Universidade Federal Do Espírito Santo

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Universidade Federal Do Espírito Santo 1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO Claudeir Aparecido de Souza A VOZ NO SILÊNCIO – A LINGUAGEM PERFORMÁTICA INTERDITADA NA CANÇÃO POPULAR PRODUZIDA NO PERÍODO DA CENSURA DO BRASIL PÓS-1964: O CASO RONNIE VON Vitória 2016 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO Claudeir Aparecido de Souza A VOZ NO SILÊNCIO – A LINGUAGEM PERFORMÁTICA INTERDITADA NA CANÇÃO POPULAR PRODUZIDA NO PERÍODO DA CENSURA DO BRASIL PÓS-1964: O CASO RONNIE VON Este trabalho é submetido ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Espírito Santo como requisito para a obtenção do título de Doutor em Letras. Orientadora: Profa. Dra. Viviana Mónica Vermes Vitória 2016 3 AGRADECIMENTOS A Juliano Bossato a dedicação, o cuidado e o tempo dispensados ao meu trabalho; A Ariel Sesso o incentivo e o empenho demonstrados no período final de entrega do trabalho. 4 DEDICATÓRIA A Debora Barcelos 5 ―A voz foi infiel trocando de traqueia E o dono foi perdendo a voz E o dono foi perdendo a linha – que tinha E foi perdendo a luz e além‖ (Chico Buarque) 6 RESUMO O silenciamento é a interdição manifesta da circulação do sujeito pela decisão de um poder fortemente regulador. Uma vez que, no autoritarismo, o sujeito não pode ocupar diferentes posições, o que impõe ao mesmo a produção dos sentidos que não lhe são proibidos, resta, por meio da própria discursividade, o deslinde dos lugares de silêncio, para onde a materialidade do discurso escorre para significar. Nessa perspectiva, uma obra do cantor Ronie Von, produzida em 1968, em pleno contexto de acirramento da censura do governo militar brasileiro, apresenta uma série de elementos pelos quais o silenciamento imposto à voz e à corporeidade do cantor, tanto por seus pares quanto pelo poder maior na sociedade, que imbricava o jogo mercadológico e as políticas culturais do Estado autoritário, pode ser rompido pelos sentidos que escorrem nos vãos criados pelo jogo discursivo da própria obra e do seu cantor, ambos relegados ao silêncio. Nesse percurso, a análise da voz humana cantada apresenta-se como fio condutor da compreensão do trabalho dos gestos performáticos se realizando como discurso. Através da análise da obra de Ronnie Von gravada em 1968, busca-se entender e caracterizar determinados sentidos que se ofereceram à significação nos silêncios ou ―brancos‖ que acompanham a voz. A voz gravada do cantor é um ―meio‖ por onde escorrem os discursos ideológicos produzidos pela censura no contexto do autoritarismo brasileiro pós-1964. No decorrer do trabalho, verificam-se três configurações nas quais se dá o silenciamento ou a interdição do discurso. Na primeira, em que a voz canta o silenciamento, na medida em que a voz é projetada no espectro social ela se junta às demais vozes que projetam o mesmo discurso perfazendo um ―borrão‖ onde nada se distingue, configurando uma condição de interdição. Na segunda configuração, na presença da voz que canta em detrimento do silenciamento, a voz ecoa discursos interditados sem, entretanto, ter sofrido a ação direta da censura, permanecendo à revelia do espectro da mesma, bem como na periferia do campo de vozes censuradas configurando um ―duplo silenciamento‖. Na terceira configuração, em que a voz canta em silenciamento, sob a vigilância da censura, as performances carnavalizadas e parodiadas fazem ecoar o discurso interditado numa perspectiva para além do controle da censura. Nessa perspectiva, a obra de RV de 1968, mediada pela estética tropicalista, apresenta uma série de elementos pelos quais o silenciamento imposto à voz e à corporeidade do cantor, tanto por seus pares quanto pelo poder que imbricava o jogo mercadológico e as políticas culturais de um Estado autoritário, pode ser rompido pelos sentidos que escorrem nos vãos criados pelo jogo discursivo da própria obra relegada ao silêncio. Palavras-chave: Canção popular – Silenciamento - Ronie Von – Autoritarismo – Discurso - Poder. 7 ABSTRACT The muting is the expressed interdiction of the person‘s movement by decision of a strong regulation power. Once, in the authoritarianism, the person is not allowed to fill different positions, which forces, at the same time the production of the senses that are not prohibited to him/her, remains, across the discursivity, the clarification of the silence places, to where the materiality of the speech slides to have meaning. In that perspective, one work of the singer Ronnie Von, produced in 1968, in a full fiercer context of the brazilian military government, mediated by tropicalistic aesthetics, presents a series of elements whereby the muting imposed to singer‘s voice and corporeity, both by his colleagues and the power that had control over the market game, besides the politics of the authoritarian State, can be broken by the senses that slide in the holes created by the discursive game of the work itself, and it‘s singer, both relegated to the silence. Key Words: Pop song – Muting – Ronnie Von – Authoritarianism – Discous – Power. 8 Sumário CONSIDERAÇÕES INICIAIS ..................................................................................................... 9 Trata-se, por fim, de auscultar na corporeidade da voz cantada as marcas dos silenciamentos aqui propostos como mecanismos funcionando no engenho do poder para produzir silêncio não obstante o paradoxal soar das canções. .......................................................................... 18 1- EM TORNO DA CENTRALIDADE DA VOZ .............................................................................. 20 1.1 – LIMITES ENTRE VOZ E LINGUAGEM: A NATUREZA DA MATERIALIDADE DA VOZ .............................................................................................................................. 20 1.2- PERFORMANCE EM PERSPECTIVA: A PRESENÇA DO CORPO NA VOZ ...... 27 1.3- O PAPEL DA LETRA POÉTICA NA CANÇÃO: POSSÍVEIS RELAÇÕES ENTRE CANÇÃO POPULAR E LITERATURA ........................................................................... 30 2 – VOZ E RELAÇÕES DE PODER .............................................................................................. 37 2. 1- O TRABALHO DA VOZ NA LINGUAGEM: A VOZ E AS RELAÇÕES DE PODER ................................................................................................................................ 37 2.2 - VOZES SOB O PODER ............................................................................................. 39 2.3 - VOZES DE PODER CONTRA O PODER DO ESTADOO...................................... 43 2.4- PODER E INTERDIÇÃO DE DISCURSOS .............................................................. 49 2.5- NOS VÃOS DA INTERDIÇÃO DO DISCURSO, O SILÊNCIO .............................. 51 2.6- O TRABALHO DO SILÊNCIO NA CENSURA: A POLÍTICA DO SILENCIAMENTO ............................................................................................................ 54 2.7- O RUMOR DO SILÊNCIO: PENSANDO O SILENCIAMENTO IMPOSSÍVEL .... 56 3- CONSIDERAÇÕES SOBRE CANÇÃO POPULAR ..................................................... 58 3.1- PRODUÇÃO CULTURAL E ARTÍSTICA SOB A VIGÊNCIA DO REGIME MILITAR ............................................................................................................................ 58 3.2- A CANÇÃO POPULAR NO BRASIL DOS ANOS 1960 - 1970 ............................... 62 4. RONNIE VON NA ORDEM DO DIA. .......................................................................... 72 4.1 UMA INCURSÃO PELA ANÁLISE DO DISCURSO: A COSTRUÇÃO DOS LUGARES DE FALA E DE SILÊNCIO ............................................................................ 85 4.2- A VOZ QUE CANTA O SILENCIAMENTO: A BATUTA DO PODER ................. 91 4.3 – A VOZ QUE CANTA EM DETRIMENTO DO SILENCIAMENTO: UMA HISTÓRIA DE DUPLO SILENCIAMENTO .................................................................. 101 CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 119 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 120 ANEXOS..........................................................................................Erro! Indicador não definido. 9 CONSIDERAÇÕES INICIAIS O trabalho A voz no silêncio – a linguagem performática interditada na Canção Popular produzida no período da censura do Brasil pós-1964: o caso Ronnie Von, que se apresenta como tese de Doutorado em Letras, adstrito à linha de pesquisa Literatura e Outros Sistemas de Significação (LOSS), procede a pesquisa, levantamento e análise dos efeitos da política de silenciamento em performances da voz cantada da obra do cantor Ronnie Von, de 1968, cuja produção e circulação ocorrereu em plena vigência do acirramento da censura imposta a certas instâncias sociais e produtos culturais do país; período em que os aparelhos de manutenção do autoritarismo permeavam as ações do Estado brasileiro, entre as décadas de 1960 e 1970. A presente pesquisa nasceu da necessidade de intensificar a pesquisa sobre a Canção Popular, matéria da dissertação do Mestrado em Letras1, buscando extrapolar o trabalho com a letra poética rumo à compreensão do funcionamento da mesma com a linguagem musical, uma vez que a Canção é um gênero híbrido a desafiar o olhar do analista. Por conta das injunções do campo literário, as análises de canções inicialmente tiveram como procedimento modelar a busca pelo esgotamento dos sentidos da letra poética, afastando-se de um funcionamento mais específico no campo musical. O campo literário produziu trabalhos
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