Alertas Sobre As Conseqüências Dos Projetos Hidrelétricos No Rio Xingu Organizador A
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TENOTÃ-MÕ Alertas sobre as conseqüências dos projetos hidrelétricos no rio Xingu Organizador A. Oswaldo Sevá Filho Paulo Jares Paulo No dia em que o engenheiro Muniz compôs a mesa diretora dos trabalhos no ginásio coberto de Altamira, vários índios vieram se manifestar ali mesmo em frente à mesa, alguns falando em sua língua ao microfone e sendo traduzidos. Tu-Ira, prima de Paiakan, se aproximou gritando em língua kaiapó gesticulando forte com o seu terçado (tipo de facão com lâmina bem larga, muito usado na mata e na roça). Mirou o engenheiro, seu rosto redondo de maçãs salientes, traços de algum antepassado indígena, e pressionou uma e outra bochecha do homem com a lâmina do terçado, para espanto geral. Um gesto inaugurador. Situação que merece uma palavra-chave dos índios Araweté da Terra Ipixuna, no médio Xingu, recolhida pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro:· “Tenotã - Mõ significa “o que segue à frente, o que começa”. Essa palavra designa o termo inicial de uma série: o primogênito de um grupo de irmãos, o pai em relação ao filho, o homem que encabeça uma fila indiana na mata, a família que primeiro sai da aldeia para uma excursão na estação chuvosa. O líder araweté é assim o que começa, não o que comanda; é o que segue na frente, não o que fica no meio. Toda e qualquer empresa coletiva supõe um Tenotã-mõ. Nada começa se não houver alguém em particular que comece. Mas entre o começar do Tenotã-mõ, já em si algo relutante, e o prosseguir dos demais, sempre é posto um intervalo, vago mas essencial: a ação inauguradora é respondida como se fosse um pólo de contágio, não uma autorização” (trecho extraído de seu livro “Araweté o povo do Ipixuna” CEDI- Centro Ecumênico de Documentação e Informação (ISA), S.P., 1992, pág.67) TENOTÃ - MÕ 2005 Oswaldo Sevá TENOTÃ - MÕ Ficha Técnica organização A. Oswaldo Sevá Filho edição Glenn Switkes projeto gráfico Irmãs de Criação produção gráfica Irmãs de Criação Danilo Henrique Carvalho fotos capa Andreas Missbach Beto Ricardo, ISA tiragem 1000 exemplares 1ª edição • 2005 www.irn.org [email protected] (11) 3822.4157 realização Sumário APRESENTAÇÃO .......................................................07 CAPÍTULO 5 ............................................................114 Resumos técnicos e históricos das tentativas de Análise do projeto Belo Monte e de sua rede barramento do rio Xingu de transmissão associada frente às políticas Glenn Switkes e Oswaldo Sevá energéticas do Brasil Andre Saraiva de Paula MENSAGEM DE ABERTURA ...................................09 Dom Erwin Kräutler, bispo do Xingu 5.1. A eletricidade gerada em Tucuruí: para onde? para quê? ...............................................135 RESUMO EXECUTIVO............................................. 13 Rubens Milagre Araújo, Andre Saraiva de Paula e Glenn Switkes e Oswaldo Sevá Oswaldo Sevá 5.2. Dados de vazão do rio Xingu durante o período PARTE I – OS XINGUANOS E O DIREITO 1931-1999; estimativas da potência, sob a hipótese CAPÍTULO 1 ..............................................................29 de aproveitamento hidrelétrico integral ................ 145 Povos indígenas, as cidades, e os beiradeiros do Oswaldo Sevá rio Xingu que a empresa de eletricidade insiste CAPÍTULO 6 ............................................................150 em barrar Especialistas e militantes: um estudo a respeito Oswaldo Sevá da gênese do pensamento energético no atual governo (2002-2005) Informes das lideranças em Altamira, Pará Diana Antonaz 1.1. O assédio da Eletronorte sobre o povo e as entidades na região de Altamira ............................... 55 Antonia Melo PARTE III – NATUREZA: AVALIAÇÃO PRÉVIA DO PREJUÍZO 1.2. A Terra do Meio e os projetos de CAPÍTULO 7 ............................................................175 hidrelétricas no Xingu ............................................... 58 Evolução histórica da avaliação do impacto Tarcisio Feitosa da Silva ambiental e social no Brasil: sugestões para o complexo hidrelétrico do Xingu CAPÍTULO 2 ..............................................................63 Robert Goodland Uma abordagem jurídica das idas e vindas dos projetos de hidrelétricas no Xingu 7.1. A lógica da Volta Grande adulterada: Raul Silva Telles do Valle conseqüências prováveis afetando moradores urbanos, rurais e ribeirinhos em Altamira e CAPÍTULO 3 ..............................................................74 municípios vizinhos; efeitos possíveis para os Xingu, barragens e nações indígenas arquipélagos, pedrais, cachoeiras, Felício Pontes Jr e Jane Felipe Beltrão e na “ria” do baixo Xingu. ......................................192 Oswaldo Sevá 3.1. As pressões da Eletronorte sobre os autores do EIA trecho extraído de Louis Forline e Eneida Assis ..............91 7.2. Informe sobre a “Vazão ecológica” determinada para a Volta Grande do rio Xingu ....... 199 PARTE II – ELETRICIDADE PARA QUEM? Ivan Fumeaux ÀS CUSTAS DE QUEM? CAPÍTULO 8 ............................................................204 CAPÍTULO 4 ..............................................................95 Hidrelétricas planejadas no rio Xingu como Grandezas e misérias da energia e da mineração fontes de gases do efeito estufa: Belo Monte no Pará (Kararaô) e Babaquara (Altamira) Lúcio Flávio Pinto Philip M. Fearnside PARTE IV – O ANTI-EXEMPLO ALI PERTO, CAPÍTULO 13 ..........................................................296 O POVO AMEAÇADO E CONFUNDIDO Contra-ataque! Choque da Comissão Mundial de Barragens estimula a indústria de grandes CAPÍTULO 9 ............................................................245 barragens à ação Política e sociedade na construção de efeitos Patrick McCully das grandes barragens: o caso Tucuruí Sônia Barbosa Magalhães 13.1. Barragens e desenvolvimento: um novo modelo para tomada de decisões............................ 301 CAPÍTULO 10 ..........................................................255 Comissão Mundial de Barragens Índios e barragens: a complexidade étnica e territorial na região do Médio Xingu ANEXOS Antonio Carlos Magalhães Manifestos e cartas abertas das entidades da região paraense do rio Xingu (2001 e 2002) ......... 317 CAPÍTULO 11 ..........................................................266 Dias de incertezas: O povo de Altamira diante Glossário ...................................................................335 do engodo do projeto hidrelétrico Belo Monte Reinaldo Corrêa Costa Endereços de contato de grupos trabalhando em defesa do Xingu .................................................341 PARTE V – OUTRO FUTURO: NÃO BARRAR RIOS NEM GENTE, QUE VALEM E VALERÃO POR SI Resumos biográficos dos autores ............................ 343 CAPÍTULO 12 ..........................................................281 Conhecimento crítico das mega – hidrelétricas: para avaliar de outro modo alterações naturais, transformações sociais e a destruição dos monumentos fluviais Oswaldo Sevá Apresentação: Resumos técnicos e históricos das tentativas de barramento do rio Xingu Glenn Switkes e Oswaldo Sevá Este é um livro feito de capítulos e notas técnicas inéditas, e de alguns trechos extraídos de trabalhos já publicados, que foram assinados por 20 pessoas que acompanham de perto o problema dos projetos hidrelétricos no rio Xingu e na região amazônica. É uma obra de militantes de entidades, de jornalistas, e de pesquisadores de várias áreas acadêmicas, participantes de um Painel de especialistas e de entidades por nós organizado. Esperamos que seja uma ferramenta fundamental para ampliar e aprofundar o debate sobre a proposta da construção do Complexo Hidrelétrico do Xingu. Nosso livro é para atualizar um embate de mais de vinte anos. Nosso compromisso é com as pessoas que vivem e viverão no vale do Xingu, especialmente os que estão ameaçados por esses projetos. Estes milhares de moradores urbanos e rurais, os ribeirinhos, beiradeiros 07 de todo tipo, as muitas aldeias indígenas e seus muitos descendentes, desaldeiados, soltos pelo mundo, misturados com os demais brasileiros, quase todos vão sendo cercados em seu pedaço amazônico. Cercados lá onde já viviam há muito, e lá aonde chegaram há mais tempo, nessas glebas que transforma- ram em roças e pomares, em seus recantos cheios de riquezas cobiçadas pelos predadores que a especu- lação move, que o desgoverno acomoda. São levas de gentes e gerações que se entrecruzam, os xinguanos antigos como os vários grupos Kaiapó, os Parakanã, os Araweté e os Juruna, também os seringueiros do curto segundo ciclo da borracha (nos anos 1930, 1940), e xinguanos recentes como os colonos e fazendeiros dos travessões da Transamazôni- ca, os pobres e os peões, os comerciantes e artesãos que já estavam e os que vêm chegando a Altamira, a São Félix do Xingu e tantas cidadezinhas e vilarejos. Todos vão tendo agora que conviver, que se aliar com - ou explorar - os demais pobres errantes que vão à frente da expansão, essa infantaria que vai garimpando ouro, estanho e pedras, serrando árvore, abrindo estrada, fazendo pasto, quase todos trabalhando pros donos, tentando sobreviver, e muitos ainda conse- guindo enviar um pouco de renda pros seus que ficaram, pros que deles dependem. Nesse meio de mundo, chamado de Terra do Meio, um Brasil fervilhante e conflituoso, onde sempre cabe cometer mais uma pilhagem – ou então criar grandes oportunidades nesta imensa continuidade fragmentada por seus enclaves e por eixos conectados aos circuitos internacionais, pontilhada de pistas de pouso, tracejada de rotas fluviais, um conjunto bem distinto daquela Amazônia distante, paradisíaca,