democratização. As artes plásticas mantiveram, neste momento de crise, seu espaço permanente dentro dos meios de comunicação social-, nestes não se percebe questionamentos mais profundos ou grandes antagonismos; pelo contrário, uma arte mais tradicional, figurativa, de inspiração modernista, seguia ao lado da abstração que se dividia em duas vertentes: uma mais informal e intimista e outra mais geométrica e racional.

Eram tendências estilísticas diferenciadas, que, inclusive, se identificavam com projetos e visão de mundo conflitantes, mas que se harmonizavam na manutenção da lógica de distinção do sistema das artes plásticas.

A partir de 64 esta harmonia no Sistema das Artes

Plásticas, foi rompida por demandas externas que introduziram mudanças no sistema. Neste estudo, evidencia-se que as 236 mudanças foram resultado de estratégias de subversão, empreendidas por setores sociais insatisfeitos com o projeto que os setores dirigentes das elites implantavam através do

Estado autoritário. Uma nova dinâmica se estabeleceu dentro da sociedade brasileira: o modelo político e social implantado após o golpe gerou resistências dos setores sociais discordantes e disputas entre os diferentes segmentos de classe dominante. Setores insatisfeitos com o modelo que se estava implementando, principalmente com seu caráter autoritário, tentavam reagir de diversas maneiras. Neste momento, em que a mobilização cultural estava diretamente influenciada por setores de classe média urbana e mesmo por setores descontentes da classe dominante no Sistema das Artes

Plásticas se disseminou uma série de estratégias de subversão que visavam alterar este sistema, favorecendo a maior participação do público nos processos de produção, circulação e consumo destes bens culturais. Esta orientação buscou desestabi1izar o sistema das artes em sua função de distinção social (seguindo um padrão generalizado na cultura brasileira neste momento), com o objetivo básico de mobilização da sociedade civil, numa tentativa de questionar e mesmo frear os avanços do autoritarismo.

Preocupados em encontrar formas de atuação, seguimentos do Sistema das Artes Plásticas questionaram o elitismo, usando como referencial as vanguardas internacionais mais críticas, como o Pop e a Nova Figuração. Com uma produção bastante 237

politizada, por exemplo, atuou o grupo Nova Objetiv idador que

incluía artistas iniciantes, como Antônio Dias, Rubens

Guerschmam, Pedro Escosteguy e outros, já consagrados, como

Hélio Oiticica e mesmo críticos de renome como Mário Pedrosa.

As estratégias de subversão internas ao sistema responderam às demandas da sociedade, sendo também ações políticas. Esta segunda metade da década de 60 foi, portanto, um momento

fértil, em termos de mudanças, dentro da estrutura do Sistema das Artes Plásticas, nele se implementaram experiências formais e sígnicas que foram retomadas posteriormente.

A fermentação que se pode observar de 64 a 69, dentro da cultura brasileira, introduziu alterações no Sistema das Artes Plásticas. 0 papel que os salões, por exemplo, passaram a desempenhar foi muito importante. Diferenciando-se do tradicional salão acadêmico e modernista, cuja função maior era legitimar artistas e difundir um estilo de vida, surgiram então, uma variedade e quantidade de salões financiados com verbas públicas ou privadas, cujo traço comum foi o caráter democratizante. Neles pode vir à tona uma produção mais questionadora, abrindo—se possibilidades de apresentação de obras que, por suas características de execução, não teriam possibilidades de serem exibidas em museus ou galerias. Os Salões foram espécies de Feiras de exposições daquilo que de mais novo e ousado se pensava e executava em artes plásticas. Era uma nova dinâmica, atraindo um público maior e mais diversificado. 238

À partir de 69, na medida em que o Estado autoritário se aprofundou,através do Ato Institucional n- 5, sustou—se o

processo mohilizador de resistência que se desenvolvia dentro do panorama artístico- Nos momentos mais fechados do autoritarismo, alguns segmentos do Sistema das Artes Plásticas se viram fortalecidos, com forte apoio estatal, através da criação de salões, como os dos Transportes e o da Eletrobrás, ou mesmo, pela transferência e concentração de renda, abrindo novas possibilidades de consumo de bens de luxo. Investir em artes plásticas, como fonte de legitimação e de status econômico, se tornou um padrão das novas elites. No novo modelo econômico, sob a pressão de rígida censura, o mercado de artes plásticas pode alcançar um desenvolvimento significativo. Assim, à ampliação de público proposta ao longo dos anos 60, sucedeu um mercado consumidor restrito e elitizante. Na primeira metade da década de 70, o Sistema das

Artes Plásticas retomou seu elitismo com o apoio seguro e permanente do Estado, servindo ao mesmo tempo á consolidação da hegemonia dos segmentos de classe dominante que assumiram o poder através do Estado autoritário.

□ Sistema das Artes Plásticas, como legitimador da distinção, de determinados grupos sociais reforçou a separação entre "arte" e "não arte", utilizando estratégias de conservação que foram desde a desarticulação de iniciativas democratizantes como feiras e outras propostas do mesmo gênero, até a implementação e favorecimento de processos de 239

exoerimentação intelectualizados e herméticos de difícil

apropriação pelo público. O controle do Estado, em relação aos

limites políticos que as práticas artísticas podiam desempenhar, ofereceu ao sistema um reforço externo de

repressão e censura. 0 sistema, assim, não aparecia como

repressor ou limitador, mas antes como um espaço de liberdade.

Neste período (69 a 73 mais especificamente) o Estado que deteve o controle do que podia ser dito ou feito em termos gerais na sociedade brasileira, e, assim também, nas artes plásticas.

Foi, portanto, no período que se estendeu entre 69 e 75, que o sistema das artes plásticas no Brasil consolidou a forma elitista e aparentemente despo1itizada que seguiu posteriormente. E o fez com o apoio do Estado autoritário; censura e financiamento foram as estratégias utilizadas. Este papel do Estado, no entanto, foi bastante encoberto e paralelamente, o sistema das artes plásticas procurou passar uma imagem de descompromisso e autonomia, irreal em um país como o Brasil, em que o mercado de bens culturais de luxo era restrito ou irrisório, se comparado a países desenvolvidos. Mesmo na etapa seguinte, quando os setores empresariais responsáveis pela comercialização, tenderam a assumir o controle do sistema, retirando das mãos do estado um maior compromisso com a manutenção destas práticas artísticas, na medida em que elas obtinham uma estabilidade de mercado, o

Estado permaneceu ainda como um grande cliente desta 240

comercialização.

À partir de 1975, o sistema das artes plásticas

evidenciava já uma estrutura compatível com o avanço das

relações capitalistas monopolistas dominantes no país. A empresa privada, através de seus segmentos especializados

(marchand) assumia o comando do sistema, estimulando a progressiva setorização da produção e comercialização.

Galerias se especializaram em gravuras, outras em objetos ou arte conceituai e, outras ainda, em uma produção mais acadêmica e conservadora. 0 setor da comercialização tendeu a absorver e controlar a difusão e a produção, articu1ando-se de forma setorizada, por tendências, como o sistema internacional. Não ocorria mais a simples absorção de modelos e estilos, mas um entrosamento estrutural, na medida em gue os mesmos procedimentos de produção, consumo e difusão internacionais foram utilizados dentro do sistema local. O espaço de despolitização se fez, então, não mais por uma censura direta, mas pela prõpria ideologia de uma arte pura, ideologia da arte autônoma, oairando acima das condições de produção.

G setor empresarial, consolidado, a partir da segunda metade da década de 70, atuou basicamente nos setores de comercialização e difusão, favorecendo a troca entre os capitais cultural, econômico e social. Nesta troca, as empresas de comercialização participavam também na 241

constituição do valor simbólico que acrescentavam à obra,

através de suas relaçóes com a estrutura do sistema das artes

plásticas, estabelecendo legitimidade dos produtos e processos

artísticos. O setor empresarial teve forte participação

quando, por exemplo, organizou a mostra "Art& Brasileira

Hojez 5O anos depoiseditando um catá1ago-1ivro. O prestígio

que determinadas empresas obtiveram com sua atuação, as

legitimava como rotuladoras. Expor um artista, com a

apresentação de um crítico (muitas vezes por ela contratado),

divulgar o evento nos meios de comunicação e referendá-lo com

sua tradição acrescentavam à obra um valor simbólico que se constituía também em valor de mercado.

A análise da atuação de Sistemas das Artes Plásticas nas décadas de 60 e 70 nos permite algumas considerações gerais. A primeira delas é a de que, no Brasil, neste período o Estado ampliou progressivamente sua ação junto ao Sistema das Artes

Plásticas, cumprindo três tarefas básicas: estancar as propostas democratizantes e participativas que se formularam na segunda metade dos anos 60; de forma indireta, através do processo de concentração de renda, favorecer o fortalecimento do mercado das artes; instaurar, por meio de várias formas de apoio, o laboratório experimental de uma arte formalista e conceituai que este mercado absorveu.

□bserva-se assim que o Estado interferiu decisivamente, de forma direta ou indireta, na adequação do Sistema das Artes 242

Plásticas à lógica de mercado, garantindo, assim, a

manutenção do elitismo que por sua vez, era útil à legitimação

de um regime político autoritário, portanto também elitista.

A segunda consideração geral é de que, durante o período

em estudo, o Sistema das Artes Plásticas, assumiu

progressivamente um tendência internacionalizante no contexto

do processo global da economia brasileira. A

internacionalização do Sistema das Artes Plásticas se deu em

função de dois fatos principais: a expansão da indústria

cultural que atingiu amplas camadas da população, divulgando e

inundando seu cotidiano de padrões culturais, internacionais e a identificação das elites brasileiras com os valores das elites internacionais com que se aliaram. Na produção local, o

Sistema das Artes Plásticas incorporou modelos e padrões estéticos dos pólos hegemônicos a nível internacional, seguindo suas correntes estilísticas. Além disso, ampliou—se os intercâmbios entre as instituições locais e suas congêneres in ternac ionais.

Finalmente, cabe apontar uma consideração geral fundamental para a compreensão do Sistema das Artes Plásticas, neste período: apesar das tentativas da modificações democratizant.es em determinado momento, este sistema manteve sempre um papel elitista no conjunto das práticas artísticas no pais, servindo à distinção daqueles grupos restritos que a ele podiam ter acesso. 243

Se, no entanto, o Sistema das Artes Plásticas, mantendo sua especificidade, está relacionado como meio social em que se encontra, dele recebendo, como se viu, influências fundamentais, considera—se que a manutenção do elitismo ou democratização deste sistema dependerão, em grande parte, do próprio curso seguido pela história brasileira. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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COLETIVA OITO ARTISTAS. Textos Aracy Amaral, liátrio Schenberg. São Paulo. Galeria Atrium, 18 ago 1966. (Colab. Galeria G-4, RJ ) .

VANGUARDA BRASILEIRA. Apresent. Frederico Morais. Reitoria da UFMG, Belo Horizonte ago 1966.

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1- EXPOSIÇÃO JOVEM ARTE CONTEMPORÂNEA. Apres. Walter Zanini. São Paulo, Museu de Arte Contemporânea/USP, 20 set./19 out. 1967.

1- EXPOSIÇÃO PAÇO DAS ARTES. Apres. Frederico Morais, Paulo Mendes de Almeida. São Paulo, Paço das Artes, 1969.

1- SALÃO DA BOSSULA. Aroldo Araújo Propaganda Ltda. Rio de Janeiro, Museu de Arte Moderna 5 nov.15 dez.1969.

ARTE-OBJETO. São Paulo, Paço das Artes, 1970.

BRASIL PLÁSTICA - 72. Mostra de Arte do Sesquicentenário da Independência. Fundação Bienal de São Paulo. São Paulo, 1972.

ACONTECIMENTOS - Apres. Walter Zanini - São Paulo, MAC/USP, abril 1972. 260

SALÃO DE ARTE CONTEMPORÂNEA DE CAMPINAS — "Desenho Brasileiro 74" - Museu de Arte Contemporânea de Campinas, 1974.

10- SALÃO DE ARTE CONTEMPORÂNEA. ARTE NO BRASIL. Documento/Debate. Apres. Aline Figueiredo, Aracy Amaral, Frederico Moraes. Campinas, SP, Museu de Arte Contemporânea, nov.1975.

SALÃO GLOBAL DE INVERNO — "0 Gesto Criador" — Belo Horizonte, Palácio das Artes, 1974.

7 ARTISTAS DO VÍDEO. MAC/USP. São Paulo, maio 1977.

19 PINTORES - Aores. Jacob Klintowitz. São Paulo MASP/SP Agos.set.1978.

MATRIZES, FILIAIS E COMPANHIAS - Partic. Flá.vio Motta, Flávio Império, Cláudio Tozzi, Renina Katz - São Paulo, SESC, dez.1979.

JÚLIO F^ACELLO e sua obra editorial. Apres. José Mindin. MASP/SP, 1979.

NOVOS CAMINHOS DA ARTE FANTÁSTICA, apres. Lourdes Cedsran - São F'aulo, Paço das Artes, 1979.

HOMENAGEM A MARIO PEDROSO - Galeria Jean Boghici. Rio de Janeiro, abr.jun.1980.

ESPAÇO NO. — Eventos e Artistas atuantes — 1979—1982. Espaço N.O. Porto Alegre, agosto de 1982.

NEOCONCRETISMO - 1959—1961. Apres. Frederico Morais. Ciclo de exposições sobre Arte no Rio de Janeiro - Galeria de Arte BANERJ/RJ - set.1984, MAC/USP, São Paulo. 261

25 ANOS GALERIA IBEU - Apres- liarc Berkowitz - Galeria de Arte do Inbstituto Brasileiro - Estados Unidos - Rio de Janeiro, out.1985.

1960-1985 - GALERIA B0NIN0 EXPOSIÇÃO COMEMORATIVA. Apres. Mario Pedrosa Jayme Maurício, Frederico Morais, Maria S. Brito, Ladi Biezus - Rio de Janeiro, Galeria Bonino, maio de 1985.

DEPOIMENTOS DE UMA GERAÇAO - 1969-1970 - Ciclo de exposições sobre Arte no Rio de Janeiro - Galeria Arte BANERJ„ julho de 1986.

"OPINIÃO 65" - Ciclo de Exposições sobre arte no Rio de Janerio - Galeria de Arte, BANERJ - Rio de Janeiro, 1986.

WALDEMAR CORDEIRO: Uma aventura da razão. Apres. Aracy Amaral. MAC/USP, São Paulo, ago. set.1986.

LVGIA CLARKE E HÉLIO OITICICA - Sala especial do 9? Salão Nacional de Artes Plásticas Rio de Janeiro. Paço Imperial, nov.dez.86. MAC/USP, São Paulo, nov.dez.1987.

NOVA FIGURAÇÃO - Rio/Buenos Aires. Apres. Paulo Herkonhoff, MAM/Rio de Janeiro, dez. 1987.

BIENAL INTERNACIONAL DE SAO PAULO - Fundação Bienal de São Paulo, São Paulo, 1961, 1963, 1965, 1969, 1970, 1971, 1973, 1975,1979,

BIENAL NACIONAL - Fundação Bienal de São Paulo, São Paulo,

1964-1966.

BIENAL LATINO AMERICANA DE SAO PAULO - Fundação Bienal de São Paulo - São Paulo, 1978. 262

PANORAMA DA ARTE ATAUL BRASILEIRA - MAM - São

Paulo, 1969,1970, 1971, 1972, 1973,1974, 1975, 1976, 1977,

1978, 1979, 1980.

BIENAL INTERNACIONAL DE VENEZA - Veneza, Itália, 1960-1964. 263

- Entrevistas Realizadas

Carlos Zillio - 06 nov. 1987, Rio de Janeiro. Vera Chaves Barcelos - 23 set. 1987, Porto Aleqre Gilberto Salvador - 02 dez. 1987, São Paulo. Arma Bella Geiger - 11 out. 1987, Porto Alegre. Roberto floriconi - 05 nov. 1987, Rio de Janeiro. Aldemir Martins - 10 nov. 1987, São Paulo. Carlos Von Schimt - julho 1987, São Paulo. Frederico Morais - 26 jul. 1988, Rio de Janeiro. Carlos Fajardo - 11 nov. 1987, São Paulo. Giovana Bonino - 22 jul. 1988, Rio de Janeiro. Renato Rosa - agosto 1987, Porto Alegre. Yokata Toyota - 12 out. 1987, São Paulo. Pedro Escosteguy - dezembro 1987, Porto Alegre.

Arquivos Consultados

Museu de Arte Contemporânea - USP, São Paulo. Museu de Arte Moderna - São Paulo. Museu de Arte Moderna - Rio de Janeiro. Museu de Arte de São Paulo - São Paulo. Museu Nacional de Belas Artes — Rio de Janeiro. Museu de Arte Brasileira - FAAP. São Paulo (não dispõe de material para consulta). Museu Lazar Segai - São Paulo. Fundação Bienal de São Paulo - São Pauloa. Pinacoteca Estadual de São Paulo - São Paulo. LISTA DE ANEXOS

ANEXO 1 - INSTITUIÇÕES > • LJ i_l

ANEXO 2 - SALÕES i ■ jc_'PAA OO

ANEXO ■j» — RESUMO JB - década de 60 - MAM - Jornal

do Brasil - Rio de Janeiro 267

ANEXO 4 - Livros de Artes Plásticas Publicados,

no Brasil nas décadas de 60 e 70 269

ANEXO 5 - Atuações das vanguardas 1965-1975 .--271

ANEXO 6 - Lista de Artigos Citados em Catálogo

de Leilões (1975) m X~274 / *T

ANEXO 7 - Relação das Galerias 275

ANEXO 8 - Lista de Galerias com Exposições, apre-

sentadas pela Folha de São Paulo - se-

ção "Exposições" » JC-277 / /

ANEXO 9 - Júris do Salão Nacional de Arte Moderna . ...281

ANEXO 10 - - Juri Jovem Arte Contemporânea/MAC-USP . 283 6 77 8 79 Maria Edson j Maria Maj ar£ flotta Luiza Gastei o Carragom Branco

Mdurlcxo Pedro Heloísa Carlos Rober to Pereira Aleixo Junqueira Filho Custosa Avres

Wolfang Pteiffer Alfredo Clóvis Gomes Walter Aracy Graciano Wey Amaral

Roberto Parreira

RJ - Fede tec^ do Es E - RJ - F «iu Art-& 0 4 n CO o: t CL a o (/) L0 aO a: V» a *40 i

n £ iT ^ 0.l/l • T3 • cn Dd u.Oi * CL u. v, Ui01 • I w i -ad oi uioi * u. «L I UJ v». .0o ^ H 01 V. * *43 C1 Wd Çd

a:i/i a. i ♦oi> • l/l H<1 Qü. Ui ?Jf.1 01 LL 01 CD ^ 01 UO I UJ - UJ01 c« if&i 267

ANEXO 3

RESUMO JB - década de 60 - MAM - Jornal do Brasil

Rio de Janeiro

Obs: As exposições marcadas com asterisco foram realiza- das na Galeria Bonino.

63. Volpi 64. Maria Leontina Dj anira Flávio Shiró Iberê Camargo * Emeric Mercier Milton Dacosta Ivan Freitas Frans Kracjberg Lygia Clark * Antonio Bandeira Darei Valença Manabu Mabe Augusto Rodrigues Bruno Giorgi Isabel Pons M. Grassmann Newton Cavalcanti * Fayga Ostrover

65. Di Cavalcanti 66. Abrâo Palatinik Ivan Serpa Tomie OtaKe Rubens Guerchman Yolanda Mohalyi * Raimundo de Oliveira Gastão Manuel Henrique Franz Krackjberg Benjamm Silva Sérgio Camargo Frank Scaeffer Farnese de Andrade Maurí cio Sa1gueiro Arthur L. Pizza Antonio Dias Ana Letycia Ivan Serpa 67. * Iberé Camargo Roberto Magalhães João Amaglia Maciel Babinski Carlos Scliar 268

Geza Hei ler Gastão M. Henrique Dora Basilio Farnese de Andrade 68. Ana Bella Geiger M. Bonomi Antonio Dias Mario Cravo Jr. Carlos Vergara Roberto Magalhães Milton Dacosta % Aldemir Martins * Rubem Valentim

* Arthur L. Pizza 70. Tarcila do Amaral Marcelo Grassmann * Emanuel Araújo Newton Cavalcanti Ascanio MMM Vilma Martins Humberto Espindola * Sônia Ebling Toyota Rubens Guerchman Vanda Pimentel Dileni Campos Vicente Rego Monteiro Ubi Bava 69- * lone Saldanha Antonio Maia Ivan Freitas * Abelardo Zaluar % Ivan Serpa * Amélia Toledo Sanson Flexor * Raimundo Colores Ana Letycia Carlos Vergara Fayga Ostrower Tomie Otake Franz Krajcberg Tomoshige Kosuno José Lima Darcilio Lima Darei Valença Fornese de Andrade Lygia Clark * Hélio Eichbauer 269

ANEXO 4

Livros de Artes Plásticas publicados, no Brasil nas décadas de 60 e 70.

Década de 60

- AYALA. Walmir. A Criação Plástica em Questão. Petrópolis, Vozes, 1970.

- BARDI, Pietro M- Profile of the new Brazi1ian art. São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Kosmos, 1970.

Quem e Quem nas letras e nas artes no Brasi1. Ministério de Relações Exteriores - Departamento Cultural e de Informa- ções. Rio de Janeiro, 1966.

- PONTUAL, Roberto. Dicionário de Artes Plásticas no Brasi1. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1969.

Obs: Estas publicações tém poucas ilustrações e em branco e preto, o papel utilizado é tipo sulfite e a encadernação é brochura, com exceção do "Profile of the new Brazilian art" que apresenta já o padrão das publicações da década seguinte.

Década do 70

- CAVALCANTI, Carlos (org. ) . Dic ionário de Artistas Plásticos. MEC/Instituto Nacional do Livro, Brasília, 1973. 270

- PONTUAL, Roberto. Arte/Brasi1/Hoie - 50, anos depois. SSo Paulo, Collectio, 1973. (Livro—Catálogo).

~ - Arte Brasileira Contemporânea. , Rio de Janeiro, Jornal do Brasil, 1976.

~ (orq.). Visões da Terra. Rio de Janeiro, Jornal do Brasil, 1977. (Livro—Catálogo).

- AYALA, Walmir. O Brasi1 e seus Artistas. Brasília, MEC, 1979.

- KLINTOWITZ, Jacob. Versus: 10 anos de critica de arte. São Paulo, Spade, 197S.

- FUNARTE - COL. Arte Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro, 1978/79.

- LEITE, José Roberto Teixeira e MANOEL, Pedro. Arte no Brasi1. São Paulo, Abril, 1979.

Obs: Estas publicações são fartamente ilustradas (algumas delas basicamente com fotos coloridas) papel tipo couchete encadernações com capa dura, aparência sofisticada em termos de capa e diagramação.

Obs: estes livros eram aqueles organizados a partir da citação de nomes de artistas plásticos contemporâ- neos. 271

ANEXO 5

ATUAÇÕES DAS VANGUARDAS 65-75

65 - "Opinião 65" - MAM Rio de Janeiro- Org Ceres Franco e

Jean Boguichi - "Propostas 65" - FAAP- São Paulo. Org

Wa1demar Cordeiro.

66 - "Pare" - Galeria G4 Rio de Janeiro- Grupo ligado a

Antonio Dias.

- Inauguração galeria Rex. São Paulo. Grupo ligado a

Wesey Duke Lee

- "Opinião 66" - MAM- Rio de Janeiro.

- "Propostas 66" Biblioteca Municipal. São Paulo.

- "Vanguarda brasileira" UFMG. Belo Horizonte. Org. Fre-

derico Morais.

- "Do corpo a Terra" Hidrominas. Belo Horizonte. Org.

Frederico Morais.

- "Agnus Dei" Petite Galerie. Rio de Janeiro.

67 - Declaração de Princípios da vanguarda Brasileira- Org-

Pedro Escosteguy.

- "Nova Objetividade" MAM. Rio de Janeiro-

- "6 pintores da Nova Objetividade" galeria IBEU- São 272

Paulo.

- "Rex Caputz" - Rex Galerie. Sâo Paulo.

- "Salão das Caixas" - Petite Galerie. Rio de Janeiro.

Org. Franco Terranova.

- "Bandeiras e Estandartes" Galeria Atrium. São Paulo.

68 - "Domingo das Bandeiras" - Rio de Janeiro.

- "I Feira de Arte" XX AIAP. Secção Guanabara. Rio de

J anei ro.

- Criação da Unidade experimental do MAM. Rio de Janeiro.

- Cildo Meireles Luiz Alphonsus, Frederico Morais.

- "O artista Brasileiro e a Iconografia de massas". MAM.

Rio de Janeiro. F Morais.

- "Arte no Aterro". Parque do Flamengo. Rio de Janeiro,

ürg. Frederico Morais.

69- "Supermercado de Artes". Rio de Janeiro. Org. Jaksom

Ribeiro.

- "Salão da Bússola. Sala quente. MAM Rio de Janeiro.

70 a 74 - Grupo Escola Brasil - São Paulo. Nasser, Fajardo,

Resende, Baraveli.

71 - "Domingos de criação" MAM. Rio de Janeiro. Org. Frederico

Morais.

— "Arteônica" — FAAP. São Paulo. Org. Maldemar Cordeiro. 273

72 - "Acontecimentos" - MAC/USP. São Paulo. Org. Walter Za—

nini .

73 - "Significado, natureza e função da obra de arte". IBEU,

Rio de Janeiro. Org. Frederico Morais.

- "Expo-projeção" - GRIFFE. São Paulo. Org. Aracy Amaral.

74 - "Prospectiva 74" - MAC/USP. São Paulo. Org. Walter Zani-

75 - Criação do Espaço Experimental do MAM. Rio de Janeiro.

Org. Cildo Meireles.

- "I Exposição Internacional de Arte Postal" - Recife. Org.

Paulo Brusky. 274

ANEXO 6

Lista de Artistas Citados em Catálogos de Leilões (1975)

Gbs.. foram relacionados somente aqueles que aparecem pelo menos em 3 dos 5 catálogos analisados.

9J. lectio Uirapuru Da Praça Bolsa de Arte Arte em Leilão Idemir Martins Aldemir Aldemir Aldemir ^nelli * Aldemir Martins lanei 1i lanei 1i Snadei + Bonadei Bonadei Bonadei ^ b i n s k i Babinsk i Babinski ^ndeira % Bandeira Bandeira ^ico da Silva □ Chico Silva i Cavalcanti # Chico da Silva Di Cavalcanti Di Cavalcanti ^ Costa Di Cavalcanti Da Costa Da Costa Da Costa ^ávio Carvalho Da Costa F. Carvalho F. Carvalho ^mide F. Carvalho Gomide Gomide ^assman Gomide olassman G1assman G1assman llignard # G1assman Guignard Guignard Guignard ^ilherme Faria G. Faria ^Qres Ingres • Leontina * M. Leontina ^mael Nery • I. Nery I . Nery I . Nerv ^ávio Araújo O. Araújo O. Araújo iosola O. Araújo Odriosola Odriosola ^ncetti # Pancetti Pancetti Pancetti Pancetti ^nacchi + Penacchi Penacchi ^rtmari # Portinari Portinari Portinari ^imundo Portinari 'iveira a R. Oliveira R- Oliveira R. Oliveira ^bolo # R. Oliveira Rebolo Rebolo ^gaud Rebolo Sigaud Sigaud ^sila + Tarsila Tarsi1 a Tarsila Tarsila Tuneu Vol pi Vol pi Vol pi Viscon ti Visconti Visconti Zanini Zanini Zanini R. Monteiro R. Monteiro Carybe Carybe Carybe Pizza Pizza ^ 1 d i Goe1d i Goeldi

Abstratos Modernistas ^rimi tivos 275

ANEXO 7

Relação das Galerias. São Paulo, Data de Inauguração

DATA GALERIA

1957 OCA

1959 ANDRÉ

1959 ASTREIA

1964 AZULÃO

1966 COSME E VELHO

1966 MIRANTE DAS ARTES

1966 COSEME VELHO

1967 A GALERIA

1968 AUGOSTO AUGUSTA

1968 PORTAL

1969 OPUS

1969 DOCUMENTA

1971 EUCATEXPO

1971 ARTE APLICADA

1971 ESPADE

1973 MÚLTIPLA DAS ARTES

1973 RENATO M. GOUVEIA

1973 SARUTAIA

1973 VANGUARDA

1973 ACADEMUS 277

ANEXO 8

LISTA DE GALERIAS COM EXPOSIÇÕES, APRESENTADAS

PELA FOLHA DE SXQ PAULO - SEÇXO "EXPOSIÇÕES"

Dezembro 61

- Galeria de Arte da Folha - De Cont, Regina Silveira, An

Kenda1.

- MAM - VI Bienal de São PaLilo.

- Casa do Artista Plástico - R. Nestor Pestano 115.

- Esmeia Coarcci e Anésia Teles.

- Gal. São Luiz - Av. São Luiz 130

* Antonio Bandeira.

- Gal. Vila Rica - R. Barão do Itapetininga 275

* - Pintura nacional (vários)

- Gal. Ambiente - Martins Fontes 205

* — Fernando Odriozola

- Gal. Astréia - Praça Ramos de Azevedo 209

* - Douglas Marques de Sá

- Gal. Sistino - Augusto 1791

* - Heitor dos Prazeres

- Clubinho - Bento Farias s/n

- Marcelo Gross mom e Mario Truber

- Gal. I tá 278

— Acervo

- Gal. Prestes Maia

- exposição de solidariedade com exilados políticos de

Port. e Esp.

- ACM

— Cerâmica de Rancho Laterno-

- Petite Galerie - Paulista 1731

# - Mario Cravo

- Gal. Studio Toya. Augusta 464

# - Acervo

- Loja do Livro Italiano — Baro Itapetining 140

# - Arte Grafica Chinesa

- Museu Arte Brasileira - FAAP - Alagoas 903

- Arte infantil

Legenda:

* Centro

<& Jardins 279

LISTA DE GALERIAS COM EXPOSIÇÕES, APRESENTADAS

PELA FOLHA DE SÃO PAULO - SEÇÃO "EXPOSIÇÕES"

Dezembro 7b

- Gal. Espade - Planpono 929

^ — Yolanda iiotta e Steval Forte

- Gal. Chelsea - Augusto 1931

# - Sanson Flexor

- Gal. Global - Hadok Lobo 1397

# - Nelson Leirner

- Gal. Sarabataiá - Al. Franca 63

# - Domingos Ugo Face

- Biblioteca Mário de Andrade

- Livro Israelense

- Gal. Quarto crescente. Palmeiras 73

- Philip Hallawell

- Gal. Guimar - Hadok Lobo 356

- João Porisi Filho

- MASP

- Shoko Suzuki

- Gal. Astréia - Padre João Manoel 1253.

- Gravuras nacionais e estrangeiras.

- Gal. Paulo Prado - Eng. Alcides Barbosa 47

- Carlos Magno 280

- Gal . Pátio - Av - Angélica 2016

- Aldemir Martins

~ MAC

- Acervo

- Gal. Contorno — Hadok Lobo 1544

# - Agislous

- Gabinete de Artes Gráficas - Hadok Lobo 1568

- Júlio Plazzo

- Gal. Domus - Padre Manoel 861

- Renzo Gori

- Gal. Dofan ~ Itambé 4

- Exposição conjunta

- Gal. Prequeté - (Embu)

- Joel Camara

- Museu Lazar Segai - Faria Lima 1760

- MAM

- Panorama da Arte Atual Brasileira

- Gal. Bonfigliolli — Augusto 2995

- Odeto Guersoni

- Gal. Cangás - Augusto 1600

# - Tão Siguldo

- Gal. Modular - (Perdizes)

- Maurício Nogueira Lima ANEXO 9

JÚRIS DO PALCO NACIONAL DA ARTE MODERNA

60 - Lorival Tomé Machado, Milton Dacosta, Marco Pedrosa.

61 - Geraldo Ferraz, Carlos Cavalcanti, Rubem Bustamonte Sá.,

62 - Yolanda Mohalyi, Fayga Ostrower, Antonio Bento.

63 — Ernani Vasconcelos, Joaquim Tenreiro, Edson Mota.

64 - Flavio de Aquino, Carlos Magno, Sigoud.

65 - Carlos Cavalcanti, Rubem Bustamonte Sá, De Figueiredo.

66 - Abelardo Zaluar, darei Valenço, Quirino Campoflorito.

67 - Walter Zanini, Aloisio Carvão, Antonio Bento-

69 - Marcelo Grassmann, Antonio Bento, Walmir Ayala-

71 - Carmem Portinho, Aloisio Carvão, Waldyr Mattos-

72 - Aluisio magalhães, darei valenço, Carmem Portinho. 282

74 - Walmyr Ayala, Alfredo Vitter, darei Valenço.

75 - Onofre Penteado, de Azevedo.

— ^ Nacional de APL. Cl^rido Geada, Edy carollo,

Walmir Ayala, Fernando Bolonha, Reis Júnior, Wolfang

Pfeiffer - indicados para FUNARTE. 1979 - Sala Nacional

de Arte Plástica - Walmyr Ayala, Clérido Geada, Vicente

de Pérsia, Geraldo Edson de Andrade, Carmem Portinho,

Quirino Campofiorito, José Cândido de Carvalho. 283

ANEXO 10

JURI JOVEM ARTE CONTEMPORÃNEA/MAC-USP

67 Seleção - José Geraldo Vieira, Caciporé Torres (eleito)

Walter Zanini. Premiação - Ryszard, Stanislawski, Eduardo

Wilde (diretor Museu Amsterdan, Walter Zanini.

68 - Maria Eugênia Franco, Nelson Leirner, Walter Zanini.

69 - Wolfang Pfeiffer, Nelson Leiner, Walter Zanini.

- Liseta Levy, Dova Ludis, Walter Zanini.

71 — Walter Zanini, Theon Sapadanius, Frederico Nasser, Anésia

Pacheco Chaves, José Geraldo Vieira.

7^ — Eliminou o juri e não concedeu prêmios. Houve uma escolha

final dos trabalhos ou de sua documentação que se

destinou à coleção do museu.