<<

Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

Telenovelas brasileiras adaptadas: um levantamento do período compreendido entre 1998 e 2013

Regina Tavares de Menezes dos Santos1

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP

Resumo

O presente artigo visa dar continuidade ao levantamento realizado por Reimão (2004) no qual se observa, entre outros aspectos, a quantidade de brasileiras adaptadas de romances nacionais, veiculadas em emissoras da rede aberta de televisão no Brasil. Para tal fim, torna-se necessário o voo panorâmico pela revisão da literatura desta área de pesquisa, pela história das telenovelas brasileiras e pela relação de proximidade entre a e a literatura. Em seguida, foi necessário pesquisar junto aos sites de cada emissora de televisão aberta: os nomes e a quantidade de telenovelas produzidas entre os anos de 1998 e 2013, entre outras informações como ficha técnica etc. Acreditamos que esta abordagem pode suscitar pistas para novas reflexões acadêmicas e investigações científicas junto à produção televisual nacional.

Palavras-chave: Telenovela brasileira; produção televisual; telenovelas adaptadas; literatura nacional.

Introdução

A telenovela brasileira vem sendo alvo de pesquisas científicas há pelo menos quarenta anos, caso considerarmos a primeira dissertação de mestrado realizada sobre o tema em 1974 (FADUL, 1993). Nesse sentido, estudos como os promovidos por Ortiz (1989); Fadul (1993); Fernandes (1987); Borelli (2001); Reimão (2004); Sadek (2008), entre tantos outros, de igual excelência, se destacam. Borelli (2001) afirma que a inserção da produção televisual como objeto de estudo no meio acadêmico foi tardia, tendo em vista que a telenovela consta na programação da televisão desde sua origem, em 1951. Para Borelli (2001) as narrativas ficcionais televisivas percorreram um longo caminho até serem reconhecidas como objetos de reflexão acadêmica no campo cultural. Ortiz (1989) também comenta como são raras as produções acadêmicas que tomaram as novelas como objeto de análise, graças ao desprestígio cultural da produção televisual no meio.

As razões que justificam a afirmação anteriormente mencionada, sobre a existência de um certo preconceito acadêmico diante do fenômeno das telenovelas, residem no fato de que, neste debate, cultura sempre foi considerada sinônimo de culto, erudito. Ainda que se tenha preservado, no

1 Trabalho apresentado pela doutoranda dos Estudos Pós-graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Regina Tavares de Menezes dos Santos ([email protected]), no DT4 Comunicação Audiovisual - GP Ficção Seriada do XV Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação, evento componente do XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.

1 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

contexto acadêmico, um espaço para a análise de manifestações da cultura popular (...) (BORELLI, 2001, p.30)

Bosi (1992) comenta a diversidade cultural brasileira:

Teríamos em registro analítico: cultura universitária, cultura criadora extra-universitária, indústria cultural e cultura popular. Do ponto de vista do sistema capitalista tecnoburocrático, um arranjo possível é colocar do lado das instituições a Universidade e os meios de comunicação de massa; e situar fora das instituições a cultura criadora e a cultura popular. (BOSI, 1992, p. 309)

A consolidação da cultura de massa no Brasil e no mundo a partir dos anos 1960, assim como a hegemonia do pensamento frankfurtiano nos estudos da cultura contemporânea impregnou, sobremaneira, as pesquisas da época sobre telenovelas (BORELLI, 2001). Mais adiante, Bosi concorda com Borelli:

O que se percebe, porém, como novidade importante é a posição crítica do intelectual diante da indústria cultural. A atitude adesista e até mesmo entusiástica, comum na década de 60, época áurea das leituras sobre mass communication, passou a ser crítica a partir de 70. Multiplicam-se nas faculdades dissertações e teses que procuram denunciar a ideologia conformista dos grandes programas de TV ou de certas figuras-ídolo dos quadrinhos mais vendidos. Sob a égide de Adorno, faz-se uma denúncia radical da indústria cultural, denúncia que se estende a todos os meios de comunicação, e que acaba sendo um vezo contra-ideológico bastante pronunciado. Chega-se até ao sacrilégio de arranhar a idolatria futebolística acionada pela propaganda oficial. Essa posição de desconfiança, por parte da cultura de resistência, não altera, porém, como se pode perceber facilmente, o quadro objetivo estatístico que continua contando com o êxito garantido pela eficiência da indústria cultural e do seu respectivo mercado. (BOSI, 1992, p. 315)

Para Borelli (2001) somente nos anos de 1980, as pesquisas acadêmicas nesta área adquiriram um tom mais atenuado, em concordância com os Estudos Culturaisi. Obviamente, pesquisas frankfurtianas persistiam entre os marxistas mais ortodoxos, contudo crescia em paralelo, análises apoiadas no discurso mais ameno de Walter Benjamin: “Além disso, mantém se o diálogo com a Escola de Frankfurt privilegiando, entretanto, menos as tendências preconizadas por Adorno (...) e mais um certo tom “benjaminiano” de crítica à modernidade”. (BORELLI, 2001, p. 31) O número de produções acadêmicas a respeito das telenovelas não se assemelha em nada ao cenário de 40 anos atrás, tendo em vista o número considerável de centros de pesquisa da telenovela em universidades brasileiras, como o Centro de Estudos da Telenovela da Universidade de São Paulo (USP), o CETVN. Além disso, o teor das pesquisas científicas tem se desligado da análise ideologizada dos meios para se relacionar a metodologias diversas como a dos Estudos de Recepçãoii, de acordo com Fadul (1993).

Panorama histórico

É consenso entre autores como Ortiz (1989), Borelli (2001) e Sadek (2008) que a telenovela brasileira tem origem em três frentes diversas, são elas: o folhetim, a radionovela e a soap-opera norte-americana.

2 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

O folhetim surge na França no século XIX como consequência de uma série de fatos revolucionários para a impressão de jornais e livros, tais como: “(...) a fabricação de tinta para papel, introdução de processos para impressão em grande escala, novo maquinário (prensa a vapor e mecânica)” (ORTIZ, 1989, p.12). Outro dado importante está situado no campo da leitura. Inegavelmente, a aptidão à leitura contribuiu para a produção e a difusão da imprensa impressa. Sobre o tema, Chartier revela os motivos da “revolução da leitura”, já sentida na segunda metade do século XVIII:

Seus suportes foram bem observados na Inglaterra, na Alemanha e na França: assim, o crescimento da produção do livro, a multiplicação e a transformação dos jornais, o sucesso dos pequenos formatos, a redução do preço do livro, graças às cópias, a proliferação das sociedades de leitura (...) como as bibliotecas de empréstimo (...). (CHARTIER, 1998, p. 100)

Ortiz (1989) ressalta que o folhetim tem origem popular e surge interessado no entretenimento. Geralmente, situado no rodapé da página de jornal, o folhetim tinha sua história publicada em partes. No Brasil, a nova modalidade literária chega quase que simultaneamente à Europa, contudo como sugere Hallewel (2005), a literatura folhetinesca era dirigida à elite do país, e por este motivo, dificilmente atingiria o status de literatura popular, já conquistado no Velho Mundo. Para Silva (2009), a telenovela possui proximidade com o folhetim na medida em que: se constitui em blocos e capítulos, assim como o folhetim em edições; carrega o gancho, ou melhor, o suspense no final de cada capítulo, assim como nos romances- folhetins; por fim, a oralidade presente na narrativa da telenovela também se assemelha à existente na literatura folhetinesca e na literatura oral. Para a autora, a oralidade aqui se caracteriza como: “(...) uma forma de descobrir o mundo, de se informar, de perpetuar os costumes.” (SILVA, 2009, p.8). Mais adiante, a autora afirma que a telenovela pode ser considerada agente narrador da pós-modernidade, como os folhetins de outrora. Para Benjamin (1985), as narrativas escritas que mais de aproximam das histórias orais contadas pelos narradores anônimos podem receber o título de narradores da modernidade. Ao concluir sua tese, Silva (1985) considera que o romance-folhetim assim o fizera. “Portanto é possível afirmar que o formato telenovela através de sua estrutura ficcional - o gancho, o suspense, a edição em capítulos diários, os territórios da ficcionalidade (...) é um narrador da contemporaneidade (...).” (Ibidem, p. 14) Follain (2010) também aponta características semelhantes às levantadas por Silva (1985), no que diz respeito aos romances publicados nos jornais:

Em função da nova economia da escrita instalada com a tecnologia do impresso, os romances, desde o momento em que começaram a ser publicados em capítulos nos jornais, passaram por mutações, como a divisão em capítulos menores e a instituição do gancho entre um capítulo e outro, visando estimular a curiosidade do leitor: marcas de composição que tendiam a se manter mesmo quando, posteriormente, as narrativas ficcionais eram publicadas em livro, ganhando, então, outro sentido, uma vez que foram determinadas pela modalidade de leitura instituída pela veiculação, em fragmentos, no suporte do jornal. Acrescente-se que, divulgado no espaço dos jornais, o romance derrubou a fidelidade aos modelos literários mais clássicos, e, afirmando-se como gênero, pouco a pouco, passou a disputar a popularidade com o teatro. (FOLLAIN, 2010, p. 27)

3 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

Na trilha da popularização vivida pela comunicação de massa nos Estados Unidos, o rádio passa a veicular, pela primeira vez, histórias seriadas na década de 1930. “No início trata-se de dramas com uma duração curta, quinze minutos, apresentados diariamente no horário diurno.” (ORTIZ, 1989, p. 18) Com a Grande Depressão, da década de 1930, grandes organizações que financiavam o rádio comercial passaram a produzir as “óperas de sabão”. Veiculadas pela manhã e focando com maior ênfase as donas de casa, a soap-opera era marcada pela venda de produtos de higiene pessoal e limpeza e não tinha um fim definido, divergindo assim das telenovelas latino-americanas, em especial, das brasileiras. A herança desta modalidade radiofônica persiste nas telenovelas norte-americanas. Segundo Ortiz, (1989, p.19) “Por isso as “novelas” americanas são bastante longas, chegando a permanecer no ar por mais de vinte anos (...)”. No Brasil, a radionovela chega somente em 1941, seguindo a tendência norte- americana, as histórias eram financiadas por grandes empresas como a Colgate-Palmolive e o público-alvo era, em sua maioria, composto por donas de casa. (ORTIZ, 1989) Revisitando o início da produção televisual brasileira é possível compreender a migração dos profissionais do rádio para a televisão, especialmente para as primeiras telenovelas. Ao lado destes profissionais, destacam-se personalidades do cinema e do teatro como pioneiros das telenovelas. Adiante, notaremos que este pode ser o motivo de certo desprestígio da telenovela em meio aos demais produtos da televisão. A primeira telenovela nacional Sua vida me pertence data de 1951 e foi veiculada pela TV Tupi. De acordo com Sadek (2008), a novela era transmitida duas vezes por semana com capítulos de aproximadamente 20 minutos de duração. No ano seguinte, o número de telenovelas brasileiras saltou de 1 para 12, segundo ORTIZ (1989). A ausência de mão de obra preparada especificamente, para a televisão - ainda em adaptação no país - abriu precedentes para uma atuação amadora, que só viria a ser alterada no final dos anos de 1960 e início dos anos de 1970. Para Borelli (2001), as principais inovações deste período foram, cronologicamente: - O aparecimento do videoteipe; - O uso de câmeras mais leves, capazes de realizar gravações externas; - A introdução da cor; - O investimento e a formação em recursos humanos especializados; - O processo de divisão do trabalho; - A transmissão da programação televisual em rede nacional, para determinadas emissoras. Em 1963, surge a primeira telenovela diária 2-5499 Ocupado, que trazia futuros ícones da teledramaturgia brasileira como Glória Menezes e Tarcísio Meira. Fernandes descreve a trama: “Glória é uma presidiária que trabalha como telefonista do presídio. Tarcísio apaixona-se por ela através do único contato: a voz, sem saber sua real condição.” (1987, p.39) O ano de 1964 é marcado pela fundação da TV Globo e pelo reconhecimento da novela O direito de nascer como o primeiro grande sucesso ficcional da TV brasileira, como descreve Fernandes:

Seu encerramento, a 13 de agosto de 1965, teve uma festa no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, e no dia seguinte a façanha seria repetida com maior repercussão no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro. O estádio superlotado dava uma mostra do poder das novelas sobre as massas. Numa espécie de neurose coletiva, o povo gritava os nomes dos

4 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

personagens e chorava por Mamãe Dolores, Maria Helena e Albertinho. (1987, p. 50)

Depois de experimentar inúmeros gêneros e linguagens, a telenovela brasileira viveu uma mudança drástica na constituição de suas tramas: a veiculação da realidade brasileira nos enredos, atuações mais realistas e debates críticos passaram a contaminar as produções do final dos anos de 1960.

Entre os dias 4 de novembro de 1968 e 30 de novembro de 1969 a TV Tupi transmitiu um marco e uma referência na constituição da identidade brasileira da telenovela: . Linguagem coloquial, interpretação natural, diálogos ágeis, pequenas histórias do dia a dia e um protagonista que era um anti-herói - um alegre e simpático jovem atrás de um “golpe do baú”. Beto Rockfeller foi antecedida por outras produções que buscavam fugir do melodrama e ser mais “realistas” e “próximas do cotidiano” como Antonio Maria, de Geraldo Vietri (Tupi, 1968). No final de 69, captando essa tendência do gênero, a TV Globo investiu em Véu de Noiva, de Janete Clair, mais voltada para a realidade nacional e que a emissora anunciava como ‘novela verdade’, “onde tudo acontece como na vida real”. (REIMÃO, 2004, p. 22)

A respeito desta mudança de “eixo temático” nas telenovelas brasileiras, Borelli diz que: (...) incorpora-se à trama um tom de debate crítico sobre as condições históricas e sociais vividas pelos personagens; articulam-se, no contexto narrativo, os tradicionais dramas familiares e universais da condição humana, os fatos políticos, culturais e sociais, significativos da conjuntura no período; esta nova forma inscreve-se na história das telenovelas como uma característica particular da produção brasileira; e estas narrativas passam a ser denominadas “novelas verdade”, que veiculam um cotidiano que se propõe crítico, por estar mais próximo da vida “real” e por pretender desvendar o que estaria ideologicamente camuflado na percepção dos receptores. (2001, p. 33)

Com o passar do tempo, a Rede Globo se destaca em meio às demais emissoras como produtora renomada de telenovelas, “Mais do que líder de audiência, a Globo chegaria ao final dos anos 70 como rede televisiva francamente hegemônica no país”. (REIMÃO, 2004, p. 25) Afim de tomar uma postura estratégica no mercado competitivo, a Rede Globo resolve estabelecer faixas de programação por horário, para os mais diferentes telespectadores brasileiros. “Na TV Globo, as telenovelas das 19 horas eram dirigidas aos públicos infantil e jovem; o horário das 20 horas era voltado à reunião da família em torno da TV, depois de assistirem o Jornal Nacional; e o horário das 22 horas era reservado a tramas mais adultas.” (SADEK, 2008, p. 37). Com o tempo entraram na programação televisiva, as novelas das 17h50 (para o público juvenil), das 18h30 (geralmente com temas históricos), das 19h35 (geralmente, com temas mais cômicos) e das 21h, a antiga “novela das 8” (com cenas de sexo e violência)iii. Para Ortiz (1989), a retirada da novela das 22h da programação da Rede Globo marca a inserção das séries e minisséries na produção dramaturga nacional. Ao longo destes sessenta anos, as telenovelas brasileiras têm lançado mão de inúmeros personagens, enredos e cenários advindos da literatura; tratam-se de incontáveis telenovelas, séries e minisséries caracterizadas como adaptações literárias de romances

5 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

brasileiros. A partir de estudos encaminhados por Reimão (2004, p.18): “Entre 1951 e 1963, enfocando as telenovelas não-diárias veiculadas em São Paulo, têm-se 164 produções, sendo que cerca de 95 delas eram adaptações literárias, e destas, dezesseis eram adaptações de romances de autores brasileiros.” Para Reimão (2004), os romances brasileiros adaptados para TV, especialmente entre 1951 e 1963, traziam legitimidade à telenovela diante dos telespectadores, dos investidores e dos profissionais do meio, tendo em vista que “O pólo culto e prestigiado da TV de então ficava por conta dos teleteatros.” (REIMÃO, 2004, p.18) Com o sucesso progressivo das telenovelas no Brasil, a necessidade de se ancorar na literatura como forma de legitimidade diminui e o número de telenovelas adaptadas de romances brasileiros em canais comerciais também. “Tomando, como amostra, as telenovelas diárias transmitidas em São Paulo entre 1963 e 1969 teremos cerca de 167 produções. Do total dessas produções apenas seis eram adaptações de romances de autores nacionais.” (Ibidem, p.21) Mais adiante, a autora conclui que além da diminuição de adaptações literárias nas telenovelas, a origem dos romances nos anúncios publicitários destas ficções, é minimizada ou omitida. Segundo levantamento feito pela autora Reimão (2004) a partir dos dados estabelecidos por Fernandes (1987) é possível constatar tal realidade. Vide a seguir, tabela publicada por Reimão (2004, p.42):

Total de Telenovelas Telenovelas adaptadas de romances de autores brasileiros em canais comerciais abertos*

1970-1979 139 18 = 12%

1980-1989 116 12 = 10,3%

1990-1997 63 6 = 9,5%

* “Em 1969 a TV Cultura de São Paulo tornou-se uma emissora pública. Estamos excluindo desta tabela as telenovelas adaptadas de romances brasileiros produzidas por esta emissora devido ao seu caráter francamente educativo.” (Ibidem, p.42)

Para dar continuidade ao levantamento feito por Reimão (2004), este artigo pretende levantar quantitativamente as telenovelas produzidas nas emissoras comerciais da rede aberta de televisão, no período de 1998 a 2013 e identificar, posteriormente, quantas e quais destas telenovelas são baseadas e/ou inspiradas em romances brasileiros. Esperamos que este ínfimo levantamento contribua de alguma forma com a produção acadêmica em torno deste elemento cultural tão bem quisto pelo brasileiro.

Metodologia

Este artigo amparou-se em uma pesquisa de cunho quantitativo e qualitativo e teve como instrumento de coleta e análise de dados, os métodos das pesquisas bibliográfica, exploratória e documental.

6 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

A pesquisa bibliográfica se deu por meio da revisão da literatura em livros e publicações acadêmico-científicas relacionadas à produção de telenovelas no Brasil. Tal levantamento bibliográfico foi substancial para proporcionar a exploração do tema com maior familiaridade e auxiliar na construção de hipóteses de pesquisa para futuros estudos no âmbito das ciências sociais. Para empenhar a pesquisa documental junto a materiais que ainda não haviam sido apontados em bibliografia recente, fez-se necessário pesquisar, junto aos sites de cada uma das emissoras comerciais da TV aberta brasileira, a ficha técnica das telenovelas exibidas no período de 1998 a 2013. As emissoras e seus respectivos endereços eletrônicos consultados foram: Rede Globo - http://memoriaglobo.globo.com/; Rede Manchete - http://redemanchete.net/temas/#Novelas; Rede Record - http://rederecord.r7.com/historia.html; as emissoras SBT e Band não fazem, em seus sites, menção às telenovelas já exibidas em sua programação. Sendo assim, consultamos o endereço http://www.teledramaturgia.com.br/tele/home.asp para realizar o levantamento sobre as referidas emissoras. Cabe mencionar que o presente levantamento considerou apenas telenovelas produzidas no período de 1998 a 2013, tendo em vista que a pesquisa realizada por Reimão (2004) trouxe dados equivalentes até 1997. Vale ressaltar que nosso artigo exclui séries e minisséries. Dando prosseguimento ao levantamento, nos coube relacionar e quantificar as telenovelas exibidas e não necessariamente produzidas por cada uma das emissoras comerciais da rede aberta de televisão, são elas:

Emissora Ano Telenovela 1998 Meu pé de laranja lima Serras azuis 2005 Floribella Band 2006 Floribella (continuação) Mandacaru Paixões proibidas 2007 Dance dance dance 2008 Água na boca 1998 Era uma vez Torre de babel 1999 Força de um desejo Terra Nostra Vila Madalena 2000 Esplendor Laços família Uga Uga 2001 As filhas da mãe Estrela-guia

7 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

O clone Rede Globo Um anjo caiu do céu 2002 Coração de estudante Esperança Sabor da paixão 2003 Agora é que são elas 2004 Começar de novo 2005 Alma gêmea América Bang-bang Belíssima 2006 Cobras e lagartos Páginas da vida Pé na jaca Sinhá moça 2007 Eterna magia Paraíso tropical 2008 Ciranda de pedra Negócio da China Rede Globo Três irmãs 2009 Caminho das Índias Caras e bocas Paraíso 2010 Araguaia Passione Ti ti ti 2011

8 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

Fina estampa Insensato Coração Morde e assopra 2012 Avenida brasil Gabriela 2013 Amor à vida Além do horizonte Rede Manchete 1998 Brida 1998 Estrela de fogo 1999 Louca paixão Tiro e queda 2000 Marcas da paixão Vidas cruzadas 2001 Roda da vida 2004 Metamorphoses A escrava Isaura 2005 Essas mulheres Prova de amor 2006 Alta estação Rede Record Bicho do mato Cidadão brasileiro 2007 Amor e intrigas Luz do sol Os mutantes 2008 2009 Bela, a feia Promessas de amor 2010 Ribeirão do tempo 2011 Rebelde 2012 Máscaras Balacobaco 2013 Pecado Mortal 1998 Fascinação Pérola negra 2001 Amor e ódio O direito de nascer Pícara sonhadora

9 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

2002 Marisol Pequena travessa 2003 Canavial de paixões 2004 Esmeralda SBT 2005 Os ricos também choram Xica da Silva 2006 Cristal 2007 Amigas e rivais Maria esperança 2008 Pantanal Revelação 2009 Dona Beija Vende-se um véu de noiva 2010 A história de Ana Raio e Zé Trovão 2011 Amor e revolução 2012 Corações Feridos 2013 Chiquititas

Ao total, foram exibidas 134 telenovelas na rede aberta e comercial de televisão do Brasil. Deste montante, 11 são telenovelas adaptadas de romances brasileiros, conforme exposto na tabela abaixo. Não foram consideradas, a seguir, as telenovelas adaptadas e exibidas em caráter de reprise. Também cabe informar que, segundo os sites consultados, as telenovelas podem ter sido adaptadas, baseadas ou inspiradas pelos livros citados.

Emissora Ano Telenovela Livro BAND 1998 Serras azuis Romances Serras azuis, Branca bela e Nó cego de Geraldo França de Lima 1998 Meu pé de laranja lima Romance homônimo de José Mauro de Vasconcellos 2006 Paixões proibidas Romances Amor de perdição, Mistérios de Lisboa e Livro negro de Padre Dinis de Camilo Castelo Branco Rede Globo 2001 Porto dos milagres Romances Mar Morto e A descoberta da América pelos turcos de Jorge Amado 2004 Cabocla Romance homônimo de Ribeiro Couto 2006 Sinhá moça Romance homônimo de Maria Dezonne Pacheco Fernandes 2008 Ciranda de pedra Romance homônimo de Lygia Fagundes Teles Rede Manchete 1998 Brida Romance homônimo de Paulo Coelho Rede Record 2004 A escrava Isaura Romance homônimo de Bernardo Guimarães 2005 Essas mulheres Romances Senhora, Lucíola e Diva de José de Alencar 2009 Poder paralelo Romance Honra ou vendetta de Silvio

10 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

Lancelotti

Resultados

Neste levantamento, observamos que apenas 8,8% das telenovelas exibidas, no período de 1998 a 2013 na rede aberta comercial de televisão, são adaptações de romances brasileiros. Desta amostragem, nos chamou atenção, o número considerável de telenovelas adaptadas de romances brasileiros na condição de remakes, ou seja, regravações de telenovelas. Os remakes veiculados pela Rede Globo foram: Cabocla, Sinhá moça e Ciranda de Pedra. Tais telenovelas foram coincidentemente exibidas às 18h30 e são consideradas “novelas de época”. De certa forma, esta faixa de programação na referida emissora atesta sua vocação para a exibição de telenovelas com temas históricos. Outros remakes de telenovelas adaptadas de romances brasileiros também puderam ser constatados em outras emissoras: A escrava Isaura (Rede Record) e Meu pé de laranja limaiv (Band). Podemos aferir ainda, o interesse das telenovelas por romances recém-lançados tais como: Brida (Rede Manchete)v e Poder paralelo (Rede Record). Ambas as telenovelas, tiveram os respectivos romances publicados em 1990 e 2001. Por fim, notamos que algumas destas telenovelas são baseadas, inspiradas ou adaptadas livremente de um ou mais romances do mesmo autor. Este é o caso das telenovelas: - Serras azuis (Band): Baseada em três romances de Geraldo França de Lima, são eles: Serras azuis, Branca bela e Nó cego. - Paixões proibidas (Band): Baseada em três romances de Camilo Castelo Branco, são eles: Amor de perdição, Mistérios de Lisboa e Livro negro de Padre Dinis. - Porto dos milagres (Rede Globo): Baseada em dois romances de Jorge Amado, são eles: Mar morto e A descoberta da América pelos turcos. - Essas mulheres (Rede Record): Baseada em três romances de José de Alencar, são eles: Senhora, Lucíola e Diva.

Considerações Finais

A partir dos dados levantados com este breve levantamento é possível observar o surgimento oportuno de determinadas hipóteses de pesquisa, capazes de despertar o interesse desta presente pesquisadora e de seus pares em investigações científicas futuras. Como já foi observado anteriormente, o número de telenovelas adaptadas de romances brasileiros em sua segunda ou até mesmo terceira versão merece destaque. O fato pode servir como indício da preocupação das emissoras com a preservação da memória da literatura, das telenovelas e até mesmo da televisão brasileira. O papel de guardião da memória exercido pelas telenovelas atualmente, também se assemelha à função de narrador da pós-modernidade como atesta Silva (2009). A constatação de que os remakes de telenovelas adaptadas de romances brasileiros correspondem a tramas de época nos leva a crer que as telenovelas exercem papel determinante na produção do imaginário que o país tem de si próprio, inclusive de seu passado. Contudo, em consonância com Reimão (2004), cabe recordar, nos primórdios da televisão brasileira, o poder legitimador das telenovelas adaptadas de romances brasileiros na corrida desenfreada das emissoras comerciais pela audiência. Para aferir possíveis estratégias de legitimação do gênero ficcional televisivo na atualidade, seria necessário pesquisar o contexto das emissoras e das produções de suas telenovelas.

11 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

Outra análise profícua diz respeito às telenovelas baseadas na obra de romancistas nacionais. Seria relevante estudar de que forma a telenovela tratou de dois ou até três livros de um mesmo autor, simultaneamente. Valeria compreender como os personagens de diferentes tramas foram mesclados em uma história única. Caberia ainda entender até que ponto os enredos foram mantidos ou maculados diante do tratamento do escritor da telenovela e/ou até mesmo da interferência do público-telespectador. Estas são apenas algumas das hipóteses de pesquisa a serem exploradas a partir deste levantamento quantitativo. De forma alguma, este artigo tem a intenção de esgotar o tema em questão, inclusive reconhece suas fragilidades; para citar algumas delas: a não-distinção entre telenovelas adaptadas de romances brasileiros e telenovelas inspiradas ou baseadas na obra de determinados autores, a não-consideração de séries e minisséries adaptadas de romances brasileiros, as telenovelas adaptadas e exibidas em caráter de reprise, entre outros aspectos.

Referências Bibliográficas

BENJAMIN, W. A Paris do Segundo Império em Baudelaire. In: Obras escolhidas. São Paulo: Brasiliense, 1985. BORELLI, S. H. S. Telenovelas brasileiras: balanços e perspectivas. São Paulo em perspectiva. São Paulo, V, 15, n. 33, jul/set. 2001 BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p.308-345: Cultura brasileira e culturas brasileiras. CHARTIER, R. A ordem dos livros. Brasília: Ed. Club, 1998. FADUL, A. Ficção seriada na TV: as telenovelas latino-americanas (Bibliografia anotada da telenovela brasileira). São Paulo, ECA-USP, 1993. FERNANDES, I. Memória da telenovela brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1987. FOLLAIN, V. Narrativas em trânsito. Revista Contracampo n. 21. Niterói: UFF, Ag. 2010, p. 26- 39. HALLEWELL, L. O livro no Brasil. São Paulo: Edusp, 2005. HISTÓRIA da Rede Record. Disponível em: . Acesso em: 20 de jun.2011. MEMÓRIA Globo. Disponível em: . Acesso em: 20 de jun.2011. TELEDRAMATURGIA. Disponível em: . Acesso em: 20 de nov.2013. NOVELAS da Rede Record. Disponível em: . Acesso ORTIZ, R.; BORELLI, S.H.S. e RAMOS, J.M.O. Telenovela: história e produção. São Paulo, Brasiliense, 1989. PAULINO, R. A. F. Estudo de Recepção: o mundo do trabalho como mediação da comunicação. São Paulo, ECA-USP, 1999. (Tese) REIMÃO, S. Livros e televisão: correlações. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004. SADEK, J. R. Telenovela: um olhar do cinema. São Paulo: Summus, 2008. SILVA, J. F. T. Telenovela: o narrar da pós-modernidade. In: Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, XXXII, 2009, Curitiba. Anais eletrônicos do Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Disponível em http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-2317-1.pdf. Acesso em: 15 de jun. 2011. WOLF, M. Teorias das Comunicações de Massa. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

i Ver A perspectiva dos Cultural studies em Wolf (2005.

12 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015

ii Ver PAULINO, R. A. F. Estudo de Recepção: o mundo do trabalho como mediação da comunicação. São Paulo, ECA- USP, 1999. (tese). iii Informações obtidas no site: http://redeglobo.globo.com/programacao.html, em 22/06/2011. iv A Band produziu a terceira versão deste romance para a televisão. O romance também já foi adaptado para o cinema. v Brida foi a última telenovela produzida pela Rede Manchete.

13